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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 110

ANO DE 1971 25 DE JUNHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 110, EM 24 DE JUNHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amilcar da Costa Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 105 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
A Sr.ª Deputada D. Maria Raquel Ribeiro realçou a oportunidade do decreto-lei que introduz alterações ao Estatuto Judiciário, a propósito da oportunidade dada aos licenciados do sexo feminino quanto à possibilidade de ingresso na magistratura.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta e projectos de lei de alterações à Constituição Política, tendo usado da palavra os Srs. Deputados D. Custódia Lopes, Correia da Cunha, Santos Bessa, David Latina, D. Sinclética Torres, Maximiliano Fernandes e Pereira de Magalhães.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 30 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Boboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Henrique José, Nogueira Rodrigues.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.

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Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
Teodoro de Sousa Pedro.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 106 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs tem reclamações a apresentar ao n.º 105 do Diário das Sessões, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Da empresa CHA, de Moçambique, da Comissão Municipal Bolongongo, da Câmara Municipal de Nova Sintra e da Comissão das Confrarias Muçulmanas Nativas, com sede na cidade de Moçambique, apoiando as intervenções dos Deputados do ultramar ma defesa da proposta de lei de revisão constitucional.

Postal

Do Sr. Eduardo Rodrigues, a propósito da forma de eleição do Chefe do Estado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr. Deputada D. Maria Raquel Ribeiro.

A Sr.ª D. Maria Raquel Ribeiro: - Sr. Presidente, Sus. Deputados: Na passada sessão legislativa, quando há pouco mais de um ano pudemos intervir nesta Câmara a propósito da criação dos tribunais de família, propusemos que, na assessoria de tais tribunais, fosse possível a presença de licenciados em Direito do sexo feminino. Dizíamos então que, baseada no direito da não discriminação que a Constituição Política reconhece, fosse reconhecida a possibilidade de a mulher portuguesa ascender a magistratura, tal como é de direito e de facto noutros países.
Acaba o Governo de reconhecer tal situação, em decreto-lei publicado no Diário do Governo, de hoje, que introduz alterações ao Estatuto Judiciário, dentro de um critério de reforma e aperfeiçoamento da função pública, no âmbito da Reforma Administrativa.
O caminho está aberto: «Os notários do sexo feminino deixam de estar excluídos do desempenho das funções de subdelegados nos julgados municipais, adoptando-se o mesmo princípio quanto à substituição dos delegados do procurador da República nas comarcas.» São estas as disposições vinculadas nos artigos 180.º e 183.º do citado decreto-lei.
Não podíamos ficar em silêncio perante esta medida de real valor para a mulher portuguesa, vinculando-se, assim, mais um dos factores da sua promoção.
Aqui fica, pois, o nosso obrigado ao Governo de Marcelo Caetano e, particularmente, à pessoa de S. Ex.ª o Ministro da Justiça, por, em tão pouco tempo, nos ter dado ensejo de lhe manifestarmos o nosso reconhecimento,

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A oradora foi cumprimentada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposta e dos projectos de lei de alterações à Constituição Política.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Custódia Lopes.

A Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente: É bem consciente da responsabilidade que me cabe, ao apreciar a lei fundamental do País, que ouso subir a esta tribuna para fazer algumas breves considerações sobre a proposta de lei de revisão constitucional que o Governo entendeu submeter a esta Assembleia.
Se careço da preparação jurídica necessária para uma análise aprofundada de tão importante matéria, nos seus vários aspectos, não me falta o entendimento do alcance político e social da revisão, num momento em que o País atravessa uma das mais graves fases da sua história, devido à, luta que tem de enfrentar no ultramar, em defesa da integridade do território e das suas populações.
Como Deputada da Nação por uma das províncias ultramarinas, sinto ser meu dever dar o meu modesto contributo à elaboração de uma lei que a todos importa, ainda que pouco possa acrescentar ao muito que tão brilhantemente foi já dito pelos ilustres Deputados que me antecederam.
Sr. Presidente: Doze anos passados sobre a última revisão constitucional, procura o Governo, pela presente proposta de lei, ajustar os preceitos constitucionais às realidades e exigências da Nação Portuguesa, de modo

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que ela possa progredir e continuar a desempenhar no Mundo, apesar das circunstâncias difíceis, a missão histórica e humana que se propôs.
Procura-se, ao mesmo tempo, actualizar a lei fundamental do País, na sua forma, tornando-a mais precisa e eliminando conceitos e expressões que não se coadunam já com a evolução da sociedade portuguesa multirracial e que, conservados, poderiam até levar a ilações contrárias a nossa maneira de estar no Mundo, sempre atenta à dignidade humana.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - E este último aspecto não me parece de somenos importância, porquanto sabemos como os meios internacionais, que nos são hostis, estão sempre prontos a encontrar motivos, ainda que injustos, para nos atacarem.
Diz o parecer da Câmara Corporativa que a aprovação das inovações «deixará intacta a lei fundamental no que ela tem de mais característico e identificante».
Na verdade, pela análise atenta e reflectida da proposta governamental, verifica-se que houve a preocupação de se manter íntegra a unidade da Nação, começando por se declarar expressamente no artigo 4.º que a Nação Portuguesa constitui um Estado independente, cuja soberania é «una e indivisível», para mais adiante, no artigo 136.º, que se refere à autonomia das províncias ultramarinas, se preservar essa unidade, através da competência legislativa e fiscalizadora dos órgãos da soberania, declarando-se no corpo do mesmo artigo, na fórmula dada pelo parecer da comissão de revisão, que «o exercício da autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação, nem a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado».

O Sr. Neto Miranda: - Muito bem!

A Oradora: - Como se vê, para além da unidade da Nação, expressamente declarada neste preceito, consideram-se também os grandes laços que devem unir todas as parcelas do território português, o que reforça a unidade que todos os portugueses, da metrópole e do ultramar, desejam que seja real.
Consagrada e definida a unidade, base e força da Nação, visa a proposta de lei responder à problemática dos condicionalismos dos diferentes meios em que se insere o heterogéneo povo português, através do aperfeiçoamento das instituições e de novos sistemas político-administrativos que melhor e mais rapidamente conduzam as populações ao progresso social e económico, o que levou a considerar, desde já, as províncias ultramarinas como regiões autónomas.
Referir-me-ei mais adiante e mais demoradamente à situação das províncias ultramarinas no contexto da proposta de revisão constitucional, detendo-me por ora na apreciação de alguns outros aspectos também significativos e que me merecem alguns comentários.
Entre eles é de especial relevância a cidadania concedida na proposta de lei aos brasileiros no nosso país, em reciprocidade com o previsto na Constituição brasileira para os portugueses no Brasil.
Foi um passo decisivo para uma verdadeira comunidade luso-brasileira, já assente numa língua comum - e não há mais fundo traço de união de povos do que a língua -, e que veio dar foros de lei a anseios e sentimentos já há muito existentes nas duas nações irmãs.
Não poderei também deixar de evidenciar a consagração de preceitos que muito contribuirão para o desenvolvimento sócio-cultural do povo português.
Nunca é de mais repetir que na educação se baseia todo o progresso e desenvolvimento dos povos. Sem ela, ficarão comprometidos quantos planos se possam arquitectar nos diversos domínios das nações. Daí, que os governantes se preocupem não só em elevá-la e aperfeiçoá-la, mas também em estendê-la a todos os cidadãos, pelo menos no que respeita a uma educação de base obrigatória.

O Sr. Dias das Neves: - Muito bem!

A Oradora: - Que entender por uma educação de base?
A expressão só se pode compreender numa transformação e relação constantes com a época e a conjuntura nacional e internacional.
Para se poder afirmar o que é em determinado momento a educação de base há que atender a um contexto variado de factores que ultrapassam o âmbito nacional.
Mais do que nunca os povos vivem integrados em comunidades cada vez mais extensas e há que habilitar a pessoa humana a fazer face aos problemas que em qualquer latitude ou longitude lhe sejam postos.
A educação de base que o Estado preconiza para o cidadão de hoje é a instrução primária, acrescida dos dois anos do ciclo preparatório.
Mas a expressão consignada na proposta de lei pressupõe a constante de que falei e uma permanente actualização.
As alterações ao corpo do artigo 43.º e ao seu § 1.º são altamente significativas e reveladoras da profunda renovação que nos campos do ensino e da cultura o Governo pretende realizar no nosso país.
Muitos outros aspectos da proposta de lei e dos projectos apresentados por ilustres Deputados mereceriam que a eles especialmente me referisse, mas o facto de aqui já terem sido tão ampla e notavelmente debatidos dispensa-me de fazê-lo.
Embora caiba mais na apreciação do que na especialidade, não deixarei de aludir, entretanto, à nova redacção dada ao § 2.º do artigo 5.º na parte que à mulher se pode referir, estabelecendo como fundamento de eventuais diferenças, quanto ao sexo, apenas as que resultam da sua natureza, o que entendo ser de justiça e a dignifica.
São também de registar as alterações introduzidas ao artigo 6.º pelo parecer n.º 6/X e que vêm precisar e reforçar o espírito que ressalta da lei fundamental quanto à preocupação de se promover o bem-estar social e de se assegurar aos cidadãos um nível de vida de acordo com a dignidade humana.
Sr. Presidente: É com o pensamento na província de Moçambique, onde tantos portugueses das mais variadas raças e credos trabalham, lutam e morrem por um Portugal unido e engrandecido, província que me outorgou o honroso mandato de transmitir nesta Assembleia os interesses e sentimentos da sua população, que vou ocupar-me de uma das mais importantes matérias que a proposta de lei contém para revisão, a qual diz respeito às províncias ultramarinas.
Pela presente proposta de lei procura o Governo satisfazer as legítimas aspirações das províncias do ultramar ao conceder-lhes uma maior autonomia, de acordo

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com o «seu grau de desenvolvimento, para que, por via dela, se acelere ainda mais o seu progresso.
Gozam já hoje as províncias ultramarinas de autonomia administrativa e financeira, podendo também legislar nas matérias que exclusivamente lhes dizem respeito, através dos seus conselhos legislativos.
É uma orientação de há muito consagrada na lei fundamental do País e reforçada «aquando da última revisão da Lei Orgânica do Ultramar em 1963, sem que isso de algum modo tenha afectado a unidade da Nação. Pelo contrário, durante o já longo período de luta que vimos suportando, o portuguesismo das variadas populações do ultramar tem-se revelado em toda a plenitude, desde as cidades às regiões mais afastadas do mato africano, na firmeza e persistência com que se vêm defendendo e desenvolvendo as terras e promovendo as gentes.
O surto de progresso que ultimamente se verifica nas províncias do ultramar é bem uma consequência do feliz caminho traçado de progressiva e crescente autonomia na administração ultramarina e do aproveitamento dos valores regionais na solução dos seus próprios problemas.
Há, pois, que continuar, renovando processos e corrigindo defeitos.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Não basta que se consagrem os princípios e que se reformem as leis, importa também que haja autenticidade na sua execução em obediência aos princípios estabelecidos na lei fundamental e um espírito novo e dinâmico na sua aplicação, a fim de se conseguirem os objectivos que se pretendem.
Se, por um lado, há nas províncias ultramarinas a necessidade de uma maior autonomia consentânea com o seu estado de desenvolvimento e recursos próprios, por outro, é imperioso que se dê uma mais ampla e efectiva participação de todos os seus elementos, não só na administração local, mas também no governo da Nação.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Creio que é no equilíbrio e na harmonia destes dois princípios - autonomia e participação - que reside a melhor maneira de servir o interesse nacional.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Dentro deste contexto, avulta o aumento do inúmero de Deputados à Assembleia Nacional, que irá contemplar, decerto, os círculos do ultramar, dando-lhes uma representação que corresponda melhor à grandeza e ao desenvolvimento dos territórios ultramarinos.
Disse o Sr. Presidente do Conselho, Prof. Marcelo Caetano, no discurso proferido perante a Assembleia Nacional, em Dezembro de 1970, a propósito da revisão constitucional:

À igualdade jurídica de todos os portugueses tem de corresponder sempre em todos os lugares a compenetração social.

No ultramar, mais do que em qualquer outro lugar do espaço português, a realização efectiva e plena de tão justa afirmação só se poderá dar através de um real e concreto esforço no campo da educação, de modo que o número cada vez maior de crianças possa atingir o mínimo educacional previsto, de momento, na proposta de lei.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - E, sendo a língua o veículo essencial para a transmissão de (conhecimentos e elo de povos, há que promover, nomeadamente em Moçambique, uma verdadeira campanha em prol da difusão da língua portuguesa. É um ponto em que tenho tantas vezes insistido nesta Assembleia, e não me canso de fazê-lo, porque o acho fundamental para atingirmos os objectivos de uma verdadeira promoção social.
Li, algures, que um Ministro da Instrução Pública dos recuados tempos do liberalismo dissera, um dia, acerca de um ensino primário generalizado:

A descentralização administrativa, este artigo de fé nos povos mais civilizados, nunca será realidade entre nós sem a fazerem preceder da instrução popular.

E mais adiante acrescentava:

Verdadeira descentralização nacional não a tereis nunca sem que a educação faça compreender às classes locais a utilidade dos serviços públicos, para que os vigiem, lhes dêem vigor, os tomem a peito como sendo de cada um os negócios da comunidade.

Se estas palavras já não são, felizmente, aplicáveis à parcela metropolitana do território português, estou a lembrar-me do que foi preciso fazer e da campanha de educação popular, tanto se não pode dizer quanto ao ultramar, onde, apesar do esforço que se vem realizando, há muito ainda a fazer neste campo.
Para a realização dessa tarefa muito poderá contribuir o escol de valores já existentes no ultramar e que em vários sectores da vida cultural, social, política e administrativa vem dando provas das suas reais capacidades e do muito que dele se pode esperar.
Há que contar com esse escol, não só para as tarefas da vida local, mas também para as grandes realizações da vida da Nação.
É com a comparticipação de todos, indistintamente, que poderemos construir os caminhos da paz e do progresso e assegurar, no futuro, a Nação Portuguesa pluricontinental e multirracial.
Termino, Sr. Presidente, dando a minha aprovação na generalidade à proposta de lei de revisão constitucional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

A oradora foi cumprimentada.

O Sr. Correia da Cunha: - Sr. Presidente: Vou tentar, ao intervir pela primeira vez neste debate, ser coerente e preciso nas minhas afirmações. Não sendo homem de leis, terei de me socorrer das análises, quase sempre profundas e bem fundamentadas, que outros colegas, para além da Câmara Corporativa, já produziram sobre os textos em discussão. Mas não quero, de forma alguma, prender-me e perder-me no pormenor. O circunlóquio não me agrada nada e a subserviência ainda menos; prefiro chamar as coisas pelos nomes e não deixar em ninguém dúvidas sobre o que penso e o que quero. Assim tenho agido e não será este o momento mais azado para mudar de atitude.
Subscrevi, como se sabe, depois de prévia e minuciosa apreciação do texto, o projecto de lei n.º 6/X. Fi-lo, pois,

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em plena consciência, e não por mera solidariedade para com qualquer grupo ou tendência. Fi-lo porque entendi que era meu dever fazê-lo. E vou procurar dizer porquê. Antes, porém, quero afirmar a todos VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, que a rejeição, pela Câmara Corporativa, do projecto de lei a que me refiro não suscitou em mim qualquer sentimento especial; direi mesmo que a esperava. Depois de uma breve análise na especialidade acabou por o rejeitar na generalidade. Considero esta atitude como de defesa, mal interpretada, dos propósitos do Governo. Mas já não posso reagir da mesma forma sobre factos passados no seio desta Câmara quando algumas das suas comissões foram solicitadas a pronunciar-se sobre a admissibilidade deste projecto à discussão no plenário. Aqui, sim, encontro razões para me lamentar, precisamente porque não vislumbro nas atitudes então assumidas qualquer intenção de dignificar a Câmara e de servir o País; pretendeu-se, apenas, uma vez mais, evitar os problemas, para não ter de os resolver.

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - Peço desculpa de o interromper...

O Orador: - Não, não, V. Ex.ª pode estar à vontade, porque reservei vinte e cinco minutos para interrupções.

O Sr. Júlio Evangelista: - Não é para interromper V. Ex.ª, desculpe, nem para abrir conflito. Era só para interpretar bem o pensamento de V. Ex.ª
V. Ex.ª disse... Desculpe, no período que disse atrás:... lamento que nesta Câmara não se tenha... Era isso que eu queria ver aclarado. Importa-se de voltar a ler?

O Orador: - Eu leio, eu leio.
Aqui sim, encontro razões para me lamentar.

O Sr. Júlio Evangelista: - Aqui, em que ponto?

O Orador: - Aqui. Aqui, neste ponto.

O Sr. Júlio Evangelista: - Não. É no período anterior, se faz favor.

O Orador: - Com certeza.
Mas já não posso reagir da mesma forma sobre factos passados no seio desta Câmara, quando algumas das suas comissões foram solicitadas...

O Sr. Júlio Evangelista: - Pois era aí que eu queria chegar.

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Júlio Evangelista: - Desculpe, se interpretei as suas palavras, Sr. Deputado Correia da Cunha, como de alguma maneira uma censura. V. Ex.ª falou em comissões, mas, que eu saiba, nessa matéria só houve uma comissão, que todos sabemos qual é. Foi a comissão eventual, designada por despacho da Presidência da Assembleia Nacional e a que presidiu, com toda a dignidade, o Sr. Deputado Albino dos Beis.

O Orador: - V. Ex.ª desculpe, mas não apreendeu o que eu queria dizer.

O Sr. Júlio Evangelista: - Então, não apreendi. Era isso que eu queria saber.

O Orador: - Eu, quando falo em comissões, refiro-me a comissões, e não a comissão eventual.

O Sr. Júlio Evangelista: - Mas se V. Ex.ª se está a referir ao projecto n.º 6/X só pode referir-se à comissão eventual.

O Orador: - Refiro-me à admissibilidade deste projecto à discussão do plenário.

O Sr. Júlio Evangelista: - Ora, muito bem! Fiquei esclarecido, Sr. Deputado. Não tenho mais nada a dizer.

O Orador: - Muito obrigado.

O Sr. Sá Carneiro: - Não era necessário.

O Orador: - A consumar-se o facto, ter-se-ia demonstrado, de forma iniludível, que alguns de nós não tínhamos realmente lugar nesta Assembleia.
Meus senhores: Vou procurar reagir como simples homem da rua que procura interpretar os textos, pareceres e o que já foi dito nesta tribuna em relação com a revisão constitucional. Não poderá parecer estranho que procure interpretar por esta óptica uma sucessão de acontecimentos tão complexa porque da assume, aos olhos do cidadão comum, foros de um acontecimento do maior relevo. Trata-se, nem mais nem menos, do que rever a lei fundamental da Nação, que define o regime em que vivemos e os direitos e deveres de cada um.
Não há dúvida de que o País se encontra suspenso pelo que se tem passado neste anfiteatro. Esse facto leva-me a desejar que os canais de informação funcionem sem constrangimentos, numa tarefa de divulgação tão ampla quanto possível, transmitindo o que aqui se diz e pensa em termos de perfeito equilíbrio. Estou em crer que nem sempre isso se verifica, o que pode significar mau entendimento por parte de alguns responsáreis do que é o servir o público. Mas as possíveis razões de queixa não se limitam, infelizmente a este ponto.
O estudo atento do que se passou no decurso das últimas revisões constitucionais e do que já se disse em torno desta leva-me a duvidar que valha a pena debatermos tão profundamente os termos em que a Constituição é redigida quando é tão fácil e tão frequente desvirtuar o seu conteúdo. Isto significa que me sinto substancialmente mais preocupado com o uso que se posa fazer do diploma legal do que, propriamente, passe o exagero, com a sua substância. E esta minha dúvida é reforçada pelo que se lê algures no parecer da Câmara Corporativa: «... não há que ter medo das palavras!» O que importa, pelos vistos, é ter força para adulterar o seu sentido e agir em conformidade com os interesses do momento.
Vejamos como tem sido isto possível.
A Constituição Portuguesa, plebiscitada em 1933, consagra, como já foi dito, uma concepção democrática do poder popular. Por isso mesmo o Presidente da República e os Deputados eram, originalmente, eleitos pelo sufrágio directo dos cidadãos.
A separação dos três poderes do Estado, também prevista em 1933, nunca se verificou, na realidade, uma vez que a Assembleia Nacional permaneceu sempre largamente subordinada ao Chefe do Estado.
Dotado o Governo, a partir de 1945, de poder legislativo, de carácter não excepcional, deu-se forma a uma realidade já existente e que consistia numa concentração

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do poder político no Presidente da República. Mas isto, apenas em teoria, porque tudo se passou durante o longo consulado de Salazar e este nunca quis deixar de ser, simplesmente, Presidente do Conselho de Ministros.
A pouco e pouco, mas conscientemente, esta Assembleia permitiu que as suas atribuições de órgão legislativo fossem perdendo conteúdo e sentido para se satisfazer com uma vaga atribuição de órgão fiscalizador dos actos do Governo.
A Assembleia Nacional perdeu, de facto, com os poderes inicialmente atribuídos, importância e projecção políticas. Funcionando apenas durante um curto período em cada ano, a sua actividade pode ser facilmente orientada e consumida no tratamento de assuntos de escasso significado para a vida política do País.
Mas é em 1959 que a Constituição sofre, com o assentimento resignado desta Câmara, o maior atentado que se lhe poderia fazer: o Chefe do Estado, autoridade suprema da Nação, passa a ser escolhido por um colégio eleitoral, cuja representatividade e independência deixam muito a desejar.
Todos nós sabemos por que surgiu esta ideia peregrina do colégio eleitoral; todos nós sabemos por que se aborrecem os pedidos eleitorais. Mas que o Governo assim pense, ainda se pode aceitar; impõe-no, quando muito, a continuidade do Regime. O que se me afigura inadmissível é que esse mesmo sentimento possa ser manifestado pelos legítimos representantes do povo que nós somos, do povo que constitui a Nação e do qual emana toda a soberania, do povo que, a pouco e pouco, se viu divorciado do Poder.

O Sr. Agostinho Cardoso: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Agostinho Cardoso: - V. Ex.ª acaba de dizer que acha inadmissível que alguns de nós pensem haver vantagem em manter o actual sufrágio, corrigido e aumentado.
Vou-lhe dizer por que acho admissível pensar assim e por que acho estranho o uso da palavra «inadmissível».

O Orador: - É a palavra que entendi dever usar.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Não quero neste momento estabelecer uma controvérsia sobre a superioridade do sufrágio directo ou do sufrágio dualista, como agora se usa para eleição do Presidente da República, porque isso é muito complexo.
O que lhe quero dizer é que o sufrágio directo foi aperfeiçoado ao longo do tempo que vai de 1933 para cá: votam mais mulheres, votam mais analfabetos, vota muito mais gente...

O Sr. Pinto Machado: - Os analfabetos parece-me que não.

O Orador: - Parece-me que há certos analfabetos que podem votar, gente que paga além de uma certa importância na contribuição predial, etc.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Os analfabetos crónicos...

O Sr. Sá Carneiro: - Os analfabetos políticos...

O Sr. Agostinho Cardoso: - Eu admito que este sufrágio dualista, não exclusivamente orgânico, possa ser aperfeiçoado. O colégio eleitoral é constituído em grande parte pelos Deputados que foram eleitos com a capacidade de rever a Constituição, que todos nós estamos a discutir, da qual revisão vai depender o processo de sufrágio para eleição do Presidente da República - a esses Deputados, dizia, foi conferido um poder maior do que o de eleger o Presidente da República: o de reverem a Constituição.
Esses Deputados foram eleitos directamente pelos cidadãos, já com este condicionamento de os representarem nesta eleição.

O Sr. Pinto Machado: - Esse raciocínio está algo obscuro... ou eu é que estarei algo obtuso?

O Sr. Agostinho Cardoso: - Sr. Deputado: Eu estou a improvisar.
Portanto, se tiver qualquer dúvida, poderei depois esclarecê-lo.
Este sufrágio dualista pode ser aperfeiçoado, dizia, pois reconheço que tenha algumas deficiências, como seja, sobretudo, conter pessoas que são da nomeação do Governo.
É possível, portanto, aperfeiçoar aquilo que em 1959 foi feito com certos defeitos.
Mas não há, parece-me, motivos para se julgar inadmissível que aqui na Assembleia haja quem pense de maneira oposta a V. Ex.ª, e tenha razões para isso. Pode V. Ex.ª achar vantagens no sufrágio directo; eu acho-lhe inconvenientes graves.

O Orador: - Eu agradeço muito a exposição que V. Ex.ª acaba de fazer e que é fruto de uma longa vida parlamentar.
Aquilo a que eu chamo inadmissível é a atitude da Assembleia em 1959. - É um bocadinho diferente...

O Sr. Agostinho Cardoso: - Eu pensava que se referia às pessoas que discordam do sufrágio directo.

O Orador: - Eu aceito perfeitamente o lapso, porque ontem ou anteontem também troquei o sentido de uma palavra e intervi sem razão.
Portanto, o que se me afigura inadmissível é que esse mesmo sentimento possa ser manifestado pelos legítimos representantes do povo - nós que somos eleitos por sufrágio directo.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Portanto, é inadmissível, diz V. Ex.ª, que nós, que fomos eleitos por sufrágio directo, pensemos assim. Afinal eu tinha razão nos comentários que fiz.

O Orador: - No dia em que o povo português for totalmente impedido de se manifestar, no pleno uso dos direitos que a Constituição lhe confere, na escolha dos seus representantes e dirigentes e na definição do regime que o deve governar, então, meus senhores, teremos voltado à ditadura e renegado os mais elementares princípios da democracia e da liberdade do homem.
As últimas eleições para Deputados constituíram uma prova insofismável de que o povo não trai, de que o povo reconhece os méritos de quem o serve, de que o povo, ainda que mal informado, corresponde da melhor forma às provas de confiança que lhe dão. Marcelo Caetano pôde receber, assim, nessas eleições, um dos testemunhos mais vibrantes de apoio jamais outorgado neste País a um Chefe do Governo.

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Defendendo neste momento e nesta tribuna o direito de os cidadãos poderem eleger, por sufrágio directo e universal, o supremo magistrado da Nação, eu estou pugnando pelo prestígio de que este nunca pode prescindir e estou reconhecendo, ao mesmo tempo, que Marcelo Caetano não precisa adoptar subterfúgios herdados para continuar a ser o chefe incontestado de todos os portugueses. Sabemos que serviços o País lhe deve ao longo da sua vida de homem público; sabemos quão ansiosamente foi aguardada a sua ascensão ao Poder; sabemos, finalmente, quanto é pesada a tarefa que se lhe entregou em mãos.
Mas sabemos mais. Sabemos que na chefia do Governo Marcelo Caetano se tornou credor da gratidão de todos ao revelar-se um dirigente que dá contas do que faz e consegue conciliar a prudência com o sopro renovador de que tanto carecíamos.
Para as ingentes tarefas que se nos deparam no presente e vislumbram no futuro, o Chefe do Governo não hesita em apelar para todos os portugueses para que se dêem de alma e coração ao seu trabalho. Ele sabe que precisa do povo. Nunca, porém, semelhante mobilização de vontades foi conseguida sem que, em contrapartida, se atribuísse maior grau de liberdade e responsabilidade aos cidadãos. Eles precisam ser solicitados a viver, a sentir os problemas que transcendem o círculo limitado dos seus interesses. De nada serve buscar o bem geral se, desse processo, o homem sair aviltado. A liberdade que se preconiza, e sob cujo signo eu estou falando aqui, constituirá a melhor defesa contra os traidores que, na sombra, difamam e destroem; contra os ineptos e tíbios, para os quais a mediocridade é condição de sobrevivência; contra os sonhadores, incapazes de construir seja o que for, porque perseguem sempre uma perfeição que não é deste Mundo.
Ao comemorar o 25.º aniversário da República Italiana o Presidente Saragat teceu, recentemente, um verdadeiro hino à liberdade. «Com a liberdade, afirmou ele, tudo será possível. Sem liberdade, tudo ficará comprometido e tudo se perderá. Há na vida dos povos momentos decisivos, durante os quais o enfraquecimento do espírito de liberdade pode levar à decadência e, por fim, à ruína.» Esta voz levanta-se, meus senhores, no país que suportou, quase simultaneamente, o fascismo, as devastações de uma guerra, o domínio estrangeiro e as investidas de um dos mais poderosos partidos comunistas do Ocidente.
Sem liberdade não há progresso económico nem evolução social satisfatórios. O desenvolvimento, na verdadeira acepção da palavra, pressupõe um desejo voluntário de adesão por parte das populações. Por isso, não consigo dissociar os dois fenómenos e fui levado a subscrever as alterações propostas ao artigo 8.º pelo projecto de lei n.º 6/X. Tive já a satisfação de registar a forma favorável com que alguns ilustres colegas entenderam os nossos propósitos, não encontrando neles algo que possa ser considerado anticonstitucional ou subversivo.
Mas quando se afirma que a liberdade é uma consequência do desenvolvimento, não posso deixar de ficar perplexo. De acordo com essa tese, teria de aceitar que as nações subdesenvolvidas não podem ser livres e que o processo de desenvolvimento se não coaduna com a livre manifestação de sentimentos, ideias e iniciativas. O que na realidade se verifica, sem ser necessário fazer um estudo de economia comparada, é que o desenvolvimento só é possível quando incide em sociedades livres. Recuso-me a confundi-lo com crescimento económico, porque esse em qualquer regime pode criar riqueza sem servir o homem.

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - Governar um povo de ignorantes e mantê-lo nesse estado é fácil; o que se torna difícil é criar e dirigir uma sociedade onde todos beneficiem de iguais oportunidades, onde o mérito sobreleve a fortuna e onde cada um se sinta capaz de participar num destino comum.
Não será necessário insistir sobre a importância que se atribui à informação livre e verídica neste ideário de vida que desejaríamos poder assegurar a todo e qualquer português. Ele pressupõe naturalmente o direito à livre associação. O noticiário tendencioso, por deturpado ou incompleto, suscita a desconfiança e mais tarde a indiferença.
A Nação precisa de se manter informada sobre tudo o que directamente lhe disser respeito para que o possa entender, discutir, concordar ou discordar. E não creio que seja tão dura nos seus juízos que não saiba distinguir o erro fortuito da inépcia ou má intenção. Não encontro outra forma de reunir todos os portugueses em torno dos problemas comuns. E sabemos, pela boca do Chefe do Governo, quanto eles são absorventes e delicados.
Entre todos avulta, pelo seu carácter de movimento de massa difícil de controlar e cheio de consequências para o futuro, a emigração para certos países europeus.
Sabe-se como ela foi durante algum tempo contrariada em nome dos interesses da grei. Essa política errada desagregou famílias, gerou ódios e rancores, permitiu extorsões, criou trânsfugas e fez sofrer muitos dos nossos irmãos.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Não teve vantagens, Sr. Deputado?

O Orador: - V. Ex.ª pergunta se não teve vantagens a emigração?

O Sr. Casal-Ribeiro: - Julguei que era a política seguida durante os tais quarenta anos, em que todos nós estivemos a dormir e a sonhar, que tinha provocado, na verdade, toda essa espécie de urticária que ataca os senhores liberais. É uma urticária autêntica!

O Orador: - Sr. Deputado, eu refiro-me aos quarenta anos um pouco mais adiante.

Risos.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Ah! Bom!

O Orador: - Aqui referia-me apenas à política errada da emigração.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Desculpe. Adiantei-me um bocadinho...

O Orador: - Não, Sr. Deputado, tive muito gosto. Estou a reparar um erro que cometi também, há algum tempo, em relação a V. Ex.ª
E tudo porque eles se permitiram contra tudo e todos dar novo rumo às suas vidas. Desapareceram assim do nosso convívio centenas de milhares de homens, mulheres e crianças. Nada os deteve na impressionante votação que a sua partida significou. É insensato dizer que traíram a sua Pátria por um prato de lentilhas. Para a maioria, a Pátria resumia-se a uma comunidade restrita, onde a vida era dura, sempre igual e sem esperança. E, não obstante a exploração a que foram vota-

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dos pelo nosso abandono, essa massa anónima de gente sem eira nem beira tem podido, com muito suor e lágrimas, arrecadar o suficiente para equilibrar o orçamento do País.
Foi ainda Marcelo Caetano que reconheceu o erro e a injustiça; e hoje, graças a Deus, o Secretariado Nacional da Emigração pratica uma política de aproximação, defende os interesses dos emigrantes, considerais cidadãos de direito e procura evitar que se percam para a comunidade. Mais uma vez a política da força e da prepotência falhou. E não se pode dizer que daí tenham resultado inconvenientes de qualquer natureza; o Governo saiu prestigiado e os portugueses ficaram mais unidos.
Os factos demonstram que as limitações postas à liberdade dos indivíduos nunca contribuíram para o progresso de um povo. O que se passa a este respeito nos países comunistas é bem esclarecedor. Não queiramos, pois, imitá-los, seja a que pretexto for.
Permito-me agora passar a outro ponto: o que se relaciona com o processo de desenvolvimento em que nos encontramos empenhados. Durante muito tempo relegou-se para plano secundário tudo o que dissesse respeito à formação e preparação profissional da juventude, induzindo-a assim a uma passividade que apenas traduzia ignorância. Aqui reside, quanto a mim, a nossa principal frente de luta, numa tentativa de recuperar, a todo o transe, o tempo e as oportunidades que se perderam.
Mas o progresso tecnológico, factor indispensável do desenvolvimento, depende, não só de estruturas económicas adequadas, mas também das estruturas sociais, institucionais e culturais existentes em cada país. Não é pois possível avançam e permanecer ao mesmo tempo.
Uma sociedade em pleno processo de desenvolvimento é uma sociedade dinâmica, aberta às inovações, vibrátil nas suas manifestações e, por isso mesmo, difícil de controlar rigidamente.
Não se pode pretender queimar etapas neste processo de desenvolvimento, vital para a nossa subsistência como povo, enquanto mantivermos imutáveis estruturas que fizeram a sua época, mas já estão, há muito, ultrapassadas. Essa desactualização constitui um importante travão para o progresso da agricultura; limita fortemente o poder competitivo da indústria, desequilibra as relações entre o capital e o trabalho; prejudica, na administração, a vitalidade das instituições municipais; favorece, a todos os níveis, a permanência de um estado de espírito que tudo faz depender das iniciativas e da protecção do Estado-providência.
Os quarenta anos de paz, estabilidade social e equilíbrio financeiro tiveram o seu preço e não nos podemos eximir a pagá-lo. Atrasámo-nos irremediavelmente. Mantivemos vazios territórios imensos, deixámos de explorar riquezas incomensuráveis. Geraram-se tensões cuja explosão nos apanhou desprevenidos. Não se anteviu o futuro em termos de responder às suas solicitações.
E só quando esse futuro chegou, nos apercebemos do que se passara. E entrámos a lutar, nas frentes económica, política e militar, aqui e no ultramar. Da inércia, passou-se à acção; da apagada e da tristeza, aos feitos que só os heróis realizam. Não houve tempo para ajustar estruturas nem para reavivar esperanças. Foi-se para a frente. E essa frente tanto se situa em Cabora Bassa como no Nordeste transmontano; na esteada inçada de minas como no gabinete do técnico; ma escala como na fábrica. Todos nós podemos trazer a este areópago testemunhos bem vivos desta epopeia em que estamos empenhados. Para quê, pois, perdemo-nos em palavras, em debates estéreis, em questiúnculas de quem se sente bem instalado na vida? Por que não havemos de agir, uma vez que seja, apenas de acordo com a nossa consciência?

O Sr. Sá Carneiro: - Muito bem!

O Orador: - O Poder sempre implicou responsabilidade; e não creio que nesta Câmara haja alguém que, por qualquer forma, se queira atraiçoar e ao seu País.
Este pensamento leva-me, uma vez mais, a encarar os problemas suscitados pela situação nas províncias ultramarinas. Já me referi, ao regressar de Angola, ao orgulho de que vim possuído pela obra gigantesca que ja se está realizando; já afirmei quanto, em face de realidade tão portentosa, senti serem mesquinhas muitas das nossas preocupações e intenções.
Ao abordar a situação constitucional das províncias ultramarinas, a proposta do Governo fá-lo de forma corajosa. E estou certo de que só não vai mais à frente porque a guerra condiciona, neste momento, os nossos actos de decisão. Apoio, pois, sem reservas, o espírito e a letra da proposta em tudo o que se refere ao ultramar.
Também penso que a nossa preocupação primordial não deve consistir em manter a todo o transe o domínio económico em territórios tão vastos. O patriotismo de alguns satisfaz-se com isso; mas creio que é aspecto secundário. À medida que Angola e Moçambique se desenvolvem, automaticamente se estão autonomizando sem remissão. A afluência de capitais, a diversificação do comércio externo, a satisfação de necessidades próprias e uma administração cada vez mais complexa impõem que os centros de decisão se localizem nos respectivos territórios.
Contrariar este processo é ajudar a subversão, porque a luta que se trava em África só pode ser ganha pela via do desenvolvimento. E esta implica que se promovam as populações, se rasguem estradas, se construam cidades e portos, se implantem indústrias, se formem técnicos e cientistas. A permanência do mundo lusíada em África não se garante com palavras e sofismas, mas com actos de coragem e bom senso. A língua portuguesa e a nossa forma tão especial de ser e estar no Mundo hão-de garantir, para todo o sempre, uma presença viva e digna num continente que ajudámos a descobrir e a desenvolver. Não temamos, por isso, a autonomia. Pelo contrário, facilitemo-la, confiando abertamente no portuguesismo e na capacidade para se governarem das populações locais. Quando se advoga abertamente uma descentralização administrativa como condição essencial do esquema de desenvolvimento regional em curso na metrópole, mal iríamos se pretendêssemos prosseguir uma política centralista em relação ao ultramar.
No dia em que explodiu em Angola a primeiro bomba terrorista acabou o período colonial. E acabou de vez, porque as nossas tropas não estão a defender em África interesses ultrapassados, de grupos ou pessoas; estão, pelo contrário, a ser factor importante neste processo de transformação acelerada que lá se opera. Estão a fazer, com armas na mão, o que não deixámos que fosse realizado na paz por homens de visão larga e estatura política invulgar como Norton de Matos.
Também aqui, meus senhores, o desenvolvimento dá pelo nome de liberdade e responsabilidade. Tudo o que o contrarie contribuirá para a nossa desagregação e enfraquecimento. Creio mesmo que chegou a hora de se tomarem decisões importantes, como a de instaurar uma autonomia monetária ou cambial que resolvesse de vez o problema das transferências para a metrópole; como a de transferir para as populações autóctones uma parte mais

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substancial do esforço de defesa; como a de eliminar todas as restrições ao livre crescimento da economia dos dois grandes territórios. E quando surgirem interesses contraditórios, a metrópole terá de se habituar a dialogar, em pé de igualdade, «com os territórios portugueses de África.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Montanha Pinto: - Sr. Deputado, dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Montanha Pinto: - Se V. Ex.ª me permite, queria felicitá-lo muito sinceramente pelo desassombro de todas as suas afirmações, especialmente pela parte que respeita ao ultramar. As declarações que V. Ex.ª está fazendo, eu pedia licença para as perfilhar integralmente. Muito obrigado.

O Sr. Sá Carneiro: - Muito bem!

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - Obrigado.

Creio que não valerá a pena insistir sobre o que penso deverem ser, num futuro próximo, as nossas relações com Angola e Moçambique. Ainda aqui há que sacudir muita poeira dos espíritos e pôr a nu muitos erros e omissões. E quanto antes, para que não se criem situações irremediáveis. Não aceito, por isso, nenhuma das reservas e restrições enunciadas, a este respeito, no parecer da Câmara Corporativa. Há um cento tipo de argumentação que já não convence.

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - E nós não queremos, nem podemos, continuar a viver desfasados dos outros povos. O sermos iguais a nós próprios não nos impede de assimilar o progresso e seguirmos, se possível, na vanguarda das conquistas sociais. Estou certo que, em África, podemos dar ao mundo uma noção da nossa real grandeza. Assim saibamos aproveitar a oportunidade que se nos depara.
Sr. Presidente, vou concluir estas modestíssimas considerações. Faço-o com a consciência de quem cumpriu um dever. Ao aprovar na generalidade os documentos em causa passo a aguardar, serenamente, que a Câmara se pronuncie. E não deixará de o fazer, estou certo, considerando apenas o interesse do País. Espero assim não ter necessidade de invocar o nome de Deus e clamar pela misericórdia divina para que a Constituição Portuguesa passe a ser, não só um documento equilibrado, mas uma lei que se cumpre.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: Venho fazer um depoimento breve, como V. Ex.ª o solicitou, e breve também porque não venho fazer exposição doutrinária sobre a proposta e os projectos de revisão constitucional. Venho sómente dizer com toda a sinceridade e objectividade o que penso, como político, de alguns dos problemas que uma e outros contêm.
Os documentos em causa foram maduramente pensados pelos seus autores. Sobre eles recaiu estudo aturado de dignos Procuradores especializados em tais assuntos e foram depois passados pelo crivo de longas e criteriosas discussões da comissão eventual, que V. Ex.ª se dignou designar.
Tive a honra de fazer parte desta última, que segui com possível cuidado e com o maior interesse e análise dos vários aspectos de tantos dos seus problemas, pude esclarecer-me, formar uma ideia acerca de cada um deles e fiz opções que espero não tenham de ser alteradas pela argumentação que vier a desenrolar-se na discussão na especialidade. Sinto que é meu dever transmitir a linha geral das minhas impressões ao plenário, embora de antemão saiba que lhe não trago achegas de vulto. Mas numa Câmara política nem só os doutrinadores do direito constitucional devem depor sobre problemas da natureza daqueles que aqui nos congregam e que são eminentemente políticos.
Antes, porém, quero deixar aqui bem expressas as minhas homenagens ao ilustre relator do exaustivo e douto parecer da Câmara Corporativa e a minha profunda satisfação pela forma como foram orientados, pelo seu ilustre presidente, os trabalhos da comissão eventual da Assembleia Nacional; pela elevação e pela correcção com que decorreu a discussão da grande maioria dos problemas ali debatidos; pela sobriedade, proficiência, dignidade e elegância com que se portaram os autores e os defensores dos projectos n.ºs 6/X e 7/X e ainda pelo rigor, concisão e verdade com que o ilustre relator do parecer da comissão eventual traduziu o que de essencial ali se passou.
Sr. Presidente: Julgo que foram já oito as revisões a que foi sujeito o estatuto fundamental da República Portuguesa, que foi submetido a plebiscito e que está em vigor desde II de Abril de 1933.
Nas várias legislaturas em que tenho tido a honra de representar o distrito de Coimbra, é esta a terceira que assume funções constituintes.
A necessidade das revisões e dos ajustamentos periódicos da Constituição de 1933 foi uma das preocupações de Salazar - esse génio político verdadeiramente excepcional a quem ficamos devendo, entre tantas outras coisas, as estruturas que permitiram a Portugal a estabilidade, a paz e o progresso que todos reconhecemos.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Que, lamentavelmente, tão esquecido é, Sr. Deputado.

O Orador: - Das instituições por ele criadas, volvidos já quarenta anos sobre o seu funcionamento, disse o que aqui recordo:
Nada há de imutável e por isso é natural que continuem a ser melhoradas consoante as necessidades que forem surgindo. Não vejo que isso seja motivo de estranheza.
No nosso país, como nos demais, a evolução impõe que a (c)Ias se vão ajustando, periodicamente, as respectivas leis fundamentais. Actualizar fórmulas, melhorar técnicas, aperfeiçoar textos, ajustar disposições às novas realidades que a evolução e o progresso vão criando corresponde, sem sombra de dúvida, a reforçar as condições de resistência à erosão e ao desgaste do tempo, a dar maior vigor às instituições, a insuflar-lhes nova vida, numa palavra - a revitalizá-las.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Ora, nos vinte anos volvidos sobre a última revisão constitucional, não sómente muita coisa se alterou, tanto na metrópole como no ultramar, muita legislação foi publicada, muitas novas normas foram estabelecidas pela evolução e pelo progresso, mas também novos factores surgiram, tais como a subversão e as guerrilhas, que justificam a oportunidade e impõem a necessidade deste novo ajustamento de que o Governo tomou a iniciativa. Há mesmo aspectos que aguardam, há longos anos, a sua revisão.
Tenho para mim como firmemente demonstrada esta oportunidade e esta necessidade. É preciso ajustar o nosso documento fundamental às realidades da hora presente.
Estamos no limiar de uma nova era política, no arranque para novas tarefas e, por isso, carecemos de aperfeiçoamentos estruturais que as possibilitem ou facilitem. Vejo a proposta do Governo como uma tentativa a um tempo arrojada e comedida, inspirada por um pensamento ousado, mas mantida dentro dos limites de uma sábia prudência. Tenho para mim que o Governo buscou cautelosamente o que precisava de ser emendado, ajustado às nossas actuais condições de vida, à evolução realizada e aos anseios da Nação. E fê-lo com marcada precisão e objectividade, francamente, sem a mínima ambiguidade. As palavras de que se serviu foram medidas, pesadas, seleccionadas com particular atenção às suas potencialidades políticas, a despeito do que já vi referido por quem já teve responsabilidade no Governo do nosso país.
Ninguém pode negar que ela não respeite o desígnio do povo português e que ali se não encontre devidamente respeitado e mantido o travejamento básico da Constituição de 1933, garantida a permanência dos princípios constitucionais fundamentais e assegurada, portento, a continuidade do regime. Para além desta preocupação de manter o mesmo rumo, o Governo procurou oferecer ao País novos trilhos que serão a via evolutiva por onde se pretende conseguir um Portugal renovado.
Estas novas disposições correspondem, a meu ver, aos anseios da Nação, às aspirações do povo português que nunca pôde tolerar, ao longo da sua história, nem o marasmo nem a inércia.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Entre os poucos pontos que desejo salientar na apreciação na generalidade desta proposta e destes projectos, o primeiro é o da unidade política e territorial da Nação.
Tanto pelo texto da proposta como pela palavra do Presidente do Conselho, está exuberantemente reafirmada e repisada uma posição firme, inabalável e indiscutível dessa unidade.
«Unidade nacional a todos as luzes», como diz o ilustre relator do parecer da Câmara Corporativa. Não vejo que, sinceramente se possa levantar qualquer dúvida a esse respeito nem que, com ela, se possam alimentar atitudes oposicionistas.
Aquela mesma unidade que o Governo proclama e que todos nós desejamos deve ser assegurada por todas as formas, impedindo, por todos os meios, as manobras que os inimigos externos de Portugal - os tais, como disse o Sr. Presidente do Conselho, que se reúnem em «areópagos internacionais em que se fazem discursos, em que a ignorância e a má fé andam de mão dadas», movem contra o nosso país.
E não sómente contra essas, mas também contra as de alguns portugueses transviados que, movidos por baixos sentimentos ou guiados por deploráveis ideologias, estão, consciente ou inconscientemente, ao serviço dos inimigos de Portugal.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!

O Orador: - Neste momento difícil da vida portuguesa, em que, mercê de um esforço, de uma dedicação e de uma abnegação digna dos maiores louvores, o Presidente do Conselho procura, por todos os meios, garantir a defesa da integridade nacional e marcar nova senda de progresso para o País, entendo que é dever de todos os portugueses cerrar fileiras à volta do venerando Chefe do Estado e do ilustre Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu cumprirei o meu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O funcionamento da Assembleia Nacional é outro assunto sobre o qual queria fazer breves considerações.
Quero recordar, em primeiro lugar, o que disse o Sr. Presidente do Conselho, em 2 de Dezembro do ano passado. Textualmente afirmou que se procurava, na revisão actual:

Além de aumentar o número de Deputados, ampliar-lhe as atribuições legislativas, pela extensão da lista das matérias reservadas à sua competência exclusiva.

Estas intenções traduziram-se objectivamente nas alterações da proposta contidas especialmente nalguns dos números dos artigos 91.º e 93.º
Louvamos, sem reseva, estes propósitos e temos esperanças de que a Assembleia, no momento oportuno, não dixará de os ter em devida conta, bem como certos aspectos do projecto n.º 7/X que lhes dizem respeito. É o caso da apreciação das contas dos institutos e dos organismos autónomos e das da Previdência e também o da discussão dos projectos dos planos de fomento.
Eu sei que estes aspectos do projecto n.º 7/X não obtiveram aprovação na comissão eventual. Mas julgo-os de tal importância que tenho dúvidas sobre se deve manter-se essa rejeição. Gostaria que fossem expostos no plenário e devidamente discutidos os prós e os contras, a fim de serem completamente esclarecidas as dúvidas sobre os inconvenientes da sua inclusão nas disposições da Constituição.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Porque hão-de ser apreciadas, pela Assembleia Nacional as contas do Estado e não as dos institutos e organismos autónomos e da previdência?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De harmonia com as intenções expressas pelo Sr. Presidente do Conselho, gostaria de ver incluídas na ampliação das atribuições legislativas da Assembleia as decisões sobre as grandes reformas da vida portuguesa.
Eu estou de acordo em que o Governo envie à Assembleia Nacional propostas como as da liofilização dos produ-

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tos biológicos e outras idênticas (risos), mas entendo que a mesma atitude deve ser tomada para as grandes reformas da vida nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O País não poderá compreender como é que a mais alta Câmara política, eleita pelo povo, não possa pronunciar-se sobre projectos que hão-de constituir as leis que regem a vida da Nação.
Foram aqui discutidos, na ocasião oportuna, por exemplo, o Estatuto do Ministério da Saúde e Assistência, a reforma da Previdência e muitos outros diplomas de igual importância.
Espero que o Governo, com a mesma orientação, não deixe de submeter à apreciação da Câmara certas reformas em estudo e que têm necessariamente sérias implicações políticas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: As alterações propostas no que se refere ao ultramar mereceram-me também uma atenção particular.
Este assunto já foi aqui ventilado por muitos dos ilustres Deputados que, nesta tribuna, manifestaram o seu acordo com o caminho traçado pela proposta governamental.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!

O Orador: - Mas nem por isso deixarei de tomar posição em tão importante sector.
Ao invés de certas dúvidas e receios que têm aparecido, velada ou claramente, em artigos de periódicos, em conferências ou em livros, penso que os aperfeiçoamentos introduzidos nesta revisão constitucional acerca do ultramar servirão para jungir as províncias ultramarinas por laços ainda mais fortes entre si e com a metrópole, reforçando a unidade territorial, económica e política da Nação Portuguesa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nas minhas viagens a Angola e a Moçambique pude melhorar a minha documentação sobre o surto de desenvolvimento que ali se processa; sobre a forma como os portugueses de aquém e de além-mar ali defendem, com sacrifício da vida, o território nacional, como se mantém vivo em quantos contactei o sentimento da unidade nacional e também o de acendrado e inalterável portuguesismo.
A década de 60 foi especialmente caracterizada pelo desencadear contra Portugal não só das arremetidas da O. N. U. e de outras assembleias políticas antiportuguesas, mas também do terrorismo de Angola, da Guiné e de Moçambique. Mas foi mesmo nesse período, como todos sabem, que nas províncias do ultramar português se renovaram os processos de administração ultramarina, se definiram novos regimes jurídicos e se fez a revisão da Lei Orgânica do Ultramar, no sentido de conceder a essas províncias uma maior autonomia administrativa e legislativa, de se lhes atribuir descentralização administrativa e autonomia financeira, que se aboliu o Estatuto dos Indígenas, etc.
Em vez do abandono, Portugal consagrou aos seus territórios de além-mar uma protecção ainda mais intensa do que até aí, fazendo uma reforma profunda nas suas instituições com uma evidente determinação de desenvolver esses territórios, marcada e legitimamente portugueses, e de fazer a promoção social das suas gentes a um ritmo mais intenso.
Nesta fase reforçou-se a unidade política das províncias ultramarinas, foi-se-lhes atribuindo crescente autonomia legislativa, administrativa e financeira, foi-se promovendo e auxiliando financeiramente o seu desenvolvimento económico e foi-se fazendo a integração racial e social das populações autóctones.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Recordo, a propósito, as declarações do Presidente Marcelo Caetano no regresso da sua viagem a Angola, Moçambique e Guiné, em Abril de 1969, referindo as aclamações do povo que sempre o rodeou e vitoriou:

Nenhum governante no mundo inteiro pode, estou certo disso, deslocar-se com uma escolta assim: a escolta seguríssima de uma multidão de pretos, brancos, mestiços, amarelos... unidos no mesmo propósito de manter portuguesa a terra onde vivem e que querem conservar progressiva e em paz.

Vozes - Muito bem!

O Orador: - E ainda:

Eles, os portugueses de além-mar, querem continuar a ser portugueses! E não vacilemos na decisão. Adiante! Sigamos intrepidamente para a frente!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os ajustamentos agora propostos na revisão constitucional são a consequência daquela evolução natural, contínua, que se tem processado nas nossas províncias ultramarinas e que nestes últimos tempos se verificou num ritmo mais intenso. Não são enxertos estranhos - são produto de uma evolução ontológica.
Não existe no meu espírito, a tal respeito, qualquer dúvida sobre as intenções do Governo e sobre os objectivos reais da proposta.
Da aprovação do que se propõe prevejo que resultará uma mais forte coesão, um reforço da unidade que sempre existiu e uma progressiva integração das províncias do ultramar no todo nacional. Este é, sem dúvida, o desejo ardente de todo o povo português - é o sentimento geral da Nação.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!

O Orador: - Não vejo motivos para recear que os novos trilhos oferecidos por esta via para o progresso das províncias ultramarinas possam justificar os receios, que já vi apontados, da «vertigem da autonomia pura e simples» e também não vejo como é que, por via deles, se possa justificar o temor de uma «autodeterminação jurídico-passiva» ou de uma «autodeterminação política violenta», como já vi publicado algures. Não ponho em dúvida a sinceridade com que foram expostos estes receios; mas não vejo razões válidas para os aceitar.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Casal-Ribeiro: - O Diabo tece-as, Sr. Deputado.

O Sr. Ricardo Horta: - Mas isso é o Diabo?

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O Sr. Leal de Oliveira: - Existe o Diabo?

O Orador: - O alargamento da descentralização, da autonomia político-administrativa e da competência legislativa já existentes e que lhes foram conferidas pela actual Constituição e pelas disposições legais complementares não comprometem a soberania nem afectam a unidade nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Julgo de meu dever - e dever de todos nós - analisar criteriosamente os problemas que nos são postos, colocarmo-nos acima das paixões ideológicas, reagirmos contra certos escritos de propaganda gerados por pensamentos políticos de índole colonialista ou imperialista já há muito ultrapassados ou nascidos de interesses de outra natureza e criarmos disposições constitucionais que facilitem o aproveitamento integral e harmónico de todas as potencialidades de todos os territórios desta Nação que é uma só, embora os seus territórios estejam dispersos pela Europa, pela África e pela Ásia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Adiante! Para a frente!, como disse o Presidente do Conselho, em honra da memória de quantos têm feito o ultramar português e de quantos o tem defendido com o seu próprio sangue e também em homenagem ao portuguesismo de quantos ala vivem, trabalham e lutam por um Portugal melhor e por um Portugal uno!
Ninguém pode negar que, desde a primeira hora, o Presidente do Conselho tem posto à cabeça das preocupações do Governo os problemas da defesa nacional e muito especialmente os da defesa do ultramar - a qual é, aliás, um imperativo da Nação: defesa do território, protecção das vidas, defesa dos valores económicos, defesa de uma obra secular.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Entre as inovações da proposta, permito-me salientar ainda, pela sua indiscutível importância, a que consta do § 3.º do artigo 7.º - aquela que confere direitos da cidadania portuguesa aos brasileiros, tal como já se encontra disposto na Constituição do Brasil.
É um novo passo, e uma passo de gigante este que vamos dar no sentido de conferir expressão válida à comunidade luso brasileira. É nos acto de maior importância histórica e da maior relevância política. Chegou agora, com a revisão constitucional, o momento oportuno de podermos permitir ao Governo, com a aprovação deste preceito, a publicação da legislação complementar dos ajustamentos para que a comunidade luso brasileira seja uma realidade autêntica.
Por via dele reforça-se a posição que Portugal e o Brasil tomaram, «de mãos dadas, na política mundial».
Efectivamente, na declaração de Brasília, em 1957, assinada pelos Presidentes Idas Repúblicas Brasileira e Portuguesa, assim se disse:

Firmemente unidos na sua fidelidade aos princípios fundamentais da civilização ocidental cristã, Portugal e o Brasil, um através do outro, estarão sempre presentes na América e na Europa, acrescendo às injunções do passado aquelas que derivam das posições geográficas que um e outro detêm e que, pela evolução dos acontecimentos, adquiriram incontestável e evidente actualidade.
A comunidade luso-brasileira há-de ser uma realidade viva, política e jurídica indiscutível não só para os dois países como para o mundo inteiro, como disse o Presidente do Conselho.
Por mim, declaro-me inteiramente de acordo com a inovação, na certeza de que ela vem desfazer equívocos, reforçar a amizade, conjugar esforços para a realização de uma política económica e cultural da maior importância para os dois países e para o mundo ocidental.
Quanto à forma de eleição do Chefe do Estado, aquilo que já aqui foi designado como «zona quente», mantenho-me fiel à posição que tomei aquando da votação que instituiu a modalidade actualmente vigente e àquela que assumi recentemente, a sangue-frio e na maior calma, no seio da própria comissão eventual, embora me fosse muito agradável que os juristas desta Câmara e os seus mais argutos políticos encontrassem forma de alterar o colégio eleitoral, dando-lhe uma mais lata e mais autêntica representatividade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As cenas a que assisti em certas campanhas de candidatura à Presidência da República decidiram-me, sem sombra de dúvida, por uma eleição indirecta, razão por que não posso dar o meu acordo ao projecto n.º 6/X nas alterações ao artigo 72.º
Sr. Presidente: Limito a estes pontos a minha apreciação na generalidade desta proposta de lei, reservando-me o direito de tomar as posições que me parecerem mais justas e convenientes na discussão na especialidade. Dou-lhe a minha aprovação na generalidade, na convicção de que, com os ajustamentos que permite e com as inovações que introduz na nossa Constituição, se garante a Portugal a continuidade do caminho da dignidade, da paz, do progresso e da justiça social, se mantém e se defende a integridade da Pátria e se estruturam as condições para um Portugal melhor.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. David Laima: - Sr. Presidente: Ao subirmos a esta tribuna para nos pronunciarmos sobre a proposta de lei da revisão constitucional, estamos perfeitamente conscientes das limitações que nos são impostas, quer pelo reduzido tempo de que podemos dispor para o estudo desejado, quer por confessada falta de conhecimentos que nos seriam precisos para uma pronúncia mais esclarecida. Limitar-nos-emos, pois, a desenvolver os raciocínios simples que exprimiremos com a sinceridade e o desejo de ser útil como o faria qualquer cidadão da minha Angola - muitos deles com o maior brilho do que aquele que serei capaz de emprestar às minhas palavras.
O respeito que devemos àqueles que em nós acreditaram e que nos concederam o voto que nos trouxe a esta Casa não consente que calemos as palavras de apoio ou de reprovação aos textos em apreço. A consciência obriga-nos a proferi-las.
Como Deputado ultramarino que somos não podemos naturalmente deixar de recordar a íntima implicação do texto constitucional com os dois outros documentos fundamentais da gestão ultramarina - Lei Orgânica e os estatutos políticos, muito nos preocupando desde já com as futuras revisões que lhe devem ser introduzidas para que os objectivos da nova lei constitucional possam ser efectivamente atingidos.

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As nossas preocupações incidem, muito particularmente, na circunstância de nos reconhecermos obrigados a recordar o direito que não poderá ser negado à intervenção directa de todos os representantes das próprias populações ultramarinas no estudo das referidas revisões, muito particularmente daquelas que serão feitas aos estatutos políticos uma vez que, com direito próprio, esta Câmara se pronunciará sobre as que forem propostas para a Lei orgânica. Confiamos, pois, que o Governo não deixará de proporcionar essa intervenção directa, assim praticando acto de inteira justiça.
Somos uma República unitária e corporativa (artigo 5.º e seu § 1.º), mias a verdade é que, infelizmente, em muitas parcelas do território nacional ainda não temos uma autêntica organização corporativa. Daqui resulta então uma diversidade de situações confusas, que a lei fundamental do País não contempla nem autoriza, que a ninguém aproveita e a muitos prejudica. Este hibridismo político não pode perdurar.
Os organismos corporativos - elementos estruturais da Nação (§ 3.º do artigo 5.º) - são preteridos ao bel-prazer de simpatias e tolerâncias pessoais, daí resultando graves e injustos atentados às suas legítimas prerrogativas. Este dualismo metrópole-ultramar, evidenciando em muitos outros aspectos tão salientes coimo os que apontamos, apenas resulta de hesitações que urgente se torna eliminar. Oportuno, da maior oportunidade, nos parece também recordar que, contrariamente à (própria filosofia do nosso regime político, os trabalhadores ultramarinos, ainda que devidamente organizados nos respectivos organismos corporativos, não tem representantes na Câmara Corporativa, em chocante situação excepcional que nada pode justificar.
Ainda que possuindo representantes nos conselhos económicos - embora em número insuficiente, se tivermos em consideração a importância do sector que representam -, ainda que os Procuradores à Câmara Corporativa pelo ultramar sejam eleitos pelos referidos conselhos económicos, a verdade é que, por força de despropositadas disposições legais, essa representação, que até a coerência justifica, não se verifica.
Porquê? O absurdo, porque de um autêntico absurdo se trata, não pode perdurar e urge que, para além dos conceitos teóricos, a realidade confirme as opções efectuadas. Os princípios, para serem respeitados, têm de ter efectiva aplicação prática, e a unidade da Nação não consente, néon tolera, segregacionismos que a própria razão condena. A participação política do ultramar para ser digna, para ser válida, tem de se processar em condições absolutamente idênticas às da metrópole. O contrário, que tem resistido ao tampo e à lucidez, fere e divide. O regionalismo político não colide com os direitos inalienáveis de uma participação activa e em termos de absoluta igualdade de todos os cidadãos da Pátria Portuguesa, qualquer que seja a terra onde tenham nascido ou onde labutem.
É ainda embalado na mesma linha de raciocínio que nos recordamos do artigo 38.º, confiados que legislação apropriada seja aplicada no ultramar, para que os lídimos direitos reconhecemos no referido artigo possam, finalmente, ser usufruídos por quem de há muito os merece.
Recusamo-nos, terminantemente, a reconhecer a incapacidade do povo português para vencer as ansiedades de uma eleição presidencial, de dominar os sobressaltos das indecisões, de conservar a dignidade e defender a clarividência que garantem o respeito de uns pelos outros.
Não nos parece justo que a todo um povo que luta, sofre, labuta aplicadamente pelo engrandecimento da Pátria se possa negar o direito de, em intervenção directa, escolher o seu Chefe.
Um colégio eleitoral em que nem todos são elementos eleitos (e muitos ali surgem favorecidos por simpatias pessoais) não pode cumprir, em consciência, a tarefa sublime para que foi investido. Não, essa tarefa não pode ser de alguns; a todos pertence como responsabilidade própria, acto de consciência, expressão da vontade, cumprimento do dever. Por esta razão, porque, repetimos, acreditamos veementemente no homem português, não podemos deixar de juntar o nosso aplauso ao processo de eleição do Chefe do Estado Português por sufrágio directo.
Propagam-se afirmações considerando perigosa a autonomia controlada, pelos próprios textos legais, das províncias ultramarinas. Perigosa porquê? Afirmações desse teor não surgem nem protegidas, como seria de desejar e à evidência se requeria, por esclarecimentos que lhes dessem valor autêntico, que as tornassem merecedoras do crédito devido aos princípios lógicos. Surgem apenas com ares de dogmas apressados, reflexões produzidas por exaltados receios, simples expressão do hábito de pensar sempre d» mesma maneira. Abandonado o casulo pátrio, despojados de paixões exacerbadas, de narcisismos e petulâncias ridículas, fácil será então verificar que o mundo não é o mundo com que muitos ainda sonham.
Ao adoptarem-se, pois, as soluções que a inteligência aponta como as mais válidas para o momento actual, não se praticam transigências com qualquer moda ditada do exterior. Cumpre-se apenas o dever de ser lúcido e corajoso. Ninguém se lembrará certamente de invocar idênticos argumentos quando se aja no domínio das ciências físicas ou sociais ou humanísticas. Porque especular, pois, e apenas, no domínio das ciências políticas? O País não é, nem pode ser, de uma elite favorecida, e só através de uma sincera actualização dos sistemas se poderão colher as vantagens do diálogo com o pensamento novo.
Mal iria a Nação, e sacrificado estaria, indubitavelmente, o seu destino, se a garantir a sua unidade apenas existissem os textos ou a tradição.
Pensar assim é ultrajar imerecidamente quem tem demonstrado, à sociedade, que acredita em que as razões espirituais que nos unem, resistindo ao tempo e aos delírios, se sobrepõem e dominam todos os valores materiais e todos os contextos jurídicos.
Haverá alguém que, honestamente, ainda acredite que uma sociedade, qualquer que ela seja, pode resistir às causas internas e externas que constantemente a corroem se não se defender, protegendo e aperfeiçoando as suas características próprias resultantes da forma de pensar e da vontade dos homens que a constituem - forma de pensar e de vontade caldeadas no meio físico em que vivem? É, pois, trilhando esta linha de pensamento que repudiamos, com veemência, os temores mal escondidos por detrás de insinuações que não toleramos.
A autonomia das províncias ultramarinas, referida no artigo 135.º e limitada no artigo 136.º, e, por conseguinte, dirigida pelos próprios textos, surge, pois, como a concretização de uma realidade que não pode deixar de ser reconhecida.
Infelizmente, porém, acrescente-se, a autonomia não é apenas um problema de textos. É também, e muito principalmente, um problema de homens, de homens de coragem. Na nossa tradição política os textos sempre existiram, mais ou menos pormenorizados, mais ou menos realistas, sem que, contudo, infelizmente, tivessem merecido a aceitação disciplinada dos homens. Por isso os erros se acumularam e deles se guarda hoje triste memória. Confiamos, porém, que a clarividência a todos atinja e que daí resulte o reconhecimento da vantagem que advém do respeito pelos princípios que, para bem de todos, importa proteger.

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Os benefícios da autonomia que se procura não poderão, contudo, ser efectivos se os conselhos legislativos das províncias não forem profundamente remodelados, deforma que lhes sejam dadas as características de representatividade autêntica que hoje não têm; se lhes não for também reconhecido que poderão reunir por direito próprio, independentemente de vontades ou de conveniências; se os conselhos económicos não forem chamados a uma intervenção directa e constante na gestão governativa; se, enfim, se não remodelarem estruturas anacrónicas servidas por uma burocracia discricionária em que muito elemento se julga omnipotente, viciado no princípio de que o executivo forte que se deseja nada deve à Nação, que afinal deve servir com humildade.
A autenticidade do destino da Nação Portuguesa não está, e de desejar seria que nunca tivesse estado, em acções colonizadoras votadas a garantir a felicidade dos que o colonizam, mercê do esquecimento dos que são colonizados. Fundidos com a terra e com as gentes, trabalhando e sofrendo sob o mesmo sol, amando o próximo como a nós mesmo, temos divulgado conhecimento, temos vencido a doença, temos valorizado a pessoa humana, física e espiritualmente. Este, sim, o grande destino nacional: Valorizar a pessoa humana!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: For tudo quanto se disse nos permitimos então concluir que a autonomia só pode, pois, estimular a colaboração das populações na vida política, administrativa e jurídica de cada parcela diferenciada do território, por se reconhecer, finalmente, a responsabilidade de cada

Vozes: - Muito bem!

O Orador: Assim se reforça indubitavelmente a unidade.
Sr. Presidente: Não podemos calar a palavra que se nos oferece dizer sobre- os direitos individuais contemplados no artigo 8.º
Como já nesta Casa tem sido recordado, razões da mais variada ordem, umas sinceras, outras evidentemente especulativas, têm sido invocadas para que as liberdades individuais no País sejam controladas por receios que só a imaginação tantas vezes avoluma. Daqui, tem pois, resultado uma actuação tímida de legisladores cautelosos, preocupados em controlar exageros sempre possíveis, mercê da nossa maneira de ser apaixonada, da reconhecida carência de cultura, de insipientes hábitos cívicos, de um sentido de obrigações mútuas tantas vezes atropelado.
A verdade, porém, é que fazer pagar o todo pela parte, quando pelos erros da parte também somos todos responsáveis, parece-nos solução tão cómoda como injusta.
Pensamos que chegada é a altura de o País melhorar os processos de vivência, ensaiar o risco de alguma novidade, garantindo-se assim a consciencialização do cidadão e, ipso facto, do seu interesse pelos problemas da comunidade em que existe e pela qual também tem de se responsabilizar.
O tempo, esse grande justiceiro, confirmará que as vozes derrotistas que apregoam imaginadas fatalidades se perderão no deserto da não razão.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

A Sr.ª D. Sinclética Torres: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria trair-me a mim própria e às populações que nesta Câmara represento se na discussão de tão importante documento para a vida da Nação não desse o meu modesto contributo, transmitindo, sincera e integralmente, a nossa satisfação e as justificadas aspirações dessa maioria esmagadora das populações de Angola.
Peço, porém, que me perdoem os ilustres colegas se, antes de tecer algumas considerações que me parecem pertinentes para o estudo da revisão constitucional, eu felicite os ilustres colegas que me antecederam pelas suas intervenções, algumas das quais são verdadeiras lições de Direito Constitucional.
Quando eclodiu o terrorismo em Angola, o Prof. Oliveira Salazar tomou a posição imediata e oportuna de defender o património ultramarino.
Ficou célebre a sua frase «para Angola imediatamente e em força»...
Quando o Prof. Marcelo Caetano perguntou à Nação o destino a dar ao ultramar português, a resposta foi estrondosa e uníssona em todo o território nacional: manter e defender o ultramar como parte integrante da Nação...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Muito bem!

A Oradora: - Quando percorremos as vastas áreas daquela imensa província e a nossa curiosidade nos conduz à observação atenta tanto das casas dos aldeamentos como das cubatas das sanzalas, bem como dos respectivos locatários, fica-nos a certeza de que aquele povo se sente português...
Que receios, que dúvidas poderão surgir desta revisão constitucional para se concluir que está em perigo a integridade da Nação?
O que faz perigar a Nação, no todo ou em parte, é, sim, a proliferação de partidos políticos; suo as inúmeras ideias e convicções que embriagam os mais incautos; é a cega paixão que nos impede de destrinçar o bem do mal, a verdade da intriga e o egoísmo da maldade!

O Sr. Casal-Ribeiro: - Muito bem!

A Oradora: - Que felizes não seríamos se perante a força colectiva da vontade firme e do ideal comum desaparecesse a individualização de grupos!

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Se sem melindres nem ofensas que bom seria podermos, em conjunto, dialogar e analisar ponto por ponto tudo quanto convém a Nação, como berço de portugueses de todas as etnias, credos ou raças!

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Dou a minha concordância a esta revisão constitucional, e não noto que, através da proposta do Governo, a que dou a minha aprovação, haja a pretensão de alterar a nossa posição no Mundo e muito menos a de impedir a formação de sociedades plurirraciais, que não são mais que uma repetição de um passado histórico.
Não posso conceber autonomias totais ou hipotéticas independências em territórios cuja maioria esmagadora das suas populações ainda não atingiu maturidade suficiente para se poder pronunciar.

Vozes: - Muito bem!

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A Oradora: - Aceito sim, de alma e coração, a colaboração de todos e a fusão que possa surgir entre todas as etnias.
E, se nos dermos sem reservas, se não esquecermos que, como afirma o Prof. Marcelo Caetano, «tendo de viver em comum, não podemos guiar-mos exclusivamente pelas nossas próprias conveniências ou pelos interesses particulares», fica-nos a certeza de que, seja qual for o destino que o futuro nos reservar, Portugal ultramarino viverá eternamente na continuidade das gerações futuras.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Como já disse, aprovo ma generalidade o diploma do Governo, embora continue a defender também, devido à formação religiosa que recebi, a proposta n.º 7/X, que, com outros Srs. Deputados, subscrevi.
Nos capítulos relativos ao ultramar é notória a redução dos quarenta e dote artigos para quatro; contudo, aguardo o estudo da futura lei orgânica e idos estatutos das provinciais que, como muito bem afirmou o Deputado Neto Miranda, hão-de definir os parâmetros da administração política, económica, social e legislativa ida província.
Compreendo e aceito que haja necessidade de uma maior descentralização nas províncias ultramarinas; contudo, não deixarei de chamar a atenção da Assembleia para a autonomia administrativa, sobretudo nas relações sociais para com os tradicionais econòmicamente débeis.
São populações imensas que precisam de ser cuidadosamente protegidas, orientadas e defendidas, para que os inimigos ou traidores mão exerçam a sua influência, convertendo-se em elementos subversivos.
Para isso, sugeria ao Governo que se criassem departamentos onde essa população encontrasse devidamente defendidos os seus direitos, onde esteja alguém que, pacientemente, a oiça e ajude a resolver os seus problemas.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

A Oradora: - Não estou a pedir, de forma alguma, o regresso do Estatuto do Indigenato, já que este foi um documento discriminatório e um desrespeito pela dignidade humana que felizmente e em boa hora o Governo extinguiu.
Mas temos de convir que a maioria das populações não atingiu ainda o desenvolvimento capaz de tirar proveito das leis, nem mesmo quando estas os vão beneficiar.
Geralmente, essas leis ficam ao critério de quem está encarregado de as fazer cumprir; e não é raro encontrar-se aplicação diferente ide um diploma legislativo de distrito para distrito. Basta ter em conta o que se passa com o diploma dos mercados rurais.
Em resumo: sujeitar as populações à mercê de apetites pessoais ou dos menos escrupulosos, além de ser imoral e anti-social, é um erro que nos pode conduzir a sérios problemas e que urge evitar com veemência.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

A Oradora: - De resto, tanto o antigo Acto Colonial como a actual Lei Orgânica do Ultramar respeitam os bens tradicionais e tudo quanto diga respeito à dignidade humana; no entanto, nem sempre se tem respeitado aqueles princípios.
Em quase todas as minhas intervenções nesta Câmara tenho focado os vários aspectos destes atritos, e, para não os voltar a repetir, direi apenas que muitos erros se têm cometido, talvez irreflectidamente, mas a verdade é que os desesperos das ciasses atingidas são tão inconvenientes como perigosos no momento presente.
Se nós não corrermos em seu auxílio, alguém o fará por nós...

O Sr. Pinto Machado: Muito bem! Esse é o problema.

A Oradora: - Sr. Presidente: Não basta legislar, é importante encontrar-se quem seja capaz de executar essas leis sem se trair a si próprio nem a Nação; aliás, é a tese que a proposta em discussão também considera como dever indeclinável do chefe da província.
É fundamental encontrar pessoas com dignidade suficiente para renunciarem a caprichos desregrados e que não se deixem adormecer sobre tão graves problemas.
Estas populações, que tenho defendido nesta Câmara, constituem um património sagrado. É o exército da retaguarda, que, se for bem aproveitado, melhor que ninguém saberá defender a integridade da Nação.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - Termino reafirmando mais uma vez as palavras do Prof. Salazar:

... quem se coloca no terreno nacional não tem partidos, nem grupos, nem escolas, aproveita materiais conforme a sua utilidade para construir o País; tem a grande, a única preocupação de que sirvam e se integrem no plano nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Casal-Ribeiro: - Eu quero felicitá-la vivamente pelo realismo do seu depoimento.

O Sr. Pinto Machado: - Eu, igualmente. Apoio as palavras do Sr. Deputado Casal-Ribeiro.

A oradora foi cumprimentada.

O Sr. Maximiliano Fernandes: - Sr. Presidente: Com palavras bem definidas, e que não deixam margem a quaisquer dúvidas a quem use de lógica e não se desvie do seu verdadeiro conteúdo, tem o Sr. Presidente do Conselho aclarado sobejamente a proposta governamental de revisão constitucional no tocante ao ultramar, reafirmando o princípio da unidade e da integridade da Nação, a par da descentralização administrativa e da autonomia das nossas diferentes parcelas geográficas.
Estes princípios não são novos, pois vêm de há muito sendo expendidos pelos mais eminentes responsáveis pela nossa administração ultramarina, além de que se encontram inscritos em leis básicas.
No entanto, embora já tivéssemos dado alguns passos tímidos no sentido de evoluir dentro desses parâmetros, crê-se que o País não está ainda amadurecido e consciencializado o bastante para a inevitabilidade, e a consequente necessidade, dessa evolução.
O Governo, porém, pretende actualizar e revitalizar tais princípios, sem prejuízo ida unidade básica no plano da soberania, maleabilizando esse, aliás, tradicional corpo de doutrina, dando à filosofia política nacional, se não uma nova dimensão, ao menos uma nova elasticidade - facto que merece o nosso incondicional apoio.

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Na verdade, como componentes interdependentes e insoláveis da comunidade mundial em geral, e ocidental em particular, não podemos alhear-nos da imperatividade dos fenómenos político-sociais gerados mo seio da civilização a que pertencemos e denodadamente defendemos.
A cada época e a cada latitude a sua política. Se as realidades se transformam, deve a política adaptar-se-lhes, apenas com o limite de que se confinem dentro das traves mestras dos Principios inegociáveis.
Por isso se nos afigura que as chamadas «aberturas» do Governo - agora as que ao ultramar se referem - conciliam a prudência e a coragem necessárias.
Insatisfeitos e «velhos do Restelo» sempre os houve e sempre os haverá. Entre o imobilismo e a temeridade, o optimismo fácil e o pessimismo estéril, há que ser-se realista.

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - É, a nosso ver, o que o Governo está sendo.
Do que se trata, afinal, é de dar execução a um principio constitucional de que até hoje se fez modesto uso.
Sendo preciso desenvolver para progredir, corresponder, em suma, ao ritmo do nosso tempo, é indispensável que a descentralização e a autonomia passeou de princípio teórico, ou pouco menos, a realidade viva.
De outro modo não será possível viabilizar os recursos néon a dinâmica necessários para alcandorar o nosso ultramar e os seus milhões de habitantes para estádios de progresso económico e social que os integrem de facto - e não apenas na letra de textos legais - na plenitude do complexo de direitos e deveres inerentes à nobre condição de português.
Demais já fomos surpreendidos e ultrapassados pelos acontecimentos. Demais já deixámos perder oportunidades e possibilidades irrecuperáveis. Impõe-se agora um esforço de actualização e recolagem que, evidentemente, não cabe na capacidade de determinação de espíritos receosos, contemplativos ou escravos de tentadoras rotinas.
É por isso que nesta Assembleia, neste momento, repousa uma responsabilidade incomensurável, mas também uma oportunidade de contribuir para um Portugal maior no Mundo.
O homem é como a água: só repousa nivelado.
Entre poucos muito ricos e muitos muito pobres, entre privilegiados e desprotegidos, não será fácil encontrar, nos tempos que correm, uma trégua duradoura. A tarefa que se nos impõe, e que está na linha da nossa clássica visão personalista do mundo e da vida, é a de, sem demora, procurar nivelar abismas que separam etnias, grupos económicos e culturais, por forma que, sem se cair em abstracções irrealistas, cada região ou cidadão portugueses se não sinta o parente pobre de uma só família.

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - Esta a realidade insofismável a que não vale a pena pregar o anátema de rótulos envelhecidos.
Bem recentemente, o ilustre governador da província da Guiné, general (António de Spinola, preveniu que «será utópico pensar que a mera definição de esquemas políticos com textos legais bastará para o fim em vista». Acrescentou que «também não deve esperar-se que as afirmações produzidas em actos públicos pelos chefes responsáveis cheguem para preencher tal lacuna». «É necessário», concluiu, «para além disso, definir claramente o rumo a seguir, através de uma orientação concreta e objectiva que todos apreendam e em que todos sintam a sua quota-parte de participação responsável.»
Palavras justas. Palavras que iluminam.
Não bastará, pois, alterar a própria Constituição se não empreendermos, logo de seguida, toda uma série de medidas, de reformas, diríamos mesmo, até de revoluções administrativas, para que de facto haja evolução e para que ela se processe com naturalidade, com coerência lógica, sem precipitações, mas também sem demoras desnecessárias.
Consciencializar a Nação e dirigi-la, impulsionando-a ao encontro do seu próprio desígnio histórico, proceder, enfim, à modernização e dinamização de orgânicas e sistemas ultrapassados pela fenomenologia da era planetária - eis o objectivo inadiável e indeclinável que tem de merecer as honras da nossa mais atenta preocupação.
Ao apoiarmos, conscientemente e sem hesitações, os propósitos do Governo, sentimos ser nosso dever justificar a nossa tomada de posição, e tecer algumas considerações que, embora possam ser talvez ajustáveis a todo o ultramar, queremos referir especialmente a Moçambique - terra em que nascermos e nos nasceram filhos, onde vivemos e que, por isso, melhor conhecemos.
Poderão elas, à primeira vista, parecerem demasiadamente particularizadas ou irrevelantes na apreciação da revisão constitucional, mas entendemos enumerar em detalhe e evidenciar alguns problemas, precisamente por se tratar de dificuldades e de falhas que, no fundo, militam a favor das renovadoras atitudes do Governo, sem as quais não julgamos possível uma solução permanente.
Embora aquela província ofereça já um admirável complexo unificado geoumano, racial e religioso, que constitui exemplo nos dias de hoje, podemos afirmar que, apesar de consideráveis progressos, ela está apenas a acertar os primeiros passos para o grande futuro que seguramente a espera.
Tenha-se presente, antes de mais, a premissa por vezes esquecida, de que ela se situa a muitos milhares de quilómetros da metrópole, em confronto com a qual se deve considerar uma região com substrato étnico, geográfico, religioso e social diferenciados.
Infelizmente é uma parcela pouco conhecida do mundo em geral, da maioria dos portugueses em particular, e até de grande partia dos Srs. Deputados que ilustram festa Câmara - o que torna algo anais difícil a compreensão, em termos de vivência, dos seus problemas e dos seus anseios.
A este respeito, não sabemos nos - por pouco entendidos na matéria - se seria de todo em todo impossível prever-se que, para deliberar sobre assuntos de maior envergadura que afectem particularmente o ultramar, esta Câmara, ou ao menos algumas das suas comissões especializadas, pudessem reunir no teatro dos problemas, ouvindo as opiniões dos cidadãos ali vivendo - daqueles que, pelos ensinamentos que só a permanência proporciona, lá olham o céu e sabem quando chove, ou anunciam, perscrutando as nuvens, que o vento vai mudar.
Na dúvida, aqui deixamos a sugestão.
Cabe nesta altura uma insistência. E essa para frisarmos que, em nossa opinião, a Assembleia Nacional deve reflectir, tanto quanto possível, o consenso dos portugueses de todos os matizes étnicos e políticos, desde os mais ilustres aos mais humildes, inclusive, senão, sobretudo, daquelas camadas que constituem a chamada maioria silenciosa, como tal classificada por não dispor de porta-vozes próprios, ou por viver num alheamento de que é preciso arrancá-la.

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Queremos referir-nos especialmente aos milhões de cidadãos africanos, sedentos de mais progresso e justiça social.
Nesta medida, não podemos deixar de ver com olhos favoráveis o aumento de representantes do ultramar. Mas esse aumento quantitativo mão basta. Há que ser-se cuidadoso na qualidade dos representantes escolhidos. Não terão de ser, necessariamente, os mais ilustrados. Mas hão-de ser os mais representativos, para que diversos grupos sociais diferenciados - os pobres, os africanos, os ricos, os europeus, quiçá os de todas as latitudes nacionais - tenham nesta augusta Casa quem neles pensa, quem por eles fale, quem os represente, enfim, quem os defenda.
Aos interesses de alguns desses compatriotas temos estado por vezes quase totalmente alheios, pois os temos avaliado por um prisma muito unilateral, muito pouco particularizado, e não como eles na realidade são, sentem, sofrem e anseiam.
Já nos referimos neste areópago ao perigo de frustração que tal ausência pode acarretar, e sentimo-nos hoje apoiados por uma voz - a do Sr. General Spinola - autorizada por profundo saber e actualizada por dura experiência, a prevenir que «os povos aspiram a ser bem governados, sentindo nos seus governos força e protecção, encontrando neles um claro sentimento à luz de conceitos definidos em conformidade com as suas arreigadas tradições e desejam obter desses governos total audição e interesse pelos seus problemas, sentindo assim que contribuem com a sua quota-parte de responsabilidade para a prossecução do bem comum».
Acrescenta esta destacada figura, revelando profundo saber e penetração da problemática ultramarina:

Pensamos por isso que qualquer política africana só é válida se for impregnada do verdadeiro espírito de instituições consideradas na sua pluralidade, para, no respeito pela individualização, se construir o todo pela solidariedade das suas partes, com plena participação, através de representantes legítimos, na gestão dos interesses colectivos. A missão do Governo é zelar pelo bem-estar geral, orientar o esforço colectivo para a satisfação dos legítimos anseios das grandes massas populacionais. E esses anseios não se definem nem se avaliam por padrões não africanos. Terão de ser as próprias populações a enunciá-los, a tomar consciência das limitações da sua realização e a contribuir directamente para a construção do seu futuro.

Continuamos, pois, a sustentar que a apreciação dos problemas nacionais não pode ser integrada e completa enquanto esse grande sector humano continuar à margem da sua gestão, podendo esta resultar como que precariamente assente em areias movediças, enquanto não estiver assegurada a audição dos seus legítimos representantes. Esta qualidade, no que àquele segmento se refere, nenhum de nós pode, com autenticidade, reivindicar.
Paralelamente ao problema da representatividade, avulta o facto de a nossa orgânica legislativa não permitir que os Deputados pelo ultramar possam apresentar projectos de lei para aquelas áreas, circunscrita, como está, a respectiva competência ao Ministro do Ultramar.
Não nos parece aconselhável esta limitação, pois além de cometer a uma só cabeça - posto que excepcionalmente dotada - uma responsabilidade demasiadamente pesada, recusa aos ditos Deputados a sua prerrogativa mais importante, e rouba a este órgão supremo - que é a Assembleia Nacional -, na sua função de legislar com independência para todo o território nacional, o contributo válido de algumas genuínas e fundamentadas iniciativas.
Prosseguindo:
Apesar de a província dispor de consideráveis perspectivas económicas e ilimitadas possibilidades que convidam ao investimento e à acção, desde a exploração directa do solo e do mar, à instalação de indústrias transformadoras, enfim ao incremento do comércio, encontra-se, como se sabe, em frágil situação económica e em perturbante crise financeira.
Fossem essas dificuldades transitórias ou resolúveis dentro da actual orgânica ultramarina e não representasse a economia da província uma segunda frente da sua sobrevivência, seria descabido trazê-las a este foro, ademais numa altura transcendente em que se discute a própria lei base da Nação.
Vamos fazê-lo, todavia, pois cremos que a sua solução reside, sobretudo, numa questão de estrutura a que estão Intimamente ligados os conceitos de descentralização e autonomia que o Governo, em boa hora, pretende imprimir na sua administração.
Devem-se estas dificuldades, em parte, à circunstância de em demasiado se terem transplantado para o ultramar as soluções, os quadros e as medidas formuladas ou aplicadas na Europa, sem contemplação do seu particularismo ecológico, quase todo regido por uma burocracia copiada da de Lisboa por uma pena.
Mas em Moçambique a dimensão é outra, os ciclos de produção e de consumo outros são, os factores de crise divergem, as infra-estruturas não existem, todo um condicionalismo geossócio-económico demandam uma economia para o ultramar, a pão: de uma sociologia e de uma política diferenciadas.
«A unidade na diversidade» deve, pois, ser efectivamente o leit-motiv de uma política autenticamente nacional, se a queremos mais verdadeira e mais funcional.
Com efeito, é preciso que não se confundam os conceitos de unidade e uniformidade. Para se ser uno não é necessário ser-se uniforme.
Uno é o corpo humano, comandado de um só centro, e diversos os seus componentes. Assim também o corpo sócio-político da Nação Portuguesa.
Uno pode ser o sistema de leis por que se rege, na medida em que fiel a certos princípios válidos para todo o espaço português, sem prejuízo das especialidades que se mostrem necessárias para que adequadas aos particularismos de cada região de características autonomizadas.
É mesmo reconhecendo a característica da nossa diversidade que melhor podemos alicerçar um válido conceito de unidade, planificar a nossa administração, elevar as nossas etnias, edificar, enfim, uma sã economia global em que cada parte do todo se desenvolva livremente, sem o espartilho de postiças paridades, até ao máximo da sua capacidade e seguindo o ritmo das próprias potencialidades.
A título de exemplo, citaremos o duro preço que teríamos de pagar por uma identidade de política fiscal, aduaneira, agro-pecuária, etc., entre a metrópole e o ultramar.
As determinantes metropolitanas, onde a terra é escassa e superfraccionada, onde a ocupação é quase total, onde as potencialidades do subsolo se encontram inventariadas, ou pouco menos, onde a mão-de-obra se vai especializando, onde o investimento não raro carece de oportunidades, onde o consumo se programa para os grandes espaços económicos em que a metrópole se integra ou visa integrar-se - nada tem que ver com os condicionamentos económicos dos territórios ultramarinos.
Ali, a terra abunda, o subsolo é uma promessa aliciante, a mão-de-obra é primitiva, o investimento hesita entre oportunidades mil, e os mercados externos são provisòria-

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mente hostis. Onde tanto está por se fazer, é de proteger e não de condicionar ou empatar tudo quanto se faça, ainda que um tanto empírica ou desordenadamente.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - E a sobrecarga fiscal deve ser aligeirada, para que o capital que sobrevoa o mundo à espera de uma chance de «picar» e enraizar-se, vejamos incentivos e nas isenções fiscais um convite, e se fixe entre nós. A riqueza que produzir será, afinal, o mais válido contributo para o progresso, com a vantagem de não ter sido «imposto».
Nesta medida, a quase identidade dos sistemas fiscais metropolitano e ultramarino pode ser um mal, se não o é seguramente.
Ilustra esta verdade, mais do que qualquer outro, o imposto sobre as explorações que já aqui classificámos de funesto à actividade agrícola e pecuária de Moçambique, pois ali actua como dissuasor do aproveitamento da terra.
Com a ressalva de que não somos versados em economia, não vemos como se prebende uma economia integrada sem o pré-requisito de uma moeda única. Enquanto existirem moedas regionais de circulação meramente interna, cremos que não poderá pensar-se, em termos válidos, num mercado único português.

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - Temos para nós que esse facto primário é responsável pela ineficiência de um sistema que demora mais de um ano os pagamentos interterritoriais e que tanta ansiedade tem causado a milhares de cidadãos e ameaça a disrupção do comércio de ambos os lados.
Não é segredo para ninguém que, para este desequilíbrio da balança de pagamentos, contribuem os invisíveis que, pelos mais ínvios caminhos, o cidadão ultramarino faz chegar à metrópole. Mas fá-lo às escondidas, porque não pode fazê-lo às escâncaras. Fá-lo porque é proibido. Fá-lo porque receia não o poder fazer quando lhe surgir uma situação em que tenha mesmo de o fazer.
E tal é a força dessas determinantes, que troca maior por menor rentabilidade, deixa de fazer operações num meio que conhece e o recheia de oportunidades, para as fazer noutro meio para ele desconhecido e de oportunidades escassas.
Há, pois, que se procurar um remédio definitivo para este estado de coisas, mas duvidamos de que, sem alterações profundas, seja possível encontrar-se na província uma solução capaz. E nessa procura, estamos certos, surgir-nos-á pela frente a aplicação mais visível dos princípios que o Governo ora pretende vitalizar.
O que, a nosso ver, não constitui solução, são as medidas de extremo recurso a que, no entanto, houve de se lançar mão à falta de melhor caminho, mas que representam travar o progresso com condicionamemtos que amortecem a economia, com medidas restritivas da importação que empobrecem o comércio de cá e de lá, reduzem a massa (tributária, favorecem o exportador estrangeiro e geram nos espíritos um pernicioso estado de alarme.
Fechado na sua ilha monetária, o português ultramarino sente-se tristemente desencorajado de na Mãe-Pátria adquirir os seus bens de consumo e fruição, de para ela enviar os seus filhos, de visitá-la e, Deus queira que não também, de em certa medida a amar.
Ao ter de trocar moeda por moeda com tanta dificuldade e ao sentir a sua tão desvalorizada, ele tende irresistivelmente a identificar a metrópole com outro país, e isso pode-nos custar duro preço em patriotismo e outros sentimentos inestimáveis.
E mão se veja neste ponto Ide vista - que dirigimos aos responsáveis e aos especialistas como modesto contributo de quem mais sente o problema do que em profundidade o conhece - uma contradição com a defesa do reconhecimento dos particularismos regionais. É que, exactamente, pensamos que nesta matéria se não faz mister qualquer diferenciação. E só a defendemos até onde a mesma se mostre irrecusável.
Sem contradição, pois, cremos que a autonomia das províncias ultramarinas tem estado demasiadamente pendente ide condicionalismos ao seu progressivo desenvolvimento.

O Sr. Correia da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Um maior ritmo ide desenvolvimento depende, precisamente, de uma maior autonomia. Acontece que um círculo vicioso impede, por um lado, que a autonomia do ultramar se acentue por falta de desenvolvimento suficiente e, por outro lado, tolhe o seu desenvolvimento.
Continuamos a trabalhar segundo um regime obsoleto de decisões à distância, com a inerente demora, por quem, muitas vezes, tem dos problemas a visão que dá um relatório, bem diverso, como se sabe, do conhecimento que só o contacto com as realidades e a permanência garantem.
Nesta época de contínuas mudanças e evolução, muitas das nossas fórmulas antigas se encontram ultrapassadas pelo tempo e pelas implicações da natural inserção da parcela mãe de Portugal na nova Europa.
Impõe-se, pois, e antes de mais, uma revolução nas mentalidades, logo expressa numa mexida em profundidade nos nossos inquistados métodos de trabalho, dirigida ao fomento da riqueza e à promoção do homem português, sobretudo do português do ultramar, cuja elevação já aqui preconizámos como devendo ser o nosso primeiro mandamento, mas que mal temos cumprido.
Urge dar prioridade às actividades agrárias, se não quisermos assistir impassíveis ao seu progressivo depauperamento e se quizermos impedir a criação de um vácuo no hinterland a favor de uma desmedida concentração populacional nas grandes urbes, com todo o seu cortejo de inconvenientes e perigos de ordem social, económica e política.
Naquele território a agricultura e a pecuária são, de resto, instrumentos indispensáveis de promoção e exemplo frisante de riqueza ao alcance de todos: aí está, talvez, mais uma razão para que devam ser encaradas com particularíssimo carinho.
É que, onde há tanta gente em estado quase primitivo de civilização, com aspirações de melhoria de vida, de habitação, de educação e outros anseios que têm estado fora do seu fácil alcance, a sua defesa e elevação adquirem foros de problema prioritário e grave, por isso inadiável e indissociável dos objectivos imediatos de qualquer programa de governo.
Tudo isto, mesmo em medida mínima, demanda a compreensão e a colaboração de todos - governantes e governados - e exige gigantescos esforços e recursos, numa hora em que os nossos estão sendo reclamados para outras tarefas irrecusáveis.
Continuamos, por isso, a advogar - e fortemente - uma maior facilidade na entrada e no enraizamento em Moçambique de iniciativas e empreendimentos nacionais e

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estrangeiros que, com o seu capital, a sua técnica e a sua experiência, podem efectivamente animar a vida económica da província, contribuindo poderosamente para a montagem de estruturas, para o emprego, a melhor remuneração e mais nível dos seus habitantes.
O afluxo de capital e de know-how, e o consequente aproveitamento da capacidade de trabalho dos que ali vivem, são essenciais para os dignificar, pana o aumento do produto provincial bruto e para a melhoria do rendimento per capita, sem o que será utópico sonhar coou ordem social e paiz duradouras.
Sem embargo, o clima actual não é favorável ao investimento.
Toda uma falta de estruturas (transportes, armazenagem, comunicações, etc.), toda uma falta de apoio creditício, que é quase inexistente onde mais deveria incidir - seja nas actividades primárias - , toda uma desaconselhável concentração industrio! em apenas duas cidades, toda um tendência para o condicionalismo e a procrastinação, todo um sistema fiscal de incidência severa, desanimam o mais bem-intencionado.
Sobretudo se oriundo de países onde as iniciativas são acarinhadas, sente-se indesejado, repelido até, e acaba por desviar-se para territórios onde a burocracia auxilia sem empatar, onde o crédito apoia, onde as trocas são minimamente condicionadas, onde o céu do futuro se apresenta mais desanuviado.
Consequência fatal: o investimento de carácter especulativo, empreendimentos que não trazem dinheiro nem capital, procurando trabalhar com financiamentos obtidos a partir de poupanças locais, isto é, sem risco, e também sem verdadeiramente fomentarem riqueza, e sem encararem as suas responsabilidades de ângulo autenticamente ultramarino - condição indispensável para que sejam encaradas de ângulo nacional.
Daí a precária integração de elementos locais válidos nos quadros dessas iniciativas de empréstimo, a modos que desmontáveis, pré-fabricadas, sem genuíno enraizamento no solo e no futuro de Moçambique.
Algumas novas estruturas creditícias ou unidades industriais representam, aos olhos de quem ali vive, uma nova floresta de directores, somada à floresta dos que por lá dirigiam, sem que cresça realmente a riqueza dirigida.
De fora também, habitualmente, os dirigentes mais responsáveis.
À parte o governador-geral - esse fora de causa - toda uma hierarquia que vem para fazer comissões, frequentes vezes demasiadamente curtas para poderem dar fruto, e levar na mala de retroviagem a bagagem de conhecimentos que devia possuir à chegada, e que se tornam inúteis após o seu regresso.
Todo o antecedente e muito mais são factores que clamam pela solução que o Governo vem de preconizar para a administração do ultramar, na sua proposta, e a justificam imbatívelmente.
Temos localizado na parcela-mãe de Portugal, ou seja no vórtice da pirâmide nacional, um Governo Central, com quinze Ministérios, Secretariados e Subsecretariados, que chamam a si todas as responsabilidades dos respectivos sectores, mas contam também com todos os poderes para poderem efectivamente agir e governar.
Trata-se de um elenco governativo estável, pronto a atender in loco os múltiplos problemas desta faixa da Nação, por imposição geográfica forçosamente absorvido com os seus problemas - que não são poucos nem fáceis - e virado, cada vez mais, para as implicações da comunidade europeia a que, por unidade geográfica e por afinidade (política e sócio-económica, .pertence.
Podemos, pois, sem fugir à realidade, sustentar que o Governo Central está - pelo menos no momento presente- mais afecto à problemática europeia, embora possuindo, é certo, um Ministério com jurisdição exclusiva sobre o ultramar. Não obstante, representaria um sério engano confundir um só Ministério com todo um Governo, embora queiramos aqui expressamente reconhecer o extraordinário e relevante papel desempenhado por este Ministério, e, de há anos a esta parte, pelo excepcional Ministro que a ele preside.
Digamos antes que a primeira vítima deste arranjo orgânico é o próprio Ministério do Ultramar, colocado não raro na situação de ter de ser Governo, ou fazer as vezes disso, para todo o imenso espaço ultramarino.
Espaço cuja problemática deve ser medida à escala do seu tamanho geográfico - e humamo: mais de metade da população portuguesa vive no ultramar, geogràficamente vinte vezes maior que a metrópole. Se a isto somarmos as variedades étnicas, linguísticas e religiosas, os grandes desníveis económicos, enfim, uma diversidade de costumes e de aspirações que de todo em todo se exprimem em específicos problemas, teremos somado razões bastantes para concluir que chegou a hora de governos locais, integrados tanto quanto possível por elementos locais, dotados de competência própria, pelos quais seja responsável em face do Governo Central, a figura prestigiosa e mais representativa, inspiradora e fiscalizadora do que actuante, de um governador-geral munido dos poderes e das atribuições que sejam necessários para que os problemas particulares da província possam ser cabalmente apreciados, encaminhados e resolvido?, assegurando-se assim à respectiva administração uma maior eficiência ê actualidade de que cada vez se sente mais carência.

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - Se bem entendemos a proposta governamental de alteração da actual Constituição, comporta ela a possibilidade de uma evolução nesse sentido.
Quem com coragem, com inteligência e com saber a inspirou é digno da profunda gratidão de todo o ultramar, e aqui estamos a tributar-lhe a nossa, como cidadão que no ultramar nasceu e reside.
Depositamos nesse aspecto as maiores esperanças e cremos residir nele o melhor sinal do realismo saudável com que o Governo encara os caminhos do futuro.
Aparecerá (ou apareceram já) quem deduza mil perigos potenciais nessa medida. Maus portugueses são, porém, os que pretendem impedir que Portugal se confirme como país que ensina caminhos, como país que de há muito abriu cátedra sobre problemática africana, tentando vinculá-lo a soluções ultrapassadas, e nessa medida negativas, se não mesmo suicidas.
Queremos citar, a propósito e mais uma vez, as directrizes realistas e clarividentes traçadas para a Guiné pelo seu prestigioso governador, general António de Spinola - e que podemos considerar igualmente oportunas para Moçambique -, quando manifesta o empenho de «acelerar a formação de élites, por forma a permitir aos Guinéus um acesso cada vez maior, não só às estruturas privadas do desenvolvimento económico, como até aos quadros superiores da administração provincial, aos seus órgãos legislativos e aos seus serviços, caminhando assim para uma Guiné administrada fundamentalmente por Guinéus».

O Sr. Pinto Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

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O Sr. Pinto Machado: - Sr. Deputado: Já que se referiu ao Sr. Governador da Guiné, e porque tenho procurado estar a par objectivamente da sua acção, eu queria declarar aqui a minha profunda admiração pela extraordinária obra de autêntica unidade nacional - essa é que é obra de autêntica unidade nacional - que ele está a realizar nessa província, e que, oxalá, efectivamente se realize nas restantes e até aqui nesta província lusitana.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Integralismo do mais puro.

O Sr. Barreto de Lara: - V. Ex.ª dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Barreto de Lara: - Eu queria fazer minhas, inteiramente, estas palavras do Sr. Deputado Pinto Machado.

O Sr. Ulisses Cortês: - De acordo. Mas torno extensiva a homenagem a todos os governadores do ultramar.

O Orador: - Aqueles que procuram resolver os problemas a partir de dados concretos e irreversíveis, e aqueles que, sabendo que não somos uma ilha, mas sim parte de um mundo e de um século em constante mutação humana, social, política e tecnológica, concluíram já que a única forma de nos afirmarmos é através do coração das gentes, dando ouvido e satisfação às suas legítimas aspirações, encontrarão neste conceito o preço da continuidade de Portugal em África.
Por outro lado, o reforço da competência de um executivo provincial implica, como consentâneo lógico, um legislativo regional algo mais amplo, mais representativo e mais capaz do que o de que actualmente dispomos.
Também isso se prevê na proposta governamental, que por mais essa razão merece o nosso aplauso.
Mister se faz, contudo, que ao passar-se a acto esta revelantíssima inovação, nos não fiquemos pelas aparências.
O Conselho Legislativo da província, na situação actual, pouco mais faz do que dar sanção da sua limitada representatividade aos projectos do Governo-Geral. Deve, portanto, ser reestruturado por forma a ser encorajado na iniciativa e a legislar de facto sobre todas as matérias de interesse não só exclusivamente, como predominantemente provincial, ainda que, em certos casos, as leis por ele votadas possam vir a ficar sujeitas à confirmação da Assembleia Nacional.
Impõem-se, pois, medidas tendentes a dar-lhe uma voz mais eloquente e activa na promoção do bem da província e à institucionalização do seu prestígio.
A activa participação das gentes locais de todas as raças, de todas as cores e de todas as crenças - daqueles a quem mais directamente dói a fazenda, daqueles que sentem no âmago do seu ser e no dia a dia da sua vida as dificuldades do meio e os problemas dos concidadãos que os circundam, daqueles que ali têm as raízes, os haveres e as famílias, o passado, o presente e o futuro -, a activa participação destas gentes, repetimos, mãos dadas, corações unidos, é indispensável à construção de um Moçambique maior, adentro de fronteiras mais altaneiras da Nação.
Municípios de sabor local, com cargos de presidência preenchidos, não por nomeações vindas de cima, anãs sim por indivíduos escolhidos, se possível por via electiva...

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - ... entre os homens bons - que os há muitos -, que na área fazem vida e têm permanência, como células motoras e promotoras de um mais amplo desenvolvimento regional, actuando com maior dinamismo e em melhor simpatia com o meio.

O Sr. Barreto de Lara: - Muitíssimo bem!

O Orador: - Um fisco instruído pelo condicionalismo local, mais justo e eficaz, operando através de um sistema de tributação deseivado de dispositivos redundantes, que mereça mais pronta adesão idos cidadãos, e que, atingindo melhor os objectivos do Estado, sirva até de ponta de lança do desenvolvimento ido território.
A eliminação total idas barreiras alfandegárias, com vista a facilitar as trocas interparcelares, a fomentar o comércio e, ainda, a dar plenitude ao significado de validade.
Uma rede administrativa desburocratizada, eficiente, impregnada da preocupação ide servir, de simplificar e de activar, ela também integrada a todos os níveis de elementos de todas as etnias.
Tribunais onde os processos não demorem anos, quando não vidas, a ser resolvidos.
Medidas para acelerar a promoção e a integração de todos os cidadãos, indistintamente, nos diversos escalões dia vida social, económica e política da província.
Enfim, tudo o demais que seja necessário para completar o esquema moderno e dinamizante que visualizamos, inscrito na moldura das reformas subsequentes à revisão constitucional, e por ela não só possibilitada, mas, sobretudo, inspirada.
São, pois, fortíssimos e, ao mesmo tempo, esperançosos os motivos por que damos a nossa aprovação na generalidade à proposta de lei em debate.
Que os «velhos do Restelo» recolham às Torres de Belém do seu saudosismo imobilista.
Que a Nação em peso compreenda a essencialidade e a inadiabilidade da renovação vital proposta pelo Governo e a acalme.
Que Portugal se cumpra em actualidade e progresso e que Deus nos ajude.
Assim seja.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Pereira de Magalhães. - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que poderia supor-se, não irei fazer uma análise crítica generalizada à proposta do Governo sobre a revisão constitucional e também não tratarei aqui - ficará para outra ocasião - do ebuliente, quase explosivo, problema da liberdade individual dos cidadãos e das suas incidências na vida colectiva nacional.
Como se verá, é menos ambiciosa esta exposição.
Entre as várias alterações que a proposta em exame pretende introduzir na Constituição, situam-se algumas (artigos 29.º a 41.º) de ordem económica e social.
Ora, a respeito e em desfavor de um importante sector da nossa actividade económica - a lavoura - parece continuar a existir certa discriminação ou diversidade de tratamento, quer na forma e diligência de resolver os seus instantes problemas, quer mesmo no aspecto conceituai, e isso talvez por inobservância dos princípios consignados de forma um tanto vaga nas citadas disposições constitucionais.
Deste modo, pensamos que seria da maior oportunidade que se inserissem ali também um ou dois outros preceitos

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mais explícitos, destinados a impedir semelhante situação, medida que se justificará pelas razões que passaremos a expor com algum desenvolvimento.
É princípio elementar que o homem, porque vive em sociedade, tem o dever e o direito de nesta desempenhar as tarefas, ou desenvolver as actividades que lhe forem distribuídas, ou atribuídas, de preferência as que mais se harmonizem com a sua capacidade física e intelectual, isto é, com as suas naturais aptidões.
Mas, no exercício dessas, múltiplas actividades, está evidentemente sujeito às exigências da solidariedade social, que se traduz, como é sabido, num conjunto de regras de convivência ordenadamente estabelecidas seguindo a vocação e os ditames da justiça (comutativa e distributiva) e, entre nós, também à luz da «imortal doutrina», que supomos ainda na base da nossa milenária civilização.
Assim, se qualquer membro do corpo social, porque comprometido nessa solidariedade, não pode deixar de se sentir, em consciência, inteiramente responsabilizado na execução da tarefa que foi chamado a desempenhar, há-de igualmente, só por via dessa tarefa, considerar-se credor dos proventos ou vantagens indispensáveis à sua sobrevivência, de harmonia com a sua capacidade, a sua condição e a dignidade da pessoa humana.
A própria solidariedade, com o princípio da divisão do trabalho, ou especialização, para que irreversivelmente se tende, postula que toda a função social, ou profissão, se entenda e defina em termos de auto-suficiência, isto é, isoladamente rentável, e portanto, remuneradora, por si só, do esforço intelectual ou físico que, através dela, se tenha porventura despendido no interesse da colectividade.
Nestas condições, todo aquele que se entrega a uma actividade útil terá, só por isso e independentemente do exercício de qualquer outra, o direito à contrapartida, ou seja, o direito à obtenção dos meios indispensáveis à sua própria mantença - queremos dizer, do seu agregado familiar -, de modo a poder ascender aos benefícios da civilização, em fraterna paridade com os seus semelhantes e de conformidade com o lugar que ocupa na hierarquia social.
Em suma: se é certo que todos devemos trabalhar, já não será legítimo, nem mesmo útil (a especialização aumenta a produtividade), que se exija a qualquer para se manter a prática de mais que uma profissão.
Estes princípios que dominam a ordem social são, como se compreende, sobretudo válidos e dogmàticamente aplicáveis no campo das actividades económicas e, aí, tanto na empresa como na sua administração, ou mão-de-obra de qualquer nível ou categoria.
A sociedade deverá, pois, organizar-se de modo que o sujeito de qualquer actividade económica válida se possa dedicar inteiramente à sua profissão, e dela também exclusivamente viver, como, aliás, está no espírito da nossa lei fundamental.
Reconhecem-se, efectivamente, sem esforço, estas condições de viabilidade (económica e social) nas grandes unidades industriais, ou comercias, e, certamente, também na grande ou latifundiária lavoura, se bem organizada pelas potencialidades que a sua dimensão e estrutura lhe conferem. O volume e as condições de produção de bens serão, aí, de molde a garantir-lhes os necessários rendimentos, capazes de remunerar com suficiência o capital, a administração, a mão-de-obra e também o empresário.
Já o mesmo, todavia, se não dirá da pequena ou média empresa (sobretudo da lavoura), enleada como está em peias de vária ordem, que embaraçam a acção, ou limitam as possibilidades dos seus agentes, os quais constituem, afinal, um grande sector - certamente o maior - das actividades nacionais, ou seja, a chamada «classe média».
Vem tudo isto a propósito de uma embaraçosa recomendação (embaraçosa em nosso entender, evidentemente) que podemos deduzir de algumas disposições, que vêm sendo inseridas na lei de meios e em outros textos oficiais ou oficiosos, segundo as quais, se bem entendemos, os pequenos empresários agrícolas devem procurar na industrialização dos seus produtos o rendimento que, na actual conjuntura, se reconhece não poderem retirar da sua própria empresa.
É que semelhante critério, se generalizado, levar-nos-ia a posições um tanto difíceis de sustentar.
Para sermos coerentes teríamos, então, igualmente, de aconselhar, por exemplo, à indústria de lanifícios, ou têxtil, em épocas de crise, a instalação ou abertura de alfaiatarias, ou casas de confecções de pronto-a-vestir, que lhe restaurassem o perdido equilíbrio financeiro.
E a verdade é que ninguém irá, do mesmo modo, exigir que o produtor cerealífero, para sobreviver, volva moageiro, padeiro e sei lá que mais...
Feitas estas considerações - e assim procedemos mais por necessidade de apoiar o próprio raciocínio do que no intuito de esclarecer o distinto auditório sobre o nosso pensamento nesta matéria - iremos, então, referir-nos a determinadas dificuldades, que, muito particularmente, afligem a pequena lavoura, procurando, ao mesmo tempo, um outro caminho para a resolução dos seus problemas.
Todos sabemos que a pequena exploração agrícola ou pecuária tem sido e continua a ser a menos compensadora das actividades económicas, vivendo a grande massa dos pequenos agricultores em quase permanente regime deficitário.
Esta situação representa, porém, no conjunto dessas actividades, uma anomalia grave, que se vem protelando e urge remediar, pois que, além do mais, nega todos os princípios de solidariedade acima referidos.
Os produtores agrícolas (pequena e média lavoura, entenda-se) vêm, na verdade, exercendo uma actividade que as mais das vezes é colocada, deliberada e conscientemente, era situação deficitária, subtraindo-se-lhe todas as possibilidades de obtenção do justo lucro.
De vária ordem são as causas que levam a semelhante conjuntura. Vamos, no entanto, enumerar e analisar as principais, que o serão, já se vê, segundo a nossa medida de valores.
Antes, porém, de o fazermos, importa dar aqui por resolvido um outro problema básico, já decorrente do que deixámos dito - o de saber se deve ou não manter-se e fomentar-se a pequena e a média empresa (em geral, a pequena ou média propriedade), isto é, se deverá subsistir entre nós a chamada «classe média» como elemento fundamental e, desse modo, imprescindível na contextura da nossa comunidade política.
Não hesitaremos na afirmativa, com duas sóbrias palavras de justificação.
Uma estrutura económica que, por selecção natural, ou de outra forma, viesse a alicerçar-se apenas em macro-empresas privadas, designadamente de sinal monopolista, com os meios de produção e outros exclusivamente concentrados nas mãos de alguns indivíduos (necessariamente poucos) e a técnica e o trabalho nas mãos de todos os demais, tomaria naturalmente, nessa fase, o aspecto de uma incómoda oligarquia (a potência económica dita sempre ou quase sempre a fórmula política) que, a breve trecho e no desencadear de uma série de fenómenos que levam à inversão das forças sociais em jogo, ou à subver-

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são de valores - tese catastrófica de Marx, que nos parece não estar ainda de todo desacreditada -, se transformaria na indesejável ditadura do proletariado.
Qualquer dos termos desta alternativa seria, contudo, a negação da verdadeira democracia (e assim nos exprimimos para a distinguir, ao menos, da de Pankow ...) que se baseia e fundamenta na livre iniciativa privada, embora, como entre nós, com a natural sujeição à disciplina corporativa, que a incentiva no que tem de social e econòmicamente útil e a limita no que venha a evidenciar de prejudicial e negativo.
E a classe média, a que este processo sócio-económico necessariamente conduz, será, pois, condição sine qua non da sobrevivência das instituições que actualmente integram a nossa comunidade nacional, e que devemos ciosamente preservar.
Só por isso merece a classe média - diga-se em parênteses - toda a atenção e toda a protecção e amparo que o Estado lhe possa dispensar, vitalizando-a e fazendo-a prosperar.
Analisemos, então, agora, as causas que perturbam a pequena lavoura, como nos propusemos fazer.
Verifica-se, efectivamente, que os produtos da terra são, em geral, adquiridos aos pequenos agricultores e lançados no mercado por preços que raramente cobrem o seu custo de produção.
Esta circunstância, porém, não resulta, como poderia supor-se, do normal e livre - embora disciplinado - funcionamento do mercado, mas sim de outros factores que o pressionam, ou seja, de certas medidas que, por invocadas razões sociais (e estas nesse caso sê-lo-ão apenas unilateralmente), se tem vindo a adoptar e a impor de forma mais ou menos arbitrária.
Assim:

a) Todos sabemos que os géneros agrícolas têm estado, na sua grande parte, sujeitos, para o consumo, a tabelamento de preços; mas,
b) As tabelas são, as mais das vezes, organizadas ao acaso, pois raramente se baseiam na determinação prévia do respectivo custo de produção, e muito menos atendem ao justo lucro a que o empresário agrícola tem, como os outros, incontestável direito;
c) Esta política de tabelamentos visa, como é sabido, a protecção do consumidor (o que estaria certo), mas sem curar dos direitos e interesses do produtor (o que já estará errado), acrescendo também neste sector os muitos solícitos e zelosos cuidados sobre uma problemática inflação que - argumenta-se - a subida dos preços viria fomentar.

Ora, em nosso entender, ainda mesmo que só por deficiente e anacrónica organização ida empresa agrícola resultem demasiado gravosas as autuada condições de produção, os preços desses géneros assim estabelecidos não podem, apesar de tudo, considerar-se socialmente justos, enquanto negam ao empresário-produtor a margem de lucro que lhe permita ascender também a um digno padrão dó vida, segundo as exigências da justiça social a que aludi-mos e que as nossas instituições não podem desconhecer.
Tudo isto tem sido até largamente reconhecido pelas instâncias oficiais; e tanto que, no intuito de minorar os inconvenientes deste discriminatório tratamento, se vão decretando e concedendo apreciáveis subsídios à lavoura, como nos cereais, na pecuária, na motomecanização e alguns outros, aliás sempre insuficientes para um salutar equilíbrio orçamental dos beneficiários.
Decididamente, não nos parece que este processo seja o mais propício à edificação e contextura de um verdadeiro Estado social.
Em primeiro lugar, porque esta solução, ao favorecer uma classe em prejuízo de outra, que depois se pretende em parte compensar à custa de tais subsídios, além de lesiva dos interesses desta última, é sumamente vexatória, por manter esses trabalhadores em situação de manifesta inferioridade em relação aos demais, talvez com a feriste aparência de uma classe tolerada, se não mesmo parasitária.
Contudo, de modo totalmente diferente e com alguma solicitude se tem procedido em relação às actividades não agrárias: para as empresas, com a cotação dos preços em níveis satisfatórios; quanto aos trabalhadores, através da celebração de numerosos contratos colectivos de trabalho, que por aí tem proliferado, sempre com novas vantagens e regalias (muitas certamente justas, mas algumas talvez exageradas na presente conjuntura - parece que estamos em guerra), as quais, em todo o caso, ultrapassam muito sensivelmente «o pão nosso de cada dia» que humildemente pedimos na primeira oração cristã...
Outrossim, devemos considerar que esses outros trabalhadores consumidores não estão dispensados dos deveres de solidariedade, e creio que hão-de ser os primeiros a compreender que, antes de se deixarem solicitar por determinadas despesas voluptuárias ou sumptuárias, tem o dever de pagar aqueles produtos essenciais pelo seu justo valor, isto é, por forma que os trabalhadores da tenra - seus irmãos - possam, como elos, prover às suas mais instantes e razoáveis necessidades.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: V. Ex.ª anunciou que iria ocupar-se especialmente de uns certos artigos da Constituição. Quais são?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Artigos 29.º a 41.º

O Sr. Presidente: - Aqui na Mesa, não há muito a impressão de que as considerações de V. Ex.ª estejam directamente ligadas à matéria da ordem do dia. Queria pedir a V. Ex.ª o favor de entrar na matéria da ordem do dia tão depressa quanto possível.
Muito obrigado.

O Sr. Magalhães Mota: - Muito bem!

O Orador: - No final eu proponho...

O Sr. Presidente: - Compreendo perfeitamente que V. Ex.ª esteja a preparar as suas conclusões. É que, neste momento, dava-nos a impressão de que se afastava um bocadinho da ordem do dia. Mas ouvi-lo-emos todos com muito interesse.

O Sr. Correia da Cunha: - Também tinha a mesma impressão...

O Orador: - Realmente, neste aspecto, eu ia tirar uma conclusão que só posso ler no final.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se V. Ex.ª está construindo a sua intervenção, no sentido de sustentar uma determinada tese e se essa tese se prende com a matéria da ordem do dia, tenha a bondade de continuar as suas considerações.

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O Orador: - Suponho que realmente é assim.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de continuar. E não é necessário suprimir qualquer passo, desde o momento que o considere útil para a sua conclusão.

O Orador: - Se V. Ex.ª me dá licença, eu continuo. Não deve o consumidor esquecer que, ao comer um pão, ao refrescar-se com uma salada, ou ao saborear a vianda, de muito trabalho não remunerado ou insuficientemente pago, se estará talvez a aproveitar.
Em segundo lugar (continuemos o raciocínio), porque toda a intervenção directa do Estado nas actividades económicas tem a sua discreta inspiração no socialismo materialista, cuja filosofia desconhece a finalidade transcendente da vida humana. E a verdade é que o sistema político e sócio-económico que elegemos, além de se inspirar na tradição nacional, mergulha as suas raízes na doutrina social da igreja romana, que sómente reconhece e pretende servir - cremos que ainda assim será - não o homo economicus, ou mesmo o homo socius, porventura animado de «sensibilidade e de reacções psicológicas de naturezas múltiplas» (no conceito de certos escritores da especialidade), mas o verdadeiro ser humano, para o qual a posse e fruição de bens materiais apenas se justifica na medida em que estes sirvam o seu aperfeiçoamento moral e espiritual.
Por tudo isto queremos, desde já, adiantar (e que fique aqui bem vincado este nosso pensamento) que a protecção do consumidor se deverá principalmente fazer, não por aquele processo anti-social e, portanto, anti-humano, mas através de uma equilibrada e justa política de ordenados e salários, sem discriminações sectoriais e no âmbito de todo o território nacional.
Enquanto a promoção dos agricultores terá de se efectuar, não à custa de vexatórios subsídios, mas com base numa sábia organização da empresa, conjugada com a criteriosa valorização dos seus produtos.
É que também neste campo devemos ir em busca da realidade.
Mas para toda esta brumosa panorâmica da pequena lavoura - faz-se-lhe, na verdade, essa acusação - terão concorrido, entre outros, os seguintes factores:

1) O regime do minifúndio em que se vive, com a sempre crescente pulverização da propriedade rústica, que impede a conveniente utilização das indispensáveis máquinas agrícolas;
2) Os processos rotineiros de cultura, ainda usados pela maior parte dos agricultores, que vão resistindo à introdução das novas técnicas;
3) As fracas perspectivas que se vêem no que respeita à espontânea reconversão agrária, com a manutenção de culturas de menos interesse, em detrimento de outras de maior rendimento. E, com tudo isso,
4) O agravamento do custo de produção dos géneros agrícolas que - diz-se também - a colectividade não tem obrigação de suportar, por se dever a uma culposa inadaptação do agricultor às exigências da vida económica moderna.

Em boa verdade, não podemos negar a pertinência e até, em certa medida, a justeza de toda esta argumentação crítica.
Quer-nos, no entanto, parecer que dessa precária situação da lavoura não será o agricultor o único, nem mesmo o principal responsável.
Expliquemos:
Entre os processos de solucionar o instante problema, teve a primazia o emparcelamento fundiário.
De facto, veio este a ser legalmente instituído entre nós pela Lei n.º 2116, de 14 de Agosto de 1962, regulamentada pelo Decreto n.º 44 647, de 25 de Outubro do mesmo ano, e é agora também contemplado nos artigos 1376.º e seguintes do novo Código Civil.
Mas a verdade é que, à parte um ou outro pequeno ensaio, essas providências legislativas ficaram letra morta.
Como razões justificativas dessa inércia têm-se invocado determinadas limitações orçamentais e, sobretudo, inevitáveis perturbações sociais e políticas que, porventura, surgiriam - diz-se - com a instalação do novo estatuto agrário.
Ora, nenhum desses argumentos nos merecerá incondicional audiência.
Quanto ao aspecto financeiro, devemos considerar que nem tudo se faria de uma só vez, podendo distribuir-se por muitos anos (e já lá vão nove) as verbas necessárias a esse empreendimento.
Acresce ainda que, tratando-se da resolução de um problema vital para a economia do País, seria perfeitamente justificável um eventual sacrifício com mais esse investimento, aliás largamente reprodutivo.
Quanto às apreensões de ordem política e social, também o argumento não seria decisivo e muito menos inibitório.
É que nem todos os agricultores enjeitam de um modo absoluto a ideia do emparcelamento. Nota-se mesmo, em algumas regiões, certa receptividade a essa inovadora solução.
Por outro lado, sabe-se que já abundam pelo País terras abandonadas ou disponíveis (damos como exemplo as do vale do Lis) que, sem qualquer oposição válida ou inconveniente de maior, facilitariam, strictu sensu, o emparcelamento fundiário.
Mas, certamente para fugir a tais dificuldades, reais ou virtuais, de Instalar e fazer funcionar a máquina do emparcelamento, ou talvez por outras insondáveis razões, vêm sendo os agricultores, além do convite à industrialização dos seus produtos, reiteradamente solicitados para se associarem em cooperativas e outros agrupamentos afins, panaceia considerada agora debeladora, por excelência, de todas as enfermidades da paciente lavoura.
Quer dizer: em vez de se promover o decretado emparcelamento e de se entregar à organização corporativa a resolução desses problemas, prefere-se, para tanto, enveredar pelo associacionismo de promoção estadual, ou «associativismo», como agora se diz, figurino de além-Pirenéus, onde as ideologias sócio-políticas divergem essencialmente das nossas.
Parece-nos, todavia, que se inicia aqui um negligente desvio dos fundamentais princípios em que assenta o nosso sistema sócio-económico.
Não se julgue, porém, que vemos qualquer inconveniente na livre associação dos agricultores em cooperativas ou, de outro modo, para, a seu prazer, melhor defenderem os interesses comuns. Em certos casos essa prática será da maior utilidade e até a única aconselhável.
Mas já não entendemos que seja o Estado ou qualquer dos seus departamentos a promover e a fomentar deliberadamente - quando não a impor - esse movimento associativista, atendendo a que semelhante orientação poderá levar-nos directamente ao colectivismo, que é contrário à nossa convicção.
Basta pensarmos no que sucederia se em todo o país, ou na sua maior parte, a produção e o consumo, com a

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consequente e inevitável supressão das actuais empresas privadas, se associassem daquela forma, isto é, por intervenção e autoridade mais ou menos efectiva do Estado.
Como adverte a generalidade dos mais responsáveis economistas (por todos, Prof. Lumbrales - Lições de Economia Política), «essas associações seriam, assim, independentemente de transformações políticas imediatas, como que elementos polarizadores de uma organização geral da vida económica naqueles moldes, já sob a fórmula colectivista, já sob a do comunismo».
E é talvez por isso - acrescentamos por nossa parte - que certos economistas, da escola socialista, vêm pugnando, com muita perseverança e a maior sagacidade, pela imediata instalação desse aliciante e celebrado sistema.
E não se argumente que se está aqui longe de pensar num associativismo total, visto que, de duas uma: ou a generalidade dos produtores havia de seguir por esse caminho, e as consequências seriam as apontadas; ou só alguns o fariam, e então teríamos de enfrentar um maior desequilíbrio entre uns e outros nos custos de produção.
Parece-nos, assim, que a solução terá, porventura, de ser outra.
Sabemos e deixamos dito que o sistema corporativo enjeita, em princípio, toda à intervenção directa e imediata do Estado na vida económica da Nação. A não ser em casos excepcionais (supletivamente - artigo 33.º da Constituição), só mediatamente lhe será lícito fazê-lo, através das corporações ou dos organismos que as constituem, criados que foram com essa exclusiva finalidade.
Todavia, o Estado, que se reserva «o direito e a obrigação de coordenar e regular superiormente a vida económica e social» (artigo 31.º do citado diploma), possui inteira legitimidade para estruturar formal e objectivamente as actividades ou explorações económicas, de harmonia com o interesse nacional, sem com isso ofender os princípios informadores do sistema corporativo; isto é, tem a mais larga competência para definir as bases e limites mínimos (de dimensão e estrutura) em que deve assentar a rentável instalação de toda e qualquer empresa privada.
E assim, tendo em vista as condições ecológicas de cada região e as demais exigências geográficas, físicas e humanos aí atendíveis, a empresa agrícola, como as demais, seria dimensionada e estruturada pelo Estado, isto é, condicionada, de modo a torná-la económica e socialmente viável em toda a sua plenitude.
Aqui a tarefa seria não apenas dos políticos, mas principalmente dos técnicos (economistas, agrónomos, sociólogos e outros), que muito profícuo e meritório trabalho iriam realizar.
Instituída desta forma a empresa agrícola (empresa mínima, entenda-se), não mais haveria necessidade de cuidar no futuro de explorações - antes se interditariam - a que faltassem os requisitos estruturais, técnicos, financeiros e administrativos do novo modelo agrário.
Teríamos, assim, a empresa agrícola estruturada em bases realistas, por forma a poder-se alcançar, sem prejuízo da ordem social, o mais baixo custo de produção, incluindo o compatível com as exigências idos mercados internacionais, mas sem esquecer a cotação dos preços dos produtos em nível a estabelecer, já não arbitrariamente, anãs por intermédio e regular funcionamento da organização corporativa, que, para esse efeito, interviria oportuna e criteriosamente no mercado, e tudo também no propósito de encontrar o justo lucro, única forma de remuneração normal e digna dos «respectivos empresários. Nesta ordem de ideias, empresa devidamente dimensionada e estruturada, por um lado, e preços não discriminatórios no concerto ida produção nacional, mas econòmicamente compensadores e socialmente justos, por outro, constituiriam o binómio em que, de futuro, assentaria toda a nossa política agrária, colocando-se assim a empresa agrícola no mesmo plano das outras actividades económicas.
Que os agricultores aderissem à nova estrutura por qualquer dos meios legalmente possíveis (comprando, trocando ou associando-se) seria questão a solucionar pela iniciativa privada, embora com a fiscalização e vigilância do Estado, tendente a evitar que a propriedade privada, por qualquer mau uso ou abuso do seu detentor, se desviasse da sua inerente função social.
Pois se na indústria e no comércio, para preencher (ou não) o condicionalismo económico e social, os interessados se constituem em sociedades em nome colectivo, em comandita, anónimas e por quotas, porque não hão-de os produtores agrícolas seguir o mesmo caminho?
Cremos que o condicionamento proposto abriria à lavoura outras perspectivas, que não deixariam de atrair ao sector novos capitais, em todo o território nacional.
Por tudo isto, é nossa convicção - e estamos a lembrar-nos do ovo de Colombo - que esta solução (emparcelamento fundiário conjugado com o sistema que esboçamos), além de econòmicamente viável e socialmente justa, seria a mais próxima da índole individualista do povo português, e, por isso, também, pela sua base de iniciativa privada, a que melhor se adaptaria à nossa concepção democrática (fala-se agora tanto em «democratizar»...), que, afinal, se contém na essência e emerge do sistema económico e sócio-político que o génio de Salazar concebeu e fez radicar no País.
A solução indicada seria, de resto, exactamente paralela à que, pelo menos em parte já foi adoptada na indústria (condicionamento industrial) e é a mesma a que o comércio aspira e vem insistentemente reclamando, designadamente ao sugerir a imediata promulgação do chamado «Estatuto do Comerciante».
E assim, com um equilibrado e criterioso condicionamento agrícola, a par do industrial e comercial, bem estruturado, ordenado e convenientemente integrado no conjunto das actividades económicas nacionais, cremos que se abririam, com o novo prestígio alcançado pelo sector, novos e promissores horizontes à nossa economia, e muito se dignificaria (e bem carecem desse incentivo as populações rurais) a função de quantos a essas actividades, igualmente válidas e honrosas, se vão operosa e abnegadamente dedicando.
E parece-nos que também aqui devemos «andar ràpidamente e em força» se quisermos evitar que se agrave até à ruína esse desolador despovoamento dos campos, que se vai irreversivelmente processando.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: V. Ex.ª quer ter a bondade de me dizer, precisamente, qual dos artigos da revisão constitucional em causa está V. Ex.ª visando? Porque a impressão que tenho é que V. Ex.ª está produzindo considerações, aliás brilhantes, no sentido do que seria conveniente introduzir na Constituição, mas não está contemplado na revisão em causa.
Como V. Ex.ª sabe, a proposta e projectos de lei reportam-se a artigos determinados da Constituição. Não é a altura de defender quaisquer outros passos da Constituição, que não os atingidos pela proposta e projectos de revisão.
E por isso que peço a V. Ex.ª o obséquio de me dizer qual é, precisamente, de entre esses artigos que estão em discussão, isto é, aqueles que são objecto de revisão, aquele que V. Ex.ª contempla nas suas considerações.

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O Orador: - Sr. Presidente: Julgo ter dito já que se tratava dos artigos 29.º a 41.º Mas estou prestes a terminar.

O Sr. Presidente: - Faça então favor de continuar.

O Orador: - Resta-nos tirar agora desta exposição as seguintes conclusões:

1) O princípio da divisão do trabalho, ou especialização, deve observar-se em todas as actividades económicas e, portanto, sem exclusão da agrícola;
2) Esta prática, que leva sempre ao crescente aperfeiçoamento técnico e administrativo do empresário, é a que mais convém, pelo maior rendimento que toda a especialização proporciona;
3) É de vital interesse que se fomente e se proteja a pequena ou média empresa, com o condicionamento sugerido, e de um modo geral a pequena ou média propriedade, que leva à permanência da classe média, principal sustentáculo da verdadeira democracia, que entre nós se .pretende consolidar com a criação do Estado social;
4) O Estado deverá abster-se, tanto quanto possível, de promover directamente, ou fora da sua orgânica corporativa, cujo fortalecimento e vitalização se impõem cada vez mais qualquer movimento associativista (em cooperativas ou outras associações económicas afins, que apenas devem partir da iniciativa privada), visto que o associativismo de chancela estadual funcionaria como elemento polarizador de unia organização geral da vida económica de feição colectivista-marxista;
5) Na protecção da classe média avultará o interesse pela lavoura, pois ainda é nas populações rurais a esta ligadas que se encontram em maior grau as genuínas virtudes da raça lusíada;
6) Deve permitir-se à empresa agrícola vida próspera, a alcançar pelos seus próprios meios, e sem necessidade de permanentes e vexatórios subsídios; e, para tanto,
7) É indispensável e urgente que se dimensione e estruture adequadamente a empresa agrícola, isto é, se proceda ao seu imediato condicionamento;
8) Na relação empresa (devidamente estruturada) e preço dos seus produtos (em nível compensador) terá a actividade agrária de encontrar os meios da sua sobrevivência, expansão e eficiência;
9) Jamais se deverá impor à lavoura a exclusiva e injusta obrigação de pagar o «pão político» com que desde há muito vem sendo tributada;
10) A protecção do consumidor, quando for caso disso, terá de se fazer não à custa do sacrifício de outra classe (a agrária), mas através de uma criteriosa e equilibrada política de ordenados e salários (eu digo criteriosa e equilibrada), a adoptar em todo o espaço português;
11) Não será de boa prática, mas antes anomalia grave, que reiteradamente se prescreva, como solução salvadora, uma incongruente dispersão ou digressão do empresário agrícola por outras actividades, só porque as suas explorações actuais, por insuficiências de que não será o único responsável, não possam prover à sua mantença como associado dá grande e máxima empresa que é a Nação;
12) Para honra e serviço da democracia, tal como a entendemos e acima definimos, é indispensável, antes de mais - o resto virá por acréscimo -, estruturar e promover o prestígio da actividade agrágria, considerando-a e tratando-a nos seus vários aspectos, não por forma discriminatória como vem acontecendo em seu desfavor, mas em pé de igualdade com as demais, pois só daí poderá resultar a ordem, a segurança, a justiça e, consequentemente, a indispensável paz social.

Parecia-nos, assim, da maior vantagem - e com esta sugestão damos por findo o nosso trabalho - que ao artigo 31.º se viessem a aditar, talvez, dois parágrafos, com a seguinte redacção, ou qualquer outra que se julgasse mais apropriada:

§ l.º O Estado condicionará as explorações agrícolas, industriais e comerciais, definindo a sua dimensão e estrutura, de modo a garantir-lhes viabilidade económica e social.
§ 2.º Os preços dos produtos, salvo o caso de urgente necessidade pública, em que o Governo poderá intervir na sua determinação, serão os que resultarem do respectivo mercado, com os limites máximo e mínimo a fixar pela organização corporativa no seu normal e regular funcionamento.

O Sr. Presidente: - Bem, não há dúvida de que o artigo 31.º é um daqueles que são objecto de revisão. Tenha então V. Ex.ª a bondade de acabar. Não me parece que possa ser muito operante a sua intervenção, se não a concretizar em propostas, mas isso é um direito que V. Ex.ª tem. Ë, portanto, um comentário ao artigo 31.º, que está efectivamente em causa. Tenha a bondade de continuar e peco-lhe que me desculpe, porque o longo caminho percorrido por V. Ex.ª é que, a certa altura, não me permitia ver o fim.

O Orador: - Sr. Presidente: Tenho verificado que realmente há uma disparidade de tratamento entre a actividade agrária e as outras actividades económicas, e é precisamente por essa disparidade, e por via dessa discriminação que se tem feito, que veio esta minha intervenção. E eu tinha de justiçar que realmente se verifica essa disparidade. E, por consequência, agora concluía que mais explicitamente se fizesse constar da Constituição, neste artigo 31.º, precisamente uma disposição que evitasse, no futuro, essas disparidades.

O Sr. Presidente: - Está muito bem. Tenha a bondade de continuar.

O Orador: - Não sabemos até que ponto as questões acima levantadas e as soluções sugeridas podem aqui ser tidas por válidas e pertinentes.
Cremos, no entanto, que submetendo respeitosamente à apreciação da Assembleia, e até mesmo à sempre esclarecida atenção do Governo, este grave problema da lavoura, teremos ao menos dado um pequeno contributo piara o seu conveniente equacionamento, para o seu estudo e para a sua adequada e justa solução.

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Resta-nos declarar que, nesta matéria e com as reservas decorrentes do que deixamos dito, também aprovamos na generalidade a proposta do Governo e o projecto n.º 7/X sobre a revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.
Anuncio para amanhã duas sessões. A primeira sessão será às 11 horas, tendo como ordem do dia a continuação do debate na generalidade da proposta e dos projectos de lei de alterações à Constituição.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Dias de Araújo Correia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Valente Sanches.
Rafael Valadão dos Santos.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
D. Sinclétáca Soares dos Santos Torras.
Teófilo Lopes Frazão.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Peneira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
José Coelho Jordão.
José Guilherme de Melo e Castro.
José João Gonçalves de Proença.
José da Silva.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.

O REDACTOR - José Pinto.

Proposta enviada para a Mesa durante a sessão

Proposta de emenda

De harmonia com o artigo 38.º do Regulamento da Assembleia Nacional, propomos que ao § 8.º do artigo 85.º da Constituição da República Portuguesa seja acrescentado o seguinte:

Todavia, no caso de desaparecimento de todos os Deputados eleitos pelo mesmo círculo, terá lugar nova eleição dentro dos (trinta dias seguintes à ocorrência.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 24 de Junho de 1971. - Os Deputados: Armando Roboredo e Silva - Alberto de Meireles - Magalhães Mota - Salazar Leite - Francisco Sá Carneiro - António Castelino e Alvim - Álvaro Barreto de Lara - Oliveira Pimentel - Lopes Quadrado - Themudo Barata.

IMPBENSA NACIONAL

PREÇO DESTE NUMERO 10S40

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