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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 117

ANO DE 1971 3 DE JULHO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 117, EM 2 DE JULHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Alberto de Alarcão, sobre o desenvolvimento económico e futuro demográfico do Baixo Alentejo litoral; Peres Claro, para se referir à Mocidade Portuguesa, e Correia da Cunha, para um esclarecimento acerca de anteriores declarações do Sr. Deputado Almeida Cotta, que também usou da palavra para explicações.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na especialidade das alterações à Constituição Politica. Foram discutidos, votados e aprovados os artigos 59.º, 60.º, 61.º, 62.º, 70º, 72.º, 80.º, 81.º, 82.º, 84.º e 86.º
Usaram da palavra no decorrer do debate os Srs. Deputados Ulisses Cortês, Moura Ramos, Leal de Oliveira, Jorge Correia, Alberto de Meirelles, Correia das Neves, Nunes de Oliveira, Henrique Tenreiro, Roboredo e Silva, Barreto de Lara, Neto Miranda, Camilo de Mendonça » Valadão dos Santos.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira. António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteres Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.

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Gabriel da Gosta Gonçalves.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baesaa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 83 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 liaras e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 113 do Diário das Sessões.
Se VV. Ex.ªs, por qualquer circunstância, preferirem que a apreciação deste Diário seja adiada para a próxima terça-feira, eu fá-lo-ei. Provavelmente nessa altura terá de ser apreciado juntamente com algum outro que tenha sido distribuído, com tempo bastante para se poder supor que já foi apreciado pelos Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: As reclamações sobre o n.º 113 do Diário das Sessões ficam adiadas para a sessão de terça-feira.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Do Sr. António Arnaut protestando contra a retirada da discussão do projecto Sá Carneiro.
Do Dr. Humberto Soeiro protestando contra a forma como se está procedendo è, discussão na especialidade da revisão constitucional.
De Helena Rita Cabrita e outros protestando contra a prisão de uns seus familiares.
De António Taveira Pinto e outros protestando contra a prisão de Daniel Cabrita.
De Rui Medeiros no mesmo sentido.
Do Sindicato dos Empregados Bancários no mesmo sentido.
Da direcção do Sindicato Nacional dos Profissionais dos Serviços Sociais no mesmo sentido.
Da direcção do Sindicato dos Empregados Bancários do Porto no mesmo sentido.
Do Sindicato dos Profissionais de Seguros no mesmo sentido.
Dos corpos gerentes do Snecia de S. Tomé de aplauso à intervenção do Deputado Castro Salazar.
Da Junta Distrital de Moçâmedes manifestando inteiro apoio ao Governo da Nação.
Da Comissão Municipal de Angola aplaudindo as intervenções dos Deputados ultramarinos.
Das Actividades Económicas do Concelho de Muchoges na mesma ordem de ideias.
Da Junta Distrital do Cunene no mesmo sentido.
Da Câmara Municipal da Gabela, também no mesmo sentido.

Cartas

De Lúcia Santiago reclamando a inclusão do nome de Deus na revisão constitucional.
Do Dr. João de Carvalho Grosso sabre questões da vida moderna e o custo da vida actual.
De José Antunes da Silva acerca da sua situação de funcionário do Ministério das Finanças.

O Sr. Alberto de Alarcão: - S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho foi de longada, no passado fim de semana, até terras do Baixo Alentejo litoral.
Pelas vozes dos Srs. Deputados Correia das Neves e D. Luzia Beija já tiveram as gentes baixo-alentejanas e do círculo de Setúbal ocasião para manifestarem, nesta Câmara, a sua alegria pela oportunidade a elas chegadas de participar também no processo de desenvolvimento económico e social, com a instalação, em Sines, de uma refinaria de petróleos brutos e suas instalações petroquímicas complementares.
A essas vozes se associou a do Sr. Deputado Leal de Oliveira, lembrando, no entanto, essoutro «campo branco» - para usarmos a terminologia agrária regional - do Sudeste alentejano e algarvio, virgem para as formas modernas de civilização industrial, e objecto de um processo de «desertificação» humana que começa a revestir aspectos verdadeiramente dramáticos. É a lei da vida e da morte económico-social de muitos espaços que a tanto obriga ...
Com a sua autoridade de técnico de planeamento pôde o Sr. Deputado Correia da Cunha recordar as diversas

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opções postas para a localização geográfica deste empreendimento e formular algumas das razões da decisão.
Não parece que na realidade existisse na nossa costa a sul do Tejo muitas outras zonas indicadas para a instalação de um grande porto mineraleiro e instalação de indústrias petroquímicas, sem prejuízo de riquezas naturais e turísticas de mais significativo valor e em fase mais adiantada do processo de valorização: caso da serra da Arrábida e suas praias, ou do litoral algarvio, cartaz de primeiro plano do turismo nacional.
Razões geográficas, económicas e histórico-demográficas efectivamente militam a favor do litoral baixo-alentejano, e particularmente de Sines.
Como escreveu algures o engenheiro Amaro da Gosta, em artigo de fundo subordinado ao título «Recursos naturais»:

A vizinhança das grandes linhas de navegação atlântica; o abrigo natural do cabo de Sines; a facilidade de acesso marítimo; as águas profundas junto a terra; a ausência de movimentos aluvionares; as áreas terrestres extensas e livres, e as comunicações ferroviária e rodoviária [...] oferecem um tal conjunto propiciatório para a instalação de um grande porto mineraleiro, que não deve encontrar paralelo em toda a costa da Penísula Ibérica.
Trata-se da zona compreendida entre as praias de Sines e S. Torpes [...],

que bem pudemos testemunhar ao tempo em que andámos trabalhando para uma monografia das terras do Baixo Alentejo:

[...] o aproveitamento adequado das excepcionais condições naturais dessa zona de eleição, traduz-se pela criação de um grande porto, sem quaisquer problemas de conservação de fundos ou de limitações de tonelagem para servir simultaneamente aos maiores cargueiros e petroleiros actuais e dos que venham a sulcar os mares do futuro.

Mas não é apenas em termos de proximidade das rotas dos grandes fluxos de tráfego marítimo petroleiro que procuram a Europa, e praticabilidade de fundos, que razões geográficas assistem a tal localização:

[...] das cinco matérias-primas consideradas por certos especialistas como pilares de indústria química em que se apoia a civilização material do nosso tempo - sal-gema, enxofre, calcário, carvão e petróleo -, possuímos enormes quantidades das três primeiras, e quiçá relevantes da última, no ultramar.
Detenhamo-nos, porém, no enxofre, que o mesmo é dizer sobre pirites alentejanas.
Há poucos anos calculavam-se os respectivos jazigos em 100 milhões de toneladas; actualmente já duplicou aquele cômputo, e ainda estamos longe do final da prospecção.
O teor de cobre das pirites, chegando a ser de 2 por cento, bastaria para tornar rendosa a exploração mineira, sem falar nos valiosos produtos dela resultantes.
Mas a nobreza das pirites melhor se pode ajuizar através da indicação do que é corrente referir como podendo obter-se de 1 milhão de toneladas de minério: 1 250 000 t de ácido sulfúrico, 700 000 t de ferro, 21 000 t de zinco, 10 000 t de cobre, 4000 t de chumbo, 140 t de cobalto, 20 t de prata, 5 t de selénio e 200 kg de ouro.
Se multiplicarmos estes valores pelos 200 milhões de toneladas das reservas já conhecidas, e tendo em conta o teor real de cobre, completa-se a noção do gigantesco potencial que, por ironia, jaz quase inerte sob as terras alentejanas, cada vez mais despovoadas.
Mas o facto tem explicação simples. Está no tipo e na índole que presidiram durante muitos anos à exploração das pirites do Baixo Alentejo.
O caso das minas de S. Domingos (explorado no concelho de Mértola, por empresa estrangeira) é, a este título, esclarecedor. No decorrer de cerca de um século daí saíram vinte e tal milhões de toneladas de pirites em exploração do tipo praticamente colonial. As diversas gerações de mineiros receberam o magro salário, e nada mais; a exportação e a indústria (nacionais) retiraram poucos benefícios. Fora disso e de uma plantação florestal, envolvendo uma povoação pobre e sem atractivo, ficaram-nos as cavernas das minas e uns largos centos de famílias desprovidas de recursos, com muitos dos seus chefes em idade avançada e doentes.

A silicose, efectivamente, Mo perdoa. Foi-se o minério, vão-se os homens, levados pela morte ou atingidos pela emigração, que despovoa de gentes as terras baixo-alentejanas. No Sudeste, o concelho de Mértola assistiu, no passado intercenso, à redução de 44 por cento da sua população; a freguesia de Corte do Pinto, onde se situava tal mina, quebrou de gentes 66 por cento - de cada três pessoas em 1960, ficou uma em 1970.
Começa a fazer menor falta, em termos do número de assistidos, essa alma grande de médico dos pobres: os seus mineiros, que dava pelo nome de António Fernandes Covas Lima. Mas a sua memória persiste na recordação das gentes.

Nas outras minas piritosas em pouco deferirá ou pouco terá evoluído o tipo de exploração referido. E a manter-se a marcha da exploração actual teríamos tarefa para mais de trezentos anos, até se esgotarem os 200 milhões de toneladas adormecidas debaixo da terra.
Mas depois ficaríamos todos nós mais pobres se continuássemo apenas a exportar matérias-primas ao preço do seu desmonte ou pouco mais, em vez de tentarmos valorizar os recursos naturais por incorporação de mão-de-obra, que em tão grande número igualmente exportamos para as sete partidas da Terra.
Daí que se torne importante rever e actualizar os sistemas de extracção em vigor, tendo em conta, precisamente, e em primeiro lugar - mas não só -, a dimensão correspondente à grandeza das reservas.
Daí também que o interesse da economia nacional e dos próprios concessioniários torne necessário o estabelecimento de um plano de exploração com prazo aceitável.
Considerando o de quarenta anos, as reservas já reconhecidas permitiram levar a extracção anual para 5 milhões de toneladas de pirites. Com este volume de minério poder-se-ia criar uma metalurgia dos metais base, que são o cobre, é zinco e o chumbo, deixando de os importar e de estarmos na situação de sermos
exportadores de matérias-primas de produtos que depois vamos comprar ao estrangeiro. A produção de fertilizantes e dos ácidos utilizados por muitas indústrias poderia ser intensificada em larga escala.
A exportação das pirites (poderia aumentar consideravelmente e servir de moeda de troca para a aqui-

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sição de Carvão e fosforites, com grande benefício para a produção de ferro e fertilizantes, possivelmente em termos concorrenciais europeus.
Este ou outro programa de valorização das pirites sómente será viável se existirem instalações portuárias que permitam a carga rápida de grandes navios mineraleiros capazes de levar as pirites [ou os seus produtos] a toda a parte, a preços Competitivos com os praticados pelos outros grandes produtores mundiais: (Espanha, índia, Rússia e China.
Existem bons exemplos em território português de soluções deste tipo. Assim, para aproveitarmos os minérios de Cassinga construímos o Porto Salazar. [...] Em Lourenço Marques dispomos de instalações de carga de minérios à altura de satisfazerem as exigências da exportação dos países vizinhos e outro tanto sucede no Lobito.

Em contrapartida, na metrópole até tivemos uma ponte de ramal ferroviário a embargar os acessos marítimos dos minérios aos cais da Siderurgia Nacional. Foi preciso que uma barcaça desse um pouco mais de flanco para o problema de algum modo se resolver. Faltam agora aos cais do Seixal (ou outros) maiores fundos praticáveis.

As iniciativas que já realizámos indicam-nos o caminho a seguir, com a vantagem, de a solução à vista ser mais fácil do que as de África. De facto, à generosidade do subsolo junta-se, no caso que agora nos ocupa, a da costa marítima, que a curta distância das minas limita, no Atlântico, a faixa piritosa alentejana.

Por outro lado:

A atribuição à actividade mais rendosa e de lucro à vista - a petrolífera - da parte dos encargos das obras de realização imediata e de interesse comum poderia talvez ser solução a encarar - e não seria inovação - para se dar começo à realização do empreendimento.
O aproveitamento e industrialização dos- minérios, originando um sem-número de actividades e as mais vastas e benéficas repercussões económicas e sociais, representam objectivos que de forma ímpar correspondem aos desígnios do Governo em matéria de desenvolvimento geral e regional.
Um verdadeiro porto como o sugerido serve igualmente tal política e é essencial para que as valiosíssimas riquezas naturais do País não continuem a jazer no seio da tenra, quantas vezes - e tantas têm sido- ao sabor do interesse alheio.
A conjugação com o terminal dos petroleiros poderá constituir uma contribuição decisiva pára a construção do porto mineraleiro e para tornar em radiosa realidade o aproveitamento dessas riquezas.

Assim escrevera, há tempos, o articulista que venho de citar.
O sonho está em vias de tornar-se realidade.
Mas não são apenas razões dessas que militam a favor do porto mineraleiro, da indústria petrolífera e do importante centro urbano que se anuncia para os termos de Sines.
Razões demográficas as assistem, e não poderíamos calá-las.
A população alentejana no início do século XVI andaria por 317 000 almas, o que representaria cerca de 30 por cento da população do continente.
Com uma densidade de 15, superior à então anedie. geral de 13 habitantes por quilómetro quadrado, o Alentejo seria, ao tempo, espaço relativamente bem povoado de gentes.
Mas logo a população «estagnou, e depois diminuiu, como a de todo o País [...], em consequência da sangria das conquistas, das viagens marítimas e do povoamento da Índia e do Brasil.
Estas causas, a inospitalidade do clama e o regime da propriedade», afirmou-o o então Subsecretário dias Obras Públicas ao inaugurar, em 1964, um ciclo de conferências sobre o Plano de Rega do Alentejo, «explicam que há um século o Alentejo contasse apenas 342 000 habitantes, ou seja, praticamente, o mesmo do século XVI», apesar de a população do continente ter bem mãos que triplicado.
Ao contrairmos no século XX, a população «de facto» dó Alentejo já subira paira 445 milhares de habitantes e, decorridos mais sessenta anos, acresceu de 285 000, dos quais 200 000 correspondem - números redondos - aos anos de 1920 a 1940.
Deu-se assim, com o desbravar dos matorrais dessa «planície heróica», fenómeno bem nítido de atracção de gentes e de fixação de «seareiros».
Mas o esforço quebrou, a continuidade perdeu-se, as gentes cansaram-se na incerta labuta pelo pão de cada dia; e a população estabiliza ou retrograda na quase totalidade dos concelhos.
O acréscimo - 64 por canto desde o início do século e até ao recenseamento de 1960, como haveríamos de afirmar em outra conferência desse ciclo (1) - não se processou uniformemente ao longo da terra alentejana.
A bordadura litoral que acusa no clima, na vegetação, nos diferenciados usos e costumes, como nos próprios habitat e psicologia social, influência diversa, incontestavelmente marcada pela proximidade atlântica e por contacto com formas algo diversas de civilização, regista maiores índices de crescimento populacional que a faixa intermédia, e esta maiores acréscimos que a mancha transtagana mais dobrada ou vizinha da raia.
O fenómeno -que assume, aliás, foros de quase universalidade com o preferente encaminhar-se das populações do interior para o litoral e das montanhas ou colinas para as planícies - é facto que deve ter-se em conta no estabelecimento de qualquer política de planeamnto regional.
Mas o acréscimo da população alentejana encontra-se fortemente comprometido por evolução demográfica mais recente, de que se não deixa de referir aspecto bem sintomático: a população presente do Alentejo diminuiu de 40 000 habitantes na decaída de 50, talvez de 150 000 em estimativa que apressadamente traçámos para a década de 60. Mas muitos mais partiram se lhe houvéssemos juntado os saldos fisiológicos entretanto verificados.
Vão-se assim embora as gentes que, em passado recente, tão apegadas à sua terra, ou letárgicos à partida, se tinham afirmado. E atingidas por esse mal endémico que se alarga, aliás, à quase totalidade da terra portuguesa: o êxodo rural, facultam as migrações humanas quadros de autêntica «debandada» que os saldos fisiológicos não conseguem suprir - também eles se consomem na voragem das partidas.
Assim se explica o amortecer do crescimento, a posterior estabilização e o mais recente retrocesso da gente alen-

(1) ALARCÃO, Alberto do - População, Mão-de-Obra, Emprego no Limiar do Plano de Rega do Alentejo. Lisboa, Ordem doe Engenheiros, 1964. (Memória n.º 198.)

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tejana: dos 30 por cento da população do continente no alvorecer do século XVI chegar-se-á hoje a 8 por cento?
Em boa hora novas actividades económicas procuram as terras do além-Tejo, cidades-centros urbanos de apreciável grandeza se anunciam para a zona de Sines.
Bem útil o será, até para dar cumprimento ao disposto no n.º 1.º-A do artigo 8.º da nossa Constituição, em que se reconhece «o direito ao trabalho, nos termos que a lei prescrever». Mas não deverão os direitos das gentes nacionais à vida e ao trabalho estar, de algum modo, acima dos simples interesses materiais estranhos dos detentores de «alheias» concessões? (No sentido de «distantes», v. nomeadamente Dicionário de Cândido de Figueiredo.) Também isso é política, e não se dirá que se não trate de política nacional.

O Sr. Correia das Neves: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Correia das Neves: - Sr. Deputado Alarcão e Silva, eu, como vosso colega, representante do círculo de Beja, que o mesmo é dizer da quase totalidade do Baixo Alentejo, não posso deixar passar a oportunidade para registar o meu grande apreço pela intervenção de V. Ex.ª
Não é V. Ex.ª um alentejano, não tem responsabilidades especiais na defesa dos interesses do Baixo Alentejo e do Alentejo em geral, aqui, na Assembleia. Mas, homem profundamente estudioso, como se tem revelado, pôde V. Ex.ª equacionar, com clareza, os mais graves problemas dessa grande província portuguesa.
Estou com V. Ex.ª, quanto às apreensões que apresenta. Estou também de acordo com V. Ex.ª, quanto a que o porto de Sines, e todo o empreendimento industrial que o Governo se propõe levar a cabo, trarão, com certeza, grande desenvolvimento a toda essa vasta área.
São esses realmente os votos que formulo.
E, já agora que V. Ex.ª estava a focar em especial o aspecto social, que sempre se prende com empreendimentos dessa natureza, também peço, especialmente ao Governo, como superior orientador da economia, que desse grande empreendimento - que o vem a ser com certeza - resulte o melhor proveito social, mão só parta as populações do Baixo Alentejo, que vivem um quadro realmente carregado, como poma o colectividade em geral.
Muito obrigado pela oportunidade que me deu.

O Orador: - Agradeço ao Sr. Deputado Correia dias Neves as palavras gentis que fez o favor de aduzir e comungo igualmente dos mesmos sentimentos quanto às preocupações sociais idas populações alentejanas.
Não sou, evidentemente, alentejano, nem por nascimento nem por residência, mas durante muito tempo trabalhei no Baixo Alentejo e, felizmente, percorri-o de uma ponta à outra».
Fadado o litoral alentejano para o processo de arranque do desenvolvimento económico e social, razões de fundo não encontramos para que o adensamento dos gentes das tenros da Maia à seara da Arrábida se não prolongue para sul, ia cominho ido Algarve, nas rotas do Sol.
Boa hora o trouxe, boa hora o levou, ao Sr. Presidente do Conselho, a tetras do Baixo Alentejo litoral, dirão suas gentes ... ia nós com elas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Peres Claro.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: Artista plástico nosso, em desenhos que fazia em certo semanário, de crítica a acontecimentos citadinos ou mesmo nacionais, punha sempre, nas mais incríveis posições, às vezes exigindo busca cuidada mas sempre satisfeita, um senhor de chapéu na cabeça e bigodes de retorcer, a quem ele chamava «o Sr. Parece-Mal». Era um símbolo nacional, símbolo de um pudor, quase subserviência, que nos é atávico e tanto nos faz perder como gente e como nação. O que venho aqui dizer andava há muito comigo, há longos meses, na esperança de vir a deitá-lo fora, por sem razão. Mas hoje, exactamente - e adiante direi porquê -, matei dentro de mim «o Sr. Parece-Mal» e aqui estou.
A nossa juventude está em três frentes de combate, defendendo nelas a integridade da Pátria, contra forças vindas do estrangeiro, treinadas e mantidas por estrangeiros. A nossa juventude está na guerra há dez anos e não se vislumbra que o deixe de estar em breve. Pergunto: Como é preparada a nossa juventude para a guerra? Responder-me-ão que nos quartéis o fazem e muito bem. E eu confirmo, mas direi também que, para se fazer um soldado resoluto por consciência do dever que lhe incumbe e das qualidades que tem, não basta pegar num jovem na casa dos 20 anos, dar-lhe durante dois meses intensiva preparação física e psicológica e desembarcá-lo a seguir nas praias africanas. Isso não basta. Se a nossa juventude vai para a guerra, tem de ser educada para a guerra, pareça isto mal a quem parecer. A realidade é esta. Esquecê-la ou desprezá-la não será bom serviço prestado à Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sou contra as guerras; nós todos, estou certo, somos contra as guerras. Make love, not war! - amem-se, não se matem! - não é apenas o grito dê presença de um grupo que fez do amor livre a bandeira da sua revolta contra as leis da sociedade dos homens. É também a palavra serena e permanente de Cristo, na proclamação da identidade divina dos homens: «Amai-vos uns aos outros!» Nós estamos neste país em espírito cristão. Mas uma coisa é a atitude filosófica perante a vida e outra a realidade da própria vida. Nós estamos em guerra. Guerra que não procurámos, todos lançados nos caminhos de um viver melhor em entendimento comum. Guerra que se faz no emaranhado das selvas, entre campos de minas, por sucessivas artimanhas em que os homens têm de chamar a si as qualidades que a Natureza deu aos animais, para eles poderem escapar às armadilhas da luta pela vida. Quando dantes as guerras se faziam em grita de cavaleiros e peões à carreira pela «terra de ninguém» ou de todos; quando dantes se faziam as guerras com o avanço de batalhões cerrados ao rufo dos tambores e ao grito dos clarins, bastava, mas era imprescindível, que os homens - como então D. João I aconselhava - martirizassem o corpo em exercícios físicos, adestrassem o braço no manejo da arma, fortalecessem o ânimo para as privações. Isso bastava, que os desfalecimentos ida vontade se revigoravam no roçar dos companheiros ou na embriaguez heróica da carga sobre o inimigo. E para as pequenas cobardias havia sempre uma segunda fila. Muito mudou, porém, o modo de guerrear dos homens. A luta de guerrilhas em que toda a guerra se transformou responsabiliza individualmente o soldado.

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Ele, se ainda se integra num grupo, tem tarefa bem determinada a executar e não pode, por isso, esbater-se no meio dos outros, retardar o passo para ficar sempre protegido pelo companheiro da frente; não pode fingir-se de soldado, tem de ser mesmo combatente activo e, como todos, sujeito a acção directa do inimigo. O cara-a-cara foi substituído pela surpresa do encontro; a boca escancarada dos canhões, pela mina escondida em terreno inocente; a espingarda, pelo punhal silencioso. O que se anunciava dantes pelo toque de clarim tem de descobrir-se hoje por indícios dos caminhos; o que o silvo das granadas dantes proclamava tem de descobrir-se hoje no cotejo das informações.

O Sr. Roboredo e Silva: - V. Ex.ª dá-me licença.

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Roboredo e Silva: -O meu curto aparte tem apenas como objectivo felicitar V. Ex.ª peio seu conhecimento, aliás profundo para um civil, das questões militares que estou tão pouco habituado a ouvir em Portugal.
Infelizmente, neste nosso país, as ciasses civis-mesmo as de mais alto nível -, em regra, não têm por hábito debruçar-se sobre os problemas da defesa nacional. Por isso sinto-me duplamente satisfeito e felicito V. Ex.ª por ter abordado esse tema.
Afigura-se-me, também, que as preocupações de V. Ex.ª, aliás muito justas e que, outrora, no tempo da I Republica, eram resolvidas através da instrução militar preparatória, poderiam actualmente ser, efectivamente, resolvidas pela Mocidade Portuguesa ...

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem!

O Sr. Roboredo e Silva: - ... se essa Mocidade Portuguesa for devida e convenientemente organizada para ser na realidade uma organização verdadeiramente útil ao País.
Muito obrigado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª a intervenção que teve e, como adiante verá, é a esse ponto que quero chegar. Continuando ... O impacte conseguido dantes pelo fragor das batalhas consegue-o hoje, com o mesmo efeito paralisante, a instalação capciosa da dúvida. Por tudo isto e o mais que calo, para ser breve, eu disse que não basta preparar a guerra, é preciso educar para a guerra. Agora e sempre: Se queres a paz, prepara-te para a guerra! Só o que é forte sustém em respeito o ímpeto do seu adversário. Uma nação que não cuide de fortalecer física e moralmente a sua juventude, de a exercitar e adaptar às exigências do meio em que ela terá de viver, torna-se, mais dia menos dia, a presa fácil das outras nações. Ora nós estamos a descurar tragicamente a preparação básica da nossa juventude até à entrada nos quartéis.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, eu que sou um homem ingénuo que procura viver a vida simplesmente, dei por mim a perguntar-me se nisso mão haverá mais do que o cansaço natural das pessoas, do que o envelhecimento natural das instituições, do que a concordância natural com pedagogias novas. E foram essas interrogações que mataram dentro de mim «o Sr. Parece-Mal» e hoje me trouxeram aqui, hoje exactamente e adiante direi porquê.
Fez-se e está a fazer-se neste país um grande esforço para a formação de professores de Educação Física, pagos como qualquer licenciado e, sendo efectivos mas escolas, como qualquer efectivo. Fez-se e está a fazer-se neste país um grande esforço parca se espalhar por todo ele uma fechada rede de ginásios e instalações gimnodesportivas. Pois que respondam agora dos quartéis: Que preparação física levam pana a vida de soldados, que todos têm de ter, e de soldados para uma guerra especial, os jovens que saem das escolas? Directivas sucessivas têm vindo a substituir o ensino tradicional da ginástica: não há já formatura, nem mancar passo, nem esquema de lições, nem movimentos rítmicos;, nem trabalho nos aparelhos, nem correcções respiratórias, nem flexões, nem torções, nem extensões numa distribuição harmónica de movimentos comandados pelo professor. Hoje, a grande preocupação oficial -porque ias directivas vêm de instituição estatal - é que se dê aos alunos inteirai liberdade de escolha daquilo que hão-de fazer na aula de ginástica. Entram em molho ou vão cobrando e calda um faz o que lhe apetece. O professor já miem sempre veste o fato de treino, nem sempre já permanece entre os alunos e, se está entre eles, é apenas um homem de apito na boca, Hoje o que vale é a iniciação desportiva. Pois continuamos a ser desportivamente a mesma coisa e os nossos rapazes chegam cada vez menos ginasticados aos quartéis, numa, altura em que a preparação militar exige uma excepcional capacidade física. Há muitos professores de Educação Física em furacões burocráticas, há muitos doutoreis em Educação Física; precisamos mas é de técnicos actuantes de ginástica e da disciplina motora e psíquica que a boa ginástica dá. Precisamos que não demore a já por de mais falada reforma da educação física. Em França não há aluno que passe de ano lectivo sem prova positiva de aptidão física. E nós que estamos em guerra, que há dez anos, e não se sobe por quantos mais ainda, mandamos os nossos alhos pana a guerra, vamos abrindo falência ma educação física.

O Sr. Leal de Oliveira: - V. Ex.ª dá-me licença.

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Leal de Oliveira: - Queria só dizer uma palavra, em meu nome pessoal, de agradecimento pelo ponto que V. Ex.ª está a focar: a necessidade do desenvolvimento físico da nossa juventude.
E digo-o também por outra pessoa que não está aqui presente, porquanto não é Deputado, nem poderia aqui Mar, mas que passou toda a sua vida lutando nesse sentido, e, infelizmente, no acabar dos seus 70 e muitos anos vê, com pesar, que o problema da educação física não foi resolvido e está pior do que estava, digamos, há algumas dezenas de anos.
Muito obrigado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Muito obrigado. Tenho muito respeito pelo seu brilhante pai.
Mas não foi só nesse sector que a Organização Nacional Mocidade Portuguesa depôs as armas, por desatenção das realidades. Quantos de nós aqui não vivemos os tempos em que a Mocidade Portuguesa era uma organização e um movimento, era uma força e tinha uma doutrina? Foi-o em 1936, despertar magnífico de uma mentalidade nova; foi-o em 1946, certeza magnífica de um escol; foi-o ainda em 1956, em entusiasmo renovador; pouco já era

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em 1966 e de então para cá nada mais foi. E, no entanto, desde 1961 (coincidência terrível), a nossa juventude marcha para a guerra. O que fora organização impecável e absorvente, o que fora mística criadora em tempos de paz, é hoje, em tempos de guerra, uma apagada tristeza. Foi-se de cedência em cedência, no receio estimulado do parece-mal; perdeu-se a política da juventude por acanhamento; fala-se, mas apenas se fala, em nova política da juventude. E, entretanto, os que foram feitos ao calor de uma política nacional da juventude, na formação e preparação do autêntico homem português, passaram já pelas frentes africanas de combate. São hoje a retaguarda. Cumpre-lhes o mesmo dever, acrescido daquele outro de não deixar ir para a guerra, mais desamparada e menos preparada, a juventude de hoje.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Estas palavras, talvez fora de moda, que não das realidades, tinha eu de as dizer hoje aqui, pareçam mal a quem parecerem, exactamente hoje, porque se os factos têm corrido de outra feição, na descuidada maneira da nossa temperança, daqui a poucos minutos seria discutida em plenário a substituição do artigo 56.º da nossa Constituição Política, cujas palavras são estas: «O Estado promove, protege e auxilia instituições civis que tenham por fim adestrar e disciplinar a mocidade em ordem a prepará-la para o cumprimento dos seus deveres militares e patrióticos.» A proposta do projecto n.º 6/X era de que estas palavras, em que o Governo não achou oportuno mexer, nem a Câmara Corporativa, nem a nossa comissão eventual, fossem substituídas pelas seguintes: «Os serviços do Estado, as autarquias locais, todas as outras pessoas colectivas de direito público e as instituições ou empresas privadas têm o dever de concorrer para a mobilização dos recursos nacionais e para a preparação da defesa, em especial no que respeita à defesa civil e à protecção dos bens localizados em território nacional.»

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: Peço a V. Ex.ª o favor de não se ocupar, no período antes da ordem do dia, de matérias que poderiam pertencer à ordem do dia, se nela ainda estivessem sujeitas a discussão.

O Sr. Mota Amaral: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não restabeleçamos precedentes que já têm merecido «não apoiados», quando utilizados por outros Srs Deputados; é melhor mantermo-nos dentro das regras regimentais.
Pedirei a V. Ex.ª o favor de não comentar projectos, que a Assembleia resolveu não discutir e que, de qualquer maneira, não seriam para ser discutidos no período antes da ordem do dia.

O Orador: - Naturalmente tenho de acatar o pedido de V. Ex.ª, Sr. Presidente, mas lastimo profundamente que o fecho do meu discurso tenha ficado prejudicado.
Passo, portanto, à frente o apontamento que aqui tinha e no qual eu iria dizer que me parecia que se estava a querer pôr um remate num longo processo de enfraquecimento das forças vitais da Nação, com vistas ao seu futuro.
Passando, pois, adiante:
O Sr. Prof. Marcelo Caetano, em discurso recente, referindo-se às características da guerra subversiva, disse o seguinte, a repisar o que dissera em discurso anterior:

A guerra subversiva, em vez de procurar ocupar territórios e de travar batalhas campais, tem como fito a desmoralização das populações, acompanhada da infiltração de uma propaganda capciosa que primeiro abale os espíritos nas certezas adquiridas, depois aproveite as dúvidas para criar a instabilidade e o descontentamento até, finalmente, conquistar larga audiência e apoio que destrua os reflexos da defesa e a vontade de combater, conduzindo pela renúncia a capitulação. Ova, nesta guerra não há frente nem retaguarda. A frente está em todos os sítios e em todos os momentos em que o adversário procura instilar as suas ideias derrotistas, preconizando o abandono do ultramar, incitando mancebos em idade militar à emigração ou soldados à deserção, insinuando que está ultrapassado o amor à Pátria ou que já não tem cabimento a ideia de Nação, minando até nas escolas oficiais o moral da juventude e pregando, em palavras doces ou em cantatas nostálgicas, uma paz desvirilizada, feita de cobardias e de cedências perante todas as reivindicações mais atrevidas ou os ataques mais audaciosos. A capitulação perante tais combatentes não conduz à paz, mas u, submissão...

Vozes: - Muito bem!

O Orador:

... Submissão de escravos, por que o mundo continua a ser dos que lutam. Ai dos que deixam cair os braços a sonhar com paraísos utópicos!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pois, Sr. Presidente do Conselho, se V. Ex.ª sabe que é assim, porque assistimos de braços caídos ao desmoronar de uma política de juventude que o teve por chefe responsável e incontestado?
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia da Cunha.

O Sr. Correia da Cunha: - Sr. Presidente: Não pretendo fazer uma declaração de voto. Nesta Assembleia considero-me responsável, perante a minha consciência e o juízo dos meus eleitores.
Pedi a palavra apenas para esclarecer o Sr. Deputado Almeida Cotta.
Disse S. Ex.ª ontem que aceitava não constituírem alguns Deputados nem um grupo nem um partido, ainda que estranhasse a sua singular solidariedade ...
Não creio que essa estranheza se justifique ...
Mal iria este País, se, num grupo tão amplo de representantes da Nação, não tivesse sido possível reunir, ainda que com certo esforço, a minoria que aqui representamos.
Nenhum de nós mudou, reparai bem!
Somos como éramos. E continuaremos a ser como somos. E isso sim, Sr. Deputado, aceito que seja considerado singular nesta Câmara.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, chamo a atenção de V. Ex.ª pana a grave interpretação a que as últimas palavras o sujeitam.
Pois V. Ex.ª faz uma declaração de constância, que considera singular nesta Câmara. Permito-me sugerir-lhe

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que reveja exactamente o sentido dessas palavras, para que não fique nas nossas actas o que pode parecer aos observadores estranho, a afirmação de um membro desta Casa, que manter constância de opiniões é singular aqui dentro.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Almeida Cotta: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a palavra para explicações, Sr. Deputado?
Tem a palavra para explicações o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Eu queria traduzir, com menos brilho, certamente, aquilo que V. Ex.ª acabou de dizer. Portanto, muito obrigado.

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à ordem do dia. Continuação da discussão na especialidade das alterações à Constituição Política. Vamos discutir a proposta de alteração ao artigo 59.º da Constituição.
Vai ser lida.

TÍTULO XIII

Artigo 59.º

Nos termos regimentais, propomos que a epígrafe do título XIII e o artigo 59.º da Constituição Política passem a ter a seguinte redacção:

TITULO XIII

Das empresas de interesse colectivo e das concessões

Art. 59.º São consideradas de interesse colectivo e sujeitas a regime especial, no tocante aos seus direitos e deveres, nacionalidade, corpos gerentes, pessoal e intervenção ou fiscalização do Estado, conforme as necessidades da defesa nacional, da segurança pública e do desenvolvimento económico e social, as empresas concessionárias de serviços públicos, de obras públicas ou de exploração de coisas do domínio público do Estado, as sociedades de economia mista e de economia pública, as empresas que desempenhem alguma actividade em regime de exclusivo ou com privilégio não conferido em lei geral e ainda todas as empresas que exerçam qualquer actividade considerada por lei de interesse nacional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Marina, de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a proposta de alteração ao artigo 59.º da Constituição, vamos passar à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar agora à proposta de alteração ao artigo 60.º, a qual vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO XIII

Artigo 60.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 60.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 60.º As concessões do Estado ou das autarquias locais, na esfera da sua competência, serão sempre sujeitas a cláusulas que assegurem, dentro do justo equilíbrio dos interesses, a salvaguarda do interesse público e o respeito das conveniências de economia nacional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir ã proposta de alteração ao artigo 60.º da Constituição, vamos passar à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar ao artigo 61.º, objecto também de uma proposta de alteração, que vai ser lida.

Foi lida, é a seguinte:

TÍTULO XIII

Artigo 61.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 61.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 61.º As tarifas de exploração dos serviços públicos concedidos estão sujeitos à regulamentação e à fiscalização do Estado.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves- Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

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O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a proposta de alteração do artigo 61.º da Constituição Política, apresentada, pelos Srs. Deputados Albino dos Heis e outros, pô-la-ei à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora ao artigo 62.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.

Foi lida, é a seguinte:

TITULO XIII

Artigo 62.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 62.º e seus n.ºs 1.º, 2.º e 3.º (actual artigo 60.º da Constituição Política) passem a ter a seguinte redacção:

Art. 62.º Obedecerão a regras uniformes, sem prejuízo, em pontos secundários, das especialidades necessárias:

1.º O estabelecimento ou transformação das comunicações terrestres, fluviais, marítimas e aéreas, qualquer que seja a sua natuzera ou fins;
2.º A construção das obras de aproveitamento de águas ou carvões minerais para produção de energia eléctrica, e bem assim a construção de redes para o transporte, abastecimento ou distribuição da mesma, e ainda as obras gerais de hidráulica agrícola;
3.º A exploração dos serviços públicos relativos às mesmas comunicações, obras e redes.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Coita - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotia Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão esta proposta de alterações.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre a proposta de alterações ao artigo 62.º da Constituição Política, proposta esta subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, vou pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar agora ao artigo 70.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO XIV

Artigo 70.º

Nos termos regimentais, propomos que os §§ 1.º e 2.º do artigo 70.º da Constituição Política passem a ter a seguinte redacção:

Art. 70.º..................
§ 1.º Em matéria de impostos, a lei determinará: a incidência, a taxa ou os seus limites, as isenções a que possa haver lugar, as reclamações e os recursos admitidos em favor do contribuinte.
§ 2.º A cobrança de impostos estabelecidos por tempo indeterminado ou por período certo que ultrapasse uma gerência depende, nas gerências subsequentes àquela em que foram criados, de autorização da Assembleia Nacional.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves- Manuel Coita Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Ulisses Cortês: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ulisses Cortês.

O Sr. Ulisses Cortês: - Era meu propósito não intervir na discussão do artigo 70.º, §§ 1.º e 2.º, que se justificam por si, sem necessidade de esclarecimentos. Julgo, porém, conveniente tomar parte nesse aspecto do debate, sobretudo para afirmar a constância doutrinária que não é privilégio ido Sr. Deputado Correia da Cunha, mas apanágio de todos nós.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Oito séculos de finanças desorganizadas explicam a atenção especial que a Constituição dedica às finanças do Estado.
É esse o objectivo do título XIV da Constituição, onde se insere o artigo 70.º, e ainda os n.ºs 3, 4 e 5 do artigo 91.º e do artigo 93.º Estes preceitos constituem um todo lógico e indivisível. Expliquemos: quanto à votação de impostos, é ela atribuição exclusiva da Assembleia, constituindo, assim, o que em terminologia jurídica se designa por reserva da lei. Assim, compete ao órgão legislativo fixar as taxas ou os seus limites, a incidência, as isenções e as reclamações e recursos.
Entre o estabelecimento de uma taxa fixa e uma variação entre limites optou-se, porém, por um processo mais flexível e mais bem ajustado aos interesses do Tesouro e às conveniências do contribuinte. Constitui esta medida um progresso que não posso deixar de aplaudir. As atribuições da Assembleia em matéria de impostos são, pois,

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exclusivas, de harmonia com as suas funções históricas e tradicionais. Carecem da aprovação da instituição parlamentar, do consenso dos lídimos e autênticos representantes da Nação, depositários da sua vontade, expoentes da sua soberania.
O Governo, porém, poderá lançar impostos ema caso de urgência e necessidade pública e fora do funcionamento da Assembleia, mas o órgão legislativo terá de as ratificar na sessão seguinte, sob pena .de caducidade, embora também sem prejuízo da sua imediata cobrança. Quanto às despesas mão determinadas em leis preexistentes, a Assembleia fixa os seus princípios orientadores, os seus sistemas de prioridade, as suas ordens de urgência. Além disso, é a Assembleia que autoriza anualmente o Governo a cobrar as receitas e a realizar as despesas do exercício. A organização do orçamento é, todavia, da competência exclusiva do Governo, mas dentro da autorização legislativa e sujeita à fiscalização parlamentar. Este sistema, que inspira as concepções progressivas das finanças modernas, produziu resultados frutuosos e de transcendente significado durante quase meio século de vigência. Foi o início de ressurgimento da cruzada de resgate de que Salazar foi o promotor e o artífice eminente.
A estes princípios devemos o surto do progresso verificado nos últimos anos, a justiça social que sobre ele edificámos, a solidez da moeda mundialmente reconhecida e que é a bandeira representativa da verdade dos nossos critérios e do nosso equilíbrio financeiro, interno e internacional. Houve nesta mataria actualizações que se impuseram, aperfeiçoamentos aconselháveis, inovações exigidas pelas circunstâncias. O Governo procurou, porém, renovar na continuidade, e permanecer fiel aos grandes princípios da regeneração financeira, ao magistério do seu prestigioso inspirador e ao pensamento substancial que o animou.
Aprovo, nestes termos, o texto governamental, na sua precisa redacção e no conjunto das suas disposições, que suscito a manha adesão, quer no plano da doutrina, quer da técnica. O valor exemplar dia nossa administração financeira constitui aquisição que não pode delapidar-se.
E termino como comecei. Atitude singular é a afirmação da existência, nesta Assembleia, de uma ala que se qualifica de liberal e pratica a intolerância, que reivindica o Regimento para ter a liberdade de o violar e que, dizendo-se democrática, não aceita as decisões da maioria, abandonando os trabalhos parlamentares.
Singular liberalismo este, Sr. Presidente.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de alterações aos §§ 1.º e 2.º do artigo 70.º da Constituição Política.

Pausa

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a proposta de alterações aos §§ 1.º e 2.º do artigo 70.º da Constituição, proposta subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, vou pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar ao artigo 72.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO II

CAPÍTULO I

Artigo 72.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 72.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 72.º O Chefe do Estado é o Presidente da República eleito pela Nação, por intermédio de um colégio eleitoral constituído pelos membros da Assembleia Nacional e dai Câmara Corporativa em efectividade de funções e pelos representantes municipais de cada distrito ou de cada província ultramarina não dividida em distritos e ainda pelos representantes dos órgãos electivos com competência legislativa das províncias ultramarinas.
Os representantes municipais serão designados pelas vereações eleitas, nos termos da lei, a qual fixará o número que deve caber a cada distrito ou província ultramarina em correspondência com o número das respectivas câmaras; os representantes dos órgãos electivos com competência legislativa das províncias ultramarinas serão designados por estes órgãos nos termos da lei, a qual fixará o número que deve caber a cada um deles em correspondência com o seu carácter representativo.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotia - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotia Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Moura Ramos: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Pedi a palavra para, relativamente ao artigo 72.º, em discussão, fazer uma declaração de princípios.
Pouco propenso a acreditar nas virtudes do sufrágio, acontece, quando chamado ou levado a reflectir sobre o crucial problema da chefia do Estado, acudirem-me logo ao espírito as frases de Salazar (Discursos, vol. III, pp. 310 e 311):

Felizes as nações que nos momentos cruciais da sua vida não são obrigadas a escolher, e às quais a Providência, com desvelado carinho, dispõe os acontecimentos e suscita as pessoas de modo tão natural e a propósito que só uma solução é boa e essa a vêem com nitidez no íntimo da sua consciência todos os homens de boa vontade! Felizes porque não se debatem em dúvidas angustiosas, porque não se arriscam em desmedidas contingências, felizes sobretudo porque não se dividem.

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E mais tarde, a 22 de Novembro de 1951, no discurso inaugural do III Congresso da União Nacional, afirmou (Discursos, vol. V, p. 69):

A monarquia tem a superioridade real de conter em si própria resolvida - tanto quanto humanamente o pode ser - a questão da estabilidade da chefatura do Estado.

O Sr. Leal de Oliveira: - Não apoiado!

O Orador: - Tudo para querer significar que a hereditariedade, suprimindo todos os problemas aparecidos com a eleição, tem ainda a grande vantagem de garantir a continuidade e independência e integridade de uma política.
Daí que António Sardinha tivesse dito que os reis são «a Pátria com figura humana», porque «assentam praça quando nascem», no dizer de Mouzinho de Albuquerque pelo que, mesmo quando se trata de «um homem vulgar, de medianas qualidades, revestido no duro ofício de reinar por uma tradição secular que fez dos interesses da Nação os interesses da família que representa, aparece sempre nos momentos de crise nacional como sendo o mais sensato, o mais inteligente e o mais forte de toda a Nação» (Prof. Doutor Marcelo Caetano, citado na obra Para Um Verdadeiro Governo do Povo, da autoria do Prof. Doutor Jacinto Ferreira).
Sendo o Chefe do Estado o traço de união entre todos os portugueses, conviria pô-lo a coberto de um processo de designação que não sendo o da hereditariedade ou solução que prefere os menores azares do nascimento aos maiores azares da eleição, adoptasse uma fórmula que mais de acordo estivesse com a nossa concepção corporativa do Estado, furtando o País às preocupações graves que geralmente se geram com os abalos eleitorais e a agitação a que temos assistido. Como nacionalista que sou e defensor da ordem social existente, entendo que entre dois inales - o da eleição por sufrágio directo ou por um colégio eleitoral - se deve preferir o menor, e esse é, sem dúvida, aquele que a Constituição consagra na redacção actual do artigo 72.º
Tenho dito.

O Sr. Leal de Oliveira: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Leal de Oliveira: - Exmo. Sr. Presidente: Não me era possível deixar passar a discussão na especialidade do artigo 72.º sem aqui proferir algumas palavras que possam traduzir inequivocamente o meu pensamento sobre tão importante e discutido problema nacional.
Serei breve, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e para tanto direi imediatamente a todos VV. Ex.ªs que sou, em tese, a favor do sufrágio universal na eleição do Chefe do Estado, o mais alto magistrado da Nação.
Todavia, reportando VV. Ex.ªs para a argumentação expendida pelos Deputados Homem Ferreira e Homem de Mello nos seus admiráveis discursos aqui ouvidos durante a discussão na generalidade da proposta e dos projectos de lei de alteração à Constituição Política e, vinculado à confiança que deposito em S. Ex.ª o Prof. Marcelo Caetano como o homem que pode guiar a Nação num período extremamente grave, acompanharei S. Ex.ª na sua afirmação de que:

Será discutível a forma de eleição do Chefe do Estado. Mas não se afigura conveniente, a tão curta distância da resolução tomada sobre o assunto na última revisão, voltar a contravertê-lo. Há que prosseguir na experiência da fórmula adoptada e colher daí lição para mais tarde formar um juízo fundado sobre a conveniência de a conservar ou substituir.

Desta forma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com a esperança de que o Governo dê melhor representatividade aos membros do colégio eleitoral, darei o meu voto na especialidade ao artigo 72.º do capítulo I, título II, na redacção sugerida pela comissão eventual.
Tenho dito.

O Sr. Jorge Correia: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Jorge Correia: - Sr. Presidente: Parece que vai sendo uso, mesta Câmara, começar os palavras por dizer que se vai fazer uma declaração de principias. Pois também vou fazer uma declaração de princípios, e, muito particularmente, para dizer a esta Câmara que não é verdade o que o Diário de Lisboa há diais deixou transparecer, dizendo que eu era partidário da eleição presidencial por sufrágio directo. Não foi nada disso que eu aqui disse ma minha intervenção ma generalidade. Mais, porque sou sempre fiei à minha consciência e liberal - sou daqueles que me considero liberal - devo informar a Câmara que não estou inteiramente de acordo com uma eleição presidencial mo estilo do colégio actual: eu desejaria que o colégio fosse mais alargado.
Tendo em atenção, porém, as leis que regulam ou podem vir a regular a formação do colégio eleitoral, verifico que o próprio Governo pode fazê-lo. E eu confio inteiramente no Governo do Prof. Marcelo Caetano: confio na sua boa vontade, na vontade de acertar e na vontade até de se aproximar idas opiniões gerais.
Entendo, portanto, que se o colégio eleitoral fosse alargado, em nada diminuiria o valor actual da eleição por sufrágio indirecto, mas, pelo contrário, dar-lhe-ia mais representatividade.
Vou votar, portanto, pelo sufrágio indirecto, e não pelo sufrágio directo, porque, nas condições actuais, acho que a Nação não está em altura de poder correr riscos desses.
Tenho dito.

O Sr. Alberto de Meireles: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Alberto de Meireles: - São poucas as palavras que vou dizer. Não vou entrar, evidentemente, na querela, tão acesa nessa tribuna, acerca da forma de eleição presidencial.
Ideologicamente fiel a mim mesmo, coerente com o pensamento que sempre afirmei, tenho orgulho em poder lembrar aqui uma alta figura de parlamentar, uma alta figura política, com quem tive a honra de trabalhar nesta Casa: o venerando Dr. Paulo Cancela de Abreu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Fez ele, nesta Casa, em 1959, afirmações corajosas de um homem de uma só fé, de carácter, um homem que sofreu em si e no seu pai as amarguras de uma série de perseguições políticas. E, sempre fiel a si mesmo, veio declarar aqui que tinha de ser alheio às querelas, que tinha de ser alheio aos sistemas, porque a todos reprovava. Só aceitava um, e esse, Sr. Presi-

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dente, esse sistema que não é sistema, porque não é eleição dos homens, é uma instituição, é aquele a que ideologicamente adiro.

O Sr. Leal de Oliveira: - Não apoiado!

O Orador: - Disse-o na comissão eventual, em poucas palavras: «Felizes os povos que não têm que escolher. Também penso assim.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Correia das Neves.

O Sr. Correia das Neves: - Sr. Presidente: Eu, como um dos novos desta Assembleia, ainda há pouco chegado às lides políticas, e no momento em que parece desenhar-se um certo desentendimento entre os chamados «novos» e «menos novos» - e bom é que se não crie nesta Casa um ambiente emocional, seja a propósito de que problema for, o que pode prejudicar a fria reflexão e o melhor entendimento-, queria, muito serenamente, como é meu hábito, dizer, como novo, o que penso do sistema de eleição do Chefe do Estado. Em princípio, em lógica de direito constitucional, ideologicamente, eu votaria pelo sufrágio directo. Se o Chefe do Estado é o representante da Nação, em princípio deverá ser a Nação inteira a elegê-lo. No entanto - e gosto de ser claro e que a minha posição como novo fique bem expressa -, atendendo às circunstâncias históricas que o País atravessa; atendendo a que se encontra numa crise de crescimento social e económico; que está numa fase de arrancada e que são peculiares a estes períodos certas perturbações e convulsões; atendendo a que o povo, em geral, não tem uma maturidade cívica e cultural que lhe permita ser bem consciente na escolha do seu chefe; atendendo a que, se é preciso mais liberdade, maior liberalização - e são necessárias -, também é preciso actuar ao mesmo tempo na promoção cívica, educacional e cultural (e uma sem a outra não poderão resultar bem); atendendo a todas estas circunstâncias, acidentais e ocasionais: entendo que é mais sensato, que pode ser mais feliz para todo este querido Portugal, votarmos, por agora, um sistema de eleição indirecta, orgânica ou colegial.
Será neste sentido o meu voto.
Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Disse V. Ex.ª muito bem.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Oliveira.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Atarei muito breve, porquanto o problema relativo ao processo de eleição do Chefe do Estado foi suficientemente debatido para que todos estejamos bem elucidados.
Por outro lado, não existe qualquer proposta a contrariar o que está exposto no artigo 72.º, e isso mais justifica a brevidade das minhas palavras.
Entretanto, alguma, experiência política, que possuo - pois vivi intensamente duas campanhas eleitorais por sufrágio directo e participei como Deputado na eleição do Chefe do Estado, segundo o sistema instituído pela revisão constitucional de 1959 - leva-me a corroborar, sem qualquer hesitação, mormente na fase delicada de guerra que nos foi imposta, o que se encontra já preceituado na Constituição que estamos a rever. O argumento constitui, entre outras razões, como, aliás, nesta Câmara se acentuou, uma valor político a ter bem presente.
Neste caso concreto, da mais alta importância, a que se refere o artigo 72.º, nada me leva a fazer pensar contràriamente ao que aí se encontra consignado, pelo que aprovo o texto em discussão.
E o momento actual, repito, também assim o exige.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Tenreiro.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Sr. Presidente: Peço desculpa destas primeiras palavras.
Não sou liberal, não sou conservador. Mas sou português desejoso do progresso do meu país, com longos anos de combate na defesa dos interesses da Nação. Repudio todas as divisões e desejo que acabem quaisquer mal-entendidos nesta retaguarda, em que o País tem a sua atenção.
Sr. Presidente: Dou o meu voto ao artigo 72.º na redacção proposta pela comissão que funcionou nesta Assembleia, não principalmente por razões subjectivas, mas porque considero o sistema de eleição indirecta do Presidente da República como o mais adequado à nossa estrutura constitucional.
É, na verdade, no campo dos princípios que eu desejo, antes do mais, pôr o problema.
Um sistema de eleição indirecta tem autenticidade e assegura a participação dos elementos estruturais da Nação - que não são apenas os indivíduos - na vida política.
Defendi, na minha intervenção ma discussão na generalidade, um aperfeiçoamento do actual sistema, com vista a uma maior autenticidade de representação dos que são chamados a votar no sufrágio indirecto.
Este desejo é legítimo e sempre actual. O aperfeiçoamento no funcionamento das instituições constitui uma tendência que corre paralela ao próprio progresso social.
Isto, porém, não significa minimizar o princípio consignado no texto constitucional, mas apenas desejar uma maior perfeição das leis que o executam e do bom funcionamento dos sistemas que se desenvolvem ao abrigo das mesmas leis.
No sistema indirecto não se trata apenas do voto corporativo. Os Deputados participam na eleição do Presidente da República, eles que foram eleitos por sufrágio directo da Nação.
O voto é naturalmente das pessoas e não dos órgãos que estas representam. No caso dos Deputados, eles apresentam-se portadores de um mandato que lhes foi conferido pelo eleitorado livremente designados por sufrágio universal.
Esta participação mista não minimiza, de qualquer modo, a qualificação e a representatividade dos que são chamados a votar.
A pessoa representa um organismo na medida em que, votando com independência, dá sentido consciente ao espírito e aos interesses do sector a que se encontra ligado.
Também é matéria pacífica que os elementos estruturais da Nação participam na vida política, como resulta do artigo 5.º, na redacção já votada.

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Quando se afirma que a Nação é mais do que a soma dos indivíduos e miais ido que ia soma das instituições, defende-se logicamente o sistema indirecto de eleição.
Não é apenas o número que tem sentido na vida politica e administrativa e não são iguais todos os problemas e interesses.
O voto da Nação não poderá, pois, ser apenas a soma algébrica dos indivíduos, anãs a conjugação da presença dos vários elementos estruturais da mesma.
Visto o problema, relativamente às províncias ultramarinas, afigura-se-me miais viável e autêntico, na actual conjuntura, o sistema da eleição indirecta.
Na vida política a linguagem a utilizar deve sempre ser a do realismo e não a de fórmulas abstractas, contrarias às necessidades dos tempos, às exigências dos povos e à adequação das estruturas sociais.
O actual sistema deu as suas provas, e eficazmente. Há que o experimentar mais tempo, não é oportuno modificá-lo agora.
A serenidade e a reflexão de um colégio eleitoral são valores da sua própria autenticidade e representatividade.
Estará o País disposto a correr o risco da agitação só para podermos dizer que é por tal via que se realiza a promoção política do povo?
Será legítimo brincar com o fogo, só para nos orgulharmos disso mesmo?
Desejaremos, em suma, pagar caro os riscos da instabilidade e da agitação, só pelo luxo de os correr?
Nos países onde existe sufrágio directo verifica-se, algumas vezes, todo um processo prévio que limita a escolha dos candidatos e acaba por pôr limitações aos próprios candidatos escolhidos. Isto acontece em países altamente evoluídos e com grande poder na cena mundial.
Nestes casos poder-se-á, porventura, falar numa escolha de todos e não de alguns, numa participação universal dos indivíduos?
A participação dos homens na vida da Nação será apenas a que se realiza .pelo voto directo? Será esta a mais autêntica, a mais válida, aquela em que cada pessoa se considera verdadeiramente realizada?
A vida é mais complexa do que sugerem fórmulas abstractas e o realismo dos homens acaba muitas vezes por condenar as utopias dos idealistas ou o inconformismo dos que por natureza têm dificuldade em aceitar os limites que resultam das exigências da paz social e do labor que visa o progresso e o bem-estar da comunidade.
É, pois, minha convicção, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, votando esta Assembleia o artigo 72.º na redacção proposta pela comissão, corresponderemos às exigências da estrutura política consagrada na Constituição e asseguraremos uma forma idónea da escolha do mais alto magistrado da Nação, sem divisões prévias, sem lutas que inferiorizam ou minimizam os homens. Permitiremos, finalmente, que o Chefe do Estado apareça como chefe incontestado da Nação e não enfraquecido por divisões prévias.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Duas palavras apenas, para dizer mie na votação manterei a opinião que expendi a este respeito na minha apreciação na generalidade.
Muito obrigado.

O Sr. Barreto Lara: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barreto de Lara.

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: A circunstância de ter reclamado do Diário das Sessões, quando o meu nome aparecia assinando a proposta da comissão eventual, por lapso que V. Ex.ª já fez o obséquio de mandar «corrigir, define perfeitamente a minha posição quanto à eleição do Chefe do Estado, que entendo deverá ser por sufrágio directo, comungando inteiramente com a opinião do Sr. Almirante Roboredo e Silva. E aqui estamos duas gerações a entender que seria o momento mais oportuno, exactamente, para modificarmos um sistema pelo outro.
Tenho dito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, porei à votação a proposta de alterações ao artigo 72.º da Constituição Política.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à discussão da proposta de alterações ao artigo 80.º, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO II

CAPÍTULO I

Artigo 80.º

Nos termos regimentais, propomos que o § 2.º do artigo 80.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Artigo 80.º

§ 2.º Enquanto se não realizar a eleição prevista neste artigo, ou quando por qualquer motivo houver impedimento transitório das funções presidenciais, ficará o Presidente do Conselho, e, na sua falta, o Presidente da Assembleia Nacional, investido nas atribuições de Chefe do Estado, com prejuízo, neste último caso, do exercício das funções próprias.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves . de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a proposta de alteração ao artigo 80.º pô-la-ei à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

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O Sr. Presidente: - Vamos agora passar ao artigo 81.º, que, em relação aos seus n.ºs 7.º e 9.º, há proposta de alterações.
Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO II

CAPÍTULO II

Artigo 81.º

Nos termos regimentais, propomos que os n.ºs 7.º e 9.º do artigo 81.º da Constituição Política passem, a ter a seguinte redacção:

Art. 81.º

7.º Representar a Nação e dirigir a política externa do Estado, concluir acordos e ajustar tratados internacionais, directamente ou por intermédio de representantes, e ratificar os tratados, depois de aprovados pela Assembleia Nacional ou pelo Governo.

9.º Promulgar e fazer publicar as leis e resoluções da Assembleia Nacional, bem como os decretos-leis, os decretos para o ultramar e os decretos regulamentares, e assinar os restantes decretos. Os diplomas mencionados neste número que não sejam promulgados, assinados e publicados segundo nele se determina, são juridicamente inexistentes.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho, de Almeida Coita - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão esta proposta de alterações.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir esta proposta de alterações aos n.ºs 7.º e 9.º do antigo 81.º da Constituição, proposta esta subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, pô-la-ei à votação.

Submetida à notação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar agora ao artigo 82.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO II

CAPÍTULO II

Artigo 82.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 82.º e seus §§ 1.º, 2.º e 3.º da Constituição Política passem a ter a seguinte redacção, sendo-lhes aditados os §§ 2.º e 3.º abaixo referidos:

Art. 82.º Os actos do Presidente da República devem ser referendados pelo Presidente do Conselho e pelo Ministro ou Ministros competentes, sem o que serão juridicamente inexistentes.
§ 1.º Não carecem de referenda:

1.º A nomeação e exoneração do Presidente do Conselho;
2.º As mensagens dirigidas a Assembleia Nacional;
3.º A mensagem de renúncia ao cargo.

§ 2.º Devem ser referendados por todos os Ministros os decretos-leis e os decretos que aprovem tratados internacionais que versem matéria legislativa, quando uns e outros não tiverem sido aprovados em Conselho de Ministros.
§ 3.º A promulgação das leis e resoluções da Assembleia Nacional será referendada apenas pelo Presidente do Conselho.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Aipim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs desejar usar da palavra para discutir a proposta de alterações ao artigo 82.º, que foi lida, vou pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora ao artigo 84.º, em relação ao qual, também, há uma proposta de alterações.
Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

TITULO II

APÍTULO LII

Artigo 84.º

Nos termos regimentais, propomos que a alínea a) e o § único do artigo 84.º da Constituição Política passem a ter a seguinte redacção:

Art. 84.º .................

a) Verificar a situação de impossibilidade da reunião do colégio eleitoral referida no artigo 72.º e a cessação dela para os efeitos do artigo 80.º-A, bem como a impossibilidade de realização das eleições para Deputados prevista no artigo 85.º;

§. único. O Conselho reunir-se-á por direito próprio para exercer a competência a que se refere a primeira parte da alínea a).

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis

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Júnior - José Coelho de Almeida Coita - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves-Manuel Coita Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre esta proposta de alterações ao artigo 84.º da Constituição, subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros Srs. Deputados, vou pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Segue-se agora o artigo 85.º, em relação ao qual há uma proposta de alterações subscrita pelos Srs. Deputados Albino .dos Reis e outros, e outra proposta de emenda subscrita pelos Srs. Deputados Roboredo e Silva, Alberto Meireles e outros Srs. Deputados. Esta última proposta é, efectivamente, de aditamento.

Foram lidas, são as seguintes:

CAPITULO I

Artigo 85.º

Nos termos regimentais, propomos que o artigo 85.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:

Art. 85.º A Assembleia Nacional é composta de cento e cinquenta Deputardes, eleitos por sufrágio directo dos cidadãos eleitores, e o seu mandato terá a duração de quatro anos improrrogáveis, salvo o caso de acontecimentos que tornem impossível a realização do acto eleitoral.

Sal a das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho ide 1971.-Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Sal azar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

Proposta de emenda

De harmonia com o artigo 38.º dó Regulamento da Assembleia Nacional, propomos que ao § 3.º do artigo 85.º da Constituição da República Portuguesa seja acrescentado o seguinte:

Todavia, no caso de desaparecimento de todos os Deputados eleitos pelo mesmo círculo, terá lugar nova eleição dentro dos trinta dias seguintes à ocorrência.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 24 de Junho de 1971. - Os Deputados: Armando Roboredo e Silva - Alberto de Meireles - Magalhães Mota - Salazar Leite - Francisco Sá Carneiro - António Castelino e Alvim - Álvaro Barreto de Lara - Oliveira Pimentel - Lopes Quadrado - Themudo Barata.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão,- conjuntamente, as duas propostas, ou seja a proposta à alteração ao artigo 85.º e a proposta de aditamento a este mesmo artigo.

O Sr. Barreto de Lara: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barreto de Lara.

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Estou inteiramente de acordo com a redacção da alteração ao artigo 85.º e com o aditamento proposto por outros Srs. Deputados.
Eu desejaria deixar aqui vincado, para constar no Diário das Sessões, que o aumento de 130 para 150 Deputados, que será regulado pela lei eleitoral, tivesse reflexo directo na representação ultramarina.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao aditamento proposto pelos Srs. Deputados estou inteiramente de acordo com ele, pois é muito oportuno e dado que pode haver um círculo eleitoral que fique completamente desprovido de Deputados e de representação nesta Câmara, como seria, infelizmente, o caso da Guiné, se alguns Srs. Deputados, por generosidade e bondade, não tivessem tomado esse papel sobre si e defendido intransigentemente os interesses da Guiné Portuguesa dentro desta Casa.
Aproveito a oportunidade para recordar com muita saudade a memória dos nossos ilustres, queridos e chorados colegas de trabalho que lá deixaram a sua vida.
Tenho dito.

O Sr. Neto Miranda: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Neto Miranda.

O Sr. Neto Miranda: - Sr. Presidente: Eu desejaria deixar aqui assinalado nesta Câmara, e de harmonia com o pensamento expresso por mim em Dezembro, a propósito da apresentação da revisão constitucional à Assembleia e, também, corroborando as afirmações expressas pelo Sr. Deputado Barreto de Lara, que é indispensável que as províncias ultramarinas tenham uma representação mais adequada ao seu desenvolvimento e progresso.
Isto que acabo de dizer é, aliás, pensamento do próprio Governo. O Sr. Presidente do Conselho quando veio a esta Câmara exprimiu o seu sentir, manifestando que a representação do ultramar nesta Assembleia devia ser de uma forma mais expressiva e que o aumento proposto de vinte Deputados tinha em vista que a maioria desse número pudesse caber às províncias ultramarinas. Mas isso é matéria propriamente da lei eleitoral que vier a ser posta em vigor.
Tenho a impressão de que na segunda proposta, que foi apresentada e que V. Ex.ª mandou ler, poderia encontrar-se uma solução adequada, que desejo fique consignada na acta: a de obviar àquilo que aconteceu e que todos muito lamentamos.
Suponho, Sr. Presidente, que as províncias ultramarinas poderiam ter, além de Angola e Moçambique, uma

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representação de maior número; poderiam, cada uma delas, ser apresentadas por dois Deputados. Já assim se evitavam casos de infelicidade, além de que a representação era mais conveniente. Para Angola e Moçambique o número seria maior do que para os outras províncias.
Nestes termos, Sr. Presidente, dou o meu voto de aprovação à proposta do Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Sifra: - Sr. Presidente: Eu sou avesso a retóricas e o Sr. Deputado Barreto de Lara já quis ter a bondade de defender a proposta de aditamento, que foi assinada por vários Srs. Deputados e por mim próprio.
De resto, essa proposta de aditamento foi feita na natural sequência das afirmações que eu fiz naquela tribuna, quando se discutiu na generalidade a proposta do Governo e os projectos de alguns Srs. Deputados relativos à revisão constitucional.
Todos nós temos ainda no coração e na alma aquela tragédia que se passou na Guiné. E não me parece que seja admissível que amanhã, por outro motivo - «por Deus nunca será pela mesma razão», como eu disse, se bem me lembro, qualquer coisa neste género -, possa suceder que um círculo eleitoral, seja qual for, fique sem representação nesta Assembleia.
O número de Deputados tem de ser resultante de variadíssimas circunstâncias, inclusive a população, de modo que eu mão sei, com o aumento de vinte Deputados, até onde é que se podem cobrir todas as necessidades, para conceder dois Deputados a cada um dos círculos que só têm um. Mas, ainda que seja possível atribuir dois Deputados, quem é que tem a vida na mão? Qual é o círculo que está livre amanhã de lhe poderem desaparecer os Deputados que o representam?
É admissível, é aceitável, que esse círculo fique, por uma sessão, por duas sessões, até só por dois meses, sem representação neste hemiciclo?
Eu não compreendo que assim possa suceder, Sr. Presidente, e por isso mantenho integralmente e estou convencido de que a proposta que foi por mim assinada com outros Srs. Deputados é uma proposta que tem total cabimento.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Camilo de Mendonça.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: E apenas para fazer duas notas.
Uma relativamente à que já foi feita pelo Sr. Deputado Barreto de Lara e pelo Sr. Deputado Neto Miranda. Gomo Deputado ultramarino, embora, e do mais recôndito círculo do continente, apoio o desejo dos Srs. Deputados no sentido de que o Governo, na lei eleitoral a elaborar, contemple na maior possibilidade a representação do ultramar, porque, efectivamente, só temos todos a ganhar em que enriqueçamos um pouco a representação das parcelas nacionais.
A segunda é para chamar a atenção de que, efectivamente, a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Roboredo e Silva e outros Srs. Deputados me parece deslocada. Se a lei eleitoral vai fixar, nomeadamente, a representação dos círculos em número de Deputados, com muito mais forte razão deverá fixar as formas como serão substituídos e as condições em que as vagas serão preenchidas. Efectivamente, compreendo o anseio, respeito a intenção, considero necessário que a lei eleitoral venha a legislar sobre isso, mas creio que é efectivamente na lei eleitoral que terá melhor lugar essa solução do problema. Além de que, efectivamente, nós somos Deputados eleitos por um círculo, mas somos todos Deputados da Nação. De outra forma, poderíamos estar a deslocar um pouco o conceito que a própria Constituição estabelece a este respeito. Afigura-se-me, portanto e por isso, que efectivamente o lugar próprio é na lei eleitoral e que, daqui, a única coisa que devemos é chamar a atenção do Governo para que, ao elaborá-lo, não deixe de contemplar, de uma forma precisa e efectiva, a solução deste problema.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Neto Miranda.

O Sr. Neto Miranda: - Sr. Presidente: Eu não sou contra as fatalidades. Eu apenas quis deixar um apontamento, para ser considerado na devida oportunidade. Precisamente aquela oportunidade que o Sr. Deputado Camilo de Mendonça aponta, e que é essa que eu reputo como essencial para resolver todo este problema. Já o disse em Dezembro e volto agora a repeti-lo aqui, pela terceira vez.

O Sr. Camilo de Mendonça: - De resto, se me permite, há uma observação a fazer, trinta dias seria sempre um prazo insuficiente ...

O Orador: - Sr. Presidente: Por este motivo, mantenho o meu ponto de vista de aprovação à proposta do Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Eu não sou jurista, nem sei de direito constitucional. No entanto, não obstante os argumentos que foram apresentados pelo Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça, por quem tenho, pelos conhecimentos enciclopédicos de que tem dado provas manifestas nesta Assembleia, a maior consideração, e também pelas suas capacidades, eu não fiquei convencido, Sr. Presidente, e, por consequência, mantenho integralmente, na parte que me toca, a proposta. Não sei o que dirão os nossos colegas que assinaram comigo. Pois muito bem ... Se não for votada, não estranharei, pois isso é normal numa Assembleia em que cada um tem a sua própria opinião!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Tem a palavra o Sr. Deputado Camilo de Mendonça.

O Sr. Camilo de Mendonça: -Sr. Presidente: Era só para agradecer ao Sr. Deputado Roboredo e Silva as palavras que me dirigiu e para lhe dizer que pela minha parte tenho pelo seu espírito e pelo brilho com que toca qualquer problema a maior consideração e respeito.
Efectivamente eu também não sei nada de leis, considero isso sob augurais aspectos uma felicidade (risos), e por isso mesmo me chocaria profundamente que nós quiséssemos estar aqui a regular, em termos constitucionais definitivos e irrevogáveis, a solução para um caso subsequente da maior importância, que não pretendemos regular, que é a distribuição de Deputados por círculos.

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De resto, para lá da solução do caso concreto de um círculo, há o problema geral de regular primeiro, quando é que, pelo número de perdas de mandato, há lugar a uma eleição suplementar, ou geral. Portanto não compreendo que se possa ir regular na Constituição um aspecto que já é, pelo visto, de terceira ordem, quando o de primeira e de segunda ficariam por regular.
Pois eu respeito e compreendo perfeitamente a posição. Parece-me, todavia, como o fiz em aparte ao Sr. Deputado Neto Miranda, trinta dias um período inconveniente; é sempre o perigo neste, como em todos os casos, de na Constituição querermos fixar normas muito rígidas, para uma eleição suplementar. Parece-me, portanto, salvo o devido respeito, que, efectivamente, não é aqui o lugar nem o momento e que a solução está em que a lei eleitoral deva contemplar, de forma executada, o que hoje não acontece, o problema das eleições suplementares.
Mas tem de o fazer, depois de o considerar quando é que as perdas ou faltas dos Deputados dão lugar a uma dissolução. E eu parece-me que a interpretação deste artigo, depois do aumento do número para 150 Deputados, é lícita, só em relação aos 130 e às perdas ocorridas a partir do número de Deputados que existia, e não daqueles que passarão a existir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barreto de Lara.

O Sr. Barreto de Lara: -Sr. Presidente: É indiscutível que depois da lição jurídica dada pelo Sr. Deputado Camilo de Mendonça, que aprendi muito respeitosamente, se depreende que nós somos Deputados da Nação. Mas então não compreendo como é que somos eleitos por círculos, o que significa o seguinte: «O raciocínio morre no próprio raciocínio.»
Se nós fôssemos eleitos por sufrágio de todo o País, indiscutìvelmente que o argumento do Sr. Deputado Camilo de Mendonça era válido. Se somos eleitos por círculos, ainda que Deputados da Nação, é porque os eleitores desses círculos nos conhecem, e somos os indivíduos realmente encarregados de trazer aqui ao plenário os interesses restritos dos nossos círculos, enquadrados na contextura da Nação.
Posto isto, e uma vez que se verificou já a perda do Deputado representativo da Guiné, parece-me que merece dignidade constitucional a circunstância de se prever já na Constituição (afastando pois da vontade, pura vontade do Governo na lei eleitoral, de o regulamentar) que quando um círculo fique sem qualquer representação se proceda a uma eleição suplementar.
É possível que o período que o Sr. Deputado Neto Miranda diz seja curto; mas, se o período é curto, remeta-se para a lei eleitoral a duração desse período.

O Sr. Camilo de Mendonça: - V. Ex.ª poderia dizer-me como é que justifica a circunstância de não legislar na Constituição, quando relativamente à perda de mandatos determina uma dissolução. E quanto aos círculos pretende legislar quanto a um pormenor subsequente e consequente?

O Orador: - O que eu pretendo é que nenhum círculo, qualquer que seja a forma que VV. Ex.ªs queiram encontrar, é que nunca em qualquer circunstância, nenhum círculo eleitoral deixe de ter a sua representação nesta Casa. Mas que o não a deixe ter efectivamente.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Mas ... Estamos todos de acordo a esse respeito ...

O Orador: - Então ... vamos votar a proposta.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Perdão ... Por esse mesmo receio, então teríamos de estabelecer aqui os círculos, porque amanhã o Governo podia não atribuir um Deputado a um círculo.
Pelo mesmo princípio. É o que digo! Esse é de primeira ordem; V. Ex.ª é de segunda, embora esteja perfeitamente de acordo com a intenção.

O Orador: - Nós definimos princípios, sejam quais forem os círculos que o Governo estabeleça, ou que venha a estabelecer, isso é completamente indiferente. O princípio que se quer constitucionalmente estabelecer é este: não interessa se o Governo se lembra de estabelecer um círculo na Baixa da Banheira, por exemplo ...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Eu preferia ser representante da Baixa da Banheira por medida de higiene ...

O Sr. Camilo de Mendonça: - E era bem bom!

O Sr. Veiga de Macedo: - E Moçâmedes, e Vila da Feira e ... e ...

O Sr. Barreto de Lara: - Interessa que há círculos .. E o que interessa, efectivamente, é que nenhum círculo deixe de ter o seu representante nesta Casa seja qual for a circunstância.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Estamos de acordo!

O Sr. Barreto de Lara: - Pronto ... É isso exactamente que se consigna na proposta dos Srs. Deputados.

Risos.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Roboredo e Silva: O Sr. Deputado Correia das Neves tinha pedido a palavra antes de V. Ex.ª, permita-me que lha dê.

O Sr. Roboredo e Silva: - Peço desculpa.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Correia das Neves.

O Sr. Correia das Neves: -Sr. Presidente: Como estava a estabelecer-se certo diálogo entre duas pessoas muito respeitáveis, mas que não são juristas e que deram a entender que seria oportuna a intervenção de um jurista, lembrei-me de dizer duas palavras, mas o meu colega, também jurista, Barreto de Lara já se antecipou. Não creio, também, que nós juristas possamos adiantar muito ao ponto em discussão.
No entanto, como realmente há outros aspectos mais importantes de que não cuida a Lei Constitucional, ligados com o problema da dissolução da Assembleia, por exemplo, creio que o aditamento posto pelos Srs. Deputados, com boa intenção, sem dúvida nenhuma, me parece deslocado o ilógico, só por essa razão.
Assim sendo, e como a lei ordinária há-de cuidar de variadíssimos aspectos, tão importantes como esse, eu iria mais pela opinião do Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça. Era quanto queria dizer, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

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2384 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 117

O Sr. Roboredo e Silva: - Eu queria pedir a V. Ex.ª o favor de suspender a sessão por cinco minutos para ver se chegaríamos a uma conclusão sobre este assunto, que considero importante.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: Peço desculpa a V. Ex.ª, mas o Regimento não me permite suspender a sessão senão para elaborar uma nova proposta.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: A minha intenção era precisamente a de modificar a proposta por forma a tentar satisfazer algumas observações surgidas.

O Sr. Presidente: - Pode, Sr. Deputado. Eu suspendo a sessão por alguns minutos para eventual elaboração de uma nova proposta.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

O Sr. Roboredo e Silva: -Peço a palavra, Sr. Presidente, para um requerimento.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Roboredo e Silva.

O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Auscultados vários dos nossos colegas, surgiram algumas ... - Como hei-de dizer? Não queria dizer desinteligências ... - maneiras de interpretar o texto que me levaram a pensar que estará, na realidade, incluída na redacção da proposta uma palavra que não será verdadeiramente constitucional, e que, por consequência, poderia provocar qualquer pequena anormalidade no funcionamento dos nossos trabalhos.
Consequentemente, consultados os colegas presentes que comigo quiseram ter a bondade de assinar a proposta, eles estão de acordo em requerer a V. Ex.ª e à Assembleia que a proposta seja retirada. Simplesmente, eu desejaria vincar bem que o espírito, pelo menos dos Deputados que assinaram a proposta - mas estou, convencido de que no de muitos mais -, é o de que fique bem claro que se espera que na lei eleitoral que virá a ser publicada em consequência da revisão constitucional este ponto não possa deixar de ser considerado.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: O Sr. Deputado Roboredo e Silva requereu autorização para retirar a proposta de aditamento ao artigo 85.º da Constituição, que oportunamente apresentou, com o numero regimental de subscritores, dos quais ele é o primeiro.
Pergunto à Assembleia se autoriza a retirada da proposta de aditamento ao artigo 85.º, subscrita pelo Sr. Deputado Roboredo e Silva e outros Sus. Deputados.

Submetida à votação, foi autorizada a retirada da proposta.

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, pendente da apreciação da Assembleia apenas a proposta de alterações ao artigo 85.º, subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, a qual tem estado e continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre esta proposta, vou pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Segue-se o artigo 89.º, em relação ao qual há uma proposta de alterações subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, e uma proposta subscrita pelo Sr. Deputado Agostinho Cardoso, que, efectivamente, será um aditamento à alínea e), se ficar aprovada com as alterações preconizadas pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros.

Vão ser lidas.

Foram lidas, são as seguintes:

TÍTULO III

CAPÍTULO II

Artigo 89.º

Nos termos regimentais, propomos que a alínea e) e § 3.º do artigo 69.º ida Constituição Política passem a ter a seguinte redacção:

Art. 69.º

e) Têm direito ao subsídio que a lei eleitoral estabelecer e às precedências oficiais correspondentes a sua dignidade de representantes da Nação.

§ 3.º As imunidades e regalias estabelecidas nas alíneas b) e d) e primeira parte da alínea e) subsistem apenas durante o exercício efectivo das funções legislativas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta, Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.

Proponho a seguinte redacção para a alínea e) do artigo 69.º do texto da revisão constitucional, proposto pela comissão eventual da Assembleia Nacional, que ficaria assim redigida:

e) Tem direito ao subsídio que a lei eleitoral estabelecer e as precedências oficiais correspondentes a sua dignidade de representantes da Nação sobre as autoridades civis e militares, com excepção do Governo e seus representantes, e dos presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e da Câmara Corporativa.

Assembleia Nacional, 24 de Junho de 1971. - Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.

O Sr. Presidente: - Esclareço a Assembleia que a proposta do Sr. Deputado Agostinho Cardoso foi apresentada só com a sua assinatura porque durante a discussão na generalidade, como VV. Ex.ªs terão notado, a proposta do Sr. Deputado Agostinho Cardoso é um aditamento ao preconizado texto da alínea e). Portanto, de qualquer

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3 DE JULHO DE 1971 2385

maneira, só depois de votada a proposta dos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros é que poderá ser posta à votação a proposta do Sr. Deputado Agostinho Cardoso.

O Sr. Valadão dos Santos: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Valadão dos Santos: - Requeiro a contagem dos Srs. Deputados presentes.

O Sr. Presidente: - Vai-se proceder à chamada, para verificação do número de Srs. Deputados presentes.

Procedeu-se à chamada das Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Feita a chamada, verificou-se que estão presentes 66 Srs. Deputados.
Há, portanto, quórum para a Assembleia funcionar no período da ordem do dia.
Continuam em discussão as propostas de alteração e aditamento ao artigo 89.º

O Sr. Valadão dos Santos: - Peço uma interrupção para apresentar uma contraproposta à que está na Mesa.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia.
O Sr. Deputado Valadão dos Santos requereu uma suspensão da sessão, nos termos regimentais, para elaborar uma contraproposta.
Devido ao adiantado da hora, parece-me preferível encerrar a sessão, ficando pendentes de discussão Na próxima sessão poderá ser apresentada à consideração da Assembleia a contraproposta que o Sr. Deputado Valadão dos Santos tem nas suas intenções e, com certeza, nas de mais nove Srs. Deputados.
A próxima sessão será na terça-feira, à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação da discussão na especialidade e votação das alterações à Constituição Política.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alexandre José Linhares Furtado.
António Júlio dos Santos Almeida.
Augusto Domingues Correia.
Fernando David Laima.
Gustavo Neto Miranda.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Liebermeister Mendes Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
José Dias de Araújo Correia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Rui Pontífice Sousa.
Teófilo Lopes Frazão.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Francisco José Peneira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
João José Ferreira Forte.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José da Costa Oliveira.
José Guilherme de Melo e Castro.
José da Silva.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O REDACTOR - Luiz de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL

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