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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 119
ANO DE 1971 8 DE JULHO
X LEGISLATURA
(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)
SESSÃO N.º 119 DA ASSEMBLEIA NACIONAL
EM 7 DE JULHO
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto
Secretários: Exmo. Srs. João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 50 minutos.
Antes da ordem do dia.- Foi aprovado o n.º 116 do Diário das Sessões, com rectificações apresentadas pelos Srs. Deputados Roboreão e Silva, Alberto de Alar cão, Costa Ramos, Themudo Barata, Alberto de Meireles e Carvalho Conceição.
O Sr. Deputado Júlio Evangelista fez reparos ao teor de um aparte do Sr. Deputado Correia da Cunha a uma intervenção sua.
O Sr. Deputado Correia da Cunha lamentou o facto de a sua r intervenção antes da ordem do dia, inserta no n.º 117 do Diário das Sessões, não ter sido reproduzida pelo manuscrito que entregara.
Deu-se conta do expediente.
A Sr.ª Deputada D. Custódia Lopes referiu-se à maneiro como se estava processando a visita do Sr. Ministro do Ultramar ao Malawi.
O Sr. Deputado Roboredo e Silva, a propósito da visita do Sr. Presidente da República ao navio Roçadas, recentemente adquirido pela Empresa Insulana de Navegação, congratulou-se com a situação actual da nossa frota mercante.
O Sr. Deputado Cancella de Abreu solicitou um esclarecimento quanto ao sentido da intervenção do Sr. Deputado Correia da Cunha, no período antes da ordem do dia, inserta no n.º 127 do Diário das Sessões.
Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão na especialidade e votação das propostas de alterações à Constituição Política.
Intervieram no debate os Srs. Deputados Roboredo e Silva, Albino dos Reis, Ribeiro Veloso, Sá Viana Rebelo, Moura Ramos, Meneses Falcão, Barreto de Lara, Duarte do Amral, Casal-Ribeiro, Montanha Pinto, Silva Mendes, Neto Miranda, Alberto de Meireles, Almeida Coita, Ulisses Cortês, Júlio Evangelista, Camilo â e Mendonça, Pinto Castelo Branco, Amílcar de Magalhães - Custódia Lopes, Themudo Barata e Delfino Ribeiro.
Antes do encerramento da sessão, o Sr. Deputado Alberto de Meireles prestou homenagem ao trabalho levado a cabo pela Assembleia e pela comissão eventual para a revisão constitucional acabada de votar e à forma como o Sr. Presidente conduzira os trabalhos.
Foi concedido um voto de confiança à Comissão de Legislação e Redacção para a redacção definitiva do decreto da Assembleia relativo às alterações introduzidas na Constituição.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 40 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
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Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Finto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Lima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José Maria de Castro Salazar.
José da Silva.
José Vicente Cordeiro Malaito Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernfto Pereira Beija.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximaiano Isidoro Pio Fernandes
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadâo dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sindética Soares dos SantosTorres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 85 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 116 do Diário das Sessões.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Tenho algumas rectificações a fazer a uma das minhas intervenções, na sessão a que se refere o n.º 116 do Diário das Sessões. (Mas para não maçar V. Ex.ª nem a Assembleia, se V. Ex.ª autorizasse, eu passava o papel com as alterações aos serviços respectivos.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Roboredo e Silva: -Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Eu desejaria aditar exactamente algumas rectificações ao Diário das Sessões em referência, que entregarei na Mesa, se me permite.
Muito obrigado.
O Sr. Costa Ramos: - Sr. Presidente: Eu desejaria também introduzir algumas rectificações ao n.º 116 do Diário das Sessões, mas, como são muito extensas, pedia licença para as entregar na Mesa.
O Sr. Presidente: - Com certeza.
O Sr. Costa Ramos: - Muito obrigado.
O Sr. Themudo Barata: - Sr. Presidente: Eu peço a V. Ex.ª para mandar fazer as seguintes rectificações: na p. 2361, col. 1.º, 1. 14, onde se lê: «proposta n.º 7/X», deve ler-se: «projecto n.º 7/X»; e na 1. 19, substituir, a partir da última palavra, pela seguinte expressão: «aquela que seria bem humana de ver inseridos os seus nomes nesta proposta». As palavras são as mesmas, aproximadamente, mas há uma diferença de redacção. (Muito obrigado.
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Como habitualmente, não revi o texto extraído da gravação da minha intervenção na sessão de 1 de Julho.
Dispensar-me-ia de quaisquer rectificações se tivesse sido aposta a anotação de que «o orador não reviu», como deveria fazer-se sempre que não é fornecido texto escrito e não foi facultada a revisão ao autor da intervenção.
Mas, já que assim não sucedeu e encontro no texto algumas imperfeições, até gramaticais, comprometedoras, requeiro que fiquem no Diário das Sessões as seguintes rectificações: na p. 2339, 1. 14, onde se lê: «Registo», deve ler-se: «Registo-o»; na 1. 119, onde se lê: «e que corresponde às validades do conteúdo do articulado», deve ler-se: «e que corresponde à realidade do conteúdo do articulado»; na 1. 41, onde se lê: «É certo que ele está enunciado ...º, deve ler-se: «E certo que ela está enunciada ...; na 1. 58, onde se lê: «§ 3.º», deve ler-se: «Parágrafo 3.º»; na 1. 63, leia-se: «pois deveria estar em § único ao artigo 45.º ...º; na p. -2360, 1. 11, leia-se: «e esses parecem-me graves.; na 1. 21, onde se ía: «Protegê-los, sim!», deve ler-se: «Protegê-los?»; na 1. 22, leia-
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-se: «Este é um conceito ...º; na 1. dl, leia-se: «chamar a atenção da Câmara para o problema.; na 1. 37, leia-se: «daquelas que segundo Chesterton ; na 1. 48, leia-se: «será motivo de verrina desnecessária».
O Sr. Carvalho Conceição: - Sr. Presidente: Peço o favor de mandar proceder às seguintes rectificações: na p. 2355, col. 1.º, 1. 46, onde se lê: «artigo 3.º», deve ler-se: «artigo 33.º»; na mesma página, col. 2.ª, 1. 5, deve ler-se: «a desaparição, no § 1.º, da referência ao ensino no lar doméstico».
Muito obrigado.
O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Peco muita desculpa a V. Ex.ª da forma um tanto improvisada como requeiro as rectificações ao n.º 116 do Diário das Sessões, mas o facto é que não tenho assistido, como V. Ex.ª sabe, nos últimos dias aos trabalhos parlamentares e não tive oportunidade de requerer rectificações que eventualmente teria de fazer aos Diários das Sessões anteriores.
Pela simples leitura que agora acabo de fazer a este Diário das Sessões, verifico, Sr. Presidente, que, na p. 2340, col. 2.ª, aparece um aparte do Sr. Deputado Correia da Cunha, que, efectivamente, eu não vi registado no Diário no dia em que fiz a revisão das provas desta intervenção, e, até pela (maneira como não se enquadra no texto, se me torna demasiado insólito.
V. Ex.ª verá que há um «não apoiado» do Sr. Deputado Mota Amaral e há depois um aparte do Sr. Deputado Correia da Cunha que diz: «A que título fala V. Ex.ª em nome da Assembleia?», quando é certo que não tem nenhuma relação com as palavras que eu acabava de dizer, nem eu as tinha visto no texto que revi.
Há uma total falta de lógica no aparte do Sr. Deputado Correia da Cunha, não me lembro dele, não lhe respondi e não tem sentido nenhum no enquadramento do texto.
Peço a V. Ex.ª muita desculpa do improvisado desta minha reclamação, pois acabo de ler o Diário das Sessões.
Portanto, não há necessidade de rectificação, há apenas a minha estranheza e a minha declaração de que não ouvi o aparte e de que não tem relação absolutamente nenhuma, nem lógica, em relação às palavras que eu proferi.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª está, portanto, a reclamar da atribuição, pelo Diário, de palavras de outro Sr. Deputado?
O Sr. Júlio Evangelista: - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Eu suponho, com todo o respeito e consideração, que não é costume nós reclamarmos das palavras dos outros.
O Sr. Júlio Evangelista: - Não. Eu peço desculpa a V. Ex.ª, mas quando as palavras dos outros têm a ver com as que nós dissemos ...
O Sr. Presidente: - Continua em reclamação o n.º 116 do Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Como mais nenhum de VV. Ex.ªs tem qualquer reclamação a apresentar, considero o n.º 116 do Diário das Sessões aprovado.
O Sr. Correia da Cunha: - Peço autorização a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para me referir, não ao n.º 116 do Diário das Sessões, mas ao n.º 117. Esse diário transcreve a minha intervenção de sexta-feira passada, e verifico, ao lê-lo, que não foi cumprido o pedido que fiz de serem anuladas as duas últimas palavras desse texto. Ontem afirmei nesta Câmara que tinha realmente satisfeito o pedido de V. Ex.ª no sentido de corrigir o que poderia parecer mais atentatório da dignidade dos Exmos. Colegas, e fiquei surpreendido ao verificar que isso não tinha sido cumprido. Segundo me dizem, o manuscrito que entreguei foi substituído pela bobina gravada, e isso justifica, talvez, além da minha precipitação de momento, a não correcção.
Não tive o cuidado também de ir à Imprensa Nacional da parte da manhã. Lamento-o, nesta altura. Para não deixar arrastar este desagradável incidente, solicito a V. Ex.ª que me permita esta explicação para a Câmara, solicitando ainda a benevolência e a compreensão dos colegas que porventura se tenham sentido chocados com frases que não tinham a intenção de atingir aquele objectivo que porventura alguns, precipitadamente, justificada ou injustificadamente, não interessa agora, terão interpretado.
Era isto apenas, Sr. Presidente. Fico-lhe muito grato pela oportunidade que me deu para rectificar uma intenção que não tive na realidade.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Correia da Cunha: compreendo que V. Ex.ª tenha agora querido fazer essa explicação, e espero que a Câmara a aceite, tendo em consideração os seus termos e até a urbanidade com que foi apresentada.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegramas
De várias individualidades, da Câmara e da Acção Nacional Popular da Boa Vista (Cabo Verde), de apoio à intervenção do Sr. Deputado Bento Levy no debate da revisão constitucional.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada D. Custódia Lopes.
A Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente: A convite do Governo do Malawi, está de visita a este país, vizinho da província de Moçambique, o Ministro do Ultramar, Prof. Silva Cunha, que, em representação oficial, assistiu às comemorações do aniversário daquela República, no prosseguimento da política de boa vizinhança e colaboração que Portugal tem procurado manter com os países vizinhos, tanto na Europa como em África.
O próprio Ministro português, falando para a rádio do Malawi, declarou que, durante a sua permanência naquele país, trocaria impressões com membros do Governo do Malawi sobre problemas de interesse comum para os dois países, no prosseguimento de outros contactos havidos, dentro da política de boa vizinhança e de leal cooperação que sempre temos praticado.
Pelas notícias que nos têm chegado através da imprensa, sabemos da maneira extremamente relevante e acolhedora com que o ilustre membro do Governo Português tem sido recebido.
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Teve o Presidente da República do Malawi, Dr. Kamuzu Banda, palavras de simpatia para com o nosso país, não hesitando, na abertura da nova sessão legislativa do Parlamento e na presença do Ministro português, em reafirmar as relações de amizade que tem mantido e continuará a manter com Portugal e outros territórios vizinhos, apesar do desacordo das nações africanas, que não aceitam a política de paz e entendimento e preferem a guerra e a subversão.
Embora estes factos sejam do conhecimento público, não quis deixar de os salientar, nesta Assembleia, pondo em relevo a atitude firme, esclarecida e realista do ilustre Presidente da República do Malawi, na prossecução da única política que serve, verdadeiramente, os interesses e o bem-estar dos povos de África.
Vozes: - Muito bem!
A Oradora: - Em curto espaço de tempo, doas ilustreis membros do Governo Português, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Rui Patrício, e o Ministro do Ultramar, Prof. Silva Cunha, depois de terem estado, mais uma vez, mas províncias de Angola e de Moçambique, visitaram, respectivamente, a lírica do Sul e o Malawi, encontrando-se também, neste momento, no nosso país um Ministro da Suazilândia, o que é prova evidente de que estamos sempre dispostos a dialogar e a colaborar com os países vizinhos.
Vozes: - Muito bem!
A Oradora: - A este propósito, disse o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Rui Patrício, na sua recente visita à República da África do Sul: «O objectivo de Portugal é colaborar com todos os seus vizinhos, mesmo com aqueles com quem não mantém relações diplomáticas ou que mão estão de acordo com a nossa política. Como exemplo, citou o acto de os caminhos de ferro portugueses serem utilizados por esses vizinhos.
Afirmou ainda o ilustre Ministro, em entrevista concedida ao Diário de Luanda, que «baseamos a nossa política em África ma colaboração económica, e, outra, em relações de boa vizinhança e aceitando a política própria de cada país».
E acrescentou acerca do tão discutido diálogo com os países Africanas:
Há muito tempo que preconizamos esse diálogo, reconhecendo que no munido contemporâneo só em paz podem coexistir regimes diferentes.
Sr. Presidente: Eu penso que alguns países africanos estão agora a compreender a vantagem das relações mútuas e é com satisfação que noto que há vezes que se erguem nesse sentido em África, o que, alguns mais atiras, não era possível.
Agora, porém, vê-se que as realidades se impõem, realidades essas que eram propositadamente ignoradas ou mesmo negadas por centos extremistas que procuravam dominar a cena política africana.
Entretanto, nos territórios portugueses de África temos demonstrado que o dialogo é possível, na colaboração e cooperação que oferecemos aos países vizinhos, com estrito respeito pelas suas políticas internas, com o que muito tem beneficiado as diferentes populações.
Vozes: - Muito bem!
A Oradora: - Observadoras imparciais estrangeiros, que ultimamente tem visitado os territórios do ultramar português, têm testemunhado os êxitos que nos campas social e económico vimos conseguindo, apesar das dificuldades que nos tem sido impostas, o que nos permite encanar o futuro com optimismo.
Está nas nossas mãos construir esse futuro com determinação e confiança, e o tempo, que é mestre da vida. virá, decerto, em nosso favor.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
A oradora foi cumprimentada.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Apraz-me usar da palavra porque vou elogiar com justiça. Não sou normalmente muito dado a incensar, até porque penso que o cumprimento do dever é obrigação geral e assim quem o cumpre não faz mais do que ser honesto nos seus procedimentos e ter recta consciência.
Todavia, e como nas tomadas de contas relativas a 1968 e a 1969 fiz algumas considerações a respeito da nossa marinha mercante, que em relação às contas de 1968 foram até pouco agradáveis, criticando a mediocridade da nossa marinha de comércio além de outras deficiências e consequentes prejuízos para a economia nacional e ligações com o ultramar neste país marítimo por excelência, não poderia nem devia ficar agora calado.
Certamente todos VV. Ex.ªs tomaram conhecimento de que anteontem, dia 5, teve lugar a visita do Sr. Presidente da República ao Roçadas, novo navio de carga geral de 16 700 t, recentemente adquirido pela Empresa Insulana de Navegação.
O Sr. Ministro da Marinha aproveitou a oportunidade para fazer o ponto da situação actual da nossa frota mercante, indicando que nos últimos três anos foram adquiridos 21 navios de vários tipos e características, desde navios de carga geral, a carga a granel, transporte de vinho a granel, frigoríficos, petroleiros e butaneiros, num total de 330 000 t.
Frisou no mesmo discurso que no ano corrente o Chefe do Estado visitara já quatro navios integrados na marinha de comércio.
Afirmou ainda o Ministro da Marinha que presentemente se encontram em construção em estaleiros estrangeiros nove unidades: três petroleiros para a Soponata, dois navios de carga a granel para a Sofornar, dois de carga geral para a Sociedade Geral e dois frigoríficos para a Transfruta, num total de quase meio milhão de toneladas.
Os navios adquiridos e encomendados, nos últimos três anos, representam um investimento da ordem de cinco milhões de contos, o que para a modéstia da nossa economia é digno de relevo.
O Sr. Alberto de Alarcão: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Com certeza.
O Sr. Alberto de Alarcão: - Eu apenas desejaria solidarizar-me com V. Ex.ª no que respeita exactamente à expansão e modernização da nossa frota mercante.
Muito obrigado.
O Orador: - Muito obrigado sou eu, Sr. Deputado.
Deduz-se dias considerações do Ministro que há planos dos armadores para futuras aquisições e que só a Soponata, como já foi revelado, prevê a construção de seis navios
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petroleiros de 250 000 t cada um, dos quais dois deverão ser entregues antes de a refinaria do sul arrancar com a laboração. Só esta companhia, com os navios em construção e planeados, atingirá 2 milhões de toneladas de navios novos!
Esta viragem espectacular - recordo-me que quando apreciei as contas de 1968 pedia para breve 1 milhão e 500 mil toneladas e que na década de 1970 teríamos de ultrapassar os 2 milhões - representa um enorme esforço do armamento, ao qual rendo justo tributo, e uma visão do Governo que se vem fazendo sentir nas várias actividades fundamentais da Nação, desenvolvendo um dinamismo e novos métodos de governar, de acção e de decisão que não desejaria deixar de assinalar e louvar.
Ultrapassaremos acentuadamente no ano em curso o milhão de toneladas e caminhamos em acelerado para os 2 milhões e não pararemos mais. Estaremos lançados no trafego internacional, fonte de divisas da maior importância, e satisfaremos as necessidades do tráfego interterritorial, que tantas preocupações nos tem dado.
Está o País de parabéns e não seria correcto deixar de neste momento, lembrar o nome do Sr. Presidente da República, que, mais do que todos nós, estará satisfeito pela alta compreensão e decisões que oportunamente tomou quando era Ministro da Marimba, conseguindo tirar a marinha de comércio do quase zero e que foi reduzida no fim da última Grande Guerra para efectivos que na altura foram orgulho de todos os portugueses.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Um grande passo foi dado no sentido de sairmos da tal mediocridade a que me referi, neste particular, e oxalá que todas as medidas complementares, desde o agrupamento das companhias para assumirem proporções compatíveis com as exigências de empresas modernos de navegação à preparação de pessoal de mar e revisão dos seus problemas salariais até ao apetrechamento e expansão de pontos comerciais e política de fretes, tomem o ritmo que corresponde ao crescimento da frota de comércio.
Termino, afirmando, como português e oficial da Marinha, que embandeiro em circo com estas realidades de que nos deu conhecimento o Sr. Ministro da Marinha, a quem e ao Governo de que faz parte, que o apoiou em tão ingente tarefa, rendo calorosa homenagem.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
O Sr. Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: Perderam oportunidade as considerações que desejava fazer acerca da parte final da intervenção que o Sr. Deputado Correia da Cunha teve nesta Assembleia no passado dia 2. E perderam a oportunidade porque este Sr. Deputado, numa atitude que só o dignifica, rectificou parte das palavras que então havia proferido. Ao cumprimentar o Sr. Deputado Correia da Cunha por essa atitude, desejava pedir-lhe um esclarecimento.
O Sr. Deputado Correia da Cunha afirmou que nem ele nem o grupo dos seus amigos havia mudado de ideias, que são como eram e que continuarão a ser como têm sido. E considerou isso uma atitude singular. Hoje, e muito bem, retirou as palavras «nesta Câmara».
Eu pretendia lembrar que existem por todo o País dezenas, mesmo centenas, de milhares de portugueses que, politicamente, continuam a ser como eram e que serão como são até Deus lhes permitir. Quero crer que no espírito do Sr. Deputado Correia da Cunha não se deseja retirar a esses muitos milhares de portugueses a singularidade de atitudes a que se referiu.
A não ser assim, e quero crer que o é, não poderia deixar de significar o meu repúdio para esse exclusivo de singularidade de manutenção de ideais políticos, que é apanágio de tantos e não apenas de alguns.
Era só este esclarecimento que eu agradecia receber.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à
Ordem do dia
Continuação da discussão na especialidade e votação das propostas de alterações à Constituição Política.
Vem agora, e pela ordem das propostas pendentes na Mesa, o artigo 121.º, em relação ao qual há uma proposta de alterações, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
TITULO V
Artigo 121.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 121.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 121.º As audiências dos tribunais são públicas, excepto nos casos especiais indicados na lei e sempre que a publicidade for contrária ao interesse e ordem públicos ou aos bons costumes.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Coita - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves- Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra para a discussão desta proposta, passamos à votação.
Submetida à votação foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Passemos agora ao artigo 123.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 123.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 123.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 123.º Nos efeitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto nesta Constituição ou ofendam os princípios nela consignados, cabendo-lhes, para o efeito, apreciar a existência da inconstitucionalidade, salvo se o seu conhecimento for da competência exclusiva da Assembleia Nacional, nos termos do § 2.º deste artigo.
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§ 1.º A lei poderá concentrar em algum ou alguns tribunais a competência para a apreciação da inconstitucionalidade referida no corpo do artigo e conferir às decisões desses tribunais força obrigatória geral.
§ 2.º A inconstitucionalidade orgânica ou formal da regra de direito constante de diplomas promulgados pelo Presidente da República ou de normas constantes de tratados ou outros actos internacionais só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e por sua iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assembleia os efeitos da inconstitucionalidade, sem ofensa, porém, das situações criadas pelos casos julgados.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotia Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Crua de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: É apenas para pedir a atenção - suponho que a nossa Comissão de Legislação e Redacção daria conta - que no princípio do artigo 123.º não é «Nos efeitos ...», conforme ouvi ler e está escrito na proposta da comissão eventual, mas sim «Nos feitos submetidos a julgamento ...»
O Sr. Albino dos Reis: - É na realidade «Nos feitos ...», isto é, nos autos, nos processos, nos casos.
O Orador: - É claro. É capaz de ser gralha, mas como vejo aqui no texto apresentado pela comissão e ouvi na leitura que foi feita «Nos efeitos ...», chamo a atenção para que não passe despercebido.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Efectivamente, a redacção actual da Constituição tem «feitos» e não «efeitos». Creio que a nossa Comissão de Legislação e Redacção poderá examinar e apurar o ponto.
Continua em discussão a proposta de alterações ao artigo 123.º
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre ela, pô-la-ei à votação.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Segue-se uma proposta de alterações ao artigo 133.º, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de alteração e aditamento
TITULO VII
Artigo 133.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 133.º da Constituição Política passe a ter nova redacção, sendo-lhe aditado um § único, redigido da forma seguinte:
Art. 133.º Os territórios da Nação Portuguesa situados fora da Europa constituem províncias ultramarinas, as quais terão estatutos próprios, como regiões autónomas, podendo ser designadas por Estados, de acordo com a tradição nacional, quando o progresso do seu meio social e a complexidade da sua administração justifiquem essa qualificação honorífica.
§ único. A lei que fixar o regime geral de governo das províncias ultramarinas e estabelecer em conformidade, o respectivo estatuto deverá prever a possibilidade de serem criados serviços públicos nacionais integrados na organização de todo o território português.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior - José Coelho de Almeida Cotta - José Gonçalves de Proença - João Duarte de Oliveira - António Vadre Castelino e Alvim - João Manuel Alves - Manuel Cotta Agostinho Dias - Bento Benoliel Levy - Albano Vaz Pinto Alves - Júlio Alberto Evangelista - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Manuel Monteiro Ribeiro Veloso - José Maria de Castro Salazar - Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Ribeiro Veloso: - Sr. Presidente: O texto do artigo 133.º, que acabou de ser lido, é total e completamente diferente do que consta da Constituição vigente.
Esta alteração, quanto a mim, é perfeitamente aceitável, justificável e absolutamente necessária.
O artigo 133.º, tal como está redigido na Constituição vigente, fala na «função histórica de colonizar as terras dos Descobrimentos sob a sua soberania e de comunicar e difundir ...
Ora tudo isto, embora seja verdade, está ultrapassado e, consequentemente, foi muito oportuna a alteração que o Governo propôs no texto da proposta de lei.
Queria ainda frisar que o Governo deu uma prova de abertura, que considero notável e de registar aqui, pela circunstância de aceitar que se juntasse ao texto do artigo 133.º, tal como propôs, o § único que prevê a possibilidade de serem criados serviços públicos nacionais, integrados na organização de todo o território português.
Acho que, tal como está redigido o artigo 133.º e o seu § único, corresponde exactamente àquilo que nós, no todo ou em grande parte, os de Moçambique, desejaríamos.
Por isso dou-lhe a minha aprovação total na especialidade.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Sá Viana Rebelo: - Pela primeira vez, a meu ver, a Constituição Portuguesa dá possibilidades aos nossos territórios da África, cujo progresso do seu meio social e a complexidade da sua administração o justifiquem, de serem honrados com a designação de Estados.
Angola, pelo seu potencial agrícola, comercial e industrial e pela realidade que constitui, julga-se à beira de tal qualificação se for aprovado este artigo 133.º do título VII, e portanto natural é a expectativa que ali se vive, cujos ecos me chegam de todos os pontos e julgo meu dever trazer a esta Assembleia.
Aguarda-se essa aprovação e destaca-se a justiça da proposta.
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Mas não se pense ou depreenda que tal deliberação, conducente a euforia gritante entre as gentes de Angola, a leve ao desejo imediato e pressuroso de que lhe seja dada a designação de Estado.
Há que aceitar como natural a expectativa e a satisfação; porém, estou convencido de que Angola aguarda calma e consciente, reconhecendo que só ao Governo compete escolher o momento oportuno para lhe ser conferida a honra tão desejada.
As precipitações podem ser perigosas pelas especulações que por vezes se criam, pelos mal-entendidos que inopinadamente surgem e compete ao Governo evitá-los.
Assim, Angola está convicta de que espera confiante o resultado da votação, mas acatará a oportunidade de ser Estado quando ela for mais conveniente e o Governo indicar.
Posto isto, dou a minha concordância e inteiro apoio à proposta de alteração e aditamento respeitante a este artigo 133.º agora em discussão.
O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: Apenas umas breves palavras.
Durante a discussão na generalidade da proposta de lei n.º 14/X, tive a ocasião de com toda a lealdade, sem rodeios nem ambiguidades, dizer à Câmara aquilo que pensava quanto à revisão constitucional e, mais concretamente, quanto às «profundas transformações introduzidas nos preceitos constitucionais relativos ao ultramar».
Quis V. Ex.ª, Sr. Presidente, ter a oportunidade de salientar - o que foi, aliás, patente - que esteve então bem marcado não ter eu tido a concordância unânime da Assembleia, o que para mim não constituiu surpresa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: E preciso V. Ex.ª fazer o favor de notar que, se eu entendi dever marcar que não havia, naquele momento, uma concordância unânime à volta das palavras de V. Ex.ª, foi única e exclusivamente para justificar a recomendação que fiz a um outro Sr. Deputado, que parecia disposto a interromper V. Ex.ª para marcar mais a sua discordância, de que já não era indispensável ele estar a roubar o tempo que era evidentemente bastante reduzido para V. Ex.ª Nunca me permitiria eu próprio tirar conclusões destacadas ou autónomas sobre o acolhimento que as palavras de qualquer Sr. Deputado tivessem a receber da Assembleia. Simplesmente, numa circunstância em que parecia que havia quem quisesse interromper V. Ex.ª para discordar, em que parecia que V. Ex.ª não tinha diante de si demasiado tempo para concluir as suas considerações, em que, portanto, era necessário pedir a outros Srs. Deputados que não interrompessem V. Ex.ª, pareceu-me, de certo modo, para justificar o pedido de silêncio que fazia a esses Srs. Deputados, que poderia fazer aquele comentário, que, infelizmente, nalgumas interpretações, apareceu como uma intervenção do Presidente no debate, o que nunca o Presidente se permitiria, e espera que a Providência lhe permita que nunca o faça, pois considera isso grave falta aos seus deveres.
Dada esta explicação, não foi com esse sentido que eu fiz o comentário, não era de modo nenhum uma intervenção ou uma avaliação das palavras de V. Ex.ª, era apenas uma avaliação da oportunidade e da necessidade de interromper mais V. Ex.ª
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu quis apenas referir que, efectivamente, eu não tinha tido a concordância da Câmara. Nada mais.
Não obstante isso, desejo agora apenas reafirmar, logicamente e coerente com as considerações então produzidas, que, sob pena de me negar e aos princípios muito sincera e convictamente aqui defendidos, não poderei votar as disposições contidas no título VII do texto da proposta governamental e relativas ao ultramar, por se me afigurar que, apagando-se a designação e serviço do desígnio nacional, deixará de indicar-se cada vez mais - como importava fazer - a Pátria no ultramar, travando deste modo o caminho para a integração numa só nação.
Como então salientei, os princípios que defendi em nada prejudicam, antes supõem, a mais ampla descentralização administrativa dentro da unidade política.
Tenho dito.
O Sr. Meneses Falcão: - Só duas palavras para concretizar uma ideia já expressa quando da discussão na generalidade.
Quem teve oportunidade de auscultar de perto a ansiedade que se vive no ultramar nesta hora encontra possibilidades de extremas posições no campo da consciência até ao ponto de aceitar a boa fé do texto proposto pela comissão eventual, na linha de pensamento que foi enunciada e oportunamente explicitada na proposta do Governo.
Fiel ao princípio individual da integração e considerando as províncias ultramarinas tão ligadas à Mãe-Pátria como os membros ao tronco, não me repugna aceitar os propósitos de estruturação no sentido da conveniente, por funcional e lógica, autonomia administrativa, nem a eventual qualificação honorífica de Estados, certo de que tal distinção será defendida de possíveis especulações oportunistas.
O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Gostei muito de ouvir o Sr. Deputado Moura Ramos proferir aqui as palavras que proferiu, dizendo que se havia expressado sem rodeios nem ambiguidades. Com todo o respeito que me merece S. Exa., e não é de S. Ex.ª que vem a crítica, até porque já tivemos ocasião de trocar palavras sobre o assunto, desejo realçar que várias cartas que tenho recebido me acusam, exactamente, de ter exercido práticas parlamentares inadequadas, anquilosadas, obstruindo o Sr. Deputado de ter usado livremente da sua palavra e do seu poder de expressão nesta Câmara.
Muito obrigado, Sr. Deputado, por V. Ex.ª me ter feito a justiça de pensar e de dizer que eu não usara tácticas parlamentares antiquadas, até por uma razão muito óbvia, que S. Ex.ª não disse, mas diria eu: tenho 45 anos e, portanto, não conheço as tácticas parlamentares que usavam pana além ... O que eu sei, é que S. Exa., com o poder liberalístico que quis fazer o favor e a gentileza de me conceder, permitiu que eu o interpelasse várias vezes. Devo-lhe essa atenção, e aqui lhe agradeço muito reconhecidamente.
E aos maus intérpretes desta comunicabilidade, e aos maus intérpretes desta lhaneza de trato, pois eu os entrego à sua consciência para que se revejam a si próprios, para que se olhem aos espelhos pela manhã e para que se envergonhem pelo aviltamento feito à luz do que se passou exactamente nesta Casa.
Muito obrigado, Sr. Deputado.
Disse o Sr. Deputado Moura Ramos que as modificações que o Governo propõe à Constituição Política operam uma profunda transformação do regime político vigente. Ora, eu não creio assim! Porque a palavra «Estados» já aparece nas nossas constituições políticas de há longa data.
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Socorrer-me-ei, nesta parte, de um livro, escrito pelo general Norton de Matos, que foi prefaciado pelo Prof. Egas Moniz e pelo Prof. Barbosa de Magalhães, o qual concorreu ao Prémio Abílio Lopes do Rego.
Acontece que a Academia das Ciências entendeu nesse ano não ser justo atribuir esse prémio ... e ficou assim o prémio desocupado, quando essa obra notável do general Norton de Matos, que se chama A Nação Una, tem sido o leitmotiv de tantas evocações nesta Câmara, de tantos matizes e de indivíduos que até professam políticas inteiramente divergentes e tem sido, realmente, o denominador comum para justificar teorias e opiniões, donde eu concluo que a Academia das Ciências nesse ano cometeu um profundíssimo e tremendíssimo erro!
Felizmente, eu não sou cientista. Graças a Deus, não sou.
Mas Norton de Matos, nesse livro, diria a certa altura:
... As regiões que Portugal descobriu, conquistou e que, de qualquer maneira, outro ocupou na África e noutras partes do Mundo foram sempre consideradas pelos Portugueses como um aumento e uma prolongação do território nacional.
Deram-se a estas regiões o nome de «Descobertas», «Províncias» e até de «Estados», mas nunca, nos tempos passados, o de «Colónias».
Os novos países do ultramar formaram, à medida em que se iam ocupando, novas províncias portuguesas; o mesmo aconteceu há séculos [continua Norton de Matos a dizer], com territórios ibéricos, sendo, assim, que o Algarve, situado no extremo sul de Portugal, passou a ser província portuguesa, depois de conquistada aos Muçulmanos ...
Disse eu, outro dia, na intervenção que o Sr. Deputado Moura Ramos me consentiu, que teve a amabilidade e o obséquio de me consentir, repito, que ao termo «colónia» só foram atribuídos foros legislativos depois do 28 de Maio.
Quero declarar a VV Exas. que eu estava errado. Não é verdade. Foi uma pequena deficiência minha, de memória, já que um capítulo da Constituição Política de 1911 se referia «Das colónias», mas também quero sublinhar que foi nassa altura que surgiu o regime de altos-comissários, e nunca neste país houve maior descentralização administrativa que no regime dos altos-comissários, dos quais foi realmente distinto e brilhante exactamente o general Norton de Matos.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª dá-me licença?
Não lhe parece que com os comissários-régios, como Mouzinho de Albuquerque, já estivesse estabelecido regime equivalente ao que cita?
O Orador: - Sr. Deputado Duarte do Amaral: Eu. como republicano convicto, direi a V. Ex.ª, perante a observação que teve a fineza de me fazer, que efectivamente no tempo da monarquia se reconhecia essa descentralização declaramente límpida. Nunca houve quaisquer espécies de duvidas. Na carta orgânica de Vieira de Castro já se chamavam, por exemplo, os Estados de Angola, de Benguela e de Cabinda. Angola era composta pelo Estado de Benguela e pelo Estado de Cabinda. Nunca isso serviu para desprestigiar, nunca isso serviu para nada, nem para se afectar a unidade da Nação. A monarquia acentuou-o muito bem, e, se desvirtuamento houve, foi exactamente em regime de república.
O &r. Duarte do Amaral: - Foi uma má moda, mais nada.
O Orador: - Por isso mesmo, eu acrescentaria que em documento anexo ao regimento do Conselho Ultramarino, datado de 1604, aparece a designação de Estados e na primeira carta orgânica do ultramar português de Vieira, datada de 7 de Dezembro de 1836. se diz textualmente que os domínios africanos formarão três governos gerais e um particular, a saber:
1.º O de Cabo Verde, o qual se comporá do arquipélago deste nome e dos pontos situados na costa da Guiné e suas dependências;
2.º O de Angola, que se comporá do reino deste nome e de Benguela e todas as partes da África austral a que tem direito a coroa portuguesa.
No seu artigo 2.º diz textualmente o seguinte:
Os domínios asiáticos formarão outro governo-geral com a denominação de Estado da Índia.
Repare V. Ex.ª que esta designação «Estado da Índia» nunca foi retirada do nosso texto constitucional, ainda hoje lá existe.
No regimento do Conselho Ultramarino, datado de 1642, delimitava-se e definia-se a sua competência do seguinte modo:
Para todas as matérias e negócios de qualquer qualidade que fossem tocantes aos ditos Estados da índia, Brasil, Guiné e ilhas de S. Tomé e Cabo Verde e todas as demais partes ultramarinas e lugares de África.
Não valerá a pena referir mais documentos, nem acentuar mais circunstâncias para se significar que a designação de Estados a dar àqueles territórios ...
O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Duarte do Amaral: - Era para dizer o seguinte: eu fui criado na escola, no liceu e num meio de gente que vivia profundamente os problemas do ultramar, com a ideia generalizada e por todos aceite de que se chamava Estado da Índia às regiões que nos foram roubadas pela União Indiana precisamente porque esse Estado tinha sobre as outras regiões ultramarinas de Portugal - e essas pessoas no meio de quem eu vivia bem condenavam que se lhes chamassem colónias - uma posição mais adiantada de civilização. Por consequência, devo dizer aqui, com a honestidade que caracteriza sempre as minhas actuações, que não percebo muito bem, como já disse em relação ao problema geral do ultramar, a impressão que faz a certas pessoas, aliás das mais distintas, a proposta do Governo sobre a designação de Estados.
V. Ex.ª trouxe elementos históricos, mas nós, todos os da minha idade, que já não é pouca, fomos criados a ouvir dizer e ver classificado o Estado da Índia desta forma, precisamente porque era de todo o nosso ultramar aquele que estava em período mais adiantado de civilização.
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Dado o enorme esforço dos portugueses daqui e de além-mar para fazer subir a categoria de Angola e de Moçambique, por exemplo, sobre todos os aspectos, não estranho absolutamente nada que a Angola e a Moçambique seja dado o nome de Estados.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado, pela ilustração que V. Ex.ª quis trazer às minhas despretensiosas e modestas palavras.
Exactamente, ao Estado da Índia foi-lhe dada a designação de Estado pelo seu estádio de desenvolvimento, o que implica implicitamente que a Angola e Moçambique ou à Guiné ou a S. Tomé, quando atingirem esse estádio de desenvolvimento, também se lhes esteja a atribuir essa designação, o que significa, em última análise, que nós estamos a prever o desenvolvimento destas províncias ultramarinas, e isso não significa de modo algum um desagregamento da unidade nacional.
O Sr. Duarte do Amaral: - Nós não temos a Índia ocupada pelo facto de há muito tempo se chamar Estado, mas apenas pelo poder imperialista da União Indiana.
O Orador: - Eu ia dizer exactamente isso.
Nós não perdemos a Índia pela circunstância de se chamar Estado, mas pela força bruta. De tal forma que os verdadeiros goeses, aqueles indivíduos que sentem no seu sangue a mística nacional, como eu a sinto, continuam a considerar-se portugueses espoliados do seu território pátrio e da sua nacionalidade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Pouco mais resta acrescentar, a não ser que não valerá a pena referir mais documentos, nem acentuar mais circunstâncias para significar que a designação de Estado a dar àqueles territórios onde o progresso do seu meio social e a complexidade da sua administração venham a justificar tal qualificação honorífica, conforme a proposta de revisão constitucional, não constitui qualquer inovação, pois é exactamente, como na mesma se diz, a senda da tradição nacional e até a que traduz com autenticidade o rumo histórico da Nação.
Numa hora em que em todo o mundo e em toda a parte se proclama pela revolução da autenticidade e se reconhece que o rumo apontado pelo vento da história se desviou da sua essência por designações e processamentos menos felizes, só pode merecer o mais caloroso aplauso a adesão do Governo a essa revolução, a da autenticidade, e que afinal mais não é que o retorno à essência da Nação, que de tão antiga se perde no tempo, mas jamais na memória dos homens. For isso eu dou o meu apoio à proposta do Governo, sem embargo de dizer que todas as minhas convicções e toda a minha formação política se encaminham no sentido da formação da Nação, exactamente aquela que Norton de Matos preconizou. Norton de Matos, que tão caluniado foi e tão desvirtuado foi, em certa altura, neste país, mas que realmente traçou então com a sua prática, com os seus conhecimentos, com a sua ilustração, qual era o verdadeiro desígnio da Nação Portuguesa.
Tenho dito.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Sr. Presidente: Apenas duas palavras:
1.º Para afirmar nesta Câmara, como simples desabafo, quanto hoje, particularmente, me sinto só.
O Sr. Meneses Falcão: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça o favor.
O Sr. Meneses Falcão: - Era só para dar conta a V. Ex.ª de uma posição ligeiramente discordante em relação à afirmação que acaba de fazer.
Precisamente pelas razões que levaram V. Ex.ª a declarar-se só, neste momento, eu quero afirmar-lhe, por força dessas mesmas razões, que V. Ex.ª não está só e também quero afirmar-lhe que estou convencido de que eu também não estou só na posição que acabo de tomar.
O Orador: - Registo as palavras de V. Ex.ª, que agradeço.
2.º Para confirmar as reticências por mim postas quando da discussão na generalidade dos artigos 133.º e seguintes do parecer da comissão eventual, texto adoptado pelo Governo. Tal como então admiti, discordo da sua redacção, lamentando não ter sido possível encontrar-se outra para os artigos em referência. Faço-o em plena consciência e profundamente penalizado.
O Sr. Montanha Pinto: - Sr. Presidente: Apenas uma palavra muito breve para, em nome de Angola, província que aqui represento, dizer a V. Ex.ª e à Assembleia que Angola pede e espera tratamento adequado, expresso em actos, que não sòmente em palavras.
Muito obrigado a V. Ex.ª
O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente: Presente ainda na minha memória e profundamente gravado no meu coração tudo o que me foi dado observar quando, com um grupo de colegas desta Assembleia, visitei algumas parcelas de Portugal em África, dou a minha inteira concordância ao artigo em debate, pois ele coaduna-se inteiramente com a intervenção que, em devida altura, fiz nesta Casa.
Os portugueses que ali vivem merecem em tudo e por tudo a nossa inteira confiança e são merecedores da nossa ajuda no sentido de, legislando, lhes facilitar aquilo que mais desejam - possibilidades e facilidades para um intenso trabalho de valorização daqueles territórios, sem peias burocráticas que os asfixiem.
Facilitar a vida dos que ali labutam não afecta em nada a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado, que não está, nem pode estar nunca, em causa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Neto de Miranda: - Sr. Presidente: Pôs V. Ex.ª à consideração da Câmara o artigo 133.º da proposta do Governo, na redacção que lhe foi dada pela comissão eventual.
Dentro da economia político-jurídica dessa proposta, e se V. Ex.ª mo permite, eu pediria licença para fazer uma análise correlacionada dos artigos 133.º e seguintes, dada a sua íntima ligação.
Ouvimos, relativamente ao artigo 133.º, elevadas considerações de conceito e de conteúdo jurídico. Pois, Sr. Presidente, mesmo muito pouco me resta acrescentar em apoio das expressões que foram usadas para significar que o artigo 133.º nada tem que possa contrariar o sentido unitário da Nação.
Foi invocado aqui, Sr. Presidente, o Estado da índia. Eu vivi lá três anos. E bem senti quanto aquelas popu-
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lações pensavam tão portuguêsmente, tão irmanadas estavam, desde o século XVI, com o nosso pensamento. Não tenho dúvidas em afirmar que, apesar das vicissitudes que por lá se passam, desde há dez anos, mesmo agora, e ainda recentemente disso tivemos eco, todos podemos aceitar como um alto exemplo de portuguesismo esse pensamento dos goeses.
Não quero entrar em explanações de diversa ordem. As funções que ali exerci determinaram em mim um sentimento de muito orgulho por aquilo que fizemos e por aquilo que continuamos a fazer.
Sentiam-se as gentes de Goa com a designação de Estado, como se lhes fosse devido esse tributo pela contribuição que deram à cultura portuguesa também. E, se não estou em erro, foi nessa altura, quando eu ali estava, que lhes foi consentido que Goa passasse a ter um estatuto.
Quer dizer: aquilo que Angola, Moçambique e outras províncias vieram, a ter, suponho que em 1963, pois em 1948, 1949 e 1950 já Goa pensava e teria o seu estatuto.
Sr. Presidente: Eu quis, com isto, significar apenas que as palavras não são de atemorizar seja quem for. O que interessa nelas é que não se ultrapasse o seu próprio significado e que não se aproveitem para delas se tirarem resultados que nenhum de nós deseje.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Se V. Ex.ª agora mo permite, eu não estou fisicamente em condições de poder usar da palavra durante muito tempo, passaria a debruçar-me sobre os artigos 133.º e seguintes, dado que se enquadram perfeitamente no contexto do ultramar.
Em quatro artigos se condensam os princípios que definem ou limitam o âmbito da autonomia das províncias ultramarinas, no aspecto da descentralização administrativa, autonomia financeira, desconcentração de poderes e competência legislativa própria, isto é, tudo que permita uma gestão adequada ao desenvolvimento e progresso daquelas parcelas da Nação, sem quebra da sua vitalidade, unidade de soberania e solidariedade entre si, como se formassem, como formam, um só corpo, uma só vida.
Já tive ocasião de aquando da discussão na generalidade, fazer uma análise no momento aconselhável, o que não retira nesta altura que mais um pouco se diga em face do que se dispõe nos artigos 134.º a 136.º
O que neles se estabelece é uma definição correcta do comando jurídico da gestão das províncias ultramarinas, a que um estatuto próprio, para cada uma delas e consoante a sua situação geográfica e as condições do seu desenvolvimento, há-de conter a sua organização político-administrativa.
A amplitude desta organização não poderá afectar a unidade da Nação, a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado, de que são guardiões supremos os órgãos de soberania. For disso se lhes «atribui, na alínea b) do artigo 136.º, o poder de estabelecer os estatutos das províncias ultramarinas.
E quando conjugamos a competência conferida no artigo 136.º com os direitos outorgados às províncias pelo adágio 135.º, paira que elas possam exercer a autonomia, encontramos o laço que melhor fortalece a unidade da Nação, pois que os tais direitos consentem uma administração eficiente, uma gestão financeira impulsionadora do progresso dos territórios, uma uniformidade política, uma realidade social, uma economia visando o bem-estar das populações e integradora na economia da Nação.
O que é necessário ter presente, quer quanto ao estabelecimento do regime geral do governo das províncias - que compete em exclusivo à Assembleia definir -, quer quanto à outorga dos estatutos, é que a descentralização administrativa, a descentralização de poderes e a gestão financeira se exerçam com autoridade e verdadeira noção da responsabilidade, as normas em que se apoiam os poderes constituídos e são garantia do progresso da Nação.
Conferir aos órgãos do Governo das províncias ou aos seus elementos gestores poderes concretamente definidos na lei, e mão só delegados, torna seguramente mais eficiente uma administração, pois que cada um se move assim no sentido da orientação recebida e assume verdadeira posição de comando responsável.
Pensamos que o dever indeclinável do governador de sustentar os direitos de soberania e promover o bem da província encontrará, daquele modo, o devido eco nos órgãos executivos locais.
Sr. Presidente: No conjunto de todas as leis que estamos aprovando e das que ainda virão para completar os princípios básicos para o exercício do governo das províncias ultramarinas, teremos encontrado, certamente, o sentido exacto do que somos desde há oito séculos, em que sempre permanecemos iguais a nós mesmos, com profundo respeito pela dignidade humana, de que a Constituição é permanente salvaguarda.
Têm, pois, o meu voto favorável os artigos 133.º a 136.º em discussão.
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Vou pôr à Câmara o enfado de me ouvir na generalidade neste debate.
Vozes: - Não apoiado!
O Orador: - E não porque não tivesse preparado uma intervenção que procurei fosse digna dia Câmara, já não de mim.
Mas ouço discutir agora o título VII da Constituição em tais termos de elegância, de cordura e de compreensão, que me é grato dizer também uma palavra, que não disse na generalidade, adequada ao título VII, no seu conjunto.
Louvando-me no que aqui foi dito, pois esse título vinha carregado de emoção, mercê de circunstâncias, mercê de uma literatura muito divulgada e autorizada de pessoas que respeito, cujas intenções não ponho em dúvida, trouxeram grande dose de emoção, digo de angústia, a muitos espíritos.
Durante meses a vivi, mas, Senhores ..., não há nada para clarificar o espírito como reverter às fontes autênticas. E para mim é-me grato dizer que essa autenticidade vem do homem que, seja qual for o julgamento da história, salvou e firmou a nossa posição no ultramar - António de Oliveira Salazar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Pois é a ele que reverto, para clarificar o meu espírito. E vou ler - perdoem-me -, pois a voz dele, mesmo póstuma, é sempre uma voz de longe, e ouvi-la sabe bem.
Vou lê-lo, na sua radiomensagem ao País em 1963, sobre política ultramarina:
A Constituição Política define a Nação Portuguesa como o Estado unitário na complexidade dos territórios que a constituem e dos povos que a habitam.
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A fórmula constitucional não é neste ponto mais que a declaração de um estado de consciência estratificado em séculos de história, e através desses séculos, pelo trabalho dos Portugueses e pelo humanitarismo cristão de que foram portadores.
E mais adiante:
À medida que os territórios progridem económica e socialmente, que as élites locais são mais numerosas e capazes, podem aparecer forças centrífugas que aspiram à plenitude do poder e ao monopólio das situações. E isso representa um risco para a unidade da Nação.
No caso português, porém, estão abertas, e cada vez mais facilitadas, as vias de acesso aos mais altos postos.
Adriano, nascido na Espanha, pôde ser imperador de Roma. E, por outro lado, havendo um quase equilíbrio populacional, há ainda grande desequilíbrio de possibilidades nas parcelas europeia e ultramarina de Portugal.
E, por isso, essas forças, se existem, representam interesses egoístas de minorias, que agem contra si próprias e contra a colectividade e o interesse geral.
Em tal direcção ou tendência deverão ser combatidas, ao mesmo tempo que utilizadas ao máximo e canalizadas para o trabalho comum.
E mais adiante:
A unidade nacional, respeitados os seus elementos essenciais, uma capital, um Governo, uma política, é perfeitamente compatível com a máxima descentralização administrativa na construção de órgãos locais e da definição da sua competência.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:
A Constituição permite a descentralização administrativa que, sendo conforme ao estado social dos territórios, não atente nem lese a unidade nacional.
Ora, nós podemos dizer que, à parte esta exigência, as grandes províncias ultramarinas são, na legislação actual, verdadeiros Estados administrativamente autónomos, integrados politicamente e para cujas populações se busca uma assimilação de cultura.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E referindo-se à Lei Orgânica do Ultramar, que, aqui, na VIII Legislatura tivemos a honra de votar, termina Salazar:
Quando se reflecte nos traços desta reforma e se faz a comparação com muitas outras organizações políticas em vigor por esse mundo, mesmo de Estados de tipo federativo, reparar-se-á em como é rasgada e vasta a autonomia que consagra e que, como em certas matérias, a excede.
A reforma é, sobretudo, confiante nas qualidades dos povos que hão-de servi-la e nas possibilidades dos territórios a que se aplica. E, se em uns e outros casos reclamassem mais ou coisa diferente, é que de facto pretenderiam também coisa diversa do que se contém no nosso ponto de partida: a unidade da Nação Portuguesa!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Pois, meus senhores, soube-me bem e, certamente, à Câmara ouvir estas palavras que datam de 1963, num período agudo da nossa vida como Nação. E, rendendo homenagem a quem as escreveu e pensou, eu digo que não tenho dúvida alguma em afirmar que não devemos, nem podemos pôr em causa a ortoxia, a lisura, a probidade com que o Governo articulou os novos textos constitucionais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Devemos ao Sr. Presidente do Conselho, não digo essa reparação, mas a justiça de o afirmar!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Meus senhores: Tendo ouvido tão doutas e autorizadas opiniões, afirmações, melhor digo, de homens que vivem,, sentem e labutam, no ultramar, como eu ouvi dentro da comissão eventual, de que fiz parte, e como ouvi aqui, sumariamente agora, digo que é caso para lembrar àqueles que duvidam: se não vedes a quem agravais, atentai ao menos nos que intimamente aplaudam. E não são certamente esses os que rectamente defendem e desejam a integridade do ultramar.
Mas, meus senhores: Sinto-me tentado a terminar com Vieira:
Oh, homens! Oh, Deus! Só a vossa união vos há-de conservar e só a vossa desunião vos pode perder.
Muito obrigado.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Depois das elevadíssimas considerações feitas nesta Câmara acerca de um problema de tão grande importância, desejaria apenas fazer um rápido e leve apontamento, mais na qualidade de presidente da comissão do ultramar do que na de qualquer outra.
Não há, em meu entender, disposições, na parte relativa ao ultramar, que não sejam atinentes à unidade do Estado, claramente expressa no texto constitucional, donde tudo o mais parte. São fórmulas de descentralização que toda a Câmara parece aceitar, segundo ouvi já hoje aqui, e tradicionalmente consagradas no nosso direito e ditadas pela necessidade de atender às imposições de uma administração eficaz, provocadas pelo desenvolvimento que, apesar de tudo, se processa nas províncias ultramarinas a um ritmo verdadeiramente extraordinário.
Tenho a impressão de que, afinal, todos estaremos de acordo e ninguém estará só. Eu, pelo menos, gostaria que assim fosse.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barreto de Lara, cujo pedido para usar da palavra segunda vez notei oportunamente, mas, com licença de S. Exa., pareceu-me dever preferir-lhe os que falavam pela primeira vez nesta discussão.
O Sr. Barreto de Lara: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Fez V. Ex.ª muito bem, para ouvirmos tão notáveis palavras antes das minhas, despretensiosas.
As minhas palavras dirigem-se, primeiramente, ao Sr. Deputado Casal-Ribeiro, a quem apresento os meus cumprimentos, quando diz: «Estou só!»
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Não. V. Ex.ª, Sr. Deputado, não está só. Nas angústias pelos destinos da Pátria V. Ex.ª não está só. Está com todos nós. Pelo menos, comigo está de certeza absoluta.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Que diverjamos de pontos de vista, pois com certeza. É assim que se formam os desígnios das nações, quando os homens conversam, articulam, se expressam livremente, chegam a uma determinada conclusão e acatam a decisão da maioria representativa da Nação...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como é o meu caso, como liberal, quando acato, disciplinadamente, a maioria dos votos de qualquer colégio eleitoral ou qualquer colégio a que eu pertença.
O Sr. Casal-Ribeiro: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Primeiro quero agradecer as suas amáveis palavras e, depois, dizer o seguinte:
Eu não sou liberal, mas acato a decisão da maioria, sem que saia da sala e sem que pense, por um instante sequer, em não continuar os meus trabalhos, expressando as minhas opiniões e dando a minha colaboração, dentro da minha modéstia e da minha humildade.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como vê, V. Ex.ª engana-se. V. Ex.ª é tão liberal, ou mais liberal, como eu.
Risos.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Isso é uma afirmação...
O Orador: - Mas ficaram duas perguntas por responder num diálogo que V. Ex.ª quis fazer o favor, liberalmente, de me consentir.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Por isso sou Deputado...
O Orador: - Não é por isso. Eu penso que por espírito também.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Dentro de certos limites...
O Orador: - V. Ex.ª perguntou-me se eu me considerava português de primeira, segunda ou de terceira, e deixou para segundas núpcias essa resposta.
Pois essa resposta vem hoje: «simplesmente português». Nunca me preocupou, nem a mim, nem a todos os homens do ultramar, qualificações jurídicas que nos tivessem dado, divergentes daquelas que eu sentia no meu coração, porque o meu coração de português é intocável e estou perfeitamente despreocupado da classificação que me queiram dar ou me tenham dado.
Serei português, e quando não puder ser português a viver em Angola, só me resta, como alternativa, vir para o berço de nacionalidade dos meus antepassados.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Casal-Ribeiro: - Apraz-me as novas núpcias... de V. Ex.ª
Risos.
O Orador: - Aí é que está o engano de V. Ex.ª Novas núpcias é que é o engano.
O Sr. Casal-Ribeiro: - V. Ex.ª é que disse..., perdão.
O Orador: - V. Ex.ª está a considerar-me bígamo, eu não o sou.
Risos.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Não. A frase é de V. Ex.ª Deus me livre ...
Risos.
O Orador: - V. Ex.ª permite sempre um diálogo bastante agradável, bastante irónico e com muita graça, o que lhe agradeço.
V. Ex.ª perguntou-me também, outro dia: «Onde estaríamos nós, se não fosse o portuguesismo destas gentes?».
Pois eu respondo. Hoje, estávamos exactamente no mesmo sítio. A defender intransigentemente a nacionalidade portuguesa.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Desculpe-me. Mas eu, naquela altura, perguntei o que seria de nós; de V. Ex.ª e de nós todos, portugueses - daqui ou do ultramar -, se não fosse o portuguesismo da metrópole. Foi o que eu disse, nessa altura. «Com rapidez e em força para salvar Angola. Recordo a V. Ex.ª as palavras do Dr. Oliveira Salazar!
O Orador: - Ai é que estamos em desacordo. Portuguesismo dos portugueses da metrópole é uma dicotomia que eu não compreendo, nem entendo. Portuguesismo dos portugueses, está certo. Agora, estabelecer V. Ex.ª alternativa da metrópole ou do ultramar é que eu não concordo.
O Sr. Casal-Ribeiro: - V. Ex.ª esquece - bem sei que não temos nada com isso, nós estamos em Portugal, interessam-nos os nossos casos -, mas V. Ex.ª esquece que foi na falta de compreensão pelos problemas pátrios de outras orações que outros territórios do ultramar se penderam. Não no que diz respeito a Portugal, mas no que diz respeito a outros países.
E foi a determinação de ir para Angola, repito, com rapidez e em força que fez com que VV. Ex.ªs, que ali viveram os piores momentos, que ali resistiram à mais atroz das calamidades que caíram sobre a nossa Pátria, ali permanecessem, e, portanto, era preciso que houvesse qualquer coisa que os acompanhasse, e foi esse o sentimento que não faltou.
Era apenas isto que eu queria dizer.
O Orador: - Sim, senhor, eu compreendo perfeitamente, mas essa luz vinha do passado. Pode ter sido reacendida nessa altura... Porque os Franceses também estiveram na Argélia e também foram rapidamente e em força. Mas essa luz que nos alumiou foi a do passado. E eu posso dar um exemplo a V. Ex.ª, muito pequeno, mas que talvez seja elucidativo das minhas palavras. É que, quando deflagrou o terrorismo em Angola e quando
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«nós, na nossa boa-fé e na nossa sã paz de espírito, pensando que estávamos a proceder perfeitamente bem, fomos atacados por esse flagelo, a que não nos pudemos escusar e a que tivemos de responder de pronto, enquanto os barcos não chegavam, enquanto os aviões não chegavam, na determinação que V. Ex.ª significou - e muito bem...
O Sr. Casal-Ribeiro: - Honra lhe seja feita!
O Orador: - ... V. Ex.ª esclareceu perfeitamente - eu estou perfeitamente esclarecido, e ainda bem que se esclareceu esse ponto - foram os portugueses de Angola, os que lá estavam, uns militares, outros civis, que aguentaram com a força de sangue o desígnio da Nação.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Muito bem! Estou completamente de acordo.
O Orador: - A primeira preocupação que teve aquela gente, quando recuperava fosse o que fosse, antes de chegarem os navios ou os aviões, era exactamente erguer a bandeira nacional no mastro mais alto, donde de toda a parte ela se pudesse ver.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Honra lhe seja feita, Sr. Deputado. Nos lembre-se de uma coisa: é que, quando uma candeia, use o combustível que usar, não tem reabastecimento, apaga-se, Sr. Deputado.
O Orador: - Não acredito. Desculpe, Sr. Deputado, mas eu, em nome de Angola, não acredito que se apague essa candeia.
O Sr. Montanha Pinto: - A determinação existe, e provou-se.
O Orador: - E eu não acredito que essa candeia se apagasse. Nós tínhamos uma força anímica...
O Sr. Montanha Pinto: - Não se apaga nem se apagará. E, se fosse preciso, sós continuaríamos, na defesa da integridade nacional.
O Orador: - Não quero dizer com isto, de modo algum, que os homens que foram daqui, na altura precisa, perante a palavra do Chefe do Governo de então, com quem eu politicamente estava em desacordo - e perdoe-me, Sr. Deputado...
O Sr. Casal-Ribeiro: - Ora essa!
O Orador: - ... não tivessem realmente ido dar uma ajuda ideal, na altura ideal.
Mas quero dizer a V. Ex.ª que, por acaso, eu não estava em Angola na altura em que isso aconteceu. Cheguei exactamente nessa noite de Paris e dormi em Bra-zaville; no dia seguinte, em Luanda, vi uma bicha enorme formada à porta, da Polícia de Segurança Pública. E eu pensava que era gente que estava a preparar os seus documentos de embarque para fugir de Angola. Toda a gente estava apavorada com o que se tinha passado... E, então, aproximei-me dessa bicha e quis saber o que se passava ali. Eram homens e mulheres que, de lágrimas de raiva nos olhos, pediam aquilo que não tinham, para regressarem às suas terras: armas. Regressaram e mantiveram-se pela força, pela força que o decorrer dos séculos lhes transmitiu, que transmitiu a mim e que eu transmitirei aos meus filhos, se puder e se para tanto chegar o meu talento.
O Sr. Casal-Ribeiro: - Honra lhe seja feita, Sr. Deputado, honra lhe seja feita, ninguém o nega...
O Orador: - Há mais uma coisa que eu pretendia dizer.
Tem-se posto, em certos círculos e em certas publicações, que para o ultramar só há duas alternativas: ou assimilação, ou independência negra. Quero dizer que é um modo demasiado agudo de ver o problema. Porque, meu Deus, não há mais alternativas? Só existem essas?
Eu desejava ler a VV. Ex.ªs este pequeno extracto de uma exposição que foi dirigida ao Sr. Presidente do Conselho pelas Associações Económicas de Angola quando, em 1969, resolveram não apresentar candidatos a Deputados à Assembleia Nacional. Talvez que se elas tivessem outra determinação, possivelmente eu não estaria aqui a falar.
Mas diziam eles:
Sr. Presidente do Conselho de Ministros: Excelência: Para os portugueses conhecedores das realidades do ultramar - e tão poucos são, infelizmente - não pode ter causado estranheza a posição assumida por Angola ao determinar-se pela não discussão quanto à escolha de quem haveria de representá-la à Assembleia Nacional na próxima legislatura.
E isto porque tal posição se situou como corolário lógico de uma linha de rumo conscientemente traçada no sentido de que as divergências porventura existentes quanto a este ou aquele sector da nossa política administrativa não poderiam, em nenhuma circunstância, ser trazidas ao lume da discussão pública num momento em que, sabíamos, pretendia pôr-se em causa o dogma fundamental da unidade e integridade da Nação Portuguesa; na pluricontinentalidade dos seus territórios e na multirracialidade das suas gentes.
Tanto justificaria, de imediato, a nossa posição face à campanha eleitoral que se avizinhava, pois que em Angola não existem partidos ou, sequer, entendimentos que permitam conduzir à divergência quanto àquele essencial aspecto da sobrevivência nacional.
Contudo, não nos pareceria honesto quedarmo-nos por esta justificação, muito embora se imponha reconhecer que ela, só por si, legitimava o nosso comportamento, avisados, como temos obrigação de o estar após uma guerra de oito anos, de que nenhum objectivo, por mais idóneo e digno, deve ser lançado irreflectidamente ao comentário dos nossos inimigos, sôfregos de interpretações de maliciosa ou pérfida deturpação, a usar como arma de imprevisíveis consequências.
É que, Sr. Presidente do Conselho, a nossa determinação se escudou, também, noutras causas que importa encarecer: a esperançosa confiança na política ultramarina preconizada e reafirmada por V. Ex.ª e o expressivo e amplo mandato que, espontaneamente, foram plebiscitados pela população de Angola aquando da deslocação de V. Ex.ª ao Portugal do ultramar.
Abro aqui um parêntesis apenas para esclarecer e para reproduzir uma conversa que tive com o Sr. Presidente do Conselho quando eu lamentei, como homem de Nova Lisboa, que S. Exa., quando ali esteve, não tivesse
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dirigido uma palavra às suas populações. O Sr. Prof. Marcelo Caetano, com aquela humildade que todos lhe conhecemos, disse:
Não proferi, porque não podia. Eu estava tão comovido ao ver aquela massa de gente que me transportava, eu vi tanta gente à minha frente, que não podia.
A minha voz estava embargada de soluços, eu não pude dirigir uma palavra àquela gente que ali estava.
Continuo:
Por isso, outra atitude que não a assumida perante as eleições para Deputados à Assembleia Nacional poderia significar uma incoerência, se não, até, uma desonestidade do nosso pensamento. O que se plebiscita por iniciativa do povo não carece de ser equacionado em campanhas de eleição.
Quanto vem de dizer-se conduz a garantir a afirmação de que Angola se não absteve, como não abdicou do seu direito de intervir num momento político que consideramos crucial para o futuro da Nação. Bem ao contrario, sem necessidade de recorrer às urnas e muito antes da abertura destas definiu, com consciente intransigência, a sua irreversível determinação pela integridade da Pátria e pela confiança depositada em V. Ex.ª e nas forças armadas no sentido de a defenderem de uma luta iniciada e aumentada pelo neocolonialismo de certas potências, coadjuvado pela insensatez de pretensos ideais, que já não esconde a cobiça de um interesseirismo estruturalmente comercial, na busca ambiciosa de mercados aparentemente fáceis.
Entenderam, pois, as Associações Económicas de Angola, responsáveis que são por um vasto sector da economia da província, que não deveriam renunciar à obrigação de trazer a V. Ex.ª neste preciso e grave momento o testemunho directo da sua confiança, enquadrada nas afirmações que vimos de produzir.
Estas foram as palavras dirigidas pelas Associações Económicas de Angola, responsáveis por grande sector daquela província, quando decidiram abster-se ou não intervir no último acto eleitoral, depois das afirmações que S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho fez, dirigidas ao ultramar.
Resta-me terminar. E, para fazê-lo, quero contar a VV. Ex.ªs uma pequena historia passada no Cuando Cubango com o então governador daquele distrito comandante Sousa Machado, que um dia, discutindo se determinado objecto era de origem quilengues ou de outra origem, de outra etnia, perguntou a uma criança, que era filha do homem que tinha feito aquela obra:
- Ouve lá, explica-me: o teu pai de que raça é? E quilengues ou é...? - não me recordo da outra. E o garoto, com a ingenuidade própria e com espontaneidade, disse:
Não, o meu pai é português.
Pois, com estas palavras parece-me que termino, dando a minha aprovação à proposta do Governo, que penso enquadrar-se perfeitamente na política actual da Nação portuguesa.
Tenho dito.
O Sr. Ulisses Cortês: - Sr. Presidente: Também eu, em certo sentido, me sinto desacompanhado - quase orgulhosamente só - em algumas atitudes que tomei em relação à proposta de revisão constitucional, nomeadamente no que se refere ao ultramar.
O facto não abala o meu espírito nem perturba a minha consciência.
Durante quase doze anos prestei no Governo a minha devotada colaboração a Salazar, e permaneço constante na minha devoção e inalterável na minha fidelidade.
Mas, no prolongamento daquela colaboração e na permanência dos meus sentimentos, dou a minha aprovação ao preceito que se encontra em debate, cônscio das minhas responsabilidades, dos deveres que decorrem do meu passado e sem renúncia de princípios ou abandono de posições, que, ao contrário, reafirmo na sua plenitude.
A proposta consagra, com efeito, a unidade da Nação, a integridade territorial, a solidariedade de todas as parcelas do conjunto português, a sua comunidade de vida e de destino.
São estes os valores supremos a salvaguardar e que a proposta governamental, na sua indiscutível autenticidade, acautela e proclama com intransigente portuguesismo e como imperativos indeclináveis.
Na continuidade do meu pensamento de sempre e de acordo com a minha ideia da Pátria, da sua vocação e do sentido da sua história, dou o meu acordo ao preceito em discussão e testemunho ao Governo a minha solidariedade.
Muito obrigado.
O Sr. Júlio Evangelista: - Nenhum de nós, Sr. Presidente, estou seguro disto, lava as mãos do passado ou pretende lavar os mãos do passado; as nossas mãos mergulham bem, mergulham bem na autenticidade e na legitimidade da tradição portuguesa. Nessa tradição, na tradição administrativa portuguesa, Sr. Presidente, se enquadram, como pontos permanentes, e isto já foi esclarecido nesta Câmara, o da descentralização e o da autonomia.
Segunda constante, Sr. Presidente, a constante secular do ataque externo ao nosso ultramar.
E destas constantes que saem as raízes profundas em que Portugal tem encontrado as mais hábeis ou mais dolorosas soluções, com as suas armas, o sangue dos seus soldados, o sangue dos seus filhos, e as soluções dos seus estadistas, da inteligência dos seus estadistas, do hábil e acutilante espírito dos seus diplomatas.
Pois, Sr. Presidente, este artigo 133.º, proposto para o texto constitucional, implica a referência aos estatutos próprios das províncias como regiões autónomas: estatutos próprios, regiões autónomas e designação de estados. Os estatutos que o artigo 133.º perconiza para as províncias ultramarinas mergulham na legitimidade da tradição portuguesa;, são nos tempos de hoje os velhos forais dos nossos concelhos ampliados à prodigiosa dimensão dos territórios de além-mar.
Só o racionalismo, com os códigos racionalistas do século passado, e o pensamento liberal vieram quebrar esta tradição do verdadeiro localismo e das leis locais na sua autenticidade e na sua tradição brilhante e pujante.
As regiões autónomas, quanto às províncias ultramarinas, também já se esclareceu, decorrem da singularidade do corpo e da singularidade da alma de Portugal. Da singularidade do corpo de Portugal pela descontinuidade geográfica; da alma de Portugal porque não somos um povo que se possa afirmar dispor de unidade étnica, de unidade religiosa, de unidade cultural. Pois são estas diversidades cultural, étnica e religiosa, conjugadas com a descontinuidade geográfica, que impõem a autonomia viva e vivida das províncias ultramarinas.
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O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Serei muito breve, mas não é sem profunda emoção que vou proferir algumas palavras.
O debate vai longo, já perdemos tempo com pormenores quando a Gamara estava suficientemente esclarecida, perdeu-se porventura no grau de emoção que este debate chegou por vezes a atingir.
Há uma verificação que se impõe, creio que sobre todas. Se nalgum aspecto esta Câmara é coesa, está perfeitamente unida, é na defesa intransigente da integridade da Pátria e da unidade da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sendo assim, as divergências sobre o melhor modo de servir esse objectivo merecem o nosso respeito, principalmente quando se apresentam com dignidade e com nobreza. Todavia, está em causa apenas escolher o melhor modo de assegurar a perenidade da Pátria e a unidade intransigente de todo o espaço português. Isso ninguém o contesta, isso ninguém o põe em dúvida.
Nessas condições, ninguém está só. Não está só o Sr. Deputado Casal-Ribeiro. Sei bem que neste dia tem recordações familiares de quem morreu em terras de Angola. Essa é a sua solidão e para ela tem a nossa admiração, respeito e solidariedade. Não está só.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não está só o Sr. Deputando Ulisses Cortes. Tem com ele seguramente a maior parte dos colaboradores do eminente estadista que foi Salazar, tem com ele a Nação Portuguesa, que tão bem o entendeu e tanto e sempre nele soube confiar.
As divergências sobre a forma de melhor servir o objectivo unânime desta Câmara não são motivos de solidão para ninguém, são motivo de orgulho para todos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Não está em causa o patriotismo dos portugueses de qualquer parcela do território. Não está em causa a valentia dos que no Congo de Angola lutaram, tantas vezes indefesos, contra a barbárie que contra eles irrompeu. Não está em causa o patriotismo dos que aqui prontamente se prestaram a legar bens, fazenda e vidas para assegurar a perenidade lusíada daquela nossa tão querida Angola. Não está em causa, inclusive, como ontem aqui foi dito, o patriotismo daqueles que sob a ocupação inimiga continuam em Goa a ser tão portugueses como nós. Não está em causa nada que nos divida. Está em causa, apenas, o melhor modo de servir esse princípio permanente que não nos pertence, que o herdámos, e que legaremos aos nossos filhos.
Está em causa a melhor forma de servir a Pátria.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O Governo, ao apresentar esta proposta, contemplou naturalmente as inquietações e ansiedades das populações que vivem nos vastos territórios de África.
E teve em conta também que haveria que dar forma jurídica a soluções e práticas já correntes que o realismo frio e sereno de Salazar dia a dia fora criando e formulando. Eu não creio que seja qualquer mácula para o seu pensamento, mas antes a serena, clara e firme continuação do seu espírito e dos seus princípios que nós estaremos neste momento a votar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Creio, por isso, que a atitude do Governo merece o nosso aplauso e a nossa simpatia, com aquela confiança que mesmo os que põem reservas a um ou outro aspecto de pormenor lhe não negam. Todos estamos de acordo quanto à recta intenção de propósitos e ao melhor espírito de objectivos, da perenidade das nossas razões, relativamente à proposta que discutimos. É por isso que eu sustentei que do conjunto do texto ressalta, de uma maneira nítida, a persistência da defesa intransigente da unidade da Pátria, sem prejuízo de concessões de autonomia, de regionalização, que até neste pequeno rincão europeu regiões como a minha tanto reclamam.
Estamos, portanto, todos de parabéns. O debate provará ao País que a defesa da integridade da Pátria constitui, talvez, o único traço de total unidade desta Câmara. Provará ao País que qualquer pequena divergência, que devemos respeitar, até pelas pessoas de que vêm e os serviços que prestaram, não ofusca nem macula a intenção recta, nítida e clara da persistência perene dos mesmos princípios e dos mesmos objectivos que o Doutor Salazar tão nobremente incarnou.
Prestemos homenagem ao portuguesismo de todos os portugueses de todos os territórios, mesmo dos ocupados.
E com isto creio, Sr. Presidente, poder terminar com aquela emoção de quem fala em matéria que tem bem a consciência de ser a mais delicada, a mais aguda, da nossa vida, da vida dos nossos dias.
Sr. Presidente: Com isto, presto as minhas homenagens, e dou o meu voto à proposta do Governo como a comissão a formula.
O Sr. Roboredo e Silva: - Sr. Presidente: Declaro que vou ser breve, e serei mesmo.
Estive ausente, por motivo imperioso de serviço público, durante uma parte da discussão que aqui se passou no hemiciclo, e por isso não estou perfeitamente senhor de toda a argumentação que aqui foi desenvolvida.
Todavia, não desejaria deixar de pronunciar algumas palavras, como português que residiu largos anos no ultramar e como ex-chefe militar que teve altas responsabilidades na condução da luta que ali enfrentamos.
Por isso, se me calasse neste momento, poderia haver dúvidas em alguns espíritos sobre qual seria a minha opinião.
O Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça, que foi praticamente o único orador que ouvi na íntegra, expressou, de uma maneira de que eu não era capaz, porque não tenho a sua capacidade de oratória nem a sua eloquência, aquilo que eu penso a respeito da importantíssima matéria que estamos a discutir.
Aquando da apreciação na generalidade, disse na tribuna que a proposta do Governo no que respeitava ao título VII da Constituição me satisfazia e que apenas mereceria alguns pequenos ajustamentos na discussão na especialidade. Quando depois foi lido o parecer da nossa comissão eventual e verifiquei terem sido introduzidos alguns desses ajustamentos - os tais a que me referi -, não tenho qualquer objecção a fazer à matéria do título VII, antes pelo contrário. Mentindo que ela se coaduna com o momento presente e com o futuro próximo, que podemos imaginar se apresentará à Nação Portuguesa, reafirmo que a proposta me dá plena satisfação e, assim, não posso deixar de lhe dar, na íntegra, a minha aprovação, com a certeza absoluta de que considero todos os portugueses que residam em qualquer das parcelas que constituem o território nacional ao mesmo nível em dedicação à Pátria,
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em espírito de sacrifício, em devoção e em tudo o mais que se lhes possa exigir, inclusivamente a própria vida, para defender a integridade territorial da Nação. Muito obrigado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Continua em discussão a proposta de alterações ao artigo 133.º da Constituição.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação desta proposta, subscrita, como sabem, pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros. Peço aos Srs. Deputados que aprovem, o favor de se porem de pé; aos que rejeitem, para se conservarem sentados.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos passar agora ao artigo 134.º, em relação ao qual há uma proposta de alterações, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de alterações
TITULO VII
Artigo 134.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 134.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 134.º Cada província constitui uma pessoa colectiva de direito público com capacidade para adquirir, contratar e estar em juízo e cujo estatuto estabelecerá a organização político-administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do seu desenvolvimento.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior
José Coelho de Almeida Cotta
José Gonçalves de Proença
João Duarte de Oliveira
António Vadre Castelino e Alvim
João Manuel Alves
Manuel Cotta Agostinho Dias
Bento Benoliel Levy
Albano Vaz Pinto Alves
Júlio Alberto Evangelista
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso
José Maria de Castro Salazar
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir esta proposta de alteração do artigo 134.º da Constituição, pô-la-ei à votação.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos agora passar ao artigo 135.º, em relação ao qual também há uma proposta de alterações, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
TITULO VII
Artigo 135.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 135.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 135.º A autonomia das províncias ultramarinas compreende:
a) O direito de possuir órgãos electivos de governo próprio;
b) O direito de legislar, através de órgãos próprios, com respeito das normas constitucionais e das emanadas dos órgãos de soberania, sobre todas as matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não estejam reservadas pela Constituição ou pela lei a que fie refere a alínea m) do artigo 93.º à competência daqueles últimos órgãos;
c) O direito de assegurar, através dos órgãos de governo próprio, a execução das leis e administração interna;
d) O direito de dispor das suas receitas e de as afectar às despesas públicas, de acordo com a autorização votada pelos órgãos próprios de representação e os princípios consignados nos artigos 63.º e 66.º;
e) O direito de possuir e dispor do seu património e de celebrar os actos e contratos em que tenham interesse;
f) O direito de possuir regime económico adequado às necessidades do seu desenvolvimento e do bem-estar da sua população;
g) O direito de recusar a entrada no seu território a nacionais ou estrangeiros, por motivos de interesse público, e de ordenar a respectiva expulsão, de acordo com as leis, quando da sua presença resultarem graves inconvenientes de ordem interna ou internacional, salvo o recurso para o Governo.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior
José Coelho de Almeida Cotta
José Gonçalves de Proença
João Duarte de Oliveira
António Vadre Castelino e Alvim
João Manuel Alves
Manuel Cotta Agostinho Dias
Bento Benoliel Levy
Albano Vaz Pinto Alves
Júlio Alberto Evangelista
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso
José Maria de Castro Salazar.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Pinto Castelo Branco: - Sr. Presidente: Peço licença antes de mais, para cumprimentar V. Ex.ª e apresentar-lhe as minhas homenagens pelo magistral exemplo de elegante e são parlamentarismo que V. Ex.ª tem continuado a dar a esta Assembleia, muito particularmente ao longo dos trabalhos da revisão constitucional.
Por tudo, Sr. Presidente, as minhas reiteradas homenagens e os meus agradecimentos.
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Srs. Deputados: Ao ler o texto inicial da proposta do Governo, devo confessar, francamente, ter ficado desagradàvelmente surpreendido com a alínea g) do artigo 135.º E logo manifestei, publicamente até, a dúvida de qual seria a minha posição quando o debate chegasse à especialidade.
Entretanto, tive ocasião, socorrendo-me nomeadamente do valioso parecer da Câmara Corporativa, bem como de troca de impressões com alguns dos ilustres membros da comissão eventual, de aprofundar o assunto e modificar a minha impressão inicial.
Na realidade, e este foi para mim um dos pontos mais importantes, o preceito na sua substância já se contém integralmente no actual artigo 137.º do texto vigente. Não se trata, portanto, de uma inovação, mas apenas de uma continuação.
Por outro Lado, creio não haver dúvidas de que, quer na redacção em vigor, quer na proposta, o que se pretende efectivamente é assegurar uma protecção adicional, digamos assim, aos territórios ultramarinos da Nação e às respectivas populações, tendo em atenção o seu menor desenvolvimento relativamente à metrópole.
Procura-se assim evitar qualquer forma de colonialismo da metrópole em relação ao ultramar, tanto no plano político como no económico, cultural ou social. E esta é uma orientação que, necessariamente, não pode deixar de ter o meu aplauso.
Há, no entanto, dois pontos que julgo dever ainda acrescentar para completar o meu pensamento.
O primeiro é o de concordar inteiramente com o Digno Relator do parecer da Câmara Corporativa quando afirma que a disposição em causa nada tem especificamente que ver com o conteúdo da «autonomia» político-administrativa de cada província ultramarina, embora aceitando, à falta de melhor lugar, a inserção do preceito no artigo em discussão.
Pena é que não seja possível localizá-lo melhor, por forma mais consentânea, até, com o que estou certo serem as intenções do Governo ao propô-lo e da comissão eventual ao aprová-lo.
Por último, não quero também deixar de chamar a atenção da Câmara para o facto de o preceito em discussão, justificado, como acabo de dizer, nas circunstâncias actuais, ir perdendo razão de ser à medida que a política de promoção espiritual, social e material da Nação (e esta é a nossa vocação tradicional, como aqui já tive ocasião de referir), à medida que tal política, dizia, se for acelerando e os seus frutos se tornarem ainda mais sensíveis do que já são.
Atingido tal estádio, as diferenças de desenvolvimento e civilização entre metrópole e ultramar tornar-se-ão inexistentes, e a integração efectiva de todas as parcelas da Nação, em todas as suas múltiplas dimensões, será um facto - ia a dizer perfeito, ao passo que neste momento apenas o é imperfeitamente, como todos sabemos. Basta atentar, por exemplo, no que se passa no campo económico.
Em tal altura, e Deus queira se verifique o mais breve possível, o preceito em apreciação, de justificado e útil, passará, em meu entender, a inútil e potencialmente prejudicial - discriminatório, até, em relação à metrópole.
Por isso, na futura revisão constitucional que então ocorrer - e repito: praza a Deus seja o mais brevemente possível - este ponto deverá então (mas só então) ser adequadamente reajustado.
Até lá, é de manter-se.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Amílcar de Magalhães: - Não comungo das apreensões que, uma ou outra vez, se têm manifestado, sobre a matéria em exame, em primeiro lugar porque creio nos Portugueses, depois porque a cada passo nos chegam testemunhos de que a Nação (aquém e além-mar) pretende continuar una e indivisível.
Quiseram há dias os Srs. Deputados do ultramar honrar o distrito de Leiria com a sua distinta e cativante presença.
Em eloquentes comunicações evocaram-se alguns feitos da nossa história, a denunciar um acendrado patriotismo.
Celebraram-se os heróis e veneraram-se os santos.
Foi o encontro espiritual com o Rei Lavrador no seu pinhal de Leiria, tão intimamente ligado à epopeia ultramarina; a evocação da Rainha Santa, que pôde transformar o pão em rosas; a celebração das potencialidades económicas e sociais do distrito, das suas belezas naturais e da sua riqueza natural. Tudo com tanta projecção no ultramar!
Foi ainda a enternecedora oração, à lâmpada votiva da sala do capitulo da Batalha;, sala e lugar sagrado onde repousa o Soldado Desconhecido, como símbolo da unidade nacional.
Dessas palavras que então ouvi tirei mais uma eloquente e preciosa lição.
A integridade da Pátria não está apenas nas palavras que vão ser confiadas ao pergaminho. Está, sim, na vontade de um povo que sabe o que quer, orientado pelos seus valores e responsabilidades e dinamizado por uma inteligência esclarecida.
Mais rígida ou menos rígida, com maior ou menor autonomia, não haverá Constituição que resista, se for outra a vontade dos homens.
É pois, no coração dos Portugueses, no seu bom senso e no seu messianismo, que estará sempre a unidade da Pátria.
Dou, por isso, o meu voto a estas disposições.
Sr. Presidente: Só mais uma palavra.
Os portugueses do meu distrito têm feito preces a Santa Maria da Vitória, padroeira daquelas promissoras terras, para que continuem portuguesas as províncias ultramarinas.
Pois foi agora esse escol de ilustres Deputados do ultramar que. pelas armas da sua inteligência e da sua cativante simpatia, acabou por conquistar o distrito de Leiria para o ultramar.
Bem hajam por essa conquista, Srs. Deputados do ultramar.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.
O Sr. Barreto de Lara: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Era apenas para requerer a V. Ex.ª o seguinte:
Desejava, apenas, que V. Ex.ª, se pusesse à votação conjuntamente (V. Ex.ª vai pôr à votação, decerto, o artigo 135.º com todas as suas alíneas) todas as alíneas deste artigo, o fizesse com excepção da g), sobre a qual tenho uma tomada de posição que desejava vincar.
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O Sr. Presidente: - Não vejo inconveniente em deferir o requerimento do Sr. Deputado. Vamos, pois, proceder à votação da proposta de alterações ao artigo 135.º, apresentada pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, nas suas alíneas a) a f), inclusive.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a alínea g) do artigo 135.º
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos agora passar ao artigo 136.º, em relação ao qual há uma proposta de alterações que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
TITULO VII
Artigo 136.º
Nos termos regimentais, propomos que o artigo 136.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 136.º O exercício da autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação, a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado.
Para esse efeito, compete aos órgãos da soberania da República:
a) Representar, interna e internacionalmente, toda a Nação, não podendo as províncias manter relações diplomáticas ou consulares com países estrangeiros, nem celebrar, separadamente, acordos ou convenções com esses países ou neles contrair empréstimos;
b) Estabelecer os estatutos das províncias ultramarinas, legislar sobre as matérias de interesse colectivo ou de interesse superior do Estado, conforme for especificado na lei a que se refere a alínea m) do artigo 93.º, revogar ou anular os diplomas locais que contrariem tais interesses ou ofendam as normas constitucionais e as provenientes dos órgãos de soberania;
c) Designar o governador de cada província como representante do Governo e chefe dos órgãos executivos locais;
d) Assegurar a defesa nacional;
e) Superintender na administração das províncias, de harmonia com os interesses superiores do Estado;
f) Fiscalizar a sua gestão financeira, prestando-lhes a assistência indispensável, mediante as garantias adequadas, e proporcionando-lhes as operações do crédito que forem convenientes;
g) Assegurar a integração da economia de cada província na economia geral da Nação;
h) Proteger, quando necessário, as populações contra as ameaças à sua segurança e bem-estar que não possam ser remediadas pelos meios locais;
i) Zelar pelo respeito dos direitos individuais nos termos da Constituição.
§ 1.º Os órgãos de soberania com atribuições legislativas relativamente às províncias ultramarinas são a Assembleia Nacional, nas matérias da sua exclusiva competência ou quando haja de legislar para todo o território nacional ou parte dele que abranja a metrópole e uma ou mais províncias, e o Governo, por meio de decreto-lei, ou, nos casos em que os diplomas se destinem apenas às províncias, por meio de acto do Ministro a quem a lei confira competência especial para o efeito.
§ 2.º Os actos legislativos do Ministro com competência especial para o ultramar revestirão a forma de decreto, promulgado e referendado nos termos constitucionais, podendo adoptar-se a de diploma legislativo ministerial, quando o Ministro estiver a exercer as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas, e a de portarias nos outros casos previstos na lei.
§ 3.º A competência legislativa ministerial para o ultramar será exercida precedendo parecer de um órgão consultivo adequado, salvo nos casos de urgência, naqueles em que o Ministro esteja a exercer as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e nos demais indicados na lei.
§ 4.º A vigência nas províncias ultramarinas de qualquer diploma publicado pelo Governo Central depende da menção de que devem ser publicados no Boletim Oficial da província ou províncias onde haja de executar-se.
§ 5.º É indeclinável dever do governador, em cada uma das províncias ultramarinas, sustentar os direitos de soberania da Nação e promover o bem da província, em harmonia com os princípios consignados na Constituição e nas leis.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior
José Coelho de Almeida Cotta
José Gonçalves de Proença
João Duarte de Oliveira
António Vadre Castelino e Alvim
João Manuel Alves
Manuel Cotta Agostinho Dias
Bento Benoliel Levy
Albano Vaz Pinto Alves
Júlio Alberto Evangelista
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso
José Maria de Castro Salazar
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Em relação a este artigo há também uma proposta de aditamento, há pouco entrada na Mesa e subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Reis e outros, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de aditamento
Artigo 136.º
Propomos que à alínea i) do artigo 136.º da Constituição Política seja feito o seguinte aditamento:
i) ............................................................................
dos valores culturais das populações e dos seus usos e costumes não incompatíveis com a moral e direito público português.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 1 de Julho de 1971. - Os Deputados: Albino Soares Pinto dos Reis Júnior
José Coelho de Almeida Cotta
Filipe José Freire Themudo Barata
Delfino Ri-
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beiro
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês
Fernando de Sá Viana Rebelo
Albano Vaz Pinto Alves
Pedro Baessa
José Maria de Castro Salazar
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão conjuntamente.
Sr.ª D. Custódia Lopes: - Sr. Presidente: No artigo 136.º da proposta de lei n.º 14/X faz-se a afirmação de que o exercício de autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação nem a integridade da soberania do Estado, princípios basilares no contexto da autonomia que se pretende dar às províncias ultramarinas.
Como disse, quando falei na generalidade, a autonomia crescente que se vem dando em nada tem afectado a unidade da Nação, nem a integridade da soberania do Estado. O comportamento das populações na defesa dos territórios, no seu progresso e no das suas gentes tem sido bem a prova da confiança que o Governo nelas tem depositado ao conceder às províncias ultramarinas uma maior autonomia.
Contudo, será também necessário que haja entre as diferentes parcelas do território português uma verdadeira solidariedade e que esta fique afirmada na própria Constituição, para que a unidade que todos desejamos seja mais completa e real.
Por isso, dou o meu apoio à proposta de alteração, assim como às alíneas e aos parágrafos e à proposta de aditamento que fazem parte deste mesmo artigo.
O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Aquando da discussão no seio da comissão eventual, houve efectivamente muitas dúvidas acerca da alínea i) do preceito que temos em discussão.
Aconteceu, Sr. Presidente, que eu fui de opinião, opinião que mantive e quero manter no plenário, de que não carecia a alínea i) de qualquer aditamento. A comissão debruçou-se sobre várias propostas de alguns textos; nenhum deles mereceu a sua aprovação.
E qual era o fundo do meu raciocínio, Sr. Presidente? É que, consagrando o artigo 8.º da Constituição os direitos, liberdades e garantias individuais que são enumerados no longo desfile que constituem os seus números, o § 1.º desse mesmo preceito constitucional esclarece o seguinte: «A especificação destes direitos e garantias não exclui quaisquer outros constantes da Constituição ou das leis, entendendo-se que os cidadãos deverão sempre [...]»
O ponto central da minha tese era este. Sr. Presidente: que tudo o que dissesse respeito à providência que se pretende agora consagrar com o aditamento que foi entregue na Mesa se alcançaria através da legislação ordinária, tendo como base Constitucional o § 1.º do actual artigo 8.º, que continua em vigor.
Era esta em síntese, a minha posição, à qual ainda me mantenho fiel, não obstante reconhecer as intenções, as manifestas e altas intenções, do texto proposto. E, portanto, ao texto e às intenções eu adiro; só não adiro por um motivo técnico, de técnica legislativa, que é o de considerar inútil, ou pelo menos dispensável, a alínea i).
Tenho dito.
O Sr. Themudo Barata: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para uns breves esclarecimentos sobre esse aditamento apresentado pelo Sr. Deputado Albino dos Reis e outros Srs. Deputados.
Quero começar por agradecer as palavras amáveis dirigidas aos autores e impulsionadores dessa proposta, nomeadamente a Sr.ª D. Custódia Lopes e o Sr. Dr. Júlio Evangelista. Vejo-me na posição difícil de ter de contrariar as opiniões expressas por juristas, e só por isso o meu muito amor às coisas ultramarinas poderá suprir a minha deficiência jurídica. Tentarei fazê-lo.
Ora, duas ordens de razões levaram a introduzir este aditamento: razões de natureza política e razões de natureza jurídica.
As primeiras vêm daquele princípio de marcar o princípio da multirracialidade, que é velha e sã tradição nacional.
As segundas, de dar acolhimento constitucional a todo um conjunto de leis e a uma salutar tradição de respeito pelas diversas realidades culturais do espaço português. Aliás, como muito bem salientou o Sr. Deputado Júlio Evangelista, assim o pensou também a comissão, pois no seu relatório diz o seguinte: «Ainda a propósito das alíneas do artigo 136.º, a comissão ponderou que à alínea í) poderia e deveria ser acrescentada uma referência destinada a salvaguardar os valores culturais e religiosos, bem como os usos e costumes locais não incompatíveis com a moral ou a livre soberania portuguesa, não logrando todavia obter uma forma que alcançasse a aceitação maioritária. Esta dificuldade compreende-se perfeitamente, ao fim de longas sessões, mais de quatro dezenas de sessões, muito prestes a ter de se apresentar o relatório na Assembleia.
Aliás, eu creio que convém acentuar que este reconhecimento dos diferentes estatutos de direito privado não cria qualquer diferenciação de estatuto (político entre os cidadãos. Reconhece apenas realidades sociológicas e, ao fazê-lo, trata, em pé de igualdade, os grupos sociais em presença. Se a palavra democracia aqui tem também sentido, será este a verdadeira democracia humana. Poderá observar-se, como o fez o Sr. Deputado Júlio Evangelista, que este preceito, este princípio, não carece de inserir-se na lei constitucional, porque a lei ordinária poderia, contemplá-la. Discordo, em primeiro lugar, «porque não se trata de uma pura extensão dos direitos individuais, e, em segundo lugar, concedendo, embora, que esse argumento fosse válido, porque creio que com mais forte razão ele poderia e deveria aplicar-se a uma multidão de preceitos constitucionais que têm, com certeza, muito menos dignidade constitucional do que este. Discutimos há dias as precedências dos Deputados, figuram na lei constitucional questões secundaríssimas, como, por exemplo, a publicação de notas oficiosas, etc., e eu creio que este preceito, até por essa ordem de razões, tem perfeita dignidade para figurar na Constituição.
Por outro lado, a falta de codificação dos usos e costumes e, até, a sua inviabilidade aconselharão a que se inclua este preceito na nossa lei constitucional. Esta codificação foi ambição muito velha, e há uma ordem, que tem mais de um século, que ainda não foi cumprida. Como VV. Ex.ªs saberão, quando foi publicado o Código de 1867, de Rebelo da Silva, ele dizia no seu artigo 8.º, § 3.º, que «os governadores das províncias ultramarinas mandarão imediatamente proceder, por meio de pessoas competentes, à codificação dos usos e costumes, ressalvadas no parágrafo e ainda não codificados, submetendo os respectivos projectos à aprovação do Governo». Este diploma tem a data de 18 de Novembro de 1869.
É claro que esta ordem não foi possível cumprir-se, porque todos sabemos quanto é difícil codificar usos e costumes que estavam feitos apenas para Macau e para Goa e quanto, até, isso pode ser pernicioso, porque levaria possivelmente a cristalizá-los, quando nós queremos que as populações evoluam.
Portanto, limitar-me-ei a justificar, brevemente, as ideias que presidiram a este aditamento e à fórmula usada.
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Em primeiro lugar, atrevo-me a pensar que este princípio estaria até igualmente no espírito do Governo ao apresentar a proposta, pois esta conclusão pode tirar-se perfeitamente do discurso proferido, nesta Câmara, pelo Sr. Presidente do Conselho. Com efeito, diz o Sr. Presidente do Conselho:
Essa política [referia-se à política em relação ao ultramar], porém, mesmo nos planos da cultura, deve respeitar as diferenciações regionais, como sucede dentro da própria metrópole. Em cada província ultramarina há populações, com os seus usos, costumes, religiões e práticas que, em tudo quanto não ofenda os princípios morais da civilização, respeitamos e procuramos conservar, fazendo, quanto muito, evoluir colectivamente os agregados sociais.
Por outro lado, quando o Conselho Ultramarino se debruçou, ainda há poucos anos, sobre a extensão do Código Civil ao ultramar, escreveu palavras que creio que merecem reproduzir-se, porque são de entidades jurídicas bem mais idóneas do que eu. Dizia-se, ao comentar o projecto do novo Código Civil:
Os autores do projecto do Código Civil - tal como se deu com o legislador de 1869 -, expressão da cultura de uma comunidade, alhearam-se das realidades ultramarinas, atitude, aliás, compreensível, pois que, embora em quase um século muita coisa tenha mudado e evoluído, mantém-se, todavia, a diversidade de relações sociais a regular, a multiplicidade de padrões culturais, a peculiaridade de objectivos a atingir. No tocante ao regime dos direitos sobre a terra, os fins políticos são ainda os mesmos de há cem anos, os mesmos de sempre: aproveitamento económico, fixação das populações, acautelamento da soberania, defesa dos direitos das populações autóctones, combate ao absentismo, à especulação, à má utilização dos terrenos e a todos os males derivados do liberalismo e individualismo agrícolas.
Daí que, imperturbavelmente, a legislação ultramarina nunca tenha perdido, através dos tempos, do feudalismo à idade contemporânea, a sua feição socializante e intervencionista, ao lado da qual empalidece o dirigismo de que se diz imbuído o citado projecto.
E, ao falar dos direitos de família, diz também o mesmo parecer:
A composição heterogénea do povo português, a sua estrutura tradicional e comunitária e patriarcal e o ideal cristão de fraternidade, que sempre esteve na base da obra da expansão, cedo definiram a nossa acção perante outras sociedades e culturas, e impregnaram-na desde logo do acentuado respeito pelos usos e costumes das populações que se nos depararam, de forma que a exigência da nossa actual Constituição, no que toca à contemporização com os usos e costumes locais, é regra que sempre se incluiu nos alvarás e disposições régias.
Assim, a consideração do homem de cada homem, como fenómeno único, levou a admitir um conjunto de direitos públicos, em harmonia com o direito privado, que se reconhecia e protegia, devendo-se a este, inquebrantável linha de conduta, que seja antes de mais uma contribuição portuguesa à concepção dos direitos do homem como poderes efectivos, e não como simples faculdades abstractas.
Deve-se-lhe, realmente, a formulação do único humanismo que até hoje se mostrou capaz de implantar a democracia humana no mundo para onde expandiu o Ocidente.
E conclui esse parecer:
Foi exactamente da sábia e oportuna conjugação desses dois factores, respeito pelos usos e costumes locais e vincado propósito de assimilação, que resultou a harmoniosa sociedade multirracial que se contém nos limites do território português e que, mau grado as fáceis e interessadas críticas dos nossos detractores de hoje, constitui um dos maiores serviços jamais prestados à dignificação do homem.
Eu creio que estes argumentos, aos quais poderia acrescentar a formulação feita em encíclicas recentes, justificam perfeitamente que esta ideia não tem nada de retrógrada.
Aliás, quando tive ocasião, nesta Assembleia, de defender a proposta na generalidade, eu disse que não se trata de condescender paternalmente, trata-se, antes, de uma posição diversa, que é a de respeitar os diferentes estilos de vida e as diferentes escalas de valores humanos, com os seus diferentes modos de usar as coisas, de trabalhar e de se exprimir, de formar costumes e de criar as suas instituições peculiares, de praticar a religião e de à sua maneira cultivar as artes e criar beleza. Este, pois, o sentido das palavras empregadas nesta fórmula, nas quais para produzir uma mais alta consideração se preferiu usar a palavra «respeito» à palavra «contemporização», e também o sentido da palavra «cultura».
Tenho dito.
O Sr. Delfino Ribeiro: - Sr. Presidente: Com autorização do Sr. Deputado Themudo Barata, faço minhas as suas oportunas, brilhantes e convincentes palavras.
A proposta de aditamento à alínea i) do artigo agora em discussão espelha a política nacional que vem sendo tradicionalmente seguida, com visão ecuménica, costumes e valores culturais das populações que habitam o nosso ultramar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O acrescentamento sugerido nada inova, limita-se tão-sòmente a realçar, conferindo-lhe dignidade constitucional, uma das inconfundíveis facetas da maneira de ser lusa:, face a multirracialidade das gentes que constituem a grande família portuguesa e das que se acolhem à sombra da nossa bandeira.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Júlio Evangelista: - Sr. Presidente: Só mais um esclarecimento para informar a Câmara de que não estão em causa as altas intenções que os Srs. Deputados Themudo Barata e Delfino Ribeiro acabam de expor e com as quais estou inteiramente de acordo. Eu só discordo do aditamento, não quanto ao seu significado ou ao seu fundo, mas por motivos, como acrescentei, de técnica jurídica.
O que é que aconteceu? No texto da Constituição actualemente em vigor insere-se no título VII, capítulo 2.º, o artigo 138.º, que prescreve o seguinte:
Haverá nos territórios ultramarinos, quando necessário e atendendo ao estado de evolução das po-
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pulações, estatutos especiais que estabeleçam, sob a influência do direito público e privado português, regimes jurídicos de contemporização com os seus usos e costumes, se não forem incompatíveis com a moral, os ditames de humanidade ou o livre exercício da soberania portuguesa.
Este preceito, designadamente, contemplava o chamado estatuto dos indígenas da Guiné, Angola e Moçambique, era o estatuto do indigenato.
Este preceito, na actual revisão, desaparece. O seu conteúdo, como disse o Sr. Deputado Themudo Barata, implica valores respeitáveis.
Simplesmente, volto à minha: o artigo 8.º da Constituição, no seu § 1.º, consigna precisamente, bem interpretada, a mesma doutrina, quando diz que os direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos especificados não excluem outros, constantes da Constituição ou das leis.
O Sr. Themudo Barata: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Themudo Barata: - Eu percebo perfeitamente a argumentação de V. Ex.ª, e desejo agradecer-lhe uma vez mais a compreensão que manifestou pelas nossas intenções, mas parece-me que há um pequeno lapso no raciocínio tão brilhante de V. Ex.ª e que é o seguinte: sem dúvida nenhuma que a Constituição não pode consagrar todas as normas fundamentais da vida de um país, e V. Ex.ª sabe muito melhor do que eu que há até constituições não escritas.
Pergunto se este princípio não tem muito maior dignidade constitucional que outros princípios que figuram na Constituição. Em segundo lugar não se trata apenas de reconhecer direitos individuais, trata-se de reconhecer diferentes estilos de vida; pergunto se será justo, por exemplo, para uma população como a de Macau, que vive tão perto do mundo oriental, que é a China, com a bandeira portuguesa., se nós aí consagrarmos o nosso Código Civil, quantos direitos de família são completamente diferentes...
Pergunto se não será uma prova de consideração para com as populações ultramarinas dar-lhes uma palavra na Constituição nesse sentido. E por isso que volto a repetir o sentido da palavra «respeito».
O Orador: - Agradeço muito a companhia de V. Ex.ª aqui, porque, já agora, vale a pena continuarmos a esclarecer.
O artigo 136.º tem o seguinte texto, de acordo com a proposta da comissão eventual:
O exercício da autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação, a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado.
Para esse efeito, compete aos órgãos da soberania da República:
E depois vêm as alíneas que se seguem.
Eu chamei a isto na comissão eventual, no que tive a honra de ser citado pelo Sr. Deputado Linhares de Andrade, no seu discurso durante o debate na generalidade, chamei a este preceito, de algum modo, a alienação de travões para eventuais forças centrífugas da ordem jurídica que exclusivamente pertença à soberania do Estado.
Portanto, este artigo 136.º, numa boa hermenêutica, numa hermenêutica que se impõe à nossa inteligência, pretende, Sr. Presidente, reservar para os órgãos da soberania da República, isto é, para os órgãos centrais do Estado Português, o velar por todos os princípios e garantias aí consignados, incluindo o respeito dos direitos individuais nos termos da Constituição.
O aditamento parece-me de alguma maneira deslocado, atendendo até à própria intenção do artigo 136.º Portanto, terminando e prestando a minha homenagem a V. Ex.ª, eu volto a dizer: o artigo 136.º, alínea i), não era o lugar próprio para este aditamento.
Tenho dito.
O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente: Seguindo o raciocínio do Sr. Deputado Júlio Evangelista, toda a alínea i) estiaria deslocada, porquanto, se ali se diz «zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição». É, pois, uma (redundância estar aqui alínea i). Parece-me uma incongruência, realmente, discutir este aditamento, que alguns Srs. Deputados, entre os quais eu, tiveram a honra de subscrever uma proposta de alteração à alínea i), e
manter a sua primeira parte, que diz: «zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição», e excluir a segunda parte do aditamento.
O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Júlio Evangelista: - É que a intenção da alínea i), desculpe, não está deslocada, é indispensável no contexto do artigo 136.º, e indispensável tal como está. E porquê? O que a alínea i) pretende significar é que compete aos órgãos da soberania do Estado zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição, quando os órgãos legislativos ou executivos locais porventura desrespeitem esses princípios constitucionais.
É isto que se pretende exactamente da alínea i). Portanto, ela é indispensável nesta mecânica jurídica. Compreende V. Ex.ª? Era só este aparte.
O Orador: - O raciocínio de V. Ex.ª, quando esses órgãos locais desrespeitem os valores culturais das populações, dos seus usos e costumes, não compatíveis com a moral e o direito português, não está a mais; está até bastante bem. E eu até cato um exemplo, extraído de um jornal recentemente chegado à minha mão. É que houve uma altura, Sr. Deputado Júlio Evangelista, em que houve a preocupação de modificar nomes de várias cidades de Angola. Por exemplo, este nome, cheio de poesia e cheio de música que se designava «Capenda Cavilongo» passou a chamar-se «Oliveira-a-Nova», um nome que não diz nada às gentes que habitam aquela região. Eu acho isto muito simpático, mas não diz nada. Portanto, este respeito pelas culturas, este respeito pela África autêntica, de uma cultura africana, de uma África inóspita, selvagem possivelmente, mas com uma cultura sui generis, neste país que é pluricontinental, não parece desasado, nem me parece a mais. Que seja constitucionalmente consagrado o respeito por estas culturas que existem nesta África autêntica que nós devemos manter, e chamar isto à colação do nosso folclore e da nossa linguagem...
O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª dá-me licença, ainda, para outro aparte?
O Orador: - Faz favor.
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O Sr. Júlio Evangelista: - É que não chegámos a entender-nos no fundo do raciocínio. É que esse respeito pelos outros, pelos costumes, está entregue, na nova técnica constitucional, aos órgãos executivos e legislativos das províncias, com a maior competência que lhe é dada na Constituição que estamos a votar. Portanto, isso é da competência dos órgãos locais. O aditamento não põe nem tira para os valores que pretendemos defender. Não sei se me fiz entender por V. Ex.ª
O Orador: - V. Ex.ª fazer entender, fez-se. Mas não me fez foi convencer porque, eu digo e repito: quando esses órgãos de gestão local se afastarem do respeito pelos valores culturais das populações, etc., lá está o preceito constitucional a vinculá-los a esse respeito, tal como aos princípios consignados no artigo 8.º da Constituição.
Era perfeitamente inútil pôr todo o articulado. Até era perfeitamente inútil, seguindo o raciocínio de V. Ex.ª Portanto, se se põe a primeira parte deste aditamento, proposto pelos Srs. Deputados Themudo Barata e creio que pelo Sr. Conselheiro Albino dos Reis, acho que a segunda parte deve estar expressamente consignada.
Até, digo-lhe mais, é uma afirmação possivelmente redundante.
O Sr. Júlio Evangelista: - Inteiramente redundante.
O Orador: - Mas simpática.
O Sr. Júlio Evangelista: - Mas V. Ex.ª está a aproximar-se do meu raciocínio e da minha tese. V. Ex.ª acaba de considerar redundante o aditamento.
O Orador: - Como o é a primeira parte. Se a primeira parte não o for, a segunda também não o é.
O Sr. Júlio Evangelista: - Não, V. Ex.ª não pode raciocinar igualmente.
O Orador: - Então, mas é exactamente isso. No entendimento de V. Ex.ª é de mais, mas lá diziam os nossos colegas quod abundat, non nocet.
O Sr. Júlio Evangelista: - Pois é evidente. Por esse princípio...
O Orador: - Portanto, se está a mais, nunca vem a faltar. Eu não sou do ultramar e tenho visto a preocupação que houve em certos indivíduos, com mentalidade verdadeiramente deformada, de pacificamente irem destruindo nomes, folclores, costumes, princípios, que não eram contra a moral nem contra a religião. E o exemplo que eu lhe dei é bem palpável. Capenda Cavilongo é um nome cheio de poesia, cheio de música.
O Sr. Júlio Evangelista: - Mas é que não estamos a discutir os nomes. Estamos a discutir técnica constitucional.
O Orador: - Agora Olivença-a-Nova! Valha-nos Deus! Já estou ali como o Sr. Deputado Casal-Ribeiro, lá da Baixa da Banheira e do banho. Chamar agora Baixa da Banheira ao Quipungo...
O Sr. Júlio Evangelista: - Estamos a desviar-nos, peço desculpa a V. Ex.ª, do verdadeiro problema.
O Sr. Delfino Ribeiro: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Sr. Júlio Evangelista: - Faz favor.
O Sr. Delfino Ribeiro: - Era apenas para lhe dizer que se me afigura que o raciocínio de V. Ex.ª...
O Sr. Presidente: - Há aqui muita curiosidade na Mesa. Eu gostava de saber se o Sr. Deputado Barreto de Lara já acabou o discurso que dirigiu ao Sr. Deputado Júlio Evangelista, e nessas circunstâncias a quem é que o Sr. Deputado Delfino Ribeiro está a interromper.
O Sr. Barreto de Lara: -Liberalmente deixei o meu colega falar, como sempre, até que se esgote...
O Sr. Delfino Ribeiro: - Quero dizer ao Sr. Presidente que pedi autorização ao Sr. Deputado...
O Sr. Presidente: - é que o Sr. Barreto de Lara sentou-se. A perplexidade resultou daí. O Sr. Deputado Barreto de Lara quer continuar no uso da palavra e consentiu um aparte ao Sr. Deputado Delfino Ribeiro.
Está muito bem assim.
O Sr. Barreto de Lara: - Estou um bocadinho cansado. Se V. Ex.ª não se importa, eu sentava-me um bocadinho.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Delfino Ribeiro tem a bondade, continua. É aparte ao Sr. Deputado Barreto de Lara. Se o Sr. Deputado Delfino Ribeiro quer usar da palavra autonomamente, também lha concedo, com todo o gosto.
O Sr. Delfino Ribeiro: - Muito obrigado. Era só para responder ao Sr. Deputado Júlio Evangelista, que aliás já me deu autorização para falar.
Com autorização de V. Ex.ª ...
O Sr. Presidente: - Ao Sr. Deputado Júlio Evangelista é que eu não posso dar autorização para falar, a njão ser em conversa com V. Ex.ª e ao abrigo do tempo de V. Ex.ª, uma vez que já falou duas vezes.
O Sr. Delfino Ribeiro: - Era só para dizer que se me afigura que o raciocínio do Sr. Deputado Júlio Evangelista se apoia em razões de ordem jurídica e que a Constituição é política, e não jurídica. De forma que há certas repetições, certas redundâncias, que se me afiguram ser de aceitar, tendo em vista essencialmente o fim político.
Era só isso. Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Barreto de Lara: Eu tenho dito, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
O Sr. Júlio Evangelista: - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a palavra, para?
O Sr. Júlio Evangelista: - Para uma breve explicação. Para consignar que se aceitou que há uma redundância.
O Sr. Barreto de Lara: - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Barreto de Lara tem a palavra pela segunda vez.
O Sr. Barreto de Lara: - Para explicações. Eu aceitei que sou redundante, mas eu não sou a Assembleia. Era só isso que eu queria dizer.
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O Sr. Presidente: - Continua em discussão a proposta de alterações ao artigo 136.º e o aditamento à sua alínea i).
O Sr. Albino dos Reis: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: não havia necessidade de usar da palavra depois do longo debate produzido sobre a alínea i). Não havia necessidade, porque está esclarecido.
Eu falo apenas porque, tendo sido presidente da comissão eventual, tenho responsabilidades nesta matéria.
Na comissão eventual foi votada por maioria a conveniência de se acrescentar qualquer coisa à alínea i) no sentido do respeito pela cultura, pelos usos e costumes das populações das províncias ultramarinas.
Como não se chegasse a encontrar um texto que reunisse a maioria da comissão, votou-se apenas o texto da alínea i) e esperou-se que se encontrasse depois uma fórmula.
Chegou-se ao debate na generalidade e o Sr. Deputado Themudo Barata redigiu a fórmula que VV. Ex.ªs têm presente. Esta introdução é para explicar a VV. Ex.ªs a génese desse aditamento. A comissão, por maioria, votou a conveniência de se fazer um aditamento à alínea i) no sentido do respeito pelas culturas, pelos usos e costumes das populações das províncias ultramarinas.
Já no plenário fui solicitado para assinar a proposta de aditamento e assinei-a da melhor vontade por entender que era conveniente que ficasse no texto que estamos a discutir uma palavra que assegurasse o respeito pelas culturas dos indígenas dos nossos territórios ultramarinos. O que eu não queria, porque não é esse o meu pensamento nem intenção, é que se considerasse que eu estou a arranjar travões, como ouvi dizer ao meu distinto amigo e ilustre colega Júlio Evangelista.
Não estou convencido disso. Se estivesse, não tinha assinado essa proposta. Mas não a retiro porque não estou convencido. O que está nesse aditamento constava já do texto da Constituição, embora em vez da palavra «respeitar», estivesse a palavra «contemporizar», mas o pensamento estava já no texto da Constituição, no seu artigo 138.º: «haverá nos territórios ultramarinos estatutos especiais que estabeleçam, sob a influência do direito público e privado português, regimes jurídicos de contemporização com os seus usos e costumes, se não forem incompatíveis com a moral, os ditames da humanidade e o livre exercício da soberania», coimo aliás está nesse aditamento.
Nestas circunstâncias, Srs. Deputados, não me alongarei, porque não vale a pena. VV. Ex.ªs estão convenientemente esclarecidos, mas, já que estou no uso da palavra, queria neste momento congratular-me com a Câmara pela maneira elevada como apreciou a proposta de lei e o parecer da comissão. Estou convencido de que é um momento grande na nossa história política, este que hoje aqui se passa, com a votação da revisão constitucional.
Estamos todos de parabéns, felicito VV. Ex.ªs e creio, Sr. Presidente, que sobre este assunto não tenho mais nada a dizer.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre a proposta de alterações ao artigo 136.º e o aditamento à alínea i), passaremos à votação.
Porei primeiramente à votação a proposta de alterações ao artigo 136.º da Constituição, subscrita pelo Sr. Deputado Albino dos Reis e outros.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos passar agora à votação da proposta de aditamento de duas linhas à alínea i) do mesmo artigo 136.º, subscrita pelos Srs. Deputados Albino dos Beis, Themudo Barata e outros.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Vamos passar agora ao artigo 137.º, sobre o qual há uma proposta de alteração, que se aplica ao que é actualmente o § 2.º do artigo 176.º da Constituição.
Vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Disposições complementares
Artigo 137 º
Nos termos regimentais, propomos que o § 2.º do actual artigo 176.º da Constituição Política passe a ter a seguinte redacção:
Art. 137.º ....................................................................
§ 2.º Apresentada uma proposta ou projecto de revisão constitucional, quaisquer outros só poderão ser apresentados no prazo de trinta dias, a contar da data daquela apresentação.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 25 de Junho de 1971. - Os Deputados: Albino dos Reis Júnior
José Coelho de Almeida Cotta
José Gonçalves de Proença
João Duarte de Oliveira
António Vadre Castelino e Alvim
João Manuel Alves
Manuel Cotta Agostinho Dias
Bento Benoliel Levy
Albano Vaz Pinto Alves
Júlio Alberto Evangelista
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso
José Maria de Castro Salazar
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
O Sr. Presidente: - Está em discussão.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: Desejo apenas anotar que a alteração visa aumentar em dez dias o período para apresentar propostas. E este artigo 137.º da proposta apresentada como o 121.º são também matéria do projecto de lei n.º 6/X.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Submetida à votação, foi aprovada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Está assim concluída a votação das alterações à Constituição Política, mais sucintamente conhecidas por revisão constitucional.
Certamente durante muito tempo esta revisão e a maneira como foi conduzido o debate serão comentadas de modos diversos.
Não me demorarei a oferecer longos comentários a esta votação, por razões que VV. Ex.ªs hão-de facilmente compreender, mas parece-me que quaisquer comentários que se façam não serão fiéis à verdade se esquecerem a intensa aplicação, a profunda dedicação, o altíssimo espírito patriótico com que a Assembleia Nacional se debruçou sobre as propostas que lhe foram presentes, as discutiu e as votou.
Como último de VV. Ex.ªs para servir a Assembleia e imerecidamente o primeiro para a representar, creio que posso congratular-me com VV. Ex.ªs e com o País pela maneira como a Assembleia Nacional soube cumprir e honrar o seu mandato.
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2434 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 119
O Sr. Alberto de Meireles: - Sr. Presidente: Pretendo ocupar poucos momentos.
Mas é especialmente para agradecer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, ter dito alto, com a sua autoridade de parlamentar ilustre que foi e com a autoridade de Presidente desta Casa, as palavras que disse e que nos atingem a todos e são motivo de satisfação para todos.
Penso poder afirmar com toda a Câmara que cumprimos esforçada e honradamente o nosso dever. Assumimos responsabilidades graves perante o País e perante a História.
Trabalhámos duramente numa comissão que, como V. Ex.ª sublinhou, terá tido um trabalho ímpar na história constitucional portuguesa pela sua duração.
Pois fizemo-lo com o sentido das responsabilidades; e aqueles que, não pertencendo, embora, à comissão eventual, intervieram neste debate honraram de maneira geral a Câmara e estiveram à altura das suas responsabilidades.
Cumprimentando V. Ex.ª e agradecendo as palavras que disse, queria sublinhar por todos, como o mais humilde, até que ponto a autoridade, a firmeza e até a tolerância de V. Ex.ª concorreram para o bom êxito dos trabalhos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Por último, direi que os trabalhos da comissão eventual foram aqui referidos na tribuna profusamente, mas com justiça o digo: esse trabalho deve-se principalmente à maneira como foi conduzido pelo seu presidente.
Pois o Sr. Conselheiro Albino dos Beis, não só pela forma como dirigiu os trabalhos da comissão, com a sua experiência e autoridade, e até pela maneira como aqui no plenário quis excepcionalmente intervir, fazendo-o como grande parlamentar que sempre foi, o Sr. Conselheiro Albino dos Reis é credor da gratidão desta Câmara.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Disse que não me alongaria e por isso estas palavras chegam.
Encerro-as com este sentimento que é de todos nós: estivemos à altura das nossas responsabilidades, penso eu.
Houve certamente alguns pontos ou omissões que terão ensombrado os nossos trabalhos. Lamentamo-lo. Mas, de qualquer maneira, a Câmara está de parabéns, como disse o Sr. Conselheiro.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Há ainda algumas pequenas matérias conexas a resolver. Desejo, no entanto, começar por agradecer as palavras amáveis do Sr. Deputado Alberto de Meireles e o apoio que receberam de alguns dos Srs. Deputados.
A comissão eventual, constituída por despacho de 1 de Março para apreciação da proposta e projectos de alterações à Constituição Política, sessará hoje definitivamente as suas funções.
Já tive o grato ensejo de manifestar o meu apreço pelo seu trabalho e não posso senão associar-me às palavras do Sr. Deputado Alberto Meireles, que conheceu bem de perto este trabalho. Quis que ficassem aqui na Assembleia a registar o merecimento e a intensidade dele, e especialmente as que endereçou ao Sr. Conselheiro Albino dos Reis, presidente dessa comissão eventual.
No decurso deste debate aconteceu que algumas vezes os Srs. Deputados quiseram comentar generosamente a maneira como a Mesa conduzia os trabalhos.
É ocasião melhor do que qualquer outra para devolver esses comentários generosos e o que continham de cumprimentos para o Sr. Deputado Albino dos Beis, com quem a pessoa que agora exerce a presidência da Assembleia aprendeu o que pode aplicar ao desempenho do seu cargo.
Aprendeu na contemplação de uma presidência brilhantissimamente exercida, essa sim. E, se der má conta da lição, o defeito não terá sido do mestre.
Srs. Deputados: É natural que, dada a maneira como todos VV. Ex.ªs estão ocupados com os trabalhos parlamentares ainda a desempenhar, e, portanto, os que fazem parte da nossa Comissão de Legislação e Redacção, não possam concluir rapidamente a ultima redacção da lei da revisão constitucional que acabamos de votar, pelo facto do impedimento de alguns, dos seus membros noutras tarefas urgentes.
Mas não seria conveniente corrermos o risco de ter de esperar, para além desta convocação extraordinária, o recomeço dos trabalhos ordinários da Assembleia, para que essa última redacção pudesse transformar-se em lei.
Peço, portanto, a VV. Ex.ªs um voto de confiança à nossa Comissão de Legislação e Redacção para a última redacção da lei de alterações à Constituição Política.
Vou encerrar a sessão.
A próxima sessão será na terça-feira, à hora regimental, tendo como ordem do dia o início da discussão na generalidade da proposta de lei sobre liberdade religiosa.
Peço aos Srs. Deputados que pretendam intervir nesse debate o favor de se prepararem para que ele possa correr, pelo menos, com tanta rapidez e, ao mesmo tempo, com tanta elevação e substância como pôde revelar o debate sobre as alterações à Constituição.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
João Duarte Liebermeisiter Mendes Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Manuel Alves.
João Ruiz de Almeida Garrett.
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Ricardo Horta Júnior.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Armando Valfredo Pires.
Augusto Domingues Correia.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Francisco Correia das Neves.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
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8 DE JULHO DE 1971 2435
Joaquim Germano Finto Machado Correia, da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Jorge Augusto Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José João Gonçalves de Proença.
José dos Santos Bessa.
Júlio Dias das Neves.
Luís Maria Teixeira Finto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Rui Pontífice Sousa.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
O REDACTOR - José Pinto.
Rectificações ao Diário das Sessões, n.º 116, entregues pelo Sr. Deputado Roboredo e Silva:
Rogo que sejam feitas as rectificações seguintes na minha intervenção:
P. 2364, col. 1.ª, a seguir a «a minha posição é esta», inserir dois pontos e começar por «tecnicamente», suprimindo «É que»; suprimir na linha imediata a palavra «alto» após «o mar».
Mais abaixo, o período que começa em «Uma vez» deve ser substituído na totalidade por: «Uma vez que se diga mar territorial ou mesmo águas territoriais não seria preciso dizer 'e seu leitos' porque isso está implícito nos direitos que se possuem nesse mar ou aguais, Todavia, nada tenho a opor à inclusão dessas palavras, porque, neste caso particular, quod abundat non nocet.»
Finalmente, na col. 2.ª da mesma página suprimir a palavra «alto», a seguir a «o mar»; logo na l. 1, eliminar a palavra «definitivamente» após «aplicada»; nas l. 4 e 9, aipos «as potências marítimas seguem», incluir as palavras «em muitos aspectos».
Rectificações ao Diário das Sessões, n.º 116, entregues pelo Sr. Deputado Alberto de Alarcão:
Sr. Presidente: Solicito a- V. Ex.ª que sejam tomadas em consideração as seguintes rectificações ao Diário das Sessões, n.º 116, p. 2357, col. 2.ª, nota de fim de página. Em vez de: «Janeiro de 1970», deve escrever-se: «Janeiro de 1971»; p. 2363. col. 1.ª, l. 51, em vez de: «religioso», deve escrever-se: «irreligioso».
Também relativamente ao Diário das Sessões, n.º 116, algumas expressões foram tipogràficamente compostas como de autores citados, em vez de próprias.
Rectificações ao mesmo Diário das Sessões entregues pelo Sr. Deputado Costa Ramos:
Peço a palavra, Sr. Presidente, para solicitar as seguintes rectificações aos textos das minhas intervenções na sessão de 1 de Julho:
No n.º 116 do Diário das Sessões, p. 2344, col. 1.ª, l. 31, a palavra «Mantendo» deve escrever-se com letra pequena; na mesma página e coluna, l. 54, a palavra «visivelmente» deve ser antecedida e seguida de uma vírgula; na mesma pagina, col. 2.ª, l. 33, deve ser eliminado o ponto final situado à frente da palavra «significasse»; na mesma página, col. 2.ª, l. 34, a palavra «As» deve escrever-se com letra pequena e ser antecedida de aspas: na mesma página, col. 2.ª, l. 36, a palavra «económico» deve ser seguida de aspas; na mesma página, col. 2.ª, l. 37, a palavra «optou» deve ser eliminada; na mesma página, col. 2.ª, l. 51, onde se lê: «terminologia», deve ler-se: «terminológica»; na p. 2358, col. 2.ª, l. 8, onde se lê: «dependeria», deve ler-se: «depende»; na mesma página, col. 2.ª, l. 12, onde se lê: «Dadas as [...]», deve ler-se: «Dadas no entanto [...]»; na mesma página, col. 2.ª, l. 13 e 14, onde se lê: «[...] a fórmula encontrada conforme razoavelmente em longa medida [...]», deve ler-se: «[...] a fórmula encontrada corresponde em larga medida [...]»; na mesma página col. 2.ª, l. 20, a palavra «muito» deve ser eliminada; e, finalmente, na mesma página, col. 2.ª, l. 25, onde se lê: «[...] que não continue a consideração com a sede própria para a invocação do regime do Ser Supremo [...j», deve ler-se: «[...] que não continue a considerar ser a sede própria para a invocação do Ser Supremo [...]».
Muito obrigado.
Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:
Nos termos do artigo 46.º, n.º 7, do Regimento, venho requerer que, pela Secretaria de Estado do Comércio, me sejam fornecidas as conclusões do Grupo de Trabalho, criado em Junho de 1970, para o estudo e revisão do sistema de aplicação dos preços dos medicamentos, cujo relatório deveria estar concluído em 31 de Maio do corrente ano.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 7 de Julho de 1971. - A Deputada, Maria Raquel Ribeiro.
IMPRENSA NACIONAL
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PREÇO DESTE NÚMERO 10$40