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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 125

ANO DE 1971 22 DE JULHO

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 125 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 31 DE JULHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Ex.mos Srs. João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.
Foi recebido na mesa, enviado pela Presidência do Conselho para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o n.º 167 do Diário do Governo, inserindo diversos decretos-leis.
Usou da palavra o Sr. Deputado Malato Beliz para se referir à vida e obra do Prof. Sousa da Câmara, recentemente falecido.

Ordem do dia. - Continuação da discussão na especialidade da lei da liberdade religiosa.
Foram discutidas e votadas as bases IV, V e VI.
Usaram da palavra no decorrer do debate os Srs. Deputados Sá Carneiro, Almeida Cotta, Veiga de Macedo, Ávila de Azevedo, Carvalho Conceição, Leal de Oliveira, Silva Mendes, Sousa Pedro e Moura Ramos.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 13 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 11 horas e 25 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Finto dos Reis Júnior.
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Augusto Salazar Leite.
Bento Bemoliel Levy.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.

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José Coelho de Almeida Cotta.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luis António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Pedro Baessa.
Prabacor Baú.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 66 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 11 horas e 35 minutos.

ntes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Informo VV. Ex.ªs de que porei em reclamação, na sessão da tarde, o n.º 123 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição de professores dos três ramos do ensino secundário acerca da sua situação.

O Sr. Presidente: - Enviado pela Presidência do Conselho, encontra-se na Mesa, para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, o n.º 167 do Diário do Governo, de 17 do corrente, que insere os Decretos-Leis n.º 311/71, que autoriza a cunhagem de uma moeda de prata de valor facial de 50$ comemorativa do 1.º centenário do nascimento do marechal António Oscar de Fragoso Carmona, e 313/71, que autoriza o Fundo Especial de Transportes Terrestres a contrair na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência um empréstimo de 175 000 000$ para ser aplicado no financiamento de investimentos ferroviários (C. P.) previstos no III Plano de Fomento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Malato Beliz.

O Sr. Malato Beliz: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como ontem referiu nesta Câmara o Sr. Deputado e ilustre colega Alarcão e Silva, com total oportunidade
e perfeito sentido das realidades, o falecimento do Prof. Engenheiro António de Sousa da Câmara, ocorrido há dois dias, constituiu não só tremendo golpe para a agronomia portuguesa, mas também perda de grande vulto para a ciência em geral. E porque não abundam por esse mundo além as figuras de eleição como era a do ilustre extinto, atrevo-me a acrescentar mais algumas palavras às que aqui foram proferidas, com a única pretensão de prestar singela homenagem à memória do insigne mestre e notável homem de ciência.
Não tive a felicidade de ser seu aluno, nem tão-pouco os benefícios intelectuais de seu colaborador directo, o que acrescentará ao defeito de evidente ligeireza das minhas palavras a virtude de total isenção.
O Prof. Engenheiro António de Sousa da Câmara foi mestre de agronomia notabilíssimo, mestre com caracteres bem maiúsculos, ao qual os excepcionais dotes de inteligência, de compreensão e de bondade granjearam a entusiástica e respeitosa admiração dos alunos.
As suas raras qualidades intelectuais, os seus profundos conhecimentos científicos e a sua extrema humanidade abriram-lhe as portas de numerosas Universidades e institutos de investigação de vários países. Em quantos trabalhou, com quantos colaborou e até naqueles que orientou deixou bem vincada a sua estatura de cientista de eleição, traduzida na respeitosa e amiga admiração de quantos com ele privaram.
Esses mesmos dotes excepcionais fizeram com que o dinamismo e o esclarecimento da sua acção transcendessem muito a cátedra que ocupava. Daí o apoio da sua clarividente inteligência à acção de governantes e, sobretudo, a partir de determinada época da sua vida, a dedicação total à investigação agronómica em Portugal. Esta ficou-lhe devendo a existência como tarefa organizada e consciente e, sem dúvida, o lançar e o alargar, continuada e firmemente, de créditos além-fronteiras.
O reconhecimento das suas invulgares qualidades de homem e de cientista no estrangeiro trouxeram-lhe um sem-número de solicitações de orientação, colaboração e apoio. Da forma como a elas correspondeu e dos frutos da sua acção falam bem alto as numerosas condecorações e outras distinções honrosas que lhe foram atribuídas por governos e instituições estrangeiras.
Entre essas muitas formas de reconhecimento do seu valor não é certamente honra menor o facto de ter sido director do Laboratório de Citogenética do Instituto José Celestino Mutis, de Madrid, e conselheiro do Conselho Superior de Investigações Científicas do país vizinho.
O seu talento brilhou, ainda, nesta Câmara, como Deputado pelo círculo de Évora durante a V Legislatura. Aqui teve oportunidade de referir, com a profundidade de conhecimento, a inteligência superior e a clareza de conceitos que o caracterizavam, uma vez mais, o problema da investigação científica.
Para além da invulgar dimensão como homem de ciência, António de Sousa da Câmara foi, pela sua simplicidade, um verdadeiro aglutinador de esforços, um autêntico chefe de equipa. Na imensa superioridade da sua inteligência e da sua vastíssima cultura, postas, com a maior simplicidade, ao serviço dos seus colaboradores e das instituições que dirigiu, era, ele próprio, o mais humilde e compreensivo colaborador nos momentos de dúvida ou de dificuldade.

O Sr. Cancella de Abreu: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

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O Sr. Cancella de Abreu: - Eu desejava associar-me inteiramente às justíssimas palavras que V. Ex.ª está dirigindo à memória de António de Sousa da Câmara.
Foi realmente alguém no nosso país. E eu, que neste momento ocupo a presidência da Comissão Nacional da F. A. O., de que ele foi fundador e primeiro presidente, não queria deixar de estar ao lado de V. Ex.ª e de lhe dizer quanto são justas e merecidas as palavras elogiosas que aqui neste momento está proferindo.
Não fui, como é lógico, por ter uma profissão diferente, seu aluno de Agronomia. Fui apenas seu companheiro de armas e seu amigo.
Na sala de armas, na luta diária de espada em punho, habituei-me a conhecer o homem na sua plena integridade de carácter. Agoira, na Comissão Nacional da
F. A. O., reconheço quanto essa Comissão e a ciência portuguesa devem a um homem da envergadura mental e moral de António de Sousa da Câmara.
Eram só estas as palavras que eu desejava dizer. Não poderia calar-me ao ouvir evocar a memória de tão grande português. Muito obrigado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Cancella de Abreu, pela valiosíssima achega que deu às minhas descoloridas palavras, no sentido de tornar bem evidente o valor excepcional que possuía o nome e a pessoa daquele que aqui evocamos.
Este espírito de compreensão e de humildade com que dava totalmente a sua capacidade e inteligência às tarefas que lhe eram cometidas caracterizavam, por forma iniludível e para além do vasto saber, o mestre de excepção.
A juventude, dir-se-ia, perene do seu espírito e o desejo sempre renovado de conhecimento, a forma inesquecivelmente simples e despretensiosa com que descia até aos menos dotados ou menos experientes, no desejo cativante de utilidade, transcenderam mesmo as suas forças físicas e ficaram, como recordação imorredoura, naqueles que com ele tiveram o privilégio de privar.
Já na fase derradeira da pertinaz doença que o vitimou, quando o vigor físico já quase o abandonava, com que fulgor intelectual vivia ainda os problemas, as dificuldades e os segredos da investigação científica!
Portugal perdeu, sem dúvida, um homem e um cientista de invulgar dimensão!
O seu exemplo vem de longe e manter-se-á pelos tempos fora bem vivo para todos nós. À sua obra só a história dará a verdadeira e total dimensão.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito para o período de antes da ordem do dia. Vamos, em consequência, passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão e votação na especialidade da proposta de lei de liberdade religiosa.
Cabe agora ocuparmo-nos da base IV, em relação à qual há uma proposta de eliminação subscrita pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros.
Vão ser lidas a base IV e a proposta.
Foram lidas. São as seguintes:

BASE IV

1. Ninguém será obrigado a declarar se tem ou não religião, nem qual a religião que professa, a não ser, com carácter confidencial, em inquérito estatístico ordenado por lei.
2. Ninguém pode ser perseguido, nem privado de um direito ou isento de um dever, por causa das suas convicções religiosas; e nenhuma discriminação se fará, por motivo delas, no acesso aos cargos públicos ou na atribuição de quaisquer honras ou dignidades oficiais.

BASE IV
(Eliminada.)

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Os Deputados: Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Carneiro.

O Sr. Sá Carneiro: - Em virtude da votação ontem feita quanto à base III, entendo que está prejudicada a proposta de eliminação da base IV, de que fui um dos signatários, e, portanto, peço à Câmara autorização para a retirar.

O Sr. Presidente: - VV. Ex.ªs ouviram o requerimento do Sr. Deputado Sá Carneiro para que seja retirada da discussão a sua proposta de eliminação da base IV. Pergunto à Câmara se autoriza a retirada da discussão da proposta de eliminação da base IV da proposta de lei subscrita pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros.

Consultada a Assembleia, foi retirada.

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, apenas pendente da apreciação da Assembleia o texto da base IV da proposta de lei, em relação à qual não há qualquer outra alteração.
Está em discussão a base IV da proposta de lei.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a base IV da proposta de lei, pô-la-ei à votação.
Ponho à votação conjuntamente os n.08 1 e 2 que constituem esta base IV.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vamos passar agora à base V, em relação à qual há várias propostas.

Além do texto da base, há uma proposta de alteração subscrita pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros, outra subscrita pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros e ainda uma terceira subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Machado e outros.
Vão ser lidas.
Foram lidas. São as seguintes:

BASE V

1. É lícita a reunião das pessoas para a prática comunitária do culto ou para outros fins específicos da vida religiosa.

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2. O culto público das confissões religiosas reconhecidas que tenha lugar dentro dos templos ou lugares a ele especialmente destinados, bem como a celebração dos ritos próprios dos actos fúnebres dentro dos cemitérios, não depende de autorização oficial nem de participação às autoridades civis.

BASE V

Propomos, nos termos regimentais, que o n.º 2 da base V passe a ter a seguinte redacção:

2. Não dependem de autorização oficial nem de participação às autoridades civis as reuniões com as finalidades indicadas no n.º 1 promovidas pelas confissões religiosas reconhecidas, desde que se realizem dentro dos templos ou lugares a elas especialmente destinadas, bem como a celebração dos ritos próprios dos actos fúnebres dentro dos cemitérios.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 13 de Julho de 1971. - Os Deputados: Almeida Cotia, - Miguel Bastos - Nunes de Oliveira - Oliveira Ramos - Salazar Leite - Bento Levy - Ricardo Horta Júnior-Veiga de Macedo - Prabacor Rau - Cunha Araújo.

BASE V

1. O culto público das confissões religiosas reconhecidas que tenha lugar dentro dos templos ou lugares a ele destinados e a celebração dos ritos próprios dos actos fúnebres dentro dos cemitérios não dependem de autorização ou participação, podendo as capelas nestes existentes ser utilizadas pelos membros de qualquer confissão.
2. A construção ou instalação de templos ou lugares destinados à prática do culto só são permitidas às confissões religiosas reconhecidas, mas não dependem de autorização especial, estando apenas sujeitas aos condicionamentos e regimes genericamente estabelecidos na lei.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Os Deputados: 8á Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente:- Chamo a atenção da Câmara: com relação à proposta subscrita pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros, o n.º 1 é uma emenda ao n.º 2 da proposta de lei, o n.º 2 da proposta dos mesmos Srs. Deputados é um aditamento ao texto da proposta de lei e corresponde ao que nesta proposta de lei constitui matéria da base XVII.
Em relação à proposta subscrita pelo Sr. Deputado Pinto Machado e outros, ela reporta-se a uma alínea i) da base III, que não prevaleceu na votação da Assembleia, portanto, tal como está não poderá ser posta à apreciação de VV. Ex.ªs, a não ser que estes Srs. Deputados queiram rectificar a sua proposta, tendo em consideração a votação anterior.
Estão em discussão, conjuntamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Carneiro.

O Sr. Sá Gameiro: - Considero também prejudicada pela votação da base III esta proposta de alteração para II base V, por isso solicito também autorização à Câmara para a retirar de discussão.

O Sr. Presidente: - VV. Ex.ªs ouviram o requerimento do Sr. Deputado Sá Carneiro, que é um dos signatários da proposta que eu identifiquei como do primeiro proponente, o Sr. Deputado Pinto Machado. E aquela que eu acima referi, que menciona a alínea i) da base III, e que, portanto, não está conforme com os textos já votados.

O Sr. Sá Carneiro: - V. Ex.ª dá-me a palavra para um breve esclarecimento?
Era que eu reportava-me, na realidade, à proposta de que fui o primeiro signatário, que considero prejudicada; essa, como V. Ex.ª diz, está automaticamente prejudicada; a outra é que eu pedi autorização para retirar.

O Sr. Presidente: - Eu peço desculpa a V. Ex.ª, como parecia muito lógico o movimento de V. Ex.ª em relação à proposta que invoca a alínea i) da base III, tomei-a como tal. Então V. Ex.ª pede para retirar ...

O Sr. Sá Carneiro: - As duas.

O Sr. Presidente: -- As duas?

O Sr. Sá Carneiro: - Exacto.

O Sr. Presidente: - Todas as suas propostas à base V, não é verdade?

O Sr. Sá Carneiro: - Exactamente.

O Sr. Presidente: - Os dois números?

O Sr. Sá Carneiro: - Os dois números.

O Sr. Presidente: - Portanto, peço a atenção da Assembleia. O Sr. Deputado Sá Carneiro, como primeiro subscritor da proposta de alterações à base V, com os dois números que VV. Ex.ªs ouviram ler, e como um dos subscritores da proposta de alterações ao n.º 1 da base V, que se reporta a uma alínea í) da base III, que não foi aprovada pela Assembleia, pede autorização para retirar as duas propostas.
Consulto a Assembleia sobre se concede esta autorização em relação, repito, às duas propostas de alterações.
Consultada a Câmara, foi autorizada a retirada das duas propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, em discussão a base V, segundo o texto da proposta de lei e a proposta de alterações subscrita pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Desejaria fazer apenas um breve comentário acerca desta base, para esclarecer que a proposta não esqueceu que a vida religiosa é mais do que a prática do culto, como aqui se chegou a sugerir. E assim, logo na base I, garantir-se às confissões religiosas protecção jurídica adequada, implicitamente se abrangiam todos os aspectos em que se desenvolvem as crenças, e não só o culto, que é, na verdade, uma das mais importantes manifestações da fé. A base V fala realmente do culto, mas também se refere a outros fins específicos da vida religiosa, só afastando, portanto, os que não se inscrevam no âmbito próprio de qualquer confissão.
Toda a parte relativa ao ensino pressupõe finalidades bem diferentes da prática do culto.
As bases XI e XII, por seu turno, contemplam a constituição de associações e institutos destinados principal-

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mente à sustentação ou ao exercício do culto, mas ainda, como ficou expressamente previsto na alteração a esta base, que tive a honra de subscrever, permitindo quaisquer outras actividades especificamente religiosas.
O que seria estranho, ou ao menos singular, era permitir a criação de associações ou institutos para fins diferentes dos prosseguidos pelas confissões religiosas, o que corresponderia, nas sociedades civis, a consentir o exercício de actividades não previstas nos objectivos sociais e, portanto, nos respectivos estatutos.
Quanto às associações religiosas, foi notada por um Sr. Deputado a precariedade das suas possibilidades, ao confinarem-se à sustentação do culto. Também não é exacto. O fim principal será esse, mas outros ficam ao seu alcance, conforme a redacção dada pela comissão eventual ao n.º 1 da base xii, aliás já se podendo considerar incluídos no espírito, se não na letra da proposta.
Igualmente carecem da razão os reparos que se fizeram sobre a forma como na proposta se regula a reunião das pessoas para a prática comunitária do culto.
Com efeito, se a reunião se efectua dentro dos templos ou lugares a ele destinados, é dispensada a autorização oficial e a participação às autoridades civis, conforme dispõe o n.º 2 desta base.
Se a reunião se realiza noutros lugares, ficará sujeita à lei geral, pois não parece justificável um procedimento de excepção, tanto mais que nunca se sabe o que se irá passar a pretexto da prática do culto, mesmo sem culpa da organização que a promova. é muito difícil disciplinar as multidões, mesmo de fiéis, nos tempos que vão correndo.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a base v.
Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Macedo.

O Sr. Veiga de Macedo: - Já tive ensejo de me referir à base V quando me pronunciei sobre a base III. Não será necessário recordar o que disse, mas devo acrescentar que a proposta de alteração apresentada pela comissão eventual, que assinei, alarga o âmbito de aplicação da doutrina a que então me reportei e que era a da Câmara Corporativa. Esta entende que só a prática do culto nos lugares especialmente destinados a esse fim não fica dependente de autorização oficial ou de participação às autoridades. A comissão foi mais longe, pois é de opinião que também as reuniões para fins específicos religiosos, desde que se realizem em lugares a elas especialmente destinados, devem ficar sujeitas à mesma regra.
Creio que, de outro modo, poderiam criar-se sérios entraves à realização de reuniões com fins especificamente religiosos, sem vantagem para ninguém.
refiro-me, é evidente, apenas às reuniões com fins religiosos, porque, se se pretende tratar nelas assuntos de índole diferente, as autoridades terão de ser ouvidas previamente, como bem se compreende.
Esta afirmação não é, infelizmente, ociosa, pois diversas reuniões, embora ao abrigo de prerrogativas ligadas aos actos confessionais, se têm realizado, de modo camuflado ou ostensivo, com fins completam ente alheios ao foro da religião e, por vezes, contrárias não só à ordem social estabelecida e à ideia da Pátria, como à essência da própria doutrina religiosa. E é ou não verdade que mesmo em tribunas sagradas se têm cometido abusos desta natureza, por vezes com escândalo público e afronta à consciência nacional?
Estamos a votar uma lei que assenta na liberdade e que estabelece regras para o seu exercício. Pois é preciso que essas regras se cumpram ... para se assegurarem, efectivamente, as liberdades consagradas.
Assinale-se que, nesta matéria, a legislação em vigor coincide, fundamentalmente, com a doutrina da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Carneiro.

O Sr. Sá Carneiro: - Respeita esta base ao direito de reunião dos fiéis.
É-me grato salientar que em sondagem à opinião pública promovida pelo Instituto Português de Opinião Pública e Estudos de Mercado, e recentemente divulgada - inquérito cujos resultados são do maior interesse e cuja iniciativa é a todos os títulos louvável -, das pessoas que responderam, respectivamente 74,5 por cento e 87,3 por cento entendiam que a liberdade de culto e o direito de reunião inerente deviam ser assegurados a todas as comunidades.
Quanto ao direito de associação, entendia também uma grande maioria - 80,1 por cento - que devia ser igualmente reconhecido a todas as confissões religiosas.
A meu ver, a redacção da base v, que está em discussão, é deficiente pelas razões que ontem expus a propósito da base III
O texto da proposta de alteração, de que será um dos signatários, encarava realmente a liberdade de reunião e a liberdade de associação em termos diferentes, mais amplos, e a meu ver juridicamente mais precisos.
Mas desde que a votação ontem feita acolheu a base III, na redacção proposta pelo Governo, essa matéria ficou decidida.
Está, pois, apenas em discussão a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros Srs. Deputados quanto ao n.º 2.
Pela minha parte, considero-a preferível à constante da proposta de lei e votá-la-ei, votando embora contra a redacção do n.º 1.º, pelas razões já ontem aqui expostas e que não há, portanto, que repetir.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a base v, passaremos à votação.
Ponho primeiro à votação o n.º 1 da base V segundo o texto da proposta de lei, em relação ao qual não há qualquer proposta de alteração.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a proposta de emenda ao n.º 2 da base V, que foi apresentada pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros Srs. Deputados. Esta emenda, naturalmente, prejudica o n.º 2 do texto da proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à base VI, em relação à qual não está na Mesa qualquer proposta de alterações, e que vai ser lida.

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Foi lida. É a seguinte:

BASE VI

1. A assistência a actos de culto religioso, ainda que celebrados em unidades militares ou em estabelecimentos públicos, é facultativa.
2. Podem, todavia, os actos de culto religioso ser prescritos em estabelecimentos educativos ou de formação, ou em instituições penitenciárias ou de reeducação, com carácter obrigatório para os menores cujos pais ou tutores não hajam pedido isenção.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre esta base, passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à base VII, em relação à qual há várias propostas de emenda. Vão ser lidas, a base e as propostas de emenda.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE VII

1. O ensino ministrado pelo Estado nas escolas públicas será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs, tradicionais do País.
2. O ensino da religião e moral nos estabelecimentos de ensino será ministrado aos alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.
3. Os alunos maiores de 18 anos poderão fazer eles próprios o pedido de isenção.
4. Para o efeito, no acto de inscrição em qualquer estabelecimento em que se ministre o ensino de religião e moral aquele a quem competir declarará se o quer ou não.
5. A inscrição em estabelecimentos de ensino mantidos por entidades religiosas implica a presunção da aceitação do ensino da religião e moral da respectiva confissão, salvo declaração pública em contrário dos respectivos dirigentes.

BASE VII

Propomos, nos termos regimentais, que o n.º 1 da base VII passe a ter a seguinte redacção:

1. O ensino ministrado pelo Estado será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs, tradicionais do País.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 13 de Julho de 1971. - Os Deputados: Almeida Coita - Miguel Bastos - Nunes de Oliveira - Oliveira Ramos - Salazar Leite - Bento Levy - Ricardo Horta Júnior - Veiga de Macedo - Cunha Araújo.

BASE VII

1.

2. O ensino da religião e moral confessional nos estabelecimentos de ensino será ministrado aos alunos cujos país ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.
3. .....................
4. Para o efeito, no acto da inscrição em qualquer estabelecimento público em que se ministre o ensino de religião e moral, aquele a quem competir declarará se o quer ou não.
5. .....................

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - O Deputado, Teodoro Sousa Pedro.

O Sr. Presidente:- Estão em discussão conjuntamente.

O Sr. Almeida Cotta: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Cotta.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: O n.º 4 da base VII foi objecto de variadíssimas considerações no seio da comissão.
Primeiramente julgou-se haver alguma discordância entre o que nele se dispõe e o preceituado no n.º 2.
Neste diz-se, com efeito, que o ensino da religião e da moral nos estabelecimentos de ensino será ministrado aos alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.
O n.º 4 estabelece que no acto da inscrição em qualquer estabelecimento em que se ministre o ensino da religião e moral, aquele a quem competir declarará se o quer ou não.
Ora, o que deve entender-se da conjugação dos dois preceitos é que o princípio expresso no n.º 2 é completado com o inserto no n.º 4. Não são contraditórios, mas complementares.
Não há contradição, antes uma ratificação que se nos afigura indispensável e essencial.
Na verdade, faz algum sentido que os pais ou quem suas vezes fizer dêem tacitamente o seu consentimento para se ministrar o ensino da religião e da moral e se lhes não confira o direito de expressamente o confirmarem?
Em matéria de tanta delicadeza e considerando as críticas que publicamente têm sido feitas, não será avisado e da mais elementar prudência rodear das devidas cautelas o acordo que os pais devem dar ou não dar para o ensino de disciplinas da mais alta importância na formação do carácter?
Não seria lapso sério deixar à natural inércia todo o comando dos dispositivos legais?
Não serão os pais mais interessados em acompanhar de perto a educação dos filhos?
Parece-me irrecusável uma disposição que neste aspecto só tem esses objectivos.
Para além disso, julgo não ser também indiferente pôr à disposição dos estabelecimentos de ensino elementos que lhes permitam, a tempo e horas, organizar os cursos devidamente, para o que lhes é indispensável conhecer o número de alunos com que têm de contar.
E ainda será razoável admitir que a circunstância de os pais acompanharem efectivamente o ensino ministrados aos filhos não deixará de ter efeitos benéficos na sua qualidade e regularidade.
Também aqui se nos afigura dever considerar-se a enorme importância desta questão a interessar não só à tranquilidade dos pais, mas à própria vida da Nação, à sua força, à sua dignidade e ao seu progresso, indissoluvelmente ligados à cultura intelectual e à formação moral dos cidadãos.
Debrucei-me atentamente sobre as alterações propostas pelo Sr. Deputado Sousa Pedro para os n. ºs 2 e 4 desta base, o mesmo fazendo, claro está, quanto a todas quantas foram já apresentadas e o mesmo continuando a fazer quanto às que - Deus meu - ainda o venham a ser.

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Alterações de pormenor numa e outra, que, por isso mesmo, me levaram a concluir pela sua inviabilidade, dado criarem situações especiais sem aparente justificação ou cujo alcance não resulta inequivocamente claro.
Com efeito, o ensino da religião e da moral, a que se refere o n.º 2, deve entender-se conjugando essa disposição com a do n.º 1, em que se afirma que o ensino, será orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs tradicionais do País, de acordo, aliás, com o disposto no § 3.º do artigo 4.º da Constituição.
Não julgo, por isso, necessário referir-se, como vem proposto nas alterações a esta base, que se trata do ensino da religião e da moral confessional.
Quanto às alterações do n.º 4, julgo ser uma questão puramente regulamentar, embora parecendo-me, como direi, inadequado erigir na lei excepções à regra geral da autorização expressa dos pais para o ensino da religião e da moral em virtude das razões a que já anteriormente aludi.

O Sr. Veiga de Macedo: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Macedo.

O Sr. Veiga de Macedo: - Os sistemas jurídicos hão-de obedecer a princípios que os inspirem e lhes dêem um sentido superior.
Por outro lado, compreende-se que o mesmo sistema não se funde em princípios contraditórios.
Estas regras naturais, enunciadas deste modo singelo, hão-de presidir também a uma política de educação digna desse nome, sob pena de não haver unidade de espírito nas leis em que se apoia, nem harmonização e coerência nas finalidades que visa atingir.
O Governo, ciente desta verdade, entendeu que deveria inserir também na lei sobre liberdade religiosa o alto princípio proclamado no artigo 43.º, § 3.º, da Constituição. E fê-lo aqui em termos claros, dignos do melhor apreço, sem com isso ter afectado o princípio da liberdade religiosa ou criado qualquer problema a confissões diferentes da católica. Não vou reproduzir o que a propósito dó artigo 46.º da Constituição aqui disse há dias. Mas sublinharei que as considerações então formuladas também têm pleno cabimento na matéria em discussão.
E note-se que o problema não é apenas religioso, ou melhor, independentemente da importância de uma religião no contexto nacional, sempre haveria que fazer opções fundas ao estabelecerem-se as bases do edifício jurídico de um país e os princípios informadores de um sistema de educação. E, no domínio do essencial, não se vê como pudessem escolher-se bases inconciliáveis ou princípios antagónicos entre si, para sobre umas e outros se assentar o ordenamento legal ou a política educativa.
Estas considerações visam esclarecer que este preceito não poderia deixar de ser redigido em termos genéricos, pois, reproduzindo uma norma constitucional de interesse nuclear, há-de ser aplicado em todo o espaço português, qualquer que seja o desenvolvimento ou regulamentação que venha a ter. Foi neste entendimento que a comissão lhe deu a sua concordância e, por isso, julgo que o deveria dizer aqui, para os devidos e compreensíveis efeitos, antes de a Assembleia proceder à sua votação.
Sublinharei ainda que a comissão, de harmonia com proposta minha, concordou com a eliminação, no n.º 1 da base VII, da expressão «nas escolas públicas», por a julgar redundante ou até, em certa medida, limitativa. Aliás, a redacção sugerida é a que melhor se concilia com a do citado artigo 43.º, § 3.º, da Constituição.
Quanto às restantes disposições da base VII da proposta de lei, direi nada ter a opor à do n.º 2, mas suscita-me reserva a do n.º 3 e viva discordância a do n.º 4.
Sobre este último preceito, a comissão, que começou por optar, sem discrepâncias, pela sua eliminação, entendeu, depois, por maioria, que deveria propor a adopção da doutrina da proposta de lei.
Não pude, pelas razões que desenvolvidamente então apresentei, acompanhar a evolução de pensamento operada.
Se o Estado se compromete solenemente a que o ensino seja orientado de harmonia com os princípios da moral e da doutrina cristãs no País, não pode, por via de preceitos complementares, favorecer o não cumprimento de tais princípios, estabelecendo condicionalismos formais susceptíveis de levarem os pais a não reflectirem bem na importância da formação moral e religiosa no processo educativo e na vida social.
O disposto no n.º 4 da base VII é precisamente de moldo a originar uma precipitada decisão sobre um problema que não deve, forçosamente, ser resolvido na altura da inscrição dos alunos, pouco propícia à reflectida ponderação do assunto, por sobrecarregada com acrescidas preocupações não só para os pais, como para os professores e responsáveis pelos estabelecimentos de ensino.
Sei que algumas aulas de Moral têm servido para lições e exemplos nada edificantes e que alguns professores se mostram impreparados para as ministrarem, e até imbuídos de ideias espúrias. Mas isso não pode levar o Estado a eliminar as aulas ou a reduzi-las, antes deverá impor-lhe que tome providências positivas destinadas a afastar o mal. Se parte do corpo social não está a funcionar bem, mister se torna recuperá-la e integrá-la na linha da sua própria finalidade, que não suprimi-la com ofensa de interesses de todo o conjunto.
Depois, se há, na verdade, professores de Moral ineptos ou mal orientados, outros há, e são grande maioria, que têm dado inequívocas provas de competência, zelo e espírito cristão. Afastem-se os primeiros, sem mesmo se esperar que os pais o reclamem, até porque muitos destes não estão em condições de saber ou de interpretar o que se passa dentro das aulas de Moral. Mas os segundos, esses, devem ser estimulados e apontados como exemplo a seguir, até para se não chamar só a atenção para os que não se mostram à altura da delicada e nobre missão que lhes foi confiada. Vou mesmo ao ponto de dizer que se determinada autoridade eclesiástica não indica, por sistema, professores conscientes e pedagogicamente preparados, devem ser tomadas todas as providências exigidas pela extrema relevância dos valores em causa. Sei que o problema é deveras melindroso, mas sei também que o Estado não pode deixar de o enfrentar a tempo com uma determinação tão serena e prudente quão firme e clara.
Nem se diga que a racional organização dos programas escolares exige unia prévia declaração escrita dos pais sobre se querem que os seus educandos frequentem ou não as aulas de Moral.
Mesmo que assim fosse, haveria que hierarquizar os valores em presença, de modo a evitar inversões materializadas no empolamento de interesses meramente secundários, com prejuízo de outros de carácter essencial.
Mas quem tem experiência da vida escolar sabe que os dirigentes dos estabelecimentos de ensino não enfrentam dificuldades invencíveis na matéria, pois têm podido e poderão programar a vida escolar anual com o conhecimento que possuem do meio e das tendências observadas nos anos precedentes. Tudo está em que se não crie um clima em volta deste problema capaz de perturbar os espíritos e conduzir os mais influenciáveis a assumirem posições menos amadurecidas.

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Convém ainda atentar nesta afirmação da Câmara Corporativa:

Em relação à necessidade do pedido expresso de isenção, objecta o Governo, porém, com os melindres que pode revestir um requerimento especial nesse sentido, por entender que merece ser respeitada semelhante inibição. Para tal se facultaria aos pais o pedido de isenção no próprio acto de inscrição dos alunos.
Há aqui, no entanto, dois aspectos da questão que não podem nem devem ser confundidos.
Uma coisa é saber se, para frequentar as aulas de Religião e Moral, o aluno necessita de declaração expressa dos pais; outra coisa, muito diferente, é saber se, não sendo essencial a declaração positiva dos pais, mas sendo, sem dúvida, facultativo o ensino da disciplina, o pedido de isenção dela pode ser formulado no acto de inscrição dos alunos.

A Câmara Corporativa, que não hesita em responder negativamente à primeira questão, pelas razões acima expostas, nenhum reparo sério tem a opor quanto à segunda, que julga não brigar com a solução geral fixada no primeiro parágrafo do artigo XXI da Concordata.
Também me parece que, no acto da matrícula, os pais poderão requerer a isenção em causa, o que não quer dizer que sejam obrigados a fazer nessa altura qualquer declaração. Tudo aconselha a que se lhes deixe nesta melindrosa matéria a possibilidade de apresentarem esse pedido quando o julgarem mais conveniente. Esta, sim, é a solução mais respeitadora da iniciativa e da vontade dos pais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas há outro aspecto que não vejo possa ser ignorado. Refiro-me ao que se contém no artigo XXI da Concordata, o qual prevê que o ensino da moral e religião católica seja ministrado nas escolas públicas elementares, complementares e médias aos alunos cujos pais, ou quem suas vezes fizer, não tiverem feito pedido de isenção.
A este respeito, a Câmara Corporativa acentua:

A desarmonia entre os dois textos (apesar de ambos eles terem de comuna o carácter facultativo da frequência da disciplina) parece incontestável, sobretudo para quem tiver presente que as escolas públicas elementares, complementares ou médias são de facto as escolas públicas em cujo programa se inserem aulas de religião e moral.

Também por isto não vejo que seja correcto ou viável, por via unilateral, alterar um preceito concordatário num ponto que não é formal ou regulamentar, como pode parecer a quem se atenha a uma visão meramente técnica do problema.
Refira-se ainda, na mesma ordem de ideias, que regime semelhante foi estabelecido na Espanha (artigo 7.º, n.º 3, da Lei de 28 de Junho de 1967) e na Itália (artigo 6.º da Lei de 24 de Junho de 1929) e que «igual faculdade é reconhecida aos pais, relativamente ao ensino da religião e moral, nas escolas públicas tanto da Alemanha como da Áustria».
Quanto ao que se contém no n.º 3 da base vil, direi que representa um notável avanço em relação ao princípio enunciado no n.º 1 da base V do projecto da proposta de lei, que desde início se me afigurou de todo inaceitável.
A Câmara Corporativa desenvolveu uma argumentação que, na sua máxima parte, foi tomada em consideração pelo Governo. Contudo, a fórmula constante da proposta de lei está longe de dar satisfação a todos os interesses e valores em causa. Seria preferível a adopção daquela que a Câmara apresentou, ou seja a seguinte:

Incumbe aos pais, ou quem suas vezes fizer, nos termos prescritos para o exercício do poder paternal ou de tutela, decidir sobre a educação religiosa dos filhos menores.

Esta solução da Câmara Corporativa vinha de encontro à doutrina da Igreja, renovada, de modo muito claro, na declaração do Episcopado de 13 de Novembro do ano findo. Aí se diz ser necessário que o direito de os pais decidirem sobre a educação religiosa dos filhos não sofra quaisquer obstáculos, nem dos costumes, nem das leis, e que impor limites, mais ou menos arbitrários, à acção dos pais, neste campo delicadíssimo das suas relações com os filhos, que só na intimidade doméstica se podem equacionar convenientemente, e, mesmo com a melhor das intenções, é provocar danos muitas vezes irreparáveis.
Ora - acentua-se na declaração episcopal - , essa parece a consequência inevitável da inovação admitida no projecto da proposta de lei [base II, alínea g)], ao restringir o direito de os pais decidirem sobre a educação religiosa dos seus filhos apenas aos filhos menores de 16 anos, limite sem paralelo nas nossas leis em nenhum outro sector da educação e muito menos justificável por se tratar daquele que maior relevância tem para a formação integral do homem.
É certo que a proposta de lei passou tal limite de idades para os 18 anos, o que, do ponto de vista prático, atenua consideràvelmente os inconvenientes do preceito. Mas o princípio de base, em si, fica violado, precisamente no plano mais importante e melindroso das relações dos pais com os filhos, que é o da educação religiosa e o da formação moral destes.
Não é verdadeiramente, como denunciam os bispos portugueses, tanto a, autoridade jurídica dos pais que resulta ofendida, mas a autoridade moral, o que é deveras grave, pois a emancipação, sendo expressão jurídica de capacidade, não se concebe numa fase da vida em que os rumos do espírito normalmente ainda estão por definir.
Numa época em que liberalizações de toda a ordem, mas tantas vezes mal compreendidas, se defendem e realizam à sombra dos ensinamentos conciliares ou ditos conciliares, creio que virá a propósito reproduzir as palavras da declaração Dignitatis humana do Concílio Vaticano II:

A cada família, enquanto sociedade que goza de um direito próprio e primordial, pertence o direito de ordenar livremente a sua vida religiosa doméstica sob a direcção dos pais. A estes cumpre o direito de determinar a forma de educação religiosa que se há-de dar a seus filhos, de acordo com as suas próprias convicções religiosas.

Sei que nesta matéria não basta considerar a liberdade religiosa dos pais, mas também a dos filhos, «para se saber como há-de, ela ser conjugada com a organização hierarquia da instituição natural que é a família».
Ora, e no tocante à fixação de um limite etário diferente do da maioridade, há-de ser sempre mais ou menos arbitrário e perigoso estabelecer regras novas, neste domínio, contrárias ao princípio geral da lei. A generalidade das legislações dos outros países não o faz, certamente para evitar derrogações a uma norma que importa não atingir com desvios ou excepções, mesmo que se saiba

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que, na vida familiar, a maioridade dos filhos é, de facto, reconhecida e estimulada pelos pais antes da idade limite.
Razão tem a Câmara Corporativa quando adverte que «se os deveres dos pais compreendidos no poder paternal só findam com a maioridade dos filhos, começa por não haver grande coerência no estabelecimento legal de um limite (rígido) diferente dos poderes paternais em matéria de educação», tanto mais que «o simples bom senso dos pais, as reacções naturais dos filhos e a própria doutrina das confissões religiosas se encarregam de dar ao exercício do poder paternal, nesta matéria entre todas delicada, a flexibilidade que melhor se adapta às circunstâncias de cada um e à capacidade real de cada menor».
E por isso que as exageradas discriminações legais em assuntos desta natureza, embora- formalmente de sentido liberal, afectam, tantas vezes, liberdades essenciais, e, por paradoxal que pareça, podem abrir perspectivas a ulteriores repressões em que se afundam as iniciais vantagens de uma política de facilidades e de aberturas generalizadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não quero encerrar este breve depoimento sem referir a proposta de alteração ao n.º 2 da base VII do Deputado Sousa Pedro, segundo a qual o ensino da moral e da religião a prever, como facultativo, deveria ser apenas o confessional.
Aliás, já aqui o Deputado José da Silva, cujas afirmações nem sempre me têm despertado sentimentos de concordância, disse não compreender que os alunos das escolas portuguesas sejam obrigados a saber mais de mitologia grega do que do Cristianismo.
Tem carradas de razão, mas os tempos, pelos vistos, não correm propícios a que se reme contra a maré das ideias-feitas, do deixa-estar, do não-vale-a-pena ...
Não há dúvida de que, para aqueles que não queiram assistir às aulas de Religião e Moral confessional, deveria ser obrigatória a frequência de uma «cadeira de instrução sobre os princípios universalmente reconhecidos pela lei moral natural», como, por exemplo, se verifica na Alemanha, segundo se diz em nota do parecer da Câmara Corporativa.
Penso, todavia, que a proposta de alteração do Deputado Sousa Pedro não pôde ser estudada pela comissão eventual, pelo que eu, pelo menos, não me sinto capaz, à primeira vista, de medir as consequências que poderia acarretar ao nosso regime de ensino se, sem exame aprofundado, viesse a converter-se em norma geral obrigatória. Aliás, penso que o problema pode ser resolvido pelas autoridades competentes, mormente nesta época de reformas ousadas já anunciadas.
Este apontamento não o poderia omitir, até porque me proporciona o ensejo de render homenagem ao alevantado espírito inspirador da proposta de alteração em causa.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Avila de Azevedo: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ávila de Azevedo.

O Sr. Ávila de Azevedo: - A ordenação e a especificação da base VII da proposta de lei relativa à liberdade religiosa melhora consideràvehnente o ensino da religião nas escolas públicas.
Embora fosse admissível pela lei vigente que os encarregados de educação, mediante requerimento, obtivessem a dispensa da frequência da disciplina de Religião e Moral, julgo que existe uma diferença bem nítida de formulação e de execução entre o anterior processo e o processo agora proposto. Naquele tinha de se marcar uma atitude negativa, significava-se uma espécie de protesto em relação à maioria mais ou menos impregnada de sentimento religioso. Neste, escolhendo entre duas opções, uma afirmativa e outra negativa, tem-se bem a noção da responsabilidade do valor de um voto em matéria tão grave para a formação moral dos educandos. Desta maneira, os pais, tutores ou simplesmente os maiores de 18 anos dispõem de ampla liberdade de escolha: os que aceitam não sómente a educação religiosa e moral da igreja católica, mas ainda o programa da disciplina e a docência do professor proposto pelo Ordinário, afirmam-no expressamente por um acto deliberado. Respeita-se, assim, o foro íntimo da consciência e, de certo modo, afastam-se os que condescendiam apenas com o ensino religioso.
Por exemplo, nos liceus franceses, em que é perfeitamente livre a escolha da confissão religiosa, os bispos diocesanos primam em nomear para as capelanias os sacerdotes do mais elevado mérito e de reconhecidos dotes pedagógicos. Pode dizer-se que o ensino da religião católica atinge nestes estabelecimentos invulgar grau de eficiência, com perduráveis frutos espirituais e morais para os educandos que frequentam as aulas e actividades correlativas.
De facto, nos países em que é possível considerar igualmente o ensino religioso das minorias em França as comunidades protestantes são ainda muito representativas - não só se alimenta o espírito ecuménico, mas ainda se mantém aceso entre as diferentes confissões um proselitismo que revigora a fé e incita à prática das virtudes cristãs.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Conceição.

O Sr. Carvalho Conceição: - «Toda a pessoa tem o direito à educação», e esta supõe, para além das condições naturais de cada indivíduo, a existência de um
sistema de valores, uma concepção da vida e do destino do homem, em função do qual, e fora de toda a coacção externa, este se realize.
Em Portugal, de acordo com a Constituição Política (artigo 45.º, § 3.º), a orientação geral do Estado em matéria de ensino é clara: orienta-se «pelos princípios da doutrina e da moral cristãs tradicionais no País».
E o n.º 1 da base VII da proposta em discussão é do mesmo teor:

O ensino ministrado pelo Estado nas escolas públicas será orientado pelos princípios da doutrina e da moral cristãs tradicionais do País.

O n.º 2 da base VII diz:

O ensino da religião e moral nos estabelecimentos de ensino será ministrado aos alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.

É a reprodução quase fiel da linguagem concordatária, pois esta no seu artigo XXI declara:

[...] consequentemente, ministrar-se-á o ensino da religião e moral católicas nas escolas públicas elementares, complementares e médias aos alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.

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Que podemos concluir destes dois números da base VII?
Em primeiro lugar, que «e aceitam os princípios da doutrina e da moral cristãs e, em segundo lugar, que aos pais cabe o direito de «escolher o género de educação a dar aos filhos».
Examinemos estes pontos.
O artigo 42.º da nossa Constituição declara que «a educação e a instrução são obrigatórias e pertencem à família e aos estabelecimentos oficiais ou particulares em cooperação com elas», enquanto o artigo 14.º, n.º 4.º, diz ser obrigação do Estado «facilitar aos pais o cumprimento do dever de instruir e educar os filhos, cooperando com eles por meio de estabelecimentos de ensino e correcção ou favorecendo instituições particulares que se destinam ao mesmo fim». Por sua vez, a declaração conciliar afirma ser dever do Estado «tutelar o direito das crianças inconveniente educação escolar [...], mas tendo em conta o princípio da subsidiariedade e excluída qualquer forma de monopólio escolar que se opõe aos direitos naturais da pessoa humana, ao progresso e à divulgação da cultura, ao convívio pacífico dos cidadãos e ainda ao pluralismo hoje vigente em muitas sociedades».
Por outras palavras, por direito natural, a prioridade no sector da educação pertence à família, cabendo à(s) Igreja(s) e ao Estado uma função supletiva. No entanto, a evolução da família determinou um «jogo de competência» entre a Igreja e o Estado, ambos interessados que são na educação, embora a títulos diferentes.
Naturalmente, a igreja catódica, sobretudo, pela voz de alguns pontífices, afirmou que ao Estado cumpria não apenas «consentir» na acção educativa empreendida pela família ou pela Igreja, mas sobretudo proteger e promover as tarefas por elas realizadas nesse sector, sem esquecer que «ajudar» não é «destruir» nem «absorver».
Era defesa do princípio da subsidiariedade afirmar a possibilidade de serem vários os caminhos para alcançar o objectivo da educação, ressalvando-se embora a defesa da pessoa humana e ida sociedade. A sua aceitação implicava, como o exprimiu Paulo VI em 6 de Outubro de 1963:

A escola, se quer ser fenómeno vivo do povo, deve ser livre e pluralista, e quando brota tão providencial e espontânea da boa vontade dos fiéis cidadãos deve encontrar protecção na ordenação civil, ajuda, disciplina, complemento, mais do que abandono, refreamento ou desalentadora desigualdade de trato.

Do que antecede, poderíamos concluir:

1.º O respeito pela diversidade de crenças deve conduzir a um pluralismo escolar: ao lado de escolas publicas, escolas confessionais privadas;
2.º Pela mesma razão, e dada a dificuldade prática de realizar autêntica «liberdade de ensino», nas escalas públicas deverá haver um regime pluralista no que ao ensino religioso se refere;
3.º Liberdade efectiva para os pais escolherem a escola para seus filhos, de acordo com as suais convicções religiosas.

O n.º 5 da declaração conciliar, depois de afirmar que compete aos pais «o direito de determinar a forma de educação religiosa que se há-de dar a seus filhos», o que implica a liberdade de escolher as escolas e os meios educativos, cabendo ao Estado evitar que do exercício desse direito resultem «injustos encargos», acentua: «Além disso, são violados os direitos paternos, se os filhos forem obrigados a assistir a lições escolares que não correspondam às convicções religiosas dos pais, ou se for imposta lima forma única de educação de que se exclua totalmente a formação religiosa.»
Quer dizer: aos pais deveria ser concedida, face à secularização das escolas públicas (consequência do seu pluralismo) , a possibilidade de inscreverem os seus filhos em estabelecimentos de ensino mantidos por entidades religiosas. Mas essa Uberdade concreta só poderá surgir quando, através de um sistema de subsídios ou de bolsas, os pais puderem escolher entre as escolas públicas ou particulares, sem com isso sofrerem aumento de encargos. Mas como isso ainda não é viável, os pais reclamam, para seus filhos, o ensino religioso nas escolas oficiais. Por isso mesmo, reconhecendo a igreja católica que a educação religiosa e moral dificilmente se pode separar da formação escolar, entende dever esse ensino ser ministrado «nas escolas públicas elementares, complementares e médias ... (artigo XXI da Concordata), e noutros estabelecimentos de educação e correcção».
Mas, se se reconhece o princípio da «liberdade religiosa», logo o direito de cada um decidir sobre se deve ou não buscar numa igreja ou confissão o caminho da salvação; se aceitamos ser «violação dos direitos paternos» obrigar os filhos a assistir a lições que não correspondam às convicções dos pais, parece-me que se terá de prever a extensão do ensino religioso a outras confissões. Penso, em especial, nas escolas do ultramar, onde se poderá mesmo perguntar se será admissível continuar a afirmar o preceituado no n.º 1 da base VII (ensino ministrado de acordo com os princípios cristãos). A omissão do adjectivo «católicas» a qualificar «religião e moral» no n.º 2 desta base é talvez prenúncio dessa abertura das escolas aos ministros de outras igrejas.
Embora aceitando que o «Estado não professa qualquer religião» e que «as suas relações com as confissões religiosas assentam no regime de separação», pelo que a todas deve «igual tratamento» (base II), o Estado não tira daí todas as suas consequências, uma das quais seria o carácter «neutral» do ensino público. E certo que a neutralidade inquieta não só os grupos religiosos - que nela vêem a falta de um referencial espiritual -, mas também o próprio Estado, que sente a necessidade de substituir um subjectivismo mais ou menos anárquico das consciências por um objectivismo imperativo que realize uma convergência de consciências, em torno de uma tábua de valores. Por isso se afirma (Episcopado da metrópole) que, «se nem todos os portugueses aceitam explicitamente a fé cristã ... todos aceitamos uma certa concepção de vida residual cristã que nos define como povo». Daí a razão de ser para a amplitude dada no n.º 1 da base VII «Ensino orientado segundo a doutrina e moral cristãs».
Se sociològicamente era natural que a educação religiosa fosse dada conjuntamente com a educação política e familiar, quando a religião fazia corpo com a Nação, actualmente o «pluralismo religioso» e a dissociação entre a vida espiritual e outras formas de viver social levariam a pensar ser lógico admitir a neutralidade da educação do Estado. Contudo, «guardar silêncio» sobre o fenómeno religioso e sobre a religião católica (ou outra) poderia deixar na juventude a impressão da sua não importância, quer como mensagem espiritual e de salvação, quer ainda como elemento relevante na formação e na expansão do mundo português. Isto é, faltar-lhes-iam elementos para a completa ê inteligente compreensão da história humana e pátria.
Em qualquer dos casos, negar a educação religiosa ou opor-se-lhe é violar a liberdade religiosa. Nenhum ser humano pode ser privado de um ensino formativo ou, pelo menos, informativo sobre as várias religiões. O respeito

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pela liberdade dos outros impede-nos de coagir, de impor. Formar não é sinónimo de doutrinar. O educador ajuda a criança e o jovem a encontrar-se. Como expressivamente declarou o Episcopado da metrópole «o homem só aborda a verdade por meio de uma investigação pessoal e livre, que nenhuma pressão externa deve estorvar ou impor».
A finalidade de tal ensino não é tanto formular um código de receitas de conduta, mas ajudar o adolescente a construir uma personalidade. Não basta, por isso, a simples adesão intelectual a um conjunto de princípios. É na acção e pela acção que o homem se realiza. Uma verdade para ser interiorizada e tornar-se móbil da conduta deve ser vivida.
Eis por que as sessões de (religião e moral devem ser ocasião não apenas para pregar a «mensagem, evangélica», mas para anunciá-la numa praxis. No fundo, as estruturas do ensino, produto do Estado, correspondem a um projecto político, não são neutras; os programas, veiculando uma ideologia, também não são neutros; os processos pedagógicos, transposição de uma prática social, também não são neutros; eis por que ensinar é «empenhar-se». Daí que a escola cristã deva expressar a praxis da vida religiosa e ser servida por quem dela dê «testemunho».
Que procuram em tais sessões os alunos, sobretudo os mais velhos? Pouco preocupados com a catequese (tida por problema menor), reivindicam antes educação sexual, informação política, social e mesmo sindical. Poucos reivindicam uma formação cristã mais considerável e autêntica. E quando para eles se apela, em tentativas de diálogo, em busca da formação de grupos de trabalho, ficam silenciosos. Será porque se consideram satisfeitos ou porque as questões postas os deixam indiferentes? Será porque, querendo um «clima de autenticidade», em muitos casos o não encontram? A este respeito, é curioso o desabafo de alguns dos estudantes que, em França, viveram os dias de Maio de 1968. Diziam eles, referindo-se aos seus professores de Educação Moral: «temos a impressão de que eles têm vergonha ...» É certo que muitas vezes nos damos conta de que se verificam «desvãos», que inquietam os pais como os governantes, e ide que deu conta ao País o Sr. Presidente do Conselho, em 16 de Novembro de 1970: «Acontece, porém, que nos últimos anos chegam com frequência ao Governo reclamações quanto ao modo como, sobretudo em certas dioceses, é orientado o ensino da religião e da moral por professores designados pelas autoridades eclesiásticas.»
Sem dúvida, estas sessões não podem ser desencarnadas do Mundo e dos seus problemas. «A Igreja e os cristãos reclamam», escreveu João XXIII, «a possibilidade de manifestarem, livremente, a eficácia singular da sua doutrina paira organizar a sociedade». Exige-se mesmo que os respectivos professores tenham conhecimento das realidades sócio-culturais em que são chamados a exercer a sua acção, que, possuindo documentação sobre os problemas do seu tempo, sobre ela exerçam, com os seus alunos, em grupos de trabalho, uma análise serena, sem sectarismos. Mas, para tal, precisam de conhecer igualmente a realidade aluno, sabendo criar um dia de simpatia, e «empenhando-se», dando-se à sua tarefa com entusiasmo. Eis por que muito se discute, actualmente, sobre se tais sessões mão deveriam ser descolarizadas, o que permitiria dispor «por grupos» os alunos, reunir os jovens de acordo com a sua sensibilidade aos valores religiosos e morais, e levá-los à participação na procura das soluções para os problemas levantados. Be «professor catedrático» passaria a «professor animador», o que também exige mudança de atitudes e de ambiente.
Resta-me tratar de um último ponto: sendo o ensino da religião e moral facultativo, a quem cabe a decisão quanto à sua frequência?
De acordo com a proposta em discussão, os pais eram os responsáveis pela educação religiosa dos filhos até que estes perfizessem 16 anos (na primitiva redacção) ou 18 anos (forma actual). A partir destas idades, seria o próprio educando que requereria ou não o direito de ser dispensado da sua frequência.
A proposta inicial criava uma «maioridade religiosa» aos 16 anos, o que vinha contrariar o sistema actual, regido pela Concordata, a qual regula o âmbito da sua aplicação pelos graus de ensino, independentemente, portanto, da idade dos alunos. Contra a proposta se argumentou, fundamentalmente, que, nessa idade, os jovens atravessam um período de instabilidade e carecem de suficiente maturidade para julgarem da conveniência ou não de tal ensino. No entanto, a estrutura escolar portuguesa põe precisamente nessa idade a grande opção para o adolescente: escolher o curso complementar dos liceus. Será nesta fase que surgem as disciplinas de opção. Por outro lado, se é verdade que aos 15/16 anos o jovem ainda não é um adulto, embora possa ter lido muito ou julgado ter já vivido muito, também é certo que ele deve ter chegado a essa idade com um certo número de noções e vivências, que deveriam funcionar já como que de modo reflexo e trazer outras em situação de serem simplesmente desenvolvidas. Quer dizer, até aos 16 anos a família e a(s) igreja(s) ou confissões deveriam ter efectuado toda uma acção formativa e informativa que possibilitasse a sua vontade de, à luz de novos interesses, continuar, em comunhão com outros jovens e com a presença de um sacerdote (s) ou leigo, a sua educação moral e religiosa. O que é inegável é que o jovem de 16 anos tende, cada vez mais, a considerar-se independente da família. Serão os professores e os companheiros («grupos apostólicos») , que poderão criar um ambiente capaz de atrair os jovens dos cursos complementares para as sessões de religião e moral, onde «num clima de autenticidade na fé que, em muitos casos, diz-se, as aulas de religião, ao menos como costumam ser dadas, não possuem» (como o declara o padre A. Leite na Brotéria de Novembro de 1970), com autonomia, o educando complete a sua formação religiosa.
Pelo que antecede, não vejo inconveniente na proposta inicial do Governo. Por maioria de razão, aceito a idade dos 18 anos, que corresponde, no plano dos estudos ao ingresso nos cursos superiores, onde não existem tais sessões.
Segundo o n.º 4 da base II, «no acto de inscrição em qualquer estabelecimento em que se ministre o ensino da religião e moral aquele a quem competir declarará se o quer ou não».
Na sua comunicação ao País, de 16 de Novembro de 1970, o Sr. Presidente do Conselho, em dado passo afirmou: «Pareceu-lhe, pois, que sendo as famílias os juízes naturais da educação cristã dos filhos e dado o carácter facultativo atribuído pela Concordata ao ensino da religião e moral, a elas competiria a decisão do caso.» E acrescentava: «E como a obrigação de formular um requerimento especial ide isenção poderia apresentar melindres, que devem ser respeitados, facultar-se-ia aos pais a declaração no próprio acto de inscrição.»
O pedido «positivo» dos pais (para a frequência das referidas sessões) contraria o estabelecido na Concordata e o regime em vigor. Actualmente, o que expressamente se requer é o pedido de isenção. Argumentam os defensores deste último ponto de vista: «O Estado não pode deixar esta matéria tão importante confiada à inércia, ou até à ignorância, de tantos pais.» (Declaração do Epis-

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copado da metrópole.) Mas não será tal atitude o desejo de «pressionar» o que deverá constituir um «preceito decorrente da liberdade religiosa? E o argumento da «inércia», do comodismo de certos pais, não será igualmente aplicado também no caso do «silêncio»? Será por reconhecer a importância das aulas de religião e moral que a quase totalidade dos pais não requer dispensa delas? Creio que, como manifestação de convicções religiosas, é mais frisante o pedido positivo por parte dos pais para os seus filhos frequentarem tais sessões.
Acerca destoe ponto e do n.º 5 da base VII: «A inscrição em estabelecimentos de ensino mantidos por entidades religiosas implica a presunção da aceitação do ensino da religião e moral da respectiva confissão, salvo declaração púbica em contrário dos respectivos dirigentes» desejo observar o seguinte: tratando-se de uma escola confessional (católica ou não) é natural presumir-se que ela fui escolhida de acordo com as convicções religiosas dos pais. Pode, no entanto, entender-se que a função de uma escola, mesmo confessional, é abrir-se a todos, até porque é, por vezes, o único estabelecimento de ensino em certas regiões. Neste caso, não repugna que os dirigentes de tais escolas possam publicamente declarar ser livre o ensino religioso, como acontece nas escolas públicas. Por outro lado, dado que a educação nacional carece de toldos os estabelecimentos de ensino, e não só dos oficiais, em todos deve vigorar o mesmo regime, ou seja o dia liberdade religiosa. Repito, no entanto, que considero perfeitamente legítimo que uma escola confessional declare, publicamente, a obrigatoriedade para os seus alunos, do ensino religioso. «O Governo», como acentuou, na já referida comunicação ao País, o Sr. Presidente do Conselho, «não pode nem quer tornar-se zelador da pureza da fé e dos costumes quanto ao ensino concordatariamente entregue à responsabilidade da Igreja. E deseja mesmo evitar todo o pretexto de atrito com as autoridades eclesiásticas por virtude desse ensino.» São, pois, as famílias, face a um ensino facultativo, os juízes naturais, à Igreja e ao Estado cumprindo apenas colaborar com elas para o pleno desenvolvimento da criança e do jovem. Tenho bem (presente a declaração do episcopado da metrópole sobre o problema da liberdade religiosa quando afirma: «o homem só aborda a verdade por meio de uma investigação pessoal e livre, que nenhuma pressão externa deve estorvar ou impor». E é chamando a atenção da Câmara para este princípio que declaro dar o meu voto de concordância aos cinco números da base VII da proposta do Governo.

O Sr. Leal de Oliveira: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Leal de Oliveira.

O Sr. Leal de Oliveira: - Sr. Presidente: Não pretendo nas palavras que vou proferir, alterar, ou até simplesmente perturbar, o resultado altamente positivo alcançado pelo Governo - ao apresentar o projecto da proposta de lei n.º 6/X e a proposta de lei n.º 15/X -, pela Câmara Corporativa e pela comissão presidida pelo Sr. Deputado Almeida Coita num ajunto de tão alto potencial de controversão e de exaltação temperamental, razão por que não apresentei qualquer proposto, mas sim expressar a todos VV. Ex.ªs as minhas preocupações sobre alguns pontos da proposta de lei n.º 15/X e que se situam, precisamente, na base agora em discussão e votação.
Em primeiro lugar, feriu-me o facto de no n.º 1 da base VII (15/X) não se contemplarem as comunidades onde esteja presente forte percentagem de portugueses professando confissões não cristãs.
Para a resolução deste ponto chamo a atenção do Governo, nomeadamente do Sr. Ministro do Ultramar, para a conveniência de que, nos estabelecimentos de ensino orientados pelo Estado e localizados onde exista alta percentagem de populações não católicas, haja, com carácter alternativo, além do ensino de religião e moral orientado pelos princípios da doutrina e moral cristãs tradicionais no País, também, se solicitado por quem de direito, ensino de religião e moral baseado na confissão religiosa predominante.
Aproveito ainda para sugerir ao Governo, por intermédio do Sr. Ministro da Educação Nacional, para que se estude a viabilidade da criação de aulas de Moral e Educação Cívica em todos os estabelecimentos orientados pelo Estado a frequentar pelos alunos que baseados nos n.ºs 2 e 3 da base VII não assistem às aulas de ensino de religião e moral.
Para terminar quero, finalmente, afirmar a VV. Ex.ªs que darei o meu voto à proposta subscrita pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros para o n.º 1 e ao texto apresentado na proposta de lei do Governo para os n.ºs 2 ao 5.
Tenho dito.

O Sr. Silva Mendes: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Mendes.

O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente: Quero apenas, em breve apontamento, referir a minha concordância à idade preconizada no n.º 3 desta base: o mínimo de 18 anos para o aluno pedir, por si próprio, a isenção.
No entanto, também julgo que, quando o aluno, por si próprio e ao abrigo do número referido, ou os pais ou «quem suas vezes fizer» solicitarem essa mesma isenção, deveria a aula de Religião e Moral ser substituída por uma outra de Ética ou Moral Cívica. Nesse sentido recomendo ao Governo.

O Sr. Sousa Pedro: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pedro.

O Sr. Sousa Pedro: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: São poucas as palavras que tenho a dizer e que visam alterações de pormenor, como disse o Sr. Deputado Almeida Cotta. Em todo o caso, há pormenores que devem ficar bem claros na letra da lei. E parece-me que estes dois pormenores que aponto nas minhas propostas de alterações são deste tipo.
Diz o n.º 2 da base VII «O ensino da religião e moral nos estabelecimentos de ensino será ministrado aos alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer não tiverem feito pedido de isenção.»
A minha proposta de alteração ou de aditamento resume-se a incluir a palavra «confessional» a seguir à expressão «o ensino da religião e moral», ficando assim: «O ensino da religião e moral confessional nos estabelecimentos de ensino [...]»
A maneira como este número está redigido dá ideia de que se exclui a possibilidade de haver aulas de moral não confessional para os alunos cujos pais ou quem suas vezes fizer, pedirem isenção das aulas de religião e moral confessional.

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Ora, essa possibilidade não só é de atender como, além disso, me parece ser muito conveniente que na regulamentação desta base se recomende e insista na necessidade de preencher esses tempos do horário escolar com a ministração de um ensino de moral natural ou educação cívica, por exemplo, dirigido aos alunos dispensados das aulas de religião e moral confessional.
Esta disposição terá, além do mais, a virtude de corrigir qualquer intenção menos correcta ou pouco defensável na motivação dos alunos que se decidirem pelo pedido de dispensa previsto na lei.
Nessa ordem de ideias se propõe o aditamento da palavra «confessional» para caracterizar o ensino cuja dispensa se prevê venha a ser pedida. Assim ficará inequivocamente aberta a possibilidade de estes alunos receberem um ensino, formativo, de moral aconfessional de que ninguém está dispensado numa sociedade bem organizada.
Resta-me agradecer as palavras amáveis que esta proposta de alteração e o seu autor mereceram de parte do Sr. Deputado Veiga de Macedo; sinceramente as agradeço.
Quanto ao n.º 4 desta base, reza assim:

Para o efeito, no acto de inscrição em qualquer estabelecimento em que se ministre o exercício da religião e moral aquele a quem competir declarará se o quer ou não.

A minha proposta de alteração visa, simplesmente, a um pormenor que me parece ter importância prática. O pormenor é aditar à palavra «estabelecimento» outra palavra designando que o estabelecimento é oficial. E justifico porquê.
Segundo o texto da proposta, conferindo este n.º 4 com o seguinte, parece que as escolas particulares não pertencentes a entidades religiosas não poderão estabelecer a obrigatoriedade da frequência das aulas de Religião e Moral aos alunos que nelas se matricularem.
Embora admita que não foi essa a intenção do legislador, parece-me que essa Uberdade deve ficar bem expressa na lei. As escolas particulares, mesmo as que não dependem de entidades religiosas, devem gozar da liberdade, que a estas últimas se reconhece, de ministrarem aos seus alunos o ensino de religião e moral que entenderem mais adequado. Os alunos, ou quem por eles decidir, terão sempre, em contrapartida, a liberdade de escolher a escola particular que melhor corresponder às suas exigências ou gostos pessoais.
Quando muito, ao regulamentar a lei, conforme disse no meu discurso quando intervim na generalidade, poder-se-ia contemplar o caso excepcional de pequenas cidades ou vilas onde só haja, porventura, uma única escola particular para um determinado grau de ensino. Nesta situação, talvez seja lícito ao Estado condicionar a licença do ensino à garantia de que serão dispensados das aulas de Religião e Moral confessional os alunos cujos pais manifestem esse desejo. É uma hipótese que deixo em aberto, mas que de modo nenhum pode servir de regra.
Por tudo isto se entende que é de acrescentar o qualificativo «público» ao modelo de estabelecimento de ensino referido neste n.º 4, para não coarctar a Uberdade de as escolas particulares ministrarem aos seus alunos o tipo de ensino que julgarem mais bem adaptado à sua formação.

O Sr. Moura Ramos: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura Ramos.

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente: A matéria tratada nesta base VII foi, talvez, a mais controvertida de quantas a proposta de lei sobre liberdade religiosa contemplou.
Respeita ela ao direito dos pais à educação religiosa dos filhos, tudo se cifrando em saber como é que, considerando a Uberdade religiosa destes, se há-de isto conjugar com o princípio segundo o qual, em matéria educativa, o direito do Estado surge apenas a título supletivo ou subsidiário.
Ou então, como se diz na declaração do episcopado de 13 de Novembro de 1970:

O direito do Estado vem só posteriormente, a título de extensão do da família, pois ao Estado não compete, em matéria educativa, segundo a recta ordem das coisas, senão completar, suprir e defender a obra da família, fornecendo-lhe a organização, as técnicas, os recursos indispensáveis, para que ela possa cumprir-se integralmente.

Esta tem sido sempre a orientação seguida entre nós e que de há muito se encontra consagrada na Constituição Política, conforme se pode concluir pela leitura do artigo 42.º, que reza assim:

A educação é instrução são obrigatórias e pertencem à família e aos estabelecimentos oficiais ou particulares em cooperação com ela.

Estamos com a Câmara Corporativa quando diz que a intromissão do legislador, com soluções do tipo exarado no projecto e ainda na proposta de lei, será bastante mais nociva do que proveitosa.
Quanto ao ensino da moral e da religião, estamos plenamente de acordo com muitas vozes que contestam o ensino, tal como vem sendo ministrado nalgumas das nossas escolas, congratulando-nos com tudo quanto se faça no sentido de o aperfeiçoar e completar. Cremos, no entanto, que haverá que distinguir entre o ensino da moral e o ensino da religião ou do dogma. O ensino da moral deverá ser obrigatório, não podendo, em caso algum, ser dispensado, mormente numa época como esta, em que tanto se impõe, para couraçar os jovens às solicitações diabólicas que lhes surgem pari passu.

O Sr. Peres Claro: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Peres Claro: - V. Ex.ª acaba de sugerir que seja criada no nosso ensino uma disciplina apenas dedicada ao ensino da moral. Eu, se me permitisse, e no seguimento daquilo que o Sr. Deputado Silva Mendes disse há pouco, diria melhor: que se deveria criar antes uma disciplina de educação moral e cívica, porque não são apenas os princípios morais dos indivíduos que estão em crise; são também os princípios básicos da conduta do cidadão.
Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Quanto à religião ou dogma, parece-nos correcto o princípio facultativo.
E são estas, Sr. Presidente, as observações breves que me sugere a discussão desta base VII.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Há ainda vários oradores inscritos para a discussão desta base, pelo que me parece conveniente adiar a continuação do debate para a sessão da tarde.

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Esta tarde haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação da discussão e votação na especialidade da proposta de lei sobre a liberdade religiosa.
Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Olímpio da Conceição Pereira.
Bui Pontífice Sousa.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro
António Júlio dos Santos Almeida.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Carreia.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco de Mancada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes Vasconcelos Guimarães.
João Manuel Alves.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Luiz de Almeida Garrett.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
D. Maria Raquel ribeiro.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

O REDACTOR - Luiz de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL

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