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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETÁRIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127

ANO DE 1971 23 DE JULHO

X LEGISLATURA

(SESSÃO EXTRAORDINÁRIA)

SESSÃO N.º 127 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 22 DE JULHO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Amílcar da Gosta Pereira Mesquita

SUMÁRI0: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente.

O Sr. Deputado Amílcar Mesquita prestou homenagem à generosidade do instituidor da Fundação Eugénio de Almeida, de Évora.
O Sr. Deputado Linhares de Andrade preconizou a realização de visitas de estudo dos Srs. Deputados ao arquipélago dos Açores.

Ordem do dia. - Prosseguiu e concluiu-se a discussão na especialidade e votação da proposta de lei sobre liberdade religiosa.
Foram discutidas e aprovadas as bases X a XX, algumas com alterações, e uma base nova.
No debate intervieram os Srs. Deputados Miguel Bastos, Sousa Pedro, Pinto Machado, Sá Carneiro, Veiga de Macedo, Almeida Coita, Oliveira Dias, Magalhães Mota, Lopes Quadrado, Themudo Barata e Neto Miranda.
Foi concedido um voto de confiança à Comissão de Legislação e Redacção para a redacção definitiva do diploma acabado de votar.
O Sr. Presidente fez algumas considerações acerca do debate, que se iniciara na sessão seguinte, sobre a proposta e o projecto e lei de imprensa.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custodia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.

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Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Gameiro.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luis António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pemão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Valente Sanches.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raúl da Silva e Cunha Araújo.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 80 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: -Não tenho ainda nenhum Diário das Sessões para submeter à reclamação de VV. Ex.ªs

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Carta do P.e Joaquim de Sousa Ferreira e Silva sobre a proposta de lei de liberdade religiosa.
Exposição de João Vieira Santa Ana Júnior sobre a exploração de diamantes em Angola.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Deputado Amílcar Mesquita.

O Sr. Amílcar Mesquita: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A principal dimensão do homem e a grande norma da sua conduta é o amor, que age e se exerce na justiça e na caridade.
Nobres e imorredouros são, por isso, os actos e obras daqueles que a essa luz os praticam e erguem.
Obra de amor è a Fundação Eugénio de Almeida, porque, instituída com sede em Évora, no ano de 1963, pelo ilustre eborense engenheiro Vasco Maria Eugénio de Almeida (conde de Vilalva), reflecte, a todo o momento, os elevados sentimentos de justiça e de caridade do seu fundador e da sua extremosa senhora.
Assim é, pois a generosidade dos seus corações acaba de enriquecer o património da Fundação, à qual está afecta grande parte da sua fortuna, com mais um imóvel, no valor de 16 000 contos, que passa, desta forma, a dispor de mais meios para prosseguir os fins instituídos.
Évora e o Alentejo - e não exagero se disser que o próprio País - muito têm beneficiado - e, também, por isso, muito lhe devem - nos domínios da beneficência, da cultura e da educação; pela sua acção se restaurou ou se tem enriquecido o. património espiritual, cultural e moral de Évora e seu Alentejo - o mesmo é dizer: o património espiritual, cultural e moral da Nação.
Mercê, efectivamente, da Fundação Eugénio de Almeida, passou a ter vida a Cartuxa de Évora, com o regresso dos monges cartuxos - restaurava-se, assim, parte do património espiritual da cidade; subsidia-se a escola de educação Oratório de São José, de Évora, dos padres salesianos - enriquecendo-se, portanto, o património moral e cultural de Évora; cria-se o Instituto Superior de Economia e Sociologia, sob a orientação da Companhia de Jesus - passo decisivo para a restauração da Universidade de Évora e valor incalculável no enriquecimento do património moral e cultural do País.
Mas, Deus seja louvado e os méritos desta nobre alma reconhecidos, mais actos da maior generosidade de espírito temos a agradecer: a criação da Fundação D. Maria do Patrocínio, que possibilita a construção, em Évora, do Hospital do Cancro, a existência do aeródromo de Évora e a doação de terrenos para construção de habitações económicas.
Sr. Presidente:
Como representante do círculo de Évora nesta Câmara, grato é ao meu espírito trazer ao conhecimento da Assembleia - o mesmo é dizer da Nação - actos do maior valor humano em favor do bem comum, cuja evocação pudesse, porventura, despertar, nessa mesma medida, a generosidade de tantas almas nobres de cidadãos portugueses.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Linhares de Andrade.

O Sr. Linhares de Andrade: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A despeito da simplicidade e rapidez dos actuais meios de transporte, poucos são ainda os Srs. Deputados a quem tenha já sido dada oportunidade de conhecerem todo o território nacional, tão dispersos se encontram as suas diversas parcelas e tão distantes estas se situam uma dos outras. E é óbvio que a Assembleia Nacional, órgão de soberania de representação nacional, tanto me-

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lhor poderá cumprir a sua alta missão quanto maior for o número dos seus membros habilitados a pronunciarem-se sobre os muitos problemas locais aqui frequentemente debatidos, com a consciência do grau exacto do seu enquadramento no conjunto dos problemas nacionais.
Foi este pensamento, sem dúvida, que inspirou o Governo a promover nos últimos anos visitas de estudo às províncias ultramarinas de grupos de deputados pelos círculos europeus. Já na presente legislatura se realizaram a convite do Sr. Ministro do Ultramar duas dessas visitas, uma à Guiné e Cabo Verde e outra, da qual tive a honra de fazer parte, a Angola e S. Tomé e Príncipe.
Apesar de a primeira ter ficado tristemente assinalada pelo falecimento trágico de três colegas nossos, que sempre recordamos comovidamente, de ambas se colheram resultados de valor inequívoco, bem patentes, aliás, em brilhantes intervenções aqui produzidas por alguns dos senhores deputados visitantes.
Na verdade, regressámos com fé revigorada nos destinos de Portugal uno por tudo quanto nos foi dado observar sobre as imensas possibilidades das províncias visitadas, especialmente Angola, sobre o dinamismo e o acerto que vem caracterizando a actividade dos seus órgãos de administração, sobre a harmonia em que decorre a convivência dos seus habitantes, naturais ou radicados, o portuguesismo de todos, o ardor com que todos lutam por um progresso que dia a dia se sente crescer, e sobre o estoicismo, nunca demais exaltado, dos bravos componentes das forças armadas na defesa contra o terrorismo exterior. Mas, além disso, voltamos enriquecidos com muitos conhecimentos que só o contacto pessoal e directo com as pessoas e as terras nos podiam proporcionar e são indispensáveis para a correcta apreciação dos problemas locais aqui frequentemente tratados. Ainda há poucos dias, a propósito da revisão constitucional, em que parte importante das alterações propostas se referiam ao ultramar, à necessidade de dar às províncias ultramarinas maior autonomia administrativa, económica e política, sem prejuízo da unidade nacional, quanto vimos e ouvimos muito nos elucidou sobre a oportunidade e o acerto da proposta governativa que aprovamos.
Mas, Sr. Presidente, nem só o ultramar é, infelizmente, desconhecido ainda de grande número de portugueses, mesmo Deputados. Também os Açores, ilhas perdidas no meio do Atlântico, continuam a ser ignoradas da grande maioria dos nossos colegas. Pelas mesmas razões, penso que haveria toda a vantagem em promover visitas de trabalho de todos os Srs. Deputados que desejam conhecer e admirar as belezas das suas paisagens, o carácter das suas portuguesíssimas populações e, sobretudo, inteirar-se dos seus problemas e auscultar as suas aspirações, que são muitas e candentes.
Tempos houve, não muito distantes, em que os Açores eram confrangedoramente esquecidos, mesmo dos próprios governantes. Felizmente assim não acontece há já vários anos, no decurso dos quais, além das honrosíssimas visitas do Sr. Presidente da República e do Sr. Presidente do Conselho, vários membros do Governo ali se tem deslocado com relativa frequência, quase sempre acompanhados de altos funcionários dos seus departamentos e sempre com o propósito de estudarem in loco as melhores soluções para os nossos problemas.
Presentemente o Governo tem em mãos, na fase de conclusão, importantes estudos, de cuja execução depende o vigoroso impulso económico que importa dar ao arquipélago, sem tardança, sob pena de as ilhas se despovoarem por efeito da intensíssima emigração iniciada há duas décadas. A execução de alguns deles, como o plano portuário, de todos o mais instante, o plano turístico, o da construção de vias de acesso a grandes extensões de terrenos incultos susceptíveis de conversão em excelentes pastagens, da electrificação, do abastecimento de água, exigem grandes investimentos públicos e, por isso, irão obrigar o Governo a estabelecer prioridades em relação a outras regiões do País, dado que lhe não será possível acudir com a mesma prontidão e eficiência a todos os problemas que por toda a parte reclamam solução urgente.
A colaboração desta Assembleia ao Governo é indispensável, mas para dá-la validamente têm os seus membros de conhecer o melhor possível os problemas sobre que hão-de pronunciar-se, tanto para censurar como para aplaudir.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tomo, por isso, a liberdade de daqui sugerir que o próprio Governo ou as Juntas Gerais dos Distritos Autónomos dos Açores proporcionem aos Srs. Deputados, no maior número possível, visitas de estudo ao arquipélago dos Açores.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os Açorianos, estou bem certo, saberão recebê-los e agradecer-lhes.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão na especialidade e votação da proposta de lei sobre a Uberdade religiosa.
Vamos agora ocupar-nos da base X, em relação à qual há duas propostas de emenda pendentes na Mesa, que vão ser lidas com a base.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE X

1. O reconhecimento pode. ser revogado pelo Governo quando se mostre que a organização é responsável pela violação do disposto na base VIII, actua por meios ilícitos ou se dedica a actividades estranhas aos fins próprios das confissões religiosas.
2. Notificada a revogação do reconhecimento, cessarão imediatamente as actividades da organização, incorrendo em crime de desobediência todos os que nela prosseguirem.

BASE X

1. O reconhecimento pode ser revogado pelo Governo quando se mostre que a organização é responsável pela violação do disposto na base VIII, actua sistematicamente por meios ilícitos ou se dedica a actividades estranhas aos fins próprios das confissões religiosas.

2. .....................

Sala das Sessões, 16 da Julho de 1971. - O Deputado, Teodoro Sousa Pedro.

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BASE X

1. O reconhecimento pode ser revogado, a pedido do Governo, por sentença dos tribunais judiciais, quando se mostre que a organização como tal é responsável pela violação do disposto na base VIII, actua por meios ilícitos ou se dedica a actividades estranhas aos fins próprios das confissões religiosas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Os Deputados: Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: Uma brevíssima nota sobre as duas emendas apresentadas à base X.
A emenda apresentada pelo Deputado Sá Carneiro e outros Srs. Deputados consistem em pretender que a revogação do reconhecimento das confissões religiosas se faça, a pedido do Governo, por sentença dos tribunais judiciais.
Ora, em meu entender, isto não é possível.
Desde que o reconhecimento é por acto de concessão, só por acto do Governo pode ser revogado. Só quem concede pode revogar a concessão feita.
Se o reconhecimento fosse feito por acto normativo, então sim, já era possível que a sua revogação fosse feita pelos tribunais judiciais. Mas não é o caso.
Aliás, quer a concessão, quer a revogação, assentam em condicionalismo que escapa à fiscalização dos tribunais judiciais, bastando, para se chegar a essa conclusão, analisar os pressupostos contidos na base VIII, aplicáveis tanto a uma como a outras das situações em análise (v. g. princípios da ordem constitucional, interesses da soberania nacional).
Pelas razões sucintamente expostas, julgo ser de manter o n.º 1 da proposta de lei.
Quanto à emenda do Deputado Sousa Pedro, exigindo que a revogação do reconhecimento de certa e determinada confissão religiosa só se processe quando actue sistematicamente por meios ilícitos, também me parece inaceitável.
O exigir-se que a violação seja sistemática pressupõe que o Governo teria de acatar passivamente as violações cometidas até se atingir um clima de habitualidade que lhe permitisse actuar, situação que me parece muito difícil de poder ser considerada, pois basta um acto destes praticado, pela sua gravidade, para ter que determinar a imediata revogação do reconhecimento concedido.
Esta emenda renova uma sugestão (parecer da Câmara Corporativa) que procura no seu douto entender aproximar das causas da revogação do reconhecimento as sociedades e as associações criadas para outros fins.
Ora, é evidente que há uma grande diferença quando consideramos as causas de extinção das simples associações previstas nos artigos 167.º e seguintes do Código Civil com as que terão de determinar a revogação do reconhecimento de uma confissão religiosa quando se mostre que a sua organização é responsável por ter actuado por meios ilícitos.
A especial natureza destas organizações e o alto significado dos interesses que a lei pretende proteger bem justifica o tratamento especial adoptado nesta base da proposta.
Estas as razões por que entendo ser de rejeitar a emenda proposta pelo Deputado Sousa Pedro.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão a base X e as propostas de emenda.

O Sr. Sousa Pedro:- Para o n.º 1 desta base faço meus os comentários apropositados dos Digmos. Procuradores da Câmara Corporativa, que expressamente dizem:

Quanto à actuação da organização por meios ilícitos, entendeu-se que a disposição deve ser aproximada do disposto no artigo 182.º, n.º 2, alínea c), do Código Civil, que não se satisfaz, para a extinção das associações em geral, com a prática de actos ilícitos ou imorais isolados, exigindo para o efeito um recurso sistemático a actos dessa natureza.
Parece-me fundamental essa diferença entre uma actuação ilícita fortuita e outra que o seja de modo sistemático.
Proponho, pois, a inclusão da palavra «sistematicamente» para caracterizar o tipo de actuação que pode levar a autoridade a revogar o reconhecimento de uma organização religiosa.

O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente: Nos Estados totalitários - alguns dos quais se intitulam democráticos - os cidadãos são súbditos, meros objectos manipulados discricionàriamente pelo Estado omnipotente em que todos os poderes se concentram de facto num mesmo órgão, singular ou colegial.
Nos Estados de direito os cidadãos - em quem reside a soberania e de quem os poderes públicos são mandatários livremente constituídos - são sujeitos de direitos anteriores ao Estado e que, enquanto tal, limitam inalienàvelmente os poderes deste, que, em última análise, tem justificação e fim na defesa, garantia e promoção do bem comum, entendido este como o conjunto de todas as condições indispensáveis a que cada cidadão se realize integralmente como pessoa no respeito pela ordem pública, a qual integra a justiça e a moralidade e paz públicas.
Nos Estados de direito os poderes legislativo, executivo e judicial eram tradicionalmente exercidos por órgãos distintos: o parlamento, o Governo e os tribunais. Porém, o crescente intervencionismo do Estado imposto pela consciência cada vez mais viva do seu dever de defesa e promoção da justiça - considerada esta com conteúdo cada vez mais amplo e reconhecida como direito de todos -, associada à crescente complexidade dos problemas nos domínios em que se exercem os poderes do Estado, determinaram não só uma amplificação notável do poder executivo detido pelos Governos como ainda a atribuição a estes de importantes funções legislativas.
Disto resultaram duas consequências imediatas e fundamentais:

1) Prestígio e influência política crescentes dos técnicos, bem expressa pela sua progressiva inclusão, enquanto tais, nas equipas governativas;
2) Redução do prestígio, poder, influência e eficácia dos parlamentos, quer pela atribuição de funções legislativas aos governos, quer pela carência de apoio técnico indispensável à actividade legislante e à fiscalização dos actos do governo (realizados e omissos).
Este desequilíbrio - em relação ao equilíbrio tradicional -, se tem inegáveis e evidentes vantagens operacionais de eficácia, tem sérios perigos, de que aponto dois: o desmedido empolamento das atribuições governamentais e o predomínio dos critérios técnicos sobre os políticos, em consequente desvalorização do homem, que, de sujeito e fim, passa a máquina e instrumento.
Este novo arranjo da distribuição dos poderes do Estado pelos seus órgãos impõe reflexão e medidas correcti-

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vas apropriadas que mantenham as vantagens e eliminem os inconvenientes. E impõe também - e entro agora concretamente na matéria em debate - que seja ciosamente defendida a independência do Poder Judicial, independência esta considerada em duas linhas: a da sua competência exclusiva no julgamento e penalização das infracções às leis e a da não interferência dos governos na constituição dos tribunais.
Na defesa da sociedade contra abusos (isto é, maus usos) do exercício das liberdades cívicas há que distinguir dois momentos, duas competências, dois planos:

1) Intervenção rápida da responsabilidade superior dos governos, em ordem a fazer desde logo cessar esse abuso;
2) Intervenção ulterior da responsabilidade dos tribunais judiciais, visando julgar se houve ou não abuso e, no caso afirmativo, atribuir as penas adequadas.

Esta doutrina deve, portanto, aplicar-se também aos abusos a pretexto do exercício da liberdade religiosa, e muito particularmente quando se trata de penalização que retira o reconhecimento jurídico a uma organização religiosa, decisão cuja gravidade é despiciendo explicar aqui. Acresce que o julgamento pode ser difícil, pois nem sempre será singelo comprovar que determinada actividade é estranha ao fim próprio de uma confissão religiosa (encíclicas sociais, Gaudium et spes).
A atribuição ao Governo do poder de julgar e decidir a revogação do reconhecimento de uma confissão religiosa pode levar a arbítrios da Administração e à perda de confiança na garantia consignada na base I, coarctando-se, assim, na prática o que na teoria se quer defender.
Que o Governo, como lhe compete, vigie e detecte. Mas que sejam os tribunais judiciais a julgar.
Creio ter justificado por que subscrevi a redacção proposta para a base X pelo Sr. Deputado Sá Carneiro, a quem deixo as objecções do Sr. Deputado Miguel Bastos.
E termino estas já longas considerações aplicando à matéria em debate o que a propósito da liberdade de imprensa declarou, no seu voto de vencido ao parecer da Câmara Corporativa, o Digno Procurador Henrique Martins de Carvalho:

[A liberdade religiosa] está tanto melhor assegurada, num Estado de direito, quanto mais as condições sócio-políticas e sócio-culturais permitem ampliar a área de jurisdicionalização em detrimento das decisões tomadas por via administrativa.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: Essencialmente, a alteração proposta visa retirar ao Governo a competência para a revogação do reconhecimento, para a conferir aos tribunais. E também a condicioná-la a que: se mostre uma organização, como tal, seja responsável pela violação, etc. Parece-me esta última redacção preferível à proposta do Sr. Deputado Sousa Pedro. Visto que afasta os inconvenientes apontados pelo Sr. Deputado Miguel Bastos quanto a ter de se aguardar uma prática sistemática de actos. Mas, parece-me indispensável consignar que seja a organização, como tal, a responsável pela violação do disposto na base viu e pela actuação ilícita, e não apenas os simples fiéis.
Quanto à atribuição da competência para a revogação do reconhecimento: poderia pensar-se que estando esta matéria Intimamente relacionada como o conteúdo proposto para a base viu, a votação feita sobre esta última prejudicaria a alteração proposta para a base X. Estava efectivamente em grande parte relacionada uma matéria com a outra. Mesmo assim, apesar do teor actual da base VIII, parece-me indispensável que seja adoptada a redacção que propomos. Opõe-se a isto que, sendo o reconhecimento um acto de concessão do Governo, só pelo Governo poderia ser revogado, visto que não estão em causa normativos. Em si, o reconhecimento não é propriamente um acto de concessão. O Governo nada concede, reconhece um direito; limita-se a verificar um certo número de pressupostos, necessários para que seja garantida uma mais ampla e institucionalizada liberdade religiosa às confissões. Mas é certo que o reconhecimento dos pressupostos é feito por acto do Governo, acto administrativo. O que já não é exacto é que a revogação do reconhecimento ponha em causa apenas aqueles pressupostos que levam ao reconhecimento. O que está em causa, essencialmente, no reconhecimento, é a salvaguarda do interesse da Administração, quanto à verificação dos pressupostos enumerados na base IX. E compreende-se que os interesses da Administração sejam defendidos por esta, sobre a fiscalização dos tribunais administrativos.
Mas a revogação de um reconhecimento não surge apenas quando se não verifiquem aqueles pressupostos, visto que, na própria redacção da base X, constante da proposta do Governo, ele será revogado quando «a organização é responsável pela violação da base VIII, actua por meios ilícitos ou se dedica a actividades estranhas aos fins próprios das confissões religiosas». Basta atentar na actuação por meios ilícitos, para se ver que o que aqui está em causa são preceitos normativos da lei geral, em especial da lei penal. E teremos o absurdo de ver o Governo julgar da infracção da lei penal, decidir sobre a aplicação da mesma. Quem é que decide que os actos são ilícitos, para efeitos de reconhecimento? Pois, tal como está redigida a proposta do Governo, parece que é o próprio Governo.
Estão em causa, portanto, normativos; estão em causa interesses fundamentais das pessoas, e não, exclusivamente, interesses da Administração. Essa me parece ser a razão essencial por que não se pode confiar ao Governo a revogação do reconhecimento.
Não são apenas os interesses da Administração que estão em causa, mas sim os interesses, os direitos e as liberdades das pessoas.
Como conciliar, pois, os interesses da Administração e os das pessoas?
Afigura-se-me que só uma forma é possível e, nesse sentido, se propôs uma nova redacção para esta base X. Ao Governo competiria assegurar a defesa dos interesses da Administração, pela iniciativa que tomasse do pedido de revogação do reconhecimento. Aos tribunais competiria decidir da aplicação da lei e da defesa dos interesses das pessoas e da sua equacionação com os interesses gerais, através da decisão de revogação do reconhecimento.
Só assim se poderão conciliar, devidamente, os interesses, direitos e liberdades das pessoas com os interesses da Administração.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a base X, segundo o texto da proposta de lei e das emendas pendentes na Mesa.

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O Sr. Veiga de Macedo: - O preceito da base X contém, com algumas das alterações propostas pela Câmara Corporativa e aceites pelo Governo, a doutrina das bases IX e X do projecto de proposta de lei.
A Câmara entendia, porém, que para se revogar o reconhecimento de uma confissão religiosa se deveria exigir, para o efeito, um recurso sistemático a actos ilícitos, a exemplo do que se prevê no artigo 182.º, n.º 2, alínea c), do Código Civil para a extinção das associações em geral. O Governo, neste aspecto, não deu satisfação ao alvitre da Câmara Corporativa e creio que bem, pois se, neste domínio, se devem facultar compreensivamente amplas liberdades às confissões religiosas, não podem estas deixar de respeitar as leis vigentes e os interesses fundamentais do Estado e da Nação. Se tal não se observa, as autoridades, uma vez cientes da gravidade de actos praticados, devem agir em conformidade com as conveniências gerais que lhes cabe acautelar. Prudência não exclui energia, e magnanimidade não é o mesmo que abdicação ou renúncia.
A acção do Estado deve, pois, nesses casos, ser firme e pronta, o que se não compadecerá sempre com a exigência preconizada pela Câmara Corporativa quanto ao carácter sistemático na prática de actos ilícitos, até porque um só acto desta índole pode, pelo seu perigo e repercussão, assumir maior gravidade que a prática, mais ou menos continuada, de outros menos nocivos e de consequências mais restritas.
Estas palavras evidenciam também a minha posição quanto à proposta de alteração em debate, destinada a fazer depender a revogação do reconhecimento de uma confissão religiosa de sentença judicial, embora a pedido do Governo.
Penso que seria arriscado retirar ao Governo uma faculdade a que, por força de urgentes e indeclináveis razões de ordem pública ou de interesse nacional, pode ter de recorrer-se com celeridade incompatível com a tramitação, em regra morosa, de um processo judicial.
Só merece aplauso a intenção dos ilustres proponentes da alteração em debate, mas creio que não o merece menos o propósito do Governo, que, na justa e prudente ponderação de todos os factores em presença, deverá, neste domínio, e sempre que necessário, usar precisamente do mesmo poder que lhe permite reconhecer as confissões religiosas, no pressuposto de que estas não exorbitarão do seu âmbito natural da acção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ainda mo domingo passado a imprensa deu notícia da entrevista concedida pelo Sr. Presidente do Conselho a um jornal sueco, ao qual, a propósito do «desvio de centenas de estudantes portugueses para universidades estrangeiras», em consequência «de manobras dos nossos inimigos», o Doutor Marcelo Caetano não hesitou em declarar:

Um dos mais traiçoeiros golpes sofridos por Portugal nesse ano (ano de 1961) foi devido à acção de missões americanas que provocaram e subsidiaram a emigração desses estudantes, dispersos depois por diversos países a fim de serem educados numa atitude antiportuguesa.

Não será preciso apresentar mais exemplos, pois, infelizmente, como este exemplo, outros provenientes de sectores religiosos, protestantes e não protestantes, são de todos bem conhecidos.
É bem recente o epílogo do tristíssimo caso da mesma natureza registado em Moçambique para que se torne necessário acentuar a delicadeza e a importância de problemas como aquele sobre o qual estamos agora a debruçar-nos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Almeida Gotta: - Sr. Presidente: Nos Estados de direito as decisões do Governo não são apreciadas pelos tribunais judiciais, mas por outros órgãos da administração da justiça.
Seja como for, o reconhecimento é um acto administrativo - como aqui sublinhou o Sr. Deputado Sá Carneiro - e a apreciação desses actos tem uma jurisdição e competência próprias, para tanto devidamente estabelecidas. A termos de confiar em ^alguém, por que negar ao Estado a equidade do julgamento, tanto mais que dele há recurso para uma instância que se encontra em igual plano das instituições judiciárias?

O Sr. Pinto Machado: Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinto Machado.

O Sr. Pinto Machado: -Sr. Presidente: E um esclarecimento a um reparo do Sr. Deputado Almeida Cotta, que, aliás, não sei se me era dirigido e, a sê-lo, sinceramente que não tem cabimento.
Eu não disse que nos Estados de direito são os tribunais judiciais que fiscalizam a acção do Governo.
Referi-me, sim, às funções dos tribunais judiciais de averiguar das infracções cometidas pelos cidadãos no que respeita ao cumprimento das leis. A referência que fiz à fiscalização dos actos do Governo - que é um problema gravíssimo em qualquer país do mundo de hoje respeitava aos parlamentos. Devido ao necessário aumento do intervencionismo governamental e à complexidade dos problemas no domínio da economia, da educação, da saúde, etc., enfim, a todo este desenvolvimento técnico extraordinário, os governos necessitam e dispõem de um apoio técnico cada vez maior, apoio que os parlamentos não têm. Acerca disso li, muito recentemente, um artigo - por sinal dá autoria de um professor universitário americano - em que o problema era posto em relação às relações do Presidente dos Estados Unidos com o Congresso, Congresso que vai caminhando para uma demissão progressiva por falta de meios técnicos para poder julgar as iniciativas legislativas que a administração lhe apresenta, fundamentadas em estudos exaustivos, e os próprios actos desta. O que, por sua vez, faz com que esta administração esteja, cada vez mais, dependente das técnicas que duo os pareceres, pois o Governo decide em função das informações que os técnicos mandam e eles podem mandar umas e não mandar outras.
Foi, pois, este o problema que pus, e de maneira nenhuma aquele a que o Sr. Deputado Almeida Cotta se referiu. Aliás, não sei se era dirigido a mim esse reparo.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: A revogação do reconhecimento não põe em causa a apreciação de um acto do Governo. Ao revogar o reconhecimento não se está a julgar do acto do reconhecimento, não se está a decidir se ele foi bem ou mal feito. Para isso há, efectivamente, recurso para o Supremo Tribunal Administrativo.

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O que se está a fazer, ao revogar o reconhecimento, é a apreciar a actuação de particulares, em função de normas legais.
Portanto, não tem nada uma coisa com a outra.
Estando em causa a actuação de particulares e a aplicação de normas legais, parece-me inegável que a competência deve ser dos tribunais judiciais.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Ponho primeiramente à votação, como mais antiga, a emenda do Sr. Deputado Sousa Pedro ao n.º 1 da base X.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a emenda ao mesmo n.º 1 da base X, segundo a proposta do Sr. Sá Carneiro e outros Srs. Deputados.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, a base X, quanto ao n.º 1, reduzida ao texto da proposta de lei. E, porque em relação ao n.º 2 não há qualquer proposta de alterações, ponho agora à votação de VV. Ex.ªs, em conjunto, os n.ºs 1 e 2 da base X, segundo o texto da proposta de lei.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à base XI, em relação à qual também há uma proposta de alterações. Vão ser lidas.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XI

1. As confissões religiosas legalmente reconhecidas podem organizar-se de harmonia com as suas normas internas.
2. Às confissões religiosas reconhecidas é permitido formar associações ou institutos destinados a assegurar o exercício do culto.

Proposta de alteração

Propomos, nos termos regimentais, que o n.º 2 da base XI passe a ter a seguinte redacção:

2. Às confissões reconhecidas é permitido formar, dentro de cada uma delas, associações ou institutos destinados a assegurar o exercício do culto ou a prossecução de outros fins específicos da vida religiosa.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 13 de Julho de 1971. - Os Deputados: Almeida Cotta - Miguel Bastos - Nunes de Oliveira - Oliveira Ramos - Salazar Leite - Bento Levy - Ricardo Horta Júnior - Veiga de Macedo - Prabacor Rau - Cunha Araújo.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Veiga de Macedo: - O padre António Leite, ao apreciar a base XI do projecto da proposta de lei, afirma que a definição dessa base, que lhe parece inspirada nas «cultuais» que a Lei de Separação pretendia instituir, é demasiado restrita. E acrescenta:

Há, com efeito, muitas associações religiosas, por exemplo as destinadas à formação espiritual dos seus membros, ao exercício da caridade, etc., que não têm por fim primário a instrução do culto [...], importando, assim, modificar tal definição [...]

pois,

[...] de outro modo, por exemplo, as ordens religiosas, os organismos da Acção Católica, as conferências de S. Vicente de Paula e ... outras associações e instituições religiosas não seriam considerados por lei como associações religiosas.

A este respeito, a Câmara Corporativa também se pronuncia em termos dificilmente rebatíveis, começando por afirmar tornar-se conveniente aproveitar o ensejo para afastar as dúvidas de alguns preceitos do Código Administrativo quanto às confissões religiosas e às associações que nelas se integram.
Na verdade, a base XI do projecto de lei deixa de fora, ao aludir apenas a associações, as fundações religiosas que são pessoas morais não colegiais, mas que existem, com grande variedade, no domínio da organização católica. A Câmara Corporativa aponta, como pertencendo a este grupo de pessoas morais, as dioceses, as mitras, os seminários, as antigas colegiadas, as fábricas das igrejas paroquiais, os benefícios paroquiais, etc.
Seria, pois, inaceitável que tais «pessoas morais não continuassem, como pessoas colectivas religiosas, a gozar da protecção que a Concordata lhes quis conceder quando, ao assegurar o reconhecimento normativo da sua personalidade, se referiu intencional e discriminadamente às associações, corporações ou institutos religiosos canonicamente erectos».
O mesmo se diga quanto ao reconhecimento, «embora em termos diferentes dos prescritos na Concordata», de personalidade jurídica aos institutos religiosos não católicos.
Por outro lado, acentua ainda a Câmara Corporativa, o projecto, em obediência ao critério restritivo fixado na lei administrativa (artigo 449.º), continua a limitar o conceito das associações religiosas às pessoas morais que têm por fim principal a sustentação do culto. Ora, tal limitação não se coaduna, de modo nenhum, com o espírito e a letra do instrumento concordatário.
A comprovar esta afirmação, a Câmara Corporativa sublinha:

Ao falar amplamente nas associações, corporações ou institutos religiosos canonicamente erectos, a Concordata não quis com certeza deixar fora do campo de aplicação dos artigos III e IV aquelas corporações ou institutos, como as pias uniões (destinadas à prática de actos de piedade e de caridade) ou as ordens terceiras seculares (apostadas em promover a perfeição cristã dos seus membros), tradicionalmente admitidos no seio da igreja católica (cf. Cânone 685 do C. D. C.), mas afectados a outros fins religiosos, que não a mera sustentação do culto.
Entre os tipos de associações eclesiásticas genericamente discriminadas nesse preceito do Código de Direito Canónico incluem-se as destinadas a promover uma vida cristã mais perfeita (cân. 702 e segs.) ou a realizar obras de piedade e de caridade. E entre

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as primeiras parece caberem perfeitamente organismos de carácter cultural (e por que não recreativos?). Aliás, na própria declaração conciliar sobre a liberdade religiosa se diz (n.º 4, in fine) textualmente o seguinte: «Na natureza social do homem e na própria índole da religião se funda o direito pelo qual os homens, levados pelo seu sentimento religioso, podem livremente reunir-se ou formar associações educativas, culturais, caritativas e sociais.»
Mas não quero referir-me apenas às pessoas colectivas católicas, pois não vejo como as restantes confissões, legalmente reconhecidas, possam ser impedidas de ter «o âmbito das corporações ou institutos religiosos alargado ao aperfeçoamento moral, o recreio ou a cultura dos fiéis ou ministros da confissão, a prática da piedade religiosa, etc.».
Nem se argumente «contra a excessiva proliferação das pessoas colectivas ou o seu empolamento patrimonial com os reconhecidos inconvenientes de retenção nas suas mãos de uma parcela importante da riqueza nacional», pois, «os perigos da mão morta combatem-se por outros meios, que não a limitação artificial da área de ocupação reservada a determinada categoria de pessoas morais».
Entendo, pois, que a base XI e a base XII da proposta devem ser alteradas no sentido sugerido pela comissão eventual, que, como se vê, é coincidente com o da Câmara Corporativa e bastante mais amplo que o da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a base XI, passamos à votação.
Ponho primeiramente à votação o n.º 1 da base XI segundo o texto da proposta de lei.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a proposta de emenda ao n.º 2 da mesma base subscrita pelos Srs. Deputados Almeida Cotta e outros.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está, portanto, prejudicado o texto do n.º 2 da proposta de lei.
Vamos passar à base XII, em relação à qual há várias propostas de emenda.
Vai tudo ser lido.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XII

1. São consideradas religiosas as associações ou institutos constituídos ou fundados com o fim principal da sustentação do culto de uma confissão religiosa já reconhecida, de harmonia com as normas e disciplina dessa confissão.
2. As associações ou institutos religiosos adquirem personalidade jurídica mediante o acto de registo da participação escrita da sua constituição pelo órgão competente da confissão religiosa reconhecida; a participação será apresentada e o registo efectuado nos termos que em regulamento forem fixados.
3. Em caso de modificação ou extinção da associação ou instituto, far-se-á participação e registo nos termos estabelecidos para a sua constituição.

BASE XII

Propomos, nos termos regimentais, que o n.º 1 da base XII passe a ter a seguinte redacção:

1. São consideradas religiosas as associações ou institutos constituídos ou fundados com o fim principal da sustentação do culto de uma confissão religiosa já reconhecida ou qualquer outra actividade especificamente religiosa, desde que se constituam de harmonia com as normas e disciplina da respectiva confissão.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 13 de Julho de 1971. - Os Deputados: Almeida Cotta - Miguel Bastos - Nunes de Oliveira - Oliveira Ramos - Salazar Leite - Bento Levy - Ricardo Horta Júnior - Veiga de Macedo - Prabacor Rau - Cunha Araújo.

BASE XII

1. As associações religiosas adquirem personalidade jurídica pelo acto do registo da participação escrita da sua constituição feita pelos órgãos competentes da confissão religiosa reconhecida, apresentada na secretaria do governo civil do respectivo distrito, ou no Ministério do Interior, quando a actividade da associação deva exceder a área de um distrito.
2. Em caso de modificação ou de extinção de uma associação religiosa, far-se-á participação e registo nos mesmos termos estabelecidos para a constituição.
3. A revogação do reconhecimento de uma confissão religiosa determina a extinção das respectivas associações religiosas e, bem assim, das outras associações ou das fundações que prossigam os seus fins ou que dela dependam.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Os Deputados: Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.
Chamo a atenção da Câmara para que a proposta de emenda do Sr. Deputado Sá Carneiro e outros Srs. Deputados é praticamente uma substituição da base XII, por quanto, segundo a sua redacção, o n.º 1 da base da proposta de lei desaparece e o n.º 3 da proposta do Sr. Deputado Sá Carneiro é, efectivamente, em aditamento ao texto da proposta de lei.
A base XII, segundo a emenda do Sr. Deputado Sá Carneiro, mão poderá ser posta a votação número a número com a proposto de lei, porque é um conjunto completo; em todo o caso, a Mesa agradecerá qualquer sugestão dos Srs. Deputados autores desta proposta.
Estão em discussão conjuntamente.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: Como V. Ex.ª muito bem acabou de notar, trata-se, efectivamente, de uma substituição, substituição essa que retoma ma íntegra o texto do projecto de proposta do Governo, aditando-lhe um n.º 3, que nessa projecto de proposta em uma base autónoma.
Parece preferível à redacção proposta pela Câmara Corporativa.
Em primeiro lugar, por não haver necessidade de definir em termos estritos e, a meu ver, não aceitáveis, quando se restringem; às cultuais as associações e os institutos.

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Por outro lado, parece suficiente para disciplinar o direito de associação o conteúdo agora aprovado no n.º 2 da base Xi.
Pareceu, além disso, inconveniente deixar para regulamento a participação e o registo. É, salvo erro, o único ponto que esta lei prevê ao regulamento, que ela própria não diz quando deverá ser promulgado. Não se afigura necessário estar a deixar esta matéria para regulamento. De resto, o próprio conteúdo limitado às cultuais propósito aio D.º 1 da base XII da proposta do Governo parece nem sequer se filiar nas razões aduzidas pela Câmara Corporativa, que diz que se amplia a noção de associações religiosas, incluindo nelas as associações ou institutos com outros fins religiosos que não a sustentação do culto, mas não se prescinde que tenha carácter especificadamente religioso o seu fim predominante.
Ora, isto parece excluído na redacção do n.º 1 da base XII da proposta. Parece, portanto, preferível abandonar esta redacção e regular, em termos mais simples e de aplicação directas a aquisição de personalidade jurídica das associações religiosas.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Os problemas tratados na alteração proposta pelo Sr. Deputado Sá Carneiro contempla-os a proposta do Governo, ou nesta base ou noutras. Por exemplo, o n.º 3 da emenda, que é tratado na base XIII da proposta do Governo.
Não vejo qualquer vantagem em nenhuma das emendas, e, quanto ao regulamento, pois, como VV. Ex.ªs sabem, quer ficasse previsto que certos assuntos são desenvolvidos no regulamento, quer não ficasse previsto, todas as leis, quando disso careçam, são regulamentadas. São regulamentadas naquilo que é necessário para a sua boa execução. De maneira que eu não encontro, e com desprazer meu, vantagem nenhuma, nem conveniência nenhuma, na adopção de qualquer das emendas apresentadas.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Considerando que, como parece ter ficado estabelecido, a proposta do Sr. Deputado Sá Carneiro e outros Srs. Deputados é uma substituição da base XII, encorporando, aliás, a matéria da base XIII da proposta de lei, ponho primeiramente à votação esta proposta, dado o seu carácter de substituição, e parece-me adequado, em consequência, pô-la à votação na sua integralidade; mas continuarei a aceitar qualquer sugestão que os autores do projecto julguem que possa esclarecer melhor a Assembleia e a sua decisão.

Submetida à votação, foi rejeitada.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Ponho agora à votação a proposta de emenda ao n.º 1 da base XII preconizada pelo Sr. Deputado Almeida Cotta e outros Srs. Deputados.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Ponho seguidamente à votação os n.ºs 2 e 3 da base XII, segundo o texto da proposta de lei.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está completada a votação da base XII.
Vamos passar agora à base XIII, em relação à qual não há na Mesa qualquer proposta de alteração.
Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

BASE XIII

A revogação do reconhecimento de uma confissão religiosa determina a extinção das respectivas associações ou institutos religiosos, e bem assim das outras pessoas colectivas que dela dependam.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para discutir a base XIII da proposta de lei, ponho-a à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos em seguida à base XIV, em relação à qual há duas propostas de emenda na Mesa. Vão ser lidas.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XIV

1. As organizações correspondentes às confissões religiosas e as associações e institutos religiosos administram-se livremente, dentro dos limites da lei, sem prejuízo do regime vigente para as associações religiosas que se proponham também fins de assistência ou de beneficência e para os institutos de assistência ou de beneficência fundados, dirigidos ou sustentados por associações religiosas.
2. As organizações correspondentes às confissões religiosas e as associações ou institutos religiosos não podem ser submetidos ao regime de tutela.

Propostas de emenda

BASE XIV

1. As organizações correspondentes às confissões religiosas e as associações e institutos religiosos administram-se livremente, dentro dos limites da lei, sem prejuízo do regime vigente para as entidades religiosas que se proponham também fins de assistência ou de beneficência fundados, dirigidos ou sustentados por entidades religiosas.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 15 de Julho de 1971. - A Deputada, Maria Raquel Ribeiro.

BASE XIV

1. As organizações correspondentes às confissões religiosas e as associações e institutos religiosos administram-se livremente, dentro dos limites da lei, sem prejuízo do regime vigente para as que se proponham também fins de assistência ou de beneficência fundadas, dirigidas ou sustentadas pelas mesmas organizações.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - A Deputada, Maria Raquel Ribeiro.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada D. Maria Raquel Ribeiro apresentou um requerimento pedindo para retirar

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a sua proposta de emenda ao n.º 1 da base XIV, com data de 15 do corrente mês; vai ser lido o requerimento e VV. Ex.ªs deliberarão imediatamente sobre ele para sabermos o que é que fica em debate.

Foi lido. É o seguinte:

Nos termos regimentais, requeiro para ser retirada a proposta de emenda à base XIV n.º 1, apresentada em 15 de Julho, a fim de ser substituída pelo texto também de emenda à mesma base, n.º 1, datada de 16 do corrente.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 20 de Julho de 1971. - A Deputada, Maria Raquel Ribeiro.

O Sr. Presidente: - Em suma, a Sr.ª Deputada D. Maria Raquel Ribeiro apresentou duas propostas de emenda ao mesmo número da base XIV, uma destas propostas datada de 15 de Julho e a outra de 16 de Julho; e apresentou seguidamente um requerimento pedindo autorização para retirar a primeira dessas propostas de emenda.

Posto o requerimento à votação, foi autorizada a retirada da proposta.

O Sr. Presidente: - Ficam, portanto, pendentes apenas o texto da proposta de lei e a segunda das emendas da Sr.ª Deputada D. Maria Raquel Ribeiro, que me julgo conveniente voltar a ler, agora que a questão já está esclarecida.

Foi lida de novo. É a seguinte.

Proposta de emenda

BASE XIV

1. As organizações correspondentes às confissões religiosas e as associações e institutos religiosos administram-se livremente; dentro dos limites da lei, sem prejuízo do regime vigente para as que se proponham também fins de assistência ou de beneficência fundadas, dirigidas ou sustentadas pelas mesmas organizações.

O Sr. Presidente:- Estão em discussão a base e a proposta de emenda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Bastos.

O Sr. Miguel Bastos: - A emenda proposta pela Deputada Raquel Ribeiro parece pretender englobar, no regime geral vigente para as pessoas colectivas de assistência, as próprias organizações religiosas quando estas se proponham também fins de assistência e beneficência, por lhe parecer não ser suficiente o submeter-se àquele regime as associações e institutos religiosos que com aqueles fins se constituam.
Ora, parece que nunca esteve, nem em meu entender podia estar, no espírito do legislador submeter ao regime geral aplicável às pessoas colectivas votadas a fins de assistência ou de beneficência mais do que as associações ou institutos que, além dos fins religiosos, se propõem também fins de assistência ou beneficiência.
Já mais além parece muito delicado, especialmente por trazer uma inovação de difícil interpretação na prática.
No douto parecer da Câmara Corporativa, ao fazer-se referência aos pontos fundamentais da legislação vigente, diz-se o seguinte:

Se visam apenas a prossecução de fins religiosos, o artigo IV da Concordata (convertido em direito interno, como é sabido, pelo artigo 61.º do Decreto-Lei n.º 30 615) consagra o princípio da sua livre administração, sob a vigilância e fiscalização da autoridade eclesiástica competente, e remete, quanto á capacidade de aquisição e disposição de bens, para a legislação aplicável («legislação vigente», diz o texto concordatário) às outras pessoas morais perpétuas.
Se, além de fins religiosos, ais associações ou institutos católicos se propuserem também fins de assistência ou de beneficência, em cumprimento de deveres estatutários ou de encargos inerentes a liberdades que lhes tenham sido feitas, ficarão sujeitos, mas apenas nessa parte, às disposições do direito interno, válidas para as pessoas colectivas votadas a fins de assistência ou de beneficiência.
Aos institutos de assistência ou beneficiência fundados, dirigidos ou sustentados por associações religiosas neste caso, tanto católicas como não católicas) será aplicável, por seu turno, nos termos anteriormente expostos, o regime legal dos institutos de utilidade local de fins análogos, «sem prepuízo da disciplina e espírito religiosos que os informam».
Parece, pois, evidente que tanto o legislador concordatário como o que nos propõe a lei que estamos discutindo não quiseram abranger nesta sujeição à lei geral senão as associações e os institutos religiosos que desejam também prosseguir fins de assistência e beneficência, dentro da abertura dada ao âmbito daquelas associações e institutos pela redacção proposta para o n.º 2 da base XI pela comissão eventual.
Acresce que não se vê, dentro das disposições legais em vigor, que possa haver outra forma das confissões religiosas manifestarem o seu desejo de prosseguirem fins de assistência ou beneficência senão através da constituição de associações ou institutos.
Dentro da orientação exposta, entendo que deve manter-se a redacção dada a esta base na proposta.

O Sr. Oliveira Dias: - A alteração proposta para esta base pela Sr.ª Deputada D. Raquel Ribeiro, que teve de ausentar-se do País em serviço, destina-se a alargar o seu âmbito, (porquanto, ressalvando-se na proposta do Governo o regime vigente pana as associações religiosas que se proponham também fins de assistência ou beneficência, não foram consideradas nessa ressalva outras pessoas colectivas, designadamente as fundações.
A alteração proposta tem feição mais genérica ao referir-se a quaisquer organizações correspondentes a confissões religiosas que se proponham fins de assistência ou de beneficência.
Julgo que este assunto tem muita importância, pois que, se for votada a emenda, assegura-se a existência de estabelecimentos e serviços de saúde e assistência, de educação e promoção social, dotados de personalidade jurídica, criados, dirigidos e sustentados por organizações religiosas - quaisquer que elas sejam, associações, fundações ou outras -, podendo usufruir de benefícios e regalias, sem prejuízo do espírito religioso que os informa.

O Sr. Magalhães Mota: - Sr. Presidente: Também me parece conveniente alargar o âmbito da base XIV, tal como é proposto pela Deputada Sr.ª D. Raquel Ribeiro.

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Para além das razões que já foram expostas pelo Sr. Deputado Oliveira Dias, e às quais adiro, gostaria de salientar que há ainda dois outros aspectos que me parecem importantes.
O primeiro é salientado pela própria Câmara Corporativa em nota ao seu douto parecer, quando salienta que muitas outras finalidades podem ser, e são de facto, prosseguidas por meio de realizações concretas das associações religiosas, realizações que não chegam, todavia, a ser autonomizadas.
É o caso que se cita também no parecer da fábrica da igreja que pode fundar infantários, asilos, patronatos, lares, escolas, oratórios, construir salões paroquiais, casas de recreio, cinema, etc.
O segundo aspecto é que me parece, efectivamente, estarmos num campo que é o campo da saúde, da assistência, da educação e da promoção social, isto é, em campos importantes num processo de desenvolvimento que nos preocupa e em que todos temos algum contributo a trazer. E, por isso, julgo que todos os contributos serão úteis e serão importantes.
Julgo, mais, que esta é uma matéria em que não temos de temer a proliferação, antes, pelo contrário, me parece, repito, que todas as achegas serão úteis e que, portanto, a base, sendo mais ampla e permitindo essas contribuições, só virá ajudar o processo de desenvolvimento em que efectivamente todos estamos empenhados.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Almeida Cotia: - Eu apenas queria esclarecer uma coisa que me parece que já resultava da intervenção do Sr. Deputado Miguel Bastos.
Os serviços de assistência, como já aqui foi chamado, integrados em qualquer organização religiosa, estão compreendidos necessariamente nessas associações, institutos ou instituições, que funcionam integrados numa confissão de fé, numa confissão religiosa, e portanto não há que lhes atribuir personalidade jurídica, pois já a têm. Tem-na a confissão religiosa onde são integrados. Isto creio que resulta inequivocamente da intervenção do Sr. Deputado Miguel Bastos e da intervenção do Sr. Deputado Veiga de Macedo, há bocado, quando considerava que realmente tudo isto já está compreendido nas organizações religiosas. Volto a repeti-lo porque eu também estou convencido disso.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente: Em relação às considerações do Sr. Deputado Almeida Cotta, permito-me ainda observar, na sequência do que disse há pouco, que a base XIV se destina a ressalvar, justamente, o regime vigente para as associações religiosas que se proponham também fins de assistência.
Portanto, é este (regime que se pretende ressalvar, mas não vejo motivo para que esse regime esteja circunscrito a associações e não abranja também outras pessoas colectavas, designadamente as fundações. Esta a justificação da proposta.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Ponho à votação primeiramente o n.º 1, com a redacção constante da emenda da Sr.ª Deputada D. Maria Raquel Ribeiro.

Submetido à votação, foi rejeitado.

O Sr. Presidente: - Não havendo qualquer outra proposta de alteração, ponho conjuntamente à votação os n.ºs 1 e 2 da base XIV, segundo o texto da proposta de lei.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à base XV, em relação à qual há uma proposta de alteração do Sr. Deputado Sousa Pedro.

Vão ser lidas a base e a proposta de alteração.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XV

1. As pessoas colectivas religiosas não carecem de autorização para a aquisição dos bens necessários à realização dos seus fins, mesmo que se trate de bens imóveis e a aquisição se faça a título oneroso, nem para a alienação ou oneração dos bens imóveis a qualquer título.
2. Os bens destinados a proporcionar rendimento não são considerados necessários à prossecução dos fins das pessoas colectivas religiosas e a sua aquisição está sujeita ao disposto na lei geral.

Proposta de alteração

BASE XV

1. .....................

2. Os bens destinados a proporcionar rendimento que não se destine à sustentação do culto das igrejas e do ensino nos seminários não são considerados necessários à prossecução dos fins das pessoas colectivas religiosas e a sua aquisição e&tá sujeita ao disposto na lei geral.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 15 de Julho d(c) 1971. - O Deputado, Teodoro de Sousa Pedro.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão. A proposta do Sr. Deputado Sousa Pedro é uma proposta de emenda, que conserva parte do texto da proposta de lei e modifica o seu sentido.
Deseja usar da palavra o Sr. Deputado Sousa Pedro? Tem a palavra.

O Sr. Sonsa Pedro:- Sr. Presidente: Queria pedir a V. Ex.ª e à Assembleia: que me permitissem retirar da discussão esta proposta de alteração.

Consultada, a Assembleia, foi autorizada.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a base XV.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre a base XV da proposta de lei, ponho-a à votação nos seus dois números.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Vamos passar, agora, à base XVI, em relação à qual há uma proposta subscrita pelos

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Srs. Deputados Sá Carneiro e outros no sentido da sua eliminação.
Vai ser lida a base XVI e, a seguir, a proposta de eliminação.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XVI

1. Às confissões religiosas reconhecidas têm o direito de assegurar a formação dos ministros do respectivo culto, podendo criar e gerir os estabelecimentos adequados a esse fim.
2. Os estabelecimentos referidos no número anterior estão sujeitos à fiscalização do Estado, mas apenas para o efeito de ser garantido o respeito das leis e dos limites impostos pelo n.º 1 da base VIII.
3. Os estabelecimentos que não se restrinjam a ministrar a formação e ensino religiosos ficam submetidos, nessa medida, ao regime previsto para os estabelecimentos de ensino particular.

BASE XVI

2. (Eliminada.)

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Os Deputados: Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: O sentido da eliminação proposta é o de negar a sujeição dos estabelecimentos de ensino à fiscalização geral do Governo, que esta proposta de lei prevê para as actividades das confissões religiosas.
Não se vê, na realidade, que seja conveniente uma fiscalização especial para os estabelecimentos de ensino, visto que os poderes anteriormente conferidos já dão ao Governo a possibilidade de fiscalizar devidamente todo o exercício da actividade religiosa para os efeitos de observância da base VIII e demais disposições aplicáveis.
Parece, por outro lado, que seria nociva uma fiscalização especial do ensino, dado que ia criar uma possibilidade de conflitos, porque representava, na realidade, uma ingerência nas doutrinas ensinadas e nos métodos adaptados.
Os interesses gerais parecem devidamente acautelados nas outras bases.
Daí a proposta de eliminação que subscrevo.

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: Segundo me apercebo, a proposta do ilustre Deputado Sá Carneiro é apenas de eliminação do n.º 2.
Mais, desde que o n.º 1 da base VIII ponha como limite ao exercício dai liberdade religiosa o respeito de certos princípios, parece claro que deve ser autorizado fiscalizar os estabelecimentos de formação dos ministros das respectivas confissões, em ordem a assegurar o respeito pelos leis e por tais princípios. E apenas para tal efeito, como expressamente se diz na lei e está confirmado no n.º 2 desta base, cuja supressão não me parece de aceitar pelos motivos que acabo de expor.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Se mais nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra para discutir estes textos, pô-los-ei à votação.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação. Vou pôr primeiramente à votação o n.º 1 da base XVI, segundo o texto da proposta de lei.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Ponho, seguidamente, a proposta de eliminação do n.º 2 da base XVI, que foi apresentada pelos Srs. Deputados Sá Carneiro e outros.

Submetida à votação, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Ponho, em consequência, à votação, conjuntamente, os n.ºs 2 e 3 da base XVI, em relação aos quais não há qualquer proposta de alterações, além daquela que foi rejeitada.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à base XVII, em relação à qual também há uma proposta de eliminação, subscrita pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros Srs.
Deputados.
Vão ser lidas a base e a proposta.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XVII

A construção ou instalação de templos ou lugares destinados à prática do culto só é permitida quando este seja de confissões religiosas reconhecidas, mas não depende de autorização especial, estando apenas sujeita às disposições administrativas de carácter geral.

Proposta de eliminação

BASE XVII

(Eliminada.)

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: Não se mantém a razão de eliminação que presidiu à proposta, e que era a de esta disposição estar contida numa outra base, para a qual foi proposta nova redacção.
E, assim sendo, está prejudicada a proposta que apresentei, pedindo, portanto, autorização para a retirar.

O Sr. Presidente: - Consulto a Assembleia sobre o requerimento do Sr. Deputado Sá Carneiro. Efectivamente, já na Mesa se tinha notado que a proposta de eliminação do Sr. Deputado Sá Carneiro se justificaria, porque a matéria se continha numa outra sua proposta anterior, o n.º 2 para a sua redacção da base V, que, afinal, não prevaleceu na opinião da Assembleia.
Portanto, pergunto a VV. Ex.ªs se autorizam a retirada da proposta de eliminação desta base XVII, conforme solicita agora o Sr. Deputado Sá Carneiro.

Posta à votação, foi autorizada a retirada da proposta de eliminação à base XVII.

Página 2555

23 DE JULHO DE 1971 2555

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, de pé apenas o texto da base XVII consoante a proposta de lei.
Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à base XVIII, em relação à qual não há qualquer proposta de alteração pendente na Mesa.
Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

B) Do regime especial da igreja católica

BASE XVIII

1. Ficam salvaguardadas todas as disposições da legislação vigente, nomeadamente as contidas na Concordata de 7 de Maio de 1940, que respeitam à religião e à igreja católica.
2. São aplicáveis às pessoas colectivas católicas as disposições desta lei que não contrariem os preceitos concordatàriamente estabelecidos.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Lopes Quadrado: - Sr. Presidente: Relativamente à base XVIII da proposta de lei sobre liberdade religiosa, vou proferir breves palavras.
Felicito o Governo pela apresentação da referida proposta de lei, assegurando a liberdade religiosa às pessoas e a protecção jurídica às confissões religiosas.
Na base XVIII fica ressalvada a legislação vigente e, designadamente, a Concordata de 7 de Maio de 1940.
A Concordata, notável instrumento jurídico que estabelece as relações entre a Igreja e o Estado, mantém independentes os poderes da comunidade política e da Igreja.
Embora independentes, os dois poderes - Igreja e Estado - respeitam-se mutuamente e colaboram na realização do bem comum.
A Concordata, conforme já alguém afirmou, com verdade, tomou possível a paz religiosa em Portugal.
Decorridos mais de trinta anos, não se verificaram conflitos entre o Estado e a Igreja em Portugal.
A base XVIII da proposta de lei, discutida num clima de paz e trabalho (profícuo, assegura a tranquilidade da consciência da maioria dos portugueses e, por isso, lhe dou a minha aprovação.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Eu desejaria apenas associar-me, calorosamente, às considerações feitas pelo Sr. Deputado que acaba de usar da palavra.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão a base XVIII.

O Sr. Sá Carneiro: - Foi aqui salientada a relevância da Concordata e o serviço prestado à manutenção das relações entre a Igreja e o Estado.
Ressalva-se a Concordata e, como o Sr. Deputado Almeida Cotta numa sessão passada salientou, essa ressalva nada tem que ver com a posição dos que defendem a revisão ou até a abolição da Concordata.
Posição de revisão que o recente inquérito à opinião pública veio demonstrar ser a de uma esmagadora maioria, visto que 42,7 por cento do total se pronunciou a favor dessa revisão, sendo significativa a circunstância de que entre os católicos praticantes essa percentagem ainda é maior, pois que vai a 43,1 por cento, e num dos pontos mais controvertidos, que é o do regime a que estão submetidos os católicos quanto à possibilidade do divórcio, esses números são também altamente significativos e elucidativos, visto que do total 73,3 por cento entendem que não deve haver leis que proíbam o divórcio aos casais católicos. Nos católicos, em geral, a percentagem vai a 70,5 por cento e de entre os católicos praticantes 59,9 por cento entendem também que não deve haver tais leis proibitivas.

O Sr. Cancella de Abreu: - O verdadeiro católico tem de se submeter a determinadas regras da Igreja. A Igreja é contra o divórcio; esses fiéis, chamemos-lhes assim, praticantes que são contra uma directiva da igreja católica serão verdadeiros católicos? E uma pergunta que eu ponho.

Vozes: - Apoiado!

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - Nem cabe a V. Ex.ª nem a ninguém dizê-lo, porque isso implica um julgamento. Não estão em causa as leis da Igreja. E não compete nem a mim, nem a V. Ex.ª, nem a ninguém, dizer quais são os verdadeiros católicos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre a base XVIII, passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Passamos agora à base XIX, em relação à qual também não há propostas de alteração.
Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

IV

Do sigilo religioso

BASE XIX

1. Os ministros de qualquer religião ou confissão religiosa devem guardar segredo sobre todos os factos que lhes tenham sido confiados ou de que tenham tomado conhecimento em razão e no exercício das suas funções, não podendo ser inquiridos sobre eles por nenhuma autoridade.
2. A obrigação do sigilo persiste, mesmo quando o ministro tenha deixado de exercer o seu múnus.
3. Consideram-se ministros da religião ou da confissão religiosa aqueles que, de harmonia com a organização dela, exerçam sobre os fiéis qualquer espécie de jurisdição ou cura de almas.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

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2556 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127

O Sr. Presidente: - Como nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra sobre a base XIX, pô-la-ei à votação no conjunto dos seus três números.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Segue-se a base XX, em relação à qual há uma proposta de eliminação apresentada pelos Srs. Deputados Sá Carneiro e outros.
Vão ser lidas.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE XX

A violação do sigilo religioso é punida com a pena de prisão maior de dois a oito anos, quando consista na revelação de factos confidenciados segundo as práticas da religião ou confissão religiosa, e com a pena de prisão até seis meses, nos outros casos.

BASE XX

(Eliminada.)

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 16 de Julho de 1971. - Sá Carneiro - Pinto Machado - Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

O Sr. Veiga de Macedo: - A proposta de lei, entre as múltiplas infracções criminais que podem ser cometidas no campo da actividade religiosa, só prevê sanções para uma delas, por entender que a revisão das disposições vigentes na matéria deve integrar-se na reforma geral do direito penal.
O Código Penal em vigor, como recorda a Câmara Corporativa, consagra o primeiro título da sua parte especial (artigos 130.º e seguintes) aos crimes contra a religião ou cometidos por abuso das funções religiosas. E ao crime previsto no § 1.º do artigo 136.º desse Código que a proposta de lei se refere.
A Câmara Corporativa entende que a excepção assim aberta para o crime de violação do sigilo por parte dos ministros do culto pode justificar-se, não só pelo carácter muito especial da infracção, como pelas dúvidas suscitadas na doutrina acerca da vigência da disposição legal que especialmente se lhe refere.
Não nego procedência a este ponto de vista, mas penso que numa lei da natureza e com a alta dignidade daquela que estamos a votar não devem inserir-se preceitos de carácter penal. Estes têm outra sede para serem inscritos. É na lei penal geral que disposições desta índole devem figurar.
A circunstância de estar em revisão o Código Penal mão impede que se esclareça a dúvida referida pela Câmara Corporativa por meio de um diploma próprio, mesmo sem se esperar pela promulgação do novo Código. Além disso, a previsão feita de modo discriminado de penas para os crimes em questão pode dar a ideia de que há razões fortes a justificá-la.
Pode, na verdade, pensar-se que estes crimes são vulgares, quando se sabe que, neste delicado domínio, não se registam, felizmente, violações do sigilo religioso que imponham um tratamento da matéria fora do âmbito próprio em que ela, por tudo, deve inserir-se.
Aliás, o problema não é só de ordem jurídica ou política, mas também de sensibilidade.
Por isso, no decurso dos trabalhos da comissão eventual, sugeri, a supressão daquela base XX. É na mesma linha de orientação que, pelas razões aduzidas e por outras que me dispenso de enunciar, dou o meu voto à proposta de eliminação em debate da autoria dos Srs. Deputados Sá Carneiro, Pinto Machado Correia da Silva e Pinto Balsemão.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Estão já brilhantemente expostas, pelo Sr. Deputado Veiga de Macedo, as razões que presidiram à apresentação desta proposta de eliminação.
Efectivamente, deriva com toda a clareza, da completa fundamentação do parecer da Câmara Corporativa, que a matéria não deve ser contemplada nesta lei, cuja índole não se compadece com disposições deste género.
Nem sequer se afigura aceitável o gravoso da nova disciplina, que torna este crime punível, quando meramente culposo, quando até aqui o era quando fosse doloso apenas. A matéria está prevista no Código Penal, está regulada e deverá continuar a ter acento não nesta lei sobre a liberdade religiosa. Daí a proposta de eliminação.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Presidente: Se eu bem interpretei a passagem do douto parecer da Câmara Corporativa, parece-me que podemos chegar a esta conclusão: a Câmara Corporativa concorda, em princípio, com uma sanção nos termos, mais ou menos, como vêm estabelecidos na proposta. Acho que não é esta a tese, realmente, onde deveria figurar, e, portanto, reportava-se ao sistema penal que está ainda em estudo. A proposta propõe-se antecipar-se a um sistema penal que ainda não se sabe quando será aplicado, na convicção, tal como está a Câmara Corporativa, de que o sistema legal vigente não é o mais indicado. Portanto, "penas há aqui uma discordância quanto à lei em que deveria figurar esta sanção. Eu julgo que, no essencial, todos estamos de acordo, e, possivelmente, quando vier a lume o novo sistema penal, é possível que recolha daqui a sanção que ora fica estabelecida. Mas não convém, de maneira nenhuma, estarmos a aguardar, se se considerar que não está bem, estarmos a aguardar indefinidamente, que apareça o sistema penal que há-de contemplar este caso.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.
Ponho primeiramente à votação a proposta de eliminação da base XX, subscrita pelos Srs. Deputados Sá Carneiro e outros.

Submetida à votação, não foi aprovada a eliminação.

O Sr. Presidente: - Fica, portanto, pendente da votação de VV. Ex.ªs a base XX, segundo o texto da proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Há ainda na Mesa uma proposta de aditamento de uma base nova, que vai ser lida.

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23 DE MAIO DE 1971 2557

Foi lida. É a seguinte:

Nos termos regimentais, propomos que à proposta de lei em discussão seja acrescentada uma nova base, com o seguinte texto:

BASE

Fica o Governo autorizado a estender ao ultramar, com as necessárias adaptações, o regime da presente lei.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 20 de Julho de 1971. - Os Deputados: José Coelho de Almeida Cotia - Miguel Pádua Rodrigues Bastos - Joaquim José Nunes de Oliveira - Luís António de Oliveira Ramos - Manuel Antero Cotta Agostinho Dias.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Themudo Barata: - Sr. Presidente: Esta base está de harmonia com o espírito que presidiu à elaboração desta lei.
De facto, no relatório que antecede a proposta, diz-se que se submete à apreciação da Assembleia apenas a disciplina do exercício da liberdade religiosa na metrópole. Mas o regime que vier a ser aprovado haverá naturalmente que ser extensivo, nos termos constitucionais, ao ultramar.
Ora, a omissão desta base pode interpretar-se como devendo-se ao facto de esta lei de liberdade religiosa ter sido apresentada à Assembleia antes de aprovada a última Constituição, que nos termos da ainda em vigor a entidade competente para a publicação desta lei é o Ministério do Ultramar.
Nos termos da Constituição que acaba de ser aprovada, esta matéria está incluída na competência reservada à Assembleia Nacional.
Por isso, se não fosse introduzida esta base, a extensão dos seus benefícios ao ultramar implicaria a apresentação pelo Governo de uma nova proposta à Assembleia.
Não parece também próprio introduzir nesta proposta as diversas peculiaridades do ultramar, pois são grandes as diferenciações, desde o Oriente até às províncias de África, desde províncias de alto nível de pulverização nas populações, como Macau, até províncias menos evoluídas. Portanto, parece-me perfeitamente adaptada esta maneira de proceder. Além disso, a não extensão ao ultramar impediria que fossem concedidos benefícios desta lei de liberdade religiosa às confissões não católicas.
A igreja católica continuará a ver reguladas as suas relações com o Estado pela Concordata e acordos missionários, que ficam ressalvados pela Constituição.
Portanto, creio que a adopção desta base se justifica e se explica.
Sendo esta a primeira, e certamente a última, das vezes que me parmito falar sobre o problema da liberdade religiosa, não desejo fazê-lo sem me congratular com a aprovação desta lei, que estende, em certa medida, a liberdade religiosa, mas não posso também de deixar de acentuar que o problema fulcral reside nas relações do Estado com a igreja católica.
Este problema para a metrópole é de especial relevância, dado que 80 ou 90 por cento da sua população é católica, mas não posso esquecer que para o ultramar
o problema é talvez mais delicado ainda, pois desde há muitos séculos a mensagem evangélica esteve estreitamente ligada u missão ecuménica deste povo. E, por isso, eu creio que se haverá especial cuidado nas relações entre o Estado e a igreja católica na metrópole, deverá haver especial cuidado, especial delicadeza e especial carinho na regulação do que se refere ao ultramar.
Tendo dito.

O Sr. Neto Miranda: - Apenas duas palavras para emprestar o meu apoio às considerações de ordem jurídica e de ordem prática feitas pelo Sr. Deputado Themudo Barata.
Analisou o problema como ele é, e eu permito-me apenas acrescentar que, dentro da exclusividade conferida a esta Assembleia pela nossa Constituição, quer relativamente ao § 2.º do artigo 8.º, quer ao § 1.º do artigo 136.º, esta Assembleia, por esta base, confere ao Governo a necessária competência para que esta matéria seja tornada extensiva ao ultramar, atendendo às características que em cada uma das províncias possa presidir às confissões religiosas.
É uma confiança que é dada ao Governo e que está dentro das tradições jurídicas desta Casa.

O Sr. Veiga de Macedo: - Os autores da proposta de aditamento à base destinada a conferir ao Governo autorização para estender ao ultramar, com as necessárias adaptações, o regime da lei prestes a ser votada sabem o que penso sobre a prática, por de mais generalizada, e de há muito seguida, de se subtrair a este órgão da soberania a apreciação global de importantes problemas da vida portuguesa.
Não compreendo que a proposta de lei não tivesse sido elaborada para todo o espaço português. Continuam, assim, a ser encaradas, de modo separado, tais questões fundamentais do País, o que, naturalmente, não favorece a definição de soluções ajustadas às realidades nem a própria unidade nacional.
O primeiro signatário da proposta de alteração, proposta que, salvo erro, não foi apreciada pela comissão eventual, teve a paciência e a bondade de me ouvir sobre problemas desta natureza ao longo das sessões da comissão incumbida de estudar a proposta de lei relativa à revisão constitucional, e sabe bem, embora possa discordar dos meus pontos de vista, que estes são produto de profunda e serena reflexão.
Não os vou reproduzir agora. Se os desperto na memória daquele ilustre colega, é precisamente para não reeditar essas considerações e para, ao mesmo tempo, me sentir liberto de qualquer toque de consciência por não dar testemunho do meu pensamento em matéria de tão alta significação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A mim, neste caso, tudo me impele a tudo fazer para que se não atente, de qualquer modo, contra o que de mais profundo deve caracterizar a Assembleia Nacional, que é o ser, de nome e de facto, um órgão legislativo e de fiscalização verdadeiramente nacional.
Sei que se diz que nem todos os Deputados conhecem os problemas do ultramar. E os Deputados eleitos pelais provinciais ultramarinas Conhecem, todos eles, os problemas da metrópole, ou mesmo os de todas as províncias ultramarinas?
Aliás, a pôr-se a questão nestes termos, corremos o risco de ir longe de mais, pois será sempre difícil, numa

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2558 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127

assembleia política e não técnica, que a generalidade dos Deputados conheça bem, desde logo, todas as questões nela ventiladas. Mas todos tem a possibilidade e o dever de as estudar e não lhes faltarão elementos para se documentarem e esclarecerem a tempo. Nem se esqueça que à Assembleia cabe fixar as bases gerais dos regimes jurídicos.
Tenho advogado a ampliação da representação ultramarina na vida política do País e, por isso, entendo que os mandatários do ultramar na Câmara Corporativa e na Assembleia Nacional devem aumentar de inúmero progressivamente. Mas esta minha posição implica, naturalmente, que esses órgãos não sejam afectados, de direito ou de facto, nas suas competências em relação a todo o território português.
Mas eu prometi que não me meteria por este caminho e vou já parar.
Sem embargo de manter inteira fidelidade à doutrina defendida, vou, neste caso, dar o meu voto à proposto de alteração, pois, envolvendo ela, em certa medida, uma questão de confiança ao Governo, não poderia eu, por isso mesmo, deixar de me solidarizar com esse propósito ou sentimento.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra, passaremos à votação.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Está concluída a votação da proposta de lei sobre liberdade religiosa. A comissão eventual designada para a estudar termina assim hoje os seus trabalhos.
Aproveito a ocasião para exprimir em nome da Assembleia agradecimentos pela dedicação, que aplicou a estes problemas.
Convoco a Comissão de Legislação e Redacção para se ocupar da redacção definitiva desta proposta de lei. A Comissão reunirá para o efeito, ao bom critério do seu presidente, que fixará os dias para os seus trabalhos. Para a hipótese de essa redacção não poder estar concluída dentro do período de funcionamento efectivo desta Assembleia, nesta convocação extraordinária, peço a VV. Ex.ªs um voto de confiança à Comissão de Legislação e Redacção para a sua última redacção da proposta de lei sobre a liberdade religiosa.

Submetido à votação, foi concedido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Amanha haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia o início da discussão na generalidade da proposta e projecto de lei de imprensa. Alguns Srs. Deputados têm manifestado de várias maneiras, até no plenário, o sentimento de que é um pouco tarde para nos dedicarmos a esta tarefa. As razões que os movem, todos nós as sentimos no nosso íntimo na medida em que nos pedem mais um esforço. Mas eu quero crer que a Assembleia estará disposta a este suplemento de esforço, até porque estou inteiramente convencido de que será menos penoso prestá-lo agora do que voltarmos daqui a algumas semanas para o retomarmos.
Nem ninguém deve ficar impressionado de a Assembleia, concluir em poucos dias a discussão e votação deste magno tema. Magno tema, com certeza. Todos nos estamos conscientes da importância que tem a nova regulamentação das actividades de imprensa para o nosso país, como factor de mais ampla divulgação do pensamento. Mas são matérias já de há muito presentes perante a opinião. As grandes opções são conhecidas, e sobre elas terão VV. Ex.ªs tomado as suas posições ou ter-se-ão preparado para as tomar. Creio que, sem desmerecermos da grandeza do (tema e da sua importância para a vida nacional, se quisermos o poderemos discutir e votar realmente em poucos dias. Será uma questão de intensidade e eficiência no nosso trabalho. A Assembleia já demonstrou as suas capacidades. Não terá com certeza dúvida, nem lhe causará excessivo esforço, comprová-las mais uma vez.
Neste sentimento, pedindo, portanto, a boa vontade e a continuação da dedicação de VV. Ex.ªs à tarefa que nos foi cometida, anuncio novamente para amanhã o início da discussão da proposta e projecto de lei de imprensa e informo que, para que o debate possa ser conduzido com tanta celeridade quanta a disposição de VV. Ex.ªs consinta, se for necessário na próxima semana haverá sessões nocturnas, além das sessões à hora regimental.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cerdoso.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alexandre José Linhares Furtado.
Augusto Domingues Correia.
Fernando David Laima.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Manuel Alves.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Ruiz de Almeida Garrett.
José Dias de Araújo Carreia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.

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23 DE JULHO DE 1971 2559

José Coelho Jordão.
José Guilherme de Melo e Castro.
José da Silva.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Marques da Silva Soares.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Rafael Valadão dos Santos.

Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:

De acordo com as normas regimentais, requeiro que pelo departamento competente do Governo me sejam enviadas as conclusões do inquérito promovido pelo Instituto Nacional de Estatística relativo às receitas e despesas das famílias do continente, de Abril de 1967 a Março de 1969.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 22 de Julho de 1971.- O Deputado, Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.

O Redactor - Januário Pinto.

IMPRENSA NACIONAL

Página 2560

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