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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 161

ANO DE 1972 24 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.° 161, EM 23 DE FEVEREIRO

Presidente: Ex.mo Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto.

Secretários: Ex.mos Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia. - Para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.º da Constituição, foi presente à Assembleia o Decreto-Lei n.º 60/78.

Foi entregue ao Sr. Deputado Barreto de Lara um esclarecimento do Ministério do Ultramar relativo ao requerimento por ele apresentada na sessão de 8 de Fevereiro.

O Sr. Deputado Lopes da Grite pronunciou-se sobro o impacte da execução do plano rodoviário do Moçambique programado paru o período de 1011-1979 no desenvolvimento global da província.

O Sr. Deputado Valadão dos Santos fez considerações sobre a visita que, juntamente com alguns outros Deputados, efectuou às instalações da N. A. T. O. na Bélgica e a estabelecimentos de ensino na Alemanha Federal, visita proporcionada pela Comissão Portuguesa do Atlântico a um grupo de dirigentes do ensino liceal e técnico.

O Sr. Deputado Lopes Frazão preconizou a melhoria de situação da Guarda Nacional Republicana.

O Sr. Deputado Dias das Neves referiu-se aos prejuízos causados pela recente cheia do Tejo e à noticia do terem sido apreciados os estudos prévios para regularização do caudal daquele rio.

O Sr. Deputado Francisco António da Silva solicitou do Governo a urgente revisão da política oleícola.

O Sr. Deputado Valente Sanches realçou a necessidade de reestruturação da organização corporativa.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta de lei sobre a organização judiciária tendo usado da palavra o Sr. Deputado Homem Ferreira.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Fez-se a chamada, a qual responderam os seguinte" Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto doa Beis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.

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Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui de Moura Ramos.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 73 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Não tenho expediente para comunicar a VV. Ex.ªs
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo, 1.ª série, n.º 44, de ontem, que insere o Decreto-Lei n.° 60/72, que autoriza o Banco Nacional Ultramarino a subscrever 250 obrigações do valor nominal de 1000 contos cada uma, com o aval do Estado, a emitir pelo Fundo Monetário da Zona do Escudo, para elevação do respectivo capital estabelecida no Decreto-Lei n.° 479/71, e a entregar ao referido Fundo a importância dos respectivos títulos nos termos e nos prazos que vierem a ser estipulados na emissão.

Também está na Mesa um ofício da Presidência do Conselho, a remeter fotocópia de um esclarecimento recebido do Ministério do Ultramar em relação no requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Barreto de Lara na sessão de 2 do corrente. Vai ser entregue a este Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes du Cruz.

O Sr. Lopes da Cruz: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quase no final do passado ano de 1971 foi publicamente anunciado um grande pi uno rodoviário de Moçambique para execução nos anos compreendidos entre 1971-1979.

A meta a atingir é a de 12 000 km de estradas asfaltadas no final do período em causa, o que implicará dispêndios da ordem dos 10 500 000 coutos, com a construção da nova rede rodoviária na extensão aproximada de 10 000 km, na respectiva conservação e com o funcionamento da Junta Autónoma de Estradas.

Considerando que em 1967, no ano em que a Junta iniciou a sua actividade, as estradas asfaltadas em Moçambique não atingiam sequer os 1400 km, e que no final do ano de 1970 era apenas de cerca de 2200 km, é indiscutível o mérito do plano elaborado, para ter execução no final do III Plano de Fomento em curso e no decurso do próximo IV Plano.

Espera-se que o impacte que a execução de tal plano virá a ter no desenvolvimento global de Moçambique será superior ao da realização da barragem de Cabora Bossa, dado que os seus benefícios se farão sentir em todos os regiões da província e não apenas em determinada zona, possibilitando a fácil e necessária circulação dos pessoas e bens, permitindo a criação de novos pólos de desenvolvimento nos mais variados locais, facilitando o desenvolvimento acentuado de localidades com inegáveis possibilidades de crescimento, mas que se mantinham, atrofiadas pelas dificuldades em comunicações, e incentivando o aparecimento de novos centros urbanos disseminados por todo o território.

Na medida em que o plano for sendo executado possibilitar-se-á a eliminação progressiva da macrocefalia de Moçambique e a inconveniente concentração de actividades nas duas cidades principais, e no interior poderá incrementar-se uma desejável e maior ocupação humana organizada, com todas as vantajosas consequências nos planos do bem-estar social e da segurança colectiva.

Na mesma ocasião em que foi tornado público o plano geral, igualmente foi anunciado o lançamento da primeira grande empreitada do mesmo, com a extensão total de 985 km,, e que foi prioritariamente considerada para execução num período de três a quatro anos e meio, e compreende a construção dos troços entre Vila Paiva de Andrade-Vila Fontes-Nicoadala, Namacurra-Mocuba, Nampevo-Nampula e Namialo-Rio Lúrio, nela se incluindo a construção da ponte sobre o rio Zambeze em Vila Fontes, com a extensão de 2390 m, e mais três outras pontes de comprimentos variáveis entre os 50 e os 230 m.

Com a execução desta primeira empreitada o distrito du Zambézia ficará com ligações asseguradas, por via asfaltada, para o Sul, designadamente à Beira e Lourenço Marques, e para o Norte, nomeadamente ao porto de Nacala.

A região unanimemente considerada a mais rica de Moçambique, e que tem contribuído para a economia da província com mais de 50 par cento de todos os seus

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valores de exportação, vê esperançadamente o alvorecer de noras perspectivas no seu desenvolvimento futuro, e espera a concretização de velhos sonhos pelos quais há tantos anos tem lutado ingloriamente.

Mas ainda dentro do plano, que todos esperam venha a ser integralmente executado aba 1979, a Zambézia terá a ligação por pavimento asfáltico dos troços compreendidos entre Mocuba e Milanje e entre Malei e Pebane, estando já n ser iniciada a construção do troço compreendido entre Nampevo e Vila Junqueiro, ficando deste modo ligadas a toda a rede principal e à capital do distrato todas as zonas de maior desenvolvimento actual com elevadas produções, e concretizando-se n ligação da zona costeira com o vizinho Malawi, que poderá permitir um incremento bastante sensível no incipiente turismo, facilitando o acesso ao mar dos vizinhos que vivem no interior, e tão interessados se mostram em consegui-lo, bem como propiciar trocas comerciais entre Quelimane e a zona chàzeira do Malawi, tão desejada entre as pessoas dos dote territórios.

No noto da publicação do plano rodoviário e do lançamento da primeira grande empreitada, o Ex.mo Secretário Provincial das Obras Públicas, Engenheiro Gonçalves Henriques, e o presidente da Junta Autónoma de Estradas, ilustre Deputado Engenheiro Ribeiro Veloso - para os quais vão os minhas homenagens pala rasgada visito de que deram provais, e que suo igualmente devirias a SS. Ex.ªs o Ministro do Ultramar Prof. Silva Cunha, e o Governador-Geral, Engenheiro Arantes e Oliveira, que sancionaram e aprovaram o plano -, referiram os objectivas a atingir e as directrizes que presidiram à sua elaboração, sintetizadas, no que concerne à construção das novas vias, no seguinte:

Construção das entrados asfaltadas que se integram nos grandes eixos rodoviários destinados a ligar o extremo sul da província com o extremo norte, nos distritos de Gabo Delgado e de Tete (Angónia);

Construção ou beneficiação dos estradas asfaltadas que formam as grandes penetrantes transversais, e que servem:

a) À ligação com os territórios vizinhos;

b) À criação das principais vias de penetração nos distritos da Zambézia e de Moçambique, favorecendo as zonas de maior potencial produtivo;

c) Ao estabelecimento de um grande eixo rodoviário transversal nos distritos de Cabo Delgado e do Niassa (de Ponto Amélia a Vila Cabral e ao lago Niassa).

Construção ou beneficiação das estradas afluentes a estes grandes eixos, destinados a servir as principais zonas produtoras, e a estabelecer com as características adequadas ao respectivo tráfego;

Construção ou beneficiação de estradas asfaltadas destinadas a servir, as principais correntes turísticas e as zonas de maior potencialidade do desenvolvimento desta actividade.

Para além dos objectivou indispensáveis de ligar o Sul ao Norte, do eixo rodoviário transversal dos distritos do extremo norte, de Cabo Delgado ao Niassa, e da ligação A territórios vizinhos, apraz-me salientar a intenção declarada de favorecer as zonas de maior potencial produtivo e servir as regiões principais produtoras.

E n referência expressa às vias de penetração nos distritos da Zambézia e de Moçambique, que são de longe as regiões da- província de maiores produções e de maior potencial produtivo, indiciam, uma válida e realista linha de rumo a seguir nos planos de fomento e nos investimentos públicos a programar e a executar, linha essa que, infelizmente, nem sempre tem sido tomada na devida e merecida conta.

Espera-se e deseja-se que no planeamento a fazer em outros sectores sejam considerados os mesmos objectivos como prioritários, pura que Moçambique dê, finalmente, a grande arrancada para um mais palpável e significativo crescimento económico que muito vai tardando.

Uma outra significativa referência merece a programação do Plano, e é o facto de ter sido dada n devida publicidade aos traçados a construir e ao prazo previsível da sua execução, tornando-os conhecidos do público interessado em programar as suas actividades, as quais não podem ser previstas a curta distância nem no desconhecimento do modo como as estruturas fundamentais da administrarão pública serão programados e realizadas.

As actividades particulares que pretendem efectuar investimentos ficam desde já com a possibilidade de conhecerem as vias pelas quais irão ser movimentadas as mercadorias com mais facilidade, e os locais para onde podem colocá-las de forma mais rentável, podendo assim escolher as zonas mais favoráveis para execução dos investimentos que pretendam executar.

Tem-se por vezes afirmado que o sector privado ara Moçambique não tem correspondido capazmente aos incentivos resultantes dos investimentos efectuados no sector público, que o ritmo de crescimento não tem acompanhado os esforços e dispêndios feitos pela Administração.

Tal constatação não será resultante do facto, aparentemente elementar, de os investimentos públicos executados nem sempre obedecerem ao princípio de favorecer as regiões de maior potencial produtivo e servir as principais zonas produtoras?

E como podem os investidores privados arriscar os seus capitais se nas zonas onde seria mais rentável e lógico investirem, porque dotadas de maiores potencialidades, não se sabe que estruturas base irão ser criadas pelo sector público, quando o virão a ser ou se o virão a ser?

Estou a lembrar-me das palavras que uma entidade da metrópole, que frequentemente se desloca a Angola e Moçambique em visitas de trabalho, há alguns meses me referiu a propósito de diferenças observadas nas grandes províncias ultramarinos.

Dizia essa entidade que em Angola u opinião que as pessoas mais responsáveis e altamente colocadas na Administração Central da província, sediadas em Luanda, formulavam sobre os problemas mais importantes do desenvolvimento de todas as regiões e a forma da sua solução coincidiam com o modo como as pessoas localizados nas mais diversos regiões, desde os funcionários locais aos particulares, viam os mesmos problemas e com as soluções que para eles desejavam, e a que davam prioridade.

Mas que em Moçambique raramente se verificava essa coincidência, antes sucedendo que havia um desfasamento entre o que pensavam sobre os problemas regionais de desenvolvimento as pessoas mais altamente responsáveis pelos varias departamentos da Administração, situadas em Lourenço Marques, e os funcionários, e principalmente os particulares e várias associações de actividades, localizados nas diversas regiões da província, sobre os problemas das suas regiões mais carecidos de resolução e reputados mais necessários para o desenvolvimento.

Não será também este desfasamento, que não atende às justas aspirações das várias regiões, observado em

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Moçambique por quem sabe ver os problemas, e a eles está habituado, ouram, posição de inteira imparcialidade, unia das possíveis razões de as actividades privadas não corresponderem inteiramente, ou como seria de esperar, aos incentivos dados pelos investimentos no sector publico?

Pareça que se impõe se proceda com toda a urgência a um reexame da forma como e locais onde os investimentos do sector público são programados e executados em Moçambique, para se apreciarem as causas da falta ou as dificuldades de reacção do sector privado, e corrigirem-se sem demora os erros ao orientação desses mesmos investimentos.

A defesa territorial do nosso ultramar depende multo daquilo que vier ia conseguir-se- no progresso económico e social, e os sacrifícios e os esforços que estão a ser feitos por todos os portugueses exigem que, se erros de perspectiva e programação existem, rapidamente sejam emendados.

A propósito de deficiências de planeamento regional - que está a ser incentivado na metrópole, tendo-se criado várias comissões de planeamento regional com os seus vários grupos de trabalho -, vou transcreveu: de um estudo elaborado, salvo erro em 1966, pêlos serviços da Comissão Técnica de Planeamento e Integração Económica de Moçambique, instalados em Lourenço Marques, e no que diz respeito aos distritos da Zambézia e de Moçambique:

Ao abordarem-se os problemas dos vários sectores surgem sistematicamente dúvidas sobre a futura orientação do desenvolvimento da zona que se enquadra dentro do quadrilátero Quelimane-Milanje-Nova Freixo-Nacala.

O principal elemento de perturbação é a visualização de uma futura movimentação de cargas dentro da mesma área, que tem na suai base uma série de condicionalismos não esclarecidos.

Além da dificuldade em definir o modo como se deve orientar uma estrada que, grosso modo, ligue Quelimane a Nacala, verifica-se existir no interior da zona um caminho de ferro - o de Quelimane - que tem 145 km de- comprimento e que vem a acumular deficits de tendência crescente.

(No período de 1959 a 1965, de cerca de 14 000 contos.) Sabe-se que, mós Serviços du Portos, Caminhos de Ferro e Transportes, existe um estudo pelo qual se procurou avaliar a vantagem de prolongar este caminho de ferro até ao caminho de ferro do Niassa e que se julga tenha levado a conclusão negativa.

Também, não estilo definidos, por causa das condições naturais, os portos de saída da zona. Aliás, a correspondente zona da costa possui, como característica, girando instabilidade.

Espera-se, por outro lado, que mas zonas laterais à mesma se desenvolvam dois portos, Nacala e Chinde - continua-se n transcrever o citado estudo -, este último ligado a- exploração dá minérios que se venha A concretizar em seguimento do aproveitamento hidroeléctrico de Cabora Bossa. Espera-se também que Nacala venha a tornar-se o terceiro centro industrial da província.

Dentro da zona programa-se um aproveitamento hidroeléctrico no Alto Molocué.

A Zambézia é a região da província que detém maior valor de produção de produtos agrícolas, estando a expandir-se a criação de godo, feita pelas grandes empresas exploradoras de palmares, admitindo-se que passe em breve a exportar carne congelada de bovino.

Sabe-se da existência de uma saída, que se considera defeituosa, dos produtos da região, utilizando-se, para o efeito, portos que não parecem coerentes com o critério da utilização das mais adequadas vias de transporte. Há uma exploração mineira na zona - minérios de pegmatites - que poderá ser melhor aproveitada. Na costa (Pebane e Moebase) há, potencialmente, possibilidade de explorar ilmenite.

A população de Quelimane exerce pressões através dos seus órgãos associativos com vista a proteger-se contra uma eventual diminuição de importância da sua cidade.

E porque surgiam, e infelizmente ainda surgem, sistemáticas duvidas sobre a futura orientação do desenvolvimento da zona referida, no mesmo trabalho se recomenda, com o objectivo de se poder integrar o desenvolvimento da região dentro dos problemas gerais da província, que se constituísse para 1967 um grupo de trabalho, "para reunir, sobre a região, toda a informação disponível, com vista a propor, se assim for considerado necessário, que um corpo técnico, formado por elementos das diversas formações necessárias, estabeleça um esquema de desenvolvimento regional que possibilite a eliminação das dúvidas existentes, o que é fundamental quando há necessidade de elaborar os planos da província".

Mas não consta que, desde então até ao presente, a judiciosa recomendação do breve apontamento dos serviços da Comissão Técnica de Planeamento e Integração Económica de Moçambique tivesse sido ouvida, continuando o desenvolvimento da região mais rica e mais rendosa passa, a economia provincial a processar-se de foi-ma inteiramente anárquica, e portanto sem que todos, tanto os particulares como a própria província, retirem os resultados que seriam de esperar.
Quanto as estrados, o plano geral está traçado, dele se deu conhecimento ao público e foi-lhe fixado o prazo para a execução.

Mas quanto a outras infra-estruturas consideradas essenciais para que haja uma aceleração no desenvolvimento, como sujam a programação da produção e abastecimento de energia, e a localização dos portos de saída das produções da vasta região, nada há definitivamente planeado, nada se sabe, e em resultado disso o empresário particular retrai-se nos Investimentos a fazer, não estando, naturalmente, na disposição de correr riscos demasiado aleatórios.

Porque não efectuarem-se os trabalhos necessários para a formação de um esquema global de desenvolvimento regional, cujos linhas essenciais seriam tornadas públicas, dando-se igualmente conhecimento pleno aos interessados dos prazos da execução das infra-estruturas essenciais pelo sector público, para que os empresários privados possam planear com a devida antecedência e executar oportunamente, correspondendo, desse modo, aos incentivos resultantes dos investimentos efectuados pelo sector público?

Quanto à transcrição feita do trabalho elaborado pela Comissão Técnica de Planeamento e Integração Económica são necessários algumas observações.

Para uma completa visualização da movimentação das cargas, conhecido que é o desenvolvimento das estradas, indispensável se torna concretizar a programação dos portos, para uma conveniente movimentação dos mercadorias.

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Toda a faixa costeira, entre a Beira e Nacala, locais onde se situam dois portos de grande movimento, á dotada de condições naturais difíceis. Todavia, não se podem deixar as populações e interesses de tão vasta área na exclusiva dependência dos mencionados portos, dada a enorme distância a que se situa o distrito da Zambézia de qualquer deles, o que onera excessivamente os preços dos produtos e dificulta o seu transporte.
Conforme foi referido pelo técnico naval engenheiro Rosa Coutinho, ainda é o porto de Quelimane o que apresenta melhores 'características de utilização, em toda essa extensa zona costeira.
É certo que se projecta um grande porto a estabelecer na barra do Zambeze, no Cuama, e não no Chinde, para o escoamento dos minérios da zona de Tete, em seguimento do aproveitamento hidroeléctrico de Cabora Bassa.
Mas este porto essencialmente mineraleiro, de características específicas, servirá a navegação fluvial do rio Zambeze. Para que pudesse servir outros sectores de actividade, necessário se tornaria a construção de nova rede de estradas, dificílima na região dadas as condições do delta, obrigando à execução de numerosas e dispendiosas obras de arte. De qualquer medo, só daqui a muito largos anos se pode pensar na execução de tal obra.
Sendo assim, porque não- efectuar-se um progressivo melhoramento da barra de Quelimane, de modo que o porto possa desempenhar uma função não só útil mas até necessária para o escoamento dos produtos da região que serve?
Têm-se notado na região insistentes pressões no sentido de desviar as cargas que naturalmente se destinariam a Quelimane, para o poeto de Nacala. É contra essas pressões que a população de Quelimane reage, pois vivem os problemas e dificuldades resultantes das soluções que se preconizam e com as quais não podem concordar.
Relativamente ao pequeno caminho de ferro, tem dado efectivamente prejuízos, tendo sido de 11 173 contos em 1967 e de 10 976 contos em 1968.
Mas o caminho de ferro do Niassa, que presentemente se encontra ligado ao vizinho Malawi, em 1967 deu um prejuízo de 26 872 contos e em 1968 de 29 070 contos, e todavia ninguém pensa em substituí-lo.
Se o estudo feito do prolongamento do caminho de feno de Quelimane iate tio do Niassa levou a conclusões negativas, porque não efectuar-se o estudo do seu prolongamento até Milanje, servindo a região do Malawi com o mesmo nome, de forma que permitisse o escoamento da produção de chá e outros produtos que ali se situam, conforme desejo várias vezes manifestado pêlos nossos vizinhos, incrementando-se desse modo uma maior movimentação e especialização do porto de Quelimane em produtos de manuseamento especializado e sensível?
À luz de um objectivo planeamento regional, tanto o caminho de ferro como o porto de Quelimane são de interesse manifesto, e há que serem melhoradas os suas condições de funcionamento.
Quanto à referência de que na zona em causa se programa um aproveitamento hidroeléctrico no Alto Molocué, no Plano de Fomento em curso foram destinada verbas para a sua execução, mas o projecto foi abandonado e nada se executou. Porque o problema da criação de fontes de energia na região é grave e urge ser resolvido, abordá-lo-ei em outra ocasião.
Entretanto estão a fazer-se os estudos para o novo Plano de Fomento.
À carência das infra-estruturas essenciais ao desenvolvimento impede o progresso da região considerada.
Parece que se impõe Beja constituída uma comissão de planeamento regional para a zona compreendida no quadrilátero Quelimane-Milanje-Nova Freixo-Nacala e não somente um grupo de trabalhos, com o fim de colaborar na preparação do novo plano de fomento e acompanhar a sua posterior execução, coordenando os diversos meios de acção regional, da qual fizessem parte, não só elementos técnicos das diversas formações necessárias, mas também as individualidades da região que, pelo seu saber e experiência, pelo seu prestígio social e profissional, pelo seu poder de intervenção na vida económica e social dia região, se apresentassem como as mais qualificadas para levantar e equacionar os problemas e para propor para eles as soluções mais adequadas, coordenando-se deste modo o sector público com o sector privado.
E a necessidade da constituição de tal comissão regional resulta, entre outras razões, do facto de se tratar da zona de Moçambique com maiores valores de produção, com uma influência decisiva na obtenção de divisas tão necessárias, de ser a região com maiores potencialidades susceptíveis de mais rápido desenvolvimento no campo da produção e assim mais depressa corresponder aos incentivos resultantes dos investimentos que no sector público venham a ser feitos, e ainda de contar com cerca de 43 por cento de toda a população da província cuja promoção urge acelerar social e economicamente, e de se tratar da zona mais próximo do Norte que necessita de um adensamento da sua ocupação, e que pode propiciá-lo em condições de completo sossego e com vantagens económicas imediatas, constituindo-se desse modo uma frente sólida contra eventuais infiltrações.
Do actual governador-geral de Moçambique, Engenheiro Pimentel dos Santos, que tão bem conhece a problemática do desenvolvimento da província e as carências mais urgentes, esperam as pessoas que mourejam na zona referida a ajuda esclarecida e realista para a resolução dos seus problemas mais urgentes.
Mas voltando ao plano rodoviário que vai ser executado.
Perante o anunciar da grande obra planeada, muita gente duvida que ela seja executada totalmente e nos prazos previstos.
Essa dúvida é a resultante de várias promessas feitas que não chegam a ser cumpridas, e das dificuldades na obtenção dos meios humanos e materiais para a sua execução.
Porque é na verdade difícil contar na província com empresas devidamente apetrechadas para poderem executar todas as obras, permitiu-se o concurso de empresas estrangeiras.
Quanto aos recursos financeiros necessários, conta-se com as receitas ordinárias da Junta, considerada a taxa previsível do seu crescimento anual, com as verbas a atribuir nos planos de fomento e com financiamentos parciais das empresas concorrentes ou grupos financeiros a elas ligadas.
Para que o plano seja integralmente cumprido, como todos desejam e necessário se torna, dada a grande importância que as rodovias assumem no processo de desenvolvimento, indispensável é que as verbas a atribuir nos planos de fomento sejam efectivamente distribuídas, dado o carácter altamente prioritário da sua execução.
E houve, na verdade, grande receptividade dos respectivos empresários para a execução do empreendimento.
À inscrição para a pré-qualificação com vista ao concurso para a construção acorrerem umas trinta empresas, entre nacionais e estrangeiras.
Este facto é o melhor sintoma de que os planos foram criteriosamente gizadas e de que há confiança nos possibilidades reais do progresso de Moçambique:

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Se há várias empresas estrangeiras a confiar no nosso futuro, arriscando financiar parcialmente a execução das obras, acreditemos também nós no seu pleno êxito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Valadão dos Santos: - Sr. Presidente: Regressado ainda há pouco de uma visita que a Comissão Portuguesa do Atlântico proporcionou a um pequeno grupo de dirigentes do ensino liceal e técnico às instalações da N. A. T. O. na Bélgica, e a estabelecimentos de ensino na Alemanha Federal, e em que tomaram parte, por acumulação de funções, alguns Deputados da presente e, até de passadas legislaturas, não quero deixar de trazer a esta Câmara umas breves considerações, sobretudo de ordem política, que adiei oportuno fazer.
É que, na verdade, Sr. Presidente, quem se dispuser a percorrer em Bruxelas a sede da N. A. T. O, ou em Mons, a 30 km de Bruxelas, o Quartel-General do S. E. A. P. E. (Supremo Headquarter Allied Power Europe), quem, como nós, tiver oportunidade de contactar, um pouco de perto, com o que ali se passa, como se trabalha, de ouvir certas explicações e, principalmente, de tirar muitas dúvidas, fica com uma ideia mais real e mais verdadeira dos fins, dos objectivos e do papel importantíssimo, em vários campos, desta aliança. Papel, sobretudo, tia preservação da paz un Europa, pela- contribuição decisiva que ela veio dar a um equilíbrio de forças neste velho e tão atribulado continente, desencorajando, assim, a agressão.
Foram quinze países que aderiram ao Tratado de 4 de Abril de 1949, sendo que alguns deles, casos da Grécia e Turquia (1952) e República Federal da Alemanha (1955).. só mais tarde entraram para a aliança. E se é certo que o Pacto de Varsóvia nasceu (dizem os russos . . .) como represália ao Pacto do Atlântico, não é menos certo que este último teve a sua origem após as graves acontecimentos que se deram na Hungria, Bulgária, Roménia, Polónia (1947), Checoslováquia (1948) e bloqueio d(c) Berlim Oeste (]i943), ou seja, nos rescaldos, ainda, da última guerra.
Foram acontecimentos demasiado graves e significativos para se ficar de braços caídos num Ocidente que, ingenuamente e com a euforia da vitória, havia desmobilizado quase por completo ou, melhor dizendo; quase de tudo havia abdicado . . .
Todos nós sabemos, e até Portugal, por experiência própria, que existem maneiras de ver bastante divergentes entre estes quinze estados independentes e soberanos da N. A. T. O., mas saiba bem à vista todos eles têm consciência que o Tratado constituiu, e ainda constitui, um elemento de vital importância de estabilidade de certa segurança no mundo tão conturbado do após-guerra e em que, para infelicidade nossa, ainda hoje se vive.
A política da N. A. T. O. baseia-se fundamentalmente, em dois postulados: primeiro, manter um poder militar e uma solidariedade política (na Europa) suficientes para desencorajar a agressão e outros fins de pressão e, em segundo lugar, prosseguir uma política cem vista ao abrandamento dos tensões entre o Ocidente e o Leste. E se no aspecto militar o receio de uma guerra nuclear é contrabalançado pela crença mútua de represálias, o mesmo quer dizer que só n manutenção de um equilíbrio de forças pode contribuir para uma certa estabilidade. A defesa e a dissuasão estão, por consequência, na base dos objectivos do N. A. T. O.
Ora, Sr. Presidente, há em muitos países, inclusivamente o nosso, uma ideia errada acerca das verdadeiras finalidades da N. A. T. O. Muitos vêem-na como uma força agressiva, quando não é; dominadora, que também não é; interferente nos assuntos internos, que do mesmo modo não é; profundamente militarista (esquecendo-se estes que a paute militar, seguindo o Tratado, se submete ao poder civil).
Há que pôr os coisas no seu devido lugar e combater o que há de falso e, muitas vezes, tendencioso, acerca de uma organização que tem procurado ao longo destes vinte e três anos, em última análise, servir a causa da paz. Mas há, também, que acreditar no segundo postulado em que a aliança se baseia, ou seja, prosseguir uma política com vista ao abrandamento das tensões entre o Ocidente e o Leste. E se um dia, também, se conseguir esse objectivo, tão ansiosamente aguardado, a N. A. T. O. será merecedora do profundo reconhecimento de todos os povos que amam verdadeiramente a paz e a justiça.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente, eu queria sobretudo salientar, desta curta visita que também fizemos à República Federal da Alemanha, a oportunidade que tivemos de verificar, em altas esferas responsáveis de um dos anais importantes partidos políticos deste país, o grande apreço pelo papel de Portugal, não só dentro da organização da N. A. T. O., mas também, pelo que estamos actualmente em África.
Um antigo Ministro da Justiça e actualmente um dos vice-presidentes do Bundestag, que é, cumulativamente, presidente da Comissão Alemã do Atlântico, recebeu-nos com a maior simpatia e deferência no Parlamento Alemão em Bona, onde nos obsequiou com um almoço, ao qual assistiram altas individualidades, deferência e simpatia que a tomo, principalmente, para com esta Câmara.

O Sr. Brás Gomes: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Brás Gomes: - Tenho o maior prazer em apoiar calorosamente as palavras que V. Ex.ª acaba de proferir, palavras de justiça, quer respeitantes à N. A. T. O., um dos baluartes da defesa da civilização ocidental, quer em relação ao Bundestag, onde fomos recebidos por quem quis elucidar-nos gentilmente sobre a posição do seu país face aos problemas do nosso ultramar.
A maneira galharda como fomos recebidos mostra-nos bem o espírito de lhaneza do povo alemão. Não quero deixar de aqui agradecer a recepção que nos foi dispensada.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado, pelas palavras com que quis associar-se ao meu agradecimento e aproveito a oportunidade para dizer o prazer que tive na sua agradável companhia, nesta viagem que juntos fizemos.
Como é óbvio, houve uma larga troca de impressões não só sobre problemas de ensino, mas, sobretudo, de política.
E, se c evidente que, no campo educacional, há problemas que afligem os responsáveis profundamente, como o caso da droga e de um erotismo desenfreado, no que concerne à nossa política em África, aqueles que na Alemanha a conhecem, que já lá estiveram, que viram e que sentiram a razão de ser da nossa presença no ultramar, reconhecem o direito que nos assiste e, pelo menos, não a hostilizam. Verifica-se, e isso foi bem acentuado, que há nos meios de informação, e em muitos responsáveis

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políticos uma grande deformação dos factos; uns, claro está, por influência partidária, mas, sobretudo, por falta de contacto directo com os nossos problemas.
Ora esta guerra que nos impuseram em África tem custado muito e muito dinheiro e, sobretudo, a vida de muitos jovens que a têm dado, abnegadamente, ao serviço da Pátria. O problema de África não é militar, mas, sobretudo, político. E, seguindo a sugestão, que, alias, não é inédita, de um dos grandes vultos políticos com quem contactamos, haveria que convidar representantes dos mais qualificados, dos diversos partidos políticos, desses países, no caso vertente, da Alemanha Federal, a visitar as nessas províncias ultramarinas, n percorra-las sem embaraços e a ver o esforço enorme que ali temos despendido e o motivo da nossa presença.
Há, Sr. Presidente, que gastar dinheiro nesta batalha, e há também que vencê-la, neste campo, com as armas da razão, da verdade, do direito e da justiça, levando os outros a ver com os próprios olhos e a Apalpar as verdadeiras realidades.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Lopes Frazão: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A nossa Guarda Nacional Republicana, corporação que pelo real mérito e extrema validez da sua acção, sempre pronta, decidida, incansada, e inteiramente entregue a tranquilidade das populações, tudo isto no desprezo absoluto do materialismo degradante da vida, bem merece de nós todos, portugueses amantes da ordem e que a entendem como condição primeira de um melhor viver, o maior respeito, a mais alta consideração, e o seu envolvimento no nosso máximo carinho. , Esta, e só esta, a razão, Sr. Presidente, por que aqui vimos produzir esta fala, no intento único de, expressando o sentimento, gémeo do nosso, das gentes de bem que aqui nos guindaram, darmos contribuição, embora modesta, neste momento de premeditada reestruturação da Guarda Nacional Republicana, ao fortalecimento da mantença daqueles que com devoção e abnegadamente fazem respeitar os nossas vidas e haveres.
Só assim, de renda aumentada, podemos continuar a ter a sua presença física em permanência, indispensável por «montes» e aldeias apartadas da nossa terra, na quantidade e qualidade exigidas.
Desde a nossa meninice profissional, pelas dobras de Trás-os-Montes nos habituámos a estimar essa plêiade de homens, pelo amparo que deles sempre tivemos, totalmente alheados de interesses e de fadigas, para o fiel cumprimento dos ditames da lei, que tínhamos por missão impor. E assim tem vindo a ser tido por nós igual o seu esforçamento de vinculo activo, pelos anos adiante, que já não são poucos, da maioridade do nosso exercício de profissão.
E tal qual a Guarda Nacional Republicana, assim a Polícia de Segurança Pública e n Polícia Judiciária, na sua missão tão digna e admirável de servirem a comunidade, honrando-a, são bem credoras do nosso mais profundo reconhecimento, precisando-se, isso sim, que não afrouxe, antes que a sua força lhes seja emprestada mais f orça, para que nós todos não caiamos em fraqueza, e a história continue a rezar de nós com tamanha majestade quanto a do passado.
Uma palavra de inteira justiça é devida ainda ao corpo de segurança, que, para além do estorvo à tão molesta subversão, ameaça constante e grave do alicerce metropolitano, vimo-lo também, por terras da Guiné e Moçambique, destemorado e valente, e na maior nobreza de actuação, operá-la com o mais vincado merecimento em defesa do chão sagrado do nosso ultramar.

O Sr. Cancella de Abreu: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Posto a correr o anúncio de que alguns postos e subpostos rurais da Guarda Nacional Republicana iriam ser extintos, logo as populações, que se julgavam por tal razão prejudicadas, no natural receio do desassossego não refreado, por muita parte do Alentejo imenso, levantaram as suas vozes de natural queixume.
O Sr. Ministro do Interior apressou-se a transmitir às entidades regionais responsáveis o infundado da notícia, por o assunto, de momento, e «penas, se encontrar em estudo, e nada haver de ser feito sem ouvir a administração local.
Acertada medida é esta de reestruturar estudando com ponderação. Nós nunca quisemos acreditar que se extinguissem os postos em aldeamentos onde eles têm marcada razão de estar, por condicionalismos vários; só no distrito de Beja, dizia-se, seriam eliminadas treze unidades.
Ainda bem que assim não é, e o tempo se encarregaria de mostrar o desacerto da medida, pois vale mais prevenir que remediar, o que, em matéria de irrequietude de povos, só se consegue com a presença permanente da força, que não com brigadas móveis, ainda que dispondo da maior mobilidade.

O Sr. Leal de Oliveira: - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Leal de Oliveira: - Eu queria simplesmente apoiar o Sr. Deputado nas palavras que proferiu. E apoiá-lo com o conhecimento que me dá o andar pelo campo e o palmilhar tantas localidades «m que a presença da Guarda Nacional Republicana, só com um cabo e duas ou três praças, consegue manter a paz e solucionar tantos problemas com uma simples palavra de acalmia, mas que leva a população que os conhece e estima a continuar e manter uma vida ordeira e tranquila. Muito obrigado.

O Orador: - Eu agradeço a V. Ex.ª, Sr. Deputado Leal de Oliveira, u achega que me dá. E, já agora, permito-me contar a VV. Ex.ªs esta história autêntica passada na aldeia de Baleizão, quando há anos passados e infelizmente já muito passados, havia grande turbação nos espíritos naquela região alentejana de populações laboriosas, mas onde meia dúzia de energúmenos conseguiram perturbar os espíritos, tornando Baleizão naquela aldeia de que todos VV. Ex.ªs ouviram falar como a «Moscovo de Portugal». Pois bem, houve alguém que quis realizar uma festinha no aldeamento e foi pedir ao comandante da companhia da Guarda Nacional Republicana - isto para que VV. Ex.ªs vejam quanto vale só a presença - uma patrulha para fazer o respectivo policiamento.
O Sr.. Comandante disse-lhe que não tinha possibilidade de lhe fornecer a patrulha, e então ele pediu-lhe encarecidamente que, pelo menos, lhe emprestasse dois bonés da Guarda, para pôr nos cabides a entrada da porta! Isso bastava;
Como VV. Ex.ªs vêem, a presença é muito melhor do que um joep carregado de metralhadoras que vai calcorreando rapidamente por aqueles caminhos apertados do

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Alentejo, e dá-me a impressão que a fixidez é realmente muito mais útil e proveitosa.
Mas, dizia eu, é favor granido que ficamos devendo ao Sr. Ministro do Interior, este de resolver problema de tanta incidência no viver alentejano, em forte reflexão.
Sr. Presidente a Srs. Deputados:
Mus na verdade todos sabemos das dificuldades tremendas, nos dias de hoje, de policiamento com fixidez, e quer nos aglomerados mirais como nos urbanos, onde a Guarda Nacional Republicana e a Polícia dia a dia sentem os' seus efectivos assustadoramente decrescidos.
Beja, cidade a acresceu ter-se em ritmo da maior aceleração, tem já mais de duas dezenas de vagas na sua Polícia, já de si extremamente minguada. E, aqui em Lisboa, não é novidade para alguém, que é grande o desfalque nos quadros, e a acentuar-se cadn vez mais.
Por isso mesmo a criminalidade aumenta - e em que medida! -, torna-se de exagerada violência e audácia, e agora "tinge gravemente o cerne do País, que é a nossa juventude, entregue já a provação da droga!

O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª está convencido que é só isso?

O Orador: - Não. Há mais razões, mas esta é importante. É, talvez, das mais importantes.
Contra esta tão negra nódoa moral, todos devemos, com redobre de forças, dar tudo por tudo para a apagai de vez, não consentindo que consporque miais o nosso viver até aqui isento dessa mancha infamante.
Sr. Presidente e Srs. Deputados:

Para tanto é preciso que os sentinelas vigilantes da ordem e da pureza dos nossos costumes tenham aliciação pura um exercício proficiente, por ganho acrescentado. Não é possível ter agentes da nossa quietude, bastantes e bons, se as letras onde se integra a sua existência dificultosa suo das últimas de um, alfabeto que somente conta vinte e três, mas na sua relação com os vencimentos, o U e até ao Z parecem estar a distância infinita do A!
Hoje pago-se no Alentejo muito mais, quase o dobro, se atentarmos nos muitos benefícios concedidos a um tractorista ou mesmo n um maioral, que a uma praça da Gr. N. R., a um agente da Polícia da Segurança ou da Judiciária.

De notar é que qualquer destes agentes obriga-se a serviço activo permanente, serviço que é da maior rudeza, e ainda mais sujeito ao risco,, tontos vezes sério, da turbulência do tempo e dos homens.

O Sr. Cancella de Abreu: - Muito, bem!

O Orador: - Incluídos na mesma letra dos escriturários, estes com diminuída responsabilidade, e apenas seis horas de serviço diário, é que não achamos bem, e connosco todos quantos prezam a tão necessária acalmia.
Ninguém, pois, verá com maus olhos, e pelo contrário isso só será visto por bem, que para além de outras regalias, tal como o subsídio de. renda de casa, e mais, & força seja dada- mais força de provento, para que todos nós tenhamos o sossego por que se anseia, que é ela n força maior da nossa promoção económica e social.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: As populações do círculo de Santarém, de quem recebemos honroso mandato de representação nesta Assembleia, acabam de passar por duas situações a que desejo fazer referência.
A primeira, que vai já constituindo rotina, foi a verificação de mais uma cheia- do rio Tejo, que uma vez mais, também, indiferente às grandes obras de aproveitamento hidroeléctrico do seu curso superior e teimando em contrariar todas as previsões mais ou menos optimistas, galgou as suas margens e cobriu os terrenos marginais, transformando-os num imenso mar, apossando-se deles num deleite de posse, ao mesmo tempo belo e trágico, com todas as consequências nefastas daí resultantes.
O rio Tejo, que pode ser e é fonte imensa de riqueza e de progresso, mais uma vez espalhou as suas águas, à com elas a ruína e desolação, e transforma-se assim, à forca de repetição anual das suas cheias, numa espécie de condensação, a que estão votadas aquelas boas gentes trabalhadoras e pacientes, destruindo teres e haveres, que afectam toda n economia da região, que nos últimos vinte e cinco anos terá sofrido prejuízos que podem ser avaliados num valor médio da ordem dos 150 000 contos anuais.

À tristeza que sempre causa esta situação sucedeu-se, porém, outra, a alegria da notícia que veio a público na imprensa do passado dia 10 de Fevereiro, de que, em reunião u que presidiu S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas, foram, apreciados os estudos prévios para regulamento do caudal do Tejo.
Quando, há cerca de dois anos, mais uma cheia do Tejo atingiu os limites de uma trágica fatalidade, S. Ex.ª, em visita de- trabalho ao local flagelado, para além de medidas de emergência que. o momento requeria, e que prontamente concedeu, anunciou a criação de uma comissão para estudo dos problemas da regularização do Leito do Tejo.
Passado que foi este tempo, criada a Comissão Orientadora do Plano Geral de Regularização do Rio Tejo e o Gabinete do Plano Geral de Regularização do Rio Tejo, eis que o estudo prévio surgiu, e com ele a esperança de solução deste grave problema, que afecta Extraordinariamente toda a economia da região, e que, sendo das mais férteis do País, tem certamente a maior incidência na economia nacional.
À clarividência de pensamento do Sr. Ministro Bui Sanches, na apreciação das problemas que correm pelo seu Ministério, a que corresponde sempre uma dinâmica de acção, que S. Ex.ª imprime às suas resoluções, e uma rapidez de execução dos serviços do Ministério das Obras Públicas, e a que o País inteiro se vai habituando, tão evidentes são os benefícios deste estrio de governo, fica o Ribatejo e todo o distrito de Santarém devendo o mais alto dos serviços.
Efectivamente, aquele rio, que é fonte de riqueza, mas que, como dizia, representa uma espécie de condenação permanente de ruína e miséria, está em vias de se tornar numa for-te esperança devida, se não numa grata certeza de desenvolvimento e aproveitamento total dê uma região que oferece ao País a promessa de um mais amplo desenvolvimento.
Assim, o meu distrito de Santarém, que tanto tem merecido já o carinho e a atenção de S. Ex.ª o Ministro das Obras Públicas, sente que lhe fica devendo o mais relevionlte dos serviços.
Sabendo embora que a solução do problema, tal como foi anunciado, não é fácil nem a curto prazo; sabendo embora que haverá ainda que sofrer algo, sente igual-

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mente que o passo agora dado é o afastar de nuvens que anunciam tempestade- e o iniciar de uma caminhada que levara à solução final do problema, as populações do meu distrito rejubilam ao tomar conhecimento deste estudo, cuja execução prática se anuncia deverá ser incluída no próximo IV Plano de Fomento.
E, não podendo calar o seu sentimento de gratidão, aqui estão, pela voz modesta mas sincera do seu Deputado, a formular ao Ex.mo Ministro Rui Sanches e ao Governo da Nação que representa a sua satisfação, o seu agradecimento e a sua confiança.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Francisco António da Silva: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No quadro tradicional da agricultura portuguesa, a olivicultura tem sempre desempenhado um papel relevante. Ainda hoje, apesar da crescente concorrência das oleaginosas e das dificuldades cada vez maiores da sua colheita, o azeite, só por si, representa cerca de 5 por cento do produto bruto agrícola.
As condições típicas do nosso clima, profundamente marcado por uma influência mediterrânica, favoreceram, desde sempre, em especial nas regiões calcárias e quentes, a cultura, da oliveira. O azeite, como, aliás, as azeitonas, bem sido, de há muito, um produto significativo das nossas exportações. Numerosos documentos nos dão fé de um tráfico de certo moldo vultoso, já nos séculos XV e XVI, com as regiões do Norte da Europa. Contudo, foi só no século passado que, por condicionalismos vários, como, por exemplo, a necessidade de suprir a carência de gorduras animais e um canto impulso dado às e indústrias de conservas, se intensificou ainda mais entre os Portugueses a utilização do azeite, o que levou a um substancial Aumento das áreas de cultivo da oliveira.
Este aumento conduziu-mos, progressivamente, à situação que temos desfrutado de quinto produtor mundial de azeite.

Para se avaliar melhor do potencial económico da olivicultura no conjunto agrícola português, diremos que o número as oliveiras é de cerca de 49 milhões, distribuídos especialmente pêlos vales do Douro e do Tua, pela bacia do Mondego, peia Estremadura, pelo Ribatejo, pela Beira Baixa e pelo Alentejo, abrangendo o seu cultivo cerca de 420 000 ha, o equivalente a cerca de um décimo da superfície agrícola do território metropolitano.
No decénio de 1955-1964, a produção mediu amuai portuguesa de azeite foi da ordem de 885 milhares da hectolitros. No quinquénio de 1966-1970, segundo dados publicados pelo Instituto Nacional do Estatística, a produção média anual baixou pensa, cerca de 679 993 hl, equivalendo, em escudos, à média anual de cerca de l milhão de contos.
Por seu ,turno, a produção de óleo de bagaço de azeitonas, no mesmo quinquénio, teve a média anual de cerca de 8500t, o que equivale a cerca de 112 753 contos. Se adicionarmos a estes quantitativos no valores da exportação de azeite paca uso alimentar e dos diferentes tipos de azeitona de conserva, observaremos que a olivicultura movimenta, anualmente, valores da ordem de l 200 000 a l 500 000 contos.
Por outro lado, só no ano de 1970, o número de lagares em funcionamento, quer particulares, quer industriais, foi de 2551, pertencendo 94 a cooperativas.
Salientamos já a tendência decrescente da produção de azeite nos últimos anos. Embora ainda não sejam conhecidos os resultados da produção de 1971, sabe-se,
contudo, que houve um decréscimo de cerca de 40 por cento relativamente à produção do ano anterior, que foi da ordem dos 734 800 hl. A previsão da produção de 1971 oxalá atingisse os 500 000 hl de azeite.

A que se deve a baixa acentuada da produção do azeite?

É sabido que há oscilações de ano para ano, em virtude de a produção de azeite comportar um ritmo de safra e contra-safra. Mas isso só por si não explica a diminuição substancial da média anual da produção iro último quinquénio. Teremos de ir buscar outras causas justificativas dessa verificada baixa de produção. E encontramo-los especialmente nas dificuldades cada vez maiores da colheita do azeitona, no aumento extraordinário dos custos de produção e, aluda, na falta de estímulo oficial dessa produção.

Com efeito, nos últimos anos, a cultura da oliveira deixou de ser compensadora. Basta referir que os preços de intervenção fixados pelo Governo se têm, em certa medida, mantido estáticos, enquanto têm subido astronomicamente os factores de produção. A mão-de-obra, escassa e pouco produtiva, teve aumentos, só no apanho do última campanha, da ordem de 80 a 70 por cento, conforme as regiões e o aumento da procura, enquanto o preço de intervenção foi mantido, em relação à compunha anterior. Acrescentamos mesmo que, em muitos casos, por dificuldades de obtenção de mão-de-obra e pelo desajustamento entre os preços de custo apurados e os preços de intervenção, muitos produtores ou não tiveram possibilidade ou desinteressaram-se mesmo da apanha da azeitona, para evitar largo prejuízo.
Com a publicação da Portaria n.° 708/71, que estabeleceu o novo regime para a comercialização do azeite e óleos comestíveis, saída em 21 de Dezembro último, já em plena campanha, gerou-se, como é óbvio, uma natural desorientação na actividade olivícola, que provocou graves prejuízos. E que, quando da publicação da portaria, eram já conhecidos alguns preços de custo médio ponderados, respeitantes a várias regiões do País, por iniciativa, muito louvável, da Junta Nacional do Azeite. Contudo, houve a preocupação de manter os preços de intervenção aos mesmos níveis da campanha anterior, que, em relação aos custos apurados, se encontram muito desactualizados.
É muito justo o propósito do Governo de conter os preços dos produtos essenciais. Mas essa política de contenção de preços não pode desligar-se das realidades.. Para se fixar o preço de um produto não poderá deixar de se ter em conta os custos de produção. Estes têm também de ser contidos, para evitar que os benefícios de uns revertam em prejuízos de outros. Os benefícios e os prejuízos têm de ser repartidos equitativamente, de forma a evitar que à volta da produção se desenvolva toda uma rede de oportunistas, cuja acção foi facilitada pela tardia publicação da Pontaria n.° 708/71.

Poderá objectar-se que o produtor deverá procurar utilizar meios mais actualizados e mais eficazes de produtividade, inclusivamente o recurso à mecanização das colheitas de azeitonas, como forma de conseguir o embaratecimento dos custos de produção.

A lavoura tudo tem feito para conseguir adaptar-se às condições do progresso, mas não poderão esquecer-se duas coisas:

l.ª É discutível, ainda, a eficácia das máquinas criadas para a substituição da mão-de-obra na difícil e cansativa operação de apanha da azeitona;

2.ª Os olivais estão disseminados até por terras sem aptidões ecológicas, o que torna, em muitos casos, impraticável a utilização da maquinaria.

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Desta forma, a produtividade tem do ser procurada em novos moldes, que exigem a definição correcta de uma verdadeira, política olivícola e que envolvem, inclusivamente, a delimitação de áreas específicas da cultura da oliveira e a reconversão sob forma a permitir maiores índices de produtividade. Mas essa reconversão exige, necessariamente, um apoio técnico, que não tem havido, profundos estudos económicos e uma aplicação de capitais que a lavoura, neste momento, não está em condições de suportar, até mesmo pela falta de estímulo que a produção de azeite tem tido.

Só assim poderá pensar-se numa melhoria do sector e até na competividade de preços à escala internacional.
Julgou-se que, com a publicação da Portaria n.º 23 800, de 23 de Dezembro de 1968, estariam dados os primeiros passos para a defesa da olivicultura, mas, infelizmente, o Governo não promulgou as medidas, que se afiguravam mais aconselhadas para o fomento da produção.
E é curioso referir que os estudos dos mercados e dados estatísticos dizem-nos que o público português continua a dar preferência ao azeite, relativamente nos outros óleos, e, assim, tudo parecia indicar que a produção fosse orientada no sentido do que os mercados solicitam. No entanto, apesar de se tratar de um princípio básico em qualquer economia, este principio, quanto ao azeite, encontra-se invertido, pois a maioria dos esforços da Administração parece conjugar-se para fomento puro e simples da produção de oleaginosas.
E, entretanto, prevê-se que o desgaste em azeite para o próximo ano ronde os 90 milhões de litros e o de óleos cerca de dois terços, ou sejam 60 milhões de litros. Com tais números, é implícito que teremos de colmatar a nossa carência de gorduras fluidos com a importação lê 30 000 t de azeite e de 20 000 t de oleaginosas aproximadamente, dados as reservas e as estimativas de produção previstas quer na metrópole, quer no ultramar.
Foi precisamente num ano em que as necessidades do meneado eram maiores e em que diminuiu a produção, em que a mão-de-obra, cada vez mais escassa, subiu vertiginosamente, com paralela diminuição de produtividade, que a Pontaria n.° 708/71, sem ter em couta os custos de produção, veio fixar um preço de intervenção igual ao da campanha do ano anterior. Isto implica efectivamente para a maioria dos produtores descapitalizados a pratica de preços à produção muito inferiores aos preços de custo, e a verdade é que a própria portaria, pelo seu articulado, considera o preço do azeite livre, limitando, apenas, as margens de lucro a praticar pelo comércio.
Se quisermos, como hoje é hábito, comparar os preços pagos à lavoura portuguesa pelo azeite, relativamente aos preços que se pagam à produção no Mercado Comum, encontramos a seguinte e esclarecedora diferença:

O preço por que é pago à produção para a campanha de 1971-1972 pela C. E. E. é de 118,75 unidades de conta por 100 kg, o que equivale aproximadamente a 29$50 o libro (a 3° de acidez), enquanto, mo nosso preço de intervenção, o azeite vale 18130 o litro (com 1° de acidez).

A título de curiosidade, diga-se também, que os agricultores do Mercado Comum pedem tunda um aumento de preços de 11 a 12 por cento para este ano económico, o que não deixa de ser expressivo.

Já há alguns anos atrás, V. Ex.ª, Sr. Presidente, numa notável intervenção feita nesta Câmara, chamou a atenção do Governo para a política do azeite, o mesmo fazendo outros ilustres parlamentares, particularmente o engenheiro Camilo de Mendonça, que pediram providências sobre o assunto, mas a verdade é que as solicitações de ontem se mantêm agora com mais acuidade, porque se lhes não acudiu eficientemente, daí resultando que o sector da produção se tem progressivamente descapitalizado, estando na iminência de eme total.
É para esta situação anacrónica que me permito chamai- a atenção do Governo. A continuar-se na situação actual, verificar-se-á uma diminuição crescente da produção de azeite, sem que, em contrapartida, se saiba o que deve substituía: a oliveira e quanto é que tal transformação vai custar ao País; implicitamente, deve diminuir o quantitativo de óleo de bagaço produzido, por falta de matéria-prima; deixarão, por consequência, de funcionar numerosos lagares, não se antevendo qual o seu futuro destino; as cooperativas oleícolas deixarão de poder cumprir a sua missão, ficando, assim, por liquidar ao organismo responsável os empréstimos feitos ao abrigo du Lei de Melhoramentos Agrícolas e perder-se-á um valor expressivo da produção agrícola, ao mesmo tempo que se forçará o povo português a não consumir azeite, produto tradicional da sua alimentação, solvo se pensarmos na importação indefinida.

Mas nem essa perspectiva é animadora. A reserva actual no Mundo em azeite, no fim desta campanha, atingiu apenas 10 por cento da produção, enquanto se acentua a tendência para um maior consumo por parte de países essencialmente turísticos, como a Espanha e a Itália, dois dos maiores produtores mundiais de azeite.
Tal facto poderá vir a ter reflexos muito substanciais e ocorre-nos perguntar como será possível recorrer futuramente a importação de um produto como o azeito se os países exportadores tendem a esgotar as suas próprias reservas. Por outro lado, é também sabido que, no respeitante a outras gorduras, não somos excedentários, mas apenas deficitários.

A ponderação de todas estos circunstâncias lava-me a solicitar do Governo que seja revista, com urgência, toda a política oleícola, e se tomem providências no sentido de fomentar o desenvolvimento sócio-económico do sector, que constitui, como se disse, um dos mais fortes esteios da agricultura portuguesa, que todos pretendemos saudável e próspera e não permanentemente fonte de preocupações e de desesperança.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Valente Sanches: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sempre julgámos que o Estado não pode ser hoje mero instrumento de vigilância e garantia das actividades privadas, mas que tem de ser, cada vez mais, promotor efectivo da cultura, do desenvolvimento económico e do bem-estar social, através dos seus serviços, reconhecendo aos indivíduos os seus legítimos direitos, mas condicionando o seu exercício pelo dever que o coda pessoa humana compete de contribuir com a sua actividade e com os seus bens para melhorar a situação dos outros homens.
É, por isso, necessário inventariar necessidades e potencialidades, planificar e programar em conjunto, mas é sobretudo urgente interessar todos os portugueses no estudo e solução dos problemas nacionais e locais, dando a todos oportunidade de participação efectiva na vida nacional.
Acreditamos sinceramente que na liberdade de iniciativa assenta a grande mola do progresso e que o Estado, por mais que faça, não pode nem deve dispensar a iniciativa dos particulares. Pode, isso sim, e deve criar um ambiente de entusiasmo no campo do fomento económico de forma a promover, animar e estimular as iniciativas

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e orientá-las de modo que a propriedade individual e a empresa privada sejam concebidas e reguladas no sentido de cumprirem a sua função social e não prejudicarem os interesses colectivos.

O País necessita muito de estruturas adequadas e de uma Administração que seja mais do que nunca, instrumento fecundo e actuante e não entrave, como julgamos ter sido, ao desenvolvimento integral da Nação.
Já aqui o dissemos há cerca de dois anos, que é muito urgente modificar, reorganizar e até reformar estruturas que se têm revelado totalmente incapazes de serem suportes de uma acção eficaz mós sectores a que se destinam, mas continuamos a considerar ainda mais importante a reforma da mentalidade de muitos homens que servem ou se instalaram nos diversos sectores e escalões da nossa Administração.

O quadro geral dos serviços públicos ainda enferma de um imobilismo confrangedor e desencorajante, porque continua a permitir-se que a frente da alguns deles estejam homens de costas voltadas aos verdadeiros interesses da comunidade, num autêntico desinteresse pêlos bens que lhes confiaram.

Se o Estiado Português é uma república corporativa e se, por que assim é, todas as actividades nacionais se devem encontrar organizadas em corporações e estas são considerados elementos estruturais da Nação, tendo como finalidade não apenas a defesa dos interesses dos seus associados, mas também a colaboração com o Estado na realização dos superiores ideias nacionais, importa reestruturar e revitalizar, dinamizando toda a nossa organização corporativa, conquistando a confiança dos seus associados, de modo a obter-se de todos eles uma maior e mais franca colaboração no estudo e solução dos seus próprios problemas e da colectividade.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Apesar de terem sido levadas a cabo algumas reformas que julgamos do maior interesse, nestes dois últimos anos, nalguns sectores da nossa Administração, esta continua anquilosada e velha em muitos outros.

Cremos poder ainda hoje afirmai, sem receio de cometer o grave pecado ida injustiça, que à nossa administração pública e organização corporativa cabem, em larga medida, a responsabilidade dos atrasos em que vivemos e dos muitos males que nos afligem.
A organização corporativa disciplina a concorrência e deve procurar manter a harmonia e o equilíbrio no seio de cada sector e pode caiar a consciência de que nenhum interesse pode esqueceu a sua dependência de outros interesses e da subordinação dos interesses particulares aos interesses gerais - da profissão, da produção ou da Nação.
Este espírito ainda não existe no seio de todos os organismos corporativos.
Infiltrações malsãs vão comprometendo a solidez do edifício. Pelas fendas abertas, aqui e acolá, têm vindo a penetrar, nalguns casos indiscretamente, noutros à luz do pleno dia, os parasitas e os oportunistas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O presente e o futuro impõem a organização corporativa a adopção de medidas de reforma de estruturas e de mentalidades.
Esta estatalizou-se, burocratizou-se e, em muitos casos, desprestigiou-se.
Através da concentração, em 15 de Janeiro dó 1970, dos pastas dos Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência no mesmo titular foi ensaiada a coordenação da política social do País.
Sabemos que decorrem os estudos de reforma da estrutura do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência com vistas à adequação do Ministério às exigências da celeridade e da eficácia da administração pública comprometida no desenvolvimento económico e social de um país, inserido numa Europa e num Mundo em vertiginosa e imprevisível aceleração histórica.
Em Outubro de 1967 a nossa organização corporativa estava dimensionada da seguinte forma:
Corporações -1,1.
Uniões - 14, sendo 7 de patrões e 7 de empregados.
Federações - 48, sendo 26 de grémios e 22 de sindicatos.
Grémios - 606.
Ordens - 3.
Sindicatos - 320.
Casas do Povo - 788, de que funcionavam 653.
Casos dos Pescadores - 28.

Se a nossa organização corporativa tem já tal dimensão, e se atendermos à sua vocação integralista, fácil nos é apercebermo-nos do quanto ela pode constituir um importante elemento dinamizador do nosso desenvolvimento sócio-económico e cultural ou entrave a esse mesmo desenvolvimento.

Evoluiu a vida nos seus diversos sectores e de um modo especial no sector da produção dos bens materiais, modificavam-se os técnicas ao serviço dos capitais e a nossa administração pública e organização corporativa continuam incapazes de responder eficazmente às legítimas solicitações do progresso. E como mão se encontram devidamente estruturadas e preparadas para ele, atravessam-se-lhe, quantas vezes no s&u caminho, comprometendo o seu necessário avanço.
É muito urgente que o Governo examine a situação e perspectivas da eficiência du organização corporativa era função das exigências do desenvolvimento sócio-económico do País e promova as adaptações das suas estruturou" orgânicas e funcionais à luz destas exigências, não esquecendo os processos de articularão destas, com a administração pública.
Se este estudo não for concluído com rapidez e não forem tomadas os medidas convenientes, receio bem que o desenvolvimento económico acelerado do País, que tanto se deseja e importa, venha a ser irremediavelmente comprometido.

A este receio, que julgamos bem fundado, nos conduz a experiência do dia a dia, face a um sem-número de organismos corporativos com bem pouca vida e quase sempre divorciados dos serviços públicos, que ao seu lado funcionam, com finalidades convergentes.
Desde sempre os organismos de coordenação económica foram, reconhecidos como instrumentos necessários à disciplina do mercado de um país em economia de guerra, mas votados ao desaparecimento, pela integração dos seus serviços, ora no Estado, ora nas corporações, logo que deixasse de subsistir o condicionalismo político-financeiro dos anos de guerra.

Cremos que o Governo continua fiel a esta orientação e, por isso, talvez fosse altura de apurar já quais os organismos de coordenação económica que porventura devam subsistir e aqueles que devam integrar-se nas corporações ou no Estado, e ainda quais os atribuições dos mesmos organismos que conviria passar para a competência dos corporações.

Se assim se não fizer, continua, com grave prejuízo, reduzido o âmbito das funções normais das corporações e corre-se o risco de estes organismos que nasceram sob o signo do provisório com feição pré-corporativa se converterem em definitivas construções.

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Julgamos, porém, que se algum ou algum destes organismos de coordenação económica for de manter por mais algum tempo, catão quo se lhe introduzam remodelações capazes de uma maior actualização de método de funcionamento e, sobretudo, que se lhe concedam meios humanos e financeiros indispensáveis à satisfação das necessidades que são chamados a realizar.
De meios humanos, ainda mais do que de meios financeiros, estuo carecidos estes organismos. Seria bem necessário chamar à consciência dos seus deveres e das suas responsabilidades alguns dos homens que ocupam lugares cimeiros dentro da organização, a fim de se tornar possível uma dinamização em cadeia até aos que servem nos escalões mais baixos.

Procure-se obter dirigentes com suficiente preparação técnica e administrativa, pessoal qualificado, o que parece assumiu particular importância com a integração de Portugal nos grandes espaços económicos contemporâneos.
No tocante à distribuição de competências relativas à intervenção na economia - e que em certos rasos é pouco clara, dando origem à sobreposição entre o Estado, a organização corporativa e os organismos de coordenação económica - parece dever procurar-se que aquela distribuição seja racionalizada, em. ordem a evitar duplicações e dúvidas que afectam tanto as actividades económicas como o próprio exercício dos controles públicos.
Há longos anos ouvimos falar na crise da agricultura e mais um ano passou e a crise continua, apesar de abundarem por toda a parte os colóquios, as mesas-redondas e as reuniões de responsáveis pela solução dos problemas do sector.

Enquanto tudo isto se possa, em face dos menos aptos, não tem sido difícil aos oportunistas adquirirem os produtos à lavoura a baixo preço e colocá-los no mercado com margens de lucro chorudas.
A agricultura continua em situação de cada vez maior crise, mas todos quantos se entregam, ao negócio da venda de máquinas, utensílios ou produtos destinados à lavoura vão fazendo, em curto prazo, autênticas fortunas. Os abutres vão encontrando nesta lavoura em decadência e quase agonizante campo fértil para satisfação dos seus incontidos instintos de lucro.

A organização corporativa da lavoura, por falta de estruturas, métodos e homens, assiste impotente e sem reacção eficaz, parecendo também agonizar ao lado daquela a quem lhe competia insuflar vida. E digo por falta de estruturas, métodos e homens, e mão por carência de organismos, pois estes não faltam:
Além das 788 Casas do Povo, de que funcionavam, até há pouco tempo, apenas 653, existem os seguintes organismos patronais da lavoura, no continente e ilhas adjacentes: 14 federações de grémios abrangendo 243 grémios, l organismo particorporutivo e 5 grémios não federados.
Como elementos de ligação entre o Estado e as actividades enquadradas na Corporação da Lavoura existem: a Junta Nacional do Azeite, a Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, a Comissão Reguladora do Comércio do Arroz, a Comissão Reguladora das Moagens de Ramas, o Instituto Nacional do Pão, a Junta Nacional das Frutas, a Junta dos Lacticínios da Madeira, a Junta Nacional dos Produtos Pecuários, a Junta Nacional da Cortiça, a Junta Nacional dos Resinosos, a Comissão de Viticultores da Região dos Vinhos Verdes, o Instituto do Vinho do Porto e a Junta Nacional do Vinho.
Se o Governo está empenhado em diminuir a situação de sensível atraso da agricultura em Portugal, em relação aos outros sectores da actividade, então decida-se a encarar muito a sério e já a reestruturação e reforma profunda de todos estes organismos.
A Lei n.° 1957, de 20 de Maio de 1937, regulamentada polo Decreto-Lei n.° 29 243, de 8 de Dezembro de 1938, veio completar, ao lado da criação das Casas do Povo, o enquadramento corporativo primário da agricultura, impondo, a constituição, em todos os concelhos rurais, de um grémio representativo da produção agrícola, com os seguintes atribuições:

1) A representação pública directa ou através dos organismos corporativos intermédios da lavoura, da produção agrícola;

2) O fomento do espirito de solidariedade e de cooperação dos factores da produção agrícola - capital, técnica e trabalho - na realização de um desenvolvimento equilibrado, produtivo e harmónico da actividade;

3) A contribuição pelos meios humanos e tecnológicos ao seu dispor no aperfeiçoamento da exploração agrícola, e, consequentemente, da produção da empresa agrária, com inerente melhoria geral do nível de vida das populações das campos;

4) A disciplina económica do sector nas suas areais da jurisdição, fazendo cumprir as disposições legais e regulamentares do Governo, os deliberações e instruções dos organismos de coordenação económica, das entidades corporativas superiores e do próprio grémio nas matérias ligados à regulamentação do exercício da indústria agrícola;

5) A orientação e disciplina dais empresas agremiadas na defesa dos seus legítimos interesses à luz de uma hierarquia de valores que subordina os primeiros aos interesses económicos e saciais superiores da Nação;

6) A promoção da colocação e vendia dos produtos dos agremiados, quer indirectamente, mediante prospecção no mercado interno, quer directamente, em representação dos agricultores, podendo, então, utilizar-se das bolsas de mercadorias;

7) A aquisição colectiva dos instrumentos e maquinaria necessárias à actividade dos agremiados, promovendo, assim, e complementarmente aos departamentos estaduais ligados ao fomento rural, a equipagem e a mecanização da empresa;

8) A construção de armazéns, celeiros, adegas, a compra de animais e maquinaria e a criação d& serviços técnicos de apoio à lavoura, formando uma infra-estrutura gremial e concelhia de assistência técnica aio agricultor;

9) A colaboração com o Ministério da Economia e dos Corporações e Previdência Social e com a organização corporativa da agricultura, em vista à Aceleração do crescimento económico dos sectores agrário e pecuário e a formação profissional da mão-de-obra rural;

10) A cooperação com os Cosas do Povo na realização dos fins destes organismos, designadamente para melhoria das condições materiais e morais dos populações do campo, regulamentação convencional colectiva do trabalho rural e desenvolvimento dos instituições de previdência, assistência e mutualidade da mão-de-obra agrária;

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11) A promoção da constituição de caixas de crédito agrícola, cooperativos de produção e de consumo, mútuas pecuárias, no benefício dos seus agremiados e fins trabalhadores agrícolas.

Para a prossecução dos ambiciosos funis que se propuseram dispõem os grémios tia (Lavoura de competência parafiscal, tributando a propriedade rústica.
Terá sido isto o que os grémios da lavoura têm feito? Não respondo eu, mas desejaria que o Governo tivesse em conta a oportunidade de promover um inquérito junto da lavoura e que a esse inquérito se seguissem adequadas medidas legislativas, susceptíveis de porem termo, de uma vez para sempre, ao seu precário funcionamento.
Se os grémios da lavoura continuarem a ser pouco mais do que centros de procuradoria onde se preenchem manifestos, se fazem requerimentos e se distribuem, senhas então não se obrigue a lavoura ao encargo de os manter.

O Sr. Eleutério de Aguiar: - Muito bem!

O Orador: - Dos grémios que tem secção comercial, as alfaias agrícolas, máquinas, ferramentas agrícolas, sementes e plantas, insecticidas e fungicidas, adubos e rações para gados, adquire-as a lavoura ou ao mesmo preço ou mais caro do que es pode adquirir em estabelecimentos comerciais. Apenas com uma diferença é que nos grémios os artigos adquiridos terão de ser pagos a pronto, enquanto no comércio encontra facilidades de pagamento e este lhes coloca os produtos vendidos em casa.
Das precárias condições do funcionamento destes grémios resulta necessariamente a aplicação menos proveitosa dos dinheiros que o Estado tem vindo a destinar aos organismos de protecção a lavoura e com destino a esta.
O corporativismo tem de ser vivido e praticado pelo País inteiro. Há-de dominar na orientação das empresas e de penetrar na consciência dos trabalhadores. Daí a grave responsabilidade dos dirigentes corporativos, que tudo devem fazer para que o espírito de rotina o não prive do sopro do idealismo que animou o movimento inicial.
Sou defensor exigente deste idealismo e, por isso, não 'desejaria sentir, na minha própria corne, os perspectivas do fracasso do sistema.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar a

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposto de lei sobre a organização judiciária. Tem a, palavra o Sr. Deputado Homem Ferreira.

O Sr. Homem Ferreira: - Sr. Presidente: Uma intervenção breve e descarnada, pois, além de ser pouco extensa a proposta de lei em debato, não alimento grande simpatia por estas alterações legislativas de tipo parcelar.
Mercê de acontecimentos judiciais recentes, a que a imprensa atribuiu amplo relevo, a opinião pública começou a ficar perplexa e alarmada com o sector da administração da justiça.

A proposta de lei não responde a esta inquietação geral e parece dirigir-se mais aos sintomas do que & própria crise que percorre a organização judiciária e que, aliás, tem, sido objecto de sucessivas advertências dos profissionais do foro.
No ano de 1970 foram decididos, nos nossos tribunais, 97 414 processos penais e foram resolvidas 79 924 acções cíveis, com o valor de 4 578 000 000$.
A grandeza e eloquência destes números mostram o peso da actividade judicial na vida da Nação e dispensam comentários.
Mas permitem avaliar as dramáticas condições de trabalho a que estão submetidos os servidores da justiça, encharcados do papel selado, sem tempo para aprofundarem os problemas, aperfeiçoarem, os conhecimentos jurídicos e pensarem, reflectidameiube, as decisões.
O volume do serviço e a pressão dos prazos, tendo à ilharga o fantasma de uma inspecção nem sempre compreensiva, criam a tendência para a velocidade, com prejuízo da serenidade que todo o julgamento pressupõe e exige.
Daí resvalar-se cada vez mais na preocupação de julgar depressa em vez de se procurar julgar bem.
Tudo assenta nesta realidade: há juizes a menos e processos a mais.
Por isso, muitas dos críticas que incidem sobre estes aspectos, no fundo e bem vistas as coisas, são mais endereçarias a uma orgânica que já não suporta o ritmo processual e começa a estalar pelas costuras, do que u pessoa dos juizes, cujo esforço meritório é inegável, mas cuja capacidade de resistência tem de ser aferida por padrões humanos.
Por outro lado, o mecanismo destinado a garantir a independência do Poder Judicial carece de aperfeiçoamento e de uma revisão de estruturas, no sentido de ser a própria magistratura a participar, mediante um sistema electivo, na formação dos seus órgãos superiores que dispõem de poderes disciplinares, de modo a dissolver no seu espírito o receio ou n suspeita de qualquer influência estranha que possa perturbar ou macular a alta missão que lhe está confiada.
Acresce também que, mio capítulo económico, a carreira judicial não dispõe de qualquer aliciante susceptível de atrair es camadas jovens dos diplomados em Direito.
A magistratura, atendendo à sua elevada categoria social e à responsabilidade da função, é extremamente mal paga.
Um juiz de 1.ª instância ganha entre 9600$ e 13 000$, importâncias sujeitas a um desconto de 6 por cento.
Numa conferência publicada mo último número da Revista da Ordem dos Advogados, o meu ilustre colega Dr. Santos Silva demonstrou que um juiz de 1.ª classe, no Porto, casado e com dois filhos, auferindo 11 600$ por mês, depois de deduzidas as despesas essenciais com habitação, alimentos, vestuário, educação dos filhos, médicos e farmácia, ficava com a verba livre de 200$ para as despesas extraordinárias, designadamente diversões, viagens, livros e imprevistos.
Havemos de concordar que, debatendo-se neste quadro de vida, sob a pressão de um trabalho esgotante, de uma profunda amargura económica e de uma, pesada responsabilidade, um juiz tem de recordar constantemente - para mão se perder, nem revoltar - o conselho do chanceler francês:

Um magistrado que não é um herói nem chega a ser um homem de bem.

Simplesmente, o mundo mão pode se: uma teoria de heróis e é fácil de ver que esto clima de angústia financeira não é a melhor moldura para a tranquilidade de espírito, indispensável a quem tem de decidir sobre a

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liberdade, a honra e o património dos cidadãos, numa palavra: a quem tem de proteger e assegurar os mais altos valores de uma comunidade.
Uma referência, ainda, ao funcionalismo judicial, cujo sacrifício humilde não deve nem pode ser ignorado.
Na grande maioria dos tribunais trabalha-se dia, e noite parca corresponder, de forma briosa, às exigências e ao volume ido serviço e parai defrontar e atenuar o seu oouistambe acréscimo.
E chega ia sor chocante que o Estado, sempre tão pressuroso em punir os particulares pela violação do horário de trabalho e em impor-lhes o pagamento das horas extraordinárias, seja, precisamente no sector da justiça, o primeiro a infringir a lei e a esquecer-se de remunerar o serviço prestado fora das horas regulamentares.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Perante este esboço rápido, não parece de mais solicitar a atenção do Governo para a necessidade de enfrentar e corrigir este estado de coisas.
E isto não apenas em defesa de magistrados e funcionários - a cujo aprumo, isenção e honradez em circunstâncias tão precários e difíceis presto sincera homenagem -, mas, sobretudo, em defesa da sociedade, em defesa do destino de todos nós.
For maior que seja o progresso material de um país, se o Estado não dedicar a administração da justiça o mais desvelado interesse e carinho, a tranquilidade e segurança da população correm perigo e nunca será possível atingir um nível do autêntica civilização.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As sombras do panorama que tracei não foram enunciadas com o propósito estreito de demolir, mas somente com a recta intenção de lembrar e focar os realidades e de sublinhar a urgência de uma revisão total e profunda da orgânica judicial.
A organização judiciaria não foge às regras do qualquer outra organização, pelo que, sempre, dependerá menos das paredes de pedra e cal - aliás úteis e indispensáveis - em que funciona, do que do elemento humano que a integra, a faz viver e é o seu alicerce fundamental.
Assim, não precisam de desculpa e absolvição estas considerações com que fatiguei a Câmara, convencido como estou de que não é possível cuidar de uma árvore;, esquecendo os raízes.
Sr. Presidente: O aspecto mais saliente da proposta de lei circunscreve-se à criação de juízos de instrução criminou, com o fim de separar a actividade investigatória dos delitos, dos funções jurisdicionais a que está ligada e submetida.
Com este controle judicial houve o propósito transparente de estabelecer o equilíbrio entre o zelo apaixonado do investigador e a fria imparcialidade do julgador, de forma a garantir e proteger os arguidos contra quaisquer excessos que, porventura, possam ferir a esfera jurídica dos seus direitos individuais.
É uma, medida processual do longo alcance filiada nos melhores intenções da última revisão constitucional e que merece aplausos e Louvores.
Torna-se, porém, incompreensível que não seja alargada a todos as entidades encarregadas da investigação criminal especializada, designadamente h Direcção-Geral de Segurança.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E por várias razões. Em primeiro lugar, semelhante discriminação cria uma desigualdade perante a lei que um estado de direito não pode acolher e não deve consagrar.
Em segundo lugar, é inconcebível que, precisamente, os arguidos dos crimes mais tenebrosos e mais graves - o assassino, o violador, o assaltante e o gatuno - gozem de garantias e vantagens legais que são negadas aos suspeitos de crimes menos graves, como, por exemplo, o simples distribuidor de um panfleto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:.- Finalmente, como sublinha a declaração de voto do digno relator do parecer da Câmara Corporativa, não se compreende que a nova providência judicial abranja a Policia Judiciária, que já é dirigida por juizes, e não se estenda aos órgãos de investigação especializada, em que as funções jurisdicionais não são exercidas por juizes do direito.
A defesa do Estado deve ser enérgica e firme, mas não pode conduzir, a incoerências graves, sob pena de resvalar numa linha jurídica afastada do sentimento da justiça.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Prevê-se, ma proposta, de lei, a possibilidade de instituir tribunais colectivos nos juízos correccionois e de polícia.
Que significa isto? A adopção do regime de oralidade, ou a eliminação pura e simples dos recursos, nos processos de forma menos solene?
A mulher do mercado do Bolhão que profere uma obscenidade passa a ser julgada por três juizes, ou vai ficar privada do recurso de uma sentença injusta?
O preâmbulo da proposta é omisso quanto às razões c objectivos da alteração preconizada.
E esta Assembleia, ao contrário da Câmara Corporativo, não teve a sorte de ser informada sobre os linhas gerais da reforma de processo penal já em fase adiantada de preparação.
Deste modo, parece aventuroso arriscar uma opinião no escuro e sem conhecer a extensão e alcance da anunciada reforma, com a qual os novos tribunais colectivos devem estar articulados.
Por mim, não tenho qualquer preconceito contra os tribunais colectivos.
Mas, sem descair na clássica discussão entre o sistema da oralidade e o sistema da prova escrita, não posso deixar de reconhecer os defeitos que se lhes apontam.
As linhas do diagnostico soo conhecidas dos profissionais do foro e fáceis de enunciar: tendência paira confundir, na apreciação da prova, prudente arbítrio com arbitrariedade; desatenção e desinteresse de alguns juizes, transformando um colectivo de "três pessoas distintas numa só verdadeira"; culto de um impressionismo infalível e soberano no, decisão do material probatório; adaptação dos factos à solução jurídica e, finalmente, uma falta de tempo aflitiva, que conduz a uma celeridade mal entendida, o inimiga de um julgamento sereno e cuidado.
Por tudo isto, também me parece -ma esteira dos ilustres Procuradores Prof. Palma Carlos e conselheiro Trigo de Negreiros - que, em vez da criação de mais tribunais colectivas, seria, preferível estudar seriamente o seu funcionamento, através de novas estruturas processuais, no sentido de corrigir as deficiências de que enfermam.

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Mas não tenhamos ilusões. Nenhuma solução será viável se não se conseguir aumentar os quadros da magistratura, promover um recrutamento seleccionado dos juizes e criar estímulos para a carreira judicial, principalmente no capítulo dos remunerações.
Poderão, é certo, fazer-se economias, agrupando as comarcas de pouco serviço sob o direcção de um mesmo juiz, como pretende a base V da proposta.
Porém, em outras zonas do País há que proceder à criação de noras comarcas, para descongestionar aquelas que estão soterradas debaixo de uma verdadeira avalancha de processos.
Também relativamente à parte final do texto em discussão m Só há inconveniente em que os juizes adjuntos do Ministério Público possam servir em grupos de círculos.
Da minha experiência profissional não resulta, grande esperança nas funções destes representantes do Ministério Público, a que na gíria forense se chama "delegados de luxo".
Gosto, todavia, de expor, mas não de impor, opiniões.
Por isso, compreendo e aceito que possa ser outra, e mais optimista, a óptica para avaliar as funções específicas dos juizes adjuntos, mormente a assistência "assídua e familiar" que prestam aos delegados principiantes, cujos hesitações e deficiente preparação são, por vezes, confrangedoras.

Neste aspecto, como aconselha a Câmara, Corporativa, a descentralização dos ajudantes do procurador da República permitirá responder melhor a estas carências, pelo que não regatearei a minha concordância.

Sr. Presidente: Embora de pequena extensão, a proposta de lei versa aspectos da maior importância.
Engloba um tema que dava para um volume. Dediquei-lhe um simples apontamento.
Tenho, porém, a noção exacta da delicadeza e interesse das soluções aventadas, porque ninguém pode permanecer indiferente ao aperfeiçoamento da administração justiça de um povo.

Os tribunais não resolvem, apenas, equações jurídicas. Julgam, sobretudo, casos humanos.

E é sabido, como ensina um grande espírito, que o direito está ao serviço da vida e a justiça tem de brotar mais das sentenças do que da lei.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Daí que o ajustamento e melhoria das funções dos órgãos judiciários assumam particular relevo ma própria vida da Nação.

Com as reservas que enunciei, dou a minha aprovação na generalidade a proposta de lei em debate, com a perfeita consciência de que não pode existia, na verdadeira acepção da palavra, um país sem civilização e civilização sem justiça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.

Amanhã haverá sessão à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação da discussão na generalidade da proposta de lei sobre a organização judiciária.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horta e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Júlio dos Santos Almeida.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Augusto Domingues Correia.
Delfim Linhares de Andrade.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João António Teixeira Canedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Dias de Araújo Correia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui Pontífice Sousa.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de pereira Pinto Costa Ramos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alexandre José Linhares Furtado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Armando Valfredo Pires.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Jorge Augusto Correia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teodoro de Sousa Pedro.

O REDACTOR - José Pinto.

Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:

Ao abrigo das disposições regimentais requeiro que me sejam fornecidos pelos Ministérios do Ultramar, Economia e Comunicações os seguintes informações, com a possível urgência:

1) Quantidade de bananas, por província, vinda do ultramar em cada um dos últimos cinco anos;
2) Navios utilizados para o transporte;
3) Subsídios ou outras facilidades concedidas pelo Ministério do Ultramar a cada província para

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o transporte e colocação da banana ultramarina na metrópole e, nomeadamente, os subsídios para tomar menos onerosos os fretes;
4) Quais as nacionalidades dos navios fruteiros utilizados e qual o custo do seu fretamento por viagem;
5) Quais as estruturas existentes hoje no porto de Lisboa para protecção e descarga da mercadoria (banana), nomeadamente se foi construído algum armazém., e se o foi quais as suas características, capacidade, local onde se situa, custo da sua construção e apetrechamento o tempo que a construção levou a efectuar;
6) Em que condições, é recebida no porto de Lisboa, quanto à protecção e descarga, n banana vinda da ilha da Madeira.

Mais peço que me sejam fornecidas as conclusões e relatórios acerca dos problemas de comercialização e do circuito comercial da banana da Madeira paralelamente com o que se possa, a este respeito, com a banana ultramarina.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 23 de Fevereiro de 1972. - O Deputado, Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.

IMPRENSA NACIONAL

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