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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CAMARÁ CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 176

ANO DE 1972 5 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL X LEGISLATURA

SESSÃO N.º 176, EM 4 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs. João Pimenta Serras e Silva Pereira.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão as 16 horas e 5 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 174 o 175 ao Diário das Sessões.
Foi lido um oficio da, Presidência, do Conselho a comunicar o assentimento ao Conselho do Ministros a projectada viagem do Sr. Presidente da, República, ao Brasil e a pedir que a Assembleia igualmente se pronunciasse. Para esse efeito, o Sr. Presidente, realçando o significado daquela, viagem, convocou a, Comissão dos Negócios Estrangeiras e a Comissão Eventual para. estudo das medidas tendentes a reforçar a comunidade luso-brasileira.
Deu-se conta do expediente.
Para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, foram presentes à Assembleia, vários decretos-leis.
Foram enviadas aos Srs. Deputados Nogueira. Rodrigues o David Laima fotocópias, respectivamente, de informações requeridas pelo primeiro na sessão de 9 de Dezembro do ano findo e de um esclarecimento do Ministério do Ultramar relativo a intervenção do segundo na sessão de 23 de Março do corrente ano.
Foi dada informação de se encontraram na Mesa, os pareceres da. Camará, Corporativa, relativos às propostas de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros e sobre a revisão da Lei Orgânica, do Ultramar, com o fim de serem publicados no Ditado das Sessões o baixaram, respectivamente, & Comissão de Trabalho, Previdência, e Assistência Social e à Comissão Eventual para o estudo das alterações à referida Lei Orgânica do Ultramar.
Foram lidas duas notas de perguntas, uma do Sr. Deputado Sousa. Pedro (juntamente com a respectiva resposta, do Governo) relativa, aos planos portuários dos Açores e da Madeira e a outra, do Sr. Deputado Magalhães Mota relativa ao problema, da alta de preços e aumento do custo de vida.
O Sr. Presidente fez algumas considerações sobro o Meio das comemorações do 50.º aniversário da viagem aérea ao Rio de Janeiro realizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, anunciando a abertura de inscrição especial sobre o assunto para o período de antes da ordem do dia da sessão de 18 de Abril.

O Sr. Deputado Nunes de Oliveira lembrou a figura e obra do recentemente falecido comendador António Maria Santos da, Cunha, antigo Deputado e presidente da. Câmara Municipal de Braga e que desempenhava, a data da morte, as funções de governador civil do distrito de Braga.
Às considerações feitas por aquele orador associou-se, a título pessoal, o Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Leal do Oliveira pediu providências ao Governo no sentido de evitar a poluição da costa algarvia, ameaça coma a que poderia advir do naufrágio do navio-tanque italiano Ginaseppo Gintette ocorrido a 14 milhas do cabo de S. Vicente.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta, do lei sobra o fomento industrial, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Correia, da, Cunha, Alberto de Alarcão e Pinto Castelo Branco.
O Sr. Presidente, depois do convocar a Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social para iniciar a apreciação da proposta de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros, encerrou a sessão às 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Sr. Deputados:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.

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Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Martins da Cruz.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Baú.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 61 Srs. Deputados, número suficiente para a Assembleia funcionar em período de antes da ordem do dia.
Esta aberta a sessão.

Eram 16 horas o 5 minutou.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 174 e 175 do Diário das Sessões.
Poderei diferir a sua aprovação pana a sessão de amanhã se algum de VV. Ex.ªs o desejar.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum de VV. Exas. deseja usar da palavra para apresentar reclamações a estes Diários das Sessões, considero-os aprovados.
Está na Mesa um ofício de S. Exa. o Presidente do Conselho comunicando que o Conselho de Ministros deu o seu assentimento à viagem ao Brasil do Chefe do Estado, nos termos do artigo 76.º da Constituição, e dando-me conhecimento do facto, para que, de acordo com o mesmo preceito constitucional, a Assembleia Nacional se pronuncie.
O ofício vai ser lido para conhecimento mais perfeito de VV. Exas.

Foi lido. É o seguinte:

Sr. Presidente da Assembleia Nacional:

Excelência:

O Ex.ma Presidente da República Federativa do Brasil, General Garrastazu Medici, por mensagem de 10 de Agosto de 1971, solicitou do povo português a oferta, no ano em que se comemora n 150.º aniversário da independência brasileira., dos restos mortais do seu fundador. D. Pedro IV de Portugal e D. Pedro I do Brasil. Na mesma mensagem pediu ao Chefe do Estiado Português que acompanhasse pessoalmente os despojos na sua viagem para a terra brasileira.
O Presidente da República Portuguesa, interpretando a vontade e o sentimento nacionais, anuiu com espírito fraterno ao apelo do país irmão. E crê o Governo que a visita oficial do Chefe do Estado no Brasil, para além do alcance que sempre terá, realizada neste momento histórico e com o sentido que lhe conferem as circunstâncias particularíssimas que a rodeiam, representará um momento decisivo no reforço das relações luso-brasileiras, selando cento e cinquenta anos de comunidade de espírito na independência política mutuamente, respeitada.
Entendeu, pois, o Conselho de Ministros que deveria dar o seu assentimento à viagem, nos termos do artigo 76.º dia Constituição. Desse facto venho dor conhecimento a V. Ex.ª, para que, de acordo com o mesmo artigo, a Assembleia Nacional se pronunciei.
A ausência do Chefe do Estado deve ter duração aproximada de trinta e cinco duas, a contar do próximo dia 10 de Abril.

A bem da Nação.

Presidência do Conselho, 3 de Abril de 1972. - O Presidente do Conselho, Marcello Caetano.

O Sr. Presidente: - Srs. Disputados: O artigo 76.º da Constituição prescreve, com efeito, que o Presidente da República só pode ausentar-se do Pais com assentimento da Assembleia Nacional e também do Governo.
O Governo já deu o seu assentimento, acabamos nós de saber. É-nos pedido que a Assembleia Nacional se pronuncie.
É com profunda simpatia, com íntimo aplauso, que eu vou submeter a questão a VV. Ex.ªs Desde que foi tornado conhecido o projecto da viagem de S. Ex.ª o Presidente da República ao Brasil, neste ano em que aquela nação irmã. vive tão intensamente as recordações de alguns dos mais importantes factos da sua história, o associando-se a um acto carregado do mais profundo sentido espiritual e patriótico - desde que esse projecto foi conhecido, eu creio que todo o País lhe deu inteira

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e imediata, adesão, e m"ris do que adesão, aplauso no íntimo dos seus pensamentos.
Eu próprio tive já oportunidade, na qualidade de Presidente da Assembleia Nacional, de assistir a netos que postulavam essa viagem, e foi com o maior prazer e o mais completo acordo que os presenciei.
Há, porém, que cumprir o preceito constitucional, e para que a Assembleia o possa cumprir, com pleno aferimento de todos os aspectos da questão, convém que sobre o assunto se debruce a nossa Comissão dos Negócios Estrangeiros. Mas convém mais ainda, parece-me, que também se debruce sobre ele a comissão eventual para o estudo das medidas tendentes a (reforçarem a comunidade luso-brasileira, porque o Sr. Presidente da República n ao fará simplesmente a viagem de um Chefe de Estado, que, personificação a Nação Portuguesa, visita um país amigo: é a personificação da Nação Portuguesa que vai visitar o país irmão, numa vingam carregada do mais alto simbolismo. Não pode senão tal viagem concorrer, particularmente neste ano sesquicentenário, para estreitar os laços da comunidade luso-brasileira.
Parece-me, portanto, que o projecto da viagem, para fins de assentimento da Assembleia Nacional, deve também ser apreciado pela nossa comissão eventual para o estudo dos medidas tendentes a reforçarem a comunidade luso-brasileira.
Convoco, pois, os duas comissões que referi - a Comissão dos Negócios Estrangeiros e a comissão eventual pana o estudo das medidas tendentes a reforçarem a comunidade luso-brasileira - para se reunirem amanha, pelas 11 horas e 30 minutos, a fim de se pronunciarem sobre o pedido do Chefe do Estado de assentimento à sua projectada viagem ao país irmão.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários de apoio à intervenção do Sr. Deputado Costa Oliveira ao debate na generalidade da proposta de lei sobre o fomento industrial.
Dos escriturários da Comam Municipal de Tavira apoiando a intervenção do Sr. Deputado Lopes Frazão em defesa do funcionalismo público, designadamente da referida classe.
O Sr. Presidente: - Tara cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, estilo na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, os n.º 72, 74, 75, 76 e 78 do Diário do Governo, l.º série, de 25, 28, 29 e 80 de Março findo e 3 do corrente mós de Abril, que inserem os seguintes decretos-leis:

N.º 99/72, que fixa os novos quadros do pessoal do Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil.
N.º 102/72, que insere disposições relativas ao vencimento dos professores de Organização Política da Nação e Economia Corporativa dos institutos industriais e comerciais.
N.º 103/72, que autoriza a Câmara Municipal de Lisboa a participar com determinada importância no capital social da empresa que se constituirá para instalar o explorar a estacão de tratamento de lixos da mesma cidade.
N.º 105/72, que regula a prática das artes marciais e cria uma comissão directiva no Departamento da Defesa Nacional para superintender em tais actividades.
N.º 106/72, que autoriza a empresa Metropolitano de Lisboa, S. A. B. L., a emitir, em 1972, 50 000 obrigações, nominativas ou ao portador, do valor nominal de 1 000$ cada uma, em títulos de l, 5, 10, 50 e 100 obrigações, e autoriza igualmente a Câmara Municipal de Lisboa a conceder o aval às obrigações emitidas.
N.º 108/72, que Autoriza a Administração-Geral do Porto de Lisboa a contrair na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência um empréstimo amortizável para ocorrer ao financiamento de empreendimentos previstos no III Plano de Fomento.
N.º 109/72, que abre um crédito no Ministério das Finanças, a favor do Ministério dos Negócios Estrangeiros, para a respectiva importância constituir o n.º 1) do artigo 65.º-A do capítulo 5.º do orçamento respeitante ao corrente ano económico do segundo dos mencionados Ministérios.

Está na Mesa um ofício da Presidência do Conselho, no qual se transmito uma informação do Ministério do Ultramar relativa ao (requerimento Apresentado pelo Sr. Deputado Nogueira Rodrigues na sessão de 9 de Dezembro último e um esclarecimento do mesmo Ministério do Ultramar relativo a intervenção do Sr. Deputado David Laima na sessão de 28 do mês findo sobre a demora, no embarque para Angola de funcionários que haviam terminado as suas licenças.
Vão ser entregues fotocópias àqueles Srs. Deputados.
Estão ainda na Mesa os pareceres da Câmara Corporativa acerca dos propostas de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros e sobre a revisão da Lei Orgânica, do Ultramar. Vão ser publicados no Diário das Sessões e baixarão à Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social e à comissão eventual para o estudo das alterações h Lei Orgânica do Ultramar, respectivamente.
Vão ser lidas as notas de perguntas formuladas pelos Srs. Deputados Sousa Pedro e Magalhães Mota e as respostas do Governo até agora recebidos.

Foram lidas. São as seguintes:

Nota de perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Sousa Pedro.

Os portas, anos Açores, suo infra-estruturas vitais do desenvolvimento do arquipélago.
Em Abril de 1969, o Governo nomeou uma comissão para estudar e rever os planos portuários daquele arquipélago e da Madeira.
Em 1970, a referida, comissão deu por findos os seus trabalhos, formulando uma proposta que submeteu à consideração do Governo.
Nessas circunstâncias, atendendo ou geral interesse e expectativa da população ido distrito de Ponta Delgada, em seu nome pergunto ao Governo, ao abrigo dos disposições próprias da Constituição e do Regimento da Assembleia Nacional:
1.º Espera-se, para breve, que e Governo venha a tomar uma decisão relativamente à proposta que lhe foi submetida?
2.º Terão inicio, no corrente ano, as obras previstas na mencionada proposta, se for aprovada, nomeadamente quanto ao porto de Santa Maria e porto pesqueiro de S. Miguel?

Sala das Sessões da Assembleia. Nacional, 16 de Marco de 1972. - O Deputado, Tcoáoro do Sousa Pedro.

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Resposta à nota de perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Teodoro de Sousa Pedro na sessão de 18 do corrente, enviada pelo Ministério das Comunicações.

A comissão incumbida do estudo e revisão do plano o portuário dos Açores apresentou o seu trabalho em Agosto de 1971 e neste mesmo mês ele foi enviando ao Conselho Superior da Obreis Públicas para parecer.
O Conselho terminou a respectiva apreciação em sessão do passado dia 24 de Fevereiro e o Ministro espera exarar o seu despacho dentro de alguns dias.
Desta forma, não será possível iniciar no corrente ano senão os projectos de algumas obras prioritárias Ministério dos Comunicações, 21 de Março de 1972. - O Ministro das Comunicações, Rui Alves da Silva Sandias.

Nota de perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.

Tendo o problema da alta de preços e aumento de custo de vida sido debatido em Conselho de Ministros, conforme comunicado oportunamente difundido, nos termos constitucionais e regimentais, designadamente os da alínea c) do artigo (11.º do Regimento desta Assembleia, pergunto ao Governo:

a) Quais os medidas concretas adoptadas?
b) Quais os resultados que até ao momento foi possível obter?

Sala das Sessões da Assembleia. Nacional, 17 de Março de l972. - O Deputado. Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Desejo aproveitar esta oportunidade para lembrar a VV. Ex.ªs que começaram a correr as manifestações comemorativas do quinquagésimo aniversário da gloriosa viagem aérea do almirante Gago Coutinho e do comandante Sacadura Cabral ao Rio de Janeiro. O primeiro acto foi uma soleníssima sessão na Sociedade de Geografia, em que logo os que a ela assistiram, e os que dela tiveram conhecimento, através da imprensa, puderam medir -se não os viveram no tempo - a enorme importância e o alto significado nacional e científico dessa viagem.
Parece-me apropriado que na Assembleia Nacional ela seja também recordada e celebrada.
Não esquecerei que no regresso ao Brasil os heróicos aviadores foram alvo, no Congresso da República, com reunião plenária da Câmara dos Deputados e do Sentado, de uma sessão de homenagem extraordinariamente vibrante e significativa.
Passados cinquenta anos, não será o caso de se repetir exactamente a mesma celebração, mas proponho-me abrir inscrição para o período de sabes da ordem do dia, da sessão de 18 de Abril, data cinquentenária da largada dos aviadores da cidade da Praia e da chegada ao penedo de S. Pedro, para que entre nós possam ser recordados e enaltecidos todos os aspectos dessa notável façanha.
Nessa sessão, se, como espero, se inscreverem oradores pana tratarem da matéria, nenhuma outra será versada DO período de antes da ordem do dia.

O Sr. Nunes de Oliveira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Morreu António Maria Santos da Cunha!
A notícia correu célere por todo o Pois na aranha de domingo de Ramos, deixando os pessoas verdadeiramente perplexas, dado que nada fazia supor desenlace tão doloroso como inesperado.
O distrito, onde representava o Governo com rara devoção e dedicação, sentiu-se fortemente abalado, pois havia perdido um dos seus filhos mais valorosos e o País um firme e leal servidor. Todos se interrogavam e choravam o desaparecimento de um homem em que a bondade, lhaneza de troto e magnanimidade, com justiça deve ser considerada difícil de ultrapassar. Para ele tanto contavam os mais favorecidos como os mais desprotegidos pela fortuna, ocupando estes lugar muito especial no seu coração sempre aberto aos sentimentos altruístas.
Tive a honra da sua inestimável amizade e distinguido com confidências que agora me permitem afirmar categoricamente que nunca pretendeu prejudicar quem quer que fosse, antes pelo contrário, muita vez se preocupou com as naturais contrariedades ou vicissitudes da vida dos que pêra com ele haviam sido injustos.
Desde muito jovem, desde os bancos da escola comercial que frequentou, até à sua monte, foi um estrénuo defensor daqueles altos ideais que sempre soube sentir e compreender e que tanto hoje como ontem importa preservar e defender - o culto de Deus, o amor da Pátria, a veneração pela Família.
Quis Deus dotá-lo de uma fina inteligência e de uma sólida formação moral, bens que, tange de desperdiçar, soube pôr a serviço do bem comum.
Serviu a Igreja e a Pátria com entusiasmo sem arrefecimento.
Como católico praticante que foi, sempre o encontrámos na primeira linha, qual homem nobre e esforçado, a pugnar pelo prestígio da Igreja. Melhor que todas as palavras que neste aspecto pudesse pronunciar ecoam tunda aos meus ouvidos aquelas outras que, repassadas de viva emoção e perante o silêncio de milhares de pessoas, S. Ex.ª Rev.ma o Arcebispo Primaz de Braga pronunciou- ma Igreja da Santa Cosa da Misericórdia, instituição essa que ficou a dever a António Maria Santos da Cunha o mais extraordinário surto de desenvolvimento.
Na qualidade de homem publico pode dizer-se que atingiu o seu apogeu como presidente da Camará Municipal de Braga, ao realizar uma obra que, embora contestada por alguns, transformou iniludivelmente a estrutura da cidade - a smenina dos seus olhos" - ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ..., rasgando-lhe novos horizontes e abrindo-lhe verdadeiramente o caminho para a construção de uma cidade nova.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Compelido por força de lei a deixar esse cargo ao fim de doze anos de exercício, altura em que os Bracarenses lhe prestaram grandiosa e significativa homenagem, pouco tempo decorreu, após ter servido na Comissão Distrital da União Nacional, para que fosse eleito Deputado à Assembleia Nacional na VIII Legislatura, voltando a ser reeleito na IX Legislatura, cujo mandato não concluiu pelo facto de o seu prestigioso nome ter sido indicado para o elevado cargo de governador civil de Braga.
Na vida parlamentar encontrou, sem dúvida, um dos melhores aliciantes para a sua maneira de ver e de sentir os problemas nacionais ...

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - ... do distrito que representava, com intervenções cheias de oportunidade e sentido das realidades, que bem se irmanavam cora os mais sagrados interesses do País.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Chamado, entretanto, ao desempenho das funções de governador civil, desde logo o seu reconhecido dinamismo sacode todo o distrito, levando a cada concelho, dos treze que o compõem, uma era vivificadora e de esperança. Os presidentes das câmaras municipais são arrebatados pelo seu entusiasmo trasbordante, impregnado de abnegação e denotando um espírito de sacrifício sem limites ... E que este homem, pelo seu peculiar temperamento, nunca se deixou dominar simplesmente pelo trabalho de gabinete ou por uma vida mais ou menos cómoda, nem tão-pouco se detinha na contemplação do trabalho realizado, mas antes imprimia à sua missão um movimento constante, na ânsia de uma promoção adequada a grandeza e importância do distrito, confundindo-se com o povo nas suas mais lídimas aspirações, que sabia compreender como ninguém.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Foi António Maria Santos da Cunha um homem de acção que me habituei a apreciar e a ouvir com a mais profunda amizade e viva admiração.
O seu funeral constituiu uma das mais espantosas manifestações de pesar a que Braga assistiu, em demonstração inequívoca do respeito e do prestígio de que desfrutava.
A presença nesse acto do Sr. Presidente do Conselho - Professor Doutor Marcelo Caetano -, que se fazia acompanhar de alguns ilustres membros do Governo, consagrou o zelo, a lealdade e a dedicação com que António Maria Santos da Cunha se deu durante toda uma vida, sem qualquer descanso, u. causa da paz e do progresso da sua terra natal e do País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Toda a população do distrito de Braga sentiu tão alta deferência, e no cumprimento do mandato de que estou investido aqui deixo uma palavra de reconhecido agradecimento a S. Ex.ª o Chefe do Governo, por ter querido distinguir daquele modo um homem que viveu, lutou e morreu ao serviço de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Deixou os seus amigos - e tantos tinha! - mais pobres e sua bondosa esposa, que sempre soube compreender o carinho que ele pás ao serviço da grei, mergulhada na mais intensa dor. Mas o seu exemplo permanece e há que continuar a sua obra pela ideia de justiça que ela envolve e por ser, além do mais, uma forma de lhe prestar a nossa mais sincera homenagem.
Morreu como sempre desejou: na graça de Deus e a lutar pelo engrandecimento da sua terra e pela grandeza de Portugal.
Morreu em glória, porque morreu como permanentemente viveu - a lutar, sem um desfalecimento, pelos ideais que estavam na base da sua personalidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Com vénia de VV. Exas., a título puramente pessoal, quereria associar--me as expressões de apreço e de saudade dedicadas, agora mesmo, ao notabilíssimo e devotadíssimo português e bracarense que foi o comendador Santos da Cunha.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Leal de Oliveira: - Sr. Presidente: Noticiaram os jornais do passado dia 2 do corrente mês a ocorrência do naufrágio do navio-tanque italiano Giuseppc Giulctit a cerca de 14 milhas a sudoeste do cabo de S. Vicente, que transportava um carregamento de 18 000 t de fuelóleo.
Graças a Deus não houve perda de vidas a lamentar e em relação a perda do navio a entidade armadora não ficará exageradamente prejudicada, já que parece existir o seguro do navio desaparecido.
Mas um grave problema pode vir a surgir para a costa portuguesa, nomeadamente para a costa algarvia que se prevê não afectável pela futura refinaria de Sines e que se quer despoluída, pois é a base da única indústria rentável que ali surgiu e base, também, da pesca e da indústria de conservas, que mesmo em crise dá o pão a milhares de algarvios.
Peço, pelas razões aduzidas e deste lugar, amplas providências ao Governo da Nação, que, estou certo, não descurará o problema, destinadas a impedir que a possível "maré negra" invada a costa portuguesa, invada a costa algarvia.
Sr. Presidente: A poluição do Algarve pelos derivados do petróleo é hoje o tema desta minha fala, pelo que me permito ainda chamar a atenção do Governo para o perigo que trará para a costa algarvia a prospecção do chamado "ouro negro" na plataforma que se estende para o sul daquela província.
Alertado igualmente por notícias vindas a luz e na imprensa diária em 18 de Janeiro do corrente ano, solicitei aqui, por requerimento, informações sobre, o perigo por poluição do ambiente que poderia advir das projectadas prospecções petrolíferas.
A Secretaria de Estado da Indústria forneceu-me a seguinte resposta, que agradeço e passo a ler:

Toda a plataforma continental metropolitana até à batimétrica de 200 m, desde Caminha a Vila Real de Santo António, foi aberta para negociações, que deverão culminar cora a outorga de concessões para petróleo.
Só depois da outorga destas concessões haverá possibilidade de se saber onde, efectivamente, se realizarão trabalhos.
A poluição é um risco inerente a esta actividade, que poderá existir no nosso país tanto como em qualquer outro em que se realizam trabalhos desta natureza.
De um modo geral, dado o carácter espectacular destas poluições, quando se verifica alguma logo todos os meios de informação lhe dão ampla publicidade, impressionando o mundo. Assim é que tiveram larga repercussão as que se verificaram nas costas da Luisiana e, especialmente, no canal de Santa Bárbara, onde se verificaram prejuízos consideráveis.
Equipamentos cada vez mais aperfeiçoados, medidas preventivas e fiscalização apertada diminuem as possibilidades de ocorrência, mas não conseguem eliminá-las totalmente.
Apreciando, porém, a extraordinária expansão que nos últimos anos tem sido a pesquisa de petróleo em

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áreas marinhas, forçoso é reconhecer que a probabilidade de ocorrências de alta gravidade é, afinal, relativamente pequena.

Não conseguiram sossegar-me totalmente as informações que me foram fornecidas e agora apresentadas, e assim, tendo em atenção os muito elevados investimentos turísticos levados u efeito no Algarve - cerca de l 300 000 contos, dos quais 435 000 foram financiados pelo Fundo do Turismo ou com o seu aval, citando somente os que tiveram apoio estatal -, solicito ao Governo a máxima atenção para o risco de poluição, agora pelas possíveis prospecções petrolíferas, que deverá ser evitada, e, quando ocorrida, possa ser rapidamente detectada e atacada por todos os meios que a técnica de hoje permite.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar a

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei de fomento industrial. Tem a palavra o Sr. Deputado Correia da Cunha.

O Sr. Corroía da Cunha: - Sr. Presidente: Ao procurar, com a melhor das intenções, alinhar duas ideias sobre a proposta de lei que contempla o fomento industrial, não me pude furtar a um sentimento de quase frustração perante o esforço que é pedido a um. Deputado, qualquer que seja, quando pretende pronunciar-se em consciência sobre documentos desta importância. Trata-se, na realidade, de assumir a tremenda responsabilidade de avalizar, estudando um por um e em sequência que nem sempre é a melhor, os textos legais que vão servir de base à estruturação de uma nova, economia e, (por que não, à definição de um país novo.
Atento à evolução sectorial ou ao pormenor que em cada momento o solicita, o Deputado perde facilmente a linha de rumo que deve estar subjacente a todo este processo legiferador; na dificuldade em atar as pontas dos fios para (poder compreender, com alguma antecipação, sonde leva a meada, reside neste momento a minha maior preocupação. Não se estranhará, por isso, que renuncie ao propósito de ser exaustivo na apreciação que vou fazer, limitando-me a glosar alguns pontos que porventura tenham sido menos focados em anteriores discursos.
Meus senhores: A intenção do Governo ao elaborar esta proposta de lei é dará e meritória. Dá continuidade a doutrina expressa no III Plano de Fomento e, pelo menos, nas últimas leis de meios. Depois de um longo período em que vigorou uma política industrial paternalista, condicionante das iniciativas, mas apadrinhadora de múltiplas inépcias empresariais, o Governo aparece a afirmar o principio da liberdade da iniciativa privada, reservando no Estado apenas uma função supletiva de orientação. Não poderia ser mais drástica a mudança de atitude face aos problemas levantados pelo regime vigente. Esse facto bastaria, por si só, para concitar a minha simpatia, tanta vez tenho apregoado a necessidade de se ser corajoso e oportuno nas medidas reformadoras que ponham em causa situações reconhecidamente inconvenientes.
Neste ponto creio que estaremos todos de acordo. Do esforço programado através dos planos de fomento nos últimos vinte anos não se colheram, neste como noutros sectores, os resultados a que legitimamente se poderia aspirar. Durante este período a indústria portuguesa desenvolveu-se, é inegável; mas fê-lo de uma forma declaradamente parasitária, jogando com, salários baixos, matérias-primas baratas e um mercado interno disposto (ou obrigado) a colaborar, em face das medidas proteccionistas adoptadas.
Estou certo que nunca se concebeu um desenvolvimento equilibrado, em termos de. conciliar os interesses de uma agricultura desfavorecida com os da indústria nascente. Esta última beneficiou sempre de um tratamento privilegiado, sem ter sabido retirar dele todos os benefícios possíveis. Na verdade, não obstante o sacrifício durante muito tempo suportado pelas actividades primárias, a indústria não conseguiu ganhar a capacidade e organização suficientes para transpor, com êxito, os obstáculos levantados pela concorrência internacional e o seu próprio crescimento.
O País sabe agora que se errou e espera, como nós, que se não insista no erro. Tem que se passar da fase do amadorismo e da protecção mais ou menos velada, conseguida através de conselhos de administração escolhidos a dedo, para a da plena responsabilização. Este raciocínio deve ser válido não só para a actividade industrial stricto scnau, mas para qualquer outra cujo nível de investimentos justifique maioridade nos processos usados. Neste momento estou a pensar no turismo, por exemplo. Tratando-se de uma das poucas actividades em que podemos competir com êxito, interessa cuidar bem da gestão dos empreendimentos, não permitindo que a intromissão de amadores venha a criar problemas que se reflectem não só no sector como em toda a economia nacional. Esta referência permite-me fazer eco da preocupação de eficácia que deve estar subjacente a todo este processo. Ela envolve tanto os patrões como os operários, a orgânica privada como a administração pública.
Bem definidos os objectivos, estruturados os planos, atribuídas responsabilidades, criados os meios de trabalho, espera-se apenas que os homens cumpram, qualquer que seja a missão que a cada um compete. E o interesse nacional que está em causa e a ele se devem subordinar todos os outros.
Evidenciados a necessidade, oportunidade e espírito da proposta de lei, julgo de interesse salientar quanto a sua aprovação pode vir a contribuir para abalar a anquilose de certas estruturas sociais. O fomento das indústrias não dispensa uma forte mutação no estatuto profissional e na própria distribuição du mão-de-obra disponível. A transformação de uma economia de índole rural numa outra alicerçada no desenvolvimento industrial implica necessariamente a criação de uma nova mentalidade por parte da massa trabalhadora, bem como a adaptação a um ambiente de vida e de trabalho totalmente diferentes. E a urbanização acelerada, a despersonalizarão de cada um, a preponderância de um ritmo e vontade novas. As relações entre o capital e o trabalho processam-se em campo mais adequado ao confronto. A consciência dos direitos e dos deveres da colectividade assume nova expressão, à medida que se esbate o individualismo característico do homem do campo. Quero significar com isto não julgar possível levar por diante uma política industrial sem ajustar as estruturas sociais de forma a transformar rurais desenraizados em operários conscientes. Não vejo a proposta muito preocupada com este aspecto, mas é importante que se pense nele.
Como se diz algures no parecer da Câmara Corporativa: "Vão-se apagando os ecos do agrarianismo saudosista ..." A emigração, a guerra e a própria evolução da economia

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acabaram definitivamente com um estilo de vida sedentário e acomodatício que está muito na raiz do nosso atraso. Resta-nos alinhar pelos padrões europeus, adaptando os homens as exigências da sociedade de consumo, com todos os seus vícios e virtudes.
A nossa esperança é que saibamos aprender, na experiência dos. outros, ia melhor forma de o fazer. Passaram os tempos bucólicos em que o agricultor orientava A produção do acordo com as suas necessidades ou se regulava pelos directrizes do Governo coadas através dos organismos de coordenação económica. As aspirações suo outras e os horizontes mais largos. Mas se a qualidade do rural se alterou, o mesmo aconteceu, em termos quantitativos, com o marcado do trabalho. Já não existem em deposito reservas humanos aguardando solicitações e a escolha inerente. Isso constitui para a indústria nova fonte de complicações, a juntar-se a tantas outras: agressividade concorrencial, acesso unais difícil as matérias-primas e maior responsabilização. Se a "burocrocite" que a Administração montou cuidadosamente ao longo dos anos não for drasticamente removida, tenho por certo que hão-de continuar a diminuir os investimentos nacionais no sector, ao mesmo tempo que aumenta o peso do domínio económico estrangeiro. Também neste ponto espero que se saibam dosear os prós e os contras em termos de atingir o nível menos mau.
O parecer do Câmara Corporativa sobre a proposta de lei relativa ao emprego de trabalhadores estrangeiros ó esclarecedor sobre aã perspectivas que se nos abrem no campo do neocolonialismo económico.
Nunca como neste momento, em face dos perspectivas enunciadas, importou tanto definir uma política de desenvolvimento que atenda simultaneamente ao crescimento económico e à promoção social.
Se até agora os planos de fomento, elaborados por técnicos portugueses, não conseguiram resultados brilhantes era qualquer dos sectores, é de esperar que essa preocupação continue relegada para plano secundário em face dos interesses internacionais em jogo. A liberalização anunciada pode favorecer este estado de espírito, aumentando os distorções e comprometendo definitivamente princípios e equilíbrios de que se não pode abdicar. E a estes que pretendo fazer uma referência mais significativa.
Sabe-se que o III Plano de Fomento, marcou a intenção de o Governo enveredar por uma política de desenvolvimento regional.
Posteriormente, ficam criados esses órgãos, as comissões de planeamento, e elaboração relatórios definidores das grandes linhas do chamado ordenamento do território. Dada a importância de que se revestem estes documentos orientadores, pretendi chamar para eles a atenção desta Câmara ao efectivar o aviso prévio sobre ordenamento. Creio mesmo que todo este processo renovador devia ter sido alicerçado numa discussão cuidada dos mesmos. A dificuldade em conseguir que a sua consulta fosse generalizada e em suprir as minhas próprias insuficiências, levam-me a admitir não ter conseguido colher grande resultado da iniciativa. Mas O Governo é que certamente não desconhece as sucessivas medidas que vem adoptando a este respeito e a orientação que se vem dando, no decurso da preparação do IV Plano de Fomento, ao trabalho a desenvolver pelas comissões de planeamento regional. Por isso mesmo une sinto um pouco confundido quando, em relação a coda um dos documentos sectoriais enviados a Assembleia, pressinto um esquecimento deliberado ou uma ignorância quase total dos princípios que têm norteado a política do Governo. É verdade que na base i da proposta se diz que o política industrial deve estar "de acordo com as finalidades da política de desenvolvimento económico e social, nomeadamente as definidas nos planos de fomento"; é também verdade que na base XIV se propõe que a localização dos porquês industriais satisfaça as "directivas da política de desenvolvimento regional do Governo".
Estas indicações afiguram-se-me, no entanto, insuficientes quando, a partir delas, se pretende imaginar uma base espacial devidamente ordenada em relação às novas implantações. Será que os unidades industriais serão todos instaladas em parques? E o que se entende por parque industrial?
É hoje possível considerar, para além dos chamadas zonas industriais, que são áreas reservadas poro eventuais implantações, pelo menos três conceitos admissíveis paro o articulado da proposta: os de loteamento, parque e complexo industriais. Por loteamento industrio! entende-se uma área devidamente localizada e apetrechada para admitir a implantação do estabelecimentos industriais. Um parque, por seu turno, é muito mais do que isso: uma aglomeração planeada de indústrias, com administração própria e servida por estruturas de apoio tecnológico, financeiro e social. Por isso a sua criação assume uma função primordial como instrumento de política industrial no âmbito das grandes linhas de ordenamento do território. Não se vê que, sem graves riscos, a sua criação possa ficar dependente da iniciativa de entidades privadas ou dos autarquias locais, finalmente, o complexo industrial não é mais do que um porque caracterizado por uma forte interdependência técnica e económica entoe todas as unidades que o constituem.
Em regra o seu núcleo é constituído por uma indústria pesada: extractivo, química, metalúrgica, etc.
A complexidade que caracteriza estos implantações e o volume de investimento inerente não admitem o ligeireza com que são referidas no texto do proposta; o mesmo se pode dizer da natureza dos compromissos Assumidos pelo Governo em matéria de desenvolvimento regional. Considero, por isso, muito importante consignar nela, em termos claros, como compatibilizar a liberalização desejável com a disciplina indispensável a um autêntico fomento industrial. O País não lucrará certamente com o sucessivo fracasso de iniciativas sem pés nem cabeço; nem será desejável que em matéria de localização o aviso dos órgãos do planeamento seja considerado dispensável.
Reforçando o que ficou dito e considerando que os verdadeiros instrumentos de política são os parques, e são os loteamentos industriais, importa que se defina de fornia explícita o significado, estrutura e objectivos dos parques industriais; se refira o princípio da intervenção activa do Estado (relativamente a sua instalação e, finalmente, se assegure o seu enquadramento nas directrizes do planeamento regional e do ordenamento do território.
Para concluir pretendo ainda aludir a um ponto que considero da maior importância: o da defesa do ambiento.
Tenho visto escrito e ouvido dizer em vários tons, nos últimos tempos, que se terá de optar entre desenvolvimento industrial e um ambiente sadio. Isto pretende significar que não poderá haver progresso económico sem sacrificar os condições de vida de, pelo menos, uma parte da população. O espectro da poluição aparece, assim,

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como obrigatoriamente aceitável, dado que ninguém boje, em seu juízo, pensa renunciar ao progresso. Este raciocínio parte de uma base tendenciosamente errada. Em primeiro lugar não á possível conceber progresso económico sã não incluir nos seus esquemas uma constante melhoria das condições de vida das populações em causa. Referi-lo apenas a um acréscimo de produto nacional não é hoje considerado suficiente: importa saber em que termos esse produto se distribui e que utilização lhe dá a comunidade.

Há um certo número de bens e valores que nenhum povo desejará trocar por uma prosperidade que se traduza apenas em acumulação de riqueza. Se a independência económica é cada vez mais afectada pela força do capital internacional sem que se lhe possa opor uma resistência eficaz, o mesmo não acontece com a salvaguarda do ambiente. Ela é objecto, hoje, de uma verdadeira cruzada a nível mundial, cruzada que interessa tanto os países desenvolvidos como os mais atrasados.
Começam a ser definidas, um pouco por todo o lado, autênticas reservas naturais para constituírem pulmões essenciais a uma humanidade que se degrada constantemente. A ânsia pelo lucro imediato leva muitas vezes a postergar o que deve representar a essência do progresso, ou seja a capacidade para servir o homem. Pois bem, numa altura em que se endeusa o crescimento económico, eu afirmo convictamente que ele só deve merecer a nossa atenção se não puser em causa os fundamentos doe sociedades que se pretende promover. As condições de atraso em que se vive em muitas áreas deste país são naturalmente indesejáveis e só com um desenvolvimento equilibrado podem ser superadas. Nesse processo de industrialização representa, evidentemente, uma ferramenta fundamental, se for utilizada de forma inteligente. Países com muito mais experiência neste domínio começaram a inflectir a sua política a custa de pesados sacrifícios; muitas vezes fazem mesmo questão em instalar fora do seu território as unidades industriais mais difíceis de dominar em termos de poluição do ambiente. Cuidado, portanto, com a avaliação dos beneficies resultantes de iniciativas desse género, porque a sua aceitação incondicional pode contribuir para hipotecar irremediavelmente o nosso futuro.
Pois bem, afigura-se-me que a proposta de lei em discussão, ainda que refira esta preocupação nas bases IV e XIV, não lhe dá a ênfase que o assunto merece. O ar e a água são bens tão esfaimáveis para a vida normal de uma oração como a herança cultural e a independência. Constituem um património valioso que interessa todos os cidadãos e que não pode ser sacrificado a interesses particulares, por mais privilegiados que sejam.
Industrializar, de certo, mus com o talento necessário para não prejudicar irremediavelmente o ambiente em que vivemos. Qualquer indústria que hoje se pretende instalar no Pois não deve nem pode continuar a contar com salários insuficientes, mercados protegidos e o uso discricionário do ambiente. Só terá interesse verdadeiramente nacional se puder trabalhar em condições normais de concorrência e contribuir, simultaneamente, para a desejável evolução da sociedade portuguesa. Espera-se que seja esse, na realidade, o objectivo essencial desta proposta de lei.
Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: A esta Assembleia já trouxemos, no decurso da apreciação da proposta de lei de defesa da concorrência [Diário das Sessões, n.º 157, de 4 de Fevereiro de 1972, p. 315l-(4)], algumas notas acerca da modificação dos consumos e hábitos de comercialização de bens alimentares, ao passar-se dos sociedades rurais tradicionais paru- os sociedades urbanas dos nossos dias.
Iremos hoje analisar, não as alterações introduzidas no "cabaz de compras" das famílias ao elevar-se o seu nível sócio-económico e cultural e ao modificar-se o género de vida é hábitos de comercialização, mas a evolução que esperar se possa nas estruturas e actividades agro-industriais que melhor respondam ao desafio dos tempos modernos e às novas exigências da transformação.
Sr. Presidente: Nesta civilização industrial e urbana um novo género de vida vai ganhando afirmação.
Reteremos apenas, por ser fundamental para a compreensão do fenómeno, que o exercício da actividade da mulher fora do lar e o menor tempo para se consagrar às lides domésticas e carência de "empregadas", bem como o afastamento dos centros de consumo face aos da produção agrária, haverão de determinar ajustamentos na apresentação e forma final dos produtos destinadas a virem à mesa dos consumidores.
A procura passa a incidir cada vez menos sobre alimentos tal como a Natureza os facultou no tempo, de acordo com o ritmo dais estações e os períodos de colheita, para dar lugar à procura de géneros desgarrados do "tempo" (como os conservados por refrigeração, liofilização, adição de conservantes, etc.) ou transformados ma "forma" (como os semipreparados, preparados ou pré-cozinhados, etc.).
Recordemos as sopas em pacotes, os. purés de batata, as carnes enlatadas, os pratos pré-cozinhados, os legumes congelados, os sumos de fruta, os doces, os compotas, face à tradicional aquisição de hortaliças, tubérculos, carnes, frutas- e demais géneros alimentícios- para a confecção caseira dos pratos do dia a dia.
Efectivamente, aquilo que há uns anos poderia chamar-se produto "acabado" é hoje considerado pouco mais que "matéria-prima" da indústria alimentar à espera de um tratamento e acabamento final do produto que lhe aumente o poder de conservação ou lhe altere o volume, o peso, a forma de Apresentação
Não admira assim que nos Estados Unidos da América a indústria alimentar haja atingido a primeira posição de todo o sector industrial e empregue uma mão-de-obra, incluindo os circuitos comerciais correspondentes, de aproximadamente 24 milhões de activos.
As donas de casa americanas podem destinar, pois, e apenas, uma média de trinta minutos por dia para a confecção dos alimentos da família.
Também em França de admite que nos próximos quinze anos o consumo dos produtos alimentares transformados venha a atingir cerca de 70 por cento da produção agrária.
Em consequência do extraordinário ritmo de desenvolvimento deste sector da actividade transformadora, e tendo em atenção as implicações no incremento e possível valorização da agricultura, importa anteciparmo-nos e agirmos com urgência no sentido de uma industrialização agrária.
Velhos e novos condicionalismos sócio-económicos e tecnológicos impõem que se procure definir uma política e uma acção que, substituindo cómodos adiamentos ou soluções meramente parciais, dê origem a uma política global actuante e criteriosa no domínio das indústrias alimentares.

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Actividades agro-industriais, contribuindo cumulativamente para a produção de bens alimentares, devem concertar-se em termos de melhor servirem o interesse da comunidade nacional.
Não iremos apreciar - importará menos a discussão, mas mais a acção - onde reside a força motriz dos modernos "economias alimentares": se na agricultura atricto scnsu, que lhe dá o ser, se na indústria, que mais e mais a transforma, se no comércio, que prospecta os mercados e demanda- os produtos de acordo com as novos solicitações da procura.
O que importa, sobretudo, é que se proceda a urgente coordenação destes sectores da actividade alimentar, no sentido de encontrar soluções compatíveis com o progresso simultâneo do conjunto, quer no aspecto técnico, quer no económico e social.
É óbvio que situações de 'privilégio, porventura adquiridas- e mantidas por certos sectores da actividade económica nacional em detrimento dos demais, haveriam de introduzir sempre elementos de injustiça e até de fragilidade no conjunto da economia e sociedade portuguesas - que o digam o milhão de rurais que se pôs em marcha entre os recenseamentos de 1960 e de 1970 dos meios agrários metropolitanos.
Facto é que à medida que evoluem as técnicas de transformação dos produtos alimentares e aumentam as exigências do consumo, os exclusivamente produtores de bens primários (os "agricultores" tradicionais) auferem uma parte progressivamente menor de preço pago no consumidor pelos (produtos vegetais ou animais transformados, acondicionados, distribuídos.
Assim: o concentrado de tomate vendido em mercados exigentes atinge preço" no consumidor em relação aos quais a matéria-prima (tomate fresco) não representa mais que 16 por cento do valor; em contrapartida, o custo da embalagem ascende frequentemente a Sá por cento.
Na azeitona de conserva, recheada, quando em embalagens de vidro bem apresentadas e de marcas consagradas, o custo da matéria-prima situa-se geralmente entre 5 e 10 por cento do preço do produto embalado.
A incidência da matéria-prima, como o malte, o lúpulo, a fruta ou os produtos hortícolas, o amendoim ou o cacau, nos preços finais da cerveja, sumos de fruta, sopas confeccionadas, óleos alimentares ou chocolates, tal incidência vem extraordinariamente atenuada ou diluída pelas parcelas de custo real ou atribuído da transformação, acondicionamento, embalagem, transporte, distribuição, publicidade, crédito e venda.
É certo que a disparidade dos diferentes estádios de progresso entre a produção e a transformação ou distribuição de bens alimentares e o alongamento do seu círculo produtivo justifica muito do desfasamento entre um e outros valores, mas não explica totalmente a ampla parcela que se esvai da parte do produtor ao valor final do bem alimentício, agravando desequilíbrios sectoriais e regionais de repartição de rendimentos que deveriam ser algo contrariados ou corrigidos em sua distorção.
Perante a lavoura tradicional põe-se, portanto, o seguinte dilema: ou entra como "parceiro" efectivo na actividade de transformação de produtos agrícolas através de uma "integração vertical" ou mediante esquemas de colaboração com a indústria, ou apenas lhe resta a alternativa de permanecer como fornecedora de matérias-primas, não participando no "valor acrescentado" trazido pela transformação e acabamento final dos produtos.
Nesta última circunstância haverá de permanecer como o "parceiro pobre" do circuito económico e todas essas demissões se pagam em termos da deserção de mão-de-obra e de empresários agrícolas, em termos de valorização das suas produções e nível de vida - mas também o sente a comunidade nacional, através das importações maciças de géneros alimentares, e fuga de trabalhadores para países que souberem alongar, acrescer, o ciclo produtivo da sua economia.
Sem territórios de além-mar, não é célebre a indústria suíça de chocolates? Tendo perdido as "colónias" (assim reconhecidas), não persiste poderosa a indústria holandesa de cafés solúveis e outros? Sem produção de tomate em quantidades industriais, não é mundialmente considerada a indústria inglesa de molhos ketchup? E que dizer da indústria de cornes, de lacticínios, de produtos hortícolas e frutícolas industrializados, de bolachas e biscoitos, de oleaginosas, estrangeiras, que invadem tantos dos nossos mercados e fazem a delícia de vistas (e mais do que isso ...) de quem percorra os nossos melhores estabelecimentos comerciais no campo da alimentação?
Mas voltemos ao agro e à sua transformação ...
Como movimento de defesa dos agricultores, não dispondo isoladamente de suficiente "força contratual" no mercado de produtos alimentares, surge, na generalidade dos países, o caminho do associativismo agrário para, congregando esforços, técnica e capitais, conseguirem criar as condições necessárias à transformação de matérias-primas agrárias em bens alimentares.
As cooperativas e outras formas de associativismo dos agricultores tendem a entrar assim abertamente no domínio da transformação dos produtos da terra, em competição com quem quer que se arvore industrial ou já exerça actividade transformadora no campo das indústrias alimentares agrárias.
Tal não exclui que por outras vias, nomeadamente de acordos colectivos de comercialização, se tente resolver o problema de uma melhor retribuição dos factores de produção agrícola e de mais equitativa repartição do "valor acrescentado", bem como da partilha de responsabilidades de riscos assumidos por agricultores e industriais.
Substituir a desconfiança que tem lavrado entre os dois sectores: agricultura e indústria, pela solidariedade na tarefa comum de produzirem e transformarem géneros agrícolas em bens alimentares de qualidade e preços competitivos, é meritória tarefa que deve empolgar quantos se encontram a frente dos destinos destes dois sectores da actividade económica nacional, e particularmente dos seus empresários.
Será possível removerem-se tão profundas e longínquas razões de desconfiança?
Estamos confiantes que sim, já que ambos as partes começam a denotar a consciência da sua interdependência, quer pelo retrocesso de explorações agrícolas a que faltou o apoio do mercado que actividades de transformação poderiam representar, quer pelos fracassos de unidades industriais que viram comprometido o seu labor por carência de abastecimento de matérias-primas na quantidade, qualidade e tempos desejados.
Tal leva-nos a pensar se não é de prosseguir agora mais aceleradamente a instalação de estabelecimentos industriais no campo, no qual parte dos tarefas de pré-transformação ou mesmo de transformação e condicionamento são deixadas a cargo de agricultores e suas associações agrárias.
Efectivamente, quando se pensa em indústrias alimentares agrícolas, o problema que imediatamente se levanta ó o da garantia do seu abastecimento em condições de satisfazer a capacidade instalada, as suas exigências em qualidade e custo de matéria-prima, o que tudo isso requer

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relações estreitas e funcionais com o sector imediatamente a montante: a agricultura.
Não iremos desenvolver este último aspecto, mas algo importa reter.
A actividade de transformação, como sector intercalado entre a produção e o consumo, tem de responder às solicitações da distribuição que prospecta os mercados quanto a produtos transformados, no que se refere a quantidade, qualidade e preço.
Obviamente, não é possível obter um produto transformado de boa qualidade sem que a matéria-prima o seja, e um produto competitivo, em preço, sem que o custo daquela o permita.
A ser assim, deve concluir-se que um dos problemas básicos para garantir a viabilidade técnica e económica das indústrias de transformação de produtos alimentares é a modificação das técnicas culturais, a haverem de sofrer as adaptações exigidas pelo processo tecnológico de fabrico, quer quanto a características morfológicas e fisiológicas do produto agrícola, quer quanto a custo, o que pode, nomeadamente, implicar a subordinação da implantação industrial a razões de ordem ecológica ligadas à qualidade da produção.
Exemplifiquemos:

A selecção de variedades de tomate ricas em licopeno e elevado estrato seco, para fornecer concentrado de boa cor e económica concentração (l milhão de contos vai em nossa exportação) ou a de feijão verde de secção arredondada, forma rectilínea e maturação simultânea, e a localização dos culturas podem ser exemplos de trabalhos de melhoramento de plantas e de ordenamento agrário, a justificarem a necessidade de cooperação de esforços entre investigação agronómica e tecnológica, o ordenamento do território, a valorização agrária e a transformação industrial;
A necessidade de abaixamento de preços de custo por via de mecanização poderá implicar técnicas de plantação mecânica do tomate, seu cultivo e colheita (em fase, alias, já experimental), ou de feijão verde, de salsa, de alho francês, de muitas outras culturas, do próprio descasque mecânico da ervilha, etc., o que exigirá grandes áreas de culturas hortícolas (horto-industriais se lhe chama) um oposição à tradicional horticultura "de canteiro" ou em "quintal".

Outras vezes, a actividade transformadora, seguindo critério não já ecológica, mas, fundamentalmente, de maior economicidade da taxa de laboração, pode preferir a implantação industrial em zonas onde o período de colheita se alongue por forma a permitir um mais elevado nível de utilização do equipamento e mão-de-obra permanente, ainda que com algum sacrifício da qualidade do produto a rentabilidade da exploração agrária.
Estas posições, nem sempre coincidentes entre os dois sectores de actividades, justificam a apreciação da incidência do custo da matéria-prima no produto transformado e a consideração da instabilidade da produção agrária sobre a rentabilidade da transformação.
Sr. Presidente: A incidência do custo do produto bruto sobre o preço do produto transformado tem sido permanente motivo de discussão e contribuído para posições extremas entre os dois sectores, criando por vezes situações de pesado sacrifício para a agricultura, ou impossibilitando a indústria de competir em mercados onde a concorrência, baseada no preço, constitui factor decisivo.
Por exemplo, e retomando ainda o caso do concentrado de tomate, o custo da matéria-prima chega a alcançar entre 40 e 50 por cento do preço de venda das latas de 3 kg às empresas estrangeiras.
Não quer isto dizer que outros factores como a dimensão da, empresa transformadora, mão possam ter importância decisiva na formação do custo final: uma instalação fabril de elevada capacidade, laborando em bom nível de utilização e segundo regras aceitáveis de gestão, permite, pela via da redução da taxa de laboração, atribuir à matéria-prima uma valorização mais elevada que empresas de pequena ou média dimensão, dentro de condicionalismos da capacidade de abastecimento da região produtora e custos de transportes.
Mais importante, porém, é a instabilidade derivada da natureza cíclica da produção agrária (curto período anual de laboração), para mais agravado por factores incontroláveis como o tempo, a condicionarem a quantidade, qualidade e preço do produto.
Desta impossibilidade em obter antecipadamente um dos factores do custo da produção final resulta a dificuldade de a indústria, predeterminar, com adequada aproximação, o diagrama de custo que sirva ao estabelecimento de contratos de fornecimento com a lavoura. E esta, de os produzir.

Os efeitos de tal instabilidade são, além disso, agravados pelas características de grande parte da matéria-prima agrícola, nomeadamente no que respeita ao baixo grau de "transferibilidade" (deslocação no espaço) por motivos de fraco valor específico e elevado grau de "alterabilidade" (conservação no tempo), a limitarem o raio de abastecimento da unidade transformadora.
Também o carácter aleatório da oferta agrícola quanto a qualidade, dependente como se encontra de factores imprevisíveis e pouco controláveis, representa um dos mais graves problemas da indústria transformadora, particularmente da que, imobilizando elevadas capitais) em publicidade para o lançamento de produtos de marca", se sente em dado momento perante o dilema de afectar o prestígio da "marca" consagrada ou reduzir a laboração para uiveis inferiores ao da exploração económica.
Tal impõe a obrigação de a agricultura utilizar as melhores variedades e as mais consentâneas técnicas culturais para diminuição de riscos, já de si demasiados, do abastecimento de um produto pouco homogéneo por sim natureza e modo de produção.
Mas não importa apenas garantir a máxima utilização (no final da campanha) da capacidade instalada de equipamento; urge também assegurar um afluxo diário de matéria-prima em termos de satisfação do programa de fabrico, função da capacidade diária de laboração.
A actividade transformadora deverá, assim, estabelecer com- a lavoura o seu abastecimento ao longo do período de colheita ou então terá de sujeitar-se à lei da oferta e da procura, com todos os inconvenientes de irregularidade e instabilidade atrás apontados.
Isto é sobremodo acentuado e grave, já não tanto para produções agrárias de ciclo anual, de resposta mais pronta, como para as de médio prazo (ciclo de três a seis unos, com o morango, espargo, etc.) ou longo prazo (culturais frutícolas ou florestais), sob (pena de o industrial poder não encontrar oferta válida ou o agricultor se ver ia braços com problemas de colocação por capacidade inexistente ou insuficiente.
Também a cadência diária da entrega da matéria-prima é, no caso da agricultura, sobremodo relevante, desde que se trate de produtos de difícil conservação ou altamente deterioráveis. Em anos de fartas produções tal pode redundar em acentuadas perdas de produto, por haver ultrapassado o conveniente grau de maturação.

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Tudo analisado nos leva a concluir que, se as exigências da indústria quanto à quantidade, qualidade, preço e cadência da entrega de matéria-prima, têm razões indiscutíveis a que a lavoura não pode nem deve desconhecer ou eximir-se, representa igualmente para o sector da transformação uma dependência acentuada da produção agrária, a exigir estreita colaboração entre ambas - e tal nos leva a considerar, seguidamente, os relações entra agricultura e Indústria.
Sr. Presidente: A agricultura é sector deprimido e em atraso crescente no processo de desenvolvimento económico e social.
Razões de meio ambiente e enquadramento humano, razões psicológicas, culturais, sócio-económicas e até políticas justificam o desfasamento técnico-económico e social entre agricultura e indústria.
Quanto maior for esse diferencial, mais utópica é a colaboração entro os dois sectores, pois o industrial, considerando a fraqueza da agricultura e a debilidade económica e social do lavrador, sentir-se-á tentado a estabelecer, na melhor das hipóteses, simples "contrato" individual que faz do produtor um mero assalariado indirecto dia indústria - contratara com o produtor a matéria-prima pelo preço que melhor lhe convier.
Deste modo, as relações contratuais entre a agricultura e a indústria alimentar só serão eficazes e harmónicas se ambos os actividades possuírem equilibrado poder de negociação.
Vários esquemas de relações existem ou podem conceber-se, a saber:

Comercialização dos produtos agrícolas segundo relações normais de compra-venda sem pontilha de riscos;
"Integração vertical" (ascendente ou descendente) em que - um só sector assume os riscos;
Colaboração entre os dois sectores em que cada qual assume responsabilidades perante o outro, quer em riscos, quer nas obrigações.

O processo clássico de comercialização é o compra-venda, sujeitando-se o transformador à "lei da oferta e da procura" e concorrendo com os demais utilizadores (nomeadamente de "produtos em fresco") na aquisição dos matérias-primas de origem agrária.
Sendo o caso mais corrente, só é concebível quando a produção é já suficiente ou superior as necessidades de um modesto mercado consumidor e a intervenção da indústria, pouco exigente e de características artesanais, tem reduzido significado no conjunto global.
Mas reveste graves inconvenientes quando o produto transformado se destina a mercados competitivos e exigentes, pois a qualidade, decorrente do uma precária selecção doa produtos primários, á muitas vezes inferior.
Sempre que se verifica (penúria de produtos agrícolas por razões sazonarias ou de estrutura agrária, ou produções que não satisfazem as exigências qualitativas da indústria, ou custo de produção muito elevado, ou preços de venda de produtos agrícolas sem frescos extraordinariamente favoráveis por virtude da proximidade de mercados de consumo ou bons contratos comerciais, a indústria pode ver-se obrigada a tentar outras soluções.
Surgem assim contratos de compra-venda sem partilha de riscos entre agricultura e indústria, com os agricultores individualmente (caso mais frequente) ou suas associações (nomeadamente cooperativas de produção) comprometidos a fornecerem certa quantidade do produto a preço, qualidade e datas de entrega acordadas - mas "esquecem" frequentemente tatás contratos as datas de pagamento dos fornecimentos, o que pode ser causa de mal-estar e tem dado origem, por vezes, a vigorosos protestos por parte dos agricultores.
Tais contratos, vulgarizados entre nós, por exemplo, no domínio tia indústria do tomate, não compensam devidamente o agricultar individual, pois não compartilham com ele as riscos da cultura, trates incentivam a monocultura irresponsável pela adopção de planos de exploração da terra improvisados, prejudiciais à conservação fertilidade do solo, técnica e economicamente desaconselháveis.
Sendo rentáveis no plano global agro-industrial, não o suo frequentemente no plano exclusivamente agrícola, o que pode levar e tem conduzido, por vezes, ao desinteresse do produtor, forçando o industrial a dedicar-se à cultura.
Nesta "integração vertical ascendente" o industrial assume sozinho a totalidade dos riscos, passando a ser o produtor em terras adquiridas ou arrendadas, volvendo-se os agricultores simples assalariados da indústria.
Esta modalidade, implicando, por parte da indústria transformadora, a responsabilidade de todos os riscos inerentes às contingências imprevisíveis do sector agrícola, encontra-se muito pouco generalizado: e industrial raramente está disposto a assumir os riscos correspondentes quer às culturas que deseja, quer às demais componentes da lotação agrária.
E assim: ou se limita a cultivar o produto destinado à laboração mas com prejuízo, geralmente, da conservação da fertilidade do terra, ou entrega a exploração do terreno a "rendeiros" com os quais estabeleça contratos nem sempre os mais favoráveis para os cultivadores arrendatários.
Bem diverso é o caso da "integração vertical descendente": um agricultor ou, mais frequentemente, um grupo de lavradores associados, em regime cooperativo ou não, cria uma estrutura industrial para a transformação dos próprios produtos agrícolas.
Nos Estados Unidos da América, por exemplo, e limitando-nos ao sector conserveiro, enquanto apenas 8 por cento das matérias-primas empregues na indústria são produzidos mo anterior regime de integração vertical ascendente, ascende já a 21 por cento no caso de integração vertical descendente (a lavoura integrando a indústria).
Contra-argumenta-se que o agricultor, divorciado dos complexos problemas ligados à comercialização e distribuição, é incapaz de prospectar e de lançar no mercado produtos transformados, especialmente os "de mania".
Não se tem por provada essa incapacidade congénita no plano comercial, e que tal o seja apenas de agricultores, sobretudo quando resulte de agricultura "de grupo", com separação de funções entre os seus membros associados.
A "integração horizontal", pela concentração e especialização de produções, à uma das vias - talvez a mais eficiente - para alcançar a modernização das estruturas agrários e a "integração vertical descendente" é o melhor promotor daquela; aparece ainda como o meio mais eficaz da adaptação da produção as necessidades quantitativas e qualitativas do consumo.
Assistindo-se, por outro lado, a um movimento de concentração empresarial nos sectores do comercio e industria com fortes incidências no capítulo financeiro e técnico, haverá de reconhecer-se como fundamental o agrupamento de empresas agrarias do tipo familiar em cooperativas do integração horizontal e vertical como processo de melhorar a repartição do "valor acrescentado" por esta, 2.ª fase (acabamento) do processo de produção.

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Libertando os pequenos agricultores dos especulações dos intermediários e acrescentando-lhes nova fonte de receita, é via bem de recomendar na transformação de produtos especializados agrícolas.
Uma outra modalidade é a da associação intersectorial, em que os agricultores organizados em cooperativas ou outro tipo de agrupamentos se associam a indústria, compartilhando com ela os resultados da transformação.
Desenvolvido em Franga ultimamente, mereceu de alguém o seguinte comentário:

Em vez de uma integração vertical em que o produtor viria a ser um assalariado da indústria (integração ascendente) ou em que a indústria seria absorvida pelo produtor (integração descendente), optou-se por uma integração horizontal em que a agricultam participa com o transformador na investigação e experimentação agronómicas, tendo em vista a melhoria dos culturas e a adaptação destas e do equipamento tecnológico a um trabalho mais produtivo para os dois sectores, ambos participando no empreendimento global e resultados totais.

São, pois, vários os tipos básicos dos relações entre a agricultura e a indústria e numerosíssimas as variantes que podem comportar, mas, independentemente dos tendências dos interessados e dos preferências dos entidades responsáveis, facto é que se esta assistindo em todo o mundo a uma autêntica revolução agro-industrial, já manifestamente declarada na produção industrializada de carne (porcina, de aves e até bovina) e dos produtos horto-frutícolas.
Esta evolução haverá de conduzir a certa integração dos dois sectores, de forma que cada qual assuma os suas responsabilidades e deveres comuns, dando origem a uma "economia alimentar" digna desse nome e do futuro.
Sr. Presidente: A identidade fundamentei dos objectivos da agricultura e indústria (alimentar, qual seja a da procura da satisfação, mis melhores condições de preço e qualidade do produto, das necessidades alimentares das sociedades, impõe a coordenação de actividades ligadas ao sector da alimentação.
E porque a integração dia agricultura não pode conceber-se hodiernamente senão num contexto de industrialização e desenvolvimento global de actividades, a "economia alimentar" teca de atender não apenas ao consumidor - como sucede quando, por razões político--sociais, se procuram satisfazer as necessidades alimentares dos consumidores (e por que não se controlam outras bem mais gravosas, por vezes, como a habitação?) -, mas às demais actividades dos circuitos da alimentação: a agricultura, as indústrias transformadoras, os estruturas de distribuição (postos de recolha, câmaras frigoríficas, etc.). Os sacrifícios, a sanem exigidos, não podem nem devem aceitar, excluíam ou fundamentalmente, do sector da produção agrária .. .
Todas estas actividades, integrando a complexa "economia alimentar", deverão ser apreciadas conjuntamente por forma a melhor servirem, segundo critérios de máxima justiça e lógica económica, todos os intervenientes no sistema.
Quantas vezes a alta rentabilidade dos indústrias transformadoras é mais resultante do baixo preço por que adquirem a matéria-prima do que proveniente de uma gestão eficiente?
Quantas vezes a participação da produção agrária no elevado preço do produto "acabado" no consumidor é mínima em relação à transformação e distribuição?

Quantas vezes o produto "bruto" é sujeito a longos transportes para ser transformado a grandes distâncias dos centros de produção, ignorando-se os mais elementares princípios da "economicidade" do conjunto?
Isto sem esquecer o muito que haverá de pedir-se ao sector da produção agrária em termos de correcção de estruturas deficientes e tecnicidade ultrapassada. Mas avante.
Obviamente, a agricultura, como sector mais retardado do conjunto (até por razões de insuficiente remuneração e formação profissional e empresarial agrícolas), deverá merecer tratamento "preferencial" em termos de apoio e fomento como parceiro mais debilitado do conjunto.
Dentro desta orientação - de promoção de actividades agrárias em processo de renovação -, é urgente que se encare a instalação de empresas e instalações fabris que sirvam, à dinamização da produção agrária e sejam valorativas dos seus esforços, dos produções e populações rurais, da economia e sociedade nacionais.
Que a experiência de outros países no campo alimentar, e a nossa própria em domínios já ensaiados ou creditados de transformação de produtos agrários, nos ajude a concretizar uma política de fomento agro-industrial que passa servir Portugal e os Portugueses.
"Caminho de país novo", ou a pretender renovar, quem os não quererá de boa mente percorrer?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Pinto Castelo Branco: - Sr. Presidente: Estamos aqui para apreciar na generalidade a proposta de lei do Governo sobre fomento industrial, quer dizer, estamos aqui a avaliar da sua oportunidade, vantagem e economia.
Quanto a oportunidade, creio que ela é indiscutível.
De há anos tem vindo a ser reclamada com insistência cada vez maior pela opinião pública, e anunciada com frequência igualmente crescente pela Administração, a necessidade da revisão do quadro legal definidor do nosso desenvolvimento industrial.
Na realidade, todos vimos sentindo com maior premência a necessidade de se passar de um estádio de condicionamento, justificado há algumas dezenas de anos pela escassez de recursos inumanos e materiais, em particular financeiros, para uma política já não restritiva, mas de promoção do desenvolvimento industrial do País, política esta tomada, além de necessária, possível pelo próprio êxito da orientação anterior, que, e creio este ponto pacífico, atingira entretanto o limite das suas possibilidades.
Aqui um (parêntesis: não deve esquecer-se como factor determinante do sucesso na primeira fase a intervenção directa do sector público no lançamento dês grandes indústrias de base - energia, transportes e certas transformadoras essenciais, como sejam a química dos adubos, refinação de petróleos, celulose, etc.
No mesmo período teve sem dúvida papel de relevo a iniciativa privada. Mas a verdade é que sem o lançamento pelo Estado daquelas indústrias, e o apoio que a mesma Administração Pública proporcionou sistematicamente às próprias iniciativas do sector privado, é para mim fora de dúvida que as realizações deste não teriam conseguido atingir expressão significativa, nem ele agora estaria em condições de desempenhar o papel que o Governo pretende dar-lhe, em cumprimento, aliás, dos próprios termos da Constituição.
Considero este aspecto fundamental, assim como enteado que uma dos vantagens, se não a maior, da proposta

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em debate consiste na equilibrada consideração, por um lado, do papel da iniciativa privada no processo de desenvolvimento económico, graças a capacidade que ela em si próprio entretanto desenvolveu, simultaneamente com a manutenção da linha do rumo que confere ao Estado funções de supletividade, impulsionamento e definição última desse mesmo desenvolvimento, em termos de bem comum.
Disse há pouco que a proposta do Governo visava a substituição de uma óptica de condicionamento por uma óptica de fomento de promoção industrial.
Na realidade, toda a proposta, na sua economia, esta orientada e da prioridade aos incentivos, aos auxílios, a definição programática e promocional. E se mantém ainda alguns esquemas de condicionamento, fá-lo expressamente com carácter excepcional, transitório e restrito.
Penso também estar certíssima esta orientação, por todas os razões e até por estar convencido de que na ordem das realidades concretas (e em política aplicada - se é que há outra ... só as realidades devem interessar); ata par estar convencido, dizia, de que a linha que se pretende seguir é a mais susceptível de garantir a efectiva participação dos cidadãos no processo de desenvolvimento económico, de que, em última instância, devem ser os agentes e os beneficiários.
Participação e desenvolvimento que, quanto a mim, considero, e cada vez mais, como início esquema capaz do assegurar um equitativo progresso social e, através dele, a promoção integral - em corpo e em espírito, que deve constituir a finalidade última de qualquer (processo de desenvolvimento humano, individual ou colectivo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nisto reside, aliás, a própria justificação do progresso económico, seja ao nível das pessoas individualmente consideradas, seja ao dos vários corpos intermédios, que, na especificidade e indispensabilidade próprias a cada um, vão sucessivamente integrando a sociedade até que, passando pelas nações e por intermédio destas, chegam ao ultimo de entre eles, isto é, ao conjunto da própria humanidade.
Nesta ordem de ideias, aliás, se regista, apoiando-a inteiramente, a definição dos finalidades da política industriai feita na base IV da proposta, rematada, e muito bem, com justa referência a coordenação do desenvolvimento industrial da metrópole com o das províncias ultramarinos.
Este o sumário das razões que me levam a considerar oportuna e vantajosa a proposta em apreciação e a aderir à sua economia.
Embora correndo o risco de me alongar mais do que desejaria - pois entendo que, mesmo num Parlamento, os palavras devem ser, adem de medidas, economizadas, já que anais não seja como forma de não desperdiçar o tempo da Assembleia nem abusar da paciência dos Srs. Deputados -, juntarei ainda alguns comentários sugeridos por afirmações proferidas neste debate, ou pela analise da posição assumida pela Câmara Corporativa.
Relativamente a esta, parece-me de toda a justiça salientar o equilíbrio apesar de tudo conseguido no seu parecer, e, portanto, a contribuição positiva que se me afigura ter dado ao Governo para a redacção final da proposta. Tal me leva naturalmente a prestar os minhas homenagens ao seu relator, Digno Procurador Hermes dos Santos, bem como ao trabalho, manifestamente difícil, do relator do parecer subsidiário da secção de Indústria, Digno Procurador António Pessoa Monteiro.

Outro ponto me impressionou também. Refiro-me ao facto de as aposições a orientação proposta pelo Governo serem redutíveis a duas posições de fundo que se verifica serem perfeitamente antagónicas, mas, apesar disso, conduzirem a atitudes que na prática - e esta em política, insisto, é o que interessa - levam ao mesmo, ou seja, à não adesão em mais ou menos extensão à orientação que o Governo propõe.
Efectivamente, de um lado temos a tese de que a sociedade portuguesa, errada nos seus fundamentos, ou pelo menos na sua expressão mais tangível, isto é, nas suas estruturas, deve ser reconstruída em bases novas (e portanto destruída antes disto). Para tanto, a proposta de lei, até por ter o seu âmbito limitado à economia industrial, é, diz-se, manifestamente insuficiente.
No pólo oposto encontra-se a tese, em regra não explícita, mas sem dúvida claramente implícita, de que só o que existe, mais objectivamente: só as actuais (e provavelmente confortáveis ...) situações adquiridas é que são válidas.
Nesta óptica, a proposta de lei - pretendendo promover e incrementar a criação, devidamente planeada, de novas actividades, além de obrigar as existentes a um permanente esforço de adaptação a evolução das circunstâncias nacionais e internacionais, em termos de bem comum, pode ser inconveniente, provavelmente desvantajosa, ou até inoportuna.
O que há de curioso nisto tudo é que ambas na tendências invocam mais especialmente em abono dos seus pontos de vista a falta de audiência da organização corporativa, que, dizem, resulta da letra e das intenções da proposta do Governo.
Ao mesmo tempo, tão depressa se considera que a organização corporativa é insuficientemente ouvida, como se afirma não ser bastante representativa no plano sindical, no plano gremial ... ou em todos os planos.
Ora bem, parece-me que uma análise equilibrada levará, comezinhamente, à conclusão de que a nossa organização corporativa é imperfeita como tudo o que é humano e deve, por isso, ser sistematicamente aperfeiçoada, mas que os seus méritos e as suas virtualidades são inegáveis, desde que efectiva e rectamente utilizados pelos interessados. À verdade, porém, é que nem sempre isto tem sucedido!
Quanto ao problema em si da obrigatoriedade da audiência da organização corporativa, louvar-me-ei na declaração de voto do Digno Procurador Jacinto Nunes, no que fico em excelente companhia, juntamente com os Dignos Procuradores Pinto Barbosa, Sequeira Braga e Hermano Saraiva.
"Votei vencido a base vi", disse o Digno Procurador, Jacinto Nunes, "porquanto a Câmara, ao votá-la, não tomou uma posição quanto à audiência casuística prevista no Decreto-Lei n.º 46 666. Perfilho a audiência de todos os interessados na definição da política industrial, mesmo a nível sectorial, mas aceitar, para além disso, a obrigatoriedade de audiência nos casos particulares dos interesses que com eles se relacionam pode revestir-se, afigura-se, de múltiplos inconvenientes.
Defendo uma estrutura participativa, mas que englobe, como se referiu, todos os interessados. Uma participação parcial pode ser pior do que a ausência de participação.
Por outro lado, posto o problema do nível em que se efectuaria a participação, pareceu na discussão predominar o ponto de vista que ela se deveria fazer a nível geral, mas aceite esta orientação omitiu-se qualquer referência à cessação da intervenção dos organismos interessados ao nível dos casos específicos.

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