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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 182

ANO DE 1972 14 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.º 162, EM 13 DE ABRIL.

Presidente: Ex.mo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Ex.mos, Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas.

Antes da ordem do dia. - foi aprovado o n.º 180 do Diário doa Sessões, com rectificações apresentadas pelo Sr. Deputado Mota- Amaral.
Deu-se conta do expediente.
Foi enviada ao Sr. Deputado Malafaia Novais fotocópia de um esclarecimento do Ministério das Comunicações, em satisfação do requerimento apresentado na, sessão de lê de Dezembro do ano findo.
Foi anunciado estar na Mesa e ir ser publicado no Diário das Sessões o parecer da Comissão de Contas Públicas acerca das contas da Junta do Crédito Público relativas ao ano de 1970.

O Sr. Deputado Santos Bessa falou sobre as reuniões da Associação Médica para o Estudo das Condições de Vida e da Saúde, recentemente realizadas em Lisboa e em Coimbra.

O Sr. Deputado Martins Nunes referiu-se às impressões colhidas na deslocação à Guiné, integrado na comitiva do Sr. Ministro do Ultramar na sua recente visita àquela província,

O Sr. Deputado Coifa Dias prestou alguns esclarecimentos complementares a respeito das considerações por si produzidas na sessão anterior em interrupção a uma intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota acerca do processo de uma peça de teatro cuja representação não foi autorizada.

Ordem do dia. - Iniciou-se a discussão na generalidade da proposta de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros.

Usaram da palavra os Srs. Deputados Amílcar Mesquita, que leu o relatório da Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social, Vaz Pinto Alves e Alberto de Alarcão.

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se a chamada.
Eram 15 horas e 45 minutos.

Fez-se a chamada, á qual, responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Bocha Lacerda.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Si Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.

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Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José da Silva.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
D. Luzia Neves Pernão Pereira-Beija.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Feres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

O Sr. Presidente:-Estuo presentes 76 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 180 do Diário das Sessões.

O Sr. Mota Amaral: - Sr. Presidente: No n.º 180 do Diário das Sessões, solicito que sejam feitas as seguintes rectificações: na p. 85S2, col. 1.º, 1. 56, onde se lá: "colaborar", deve ler-se: "colaboram", e na p. 3553, col. l. N.º 1. 2, deve ler-se: "sobrecustos", tudo ligado.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para (reclamações sobre este Diário, considerá-lo-ei aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está aprovado. Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama
De um grupo de alunos do 4.º ano da Faculdade de Medicina de Lisboa, que fazem parte do grupo de trabalho sobre o fumo do tabaco, chamando a atenção dos Srs. Deputados para a legislação em vigor, que não defende da melhor maneira a saúde dos cidadãos.

O Sr. Presidente: - Enviado pela Presidência do Conselho, está na Mesa um esclarecimento recebido do Ministério das Comunicações, destinado a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Malafaia Novais na sessão de 14 de Dezembro de 1971. Vai ser. 'entregue fotocópia a este Sr. Deputado.

Está também na Mesa o parecer da nossa Comissão de Contas Públicas acerca das contas da Junta do Crédito Público do ano de 1970. Vai ser publicado no Diário das Sessões.

Tem a palavra o Sr. Deputado Santos Bessa.

O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: No decurso da Semana - Santa e de harmonia com a autorização e o apoio do Governo, decorreram, em Lisboa e em. Coimbra, certos actos a que a imprensa deu escasso relevo, mas acerca dos quais eu julgo dever fazer, nesta Câmara, um breve apontamento, dado o interesse nacional que eles tiveram. Refiro-me às reuniões da Associação Médico para o Estudo das Condições de Vida e da Saúde (habitualmente conhecida pelas suas iniciais: A. M. 1. E. V.), que tiveram lugar no Centro de Medicina Recuperadara do Alcoitão e na Obra de Assiste cia Materno-Infantil do Dr. Bissaia Barreto, incorporada no Centro Hospitalar de Coimbra, e durante as quais foi constituído o grupo português dessa mesma Associação.

Aquela A. M. I. E. V., associação internacional, foi fundada há pouco mais de vinte anos. em Roma, por eminentes personalidades intensamente e justificadamente preocupadas com as condições de vida na Europa e as suas relações com a saúde dos populações. Mas a sua actividade tem sido notável, através de vários congressos e de outras reuniões, efectuadas não só em várias capitais da Europa, mas também na América, nas quais têm sido debatidos problemas do mais relevante interesse pela repercussão que indiscutivelmente têm sobre a saúde física e mental, tanto em países de pujante desenvolvimento, onde a indústria tomou destacada posição, como naqueles que ainda 'hoje se encontram em via de desenvolvimento.

As drogas, a poluição pelos resíduos químicos e industriais, as radiações atómicos, a alimentação, a infância ia a dinâmica do desenvolvimento e a mortalidade infantil constituem um grupo de problemas da nossa época, portanto, de flagrante actualidade, cujo estudo tem merecido à jovem Associação um especial interesse. Dela fazem parte não somente médicos, mas indivíduos das mais variadas profissões e actividades que estuo ligados à evolução destes e de outros factores sociais que too grande repercussão têm na saúde e na vida das populações.
Muitos dos problemas que acabo de referir foram já trazidos a esta Câmara por vários Deputados, que salientaram a sua importância para a saúde e a vida dos Por-

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tugueses. A defesa contra a poluição pelos resíduos da indústria, a necessidade de uma protecção eficaz contra os produtos utilizados na guerra química contra os insectos e várias pragas da agricultura, a necessidade da manutenção de certos equilíbrios ecológicos, a mortalidade infantil e tantos outros têm aqui sido abordados com certa frequência pelos membros desta Assembleia. O próprio Governo enviou aqui, ainda não ha muito tempo, um projecto de lei sobre a defesa da Natureza que foi objecto de análise cuidada por muitos dos nossos ilustres colegas.
Pois o grupo português, designado "Associação Médica Portuguesa para o Estudo das Condições de Vida e da Saúde", constituído agora e empossado pelos membros do Comité Internacional da A. M. I. E. V. que aqui se deslocaram, visa precisamente o estudo, a escala nacional, de todos os problemas relacionados com os nossas condições de vida e de saúde. Nos seus estatutos, está consignado que esta "Associação tem por objectivo promover o estudo científico das relações entre as condições de vida e de saúde,- em benefício das populações, com respeito pelos princípios informadores do Estado Português", e também lhe cabe, sem exclusivo, a divulgação, no espaço territorial português, dos estudos, relatórios e publicações de qualquer espécie da A. M. I. E. V.". Dele fazem parte juristas, engenheiros, arquitectos, médicos, sanitaristas, assistentes sociais, administradores hospitalares e outros, de modo a garantir o estudo dos múltiplos problemas que lhe cumpre encarar. Esperamos que a estes outros venham juntar-se para enriquecer o grupo.
Honramo-nos com que nele estejam incluídas personalidades do mais alto relevo político, social e científico, entre as quais me permito salientar, sem desdouro para os demais, a Sr.ª Dr.ª D. Maria Teresa Lobo, ilustre Subsecretário de Estado da Saúde e Assistência, e o Sr. Dr. Lino Neto, Digno Procurador a Câmara Corporativa e provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, aos quais a Associação Portuguesa ficou devendo a possibilidade da sua constituição e da realização das reuniões indispensáveis.
Cumpre-me salientar também, como acto de pura justiça, quanto se ficou devendo ao Prof. Almerindo Leça, não só por causa dos esforços 'empreendidos para trazer a Portugal o presidente, um dos vice-presidente, o secretário-geral e demais membros da A. M. I. E. V., como também o facto de ter salientado e demonstrado que pertence a um português de. grande renome universal - o Dr. Eibeiro Snnches- o mérito de ter sido o primeiro a chamar para os assuntos que hoje constituem os objectivos daquela Associação Médica as atenções dos povos e dos Governos. Efectivamente, foi esse ilustre médico que, depois de frequentar várias Universidades e capitais da Europa, de ser examinador de médicos e cirurgiões na Rússia, de ser médico do Corpo Imperial de Cadetes da Corte de S. Petersburgo, publicou, em Paris, há mais de duzentos anos - em 1756 -, em língua portuguesa, o seu notável Tratado da Conservação da Saúde doa Povos.

Isso mesmo foi gravado em excelente medalha de bronze com a sua efígie, a qual foi distribuída aos componentes da Associação que se deslocaram a Portugal, reivindicando-se, assim, para este sábio português a posição de pioneiro das problemas da poluição e de tantos outros que afectam a saúde e a vida das gentes e a quem cabe tombem o mérito de ter criado a Medicina Social e a Saúde Pública.

Seja-me permitida uma palavra de muito reconhecimento a SS. Ex.ªs, os Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Saúde e Assistência e Subsecretário de Estado da Saúde e Assistência e também ao ilustre provedor dia
Santa Casa da Misericórdia de Lisboa pela autorização e pelos auxílios concedidos.
E não ficaria bem com a minha consciência se não referisse aqui quanto ficamos a dever à gentileza, distinção e alta compreensão do magnífico reitor da Universidade de Coimbra, que nos honrou, entre outras coisas, com a presidência da sessão que se - realizou naquela cidade.
E seja-me consentido acentuar o prazer com que ouvi o ilustre sociólogo, presidente da Associação, o Prof. Josué de Castro, na sessão de Coimbra, perante mestres e estudantes, acentuar a importância da Universidade de Coimbra na criação e no desenvolvimento da tão característica e inconfundível cultura brasileira, e não só da Universidade, como de Portugal, que, no seu dizer, foi, no século XVI, o maior país do Mundo, aquele que o alargou para além dos limites do conhecimento e ensinou ao Mundo os caminhos do Oriente e das riquezas.

Sr. Presidente: Vou terminar esta informação, intencionalmente breve, fazendo os melhores votos por que o grupo português possa empreender com êxito os estudos que lhe competem e possa ver realizadas em breve, com a ajuda do Governo, obras que possam melhorar as condições de vida e de saúde do povo português.
Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem! O orador foi cumprimentado.

O Sr. Martins Nunes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A convite do Governo da província, desloquei-me à Guiné no dia 5 do corrente mês, na companhia de S. Ex.ª o Sr. Ministro do Ultramar, Prof. Silva Cunha, tendo regressado no passado dia 9.
A viagem constituiu para mim uma experiência nova, repleta de emoções, por ser a primeira que fiz com destino à minha terra natal na qualidade de Deputado pelo respectivo círculo.
Não obstante a curta duração da visita (cerca de quatro dias), tive ocasião de percorrer vários pontos da província, acompanhando o ilustre visitante nos suas deslocações.
Pude assim voltar a tomar contacto .com as suas populações e tive ensejo de trocar impressões com alguns dos elementos mais representativos da vida política, administrativa, económica e social da província, o que me permitiu actualizar o meu conhecimento dos problemas locais e alargar a minha visão acerca da situação.
É para transmitir a esta nobre Câmara as impressões colhidas nessa viagem que pedi a palavra.
Foi grande e muito carinhoso o acolhimento que tive, quer por parte do Governo da província, quer por parte do povo, facto que em nada me surpreendeu, dado que é a confirmação daquilo que por outras formas e em outras ocasiões as duos entidades, em perfeita comunhão de pensamento e de sentimento, me têm manifestado.
O que na verdade me impressionou grandemente, embora também não constituísse motivo dê surpresa para mim, foi a calorosa, entusiástica e posso dizer mesmo apoteótica recepção de que foi alvo por parte do povo S. Ex.ª o Sr. Ministro do Ultramar.
Acompanhei - como já disse - o' ilustre visitou-te era todas as suas deslocações dentro da província e pude testemunhar directamente o calor humano que o envolveu sempre desde a sua chegada até ao momento do seu regresso & metrópole.
Este facto não se registou apenas em Bissau, mas em todos os pontos por que passou S. Ex.ª, e foram vários

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os sítios visitados, como deram conta os órgãos da informação que seguiram de perto o acontecimento.
Em alguns pontos o entusiasmo popular excedeu a minha expectativa mais optimista e não foi possível aos repórteres fotográficos gravar tudo em imagens.
Fiquei profundamente emocionado ao ver no Gabu pessoas atropelarem-se, empurrando-se e acotovelando-se com o único objectivo de chegarem junto do ilustre hóspede, apertar-lhe a mão e entregarem-lhe as suas prendas, sem significado material, mas cheias de simbolismo, que eram desde simples objectos de artesanato local até animais vivos. Destinadas quase todas, ao Sr. Doutor Silva Cunha e ao Sr. General Spinola. Eu próprio recebi também uma, já na minha vinda, para entregar a S. Ex.ª o Sr. Presidente do Conselho, Prof. Doutor Marcelo Caetano, o que farei logo que se oferecer oportunidade.
São prendas de valor quase simbólico, roas todas elas repletas de grande carga afectiva e de profundo significado.

ão será tudo isso símbolo indiscutível de lealdade, de fidelidade, de completa adesão a uma política por porte de um povo que na paz quer construiu- o seu futuro? Direi que os amigos deste povo ou os que assim se dizem - se o são de facto prestar-lhe um melhor serviço cooperando com Portugal no esforço para o seu desenvolvimento ou, na impossibilidade disso, deixando-o em paz, não fomentando a sua destruição.
Aquelas, manifestações espontâneas e sinceras do povo da Guiné levaram S. Ex.ª o Sr. Ministro, numa das suas declarações públicas, dirigindo-se às populações, a afirmar, cheio de emoção, que "o seu grande patriotismo, a sua completa dedicação a causa de Portugal, o inteiro respeito pela chefia do Sr. Presidente da República e do Sr. Presidente do Conselho, são as melhores garantias de que a Guiné há-de continuar a ser portuguesa e há-de sei- cada vez a Guiné melhor" - a que todos desejamos.
Esta afirmação, feito por um membro do Governo em cujas mãos está o destino do ultramar è o seu futuro melhor, é de facto animadora e leva-me a repetia- com fé que assim há-de ser, porque assim o queremos, assim o quer o povo.
Outro facto digno de nota que registei é o considerável número de inaugurações levadas a efeito sob a presidência do Sr. Prof. Silva Cunha, dos quais saliento as do movo posto emissor de 100 KW, das Estiradas Teixeira Pinto Cacheu, Xime-Bambodinca, Nova Lamego-Piche e Pirada fronteira do Senegal, e ainda a do novo cais de cabotagem, de acostagem permanente, de Bolola (em Bissau), melhoramentos de grande vulto nos aspectos social, económico e cultural.
O que acabo de referir é a confirmação do que declarei aqui há bem pouco tempo, no sentido de que o esforço de desenvolvimento que se vem verificando na província tem sido A arma mais eficaz contra o inimigo.
Com efeito, este só tem agora uma alternativa: aceitar honestamente a realidade insofismável de que o povo lhe virou as costas na Guiné de uma vez para sempre, para se ocupar na construção do seu futuro, por opção, à sombra da bandeará que o viu nascer - a bandeira verde-rubra da paz, da justiça e da fraternidade entre os homens. Ou fará isso, ou se volta abertamente contra esse mesmo povo que diz pretender libertar, desmascarando-se, deste modo, quanto as suas intenções ocultas. Aliás, é o que tem vindo a fazer, como o demonstram casos como os de Pirada e outros.
Quero voltar também a referir o que todos as manifestações simbolizam de apoio ao Governador A. Spinola, ilustre representante do Governo na província.
De simpatia pela sua acção inicial passou-se à pura amizade e desta a uma verdadeira devoção e cega confiança. Desde então, Governo e povo se confundiram, fundindo-se governante e governados numa perfeita e profícua simbiose, circunstância que tem tornado possíveis os realizações e progressos tanto no plano militar como no campo sócio-polítrico e económico que se vem verificando.
Com o decorrer do tempo, o inimigo, surpreendido por este facto insólito que contrariava todos os seus planos, desencadeou uma intensa campanha de mentiras e calúnias contra o Governo e de atemorização da população com boatos e falsos avisos através da rádio e de agentes internos e externos de subversão, tentando destruir o bloco monolítico constituído pelo binómio Governo-Povo.
Para denunciar a extensão, a organização e a falsidade dessa campanha, uma outra palavra quero aqui deixar, no seguimento da nota oficiosa apreciada pelos órgãos de informação sobre uma hipotética presença de observadores da O. N. U. em territórios da Guiné. Não poderia deixar de aproveitar a ocasião para informar esta Câmara de que pude verificar por mim próprio e m loco a falsidade dos afirmações vindas a público. De resto, já não é a primeira vez que notícias deste género são publicadas. O P. A. I. G. C. faz passear estes pretensos observadores em territórios da República da Guiné, mais ou menos afastados da província portuguesa da Guiné, fazendo-lhes crer que se encontram em "áreas libertadas" da mesma província. Se fosse ingenuidade, era muita ingenuidade!
Eu, se o Governo o não tivesse feito já, viria assegurar a esta Câmara que nenhum observador entrou na Guiné durante o referido período, e tal como a nota oficiosa do Governo Português o afirma, também eu desafio os três membros do chamado "comité dos vinte e quatro" a indicarem concretamente os locais que percorreram, para que assim fique bem provado o tremendo logro em que caíram e a interpretação mais benévola, o que de resto está na linha de conduta com que o P. A. I. G. C. tem procurado há já alguns anos convencer, embora inutilmente, primeiro os portugueses da Guiné e depois os estrangeiros, mais facilmente influenciáveis, dado não conhecerem não só as realidades do mundo africano como, e sobretudo, as realidades do Portugal africano.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Cotta Dias: -Sr. Presidente: A mesma estranheza que ontem me fez interromper considerações aqui produzidas, em relação a uma peça de teatro, levou-me posteriormente a procurar informação mais completa sobre o assunto.
Aquela que me foi possível reunir, parece-me correcto e útil não a guardar para mim e trazê-la ao conhecimento da Assembleia, cuja atenção foi desperta para o assunto, facultando mais peças de um processo que foi dito muitas pessoas não conhecerem e das quais resulta o esclarecimento mais nítido de todas as dúvidas aqui postas.
Não voltarei a nenhuma apreciação crítica sobre a peça em si. E isso porque, por um lado, a natureza mais geral de algumas das questões aqui levantadas, relativamente a classificação dos espectáculos, lhes confere relevo maior, a carecer de esclarecimentos com igual generalidade.
Por outro, aconteceu ser a peça objecto de detalhada análise crítica num órgão da imprensa de hoje, o jornal

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Novidades, para o qual se remetem todos quantos queiram ficar sobre a sua perigosidade moral e social com um esclarecimento completo que a versão francesa ...

O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte do Amaral: - Perigosidade, está bem, mas apenas para os que professam os princípios da civilização cristã e do espírito da velha Europa.

O Orador: - Dizia eu que a versão francesa, ao classificá-la, na própria capa, de "peça repugnante", exprime de forma bem sugestiva.
Necessidades fortemente sentidas levam, naturalmente, em todos os países civilizados, a organizar as defesas da sociedade, numa atitude de profilaxia mental e moral que oponha, à dissolução dos costumes, barreiras em relação às quais, também por todo o mundo civilizado, se alguma coisa se vê lamentar é a sua fragilidade pára; citando a imprensa de hoje, evitar que a liberdade descambe em libertinagem e a abertura em pandemónio.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Diário de Noticias dá-nos boje conta de que uma acção de boicotagem à pornografia e à violência nos écrans de televisão é objectivo de um movimento, a que já aderiram 50 000 suecos, desgostosos e inconforma - dos, que marcaram para o dia l de Julho um protesto colectivo que deve durar três meses.
O nível de informação e preparação dos espectadores e a natureza dos espectáculos em si determinarão graduações diferentes e diferentes selecções dos tipos de intervenção de país para país, mas o sentimento da necessidade, esse, é indiscutivelmente generalizado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isso, a Comissão de Exame e Classificação de Espectáculos, assim designada no Decreto n.º 268/71, que a reformou, é órgão homólogo de outros, com idênticas funções e objectivos, existentes na generalidade dos países civilizados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nos termos da lei portuguesa, a Comissão de Exame e Classificação de Espectáculos é composta por dezassete membros, dós quais dois representantes do Ministério da Justiça, dois representantes do Ministério da Educação, nove da Secretaria de Estado da Informação e Turismo e quatro membros da Comissão de Literatura e Espectáculos para Menores.
Para além de uma composição muito ampla e variada, a assegurar assim pontos de vista e formações as - mais diversas, inovou a lei portuguesa em 1971, aumentando as garantias do sistema, ao instituir uma comissão de recurso, funcionando a requerimento dos interessados do sector privado, aliás representado nela através de três elementos designados pela Corporação dos Espectáculos.
Deve notar-se que, no caso presente, esta instância de recurso não foi sequer solicitada a pronunciar-se.
Primeiro ponto a sublinhar, o de que, aceite como indispensável perante as realidades da sociedade actual um sistema de defesa desta e montado tal sistema de forma equilibrada e racional, assegurados os recursos que afastem arbitrariedades, há .que acatar as suas decisões como se de um verdadeiro tribunal- se tratasse.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Segundo ponto a esclarecer, em definitivo, é o de saber quais os trâmites que conduziram à decisão final.
Esta, sublinha-se, foi tomada por unanimidade.
Numa primeira leitura, ainda sobre texto original, quatro vogais reprovaram e quatro aprovaram com reservas. Noa termos regulamentares, lida a peça por mais três vogais, votaram eles desfavoravelmente.
No clima que se pretende fazer crer que existe, aí teria morrido o assunto, com uma decisão por maioria, que aliás em nenhum caso e em nenhum aspecto diminuidora da decisão final. Mas não.

O Sr. Augusto Correia: - Uma decisão democrática, claro.

O Orador: - Mas não, dizia.

Procurando todos os fundamentos de uma possível revisão, promoveu-se a tradução do original, que a Comissão verificou em nada diferir dele, pelo que seria de manter a sua decisão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E foi-se ainda mais longe no mesmo esforço de assegurar o maior fundamento e correcção a uma deliberação final.
A Comissão reuniu perante a encenação prevista para a peça, levando-a em conta, e certamente porque, em vez de qualquer atenuação, apenas aumentou com ela a agudeza dos ângulos mais criticáveis moral e socialmente, a decisão por maioria transformou-se, perante o que seria A realidade do espectáculo, ma decisão por unanimidade que já referi.
Repito: divergências, houve-as em primeira leitura; tudo fez a Comissão, mesmo com risco da demora, filha apenas da sua boa vontade e de que agora se vê acusada, para esclarecer tais divergências. Superadas foram elas, construindo-se à vista do espectáculo uma bem compreensível unanimidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Desta forma funcionou um regime que existe, que se tem por muito fundamentado e se encontra claramente definido perante público, empresários e profissionais de espectáculos e que não é aceitável ver diminuído, desvalorizado ou posto em causa por aqueles a quem não agradem as consequências do seu funcionamento.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E esse regime tem mesmo funcionado de forma a permitir larga ampliação dos textos e espectáculos a que o pública português tem tido acesso nos últimos tempos, sendo, nomeadamente, ao abrigo dele reclassificados muitos espectáculos que vieram a ser autorizados.

O Sr. Cunha Araújo: - V. Ex.ª, dá-me licença? O Orador: - Faça favor.

O Sr. Cunha Araújo: - Muito obrigado pela interrupção que me consente.
Eu tive ontem ocasião de dizer ao Sr. Deputado Magalhães Mota, logo após- a sua intervenção; que a lamentava por entender que esta não estava nem à altura das sues possibilidades, nem V altura das suas responsabilidades.

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Eu não esperava a intervenção de V. Ex.ªs, neste sentido, e, por asso, aprovei-to a oportunidade para que esta minha declaração feita ao Sr. Deputado Magalhães Moto fique-a constar das actas desta cessão, até pelo que ela tem de lisonjeiro para ele, na medida em que revela bem o bom conceito em que o tenho.
Quanto ao mais, escusado será dizer que estou absolutamente solidário com a opinião que V. Ex.ª acaba de expressar mesta sua primorosa intervenção, no que julgo estar a ser acompanhado por toda a Câmara.
Muito obrigado.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Salazar Leite: - V. Ex.ª, dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Salazar Leite: -Srs. Deputados: Eu não' quis, de modo algum, interromper o Sr. Deputado Cotta Dias, porque quis também ouvir com cuidado e com toda a atenção as explicações que ele nos trouxe sobre o problema que ontem aqui se levantou e no qual não intervim directamente para que se não fosse Levantar questão a margem de um dos pontos que foi citado pelo Sr. Deputado durante essa discussão.
É evidente, Sr. Deputado Cotta Dias, que mão posso deixar de estar inteiramente de acordo com as observações feitos por V. Ex.ª, ontem, assim como mão posso deixar de lhe agradecer as elucidações que nos quis trazer e que vieram justificar, já não digo a indignação, porque indignação talvez não caiba bem dentro da maneira como nós nos devemos portar no mundo tão conturbado como o de hoje, e em que o sangue-frio está na base de todos os nossos raciocínios, mas, com espanto, admiro-me como haja a possibilidade de vir defender a apresentação de uma peça que eu não conheço inteiramente, mas cujas primeiras páginas de leitura (não a vi) me fizeram pô-la, de parte, um pouco talvez enojado, porque lançava porá a cena pública alguns dos mais graves problemas que afectam a Humanidade.
Eu não censuro, até acho que há toda A vantagem em que nos lugares apropriados estes problemas sejam discutidos em tese para que possam ser transmitidos, e por todos os meios, as conclusões das pessoas que os estudam e que, normalmente, devemos levar àqueles que não têm possibilidade de fazer um estudo detalhado do problema. Mas defender em público vícios, deficiências morais de uma sociedade que nós vemos dia a dia cada vez mais conspurcada, lançar para ò público como que o elogio do emprego de drogas narcóticas e de outra natureza, apresentar a outrem cenas que encaminham toda a acção de uma peça no sentido pornográfico, parece-me profundamente descabido e que merece - essa sim - profunda indignação e profundo desprezo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E nesse sentido, Sr. Dr. Cotta Dias, que eu me atrevi a pedir-lhe autorização para o interromper e de pedir àqueles que me escutam que tenham bem

presente que, se alguma vez pudemos falar dos malefícios das drogas (que hoje são tão propagados através do Mundo), venham a saber que as grandes potências estão extremamente preocupadas com a evolução que está tomando o uso e o abuso das drogas, chegando-se a afirmar que em alguns países tomou características de epidémico.
Qualquer luta, qualquer possibilidade que tenhamos de entravar a marcha, cada vez mais rápida, desse movimento, é sempre bem vinda, e não devemos nunca permitir que se possa vir a público fazer a apologia de qualquer dessas drogas, que, seguramente, estão provocando o desequilíbrio moral dentro da população deste universo.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Magalhães Mota: - Tendo a oportunidade que V. Ex.ª me dá, eu gastaria só um minuto num ligeiro esclarecimento.
O primeiro ponto - que eu breio ter deixado ontem bem claro -, é que não discutia duas coisas. A decisão - primeiro ponto -, e portanto julgo que não tem qualquer correspondência com aquilo que eu ontem tenha dito, qualquer espécie de apologia da droga. Por amor de Deus ... não vamos pensar nisso!
Segundo ponto: também não discuti a existência de uma comissão de exame e verificação de espectáculos. Não discuti estes dois pontos. Limitei-me a salientar três questões, e exclusivamente essas.
Primeira, que considerei positiva: saber-se que tinha havido uma peça proibida, que tinha sido proibida e por quem. Considerei isso um facto positivo, esclarecedor no ambiente nacional e um progresso assinalável em relação a uma situação difusa.
Segundo ponto: considerei que os motivos da proibição não poderiam ter sido, como se alegou, uma entrevista dada por um dos elementos ligados ao espectáculo.
Terceiro ponto: lamentei, e nesse ponto tive algumas concordâncias, o atraso da decisão.
Por aqui me fiquei. Não queria deixar de vincar este esclarecimento, que me parece extremamente importante, e, portanto, era apenas isto que gostaria que ficasse sublinhado. E também eu me congratulo com o facto de a opinião pública receber hoje mais esclarecimentos, o que talvez até devesse ter sido feito há mais tempo.

O Sr. Duarte do Amaral: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Duarte do Amaral: - O Sr. Deputado Magalhães Mota tem dado a esta Casa uma noção muito profunda da sua inteligência e do seu senso. E longe de nós pensar, e ele mesmo ontem aqui o sublinhou, que é partidário da droga. Simplesmente, a sua intervenção levou as pessoas que a leram no jornal e que o ouviram aqui, o ilustre Deputado Cotta Dias e a mim próprio, a ter muita pena dessa intervenção, que na realidade, como disse-o nosso ilustre colega Cunha Araújo, não correspondeu à altura em que o Sr. Deputado Magalhães Mota tem situado as suas intervenções, muito apreciadas, mesmo que não se concorde com as suas posições ideológicas.
No fundo o problema é só este: o Sr. Deputado Magalhães Mota veio falar do processo da peça, sem conhecer as peças do processo ...

O Orador: - Sr. Presidente: Estou a terminar, mas não 'queria faze-lo sem me regozijar com as interrupções de que a minha intervenção foi objecto. Mas, se me é per-

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mitido, e sem desmerecer das outras, aquela que particularmente me regozija é a do Sr. Deputado Magalhães Mota.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Tenho muito gosto em registar tais afirmações, proferidas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, embora eu não me atrevesse, nem tinha razões, para pôr em dúvida que fossem essas as convicções dele sobre a matéria.
Eu apenas quero frisar que com a minha interrupção de ontem e com a minha intervenção de hoje procurei esclarecer-me a mim próprio e com os esclarecimentos que obtive contribuir para o esclarecimento- de outros, mas sobre uma coisa não necessitava eu de ser esclarecido: o carácter, a maneira de ser e a formação do Sr. Deputado Magalhães Mota não permitem qualquer confusão com acusações como aquela de que S. Ex.ª, se estaria a defender sem eu o ter acusado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Dizia eu: funcionará assim bem - só o não vê quem não quer -, sem estreiteza de vistas, ao serviço do espectáculo em geral e do teatro em particular, como veículo de cultura. Mas para que tal se mantenha não se poderá deixar que se transforme em estendal de imoralidades um teatro que, como já a propósito deste caso se escreveu, "não se criou para alardear o que não deveria existir, porque, nessa funesta trajectória, não pode servir a cultura nem oferece recreio espiritual".

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar à

Ordem do dia

Discussão na generalidade da proposta de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros.
Para ler o relatório da nossa Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social tem a palavra o respectivo secretário, Sr. Deputado Amílcar Mesquita.

O Sr. Amílcar Mesquita: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mandada ouvir, nos termos regimentais, para se pronunciar sobre a proposta de lei n.º 18/X, relativa no emprego de trabalhadores estrangeiros, a Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social entende emitir o seguinte parecer:
1. Na ordem jurídica portuguesa o direito dos estrangeiros é definido pelo principio da equiparação condicionado pela regra da reciprocidade.
A situação dos estrangeiros em Portugal no domínio do direito público está regulada no § 2.º do artigo 7.º da Constituição Política, que consagra aquele principio, para o qual prevê, no entanto, certas restrições.
Assim, afasta o princípio da equiparação relativamente aos direitos públicos políticos - com a ressalva daqueles estrangeiros que exercem funções públicas predominantemente técnicas e a excepção feita aos brasileiros, nos termos do § 3.º do mesmo artigo ...

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados o favor de me deixarem ouvir o orador.

O Orador: - ... e aos direitos públicos não políticos que se traduzem num encargo para o Estado, salvo, quanto a estes, a verificação da reciprocidade de vantagens concedidas aos cidadãos portugueses.
Segundo a previsão da referida norma constitucional, o sistema da equiparação pode ser objecto de restrições em relação a certos direitos públicos.
A situação dos estrangeiros no campo do direito privado rege-se pela disposição do artigo 14.º do Código Civil, que estabelece, também, o sistema da equiparação limitado pela reciprocidade (artigo 14.º, n.º 2) ou, em certos casos, restringido o sistema ou, noutros, afastado mesmo, como acontece quanto aos casos do artigo 52.º da nossa Constituição, da proibição a estrangeiros da propriedade de navios de comércio portugueses e de embarcações de pesca, do exercício de certas actividades fundamentais para a economia nacional e de certas indústrias.
A restrição ou o afastamento do princípio da equiparação dos estrangeiros aos nacionais encontra-se no regime vigente do direito ao trabalho de estrangeiros na metrópole, cuja revisão a proposta de lei n.º 18/X, ora em debate, pretende atenuar, atento o condicionalismo actual do mercado de emprego e o desenvolvimento económico do Pais.
Efectivamente, o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 22 827, de 14 de Julho de 1938, estabelece que as empresas nacionais ou estrangeiras em território continental só podem ter ao seu serviço empregados de nacionalidade portuguesa enquanto se verificar a existência de desempregados.
Deste modo, a admissão de estrangeiros para trabalhar em Portugal depende, de autorização prévia do Ministro das Corporações e Previdência Social.
A autorização continua, porém, na proposta a ser requisito necessário à validade dos contratos de trabalho de estrangeiros celebrados com entidades patronais nacionais ou estrangeiras.
Daí que se devam tomar providências eficazes no sentido de ser regularizada a situação do trabalhador estrangeiro sempre que as entidades patronais os admitam sem estarem munidas da autorização prevista ou comunicarem a Direcção-Geral do Trabalho e Corporações e à Direcção-Geral de Segurança.
Esta proposta, ao contrário da lei vigente, não foz referência expressa a necessidade de requerer para os estagiários estrangeiros a dita autorização.
Parece-nos, contudo, que não se trata de lacuna da proposta de lei, pois que a situação pode, perfeitamente, enquadrar-se no n.º l da base I, uma vez que os estagiários estão ao serviço das empresas.
Mas, se assim não for entendido com fundamento na falta de contrato de trabalho por não caber ao estagiário uma retribuição, recomenda-se, então, ao Governo para contemplar a situação na altura em que regulamentar o n.º 3 do artigo 121.º do Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969, relativo ao contrato de aprendizagem.

. Nos termos regimentais, a discussão na generalidade de qualquer proposta versará sobre a sua oportunidade e a vantagem dos novos princípios legais e sobre a economia da mesma.
Quanto à economia, a proposta de lei em debate pretende:
a) Atenuar o carácter restritivo do regime jurídico em vigor relativo ao emprego de trabalhadores estrangeiros nas actividades económicas nacionais, estabelecendo o princípio mais amplo da sua admissibilidade ao serviço de entidades patronais no País, sem abstrair do respeito pelo princípio da prioridade, em condições análogas

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de formação profissional, da mão-de-obra nacional, como sucede, aliás, em todos os Estados (bases I e IV);
b) Reunir num único diploma legal o regime disperso pelos Decretos-Leis n.ºs 22 827 e 29 762, respectivamente, de 14 de Julho de 1933 e 19 de Julho de 1939, e- pelos despachos ministeriais de 18 de Janeiro de 1937 e 30 de Maio de 1941 (bases I e III);
c) Estabelecer regras que promovam e facilitem o aperfeiçoamento e simplificação do processo referente à prévia autorização (bases I, IV, V e VI).

Como sucede já no presente regime, a proposta de lei não prejudicará (nem poderia prejudicar por força da aplicação dos artigos 3.º e 4.º da nossa Constituição Política) as disposições sobre a matéria, decorrentes de tratado ou convenção (v. g. os acordos de emigração assinados por Portugal com a França, Alemanha, Países Baixos e Luxemburgo). Tão-pouco afasta a legislação especial referente ao exercício de profissões determinados.
Reportando-se à autorização para validade do contrato de trabalho subordinado, a proposta de lei, uma vez aprovada, não revogará os diplomas legais respeitantes ao exercício de profissões liberais, a saber:

Lei n.º 1976, de 10 de Abril de 1939 (médicos).

Lei n.º 1991, de 19 de Março de 1942 e Decreto-Lei
n.º 37477, de 9 de Julho de 1949 (engenheiros, arquitectos e outros técnicos).

Também não prejudica a seguinte legislação especial:

Decreto-Lei n.º 31 187, de 21 de Março de 1941 (jornalistas, pessoal de redacção das agências noticiosas, correspondentes de jornais e estações de radiodifusão estrangeiros).

Por sua vez, convém referir que há legislação a limitar o número de trabalhadores estrangeiros ao serviço de certas empresas portuguesas ou a limitar a sua ocupação ao nível de determinadas funções.
Contam-se a este respeito os seguintes diplomas:

Decreto-Lei n.º 39 188, de 25 de Abril de 1953, para a empresa T. A. P.;
Decreto-Lei n.º 88 246 - base XLVI anexa a este diploma, relativa à C. P.;
Decreto-Lei n.º 30 341, de 18 de Outubro de 1955, para a R. T. P.;
Decreto-Lei n.º 41 386, de 22 de Novembro de 1957, para as empresas concessionárias de tabacos (artigo 32.º);
Decreto-Lei n.º 41 812, de 9 de Agosto de 1958, para as empresas concessionárias de jogo;
Decreto-Lei n.º 42 641, de 12 de Novembro de 1959, para os estabelecimentos em Portugal de bancos estrangeiros (artigo 81.º);
Decreto-Lei n.º 23 986, de 9 de Junho de 1934;
Decreto-Lei n.º 34 355, de 19 de Novembro de 1960 (artigo 27.º).

3. A maior liberalização a introduzir no regime jurídico da ocupação de trabalhadores estrangeiros nas actividades económicas nacionais aparece, oportunamente, na altura em que o Governo mais empenhado está no rápido e progressivo desenvolvimento económico do País e quando se encaminha para a Comunidade Económica Europeia.
Ora o fomento nacional através da reorganização industrial e instalação de novas unidades económicas virá a exigir do mercado de emprego nacional mão-de-obra especializada e de certa qualificação profissional. A falta de resposta a essa exigência determinará, necessariamente, o recurso dos empresários a outros mercados de trabalho.
Não pode, porém, perder-se de vista a qualidade da mão-de-obra portuguesa existente para corresponder as necessidades da economia nacional, nem sequer subestimá-la em confronto idêntico com os trabalhadores estrangeiros.
Dispõe já o Ministério das Corporações e Previdência Social das estruturas do serviço de emprego e da organização do mercado de trabalho suficientes para permitir ao I. N. T. P., sem ofensa da prioridade a dar a mão-de-obra portuguesa com idêntica formação profissional, a decisão certa sobre a prévia autorização do trabalho qualificado de técnicos estrangeiros. Tal resultado é o que pode esperar-se da articulação estabelecida a nível central e regional, por despacho superior do Secretário de Estado daquele departamento governativo, entre o I. N. T. P. e o Serviço Nacional de Emprego.
Não se pense, por isso, que a faculdade prevista para o I. N. T. P. nesta matéria 4 incondicional ou inteiramente discricionária.
Neste ponto, a Comissão recomenda ao Governo que adapte e utilize os estruturas do Serviço Nacional de Emprego a fim de, em coordenação com o Secretariado Nacional da Emigração, ficarem constituídas as condições favoráveis ao retorno da mão-de-obra portuguesa a trabalhar no estrangeiro, designadamente dos profissionais qualificados, que viriam, assim, participar no desenvolvimento económico do País, com dispensa de trabalhadores estrangeiros de igual formação.
Como se afirma, não podem nem devem ignorar-se, no processo organizado para conceder a autorização em causa, as possibilidades oferecidas pelo mercado de emprego português.
Nos próprios países que estabeleceram entre si mercados de trabalho comuns através de uma maior liberalização dos movimentos de mão-de-obra ou de livre circulação de trabalhadores estão previstas restrições e normas de protecção para a mão-de-obra nacional.
Tenham-se em conta, a este propósito, os artigos 48.º e 49.º do Tratado de Roma, que instituiu a Comunidade Económica Europeia (Mercado Comum) e os correspondentes regulamentos sobre a livre circulação dos trabalhadores.
Na verdade, o referido artigo 48.º estipula certas limitações à liberdade de circulação dos trabalhadores, com _ fundamento no receio de se desencadearem migrações maciços de mão-de-obra, especialmente quando se verificasse nalgum dos países membros desemprego em mossa.
De facto, aquele artigo estabelece o princípio da realização gradual da livre circulação da mão-de-obra, enquanto o artigo 49.º determina que o Conselho fixará as medidas necessárias para a realização progressiva da livre circulação dos trabalhadores.
4. Nestas condições a proposta de lei n.º 18/X procura responder às perspectivas actuais da economia da Nação e aos compromissos susceptíveis de serem assumidos no futuro pelo Estado Português em organizações internacionais de carácter económico, ao consagrar o novo princípio da admissibilidade da ocupação de trabalhadores estrangeiros, limitado, embora, pela necessidade de manter a protecção do mão-de-obra portuguesa com idêntica formação, ao simplificar os mecanismos processuais da execução do princípio e ao dispensar, para certos casos, o regime a estabelecer.

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5. For fim, a Comissão entende adoptar o texto proposto no parecer n.º 38/X da Câmara Corporativa, à excepção do n.º 3 da base VI, cuja proposta de eliminação será apresentada na devida oportunidade, por tratar-se de matéria estritamente regulamentar, cuja formulação, por isso, deve caber ao Governo.
6. Nestes termos, Sr. Presidente, a Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social dá a sua aprovação na generalidade a proposta de lei n.º 18/X, relativa ao emprego de trabalhadores estrangeiros.
José dos Santos Dessa, presidente - Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso - Albano Vaz Pinto Alves - Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva - António da Fonseca Leal de Oliveira - Eleutério Gomes de Aguiar - Fernando David Laima - Jorge Augusto Correia - Lusia Neves Pernão Pereira Beija - Manuel Valente Sanches - Maria Raquel Ribeiro - Olímpio da Conceição Pereira - Ramiro Ferreira Marques de Queirós - Ricardo Horta Júnior - Rui de Moura Ramos - Teodoro de Sousa Pedro - Teófilo Lopes Frazão - Amílcar da Costa Pereira Mesquita, secretário e relator.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Sr. Presidente: Integra-se a proposta do Governo sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros na linha de uma política de liberação da circulação da mão-de-obra como elemento de aceleração e progresso para o desenvolvimento das actividades produtivas do País. Não se trata, evidentemente, de identificar livre circulação com mercado comum de trabalho. Se a livre circulação dos trabalhadores constitui um elemento importante na definição de um mercado comum de trabalho, não significa, porém, que seja tomada como um fim em si mesma, mias como processo de maior racionalização da produção e, portento, de elevação do nível de vida dos populações em vias de desenvolvimento e com relativo atraso tecnológico.
Não é difícil compreender que, mesmo por mais esforços desenvolvidos no sentido de diluir os barreiras que entre os vários mercados de trabalho existem, haverá sempre pontos de salvaguarda, para além dos quais não se poderá passar.
A regra, por exemplo, da prioridade ao mercado nacional para a mão-de-obra com idêntica formação profissional é transparente ou claramente enunciada nos quadros da legislação interna dos países e nos acordos ou trabalhos internacionais.
No entanto, a procura da mão-de-obra não nacional assume variados cambiantes, conforme se trata de países com níveis elevados de progresso ou, pelo contrário, se trata de países em vias de desenvolvimento e virados para um processo de expansão e diversificação económica.
Nós encontramo-nos na posição de recurso ao trabalho de estrangeiros por não possuirmos ainda a mão-de-obra nacional em número e devidamente qualificada indispensável & reestruturação e reorganização das actividades industriais ou outras ligadas aos sectores da investigação científica e ao lançamento de novas técnicas e equipamentos.
Ora, um processo de expansão económica implica a formação de técnicos altamente especializados e de trabalhadores qualificados que não se pode dispor em curto espaço de tempo e o desenvolvimento industrial e o progresso do País exige que andemos depressa.
Assim, não podemos pôr de parte a mão-de-obra estrangeira, a quem as empresas têm de recorrer, enquanto os quadros nacionais se não mostrem totalmente aptos às tarefas que lhes são exigidas. Por outro lado, aproveitando a experiência dessa mão-de-obra, os países poderão prosseguir com maior eficácia os seus planos de desenvolvimento, por forma a alcançar padrões dada vez mais elevados de produtividade, através de novas técnicas, modernização dos esquemas industriais e transferências de conhecimentos tecnológicos. Se parece por de mais evidente que será de aconselhar que se levem as fábricas para onde hajam homens, julga-se que tal medida é susceptível de atrair os capitais estrangeiros, dado que se torna possível utilizar mão-de-obra mais barata, permitindo uma redução nos custos de produção.
Concomitantemente, o recurso ao trabalho de técnicos e mão-de-obra especializada estrangeira verifica-se como uma alternativa desses investimentos, a fim de assegurarem a devida assistência e a sua viabilidade inicial ou futura. E não só as empresas estrangeiras ou com a participação de capitais nacionais utilizam essa mão-de-obra. As próprias empresas nacionais que querem proceder à sua reorganização, ao aproveitamento adequado de recursos não aproveitados, à racionalização de processos e métodos de trabalho têm necessidade de utilizar mão-de-obra qualificada e técnica estrangeira por deficiências estruturais do mercado de emprego nacional.
Esses trabalhadores qualificados ou técnicos ensinam e contribuem para a valorização da mão-de-obra nacional. A ilação que se pode tirar é que, por todos os meios ao nosso alcance, se quisermos competir nos difíceis momentos que nos aguardam, teremos de deixar de ser um país de mão-de-obra não especializada.
Adiante voltaremos, em breves considerações, a este momentoso e importante problema.
Estreitamente ligado ao desenvolvimento sócio-económico está o papel dos recursos humanos. Sem estes não pode haver desenvolvimento. O homem é o destinatário de todos os bens, mas é pela sua inteligência, pelo seu poder criador que se accionam as alavancas do progresso ao serviço das comunidades.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Daí, que os factores humanos assumam característica essencial na política de desenvolvimento social e económico dos povos.
As soluções que para tal se busquem devem reflectir perspectivas que facilitem e permitam as correcções dos assimetrias existentes nos condições de vida dos diversos estratos sociais.
Nos tempos de hoje as tarefas da produção e de direcção exigem uma adequada formação do trabalhador, do técnico ou do director.
A figura do dono de uma empresa, de quem emanam todas as decisões, é cada vez mais uma figura do passado e o trabalhador tende a especializar-se e preparar-se para subir na escala hierárquica, no desejo de completar os seus conhecimentos, por forma a poder participar coda vez mais e melhor na actividade da empresa. Perante tais transformações, havemos de concluir que se está a passar para uma concepção inteiramente diferente da vida empresarial, em que as exigências quanto à qualidade do trabalho assumem papel altamente relevante.
Ao trabalhador habilitado é-lhe proporcionado, deste modo, uma gama de possibilidades, desde o trabalhar bem no ofício que escolheu, a tornar-se apto a encarar as evoluções técnicas e operacionais da profissão e adaptar-se, se necessário, a novos processos de trabalho.
Em todos os tempos os trabalhadores não qualificados e, por vezes, até os semiqualificados foram, nas crises de trabalho, os mais atingidos. Ora, o avanço da técnica dos novos métodos de produção e de organização científica do trabalho estão a criar, sucessivamente, maiores dificuldades à colocação de mão-de-obra pouco qualificada,

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não só quando as migrações profissionais se dão entre sectores diferentes, mas também no interior de cada sector.
Por isso nem a indústria nem os serviços poderão absorver, sem qualquer preparação prévia, os excedentes da mão-de-obra não diferenciada. Acresce que o galopante crescimento do progresso técnico implica que os trabalhadores estejam aptos a compreendê-lo, o que exigirá aumento do nível da cultura de base, nova mentalidade e uma adequada formação técnica. Para tonto, há que intensificar e adaptar os programas de ensino nas escolas técnicas e dar h preparação e reconversão profissionais maior elasticidade nos seus circuitos e no integral aproveitamento das estruturas existentes, por forma a lançar-se no mercado de trabalho um maior número de mão-de-obra valida e especializada.

Este propósito tem de ser obra de todos, desde os Poderes Públicos, na definição de programas em que se estabeleçam critérios a seguir e se assegure a soía eficácia, até a própria participação, a vários títulos, das entidades empresariais na formação e selecção da sua mão-de-obra 13 certo que não se esgota só nestes aspectos a problemática do pessoal qualificado. A sua evolução teria de ser estudada em paralelo com outras evoluções, desde a demografia geral do País, do decréscimo da população urbana, do desenvolvimento das necessidades próprias de cada indústria, do desenvolvimento regional, da composição qualitativa do emprego.
Não nos iremos embrenhar nos contornos desta matéria. A sua importância é conhecida, e não há sociólogos, economistas e políticos que não tenham posto à reflexão atenta e à controvérsia elucidativa estes pontos básicos do processo humano de desenvolvimento sócio-económico.
Interessa-nos neste tipo de intervenção certos aspectos gerais do mercado de emprego português, para alinharmos algumas considerações finais sobre o recurso ao emprego de trabalhadores estrangeiros.
Na distribuição da população activa portuguesa por actividades notam-se certos desajustamentos entre as percentagens existentes na agricultura e nos outros sectores, secundário e terciário.
É certo que o volume da emigração a partir de 60 não podia deixar de se reflectir na população portuguesa, que no último decénio, conforme se lê no parecer da Câmara Corporativa, decresceu 2 por cento. Tal circunstância não deixou de ter as suas repercussões no mercado do trabalho nacional. Acentua-se a falha de trabalhadores nas mais diversas actividades. Mas a emigração tem facetas válidas, porque a emigração também tem e pode ter aspectos positivos, como impor a aceleração dos mecanismos da política social e o pagamento de salário justo, concluir a mais rápida modificação na mentalidade dos empresários, obrigados, deste modo, à racionalização dos métodos e estruturas de produção, concorrendo ainda para uma natural e salutar distribuição da mão-de-obra pelos sectores agrícola, industrial e dos serviços.
E compreende-se, por outro lado, que não são aconselháveis nem desejáveis os meios coercivos para reter a emigração, que procura lá fora mais favoráveis condições de vida. Há que travá-la através do desenvolvimento económico do País e a criação de novos empregos que permitam melhores remunerações e níveis mais elevados de promoção social.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Muito bem!

O Orador: - E também é preciso que se vão esbatendo as acentuadas assimetrias na repartição dos rendimentos. No entanto, na execução de planos de desenvolvimento, na montagem de novas empresas, na renovação de equipamento, tem-se mostrado útil e necessária a vinda, de pessoal estrangeiro especializado, na medida em que as características conjunturais do mercado de trabalho nacional não permitem responder satisfatoriamente às exigências que lhe vinham a ser formuladas pelas empresas. Todavia, dos relatórios que se conhecem acerca da distribuição da nossa população activa por actividades; dos taxas etárias de actividade da população económica activa; da distribuição da população activa por profissões, por níveis de instrução ou segundo as habilitações por sectores de actividade, o recurso à mão-de-obra estrangeira parece funcionar, em grande parte, por deficiências estruturais da nossa população activa.
Sendo assim, é mister, como já atrás se acentuou, que rapidamente se atinjam níveis de instrução satisfatórios da população activa e uma adequada e operacional formação de trabalhadores qualificados e altamente especializados. Havemos de convir que são, iniludilvelmente, acentuadas as carências de pessoal qualificado em' quase todos os ramos de actividade económica e em grande número de profissões e que o surto emigratório a partir de 1960 veio ainda agravar.
Deste modo o recurso à mão-de-obra estrangeira é .um factor útil imprescindível e até inevitável para o apetrechamento e desenvolvimento económico e social do Pais.
Eis, Sr. Presidente, ao que veio a louvável proposta do Governo, que se propõe, assim, alterar profundamente o sistema pelo qual se tem estado a processar a vinda de trabalhadores estrangeiros para o País.
Se não nos encontrarmos, por motivos óbvios, integrados em qualquer sistema de compensação internacional de oferta e de procura de trabalho, o que se reflecte, até, rã dualidade de legislação existente para a saída dos trabalhadores portugueses e para a entrada dos estrangeiros, o que é certo é que as medidas ora tomadas configuram uma política de liberação dos movimentos da mão-de-obra e estatuem ainda um regime mais consentâneo com as legislações dos países da Europa ocidental.
No direito do trabalho coexistem normas de direito público e de direito privado.
Daí que o Estado, por motivos de protecção ao trabalho nacional, saúde pública e segurança, intervenha na liberdade de circulação de trabalhadores, disciplinando e regulamentando, por forma especial, o modo de utilização da mão-de-obra não nacional. A igualdade de tratamento, salvo disposição legal em contrário, não sofre restrições de carácter geral.
Os direitos da família, a segurança social e as transferências de salários encontram-se asseguradas ou pela lei geral ou por acordos bilaterais. A garantia dos direitos dos trabalhadores estrangeiros é assegurada através do recurso para a autoridade administrativa e judicial e até para comissões mistas.
Em suma, a proposta de lei contempla, expressa ou implicitamente, os objectivos da liberalização na admissibilidade de ocupação de trabalhadores estrangeiros como veículo de expansão e progresso económico e social.
Segundo dados do F. D. M. O. o volume de estrangeiros que em 1960 trabalhavam em Portugal era de 12 101, o que representava 0,4 por cento da população nacional activa com profissão.
Por virtude da Convenção Luso-Espanhola de 1870, os Espanhóis têm um tratamento diferente, representando cerca de 47,6 por cento da totalidade da população estrangeira trabalhadora no comércio e indústria. Da repartição sectorial desta população anotamos o elevado número na actividade "Serviços" - 5000.

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Ainda aqui se faz sentir o elevado peso dos trabalhadores espanhóis, cujo número razoável se emprega na hoteleira.
Depois vinham o comércio, bancos, seguros e operações sobre imóveis. Nas indústrias transformadoras também era significativo o número de estrangeiros.
Esta, a traços largos, a estrutura da população activa estrangeira existente no mercado do trabalho português em 1960. De 1965 a 1966 o movimento de autorizações aumentou de ano para ano (não se incluem os espanhóis) entre 1965 e 1968. Em 1969 houve uma ligeira regressão. Também se verifica que o maior número de autorizações respeita a períodos de seis a doze meses. Isto permite concluir que os estrangeiros que vêm trabalhar para Portugal não se limitam, na sua grande maioria, a passagem fugaz pelas empresas portuguesas, antes se destinam ao desempenho de tarefas que exigem uma certa permanência de tempo.
Esta permanência deriva sobretudo da instalação de empresas estrangeiras ou de origem estrangeira com participação portuguesa, o que parece ter implicado a utilização de um número cada vez maior de administradores, gerentes e pessoal de chefia administrativo.
Depois vêm os inspectores técnicos de contas e os peritos em economia e finanças. Saindo do campo das actividades, económicas, encontramos duas profissões, em que o número de autorizações foi considerável: os professores e profissionais de espectáculos, com tempos diversos de permanência.
Em resumo, temos por profissões, e por ordem decrescente, os seguintes grupos de estrangeiros autorizados a trabalhar em Portugal:

a) Técnicos (assistentes, instrutores e montadores de máquinas e equipamentos diversos);
b) Administradores, gerentes e adjuntos;
c) Empregados de escritório especializados;
d) Directores, chefes de serviço e chefes de laboratório.

Não se duvida que o País tem necessidade de dotar as unidades económicas de pessoal melhor preparado, com vista a alcançar mais elevados graus de produtividade.
"Mas, o recurso a mão-de-obra estrangeira só é viável, entre nós, em fase do estádio de desenvolvimento do País em relação a profissões de nível técnico ou formação elevados, às quais é possível proporcionar condições de trabalho aceitáveis por trabalhadores estrangeiros e que sendo indispensáveis não encontram, pelas suas características, nacionais em condições de as desempenhar cabalmente, em número suficiente."
Posto isto, parece inegável que a mão-de-obra estrangeira tem sido útil, necessária e abe inevitável.
Daqui algumas conclusões podemos tirar:

1) Numa política de desenvolvimento económico e social, integrada num processo de desenvolvimento global, é preciso que o País disponha de uma população activa suficientemente evoluída a todos os níveis: pessoal dirigente, técnicos superiores, trabalhadores qualificados;
2) Que se imprimam aos esquemas de formação de base e- da formação profissional carácter mais vincadamente progressivo em termos de amplitude cultural e de aproveitamento total das estruturas existentes, precedendo um estudo e planeamento das necessidades e disponibilidades do País em matéria de mão-de-obra;
3) Que se promova a ligação entre a Universidade e a indústria no sentido de apoio desta à fábrica, e no acesso viável de mais amplas camadas profissionais ao ensino técnico e superior;
4) Que se criem bases para um desenvolvimento real e rápido, em todos os aspectos, de todas as regiões do País, por forma a estruturar a mão-de-obra e a prepará-la profissionalmente.

Sr. Presidente: É altura de dar por findas as minhas considerações na generalidade sobre oportuna proposta de lei que o Governo, pelo Ministro das Corporações e Previdência Social, submeteu à apreciação desta Câmara. Não quero deixar de aludir ao bem documentado e fundamentado parecer da Câmara Corporativa, que proporcionou valiosos elementos de estudo comparado.
A Câmara opina algumas alterações, a que, em principio, darei o meu acordo. A sua apreciação melhor cabimento terá na discussão que se fizer na especialidade.
Há um ponto que não me parece que a Câmara siga na esteira das melhores regras hermenêuticas. De facto, a alteração proposta pela Câmara quanto ao n.º 3 da base VI assume nítida competência regulamentar.
Á lei devem presidir os princípios gerais, deixando para o regulamento os planos de especialidade que cabem à esfera do Executivo. A excessiva preocupação em introduzir nas leis matéria especificamente regulamentar não corresponde as directrizes constitucionais que apontam os regras gerais ou linhas de orientação á que devem obedecer as leis. Mas reserva-se para a especialidade o mais que se entender sobre este assunto.
Dou, assim, Sr. Presidente, a minha aprovação na generalidade à presente proposta de lei, que procura, fundamentalmente, dar expressão legal à importante alteração das circunstâncias em que se baseou o regime que vem desde 1933 sobre o trabalho de estrangeiros em Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: A livre circulação de trabalhadores através das fronteiras dos Estados constituiu um dos aspectos mais característicos da economia liberal internacional do século XIX; entro 1846 e 1914 cerca de 43 milhões de pessoas abandonaram a Europa para se instalarem no Novo Mundo.
Já muito antes Portugal participara nessa movimentação de gentes para o continente americano, pois que, estimando-se a população do Brasil em cerca de 57 000 pessoas pouco após o seu adiamento, lá pelo ano de 1576 a vira quadruplicada até final do século e acrescida para 1,9 milhões de presenças em 1776, para 10 milhões em 1872 e para 18 milhões nos começos deste século XX.
Actualmente serão mais de 90 milhões de brasileiros a ajudarem a compor, substancialmente, essa promissora comunidade luso-brasileira, se todos soubermos ajudar a construir. Tempo virá em que a língua de Camões seja falada por meio milhar (ou mais) de milhões de luso-descendentes pelo Mundo dispersos.
Pode afoitamente afirmar-se que a expansão demográfica e económica das Américas (e de outros continentes ou territórios) não poderia ter-se verificado no ritmo em que se processou sem o afluxo incessante de trabalhadores, técnicas e capitais europeus.

1 F. D. M. O. - Trabalho de Estrangeiros em Portugal, de Fernanda L. Marques Guimarães.

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A partir de 1921 foram promulgadas, porém, nos Estados Unidos da América leis sobre quotas de imigração, que haveriam de assinalar o início de uma era de restrições à livre circulação de trabalhadores não nacionais.
O nacionalismo económico e demográfico acabou por generalizar-se à maior parte dos países, através de um processo de licenciamento de trabalho que haveria de volver-se numa quase proibição de circulação de trabalhadores e seus familiares: de 1650 milhares de indivíduos migrando transoceânicamente entre a Europa e as Américas em cada ano do período 1911-1914 desceu-se para uma média de 750 milhares em 1919-1920, para 300 milhares em 1929-1932, tornando-se quase insignificante a partir de 1933.
Também nós, os Portugueses, de algum modo conhecemos e experimentámos essas fases de emigração - e, se dúvida houvera, consulte-se para aclaramento esse douto parecer que da Câmara Corporativa a nós chega, a acompanhar a proposta de lei n.º 18/X, sobre semprego de trabalhadores estrangeiros".
Bem pode dizer-se, como Wilhelm Ropke, que as severas limitações ao movimento dos pessoas constituíram um dos grandes paradoxos da época contemporânea (Ropke, Wilhelm - Loa migrations internationales et loura entraves. Geneve, 1959, p. 81):

Ao passo que a nossa civilização se tornava verdadeiramente universal, e o génio humano obtinha um dos seus maiores triunfos ao encurtar as distâncias, o número de migrantes internacionais quedava-se aquém do nível do passado recente, em que as migrações representavam ainda uma longa, penosa e dispendiosa viagem para países estranhos ou desconhecidos, ou mesmo uma aventura nas solidões inexploradas.

Assim iam os tempos...
As causas principais destas limitações à livre circulação de trabalhadores deviam-se, sobretudo, a obstáculos levantados pelas legislações e práticas administrativas dos países de recepção de migrantes.
Um dos argumentos sobremodo invocados foi a necessidade de proteger os nacionais em seu "mercado de trabalho" - passe a expressão, por consagrada. Subemprego latente ou desemprego declarado bem podem ter justificado nesses tempos a adopção de medidas restritivas quanto à aceitação de mão-de-obra estrangeira.
Mas os tempos mudaram, os condicionalismos algo também. E a legislação restritiva, que teve sua época e justificação, acabou por mostrar-se nitidamente desfasada quanto a 'Situação conjuntural do emprego e das ideologias por via do desenvolvimento económico e do progresso cultural e social do pós-guerra.
As tendências que então se desenhavam, e mais tarde se afirmaram, no sentido de atenuação do nacionalismo económico, de cooperação internacional, da própria integração de espaços e economias, de instalação de estabelecimentos industriais, comerciais ou agrícolas em outros Estados, de multiplicação de empresas multinacionais, haveriam de conduzir à liberalização do regime de condicionamento à circulação de pessoas, bens ou serviços e capitais.
Podem disso ser exemplos, neste continente europeu, berço de civilizações, certas fórmulas de coordenação de economias nacionais, como as zonas de livres trocas, as uniões aduaneiras, ou mesmo de integração económico-social.
Como já alguém escreveu:
A zona de livre câmbio não implica a livre circulação, de mão-de-obra; é nítida a sua configuração de mera associação de índole comercial, que, longe de exprimir uma tendência para a fusão dos economias, apenas supõe um maior estreitamento, através de uma fórmula cooperativa, dos vínculos de comércio internacional estabelecidos enfare os países participantes.
Em rigor, uma união aduaneira não exigiria também a livre circulação de trabalhadores. Há exemplos históricos de agrupamentos deste tipo que se limitaram ao laisser passcr no plano das mercadorias.

Porém, o Tratado da Comunidade Económica Europeia, actualmente em vigor na chamada "Pequena Europa", a querer pesquisar novos caminhos de dilatar-se, não instituiu uma pura união aduaneira, mas uma verdadeira união económica e de algum modo social também.
Não é de surpreender, portanto, que, a par de um título sobre "A livre circulação das mercadorias", o Trotado de Roma haja incluído um outro acerca de "A livre circulação dos pessoas, dos serviços e dos capitais", que não tem correspondência com qualquer das disposições da Convenção de Estocolmo que instituiu a Associação Europeia de Comércio Livra (E. F. T. A.), ora em crise de transformação, se não mesmo em vias de desaparecimento.
Mas voltemos atrás e ao termo da 2.ª Grande Guerra Mundial.
As tendências que então se verificavam para a atenuação do nacionalismo económico e o restabelecimento de uma orientação algo mais liberal em matéria de economia internacional não podiam deixar de ter repercussões no domínio da movimentação da "mão-de-obra" e "cérebros", de trabalhadores, numa palavra.
Compreendem-se os receios que uma livre circulação de trabalhadores poderia suscitar para os países de origem das migrações, em termos de desertificação dos espaços e rarefacção da mão-de-obra, com os inevitáveis incrementos de salários e imposição a mudança de organização e métodos, de tecnologias; ou, para os países de recepção de migrantes, em termos de atenuação dos privilégios de que desfrutam es trabalhadores nacionais em seu próprio mercado, por virtude agora da concorrência de indivíduos de mais baixo teor de vida e exigências económico-sociais.
Simplesmente, os condicionamentos às migrações não resolvem os problemas de fundo das economias e sociedades em vias de internacionalização: tal como as jovens plantas criadas ao abrigo da luz solar, cedo estiolam o acabam por definhar, assim o mesmo se possa com os organismos, sociais e as economias nacionais quando receosamente se pretenda preservar, confinado às suas próprias fronteiras, o seu débil desenvolvimento.
Impunha-se, portanto, a criação de um mercado, mais livre de trabalho, por forma a que o indivíduo pudesse deslocar-se, sem excessivos entraves, atiravas das fronteiras dos Estados.
E se muitos estão de acordo ser desejável que os- pessoas possam viver em condições que tornem natural uma vida sedentária ou geograficamente estabilizada, haveremos de convir e reconhecer razões porá que os trabalhadores possam deslocar-se e procurar emprego, se assim o desejarem. Eles e seus familiares não devem suportar gravosamente as custas de um processo que resultou do froco ritmo de desenvolvimento económico e de progresso social das nações.

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14 DE ABRIL DE 1972 3593

É evidente que deslocações maciças de trabalhadores não constituem o remédio ideal para a resolução dos problemas de excedentes de mão-de-obra ou carências de emprego de economias em atraso no processo de expansão ou reconversão.

Solução mais indicada consistiria sempre em activar o crescimento económico e o progresso social através de uma política de fomento de criação de riquezas e de postos de trabalho e melhor repartição de rendimentos. Bar tal, bem pode impor-se à consideração de governantes e empresários um apelo a colaboração de conhecimentos, de cultura e arte, de ciência e técnica: de trabalhadores e capitais estrangeiros - que venham ensinar a promover o próprio desenvolvimento, a valorizar economias, a enriquecer civilizações.
No caso português, estaria, aliás, no seguimento das mais lídimas tradições nacionais: quantos vultos estrangeiros- não passaram às páginas da história pátria nos períodos da conquista e reconquista, da afirmação de humanidades, no perscrutar o futuro e devassar "mar tenebroso", de valorização da terra e economia portuguesas.
Recordar apenas quero nesta hora ... flamengos e bretões, mestres que ajudaram a tomar célebres Universidades de antanho, cartógrafos e mareantes da escola de Sagres, comerciantes ingleses estabelecidos nas feitorias do Douro ...
Nesta hora de revisão de alguns dos fundamentais diplomas legislativos da- Nação que contemplam actividades económicas e de que quero lembrar já nesta legislatura, os da "actividade teatral" e "protecção do cinema nacional", "natividades de seguros e resseguros", "defesa de concorrência" e "fomento industrial", bem justificado fica que até nós chegue essoutra proposto de lei sobre "emprego de trabalhadores estrangeiros". Tem-se assim por oportuna a sua apresentação.
Não receemos uma "invasão" de europeus ou de outros povos, aliás, mediana ou altamente desenvolvidos.
O nível de crescimento económico e de progresso social (com algumas sombras a mistura ...) já alcançado não fará remeter da Europa para Portugal grandes massas de trabalhadores migrantes estrangeiros.
Chegam-nos, sim, em revoadas, os turistas, mas, tal como as andorinhas, vêm e vão em cada ano, gozando as delícias do sol, terra e hospitalidade portugueses.
Mais natural é que nos surjam essas grandes "massas" de trabalhadores migrantes manuais do vasto espaço económico e demográfico ultramarino, se aí se não incrementar devidamente o ritmo de desenvolvimento económico e de multiplicação de empregos.
Virão dar vida e cor às nossas ruas e populações, substituir os trabalhadores que se foram deste "cantinho a beira mar plantado" e insuficientemente valorizado, partidos ultimamente - não direi já à aventura, mas cônscios de possibilidades - para terras da Flandres, a ajudar a erguer com pelle et pioche e demais ferramentas e maquinismos aquelas edificações e actividades que tanta falta nos fazem nos domínios da "construção" e "indústrias transformadoras" ... ou não fossem, no conjunto das nossas importações, cerca de 55 milhões de contos para o estrangeiro, como nos lembram os pareceres sobre as contas gerais do Estado de 1970 (v. Parecer sobro Contas Gorais do Estado de 1970. Metrópole, p. 78, e Ultramar, p. 13), para pagar bens daí oriundos sem contrapartida devida nas exportações.

Compreende-se assim a tónica posta pelo Governo e por esta Assembleia recentemente aprovada, de que

BASE IV

1. À política industrial do Governo visará as seguintes finalidades fundamentais:

c) Estimular a projecção da indústria nos mercados externos;

isto sem descurar a produção para consumo interno que possa substituir muitas das nossas importações - se até os lápis e borrachas de que se servem muitas das nossas crianças em escolaridade alargada nos chegam do estrangeiro, que dizer, dessoutros materiais mais elaborados requeridos pelas mais progressivas formas, como as do ensino audiovisual? E muitos dos outros bens das actividades transformadoras?
Estive quase com vontade de sugerir que responsáveis da nossa administração pública ou privada viessem às câmaras da TV, aos postos de rádio ou aos prelos dos jornais informar o País e seus empresários, presentes ou potenciais, das necessidades de produção de bens para satisfazer procuras quase garantidas.
Não seria essa uma das formas possíveis, pela via da I formação, de estimular projectos de instalações industriais, de "impulsionar o ritmo de crescimento da produção industrial"? [Alínea a) da mesma base IV da lei.]
Mas voltemos aos trabalhadores migrantes e passemos dos aspectos quantitativos de emigração "de massa" aos qualitativos de imigração reduzida e "qualificada".
Diverso poderá ser o entendimento em termos qualitativos quanto à necessidade de mao-de-obra especializada e, sobretudo, de técnicos ou artistas estrangeiros - pelo que se impunha, para além da introdução de "aperfeiçoamento e simplificações nos processos burocráticos" de autorização de trabalho de não nacionais, a revisão de "um regime legal iniludivelmente adverso à generalização do acesso de estrangeiros ao nosso mercado de emprego", como era o definido pelo Decreto-Lei n.º 22 827, de 14 de Junho de 1933, promulgado em pleno período restritivo de condicionamento legal da imigração.
Não deixando de reconhecer "a vantagem dos novos princípios legais" formulados na proposta governamental, seria- coso de inquirir como se irá processar a concessão das correspondentes autorizações, bem como a legislação do emprego ocasional ou temporário de trabalhadores estrangeiros sempre que existam, ou possam existir, trabalhadores disponíveis com idênticas ou equivalentes qualificações no mercado nacional; ou se não seria conveniente procurar fórmulas que possibilitassem a integração desses conhecimentos alheios na cultura e ciência nacionais, através da presença de profissionais portugueses que participassem do trabalho da reflexão e elaboração mental e do esforço físico ou criativo-artístico desses trabalhadores estrangeiros - mas tudo isso pode vir a ser objecto de tratamento na apreciação na especialidade.
Relativamente a este último aspecto, a Comissão de Apreciação da Actividade de Estrangeiros da Ordem dos Engenheiros, em informação relativamente recente sobre o problema, chegou mesmo a formular, por exemplo:

Todas os empresas que exerçam a sua actividade em Portugal, ainda que a sua sede seja localizada no estrangeiro e queiram ter ao seu serviço técnico estrangeiros, deverão contratar um português com

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habilitações equivalentes, que actuará como assistente do estrangeiro e seu primeiro colaborador directo.

Assim se daria uma certa integração de conhecimentos e técnicas estrangeiros no património cultural, científico e tecnológico português.
Mas tudo isso e outras matérias bem podem ser objecto de regulamentação que melhor cuide de alguns problemas a resolver, se abrangidos, porventura se não encontram nessa "legislação especial:", a que se refere a base VIII desta proposta de lei n.º 18/X - Emprego de trabalhadores estrangeiros, ou não caibam dentro dos cláusulas de reciprocidade ajustadas, ou que venham a ajustar-se, entre Portugal e qualquer outro país.
E por aqui me fico, dando a minha aprovação na generalidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.
O debate continuará na sessão de amanhã, que será iniciada à hora regimental e terá como ordem do dia a continuação, e espero que conclusão, da discussão na generalidade da proposta de lei sobre o emprego de trabalhadores estrangeiros. No caso de se concluir a discussão na generalidade, iniciar-se-á imediatamente, e far-se-á o possível por acabar dentro da mesma sessão, a discussão na especialidade e votação da proposta de lei.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Dias de Araújo Correia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Finto Costa Ramos.

Sr. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre José Linhares Furtado.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Júlio dos Santos Almeida.
Armando Valfredo Pires.
Delfim Linhares de Andrade.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Augusto Santos e Castro.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Guilherme de Melo e Castro.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Elias Trigo Pereira
Manuel Marques da Silva Soares.
Manuel Valente Sanches.
Pedro Baessa.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.

O REDACTOR - José Pinto.

Requerimento enviado para a Mesa durante a sessão:

Ao abrigo do Begimento da Assembleia Nacional, requeiro que me seja fornecida cópia do relatório do grupo de trabalho para a programação dos novos, centros produtores de energia.
Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 13 de Abril de 1972. - O Deputado, António da Fonseca Leal de Oliveira.

IMPRENSA NACIONAL

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