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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 206

ANO DE 1972 13 DE DEZEMBRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.º 206, EM 12 DE DEZEMBRO

Presidente: Ex.mo Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários Ex.mos Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

Nota. - Foi publicado um suplemento ao n.º 804 do Diário das Sessões, que ingere o parecer da Câmara Corporativa n.º 45/X relativo ao Acordo entre os Estados Membros da Comunidade Europeia, do Carvão e do Aço e a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, por um lado, o a República Portuguesa, por outro lado, e ao Acordo entre a Comunidade Económica Europeia e a República. Portuguesa.

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - foi aprovado o n.º 204 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
Para cumprimento do disposto no- § 3.º do artigo 109.º da Constituição foram presentes os Decretos-Leis n.ºs 492/72, 495/ 72, 498/72, 500/72, 501/72 e 504/72.
Foi lida uma nota do perguntas apresentada pelo Sr. Deputado Oliveira Ramos.
O Sr. Deputado Peres Claro apresentou um requerimento.
O Sr. Deputado Linhares Furtado usou da palavra para tratar de assuntos relacionados com a assistência medica, nomeadamente dos doentes sem meios e cujos males não têm possibilidades de tratamento no nosso pais.
O Sr. Deputado Baptista da Silva analisou pormenorizadamente o problema dos transportes colectivos em Lisboa.
O Sr. Deputado Barreto de Lara focou vários problemas de política geral, nomeadamente a concessão de uma nova amnistia.
O Sr. Deputado Dias das Neves teceu várias considerações acerca da política de desenvolvimento regional no distrito da Santarém.
O Sr. Deputado Alberto de Alarcão agradeceu uma comunicação do Sr. Secretário de Estado da Instrução e Cultura acerca do reconhecimento da assinatura dos encarregados de educação nos boletins de inscrição liceal.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1973.
Usaram da palavra os Sr s. Deputados Correia da Cunha, Moura Ramos, Eleutério de Aguiar, Gaspar de Carvalho, Ávila de Azevedo e Valente Sanches.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 5 minutos.

Texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção.
Decreto da Assembleia Nacional sobre prestação de avales pelo Estado.

O Sr. Presidente: -Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Beis Júnior.
Alexandre José Linhares Furtado.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.

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António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Lopes Quadrado.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
Delfim Linhares de Andrade.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João José Ferreira Forte.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
Joaquim de Pinho Brandão.
José Coelho de Almeida Cotta.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Lute António de Oliveira Ramos.
D. Luzia. Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Valente Sanches.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Pedro Baessa.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rui de Moura Ramos.
Rui Pontífice Sousa.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 76 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.° 204 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum de VV. Ex.ªs deseja usar da palavra para rectificações a este Diário das Sessões, considerá-lo-ei aprovado.

Pausa.

O Sr. Presidente:-Está aprovado o n.° 204 do Diário das Sessões.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

De vários professores e educadores do ensino especial apoiando a intervenção do Sr. Deputado Eleutério de Aguiar de 28 de Novembro.
Do Sindicato Nacional de Telecomunicações e Radiodifusão apoiando a intervenção do Sr. Deputado Pinto Balsemão na sessão de 7 de Dezembro.
Do Sr. Rufino Henriques apoiando o Sr. Deputado Miller Guerra pelo seu discurso de homenagem ao Sr. Dr. Melo e Castro.
Da direcção do Externato tia Luz, da direcção do Colégio dos Padres Jesuítas de Santo Tirso, do Colégio Teresiano, do director do Externato de Alcácer do Sal, da directora è professores do Colégio Luso-Britânico, das Irmãs Doroteias do Externato do Parque, da directora e professores do Colégio de Santa Teresa, da direcção da Federação dos Institutos Religiosos Femininos, das Irmãs Doroteias, da direcção da Associação dos Pais do Colégio do Sagrado Coração de Maria, da direcção do Colégio do Sagrado Coração de Maria e dos Srs. João Paulos, Adelino Pires, João Vitória, Diamantino José, Hermínio Gonçalves Carneiro, António J. de Fraga, José da Costa, António Augusto Tomé e Dias de Sousa apoiando os discursos dos Srs. Deputados José da Silva e Agostinho Cardoso acerca do ensino particular.
Da Sr.ª D. Mercinha Tojinha e António João Chula, da Sr.ª D. Maria José Viegas dos Santos, do Sr. António Maria Candeias, da Sr.ª D. Helena Rodrigues, da Sr.ª D. Fernanda, da Sr.ª D. Teresa, do Sr. Filipe Assunção Rodrigues, do Sr. Raul Rodrigues e vários sem identificação pedindo amnistia para os presos políticos.
De um grupo de trabalhadores bancários protestando contra n possível aprovação do projecto de lei sobre a revisão: do regime de rendas dos prédios de habitação em Lisboa e Porto.
De um grupo de inquilinos da Amadora agradecendo as intervenções que venham a ser feitas contrárias aos aumentos das rendas de casa.

Cartas

Dos Srs. José Gaspar da Conceição Pinho, Armindo Ferreira. Pingalho, José Soares de Pinho, D. Maria Fernanda Pinho dos Reis, Félix da Costa Pinho, D. Ermelinda da Conceição Soares Pinto, Alberto da Conceição Pinto e José dos Reis Gervásio pedindo amnistia para diversos presos políticos.
Do Sr, Armando Bacelar apoiando as intervenções dos Srs. Deputados Sá Carneiro, Pinto Balsemão e Magalhães Mota.

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Da família de Maria Teresa Tengarrinha Dias Coelho acerca das condições da sua detenção e interrogatórios.

Do Sr. Raul Martins Ruivo acerca do imposto sobre os automóveis não utilitários.

Da Companhia Industrial de Cimentos do Sul, S. A. R. L., acerca da intervenção do Sr. Deputado Leal de Oliveira na sessão de 28 de Novembro.

Do Sr. António Mestre de Azevedo acerca das intervenções dos Srs. Deputados Henrique Tenreiro e Agostinho Cardoso.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa, enviados pela Presidência do Conselho, para cumprimento do disposto no § 3.° do artigo 109.° da Constituição, os n.ºs 284, 285 e 286 do Diário ao Governo, l.ª série, datados de 7, 9 e 11 do corrente mês, que inserem os seguintes decretos-leis:

N.° 492/72, que torna extensivas às forças armadas no ultramar e aos funcionários civis nelas prestando serviço as disposições contidas no Decreto-Lei n.° 457/72, de 15 de Novembro, respeitante à atribuição de um suplemento eventual de ordenado ou pensão no mês de Dezembro de 1972;

N.° 495/72, que altera o quadro do serviço geral do Exército, estabelecido no Decreto-Lei n.° 42 314, de 15 de Junho de 1959;

N.° 498/72, que promulga o Estatuto da Aposentação;

N:° 500/72, que introduz alterações na redacção do Decreto n.° 45 814, de 14 de Julho de 1964, respeitante ao regime aduaneiro dos contentores e da Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei n.° 46 311, de 27 de Abril de 1965;

N.° 501/72, que altera o quadro dos oficiais do serviço geral da Armada;

N.° 503/72, que confere o direito à aposentação a todo o pessoal que actualmente presta serviço em tempo integral na Obra das Mães pela Educação Nacional;

N.º 504/72, que acresce de vários lugares os quadros de pessoal administrativo das Escolas Superiores de Belas-Artes de Lisboa e Porto.

Vai proceder-se à leitura de uma nota de perguntas, enviada para a Mesa pelo Sr. Deputado Oliveira Ramos.

Foi lida. É a seguinte:

Nota de perguntas formulada pelo Sr. Deputado Oliveira Ramos.

Nos termos do Regimento, pergunto ao Governo, através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, qual a posição actual do Executivo em relação à Conferência de Segurança Europeia, agora na sua fase preparatória.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 29 de Novembro de 1972. - O Deputado, Luís António do Oliveira Ramos.

O Sr. Presidente: - Informo VV. Ex.ª de que, no abrigo da alínea a) do artigo 31.° do Regimento, designei para constituírem a deputação da Assembleia Nacional à conferência interparlamentar sobre a cooperação e a segurança europeias, a realizar em Helsínquia no mês de Janeiro próximo, os Srs. Deputados Franco Nogueira, Roboredo e Silva, Sal azar Leite, Neto de Miranda e Mota Amaral.

Tem a palavra, para um requerimento, o Sr. Deputado Peres Claro.

O Sr. Peres Claro: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte

Requerimento

Ao abrigo do Regimento, requeiro que, pelo Ministério da Educação Nacional, me seja informado:

1.º Quantos lugares há criados de leitores de Português no estrangeiro;
2.º Quantos desses lugares estão preenchidos;
3.° Quantos dos lugares preenchidos o estão por professores portugueses;
4.° Havendo Lugares vagos, que razões têm impedido o seu preenchimento.

O Sr. Linhares Furtado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Um problema aqui levantado há alguns dias pelo Sr. Deputado Almeida e Sousa, com a dignidade, o calor humano e a eloquência que lhe são próprios, merece algumas considerações adicionais, que caberão dentro do próprio desejo daquele Deputado de que o assunto fosse retomado.

O assunto é o dos doentes sem meios, cujos moles não têm possibilidades de tratamento no nosso país.

As rainhas considerações pouco mais serão do que o simples testemunho de um médico, na medida em que tem oportunidade de contactar com doentes que pretendem ser tratados no estrangeiro ou que já foram lá tratados e também de um médico que já sentiu o desgosto de ver, em centros estranhos, não poucos doentes, para os quais não haveria a menor justificação do recurso à medicina de outros países.

Deixo as considerações humanitárias, que por certo estarão no espírito de todos nós e na minha acção; eu próprio já auxiliei muito (e voltaria a fazê-lo nas mesmas condições), pelo menos um doente, em andanças pela Grã-Bretanha, movido unicamente por razões humanitárias, já que o seu mal era, e foi, infelizmente, tão irremediável aqui como lá.

Mas a convicção de muitos dos que vivem num país, em geral tecnologicamente atrasado, é a de que também no medicina esse atraso é apreciável e daí as esperanças e a confiança, tantas vezes quase infantis, que depositam nas técnicas e nas aparelhagens que supõem não possuirmos.

Seria injusto não referir um dado de observação pessoal - as dificuldades de natureza psicológica e moral que alguns desses doentes sentem em ambiência tão diferente da sua.

O problema posto restringe-se aos doentes sem meios materiais, que terão necessidade de um recurso à medicina estrangeira. O Sr. Deputado Almeida e Sousa afirmou que "não serão, porventura, muitos". Creio que serão mesmo muito poucos os que naquelas condições poderão encontrar somente "lá fora", como se diz, o tratamento que não é possível ministrar cá dentro.

Durante a primeira das minhas estadas na Grã-Bretanha, de quase oito meses, vi oito doentes portugueses serem lá tratados e soube de outros tantos. Dos que vi, apenas um procurou com justificação médica tratamento fora do País, por se tratar de um caso de cirurgia que realmente se não realizava ainda, aquela dota, em Portugal.

Na minha, clínica privada, ainda que o exerça há poucos anos, a experiência bem sido exactamente a mesma.

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Na, verdade, penso que se poderão encontrar ao todo uns dois ou, no máximo, três ramos de actividade médica, em que casos especiais e excepcionais poderão beneficiar de recursos que não possuímos Não creio que tal montante de doentes se traduza em encargo importante para o Estado, mas é evidente que a existência ou a criação de um fundo especial ou de disposições legais para esse fim deverá atender a princípios essenciais.

É, com efeito, fundamental que o doente tenha realmente necessidade de ser tratado fora do Pais. Isso pressupõe, antes do mais, o conhecimento das possibilidades técnicas do meio nacional, que não pode ser deixado ao critério de um médico às vezes afastado da especialidade em causa ou, pior ainda, deixado ao acaso dos conhecimentos e influências de leigos.

A solução é muito simples. Todo o doente, supostamente naquelas condições, apresentaria na instituição oficial de assistência mais próxima um relatório passado pelo médico responsável pela sugestão. Automaticamente o caso seria apreciado por uma comissão ou conselho médico nacional da especialidade em causa, o qual, verificando a impossibilidade de tratamento no País, escolheria o centro mais apropriado no estrangeiro. Se a situação tivesse remédio em Portugal, o doente seria acolhido no centro qualificado mais próximo da área da sua residência.

A constituição desses conselhos médicos deveria englobar especialistas reputados dos três centros universitários da metrópole e dos principais hospitais centrais. Tais conselhos deveriam ser amplos na sua constituição, ainda que para a apreciação de cada caso se reunissem obrigatoriamente apenas os três membros com as maiores qualificações profissionais, um por cada centro, cabendo-lhes o direito de ouvirem as opiniões de parte ou de todos os restantes membros ou mesmo de colegas alheios ao conselho.

As vantagens de tal orientação transcenderiam as da simples economia.

O Sr. Agostinho Cardoso: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Estou a ouvir com imenso interesse as suas considerações e a concordar com elas. Apenas há um pequeno pormenor a considerar: seria necessário que esses conselhos, que se pronunciariam acerca da ida ao estrangeiro ou não dos doentes ou acerca do seu internamento em estabelecimentos portugueses, tivessem, em primeiro lugar, um prazo obrigatório para darem a sua opinião, para não acontecer os doentes morrerem antes da decisão; em segundo lugar, que fosse assegurado, imediatamente a seguir ao parecer, o internamento.

O Orador: - Muito agradecido, Sr. Deputado, e concordo plenamente com essas sugestões, que viriam a aperfeiçoar este possível sistema.

Tenho verificado, com surpresa, que grande número de emigrantes, por vezes já razoavelmente radicados e do, minando até as línguas dos países em que foram labutar, vêm a Portugal com o objectivo de ouvirem um médico português. E tenho-os inquirido sobre essa atitude. Há de tudo - maior, confiança em nós, inadaptação ao meio hospitalar local, dificuldades de encontro psicológico médico-doente, etc.

Para mim, porém, há dois aspectos que contam mais ainda que tudo isso: são o prestígio nacional e a força negativa que o recurso ao estrangeiro representa para o progresso de certos sectores da nossa medicina.

Quanto ao primeiro aspecto, pude experimentar sentimentos de vergonha e de revolta mais que uma vez, ao ver que éramos na Europa o único País com um tipo de exportação lamentável - exportação de doentes -, que nos colocava ao lado dos países recém-nascidos em África.

Não é raro que a médicos caibam as culpas por desconhecerem inconsciente ou conscientemente o que se faz no seu próprio país, porventura na cidade ou no hospital onde trabalham.

O prestígio do País é profundamente abalado por tal tipo de exportação, mormente quando as situações atingem foros de ridículo, pela banalidade dos casos ou por motivos ainda mais tristes, nenhum dos quais passava despercebido à observação de médicos e enfermeiras, cujo conceito teórico da nossa pátria já não era nada favorável.

Relembro a situação de um doente que se deslocara a Londres para um exame, cuja técnica nascera e se desenvolvera largamente no nosso país, onde existiam centros que a praticavam com frequência muito maior do que o hospital que ele procurara no estrangeiro.

Do segundo ponto, direi que é lamentável ver sair do País dinheiro que não terá outro rendimento senão o do momento, quando o tem, e que, transformado em subsídios de investigação, já teria rendido muito no arranque, organização e expansão de sectores necessitados. Não são raros aqueles médicos que têm imposto a si próprios imensos sacrifícios materiais e pessoais, intelectual, física e moralmente, prescindindo de proveitos que lhes seriam fáceis de obter, para dedicar o melhor esforço da sua vida a um projecto de evidente utilidade pública nacional.

O Sr. Pinto Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pinto Machado: - Em relação às considerações que V. Ex.ª está fazendo, devo dizer o seguinte: quanto a estrutura que propõe para os doentes que necessitam de uma assistência médica particularmente diferenciada, estou de acordo com ela nas suas linhas gerais.

Não tenho a experiência hospitalar de V. Ex.ª Gostaria de partilhar do seu optimismo, no sentido de que os nossos hospitais estão aptos a proporcionar a assistência médica, incluindo, evidentemente, a cirúrgica, altamente especializada que muitos desses casos a que V. Ex.ª se refere efectivamente requerem.

Creio que em certas situações médicas, como, por exemplo, de patologia hemática, ou de doenças malignas, ou ainda de imunopatologia e de tantos outros sectores, n ida dos doentes lá fora não será sempre por desconhecimento dos médicos - que são eles muitas vezes, como V. Ex.ª referiu, que enviam os seus doentes lá fora e alguns até são professores universitários -, como não será sempre por exibicionismo nem por um legítimo descargo de consciência - a consciência de se ter feito quanto era humanamente possível.

Creio que, efectivamente, há situações em que nós não estamos aptos a realizar uma assistência médica hospitalar eficiente, que envolve até uma estrutura de serviços, com full-time hospitalar, que não temos. Mas, independentemente destes casos, há um outro que é importante considerar: apesar de em muitos aspectos termos já felizmente inegável capacidade - estou a pensar, por exemplo, em cirurgia cardíaca, com circulação extracorporal -, o tempo de espera dos doentes é tão grande que, do ponto de vista prático, não interessa nada que a intervenção se faça. Isto porque, quando chega a vez de

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o doente ser chamado, ele poderá já estar morto. Tudo se passa, pois, como se esse serviço não existisse.

Concordo com V. Ex.ª no sentido de um apelo para que se aproveitem os recursos humanos de que dispomos - infelizmente, v. Ex.ª sabe isso melhor do que eu, muitas vezes os médicos vão lá fora, por vezes, a expensas suas, preparam-se, regressam e nem sempre têm o acolhimento que mereciam.

Apelo para que se criem as condições no sentido de impedir essa exportação de doentes, que receio sejam, em número significativo, realmente necessárias.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado, embora não concorde com alguns dos seus pontos de vista, e a nossa discordância provavelmente advém de um facto simples: a nossa experiência é completamente diferente.

Eu creio que são verdadeiramente excepcionais os casos que necessitam realmente de recorrer ao estrangeiro. Alguns dos ramos- da patologia que indicou encontram no nosso puis meios de tratamento. Há evidentemente insuficiências hospitalares, mas muita gente confunde o aspecto das instalações com a eficiência daquilo que lá se faz. São exemplos notáveis, para quem visita centros estrangeiros, que os hospitais onde por vezes se têm feito os maiores progressos na medicina nos últimos anos são hospitais velhos, como o caso do hospital onde nasceram as transplantações renais, que é um hospital velhíssimo, simplesmente com readaptações sucessivas e bom aproveitamento das capacidades humanas que tem.

Por outro lado, acho muitíssimo mal, digamos, dar uma certa facilitação na exportação de doentes, termo que é um pouco contundente, mas autêntico, porque leva a desconhecer aquilo que se faz no Pais, e não incrementar e desenvolver aquilo que já se faz.

O tempo de espera que os doentes podem aguardar no nosso país para determinados tipos de intervenções devo-lhe dizer que não é maior do que aquilo que acontece noutros campos. Lembro-me que no Sul de Inglaterra havia doentes com tumores da bexiga que esperavam seis meses pelo internamento, isso há cinco anos, e as listas para transplantações aguardam imensos meses, e há doentes portugueses que têm ido a França, Inglaterra e América para serem transplantados com órgãos de cadáver e têm de esperar seis a sete meses.

Em patologia tumoral é preciso não confundir aquilo que é para investigação cientifica ou um tratamento que tem algum efeito, mas que está numa fase de investigação cientifica, dando esperanças que não se concretizam na prática, com aquilo que é realmente eficaz. E há muita gente nacional com patologia tumoral que vai ao estrangeiro, ficam maravilhados com técnicas que cá parecem não ser executadas, simplesmente são técnicas que estão numa fase puramente experimental e que acabam, quando muito, por fazer sobreviver o doente por mais um mês ou dar essa ilusão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Continuando. E que encontraram por parte das entidades chamadas competentes? Muito pouco ou mesmo atitudes negativas. É espantoso verificar não só o desconhecimento, mas, mais ainda, os entraves surgidos nas vias competentes ao progresso de iniciativas de grande mérito e de imensa utilidade nacional e que morrem, às vezes, afogadas na inércia calma e tranquila de consciências mal formadas, mas bem colocadas na Administração do Estado, e que diariamente apõem a sua assinatura em papéis que consignam factos ou quando muito iniciativas de 2.ª ou mais baixa ordem, depois de uma fórmula tão cheia de significado mas muito abusada e mal tratada - A bem da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Baptista da Silva: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Entre os mais graves problemas postos & sociedade dos nossos dias conta-se o do transporte de passageiros nos grandes centros urbanos. Tratando-se, como todo o tipo de transporte, de uma actividade integrada no âmbito do domínio económico, ela é, no entanto, caracterizada por uma destacada função social e constitui, em si mesma, um exemplo típico de necessidade colectiva.

As exigências crescentes do movimento da população urbana e a impossibilidade certa de os transportes individuais lhes darem satisfação impõem em todo o Mundo que se reforce a atenção para com os transportes colectivos, procurando estádios verdadeiramente eficientes de funcionamento. Só assim será possível enfrentar a deslocação diária de grandes massas populacionais e, paralelamente, manter a circulação em geral. Quem, a nível de responsabilidade, não acreditar neste conceito elementar tornar-se-á cúmplice, quando não réu, de uma situação futura de caos generalizado.

Esta perspectiva, quando não exemplificada à evidência, isto é, por forma que nos ameace a pele, deixa cada um pouco mais que indiferente e propicia se mantenha um clima geral de cómoda e perigosa inconsciência. A gravidade aumenta quando desse estado de espírito não conseguem emergir os que, por funções públicas, têm obrigação de prever a tempo e resolver com coragem.

Porque ao meu conhecimento e à minha experiência serve como exemplo perfeito para a perspectiva enunciada o da cidade capital do nosso país, eu estou hoje a fazer esta intervenção.

Antes de prosseguir, é para mim ponto de honra dizer a quem o não saiba, dentro ou fora desta Casa, que no conhecimento e na experiência referidos conta salientemente, pelo que representa de actualização intensa e preocupantemente ganha, o tempo dos últimos anos com a responsabilidade maior do pelouro de trafego da Companhia Carris de Ferro de Lisboa.

Posto isto, parece-me vantajoso iniciar propriamente a abordagem do tema com um esclarecimento sobre importante aspecto: o da tentação de se procurarem resolver os problemas de transportes urbanos facilitando a utilização do veículo particular. Julgo isto de especial interesse perante o conjunto de decisões e de realizações, acabadas ou em curso, dos tempos últimos de conhecida e dinâmica administração municipal, o qual pode ser erradamente interpretado.

É já de si muito difícil uma grande cidade, e sobretudo se europeia, poder sofrer as transformações necessárias a possibilitarem a utilização indiscriminada do veículo automóvel. Esta verdade permaneceria óbvia mesmo que fossem ilimitadas as disponibilidades financeiras, mas como o não são, ou estar-se-ia logo condicionado no plano ou estaria comprometida a sua prossecução mais cedo ou mais tarde.

A experiência, aliás, está de certo modo feita em grandes cidades americanas, onde se fomentou a construção de vias urbanas de grande capacidade. Pois não demorou muito tempo que a capacidade estivesse saturada, novos e iguais congestionamentos fossem verificados e, inclusive, se detectasse o fenómeno imprevisível da decadência desses centros urbanos quando se procurava revitalizá-los.

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Está assim comprovado, por uma experiência onerosa, que as acções apoiadas apenas em medidas de engenharia do tráfego, tendentes a assegurar o seu escoamento, não perduram, dado serem, a curto prazo, absorvidas pela incentivação dada ao uso da viatura particular.

Não estou a defender, entenda-se bem, que as administrações municipais não realizem esforços de melhoramento local das condições de circulação, tonto mais sabendo imporem-se múltiplas tarefas desse teor - algumas exigindo até modestos investimentos. O que pretendo defender é ser fantasioso trabalhar por compartimentos estanques nesta matéria e ser indispensável que um plano urbano, seja qual for a sua extensão, integre um plano de coordenação de transportes capaz de regular, de ordenar e de correlacionar todos quantos postos ao dispor da população.

Cabe bem aqui o que há dez anos, dirigindo-se ao Congresso, disse o então Presidente dos Estados Unidos da América, John Kennedy:

Os métodos graças aos quais as pessoas e as mercadorias se podem deslocar nos centros urbanos exercerão uma incidência decisiva sobre a estrutura das cidades, sobre a eficiência da economia urbana e sobre o acesso à melhoria social o cultural que elas podem oferecer aos cidadãos. Por consequência, o nosso bem-estar nacional exige a oferta de transportes urbanos que satisfaçam, assegurando um equilíbrio adequado entre a utilização das viaturas particulares e a dos transportes públicos, para ajudar a orientar e a servir a expansão urbana.

A cidade de Lisboa, a grande Lisboa, pois não podem respeitar-se os limites administrativos quando pensamos transportar uma população agregada que não está nem pode estar circunscrita ao foral do concelho, sofre hoje, na satisfação das necessidades elementares de bens de consumo essenciais, as maiores dificuldades no sector dos transportes. Ao estenderem-se cada vez mais as linhas de força da cidade, como aglomerado principal da região, por elos se repercutem a todos os pontos as suas insuficiências e deficiências, somando-se às já sofridas em cada local. Concentram-se, porém, com maior acuidade, na pequena Lisboa, aquela que, forçando a geometria, cabe num polígno com vértices em Pedrouços, Benfica, Lumiar, Olivais Norte e Poço do Bispo.

De resto, não veria razoabilidade prática para se buscar de imediato um extenso plano regional de transportes, sem ter perfeitamente definido o da pequena Lisboa, pois neste se há-de inserir e com ele coordenar todo o sistema da região. Isto não invalida, todavia, que os parâmetros fundamentais dessa coordenação não exijam a submissão a um pré-planeamento global que envolva as estações fluviais, as centrais de camionagem, as estações ferroviárias urbanas- e suburbanas, os parques de estacionamento da periferia, as correspondências da camionagem suburbana com os transportes urbanos, etc.

Sabe-se que os transportes colectivos urbanos de Lisboa integram explorações a cargo da Sociedade Estoril, da C. P., do Metropolitano, da Carris e uma multiplicidade de serviços de aluguer, onde nem sequer parece faltarem agora os clandestinos ... De todas assumem papel preponderante as explorações a cargo do Metropolitano e da Carris, que em 1971 transportaram, respectivamente, 59 milhões e 315 milhões de passageiros. É sobre os serviços destas empresas que vêm recaindo, justificadamente, os reparos, os queixas, os azedumes, melhor, todo o mal-estar de uma população directamente afectada na sua vida diária quando caminha para o trabalho ou para o descanso. De todo esse clamor e mais ainda, por acréscimo, do provocado pelo mau serviço de táxis, tem a própria imprensa feito eco, como lhe compete. Falemos dos fundamentos e das verdades.

Quanto ao Metropolitano, para além da ampliação das actuais estações para maior número de carruagens poderem operar, tem-se como problema fulcral o de haver que prosseguir, continuamente, a extensão da sua rede - actualmente com uma dúzia de quilómetros. Ora, só pelo que publicamente tem sido dado a conhecer, é coisa certa não permitir a situação financeira da empresa corresponder a esse anseio e a essa necessidade pêlos seus próprios meios. Levanta-se assim a questão de só ser possível solucionar o impasse desde que a construção do túnel passe a ser encargo estadual ou municipal, tal como o são as estradas, as ruas ou os esgotos. Não será inovadora a decisão. São já numerosos os exemplos e em alguns deles abrangendo, também, o encargo da construção da própria via.

Reconhecendo-se indiscutível ser a cidade de Lisboa absolutamente indispensável dispor desse serviço público em termos que ultrapassem largamente os existentes, ter-se-á de encontrar fórmula para tal atingir, nem que se debitem aos ganhos sociais os importantes investimentos a fazer.

No que respeita à Carris, será de realçar primeiro a Situação geral do trânsito' em Lisboa, onde opera submetida as seguintes sujeições:

Aumento explosivo da motorizarão, a atingir índices similares aos de algumas grandes capitais europeias;

Regulamentação municipal de trânsito desactualizada ou não cumprida em aspectos influentes na fluidez: cargas e descargas, circulação de veículos de tracção animal, instrução auto, limites de tonelagem, etc.;

Regularização policial reduzida e descontínua e falta de apoio à realizada por sinalização luminosa automática, comprometendo o funcionamento desta;

Fiscalização geral em estado degenerativo, numa manifestação nítida de perda de controle da situação;

Pavimentos em estado de ruína ou pré-ruína em muitas vias;

Circulação de carros eléctricos em vias não diferenciados, provocando ou agravando congestionamentos.

Desta situação geral resulta que os veículos da Companhia circularam, em 1971, a uma velocidade comercial média de 10,56 km/h para os eléctricos e de 14,57 km/h para os autocarros, com os consequentes perdas económicas, pelo agravamento do custo do transporte, em função do maior consumo de combustível e de mais elevado desgaste de material.

É evidente que só pelo que ficou dito será impraticável a prestação de serviços em moldes desejáveis, mas estes vêem-se ainda permite, Outras circunstâncias agravantes: rigidez dos horários ide trabalho originando "pontas" muito estreitadas; desaparecimento da "ponta" do almoço; concorrência entre a exploração feita com eléctricos e a feita com autocarros pelo diferencial tarifário existente; grandes dificuldades quanto a efectivos de pessoal pela impossibilidade financeira da empresa em competir no mercado de trabalho, resultando volumosos saídas de pessoal e reduzidas admissões.

Criou-se assim uma situação em agravamento progressivo, a qual enteou em estado de ruptura desde o início de Setembro e põe em sério risco a prestação do serviço público, desde aquele mês já reduzido por uma imobili-

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zação diária de cento e cinquenta a duzentos veículos distribuídos pelas duas "pontas". Fosso afirmar, com plena autoridade, que a situação não duplicou já de gravidade por se ter recorrido a todas as medidas possíveis de emergência e se ter contado com o esforço e dedicação exemplares da maioria esmagadora do pessoal, tocando pelo sacrifício no que respeita ao pessoal do tráfego, ao qual a população deve uma atitude compreensiva, e até de gratidão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Penso que nada disto pode constituir especial surpresa para quem tenha lido e reflectido no Decreto-Lei n.° 317, de 18 de Agosto ultimo, dos Ministérios do Interior, das Comunicações e das Corporações, através do qual o Governo interveio para aliviar a crise dos Transportes Colectivos do Porto. Esse decreto constitui doutrina lapidarmente exposta sobre o problema, o qual é, em síntese, o de se conseguir conciliar que empresas comerciais, com todas tis obrigações inerentes, possam assegurar um serviço em que terão de praticar tarifas sociais. Vou dele lembrar algo:

. . ., parece ter passado o tempo em que a prestação do serviço público de transporte urbano [...] era susceptível de se organizar por forma a proporcionar lucros ao produtor.

A concorrência movida pela viatura privada, o agravamento constante do custo da mão-de-obra e dos materiais, as dificuldades do trânsito, a manutenção de serviços oferecidos a um preço por vezes muito aquém do seu preço real ou económico, tudo isso, a par de uma maior consciência do efectivo desempenho de uma tarefa social e uma apurada exigência da população utente, outrora inexistente ou não expressa, no que toca à qualidade e quantidade do serviço prestado, não podia deixar de conduzir a uma alteração profunda da situação das empresas públicas concessionárias do transporte colectivo urbano.

A situação de crise que afecta o transporte colectivo na quase totalidade dos grandes aglomerados urbanos e que se faz sentir, mormente por força de razões estranhas à exploração, no Serviço de Transportes Colectivos do Porto, exige, neste caso concreto como em todos os outros, atentas as aduzidas considerações decorrentes da natureza pública e imprescindível do serviço prestado, que sejam adoptadas as medidas necessárias em ordem a evitar a degradação da actividade produzida para além de um limite em que a recuperação para um nível liminarmente aceitável se mostraria altamente problemática ou onerosa.

A urgência que essa adopção requer conduz, sem alternativa, ao caminho das soluções susceptíveis, por um lado, de imediata exequibilidade e, por outro, de produzirem a curto prazo os efeitos desejados, sem prejuízo, evidentemente, do estudo mais moroso e profundo de medidas que, exigindo prazos mais longos para execução e produção de efeitos, trarão ao problema soluções certamente mais eficazes.

Penso ter-se dado por esta forma - mais correcta e garantidamente mais credenciada o quadro geral em que se situa a exploração dos transportes colectivos, não só do Porto, como de Lisboa, pois são casos bem similares, como são os de Madrid ou Genebra, de Milão ou Bruxelas.

Julgo assim chegado ao ponto de pedir que a atitude intervencionista do Governo junto dos transportes colectivos do Porto para garantir a satisfação do serviço público, se alargue, na esfera da sua competência e com o mesmo objectivo, aos transportes colectivos de Lisboa. A mesma amplitude dessa acção se exige também, para que além do imediato indispensável se faça o ponto do planeamento regional trabalhado, prioritariamente em relação à própria cidade, com salvaguarda do que possa comprometer as soluções da região.

Neste campo de política de transportes a administração pública é sempre posta perante dois caminhos a seguir: ou chama a si mesma a tarefa de assegurar a satisfação das necessidades colectivas do serviço público, ou promove, fiscaliza e apoia a iniciativa privada que dessa tarefa se encarregue. A primeira opção não tem sido a seguida na generalidade dos países europeus, sem que tal tenha impedido uma crescente intervenção governamental no sector dos transportes. É essa intervenção que é urgente processar-se e integrá-la, no que não for imediatamente exigível, através de objectivos e critérios nitidamente definidos, nos domínios de acção e de estudo do IV Plano de Fomento..

Termina aqui o meu depoimento sobre este problema, problema de Lisboa, com dimensão nacional, de gravidade extrema, com reflexos sociais de grande densidade e susceptível de assumir delicadeza política que não está nas suas causas, mas pode ser explorada nos seus efeitos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Vai para três anos que iniciei de facto a actividade parlamentar com uma intervenção no dia 25 de Novembro de 1969, pedindo ao Governo uma ampla amnistia e um generoso indulto, que considerei para alem de um acto de generosidade e tão ao sabor da alma nobre do povo português ou de uma medida que sempre reveste o interesse da recuperação para a sociedade de elementos válidos, principalmente como um passo necessário e de evidente alcance político, todo dirigido a uma indispensável pacificação da família portuguesa.

Para além daquele propósito e que foi realmente o motivo dessa intervenção, aproveitei o momento para pôr um acento tónico & partida do início do mandato que o povo me confiara, insinuando, assim, e portanto, a dominante da minha actuação futura.

Mas, porque a breve espaço me convencesse da insuficiência, vi-me forçado, e por mais de uma vez, a clarificar os meus objectivos e propósitos, evidenciando-me declarado partidário de uma liberalização rápida mas progressiva, absolutamente necessária, à vida nacional e ostensivamente em rebeldia com ideias e princípios, partissem de que ala partissem, desde que ao meu paladar se não amoldassem ao figurino nacional. E, até com certo sabor a romance de cavalaria, tipifiquei-me como um franco-atirador. Inusitada expressão em política que me causou algumas nódoas negras!!! E não tanto por parte dos que não alcançaram o seu real significado e objectivo, mas, muito mais, de alguns que bem dentro dele revelaram inconformismo a declarada insubordinação a actuações activistas, mas que à luz da minha consciência não serviam com a indispensável oportunidade o bem comum, e antes até se mostravam inadequadas ao momento da Nação.
Pois, decorridos três anos, mantenho firme a agulha magnética que desde o início me apontou o norte.
E foi bem dentro deste rumo que sempre, mas sempre, aderi fosse a que fosse, posto é que a tónica se

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situasse no bem comum, segundo a minha óptica, que até hoje não encontrei motivos para considerar errada.

Pois, pacifista por formação, não vi então, nem vejo ainda, que a transformação da sociedade portuguesa não possa continuar a fazer-se em paz e por uma evolução gradativa e tendencial à sua completa liberalização.

A forma e o tempo de o atingir é que podem originar interrogativas, pois se há quem pense que tal evolução se pudera e devera até ter-se acelerado, outros opinam que a sociedade portuguesa não está preparada para tais acelerações, que lhe poderiam atingir os alicerces frágeis e causar irremediável dano, mas que, embora isso, haveria de se ir para a frente e sempre mais para a frente, mas devagar e cautelosamente.

E é a opção, por uma ou outra via, que causa angústia, exactamente porque em ambas se vêem fortes linhas de razão. Por qual optar? E ponto em que o meu espirito se encontra ainda, como disse, digamos, menos aquietado, sobretudo pelo receio, ora que se esteja a confundir rapidez com precipitação, ora que ao meu temperamento buliçoso a prudência pareça excessiva.

Por isso dizia e disse que estou e estarei sempre ao lado de quem me indicasse o melhor caminho à solução nacional, e rebelde a orientações idealistas, só porque idealistas.

Pois foi exactamente dentro desta disposição que desde inicio orientei a minha actuação política. Tudo ouvi e a todos ouvi, e continuo na expectativa de motivos para desviar o rumo.

E foi assim que ouvi aqui há dias, nesta Câmara, o ilustre Deputado Dr. Júlio Evangelista, e que foi observado num jornal citadino,- como elemento da ala mais conservadora desta Casa, vir ao encontro de desejos meus, pedindo ao Governo a concessão de uma amnistia.

Ser ou não ser conservador, e o significado que a expressão comporte e haver ou mão pertinência aã qualificação é coisa que ora nem importa, pois a verdade é que, reconhecendo inteira oportunidade e a generosidade da solicitação, aqui lhe venho manifestar total, e incondicional apoio e comungar assim com o ilustre Deputado nos seus esforços, insistindo junto do Governo no pedido para que se conceda não só uma ampla amnistia, como ainda um generoso idulto.

E releve-se abe que dias depois daquele seu pedido, parece, ou eu ao menos assim o interpretei, o Sr. Ministro da Justiça se mostrou adepto à concessão da amnistia . . .

Vozes: - Não, não!

O Orador: - ... pois afirmando-se adverso à concessão de amnistias frequentes não o mostrou ser em relação a amnistias oportunas.

O Sr. Almeida Cotta: - Sr. Deputado, mas porquê agora?

O Orador: - Porque estamos no Natal!

Risos.

O Sr. Almeida Cotta: - Todos os anos há um Natal. . .

O Orador: - Mas eu explico a V. Ex.ª Quer ter um momento de paciência para me ouvir?

O Sr. Almeida Cotta: - Não é paciência, eu tenho gosto!

O Orador: - Revendo o passado, verifica-se que as amnistias vêm tendo uma certa periodicidade que pode situar-se de dois anos e meio em dois anos e meio. E como a última amnistia teve lugar em 12 de Maio de 1970, pelo Decreto n.° 204/70, é exactamente este o momento oportuno ...

Risos.

O Orador: - ... para concessão de nova amnistia e afastados, portanto, os temores por amnistias frequentes.
Não vou discutir as razões que então aduziu o Sr. Deputado Júlio Evangelista ao fundamentar o seu pedido e até se além delas outras haverá.

Centralizar-me-ei apenas numa: que melhor oportunidade há para uma amnistia que a festa da família que é a quadra do Natal? Época tão querida do povo português, bastará tão-só essa motivação para justificar a medida de clemência e para fundamentar o apelo que em comunhão com todos os bons portugueses aqui também deixo feito ao Governo.

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem!

O Orador: - Não quero nem devo ainda terminar sem deixar de manifestar o meu vivo aplauso ao Decreto n.° 450/72, que pôs termo às medidas de segurança aplicáveis aos delinquentes políticos.

E tal acto, de tão largo alcance político, surgiu, assim, inesperado e simplesmente, sem grandes alardes, publicidades ou reclamos, como que a significar à Nação que, atingida natural e logicamente certa etapa de um caminho evolutivo metodicamente planeado, tivesse chegado o momento oportuno para o consumar.

E o Governo fê-lo simplesmente, como o disse já, com a maior das singelezas, numa demonstração viva ao País de que as promessas feitas se vão cumprindo, não de improviso ou na busca de efeitos espectaculares, mas em obediência à sua oportunidade.

Aqui deixo, pois, reafirmado, com a minha esperança numa evolução tão rápida quanto o comporte o clima nacional, o pedido de amnistia e de um generoso indulto, motivo determinante desta intervenção.
Tenho dito.

O Sr. Dias das Neves: - Sr. Presidente: Li, há algum tampo, algures, que o desenvolvimento não constitui apenas caminho para a abundância, mas é sobretudo e sem dúvida a construção de uma sociedade.

Esta afirmação, se traz consigo implicações éticas, úteis do maior alcance que se não podem evitar, traz também uma exigência fundamental, que é a da participação efectiva de todos no processo geral de desenvolvimento, o que é o mesmo na preparação do seu futuro.

Porém, ninguém participa verdadeiramente naquilo que não compreende, e por isso ao estabelecer-se qualquer plano de desenvolvimento há que realizar uma intensa campanha de educação e esclarecimento, para que todos possam saber perfeitamente os fins que se visa obter e qual a parte que lhes cabe nessa participação.

Assim o entendeu o Governo quando se lançou definitivamente numa política de desenvolvimento regional, que fora esboçada já no Plano Intercalar de Fomento, quando lançou por vários meios uma vasta campanha de educação e conhecimento dessa política, permitindo um longo e proveitoso diálogo, com viste a uma maior consciencialização de todos os implicados no processo.

Efectivamente, quando em Maio de 1967, em Abrantes, um dos mais importantes centros urbanos do distrito de Santarém, se realizou o I Colóquio de Desenvolvimento Regional, mais do que fazer demonstração de erudição,

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posse da ciência do desenvolvimento regional ou apresentação de espírito inovador, o que se pretendeu, quanto a nós, foi demarcar uma linha de actuação coerente com as directrizes já esboçadas no Plano Intercalar de Fomento (1964-1967), preparar e alargar os caminhos para uma motivação do País para as técnicas de planeamento e desenvolvimento regional e para uma participação mais consciente de todos os interessados na execução de uma política de desenvolvimento económico, que nesse importante documento se anunciava já como aquela que poderia corrigir as pronunciadas assimetrias regionais de desenvolvimento existentes e promover um mais rápido desenvolvimento geral do Pais.

A partir deste importante documento, foram publicadas uma série de medidas legislativas e realizados largos estudos e trabalhos em ordem a uma acção de desenvolvimento regional, que culminou com a confirmação dessa política no III Plano de Fomento (1968-1973), o qual inclui um capítulo especificamente dedicado a essa matéria, onde se fundamentam as acções a desencadear no futuro, se traçam caminhos e se foi mesmo mais longe, pois se estabeleceram medidas concretas nesse sentido.

Ao longo dos estudos preparatórios do III Plano de Fomento pôde concluir-se que o distrito de Santarém, ponderados todos os indicadores, graças especialmente ao peso dos sectores secundário e terciário da sua zona norte, poderia, no confronto dos dezoito distritos do continente, considerar-se daqueles que imediatamente a seguir a Lisboa, Porto, Aveiro e Setúbal tinham maior interesse na dinamização do processo de desenvolvimento geral do País, emparelhando com Braga e Leiria.

Não admira, pois, que no III Plano de Fomento se dissesse textualmente na p. 638 do vol. 2.º (ao caracterizar a região de Lisboa uma das. quatro regiões de desenvolvimento preconizadas):

A atracção populacional que "era originada pelos novos pólos de crescimento aconselha ao dimensionamento apropriado dos sectores urbanos localizados nos referidos eixos, considerando-se o seu apetrechamento em matéria de equipamentos e infra-estruturas que favoreçam a fixação populacional e contrariem a atracção de Lisboa, nomeadamente pela transferência para esses centros de serviços públicos que correspondam ao grau das necessidades criadas pelo desenvolvimento industrial e sirvam de modo eficiente as populações locais.

Neste sentido, deve estudar-se a criação de um pólo de crescimento de nível intermédio triângulo - Torres Novas-Tomar-Abrantes, onde existem já alguns elementos de implantação industrial que revelam certo dinamismo.

O Sr. Castelino e Alvim: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Castelino e Alvim: - Tenho ouvido a intervenção de V. Ex.ª com a maior atenção. E agora, ao ouvir falar no triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes, julgo devermos concluir que este triângulo é uma figura mais económica que geométrica. Gostaria de lembrar que entoe os diversos vértices desse triângulo existem concelhos que, estou convencido, V. Ex.ª não deixará de considerar também dentro dele. Noto especialmente que o concelho de Vila Nova de Ourem fica exactamente na intersecção entre Torres Novos e Tomar.

Esse "triângulo", perdoe-me a Câmara a falta de respeito por conceitos geralmente aceites, é capaz de ter que ter mais de três lados. Será unia anomalia geométrica, mas económica e realisticamente fica mais certo.

O Orador: - Quero dizer a V. Ex.ª que não sou responsável pela designação "triângulo". Se V. Ex.ª, contudo, tiver a paciência de me ouvir, há-de encontrar resposta exacta a essa questão. Eu também não considero o triângulo como uma figura geométrica, mas sim como uma realidade económica, onde se integra toda uma vasta região de que ele é elemento polarizador.

O Sr. Castelino e Alvim: - Muito obrigado.

O Orador: - Esta decisão anunciada no III Plano de Fomento, que têm a maior relevância para os três centros urbanos mencionados, não a podemos considerar nascida ao sabor de qualquer espírito de ficção, de qualquer acaso ou conveniência. Ela ó toda uma consequência lógica do estudo atufado e ponderação efectiva de um grupo de técnicos altamente competentes. Todos sabemos bem dos cuidados que são postos na preparação dos planos de fomento do nosso país e do extraordinário esforço de estudo e elaboração que estes têm merecido ao Secretariado Técnico da Presidência do Conselho, órgão responsável pela preparação dos mesmos, que ao País tem prestado os mais relevantes serviços.

O Sr. Correia da Cunha - V: Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Correia da Cunha: - Gostaria de dar uma pequena achega à exposição que V. Ex.ª está a fazer e dizer-lhe que os técnicos que ajudaram a criar essa entidade económica que é o triângulo Abrantes-Torres Novas-Tomar foram muito ajudados pêlos responsáveis locais. Não me esqueço que foi em Abrantes, no decurso de um colóquio de desenvolvimento regional, que o então Ministro de Estado teve oportunidade de anunciar ao País a criação de regiões, o arranque, portanto, do desenvolvimento regional que marcou, com muita originalidade, o III Plano de Fomento.

Não queria antecipar-me com considerações que poderei expender daqui a pouco, mas diria que, nesta retracção que o rectângulo do continente português está a apresentar, após um surto emigratório extremamente intenso, essa retracção limita-o praticamente à faixa litoral entre Lisboa e Braga - eu diria que, à medida que esse processo de encurtamento e debilidade se vai implantando, tudo aquilo que puder conduzir ao desenvolvimento para o interior assume um carácter de grande importância.

O Sr. Castelino e Alvim: - Muito bem!

O Sr. Correia da Cunha: - Aqui há alguns dias pronunciámo-nos sobre o traçado da auto-estrada do Norte que ao longo do vale do Tejo nos vai permitir penetrar com certa facilidade até ao Ribatejo, até pouco acima de Santarém. Eu direi que, para além disso, como V. Ex.ª referiu, o criar condições de permanência, de desenvolvimento, numa área que é central em relação ao País - situo-se quase no centro geométrico do continente o criar nesse triângulo condições de estruturação, de vitalidade, pode corresponder a contrariar de forma eficaz todo esse processo de retracção pró-litoral da área desenvolvida do País. Portanto, eu penso, aceito e creio que o IV Plano de Fomento terá isso em consideração, não se limitará apenas à implantação de um parque industrial em Guima-

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rães e dará aquele mínimo de condições para desenvolvimento a essa área central que tanto interessa não só ao círculo que nos elegeu, mas verdadeiramente a todo o País.

Muito obrigado, Sr. Deputado.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Dias das Neves, em virtude do adiantado deste período de antes da ordem do dia, que não consinta mais interrupções.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente, farei o que me pede.

Em todo o caso, queria agradecer ao Sr. Deputado Correia da Cunha a sua intervenção valiosa, que veio dar preciosa achega a este modesto trabalho, tanto mais que vem de um dos técnicos mais competentes em desenvolvimento regional.

Das conclusões do I Colégio de Desenvolvimento Regional de Abrantes se podem tirar numerosas conclusões, das quais destacamos três:

1) Exeguidade da unidade administrativa "concelho", como unidade base de desenvolvimento regional, e desajustamento entre a actual divisão administrativa e as necessidades de institucionalização do plano de desenvolvimento regional;

2) A possibilidade que através de um esquema de ordenamento do território pode vir a constituir-se na zona do triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes uma zona tampão à corrente migratória em direcção a Lisboa;

3) A possibilidade de poder construir-se uma experiência de ordenamento industrial numa zona que, ficando fora da área metropolitana de Lisboa, pode constituir, sem afectar o desenvolvimento da capital, um esquema complementar desse desenvolvimento, pois se situa no norte do troço do vale do Tejo um dos principais eixos de expansão económica da grande Lisboa.

Ao longo destes cinco anos do III Plano de Fomento, os três centros urbanos de Tomar, Torres Novas e Obrantes têm desenvolvido porfiados esforços no sentido da efectivação do pólo de crescimento, no "triângulo", no qual cada um ocupa um vértice, dinamizando por sua vez outras zonas que lhe são adjacentes.

Também neste mesmo espaço de tempo o Estado fez um grande esforço no sentido de procurar dotar os três centros urbanos e de uma maneira geral toda a zona, de equipamento e infra-estruturas de apoio necessários ao desenvolvimento previsto em ordem ao "triângulo", numa total coerência com a política de desenvolvimento preconizada.

Assim podemos anotar os seguintes empreendimentos:

Sector dos transportes:

1) Electrificação do ramal de Tomar (incluído no III Plano de Fomento), cujas obras estuo a decorrer e se concluirão no ano de 1973, que importam em cerca de 80 000 000$, que têm a maior importância nas deslocações de pessoas e mercadorias daquela localidade, e da sua zona os influências que atinge o vasto Interland constituído por Alvaiázere, Sertã, Figueiró dos Vinhos e Cernache do Bonjardim;

2) Reparação e regularização da estrada nacional n.° 110, do Entroncamento até Condeixa que importam em cerca de 70 000 000$, e é uma das mais importantes vias de comunicação da região, pela facilidade e rapidez de ligação de Coimbra com toda esta zona;

3) Reparação da regularização da estrada nacional n.° 118, da Chamusca a Abrantes, prestes a chegar ao Tramagal, principal via de ligação desta cidade com Lisboa, e que trará os maiores benefícios para a economia desta região.

Neste sector acaba de verificar-se um acontecimento da maior relevância, do qual toda a zona do vale do Tejo, e esta subzona do "triângulo", bera como todo o País, virão a tirar os mais altos benefícios; refiro-me a auto-estrada do Norte, cujo contrato de construção acaba de ser anunciado.

As autoridades mais representativas das regiões beneficiadas já manifestaram a S. Ex.ª o Presidente do Conselho a sua satisfação e o seu apoio à política ora iniciada. Todavia, não queremos deixar de aproveitar esta oportunidade para confirmar o nosso regozijo e consignar o nosso total apoio a esta obra grandiosa, que um traçado diverso daquele que inicialmente se esboçava e sobre o qual já se pronunciaram especialmente e com muito brilho, nesta Casa, os Srs. Deputados Castelino e Alvim, Correia da Cunha e Pinto Castelo Branco.

Em nosso entender, o programa de auto-estradas agora anunciado ficará a constituir público testemunho da coragem, do atrevimento, e é necessário ser atrevido, e da vontade forte de um Governo que, consciente das dificuldades do presente, se preocupa com o futuro, que sente ser seu dever preparar, rasgando no horizonte do desenvolvimento as artérias por onde irá correr a seiva que irá alimentá-lo.

A auto-estrada do Norte, com o seu novo troçado, ficará a constituir um símbolo de esforço da unidade dos Portugueses, ligando as duas cidades capitais num grande amplexo, ao mesmo tempo que a elas fará acorrer as restantes populações, numa aproximação cada vez maior.

Aproveito por isso esta oportunidade para reiterar todo o meu apoio ao Sr. Ministro das Obras Públicas, guarda avançada neste sector, de um Governo ao leme do qual a figura prestigiosa, inteligente, dinâmica e forte do estadista que é o Presidente Marcelo Caetano, é exemplo de trabalho e dedicação à causa nacional, a apontar o caminho a todos nós.

Sector do ensino:

Neste sector, tem esta zona merecido, desde 1954, o maior cuidado por parte do Governo, pois na data em que apenas havia um Liceu Nacional de Santarém e uma Escola Industrial e Comercial de Tomar (1884), até hoje. foram criados os seguintes estabelecimentos de ensino:

Dois liceus (Tomar e Abrantes) e três secções liceais (Entroncamento, Torres Novas e Vila Nova de Ourem), no decorrer do III Plano de Fomento.

Cinco escolas técnicas (Abrantes, Torres Novas, Alcanena, Entroncamento e Vila Nova de Ourem) e uma secção no Tramagal (três das quais no III Plano de Fomento). Está neste ano em curso, em Tomar, uma experiência pedagógica, determinada por S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, "habitação complementar para os institutos", com vista ao futuro ensino politécnico.
Sector de saúde e assistência:

Também neste sector houve a intenção de fornecer os elementos necessários para a cobertura sanitária da zona a construir, e assim se criaram três centros de saúde, um em cada vértice, como pontos fundamentais de um es-

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quema de saúde e assistência que possa servir bem a região.

Esta zona, de que não interessa a forma geométrica (o triângulo será apenas o núcleo motor e cabeça visível), mas que tem potencialidades, bem patentes nos estudos realizados pelo Secretariado Técnico da Presidência do Conselho, que constam dos seus vários trabalhos e relatórios sobre o ordenamento do território e também de outros documentos produzidos pela Comissão de Planeamento da Região de Lisboa, engloba centros urbanos de importância económica, histórica, política e estratégica da maior valia, como Tomar, Abrantes, Torres Novas, Entroncamento, Golegã, Vila Nova de Ourem, Barquinha, Constância, Sardoal, Ferreira do Zêzere, Mação e Alcanena, e contém uma população de cerca de 300 000 habitantes, pois só nos três concelhos principais existem cerca de 125 000.

Toda esta população tem vindo a ser motivada para a valorização deste pólo de crescimento, demarcação e instalação do respectivo equipamento industrial, que se impõe para o desenvolvimento da zona. Tem sido um longo caminho a percorrer, consideradas as pequenas grandes rivalidades locais, tantas vezes tão benéficas, mas outras mais prejudiciais ainda; foi um afastar de barreiras e preconceitos das próprias autoridades administrativas; foi, enfim, um abrir para uma solução que se concluiu ser n única que poderá reverter em proveito comum - dar-se as mãos e participar abertamente no desenvolvimento da região.

As autoridades e forças vivas locais estão já procurando ensaiar a resolução de alguns problemas básicos em comum, preconizando mesmo como meta final a federação dos três concelhos Tomar, Abrantes ë Torres, numa linha de coerência com a actual política de desenvolvimento económico. Debruçam-se já sobre a criação de um gabinete de estudos comum, com vista ao desenvolvimento do "triângulo" e sua zona dê influência, bem como de uma comissão de coordenação de todos as acções respeitantes ao mesmo triângulo.

Ali aprendeu-se a lição e, neste momento em que começam a ultimar-se já os trabalhos preparativos do IV Plano de Fomento, confia-se no Governo, na extraordinária acção de S. Ex.ª o Ministro de Estado, Dr. Mota Campos, a cujo insano labor governativo em dois sectores da actividade governativa o País já tanto deve.

Confia-se e sofre-se, com incertezas e dúvidas quase sempre resultantes de uma informação deficiente ou deformada, mas, principalmente, acredita-se nas suas razões justas, às quais o Governo não poderá ser insensível.

Principalmente, vive-se preocupado, porque se sente a infância de |uma acção que lhe permita estancar a sangria que representa a emigração dos seus habitantes, que marca o seu corpo como ferro em brasa, que foz com que o concelho de Vila Nova de Ourem tenha menos população presente do que ausente (cerca de 50 000 emigrantes), fogo que começa a alastrar com intensidade nos concelhos de Tomar, Ferreira do Zêzere e Alcanena.

Preocupação que resulta do conhecimento que se tem de que alguns dos seus predicados vão perdendo o peso como factor de equilíbrio do desenvolvimento, como se pode observar no relatório de um grupo de trabalho especialmente nomeado pela Comissão de Planeamento da Região de Lisboa para estudar o problema do triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes, e onde se lê textualmente:

"Por outro lado, verificou-se uma quebra (para quase todos os indicadores utilizados) do peso da zona de influência do referido triângulo notoriamente quando se considera o continente como universo.

Esta conclusão, se faz perigar o papel que se tem vindo a apresentar ao triângulo, como possível pólo de desenvolvimento, no contexto de uma política de desenvolvimento regional equilibrado, entre o litoral e o interior, mais acentua a necessidade de serem tomadas medidas para que a referida zona económica não perca o peso considerado anteriormente como factor potencial de equilíbrio.

Por outro lado, a distância em relação a Lisboa, ao mesmo tempo que faz perder a Influência do triângulo, define-lhe condições de autonomia, que deviam ser aproveitados como efeito compensador."

Sr. Presidente: Ao trazer a esta Câmara as preocupações dos gentes do norte do distrito de Santarém fazemo-lo na convicção de que não se trata de um problema meramente regional, pois que a zona em referência, pelas potencialidades já demonstradas, pela sua posição estratégica do Centro do País, podendo no futuro servir-se de dois importantes portos de mar, dos quais é equidistante, Lisboa e Figueira da Foz, se insere no contexto do desenvolvimento geral do País com tal profundidade que tem ide merecer n atenção de todos os responsáveis.

Sabemos todos que um plano de fomento é um conjunto de programas exequíveis, é mais um plano de metas e objectivos a atingir, mas será muito mais: um conjunto de sonhos a realizar, com visto a elevação do bem-estar do País, e que ao Estado caberá tomar as medidas de política, em termos de uma melhoria global do nível de vida dos cidadãos.

Sabemos também que no plano financeiro o Estado não pode responsabilizar-se para além dos investimentos públicos programados, que constituem normalmente uma percentagem pequena desse investimento global, cabendo-lhe mais acarinhar, interessar e orientar a iniciativa privada, a quem caberá a realização da maior percentagem. Dispondo então, esta zona do triângulo, de um conjunto de equipamentos e infra-estruturas de apoio da maior valia, que não será fácil reunir numa área tão bem delimitada e com tantas possibilidades, ao Estado pede-se não a inclusão, porque essa está assegurada já pela própria natureza do problema e especialmente pela compreensão dos entidades responsáveis, pede-se, isso sim, um esforço para a efectivação no IV Plano de Fomento do pólo de desenvolvimento no triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes, que foi mandado estudar no III Plano de Fomento, pois acreditamos que haverá que fazer algum reforço financeiro no plano dos investimentos para complemento do já existente, mas essencialmente haverá que fazer um esforço de orientação e incentivo à iniciativa privada, com vista à implantação do equipamento industrial indispensável à sua valorização.

Sr. Presidente: A realidade que apresentámos conhece-a V. Ex.ª como ninguém, como o mais lídimo representante daquela região pela qual foi justamente eleito, e a nós, ao erguermos a nossa voz nesta Câmara, não nos move qualquer intenção de alimentar rivalidades ou desejos de supremacias ridículas, mas tão-somente contribuir cora a nossa modesta palavra para valorizar ainda mais toda o região de Santarém, situada as portas de Lisboa, e que, naturalmente influenciada pelo desenvolvimento desta, terá de aproveitar integralmente todos os suas potencialidades, se pretende continuar, e mesmo melhorar, a sua posição no conjunto dos dezoito distritos do continente.

Para isso pretendemos apenas que a nossa voz seja o eco de todas as que naquela vasta região se preparam para numa participação consciente e activa tomar a sua parte na construção da sociedade nova que será o Portugal de amanhã.

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O Estudo social que estamos a construir exige uni aproveitamento integral da todas os potencial idades, com vista a criação de riquezas que permitirão distribuir com justiça, a cada um, o maior quinhão disponível, de modo que todos possam usufruir de um nível de vida condizente com a sua dignidade humana.

Mas exige, também, que cada um de nós, que todos nós, no posto que nos foi destinado, realize a sua vocação, apegando Um esforço total de participação de consciência num aproveitamento que se impõe.

Conscientes desta verdade, acreditando na política iniciada, num momento tão grave da nossa história, e especialmente no chefe incontestado, que à frente do Governo impõe o rumo da construção de um Portugal que todos queremos melhor, os habitantes do triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes reclamam a sua parte nessa construção.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Acabo de receber comunicação do Sr. Secretario de Estado da Instrução e Cultura de que ira ser revista a situação anómala, porque não exigida no ensino básico tem superior, do reconhecimento notarial da assinatura dos encarregados de educação dos álamos do ensino liceal.

Em nome de quantos têm filhos ou outros tutelados nesse grau de ensino, muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa aos Srs. Deputados que ainda estavam inscritos neste período de antes da ordem do dia por não lhes dar hoje a palavra, mas o adiantamento do tempo impõe-me esta decisão.

Vamos passar, portanto, à

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1973.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia da Cunha.

O Sr. Correia da Cunha: - Sr. Presidente: Ao analisar a proposta de lei em que o Governo solicito autorização para cobrar as receitas necessários ao exercício do próximo ano senti-me uma vez mais obrigado a prestar público depoimento sobre o que penso e espero do referido documento. Pareceu-me oportuno, tombem, reflectir um pouco sobre a evolução de conceitos e a definição de objectivos que se podem detectar através da leitura das últimas propostas governamentais e dos respectivos pareceres da Câmara Corporativa e da Comissão de Finanças e Economia e ainda dos textos dos discursos mais significativos aqui pronunciados. A primeira conclusão a que se pode chegar após este estudo é a de que o modelo adoptado para a proposta se revela particularmente estável e refractário a adopção das sugestões que, ao longo do tempo, este órgão de soberania foi acumulando.

Só não se pode falar em diálogo de surdos porque, na realidade, nunca houve diálogo a propósito, não obstante se manter em vigor o salutar princípio de prestação de esclarecimentos por parte do Sr. Ministro dos Finanças. Trata-se, na realidade, de um documento subscrito por este membro do Governo e, por consequência, elaborado pelo departamento que dirige. Esta circunstância afecta decisivamente o seu conteúdo, tornando-o desequilibrado e incapaz de transmitir a visão global que tontos de nós desejaríamos encontrar nele.

Não se duvida, ninguém duvida, de que uma lei de meios é um documento fundamental para a vida do País.

Por isso mesmo ela responsabiliza todo o Governo e assume tamanha ressonância nesta Câmara. Por seu intermédio deviam ficar a conhecer-se as linhas mestras da política governamental para o ano em causa, não só no que respeita à fiscalidade e orçamento, como aos sectores económico e social. Não acontece assim, infelizmente, nem se adivinha qualquer progresso nesse sentido. Pelo contrário, a leitura da edição feita para vigorar em 1973 fez-me sentir quão cheia de boas intenções era a proposta de 1970.

Mantiveram-se os carências e as lacunas, adaptou-se o tom displicente de quem. está muito seguro das suas (razões e calaram-se muitos dos bons (propósitos manifestados anteriormente; e isto para não falar já no absoluto olvido a quo foram condenadas todas os sugestões emanadas desta Casa. Significa isso que o Governo não pode fazer melhor ou que não quer ouvir mesmo as razões advogados pela Assembleia ou por alguns dos seus membros?

Seja como for, a realidade á esta: a Lei de Meios para 1973 não corresponde, de forma alguma, ao que se deveria esperar de um documento de importância tão decisiva para a vida nacional. Posso a justificar esta afirmação.

Em primeiro lugar, titio possui expressão global: não refere todo o território nacional, não tem em conta a unidade e universalidade do orçamento (para repetir uma expressão já consagrada), não identifica, na justificação que apresenta, alguns dos sectores mais destacados da natividade nacional.

Como se isto fosse pouco, enferma ainda de outros vícios de base: não é suficientemente explícita quanto a objectivos de política económica porque pretende ser programática sem dispor de um programa; não é suficientemente rigorosa nas análises e perspectivas que apresenta porque se não dispõe tunda do órgão estatístico que o desenvolvimento do País há tantos anos reclama; finalmente, é parcial nos juízos que expende porque não encara de frente os verdadeiros problemas com que o País se debate e condicionam tudo o que se fizer para definir o seu futuro: a emigração, a guerra e a inflação. No que respeita, às medidas de política sectorial que enuncia, a proposta é confrangedoramente falha de originalidade e convicção, especialmente no que respeita ao sector agrícola. Bate-se sempre a mesma tecla, muito estafada, da melhoria dos estruturas agrárias, da formação profissional, das condições de exploração dos aproveitamentos hidroagrícolas, de vários tipos de fomento ligados a culturas e a pecuária, etc. Como se os principais interessados pudessem, ano aipos ano, aguardar o desencadear de acções eficazes em caída um destes domínios.

Mas, enfim, retomo o fio da meada, repetindo o que já por várias vezes afirmei sobre o equívoco em que se labora dizendo que o capítulo II trata da economia nacional, quando, na realidade, se reporta, quando muito, à economia metropolitana. Insisto neste ponto apenas por uma questão de coerência, e não porque esteja convencido das vantagens de vir a abordar a gestão dos territórios ultramarinos por esta via. Sabe-se, por outro lado, que o Orçamento Geral do Estado respeita apenas à metrópole e que a contabilidade nacional só tem em conta o território do continente . . . Tudo isto contribui, evidentemente, para tornar o esquema substancialmente confuso. O que me parece importante, no entanto, é manter o princípio de que os economias metropolitana e ultramarina permanecem ainda demasiado dependentes para que se possa compreender a evolução de uma na quase completa ausência de referências à outra.

No que respeita ao carácter parcelar da Conta Geral do Estado, convirá dizer que ele não resulta apenas da

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limitação geográfica, mas também cia circunstância de não se entrar em linha de conta com a totalidade das receitas da Previdência, dos serviços e fundos autónomos e da administração local. Em 1970, segundo dados provisórios, o seu montante ascenderia a cerca de 18 milhões de contos, ou seja, 55 por cento das receitas orçamentais do Estado para o mesmo ano. Esta observação, à força de ser repetida, já ganhou foros de rotineira. Mas, se a Constituição Política define o Estado português como uma República unitária, se o Orçamento Geral do Estado é unitário, como é possível imaginar que perdurem no seu seio áreas de gestão autónomos? Por outro lado, como também se dizia na proposta para 1970, impõe-se proceder cão ajustamento da organização corporativa aos princípios da Constituição e das leis fundamentais".
Pergunto: que se fez, entretanto, no sentido de ajustar a realidade as intenções manifestadas então pelo próprio Governo?

Outra falha importante reside na ausência de referências à política a seguir em alguns sectores, como a educação, obras públicas, transportes e comunicações, etc. Tudo isso terá de aparecer inserto no programa de execução para o próximo ano e deveria já estar disponível para acompanhar a proposta. Fica por definir o país a que ela se dirige e não se caracteriza suficientemente a situação em que se encontra o povo que aqui representamos. Esse povo, sabemo-lo todos, foi tocado intensamente pelo fenómeno emigratório ao longo da última década. Que se diz, a propósito, em toda a Lei de Meios? Que conjecturas se formulam sobre as deslocações internas, as transferências entre os diversos sectores de actividade, o grau de satisfação das necessidades primarias já alcançado? Nada.

A propósito do emprego, diz-se apenas que o mercado do trabalho evoluiu de forma positiva, mercê da acentuada diminuição da corrente emigratória verificada em 1971, e, quanto a orientação geral, consigna-se no artigo 3.° a intenção de o Governo "promover a elevação do nível de vida do povo português e assegurar a estabilidade económica interna". Neste mesmo ponto [alínea b)] deixou de se referir como intenção procurar-se atingir "um melhor equilíbrio regional no desenvolvimento da economia da Nação" (cito a proposta elaborada para 1972).

Na verdade, á bom que nos comecemos a habituar a ideia de que é ainda possível promover um desenvolvimento equilibrado do País. As distorsões tornaram-se tão acentuadas e as carências de certas áreas tão profundas que será utópico considerar ainda viáveis os esperançosos esquemas de ordenamento do território que trouxeram alguma novidade ao III Plano de Fomento. Bem desejaria estar enganado ao fazer esta afirmação porque a renúncia àqueles objectivos corresponde a meia derrota na batalha que estamos travando no campo económico.

Mas temos de ser realistas e por isso não posso deixar de compreender a prudência do Governo ao eliminar semelhante objectivo do rol de directrizes fundamentais a seguir. Em todo o texto pressente-se, aliás, uma sensível renúncia u invocação da política regional. Há que promover o desenvolvimento com base em investimentos concentrados nas áreas mais dinâmicas; e isso sem perda de tempo, porque também elas começam a acusar sintomas pouco tranquilizantes.

Não obstante os meritórios esforços desenvolvidos por todos os que lutaram pela definição e aplicação de uma política regional, o interior do País continuou a afundar-se no pântano da inércia e da descrença, sangrado dos seus melhores valores, impotente para resistir ao apelo que lhe chega das áreas naturalmente mais dotadas. Perdida esta batalha, Portugal ficará mais pobre, mais pequeno e também mais vulnerável. Nas áreas predestinadas ao abandono só será possível manter viva uma presença que dignifique, se se facilitar o acesso a elas a partir do litoral e das áreas fronteiriças espanholas; se se revigorarem alguns centros urbanos fundamentais, como Bragança, Guarda, Covilhã, Castelo Branco, Portalegre e Beja; se se fizer acompanhar uma arborização maciça de uma política criteriosa de aproveitamento de recursos aquíferos e potencialidades turísticos. Para ser possível, o desenvolvimento terá de ser induzido do exterior através de estímulos sociais e económicos de vária ordem.

É evidente que a falência que acabo de referir se liga Intimamente à de uma agricultura de subsistência que todos sabíamos condenada ao insucesso. Vai agitar-se ainda por alguns anos, apenas o tempo suficiente para deixar morrer os velhos que restam, dar asas a alguns jovens e caírem em si alguns indecisos. Se a licito nos puder servir, olhe-se, enquanto é tempo, para as áreas onde a agricultura ainda é viável, incentivando a associação dos agricultores, interessando-os na transformação e comercialização dos seus produtos, integrando-os, em suma, nos circuitos económicos que se reconhecem válidos para outros sectores.

Mas se a emigração não afectou igualmente as áreas agrícolas e, em certa medida, até favoreceu algumas, que pensar dela como fenómeno global, transformador de homens e sociedades, agente de progresso ou de ruína? Nem todos nos apercebemos ainda das consequências profundas que o actual surto inevitavelmente trará a toda a economia portuguesa. A partir de 1966 a população começou a diminui e a composição etária a alterar-se com tendência para um progressivo envelhecimento. A rarefacção dos camadas jovens tornou mais difícil a mobilidade profissional e menos elástica a oferta de mão-de-obra, o que limita de algum, modo os transformações em curso. E evidente que se conseguiu assim evitar o desemprego (nos doze últimas anos o déficit de postos de trabalho teria subido a 600 000) e beneficia" de substanciais poupanças (mais de 18 milhões de contos, só em 1971).

Mas os valores oficiais relativos ao último ano e a intensidade da emigração clandestina polarizada para França, preocuparam-me sobremaneira. Porquê? Não esperava que em 1971 ainda fosse possível ver partir para cima de 150 000 pessoas, entre as quais mais de 100 000 seguiram o seu caminho com o rótulo de clandestinos. Neste movimento participaram amplamente mulheres e crianças, com relevo para o grupo etário até aos 14 anos; e, para cúmulo da surpresa, verifiquei que tinham partido especialmente da faixa litoral mais desenvolvida (distritos de Lisboa, Porto, Aveiro, Leiria e Braga, para além do de Ponta Delgada, já tradicional). Sei, por outro lado, que para o ano em curso a situação não melhorou muito e está começando a afectar seriamente o tal rectângulo mais estreito em que se concentram agora as nossas esperanças.

Em face da indiferença com que estes valores foram recebidos pelo grande público através da imprensa, pergunto a mim próprio se as pessoas tidas por mais responsáveis estão inconscientes ou incapazes de reagir. Uma vez seco o interior, o movimento envolve já áreas onde se vive razoavelmente, onde há trabalho e se paga decentemente; e não é só a agricultura que expulsa gente activa, são também as indústrias, que a deixara partir! Se possuímos uma estrutura produtiva tão vulnerável, com que tranquilidade podemos encarar o futuro? Para que servirá elaborar planos se não tivermos a quem os endossar?
Não estará realmente o povo português a divorciar-se dos destinos da sua pátria?
Sinto que estas palavras traduzem muita amargura, mas não podia deixar de as pronunciar.

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Há-de chegar o dia em que teremos de prestar contas pela nossa imprevidência. Estamos a queimar trunfos, uns atrás dos outros, preferindo guardar um presente aprazível a prevenir um futuro negro. E para não carregar muito os tons vou evitar falar do segundo grande problema que enunciei - a guerra - para passar imediatamente à inflação.

Como não podia deixar de ser, a proposta de lei fez várias referências a este fenómeno, evitando, no entanto, todo o tom alarmista.

Circula dinheiro em excesso, mas o investimento é escasso; os preços galopam, os salários procuram acompanhá-los, mas a produtividade do trabalho nem sempre reage a esse estimulo. O Governo manifesta-se prudentemente receoso de que qualquer intervenção possa afectar o ritmo de crescimento e o volume de emprego (pp. 23-24).

Mas não sei até que ponto essa prudência não parecerá excessiva àqueles que mais directamente sofrem o impacte demolidor da inflação. Quero referir-me, aos funcionários públicos, àquela horda de serventuários, mais ou menos capazes, que não têm possibilidade de se dirigir ao patrão pedindo aumento de ordenado porque a vida está cara. Se pudessem ler a Lei de Meios, talvez achassem estranho que a certa altura se diga que "o montante das emissões de acções efectuadas de Janeiro a Outubro deste ano ascendem [. . .] a perto do triplo do valor registado em igual período de 1971" (pp. 44-45). E que em países estrangeiros, como na Suíça, uma das medidas decretadas contra a inflação consiste exactamente em limitar drasticamente a emissão de acções e obrigações. Poder-se-á objectar que por esta via a pequena poupança pode ser canalizada para o investimento produtivo. Em face do que se tem passado ultimamente, recuso-me a aceitar que isso seja verdade. Há quem beneficie, sim, mas não é o pequeno investidor. Esse nunca sabe verdadeiramente o que há-de fazer ao dinheiro quando pode constituir um pequeno pecúlio.

É que este aumentará sempre mais lentamente do que o custo dos bens que quer adquirir. Uma caso, por exemplo, é uma genuína aspiração, de muitos, mas dificilmente concretizável se não houver outros bens para venda ou disposição para emigrar.

Este monstro de sete cabeças que é a inflação, ao mesmo tempo que gera o dinheiro fácil, torna realmente a vida difícil a muita gente. Voltando ao funcionalismo público, e sem qualquer ponta de egoísmo, não posso deixar de dizer que me regozijo com a intenção manifestada pelo Governo de proceder a revisão das condições em que presta serviço.

Os termos em que a mesma é referida podem parecer talvez um pouco vagos, mus na justificação prévia esclarece-se que se trata de "dobar a máquina administrativa do pessoal qualificado que o seu bom funcionamento cada vez mais exige" (p. 106).

Receio bem que esse pessoal qualificado seja cada vez mais difícil de encontrar; mas restam os outros escalões, ainda apegados ao prestígio e segurança que a função traz.

Em que situação se encontram após quatro anos de congelamento de vencimentos e em face de uma deterioração do poder de compra da ordem dos 30 por cento?

Imagina-se o que será o seu dia-a-dia. Mas, enfim, em plena campanha anti-inflacionista o Governo entendeu por bem propor um novo imposto, um tímido imposto. Foi a melhor forma de chamar a atenção do publico para um documento que, de outro modo, passaria despercebido. Em face do elevado preço dos automóveis, da gasolina, das reparações, dos seguros e do estado das estradas, sentir-me-ia, naturalmente, inclinado a votar contra este imposto, até porque não creio que, com ele, venha melhorar-se muito seja o que for. Se se resolvesse por esta forma o problema da circulação em Lisboa! . . .

Por outro lodo, um veículo de duas ou quatro rodas é um bem estimável e uma ferramenta de trabalho importante, face à crescente insuficiência dos transportes colectivos. Não, decididamente creio que se vai cair num outro pequeno beco sem saída. A tributar, preferia que se optasse pelo tabaco, que ó o mais barato da Europa e indiscutível fonte de malefício. Um escudo em cada moço de tabaco renderia ao fisco, com muito menos trabalho e mais justiça, o equivalente ao rendimento do imposto que se tem em vista. Limitaria este apenas aos proprietários de automóveis de luxo (de preço superior a 150 contos, por exemplo), taxando fortemente aqueles que possuíssem mais do que um.

Começar-se-ia, assim, a dar corpo a uma ideia que surgiu, mas não fez carneira e que consiste em tentar limitar a ostentação tributando os índices exteriores de riqueza.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, enfim, não quero complicar mais as pesados tarefas que impendem sobre o Governo. Na realidade, é fácil propor, é fácil lamentar, é fácil criticar. O difícil é pôr de pé seja o que for, ainda que seja uma quarta edição da lei de meios que o Governo nos ofereceu em 1969.

O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A proposta da lei de meios ora em discussão, a semelhança das do último decénio, visa a adaptar-se às horas graves que o País atravessa, traduzindo primacialmente o firme e inabalável propósito de as enfrentar não só com dignidade, mas também com realismo de soluções.
Através de tão importante quão necessário documento - pois que constitui o plano de vida e da Administração do País para o ano de 1973 -, verifica-se que o programa financeiro a executar assenta numa escala de valores onde a prioridade é dada, conforme se dispõe no artigo 4.°, aos encargos com a defesa da integridade nacional, pois que continuam perfeitamente válidos "os fundamentos que têm presidido à sua formulação e inalteradas as circunstâncias especiais de conjuntura política no ultramar". O respeito pelo princípio da defesa da integridade da Pátria é da própria essência dos valores nacionais e continua a ser dele expressão legislativa a primeira prioridade que às despesas com a defesa vem sendo dada nas leis de meios.

Esta norma orientadora do toda a política de despesas, e que, como bem se sublinha, "materializa um compromisso do Governo perante a Nação quanto as mais altas metas a que visará a sua actuação política", não leva, porém, a descurar, mas antes a procurar harmonizar, este imperativo da defesa da integridade nacional com a continuidade do esforço para promover o mais rápido e profundo processar do desenvolvimento.

A Lei de Meios que estamos a apreciar vem vazada nos moldes técnicos e em princípios de equilíbrio ordenado e prudência administrativa instaurados em 1928 por Salazar e, desde então, seguidos por todos quantos lhe sucederam na gerência da pasta das Finanças. Continuando a definir as linhas mestras a que a administração pública deverá obedecer e constituindo como que o espelho da vida económica e financeira do País, a Lei de Meios que o Ministro Cotta Dias apresenta para vigorar no próximo ano vem acompanhada, como é já costume, de um extenso e bem elaborado relatório, em

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que se trata da conjuntura económica, internacional e nacional, da actividade financeira do Estado e, por último, da definição e justificação dos propósitos.

E, decorrendo a sua discussão numa época particularmente grave para a vida da Nação, natural e lógico é que de nós exija redobrada fidelidade & verdade portuguesa e lealdade aos métodos que fundamentam a sua permanência ou o seu êxito.

Isto porquê, e como já foi salientado pelo Sr. Presidente do Conselho, "inquietantes condições da economia e da política internacionais agudizam os problemas nacionais, fazendo-nos atravessar horas muito difíceis".

Em tais circunstâncias, a sobriedade deveria constituir timbre da nossa maneira de ser nacional, pois, uma vez esquecida, é indício de aviltamento. A austeridade que tão arredia anda e que deveria marchar a par com um aumento de produtividade dá-nos, pelo contrário, sinais de relaxamento traduzidos numa diminuição do esforço posto na produção com excessivos vagares na execução dos trabalhos sem ourar da preocupação pelo que possa acontecer quanto à produtividade.

Esses sinais de relaxamento que, por vezes, já têm sido denunciados nesta tribuna são captados pelo povo que sua e pinga e que tanto gostaria de novo ver arvorado em norma de vida portuguesa o austero lema do "produzir e poupar" que nas duras privações subsequentes & guerra vigorou e cuja actualidade e necessidade bem vivas importava manter não só por parte dos dirigentes, como doa dirigidos.

Sempre atento ao interesse nacional de que foi intérprete fidelíssimo e devotado servidor (e afirma-se isto na convicção de que se proclama uma verdade que importa (repetir, muito embora pese e incomoda uns tantos vesgos de ódio e malquerenças e mergulhados na cegueira dos seus interesses pessoais, das suas desmedidas ambições e dos seus ressentimentos e frustrações), Salazar ensinava, em 1946, numa mensagem dirigida aos Portugueses (in Discursos, vol. IV, p. 220):

Há que fazer sentir que todo o desperdício é um pecado contra a Nação, quando importa lembrar que o nosso supérfluo pode ser o necessário para outros e os nossos desperdícios a vida de muitos homens.

Trabalhar e poupar devia ser, nos momentos difíceis que vivemos, divisa nacional. E que estamos longe de ser ricos paira nos podermos dar ao luxo de deixar de trabalhar e de poupar. O rendimento dos bens nacionais, mesmo bem distribuído, não chega para que todos os portugueses possam ter o necessário. Há que produzir mais riqueza e, sobretudo, evitar o seu esbanjamento, até porque, do ponto de vista moral, a ninguém é licito desperdiçar ou esbanjar aquilo de que outros carecem.

No florilégio das nossas sentenças populares consta uma que reza assim: "água mole em pedra dura tanto dá até que fura". Eis por que, escudado na força desta sentença, não nos tenhamos cansado de, por alturas da discussão das leis de meios e das contas públicas, clamar pela necessidade de um clima de austeridade nos gastos públicos, pois que consideramos que um mínimo de clima de guerra deveria ser vivido convictamente pela Nação, tanto interna com externamente, sem que fosse afectado o seu progresso económico, que reputamos vital. Quer em representações oficiais para estarmos presentes em todos os congressos no estrangeiro, quer em comemorações e solenidades de carácter nacional e regional, tudo se processa como se a vida da Nação decorresse em mar de rosas e a situação não fosse aquela que tão dispendiosa é com a condução de uma guerra imposta e que tanto requer uma firme e sã disciplina nos gastos públicos, com vista a evitarem-se despesas inúteis e desnecessárias.

Numa época em que sacrifícios são pedidos a todos os portugueses, não seria senão de aplaudir que os serviços oficiais dessem exemplo e partilhassem, efectivamente, desse sentimento de austeridade. É que está em causa o interesse vital da Nação, pelo que não pode haver concessões nem transigências, pois, conforme há tempos afirmou o general António Spinola, "não faz sentido que a uns se exija tudo, até ao limite da própria vida, e que outros continuem a viver um clima de cómodo alheamento".

Como em todas os horas graves, há que cerrar- fileiras e retomar a vigília de armas, quer nos frentes de combate, quer na retaguarda, pois que, se o perigo pode vir do inimigo que nos ronda a porta da Nação, onde há, por isso mesmo, muralhas e trincheiras a guarnecer, não menos se encontra na retaguarda, onde se impõe proceder de igual maneira, como na batalha das frentes africanas em que a juventude repele corajosamente os assaltos do terrorismo.

O Sr. Peres Claro: - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, o perigo, se está na ameaça que os inimigos de dentro e de fora fazem investir contra a Nação, não menos se encontra nas facilidades, no desinteresse, na apatia e no comodismo perante "a grande força social que assegura o aproveitamento das riquezas naturais e constitui a manifestação mais evidente do espírito de colaboração no seio do agregado nacional - o trabalho", ocasionando uma baixa de produtividade que se repercute numa alta de preços e menor eficiência dos serviços. Ora, o momento que vivemos não é o momento de descansar e de adormecer ura sentimento de falsa segurança, mas antes o de trabalhar e estar vigilante. Pensar o contrário pode vir a ter o mais amargo dos sabores.

Daí que a vida nacional - a privada e a pública - não possa nem deva continuar a processar-se como se vivêssemos tempos áureos, sem que se reflicta bem nas circunstâncias, e, de harmonia com elas, a travarmos gastos desmedidos e desnecessários e a comprimirmos despesas que não sejam imprescindíveis.

A Administração tem de dar exemplo para tanto, não contrariando os princípios de austeridade na utilização dos dinheiros públicos nem os "critérios de estrita economia na execução orçamental . . .".

Tudo deve ser orientado, quer no sector público, quer no particular, para que o útil não seja sacrificado ao fútil, para que o nível de produção seja elevado, contrariando a orientação - infelizmente já muito generalizada entre nós - de procurar antes diminuir o esforço posto na produção, sem qualquer preocupação pelo que possa acontecer quanto à produtividade, com a cada vez maior progressão dos salários e sem a correspondente melhoria da qualidade e quantidade dos bens produzidos. De contrário, o desequilíbrio económico que já hoje domina a vida portuguesa tenderá a agravar-se de maneira acentuada e com desastrosas consequências.

Em obediência e para corresponder "a um sério pensamento de governo" há que impedir que os objectivos e os processos da Administração e do Governo sejam subvertidos pela influência de elementos cuja actividade e atitudes só acarretam o desprestígio dessa mesma Administração e Governo.

E depois destas considerações gerais, permito-me ainda, Sr. Presidente, fazer umas ligeiras anotações aos arti-

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gos 9.°, alínea g), e 22.°, que se referem, respectivamente, à, política fiscal e às providências sobre o funcionalismo.

Mantém-se mi presente proposta da lei de meios as "traves mestras da política fiscal em execução, procedendo-se apenas a alguns ajustamentos nas figuras tributárias existentes" e u criação de um novo imposto anual lançado sobre veículos automóveis classificados de não utilitários.

Considerada necessária esta tributação, o critério da cilindrada apontado na proposta para definir o carro utilitário não se nos afigura como o mais adequado. Estamos com a Câmara Corporativa quando entende como mais lógico e mais justo o critério de fazer incidir o imposto sobre todos os veículos automóveis, urna vez que a receita será consignada a melhoria ou construção de novas estradas, pelo que todos os utentes dessas estradas devem, sem excepção, pagar o benefício que virão a ter. De outra forma, criar-se-á o problema de injustiça fiscal, isentando-se do pagamento do imposto uma legião de proprietários de carros de pequena cilindrada perfeitamente aptos a pagar o imposto e para quem o carro constitui um sinal exterior de riqueza, e não um instrumento de trabalho.

Aponta-se também na proposta a preocupação do Governo em deter a conjuntura inflacionista, preconizando-se para tanto uma política prudente. O ataque à alta de preços que vem toldando de dificuldades sérias a vida dos Portugueses é tarefa meritória que se impõe fazer, não devendo o Governo regatear esforços nesse sentido. Mas como se verifica também serem elevados os volumes de dinheiro, resultantes da poupança dos particulares, há que criar condições suficientemente atractivas para suscitar o interesse desses particulares, levando-os a canalizar esses volumes de poupança e aplicá-los mão em importações de artigos supérfluos, em especulações de terrenos ou no financiamento de luxuosas construções, mas antes em investimentos produtivos e empreendimentos que sejam tidos por socialmente aconselháveis.

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem!

O Orador: - O problema da situação do funcionalismo público constitui um outro grave problema que o Governo tem de enfrentar. Sabido que da sua deficiente remuneração resultam várias e graves incidências, todas elas em prejuízo do bom funcionamento dos serviços, . . .

O Sr. Albino dos Reis: - Muito bem'

O Orador: - ... tais como a dificuldade no recrutamento de bons elementos, a acumulação de empregos, a fuga dos melhores para o sector privado e ainda a necessidade de horas extraordinárias para melhorar as condições de remuneração, não admira que o flagrante problema do funcionalismo continue presente nas preocupações do Governo, constituindo uma das suas preocupações dominantes.

E muito embora haja sido realizado bastante, muito mais importa ainda realizar, quer pelo que respeita à revisão necessária do seu Estatuto, quer às condições de base da sua valorização e às medidas de carácter social que digna é humanamente devem rodear e proteger o servidor do Estado e o seu agregado familiar.

E bom será que o Governo possa, dentro das actuais limitações financeiras, prosseguir, tão "rapidamente e em força" quanto possível, os objectivos económico-sociais em benefício do funcionalismo público. Só desta maneira poderá evitar não só o aviltamento das condições de vida dos seus servidores, mas também o não menor perigo do depauperamento dos elementos de qualidade existentes nos seus quadros pela fuga para o sector privado.

Mas a par de tudo quanto o Estado possa fazer pelos seus servidores, concedendo-lhes aquilo que pode conceder-lhes, importa também que todos os servidores se compenetrem dos seus deveres para com o Estado, dando-lhe, em dedicação, assiduidade, zelo e competência, tudo a quanto se obrigaram com a prestação do juramento que os fez ingressar na função pública.

E dando o meu voto na generalidade à Lei de Meios pára o ano de 1973, não quero deixar de fazer uma afirmação do fé: nos governantes, a quem Deus não deixará de assistir dando-lhes o ânimo e a clarividência necessários para enfrentarem as dificuldades que todos os inimigos da causa sacrossanta da Pátria nos ofereçam; e nos governados, para que mais e melhor se compenetrem da gravidade do momento que a Nação atravessa e actuem em conformidade, de modo que possa ser sempre seguido o caminho certo - o caminho digno de Portugal.
Tenho dito.

O Sr. Eleutério de Aguiar: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A exemplo dos anos anteriores, subimos a esta tribuna com o propósito de fazermos algumas considerações acerca da proposta de lei de autorização de receitas e despesas, diploma em que se formulam os princípios básicos que orientarão a política económica e financeira do Governo no ano de 1973.

Para ganhar tempo e economizar esforços, acompanharemos a argumentação produzida no relatório que antecede a proposta governamental, que nos permite, com relativa facilidade, apreciar a evolução da conjuntura do País, por comparação entre o que se passou em 1971 e nos primeiros oito meses do ano em curso, tendo em atenção, por outro lado, a situação internacional.

Assim, extrai-se, em síntese, a afirmação de que se intensificou a expansão da actividade produtiva na generalidade dos países, atingindo os 5 por cento, no conjunto da O. C. D. E., enquanto o aumento dos preços, no espaço considerado, foi de 4,75 por cento contra 6 por cento nos anos anteriores. .

Retendo o que, entretanto, se verificou no nosso país, duas conclusões se nos oferecem de sentido antagónico. Efectivamente, por um lado, assinala-se um crescimento do produto interno nacional da ordem dos 7 por cento, sensivelmente superior ao do conjunto dos Estados membros da O. C. D. E., facto que se impõe desde já salientar, atendendo-se às vicissitudes que impendem sobre a economia portuguesa, em especial as incidências da luta que travamos no ultramar. Já o mesmo sentimento, porém, não nos acompanha quando comparamos o aumento dos preços, manifestamente superior do lodo português, avolumando ainda mais a preocupação sentida, face aos agravamentos substanciais registados nas rubricas "Alimentação" e "Habitação". Na verdade, verificaram-se aumentos dos preços ao consumidor entre 12,5 e 17,2 por cento, em relação ao período Janeiro-Agosto do ano de 1971, ao passo que os aumentos dos salários atingiram apenas o índice de 13 por cento.

Conforme, aliás, se salienta no relatório, continuam a evidenciar-se pressões inflacionistas, aumentando consideravelmente o saldo negativo da balança comercial. Nos primeiros oito meses do ano corrente, as importações aumentaram cerca de 27 por cento, correspondendo apenas um acréscimo de 9 por cento no valor global das exportações, resultando substancial agravamento do déficit da balança, passando de 9 951 000 contos para 15 766 000 contos.

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Em contrapartida, a balança de pagamentos evidencia saldo positivo, em consequência das remessas dos emigrantes e das receites do turismo. Se, com satisfação, detectemos uma tendência regressiva no factor, emigração, que esperamos se acentue a medida do desenvolvimento em curso, é com particular regozijo que se acompanha o crescente ritmo de expansão das actividades turísticas.

De acordo com números recentemente divulgados pela respectiva Direcção-Geral, no 1.° semestre de 1972 o saldo da balança turística nacional relativa u metrópole foi de 2 578 000 contos. Acrescentam elementos preparados pelo Comité de Turismo da O. C. D. E. que, em 1971, as receitas globais do turismo atingiram 8 619 000 contos, enquanto as despesas se cifraram em 3 306 000 contos. O saldo daí resultante, de 5 313 000 contos, correspondente a um acréscimo de 48,7 por cento em relação a 1970, permitiu cobrir - segundo a mesma fonte - mais de um quarto do déficit da balança comercial.

Até o fim de 1972 prevê-se que o número de visitantes atinja os 4 500 000, significando um aumento de 16 por cento em relação a 1971, o que nos permite antever a importância desta actividade no conjunto da economia nacional. De 1963 a 1971 a nossa capacidade hoteleira passou de 57 000 comas para, 74 000, devendo alcançar-se 130 000 em 1979.

Constituindo expressivo índice de extraordinário desenvolvimento, os investimentos neste domínio, que foram de 5300 milhares de contos na vigência do III Plano de Fomento, deverão elevar-se a mais de 11 milhões entre 1974 e 1979. Significativo, por outro lado, que no âmbito do IV Plano de Fomento esteja prevista a criação de 30 000 novos empregos, impondo-se, assim, o turismo como insofismável instrumento de movimentação económica, a reflectir-se de forma decisiva no quadro das actividades nacionais.

Analisemos, agora, mesmo sucintamente, a actividade financeira do Estado em 1971, para melhor compreensão do esforço que vem sendo despendido no ano em curso. Temos, em milhares de contos, que as receitas arrecadadas foram: ordinárias, 32 285; extraordinárias, 4644. E as despesas, respectivamente, de 19 650 e 16 998.

Da evolução das receitas e das despesas ordinárias - continuamos com o relatório em mãos - resultou um saldo positivo de 12 635 milhares de contos, que possibilitou o financiamento de 73 por cento das despesas extraordinárias, tendo sido respeitadas as prioridades oportunamente votadas, avultando os encargos com a defesa nacional, que somaram 10 134 milhares de contos, contra 9476 em 1970, e bem assim os investimentos públicos efectuados no continente e ilhas adjacentes ao abrigo do III Plano de Fomento, num total de 5542 milhares de contos, traduzindo uma expansão de 23 por cento relativamente aos 4184 milhares despendidos no ano anterior. De acordo com o mesmo programa, o auxílio financeiro ao ultramar cifrou-se em l 190 000 contos, incluindo 530 000 destinados ao empreendimento de Cabora Bassa.

Afigura-se-nos oportuno confrontar a actividade financeira nos meses Janeiro/Agosto últimos com os de 1971. Regista-se, desse modo, um acréscimo de 14,7 por cento nos receitas ordinários, enquanto na despesa o aumento foi sensivelmente inferior, situando-se a taxa de 8.5 porcento, não obstante reforços apreciáveis nas dotações atribuídas aos Ministérios da Educação Nacional (+ 367 200 contos) e da Saúde e Assistência (+ 11 100 contos).

Igualmente, em 1072, estão a assumir especial relevância os investimentos afectos à execução do Plano de Fomento, que atingiram 20 774 milhares de contos, contra 17 920 em homólogo período de 1971, assim distribuídos: investimentos de carácter social, 4372 milhares de contos; sectores fundamentais para o crescimento da economia, infra-estruturas e pólos de desenvolvimento, 16 373 milhares de contos, isto relativamente ao espaço metropolitano.

Congratulando-nos por verificarmos que, não obstante o esforço anormal exigido pela defesa da integridade nacional, o Governo teju mantido o equilíbrio financeiro indispensável ao lançamento e prossecução da política de desenvolvimento, considera-se legítimo reformular o pedido, já, feito, em perfeita comunhão de ideias com os responsáveis administrativos dos distritos autónomos, sobremaneira carenciados, no sentido de que o Estado Abdique de porte dos impostos que ali arrecada, os quais em 1971 atingiram 231 069 contos só no Funchal, ao passo que a receita total da respectiva Junta Geral foi inferior a 118 000 contos.

Analisemos agora a proposta para 1978 em termos necessariamente breves, até porque o Governo se propõe prosseguir na orientação definida nos anos anteriores.

Palavras de justo apreço são devidas pêlos objectivos enunciados, particularmente no domínio da política económica e financeira, visando o fomento da actividade produtiva e o reforço da nossa capacidade competitiva, tanto mais de salientar quanto se aproxima a luta num vasto e poderoso mercado internacional.

Reservando-se para outra oportunidade referência mais circunstanciada às medidas que o Governo pretende adoptar, em matéria de política comercial, defesa do consumidor e fomento da exportação, retivemos o propósito do incentivar a reestruturação fundiária, particularmente importante para a Madeira, cuja propriedade é extremamente defeituosa, facto que, para além da permanência em larga escala do obsoleto regime de colónia, com as inerentes vicissitudes de ordem social e económica, condiciona quase decisivamente o fomento agro-pecuário. Em 20 000 ha agricultáveis, representando 27 por cento da área total da ilha, existem mais de 27 000 explorações, sendo a dimensão de 87 por cento inferior a 0,5 ha e cerca de 50 por cento não chegando a atingir os 1000 m2.

Seguindo o esquema da proposta, aguardamos com natural expectativa as anunciadas providências sobre o funcionalismo, certos de que o Governo terá na devida conta os reconhecidas desvantagens existentes, em relação ao sector privado. Não esquecemos, a propósito, a frustração que se apoderou da classe dos servidores do Estado, em virtude de as alterações introduzidas no Estatuto da Aposentação, com aspectos indiscutivelmente positivos, por outro lado, não terem incluído os limites de idade, mantendo-se os 70 anos para o exercício da função e os 60 de idade e 40 de subscritor da Caixa na aposentação ordinária. Consideremos o abaixamento daqueles limites para os ansiados 65 e 36 anos, respectivamente, como meta a atingir em futuro próximo pelo Estado social de Marcelo Caetano.

Cabe aqui um parêntesis para insistirmos na imperiosa necessidade de serem alargadas a todos os funcionários que trabalham nos ilhas adjacentes os regalias já concedidas, muito justamente, por alguns serviços. A este candente assunto temo-nos referido em várias ocasiões, mais documentadamente em Dezembro de 1970, e vimo-nos acompanhados, com particular brilho e flagrante oportunidade, face ao constante agravamento do custo de vida, pelo ilustre colega, Dr. Sousa Pedro, na passada sessão legislativa.

Algumas palavras, ainda, sobre o proposto encargo sobre os automóveis e outros meios de transporte particular, incluindo motociclos, considerando já a alteração sugerida pela Câmara Corporativa.

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Não é sem reservas que acolhemos a iniciativa governamental, e muito menos acompanhamos a Câmara no seu "entusiasmo fiscal". E isto porque, em muitos casos, não conseguimos destrinçar entre "sumptuário" e "utilitário", além de que não nos afastaremos demasiado da realidade, admitindo-se que o imposto acabará por ser suportado com prejuízo de bens mais essenciais. As nossas principais reservas filiam-se; porém, na elevada tributação que já incide sobre os veículos automóveis, avultando a taxa para o Fundo de Fomento de Exportação, inteiramente a cargo do comprador, variando desde 10 por cento, sobre custos até 50 contos, aos 100 por cento, acima dos 400 contos. Quanto aos motociclos, constituem o meio de transporte das massas trabalhadoras e de estudantes, sobretudo nos meios rurais. Mais comentários seriam perfeitamente desnecessários, aguardando-se uma iniciativa desta Assembleia, com vista a encontrar fórmula equilibrada, que, não dificultando a acção governamental, também não venha sobrecarregar consideravelmente o já difícil orçamento de grande porte dos cidadãos, ainda que, na circunstância, possuidores de meio de transporte.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Como habitualmente, terminaremos a nossa intervenção no debate sobre a lei de meios com uma referência ao sector do ensino. E considerando o que sempre aqui temos afirmado, desde Dezembro de 1969, acentuando a necessidade de uma autêntica democratização, é-nos muito grato manifestar o nosso aplauso pelo conjunto de realizações concretizadas pelo Ministério da Educação Nacional.

O nosso entusiasmo só é limitado porque ainda não conseguimos atingir um ritmo susceptível de recuperar os atrasos sectoriais, correndo-se o risco de nos distanciarmos dos padrões que constituem as metas desejadas e indispensáveis. Para melhor sermos compreendidos, cita-se o exemplo das instalações escolares, que é flagrante, pois, se o actual ritmo de construção for duplicado, só em 1977 ficará concluído o plano previsto para execução até 1970. A manter-se o ritmo presente, só em 1984 o referido plano estará completo . . .

Encontramos, no entanto, aspectos que nos suscitam apoio incondicional, pois traduzem o desejo firme de andar mais depressa e melhor, passe o paradoxo com o aforismo popular. Que a política se afirma mais por obras do que por palavras!

Por directa associação com os considerações que acabámos de ler, salientamos em primeiro lugar a reorganização do Gabinete de Estudos e Planeamento da Acção Educativa, de harmonia com a nova Lei Orgânica do Ministério, passando a denominar-se Gabinete de Estudos e Planeamento e competindo-lhe funções de estudo, planeamento, coordenação e dinamização das acções que cabem na formulação da política geral da educação e execução da ampla reforma em curso a todos os níveis do ensino. Estando cometida ao Gabinete, concretamente, o planeamento da rede escolar do País e propor a criação, modificação ou extinção de estabelecimentos, sugerimos aos seus responsáveis, como matéria de estudo já adiantada, um importante trabalho elaborado no âmbito do Plano Director da Cidade do Funchal, em que é objectivamente criticada a qualidade inferior da maioria dos edifícios existentes e se acentua a manifesta falta de novas construções e a conveniência da revisão dos núcleos, em consequência das variações resultantes da mobilidade geográfica da população residente, no próprio espaço regional, e, sobretudo, através do emigração.

O decreto relativo à coeducação, que vigorará a partir de Outubro do próximo ano, virá iniciar uma nova época no nosso ensino, pondo cobro à anacrónica separação dos sexos. Responsável por um estabelecimento em que se pratica o sistema desde a criação, com crianças e jovens entoe os 3 e os 16 anos de idade, julgamo-nos autorizados a deixar aqui breve testemunho das vantagens da coeducação.

A realização dos exames de admissão à Universidade, para Indivíduos com mais de 25 anos, não obstante as dificuldades de vária ordem que se verificaram, constituem mais um passo para vencer a batalha da educação, o mesmo devendo afirmar-se em relação ao ensino liceal nocturno, que urge generalizar a todos os distritos.

O apoio oficial ao ensino particular, que em intervenções anteriores constituiu preocupação evidenciada e que foi objecto de oportuna nota oficiosa, na qual se- informou o País acerca das finalidades a atingir e dos meios financeiros mobilizados, particularizando referências ao Estatuto, qualidade do ensino ministrado, rede escolar do ensino obrigatório, escolas de magistério infantil, postos de recepção do ciclo preparatório TV, representa outra achega que importa relevar.

Foi considerável o esforço financeiro a favor do ensino particular na metrópole, totalizando à portada mais de 65 000 contos, sendo de referir, porá além do eido preparatório, a dotação de 30 000 contos visando o apoio a estabelecimentos que ministrem ensino secundário até o final do corrente ano, o que representa mais um esforço de cerca de 100 000 contos no ano lectivo, se admitirmos a correcção do montante, com base no inquérito a que o Ministério procedeu junto dos interessados.

Acresce que permitindo alargar substancialmente o cumprimento da escolaridade obrigatória dos seis anos, tais medidas no nosso distrito resultaram na extensão do ensino gratuito do ciclo preparatório aos concelhos rurais da Ribeira Brava e S. Vicente, uma vez que já funcionava oficialmente nos concelhos de Machico e, a partir do ano lectivo em curso, da Calheta.

Por outro lado, se tivermos em devida conta o facto de, como assinalou o próprio Ministro, num ano a batalha ter produzido 63 escolas preparatórias, 85 novos cursos de ensino liceal e técnico, 6 escolas do magistério primário e 2 cursos de habilitação complementar para os institutos politécnicos, o facto de se ter passado, no período 1968-1972, de 12 000 contos para 140 000 na montagem de pavilhões pré-fabricados, estando já previstos 360 000 contos para o próximo ano, se considerarmos a promoção de regentes escolares, após concurso de provas e as facilidades concedidas com vista a frequência das escolas do magistério primário, bem como o recente subsidio de residência aos agentes de ensino, teremos conscientemente encontrado suficientes motivos para aplaudirmos a acção governamental no domínio da educação sob a égide do Presidente do Conselho, de que o Prof. Veiga Simão se afirma dinâmico e fiel intérprete.

Sr. Presidente a Srs. Deputados: Não incluiremos nesta intervenção a habitual analise qualitativa e quantitativa da estrutura escolar no distrito do Funchal. Já não o consentiria o tempo regimental de que dispomos e, por outro lado, constitui matéria bastante para nos debruçarmos com mais vogar e profundidade.

Registe-se, entretanto, que a situação permanece alarmante, com a frequência do único liceu e da escola técnica ainda mais excedida do que nos anos anteriores, o mesmo ser verificando em relação à falta de professores, tanto no ensino básico como no secundário. Porém, com aspectos positivos, entre os quais importa salientar o esforço da Junta Geral na montagem de pavilhões e no recurso a outras instalações provisórias, para atenuar as carências, bem como em diversas realizações de interesse para a vida escolar, despendendo a considerável verba de 4500 contos.

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Ainda uma referência a publicação do despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Educação Nacional, na folha oficial de 9 do corrente, determinando que a Escola do Magistério Primário do Funchal passe a funcionar em regime de completa autonomia financeira e pedagógica, medida simples, mas que terá decisiva influência no aumento de alunos-mestres, como se impõe, a fim de se dar a cada estabelecimento os professores necessários ao melhor aproveitamento do ensino ministrado.

E finalmente, um apelo no sentido de que, em conformidade com a medida tomada pelo titular da posta da Educação na visita efectuada em 1971 ao Funchal e aos Açores, se dê urgente concretização à Procuradoria dos Estudantes dos Ilhas Adjacentes, para cujos trabalhos preparatórios foi já criada uma comissão, de modo que, no decurso do próximo ano, possa, a juventude insular ser aliviada de muitos dos sacrifícios e preocupações com que se debate, quantas vezes em lute, inglória por absoluta carência de meios.

Sr, Presidente e Srs. Deputados: terminaremos concedendo o nosso voto na generalidade a proposta em discussão. Na homenagem que é devida, e com prazer prestamos ao Ministro responsável pela sua apresentação, queremos reafirmar ao Dr. Cotta Dias o firme propósito de modesta mas incondicional colaboração designadamente no que possa respeitar ao estudo e solução dos inúmeros problemas com que se debatem os sectores do nosso distrito, afectos às postos da Economia e das Finanças.
Tenho dito.

O Sr. Gaspar de Carvalho: - Sr. Presidente: E tradição desta Cosa, há muito radicada, aproveitar a discussão do chamada "lei de meios" para apreciar - como é lógico - a orientação que o Governo se propõe adoptar no próximo ano è também a que se imprimiu naquele que decorre ainda. E bem se compreende tal procedimento: como justamente se sublinha no n.° 41 do relatório que precede o articulado do respectiva proposta, "de facto, e sobretudo nos últimos anos, tem se entendido que a lei de meios" deverá ser "um diploma em que se formulam princípios básicos que orientarão a política económica e financeira do Governo durante o ano, de acordo com a situação conjuntural do País" - e nada melhor, para esse efeito, do que o balanço daquilo que se fez com o que se projecta realizar.

Dentro deste pensamento, proponho-me tecer algumas considerações, necessariamente superficiais, acerca de certos pontos versados no articulado da proposta de lei ora em discussão, e no notável relatório que a precede; farei quanto puder para ser breve.

Seria negar a própria evidência deixar de reconhecer que tem havido um grande dinamismo no que respeita ao progresso da economia nacional, mas tem de considerar-se igualmente que, mesmo assim, estamos aquém do indispensável. Tarefa que urge, e das mais prementes, é a de convencer desta situação de atraso os mais directamente responsáveis em tal matéria, ou sejam, os empresários e os trabalhadores, mentalizando-os - não me canso de repetir - no sentido de obter maior produtividade e melhor qualidade, que são, a meu ver, os dois factores decisivos para que se torne viável atingir o nível de riqueza nacional por que todos almejamos.

Tudo quanto se faça no sentido de fomentar a actividade produtiva reveste-se da maior importância já que sobre ela "tem de repousar, em última análise, todo o processo de desenvolvimento da economia nacional" é o que lucidamente se observa no n.° 44 do mencionado relatório.

Particularmente no que respeita à produção de carne, de leite e de lá, as possibilidades de a aumentar são indiscutíveis.

Há, porém, que capacitarmo-nos de que tal produção só poderá aumentar desde que se proporcionem preços compensadores e se estimule uma adequada organização da produção e distribuição a fim de diminuir os respectivos custos.

Para tanto tornar-se-á necessária, por vezes, ajuda substancial do Estado, pois é do conhecimento geral, e dispensa, portanto, demonstração, que a lavoura está sem recursos financeiros. De qualquer modo, ao País ficará menos dispendioso suportar esse auxílio, aliás reembolsável, pelo menos em parte, do que custear os volumosas importações do estrangeiro que se vêm efectuando, a constituir pesado ónus e a originar sensível salda de divisas, bem dispensável.

Claro que ao advogar o auxílio do Estado, longe de mim sustentar que deva ser prestado sem critério e sem limite; ao invés, entendo que investimentos dessa natureza deverão ter carácter meramente complementar, e subsidiário e ser concedidos apenas a quem dê, sob todos os aspectos, sólidas garantias. Os dinheiros do Estado, que são, afinal, o suor de todos nós, não podem nem devem ser comprometidos em aventuras nem, por via de regra, constituir fonte exclusiva, ou principal, de financiamento; este cabe, em especial, ao empresário, pois á a entidade que, por sua própria natureza, tem de suportar os maiores riscos. Por outras palavras, e seguindo o que se escreveu no n.° 66 do relatório já invocado: ao sector privado é que cabe parcela preponderante na formação do capital.

Mas estes elementares princípios, que são básicos e aplicáveis à, generalidade das situações, andam por vezes arredios da mente de quem tem, no assunto, poder de decisão. Por isso aqui se recordam.

Outro ponto para mim de grande delicadeza é o que respeita a expansão das actividades horto-frutícolas.

O auxílio técnico e financeiro do Estado tom sido, a tal respeito, verdadeiramente inestimável, sendo de justiça dizer aqui uma palavra de sentido reconhecimento às Secretarias de Estado da Agricultura e do Comércio, bem
assim como à Junta Nacional das Frutas e à Junta de Colonização Interna.

Alguma coisa, porém, parece agora estar desacertada, pois contraria o critério que vinha sendo seguido, com resultados óptimos, e que o n.° 94 do relatório já citado mostra que o Governo deseja manter.

Certo que se não esmoreceu nos incentivos dados à plantação de pomares, que são cada vez em maior número.

Mas, inexplicavelmente, não se dedica atenção idêntica às instalações de frio que, necessárias à recepção e conservação dos frutos que esses pomares produzem, estão em considerável atraso, e, por conseguinte, prejudicam já o indispensável equilíbrio entre a produção, a conservação e o consumo.

Este ano já se verificou a inutilização de apreciável quantidade de frutas, particularmente de maçãs, por falta de capacidade de armazenagem dos frigoríficos existentes, com perda total para o produtor e também afectando os interesses do Estado, pois obviamente que o fruticultor ficou impedido de solver os seus compromissos para com este, derivados dos empréstimos que o Estado recebeu e para cuja amortização, é evidente, contava com os rendimentos da venda dessas frutas.

Está, pois, a gerar-se um problema de extrema agudeza que dois factores agravam de forma alarmante: por um lado, a baixa das cotações das frutas no mercado, resultante, em grande parte, da saturação, por excesso de oferta, relativamente à procura, no momento, da colheita;

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por outro, a previsão de próximo e explosivo crescimento da oferta, pois os pomares actualmente em produção plena não atingem sequer metade dos que estão plantados.

Assim, dentro de três anos a situação será catastrófica se, entretanto, não for organizada uma rede de instalações de frio que permita recolher a produção que exceda as necessidades de consumo na ocasião da apanha dos frutos e possibilite, portanto, o escoamento a medida que essas necessidades vão surgindo, e isso sem quebra das boas condições sanitárias e de custos simultaneamente compensadores para o produtor e razoáveis para o público, o qual, como muitos exemplos o ilustram, em nada beneficiará com o aviltamento dos preços na origem e a ruína subsequente do empresário.

Por isso, volto a insistir, é imperioso impulsionar a instalação de frigoríficos, fazendo-o com o mesmo entusiasmo, o mesmo poder de persuasão, o mesmo dinamismo com que foi espalhada a ideia da plantação de pomares, esperando que o Estado intensifique a sua ajuda técnica e financeira para aquele efeito.
De outro modo, corremos o risco de desencadear uma crise de proporções incalculáveis, cujos reflexos impossível é também de prever.

Claro que, ao mesmo tempo, outras providências haverá de tomar, avultando entre elas a industrialização das diferentes frutas e a exportação, mormente para o ultramar e para o Brasil. Estas serão, contudo, medidas que, por si sós, não solucionam o problema, sem quebra do grande valor que possam ter, e efectivamente têm, na sua resolução.

Permitam-me VV. Ex.ª, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o assinale: se a situação não for enfrentada rapidamente e com energia, a fruticultura deixará, muito em breve, de ser esperança fagueira de tantos, para se transformar em autêntica calamidade para aqueles, e muitos foram, que, seguindo as sugestões dos serviços oficiais, enveredaram por caminho que se antevia promissor.

As afirmações que precedem faço-as em plena consciência e com conhecimento de causa, já que creio estar devidamente elucidado acerca da situação, dadas as especiais responsabilidades que no sector me cabem, quer como produtor, quer, sobretudo, como presidente da direcção da Cooperativa Agrícola dos Produtores de Fruta do Distrito da Guarda.

E se há região em que o assunto se revista de notória acuidade, essa é o meu distrito, onde a pobreza do solo se alia à dureza do clima, a carência de matérias-primas e a limitada industrialização.

Se se não extrair um rendimento, embora modesto, desses capitais - que vai ser da maioria dos empresários, quase todos gente sem meios de fortuna?

Foi pensando no futuro que a Cooperativa em causa se lançou decididamente na orientação que menciono, e que coincide com u do Governo, como resulta da simples leitura, entre mais, dos n.ºs 45 (parte final), 57 e 94 do relatório, que, já o frisei, precede a proposta de lei em discussão. Ponto é que se concretizem, os princípios ai definidos e que se não esqueça outro dos objectivos fundamentais a prosseguir, que é - expressamente o refere o n.° 44 do mesmo documento - "o da correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento".

Assim, e em perfeita harmonia com esses princípios e com as normas estatutários que a regem, a referida Cooperativa tomou a iniciativa de se apetrechar com uma rede de instalações frigoríficas, colocadas estrategicamente, de modo a cobrir as necessidades da área em que actua, agora e no futuro mais próximo. O desenvolvimento e a efectivação desse plano, bem como do aproveitamento industrial das frutas, dependerá apenas do apoio material que receber do Governo, através da concessão de créditos e de subsídios adequados, aliás já requeridos, sendo certo que os sócios da Cooperativa assumirão a quota-parte das responsabilidades que lhes cabem.

Simultaneamente, procura-se a melhor comercialização, de forma a eliminar, no possível, os intermediários oportunistas e a fazer chegar os produtos ao consumidor nas condições ideais de conservação, bem como a preços acessíveis.

Questão vizinha desta, e com ela intimamente relacionada, é a da dimensão da empresa agrícola.

Mais do que os grandes latifúndios, a minipropriedade é altamente prejudicial, quer para a economia dos seus donos, quer para a da Nação.

Não é necessário ser perito na matéria para discernir que a pulverização da propriedade acarreta a ruína de quem se dedica à sua exploração, pois a torna economicamente inviável e, para além disso, impossibilita métodos modernos de cultivo, cujo uso somente se justifica em exploração em larga escala, racionalizada e com agricultura diversificada. E também apenas dessa maneira se conseguem preços competitivos e ao mesmo tempo remuneradores, que facultem ao lavrador um nível de vida aceitável.

Publicaram-se, há anos já, os instrumentos jurídicos que habilitam o Governo a promover o emparcelamento; existem também as normas legais que facilitam, através de isenções e de benefícios de vária ordem, a agricultura de grupo, em sociedades constituídas com esse objectivo; de uns e de outras se faz menção no relatório a que já aludi.

A realidade, porém, é esta: até agora, talvez pela inércia dos interessados, talvez por culpa da nossa formação extremamente individualista, nenhum dos institutos funcionou, pelo menos de forma eficiente. Alguns exemplos que possam existir, poucos, decerto, não invalidam a afirmação.

Entretanto, o abandono dos campos acentua-se; a mecanização não se faz, por carência de meios e por injustificada, perante os diminutas dimensões do agro; os oportunistas, aproveitando-se do desânimo dos lavradores, assenhoreiam-se das melhores terras, adquirindo-as por preços, irrisórios; aqueles que teimam na utilização de métodos primitivos, arruinam-se ingloriamente; os preços por que se obtêm os produtos são proibitivos - descontentam o lavrador, que se queixa de não obter a merecida recompensa do seu trabalho, e originam protestos do público, que reclama contra o custo elevado e a qualidade insatisfatória.

Enfim, ninguém ganha e todos perdem.
Julgo, portanto, chegada a hora do arranque, sem violências escusadas, mas com ânimo, como parece estar nos propósitos do Governo, se bem entendo o que se lê nos n.ºs 69, 71 e 72 do aludido relatório.

Os espíritos já se encontram, aliás, preparados, pois mesmo os mais renitentes compreenderam que se ultrapassou a época da pequena leira a fornecer, embora por preço exorbitante, o magro sustento da família, e que persistir em tal caminho é luta inglória que a sociedade de consumo em que, queiramos ou não, temos de viver torna antecipadamente perdida.

Têm a palavra os departamentos do Estado com competência para intervir e dar o impulso inicial, incutir ânimo aos mais timoratos e harmonizar os interesses porventura divergentes.

O que não pode continuar - refiro-me em especial à zona das Beiras - é aquilo que se passa actualmente com os pequenos lavradores, na posição mais aflitiva

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que se possa imaginar, sem rendeiros, sem trabalhadores, sem protecção, desesperançados, quando não mesmo desesperados. Pois nem só es condições climatéricas explicam a quebra de produção assinalada no n.° 9 do parecer da Câmara Corporativa ...

Se, na expressão popular, "tudo vem da terra", então há que valorizá-la cada vez mais, e não, como está a acontecer, deixar que se perca como elemento económico de primacial importância para tantos que teimam em dela tirar o sustento.

Outro problema que se me afigura também digno da melhor atenção é o dos pequenos comerciantes, designadamente de mercearia, perante os supermercados.

Sem dúvida que temos de nos acomodar aos tempos que correm, e não vale teimar em posições que de antemão se sabe serem insustentáveis.

Os supermercados são uma realidade de carácter irreversível, tanto quanto é possível prever, e há que aceitá-los como tal.

Mas isso não justifica, salvo o devido respeito pelo entendimento contrário, que se favoreçam estes, autênticos potentados económicos, em detrimento dos pequenos estabelecimentos, hoje desactualizados, mas que prestaram, e continuam a prestar, grandes serviços às populações, e sempre contribuíram para o erário público por forma bastante significativa.

Pois bem: como se lhes não bastasse a posição desfavorecida em que hoje se encontram, ela foi agravada pela circunstância de, em oposição à rigidez de horários de funcionamento que se lhes exige, gozarem os supermercados das maiores facilidades, que lhes possibilita não só horário de funcionamento singularmente alongado, mas até estarem abertos aos domingos!

Que os pequenos estabelecimentos estão condenados, até porque sob o ponto de vista económico são indefensáveis, aceito-o; considero-o mesmo inevitável.

Haverá, por conseguinte, que, com brevidade, pois o tempo urge, mas com a indispensável ponderação, tentar solucionar a penosa situação em que ficará tanta gente que tira o seu sustento dos escassos rendimentos dessas pequenas unidades comerciais, nomeadamente através da extensão do regime geral da Previdência, com as indispensáveis adaptações, aos patrões economicamente débeis.

Mas até que se alcance a solução justa e humana que a própria moral exige, que se não aumentem as já difíceis condições em que labutam esses modestos estabelecimentos; que não seja o próprio Estado a acrescentar-lhes as dificuldades, sancionando uma dualidade de critérios que seria, sim, compreensível se os favorecesse.

Ainda a propósito de problemas de comércio, desejo referir-me à preocupação que grassa nos meios mercantis perante o decréscimo, que se não atenua, das transacções com o ultramar, destino tradicional de tantas das nossas exportações, agora severamente condicionadas.

Não ignoro as razões do facto, não as discuto, nem as contesto.

Desejo unicamente exprimir, neste ligeiro apontamento, o voto de que a situação se possa normalizar rapidamente e tudo volte a correr com agrado para todos - o daqueles que vendem e o daqueles que estão ávidos de comprar.

Na mesma ordem de ideias, passo agora a reportar-me, também muito ao de leve, ao que se passa com o mercado de títulos.

As emissões sucedem-se, com imobilizações maciças de enormes somas, que- totalizaram, em duas das mais recentes, cerca de 10 milhões de contos.

Se é exacto que grande parte desse dinheiro, o que excede o capital posto à subscrição, volta mais tarde a girar, ou pelo menos a ser posto à disposição dos particulares, são, todavia, de ponderar as dificuldades que, entretanto, para o comércio representa a retirada de circulação de tão elevadas importâncias, às vezes por tempo bastante dilatado.

Por via disso, em época que é considerada de ponta, o comércio retalhista de Lisboa e do Porto (e decerto também o de outras localidades) foi afectado gravemente, no passado mês, pela grande quebra sofrida no volume de vendas.

Projecta o Governo disciplinar o mercado de títulos, segundo se declara na alínea a) do n.° 2 do artigo 21.º da proposta de lei de autorização de receitas e despesas porá 1973.

Oxalá se não fique na intenção, antes que ela se concretize em curto lapso de tempo, e que nesses sãos propósitos se incluam os de moderar e escalonar a emissão de acções e obrigações, de modo que a mobilização de vultosos capitais não afecte as outras actividades; que se tomem ainda medidas que desencorajem o carácter especulativo que explica o aparecimento de muitos dos subscritores, mas se tenha também em conta a necessidade de captar as pequenas poupanças criando mecanismos adequados que facilitem a sua aplicação em investimentos rentáveis e produtivos.

O Governo manifesta também o intuito de criar um imposto sobre veículos automóveis, em taxas consideradas moderadas, pois não será ultrapassado o montante de 5000$ anuais por unidade.

Creio que a inovação merece inteiro aplauso, considerando o fim a que se destina a importância que venha a ser arrecadada: "assegurar apoio financeiro à execução de programas e projectos de autarquias locais de reconhecido interesse", segundo se lê na parte final do n.° 61 do relatório a que já antes recorri.

Sabidas as dificuldades financeiras com que as autarquias locais se debatem, dado que ao acréscimo de encargos que as oneram não correspondeu, na generalidade dos casos, correlativa actualização dos rendimentos (cuja progressão, salvo casos excepcionais, não acompanhou o ritmo dos do Estado), a medida é aceitável.

Indispensável se torna, no entanto, que a receita em causa tenha efectivamente o destino que se lhe marca - sobre o que a alínea g) do artigo 9.° é omissa -, e que a "criteriosa fixação das taxas do imposto" conduza "n que se "tinjam, predominantemente, os situações de carácter sumptuário", ficando isentos da tributação os veículos "que, por sua natureza, são utilizados como elementos indispensáveis à actividade dos seus proprietários".

Não me atrevo sequer a pôr em dúvida que, por parte do Governo, assim sucederá; mas para evitar desvios de aplicação, sempre possíveis e até bem intencionados, da parte de quem execute as normas legais, conveniente se me afigura que na regulamentação do imposto se insiram, elevados, assim, à categoria de normas jurídicas, os salutares princípios enunciados no citado n.º 61 do relatório,' e que deixei referidos, na parte que interessa.

Problema candente, e que desejaria ver tratado com maior minúcia, já que "constitui uma das preocupações dominantes do Governo", é a situação dos funcionários públicos.

Sabido que a intervenção do Estado em todos os sectores da vida nacional se processa cada vez com mais intensidade, necessitamos - está dito e redito - de funcionários inteiramente capazes em todos os aspectos, cuja actividade se oriente para o progresso da Nação, e não de burocratas, no mau sentido do termo; apostados em entravar esse mesmo progresso, com as suas exigências descabidas. Em suma, e para me servir de frase, que

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fez carreira, direi que julgo indispensável a existência de uma Administração voltada ao desenvolvimento.

Ora, ninguém ignora que razões por de mais conhecidas estão a ser a causa do generalizado desinteresse dos melhores no preenchimento, de cargos públicos, e que, salvo honrosas excepções, que felizmente são ainda em grande número, os mais qualificados deles se têm afastado.

Problema altamente preocupante, carece de solução urgente e eficaz; a Administração é, no fundo, aquilo que forem aqueles que a servem.

Por isso anoto, com grande agrado, a intenção do Governo de em 1973 "rever as condições do exercício da função pública, para que se consiga dotar a máquina administrativa do pessoal qualificado que o seu bom funcionamento cada vez mais exige".

E chego ao fim das minhas despretensiosas considerações.

Seria presunção da minha parte, que não tenho, pensar que trouxe alguma novidade a esta Câmara ou disse ao Governo algo que ele ignore. Dos claros e inequívocos propósitos do Governo, e quanto aos pontos que foquei, são prova concludente não só os passos, que fui assinalando, do relatório que precede a proposta da lei de meios para 1973, como as normas estabelecidas nos artigos 3.°, 9.°, 13.°, 18.°, n.° 2, e 21.° da mesma proposta.

Mas atrevo-me a acreditar que as minhas palavras, as palavras de um homem da rua que sente como seus os anseios do Pais, e que outro mérito não reivindica do que o de ser sincero, não serão completamente inúteis, já que lembrar certos princípios básicos, embora elementares, nesta época tão agitada, tem, pelo menos, o condão de os reafirmar e de permitir reflectir sobre eles, sobre verdades simples, na sua essência e nos seus efeitos. E isso, no meu modo de ver, é oportuno, mormente a respeito de um plano de actividade - que é o primeiro a ser formulado após o alargamento do Mercado Comum Europeu, e cuja execução se inicia com a do acordo negociado pelo Governo Português com os países que constituem aquela organização - em meu parecer o único caminho que se nos abria, mas que, por ser árduo, vai exigir de todos nós, Estado e particulares, novo esforço e mais canseiras, para que possamos continuar a viver honradamente e sem sobressaltos.

De resto, a minha confiança no Governo permanece intacta; no que particularmente respeita ao Dr. Cotta Dias, que com tanta distinção está exercendo o cargo de Ministro das Finanças e da Economia, a quem rendo as minhas homenagens da mais alta consideração e estima pessoal, as suas invulgares qualidades de há muito o impõem ao respeito geral. No documento a tantos títulos modelar que é o relatório de que com frequência me servi nesta minha já longa exposição ficam bem vincados os traços da sua inteligência privilegiada, do seu profundo saber, do seu senso político.

Ao aprovar na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1973, permito-me formular um só voto: o de que a sua execução venha a corresponder ao pensamento de quem a concebeu e redigiu, pois seria lastimável que os princípios nela mencionados ficassem esquecidos nas páginas inertes do número do Diário do Governo que a publicar.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Sr. Presidente: 1. A proposta da lei de meios está suficientemente debatida e esclarecida na generalidade. Os mais brilhantes economistas, que participam da nossa Assembleia, debruçaram-se sobre ela, analisando-a em todas as suas motivações, implicações e consequências. Todavia, e já a concluir o debate, não me parecem extemporâneas algumas observações que ainda não foram aduzidas.

A primeira é um aspecto positivo. A inclusão de atribuição essencial da Assembleia de apreciar "os princípios a que deve ser subordinado o orçamento" provém da Constituição de 1933. Representa uma nova era na nossa administração financeira: a da regularidade e a do equilíbrio das contas públicas. Sucedeu a um período calamitoso de um século em que vivemos sempre com orçamentos desequilibrados e numa inquietante desordem financeira.

Consultei, por curiosidade, a Carta-Lei do Orçamento de 1841-1842, aprovada pela Sr.ª D. Maria II. Todas os despesas da Nação orçavam então por 11 000 contos. Mas o deficit previsto nesse ano atingia 650 contos.. Estes deficits repetiram-se constantemente durante o Constitucionalismo, só com um intervalo salutar, depois da implantação da República, em 1913-1914, em que se apresentava um pequeno superavit. Mas desde 1928 que passámos a fruir de orçamentos em que as despesas eram consideradas em função das receitas. O do ano de 1973 é o quadragésimo quarto perfeitamente equilibrado.

2. Há um segundo ponto igualmente positivo. Apesar das nossas carências económicas, da nossa marcha lenta para o desenvolvimento, do ritmo ainda débil do crescimento do produto nacional bruto, do atraso dos nossos investimentos industriais, quer no ponto de vista da produtividade, quer no ponto de vista tecnológico, do desequilíbrio alarmante da nossa balança comercial e até dos desfalques demográficos de que estamos sofrendo - o orçamento das receitas e das despesas continua a sua marcha ascensional de ano para ano. Ainda que tenhamos em linha de conta a desvalorização da moeda, acentuada nos últimos anos, é certo que as receitas em 1939 mal excediam 2 milhões de contos; em 1941 atingiram os 3 milhões; em 1943 passavam dos 4 milhões; em 1947 já se aproximavam dos 6 milhões. Há então uma relativa estabilização até 1955.

De 1955 a 1959 ainda não conseguíramos exceder os 10 milhões de contos. Em 1960 acentua-se a progressão das receitas, que já ultrapassam os 18 milhões de contos em 1965. Em 1967 alcançávamos quase os 20 milhões. No triénio de 1967 a 1970 as receitas acusam um acréscimo espectacular, saltando bruscamente para 80 milhões de contos, ou seja de mais de um terço em relação a 1967. Situamo-nos agora nos 37 milhões. E sem dúvida um resultado inferior a outros orçamentos europeus, um décimo por exemplo do da Bélgica, como foi salientado pelo Sr. Deputado Roboredo e Silva. Mas significa um notável índice de progresso nas disponibilidades do Estado Português.

3. Mas há também na proposta de lei outros aspectos mais sombrios em face destas claridades meridianas, sem deixar de realçar o método persistente e a atenção escrupulosa que presidiu à sua elaboração. Pelo menos desde 1970, em que ela foi presente no primeiro ano de funcionamento da actual legislatura, inscreve-se um capítulo designado como "orientação geral da política económica e financeira". Ora desde aquela data, como aliás se reconhece no texto da proposta, as grandes directivas da política económica do Governo mantêm-se num sentido invariável, sem que sejamos amplamente informados dos resultados conseguidos.

Assim, a título exemplificativo, já em 1970 se preconizava que se incentivassem e apoiassem "as transformações das estruturas económicas e financeiras das empresas portuguesas"; em 1971 mudam-se apenas os termos quando se pretende "promover e estimular a aceleração do investimento em empreendimentos produtivos e em infra-estruturas económicas e sociais"; em 1972 repete-se a mesma intenção ao "promover e apoiar um ritmo elevado de inves-

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timento"; finalmente, para 1973 regista-se .que .se deve "incentivar e apoiar o processo de desenvolvimento da economia portuguesa".

É bem evidente, mesmo- para um leiga em matéria económica, que se não conseguem concretizar os objectivos a atingir, consignando-se apenas aspirações que não correspondem a metas precisas no processo do desenvolvimento económico do nosso país. Não há, como já aqui se acentuou, "indicadores" quantitativos que nos elucidem comparativa e cronologicamente sobre os termos da orientação económica e financeira. É, porém, de esperar que com os planos e os investimentos do Governo em curso se consigam resultados positivos.

4. Permito-me ainda focar na proposta de lei uma ponto do capítulo IV que se refere à política fiscal. Desde 1971 que o Governo se propunha "continuar a reforma dos regimes tributários". No ano passado tive a Oportunidade de apresentar uma proposta; introduzindo uma pequena modificação na alínea b) do artigo 10.º (Diário das Sessões, n.º 145, de 6 de Dezembro 1971) Preconizava então que se estudassem "novas formas de tributação sobre índices exteriores da riqueza". Fundamentei a minha intervenção sobre uma sugestão de um nosso ilustre colega, o Sr. Deputado Teixeira Pinto (Diário das Sessões, n.° 148, de 16 de Dezembro de 1971 ). Aquela proposta foi aprovada unanimemente pela Assembleia.

Notamos, porém, que a modificação foi suprida na proposta de lei do corrente ano, alias com a concordância do douto parecer dos Dignos Procuradores da Câmara Corporativa. Afirma-se, que aquela Câmara "perfilha inteiramente esta orientação, até porque a expressão usada lhe parece pouco, clara lê, por -conseguinte, difícil interpretação".

Contudo, o Sr. Deputado Teixeira Pinto, com a sua autoridade especial de economista,- esclareceu-nos o ano passado sobre significado da expressão.

Não creio que seja necessária, uma atenção muito grande para que se possa ver rapidamente o que são sinais de ostentação, visto que o próprio nome indica que eles são evidentes.

Sr. Presidente: Verifico, todavia, jubilosamente que se a, expressão foi suprimirá na lei orçamental subsistiu o princípio então anunciado (...) Não será esse o sentido do novo imposto criado pela alínea g) do artigo 9.º do capitulo IV que a própria Câmara Corporativa pretende estender aos motociclos e aos aviões de uso particular? Excluindo-se naturalmente, como é da mais elementar justiça, aqueles veículos "que por sua natureza são utilizados como elementos indispensáveis à actividade dos seus proprietários", não serão visíveis manifestações de ostentação na sua maioria, os carros de possante cilindrada e de custo muito elevado?

Julgo assim que, embora cautelosamente, estamos a dar os primeiros passos na aplicação de um imposto sobre os índices exteriores da riqueza, como aliás, acontece em países, mais ricos, muito mais ricos, do que o nosso. Temos de prosseguir neste caminho, não só para aumentar as receitas do erário do Estado, mas ainda para tomar mais efectiva a participação tributária daqueles que podem usufruir, com largueza de bens materiais e, por vezes, supérfluos.. A gama destes impostos pode, alargar-se, como é uso lá fora, a ocupação de imóveis desnecessários à residência normal, ao número de serventuários e a outras exteriorizações, do mesmo género.

Como disse ainda há dias o Sr. Presidente do Conselho num discurso tão curto quanto incisivo, é bem necessário que corra na boa terra portuguesa uma; torrente de bens cada vez mais abundante " cada vez mais bem repartida por quantos contribuem para criá-la.
Tenho dito.

O Sr. Valente Sanches: - Sr. Presidente: Ao iniciar a minha modesta actuação nesta última- sessão legislativa começarei pelo gratíssimo dever de apresentar a V. Ex.ª as minhas mais efusivas saudações.

Vem esta proposta de lei de meios para 1973, de índole essencialmente conjuntural, como as anteriores, num período particularmente difícil e grave da vida do País, resultante, por um lado, da actual conjuntura internacional e da guerra no ultramar e, por outro, da própria evolução da nossa economia e da economia mundial.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: a proposta de lei em discussão introduz inovações de grande importância ao definir e hierarquizar os objectivos da política económica e financeira que não devemos esquecer se pretendermos compreenderias providências sectoriais adoptadas..
Do artigo 3.º da proposta constam esses objectivos:

a) Incentivar e apoiar o processo de desenvolvimento da economia portuguesa, de acordo com as exigências que resultam da progressiva integração económico-social dos diversos territórios nacionais e da articulação dos mesmos com os espaços geoeconómicos a que pertencem;

b) Promover a elevação do nível de vida do povo português e assegurar a estabilidade económica interna;

c) Assegurar a solvabilidade externa da moeda;

d) Estimular as transformações estruturais necessárias para aumentar a produtividade das várias actividades económicas e para reforçar a sua competitividade perante a concorrência internacional.

Porque o não permitiu o movimento geral de liberalização dos trocas no pós-guerra, nem o consentiu o interesse bem esclarecido e entendido do Pois, a economia portuguesa deixou de ser uma economia fechada.

A intensificação das relações económicas com a Europa Ocidental, ao abrigo da convenção de Estocolmo, e o reforço das solidariedades no âmbito do espaço económico português vieram acelerar a substituição de uma tendência toda voltada para o mercado interno para uma vocação aberta para o exterior.

A economia portuguesa caminhará, assim, não ao abrigo do proteccionismo dirigista, mas sob a égide da salutar concorrência.

O desenvolvimento económico do País - como bem se afirma na alínea a) do citado artigo 3.°- tem. pois, de se orientar por dois objectivos solidários: a integração económica interna e a integração internacional de cada zona do nosso espaço económico, de harmonia com a sua situação peculiar.

O imperativo da integração reclama o da competitividade, em face dos esforços que nos vão ser exigidos nela liberalização das trocas com o Mercado Comum industrializado e dinâmico, e torna-se cada vez mais urgente o reforço do poder concorrencial dos sectores que venham a assumir maior relevância no comércio desenvolvido ao abrigo do acordo.

Por outro lado, o imperativo da competitividade exige o da estabilidade, seja qual for o poder concorrencial de qualquer sector da nossa economia; se continuarmos a suportar uma subida de preços mais acelerada do que a dos nossos competidores, esta competitividade em breve se desvanecerá. Para além dos seus inconvenientes no

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plano interno, a inflação enfraquece o poder de penetração da nossa exportação nos mercados externos e toma cada vez mais aliciante a operação de importar.
E se é certo que a inflação é um fenómeno se não universal, pelo menos europeu, também não é menos certo que o ritmo da subida dos preços em Portugal é dos mais altos entre os países da O. C. D. E. Esta tendência inflacionária tem aumentado as dificuldades que se apresentam à economia portuguesa.
O Organização do Cooperação Económica e Desenvolvimento, no seu relatório anual sobre Portugal, afirma que "uma expansão mais rápida da economia parece ser possível, em princípio, em virtude do substancial saldo positivo da balança de pagamentos portuguesa".
O relatório nota que esse saldo respeitante a Portugal metropolitano aumentou de 117 milhões de dólares em 1970 para uma verba calculada provisoriamente de 2,2 milhões de dólares no ano passado.
O saldo negativo da balança de comércio visível, que foi de 601 milhões de dólares, foi largamente compensado pela receita obtida através do turismo e pelas remessas dos trabalhadores emigrados.
Analisando as causas da inflação em Portugal, a O. C. D. E. diz que a emigração de trabalhadores em grande número criou pressões internas para aumento dos salários, ao mesmo tempo que, por outro lado, o dinheiro por eles enviado para os famílias veio aumentar o poder de compra e, portanto, a procura de bens de consumo.
Ao mesmo tempo, a produtividade da agricultura continua a ser baixa e os preços na construção civil têm sofrido pressões devido à urbanização e ao desenvolvimento do turismo.
É importante, contudo, que as medidas tornadas para combater a inflação interfiram o menos possível com o necessário aumento dos investimentos e da produção.
A política de maior expansão recentemente adoptada pelo Governo Português, caso seja aplicada de forma sistemática è eficaz, permite esperar que o processo de desenvolvimento se acelere.
Esta política de maior expansão, cremos nós, só será possível procurando atenuar e mesmo vencer as causas do atraso económico e social em que o nosso país se encontra em relação a Europa industrializada.
Também nós, como um ilustre governante, pensamos que esse atraso se deve, fundamentalmente, a três factores de ordem essencialmente cultural, que continuam a operar na sociedade portuguesa, reduzindo o alcance dos esforços para assegurar o seu mais rápido desenvolvimento:
O baixo nível de educação de base de largas massas da população portuguesa; a deficiente gestão dos recursos humanos disponíveis, incorrendo em fortes desajustamentos entre as aptidões possuídas e as qualidades requeridas pelo exercício das funções; as insuficiências do processo de decisão tanto no sector público como no sector privado - resultante em larga medida da não observância das normas bem conhecidas da eficácia desses processos.
Necessitamos, afirma o mesmo governante, de seleccionar os homens, de acordo com critérios objectivos e métodos precisos da psicologia aplicada e organização do trabalho, de ajustá-los as funções que hão-de desempenhar; de estabelecer carreiras onde as não haja; de exigir qualificação; de introduzir tecnicidade do desempenho das tarefas; de recusar definitivamente o "empenho", o favoritismo, a colocação de influência política, como coisa do passado com as quais se não compadecem os necessidades de renovação e de transformação da sociedade portuguesa.
Precisamos, finalmente, de descentralizar, de conferir autoridade aos escalões inferiores de decisão, de responsabilizar; necessitamos de dar à nossa Administração, nomeadamente no campo económico, uma orientação de sentido dominantemente positivo, fomentador, impulsionador de iniciativas, cooperador com a actividade privada, mais do que fiscalizador, restritivo ou limitativo ... o que pressupõe, por seu turno, a criação de confiança da parte do sector privado, a procura de objectivos, empreendimentos e actividades válidas, sem favores nem proteccionismos, conformes com o interesse nacional.
Precisamos de continuar, mas precisamos ainda mais de evoluir; temos de pôr muito o acento tónico na evolução, na urgência dos transformações, da modernização dos estruturas produtivas e sociais.
A presente proposta continua, no prosseguimento da orientação seguida nos últimos anos, a colocar na primeira posição da ordem de precedência os encargos com a defesa nacional, nomeadamente os que visam a salvaguarda da integridade territorial da Nação.
A oportunidade desta medida tem, de há muito, unânime apoio de todos os portugueses conscientes e esclarecidos e não pode nem deve sofrer discussão: o que se plebiscita por iniciativa do povo não carece de ser equacionado nem discutido.
Seguem-se-lhe os despesas relacionadas com o desenvolvimento económico de todo o espaço português, designadamente as decorrentes dos investimentos públicos previstos na parte prioritária do III Plano de Fomento e, bem assim, do auxílio económico e financeiro às províncias ultramarinas e ainda outros investimentos de natureza económica, social e cultural.
É consolador verificar, mais uma vez, que, apesar dos múltiplos factores desfavoráveis, se conseguirá manter um equilíbrio financeiro sem descurar as exigências de defesa a que dolorosamente somos forçados.
Embora obedecendo a este imperioso condicionalismo, verificamos que "ainda é possível a manutenção de um orçamento de paz e progresso acelerado aonde se inscreverá um plano de acção destinado a recuperar atrasos, a trilhar rumos de modernidade e de progresso de onde beneficiarão, cada vez mais, todos os portugueses. Ao mesmo tempo, vai-se realizando uma obra acelerada de desenvolvimento dos províncias ultramarinas, acorrendo aqui- a crises da Natureza, favorecendo acolá transformações sociais, permitindo além a exploração económica e em toda a parte fazendo com que os territórios desde sempre portugueses sobressaiam de entre a miséria, a confusão, o caos, o retrocesso ao tribalismo em que mergulhou a maior parte das terras africanas entregues à sorte dos independências prematuras", estas são palavras do Sr. Presidente do Conselho.
Propõe o Governo, no artigo 6.° da presente proposta de lei. que os serviços do Estado, autónomos ou não, os institutos públicos incluindo os organismos de coordenação económica, as autarquias locais, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e os próprios organismos corporativos, observem, na administração das suas verbas, as normas de rigorosa economia.
Muito caberia dizer aqui relativamente à maneira pouco dignificante e menos escrupulosa como alguns vêm administrando os fundos públicos e delapidam o que é de toda a Nação.
Não raro acontece termos de recorrer a serviços públicos ou de organização corporativa e regressarmos escandalizados com o luxo de gabinetes e a sumptuosidade das instalações, onde, não raras vezes, bem pouco se produz e muito se não deixa fazer.

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Ainda se continua com acentuada tendência para os gastos exagerados e não produtivos, esbanjando-se dinheiro em deslocações constantes ao estrangeiro, em festas e banquetes e outros que julgo melhor não referir aqui, com o esquecimento total de que o erário se alimenta de impostos, taxas e contribuições que a maioria da população paga com enormes sacrifícios.
Já aqui tem sido referido por outros senhores Deputados o impudor e a insensibilidade social de muitos funcionários do Estado, dos organismos cooperativos e de coordenação económica e dos cargos administrativos na utilização abusiva, em proveito próprio, dos automóveis dos serviços públicos.
Fará que não continuem a recair sobre a Administração críticas permanentes pelo aspecto escandaloso que vem oferecendo com essa utilização abusiva, daqui nos permitimos apelar para o Governo, solicitando o estudo urgente de medidas mais eficazes do que as actuais para, de uma vez para sempre, se pôr termo a todos estes abusos, em tudo contrários às regras de austeridade recomendada e imposta noutros domínios.
O Governo, mais uma vez na presente proposta de lei, aconselha a necessidade de um clima de austeridade, pois as circunstâncias próprias da nossa conjuntura de nação em guerra e apertada vigilância económica obrigam a reforçar o clima de parcimónia. Aceitam-se, portanto, com toda a compreensão, as regras de cautela e prudência na aplicação dos dinheiros públicos.
Uma palavra apenas em relação à política fiscal. Da leitura do documento agora em apreciação depreendemos que as principais inovações relativamente à política fiscal preconizada nas leis anteriores é a exoneração especial do imposto complementar dos abonos de reserva e pensões de aposentação dos servidores de entidades públicas; revisão do regime tributário das cooperativas agrícolas; elevação do limite a partir do qual há adicionamento ao imposto profissional por acumulação; elevação do limite a partir do qual se aplica a taxa da contribuição industrial a certos rendimentos do trabalho.
Finalmente, a criação de um novo imposto anual sobre barcos de recreio a motor e veículos automóveis.
A exoneração especial do imposto complementar das pensões de aposentação e reforma é uma medida de justiça com um alcance social que aqui gostosamente sublinhamos. Uma visão humana e rasgada de justiça social não pode inspirar-se só no mundo dos que trabalham, mas preocupar-se com os que já não podem trabalhar.
Propõe-se o Governo criar um imposto anual até ao máximo de 5000$ sobre barcos de recreio a motor e sobre veículos automóveis com cilindrada superior a 1350 cm3 para transporte particular de passageiros e mistos com lotação superior a dois lugares.
Nada se nos oferece dizer quanto à oportunidade do estabelecimento de mais este imposto, senão lembrar à Câmara os seguintes factos, que julgo deverem ser tomados na devida conta quando, na discussão na especialidade, tivermos de deliberar sobre este ponto:
a) Os veículos automóveis são, em muitos casos, instrumentos imprescindíveis de trabalho que a vida moderna exige;
b) Estes veículos, quer directamente, quer por vias indirectas, já se encontram fortemente tributados;
c) Que se deve ir buscar mais dinheiro, através dos impostos, a quem o pode dar, defendendo-se as classes economicamente mais débeis, demasiado oneradas;
d) Que há milhões de contos imobilizados, sem utilidade, em viaturas usadas, em bom estado, porque
milhões de contos são gastos todos os anos em carros novos, trocados por outros com pouco uso, e isto quantas vezes por snobismo, vaidade ou ostentação;
o) Ainda há no nosso país quem compre automóveis, avionetas e barcos de recreio de mais de 500 contos, continuando a fazer grandes fortunas.
Que o Governo, como se propõe no artigo 17.° da presente proposta de lei, proceda no ano de 1973 a investimentos bem programados e rápidos em melhoramentos rurais, de modo a estabelecer em todo o território uma adequada rede de infra-estruturas económicas e sociais.
São críticas as circunstâncias em que se vem desenvolvendo a actividade da nossa agricultura. Se essa crise se mantiver por muito mais tempo, atingirá os próprios fundamentos das estruturas e da paz sociais.
Terá a agricultura, pois, de se capitalizar, comercializar e industrializar, mas para isso torna-se urgente completar a rede de estradas municipais, o abastecimento de água, a electrificação e o saneamento dos meios rurais, em condições de sobrevivência.
Na elaboração e execução do Orçamento Geral do Estado para 1978, prevê a proposta em apreciação que deverá o Governo continuar a dar prioridade, de acordo com o programa de execução do III Plano de Fomento para o mesmo ano, aos investimentos a efectuar na educação e na saúde pública.
Ninguém duvida, e muito menos aqueles que alguma vez a perderam, de que a saúde, dando-nos energia e vontade de trabalhar, gosto de viver e capacidade para encarar as dificuldades com a determinação de as vencer, é a condição mais importante da nossa vida.
Sendo, pois, a saúde esse estado de completo bem-estar mental e social, e não apenas ausência das doenças ou enfermidades, é necessário criar as condições de a manter, de a melhorar ou recuperar, de a saber vigiar e acompanhar.
Sem a mínima intenção de ser menos justo, cremos poder afirmar que em Portugal não tem sido feito tudo quanto se poderia fazer nesse sentido.
Só há pouco tempo começaram a reunir-se os meios técnicos e administrativos eficazes e a deliberação firme de os aplicar.
Temo-nos preocupado, ao longo dos tempos, mais com as doenças do que com a saúde, talvez porque a saúde é um bem de que só se tem verdadeira consciência quando se perde.
A luta pela saúde é hoje o primeiro objectivo da humanidade. A saúde das nossas populações pode e deve ser muito melhorada, pelo aperfeiçoamento dos métodos de promoção, vigilância e cura a utilizar e, sobretudo, pelo melhor funcionamento dos serviços de saúde, em bases técnico-científicas e administrativas correctas.
Sabemos bem que não abundam no nosso país os meios materiais, técnicos e humanos no campo da saúde, e, se não será difícil a mobilização de capitais e recursos técnicos, já será menos fácil, a curto prazo, a obtenção dos necessários meios humanos.
Em Portugal, em 1970, a cada médico correspondiam 1100 indivíduos. Embora este número se aproxime do mínimo recomendado pela Organização Mundial de Saúde (l médico para 1000 habitantes), ele esconde por completo as grandes diferenças distritais. Enquanto em Lisboa, Porto e Coimbra existe um número satisfatório de médicos por habitante, há distritos do País, nomeadamente no interior e nas ilhas adjacentes, onde a proporção é muitíssimo desfavorável.

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O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!

O Orador: - Com o restante pessoal de saúde, em especial o de enfermagem, acontece o mesmo.
A deficiência em pessoal de enfermagem relativamente aos valores mínimos aconselhados pela Organização Mundial de Saúde é ainda mais marcada do que a do pessoal médico e, como este, muito irregular de distrito para distrito, sendo em certas zonas do País a falta de pessoal de enfermagem muitíssimo grave.
Se o direito de todo o indivíduo à saúde está reconhecido entre nós constitucionalmente, e foi declarado pelo diploma orgânico do Ministério da Saúde e Assistência (Decreto-Lei n.° 413/71, de 27 de Setembro) como direito de personalidade que não sofre restrições, salvo as impostas pêlos limites dos recursos humanos, técnicos e financeiros disponíveis, importa que se mobilizem todos estes recursos, num total e racional aproveitamento, evitando-se a todo o custo que a mínima parcela destes mesmos recursos possa não ser cabalmente aproveitada.
Cabe aqui uma palavra de rasgado louvor ao Ministro Rebelo de Sousa pela obra, a todos os títulos notável, que vem desenvolvendo no sentido de se obter um melhor aproveitamento de todos os recursos técnicos, financeiros e humanos disponíveis no nosso país, em ordem a saúde das nossas populações.
O recente despacho, proveniente dos Ministérios das Corporações e Previdência Social e da Saúde e Assistência para unificação dos serviços de saúde e de previdência virá, certamente, pôr termo a situações de duplicações e lutas de competências que se vêm traduzindo em autêntico e criminoso esbanjar dos escassos meios de que dispúnhamos no campo da saúde.
Embora a percentagem do produto nacional bruto despendido com a saúde esteja longe de atingir o nível que se observa nos países desenvolvidos, e que nós devemos procurar assegurar rapidamente, existe a certeza geral de que não se tem tirado o rendimento correspondente às verbas investidas na actual multiplicidade de serviços, muitos deles autónomos no sentido de independentes, elaborando os seus próprios programas com desconhecimento do que está a ser feita pêlos outros serviços no mesmo campo de trabalho. O País exige que se estruture, quanto antes, uma política unitária de saúde, de modo a vir a proporcionar uma organização sanitária que atinja todos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: vou terminar deixando ainda uma palavra de muita satisfação e aplauso pelas medidas já tomadas pelo Governo, relativamente ao funcionalismo público e por aquelas que se anunciam.
Porque o Estado Português pretende ser um verdadeiro «Estado Social», não duvidamos de que na próxima revisão de vencimentos o Governo terá na devida conta a necessidade de melhorar mais substancialmente as remunerações daqueles que ganham menos, de modo a permitir que esses servidores deixem de vegetar para passarem a poder viver.
O Sr. Peres Claro: - Muito bem!
O Orador: - Não desejava exaltar o que neste campo está feito, para adiar o que está para fazer. Mas também não quereria cair no exagero oposto, escondendo com o que falta tudo quanto existe.
Poucos terão consciência de como se tem caminhado em alguns aspectos.
Por exemplo, sobre o ponto de vista da redução das desigualdades sociais, é curioso registar que enquanto na reforma de 1935 um funcionário da letra Z vencia 250$ e um da letra A vencia 5000$, hoje a diferença entre a base e o topo da escala é de 1900$ para 16000$. Quer dizer, numa geração transformou-se a relação de l para 20 numa relação de l para 8.
Ainda antes de concluir, desejava lembrar ao Governo a necessidade urgente de na próxima revisão de vencimentos não deixar de ter em conta a situação de todos aqueles que têm sobre os seus ombros o pesado encargo de fazer justiça.
É que, como bem disse o Sr. Ministro da Justiça aquando da inauguração do Palácio da Justiça de Águeda, «a magistratura constitui uma carreira específica sujeita, pela sua própria natureza, a um apertado regime de incompatibilidades, de severas exigências e limitações, a que se torna indispensável salvaguardar o prestígio e a dignidade, que representam verdadeiros pergaminhos de garantia da imparcialidade no julgamento da honra da liberdade e da fazenda dos cidadãos. O mesmo é dizer: garantia da ordem social e de paz dos consciências.
Recordo que a função do magistrado é estritamente inconciliável com o exercício de qualquer outro cargo público ou privado. Recordo as mudanças periódicas impostas por lei e o esforço suplementar requerido pelas necessidades de um serviço que se encontra permanentemente submetido à apreciação superior» (Boletim ao Ministério da Justiça, n.° 185, p. 6).
Os juizes constituem um dos órgãos da soberania com a particularidade de serem vitalícios e inamovíveis.
É já essa uma razão decisiva para não deverem ser equiparados a quaisquer outros funcionários públicos. Constitucionalmente, servem a Nação no mesmo plano que o Chefe do Estado, os Deputados, o Presidente do Conselho e os Ministros.
Mas há outros motivos: em primeiro lugar, a necessidade de assegurar a independência dos juizes - antes de mais a sua independência económica. Na verdade, se a eles e só a eles compete julgar «da honra, da liberdade e da fazenda dos cidadãos», nenhum outro funcionário precisa de ser independente em tão alto grau. A independência dos juizes interessa sumamente à Nação. Porque, como disse Eduardo Couture, «no dia em que os juizes tiverem medo nenhum cidadão poderá dormir tranquilo».
Importa aqui salientar especialmente que quase todos os funcionários públicos arranjaram formas mais ou menos licitas, mais ou menos honestas, de compensar a exiguidade dos seus vencimentos. São os acumulações das funções públicas com actividades particulares; são os professores que quase não dão aulas ou que dão explicações remuneradas aos seus próprios alunos; são os técnicos autorizados a passar de fugida pelas suas repartições; são as ajudas de custo abonadas por pretensas deslocações; e sabe-se lá o que mais.
De nenhum de tais vícios enferma ou sequer pode enfermar a magistratura. Em virtude da própria natureza dos funções que exercem, é defeso aos magistrados procurar fontes complementares dos seus vencimentos, ainda que impolutas. Têm de viver exclusivamente daquilo que o Estado lhes paga. Nem, de resto, o exercício do seu múnus, que lhes absorve o tempo todo, permitiria que eles se dedicassem a qualquer outra actividade.
Nestas circunstâncias, equiparar a situação dos magistrados a qualquer outra categoria de funcionários públicos corresponde efectiva e insofismavelmente a tratar os pri-

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13 DE DEZEMBRO DE 1972 4077

meiros com desfavor - um desfavor que não merecem de modo nenhum.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Orador: - À despeito do empenho especial que se tem procurado imprimir, ao movimento de renovação das instalações dos serviços do Ministério da Justiça, não poderia o Governo deixar de reconhecer que é na competência e na integridade moral dos julgadores que reside o elemento primordial da justiça.
Mais do que do desafogo ou do conforto das instalações, mais do que da própria perfeição técnica do sistema legislativo, é de bons magistrados e de honestos funcionários de justiça que a colectividade necessita para seu governo.

Vozes: -Muito bem !

O Orador: - Termino, dando a minha aprovação na generalidade a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1973.

O Sr. Presidente: - Informo a Assembleia de que durante a sessão deu entrada na Mesa uma proposta de aditamento à proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1973, enviada pelo Governo ao abrigo do disposto no § 1.° do artigo 97.° da Constituição. Vai ser publicada no Diário das Sessões.
Vou encerrar a sessão. Amanhã haverá sessão à hora regimental. A ordem do dia será desdobrada em duas partes: na primeira parte, iniciaremos a discussão dos acordos com o Mercado Comum Europeu. VV. Ex.ªs sabem que são dois, têm títulos relativamente longos, mas, para abreviar, chamar-lhes-ei assim; na segunda parte, continuaremos com a discussão na generalidade da proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1973.
É provável que durante essa segunda parte não possam ser esgotadas as inscrições para o debate que ainda estão pendentes na Mesa. Sendo assim, haverá sessão na parte da manhã de quinta-feira, além da sessão da tarde.
Portanto, para amanhã haverá sessão com os duas ordens do dia que já indiquei, e iniciar-se-á a hora regimental.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas o S minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
António Júlio dos Santos Almeida.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte Leibermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Duarte de Oliveira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Júlio Dias dos Neves.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Rafael Valadão dos Santos.
Rogério Noel Feres Claro.
Teodoro de Sousa Pedro.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram á sessão:

Amuando Valfredo Pires.
Carlos Eugênio Magro Ivo.
D. Custódia Lopes.
Francisco Correia das Neves.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Lopes da Cruz.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho Jordão.
José da Costa Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José João Gonçalves de Proença.
Manual Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Marques da Silva Soares.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

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4078 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 206

Texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção

Decreto da Assembleia Nacional sobre prestação de avales pelo Estado

CAPÍTULO I

Da concessão de avales do Estado por acto administrativo
BASE I

É autorizado o Ministro das Finanças a prestar, por uma ou mais vezes, o aval do Estado a operações de crédito interno ou externo a realizar palas províncias ultramarinas, por institutos públicos ou por empresas nacionais.

BASE II

1. O aval será prestado apenas quando se trate de financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional, ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação dessa garantia e, em qualquer caso, se verifique não poder o financiamento realizar-se satisfatòriamente sem o referido aval.
2. Se a operação de crédito for proposta por empresa privada, o aval somente poderá ser concedido após verificação de que a empresa oferece a segurança suficiente para fazer face às responsabilidades que pretende assumir, designadamente pelas suas características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa.
3. A responsabilidade em capital decorrente para o Estado dos avales prestados -ao abrigo da autorização concedida pela base anterior não excederá a quantia que for fixada pelo Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos sobre proposta do Ministro das Finanças.
4. As responsabilidades actuais do Estado, em capital, decorrentes daconcessão de avales a operações de crédito externo, serão contadas para efeito do limite fixado no número precedente desta base.

BASE III

Precedendo acordo do Ministro das Finanças, parte dos empréstimos a que tiver sido dada a garantia do Estado pode, de harmonia com as regras deste diploma, ser utilizada para financiamento de operações de fomento a realizar por outras entidades públicas ou privadas.

BASE IV

A concessão de avales do Estado a entidades com a actividade principal ou exclusiva nas províncias ultramarinas ou a favor de projectos de investimento a realizar nos mesmos territórios poderá ficar dependente da prestação de contragarantia pelas províncias interessadas.

BASE V

Os créditos avalizados terão prazos de utilização não superiores a cinco anos e deverão ser totalmente reembolsados no prazo máximo de vinte anos, a contar das datas dos respectivos contratos.

BASE VI

A declaração de aval caduca trinta dias após a respectiva concessão, se entretanto não tiver sido dado início à operação, salvo fixação expressa de prazo superior, no respectivo despacho de autorização a que se refere a base VII.

CAPÍTULO II

Do processo de concessão de avales do Estado

BASE VII

1. O aval será prestado, em cada caso, mediante prévio despacho de autorização do Ministro das Finanças, pelo director-geral da Fazenda Pública, ou seu legal substituto, o qual poderá, para o efeito, outorgar nos respectivos contratos, emitir declarações de aval autenticadas com o selo branco da mesma Direcção-Geral, ou assinar títulos representativos das operações de crédito avalizadas.
2. A prestação do aval será precedida de consulta aos órgãos competentes do planeamento económico.
3. A inobservância do disposto no n.º l desta base implicará a nulidade do aval.

BASE VIII

1. Em anexo ao despacho referido no n.° l da base anterior figurará o plano de amortização do capital mutuado e de pagamento dos juros respectivos.
2. A modificação do plano a que se refere o número anterior, sem prévia autorização do Ministro das Finanças, implicará a imediata cessação do aval, não podendo o beneficiário do mesmo invocar qualquer responsabilidade do Estado após o início da execução das modificações introduzidas.

CAPITULO III

Da execução dos avales do Estado

BASE IX

1. As entidades a quem o aval for concedido nos termos dos bases anteriores comunicarão à Direcção-Geral da Fazenda Pública, no prazo de cinco dias, as amortizações de capital e os pagamentos de juros a que procedam, indicando sempre as correspondentes importâncias que deixam de constituir objecto de garantia do Estado.

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2. As mesmas entidades, quando reconhecerem não estar habilitadas a satisfazer os encargos de amortização e de juros nas datas fixadas para o respectivo pagamento, darão do facto conhecimento àquela Direcção-Geral, com a antecipação mínima de quarenta e cinco dias em relação ao vencimento dos referidos encargos.

CAPITULO IV
Das garantias do Estado pelo facto da prestação de avales

BABE X

A concessão do aval do Estado confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da entidade beneficiária da garantia, tanto do ponto de vista técnico e económico como do ponto de vista administrativo e financeiro.

BASE XI

1. É criado um fundo de garantia destinado à cobertura dos prejuízos que se registem em virtude da execução de avales concedidos pelo Estado, quer no plano interno, quer na ordem externa, para o qual reverterá nomeadamente o produto de uma taxa de aval, de montante a fixar por despacho do Ministro das Finanças, a suportar pêlos beneficiários respectivos.
2. Para os efeitos do número anterior, serão tomadas pelas Direcções-Gerais da Fazenda Pública e da Contabilidade Pública as providências necessárias para a abertura na escrita do Estado de uma conta de operações de tesouraria sob a designação «Fundo de garantia dos avales concedidos pelo Estado», a movimentar mediante prévio despacho do Ministro das Finanças.

BASE XII

1. Quando o aval tenha sido concedido a sociedades anónimas, o Estado poderá, até ao termo do ano seguinte ao pagamento de qualquer prestação por ele efectuada, exigir a transformação do crédito daí resultante em acções da mesma sociedade, devendo esta promover as formalidades que para isso forem necessárias, no prazo de três meses, contados da referida exigência.
2. Além das garantias que em cada caso forem estipuladas, o Estado goza, sobre os bens das empresas privadas a que tenha concedido aval, de privilégio creditório, nos termos dos artigos 735.°, n.° 2, e 747.°, n.º l, alínea a), do Código Civil, pelas quantias que efectivamente tiver despendido a qualquer título, em função do aval prestado ao abrigo deste diploma.

CAPITULO V

Disposição final

BASE XIII

Ficam revogados os Decretos-Leis n.ºs 43 710 e 46 261, de 24 de Maio de 1961 e 29 de Março de 1965, respectivamente.
Sala das Sessões da Comissão de Legislação e Redacção da Assembleia Nacional, 12 de Dezembro de 1972.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Henrique Veiga do Macedo.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Rafael Ávila de Azevedo.

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