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REPÚBLICA PORTUGUESA
SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA
DIÁRIO DAS SESSÕES
N.° 220 ANO DE 1973 2 DE FEVEREIRO
ASSEMBLEIA NACIONAL
X LEGISLATURA
SESSÃO N.° 220, EM 1 DE FEVEREIRO
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto
Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita
Nota. - Foram publicados três suplementos ao n.° 214 do Diário das Sessões, que inserem: o 1.°, a proposta de lei n.° 25/X, referente à reforma do sistema educativo; o 2.º, a proposta de lei n.º 26/X e o parecer da Câmara Corporativa n.° 47/X, referentes a agrupamentos complementares de empresas, e o 3.°, a proposta de lei n.º 27/X e o parecer da Câmara Corporativa n.º 461X, referentes à protecção da intimidade da vida privada.
SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados, com rectificações, os n.ºs 217 e 218 do Diário das Sessões.
Deu-se conta do expediente.
Foram entregues elementos requeridos pelo Sr. Deputado feres Claro na sessão de 12 de Dezembro.
O Sr. Deputado Moura Ramos apresentou um requerimento.
O Sr. Deputado Trigo Pereira analisou vários aspectos da formação da juventude portuguesa.
Ordem do dia. - Continuou a apreciação do aviso prévio sobre os meios de comunicação social e problemática da informação em Portugal.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Almeida e Sousa, Pinto Balsemão e Oliveira Dias.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 45 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Augusto Domingues Correia.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Delfim Linhares de Andrade.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando David Laima.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do. Nascimento de Malafaia Novais.
Francisco António da Silva.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
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João António Teixeira Canedo.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Manuel Alves.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José Coelho de Almeida Cotta.
José da Costa Oliveira.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José dos Santos Bessa.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Nicolau Martins Nunes.
Olímpio da Conceição Pereira.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teófilo Lopes Frazão.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 67 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.ºs 217 e 218 do Diário das Sessões, o segundo dos quais já ontem foi distribuído.
Acerca do n.° 217 do Diário das Sessões, eu próprio enviei uma rectificação para a Redacção do Diário das Sessões, pois, por lapso tipográfico, consta que observei a um Sr. Deputado que ele tinha contribuído "ultimamente" para o esclarecimento do debate, quando o que lhe disse foi que ele tinha contribuído "utilmente" para o esclarecimento do debate.
Estão, pois, em reclamação os n.ºs 217 e 218 do Diário das Sessões.
O Sr. Cancela de Abreu: - Queria que V. Exa. mandasse rectificar no n.° 217 do Diário das Sessões: na p. 4443, col. 2.ª, l. 36, onde está: "o que", deve ler-se: "isso"; l. 38, onde está: "o § 1.° que", deve ler-se: "o § 1.° em discussão que"; l. 40, onde está: "neste prazo ora", deve ler-se: "dentro de determinado período, e", e l. 41, onde está: "nenhum", deve ler-se: "qualquer".
Muito obrigado.
O Sr. Oliveira Ramos: - Sr. Presidente, peço que no n.° 217 do Diário das Sessões V. Exa.mande fazer as seguintes correcções: na p. 4440, col. 2.ª, l. 2, onde se lê: "possa aprovar", deve ler-se: "a possa aprovar", e na p. 4333, col. 2.ª, l. 18, onde se lê: "pelo que", deve ler-se: "por que". Muito obrigado.
Rectificação apresentada pelo Sr. Presidente ao n.° 217 do Diário das Sessões:
A p. 4443, col. 2.ª, l. 49 e 50, onde está: "ultimamente", deve ler-se: "utilmente".
O Sr. Presidente: - Continuam em reclamação os n.ºs 217 e 218 do Diário das Sessões.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Exas. deseja usar da palavra para rectificações a qualquer destes números do Diário das Sessões, considerá-los-ei aprovados.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Estão aprovados.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama
Dos trabalhadores dos lanifícios de Lisboa, reunidos no seu Sindicato, protestando contra o projecto de revisão das rendas dos prédios destinados a habitação em Lisboa e no Porto.
O Sr. Presidente: - Enviados pela Presidência do Conselho, estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério da Educação Nacional destinados a satisfazer o requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Peres Claro na sessão de 12 de Dezembro último. Vão ser entregues a este Sr. Deputado.
Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Moura Ramos.
O Sr. Moura Ramos: - Sr. Presidente, pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte
Requerimento
Considerando a evidente necessidade de incrementar a florestação das vastas zonas para tal convenientes;
Considerando a esperança de que um vigoroso impulso irá ser dado à florestação, em face das recentes afirmações feitas pelo Sr. Ministro da Economia no acto da posse do presidente do Fundo de Fomento Florestal e do Instituto de Produtos Florestais;
Porém, atendendo a que é factor essencial dessa ingente tarefa assegurar um preço justo pelas árvores a pagar pelas empresas de celulose e de aglomerados de madeira; atendendo aos constantes queixumes da lavoura contra os preços que lhe são impostos por esses dois grupos de empresas consumidoras, que intencionalmente mantêm a procura muito abaixo da oferta, re-
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queiro, para efeitos de uma eventual intervenção, me sejam fornecidos os elementos seguintes:
1.° Indicação dos preços médios pagos à lavoura:
a) Em cada um dos anos de 1972 a 1968;
b) No período de 1967 a 1963 e no de 1962 a 1958;
2.° Quais as novas unidades industriais, de cada um daqueles dois grupos, que se espera venham a ser instaladas, para melhor equilíbrio com a crescente florestação em marcha e a incrementar para o futuro.
O Sr. Trigo Pereira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cada um dos membros desta Assembleia tem de considerar-se, a si próprio, um homem do seu tempo, e, por assim ser, não pode deixar de intervir e de participar na condução das acções que podem contribuir para uma melhoria das condições de vida da Nação.
Dentro deste contexto, quer queiramos, quer não, comportamo-nos como um elo na cadeia dos factos e das ideias que desde o dealbar das civilizações vai insensivelmente ligando as gerações até ao presente e, depois deste, nos ligarão até ao futuro, por mais distante que o consideremos.
Temos, assim, atrás de nós, e sempre, um conhecimento adquirido e uma experiência vivida que nos serve de apoio e de ânimo para todas as inovações que sonhamos.
Experiência, conhecimentos, culto, moral e símbolos que dignifica perfilhar e seguir e, mais, nos dão ânimo e razão para prosseguir no esforço de o transmitirmos às gerações vindouras, não com a mesma forma exterior, porque essa nos cabe afeiçoar ao tempo em que vivemos, mas preservados religiosamente puros quanto ao cerne da sua essência.
De entre aqueles, algum português poderá negar que hoje e sempre foram aceites como valores fundamentais:
Deus e a Sua Glória;
A Família e o seu relicário de virtudes, e com ela as comunidades locais e profissionais e outras em que legitimamente o indivíduo se integra e a sua personalidade se projecta;
A Pátria, ontem como hoje, plurirracial e pluricontinental;
A justiça social que a todos faça chegar a parte a que cada um tem direito e, com ela, o reconhecimento da propriedade e da livre empresa.
O respeito pela dignidade humana e a necessidade de a defender, quando ameaçada, sem ódios, mas também sem tibiezas;
A fraternidade entre povos e raças diferentes;
O repúdio da violência como processo da resolução de problemas políticos e sociais;
O culto das verdadeiras tradições e dos símbolos maiores em que todos estamos contidos.
Estas, e outras mais, as máximas que presidiram à minha formação e à de muitos outros, num período de estuante força juvenil e aceitação sem reservas das verdades que em si contêm e representam e que hoje, claramente afirmo, em nada foram desmentidas.
Foi através destes princípios que se uniu a maioria, se não mesmo a quase totalidade, de jovens deste país no desejo de estar ao serviço da Nação.
Foi através destes princípios que se uniram homens saudáveis de corpo e alma, conhecendo perfeitamente os deveres, as obrigações e os direitos de ser português.
Foi também através destes princípios que se uniram e ajudaram a formar e deram corpo à Organização Nacional Mocidade Portuguesa, representada por um símbolo perene de pureza e de determinação, que é o da Bandeira da Ala dos Namorados.
Símbolo da pureza das intenções da juventude na defesa da honra da Pátria agredida e violentada como hoje, da honra e da liberdade de uma juventude que continuava e continua a querer ser livre e independente, mas conscientemente portuguesa -estritamente portuguesa -, glorioso quadrado esse, o de Aljubarrota, que nos deu exemplo do querer e de uma determinação que é bem símbolo grande e impoluto que nos cumpre defender e seguir e que diariamente, bendito Deus, vemos repetido em determinação bem portuguesa por essas terras de África.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Quer queiram, quer não queiram, naquela Organização Nacional educou-se e formou-se uma juventude genuinamente portuguesa, de que nos orgulhamos.
Hoje mais do que nunca, olhando à nossa volta, perscrutando o futuro, analisando o presente e os desvarios das doutrinas, das solicitações e dos meios de prostituição, moral e física, usados na perversão da juventude, que alguns desejam se esqueça e repudie as origens e os padrões de avaliação por nós usados, havemos de considerar que felizmente os homens dos anos 30 estavam no bom caminho e, mais ainda, que todo o esforço então despendido tem sido sobejamente compensado.
Srs. Deputados, situações semelhantes àquela que hoje atravessamos já as tivemos nós e as tiveram antes outras pátrias, e por isso vem a propósito lembrar aquele momento em que, numa Assembleia como esta em que se discutia o futuro assente nas realidades do momento e em que todos admitiam que a sociedade e as instituições haviam chegado a um estado de degradação que tornava improvável qualquer recuperação sem o uso da violência, um dos presentes arremessou uma maçã quase totalmente podre para o meio dos seus pares e inquiriu como é que daquele fruto se poderia reconstituir outro sadio, fresco e puro.
Diria que, à semelhança do nosso caso, o ancião, abrindo-o, deu a resposta à sua pergunta retirando as sementes e dizendo que, se elas fossem lançadas à terra e acompanhado e acarinhado o desenvolvimento da árvore que delas havia de nascer, se consiguiriam de novo os frutos pretendidos.
Pois esta será a imagem mais correcta que no momento nos ocorre, ao verificar os cuidados postos pelos responsáveis do actual movimento da Mocidade Portuguesa, que não podemos deixar de apontar como exemplo de abnegação face às vicissitudes e exigências da vida, de sã e reflectida determinação na con-
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quista das metas que se propuseram, de doação a uma causa que consideram justa e nobre; doação que bem podemos dizer de vidas e fazenda à causa de uma juventude que queremos venha e que continue a ser uma verdadeira Mocidade Portuguesa.
Pois não há dúvida de que tomaram nas suas mãos as sementes que ainda estavam puras e com capacidade germinativa e as lançaram à terra há bem poucos meses.
Com os cuidados dispensados e a terra ubérrima e sã de que dispomos e onde foram lançadas, já começaram a crescer, e com que pujança, os primeiros rebentos, que agora deve amparar e defender com todo o carinho.
O Sr. Dias das Neves: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faz o obséquio.
O Sr. Dias das Neves: - Eu estou a ouvir V. Exa. com toda a atenção, pois eu comungo com V. Exa. nesse mesmo ideal, na medida em que somos homens da mesma geração, e comungo igualmente com as preocupações que V. Exa. está a manifestar.
Mas as palavras que V. Exa. acabou de pronunciar agora lançaram no meu espírito uma dúvida. É que eu estou a verificar, na minha qualidade de director de um estabelecimento de ensino, que será muito difícil à Mocidade Portuguesa, se não for acarinhada, como V. Exa. diz e pede, fazer renascer essas sementes.
Eu creio que a Organização Mocidade Portuguesa, que tanto contribuiu para a formação dos homens que hoje estão à frente dos destinos do nosso país, tem que forçosamente florescer nos estabelecimentos de ensino. Na medida em que estamos a alargar a escolaridade obrigatória, a juventude é obrigada a estar cada vez mais tempo na escola. É, portanto, indispensável que na escola se faça todo o esforço, todo o trabalho.
Quando eu vejo o Secretário Nacional da Juventude criar uma organização que terá de agir, penso eu, em paralelo com a Mocidade Portuguesa, em concorrência dentro do estabelecimento de ensino, eu não vejo bem como as coisas poderão ser.
V. Exa. poderá, talvez, esclarecer-me melhor.
O interruptor não reviu.
O Orador: - A intenção directa da minha intervenção não é, Srs. Deputados, a esquematização, nem, seguramente, a definição de princípios ou de métodos. É, quando muito e exclusivamente, o aspecto de situar um problema no contexto político nacional.
É evidente que a posição que hoje ocupa o movimento, isto é, a Associação da Mocidade Portuguesa, completamente livre e independente, portanto de voluntariado absoluto, será uma fórmula de verificarmos até que ponto as raízes da Pátria, e o peso de uma educação centenária, para não dizer quase milenária, podem, na população deste país, levar à formação de homens iguais, se não melhores, àqueles que uma organização institucionalizada formou no País.
Por outro lado, não podemos esquecer que, em todos os países do Mundo, em todos os partidos, em todas as organizações políticas, os homens que ocupam o Poder, os homens que definem uma política, foram, regra geral, formados, para não dizer, porque agora é difícil e é feio dizer, chefes de juventude. Esta é uma verdade, que nenhum dos Srs. Deputados pode esquecer, na vida pública e política deste país ou de qualquer nação.
O Sr. Jorge Correia: - Nós não esquecemos, mas há quem esqueça.
O Orador: - Infelizmente. Por isso a nossa obrigação é estarmos aqui presentes e chamarmos a atenção para as situações que reputamos de interesse, não para partidos, não para grupos, mas fundamentalmente para o País e para a Pátria.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Desde já ansiamos ver florir por todo o País novos centros de actividade da móvel e remoçada Mocidade, não para ocupar, como agora se diz, os tempos livres da juventude, mas antes para que esta tenha o espírito livre para estudar, analisar e compreender na totalidade a gesta da nacionalidade e os sagrados princípios em que assenta, e os tempos ocupados em actividades de formação individual e colectiva, que os leve a considerar que sobre os seus ombros pesará dentro em breve a responsabilidade da condução dos destinos da Pátria e da ordenação e orientação das transformações que por certo hão-de sofrer as gerações vindouras, mas sem que estas percam a sua caracterização genuinamente portuguesa.
Só assim, penso, continuaremos a ter argumentos e força moral para dialogarmos abertamente com a Nação.
Por isso estamos com o actual comissário nacional e com o seu colégio ao afirmar que confiamos e cremos em que "o que existe de mais nobre na juventude é poder captar todos os ensinamentos que lhe pudermos transmitir de forma a que possam levar também a outros, ampliados, os conhecimentos adquiridos".
Isto não significa despersonalização, nem muito menos a criação de "jovens massa", mas antes, pelo contrário, a presença e actuação de duas ou mais gerações, ou, se assim não quiserem, a presença de dois estádios diferentes de aquisição de conhecimentos na continuação histórica da nossa evolução.
O Sr. Carvalho Conceição: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faz obséquio.
O Sr. Carvalho Conceição: - Estou a ouvi-lo com muito interesse e gostaria de fazer uma achega, como vulgarmente se diz. É que vejo centrar muito as preocupações de V. Exa. na criação de centros, isto é, de locais possivelmente onde a juventude possa conviver, discutir a diversa problemática de natureza social, política, etc. Mas eu gostaria talvez de sugerir a V. Exa. que não creio que isso baste. Creio que a política tem que ser de natureza global.
Não podemos apenas esperar que seja a escola ou esse centro que possa exercer uma acção conducente a esse desenvolvimento integral da juventude. Se os meios de informação, de difusão, de massa, não tiverem também uma acção nesse mesmo sentido, não esquecendo, inclusive, que esses meios de difusão
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saltam fronteiras e que cada vez mais, com os satélites, será possível haver como que uma internacionalização de certas ideologias, eu creio bem que não é apenas na escola ou nos centros, mas a nível mais elevado, que há que actuar para garantir de facto a inviolabilidade das crenças nacionais.
O interruptor não reviu.
O Orador: - A achega que V. Exa. me deu é perfeitamente pertinente e cabe inteiramente no contexto da minha intervenção. Sem escola, sem família, sem orgânica estatal, dando apoio directo à formação e à organização da juventude -é evidente que nós assistimos também internacionalmente ao mesmo problema-, pergunto, e pergunto aos meus pares: Nós devemos criar uma juventude internacional, contrariando as políticas seguidas em todos os países, ou devemos dar-lhe antes um conhecimento da problemática internacional e uma constituição e formação nitidamente portuguesa? Aliás, não fazemos mais do que aquilo que os outros fazem.
Haja em vista a problemática e a política definida e seguida nos países que vão desde a China de Mao Tsé-Tung e todos ou outros países socialistas até esta ponta da Europa, onde nós vemos imbuir a juventude em princípios que a definem e moldam como juventude com características próprias. Ou acaso será que temos de admitir que uma juventude de um país como a U. R. S. S. não está formada nos princípios que definem o Estado e princípios políticos da sua própria organização?
O Sr. Ricardo Horta: - E de que maneira!
O Orador: - Muito obrigado.
Continuando: Deseja-se, isso sim, é que cada jovem se devote desde novo ao conhecimento dos interesses legítimos da comunidade nacional, dando-lhe a generosidade dos sacrifícios aceites, em prol do bem comum, não por heroísmo, mas como quem pratica dever de solidariedade natural.
Por isso somos e continuaremos a ser pelo desassombro no julgamento das instituições para que, quando forem tidas por ultrapassadas, por inoperantes ou por desnecessárias, sejam pura e simplesmente retiradas da vida pública do País, mas em contrapartida repudiamos que para tal se conseguir ou justificar se vão progressivamente estrangulando, se lhe retirem pouco a pouco os apoios, se lhe subtraia toda a possibilidade de diálogo e se amoleça a vitalidade dos homens que a elas se dedicam, transformando-os em meros profissionais burocratas de coisas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A juventude quer clareza nos princípios, honestidade nos métodos, doação à causa e um certo grau de sacrifício pessoal e colectivo para se atingirem as metas propostas e acção e participação clara no trilhar dos caminhos do futuro.
Assim sendo, confiamos e cremos em que à novel Mocidade Portuguesa não falte, nem os apoios básicos do Governo que, mais do que se justificam, se impõem, nem tão-pouco o daqueles que se orgulham da juventude e dos exemplos que tem vindo a dar, um pouco por todo o mundo, na defesa da Pátria, que nela tem a certeza de residir a semente que guarda todo o potencial herdado de portuguesismo e férrea determinação de continuar a ser portuguesa.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Por assim pensar, confiamos e cremos que assim será.
Tenho dito.
O orador não reviu. Vozes: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: vamos passar à
Ordem do dia
Continuação da efectivação do aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota sobre os meios de comunicação social e problemática da informação em Portugal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida e Sousa.
O Sr. Almeida e Sousa: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproveitando o aviso prévio agora em discussão, pode parecer impertinente da minha parte - e, se o for, só tenho a pedir desculpa- que, depois de ter sido vencido nesta Câmara aquando da aprovação da base XII da Lei de Imprensa, insista ainda na ideia que era a minha, e continua a ser, acerca do ensino do jornalismo em Portugal. Fui vencido, mas, tenho de confessar, não fiquei convencido. Passou-se ano e meio sobre essa aprovação, a problemática do ensino em Portugal acelerou-se por forma que ninguém então ousaria adivinhar, e hoje, quando reflicto sobre as ideias que aqui expus e que não lograram a completa aquiescência de VV. Exas., não consigo deixar de pensar serem essas as ideias que mais estarão na linha do sobre-humano esforço que, neste campo, a Nação vem fazendo.
Oito anos de escolaridade obrigatória, se bem cumpridos e bem aproveitados, hão-de por certo modificar inteiramente a mentalidade e as necessidades de cultura deste País. Ao fim de oito anos de escola, se a escola for, em ensino e em educação, o que por certo todos queremos seja, não se poderá dizer apenas que os Portugueses saberão ler. Ao fim de oito anos de escola e de educação, estou certo que há-de haver muitos portugueses que hão-de saber querer, que hão-de saber querer ser do seu tempo e do seu mundo, hão-de saber querer ir mais além. E aqueles que o quiserem, a Nação bem precisa deles. Nunca serão de mais.
Penso que na actual estrutura da vida e do trabalho, o jornal será ainda um dos grandes veículos da cultura e da actualização.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - Só a leitura nos poderá fazer pensar e reflectir, formar o espírito crítico que nos é indispensável, fazer o exame de consciência que, dirigido ao que somos, ao que valemos e ao para que servimos, poderá fazer avançar os homens e, consequentemente, a Nação no caminho do progresso e do bem.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - Não acredito - desculpem-me se estou errado, ou se é uma maneira egocentrista de ver o mundo que mo faz ver assim -, não acredito que
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seja uma sucessão de imagens fugitivas, que preguiçosamente permitimos nos sensibilizem o cérebro, que consiga dar-nos a estrutura mental e cultural de que necessitamos para vencer, vencer o mundo em que temos que vencer.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - Serei eu que erradamente penso assim...
Rendendo homenagem ao que, através dos tempos, pela cultura do nosso povo, os nossos jornais têm feito, com meios que nem sempre terão sido os mais consentâneos, porque não havemos de ambicionar ter amanhã melhores jornais para os homens mais cultos, que o esforço que estamos consentindo há-de fazer?
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - E para termos melhores jornais, penso que quanto mais jornalistas preparados tivermos melhor será. Para mim, é um axioma.
Foi oportunamente anunciada a instituição em Lisboa de uma escola de ensino superior particular que inclui entre os seus cursos o de jornalismo. Os nomes ilustres de quem a dirige e de quem nela prelecciona são, sem dúvida, garantia suficiente de um ensino de alto nível, verdadeiro ensino superior em qualquer parte do Mundo. Por outro lado, as habilitações exigidas na admissão e os três anos por que se distribuem as disciplinas são mais uma certeza.
Estamos, pois, ao nível do futuro ensino politécnico, embora neste caso de índole particular. Já é alguma coisa, sem dúvida, e não serei eu que menosprezarei, por uma palavra sequer que seja, nem o serviço que se presta, nem o fruto que se espera.
Mas porque não ensino oficial para já, com toda a brevidade de que os meios de que se possa dispor permitam? Recente informação havida aquando da posse dos novos corpos directivos do Sindicato Nacional dos Jornalistas parece dizer que o Ministério da Educação Nacional tenciona resolver muito em breve o problema. E ainda bem! Com que nível? Não consegui obter precisão, mas, de qualquer maneira, e no decurso dos três primeiros anos, a questão não se porá.
Sei, por outro lado, que a Comissão Regional de Planeamento do Norte, no estudo que fez da planificação do ensino na sua área, propôs e defendeu a instituição, para já, no Instituto Politécnico do Porto, do curso de Jornalismo. De facto, se o passado alguma coisa nos merece e em alguma coisa nos obriga, seria neste campo a maior injustiça deixar o Porto, berço da grande maioria dos melhores jornalistas portugueses, sem uma escola da profissão que já vem no sangue de tantos dos seus filhos.
O Sr. Ávila de Azevedo: - Muito bem!
O Orador: - Não me desmentem nem as páginas, nem os nomes gloriosos que se lêem nas colecções dos nossos centenários jornais.
Porventura terá agora chegado a hora de a Nação se redimir do pecado que foi ter deixado região de tão altas tradições literárias, que lhe tem dado, através dos séculos, os melhores nomes da literatura portuguesa, sem uma única escola superior de letras.
Quando lha deu, tirou-lha logo a seguir, e só agora, quase meio século depois, lha restituiu. Se o passado merece e o futuro pede, penso que é justo e será muito útil instituir quanto antes, sob qualquer forma que seja, a Escola Superior de Jornalismo do Porto.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Para além dos continuados e muito meritórios esforços do Sindicato Nacional dos Jornalistas para a valorização dos seus sócios, é tudo quanto conheço acerca do estado actual do problema do ensino do jornalismo em Portugal.
Poder-me-ão dizer que são escolas a mais e que a profissão não comporta tantos diplomados. Falam-me em quarenta e oito diários que absorveriam apenas, por ano e em média, quarenta novos profissionais. Serão números de que partir, sem dúvida, mas quando se fala apenas nos diários que existem e nos profissionais que pedem ignoram-se muitas coisas, a primeira das quais é evidentemente o impacte que a batalha da educação tem forçosamente de trazer ao modo de ser e aos hábitos da população portuguesa. Se assim não fosse, quase que diríamos que não valeria a pena o esforço que estamos fazendo.
Em segundo lugar, põe-se de lado o pequeno número de revistas e publicações periódicas de informação que se publicam em Portugal - se nos restringirmos a informação geral, não me lembro que no Norte se publique alguma -, publicações que tanto podem contribuir para que se faça nos dois sentidos que esta palavra aqui pode ter a história do nosso povo. As revistas e publicações que há não chegarão por certo para as necessidades dos 10 milhões de homens oito anos escolarizados que na Europa havemos de ser.
Por último, ignora-se a falta tremenda que fazem pessoas especializadas (que não há) para a orientação de tantas publicações sectoriais ou regionais que neste país se editam, infelizmente para não serem lidas. Quantas revistas e quantos boletins -profissionais, técnicos, corporativos ou associativos- se publicam em Portugal que, por falta absoluta de atracção, não merecem daqueles a que se dirigem qualquer espécie de interesse? Tanto trabalho que morre no cesto dos papéis!
Todos, mais ou menos, seremos testemunhas deste facto como assinantes, e com certeza que, com mais responsabilidades, muitos de nós poderíamos testemunhar aqui as dificuldades que sentimos ao querer tornar atractivas publicações que tantas vezes nos interrogamos se valerá a pena continuar a editar.
É todo um vasto campo que, a bem da cultura e do progresso da Nação Portuguesa, há que fazer evoluir. O amadorismo teve a sua, e tantas vezes bem meritória, parte no desenvolvimento da nossa informação. Para os homens que hoje somos e, sobretudo, para o país que amanhã seremos, creio que não basta, creio que é preciso mais! É esta a razão profunda da minha intervenção de hoje.
Não nos compete aqui, com certeza, planear. Compete-nos, sim, em plena sinceridade, afirmar o que sentimos serem as necessidades, no presente e no futuro, da Nação Portuguesa. Por discutíveis que necessariamente sejam ou possam ser...
Deixo para o fim uma palavra sobre as necessidades de informação que o País sente nos campos cientí-
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fico, técnico e tecnológico. Sem uma informação válida nestes campos é impossível, impossível no sentido literal da palavra, a recuperação que desejamos e nos é mais do que necessária.
O Sr. Magalhães Mota: - Muito bem!
O Orador: - Somos demasiado pobres em homens e em meios para nos permitirmos reinventar o que os outros, porventura há muito, já inventaram. Temos de saber, dia a dia, onde eles estão para deles nos aproximarmos, aproveitando esforços que não foram nossos e que, portanto, não temos de pagar, em tempo ou dinheiro.
É, pois, com uma palavra de louvor para o Centro Nacional de Informação, agora e bem perto daqui em vias de ser criado, que quero terminar, desejando de todo o coração que venha a ser a instituição prestigiada e útil que o País tanto necessita seja.
O Sr. Pinto Balsemão: - Sr. Presidente: Em boa hora apresentou, em Abril de 1970, o Sr. Deputado Magalhães Mota o seu aviso prévio sobre os problemas da informação em Portugal.
Estávamos então -já lá vão quase três anos - no fim da primeira sessão legislativa deste nosso mandato. As esperanças e as ingenuidades iniciais tinham, por vezes bruscamente, sido substituídas por alguma maturidade e muito realismo. Sabíamos -refiro-me, como é óbvio, aos que haviam acabado de entrar na vida política- que os mecanismos estavam mais emperrados ou avariados do que pensáramos, mas acreditávamos na possibilidade de os lubrificar ou reparar. Conhecíamos - continuo a reportar-me aos políticos principiantes, sobretudo aos que aceitaram candidatar-se pela União Nacional mediante certas condições - a compexidade dos direitos adquiridos e a força dos interesses estabelecidos, mas julgávamos viável o distrinçar de uns e o destruir de outros.
Estávamos conscientes das dificuldades de prosseguir os objectivos que nos trouxeram a S. Bento, mas considerávamos que valia a pena lutar, andar para a frente, propor soluções, derrubar obstáculos.
Foi dentro deste estado de espírito que, então, acolhi com entusiasmo o aviso prévio agora, finalmente, em discussão. O Dr. Francisco de Sá Carneiro e eu próprio havíamos acabado de conseguir o visto da comissão parlamentar para o nosso projecto de lei de imprensa que lhe fora submetido a exame prévio.
O Abril em Portugal não estava totalmente toldado pelas chuvas mil que daí em diante, por inexplicável fenómeno meteorológico, o tem caracterizado. A Primavera política, embora não tão radiosa, parecia ainda aceitável e perdurável.
O aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota, foi, por isso, recebido por mim e por muitas outras pessoas como um passo importante no caminho difícil que traçáramos Desejávamos que o País saísse da inércia, queríamos o acento tónico na evolução, rejeitávamos grande parte do passado próximo, radicávamos a nossa fé na inevitabilidade de mudanças, de reformas, na concessão a todos de uma verdadeira participação. Debater o tema do aviso prévio - a problemática da informação - era contribuir para clarificar posições, era provocar uma "imagem do Portugal novo", era denunciar o que estava mal, para conseguir que passasse a estar bem.
Decorreram, entretanto, três anos, Sr. Presidente. Três longos anos em que as desilusões e os descontentamentos não lograram fazer-nos amargos, mas marcaram as nossas vidas e as nossas convicções. Morreu José Pedro Pinto Leite (muitas vezes me pergunto como teria sido esta legislatura, se ele aqui estivesse, com a sua inteligência, a sua coragem, o seu desembaraço - e com o seu sentido de humor, qualidade que se afigura ter desaparecido desta Casa). Extremaram-se as posições, sem vantagens para ninguém, e muito menos para o. País. Tornaram-se inúteis os esforços de negociação, de transigência, de compreensão. A pouco e pouco, foi-se sentindo a irrelevância de qualquer voz discordante. O apregoado pluralismo não era, de facto, desejado. Serviria, quanto muito, de paliativo, de assunto para alguns (não todos, claro) jornais, de tabo para o Telejornal, de produto aproveitável para exportação externa, mas em nada influenciaria o andamento dos negócios públicos. E, assim, muito tranquila e naturalmente, Sá Carneiro é o primeiro a renunciar ao mandato.
O Sr. Almeida Garret: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Almeida Garret: - Tenho estado a seguir as palavras de V. Exa. com toda a atenção e com todo o respeito que me merece não só a pessoa de V. Exa., como os propósitos honestos que em V. Exa. reconheço.
No entanto, as palavras que acaba de proferir produzem-me alguma perplexidade, e eu não desejava corresponder às intenções de V. Exa. com a reserva que porventura o meu silêncio pudesse significar.
V. Exa. falou em pluralismo, e sem necessidade de fazer referências pessoais tenho a impressão de que tenho alguma autoridade na matéria.
Falou de um pluralismo que não era "desejado".
Eu pedia muito sinceramente a V. Exa. o obséquio de tornar mais claras essas palavras, na medida em que pode ficar no pensamento de alguns dos seus pares e no pensamento da Nação, através da imprensa, em que V. Exa. teve e tem especiais responsabilidades, pode ficar uma ideia talvez não totalmente correspondente às expressões de V. Exa.
Um segundo ponto sobre o qual eu desejaria fazer algumas reservas, e peço desculpa se V. Exa. vê nisso alguma deselegância, é o seguinte: suponho que a referência pessoal que acaba de fazer diz respeito a um problema que vai ser submetido oportunamente ao plenário. O plenário sobre isso terá constitucional e regimentalmente de se pronunciar. Sem me atrever a sugerir a V. Exa. uma determinada conduta, suponho que a primeira posição que se deve ter quando se fala num pluralismo bem entendido, quando se fala numa posição de perfeita compreensão entre todos nós, a primeira posição seria esperar que o plenário sobre isso se debruçasse.
Vozes: - Muito bem!
O Sr. Almeida Garrett: - Eu não me atrevo a insistir neste ponto, mas gostaria que V. Exa. meditando nisso se abstivesse de outras afirmações desse
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género que, embora não reduzindo a consideração que tenho por V. Exa., me deixariam a mim e a todos que encaram seus pares com o respeito e a consideração devidos a um Deputado ligeiramente magoado pelas afirmações que V. Exa. fizesse dessa Tribuna.
O Orador: - Muito obrigado eu, Sr. Deputado Almeida Garrett, pela correcção e pela clareza com que V. Exa. apresentou algumas objecções àquilo que eu acabava de dizer.
Penso que essa é realmente a única maneira de trabalharmos nesta Casa e mais uma vez V. Exa. deu provas de que estamos aqui com o mesmo espírito. É por isso que, com todo o gosto, tento responder às suas objecções que me apresentou.
O Sr. Almeida Garrett: - Foi só uma, foi só uma... A outra foi meramente uma sugestão.
O Orador: - Decerto, mas como se sentiu ligeiramente magoado, acaba por ser uma objecção.
O Sr. Almeida Garrett: - Se V. Exa. quiser, eu retiro o "ligeiramente"...
O Orador: - Então se fica só "magoado", a objecção é mais forte.
Quanto ao pluralismo indesejado, é evidente que aqui desta tribuna ou ali dos nossos lugares, quando falamos, fazêmo-lo em nome pessoal. Não falamos em nome de um grupo ou de outros Deputados aqui presentes. Apenas estamos a representar, penso eu, os eleitores.
Quando referi que na minha opinião - e essa mantenho-a! - o pluralismo não é desejado, fundamentei-me em factos da minha experiência pessoal. Posso estar errado, é uma opinião que forçosamente tem de ser subjectiva, mas que julgo baseável nalguns factos.
Aponto-os muito rapidamente, para não alongar a minha intervenção, que, aliás, é extensa. Em primeiro lugar, senti-me muitas vezes nesta Casa, durante estes três anos e tal, vítima (no bom sentido da palavra) de derrotas sucessivas. Posso citar a V. Exa. um caso concreto, o da Lei de Imprensa, em que, por exemplo, e vou referir um tema inocente, o da publicidade redigida sem sinal identificador de pago, essa derrota foi injusta. A minha intervenção foi inútil, pois, apesar de eu ter razão e de muitos Deputados mo virem dizer, depois da votação, perdi.
O Sr. Casal Ribeiro: - A maioria não o julgou!
O Orador: - Aprecio a intervenção de V. Exa. e o seu exemplo democrático - mesmo que seja só aqui, já é qualquer coisa ... Portanto - e repito que a opinião é minha -, tenho vindo a sentir, ao longo desta evolução da minha vida parlamentar, que o pluralismo não é desejado. Em muitas ocasiões - e cito o caso das cooperativas...
O Sr. Almeida Garrett: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Com certeza. Eu estou a dar-lhe exemplos, para tentar objectivar a minha posição...
O Sr. Almeida Garrett: - Agradeço profundamente essa sua disposição. Qualquer intervenção que eu faça ou que tenha feito, sabe-o V. Exa., e desejo-o com o coração nas mãos, é só no sentido de me esclarecer, nada mais. Mas, talvez por falta minha, não consigo compreender o argumento de V. Exa. Se o pluralismo é negado por se ter sido vítima de derrotas sucessivas, isso é precisamente a negação do processo democrático.
O Orador: - Não. Eu não o entendo assim e era isso que eu estava a tentar explicar pelas palavras mais diplomáticas e delicadas.
O Sr. Almeida Garrett: - É incompreensão minha...
O Orador: - No caso das cooperativas, como V. Exa. sabe, o decreto-lei veio à Assembleia para ratificação. Entendo que não será conveniente divulgar aqui pormenores sobre conversas que tive - que tivemos alguns dos que entendíamos que devia haver, pelo menos, emendas ao articulado inicial do decreto-lei -, nem será aqui o momento de revelar como essas conversas decorreram, com quem se efectuaram, etc. Posso no entanto divulgar que, tendo havido, da minha parte pelo menos - e também de outros Deputados -, vontade de transigir até certo ponto, de negociar uma solução em que todos ficássemos de acordo, verificou-se que se tornou impossível, sem culpa nossa.
O Sr. Almeida Garrett: - Ah, mas o pluralismo não se define na negociação, extraparlamentar ou extraplenária, Sr. Deputado. Suponho eu. O pluralismo define-se pela liberdade de cada um defender as suas posições e de ser possível, efectivamente, a presença nesta Casa de pessoas que, como se sabe, não têm todas a mesma opinião.
Isso é que é o pluralismo.
O Orador: - V. Exa. acha que isso chega?
Portanto, basta ser possível a presença nesta Casa de pessoas que tenham opiniões diferentes?
O Sr. Almeida Garrett: - Pois com certeza. Eu tenho-as tido muitas vezes.
O Orador: - Se uma opinião de minoria, para usar expressões mais concretas, não for aceite democraticamente pela maioria, isso é uma coisa; outra é essa minoria entender que a votação não corresponde, em muitos casos, ao sentir da maioria expresso pelo voto.
Eu não queria ser tão claro, mas V. Exa. obrigou-me.
O Sr. Almeida Garrett: - Isso é o entender de V. Exa.
O Orador: - Com certeza.
O Sr. Almeida Garrett: - Evidentemente que V. Exa. é livre, e deve sê-lo, e cumprimento-o por isso, no entendimento que tenho sobre todos os problemas que se põem nesta Casa.
É a liberdade que arrogamos para cada um de nós.
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O Orador: - É nessa base, precisamente, que eu sustento o que disse há pouco: para mim o pluralismo, como o entendo, não é desejado.
E, se V. Exa. mo permite, agora passo à sua segunda objecção ou pergunta.
A referência que fiz à renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro, se V. Exa. me estava a ouvir realmente com atenção, inseriu-se no contexto de uma descrição que estava à fazer sobre o ocorrido nos últimos três anos. Falei em vários outros assuntos e acabei com a referência do Sr. Dr. Sá Carneiro que amanhã é votado. Sei perfeitamente que não posso nem me devo antecipar a tal votação, e V. Exa. sabe, se me conhece, que hoje com certeza não voltarei a falar no problema.
O Sr. Almeida Garrett: - Precisamente por isso é que eu me sentia magoado, porque conhecia V. Exa.
Muito obrigado.
O Orador: - Penso que não ficámos totalmente esclarecidos, mas entendo que este diálogo foi muito útil para a opinião pública e para a tal imprensa válida, de que me orgulho de fazer parte. Muito obrigado.
O Sr. Pinto Machado: - V. Exa. dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Pinto Machado: - É para, com o meu testemunho, confirmar o que foi aqui há pouco dito pelo Sr. Deputado Almeida Garrett, que declarou, salvo erro, que se sentia autorizado para defender o pluralismo ou ser...
O Sr. Almeida Garrett: - Desculpe. Realmente defendo, mas não disse isso. Disse, sim, que tinha algumas responsabilidades.
O Sr. Pinto Machado: - Pois é, eu queria precisamente confirmar isso, na medida em que a minha presença na Assembleia Nacional, a do Sr. Deputado Sá Carneiro e de outros se deve às diligências, empenhadas e insistentes, do Sr. Deputado Almeida Garrett, conhecendo previamente os nossos pontos de vista.
Muito obrigado.
O Sr. Almeida Garrett: - Em 1969.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pinto Balsemão: V. Exa. é que sabe a extensão provável das suas considerações.
Apenas lhe peço que a meça, contra a sua liberalidade na concessão de interrupções, para não criar problemas no que se refere ao tempo regimental, que desde já lhe digo poderá ir até uma hora, uma vez que do melhor grado lhe concederei, se necessária, a prorrogação de quinze minutos que está nas minhas mãos.
O Orador: - Muito obrigado Sr. Presidente. Continuando:
Não equivale tudo isto a uma declaração de impotência. Apenas a uma declaração de consciência, o Que é menos e é mais. Menos, porque a impossibilidade de actuar só existe quando as pessoas não se sentem conscientemente capazes de prosseguir. Mais, porque essa consciência só surge quando as pessoas, apesar de se julgarem válidas, entendem que não vale a pena prosseguir.
Em boa hora ingressou na ordem do dia o aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota sobre a informação. Se há três anos o debate se apresentava promissor, hoje as probalidades de êxito -no sentido de uma concretização do que tem sido e será proposto - serão mais reduzidas, mas a oportunidade é maior.
Na verdade, se analisarmos o que se passa no campo da informação em Portugal, em 1973, verificaremos que:
A televisão está nas mãos de uma concessionária, cujo prazo de concessão será muito provavelmente prorrogado quando, em 1975, terminar. Isso significa que continuaremos a não poder optar senão entre dois (ou mais) canais da RTP. A preto e branco ou a cor (se esta um dia chegar aos pequenos écrans, será sempre e só a R. T. P. a penetrar nos lares de milhões de portugueses, a fornecer-lhes notícias e entretenimentos "à sua maneira", a hierarquizar a informação como muito bem entender, a vetar a presença nos seus estúdios de pessoas cujas opiniões muito interessariam o País, a impor a presença de indivíduos que nada adiantam (por vezes até atrasam), a focar os factos e as ideias segundo um prisma único, para muitos totalmente deformado ou desactualizado.
Notem-se, por exemplo, "o papel crescente que vem sendo dado aos comentadores que da sua cátedra vêm ensinar" e "o facto de boa parte desses comentários errarem as suas previsões (não será necessário evocar largos ou remotos exemplos: basta pensar na vitória eleitoral do chanceler Brandi)". Registe-se que sempre que acontece algum facto novo (e o imprevisto teima em acontecer) aparece a voz "solene e majestosa" do locutor ou do editorialista, para compensar a irreverência" (Magalhães Mota, sessão de 30 de Janeiro de 1973).
Pense-se no modo como é noticiado pelo Telejornal o que se passa nesta Casa e no pouco relevo dado às nossas actividades.
Também a rádio prossegue uma existência incerta. Tal como sucede com a televisão, não há lei que a regule, não há direitos nem deveres. Os méritos de alguns programas e de alguns serviços de noticiário são puras conquistas de um número reduzido de responsáveis.
Nenhum deles sabe por quanto tempo permanecerá a "abertura" que conseguiram criar, nenhum deles tem uma garantia de que o seu emprego durará.
No que respeita ao livro, bastará lembrar o n.° 4 da base XXII da Lei de Imprensa:
O editor de qualquer publicação não periódica em que versem assuntos de carácter político, económico ou social deve mandar entregar um exemplar aos serviços de informação, até três dias antes daquele em que seja posta a circular.
Talvez seja bom recordar que este preceito não fazia parte da proposta da Lei de Imprensa do Governo; foi acrescentado pela comissão parlamentar e aprovado pela Assembleia, contra o meu voto, aliás. Observe-se também que, hoje em dia, raros são os assuntos que não possam ser considerados políticos, económicos ou sociais.
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O cinema, por seu lado, continua à espera da regulamentação da sua discutida (e não unanimemente aprovada) lei. Está amplamente excedido o prazo constitucional de seis meses para tal regulamentação, mas até agora, já lá vão catorze meses, nada sucedeu. O que tem acontecido, isso sim, é que exibidores, distribuidores e público vêem a sua vida continuamente dificultada pelas intervenções da Censura.
Quanto à imprensa, finalmente, todos sabemos o regime em que vive. Baseando-se na resolução desta Câmara de 20 de Setembro de 1971, o Decreto-Lei n.° 150/72 sujeita a imprensa periódica a exame prévio.
Não interessa discutir agora as circunstâncias em que alguns de nós votaram essa resolução - eu, pelo menos, não a votei para permitir a continuação da censura prévia aos jornais. Não importa, agora, acentuar que o facto de a Assembleia Nacional entender que há subversão nalgumas parcelas do território nacional tenha proporcionado a implantação do exame prévio em todo o território nacional. Mais urgente será denunciar a impossibilidade em que a imprensa se encontra -continua a encontrar-se - de desempenhar a "função de carácter público" que a Constituição lhe aponta. Amordaçada ao ponto de não poder reproduzir discursos nesta sala proferidos, a imprensa, quando não posta ao serviço da política de certos grupos (e não vitimada pela consequente censura interna), debate-se com dificuldades permanentes para relatar, explicar, interpretar o que se passa no País e no Mundo.
É este, Sr. Presidente, o panorama da informação em Portugal: inexistência de lei para a televisão e a rádio, estagnação ou retrocesso relativamente ao livro, não regulamentação do legislado para o cinema, manutenção da censura prévia para a imprensa. Como na passada terça-feira aqui afirmou o Sr. Deputado Magalhães Mota, "continuamos a não dispor de uma lei nem de uma óptica de informação". Panorama sombrio, sem dúvida, mesmo que algumas pessoas, mais ou menos bem intencionadas, queiram dar-lhe um tom mais alegre.
Nada nos prova, na verdade, que a orientação seguida seja a mais útil ao País. O unilateralismo, o tom monocórdico, o monopólio da verdade e do patriotismo cansam, massacram, não convencem. A informação, por abuso, cai em descrédito. Os cidadãos, à medida que apreendem o que se passa, deixam de acreditar, de ser influenciados, buscam nos media estrangeiros a mensagem mais capaz de os esclarecer. Citando de novo o Sr. Deputado Magalhães Mota: "o que queria perguntar é até que ponto a política de informação que possuímos corresponde ao desejar a construção do futuro e a torná-lo, corajosamente, em mãos ou ao pretender avolumar ou manter as indecisões, as meias decisões, numa recusa de mudar e de abandonar a antiga segurança".
Por tudo que ficou exposto, o aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota é útil, é tempestivo. Mais como um grito de alarme do que como uma proposta de soluções a aplicar efectivamente. Todos os que, durante quatro meses por ano, aqui nos temos reunido sabemos, seja qual for a corrente de opinião em que nos integremos, que a política de informação permanecerá igual a si própria.
Não valerá, por isso, a pena alimentar grandes esperanças de que os caminhos e soluções resultantes do aviso prévio venham a ser adoptados pelo Poder Executivo. Resta a consolação de que, muito antes do que se imagina, a tecnologia obrigará a rever a política de informação em Portugal: tal como, hoje em dia, é incontrolável o escutar da rádio nos transístores espalhados pelos cantos mais remotos do País (ou a audição de discos, ou a leitura de livros ou publicações), em breve será incensurável a captação de programas de televisão emitidos pelos satélites artificiais da segunda fase (ou a compra de video-cassettes ou mesmo a instalação da televisão por cabo).
Nessa altura, por mais reticências que surjam, haverá que rever a estratégia do "orgulhosamente sós", terá de ser repensada a preguiça informativa em que, não tão pacificamente como se julga, coexistimos, deverão, por uma vez, ser estudadas, com liberdade, as hipóteses de sobrevivência em que nos debatemos.
Seja como for, o grito de alarme, dado através do excelente veículo informativo que é o aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota sobre os problemas da informação, aqui fica.
O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que ninguém discute, hoje, a extraordinária importância dos meios de comunicação social na sociedade contemporânea, e daqui decorre a conveniência e oportunidade do aviso prévio em debate.
Julgo, porém, que a posição a assumir perante a problemática envolvida na matéria depende, antes de mais, do próprio conceito que se tem da comunidade política e do papel que, nela, devem desempenhar os chamados órgãos da informação.
Por mim, adiro inteiramente à concepção de uma ordem político-jurídica ao serviço do homem - de todos os homens -, e por isso pluralista - dando a todos iguais oportunidades -, tolerante, porque assente no respeito pelos adversários, participada, ao procurar a colaboração de todos na prossecução do bem comum.
Esta, aliás, a concepção dominante da comunidade política nos nossos dias, sendo a participação crescente dos indivíduos na vida pública uma realidade evidente nas sociedades contemporâneas.
Passou, há muito, de moda o conceito de que a vida pública era privilégio de alguns "iluminados", cedendo lugar ao princípio, hoje incontroverso, de que a actividade política deve ser de todos, porque a todos deve interessar e todos devem contribuir para o bem da comunidade em que estão inseridos.
Assistimos, assim, à politicização das massas, o que está plenamente conforme com a dignidade da pessoa humana, na medida em que, por um lado, torna todos e cada um dos homens co-responsáveis pelo futuro da comunidade e, por outro, assegura um maior progresso económico-social ao congregar o esforço de todos os cidadãos na construção de uma sociedade mais justa.
Mas se a todos é devido esse contributo, então haverá que dotar o corpo social das estruturas político-jurídicas que assegurem a cada um o direito de ser informado com objectividade e o direito ò exprimir livremente a sua própria opinião.
Se assim não for, não poderemos falar de pluralismo nem de tolerância e a participação será uma palavra vã.
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Todo o homem tem o direito e o dever de procurar a verdade, todo o homem tem o direito e o dever de comunicar com os outros homens e, por isso, todo o homem tem o direito e o dever de ser informado e de informar.
Daqui decorre a importância dos meios de comunicação social na vida política, a qual para se processar com normalidade supõe necessariamente a existência de uma informação objectiva ampla e pluralista e, ao mesmo tempo, a possibilidade de todos os cidadãos manifestarem as suas opiniões em diversidade salutar e num clima de tolerância.
Um dos fenómenos característicos do nosso tempo, aliás salientado pelo Papa João XXIII na encíclica Mater et Magistra, é o da "socialização", ou seja o incremento das relações mútuas entre os homens.
Suplantada a ética individualista, cada homem deve procurar contribuir para a solução dos problemas do seu semelhante e daí a necessidade da comunicação de indivíduos e de grupos e o enriquecimento mútuo que decorre desse intercâmbio.
Os meios de comunicação social - imprensa, rádio, televisão - possibilitam hoje o contacto permanente entre os homens de todo o mundo e a esses meios se deve, em grande parte, a politicização das massas ao trazer os indivíduos cada vez mais informados sobre os problemas nacionais e internacionais e interessando-os, naturalmente, na sua resolução.
Informação e opinião - dois pólos em redor dos quais se desenvolve a problemática dos meios de comunicação social.
A informação, diz-se, deve ser objectiva e verdadeira, o que supõe o livre acesso à obtenção de notícias e a sua livre divulgação, salvaguardados os limites da ordem moral objectiva, os segredos de Estado e a independência nacional.
Como estamos nós neste capítulo?
Forçoso é reconhecer que a informação tem sido demasiado monolítica, muitas vezes se confundindo com a mera propaganda, como se daí resultasse algo de útil à comunidade. Quem se deixa hoje convencer pelo tom "patrioteiro" de certas notícias?
E quem suporta a louvaminha e a subserviência ainda tanto em voga?
Tem sido independente a nossa informação? Julgo que demasiadas vezes tem estado sujeita a contrôles de ordem política e económica e não vejo que se esteja a recuperar neste campo.
Isto sem quebra de respeito pelos seus agentes, quase nunca os culpados.
Não esqueçamos, porém, como escreveu Jean-Pierre Lassale que:
A informação [...] pode ser uma técnica de alienação tanto como uma técnica de liberdade.
Quando os meios de comunicação social não divulgam a verdade - ou toda a verdade -, ocasiona-se um estado de espírito favorável à propalação de boatos do tipo passou-se "isto" ou não deixam publicar "aquilo" ou abafaram aqueloutro facto.
E depois os boatos serão vigorosamente condenados, quando se poderiam ter evitado ao revelar-se, simplesmente, a verdade.
A informação deve ser, também, pronta, e quantas vezes a notícia vem tardiamente, depois de toda a gente a já saber mais ou menos em segredo. Desta forma, não se gera a confiança nos meios de comunicação social, elemento indispensável à formação de uma recta opinião pública.
A informação deve ser imparcial, e quantas vezes se trunca, se exagera, se adultera. Por isso, a informação deve ter uma feição pluralista para que do confronto de versões possa resultar a verdade objectiva.
Urge, também, promover o nível cultural dos nossos meios de comunicação, procurando transformá-los em instrumentos de difusão permanente do ensino e da cultura. Neste ponto, têm uma missão de extraordinária importância a cumprir no nosso processo de desenvolvimento.
A correcta informação gerará, naturalmente, uma válida opinião pública. E ninguém desconhece a importância crescente da opinião pública nos estados modernos. A cada passo é auscultada, sondada e objecto de estudos e especulações, as mais variadas.
Para que a opinião pública se forme correctamente há que permitir-lhe que se abasteça livremente e livremente se exprima depois.
Opinião pública não significa opinião monolítica. Antes ela é, naturalmente, diversificada, conforme as ideologias de pessoas e grupos.
À opinião pública cabe, hoje em dia, uma função ao mesmo tempo fiscalizadora e dinamizadora da actividade do Estado. Por isso, deve disfrutar de liberdade, o que não exclui, naturalmente, a responsabilidade de pessoas e grupos. E sem liberdade de expressão de opiniões, repito, não podemos falar em pluralismo.
Vivemos, actualmente, uma época difícil na sociedade portuguesa. Já não se fala em convergência, nem em abertura, nem em diálogo, e diz-se que se deram demasiadas liberdades e que estão marginalizados os homens que têm pugnado pela evolução da nossa vida política para uma sociedade mais participada.
Para mim, julgo que vale a pena insistir sempre.
A pacificação da família portuguesa não se consegue pela via do "estremar de campos", nem pela violência, nem pela repressão. Só pela via de diálogo é possível a concordância e o dar as mãos em obra comum; só na diversidade - como tenho sustentado - a verdadeira unidade; só na defesa das liberdades, sem prejuízo da indispensável autoridade do Estado de direito o caminho da paz.
Tenho para mim que a promoção dos meios de comunicação social e o reconhecimento da necessidade do seu pluralismo como expressão de uma opinião pública válida e diversificada são peça indispensável da normalização da vida política portuguesa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá sessão à hora regimental.
Na primeira parte da ordem do dia procederemos à votação, em escrutínio secreto, sobre a aceitação da renúncia do mandato do Sr. Deputado Francisco de Sá Carneiro; na segunda parte, continuará a discussão do aviso prévio sobre meios de comunicação social e problemática da informação em Portugal.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 10 minutos.
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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Gabriel da Costa Gonçalves.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Coelho Jordão.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Valente Sanches.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Rafael Valadão dos Santos.
Teodoro de Sousa Pedro.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José da Silva.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Marques da Silva Soares.
Pedro Baessa.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Rui Pontífice Sousa.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.
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