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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES

N.° 221 ANO DE 1973 3 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

X LEGISLATURA

SESSÃO N.° 221, EM 2 DE FEVEREIRO

Presidente: Exmo. Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
Amílcar da Costa Pereira Mesquita

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado, com rectificações, o n.º 219 do Diário das Sessões.
O Sr. Deputado Pinto Machado interrogou a Mesa acerca do motivo da não publicação da declaração de renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro, ao que o Sr. Presidente prestou os devidos esclarecimentos.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente informou a Assembleia de que o Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil visitará Portugal e possivelmente assistirá à sessão da Assembleia do dia 13.
O Sr. Deputado Silva Mendes solicitou ao Governo um inquérito acerca das anomalias verificadas com as comunicações no distrito de Portalegre.
O Sr. Deputado Alberto de Alarcão teceu algumas considerações acerca da controvérsia entre as partes interessadas num carregamento de vinho para Luanda.
O Sr. Deputado Vaz Pinto Alves enalteceu o esforço do Sr. Ministro da Educação Nacional na política educacional do País, lamentando, no entanto, não terem sido consideradas as condições sócio-económicas de Viseu.
O Sr. Deputado Santos Almeida referiu-se à política ultramarina face aos acontecimentos ultimamente verificados.

Ordem do dia. - Na primeira parte procedeu-se à votação acerca do pedido de renúncia de mandato do Sr. Deputado Sá Carneiro.
O Sr. Presidente convidou para escrutinadores os Srs. Deputados Pinto Machado e Barreto de Lara.
Foi aceite a renúncia ao mandato apresentada pelo Sr. Deputado Sá Carneiro.
Na segunda parte prosseguiu a apreciação do aviso prévio sobre meios de comunicação e problemática da informação em Portugal.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Meneses Falcão, Carvalho Conceição e Ávila de Azevedo.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Alberto Maria Ribeiro de Meireles.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Amílcar da Costa Pereira Mesquita.
Amílcar Pereira de Magalhães.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António Júlio dos Santos Almeida.
António Lopes Quadrado.
António Pereira de Meireles da Rocha Lacerda.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Augusto Salazar Leite.
Bento Benoliel Levy.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Monteiro do Amaral Netto.
D. Custódia Lopes.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Eleutério Gomes de Aguiar.

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Fernando Artur de Oliveira Baptista da Silva.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando do Nascimento de Malafaia Novais.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco António da Silva.
Francisco Esteves Gaspar de Carvalho.
Francisco Manuel de Meneses Falcão.
Francisco de Moncada do Casal-Ribeiro de Carvalho.
Gabriel da Costa Gonçalves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo.
João Duarte de Oliveira.
João José Ferreira Forte.
João Lopes da Cruz.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
João Ruiz de Almeida Garrett.
Joaquim Carvalho Macedo Correia.
Joaquim Germano Pinto Machado Correia da Silva.
José Coelho de Almeida Cotta.
José João Gonçalves de Proença.
José Maria de Castro Salazar.
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
Júlio Dias das Neves.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Manuel Elias Trigo Pereira.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel Martins da Cruz.
Manuel Monteiro Ribeiro Veloso.
D. Maria Raquel Ribeiro.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Miguel Pádua Rodrigues Bastos.
Nicolau Martins Nunes.
Prabacor Rau.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rafael Valadão dos Santos.
Ramiro Ferreira Marques de Queirós.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui de Moura Ramos.
Teodoro de Sousa Pedro.
Teófilo Lopes Frazão.
Vasco Maria de Pereira Pinto Costa Ramos.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 67 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.° 219 do Diário das Sessões.

O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente, em relação ao Diário das Sessões que está em discussão, desejava fazer um reparo, apresentar o seu fundamento, interrogar a Mesa. Como a matéria se prende com a primeira parte da ordem do dia, pergunto a V. Exa. se será este o momento mais oportuno para eu pedir a palavra ou se só devo fazê-lo nessa altura.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a primeira parte da ordem do dia tradicionalmente não é objecto de discussão. Se V. Exa. deseja fazer uma rectificação ou pedir um esclarecimento sobre o n.° 219 do Diário das Sessões, dou-lhe a palavra. Se V. Exa. interrogar a Mesa sobre qualquer assunto de interesse parlamentar, também tem a palavra para o efeito.

O Sr. Pinto Machado: - Então posso usar da palavra agora, se V. Exa. assim o entender.

O Sr. Presidente: - Parto do princípio que V. Exa. deseja interrogar a Mesa. Tenha a bondade.

O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente, o reparo é o seguinte: V. Exa. tinha, na sessão a que se refere este Diário das Sessões, marcado para hoje o pronunciamento sobre a declaração de renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro, tendo anunciado que iria comunicar a cada um dos Deputados o texto da sua declaração. Efectivamente assim foi. Recebi ontem pelo correio uma cópia do texto da sua declaração bem como do parecer da Comissão de Política e Administração Geral e Local que realmente era importante na medida em que estava nas origens do pedido do Sr. Deputado Sá Carneiro.
Confesso - pode ser que esteja a ver mal o problema, a primeira parte desta minha pequena intervenção é um reparo de interrogar a Mesa - que supunha que este Diário das Sessões incluiria o texto desses dois documentos. Verifiquei que isso não aconteceu e eu estranhei, Sr. Presidente - já agora apresento as minhas razões -, porque se prendia com matéria da ordem do dia que ia ser sujeita a votação e recordo, de resto, que em tempos idos o problema chegou a ser levantado pelo Sr. Deputado Dr. Mário de Figueiredo.
Realmente a renúncia é uma atitude muito grave, pois o mandato é conferido pela Nação e, em princípio, entendo que a Nação tem o direito de saber por que é que o Deputado pede escusa do seu compromisso.
Evidentemente, também admito que possa haver circunstâncias muito pessoais, muito íntimas, muito privadas, em que há que confiar apenas na boa formação da consciência do Deputado e essas razões não devem passar da esfera privada da Assembleia, caso que não se verificava agora.
Acresce, Sr. Presidente, que tive ocasião de compulsar os Diários das Sessões referentes a anteriores pedidos de renúncia e verifiquei que isso era o que acontecera.
Refiro-me, claro, a pedidos de renúncia apresentados durante o período efectivo de funcionamento da Assembleia. Recordo até o último, do Sr. Dr. Gonçalves Rodrigues, em que o então Presidente da Assembleia Nacional, Dr. Mário de Figueiredo, leu a sua declaração de renúncia cuja votação se realizou na sessão seguinte - foi em 9 e 10 de Janeiro de 1963.
Já agora, Sr. Presidente, havia outra razão de ordem meramente conjuntural, muito pragmática, que era o facto de não tendo sido permitida a publicação na íntegra dessa declaração parece-me que se evitariam incorrectas e desagradáveis interpretações na sua inserção no Diário das Sessões.

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Portanto, a pergunta à Mesa é esta: Se a não inclusão desses textos, nomeadamente a declaração de renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro, no n.° 119 do Diário das Sessões agora em discussão, significa que efectivamente ela não vai ser incluída no Diário das Sessões referente à sessão de hoje ou se se tratou apenas de um adiamento.
Era esta a minha pergunta, Sr. Presidente, e agradeço ter-me permitido apresentar a minha justificação.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a pergunta de V. Exa. foi o que se pode dizer bastante circunstanciada, bastante desenvolvida. Eu julgo que não é necessário responder-lhe, para esclarecer a posição da Mesa, com tanto desenvolvimento.
Em primeiro lugar, não é efectivamente qualquer lapso do Diário das Sessões.
Eu não mandei publicar a declaração de renúncia ao mandato do Sr. Deputado Sá Carneiro. Não era a isso obrigado. Não é das matérias que, segundo as alíneas d) e e) do artigo 19.° do nosso Regimento, devem ser completamente publicadas no Diário das Sessões.
Creio que V. Exa. reconheceu que, em princípio, uma renúncia de mandato é questão delicada, e acrescentarei que pode envolver graves melindres.
Foi perante a primeira consideração destas, e tendo a liberdade de interpretar o Regimento, não à minha discrição, mas segundo o critério mais apurado que possa formar, que entendo que a delicadeza genérica de uma rescisão de mandato aconselha, em princípio, aguardar reserva sobre ela.
É claro que essa reserva não é, de maneira nenhuma, para os Srs. Deputados que têm de se pronunciar.
Portanto, e sem atenção a circunstâncias de espécie ou de oportunidade, eu não mandei publicar a carta de renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro porque entendo ser mais correcto, em situações destas, não fazer exibição pública da documentação respectiva e informadora de decisões da Assembleia a tomar em escrutínio secreto.
Ouvi, no entanto, dizer a V. Exa. que não tinha sido feita publicação da declaração de renúncia do Sr. Deputado Sá Carneiro. A isso permitir-me-á V. Exa., com a mesma liberdade de apreciação de que V. Exa. fez uso, que eu responda de duas maneiras: em primeiro lugar, parece-me discutível que um documento enviado à Presidência, antes de ter sido anunciado à Assembleia, seja objecto de publicação na imprensa. Em segundo lugar, creio ter podido verificar que o foi, se não por completo, pelo menos em extractos.
É tudo quanto tenho a dizer a V. Exa.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Continua em reclamação o n.° 219 do Diário das Sessões.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Sr. Presidente: Por ter saído com uma alteração que transforma por completo o sentido da expressão, solicito que seja rectificado o n.° 219 do Diário das Sessões, p. 4479, col. 1.ª, l. 52: em vez de "o dever de ser informado", deve ler-se "o dever de se informar".

O Sr. Presidente: - Continua em reclamação o n.° 219 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se mais nenhum de VV. Exas. tem rectificações a apresentar ao n.° 219 do Diário das Sessões, considerá-lo-ei aprovado.

Pausa.

Está aprovado.

Rectificações apresentadas pelo Sr. Deputado Pinto Machado no decorrer da sessão de hoje, por não se ter apercebido de ter sido posto em reclamação o n.° 217 do Diário das Sessões; e relativas a esse n.° 217:

P. 4337, col. 2.ª, l. 14, a contar do fim, retirar "lhe"; l. 13, a contar do fim, substituir "funcionamento" por "pronunciamento"; l. 8, a contar do fim, substituir "," por ":"; l. 6, a contar do fim, substituir "elas", por "pois as propostas".

P. 4446, col. 1.ª, substituir "tenha" por "ter", na l. 31, e "optando" por "opte", na l. 32.

P. 4447, col. 1.ª, l. 26, colocar uma vírgula depois de "aquela"; l. 29, substituir "I" por "G".

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Dos Srs. José Rodrigues Piteira e José Saraiva repudiando as palavras do Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Desejo informar VV. Exas. de que, num sentimento de estreitamento das relações que fundamentam e inspiram a comunidade luso-brasileira, entendi dever convidar o Sr. Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil a visitar Lisboa e Angola. Aliás, para este convite tive toda a colaboração do Governo.
O Sr. Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil aceitou, em princípio, e acaba de me fazer saber que pode dispor de alguns dias, a partir do próximo dia 10, para vir a Portugal, europeu e africano, mais concretamente, ao Estado de Angola.
Espero que o Sr. Deputado Pereira Lopes, Presidente da Câmara dos Deputados do Brasil, chegue a Lisboa no dia 11 e que isso lhe permita satisfazer o desejo, que já manifestou, de assistir a uma sessão da Assembleia Nacional, que será a sessão do dia 13. Espero, ainda, que, no uso de um princípio já aprovado por VV. Exas., embora não seja ainda lei interna da Assembleia, consintam que eu receba o Sr. Deputado Pereira Lopes no seio desta Casa pela sua qualidade de Deputado brasileiro e pela sua categoria de Presidente da Câmara dos Deputados do seu grande país.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Mendes.

O Sr. Silva Mendes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procurarei, como é meu hábito, ser breve no uso da palavra, embora o faça em nome de centenas, se não de milhares, de pessoas que na minha região, e

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julgo até que no resto do País, vivem afectadas pelas anomalias dos serviços públicos de comunicações.
A zona norte do Alto Alentejo, mercê do esforço do Governo na criação de infra-estruturas, trilha caminhos diferentes dos percorridos anteriormente, os quais lhe possibilitam descobrir novos horizontes e são prelúdio do raiar de novos dias.
No entanto, triste é dizê-lo, pioram de dia para dia os serviços de comunicações, e sem estas não é possível haver verdadeiro progresso.
O Governo, ao conferir regalias e protecções especiais às empresas, fá-lo na esperança e convencimento que resultarão daí benefícios para os seus utentes, mas muitas delas, em certos aspectos, mostram-se incapazes de corresponder àquilo que é lícito exigir-lhes.
O drama de quem tem de utilizar, como elemento de trabalho, o telefone, é verdadeiramente assustador e creio mesmo que dentro em breve será causador de grande número de doenças nervosas, a pedir internamento imediato...
São horas consecutivas, horas de enervamento e de perda de tempo, que se gastam à espera de uma ligação telefónica e atinge-se o auge quando se trata de contactar Lisboa!
E quando se consegue o quase milagre da ligação, a alegria é às vezes momentânea, pois passados os primeiros segundos, desaparece o interlocutor e a voz da telefonista de serviço informa, em tom mais ou menos agradável, que tem de se esperar mais algum tempo, porque o "automático" desligou.
Abençoados automáticos que só são precisos e seguros na facturação das chamadas...
Como exemplo, entre muitos outros com que poderia ilustrar as minhas afirmações, refiro apenas um:
Em Outubro passado, durante cinco dias consecutivos, das 10 às 17 horas, apenas com a interrupção da hora do almoço, tentei ligação com um serviço oficial cuja sede é em Lisboa, e com o qual tinha assunto urgente a resolver.
Pois para conseguir os meus intentos, tive de, ao cabo desse tempo, deslocar-me, de automóvel, à capital, como único processo de falar com os serviços referidos.
E repare-se, as chamadas feitas tiveram sempre a indicação de oficiais - urgentes!
Faço aqui um parêntesis para prestar homenagem à quase totalidade das telefonistas da minha zona, pois normalmente são elas as primeiras vítimas do mau serviço da empresa a que pertencem e da má disposição dos assinantes.
E que dizer da situação da população da quase totalidade das sedes de freguesias rurais, que, a partir das 18 horas, se vê privada, por encerramento dos postos, de contactar com o resto do País?
Em região cuja cobertura médica é deficiente, vislumbram-se facilmente, para além do mais, os inconvenientes gravíssimos que resultam de tal horário.
Se o facto se verifica num sábado, após as 18 horas, só na segunda-feira seguinte, depois das 9 horas, se poderá utilizar o telefone.
Mas como será lícito pedir mais aos encarregados dos postos de correio, se já são obrigados à prestação de oito horas de serviço, mediante a gratificação de 60$ mensais e 200$ de subsídio de instalação, como relata um desses encarregados, oriundo de Ribeira Seca, nos Açores, na revista Observador, no seu n.° 101?
Não podemos continuar assim.
O País não pode estar à mercê de empresas que não satisfaçam e correspondam aos justos interesses do público, nem podemos calar por mais tempo o nosso protesto contra uma situação que, no momento presente, bem pode considerar-se caótica e insustentável.
E os ventos também não correm de feição, pelo menos no Alto Alentejo, para os utentes dos serviços públicos de camionagem, cuja empresa, a única existente, alegando o aumento dos encargos, deliberou, pura e simplesmente, suprimir todas as carreiras que efectuava aos domingos e dias feriados.
Nem ainda são favoráveis aos que usavam como meio de transporte o comboio, pois a C. P. também deliberou suprimir a ligação para Eivas do comboio que parte de Lisboa (Santa Apolónia) às 18 horas e 45 minutos e deixou de partir daquela cidade o que ali tinha início às 5 horas e 50 minutos.
Como VV. Exas., Sr. Presidente e Srs. Deputados, vêem, um vento ciclónico varreu os serviços de comunicações do distrito de Portalegre!
Desta bancada, num apelo veemente, solicito ao Governo que as anomalias que referi sejam fruto de imediato inquérito, a fazer pelos serviços competentes, e que se respeitem os interesses das empresas, desde que estes se não sobreponham ou asfixiem os justos e sagrados direitos da população para cujo serviço foram criadas, ou não tenham em consideração o salário justo dos funcionários que as servem.

O Sr. Pinto Machado: - Sr. Presidente: Eu era apenas para dizer o seguinte: há pouco, depois dos esclarecimentos de V. Exa., ia pedir a palavra para agradecer a atenção que V. Exa. teve em prestá-los e declarar que tinha considerado útil que o debate se tivesse estabelecido sobre esse ponto.
Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: Peço a V. Exa. que me desculpe por não ter notado a sua intenção de usar da palavra. Tinha-lhe prestado os meus esclarecimentos sobre um pedido de informações que V. Exa. fez à Mesa e julgava realmente não merecer nenhum agradecimento por isso. Mas o que eu mais desejaria era que V. Exa. não pudesse pensar que eu desatendera uma intenção de V. Exa., como de qualquer Sr. Deputado, para usar da palavra.
Agradeço os vossos agradecimentos, que, repito, não me pareciam devidos e peço desculpa se realmente lhe dei a impressão de ter sido menos atento para com o vosso propósito.

O Sr. Alberto de Alarcão: - Noticiaram os jornais da passada semana que cerca de 200 000l de vinho verde chegados a Luanda no navio Nova Lisboa e consignados a uma empresa local provocaram acesa controvérsia entre as autoridades aduaneiras, a Delegação de Saúde e os importadores interessados.
Declarados como "impróprios para o consumo", 198 000l do vinho a granel que o navio transportava

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não puderam ser descarregados por embargo da Delegação local de Saúde.
Os importadores, por seu turno, não se conformaram com a opinião técnica dos Serviços de Saúde e não se mostravam dispostos a transformar o vinho em vinagre - única forma de ser autorizado o desembarque, segundo a lei vigente.
O Nova Lisboa foi descarregar outros contingentes de vinho ao Lobito e, no regresso, os 198 000l de vinho verde foram finalmente desembarcados por determinação da Secretaria Provincial de Planeamento e Finanças, que houve de intervir, sendo selados os vagões transportadores até ao destinatário, onde o vinho, impróprio para consumo, foi encerrado em cisternas, seladas também posteriormente. Até ver... ou resolver.
Sr. Presidente: Já há bastante tempo fazia tenções de levantar nesta Assembleia Nacional o problema da qualidade de alguns produtos e defesa do consumidor, como convém.
Comecemos, pois, por este caso.
A preparação de alimentos para a sobrevivência da Humanidade tem tomado no decorrer dos séculos um desenvolvimento enorme, sendo cada vez em menor número a parcela dos produtos transformados relativamente ao modo como a Natureza os teria criado ou originado.
A intervenção do homem no processo de produção, transformação e comercialização dos produtos alimentares é cada vez mais vasta, não dispensando os serviços públicos de interferirem em tais actividades, ao abrigo de legislação que procura acautelar, defender ou promover a saúde e o bem-estar da Humanidade.
A manipulação, em grandes quantidades, dos alimentos que são fornecidos ao público, através de empresas agrárias, comerciais e industriais por vezes bem poderosas, requer a contrapartida da fiscalização e contrôle, por parte dos Poderes Públicos, da higiene e estado sanitário dos alimentos que irão ser consumidos pelas populações.
Acontece, por vezes, que determinados géneros alimentícios estão pouco vigiados ou são deficientemente fiscalizados, por a legislação ser antiquada ou inoperante ou por os manipuladores não possuírem a capacidade técnica e administrativa necessária para terem o conhecimento bastante das consequências que determinadas fraudes podem acarretar ao organismo humano num prazo mais ou menos próximo.

O Sr. Barreto de Lara: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Barreto de Lara: - Pedi a V. Exa. para intervir muito embora seja um leigo e V. Exa. um técnico qualificado.
Mas queria dizer-lhe que vim recentemente de Angola, onde deparei com a situação que V. Exa. acaba de enunciar, o que me causou uma perplexidade muito grande.

O Orador: - Não só a si.

O Sr. Barreto de Lara: - E essa perplexidade deriva fundamentalmente desta circunstância. Como V. Exa. sabe, produzia-se em Angola um produto a que se chamava bebidas fermentadas e também vulgarizado com o nome de vinho.

O Orador: - Exactamente.

O Sr. Barreto de Lara: - Também havia algum "vinho" que ia daqui e que afinal mais não era que um produto fermentado e a que anacrònicamente chamavam vinho. A ganância do lucro! Preparava-se ali para as bandas do Poço do Bispo com toda a calma, exactamente como se faziam alguns dos fermentados de Angola. Até talvez com menos fruto. Mas o sistema de preparação era precisamente o mesmo, se não pior, e só divergia do fruto de que se dizia originário.

O Orador: - Também acontecia isso, exactamente.

O Sr. Barreto de Lara: - Simplesmente aconteceu o seguinte. O Governo da província, então a cargo do ilustre coronel Rebocho Vaz, elaborou uma regulamentação, talvez demasiado rígida, acerca dos fermentados. Principalmente, estava em causa um problema de elevada percentagem de cobre, e nas malhas da mesma rede onde se quiseram enquadrar os fermentados caíram também os vinhos exportados daqui. E então a minha perplexidade reside nisto: enquanto o Laboratório Bromatológico de Angola, salvo erro, deu esse vinho como impróprio para consumo, os laboratórios metropolitanos dão-no como bom. O que é uma coisa que me deixa perfeitamente abismado. Por outro lado - quero significar a V. Exa. que sou mais "cervejeiro" que apreciador de vinho e que, portanto, estou alheio a posições de interesse e até de paladar -, a percentagem de cobre existente, por exemplo, no vinho Lagoa e de outros vinhos de certas regiões não pode, apesar da sua excelência, entrar em Angola se se observarem as regras que foram estabelecidas pelos laboratórios de lá.
Era este o esclarecimento que eu queria dar a V. Exa., porque tive o cuidado de o averiguar pessoalmente, visto que há milhares de contos em jogo e só por se mudar de repartição e dentro do mesmo espaço nacional, e também a querer esclarecer-me e saber até que ponto é que estávamos a comprar um produto em boas condições de consumo ou estávamos a ser envenenados.
Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Eu agradeço imensíssimo esta achega, tanto mais que vem complementar algumas das afirmações que no seguimento irei produzir.
Impõe-se ir actualizando sistemática e constantemente as disposições legais vigentes em Portugal; talvez se venha a requerer, inclusive, a formulação de bases gerais de regimes jurídicos que à defesa da saúde do consumidor se consagrem.
Em qualquer hipótese, jamais deverão dispensar a exigência de técnicos especializados e responsáveis que, à testa das actividades produtivas, possam dar o aval dos seus conhecimentos e a garantia das responsabilidades assumidas.
Isto, que para algumas actividades económicas já foi feito (veja-se a indústria farmacêutica, construção civil, etc.), importa aplicar-se igualmente ao campo agrário ou com ele directamente relacionado, como são as indústrias alimentares.

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Ficariam tais técnicos solidariamente responsáveis com os gerentes das actividades produtivas pelas fraudes ou omissões que viessem a ser cometidas e verificadas pelos serviços de fiscalização, com a competente responsabilidade civil ou criminal, quando em tal incorrerem.
Assim se evitariam muitas falsificações e outros delitos, dada a vigilância que os próprios técnicos responsáveis exerceriam para não incorrer em graves penalidades que poderiam ir até à suspensão e impedimento do exercício da profissão.
No caso do vinho, produto largamente consumido e fácil de adulterar, sem que a legislação que actualmente o proteja contemple muito mais que umas quantas multas e perda do produto, impõe-se medidas cautelares que reduzam o âmbito e a incidência de adulterações e outras fraudes.
E o caso é tanto mais grave quanto, como pode ler-se na recente obra portuguesa Enologia Prática, muitos dos vinhos comuns de exportação (ou consumo interno ou ultramarino) podem ser feitos utilizando métodos menos legais ou menosprezando exigências químico-qualitativas dos mercados consumidores, nomeadamente da Europa, nesta hora de novos acordos e contratações comerciais.
Compatibilizar se deveria, também, a nossa ultrapassada legislação vitivinícola com aquela que nos irá ser exigida ou possibilitada pelos novos acordos negociados.
Com a exigência de técnicos responsáveis nos corpos das empresas produtoras, armazenistas e exportadores de certa grandeza poderia esperasse que muitos daqueles actos ou práticas fossem impedidos ou irrealizados, dada a vigilância que os próprios técnicos responsáveis exerceriam, pelas razões já aduzidas. E dispensar-se-ia muita da actual fiscalização, que onera sobremodo os orçamentos públicos sem grande proveito e garantia de que as poucas determinações legais se cumpram a contento, como igualmente se requereria a reorganização dos nossos laboratórios vinícolas oficiais.
Como já alguém escreveu, em comunicação apresentada recentemente em "Jornadas Vitivinícolas", "até mesmo a aplicação de determinados produtos e práticas possíveis, que estão hoje pouco estudadas" ou se desconhecem os efeitos, "não seriam aplicados, ou, quando o fossem, teriam a conveniente vigilância de técnicos responsáveis".
"Com esta medida" - existência de técnicos responsáveis no comércio do vinho por grosso -, "que se pede que seja tomada pelos Poderes Públicos, julga-se que seriam evitados muitos erros até agora cometidos, como ainda se iria dar um passo em frente em matéria de repressão de fraudes possíveis, neste produto alimentar que é o vinho, como ainda seria mais fácil e possível ter a certeza que esta saudável bebida" (quando não consumida em excesso) "passaria a ter mais aceitação por parte de grande número de pessoas que hoje se queixam dela, alegando que anda muito adulterada", e não se dirá sempre sem razão.
E concluía o autor da comunicação propondo que:
1.° Seria pedida a promulgação de uma lei para que, de futuro, todos os comerciantes de vinho por grosso - ou sejam os armazenistas -, quer trabalhassem para o mercado interno ou externo, sejam obrigados a ter como responsáveis, independentemente de serem ou não seus associados, um engenheiro agrónomo ou regente agrícola (e por que não de enólogo reconhecido pela Union Internationale des Oenologues?) à frente dos seus negócios, como técnico responsável, devidamente inscrito na Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, o qual seria responsabilizado judicialmente sempre que fosse verificada qualquer fraude que as autoridades competentes considerassem lesivas da saúde pública, por prática ou adição de produtos tóxicos ou proibidos por lei, ou mesmo por deficiências tecnológicas consideradas lesivas de higiene e impróprias de actividades de tanta importância na alimentação humana.

O Sr. Alberto de Meireles: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Alberto de Meireles: - Como é que V. Exa. quer que funcionem enólogos se não os há em Portugal nem podem ser reconhecidos, como me tenho farto de dizer nesta Casa, pois se não há o curso de enologia nem o diploma de enólogo.
A Associação Internacional de Enologia reconhece o enólogo formado em França, mas em Portugal não tem validade.
A comunicação que ouvi desejava que os armazenistas e os exploradores de certo nível tivessem um responsável.
Quando V. Exa. diz um regente agrícola ou um agrónomo, ele pode também ser enólogo, mas eu penso que V. Exa. e outros engenheiros agrónomos ou regentes agrícolas não se julgam habilitados como enólogos a titularem o vinho ou evitar que o vinho chegue a Angola com excesso de cobre ou excesso de chumbo na garrafa.
Ou não será assim, Sr. Deputado?

O Orador: - Exactamente.

O Sr. Alberto de Meireles: - Desculpe-me mais uma coisa: dado o melindre de uma posição que tive, não me referi a este lamentável caso de Angola, mas respeito os outros e respeito-me a mim não o fazendo.

O orador não reviu.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu agradeço mais esta achega que vem completar algumas outras afirmações aduzidas.
2.° Acabar-se-iam as compras de vinhos considerados impróprios para o consumo à lavoura descuidada, teimosa e ignorante das boas práticas tecnológicas.
3.° Terminariam as compras de vinhos feitas pelos intermediários, à base da determinação pura e simples do álcool e acidez volátil; esta muitas vezes com valores por vezes inconcebíveis, dada a possibilidade que agora existe de se poder proceder mais tarde a práticas melhoradoras, actualmente consideradas nocivas à saúde.
4.° Pôr-se-ia termo à aplicação, quando do fabrico, de produtos impróprios e lesivos à sanidade e inocuidade desta bebida [...].
5.° Melhorar-se-ia rapidamente o fabrico de vinhos na adega e a preparação dos mesmos em armazém,

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quer daqueles a expor à venda ou a exportar [...]. Aumentar-se-ia certamente o seu consumo e valorização com a aplicação de novas técnicas [...] e daríamos um passo em frente, ficando em primeiro plano no mundo vitivinícola [...].
E solicitando que lhe relevassam os comerciantes e lavradores progressivos que não necessitam de disposições legais ou regulamentares para terem ao seu serviço técnicos que lhes preparem os produtos e os ajudem a singrar na vida comercial com a genuinidade ou pureza dos seus vinhos, o autor - abalizado técnico, aliás, do Laboratório Central da Junta Nacional do Vinho - termina por reafirmar que tais contratos entre empresas e técnicos, de diversos graus e com funções bem delimitadas, deveriam ser feitos com inteira liberdade por parte dos comerciantes (ou seus agrupamentos) com quantos estivessem inscritos na I.G.P.A.I. e em relação com a importância do comércio ou exigências da sua vida comercial. Mas jamais por dirigentes ou funcionários dos serviços técnicos oficiais com funções de fiscalização.
Exceptuar-se-ia dessa imposição, porventura, o caso dos vinhos do Porto, dado que a sua produção, comércio e circulação são apertadamente controlados pelo Instituto do Vinho do Porto.
Para começar, aí está, Sr. Presidente, uma matéria que bem poderia ter cabimento nas disposições regulamentares da Administração Pública a respeito da "qualidade de vida" e defesa da saúde dos consumidores por via da garantia da alimentação.
Da sua oportunidade e vantagem ... nem se fala.
Mas já que ao assunto consagrámos alguma da nossa atenção, terminar não quero sem chamar a atenção para o facto de apenas 25 por cento do vinho nacional ser processado em cerca de centena e meia de adegas cooperativas, e poucas uniões, o que pode pôr de algum modo em causa as técnicas de fabrico, armazenagem, conservação e comercialização de quanto não seja produzido por grandes viticultores ou organizações devidamente assistidos e comercialmente estruturados, organizados para uma venda "agressiva" (passe a expressão) e conquista de mercados.
Seria caso, inclusive, de lembrar, nesta hora de educação nacional, o interesse que poderia revestir nos planos do ensino, para além de escolas formando para a vida agrária e capazes de responder às solicitações de modernização da agricultura, disciplinas, cursos ou textos (nomeadamente elementares para o ensino básico) de formação e educação cooperativa e de desenvolvimento comunitário de agregados locais e/ou regionais que pudessem formar verdadeiros cooperadores para uma transformação agrária e dos meios rurais.
Mas isso seria fugir já algo ao tema, e por aqui me calo. Aguardando fico o solicitado.

O Sr. Vaz Pinto Alves: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Educação não se tem poupado a esforços, trabalhos e canseiras nesta arrancada da política educacional do País, que, na verdade, ficará assinalada na história portuguesa contemporânea como uma das transcendentes realizações do pensamento e da política de Marcelo Caetano.
Honra, pois, é devida ao Sr. Ministro pela sua persistência, dinamismo e devoção à coisa pública.
A vasta obra realizada no campo educacional atesta a capacidade empreendedora do ilustre governante e homem público que é o Prof. Veiga Simão. Estas palavras, ditas por imperativos de justiça e consciência, não envolvem, todavia, concordância total, num ou noutro ponto, quanto a certas decisões do Departamento de Estado da Educação.
A discordância leal, objectiva, sincera, em consciência e respeitosa, em relação a certos actos porventura julgados menos realistas nada tem a ver com a crítica destrutiva e a maledicência gratuita, pretende ser uma forma de participação das pessoas na condução dos negócios públicos e o afã de chamar a atenção dos responsáveis para possíveis anomalias que devam ser corrigidas.
Por outro lado, as assimetrias existentes nos vários domínios, se não se procuram atenuar ou corrigir, geram, na consciência dos povos, opções de variada ordem, filiadas, tantas vezes, na não concretização de soluções correspondentes a necessidades ou fundas aspirações sentidas pela colectividade.
Ora, vem isto a propósito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ainda das declarações do Sr. Ministro da Educação sobre a expansão do ensino superior, através da criação de novas Universidades, Institutos Politécnicos e Escolas Normais Superiores.
O País ouviu da boca do Sr. Ministro - o que foi uma decisão histórica nos anais da educação nacional - a indicação dos centros do País onde se localizarão as referidas Universidades, Institutos Politécnicos e Escolas Normais Superiores.
Viseu foi dotada com esta última categoria de estabelecimento de ensino superior. Não está em causa a rectidão de intenções ou de propósitos dos governantes, se bem que se ouçam alguns reparos em matéria do que poderá ser considerado justiça distributiva. O que nos parece, todavia, é não poderem ser únicos ou exclusivos os critérios adoptados na localização dos estabelecimentos de ensino superior, a nível universitário ou politécnico.
Daqui derivam algumas conclusões.
A primeira é a de que na execução da reforma não se podem considerar exaustivos os critérios agora definidos, e, portanto, tornam-se passíveis dos ajustamentos que se imponham pela evidência dos factos ou pela força das realidades; a outra, no seguimento desta, é a de que Viseu, na problemática educacional, carece de outras estruturas de ensino superior, que não somente as que lhe foram outorgadas. Efectivamente, Viseu, pela sua importância como centro preponderante da Beira; pela sua projecção comercial; como cidade do interior, que irradia para a fronteira e para o litoral; como centro de convergência de muitos concelhos do distrito e da província; capital de um distrito em que habitam ainda cerca de meio milhão de almas; zona turística de surpreendentes riquezas artísticas, paisagísticas, históricas, etnográficas e enológicas; com recursos naturais ainda por explorar no campo das apagadas indústrias extractivas; de incontestada aptidão agro-pecuária e florestal; sede de uma importante e operacional estação agrária - que poderia até servir de apoio a um instituto de formação de técnicos agrários -, Viseu, por todas estas circunstâncias e outras, parece caber

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no âmbito das condições económicas, sociais, ambientais, demográficas e urbanas que presidiram à instituição dos cursos universitários ou politécnicos.
No próprio ordenamento do território, Viseu é classificado como centro sub-regional secundário, ao lado de Vila Real e Covilhã, o que significa o reconhecimento das suas potencialidades como futuro centro urbano de expansão industrial - já que o seu comércio é notável ao lado de outros grandes centros - e com uma população que oscilará entre 30 a 50 mil pessoas.
Ora, neste contexto, a educação, sabe-se, é um factor poderoso de desenvolvimento, e a implantação de centros de ensino, adentro de uma política de descentralização de estudos superiores, arrasta uma extensa gama de possibilidades que se traduzem em fortes vectores no desenvolvimento das regiões menos favorecidas.
Temos de convir, contudo, que Viseu, centro de um núcleo populacional de meio milhão de habitantes, a 100 km do Porto, Aveiro e Coimbra, não pode beneficiar, em toda a sua extensão, da igualdade de acessos e de oportunidades que estão na base de uma política educacional de massas e de aproveitamento dos melhores valores.
Não queremos, longe de nós, minimizar a criação da Escola Normal Superior de Viseu. Tem a sua utilidade e a sua função nobres. Simplesmente, não basta para corresponder às necessidades e aspirações que me parecem legítimas no contexto sócio-económico-demográfico da região.
Parece-me, pois, que é necessário dar um passo mais em frente por ser de justiça e representar uma contribuição para o desenvolvimento de uma vasta região do País.
Ouvem-se, por vezes, vozes a favor de uma maior concentração de actividades, invocando critérios de produtividade. Eu, por mim, responderei que se esquecem as potencialidades reais das zonas mais atrasadas, se ofende o princípio da justiça distributiva e a participação por forma homogénea das populações no desenvolvimento, nos aspectos elevados que a palavra comporta. Num Estado social, o sentido mais amplo do desenvolvimento económico há-de processar-se na promoção humana das suas populações e numa mais justa distribuição dos bens e da riqueza por todos os membros da colectividade.
Não é possível uma grande obra de fomento económico sem que haja finanças sãs, sem que os estabelecimentos escolares forneçam homens profissionalmente aptos, sem que a disciplina geral propicie o ambiente necessário ao dinamismo do conjunto. Também não é possível uma obra de educação grande - no sentido que todos a desejamos - sem que as actividades nacionais - sectores público e privado e, até, os próprios cidadãos - cooperem activa e conscientemente no labor grandioso da promoção das gentes portuguesas, naquela linha de uma política dinâmica e equilibrada, claramente definida e superiormente orientada pelo Sr. Presidente do Conselho.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: Vou terminar: Faço-o com um apelo: à boa compreensão do Prof. Veiga Simão, que sempre tem afirmado estar atento às sugestões límpidas e válidas que lhe sejam transmitidas, queremos deixar estas notas, pronunciadas nesta Casa, na antecipada certeza de que não deixarão de pesar no alto e justo critério do ilustre governante e na esperança de que, a breve trecho, as estruturas educacionais do distrito, a nível do ensino superior, venham a ser repensadas, através, designadamente, da descentralização de faculdades nos ramos do ensino adequados ao desenvolvimento económico e social de uma vasta região que tem Viseu por cabeça.

O Sr. Santos Almeida: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Logo após o início da nossa actividade nesta Casa, quando mal se tinha ainda extinguido o eco de perigosas ideias espalhadas durante a campanha eleitoral acerca da nossa posição relativamente ao ultramar, e após nos termos referido à apreensão que havíamos sofrido, afirmámos, com manifesto alívio e profunda satisfação:

Felizmente que tudo passou, e o portuguesismo, o bom senso e o espírito fraternal que levaram o País a dar o seu claro apoio à política governamental certamente não permitirão que esse apoio seja alguma vez retirado.

O Sr. Ribeiro Veloso: - Muito bem!

O Orador:

O que pensamos nós, portugueses do ultramar, sobre tão importante assunto está bem patente na maciça votação lá verificada.

E mais adiante:

Pois bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados: assente e aceite por todos nós, portugueses de cá, de lá, de toda a parte, que o ultramar se não negociará, passado, portanto, que foi grave momento vivido, reiniciou-se a nossa vida normal e todos nos encontramos a enfrentar novamente os nossos próprios problemas, problemas nacionais e regionais, todos problemas internos e próprios de um grande país como o nosso.

Permitimo-nos agora recordar estas palavras, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a propósito de acontecimentos recentemente verificados e que tiveram largos reflexos nesta Câmara, fazendo, assim, ressurgir, por momentos, o problema ultramar.
Não vamos sequer tentar análise profunda do que se passou, ou das suas causas.
Falta-nos francamente até a coragem para nos determos demasiado tempo sobre tais acontecimentos e, sobretudo, sobre atitudes deles derivadas. Sentimos um misto de revolta e de desgosto que facilmente nos poderia conduzir a uma reacção que acabaria certamente por originar um jorrar de palavras susceptíveis de ferir tão profundamente como nós próprios fomos feridos. Não queremos isso, sejam quais forem as causas que se encontrem na base de atitudes tão insólitas e tão contrárias ao sentimento geral que anima a comunidade nacional: inconsciência, incompreensão ou maldosos desígnios.
Serenamente, queremos apenas deixar aqui bem expresso o nosso repúdio por tudo quanto, consciente

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ou inconscientemente, atente contra a sobrevivência dos portugueses do ultramar, qualquer que seja a sua cor ou credo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E neste se salientam alguns milhões de católicos, de cuja sinceridade não é lícito duvidar-se, e que de modo tão veemente e claro têm manifestado, não apenas o desejo, mas uma firme e inabalável determinação de continuarem portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Barreto de Lara: - Ontem chegado de Angola, não tinha o propósito de intervir, porque V. Exa. está a empolgar a Assembleia e a minha intervenção é susceptível de quebrar esse ritmo, e faço-o talvez até com uma certa infelicidade, prejudicando o empolamento que V. Exa. está a imprimir à Câmara.
Mas acontece que eu estava em Angola quando ouvi as palavras do Sr. Presidente do Conselho. E fiquei profundamente surpreendido, pela forma veemente, e incisiva, se não duro até, como pronunciou as palavras que penetraram fundo no coração de todos os portugueses de Angola e activaram a chama do seu amor pátrio.
Na altura, confesso, não encontrei a justificação de tal forma incisiva de expressão. A explicação foi-me, porém, dada hoje pelo Sr. Deputado Alberto de Meireles, que quis fazer o favor de me dar cópia de uma moção que foi aprovada depois de discutida na Capela do Rato em 31 de Dezembro de 1972.
E quando olhei para ela, compreendi imediatamente a reacção do Sr. Presidente do Conselho.
Além disso, pensava eu que nesta legislatura não poderia haver mais lugar à discussão do problema da subsistência ou insubsistência da guerra do ultramar.
Cento e trinta Deputados se sentaram nesta Casa com um denominador comum: a defesa à outrance da integridade do território nacional. Representando o povo, pois legítimo seria pensar que era o povo que estava nesta casa.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - Surpreendi-me, portanto, que, e demais para mais, numa igreja de Cristo, num templo destinado à meditação, onde se reza ...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Onde se devia rezar.

O Sr. Barreto de Lara: - ... onde por conseguinte as almas procuram estar em contacto com poderes divinos tal moção tivesse sido discutida, discutida e votada. E surpreendeu-me tanto mais, na medida em que "o problema da defesa do ultramar" não se trata já apenas de um problema de cariz político, não se trata já apenas de um problema de tradição nacional, não se trata já apenas do respeito pela Constituição Política que foi votada pela Nação. Trata-se de muito mais, trata-se de um problema profundamente cristão.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Devia ser!

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreio de Lara: - Trata-se de proteger e de defender a vida e a fazenda daqueles que há séculos se confiaram e acobertaram à Bandeira Portuguesa.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - Pois tal reunião e o que ali se passara terá estimulado ao fim e ao cabo as guerrilhas. Mas, digamos assim, "o tiro saiu pela culatra". Se realmente as guerrilhas se terão incentivado sob a autoria moral dos votantes, se houve mais operações, se terá havido mais sangue derramado, por outro lado, que não haja qualquer espécie de dúvida, os homens do ultramar também se estimularam e, como na arrancada de 1961, todos à uma estão preparados para receber seja quem e em que circunstâncias for e discutir seja que problema for.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Os do ultramar e os da metrópole também.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - Realmente eu creio que isso é um denominador comum da Nação Portuguesa, Sr. Deputado Camilo de Mendonça.
Por outro lado, verifico que em todas as campanhas políticas que se têm feito neste país - nós em Angola somos menos politizados, pois, a nossa política é de natureza um tanto divergente, é uma política de mais virilidade e trabalho e de menos conceitos filosóficos.

O Sr. Henrique Tenreiro: - É uma política nacional.

O Sr. Barreto de Lara: - Exactamente.
Mas dizia, é que verifico que nas campanhas políticas na metrópole, e nalgumas delas eu intervim como militante activo, inclusivamente na última campanha eleitoral de Humberto Delgado, em que tive actuação activa exactamente em representação da sua candidatura...

O Sr. Casal-Ribeiro: - Mau gosto!

O Sr. Barreto de Lara: - Eu peço desculpa. Foi um candidato à Presidência da República que eu respeito exactamente porque foi um candidato à Presidência da República!

O Sr. Casal Ribeiro: - Mau gosto!

O Sr. Barreto de Lara: - Porque também foi candidato à Presidência da República o Sr. General Norton de Matos, que eu vi com fotografias pregadas nas paredes com as insígnias de grão-mestre da maçonaria portuguesa e já vi nesta Assembleia Nacional citado como um ilustríssimo português.

O Sr. Veiga de Macedo: - Eu fui um deles.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Barreto de Lara: - E foi dos portugueses mais ilustres que teve este país.

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O Sr. Casal-Ribeiro: - Não confunda os dois generais!

O Sr. Barreto de Lara: - Não confundo generais. Foram dois candidatos à Presidência da República, é tudo.

O Sr. Casal-Ribeiro: - Está bem, mas isso não quer dizer nada...

O Sr. Barreto de Lara: - São dois oficiais generais, e quem os fez generais não fui eu! Nem o povo!

O Orador: - V. Exa. dá-me licença, Sr. Deputado Barreto de Lara?

O Sr. Barreto de Lara: - Foram escolhidos em Conselho de Ministros.

O Sr. Casal-Ribeiro: - O Conselho de Ministros também se engana, às vezes!

O Orador: - Perdoe-me V. Exa., mas agora gostava eu de interrogar V. Exa., pedir permissão para o interromper...

Risos.

O Sr. Barreto de Lara: - Eu só vou terminar, só vou dizer mais uma coisa, se me der licença.

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Barreto de Lara: - É que os portugueses do ultramar e os portugueses da metrópole estão cansados deste jogo de pingue-pongue que se está a fazer. Se o Governo decidisse abandonar amanhã o ultramar, levantava-se tudo porque abandonar o ultramar era uma traição às tradições históricas. Se o Governo continuar a defender o ultramar, aqui d'el-rei porque o defende.

O Sr. Henrique Tenreiro: - Isso não se discute!

O Sr. Barreto de Lara: - Portanto, não sabemos como é que nos havemos de entender, e não queria deixar de manifestar aqui, realmente, com certo fastídio por este estado de coisas.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Dá-me licença? É só uma pequena minoria...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Santos Almeida: Peço-lhe o favor de continuar as suas considerações.

O Sr. Barreto de Lara: - Sr. Deputado Santos Almeida, desculpe em me ter...

O Orador: - Obrigado, Sr. Deputado Barreto de Lara; não há dúvida de que V. Exa. deu uma vivacidade que eu não seria capaz de dar - e também que não gosto de dar - às minhas intervenções. Gosto, realmente, de falar com uma seriedade diferente. Mas, no fundo, todos temos o mesmo objectivo, embora os processos sejam ligeiramente diferentes.
Sou apologista de uma maneira de dizer as coisas um pouco mais brandas, digamos assim. De qualquer modo, muito obrigado, e, se V. Exa. me permite, eu continuo.
Como se arrogam alguns o direito de quererem decidir o nosso próprio destino!
Com que leviandade se procura às vezes defender disparatadas teorias com o argumento de que elas têm o nosso apoio! Como se confunde o natural desejo de um grau crescente de descentralização administrativa com independência política, que, além de tudo o mais que não queremos nem estamos sequer dispostos a aceitar, representaria a nossa aniquilação imediata!
Não se duvida só dos nossos sentimentos de portugueses, mas insulta-se até a nossa própria inteligência.
Não se procura ajudar a conseguir o objectivo que todos temos em vista: o rápido progresso social do ultramar baseado na igualdade de raças, o que, consequentemente, implica até a crescente participação de todos na condução dos negócios públicos. Pelo contrário, criam-se sérios obstáculos a esse progresso, à valorização dos africanos, portanto, e, valha-nos Deus, isso faz-se em nome desses mesmos africanos!
Lamentam-se as perdas humanas causadas pela guerra (e ninguém o lamenta mais do que nós próprios, evidentemente), mas estimula-se essa mesma guerra através de apoio implícito e criminosamente concedido àqueles que no-la impõem!
Repetimos: Valha-nos Deus!
Sr. Presidente e Srs. Deputados: É certamente compreensível para todos VV. Exas. que sejamos nós, os portugueses ultramarinos, aqueles que mais intensamente vivem, aqueles que mais profunda e amargamente se sentem revoltados, ou até apenas tristes, em face de tanta incompreensão, ao verem pairar qualquer dúvida sobre a política governamental de intransigente defesa do ultramar.
Temos as fortíssimas razões que assistem a qualquer português que se preze, acrescidas ainda da terrível visão do que aconteceria às nossas próprias vidas se fosse seguida uma política de abandono.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente que, do mesmo modo, é sempre profundo o seu sentido de gratidão para com aqueles que se mantêm firmes na defesa do ultramar, ainda mesmo que a exteriorização de tal sentimento de gratidão surja de modo pouco expressivo.
Mas ao dizermos isto queremos especialmente que fique bem claro que os nossos sentimentos de repulsa ou de revolta não podem ou devem ser medidos pela exuberância com que os testemunhamos.
Por detrás da nossa aparente apatia está sempre um espírito atento e observador, um mundo de cogitações, de mágoa e até de receios que teimosamente surgem, embora felizmente logo abafados pela confiança que sempre depositamos no Sr. Presidente do Conselho, aliada ao conhecimento que temos de que o modo como defende a integridade nacional é apoiado pela extraordinária maioria de todos os portugueses de aquém e de além-mar.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Não significa isto que minimizemos a importância dos ataques que, criminosamente ou não, nos são dirigidos. Compreendemos e aceitamos a discussão de diferentes pontos de vista sobre a condução de todos os problemas nacionais, necessariamente neles se compreendendo os do ultramar, mas desde que não seja posta em jogo a sua manutenção como parte de Portugal, pois bem sabemos que o simples facto de discutir tal é, só por si, servir os interesses daqueles que nos movem a lamentável guerra que nos vemos forçados a suportar, é apoiar os nossos inimigos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E os reflexos desse apoio inevitavelmente redundam em maiores perdas daquelas vidas que todos queremos defender, em maiores dificuldades no consegui mento da paz e do progresso social equilibrado que todos ambicionamos.
Temos disto plena consciência, Sr. Presidente e Srs. Deputados.

Vozes: - Muito bem! Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à

Ordem do dia

Conforme foi fixado ontem, a primeira parte da ordem do dia vai ser dedicada à votação em escrutínio secreto sobre a aceitação da renúncia do mandato de Deputado do Sr. Francisco de Sá Carneiro. VV. Exas. têm presente a disposição regimental de que a eficácia da renúncia depende da aceitação da Assembleia, no caso de esta estar em funcionamento efectivo.
Vai-se fazer a votação por esferas brancas e pretas. Peço a atenção de VV. Exas. Sobre a Mesa em frente da tribuna estão duas urnas, uma das quais ostenta um rectângulo branco e a outra um rectângulo preto.
A urna com o rectângulo branco é a que serve para a votação, a urna com o rectângulo preto serve para contraprova, segundo as praxes estabelecidas nesta Casa.
Os Srs. Deputados votam, pois, introduzindo esferas brancas ou pretas, conforme o sentido do seu voto, na urna n.° 1, e as outras esferas que lhes ficam introduzi-las-ão na urna n.° 2, que servirá para confirmação, pelo contraste.
A tantas esferas brancas ou pretas na urna n.° 1 deve corresponder igual número de esferas pretas ou brancas na urna n.° 2, e isso servirá de contraprova.
Os Srs. Deputados que votem pela aceitação da renúncia introduzirão uma esfera preta na urna n.° 1 e correlativamente uma esfera branca na urna n.° 2.
Correlativa e complementarmente, introduzem a outra esfera das que lhes foram entregues na urna que ostenta o rectângulo preto.
Portanto: votação aceitando a renúncia, esfera Preta na urna com o rectângulo branco.
Votação não aceitando a renúncia, esfera branca na urna com o rectângulo branco.
Vão ser, para o efeito, distribuídas aos Srs. Deputados esferas brancas e pretas.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção de VV. Exas.: numa das urnas, para maior clareza, foi posto o dístico "urna de votação"; essa é a urna cujo conteúdo contará para a votação. A outra urna será, portanto, uma urna de contraprova.
Vai, pois, iniciar-se a votação.

Fez-se a votação.

O Sr. Presidente: - Está terminada a votação. Peço aos Srs. Deputados Pinto Machado e Barreto de Lara o obséquio de servirem como escrutinadores.

Fez-se o escrutínio.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia. Responderam à chamada para votação 85 Srs. Deputados. Verifica-se que na urna que ostentava o rectângulo branco, e que podemos chamar a urna da votação, entraram 76 esferas negras e nove brancas. Na urna que servia de contraprova, entraram 9 esferas negras e 76 esferas brancas.
Estes resultados são concludentes, e resulta daqui que a Assembleia aceita a renúncia do Sr. Deputado Francisco de Sá Carneiro.
Vamos passar à segunda parte da ordem do dia. Continuação da discussão do aviso prévio sobre os meios de comunicação social e problemática da informação de Portugal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Meneses Falcão.

O Sr. Meneses Falcão: - Sr. Presidente: Facilmente se previa que o aliciante tema proposto pelo Sr. Deputado Magalhães Mota iria provocar uma caudalosa torrente de considerações.
E é curioso notar que, sendo muitas as comunicações que estamos a fazer, servindo-nos deste único meio de comunicação, múltiplas formas de raciocínio nos dispersam e qualquer coisa nos une e identifica com um sentimento comum. Queremos todos o mesmo: valimento e enriquecimento dos meios de comunicação, respostas à problemática da informação.
Porque de uma discussão se trata, não ficará mal procurar o fulcro da questão nas premissas postas pelo ilustre Deputado avisante e, sem prejuízo do brilho das suas concepções e consistência da sua documentação, ir procurar conclusões no campo raso da vida prática.
Legítimo parece também um recurso às análises que aqui vêm sendo feitas, para que possa encontrar-se a desejada manifestação de diálogo, sem a qual o sentido do próprio aviso prévio estremeceria nas suas bases.
Aceitando sem dificuldade que ninguém pode ser o único depositário do interesse geral ou monopolizar o patriotismo, já tenho uma certa dificuldade em entender que todos possam ser detentores da verdade, quando a presença desta é incompatível com a diversidade de conceitos que a definem e caminhos que a procuram.
Enunciar os meios de comunicação, dar relevo ao seu valor crescente, projectá-los na vida social, económica, moral e política, parece tarefa fácil.
Procurar ali causas e efeitos para uma nova feição de vida, na busca da evolução a que o homem anseia, também está ao alcance da compreensão de todos.

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Mas abrir afoitamente os braços a uma nova civilização, fugir apressadamente dos cultos do passado, incitar o homem a que se autodetermine, viver o entusiasmo da presença humana na Lua, e tudo isto para legitimar novas regras de trânsito social, é que me parece arriscado.
O homem foi à Lua, mas nem alterou nem altera a marcha das suas rotações ou qualquer das leis que comandam o movimento nos espaços siderais. Pode mesmo fugir ou afastar-se de Deus, mas será sempre um fruto da sua criação. Quando procura e interpreta as suas leis, aperfeiçoa-se. Quando se afasta delas, destrói-se.
Retirar uma ordem, uma disciplina, uma escala de valores, um preceito directivo - um preceito constitucional, se quisermos ser mais explícitos -, a todo o processo de comunicação e informação, não estará nas intenções de ninguém. Mas fazer assentar esse ordenamento em concepções ideais, como já se verifica em afirmações feitas, princípios definidos, é que não será prudente aceitar sem reflexão.
A esta reserva chama-se, impropriamente, conservadorismo.
Ora a verdade é que o princípio conservador, no bom sentido, encerra mais a defesa de um método de evolução do que a negação de outros métodos quantas vezes menos evolutivos e mais fechados a uma autêntica liberalização.
Basta de termos vagos, como objectivamente tem acentuado a reportagem, nesta discussão que tão directamente lhe diz respeito.
Todos temos em mente as exigências da vida moderna e o papel que cabe à imprensa, à rádio, à televisão, na formação e informação que hão-de colocar o homem no seu tempo.
A controvérsia, mais aparente do que real, parece partir daqui: pretendem uns que se ultrapassem fronteiras e a barreira do som, com largas à curiosidade, à ciência, ao saber, ao contacto com tudo, ainda que tudo possa acontecer.
Pretendem outros que àquela busca do que é brilhante se prefira o que é sólido; que o homem não se ultrapasse na sua condição, que não se destrua por cedência aos instintos.
Parece exagerada ou mesmo irreal esta definição. Mas tem o seu fundo de autenticidade.
Tão certo quanto é verdade verificar-se uma disputa pelo comando do comportamento dos cidadãos em todos os passos da sua vida.
Ninguém qualificado contraria pelo prazer de contrariar, ninguém usa do poder pelo prazer diabólico de esmagar o adversário e também não creio que haja quem dispute o poder senão pela convicção de que é capaz de fazer melhor uso dele.
E quando conciliatòriamente aceitamos como denominador comum o desejo do bem, aparece-nos o fantasma dos numeradores a estragar tudo.
Pois é nesta problemática da informação a partir dos meios de comunicação que todos queremos, exigimos objectividade, liberdade e verdade.
É no seio desta trilogia que se gera o conflito.
Não será certo que a objectividade, a liberdade e a verdade não são a mesma coisa para toda a gente?
Deixemos tudo quanto está aceite no valimento e preponderância dos meios de comunicação e vamos ao conflito.

O homem não pode ser manipulado pelos meios de comunicação social, há que respeitar a sua dignidade e os seus direitos.

Assim se pronunciou a Sra. Deputada D. Raquel Ribeiro. E peço licença para dizer "muito bem", se bem alcancei o seu ponto de vista.
Mas seja qual for a forma de actuação desses meios, a "manipulação" não existirá sempre?
Fugimos de um padrão, caímos noutro. Qual é o melhor?
E pior será ainda não cair em nenhum. Pode ser o desnorteamento, o ficar à deriva.
Poderemos nós ignorar que aos Poderes Públicos compete doutrinar, encaminhar os cidadãos, embora sem cercear a sua liberdade?
Perfilha esta ideia o Sr. Deputado Themudo Barata, que leva a sua habitual ponderação a preconizar a limitação do número de "brilhantes exposições" e à introdução de "autênticos diálogos de ideias". Mas acrescenta: "Entre espíritos superiores."
Quem selecciona esses espíritos? Quem aceita essa superioridade?
A alguém há-de caber essa autoridade, depreende-se daquela linha de pensamento. Estamos de acordo Sr. Coronel; mas não podemos contar com o acordo da maioria.
O Sr. Deputado Oliveira Dias requer - e muito bem - observação objectiva e verdadeira. Também eu. Mas ambos sabemos que isso mesmo reclamaram de nós, politicamente, aqueles a quem fizemos a mesma reclamação!
Mais explícito e mais responsável, porque lhe pertence a condução do tema, o Sr. Deputado Magalhães Mota considera necessária uma imagem de Portugal novo. Mas não romântica, folclórica, patrioteira ou provinciana.
Certamente que todos nós estamos com o ilustre Deputado avisante na pretensão de uma imagem de Portugal novo.
Mas aquela rejeição da feição romântica, folclórica, patrioteira e provinciana não será pouco liberal?
Ou será esta dúvida da minha parte um provincianismo?
Mesmo que o seja, quero ter direito a ele.
Reclamo-o com a mesma simplicidade e sinceridade com que os entrevistados da RTP reclamam peças portuguesas, música portuguesa, dissertações sobre história e cultura portuguesa.
Reclamam a sua verdade com a sua objectividade.
Todos calculamos de quantas dificuldades há-de rodear-se a organização dos programas da rádio e da televisão, quantos esforços para agradar à maioria e para servir da melhor maneira a colectividade.
Quanta preocupação ali não haverá para que a verdade não fira inutilmente e a subjectividade não iluda!
No entanto, todos nós sabemos, por críticas que lemos e como críticos que somos, que os programas detestáveis para uns fazem as delícias de muitos outros.

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Todos sentimos o direito de apontar inconveniências, erros crassos.
Mas se quisermos usar de objectividade, que também é obrigação nossa, não é só deles, havemos de convir que tais desgraças têm o seu auditório.
Poderá dizer-se: elimine-se tudo quanto é inconveniente, deletério, demagógico. Está bem. E a liberdade, que tratamento leva?
Será fácil responder a esta pergunta dizendo que basta destituir os monopolizadores da verdade.
E essa destituição destrói o monopólio ou cria novos monopolizadores?
Isto é muito complicado!
Cabe agora aqui a pergunta feita no aviso prévio: Poderá e deverá ser livre a informação? O Sr. Deputado avisante responde: sim.
Também direi sim ao deverá, e tenho pena que não possa, sem algumas restrições, dizer sim ao poderá.
Mas alinho incondicionalmente com o mesmo ilustre Deputado quando considera necessária uma moralização da publicidade e o fomento da informação especializada.
Contudo, não esqueçamos que moralizar é restringir...
Por mim, como disse, sou por essa espécie de restrições.
Se eu pudesse fazê-las na televisão, não apresentaria ao mundo um Camões de barrete e uma índia cobiçada pelas especiarias, para gáudio de algumas concepções de Portugal de amanhã e tristeza dos patrioteiros do Portugal de ontem.
É que as rectas intenções do esclarecido e brilhante autor do programa perderam-se na deficiente interpretação do espectador comum.
Continuaremos a ver uma coroa de louros na venerável fronte de Camões e um indicativo de fé na cruz das caravelas. Mas já há quem se ria disso!
Terá algum interesse a forma de objectividade desta forma de comunicação?
Raciocínios semelhantes e talvez mais expressivos poderíamos fazer a propósito das imagens de sentido moral em manifestações sociais que agridem a sensibilidade de quem repudia o ócio, a vadiagem e o vício.
Quando um comentador da TV, por mais qualificado que seja e já num ambiente de aceitável leveza e pertinentes considerações, se apresenta ao auditório nacional a dizer que vivemos num País em que ainda se faz uma sessão solene para inaugurar um fontanário, que ganhamos nós com esta caricatura fantasiosa, embora haja quem lhe encontre ou explore uma objectividade famosa?
Continuam a parecer-me válidas certas restrições.
No que respeita à imprensa, calculamos ou sabemos que as dificuldades desta acomodação ao interesse geral não serão menores.
Informar livremente, com objectividade e verdade, é um direito indiscutível. Mas se quem informa ou comanda a informação age segundo a sua interpretação, nem é preciso que haja maldade para que a verdade possa perder-se na falta de objectividade.
A objectividade não se regulamenta. Requer intuição e, sobretudo, formação.
Nesta ideia encontramo-nos com a tese do Sr. Deputado Almeida e Sousa.
Importa não confundir o uso da informação com o abuso da interpretação.
Com este cuidado e mais uns tantos disciplinadamente aceites por uma deontologia profissional que tenha em vista os superiores interesses da colectividade, facilmente se isola e fica fora de combate a antipática e às vezes degradante censura prévia, com relevo cada vez maior para a nobre missão de formar e informar, ao serviço da verdade tutelada pelo senso comum.
Ora, se um jornal responsável se lembrasse de trazer à consideração do público a glorificação de uma figura que a sensibilidade e a consciência da Nação condenasse irremediavelmente, com a agravante de estarem em causa as estruturas da própria segurança nacional, estaríamos em presença de um direito objectivo, mas também de um conflito de critérios com altos e respeitabilíssimos interesses de permeio.
Como se resolveria esse conflito?
Por mim, continuaria a confiar nos mais altos responsáveis, até porque são detentores de um mandato que lhes foi conferido para isso mesmo, para as grandes decisões.
Se nesta análise não fui mais objectivo, é porque a objectividade é coisa difícil.
Livre fui. E usei da minha verdade.
Com a mesma verdade afirmo que atribuo o maior mérito aos propósitos deste aviso prévio.
Que a moção a que der lugar ajude a caminhar ao encontro da liberdade que sirva a cada um e da verdade que sirva a todos. São os meus votos.
Entretanto, e porque penso que a vida de hoje, como a de amanhã, há-de ter sempre raízes vivificadoras no dia de ontem, vou aos passados mais longínquos buscar a certeza de que nesta luta pela verdade muitos hão-de continuar a beber estòicamente a cicuta até ao último trago, outros tantos a afirmar a certeza de que sabem apenas que nada sabem, e os restantes a pedir simplesmente que não lhes tirem o Sol.

O Sr. Carvalho Conceição: - Sr. Presidente: A origem e o fim essencial da vida social é o desenvolvimento da pessoa humana. O aperfeiçoamento que se procura não é o de uma abstracção, antes visa seres concretos, situados num espaço e tempo determinados, membros de uma família e cidadãos de uma pátria.
Reconhece a sociedade incumbir-lhe, através de actuação difusa ou sistemática contribuir decisivamente para de cada indivíduo fazer uma pessoa, isto é, um ser livre, fruindo de autonomia intelectual e moral, e que sabe aceitar, voluntariamente, um sistema de normas regulador das suas relações com os outros. Face aos estímulos recebidos, adapta-se ou inova, buscando construir a sua personalidade e desse modo enriquecer a comunidade em que se integra.
Bem se entendem, por isso, os artigos da Constituição ou da Declaração dos Direitos do Homem, que expressamente declaram ser o desenvolvimento do homem função do respeito dos "direitos e liberdades fundamentais".
Entre tais direitos, permito-me referir o "direito à educação" e o "direito à informação", tão intimamente associados. Digo mais: direitos correlativos,

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na medida em que todo o processo educativo se realiza mediante uma linguagem, gestual, escrita, televisiva ou outra, a veicular valores e a traduzir mensagens a ser interpretadas para posterior actuação.
Se todo o acto social supõe uma certa informação e comunicação nos nossos dias, caracterizados por uma crescente socialização, consequência da passagem do ruralismo ao urbanismo, assistimos à difusão maciça de mensagens, responsáveis pelas inúmeras transformações intelectuais, técnicas, sociais e morais. Da comunicação restrita, de indivíduo a indivíduo ou de pequeno grupo a pequeno grupo, passamos à transmissão planetária. Os acontecimentos de maior ou menor relevância tornaram-se, se assim nos podemos expressar, quotidianos aos habitantes do Globo.
Os homens ficaram mais próximos fisicamente, mas confrontando-se espiritualmente, pesem embora as tentativas feitas para conduzir à compreensão, primeiro estádio para a paz entre os homens.
E todos se deram conta então da importância dos novos meios de comunicação. A imprensa, a rádio, o cinema, a televisão, fornecem conhecimentos diversos, revelam atitudes, apresentam a história, enquanto se faz, fomentam o consumo das mais diversas mercadorias e bens, orientam a população nos seus movimentos, distraem e educam, convocam os povos para as tarefas comuns, a nível local ou nacional, criam ou mantêm o sentimento comunitário e desenvolvem a fraternidade, a todos dando consciência de que do labor de cada um depende o progresso da colectividade.
Podemos dizer, sem receio de errar, que o homem está mais do que nunca dentro do acontecimento e, por isso, em melhores condições para actuar. Mas para que tal aconteça é indispensável que possua a competente informação. Daí o "direito à informação".
Contudo, vozes se ergueram, e erguem, contra a nefasta acção desses grandes órgãos de informação, acusando-os de reduzirem o homem a mero "consumidor de informações", diluindo-o numa "massa" informe, forjando-lhe um espírito conformista, de cultura medíocre, desinteressado de qualquer esforço crítico, contentando-se com vagas opiniões, por não saber discernir entre a catadupa de palavras, de imagens, irresponsável, porque entre a vida e ele se interpõem o jornal, o emissor, o pequeno écran... Máquinas de propaganda, aviltadoras e criadoras de ilusões, narcotizantes, alguns lhes chamaram.
A influência sempre crescente das novas técnicas de comunicação permite que alguns falem de "condicionamento", de "violação das multidões", de "manipulação dos indivíduos ou grupos". Chega-se a dizer que se pode fazer crer não importa o quê desde que se saibam utilizar os meios de difusão colectiva.
A isto contrapõem os mais optimistas que tais meios permitem um melhor conhecimento dos homens, no fundo habitantes da mesma "grande aldeia".
Da importância dos novos meios de comunicação se deram bem depressa conta o Estado e grupos possuidores de grandes interesses, que, por isso, procuram conseguir o seu eficaz contrôle. Eis por que o problema é também de natureza política.
E assim se levanta um novo problema: o "direito à informação" é passível ou não da intervenção do Estado? A informação tornar-se-á, por esse facto, "propaganda" despida de "objectividade"?
Dizem os meios de informação que a sua função tem sido a de apresentar, em toda a sua nudez, os factos, deixando ao leitor, ao ouvinte ou ao telespectador a responsabilidade da sua interpretação e estruturação. As distorções, quando as há, resultariam da dificuldade de acesso às fontes de informação ou da incompreensão do público, cujo atraso cultural não lhe permitia a conveniente assimilação ou, pelo menos, a sua inteligibilidade. Mas quem não sabe que a "notícia" transmitida foi captada por uma sensibilidade e inteligência, por um indivíduo portador de uma cultura e de uma história?
A captação e a apresentação do "visto" ou do "ouvido" em fontes tidas por fidedignas é sempre função das tendências ideológicas do repórter ou do realizador e programador do noticiário, do editorial, do documentário. Daí, aliás, o papel que desempenham na formação da opinião pública.
É inegável que, em regra, muitos dos leitores ou ouvintes não estarão em boas condições para devidamente apreciarem o que lhes é fornecido. Por isso se espera do homem da informação uma interpretação ou, pelo menos, que lhes oriente a atenção, que os ajude a decidirem-se. E, consciente ou inconscientemente, o leitor ou o ouvinte faz "suas" as opiniões impressas ou televisivas.
Esse extraordinário poder apoia-se no artigo 19.° na Declaração dos Direitos do Homem, aprovada pelas Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948, que diz:

Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão; este direito inclui o de não ser incomodado por causa das suas opiniões, o de investigar e receber informações e opiniões e o de difundi-las, sem limitação de fronteiras, por qualquer meio de expressão.

Não podemos, no entanto, deixar de considerar que tal poder deve pressupor uma ética, subordinada ao respeito da verdade e em obediência à sua responsabilidade social. A doutrina da responsabilidade social é, afinal, um prolongamento do enunciado nos velhos princípios da Declaração dos Direitos saídos da Revolução Francesa, que já pedia a regulamentação das condições do exercício da liberdade de informação num sentido conforme às suas funções sociais. Importa referir ainda que o direito à informação não comporta somente regras estabelecidas pelo Poder Público; engloba todas as regras estatuídas pelos próprios profissionais da informação, sejam convencionais ou sancionadas pela lei. A necessidade de lutar contra os abusos a que a informação pode conduzir e até o próprio cuidado de prevenir a intervenção do Estado, que não pode ficar indiferente perante tais abusos, sob pena de se demitir das suas funções, deve levar à elaboração de um código deontológico, como a diferente estruturação dos órgãos gestores das referidas empresas, com a criação, por exemplo, de conselhos de imprensa e de redacção.
Compreende-se, por conseguinte, a inserção do artigo 22.° na nossa Constituição, que dispõe:

A opinião pública é elemento fundamental da política e administração do País, incumbindo ao Estado defendê-la de todos os factores que a desorientem, contra a verdade, a justiça, a boa administração e o bem comum.

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É evidente que admitir tais contrôles nada tem a ver com o papel dos órgãos de informação, na sua missão de formar a desejável opinião pública para o bom andamento dos negócios públicos, como o afirma Marcello Caetano, no seu livro A opinião Pública no Estado Moderno, a p. 49:

Tem uma função motora quando reclama iniciativa ou exige reformas. Serve de freio (ou travão) quando impede abusos ou faz reflectir sobre as providências a tomar. E forma um tribunal que aprova ou condena actos e medidas, aplaude decisões ou censura os homens.

Com clareza meridiana, o Presidente do Conselho escreveu no prefácio do livro Anticolonialismo e Descolonização:

Não pertenço ao número daqueles para quem há pessoas que têm sempre razão por temperamento e por formação defendo a liberdade de exposição e de crítica das ideias, dos princípios e das fórmulas. Mas nas questões políticas, em que se acham envolvidos interesses essenciais de uma nação, a debater-se na complexa teia das cobiças e das paixões que agitam demegògicamente a opinião internacional, a vida mostrou-me como é difícil formular uma opinião fundada quando se não dispõe do conjunto de elementos de informação e de apreciação que permitam a opção válida entre soluções possíveis. Pode cada cidadão ter facilmente simpatias, preferências, palpites, intuições: mas se é fácil exprimir entre amigos pontos de vista irresponsáveis que, finda a conversa, se evolam no fumo das coisas vãs, é dramaticamente difícil tomar decisões, destas que empenham a sorte de todo um povo e responsabilizam as consciências perante a história.

Eis por que se impõe uma política de informação capaz de evitar a corrosão do boato ou o recurso a outras fontes, tendenciosas as mais das vezes. E é tanto mais urgente a prestação constante e segura de informações quanto mais vulnerável se torna o povo, bombardeado pelos meios áudio-visuais, em especial pelas emissões radiofónicas, captadas por qualquer transístor, e dentro em breve pelas emissões televisivas transmitidas via satélite. É que no meu entender, aos órgãos de informação cabe primacial papel no reforço do espírito português, no desenvolvimento do sentido comunitário. E isto não são "loas patrioteiras", antes a convicção em que estou de que o universalismo cultural a que se pode tender pelos potentes difusores nada tem que ver com a manutenção de uma cultura própria. Ou não somos nós o vivo exemplo de contínuas aculturações em todo o espaço português?
Se existe o "direito à informação", este deve ser dominado pelo respeito da verdade, mas sabendo respeitar os legítimos direitos e dignidade do homem, tanto no processo de obter a notícia como na sua posterior divulgação. Haverá quem negue, por exemplo, 0 direito à intimidade da vida privada ou que admita a sua violação por uma imprensa dita sensacionalista? Acaso não serão legítimas as medidas legais visando impedir a venda de certas publicações destinadas à juventude, simples mostruários de violência, de sadismo, de erotismo, pese embora à corrente que nisso vê uma função psicoterapêutica da imprensa? E que dizer de certos programas de televisão, aparentemente amiga da criança, pois lhe leva a casa os seus heróis preferidos, e que se comporta como "ama" benévola que os aquieta ou retém em casa, que lhe revela cenas de violência e outras para as quais ela se não encontra ainda preparada para presenciar?
Dir-se-á: mas ninguém é obrigado a comprar certo jornal ou revista, a ouvir certas emissões ou a assistir a certos espectáculos. Sem dúvida, mas isso não implica, por parte dos próprios profissionais, uma reacção salutar para fazer dos mass media factores de informação, de divertimento ou mesmo de fisioterapia, mas também agentes da "democratização da cultura"? É preciso que os meios difusores se tornem colaboradores na obra educativa, sem o que se atrase o desenvolvimento nacional. Já se pensou que nas regiões ultramarinas a rádio e a imprensa, mas mais aquela, e em breve a televisão, podem cobrir todo o espaço e afectar toda a população?
Mas não será tanto uma questão de "liberdade de informação" e de "direito à informação"? Acaso, porque sou livre, posso invadir ou destruir o domínio dos outros? Se a imprensa, escrita ou televisiva, quer evitar "exames prévios", cujos perigos não se ignoram, porque não criam o seu código deontológico?
Os advogados têm o seu e os médicos também e nem por isso se consideram menos livres. Importa frisar que, para além da sua realização pessoal, o jornalista, o realizador, têm uma obrigação social: atender ao "bem comum".
Como afirmou Paulo VI, "o jornalista, o homem da vida política, é um piloto: tal como é importante que um piloto tenha a vista apurada para ver ao perto e ao longe, também o jornalista precisa de ver o presente e o futuro e de ter consciência da sua imensa e incalculável responsabilidade, porque o Evangelho diz: "se um cego guiar outro cego, ambos cairão no precipício".
Daqui decorrem, para concluir, duas ordens de considerações: em primeiro lugar, que os elementos ligados ao mundo da informação devem receber educação adequada e ganhar uma crescente consciência da responsabilidade, que é a sua, dada a extraordinária influência dos instrumentos que manejam; e, em segundo lugar, que importa dotar os jovens dos necessários anticorpos contra os malefícios decorrentes dos abusos possíveis do sector da informação. Se pais e educadores não querem ver destruída em pouco tempo a obra que ajudaram a erguer, não podem limitar-se a pedir providências ao Estado, para que restrinja a "liberdade de expressão", antes devem tornar-se "mediadores", discutindo com os jovens os programas que vêem ou ouvem, levando-os a apreciar, a reflectir, aconselhando-os mesmo a leituras complementares. Mais entendo que na escola - pois é lá que se joga o futuro das gerações - deve dedicar-se atenção ao problema da informação e dos meios de difusão, não como simples auxiliares pedagógicas, nem mesmo para fazer "instrução cívica", mas sobretudo para preparar o jovem para o exame crítico das mensagens que possa vir a receber. Este o grande papel da escola, ao Estado cabendo realizar, em benefício da juventude, a convergência de todos os meios de informação e de formação existentes. Como acentua recente relatório da U.N.E.S.

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C.O., num país não pode haver três escolas paralelas: a escola tradicional, os centros sócio-culturais e as redes de mass media... Se a criança é, naturalmente, una, no crescimento do seu ser, cultura, lazeres e técnicas de conhecimento devem fazer um todo. Por isso a política de informação tem de ser integrada numa política global do desenvolvimento nacional, enquanto meio de dar a cada um o sentido da sua responsabilidade na obra colectiva a empreender.

O Sr. Ávila de Azevedo: - Sr. Presidente: No debate do aviso prévio do nosso distinto colega Deputado Magalhães Mota, sobre os meios de comunicação e a problemática da informação, desejo apenas inserir o meu depoimento na alínea a) do n.° 1) do esquema que foi apresentado:

A evolução social e a evolução dos meios de comunicação.

Procurarei tratar, em especial, da situação da imprensa, com referência à imprensa portuguesa, na transformação que se operou nas últimas décadas na mass media - para empregar um termo generalizado do vocabulário americano -, ou sejam as técnicas de difusão colectiva iniciadas com a invenção da fotografia e continuadas pelo cinema, pela rádio e pela televisão finalmente.
Eu sei que um tema desta natureza implicaria um aturado inventário de documentação e uma longa reflexão. Infelizmente não me foi possível proceder a esse estudo. Como me inscrevi, porém, entre os participantes do debate suscitado pelo Deputado Magalhães Mota, senti-me na obrigação de corresponder, ainda que com brevidade e simplicidade, ao seu convite.
Sr. Presidente: Creio que uma das teorias interpretativas mais sedutoras do fenómeno de transformação dos meios de comunicação humana do nosso tempo é a exposta na obra do sociólogo canadiano Marshall Mac Luhan, com grande audiência no mundo anglo-saxónico. Segundo este autor, as civilizações teriam passado por três estádios determinados pelos veículos de comunicação: o primeiro - o das civilizações analfabetas; o segundo - o das civilizações do alfabeto fonético ampliado com a invenção da imprensa, que ele designa como a "galáxia de Gutenberg"; o terceiro - aquele a que assistimos, em nossos dias, da difusão do pensamento pelas técnicas electrónicas.
Quanto à consideração dos dois primeiros estádios, não me parece muito original a tese de Mac Luhan. Já Claude Lévi-Strauss, o eminente etnólogo francês, havia dividido as civilizações em dois grandes períodos: o das civilizações não escritas e o das civilizações escritas. Nas primeiras incluía o que os historiadores e os etnógrafos nomeavam vulgarmente como "povos primitivos", ou mesmo "selvagens" se remontarmos à classificação dos filósofos do século XVIII.
Mas o pensador canadiano vai mais longe deduzindo desses três estádios conclusões sociológicas. Assim, no estádio do analfabetismo, em que só domina a transmissão oral, as relações entre o indivíduo e a sociedade tornam-se mais íntimas, mais fáceis dentro da coesão do grupo humano. Daqui resulta a fusão e mesmo a subordinação do indivíduo no grupo que forma a tribo.
O segundo estádio, a invenção da escrita, opera uma mudança total de mentalidade. Todos os sentidos ficam sujeitos à visão. Entra-se no reinado do conhecimento objectivo. As comunidades primitivas alargam-se a sociedades estruturadas. Nas novas relações entre o homem e o mundo exterior o tribalismo desaparece para dar lugar ao pensamento individual, ao racionalismo, à centralização do poder.
Esta transformação é ainda acentuada e reforçada com a invenção da imprensa no século XV. É o livro impresso que provoca a distinção entre os clérigos e os leigos. Impõe a noção que o único conhecimento verdadeiro é o que toma a forma dos caracteres tipográficos. Universaliza a cultura, prepara o advento de Descartes, sobrepõe a dedução fria da razão aos impulsos da afectividade... O livro propaga-se como um objecto de consumo.
Ora, no terceiro estádio, o dos actuais meios de informação, reintegrámos o Universo nos processos auditivos e visuais. O alfabeto escrito transmuda-se em sons e, ao mesmo tempo, os sons transmundam-se em sinais simbólicos. O conhecimento já não se reduz ao material impresso.
Conclui Mac Luhan que a sociedade aonde ainda mergulham as raízes da nossa cultura, a sociedade do alfabeto, está ameaçada de morte. Não que voltaremos às comunidades primitivas. Mas a idade da electrónica, com a simultaneidade universal da propagação da palavra, tende a englobar a família humana numa grande tribo... Nessa neosfera que já falava Teillard de Chardin para onde caminhava todo o género humano...
Não aceitamos, porém, nas suas consequências extremas as teorias do sociólogo canadiano. E como decorreram muitos séculos na transição do primeiro estádio, o da oralidade exclusiva para o do predomínio da palavra escrita, assim podemos também esperar que a nova fase dos meios áudio-visuais não levará à eliminação total do papel impresso. Nada impede mesmo que uma e outro possam subsistir ocupando um lugar paritário na cultura do nosso tempo.
Por isso me permite fazer esta interrogação:
Qual será a função da imprensa, do jornalismo, nos tempos que correm?
Sr. Presidente: evoco algumas longínquas recordações pessoais sobre os meus contactos iniciais com a folha impressa designada comummente por "jornal". Era então na minha infância e na minha adolescência o único meio de comunicação social, a única janela aberta para o mundo que nos cercava... Como soletrei as primeiras letras em Lisboa, no tumulto da Guerra Mundial de 1914-1918, foi através de um cotidiano bem conhecido, O Século, então com grandes espaços em branco (os cortes da censura), que recebi as primeiras sugestões e emoções que alimentaram o meu espírito... Quase ao mesmo tempo que o livro escolar, o jornal fizera despontar em mim o respeito pela letra impressa. Oferecia-me não só um estímulo para a minha curiosidade infantil, mas ainda os tópicos de conhecimentos incipientes. Depois, no meio dos mares e no microrganismo de uma so-

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ciedade insular, continuava a ler cotidianamente os jornais ali publicados. Um deles, que ainda existe, chama-se A União. E o bom povo da minha ilha generalizava o título aos que vinham de fora: eram As Uniões ou As Uniães do continente.
Acreditava com uma fé inabalável nas opiniões, nos comentários, nas reflexões e nas aspirações que os jornalistas expunham. Constituíam para mim uma matéria dogmática. Supunha mesmo que as instituições e o Governo, a que compete a felecidade dos povos, se deviam reger pelas doutrinas e pela orientação emanada dos redactores dos jornais... Eu mesmo fui jornalista e sou um tanto jornalista... Com o Dr. Dutra Faria, um dos mais brilhantes articulistas portugueses, e Correia de Melo, poeta, ajudei a fundar um semanário Os Novos, de que saíram apenas quatro números...
Pode dizer-se que a imprensa conta dois milénios. Já os Romanos no primeiro século a. C. publicavam, por afixação, as Acta Diurna. Mas foi a Gazette, editada por Théophraste-Renaudot, que inaugura o jornalismo moderno.
Em Portugal também, logo no início do século XVIII, em 1715, apareceu a Gazeta de Lisboa, antecessora do Diário do Governo. No seu primeiro número ficámos sabendo que "Suas Magestades logram saúde perfeita". No n.° 6, com a data de 7 de Setembro, regista-se uma notícia sensacional:

Com universal sentimento de toda a monarquia francesa faleceu em Versalhes no primeiro do corrente, pelas oito horas da manhã, el-rei cristianíssimo.

Era Luís XIV.
É, porém, na alvorada do século XIX, com os sucessos políticos de uma das épocas mais agitadas da nossa história, que as folhas impressas se multiplicam. Folhas partidárias com títulos pitorescos, como O Oráculo, O Campeão, O Chocalho, O Trovão, O Almocreve das Petas, O Tagarela, A Trombeta Lusitana, O Tira-Teimas...
Na segunda metade do século surge a imprensa noticiosa, sem rótulo pardidário e com tiragens crescentes. Corresponde ao desenvolvimento da sociedade industrial e capitalista. Os progressos técnicos da impressão acompanham este surto com a invenção da máquina rotativa e das linótipos.
Entre nós, Eduardo Coelho, fundando o Diário de Notícias, em 1864, inspira-se em Le Figaro, de Paris. Como se escreve no artigo de apresentação, o jornal procura "interessar a todas as classes, ser acessível a todas as bolsas e compreensível a todas as inteligências".
São desta época, entre outros quotidianos desaparecidos, não só o Diário de Notícias e O Século, como o Jornal do Comércio, O Comércio do Porto, O Primeiro de Janeiro, O Jornal de Notícias e outros.
Esta imprensa já se reflecte na literatura novecentista como uma verdadeira instituição social - literatura que é um documento do século, com as suas tendências doutrinárias, os seus costumes, os hábitos das personagens nela representadas.
Por exemplo, Luísa, a triste heroína de O Primo Basílio, a Bovary portuguesa, "ficara sentada à mesa a ler o Diário de Notícias no seu roupão de fazenda preta...".
Em A Capital, ainda de Eça de Queirós, Melchior Carneiro era redactor de O Século. Era ele quem gabava ao Artur, de Oliveira de Azeméis, a profissão de jornalista "quando a gente já se sabe tem alguma coisa de seu...". Mais tarde ou mais cedo apanhava-se um nicho... Além disso sempre se era um bocado temido...
Fradique Mendes, o representante do diletantismo em Portugal, a sedutora personagem idealizada por Eça, informava-se pelo Times e pelo Figaro. Mas acabava igualmente por ler os jornais portugueses, que ele chamava então "fenómenos picarescos de decomposição social...".
Sr. Presidente: Podemos afirmar que a idade de ouro da imprensa, da imprensa como força de opinião e de monopólio da comunicação, se encerrou com o termo da 1.ª Guerra Mundial. No decénio de 20 a rádio já emite nos Estados Unidos um serviço quotidiano de notícias e expande-se em todo o mundo ocidental. No decénio de 40 começa a desenvolver-se a televisão com febril actividade. Há uma ruptura brusca com o passado. A imprensa procura adaptar-se, desde então, às novas condições dos meios de informação.
Uma das características essenciais do jornal é a variedade de temas e de imagens que se oferecem ao leitor. Ao contrário da televisão, que impõe um modelo e um estilo uniforme de informação, a leitura do periódico permite uma atitude de selecção individual, tanto pela temática das suas secções como pelo conteúdo dos artigos.
Só o jornal nos faculta um esclarecimento completo sobre os acontecimentos da actualidade. Enquanto a rádio ou a televisão nos transmitem a notícia na sua primeira forma de captação, o jornalista já tem ensejo de reflectir e de fazer reflectir o leitor sobre o seu significado.
Em segundo lugar, só o redactor de um jornal ou os seus colaboradores estão preparados com alguma dilação para integrar a notícia numa sequência de factos, num contexto histórico, num condicionalismo temporal ou até numa explicação científica. Como se sabe, a maior parte dos grandes quotidianos de expressão universal possui um corpo redactorial de especialistas dos assuntos religiosos, políticos, diplomáticos, económicos, financeiros, sociais, desportivos e de outros tantos motivos de interesse para todas as categorias de leitores.
A clientela que lê o seu quotidiano ou outra qualquer folha impressa, se se encontra quantitativamente determinada em muitos países, nem sempre foi identificada qualitativamente. Não creio que em Portugal, por exemplo, se tenham feito estudos sociológicos sobre as preferências dominantes dos leitores, os seus grupos etários, as suas profissões, a sua formação cultural, as suas reacções pessoais. Antigamente os jornais eram mais lidos nas cidades do que no campo. Porém, hoje, nalgumas nações da Europa, pelo contrário, são mais lidos no campo, ou porque os costumes rurais se aproximam dos da cidade, ou porque os lazeres sejam mais frequentes.
Nos periódicos do nosso tempo as informações e os comentários políticos que apaixonaram os nossos avós tendem a restringir-se. Os jornais de cor propriamente política fizeram a sua época. De resto, para que se satisfaça uma clientela cada vez mais numerosa, não há vantagem em adoptar uma opinião que

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seja estritamente partidária. De qualquer modo, o jornal deve corresponder às curiosidades de um público cujo nível cultural tende a elevar-se.
A imprensa já não consegue mobilizar, como no passado, as forças de reivindicações sociais políticas e económicas. Mas exerce uma influência perdurável nas opiniões, nos gostos, na exaltação de certas personalidades, na coesão da unidade nacional, no reforço dos laços que unem os diferentes grupos sociais. Desta maneira, ainda actua em muitas das nossas manifestações contemporâneas.
Além disso, cada um dos jornais - dos grandes jornais, bem entendido - pode contar com uma fidelidade e uma persistência dos seus leitores que, por vezes, se transmite de geração em geração. Estes leitores criaram um hábito de leitura diária e são muito sensíveis a qualquer mudança, tanto de apresentação gráfica como à supressão das rubricas que prendem a sua atenção. Em muitos casos sentem-se então frustrados nos seus gostos e abandonam o jornal preferido.
Há, portanto, influências recíprocas da imprensa sobre a opinião pública e da opinião pública sobre a imprensa. São estas acções e reacções que medem a vitalidade do jornal, a sua expansão, a sua penetração na mentalidade dos leitores.
Pode ser que a imprensa já não seja esse quarto poder do Estado a que se referia Balzac. Mas ainda continua a desempenhar uma função primordial nas relações humanas e no progresso social. Há alguns anos, já depois do advento da televisão, os jornais nova-iorquinos entraram numa greve demorada. Foi uma espécie de pânico na grande cidade americana. Os ianques sentiram-se ainda mais isolados e mais perdidos na imensa multidão. Faltava-lhes algumas das noções indispensáveis ao seu comportamento social e à sua condição de homens civilizados.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Desejo levar ao conhecimento de VV. Exas. que, para receber no Estado de Angola o Sr. Presidente de Câmara dos Deputados do Brasil, solicitei, em virtude do meu impedimento pelos trabalhos parlamentares, o 2.° vice-presidente da Assembleia Nacional, Deputado Gustavo Neto Miranda, que acedeu, e a quem, portanto, designo, para todos os efeitos, para esse encargo em que ele saberá honrar o seu círculo e a Assembleia Nacional.
Vou encerrar a sessão anunciando que haverá sessão na terça-feira, à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação, e espero que conclusão, do debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Magalhães Mota sobre os meios de comunicação social e a problemática da informação em Portugal.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

António Bebiano Correia Henriques Carreira.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim.
Augusto Domingues Correia.
Delfim Linhares de Andrade.
Fernando David Laima.
Francisco João Caetano de Sousa Brás Gomes.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Duarte Liebermeister Mendes de Vasconcelos Guimarães.
João Paulo Dupuich Pinto Castelo Branco.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José Coelho Jordão.
José Gabriel Mendonça Correia da Cunha.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Luís António de Oliveira Ramos.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Olímpio da Conceição Pereira.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira.
Alexandre José Linhares Furtado.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
Armando Valfredo Pires.
Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Carlos Eugénio Magro Ivo.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando de Sá Viana Rebelo.
Francisco Correia das Neves.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Francisco de Nápoles Ferraz de Almeida e Sousa.
Henrique José Nogueira Rodrigues.
João Manuel Alves.
João Pedro Miller Pinto de Lemos Guerra.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Augusto Correia.
José da Costa Oliveira.
José Dias de Araújo Correia.
José da Silva.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria Teixeira Pinto.
D. Luzia Neves Pernão Pereira Beija.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Marques da Silva Soares. Manuel Valente Sanches.
Pedro Baessa.
Rui Pontífice Sousa.
Tomas Duarte da Câmara Oliveira Dias.

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