O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 435

REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA - GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL E DA CÂMARA CORPORATIVA

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

ANO DE 1974 1 DE FEVEREIRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

XI LEGISLATURA

SESSÃO N.º 20, EM 31 DE JANEIRO

Presidente: Ex.mo Sr. Carlos Monteiro do Amaral Netto

Secretários: Exmos. Srs.
Manuel Homem de Oliveira Themudo
Amilcar da Costa Pereira Mesquita

SUMARIO: - O Sr Presidente declarou aberta a sessão aí 15 horas e 40 minutos

Antes da ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 19 do Diário das Sessões, sem rectificações
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Mendonça e Moura apresentou um requerimento
O Sr. Deputado Lucena e Valle, a propósito da recente vivia do Sr Ministro das Obras Públicas e Comunicações ao distrito de Viseu, fez considerações acerca das obras ali em curso e sobre a situação dói seus transportes ferroviários.
O Sr Deputado Silva Mendes usou da palavra para abordar a problemática do ensino no distrito de Portalegre.
O Sr Álvaro Monjardino referiu-se à situação existente na Base das Lajes e às condições que devem ter-se em conta na negociação de novo acordo sobre a sua utilização pelas forças aéreas norte-americanas.

Ordem do dia. - Continuou a discussão na generalidade da proposta de lei acerca do regime de condicionamento do plantio da vinha
Usaram da palavra os Srs Deputados Calado da Moía, Camilo de Freitas e Gonçalves de Abreu.

O Sr Presidente encerrou a sessão às 17 horas e 30 minutos

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 35 minutos

Fez-se a chamada, â qual responderam os seguintes Srs Deputados:

Abílio Alves Bonito Perfeito.
Adolfo Cardoso de Gouveia.
Albano Vaz Pinto Alves.
Alberto da Conceição Ferreira Espinhal.
Alberto Eduardo Nogueira Lobo de Alarcão e Silva.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alda da Conceição Dias Carreira de Moura d'Almeida.
Alexandre Pessoa de Lucena e Valle.
Alípio Jaime Alves Machado Gonçalves.
Almeida Penicela.
Álvaro Barbosa Ribeiro.
Álvaro de Mendonça Machado de Araújo Gomes de Moura.
Álvaro Pereira da Silva Leal Monjardimo.
Amilcar da Costa Pereira Mesquita.
António Alberto de Meireles Campos.
António Azeredo Albergaria Martins.
António Calapez Gomes Garcia.
António Fausto Moura Guedes Correia Magalhães Montenegro.
António da Fonseca Leal de Oliveira.
António de Freitas Pimentel.
António José Moreira Pires.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Manuel Rebelo Pereira Rodrigues Quintal.
António Manuel Santos Murteira.
António Moreira Longo.
António Victor Ferreira Brochado.
Armando Júlio de Roboredo e Silva.
Armindo Octávio Serra Rocheteau Artur Augusto de Oliveira Pimentel.
Assahel Jonassane Mazula.
Augusto Arnaldo Spencer de Moura Braz.

Página 436

436 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

Augusto Leite de Fana e Costa.
Augusto Salazar Leite.
Carlos Monteiro do Amaral Netto
Eduardo António Capucho Paulo.
Eduardo do Carmo Ribeiro Moura.
Eleutério Gomes de Aguiar.
Fernando António Monteiro da Câmara Pereira.
Fernando Dias de Carvalho Conceição
Filipe César de Góes.
Filipe José Freire Themudo Barata.
Francisco Domingos dos Santos Xavier
Francisco José Correia de Almeida.
Francisco José Roseta Fino.
Francisco Magro dos Reis
Francisco de Moncada do Cazal-Ribeiro de Carvalho
Gabriel Pereira de Medeiros Galvão
Graciano Ferreira Alves.
Gustavo Neto Miranda.
Henrique Callapez Silva Martins.
Henrique Vaz Lacerda
Jaime Pereira do Nascimento
João Afonso Calado da Maia.
João Duarte de Oliveira.
João Manuel Alves.
Joaquim António Martins dos Santos.
Joaquim Emídio Sequeira de Fana.
Jorge Carlos Girão Calheiros Botelho Moniz
Jorge Manuel de Morais Gomes Barbosa.
José Alberto de Carvalho
José de Almeida
José d'Almeida Santos Júnior
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José João Gonçalves de Proença.
José Joaquim Gonçalves de Abreu.
José Mana de Castro Salazar
José de Mira Nunes Mexia
José dos Santos Bessa.
José Vicente Cordeiro Malato Beliz.
José Vieira de Carvalho.
Josefina da Encarnação Pinto Marvão.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Lia Mana Mesquita Bernardes Pereira Lello.
Lopo de Carvalho Cancella de Abreu.
Luís António de Oliveira Ramos.
Luiz de Castro Saraiva.
Manuel Afonso Taibner de Morais Santos Barbosa.
Manuel Fernando Pereira de Oliveira.
Manuel Ferreira da Silva.
Manuel Gardette Correia
Manuel Homem de Oliveira Themudo.
Manuel de Jesus Silva Mendes.
Manuel Joaquim Freire.
Manuel Jorge Proença.
Manuel José Constantino de Góes
Manuel Rosado Caldeira Pais
Manuel Valente Sanches
Manuel Viegas Carrascalão.
Mana Angela Alves de Sousa Craveiro da Gama.
Mana Clementina Moreira da Cruz de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Maria de Lourdes Cardoso de Menezes Oliveira Mana Luísa de Almeida Fernandes Alves de Oliveira Nicolau Martins Nunes Nuno Tristão Neves.
Oscar Antoninho Ismael do Socorro Monteiro.
Paulo Otheniel Dimene.
Rafael Ávila de Azevedo.
Rómulo Raul Ribeiro.
Sinclética Soares dos Santos Torres.
Teotónio Rebelo Teixeira de Andrade e Castro

O Sr Presidente: - Estão presentes 101 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão
Eram 15 horas e 50 minutos

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o n.º 19 do Diário das Sessões
Pausa.
Se nenhum de VV. Ex.ªs tem rectificações a apresentar a este Diário, considerá-lo-ei aprovado

Pausa.

Está aprovado

Deu-se conta do seguinte.

Expediente

Telegrama

Do presidente da Liga dos Antigos Graduados da Mocidade Portuguesa

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para apresentar dois requerimentos o Sr Deputado Mendonça e Moura.

O Sr. Mendonça e Moura: - Pedi a palavra para apresentar os seguintes:

Requerimentos

Ao abrigo das disposições do Regulamento desta Assembleia, requeiro que pelo Ministério da Saúde me sejam fornecidos os seguintes elementos.
Número e localização dos centros de saúde criados,
Número e localização daqueles que no fim de 1973 estavam efectivamente a funcionar;
Pessoal respectivo, discriminado por categorias e forma de provimento;
Instalações (prédios próprios, especialmente construídos, instalação em hospitais ou outras instituições de saúde ou assistência),
Valências efectivamente funcionais em cada um daqueles centros de saúde no final de 1973;
Coordenação estabelecida por cada centro de saúde com outras instituições oficiais ou particulares de saúde - de assistência ou de previdência (natureza dessa coordenação* acordo, despacho, regulamento, etc);
Elementos de que a Direcção-Geral de Saúde ou outras entidades do Ministério da Saúde disponham relativos à morbilidade e mor-

Página 437

1 DE FEVEREIRO DE 1974 437

talidade materno-infantil nas áreas de cada um dos centros de saúde desde a sua entrada em funcionamento.
Ao abrigo do Regimento desta Assembleia, requeira que pelo Ministério das Corporações e Segurança Social me sejam fornecidos elementos respeitantes
A demora média de atendimento das consultas médicas, por especialidades e por cada caixa distrital com serviços médico-sociais.
Ao número de médicos de clínica geral e de cada especialidade que trabalham para cada uma das mesmas caixas, por distritos,
Regime de trabalho respectivo (contrato, remuneração por acto médico, capitação em postos, em consultório, laboratório, gabinetes de radiologia, etc);
Número de inscritos como beneficiários e agregados no regime de livre escolha, nos distritos em que está estabelecido.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lucena e Valle.

O Sr Lucena e Valle: - Sr. Presidente- Nos passados dias 11 e 12 do corrente mês deslocou-se ao distrito de Viseu o Sr Ministro das Obras Públicas e das Comunicações, acompanhado dos mais altos responsáveis dos serviços que dele dependem No decurso dessa visita de trabalho, que abrangeu os concelhos de Resende, Lamego, Viseu e Tondela, foi possível àquele membro do Governo, dada a maturidade e plena justificação dos projectos apresentados, tomar importantes decisões nos sectores da viação rural, abastecimento de água, saneamento, abertura de novos arruamentos e instalações desportivas, que vão exigir a mobilização de avultados recursos financeiros.
Não se punham em causa a urgência e a necessidade das obras agora aprovadas e comparticipadas, que em muito virão beneficiar a população residente. Mas é sempre grato registar o reconhecimento dessas mesmas carências e a adopção imediata, por parte de quem o pode fazer, das providências indispensáveis à rápida consecução dos programas traçados em obediência à satisfação de necessidades colectivas.
Para um dos pontos abordados, e que causava as mais sérias preocupações - o abastecimento de água de diversos concelhos da Região de Viseu -, foi encontrada uma generosa compreensão que permitirá, estamos em crê-lo, mercê da dedicação e da conjugação de esforços do Ministério das Obras Públicas e dos serviços municipais, evitar, já durante a próxima estiagem, restrições tão drásticas ao consumo como aquelas que, com grave incómodo dos utentes, se têm verificado em anos anteriores À solução de emergência preconizada não se oporá, pelo que diz respeito à cidade de Viseu, o período de tempo que tem de decorrer até à construção da barragem de Fagilde - local onde vão ser captadas as águas. Indispensável é que os atrasos registados na finalização do projecto da estação elevatória e do tratamento de águas, imputáveis a uma empresa privada a quem foi encomendado, sejam recuperados, a fim de, muito breve, se dispor de um abastecimento regular ao longo de todo o ano.
Nestas condições, não me parece poder duvidar-se de que o ano de 1974 se inicia no distrito de Viseu sob os melhores auspícios, contrariando previsões de alguns sectores descrentes por natureza ou por intenção.
A breve concretização de importantes obras públicas, a que poderemos acrescentar o anúncio de soluções que atenuarão os inconvenientes decorrentes de uma ainda insuficiente capacidade de armazenagem da produção frutícola, a projectada florestação em propriedades privadas de uma vasta área sem aptidão agrícola na região de Montemuro e a recente concessão à Federação dos Grémios da Lavoura da Beira Alta de um alvará para fabricação de aglomerados de madeira - medida que abre novas perspectivas a uma desejável industrialização do distrito- permitem-nos encarar o futuro com franco optimismo e confiar na esclarecida e profícua actuação do Governo.
Os resultados que se deixam indicados são fruto de longo e constante trabalho dos serviços centrais e regionais, aos quais o Governo, naturalmente depois de cuidadosa análise, deu o seu aval.
Devem, por isso mesmo, as populações que vão colher os benefícios das medidas adoptadas reconhecer esse esforço e manifestar para elas a sua satisfação.
Nesse sentido, reputamos indispensável, e foi isso que vimos acontecer em relação às medidas tomadas durante a recente visita do Sr Ministro das Obras Públicas, a serenidade de espírito e a isenção suficientes para não se julgarem apressadamente certas opções a que o Governo, qualquer governo, não pode furtar-se, e que terão necessariamente de atender aos meios humanos o financeiros disponíveis e às potencialidades de cada região Só num clima de trabalho, de tranquilidade, de confiança recíproca e do reconhecimento da medida do possível em cada momento se poderão encontrar progressiva e seguramente as soluções por que todos ansiamos.
Sr. Presidente. Iniciei esta breve intervenção no período de antes da ordem do dia sob o signo de obras públicas e comunicações. Não quero por isso deixar de referir um outro problema que se encontra em aberto no distrito de Viseu, ligado a um daqueles sectores o da situação dos transportes ferroviários.
Há muito que na região se procedeu à instalação de duas linhas de via reduzida, que serviam dezenas e dezenas de localidades, muitas delas isoladas do Mundo se não existissem aqueles velhos ronceiros mas simpáticos comboios Essas linhas, planeadas e construídas numa época já remota, não foram objecto de qualquer actualização que melhorasse o seu traçado, encurtando distâncias.
O material circulante que nelas operava foi envelhecendo, degradando-se e exigindo custos cada vez mais elevados para a sua conservação.
Numa época em que a rapidez das comunicações significa muito para as pessoas e tem uma importância capital no tráfego das mercadorias, a velocidade dos comboios manteve-se ou até diminuiu Naturalmente as populações foram procurando, sempre que possível, outros meios de transporte que lhes ofereciam maior comodidade e menos tempo perdido em deslocações Os coeficientes de exploração e de rendibilidade foram naturalmente baixando, tendo a empresa concessionária de suportar avultados prejuízos com a manu-

Página 438

438 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

tenção daquelas linhas. E um dia aconteceu aquilo que, nas condições existentes, dificilmente poderia deixar de acontecer o encerramento da linha do Vale do Vouga.
A decisão é com certeza justificável a nível empresarial. E suponho que sem dados rigorosos seria estultícia ou, pelo menos, arriscado da minha parte afirmar que a linha seria operacional, numa perspectiva económica, se reunisse as condições de comodidade, segurança e velocidade exigíveis a um caminho de ferro moderno.
Sem dúvida que o encerramento de uma linha pode representar, se não for acompanhado de quaisquer contrapartidas, um grande prejuízo para a região que por ela é servida, mas por isso mesmo o contrato de concessão obriga a companhia concessionária, quando assim proceda, a estabelecer serviços de transportes de passageiros e de mercadorias por estrada, de forma a assegurar as necessidades públicas e a dar satisfação às exigências de desenvolvimento da região em causa
Na região do Vale de Vouga esse serviço de camionagem de substituição foi de facto instituído, mas não satisfez ainda inteiramente as populações, que, por intermédio dos seus municípios, expuseram já ao Governo as suas pretensões no que diz respeito ao melhoramento de estradas e de caminhos, eliminação de atrasos nos transportes de mercadorias, que podem limitar o natural desenvolvimento da zona, e criação de um maior número de carreiras.
Para a resolução destas dificuldades, que actualmente ainda se defrontam, permito-me pedir a esclarecida atenção do Governo e da empresa responsável, embora reconheça o contributo decisivo que a elas vai ser dado pela futura ligação Aveiro-Viseu.
E a linha do Dão? É certo que ainda não foi encerrada, mas as condições de exploração são aparentemente de tal modo semelhantes às que oferecia a do Vale do Vouga que temos de admitir que em relação a ela, ou outras na mesma situação, se venha a produzir uma decisão idêntica.
Na realidade, a linha é fortemente deficitária e, embora não tenhamos números disponíveis, estamos convictos de que é reduzido o seu movimento de passageiros e até de mercadorias.

O Sr João Manuel Alves: - Dá-me licença?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. João Manuel Alves: - Tenho estado a ouvi-lo com muita atenção e a apoiá-lo intimamente, só que a última parte que acaba de dizer me deixa, de algum modo, perplexo Parece-me que se quer referir à linha do Dão e à perspectiva de a encerrar. Eu tenho a impressão de que o problema das linhas secundárias se tem que pôr, não num plano de rendimento actual, mas de rendimento potencial. E a pergunta que eu deixaria era esta: se efectivamente a empresa prestasse serviços de bom nível, o rendimento não seria outro? Porque o que acontece e que se parte de números actuais, números de rendimento a que se chegou, deixando deteriorar os serviços, de modo que as pessoas não têm qualquer interesse em utilizar o serviço da C P.
O problema que se põe é o de se efectivamente a empresa prestasse os serviços a que se obrigou pela concessão, se os prestasse de bom nível, esse rendimento não seria outro e já não seria suportável a exploração. Partindo, portanto, de números que uma deterioração constante e sucessiva vem agravando, naturalmente que daqui a pouco não temos caminhos de ferro no País.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado João Alves. Eu agradeço a sua intervenção e quero dizer que nem sequer de fundo discordo O que eu estava a referir é que a situação actual da linha do Dão leva-nos a admitir que uma solução desse tipo se tenha que tomar.
Se se modificarem as condições -pois que isto é uma questão de números-, é evidente que nessa altura é que se poderão fazer as contas para saber se a linha é ou não rendível Aliás, isto estava exactamente na sequência do que eu agora vou dizer.
Se essas condições não se modificarem e atingirmos uma situação que, por excessivamente onerosa, se revele insustentável, confiamos em que, antes de isso mesmo ser reconhecido, venham a ser adoptadas providências que assegurem à região actualmente servida por essa via férrea contrapartidas suficientes no sector rodoviário.
É ao Estado e à empresa concessionária que tal esforço é pedido.
Aquele, com fundamento de que as suas funções visam a satisfação de necessidades colectivas; à empresa concessionária, com base na ideia de que a realização de um interesse público, objecto da sua actuação, e os meios que utiliza não podem deixar de impregnar as suas actividades e de a levar a aprovar, com a tutela do Executivo, soluções que constituam condições vitais do desenvolvimento de regiões pouco evoluídas e já hoje a braços com graves problemas de comunicações, e muito particularmente de transporte de mercadorias.
Sr. Presidente:
Tenho perfeita consciência das dificuldades que se têm de superar para concretização das sugestões que deixo apresentadas de uma forma breve, dada a carência de meios de actuação da empresa concessionária e dos projectos já aprovados que neste momento tem em curso de realização.
O certo é que elas correspondem a necessidades profundamente sentidas pelas populações e condicionam em alto grau o desenvolvimento de regiões que importa não deixar perecer.
E essa é, afinal, a razão da minha intervenção

Vozes: - Muito bem!

O Sr Silva Mendes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Tivemos ocasião, há poucos dias, de ouvir o Deputado Amílcar Mesquita transmitir e afirmar a esta Câmara os sentimentos de alegria e de reconhecimento dos povos da região Sul, pela abertura da Universidade de Évora, acto de justiça que, dignificando um Governo, é uma resposta mais às aspirações de quem confia no Estado Social, que se fortalece e alicerça em bases cada vez mais sólidas.
O acto, em si, ultrapassa o âmbito regional e bem pode ser considerado uma vitória mais na batalha da educação, uma pedra a dizer-nos que a reforma não se promete, constrói-se em cada hora que passa.

Página 439

1 DE FEVEREIRO DE 1974 439

Só assim a democratização do ensino poderá ser uma realidade e poderemos caminhar ao lado das nações que mais procuram progredir no campo educacional.
O papel que a Universidade de Évora irá ter será simultaneamente universalista e regional», como afirmou o magnífico reitor no acto solene da sua investidura.
S. Ex.ª o Ministro da Educação Nacional, nesse mesmo acto solene, referiu ainda que s... os projectos de desenvolvimento, intimamente ligados aos interesses das suas gentes, determinarão um mais elevado grau às todos na riqueza comum, irão desencadear grandes incidências no sector agro-pecuário, na sua organização e gestão e nas indústrias alimentares ...»
Ora, para que às populações do interior sejam dadas condições que lhes permitam vir a beneficiar de todos estes enunciados, muito há ainda a fazer, muito há a completar, e cremos que é à distância que têm que ser resolvidos problemas que afectam neste momento os povos desta região.
Se temos uma Universidade em Évora e esperamos ter dentro em breve uma Escola Normal Superior a funcionar em Portalegre, e são motivos do nosso regozijo, Escola que, segundo cremos e muito desejamos, irá estar ligada àquela Universidade, não esqueçamos que mais de 50 % dos concelhos que constituem o distrito de Portalegre não dispõem ainda de ensino preparatório directo, aspiração que é, sem dúvida, um inalienável direito.
Assim, Arronches, Craio, Marvão, Monforte e Sousel ainda nem sequer viram incluídos os seus anseios na lista dos que hão-de ser satisfeitos no ano lectivo de 1974-1975, como parece já suceder com Alter do Chão, Fronteira e Gavião.
Mas não ficam aqui as nossas preocupações de um caminhar uniforme em busca do sagrado direito à educação de toda a população portuguesa.
O concelho de Nisa, dos maiores 'em extensão territorial, apesar de ter matriculados no 1.º e 2.º anos da Escola Preparatória do Professor Mendes dos Remédios 267 alunos e na sua freguesia de Alpalhão mais 48 frequentarem o ciclo preparatório TV, não tem, no momento, qualquer estabelecimento de ensino secundário criado que garanta a esses alunos o poderem transitar ao ensino liceal ou técnico, sem uma deslocação incompatível com as possibilidades financeiras da população que ali recebe ensino.
Os factos assim o demonstram.
Das centenas de alunos que no concelho completaram o 2 º ano do ciclo preparatório só cerca de meia centena pôde frequentar o grau de ensino imediato, pois para tal têm que fazer diariamente em carreira normal de camioneta o percurso Nisa-Portalegre-Nisa.
Como é natural, estes são oriundos de famílias a quem, certo que com sacrifício, ainda é possível satisfazer a despesa resultante da deslocação e da refeição diária que tem que ser tomada em Portalegre.
Os outros, a maioria, ficaram pelo caminho...
Para que tal não se continue a verificar, ou para que não suceda o mesmo que sucedeu no decorrente ano lectivo no concelho de Avis, isto é, para que estes alunos possam usufruir do direito a uma continuidade de ensino, dependente apenas das suas possibilidades intelectuais, solicita-se que seja encarada, para na altura própria se encontrar resolvida, a criação de uma secção do Liceu de Portalegre a funcionar no próximo ano lectivo na sede do concelho de Nisa
E que dizer da situação em que se encontra a população escolar do concelho de Elvas?
Esta cidade, a sofrer a influência de um desenvolvimento que tem as suas raízes no passado e se projecta no futuro a que tem direito pelo trabalho que nela se realiza, não tem, no presente, qualquer estabelecimento de ensino a nível médio.
A população escolar na cidade (no que se refere aos ensinos preparatório e secundário), constituída por cerca de 1500 alunos, dos quais cerca de 1000 no ensino secundário - liceal, técnico ou comercial -, não vê à sua frente horizontes que lhe possibilitem um acesso a um curso médio.
Não nos esqueçamos que uma percentagem elevadíssima, tão alta que não vale a pena referir, porque será quase a totalidade, é oriunda de famílias cujas receites lhes não permitem mandar os seus filhos para meios onde se situam essas possibilidades.
Mas anote-se ainda, para melhor apreciação do problema, que Eivas fica a pequena distância de Campo Maior, onde se encontram já, em idênticas circunstâncias, 380 alunos.
Estes números são eloquentes e falam por si próprios, dizendo da necessidade de serem criados naquela cidade estabelecimentos de ensino médio.
Das o to escolas de educadoras de infância previstas no IV Plano de Fomento não poderá desde já ser considerado que uma se situará, com prioridade absoluta, em Elvas?
E não poderá e deverá aproveitar-se, numa zona essencialmente agrícola, toda a estrutura que nos é dada pelo funcionamento da Estação de Melhoramento de Plantas, que dispõe dos melhores técnicos da especialidade, para ali fazer funcionar um estabelecimento de ensino deste ramo?
Que mágoa sentimos ao ver uma cidade e uma região de tantas tradições agrícolas sem qualquer estabelecimento de ensino a esse sector ligado.
Mas se tudo o que dissemos não for suficiente para fazer considerar o nosso pedido, acrescente-se a situação do concelho no que diz respeito à falta de infra-estruturas que correspondam às mais prementes necessidades da população
Não dispondo de um hospital em boas condições, apesar de todo o esforço despendido pela mesa da Santa Casa da Misericórdia e de todos os que ali trabalham, não tendo médicos em número suficiente para responder às mesmas necessidades, vê-se a população na contingência de ter que solicitar os serviços hospitalares ou médicos à cidade de Badajoz
Porque não recebe em boas condições es emissões da televisão portuguesa, a população tem que ligar os seus canais para a espanhola...
Não se crie agora uma situação mais a agravar todas estas e outras que não referi e que já nos diminuem e prejudicam
Não se dê ocasião a que por falta de estruturas escolares em Eivas e Campo Maior os nossos jovens sejam obrigados a frequentar as escolas médias ou superiores da cidade de Badajoz.
Amigos, amigos, problemas de educação à parte
Pensamos também que urge encarar os problemas do concelho de Ponte de Sor, onde no ano lectivo

Página 440

440 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

em curso se atingiu uma média de 724 alunos nos ensinos preparatório e secundário.
Há, pois, que considerar a necessidade da criação de uma escola de ensino médio, qualquer que seja o ramo, naquele concelho, pronta a absorver as centenas de alunos que em breve terão natural acesso a este grau de ensino.
Caso contrário, estaremos frente a uma barreira que o factor económico não deixa transpor.
Repare-se que a situação geográfica de Ponte de Sor permite que sirva de apoio a concelhos de menor densidade de população escolar, que não justificam portanto o funcionamento de estabelecimentos de ensino deste teor.
Sr Presidente, Srs Deputados* Em síntese, solicitamos, com igual prioridade:

1.º Que sejam criados, de imediato, estabelecimentos de ensino do ciclo preparatório directo nos concelhos de Crato, Sousel e Marvão, e facultado aos Municípios de Arronches e Monforte transporte que garanta a possibilidade de os alunos nele residentes frequentarem o ciclo, o ensino secundário, médio ou superior na cidade de Portalegre,
2.º Que sejam criadas secções de ensino secundário em Avis, Nisa e Castelo de Vide;
3 º Que se aproveitem as óptimas instalações situadas na freguesia de Benavila, concelho de Avis, no presente sem qualquer utilização válida, e se faça funcionar ali uma escola prática de agricultura;
4 º Que em Ponte de Sor seja criada uma escola de ensino médio,
5 º Que em Eivas seja criada uma escola de educadoras de infância e um estabelecimento de ensino agrícola, médio ou superior,
6º Que em Portalegre, e em colaboração com a Universidade de Évora, seja garantido desde já o funcionamento de cursos de Engenharia Têxtil.

O Sr Ministro da Educação Nacional, ao confirmar a posse do magnífico reitor da Universidade de Évora, salientou de novo «que não podemos descansar enquanto na sociedade portuguesa todos os cidadãos não usufruírem cada vez mais amplamente dos direitos em que se integram o da educação, da saúde, da habitação, do trabalho, da participação na vida colectiva e de benefícios sociais que permitam a cada um viver uma vida digna de ser vivida São direitos que exigem também deveres perante a Nação»
É, pois, para que as populações da região alentejana, e particularmente do meu distrito de Portalegre, tenham cada vez mais consciência desses deveres perante a Nação e possam usufruir dos direitos que S. Ex.ª enunciou, que eu levanto estes problemas, confiado em que quem os pode ajudar a resolver lhes dará, com a urgência que requerem, as soluções que pedimos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Álvaro Monjardino: - Sr. Presidente: 1. Foi a meados de Outubro passado Q Prof Ávila de Azevedo e eu percorríamos, uma por uma, as povoações do distrito de Angra do Heroísmo. Numa daquelas «sessões de esclarecimento», ao lado da igreja simbolicamente chamada de S. Miguel Arcanjo, uma das poucas pessoas presentes - um homem para a minha idade, mas de cabelo já todo branco - desabotoou lentamente a camisa, mostrou-nos uma espádua ensanguentada de carregar água aos ombros para a sua casa. Ali ao lado, a escassas centenas de metros, sucediam-se as aterragens e as descolagens dos grandes cargueiros aéreos, num movimento contínuo e imparável, que implicava o consumo diário de 4 milhões de litros de jet fuel Aquele contraste nunca mais nos esquecerá. Não prometemos nada ao homem do ombro ferido mas assumimos o compromisso íntimo de relatar o facto a quem fosse capaz de o compreender e lhe medir o alcance e o significado.
O lugar onde isto se passou chamava-se Lajes O que os cargueiros aéreos traziam destinava-se ao Estado de Israel.
2 Será este o momento -agora que estão em curso, felizmente não acelerado, as negociações para a eventual renovação do acordo sobre a utilização da grande base dos Açores - de apontar a esta Câmara, ao Governo e ao País certos aspectos que ressaltam de trinta anos de convívio entre portugueses dessas ilhas e norte-americanos estacionados naquela base.
O primeiro aspecto é positivo Em tantos anos podem considerar-se excepcionalmente raros os atritos surgidos entre as duas comunidades, que pouco se interpenetram e vivem em paz Seguramente em nenhum outro lugar do Mundo serão os Norte-Americanos tão pouco hostilizados como entre a gente dos Açores o têm sido O facto de darem emprego a cerca de 1500 civis portugueses fez da base aérea um pequeno pólo, não direi de desenvolvimento, mas de fixação de gente que, por isso mesmo, emigra da ilha Terceira numa percentagem inferior à do resto do arquipélago. Aqueles empregados estão sujeitos a uma disciplina que, sob vários pontos de vista, os valoriza profissionalmente, na medida em que lhes transmite esquemas mentais práticos e determinados hábitos de trabalho.
Mas, paralelamente com isto, surgem muitas coisas que, em boa medida, anulam estas pequenas vantagens, quando deviam antes sublinhá-las e aumentá-las até Referir estas coisas pode contribuir para a destruição de um mito generalizado e alimentado por quem possa ter interesse em o manter o do valor da permanência, naquela base portuguesa, de militares norte-americanos, nas condições actuais.
O estatuto, substantivo e processual, dos trabalhadores portugueses é claramente desfavorável a estes últimos A sua incipiente e balbuciante representação corporativa não conseguiu ainda, de facto, e mau grado os seus esforços, uma efectiva e real equiparação, pelo menos às dos trabalhadores das empresas privadas nacionais, nem o acesso aos tribunais do trabalho.
Os residentes norte-americanos gozam de um estatuto jurídico-penal que, também de facto, se revela atentatório da soberania portuguesa, e que de maneira alguma pode manter-se.

O Sr. Ávila de Azeredo: - Muito bem!

Página 441

1 DE FEVEREIRO DE 1974 441

O Orador: - As estradas da ilha Terceira são percorridas por 1500 automóveis norte-americanos, que, representando embora 20% do tráfego local, em nada contribuem para a respectiva conservação, salvo por via de uma «compensação» de 1200 contos que foi entregue à Junta Geral de Angra (após árduas negociações) por uma única vez, no já longínquo ano de 1957
E depois há o chamado programa People-to-People, o qual, como é sabido, se destina a dar uma boa imagem de marca das forças armadas americanas por todo o Mundo, e se traduz em actos unilaterais de benemerência - dádivas a escolas, a asilos e hospitais, auxílio a sinistrados e algum apoio a organismos económicos oficiais- feita com convites às autoridades e com uma publicidade ostensiva e desproporcionada aos benefícios concedidos.
Por outro lado, a base americana é uma pequena cidade. Mas em matéria de infra-estruturas urbanas será mesmo a primeira do arquipélago Dispõe de um hospital, de biblioteca e de escolas que vão do ensino pré-primário até aos dois primeiros anos do college universitário. De três clubes, de duas piscinas, de dois cinemas, de ginásios, campos de jogos e até um pequeno hipódromo De redes completas de abastecimento de água, de saneamento e de distribuição de energia eléctrica. De uma estação radiodifusora e de um posto emissor de TV, por sinal o primeiro que funcionou em território português As suas cantinas vendem géneros originários de todo o Mundo, a preços incrivelmente baixos (porque isentos de direitos) para benefício dos residentes norte-americanos e de raros privilegiados portugueses. Dá-nos um modelo de ocupação urbana que à nossa gente nunca foi proporcionado até ao presente.
3 À população açoriana, e à primeira vista, os norte-americanos não fazem grande mal, tirando as devastações morais que circundam sempre uma base militar. Fazem mesmo algum bem. Todavia, psicologicamente, são um factor negativo e humilhante O contraste entre a sociedade portuguesa, arcaica, rural, modesta, não urbanizada, e os 5000 estrangeiros bem alimentados, bem assistidos, bem vacinados, bem vitaminados, abarrotados de electrodomésticos, eriçados de antenas de TV, de máquinas fotográficas japonesas, de carros de oito cilindros, de equipamentos para pesca submarina e caçadeiras com mira telescópica, não pode deixar de sugerir confrontos, de marcar diferenciações, de dar vontade de partir para a terra donde eles vieram, ainda que para responder, sem preparação alguma, às exigências brutais de um implacável mercado de trabalho.
Quando se sabe, como tem sido divulgado, que esta situação se mantém há trinta anos sem contrapartida visível, designadamente ao nível - mas ao nível bilateralmente estabelecido da efectiva promoção das gentes do arquipélago, quando se sabe, por outro lado que ao longo desses mesmos trinta anos aquela base, como um barómetro, acompanha e responde a todas as convulsões militares e paramilitares do mundo ocidental - impõem-se, a quem reflecte, duas ordens de conclusões.
A primeira é que não interessa à região, nem ao País, a manutenção deste estado de coisas É um estado de coisas que nos diminui; que se mantém no exclusivo interesse dos utentes estrangeiros e cessará (como outros cessaram) quando tal interesse se modificar, que não nos concita gratidão, nem sequer respeito, por parte dos nossos aliados norte-americanos Pelo que deles conheço, sei que tomam muito mais a sério quem lhes exige com razão e com firmeza do que quem perde oportunidades para o fazer.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A segunda é que o conjunto Lajes-Praia da Vitória, pelo que vale em si, e pela sua situação estratégica entre os dois maiores blocos económicos mundiais, há-de ser sempre um elemento fundamental, seja para fins militares, seja para os fins pacíficos de uma política de contenção continental portanto, em qualquer caso, numa perspectiva internacional, mas nunca forçosamente norte-americana.
4. Um primeiro ponto a deixar aqui vincado é que todo o arquipélago dos Açores -por aquilo que ficou referido, e até pelos riscos de uma retaliação nuclear, que surgem aquando de cada crise mundial- se julga no direito de esperar que, pela primeira vez, e na eventual hipótese de renovação do acordo, os Norte-Americanos se comprometam contratualmente na efectiva promoção das potencialidades, naturais e humanas, da região.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Basta pensar no que nos falta em matéria de comunicações, em matéria de valorização de quadros locais para o fomento agro-pecuário, e em matéria de tecnologia avançada e meios financeiros para o aproveitamento das riquezas geotérmicas do arquipélago.
Um segundo ponto é que as situações de desigualdade, ao nível laborai, ao jurídico-penal e ao da utilização das infra-estruturas, deverão desaparecer de uma vez para sempre, sem prejuízo da criação de um fundo de compensação para salários, aplicável no financiamento de projectos regionais

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - 5. Mas nós, Açorianos, povo voltado para todos os horizontes (e talvez por isso persistentemente português, ao menos enquanto em Portugal), não somos propriamente os habitantes da ilha de Malta E sentimos que esta base atlântica merece ainda mais contrapartidas do que aquelas -ao que supomos indiscutíveis- a obter para benefício local O que aquela base vale faz parte do património nacional E os benefícios a auferir dela deverão também atingir todos os portugueses Creio que bastará recordar os conhecidos exemplos da Espanha, para se saber o que pretendo apontar

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - 6. Estas palavras não envolvem hostilidade para ninguém. Com estas pretende apenas exprimir-se um voto, muito positivo e muito firme: que não percamos as oportunidades ao nosso alcance; que tiremos partido imediato da terra e dos homens, do solo e do mar, de situações geográficas que são únicas, de conjunturas históricas que podem não se repetir, e de potencialidades. económicas que há séculos espe-

Página 442

442 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

ram alguém para es acordar. Que a negociação do acordo das Lajes se faça, por tudo isto, de maneira a não descurar-se nenhum dos escalões, sem os quais ela seria sempre imperfeita o dos interesses da região onde o objecto material do acordo se situa, o dos interesses globais do País de que a região é parte integrante e indiscutida.
Não são dois termos de uma alternativa. São duas realidades prementes - e complementares.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Os Srs Deputados que ainda estavam inscritos para usarem da palavra neste período de antes da ordem do dia ficam com ela reservada para amanhã

Vamos passar à

Ordem do dia

Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei acerca do regime de condicionamento do plantio da vinha
Tem a palavra o Sr Deputado Calado da Maia.

O Sr Calado da Maia: - Sr Presidente: Não é sem profunda emoção que subo pela primeira vez os degraus desta tribuna, com a consciência da responsabilidade que advém do mandato recebido daqueles que me elegeram para ser aqui, nesta alta Câmara, porta-voz dos seus legítimos anseios, defensor dos seus justos interesses, que as leis aqui discutidas, votadas e aprovadas hão-de reger, regulamentar e disciplinar.
Espero, com a ajuda de Deus, nunca atraiçoar a confiança em mim depositada e com a sinceridade, a verdade e a independência que me orgulho de possuir e a liberdade daí resultante defenderei sempre, com entusiasmo, persistência e fé os pontos de vista que mais se ajustem à defesa dos interesses regionais do meu distrito, na medida em que eles se conjuguem com a realização dos mais elevados interesses nacionais, que, sem preterir aqueles, se lhe devem sobrepor
Sr. Presidentes: Antes de entrar na apreciação na generalidade da proposta de lei n º 6/XI, sobre o regime de condicionamento do plantio da vinha, e ao usar da palavra pela primeira vez nesta tribuna, é com o maior respeito que dirijo a V. Ex.ª as minhas homenagens, reafirmando-lhe os sentimentos da maior admiração pelos elevados dotes de inteligência, bondade e firmeza e o mais apurado sentido das realidades com que V. Ex.ª tem conduzido os trabalhos desta Assembleia.
É V. Ex.ª um dos maiores parlamentares do nosso tempo, por isso ocupa, com o consenso de todos os seus pares, a elevada missão em que se encontra investido e que tanto tem prestigiado.
Srs Deputados: A VV Ex.ªs apresento as minhas mais cordias saudações e expresso o meu desejo de uma leal e sincera colaboração, extensiva a todos os que trabalham nesta Casa e de um modo especial aos órgãos de informação, meus camaradas de trabalho na imprensa diária e no labor de dar ao País o relato dos acontecimentos desta Câmara, cumprindo esforçadamente uma missão que diariamente se renova e nunca acaba.
Gostosamente lhes testemunho a minha admiração pelo interesse que tenho visto porem no cumprimento.
da sua difícil tarefa de transmitirem com fidelidade e clareza a forma como nós, os Deputados, cumprimos o mandato que nos foi confiado.
A minha primeira intervenção nesta Câmara, e dentro da ordem do dia, por feliz coincidência, destina-se a apreciar uma proposta de lei que estabelece as bases sobre s quais vai assentar a regulamentação do condicionamento do plantio da vinha, problema da maior importância económico-social e que interessa a todas as regiões do território nacional, metropolitano e insular, mas que na vasta região ribatejana assume um aspecto decisivo na sua economia e tem a maior incidência social, política e económica.
Através da leitura do preâmbulo da proposta de lei, colhe-se a certeza de que é intenção do Governo estabelecer e definir uma política vitivinícola norteada pelo sentido de melhorar a qualidade, ao mesmo tempo que se procurará um equilíbrio entre o potencial da produção vinícola e o seu escoamento.
Não podemos deixar de louvar o enunciado destes princípios, que são a base de uma política que a viticultura de há muito aguarda, pois neste sector tão importante da economia nacional, não obstante os esforços que têm sido feitos através dos últimos decénios no sentido de a orientar e disciplinar com a publicação de inúmeros diplomas legais, nunca se estabeleceu uma estruturação global e antes se tentou parcelarmente equacionar o problema, sem que os resultados possam considerar-se de qualquer maneira felizes.
Nesta proposta de lei, logo na base i se estabelece que o plantio da vinha é condicionado e que a sua autorização fica dependente das condições que o Governo vier a estabelecer.
Na base II e cem vista a essa autorização, estabelece-se que, para efectivação da mesma, ter-se-á em conta a qualidade e tipicidade dos vinhos, considerando-se a existência no continente e ilhas adjacentes de regiões vinícolas demarcadas, de zonas vinícolas tradicionais e de zonas produtoras não especificadas.
Portanto, em todo o desenvolvimento da futura política vitícola, que o Governo se propõe realizar e que terá por base a lei em discussão, se toma em linha de conta a classificação das regiões vinícolas em: regiões demarcadas, regiões ou zonas tradicionais e outras não especificadas
Assim, a determinação ou classificação de cada uma das regiões do País, que fica dependente de regulamentação desta proposta de lei, a efectuar pelo Governo, tem uma importância extraordinária no futuro económico e social das várias manchas vitícolas actualmente existentes na carta de Portugal.
A proposta de lei define p que seja uma região demarcada e também enuncia aquilo que considera como zonas vinícolas tradicionais.
Lê-se no n º 2 da base II «Dizem-se demarcadas as regiões vinícolas cujos vinhos, pelas características de reputada qualidade e tipicidade, mereçam a distinção de denominação de origem »
Parece-nos que esta definição & suficientemente clara e precisa e permitirá estabelecer, além das já existentes, algumas regiões demarcadas, dentro daquelas zonas tradicionalmente vinícolas, onde existem tipos de vinho de reputada qualidade que de há muito deveriam fazer parte de regiões demarcadas que os melhorassem e defendessem.

Página 443

1 DE FEVEREIRO DE 1974 443

Não temos, pois, qualquer dúvida sobre o conceito do que seja uma região vinícola demarcada, tal como a define a proposta de lei.
Todavia, o que se considera na mesma proposta como zona vinícola tradicional já nos sugere algumas dúvidas na sua determinação, pois do que resulta do n º 3 da citada base II parece que as regiões vinícolas tradicionais são apenas as que produzem vinhos de qualidade, os quais não reúnem, todavia, condições para merecerem a distinção de uma denominação de origem, sem que se tenha em linha de conta a tradição da cultura da vinha nas respectivas zonas.
Esta definição é extremamente vaga e imprecisa para não deixar de preocupar tantas zonas tradicionalmente vitícolas que existem no País e cuja qualificação como zonas tradicionais, nos termos do n º 3 da base n, fica dependente de uma classificação de os seus vinhos serem ou não de qualidade
Parece-nos extraordinariamente aleatória esta disposição, pois o que seja um vinho de qualidade depende de tantos e tais factores de apreciação, graduados em escala de valores tão vasta, que pode levar a injustiças, conducentes a graves problemas regionais, sociais e económicos.
Entendemos, por isso, que no n º 3 da base II se deverá precisar por forma mais clara o que se vai considerar, para o efeito do condicionamento do plantio da vinha, uma zona vinícola tradicional, pois dessa classificação resultam prioridades e vantagens previstas nesta proposta de lei, nomeadamente no que respeita não só a novas plantações, mas às reconstituições e transferências de vinhas existentes.
Região tradicional tem de ser toda aquela onde ao longo de muitos anos se cultiva a vinha, numa tradição que se transmite de gerações em gerações, onde a prática e a experiência ensaiaram castas mais apropriadas às condições ecológicas da região, onde os homens se fixaram e especializaram na cultura da vinha, e não só nas técnicas culturais, mas na mecânica da sua comercialização
Todos temos consciência do apurado sentido do agricultor tradicional, que adopta nas suas explorações as culturas que a sua experiência lhe diz serem as mais rentáveis e mais apropriadas às suas terras, tendo em atenção as condições do clima, do solo, de humidade e tudo o mais que a sua observação lhe ensinou.
Pensamos ser esta a ideia de tradicionalidade que deve presidir à classificação das zonas onde a vinha se instalou há muitos anos.
É evidente que se deve atender à boa qualidade do vinho produzido nestas zonas tradicionais, embora tenhamos de vencer a dificuldade apontada de determinar qual o grau de qualidade que pretendemos atingir.
Certamente que no conceito de zona tradicional, que deixamos desenhado, fica implícita a ideia de que os vinhos nela produzidos têm de ser de boa qualidade, pois a experiência de dezenas de anos, de séculos até, não pode ter deixado de levar os homens a apurar as castas e as técnicas para melhorarem os seus vinhos, e também não seria admissível que se mantivessem tantos anos essas zonas vinícolas (p que lhes dá até o carácter de tradicionais) se os seus vinhos não tivessem qualidade para se imporem nos mercados
Nesta linha de pensamento, a vasta zona do Ribatejo integra-se perfeitamente no conceito de zona vinícola tradicional, porventura das mais antigas da Península, pois sabemos que os Romanos, cultivadores da vinha em larga escala, a teriam trazido quando aqui se fixaram, durante as fases de formação e expansão do seu império, fazendo-a desenvolver e prosperar, num clima que lhe era propício, através das suas excepcionais e evolutivas técnicas agrícolas
As condições ecológicas do actual Ribatejo eram extraordinariamente propícias ao desenvolvimento destas ampelídeas, que talvez até, segundo alguns historiadores, aqui tivessem sido introduzidas pelos Fenícios, que, utilizando a via - fluvial, ao fundarem as suas feitorias na costa atlântica, tivessem subido o velho «Tagus» e procurado esta região mais fértil para implantarem a sua agricultura.
«É mesmo de supor que pertençam à região ribatejana os pergaminhos da mais antiga mancha vinícola desta faixa ocidental da antiga Hispânia, que há mais de oito séculos se chama Portugal.» Assim afirma no interessante trabalho sobre a viticultura ribatejana o investigador e ilustre técnico regente agrícola Cláudio Gonçalves.
Não restam dúvidas, porém, de que, quando da fundação da nacionalidade já existiam vinhas no Ribatejo, pois no foral de D Afonso Henriques à cidade de Santarém, em 1170, determinava-se que «Os peões devem dar a oitava de pão, vinho e linho »
Já no reinado do nosso primeiro rei, e segundo o citado investigador, o vinho era um importante produto agrícola, com determinações de comercialização, e, facto curioso, já nesse tempo se defendia a pureza do vinho e se aplicavam sanções aos prevaricadores.
No reinado de D. Sancho I foi extraordinariamente incrementada a agricultura, o mesmo acontecendo com os reis seus sucessores, e no testamento de D Sancho II pode ler-se: «Deixo ao Mosteiro de S. Jorge parte das minhas vacas e ovelhas e metade das minhas vinhas de Alvisquer, termo de Santarém, e outra metade ao meu chanceler do Arando Furjás e a minha adega de Marvila, com todas as suas cuvas» Alvisquer, segundo refere D. Luís Cardoso de Meneses (Margande) na sua curiosa publicação A Vinha no Ribatejo, é o actual Campo do Rossio, na margem direita do Tejo, junto à Ribeira de Santarém.
No reinado de D Dinis, o rei lavrador, o poeta da corte, Estêvão da Guarda, cantou as vinhas de Vaiada, nos curiosos versos:

D'uma gram vinha que tem em Vaiada Alvar Rodrigues nom pod'aver prol Vedes porqui, ca el nom cura sol De a querer per seu tempo cavar e a mays d'ela faz por adubar pêro que tem à mourisca podada

Nessa época, a produção de géneros agrícolas, nomeadamente a do vinho, excede o consumo interno, e Portugal exporta para a Flandres, Inglaterra, Bretanha e Catalunha cereais, vinho, azeite e fruta seca.
Também D. Pedro I, pela Lei de 18 de Fevereiro de 1364, determinou:

Aos homens bons de Santarém... outro sim em razão das lavras de vinhas, tenho por bem, que os serviçais da vinha sejam todos inscritos num livro do concelho...

Página 444

444 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

O mesmo rei proibiu a entrada em Santarém de vinhos de fora até ao dia de Santa Mana de Agosto, porque faziades grandes despesas em adubar as vinhas».
D. Fernando, por Carta de 3 de Julho de 1367, autorizou que os moradores de Santarém «vendessem livremente o seu pão e o seu vinho», Carta confirmada por D Afonso V. em 18 de Dezembro de 1443, e por D. João II, em S de Julho de 1487
O mesmo rei D Fernando desenvolveu extraordinariamente a agricultura, referindo o cronista Fernão Lopes as grandes carregações de vinho, escrevendo:
Que durante este reinado a exportação anual chegou a carregar 400 a 500 navios, chegando em um só ano a exportar 12000 tonéis de vinho.

Pois este monarca, por Carta de 25 de Março de 1368, manda acatar a postura da Câmara de Santarém, que proíbe a entrada de vinho de fora do concelho, porque no dito concelho não há outro mantimento senão de vinhas e de sal»
Através, portanto, de toda a história de Portugal documentalmente se prova que na vasta região ribatejana tradicionalmente se cultivou a vinha em toda ela, quer nas margens do Tejo, quer nas terras altas, pois ali encontrou um ambiente ecológico verdadeiramente excepcional
Com a dinastia de Avis a agricultura portuguesa sofreu as consequências de uma transformação dos interesses nacionais virados para o mar, na descoberta de novos mundos e na conquista de novas terras, todavia não desapareceram do Ribatejo os vinhedos, que de há séculos ali verdejavam.
Logo no reinado de D Afonso V foi determinado, por Carta de 22 de Dezembro de 1450, que estejam escusados de pagarem fundagem quaisquer estrangeiros que no Termo da Vila de Santarém carregarem vinho em barcos e os levarem para fora», o que demonstra não só que os vinhos do Ribatejo eram exportados para o estrangeiro como deveriam ser abundantes para permitirem essa exportação.
Também o mesmo monarca, por Carta de 9 de Junho de 1459, dada a destruição que os veados das coutadas reais faziam nas vinhas dos campos de Vaiada, tomou as necessárias providências.
No mesmo reinado, por Carta de 1 de Abril de 1467, confirmada em 4 de Maio de 1471, e mais tarde por D. João II, em 25 de Julho de 1487, foi proibida a entrada de vinhos de regiões de fora de Santarém e seu termo, para defesa dos vinhos desta.
Somente, no reinado de D. José, o seu primeiro-ministro, o marquês de Pombal, determinou que, «dadas as extraordinárias diminuições na lavoura de pão, fossem arrancadas as vinhas com que se tem ocupado as margens do Tejo e campinas de Vaiada, de Santarém e da Colega», mas também ordenou que do mesmo modo se procedesse em relação às margens e campinas dos nos Mondego e Vouga e nas demais terras que forem de paul e lezíria; logo de seguida mandou que fossem também arrancadas as vinhas das terras baixas de Torres Vedras, Anadia, Mogo-fores, Arcos, Avelãs de Caminha e Fermentelo, isto por alvará de 18 de Fevereiro de 1766.
Foi portanto uma emergência nacional grave que determinou o arranque das vinhas destas regiões, nas quais se incluem parte do Ribatejo, cujas famosas
vinhas logo foram reconstituídas, continuando uma tradição, que já vinha de séculos, na produção dos seus afamados vinhos
Toda esta digressão histórica, coligida dos interessantes e já citados estudos de Cláudio Gonçalves e D Luís Margande, teve em vista demonstrar que as vinhas do Ribatejo, secular e tradicionalmente, formam uma enorme região vitivinícola, que, de acordo com a diferenciação geoagrológica, Cláudio Gonçalves dividiu em três sub-regiões
A) Sub-região conhecida por Bairros, ocupando a maior parte dos concelhos ao norte do Tejo, nomeadamente os de Vila Franca, Azambuja, Cartaxo, Rio Maior, Santarém, Alcanena, Torres Novas, Tomar e Abrantes. Os Bairros são formações argilo-calcárias e produzem famosos vinhos, nos quais se incluem os afamados vinhos tintos do Cartaxo e também os suaves e espirituosos vinhos de pasto desta enorme mancha calcária, que se espraia por tão larga zona
B) A segunda sub-região vitícola será a da Charneca e ocupa uma larga mancha do Terciário para sul do Tejo, compreendendo duas formações geológicas, o Pliocénico e o Miocénico Lacustre, formadas, sobretudo a primeira, por depósitos arenosos sobre estratos de areias cimentadas, saibro vermelho, caulino e greda, que retêm a humidade, o que permite a existência de um lençol friático a pequena profundidade, o que valoriza estes solos para a cultura da vinha»
Toda a planície arenosa que se estende ao longo dos terrenos aluvionais ao sul do Tejo, localizada na mancha pliocénica, se encontra coberta por enormes vinhedos, que formam as fazendas de Alpiarça e Almeirim, os foros de Benfica, Marinhais e Salvaterra e ainda os de Coruche e Benavente
Sobretudo, quando a filoxera devastou grande parte das vinhas dos Bairros, onde facilmente se propagava o terrível flagelo, se incrementou a implantação de vinhas nesta região das areias, então extenso matagal, até por se ter verificado que, nestes terrenos, não se propagava tão facilmente o mal
C) A terceira região vitícola é dos férteis campos marginais do Tejo, onde a pujança e a fertilidade das vinhas se alia à qualidade dos vinhos produzidos
Tem esta sub-região condições agrológicas excepcionais para a produção do vinho, desde os vinhos brancos de Vaiada, de Almeirim e de Alpiarça e dos campos da Chamusca (estes últimos poupados do arranque geral da lei pombalina)
Escreve Cláudio Gonçalves, referindo-se a esta sub-zona.
Quanto à vinha, temos de confessar que ela aproveita as excepcionais condições mesológicas desta sub-região A par de um clima propício, em que o sol luminoso incide fortemente sobre a planície, quando os cachos estão formados e em condições óptimas de amadurecimento, temos a fertilidade natural do solo e a existência de um lençol friático que se mantém sensivelmente à altura do nível hidrostático do no, permitindo que as águas sejam directa ou indirectamente utilizadas pela videira. Tais vantagens, que provocam invulgar pujança nos vinhedos e produções avultadas, aliadas muitas vezes à possibilidade de mecanização cultural, tornam o custo da produção vinícola desta região incomparavelmente mais reduzido.

Página 445

1 DE FEVEREIRO DE 1974 445

Calcula-se em cerca de 167 000 ha as terras de lezíria do Ribatejo, das quais pouco mais de 100 000 ha são defendidas das cheias por diques ou tapadões 45000 ha, aproximadamente, têm as vinhas do Ribatejo, e destas apenas 30% se encontram plantadas em terrenos de campo aluvionais, cerca de metade em cada margem do Tejo
Além do mais, é a cultura da vinha a única com possibilidade económica na maior parte das zonas afectadas pelas cheias do no, pois não só fixa a deposição dos nateiros, obstando ao assoreamento das terras adjacentes, como evita, ao mesmo tempo, a erosão.
Poucas zonas de vinha no continente português possuirão as condições do Ribatejo para uma modernização cultural da vinha, na introdução das mais avançadas técnicas de mecanização, dadas as circunstâncias, sobretudo, de as subzonas da charneca do campo serem planas e de terreno de fácil mobilização
Por outro lado, o volume das suas produções permite ao Ribatejo manter uma exportação de vinho bem dimensionada, podendo, portanto, atingir e conquistar mercados estrangeiros, como acontece há tantos séculos.
Mas, voltando ao conceito de zonas vinícolas tradicionais resultantes do n.º 3 da base n da proposta de lei em discussão, parece ser apenas a qualidade dos vinhos nelas produzidos que determinam a sua classificação.
Ora, a região do Ribatejo, neste longo historial das suas vinhas, produziu vinhos da melhor qualidade, que, no mercado nacional e nos mais exigentes mercados estrangeiros, atingiram sempre as melhores cotações e satisfizeram os gostos dos apreciadores mais requintados.
Quando a invasão da filoxera, a partir de 1862, devastou as vinhas da região do Douro, foram os vinhos licorosos do Ribatejo, que então estava incluído na província da Estremadura, que permitiram aos comerciantes de vinho do Porto manter a sua exportação.
Isso comprova uma exposição feita às Cortes em 1908 pela Associação Comercial do Porto, protestando contra a proibição de os licorosos do Sul poderem ser lotados com os vinhos generosos do Douro, evocando que anteriormente assim vinha sido feito «sem jamais dar lugar a reclamações», proibição esta feita no Governo de João Franco.
Os vinhos adamados do Ribatejo são exportados para a Alemanha, onde, pela sua alta qualidade, têm a maior aceitação, acrescentando a produção dos afamados vinhos do Reno.
Considerando a extraordinária qualidade dos vinhos produzidos por esta zona ribatejana, em 14 de Janeiro de 1933 o Decreto n.º 22 123 criou a marca «Estremadura» para os vinhos de pasto e licorosos produzidos nessa província, especialmente os destinados à exportação, província que então englobava o distrito de Santarém.
Esta marca ou designação de origem não consta que tenha sido revogada e tinha por fim dar garantia de origem e de genuinidade aos vinhos produzidos naquela província.
O Ribatejo, nas suas três sub-regiões referidas, possui extraordinários vinhos, não só de boa qualidade, mas que, pela tipicidade de alguns, nela podem _e devem surgir regiões demarcadas, tal como a região do Cartaxo, de algum tempo em organização, e outras, dentro do conceito que a proposta de lei refere.
Os vinhos produzidos, quer na zona do Campo, quer nas zonas do calcário e do pliocénio e miocénio, pelo seu boquet, ligeireza e perfume, podem comparar--se aos melhores produzidos na França, na Itália e na vizinha Espanha.
Nos concursos anuais promovidos pela Junta Nacional do Vinho denominados melhor vinhos são atribuídos prémios nacionais -taça Federação dos Vinicultores, menções honrosas e prémios para cada zona e classe estabelecidas.
De 1957 a 1972, isto é, em dezasseis anos, no Ribatejo foram distribuídos os seguintes prémios nacionais.

1957 - Adega Cooperativa de Almeirim, 3.º prémio, sendo o 1.º prémio desse ano atribuído a um vinicultor do Cartaxo, com vinho tinto.
1958 - O 1.º prémio foi atribuído a um vinicultor de Salvaterra de Magos, também com vinho tinto.
1959 - O 1 º prémio voltou a ser recebido por um vinicultor de Salvaterra de Magos.
1961 - O 1.º prémio foi novamente para um vinicultor de Salvaterra de Magos.
1962 - A Cooperativa da Chamusca recebeu o 2 º prémio, com vinho tinto.
1963 - À mesma Cooperativa da Chamusca foi atribuído o 1.º prémio, também com vinho tinto.
1965 - O 1º prémio de vinho branco foi para a Cooperativa do Cartaxo.
1966 - 0 1º prémio de vinho branco foi novamente para a Cooperativa da Chamusca e o 1.º prémio de vinho tinto foi atribuído a um vinicultor de Torres Novas.
1968 - A Cooperativa de Almeirim recebeu o 3.º prémio em vinho branco e o 1.º prémio em vinho tinto foi concedido ao mesmo vinicultor de Torres Novas.
1969 - O 1.º prémio de vinho tinto foi atribuído a um vinicultor de Almeirim.
1970 - O 1.º prémio de vinho tinto foi recebido por um vinicultor de Rio Maior e o 2.º prémio em vinho tinto pela Cooperativa de Alcanhões.
1971 - Foi contemplado com o 1 º prémio de vinho tinto um vinicultor de Almeirim
com o 3.º prémio, também de vinho tinto, a Cooperativa de Alcanhões.
1972 - Ainda não se conhecem todos os resultados e apenas se sabe que o 2.º prémio em vinho tinto coube novamente á Cooperativa de Alcanhões.
É interessante verificar que os extraordinários resultados alcançados pelos vinicultores do Ribatejo foram distribuídos, quer pelos que cultivam a vinha nos campos aluvionais, como pelos que a cultivam nas terras do Alto Ribatejo, nomeadamente nos concelhos de Torres Novas e Rio Maior. De notar também que as Cooperativas, quer do argilo-calcário, quer as do Campo, Cartaxo, Chamusca, Alcanhões, Benfica do Ribatejo, Almeirim, Vale do Sorraia e Tomar, receberam em todos os anos referidos menções honrosas, quer em vinhos tintos, quer em brancos.

Página 446

446 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

Do mesmo modo e nestes concursos, por zonas e classes, têm sido premiados anualmente com os 1.ºs prémios numerosos vinicultores de toda esta grande região vinícola ribatejana.
No 1 º Concurso Internacional do Vinho, realizado em Bucareste (Roménia), um conceituado lavrador do Ribatejo obteve uma medalha de ouro e dez medalhas às prata com os vinhos que apresentou naquele certame, realizado em Agosto de 1968.
Também em Bratislava (Checoslováquia), no 2.º Concurso Internacional do Vinho, o mesmo lavrador obteve uma extraordinária pontuação nos vinhos nele apresentados, recebendo uma medalha de ouro, três d: prata e três de bronze.
No 3 º Concurso Internacional do Vinho, realizado também em Bratislava em 1971, a mesma casa agrícola voltou a repetir uma esplêndida pontuação, trazendo para Portugal uma medalha de ouro, oito de prata' e uma menção honrosa.
Uma outra casa agrícola do Ribatejo, no concurso de vinhos em Budapeste, em 1964, recebeu uma medalha de prata e duas de bronze.
Este pequeno apontamento serve para demonstrar a nossa afirmação da reconhecida qualidade dos vinhos produzidos nesta zona tradicionalmente vinícola do Ribatejo e da possibilidade que a mesma tem de nela serem criadas regiões demarcadas que possam defender e melhorar os típicos vinhos nela existentes, que tanto êxito têm alcançado, quer nacional, quer internacionalmente.
Na proposta de lei que temos vindo a apreciar fica ao Governo a possibilidade de estabelecer os princípios a que deverão obedecer o licenciamento de novas plantações, bem como as reconstituições e transferências de vinhas, considerando-se prioritariamente as regiões demarcadas e as zonas vinícolas tradicionais. Nesse condicionamento estabelecem-se vários factores a ter em conta, como sejam a área total definida para cada região ou zona vinícola, a qualidade ou situação dos terrenos a utilizar, e as normas técnicas que se imponham.
Isto se determina na base III da proposta de lei, e com ela concordamos plenamente no que se refere a novas plantações.
Todavia, na reconstituição das vinhas, pensamos que a mesma não pode ficar dependente de prioridades ou de limitações, devendo ser permitida a reconstituição de todas as vinhas existentes desde que se encontrem devidamente cadastradas
Nem se poderá compreender que, ao pretender reconstituir-se uma vinha envelhecida, essa reconstituição fique dependente da limitação da área ou zona onde se encontra implantada, visto que ela faz necessariamente parte da área ocupada O mesmo se poderá dizer do terreno onde esta plantada, pois que, se não fosse apropriado, ela não existiria ali, devidamente legalizada Apenas a observação das normas técnicas podem e devem ser impostas, na reconstituição das vinhas, com vista a melhorai a sua qualidade
Estamos certos de que o Governo, ao regulamentar esta matéria, tomará em linha de conta os factos apontados e determinará, como é justo, a possibilidade de reconstituição de todas as vinhas existentes à data da publicação desta lei.
No que respeita às transferências, não deverá ser permitida para fora da região ou zona onde a mesma se encontre. Também aqui não deverão funcionar
prioridades que não têm sentido, mas poderão ser levadas em linha de conta as limitações impostas na referida base.
A presente proposta de lei dá ao Governo ampla liberdade de legislar, no que respeita às normas que hão-de reger o plantio das vinhas.
Além do que temos vindo a apreciar, também no que se refere á plantação de vinhas para produção de uvas de mesa, sumos e passas, actividade viveiristica, e ao agrupamento de vinhas previsto na base viu, se deveria concretizar melhor as disposições nelas contidas.
Tem sido extremamente abusiva a utilização do licenciamento para a implantação de pomares de videiras para produção de uvas de mesa, que tantas vezes são transformadas em vinho, aumentando assim a produção vinícola do País em quantidade e má qualidade.
Também deve haver o maior cuidado na disciplina a impor à actividade viveiristica, não apenas do aspecto de honestidade técnica quanto aos produtos comercializados, mas também nas exigências fitossanitárias que lhe devem ser impostas.
Aplaudimos a constituição da comissão prevista nos termos da base XI, a qual deve ter a mais ampla representatividade de todos os sectores da vinicultura, de forma que, da experiência de uns, aliada à técnica de outros, possa contribuir para uma boa e justa regulamentação de ião importante sector da vida nacional.
Finalmente, discordamos da legalização das vinhas não licenciadas e existentes à data da entrada em vigor da presente lei, através de uma taxa variável entre 1$ e 5$, em função da data da plantação
É do conhecimento geral a abusiva plantação de vinha que se tem verificado nos últimos anos, com valorizações de terreno na ordem dos 300 %, e, portanto, uma taxa tão diminuta e ainda por cima variável representa um prémio à ilegalidade e traduz-se num estímulo a futuras transgressões.
Deveria, pois, estabelecer-se uma taxa fixa, mais elevada, e limitar as legalizações a vinhas cuja enxertia seja realizada no corrente ano, uma vez que se nos afigura ser imoral que se plantem vinhas depois de conhecido o texto desta proposta de lei, para serem legalizadas, mediante o pagamento das diminutas taxas referidas, e com manifesto prejuízo daqueles que, cumpridores das leis, se têm coibido de efectuar quaisquer plantações.
Depois de um notável parecer da Câmara Corporativa, o Governo apresentou à Assembleia esta proposta de lei, manifestando a intenção de apenas estabelecer aos princípios básicos, deixando para disposições regulamentares a estabelecer de acordo com a política que vier a ser definida a consideração dos aspectos de pormenor, que terão de ajustar-se à evolução da técnica e da conjuntura económica» Isto se lê no preâmbulo da proposta de lei.
Defendemos o princípio de que, dentro do novo condicionamento, deve ser autorizado o plantio da vinha em todas is regiões do território nacional, metropolitano e insular, onde as condições ecológicas aconselhem a sua implantação, sem prejuízo, contudo, das regiões ou zonas demarcadas ou tradicionais e dentro do condicionalismo imposto na base III, e com a preocupação dominante, expressa no final do preâmbulo da proposta de lei ao equilíbrio entre o potencial da produção vinícola obtida nas melhores condições técnicas e económicas, as perspectivas do seu escoa-

Página 447

1 DE FEVEREIRO DE 1974 447

mento e a obediência a uma política de qualidade que deve nortear a viticultura nacional».

Fez-se ouvir uma voz do Ribatejo, de alguém que não é vinicultor nessa província, mas que recebeu um mandato indeclinável de trazer aqui, com absoluta independência, as preocupações da lavoura vitivinícola ribatejana, perante uma proposta de lei, cujas bases de forma tão indefinida hão-de servir para formular uma regulamentação de condicionamento do plantio da vinha, que tanta importância tem na sua vida económica, social c política.

Confiadamente esperamos que, da discussão da pró posta de lei nesta Câmara e do trabalho da respectiva comissão, hão-de resultar algumas válidas alterações nas bases apresentadas, de forma a torná-las mais concretas, sobretudo em relação àqueles que aqui referimos. Acreditamos também que o Governo terá o maior cuidado e procederá com justiça e ponderação na regulamentação desta importante matéria do condicionamento do plantio da vinha, autorizado pelas bases desta proposta de lei, e por isso lhe damos a nossa aprovação na generalidade

Vozes: — Muito bem!

O Sr Camilo de Freitas: — Sr Presidente, Srs. Deputados: Ao pronunciar as minhas primeiras palavras nesta Câmara, não deve admirar que as tenha escrito ponderando com extremos de atenção. Particularmente estas mais primeiras que exigiria exprimissem com autêntica sinceridade os cumprimentos que devo ao nosso muito ilustre Presidente.

O lapso de tempo que decorreu desde o início dos trabalhos parlamentares já me deu sobradas oportunidades para apreciar a dignidade, a alta qualidade do exercício da função em que honrosamente foi eleito, o geral elogio que recolhe, o elevado prestígio de que goza. Daí que não possa deixar de congratular-me pelo facto de estas minhas palavras de cumprimento e de enaltecimento se sintam libertas de toda a formalidade, sejam vendicamente palavras de quem quer exprimir admiração, de quem se sente honrado, como membro desta Câmara, pelo homem que a preside

Quero também cumprimentar desta tribuna os Ex.mos Colegas e a Imprensa aqui presente, a quem saúdo cordialmente e a quem ofereço os meus préstimos.

Sr. Presidente: Procede-se- à discussão da proposta de lei que visa formular um novo regimen de condicionamento do plantio da vinha Em meu parecer, a proposta de lei, ainda que signifique um progresso positivo no sentido de uma política que a conjuntura actual tornou imperativa, que desde há anos vem sendo entretecida e se insira na linha programática que se propõe no IV Plano de Fomento, não procede a dar-nos confiança de que estamos no dealbar de reformas de vulto.

Na verdade, não consigo conceber uma política agrária adequada aos condicionalismos actuais e que consiga em curto prazo sucesso evidente, se não revela um dinamismo que induza modificações profundas. Vemo-las, as modificações de vulto, supostas no relatório do IV Plano de Fomento, como objectivos a serem atingidos, lenta, dificilmente Mas há objectivos, há interesses, que importa contemplar com muita brevidade, porque são fundamentais são os tra-

balhadores da terra que necessitam, urgentemente, de ser equiparados aos restantes trabalhadores, percebendo idênticas remunerações, semelhante segurança social, igual consideração; são os consumidores, que somos todos nós, que necessitam de ter assegurado o abastecimento de produtos alimentares em condições de qualidade e de quantidade e de justo preço, é a Nação, que necessita de uma agricultura capaz de contribuir para a expansão do produto nacional com uma contribuição que seja válida e a dignifique no confronto com as outras actividades. Que a aparente e flagrante inferioridade não o é por falta de esforço e de espírito de serviço dos homens do campo. Só pela inadequação das estruturas

Ora, a consecução dos três objectivos fundamentais por um processo activo e rápido não se compadece com as orientações que tradicionalmente se têm aplicado à lavoura

Já tenho ouvido, como interpretação desta situação, que a agricultura assim desprestigiada, empobrecida, relegada ao sector humano menos diferenciado culturalmente, sofria a evolução necessária para que uma reconversão válida se dê em condições menos dolorosas e quase espontânea

Há gente a mais a querer viver da terra e da agricultura, os processos que utilizam e a que aderem invencivelmente são de produtividade reduzida, a preparação profissional quer dos empresários, quer dos braços de trabalho, o menos que se pode dizer, é insuficiente; como consequência óbvia, os investimentos, a investigação aplicada, as infra-estruturas de apoio à produção ou não existem, ou são apenas apropriadas às circunstâncias

Reportando-nos à problemática que ora nos reúne, onde possuímos os técnicos em número suficiente e capacidade, preparação e experiência necessárias para darem a conveniente assistência ao programa de vitivinicultura que se subentende nesta proposta de lei?

O lavrador que pretenda videiras de qualidade e características selectivas para o seu terreno, sob encargos aceitáveis, onde as procura? Onde pode encontrar, com celeridade e competência, orientação para analisar e corrigir os solos, para tratamentos, para as múltiplas dificuldades técnicas que numa exploração que busque rentabilidade de tipo industrial constantemente surgem?

Onde pode encontrar pessoal reciclado para actuações específicas que são básicas para um perfeito aproveitamento das potencialidades da terra que lhe pertence fazer produzir? Onde encontrar garantia de que trabalhando neste sector, quer como empresário, quer como trabalhador braçal, recebe compensação nunca inferior à dos restantes trabalhadores e independentemente das contingências do tempo ou das qualidades das colheitas?

Não, não me ficam dúvidas da bondade desta proposta de lei, como da excepcional classe do parecer expendido pela Câmara Corporativa, como não tenho de a aprovar na generalidade Nem me ficam dúvidas de que dos programas de acção da Secretaria de Estado da Agricultura se não enformem directrizes que visam atacar os condicionalismos apontados, que prejudicam a nossa agricultura.

O que pretendo com esta minha intervenção, nuclearmente, é alertar para a necessidade de uma audácia maior, que elimine dúvidas de que se jogue

Página 448

448 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 21

nessa maquiavélica táctica de deixar arrumar a lavoura para que depois seja barato e fácil reconvertê-la Modificar a situação é urgente e é necessário Talvez não seja necessária tanta gente e talvez seja Questão de a diferenciar nas suas funções É necessário que o produto bruto por activo agrícola seja igual ao de um activo não agrícola - e que se o não for o seja, o rendimento disponível pelo agente agrícola que trabalha É necessário que a preparação profissional, desde o investigador ao mais humilde operário da terra, seja verdadeiramente adequada às circunstâncias É necessário muita legislação, novas estruturas jurídicas, um propósito deliberado de, sem eliminar a liberdade da exploração familiar ou do cultivador individualista ou dos cultivadores que se sacrificam nas áreas difíceis, conseguir em breve prazo o objectivo de uma predominância de explorações com dimensão, gestão e rentabilidade convenientes
Como se sugere no IV Plano de Fomento, através de empresas públicas, das fórmulas de associativismo quer da agricultura de grupo, quer de formas de gestão de património fundiário, quer de formas empresariais jogando com esquemas de arrendamento adaptados às circunstâncias, parece possível e conveniente que estes modelos possam ser desencadeados e conduzidos a obter êxito com máxima brevidade.
Uma estruturação geral, por todos desejada, creio-o bem, é urgente, é necessária e é possível Tanto como a reestruturação do regime de condicionamento do plantio da vinha. Mas a criação de condições para o aumento qualitativo e quantitativo do sector terciário das gentes da agricultura, em meu parecer, sobreleva todas as restantes necessidades As mais belas ideias perdem-se se não houver homens que as realizem.
Se as nossas teorizações puderem ser aplicadas ao terreno por homens sensatos e competentes, apoiados por estruturas funcionais, eu posso crer que poderemos decidir com o sentido posto numa viticultura séria, competitiva no concerto dos mais produtores, com potencialidades que ultrapassarão as nossas previsões.
No caso contrário já o grande capital vai tomando posições para realizar com bons lucros o que a agricultura imaginou mas não soube ou não pôde conseguir.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Gonçalves de Abreu: - Sr. Presidente e Srs Deputados Da apreciação da proposta de lei alusiva ao condicionamento do plantio da vinha, que está a ser apreciada nesta Assembleia, e a que distintos parlamentares deram já o seu contributo, valioso e esclarecido, ficamos todos - assim o oremos - mais enriquecidos de saber e mais esclarecidos também acerca do valor que a cultura da vinha representa na economia do povo português Diploma de inegável interesse para a lavoura nacional, da qual vive uma boa parte da sua população, é evidente o interesse de que se reveste o seu conteúdo e o esforço desta Câmara em busca de soluções que melhor possam servir a economia agrária e com ela o interesse nacional.
Daí que também nós, embora sem a experiência e o saber que já aqui foram revelados pelos ilustres intervenientes, que tão bem trataram o problema e tão acertadamente apontaram soluções, ousemos, com a permissão de V. Exª, Sr Presidente, intervir no apreço à referida proposta de lei, única e simplesmente com o objectivo de trazer alguma contribuição, embora modesta, para que o diploma em apreço, se vier a ser aprovado - como se impõe -, possa contemplar também na sua finalidade e objectivos uma das regiões expressivas na produção de vinhos de marca deste país - a região do vale do Tâmega.
Com efeito, tradicionalmente produtora dos apreciados vinhos verdes, cuja região demarcada se estende do Minho ao Douro Litoral, tem esta região, ao longo do tempo, investido todo o seu trabalho e devoção à cultura do vinho numa luta árdua e penosa para sobreviver. Terrenos cuja vocação é a cultura da vinha e a floresta, sem outras possibilidades de granjeio, ou perspectivas de rendimento, para além disso, já pela natureza do terreno, alcantilado e dividido em pequenas glebas, já pelas suas condições climáticas pouco aliciantes a outras culturas, é na produção vinhateira, especialmente, que põe todas as suas esperanças e será por ela também que, estóica e corajosamente, se propõe continuar uma vida de trabalho na difícil e verde profissão que lhe legaram gerações que fizeram aquelas terras É evidente, por isso, o interesse de que se reveste o diploma referido para aquela extensa região e a expectativa que se criou à sua volta como provável fonte dinamizadora da cultura do vinho, do qual dependem as suas gentes e uma boa parte da sua economia.
E, da análise que sumariamente fizemos a essa actividade e ao espírito e à letra do diploma em discussão, ficou-nos a ideia de que o documento em causa se ajusta perfeitamente ao interesse de quantos, pugnando pela defesa de qualidade das vinhas da região, vêem nas medidas que o legislador propõe na referida proposta de lei, os meios de legitimar as suas aspirações- defesa da qualidade
Na verdade, tudo quanto sirva para disciplinar a cultura da vinha, quer na exigência de qualidade das cepas, da exclusão total e completa do produtor directo», da fiscalização da própria preparação do vinho, em suma, da melhoria do produto, merece o nosso aplauso e o aplauso daquelas gentes que generosamente se devotam ao amanho da terra e fazem do seu trabalho uma profissão de fé.
Dentro deste pensamento e como acto de justiça a exaltar o merecimento do trabalho apresentado, damos-lhe o nosso inteiro aplauso na generalidade, sem prejuízo, todavia, de alguns reparos que nos sugeriu a sua apreciação, e desejaríamos trazer ao alto apreço de V. Ex.ª, Sr Presidente, e desta Assembleia.
Na verdade, uma grande parte das gentes daquele vale ficaram, ao longo destes sete anos, indecisos se haviam ou não de fazer plantações As vinhas foram-se definhando, a produção manteve-se no seu nível normal e quiçá, em certos casos, abaixo desse nível. Uns quantos, mais ousados e confiados na clemência da Administração, foram plantando ou renovando os seus vinhedos e, só por isso, a produção não baixou desastrosamente Já hoje, com falta de vinho para a exportação e até para o mercado interno, poderemos facilmente aferir do que se estaria a pás-

Página 449

1 DE FEVEREIRO DE 1974 449

sar se, de braços cruzados ao longo deste tempo, ninguém tivesse cuidado da renovação das vinhas e da sua ampliação. Se isso tivesse acontecido, a estas horas não haveria vinho disponível para o mercado interno, nem para exportação, e a nossa lavoura estaria ainda mais empobrecida e desencorajada Tecer um hino de louvor àqueles que, ignorando a lei ou fingindo ignorá-la, fizeram plantações ilegais, não é o nosso propósito, evidentemente Mas reconhecer que, mercê dessas plantações, o nível de produção se manteve e equilibrou um pouco melhor o balanço negativo dos lavradores, isso não se pode negar também.
Como punição pela infracção cometida, que afinal a ninguém prejudicou, antes pelo contrário, beneficiou a todos, não se nos afigura razoável que, para manter as cepas de plantação clandestina, se tenha de pagar de IS a 5$ por pé, pois tal contribuição será superior -assim nos parece- às possibilidades da maioria dos lavradores que têm a produção do vinho como a sua única fonte de rendimento, já que naquelas terras não se cultiva praticamente outra coisa.
Por outro lado, tal como estabelece a base III no seu n º 1 do citado diploma, também aqui, a taxa de $50 por pé de videira a plantar de novo, reconstituída ou transferida (depreende-se que «reconstituída» significa substituição daquelas que vão morrendo por velhice ou doença, e «transferida» a mudança para local mais apropriado, que em qualquer dos casos não significa aumento de produção), tal critério deveria ser ajustado aos reais interesses da lavoura, eliminando-se tal sobretaxa, pois a lavoura, tal como a vivemos e conhecemos, não alicia ninguém a trabalhá-la e a continuá-la.
São estas, Sr Presidente, as considerações que respeitosamente formulamos no apreço à «proposta de regime de plantio da vinha» e ficaríamos mais tranquilos e confiantes se elas puderem merecer a consideração desta Assembleia, como contribuição à viticultura daquela região que bem precisa, também, e merece toda a ajuda que o Governo lhe possa dispensar.

Vozes: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Srs Deputados, vou encerrar a na generalidade da proposta de lei sobre o regime de condicionamento do plantio da vinha Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 30 minutos

A próxima sessão será amanhã à hora regimental, tendo como ordem do dia a continuação da discussão.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão

Álvaro Filipe Barreto de Lara.
Aníbal de Oliveira.
António de Sousa Vadre Castelino e Alvim
Augusto Domingues Correia
Camilo Lopes de Freitas
Daniel Mana Vieira Barbosa.
Delfim Linhares de Andrade.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Fernando Guilherme Aguiar Branco da Silva Neves.
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Souza de Macedo Mesquita.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Paulo Dupuich Pinto de Castelo Branco.
José de Vargas dos Santos Pecegueiro.
Luís Augusto Nest Arnaut Pombeiro.
Maria Teresa de Almeida Rosa Carcomo Lobo
Mário Hofle de Araújo Moreira Ricardo Horta Júnior.
Sebastião Alves.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Tito Manuel Jeque.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
Victor Manuel Pires de Aguiar e Silva.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Álvaro José Rodrigues de Carvalho.
Delfino José Rodrigues Ribeiro.
Fernando de Sá Viana Rebelo
Henrique Veiga de Macedo.
Humberto Cardoso de Carvalho.
João António Teixeira Canedo
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira
João Ruíz de Almeida Garrett
Joffre Pereira dos Santos van Dunem
José Fernando Nunes Barata
José da Silva
Júlio Dias das Neves.
Luiz Mana Loureiro da Cruz e Silva.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Vasco Mana de Pereira Pinto Costa Ramos.

Página 450

IMPRENSA NAOCNAL CASA DA MOEDA

PREÇO DESTE NÚMERO 6$40

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×