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I Série - Número 20 Sexta-feira, 16 de Dezembro de 1977
DIÁRIO Da Assembleia da República
I LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1977-1978)
Presidente: Exmo. Sr. António Duarte Arnaut
REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE DEZEMBRO DE 1977
Secretários: Exmos. Srs. Alberto Augusto Martins da Silva Andrade
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antas da ordem do dia - Deu-se conta do expediente, da apresentação da proposta de lei n.º 142/I, que autoriza o Governo a emitir um empréstimo interno até à importância lotai de 40 milhões de contos, do pedido do PSD de sujeição a ratificação (Ratificação nº 25/I) do Decreto-Lei n.º 478/77, que criou no Ministério da Educação e Investigação Cientifica a Direcção-Geral da Extensão Educativa, e de vários requerimentos.
O Sr. Deputado Fernando Roriz (PSD), relativamente a um seu protesto, na sessão anterior, contra uma noticia da Radiodifusão Portuguesa, deu um esclarecimento à Assembleia, a que se seguiram intervenções para dar esclarecimentos e fazer protestos ou contraprotestos, além do orador, dos Srs. Deputados Igrejas Caeiro (PSi. Raúl Rego (PS), José Luis Nunes (PS), Moura Guedes (PSD) e Helena Roseta (PSD).
O Sr. Deputado Aires Rodrigues (Indep) retirou, em nome dos Deputados independentes, o voto de protesto apresentado na sessão anterior contra o decreto-lei que instituiu o ensino superior de curta duração, em virtude da inclusão desta matéria na ordem do dia.
O Sr. Deputado Custódio Gingão (PCP) teceu_ várias considerações sobre as visitas dos nossos emigrantes ao País na quadra natalícia, reclamando medidas para a superação das dificuldades que se levantam neste campo.
Ordem do dia.- Na primeira parte, foram autorizados vários Srs. Deputados a prestar declarações em tribunal e nos Serviços de Coordenação da Extinção da PIDE/DGS e LP.
A Assembleia deferiu o pedido de concessão de urgência para a discussão dá proposta de lei n.º 142/I atrás referida.
Na segunda parte, concluiu-se a discussão na generalidade da ratificação do Decreto-Lei n.º 427-B/77, que cria o ensino superior de curta duração, com intervenções dos Srs. Deputados Zita Seabra f PCP), Nuno Abecassis (CDS). Amélia de Azevedo (PSD), Jorge Lemos (PCP) e Acácio Barreiros (UDP).
Usaram também da palavra para fazer pedidos de esclarecimento ou protesto e dar explicações os Srs. Deputados Teresa Ambrósio (PS), Pedro Roseta (PSD), Nuno Abecassis (CDS), Zita Seabra (PCP). Dieter Dellinger (PS) e Mata de Cáceres (PS), a alguns dos quais os oradores responderam.
A ratificação do decreto-lei em referência foi aprovada na generalidade, seguindo-se declarações de voto dos Srs. Deputados Manuel Gusmão (PCP), Gonçalves Sapinho (PSD), José Leitão (PS), Nuno Abecassis (CDS) e Acácio Barreiros (UDP) - que motivou um esclarecimento e protestos do Sr. Deputado Nuno Abecassis (CDS), a um dos quais o orador respondeu -, tendo baixado à comissão competente, a requerimento do PSD, para discussão e votação na especilidade
Por último foi aprovado o Orçamento da Assembleia da República.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Augusto Martins cia Silva Andrade.
Alberto Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Amadeu da Silva Cruz.
António Barros idos Santos.
António Cândido Macedo.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca,
António José Pinheiro Silva.
António José Sanches Esteves.
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Armando dias Santos Lapas.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Benjamim Nunes Leitão de Carvalho.
Carlos Caridoso Lage.
Carlos Jorge Ramalho dos Santos Barreira.
Carlos Manuel da Costa Mareara.
Delmiro Manuel de Sousa Carreira.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Fernando Abel Simões.
Fernando Gomes Vasco.
Ferroando Reis Luís.
Francisco António Marcos Barracosa.
Francisco de Assis de Mendonça Lino Neto.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Herculano Rodrigues Pires.
Jaime José Matos da Gama.
Jerónimo da Silva Pereira.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
José Gomes Fernandes.
José Luís do Amaral Nunes.
José Mania Parente Mendes Godinho.
José Maximiano de Albuquerque de Almeida Leitão.
José de Santos Francisco Vidal.
Ludovina das Dores Rosado.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís José Godinho Cid.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.
Manuel Augusto de Jesus Lima.
Manuel do Carmo Mendes.
Manuel João Cristino.
Manuel Joaquim Paiva Peneira Pines.
Manuel Lencastre Menezes de Sousa Figueiredo.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria Alzira Costa de Castro Cardoso Lemos.
Maria Margarida Ramos de Carvalho.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Paulo do Vale Valadares.
Sérgio Augusto Nunes Simões.
Victor Manuel Ribeiro Fernandes de Almeida.
Partido Socialista Democrata (PPD/PSD)
Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Álvaro Barroso Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amantino Marques Pereira de Lemos.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Américo de Sequeira.
António Manuel dos Santos Vasconcelos.
António das Neves Costa.
António Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António José dos Santos Moreira da Silva.
Arcanjo Nunes Luís.
Armando António Correia.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Eduardo José Vieira.
Fernando José Sequeira Roriz.
Francisco Barbosa da Costa.
Francisco Braga Barroso.
Henrique Manuel de Pontes Leça.
João António Martelo de Oliveira.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
João Lucílio Caceia Leitão.
João Manuel Ferreira.
João Vasco Paiva.
José Adriano Gago Vitorino.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Joaquim Lima Monteiro Andrade.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Rui Sousa Fernandes.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Júlio Maria Alves da Silva.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Manuel Henrique Pires Fontoura.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Manuel Valentim Pereira Vilar.
Manuel Sérgio Vila Lobos de Meneses.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Gil Pires.
Olívio da Silva França.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Victor Hugo Mendes dos Santos.
Centro Democrático Social (CDS)
Alcino Cardoso.
Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
Ângelo Alberto Ribas da Silva Vieira.
António Jacinto Martins Canaverde.
Carlos Martins Robalo.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco Manuel Farromba Vilela.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.
João Carlos Filomeno Malho da Fonseca.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José Magalhães Ferreira Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes.
José Cunha Simões.
José Luís Rebocho de Albuquerque Christo.
José Manuel Macedo Pereira.
José Vicente de Jesus do Carvalho Cardoso.
Luís Esteves Ramires.
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Maria José Paulo Sampaio.
Rui Fausto Fernandes Marrana.
Vítor Afonso Pinto da Cruz.
Vítor António Augusto Nunes de Sá Machado.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Matos Zuzarte.
António Marques Pedrosa.
Cândido de Matos Gago.
Carlos Hahnemann Saavedra de Aboim Inglês.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
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Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Joaquim S. Rocha Felgueiras.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Paiva Jara
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Comes.
Manuel Gonçalves.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Manuel Pereira Franco
Manuel do Rosário Moita.
icolau de Assunção Madeira Dias Ferreira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Raul Luís Rodrigues.
Severiano Pedro Falcão.
União Democrática Popular (UDP)
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Independentes
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António Poppe Lopes Cardoso.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 160 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - O período de antes da ordem do dia termina às 16 horas e 25 minutos.
Peço a atenção dos Srs. Deputados para a leitura do expediente.
O Sr. Secretário. (Alberto Andrade): - Deu entrada na Mesa um oficio da Assembleia de Freguesia de Odivelas dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que junto remete, para conhecimento deste, uma moção aprovada por maioria em sessão da Assembleia de Freguesia de Odivelas, realizada no passado dia 3 do corrente mês, que í a seguinte:
Moção
A Assembleia de Freguesia de Odivelas, reunida em sessão ordinária de 3 de Dezembro de 1977, e considerando:
Que o terrorismo fascista aumenta consideravelmente sob a maior impunidade, face aos princípios definidos na Constituição;
Que a manifestação realizada no passado dia 1 de Dezembro em Lisboa é a prova cabal de que as liberdades conquistadas em 25 de Abril, bem como os órgãos democráticos legitimamente constituídos e a pessoa do Presidente da República, garante da própria democracia, foram postos em causa por grupos neonazis a coberto das forçais reaccionárias sedentas do Poder;
Vem manifestar o seu mais veemente repúdio pela forma claramente desestabilizadora de que se revestem tais manifestações e exigir dos Órgãos de Soberania medidas concretas e imediatas que ponham cobro a iniciativas desta natureza, fazendo assim com que se cumpra a Constituição da- República Portuguesa.
Deu também entrada na Mesa um ofício da Assembleia de Freguesia de S. João (4.º Bairro de Lisboa), com a data de 13 de Dezembro de 1977, do seguinte teor:
Ofício
Exmos. Senhores: Tendo-se efectuado a Assembleia de Freguesia de S. João no dia 29 de Novembro de 1977, nas instalações da respectiva Junta, foi aprovada a moção que a seguir se transcreve:
Considerando que o direito à habitação é um direito humano natural e (imprescritível, que esse direito se encontra consagrado pela Constituição da República Portuguesa, lei fundamentai a que devem subordinar-se todas as leis regulamentadoras;
Considerando que presentemente se encontram em risco de serem atirados à rua milhares de portugueses que após o 25 d(c) Abril de 1974 ocuparam, só na zona de Lisboa, com legitimidade revolucionária, cerca de quinze mil habitações que se encontravam devolutas, muitas delas há dezenas de anos;
Considerando que não basta que o prazo de legalização das ocupações tenha sido prorrogado até ao fim do ano corrente e que após este prazo a vida de milhares e milhares de pessoas, de crianças a velhos ficará do novo dependente da vontade de senhorios apoiados num aparelho judicial que os favorecem.
Considerando que os privilégios de uma minoria não podem prevalecer sobre os interesses da maioria da Nação;
A Assembleia de Freguesia de S. João toma a resolução de propor aos Órgãos de Soberania que seja proclamada uma amnistia para todas as ocupações verificadas até esta data e que seja promulgada nova legislação que permita a regularização, por via judicial, dessas ocupações e repare quaisquer abusos ou injustiças que porventura tenham sido cometidas em algumas delas.
Com os mais sinceros e cordiais cumprimentos - O Presidente da Assembleia da Freguesia de S. João, Mário Rodrigues da Silva.
Da Assembleia de Freguesia dos Prazeres foi também enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República o seguinte oficio:
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Ofício
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:
Excelência
Para conhecimento de Vossa Excelência e fins que tiver por convenientes, abaixo se transcreve o teor de uma moção, aprovada por unanimidade petos membros quo compõem esta Assembleia de Freguesia, reunidos em sessão pública, no dia 30 die Novembro de 1977:
Moção
Considerando que:
a) A Junta de Freguesia não teve, durante este ano, conhecimento exacto das verbas de que viria a dispor;
b) Este facto prejudica o funcionamento e autonomia da mesma;
A Assembleia de- Freguesia dos Prazeres, reunida em sessão pública no dia 30 de Novembro de 1977, desde que:
1 Na Assembleia da República seja aprovado, o mais depressa possível, o diploma que consagra sobre as finanças locais;
2 Que esta moção seja enviada ao Exmo. Sr Presidente da Assembleia da República e lida publicamente no exercício dia mesma.
Sem mais, permita que em nome desta Assembleia de Freguesia apresente a V. Ex.ª os mais respeitosos cumprimentos.
O Presidente da Assembleia de Freguesia dos Prazeres, João Jesus Simões.
Da Assembleia Municipal de Cabeceiras de Basto foi igualmente enviado um ofício do seguinte teor:
Na reunião da Assembleia Municipal de Cabeceiras de Basto, que teve lugar no dia 3 do corrente, foram aprovados os seguintes votos:
Um de congratulação pela entrada em vigor da Leu ,n.º 79/77;
Um de solicitação a Vossa Excelência pana que seja votado o regime jurídico das finanças tocais, e,
Um de protesto pela votação na Assembleia da República da lei que altera as disposições do artigo 109.º da Lei n.º 79/77.
Para os devidos efeitos e para dar cumprimento às propostas aprovadas, junto envio a Vossa Excelência fotocópias dos documentos (respectivos.
Com os melhores cumprimentos.
O Presidente da Assembleia Municipal, (ilegível).
Da Assembleia Municipal de Évora foi também enviado um ofício que traz em anexo a seguinte moção de protesto, aprovada por unanimidade na sua sessão ordinária de 1 de Dezembro de 1977:
A Assembleia Municipal de Évora, reunida em sessão ordinária no dia 1 de Dezembro de 1977, protesta junto ida Assembleia da República pela falta de elaboração e aprovação da lei das finanças locais, agravada ainda recentemente por mãos um adiamento que esta Assembleia considera Inadmissível na medida em que a falta de tal lei esvazia na sua maior parte o poder autárquico de toda a capacidade de decisão e possibilidades de actuação e constitui um fenómeno centralista e centralizador contrário aos interesses das populações o à própria Constituição da República.
O texto da presente moção deverá ser enviado ao Governo Central, à Presidência da República, ao Conselho da Revolução, além da própria Assembleia da República a quem é especificamente dirigido
Évora, 5 de Dezembro de 1977.
Um outro ofício da Assembleia Municipal da Marinha Grande tem o seguinte texto:
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:
Esta Assembleia Municipal, reunida em sessão de 28 de Novembro, aprovou por unanimidade a moção de abaixo transcrevo na íntegra e paira a qual chamo a melhor atenção de Vossa Excelência:
Moção
A Assembleia Municipal de Marinha Grande expressa publicamente o seu repúdio pelas manifestações fascistas dos dias 5 e 19 de Novembro na cidade do Ponto, considerando-as factores de destabilização da vida política portuguesa.
De igual modo expressa o seu repúdio pela manifestação fascista convocada para o de 1 de Dezembro para a cidade de Lisboa.
Os atentados bombistas, arma das forças reaccionárias, merecem também a mossa repulsa e veemente reprovação, peto que se exige que os tribunais julguem com celeridade e severidade todos estes atentados à nossa democracia, com base nas normais constitucionais.
Marinha Grande, 28 de Novembro die 1977.
Com os melhores cumprimentos. Marinha Grande, 2 de Dezembro de 1977. - O Presidente da Assembleia Municipal, (ilegível).
Ainda dai Assembleia Municipal da Marinha Grande, um ofício nos seguintes termos:
Exmo. Sr. Presidente dia Assembleia da República:
Esta Assembleia Municipal, reunida em sessão de 28 de Novembro próximo passado, aprovou por unanimidade a moção que abaixo transcre-
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vo na íntegra e para a qual me permito chamar a atenção de Vossa Excelência:
Moção
A Assembleia Municipal da Marinha Cirande apela ao Governo e à Assembleia da República para que rapidamente seja aprovada e publicada d Lei sobre as finanças das autarquias locais.
Só através de aprovação e publicação desta lei será possível, às autarquias locais elaborar conscientemente os seus planos e orçamentos. Estado sujeitas, como estão, a comparticipações que nunca; sabem quando lhes são dadas, isso não é possível.
Com os meus respeitosos cumprimentos.
Marinha Grande, 2 de Dezembro de 1977. - O Presidente da Assembleia Municipal, (ilegível).
Ofício da Assembleia Municipal de Rico Maior, dizendo o seguinte:
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:
Moção da repúdio
Cumprindo um decisão da Assembleia Municipal, tomada ontem no período de antes da ordem do dia, venho remeter a Vossa Excelência, para que dela dê conhecimento aos Srs. Deputados, uma moção de repúdio pelos actos de terrorismo praticados em Rio Maior, no dia 25 de Novembro findo, bem como acções de agressão de que (foi vítima um dos membros desta Assembleia.
A moção foi aprovada, por unanimidade, com acto de contraprova.
Reiterando os meus cumppimentos.
O Presidente da Assembleia Municipal, Júlio Carreira Pereira de Almeida.
Da Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira,
contendo a seguinte moção:
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República.
Moção
A Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira, reunida em sessão extraordinária no dia 30 de Novembro de 1977, deliberou aprovar por unanimidade e aclamação a seguinte moção:
As manifestações fascistas dos dias 5, 19 e 25 de Novembro, reflexo directo da ofensiva reaccionária, provaram ser justas as preocupações das forças e órgãos democráticos, que a elas se opuseram.
A Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira, ao manifestar o seu firme repúdio por uma das referidas manifestações e ao exigir que fossem tornadas medidas pelos órgãos de
Poder competentes, solidarizou-se com as legítimas preocupações que os elegeu.
O povo português não pode estar sujeito a que se permita que forças saudosistas continuem a promover iniciativas contrárias à Constituição da República, que grupos de arruaceiros continuem a destruir à boa maneira fascista sedes de partidos políticos, livrarias, outros bens colectivos e individuais e que se esfaqueiem e persigam pessoas ligadas a partidos ou organizações democráticas.
O povo português não pode estar sujeito, nem permitir, que o Hino Nacional seja cantado e ao mesmo 'tempo acompanhado pela saudação nazi.
Estas iniciativas têm contado com a adesão mais ou menos velada de forças políticas e organizações que têm tentado a desestabilização, a vários níveis, para assim alcançarem objectivos já largamente repudiados pela maioria do povo português e que a Constituição consagra.
Estando de novo marcada para amanhã, dia 1 de Dezembro, nova manifestação em Lisboa, não pode a Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira deixar de voltar a exigir dos órgãos do Poder medidas enérgicas contra aqueles que tudo fazem para que o nosso povo volte de novo a estar sujeito ao jugo do fascismo.
Como representantes da população de um concelho que sucessivamente revelou a sua firme disposição de defender a legalidade democrática, é dever desta Assembleia condenar vivamente tais iniciativas.
O Presidente da Assembleia, Fernando Gomes Vaz.
E finalmente um outro ofício da Câmara Municipal da Lourinhã com o seguinte texto:
Sr. Presidente da Assembleia da República: Excelência:
A Câmara Municipal da Lourinhã, em cumprimento do deliberado pela Assembleia Municipal deste concelho, vem remeter a Vossa Excelência cópia do voto aprovado na reunião daquela Assembleia, realizada em 30 do mês findo, acerca da aprovação pela Assembleia da República do diploma que revoga o artigo 79/77 de 25 de Outubro, que retira às autarquias locais a administração dos baldios
Com os meus respeitosos cumprimentos.
Lourinhã, 12 de Dezembro de 1977. - O Presidente da Câmara, José Máximo do Costa.
Deu-se conta de mais o seguinte expediente
Telegramas
Telegramas de inteiro apoio ao documento apresentado aos grupos parlamentares em 15 de Novembro pelos Sindicatos dos Engenheiros Técnicos, Associação Profissional Engenheiros Técnicos Por-
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tugueses (Zona Norte), pela Associação Portuguesa de Contabilistas e pelo Sindicato dos Oficiais Maquinistas da Marinha Mercante, quanto ao diploma que cria o Ensino Superior Curto (Decreto-Lei n.º 427-B/77), expedidos por Artur Varzielas Henriques Correia (do Porto), Áureo Manuel Silva Gonçalves (do Porto), Diamantino Figueiredo (de Leça da Palmeira), de Fernando Santos (da Póvoa de Varzim), de Francisco Camarinha de Barros, (do Porto), de Gomes Afonso (de Viana do Castelo), de Henrique Sever ino de Almeida (de S. João da Madeira), de Joaquim Pinho (de S. João da Madeira), de Manuel Couto (da Póvoa de Varzim), 'de Mário Cordeiro (do Porto), de Oscar Esteves (do Porto), de Rui Sousa (de Vila do Conde) e de Torcato David (de Vila Nova de Gaia).
Telegramas a solicitar a revogação do Decreto-Lei n.º 427-B/77, que cria o Ensino Superior Curto, em virtude de não terem sido ouvidas escolas e organizações profissionais, expedidos por Alberto P. Cardoso, António Luz Couto e José Antunes Bernardo (todos de Lisboa).
Ofício
Do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis do Distrito do Porto, a remeter fotocópias de abaixo-assinados de trabalhadores das empresas, intervencionadas Abel Alves de Figueiredo, L.da, Companhia de Fiação de Crestuma, L.da, e Fábrica de Fiação e Tecidos do Jacinto, S.A.R.L., bem como um documento que refere a recuperação económica verificada nas três empresas durante o período de intervenção.
Cartas
Da Comissão Unitária de Mulheres, de Braga, dando conta dos resultados de um inquérito distribuído a mais de mil e quinhentas famílias, bem como de uma moção e de um "cabaz de compras" aprovados em plenário realizado na Escola Alberto Sampaio;
Da Associação Portuguesa dos Controladores de Tráfego Aéreo e Comissão de Trabalhadores de Operação, solicitando a atenção para o vácuo que pode vir a criar-se nas relações de trabalho no sector da actividade aeronáutica nacional;
Da comissão de trabalhadores da Mundet e C.a, L.da a remeter o relatório da sua actividade de trabalho e o balanço da gestão dos trabalhadoras compreendido entre 1 de Janeiro e 30 de Setembro de 1977;
De José Carlos Correia de Sequeira, de Reboleira- Amadora, dando conta do facto de ainda lhe não ter sido paga a indemnização de cerca de cento e trinta mil escudos que em Janeiro de 1974 lhe foi atribuída pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa, pelo facto de a firma empregadora Gris Impressores, S.A.R.L., ter sido intervencionada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Governo apresentou a proposta de lei n.º 142/I, na qual impetra autorização para emitir um empréstimo interno amortizável até à importância total de 40 milhões de contos. Foi pedida a concessão de prioridade e urgência. A prioridade já foi concedida e a urgência será hoje discutida, ina altura própria, tendo baixado à 6.ª Comissão.
O Grupo Parlamentar do PSD requereu a sujeição a ratificação do Decreto-Lei n.º 478/77, de 15 de Novembro, que criou no Ministério da Educação e Investigação Científica a Direcção-Geral de Extensão Educativa. Trata-se da ratificação n.º 25/I.
Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Governo, formulado por um grupo de, Deputados do PSD e pelo Sr. Deputado Nandim de Carvalho, e ao Ministério da Educação e Investigação Científica, formulado pelo Sr. Deputado. Basílio Horta.
Como podem verificar, a ordem do dia de hoje inclui, além das matérias agendada para a última sessão, a discussão de duas matérias novas: a proposta de lei n.º 129/I - Orçamento Geral do Estado para 1978 e a discussão e votação do Orçamento da Assembleia da República.
Quanto ao primeiro diploma, o assunto foi ontem debatido na reunião dos grupos parlamentares, tendo estes reservado a sua posição para o Plenário. Não obstante, e em cumprimento da Lei n.º 64/77, de 26 de Agosto, quo estabelece, no seu artigo 11.º, que a Assembleia da República votará a Lei do Orçamento até 15 de Dezembro, resolvi incluir na ordem do dia de hoje esta matéria.
O Sr. Provedor de Justiça proeurou-me há momentos a fim de me expressar a necessidade ou conveniência de a Assembleia da República dotar aqueles serviço da lei orgânica respectiva, até ao fim do corrente ano. A fim de discutirmos este assunto, convoco a conferência dos grupos parlamentares para amanhã, às 12 horas.
Entretanto, e como os colegas sabem,, pelas 11 horas o Sr. Presidente da Assembleia da República dá posse aos Conselhos de Informação para a Imprensa, Radiodifusão Portuguesa, Radiotelevisão Portuguesa e Anop.
O Sr. Deputado Fernando Roriz pediu a palavra para prestar um breve esclarecimento à Câmara. Como entendo que, tal esclarecimento é cabido, vou conceder-lhe a palavra para esse efeito.
Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na passada terça-feira, o Partido Social-Democrata por meu intermédio, teve ocasião de manifestar aqui o seu protesto por aquilo que fui uma grosseira deturpação dos resultados das últimas eleições para as autarquias locais veiculada por uma notícia dá Radiodifusão Portuguesa A esse protesto entendeu responder o Sr. Deputado Igrejas Caeiro, também director da Radiodifusão Portuguesa, informando que tal notícia tinha sido da responsabilidade de um filiado do PSD, a esse propósito acrescentou algumas considerações nas quais apoiou para o nosso bondoso coração em termos de podermos desculpar o nosso filiado.
O Partido Social-Democrata não respondeu de imediato a essa resposta do Sr. Deputado Igrejas Caeiro porque não tem (por hábito argumentar sem dados, argumentar apenas em termos de dialogo mais ou menos gratuito e porque desejávamos esclarecer-
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nos acerca das verdadeiras origens dessa notícia. Hoje estamos em condições de o fazer com a verdade que sempre usámos e que é apanágio do Partiu" Social-Democrata, e por isso aqui voltámos ao assunto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A verdade é que a notícia veiculada - e a verdade de fundo da questão, essa permanece parque ninguém negou a deturpação contida na notícia-, a responsabilidade da notícia cabe sim a uma militante ou filiada do Partido Socialista, a Sr.ª Fernanda Laranjo, chefe de turno do "Jornal da Tarde" da RDP, e, como é óbvio, militante socialista.
Uma voz do PSD: - Como é óbvio! Muito bem.
O Orador: -O locutor de serviço que leu a notícia esse é, efectivamente, filiado do PSD, o Sr. Eduardo Vidal, que, naturalmente, ao ler a notícia se terá apercebido da falsidade que da continha,, mas parque, com certeza, não tem vocação para censor, não fez a censura da redacção da sua colega e militante do Partido Socialista e se limitou ler a notícia nos precisos termos em que ela foi redigida.
Daqui se deduz, pois, que o Partido Social-Democrata mais uma vez argumentou em termos de perfeita correcção e mais uma vez usou apenas da verdade. Daqui se deduz, portanto, que quem tem de apelar agora pana o magnânimo coração do Sr. Deputado Igrejas Caeiro mo sentido de perdoar ao seu correligionário e de perdoar, também, ao funcionário dos serviços de que ele superintende é, portanto, o Sr. Deputado Igrejas Caeiro e não nós.
Espera o Partido Social-Democrata que o "isento" jornal A Luta não se esqueça de rectificar o comentário que ontem fez em tom triunfalista, dizendo quo quem saiu tosquiado foi o PSD, e dizer que, afinal, quem saiu tosquiado foi o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
esta também que certa imprensa, muito pressurosa em assinalar os sorrisos de gáudio da bancada do Partido Socialista, não se esqueça agora de dizer que esses sorrisos se transformaram afinal em sorrisos amarelos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Vozes do PS: - Muito mal!
O Orador: - Mas o quo importa, ao fim e ao caibo, é que fique feita a prova de que o Partido Social-Democrata mais uma vez usou apenas a verdade, mais uma vez tem razão, e que mais uma vez se provou que se há deturpações nos meios de comunicação social elas resultam da actuação de militantes do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Igrejas Caeiro pede a palavra e, como foi directamente visado, concedo-lha.
Tenha a bondade.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Aliás, Sr. Presidente, mesmo que não tivesse sido directamente visado, pensava pedir-lhe a palavra para dar o esclarecimento devido ao Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata. Até tenho aqui uma carta para lhe entregar, mas entregar-lha-ei pessoalmente e não a vou utilizar neste esclarecimento.
Na altura em que me dirigi ao Sr. Deputado que então acusava de manipulação a RDP só porque tinha tido um erro de informação que na imprensa se chama "gralha" e que ali foi um erro, que eu próprio lamentei, disse que se tinha iniciado um inquérito para apurar responsabilidades.
Por audição pessoa], verifiquei quem tinha lido a notícia e disso dei conta neste hemiciclo, mas exactamente porque não dava por finda toda a minha informação disse que se tinha iniciado um inquérito. Queremos hoje afirmar que esse inquérito revela que a notícia foi feita por um chefe de turno e lida pelo locutor já aqui referido.
Acho particularmente grave o que o Sr. Deputado do PSD acaba de insinuar em relação ao seu militante. Disse o senhor que se o seu militante se apercebeu, e por isso não alterou a notícia, é porque não tem missão de censor e não quer fazer censura. Ora, esta intervenção vai ser talvez grave para o prosseguimento do inquérito, porque qualquer trabalhador da informação quando sabe de um erro que tem nessa informação deve procurar corrigi-lo.
Aplausos á@ PS.
E como não há nenhuma determinação, já que os redactores são simultaneamente locutores ou redactores-locutores ou locutores-redactores, pois eles, próprios produzem notícias, fazem-no com espírito de equipa e item exactamente de trocar impressões com o seu chefe de turno que funciona como subchefe de redacção.
Houve, de facto, um erro lamentável - eu próprio o lastimei na intervenção que fiz na tentativa de esclarecimento. E certamente a Radiodifusão Portuguesa terá oportunidade de prestar e apresentar as suas desculpas ao Grupo Parlamentar do PSD.
Parece-me, em todo o caso, que é distorcer, de algum modo, o assunto considerar uma simples gralha ou um simples erro como ataques demagógicos para querer dar exemplos de manipulação de informação.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Meus amigos, tenho a impressão de que este erro, que por momentos uniu dois antagonistas, políticos, pode servir de apelo para que todos nós aqui, de uma ala a outra deste hemiciclo, estejamos mais unidos no acento que no erro. Houve realmente uma gralha, o que acontece quotidianamente às dezenas na imprensa portuguesa e que pode ser compreendida por gente que saiba falar
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de informação sem, que, a propósito de 'tudo e de nada, se queira ver nisso manipulação.
Vozes do PS: - Multo bem!
O Orador: - Maus amigos, é redimem-te notório que os partidos desejam deter o Poder e desejam utilizá-lo para o exercer nos órgãos de comunicação, mas o que é certo é que, se houver um pouco de discernimento, saber-se-á distinguir onde há a manipulação e onde pode haver apenas o erro.
É exactamente este espírito de compreensão, para quem o pode ter, que nós pedimos a quem encontrar um erro na informação da RDP.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fernando Roriz pede de novo a palavra. V. Ex.ª prestou esclarecimentos e o Sr. Deputado Igrejas Caeiro deu também alguns esclarecimentos. Peço desculpa, mas não lhe posso conceder a palavra, sob pena de não entrarmos no período de antes da ordem do dia, pois penso que o assunto já está esclarecido.
O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Eu peço desculpa por insistir, mas "u desejava fazer um protesto e parece-me que. regimentalmente tenho esse direito.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de o fazer, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Ouvi com toda a atenção o Sr. Deputado Igrejas Caeiro. De resto, seria difícil não dar atenção às palavras que ele proferiu, porque ele é, neste assunto, uma autoridade.
Começo por anotar o que há de curioso no facto de o Sr. Deputado Igrejas Caeiro considerar o erro da Radiodifusão Portuguesa como uma simples gralha.
Mas queria protestar sobretudo em relação a uma afirmação que fez e que me parece menos, exacta: o Sr. Deputado Igrejas Caeiro deixou claramente entendido que na sua intervenção de terça-feira não terá dito que a notícia era da responsabilidade do militante do PSD, mas sim que foi lida por ele. É evidente que esta afirmação não resiste à análise mais superficial porque, de contrário, não se compreenderia o gáudio que a sua afirmação produziu de imediato na bancada do Partido Socialista.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira formular sinteticamente o seu protesto!
O Orador: - Estou a formulá-lo, Sr. Presidente.
Queria protestar também porque o Sr. Deputado Igrejas Caeiro deixa entender na sua intervenção que o protesto do PSD é um protesto que não tem em conta o clima de concórdia e de compreensão que tem de existir para erros deste tipo. Nós não fizemos aqui outra coisa que não fosse assinalar uma deturpação objectiva, e que está confirmada, de uma notícia que induziu em erro as pessoas que a ouviram.
E a prova de que esta compreensão não existe na Radiodifusão Portuguesa foi feita ontem em comentário que a própria RDP fez a este diálogo, em tom jocoso, quando se pretendeu tirar proveitos daquilo que considerava ser um erro - o protesto do Partido Social-Democrata.
O Sr. Mário Pinto (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A RDP foi a primeira a colocar o problema em termos que se afastam da compreensão para a qual o Sr. Deputado Igrejas Caeiro apelou aqui.
O Partido Social-Democrata sempre deu provas de ser um partido tolerante, que procura a compreensão.
Risos do PS.
Por muito que isso provoque os risos dos Deputados do Partido Socialista, esta é a verdade. Mas quem tem, neste caso, de dar exemplo de tolerância é a Radiodifusão Portuguesa, que foi a primeira a quebrar esse espírito e a primeira a dar exemplo que não ajuda nada à compreensão e à tolerância em que nós estamos e sempre estivemos interessados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Rêgo para um protesto.
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - O Sr. Deputado do PSD referiu-se ao gáudio e aos "amarelos" de A Luta.
Eu quero dizer que em A Luta não há "amarelos", a começar pelo director: A Luta tem pessoas com uma posição definida que estão hoje onde estavam ontem. Assim possam dizer o Sr. Deputado e o seu partido a mesmo coisa.
Aplausos do PS.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes pede a palavra paira que efeito?
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra, antes de mais, para ,dizer que não admito nem tolero qualquer espécie de provocações enquanto estiver a falar. Isso não se refere, de forma nenhuma, ao Sr. Presidente, mas às pessoas que, de vez em quando, provocam de forma incorrecta desta bancada.
O Sr. Presidente: - Não verifiquei isso, Sr. Deputado. Diga-me para que efeito pretende usar da palavra.
O Orador: - Para dar um esclarecimento à Câmara para usar de um direito regimental, que é o direito de requerimento.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Orador: - O esclarecimento que queria dar à Câmara é o seguinte.: este caso é um caso profundamente importante e até com um certo sentido ético. Tem um certo sentido ético porque não há dúvida nenhuma que houve duas pessoas que cometeram dois
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erros. Uma que redigiu incorrectamente uma notícia e outra que a leu,...
O Sr. Mário Pinto (PSD): - Correctamente!
O Orador: - ... podendo corrigi-la.
Uma voz do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Isto implica Srs. Deputados, o dever que todos nós temos de colaborar com a Administração e de, pura e simplesmente, corrigimos os erros alheios.
Não vou dizer quem é que fez isso, porque a filiação partidária não desculpa as asneiras. O facto de um indivíduo ser membro dos Partidos Socialista. Social Democrata, Centro Democrático Social, Partido Comunista Português ou da União Democrática Popular, não desculpa que, possa cometer erros na sua actividade profissional.
Simplesmente, esta Assembleia tem um papel que deve estar acima desse tipo de erros e de- picardias. Penso que o Sr. Deputado Fernando Roriz tinha uma coisa a fazer, que não fez, e que, pela primeira vez na minha vida, substituindo-me ao que penso - é uma opinião pessoal -, que deveria ter sido feito, eu próprio vou fazer, e é o seguinte: Sr. Presidente e Srs. Deputados: Ao abrigo dos direitos regimentais aplicáveis, requeiro à Secretaria de Estado da Comunicação Social que sejam enviados a esta Assembleia, os resultados do inquérito para que as pessoas possam julgar em consciência.
O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Já a requereram na terça-feira, Sr. Deputado.
O Orador: - Julgo que, para além disto, referir por exemplo os nomes do" locutores em causa é pôr em causa a dignidade profissional -- e não moral, isso não. tem importância nenhuma - de doas profissionais quo o não merecem
Só se sabe quem falou ou quem não falou, quem fez ou quem não fez, depois do inquérito. E um dos pontos que acho importante na intervenção do Sr. Deputado Igrejas Caeiro é que não referiu um único nome. Era esse estado de espírito que eu acho que devia predominar nesta Assembleia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes tora a bondade de apresentar o seu requerimento por escrito, para lhe ser dado o devido seguimento.
O Sr. Deputado Moura Guedes pede a palavra para que efeito?
O Sr. Moura Guedes (PSD): - É para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem todo o direito de protestar e vou já conceder-lhe a palavra para esse efeito.
Entretanto, pedia aos colegas que dessem por findo este incidente, porque, como sabem, o período de antes dia ordem do dia termina imperativamente às 16 horas t 25 minutos e hoje não pode ser prolongado, visto que já o foi na sessão anterior.
Tenha a bondade, Sr Deputado Moura Guedes.
O Sr. Moura Guedes (PSD): Sr. Presidente, Srs. Deputados: O protesto que quero favor é o seguinte o Sr. Deputado José Luís Nunes afirmou que havia dois responsáveis e é contra esta afirmação que quero protestar.
Considerar que um locutor é responsável porque lê com fidelidade, porque lê textualmente um papel que lhe dão para ler ao microfone é um absurdo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... e, não é uma atitude correcta
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O dever deontológico de uni locutor é ler com fidelidade os textos, que lhe dão. A responsabilidade desses textos é, por um lado. do seu autor, e, por outro, de quem dirige os, respectivos serviços, que deve orientá-los de modo a que não ocorram tais situações.
Vozes do PSD: - Muito bem'
O Orador: - Queira, pois, protestar cantora cisto afirmação e ainda contra o facto de o Sr. Deputado Igrejas Caeiro, tão levianamente, ter vindo imputar a falta a uma pessoa que a não cometeu, quando - segundo ele próprio diz - está um inquérito em curso, antecipando-se assim injusta e erradamente, às conclusões desse mesmo inquérito
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Queria protestar também contra o facto de a Radiodifusão Portuguesa, desta maneira- porque este é um caso exemplar, continuar a contribuir para a desinformação da sociedade portuguesa.
Aplausos do PSD
O Sr. Presidente: -Srs. Deputados, como disse há pouco, tomam amanhã posse o Conselho de informação e creio que eles terão o campo aberto para uma larga actividade, nessa matéria.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me Licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Para que efeito pede o Sr Deputado José Luis Nunes novamente a palavra? É sempre um prazer ouvi-lo, mas terá de me informar para que efeito, pois tenho de ver se a. sua intervenção se enquadra nalgum normativo regimental.
O Sr. José Luis Nunes (PS): -- Peco-lhe apenas que não diga que é um prazer ouvir-me, porque as pessoas podem tomar a sério e julgar que está a infringir o seu dever de imparcialidade partidária.
Risos.
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O Sr. Presidente: - Creio que asso não pode ser posto em dúvida, Sr. Deputado. Mais o Sr. Deputado quer usar da palavra paira que efeito?
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Desejava dar um esclarecimento à Camará.
O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - A declaração do Sr. Deputado Moura Guedes é, efectivamente, um ponto de vista respeitável. E for exactamente esse o ponto de vista defendido pelos locutores da Radiotelevisão Portuguesa saneado no pós 25 de Abril, por lerem noticias falsas e tendenciosas ao serviço do Governo fascista.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro, e talvez para serenar um pouco os ânimos, que, alias, estão serenados, quero dizer que me apraz registar que, não obstante a importância desta matéria, os Srs. Deputados compreendam naturalmente a serenidade com que urge discuti-la
Queria também pôr à Câmara a seguinte questão: o Sr. Deputado Carlos Brito sugeriu que a discussão da proposta de lei n.º 129/I - Orçamento Geral do Estado - fosse colocada no final da agenda de hoje, por uma única razão que me parece procedente: é que, se a discutirmos no ponto em que está incluída, provavelmente coincidirá com a hora em que os presidentes dos grupos parlamentares e outros Deputados irão receber o Sr. Presidente da República. Há, naturalmente, como todos compreendem, conveniência em que os prementes dos grupos parlamentares estejam ma Assembleia quando desta discussão.
Se a Assembleia nada opuser à sugestão que foi apresentada pelo Sr. Deputado Carlos Brito, e com a qual inteiramente concordo face às razões invocadas, esta matéria passaria para logo a seguir à discussão do Orçamento da Assembleia da República.
Pausa.
Visto não haver objecções, assim se fará.
Tenha a bondade. Sr. Deputado Igrejas Caeiro. Mais V. Ex.ª, que já fez um protesto e já deu um esclarecimento, pretende agora usar da palavra a que título?
O Sr. igrejas Caeiro (PS): - Pretendia se o Sr. Presidente autorizar, dar um esclarecimento de carácter técnico, pois me parece que o Sr. Deputado Moura Guedes mão tem consciência -o que é natural - do que é a realidade de uma Redacção.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de o fazer, Sr. Deputado, se julgar que o esclarecimento é importante.
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Aquilo não é a Radiodifusão Portuguesa, é "Rádio Moscovo".
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Cunha Simões poderá fazer uma intervenção, mas creio que não tem o direito - e desculpe-me que o diga - de produzir esse aparte.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Por um lado, pareceu-me que o Sr. Deputado Moura Guedes, por quem tenho a maior consideração, está realmente a focalizar os trabalhadores da informação da Radiodifusão Portuguesa como se estivessem a cumprir determinações que já não se usam desde o 25 de Abril.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O locutor que fez a leitura infeliz de um erro que foi infelizmente redigido é simultaneamente locutor-redactor, está integrado numa redacção, tem capacidade de redigir por sua própria, iniciativa o trabalho que faz, mas é evidente que também lê o trabalho que outros camaradas fazem.
Trata-se, por coincidência, do trabalho de um chefe de turno. Mas, talvez vos possa explicar que esta chefia de turno não envolve aquele acto ditatorial que antigamente correspondia a determinadas redacções. São turnos que têm equipas que estão perfeitamente a trabalhar com uma compreensão total, mesmo que os separem as rivalidades partidárias. No seu trabalho produziam um trabalho de equipa e trocam impressões acerca do que têm a fazer.
Era perfeitamente natural, perfeitamente normal que se o locutor se tivesse apercebido -e espero que se não tenha apercebido- do erro, o fizesse, como é hábito nas redacções, sentir à pessoa que o havia escrito. Insisto, tenho quase a certeza, em que o locutor não se apercebeu do erro, porque senão tê-lo-ia posto em evidência, para que isso não acontecesse. Estou neste momento a render uma homenagem a um profissional da rádio, que está inscrito fio vosso partido, com muito mais interesse do que os nossos amigos do PSD o fizeram.
Vozes do PSD: -Ah! Ah!
O Orador:- Queiró, portanto, dizer que o locutor já não é um papagaio, mas um criador, e posso acrescentar à minha explicação que, ainda há dias, um locutor que se recusou, num trabalho de locução a ter um texto religioso, só porque não correspondia à sua própria religião, conseguiu apresentar um problema, que está em estudo, de objecção de consciência. Mas não foi punido e apenas se está a analisar até que ponto isto é possível voltar a fazer-se.
Na Radiodifusão Portuguesa há respeito pela pessoa humana, não se faz nenhuma pressão, não se faz nenhuma manipulação. E se, o estou a dizer, não é por defesa do director de Programas, mas por defesa de todos os trabalhadores que ali estão, que não podam de forma nenhuma ser apelidados de profissionais se estiverem à mercê de pressões. É em nome deles que neste momento torno a palavra, não para me defender a mim, mas para os defender a eles" que já não tem que estar à mercê dessas pressões.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu pessoalmente estou a seguir com o maior interesse estes
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esclarecimentos, mas vejo que alguns colegas manifestam já um certo enfado, aliás creio que injustificado.
Á Sr.ª Deputada Helena Roseta pediu a palavra e terei que lha conceder, visto que abrimos este precedente.
A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Sr. Presidente, queria fazer um protesto.
Em primeiro lugar, protesto peto facto de se estar aqui a arrastar uma discussão de cujo resultado não podemos ter neste momento a prova imediata. Há um inquérito aberto e é sobre os resultados desse inquérito que temos de nos pronunciar.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!
A Oradora: - Não se justifica, no meu ponto de visita, que a Assembleia da República esteja efectivamente a discutir maus sabre um caso que é grave, mas para. o qual fanam já tomadas providências de inquérito.
Aplausos do PSD, PS e do Sr. Deputado Carlos Robalo (CDS).
A Oradora: - Não posso, no entanto, deixar fite protestar contra algumas afirmações que foram feitas pala bancada do Partido Socialista e peço a compreensão de todos os Srs, Deputados para essa minha palavra.
O que tenho a dizer é o seguinte: é evidente que depois do 25 de Abril não são admitidos locutores-papagaios, como não eram admissíveis antes do 25 de Abril, teto porque nós temos consciência de que, quer sob um regime ditatorial quer sob um regime democrático, há acima de tudo, que respeitar a isenção e a idoneidade dos profissionais da informação. Muitos deles já o eram antes do 25 de Abril, muitos deles apenas o são agora depois do 25 de Abril, mas em todos eles -naqueles que tem uma verticalidade dia actuação - houve sempre idoneidade e isenção, e souberam defender-se cantora as formas com que a censura, no antes do 25 do Abril, os atacava e sabem, hoje, defender-se contra a forma como certos abusos e excessos, na direcção de determinados órgãos, os continuam a atacar.
Presto homenagem à isenção dos profissionais da informação, sem distinguir os partidos a que eles pertencem, mas distinguindo acima de tudo o papel relevante que eles têm o direito e o dever de prestar ao povo e à Nação Portuguesa.
Aplausos do PSD e PS.
A Oradora: - Em segundo lugar, quando o Sr. Deputado Igrejas Caeiro diz que se podem pôr problemas de objecção die consciência no desempenho da actividade de locutor, digo-lhe que reconheço isso, mas que não é o caso. O que se passou não tem nada a ver com uma situação de objecção de consciência. Tem a ver com o relato de uma notícia que é falsa. Quando o Sr. Deputado me diz que o locutor tem responsabilidade na redacção, chamo-lhe a atenção para que quando não se trata de uma transmissão directa, o locutor não tem responsabilidade na redacção, O locutor apenas tem responsabilidade no que está a transmitir quando é uma transmissão directa e quando ele próprio está a fazer a reportagem dos factos. Quando está a ler noticiários, que são feitos por uma redacção, ele não tem a responsabilidade directa daquilo que está a ler.
É assim que as coisas são. O Sr. Deputado sabe perfeitamente disso e não me venha dizer o contrário.
Vozes do PSD: - Apoiado!
A Oradora: - Quero, finalmente, protestar pelo facto de estarmos aqui a atribui responsabilidades a A, B ou C, e a posição do PSD é de que a responsabilidade tem de ser apurada por inquérito e é sobre isso que nos temos de pronunciar e não estarmos aqui a discutir se a responsabilidade é do locutor, se foi do redactor ou de quem foi. O inquérito que apure isso. Se a responsabilidade -como parece ser presumível é fundamentalmente da redacção, o inquérito terá de o apurar e nós teremos de protestar sobre isso.
Mas o fundamental é que o controlo dos órgãos de informação estatizados não dependa mais de lapsos, voluntários ou não, como este, e sim do funcionamento afectivo da legislação em vigor, em particular dia legislação sobre os Conselhos de Informar cão, que são os órgãos a quem cabe a manutenção e o controlo da idoneidade e da atenção dos órgãos de informação estatizados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Moura Guedes pede agora a palavra. Quererá dizer-me para que efeito é e ao abrigo de que disposição regimental, pois tenho muitas dúvidas em concedê-la neste momento?
O Sr. Moura Guedes (PSD): - O Sr. Deputado Igrejas Caeiro fez um esclarecimento, e eu queria dar outro esclarecimento ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Moura Guedes, vou dizer-lhe o seguinte: não lhe recuso a palavra porque não posso ser juiz do melindre com que encara esta questão. Se V. Ex.ª entende que deve dar um esclarecimento, certamente que deverá fazê-lo, mas tenho mulitas dúvidas a esse respeito. Peco-lhe a sua compreensão).
O assunto já está esclarecido. Ainda agora, a nossa colega Helena Roseta expressou justamente esse juízo, no sentido de que não deveríamos estar a discutir sem que o inquérito averiguasse os factos. Eu próprio também já reflori que me parecia que estávamos a arrastar demasiadamente este incidente.
V. Ex.ª dirá se quer usar da palavra ou não.
O Sr. Motora (Guedes (PSD): - Queria sim. Sr. Presidente, e agradeço a V. Ex.ª a atenção.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.
O Sr. Moura Guedes (PSD): - Queria apenas prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro, meu
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É o seguinte: a respeito das considerações que ele fez ao respeito do modo de funcionamento interno da RDP e ao facto de aquela ser uma família...
O Sr. Cunha Simões (CDS): - Uma família comunista!
O Orador: -..., segundo resultava das suas considerações.
Penso que talvez o mal da RDP, como o mal de muitas das instituições deste .país durante os últimos dezasseis meses, seja o Idas instituições se terem transformado em instituições familiares.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Penso que esta manobra de diversão e ais acusações que o Sr. Deputado Igrejas Caeiro pretendeu virar contra o locutor, que nenhuma culpa tem nesses acontecimentos, talvez resultem de ele justamente, não pertencer ai essa família.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Penso que é indiscutível que o locutor que lê um texto que lhe enviam tem o dever deontológico de o lar textual e correctamente. E não se diga, como já aqui foi dito, que ide tem funções correctivas, críticas ou censórias. Os locutores do antigo regime, do regime fascista, não foram saneados por lerem textualmente as noticias que lhes davam. Foram por terem, muitos deles, profundas implicações políticas, por estarem comprometidos, efectivamente, a outros níveis, com esse regime. Tivessem eles exclusivamente lido as notícias de acordo com os textos e, com certeza que mão teriam sido saneados. Um escrivão quando reproduz uma sentença; de um juiz não tem que alterá-la, nem pode alterá-la.
O Sr. Cal Brandão (PS): - Os locutores mio são escrivães!
O Orador: - Ele mão é o responsável pelo conteúdo da sentença, por mais injusta que da seja.
Protestos do PS.
Vozes do PSP: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado Igrejas Caeiro está a ser profundamente injusto para um seu colaborador, a quem acusou, precipitadamente, quando estava em curso o respectivo processo disciplinar, o que, deontologicamente, está profundamente errado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Considero encerrado o incidente.
Víamos discutir o voto apresentado na sessão de ontem pela Sr.ª Deputada Carmelinda Pereira, que, como bem se recordam, foi adiado paira a sessão de hoje.
Tem a palavra o Sr. Deputado Aires Rodrigues.
O Sr. Aires Rodrigues {Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como subscritor do voto apresentado ontem sobre a questão do anseio superior curto e da situação que se vive nas escolas por ele afectadas, queria dizer a esta Assembleia que, em função do facto de hoje ser votada a ratificação, ou não (ratificação, do decreto-lei que institui o ensino superior curto, o voto que ontem foi apresentado com o sentido de- que uma vez mais mão fosse adiada a discussão sobre esta matéria, e dada a acuidade que da tinha, hoje esse voto, que se recorta do voto sobre, o decreto que institui o ensino superior curto " que vai ter lugar daqui, a pouco na ordem do dia, perdeu um pouco a razão de ser.
Por esse motivo, e dado que a discussão já se iniciou na sessão de ontem, em nome dos subscritores desse voto, nós retiramos o voto, na medida em que, como disse há pouco, de se recorta do voto sobre o decreto que institui o ensino superior curto e que terá lugar, naturalmente, na sessão de hoje.
O Sr. Presidente: - Considero, portanto, retirado o voto.
Faltam dez minutos para o termo deste período prévio.
Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão para uma intervenção.
O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomo hoje a palavra neste hemiciclo para tratar de um tema que diz respeito aos emigrantes.
São muitos, como se sabe, os problemas que preocupam os emigrantes. Ainda há dias, aquando da minha deslocação a Finança integrado numa deputação desta Assembleia, pude tomar conhecimento directo de muitos desses problemas.
Conversando com trabalhadores emigrantes, pude ver que problemas como o da estabilidade do emprego, do ensino, da segurança social e outros continuam em grande parte por resolver.
Não é dessas questões que vou tratar. Vou referir-me concretamente às dificuldades dos milhares de emigrantes que vêm a Portugal nestas curtas férias do Natal.
Muitas dezenas de milhares de emigrantes vêm junto dos seus familiares para confraternizar com os seus e ao mesmo tempo matarem saudades de um país que foram obrigadas a abandonar, alguns há muitos anos, mas que jamais puderam esquecer.
Nesta quadra são milhares e milhares de emigrantes que se preparam para passar umas curtas férias em Portugal.
Mais para estes trabalhadores, que durante largos meses já foram sujeitos a duros sacrifícios, esta viagem, tão desejada, representa afinal mais um sacrifício.
É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados, sucede que quando o emigrante vem de férias, corre o risco de passar no caminho quase metade dos poucos dias que tem para gozar.
Para muitos emigrantes, viajar significa passar dois e três dias de comboio, quantas vezes sem um lugar para se sentar, com comboios superlotados, dando por vezes origem a acidentes, conflitos e mal-entendidos,
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tudo isto porque os comboios mão tem o mínimo de condições necessárias para tão longas viagens.
Quantas mães, domo eu próprio vi, têm que fazer estas viagens com os filhos nos braços, muitas vezes sem água para os lavar e dando-lhes refeições que não são ais mate próprias!
A água para beber e os alimentos para as refeições têm que ser metidos mas bagagens, perdendo por isso muitas qualidades, quando não chegam mesmo ao estado de impróprios para a alimentação,
Quantas vezes a água se esgota, quantas vazeis adultos e crianças fazem viagens inteiras doentes e som um médico e sem condições mínimas de higiene.
Enfim, um drama que os emigrantes defrontam e para cuja resolução há muito reclamam medidas! E o facto é que, pelas informações que colhíamos, essas conduções pouco tem melhorado, muito embora promessas não tenham faltado.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Outro problema com que se defrontam os emigrantes em viagem é o das bagagens.
Ao atravessar ias fronteiras, mudar de comboio com crianças, ter que subir e descer escadarias, atravessar linhas e andar longas distâncias, é um sacrifício que só a saudade da sua família e do seu País os obriga a passar.
Muitos despacham as suais bagagens para assim fazerem uma viagem melhor. No entanto, correm grandes riscos. Frequentemente, as bagagens contendo roupas e outras coisas necessárias chagam com dois e três dias de atraso.
Frequentemente, os "imigrantes têm que ir buscar as suas bagagens a várias dezenas die quilómetros e pender alguns dos seus poucos dias de férias para as levantarem.
Pelo que acabo de expor e por tudo o mais que muitos de nós sabemos, pelas queixas válidas que todos certamente temos ouvido, pode-se concluir que sempre que se tem deslocado a Portugal, a grande maioria dos emigrantes o tem feito com grandes sacrifícios e em péssimas condições.
Outro problema são as conduções de assistência que encontram ao chegarem a Portugal.
Para quem chega à fronteira depois de uma viagem estafante e de estar longas horas na bicha para passar a alfândega, tornam-se incompreensíveis as deficientes condições de apoio e de assistência que aí se deparam.
É a falta de salas para alojamento, é a falta de sanitários e de água. É, por vezes, a inexistência de um bar e de um telefone. São as deficientes condições de assistência médica e a falta de pessoal de apoio capaz de dar "Informações sobre transportes paina o local de destino no País ou de orientar o emigrante que deseja resolver qualquer problema com as entidades oficiais.
A decisão de não se formar, durante o período de florias que agora se inicia, uma equipa de apodo aos emigrantes na fronteira do Caia faz-nos temer que, pelo menos no que diz respeito à recepção dos emigrantes, em vez de se avançar, se esteja a recuar.
As consequências desta falta de apoio são bem visíveis.
São as mulheres e as crianças ao sol e à chuva, por falta de alojamentos, muitas vezes portanto já as suas deficientes condições de saúde.
Por falta de telefone, pessoas ficam horas e horas para resolver qualquer problema e por vezes chegam a ter que voltar a atravessar a fronteira para telefonar.
A falta de equipa de apoio na fronteira obriga que muitos emigrantes que têm problemas a resolver com entidades oficiais sejam obrigados a perdas- de tempo e a fazer viagens desnecessárias para tratar de qualquer assunto que tenham pendente.
E não acabam aqui os problemas. É, finalmente, a questão do regresso, com atrasos e dificuldades sem conta, com dificuldades em arranjar lugar, com perdas de dias de trabalho com tais atrasos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Já levantámos nesta Assembleia o problema das. condições de transporte dos emigrantes que "m férias se deslocam a Portugal ou que aqui vêm em datas festivas para confraternizar com as suais famílias.
Foi-nos dito em resposta que estava em marcha um acordo com a TAP e outro acordo com a CP para o estabelecimento de um plano mínimo destinado a assegurar a deslocação dos emigrantes a Portugal em épocas de grande afluxo.
Em que Situação estão esses acordos?
Esta tem sido uma das queixas mais insistentes dos nossos emigrantes, seja de França, da Alemanha, da Bélgica ou de qualquer outro país.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: As várias e insistentes reclamações que tem sido feitas sobre este problema não poderão ser em vão.
Impõe-se que sejam tomadas as medidas necessárias para que não se repitam as dramáticas situações que aqui referi.
Só adoptando essas medidas o Estado Português dará cumprimento às suas obrigações para com os trabalhadores emigrantes. Só assim demonstrará por actos, que considera e respeita a sua condição, que mão os vê em função das suas remessas, mas que os considera como trabalhadores portugueses obrigados a sair do Pais para ganhar o seu pão. Só assim se poderá mostrar-lhes que a democracia portuguesa tem -também para os trabalhadores emigrantes - um significado concreto.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar no período da ordem do dia. Se desejarem inscrever-se para solicitar esclarecimentos, poderão fazê-lo, mas eles terão que ser solicitados e respondidos na próxima sessão.
A Sr.ª Secretária anotará os colegas que pretendem pedir esclarecimentos.
Pausa.
Inscreveram-se os colegas Álvaro Ribeiro, Macedo Pereira, Teodoro da Silva, Rui Pena e a Sr.ª Deputada Maria Alzira, que ficam com a palavra reservada para a próxima sessão.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Vamos entrar no período da ordem do dia.
Na primeira parte, tomos de apreciar uni pedido de autorização paira quo o Sr. Deputado Madeiras
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Ferreira seja ouvido no Serviço de Coordenação da Extinção da PIDE/DGS e LP, no dia 18 de Janeiro, pelas 10 horas (Proc. C. D. n.º 628/75, 2.º Sec., 5.ª Brigada).
O Sr. Deputado e a Assembleia não têm nada a opor?
Pausa.
Como não têm, está concedida a autorização.
Está também pendente um pedido de autorização pana que o Sr. Deputado Faria de Almeida preste declarações, como ofendido, no Tribunal Judicial de Celorico da Beira, no dia 24 de Janeiro, pelas 15 horas (Proc. 51/77).
O Sr. Deputado e a Assembleia não têm nada a opor?
Pausa.
Está concedida a autorização.
Finalmente, outro pedido de autorização para que o Sr. Deputado Carlos Lage seja ouvido, em declarações, nos Serviços de Coordenação de Extinção da PIDE/DGS e LP, em data e local à sua escolha (Proc. 1987, 1.ª Secção, 2.ª Brigada).
O Sr. Deputado Carlos Lage goza aqui de um privilégio especial. Poderei informar o Sr. Deputado e a Assembleia de que se trata de prestar esclarecimentos sobre factos relacionados com o tratamento de presos na cadeia da Machava, em Moçambique.
O Sr. Deputado e a Assembleia não têm nada a opor?
Pausa.
Está então concedida autorização.
Está agora na ordem do dia a concessão da urgência para a discussão da proposta de lei n.º 142/I, que autoriza o Governo a emitir um empréstimo interno amortizável, até à importância total de 40 milhões de contos.
A Assembleia tem alguma coisa a opor quanto ao pedido de urgência?
Pausa.
Como não há oposição, está deferido.
Passamos à segunda parte da nossa ordem de trabalhos.
Continuação da discussão da ratificação n.º 21/I - Decreto-Lei n.º 427-B/77, de 14 de Outubro, que cria o ensino superior de curta duração.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para uma intervenção.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Numa intervenção que há dias aqui fizemos juntamos factos no sentido de demonstrarmos que o saldo de ano e meio de política governativa do MEIC se traduzia por toda uma acção que servia as classes favorecidas, que beneficiava os economicamente mais fortes, que visava manter um ensino elitista, de classe, que visava impedir o acesso dos trabalhadores e dos seus filhos aos graus superiores de ensino, que contrariava o espírito e a letra dos artigos 73, 74, 75 e 76 da Constituição da República.
O Decreto-Lei 427-B/77, em apreço, é bem um exemplo dessa nossa afirmação.
Em primeiro lugar, porque este decreto-lei não cria efectivamente o ensino superior curto. Cria, sim, a nível do pós-secundário uma segunda via, tal como tivemos, e em certa medida ainda temos, as duas vias do secundário - as escolas técnicas e os liceus. Cria, sim, um ensino para alguns dos que não têm possibilidades económicas para frequentar a Universidade, cria, sim, um ensino médio curto, especializado restritivo, sem saída para a outra via, formando
uns «técnicos especialistas» que, apesar de três anos de escolaridade, após o secundário e mais um de propedêutico, não são bacharéis.
Para os outras, para os estudantes economicamente mais favorecidos, mantêm-se toda a estrutura universitária.
A preocupação de manter intacta e defendida a velha instituição universitária foi tão grande que nem se prevêem, e se excluem mesmo, formas de comunicação horizontal ou vertical entre as duas vias.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O conteúdo de classe deste decreto é para nós, comunistas, o aspecto mais saliente, mas não menos relevante é também o seu desequadramento de qualquer espécie de planificação.
Como se pode compreender que o MEIC publique um decreto-lei sobre o ensino superior curto sem previamente ter reformulado o terminal do secundário, mantendo-se a incógnita sobre o que vai seguir-se ao 9.º ano de escolaridade? Se o 9.º ano vier a ter, como pensamos que deve ter, e com muita urgência
- este ano e meio que se perdeu já é extremamente grave-, um terminal profissionalizante, como se insere neste contexto o superior curto agora criado?
E como se insere este mesmo esquema de ensino nas bases gerais do ensino superior que o MEIC deveria ter apresentado a esta Assembleia e não fez?
Quantos graus médios, superiores médios ou curtos viramos a ter? Os terminais do secundário serão uns, os bacharéis das Universidades serão outros, depois os tais técnicos especialistas com a mesma escolaridade, outros, entretanto as escolas de enfermagem ainda e de facto com a mesma escolaridade não são nada, depois existe a licenciatura só para os que tiveram os três anos na Universidade. Há ainda os diplomados dos actuais institutos superiores, como, por exemplo, o de Aveiro, o da Covilhã ou de Évora, que não percebamos bem se são ou não curto.
Como vêem, Srs. Deputados, reina a confusão completa. Mas na confusão percebe-se bem a preocupar cão de não alterar nem mima linha no caminho da democratização, a Universidade, que o MEIC deve escrever caída vez com um U maior, apesar de estar progressivamente mais incapaz de corresponder às reais necessidades à nossa democracia.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Começámos por afirmar que um dos equívocos que este decreto gera está em falar ma criação de uma via (e digo via e não grau) de ensino, que efectivamente não cria. O que é feito, sim, é a completa destruição do que os professores e alunos dos institutos superiores de contabilidade e administração, dos institutos superiores de engenharia e das escolas de regentes agrícolas, num grande esforço de recuperação das suas escolas, de adaptação às necessidades do País e à
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valorização profissional! dos seus estudantes, haviam feito desde o 25 de Abriu.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Senão vejamos. O artigo 2.º prevê a reconversão dessas escolas (c)m escolas superiores técnicas até 1979-1980, nuns casos, e 1981-1982, noutros.
Mais quais são os prazos para criação dias escolas em ramos novos que no próprio, decreto vêm especificadas como necessárias e auto "tecnologia industrial, produção agrícola, pecuária, florestal, saúde e serviços"?
Os ISCA, ISES e escolas superiores de regentes agrícolas vão passar a formar técnicos especialistas (sendo-lhes vedado a possibilidade de ministrarem licenciaturas), o que será uma forma envernizada de fazer renascer os algentes técnicos, no fundo quadros de 2.º, sublicenciados, o que terá reflexos imediatos no mercado do trabalho e condenará estes estudantes a toda a vida serem os tais bacharéis de 3.º, porque o MEIC não lhes permitiu que continuem os seus estudos.
Outra consequência desta medida, e que patenteia claramente o absurdo desta política, é o liquidar-se no nosso país a possibilidade de existência da licenciatura em Contabilidade, como existe em todos os países minimamente desenvolvidos.
No entanto, o meu camarada Jorge Lemos aprofundará com mais pormenores este problema. Não posso, no entanto, deixar do referir que, visando este decreto, e essencialmente a passagem destas escolas a ensino médio, os respectivos órgãos de gestão democráticos, as associações de estudantes e sindicatos dos professores não tenham sido ouvidos, nem consultados.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Que cria de novo este decreto? Objectivamente, muito pouco, e lendo-o atentamente algumas interrogações saltam à vista. Que. planos e que, estudos fez o MEIC para discriminar esses cursos novos e não outros? Informados pelos Srs. Deputados socialistas de que os estudos e os piamos tinham sido intensos, múltiplicámo-nos em esforços para lhes ter acesso e mais conscientemente nos pronunciarmos hoje. Nada conseguimos. E perante as dificuldades, surge-nos a dúvida legitíma. Existiram mesmo, ou será mais um passo na política tão seguida neste ano e meio pelo MEIC e conhecida no País pela técnica "olhómetro"?
No entanto, mesmo criando muito pouco, há questões no seu articulado que merecem uma referência.
No artigo 8.º, que respeita ao pessoal docente, diz-se:
O pessoal docente da escolas superiores técnicas e da escolas superiores de educação reger-se-á por estatuto próprio, que constará do decreto-lei
Esta via de ensino tem tão pouco de superior na concepção dos seus autores que os docentes nem tem o mesmo estatuto. E se isto é grave em relação à desvalorização profissional dos acuais docentes das escolas abrangidas pelo decreto, não menos grave é em relação às escolas que se viessem a criar se este projecto fosse avante.
Mais uma vez e com grande clareza ressalta a concepção de classe inerente a este decreto.
Para uns, os docentes de cátedra, para os outros, os docentes de estatuto especial. Se não se criam no ensino superior curto atractivos profissionais e da valorização dos docentes, e se se pensa na regionalização, a pergunta é legítima: Que nível pedagógico e científico se pretende dar a este ensino?
Quanto ao acesso, regulamentado no artigo 7.º, estabelece que vigoram as normas gerais de acesso ao ensino superior. Mas se se pretende, e cito, "ministrar o ensino predominantemente técnico para formação de profissionais qualificados" em vários domínios e se se diz que "os cursos conterão uma forte componente prática ou pedagógica especializada, de molde a permitir o ingresso '{imediato dos respectivos diplomados na actividade para que foram formados", é verdadeiramente estranho que não se prevejam normas especiais de ingresso dos trabalhadores estudantes e dos trabalhadores (profissionais nesse mesmo ramo?
Não seria exactamente aqui um dos .locais em que o Sr. Ministro se podia ter recordado de que existe um artigo 76.º da Constituição 'sobre o acesso à Universidade onde se fala claramente em "estimular e favorecer a entrada dos trabalhadores" na Universidade?
Como a Constituição andou longe da 5 de Outubro durante este ano e meio!
Uma outra concepção de ensino superior curto constante do Decreto-Lei n.º 427-B/77 não pode, em nosso entender, ser escamoteada e está na separação física dos estabelecimentos de ensino superior curto das Universidades. Se a concepção inversa era efectivamente curta, não se compreende porque não poderá e deverá em muitos casos existir ensino superior curto em Faculdades já existentes.
Não seria esta existência um factor tendente à própria reconversão do ensino superior, que, como já dissemos, cada vez serve menos as necessidades do País? Não seria uma forma de as universidades deixarem de formar anualmente milhares de desempregados, com todo o prejuízo que acarreta para o País e para os jovens, que no fim de anos de estudos vêem como .futuro mais próximo o desemprego?
A dúvida surge-nos. Que contágio temeu o Sr. Ministro da Educação?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os artigos 9.º, 10.º e 11.º do decreto-lei em apreço pretendem regulamentar a gestão dos estabelecimentos de ensino e- a criação de um órgão nacional de coordenação.
O mínimo que se poderá dizer é que é muito estranho que o decreto de gestão em vigor, da autoria da mesma equipa governamental, não se aplique a estas escolas. Estará inerente a esta medida o combate à gestão democrática, mesmo a partir de um decreto que já tão pouco tem de democrático?
E se o regime de instalação provisória poderia ser legítimo das novas escolas a criar, que objectivos teve o Sr. Ministro quando acabou com a gestão democrática em escolas em que já existe e em que tem dado sobejas provas como os ISCA e ISES outras?
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No entanto, Srs. Deputados, no artigo 11.º diz-se:
Nas escolas superiores técnicas será criado obrigatoriamente um conselho consultivo em que terão assento, piara além de representantes dos seus órgãos de direcção, representantes das actividades sócio-económicas, através das estruturas nacionais ou regionais responsáveis ou interessadas.
Para além de estranharmos que não esteja prevista a participação neste órgão dos legítimos representantes dos estudantes -as suas associações - interrogámo-nos do porquê desta rebuscada fórmula de representantes das actividades sócio-económicas? Será que o Sr. Ministro da Educação pretende referir-se com estas estruturas às entidades patronais? Aos sindicatos não é costume chamar-se assim?
Fica-nos a dúvida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP já por mais de uma vez, aqui mesmo na Assembleia da República, se manifestou favorável à criação do ensino superior curto. No entanto, como por um lado temíamos já que o conteúdo que lhe viesse a ser dado pelo actual Ministro não correspondesse aos reais interesses nem dos estudantes, nem do País, e por outro porque pensámos que esta matéria deveria ser alvo de debate nesta Câmara, votámos contra o pedido de autorização legislativa solicitado nesta matéria pelo Governo.
Hoje, verificamos que tivemos razão, e que se teria poupado tempo se o PPD/PSD e o CDS não tivessem votado favoravelmente a concessão dessa autorização. Pois ainda hoje pensamos que e urgente legislar nesta matéria e somos de opinião que se o decreto não for ratificado, o futuro Governo deve, no mais breve prazo, apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, porque o Grupo Parlamentar do PCP considera urgente a reconversão das escolas normais de educadores de infância e das escolas do magistério primário em escalas normais superiores, como se prevê neste decreto-lei.
Em segundo lugar, porque não menos urgente é criar um verdadeiro ensino superior curto.
Neste sentido, e prevendo a hipótese de ser concedida a ratificação, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta hoje uma série de propostas de alteração que contêm os princípios básicos que, em nosso entender, devem presidir à criação deste grau de ensino, e digo grau e não via de ensino.
1.º O ensino superior curto deve, em nosso entender, conferir o grau de bacharel. Inerente a esta concepção estão duas ideias: Por um lado, que existe licenciatura; ou que no caso de ela vir a ser criada, ela possa existir, que o estudante possa sem mais continuar os seus estudos, por outro, que três anos de escolaridade no ensino superior valha o mesmo, quer se trate de curto ou de longo.
2.º Concordamos que o ensino superior curto vise a satisfação de necessidades económicas, sociais e culturais do País, tanto de nível nacional como regional.
3.º Se concordamos que os cursos devem ter uma componente prática que habilite os estudantes a ingressar imediatamente na sua profissão, pensamos que a preparação teórica não deve ser preterida, sob pena de estarmos objectivamente a impedir o acesso à licenciatura (como fazia o regime fascista) e estarmos, devido a uma preparação excessivamente especializada, a produzir futuramente desempregados.
4.º Pensamos também, e por isso apresentaremos proposta nesse sentido, que quando se pense na regionalização do ensino se devem criar as formas de participação das regiões, e enquanto estas não existirem, das assembleias distritais, na planificação dessa regionalização.
5.º Sobre o acesso, pensamos que deverão ser criados mecanismos de ingresso directo dos trabalhadores profissionais no ramo de ensino respectivo que permitam que esses trabalhadores, com a sua experiência profissional, mas sem a respectiva habilitação académica, se valorizem profissional, social e culturalmente.
6.º Quanto ao campo docente, propomos que se reja pelo mesmo estatuto dos restantes docentes do ensino superior e que não seja objecto de nenhuma espécie de discriminação.
7.º Propomos que aos estabelecimentos que vierem a ser criados de novo no âmbito do ensino superior de curta duração se devem aplicar as normas de gestão democrática em vigor nos restantes estabelecimentos de ensino superior.
8.º Propomos atada, que se mantenham em vigor os Decretos-Leis n.ºs 830/74, de 31 de Dezembro, 316/76, de 29 de Abril, e 327/76, de 6 de Maio, que dizem respeito aos institutos superiores de engenharia, aos institutos superiores de contabilidade e administração e às escolas superiores de regentes agrícolas.
No esquema de ensino superior curto que pensamos dever existir a concepção destas escolas, contidas nesses decretos-leis e cabe perfeitamente este esquema, diremos mesmo que são um exemplo concreto disso.
9.º Somos de opinião favorável ao que o presente decreto-lei estipula sobre a existência de escolas normais superiores e dias escolas superiores de educadores de infância, acrescentando-lhe as escolas de enfermagem.
Aqui, cabe uma referência às discordâncias que temos em relação às propostas que o PSD aqui fez e que motivou o seu pedido de ratificação deste decreto-lei. É que é exactamente neste ponto, no único ponto em que o Partido Comunista está de acordo com o decreto-lei, que o PSD fundamenta o seu pedido de ratificação.
10.º Eliminamos todos os artigos, ou tudo aquilo que neste decreto vise criar, fomentar ou manter discriminações sociais, ou ter um claro conteúdo de classe, desfavorecendo os estudantes economicamente mais desfavorecidos.
Se o ensino superior curto viesse a ser criado nesta óptica, poderíamos então dizer que se dava um importante passo no sentido real da democratização do ensino. Poderíamos também dizer que daríamos um não menos importante passo no sentido de adaptar o ensino às reais necessidades do País em quadros técnicos e, consequentemente, no combate ao espectro do desemprego, que tanto preocupa e atinge a juventude.
Por tudo o que dissemos, e pelo que acabamos de referir como linhas gerais que, em nosso entender.
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deve ser conteúdo do ensino superior curto, a posição do Grupo Parlamentar do PCP não pode ser outra que a de votar contra o pedido de ratificação do Decreto-Lei 427-B/77.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Demagogia pura. O Sr. Presidente dá-me licença?
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade. Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, ouvi a sua intervenção e devo dizer que, em muitos pontos, gostei de afirmações que fez e que vieram, aliás, corroborar algumas outras que ontem mesmo aqui fiz. Mas gostaria de lhe fazer umas perguntas.
A primeira é a seguinte: creio que a Sr.ª Deputada tem presente o programa do Governo relativamente à parte de educação e à parte em que o Governo se propõe apresentar a esta Assembleia a reforma geral do ensino e nomeadamente a reforma do> ensino superior. Pergunto, pois, se a Sr.ª Deputada sabe para que ano lectivo é que o programa do Governo propunha a apresentação dessa proposta? Para a ajudar, devo dizer-lhe que era precisamente para o ano lectivo de 1977-1978 que estava apontada a apresentação desse projecto de reforma.
Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada referiu que tinha sido dito por um Deputado do Partido Socialista, aliás suponho que fui eu, que estavam na base destes estudos outros, quer da análise comparativa de estruturas de ensino ao nível superior e internacional e também estudos) de ordem nacional. Suponho que a Sr.ª Deputada não desconhece que esses estudos existem - basta dar uma vista de olhos pelas imensas publicações do Conselho da Europa, da OCDE, da UNESCO -, que são acessíveis a todos os Deputados. Mas pergunto por que razão é que a Sr.ª Deputada só se lembrou na última reunião da comissão especializada de educação quando eu falava desse assunto, de solicitar esses mesmos estudos, e por que é que, quando começou a pensar no assunto, nomeadamente quando teve de se pronunciar sobre ele, (c)m Agosto, na altura da autorização legislativa ao Governo, não os solicitou ao respectivo Ministério, dado que lhe está aberta essa possibilidade.
Em último lugar, gostava de saber se a Sr.ª Deputada considera que se deve manter o actual estatuto, nomeadamente dos ISEs e dos ISCAs - institutos superiores de engenharia, institutos superiores de contabilidade e administração-, tal como está, isto é, possibilitando a licenciatura e o doutoramento. Pergunto-lhe, pois, se considera que, mantendo-se esse mesmo estatuto, essas serão escolas concorrentes com outras escolas que, neste momento, dão licenciatura e doutoramento ao nível do ensino superior, e se não se correrá o perigo de, ao mante-las, se lhes dar um estatuto de universidade de 2.ª ordem?
Repare, Sr.ª Deputada, que o total dos docentes destas escolas é de 791, dos quais apenas 40 são professores auxiliares ou equiparados, o que quer dizer menos que 5%, e apenas 2 são doutorados, ou seja, menos que 0,2%.
Neste momento nós temos 8 escolas, por exemplo, que formam engenheiros. Uma universidade não é uma escola que se cria e que fica desde logo universidade: é uma escala que demora tempo a arranjar espaço para se impor com dignidade e com prestígio. Pergunto se não teima que duas escolas novas deste género, ainda por cima com o corpo docente e com a qualificação que tem, venham, no fundo e ao cabo, para não dizer já, e destroçar todo o processo de formação de engenheiros ou técnicos qualificados - já que, neste momento, como sabe, está invertida a nossa pirâmide. -, se não teme pelo menos isto, que elas, pura e simplesmente, venham sempre a ser consideradas escolas universitárias de 2.ª classe.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para responder.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Quanto à primeira questão que a Sr.ª Deputada me coloca, de qual era o prazo que o Governo se propunha no seu programa para apresentar a esta Assembleia as bases gerais da reforma do ensino superior, pois a Sr.ª Deputada o relembrou. O que lamento, porém, não é tanto o prazo que vinha previsto no Programa do Governo, mas que o Ministério da Educação, ao longo deste ano e meio, não tenha começado exactamente por aí e tenha começado por tomar toda uma série de medidas como esta, por exemplo, que pode entrar, evidentemente, tem choque com essas lacte bases gerais da reforma de que me fala. Repare: se se cria agora o ensino superior curto antes de se ter remodelado os terminais do secundário, com os estudantes que estão mo 9.º amo a não saberem nada, qual vai ser o seu futuro, antes de se ter feito o que quer que seja em redacção às escolas do ensino superior, em relação às quais este Ministério a única escola que fez foi nomear umas comissões científicas nacionais, todas elas constituídas por catedráticos que, na larga maioria dos casos, não disseram nem remodelaram nada e ultrapassaram todos os prazos que lhes foram concedidos, inclusive numa lei aqui aprovada pela Assembleia da República? Ora, antes de isso estar feito, que se crie a meio caminho o ensino superior curto, temo, Sr.ª Deputada, que não tenha sido por o Sr. Ministro acabar o seu mandato sem ter feito nada de positivo e, pelo contrário, ter só destruído aquilo que estava a ser feito.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Em relação aos estudos, Sr.ª Deputada, tenho a dizer, em primeiro lugar, que os estudos que eu solicitava não são os estudos que a OCDE fez ou que foram fados em qualquer país do Mundo, mas os estudos feitos em Portugal sobre a mossa realidade nacional. E eram esses estudos que eram necessários conhecer, porque, Sr.ª Deputada, orlar ourelos novos em ramos nos quais eles não êxuis-
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tem, que não sejam na base dias necessidades de cos concretos que a nossa economia virá a ter dentro de dois, três, quatro anos e para o seu futuro, temo que seja a tal politica do "olhómetmo" a que me referia.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Andes ate lhe, permitir que me interrompa, gostaria só de lhe dizer que é natural que, se o Sr. Ministro se baseou nestes tais estudos internacionais da CEE ou de outros quaisquer, tenha liquidado as escolas que desde o 25 de Abril encetaram o processo visando a sua própria remodelação. É natural que tenha tomado medidas como acabar com os ISEs, com os ISCAs e com essas escolas que tenham encetado uma experiência bastante positiva baseada na nossa realidade nacional, e não nos estudos da CEE.
Mas, como diz que eu só pedi esses estudos na última reunião da Comissão, isso não é verdade, Sr.ª Deputada. Há um mês que esses estudos foram pedidos na própria Comissão - não sei qual é a data do ofício enviado pelo Sr. Presidente nesse sentido, mas deve ter pelo menos três semanas. Digo-lhe que há mês e meio eu, pessoalmente, telefonei para o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, atendeu-me o seu chefe de gabinete, solicitando que ele me enviasse estes estudos. O Sr. Secretário de Estado disse-me que sim, que imediatamente me ia enviar os tais estudos e não enviou nada. listo leva a deduzir que, se calhar, os únicos estudos que o Ministério fez foram, não sobre a nossa realidade nacional, sobre as necessidades de técnicos que temos cá no nosso país, mas sim os tais estudos da CEE e do Banco Mundial, que, enfim, estão ao dispor de qualquer pessoa, como já disse, e que eu podia ter consultado e consultei.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?
A Oradora: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Se me permite, Sr.ª Deputada, penso que quando a Sr.ª Deputada diz que este decreto foi baseado em critérios de "olhómetro" sem estudos nacionais - é a Sr.ª Deputada que o afirma -, porque, na realidade, se desconhece os levantamentos" os inquéritos, que foram feitos a vários organismos relativamente a necessidades de mão-de-obra qualificada, se desconhece isso - aliás, aqui, na Comissão especializada, esses estudos foram apresentados por técnicos que acompanharam o Sr. Ministro - é pura e simplesmente porque a Sr.ª Deputada os desconhece, mas nada lhe permite afirmar, com certeza, que não existe nada feito e que é apenas uma política de "olhómetro".
A Oradora: - Sr.ª Deputada, se fiz todos os esforços, inclusive através do Presidente da Comissão de Educação, Ofendia e Cultura, pana que esses estudos fossem facultados a todos os partidos que estão nesta Assembleia, para eles, mais conscientemente, se poderem pronunciar sobre o assunto; se pessoalmente, i ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior solicitando que fosse enviado ao meu grupo parlamentar esses estudos, e se (nenhum estudo nos é enviado e nenhuma resposta nos e dada, é com toda a legitimidade que podemos dizer que, se- calhar, não foram feitos estudos nenhuns. E quando a Sr.ª Deputada me diz que os estudos existiam, pergunto-lhe isto; se não seria o primeiro ponto para começar esses tais estudos, ouvir os estudantes, os professores, os órgãos de gestão, os legítimos representantes das escolas que são abrangidas por este decreto e que não foram ouvidos? Não seria de começar por ouvir o Sindicato dos Professores e o Sindicato dos Engenheiros Técnicos, que não foram ouvidos, já que, ao que parece, a única entidade que os ouviu foi o Banco Mundial e não o MEIC?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peco-lhe que conclua porque já excedeu largamente o seu tempo.
A Oradora:- Sr. Presidente, vou concluir só para mão deixar em branco uma pergunta que a Sr.ª Deputaria fez sobre se o nosso grupo parlamentar pensa quo se deve manter o actual estatuto dos ISEs e dos ISCAs. Pois pensamos que sim, e, aliás, fazemos uma proposta cone neta no sentido de que os decretos-leis que neste momento regem essas escolas se mantenham em vigor. Pensamos que de maneira nenhuma se trata de faculdades de 2.ª ordem e quando a Sr.ª Deputada, para argumentar que o são, me diz que só têm dois doutorados, pergunto-lhe se o nível científico de uma escola se vê pelo número de doutorados que tem. Digo-lhe até Que esses tais doutorados que foram, pelo actual Ministro, encarregados de remodelar a Universidade não conseguiram fazer nada, e, na sua larga 'maioria, são bastante incompetentes, como quarenta anos em que o ensino superior esteve entregue a esses tais doutorados, demonstrou...
Aplausos do PCP.
..., enquanto estas escolas têm tido no seu corpo docente alguns dos melhores técnicos, homens com uma larguíssima experiência profissional, que não seria mau que os próprios docentes das actuais escolas de Engenharia tivessem.
Mas, quando me pergunta se isso não se poderia chocar com outras licenciaturas de outras faculdades, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, em que faculdade é que é feita a licenciatura de confiabilidade e administração? Tenho ideia que em maus nenhuma, se não na que neste momento está previsto que possa existir nos actuais ISCAs, mas em mais nenhuma outra. Creio que uma Universidade de 2.ª, que nem Universidade será, certamente, é o que este decreto visa criar, criando-se uma via de que os estudantes nem sequer poderão transitar para a tal Universidade tradicional.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço desculpa, mas já pedi que concluísse as suas considerações. Leva cinco minutos de intervenção e não pode ser, pois tinha apenas três minutos para o fazer. Peço desculpa, V. Ex.ª pode fazer uma segunda intervenção mas não posso permitir que continue.
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Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Rosetai, para pedidos de esclarecimento.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, não é para pedir esclarecimentos, mas sim para os dar.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado acha que a Câmara precisa de esclarecimentos?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sim, Sr. Presidente, porque a Sr.ª Deputada Zita Seabra fez uma afirmação que não corresponde à verdade.
O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - A Sr.ª Deputada Zita Seabra afirmou - a não ser que eu tenha entendido mal -que o Grupo Parlamentar do PSD teria votado favoravelmente a autorização legislativa pedida pelo Governo em Agosto. Não foi isso que se verificou. Tenho aqui o Diário da Assembleia da República, N.º 139, de 10 de Agosto, que confirma que o Grupo Parlamentar do PSD - por razões que vou repetir com a maior brevidade paira que fique claramente esclarecida a Câmara e, em espacial, a Sr.ª Deputada - se absteve.
Antes de reler esses pedaços essenciais, quero dizer que nós pensávamos, mesmo abstendo-nos, que se tratava de um decreto que visava criar um novo tipo de ensino superior curto, e não, como disse ontem na minha intervenção, que se entrasse peto caminho dia reconversão de escolas já existentes. Pusemos muitas reservas, que poderia sumariar, quando afirmei que nos custava a perceber como se pretendia criar entre nós este tapo de ensino sem o enquadrar numa inovação global do ensino superior, precedida de amplo debate com base unicamente em estudos de gabinete, mais ou menos tecnocráticos. Se se pretendi que as novas escolas sejam instituições, cumpre saber com precisão quais vão ser as possibilidades de passagem de outras instituições de ensino para estas e vice-versa. E também não nos consideramos esclarecidos sobre a ligação adequada no curso complementar do ensino secundário, etc., e gostava que isso ficasse bem esclarecido. Pusemos muitas outras dúvidas quo constam da declaração de voto proferida peto Deputado Gonçalves Sapinho. Infelizmente, essas duvidas vieram a confirmar-se com a publicação do diploma e daí as nossas reservas, já expressas, e as nossas propostas de profundas alienações.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecassis, .paira uma intervenção.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando, em 10 de Agosto de 1977, esta Assembleia da República concedeu ao Governo autorização para Legislar sobre a criação do ensino superior do curta duração, assinalámos, na intervenção feita então, alguns aspectos que convém agora recordar.
1.º O desenvolvimento económico, social e cultural do nosso país exige, desde há muito, que se proceda a uma diversificação, em extensão e em profundidade, do sistema de ensino pós-secundário e universitário;
2.º Tendo em conta que todo o sistema nacional de ensino deve ser, em si mesmo, um sistema de selecção justa dos mais aptos, independentemente das respectivas procedências geográficas, sociais ou culturais, deve ser assegurado aos estudantes o direito elementar, e aliás constitucional, de livre circulação no seu interior e de livre acesso a qualquer um dos seus graus;
3.º A incongruência de se lamentar o desaparecimento de técnicos de nível médio quando se prossegue na liquidação, pura e simples, do ensino técnico secundário sem curar de o substituir por um ensino unificado que, realmente o seja;
4.º O irrealismo de supor, erradamente, que a simples criação de um ensino superior, ou pós-secundário, curto e profissionalizante poderá, por si só, realizar o milagre de suprir a falta de toda uma formação prévia, actualmente inexistente.
Nestes quatro pontos estão sintetizadas as ideias que temos repetidamente manifestado sobre o que deve ser, na nossa opinião, o ensino superior de curta duração - numa palavra: um meio privilegiado da promoção cultural e profissional para a sociedade portuguesa e não uma nova forma, sofisticada, de promover a igualdade na ignorância.
Quer isto dizer, muito claramente, que quando se cria um novo grau de ensino deverá entender-se que o seu preenchimento há-de fazer-se por aqueles que ainda o não atingiram, e não, nunca, por aqueles que já o ultrapassaram.
Bem ao contrário, o conceito expresso e informador do decreto-lei agora sujeito a ratificação denota um total desajustamento da realidade nacional ao estabelecer, a prazo mais ou menos curto, a reconversão dós actuais institutos superiores de contabilidade e administração e de engenharia para estie novo ramo.
Adiante nos referimentos, em mais detalhe, a estes casos. Por agora, gostaríamos de manifestar a nossa total concordância com a afirmação já aqui feita de que a instituição do ensino superior de curta duração é, de certo modo, um acontecimento de alta importância e, em qualquer caso, o primeiro e até agora o único passo dado no sentido de tão necessária diversificação do ensino superior.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que manifeste a minha perplexidade perante este facto insólito: como é possível que uma ideia tão rica em potencialidades criadoras tenha sido vazada num decreto-lei de tal pobreza de conteúdo?!
Por mim, e em termos de concurso televisivo que tanto influenciaram o passado recente deste país, eu dar-lhe-ia 8 valores pela "ideia", por não ser original, e 2 pelo "sotaque".
Risos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um país como o nosso, pobre, ou pelo menos não rico em matérias-primas, que quer, muito justamente, promover o seu desenvolvimento e reencontrar um projecto nacional motivador, não tem outro recurso que não seja o de aproveitar toda a sua riqueza humana. Em qualquer circunstância, esta seria uma realidade irrefutável.
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Muito mais o sara hoje pelas razões que a seguir aponto.
Em primeiro lugar, o nosso pedido de adesão da CEE, em tão boa hora apresentado, traz consigo o risco, que desde hoje deve ser tido em conda, de permitir dentro de dez anos a livre circulação de técnicos no interior do espaço então criado. Quer isto dizer que todo o desemprego tecnológico existente na Europa ?e encaminhará para Portugal, em busca de nosso sol e dos postos de trabalho disponíveis, relegando para segundo lugar os nossos filhos, se até então não lhes tivermos conseguido dar uma formação cultural, tecnológica e profissional que os habilite a competir no mercado aberto de trabalho.
As implicações sociais, e mesmo de independência nacional, que esta situação comporta são de tal gravidade que não compreendemos nem aceitamos que até hoje ninguém tenha lançado este aviso e este grito de alerta mobilizador à juventude portuguesa. Ele aqui fica! A nossa juventude dar-lhe-á a resposta, esforçada e exigente, pedindo e criando as condições para que amanhã não venha a ser condenada a fazer parte das legiões de emigrantes que, injustamente, se vêem obrigadas a correr mundo.
Em segundo lugar, a abertura de Portugal a todos as países do Mundo criou as condições Meais para que possamos explorar, em nosso proveito e no dos restantes povos, essa riqueza inesgotável que constitui a assistência técnica a países em desenvolvimento. Se formos capazes de formar técnicos competentes, aptos como estamos, e sempre estivemos, para o contacto e compreensão de outros povos e civilizações, sem complexos de superioridade nem espírito de neo-colonialismo, poderemos" encontrar nessa ajuda técnica ao desenvolvimento de outras nações um forte impulso paira a nossa economia e, do mesmo passo, contribuir para a instauração de uma vida melhor e mate justa para a Humanidade,
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, pois, neste quadro que reafirmo a indispensabilidade da implantação de um ensino superior de curta duração integrado e não desgarrado, do sistema nacional de ensino hoje ainda tão tragicamente abalado.
A função fundamental que este ensino deverá vir a ocupar é a do preenchimento do espaço de competência, hoje vazio, entre a formação de nível secundário e a de nível universitário, quatro ou cinco anos mais longa.
Todos conhecemos as consequências desse vazio. Tem-se verificado, desde sempre, uma nefasta tendência pana o subaproveitamento dos nossos técnicos de formação universitária. Eles são, em grande número, chamados a desempenhar, funções de grau muito inferior ao daquelas que deveriam desempenhar e, com isso, provocam-se dois males igualmente nefastos: se, por um lado, o seu ancilosamento representa um desperdício da capacidade e da riqueza nacional!, por outro, o seu subaproveitamento bloqueia a oferta de oportunidades a tantos outros que, tento capacidade, se vêem relegados a nunca terem ocasião de a demonstrar. Por uma e outra razão, talvez esteja aqui uma das mais fortes razões do nosso subdesenvolvimento cultural e do cortejo de injustiças sociais que em si mesmo comporta.
Será esta a visão que se reflecte no decreto-lei que agora apreciamos? Estou em crer que não, e lamento-o. No entanto, tem esta Assembleia, pelo instituto de ratificação, a oportunidade de introduzir à lei as alterações que se impõem e de reintegrar este ramo de "resino na função fundamental que de deve vir a desempenhar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na introdução ao Decreto-Lei n.º 427-B/77 fazem-se algumas afirmações e praticam-se algumas omissões sobre- as quais esta Assembleia da República deverá meditar.
Em primeiro lugar, não é correcto afirmar-se que a formação de técnicos de nível médio desapareceu em Portugal devido à transformação dos antigos institutos em escolas superiores. Não o é por dois motivos: primeiro, porque aqueles institutos nunca formaram essa espécie de técnicos; segundo, porque o ensino técnico profissional não chegava a formá-los. Na realidade, nunca existiram em Portugal, salvo raras excepções de autodidactismo, verdadeiros técnicos de nível médio.
No que se refere aos institutos industriais, quem poderá esquecer o ridículo de currículos praticamente idênticos aos das escolas de Engenharia, mas da "via reduzida", que causaram tantos e tão graves traumatismos sociais e não foram capazes de resolver nenhum dos problemas de fundo da nossa defeituosa estrutura industrial?
Quanto aos institutos comerciais, pergunto o que se deve pensar de uma sociedade que em 1977 ainda se não apercebeu da importância vital de formar economistas de empresa - ou especialistas de microeconomia - e continua a produzir, em quantidades industriais, pseudomacroeconomistas que, se o fossem de facto, já seriam suficientes para planear o futuro da Humanidade até ao século XXII?
Por outro lado, não vemos no preâmbulo do decreto-lei qualquer referência, ou sequer qualquer apontamento, à parte uma anódina, incompleta e não justificada referência a uns tantos sectores de actividade, sobre a necessidade de criar técnicos especialistas em sectores especializados da indústria, ou da agricultura, ou da pecuária, ou das pescas, ou da exploração prática e imediata das riquezas que o alargamento das nossas águas territoriais nos proporciona. Não vemos também referência à formação de técnicos de gestão cooperativa ou de administração local, quando tanto ênfase se põe, por vezes, no desenvolvimento cooperativo ou na descentralização administrativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria ainda de chamar a atenção desta Câmara para dois pontos da maior relevância.
O primeiro refere-se ao livre acesso dos mais aptos aos graus universitários do ensino. Talvez não valha a pena insistir muito sobre ele, até porque a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio já aqui anunciou a atenção do PS de introduzir um aditamento que clarificará a situação. Nós, de resto, apresentaremos também um aditamento que torna explícita esta nossa preocupação.
O segundo refere-se à possibilidade de reversão para graus de ensino superior curto de todos aqueles estudantes que, por um motivo ou por outro, se vejam impedidos de prosseguir os seus estudos universitários. Não há no presente decreto-lei qualquer referência a esta situação e, contudo, ela cons-
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titui, e sempre constituiu, uma das mais pesadas fatalidades a que a sociedade portuguesa tem estado sujeita. Com efeito, quem ignora os milhares e milhares de portugueses que, abandonando as universidades a meio dos seus cursos tantas vezes por insuperáveis dificuldades familiares e económicas, se vêem sujeitos à situação injusta de serem considerados, para iodos os efeitos úteis, como simples detentores do diploma do ensino secundarão complementar? Será que estes cidadãos não poderão encontrar uma actividade mais compensadora para eles próprios e mais útil para a sociedade em que vivem? Será que este pais é tão rico que se pode permitir esta contínua e inacabada sangria de valores? Será que é conveniente, ou justo, ou merecido, rechear a sociedade portuguesa de cidadãos frustrados e não realizados nas suas reais capacidades?
O CDS, consciente da necessidade urgente de acabar com este estado de coisas, apresentará uma emenda que porá fim a esta situação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No campo das medidas concretas, gostaria agora de anunciar que vamos propor a integração neste novo ramo de ensino superior das actuais escolas de enfermagem, para cuja frequência já hoje são exigidas as condições de admissão que neste decreto-lei se prevêem.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Não se trata só de praticar um acto da mais elementar justiça para com os interessados. Trata-se também de contemplar, dentro de um espírito europeu, as necessidades de formação crescente deste campo de actividade, se queremos de facto proporcionar ao nosso povo a fruição do elementar e constitucional direito à saúde
Vozes ao CDS: - Muito bem!
O Orador: - Proporemos também o abreviamento do ingresso das escolas de educadoras de infância e das escolas do magistério neste novo ramo de ensino. Há resoluções que não podem nem devem ser adiadas, mesmo que a sua execução (mediata faça apelo a um esforço dos próprios interessados. Com efeito, o alargamento da escolaridade obrigatória, para ser efectivo e eficaz, exige de imediato um acréscimo de formação dos docentes e, por outro lado, o melindre da educação da infância já hoje exige, a quem a ele se dedica, um tipo de formação e de conhecimentos que perfeitamente se enquadram neste novo ramo de ensino. Proporemos também uma medida que conduza a que o Ministério da Educação e Investigação Científica reconheça, para todos os efeitos úteis, a paridade dos estabelecimentos privados de ensino que já hoje e em exclusividade têm proporcionado aos portugueses este nível de educação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma última referência às escolas superiores referidas no decreto-lei. Desde já quero anunciar que o CDS se opõe à sua integração neste ramo de ensino. Passarei a explicar porquê. Como anteriormente disse, verifica-se em Portugal a circunstância curiosa de se multiplicar o número de faculdades de Economia, onde se formam financeiros e macro-economistas, e de ninguém se ter apercebido até hoje da importância fundamental da formação de economistas de empresa com perfeito domínio nos campos da contabilidade, das funções administrativas, da auditoria e dos circuitos internos.
Só isto explica que no nosso país prosperem empresas estrangeiras deste ramo, enquanto, pacífica e tranquilamente, continuamos a discutir entre nós das vantagens ou inconvenientes de permitir o acesso à licenciatura dos nossos contabilistas e administra-
Vozes do CUS: - Muito bem!
O Orador: - É bom que fique claro, de, uma vez por todas, que contabilidade e administração constitui uma ciência autónoma em relação à economia e que, por isso mesmo, se justifica a sua existência ao nível do ensino universitário. Saliento: contabilidade e administração, pois, com efeito, é da conjugação destas duas ciências que resulta a completa compreensão em relação aos problemas de reestruturação das nossas unidades industriais que permitirá no futuro libertarmo-nos, pelos nosso próprios meios, da sangreira que tem representado a epidemia de organizadores estrangeiros que tem enxameado este país sem que daí resultem quaisquer consequências positivas para a nossa economia.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Uma última palavra no que se refere aos institutos superiores de Engenharia. Eu sei, e quero afirmá-lo aqui mais uma vez, que todo o ensino de Engenharia tem de ser corajosamente reformulado neste país e é exactamente por isso que me oponho a que aquelas escolas se vejam remetidas para o ramo de ensino agora criado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de vos ler alguns passos de um trabalho de alguém que tem competência sobre este assunto, o Prof. Eduardo Abrantes e Oliveira, recentemente nomeado reitor da Universidade Técnica de Lisboa, referindo-se a licenciaturas e bacharelatos.
"Sendo o Instituto Superior Técnico, antes de mais, um estabelecimento de ensino, a primeira questão que se levanta é a do tipo de cursos que virá a ministrar no futuro. A questão não é de resposta simples porque se prende com o problema da organização do ensino da Engenharia em Portugal, a qual será examinada neste capítulo à luz de dois princípios que se julgam 'indiscutíveis. O primeiro" - chamo a atenção dos Srs. Deputados para este aspecto - "é que a engenharia pode e deve ser exercida a vários níveis. Parece ser nomeadamente do consenso geral que os técnicos superiores se devem repartir por duas categorias, podendo as de nível mais baixo ascender ao mais elevado mediante o preenchimento de condições que não interessa aqui discutir. O segundo princípio indiscutível é que a distinção entre os planos de estudo dos bacharéis e dos licenciados não deve residir propriamente na informação tecnológica, a qual se desactualiza rapidamente, mas na formação científica e metodológica
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que dá capacidade para assimilar não só as técnicas do presente, à medida que vão sendo necessárias, mas também as que forem surgindo ao longo dos quase cinquenta anos de uma vida profissional normal.
Ora, em face da necessidade de formar bacharéis e licenciados, duas soluções são possíveis.
Primeiro, formar os licenciados a partir dos bacharéis, organizando cursos de um único tipo, em que os primeiros anos levem aos bacharelato e esses mais os últimos à licenciatura.
Segundo, separar os candidatos ao bacharelato dos candidatos à licenciatura logo desde os estudos secundários, oferecendo cursos distintos a uns e a outros."
E depois de analisar as vantagens e inconvenientes de cada uma destas soluções, o Prof. Arames e Oliveira diz o seguinte:
Os inconvenientes referidos para a primeira solução são, no entanto, reais, o que explica que se não deixe de estudar a possibilidade de os minorar, considerando que é preferível ter alunos frequentando simultaneamente duas escolas - e lembra-se que tal já aconteceu, pelo menos no curso de Medicina de Lisboa na época do seu apogeu, a investigadores em duplo emprego. Tal possibilidade, que no fundo constitui uma terceira solução, síntese das duas primeiras, consiste em instalar nas escalas de licenciados só parte das cadeiras que conduzam às licenciaturas, devendo os candidatos frequentar as restantes em escolas de bacharéis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assam sendo, e havendo necessidade de reformular totalmente o ensino da Engenharia em Portugal, não nos parece sensato fechar portas. Os traumatismos sociais assim criados e as injustiças praticadas em relação a institutos que se portaram com dignidade e com sentido de responsabilidades, inviabilizariam as futuras transformações a que teremos de nos abalançar imediatamente. Neste campo, as soluções, quanto a nós, serão encontradas na utilização conjugada das escolas existentes. Nunca serão obtidas com atitudes discriminatórias e desligadas da realidade portuguesa.
Aplausos do CDS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Vítor Sá Machado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado, apenas quero fazer-lhe duas perguntas muito breves.
Na sua intervenção fala o Sr. Deputado na necessidade de estar presente a preocupação de se dar condições de acesso aos mais aptos. Se interpretei bem as suas palavras, é esta a ideia que me pareceu transmitir. E eu fazia a seguinte pergunta: estarão o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar dispostos a considerar favoravelmente a votação de uma proposta tendente a dar acesso ao ensino superior curto aos trabalhadores profissionais em ramos de actividade de escolas, que venham a ser criadas no âmbito do ensino superior curto, sem que eles detenham a respectiva habilitação académica?
Outra pergunta: o seu grupo parlamentar votará favoravelmente a aprovação de uma proposta no sentido de se manterem em vigor os Decretos-Lei n.ºs 830/74, 316/76 e 327/76, que vigoram neste momento para os institutos superiores de Contabilidade e Administração, os institutos superiores de Engenharia e as escolas superiores de regentes agrícolas, partindo nós do princípio, tal como os estudantes e os professores dessas escolas que recebemos na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, de que há necessidade de melhorar o nível científico e pedagógico dos respectivos cursos e que aqueles decretos se devem manter em vigor?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nuno Abecassis deseja responder já ou quer aguardar os pedidos de esclarecimento do outro Sr. Deputado que se encontra inscrito?
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Para não deixar de responder totalmente, talvez seja melhor responder caso por caso.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, penso que é evidente na minha intervenção que eu quis virar o problema e iluminá-lo a uma luz que, a meu ver, ainda não tinha sido projectada sobre ele. Mas de tudo o que eu disse ressalta claramente - e para a Sr.ª Deputada mais claramente do que para qualquer outra pessoa, visto que tem tido um trabalho continuado comigo na Comissão de Educação, Ciência e Cultura - que é minha ideia, muito dará, muito firme e muito esclarecida, que um sistema nacional de educação para ser nacional tem de dizer respeito a todos os portugueses, e que para ser de educação tem de promover a selecção dos mais aptos. Tenho, aliás, muito gosto em dizer à Sr.ª Deputada que na empresa onde trabalho isto já se pratica há muito tempo. Operários nossos são conhecidos em todo o mundo, menos em Portugal, como engenheiros, e tenho um grande orgulho em ter contribuído esforçadamente para que assim fosse.
Verei, e penso que todos os portugueses o deverão ver, com uma grande alegria, com uma grande satisfação e com uma grande confiança no futuro o momento em que em Portugal se possa fazer uma selecção de competências e possamos aproveitar ao máximo os 9 milhões de cérebros que temos, em vez de andarmos a esgotá-los e a deitá-los estupidamente fora, quando é, de certeza, o melhor e o mais rico recurso que possuímos.
No que diz respeito aos decretos sobre as escolas superiores, a minha resposta, Sr.ª Deputada, é simples.
Primeiro que tudo, estas escolas, a meu ver, nada têm que ver com o decreto-lei que está em ratificação. Recuso-me terminantemente a meter um remendo nalguma coisa que tem de ser vista com pés e cabeça. Considero, como disse na minha intervenção, que há dois casos totalmente diferentes: um é o do instituto superior de contabilidade e adminis-
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tração, que deve ser visto autonomamente e que, a meu ver, deve constituir efectivamente uma escola universitária, porque convém que os Srs. Deputados não esqueçam que, se foi possível aos países desenvolvidos explorarem a organização de empresas em todo o mundo, foi porque desde há muito tempo têm investigadores, licenciados e doutorados nos campos da contabilidade e da administração. Nós próprios fomos vítimas disso e continuamos a ser porque infelizmente temos caído nas mãos de muitos charlatães. Para mim isso é um problema autónomo, nada tem que ver com isto. Considero que esses decretos não tiveram em conta a totalidade do problema e nós temos de ter em conta a totalidade do problema.
No que respeita aos institutos superiores de Engenharia, pelo que eu disse é evidente que não me satisfazem, de forma alguma, os decretos que estão feitos. A minha visão é que há que explorar integradamente todas as escolas portuguesas de Engenharia. Já uma vez disse nesta Assembleia, e repito, que em Portugal há vastíssimos campos do domínio da engenharia que não estão cobertos.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado já ultrapassou o seu tempo de resposta. Peço que a abrevie.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Senão nos abalançarmos a isso com realismo, com urgência e com coragem, e não em regime de remendos, perderemos o comboio que temos para os próximos dez anos. Portanto, não sou favorável a falar-se agora desses decretos. Esses decretos, quanto a mim, são insuficientes, não cobrem a realidade portuguesa e, além disso, nada têm a ver com o decreto em ratificação.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio.
A Sr.ª Teresa Ambrósio ((PS): -Sr. Deputado Nuno Abecassis, foi com muito agrado que ouvi a sua intervenção, porque introduziu objectividade e realidade na discussão a que estamos procedendo nesta Assembleia. Como nomeou e citou algumas das passagens do último estudo do Sr. Prof. Arantes e Oliveira que também .tenho a possibilidade de ter nas minhas mãos, e uma vez que o Sr. Deputado terminou as referências ao mesmo numa dada altura e depois existe realmente uma sequência nas análises que o Sr. Prof. Arantes e Oliveira faz, nomeadamente e relativamente à formação de engenheiros, eu gostaria que o Sr. Deputado me esclarecesse sobre dois aspectos.: conclui o estudo do Sr. Prof. Arantes e Oliveira que as escolas que concedem licenciatura não devem ser as mesmas que concedem bacharelatos, acrescentando em seguida que parece ser razoável prever que o Sr. venha a ser, como, de resto, sempre foi, exclusivamente uma escola de licenciados. Aliás, como o Sr. Deputado conhece, existe depois um esquema que até clarifica bem este ponto de vista.
Ora, o que eu queria perguntar ao Sr. Deputado era o seguinte: dado que o fluxo dos nossos alunos na procura do ensino, nomeadamente o de Engenharia, continua a demonstrar uma procura clássica e conservadora, e como o Sr. Deputado sabe que este ano, nomeadamente, procuraram o ensino para licenciatura 12319 alunos, enquanto continuaram a procurar o ensino ao nível do bacharelato de Engenharia 6317 alunos, isto é, continuamos a ter um fluxo invertido de alunos sobretudo ao nível da formação de Engenharia, pergunto M& o Sr. Deputado está de acordo com esta ideia do Sr. Prof. Arantes e Oliveira, isto é, que, nomeadamente no ramo da engenharia, o ensino se deve processar integradamente em duas fases, mas que haja umas escolas que dêem o primeiro grau profissionalizante e umas outras escolas directamente integradas que darão a licenciatura e o doutoramento.
Quanto à segunda pergunta, é a seguinte: considera ou não o Sr. Deputado Nuno Abecassis que, clarificado o sistema de ensino superior em Portugal, é possível haver ou não uma integração adequada entre o ensino superior curto e o ensino universitário, isto é, entre as escolas que formarão um primeiro ciclo de ensino superior de carácter profissionalizante e as escolas que concederão as licenciaturas e os níveis seguintes?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecassis, para responder.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio, eu permiti-me citar o Sr. Prof. Arantes e Oliveira, não plagiá-lo, porque me pareceu interessante ele mencionar alguma coisa com que eu estou profundamente de acordo, o que não quer dizer, nem eu o disse, que o Sr. Engenheiro Arantes e Oliveira tenha as mesmas preferências que eu. Eu gostava, a seguir, de dizer à Sr.ª Deputada que numa sociedade bloqueada me parece que é impossível exigir que as procuras de formação não sejam inevitavelmente conservadoras. A nossa sociedade está bloqueada no que diz respeito ao desenvolvimento técnico, o nosso sistema de ensino está radical, completa e .totalmente falseado e errado e esta é a realidade que os Portugueses têm de encarar. Um sistema de ensino tem de ser coerente, e o nosso sistema de ensino é a figura completa e total da incoerência. Quando nós conseguirmos isso - e eu estou convencido de que o conseguiremos em breve, se conseguirmos de facto mobilizar principalmente a vontade da juventude portuguesa-, estou convencido de que nunca mais se falará em Portugal em becos sem saída. É evidente que quando eu manifestei a minha preocupação em que este intervalo de cinco ou seis anos que hoje existe sem que nada seja preenchido, estou a pensar numa estrada para o desenvolvimento do povo português, pois não quero caminhos com buracos onde ele caia. Porém, para conseguirmos isto, temos de assumir esta tarefa com coragem, sem atirar culpas para cima de uns e outros porque são de todos nós as responsabilidades do caos do ensino em Portugal.
Aquilo que eu repito nesta Assembleia é que, se dentro de dez anos não tivermos invertido a situação, os nossos filhos talvez possam trabalhar na Abissínia, se na Abissínia ainda tiverem um nível de ensino inferior ao nosso. Mas aqui é que não trabalham,
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com. certeza. E isto, Sr.ª Deputada, a nós, como representantes do povo, constitui-nos numa responsabilidade sagrada que e salvar o futuro deste país Temos de o dizer com toda a energia, e temos de encarar esta situação como um bloco, porque o problema da educação em Portugal é um problema nacional, não é um problema partidário.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Assim me tenho esforçado por levar a minha luta desde que o destino quis que me ocupasse destes problemas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos 'fazer agora o nosso intervalo. A sessão fica interrompida por trinta minutos.
Eram 17 horas e 35 minutos.
Após o intervalo, substituiu a Sr.ª Secretária D. Amélia de Azevedo o Sr. Deputado Barbosa da Costa (PSD).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão está reaberta.
Eram 18 horas e 15 minutos.
O Sr. Rui Perna (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Pena pede a palavra para que efeito?
O Sr. Rui Pena (CDS): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:- Tenha a bondade.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu grupo parlamentar tem fundadas dúvidas sobre a sequência dos trabalhos nesta sessão. Por isso, requeria a suspensão regimental dos trabalhos por um período não inferior a quinze minutos, e sugeria ao Sr. Presidente que convocasse a conferência dos presidentes dos grupos parlamentares para se debruçar sobre esta questão.
O Sr. Jorge Leite (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Leite também pede a palavra. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu sugeria, na medida em que me parece um pouco inoportuno convocar a reunião dos presidentes dos grupos parlamentares, pois a maior parte dos presidentes dos grupos parlamentares não se encontra nesta Assembleia porque tiveram de ausentar-se, que a reunião e, portanto, a interrupção fosse adiada para mais tarde.
O Sr. Presidente: - Se os Srs. Deputados não se opuserem, e eu creio que o Sr. Deputado Jorge Leite tem toda a razão, continuaremos a discussão da ratificação do diploma em causa, muito embora o Sr. Deputado Rui Pena tenha a última palavra, uma vez que mão podamos negar-lhe o pedido de suspensão que formulou.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi nesse sentido que eu pedi a palavra, antecipando-me, para concordar com a observação do Sr. Deputado Jorge Leite e, portanto, sugeria que a suspensão se faça às 18 horas e 45 minutos e que entretanto se continue com a discussão dia ratificação do diploma em causa.
O Sr. José Luís Numes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luas Nunes pediu a palavra para que efeito?
O Sr. José Luís Numes (PS): - Se bem entendi, o problema do orçamento não vai ser discutido neste momento, pois não?
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Estamos discutindo a ratificação do decreto-lei sobre o ensino superior de curta duração.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): -Sr. Presidente Srs. Deputados: No prosseguimento da apreciação na generalidade do pedido de ratificação do Decreto-Lei n.º 427-B/77, de 14 de Outubro, pedido pelo Grupo Parlamentar do PSD, cabe-me tecer algumas considerações acerca do ensino superior curto, com particular incidência no aspecto da reconversão dos institutos superiores de Contabilidade e Administração (ISCAs) e dos institutos superiores de Engenharia (ISEs), previsto no artigo 2.º, n.ºs 2 e 4, do referido decreto.
Antes de entrar na análise deste controvertido texto legal, convém que nos debrucemos sobre o momento histórico da criação dos referidos institutos, descortinando os condicionalismos que os precederam, os objectivos que se propuseram atingir e referindo o grau de ensino por eles ministrado ao longo de um século.
Assim, em 1852, foi criado o Instituto Industrial de Lisboa, quando Portugal despertava para a era da industrialização e se reconhecia a premente necessidade da existência de uma escola de Engenharia.
Depois, em 1886, e correspondendo a uma fase de desenvolvimento económico que pressupunha quadros técnicos de apoio, o Governo cria o Instituto Comercial.
Deve acentuar-se que estes institutos, além dos cursos de verificador de alfândega e consular, ministravam o curso superior de comércio, sendo o seu corpo docente constituído por professores do ensino superior.
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Após o advento da I República, isto é, em 1911, procedeu-as a amplas reformas no campo do ensino, reestruturando-se algumas escolas e criando-se novas faculdades. É assim que o ensino de Engenharia de grau universitário transita para os institutos superiores técnicos em Lisboa e para a Universidade Técnica do Porto, hoje Faculdade de Engenharia.
Por seu turno, o Instituto Comercial é reestruturado também em 1911 e passa a denominar-se Instituto Superior de Comércio, com a específica finalidade de formar diplomados à altura de corresponder às exigências técnicas contabilísticas que a nossa expansão pressupunha.
Posteriormente, em 1933, quer os institutos industriais quer os institutos comerciais passaram a integrar-se no ensino técnico médio, circunscrito ao Porto e a Lisboa. Assistiu-se, deste modo, ao abaixamento do seu grau de ensino, à consequente despromoção dos alunos formados por essas mesmas escolas, com. o objectivo evidente de preencher os quadros subalternos da Administração Pública e da actividade técnica empresarial.
Paralelamente, o ensino universitário era reservado ao escol da sociedade portuguesa donde saíam os licenciados para os altos postos dia governação, da direcção administrativa das empresas, as profissões liberais e para o ensino secundário e superior. As desigualdades sociais ainda maus se acentuaram pela dificuldade de acesso às faculdades das classes mais desfavorecidas. Os institutos passam a ser frequentados, em regra, por alunos oriundos de famílias com parcos recursos ou por trabalhadores-estudantes.
Para estas existe sempre a premência da obtenção de um diploma profissional, num curto prazo, como condição de subsistência. E embora a sua inserção no mundo do trabalho fosse sempre rápida, pelas apreciáveis provas de competência dadas quer pelos diplomados pelos institutos industriais, os agentes técnicos, quer pelos diplomados pelos institutos comerciais, os contabilistas e peritos aduaneiros, o certo é que não raro sofriam humilhações e desvantagens na carreira profissional em confronto com licenciados e bacharéis. Eis que a desigualdade social à partida se mantinha pela vida fora, contribuindo desse modo para uma estratificação social e uma distanciação cada vez mais acentuada entre pobres e ricos.
Com a Revolução do 25 de Abril nasceu para 'todos os portugueses a esperança da abolição das discriminações e desigualdades sociais pelos condicionalismos económicos a elas subjacentes. A caminhada para a democratização da sociedade revolucionou velhas instituições, levantou barreiras e ultrapassou prejuízos Ora, o vasto campo da educação, com as suas ancilosadas estruturas, os seus rígidos métodos, os seus hierarquizados graus académicos, não escapou a essa onda revolucionária, que, a despeito d" muitos excessos, teve na sua base uma genuína ideia de justiça social. Assim se abriu o caminho à reconversão dos institutos comerciais e industriais em escolas integradas no ensino superior.
Foi impressionante o movimento de solidariedade e coesão entre professores, alunos e organizações profissionais em torno deste objectivo.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD).-Muito bem!
A Oradora: - Entretanto, imantas audiências ministeriais foram solicitadas e concedidas, fendo-se gerado uma generalizada simpatia popular por esta justa reivindicação.
Neste contexto se insere a reconversão dos vários institutos em estabelecimentos de ensino superior. Segundo a ordem cronológica, 05 primeira; a ser reconvertidos foram os institutos industriais, que pasmaram a denominar-se institutos superiores de Engenharia pelo Decreto-Lei n.º 830/74.
O Instituto Comercial de Aveiro, que ao tempo era secção do Instituto Comercial do Porto, é reconvertido no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Aveiro e considerado instituto universitário pelo Decreto-Lei n.º 313/75, de 26 de Junho. Desde logo, e- por este decreto se acentua, são equiparados a bacharéis os diplomados pelos institutos, comerciais.
Os restantes institutos comerciais virão, finalmente, a ser reconvertidos em institutos superiores de contabilidade e administração pelo Decreto-Lei n.º 327/76, de 6 de Maio.
Por outro lado, em paralelismo com o Instituto de Aveiro, admite-se neste diploma que os outros muitos possam ser integrados na Universidade, por acordo de ambas as partes.
Atribui ainda o Decreto-Lei n.º 327/76 aos institutos o encargo de organizar o ensino do bacharelato, por especialidades e com a duração mínima de três 'anos, após o que se deverá proceder à organização do ensino da licenciatura também por especialidades.
Justo é sublinhar, acima de iludo, que o reconhecimento legal de passagem a ensino superior a todos congregou na patriótica tarefa de estruturação e planeamento dos cursos em novos moldes.
Assim, o ISEL, a partir de 1974, desdobrou o curso de Electrotecnia e Máquinas em três novos cursos: curso de Máquinas, curso de Electrotecnia e Telecomunicação e cursos de Energia & Sistemas de Potência.
Este desdobramento permitiu a especialização em modernos modelos, com a introdução de novas cadeiras, em adequada resposta às concretas exigências do desenvolvimento nacional.
Apresentaram os ISCAs, nomeadamente o do Porto, um plano concreto para o bacharelato e licenciatura em Contabilidade. Nele, o estudo de Contabilidade constitui o núcleo essencial de disciplinas, que vai desde o ensino de conhecimentos genéricos, no 1.º e 2.º anos, ao estudo detalhado de contabilidade analítica de exploração ao longo do 2.ª e 3.º anos, com inclusão da contabilidade provisional e análise de balanços. No 3.º ano, será ainda incluída a contabilidade nos sectores das instituições de crédito e previdência.
Por último, e para corresponder ao grau de licenciatura o plano estabelece o crismo da contabilidade
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pública nacional e a contabilização dos casos especiais, a par da auditoria contabilística.
Referi muito sucintamente aspectos essenciais desses planos, não cabendo aqui referir, por escassez de tempo, outros que poderiam traduzir a preocupação de renovar, dentro de princípios de criteriosa exigência de conhecimentos por parte de professores e alunos. Nem tão-pouco as reivindicações estudantis puseram, de qualquer maneira, em causa o bom funcionamento destas escolas.
Nenhuma delas foi considerada ou classificada como escola degradada, ao contrário de que se passou em certas faculdades, o que levou o MEIC ao seu encerramento compulsivo. Justo é deixar assinalado nesta Assembleia que estes institutos merecem toda a simpatia do povo português pelo trabalho neles desenvolvido, em perfeita solidariedade com os responsáveis pelos corpos docentes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - A par destas e de outras razões de justiça social que conduziram ao reconhecimento destes institutos como estabelecimentos de ensino superior, sobrelevam, na sua objectividade, ponderosos argumentos de carácter económico, científico e técnico, dos quais importa sinteticamente destacar o pedido de adesão de Portugal à CEE (Mercado Comum) e a sua projectada integração no próximo decénio impõe a todo o povo português um enorme esforço de desenvolvimento pela adequada exploração dos nossos recursos e a implementação de novas especialidades, em estreita cooperação com outros países, nomeadamente com os que fazem parte desse espaço económico. Exige-se, assim, que os diplomados pelos institutos estejam à altura das suas funções, pela aquisição de mais profundos conhecimentos e pela melhoria dos seus níveis científico e técnico, em suma, por uma adequada formação técnico-prática.
Terá de haver um casino capaz de estimular a investigação nos seus específicos sectores, sem o que não se poderá falar de ensino superior. Para dar satisfação a esta evolução dinâmica, os ex-institutos industriais vinham procedendo de há muito a uma autêntica reestruturação dos seus cursos, actualizando as disciplinas básicas e promovendo a especialização em campos tão importantes como a Química, a Engenharia Civil, Máquinas, Electrotecnia, Telecomunicação, Energia e Sistemas de Potência. O ISEL (Instituto Superior de Engenharia de Lisboa) apresentou mesmo ao MEIC um projecto de licenciatura em Automação Industrial, única no País. Incompreensivelmente, o MEIC não só não reconheceu e homologou os actuais cursos professados nesta escola, como também não se abriu ao diálogo; nem tão-pouco lhe atribuiu o devido apoio técnico, económico e administrativo, antes cortou verbas para equipamentos de laboratórios e oficinas.
Se hoje os ISEs, a despeito dos bem elaborados planos de estudo, ainda são acusados de fornecer ao País diplomados com uma formação teórica aproximada do das faculdades de Engenharia, isso deve-se em grande parte à falta de apoio experimental que a carência de maios atribuídos plenamente justifica.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Os ex-institutos comerciais, agoira designados institutos superiores de Contabilidade e Administração, são os únicos estabelecimentos de ensino superior onde a contabilidade constitui o núcleo essencial de disciplinas. Primitivamente, em Lisboa, o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras ministrava a licenciatura em Economia e Finanças com relevo para a contabilidade. Como se sabe, mais tarde passou a Faculdade de Economia.
Do mesmo passo, no Porto, a Faculdade de Economia, que a princípio incluía a Contabilidade no seu elenco de disciplinas, passou a estruturar o seu curso virado para a macroeconomia.
Quer dizer, os ISCAs são verdadeiramente os redutos onde o ensino de contabilidade e da gestão micro económica se professam verdadeiramente, des dobrando-se em múltiplas cadeiras, ao longo de vários anos.
Acresce que o ensino de contabilidade e a profissão de contabilista assumem notoriedade e projecção cada vez maiores, pelo relevante contributo que a contabilidade vem dando ao progresso do País, a nível nacional e regional.
A necessidade de formação de quadros contabilísticos, a exigência de um planeamento sócio-económico, a investigação a levar a cabo num ramo de saber, não se poderão fazer sem aprofundados conhecimentos numa escola superior.
Num país como o nosso, em que amplos sectores da economia foram nacionalizados e em que a iniciativa privada tem papel de relevo, à face da Constituição e imperioso reconhecer à contabilidade e à profissão de contabilista o mérito que já internacionalmente lhe é atribuído.
A Associação Internacional dos Contabilistas é defesa prova evidente, bem como o surgir de um novo ramo de direito - o Direito Contabilístico - que começa a tomar corpo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos, portanto, cientes de que os institutos superiores de Engenharia e os institutos superiores de Contabilidade e Administração ocupam no sector de ensino superior o lugar que me merecidamente lhes cabe.
Não se compreende, assim, que o Decreto-Lei n.º 427-B/77, de 14 de Outubro, venha, no seu artigo 2.º, n.º 2 e 4, estabelecer de novo a sua reconversão em estabelecimento de ensino superior curto! Algo dei substancialmente diferente se pretendeu com esta disposição legal. De outro modo, seria reconhecer que o legislador os reconverteu em ensino superior curto paira, ao fim e ao cabo, apenas os arrumar no ensino superior - onde já estavam!...
Seria um dispositivo legal vazio!...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Além do mais, não se vislumbram argumentos válidos que apoiam tal reconversão dois ISCAs e dos ISELs em ensino superior curto. Se o ensino superior curto é, em principio, de admitir (haja em vista a autorização legislativa que esta Assembleia concedeu ao Governo em 9 de Agosto de 1977 para a sua criação), "ao se nos
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afiguram convincentes ais razões aduzidas no preâmbulo do decreto.
Em primeiro lugar, há que notar que a autorização legislativa foi concedida para criar e não para reconverter.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Nem se diga que se trata de um argumento meramente formal, porquanto é sumamente nociva tal interpretação. Com efeito, a mutação dos institutos em escolas superiores técnicas, no âmbito do ensino superior curto, acarreta uma identificação que apenas contribui para travar o seu processo de valorização pedagógica, sustar iniciativas várias de nova reestruturação, desmotivar toda a investigação nesse domínio.
Vozes do PSD: - Mulato bem!
A Oradora: - Conduz ainda à desvalorização profissional de todos quantos as frequentariam ou possam vir a frequentar, com as inevitáveis consequências no mundo do trabalho. Agrava mesmo a já existente indefinição da situação do seu corpo docente com a ameaça de desemprego, pela instabilidade ligada à natureza da própria escola. Lança escolas com uma tradição secular e méritos comprovados numa mova experiência pedagógica num campo de ensino onde nada existe e tudo se improvisa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - No momento que antecedia a votação ao pedido de ratificação deste decreto muitas interrogações subsistem:
Em que estudos de carácter quantitativo e qualitativo se baixou o MEIC para se proceder a uma inovação legislativa de tal magnitude?
Atentou o MEIC na solução de continuidade que existe, por um lado, entre um ensino secundário não propriamente unificado, mas realizado, um ensino complementar anda em embrião e, por outro lado, o ensino superior curto?
Quando e como se pode obter um diploma profissional neste país?
Por todos estes motivos, opor-nos-emos a que os ISESs e os ISCAs sejam integrados no ensino superior curto definido por este decreto. Apresentaremos mesmo uma proposta nesse sentido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podemos deixar de chamar a atenção desta Câmara e do Executivo para o facto de não terem sido ouvidos os sindicatos e as escolas na leitura deste decreto como expressamente preceitua a Constituição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Só assim se explica que a solução de reconversão dos institutos tenha levantado tantas e tão bem fundamentadas objecções.
Uma das mais graves lacunas deste decreto diz respeito à possibilidade de diplomados por estes institutos poderem, após a obtenção de diploma e, eventualmente, depois do uma mais ou menos longa experiência profissional, prosseguir a licenciatura numa faculdade. Embora a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio, do PS, num discurso neste Plenário, tenha admitido expressamente tal articulação, não nos podia tranquilizar o processo de se colmatar uma tal lacuna através de uma declaração de uma Deputada, a menos que seja apresentada e através de uma proposta. Sinto-me tranquila porque a Sr.ª Deputada disse que iria apresentar uma proposta messe sentido. Nós, aliás, faremos também uma proposta nesse sentido.
Entendemos, portanto, que uma futura lei reguladora de ensino superior, dando cumprimento ao preceituado no artigo 74.º, n.º 3, alínea d), da Constituição, garanta a todos os cidadãos o acesso aos graus mais elevados do ensino e da investigação científica. Ponto é que nela venham a ser definidas as condições de acesso dos melhores e mais aptos às licenciaturas nas universidades.
r. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos deste modo ter dado 10 nosso contributo para a solução justa de um problema que, extravazando os limites de um número restrito de escolas, se configura como uma questão que toca a cada um e a todos os cidadãos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A preparação de um diploma como o que editamos a analisar nesta Câmara neste momento exigiria, em nosso entender, um estudo atónito das diferentes alternativas que se poderiam colocar para o problema, uma ponderação e um ter em conta as opiniões dos sectores que directa ou indirectamente seriam por ele afectados. Tal tornar-se-ia tanto mais necessário quanto é certo que o diploma em análise, mais do que criar um movo tipo de ensino, procura reestruturar os actuais institutos superiores de Engenharia, institutos superiores de Contabilidade e Administração, escolas do magistério e escolas de regentes agrícolas. Mas como já vimos sendo habituados pelos titulares ao MEIC, não está nos seus métodos de trabalho a consulta aos mais directamente interessados nos diplomas a produzir. Do que podemos saber nem uma só estrutura representativa dos professores, estudantes ou empregados dos referidos estabelecimentos de ensino foi ouvida. Mais, chegou-se ao ponto, segundo tomámos conhecimento por informação de um elemento da direcção do Sindicato dos Engenheiros Técnicos do Sul, de não ter havido quaisquer contactos ou consultas a estruturas sindicais sobre o problema da criação do ensino superior de curta duração por parte do MEIC, enquanto, e por duas vezes, essas estruturas foram consultadas sobre o assunto por peritos do Banco Mundial.
Aliás, exigências externas não devem ser alheias à rapidez com que o MEIC se apressou a legislar sobre o ensino superior curto, com a sua actual estrutura.
Quando se afirma no diploma em causa, e referindo-se às escolas que vão agora ser afectadas, que não teria havido, e passo a citar, «a preocupação de
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se estudar a correspondência entre a quantidade die diplomados por estas escolas e as reais necessidades do País", tal afirmação tanto se poderá aplicar aos Decretos n.ºs 830/74, 316/76 e 327/76 como ao Decreto n.º 427-B/77, hoje submetido à ratificação desta Assembleia. Quando se afirma que "a partir de um estudo atento se optou pela institucionalização de um novo modelo de ensino superior", utiliza-se certamente muita demagogia, pois não se conhecem esses estudos, nem se debateram esses problemas com os especialistas, nem com os técnicos, professores, alunos e organizações sindicais directamente interessada. Pelo nosso meio, pomos em causa esse estudo atento, e fazemo-lo, pois, em nosso entender, ele não é possível quando não se ouvem as escolas e os profissionais que vão ser afectados.
E, por não nos terem sido fornecidos qualquer novos dados durante este debate, voltamos a perguntar: estará o MEIC em condições de apresentar aqui, perante os legítimos representantes do povo português, um planeamento qualitativo e quantitativo do ensino que responda sim ambiguidades às necessidades reais do País nos campos da engenharia, da engenharia da contabilidade e administração, da saúde ou outros?
Possui o MEIC alguns dados estatísticos sobre o problema? Ou terá a recolha de tais dados estatísticos ficado pela cerca de 300 entrevistas que, no dizer dos nossos colegas socialistas, se teriam realizado? Será que a estas centenas de entrevistadas foi perguntado se se deveriam extinguir as escolas já existentes? Em caso afirmativo, quais foram as respostas? Quais as granidas 'firmais portuguesas de tecnologia avançada consultadas?
Porque não nos forneceu o MEIC os elementos em que se baseou para a elaboração do presente diploma, apesar das numerosas tentativas que fizemos para os obter?
Como pretende o MEIC que possamos votar favoravelmente a ratificação de um diploma sobre o qual oficialmente não dispomos de qualquer tipo de informação? Sr. Presidente, Srs. Deputados: O diploma em apreciação vem pôr directamente em causa o futuro de escolas como os ISE e os ISCA. Não me compete aqui fazer a história de tais institutos, como já sobejam ente ouvimos nesta Assembleia. Queiramos, contudo, dizer que contra ele se tem erguido um justo coro de protestas que se tem materializado, nomeadamente, em posições de repulsa nacionais dos estabelecimentos afectados, dos sindicatos, em pedido de audiência à Comissão de Educação, Ciência e Cultura desta Assembleia, em colóquios, conferências de Imprensa, tentativas de contacto com o MEIC, etc Assim, embora o diploma o não diga expressamente, pretende-se por seu intermédio revogar a legislação que dá corpo aos referidos institutos superiores, nomeadamente os Decretos-Leis n.ºs 830/74, de 31 de Dezembro, 316/76, de 29 de Abril, e 327/76, ;de 6 de Maio. Tal legislação foi uma dura conquista de estudantes e professores e veio muito justamente reconhecer o nível técnico que possuíam os diplomados pelas antigos institutos industriais e comerciais e escolas de regentes agrícolas e possibilitar-lhe o bacharelato nas respectivas especialidades.
Refere o diploma a falta de "técnicos de nível" como justificação da reestruturação que pretende impor às escolas em causa, tentando suprir a sua falta com "a formação die técnicos qualificados de nível superior intermédio", mas esquece-se o MEIC de dizer que os actuais: ISE e ISCA conferem o grau de bacharel, que é um grau superior, intermédio entre o diploma do ensino secundário e a licenciatura.
Planos foram fritos para que a curto prazo estas escolas pudessem proporcionar aos seus estudantes um nível técnico mais elevado, nomeadamente através da criação de licenciaturas de especialidade. E de facto é isto que o MEIC pretende evitar com a actual legislação. De outra forma já teria sido dada resposta aos planos que estão no MEIC para análise pelos responsáveis. Refira-se, a título de exemplo, o projecto de licenciatura em automação industrial apresentado pelo ISEL e a que o MEIC não deu ainda qualquer resposta.
Fazendo tábua rasa de todo o trabalho já desenvolvido por estas escolas, o MEIC avança para a sua extorção, lançando-se numa aventura que representa elevados gastos para o País e da qual não se sabe, à partida, o resultado.
Refere o Decreto-Lei n.º 427-B/77 que "urge promover a criação de escolas de ensino superior de natureza essencialmente prática". Mas desconhecerá o MEIC que os actuais ISE e ISCA, com os necessários ajustamentos tendentes à melhoria do ensino ministrado, são escotas do ensino superior de natureza essencialmente prática? E reconhecerá, certamente, o MEIC que, se nalguns casos a pedagogia do giz se substitui à pedagogia da verificação e da experimentação, tal se devia fundamentalmente a cortas de verbas para material de laboratórios e oficinas, por exemplo.
Mais, diz-se no Decreto-Lei n.º 427-B/77 que, e passo a citar, "se aumentou a produção de diplomas dos portadores de uma formação teórica semelhante à conferida pelas escolas universitárias". Ora, é precisamente na formação teórica que existe a diferença fundamental entre os, actuais cursos de bacharelato dos referidos institutos e as licenciaturas das universidades. As semelhanças, se existem, verificam-se no campo ida formação específica tecnológica que para o nosso actual tipo de empresas, dependentes sob o ponto de vista tecnológico, constitui realmente a principal característica exigida para a contratação dos quadros teóricos.
Aliás, de acordo com a opinião de professores, nomeadamente do ISEL, alguns, dos cursos que se prevêem para a formação de técnicos especialistas correm o risco de vir a lançar ainda mais jovens piara o desemprego. Queremos com isto dizer que caminhar no sentido da demasiada especialização a curto prazo e indiscriminadamente, não tento em conta que a nesta economia ainda não está panificada, traz o risco dia incapacidade de absorção desses mesmos técnicos pela indústria nacional. Em nosso entender, e nos tempos mais próximos, será maus fácil encontrar colocação no mercado de trabalho um teórico de formação relativamente mais valia do que um técnico especializado mas de conhecimentos gerais restritos. Aliás, é sintomático constatar que, quer os bacharéis dos ISEs quer dos ISCAs não têm actualmente grande dificuldade de arranjar emprego. Por exemplo, basta uma simples consulta
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de uma página de anúncios de jornais para constatar que são muito superiores as ofertas de emprego para engenheiros técnicos formados pelos ISEs do que para engenheiros formados pelas faculdades de Engenharia.
No caso concreto dos ISCAs, chamamos daqui a atenção da Câmara para a gravidade da situação que poderá ser criada no caco dei o diploma em análise não vir a ser alterado. Até ao momento não existe entre nós uma única escola superior de Contabilidade e Administração. O reconhecimento dos ISCAs como escolas superiores, a formação de bacharéis e a possibilidade de licenciaturas previstas na anterior legislação era um primeiro passo nesse sentido, na esteira do que, aliás, sucede na maioria dos países. Disso são prova os deferentes trabalhos apresentados à IV Conferência Internacional sobre o Ensino de Contabilidade, realizada de 5 a 7 de Outubro deste ano em Berlim Oeste, na República Federal da Alemanha.
Como se compreende, Sr. Presidente. Srs. Deputados, que neste diploma não as preveja a possibilidade de os alunos, acabada que, seja a frequência dos cursos superiores curtos, antes ou depois de uma passagem pelo exercício da profissão, possam continuar os seus; estudos para se aperfeiçoarem e assim contribuírem para o progresso do País?
Será que no entender do MEIC eles deverão voltar ao primeiro ano das universidades como acontecia no tempo do fascismo, com os alunos que acabavam os cursos do Instituto Industrial e do Instituto Comercial? Em caso afirmativo, para que se diz no artigo 7.º do presente diploma que, cito, "o ingresso nos estabelecimentos de ensino de curta duração fincará sujeito ao regime dos numerus clausus e ao preenchimento das demais condições genericamente fixadas para o acesso aos restantes estabelecimentos de ensino superior"? Não será isto um verdadeiro tampão para todos os estudantes que pretendem aumentar os teus conhecimentos e ascenderem a uma licenciatura? Não estará aqui a marca de classe que o MEIC pretende impor a este novo tipo de ensino?
E é bom que fique claro. Não há técnicos a mais no nosso país. Bem seria que os houvesse. Se tivermos em conta as possibilidades de exportação de tecnologia, baseada em acordos bilateralmente assinados com outros países, nomeadamente os novos países de expressão portuguesa, seremos forçados a reconhecer que são precisos ainda mais técnicos, de melhor nível técnico-científico, de melhor e mais aperfeiçoada formação. Tal não será conseguido com os cursos que agora se pretende criar, que têm como principal objectivo a desqualificação profissional e técnica. Não aceitamos Sr. Presidente, Srs. Deputados, que qualquer organização internacional ligada às altas esferas imperialistas queira Impor no nosso país esquemas de ensino de clara sujeição aos interesses das grandes empresas multinacionais, que faça depender o nosso avanço técnico-científico das suas conveniências, que, numa palavra, queira esmagar o progresso da nossa Pátria e a nossa independência nacional
De referir ainda que com esta medida o MEIC visa ai destruição d& escolas frequentadas na sua maioria por trabalhadores-estudantes. Cite-se, a título de exemplo, o caso do ISCAL, com cerca de 1600 alunos, dos quais aproximadamente 1100 são trabalhadores-estudantes. Para onde foi relegado o preceito constitucional expresso na alínea g) do n.º 3 do artigo 74.º, que, ao abordar as incumbências do Estado na realização da política de emano, incluir:
Estimular a formação de quadros científicos e técnicos originários dais classes trabalhadoras?
Mas este decreto vai mais longe. Pretende, além de tudo o que já se disse, acabar com a gestão democrática que funciona nos institutos em causa. Tal decorre, aliás, do seu artigo 11.º, ao prever que, cito, "as escolas superiores técnicas e as escolas superiores de educação ficarão submetidas ao regime de instalação que, por legislação especial, vier a ser definido nos noventa dias imediatamente subsequentes à entrada em vigor deste diploma". Por outras palavras, a gestão destas escolas caberá à comissão instaladora nomeada pelo MEIC - belo exemplo de concepção de gestão democrática!
Também os professores destas escolas tem erguido as suas vozes contra este decreto. De facto, no momento em que actualmente eles são considerados docentes do ensino superior, avançar no decreto com um estatuto próprio para os professores do ensino superior curto traduz-se numa perda de direitos e regalias já conquistadas e constitui, além disso, manifesta intenção do MEIC de uma futura diferenciação dos docentes relativamente a outras escolas do ensino superior. Isto sem pormos em causa as necessárias adaptações a fazer ao actual estatuto da carreira docente do ensino superior no sentido- de salvaguardar os postos de trabalho dos professores dos actuais ISE e ISCA.
A situação é tanto maus grave quanto, pelas informações que conseguimos obter, alguns dos cursos superiores de curta duração versariam domínios específicos e não teriam carácter permanente. Daí decorreria, necessariamente, uma grande rotação de pessoal docente e, sem dúvida, o despedimento de muitos que leccionam disciplinas de formação geral. O MEIC argumentará que não é sua intenção despedir professores. Mas se o MEIC está seguro das suas intenções, por que não dá garantas de emprego por escrito aos docente? Maus se o tipo de ensino proposto pelo diploma em causa não é aliciante para os professores, que sentem que também a sua carreira profissional terá um tecto inultrapassável. Não dera que este tipo de ensino contrairia o que está disposto no Decreto-Lei n.º 131-C/76, que prevê a mobilidade das professores do ensino superior entre estabelecimentos da mesma área? Está ou não o MEIC disposto a ouvir estes professores e a fazer da sua opinião uma contribuição justa para a futura legislação?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, também, necessário referir os propósitos do MEIC, quanto a nós válidos, de criação de escolas superiores de educação que terão como finalidade a formação de educadores de infância e de professores do ensino primário. É importante, no entanto, lembrar que o MEIC vem agora criar cursos, como os de educadores de infanda, que se apressou a extinguir pouco tempo decorrido sobre a tomada de posse do Governo. Por outras palavras, o MEIC faz aqui o que se
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a desfazer quando ocupou o lugar na 5 de Outubro!
Voltamos a dizer que no nosso entender é uma medida positiva. Mas por uma questão de coerência gostaríamos de a ver esclarecida, e a menos que o MEIC tinha algum dado novo a introduzir para a análise do problema, não podemos compreender a sua brusca mudança de atitude. Para que já voltaram do estrangeiro os orientadores que lá terão ido bater as ideias capazes de orientar um curso de educadores, que, por sua vez, irão leccionar nas escolas superiores de educação?
Enfim, ao MEIC compete responder perante o povo português sobre a razão do atraso ida entrada cm. funcionamento do curso de educadores de infância,, tão necessário para o preenchimento cabal do previsto na alínea b) do n. º 3 do artigo 74.º da nossa lei fundamental.
Acresce que, apesar de no diploma em análise se fazerem umas vagas referências à formação de técnicos de saúde, não estão m contempladas as actuais escolas da enfermagem. É legitimo perguntar se terá sido apenas um mero esquecimento ou se o MEIC se propõe destinar-lhes um "estatuto próprio" que aferiu ainda mais um escalão nos variadíssimos graus e tipos de diplomas em que têm sido pródigos os responsáveis da 5 do Outubro?
Pensamos que, tendo as actuais escolas de enfermagem cursos estruturados para três anos, sendo exigido o curso complementar de liceus para o acesso, neste caso, sim, se justificara a paragem das referidas escolas a estabelecimentos de ensino superior curto conferindo o grau de bacharel. Alfas, tal viria na linha dos numerosos pedidos que nos têm chegado, quer de estudantes quer de profissionais, no sentido de verem dignificada a sua profissão e reconhecidos os esforços desenvolvidos para aperfeiçoamento dos respectivos cursos.
inalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não está em causa o nosso apoio ao ensino superior de curta duração. Pensamos que ele é necessário e urgente para podermos avançar com decisão para o progresso da nossa Pátria. Pensamos, contudo, e as mossas propostas vão neste sentido, que se deve caminhar para a regionalização do ensino superior curto, alargando e não destruindo as formas deste tipo de ensino já existentes, que, permitindo- a formação de técnicos competentes, não cortem a estes a possibilidade de uma posterior especialização e, daí decorrente, a possibilidade de criação de uma maior riqueza pana o .nosso povo e para o nosso pais.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dieter Dellinger, para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Dieter Dellinger (PS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, queria fazer-lhe uma pergunta: no princípio da, sua intervenção o Sr. Deputado faz uma crítica muito grande ao ensino superior curto, e no fim diz que, de certa maneira, adere ao princípio do ensino superior curto e faz a indicação de que o ensino superior curto deve ser qualquer coisa que permita avançar par o ensino superior normal.
Qualquer trabalhador que trabalhe em Portugal e não tenha mm curso superior 'trabalha em profissões em que ele adquiriu um conhecimento prático, quase artístico, como gê nascesse com de. Esse trabalhador sabe perfeitamente que nunca encontrou em Portugal uma possibilidade de se desenvolver essa profusão. E, como exemplo, posso citar os jornalistas, os repórteres, os: técnicos de óptica - profissão de muita responsabilidade onde há, por vezes, enganar-nos devido ao facto de- esses trabalhadores serem essencialmente práticos, sem o mínimo de preparação teórica e que causam graves perturbações às pessoas porque vão utilizar óculos errados - , tradutores-intérpretes, contabilistas, empresas do grupo B, e muitas outras que, a meu ver, justificaram um ensino superior curto, sem necessariamente se justificar um ensino superior alargado máximo. Acho que um tradutor ou um intérprete e uma pessoa que se deve especializar numa ou duas línguas e não precisa forçosamente de ser um filólogo e até diria que haveria um desperdício de ensino, se assim for. Um jornalista é evidente que também não precisa de ser uma pessoa com um curso superior, pois, a meu ver, dois anos chegariam. E isto abrange a grande maioria das profissões. Até digo mais: em Portugal há uma situação fascizante: que é a de só as pessoas com cursos superiores terem dignidade profissional, porque qualquer trabalhador não consegue, por meio de um curso uma qualificação geral para adquirir uma profissão. A meu ver, o ensino superior curto seria um passo; assim como deveria ser avançar-se no sentido de estabelecer o equivalente ao que há em França e que são os certificados de, aptidão profissional para todos os trabalhadores com curtos e adaptação.
Gostaria de saber se é neste sentido que o Sr. Deputado interpreta as suas ideias ou se prefere, como até agora, um único ensino superior em que o ensino é todo ele, uma passagem ou um aspecto intermédio para se chegar a ser o sr. dr. ou o sr. eng.º
O Sr. Presidente: - Sr. deputado Jorge Lemos, há mais um Sr. Deputado inscrito para pedir esclarecimentos. Profere responder já?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, dada a extensão do pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Dieter Dellinger e com medo de me perder nas longas considerações que o Sr. Deputado fez, penso que é melhor responder já.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Em primeiro lugar, desejava dizer-lhe que duvido que o Sr. Deputado conheça o decreto ou que pelo menos o tinha estudado atentamente. Se o tivesse estudado atentamente não me viria falar, com certeza, no caso dos técnicos de óptica dos jornalistas, que são casos que não são previstos, para ensino curro no decreto.
Quando o Sr. Deputado me vem perguntar se estou ou não de acordo com o ensino superior curto, eu lembro que terminei a minha intervenção doendo que estamos de acordo com o ensino superior curto. Não estamos é de. acordo com a óptica do decreto que o pretende criar - ensino curto para os pobres, ensino longo para os ricos. Ou seja, aquietes que não
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podem pagar durante muito tempo a escolaridade irão para o ensino curto, aqueles que têm mais possibilidades, que não têm de começar a trabalhar tão cedo, poderão continuar a ser srs. drs. Isto é bom que fique claro, Sr. Deputado. Se o Sr. Deputado tivesse estudado melhor o decreto do sou Governo, evitaria provavelmente o pedido de esclarecimento que me fez e a que respondi com tão poucas palavras.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Caçares para pedidos de esclarecimento.
O Sr. Mata de Cáceres (PS): - O Sr. Deputado começou a sua intervenção insurgindo-se. comi rã o MEIC pelo facto de ele não ter ouvido ninguém directamente interessado antes de legislar.
Gostada que me dissesse em que e que baseia as suas afirmações, que pareceram tão claras, tão redundardes, para poder dizer que o Ministério não ouviu ninguém.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos para responder.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado, em esclarecimento à sua pergunta quero dizer que a minha intervenção é clara quando diz que nós ouvimos dos nossos colegas socialistas que teria havido cerca de trezentas entrevistas. Portanto, não quisemos pôr em causa a realização das trezentas entrevistas. O que pomos em causa, sim, é que não tenham sido ouvidas as "pessoas mais directamente afectadas pelo problema, porque o Sr. Deputado sabe que eu também posso chegar aqui à Assembleia e dizer que ouvi trezentas pessoas sobre um determinado problema, que nada tenham a ver com ele. E pergunto ao Sr. Deputado se considera as respostas destas trezentas pessoas válidas para emitir um juízo claro honesto sobre o problema
Outra questão: eu referi que não foram ouvidas as principais pessoas que são afectadas pelo problema: estudantes, professores, sindicatos e associações de contabilistas. Quem é que o MEIC ouviu? É uma pergunta que vimos a fazer há mês e meio, Sr. Deputado. Quando o decreto foi publicado e na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, recebemos a delegação do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, tivemos oportunidade de perguntar isso mesmo. Nada nos foi dito até hoje, nem uma linha nos veio do MEIC, dizendo ou não quem ouviu. É ou não legítimo que nos perguntemos se as trezentas entrevistas terão sido com as: melhores pessoas? Penso que sim.
O Sr. Mata de Cáceres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.
O Sr. Presidente: -Faça favor.
O Sr. Mata de Cáceres (PS): -Sr. Deputado, não gosto muito de protestar, mas tenho de o fazer pelo seguinte: dado que o Sr. Deputado começou a sua intervenção insurgindo-se contra o MEIC por não ter ouvido as pessoas mais directamente interessadas: estudantes, escotas, etc. tenho de protestar porque
se não houve uma audição exaustiva, pois não tenho conhecimento de todos os pormenores, o MEIC ouviu pelo menos, que eu saiba, a Associação dos Contabilistas, as Escolas de Regentes Agrícolas de Coimbra e Santarém, os Institutos de Contabilidade e Administração de Aveiro, Porto e Coimbra, além de outros, isto contraria bastante aquilo que o Sr. Deputado me desse. É pois contra isso que protesto.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contraprotesto.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Primeiro, queria agradecer ao Sr. Deputado, do PS a possibilidade que ao fim de mês e meio me deu de ficar a saber que afinal o MEIC sempre tinha ouvido alguém. Não quero pôr isso em causa.
O meu contraprotesto vai neste sentido: parece-me extremamente estranho que não tenham sido ouvidas as escolas em que houve transformações mais profundas, como os Institutos Superiores de Engenhada de Lisboa e Ponto, o Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa, o Sindicato dos Engenheiros Técnicos, quer do Sul quer do Norte, e tantos, tantos outros, que vão ser afectados por este diploma.
Se me permite ultrapassar as raias do contraprotesto, gostava de saber qual foi o teor das respostas dadas pelas pessoas ouvidas. Gostava que o Sr. Deputado me esclarecesse, se pudesse, pois possivelmente até nos ajudaria no nosso voto. Se fosse capaz de dizer qualquer coisa sobre isso agradecíamos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros para uma intervenção.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP):- Sr. Presidente, Srs. Deputadas: De todas as intervenções que ouvi e daquelas que lá, penso que todos os partidos desta Assembleia parecem estar de acordo em duas questões: a primeira é que não estamos a votar um decreto qualquer, estamos a tomar opções de fundo que podem ter e terão necessariamente sérias repercussões no futuro deste país. Penso que isso foi sublinhado por todos os Srs. Deputados; uma segunda questão que penso Que também foi abordada por todos os Srs. Deputados é que estamos em presença de um mau decreto, tão mau quanto nem sequer existe qualquer planificação global das opções neste campo, que não podem ser tomadas de ânimo leve.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que destas duas conclusões o mínimo que seria de esperar de todas as bancadas desta Assembleia seria que rejeitassem este decreto. Tanto mais que o estamos a discutir sem a presença do Governo, por razões óbvias, que é o responsável pelo mesmo decreto. Na situação actual, o mínimo que seria de esperar, semi me referir às diferenças de opiniões que existem sobre o assunto, era que os vários partidos dessem uma prova da responsabilidade de que tanto se reclamam, esperando por um novo governo, esperando pelo menos pelo Plano a médio prazo, dado que é uma opção de fundo que se está a tomar e ninguém em consciên-
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cia a pode tomar semi. ao menos, saber o que é que se pensa fazer neste país nos próximos quatro anos. E em último lugar pelo facto de nem sequer se ter ouvido a opinião dos professores e dos alunos.
Penso, inclusivamente, que a profundidade de conhecimentos e a maturidade dos vários memorandos que foram enviados a esta Assembleia demonstram que na verdade, respeitando a opinião dos professores o dos alunos dos institutos superiores, seria possível fazer um bom decreto Portanto, que fique claro que, em nossa opinião, não se está nesta Assembleia; de se votar a ratificação deste decreto, a fazer passar apenas um mau decreto com alguns remendos. Está-se sim, a cortar a possiblidade real de, com mais ponderação, com outras Condições, se poder fazer um bom decreto que efectivamente sirva os interesses nacionais.
A UDP não quer deixar também de apresentar aqui a sua opinião anda que brevemente, sobre o próprio decreto-lei cuja ratificação está aqui em discussão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O decreto-lei que foi apresentado como uma nova saída para a política da ensino e para o campo do trabalho, prova-se hoje, pelas exposições apresentadas pelo ISEL e pelo ISCAL a este Parlamento, que não visa mais do que fazer desaparecer escolas que após o 25 de Abril, com grande, enforco das suas populações, conseguiram surgir como escolas superiores e que então reconhecidas pelos mais diversos sectores do nosso país. Visa ainda fomentar o desemprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Podemos reproduzir aqui alguma" interrogações que constam da exposição enviada pelos professores e alunos do ISEL.
Será que o País precisa de técnicos muito especializados em sectores de actividade exclusivo" e restritos como, por exemplo, a electrónica?
Necessitamos de técnicos que saibam tratar, exclusivamente, com o sector televisivo ou necessitamos de técnicos, que com um conjunto mais amplo de conhecimentos se possam integrar nas empresas que vão encontrar ao saírem das escolas?
Devemos ter bem presente que a nossa economia não está planificada e que a indústria está em crise. Nestas circunstâncias, formar técnicos do tipo atrás referido não será criar condições para aumentar o número de desempregados?
Nos tempos, mais próximos, e mais fácil encontrar colocação no mundo do trabalho um técnico de formação relativamente mais vasta do que um técnico especializado, mas de conhecimentos gerais restritos.
Por tudo isto os Srs. Deputados devem analisar os efeitos que vão surgir da aplicação do decreto-lei.
Mais, têm de reflectir e reconsiderar as posições tomadas, pois tem de admitir que foram levados por palavra, enganadoras e por motivos estranhos e até aqui não justificados mas que nos parecem claramente contrários ao interesse do povo português e impostos pelo Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial.
A tentativa de instaurar no nosso país o ensino superior curto e mais concretamente a reconversão dos ISEs, ISCAs e escolas superiores de regentes agrícolas surge na altura em que as negociações de empréstimos com o Banco Mundial e FMI estão dependentes destes dois agentes do imperialismo.
A finalidade deste plano é evidente, formação de quadros executores para empregar em empresas, multinacionais, cuja tecnologia é totalmente importada e onde apenas interessa ter quem a aplique, e não quem investigue não se dando assim aos técnicos portugueses oportunidade de desenvolverem as suas capacidades criativas, que muito contribuiriam para o avanço da tecnologia em Portugal e, consequentemente, para a independência nacional.
As exigências do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial não se, ficam só pelo plano de reconversão de escolas vão mais longe ainda. O governo a nada disto se opôs, a tudo cedeu sem ligar às consequências que estas exigências implicam, e assim verificamos a extinção do ISCSP, as reestruturações dos ISEFs, e Faculdade de Direito, a extinção de ISCTE, o ressurgir do exame de aptidão à Universidade e a imposição do numerus clausus. Toda estas medidas em nada vieram favorecer os estudantes e professores; o ensino em Portugal torna-se cada vez mais eficaz e os professores vêem-se com mais frequência no desemprego.
Porque será, Srs. Deputados, que as escolas abrangidas pela reconversão são precisamente as que foram criadas pelos estudantes e professores após o 25 de Abril?
Não será este mais um claro ataque às conquistas do 25 de Abril e à possibilidade de uma pátria Livre e independente que das acarretam?
Sr. Presidente, Srs. Deputado": Já foi dito nesta sala que o Decreto-Lei n.º 427-B/77, que visa o ensino superior curto, tem um enorme alcance, e tem-no de facto. Há que o reconhecer, pois caso ele viesse a ser posto em prática conseguiria destruir lodo o trabalho desenvolvido pelos professores e alunos dos institutos superiores ao longo de largos meses e com enormes sacrifícios pessoais. Sacrifícios esses que o decreto desrespeita declaradamente.
Este decreto-lei na prática o que cria é o caos e a degradação pedagógica em institutos que graças aos esforços de professores e alunos, e apegar de todo o boicote técnico e económico por parte daqueles que têm varado a ser os responsáveis pela Ministério da Educação, conseguiram melhorar e aperfeiçoar substancialmente a qualidade de ensino. Temos de reconhecer a capacidade demonstrada pelos professores e alunos dos institutos superiores, que, não desmoralizando perante uma tarefa, que parecia gigantesca e que alguns consideravam impossíveis, conseguiram levar por diante uma reestruturação profunda e eficaz dos respectivos cursos.
Quem diz que a passagem dos ex-alunos de ensino médio superior criou uma lacuna no ensino em Portugal, ou o faz por má fé ou por desconhecimento das realidades. Pois é do conhecimento público, que, por exemplo, nos institutos industriais não se formavam técnicos especializados mas sim engenheiros, de segunda, pois a matéria versada nos cursos era de carácter geral e não de carácter especializado, como se dá a entender no preâmbulo do decreto-lei. Para o provar basta dizer que o curso de electrotécnica e máquinas ao ser reestruturado- foi desdobrado em três, o de máquinas, electrónica e telecomunicações e ainda o curso de energia e sistemas de potência.
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Os estudantes e professores dos ISEs e ISCAs dizem, e com razão, que- quem fez este decreto-lei deve abandonar os gabinetes -que pelos vistos é o seu mundo- e ir aos institutos contactar com a realidade.
No caso dos ISEs, o Governo nunca se preocupou com a qualidade de ensino ali. administrado, uma vez que sempre que eram atribuídas verbas para o apetrechamento destas escolas, os Ministérios sempre foram pródigos não no reforço destas verbas mas sim nos cantes sucessivos. Alega-se que é necessário o conte destas verbas, pois existem casos mais prioritários para o seu emprego.
Mas basta analisar o Orçamento Geral do Estado, ou a proposta que foi feita pelo anterior Governo, para ver que não é nem para o; sectores da saúde nem parai os sectores, da habitação que as verbas que estão a ser tiradas ao ensino são levadas, mas sim para pagar empréstimos estrangeiros e para o sector militar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que ficou perfeitamente provada a justeza, da posição dia UDP quando votou contra a autorização legislativa ao MEIC, que aparece subitamente nesta Assembleia paira tratar de um assunto desta importância, a pedir uma urgência e uma autorização legislativa para num mês fazer o que não fez em varro meses.
Razão tinha a UDP ao indicar que o que o Ministério pretendia era, em primeiro lugar, um cheque em branco para poder legislar durante as férias, desta Assembleia e, em seguindo lugar, ao abrigo da urgência que dizia existir, de instituir o ensino superior curto, arranjar argumentos para não consultar nem os professores nem os alunos, que são os principais interessados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Terminamos dizendo que, pelas razões expostas, a UDP vai votar contra e espera que aqueles partidos que votaram a favor desta ratificação justifiquem como é que, sem termos definido ao menos um Plano a médio prazo, se sentem com autoridade de tomar opções de fundo em matéria como esta.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação na generalidade da ratificação do Decreto-Lei n º 427-B/77.
Submetida à votação, foi aprovada,, com 83 votos a favor (PS e CDS), 37 votos contra (PCP, UDP e dos Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Aires Rodrigues) e a abstenção do PSD.
Neste momento reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Arnaut,
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma declaração de voto o Sr. Deputado Manuel Gusmão.
O Sr. Manuel Gusmão: (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 427-B/77 pelas seguintes quatro ordens de razão fundamentais:
1.ª Não sendo nós contra a criação do ensino superior de curta duração ligada à institucionalização ou reformulação de um grau académico e de uma especifica qualificação profissional e funcional, tal como apoiamos o aparecimento das escolas superiores de educação, consideramos, entretanto, que aquela criação deve obedecer a uma determinada coerência a construir para o sistema escolar e corresponder ao estudo sério das necessidades do desenvolvimento económico- social, estudos esses, inerentes à necessidade objectiva e constitucional de planificação desse desenvolvimento.
Não somos adeptos de esquemas ou coerências formais e abstractas. Admitimos a reformulação gradual e progressiva do sistema escolar, mas em função de um horizonte de coerência mínimo e não desgarradamente.
Esta mesma ideia manifestámo-la nós aquando da apreciação do pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo à Assembleia da República sobre esta matéria. Votámos então contra a concessão de tal autorização, entre outras razões, pela importância de que se revestia (e reveste) o assunto por considerarmos que era a Assembleia da República a sede própria para politicamente se decidir sobre a questão, não tendo nós, pela análise da política do MEIC, razões para confiarmos numa solução correcta por parte do Governo.
O decreto cuja ratificação recusámos é confino, desconexo, de aplicação perigosa e revelar uma visível precipitação. O seu quadro geral torna-o dificilmente recuperável através da introdução de alterações pontuais.
A criação de um ensino superior de curta duração e, quanto a nós, dificilmente desligável, senão indesejável, das situações a adoptar quanto ao terminal do ensino secundário e quanto às futuras bases gerais do ensino superior, em vez de se introduzir mais um factor de complicarão e distorção do sistema escolar e de ensino.
Como foi salientado pela minha camarada Zita Seabra, igualmente faltam pelo menos que conheçamos na fundamentação das "situações" encontradas, os necessários, estudos que relacionem o tipo de ensino aparentemente criado com o rastreio das necessidades económico-sociais e os objectivos de planificação constitucionalmente prevista.
Votámos, pois, contra, desde logo, pela confusão, desconexão, laconidade, e deficiente fundamentação do decreto em apreço.
2.ª Ordem de razões: A tendência, explicita embora, para a regionalização do ensino superior acaba por ter pouco conteúdo útil e preciso neste decreto; e o próprio objectivo da criação do ensino superior curto é nebuloso e o de que real consequência se encontra de facto no texto, para além do que se refere às escolas superioras de educação, é a destruição de uma experiência de sinal positivo do pós-25 de Abril a transformação dos antigos institutos industriais e institutos comerciais em institutos superiores.
Assim, um Ministério que se caracterizou fundamentalmente pela paralização ou destruição de medidas positivas anteriores, inovadoras, mesmo quando pretende inovar, acaba por virar no fundamentam a destruição e não ai adaptação criadora e correctiva de novas realidades escolares.
O absurdo da solução em relação aos ISCAs, preparando o desaparecimento da formação universitária no domínio da contabilidade ao contrário de se
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abrir a possibilidade de licenciatura em tal ramo, ao invés, aliás, do que se, passa, ou é tendência geral noutros países, é acompanhado, no que respeita aos ISEs, por uma tentativa de reparar a posição de uma situação próxima da passada quanto aos institutos industriais com o demérito de regresso ao passado de incriminação, sem que avance no sentido da reconversão do ensino superior e universitário no seu conjunto.
Se se pensa que os actuais ISEs não cumprem as funções para que foram criados e se encontram enfermos dos mesmos vícios da nossa Universidade, o que é discutível, pelo menos em relação a iodos os casos, o que há é que procurar introduzir as alterações necessárias nesses institutos, e nas Faculdades próximas e não liquidar uma experiência que entre outros objectivos tinha já explicitamente a ter uma função teórico-prática virada para o exercício de determinadas profissões.
A pseudo-solução preconizada no decreto, peto contrário, parece trazer, em conformidade com a iniciativa de destruição, uma concepção de inaceitável fatalismo ou imobilismo quanto à transformação democrática da Universidade do sem conjunto, que deve ser processada na adequação da sua estrutura, na elevação de nível científico e técnico de preparação que fornece e no justo critério social na determinação do acesso, em obediência aos preceitos constitucionais sobre a matéria.
Votámos, pois, contra, também pela falta de perspectivas criadoras e construtivas deste decreto.
A 3.ª ordem de razões, que não é, antes pelo contrário, a última, reside no conteúdo de ciasse do decreto que reedita a orientação elitista e conservadora do MEIC
Nota-se esta marca que tende a manter a selectividade de classe no acesso ao ensino superior, na desintegração deste tipo de ensino em relação ao sistema escolar, nomeadamente em relação ao ensino superior no seu conjunto, criando" um beco sem saída prevista, o que é manifestado pela ausência de ligação horizontal e vertical com esse ensino.
O mesmo se verifica na base da já referida concepção fatalista em relação a ele. e na falta da previsão de discriminações positivas a favor dos trabalhadores que exercem as profissões para as quais os ramos de ensino em questão fornecem a preparação técnica e científica
É infelizmente necessário reproduzir nesta declaração de voto dos preceitos constitucionais transparentes nos seus significado e objectivos:
Art. 74.º -2. O Estado deve modificar o ensino de modo a superar a sua função conservadora da divisão social do trabalho.
Ari. 76.º O acesso à Universidade deve ter em conta as necessidades do País em quadros qualificados e estimular e fornecer a entrada dos trabalhadores e dos filhos das, classes trabalhadoras.
Nós, comunistas, sabemos que a realização plena destes objectivos não se obtém do dia para a noite em curto prazo de tempo. Sabemos que só a sociedade socialista e o seu desenvolvimento poderá realizá-los cada vez mais extensa e profundamente. É entretanto claro, e mesmo óbvio, que desde já podem e devem ser tornadas as medidas que apontem no sentido de realizar estes objectivos democráticos e constitucionais. O que e inadmissível e que não só não se dêem para isso os passos necessários, mas antes se reforçam os obstáculos que existem na actuai estrutura escolar e mais ainda que se volte atrás no que já depois do 25 de Abril foi feito no sentido de atenuar a selectividade e discriminação de classe da estrutura de ensino (refiro-me aos casos dos ISEs e dos ISCAs).
A questão do elitismo e da marca de classes não é apenas, como foi aqui, pretendido a do feiticismo do t iludo académico e é mais funda do que o vício de se ligar a esse titulo em determinado estatuto, social. A questão está em que esse fetichismo é de facto um reflexo da divisão sociais, do trabalho nos sociedades divididas em classes de interesseis antagónicos, sobre-determina a divisão técnica do trabalho e no sistema de reprodução das relações sociais, entre os quais o ensino, tende a que sejam os oriundos das classes dominantes a serem seleccionados para os níveis mais elevados, da ciência e da técnica e para as funções técnicas de domínio. Ora, este decreto tende a perpetuar e mesmo a criar fiadores de agravamento dessas selectividades.
O mesmo sentido de classe do decreto manifesta-se na possibilidade de verem a criar-se escolas, desde a sua criação, compelia mente transitórias e com o objectivo de proporcionar especializações restritivas inteiramente dependentes do sentido negativo, da mobilidade do processo tecnológico e da anarquia de uma produção não planificada. Tal tipo de formação, como há já exemplou em outros países, pode conduzir à submissão da qualificação técnica da força, do trabalho a necessidades porventura pontuais e não planificadas e à consequente ameaça de degradação contínua da formação profissional e, logo, do valor da força do trabalho.
Votámos assim contra, pelo carácter regressivo e de acentuação da selectividade de classe na política de ensino expressa neste decreto
A 4.ª ordem de razões que fundamenta o nosso voto reside no facto de termos ponderado e considerado haver muito de justo e de irrecusável nas posições tomadas por um grande leque de associações profissionais, socioprofissionais e de docentes e estudantes, que abarca desde representantes das escolas abrangidas pelo decreto aos Sindicatos, de Engenheiros Técnicos do Norte e do Sul. à Associação Profissional dos Engenheiros Técnicos Portugueses (Zona Norte), Associação Portuguesa dos Contabilistas, ao Sindicato dos Professores da Zona da Grande Lisboa, ao Sindicato dos Oficiais e Maquinistas da Marinha Mercante, etc.
O denominador comum das posições destas associações é fortemente critico e dificilmente pode ser considerado fruto do opções puramente corporativas ou de classe profissional.
Este facto revela, aliás, o vício de legislar sobre matéria de tão grande importância som passar pela Assembleia da República e sem a necessária consulta e discussão com as escolas & as associações socioprofissionais e sindicatos, vício tanto mais grave, quanto
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é facto que na passagem dos antigos institutos industriais e institutos comerciais a institutos superiores as escolas foram ouvidas.
Queremos entretanto deixar claro que votámos contra porque discordamos global monte do Decreto-Lei n.º 427-B/77. Apresentámos, entretanto, propostas de alteração e de eliminação, que defenderemos na Comissão, no sentido de recuperar o pouco de positivo que o decreto contém e a reduzir o mais possível o muito de negativo que no decreto existe. Com essas propostas, visamos fundamentalmente:
a) Manter a criação de escolas superiores de educação com a sua diversidade de objectivos de formação, visando entretanto encurtar o prazo de definição dias condições para tal criação;
) Incluir o objectivo de reconversão das escolas de enfermagem dm escola? superiores de enfermagem;
c) Paira deixar claro o propósito de regionalização do ensino superior melhorar formulações e consignar às futuras regiões administrativas e enquanto não exaltam às assembleias distritais, previstas na constituição, a capacidade de propor a criação de estabelecimentos de ensino superior de curta "duração, tendo, em conta as necessidades de desenvolvimento económico e social da respectiva região;
d) Acautelar o justo estatuto dos docentes e a aplicação das normas de. gestão em vigor nos restantes estabelecimentos de ensino superior;
e) A necessidade de o Governo definir por decreto-lei normal especiais que favoreçam o acesso a este tipo de ensino dos trabalhadores profissionais nos respectivos ramos.
Aplausos do PCP
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalves Sapinho para uma declaração de voto.
O Sr. Gonçalves Sapinho (PSD): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando no Pinai, da I Sessão Legislativa, no quente mês de Agosto, O Ministério da Educação e Investigação Cientista apresentou a esta Assembleia um pedido de autorização legislativa, com vista à criação do ensino superior de curta duração, o PSD deixou bem, claras, com a sua abstenção, duas coisas:
1.º Que era favorável ao princípio dai criação, do ensino superior de curta duração;
2.º Que, dada a importância, da matéria, a questão deveria merecer amplia discussão, na Assembleia da República., conforme consta da declaração de voto por mim próprio proferida e da intervenção do Sr. Deputado. Pedro Roseta, que disse a dado passo: "(...) toda? estas preocupações podarão impor-nos, eventualmente, um período de ratificação da legislação que vier a ser publicada" e mais à frente: "(...) o PSD entende que as questões fundamentais de ensino devem ser objecto de debate público (...)"
Com toda a coerência, o PSD, ao sujeitar a ratificação o Decreto-Lei n.º 427-B/77, fê-lo, não por motivos de clientela eleitoral, mas no cumprimento da promessa já referida e com o intuito de provocar amplo debate público no lugar próprio e com a profundidade necessária sobre o problema cuja importância não vale a pena enaltecer.
Com a mesma coerência, o PSD absteve-se na generalidade na ratificação do Decreto-Lei n.º 427-B/77 e reafirmou a sua adesão à ideia da criação do ensino superior de curta duração.
As objecções por nós levantadas nas intervenções idos Srs. Deputados Pedro Roseta e Amélia de Azevedo, bem como as propositais de alteração já apresentar das na Mesa para discussão na especialidade, mostram que o decreto-lei em causa não corresponde aos objectivos que devam presidir à institucionalização do ensino superior de curta duração.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Para nós, são questões essenciais as seguintes:
As escolas de ensino superior curto devam ter a sua própria identidade de modo que, quer os seus professores quer os seus alunos, não se sintam professores ou: alunos de segunda, nem aspirem a ser, a curto prazo, professores ou alunos, exactamente iguais aos das instituições universitárias. Há que, à partida, criar esta identidade, ou seja, criar um espaço próprio e definido dentro da estrutura do ensino, sob pena de estarmos a criar um nado-morto.
A título de apontamento, acrescentaria que o nado-morto pode ser provocado, não só pela razão apontada, mas ainda se não se estabelecer um equilíbrio estável entre a formação que este Cipo de ensino dá e as perspectivas die- emprego.
O ensino superior curto não pode, apesar disto, constituir-se num mundo fechado, e daí a necessidade de garantir, à partida, mecanismos de permeabilidade entre este tipo de ensino e o restante ensino superior, incluindo o universitário.
Deverá assim ser aberta a possibilidade de os melhores diplomados pelas escolas superiores técnicas terem acesso aos graus superiores do ensino superior.
Os ISEs e os ISCAs não devem ser reconvertidos per cate decreto-lei e transformados em escolas superiores técnicas, pelos motivos que os Deputados sociais-democratas já apontaram desenvolvidamente.
O ensino nocturno de- modo a possibilitar, designadamente aos trabalhadores da província, o acesso a formas de valorização profissional que até aqui lhes foi' negada.
Não queríamos terminar esta declaração de voto em fazer uma alusão, muito breve, à intervenção da Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio: louvamos a inteligência, a imaginação e o engenho da Sr.ª Deputada ao superlativar o papel do ensino superior curto, transformando-o, em pedra de toque de todo o ensino, capaz de provocar, por arrastamento, a reformulação do ensino secundário terminal e da própria Universidade.
Porém, se louvamos a imaginação, não comungamos, de modo algum, do optimismo da Sr.ª Deputada, nem sequer queremos acreditar que a ausência de um plano coerente para uma reformulação global do sistema de ensino venha a ser colmatada por esta nova descoberta, transformada, por artes mágicas., em panaceia de todo o sistema escolar.
Não será antes que o ensino superior curto, tal como foi concebido, se transformou no canto do
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cisne de um Ministério que não soube ser da Educação nem da gestão concreta dos meios materiais e humanos postos ao seu dispor?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Leitão, também para uma declaração de voto.
O Sr. José Leitão (PS): -O Grupo Parlamentar do PS votou favoravelmente a ratificação do Decreto-Lei n.º 427/77 por considerar que com ale se cria em Portugal um ramo diversificado do ensino superior que, para além de se integrar no espírito de uma reforma global do ensino superior adequada ao nosso país, favorece desde já a possibilidade de formação de técnicos superiores qualificados tão necessários ao País.
Considera ainda o Grupo Parlamentar do PS que com esta medida, que deverá ser criteriosamente articulada com outra e urgentes reforma? do ensino superior, nomeadamente a nível universitário, se contribui para corrigir a propensão para a busca de cursos clássicos que não são os que, com mais urgência, o País necessita, possibilitando-se o aparecimento de um corpo de diplomados do ensino superior, que pelo eu prestígio profissional introduzirão mudanças significativas na dinamização social actualmente hierarquizante do ensino universitário.
Congratula-se ainda o nosso partido pela elevação a nível superior da formação dos professoras primários, medida que é inteiramente justa e que vem ao encontro do já solicitado pelo nosso partido e dos anseios da classe, que sempre se opôs a uma promoção por via administrativa. Espera o nosso grupo parlamentar que com a criação do ensino superior de curta duração seja possível reexaminar os objectivos de formação de várias escolas existentes, quer a nível do 1.º ciclo profissionalizante, quer a nível universitário, a fim de dar coerência a todo o sistema de ensino superior, concedendo-lhe eficiência, danar mínimo, adaptabilidade e mobilidade inter-ramos e escolas.
Aguardamos também que, no espírito deste decreto se reveja a formação dos técnicos de enfermagem, que, entre outros, se nos afigura devem ser considerados no âmbito do MEIC, possibilitando-se também comparar a técnicos de outros sectores de formação a nível superior. Neste sentido, enviámos à Mesa duas propostas de alteração ao decreto, que iremos ter oportunidade de discutir na especialidade com os outros partidos.
O Sr. Presidente: - Tom a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecassis.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Acácio Barreiros lançou um desafio e não precisava de o lançar porque eu já me tinha antecipado a justificar o nosso voto.
Penso que o fiz com clareza, penso que não ficaram quaisquer dúvidas sobre as críticas que fazemos ao decreto em apreciação. Mais: apressámo-nos a introduzir as alterações necessárias pana que este País não tivesse de continuar adiado também neste aspecto.
Não vale a pena que- iludamos os problemas. O ensino superior curto que é uma necessidade hoje, já era uma necessidade há longos anos. Exige-o o nosso desenvolvimento económico, exige-o a nossa justiça social, exige-o o acesso, que devamos permitir, à cultura do povo português.
Todas as objecções que aqui foram levantadas pelos vários grupos parlamentares foram contempladas não só na minha intervenção como nas propostas que apresentamos.
Recordo que as principais, aquelas que poderiam significar um bloqueio efectivo à sociedade portuguesa, feiram fites em consideração de uma forma muito particular na intervenção que fizemos.
Temos a certeza antecipada, mesmo antes de começar o debate na Comissão Parlamentar de Educação de Ciência e Cultura que os institutos superiores, de Engenharia, de Economia, de Contabilidade e Administração não serão incluídos neste diploma, nem ficarão incluídas neste tipo de ensino.
Tudo o resto é iludir os problemas. Eu, afirme, na minha comunicação a esta Assembleia que o povo português tem dez anos para recuperar o atraio cultura! em que se encontra. Não será com a nossa responsabilidade que esses anos serão perdidos. Não será com a ideia falsa de que para fazer alguma coisa é preciso ter planos a médio prazo, quando nós reclamamos os planos a médio prazo. O que entra pelos olhos dentro não necessita de ser adiado. Foi por toso que votámos como votámos, e por Oro que tornaremos todas as disposições necessárias para que este decreto seja emendado em tudo o que tiver de o ser, e será por isso que daremos todo o nosso contributo para que a sua regulamentação seja concreta, para que poisamos entrar definitivamente no rumo do desenvolvimento.
Aplausos do CDS.
O St. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvindo as palavras do Sr. Deputado Nuno Abecassis, poder-se-ia pensar, quem não conheça o decreto, que estávamos perante um decreto que definia o rumo do futuro, que tipo de cursos é que se vão criar, mas na verdade nada disso acontece. Nem as próprias propostas do CDS para aí apontam. O que na verdade é preciso saber neste país quando se fala de ensino superior curto, isto é, de ensino altamente especializado, é para onde é que nos próximos quatro anos a nossa economia vai ser orientada, e, por exemplo, fundamentalmente para a agricultura, ou para a produção de máquinas ou para outros sectores onde é que vai ser necessário maior esforço económico. E dentro dessa planificação está bem que se lancem cursos - e mor, em princípio, não somos contra o ensino superior curto, curto de especialização, para servir essa economia que está planificada e está minimamente orientada.
Na verdade, penso que em todas as intervenções aqui feitas a favor deste decreto - alias, roguem 55 atreveu a falar a favor dele, mas sim a favor com remendos - , ninguém disse, porque não podia, que tipo "de ensino vai ser criado. E o decreto também
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não diz que matérias vão ser contempladas ou em que iramos fundamentais vai ser feito o principal esforço.
Eu quero dizer que o decreto não diz isso propositadamente, pois este decreto está feito, e eu disse isso na minha intervenção, de acordo com as exigências do imperialismo. Portanto, do que se trata é de abrir as portas à criação de cursos superiores que ninguém sabe muito bem quais serão, e agora vamos ficar à espera que as multinacionais se lembrem de lançar, por exemplo, um determinado sector de electrónica e de dizerem: "precisamos de um determinado conjunto de "técnicos", e aí vai o Governo correndo para, sem qualquer plano nacional, criar rapidamente um curso, possivelmente com os, técnicos americanos para lançar esse sector de electrónica. E daqui a três anos essa multinacional, como sempre acontece, lá descobre que, é mais rendível mudar a sua fábrica para Marrocos, vai-se embora, o curso fecha e os alunos que já vão a meio (do curso perdem esse curso. É isto o que se vão passar com este decreto. Portanto, não se venha dizer com ar responsável!, e com ar de quem está a traçar 0,5 granidas rumos do futuro, que se fez um decreto para um futuro que permita que daqui a dez anos sejamos capazes... Não, fez-se um decreto que abre as portas a tudo quanto as exigências do imperialismo implicarem - o que é diferente.
O que também é claro neste decreto é quis, não se sabendo bem o que é quis ele vai construir, sabe-se muito bem o que é que se vai destruir. E o que se vai destruir é o que foi criado nos institutos superiores: o esforço e o trabalho dos professores e dos alunos que neles estão, que pode merecer críticas, evidentemente, que pode ter defeitos, mas que na realidade é uma obra que está ali a provar a esta Assembleia e a quem quer que seja que, de facto, a dedicação dos professores e a dedicação dos alunos produziu alguma coisa. E esta Assembleia, que não foi capaz de durante o presente ano aprovar, ao menos, o Plano para quatro anos, esta Assembleia que ainda há oito duas derrubou um Governo e agora vota a favor de uma opção de fundo desse mesmo Governo, ou melhor os partidos que votaram a favor ou se mascararam na abstenção, estão a dar uma prova clara da sua irresponsabilidade perante as opções de fundo. Porque o que se está a pedir a este Assembleia com esta questão é, antes de mais, que defina e clarifique a situação deste país para os próximos quatro amos, como é sua obrigação e como é exigência constitucional, que não cumpriu. O que se exige é que se espere, ao menos, pela clarificação da situação política para se tomarem opções deste género.
Na verdade, em matéria de atacar as conquistas do 25 de Abril e o que os professores e os alunos das institutos superiores criaram são efectivamente conquistas do 25 de Abril - a Assembleia não entrou de férias. Aliás, a maioria desta Assembleia não foi por isto que derrubou o anterior Governo, não foi por este não atacar as conquistas do 25 de Abri, foi possivelmente por não as, atacar tão eficientemente quanto os partidos da direita reaccionária assim o exijam.
E portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nós concluímos dizendo que a UDP estará, evidentemente, atenta à discussão na especialidade deste decreto-lei, no sentido de analisar propostas que eventualmente tenham sido feitas.
Mas o que esta Assembleia pretendeu fechar aqui foi a possibilidade de uma efectiva Legislação que crie um ensino favorável aos trabalhadores e ao interesse nacional.
Sr. Presidente, só queria dizer mais uma coisa.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Só mais uma?
O Orador: - Partidos que votaram a favor ou que se abstiveram têm dito com frequência que é preciso serenidade, que estamos numa situação muito difícil de indefinição, alguns até falam em eleições. Quer dizer, aprovam hoje uma opção de fundo e eles próprios consideram que estão criadas as condições para alterar o xadrez desta Assembleia, mas, enfim, isto faz parte das suas inconsequências, e não das nossas. Esses partidos também dizem que t preciso serenidade, que, os trabalhadores não se devem excitar, que é preciso aguardar a saída desta situação, mas, entretanto, esta Assembleia vota um decreto contra uma conquista do 25 de Abril, que vai aprofundar a situação de instabilidade nos institutos superiores.
O Ministério de Agricultura e Pescas continua os seus ataques contra a Reforma Agrária Diz-se que todos tiveram oportunidade de manifestar as suas opiniões, mas, para já, os alunos e os professores dos institutos superiores não tiveram a liberdade que está declarada na Constituição de se manifestarem, porque foram proibidos pelas autoridades.
Quando se fala em que é preciso manter a calma, o que nós. dizemos ao povo português e já agora, em particular, aos alunos e aos professores dos institutos superiores é o que já dissemos aquando da queda do Governo do Dr. Mário Soares isto é só conversa para ir adormecendo os trabalhadores, por que em matéria de ataques às conquistais do 25 de Abril elas prosseguem com o Governo ou sem o Governo. E compete aos trabalhadores defender essas conquistas e lutar por ver minimamente respeitados, o 25 de Abril e a Constituição dentro de um futuro governo a constituir
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecassis.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Presidente, eu queria pedir a palavra para prestar um esclarecimento e fazer um protesto.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr Deputado
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Primeiramente, queria prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado Acácio Barreiros, que acaba de falar.
É que lastimo que a sua memória seja curta, porque quando em Outubro apresentámos aqui um projecto de lei para a extinção do Serviço Cívico Estudantil, nós falámos, já nessa altura, na necessidade de fazer a diversificação do ensino superior. O Sr. Deputado Acácio Barreiros esqueceu-se disso certamente. No entanto, queria dizer-lhe ainda que
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não é com as suas afirmações demagógicas que fará com que o povo português 55 esqueça das realidades e se esqueça de terem efectivamente luta pelos seus interesses.
Risos do PCP.
Relativamente ao segundo aspecto, só quem está totalmente divorciado do mundo do trabalho, como o Sr. Deputado Acácio Barreiros, é que pode fazer afirmações do tipo daquelas que o Sr. Deputado fez.
Quanto à instituição do ensino superior curto, isto é, à pretensão de conceder -como ainda agora a Sr.ª Deputada Zita Seabra me perguntou e eu respondi afirmativamente - aos trabalhadores deste pais a possibilidade de ter uma formação superior e até universitária, só quem está completamento longe do que seja trabalhar é que pode fazer as afirmações demagógicas que o Sr. Deputado acaba de fazer. Não enganará ninguém e não será com as suas acusações que conseguirá destruir tudo o que de positivo eu aqui disse. E o Sr. Deputado não disse nada de positivo, e não disse porque não sabe, sobre o ensino superior de engenharia em Portugal ou sobre o ensino de contabilidade e administração. E a sua ignorância não é iludida com os seus berros. O Sr. Deputado não defende absolutamente nada, antes quer destruir e manter na ambiguidade a situação em que estavam os institutos superiores.
Nós fizemos com que se acabasse com essa ambiguidade e eles saberão julgá-lo e saberão julgaremos a nós.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros para um contraprotesto, mas peço-lhe que seja breve.
O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Com certeza. Sr. Presidente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Nuno Abecassis cata bastante irritado e enervado. Eu penso que, pela. parte que me toca, esse foi um mérito da intervenção da UDP, pois que cota não mostrou qualquer ignorância da UDP, antes desmascarou o fundo das intervenções do CDS.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Ainda bem!
O Orador: - E não sendo assim o Sr. Deputado Nuno Abecassis teria intervido da mesma forma de ainda há bocado, quando, sereno e calmo, pensou que podia fazer passar gato por lebre.
Risos.
É que, na verdade, Sr. Deputado, o mundo do trabalho precisa de especialização e o Sr. Deputado Nuno Abecassis apontou isto e apontou até inclusivamente - eu ouvi a sua intervenção com atenção - ideias positivas. Mas a questão de fundo é que foi iludida por essa intervenção e foi o apontar isso que fez irritar o Sr. Deputado. É que o que os trabalhadores portugueses precisam de saber e que tipo de economia se pensa desenvolver. Vão tentar oferecer-lhes qualquer ensino superior para servir as multinacionais e amanhã serem lançados no desemprego, como aconteceu em relação às grandes multinacionais aqui em Portugal, ou será que, finalmente, se pode fornecer alguma especialização técnica, que é necessária, pondo-a ao serviço de um plano patriótico, de um plano que realmente sirva os interesses nacionais?
Esta e a questão de- fundo que interessa aos trabalhadores, porque lhes diz directamente respeito, e é evidentemente a questão de fundo que interessa esconder ao capital estrangeiro e aos imperialistas em geral. É que o decreto -e o Sr. Deputado não conseguiu demonstrar o contrário - esconde realmente que tipo de ensino é que se pretende criar. É que ele não o pode definir, pois ainda agora se está a negociar na Alemanha e nos Estados Unidas, a ver se interessam os tais investimentos estrangeiros e se eles dizem que tipo de técnicos precisam, se é que preocupam, se é que não trazem os seus próprios técnicos.
E sabe, Sr. Deputado Nuno Abecassis, a questão de fundo que de facto nesta matéria particular nos divide aqui o Sr. Deputado vê Portugal como uma simples província da Europa e eu vejo Portugal como um país independente e socialista.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:- Sr. Deputado Nuno Abecassis, desculpe-me, mas não vejo realmente qual é a oportunidade da sua intervenção.
V. Ex.ª deu um esclarecimento, fez um protesto e o Sr. Deputado Acácio Barreiro? respondeu. Creio que o assunto está encerrado, e estamos quase em cima da hora, a não ser que V. Ex.ª considere muito importante o esclarecimento que vai dar.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Considero, sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Considero que o Sr. Deputado Acácio Barreiros acaba de. une ofender.
Risos.
O Sr. Presidente: - Confesso, Sr. Deputado, que não dei por isso, porque, caso contrário, tê-lo-ia interrompido, mas V. Ex.ª é que é o juiz
Tenha a bondade de usar da palavra.
O Sr. Nuno Abecassis (CDS): - Sr. Presidente, tenho pena que a sua sensibilidade não se tenha apercebido que quando alguém diz que eu defendo que Portugal seja uma província da Europa m1; ofende profundamente. E eu não admito isso ao Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se na Mesa um requerimento apresentado por colegas do PSD, o primeiro dos quais é o Sr. Deputado Pedro Roseta, solicitando a baixa à comissão competente para discussão e votação na especialidade da ratifi-
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cação que acabamos de aprovar na generalidade. É solicitado que a comissão competente se pronuncie até ao dia 15 de Janeiro próximo.
Vou, portanto, pô-lo à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - O ponto seguinte da nossa agenda de trabalhos, que afinal pode ser abordado nesta altura, é a discussão da proposta de lei n.º 129/I, sobre o Orçamento Geral do Estado para 1978.
Numa reunião há pouco efectuada pelos grupos parlamentares em que este assunto foi debatido, chegou-se à conclusão de que não há actualmente condições para a discussão e votação desta proposta de lei. Nestas circunstâncias ela considera-se retirada da nossa ordem de trabalhos
Passamos, pois, ao ponto seguinte, que é a discussão e votação do Orçamento da Assembleia da República, nos termos do antigo 12.º da nossa Lei Orgânica.
O relatório e os elementos respectivos já foram oportunamente distribuídos. Creio, pois, que a Assembleia poderá dispensar a sua leitura.
Se não há oposição, vamos passar à discussão.
Pausa.
Como não há pedidos de intervenção nesta matéria, passáramos imediatamente à votação do Orçamento da Assembleia da República.
Submetido à votação, foi aprovado, com a abstenção da UDP.
O Sr. Presidente: - Poder-se-á estranhar o facto de um documento tão importante não ter sido objecto de uma discussão como, porventura, podia ser esperado. Todavia, esta discussão fez-se largamente no Conselho Administrativo, da Assembleia da República, que reúne representantes de todos os partidos, que são os quadro vice-presidente, e também representantes dos trabalhadores.
A nossa aprovação deste documento tornará a forma de resolução, nos termos do artigo 169.º, n.º 4, da Constituição.
Srs. Deputados, a ordem do dia para a sessão de amanhã é constituída pelas matérias já agendadas e mas uma, que é a Lei Orgânica do Serviço do Provedor de Justiça.
A sessão de amanhã terá início, como habitualmente, às 14 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas.
Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS)
Agostinho Martins do Vale.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Moreira Portugal.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Rico Calado.
Aquilino Ribeiro Machado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Dieter Dellinger.
Fernando Jaime Pereira de Almeida.
Florêncio Joaquim Quintas Matias.
Florival da Silva Nobre.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Francisco Soares Mesquita Machado.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
João Joaquim Gomes
João da Silva.
João Soares Louro.
Joaquim José Catarino de Menezes.
Joaquim Sousa Gomei Carneiro.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Cândido Rodrigues Pimenta.
José Manuel Medeiros Ferreira.
Manuel Barroso Proença.
Manuel Pereira Dias.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Marta de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Teresa Vieira Bastos Ramos Ambrósio.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Telmo Ferreira Neto.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Partido Social Democrático (PSD)
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Manuel Barata Portugal.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Fernando José da Costa.
Gabriel Ribeiro da Frada.
João Afonso Gonçalves.
Jorge de Figueiredo Dias.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Almeida de Oliveira Baptista.
José Bento Gonçalves.
José Gonçalves Sapinho.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Manuel Ribeiro Sérvulo Correia.
Luís Fernando Cardoso Nandim de Carvalho.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Centro Democrático Social (CDS)
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro
Francisco António Lucas Pires.
Henrique José Cardoso Menezes Pereira de Morais.
João Lopes Porto.
José Manuel Cabral Fernandes.
Narana Sinai Coissoró.
Nuno Krus Abecassis.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
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Partido Comunista Português (PCP)
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Jaime dos Santos Serra.
Victor Henrique Louro e Sá.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Independentes
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
José Justiniano Taboada Brás Pinto.
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS)
Álvaro Monteiro.
António Alberto Monteiro de Aguiar
Bento Elísio de Azevedo.
Fernando Luís de Almeida Torres Marinho.
Fernando Tavares Loureiro.
Francisco de Almeida Salgado Zenha
Francisco do Patrocínio Martins.
João José de Carvalho Taveira Pinto
José Ferreira Dionísio.
Vasco da Gama Fernandes.
Partido Social Democrático (PSD)
António Augusto Gonçalves.
ntónio Augusto Lacerda de Queiróz.
António Luciano Pacheco de Sousa Franco.
Fernando Adriano Pinto.
Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.
José Ferreira Júnior.
Maria Élia Brito Câmara.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Centro Democrático Social (CDS)
Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
António Simões Costa.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
Luis Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Ruy Garcia de Oliveira.
Walter Francisco Burmester Cudell.
Partido Comunista Português (PCP)
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Independentes Carlos Galvão de Melo.
O CHEFE-ADJUNTO DOS SERVIÇOS DE REDACÇÃO, José Pinto.
PREÇO DESTE NÚMERO 20$OO
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA