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I Série - Número 94 Quinta-feira, 7 de Setembro de 1978

DIÁRIO da Assembleia da República

I LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1977-1978)

SESSÃO SUPLEMENTAR

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE SETEMBRO DE 1978

Presidente: Exmo. Sr. António Jacinto Martins Canaverde
Secretários: Exmos. Srs. Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes
José Gonçalves Sapinho
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMARIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foi anunciada a apresentação de um requerimento das petições n.º 169/I e 170/I.

Ordem do dia. - Prosseguiu e concluiu-se a discussão na generalidade sobre os projectos de lei n.º 124/I, 125/I, 126/I, 127/I, 128/I, 129/I e 130/I, sobre a lei eleitoral, tendo o Sr. Deputado Vital Moreira (PCP) respondido a um pedido de esclarecimento, quanto à sua intervenção da última sessão, do Sr. Deputado José Luís Cristo (CDS), que também fez um protesto e um esclarecimento.
Registaram-se intervenções dos Srs. Deputados Acácio Barreiros (UDP), António Barreto (PS), Armando Lopes (PS), Nandim de Carvalho (PSD) e Carmelinda Pereira (indep.), usando ainda da palavra, a diverso titulo, além dos oradores, os Srs. Deputados Pinto da Cruz (CDS), Vital Moreira (PCP) e Carlos Brito (PCP).
O Sr. Presidente leu, entretanto, uma comunicação do Grupo Parlamentar do PS em que se informa que, por terem pedido a demissão deste partido, o deixaram de integrar os Srs. Deputados António Barreto e Medeiros Ferreira.
Foram aprovados na generalidade os projectos de lei n.ºs 124/I, 125/I, 126/I, 129/I e 130/I, que, a requerimento do PS, baixaram à 2.ª Comissão para discussão e votação na especialidade, fazendo declaração de voto os Srs. Deputados Pinto da Cruz (CDS), Herculano Pires (PS), Jorge Leite (PCP) e Rui Machete (PSD) - que respondeu depois a um protesto do Sr. Deputado Vital Moreira (PCP).
A Assembleia rejeitou o recurso interposto pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira (Indep.) da decisão da Mesa que o impediu de ler a sua declaração de voto, tendo intervindo sobre o assunto, além do recorrente, o Sr. Deputado Vital Moreira (PCP).
Emitiram declaração de voto quanto a esta votação os Srs. Deputados Vital Moreira (PCP) e Meneres Pimentel (PSD).

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram 15 horas e 5 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Agostinho Martins do Vale.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Amadeu da Silva Cruz.
António Barros dos Santos.
António Cândido Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
António Francisco Barroso de Sousa Games.
António Jorge Moreira Portugal.
António José Pinheiro Silva.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Miguel Morais Barreto.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.

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Carlos Manuel da Costa Moreira.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Delmiro Manuel de Sousa Correia.
Dieter Dellinger.
Eurico Manuel das Neves Henrique» Mendes.
Fernando Jaime Pereira de Almeida.
Fernando Reis Luís.
Florêncio Quintas Matias.
Florival da Silva Nobre.
Francisco António Marcos Barracosa.
Francisco de Assis de Mendonça Lino Neto.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Herculano Rodrigues Pires.
Jaime José Matos da Gama.
João da Silva.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
José Cândido Rodrigues Pimenta.
José dós Santos Francisco Vidal.
José Ferreira Dionísio.
José Gomes Fernandes.
José Manuel Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maximiano de Albuquerque de Almeida Leitão.
Ludovina das Dores Rosado.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Branco Ferreira Lima.
Manuel Lencastre Menezes de Sousa Figueiredo.
Manuel Pereira Dias.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Paulo do Vale Valadares.
Sérgio Augusto Nunes Simões.
Teimo Ferreira Neto.

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amantino Marques Pereira de Lemos.
Américo de Sequeira.
Anatólio Manuel dos Santos Vasconcelos.
Antídio das Neves Costa.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
António Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Arcanjo Nunes Luís.
Armando António Correia.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Cirilo Oliveira Marinho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando Adriano Pinto.
Fernando José Sequeira Roriz.
Francisco Barbosa da Costa.
Francisco Braga Barroso.
Francisco M. L. de Sá Carneiro.
Gabriel Ribeiro da Frada.
João António Martelo de Oliveira.
João José dos Santos Rocha.
João Lucílio Caceia Leitão.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Jorge de Magalhães Saraiva da Mota.
José Angelo Ferreira Correia.
José Bento Gonçalves.
José Ferreira Júnior.
José Gonçalves Sapinho.
José Joaquim Lima Monteiro de Andrade.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Rui Sousa Fernandes.
Júlio Maria Alves da Silva.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Manuel Henrique Pires Fontoura.
Manuel Sérgio Vila Lobos Menezes.
Maria Élia Brito Câmara.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Olívio da Silva Franca.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Victor Hugo Mendes dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
Álvaro Manuel Brandão Estêvão.
Angelo Alberto Ribas da Silva Vieira.
António Jacinto Martins Canaverde.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique José Cardoso Menezes Pereira de Morais.
João Carlos Filomeno Malho da Fonseca.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José Magalhães Ferreira Pulido de Almeida.
João Lopes Porto.
José Luís Rebocho de Albuquerque Christo.
José Manuel Cabral Fernandes.
José Manuel Macedo Pereira.
José Vicente de Jesus Carvalho Cardoso.
Luís Esteves Ramires.
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos.
Maria José Sampaio.
Vítor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Comunista Português (PCP)

António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Jusarte.
António Marques Pedrosa.
António Pedro Valverde Martins.
Cândido de Matos Gago.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Diamantino José Dias.
Eduardo Sá Matos.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernanda Peleja Patrício.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Jaime dos Santos Serra.
João Terroso Neves.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel dá Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Gomes.

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Manuel Gonçalves.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Manuel do Rosário Moita.
Manuela Fernanda de M. dos Santos Nunes.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Nicolau de Ascensão Madeira Dias Ferreira.
Raul Luís Rodrigues.
Severiano Pedro Falcão.
Vital Martins Moreira.
Victor Henrique Louro de Sá.

União Democrática Popular (UDP)

Acácio Manuel de Frias Barreiros.

Independentes

António Jorge de Oliveira Aires Rodrigues.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
José Justiniano Taboada Brás Pinto.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 161 Srs. Deputados. Temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foi apresentado na sessão de ontem, pelo Sr. Deputado Brás Pinto, um requerimento dirigido ao Ministério da Educação e Cultura.
Foram também recebidas as seguintes petições: n.º 169/I, apresentada por Leonardo Cabanelas, que baixou à 5.ª Comissão, e n.º 170/I, apresentada por Raul António Santa Rita, que baixou à 2.ª Comissão.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 124/I, 125/I, 126/I, 127/I, 128/I, 129/I e 130/I, sobre a lei eleitoral.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Cristo para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. José Luís Cristo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Vital Moreira idêntica à que fiz ontem ao Sr. Deputado do PS.
O Sr. Deputado e o seu partido consideram ou não com natureza de sanção jurídica a inibição de ser eleito o cidadão que, estando recenseado, não exerça efectivamente o seu direito de voto? E se o Sr. Deputado a considera sanção, essa sanção é ou não mais grave do que uma sanção pecuniária idêntica àquela em é proposta pelo CDS ou pelo PSD?
No entender do seu partido e no seu, essa sanção tem ou não a finalidade de fazer com que os resultados eleitorais se aproximem o mais possível do universo
eleitoral e representem a vontade real dos eleitores, como, aliás, era defendido nos Congressos da Oposição Democrática, que criticavam a legislação de antes do 25 de Abril porque ela não promovia através de regulamentação de disposições adequadas o exercício efectivo do direito de voto?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira para responder, se assim o entender.

O Sr. Vital Moleira (PCP): - Sim, Sr. Presidente, até porque a questão parece que tem sido alvo já de muitos equívocos e importa esclarecê-la. Contribuirei para isso na medida em que me for possível, e creio que é.
Comecemos por assentar no seguinte: à face da Constituição os cidadãos portugueses não têm o direito subjectivo de serem eleitos para a Assembleia da República. Na .realidade, as candidaturas têm filiação partidária e portanto só é candidato quem um partido proponha. Logo, sem considerarmos a hipotética impossibilidade de alguém que não vote não poder vir a ser candidato na eleição seguinte, não se trata de retirar um direito, não se tratará portanto de uma sanção, mas apenas do reconhecimento de uma situação objectiva que não tem qualquer natureza de sanção.
De resto, tenho para mim que pode ser discutível mesmo a possibilidade de considerar essa inelegibilidade. Na realidade, à face da Constituição, para a Assembleia da República só não podem ser elegíveis de entre os cidadãos eleitores aqueles que exercem determinadas profissões ou que sejam atingidos por incapacidades locais. Logo, penso que é pelo menos discutível a possibilidade de, por via legal, se consagrar esta inelegibilidade.
Imaginemos que este obstáculo era ultrapassado porque, de facto, não havia obstáculos constitucionais à consagração de uma tal consequência, isto é, a inelegibilidade nas eleições seguintes para os eleitores que não votassem para a Assembleia da República. Será que isso teria de ser considerado sanção? Já respondi a isso dizendo que não.
Por outro lado, sempre teríamos de considerar o seguinte: será que o Sr. Deputado considera como sanção o facto de se considerar incapaz eleitoralmente aquele que tenha sido condenado por qualquer crime a pena de prisão maior? Será que aquele que comete um assassínio, um homicídio, e que é condenado a vinte anos de prisão, e por isso mesmo perde a capacidade eleitoral, será que o Sr. Deputado considera esta perda de capacidade eleitoral uma sanção, ou apenas uma consequência objectiva retirada do facto de esse cidadão ter cometido um crime?
Pergunta-me se, sendo uma sanção, é ou não mais grave do que a multa. Imagine-mos que era uma sanção - hipótese que rejeito como válida -, mas mesmo que o fosse era, como é óbvio, qualitativamente diferente da pena de multa e o próprio Deputado do CDS, João Morgado, afirmou ontem o seguinte: «os cidadãos não sentem esta sanção da inelegibilidade, não a sentem como obrigatória». Como é que, então, pode o Sr. Deputado vir dizer-me que esta pseudo-sanção é mais grave do que a pena de multa? A questão é que, mesmo que fosse sanção, era qualitativamente diversa da sanção da multa, porque, num caso, significaria, quando muito, a im-

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possibilidade de exercer activamente um direito, e, no outro caso, significa a perda real de um bem.
Não deixa de ser estranho que o Sr. Deputado José Luís Cristo lenha citado os congressos da oposição democrática no. que respeita ao facto de o universo eleitoral não corresponder ao universo político dos cidadãos portugueses. Mas, oh, Sr. Deputado! como pode vir dizer-me uma coisa destas! Pois não é verdade que antes do 25 de Abril só tinha direito de voto quem o regime quisesse? Que só se inscreviam quem as entidades administrativas quisessem? Que só votava, em última análise, quem as autoridades quisessem?
Onde é que está qualquer semelhança entre esta situação arbitrária, de discriminação política, pessoal, administrativa e esta situação em que todos os cidadãos legalmente habilitados têm a obrigação de se inscreverem e o direito de votarem? Onde é que está qualquer semelhança ou aproximação possível entre estas duas situações?

O Sr. José Luís Cristo (CDS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Cristo (CDS): -Eu disse exactamente que não havia semelhança nenhuma. O que pergunto é que semelhança é que existe entre aquilo que se defendia antigamente, isto é, que a legislação era má e que deveria ser modificada no sentido de promover o exercício efectivo do direito de voto, que era defendido antes do 25 de Abril, que semelhança existe entre essas opiniões manifestadas antigamente e as opiniões manifestadas hoje por certos partidos?

O Orador: - Não há semelhança nenhuma, salvo nisto: é .que, tal como, antes, o regime obrigava os seus funcionários a votarem, sob pena de serem postos na rua, ó CDS quer, agora, obrigar os seus eleitores a votar, sob pena de pagarem multa!

Aplausos do PCP.

Protestos do CDS.

O Sr. José Luís Cristo (CDS): - Isso não é verdade, Sr. Deputado!

Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto e um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Cristo (CDS): - Está claro que não é essa a vontade do CDS, porque o CDS não parte do princípio de que os cidadãos que se abstêm pertencem todos ao CDS ... Acho até muito estranho que o Sr.ª Deputado imagine que isso aconteça.

Risos do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Está-se a ver quem está interessado ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros para uma intervenção.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há um ano, ou mesmo há apenas seis meses, a hipótese de realização de uma sessão extraordinária, convocada apressadamente para aprovar as leis do recenseamento eleitoral, face à iminência da realização de eleições gerais antecipadas, fariam rir muitos dos que aqui 'hoje estão sentados e que sentem a sua ineviabilidade. É que mesmo aqueles que a determinada altura diziam propor para a saída da crise a realização de tais eleições efectivamente as não queriam, e, como parece, não as quero hoje, sendo prova bastante da falta de veracidade dessas intenções então formuladas a não apresentação, há um ano atrás nesta Assembleia, dos projectos necessários à sua concretização.
Em 30 de Julho de 1978 o Conselho Nacional da UDP, analisando a situação política, afirmava sobre o Governo PS/CDS:

Pretende a direita prosseguir a sua política sem recurso à consulta popular porque sabe que a representação das forças políticas burguesas em S. Bento em nada corresponde à vontade do povo, que, sofrendo na carne a política dos governantes, viu como esta é bem diversa das suas promessas eleitorais. Por outra razão ainda se opõe a direita à realização de eleições antecipadas: nas suas tentativas de «estabilização» da política reaccionária, o debate e a consulta à vontade popular são entraves à contínua viragem à direita na política governamental.
E continuava o manifesto:
A crise actual, aberta pelas pressões do CDS, mostra bem o caminho por onde segue o Governo. Para impedir novas viragens à direita, é preciso pôr um travão a este Governo e exigir um pronunciamento da vontade popular como forma de expressar a oposição à política da direita.
A exigência de eleições não é apenas uma perspectiva, é hoje uma exigência concreta por que lutamos e que se tornará numa alavanca para levantar o movimento popular em oposição ao Governo e à política da direita.
A vida encarregou-se de confirmar a correcção desta análise e a justeza da proposta de luta por eleições antecipadas. Efectivamente, a chantagem do CDS deu os seus frutos. Um deles vamos tê-lo aqui amanhã sentado perante nós -um Governo «independente» desta Assembleia mas «dependente» de Belém.
Ë, pois, numa situação de «casa roubada», como a do provérbio, que hoje aqui estamos a deitar «trancas à porta», a aprovar uma lei que diminua as probabilidades de o Parlamento ficar sem qualquer recheio constitucional.
O sistema eleitoral não pode reflectir o modo como está organizado o Poder, que por seu lado condiciona. Esta verdade é válida para a actual composição da Assembleia da República. Em 1976 o povo português votou nos partidos que diziam defender os interesses dos trabalhadores. Pela segunda vez consecutiva, em dois anos, a direita foi derrotada e ficou em minoria.
Daí que o PSD e o CDS não estejam interessados em concorrer de novo, sem alterar ao máximo o sistema eleitoral a seu favor, já que estão bastante estorvados pela Constituição. O deslizar da política desta

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Assembleia para a direita fazia-os jogar no tempo para mais facilmente fazerem passar uma lei eleitoral que permitisse uma composição capaz de levar a cabo a revisão constitucional.
A agudização da crise política vem, porém, obrigar desde já a pôr o jogo na mesa, demonstrando que tanto o CDS como o PSD tinham em mente o golpe eleitoral.
Face às leis em vigor, duas atitudes são possíveis: a manutenção de uma legislação que já serviu para eleger duas assembleias, feitas as necessárias adaptações constitucionais, ou a sua alteração em tudo o que seja possível ser alterado, de acordo com os últimos resultados eleitorais.
Optaram pela primeira solução os partidos à esquerda do hemiciclo, pela segunda os da direita.
Nos seus projectos, o PSD e o CDS ajustam os círculos eleitorais à sua «representatividade», empolando-a. A aritmética eleitoral nem sempre dá resultados seguros aos aprendizes de feiticeiro da sua manipulação. Ao propor a criação de círculos eleitorais, formados por agrupamentos de concelhos, cuja fixação deixa para o Governo, o PSD pretende fundamentalmente duas coisas: protelar a realização das eleições, desviando as atenções para a questão em aberto da regionalização administrativa, e pôr em causa a representatividade proporcional, imposta pela Constituição, ao aumentar o número de círculos eleitorais, logo a hipótese de as forças políticas minoritárias se fazerem representar.
Por outro lado, ao querer tal distribuição de círculos, o PSD demonstra ser um partido de implantação regional, em que pesa uma clientela política que tem de satisfazer, entre a qual, como sempre temos dito, os caciques herdados da ANP. A pretensão de transformar cada ilha do arquipélago dos Açores num círculo eleitoral e a súbita vocação de defesa dos direitos cívicos do povo de Timor Leste, há apenas a dizer que são visíveis, uma, porque megalómana, e a outra, porque hipócrita.
Diferente filosofia abraça o CDS. Partido sem real implantação a nível nacional, à procura de um espaço e de uma imagem política, destituído de quadros locais, cria uma repartição eleitoral à sua imagem e semelhança. De uma passada o CDS pretende essa coisa magnífica, ser o único partido não só a não perder, como também a ganhar, com a diminuição do inúmero de Deputados de 263 para 250 ...
A história dos arranjos dos círculos eleitorais à medida das conveniências dos partidos é tão velha quanto a :história do próprio parlamentarismo. São conhecidos os golpes dos fins da monarquia portuguesa, ainda que os seus grandes cultores sejam .hoje os EUA e a Europa Ocidental.
O CDS, mas em especial o PSD, pretendem com os seus projectos negar a representatividade dos partidos em que votaram os trabalhadores, ali onde o capitalismo e o fascismo determinaram um menor desenvolvimento económico e cultural, onde a influência ideológica dos caciques reaccionários, onde se incluem certos padres, é maior. Querem dividir o campo da cidade, o Norte do Sul, o continente das ilhas, querem pôr os trabalhadores contra os trabalhadores, querem negar que por toda a parte amplas camadas do povo lutam contra a exploração, a miséria e o obscurantismo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Esta mesma Assembleia derrotou em Dezembro de 1977, quer dizer, durante esta mesma sessão legislativa, o projecto de lei n.º 84/1, do PSD, no qual votou favoravelmente o CDS então em «convergência». Tal não impediu, no entanto, e contra o que está no artigo 130.º, n.º 2, do Regimento, que tal iniciativa seja agora renovada pelo PSD e CDS.
O que pretendem estes partidos? Uma maior participação dos cidadãos na vida nacional? Ou não será que o maior abstencionismo se verifica exactamente nos distritos onde tais partidos têm maior implantação eleitoral, os mesmos distritos, aliás, em que a sua campanha eleitoral não tem defeso, pois alguns sectores reaccionários da Igreja, onde se destaca pelo seu feroz ardor antidemocrático o arcebispo de Braga, a mantêm sempre alumiada? Será pelo terror da criação de uma nova dízima que a direita pensa elevar a consciência cívica dos cidadãos?
Sem querer entrar na discussão sobre a natureza jurídica do dever de votar e da sanção proposta - até porque mais do que de uma discussão jurídica se trata de uma discussão política- a UDP não pode deixar passar o farisaísmo daqueles que durante o fascismo nunca ergueram um dedo em favor do alargamento do direito de votar e se arvoram agora em defensores do dever de o fazer. São os mesmos, aliás, que por todos os expedientes sensitários e em todas as épocas recentes da nossa história procuraram manter à porta das assembleias de voto os operários e os camponeses e todas as camadas mais exploradas do povo.
Mas só por si o tipo de sanções proposto para quem não vote reflecte que tais partidos efectivamente não entendem o dever de votar como um dever cívico, mas sim como um mero dever regulamentar punido com multa fixa- ou um dever fiscal sancionado como qualquer não pagamento de impostos ou contribuições. Há também que salientar vir o CDS propor um sistema de controle que revela as concepções policiais que tem do Estado, em que cada um é polícia de todos e o inverso. Que máquina repressiva não teria de se montar para primeiro apurar, depois calcular, para em seguida cobrar, 5 % dos impostos pagos pelos cidadãos que justamente ou não, optaram pela posição política do abstencionismo?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP concorda fundamentalmente com a legislação eleitoral em vigor. Assim, apresentou apenas as alterações que julgou indispensáveis de adaptação do sistema eleitoral à Constituição, e fê-lo de forma que ficasse claro que apenas se tratava de modificações pontuais e não de edifícios originais, como à primeira vista podem parecer os projectos do PS e do PCP, que seguiram a mesma opção de fundo.
Introduziu, no entanto, alterações relativamente à capacidade eleitoral passiva e activa, considerando que os que forem condenados pelos crimes previstos na lei que proíbe as organizações fascistas não podem, evidentemente, eleger ou ser eleitos.
Por outro lado, e pela mesma razão que se justifica a inelegibilidade dos presidentes e vice-presidentes das câmaras municipais o exercício de cargos que podem influenciar os resultados eleitorais -, considera a UDP que os vereadores a tempo inteiro não se podem candidatar.

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Quanto à Comissão Nacional das Eleições e não existindo, por proibição constitucional, um tribunal especial para as questões eleitorais, propõe-se a sua reactivação, dotando-a dos necessários meios humanos e técnicos.
Defende também a UDP que a Comissão Nacional das Eleições deverá funcionar junto da Assembleia da República, tendo na mesma assento representantes de todos os órgãos de Soberania, e sendo esta Assembleia constituída por partidos e só podendo estes concorrer às eleições, mal se compreenderia que os seus representantes não fossem por estes designados.
Apenas dois anos decorreram sobre as últimas eleições para esta Assembleia. A estrutura eleitoral vigente provou poder ser um freio à hegemonização do Parlamento pelas forças e partidos da direita e extrema-direita. Assim, a UDP votará a favor de todos os projectos que no essencial coincidam com as posições por si defendidas, isto é, além do nosso, obviamente, o do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pinto da Cruz.

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - A dado passo da sua intervenção, que ouvi atentamente, diz V. Ex.ª, Sr. Deputado, que os diferentes partidos, ao proporem uma modificação nos 'círculos eleitorais, agiriam de acordo com a sua conveniência própria, o que transporta implícita a afirmação de que o meu partido, o CDS, ao propor a modificação dos círculos eleitorais, designadamente ao preconizar a existência de um círculo nacional, estaria a defender um privilégio relativamente a outros partidos, tese que já aqui foi defendida neste hemiciclo, nomeadamente pelo Deputado Herculano Pires, do PS, e também pelo Deputado Vital Moreira, do PCP. Que o Sr. Deputado Herculano Pires, do PS sustentasse essa tese, ainda que numa óptica sem razão, eu talvez o aceite; que o Sr. Deputado Vital Moreira vivesse conduta igual, também sem razão, eu seria levado a aceitar que assim fosse; agora que uma crítica desse género partisse precisamente de V. Ex.ª, Sr. Deputado Acácio Barreiros, isso é que me surpreende imenso!...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Também tem um prémio!

O Orador: - E direi que V. Ex.ª não atendeu convenientemente às tais contas de aritmética que seriam produzidas necessariamente na distribuição dos Deputados no caso de existir um círculo nacional de eleições.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Também era premiado!

O Orador: - É que o partido que seria beneficiado, com base mas últimas eleições, seria precisamente a UDP, que beneficiava de um. Deputado em prejuízo do PS.

Protestos do PS e do PCP.

É precisamente este esclarecimento que lhe quero dar para ver a dimensão da sua injustiça, quando veio acusar nesses termos o CDS.

Risos do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Mal agradecido!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para responder o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - De facto, parece que o CDS fez cuidadosamente as contas, embora ontem não o admitisse, e, pelos vistos, o que o preocupou na alteração que propõe é que a UDP aumente a sua representação neste Parlamento. Se calhar o próprio CDS, pelas suas contas, seria prejudicado em benefício da UDP!...

Risos.

Sr. Deputado, essa é muito grosseira para passar, mesmo sem estarmos aqui a discutir aritmética. De facto, a UDP claramente que fez análise aritmética -não. eu, mas algumas pessoas o fizeram -, e que, pela análise dos últimos resultados eleitorais, o sistema proposto pelo CDS não prejudicava a UDP e até a poderia beneficiar com um Deputado.
Mas devo esclarecer que nos opomos a essa concepção de círculo eleitoral nacional por razões de princípio quanto à forma por que entendemos que deve ser conduzido o processo eleitoral. Isto é, as candidaturas, à luz da actual legislação, traduzem uma ligação dos Deputados aos problemas locais e ao povo em cada distrito: A criação de um círculo nacional único poderia fazer com que as candidaturas se fizessem por pessoas que nada tinham a ver com os vários distritos e poderíamos cair naquelas histórias muito criticadas do tempo da Monarquia em que os Deputados eram eleitos por Freixo de Espada à Cinta sem nunca lá terem aparecido, apenas pelos favores feitos nos corredores aqui em Lisboa!
A nosso ver, o sistema eleitoral correcto é este que existe, porque permite a criação de .listas onde os Deputados têm uma maior ligação aos problemas locais e onde são mais conhecidos pelo povo de cada distrito.
Ë por isto que estamos de acordo com esta divisão e somos contra a criação de um círculo eleitoral nacional.

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente, para dar uma ligeira explicação ao Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Sr. Deputado, há uma referência na sua intervenção que não traduz a realidade e que não corresponde à verdade. Nós não defendemos a existência de um círculo nacional único, como referiu; defendemos, sim, a existência de um círculo nacional a par dos círculos regionais, dos círculos do estrangeiro, do círculo de Macau e dos círculos distritais.
Era este esclarecimento que lhe queria dar, Sr. Deputado.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Peço a palavra,

Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Já agora, se me permite, queria dizer que a proposta do CDS, nesse aspecto, vai ao encontro da proposta do PSD, no sentido de acabar com o sistema da proporcionalidade, sistema amplamente democrático que está consignado na Constituição. Repare que a criação desse círculo nacional, embora não seja um círculo nacional único com CDS para o círculo nacional único também não ia porque não beneficiava nada com isso! -, faria com que, a nível de cada distrito, houvesse menos lugares na eleição, o que ocasionava, por exemplo, que, enquanto há distritos que estão a eleger Deputados de quatro e até de cinco partidos, passariam agora a eleger ,de dois ou até de um, o que acabaria por subverter as eleições a nível distrital e o sistema amplamente democrático e representativo que as eleições pretendem ter a nível distrital, remetendo grande parte da votação e até da representatividade desta Assembleia para esse círculo nacional, porque seriam cento e vinte e cinco Deputados eleitos pelo círculo nacional e haveria outros cento e vinte e cinco eleitos em círculos distritais ...

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Muito obrigado por ter permitido que o interrompesse.
Apenas queria dizer, Sr. Deputado, que oportunamente ser-lhe-á dada resposta às críticas que neste momento está a fazer e verá que não tem razão.

O Orador: - Então aguardo pela intervenção do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que não pode deixar de se lamentar as circunstâncias que rodeiam o debate e a aprovação da lei eleitoral. O carácter precipitado, a urgência e a velocidade com que se apresentam não são de modo algum as condições, pelo menos razoáveis, exigidas por tão importantes reflexão e legislação. Seriam assim consideradas normais e adequadas as autocríticas dos Governos Constitucionais e da própria Assembleia da República. Razões estranhas à democracia devem explicar o atraso desta discussão e razões de mera circunstância explicam agora a sua urgência. Para que haja sempre alternativas democráticas, e não há democracia sem alternativas, é necessário que em qualquer altura se possa recorrer ao processo eleitoral, o que não foi possível durante dois anos dada a ausência de dispositivos legais. É assim uma anomalia do regime democrático que está agora a ser superada, embora tardiamente.
Não p fazemos, todavia, nas melhores condições. Aliás, um partido proponente teve mesmo a franqueza de sublinhar, .na exposição de motivos que antecede a proposta, a necessidade da realização de eleições antecipadas. Além disso, ilustrando bem a conjuntura pouco propícia de que falei, regista-se a coincidência no tempo desta discussão com a apresentação na Assembleia da República de um Governo não partidário e, de certo modo, de mediação presidencial. Isto é, o sistema eleitoral que vai ser aprovado ficará sem dúvida marcado por flutuações partidárias estratégicas e tácticas, por eventuais tensões institucionais e, finalmente, por urgências eleitorais de curto prazo, para não dizer míopes. Saibamos, apesar de tudo, evitar tão maus conselheiros. É o que se pode esperar, restando-me afirmar ainda que, mau grado o que antecede, a aprovação desta lei, e a do recenseamento, deve ser feita.
Não é por espírito de contradição nem por perfeccionismo exagerado, passe a expressão, que insisto na necessidade de uma reflexão de fundo à volta deste problema. Com ele estão ligadas importantíssimas questões de sociedade e do regime, para as quais nem as forças políticas nem as instituições encontraram já soluções satisfatórias. Assim: as relações entre os Órgãos de Soberania; a adequação do Estado à sociedade civil; a descentralização; as relações entre Poder Central e poder local; a legislação fundamental sobre associações e partidos políticos; e finalmente as funções e responsabilidades dos representantes do povo - eis alguns problemas cruciais que apenas serão casualmente abordados, ciado até que na generalidade das propostas, embora se devam assinalar diferenças, não se vislumbre um esforço ou uma vontade reais de abordar estes problemas em conjunto.
Reconheço evidentemente que algumas das transformações desejadas e úteis poderão vir a ter implicações no regime constitucional. É ,o que será seguramente feito quando chegar o momento e a altura da revisão. O sistema eleitoral deverá então orientar-se para formas que proporcionem e facultem melhor os consensos e o entendimento de parte apreciável da população, evitando assim os riscos de impasses políticos. Penso especialmente que os partidos políticos não devem ser os exclusivos sujeitos eleitorais, tanto nas eleições parlamentares como nas locais, com relevo para estas últimas. Aliás, só partidos receosos poderão insistir demasiado nesta exclusiva e parece ter sido este o entendimento existente aquando da votação da Constituição e de outros diplomas sobre o processo eleitoral. Ora, partidos receosos fazem uma democracia receosa, situação que denota uma inquietante fragilidade. O que é certo, a este respeito, é que à maior parte dos cidadãos portugueses não é reconhecido o pleno direito de serem eleitos, a não ser que se inscrevam num partido político ou em listas partidárias. Reconheceremos que a um direito deste modo condicionado corresponde uma noção de democracia limitada ou de democracia sob tutela.
Num futuro não muito longínquo exigir-se-ão na altura devida, como disse, normas de uma «democracia aberta», não asfixiante, não limitada por feudos. Os Deputados, sendo membros de partidos políticos ou não, deverão ser mais representantes do povo e dos eleitores e perante estes responder mais e melhor. Por isso, penso que a «eleição parcial», como método de substituição ou de confirmação, durante uma legislatura, deverá ser a regra, em oposição ao actual sistema, despersonalizado e sem responsabilização permanente. O que actualmente existe é, de certo modo, uma «democracia por procuração» e não uma real democracia de representação. Nesta, os homens também são responsáveis perante os eleitores e não se escondem sempre atrás do anonimato do colectivo partidário que, depois de obtida a procuração, regula a seu belo-prazer a Administração c

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o exercício do mandato. A título quase anedótico, não deixo de mencionar vários casos, por mim conhecidos, de Deputados, entre os quais me conto, que recebem correspondência, expedida dos Ministérios ou do Palácio de S. Bento, endereçada não ao «Deputado ..,», mas ao «Membro do Grupo Parlamentar ...»!
Bem sei que esta situação ainda deve muito aos tempos da Constituinte e à efervescência dos anos 74 e 75. O método eleitoral de então, mesmo é receando demasiados fantasmas, tinha talvez alguma justificação, dado que se elegia, e em condições muito particulares, uma Assembleia Constituinte. Os tempos mudaram, mudou a situação, mudou a natureza da Assembleia.

A Sr.ª Georgete Ferreira (PCP): - Não mudou!

O Orador: - Agora, trata-se de eleger uma Assembleia da República, e o princípio de representação parlamentar tem de se pôr de lado o princípio constituinte. Aliás, e para ir mais longe, diga-se que é difícil aprovar um novo código eleitoral sem ter, por exemplo, reflectido longamente sobre a questão dos poderes reais dos Deputados e da Assembleia da República perante o Presidente da República e o Executivo. Qualquer que seja o figurino que se venha a adoptar, «m matéria de liderança institucional, uma coisa tenho como certa: os poderes, competências, funções e iniciativas da Assembleia da República terão de aumentar consideravelmente, sob pena de acalentarmos todos a ilusão de termos um real Parlamento soberano.
Será igualmente necessário encontrar um melhor equilíbrio, um compromisso superior entre o princípio de organização partidária e o princípio de organização local, regional, de associação comunitária e de interesses diversos. Tal equilíbrio deverá encontrar formas concretas no que diz respeito ao sistema eleitoral, e terá também consequências positivas em matéria de relações entre o Poder Central e os poderes locais.
Esta uma problemática para a qual se não encontram também soluções satisfatórias 'nas cinco presentes propostas de lei.

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - Será legítimo continuar a privilegiar as cidades em detrimento dos campos? Será democrático perpetuar os desequilíbrios entre o litoral e o interior? Não será justo aumentar o número de representantes das regiões autónomas e de todas as regiões do interior cujas vozes tão pouco se fazem ouvir, aqui como noutros locais ou instituições? (Risos do PCP.) E não será paradoxal que, mau grado a Constituição indicar sem ambiguidades um novo figurino administrativo e regional - no qual a descentralização parece ser um pilar essencial-, venhamos agora consagrar de novo o distrito como círculo eleitoral? Que é feito das regiões Plano «que devem coincidir com as regiões administrativas?» Que é feito das sub-regiões das regiões Plano que poderiam perfeitamente constituir novas unidades territoriais e comunitárias com incidência eleitoral? Observo que a Constituição, que para tantos foi um limite ou um habitáculo à inovação do sistema eleitoral, neste capítulo da descentralização e da administração regional, não parece ter sido cabalmente respeitada ou, pelo menos, não terá sido fértil a sua inspiração. A propósito da Constituição, todos sabemos que esta, em diversos capítulos, consagra o princípio de legitimidade representativa e orgânica, assim como o da legitimidade popular de base. Consagra, digo bem, más não resolve as Contradições que cria. O sistema eleitoral agora em discussão teria sido um excelente pretexto para procurarmos formalizar e institucionalizar uma tentativa de fusão desses dois princípios ou dessas duas legitimidades. Ë nesse sentido, que chamei de uma «democracia aberta», que vão as propostas implícitas nas orientações que defini e que defendo. As propostas apresentadas petos grupos parlamentares esforçaram-se mais por conservar e terão como consequência a manutenção de uma democracia por procuração e de separação das duas legitimidades constitucionais. Mas, atendendo a que aqui ou ali surgiram algumas tentativas de inovação, aliás mal justificadas ou insuficientemente estudadas, são estas as razões por que não poderei votar favoravelmente nenhuma das cinco propostas. E nem se pode dizer que membros do Partido Socialista não tenham já repetidamente alertado para a necessária inovação no. domínio eleitoral. Cito em particular artigos de Medeiros Ferreira e Sousa Tavares, além das minhas próprias posições públicas há muito.

Risos do PS e PCP.

Voz do PCP: - Os Mateus Roses!

O Orador: - Sei quais são os limites constitucionais à inovação do sistema eleitoral. Reconheço que algumas das minhas opiniões levadas ao extremo se revelariam inúteis, porque contradizem a Constituição.

Vozes do PCP: - Ah!...

O Orador: - No entanto, o que pretendi afirmar e fundamentar foi uma vontade política de aprofundamento e consolidação da democracia, aproximando-a da sociedade civil; da dignificação e responsabilização do mandato de Deputado; a descentralização política, administrativa e cultural. Havendo vontade política, não seria difícil, com o tempo e reflexão, encontrar as soluções técnicas e jurídicas, no quadro cia Constituição vigente, e até à sua revisão.
Termino, constatando que uma vez mais Portugal vai adiar. Colocados perante a possibilidade de dar mais um passo no caminho da criação de instituições modernas, democráticas, duráveis e mais adequadas à realidade e às aspirações da população, não teremos ousado dar esse passo em frente. Tem-se adiado a clarificação do sistema sócio-económico, sem o qual nenhum regime sobrevive. Razões infelizes fizeram perder a dinâmica de algumas reformas de fundo, nomeadamente a da agricultura e a da saúde.

O Sr. Jorge Leite (PCP): - Perderam os reaccionários!

O Orador: - O receio e a miopia têm protelado a reforma regional, a descentralização, a moderniza-

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cão do Estado democrático, o processo de autonomia das regiões, a implantação de mecanismos e regras de consertação social e de planeamento. Igualmente a falta de ousadia e de confiança na democracia têm vindo a atrasar e a dificultar a plena integração dos partidos políticos na .vida quotidiana e institucional no nosso povo.

O Sr. António Jusarte (PCP): - Está a perder uma oportunidade de ficar calado ...

O Orador: - Pelo que se pode prever quanto à Lei Eleitoral que vai ser aprovada, não tenhamos dúvidas que perdemos mais uma 'oportunidade. Confio e espero que ainda haja forças que permitam a Portugal e à democracia corrigir tal erro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Presunção e água benta...

O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Deputado, ouvi-o com a máxima atenção, tanto mais .necessária quanto a confusão e a equivocidade de algumas das passagens do discurso do Sr. Deputado o tornavam dificilmente compreensível ...

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Não é verdade!

O Orador: -... e suscitou-me algumas perguntas que gostaria de ver esclarecidas perante a Assembleia.
Em primeiro lugar, queixa-se o Sr. Deputado de que este não é o momento oportuno para discutir e aprovar a Lei Eleitoral. Pareceu-me -e se a minha presunção não é .correcta, admito a contradita - que a sua lógica seria esta: como se fala em eleições antecipadas, não deve discutir-se a Lei Eleitoral, o que nos levaria à conclusão de não poder haver, eleições antecipadas porque não há Lei Eleitoral e não deve haver Lei Eleitoral enquanto houver o risco de haver eleições antecipadas. Pergunto ao Sr. Deputado: quando e que deveria haver Lei Eleitoral?
Segunda questão: o Sr. Deputado António Barreto perguntou se é de continuar a perpectuar as discriminações entre o interior e o litoral, as cidade e o meio rural, as regiões autónomas e o continente. Sr. Deputado, onde é que a actual Lei Eleitoral ou os projectos apresentados a esta Assembleia discriminam contra as regiões rurais em favor das cidades, contra o interior a favor do litoral, contra as regiões autónomas a favor do continente? Onde é que está isso? Onde é que a Lei Eleitoral não garante a igualdade de representação das regiões autónomas, das cidades e dos campos, do litoral e do interior?
Uma última pergunta, entre as muitas a que a intervenção insólita do Sr. Deputado daria lugar: falou em inúmeras propostas, mas ao que quis perceber, e apesar dos meus esforços, nenhuma clara e explícita proposta de alteração da Lei Eleitoral vi na sua intervenção. O Sr. Deputado permitiu-se mesmo falar em propostas implícitas no seu discurso, mas se são as propostas dos «Deputados por procuração», que somos nós, que não dão satisfação aos interesses que o Sr. Deputado gostaria de ver em termos de lei eleitoral, porque é que o Sr. Deputado, não por procuração, como aparentemente é o Sr. Deputado Barreto, não apresentou um projecto de lei eleitoral, como lhe competia à facto do Regimento e da Constituição?

Vozes do PCP e PS: -Muito bem!

O Orador: - Ou será que nem esse direito, que está expressamente reconhecido no Regimento, é reconhecido aos «Deputados por procuração»? Ou julga o Sr. Deputado que a iniciativa legislativa que cabe a todos e a cada um dos Deputados e substituída, no caso do Sr. Deputado, por um discurso em que a suficiência, a arrogância e ate, ia a dizer, a ...

Vozes do PCP: - Diz! Diz!

Risos do PCP e PS.

O Orador: -... desvergonha, ...

Apupos do PSD e do CDS.

O Orador: -... substitui a iniciativa que devia ter tomado e que responsavelmente lhe era exigida depois do discurso que aqui proferiu?!...

Aplausos do PCP.

Apupos do PSD e protestos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vital Moreira, lamento ter de lhe chamar a atenção, mas penso que a última expressão devia ter sido evitada ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permito-me substituir a palavra que utilizei por «despudor».

Risos.

O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - É mais pudica!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Barreto quer responder já ou aguarda por outros pedidos de esclarecimento de outro Sr. Deputado ire está inscrito?

O Sr. António Barreto (PS): - Aguardo outros pedidos de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado António Barreto, ouvi-o com espanto. O Sr. Deputado foi membro do I Governo do Dr. Mário Soares, até 8 de Dezembro, na plenitude das funções deste Governo; depois, foi membro do Governo de gestão; a seguir, foi Deputado na Assembleia da República.
Não compreendo como o Sr. Deputado pode pôr-se à margem do que de bom e de mau possa ter sido feito na Assembleia da República, quando é certo que o Sr. Deputado ocupou aqui e no Governo cargos da mais alta responsabilidade! ... E, no que se refere à lei eleitoral, a verdade 6 que nunca ouvimos da

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sua parte uma só reflexão acerca da necessidade dessa legislação, nunca aqui o ouvimos tomar posição nesse sentido e não compreendemos, portanto, como se arroga a posição que agora nos comunicou. O Sr. Deputado aparece-nos um bocado como «caído do céu», imas nós não acreditamos que seja anjo!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PS: - É pára-quedista!

Risos do PCP e PS.

O Orador: - Sr. Deputado, uma primeira pergunta que lhe queria fazer é a seguinte: vem o Sr. Deputado incorporar-se no esforço que todos nós estamos a fazer naturalmente a partir de posições políticas bem diferenciadas, quando não antagónicas para adequar a lei eleitoral ao texto da Constituição, ou vem o Sr. Deputado, a pretexto da discussão da lei eleitoral, reivindicar, reclamar, a revisão da Constituição?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Gostaríamos, pois, de saber em concreto o que o que o Sr. Deputado propõe para atingir o tal equilíbrio entre a província e os meios urbanos, entre os meios rurais e os meios urbanos, entre o litoral e o interior. Onde é que está uma só ideia concreta, Sr. Deputado?
Também gostaríamos de o ouvir acerca daquilo que o Sr. Deputado afirmou e que traduzo por esta forma: o engrossar a voz das regiões autónomas. Também aí, Sr. Deputado, gostaríamos de ouvir da sua parte uma proposta, uma ideia concreta!
Por último, quando todas as forças políticas representativas deste país e repare que são todas, pelo menos nas suas declarações públicas - admitem o recurso a eleições como uma saída democrática que se pode tornar necessária e indispensável, quando o Sr. Presidente da República afirma que, com a legislação existente, essas eleições, a terem lugar, a tornarem-se inevitáveis, poderiam ser impugnadas, como é que o Sr. Deputado António Barreto se atreve a vir aqui pretender invalidar o esforço que todos nós responsavelmente estamos fazendo para dotar o País da legislação indispensável?!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros, também .para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Barreto: Em primeiro lugar, devo dizer que, para um Deputado que está nesta Câmara e que para o estar se candidatou por procuração, através de um partido político, parece-me que não tem grande valor vir agora, por uma questão de princípio e até de ofensa da própria democracia, dizer que as eleições são por procuração quando, pelos vistos, não se preocupou com isso há dois anos quando foi candidato pelo seu partido e até, como é sabido, chegou ao Governo!...
Também tive oportunidade de notar, na sua intervenção, certa semelhança com o artigo do Sr. Deputado Medeiros Ferreira no Expresso. Acontece que, tanto no discurso do Sr. Deputado António Barreio como no artigo citado, em nenhum deles se apontam soluções; diz que estão implícitas, que se vai ver, vai-se estudar a revisão constitucional, enfim ...
Para esclarecer um pouco o sentido da sua intervenção, gostaria de perguntar se seria mesmo de depreender que, para não termos uma «democracia por procuração» -parece que foi esta a expressão que o Sr. Deputado usou -, passaríamos a ter, de futuro, não partidos políticos na Assembleia da República, mas representantes de regiões, personalidades independentes. Esta Assembleia da República deixaria de ter as funções que tem na Constituição, os partidos políticos deixariam de ter o papel que têm na Constituição, e .teríamos então uma Assembleia da República que seria mais ou menos um porta-voz de assuntos regionais, deste ou daquele assunto regional, e não com uma influência política directa. Ora, como estão em moda as teorias do presidencialismo, será que isso iria no sentido de, de facto, pormos o Executivo dependente do Presidente da República, Executivo esse que não estaria dependente das eleições para a Assembleia da República e apenas viria aqui ouvir o que é que têm a dizer os representantes das várias regiões e locais da aldeia tal, do concelho tal, etc.? Eles viriam aqui, por interpostas pessoas, expor ao Sr. Primeiro-Ministro os problemas das suas regiões, para o Sr. Primeiro-Ministro os ir discutir para Belém ... E agora como está na moda a tese de que os partidos políticos é que andam a atrapalhar isto tudo, que de facto é preciso concentrar poderes na mão de um só homem, o Presidente da República, gostaria de lhe perguntar se á revisão constitucional e as ideias sobre a legislação - porque, Sr. Deputado, isso não está claro, está implícito não seriam, ao fim e ao cabo, neste sentido.
Neste país a única votação importante seria a do Presidente da República e a Assembleia da República seria, mais ou menos, porta-voz de assuntos regionais, sem ter qualquer identificação partidária, e, assim, não teríamos uma democracia por procuração, teríamos a democracia do Presidente. Ê isso que estará implícito mo seu discurso e, ao fim e ao cabo, no artigo do Deputado Medeiros Ferreira ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto para responder, se assim o desejar.

O Sr. António Barreto (PS): - Ao ouvir os pedidos de 'esclarecimento dos Deputados do Partido Comunista, chegou a minha vez de exprimir uma certa admiração: um porta-voz do Partido Comunista fez estado da sua confusão e 'outro fez estado do seu espanto - enfim, duas qualidades que, normalmente, o Partido Comunista não revela assim em público!

Risos do CDS.

Por outro lado, gostava de dizer que não tenho intenções de acompanhar o Deputado Vital Moreira que, na parte final do seu pedido de esclarecimento, decidiu por razões certamente alheias à minha intervenção elevar consideravelmente o tom do debate que se poderia inaugurar a partir de agora

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face às minhas posições, mas não é de todo, como digo, minha intenção elevar o tom e de o rodear do ambiente emotivo que ele desejou pôr, aliás acompanhado depois pelo Sr. Deputado Acácio Barreiros.
A sua confusão, Sr. Deputado Vital Moreira, não é da minha culpa. Creio ter dito bem claro, para me referir aos seus pedidos de esclarecimento, que a revisão era no momento adequado, que desde ...

Pausa.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Está confuso!

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Estou a tentar reconstruir a sua primeira pergunta no que, de facto, tenho dificuldade, mas lá iremos ...
Quanto à discriminação, o Sr. Deputado perguntou onde é que nas propostas de lei havia discriminações. Admira-me 'bastante que o Sr. Deputado me faça estar aqui a referir esse ponto, dados os seus conhecimentos profundos do materialismo dialéctico ...

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): Oh, Sr. Deputado! ...

O Orador: - O Sr. Deputado sabe perfeitamente o que são os determinismos económicos, sabe o que é o sistema económico e eu apenas quis dizer, e repito agora, talvez mais claramente, que os desequilíbrios, as distorções, a desigualdade na relação entre o litoral e o interior, entre cidades e campos, é inerente ao sistema económico, é inerente ao desenvolvimento económico e social de Portugal durante vários séculos, e que estas leis eleitorais e a maneira como os círculos eleitorais estão a ser definidos e a forma de eleição dos representantes directos do povo são inerentes à própria lógica do sistema ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Sr. Deputado, preferia acabar e desde já pedir-me que me ajude a reconstituir a sua pergunta.
O Sr. Deputado falou de igualdade e também aqui confesso a minha admiração perante a sua recente ligação a esta noção burguesa, penso eu, de igualdade numérica - um homem, um voto -, dado que, sabe perfeitamente, há uma boutade que se costuma referir a certo sistema económico, «que somos todos iguais, mas há uns mais iguais do que os outros». E de facto, em Portugal, frequentemente, os homens urbanos são mais iguais do que os homens rurais, ou os homens do litoral são mais iguais do que os homens do interior!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não fiz propostas concretas, penso que talvez tenha oportunidade de, na discussão na especialidade em comissão ou hemiciclo, vamos ver o que decide o Plenário, poder, eventualmente, fazer propostas concretas.
Porque não fiz a apresentação de um projecto de lei -aliás, aqui ligo esta pergunta a outra que creio ser do Sr. Deputado Carlos Brito -, devo dizer bastante sucintamente que se não o fiz foi por razões que exclusivamente têm a ver comigo e com o partido a que eu pertenci até hoje.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não reclamei uma revisão da Constituição antecipada nem por outros modos que não sejam o do momento devido, da altura devida e nos prazos devidos. E creio que o manuscrito do texto e a gravação que foi feita poderão revelar que a cada momento em que falei da revisão ou sequer essa ideia aflora no texto disse que nem sempre há alturas e momentos devidos e adequados. Creio que nisso fui claro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Até em relação à Constituição tem reservas!

O Sr. Carlos Candal (PS): - Reservas da República ...

O Orador: - Quanto às propostas concretas, poderei dizer que, se houver vontade política - foi o que eu referi na minha intervenção- de alterar o sistema numa procura de maior democracia, penso que há modos de redefinir os círculos eleitorais e de fazer o seu recorte nacional de acordo com outros critérios que em nada chocarão com a Constituição. Aliás, parece-me bem que posso estar a laborar em erro, posso ter uma versão errada da Constituição - a Constituição nessa matéria subalterniza, se é que não esquece, pura e simplesmente, os distritos e aponta, a curto prazo, para regiões Plano, para regiões administrativas, que serão nove, e penso que era nesse sentido que se devia procurar o recorte nacional dos círculos eleitorais.
Devo esclarecer, Srs. Deputados Carlos Brito, Vital Moreira e Acácio Barreiros, que não disse que não devia haver votação da lei; pelo contrário, está dito explicitamente, mau grado o que antecede, penso que estas leis, esta e a do recenseamento, devem ser aprovadas.
O que eu fiz sobretudo foi uma critica ao passado e até hoje. Penso que a lei eleitoral e a lei do recenseamento deviam estar aprovadas e em vigor há muito tempo. Para ser radical na expressão verbal, diria que desde após as eleições precedentes.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - No fim, Sr. Deputado.
Creio que o Sr. Deputado Acácio Barreiros teceu largas e complicadas especulações, que não pude acompanhar, sobre o que eu disse. Falei numa moção de procuração sobretudo a propósito de algo que mencionei expressamente e que foram, por exemplo, as eleições parciais e as substituições de Deputados. Lembro que já em muitos sítios, públicos ou privados, pude referir que não achava que, por exemplo, Deputados que são chamados a funções governativas, ou a funções na Administração, ou que pedem a suspensão do mandato, seja o mais adequado, o mais justo e o mais correcto que esses Deputados, em qualquer altura, por simples decisão pessoal ou do partido,

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sem referência ao eleitorado, voltem à Assembleia, voltem a sair da Assembleia e regressem à Assembleia. Ë que .penso que !há um contrato moral e político entre o representante ,do povo e os eleitores, e que cada vez que há modificação desde contrato, que há novas circunstâncias, a eleição parcial deveria ter lugar.
Dir-me-ão que o sistema eleitoral actual não permite eleições parciais para um Deputado. Mas penso que há métodos técnicos e jurídicos, por exemplo, relacionar a eleição parcial com uma certa percentagem de modificações num distrito; se os círculos eleitorais forem mais pequenos ou tiverem menos representantes; quando um círculo com quatro ou cinco Deputados tiver já conhecido uma, duas ou três alterações no corpo de Deputados que representa na Assembleia, que houvesse essa eleição parcial. Quer dizer, dentro do quadro da Constituição, é perfeitamente possível buscar, se houver vontade disso, novas alterações e novos modos de funcionamento que aumentem a democraticidade das eleições e que aumentem a responsabilidade do Deputado perante o eleitorado.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, gostava de lhe fazer uma pergunta, se é que também lhe posso responder com outra pergunta: fiquei admirado com a sua diatribe contra a democracia por procuração, a que dei um conteúdo parcial, sintético e a propósito de um problema, mas, de qualquer maneira, fiquei espantado porque deduzi das suas palavras que o Sr. Deputado acredita numa democracia representativa.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Está convertido!

O Orador: - Gostava, pois, de saber se, sim ou não, acredita na democracia representativa.
Finalmente, colocou várias questões sobre o Executivo, o Presidente da República, que deixaria de haver eleições. Pois, creio que tudo isso faz parte da sua imaginação, apenas lhe digo para reler com cuidado a cópia da mínima intervenção, quando ela for distribuída, onde eu digo que «qualquer que seja o figurino institucional futuro, penso que é necessário e insisto e sublinho - que os poderes dos Deputados e da Assembleia da República, perante o Presidente da República e perante o Executivo, sejam consideravelmente aumentados.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - O que o senhor diz não se escreve!

O Orador: - Não sou especialista em direito constitucional, não sou especialista em direito político comparado, mas pela minha experiência pessoal sinto e sei que os poderes dos Deputados em Portugal perante actos do Executivo e do Presidente da República são consideravelmente reduzidos comparados com outros países de figurino parlamentar ou até, com novidade, de figurino presidencial.
Para terminar, pediria ao Deputado Vital Moreira, se ele me poderia, pedindo-lhe desculpa, relembrar a primeira pergunta que fez e que, infelizmente, não consigo reconstituir... creio que me disse se eu pensava que era um modo muito adequado e se eu entenderia que não devia 'haver votação e aprovação desta lei num momento em que eventualmente haverá eleições antecipadas. Foi essa a sua questão?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sim, Sr. Deputado.

O Orador: - Creio que, de certo modo, lhe respondi a propósito de outra questão. Não estou a dizer que esta lei não deveria ser aprovada, pelo contrário, mas penso que o momento não é adequado, dado que já devíamos ter lei do recenseamento e já devíamos ler a lei eleitoral há muito tempo, tanto quanto possível, para não chegarmos a um dia problema que, aliás, durante o último ano, várias pessoas levantaram - em que seja preciso fazer eleições antecipadas e tenhamos de 'ficar alguns meses apertados diante do tempo e dos prazos, porque não poderá haver eleições antecipadas em qualquer altura, por não existirem dispositivos legais necessários. Já que é tarde, façamo-lo, mas com a coragem de reconhecer que estamos atrasados, que já ó devíamos ter feito. Finalmente, encontro a última questão do Deputado Carlos Brito, e até estava pouco à vontade porque não conseguia reconstituí-la. Sr. Deputado, em todo o meu texto, não me coloquei à margem de erros ou de faltas que terei cometido - ou então da partilha colegial que impõe a Constituição è que impõem as normas éticas da vida política -, não me coloquei à margem de nenhum órgão enquanto a ele pertenci.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, como o Sr. Deputado António Barreto, perante a minha instância de me permitir uma interrupção, não me concedeu tal faculdade, pedia a palavra para um esclarecimento à Assembleia.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O Sr. Deputado Acácio Barreiros ...

Risos.

O Sr. Angelo Correia (PSD):- Essas ligações, essas ligações ...

O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - Questão de pudor ...

O Orador: - O Sr. Deputado António Barreto ter-se-á esquecido, entretanto, de responder à minha última pergunta, isto é, por que é que não formalizou num projecto de lei as suas propostas implícitas, tornando-as em explícitas. Porque isso permitiria, pelo menos, responder, talvez melhor do que o Sr. Deputado António Barreto foi capaz, à questão da discriminação entre os círculos e foi nessa matéria que pedi para o interromper.
Isto é, o Sr. Deputado insistiu na ideia de que existe desigualdade política, porque é dessa que estamos a tratar, entre o interior e o litoral, as cidades e as zonas rurais, as regiões autónomas e o continente. Mas

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quanto a saber e a justificar porque e que afirma que existe discriminação e ao remédio para colmatar e para solucionar esta pseudo ou pretensa discriminação nada respondeu.
Sobre isto devo dizer o seguinte: até 1951, em Inglaterra, os empresários tinham dois votos, assim como os professores universitários.

Risos do PCP.

Era esse um dos meios que se entendia usar na legislação eleitoral inglesa para solucionar a discriminação de não se dar aos empresários, por um lado, e aos professores universitários, .por outro, o seu devido valor e o seu devido peso na vida eleitoral ao lado do cidadão comum, do operário e do não licenciado. A não ser que o Sr. Deputado António Barreto nos venha propor agora que o cidadão que vtive na aldeia tenha dois votos e o cidadão que vive na cidade só um; que o cidadão que vive na praia de Mira tenha só um e o cidadão que vive em Trancoso tenha dois; que o cidadão que vive em Ponta Delgada tenha dois e o cidadão que vive em Lisboa tenha só um; não vejo meios de solucionar a pretensa discriminação política que apontou! Só que, com uma pequena ressalva, Sr. Deputado, é que isso significa, pura e simplesmente, discriminação entre cidadãos. E se há algum princípio adquirido pela civilização jurídica e irremissível na nossa Constituição é o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei, especialmente em matéria política e em matéria eleitoral. Não é essa, quero crer, a proposta do Sr. Deputado António Barreto.
Insisto, pois, em que o Sr. Deputado António Barreto, no uso de um direito, e atrevo-me a dizer agora, de um dever perante esta Assembleia, depois da sua intervenção, proponha explicitamente, através de um projecto de lei, de uma declaração formal ou de unia proposta de alteração, qual a sua ideia de solução da pretensa discriminação que afirmou existir em Portugal.

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito pede a palavra também para fazer esclarecimentos?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, encontro-me em circunstâncias semelhantes às do meu camarada Vital Moreira, pois também tinha pedido ao Sr. Deputado António Barreto que me consentisse uma interrupção e, uma vez que isso não aconteceu, queria agora prestar alguns breves esclarecimentos à Assembleia.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Em primeiro lugar, para lamentar que, na verdade, o Sr. Deputado não nos tenha enriquecido com alguma sugestão que concretizasse a doutrina geral que aqui expendeu. Nós pedíamos só um exemplo, ou seja, como se diz agora, o perfil de uma ideia concreta. Mas o Sr. Deputado não o fez e parece-nos que isso empobrece consideravelmente a sua doutrina.
Prosseguindo nesta linha, quero dizer também que no deserto de ideias que foi a declaração do Sr. Deputado António Barreio as poucas que afloraram eram sugestões manifestamente inconstitucionais.
Por fim, queria dizer que esta última intervenção do Sr. Deputado António Barreto a nossa instância esvaziou de sentido político a sua declaração anterior, porque todas as notas de recorte mais agressivo que tinha utilizado acabou por retirá-las, já que, creio, as nossas questões as fizeram em farrapos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a pedido do Partido Socialista vou ler a seguinte comunicação:
O Grupo Parlamentar Socialista comunica a esta Assembleia que os Deputados António Barreto e Medeiros Ferreira pediram a demissão do Partido Socialista, pelo que deixam de fazer parte do respectivo grupo parlamentar.
Agora, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos apresentados à apreciação desta Câmara são vastíssimos e em termos numéricos representam nada menos do que cerca de setecentos e vinte artigos, sem falar na lei vigente reguladora das eleições para a Assembleia da República com os seus cento e setenta e sete artigos.
Ao todo houve que estudar comparativamente cerca de novecentos artigos, o que representa muito mais, em extensão, que muitos códigos em vigor.
Não iremos debruçar-nos sobre todos os domínios deste maré mangam e propomo-nos destacar de todo o emaranhado legislativo dois ou três aspectos, que nos parecem que devem merecer a particular atenção desta Câmara.
Queremos referir em primeiro lugar o problema da capacidade eleitoral e do tratamento que para ele propõem os diversos projectos.
O problema de capacidade eleitoral activa, respeitando à possibilidade legal de se ser eleitor, condiciona não só o acto eleitoral como, em primeira linha, o próprio recenseamento.
Com efeito, nos termos do artigo 2.º da Lei do Recenseamento Eleitoral, recentemente aprovada, só devam ser inscritos no recenseamento os cidadãos que gozem de capacidade eleitoral. Mas o que essa lei não diz é quem goza de capacidade eleitoral, por se entender naturalmente que a sede mais própria da sua definição e desenvolvimento seria a lei que ora se discute, quando o não fosse um código eleitoral completo como objecto de todas as eleições para os Órgãos de Soberania.
A verdade é que todos os partidos propuseram a definição e a regulamentação da capacidade eleitoral nos projectos que apresentaram, embora o Partido Comunista lhe tivesse dado a autonomia de um projecto separado.

Os projectos do PS, do PCP, do CDS, da UDP e, em parte, o do PSD reproduzem praticamente o que estabelecia o Decreto n.º 93-A/76, na redacção que lhe deu o Decreto-Lei n.º 156/76, de 26 de Fevereiro. Assim, entendeu-se que serão eleitores da Assembleia da República os portugueses maiores de 18 anos, completados até ao termo do período de inscrição para efeito de actualização do recenseamento - que é durante o mês de Maio - e, bem assim, os

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que, residindo no estrangeiro, estejam, inscritos no respectivo recenseamento, nos termos da lei, ou os que ali se encontrem em missão de Estado ou serviço público reconhecido como tal pela autoridade competente e, bem assim, os cônjuges ou filhos de quem se encontre nessa situação e com ele residam.
Não obstante consagrar também estes princípios, o projecto de lei do PSD traz como novidade &m relação a todos os outros e à própria legislação vigente uma referência expressa aos brasileiros residentes em Portugal que, nos termos da Convenção sobre a igualdade de Direitos e Deveres entre Portugueses e Brasileiros, hajam adquirido o gozo dos direitos políticos em Portugal.
Parece-me, porém, inaceitável semelhante referência.
Desde logo, porque o preceito proposto não diz e não concretiza quais os brasileiros residentes em Portugal que hajam adquirido cá o gozo dos direitos políticos.
O preceito limita-se sibilinamente a fazer uma remissão opaca (passe a expressão) para a Convenção sobre a Igualdade dos Direitos e Deveres entre Portugueses e Brasileiros, Convenção essa assinada entre os dois países.
E das duas uma: ou a capacidade eleitoral dos brasileiros residentes em Portugal não resulta da citada Convenção e o projecto de lei do PSD sob esse aspecto não adianta uma vírgula; ou tal capacidade resulta da Convenção e este preceito é pura e simplesmente inútil.
Aliás, nem politicamente tem qualquer significado e alcance a referência da nova lei eleitoral para a Assembleia da República aos brasileiros residentes em Portugal que hajam adquirido aqui o gozo de direitos políticos.
O que pode importar é a eficácia que ambos os Governos quiseram atribuir ao princípio e essa eficácia é a que resulta ou não resulta da própria Convenção assinada por ambos os Governos. A simples formulação de um propósito, ainda por cima indefinido, numa lei interna portuguesa, quando não fosse encarada como numa redundância, por isso inútil, tinha o grave inconveniente de poder ser considerada como uma bajulação a nível internacional.
Ora, a esse nível, os Estados são soberanamente iguais, respeitosos mas suas relações, mas não subservientes.
E assim o PSD deveria esclarecer esta Câmara se o Governo Brasileiro já legislou da mesma maneira nas suas leis internas sobre a capacidade eleitoral dos portugueses residentes no Brasil. É que se o não fez ainda, este acto, que até parece uma bajulação, tem o estranho sabor de uma singular reverência para com os generais brasileiros.
Mas o projecto de lei do PSD em matéria de incapacidades eleitorais continua a inovar perigosamente.
Com efeito, propõe-se nele que não tenham capacidade eleitoral, nem activa nem passiva, aqueles que após o 25 de Abril de 1974 tenham violado os direitos do "homem ou pertencido a organizações que sistematicamente tenham praticado actos da mesma natureza. Ora antes de mais nada o princípio consignado no projecto de lei do PSD 'é cheio de ambiguidades.
Já aqui foi referido que o projecto não apresenta uma concepção do que entende devam ser os direitos do homem.
'E nós acrescentaremos que o projecto não diz se sempre que há uma violação dos direitos do homem existe um crime ou uma situação objectiva com intensidade tal que leve à incapacidade eleitoral do seu autor; o projecto não diz se o crime, a existir, só existe quando é intencional; o projecto não diz se todos os crimes contra as liberdades e os direitos dos outros constituem ou não violação dos direitos do homem; o projecto não diz que entidade teria competência para determinar se algum cidadão violou os direitos do homem - se as comissões de recenseamento, se os tribunais portugueses, se algum tribunal internacional.
E se nos debruçarmos sobre a segunda parte do princípio, isto é, sobre as organizações que sistematicamente tenham praticado actos violadores dos direitos do homem, novos problemas surgem.
Assim, o projecto não diz se a incapacidade eleitoral dos cidadãos que tenham pertencido a tais organizações pode ser pedida e declarada de per si ou se exige uma prévia declaração da natureza daquelas organizações.
O projecto não diz quem teria legitimidade para imputar a qualquer organização a prática sistemática de actos violadores dos direitos do homem. A proposta do PSD não adianta um milímetro sobre estes problemas essenciais.
Levanta uma questão, mas deixa-a envolta num mar de ambiguidades. Ora, fazer leis ambíguas é criar a confusão e permitir o arbítrio. É encaminhar o País no sentido do caos.
Em segundo lugar, a proposta daria lugar a uma caça às bruxas. A vinte e cinco anos de distância impor-se-ia em Portugal um novo macartismo, com o mesmo ódio vesgo e a mesma intolerância.
Em terceiro lugar, se tivéssemos de acertar que as comissões recenseadoras ou os tribunais poderiam declarar, caso a caso, a violação por algum cidadão dos direitos do homem, mais dificilmente se poderia aceitar que as comissões recenseadoras ou os tribunais apontassem o seu olho inquisidor sobre as organizações às quais algum adversário político se lembrasse de imputar a prática sistemática de violação dos direitos do homem.
Tudo entraria em crise.
Cairíamos num sistema incontrolável de denúncia e delações, num ambiente persecutório num novo Santo Ofício.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Das acusações mais ou menos objectivas, breve se passaria aos processos de intenção e a vida democrática desapareceria num ápice. Não será isto naturalmente o que pretende o PSD.
Em quarto lugar, O1 PSD não nos parece que se possa sentir à vontade para propor estas medidas persecutórias.
Com efeito, o PSD opôs-se vigorosamente nesta Assembleia à lei que proíbe e pune as organizações fascistas.
Haverá alguma dúvida, mesmo à face da Constituição, que o PSD aprovou, de que tais organizações

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ofenderam sistematicamente e ofendam, quando existam, os direitos do homem?
Então porque votou o PSD contra tal lei e agora vem, no mesmo espírito dela, sustentar uma tese contraditória como a que anteriormente sustentou?
Mas se assim não é, que organizações tenebrosas o projecto pretende punir? Que organizações pretende o projecto deixar ficar de fora? Devem ou não punir-se as organizações fascistas?

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Muito bem!

O Orador: - Novas ambiguidades, novo saco sem fundo.

Não pode, por conseguinte, esta Assembleia aceitar tal proposta do PSD.
Igualmente não podemos aceitar a proposta da UDP de ferir de incapacidade eleitoral, tanto activa como passiva, os condenados por crimes relacionados com as organizações fascistas. Não porque nos pareça que se trata de uma «lei celerada», como já se atreveu a chamar-lhe o órgão oficioso do PSD. As leis que os representantes do povo aprovam nesta Assembleia traduzem, nos termos constitucionais, o sentir da maioria do povo português, maioria correspondente à dos Deputados que as aprovaram.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não podem por isso mesmo ser «celeradas» as leis aprovadas na Assembleia da República, a não ser para aquelas pessoas que espumam ódio na sua minoria e não sabem aceitar a vontade da maioria, democraticamente encontrada.

Aplausos do PS.

Não podemos, no entanto, aceitar a proposta da UDP, pois a lei que pune tais crimes ainda não está em vigor, sendo, pelo menos, prematuro avançar com tal incapacidade.
Em termos de novidade, a proposta da UDP como que se antepõe à proposta do PSD e, tratando-se de duas fugas ao sistema básico de que ambas partiram - o Decreto-Lei n.º 94-A/76 -, cada uma apontando para o seu sentido oposto, nessa medida se pode dizer que se anulam mutuamente.

O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isto independentemente da carga política própria de cada uma das propostas.
Ainda no que respeita à capacidade eleitoral, não pode deixar-se sem reparo o projecto do PSD no que concerne aos portugueses residentes no estrangeiro. Assim, o projecto (pressupõe estranhamente o recenseamento obrigatório de todos esses portugueses. E no entanto ainda há poucos dias esta Câmara aprovou, com a Lei do Recenseamento Eleitoral, o princípio oposto, ou seja o da voluntariedade da inscrição.
O projecto insistindo num ponto de vista já derrotado tem o estranho sabor de estar a levantar problemas já resolvidos.
Talvez o PSD retire na especialidade essa proposta, com o que só lucrariam os debates e o crédito desta Assembleia.
Um outro ponto que suscitou divergências entre vários projectos apresentados foi o da constituição da Comissão Nacional das Eleições. Como se sabe, trata-se de uma entidade que se deseja isenta, na medida do possível, para que possa intervir com neutralidade no processo eleitoral.
Os projectos do PS e CDS coincidem neste aspecto, pois ambos entendem que tal Comissão deve ser composta por um juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, por um representante de cada um dos Ministérios da Administração Interna, dos Negócios Estrangeiros e da Comunicação Social e por cinco técnicos de reconhecida idoneidade profissional e moral. Onde divergem é na entidade que haverá que designar aqueles membros.
Assim, o CDS entende que todos os membros da Comissão Nacional das Eleições devem ser da livre escolha do Governo, enquanto o PS entende que o Governo só deve indicar os representantes dos três Ministérios referidos, pois o juiz conselheiro deve ser designado pelo Conselho Superior da Magistratura e os cinco técnicos pela Assembleia da República.
Supomos que a tese do projecto de lei do CDS é insustentável. Seria estranho que fosse o Governo a indicar o juiz conselheiro do> Supremo Tribunal de Justiça e não p- órgão que superintende hierarquicamente na magistratura judiciai!, o seu órgão superior de gestão - o Conselho Superior da Magistratura. Entendemos que a intervenção do Governo na escolha do juiz conselheiro seria uma intromissão indesculpável do Executivo numa actividade que a todos os títulos deve caber à própria magistratura. A independência da magistratura em face do Executivo, e que foi consignada no Estatuto dos Magistrados Judiciais que esta Assembleia aprovou, é uma conquista do 25 de Abril e não devemos regredir, retirando à magistratura o que a ela deve pertencer.
O projecto do PS bem como do PSD, do PCP e da UDP são, aliás, coincidentes quando encabeçam no Conselho Superior da Magistratura a escolha do juiz conselheiro.
Quanto aos cinco técnicos de reconhecida competência entendeu-se também ser mais correcta a sua indicação pela Assembleia da República do que pelo Governo.
A Comissão Nacional das Eleições, na medida do possível, sem perder o contacto com o Governo, deve autonomizar-se dele e não deve aparecer como fruto ou emanação da sua vontade, não deve aparecer como um órgão que fosse mera projecção do próprio Governo, a ele atado completamente pelo cordão umbilical da sua criação.
Daí que se nos afigure como muito mais aceitável que os técnicos da Comissão Nacional das Eleições sejam escolhidos por esta Assembleia da República. Esta solução é também a constante do projecto do PCP.
Também se nos afigura mais aceitável que os técnicos da Comissão, em lugar de serem escolhidos pelo presidente desta e pelos representantes dos partidos, o sejam pela Assembleia da República, o que lhes empresta à partida uma maior legitimidade.
Entendemos finalmente que da Comissão Nacional das Eleições não devem fazer parte integrante representantes do Conselho da Revolução, como ao contrário se sustenta nos projectos do PCP e da UDP.

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Es i á a legislar-se para o futuro e a estabilização da democracia pressupõe sempre o menor envolvimento político das forças armadas.
Bem sabemos como preciosa foi a sua intervenção no estabelecimento e na consolidação do regime democrático; bem sabemos que, nos termos do artigo 273.º da Constituição, as forças armadas garantem o regular funcionamento das instituições democráticas e o cumprimento da Constituição. Mas é óbvio que o entrosamento das forças armadas na vida política activa pode conduzi-las a situações melindrosas que se devem evitar.
Que o desgaste da política recaia sobre os partidos è a Assembleia da República, compreende-se pela inerência da própria função; mas que recaia também sobre uma instituição nacional que pela sua isenção partidária se deve manter à margem das pugnas políticas, já não se compreenderia muito bem.
Neste aspecto a solução preconizada pelo PS, que aliás é a mesma do PSD e do CDS, afigura-se-nos a mais aceitável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante a possibilidade, que visamos, de a crise política nacional vir a desembocar em eleições gerais antecipadas, o PS deu o seu contributo rápido para que a Lei do Recenseamento Eleitoral fosse aprovada e a Lei Eleitoral necessária fosse elaborada.
O PS não teme as eleições!

Alguns, porventura, poderão temê-las! Alguns mesmo poderão blasonar de vasto apoio nacional, que corresponde mais aos seus desejos do que à sua implantação popular.
Se da experiência das várias eleições anteriores alguma lição se pode extrair, é a dê que muitos derrotam o Partido Socialista à partida e todos acabam .por verificar que as velhas pitonisas ficaram sepultadas em Delfos e que as novas improvisadas pitonisas são adivinhos ingénuos de trazer por casa.
As rãs quando coaxam no charco também fazem muito barulho, mas não têm a força que move as montanhas. E no entanto coaxam e continuarão a coaxar. É próprio das rãs.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Nandim de Carvalho.

O Sr. Nandim de Carvalho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não parece de mais recordar no âmbito do debate na generalidade sobre os projectos de lei eleitoral submetidos ao Plenário da Assembleia da República a importância que assumem os partidos políticos no sistema político-constitucional português.
É preciso não esquecer, especialmente no âmbito desta Câmara, o artigo 154.º, n.º 1, da Constituição, que restringe aos partidos a apresentação das candidaturas de Deputados.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ë melhor dizer isso ao António Barreto!

O Orador: - Numa democracia política pluralista e pluripartidária, a definição da representatividade dos cidadãos como co-titulares da soberania popular nos respectivos órgãos constitucionais é um acto de evidente relevo. E é á lei eleitoral que é a sede adequada de desenvolvimento até à exaustão dos princípios constitucionais.
E neste domínio creio que foi elucidativa a intervenção do meu colega de bancada, que, para além dos aspectos essenciais cio projecto de lei apresentado pelo PSD, apresentou igualmente os aspectos que nos merecem reparo nos projectos dos demais partidos no âmbito dos' princípios gerais.
Um aspecto complementar e que importa focar agora com algum detalhe é a Comissão Nacional das Eleições.
Depois da adopção através da lei do recenseamento do princípio da actualização: anual dás operações de inscrição afigura-se que a Comissão Nacional das Eleições deverá ter uma existência permanente, embora o seu funcionamento possa vir a revestir características intermitentes.
De facto, todos os partidos estão de acordo quanto ao facto de a competência da Comissão Nacional das Eleições abranger todos os actos de recenseamento e eleitorais que se venham a realizar.
Essa mesma circunstância aconselhará talvez a recolher o princípio da caracterização da Comissão Nacional das Eleições como um órgão independente funcionando junto da Assembleia da República. Trata-se de um aspecto que é omisso no projecto do PSD como também no do PS, CDS e PCP. Só a UDP define com clareza aquele princípio, que, aliás, fundamenta mais directamente o corolário de que a tomada de posse dos seus membros se deve processar perante o Presidente da Assembleia da República, no que, aliás, tem o apoio do PCP e do PS e no que não e acompanhada por outros dois projectos.
Muito provavelmente, porém, em sede de comissão será possível obter a unanimidade, de apoio entre os partidos aqui presentes para a solução que mais prestigie a instituição da Comissão Nacional das Eleições, e em que talvez se venha a incluir a eliminação do prazo de duração do mandato dos membros da Comissão Nacional das Eleições proposto pelo PCP. Efectivamente, desde que se assegure sempre o preenchimento das suas vagas, não existe motivo aparente para que a Comissão Nacional das Eleições não tenha a duração das suas funções previstas sem limite de tempo, que não venha a resultar de uma nova iniciativa legislativa.
Por outro lado, também se afigura curial que as verbas Indispensáveis ao funcionamento da Comissão Nacional das Eleições sejam inscritas no orçamento da Assembleia da República como propõe, aliás, apenas um partido estão mais no do Ministério da Administração Interna. Trata-se de mais um aspecto não consagrado na solução do PSD e em que, sem dificuldades, o diálogo democrático a estabelecer poderá vir a proporcionar argumentos suficientes para a sua alteração, quer pela nossa parte, quer, pelo que presumimos, por parte do CDS, do PS e o seu acolhimento por parte do PCP, que neste ponto é omisso.
Já quanto à composição da Comissão Nacional das Eleições, haverá que esclarecer as áreas de desacordo mais frontal. Tanto o PCP como à UDP pretendem ver incluído entre os membros da Comissão Nacional das Eleições um representante do Conselho da Revolução. Por contraponto, os projectos do PS, PSD e CDS excluem essa possibilidade. Afigura-se ao PSD que essa posição maioritária é de manter, pois que,

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a prevalecer a tese da permanência de funções da Comissão Nacional das Eleições, nada aconselha a que na sua estrutura se inclua a representação de um órgão de Soberania de subsistência controvertida e de legitimidade duvidosa no quadro de uma democracia estabilizada.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Faltava essa!

O Orador: - A presidência da CNE, por contrapartida, é um dos pontos em que há unanimidade na aceitação de um juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça a designar, obviamente, pelo Conselho Superior da Magistratura, aspecto de pormenor em que o CDS é surpreendentemente divergente e contrário à independência da magistratura, visto querer substituir os seus poderes pelo Governo neste particular.
Um outro princípio aceite é o da participação de técnicos qualificados da Administração Pública que (possam assegurar a ligação indispensável aos Ministérios mais directamente envolvidos no processo eleitoral e que são claramente o Ministério da Administração Interna, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e a Secretaria de Estado da Comunicação Social. Esta explicitação é admitida com clareza nos projectos do PS, CDS, PCP e UDP, enquanto o PSD apresenta apenas a necessidade da existência de técnicos, confiando a sua designação não ao Governo, mas antes à própria Assembleia.
Por outro lado, o PSD propõe que cada partido representado na Assembleia da República disponha de um representante seu na Comissão Nacional das Eleições. O PS não é tão claro nessa repartição, mas propõe igualmente o número de cinco, o que permite que aquela solução se atinja por acordo interpartidário; mas já o projecto do PCP parece pretender retirar representatividade à UDP, já que a existência de apenas quatro vagas parece situar-se em correspondência com o número de grupos parlamentares. Finalmente, o CDS apresenta a redacção mais indesejável para o PSD, já que admite que o Governo nomeie cinco técnicos para a Comissão Nacional das Eleições! Trata-se, efectivamente, não de uma questão de pormenor, mas antes de uma questão de princípios.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à competência da CNE, no essencial todos os projectos são concordantes, embora o sentido semântico emprestado pelo PCP à tarefa do esclarecimento objectivo dos cidadãos seja menos impressivo que os dos mais partidos, que preferem sublinhar a iniciativa que a Comissão Nacional das Eleições deve tomar nesse domínio. Claro que o PSD insistirá na defesa da proposta majoritária contrária è do PCP.
Passamos a referir agora, embora brevemente, alguns apontamentos sobre aspectos de pormenor. Porém, há alguns aspectos de especialidade a referir, em que se não deixa de aflorar o princípio genérico posto pelo PSD na elaboração do seu projecto de lei e que foi no sentido da inovação e da adequação constitucional. E também não parece ajustado avançar desde já pistas para a discussão na especialidade para que o trabalho desta Assembleia seja o mais produtivo possível.
Quanto às inelegibilidades artigo 6.º, alínea f), do projecto do PSD os governadores e vice-governadores civis, bem como os administradores de empresas em regime de exclusivo, sofrem de uma limitação da sua capacidade não apenas a nível local, mas também a nível nacional. E bem se compreende que assim seja, para que as filosofias distintas que separam um cargo electivo de um cargo de nomeação governamental não se fundam numa ambiguidade negativa. Designação e eleição não são sinónimos; confiança popular e confiança governamental não se identificam, e por isso haverá que inovar nestas matérias face à legislação anterior.
Por outro lado, a nível de incompatibilidade com o exercício de funções públicas, inclui-se no projecto do PSD (artigo 8.º, n.º 3) a impossibilidade de presidentes e vereadores a tempo inteiro das câmaras municipais exercerem as suas actividades desde a data de apresentação das candidaturas e até o termo do mandato do Deputado. Trata-se de uma nossa proposta que simultaneamente procura valorizar o poder 'local e a actividade política do Deputado, criando Condições para uma especialização e dedicação efectiva às respectivas funções, e evitando que o ónus do transporte e da distância geográfica possa afectar menor atenção ao executivo camarário na defesa dos interesses autárquicos ou aos problemas nacionais de todos os portugueses.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD procura também em diversos articulados favorecer a criação das melhores condições quer no complemento das listas de candidatos, quer na possibilidade de mais fácil deslocação dos cidadãos às umas de voto, quer mesmo quanto à responsabilidade dos partidos políticos no processo eleitoral.
Assim, no artigo 39.º, n.º 4, propõe-se que no dia da eleição as empresas públicas de transportes ofereçam os seus serviços públicos gratuitamente, mas apenas para o percurso de e para a secção de voto respectiva. Está o PSD convicto de que as forças políticas interessadas em combater o abstencionismo certamente apoiarão esta iniciativa.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao artigo 65.º, n.º 4, caso da vinculação efectiva das câmaras municipais e das autoridades policiais à preservação de espaços para propaganda política, há que completar este princípio da ordenação da propaganda fixa dentro da legítima liberdade de expressão, com a proibição de pinturas murais ou inscrições de slogans fora das sedes dos partidos políticos. Acham-se, assim, salvaguardadas as preocupações já expressas por largas camadas da opinião pública, pela preservação do património histórico, cultural ou artístico do País; da dignidade dos edifícios de património ou funcionamento de serviços públicos; das placas de sinalização de trânsito, enfim, a defesa da própria propriedade privada.
Relativamente ao aclaramento da expressão do voto, propõe o PSD uma distinção no apuramento

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dos votos em branco e do número de votos nulos, separadamente. Nem se compreende o interesse de quem esteja interessado em meter no mesmo saco realidades distintas. Esperamos que os trabalhos da Comissão, neste aspecto, nos venham a dar razão. Ainda como inovação menor, mas que nem por isso .deverá ser esquecida, aponta-se a punição expressa prevista para os casos, de antipropaganda política e que representem manipulações injuriosas de meios gráficos ou dos suportes de propaganda áudio-visual de dirigentes ou candidatos concorrentes às eleições. Para não me alongar sobre outros aspectos já aflorados por outras intervenções, sublinharia apenas e .ainda a necessidade de se consagrar no direito eleitoral português a responsabilização dos partidos políticos nos casos pertinentes pelas actividades de direcção ou incitamento à prática de infracções previstas na lei. Efectivamente, nestes pontos é mais responsável por vezes quem ordena do que quem, efectivamente, pratica o acto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O contributo do PSD na redefinição da lei eleitoral portuguesa teve, pois, um carácter inovador. Até mesmo na sistematização da lei não enveredamos pelo caminho fácil e conservador do PCP, que adoptou a tripartirão dos diplomas eleitorais publicados em 1976, nem pela repetição que o PS faz de normativas anteriores.
Resta concluir com a afirmação do empenho posto pelo PSD, quer em plenário, quer em Comissão, em especial na discussão e votação de especialidade, para contribuirmos activamente para que prevaleçam as melhores soluções para o povo português, que é o mesmo que dizer para o aperfeiçoamento dos mecanismos de participação política e de, consolidação da democracia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Dado não haver inscrições, quer para pedidos de esclarecimento, quer para intervenções, vamos fazer o nosso intervalo regimental de meia hora.

Está interrompida e sessão.

Eram 17 horas e 5 minutos.

O Sr.. Presidente: - Está reaberta a sessão. Eram 17 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Carmelinda Pereira.

A Sr.ª Carmelinda Pereira (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia prepara-se para votar a lei eleitoral e penso que o povo espera desta 'Assembleia uma lei democrática, uma lei que permita que toda a população trabalhadora possa exprimir livremente a sua vontade contra os. representantes do passado, contra o PSD e o CDS, contra Eanes, como neste momento é a vontade dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que o Partido Socialista apresenta é um projecto que permite tudo isso e é por isso que o vou apoiar.
Intervenho para discutir quais os objectivos políticos dos projectos do PSD e do CDS.
Já aqui se fez uma análise do conteúdo de algumas das cláusulas destes projectos, mas considero que é importante que possamos reflectir sobre quais são os objectivos destes dois partidos ao apresentarem algumas cláusulas nos seus projectos.
Vejamos por que é que o PSD procura reestruturar os círculos eleitorais: o PSD pretende criar um dispositivo que leve o Partido Socialista, o partido mais votado, a perder Deputados na base da insolência económica e social dos caciques reaccionários, dos especuladores e dos intermediários. Ao mesmo tempo procura arranjar maneira de criar o maior número de círculos eleitorais onde mantinha a garantia de conseguir a maioria.
Nós podemos ver isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, no projecto do CDS, na cláusula em que .defende' os círculos nacionais. E ao mesmo tempo que defende os. círculos nacionais, o CDS defende na mesma os círculos regionais, permitindo dessa maneira reduzir o número de Deputados do Partido Socialista.
O projecto do PSD procura que o voto seja obrigatório, mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um tal princípio é um atentado à democracia. Faz-nos lembrar o tempo do fascismo, em que o voto não era o resultado de um acto de livre vontade, mas assentava numa base coerciva e policial.
Nós lembramo-nos de como eram as votações nessa altura. Todos aqueles que convinha que voltassem, todos aqueles, que convinham ao regime, quase que eram obrigados a votar. Faziam-se excursões de autocarro, os docentes iam votar e até os mortos votavam! ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que o PSD deveria ver os seus objectivos mais concretizados e incluir no seu projecto que quem votasse no PSD ou no CDS pagaria uma multa!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os objectivos do PSD e do CDS são claros. Eles pretendem falsear a vontade popular.
Risos do Sr. Deputado Bento Gonçalves.
Não lhes convém, tal como não convém ao Sr. General Ramalho Eanes, que nesta Assembleia esteja representada a aliança entre os operários e os camponeses, claramente expressa a partir do momento em que existe nesta Assembleia uma maioria de Deputados socialistas & do PCP. Têm medo da mobilização do Partido Socialista, das grandes reuniões, dos grandes comícios do Partido Socialista, onde se exprime, de uma; maneira extremamente viva, a vontade de todas as camadas da população trabalhadora. Não é por acaso que os autores deste projecto são os mesmos que os arautos do voto central e da salamização do PS.
Como o PS e o PCP têm mais de 50% dos votos nesta Assembleia, é necessário que o PS reduza o seu número de votos, reduza o número de Deputados para que o eixo da vida política deixe de ser o Partido Socialista, para que o eixo da vida política deixe de estar à esquerda neste país.
As posições do PSD e do CDS decorrem do mesmo objectivo do general Ramalho Eanes, ou seja, de

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amordaçar esta Assembleia, fazer dela uma sombra da Presidência da República. Por isso, ele expulsou o PS do Governo, nas costas da Assembleia da República, e nomeou um Primeiro-Ministro contra a vontade popular, contra os resultados eleitorais e contra a Assembleia da República. É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que esta Assembleia deve dar uma lição de democracia na próxima semana, quando for discutido o Programa do Governo, rejeitando-o, através de uma moção de rejeição proposta pelo partido que caracterizou correctamente a iniciativa do general Ramalho Eanes.
É nesta Assembleia que está inscrita a solução para a crise. A solução para a crise decorre da vontade da maioria dos trabalhadores, decorre da vontade popular, decorre da maioria PS-PCP. É o Governo do PS e do PCP que é necessário construir, o Governo socialista decorrente dessa maioria, para se fazer uma política socialista.
Aqueles que pensam que com estes pequenos jogos - modificação de leis - podem amordaçar esta Assembleia, que podem modificar a sua composição, que podem fazer com que ela deixe de ser o órgão máximo da soberania, que deixe de ser a essência do poder, estão bem enganados, porque estes jogos não o vão permitir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A revolução está bem viva. A esmagadora maioria da população trabalhadora é contra o passado, é contra aqueles que põem em causa a democracia, é contra aqueles que estão contra as conquistas do 25 de Abril. A esmagadora maioria da população/trabalhadora é contra o PPD, é contra o CDS, é contra o general Ramalho Eanes - e por uma política socialista, é pelos partidos dos trabalhadores, que não põem em causa esta Assembleia como aqueles que querem fazer desta Assembleia uma sombra do Presidente da República.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há oradores inscritos, está encerrado o debate na generalidade.
Vamos, portanto, iniciar as votações dos vários projectos de lei.
Vamos proceder à votação na generalidade do projecto de lei n.º 124/I, apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, PS, UDP e Deputados independentes Vital Rodrigues, Lopes Cardoso, Aires Rodrigues, Brás Pinto e Carmelinda Pereira, votos contra do PSD e Deputados independentes António Barreto e Medeiros Ferreira e as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 125/I, apresentado pelo PCP.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, PS, UDP e Deputados independentes Vital Rodrigues, Lopes Cardoso, Aires Rodrigues, Brás Pinto e Carmelinda Pereira, votos contra do PSD, dos Deputados independentes Medeiros Ferreira e António Barreto e do Deputado do CDS Faria de Almeida e dom as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 126/I, também apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, PS, UDP e dos Deputados independentes Vital Rodrigues, Lopes Cardoso, Aires Rodrigues, Brás Pinto e Carmelinda Pereira, votos contra do PSD, dos Deputadas independentes Medeiros Ferreira e António Barreto e ao Deputado do CDS Faria, de Almeida e com as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 127/I, apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, PCP, UDP e dos Deputados independentes Vital Rodrigues, Lopes Cardoso, Aires Rodrigues. Brás Pinto, Carmelinda Pereira, Medeiros Ferreira e António Barreto, votos a favor do PSD e com as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.
Durante esta votação, o Sr. Presidente chamou a atenção do Sr. Deputado Faria de Almeida, do CDS, no sentido de este manifestar claramente qual o sentido dos seus votos.)

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 128/I, apresentado pelo CDS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, PCP, UDP e dos Deputados independentes Aires Rodrigues, Lopes Cardoso, Vital Rodrigues, Brás Pinto, Carmelinda Pereira, Medeiros Ferreira e António Barreto, votos a favor do CDS e com as abstenções do PSD e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 129/I, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, PCP, UDP e dos Deputados independentes Aires Rodrigues, Lopes Cardoso, Brás Pinto, Vital Rodrigues e Carmelinda Pereira, votos contra do PSD e dos Deputados independentes Medeiros Ferreira e António Barreto e com as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Finalmente, Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de lei n.º 130/1, apresentado pela UDP.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor da UDP, PS, PCP e dos Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues, votos contra do PSD e dos Deputados independentes Medeiros Ferreira, António Barreto, Carmelinda Pereira e Aires Rodrigues e com as abstenções do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo.

O Sr. Presidente: - Como é do conhecimento do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, uma vez que foi comunicada à Câmara a sua passagem a Deputado independente, só poderá fazer a sua declaração de voto por escrito.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - O Sr. Presidente dá-me licença que use da palavra?

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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Sr. Presidente, tenho aqui a minha declaração por escrito, mas penso que a poderia ler à Câmara.

Protestos do PS e do PCP.

O Orador: - Srs. Deputados, nós tomamos nota dessa vossa .tolerância em relação às pessoas que têm alguma coisa a dizer.
Far-se-á como a Câmara entender, mas, como disse, tenho aqui a declaração por escrito, e se a Câmara quiser tomar nota do que tenho a dizer depois de aprovada a lei ria especialidade e na generalidade, através do Diário da Assembleia da República, é uma atitude ;ilógica e que só a intolerância poderá justificar. Se os Srs. Deputados quiserem tomar conhecimento da declaração de voto hoje, para não tarem que lê-la 'daqui a um mês quando ela efectivamente sair, poderei lê-la já, em curtos .minutos.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados para manterem a calma.
O Sr. Deputado Medeiros Ferreira sabe que a Mesa tem de cumprir o Regimento e, nesse sentido, uma vez que já lhe foi comunicado que passou a desempenhar as funções de Deputado independente, terá de fazer chegar a sua declaração de voto, por escrito, à Mesa, quê a poderá mandar fotocopiar, se os Srs. Deputados estiverem interessados na sua leitura. De outro modo, "não" poderá o Sr. Deputado fazer submeter essa sua pretensão de que seja a Câmara a decidir se a declaração de voto será feita por escrito ou oralmente, porquanto o Regimento já se antecipou à Câmara nessa matéria.

O Sr. Carlos Candal (PS): - O Regimento é que manda...

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Eu gostaria de dizer que embora no artigo 100.º ido Regimento, n.º 3, esteja dito que e por escrito, penso que existe uma outra disposição regimental que, bem interpretada trata-se do artigo 89.º, alínea f)- poderá levar a que á Câmara me escute. Aliás, não tomarei mais do que alguns minutos.

O Sr. Carlos Candal (PS): - O problema e regimental...

O Orador: - Eu sei qual é o problema.

O Sr. Presidente: - Bem, Sr. Deputado, já lhe exprimi a posição da Mesa e creio que até é praxe, se e possível falar-se em praxe acerca de uma matéria que até está bem definida, no artigo 103:º do Regimento. Donde a Mesa não poderá fazer outra coisa que não seja lembrar novamente ao Sr. Deputado por não estar já integrado num grupo parlamentar - que só poderá fazer chegar à Mesa a sua declaração de voto por escrito.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Então, sendo assim, pediria à Assembleia que se pronunciasse sobre a decisão da Mesa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado deseja recorrer?

O Sr.. Medeiros Ferreira (Indep.): - Exactamente, Sr. Presidente, desejo recorrer da decisão da Mesa.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Então, recorre do Regimento e não da decisão da Mesa!

O Sr. Presidente: - Então, Sr. Deputado, queira fundamentar o recurso. Porém, antes de mais, gostaria de chamar a atenção para o seguinte: é evidente que a Mesa sente que não pode impedir um recurso. Só que, realmente, este recurso não me parece ser tanto da decisão da Mesa como do próprio Regimento!

O Sr. Carlos Candal (PS):- Da interpretação do próprio Regimento.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Depende da votação da Assembleia. Não acha, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Bem, de qualquer modo, queira o Sr. Deputado fundamentar o seu recurso.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Pois, Sr. Presidente, fundamento o recurso no artigo 89.º, alínea f), do Regimento.

O Sr. Presidente: - Está interposto o recurso. Há algum Deputado que queira, usar da palavra?

Pausa.
Tem a palavra o Sn Deputado Meneres Pimentel.

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, solicito dez minutos de interrupção dos nossos trabalhos.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito antes de o Sr. Deputado do PSD ter pedido e usado da palavra para requerer a suspensão da sessão tinha eu pedido a palavra para um protesto. Requeiro, como é justo, razoável e correcto, que me seja dada a palavra antes de ser concedida a suspensão solicitada pelo Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Presidente: - Antes de lhe dar a palavra - o que farei de seguida - devo esclarecer que a Mesa, quando o Sr. Deputado levantou o braço para pedir a palavra, entendeu que seria para uma declaração de voto e não para intervir nesta matéria. Mas tem a palavra, Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Mas, Sr. Presidente, se não houve votação como é que seria para uma declaração de voto?

Uma voz do PS: - Houve votação, houve.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, depois das votações dos vários projectos de lei eu perguntei quem se inscrevia para declarações de voto. Foi nessa altura que surgiram vários braços no ar, como, por exemplo, do Sr. Deputado Pinto da Cruz, etc. Foi isto que sucedeu, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Apenas pedi a palavra depois de o Sr. Deputado Medeiros Ferreira ter insistido em fazer a sua declaração de voto. Foi nesse momento que pedi a palavra, e não antes.
Quanto ao meu protesto neste sentido: o Sr. Deputado Medeiros Ferreira permitiu-se insinuar que a Assembleia, discricionariamente, lhe retirara o direito de ler a sua declaração de voto. Creio que esta insinuação é demasiado inqualificável e intolerável para se deixar passar sem um veemente protesto.
O Sr. Deputado Medeiros Ferreira, enquanto Deputado, viveu sob um Regimento, cuja interpretação nesse ponto é unívoca, contra o qual nunca protestou, cujo sentido não tem suscitado quaisquer questões e que todos os Deputados têm aceite. É, pois, inaceitável e intolerável que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, na primeira vez que quer intervir como Deputado 'independente, queira, baseando-se numa impossível interpretação do Regimento, utilizar a palavra, quando tal não pode fazer e permitindo-se insinuar que é por vontade discricionária da Assembleia que não lhe é dado esse poder. Devemos esclarecer bem que os Deputados por procuração, que somos nós, não têm menos direitos que os Deputados sem procuração como passou a ser o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, e que a sua qualidade de Deputado independente não lhe dá privilégios nem direitos que os outros Deputados não têm.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Medeiros Ferreira pôde e teve o direito de intervir no debate - não o fez. Por isso, é intolerável e inadmissível que não o tendo querido fazer, não tendo querido transmitir à Assembleia as suas razões em matéria de lei eleitoral, se permita agora reivindicar um direito que lhe não assiste e, ainda mais, de acusar a Assembleia de lhe estar a retirar um direito que lhe julga assistir!

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Medeiros Ferreira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Para contraprotestar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Medeiros Ferreira (Indep.): - Ë que eu não disse que a Assembleia me estava a tirar a palavra discricionariamente. O que disse, isso sim, é que, perante o facto de o Diário da Assembleia da República só sair, como se sabe, com grande atraso e, possivelmente, só bastante depois da votação da especialidade e da aprovação na generalidade e na especialidade das leis eleitorais e como creio que alguma da matéria contida nesta declaração de voto pode servir ainda para melhorar a lei eleitoral...

O Sr. Lino Lima (PCP): - Mande pelo correio.

O Orador: -... eu não queria deixar de dizer que gostaria de ler a .referida declaração.
Por outro lado, se a Mesa e a Câmara não nos permitirem, não poderei fazer algo mais do que, unicamente, manifestar o meu desejo em lê-la.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Os gostos não se discutem...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Meneres Pimentel mantém o pedido de interrupção por dez minutos?

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Está interrompida a sessão, por dez minutos.

Eram 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do recurso interposto pelo Sr. Deputado

Medeiros Ferreira.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, CDS, PCP e UDP e do Deputado independente Galvão de Melo, e com votos a favor dos Deputados independentes Vital Rodrigues, Brás Pinto, Aires Rodrigues e Carmelinda Pereira.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira para uma declaração de voto relativamente à votação que acaba e ser feita.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente,

Srs. Deputados: Creio que ficaram claras as razões do nosso voto. Entretanto, queria apenas clarificar algumas dúvidas. É que, na realidade, não só o Deputado independente como todo e qualquer outro Deputado não têm o direito de fazer declarações de voto orais. Assim sentido, eu, que estou a fazer uma declaração de voto neste momento, faço-a em nome do meu grupo parlamentar. Se qualquer outro Deputado quiser fazer uma declaração de voto, tem de a fazer por escrito. O que quer dizer que tal não significa qualquer discriminação em relação aos Deputados independentes, mas apenas que o princípio da igualdade vale aqui também e que os Deputados são iguais também aqui.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Meneres Pimentel.

O Sr. Meneres Pimentel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós votámos a favor da negação do

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provimento do recurso. interposto pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira, por nos parecer suficientemente explícito o. Regimento nesta matéria. Todavia, devemos acrescentar que a regra regimental parte de um pressuposto de facto que se nos afigura, importante e que é o de as declarações de voto serem conhecidas com rapidez, o que corresponde a que o Diário da Assembleia da República seja distribuído também com a mesma rapidez. Isto, porque, conforme há pouco foi acentuado pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira, qualquer declaração de voto de um Deputado, seja ele independente, esteja integrado num grupo parlamentar e já não seria a primeira vez que um Deputado de um grupo parlamentar formula a sua declaração de voto por escrito -, tem o maior interesse para a subsequente discussão na especialidade. É que nós poderíamos na falia deste pressuposto, uma vez que, como é do conhecimento de todos, o Diário da Assembleia da República se encontra- extraordinariamente atrasado e dado o facto de, por vezes, alguns grupos parlamentares desta Assembleia terem, no nosso ponto de vista, violado claramente o Regimento, servindo-se de uma maioria aritmética, rios poderíamos, ia a dizer, sustentar uma interpretação diversa. Todavia, não é com a falta desse pressuposto de facto, ou seja, da distribuição do Diário da Assembleia da República se encontrar atrasada, que nós poderíamos, no nosso ponto de vista, é evidente, violar a letra e o espírito do Regimento. Este, portanto; o sentido do nosso voto.
Porém, como para nós é importante qualquer declaração de voto de qualquer Deputado, requeríamos formalmente à Mesa que fosse distribuída pelos grupos, parlamentares unia fotocópia da declaração de voto do Sr. Deputado Medeiros Ferreira ou de qualquer o outro. Sr. Deputado que assim o entenda dever fazer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se realmente a declaração de voto chegar à Mesa, será satisfeito o seu requerimento.
Entretanto, para uma declaração de voto sobre os projectos de lei acabados de votar, tem á palavra o Sr; Deputado Pinto da Cruz:

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS, obviamente, votou a favor do projecto de lei n.º 128/I, por si apresentado à Assembleia da República.
Após a discussão havida nesta Câmara, mantemos a posição inicial: continuamos plenamente convencidos, da bondade dos princípios que propusemos para à existência de um verdadeiro código eleitoral para à Assembleia da República! Não nós convenceram as críticas apresentadas contra o nosso projecto. São críticas que têm a sua origem muito mais na defesa de interesses partidários do que na coordenação de princípios que não servissem o interesse nacional.
É verdade que o nosso projecto vem eivado de um espírito inovador, mais do que qualquer dos outros projectos que aqui foram apresentados. Mas essa é a dinâmica do CDS. Somos pelo. progresso. Recusamo-nos a aceitar a estagnação. Julgamos que a actual situação político-social do País, que é diferente da que existia aquando da elaboração das leis eleitorais vigentes, impunha, dentro de certa medida, uma adopção de princípios também novos.
Ficamos isoladas nesta nossa intenção.
Assim ò impôs, mais uma vez, a conhecida maioria de esquerda na composição actual desta Câmara, ou seja, os votos conjugados do Partido Socialista e do Partido Comunista. Mas contra estes partidos, continuamos a pensar que melhor se serviria o País se tivessem vencimento para a próxima lei eleitoral as posições que o nosso projecto defende. . Entre elas destacaremos, aqui, em primeiro lugar, a existência, de um voto obrigatório, ajudado por uma sanção mais persuasiva, possivelmente de natureza pecuniária. Aceitamos o carácter transitório de tal medida. Aceitamos como desejável o princípio facultativo do voto. Mas não na fase actual da democracia portuguesa. Por agora, a obrigatoriedade do voto como a defendemos ajudaria a minorar o mal das abstenções, mal crescente entre os portugueses desmotivados por desacertos políticos, que cada vez os distanciam mais daquilo que eles realmente desejariam ou, pelo menos, desejaria a grande maioria dos Portugueses.
Em segundo lugar, salientarei a alteração que propomos, para os círculos eleitorais, com particular relevo para a criação de um círculo nacional. São improcedentes as críticas que aqui lhe foram dirigidas. Aliás, críticas essas inteiramente carecidas de provas. Na realidade, não basta dizer-se que as operações aritméticas provam que só o CDS lucraria com tal círculo eleitoral. Seria necessário apresentar tais operações, explicitadas a esta Câmara, o que não aconteceu. Nem podia acontecer, Srs. Deputados, porque é realmente falsa tal afirmação. Pelo contrário, o círculo nacional permitiria aos partidos, mas a todos os partidos, sem alteração influente de resultados eleitorais, e sem ferir o constitucional princípio da proporcionalidade, selecção de um grupo parlamentar melhor preparado, sobremaneira em conhecimentos técnicos, que muito viria enriquecer este Parlamento. E seria assim, já que na escolha dos Deputados a integrar o círculo nacional, todas as direcções dos partidos políticos estariam, certamente, mais libertadas das naturais pressões das suas comissões distritais, as quais, em contrapartida, decidiriam, mais independentemente, da escolha dos Deputados regionais.
A bondade deste princípio, que países europeus (entenda-se, evidentemente, países da Europa Ocidental) têm consagrados nas suas leis eleitorais, já nem sequer terá a oportunidade de vir a ser apreciada no momento e na sua sede própria, isto é, quando da discussão na especialidade. E isto 'desgosta-nos profundamente, pois todos nós sabemos que a discussão nas comissões, felizmente muito mais libertada da preocupação de publicidade política e pessoal tão do gosto de alguns parlamentares, poderia vir a ser mais receptiva a estes princípios, que consideramos do melhor interesse nacional.
Tal não quiseram o Partido Socialista e o Partido Comunista, ou seja a maioria de esquerda ainda existente nesta Assembleia.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ainda?

O Orador: - O CDS absteve-se na votação de todos os restantes projectos de lei.

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Com a nossa abstenção quisemos significar que não reconhecemos aos projectos em causa as virtudes suficientes para merecerem o nosso voto favorável na generalidade.
Os principais defeitos desses projectos situam-se, sobremaneira, no exagerado espírito conservador que revelam, crítica esta que reconhecemos menos procedente para o projecto do PSD. Não procuram acompanhar as diferenças que a sociedade portuguesa hoje apresenta. Não protegem o esforço que alguns partidos iniciam tendente a conseguir um parlamento tecnicamente, e no seu conjunto, mais preparado para o melhor exercício das tarefas, tão responsáveis, que lhe estão reservadas. São projectos, qualquer deles, enfermados, eles sim, de uma preocupação constante da defesa dos interesses partidários. São alérgicos a todos os princípios que pudessem comprometer as vantagens alcançadas e que, ciosamente, lhes interessa manter.
Mas a nossa abstenção, ou seja o não termos votado contra tais projectos, também pretende significar que consideramos que melhor se servia o interesse nacional se todos os projectos estivessem presentes à discussão e votação na especialidade.
A lei definitiva seria tanto mais enriquecida quanto mais alternativas lhe tivessem sido facultadas aquando da sua apreciação na especialidade.
Em democracia, na nossa democracia, este princípio é necessariamente muito válido, tanto mais que só assim estariam em confronto as diferentes propostas das forças políticas nacionais mais representativas e, pelo menos, teoricamente, com as mesmas possibilidades à partida.
Mais uma vez se repete que assim o não entenderam, ou pelo menos o não quiseram, o Partido Socialista e o Partido Comunista.
E assim, mais uma vez também a Nação fica empobrecida do que seria o seu melhor interesse. O CDS está plenamente convencido de que assim é. E queremos terminar esta declaração de voto com a seguinte afirmação:

O CDS é particularmente sensível a que se preencha, no mais curto espaço de tempo, o vazio resultante da falta de uma lei eleitoral, criando-se assim, com a lei já aprovada do recenseamento eleitoral, as condições necessárias ao normal funcionamento das instituições democráticas que defendemos.
Sempre foi esta a nossa posição. Os votos que acabamos de dar também apontam nesse sentido.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pires.

O Sr. Herculano Pires (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma breve mas necessária declaração de voto.
As opções do Partido Socialista, no respeitante à Lei Eleitoral, ficaram claramente expressas através das intervenções feitas pelo meu camarada Armando Lopes e por mim próprio.
Como se disse, a temática dos projectos em confronto não ficou esgotada com tais intervenções, pois estas visaram tão-só a abordagem de alguns pontos mais polémicos e controversos que, como tal, ficaram retidos e foram enunciados no relatório final da 2.ª Comissão.
No entanto, partimos do princípio de que, entre esses pontos, alguns haja que mereçam reflexão mais prolongada, porventura propiciadora de soluções diferentes daquelas que, neste momento, consideramos mais aconselháveis.
No próprio preâmbulo do nosso projecto, logo se adiantou que o mesmo não deve ser considerado ainda como um conjunto de opções definitivas ou um non plus ultra da capacidade de acerto na matéria.
Efectivamente, na definição das nossas posições, fomos sensibilizados, em larga medida, por razões conjunturais, entre as quais avulta, nomeadamente, a preocupação de urgência na publicação de um diploma sobre a matéria em causa, dada a actual crise do Governo.
Queremos, no entanto, alertar e chamar a atenção dos grupos parlamentares e faço-o em nome do Partido Socialista - para o facto de que, em alguns pontos, não consideramos as nossas posições como dados de aquisição definitiva, reservando para eles a possibilidade de, com a necessária e adequada oportunidade, encararmos soluções mais ajustadas, designadamente na matéria respeitante à organização dos círculos eleitorais.
Assim, e sem margem para equívocos, fica claramente definida a posição do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Leite para uma declaração de voto.

O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas razões fundamentais determinaram o sentido do voto do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português. Primeiro: votámos favoravelmente os projectos de lei que, com as alterações decorrentes dos preceitos constitucionais, tinham por base a anterior Lei Eleitoral porque esta provara ser uma lei progressista, adequada à formação e consolidação do regime democrático-constitucional.
É, aliás, bom recordar que esta lei teve o apoio dos maiores partidos antes- de qualquer acto eleitoral, ou seja, antes de os partidos conhecerem, através do voto, a sua implantação eleitoral. Ela era por isso uma lei alheia às manipulações partidárias do tipo das que agora o PSD e o CDS, em vão, tentaram introduzir...

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Não apoiado!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Quanto a manipulações, temos conversado!

O Orador: -... e que conduziriam à viciação, à distorção da representatividade da Assembleia da República.
Segunda razão: votámos contra os projectos de lei apresentados pelo PSD e pelo CDS porque cada um deles, à sua maneira, são antidemocráticos.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - Ah!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Oh!.... Modelo de democracia soviético!

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O Orador: - Antidemocráticos porque ambos procuram, através da lei, mais do que aquilo a que tem direito através do voto. Porque ambos procuram, através da manipulação dos círculos eleitorais, viciar a representatividade deste Órgão de Soberania.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E viciá-la com que intenções? Admitindo, como me parece razoável admitir, que riem o PSD nem o CDS são partidos suicidas, a viciação funcionaria, naturalmente, em seu favor.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Vocês é que são viciados na asneira!

O Orador: - Antidemocráticos, ainda, porque ambos baseiam a participação dos cidadãos no acto eleitoral no medo, ou seja, na repressão e na sua desconfiança na democracia.

Risos do PSD e CDS.

O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Vocês é que têm hábitos conselheiros!

O Orador: - E é bom sublinhar, a este propósito, que é precisamente destes partidos, que tanto têm falado nas excelências da democracia, que, nomeadamente, dizem que «a democracia é sempre bom confiar em si mesma e pô-la fora da cadeia do terror», e, estou a citar, que «a democracia é o reino da tolerância», são precisamente esses partidos que vêm, mais uma vez, procurar pôr o medo, a repressão, no lugar da participação consciente do cidadão eleitor.

O Sr. Amaro da Costa (CDS): - O Código Penal é um crime!

O Orador: - Consideramos, ainda, que o projecto do PSD é antidemocrático porque retira capacidade eleitoral ao cidadão que, no entender da proposta, tivesse violado os direitos do homem, não exigindo para isso, sequer, condenação por virtude dessa prática.
Sublinhamos ainda mais, que tanto o PSD como o CDS referiram, a propósito dos projectos de lei eleitoral, que ambos eram, nesta matéria, progressistas. É preciso que isto fique claro. É preciso que se diga progressistas em relação a quê. O CDS e o PSD nisto, de facto, revelaram-se progressistas no regresso à manipulação eleitoral, ao obscurantismo, ao caciquismo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - Não apoiado!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E ainda fala em caciquismo!

O Orador: - E estas, se outras não houvesse, eram razões bastantes para votar contra os projectos apresentados pelo PSD e pelo CDS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Sim, ficamos elucidados ...

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Com a aprovação destes projectos deu a Assembleia da República mais um passo importante na elaboração dos instrumentos jurídicos necessários 'à defesa da própria democracia.
Pelo nosso lado, e como já repetidamente temos afirmado, continuaremos dispostos a trabalhar no sentido da conclusão desses mesmos instrumentos jurídicos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete para uma declaração de voto.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: É para uma curta declaração de voto em nome do Partido Social-Democrata, uma vez que, na discussão que precedeu a votação, os pontos fundamentais de divergência já ficaram suficientemente esclarecidos.
Efectivamente, o Partido Social-Democrata votou contra os projectos, apresentados pelo PCP, PS e UDP, por entender que as suas concepções fundamentais em matéria de círculos eleitorais e de voto obrigatório, esses eram os pontos essenciais, divergiam fundamentalmente daqueles que nos parecem os mais aconselháveis para assegurar uma correcta representação do povo português nesta Assembleia.
Registamos, com grande satisfação, que o Partido Socialista entenda, como aliás é correcto, que nestas matérias temos de ir procedendo por aproximações sucessivas e que não faz dessas questões, em definitivo, questões fechadas. Já no que diz .respeito a certos delírios oníricos que ouvimos ao Partido Comunista (risos do PSD), não podemos, obviamente, ter o mesmo tipo de observações. É que, realmente, quem tem por modelo de eleições as eleições de tipo aclamatório que se registam nos países onde os partidos comunistas estão no Poder dificilmente poderá vir dar lições acerca de liberdade de voto, do voto pela arreata e de coisas similares!

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.

No nosso projecto, a linha essencial que presidiu à sua construção era a de aproximar os eleitores dos seus representantes. Não o entenderam assim os partidos que formaram a maioria nesta Assembleia, que continuam a manter esse afastamento baseado num critério meramente administrativo que não tem hoje justificação, nem sequer naquilo que a Constituição delineia como as próximas regiões administrativas.
É por isso que eu disse precisamente, e repito, que se trata de uma visão conservadora, naturalmente destinada a procurar manter os ganhos eleitorais que obtiveram com esse sistema.
No que respeita ainda aos círculos eleitorais, quero registar ainda dois pontos significativos de divergência: o primeiro diz respeito ao círculo dos Açores, que agora fez vencimento nesta votação na generalidade, em substituição dos três círculos até agora, existentes. Votação que foi feita ao arrepio daquilo que foi inequivocamente manifestado pela Assembleia Regional dos Açores e pelo Governo Regional dos Açores, e que, no fundo, assentou, pura e simples-

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mente esse sim num cálculo e numa manipulação eleitoralista.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - E ainda a circunstância de quem é tão estranho defensor do princípio da proporcionalidade e do método de Hondt, a ponto de o ter feito transcrever na Constituição, se esquecer de aplicar esse método e esse princípio da proporcionalidade em relação ao círculo dos emigrantes, visto que não se admite que, neste caso, os seus representantes excedam o número de dois.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Registamos que, efectivamente, o critério é dúplice, funciona num caso, não funciona no outro.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - Uma última palavra a propósito do

voto obrigatório. Também aqui se fizeram múltiplas afirmações que, obviamente, não honram quem as subscreveu. Não creio que muitos deles pronunciassem noutros sítios, designadamente na Universidade, as afirmações e as observações que aqui não se eximiram a fazer. O problema do voto obrigatório é um problema importante, é uma questão que tem de ser discutida em termos normais e desdramatizados, e não compreendo como ó que se permitem retirar ilações acerca da democraticidade quando com e condimente praticado em países, como tive ocasião de citar, como são o caso da Bélgica, do Luxemburgo e da Austrália, para citar só alguns, e onde não consta que nesses países existam situações de opressão ou de violência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Posto isto, quero significar que o meu partido, naturalmente, se encontra aberto a continuar a cooperação, que até agora tem dado, na elaboração de uma lei que não poderá, infelizmente, ser aquela que >nós aspirávamos e corresponderia ao que entendemos correcto, em termos de representação política, mas que, todavia, não nos furtaremos aos esforços para, respeitando a vontade da Assembleia, aperfeiçoar os projectos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede a palavra para que efeito?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para protestar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Há certas afirmações particularmente quando proferidas por certos Deputados - cuja responsabilidade devia ser medida. O Sr. Deputado Rui Macheie permitiu-se, à falta de melhor ponto para atacar o PCP, insinuar que o modelo eleitoral do PCP era o que desenhou com terríveis traços negativos. Devemos dizer que o modelo eleitoral do PCP ó o que está na Constituição.
Mas o que diria o PSD se disséssemos que, ao ter ouvido certas coisas, aqui nesta Assembleia, é de duvidar se o modelo eleitoral do PSD não é o que vigorou até 25 de Abril e se certos Deputados do PSD não têm saudades do método que antes elegera alguns deles à Assembleia antes do 25 de Abril?!

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Está maluquinho?! O sol fez-lhe mal! ...

O Sr. Rui Machete (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Machete pede a palavra certamente para contraprotestar. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Machete (PSD): - É exactamente para contraprotestar, Sr. Presidente. Não num tom extremamente emocionado, que não merece a intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira, ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito obrigado!

O Orador: -... mas para, em primeiro lugar, observar que .não é praxe desta Câmara que as declarações de voto sejam objecto de protestos.

Vozes do PSD: - Pois claro!

O Orador: - Em segundo lugar, devo registar que o tom extremamente vivo do Sr. Deputado mostra quanto é sensível quando se fala em certos modelos, apesar de, naturalmente, a sua abertura de espírito o orientar noutros sentidos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O Sr. Deputado Sá Carneiro não está nesta bancada!

O Orador: - Em terceiro lugar, queria significar, muito claramente, que não é habitual no meu partido permitir que se formulem quaisquer juízos, e muito menos juízos insultuosos, quanto a Deputados desta bancada por Deputados de outras bancadas. É um hábito que nós não temos em relação às outras bancadas e não podemos permitir nem autorizar que o façam em relação à nossa.
Quanto ao resto, não vale a pena continuar neste jogo de dizes tu, direi eu, mas os factos evidenciam suficientemente quem tem razão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Exacto! Especialmente para antes do 25 de Abril!

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3448 I SÉRIE - NÚMERO 94

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apresentado pelo. Grupo Parlamentar do Partido Socialista encontra-se na Mesa um requerimento para que os projectos de lei n.ºs 124, 125, 126, 129 e 130/I, acabados de aprovar na generalidade, baixem à 2.ª Comissão, para discussão e votação na especialidade.

Há alguma oposição?

Pausa.

Como não há, assim se será.
Como sabem,, amanhã, pelas 15 horas, iniciar-se a apresentação do Programa do III Governo Constitucional!

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Declaração de voto contra a generalidade do projecto de lei eleitoral, enviada para à Mesa pelo Sr. Deputado. Medeiros Ferreira.

Voto contra a generalidade do projecto de lei eleitoral n.º 29/I, apresentado pelo Grupo Parlamentar dro Partido Socialista, por aquele revelar que os responsáveis efectivos deste Partido não compreendem a evolução política portuguesa.
De. facto, considero que o projecto de lei agora votado não é mais do que a manutenção no essencial do sistema eleitoral anterior à Constituição. E considero a manutenção desse sistema eleitoral como um erro que se pode vir a revelar funesto para a estabilidade do regime democrático.
O certo é que as anteriores leis eleitorais faziam parte de uma trilogia legal. - conjuntamente com a lei dos partidos e a lei da unicidade sindical- limitativa do direito de associação.. Apenas nessa altura ainda poderia buscar-se uma justificação: após o derrube da ditadura fascista talvez fosse necessário criar rapidamente instrumentos políticos altamente centralizados a fim de se evitar o espontaneísmo convulsionista da sociedade civil.
Aliás, os constituintes ao obrigarem a Assembleia da República a elaborar uma nova lei eleitoral partiram com certeza da previsão que a plena assunção da democracia representativa requerida uma lei eleitoral nova e diferente da produzida em pleno período revolucionário, e não a mesma apenas adaptada tecnicamente aos preceitos constitucionais pertinentes. É este, infelizmente, o caso do projecto de lei agora votado.
Está, pois, esta Assembleia a dar provas evidentes de ser vítima da rapidez e do momento escolhido para elaborar a futura lei eleitoral.
Ora nada obriga a tal contraditório, a não ser o receio e a desconfiança por parte de alguns dirigentes partidários em relação às propostas do Sr. Presidente da República destinadas à ultrapassagem da presente crise política.
Repudio eu estas dúvidas e penso que, pelo contrário, nas propostas do Sr. Presidente da República, expressas no seu discurso de 1 de Agosto, podia esta Assembleia ter encontrado a inspiração para. compreender a evolução política que se opera em Portugal e para, com lucidez, ajudar a encaminhar o País para um patamar de estabilidade democrática e de maior prestígio para a democracia representativa.
Nesta perspectiva e no período normal de trabalho da Assembleia da República - com prazos marcados, evidentemente, mas com tempo para reflexão e estudo, haveria que legislar um sistema eleitoral para o País e para o futuro e não para algumas oligarquias partidárias e para o imediatismo mais curto.
Não o entenderam assim os que decidem sobre esta Assembleia e na sua ânsia de remediarem um mal a curto prazo. - que o é efectivamente a não existência de lei eleitoral - estão, a meu ver, perpetuando um instrumento desajustado à evolução democrática em Portugal.
Mal se compreende que partidos que dizem defender os trabalhadores procedam com tal ligeireza. O certo é que os interesses das grandes massas populacionais do País não se coadunam com a visão estática subjacente às propostas apresentadas.
Estou convicto que a futura Assembleia da República, no caso de não se introduzirem importantes alterações nos projectos agora votados, dificilmente poderá representar a onda de fundo da vontade popular que já se pressente.
Entre outras lacunas, não se encontram as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira convenientemente representadas, assim como é arbitrária, e até conservadora, a pura coincidência dos círculos eleitorais com a divisão administrativa do País herdada da ditadura. Por outro lado, não se dá à iniciativa popular qualquer hipótese de suscitar candidatos a Deputados, contrariando assim o exercício do direito de acção popular previsto no artigo 49.º da Constituição.
Daí o meu voto contra o projecto apresentado pelo Partido Socialista. O voto contra os projectos dos restantes partidas encontra-se justificado na generalidade pela intervenção do Deputado António Barreto.

José Medeiros Ferreira.

Deputados que entraram durante a sessão;

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Augusto M. da Silva Andrade.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando F. C. Pereira Bacelar.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Etelvina Lopes de Almeida.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Gualter Viriato Nunes. Basílio.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Francisco Ludovico da Costa.
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho de Meneses.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís José Godinho Cid.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel do Carmo Mendes.
Manuel Francisco Costa.
Manuel Joaquim Paiva Pereira Pires.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.

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Maria Teresa Vieira Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Social-Democrata (PSD)

Amândio Anes de Azevedo.
António Augusto Gonçalves.
António Joaquim Veríssimo.
António Manuel Barata Portugal.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Eduardo José Vieira.
Fernando José da Costa.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Jorge de Figueiredo Dias.
José Adriano Gago Vitorino.
José Augusto Almeida de Oliveira Baptista,
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Manuel Ribeiro Sérvulo Correia.
Luís Fernando Cardoso Nandim de Carvalho.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.

Centro Democrático Social (CDS)

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
João da Silva Mendes Morgado.
José Cunha Simões.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Eduardo Ferrara Rodrigues Pena.
Rui Garcia de Oliveira.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Rodrigues Vitoriano.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Independentes Carlos Galvão de Melo.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

Alberto Marques Antunes.
Álvaro Monteiro.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Fernando Tavares Loureiro.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Jerónimo da Silva Pereira.
Joaquim Manuel Barros de Sousa.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Luís do Amaral Nunes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Pedro Amadeu de Albuquerque dos Santos Coelho.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José dos Santos Moreira da Silva.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Luciano Pacheco de Sousa Franco.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Henrique Manuel de Pontes Leça.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Nicolau Gregório de Freitas.

Centro Democrático Social (CDS)

António Simões Costa.
Carlos Martins Robalo.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel Farromba Vilela.
Luís Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Nuno Kruz Abecasis.
Rui Fausto Fernandes Marrana.
Victor António Nunes de Sá Machado.
Walter Francisco Burmester Cudell.

O REDACTOR PRINCIPAL, Manuel Adolfo de Vasconcelos.

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PREÇO DESTE NÚMERO 14$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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