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DIÁRIO da Assembleia da República

1 LEGISLATURA

3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1978-1979)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE MAIO DE 1979

Presidente: Ex.mo Sr. Teófilo Carvalho dos Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Alfredo Pinto de Silva
Carlos Alberto Coelho de Sousa
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 46, 47 e 48 do Diário. Concluiu-se a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 141/I e 158/I, dos Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues e do PCP, respectivamente, de alterações à Lei n.º 77/77 - Bases Gerais da Reforma Agrária. Intervieram a diverso título, os Srs. Deputados Mendes Godinho (PS), Vitor Louro (PCP), Lopes Cardoso (Indep.), Carlos Laje (PS), Carvalho Cardoso CDS), Brás Pinto (Indep), António Campos (PS), Monteiro de Andrade (Indep.) e Acácio Barreiros (UDP).
Rejeitados os dois projectos de lei, emitiram declarações de voto os Srs. Deputados Carlos Laje (PS), Veiga de Oliveira (PCP), Joaquim Castelo Branco (CDS) e Álvaro Figueiredo (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 13 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 9 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho Martins do Vale.
Alberto Augusto M. da Silva Andrade.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Amadeu da Silva Cruz.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Barros dos Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Duarte Arnaut.
António José Pinheiro da Silva.
Armando F. C. Pereira Bacelar.
Bento Eliseu de Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.

Carlos Manuel da Costa Moreira.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico Manuel das Neves H. Mendes.
Fernando Reis Luís.
Florêncio Quintas Matias.
Francisco de Assis de M. Lino Neto.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
Herculano Rodrigues Pires.
José dos Santos Francisco Vidal.
José Ferreira Dionísio.
José Macedo Fragateiro.
José Maria Parente Mendes Godinho.
José M. de Albuquerque de A. Leitão.
Luís Abilio da Conceição Cacito.
Luís Alfredo Cardoso Monteiro.
Manuel Branco Ferreira Lima.
Manuel Francisco Costa.
Manuel Joaquim Paiva Pereira Pires.
Manuel Pereira Dias.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
Augusto Nunes de Sousa.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Casimiro Gomes Pereira.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Sérgio Vila Lobos Menezes.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Henrique José C. M . P. de Moraes.
João Carlos F. Malhó da Fonseca.
João Gonies de Abreu de Lima.
João José M. F. Pulido de Almeida.

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Joaquim A. da F. P. de Castelo Branco.
Luís Esteves Ramires.
Maria José Paulo Sampaio.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Mendes Tavares.

Partido Comunista Português (PCP)

António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Zuzarte.
António Marques Pedrosa.
Cândido Matos Gago.
Carlos Alberto do Vale C. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Eduardo Sã Matos.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernanda Peleja Patrício.
Francisco Miguel Duarte.
Joaquim da Silva Roclia Felgueiras.
Jorge Manuel Abreu de Lenios.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Ainieida.
José Rodrigues Vitoriano.
Liiio Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Gomes.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Manuel do Rosário Moita.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Nícolau de Ascensão M. Dias Ferreira.
Raúl Luís Rodrigues.
Severino Pedro Falcão.
Victor Henrique Louro de Sá.

lndependentes

Amantino Marques Pereira de Lemos.
Antonio Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
João Antonio Martelo de Oliveira.
João Lucilio Cacela Leitão.
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mota.
José Joaquim Lima Monteiro Andrade.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
Júlio Maria Alves da Silva.
Manuel Valentim Pereira Vilar.
Olívio da Silva França.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 94 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e ]0 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 46, 47 e 48 do Diário.
Há alguma oposição?

Pausa.

Visto não haver, consideram-se aprovados.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Godinho.

O Sr. Mendes Godinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É necessário e urgente o debate que ontem e hoje se faz aqui, na Assembleia da República, sobre a aplicação da Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária.
Mesmo que não tivessem sido apresentados os projectos de lei n.ºs 141/I e l58/l que hoje estamos aqui a apreciar na generalidade, após a aplicação que tem sido feita pelos III e IV Governos Constitucionais da Lei n.º 77/77 e por essa aplicação merecer a máxima preocupação desta Assembleia, que a aprovou, estava justificado o debate.
A aplicação da Lei da Reforma Agrária, desde que feita por democratas, permitia pelo bom senso e pelo sentido de justiça estabelecer uma forma de exploração da terra mais inteligente, um encontro de soluções mais equilibradas, tomando em conta os justos interesses em presença naquela área, como o foi demonstrado durante a actuação do II Governo Constitucional.
De tal modo esta aplicação da lei permitiu um clima menos tenso e mais dialogante da zona de intervenção que para fazer cumprir os nossos dispositivos, nunca necessitou de recorrer a outras forças que não fossem as do diálogo e as da persuasão, a outras forças que não fossem as da razão.

O Sr. Manuel Costa: (PS): - Muito bem!

O Orador: - Infelizmente, as actuações do III e principalmente do IV Governo Constitucional demonstraram que a pouca precisão de alguns dispositivos da Lei da Reforma Agrária e a evidente má fé daqueles que ultimamente a têm - aplicado demonstraram dizia, que esta lei em "más mãos" como foi dito ontem de manhã pelo meu camarada Manuel da Costa, pode ser geradora de grave instabilidade social na chamada zona de intervenção e uma grave ofensa à consciência do povo português.
0 povo português pratica as virtudes cristãs da paz e do diálogo e tem unia profunda aversão à prepotência e à vingança.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta experiência dolorosa teve, no entanto, um mérito: o de permitir um exame aprofundado e crítico da Lei n.º 77/77 e um exemplar demonstração de que, apesar de toda a carga emocional, é necessário modificar e completar certos dispositivos do seu articulado. Tornou-se necessário para nós, socialistas, sob pena de demissão das nossas responsabilidades, dar passos concretos para defender objectivamente os resultados que esperávamos ao propor e fazer aprovar esta lei do Verão de 1977.
Já ontem de manhã, nesta Câmara, o PS anunciou a apresentação de um projecto de lei de alteração de algumas disposições da Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária. Fê-lo após um profundo estudo crítico da lei em vigor, após ouvir e acatar sugestões de trabalhadores rurais, de pequenos agricultores, dos quadros que têm acompanhado de perto a - aplicação da lei do terreno, e criticas e reflexões que outras forças políticas lhe foram fazendo.
Nenhuma lei é perfeita e unia lei como a das Bases Gerais da Reforma Agrária. como mesmo a Lei do Arrendamento Rural, envolve uma complexidade tal de situações que podem rapidamente tornar-se fontes de iniquidade, em resumo, podem tornar-se numa ofensa à consciência colectiva. Com coragem, com serenidade, com imaginação, têm essa lei de sofrer as correcções necessárias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Principalmente os socialistas não permitirão que a Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária sirva, seja a qual for, para destruir a estabilidade dos postos de trabalho existentes tia zona de intervenção. pôr em causa o labor e a estabilidade dos pequenos e médios agricultores e acabar com as unidades de produção nascidas da fraternidade entre os que foram em gerações sucessivas postos numa situação socialmente humilhante para a dignidade da pessoa humana.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Os socialistas não permitirão que a Lei n.º 77/77 sirva para um ajuste de contas entre as forças sociais em presença, nem que seja a frustração das esperanças de tantos homens e mulheres, que viram nestas transformações sociais, unia maneira de terem, para si e para os seus, uma vida de trabalho mais digna,
Muitos dos que agitam o espantalho do colectivismo, da subversão ou da ineficácia actual em termos de produtividade nas áreas dos antigos latifúndios, no fundo o que tentam esconder debaixo de bandeiras já gastas é a intenção de fazer reviver uma classe social perdida na história - os latifundiários. A esmagadora maioria do povo português, as forças democráticas não o permitirão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 141/I, apresentado pelos Srs. Deputados independentes Lopes Cardoso, Vital Rodrigues e Brás Pinto, tem como objectivo, enquanto não se elaborasse legislação melhor, que a publicação da lei se fizesse de forma global, de modo a assegurar a sobrevivência das formas de exploração colectiva". Para isso, as acções de expropriação e de entrega de reservas deveriam ser sujeitas a um plano de conjunto, tendo em vista a reorganização global da chamada zona de intervenção e estas acções deveriam ser simultâneas.
Do nosso ponto de vista esta proposta é inadequada à realidade presente. Neste momento, não está tanto em causa a entrega de reservas mas antes a quem se entrega, onde se entregam e como se entregam. É este o principio ponto em que, em nosso entender o projecto de lei n.º l4l/I propõe soluções desajustadas.
Por outro lado, é necessária e urgente a criação de condições objectivas de estabilidade, de meios técnicos, de meios financeiros, de infra-estruturas para que a terra entregue em exploração produza. É imprescindível que a força de trabalho aplicada à terra expropriada dê mais e melhores frutos seja ela explorada em regime de cooperação ou por pequenos e médios agricultores.
Como muito bem diz o lúcido comunicado do Secretariado Nacional do PS, difundido esta semana e que tão pouca atenção mereceu da parte de alguns órgãos de informação, "se é legítimo invocar a necessidade de um clima psicológico de confiança para que a iniciativa privada invista e produza, não é menos legítimo exigir igual clima de segurança e estabilidade para que as unidades de trabalhadores cumpram o seu papel produtivo".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É neste segundo ponto que o projecto de lei n.º 141/I, dos Srs. Deputados independentes, propõe soluções desajustadas.
A Reforma Agrária feita após o 25 de Abril em Portugal é com certeza um instrumento político importante, com um conteúdo ideológico muito rico mas é também condição da sua realização o aumento substancial de riqueza para toda a comunidade e uma efectiva e justa distribuição dessa riqueza.
Srs. Deputados independentes, nossos antigos e solidários camaradas de luta. de partido e de bancada, é por estas razões que hoje não podemos apoiar o vosso projecto de lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei do PCP, também hoje em apreciação na generalidade e titulado de Medidas de emergência para a defesa da Reforma Agrária -, é objectivamente diferente deste que acabámos de apreciar.
Ele é fundamentado na arbitrariedade e na marginalização da lei que tem presidido à entrega de dezenas de milhares de hectares, que vinham sendo explorados por trabalhadores agrícolas e por pequenos agricultores e que têm voltado às mãos daqueles que eram responsáveis directos pelas condições de vida sub-humanas de dezenas de milhares de famílias portuguesas". Contra tal propõe medidas para viabilizar as empresas agrícolas que entretanto tenham explorado a terra e restringe as áreas a entregar a cada reservatório e mesmo as condições de acesso ao exercício do direito de reserva.
Além disso, propõe um tratamento diferenciado aos reservatórios dos prédios que foram ocupados e aos que o no foram.
Nós não concordámos, Srs. Deputados do PCP, que os reservatórios sejam todos tratados do mesmo modo e a Lei n.º 77/77 aponta para que aqueles que efectivamente exploravam a terra e que nela tenham investido tenham de ser
considerados de modo bem diverso daqueles que faziam a agricultura das tiradas de cortiça ou do lazer. A lei estabelece pontuações diferenciadas para estas situações e nós achamos que elas têm de continuar a existir. Não devem ser considerações alheias ou fortuitas ao próprio reservatório, como o ter sido ou não ocupado, que deve determinar uma reserva maior ou mais pequena. O que é indispensável é que os que exploravam directamente a terra o possam continuar a fazer, embora em área mais ajustada ao que é social e tecnicamente aconselhável e sejam distinguidos na prática dos absentistas e dos absentistas disfarçados, em suma dos que não eram empresários agrícolas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não estamos de acordo com esta concepção de reforma agrária várias vezes proposta pela PCP.
Por outro lado, no projecto de lei n.º 158/I nada se propõe para o futuro em termos de melhorar e modernizar os sistemas tradicionais de produção ainda existentes.
A defesa da Reforma Agrária passa cada vez mais pelo aumento nítido da produção em toda a zona de intervenção, não em termos de toneladas de cereal produzidas, mas em volume e valor de produtos agrícolas pecuários e florestais e nas culturas que façam o racional aproveitamento da força de trabalho existente. Para um programa deste tipo, é necessário criar rapidamente meios técnicos, financeiros, estabilidade de situações e uma sã concorrência e cooperação entre os diversos modos de exploração.
Temos uma concepção de reforma agrária pautada por imperativos sociais e económicos, que ultrapassam de longe a simples alteração de posse dos meios de produção.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Terão de haver profundas alterações técnicas ligadas a uma capacidade de realização na optimização dos recursos naturais, para uma substancial melhoria das condições de vida do povo trabalhador.
Somos contra todos os projectos que limitem a Reforma Agrária à simples redistribuição de terra, como seremos contra todos aqueles que procurem atrasar a execução das leis em vigor.
A Reforma Agrária não é para nós socialistas, uma arma de guerrilha política; ela é, acima de tudo, um imperativo nacional em nome de unia sociedade mais justa, mais fraterna e mais próspera.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Deputado Mendes Godinho, começaria por pedir-lhe desculpa por não ter tido ocasião de escutar toda a sua intervenção. Acredite que o lamento sinceramente. Por este motivo talvez seja um pou

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co abusivo o pedido de esclarecimento que vou fazer-lhe, sendo até possível que não tenha cabimento, mas o Sr. Deputado perdoar-me-á.
Se bem percebi a partir do momento em que entrei no hemiciclo, o Sr. Deputado entende que não é um plano integrado que importa, mas que mais importante do que isso é saber como se expropria, quem e onde se expropria, a quem se entregam as reservas, como e quando se entregam.
Quanto ao seu entendimento de que é mais importante saber a quem se expropria, a quem se entregam as reservas, como e quando se entregam, não estamos de acordo com ele, todavia consideramos que é necessário sabê-lo e defini-lo de forma clara. Nisso estamos de acordo. O que não entendo é que contradição existe entre esses aspectos e a necessidade, em nosso entender fundamental, de que todo esse processo seja enquadrado num plano global e de conjunto. Plano esse que, além do mais. deveria comportar a definição de todos esses aspectos a que o Sr. Deputado se referiu. Não vejo, pois, em que medida é que aquilo que nós propomos é contraditório com o que o Sr. Deputado sugere.
O nosso projecto de lei é modesto e nós temos a perfeita consciência de que não abrange todos os problemas levantados pela Reforma Agrária. O projecto aborda apenas aspectos limitados, mas que, para nós, são extremamente importantes.
Não compreendo, na verdade, que sob o argumento de que importa mais do que tudo saber - como há pouco disse - quem. como e onde expropriar, a quem, como e quando dar reservas se possa de alguma forma pôr em causa a necessidade de todo esse processo se enquadrar num plano global e de conjunto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e, em especial, Sr. Deputado Mendes Godinho: A um dos pontos da sua intervenção farei referência quando proferir a minha, mas desde já gostava de pôr-lhe algumas questões.
O Sr. Deputado considera que é errado da nossa parte querer tratar pela mesma bitola reservatórios que investiram nas suas terras e reservatórios que não investiram. Trata-se apenas de um ponto de um artigo do nosso projecto de lei, todavia, isso sugere-me outra pergunta que gostava de ver esclarecida.
O nosso projecto de lei contém um outro artigo que estabelece o mesmíssimo principio que o Sr. Deputado defende em relação a agrários que são responsáveis por terras abandonadas. Isto é: não podemos tratar de igual modo os que abandonaram as terras e os que nelas investiram. Estão o Sr. Deputado e o seu Partido de acordo com este princípio?
De facto, o nosso projecto não contém medidas para o futuro, é um projecto com medidas para o presente, para o imediato, trata-se de medidas de emergência. Ë evidente, por todas as posições que publicamente temos assumido, que defendemos medidas para o futuro, sabemos quais são, temo-las apontado e os trabalhadores não só as têm apontado como as tem levado à prática nas duras condições em que realizam a Reforma Agrária. No entanto, olhando o projecto de lei do Partido Socialista - na leitura apressada que foi possível fazer -, não se vê que exista alguma disposição virada exactamente para as medidas que no futuro são necessárias tomar por forma a desenvolver a Reforma Agrária. Também nos parece ser um conjunto de medidas para o presente, a menos que o Sr. Deputado esteja com isso a referir-se ao artigo 3.º, que cria um fundo de investimento na zona de intervenção. Se assim é não se pode depreender da redacção deste artigo que ele contém medidas para o futuro, mas apenas um meio financeiro que permite levar algumas medidas a bom termo, o que não significa nada, pois as medidas podem ser boas ou más mas o dinheiro é que só é um e os senhores só tratam dos meios financeiros. Gostava pois de perguntar-lhe, Sr. Deputado, se a crítica que dirige ao projecto de lei do Partido Comunista a adopta também para o projecto de lei do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Godinho.

O Sr. Mendes Godinho (PS): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pergunta-me se o que eu disse estava em oposição ao projecto de lei apresentado pelos deputados independentes com vista à solução dos problemas que hoje se levantam em relação à Reforma Agrária. Penso que já durante a minha intervenção referi que achávamos que esse projecto de 'lei estava desajustado. Isto porque entendemos que um plano integral e de conjunto para a solução de todos os problemas da Reforma Agrária é, no nosso ponto de vista, uma posição teórica da solução.
Fazer esse plano integral era extremamente difícil e possivelmente quando viesse a ser posto em execução teria dificuldades concretas de solução e atrasaria indefinidamente a aplicação dos imperativos constitucionais da Reforma Agrária.
Entendemos que toda a fase de lançamento das expropriações e entregas de reservas, por um lado, e, por outro, das novas unidades de produção tem de ser uma coisa relativamente rápida. Nós não podemos ficar durante dez ou quinze anos, até sob o perigo de pôr em causa a própria Reforma Agrária, a tratar deste problema. Por isso, dentro da conjuntura actual e da lei em vigor, há que arranjar um articulado que tipifique melhor as condições de acesso à propriedade e à exploração e que aponte também, para já, medidas de incremento da produção e respectiva regulamentação. Esta situação, de um ponto de vista teórico, pode não ser a melhor, mas, de um ponto de vista pragmático, tem força e bases concretas para poder ter execução prática. É por isso que o Partido Socialista pensa que o vosso projecto de lei, hoje em Maio de 1979, é realmente um projecto desajustado.
O Sr. Deputado Vítor Louro perguntou-me se entendíamos que no articulado do projecto de lei do PCP também estavam tratados de maneira diferente os reservatórios. Sobre isso o artigo 8.º do vosso articulado propõe, concretamente, que as propriedades ocupadas em Abril de 1976 tenham direito a reservas diferentes em relação às terras que nessa mesma altura não tivessem sido ocupadas. Ora o Sr. Deputado veja que um proprietário cujas terras não tivessem sido ocupadas, que não explorasse bem a terra, que fizesse uma agricultura de lazer ou que fizesse uma semiagricultura, tinha direito a uma reserva maior do que um empresário agrícola que fizesse uma boa exploração e cujas terras tivessem sido ocupadas em Abril de 1976. Isto é: por um processo alheio e fortuito ao exame objectivo da situação as reservas seriam diferenciadas.
Penso que este tratamento é injusto e desajustado face à situação, embora perceba que o intuito seria o de promover a estabilidade para as novas formas de exploração nascidas após o 25 de Abril no Alentejo.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Dá-me licença, que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Deputado, isso ficou para nós perfeitamente claro pela sua intervenção, porém a questão que lhe colocámos não foi em relação ao artigo 8.º, mas sim ao artigo 3.º. Isto é: se é justo que aqueles que tinham as suas herdades completamente abandonadas sejam tratados em pé de igualdade com os que tinham investido nas suas terras.

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O Orador: - Sr. Deputado, eu tinha percebido que eram duas as questões que me tinha formulado e responder-lhe-ia de imediato a essa segunda.
Nós entendemos que é necessário que os meios de prova para que os reservatários se candidatem às reservas de 70 000 pontos - as que, como diz a lei, são dadas aos que exploravam directamente a terra - sejam claros e conclusivos.
Nós entendemos também que um candidato a uma reserva, que tinha o prédio abandonado, que não praticava agricultura, deve ser tratado como um absentista e, como tal, ter uma reserva igual a 35 000 pontos, como manda a lei é esse, aliás, o seu espírito. E nisto só há realmente uma dificuldade que é a de provar estas duas situações.
Quanto ao nosso projecto de lei, nós não estamos hoje a apreciá-lo; o nosso grupo parlamentar marcou o dia 6 de Junho para esse efeito e então, nessa altura, poderemos debatê-lo. De qualquer modo, gostaria de dizer-lhe que no nosso projecto esses meios de prova não documentais ou então em tribunal comum. Isto é: o reservatário ou uma outra parte que não concorde que uma reserva de 70 000 pontos seja atribuída a algum reservatário terá de provar em tribunal se explorava ou não directamente os prédios.
Quanto às medidas para o futuro, Sr. Deputado Vítor Louro, o nosso projecto - e lá voltamos nós a discutir o nosso projecto - aponta-as ao introduzir na lei o FIZI (Fundo de Investimento da Zona de Intervenção) - que nós quisemos publicar em decreto-lei, no 11 Governo Constitucional -, embora, como disse, os meios financeiros não sejam a única coisa necessária para fazer desenvolver a agricultura na zona de intervenção. O Sr. Deputado lembre-se que a agricultura no Alentejo está, antes de mais, carenciada de investimento e os meios financeiros para investir na zona são uma das molas reais de avanço da produção, são uma das molas reais para tornar a agricultura mais intensiva do que hoje.
Existind o esses meios financeiros, será mais fácil elaborar planos e arranjar um corpo técnico que os vá executar. Além disso, no nosso entender, esse Fundo tem um outro papel muito importante que está consignado no nosso articulado que é o de garantir aos trabalhadores permanentes dessas empresas explorantes que ficaram inviabilizadas emprego equivalente, e a abertura desses postos de trabalho seria feita com a aplicação desses fundos financeiros do FIZI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Deputado Mendes Godinho, se me permite, queria chamar-lhe a atenção para o seguinte: o Sr. Deputado atribuiu-nos propósitos que vão muito além dos nossos. É verdade que "presunção e água benta cada um toma a que quer", mas o Sr. Deputado parte do princípio que nós tomámos muito mais água benta e presunção do que aquela que efectivamente nos demos a nós próprios.
Nós não propusemos um plano integral para solução de todos os problemas da Reforma Agrária e não sei se será possível fazê-lo. Nós, muito modestamente, não propusemos nada de parecido com isso. Propusemos, sim, um plano geral para prosseguimento do processo de reestruturação fundiária.
Vejo com espanto o Partido Socialista - que foi um dos partidos que mais reivindicou nesta Câmara que a Reforma Agrária se não processasse de uma forma anárquica, mas no quadro de um plano global - vir agora dizer, pela boca do Sr. Deputado, que esse plano é uma pura utopia e passar de repente a posições que me parecem ser um tanto ou quanto radicais quando o Sr. Deputado diz que levar a Reforma Agrária até aos seus últimos objectivos em dez anos é um horizonte que ao Partido Socialista parece extremamente longínquo, eu - talvez seja bastante mais moderado, bastante mais "reformista" - não creio que em menos de dez anos esses objectivos se possam atingir. Às vezes nós somos ultrapassados pela esquerda e pela direita com uma rapidez tal que não demos por isso - são coisas da vida! - e eu sinto agora a sensação de estar aqui a contrapor uma Reforma Agrária radical, revolucionária - que em poucos meses transforma o Alentejo e o Ribatejo de alto a baixo - a uma posição muito mais moderada de uma Reforma Agrária a processar a prazo, o que não quer dizer uma reforma agrária a ficar parada ou a andar para trás, que são coisas diferentes.
Peço pois, ao Sr. Deputado que leia o nosso projecto. Ele só tem dois artigos e em nenhum, de facto, se fala num plano global para resolução de todos os problemas da Reforma Agrária. Se nós fôssemos capazes de imaginar esse plano e o tivéssemos no bolso, com certeza que o traríamos para aqui, pois estamos tão interessados como todos vós na solução rápida e global de todos os problemas. Parece-me é que essas panaceias não são fáceis de pôr de pé.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Godinho.

O Sr. Mendes Godinho (PS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, quanto à crítica que me fez de que "presunção e água benta cada qual toma a que quer", também desta vez o Sr. Deputado me envolveu nessa mesma dose.
Realmente quando eu referi que a Reforma Agrária não deve ser feita em dez anos, o que eu queria dizer era que não deve ser daqui a dez anos que ela se deve começar a fazer, e até lá estarmos a discutir se a terra pertence ao reservatário, à cooperativa, ao pequeno agricultor ou se a entrega deve ser feita desta ou daquela maneira. É necessária estabilidade para que cada um saiba claramente com o que conta e para que a terra seja expropriada...

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - E paga!

O Orador: - ... a quem deva ser e entregue a exploração a quem de direito e estas acções têm de ser rápidas. Claro, que isto envolve o conceito de Reforma Agrária global de que falou, mas estas acções têm de ser feitas em dois anos, no máximo, pois nós temos de ter empresas estáveis no Alentejo e no Ribatejo, de modo a que possam ter direito a essas terras para nelas poderem investir e nelas produzirem. Necessitam também para isso de saber quantos anos podem estar nelas, quais as garantias de trabalho que têm, etc., e isto tem de ser feito, não podemos esperar por uma discussão teórica - talvez até um pouco académica - sobre estes assuntos. Era desta rapidez de execução que falava e não da concretização dos grandes objectivos da Reforma Agrária, pois com certeza isso será uma coisa que nunca será acabada. Todos os dias, enquanto houver pessoas progressistas e com imaginação, esses objectivos continuarão e de certo que essas qualidades de imaginação das pessoas que estiverem pelo progresso da humanidade não acabarão nesta geração. Nós próprios e os futuros políticos com certeza que nos preocuparemos em encontrar soluções cada vez mais justas e equilibradas às realidades presentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Laje (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além dos esclarecimentos que o meu camarada Mendes Godinho acaba de dar, gostava de fazer o seguinte reparo ao Sr. Deputado Lopes Cardoso.
0 intróito do projecto de lei n.º 141/I diz que o seu objectivo visa apenas resolver problemas emergentes dos dispositivos inadequados e das consequências ruinosas da

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Lei n.º 77/77 O seu projecto e encarado como uma espécie de paliativo, no entanto, o Sr Deputado Lopes Cardoso reconhece que e necessário elaborar um novo diploma, que seria a solução adequada e solida dos problemas levantados pela Lei n.º 77/77.
O Partido Socialista também e dessa opinião, e por isso apresentou um projecto de lei que e corrector dos dispositivos inadequados e que introduz os aditamentos necessários à referida lei Ou seja a nossa intenção e modificar a lei onde ela se tem revelado inadequada e não e a de adiar os problemas, quer das expropriações, quer das devoluções, quer das reservas Encaramos assim a solução de fundo e pensamos que a solução proposta pelo Sr Deputado Lopes Cardoso, embora não seja completamente errada, não é a solução adequada para este momento. E porque temos a boa solução que recusamos a semi-solução apresentada pelos Srs Deputados Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr Deputado Carlos Lage Continuo a não entender em que medida e que o nosso projecto e contraditório com as boas intenções agora proclamadas pelo Sr Deputado e pelo Partido Socialista Não vejo, de todo em todo, em que é que o nosso projecto adia qualquer espécie de problemas, mas, como dizia ontem na minha intervenção, "mais vale tarde do que nunca", e não posso deixar de me congratular pela pressa, agora atribuída pelo Partido Socialista, de resolução de todos estes problemas Só lamento é que se tenha demorado dois anos e que se tenha esperado seis meses depois da apresentação do projecto de lei n º 158/1 do Partido Comunista e do nosso próprio projecto para a apreciação destes problemas e que tenhamos agora de perder mais uns quantos meses para discutirmos as tais soluções de fundo que o Partido Socialista propõe Mas, enfim , mais vale tarde do que nunca.
Porém, o que o Sr Deputado não demonstrou, porque não é possível demonstrar, e em que medida e que o nosso projecto contraria as propostas do Partido. Socialista, impede a sua aprovação ou execução - se forem de aprovar e executar - e a atrasa O que, isso sim, atrasa bastante mais a resolução dos problemas é continuarmos estes debates académicos motivados por uma sucessão extemporânea de projectos de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Godinho.

O Sr. Mendes Godinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Começo por pedir desculpa por intervir tantas vezes, mas gostaria de lembrar ao Sr Deputado Lopes Cardoso que a equipa que esteve no MAP na altura do II Governo Constítucional, com o apoio da Lei n º 77/77 e com os decretos-leis que queria publicar, completaria e executaria uma redistribuição da terra e entregaria terra para exploração, não necessitando de uma modificação, pela Assembleia da República, da referida lei Assim, o espaço de tempo que tivemos para comprovar que não havia outra via que não fosse a da apresentação de um projecto de lei que completasse e modificasse os dispositivos da Lei n º 77/77 não são dois anos, são realmente os meses que medeiam entre a queda do II Governo Constítucional e esta data

O Sr. Presidente - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Cardoso.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Sr. Presidente Srs Deputados Os Srs Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues apresentaram a esta Assembleia uni projecto de lei preludio de um outro em que pretenderão revogar a Lei n o 77/77 e elaborar novas Bases Gerais da Reforma Agrária, que visa sustar imediatamente a aplicação daquela lei.
Com efeito, desejam os autores do projecto de lei que a concretização do direito de reserva e as devoluções de propriedades se enquadrem num plano de conjunto, tendo em vista o reordenamento agrícola global da zona de intervenção Como este plano de conjunto leva tempo a ser preparado, e óbvio que o que se pretende é impedir o cumprimento da Lei n º 77/77 no que se refere a zona de intervenção, onde o ritmo de entrega de reservas e de devoluções atingiu agora valores nunca antes alcançados.
Tenho sido daqueles que mais têm lutado para que seja preparado um ordenamento agrário do território nacional, sem o qual será sempre precária e aleatória qualquer política agrícola que se gize Existem já elementos de base suficientes para o levar a bom termo, em prazo razoável, para a metade sul do Pais, mas até agora pouco ou nada se tem feito para o concretizar, e os próprios engenheiro Lopes Cardoso e Vital Rodrigues quando foram, respectivamente, Ministro da Agricultura e Pescas e Secretario de Estado do Fomento Agrário, não se interessaram por ele ou pelo menos não determinaram imperativamente a sua execução
O que teria sido lógico, Sr Presidente e Srs Depurados, era que a chamada "reforma agrária" da zona de intervenção não tivesse sido efectuada ao sabor dos desejos do Partido Comunista, com ocupações selvagens e instalação de Cooperativas e de unidades colectivas de produção ao acaso,

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: -, mas sim devidamente programada, com base em dados científicos e técnicos já existentes, e levada a efeito de maneira gradual de forma a conseguirem-se, sem retrocessos, atropelos e desmandos os objectivos fundamentais de qualquer reforma agrária, que são a melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais e dos agricultores, o aumento da produção e da produtividade da agricultura e a igualdade efectiva dos que trabalham na agricultura com os demais trabalhadores.
E isso teria sido relativamente fácil, e receberia mesmo a adesão da esmagadora maioria dos intervenientes no processo, se tivesse obedecido a tais ditames, em vez de servir de bandeira para agitação demagógica em prol da hegemonia de um só partido E não se teria verificado o fracasso agora constatado, em que a produção vai diminuindo, os investimentos preferenciais não são em grande parte recuperados, os latifúndios não foram eliminados as grandes explorações capitalistas foram substituídas por grandes explorações deficitárias e os trabalhadores começam a ver frustradas as esperanças que em vão lhes fizeram criar, para alem das clamorosas injustiças e depredações que indevidamente se cometeram.
Em Novembro de 1976, apresentamos nós, nesta Assembleia, um projecto de lei pedindo a suspensão das expropriações de prédios rústicos na área da Reforma Agraria porque as que se estavam a verificar não se situavam sob a égide da Constituição por não estarem reguladas por lei da Assembleia da Republica Esse diploma foi rejeitado pela maioria, mas o tempo veio dar-nos razão, e a lei que se impunha acabou por surgir, embora não tenha merecido a nossa aprovação por não incorporar aqueles preceitos mínimos que reputávamos essenciais para o nosso acordo e que se referiam à pontuação, aos limites de área das reservas, aos indivisos, a retroactividade a alienação compulsiva de reservas, a não beneficiação ou mesmo penalização dos agricultores exemplares e aos limites máximos da exploração e da propriedade privada Mas os epítetos com que então nos mimosearam por querermos suspender dois decretos-leis cuja manutenção infringia os preceitos constitucionais, me-

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lhor se aplicariam agora a quem quer sustar a aplicação de uma lei aprovada pela Assembleia da República e promulgada pelo Sr. Presideiite da República.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Mas como é nosso timbre, não usaremos esses condenáveis processos!
Os autores do projecto de lei pretendem que as expropriações prossigam concocomitantemente com as entregas de reservas e as devoluções. Não podemos admitir que qualquer lei neste país, num Estado que se proclama de direito, possa, por qualquer motivo, impedir ou sequer atrasar devoluções, isto é, a entrega aos seus legítimos donos do que lhes foi ilegitimamente extorquido. Admira-nos que os Srs. Deputados independentes o tenham preconizado!
Não pode haver nem planos de conjunto, nem política partidária, nem pressões de massas que tentem obviar ao estrito cumprimento da lei, sob pena de cairmos na anarquia e perdermos a credibilidade que ainda nos resta interna e externamente.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Também não aprovamos que prossigam as expropriações sem que se cumpra o imperativo moral e jurídico que estabelece que essas apropriações, num Estado de direito, devem ser acompanhadas de justa indemnização com base em justa avaliação, como, aliás, se estipula na Convenção Europeia dos Díreitos do Homem, já ratificada por Portugal. E como todos sabemos, não houve até agora acção nesse sentido e o que se legislou sobre a matéria não prima, infelizmente, por grande sentimento de justiça.
A suspensão de entrega de reservas nesta altura, longe de vir a beneficiar do tal plano de conjunto preconizado, iria impedir que se pudesse contar com o know-how, e o espírito de iniciativa daqueles empresários individuais privados, que serão sempre indispensáveis para se alcançarem os níveis de produção e de produtividade de que o País carece avidamente, não só para diminuir o deficit da nossa balança de pagamentos mas também para tornar possível e viável a nossa adesão à CEE. Concluir imediatamente as devoluções, prosseguir a ritmo acelerado na entrega de reservas, proceder sem demora a justas indemnizações, permitindo a utilização destas para investimento, são condições indispensáveis para o processo da nossa agricultura e a recuperação económica do País.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Também as unidades colectivas de exploração, cooperativas ou outras, carecem de apoios técnicos e financeiros, mas a sua viabilização, essa sim, tem de fundamentar-se no tal plano de conjunto, porquanto o seu delineamento só poderá ser racionalmente feito com base num ordenamento agrário que não pode tardar mais. E que se cumpra o que a lei determina: que o Estado não possua explorações agrícolas senão para fins de extensão e investigação e que as terras expropriadas e nacionalizadas sejam distribuídas não apenas por formas colectivas de exploração mas também, e até preferentemente, por agricultores e trabalhadores rurais individuais, na modalidade de explorações agrícolas familiares modernas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - 0 projecto de lei n.º 158/I, do PCP, que preconiza medidas de emergência para defesa da Reforma Agrária, revela que este partido pretende alcançar agora parte do que não conseguiu aquando da discussão e aprovação da Lei n.º 77/77, à espera, talvez, da repetição de êxitos que ultimamente tem obtido com base numa reedição da "maioria de esquerda". Veremos até que ponto o PS levará a sua inflexão, vinte meses depois de tanto aqui se ter batido pela sua Lei de Bases da reforma Agrária.

O Sr. António Campos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tal como então, não daremos o nosso voto a tão prejudicial iniciativa, dispensando-nos de repetir aqui os argumentos que nós e muitos portugueses, agricultores ou não, vimos sistematicamente contrapondo aos desejos colectivistas e dominadores do PCP ..

O Sr. Joaquim Castelo Branco (CDS): - Muito bem!

Uma voz do PCP: - Não apoiado!

O Orador: - ..., cujos resultados estão há muito claramente demonstrados em todos os países ditos socialistas, em que a produtividade e a produção agrárias não conseguem, nem nunca conseguirão, igualar globalmente as dos países de propriedade privada e livre iniciativa.

Vozes do PCP: - isso é falso!

O Orador: - ... e onde, aliás, a marcha atrás é já notória em muitos deles, vejam a Polónia, a Hungria e outros, e que, para nosso mal, também já foi possível comprovar entre nós.

Aplausos do CDS.

O Sr. Manuel Gomes (PCP): - É a mesma conversa do antigamente!

O Sr. Cunha Simões (CDS): - A equipa de Caxias é melhor é estar calada!

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Cale a boca seu provocador. Tenha mais respeito!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Carvalho Cardoso disse que o nosso objectivo era sustarmos a aplicação da lei por caminhos um tanto ou quanto ínvios, e faz-nos esta acusação, suponho eu, visto ser a única razão lógica, por considerar que aquilo que propomos é, na prática, inviável. Ou seja: aceitar o princípio de que o processo de expropriação, de entrega de reservas e de devolução de propriedades se devia fazer no quadro de um plano global é a mesma coisa do que acabar com a Lei n.º 77/77, dada a impossibilidade de realizar esse plano.
Curiosamente, o Sr. Deputado Carvalho Cardoso vem dizer que eu próprio, como Ministro da Agricultura, e o meu camarada Vital Rodrigues, como Secretário de Estado do Fomento Agrário, deveríamos, em 1976, ter determinado a execução imperativa do plano que hoje considera impossível de realizar, esquecendo-se qual era nessa data a situação do aparelho de Estado.
É evidente que para nós este plano não tem nada de transcendente. Para nós constituía um objectivo - e tive ocasião de o dizer ontem ao Sr. Deputado - fundamental da política, certa ou errada, que queríamos conduzir quando estávamos à frente do Ministério da Agricultura e Pescas. E porque esse principio não foi aceite e porque já nessa altura se pretendia uma aplicação parcelar e unilateral da lei, nós, por essa razão e outras, entendemos que devíamos abandonar as responsabilidades que tínhamos.
Não se trata, Sr. Deputado, de sustar a aplicação da lei; trata-se, sim, de enquadrar minimamente a sua aplicação de forma não discriminatória e parcelar para evitar que os ar-

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gumentos aqui aduzidos possam ser utilizados consoante as circunstâncias.
Na minha intervenção tive ocasião de referir o problema - aqui frequentemente colocado - das indeminizações como óbice ao prosseguimento das expropriações. Curiosamente, esta questão só se levanta em termos da expropriação; no entanto, é a própria lei que prevê a indemnização a empresas explorantes quando a demarcação lhes traga prejuízos.
Continua a exigir-se a aplicação da lei, entendendo-se essa aplicação numa perspectiva unilateral, visto que não há uma palavra quanto àquilo que são - e os exemplos podiam alongar-se - as permanentes violações dessa mesma lei. Há reservas que se entregam a proprietários que continuam a deter patrimónios fundiários que ultrapassam largamente o direito de reserva que lhes é atribuído, continuando assim de posse não só das áreas não expropriadas que ultrapassam a reserva como das novas reservas que lhes são entregues.
Há reservatórios a quem são atribuídas - contra informações claras dos próprios serviços do MAP - reservas de 70 000 pontos, e mesmo de mais, por decisão do Governo, quando os mesmos serviços do MAP indicam que esses reservatórios teriam, quanto muito, direito a 35 000 pontos de reservas.
Estes são alguns dos inúmeros casos que se vão acumulando e sobre os quais os próprios tribunais já começam a pronunciar-se - e ainda há tribunais em Portugal -, demonstrando inclusivamente as ilegalidades que o MAP tem cometido.
Mas, Sr. Deputado, a questão está em saber se nós de facto acreditamos ou não em que é possível elaborar esse plano - e não faço qualquer processo de intenção. Se acreditamos que é de facto possível a sua elaboração, não podemos afirmar que a aprovação do nosso projecto conduz à paralisação do processo da Reforma Agrária. Todavia, se se entende que esse plano é irrealizável - é uma opinião -, então, Sr. Deputado, se não queremos fazer processos de intenção - e eu recuso-me a fazê-los também em relação a si -, não podemos dizer que a iiitençgo do projecto é a de suspender a aplicação da lei, o que de resto é algo muito diferente de dizer que a sua aprovação conduziria a essa suspensão. Não é exactamente a mesma coisa, é uma forma diferente de tratar os problemas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carvalho Cardoso, prefere responder já ou no fim, uma vez que ainda há mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento?

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Prefiro responder já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, eu não disse que a elaboração do plano de conjunto era inviável, até porque estou convencido de que é relativamente fácil concretizá-lo, mas sim bastante demorado. E digo que é fácil porque existem, como o Sr. Eng.º Lopes Cardoso sabe, suficientes elementos de base para o fazer. Simplesmente se de acordo com o seu projecto, só se passa a concretizar a entrega de reservas e de devoluções - e para estas é que não é necessário qualquer plano de conjunto porque as devoluções, em nosso entender, são um atropelo à lei que tem de ser corrigido imediatamente e independentemente de qualquer plano -, parece-nos estranho que os Srs. Deputados incluam aqui as devoluções e daí que eu tenha criticado o facto na minha intervenção.
Mas, como eu ia dizendo, em relação à entrega de reservas, o plano é demorado, pode mesmo demorar um, dois ou mesmo três anos, e neste momento sustar a entrega de reservas, quanto a nós, é comprometer o aumento de produção e de produtividade que temos necessidade imperiosa de conseguir.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - E comprometer a execução da Reforma Agrária!

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Não é a destruição da Reforma Agrária. No entanto, parece que parar todo o processo seria comprometer o aumento de produção e de produtividade de que o País precisa.
Portanto, entregando reservas, estimulamos aqueles agricultores que eram bons agricultores - e, aliás, praticamente só se entregam a esses, até pela nova lei...

Vozes do PCP: - Vê-se!

Protestos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço a vossa atenção para o orador.

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Comunista, eu nunca os interrompo e peço que me respeitem quando falo. Terão a oportunidade de depois fazerem as perguntas que quiserem.

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Esse é um partido concursionista.

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Lopes Cardoso, como eu ia dizendo, é nosso entender que uma paragem na entrega de reservas, neste momento, seria prejudicial ao aumento de produção e de produtividade que é indispensável, e parece-me que todos nesta Câmara estão de acordo com isso, embora cada um tenha uma óptica diferente para o conseguir.
Em relação ao plano de conjunto que o Sr. Deputado propõe e que, quando foi Ministro, podia ter ordenado - pois hoje estaria pronto e estaríamos nele entrosados -, o que é indispensável é a entrega das terras para exploração porque ao delinear as novas explorações é fundamental saber delineá-las com um critério racional, isto é, saber quantos trabalhadores podem viver dessa área, qual a área de solo que devem possuir para ser viável a sua exploração, etc. Assim, não é satisfatória uma ocupação ao acaso, e dizer, por exemplo, que ficam 100 trabalhadores em vários milhares de hectares leva a perguntar porquê 100 trabalhadores e não 200 ou 50. Tem, pois, que haver racionalidade na entrega das explorações, pois se assim não for podemos acertar ou não, será uma acção feita ao acaso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Queria referir apenas duas coisas: o Sr. Deputado entende que a paragem das entregas das reservas teria consequências nefastas sobre a produção. Admitindo isso, a questão que lhe ponho é se a concessão atribiliária de reservas a que vimos assistindo, com desmantelamento de unidades colectivas e de cooperativas, não tem ela também resultados extremamente negativos sobre a produção.
Em segundo lugar, admitindo que tinha sido possível a elaboração, do plano a que se refere concretamente o nosso projecto quando eu estive no Ministério da Agricultura e Pescas, devo dizer-lhe que esse plano, por via da Lei n.º 77/77, tinha sido completamente desmantelado.
Mas ainda assim devo dizer-lhe que, em relação ao problema que põe e que do meu ponto de vista é um elemento

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essencial para definir e enquadrar o processo da Reforma Agrária, quando eu saí do Ministério deixei no Conselho de Ministros, bom ou mau, um projecto de lei-quadro para o estatuto das novas unidades de produção, sem o que será extremamente difícil definir o que quer que seja nesta matéria.
Já lá vão quase três anos e nem esse estatuto foi discutido - e admito que ele fosse pura e simplesmente de pôr na gaveta -, nem foi discutida ou aprovada qualquer outra lei-quadro que definisse o funcionamento e a natureza as novas unidades a criar na zona da Reforma Agrária.

O Orador: - Muito obrigado pelo esclarecimento, Sr. Deputado.
Todavia, devo dizer-lhe que considero ser evidente a necessidade de um estatuto para as novas formas de exploração, mas considero também indispensável que o dimensionamento das formas de exploração dessas empresas seja determinado por esse plano global, nomeadamente por um ordenamento agrário racional, porque não é indiferente, como o Sr. Deputado sabe tão bem ou melhor do que eu, instalar a mesma dimensão em solos de natureza diferente e de capacidade de utilização diferente.
Por consequência, para sabermos equacionar racionalmente qual o dimensionamento e o número de pessoas a viver numa exploração, temos de a delinear racionalmente e para isso é preciso o tal plano de conjunto com base no tal ordenamento de que os Srs. Deputados falam.
Para mim é muito importante que face à lei que temos e que aqui foi aprovada - e não é a mim que compete defender a Lei n.º 77/77 porque a minha bancada até votou contra ela, mas o que é facto é que essa lei contém o articulado suficiente para ocorrer à resolução de muitos dos casos - nos casos de demarcação de reservas e nos casos das unidades colectivas que ficavam afectadas, e respondo agora à sua primeira objecção, há determinações que podem acudir a isso, o que falta é o tal plano para a atribuição das novas explorações, porque se o direito de reserva é considerado um direito - e, quanto a mim bem, até a própria Lei n.º 77/77 só expropria o remanescente das reservas -, a reserva é aquilo que fica, o que não é expropriado e não há um plano para a sua atribuição. Suponho que esta é uma concepção diferente daquela que é definida na Lei n.º 77/77 porque ela define que só se expropria o remanescente. Assim, nao pode ser como o Partido Comunista propõe, isto é, que a reserva possa ser atribuída a um sujeito do Alentejo em Trás-os-Montes, pois isso é completamente diferente do espírito da Lei n.º 77/77.
Além disso, devo dizer-llie, Sr. Deputado, que nós entendemos que as violações à lei não se resolvem através de novas leis, mas sim por recurso aos tribunais e por isso ficamos atónitos quando vemos todos ou quase todos os grupos parlamentares a apresentarem novos projectos de lei porque a lei está a ser atropelada. Parece-me que este não é um processo correcto.
Se a lei está a ser atropelada, há o recurso aos tribunais, que também são órgão de Soberania, para que a lei seja correctamente aplicada.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Vítor Louro (PCP): - E prende-se o Ministro!

O Orador: - Relativamente às indemnizações, nós estarmos inteiramente de acordo em que tem de haver indeminizações por expropriações, por prejuízos devidos a ocupações e ainda por prejuízos causados pela atribuição de reservas retiradas às unidades que as estavam a explorar. Estamos, pois, de acordo com todos esses tipos de indemnizações e o facto de termos falado só num foi porque só esse vinha à colação neste momento em que se discutem os dois projectos de lei e por isso os outros não foram tratados, embora, repito, estejamos inteiramente de acordo com eles.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Brás Pinto.

Neste momento assumiu a presidência o Sr. vice-presidente, José Vitoriano.

O Sr. Brás Pinto (Indep.): - Sr. Deputado Carvalho Cardoso, no início na sua intervenção disse não concordar com a forma como começou por se processar a Reforma Agrária e estranho que neste momento esteja contra o nosso projecto que prevê um enquadramento num plano de conjunto, porque, efectivamente, o que se tem verificado é uma mudança radical do conceito de reforma agrária.
Enquanto o conceito de reforma agrária expresso na Constituição prevê que esta seja a expropriação dos latifúndios, parece-me que o conceito que se vem desenvolvendo é que ela é a entrega de reservas.
Queria, portanto, perguntar ao Sr. Deputado qual a razão por que não concorda com o nosso projecto, quando ele prevé o enquadramento de um plano de conjunto.
O Sr. Deputado disse ainda que os latifúndios foram substituídos por grandes empresas deficitárias. Estranhamos também que no que se refere a este ponto não aprove o nosso projecto, pois ele prevê que se salvaguarde a viabilidade das cooperativas e UCP's, Assim, queria perguntar-lhe o seguinte: considera ou não que grande parte dessas dificuldades, que, segundo o Sr. Deputado, fizeram substituir os latifúndios por grandes empresas deficitárias, têm como base a efectiva descapitalização em que já se encontravam os latifúndios antes do 25 de Abril, a falta de apoio técnico e económico que foi dado às novas unidades colectivas nascidas na zona da Reforma Agrária, a acção premeditada de inviablização económica das unidades colectivas que tem sido provocada pela deturpação e pelo abuso de poder praticado pelo MAP?
Por último, queria perguntar-lhe o seguinte: o Sr. Deputado Carvalho Cardoso disse que o CDS apresentou um projecto de lei para a suspensão da aplicação da lei da Reforma Agrária e votou até contra a Lei n.º 77/77 porque, entre outras coisas, não estava de acordo com a pontuação que aí se atribuía às reservas. Depois, mais adiante, o Sr. Deputado falou em indemnizações e disse que elas eram absolutamente necessárias para dar largas ao espírito de iniciativa de empresários.
Claro que todos nós sabemos perfeitamente - e eu sei-o pessoalmente porque estou envolvido num processo de entrega de uma reserva no qual o Sr. Deputado também está envolvido,...

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Eu?

O Orador: - ... Simplesmente em pólos contrários porque o Sr. Deputado, como técnico, deu um parecer para a entrega da reserva...

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Não o conheço!

O Sr. Severiano Falcão (PCP): - São tantos que até se esquece deles!

Risos.

O Orador: - Bem, mas a pergunta que eu quero fazer ao Sr. Deputado é a seguinte: se de facto antes do 25 de Abril o Alentejo se encontrava na situação em que se encontrava tio que respeitava aos empresários, com o tal espírito de iniciativa, as indemnizações vão servir a que iniciativas e que empresários? Onde estão os empresários de que falou

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que durante quarenta e oito anos, com leis que protegiam e permitiam uma mão-de-obra extremamente barata e dócil, não tiveram qualquer iniciativa de desenvolvimento? Será que agora vão ser capazes de, em reservas mais pequenas realizar as tais iniciativas que o Sr. Deputado diz que surgirão?

O Sr. Presidente: - Se assim o entender, pode responder, Sr. Deputado Carvalho Cardoso.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Sr. Deputado Brás Pinto, julgo que da minha comunicação se podia deduzir facilmente a razão por que estamos contra o vosso projecto.
No entanto, repito o que disse ontem mesmo num pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Lopes Cardoso: nós concordamos inteiramente com o enquadramento num plano de conjunto com base no ordenamento agrário da Reforma Agrária na zona de intervenção por razões também já ontem aduzidas. Porém, com o que nós não concordamos no vosso projecto de lei é que isso seja agora trazido à colação para suster o processo em curso de aplicação da Lei n.º 77/77, porque se esse plano de conjunto tem sido feito antecipadamente não há dúvida de que a Reforma Agrária tinha tido um êxito muito diferente do que teve - se é que teve algum - sob o ponto de vista económico e social.
Portanto, estamos contra o vosso projecto porque o consideramos fora de tempo, porque o que ele propõe deveria já ter sido feito de início, e não agora numa altura em que, em nossa interpretação - que o Sr. Deputado Lopes Cardoso diz ser abusiva porque é um processo de intenção -, a ser aprovado o projecto de lei, parava todo o processo de entrega de reserva até que o plano de conjunto fosse concluído, o que, no meu entender leva um certo tempo, embora não seja impossível nem inviável, antes pelo contrário, é bem possível e viável.

O Sr. Luís Ramires (CDS): - Muito bem!

O Sr. Brás Pinto (indep.): - Dá-me licença que o interrompa Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Brás Pinto (lndep.): - Queria só perguntar ao Sr. Deputado o seguinte: se de facto o Sr. Deputado e o seu grupo parlamentar concordam com o que está a dizer, porque é que aqui há uns anos o CDS apresentou um projecto de lei para suster a Reforma Agrária com vista a alterar, do fundo, a própria lei? Por que é que nessa altura o CDS não apresentou o tal plano de conjunto que viabilizaria a lei existente?

O Orador: - Sr. Deputado Brás Pinto, parece-me que essa sua pergunta é um bocadinho despropositada. 0 CDS nunca teve um Ministro da Agricultura; o Sr. Deputado e os seus colegas de bancada é que foram Ministro e Secretários de Estado e podiam-no ter feito.
0 problema é este: quando nós apresentámos o projecto de lei a pedir a suspensão, foi porque a Reforma Agrária que estava em curso, baseada nos Decretos-Leis n.ºs 406-A/75 e 407-A/75, não estava sob a égide da Constituição e nós queríamos um projecto de lei de acordo com a Constituição. A lei foi feita e agora respeitamo-la, embora tenhamos votado contra.
Mas, que eu saiba, os partidos não têm gabinetes técnicos tão poderosos e tão disponíveis de elementos que sejam capazes de elaborar os planos que o MAP pode elaborar com os seus serviços, com os seus 13 600 funcionários, com os seus bons especialistas e técnicos e até com a possibilidade de recorrer a especialistas estrangeiros, se fosse caso disso, mas penso que este não seria o caso.

O Sr. Brás Pinto (Indep.): - Dá-me licença, que o interrompa uma vez mais, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor. Mas peço ao Sr. Presidente que estas interrupções sejam tidas em conta.

O Sr. Presidente: - Bom, com pedidos de esclarecimento e respostas podemos levar toda amanhã, portanto apelo para a compreensão dos Srs. Deputados.

O Orador: - Julgo que não devo impedir os meus colegas de me interromperem. porém o Sr. Presidente ordenará o que entender.

O Sr. Presidente: - Claro que o Sr. Deputado Brás Pinto pode interrompê-lo, mas peço-lhe que seja breve.

O Sr. Brás Pinto (Indep): - Serei muito breve, Sr. Presidente.
Queria apenas dizer ao Sr. Deputado que não é necessário ser-se Ministro para apresentar um projecto de lei. Efectivamente, nenhum de nós é Ministro e apresentámos um projecto de lei.
Por outro lado, queria dizer-lhe que não é preciso terem um gabinete técnico para apresentarem esse tal plano, pois bastava que apresentassem um projecto de lei que obrigasse o Governo a fazer o plano, mas os Srs. Deputados nem sequer essa iniciativa tiveram. Além disso, o CDS parece-me que teve um Ministro da Agricultura no "governo sombra".

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Mas que engraçadinho!

O Orador: - Sr. Deputado, como sabe, a existência de
governos sombra" é uma prática comum em todos os países democráticos e não é motivo para ironia nem para chacota.
Além disso, o Sr. Deputado tem até no seu pequeno grupo um ex-Ministro e um ex-Secretário de Estado, o que deve honrar o vosso grupo e não desonrá-lo, isto é, que não deve ser motivo de ironia ou de chacota. Mas, Sr. Deputado, o que me parece motivo de ironia é o Sr. Deputado dizer que qualquer pessoa pode fazer um projecto de lei; pois pode, mas o que me parece difícil é apresentar uma lei exequível e racional e nós nunca apresentaríamos uma lei baseada em coisas balofas!

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Continuando a responder às suas perguntas, o Sr. Deputado disse que na minha intervenção referi que os latifúndios foram substituídos por grandes empresas deficitárias.
Não foi exactamente isso que eu disse, mas, é claro, ouvir uma leitura de um texto é diferente de ler o próprio texto e o Sr. Deputado terá oportunidade de ler o texto quando ele for publicado ou, se preferir, daqui a alguns minutos pois posso emprestar-lho.
De qualquer modo, o que eu disse foi que o latifúndio não foi eliminado e é preciso ver que a definição de latifúndio varia de pessoa para pessoa. Mas, baseando-nos em reconhecidas autoridades da matéria, nomeadamente o Prof. Henrique de Barros, o latifúndio é uma grande exploração mal utilizada e continuar a haver no Alentejo grandes explorações mal utilizadas, logo continuam a haver latifúndios!
É claro que o Sr. Deputado pode dizer que não concorda com esta definição, mas, de qualquer modo, é aquela que eu adopto e estou baseado em bons técnicos e bons autores.
No entanto, o que eu disse foi que as grandes empresas capitalistas que foram eliminadas foram substituídas por grandes empresas deficitárias. E porquê? Porque o deliniamento dessas grandes empresas colectivas não obedeceu a uma racionalidade técnica e cientifica, mas a um acaso, e isso torna-as deficitárias. O Sr. Deputado disse que as em-

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presas estão descapitalizadas, pois também já o estavam anteriormente.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Não é isso, Sr. Deputado. É a política de recuperação capitalista.

Protestos do CDS.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Parecem jograis!...

O Orador: - O Sr. Deputado pode perfeitamente invocar a política de recuperação capitalista, agora o que não pode é delinear empresas que à partida são deficitárias, porque então será todo o povo português que tem de as sustentar, e a verdade é que podemos delineá-las de modo que tenham superavit e racionalidade. 15to é possível, o que e preciso é que haja vontade nesse sentido, e não demagogia política.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Elas até o são!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carvalho Cardoso, chamo a sua atenção para o facto de já ter ultrapassado o seu tempo, pelo que lhe peço que seja rápido na sua exposição.

O Orador: - Sr. Presidente, vou tentar abreviar, mas gostaria de responder às perguntas que os Srs. Deputados me, fizeram. Penso, aliás, que o debate parlamentar deve processar-se assim mesmo.
Com esta interrupção até já me esqueci de algumas perguntas que me colocou, Sr. Deputado Brás Pinto, aliás vou tentar responder-lhes.
Disse o Sr. Deputado que antes do 25 de Abril, no Alentejo só havia más explorações, o que não é verdade. Havia explorações boas e modernas, digamos ao nível das que se encontram no Mercado Comum e havia também más, é evidente, mas nesses casos existiam penalizações. A nossa Reforma Agrária tinha por base fundamentalmente premiar as boas explorações e castigar as más e não dizer, indiscriminadamente, que uma pessoa que tem 70 000 pontos é milionária. O Sr. Deputado Brás Pinto sabe muito bem que 70 000 pontos não chegam para um familia viver.
A nossa argumentação aquando do debate sobre a Lei das Bases Gerais da Reforma Agrária foi a de que a pontuação se devia basear na capacidade de uso do solo e não no cadastro, porque este, como sabe, não teve em conta, nas devidas circunstâncias, a potencialidade do solo. A pontuação foi feita de uma maneira, digamos, arbitrária e é constantemente posta em causa.
Pelo contrário, uma pontuação feita com base na capacidade de uso do solo era possível, embora fosse mais complicada como dizia o Sr. Secretário de Estado de então, Prof. Eng.º Carlos Portas. Mas para tornar racional toda uma transformação do País as coisas tèm de ser muitas vezes complicadas.

O Sr. Brás Pinto (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? É para dar um esclarecimento ou para formular um protesto? È que, se os Srs. Deputados não abreviam as suas considerações, levamos toda a manhã apenas com uma pergunta e uma resposta.

O Sr. Brás Pinto (Indep.): - Sr. Presidente, queria só protestar contra uma afirmação do Sr. Deputado Carvalho Cardoso.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Brás Pinto (Indep.): - Foi aqui dito que uma família não podia viver com 70 000 pontos, e eu queria perguntar se as famílias dos trabalhadores que ficam na outra parte podem, de facto, viver, quando cada uma não fica sequer com 20 000 pontos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Claro que podem, porque essas vivem de ar e vento!...

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos: (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Carvalho Cardoso: Gostaria de lhe fazer algumas perguntas.
Na sua intervenção distingo duas intervenções, uma de carácter técnico e outra de carácter político, e penso que a nível político algumas forças deste país têm procurado lançar alguns chavões, que, à custa de serem repetidos, vão ficando no ouvido daquelas pessoas que de facto não conhecem o sector agrário.
O Sr. Deputado disse, por exemplo, que com a Reforma Agrária se está a verificar uma diminuição da produção e adiantou que os empresários individuais é que poderiam ser os grandes agentes do aumento da produção.
Ora, o Sr. Deputado Carvalho Cardoso sabe que o Produto Agrícola Bruto (PAB) não cresce em Portugal desde l960 e a Reforma Agrária começou apenas a partir de 1974. Aliás, tínhamos já o sector agrário mais atrasado da Europa quando estava totalmente nas mãos dos privados.
lndependentemente desse factor, gostaria que o Sr. Deputado confirmasse se é ou não verdade que o sector agrário está sujeito a factores estranhos não domináveis, como sejam, por exemplo, os factores climáticos, que produzem oscilações no sector agrário, principalmente na área dos cereais praganosos, da ordem dos 300 por cento de produção. 15to é: num ano com um Inverno bastante duro e chuvoso podemos ter uma produção de 200 mil toneladas, mas num ano de Inverno de precipitação média podemos ter cerca de 700 mil toneladas. E esta estimativa é feita independentemente de factores como, por exemplo, o trabalho e o carinho com que se trabalha a exploração.
Gostaria, portanto, de saber se o Sr. Deputado Carvalho Cardoso confirma estes dados que referi sobre a produção agrícola e que foram, aliás, hoje conhecidos. Até porque, como sabe, por exemplo no ano passado, houve uma quebra na produção de vinho da ordem dos 60 por cento, e que me conste não se produz vinho na zona de intervenção. Portanto, foram, de facto, factores estranhos e climáticos que influenciaram a produção.
Uma outra pergunta que lhe queria fazer diz respeito à própria lei. O Sr. Deputado, ali da tribuna, bateu-se pela sua aplicação, dizendo que se devia cumprir e lei, mas o Sr. Deputado Carvalho Cardoso sabe que ela não está a ser cumprida e foi o próprio a defender precisamente algumas teorias de não cumprimento da mesma. Pela Lei n.º 77/77 não podem ser marcadas reservas se a área excedente não estiver expropriada, porque se deve expropriar o excedente simultaneamente com a entrega das reservas. Isto quer dizer que grande parte das entregas de reservas que têm sido feitas são de facto uma ilegalidade porque os proprietários não foram expropriados nos excedentes da reserva.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Campos, informo-o de que já está a falar há quatro minutos, e como o tempo estipulado regimentalmente é de três minutos, peço-lhe que abrevie para não arrastarmos esta discussão por muito tempo.
O Orador: - Sr. Presidente, eu gostaria apenas de dizer mais algumas palavras. É que eu queria que o Sr. Deputado Carvalho Cardoso me dissesse, à frente da Câmara, se dos latifundiários expropriados, que serão à volta de mil e duzentos/mil e quinhentos, havia mais de quarenta ou de cin

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quenta que tinham de facto uma exploração em que todos os recursos disponíveis estavam a ser utilizados.
Gostaria, pois, de saber se pensa que no Alentejo - aliás hoje encontrado pela nossa geração como foi entregue há séculos àqueles latifundiários -, dessas mil e quinhentas explorações, havia, antes do 25 de Abril, mais de cinquenta com grandes alterações nas suas formas de produção ou também nas suas formas de aproveitamento dos recursos disponíveis.
Desejaria colocar ainda uma última questão, esta dirigida ao Sr. Deputado independente Lopes Cardoso. Defende-se um plano de conjunto, mas eu pergunto: sem termos uma definição rápida e urgente de qual é a área expropriada e de qual é a área privada, como é que esse plano pode ser viável? Quanto a nós, essa rapidez é importante e é a partir daí que penso que um plano de conjunto, de viabilização e de ordenamento de toda a zona expropriada deve ser executado. Aliás, o projecto de lei do Partido Socialista apresenta um dos órgãos que faltava para esse planeamento.
Hoje, pela Lei Orgânica do Ministério da Agricultura e Pescas, há um órgão, que é o IGEF, que terá de exercer essa função. Não existia, no entanto, um órgão de financiamento, razão por que no nosso projecto aparece o FIZI, órgão que viabiliza um investimento na zona de intervenção que permitirá conjugar a parte técnica com a parte financeira e levar esse plano de conjunto por diante.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Cardoso para responder, se assim o entender.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de responder, queria dizer ao Sr. Deputado António Campos que cometeu a mesma gralha do semanário Tempo, que publicou há dias a minha fotografia e por cima o nome "Lopes Cardoso", porque me fez perguntas e depois dirigiu-se ao Sr. Deputado Lopes Cardoso. Cometeu a mesma gralha, mas espero que a corrija.

Risos do CDS.

O Sr. Deputado António Campos fez-me três perguntas e uma ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, a que, naturalmente, ele depois responderá. Penso que, na verdade, não era este o momento apropriado para o fazer, motivo pelo qual disse que o Sr. Deputado António Campos tinha cometido a gralha.
O Sr. Deputado António Campos começa por dizer que certas pessoas e partidos têm usado chavões e que não conhecem o sector agrícola. Suponho que essa piada não me deve ter sido dirigida.

O Sr. António Campos (PS): - Não, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado pela confirmação.
Disse também o Sr. Deputado que a dinamização de produção é, sobretudo, devido a factores climáticos. Suponho que o Sr. Deputado e ilustre técnico agrário António Campos conhece estudos feitos por especialistas na matéria que, comparando situações climáticas idênticas em vários anos, demonstram perfeitamente que essas baixas de produção são agravadas pelo facto de se ter semeado menos e de se ter utilizado tecnologia pior. Por consequência, a ilação continua verídica, na medida em que houve uma diminuição real do Produto Agrícola Bruto devido a uma diminuição de área semeada e de utilização de factores de produção.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Oh, Sr. Deputado, parece impossível que ainda se diga isso!

O Sr. Cunha Simões (CDS): - Claro, o que vocês não querem é ouvir as verdades.

O Orador: - Parece impossível? ... Os estudos estão feitos e merecem-nos toda a veracidade porque foram estatisticamente provados, e eu, como trabalho em ciência, acredito nela. Se os senhores não acreditam é convosco...

Protestos do PCP.

O Orador: - Espero que democraticamente me dêem a liberdade de acreditar naqueles estudos, assim como os senhores têm a liberdade de não acreditarem neles.
Agora, o que não podemos é argumentar se não com base em estudos feitos. De outra maneira, é dizer apenas: "eu julgo que..." "eu julgo que..." Todos podemos julgar desde que fundamentados em estudos estatisticamente provados, o que é diferente.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - São estatísticas oficiais, mas não são estudos nenhuns, Sr. Deputado!

O Orador: - As estatísticas oficiais demonstram que agora o PAB tem diminuído. Esteve estagnado durante muitos anos, ou melhor, cresceu à taxa anual média de 0,8 por cento - até sei isto - mas agora tem diminuído.
No entanto, tendo também em conta os factores climáticos, a resultante ainda é abaixo da resultante exclusivamente dos factores climáticos. Era isto que eu queria dizer. O Sr. Deputado diz que não, mas, enfim, os estudos estão feitos.
O Sr. Deputado António Campos perguntou depois, o seguinte: então o CDS bate-se pelo cumprimento da lei? É claro que nos batemos pelo cumprimento da lei, visto que ela foi aqui aprovada - democraticamente terá de ser assim, e o Sr. Deputado sabe isso.
Agora, uma dedução que o Sr. Deputado fez e que não lhe podemos permitir é a de que nós nos batemos pelas Ilegalidades. 0 que dizemos é que as ilegalidades e os atropelos à lei têm um local próprio - os tribunais - para serem tratados.
Portanto, pode crer que não defendemos ilegalidades, Sr. Deputado.
Por último, o Sr. Deputado António Campos perguntou-me, se não estou em erro, se não é verdade que de mil e quinhentas explorações apenas quarenta ou cinquenta latifundiários tinham antes do 25 de Abril capacidade de produção. Ora, Sr. Deputado António Campos, julgo que no Alentejo havia, como ainda há, explorações agrícolas altamente censuráveis sob o ponto de vista de progresso, de tecnologia, de capacidade empresarial, de dedicação. Com certeza que existiam, e é evidente que somos contra elas. No entanto, também houve muito empresário que investiu, que produziu e que criou empresas modernas de nível europeu. Estou a lembrar-me de muitas que têm, inclusivamente, capacidade industrial instalada, como, por exemplo, frigoríficos, e que estavam a exportar para a Europa em condições competitivas com outras empresas.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Então, quais são?

O Orador - Havia de tudo, pelo que não podemos de maneira nenhuma, generalizar a toda a gente coisas que existem em relação a um determinado conjunto de pessoas.
Não generalizemos dizendo que tudo é mau. Por exemplo, o PCP pensa que um senhorio é sempre mau e um rendeiro é sempre bom. Pelo contrário, eu penso que há senhorios bons e senhorios maus e rendeiros bons e rendeiros maus. Os maus precisam de ser penalizados e os bons de uma e outra classe não o podem ser.

Aplausos do CDS.

O Sr. Vitor Louro (PCP): - Oh, Sr. Deputado, nós até pensamos que não há gente má!...

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O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, é evidente que lhe dou a palavra para dar o esclarecimento, mas esta é uma solução um pouco enviesada, porque na verdade o Sr. Deputado António Campos não lhe podia fazer perguntas.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Eu penso que o Sr. Presidente tem toda a razão, visto que a questão que me foi posta pelo Sr. Deputado António Campos foi perfeitamente a despropósito. Tão a despropósito como o meu nome sobre a fotografia do Sr. Deputado Carvalho Cardoso no semanário Tempo, até porque o Sr. Deputado poderia ter-me feito essa pergunta ontem aquando da minha intervenção.

Portanto, se o Sr. Presidente entende que não devo usar agora da palavra, não respondo, até porque não quero, de maneira nenhuma, estar a infringir mais o Regimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, eu disse de início que lhe dava a palavra para dar o esclarecimento, mas peço-lhe que seja muito rápido.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A questão que o Sr. Deputado António Campos me pôs é tanto mais a despropósito porque ela até já me foi feita.
O Sr. Deputado António Campos pergunta-me se é urgente saber o que há para expropriar e o que há para entregar como reservas. Seguramente que é urgente, mas isso tem que ver precisamente com o plano que preconizamos, em que uma das peças-chave é precisamente a de se obrigar a saber o que é que há para expropriar e o que há para entregar como reserva. 0 que é, de facto, curioso é que ainda se não saiba, depois de termos ouvido aqui, daquela tribuna, o Sr. Secretário de Estado Carlos Portas dar uma série de números sobre as áreas a expropriar e sobre aquilo que iria para os trabalhadores, para a iniciativa privada e para os pequenos agricultores.
Aliás, vimos depois o Sr. Ministro Luís Saias reafirmar isso e vimos o Sr. ex-Secretário de Estado Ferreira do Amaral vir-nos dizer que há x mil hectares para expropriar e y para entregar como reservas, mas ao fim e ao cabo, quando se põe o problema, diz-se que não se pode fazer um plano porque não se sabe o que é que se passa. Portanto, o que é preciso é saber aquilo que se passa.
Que fé podemos ter nos números que são dados pelos responsáveis governamentais dessa tribuna, que, quando estão do lado de lá, têm uns números e que, quando passam para este lado, os fazem desaparecer como por milagre?

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Muito bem!

O Orador: - De facto, começo a não perceber onde é que estou e com que linhas me devo coser.

Aplausos do Sr. Deputado Cunha Simões (CDS).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Monteiro de Andrade.

O Sr. Monteiro de Andrade (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A votação da Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária constitui, em nosso entender, uma das importantes deliberações, se não a deliberação mais importante, tomadas pela Assembleia da República.
Isto porque se institucionalizou um mecanismo essencial para a consolidação da democracia e tal resultou de um acordo amplamente maioritário, tendo-se provado nessa altura que mesmo nas questões mais controversas é possível uma base de entendimento quando se visionam sobretudo os interesses nacionais.
Resultou, pois, num instrumento jurídico essencial para a viabilização da democracia e numa mensagem de esperança, pois o entendimento então feito permitia visionar a mobilização de uma grande maioria dos portugueses para um projecto de recuperação económica e social pelo empenhamento das forças políticas que em melhores condições se encontravam para tal tarefa.
Infelizmente, essa mensagem foi efémera, ficando incompleta, e o que de útil ficou pretendem outros agora destruir, pois os seus objectivos e o seu projecto político se diferenciam totalmente do então pretendido.
A Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária, por um lado, constitui efectivamente a reforma possível, dentro dos parâmetros constitucionais da tentativa colectivizadora e, por outro, representa a impossibilidade de voltar ao passado.
Ela permite consolidar alterações nas estruturas fundiárias numa larga zona do território nacional que eliminarão definitivamente os latifúndios individuais ou colectivos; ela permite manter, por um lado, estruturas empresariais privadas, não deixando aniquilar experiências e capacidades, mas cria, por outro lado, a possibilidade de deixar livre terras capazes de aumentar as exíguas dimensões das explorações de pequenos agricultores, de se constituírem cooperativas de produção agrícola e de permitir que a legítima ambição de muitos trabalhadores rurais ou agricultores sem terra venha a concretizar-se, isto é, venham a poder usufruir a terra com que sempre sonharam.
É, pois, um projecto que não pode satisfazer nem aos que defendem a colectivização, nem aos que defendem o direito de propriedade como um direito sagrado.
É útil nesta perspectiva salientar que, numa estranha coligação de esforços, encontramos hoje como resistentes à aplicação da Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária os que apenas pretendem defender privilégios adquiridos em tempo de vivência não democrática, seja antes do 25 de Abril, seja no período revolucionário que se lhe seguiu.
A lei não satisfaz aos que defendem a tese do "quanto pior melhor" na esperança de que o confronto os leve aos bons velhos tempos, nem aos que conseguiram domínios territoriais à revelia da vontade popular.
Não deixa, pois, de ser justo salientar a posição daqueles que, apesar de terem estado contra a Lei de Bases Gerais da Reforma Agrária, hoje reconhecem a necessidade da sua aplicação, não porque tenham mudado de projecto ou de posição, mas porque reconhecem o seu mérito na defesa e consolidação da democracia.

O Sr. Magalhães Mota (Indep.) - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se as minhas palavras iniciais deixam claramente antever que nos oporemos às alterações que modifiquem a filosofia básica da Lei n.º 77/77, não quer dizer que os deputados sociais-democratas independentes não possam aceitar correcções ou complementações que a sua aplicação prática tenha revelado convenientes.
No entanto, nenhum dos diplomas que hoje está em discussão se encontra nestas condições. 0 projecto de lei n.º l41/I não é, como decerto foi afirmado por um dos seus subscritores, uma tentativa de alteração à Lei n.º 77/77, sendo apenas um conjunto de normas regulamentadoras da sua aplicação.
0 projecto de lei n.º l58/I, através do seu articulado, pretende modificar, na sua essência, o equilíbrio conseguido com a Lei da Reforma Agrária, modificando-lhe totalmente o espírito.
Analisemos, pois, no que para nós é essencial para decidir sobre a nossa posição, cada um dos projectos de lei em causa.
0 projecto de lei n.º 14l/I defende no fundamental que a aplicação da Lei n.º 77/77 seja feita de acordo com um

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plano de conjunto tendo em vista o reordenamento agrícola global da zona de intervenção e que as expropriações, atribuições de reservas e devoluções de propriedades se efectuem concomitantemente.
Se aceitamos a tese da necessidade de um plano global de aplicação de Lei da Reforma Agrária, como de resto já por
diversas vezes tivemos ocasião de reclamar nesta Câmara, não poderemos aceitar a tese de que todas as acções sejam simultâneas. 0 que resultaria se tal tese vingasse era que se paralisaria desde logo totalmente a aplicação da lei. Isto porque, de acordo com o artigo 44.º da Lei n.º 77/77, a expropriação exige a declaração de utilidade pública e esta é obrigatoriamente precedida da demarcação de reserva, e como para a demarcação de reserva é necessária a elaboração de processos, sempre demorada, aconteceria que até à fase em que o Ministério tivesse concluído este complexo trabalho decorreria um largo período de tempo no qual não se entregariam sem reservas, sem propriedades já expropriadas (e, pela mesma razão, a expropriação continuava sem efeito legal), nem se entregavam propriedades ocupadas não expropriáveis, mantendo-se assim uma situação de ilegalidade.
Tal perspectiva é para nós inaceitável.
Deveremos, no entanto, para que não restem dúvidas, definir mais uma vez a nossa posição face às expropriações previstas na lei.
Ao votarmos a Lei n.º 77/77 tínhamos bem consciência de todas as suas consequências e por isso não nos oporemos à efectivação de novas expropriações. Exigimos, porém, que elas se façam de acordo com a lei, ou seja, o que legaliza a expropriação é a declaração de utilidade pública e o pagamento das indemnizações devidas.
Nesta perspectiva, falta ainda legalizar muitas das expropriações feitas, pois estas implicam demarcações de reserva, o que não está feito, e é por aí que se deverá começar. Ou seja: o que defendemos é que antes de se caminhar para novas expropriações há que entregar todas as propriedades ocupadas, que não expropriáveis, e proceder à entrega de reservas em todas as propriedades expropriadas.
Paralelamente, deverão ser celebrados os contratos de entrega de terras para exploração viabilizando as empresas e accionando os mecanismos já criados ou a criar.
Passando a analisar o diploma n.º l58/I, apresentado pelo Partido Comunista Português, começarei por referir que as consequências da sua aprovação se poderiam resumir, em nosso entender, muito simplesmente, nestes quatro parâmetros: manutenção das gigantescas UCP com características latifundiárias; travagem se não paralisação no processo de entrega de reservas; inviabilização da entrega de terras para exploração a pequenos agricultores, a agricultores sem terra ou a trabalhadores rurais; e acréscimo de privilégios para as empresas explorantes das terras ocupadas.

Vozes dos Deputados Independentes Sociais-Democratas: - Muito bem!

O Orador: - Como demonstração do que acabamos de referir apontaremos alguns princípios que o projecto do PCP avança.
Ao referir que a empresa agrícola explorante afectada pela demarcação de reserva tem direito à preferência da área equivalente de terra expropriada ou a expropriar, facilmente se conclui que se pretende manter as enormes áreas de que desfrutam estas empresas. Estamos frontalmente contra esta perspectiva, pois entendemos que as cooperativas beneficiárias da Reforma Agrária não deverão ter uma excessiva área, nem um excessivo número de associados, que necessariamente estão relacionados com esta, já que somos contra a proletarização do homem rural e sim pelas sua promoção a agricultor interessado na gestão e trabalho da sua empresa.

Vozes dos Deputados Independentes Sociais-Democratas: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o gigantismo das empresas é sempre um risco para a concorrência, princípio que defendemos, e também um risco para um Estado onde se pretende que o poder económico esteja subordinado ao poder político.
Este mesmo preceito reduziria substancialmente a terra disponível para entrega a outros beneficiários, e nós entendemos que se deve privilegiar a criação de empresas agrícolas familiares, de acordo com o que sempre temos defendido, pois consideramos ser a forma mais correcta de organização da empresa agrícola.

Vozes dos Deputados Independentes Sociais-Democratas: - Muito bem!

O Orador: - A inviabilização da entrega de reservas seria sem dúvida uma outra consequência, no caso da aprovação do projecto de lei.
Quando se afirma que a empresa agrícola explorante afectada pela demarcação de reserva tem direito a manter a exploração da área de reserva até à colheita de frutos pendentes está-se efectivamente a restringir de tal forma no tempo o período possível para a transferência da posse que se iria adiando o enorme número de acções deste tipo a fazer.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): Muito bem!

O Orador: - Deveremos salientar que a Lei n.º 77/77, no seu artigo 42.º,dá o direito aos frutos pendentes à entidade explorante.
Quando se afirma que se o reservatório não iniciar a exploração nos sessenta dias após a entrega da reserva a empresa agrícola explorante tem o direito ao arrendamento da área de reserva, está-se não apenas a criar uma fonte nova de conflitos como a permitir que, em muitos casos, o reservatório Não possa assumir-se como empresário agrícola: o prazo de sessenta dias é suficientemente curto para permitir que tal aconteça.
Todos sabemos que a maior parte dos reservatórios estão numa situação de descapitalização, sem máquinas ou recebendo-as em estado lastimável e todos sabemos também que não se semeia trigo em Julho ou tomate em Janeiro.
Quando no artigo 3.º se afirma que não haverá atribuições de reserva sempre que se verifiquem os pressupostos definidos nos artigos 87.º e 88.º da Constituição. está-se novamente a lançar o espantalho do abandono ou de mau uso e da sabotagem económica sem que se definam estes conceitos.

Vozes dos Deputados Independentes Sociais-Democratas: - Muito bem!

O Orador: - A Lei n.º 77/77 determina como fundamento para a atribuição da reserva a exploração directa do titular, logo o aproveitamento dos meios de produção. A lei determina também que ficam sujeitos a expropriação ou arrendamento compulsivo os prédios abandonados ou que não alcancem níveis mínimos de aproveitamento, definindo essas condições no seu artigo 39.º
Por último, nesta apreciação ao projecto de lei n.º 158/I apontemos o aspecto que se refere à prévia indemnização das benfeitorias que a empresa explorante afectada por demarcação de reserva pretenderia com a alínea a) do artigo 1.º.
Ao deixar de se fazer distinção entre as benfeitorias necessárias e úteis e as benfeitorias voluptuárias, sujeita-se o erário público ao pagamento de qualquer tipo de empreendimento realizado sem um mínimo de controle e sem que os projectos fossem apreciados ou acompanhados.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Foram os trabalhadores que fizeram as piscinas nas herdades? Foram os trabalhadores que compraram os Mercedes? Vejam lá!...

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O Orador: - E mais: criar-se-ia um precedente em que as explorações que estão ainda em áreas ocupadas ou em terras expropriadas fizessem indiscriminadamente benfeitorias para evitar que o Estado tivesse dinheiro para as indemnizações, evitando a entrega de terras para exploração.

Aplausos dos Deputados Independentes Sociais-Democratas e do CDS.

Concordamos com a atribuição de indemnizações pelas benfeitorias úteis e necessárias realizadas na área de reserva demarcada. devendo, porém, o montante da indemnização ser afectado ao pagamento das dividas ao Estado, nomeadamente dos provenientes do Crédito Agrícola de Emergência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio ter deixado bem claro as razões que nos levarão, a nós, Deputados sociais-democratas independentes, a votar contrariamente aos dois projectos de lei em discussão. Estamos convictos de que a aplicação de Lei n. 77/77 é um imperativo nacional e que a esmagadora maioria dos democratas a defendem. Se há agitação e instabilidade por causa da aplicação desta lei ela deve-se exclusivamente ao facto do não acatamento por parte de alguns das leis votadas na Assembleia de República. Porém, num Estado de direito, as leis são para se cumprir.

Aplausos dos Deputados Independentes Sociais-Democratas e do CDS.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Oh, Sr. Deputado, e consegue dizer isso sem se rir?

Neste momento, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Teófilo Carvalho dos Santos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros, para uma intervenção.

O Sr. Acácio Barreiros (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passado um período de tempo muito exagerado em relação à sua apresentação, finalmente estamos a discutir neste Plenário os projectos de lei apresentados pelos Srs. Deputados Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues, e um outro pelo PCP.
E se passado tantos meses ainda podemos aqui discutir uma coisa que existe, a Reforma Agrária, não é com certeza por vontades dos dois Governos do general Eanes, mas sim devido à resistência heróica dos trabalhadores alentejanos.
Por vontade dos Governos de Nobre da Costa e de Mota Pinto, por vontade da reaccionária equipa do Sr. Ministro Vaz Portugal, por vontade do monárquico Ferreira do Amaral, a discussão de hoje já não valeria de nada, pois o Alenteio e o Ribatejo seriam de novo terras de fome e de miséria, servindo apenas para engordar meia dúzia de senhores.
E não se pode dizer que não se tenham esforçado por, em poucos meses, destruir tudo o que com tanto sacrifício, com tanta determinação e mesmo com tanto amor, os trabalhadores vêm erguendo dia a dia sol a sol.
Embora lamentando-se sempre da falta de dinheiro, não se importam de gastar 2000 contos diários a manter uma gigantesca força repressiva, cortam os créditos sabotando a produção, cometem todas as espécies de arbitrariedades e violências.
A história desta equipa do MAP é, de facto, um amontoado de irregularidades, de compadrios, de violências gratuitas e até de mentiras descaradas. E a maior das mentiras é este Ministério dizer que tem um plano de desenvolvimento agrícola, porque se formos a ver bem esse plano resume-se a roubar aos trabalhadores 400 000 ha de terras até 1980. Não, meus senhores, este Ministério não tem qualquer plano agrícola, não tem qualquer política de Crédito que não seja o compadrio, não tem qualquer plano de deseiivolvimento de culturas e de apoio a quem trabalha. Nada disso, meus senhores. Este Ministério, se algum plano tem, é um plano de ocupação militar pelas forças repressivas da GNR das cooperativas e UCPs.
Na verdade, este não é propriamente um Ministério da Agricultura, mas antes se parece mais com um comando-geral da GNR. Os latifundiários pedem terras à vontade para eles e para a família, ultrapassando escandalosamente os próprios limites da lei, e o Ministério dá ordens à GNR para ir entregar-lhes o que pediram.
A sua política não é a enxada, os tractores, as sementeiras; a sua política são os cassetetes, as baionetas, os Shortlands e os cães-polícias. 0 seu objectivo não é a produção mas simplesmente a repressão.
Essa é a história de um Ministério que, chamando-se da Agricultura, mais certo era chamar-lhe da repressão. Essa também é a história da aplicação de uma lei criminosa, a chamada Lei Barreto. Também ela se chama pomposamente bases gerais da Reforma Agrária e mais certo estaria chamar-lhe lei das reservas. Na verdade, a UDP, que na altura do debate das bases gerais da Reforma Agrária, apresentou a única proposta alternativa, logo na altura denunciou que a Lei Barreto era uma lei que dedica um terço dos seus artigos à questão de reservas, e essa questão é a única de que verdadeiramente trata. Todos os outros assuntos são vagos e não têm qualquer importância na lei.

Assim, a Lei Barreto é uma lei reaccionária não apenas por dar terras aos latifundiários, mas também por toda a lei se resumir e isso mesmo. E se, na verdade, nenhuma pessoa séria poderá negar que a Reforma Agrária é a primeira grande nova realidade no terreno da agricultura depois do 25 de Abril, destruí-la conduziria, pura e simplesmente, o Portugal agrícola para a situação de antes do 25 de Abril.

Ao contrário, para nós, e como deixámos claro na nossa proposta de bases gerais da Reforma Agrária, uma política agrícola verdadeiramente inovadora e de acordo com os princípios constitucionais, teria de ter como um dos seus pilares fundamentais, esse gigantesco esforço dos trabalhadores alentejanos e ribatejanos, apoiando-o e incentivando-o. Opusemo-nos e continuamos a opor-nos às entregas de quaisquer reservas aos latifundiários, não apenas porque isso contraria a Constituição, mas sobretudo porque é um retrocesso em relação a uma obra de profundo significado como é a Reforma Agrária. Os latifundiários não têm direito à terra. Eles tiveram todo o Alentejo e Ribatejo nas mãos durante anos e anos e fizeram dessas terras terras de fome, de miséria e desemprego, foram um dos principais sustentáculos do fascismo e levaram o País à situação de ir comprar ao estrangeiro o pão que poderia produzir cá dentro.
Aliás, os próprios trabalhadores alentejanos, que numa primeira fase através do diálogo procuraram mostrar as suas razões, cedo verificaram que perante uma tal lei a única posição é exigir a sua revogação.
Perante o ataque reaccionário às cooperativas e UCPs, os trabalhadores através dos plenários e no terreno mostram a sua vontade inabalável de não abandonarem as suas terras, máquinas e gado, tendo feito ouvir claramente a sua ideia: não ceder!
Pela primeira vez no Alentejo houve resistência generalizada e cada local de luta não ficou isolado. Reocupando as herdades depois de a GNR abandonar o local de reserva, os trabalhadores têm conseguido paralisar as forças repressivas, impedindo que o plano ilegal seja efectivamente aplicado.
Aqui saudamos essa resistência heróica, feita de muita coragem, privações e sofrimentos.
No momento actual, as grandes lutas dos trabalhadores da Reforma Agrária e de todo o povo parte de uma ideia bem clara: a defesa da Reforma Agrária exige a demissão deste Governo e a definição de uma nova política. Não há diálogo possível com um governo cuja linguagem é o ódio e

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a repressão. E é à luz dessa luta que devemos analisar as duas propostas presentes.
Quanto ao projecto de lei n.º 14l/I dos Srs. Deputados independentes, ele merece o nosso apoio por dois motivos fundamentais. Primeiro, porque a sua aprovação permitiria terminar de imediato com a acção criminosa do MAP na zona de intervenção. Segundo, porque a elaboração de um plano de conjunto para a aplicação da lei permitiria que o País tivesse a ideia clara de como ficaria o Alentejo e o Ribatejo após a aplicação total da lei Barreto. Estamos seguros de que diante desse plano global surgiria claro a toda a gente que a aplicação da lei não permite resolver quaisquer problemas da agricultura, antes resultaria numa situação desastrosa a que, naturalmente, todo o povo se oporia. Assim, a apresentação desse plano global acabaria com a demagogia com que se tem procurado encobrir os crimes do MAP na zona de intervenção, falando de um futuro que muita gente não sabe o que é.
Entendamo-nos, pois! Nós somos contra a aplicação da Lei Barreto e se votamos a favor do projecto dos Srs. Deputados independentes é por considerarmos que a existência de um plano global será a melhor condenação dessa lei por mostrar ao que a sua aplicação global conduz.
Mas também é preciso dizer que aqueles que são a favor da lei por honestamente considerarem que ela melhorará a situação não podem opor-se ao projecto dos Srs. Deputados independentes, pois se tiverem razão então poderão prová-lo, apresentando ao País um plano global de aplicação da lei que mostre que ela conduzirá a nossa agricultura a uma situação melhor.
Quanto ao projecto de lei n.º 158/I do PCP, é inegável que ele procura eliminar alguns aspectos mais aberrantes da Lei Barreto. Simplesmente, nós duvidamos que a sua aprovação conduza a uma melhoria real da situação e, em particular, ponha cobro a uma política de violência e repressão. 0 próprio Sr. Deputado Lino Lima afirmou que sem a revogação da Lei Barreto, a situação não melhoria. Nós somos contra a entrega de reservas, porque não reconhecemos, nem sequer do ponto de vista moral, o direito de reserva. Mas, mesmo do ponto de vista técnico já afirmámos várias vezes que esse direito de reserva conduz a resultados ruinosos a que o nosso país não se pode permitir.
Neste sentido, eu perguntaria ao PCP se estaria disposto a aceitar propostas de aditamento no sentido de, em primeiro lugar, suspender entregas de reservas, limitando as desocupações àqueles casos onde tenham ocorrido ocupações de herdades de pontuação inferior a 50 000 pontos, caso existam.
Em segundo lugar desejaria saber se o PCP está disposto a aderir à filosofia do projecto dos deputados independentes, integrando-o no seu projecto, isto é, fazendo depender a continuação das desocupações num plano global.
Da resposta do PCP a estas questões para a discussão na especialidade dependerá do nosso voto favorável ao seu projecto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como afirmámos há dois anos, é sobretudo no Alentejo e Ribatejo, na força dos trabalhadores, que se decidirá a sorte da Lei Barreto, de cuja derrota depende a Reforma Agrária e o próprio 25 de Abril. Aliás, essa batalha contra a Lei Barreto é uma batalha dos nossos dias.
A determinação, a coragem com que os trabalhadores rurais se têm batido, as greves gerais já realizadas, a solidariedade a nível nacional desencadeada, mostram que há forças para derrotar a Lei Barreto.

A UDP mantém as suas propostas de luta: não assinar as reserv.as sob qualquer pretexto pedidas pelo MAP; cooperativa e UCP atacada não pode ficar isolada. Solidariedade activa das outras cooperativas e UCPs em redor, como hoje já é uma realidade generalizada a todo o Alentejo; reocupar as herdades atacadas pela GNR logo que esta as abandone, - como há numerosos exemplos e ainda o recente caso das Quebradas; avanço para nova grande jornada de luta exigindo a demissão do Governo e levantando as exigências imediatas que a UDP entende como adequadas à situação actual. 15to é:
1.º Saída da GNR das herdades;
2.º Não à entrega de reservas;
3.º Suspensão da aplicação da Lei Barreto no que diz respeito à entrega de reservas, enquadrada na luta pela revogação total desta lei;
4.º Apoio económico do Governo à Reforma Agrária, lutando por crédito de emergência a juro, de 4,5 % no prazo de cinco anos, para além das restantes reivindicações económicas das UCPs e cooperativas como sejam crédito a médio e a longo prazo, o dinheiro das cortiças, as indemnizações das sementes, etc.
É, pois, em nome desses objectivos e da luta determinada, que hoje é uma realidade no Alentejo e Ribateto, que determinaremos o nosso voto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei de Bases em vigor já ninguém contesta que é, de facto e na prática, uma lei de reservas.
Todavia, o País não dispõe de um relatório oficial sério sobre a entrega de reservas. A única coisa de que se dispõe são vergonhosas notas oficiosas, em que cada novo Secretário de Estado pretende demonstrar que é pior do que o anterior. Um Ministério tão pródigo na sua propaganda e que, no entanto, actua sob tanta acusação fundamentada e tanta crítica séria tinha obrigação de informar o País em pormenor sobre como se tem desenrolado o processo de entrega de terras aos agrários. Evidentemente, o MAP não o faz.
Mas os trabalhadores das UCP/cooperativas, esses, sim, têm apresentado publicamente, e em especial aos órgãos de soberania, relatórios objectivos, sucessivamente actualizados, sobre a evolução das consequências da aplicação da Lei Barreto.
0 projecto de lei apresentado pelo PCP resulta da apreciação cuidada e desapaixonada das principais formas de ataque desencadeadas contra a Reforma Agrária e as UCP/cooperativas à sombra da Lei Barreto e enquadra-se na perspectiva de não ser possível ainda, das presentes condições políticas, operar a sua revogação e substituição por uma verdadeira lei da Reforma Agrária.
Pode constatar-se que as principais fontes legais de destruição das UCP/cooperativas e da reconstituição dos latifúndios derivam das portas que a lei abre ao seguinte:
1.º As reservas têm levado as melhores terras das UCP/cooperativas: só durante os dois primeiros governos, de 64 000 ha que lhes foram retirados, 4000 ha eram de regadio e 58 000 ha de sequeiro fértil;
2.º As reservas têm sido insistentemente localizadas em áreas abandonadas pelos agrários e recuperadas para a produção pelos trabalhadores em áreas onde estes construíram instalações, barragens, etc., e fizeram outros investimentos;
3.º Aproveitando-se da formulação da lei, propositadamente insuficiente, têm recebido reservas separadas indivíduos que nunca poderiam ser tratados senão em conjunto;
4.º 0 mau uso do poder discricionário que a lei atribui ao Ministro tem-lhe permitido atribuir espantosas majorações, não tratar unitariamente os contitulares do direito de reserva, aplicar retroactivamente a Lei Barreto a reservas já demarcadas para as aumentar e tripudiar sobre outras disposições.
0 projecto de lei do PCP atém-se às alterações necessárias da Lei Barreto nestes pontos que se têm revelado as principais fontes de desrespeito dos preceitos constitucionais e que têm legalmente permitido a progressiva reconstituição dos domínios de diversos latifundiários e o ataque às UC-

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P/cooperativas, com a destruição já de 33 e a inviabilização de muitas outras.
A liquidação das explorações colectivas e a reconstituição ou manutenção dos latifúndios, bem como a criação de condições para a normal exploração das terras expropriadas, estão na base das preocupações que enformam o nosso projecto de lei.
Não é de mais reafirmar que com este projecto não pretende o PCP revogar a Lei Barreto, mas tão-só alterar aqueles aspectos que mais gravosos se têm mostrado na sua aplicação. Repare-se, pois, que este projecto de lei não traduz a nossa concepção de reforma agrária, mas apenas se limita a corrigir disposições da própria lei em vigor.
0 Partido Socialista fez ontem nesta Assembleia uma importante declaração política. Nela reconheceu finalmente que a Lei Barreto tem de ser alterada.
Através dessa declaração política o PS revelou preocupações nas áreas daquelas que nos levaram a apresentar o nosso próprio projecto. As soluções adoptadas pelo PS não serão as mais satisfatórias e algumas não serão positivas. Julgamos, no entanto, que, apesar das grandes diferenças entre os dois projectos, existem entre eles suficientes pontos de aproximação que permitem no debate alcançar consenso em relação a diversos aspectos importantes para a defesa da Reforma Agrária.
0 PS reconheceu igualmente que, a persistir a acção do Governo, ela liquidaria completamente a Reforma Agrária. A apresentação tardia do projecto de lei do PS em relação ao debate que hoje se trava não pode servir de argumento para deixar protelar a situação que o PS diz recriminar. Por isso mesmo, concretamente com as afirmações aqui produzidas pelo PS contra o Ministério da Agricultura e Pescas, é de esperar que vote favoravelmente o nosso projecto de lei, a fim de rapidamente serem adoptadas pela Assembleia as alterações da Lei Barreto que um e outro se propõem.
Esta ideia resulta reforçada pela intervenção hoje feita em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que encontrou razão de critica em relação a um só artigo dos dez que constituem o nosso projecto de lei, o que significa que em relação aos outros nove décimos está de acordo.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: No nosso projecto de lei cuidamos, isso sim, de definir claramente os direitos das UCP/cooperativas afectadas por reservas, no estrito sentido de defender os investimentos e as despesas por elas efectuados e de tornar obrigatório e garantir o respectivo cumprimento daquilo que na Lei Barreto está como mera faculdade dependente do querer Ministro.

Repare-se, mais uma vez, que não se põe em causa o princípio das reservas. Simplesmente, tem-se em conta que a entrega de reservas tal como vem a ser feita, é a causa principal da destruição das UCP/cooperativas, que ficam sem terras e outros meios de produção, perdem os seus próprios investimentos e as suas searas, sem que nem o Governo accione os necessários mecanismos para a intensificação cultural na área da cooperativa, nem sequer os reservatários paguem as despesas já feitas nas culturas e os investimentos realizados pelos trabalhadores, que passam para as mãos dos agrários.

Espero que o Sr. Deputado Monteiro de Andrade e os seus colegas compreendam que uma coisa é o que ele disse e outra coisa bem diferente é o que está a ser feito. É inadmissível que os agrários levem de mão beijada aquilo que foi pago exclusivamente pelos trabalhadores.
Bem se compreende que não é possível sobreviver em tais condições e que é ridículo e vergonhoso que o MAP, que assim procede, se atreva a acusar os trabalhadores pela não autorização de créditos recebidos ou pelos magros resultados financeiros obtidos. Esta afirmação que aqui fazemos em relação ao MAP estendemo-la, neste momento, aos Deputados do CDS, do PSD e aos independentes sociais-democratas. É nesta perspectiva que nós propomos condicionar a entrega das reservas à satisfação destas obrigações elementares para com as UCP/cooperativas afectadas.
Por outro lado, pretendemos clarificar aquilo que, estando embora subjacente aos dispositivos da lei, por ser princípio constitucional, acabou por ser desvirtuado no seu texto.
É nesta perspectiva que propomos, para cumprimento da Constituição e por acto de justiça, que não sejam atribuíveis reservas àqueles que são responsáveis pela manutenção de terras abandonadas. E reconduzidos a propósito que esse facto do abandono de dezenas de milhares de hectares não é um espantalho, como lhe chamou o Sr. Deputado Monteiro de Andrade, mas, pelo contrário, caracteriza as últimas décadas do fascismo e é responsável pela fuga de milhares de trabalhadores dos campos e pelo drástico endividamento externo do País, causado pela quebra da produção agrícola. Não se pode, pois, permitir que esses que dominaram o povo português pela fome venham agora ser considerados empresários normais, com direito a majorações e tudo. E é preciso tomar medidas urgentes a este respeito, porquanto esta tem sido uma das vias para retirar ilegitimamente terras às UCP/cooperativas e para deixar meios terra disponível para os pequenos agricultores.

A experiência tem também demonstrado dramaticamente a deficiente formulação da lei sobre a expropriação das máquinas, dos gados e dos outros meios de produção ligados aos latifúndios. Por via dessa disposição, têm sido sacados às UCP/cooperativas meios de produção fundamentais para a sua sobrevivência e normal funcionamento, meios de produção esses que, passados para as mãos dos agrários, em muitos casos logo são vendidos ao desbarato, ou ficam simplesmente imobilizados. É por essa via que o Governo tem assaltado o parque de máquinas das UCP/cooperativas e os seus efectivos pecuários. É por essa via que o Governo tem teimado deitar por terra o sábio esforço dos trabalhadores no sentido da transformação da miserável exploração latifundista da terra numa exploração intensiva e rica, adaptada às condições climatéricas e às características dos solos e adaptada às necessidades alimentares do nosso povo. Importa, pois, estancar com urgência esta depredação dos efectivos e dos outros meios de produção.
0 nosso projecto de lei encara ainda uma outra questão que tem assumido uma enorme gravidade e que só a alta de vontade política não tem permitido que se resolva. Ela decorre do facto de os documentos dos tractores e outras máquinas e viaturas estarem muitas vezes nas mãos dos agrários, pelo que as UCP/cooperativas, que legitimamente as utilizam, ficam sujeitas a multa. E sucede que, significamente, desde há muito as forças competentes se empenham numa fiscalização impressionantemente atenta, castigando as UCP/cooperativas com multas sucessivas e sujeitando-as a grandes transtornos na organização do trabalho por uma falta que é da exclusiva responsabilidade do Estado.
0 projecto de lei dos Deputados independentes é, em nosso entender, positivo, embora contenha importantes defeitos e insuficiências.
Na realidade, o projecto não visa tocar na Lei Barreto, isto é, parece aceitar que, desde que a entrega de reservas se fizesse concomitantemente com as expropriações, não resultaria grande mal para a Reforma Agrária. Ora o debate mostrou claramente que até mesmo os patrocinadores da lei reconhecem a necessidade de a alterar.
Acresce que, assentando o projecto na ideia base de um plano global de reordenamento agrícola na zona de intervenção, ou se definem os traços essenciais desse plano, ou então os senhores do MAP podem sempre elaborar um qualquer plano bem a seu modo e ficar tudo na mesma.
E, contudo, positivo, porque estabelecendo o princípio da concomitância das atribuições de reservas com o prosseguimento das expropriações, aponta para a liquidação dos latifúndios. Além disso, tem a justa preocupação de assegu-

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rar a Viabilidade económica das UCP/cooperativas, muito embora não defina os meios ou os terMos pr que isso se processe.
Sr. Presidente Srs. Deputados: Com as posições assumidas por diversas forças políticas nesta Assembleia, aliás, no seguimento das poderosas acções do movimento popular de massas e da corajosa luta dos trabalhadores da Reforma Agrária, a partir de agora a Lei Barreto está ferida de morte. A luta continua!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para prestar um esclarecimento ao Sr. Deputado Vítor Louro.
Não vejo como é que o Sr. Deputado pode afirmar que o nosso projecto parece aceitar a Lei Barreto - e chamo-lhe Lei Barreto porque entrou no uso e costume como algo de perfeitamente aceitável -, na medida em que, se ler o preâmbulo do nosso projecto, está claramente dito que entendemos que a Lei Barreto deve ser pura e simplesmente revogada.
Contudo, não posso deixar de me congratular simultaneamente por, apesar disso, o nosso projecto ser considerado positivo, e devo dizer que, embora se saiba desde já qual será o destino dele, nós, Deputados independentes, congratulamo-nos pela nossa iniciativa. Temos, pois, consciência de que foi a nossa iniciativa que levou a que outros tomassem iniciativas semelhantes, que levou à apresentação do projecto do PCP e que levou agora à apresentação do projecto do Partido Socialista. e se outra virtude não teve, esta virtude, só por si, aos nossos olhos, justifica-o plenamente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mais alguém deseja usar da palavra sobre este assunto?

Pausa.

Visto não haver mais Srs. Deputados inscritos, vamos votar estes dois projectos, começando pelo projecto de lei n.º 141/I, da autoria dos Srs. Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do
PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e com votos a favor do PCP, da UDP e dos Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à votação do projecto de lei n.º 158/I

Submetido à votação, foi rejeitado, com os votos contra do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e com votos a favor do PCP e dos Deputados independentes Lopes Cardoso. Brás Pinto e Vital Rodrigues e com a abstenção da UDP.

O Sr. Presidente: Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Laje.

O Sr. Carlos Laje (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está feito o retrato das arbitrariedades e prepotências que o Governo tem cometido na aplicação da Lei n.º 77/77.
Está também feito por nós o estudo crítico que nos permite assinalar nessa lei quais os dispositivos que devem ser alterados, a fim de a lei nas suas linhas de base, poder ser cumprida sem que essas arbitrariedades, sem que essa acção contra a própria Reforma Agrária possa ser feita invocando a lei.

Temos ainda que assinalar que há um vasto consenso quanto à necessidade de alterar alguns dispositivos da Lei
n.º 77/77. Só que essa concepção de alterar os dispositivos é variável de partido para partido; há aqueles que têm uma visão contrária à Lei n.º 77/77, e as suas alterações visariam também pôr em causa a lei, alterar o fundo da própria lei, e há aqueles que, tal como nós, e parece-nos ter percebido isso nos Deputados sociais-democratas independentes, entendem que a lei deve ser corrigida naquilo em que se inspira a acção do Governo para a contrariar e deve ser mantida nas suas linhas fundamentais.
Não nos intimida, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o ataque que as forças conservadoras fazem à posição do Partido Socialista relativamente à Reforma Agrária. Nós somos defensores da Reforma Agrária ... .

A Sr.ª Hermenegilda Pereira (PCP): - Vê-se!

O Orador: - ...Somos contra o latifúndio, somos pela constituição de cooperativas na zona de terra expropriada, somos pelo desenvolvimento da agricultura, temos uma concepção de esquerda e progressista da Reforma Agrária. Não estamos de acordo com a concepção que inspira a acção e a prática do Partido Comunista Português e isso aceitamos que as forças conservadoras pretendam confundir a nossa posição com a posição do Partido Comunista Português.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Possuímos um projecto autónomo, e e esse projecto que está em parte contido nesta Lei n.º 77/77 e
que agora se explicita no projecto de lei que apresentamos ontem e que será discutido no próximo dia 6 de Junho por
esta Assembleia.
Nesse sentido, rejeitamos o projecto de lei n.º 158/I apresentado pelo Partido Comunista Português, porque as alterações por ele propostas se inspiram numa concepção contrária à Lei n.º 77/77 e, além disso, alguns desses dispositivos são manifestamente inaceitáveis. No entanto, o Partido Comunista Português partilha connosco de algumas preocupações de corrigir alguns dispositivos que consideramos deverem ser modificados na própria lei.
Somos também contra o projecto de lei n.º 141/I, apresentado pelos Deputados independentes Lopes Cardoso, Brás Pinto e Vital Rodrigues, porque se fala nesse projecto apenas num plano. Plano esse que, sendo eleito pelo Governo no exercício da sua competência administrativa, tratar-se-ia apenas de um acto do Governo, que dependeria da sua exclusiva vontade, modificável a qualquer momento.
Mas se se pretendesse transformar este plano em lei, tratar-se-ia então de então de uma nova lei que os Deputados independentes, justamente no preâmbulo do projecto de lei por eles apresentado, consideram um processo rigoroso e complexo.
Este projecto não enfrenta a questão de fundo, que é a tipificação do reservatário, a redução dos poderes discricionários do Ministro para se tornar evidente qual a área expropriável e a forma de entrega de reservas. Sendo assim, como este projecto não aborda a questão de alterar aquilo que consideramos que deve ser alterado na Lei n.º 77/77, rejeitámos também o projecto de lei em causa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Consideramos que o epílogo deste debate, hoje iniciado, terá lugar no próximo dia 6 de Junho, com a discussão na generalidade do nosso projecto de lei e ainda antes do dia 15 do mesmo mês - o
fecho da sessão legislativa - na especialidade porque entendemos que é urgente., que é imperioso que a lei seja modificada a fim de que na zona de intervenção da Reforma Agrária possa haver pacificação social, para que a Lei de
Bases da Reforma Agrária possa ser um quadro legal que consolide a Reforma Agrária e que permita o desenvolvimento da produção no Alentejo e para que a Reforma

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Agrária, tal como a entenderam sempre os democratas e aqueles que se bateram contra o latifúndio, tenha um carácter não só socialista como também democrático e uma visão dinâmica de desenvolvimento económico.
Que fique claro que nós não concordamos, como ja o temos dito, com a acção que vem sendo desenvolvida pelo actual Governo, que pretendemos modificar aquilo que objectivamente entendemos que deve ser modificado e que, assim, com a nossa acção decisiva, pensamos que a lei pode ser corrigida, que a Reforma Agrária pode ser consolidada e que essa grande conquista dos trabalhadores rurais, essa grande conquista da Revolução portuguesa, há-de perdurar, e não ser destruída, como pretendem as forças de direita, que fazem a invocação de uma lei que atraiçoam, de uma lei que distorcem, de uma lei que apenas aplicam parcialmente nos seus dispositivos mais contestáveis, ou seja, naqueles que lhes permite a discricionariedade e a arbitrariedade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 debate que agora se encerra sobre o projecto de medidas de emergência para defesa da Reforma Agrária teve o importante mérito de demonstrar que a Lei Barreto está frontalmente posta em causa e acabará por ser revogada e integralmente substituída mais cedo do que muitos pensavam.
0 Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentou à Assembleia da República, em Novembro passado, o projecto de lei que agora, finalmente, por efeito de marcação de ordem do dia especial, subiu à discussão e votação ao plenário.
Visava-se com tal projecto não ainda a revogação da lei, mas tão-só impedir que a sua vigência completa, com as ilegalidades, atropelos e crimes que obrigatoriamente comporta, continuasse a produzir as já inegáveis e graves consequências para a Reforma Agrária, para os trabalhadores agrícolas, para os pequenos e médios agricultores da zona da Reforma Agrária, para a economia nacional e para o regime democrático-constitucional conquistado pela Revolução de Abril.
Visávamos e visamos alterar para já aquelas disposições da Lei Barreto através das quais mais se tem praticado a iniquidade, a prepotência, a liquidação das cooperativas e UCP.
Visávamos e visamos pôr fim à despudorada campanha de restauração dos latifúndios, que, à sombra do cumprimento da famigerada lei, vem sendo desenvolvida, em particular pelos dois últimos Governos de Nobre da Costa e Mota Pinto.
Tratava-se e trata-se de limitar os poderes discricionários do MAP e de cercear algumas das soluções mais escandalosamente favoráveis aos latifundiários, designadamente no que concerne à dimensão, localização e marcação de reservas, majorações, titularidade de direito de reserva, regime de arrendamento ou expropriação compulsiva em caso de abandono ou mau uso, retroactividade da Lei Barreto, etc.
Dois anos de vigência desta famigerada lei fazem dela um exemplo que importa não esquecer.
A vida vem demonstrando que a oposição persistente e tenaz dos trabalhadores, dos democratas, em particular dos comunistas a tão iníqua lei foi e é justa, foi e é necessária, foi e é patriótica; a vida vem demonstrando que a força da razão acabará por triunfar e que uma lei antipopular e antidemocrática contém em si os germes da sua própria destruição, contém em si os elementos da antilei, isto é, do arbítrio e da prepotência.
Na verdade, as consequências da aplicação da Lei Barreto não estão apenas nem sobretudo nos abusos e nas ilegalidades, apesar da sua quantidade, da sua natureza acintosa e do desígnio político que os tem caracterizado. Os abusos da Lei Barreto são eles mesmos um produto directo da própria lei, são os inauditos poderes discricionários deixados ao Ministério da Agricultura e Pescas, é o escandaloso favor - em relação aos agrários que nela se consagra, é o sinistro desígnio de liquidar as cooperativas e UCP é, ao fim e ao cabo, o carácter reaccionário e anticonstitucional desta lei, que gera, suscita, incita e até legitima" aos olhos daqueles que dela cinicamente se servem, aos olhos dos seus defensores, os abusos e as arbitrariedades.
É da essência das leis reaccionárias que elas só se aplicam quando favorecem os grandes e poderosos e de nada sirvam ou sejam esquecidas quando, ainda que legitimamente, defendam os interesses dos trabalhadores e do povo. É característico da Lei Barreto que a sua aplicação conduza directamente à ilegalidade, ao crime e à corrupção. É que a lei reaccionária é corrupta em si própria porque se destina a usurpar a maioria e a favorecer a ínfima minoria, porque se destina a garantir os privilégios de uns tantos à custa da miséria e repressão das massas populares.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E porque a Lei Barreto disto é um exemplo, a sua aplicação ao longo de dois anos mostrou claramente que as suas soluções conduzem à liquidação da Reforma Agrária, à reconstituição do poder latifundiário, a pôr em causa o regime democrático-constitucional.
A própria aplicação da lei provou que ela, em vez de instrumento de democracia na área da Reforma Agrária, como os seus paladinos proclamaram, é um instrumento antidemocrático; em vez de instrumento de consolidação da Reforma Agrária, como pretenderam fazer crer, tem sido um instrumento da sua liquidação; em vez de instrumento de estabilização social no Alentejo, como se tentaram convencer, tem sido um instrumento de instabilidade, de repressão e de conflitos sociais.
Por tudo isto, os votos dos partidos da direita mais não representam do que a confirmação do seu carácter reaccionário. Para eles, a Lei Barreto é um quadro apropriado para a liquidação da Reforma Agrária, objectivo que a direita reaccionária sempre prosseguiu, quer directamente, quer por interposta pessoa, designadamente através dos representantes da CAP, que neste momento ocupam o Ministério da Agricultura e Pescas. Mas por tudo isto, também é pelo menos de difícil entendimento o voto do Partido Socialista, que ontem mesmo, em declaração política aqui produzida, trouxe à Assembleia razões que sobrariam para aprovar as alterações constantes dos projectos agora votados. 0 quadro de desastrosas consequências negativas que reconhece decorrer da Lei Barreto. o empeno que afirmou ter na sua urgente alteração, o facto, mesmo, de ter já estudadas e aprontadas propostas concretas, tudo - apontava e exigia que o Partido Socialista não permitisse que se perdesse mais tempo e, em conformidade, votasse favoravelmente na generalidade os projectos acabados de rejeitar. Isso desde logo abriria caminho a que de imediato se procurasse, com emendas de especialidade, o consenso que sempre será necessário para que, finalmente, seja aprovada a lei de alterações que a vida tornou imperiosa e urgente.
0 projecto do Partido Comunista Português de alterações à Lei Barreto e o nosso voto favorável ao projecto do Deputado lndependente Lopes Cardoso não pretendem traduzir a nossa concepção de Reforma Agrária. Significam não só e simplesmente a resposta à inadiável exigência de impedir ou dificultar que o arbítrio e a prepotência continuem a campear e que à sombra da lei se negue a lei e a Constituição e se prossiga a campanha destruidora e repressiva do MAP.
Defendemos e continuamos a defender que a Lei Barreto deve ser revogada e substituída por uma verdadeira lei da

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Reforma Agrária que corresponda aos anseios dos trabalhadores e do povo português e se adeqúe ao quadro democrático-constituicional em que vivemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Alegar a concepção de Reforma Agrária defendida pelo Partido Comunista Português para justificar o voto negativo ao projecto de medidas de emergência, é de facto desvirtuar todo o seu sentido e alcance e adiar, sem fundamento aceitável, as medidas que se reconhecem, pelo menos de palavra, serem indispensáveis.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É necessário tornar claro que um tal adiamento acarretará ainda mais violências. Arbitrariedades, ilegalidades e crimes e traduzir-se-á em prejuízos irrecuperáveis para a Reforma Agrária, para os trabalhadores, para a economia nacional.
Ainda não foi hoje que se formou uma maioria para alterar a Lei Barreto. Mas ficou claro que já são minoria os que a apoiam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A Lei Barreto deixou de ser o instrumento intocável que a direita, numa gigantesca campanha de propaganda, tentou transformar em símbolo e acabou finalmente degradada à sua verdadeira dimensão de instrumento inconstitucional de contra-Reforma Agrária, de plano de restauração do domínio capitalista e latifundiário nos campos do Sul, de trampolim dos grandes agrários contra os trabalhadores e a sua grandiosa obra, realizada com determinação, sacrifício e generosidade.
Foram precisos quase dois anos para que se chegasse a esta situação - dois anos de ofensiva contra a Reforma Agrária, de arbitrariedades, de prepotência, de repressão; mas também e sobretudo dois anos de luta resoluta e corajosa, de resistência determinada e paciente, de confiança na vitória final da razão, da justiça, da democracia e da Constituição.

Aplausos do PCP.

Ao contrário daquilo que a direita pretendia, a Lei Barreto não conseguiu impor-se contra a Constituição, nem fazer eliminar a consciência popular acerca da sua ilegitimidade constitucional.
As medidas de emergência para defesa da Reforma Agrária não foram ainda hoje aprovadas pelo voto do PS. Mas a situação clarificou-se.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sabe-se melhor quem defende o quê e sabe-se sobretudo que está aberto o procedimento legislativo que conduzirá, inexoravelmente, primeiro, à modificação da Lei Barreto e, finalmente, à adopção das medidas que se impõem para defesa e consolidação da Reforma Agrária.

Aplausos do PCP, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Castelo Branco.

O Sr. Joaquim Castelo Branco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o projecto de lei n.º 14l/I, apresentado pelos deputados independentes, porque da sua eventual aprovação resultaria a paragem por tempo indeterminado da aplicação da Lei das Bases da Reforma Agrária, no que se refere à zona de intervenção. 0 plano de conjunto, tendo em vista o reordenamento agrícola global da zona de intervenção, deveria já ter sido elaborado e deveria servir de base ao delineamento das explorações a implantar nas zonas das áreas expropriadas e nacionalizadas para garantir a sua racionalidade e a sua viabilidade técnico-econóimca e social. Mas agora com a entrega de reservas só poderia redundar no agravamento da situação económica do País. por se impedir que a iniciativa privada contribua devidamente para o aumento da produção e da produtividade na agricultura.
Votámos contra o projecto de lei n.º l58/I do Partido Comunista Português, porque ele visa alcançar agora parte do que não conseguiu aquando da discussão e aprovação da Lei n.º 77/77, talvez a contar com novo êxito da maioria de esquerda. Alterações que viriam a agravar algumas disposições, com que já não concordámos na sua forma inicial, dando-lhes feição claramente injusta, só servidora dos interesses colectivistas e dominadores do Partido proponente.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Alvaro Figueiredo.

O Sr. Álvaro Figueiredo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentou o Partido Comunista Português a esta Câmara o projecto de lei n.º 158/I, que denomiNou de medidas de emergência para defesa da Reforma Agrária.
Aquando da votação na generalidade da hoje Lei n.º 77/77, disse o Partido Social-Democrata, em declaração de voto, o seguinte:
Esta não é, pois, a Reforma Agrária dos sociais-democratas. Temos um projecto claro que apresentámos pela primeira vez em 11 de Julho de 1974 - primeiro programa de política agrária que algum partido português apresentou após o 25 de Abril - e que desenvolvemos, por exemplo, até ao nosso Programa do Governo em 1976. Este projecto, claro, levou-nos a lutar contra aquilo que na legislação gonçalvista, se traduziu na substituição de latifúndios exploradores de dinheiro por latifúndios exploradores de poder, na substituição de latifúndios e explorações capitalistas, que a Constituição obriga a erradicar, por latifúndios e explorações de capitalismo de Estado que igualmente consideramos incompatíveis com uma estrutura democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entendemos que esta proposta, na parte relativa à zona de intervenção, não pode ser justificada, naturalmente, por um simples e primário anticomunismo mas entendemos também, entendemos sobretudo, que ela será uma maneira de instaurar, não apenas na zona de intervenção, mas em todo o território nacional, bases que consideramos possíveis em termos de começo na acção positiva, para a reestruturação agrária no nosso País.
Ora, parece-nos que, precisamente, o projecto ora votado não traduz, ele mesmo, um desiderato, de progresso e que, quando eufemisticamente é rotulado de medidas para defesa da Reforma Agrária, nada mais se revela do que a defesa de uma certa e determinada Reforma Agrária, que não é, nem pode ser, obviamente a nossa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Traduz assim, na sua globalidade. uma tentativa de retrocesso em relação à Lei n.º 77/77 que não podemos aceitar, já que o seu espírito se afasta daquele caminho de justiça e equidade mínimas que pretendemos imprimir à Lei da Reforma Agrária.
Mas mais: entendemos que a Lei n.º 77/77 não era uma proposta perfeita, mas era uma proposta possível e aperfeiçoável, isso o dissemos também em declaração de voto. Não é, todavia, com modificações, como as agora apresentadas, que é possível melhorar a referida lei. E, senão, vejamos porquê:

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19 DE MAIO DE 1979 2221

Primeiro, é possível concordar com a prévia indemnização de qualquer tipo de benfeitorias, quando se entende não dever o erário público responder por qualquer tipo de empreendimentos realizados sem o mínimo de controle e sem que os seus projectos sejam previamente apreciados do ponto de vista técnico e de oportunidade?
Segundo, é viável aceitar a concessão indiscriminada de crédito, isto é, sem que esse crédito seja justificado tecnicamente desde que a empresa beneficiada não dê garantias de o gerir com um mínimo de critério?
Terceiro, é possível aceitar a obrigatoriedade de o reservatário iniciar a sua exploração nos sessenta dias seguintes ao acto da entrega, quando existem condicionantes que vão da retoma de uma exploração que foi forçado a abandonar e que passam pela descapitalização que o forçará, inevitavelmente a recorrer ao crédito sempre demorado, até as épocas de inicio das próprias culturas?
Quarto, será lógico pensar na criação de um cemitério rígido para a escolha da área de reserva, quando esta deve ser uma escolha de base técnica, tendo em conta os interesses do reservatário e da cultidade agrícola explorante?
Quinto, é necessário consagrar na presente proposta o preceituado nos artigos 87.º e 88.º da Constituição, quando a Lei n.º 77/77 determina já, como fundamento para atribuição da reserva a exploração directa pelo titular, e, desde logo, o aproveitamento dos meios de produção?
Sexto, é compreensível que só os cônjuges separados de pessoas e bens não possam ser considerados como um só titular? Então os agricultores que mantinham explorações agrícolas distintas ou que exerciam em determinada exploração a sua principal actividade, daí retirando os seus meios de subsistência, deverão ser prejudicados pela lei em apreço?
Sétimo, é concebível que se dê um prazo tão curto, quando se deseja conferir ao proprietário a possibilidade de iniciar ou dinamizar uma exploração? Face às taxas de juro actuais é possível exigir um prazo tão exíguo como o de seis meses?
Oitavo, e quem determina os níveis mínimos de aproveitamento? Quais são os critérios usados para tal determinação?
Nono, entende-se ou não que o gado é um investimento do proprietário? Se é, não será completamente distinto do capital fundiário, esse sim, objecto que deve ser da expropriação?
Décimo, é ou não correcto afirmar que os prazos do recurso, contencioso, num estado de direito, devam ser os mesmos para todas as situações?

O Sr. Vitor Louro (PCP): - Já está a dar a volta à Lei Barreto!

O Orador: - Se a Lei n.º 77/77 foi aprovada na Assembleia da República pelos representantes do povo português, deve-se, quanto a ela, abrir um regime de excepção?
Décimo-primeiro, como é possível que o PCP remeta para a legislação gonçalvista, existente à data da entrada em vigor da Constituição, o regime fundiário dos prédios rústicos?
Décimo-segundo, como se pode, face às reservas postas. aceitar as revogações propostas tio artigo 9.º?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao exposto, o Partido Social-Democrata votou contra o projecto de lei n.º 158/I e fê-lo na consciência plena de que deste modo prestava um serviço à agricultura portuguesa e ao País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na realidade, para nós, sociais-democratas, a defesa da Reforma Agrária não pode ser uma simples lei de defesa das expropriações, pois, é muitíssimo mais do que isso, já que, pensamos também em formas de rendimensionamento mais por estímulos e incentivos do que por medidas impositivas. já que acreditamos no fomento da reestruturação cultural, já que pugnamos por todas as formas possíveis de apoio à agricultura, pois cremos só assim será viável e exequível uma verdadeira Reforma Agrária.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos também contra o projecto de lei n.º 141/I em parte pelas mesmas razões aduzidas no início desta declaração de voto, bem como pelas mesmas expressas no seu final. Entendemos também que se deve dar prioridade à reposição da legalidade na zona de intervenção sem prejuízo de um correcto ordenamento agrícola global, mas entendemos, todavia, que neste momento se deverá dar efectiva aplicação ao Decreto-Lei n.º 111/78, de 27 de Maio, já que a sua aplicação irá regulamentar a entrega das terras expropriadas ou nacionalizadas, definindo as regras do jogo e possibilitando assim a necessária e desejada estabilidade aos diversos beneficiários a quem foram entregues terras para exploração.

Também entendemos que, sendo Portugal um Estado de direito, não se deverá proceder a expropriações sem que se possa suportar os correspondentes encargos, atitude esta que está de acordo com as ratificações das convenções internacionais inerentes ao estatuto que se assumiu.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes determinar a sessão informo que a ordem de trabalhos para terça-feira dia 22 é a seguinte: discussão da ratificação n.º 62/I, do projecto de lei n.º l64/I, do projecto de lei N.º 171/I e de todas a ratificações que estavam marcadas na ordem de trabalhos de hoje e que não foram aplicadas e que sao as n.ºS 65/I, 66/I, 67/I, 81/I, 59/I, 49/I, 64/I, 69/I e 70/I.

Está encerrada a sessão.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
António Chaves Medeiros.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Sanches Esteves.
Antõnio Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Delmiro Manuel de Sousa Carreira.
Florival da Silva Nobre.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco António Marcos Barricosa.
Francisco lgrejas Caeiro.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho Menezes.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Candido Rodrigues Pimenta.
José Gomes Fernandes.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís José Godinho Cid.
Manuel do Carmo Mendes.

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2222 I SÉRIE - NÚMERO 62

Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Teresa Vieira Bastos R. Ambrósio.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Pedro Amadeu de A. dos Santos Coelho.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Sérgio Augusto Nunes Simões.

Partido Social-Democrata (PSD)

Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de A. de Azevedo.
António Manuel dos Santos Vasconcelos.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Júlio Simões de Aguiar.
Cristóvão Guerreiro Norte.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
José Adriano Gago Vitorino.
José Rui Sousa Fernandes.
José Teodoro de Jesus da Silva.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.

Centro Democrático Social (CDS.)

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Álvaro Manuel Brandão Estevão.
Ângelo Alberto Ribas da Silva Vieira.
António Jacinto Martins Canaverde.
Basilio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Carlos Martins Robalo.
Francisco António Lucas Pires.
José Cunha Simões.
José Duarte A.
Ribeíro e Castro.
José Luís R.
de Albuquerque Christo.
José Manuel Macedo Pereira.
José Vicente J. Carvalho Cardoso.
Manuel A. de A. de Azevedo e Vasconcelos.
Margarida Garcês da S. Ventura.
Nuno Krus Abecasis.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Walter Francisco Burmester Cudell.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
CarLos H. S. Aboim Inglez.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa C. Pacheco Pereira.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Manuel Paiva Jara.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

União Democrática Popular (UDP)

Acácio Manuel de Frias Barreiro.

lndependentes

Américo de Sequeira.
António Augusto Gonçalves.
António Joaquim Veríssimo.
António Poppe Lopes Cardoso.
Arcanjo Nunes Luís.
Fernando Adriano Pinto.
Francisco Braga Barroso.
Francisco da Costa Lopes Oliveira.
Gabriel Ribeiro da Frada.
João Manuel Ferreira.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Gonçalves Sapinho.

José Justiano Taboada Braz Pinto.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Victor Hugo Mendes dos Santos.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

Albano Pereira da Cunha Pina.
António Cândido Miranda Macedo.
António Fernandes da Fonseca.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António Jorge Moreira Portugal.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Manuel Natividade da C. Candal.
Dieter Deilinger.
Etelvina Lopes de Almeida.
Fernando Jaime Pereira de Almeida.
Fernando Tavares Loureiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Gualter Viriato Nunes Basilio.
Jerónimo da Silva Pereira.
João Francisco Ludovico da Costa.
João da Silva.
Joaquim Manuel Barros de Sousa.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Ludovina das Dores Rosado.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Lencastre M. de Sousa Figueiredo.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Telmo Ferreira Neto.
Victor Fernandes de Almeida.

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
António José dos Santos M.
da Silva.
Armando António Correia.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Eduardo José Vieira.
Fernando José da Costa.
Fernando José Sequeira Roriz.
Francisco M. L. de Sá Carneiro.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Bento Gonçalves.
José Manuel M. Sampaio Pimentel.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Maria Élia Brito Câmara.
Maria Helena do Rego da Costa S. Roseta.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nicolau Gregório de Freitas.

Centro Democrático Social (CDS)

Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Eugénio Maria N. Anacoreta Correia.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
João Lopes Porto.
João da Silva Mendes Morgado.
José Manuel Cabral Fernandes.
Luís Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Rui Fausto Fernandes Marrana.
Ruy Garcia de Oliveira.

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19 DE MAIO DE 1979 2223

Partido Comunista Português (PCP)

Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Vital Martins Moreira.

lndependentes

Antídio dás Neves Costa.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António Luciano Pacheco de Sousa Franco.

António Manuel Barata Portugal.
Carlos Galvão de Meio.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Francisco Barbosa da Costa.
José Alberto Ribeiro.
José Ferreira Júnior.
José Manuel Ribeiro Sérvulo Correía.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Rui Manuel Parente de C. Manchete.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.

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PREÇO DESTE NÚMERO 12$00

IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA

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