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I Série - Número 15
Quarta-feira, 13 de Fevereiro de 1980
DIÁRIO da Assembleia da República
I LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE FEVEREIRO DE 1980
Presidente: Ex.mo Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Secretários: Ex.mos Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura.
Alberto Marques Antunes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira.
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão as 15 horas e 20 minutos.
Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 9 e 10 do Diário, deu-se conta do expediente e da apresentação de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado José Tengarrinha (MDP/CDE) criticou recentes medidas económicas, nomeadamente o aumento do «cabaz de compras», tomadas pelo Governo.
Também em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas (PCP) criticou os recentes aumentos de preços e formulou várias perguntas ao Governo no sentido de saber que medidas tomou já, a vários níveis, desde o sua tomada de posse. Respondeu depois a um protesto formulado pelo Sr. Deputado José Vitorino (PSD).
Igualmente, em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Lage (PS) fez uma análise à actuação do Governo no domínio de vários sectores. Respondeu no fim o pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rui Pena (CDS) e Ângelo Carreia (PSD), tendo intervindo ainda, a diverso titulo, os Srs. Deputados António Campos (PS), Sousa Tavares (Indep.), José Manuel Casqueiro (CDS), Vítor Louro (PCP) e Mário Tomé (UDP).
O Sr. Deputado Mário Tomé (UDP) produziu uma declaração política sobre a actuação do Governo, nomeadamente nos domínios da Reforma Agrária, nacionalizações, trabalho e comunicação social.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Luis Barbosa (CDS) pronunciou-se sobre o alcance das recentes medidas anti-inflacionárias tomadas pelo Governo.
O Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP) criticou a política do Governo em matéria de comunicação social, nomeadamente a substituição dos administrações das empresas públicas do sector.
O Sr. Deputado Mário Tomé (UDP), referindo-se ao prazo de mês e meio decorrido desde o sismo nos Açores, considerou que os Governos Central e Regional estão descurando as necessidades mais prementes dos sinistrados. No fim respondeu a um esclarecimento do Sr. Deputado Germano Domingos (PSD).
A Sr.ª Deputada Maria José Sampaio (CDS) protestou contra o desprezo a que têm sido votados em Portugal a arte e a beleza em geral, considerando um crime o abandono f a ruína de muitas jóias arquitectónicas e outras, algumas de grande valor arqueológico, espalhadas pelo Pais. Solidarizaram-se com o teor da sua intervenção, a que deram novas achegas os Srs. Deputados Vital Moreira (PCP) e Carlos Candal (PS).
O Sr. Deputado Manuel da Costa (PS) sublinhou a importância para o desenvolvimento do Alentejo da restauração da Universidade de Évora pelo V Governo Constitucional e assinalou o facto de haverem sido distinguidos com o grau de doutor honoris causa, em homenagem ao seu labor cientifico e pedagógico, os Profs. Henrique de Barros e Caldeira Cabral. No fim respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Pedro Roseta (PSD).
A Sr.ª Deputada Marília Raimundo (PSD) reclamou a reabertura da Escola de Enfermagem da Guarda, dada a urgência na formação de pessoal de enfermagem em face dos carências do distrito. No fim respondeu a pedidos de esclarecimento e a esclarecimentos dos Srs. Deputados José Ernesto Oliveira (PCP). Almeida Santos (PS) e António Arnaut (PS).
Ordem do dia. - Foi lido pelo Sr. Deputado Armando Lopes (PS), e em seguida aprovado, um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um Deputado do PS.
Em seguida procedeu-se à eleição da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o processo de importação de batata de semente paro a campanha de 1978-1979.
Depois de lido, pelo Sr. Deputado Pinto do Cruz (CDS), o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre algumas alterações ao Regimento propostas pelo PSD, pelo CDS e pelo PPM, foram aprovados, na generalidade e na especialidade, novas redacções para o artigo 18.º e os n.0' 2 e 3 do artigo 21.º, tendo feito declarações de voto os Srs. Deputados Herculano Pires (PS), Godinho de Motos (DR), João Amaral (PCP), José Tengarrinha (MDP/CDE), Pinto da Cruz (CDS), Mário Tomé (UDP). Ferreira do Amaral (PPM) e Pedro Roseta (PSD).
Por último, tiveram lugar as declarações de voto, pendentes da anterior sessão e relativas às ratificações n.ºs 202/I, 100/I e 185/I. feitas pelos Srs. Deputados João Lima (PS)
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Teodoro da Silva (PSD), Natália Correia (PSD) José Augusto Gama (CDS), Vital Moreira (PCP) Mário Tomé (UDP) e Helena Cidade Moura (MDP/CDE).
Anunciada a entrada na Mesa de várias propostas de lei, projectos de lei e ratificações, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à chamada.
Eram 15 horas.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Álvaro Barros M. de Figueiredo.
António Duarte e Duarte Chagas.
Armando Adão e Silva.
Armando António Correia.
Carlos Encarnação.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Raimundo Rodrigues.
Henrique Alberto F. do N. Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João António Sousa Domingues.
João Aurélio Dias Mendes.
João Luís Malato Correia.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
José Adriano Gago Vitorino.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Henrique Cardoso.
José Theodoro da Silva.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Manuela Simões Saraiva.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Natália de Oliveira Correia.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Valdemar Cardoso Alves.
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu da Silva Cruz.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Duarte Arnaut.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Guilherme Gomes dos Santos.
Herculano Rocha.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Manuel Niza Antunes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Abílio Conceição Cacito.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel Joaquim de M. P. Tavares Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Partido Comunista Português (PCP)
Alberto Jorge Fernandes.
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto ao C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José António Veríssimo Silva.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel da C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Victor Henrique Louro de Sá.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
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Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Ferreira Pereira de Melo.
António Martins Canaverde.
Artur Fernandes.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Domingos da Silva Pereira.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco Gonçalves C. de Ferreira.
Isilda Sílvia Barata.
João Daniel Marques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
José Augusto Gama.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís António Matos Lima.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Maria José Paulo Sampaio.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António José Borges G. de Carvalho.
Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Helena Tâmega Cidade Moura.
José Manuel Marques do C. M. Tengarrinha.
Luís Manuel A. de Campos Catarino.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
O Sr. Presidente:-Responderam à chamada 144 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o período de antes da andem do dia encerrará exactamente daqui a uma hora; portanto às 16 horas, e 20 minutos.
Estão em aprovação os n.ºs 9 e 10 do Diário.
Pausa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, ainda não tive oportunidade de ver com atenção o que consta dos Diários mencionados; de qualquer forma, queria que ficasse registado no presente Diário que a designação que tem sido corrente em alguns Diários em relação a algumas votações, aplausos ou manifestações da maioria parlamentar pode não corresponder, e não tem correspondido frequentemente, ao sentido exacto ido que se tem passado em Plenário. Na Assembleia da República, tal como hoje está constituída, existem grupos parlamentares definidos - o do CDS, o do PSD, etc. - e parece-me que a designação mais correcta a incluir nos Diários será exactamente essa: aplausos discriminados, portanto dos grupos parlamentares que os produziram. E não, como tem sucedido em alguns Diários -e aqui não pretendo questionar isso nem em relação aos Diários anteriores nem em «dação aos Diários agora mencionados - aplausos da maioria parlamentar, que muitas vezes poderá não corresponder àquilo que efectivamente se passou.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa regista aquilo que disse não como reclamação concreta aos n.ºs 9 e 10 do Diário, mas como orientação que lhe parece ser preferível passar a ser seguida. Não é assim, Sr. Deputado?
O Sr. João Amaral (PCP): - É sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, como não há, portanto, oposição, consideram-se os n.ºs 9 e 10 do Diário aprovados.
Vai proceder-se à leitora do expediente.
Deu-se conta do seguinte
EXPEDIENTE
Exposições
Dos professores estagiários da Escola Preparatória da Figueira da Foz, manifestando a sua estranheza e o seu repúdio pela maneira, como foram contemplados pelo Decreto-Lei n.º 519-TI/79, de 29 de Dezembro, no que respeita a concursos.
De Daniel Rodrigues Correia, ex-guarda e motorista da PSP de Lisboa, solicitando a (revogação do Decreto-Lei n.º 44 702, de 15 de Maio de 1967, a fim de poder beneficiar da amnistia e, consequentemente, ter direito à pensão de reforma completa.
Da Associação Portuguesa de Contabilistas e do Sindicato dos Contabilistas, requerendo a aprovação de uma lei que permita a licenciatura em Contabilidade nos Institutos Superiores de Contabilidade de Lisboa e Porto.
Moção
Da Assembleia da Intercomissões de Montemor-o-Novo, solidarizando-se com o Governo do Afeganistão e com a luta do Irão, condenando simultaneamente a actuação do actual Governo Português em diversos sectores.
Carta
Do agente de Barcelos da Companhia de Seguros Pátria a enviar a carta que oportunamente dirigiu à sede da sua. representada, protestando contra a fusão
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que acabou com o nome de algumas companhias, concretamente o da que representa.
Ofícios
Do Sindicato Livre dos Empregados de Escritório e Caixeiros do Distinto de Faro a remeter exemplar de um comunicado sobre a suspensão da publicação de convenções colectivas de trabalho.
Do presidente da Câmara Municipal de Avis, a enviar cópia de uma moção aprovada por aquela Câmara Municipal sobre a actuação do Ministério de Agricultara e Pescas no concelho de Avis.
Do presidente da Assembleia Municipal de Beja, transcrevendo o .texto de uma moção de apoio à engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo.
Do presidente da Câmara Municipal de Braga, transcrevendo mima moção aprovada por aquela Câmara no passado dia 2 do corrente, em que solicitam seja novamente aprovado o decreto sobre a delimitação e coordenação das actuações da Administração Central, Regional e Local, relativamente aos respectivos investimentos.
Da Assembleia Municipal de Sines a (remeter fotocópia da moção de pesar e solidariedade para com o povo dos Açores.
Da Procuradoria-Geral da República a enviar fotocópia de uma moção aprovada pelo Conselho Superior do Ministério Público, em sua sessão de 29 de Janeiro findo, em que repudiam as notícias veiculadas pelo Correio da Manhã e Rádio Renascença, porque lesivas do prestígio do 'Ministério Público.
Da Câmara Municipal de Lisboa, comunicando o teor de uma moção aprovada por aquela Câmara em sua reunião pública de 30 de Janeiro, solicitando a aprovação de legislação respeitante à delimitação e coordenação das actuações da Administração Central, Regional e Local, relativamente aos respectivos investimentos.
Do Governo Civil do Distrito de Portalegre a enviar um requerimento de Manuel José Cabrinhas Vintém, encarregado do Internato Distrital de Santo António, da Assembleia Distrital de Portalegre, solicitando a revisão do Decreto-Lei n.º 466/79.
Telegramas
De um grupo de terceirenses, que se declaram admirados por a Assembleia ainda não ter tomado posição quanto ao auxílio que os voluntários das forças armadas da Arma de Engenhada poderão prestar para a reconstrução de casas sinistradas.
Da Comissão Dinamizadora Distrital do III Congresso da CGTP/IN, do Porto, protestando cantora o facto de brigadas da Câmara Municipal daquela cidade terem arrancado cartazes sobre o III Congresso, afixados em algumas avenidas.
Dos sindicatos do Porto que, reunidos em l de Fevereiro deliberaram
manifestar-se contra o congelamento da contratação colectiva determinado pelo Ministério do Trabalho e ainda contra o aumento do custo de vida.
Da Assembleia de Freguesia de Quiaios, solicitando a aprovação urgente do diploma para a criação da freguesia de Bom Sucesso.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegou à Mesa a notícia do falecimento da mãe da Sr.ª Deputada Diná Alhandra. A Mesa julga que interpreta com certeza o sentir unânime da Assembleia ao manifestar o seu pesar pelo acontecimento..
O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser dada conta dos requerimentos entrados na Mesa.
O Sr. Secretário (Pires Fontoura): - A Mesa informa os Srs. Deputados de que na última sessão lhe foram entregues os seguintes requerimentos: ao Ministério dos Assuntos Sociais e à Secretaria de Estado da Saúde, formulado pelos Srs. Deputados José Ernesto Leão de Oliveira, Zita Seabra e António Mota; aos Ministérios da Administração Interna, das Finanças e do Plano e da Agricultura e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Sanches Osório; ao Ministério dos Assuntos Sociais, formulados pelos Srs. Deputados José Ernesto Leão de Oliveira, Josefina Maria Andrade e Custódio Jacinto Gingão; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Francisco Oliveira e Jaime Gama; aos Ministérios do Comércio e Turismo e da Indústria e Energia, formulado pelos Srs Deputados Carlos Carvalhas, Ercília Talhas, Ilda Figueiredo e Octávio Augusto Teixeira; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelos Srs. Deputados Carlos Carvalhas, Jorge Lemos e Lino Lima; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelos Srs. Deputados António Reis e Igrejas Caeiro; ao Ministério da Educação e Ciência, formulado pelos Srs. Deputados 'Jorge Lemos, Zita Seabra e Rosa Maria Brandão; ao Governo, formulado pela Sr.ª Deputada Ercília Talhadas.; ao Ministério da Educação e Ciência, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; à Secretaria de Estado das Pescas, formulado pelos Srs. Deputados Carlos Espadinha, António Mota, Gaspar Martins, Alberto Jorge e Ilda Figueiredo.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, nos termos do artigo 81.º do Regimento o período de antes da ordem do dia destina-se, entre outras funções, aos anúncios que o Regimento impõe.
Suponho que estive com suficiente atenção e não ouvi que tivessem sido anunciados quaisquer requerimentos de desistência de pedidos de sujeição a ratificação.
É certo, Sr. Presidente, que a Assembleia da República e os trabalhos regimentais foram inundados de pedidos de ratificação, designadamente pelos Grupos Parlamentares do CDS, do PSD e do PPM e é certo também que a quase totalidade desses pedidos de ratificação se refere a decretos-leis do V Governo Constitucional. Entretanto sucede que na imprensa do passado fim-de-semana, designadamente em semanários, veio a notícia de que teriam sido retirados 121 pedidos de ratificação e que teriam sobrado só 25.
A atenção com que procuramos seguir os trabalhos dá Assembleia, e aqui está implícito que os pedidos de retirada de ratificação são anunciados obrigatória-
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mente pela Mesa, leva-nos a concluir que, até ao momento, foram retirados só seis pedidos de ratificação, tanto mais que no ofício distribuído nas bancadas dos grupos parlamentares, e designadamente na bancada do Grupo Parlamentar do PCP, onde se incluem outros vinte e nove pedidos de ratificação, ainda não foi, tanto quanto saibamos, lido pela Mesa.
Estamos, portanto, perante esta situação: na opinião pública, de acordo com as informações que esses jornais têm veiculado, os Grupos Parlamentares do PSD, do CDS e do PPM teriam retirado cento e vinte e uma ratificações; na prática, as ratificações mantêm--se, mantém-se a acumulação de trabalho de ratificações na Assembleia da República e nada se alterou.
interpelava a Mesa neste sentido, Sr. Presidente: Confirma-se que só foram oficialmente retirados seis pedidos de ratificação ou quereria o Sr. Presidente dar informações diferentes, talvez devidas a lapso de atenção da nossa parte?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, de momento não posso dizer-lhe exactamente o número de pedidos de ratificação que já foram retirados.
Só o que posso comunicar-lhe é que até agora foram anunciados iodos os pedidos de ratificação que entraram na Mesa e, até ao momento, não entrou ainda mais nenhum.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, posso portanto concluir que, até ao momento, foram retirados seis pedidos de ratificação. Não é assim?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso dizer-lhe que no momento preciso em que o Sr. Deputado recebia o esclarecimento, que muito gostosamente lhe dava, acabava de chegar à Mesa ...
Risos do PCP.
... o seguinte documento:
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:
Lisboa, 11 de Fevereiro de 1980.
O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata vem comunicar a V. Ex.ª que retira os requerimentos de sujeição a ratificação dos decretos-leis, abaixo indicados, pelo que os processos se devem considerar automaticamente encerrados.
Se o Sr. Deputado me dispensa a leitura do número dos decretos-leis, diria apenas o número dos processos de ratificação constantes da organização interna da Assembleia.
O Sr. João Amaral (PCP): - Com certeza. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - São as seguintes ratificações: n.ºs 239/I, 269/I, 253/I, 216/I, 285/I, 200/I, 201/I, 222/I, 249/I, 260/I, 263/I, 262/I, 250/I, 265/I, 236/I, 238/I, 223/I, 264/I, 299/I, 290/I, 283/I, 284/I, 207/I, 252/I, 258/I, 232/I, 204/I, 234/I, 220/I, 235/I, 197/I, 214/I. 205/I, 256/I e 227/I.
Srs. Deputados, acaba de chegar um outro documento também com um numeroso grupo de ratificações que são retiradas ...
Risos do PCP.
... mas para não estarmos a perder tempo, e se os Srs. Deputados dispensam a leitura, far-se-á a sua distribuição em fotocópia pelos grupos parlamentares, visto que não devem prescindir, com certeza, do seu conhecimento concreto e caso a caso.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, mais depressa ou falara mais depressa a bruxa apareceria aí...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede agora a ^palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, era só para questionar um ponto concreto dos requerimentos agora apresentados.
Nos termos que já foram abundantemente discutidos pela Assembleia e sobre os quais já existe posição, devo dizer que os processos não estão cancelados automaticamente. Aquilo que sucede é só, e tão-só, que os grupos parlamentares que requereram as ratificações as retiraram, sem prejuízo, como é evidente, das iniciativas que outros grupos parlamentares queiram tomar em relação a esses - pedidos de ratificação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é evidente que se algum grupo parlamentar quiser retomar essa posição, poderá fazê-lo porque é regimental e está certo.
Vão, de seguida, ser distribuídos pelas diversas bancadas vários exemplares fotocopiados dos requerimentos apresentados na Mesa.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Tengarrinha.
O Sr. José Tengarrinha (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Os aumentos do «cabaz de compras» são naturais num período de inflação, e são, por consequência, previsíveis. Só que sendo no seu conjunto, ou pretendendo-se que seja, aqueles que mais pesam no orçamento das famílias de menores proventos os produtos abrangidos pelo «cabaz», a concretização dos aumentos deveria, em nosso entender, ser acompanhada de medidas correctivas tendentes a minorar os correspondentes efeitos sobre a qualidade de vida de tais famílias.
Ora o que se verifica é que o Governo apenas efectiva o agravamento do nível de vida e anuncia para mais tarde as medidas correctivas, nomeadamente a revisão dos impostos, pensões der reforma, etc. Tal adiamento faz admitir, pela previsível demora, um efectivo ónus para tal classe de pessoas.
As medidas anunciadas pelo Governo formulam-se, aliás, dentro de uma óptica de verdade dos preços. Tal tem de admitir-se como inserível na política de liberalização anunciada pelo Governo da AD. Mas, para respeitar o seu Programa, não vemos que tenham sido concretizadas as medidas de defesa dos mais carecidos. Não seria lógica a simultaneidade?
A impossibilidade de tal lógica ser posta em prática, admitimo-la sempre numa óptica que não põe em duvida, à partida, a seriedade do Governo. Só que do
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conjunto de medidas previstas no seu Programa se concretizam aquelas cujos efeitos agravam a qualidade de vida dos trabalhadores e populações mais carecidas ou favorecem a recuperação do sector privado com menosprezo da figura do Estado como interveniente no sector produtivo, contrariamente ao constitucionalmente estabelecido
De facto, os aumentos anunciados e, sobretudo, os efeitos dos efectuados a nível dos combustíveis líquidos, com 31% a 37% no fuel e 31% no díesel, sendo de 17% na gasolina e de 27% a 31% na electricidade não sossegam ninguém quanto à distribuição do ónus da recuperação económica.
O Governo tem pois, de prontamente definir qual a forma e quais as medidas que, cê modo concreto, defenderão preferencialmente as populações carecidas do efeito da correcção de preços recentemente efectuada.
Terá, por outro lado, de o fazer explicando claramente como pensa ultrapassar a contradição da defesa de contenção do déficit orçamental, da sua política de austeridade, com as anunciadas medidas de protecção às economias mais carecidas, isto é, esclarecer sem qualquer demagogia qual o ónus e sobre quem efectivamente o mesmo recairá.
Estas preocupações mais se acentuam ao verificarmos o segundo conjunto de medidas agora anunciadas pelo Sr. Ministro das Finanças, pois que se envolvem medidas restritivas à manutenção da qualidade de vida dos trabalhadores com outras que parecem ter como principal propósito iludir o efeito daquelas.
De facto, o ataque ao poder de compra dos trabalhadores é um dos seus objectivos fundamentais. Pretende-se dificultar e atrasar o mais possível a publicação dos contratos ou acordos colectivos de trabalho pela exigência de estudos e demonstrações que, em muitos sectores, serão impossível de fazer ou levarão a resultados sem qualquer viabilidade. Outro aspecto importante que se traduzirá num autêntico roubo aos bolsos dos trabalhadores é não permitir que a
retracção dos vencimentos dos novos contratos seja superior a três meses, desde que tenha influência sobre os custos. Por outro lado, os aumentos de vencimentos terão de ficar dependentes do aumento da produtividade e limitados pelos aumentos dos custos.
Pretende-se que os níveis de aumentos sejam menores, que a sua entrada em vigor seja protelada e que as retroacções sejam ridiculamente curtas, o que permitirá que os antigos contratos se mantenham sempre por períodos duplos ou triplos do prazo previsto de doze meses.
Liga-se ainda nas empresas públicas o aumento dos salários à situação económica e financeira das empresas, «só serão permitidos aumentos salariais ou a consagração de prestações complementares que se revelem comportáveis pela situação económico-financeira das empresas e sejam consentâneas com o objectivo prioritário de reduzir o ritmo de crescimento dos preços no corrente ano».
Por outro lado, atacam-se, de novo, os direitos dos trabalhadores dificilmente conquistados após o 25 de Abril, nomeadamente com o pretexto de «controlar o absentismo», da «coordenação do direito do trabalho com o direito de segurança social», da «intenção de moralização das normas relativas à justificação de faltas», de «liberalizar» os despedimentos individuais.
Em suma, o pleno êxito das medidas previstas levaria em alguns aspectos a uma situação dos trabalhadores, quanto aos seus direitos, pior do que a existente nos últimos anos do fascismo.
O ataque às empresas públicas é outro grande objectivo, como se vê na decisão de que «o montante global de subsídios não reembolsáveis a atribuir às empresas públicas em 1980 não poderá exceder o montante total dos subsídios autorizados no âmbito do Orçamento Geral do Estado para 1779», ignorando-se totalmente que o custo de vida aumentou 24 % em 1979 e ignorando-se também a natural expansão dos correspondentes serviços. Serão igualmente limitados os poderes dos respectivos conselhos de gerência.
Além disso, os serviços públicos, as pessoas colectivas de direito público e as empresas públicas passam a estar sujeitas a exames especiais à sua contabilidade por parte da Inspecção-Geral de Finanças, que deverá apreciar outros aspectos relevantes da respectiva situação económica e financeira, a fim de dar parecer sobre a efectiva necessidade e razoabilidade dos subsídios solicitados. Podemos estar certos de que, mesmo que venham, os subsídios chegarão muito tarde.
Por outro lado, são postas limitações à repercussão dos aumentos de custos nos correspondentes preços, o que, a par da medidas que igualmente se explicitam no âmbito salarial para as empresas públicas e sector empresarial do Estado, de novo levanta o efeito negativo para este sector da acção do Governo.
É apresentado um enunciado extremamente ambicioso que, para resultar, precisaria de uma estrutura que não existe. A verificação de um grande número de preços, da influência dos vários factores que nele se encontram e de que resulta o valor final e a veracidade dos números apresentados não é possível com a estrutura actual. Por outro lado, as referências já feitas à especulação realizada pelos próprios particulares e a necessidade de a reprimir e a constatação de que os grandes especuladores e intermediários, bem como os donos das grandes empresas, são uma das bases de apoio fundamental do actual Governo, levantam muitas dúvidas sobre o verdadeiro alcance desta campanha. Tudo indica tratar-se de uma encenação em que os grandes responsáveis serão esquecidos e uma repressão dura se irá abater sobre os pequenos intervenientes do processo especulativo, no sentido de se poder fazer uma grande campanha publicitária e demagógica sobre a luta contra a especulação sem, no entanto, afectar os grandes responsáveis e aqueles que arrecadam grandes fortunas à custa das fraudes que originam ou dos circuitos de intermediários, perfeitamente inúteis, a que dão origem. Trata-se, no fim, de tratar os sintomas da febre da Carraca, mas tendo o cuidado de não matar a própria Carraca.
Finalmente, consideramos a medida de revalorização do escudo, como traduzindo uma efectiva melhoria da situação da nossa balança de pagamentos e, nomeadamente, de transacções correntes, apenas se nos levanta a dúvida sobre a oportunidade da mesma revalorização ou, em alternativa, de uma mais acentuada redução da taxa de desvalorização deslizante que já vinha verificando-se, algumas vezes abaixo da que é agora proposta de 0,75 %. A não ser que se pretenda um efeito puramente político com a medida de revalorização anunciada.
Assim, o MDP/CDE não pode deixar de contestar as medidas do Governo que atentam contra os inte-
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resses das camadas mais carecidas e contribuem para a degradação do poder aquisitivo das classes trabalhadoras e de manifestar a sua preocupação quanto às consequências que sobre o sector empresarial do Estado poderão resultar das medidas restritivas e burocráticas agora enunciadas.
O Sr. José Vitorino (PSD): - É incrível!
O Orador - O verdadeiro fogo de barragem feito pelos órgãos de informação foi, desde logo, uma indicação da falta de segurança que o Governo tinha na forma como o público iria acolher as suas resoluções.
Nunca, desde o 25 de Abril, uma medida governamental fora tão insistentemente, obsessivamente, martelada por diversas formas, personalidades, meios, de maneira a tentar dominar a consciência do cidadão. Foi uma das mais impressionantes e abusivas manipulações pelo Governo dos órgãos de informação estatizados a que assistimos na nossa democracia. Talvez melhor se compreenda, assim, a razão por que o Governo tinha tanta pressa de sanear tão rapidamente tão grande número de gestores e colocar aí pessoas de sua confiança.
Porém mais tarde, como o azeite na água, sob esta catadupa de palavras do Governo, a verdade virá sempre ao de cima.
Aplausos do M DP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero informar a Câmara que, para além dos pedidos de ratificação que foram retirados, há mais pedidos apresentados que parece que tinham já dado entrada na Assembleia a 7 de Fevereiro, mas que só agora aqui chegaram.
Serão oportunamente também distribuídas fotocópias.
Tem a palavra para uma declaração política o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decorrido um mês sobre a tomada de posse do Governo do PPD e do CDS, uma pergunta ocorre desde já formular:
Que medidas tomou este Governo, tal como prometeu, para expandir a economia, para melhorar a vida material e cultural do nosso povo, para resolver os problemas de saúde e de habitação, para melhorar os transportes, para dinamizar a agricultura e a indústria? Acaso deu luz verde à execução de algum projecto industrial, ao Plano Siderúrgico Nacional, ou outro? Acaso tomou medidas para garantir o escoamento de produtos, aos agricultores? Acaso diminuiu as taxas de juro, aumentou o crédito ou tomou medidas para alargar o mercado interno e, assim, dinamizar as empresas portuguesas?
Quais então as preocupações deste Governo até agora manifestadas senão a aceleração das indemnizações aos grandes capitalistas, a permissão para a criação de bancos e companhias de seguros privados (como se os pequenos e médios empresários viessem a tornar-se em banqueiros e seguradores), a integração de Portugal na CEE e, como se não bastasse, o aumento generalizado dos preços.
E, quanto à integração de Portugal no Mercado Comum e ao anúncio triunfal do calendário da adesão pelo Sr. Ministro dós Negócios Estrangeiros que o Governo pretendeu apresentar como coisa espectacular, é conveniente recordar que tal calendário já há muito estava anunciado, quer em Bruxelas quer em Portugal, nomeadamente em folhetos de vulgarização. Mas vejamos mais de perto, por exemplo, a política de preços.
O Governo liberalizou o preço do azeite, aumentou o preço dos combustíveis e apresentou, na semana passada, o seu «cabaz de compras», retirando do anterior as salsichas e a mortadela, aumentando, entre outros, o pão em 4$ o quilograma, o açúcar em 6$ o quilograma, o arroz carolino em 6$ e assim por diante.
E não se coíbe de apresentar, como justificação de tais aumentos, os custos das matérias-primas, os salários, os combustíveis, os encargos financeiros, deixando de lado, pasme-se, o principal factor, ou seja, os lucros do grande capital, como aliás salientam os relatórios do Banco de Portugal. Não será porventura, significativo e revelador tal esquecimento numa lista que se pretende exaustiva? E, se os encargos financeiros pesam nos custos, porque é que o Governo não tomou, nem anunciou ir tomar quaisquer medidas para os atenuar?
Mas a duplicidade de critérios (!) deste Governo é ainda mais transparente quando inclui nos custos do pão os encargos salariais previstos em 1980! Isto significa que os industriais vão começar a receber desde já, enquanto os trabalhadores terão ainda de negociar para recuperar os decréscimos de salários verificados durante 1979...
Um outro ponto que merece reflexão é, sem duvida, o dos subsídios. Na verdade, o Governo afirmou que mesmo com este aumento de preços terá de despender 23 milhões de contos! Mas em benefício de quem é que o Governo vai gastar estes 23 milhões? Em benefício dos consumidores ou dos grandes intermediários? É bom que se saiba que, sob a capa de subsídios ao «cabaz de compras», uma boa parte destes vão directos aos bolsos dos grandes industriais (veja-se o que se passa com o açúcar, com o leite pasteurizado, com a pescada congelada, com os óleos e com as rações).
Tomemos o exemplo das rações. O Governo vai gastar mais de 8 milhões de contos em subsídios à produção de carne. No entanto, como é conhecido, só a carne de frango é que faz parte do «cabaz de compras». O que quer dizer que nas outras carnes quem recebe subsídios são os beneficiários, isto é, as outras carnes recebem subsídios mas os preços mantêm-se em contrôle. E isto por duas vias. Portanto o grande industrial, o grande marchante, o grande intermediário é que fica com a parte do bolo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa tentativa de lançar no esquecimento o aumento de preços e de mistificar a opinião pública, o Governo anunciou agora quinze medidas que vão desde a pura demagogia até à contenção e congelamento de salários.
Até agora já tínhamos o pacote dos aumentos, agora o Governo anuncia, de uma só penada, nada mais, nada menos do que quatro pacotes!
De facto, se analisarmos as medidas, facilmente constituiremos quatro grupos. O primeiro pacote, constituído pela 2.ª, 8.ª, 11.ª, 12.ª, 13.ª, 14.ª e 15.ª ou
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seja, oito em quinze agrupa medidas efectivas para conter os aumentos de salários ou para intensificar a exploração dos trabalhadores. Nada mais. Não deixa mesmo de ser curioso que o Governo só adjective de rigorosas as normas relativas à contratação colectiva, aos aumentos salariais e como não podia deixar de ser, em relação ao estrangulamento das empresas públicas e à repressão sobre as pequenas e médias empresas ...
Na verdade, naquilo que podemos designar por segundo pacote de medidas (5.ª e 9.ª), anunciam-se novas penas e novas formas de fiscalização, que, tal como no tempo da velha senhora, vão recair sobre os que não têm meios para corromper, sobre os que não possuem os amigos bem colocados... Isto é, vão recair sobre os pequenos empresários, que depois serão apresentados, com todo o barulho, como habitualmente, como casos exemplares à opinião pública. É o que comummente se designa pela política da «caça às pulgas para deixar passar os elefantes»!
E ainda em relação aos pequenos empresários é necessário dizer que, com as medidas tomadas, as falências vão continuar e que, com o aumento de preços, são os retalhistas e os comerciantes que ficam com o odioso, por estarem mais directamente em contacto com o público, por serem os mais vulneráveis, enquanto o grande capital fica com a parte do leão dos aumentos dos preços.
Se analisarmos a 2.ª, 3.ª e 4.ª medidas, a que designaremos por terceiro pacote, facilmente se verifica que o Governo pretende conter as despesas do Orçamento Geral do Estado à custa do estrangulamento das empresas públicas, dos trabalhadores, do aumento de preços e da deterioração dos serviços sociais. E, com as medidas restritivas agora tomadas e com as dificuldades adicionais que artificialmente se estão a colocar às empresas nacionalizadas, que desempenham um papel fundamental na economia, teremos novo abrandamento no crescimento económico com as conhecidas consequências ao nível do emprego, no agravamento da situação financeira das empresas e no endividamento externo do País...
Finalmente, resta o quarto pacote, constituído pela primeira medida, a revalorização do escudo, continuando com a desvalorização deslizante, o que significa, em termos práticos, que a revalorização será anuída em menos de seis meses! Ora esta medida, para além dos aspectos puramente demagógicos e emocionais de que se reveste, terá como efeitos mais prováveis o aumento dos lucros dos grandes importadores e a criação de novas vias de obtenção de lucros especulativos a prazo. Aliás, o relatório, do Banco de Portugal, bem conhecido do Sr. Ministro das Finanças, salienta que a inflação importada tem vindo a diminuir o seu peso na inflação, enquanto a rubrica «Outros rendimentos», cuja componente principal são os lucros, tem continuado a aumentar, contribuindo em 1978 para o aumento de preços com 48,3 %.
Assim sendo, se este Governo quisesse realmente travar a inflação, teria de actuar sobre a sua principal causa, isto é, sobre os lucros. Mas, sobre o contrôle dos lucros, sobre os lucros especulativos, sobre a sub e sobrefacturação, o Governo mantém-se quieto surdo e mudo!
Por outro lado, mantendo-se o contrôle a posteriori dos preços que, como se sabe e a prática demonstra, nada resolve e. mantendo-se as taxas de juro. a
contracção do crédito e a criação de dificuldades às empresas nacionalizadas e à Reforma Agrária, o Governo nada mais pretende do que continuar a desviar a atenção dos seus reais objectivos: a reconstituição dos privilégios, a reconstituição dos grupos económicos, fazendo recair os custos de tal operação sobre a classe operária, sobre os trabalhadores, sobre os pequenos e médios empresários.
Aplausos do PCP
Mas a demagogia terá Sr. Presidente, Srs. Deputados, os dias contados.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - É isso mesmo!
O Orador: - Este Governo acabará por ser derrotado, como derrotados serão as seus reais objectivos.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quase que seria evidente que o Partido Comunista, e possivelmente outros agrupamentos políticos - tal como já aconteceu ao MDP/CDE -, viriam aqui criticar as medidas que o Governo tomou em matéria económica, em sentido lato. E a verdade é que quando a oposição não se sente capaz de criticar as medidas tomadas, quando a oposição se sente desesperada porque finalmente apareceu um Governo que toma medidas...
Vozes do PCP: - Não apoiado!
O Orador: - ...e as toma num sentido muito claro de recuperar a economia ..
O Sr. João Lima (PS): - Vê-se, vê-se!
O Orador - ... e de contribuir para o aumento do poder de compra das classes mais desfavorecidas...
Risos do PCP.
... e aqui tem de se dizer claramente que aumentar o poder de compra das classes mais desfavorecidas não é seguir a política que tem alimentado a espiral salários/preços do Partido Comunista e do Partido Socialista ...
O Sr. Vital Moreira (PCP):- É aumentar os lucros!
O Orador - ..., o tratamento tem de ser outro e demonstrar que tem de ser outro é que durante seis anos essa política não conduziu a nada de positivo - mas como a oposição se sente desesperada ...
O Sr. João Lima (PS): - Isso, isso!
O Orador:- ... - repito - então faz agora aqui aquilo que fez quando do debate sobre o Programa do Governo: fala em termos de processos de intenção, faia iam lermos demagógicos e não é capaz de, em termos económicos, rebater nenhuma das medidas que foram tomadas.
O Sr. Manuel Moreira {PSD): - Muito bem!
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O Orador: - E aquilo que posso garantir ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas é que com o Governo da Aliança Democrática a política de demagogia tem, de facto, os dias contados.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Deseja contraprotestar, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não, Sr. Presidente, quero só prestar um esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me que é evidente que inclusivamente até a própria figura regimental encontrada pelo Sr. Deputado José Vitorino é a prova cabal de que os seus argumentos não têm sustentação porque senão preferiria a pergunta, o debate e a discussão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por isso recorreu ao protesto.
Mas eu vou dar um esclarecimento: pelo que se depreende das palavras do Sr. Deputado parece que, de facto, os combustíveis não aumentaram; que os bens de primeira necessidade não aumentaram; que a bica também não aumentou; que os preços estão a diminuir - é ir à praça e aos mercados!
Risos do PCP.
-, que as classes desfavorecidas cada vez estão melhores e, claro, que prova-se evidentemente dia a dia, na prática, que de facto as classes desfavorecidas vivem cada vez melhor! Isto é: que o Governo não faz demagogia!
Aplausos do PCP.
Prova-se que, de facto, com a desvalorização do escudo, com a contenção dos salários, com a retenção e a não promulgação dos contratos colectivos, a vida vai melhorar para os trabalhadores.
De facto é verdade! É verdade que o actual Governo não faz demagogia, que o Governo só tem apresentado projectos de desenvolvimento, que este país vive muito melhor, quer em relação aos transportes, quer em relação à agricultura, quer em relação à indústria... enfim, este Governo de facto, não faz demagogia! ...
Os portugueses e as portuguesas, no dia-a-dia, mos seus locais de trabalho darão as respostas ao Sr. Deputado e ao actual Governo...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Já deram ao PCP várias vezes!
O Orador: - ...porque podem-se enganar durante um dia, podem-se enganar durante dois, mas não podem enganar-se sempre.
Aplausos do PCP.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, é que o Sr. Deputado José Vitorino como pediu a palavra para fazer um protesto eu esperava que viesse protestar por ele ou o seu partido terem sido ofendidos. Afinal vem protestar porque um Deputado pôs em evidência determinados aspectos que quis criticar em relação ao Governo.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso é a sua opinião!
O Orador: - Tenho a impressão que a figura de protesto que o Sr. Deputado José Vitorino invocou não era de utilizar e era nesse sentido que queria interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - A Mesa só sabe aquilo que as pessoas dizem depois de as ouvir, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Moreira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo decorrido mais de um mês após a formação do VI Governo, é legítimo que os Portugueses se interroguem sobre a sua actuação e ponderem se está a cumprir minimamente as promessas eleitorais e os compromissos que assumiu perante o País.
E se para aqueles que não votaram nesta coligação da direita - afinal a maioria dos Portugueses - não há qualquer surpresa na lastimável conduta do Governo, já para aqueles que alimentaram algumas esperanças com as suas promessas ele é hoje uma completa desilusão e a imagem da incapacidade e da incoerência.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A política deste Governo tem sido descoordenada, desarticulada e improvisada conduzida aos sacões, em que um aspecto parcial da actividade governamental surge repentinamente como uma tábua de salvação de um Governo sem ideias e sem planos, aspecto parcial que monopoliza as suas emergias, esquecendo-se ou ignorando-se as múltiplas necessidades do País que deveriam naturalmente ter uma resposta pronta e coerente.
O Sr. José Nisa (PS): - Muito bem!
O Orador: - Apesar disso, salientam-se sem qualquer margem de dúvida alguns temas quentes da política governamental que passaremos a analisar: a política internacional numa primeira fase, a procura constante de situações conflituais com o Presidente da República e o Conselho da Revolução, a política de subida generalizada dos preços e o assalto aos órgãos estatizados de comunicação social.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - O PS sustenta que este Governo tem dado provas de imaturidade política, de incapacidade governativa, de incompetência em toda a linha e de inquietante revanchismo.
Aplausos do PS.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!
O Orador - Com efeito, este Governo, em vez de enfrentar - os problemas concretos do povo português - como durante a campanha eleitoral afirmou que faria -, transformou a política externa na sua principal área de combate, com uma carga de agressividade insólita. Insólita mas não inocentes, pois quis criar artificialmente a figura do inimigo externo para esbater a sua incapacidade na solução dos problemas reais dos Portugueses e desencadear, com este pretexto, um conflito institucional, envolvendo o Sr. Presidente da República e a política externa que ele patrocinou.
Citemos apenas um exemplo:
Durante o II Governo Constitucional, a pasta dos Negócios Estrangeiros foi ocupada pelo Dr. Sá Machado, do CDS. Apraz-nos elogiar a forma responsável a criteriosa como o Dr. Sá Machado desempenhou as suas funções.
O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!
O Orador: - Nem nos consta que jamais qualquer elemento do CDS tivesse formulado qualquer crítica à política externa desenvolvida pelo Dr. Sá Machado no II Governo Constitucional, a qual coincidiu, no essencial, com a preconizada pelo Primeiro-Ministro de então, Mário Soares, e sempre teve na devida conta a opinião do Chefe do Estado, na sua qualidade constitucional de chefe da diplomacia portuguesa, que representa o Estado e não o Governo como (diz o artigo 138.º da Constituição).
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Eis que agora a pasta do Ministério dos Negócios Estrangeiros é ocupada de novo por um outro elemento do CDS, ou seja, o seu presidente. Prof. Freitas do Amaral.
E o que vemos? Numa prodigiosa manifestação de duplicidade política, o CDS, que em 1978 se comportava de modo responsável, faz agora uma política internacional de duas faces: uma para consumo interno, mediante a divulgação de um discurso a proferir no âmbito da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, em que ataca sem decoro e sem verdade o Chefe do Estado, acusando-o de intervenção «sempre imprecisa» e de fomentar «diplomacias paralelas»; outra para o exterior, onde procura exibir uma face mais civilizada, retirando, segundo notícias dos jornais, essas expressões ofensivas da dignidade do Chefe do Estado.
Qual o objectivo desta duplicidade? Passaremos daqui em diante a ter duas versões dos discursos de Freitas do Amaral?
O PS verbera veementemente a atitude ambígua do Vice-Primeiro-Ministro, que não respeitou a dignidade do Chefe do Estado.
O Governo da AD parece encaminhar-se inexoravelmente para o confronto institucional e social, preparando as condições para dramatizar a situação política e encontrar um escape para a sua incapacidade e ambições mais vastas, na culpabilização dos outros: a oposição, o Presidente da República, o Conselho da Revolução e, numa palavra, as instituições e valores resultantes do 25 de Abril.
O Sr. Salgado Zenha (PS): - Muito bem!
O Orador: - Esta lógica do confronto tem um encadeamento ao qual dificilmente se consegue escapar, quando, deliberadamente, o Governo dá passos nesse sentido, ainda que mais tarde pense, porventura, em recuar.
De facto, o Governo tem suscitado, intencionalmente, pontos de rotura ou de fricção com outros Órgãos de Soberania sob os mais diversos pretextos.
O PS alerta o País para o que está a acontecer com o feixe de decretos sobre as comemorações camonianas, o Congresso das Comunidades Portuguesas e o 10 de Junho, bem como com as celebrações do 25 de Abril.
A suspensão daqueles decretos paralisou as actividades preparatórias e as alterações que o Governo neles pretende introduzir, apenas visam partidarizar as comemorações e entrar em conflito com o Presidente da República.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Detecta-se nesta acção do Governo a preocupação - que disfarça um forte grau de insegurança - de diminuir a intervenção presidencial, talvez porque a Aliança está receosa do prestígio de que disfruta o general Ramalho Eanes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Quanto às comemorações do 25 de Abril, a tentativa de vetar um militar de Abril e um dos seus mais coerentes protagonistas só poderá ter uma interpretação: o Governo quer esvaziar de significado político e do seu natural simbolismo revolucionário as comemorações dessa data incomparável, condicionando o espírito dias realizações e desfigurando, em seu favor, os sentimentos populares com ela relacionados.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas o 25 de Abril não é pertença do Governo, muito menos de um Governo que representa as forças sociais e os valores que não morrem de entusiasmo por essa data e que mais gostariam de a ver reduzida a uma efeméride sem consequência ou a uma velharia que se coloca na prateleira poeirenta da História.
Aplausos do PS.
Mas tal não permitiremos, Sr. Presidente e Srs. Deputados. O 25 de Abril será festivamente comemorado pelo povo, pelos trabalhadores e pelos jovens, por aqueles para quem os cravos jamais murcharão e em pri-
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meiro lugar, pelos capitães que o fizeram com coragem e o defendem com amor, suscitando as iras da coligação governamental.
Aplausos do PS.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Está a delirar!
O Orador: - No campo da política económica, o Sr. Presidente e Srs. Deputado, o PS assinala com vigor a contradição gritante entre a demagogia eleitoralista da AD e a desoladora realidade da sua acção.
Este Governo prometeu suster a alta dos preços e não cumpriu. Ainda mal tinha aquecido o lugar, desencadeou a alta dos preços dos combustíveis, do gás e da electricidade, culminando com a subida dos produtos incluídos no «cabaz de compras»; ao mesmo tempo, os restantes bens, submetidos ao regime de preços declarados, e que é a grande maioria, continuam a subir.
Para atenuar os efeitos impopulares desta onda de aumento dos preços o Governo fez uma larga encenação à volta de um conjunto de quinze medidas pretensamente anti-inflacionistas.
Destaca-se de toda a efervescência e movimentação dos responsáveis da área económica a subordinação da sua estratégia ao objectivo - aliás de duvidosa exequibilidade - de limitar o crescimento dos preços a 20% no ano em curso. Além do mais, é um pouco ridículo montar tal propaganda a propósito de um objectivo de redução de apenas 4 pontos na taxa de inflação.
Mas tendo em conta as medida? anunciadas, sacrifica-se a criação de postos de trabalho, o desenvolvimento económico e a melhoria substancial do bem-estar da população portuguesa.
Será esta a recompensa que os eleitores de condição modesta da AD receberão? E se não é pior ainda, isso ficará a dever-se às preocupações eleitorais do Governo.
A lógica desta política vai no sentido de privilegiar os interesses privados e de asfixiar o sector público da «economia.
O PS, que tem recomendado a adopção de uma política económica expansiva, o aumento do nível de vida da população e a criação de novos empregos, vê com apreensão e condena esta míope visão e o não aproveitamento das condições positivas já criadas pelo restabelecimento dos equilíbrios da economia.
O Governo tem outras preocupações. Vai colocar a população portuguesa sob o espectro da continuação do declínio ou estagnação do seu poder de compra, da agudização do desemprego e da instabilidade social.
A esta luz se deverá julgar a decisão do Governo de devolver às associações sindicais quarenta convenções colectivas de trabalho que consagram aumentos salariais mais do que justos - provocando com esta atitude arbitrária naturais protestos dos trabalhadores com os quais o PS se manifesta solidário.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PS não pode também deixar de condenar a ofensiva contra a Reforma Agrária dirigida por um homem do agrado dos latifundiários e que não dá quaisquer garantias de respeito pela legalidade, para não falar do seu desamor pela Reforma Agrária.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo não consegue disfarçar o ambiente de mal-estar social que a sua política gera. Até os mais indefectíveis eleitores da AD se começam a interrogar sobre o sentido da utilidade do seu voto!
O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas o mais espantoso é que este Governo, passado mais de um mês, ainda não logrou substituir os governadores civis socialistas, gerando uma situação paradoxal: os socialistas, que estão em oposição frontal, por todo o País e em todos os sectores, a este Governo inapto e retrógrado, são obrigados a assegurar o funcionamento dos governos civis até que a AD concilie as ambições dos seus caciques distritais, que disputam apaixonadamente sobre qual dos componentes da Aliança terá direito ao lugar e, depois, qual dos candidatos há-de ser contemplado com tão almejado prémio...
Aplausos do PS e do Sr. Deputado Luís Catarino (MDP/CDE).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O comportamento do Governo no sector da comunicação social reveste-se de indiscutível gravidade.
As escandalosas demissões dos quinze gestores da comunicação social, acompanhados pelo afastamento de Helena Torres Marques, director-geral da Administração Local, de Maria Adelaide Rocha, director-geral do Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis, e do engenheiro Trigo de Morais, da administração da Tabaqueira, configuram actos de autêntico saneamento político e da mais arbitrária discriminação.
O Governo prescinde de apreciar a competência e cuida apenas da cor política. Dispensa a isenção e a capacidade e preocupa-se com a confiança partidária. Afasta aqueles que são isentos, prefere, aparentemente, os seus «comissários políticos». Se Soares Louro, Amílcar Martins, Pegado Lis e todos os outros fossem da AD, seriam substituídos?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É uma pergunta ingénua que faz sorrir qualquer pessoa minimamente informada. Para o Governo, serve um gestor da AD, não serve um gestor que não o seja, mesmo que tenha capacidade, competência e já tenha disso dado sobejas provas.
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Ainda bem, Já chega!
O Orador - Mas o recente afastamento dos gestores da RTP, RDP, ANOP e Diário Popular merece uma análise mais detalhada.
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Como foi já reconhecido, mesmo por uma conhecida personalidade afecta à AD, a substituição dos gestores dos órgãos de comunicação social estatizada obedeceu a um critério claramente político. O Governo visa o contrôle total da informação estatizada. Esta actuação é tanto mais grave quanto é certo que, ainda há poucos dias, o Ministro Pinto Balsemão havia declarado ser intenção do Governo não interferir na comunicação social estatizada. O executivo AD acaba de demonstrar o seu apego a esta promessa e o seu respeito pelo pluralismo e pela isenção da comunicação social estatizada. O Governo não conseguiu ainda aduzir um só argumento que seja para justificar o que nesta matéria acaba de fazer. A explicação é simples: a exoneração de quinze gestores não foi justificada, porque não tem para o Governo qualquer justificação. Trata-se ainda e apenas de, por via das novas administrações, substituir os responsáveis mais directos pelo conteúdo da informação, de forma a torná-la adaptada e adaptável aos ditames governamentais. O futuro próximo provará que esta substituição de gestores nada tem a ver com problemas de gestão, mas apenas com a necessidade de substituir grande parte dos responsáveis pela programação e pela informação, nomeadamente da RTP e da RDP. O Governo quer controlar a informação estatizada e não hesita nos meios para atingir esse fim.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Com este assalto aos órgãos da comunicação social estatizada, fica gravemente comprometido o pluralismo na informação e corre-se o risco de esses órgãos se tornarem a correia de transmissão das posições oficiais do Governo.
O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Queira abreviar, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Se tivermos em conta que a informação privada é quase monopolizada pelo poder económico, avaliamos do autêntico cerco feito aos partidos da oposição.
Com estas medidas, o sector da informação passa de estatal a governamental e da informação à propaganda.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PS confia, no entanto, que os profissionais da informação vão oferecer resistência a esta ofensiva do Governo, defendendo essa trincheira essencial da democracia que é a informação livre, isenta e pluralista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face à mais que provável falência desta experiência governativa da direita e tendo em conta o que ela representa e as convulsões que irá provocar no País, urge aglutinar todas as forças e personalidades que se reclamam do socialismo democrático, para que o sonho não morra, os ideais democráticos e anticapitalistas nascidos da revolução de Abril, não sejam espezinhados pelos interesses classistas de toda a direita - afinal a responsável histórica do atraso e da opressão do povo pelas minorias privilegiadas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A este governo negativo, sem horizontes e sem esperança, é preciso apresentar uma alternativa viável, positiva e criadora: a alternativa do socialismo democrático.
Aplausos do PS.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Rui Pena (CDS): - É para dar dois esclarecimentos à Câmara suscitados pela declaração política do Partido Socialista.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista, na sua manifesta incapacidade para atacar o Governo quanto aos aspectos mais relevantes da sua política e, muito concretamente, relativamente à política internacional, utilizou hoje, mais uma vez, o processo de atender a um fait-divers.
Neste caso não foi a carta perdida do Presidente Cárter. Tratou-se, pois, do não respeito de um embargo relativamente à divulgação de um discurso que havia sido pronunciado pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros numa assembleia internacional.
É evidente que o Partido Socialista não deve nem tem o direito de utilizar estes expedientes nem estas manobras de diversão para não atacar-se é que alguma vez tem de atacar os grandes objectivos da nossa política externa.
Risos do PS.
Srs. Deputados, com efeito não há qualquer duplicidade na política externa definida pelo actual Governo.
O Sr. João Lima (PS): - Isso é verdade!
O Orador: - Não há qualquer duplicidade, ela está bem determinada e bem vincada, e não é - como antigamente sucedia - uma política externa para português ver, outra para os estrangeiros. A nossa política externa tem objectivos muito concretos que passam pelo apoio da dignidade de Portugal no estrangeiro, pelo apoio às nossas comunidades emigrantes...
O Sr. João Lima (PS): - Isso, isso!..:
O Orador: - ... pelo apoio à nossa integração na Europa, passam pelo nosso alinhamento na NATO e, naturalmente, pelo respeito de todos os países do Mundo dentro de um princípio de não ingerência. Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Socialista foi mais além numa reviravolta verdadeiramente espectacular e contra aquilo que nos havia habituado, designadamente, nos já - para eles - longínquos anos de 1978. Ele veio trazer a esta Assem-
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bleia uma defesa vigorosa da dignidade da Presidência da República e do actual titular da Presidência da República. Ficam muito bem esses sentimentos ao Partido Socialista, sobretudo se os pusermos em comparação com as atitudes tomadas por esse mesmo partido nos anos de 1978 e 1979.
De qualquer modo, cumpre esclarecer, em primeiro lugar, que não houve qualquer expressão menos respeitosa que pudesse significar qualquer menor dignidade à função da Presidência da República. Não houve qualquer expressão menos respeitosa no primeiro projecto do referido discurso que, porventura, contra o embargo estabelecido, tivesse saído a lume.
Em segundo lugar, o Governo da Aliança Democrática - que desde sempre, e publicamente, o tem declarado manifestas vezes - respeitará a ordem institucional estabelecida e, por consequência, não quer nem pretende estabelecer qualquer confronto institucional.
Eram estes dois esclarecimentos que pretendia dar à Assembleia.
Aplausos do CDS.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Era para dar um esclarecimento à Câmara, Sr. Presidente.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ai que esclarecedor!
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente Srs. Deputados.: O Sr. Deputado Carlos Lage disse que este Governo era um Governo sem ideias e sem planos.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Com ideias fixas!
O Orador: - Curiosamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um Governo sem ideias e sem planos que ao fim de menos de um mês de funcionamento consegue fazer aquilo que nenhum Governo tinha feito anteriormente.
Risos e aplausos do PS.
Aplausos do PSD, CDS e PPM.
Ou seja, definido em Março de 1977 nesta Câmara, por voto expresso e maioritário das forças políticas então presentes, o apoio da adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia - passados ires anos em que sucessivos Governos de inspiração, liderança, participação ou apoio do Partido Socialista que não consegue em três anos definir um calendário de ligação do Governo de Portugal à CEE - é este Governo que, com um prazo de três semanas, consegue perante as instâncias comunitárias fixar pela primeira vez um calendário de integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia.
Aplausos do PSD, PPM e CDS.
Se isto não é política externa, se isto não são ideias, se isto não são planos, é apenas pela miopia política do Partido Socialista.
Vozes do PSD, PPM e CDS: - Muito bem!
O Orador: - O Partido Socialista criticou a aplicação da Lei da Reforma Agrária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não somos responsáveis pelo arrependimento político que o PS hoje manifesta face a uma lei que propôs nesta Câmara.
Vozes do PSD e do Sr. Deputado Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!
O Orador: - Não podemos é eximir-nos à responsabilidade de fazer aplicar algo com o qual concordámos, concordamos, e por isso somos coerentes.
O Sr. Deputado Carlos Lage referiu os actuais governadores civis como importantes servidores do Estado democrático e imediatamente sugeriu que os seus substitutos seriam caciques.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Era assim, era!...
O Orador: - Ou seja, o tratamento para governadores civis por parte de personalidades que são do Partido Socialista ou de personalidades que pertencem a outra área tem um tratamento completamento diferente por parte do Partido Socialista.
Este critério dúplice, este critério de para si reivindicar a justeza, a coerência e a honestidade e para os outros imputar o demérito mais não releva do que da incapacidade de fazer uma análise serena, clara e sobretudo contraditória com discursos de dirigentes socialistas. E lembro o último discurso do Dr. Salgado Zenha quando nesta Casa falava que «não há maniqueísmos políticos, não há bons e maus em democracia». Contudo, é hoje o Partido Socialista que ataca a última intervenção do Dr. Salgado Zenha ao introduzir critérios de bons e maus para pessoas que servem a mesma função.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Deputado Carlos Lage criticou a mudança dos órgãos de comunicação social atribuindo intenções veladas ao Governo de contrôle governamental dessa área. Queremos dizer que os exemplos dos vossos camaradas Edmundo Pedro e Manuel Alegre ainda não são perfilhados, nem o serão, pelas bancadas dos partidos que constituem a Aliança Democrática. Concretamente, não somos responsáveis por o Sr. Soares Louro ter posto o seu lugar à disposição, a não ser que VV. Ex.ªs quisessem que ele pusesse o lugar e nós não o aceitássemos. Não somos responsáveis por termos convidado e designado um militante socialista para presidente da ANOP e não somos responsáveis por ele ter prescindido desse lugar. O convite e a nomeação foram feitos. A recusa, não é nossa mas sim dele.
O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!
O Orador: - Também não somos responsáveis porque no leque de gestores que irão integrar os órgãos de comunicação social não se situem pessoas da área do PS, mas também não se situem pessoas militantes dos partidos da Aliança Democrática.
Risos do PS e PCP.
Encontramos um militante que integra ...
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa de interrompê-lo, mas já passaram os três minutos do seu esclarecimento
O Orador: — Sr. Presidente, vou já terminar, mas só queria dizer que integra apenas um militante dos actualmente nomeados, e sem ter em linha de conta as nomeações feitas pelo próprio Governo socialista.
Por essa razão, Sr. Presidente, Srs. Deputados, as acusações do Partido Socialista não tem qualquer espécie de fundamento. Vamos, como qualquer Governo democrático, preservar a independência, a pluralidade dos órgãos de comunicação social e, sobretudo, nunca daremos o triste exemplo e espectáculo que o Partido Socialista deu em 1976-1977, que foi o de nomear só militantes seus...
O Sr. Moreira da Silva (PSD): — Agência de empregos!
O Orador: — ... e — pasme-se, Srs. Deputados — paradoxalmente também não somos responsáveis por os seus militantes o terem abandonado e em alguns casos terem feito política contra eles.
Não somos responsáveis pela incapacidade dos próprios militantes do PS em conseguirem manter a fidelidade que inicialmente traçaram ao seu anterior partido.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. António Campos (PS)' — Sr. Presidente, peço a palavra
O Sr. Presidente: — Para que efeito?
O Sr. António Campos (PS): — É para dar um esclarecimento à Câmara.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Campos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Ângelo Correia acabou por fazer há pouco a afirmação de que o Partido Socialista estava arrependido da Lei da Reforma Agrária. Isso não é verdade, e o que lamentamos profundamente é que o actual Secretário dte Estado da Estruturação Agrária não cumpra a lei.
Aliás, é bom esclarecer a Câmara de que este Sr. Secretário de Estado é um homem que nós, socialistas, duvidamos que seja capaz de não só cumprir a lei como, também, de desempenhar honestamente o lugar que ocupa.
Vozes do CDS: — Olha quem fala!
O Orador: — As razões são simples e gostaria de as declarar aqui para que esta Câmara tome conhecimento. Este Secretário de Estado é o mesmo que no tempo de Mota Pinto transferiu do Crédito Agrícola de Emergência algumas centenas de milhares de contos para os bolsos da família do presidente da CAP, e não mais para os outros agricultores, com juros altamente bonificados e grande parte deles não investidos no sector. Por outro lado, este Secretário de Estado é o mesmo senhor que nomeia para dirigir o Plano de Investimento do Alentejo o Sr. Dr. José Godinho Trancas de Carvalho, que é um dos beneficiários e
um dos c£us amigos. Em relação aos centros de reforma agrária, os juristas estão a ser saneados. Em Beja, a semana passada, foram colocados na rua o Sr. Dr. Fernando Madeira, a Sr.ª Dr.» Marília e o Sr. Dr. Urmar só porque — retirando-lhes as chaves de acesso a qualquer processo de organização das entregas de reservas— as reservas, de facto, estão a ser entregues aos amigos e não a quem delas tem direito. Aconteceu também isso a semana passada no Freixo, em Montemor; aconteceu também que este Secretário de Estado nem sequer, em relação às decisões judiciais, as toma em conta, acontecendo o mesmo a semana passada em Avis.
O Sr. João Lima (PS): — Muito bem!
O Orador. — O que hoje se passa no Ministério da Agricultura é que um senhor, colocado lá por uma organização de agricultores e que serve só e exclusivamente a direcção dessa organização, está a levar o sector, não só no campo do investimento como também no campo da aplicação, a favor de meia dúzia de cidadãos e não no cumprimento cia lei.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Rui Pena (CDS): — Não apoiado!
O Orador: — Ele não utiliza a lei, utiliza os poderes discricionários totais que a lei lhe dá, mas ultrapassa-os todos os dias e em 'todas as acções que toma no dia-a-dia, da governação
Protestos do CDS.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): — Isso é uma calúnia!
O Orador. — Eram estes os esclarecimentos que queria dar à Câmara.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou animado de uma perplexidade regimental, dado que não percebi bem se o Sr. Deputado António Campos pediu um esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Lage ou se deu um esclarecimento autónomo. Se assim foi, em que termos do Regimento é que se insere?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): — Muito bem!
O Orador: — Em todo o caso, gostaria de pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Lage.
Referiu-se o Sr. Deputado à aplicação da Lei da Reforma Agrária e queria perguntar-lhe se aplicação da Lei da Reforma Agrária envolve unicamente o problema da entrega das reservas ou se envolve também o problema da administração das terras expropriadas que não se sabe porquê e Partido Socialista, repetidamente no Poder, abandonou completamento a uma entidade privada inteiramente à margem da lei.
Gostaria, pois, de saber se foi a isso aue o Sr. Deputado Carlos Lage se referiu, ou se foi simplesmente'
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em relação ao problema eternamente explorado da entrega das reservas.
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - É para pedir um esclarecimento.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pretende responder já ou prefere ouvir todos os pedidos de esclarecimentos?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, se me dá licença, sugeria responder já aos pedidos de esclarecimento que me foram feitos, pois insere-se aqui uma outra polémica na qual com certeza o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro quer entrar neste momento.
Portanto, se V. Ex.ª me dá licença, responderia já às perguntas que me foram formuladas e o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro aguardava, até porque vou ser muito breve.
O Sr. Presidente: - Então faça favor, Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - O Sr. Deputado Rui Pena teve uma oportunidade considerável de esclarecer as duas versões do discurso do Prof. Freitas do Amaral, Vice-Primeiro-Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Esta Câmara e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista ficar-lhe-iam muito gratos se em vez de ter proclamado quais os princípios da política externa que defende nos tivesse simplesmente esclarecido qual o motivo que presidiu à elaboração das duas versões, o que é que isso significa e se isso é ou não uma política de duas faces: uma para o interior, outra para o exterior. Perdeu a oportunidade e muito lhe agradeceríamos se conseguisse deslindar esse tão intrincado problema.
O Sr. Deputado Ângelo Correia diz que o Governo já fez a adesão à Europa. Esperemos que o Governo faça a adesão a Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PSD:- Eih!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A adesão a Portugal?!
O Orador: - Quanto às questões que o Sr. Deputado coloca sobre os governadores civis, quero dizer-lhe que não afirmei que os governadores civis da Aliança Democrática iriam ser fatalmente caciques. O que quero dizer é que passado mais de um mês sobre a tomada de posse do Governo se assistia - não disse isto, mas posso dizê-lo agora - a um autêntico folhetim em vários distritos do País - aliás, relatado pelos jornais com passagens rocambolescas -, em que se disputa quem há-de ocupar este lugar: ou um representante distrital de um dos partidos da Aliança ou de uma facção.
Chamei a isso «caciquismo», pois de facto, não há outra expressão, para designar esse conflito apaixonado que se vive a nível distrital entre os diversos candidatos ao lugar de governador civil. E o que é certo é que um acto que devia ser rápido e eficaz da parte do Governo vai-se prolongando há largo tempo, passa da agenda do Conselho de Ministros para Conselho de Ministros, e os governadores civis socialistas são obrigados a assegurar a gestão corrente dos governos civis.
Uma voz do PSD: - Muito obrigado!
O Orador: - Não tem nada que agradecer, pois é um trabalho que se faz pela população e não pela Aliança, já que a Aliança só nos merece oposição e, neste caso, desprezo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Coitadinho!
O Orador: - Quanto às questões relacionadas com a mudança nos órgãos de comunicação social como o Sr. Deputado eufemisticamente disse, não é uma mudança, é um assalto, é um saneamento.
Vozes do CDS: - Ah!!
O Orador: - Todo o País vê que é assim e não vale a pena o Sr. Deputado tentar ocultar aquilo que é evidente e perfeitamente claro aos olhos de qualquer cidadão minimamente informado.
Mas, diz o Sr. Deputado que João Tito de Morais não quis continuar. Claro que ele não quis continuar porque muito correctamente não podia manter-se quando não foi consultado para as mudanças então produzidas e passaria a ser a peninha para enfeitar um leque de personalidades todas elas afectas à Aliança Democrática.
Também o mesmo aconteceu com Soares Louro que, como vem fazendo noutras oportunidades, colocou o seu lugar à disposição do Governo. O Governo perdeu uma oportunidade de dar um ar de independência e de imparcialidade mas aproveitou para o substituir por um homem da sua confiança, por um comissário político, tal como eu disse na minha intervenção.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Esse não era peninha!
O Orador: - Portanto, chegamos à conclusão e ficamos cientes de que a culpa não é da AD, é nossa.
Quanto ao Sr. Deputado Sousa Tavares, quero dizer-lhe que o Partido Socialista nunca afirmou que a aplicação da Lei da Reforma Agrária envolvia apenas problemas de transferência de propriedade ou de marcação de reservas. Portanto, a sua pergunta é praticamente supérflua.
Sempre dissemos que além do problema da transferência da propriedade do solo e da marcação das reservas, há problemas técnicos e económicos importantes de dimensionamento das explorações colectivas, do seu estatuto, questões que têm sido sobejamente levantadas por nós. Mas não queremos deixar de marcar a nossa discordância sobre a orientação que tem
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vindo a ser seguida e que é sistematicamente interpretar de forma incorrecta a lei e aproveitar os poderes discricionários de que dispõe o Ministro para, sistematicamente, dar mais terra e vantagens aos agrários e prejudicar e destruir as cooperativas e unidades colectivas de produção.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É pois, este espírito faccioso, é esta interpretação incorrecta e classista da lei que o Partido Socialista vem denunciando de há largo tempo para cá. Isto é, desde que homens próximos da Aliança Democrática passaram a monopolizar os lugares desse Ministério e a decidirem das terras a entregar aos reservatários.
A tónica da sua actuação tem sido sempre uma: dar mais terra aos agrários, aos seus familiares, aos seus parentes, de forma que os trabalhadores tenham menos para asfixiar as boas experiências cooperativas, para fazer soçobrar a Reforma Agrária numa atitude claramente contra-revolucionária, ou seja, contra a Reforma Agrária, tal como está na Constituição e tal como ainda está no espírito da Lei da Reforma Agrária.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer um esclarecimento à Câmara em relação às afirmações que aqui foram proferidas, principalmente àquelas que foram feitas pelo Sr. Deputado António Campos.
Falou o Sr. Deputado António Campos nas ilegalidades quanto à aplicação e à distribuição dos créditos por parte do Ministério da Agricultura. Não era mau que António Campos tivesse esclarecido que é da sua autoria a legislação ao abrigo da qual foram concedidos os créditos. Não era mau que se tivesse dito que agora as irregularidades e ilegalidades que o Sr. Deputado fala se fizeram ao abrigo de leis feitas no período do II Governo Constitucional e que agora ele acusa de servirem interesses menos correctos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Sente-se a Aliança Democrática perfeitamente à vontade porque no dia 15 de Janeiro, nesta mesma Assembleia, apresentei um requerimento solicitando que nos fossem indicados pelo Ministério da Agricultura quais os resultados dos inquéritos feitos no tempo do governo de Joaquim Lourenço, à forma como tinham sido utilizados esses mesmos créditos, concedidos ao abrigo das leis socialistas - ilegais, pelo que ficámos a saber -, e que agora, nós, Aliança Democrática, nos preocupamos em saber qual o destino que foi dado.
É que para nós o que está em causa não é a quem foi emprestado o dinheiro, mas sim saber se o mesmo foi destinado à utilização de fins agrícolas, ou se foi utilizado para depósito bancário, tal como fala António Campos e organizações próximas de António Campos.
O Orador: - São esses os objectivos que estão em causa.
Quanto à forma da aplicação da Lei da Reforma Agrária não deixa de ser curioso recordar que quando o Partido Socialista foi governo tinha uma óptica bem diferente, óptica essa pela qual, por exemplo, António Barreto teve que não aceitar o cargo de Ministro da Agricultura do II Governo Constitucional. Esquecem-se, Srs. Deputados?
É que agora quem fala na distribuição de terras a seareiros, a trabalhadores rurais e a rendeiros é quem em Junho de 1977, em Coimbra, se opunha à distribuição de terras individualmente aos trabalhadores rurais, dizendo que isso era trazer para o Alentejo os problemas do minifúndio do Norte do País.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Isto disse-o António Campos, ao tempo Secretário de Estado da Estruturação Agrária.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
Mas estamos habituados, pois o Partido Socialista faz política e muda de política consoante o momento que passa.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Como em certa altura aqui disse um bem-humorado Deputado, tinha dificuldade em fazer os seus discursos porque estavam desactualizados quando acabava de falar, tal era a velocidade com que o Partido Socialista mudava.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - É para dar um esclarecimento à Câmara.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Peço-lhe, no entanto, que seja breve e conciso no seu esclarecimento, tal como diz o Regimento.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Carlos Lage desejou que o Governo da Aliança Democrática estivesse com Portugal. Nunca foi lema da Aliança Democrática a Europa connosco.
Risos do CDS e do PSD.
Talvez não seja essa a lembrança do Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado António Campos introduziu, há pouco, no debate político um elemento que é o de difamação. Nós debatemo-nos politicamente, somos adversários políticos. Contudo, a Aliança Democrática não fará intervir no debate parlamentar qualquer situação de calúnia e assim nos comportaremos.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador - O Sr. Deputado Carlos Lage referiu há pouco, na sua intervenção, que tinha desprezo pela Aliança Democrática.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Não disse isso!
O Orador: - Nós queremos dizer ao Partido Socialista que não nutrimos qualquer desprezo pelo Partido Socialista.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Que distinto!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria dizer que o esclarecimento que o Sr. Deputado Carlos Lage deu às minhas palavras foi perfeitamente ao lado do problema que eu tinha posto. Eu tinha dito que neste problema da aplicação da Lei da Reforma Agrária há várias incidências fundamentais, de que uma delas é a entrega de reservas e outra a administração dos bens nacionalizados.
É perfeitamente histórico e comprovado que o Partido Socialista enquanto esteve no Poder e os Governos subsequentes ignoraram completamente aquele segundo aspecto, que se estiveram «nas tintas» para que mais de 1 milhão de hectares fosse administrado por uma entidade particular que é actualmente o maior proprietário agrário do País, com plenos poderes sobre homens, sobre coisas, sobre gados, sobre propriedades.
Assim, eu gostaria de saber se o Partido Socialista nada tem a dizer a isto, se o Partido Socialista quando fala da Reforma Agrária subscreve este estado de coisas, se é legalista ou se é ilegalista, ou se é alternadamente legalista e ilegalista conforme lhe convém...
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esta discussão pode eternizar-se se começarmos a pedir esclarecimentos repetidamente. A Mesa não consentirá nesse caminho, porque, se assim for, não poderemos prosseguir os nossos trabalhos.
Em todo o caso, e em respeito de critérios já anteriormente definidos, não se quis coarctar a palavra do Sr. Deputado Sousa Tavares e por isso mesmo se o Sr. Deputado Carlos Lage quiser responder tem a palavra.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é para dar um rápido esclarecimento acerca da afirmação do Sr. Deputado Ângelo Correia.
Eu quando usei a palavra «desprezo» foi num certo contexto, o contexto em que estava a analisar o comportamento dos diversos candidatos distritais aos lugares de governadores civis, que era um autêntico folhetim em que esses lugares eram apaixonadamente disputados... E foi nesse caso particular que eu disse que isso me merecia desprezo. Se por acaso não fui suficientemente claro aqui fica a rectificação, porque é óbvio que era esse o espírito com que fiz tal afirmação.
Quanto ao Sr. Deputado Sousa Tavares, tenho que lhe dizei; que devia conhecer melhor o Regimento V. Ex.ª devia fazer-me perguntas sobre a minha intervenção e está-me a fazer perguntas à margem da minha intervenção, sobre um assunto que virá eventualmente a discutir-se aqui e sobre o qual estarei de bom grado disposto a entrar em debate com o Sr. Deputado, mas francamente não vamos fazer perguntas umas sobre as outras sem que a certa altura já não tenham relação nenhuma com a intervenção inicial que aqui produzi.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Deputado não sabe é responder!
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Está a fugir com o rabo à seringa!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): - O Sr. Deputado Manuel Casqueiro não desmentiu uma única palavra das que eu afirmei.
O Sr. Deputado disse que há uma legislação, há uma legislação que serve todos os agricultores, e o que eu condeno é que o Secretário de Estado da Estruturação Agrária se sirva dessa lei exclusivamente para servir a família da direcção da CAP e não para servir todos os agricultores. A família do presidente da CAP recebeu 70 000 contos que foram passados do crédito agrícola de emergência a crédito de prazo altamente bonificado e os outros agricultores portugueses não tiveram essa possibilidade.
Não está em causa a legislação, o quo está em causa é o compadrio que a sua organização faz com o Secretário de Estado da Estruturação Agrária. Isso é que está em causa.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - É uma pouca vergonha!
O Orador: - E quando o Sr. Deputado diz que não está em causa que recebeu o dinheiro, então eu gostaria de saber porquê, porque sei onde está depositado algum desse dinheiro, o que foi feito dele. De facto gostaria, porque é um crédito altamente bonificado, pago por todos os portugueses, que caiu nos bolsos da família do presidente da CAP e não caiu nos bolsos dos outros agricultores.
Por outro lado, Sr. Deputado, queria lembrar-lhe, que há dois inquéritos em andamento e cujos resultados o povo português tem direito a conhecer. Foram iniciados no tempo do próprio Prof. Vaz Portugal, que os anunciou publicamente, dizendo até que chamaria a Polícia Judiciária e versam, um, sobre a corrupção reinante na entrega de reservas no tempo do Gabinete do Prof. Vaz Portugal, de que era Secretário de Estado o actual Secretário de Estado, e, outro, sobre o desvio do crédito agrícola de emergência para alguns beneficiários que são só os apaniguados da CAP!
É o caso agora mais vil da nomeação do Sr. José Trancas Godinho de Carvalho - que foi outro, com os familiares do presidente da CAP, dos beneficiários- para director do Plano de Investimento no Alentejo. E são 13 milhões de contos em jogo! Que
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garantia têm os agricultores, que garantia têm os Portugueses da honestidade desse investimento ou de os planos serem feitos de acordo com o interesse nacional e não de acordo com os interesses dos apaniguados da CAP?
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Manuel Casqueiro pede a palavra para que efeito?
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Era para dar um esclarecimento ao Sr. Deputado António Campos.
O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado estamos a discutir uma intervenção política do Sr. Deputado Carlos Lage. Foram-lhe pedidos esclarecimentos e estar a lateralizar-se a discussão parece-me ser profundamente anti-regimental
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, considero que foram feitas afirmações extremamente graves e como tal, se não me é permitido dar uma explicação, peço para fazer um protesto.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra para um protesto, Sr. Deputado. No entanto, lembro que o mesmo deve ser apresentado objectiva e sucintamente, aos termos do Regimento.
O Sr. Lino Lima (PCP): - Por quem foi ofendido e o Sr. Deputado Manuel Casqueiro não foi ofendido... Sentiu-se foi ofendido!
Risos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É a democracia de rua!
O Sr. Lino Lima (PCP): - Isto não pode ser o reino da barafunda!
Concedida a palavra, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não percebo a preocupação que vai neste momento nas bancadas da oposição...
Quando se chega à pequenez política de em vêz de se discutir problemas graves ...
Risos do PS, do PCP e do MDP/CDE
... - e grave é o problema da Reforma Agrária e eu compreendo nesta altura as dificuldades da oposição e o seu receio quando ouve dizer, e vai vê-lo dentro da dias, que vai começar finalmente a distribuição de terras a pequenos agricultores e a trabalhadores rurais.
O Sr Vital Moreira (PCP): - Aos familiares da CAP!
O Orador: - ..., então, nesse altura, eu compreendo as razões porque se prefere a calúnia e o ataque pessoal ...
O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!
O Orador: - ... à escolha do projecto político. E o projecto político é que está em causa. Tudo isto são meras manobras de diversão.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Os 70 000 contos são diversão! ...
Manifestações de protesto do PS e do PCP
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos o favor de não interromperem e de deixarem o orador prosseguir.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não dá jeito!
O Orador: - O Sr. Deputado António Campos quando há pouco disse que haviam sido instaurados dois inquéritos esqueceu-se de que efectivamente há dois inquéritos, de que um foi mandado instaurar no tempo do Prof. Vaz Portugal à corrupção existente no MAP no período anterior ao do II Governo Constitucional
Vozes do CDS: - Muito bem!
Vozes do PS: - É falso!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não, não!
O Orador: - É que eu não o faço porque não me baixo a esse nível de fazer ataques de raiz pessoal, já o afirmei e torno-o a fazer aqui
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Tem o fogo em casa ...
O Orador: - Quando ponho o problema de que se está a fazer um processo de intenções, de calunias de carácter pessoal, como aquele que o Sr. Deputado António Campos faz sem o mínimo de autoridade moral (ele sabe bem que não a tem) ...
Vozes do CDS: - Muito bem!
Protestos do PS
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes o favor de ouvirem o orador. Depois poderão usar da palavra através das figuras regimentais adequadas.
O Orador: - É que considero que é fundamental que se esclareça a forma como foram utilizados os critérios e por isso sinto-me pessoalmente à vontade porque no dia 15 de Janeiro pedi nesta Assembleia da República, em nome dos parlamentares que englobam a maioria parlamentar, para que soubéssemos todos quais os resultados dos inquéritos.
Com certeza que o Sr. Deputado António Campos nessa altura poderá e deverá ser ouvido porque é por aquilo que sabemos, um bom inspector, já que foi um mau Secretário de Estado ...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - É que a calúnia que acaba de fazer, a afirmação que acaba de fazer de que há pessoas
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que em vez de utilizarem os dinheiros os colocaram em depósitos a prazo ...
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não e só isso!
O Orador. - ...é para mim uma calúnia extremamente grave que merece que o Sr. Deputado não só se limite à calúnia como denuncie claramente o número da conta e a violação, afinal, daquilo que o Partido Socialista tanto acusou e a quem agora vemos utilizar os mesmos métodos que utilizaram certos sectores do Partido Comunista com tanta crítica do Partido Socialista!
Meus amigos, isto não é fazer política, isto não é discutir projectos políticos. ...
O Sr. Carlos Candal (PS): - É fazer fortuna!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - É denunciar a corrupção!
O Orador: - ...isto é transformar a Assembleia da República na imagem que ela teve. Comigo não contém. ......
Vozes do PCP: - Para quê?
O Orador: - ... porque não estou disposto a participar nisso. Estou, sim, disposto a defender nesta Assembleia os interesses ...
Vozes do PCP: - Cuidado ...
O Orador:-....daqueles que nos elegeram para aqui estarmos. Estou disposto a dignificar e a colaborar para a dignificação da Assembleia da República, não estou é disposto a participar em actos de menoridade política.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, irei dar a palavra, por ordem de inscrição, aos Srs. Deputados António Campos, Carlos Lage e Sousa Tavares.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): - É para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Manuel Casqueiro está muito preocupado por eu estar aqui a discutir 70 mil contos que foram para o bolso do presidente da Associação de que é secretário-geral, mas não esteve muito preocupado por nos ter obrigado a estar aqui na última quinta-feira a discutirmos toda a tarde 60 mil contos, que era quanto custavam as comemorações do Dia das Comunidades. São dois critérios, são duas visões ...
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
Agora o que o Sr. Deputado deve fazer é esclarecer a Câmara, porque, possivelmente por lapso, enganou-se e disse que o inquérito aberto no tempo do Prof. Vaz Portugal incidia sobre a corrupção existente no tempo dos governos socialistas mas não era sobre a corrupção existente no seu próprio Governo, como ele próprio declarou no acto de posse e no discurso que fez.
Aliás, quero dizer-lhe também, Sr. Deputado, que Salazar e Caetano negaram sempre que fossem ditadores, mas, no entanto, foram-no e todos nós soubemos de que maneira!
Hoje a CAP é o Ministério da Agricultura e nega sistematicamente os seus objectivos. ...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - E faz-se pagar bem!
O Orador: - ... mas todos nós estamos elucidados sobre quais são os seus objectivos. Sr. Deputado. O senhor é, de facto, aqui o representante dos grandes senhores da terra e dos grandes intermediários, mas o senhor procura aqui sempre demagogicamente desviar as atenções. A questão que lhe pus aqui, meu caro amigo, foi que o presidente da sua associação, pela mão do actual Secretário de Estado, recebeu dezenas de milhares de contos a que os outros agricultores não tiveram direito, e isto o senhor não é capaz de desmentir. E também lhe posso assegurar que esses 70 mil contos não foram investidos na totalidade na sua exploração agrícola, porque os senhores hoje são um bando de compadres que tomaram conta do MAP e estão a executar uma política vergonhosa.
Os saneamentos que fizeram, como tirar as chaves a juristas para que estes não pudessem ter acesso aos processos só para que o povo não saiba a quem são dadas as reservas, demonstram bem o compadrio que vai neste momento na Secretaria de Estado.
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - É a legalidade!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista está disposto, como sempre, a que se cumpra o Regimento e deseja que o período de antes da ordem do dia decorra normalmente.
Fiz uma intervenção, foram-me pedidos esclarecimentos a que respondi com brevidade, mas, entretanto, o Sr. Deputado Manuel Casqueiro tem feito várias intervenções a propósito da minha intervenção e de certa maneira desligadas da mesma, e até acabou por falar da dignificação da Assembleia para que ele estaria vocacionado... Não rejeitamos essa pequena partícula de dignificação da Assembleia que pode representar a contribuição do Sr. Deputado Manuel Casqueiro. No entanto, não dignifica esta Assembleia quem se apresenta aqui como porta-voz da CAP, dos seus titulares, defendendo causas perdidas, defendendo processos em que alguns dos seus titulares estão sob acusação pública, e não se devolvem essas acusações dizendo aos outros que são caluniadores.
Sr. Deputado Manuel Casqueiro, V. Ex.ª demonstrou aqui que não é amigo dos agricultores portugueses, demonstrou, sim, que é amigo de alguns latifundiários, particularmente dos seus colegas na direcção da CAP!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.
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O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Esta polémica é uma polémica que não devia ter sido travada a propósito das declarações do Sr. Deputado Carlos Lage.
Se regimentalmente houve alguma infracção foi com a intervenção do Sr. Deputado António Campos, que a propósito da intervenção do seu colega Carlos Lage e sem lhe pedir qualquer esclarecimento, fez uma declaração altamente polémica à Câmara, envolvendo acusações extraordinariamente graves.
Aliás, neste aspecto da concessão de créditos agrícolas de emergência, eu próprio tenho tido dúvidas, dúvidas que honestamente, sem ser Deputado e sem estar ligado a qualquer organização política, procurei esclarecer junto do Ministério da Agricultura e Pescas. Nessa altura foi-me fornecido um relatório completo, que posso exigir à Câmara, sobre os créditos agrícolas de emergência, transformados depois em créditos a longo prazo, e em que se referiam dois créditos essenciais: o crédito feito à família Queiroga e o crédito feito à família Uva. Esses dois créditos suscitaram, pelo seu volume, algumas dúvidas, e eu próprio suscitei junto do Ministro da Agricultura Vaz Portugal.
Devo acrescentar até que os números citados pelo Sr. Deputado António Campos não são correctos e quando se citam números devem ter-se os elementos à vista para que sejam exactos.
Esses dois créditos foram concedidos para facilidades de intensificação de criação pecuária. Em ambos os casos os créditos pedidos foram extraordinariamente inferiores àquilo que ultimamente foi concedido e foram os serviços técnicos do Ministério - em ambos casos - que transformaram, num caso, um crédito pedido de 4 mil contos num crédito de 25 mil contos!
Risos do CDS
Vozes do CDS: - É verdade.
O Orador: - É rigorosamente verdade. Foi no caso do crédito pedido pela família Uva. O crédito pedido era de 4 mil contos e foram-lhe concedidos 52 mil contos ...
Risos do PS e PCP.
... dizendo-se que a transformação da propriedade no sentido pecuário que era pedido não comportava um financiamento de 4 mil contos, mas exigia um financiamento de 50 mil.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - É a inflação...
O Orador: - O que é extraordinário é que já depois da queda do IV Governo Constitucional e na vigência do V Governo Constitucional, da presidência da Sr.ª Eng. Maria de Lurdes Pintasilgo, à mesma entidade foram concedidos mais 15 mil contos de crédito para a mesma finalidade e desses não fala o Sr. Deputado António Campos!
Portanto, se há um inquérito a fazer, ele é muito extenso...
Vozes do PCP: - É sim!
O Orador:- ... e não pode ser simplificado politicamente a favor deste ou daquele Ministério...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... que tem que ser visto a fundo em relação a todos os serviços do Ministério e sobretudo à luz destes critérios. Se realmente se justifica que a intensificação da exploração pecuária possa exigir isso e admito que possa e que tecnicamente esteja certo que em vez de 4 mil contos sejam necessários 52 mil contos para transformar a propriedade numa propriedade pecuária intensiva - eu só pergunto o seguinte: justifica-se ou não que um crédito desse volume, bonificado e a longo prazo...
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Está tudo na mão da CAP a longo prazo...
O Orador: - ... seja concedido a uma entidade apenas e não a todas? Portanto, o problema que se pode pôr é o de selecção dos candidatos à concessão desses créditos e o saber se todos os agricultores portugueses não têm o mesmo direito de receber créditos no mesmo volume, ou até se de facto se tratou de um excesso ou de um erro técnico dos serviços. Penso que é assim que a questão deve ser lealmente posta, e não através de declarações de tipo demagógico como fez o Sr. Deputado António Campos, que não posso admitir de maneira nenhuma.
Não são os Ministros que estão em causa, é todo um conjunto de serviços técnicos e de informações técnicas em que muitas vezes os tecnocratas...
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não são os tecnocratas, é a CAP!
O Orador: - ...levados pela pura apreciação de um projecto - e nós temos demasiados exemplos disso, como o caso dos 120 milhões de contos deitados ao mar em Sines -, perante um problema qualquer, nomeadamente de um melhor aproveitamento pecuário de uma herdade, dizem que não se pode criar uma boa exploração pecuária dessa herdade com 4 mil contos, mas sim com 52 mil..
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E mais 12 mil.
O Orador:- ...e perante esse parecer os serviços respectivos dizem «conceda-se».
O que é que os Ministros, podem fazer perante isto?
Vozes do PS: - Ora, nada ...
O Orador: - Este problema é um problema extraordinariamente sério, mas que tem de ser discutido aqui na Câmara, tendo em conta a função tecnocrata neste país, porque tudo o que está errado neste país começa, em geral, pelos tecnocratas e pelos seus pareceres e a sua responsabilidade é normalmente desviada para a responsabilidade dos políticos.
Do que se trata aqui é de um problema de erro de apreciação tecnocrática.
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
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O Sr. Presidente: - Entretanto, gostaria de informar a Câmara de que ainda há três inscrições sobre esta matéria, as dos Srs. Deputados José Manuel Casqueiro, António Campos e Vítor Louro, que, além disso, há duas declarações políticas por produzir e que ainda não entrámos no período de antes da ordem do dia, apesar de já serem 17 horas e 5 minutos. Enfim, os Srs. Deputados lá sabem...
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.
O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso deixar de estranhar um pouco o que aqui se passa, porque chego a pensar se não haverá nesta altura nesta Assembleia uma certa falta de conhecimento do que é um crédito. É que quase sinto que o crédito é uma coisa que está dada a alguém...
O crédito agrícola de emergência está regulamentado por uma lei feita -pelo II Governo socialista, e como há pouco acabei de dizer, não era extensivo a todos aqueles que viviam na agricultura e foi no tempo do Ministro Vaz Portugal tornado extensivo a todos.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Essa é boa.
O Orador: - Há exposições no Ministério da Agricultura em que elevado número de pequenos agricultores se queixam de que, no tempo do II Governo Constitucional, que é como quem diz no tempo em que o Sr. Deputado Amónio Campos era Secretário de Estado da Estruturação Agrária, não lhes era facultado esse tipo de crédito, não lhes era facultado transformar o crédito agrícola de emergência em crédito intercalar, pois tal só era feito para utilização partidária, para as cooperativas socialistas, já que às cooperativas comunistas até isso era vedado.
Trata-se de exposições que em momento oportuno posso testemunhar.
Quanto à outra questão não menos importante sobre se a utilização do crédito é ou não correcta, compete à comissão de inquérito determiná-lo. A esta Assembleia compete, num acto perfeitamente correcto, aferir se o inquérito foi ou não correcto.
E foi por isso mesmo que há dias aqui nesta mesma Assembleia pedi a criação da comissão de fiscalização das. ilegalidades do MAP o mais urgentemente possível. É porque entendo que a Assembleia da República não pode nem deve continuar a discutir se a aplicação da lei foi ou não correcta.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Essa é boa!
O Orador: - Há comissões que têm de funcionar para se tirar o carácter dramático às questões que nem sempre o têm.
Quanto a afirmação feita pelo Sr. Deputado Carlos Lage de que eu estou aqui mas afinal não represento quem me elegeu, acho-a curiosa, porque, como o Sr. Deputado Carlos Lage sabe, fui eleito por um distrito onde o seu partido até há bem pouco tempo, até estas eleições, era largamente maioritário e que dava como exemplo de um distrito onde se vivia num clima de excepção democrática, onde o totalitarismo do Partido Comunista não tinha subordinado as populações. Era essa a afirmação constante de alguns socialistas, alguns dos quais respeito muito.
Hoje passaram a votar ali maioritariamente na Aliança Democrática, e eu afinal não represento os agricultores, apesar de, à minha volta, ter reunido diversas vezes largas dezenas de milhares de agricultores ...
Vozes do PCP: - Ena!
O Orador: - ...sem ter necessidade de pagar camionetas ...
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Bastaram os Mercedes!...
O Orador:- ...como afinal fez o Partido Socialista diversas vezes e que muito fazem lembrar os velhos sistemas do regime passado.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos, a quem peço o favor de ser o mais sintético possível.
O Sr. António Campos (PS): - Farei o possível, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, quero esclarecer o Sr. Deputado Sousa Tavares de que de facto não fui eu que trouxe à Câmara o assunto da Reforma Agrária, mas sim o Sr. Deputado Ângelo Correia. O que eu fiz foi prestar um esclarecimento à Câmara acerca dessa intervenção do Sr. Deputado Ângelo Correia.
Para além disso, gostaria de lhe fornecer alguns dados. Pedi há pouco que me fossem buscar um dossier que terei o prazer de lhe facultar, dado que me parece que V. Ex.ª está mal informado.
Em primeiro lugar, o crédito concedido à família Uva não foi de 50 mil contos, mas de cerca de 80 mil.
Risos do PCP.
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - Sr. Deputado, se me permite é só para dizer que recebeu 50 mil e mais 15 mil durante a vigência do Ministério Pintasilgo portanto já concedidos por este Ministério.
O Orador: - Não, Sr. Deputado, deve haver um equívoco, porque isso verificou-se no Ministério de Vaz de Portugal.
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - Não, Sr. Deputado. Foi agora, e não pode negá-lo porque é um facto dado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem não pode haver diálogo.
O Orador: - A explicação que pretendo dar à Câmara é a de que há um crédito de um ano, de juros altamente bonificados.
O Sr. Deputado José Manuel Casqueiro afirmou que no tempo do Prof. Vaz de Portugal foram passados milhares de contos do crédito agrícola de emergência para o crédito a longo prazo aos pequenos agricultores.
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Isso não e verdade e o Sr Deputado sabe-o, porque de facto dos 200 ou cerca de 300 mil contos que foram transferidos durante a vigência do actual Secretário de Estado, que e o engenheiro Goulão, que era responsável por essas passagens de crédito, o mesmo Secretário de Estado que lá está agora, foram passados cerca de 80 mil para a família Uva, cerca de 60 e tal 70 mil contos para a família do presidente da CAP e cerca de 18 mil para o Sr. Dr. José Trancas Godinho de Carvalho, que é uma trempe, aliás importante, na actual equipa do Ministério. O Sr Deputado sabe isto tão bem como eu, e não vale a pena enganarmos os Srs Deputados, porque o Senhor tem os mesmos elementos que eu tenho e já os mandei buscar para fornecer caso seja necessário.
O Sr Deputado acusa-me de ter dado crédito às Cooperativas socialistas em detrimento de outras Cooperativas, afirmações que o Sr Deputado não é capaz de confirmar aqui nesta Casa, ao passo que eu sou capaz de confirmar exactamente, por escudos e tudo, o que tenho vindo a afirmar desde o começo da polémica e o Senhor não e capaz de afirmar aqui que no tempo dos governos socialistas se tenham só financiado Cooperativas socialistas, porque se financiou os agricultores, a medida que os pedidos vieram de Cooperativas socialistas e não socialistas.
De facto, orgulhamo-nos de termos estado no governo, não como secretários e não como aquilo que o Sr Engenheiro Goulão e a sua equipa, neste momento, estão a fazer no Ministério da Agricultura e que é um caso grave, Sr Deputado.
Retirar ao Sr. Dr. Fernando Madeira, a Sr.ª Dr.ª Marília, ao Sr. Dr. Ulmar as chaves de acesso aos processos - a eles que são juristas, funcionários -, só para que tudo aquilo se faça em compadrio à porta fechada.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Conversa de cozinha.
O Orador: -... acho isto extremamente grave Se do Sr Deputado isto lhe não repugna, a mim, como democrata que sou, repugna-me violentamente. Por isso protesto, nesta Câmara, contra tais métodos, porque eu, enquanto lá estive, nunca os executei, nunca vedei nada a ninguém A governação fez-se de portas abertas, sempre escancaradas, ao passo que os senhores estão a fechar aquilo para fazer a governação no escuro e para governarem a favor dos vossos «compadres» E é isto só que está em causa, Sr Deputado É isto que o Sr Deputado Casqueiro terá de ter sempre em conta quando aqui tomar a palavra. É que nos, em Portugal e num Estado democrático em que vivemos, queremos uma governação aberta e não aceitamos a governação sé para a família da CAP Era bom que o Sr Deputado informasse esta Câmara de como têm distribuído as terras!.. É aos funcionários da alfândega, por exemplo de Elvas? Ao Sr Joaquim Lerias e companhia limitada?.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Zangam-se os compadres
O Orador: - Será que estão metidos em «redes» especiais, com alguns homens também especiais? E que estão a receber terras junto da fronteira.
Era bom, Sr. Deputado, que fosse trazendo estes assuntos para a Câmara e que, um dia, quando quiser, possamos discutir isto aqui em pormenor.
Aplausos do PS
O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.
O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Pedi a palavra, mas não quero, de modo nenhum, envolver-me nesta polémica. Apenas me limitarei a tirar a conclusão de que são fortes as razões pelas quais a direita se tem recusado sistematicamente a dizer a verdade sobre a atribuição de créditos no Ministério da Agricultura.
Curiosamente, desde o reinado de António Barreto, em que fiz o primeiro requerimento sobre a atribuição do credito agrícola de emergência, passando pelos reinados de Carlos Portas, Ferreira do Amaral e subsequentes.
O Sr Narana Coissoró (CDS). - E António Campos, também!
O Orador: -..., cinco requerimentos meus sobre esta matéria ficaram, até agora, sem resposta.
Assim, gostava apenas de aproveitar esta oportunidade para solicitar, de acordo com a oferta do Sr. Deputado Sousa Tavares, que me fornecesse os elementos que pôs à disposição da Câmara, isto e, o relatório do Ministério da Agricultura sobre os casos que referiu
Vozes do PCP - Muito bem!
O Sr Presidente - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, para dar um esclarecimento.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para dar apenas um pequeno esclarecimento à Câmara.
Constato que ficou aqui demonstrado a evidência corrupção do aparelho de Estado, nomeada e vincadamente ao nível do problema da Reforma Agrária.
Isso não e por acaso É que a Reforma Agrária e efectivamente, a base fundamental das conquistas do nosso povo.
Porém, não nos podemos esquecer que os ataques a Reforma Agrária começaram com a lei dos 50 mil pontos e continuaram, mais tarde, com a lei Barreto.
O esclarecimento que queria prestar é o seguinte estive, há poucos dias, em Beja, em Albernoa, em Baleizão e tive oportunidade de assistir ao julgamento que se ía fazer de um réu, trabalhador de uma unidade colectiva, que era acusado de ser agredido pela GNR.
Isto demonstra o estado de intimidação que existe naquelas terras e que prepara o assalto e o roubo das terras dos trabalhadores agrícolas.
Em Albernoa, neste estilo, as 9 horas da noite, os trabalhadores agrícolas não podem cantar na rua. nem sequer na taberna onde bebem um copo
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estive a falar com os trabalhadores das cooperativas de Albernoa e das herdades colectivas de Baleizão e constatei o ódio profundo desses homens à CAP, à Aliança dita Democrática ...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso foi antes ou depois do almoço? ...
O Orador:-...e que não vão consentir que a ofensiva, que o roubo às suas terras, possa continuar.
Eles estão totalmente dispostos a unir-se, a lutar a resistir e a impedir que mais qualquer roubo lhes seja feito, porque o seu lema - e que é justo - é de que a terra deve ser para quem a trabalha e não dar reservas a quem as não vai trabalhar e vai apenas aproveitá-las para continuar a viver no luxo. como até aqui.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie.
O Orador: - Sim, Sr. Presidente, vou já concluir. A luta dos assalariados agrícolas do Alentejo vai ser uma realidade!
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Vai, vai!...
O Orador: - As paralisações que se vão realizar e a agudização dessa mesma luta vão pôr em causa os ataques à Reforma Agrária e os Srs. Deputados que se dizem defensores dos trabalhadores devem ter isto em conta e devem, quando se tratar das entregas impostas das reservas, ir lá abaixo e, à frente dos trabalhadores, oporem-se a esse roubo das terras que pertencem a quem as trabalha.
Vozes do PSD: - Queremos lá vê-lo a si!...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sousa Tavares, vou dar-lhe a palavra. Porém, peço aos Srs. Deputados o seguinte: é evidente que a figura regimental do esclarecimento permite realmente tudo isto ...
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - É de ida e volta!...
Risos.
O Sr. Presidente: - É exactamente isso. Por isso, gostaria que não houvesse mais «voltas», porque a ser assim, não cumprimos o indispensável da ordem de trabalhos.
O Sr. Sousa Tavares (Indep.): - Dado que considero que este diálogo com o Sr. Deputado António Campos é útil, vou simplesmente juntar dois ou três esclarecimentos, para que fique perfeitamente clara a minha posição relativamente a este assunto.
Insisto no número que apresentei da concessão de crédito à família Uva, de 52 mil contos, aumentado com mais 20 mil contos no Ministério Pintasilgo, em que, até agora, foram utilizados 15 mil contos. Tenho os dados em meu poder.
Quanto à questão do crédito agrícola de emergência, levantada pelo Sr. Deputado António Campos, ele sabe que não tem razão.
O que se passou foi o seguinte: estes créditos do crédito agrícola de emergência são créditos de melhoramentos, a médio e longo prazo, e que o Ministério da Agricultura determinou que os créditos a longo prazo só são concedidos mediante um exame prévio da Caixa Geral de Depósitos, que, em geral, é muito lento e que demora mais de um ano. Por uma questão de precipitação do fomento agrícola, o Ministério da Agricultura tomou a deliberação - que o Sr. Deputado António Campos bem conhece -, quando os créditos estão aprovados, isto é, quando os créditos tem todos os pareceres a seu favor, de antecipar a concessão do crédito a médio prazo, através do crédito agrícola de emergência, que é reembolsado no ano seguinte.
Foi o caso que aconteceu com estes dois crédito», em questão.
O problema, a meu ver, existe e entendo que a Câmara deveria nomear uma comissão para o averiguar.
À luz dos créditos a médio e a longo prazo, não têm sido concedidos só estes créditos. Já se concederam mais de um milhão de créditos a variadíssimos agricultores, em todas as regiões do País. Portanto, não se trata de crédito isolado. O que se trata é de créditos especialmente avultados e, por isso, convém averiguar se o erro é técnico ou se o erro é político. Continuo na minha. E isto é que é fundamental que se averigúe e esta é a posição que a Câmara deve tomar sobre o assunto. Isto é, evitar que à custa da concessão de créditos - num país onde o crédito é estreito e há magreza ou impossibilidade de concessão de créditos - determinadas pessoas sejam favorecidas por pareceres mais ou menos justos. Parece-me que são justos, porque não se encontra em ambos os inquéritos feitos nenhuma acusação aos pareceres. Parece, no entanto, que estávamos no mesmo caso se eu apresentasse agora um projecto de industrialização de uma coisa qualquer e me fosse automaticamente concedido todo o dinheiro necessário para poder montar esse projecto.
O Sr. João Lima (PS): - Ou mais!
O Orador: - É possível que isso se possa fazer em países ricos, mas duvido que se possa fazer em países pobres.
Portanto, mais do que um problema político, é um problema de justiça ou de repartição justa na atribuição de créditos.
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut para interpelar a Mesa.
O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe vénia para interpelar a Mesa, com toda a cordialidade.
Acontece que tenho assistido bastante confundido a um debate estranho, processado à inteira revelia das normas regimentais, e que em nada dignifica esta Assembleia, que tem na ordem do dia bastantes e profundas matérias a discutir.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Aliás, o período de antes da ordem do dia terminou há mais de uma hora, sem que tivesse sido prolongado, e, por isso, a nossa situação também é a este título, anti-regimental.
Por outro lado, verifica-se, segundo creio, que há alguns partidos que pretendem produzir declarações políticas e têm o direito de o fazer.
Pergunto, por isso, a V. Ex.ª Sr. Presidente - não me leve a mal, estou até pensando que lhe facilito de alguma maneira a sua ingrata missão -, à luz de que normas regimentais estamos aqui produzindo um debate que não está na ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Bem, Sr. Deputado António Arnaut, sabe tão bem como eu - e também com a mesma cordialidade lhe respondo -, que estamos a seguir uma praxe e que é a de as declarações políticas - e este debate inseriu-se numa declaração política inicial - não contarem para o período de antes da ordem do dia, como muito bem sabe.
Portanto, assim, houve uma declaração política do Sr. Deputado Carlos Lage, seguiram-se os esclarecimentos, com o «vai-e-vem», como disse há pouco o Sr. Deputado Sousa Tavares, e só vejo - com a calma que daqui de cima é possível ter-se - o artigo 103.º do Regimento que diz que antes da ordem do dia, considerando que essa praxe se insere antes da ordem dó dia, nenhum Deputado poderá usar da palavra por mais de dez minutos.
Ora, tanto que ainda não estávamos no período de antes da ordem do dia que há duas declarações políticas que vão ser feitas imediatamente: a do Sr. Deputado da UDP e, depois, a do Sr. Deputado do CDS. Só depois é que temos os votos.
Porém, e muito curiosamente, tenho aqui um requerimento a pedir a prorrogação do período de antes da ordem do dia, porque justamente, ela ainda não acabou.
Posto isto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, permita-me dar-lhe uma sugestão.
Dado que nos aproximamos do intervalo, era preferível que, durante este, reunisse a conferência dos grupos parlamentares para resolver este imbróglio.
De modo contrário, vamos ter declarações políticas, votações, o período da ordem do dia que ainda se não iniciou e mais o prolongamento. Assim, iremos ter toda esta tarde ocupada com o período de antes da ordem do dia, situação que não gostamos de ver produzir-se nesta Câmara.
Assim, é possível encontrar-se durante a reunião dos grupos parlamentares uma solução que permita que esta sessão tenha período da ordem do dia e consigamos votar as matérias previstas.
O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. Agradeço a sugestão e, aliás, era essa a ideia da Mesa.
Faremos já um intervalo nos nossos trabalhos e aproveitávamos para, com toda a urgência, se fazer a reunião dos leaders dos grupos parlamentares.
Está suspensa a sessão.
Eram 17 horas e 30 minutos
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se. Srs. Deputados, a duas declarações políticas.
Tem a palavra o Sr Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A mudança anunciada pelo Governo AD começa a tomar forma. Cada vez que se reúne o Conselho de Ministros ou esta Assembleia da República é uma mudança no sentido do 24 de Abril. Em duas direcções fundamentais se estão a processar os ataques visando o regresso ao passado. Por um lado. os ataques à Reforma Agrária, às nacionalizações, às condições de vida dos trabalhadores; por outro, os ataques às liberdades, que passam pelo contrôle dos órgãos de comunicação social, para poderem utilizar este instrumento ideológico, ao serviço de uma política de repressão, de desinformação. de intoxicação da opinião pública.
O recente «pacote» da comunicação social, com a mudança dos conselhos de administração, mais não visa do que colocar sob sua direcção os órgãos de comunicação social, com elementos reaccionários nos pontos-chave. Querer-se-á transformar todos os órgãos estatizados em Diário da Manhã, Emissora Nacional e televisão do tempo passado?
O Governo dos grandes patrões tem feito uso da televisão como coutada sua numa perspectiva demagógica e reaccionária!
Os recentes aumentos de preços, ligados ao congelamento dos contratos colectivos, vêm colocar os trabalhadores, portugueses cada vez em situações mais aflitivas, abrindo mais a porta à miséria nos lares portugueses.
As promessas eleitorais, do aumento do poder de compra dos trabalhadores, encobrem, de facto, o aumento dos lucros dos grandes patrões portugueses e das multinacionais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As medidas apontadas pelo actual Governo, como meio de combate à crise com que se debate a economia portuguesa e, em particular, os trabalhadores portugueses, apresentam-se envoltas de um carácter profundamente demagógico, visando escamotear completamente as causas reais dessa crise.
Ao apontar a necessidade de combater a inflação, o Governo tem sistematicamente escondido que o principal gerador da inflação tem sido, nos últimos anos, os escandalosos ganhos dos grandes capitalistas e, em particular, dos grandes intermediários parasitas.
Com as medidas anunciadas, o Governo AD pretende que continuem a ser os trabalhadores a pagar a crise, para a qual nada contribuíram e, com a qual, uns poucos capitalistas muito têm beneficiado.
De facto, ao exigir uma maior fundamentação económica e financeira, para os aumentos salariais dos trabalhadores e exigências de produtividade mais elevadas, o Governo demonstra que não entende justos os aumentos salariais, que no mínimo reponham o poder de compra entretanto perdido, condicionando os aumentos a factores que, na maioria das vezes, não dependem sequer da vontade dos trabalhadores
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A revalorização do escudo surge, neste momento, como uma medida particularmente demagógica, logo desmascarada, pela promessa de continuação do processo de desvalorização deslizante.
Trata-se, afinal, de revalorizar um pouco hoje, para desvalorizar um pouco mais de amanhã por diante.
Relativamente aos processos de combate à corrupção e especulação que grassa aos vários níveis, do reforço dos castigos aos prevaricadores, o mínimo que nos merecem é um total cepticismo e desconfiança, já que é também nesses sectores que este Governo antinacional goza de grandes apoios.
E já sabemos que são os pequenos que, por terem a corda na garganta, às vezes são obrigados a prevaricar, vão ser atingidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O retrato mais fiel da prepotência e da arbitrariedade dos senhores da AD, neste caso do PSD, é o que se passa na Região Autónoma da Madeira.
A UDP concorreu às eleições para as autarquias locais na Região Autónoma da Madeira e obteve excelentes resultados eleitorais. Em Machico, a disputa entre o PSD e a UDP para a Câmara Municipal saldou-se em três vereadores para a UDP e quatro para o PSD. No entanto, passam-se hoje na Madeira e em Machico, particularmente, factos da maior gravidade, para os quais se chama a atenção de todo o povo do País e desta Assembleia.
Vejamos: o padre José Martins Júnior foi candidato nas listas da UDP à Câmara Municipal de Machico e à Assembleia de Freguesia da mesma localidade; na altura, o PSD impugnou a sua candidatura, alegando que aquele nosso candidato era sacerdote católico com poderes de jurisdição e que, por consequência, não poderia ser candidato face à redacção do artigo 4.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro; o Tribunal da Comarca de Santa Cruz considerou a argumentação expendida pelo PSD e proferiu sentença favorável. Dessa sentença foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa. Este último, rejeitando a tese do PSD acolhida no Tribunal de Santa Cruz. revogou a sentença do juiz deste último Tribunal e considerou elegível o nosso candidato. Estes factos são do domínio público.
Verificou-se o acto eleitoral e o padre José Martins Júnior, tal como outros candidatos, foi eleito para os dois órgãos para os quais se tinha candidatado.
Tomou posse como vereador da Câmara no princípio de Janeiro de 1980.
Em meados desse mesmo mês de Janeiro, o presidente da Câmara Municipal de Machico, eleito pelo PSD, endereçou uma carta ao padre Martins, na qual afirmava que o mesmo não podia ser vereador da Câmara por se ter tornado inelegível, ao abrigo do disposto no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 701-B/76. Na acta de verificação de poderes constava que o padre Martins continuava a rezar missa, etc. Isto sem que a situação do padre Martins face à Igreja se tenha alterado um milímetro que fosse.
Dias mais tarde, quando a Assembleia de freguesia ia tomar posse, o padre Martins é impedido de o fazer, não tendo sido sequer convocado para o acto, com a alegação, não já de ser inelegível, mas de ser vereador da Câmara.
Sem nos perdermos em grandes considerações, o mínimo que se pode afirmar é que o presidente da Câmara, sob sua responsabilidade ou mandatado por alguém, se recusa a cumprir um acórdão do Tribunal da Relação.
É pouco presumível que as «qualidades» pessoais do presidente da Câmara de Machico sejam suficientes para que ele, por si só, tenha tomado uma decisão de tal gravidade e monstruosidade. Temos de concluir que as sentenças dos tribunais são cumpridas na Madeira quando favoráveis ao PSD, não são cumpridas quando lhe são contrárias. Daí que não espante que seja proposta a regionalização dos tribunais no novo projecto de Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, a que contraria em absoluto a Constituição. A UDP sempre teve presente aquele ensinamento clássico da luta de classes segundo o qual a burguesia só respeita as próprias leis quando isso não ponha em causa os seus interesses fundamentais.
Outra pergunta, porém, fica no ar: as autoridades vão fazer vista grossa a semelhante monstruosidade? Não salvarão, ao menos, as aparências? Impedirão que o escândalo atinja proporções alarmantes para elas? Se quem deve decidir se recusa a repor as coimas no devido sítio, as massas populares da Madeira, e, neste caso concreto, do Machico, saberão dar a resposta devida a quem, não respeitando nada nem ninguém, enche os quatro ventos com as palavras «democracia» e «direito», mas faz o contrário e da forma mais escandalosa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aparente mente tudo caminha de vento em popa em função dos tenebrosos desígnios da AD. Mas a realidade é bom diferente.
Costuma-se falar muito no país real. Falemos, então, desse país real. Desses homens, mulheres e crianças que viram a esperança em Abril e que agora se defrontam com uma dura realidade. É o povo que se levanta, é ele o gigante que lutando pelo pão, pela liberdade, por uma vida melhor vai fazer recuar os pigmeus sem futuro e sem história - os senhores da AD.
São os assalariados rurais que no Alentejo e Ribatejo amadurecem a sua raiva e a sua determinação para que, no momento próprio, a justiça lhes seja feita.
São os controladores aéreos que firmemente avançam para greves prolongadas, para obrigar o Governo a vergar a sua soberba e arrogância.
São os camponeses de Norte e Nordeste que de novo se preparam para a luta para conservarem a sua ligação com o mundo, a velha máquina a vapor que este Governo lhes quer roubar.
São os 500 000 trabalhadores que, na quinta-feira, vão paralisar por cinco horas, seguidas de manifestações, perspectivando novas lutas, inclusive uma grande jornada de unidade e acção a nível nacional que paralise o País para paralisar esta política que nos desgraça.
A UDP saúda estas lutas. A UDP apoia sem restrições os trabalhadores no seu combate frontal ao Governo do grande capital.
A UDP chama à luta e à unidade todos os trabalhadores, homens, mulheres, jovens, todos os democratas e antifascistas: sigamos o exemplo destes nos-
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sós irmãos de classe. Vamos para a luta e para a unidade. Assim, obrigamos este Governo a recuar. Assim, este Governo será derrotado.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa, que igualmente dispõe de dez minutos.
O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deportados: Acaba o Governo de apresentar ao País um conjunto de medidas anti-inflacionárias. O Governo tem sido criticado pelas oposições como é seu papel e seu direito.
Mas, em matéria de combate à inflação, melhor seria que uníssemos esforços do que nos digladiássemos. Sendo a alta dos preços um mal que aflige todos os portugueses, bom seria que tão grave problema não fosse aproveitado como instrumento de luta partidária.
Por nossa parte estudaremos com interesse e isenção todas as críticas e sugestões construtivas feitas pela oposição.
O combate à inflação vai prolongar-se por vários anos. Não é a primeira vez nem será a última que o problema será abordado nesta casa. O tempo que é o melhor dos juízes, ajudará os Portugueses a julgar as afirmações que forem feitas, o tempo ajudará a julgar os partidos e os Governos.
De uma maneira sintética, pode dizer-se que as medidas tomadas pelo Governo visam: o aumento da produtividade; a contenção das despesas públicas; a contenção dos deficits das empresas públicas; o contrôle dos preços; a actualização das penalizações sobre delitos económicos para as tornar mais eficazes; o paralelismo entre o aumento de salários e o nível de inflação, quando tais aumentos se não traduzam em melhorias reais da produtividade conseguida.
Estes objectivos são de tal forma óbvios que não nos parece possível estabelecer sobre eles uma acesa controvérsia.
Pode, naturalmente, discordar-se nos métodos que irão ser utilizados para os alcançar, mas os objectivos são, em si mesmos, incontroversos.
O desafio que o Governo irá enfrentar nos próximos meses será o de tornar efectivas as medidas agora enunciadas e, para tanto, vai precisar de coragem, clarividência e bastante imaginação.
Procedeu também o Governo a uma revalorização do escudo. É uma medida tomada contra a corrente a que todos mos habituámos nos últimos anos, uma medida que colheu certamente de surpresa os Portugueses. Esta revalorização representa uma forma directa e imediata de reduzir a inflação, mas é também um marco psicológico importante de inflexão da marcha da nossa actividade económica.
Se a revalorização merece o nosso aplauso como forma genérica de intervenção, não podemos deixar de recomendar ao Governo que analise com prudência o comportamento dos vários sectores de exportação e que não receie adoptar as medidas pontuais de correcção que devam ser implementadas para ajudar esses mesmos sectores. Destaco, desde já, o caso da indústria de concentrados de tomate, bem como a de construção e reparação naval que se confrontam com crises conjunturais a nível internacional muito pronunciadas.
Mas a revalorização do escudo pode, quanto a mim, representar um sinal de que o Governo não parece disposto a confundir instrumentos com objectivos e de que pretende pôr os instrumentos, neste caso a política cambial, ao serviço dos objectivos, neste caso o combate à inflação sem parda da capacidade competitiva dos sectores de exportação.
Quem analisar as cotações do escudo relativamente às diferentes moedas facilmente concluirá que elas não tem evoluído da forma maus favorável aos nossos interesses como importadores e como exportadores.
O Governo não deixará, certamente, de aproveitar esta oportunidade para alterar a composição do «cabaz de moedas» relativamente ao qual se tem processado a desvalorização deslizante, tendo em conta que as importações mais sensíveis se fazem em dólares e as exportações mais sensíveis em moedas europeias.
Com uma hábil e realista política cambial estaremos em condições de minorar os efeitos da desvalorização externa do escudo sobre a taxa de inflação, sem criar dificuldades significativas às actividades exportadoras.
A política económica do Governo tem de definir claros incentivos aos sectores de exportação, o que impõe abertura de espírito na análise da situação actual de cada sector e flexibilidade e rapidez nos apoios a conceder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS como partido integrante da Aliança Democrática não deixará de estar atento à acção do Governo e ao cumprimento das promessas eleitorais que foram feitas.
Prometeu o programa eleitoral de governo da Aliança Democrática que as causas da inflação seriam combatidas. As medidas anunciadas estão, de acordo com as promessas feitas.
Vamos no caminho da mudança, mas queremos que o Governo faça mais, mais depressa e melhor. O Governo tem, para desenvolver a sua acção, o nosso apoio e a nossa confiança.
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os votos que constavam da ordem de trabalhos para esta reunião passam para a reunião da próxima quinta-feira.
Posto isto, mantém-se o requerimento apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP para prorrogação do período de antes da ordem do dia, nos termos regimentais.
Pausa.
Dado que não há oposição, está prorrogado o período de antes da ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na passada quinta-feira as administrações das empresas públicas da comunicação social foram chamadas à Secretaria de Estado da Comunicação Social para uma reunião com o Secretário de Estado. Formando bicha no respectivo corredor, à entrada do gabinete do Secretário de Estado, não participaram em qualquer reunião. Era simplesmente um despedimento! Foram sendo chamados um a um para lhes ser comunicado que estavam exonerados dos
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seus cargos. Justificações ou fundamentações para este «saneamento geral» - nenhumas.
Isto é sobejamente demonstrativo, Srs. Deputados, do estilo, da prática e do projecto.
Está em curso pela mão do Governo Sá Carneiro-Freitas do Amaral uma violenta ofensiva contra os órgãos de comunicação social do Estado, tendo como objectivo principal o estabelecimento do completo contrôle e monopólio dos órgãos de informação pelas forças de direita que integram a «AD». Os recentes saneamentos das administrações das empresas do sector público da comunicação social são um facto escandaloso que claramente o demonstra, para quem ainda tivesse dúvidas.
À saída da audiência em que foi sumariamente despedido comentava significativamente um dos administradores saneados: «Houve uma nítida opção por critérios com fortes conotações partidárias. Só assim posso entender que o único administrador que fica na RDP é um elemento ligado ao PSD, pessoa que este partido apresentou ao Conselho de Informação como seu candidato quando das eleições para representantes no conselho de administração. Permanecendo o Dr. Martins Aguiar, o Governo nem sequer pode invocar razões de competência, uma vez que tivemos ocasião de comprovar que esse senhor competente não é.»
Ora, Srs. Deputados, os nomes invocados para substituir os elementos afastados aí estão para provar que o Governo quer ter à frente da comunicação social do Estado os seus homens de mão, homens profundamente ligados aos partidos da coligação da direita. Os critérios de competência tão apregoados revelam, na prática, a sua dimensão de puros chavões propagandísticos. Aliás, hoje mesmo o Secretário de Estado da Comunicação Social enviou às empresas públicas do sector um parecer da respectiva auditoria jurídica, nos termos do qual quem suportará os custos das indemnizações a que têm direito os administradores abrangidos pela operação de saneamento agora efectuada serão as respectivas empresas públicas. Quantos milhares de contos custará essa operação, da exclusiva responsabilidade do Governo -, a essas empresas, sobre cujo deficit e prejuízos o Governo tanto se lamenta?
Fica claro que as preocupações do Governo da AD centrariam frontalmente e sem qualquer rebuço as directrizes constitucionais e as próprias leis que visam precisamente assegurar que os órgãos de comunicação social do Estado mantenham a sua independência perante o Governo e a Administração Pública, assegurem a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião, sigam uma orientação que respeite o pluralismo, pratiquem uma informação rigorosa e objectiva e não dêem acesso a elementos de apologia e propaganda da ideologia fascista.
Domesticar a comunicação social, pô-la ao seu serviço como arma de propaganda, transformá-la em defensora e difusora das suas medidas antipopulares e dos seus objectivos de subversão do regime democrático-constitucional, os propósitos que surgem claros na actuação do Governo para este sector.
Propósitos que se concretizam com as constantes sessões de propaganda de membros do Governo na televisão, com a profusa emissão de notas oficiosas sobre qualquer assunto - em evidente desrespeito da lei unanimemente aprovada por esta Assembleia.
Trata-se da tentativa de impor aos Portugueses uma «verdade governamental», com que são diariamente matraqueados e que nos recorda os piores tempos do Governo Mota Pinto/PPD/CDS e do seu ministério da propaganda. E se esta tem sido a prática, o Governo revela pretender vir a dar-lhe «cobertura» legal.
Protestos do PSD e do CDS.
O anunciado propósito de rever leis de conteúdo democrático como a Lei da Televisão e o Estatuto do Jornalista, a manutenção de situações de ilegalidade, como a persistência ilegal do afastamento dos trinta e seis trabalhadores da RDP e RTP abrangidos pela Lei da Amnistia, a recusa ao diálogo com os trabalhadores para tentar encontrar soluções justas e correctas para os seus problemas, como no caso do jornal O Século são, entre outros factores que vêm juntar-se à tentativa governamental de amordaçar a comunicação social e que não podem deixar de levantar sérias preocupações às forças democráticas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira abreviar. Já terminou o seu tempo.
O Orador: - Sim, Sr. Presidente, estou já a terminar.
Pelo nosso lado, reafirmamos que o caminho para derrotar esta ofensiva antidemocrática contra o direito à informação e contra a liberdade de informação é e será o caminho da luta. É, mais do que nunca, necessária a unidade dos trabalhadores do sector e a unidade dos democratas. Não temos dúvidas de que será constante a luta para defender do assalto da direita a independência dos órgãos de comunicação social do Estado, parte integrante das liberdades de expressão, de informação e de imprensa conquistadas pelo 25 de Abril e consagradas na Constituição e que são indissociáveis das lutas em defesa das grandes conquistas de Abril e dos direitos económicos, sociais e políticos dos trabalhadores.
Vozes do PCP, do MDP/CDE e do Deputado do PS José Nisa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um mês e meio é já passado desde que a terra tremeu e lançou na miséria e no desespero tantas e tantas famílias nas ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa.
Um mês e meio é já passado e o povo continua na angústia da incerteza, sem esperança, sentindo que as autoridades responsáveis, o Governo Regional e o Governo Central, estão a manifestar um desprezo absoluto pelas necessidades mais prementes dos milhares de sinistrados.
Não é preciso falar muito mais do sofrimento dos que vivem em barracas, com crianças e pessoas idosas, nem dos que vivem em cubículos ou amontoados em quartos emprestados por amigos ou nos cantos das casas quase destruídas, nem é preciso dizer muito mais da ansiedade sentida por todos aqueles
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que querem reconstruir sem que lhes seja possível fazer nada, pois as entidades oficiais não definem as medidas a tomar. Não é preciso falar muito mais da angústia dos pequenos comerciantes com os seus estabelecimentos arruinados e que não vislumbram saída para a sua situação, do problema dos desempregados lançados sem contemplação na miséria, da revolta de todos os que deram o seu contributo e vêem os donativos caírem num saco sem fundo e não chegarem às pessoas mais necessitadas.
Esta é a realidade presente, é a vida que se leva dia-a-dia, mais agravada.
Temos bem presente que toda esta situação não resultou apenas do sismo. Ela vinha já de trás. A UDP sempre denunciou os graves problemas da habitação na região, com milhares de casas degradadas, sem condições mínimas, sem casas de banho nem segurança, onde viviam as populações mais desprotegidas e foram estas as mais afectadas. Ficaram à luz do dia as vigarices de empreiteiros sem escrúpulos, a negligência das inspecções camarárias, a miséria de largos sectores das classes trabalhadoras.
Não podemos deixar de nos indignar pelo esquecimento a que tem sido votada a grande campanha de solidariedade dos nossos irmãos trabalhadores do continente, de dezenas de países de todo o Mundo, das comunidades de açorianos na América e no Canadá, de todos os que estão a ajudar sem pensar em apresentar factura ou em tirar dividendos políticos e económicos, como o está a fazer o Governo dos Estados Unidos.
A UDP, consciente das suas responsabilidades, sentindo os problemas das populações das ilhas atingidas, chama todo o povo a unir-se e a lutar vigorosamente pelas medidas que é necessário tomar para debelar a situação, pelas exigências que é necessário fazer aos governos, condensadas nas seguintes reivindicações das populações atingidas pelo sismo:
Alojamento no prazo máximo de um mês, em pré-fabricados, de todos os desalojados que estão a viver em barracas ou em outras instalações que não oferecem o mínimo de condições;
Requisição imediata, pelo Governo Regional, de todas as casas desabitadas, colocando-as ao dispor das famílias desalojadas;
Manutenção da vigência dos contratos de arrendamento, qualquer que seja o estado de destruição ou ruína das casas atingidas pelo sismo;
Reconstrução e reparação das casas arrendadas pelos respectivos senhorios, devendo para o efeito ser-lhes concedidos empréstimos sem juros e a longo prazo, de forma a que as rendas se mantenham;
Os senhorios deverão declarar, por escrito, no prazo de quinze dias, na Secretaria Regional do Equipamento Social e aos seus inquilinos, a sua pretensão de reconstruírem as casas;
Expropriação e reconstrução pelo Governo Regional dos prédios que os senhorios se recusem a reconstruir, mantendo o actual inquilino a sua posição contratual;
Reconstrução dos monumentos e edifícios que integram o património cultural, logo que seja solução nado o problema da habitação das populações atingidas:
Orientação e fiscalização das obras de reconstrução e reparação por peritos e técnicos, zelando-se pelo cumprimento das condições anti-sismicas e de higiene:
Abastecimento rápido e eficiente das zonas atingidas de materiais de construção;
Fixação de preços únicos para os materiais de construção e estabelecimento de controle efectivo na sua distribuição;
Actuação das brigadas de fiscalização económica, no sentido de impedir a especulação de preços no comércio, nomeadamente no sector de alimentação e vestuário;
Fornecimento de alimentação às famílias impossibilitadas de cozinhar a própria comida, a um preço que, em caso algum, pode ultrapassar os 50 % do rendimento familiar líquido;
Imediata distribuição das toneladas de roupa e outros donativos existentes em armazém pelas pessoas necessitadas;
Construção de balneários públicos em todas as freguesias atingidas, com águas quentes, de modo a poderem serem utilizados por adultos e crianças;
Criação de lavadouros públicos, em condições de poderem ser utilizados pelas populações desalojadas:
Marcação de uma data de reinicio do ano lectivo para todos os graus de ensino;
Definição de programas mínimos a serem leccionados com um ritmo de ensino mais de acordo com a maior falta de condições materiais para uma aprendizagem efectiva;
Adopção de novo tipo de avaliação para este ano lectivo, que exclua os exames, substituindo assim formas generalizadas de avaliação que não têm em conta a situação específica local;
Deslocação obrigatória e regular de médicos aos estabelecimentos de ensino e fornecimento gratuito de um reforço alimentar aos alunos;
Pagamento dos salários, por inteiro, a todos os trabalhadores que ficaram, mesmo que temporariamente, sem emprego;
Concessão de subsídios às empresas que sofreram danos, tendo como objectivo salvaguardar os postos de trabalho e possibilitar o pleno funcionamento das empresas;
Indemnizações aos pequenos e médios lavradores e agricultores por todos os prejuízos, nomeadamente paredes, bebedouros, silos e gado morto;
Indemnizações aos pequenos comerciantes atingidos e criação de condições de reabertura dos seus estabelecimentos;
Prestação de contas pelo Governo Regional as populações de todas as dádivas, em géneros e em mercadorias que têm sido recebidas e da sua utilização;
Informação clara das populações de quais os organismos e repartições competentes para informação e resolução dos problemas que se levantam às populações, de modo a evitar a indefinição, irresponsabilidades e perdas de tempo inúteis;
Participação do movimento sindical e de órgãos representativos dos moradores no controle da aplicação das dádivas e dinheiros públicos a utilizar na reconstrução:
Não ao pagamento das indemnizações que o Governo Central se prepara para entregar aos grandes patrões e latifundiários e redução das despesas militares, se necessário, atribuindo-se no Orçamento Geral do Estado uma verba especial de auxílio à reconstrução das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa, não inferior a 5 milhões de contos.
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Se o povo não lutar, não eleger com firmeza a resolução das carências daqueles que hoje sofrem as consequências do sismo, o Governo Regional continuará sem resolver os problemas por todos sentidos
São justas as reivindicações apontadas, a sua solução não vai cair do céu. Em cada freguesia, em cada bairro, em cada aldeamento organizemos comissões. Reforcemos o movimento sindical unitário, controlemos a actuação das juntas de freguesia, exijamos reuniões abertas das assembleias de freguesia para discutir os problemas. Por toda a parte organizemos o povo em estruturas unitárias. Denunciemos sem contemplações todos os casos de abusos, oportunismo, de corrupção, venham eles de onde vierem.
A UDP lutará ao lado do povo pela satisfação destas reivindicações, mas é necessário que se levante um forte movimento que exija dos Governos e das autoridades responsáveis o seu imediato cumprimento.
Unidos lutaremos! Unidos venceremos!
O Sr. Germano Domingos (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Germano Domingos, pretende pedir esclarecimentos?
O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, seria para um protesto, mas, tratando-se do Sr. Deputado da UDP, que não pode de maneira nenhuma representar o povo dos Açores, será para um esclarecimento a Câmara.
O Sr. Presidente: - Faça favor!
O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dar um breve esclarecimento, que talvez fosse desnecessário para todos os Deputados que aqui se encontram e todos aqueles portugueses que têm estado ao corrente do que se passa em relação à crise sísmica.
Já nesta Câmara foi dito, por mais de uma vez, que a catástrofe que atingiu tão duramente o povo açoriano não deveria servir para fazer política - e, neste caso, baixa política.
Aplausos da PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
O movimento de apoio, tanto de todo o Portugal como do estrangeiro, tem sido transmitido ao povo açoriano em comunicados diários e em relatórios mensais, onde se referem as dívidas a pagar, o dinheiro recebido, as roupas a distribuir e o transporte de géneros.
Muita gente tem contribuído indo aos Açores ajudar, e o Sr. Deputado Mário Tomé faria melhor se também lá fosse ajudar, já que sabe tanto disto, e ao mesmo tempo esclarecer-se, porque de facto não está esclarecido.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - As pessoas estão a ser alojadas o mais rapidamente possível, as linhas de crédito do Banco de Portugal estão a funcionar e há já um gabinete de apoio à reconstrução a funcionar com técnicos. Toda a gente disponível está a ajudar e daqui sugiro ao Sr. Deputado Mário Tomé que vá esclarecer-se e que depois venha aqui fazer uma intervenção num futuro próximo, que não seja muito futuro mas muito próximo.
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, faça favor de responder, se assim o entender.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu queria apenas dizer, em primeiro lugar, que o Sr. Deputado Mário Tomé não precisa de ser dos Açores para poder trazer a esta Câmara as reivindicações justas do povo dos Açores ou de qualquer outra parte do nosso país.
Em segundo lugar, todos nós sabemos como têm funcionado neste país as comissões, e, portanto, tendo todos nós conhecimento do seu funcionamento. é escusado entrar mais nesta questão.
Em terceiro lugar, quero esclarecer o Sr. Deputado que as reivindicações que aqui apresentei, em nome do povo trabalhador dos Açores, são reinvindicações do próprio povo dos Açores que foram coligidas e aqui apresentadas pela UDP.
O Sr. Germano Domingos (PSD): - Peço a palavra para um esclarecimento. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade
O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu queria dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Mário Tomé, pois eu não disse que era necessário ser dos Açores - nós somos Deputados por todo o país nesta Câmara -, só disse que tinha que lá ir esclarecer-se porque aquilo que afirmou é menos correcto - talvez por falta de esclarecimento, não quero crer que por má-fé.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Sampaio.
A Sr.ª Maria José Sampaio (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faço hoje esta intervenção como um protesto. Em Portugal continuam os crimes.
Dizer Idade do Ferro, significa falar de uma época situada cerca de 1000 anos a.C. Dizer castro de Segóvia significa dizer povoado em Elvas dos mais importantes da Idade do Ferro na Península Ibérica. Descoberto em 1972, as escavações têm sido feitas por arqueólogos portugueses e ingleses que encontraram cerâmica, jóias, objectos de âmbar, ferro e chumbo, bem como restos de muralhas romanas.
Mas, o castro de Segóvia foi destruído, no verão passado para se construir, uma plataforma principal desta estação arqueológica, uma estação elevatória de água para servir a cidade de Elvas. Que comentários se podem fazer a este crime?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas a lista de destruições é muito longa.
Uma casa solarenga do século XVIII chamada «Casa do Orfanato», em Viana do Castelo, e o quarteirão em que se integrava foram atrasados para arranjar espaço para construção urbana, sem que haja sequer planos aprovados de urbanização.
Ao pé de Oliveira do Hospital, a ponte romana existente está em perigo, por ser demasiada estreita
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para servir de acesso ao parque de campismo. Como as rolotes não cabem, já se derrubam em parte as guardas da ponte, e o resto quanto tempo resistirá, não aos anos, mas ao desrespeito e à ignorância dos homens? E quem acode à ponte romana do Marnel, num dos braços do Vouga?
Em Lisboa, ao Jardim das Amoreiras, destruiu-se a fachada da Fábrica das Sedas. A sua frontaria era coberta por azulejos do século XVIII, historiando as técnicas de tecelagem da época, mas as canalizações antigas eram de chumbo. E foi possível destruir os azulejos, picando-os, para se arrancarem os canos e se vender o chumbo!
Mas há mais! Foi vendida como material de demolições uma fonte filipina. Depois de várias diligências, veio a saber-se a proveniência dessa fonte do século XVII. Esteve num largo da cidade de Portalegre durante três séculos e meio. Tem uma inscrição datada de 1623 que mos explica que foi construída para comemorar a passagem de Filipe III pela cidade. Mas foi demolida e em seu lugar construiu-se um parque de estacionamento. Daqui faço um apelo aos habitantes de Portalegre. Será possível que a cidade não queira recuperar a sua fonte. Pô-la outra vez no seu lugar?
Tivemos uma das primeiras galerias de pintura, no seu género, no Palácio da Ajuda. O rei D. Luís mandou bolseiros da Casa Real correr a Europa reproduzindo as grandes obras de arte europeias. Reuniu cerca de 450 pinturas e abriu a galeria ao público em 1865. Esta galeria ardeu há cerca de cinco anos. Vamos esperar que o país inteiro arda?
E para quando o restauro do Mosteiro de Tibães, de S. Bento da Vitória no Porto, de S. Maria de Salzedas, do Mosteiro de Lorvão, do castelo seiscentista de Piriscoxe, em Alverca, do Teatro das Laranjeiras, do Mosteiro de Pombeiro em Guimarães, etc.?
Esta minha intervenção é um protesto, Srs. Deputados, para incúria e desrespeito com que o nosso património cultural é tratado. Considero tudo isto um crime!
Protesto, Srs. Deputados, por o pátio da Universidade de Coimbra estar transformado num parque de estacionamento de automóveis.
Protesto por ser possível, neste ano centenário de Camões, que num dos claustros do Mosteiro dos Jerónimos se cultivem couves. Camões é um poeta universal e está enterrado no Mosteiro, que é uma das maravilhas do gótico português. O Mosteiro de Santa Maria de Belém não é uma horta!
Protesto, Srs. Deputados, por a antecâmara da Sala de Música do Palácio Nacional da Ajuda estar transformada numa capoeira! Ou querer-se-á com isso simbolizar o nosso desprezo pela arte e pela beleza? Onde se ouvia música ouve-se hoje, no século XX, o cacarejo das galinhas?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas são tantos e tais que não sei paira onde vamos - só sei que não podemos ir por aqui.
Aplausos gerais.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para, a título de esclarecimento, confirmar oralmente o apoio que por aplausos, transmiti à intervenção da Sr.ª Deputada Maria José Sampaio e para dar uma achega à questão, achega que é também um protesto que se me afigura tanto mais justo quanto se refere à cidade que é capital do distrito correspondente ao círculo eleitoral por que ambos fomos eleitos.
Refiro-me à notícia que veio a público há pouco tempo relativamente ao perigo que correm algumas frontarias dos prédios da popularmente conhecida Rua do Cais, ao lado do canal central, na cidade de Aveiro. Sobre esta matéria, aliás, entreguei hoje mesmo na Mesa da Assembleia da República um conjunto de perguntas ao Governo, mais propriamente à Secretaria de Estado da Cultura, mas não queria deixar de aproveitar a oportunidade dada pela intervenção da Sr.ª Deputada para juntar também este aspecto, pois na verdade trata-se de um conjunto de frontarias que constituem um património cultural e histórico inestimável, que servem, por assim dizer, de autêntico ex-líbris da cidade e que são tão importantes que constituem um dos motivos dos magnífico» painéis de azulejos que estão nas paredes da estação ferroviária de Aveiro - aliás, também eles em vias de degradação, de delapidação e a carecerem também de protecção - e, segundo a Aderav, Associação de Defesa do Património Natural Cultural da Região de Aveiro, a destruição desses prédios foi abjecto de concordância da Secretaria de Estado da Cultura. Se isso é verdade não sei, mas entretanto o meu pedido de informações é dirigido no sentido de confirmar ou não esta informação e também de chamar a atenção para esse ponto a fim de evitar a continuação da delapidação de um conjunto arquitectónico que vale a pena preservar e, portanto, aqui na Assembleia devemos levantar a nossa voz para ajudar a preservá-lo.
Aplausos gerais.
O Sr. Carlos Candal (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Candal (PS): - De vez em quando nesta Câmara formam-se consensos, e este é um tema pontual onde os Deputados dos diversos partidos eleitos por Aveiro se podem solidarizar na defesa do património artístico da cidade capital do distrito que nos elegeu.
Realmente em Aveiro correm-se sérios riscos de serem descaracterizadas as principais ruas da cidade. Várias explicações -que não interessa agora trazer à baila, mas todas elas prosaicas - justificam os autênticos crimes contra a cultura artística aveirense que vêm sendo cometidos.
Podemo-nos solidarizar quanto a esta questão e, desde já, adianto que sobre o problema que foi sublinhado pelo Sr. Deputado Vital Moreira tenciono, na próxima Assembleia Municipal de Aveiro, fazer, também aí, um apelo para que se obtenha a solidariedade das diversas correntes de opinião na defesa daquilo que é património comum dos Aveirenses e que deve ser tutelado pelos seus representantes, não
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só a nível nacional, mas porventura, e sobretudo, a nível regional, que é onde se sentem mais as questões que doem às populações locais.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Sampaio.
A Sr.ª Maria José Sampaio (CDS): - Eu queria apenas dizer à Câmara, e em especial ao Sr. Deputado Vital Moreira, que os (Deputados do CDS eleitos pelo círculo de Aveiro já pediram à Câmara Municipal de Aveiro que informasse exactamente o que se passa quanto às fachadas da Rua do Cais
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel da Costa para uma intervenção.
O Sr. Manuel da Costa (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Realizaram-se em Évora, nos dias 31 de Janeiro e 1 de Fevereiro, no âmbito das comemorações do 6.º aniversário da criação do então Instituto Universitário, hoje Universidade de Évora, cerimónias assinaláveis, não só da efeméride como de consagração ao labor científico e pedagógico do Prof. Henrique de Barros e do Prof. Francisco Caldeira Cabral, distinguindo-os com o grau de doutor honoris causa.
Ainda que esta Assembleia já se tenha associado ao acontecimento, referindo-o e aprovando por unanimidade um voto de congratulação, nós não podíamos - porque estivemos lá nesses dias e porque em tempo recentemente recuado pudemos acompanhar, bem de perto, as dificuldades então existentes e o esforço desenvolvido pela comissão instaladora não só para as superar como, e muito principalmente, para engrandecer a instituição que há dias fez jus ao estatuto de Universidade -, não podíamos, dizíamos, deixar de trazer a esta Assembleia tão importante acontecimento.
A Universidade de Évora só o é desde de Dezembro último quando o Governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, pelo Decreto-Lei n.º 482/79, fez retomar ao Instituto a designação perdida há duzentos e vinte e um anos, quando em 8 de Fevereiro de 1759 o marquês de Pombal a mandou encerrar.
Não vamos aqui alimentar qualquer tipo de polémica quanto à importância da criação do Instituto, primeiro em 1547, depois em 1973, e posteriormente transformado em Universidade. Seria esgrimir contra uma evidência que só as mentalidades tacanhas e a miopia partidária podem omitir ou não reconhecer, o que, por mais estranho que pareça, aconteceu com os vereadores do PSD na Câmara de Évora ao votarem contra numa moção que solicitava desta Assembleia da República a ratificação do decreto que criou a Universidade de Évora.
Só a fobia desta AD a tudo que tenha a marca de Lurdes Pintasilgo pode originar a situação caricata de podermos assistir, para um mesmo assunto, em Évora o PSD a votar contra, e na Assembleia da República congratular-se com o contrário.
Que alguém, ainda que por misericórdia, explique às suas gentes que ratificar, às vezes, não passa de um mero expediente político, capaz de confundir a opinião pública, levando esta a acreditar de que aqui e agora, há uns senhores todos omnipotentes que podem, querem e mandam.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: A Universidade de Évora é uma instituição situada numa zona das chamadas deprimidas em termos de desenvolvimento. Daí também todo este inteirasse, daí todo o nosso empenho. Dada essa condição, e por se tratar de uma instituição de criação recente, há que pugnar por uma interacção entre as partes: a escola e o meio. Ora, se é certo ter sido essa uma das preocupações da novel instituição, o que já seria para assinalar dada a notável falta de vocação das nossas escolas para a ligação à coisa que a rodeia, o certo é que nem sempre o conseguiu ou, pelo menos, não o tem feito da forma que as exigências actuais mais requerem.
A Universidade de Évora, como bem o disse o decano dos seus docentes, o Prof. Rodrigues Martins, contraiu agora, e lá, a grande responsabilidade de deixar de ser Instituto para ser Universidade e tudo poder continuar na mesma.
É bem verdade que o então Instituto efectuou estudos e prestou serviços na região dignos de registo, de forma eficaz e assídua, mas não é menos verdade que a grande opção está por fazer e isso ficou bem patente no protocolo e nos discursos aquando da cerimónias comemorativas.
É que para a tal zona oprimida, então muito referida, onde esta escola ocupa o lugar primeiro do saber, a atitude a empreender deve estar de acordo com a diferença entre a vontade política subjacente ao Decreto-Lei n.º 402/73, de 11 de Agosto, que a criou, e a do Decreto-Lei n.º 482/79, de Dezembro último, que a transformou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É que o Alentejo de hoje já não é o da terra dos grandes senhores, é, sim, o do espaço imenso dos trabalhadores de que nos fala Miguel Torga, quando refere não só a terra imensa mas também o homem que não se deixou prostituir: «[...] o meio manteve-se vertical e sozinho, para que pudesse ver com nitidez o tamanho da sua sombra no chão. Modelou-o de forma que nenhuma força, por mais hostil, fosse capaz de lhe roubar a coragem, de lhe perverter o instinto, de lhe enfraquecer a razão.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por aqui, até à nova realidade operada a partir das profundas transformações económicas e sociais, é que a Universidade tem de entrar, não só para olhar e servir, como, e muito principalmente, para se comprometer numa opção clara e inequívoca de melhoramento, prossecução e consolidação da nova realidade.
O progresso nunca se alcança com tibiezas e hesitações. O destino das mentalidades tacanhas e das instituições retrógradas é o caixote do lixo da história.
Respeitem-se os costumes e as tradições, desde que os mesmos sirvam de inspiração e contributo ao futuro, de outra forma cataloguem-se e arquivem-se.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os estudantes são a única razão de ser da escola. Surpreendeu-nos o facto de, após Abril, ser ainda possível que alguma realização na sua escola possa dispensar a participação das suas organizações.
Como foi possível acontecer na Universidade de Évora que aos estudantes fosse recusado o seu dizer? Mas que tinham os estudantes para dizer
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Aquilo que disseram no documento ali distribuído - também entregue ao Sr. Presidente da República, intitulado «O discurso que não nos foi permitido fazer»: «[...] a Universidade de Évora é uma Universidade nova. Devia e podia ser igualmente nova nos métodos usados para com os estudantes, melhor no entendimento do papel do estudante na Universidade, afinal de contas, também, sua razão de existência. O regime de instalação não é oposto a uma gestão democrática em que a participação estudantil mais do que consentida devia ser solicitada amiudadamente.» E terminam dizendo: «Quisemos propormos uma visão diferente do que é a Universidade de Évora daquelas que aqui foram anteriormente (e quiçá sabidamente) apresentadas. [...] Talvez seja menos solene ou metafísica que as anteriores. É, pensamos, mais real, mais à medida daquilo que a Universidade de Évora é em si e no seu contexto. Propomos. pois, que meditem nela. Será uma contribuição para que cada vez mais a Universidade de Évora corresponda às exigências do novo Portugal que tentamos erguer.»
O ilustre reitor, também presidente da comissão instaladora, devia ter tido outro entendimento para com os seus estudantes. A sua atitude só encontra atenuante no susto apanhado no Verão de 75, quando assistiu ao princípio do quase fim do seu Instituto. Esqueceu-se de que, então, os métodos não eram democráticos e o que, hoje, está em presença de um orgão representativo de extrema limpidez democrática, até no aspecto jurídico, por imposição dos órgãos dirigentes da Universidade - a Associação de Estudantes.
Nós estivemos lá. Por isso, não podemos calar o nosso protesto! Que a nossa posição seja entendida através da globalidade desta intervenção para honra e glória da novel Universidade de Évora e do seu Alentejo!
Aplausos do PS e da Sr.ª Deputada do MDP/CDE, Helena Cidade Moura.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, suponho que para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de pedir esclarecimentos, queria esclarecer a Câmara de que obviamente mantenho as palavras de homenagem à Universidade de Évora que há dias proferi na sequência de actos - e portanto não foram apenas palavras - assumidos, aqui e noutros sítios, ao longo de anos na defesa da descentralização do ensino universitário em Portugal, quer no Sul, quer no Norte, quer no Centro do País.
Quanto aos pedidos de esclarecimento que queria fazer, eles são os seguintes: gostaria que o Sr. Deputado - que, aliás, tratou esta questão incidentalmente na sua intervenção - nos informasse sobre quais os termos da moção que o PSD de Évora votou contrariamente e se esta continha ou não questões laterais e ainda se ela teria alguma semelhança com aquela que foi aqui votada unanimemente por todos os partidos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel da Costa, se assim o desejar
O Sr. Manuel da Costa (PS): - Terei todo o gosto em responder.
Na minha intervenção apenas referi a ambiguidade de posições do PSD, felicitei-me pelo facto de esta Assembleia ter aprovado, por unanimidade, um voto de congratulação pelo facto de o Instituto de Évora passar a Universidade e referi ainda que estranhava - e repito a minha estranheza - o facto de os elementos do PSD da Câmara de Évora terem votado contrariamente uma moção que não tenho presente...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Ah, era diferente!
O Orador: - ..., ou melhor, da qual não tenho o texto para lhe ceder, mas tenho presente o seu contexto e posso dizer-lhe que um dos pontos que os elementos do PSD votaram contra era o que referia o pedido de ratificação desta Câmara do decreto-lei que transformava o Instituto de Évora em Universidade. Este ponto era muito claro, não tinha considerandos, era um ponto preciso em que e recomendava a esta Câmara a ratificação desse decreto-lei e elementos do PSD votaram contra.
Queria ainda informar o Sr. Deputado Pedro Roseta - que, pelos vistos, está com muita atenção ao esclarecimento que lhe estou a prestar...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - A atenção merecida!
O Orador: - ...que na última reunião da Assembleia Municipal de Évora, numa moção semelhante àquela que tinha sido apresentada anteriormente, embora com mais considerandos, mas ainda em relação a esta mesma matéria, os elementos do PSD evoluíram um pouco e abstiveram-se, estando portanto a verificar-se progressos, com os quais nós nos congratulamos.
Penso ter respondido, pelo menos razoavelmente, às questões que se apresentou. Sr Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.
A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como Deputada eleita pelo círculo da Guarda, compete-me sensibilizar a Assembleia da República, e por seu intermédio o povo português, para a situação em que se encontra a Escola de Enfermagem da Guarda.
Esta Escola, criada por despacho ministerial de 7 de Julho de 1965 e situada na Guarda, tem condições aceitáveis para funcionar. Abriu com o primeiro curso de auxiliares de enfermagem em 2 de Novembro de 1966. Diplomou 276 auxiliares de enfermagem até 1975. Seguidamente fez cursos de promoção profissional dos enfermeiros de 3.ª classe, tendo diplomado 141 enfermeiros.
Foi a Escola de Enfermagem da Guarda que assegurou praticamente todo o serviço de enfermagem a nível distrital, pois a maioria dos enfermeiros que tiraram o curso nesta escola encontra-se a prestar serviço na cidade da Guarda e no distrito.
Não se compreende a razão por que a citada Escola está encerrada, provocando uma situação que a Guarda e o distrito não aceitam e que urge modificar, reabrindo-a
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Passarei a expor os dados que colhi e que, na sua feia realidade, exige, só por si, essa reabertura:
No distrito da Guarda, os Hospitais de Fornos de Algodres, Almeida, (Manteigas, Sabugal, Foz Côa, Meda e Pinhel estão semi-encerrados por falta de pessoal de enfermagem.
Totalmente encerrado desde 1977 está o Hospital de Aguiar da Beira. No entanto, no edifício onde funcionava o Hospital, trabalham três enfermeiros de saúde pública que não praticam, como é óbvio, enfermagem hospitalar. Decorre desta situação que os doentes do todo um concelho ficam sem assistência, o que, entre outros protestos, chegou a provocar um levantamento da população local em 1978.
Para se poder avaliar completamente a gravidade da situação criada pela falta de enfermeiros no distrito da Guarda será conveniente considerar que este mês os referidos Hospitais foram dotados de médicos, mas, mesma assim, não poderão funcionar por falta de pessoal de enfermagem.
A nível distrital o número e a localização dos enfermeiros existentes são os seguintes:
Em Almeida há três enfermeiras, uma no Hospital e duas no Centro de Saúde; em Figueira de Castelo Rodrigo, cinco, duas no Hospital, duas no Centro de Saúde e uma nos Serviços Médico-Sociais; em Fornos de Algodres, três, uma no Hospital e duas no Centro de Saúde; em Manteigas não há qualquer enfermeiro no Hospital, muito embora existam duas enfermeiras no Centro de Saúde e uma nos Serviços Médico-Sociais. A Câmara Municipal de Manteigas paga mensalmente 30 000$ a duas destas enfermeiras, para que a população possa ter assistência hospitalar. Na Media há seis enfermeiras, duas no Hospital, três no Centro de Saúde e uma nos Serviços Médico-Sociais; na cidade de Pinhel há quatro enfermeiras, duas no Hospital, uma no Centro de Saúde e outra nos Serviços Médico-Sociais; em Vila Nova de Foz Côa, quatro, uma no Hospital e três no Centro de Saúde.
Se o panorama que oferece o distrito da Guarda no que respeita ao pessoal de enfermagem é este, a sede, cidade da Guarda, a cujo Hospital Regional chegam diariamente dezenas e dezenas de doentes provenientes dos concelhos citados e da própria cidade, apresenta-nos um panorama ainda mais desolador: o Hospital da Guarda tem 113 enfermeiros e necessita de 280!
Em todo o distrito existe um total de 215 enfermeiros e serão necessários mais 360!
Um dos mais graves problemas do distrito em matéria de saúde é, como ficou demonstrado, o do pessoal de enfermagem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reabertura da Escola de Enfermagem da Guarda impõem-se, pois, para a resolução deste grave problema, até porque é muito difícil - e, na prática tem-se revelado impossível - a deslocação de enfermeiros de outros pontos do País para uma zona de clima agreste e vida difícil como é o distrito da Guarda.
Por outro lado, essa reabertura viria resolver o problema do futuro a muitos jovens - uma grande maioria filhos de emigrantes - que, uma vez terminado o curso secundário, e não tendo possibilidades económicas de se deslocarem para os grandes centros, a fim de cursarem as Universidades, poderiam tirar nesta Escola um curso útil e que lhes desse uma estabilidade em relação ao futuro, estabilidade essa que a maioria dos jovens não tem conseguido mercê de várias razões, entre as quais se destacam o ano propedêutico e a dificuldade de obtenção do primeiro emprego.
Mas afinal, por que é que a Escola de Enfermagem da Guarda não reabre? Apenas porque três monitoras do seu quadro docente estão em comissões de serviço noutros distritos e não foi possível até agora arranjar quem as substitua, apesar do esforço do pessoal da Administração Distrital dos Serviços de Saúde da Guarda que já tentou motivar para o distrito profissionais de enfermagem com condições para exercer o docência. Deve dizer-se que estes esforços levados a cabo junto de várias escolas de enfermagem do País conseguiram interessar para se deslocarem para o distrito da Guarda dez enfermeiros. Porém, propostas as suas admissões em requerimentos entregues ao anterior Governo através da Secretaria de Estado da Saúde, foram estes documentos devolvidos passados meses com a anotação de que os enfermeiros não podiam ser admitidos! Nem desta motivação difícil o distrito da Guarda conseguiu beneficiar!
Também a anterior Assembleia Distrital instituiu um subsídio mensal no montante de 8000$ para incentivar a ida para a Guarda de profissionais que tivessem condições para leccionar. Motivação sem êxito!
De referir ainda o facto de a anterior Assembleia Municipal da Guarda ter nomeado uma comissão para tentar resolver o problema. Nada conseguiu!
De igual modo, pretendeu o conselho de gerência da Escola de Enfermagem resolver o problema, tendo alguns dos seus membros efectuado deslocações a Lisboa para tentar, junto do anterior Governo, a reabertura da Escola. Tudo em vão!
E para terminar, ainda a propósito da Escola de Enfermagem da Guarda e do problema da sua reabertura interrogamo-nos: a que intenção terá presidido o despacho exarado pelo anterior Secretário de Estado da Saúde, em 15 de Dezembro de 1979?
Diz esse despacho: «O pessoal desta Escola» - refere-se à Escola de Enfermagem da Guarda - «enquanto ele estiver inoperacional deve colocar-se à disposição da ADSE para ter aproveitamento útil.»
Sobre o mesmo despacho pergunta-se: por que é que este pessoal está inoperacional? Por que é que não tem tido o aproveitamento útil? Como explicar tanta apatia e tanta demora na resolução de uma caso que afecta profundamente a vida de todo um distrito no aspecto da saúde e assistência?
Claro que os professores não caem do céu por obra e graça do Espírito Santo, no entanto, o Governo tem o imperioso dever de providenciar na resolução deste problema.
Não temos que recuar quando a razão e a justiça que nos assistem são comungadas por todo o distrito e quando sabemos que o actual Governo se preocupa em resolver os problemas da saúde e assistência que tão grandes são neste país!
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados independentes reformadores.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Ernesto Oliveira.
O Sr. José Ernesto Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, nós congratulamo-nos com os votos aqui expressos pela Sr.ª Depu-
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tada do PSD no sentido da reabertura da Escola de Enfermagem do distrito da Guarda. No entanto pensamos que essa preocupação não pode ser restrita ao distrito da Guarda e pensamos que, ai curto prazo seria possível termos, como forma de apoio aos hospitais distritais de todo o País, escolas de enfermagem a funcionaram junto deles.
Queria agora formular duas perguntas. A primeira é a seguinte: como é que a Sr.ª Deputada concilia as suas justas pretensões no que respeita à cobertura do distrito da Guarda com pessoal de enfermagem e outros técnicos de saúde com os objectivos expressos tanto no Programa como em várias intervenções quer do próprio Governo, quer de Deputados da sua bancada, a que o seu Governo propõe, ou seja - e cito palavras de Deputados da sua bancada - da «revogação da Lei, de Bases do Serviço Nacional de Saúde»?
A segunda pergunto é se a Sr.ª Deputada tem conhecimento, e certamente que sim, que o distrito da Guarda é considerado na Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde como distrito-piloto, ou seja, aos distintos onde, a mais curto prazo, seria possível dar resposta à situação que aqui levantou e a muitas outras que afligem as populações.
E, por último, gostava de perguntar à Sr.» Deputada se corrobora a afirmação do seu colega de bancada, Sr. Deputado Malato Correia, quando ele aqui afirma que o Serviço Nacional de Saúde não devia ter como prioritários distritos com, por exemplo, o da Guarda, mas sim distritos como o de Lisboa, Porto e Coimbra, de forma a afastar deles os profissionais da saúde, 'nomeadamente o pessoal de enfermagem.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, há mais dois Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos. Prefere responder já ou no fim?
A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, não era propriamente paira pedir um esclarecimento, porque, infelizmente, sobre o problema da Escola de Enfermagem da Guarda estou mais do que esclarecido. Era unais paira me congratular - já há pouco vi aqui introduzir como inovação essa figura regimental e, se não se importa, Sr Presidente, eu recorria a ela - pela intervenção da Sr.ª Deputada Marília Raimundo, porquanto sou solidário com as suas preocupações.
Na minha qualidade de presidente da Assembleia Municipal da Guarda tenho verificado que aquela assembleia mais não é do que um muro de lamentações e entre os vários problemas que lá surgem, com carácter de quase rotina, figura efectivamente como principal preocupação a Escola de Enfermagem. E isto a tal ponto que as Câmaras tiveram de se solidarizar .para pagar aos funcionários que não trabalham, mas que se mantêm mos seus postos à espera que este ou outro qualquer Governo ponha a Escola a funcionar. É o problema da estrada, é o problema da Escola de Enfermagem, é o problema do quartel é o problema do ensino superior, são os vários problemas a partir dos quais a Guarda se sente esvaziada de conteúdo, a caminho de uma nilização que alarma os seus habitantes, e por isso me solidarizo com a Sr.ª Deputada Marília Raimundo. Ambos sabemos, porque fizemos parte da Assembleia Municipal da Guarda no último triénio, até que ponto este é um problema dramático para os habitantes da Guarda. Assim, apenas tirarei a conclusão de que, além do que disse, que é cento e exacto, razão houve de facto para que no Serviço Nacional de Saúde o distrito da Guarda fosse erigido em distrito-piloto para a instalação desse serviço.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.
O Sr. António Arnaut (PS): - Sr.ª Deputada, desejo apenas fazer-lhe uma pergunta, mas permitam-me a colega e o Sr. Presidente que a anteceda de breves considerações.
Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada, desejo dar-lhe todo o meu apoio e dizer-lhe que comungo profundamente das suas preocupações. O problema da Guarda não é mm problema único, é um problema que diz respeito a toda a zona interior do País e que, no nosso entender, só pode ser resolvido com a concretização do Serviço Nacional de Saúde.
As unidades de saúde que citou e que estão encerradas não são, infelizmente, as únicas, porque muitos hospitais distritais estão praticamente encerrados eu funcionam mal, visto que há aí 800 vagas por preencher, enquanto no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, continua a haver cerca de mil médicos a mais. Este problema só pode, portanto, ser resolvido com a criação de uma carreira nacional paira todos os técnicos de saúde que permita a sua justa e equilibrada distribuição por todo o País.
Em segundo lugar, a pergunta que lhe quero fazer é apenas esta: a Sr.ª Deputada disse na sua intervenção que o Governo está interessado na problemática da saúde, mas eu tenho a informação de que a realidade é o contrário do que poderia concluir-se das suas palavras. Ou seja, tenho a informação de que estão em vias de serem encerradas, ou até já foram, algumas unidades de saúde da província, designadamente postos dos Serviços Médico-Sociais. Queria apenas que me dissesse se isso é verdade, se me pode tranquilizar ou não a esse respeito.
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, se o pretender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.
A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer que não me referi na minha intervenção ao Serviço Nacional de Saúde. Penso que essa matéria será discutida apenas quando a lei referente ao Serviço Nacional de Saúde for aqui discutida. A minha intervenção foi no sentido de afirmar que este é um dos problemas mais graves que se faz sentir no distrito da Guarda, bem como noutros distritos, embora no distrito da Guarda o problema que levantei talvez, tenha uma acuidade especial, na medida em que se trata de um distrito com um clima especial e com uma falta de apoio
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que torna estes problemas ainda mais prementes - como é também, por exemplo, entre outros, o problema dos transportes.
Quanto ao facto de poder ou não tranquilizar o Sr. Deputado António Arnaut, penso, embora eu não seja especializada em problemas de saúde, que o Governo tem em vista - isso depreendem-se do próprio Programa do Governo - melhorar todo o aspecto de assistência e de saúde. É tudo o que lhe posso dizer, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, finalmente chegámos ao termo do período de antes da ordem do dia, hoje com a criação, a meu ver, de uma nova figura, nu seja, a da congratulação.
Risos
O Sr. Herculano Pires (PS): - É regimental.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente:-Sendo assim, Srs. Deputados, entramos agora no período da ordem do dia.
Para fazer a leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, tem a palavras o Sr. Deputado Armando Lopes.
O Sr. Armando Lopes (PS): - É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos que passo a ler:
Em reunião realizada no dia 12 de Fevereiro de 1980, pelas 17.30 horas, foi apreciada a' seguinte substituição de Deputados:
1) Solicitada pelo Partido Socialista:
Júlio Augusto Morais de Montalvão Machado (círculo eleitoral de Vila Real), por Vítor Manuel Ribeiro Fernandes de Almeida. Esta substituição é pedida por um período de dez meses.
2) Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é real e actualmente o primeiro candidato não eleito ainda não solicitado na ordem de precedência da lista eleitoral de entre os apresentados a sufrágio pelo referido Partido no respectivo círculo eleitoral.
3) Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.
4) Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente: - A Câmara tem alguma coisa a opor?
Pausa.
Visto não haver oposição, considera-se aprovado o relatório da Comissão de Regimento e Mandatos que acaba de ser lido.
Srs. Deputados, ficam convocados para comparecerem amanhã os Srs. Deputados que integram as seguintes comissões especializadas: da 1.º à 9.ª Comissão, às 10 horas; da 10.ª Comissão à última, às 11 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, passamos agora à eleição da comissão de inquérito sobre o processo de importação de batata de semente para a campanha de 1978-1979. cujos candidatos são os seguintes: pelo PSD, José Bento Gonçalves, Fernando José da Costa e Mário Dias Lopes; pelo PS, Luís Filipe Nascimento Madeira e António Chaves Medeiros; pelo PCP, Vítor Henrique Louro de Sá; pelo CDS, Carlos Alberto Faria de Almeida.
Antes, porém, de se iniciar a chamada para esta votação, chamo a atenção dos Srs. Deputados para o facto de faltarem apenas cerca de vinte minutos para as 20 horas e, como sabem, a votação em causa é nominal, o que implica, aliás como já disse, que se raça a chamada. Há alguma oposição por parte da Câmara a que a sessão seja prolongada para além de 20 horas?
Pausa.
Visto não haver oposição, está autorizado o prolongamento da sessão.
Vamos, pois, proceder à votação. Convido para escrutinadores os Srs. Deputados Bento de Azevedo, do PS, e Cecília Catarino, do PSD.
Srs. Deputados, vai proceder-se à votação.
Fez-se a chamada para a votação.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se ao escrutínio.
Procedeu-se ao escrutínio.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o resultado do escrutínio é o seguinte: votos entrados, 209; votos a favor, 184; votos nulos, 21; votos brancos, 4.
Face a estes resultados, a comissão foi eleita.
Para fazer a leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinto da Cruz.
O Sr. Pinto da Cruz (CDS): - É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos:
Esteve reunida esta Comissão no dia 8 de Fevereiro de 1980, pelas 11 horas, na Assembleia da República.
Os seus trabalhos incidiram na apreciação da oportunidade e do mérito da proposta de resolução apresentada pelos Deputados dos Grupos Parlamentares do PSD, CDS e PPM visando a alteração dos artigos 18.º, 30.º e 83.º do Regimento da Assembleia da República.
Após interessada intervenção no debate por parte da maioria dos Deputados presentes, a Comissão tomou as seguintes decisões:
l.º Dar parecer favorável à aprovação da alteração do artigo 18.º nos termos
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constantes da proposta, com ligeira emenda do seu n.º 4, que deverá passar a ter a seguinte redacção:
4) Qualquer alteração na composição ou presidência do grupo ou agrupamento parlamentar será igualmente comunicada ao Presidente da Assembleia.
Votaram esta deliberação os Deputados do PSD, CDS e o Deputado independente Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos. O PCP absteve-se e o PS e o MDP/CDE reservaram a sua tomada de posição para o Plenário da Assembleia
2.º Considerar que a razão da proposta de alteração ao artigo 30.º está já suficientemente acautelada pelo disposto no n.º 3 do artigo 21.º do Regimento.
E, assim, por unanimidade, a Comissão é de parecer que a desejável economia das normas regimentais leva a não considerai a alteração em apreço.
3.º Considerar que se torna necessário, face à alteração do artigo 18.º, alterar correlativamente os n.ºs 2 e 3 do artigo 21.º, fazendo aí também a remissão para o n.º 3 do artigo 18.º
4 - Finalmente, a Comissão considerou, também por unanimidade, ser necessário um período de tempo para uma melhor reflexão quanto às alterações propostas ao artigo 83.º do Regimento.
E, assim, desde logo acordou que a Comissão voltaria a apreciar estas alterações em nova reunião, que marcou para o próximo d<_ p='p' horas='horas' pelas='pelas' _15='_15' sexta-feira='sexta-feira' _11='_11'>
Conclusão:
A Comissão é, assim, de parecer que a proposta de alteração ao artigo 18.º do Regimento nos termos referidos no presente relatório e as correlativas alterações aos n.ºs 2 e 3 do artigo 21.º estão em condições de ser apreciadas e votadas pelo Plenário da Assembleia da República, pelo que se juntam os respectivos textos.
Palácio de S. Bento, 8 de Fevereiro de 1980. - O Relator, Pinto da Cruz
ARTIGO 18.º
1 - Os Deputados eleitos por cada partido ou coligação de partidos podem constituir-se em grupo parlamentar.
2 - Os Deputados independentes que como tais se tenham apresentado ao eleitorado em listas de um determinado partido de coligação podem constituir-se em agrupamento parlamentar.
3 - A constituição de cada grupo ou agrupamento parlamentar efectua-se mediante comunicação dirigida ao Presidente da Assembleia, assinado pelos Deputados que o compõem, indicando a sua resignação, bem como o nome do respectivo presidente e dos Vice-Presidentes, se os houver.
4 - Qualquer alteração na composição ou presidência do grupo ou agrupamento parlamentar será igualmente comunicado ao Presidente da Assembleia.
5 - Os partidos cujos Deputados não constituam um grupo parlamentar deverão indicar ao Presidente da Assembleia o Deputado que os> representa perante a Assembleia.
6 - As comunicações a que se referem os n.ºs 2, 3, 4, 5 serão publicadas no Diário
ARTIGO 21.º
(Extensão dos poderes de grupo parlamentar)
1 - .............................................................................................................................................................................................
2 - Aos Deputados que se tenham constituído em agrupamento de Deputados independentes nos termos do artigo 18.º, n.º 3, e 18.º-A são atribuídos todos os poderes conferidos pelo Regimento ao Deputado que seja único representante de um partido.
3 - Ao presidente e substitutos de cada agrupamento de Deputados independentes, designados nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 18.º e dos n.ºs 2 e 3 do artigo 18.º-A do Regimento, aplica-se o disposto nos artigos 5.º, n.º 4, 6.º, n.º l, alínea a), 9.º, n.ºs 5, 30.º, 39.º, n.º 2., 40.º, n.º 1. 64.º e 75.º, n.º 1. do Regimento.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está aberta a discussão na generalidade da proposta de resolução visando a alteração dos artigos 18.º, 30.º e 83.º do Regimento.
Pausa.
Visto não haver inscrições, vai proceder-se à votação na generalidade das propostas de alteração aos artigos 18.º e 21.º do Regimento, nos termos propostos no relatório e parecer que foi lido
Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados independentes reformadores e com as abstenções do PCP e da V DP
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à discussão na especialidade.
Penso que os Srs. Deputados dispensam a leitura dos artigos, pelo que poderíamos proceder à sua votação em conjunto.
Algum Sr. Deputado deseja usar da palavra?
Pausa.
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Visto não haver inscrições, vai proceder-se a votação na especialidade das alterações ao artigo 18.º e aos n.ºs 2 e 3 do artigo 21.º
Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PSD, do PS do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados independentes reformadores e com as abstenções do PCP e da UDP.
O Sr. Presidente: - Passando às declarações de voto, dou a palavra ao Sr. Deputado Herculano Pires.
O Sr Herculano Pires (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS votou favoravelmente estas alterações por considerar que é correcto e legítimo atribuir a qualidade de agrupamento parlamentar às tendências existentes no Parlamento.
Ponto será, no entanto - e o PS permite-se alertar a Assembleia para esse facto -, que a atribuição dessa qualidade! não ponha em causa o princípio da proporcionalidade, já que a aplicação e o funcionamento desse princípio tem de ser aferido, não apenas em termos numéricos, mas também em termos de extensão e distribuição de poderes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Godinho dê Matos.
O Sr. Godinho de Matos (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta declaração de voto, vamos referir-nos ao facto de por esta decisão da Assembleia ca República termos sido consagrados como agrupamento parlamentar, bem como ao sentido do nosso voto quanto ao relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.
Começando por este segundo ponto, votámos favoravelmente este relatório por concordarmos com ele e também porque ficou expresso no entendimento da Comissão, quanto às alterações ao artigo 83.º, que s& entendia já estar consagrada no Regimento a faculdade de os agrupamentos parlamentares fazerem uma declaração política semanal, se assim o entenderem.
Pensamos que a letra do Regimento não é especialmente clara quanto a esse direito dos agrupamentos parlamentares. Todavia, uma vez que é esse o espírito dos diferentes grupos parlamentares e dos partidos não constituídos em grupo, não vemos qualquer inconveniente em diferir no tempo essa correcção, da tetra do Regimento. Contudo, julgamos que essa correcção poderá ser vantajosa.
Posto isto, como declaração de voto pelo facto de termos sido atribuídos como agrupamento parlamentar, desejamos dizer que é do conhecimento geral que os Deputados independentes reformadores integraram, nos lugares destinados ao PSD, as listas propostas pela aliança eleitoral que hoje constitui a maioria parlamentar. Isso resultou de um contacto político celebrado entre, em representação do Movimento Reformador, José Medeiros Ferreira e António Barreto e, em nome do PSD, Francisco Sá Carneiro e o actual Presidente da Assembleia da República Leonardo Ribeiro de Almeida.
Nós pensamos que o facto de esse contrato político revelar a existência do Movimento Reformador como um movimento político e como um fenómeno político já com lugar próprio na sociedade portuguesa, bem como o facto da Assembleia dia República reconhecer expressamente esse agrupamento parlamentar, é salutar.
Para terminar, desejava dizer que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira irá entregar na Mesa a comunicação ao Presidente da Assembleia da República através da qual nós nos iremos instituir como agrupamento parlamentar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As presentes alterações ao Regimento vêm na sequência de alterações introduzidas em Julho de 1979, através das quais foi consagrada a figura do agrupamento parlamentar. Evidentemente a nossa posição neste momento decorre e situa-se no mesmo plano da posição que nessa altura assumimos.
Como todos os Srs. Deputados s& recordam, essas alterações foram introduzidas nessa altura também com a abstenção do PCP, mas com os votos contra do CDS e do PSD, que discordaram da introdução desta figura e que em relação a ela levantaram problemas de constitucionalidade.
A nossa posição, que decorre, como já disse, da posição então assumida,
resume-se no seguinte: consideramos os problemas regimentais que advêm para a Assembleia da existência de Deputados independentes e que implicam uma solução. Emendemos, no entanto, que essa solução teria sido melhor encontra-la noutro quadro que não o dia formação de um agrupamento parlamentar, nos termos em que agora é reafirmado quanto aos Deputados independente;! reformadores e que, como tal se apresentaram ao eleitorado.
De qualquer forma, consideramos que esta figura não é inconstitucional e que vai no sentido de resolver certos problemas que aqui se colocam. Daí d nossa abstenção.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Tengarrinha.
O Sr. José Tengarrinha (MDP/CDE). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa aprovação resulta, em prime iro lugar, do facto de essas alterações virem corresponder a uma realidade e uma necessidade concreta desta Assembleia.
Em segundo lugar, vêm corresponder a uma situação idêntica àquela que já estava criada, isto é já estava prevista a constituição de um agrupamento de Deputados que foram eleitos pelos partidos. Agora pretende-se a criação de grupos de independentes que vêm integrados em listas de partidos já como independentes.
Parece-nos igual a legitimidade de um e de outro caso. Parece-nos mesmo ser mais consentâneo com o próprio processo- eleitoral.
Por isso, votámos favoravelmente
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O Sr. Presidente - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinto da Cruz
O Sr Pinto da Cruz (CDS): - O CDS votou favoravelmente as alterações do Regimento ora em apreço, em conformidade com o facto de ser um dos proponentes das mesmas e em consonância com as votações que fez na comissão.
O CDS considera que estas alterações vem ajudar um melhor comportamento da actividade desta Câmara e que elas ajudam uma melhor coordenação entre as forças políticas que actualmente a compõem.
Mas o CDS aproveita esta oportunidade para dizer que considera que, com urgência, se devem seguir outras e muitas alterações ao actual Regimento, que das mesmas esta profundamente carecido, como todos os dias se observa neste Plenário.
Vozes do CDS: - Muito bem!
Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado O Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados já não bastava a continuação da intolerável discriminação de que e objecto a União Democrática Popular, partido político que nos termos da Constituição se apresentou frontalmente ao eleitorado com a sua proposta política e que se encontra aqui legitimado por cerca de 130000 votos e que e impedido, por ilegítima e inconstitucional decisão, de usufruir os direitos constitucionais que lhe são devidos.
Agora, a proposta apresentada vai mais longe.
Pretende a mesma equiparar a UDP, com os mesmos direitos e efeitos a participação dos chamados reformadores.
Não aceitaremos tal mistificação A UDP reivindica os direitos que lhe são devidos e não se curva perante as conveniências de momento de quaisquer dos partidos ou Deputados desta Assembleia.
A UDP não calara a sua voz perante mais esta tentativa de distorção do voto popular e usara de todos os meios ao seu alcance para fazer valer os seus direitos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP não votou favoravelmente a proposta de resolução de passagem dos reformadores a agrupamento parlamentar, na medida em que tal resolução consagra um estatuto artificial de representatividade não conquistado no voto popular e, também, porque a UDP deseja ver consagrado o seu estatuto de grupo parlamentar que e proposta não refere.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.
O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr Presidente. Srs Deputados O PPM votou favoravelmente esta alteração do Regimento porque entende que a consagração dos Deputados independentes reformadores como agrupamento parlamentai era um imperativo de obediência a vontade do eleitorado.
Estes Deputados, embora eleitor numa lista do PSD, foram apresentados ao eleitorado como independentes e como integrantes de um grupo político manifestamente caracterizado o do Manifesto Reformador Como tal, seria alterar e, portanto, atraiçoar a vontade do eleitorado não traduzir na organização dos grupos parlamentares o reflexo dessa vontade do eleitorado.
Por outro lado aproveito a ocasião para saudar a constituição deste novo agrupamento parlamentar constituído por cinco Deputados que estão incluídos naquilo a que «e tem chamado d maioria parlamentar. Saudamos estes Deputados e fazemos votos - que não são de lesto apenas votos, mas certezas - de que a colaboração que poderemos manter ao longo desta sessão legislativa seja a mais profícua, para respeito do mandato que recebemos dos eleitores
O Sr. Presidente: - Tem a palavra n Sr Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD votou favoravelmente estas alterações regimentais na sequência de um compromisso
pré-eleitoral que tinha estabelecido com os Deputados participantes do Movimento Reformador. Fê-lo, portanto, no respeito pela vontade do eleitorado.
Queria ainda dizer que a comparação que alguns Deputados possam fazer com o que se passou nesta Assembleia em Junho-Julho do ano passado não e exacta Os Deputados independentes reformadores foram eleitos como tais, com um determinado projecto político, em lugares pertencentes ao PSD, nas listas da Aliança Democrática Não foram provenientes de uma qualquer cisão de um partido.
Vozes do PSD;: - Muito bem!
O Orador: - Não houve, portanto um defraudar da vontade do eleitorado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O eleitorado sabia que isso ia acontecer Por isso, o PSD propôs estas alterações e viu fazer vencimento o seu ponto de vista, ou seja, que apenas Deputados independentes e eleitos como tais pudessem constituir agrupamentos parlamentares
Vozes do PSD - Muito bem!
O Orador: - Postas as coisas no seu devido pé e cem prejuízo de outras alterações de que o Regimento carece, como acaba de ser dito e que em devido tempo proporemos, não queríamos deixar passar esta oportunidade sem saudar vivamente os membros deste novo agrupamento parlamentai que, agora com novas possibilidades e com novas responsabilidades, terão certamente uma voz nova nesta Câmara e um trabalho que a todos dignificará.
Aplausos do PSD do CDS e do PPM
O Sr. Presidente: - Srs Deputados, de seguida vamos entrar no período da ordem de trabalhos respeitante as declarações de voto que fitaram pendentes da ultima sessão e que se referem as ratificações n.ºs 202/I, 100/I e 185/I.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Lima.
O Sr João Lima (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A decisão da maioria desta Câmara de proce-
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der à imediata suspensão do Decreto-Lei n.º 513-A/79, que determina que o IV Centenário da Morte de Luís de Camões seja comemorado durante todo o ano de 1980 e com início em l de Janeiro, e que cria a comissão organizadora destas comemorações, ultrapassa o terreno da simples luta política e institucional para configurar um indisfarçável atentado à cultura nacional e um verdadeiro insulto à memória de Camões. Com efeito, os argumentos utilizados pela maioria, para justificar a sua posição relativamente aos outros dois decretos-leis - o do Congresso das Comunidades e do dia 10 de Junho - não são aplicáveis, como ficou evidenciado no debate, ao decreto-lei das comemorações camonianas. Mantendo este a obrigatoriedade de apresentação ao Primeiro-Ministro do programa das comemorações e respectiva previsão de encargos, não colhem as acusações feitas quanto ao suposto carácter das comemorações a programar ou ao excesso de gastos a despender. Confirma-se, assim, este facto escandaloso, que a maioria não ousou rebater durante o debate travado nesta Assembleia: o Governo quer pura e simplesmente outra comissão organizadora das comemorações camonianas, que lhe permita obter os dividendos político-eleitorais que a actual comissão, composta por ilustres personalidades da nossa vida cultural e alguns distintos camonistas, lhe não asseguraria, à partida. A decisão de ratificar e suspender este decreto-lei exprime, pois, em última análise, um voto de desconfiança na actual comissão e a vontade clara de criar uma comissão subserviente. Para tanto, não hesitou a maioria AD em sacrificar quase meio ano de comemorações camonianas, pois não se vê como será possível ter em execução antes de Maio ou Junho um programa a elaborar por uma nova comissão que não estará em funcionamento antes de finais de Março! Ou será que à Aliança Democrática lhe interessa comemorar Camões em pleno período pré-eleitoral e eleitoral?
O mesmo se diga para os outros diplomas legislativos cuja ratificação foi objecto de discussão nesta Câmara. Por mais esforços que o Governo e a maioria AD façam no sentido de lançar a confusão e a dúvida na opinião pública nacional, os verdadeiros objectivos das ratificações revestem-se de um carácter eminentemente político que se relaciona com a estratégia global da Aliança Democrática e do seu Governo.
Como já dissemos com ênfase e alguma veemência, as propostas da especialidade apresentadas pela maioria significam, sem margem para dúvidas, o afastamento político do Presidente da República, retirando-lhe poderes e competências cuja legitimidade se radica na sua qualidade constitucional de (representante da Nação. O que se visa é o desprestígio do Presidente da República e a sua coação. pretendendo torná-lo em elemento ornamental do neonascente regime institucional a que muitos já chamam a mova ordem política.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - De forma que os argumentos de austeridade invocados não passam de jogo de diversão que visa populistamente distrair a opinião pública, que é manipulada através de uma concomitante política de comunicação social adrede desenvolvida.
Os trabalhos preparatórios do congresso já realizadas e o seu custo vão para o (lixo. £ da argumentação da situação expendida nesta Assembleia não se divisa o que, no futuro, se poupará e como se poupará.
Daqui, pois, mais uma vez denunciamos a intenção do Governo e da AD em governamentalizar o Congresso, transformando-o num instrumento de propaganda do seu regime e das suas linhas ideológico-políticas e ainda em meio adjuvante que, através da demagogia e da mentira e à custa da boa fé dos portugueses emigrados possibilite a consolidação da maior/ia da direita na próxima eleição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aguardemos a reacção das comunidades portuguesas às iniciativas agora intentadas peio Governo. Elas serão, sem dúvida, significativas, como já se percebe de algumas notícias que mos vêm chegando do estrangeiro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente a ratificação com os fundamentos expostos e ainda par uma razão: a de que as comunidades portuguesas são mais do que os conjuntos dos caciques porta-vozes da Aliança Democrática no estrangeiro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Congresso das Comunidades não pode ser o Congresso dos porta-vozes dos caciques da Aliança Democrática, mas o Congresso de todos os trabalhadores portugueses radicados fora do País.
Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Teodoro da Silva.
O Sr. Teodoro da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A bancada do Partido Social-Democrata votou favoravelmente a ratificação do Decreto-Lei n.º 462/79, consciente de ser a este Órgão de Soberania quem compete a introdução das emendas necessárias ao enriquecimento, à democraticidade e à representatividade do Congresso das Comunidades. Realizar este Congresso com dignidade e eficácia e torná-lo em algo que no futuro permita aos portugueses radicados no estrangeiro terem voz actuante nos problemas do nosso país, é o objectivo em que esta bancada e o Governo se encontram empenhados.
No decorrer do debate demonstrou-se que apesar de se terem já gasto cerca de 4000 contos, cujas rubricas não conhecemos, a preparação do Congresso se encontra numa fase tal de atraso que levou o Secretário-Geral da respectiva comissão organizadora, na carta de pedido de demissão a declarar ter «encontrado, ao assumir o cargo em Janeiro, uma situação que quanto aos preparativos do Congresso, se pode classificar como extremamente atrasada» e terminando por afirmar que «se não apresentasse a demissão estaria a enganar os milhões de compatriotas emigrados que não o merecem».
A orquestração levantada contra a deliberação soberana deste Parlamento «toca» constantemente a palavra «democraticidade», esquecendo que quando
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em 1978 foi constituída uma primeira comissão, ou se não lhe quiser dar este nome chama-se-lhe grupo de trabalho, e se destinava a iniciar os trabalhos preparatórios de organização do Congresso dela se achavam marginalizados os partidos que nessa altura representavam e hoje confirmam a representar 75 % do eleitorado das Comunidades Portuguesas no Mundo.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: Vedava-se-lhes portanto a possibilidade de qualquer manifestação sobre u forma como estavam a ser orientados os trabalhos ou o sentido que lhe estava a ser imprimido.
Queremos responder aos problemas concretos dos nossos trabalhadores emigrantes, queremos honrar a presença de Portugal no Mundo, e mesmo em austeridade, mas com dignidade, honrar o nosso passado histórico e as efemérides que o recordam. E por isso, não aceitamos a demagogia daqueles que aplaudiram a retirada de Camões dos textos escolares paira os substituírem pelos de Samora Machel e hoje pressurosamente lamentam a falta de pompa nas comemorações camonianas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Depois disto...
A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Ele não disse quem.
O Orador: - Há que denunciar toda a orquestração e demagogia levantada à volta da ratificação do Decreto-Lei n.º 462/79, demagogia que tenta afrontamentos entre Órgãos de Soberania e manipulação que poderia ter em vista o facto de o Congresso estar projectado para um período de pré-campanha eleitoral com eventuais aproveitamentos eleitorais. A esta bancada Social-Democrata nunca faltará coragem e decisão para denunciar tentativas de manipulação e de criação de conflitos, bem como para defender o poder soberano da Assembleia da República, suprema representação do povo, único órgão de Soberania em cuja escolha os emigrantes directamente participam.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.
A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Baseou-se a nossa atitude em votarmos a ratificação, assim como em apresentarmos propostas de alteração a introduzir nos Decretos-Leis n.ºs 470/79 e 513-A/79, os seguintes motivos: no primeiro caso entendemos não ser concordante com a política de contenção de despesas do Estado, pulverizar os centros de decisão em matéria de gastos administrativos. Do que, decorre merecer-nos séria ponderação a autonomia administrativa da Comissão Organizadora do 10 de Junho.
Não contendo de forma alguma esta óptica com a dignidade que se deve imprimir a essa efeméride, dado que dignidade cultural não implica necessariamente esbanjamento
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Sobre as comemorações do Centenário da Morte de Camões reiteramos a nossa perspectiva de celebrações - à altura do seu significado nacional, tendo como adequadas a este significado acções de rasgo e profundidade cultural, nomeadamente no âmbito da defesa do património cultural, artístico e histórico. Como síntese da nossa posição prevalece o princípio, para nós decisivo, de que esta Assembleia é soberana, pois nela se faz ouvir a voz do povo português que não pode alhear-se da orientação a dar às comemorações que consagram a memória de um poeta que é o próprio símbolo da nacionalidade.
Vem a propósito solidarizar-me com as palavras dos Deputados que aqui, hoje, expuseram os perigos a que está exposto o nosso património histórico e cultural.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - É inadmissível que esta situação se mantenha. E empreender a sua solução deve constituir uma das responsabilidades que prioritariamente terão de ser definidas pelo Governo. As celebrações camonianas são o tempo indicado para que essas iniciativas sejam iniciadas.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto Gama.
O Sr. José Augusto Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por lamentar a ausência do Sr. Deputado João Lima.
O CDS votou pela ratificação do Decreto-Lei n.º 462/79, de 30 de Novembro, que cria o Congresso das Comunidades Portuguesas, consciente de que, acima do encontro amigo daqueles que longe lembram e honram a sua terra, pretende e deve ser a resposta em tempo para problemas prementes de solução adiada; pretende e deve ser, acima de tudo, a festa da nossa cultura universalista. Mas o CDS tem também o sentido do equilíbrio e das proporções e pretende perfilar os seus actos por critérios de oportunidade. Num ano de austeridade, com a tragédia dos Açores - terra por excelência de - emigração - a bater ainda nos ouvidos, com a certeza antecipada de que um congresso que aspire à organização e à eficiência terá de ser programado muito antes de Dezembro, o CDS entende não estarem criadas as condições para a sua realização em termos da dignidade e eficiência que se desejam. Votou, por isso, pela suspensão do citado decreto, na esperança firme de que o mesmo irá ter lugar em 1981.
As modificações introduzidas emprestar-lhe-ão uma autenticidade maior, chamarão à comissão organizadora os emigrantes e as pessoas que com eles tenham realmente a ver alguma coisa e, sem pretender diminuir os seus objectivos, será menos ambicioso na verba que se estabeleceu gastar. Não se compreende, aliás, que num país com serviços consulares junto das comunidades emigradas e na época do telex e do telefone se despendam tantas verbas em viagens dispensáveis.
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Ao Congresso das Comunidades dizemos sim. Descansem, por isso, as bancadas da oposição que tanto agitaram o espantalho da indignação, que tanto cultivaram a palavra chorada a roçar, nalguns casos, o pátio das carpideiras, que tanto povoaram as mentes de confrontos que, para desgosto da oposição, não existem, nem se desejam.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas se ao Congresso das Comunidades dizemos sim, às organizações em contra-relógio, apressadas, das despesas exageradas, sem emigrantes na comissão organizadora dizemos inequivocamente que não, na certeza antecipada de que teremos connosco a maioria esmagadora dos emigrantes. O CDS prevalece-se ainda desta oportunidade para desejar que o calor da oposição se mantenha vivo quando soar a hora de facilitar o recenseamento aos emigrantes, quando chegar a altura de fortalecer a confidencialidade do voto até aqui preservado pelas paredes frágeis de um envelope, quando se confrontar a gritante injustiça de quatro Deputados para 3 milhões de emigrantes. O CDS olhará nessa altura para as bancadas da oposição e recordará os princípios da seriedade e da coerência. Os emigrantes, por sua vez, vão continuar atentos. Amanhã como hoje o CDS votará a seu favor.
O CDS votou pela ratificação do Decreto-Lei n.º 513-A/79, de 24 de Dezembro, referente ao IV Centenário da Morte de Luís de Camões. Fizemo-lo de consciência firme, tranquila e consciente de interpretar o superior interesse nacional. Sempre reconhecemos a Luís de Camões o lugar cimeiro a que tem legitimamente direito na história da literatura portuguesa. Nunca estivemos com aqueles que só não lhe queimaram as raízes porque estas estão em todos os Continentes e porque no campo da cultura, tal como na terra da liberdade, estarão sempre condenados ao insucesso os braços curtos dos incendiários. Nunca estivemos ao lado daqueles que entre raivas e sectarismos lhe chamaram poeta reaccionário perante as palmas de uns e o silêncio cúmplice de outros. Nunca estivemos ao lado daqueles que o quiseram exilar no stock das velharias, no desejo pagão de que o seu lugar viesse a ser ocupado por «poetas-anões» encharcados de um revolucionarismo arrivista em flagrante desrespeito pelo nosso passado cultural e artístico. Aplaudimos, por isso, com alegria este reencontro com Camões.
Cientes da nossa consciência histórica e da nossa cultura, apoiamos as iniciativas que visam mante-la viva e arrancá-la do marasmo em que, por vezes, se arrasta. Não significa isto que demos o nosso aval a toda e qualquer iniciativa. Camões deve ser lembrado, por isso, em actos que primem pela sua elevação e se não esgotem no dia da sua realização. Não queremos que deste centenário fique apenas a cinza ou a' lembrança fria do calendário. Acima da frase troante, da serpentina, da garrafa errante, defendemos, como aqui salientou a Sr.ª Deputada Natália Correia, a «realização de obras perduráveis». É neste espírito que o CDS vê o IV Centenário da Morte de Camões e, por isso, votou a favor do citado decreto-lei. Entendemos ainda que esta Assembleia deve ser ouvida, na qualidade de representante do povo, sobre o espírito que deve presidir às celebrações do IV Centenário e por isso votámos a sua suspensão e somos pela introdução de alterações que contemplem este facto.
Quanto ao Decreto-Lei n.º 470/79, referente ao 10 de Junho, seria leviano desprezar o sentido das realidades que apontam, como aqui salientou o Sr. Deputado Rui Pena, para a «grave situação económica e financeira do nosso país; que impõe um yério esforço de contenção no dispêndio dos dinheiros públicos». Em obediência a este facto e no confronto inevitável entre as soluções ideais e as soluções possíveis, decidimos optar por estas quando aquelas exigem gastos públicos que não cabem Jias balizas porque nos devemos pautar, «o reequilíbrio económico e cultural da Nação», como aqui salientou Sr.ª Deputada Natália Correia.
Somos, assim, pela suspensão do citado decreto-lei e pela introdução de alterações que ponham cobro à sua autonomia administrativa.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.
O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que aqui ocorreu na quinta-feira passada, com a votação da ratificação dos decretos-leis das comemorações do IV Centenário da Morte de Camões e do Congresso das Comunidades, com a apresentação das propostas de alteração apresentadas pelos partidos governamentais e, finalmente, com a votação de suspensão desses decretos, confirmou exuberantemente o que aqui dissemos acerca dos propósitos que amimavam as bancadas governamentais. Tratava-se efectivamente de anular, na prática, os decretos-leis, de paralisar as comemorações, de afrontar outros Órgãos de Soberania. Os protestos das bancadas governamentais de que não queriam nada disso, que queriam até as comemorações, que não queriam afrontar ninguém, soam hoje a ridículo incomensurável. O argumento da austeridade, de que pretendiam apenas diminuir despesas públicas - e a Sr.ª Deputada chegou a dizer que estava em causa apenas a autonomia administrativa de que goza uma das comissões -, não tardou a revelar-se como pretexto desajeitado e tentativa canhestra de encobrir, à última hora, os verdadeiros propósitos.
E esses propósitos surgiram flagrantes, nas propostas de alteração apresentadas no final da discussão e também pela suspensão injustificada de todos os decretos-leis sujeitos a ratificação.
Os propósitos resultam cristalinamente dos resultados: iniciativas lançadas e dinamizadas pelo Presidente da República, pretende-se agora transferi-las para o Governo; o Congresso das Comunidades, marcado paia 1980, para coincidir com a comemoração do centenário camoniano, é adiado para daqui a um ano; as comemorações camonianas, iniciadas no dia l de Janeiro, são suspensas sine die; a composição das comissões organizadoras, que segundo os decretos-leis dava garantias de isenção, passa a depender fundamentalmente do Governo, isto é, dos partidos que o constituem, a ter em conta as recentes medidas a propósito dos conselhos de gestão dos órgãos de comunicação social
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Afrontamento do Presidente da República, descaracterização dos projectos de comemorações tal como haviam sido configurados pelos seus promotores,
instrumentalização e apropriação governamental dessas idealizações, eis os resultados que traduzem os agora indesmentíveis propósitos das bancadas governamentais. Depois da apresentação das suas propostas e da suspensão dos decretos-leis, com que seriedade poderemos aceitar a invocação de argumentos de austeridade, quando, para mãos, entre as propostas apresentadas não se consta sequer nada sobre o assunto? Com que seriedade se pode continuar a esgrimir este argumento quando ainda hoje um Deputado das bancadas governamentais considerou como questão de lana-caprina a delapidação de 70 000 contos para um familiar do presidente da CAP, sabendo-se que o Congresso das Comunidades estaria orçado, quando muito, em 50 000 contos.
A suspensão dos decretos-leis ratificados merece só por si mais algumas reflexões. Os seus propósitos resultavam já claramente da suspensão de verbas determinadas, aliás ilegalmente, pelo Governo, mediante uma resolução de 26 de Janeiro, publicada, todavia, apenas no Diário da República de 9 de Fevereiro de 1980, e que rezava diariamente que «fica suspensa a realização de despesas com os actos preparatórios do I Congresso das Comunidades Portuguesas e das comemorações do IV Centenário da Morte de Camões, até que a Assembleia da República se pronuncie definitivamente sobre os diplomas reguladores dessas iniciativas, cuja ratificação está pendente». Li o n.º 3 da Resolução n.º 30/80, publicada na referida data.
Deste modo expedito, por resolução "do Conselho de Ministros, o Governo suspendia as verbas para iniciativas previstas em leis que estavam em vigor. Isto é, o Governo, mediante um acto administrativo, suspendia leis aprovadas legitimamente e dava assim uma verdadeira imagem do que significa para ele a legalidade. Além disso, e além desta resolução, mediante telefonemas e outros actos administrativos, o Governo tinha já dado ordens às nossas embaixadas de suspensão de todos os actos das comunidades, pelo que o acto da suspensão dos decretos-leis aqui perpetrado na quinta-feira passada não passa de uma tentativa de a posteriori vir sanar um propósito denunciado do Governo no dia 9 de Fevereiro.
Mas a suspensão em si mesma de decretos-leis que não são de execução continuada e indefinida, que são aquilo a que se chama «decretos concretos», ou seja, que visam propósitos concretos e que têm duração temporal limitada, não pode ter-se como equivalente à suspensão, essa sim legítima, de decretos-leis gerais, abstractos e de execução indefinida. Na realidade, suspender um decreto-lei que visa realizar uma manifestação no próximo dia 10 de Junho significa, na verdade, não suspendê-lo, mas sim revogá-lo. Quer isto dizer que a maioria das bancadas governamentais utilizou um expediente regimental, aliás não previsto na Constituição, mas cuja legitimidade constitucional não colocamos em causa, para um objectivo completamente diferente, traduzido num autêntico desvio e abuso de poder, já que a suspensão de um decreto-lei é utilizada para conseguir resultados que equivalem à revogação desse mesmo decreto-lei. Tratando-se de uma lei concreta e temporal a suspensão do decreto-lei acaba por traduzir-se na suspensão da sua execução e por pôr em causa a consecução dos seus resultados, isto é, por pôr em causa o decreto-lei na sua totalidade.
No caso do decreto-lei das comemorações camonianas, trata-se pura e simplesmente de suspender essas comemorações que já se iniciaram mo dia 1 de Janeiro e que a partir de agora, na prática, ficam suspensas indefinidamente, até que a maioria governamental resolva acabar com essa suspensão. No caso do decreto-lei do Congresso das Comunidades trata-«e também, pura e simplesmente, de uma revogação que vai adiar, inutilizar o trabalho já efectuado e alterar completamente a estrutura e a natureza do Congresso tal - como está configurado no decreto-lei actual.
Com a suspensão e o desvio deste autêntico abuso de poder de um expediente regimental, a maioria governamental ficou com o meio que lhe permite manter indefinidamente suspensa a preparação, quer das comemorações camonianas, quer do Congresso das Comunidades, ficou com o meio que lhe permite usar essa suspensão como arma de arremesso para obter eventualmente a promulgação das alterações que quer fazer aprovar.
Este episódio prova mais uma coisa: O Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral, ou melhor, Freitas do Amaral/Sá Carneiro - porque já ninguém sabe quem é o Primeiro-Ministro - não tolera qualquer manifestação política ou cultural de iniciativa oficial que ele não domine totalmente, e este é que é o verdadeiro sentido de toda a discussão que aqui teve lugar. A suspensão dos decretos-leis e as alterações que lhe são introduzidas visam pura e - simplesmente transferir para o Governo o domínio total, a apropriação, a captura, por parte do Governo e dos partidos que o constituem, de iniciativas que não lhes couberam, de actividades que não foram da sua iniciativa, de realizações que não podiam utilizar em seu benefício.
Através de todo este expediente está criado mais um elemento de vocação totalitária deste Governo, que não admite que nada de iniciativa oficial possa ser feito à sua margem, possa ser feito sem que o possa dominar totalmente. É este o verdadeiro sentido de toda esta discussão, e porque este sentido estava à mostra desde o princípio, e porque a denúncia que aqui fizemos se confirmou através da discussão, não podíamos deixar de conduzir esta discussão como a conduzimos e de manifestar a nossa mais profunda oposição e a nossa mais profunda contestação a esta iniciativa do Governo, que traduz aquilo em que se manifesta a verdadeira «mudança» que anuncia: é a mudança para a restrição do pluralismo, é a mudança para a restrição das liberdades, é a mudança para o afrontamento institucional, é a mudança para o totalitarismo governamental, não apenas no campo político, mas também no campo cultural.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo de que esta Assembleia da República foi palco na última quinta-feira mostra à
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evidência os processos e fins da AD e do seu Governo. Quem tivesse ilusões de que este Governo não iria desde já tomar as medidas reaccionárias que a sua política e a sua ideologia exigem e de que, por razões eleitorais, iria demorar por algum tempo o cumprimento das exigências dos capitalistas, latifundiários e imperialistas, seus senhores, já viu que pode e deve perdê-las.
Os caminhos deste Governo são bem diferentes. Para ele, a demagogia não pode ir até ao ponto de permitir veleidades a esquemas e processos minimamente abertos ou democráticos. Para garantir a vitória nas próximas eleições os processos que o Governo utiliza são aqueles que estão efectivamente de acordo com a sua própria ideologia reaccionária, que correspondem à única forma possível para impor a sua política de aumento da exploração e de repressão: cercear mais e1 mais as liberdades, corromper os processos minimamente democráticos, controlar cerradamente todos os mecanismos institucionais, políticos, sociais e culturais, sejam eles os congressos para emigrantes, as comemorações do centenário de Camões, a Lei Eleitoral, as escolas, a comunicação social. É o reforço do Poder, o caminho do abuso do Poder; é a transformação da própria qualidade de poder. É o único caminho possível para uma grande burguesia em crise e assediada pelas reivindicações populares.
Os trabalhadores emigrantes de - há muito que desejam um encontro nacional, um congresso em moldes democráticos e amplamente participativos em que pudessem apresentar as suas reivindicações & lançar as bases para uma política que tivesse em conta os seus legítimos interesses. Do projecto para a realização do congresso ressaltavam dois objectivos principais que, sendo baseados numa organização democrática, eram um ponto de partida aceitável para a UDP: «O estabelecimento de uma política nacional de emigração e «a institucionalização de relações entre as comunidades no estrangeiro e a sociedade portuguesa». Por isso, o Deputado da UDP fazia parte da comissão organizadora do Congresso, apesar da evidente ligação entre este e o chamado Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, sobejamente conhecido e rejeitado por isso mesmo, como o «Dia da Raça» do governo fascista.
A UDP sempre expressou a sua oposição a que o dia 10 de Junho fosse considerado como «Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades», cujo processo de comemoração também foi objecto de discussão na última sessão plenária.
Em primeiro lugar, porque 10 de Junho foi a data escolhida pelo governo fascista, usando abusivamente o nome de Camões, para celebrar uma pretensa superioridade da «raça portuguesa» que servia às mil maravilhas a sua política ultracolonialista. Nesse dia, os fascistas sublimavam com pompas, trombetas, medalhas e múmias de palanque os crimes da guerra colonial, a repressão e a pressão sobre os povos das colónias, tentando dar um sentido dito superior à exploração desenfreada sobre os trabalhadores, contribuindo assim para a maior alienação do povo português. Em 10 de Junho, o regime fascista celebrava tudo aquilo que, no fundo, levava milhares de portugueses a serem obrigados a abandonar a sua terra, dizendo-lhes que seguiam a vocação universalista cantado pelo poeta. Só uma lotai consonância política com aquele regime, ou uma total indiferença pelo sofrimento, miséria e luta do nosso povo durante décadas, ou ainda, uma insensata e leviana jogada política poderão ter levado a chamar Dia de Portugal e das Comunidades ao dia 10 de Junho.
Em segundo lugar, a UDP rejeita o sentido que se pretende dar àquela data, porque só o 25 de Abril simboliza o elo de ligação entre todos os trabalhadores portugueses, emigrados ou não, na sua luta pela liberdade e por uma pátria livre de onde não precisem de emigrar. O 25 de Abril é o dia da unidade de todos os trabalhadores portugueses, estejam onde estiverem, foi por ele que lutaram, foi nele que viram brilhar a esperança de poderem voltar. Mas a direita, apesar de ter obtido do Presidente da República a concordância com as suas exigências reaccionárias - comemorar o Dia de Portugal e das Comunidades em 10 de Junho, e não em 25 de Abril, como o povo havia imposto -, vai agora, na lógica da sua escalada, impor um «Dia da Raça» efectivo. Como vai impor um IV Centenário da Marte de Camões que sirva os seus intentos reaccionários. Nós somos por uma verdadeira comemoração do IV Centenário da Morte de Camões. Consideramos que é uma boa oportunidade para desenvolver e incrementar o estudo, a divulgação e a prática da língua e da cultura portuguesas e para aprofundar e debater as determinantes históricas, políticas, económicas, sociais e culturais da expansão e dos Descobrimentos. Comemorar hoje o IV Centenário de Camões não é querer voltar ao tempo da expansão colonial, de domínio sobre os outros povos. O que Camões teve de grande e progressista naquela época longínqua de quatrocentos anos foi o impulso para novos caminhos e novos mundos e principalmente que de universal contém a sua compreensão do sentido da história. Ë isso que não existe na AD e por isso, ao contrário de Camões, tudo faz para travar a marcha da história, para fazê-la voltar para trás.
Por isso se submete, enquanto proclamo a defesa da cultura portuguesa, à liquidação dos nossos valores, à nossa colonização cultural, por isso investe na importação dos últimos haustos de uma burguesia internacional feroz, maribunda e reaccionária. Por isso, também, impede o livrei desenvolvimento da criatividade popular, limita a acção dos grupos de teatro, cerceia a expressão artística, controla a comunicação social, sufoca a propagação das ideias, impede a expressão do pensamento, assume posições te feroz chauvinismo aliadas à mais servil submissão dos seus patrões imperialistas. Por isso suspendem os
decretos-lei, por isso já propôs as alterações necessárias para transformar o Congresso e as comemorações em arremedos reaccionários dos anseios populares, em instrumentos passivos da sua propaganda ideológica e da sua política retrógrada.
É contra isso que, lado a lado com o nosso povo, nos batemos. É por uma cultura popular que os senhores da AD antes desejariam mumificada nas folclarices para turista yankee ou da CEE, que lutamos. As forças democráticas, antifascistas, juntamente com o nosso povo, saberão impor comemorações do centenário de Camões dignas de futuro porque ele lutou e escreveu & um verdadeiro Congresso das Comunidades Portuguesas livre dar baias fascizantes!
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O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr " Deputada Helena Cidade Moura
A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A leitura das alterações propostas pelos partidos governamentais aos decretos-leis que apoiam legalmente as actividades das Comemorações do 10 de Junho, do centenário de Camões e do Congresso das Comunidades elucidam sobre a intensa e contraditória partidarização deste Governo, sobre a alienação que cai sobre esta Assembleia da República e sobre o espírito mesquinho e retórico que tenta justificações circunstanciais sobre uma política determinada que se objectiva em pontos concretos tais como: transferir do Estado Português para o Governo a representação de comemorações nacionais: repor sobre contrôle governamental toda a actividade à volta do Dia de Portugal, de Camões e IV Centenário da Morte do Poeta; inutilizar a dinâmica criada e o trabalho efectivado, em volta do Congresso das Comunidades, na impossibilidade de dominarem o processo, no estado de adiantamento em que ele se encontra; desligar o centenário de Camões do Congresso das Comunidades, sobrepondo os interesses partidários aos valores nacionais.
Para servir estes objectivos, a Assembleia da República foi forçada a suspender três decretos-leis, medida grave que a responsabiliza. É agora convidada a associar-se, através das alterações propostas ao Decreto-Lei n.º 513-A/79, à nomeação do presidente da comissão organizadora das comemorações camonianas, a quem ao mesmo tempo é retirado o direito que lhe era concedido de propor ao Primeiro-Ministro os restantes membros da comissão a que presidia. Ao Sr. Primeiro-Ministro será, pois, dado o direito de a nomear, sozinho, sem sugestões. Terá também esta Assembleia da República, para descanso do Governo, de repor, no Decreto-Lei n.º 1 470/79, ao artigo 5.º a sua redacção anterior, retirando à comissão organizadora autonomia administrativa.
Quanto ao decreto que dá suporte legal ao Congresso das Comunidades, as alterações que a AD propõe, são visivelmente mais graves e têm um sentido político retrógrado e impõem mesmo a alteração do preâmbulo do decreto, pois não será mais possível dizer em referência aos emigrantes, «que essa importante parcela do nosso povo é chamada a participar nas comemorações do IV Centenário de Camões». Facto que representa um episódio medíocre, grave e triste
O veredicto fundamental vem expresso no ponto 2 do artigo l.º: «O I Congresso das Comunidades terá lugar em 10 de Junho de 1981.» Nas propostas apresentadas, o Presidente da República assumirá a presidência da comissão de honra. A divisão entre comissão de honra e comissão organizadora, separa, para um lado, Ministros, para o outro, Secretários de Estado. Constrói-se um esquema pomposo e reduz-se a participação desta Assembleia da República integrando na comissão organizadora apenas os Deputados pelo círculo da Emigração O Primeiro-Ministro terá poderes para discricionariamente nomear o presidente da comissão organizadora substituindo-se à nomeação feita pelo Presidente da República sob proposta do Primeiro-Ministro. Todas estas mudanças são no sentido da governamentalização do Congresso, da redução do seu valor nacional
Como sempre, nas acções - deste Governo nota-se um certo excesso no uso do Poder, servido por mecanismos não muito claros; o novo congresso de 81 apresenta-se numa estrutura mais pomposa, menos participativa, diminui as representações sindicais de quatro elementos para dois, perde o seu carácter nacional de ligação ao Presidente da República e ficará atado a uma pesada superproteção do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Isto é, burocratiza-se. Podemos, pois, dizer que o Congresso se governamentaliza, se burocratiza e perde em dimensão nacional e projecção cultural e internacional, na medida em que se desliga do IV Centenário de Camões. Estas alterações, que seriam perfeitamente evitáveis no quadro de uma maior segurança democrática, tornam evidente: que os valores espirituais e culturais da AD têm conteúdo formal e eleitoralista; que para a AD, o IV Centenário de Camões tem uma ligação meramente circunstancial com o Congresso das Comunidades e que essa ligação poderá facilmente ser ultrapassada; que a AD conta estar no Governo em 10 de Junho de 1981.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros, chamando a si o Congresso das Comunidades, não o entendeu na sua real dimensão e entendeu-o sim, à luz da política externa, bradada nos últimos tempos aos quatro ventos de forma altissonante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eça de Queirós perpassa forçosamente entre aqueles para quem as reminiscências literárias são fatais. O décor da nossa política externa é hoje semelhante àquele que Eça evocou em O Mandarim, quando escreveu: «Os patriotas passam os dedos pela grenha e dizem negligentemente. Mandamos lá 50 homens e varremos a China...' - A esta sandice fez-se silêncio. E o general, depois de tossir formidavelmente, murmura com condescenda. Portugal é um belo país...» É isso que se dirá dentro em pouco a nosso respeito.
O espírito de cruzada da nossa actual política externa desliga-nos da realidade e, em consequência, adia os problemas dos nossos emigrantes e marginaliza-os precisamente no ano em que a face renovada de Camões poderia trazer às nossas comunidades uma mais forte identidade e projectar nos países onde se encontram uma mais universal dimensão da nossa cultura e da nossa língua!
Mas o Governo olha, com olhas eleiçoeiros, os países onde trabalham, sofrem, vivem, evoluem se expressam e lentamente se radicam, irmãos do nosso sangue, da nossa terra, que a fome, a miséria, a falta de liberdade, as perseguições, a guerra colonial, a ausência de ideais e o vazio do fascismo afastaram da nossa Pátria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em homenagem aos nossos emigrantes, permitam-me que cite parte de uma carta inédita de António Sérgio, quando emigrado em França, em 1930:
Formei o plano de empregar todos os emigrados assistidos, custe o que custar. Custará bastante, mas hei-de empregá-los. Até que isso se realize, porém, preciso de dar de comer aos desgraçados. Não seria possível fazer uma subscrição entre os republicanos do Porto - tudo quanto agora vier, por pouco que seja, nos fará grandíssimo serviço - com a promessa de que o peditório se não repete, pois que nós propomos em-
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pregá-los a iodos», em Paris ou na província, em França ou alhures?
Os tempos mudaram, mas esta é a realidade subjacente ao drama da nossa emigração, que para muitos, mesmo no meio das maiores cidades, é o seco, duro e estéril monte com que Camões define o exílio.
Para além das graves consequências nos planos cultural e social resultantes das suspensões dos decretos-leis, é no plano político que se situam as principais motivações e as mais lesivas implicações dessas medidas. Surpreende, desde logo, que uma tão grave decisão seja tomada sem uma fundamentação minimamente convincente. Tão frágeis e insuficientes foram os argumentos apresentados que mais parecia que a maioria estava a cumprir, displicentemente, sem talento, nem convicção, um acto formal a que atribuía secundária importância. No decorrer do debate ainda mais essa falta de fundamentação se evidenciava, perante as perguntas e críticas levantadas pelos partidos da oposição e as confusas e contraditórias respostas -e normalmente a falta de respostas- da maioria da Câmara. No final, ainda mais claro ficou para esta Câmara e para o País que as razões referidas não eram as verdadeiras. Atrás da supressão estavam intenções não confessadas, mas que a Câmara e o País claramente compreenderam ser de natureza política. Atingir-se-ia, nesta questão, um dos momentos mais agudos da guerrilha que o Governo um vindo a desencadear contra os Órgãos de Soberania Presidência da República e Conselho de Revolução. Tentar esvaziá-los do conteúdo e das competências que constitucionalmente lhes estão atribuídos, tentar minimizar a sua importância, subalternizando-os em relação ao Executivo, provocar conflitos institucionais que ponham em causa o equilíbrio e a estabilidade da organização do poder político democrático tem sido preocupação permanente do Governo. Nessa mesma linha se situa, também, a tentativa de definir as comemorações do 25 de Abril, opondo-se ao nome do militar que o Conselho da Revolução propôs que a elas presidisse. Por muito que de pessoal e revanchista aqui possa haver, o que principalmente move também aqui o Governo é abrir o conflito com o Conselho da Revolução, símbolo dos militares que tornaram possível o 25 de Abril, é o desejo de apagar quanto possível o - próprio 25 de Abril.
Nesta questão denunciou-se um aspecto muito grave para o necessário equilíbrio que a Constituição prevê entre os órgãos de Soberania: o Governo fazer desta Assembleia, não um órgão que com ele colabora, mas um órgão que lhe fica completamento submisso, e que servirá, sobretudo, como executor paciente e dócil de todos os seus caprichos e vontades. Abre-se desta forma um novo aspecto preocupante nas relações entre as instituições democráticas.
Por tudo isto, o meu partido votou clara, frontal e serenamente a favor da ratificação e contra a sus pensão destes decretos-leis.
A Pátria, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não são os governos, e os democratas aqui presentes - são poucos -, à esquerda e à direita deste hemiciclo, conhecem a força das aspirações de um povo e sabem que ele encontrará sempre a sua expressão adequada.
Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa as seguintes, propostas de lei: n.º 287/I, que elimina a alínea i) do artigo 48.º da Lei n.º 75/99, de 29 de Novembro (Lei da Radiotelevisão), que baixa à 3.ª Comissão; n.º 288/I, que autoriza o Governo a alterar a Lei n.º 46/77, de 8 de Julho, que baixa à 8.ª Comissão; n.º 289/I, que torna aplicáveis durante o l.º semestre de 1980 as disposições da Lei n.º 42/77, de 18 de Junho, e legislação complementar, excepto quanto à isenção do imposto do selo, que baixa à 8.ª Comissão; n.º 290/I, que considera determinadas áreas da Região Autónoma dos Açores, afectadas pelo sismo de l de Janeiro de 1980, regiões rurais economicamente mais desfavorecidas, para efeitos dos benefícios fiscais estabelecidos na lei durante os anos de 1980 a 1984, que baixa à 8.ª Comissão.
Deu também entrada na Mesa o projecto de lei n.º 375/I, apresentado pelo CDS, que cria a freguesia de Nuzedo de Baixo, no concelho de Vinhais, distrito de Bragança, que baixa à 16.º Comissão, e o projecto de lei n.º 376/I, apresentado pelo PSD, sobre a elevação à categoria de vila da freguesia de Rio Tinto, que baixa à mesma Comissão.
Deram igualmente entrada na Mesa as seguintes ratificações: n.º 304/I, apresentada pelo CDS, sobre o Decreto-Lei n.º 534/79, de 31 de Dezembro, que cria no Ministério da Educação a Direcção-Geral da Educação de Adultos; n.º 305/I, apresentada igualmente pelo CDS, sobre o Decreto-Lei n.º 540/79, de 31 de Dezembro, que cria no Ministério da Educação a Inspecção-Geral do Ensino e converte a Inspecção-Geral do Ensino Particular em Direcção-Geral do Ensino Particular e Cooperativo; n.º 306/I, apresentado pelo PS, sobre o Decreto-Lei n.º 519-X/79, de 29 de Dezembro, que fixa os quadros dos .magistrados judiciais.
Srs. Deputados, a reunião da próxima quinta-feira, que terá início pelas 15 horas, tem como ordem de trabalhos a discussão dos diplomas constantes da ordem do dia de hoje que ficaram por debater. Aviso desde já os Srs. Deputados que na próxima sexta-feira há sessão plenária, das 9 horas e 30 minutos às 13 horas, e que amanhã a partir das 10 horas reúnem os Deputados representados nas comissões parlamentares da 1.ª à 10.ª e os restantes às 11 horas e 30 minutos.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 10 minutos.
Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Alcino Cabral Barreto.
Américo Abreu Dias.
António Alberto Correia Cabecinha.
António José Ribeiro Carneiro.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria Pereira.
António Maria de O. Ourique Mendes.
Arménio dos Santos.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
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Fernando José da Cosia.
Francisco José de Sousa Tavares.
Germano Lopes Cantinho.
Germano da Silva Domingos.
João Baptista Machado.
Jorge Rook de Lima.
José da Assunção Marques.
José Baptista Pires Nunes.
osé Bento Gonçalves.
José Manuel Medeiros Ferreira.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Manuel Maria Moreira.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. Salema Roseta.
Mário Martins Adegas.
Miguel Camolas Pacheco.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Partido Socialista (PS)
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
António de Almeida Santos.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Fernandes da Fonseca
António José Sanches Esteves.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Herculano Rodrigues Pires.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Luís Filipe Nascimento Madeira
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Raúl de Assunção Pimenta Rêgo.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.
Partido Comunista Português (PCP)
António Dias Lourenço da Silva Dinis Fernandes Miranda.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Freitas Rodrigues.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Rodrigues Vitoriano.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Centro Democrático Social (CDS)
Eduardo Leal Loureiro.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique José C. de Meneses P. Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Macedo Pereira.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Baeta Neves.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro António J. B. Pestana Vasconcelos.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Popular Monárquico (PPM)
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
José Maria da Silva.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Partido Socialista (PS)
António Chaves Medeiros.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Fernando Luís de A. Torres Marinho.
José Luís do Amaral Nunes.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Rectificação
Por engano tem-se indicado algumas vezes como Secretário da Mesa o Sr. Deputado Manuel Baeta Neves, em vez do Sr. Deputado Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira, lapso que aqui se deixa devidamente corrigido.
O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO. José Pinto.
PREÇO DESTE NÚMERO 46$00 IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA