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I Série-Número 45
Quarta-feira, 25 de Março de 1981
DIÁRIO da Assembleia da República
II LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1980-1981)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 24 DE MARÇO DE 1981
Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Manuel da Mata de Cáceres
António Mendes de Carvalho
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - o Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Concluiu-se o debate na generalidade, das propostas de lei n.ºs 18/II e 19/II, (Plano e Orçamento), tendo usado da palavra, a diverso título - intervenções, esclarecimentos e pedidos de esclarecimento, protestos e contraprotestos -, os Srs. Deputados Raul de Castro (MDP/CDE), Portugal da Fonseca (PSD), Veiga de Oliveira (PCP), Octávio Teixeira (PCP), José Alberto Xerez (CDS), Amândio de Azevedo (PSD), Fernando Vieira (PS), Carlos Rosa (CDS), Manuel Arruda (PSD), António Vitorino (UEDS), Anacoreta Correia (CDS), Lopes Cardoso (UEDS), Mário Tomé (UDP), Pinto Nunes (PSD), Jaime Gama (PS) Jorge Miranda (ASDI) -lendo uma intervenção do deputado Sousa Franco, ausente por doença -, Azevedo Soares (CDS), Luís Coimbra (PPM), Magalhães Mota (ASDI), Carvalho Cardoso (CDS), Zita Seabra (PCP), Valdemar Alves (PSD), Vítor Constâncio (PS), Luis Beiroco (CDS), António Arnaut (PS), Jaime Ramos (PSD), Herberto Goulart (MDP/CDE), Ângelo Correia (PSD), João Cravinho (PS), Sousa Gomes (PS), Carlos Brito (PCP), João Pulido (CDS) e Anselmo Aníbal (PCP).
Intervieram, por parte do Governo, os Srs. Ministros do Trabalho (Nascimento Rodrigues), dos Transportes e Comunicações (Viana Baptista), da Habitação e Obras Públicas (Luis Barbosa), dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo) e da Administração Interna (Fernando Amaral), tendo o Sr. Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão) encerrado o debate.
As duas propostas de lei foram aprovadas por maioria, tendo feito declaração de voto os Srs. Deputados Herberto Goulart (MDP/CDE) e Mário Tomé (UDP).
Entretanto, no decurso da sessão, a Assembleia saudou com aplausos a presença, na tribuna do corpo diplomático, do Ministro dos Negócios Estrangeiros da República Popular de Moçambique, Joaquim Chissano, acompanhado da respectiva comitiva.
O Sr. Presidente, depois de anunciar a entrada na Mesa do projecto de lei n.º 173/11, sobre o estatuto do trabalhador-estudante, subscrito por deputados do PSD, encerrou a sessão, eram 21 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 9 horas e 50 minutos.
Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
Amândio Anes de Azevedo.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José F. Fleming d'Oliveira.
Fernando Manuel Cardoso e Barbosa Mesquita.
João Afonso Gonçalves.
João Aurélio Dias Mendes.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
Joaquim Pinto.
José Adriano Gago Vitorino.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
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Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ribeiro Arruda.
Manuel João Vaz Freixo.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
António Duarte Arnaut.
António Emídio Teixeira Lopes.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Beatriz Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Verdasca Vieira.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Cardona Gomes Cravinho.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Trindade Reis.
Mário Manuel Cal Brandão.
Virgílio Fernando Marques Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS)
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alberto Henriques Coimbra.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de C. Azevedo Soares.
Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
António Mendes de Carvalho.
Carlos Alberto Rosa.
Daniel Fernandes Domingues.
Eugénio Maria .Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel L. V. de Oliveira Dias.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
João Cantinho M. Figueiras de Andrade.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Ferreira Pulido de Almeida.
José Alberto de Faria Xerez.
José Augusto Gama.
José Carlos Barbosa Macedo.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
Mário Gaioso Henriques.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Carlos Alberto do Carmo da C. Espadinha.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete Ferreira de Oliveira.
Jerónimo de Carvalho Sousa.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Fernando V. Cabral Pinto.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António José Borges Gonçalves de Carvalho.
Eurico de Campos Gondim.
Jorge Victor M. Portugal da Silveira.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António Ferreira Guedes.
António César Gouveia de Oliveira.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Raul Fernandes de Morais e Castro.
O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 108 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão na generalidade as propostas de lei n.ºs 18/II e 19/II.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raúl de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A integral aplicação da Lei das Finanças Locais não tem sido reclamada apenas por numerosas câmaras municipais de todos os pontos do Pais, aí incluída a deliberação dos próprios vereadores da AD na Câmara Municipal do Porto, como referi na passada sexta-feira.
O Conselho Nacional do Plano, de par com outras críticas, que o MDP/CDE inteiramente perfilha, quanto a uma maior taxa de crescimento da produção e do emprego, à melhoria de distribuição do rendimento, ao combate ao desemprego e a uma maior justiça social, reitera, por seu turno, a recomendação do integral cumprimento da Lei das Finanças Locais.
E se tal não bastasse para evidenciar que a exigência de tal cumprimento integral da Lei das Finanças Locais não é uma questão a que o Governo pudesse eximir-se alegando tratar-se de uma querela partidária, o recente exemplo da posição assumida em Odivelas, em 8 do corrente, pelos executivos das cinco freguesias mais populosas do País -Paranhos, do
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Porto, Carnaxide, de Oeiras, Cova da Piedade, de Almada, Odivelas, de Loures e Santa Maria dos Olivais, de Lisboa serviria para demonstrar que o que está em causa é a efectiva descentralização e independência do Poder Local.
Com efeito, destas cinco juntas de freguesia, que formulam como primeiro objecto de unânime reclamação a aplicação integral da Lei das Finanças Locais, duas são APU e três são AD.
Bem se pode dizer que, ao retirar algumas dezenas de milhões de contos às autarquias locais através do orçamento proposto, o Governo ignora as reclamações das suas próprias autarquias, -legislando contra os interesses das populações e contra as aspirações dos seus representantes.
E o pior é que o Governo já nem usa o argumento técnico da matéria financeira, como evidenciou a segunda intervenção do Sr. Ministro das Finanças, na passada sexta-feira, em que, para justificar a não aplicação integral da Lei das Finanças Locais, recorreu a questões pragmáticas, como não poder tirar-se verbas donde não há dinheiro, ou impedir-se a criação de uns milhares de postos de trabalho por parte do Estado.
Verifica-se, assim, que o Governo não aplica integralmente a Lei das Finanças Locais porque tem uma concepção própria, paternalista, que o leva a sobrepor a sua vontade à própria Lei das Finanças Locais e ao Poder Local, que, em vez de descentralizado, passa a ser comandado do Terreiro do Paço, e, em vez de independente, passa a ser dependente do Governo.
Também aqui se evidenciam duas concepções opostas do Poder Local: a do Governo e a nossa.
Com efeito, para nós,, para o MDP/CDE, o Poder Local democrático é uma das grandes transformações que a Revolução de Abril produziu e que é necessário consolidar, como importante contributo para o progresso social e para eliminar distorções da estrutura da sociedade portuguesa.
Só colocando nas mãos das autarquias locais meios técnicos, económicos e financeiros será possível assegurar a descentralização administrativa e a autonomia financeira que garantam a melhoria das condições e da qualidade de vida das populações.
Não o entende assim o Governo, que também aqui ignora Abril, despreza a autonomia das autarquias e asfixia o Poder Local retirando-lhe os meios financeiros quê lhe permitam enfrentar as graves carências das populações.
Não será, contudo, com o nosso voto que a Lei das Finanças Locais deixará de ser integralmente aplicada pelo Governo.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.
O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Mostram-se as oposições muito preocupadas com as verbas atribuídas pelo Orçamento Geral do Estado às autarquias locais por imperativo da Lei n.º 1/79.
Já foi explicado pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano qual o critério interpretativo que presidiu à determinação das verbas atribuídas.
Não oferecerá dúvidas a quem quer que seja a vontade política do governo da Aliança Democrática em proceder a uma real descentralização e desconcentração no pleno respeito por uma das estruturas fundamentais do Estado Democrático, ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - ... o Poder Local, que simultaneamente é o reconhecimento do direito e da capacidade que as populações locais têm para resolver os seus problemas específicos & concretos.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Todavia, descentralizar implica também correcta definição de competências entre a Administração Central, Regional e Local, principalmente em termos de investimento. A par da definição de competências exigir-se-á também uma descentralização da capacidade técnica para a programação e execução dos investimentos programados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Implica ainda que os serviços centrais, cujas funções foram esvaziadas por força da transferência de competências, proporcionem as poupanças correspondentes.
Quer isto dizer que à vontade política de descentralizar deverá corresponder a vontade real de reestruturar e redimensionar com eficácia a Administração Central.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Tarefa árdua, cuja solução não se prevê fácil nem rápida no tempo e nos meios.
A vontade política deste Governo é patente no seu Programa. A implementação dos meios está em curso. De facto, as propostas de lei enviadas e a enviar à Assembleia da República são disso prova.
A Lei das Finanças Locais, Lei n.º 1/79, cuja interpretação tanta polémica tem gerado, necessita de reformulação de modo a que a sua aplicação seja respeitada com clareza e coerência. Os três anos da sua aplicação revelaram as suas deficiências e virtudes. A experiência alcançada possibilitará ensinamentos preciosos para que se acabe com as divergências interpretativas de que enferma e ao sabor das forças políticas no Poder. Mesmo assim, o governo da Aliança Democrática tem-se mostrado coerente na interpretação que vem fazendo da lei.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Na proposta de lei do Orçamento Geral do Estado para 1981 estão implícitas verbas que serviram de base aos cálculos das participações das receitas do OGE que serão arrecadadas pelos municípios.
Os impostos directamente arrecadados pelos municípios não sofrem qualquer contestação, somando
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6,8 milhões de contos de impostos directos e 2,2 milhões de contos de impostos indirectos.
A participação nas receitas fiscais consignadas na alínea b) do artigo 5.º também não oferece dúvidas, já que a percentagem atribuída às autarquias incide sobre a base orçamentada dos impostos directos mencionados naquela alínea, e que soma 15,2 milhões de contos.
Onde o Governo é acusado de não cumprir integralmente a lei na atribuição das verbas aos municípios é na rubrica «Fundo de equilíbrio financeiro». Não há dúvida que o artigo 8.º da Lei n.º 1/79 não define com clareza o conteúdo das diversas rubricas das «Despesas correntes e de capital» do Orçamento Geral do Estado sobre que incidirá a taxa mínima aplicável. Contudo, uma coisa é certa: quando a lei classifica as despesas orçamentais em correntes e de capital, implicitamente admite a sua classificação em termos económicos de acordo com a Lei n.º 64/77, conhecida por lei de enquadramento do Orçamento Geral do Estado, e segundo o código classificador em vigor.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Assim, as despesas com o pessoal não serão agregadas nas rubricas de Bens e Serviços,
Segundo esta interpretação poder-se-á afirmar que o Governo atribui às autarquias o mínimo estabelecido a título de fundo de equilíbrio financeiro, totalizando este 19,6 milhões de contos.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Poderia o Governo ser mais magnânimo e atribuir importância superior aos mínimos?
Evidentemente que em conjuntura mais favorável podê-lo-ia fazer e fá-lo-á, estamos certos.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Porém, quando o Orçamento Geral do Estado apresenta um défice de cerca de 144 milhões de contos, a austeridade terá de ser equitativamente repartida tanto pela Administração Central como pela Administração Local.
Mesmo assim, são atribuídas às câmaras, pelo OGE, cerca de 37,2 milhões de contos, sendo 34,8 milhões por imposição da Lei das Finanças Locais, 2 milhões para financiamento de investimentos intermunicipais e 400 mil para bonificação de juros no âmbito da linha de crédito criada a favor dos municípios.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Acrescerão ainda 200 000 contos para instalações das juntas de freguesia e 350000 contos para financiamento das actividades das assembleias distritais.
Receberão, pois, as autarquias locais um total de 37,7 milhões de contos transferidos do Orçamento Geral do Estado, o que equivale a um acréscimo, em valores nominais, relativamente a 1980, de cerca de 17 %. .
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É evidente que perante a menor clareza
objectiva da Lei n.º 1/79, o que permite interpretações que servem de pretexto à exploração demagógica das oposições e a frustrações de esperanças mais ou menos fundamentadas dos gestores autárquicos, torna-se imperativa a sua revisão. Neste sentido, além da correcta definição do conteúdo das rubricas, deve ser repensado no sentido de maior justiça o facto de as autarquias usufruírem de uma percentagem sobre os juros da dívida pública. Isto conduz, no dizer do Sr. Ministro das Finanças, a «aceitar que a falência do Estado seria a riqueza das autarquias, como se absurdas interpretações da lei pudessem desfazer a solvabilidade do País».
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Já afirmei que a aplicação da Lei n.º 1/79 proporcionou até agora valiosos ensinamentos e que a autonomia financeira por ela proporcionada às autarquias locais foi um contributo valiosíssimo no processo de descentralização em curso. Depois da mudança do regime, descentralização é uma das mudanças mais revolucionárias do pós-25 de Abril. Não depende de um acto voluntarista do Governo mas implica mudanças profundas na orgânica do Estado. Isto é um ponto essencial para compreender o sentido da expressão do Sr. Ministro das Finanças ao perguntar se «será legítimo dispensar as receitas sem que do Estado haja a mínima vontade de real descentralização de funções», e uma razão para que as oposições assumam posição positiva e colaborante face a este problema, ainda que crítica e sem prejuízo do seu posicionamento ideológico e de oposição, e não predominante demagógica, como tem sido o caso.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Isto significa que a descentralização terá lugar graças à vontade política do actual Governo e da maioria que o apoia, e não graças às oposições mas apesar da oposição.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador - Aliás, a demagogia da oposição comunista roça a má fé se nos lembrarmos que durante todo o período em que foi poder não deu um passo concreto no sentido de alterar a estrutura centralizadora existente, acentuando mesmo os seus vícios com vista a, por essa via, tentar controlar a sociedade portuguesa e as autarquias locais na proporção inversa da aceitação e implantação reais nas populações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - As comparticipações e os subsídios do Estado, administrados e manipulados pelo Governo de então, foram a regra utilizada como nunca visto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Oportuno será acentuar que não obstante os erros, as vacilações e mesmo alguns recuos das administrações socialistas, foram estas que
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deram os primeiros passos no sentido de iniciar o processo de alteração da estrutura estatal do antigo regime no sentido da real autonomia autárquica. Mas necessário se torna afirmar que os governos da Aliança Democrática, apoiados pelo Partido Social-Democrata, tomaram nas suas mãos essa tarefa histórica e fá-la-ão dar novos passos em frente, se esta Assembleia da República votar favoravelmente as leis que a permitam.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Sr. Presidente, peço a palavra para formular O Sr. Presidente: - Faça favor. O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Sr. Deputado Portugal da Fonseca, sem o saber, acabou de dizer uma série de inverdades e mesmo de mentiras. O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Oh! O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado, e faça favor de não me fazer perder tempo. Depois o Sr. Deputado responde se quiser. Risos dó PSD. A primeira questão que devo contestar é que o Partido Comunista alguma vez tenha sido poder sozinho. O Partido Comunista participou, de facto, em governos provisórios. Vozes do PSD: - Ainda bem! O Orador: - A segunda coisa que tenho de contestar é que a nossa participação tenha sido no sentido centralizador e mormente em relação às autarquias. Gostaria, pois, de lembrar ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca que a primeira vez que neste país as comparticipações foram discutidas pelos próprios municípios, em reuniões intermunicipais em que o representante do governo se limitava a ouvir, foi justamente quando o Ministro das Obras Públicas foi um Ministro comunista que está aqui na sua frente. O Sr. Silva Graça (PCP): - Muito bem! O Orador: - Foi a primeira vez que isso se fez e foi esse mesmo Ministro que se bateu para que o sistema das comparticipações acabasse. O Sr. Silva Graça {PCP): - Muito bem! O Orador: - Mas também foi ele mesmo que depois, como deputado, teve uma participação muito importante na definição da Lei das Finanças Locais. Aplausos do PCP. do PS e do MDP/CDE. O Sr. Silva Graça (PCP): - Escusava de ouvir estas coisas, Sr. Ministro. O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca, se assim o desejar. O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira que, efectivamente, o Partido Comunista Português foi poder na época gonçalvista. Embora o Ministério das Obras Públicas discutisse nessa altura as comparticipações, discuti-las é uma coisa e atribui-las é outra, os critérios de atribuição é uma outra coisa muito diferente, e os autarcas sabem como recebiam as participações e em que -percentagem as recebiam em determinadas autarquias locais. Vozes do PSD: - Muito bem! O Orador: - Quanto aos 18%, não discuto se é muito ou pouco. Eu sei que as necessidades dos autarcas são grandes, que as nossas regiões são altamente carenciadas, que os nossos concelhos têm muitas necessidades e que as verbas são insuficientes. Contudo, quando o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, aquando da leitura da Lei n.º 1/79, diz que se deveriam incluir as despesas com o pessoal, na interpretação que se dá correctamente e em articulação com a lei de enquadramento do Orçamento Geral do Estado, isso não pode ser compreendido. E digo isto porque a Lei n.º 1/79 define, no seu artigo 8.º as despesas em correntes e de capital e no código classificador isso não está lá definido e o código classificador em vigor separa abertamente as despesas com pessoal das despesas com aquisição de bens duradouros, bens não duradouros e aquisição de serviços. Isto é tecnicamente e é à interpretação correcta, Sr. Deputado.
Talvez o Sr. Deputado nunca tenha pensado porque é que estão lá 18% e não 5% ou 12% ou 25%, ou 32%. Porquê 18%? Eu vou explicar, Sr. Deputado, porque é que a vossa interpretação é falsa e, muitas vezes, mais do que falsa, é mentirosa. Estão lá 18% justamente por se terem feito as contas assim como nós dizemos: incluindo as despesas com o pessoal. Discutiu-se muito longamente se se devia ou não incluir essas despesas, o que acabou por se fazer, e a partir das contas feitas é que se marcaram os 18%.
Isto é, foi-se ver o que, nesta altura e na situação económica em que nós vivemos, seria razoável desde já transferir para os municípios. Assim, a partir desse valor, que seria razoável em face do rendimento nacional, é que se fixaram os 18%, naturalmente fazendo as contas também com as despesas com pessoal para evitar que governos menos sérios pudessem, por vias enviesadas, sonegar transferências para os municípios, sonegar autonomia municipal.
Portanto, tudo o resto é uma conversa falaciosa para inglês ouvir, mas não para aqueles que aqui estão na Assembleia, que aprovaram a Lei das Finanças Locais, que sabem porque é que aprovaram, como a aprovaram, porque é que a percentagem é de 18 % e hão outra qualquer, e portanto não vão em loas nem do Sr. Ministro nem do Sr. Deputado.
Queria protestar abertamente porque eu não discuti a Lei das Finanças Locais e até propus a sua revisão. Nesse sentido, não aceito lições de autonomia e de descentralização administrativa do par-
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tido do Sr. Deputado. O centralismo democrático é a .vossa característica, enquanto para nós é a descentralização.
Aplausos do PSD,, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Portugal da Fonseca: O vosso sistema nomialista de confundir substantivos concretos som substantivos seguidos de adjectivo já chega. Vocês «falam da libertação da sociedade civil e há quem entenda sociedade civil por oposição a sociedade militar; vocês falam agora no centralismo democrático e há quem entenda centralismo democrático por oposição a descentralização, mas isso é, pura e simplesmente, um abuso do nominalismo, é um abuso da palavra,
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - É!?
O Orador: - Sr. Deputado, não faça demagogia e não induza em erro as pessoas que possam estar mais desprevenidas. Naturalmente que espero que nesta Assembleia ninguém se engane; mas lá fora podem enganar-se.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Nem aqui nem lá fora.
O Sr. Presidente:-Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs; Deputados, Srs. Membros do Governo: Um ano depois, ele aqui está. O verdadeiro orçamento da «AD». Passadas as eleições, eis o seu orçamento real, mostrando com inusitada clareza os objectivos da «AD», a verdadeira política dos seus governos: a reconstituição acelerada dos velhos e novos grupos económicos, a condenação do «25 de Abril», o agravamento da exploração dos trabalhadores e de todas as camadas não monopolistas.
Os laivos de social-democracia que, por força de meros interesses eleitoralistas, pintalgavam o orçamento anterior, desapareceram totalmente. Acabaram-se as actualizações dos escalões dos impostos profissional e complementar, reduziram-se em termos reais os subsídios ao «cabaz de compras», não se financiam as habitações sociais eleiçoeiramente adjudicadas, os aumentos das pensões sociais aguardam, por novo ano de eleições. São estas algumas das «pequenas diferenças entre a política actual e a do ano passado» a que se referia o Sr. Ministro das Finanças em entrevista a um semanário. Para a «AD», o «objectivo fundamental, prioritário», em 1980, eram as eleições.
No Ministério das Finanças já não se fazem sentir os grupos de pressão de que se queixava o anterior Ministro. São eles próprios que já lá estão plenamente instalados, que já se encontram confortavelmente sentados à mesa do Orçamento.
Enfim, o despudorado ataque à Revolução de Abril atinge as raias do inconcebível. A proposta de lei do Orçamento do Ministro CDS das Finanças tem a desfaçatez, como alguém já o terá afirmado, de pretender tributar o «25 de Abril».
É exactamente isso que resulta, nomeadamente, do artigo 41.º, que se propõe permitir ao Governo não só o perdão dos juros de mora como o próprio perdão das dívidas fiscais dos ex-monopolistas e latifundiários, bem como do n.º 2 do artigo 13.º, que pretende revogar, com efeitos retroactivos à data da sua entrada em vigor, o Decreto-Lei n.º 375/74, que tributa os terrenos para construção, até ao início desta, bem como os prédios inabitáveis ou destinados a demolição que estejam nessa situação há mais de um ano. Isto é: o Governo pretende conceder incentivos fiscais, e quiçá financeiros, à especulação imobiliária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta de lei do OGE e os mapas que a acompanham nada tem a ver com os objectivos e prioridades da política orçamental constantes do relatório e reafirmados pelo Ministro das Finanças no seu discurso de apresentação.
A promoção de uma distribuição mais equitativa da carga fiscal não existe. Desde logo porque, em termos de valores orçamentados, os únicos comparáveis, os impostos indirectos passam de 62% para 64% das receitas fiscais. Depois, porque o imposto profissional aumenta o seu peso relativo no total dos impostos directos, passando de 28,3 % para 30,7 %. Enfim, e mais globalmente, porque a enorme maioria do articulado da proposta de lei, e como demonstraremos na discussão na especialidade, consubstanciando não já um cheque em branco mas um autêntico saque a descoberto sem qualquer limite, apenas visa aumentar as isenções e outros benefícios fiscais ao grande capital, e de que destacamos desde já a quase que total isenção fiscal pretendida para as denominadas sociedades de investimento e os «incentivos fiscais» à dinamização da especulação bolsista.
Aliás, o pacotão de benefícios fiscais com que o Governo pretende brindar os tão já presenteados senhores do grande capital faz lembrar os favores dos poderes políticos corporativos ao grande capital durante o regime fascista, e mostra, afinal, que o Governo duvida que a por si tão apregoada capacidade, eficácia e eficiência da «iniciativa privada» possa existir sem uma bem recheada bolsa de dinheiros públicos.
O pretenso desagravamento fiscal global é mais uma declaração governamental desmentida pela realidade. Os números aí estão para o demonstrar.
As receitas fiscais orçamentadas no OGE aumentam 30 % e 23,5 % em relação às orçamentadas e executadas em 1980. E, entretanto, a evolução nominal prevista para o produto em 1981 é de apenas 21,5 % ou 20 %, nas hipóteses apresentadas pelo Governo.
A que se refere, pois, o Sr. Ministro das Finanças quando fala em agravamentos fiscais? A todo o enorme estendal de isenções e reduções fiscais ao capital; (só em sede de contabilidade industrial, que incide sobre os lucros, a redução real da carga fiscal pode ser computada em mais de 500 000 contos); ao desagravamento efectivo no imposto complementar de todos os rendimentos superiores a 600 contos anuais, isto é 40 contos mensais que não são
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auferidos pela grande maioria dos trabalhadores (esta redução de laxas para os rendimentos mais elevados significará um benefício real da ordem dos 800000 contos); a redução do imposto de transacções para os produtos mais fortemente tributados, isto é, na sua generalidade artigos de luxos e supérfluos, que só são consumidos pelas famílias de elevados rendimentos (e tem o Ministro das Finanças o descaramento de afirmar publicamente que se trata de uma medida socialmente justa! Haja pudor, Sr. Ministro!).
E em relação aos trabalhadores, à grande maioria do povo português, que propõe o governo «AD»? Um agravamento real da carga fiscal no imposto profissional contabilizado em mais de 2,5 milhões de contos, e que ainda seria maior se o Governo conseguisse impor o tecto salarial de 16%; o aumento do imposto complementar por simples efeito da mudança de escalões de rendimento; a tributação dos trabalhadores da função pública em imposto complementar, sem que antes lhes garanta um nível de remuneração idêntico ao dos restantes trabalhadores, e sem que previamente com eles acorde as formas e condições de compensação; a duplicação dos descontos dos trabalhadores da função pública para a ADSE; a recusa das justas reivindicações salariais desses trabalhadores que cabem, aliás, nas verbas orçamentadas, propondo-lhes aumentos salariais muito abaixo do aumento do índice de preços. Enfim, tal como em 1980, o Governo propõe que o salário mínimo nacional seja tributado em Imposto Profissional.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Se o Orçamento é objecto na óptica das receitas, não o é menos no campo das despesas.
Mais uma vez desmentindo as declarações ministeriais de uma pertença política desenvolvimentista implícita, o Orçamento mostra que o peso das despesas correntes do Estado aumenta e que as despesas de capital, passivos financeiros excluídos, sofrem uma redução real da ordem dos 5 %. A pseudo-austeridade do Governo faz-se sentir afinal nas despesas reprodutivas e nos sectores que maiores benefícios podem trazer à população. O Orçamento é, na verdade, o espelho da «AD», do seu governo e da sua política. Como meros exemplos elucidativos dessa política, registem-se as reduções reais das transferências correntes para o Fundo de Abastecimento (menos 16 %) e para o Instituto de Acção Social Escolar (menos 30 %), ou as dotações globais para a segurança e assistência sociais (menos 6 %) e para os serviços económicos (menos 7 %), com destaque para as comunicações e transportes com menos 19 %. O Fundo de Fomento da Habitação vê as transferências correntes reduzidas em 18 %, e as de capital passarem de 5 milhões de contos para zero.
Terminadas as eleições o povo português já não necessita de habitações acessíveis à sua bolsa. Nem precisa de estradas melhoradas, pois que as transferências de capital para a Junta Autónoma de Estradas diminuíram 55 % em termos reais.
Mais uma vez o governo «AD» se coloca à margem da lei não dando cumprimento integral à Lei das Finanças Locais. E, como um camarada de bancada detalhadamente o mostrará, não é uma questão de interpretação da lei que está em causa, mas um a vontade política de a não cumprir. Na sua atrapalhação para encontrar argumentos, o Ministro das Finanças afirmou aqui que a atribuição de mais 35 milhões de contos às autarquias «significaria impedir a criação de 35 000 novos empregos produtivos». É um despautério. O Sr. Ministro não sabe que as despesas das autarquias induzem mais empregos que as da Administração Central, com a vantagem de contribuírem positivamente para o desenvolvimento regional e para estancarem o êxodo das populações rurais.
O sector empresarial do Estado é igual e fortemente afectado pelo orçamento Morais Leitão. As indemnizações compensatórias por prestação de serviços sociais têm uma redução real de 17 %, o que significa, nomeadamente, um forte aumento do preço dos transportes a curto prazo, mesmo a sua eliminação nas zonas rurais mais carenciadas, ou uma ainda maior degradação financeira das empresas. As dotações de capital, para o financiarem novos investimentos, têm um corte superior em 21 % em termos reais.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): -Muito bem!
O Orador: - É falso, Sr. Ministro, que as empresas públicas estejam a viver à custa do Orçamento. As indemnizações compensatórias são encargos do Estado e não das empresas, mesmo em países, cujo sistema político-económico o Sr. Ministro diz defender. As empresas públicas, para além dos muitos milhões de contos que pagam de impostos, ainda transferem para o OGE 11,5 milhões de contos de lucros, apesar da discriminatória política de preços e de crédito a que tem estado sujeitas. As dotações de capital estatutário não são um encargo para o Estado, más um investimento rentável. Apesar destas evidências, desafio o Sr. Ministro das Finanças a informar esta Câmara do valor global dos benefícios financeiros e fiscais atribuídos ao sector privado, para que, com as cartas na mesa, o ipovo português possa então ajuizar de quem se banqueteia à mesa do Orçamento,
Aplausos do PCP e do Sr. Deputado do MDP/CDE Raúl de Castro.
Finalmente, uma clarificação se impõe, ao § 3.º da página 3 da «exposição de motivos» que acompanhou a proposta de lei do Orçamento. O agravamento dos encargos com juros da dívida pública não é «consequência directa da acumulação dos deficits orçamentais dos anos passados», é sim, consequência directa e imediata do agravamento da dívida pública em 200 milhões de contos verificado no ano de 1980, com o governo «AD».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este orçamento é bem um instrumento das forças mais retrógradas da «AD» contra os trabalhadores e o País, e em benefício do grande capital. Sobre muitos dos aspectos a que me referi, e outros que camaradas meus já focaram ou focarão, pesa embora a exiguidade de tempo que despoticamente a maioria parlamentar atribui à minha bancada, o meu grupo parlamentar apresentará propostas de alteração que defendem o nível de vida dos trabalhadores e a justiça social, que minoram os efeitos gravosos do Orçamento de miséria que nos foi apresentado, sem que tal implique o aumento do deficit orçamental.
Mas temos consciência clara de que não há proposta de substituição que valha a este orçamento.
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O orçamento que os trabalhadores e o País desejam e que Abril prometeu só será possível com uma proposta de substituição, sim, mas deste governo e desta maioria parlamentar.
Aplausos do PCP e do Sr. Deputado do MDP/CDE Raúl de Castro.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto Xerez.
O Sr. José Alberto Xerez (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria fazer uma intervenção muito simples em relação a algumas referências feitas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, sobretudo a propósito do problema dos défices, e não deficits, e a quem deve ser imputada à responsabilidade.
Não queria cansar muito a Câmara com números, mas tenho aqui o orçamento consolidado do sector público e administrativo, e em 1973 as despesas correntes eram 19,5% do produto interno bruto; em 1974, eram 19,7%; em 1975 eram 26,9%. A poupança corrente em 1973 era positiva, era de 3,2% do PIB; em 1974, ainda era positiva, era de 0,3%; em 1975, começa a ser negativa e, é de 2,4%. E, como o Sr. Deputado sabe, aqui sé inicia o processo dos défices do Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Silva Graça (PCP): -Em 1973 é que era bom!
O Orador: - Portanto, é esta a consciência que quero transmitir às pessoas: é que quem inicia o processo imparável da acumulação dos défices do Orçamento Geral do Estado é o Partido Comunista Português.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM e protestos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já não é a primeira vez que deputados da oposição fazem afirmações que são absolutamente contrárias à verdade e que não podem eternamente deixar de ser desmentidas.
O Sr Deputado Octávio Teixeira disse que dispunha de um tempo despoticamente atribuído pela maioria. Isto é falso, redondamente falso. O Regimento não estabelece tempos para este debate e remate para um regimento especial. Discutimos a organização deste debate durante longas horas de conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, e dada força política tem, naturalmente, as suas ideias acerca da forma como o debate deve ser organizado. No parte final, quando chegámos a uma deliberação, e como sempre acontece, evidentemente, ela não agrada da mesma forma a todos os grupos parlamentares, mas não se recorreu ainda desta vez, como não se recorre (normalmente, a uma votação em que a maioria imponha a sua vontade à oposição.
Nós confrontamo-nos com a necessidade de os trabalhos da Assembleia decorrerem por forma que dignifique este orgão de soberania e nunca foi nossa intenção retirar aos deputados, nomeadamente aos da oposição, a possibilidade de exporem livre e longamente as suas posições.
Para finalizar estas considerações, queria apenas dizer que seria óptimo que o tempo de que a oposição dispõe fosse aproveitado a 10% para versar realmente as questões que aqui estão em causa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Amândio de Azevedo :e uma vez introduz na Assembleia a sua forma própria de ver estas questões de regimento, de tempo e de imposições ou não imposições da maioria.
Contudo, só quero registar que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo entende que quando chegar o dia em que a maioria imponha os tempos pelo voto, então sim, a imposição é despótica.
Risos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não me admiro que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira não tenha a mínima concepção da forma como os órgãos funcionam. Quando a maioria chegar à posição de deliberar por maioria, essa imposição é democrática e não despótica! Imposições despóticas são as do Partido Comunista.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O senhor é que o disse!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, se assim o desejar.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já não me referirei à questão levantada pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo, pois está respondida. Aliás, pela parte que nos toca, aproveitámos o máximo do tempo disponível para discutir as questões que aqui nos trazem, o que não sucede com as bancadas dos Srs. Deputados.
Em relação ao Sr. Deputado José Alberto Xerez, gostaria de dizer que estranho - ou talvez não - que durante este debate tantas vezes a bancada do Sr. Deputado e o próprio Governo tenham trazido à baila as comparações entre o peso das despesas orçamentais em relação ao PIB antes de 25 de Abril de 1974.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador - Só ainda não entendi por que é que o Sr. Deputado apenas se refere a 1973 e ainda não chegaram a 1967... Mas com certeza que lá chegarão...
Sobre o protesto que me pareceu que o Sr. Deputado José Alberto Xerez queria fazer em relação à minha intervenção, em termos de saber a quem ca-
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bem as culpas do agravamento dos encargos com juros ida vida pública em 1980, aí o Sr. Deputado não desmentiu. De facto, o aumento dos encargos com juros deve-se pura e simplesmente ao aumento da dívida verificada no ano passado de 200 milhões de contos.
O Sr. José Alberto Xerez (CDS): -Sr. Presidente, peço a palavra, pois gostaria de fazer um ligeiro parênteses àquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Alberto Xerez {CDS): - Sr. Presidente, Srs. Disputados, Sr. Deputado Octávio Teixeira: O que eu disse concretamente é que os juros que se repercutem no Orçamento deste ano são consequência directa - e se quiser posso fornecer-lhe o mapa - da acumulação dos défices registados com os sucessivos governos de esquerda.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -O aumento de juros é que é o assunto que está em discussão.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra. Sr. Deputado Fernando Vieira.
O Sr. Fernando Vieira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: À minha intervenção versará apenas sobre o sector da saúde e destina-se fundamentalmente a formular algumas perguntas ao Governo, que espero sejam respondidas no. decurso deste debate.
Acabado de ler o Orçamento Geral do Estado e depois de ouvir o discurso do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, que nem uma palavra disse sobre o capítulo da saúde, fica-nos a sensação nítida de um vazio. Senão, vejamos: o Orçamento Geral do Estado contempla o sector da saúde com a verba de 46 500 000 000$ e ainda 6 600 000 000$ para investimentos.
Dado o estado de deficiência em que se encontra o sector, a verba é mais que reduzida. Apenas mais cerca de 20 % que o Orçamento do ano passado, mas, dada a inflação, parece-nos que, se nada se fez neste ano, nada se fará no ano de 1981.
A saúde é, como todos sabemos, um sector prioritário. Sem saúde não há riqueza e não poderá haver bem-estar.
O Sr. António Arnaut (PS): -Muito bem!
O Orador: - Quanto ao Plano, mencionaram-se as dificuldades, reconheceu-se que os índices sanitários são inferiores aos padrões europeus, que a taxa de mortalidade infantil é a mais alta da Europa, que é insatisfatória a qualidade de serviços oferecidos à população, que há assimetria na distribuição dos profissionais de saúde e que os hospitais são insuficientes e incapazes.
Os objectivos nada nos dizem de positivo, pois com a verba proposta apenas se quer continuar a fazer o mesmo tipo de saúde, aquele que não serve as populações, tal como reconhece o próprio Governo.
Aparece apenas uma inovação. Vão acabar os Serviços Médico-Sociais.
Todos sabemos que eles funcionam mal, mas não me parece que só a mudança de nome para Centros de Saúde resolva o problema.
É necessário reestruturar profundamente os Serviços Médico-Sociais e a própria Direcção-Geral de Saúde. É necessário remodelar as administrações distritais de Saúde em ordem à regionalização e consequente descentralização de gestão dos cuidados de saúde.
Desejava perguntar se os Serviços Médico-Sociais mudando o nome para Centros de Saúde, passarão a fazer as consultas gratuitas, tal como agora estes fazem.
Se assim for, o povo português melhorará algo com a mudança, pois, como sabemos, pelos Despachos n.º 57/80 e 58/80 a consulta nos Serviços Médicos-Sociais passou de 2$50 para 25$, as visitas domiciliárias de 27$50 para 100$ e os exames complementares de diagnóstico, que eram gratuitos, passaram para 20$, 50$ e 100$.
Podemos aceitar certas taxas moderadoras, mas não taxas limitativas, aos necessários cuidados de saúde, pois não compreendemos que se «penalizem» os doentes por exames e análises prescritas pelo próprio médico.
O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!
O Orador: - Fala-se. na protecção materno-infantil. Mas como será possível,, se há distritos, nomeadamente o de Bragança onde fui médico cerca de doze anos, que não têm sequer um médico pediatra?
Diz-se que os hospitais são insuficientes e incapazes. Que se faz para os melhorar? Todos conhecemos o Hospital de S. José, e, como médico do Hospital Distrital de Leiria, quero dizer que esse Hospital é mais que incapaz e insuficiente.
Por que se espera para construir um hospital novo, por forma a não sobrecarregar o Hospital Central de Coimbra, que, por sua vez, também já é mais que insuficiente?
Porque não se abrem os Hospitais de Viana do Castelo e Chaves?
Por que se não completam os quadros dos Hospitais de Castelo Branco e Portalegre?
O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!
O Orador: - Como é possível fechar um hospital concelhio à sexta-feira e dar alta a um doente, que morre no dia imediato, por falta de oxigénio? Isto passou-se no ano passado em Carrazeda de Ansiães, e há cerca de um mês, em Pinhel, morreu uma criança sem que houvesse um médico para lhe prestar assistência.
Não, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados! O povo português acreditou no 25 de Abril, na Constituição de 1976 e nos deputados que elegeu para esta Câmara.
Não lhe podemos retirar o que a Constituição lhe consagra no seu artigo 64,º, nem podemos admitir que não seja executada a lei aprovada por esta Câmara, a Lei do Serviço Nacional de Saúde.
O povo português já deu provas de maturidade política, de honestidade, de trabalho e de muita paciência.
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a política do actual Governo é uma tentativa de regresso nítido à situação do antes de 25 de Abril.
Como pensa o Governo colocar médicos no interior do País? Por certo que não é com a medicina convencionada.
Que pensa o Governo fazer com os policlínicos? Que carreira lhes promete?
Por que não são gratuitos os medicamentos para os inválidos e reformados?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É necessário elaborar, por forma articulada com as unidades centrais, regionais e locais competentes, um plano nacional de equipamento de saúde.
É necessário aperfeiçoar o estatuto de todas as carreiras médicas, paramédicas, de enfermagem, reestruturar as carreiras em ordem a assegurar melhores -condições de trabalho e de segurança social e humanizar a relação médico-utente.
É preciso criar condições para a colocação imediata dos jovens médicos policlínicos em lugares estáveis e de carreira.
Em suma, é necessário cumprir o preceituado no artigo 64.º da Constituição, que diz:
Todos tem o direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.
O direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito.
Esta Assembleia já discutiu e aprovou essa mesma lei. ......
Pergunto: por que nunca foi cumprida? Se o actual Governo não quer cumprir o artigo 64.º dá Constituição, proponho que na próxima revisão constitucional o artigo 64.º seja substituído por outro com a seguinte redacção:
Todos tem o direito à protecção da saúde, desde que tenham condições económicas para a pagar.
Aplausos do PS, da ASDI, da UEDS do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Rosa.
O Sr. Carlos Rosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Apresentou-se o VII Governo Constitucional a esta Assembleia, há cerca de dois meses, a defender o seu Programa de Governo, subordinado às ideias básicas da estabilidade democrática e da modernização da sociedade.
Acreditando firmemente naquela estabilidade e naquela modernização, esta Assembleia aprovou, não só formalmente por mera solidariedade partidária, mas com toda a convicção, o Programa que lhe havia sido proposto.
Voltara-se, assim, mais uma página da nossa história actual. Encerrara-se um ciclo de governos instáveis ou constituídos com um limite temporal a curto prazo, um ciclo de programas forçosamente limitados, para se abrir um novo período, agora com a estabilidade de uma meta a quatro anos, permitindo organizar um futuro imediato e outro próximo, em termos minimamente possíveis de execução.
Logo então foi prometido que até 15 de Março seriam apresentadas as propostas de lei respeitantes às grandes opções do plano a médio prazo, conjuntamente com as grandes opções e a Lei do Orçamento para 1981.
E essa promessa foi integralmente cumprida.
Nem outra coisa seria, na verdade, de esperar. O VII Governo Constitucional é uma emanação da grande realidade política que ao País se apresentou com a Aliança Democrática.
E a AD cumpre e sabe cumprir efectivamente as suas promessas. Fá-lo sem esforço, sem demagogia, sem alardes, apenas e simplesmente pelo dever de cumprir.
Os documentos que agora são objectivo da nossa apreciação representam a sequência e a execução do Programa do Governo que esta Assembleia aprovou oportunamente.
Diferentemente não podia ser.
Os planos de actividade, a largo, médio ou curto prazo, e os orçamentos que lhes dão a necessária cobertura financeira são, no fundo, eles mesmos, também programas de actuação, que têm, ou pelo menos devem ter, as suas raízes bem firmadas no plano de estratégia global de um governo, resultante do seu programa.
Não é, pois, de estranhar que, dentro do espírito de coerência que enforma as forças políticas que aqui representamos, sejam o Plano a o Orçamento instrumentos de execução do Programa que esta Assembleia aprovou. E porque não há contradição entre este e aqueles, e porque os princípios que lhes estão ínsitos merecem a nossa plena concordância, e porque nos parece que se -trata de documentos elaborados com correcção técnica e com honestidade política, eles merecem a nossa aceitação.
Não se coadunam muito com a normal forma de ser dos Portugueses as técnicas de planeamento. Sabemos todos que somos extraordinariamente capazes quando se trata de improvisar, dando tudo por tudo, até ao sacrifício, por uma realização imediata.
Mas, quando chega o momento de prever, somos imprevidentes, quando é altura de programar, somos indecisos, quando se nos pede que executemos, já estamos dispersos.
Um plano não se confina à elaboração de relatórios e quadros mais ou menos complexos e sofisticados, à invocação de quantias e de números mais ou menos discutíveis, à exposição de razões técnicas ou ideológicas mais ou menos compreensíveis.
Um plano tem de ter em si características de exequibilidade e aceitabilidade que lhe permitam ser devidamente compreendido e ter uma adesão dos seus destinatários: os que o executam e aqueles à satisfação de cujos interesses se dirigem.
É o que nos parece verificar-se com os planos em análise, nomeadamente o Plano para 1981, que vem apresentado de maneira realista e cumprindo exactamente os objectivos para que elaborado.
É o plano anual um corolário resultante do plano a médio prazo, de que nasceu e em que se baseia. As grandes opções de um e de outros são necessariamente as mesmas, como de resto se salienta no respectivo relatório de apresentação.
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Compete apenas à Assembleia da República, nesta fase, aprovar as grandes opções correspondentes a cada plano, como resulta claramente do n.º 1 do artigo 94.º da Constituição da República Portuguesa.
É depois ao Governa que compete elaborar os planos, em obediência às grandes opções aprovadas e com vista a dar-se-lhes cumprimento e aos objectivos que com elas se pretende alcançar.
Vejamos então quais as grandes opções que neste momento importa definir, partindo-se do princípio de que nos parece indiscutível que essas grandes opções são fundamentalmente de natureza política, embora, em certa medida, condicionadas por factores de natureza técnica.
Cremos que, sob um ponto de vista político, como sob um ponto de vista jurídico, não poderemos deixar de ter em atenção o que dispõe o n.º 2 do artigo 91.º da Constituição. Ali se estatui que o Plano deve garantir o desenvolvimento harmonioso dos sectores e regiões, a eficiente utilização das forças produtivas, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com a política social, educacional e cultural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português.
A realização desses objectivos, que pensamos evidentemente prioritários, parece que poderá considerar-se indiscutível, qualquer que seja a óptica política em que nos situamos.
Onde vamos encontrar profundas divergências é rios meios e nas formas de conseguir essa realização, é na definição dos programas de acção globais, sectoriais e regionais, que devem ser contidos no plano a médio prazo, é nó desdobramento deste, que constitui o plano anual, integrado como Orçamento do Estado.
Estaremos perante um processo de execução que nos deverá levar a atingir as. metas constitucionais, e é em relação a esse processo que se torna essencial definir as grandes opções a aprovar.
A Aliança Democrática tem de há muito as suas grandes opções. Foi com elas que se apresentou ao eleitorado, delas fazendo um projecto coerente e aberto, ao qual não foi apresentada qualquer alternativa válida, projecto esse que submeteu ao sufrágio do povo e que lhe deu a vitória em Outubro passado.
Foi a adesão consciente a esse projecto que nos confirmou a razão que já pensávamos ter quanto aos caminhos que julgamos deverem ser trilhados para bem do nosso país.
São essas grandes opções, por que optou a seu tempo a maioria do povo português, que se traduzem nas grandes opções dos planos a médio prazo e anual.
Não é agora o momento para analisar exaustivamente de per si cada uma dessas grandes opções, nem o tempo que nos é atribuído tal permitiria. A simples leitura dos documentos apresentados com objectividade e imparcialidade permitirá verificar o que constituem para nós as grandes opções.
Alguns aspectos apenas, por mais salientes ou mais discutidos, importa referenciar.
Pretende-se que Portugal encontre um caminho para a integração plena, a que tem direito, na comunidade dos países da Europa Ocidental
Porque o nosso modelo de sociedade tende para o desses países, a quem está ligado por laços históricos, culturais e económicos, em muitos casos antigos de
séculos, porque o nosso respeito pela liberdade e dignidade da pessoa humana é valor comum à nossa actual conjuntura política, porque vivemos num mundo cada vez mais necessitado de laços íntimos entre povos afins, a nossa grande opção europeia é uma das mais importantes na assunção de qualquer via para o futuro.
Mas essa opção não pode ser feita sem que sejam tomadas as devidas providências para que a integração se processe por forma saudável para o nosso país.
Defendendo intransigentemente uma economia social de mercado - outra grande opção conscientemente asumida -, forçoso se torna criar as condições necessárias para o correcto funcionamento de um sistema económico desse tipo.
Assim, deverão ser dados à iniciativa privada, motor fundamental daquele tipo de economia, os necessários meios e garantias para que se exerça convenientemente.
É nesse sentido que o Governo se propõe tomar algumas medidas de especial relevo, que nos parece merecerem franco aplauso.
Está prevista uma remodelação profunda do sistema fiscal, encontrando-se já na proposta de lei referente ao Orçamento para 1981 algumas medidas que permitirão ir melhorando a legislação actualmente vigente, em muitos aspectos arcaica e desactualizada, no sentido de se obter uma melhor justiça fiscal.
É evidente que, neste como noutros campos, o trabalho a realizar tem de. ser feito gradualmente, pois a tarefa é muito árdua e, apesar de boas intenções manifestadas de há muito por outros governos, os trabalhos levados à cabo, nomeadamente quanto ao imposto sobre o valor acrescentado e ao imposto único sobre as pessoas singulares e colectivas, pouco foram além das boas intenções.
Pretende-se agora, quanto ao primeiro, a realização de uma discussão pública prévia,.
Outras medidas previstas na proposta de lei orçamental têm por objectivo criar melhores condições de intervenção de instituições financeiras, dentro dos quadros legais ora existentes e, enquanto não for possível, com a revisão da lei de delimitação dos sectores público e privado, a constituição de bancos privados.
É o que diz respeito especialmente à revisão dos regimes fiscais das sociedades de locação financeira e das sociedades de investimento, instrumentos fundamentais para uma correcta actuação do sistema de crédito e dos mercados financeiros. E, no que se refere ainda aos mercados financeiros, saliente-se a inclusão na mesma proposta de lei orçamental de referência a um sistema a criar de incentivos fiscais visando a dinamização do mercado de valores, tão importante para o relançamento da economia nacional.
E não se diga, como já estou a ouvir dizer a alguns membros da oposição, que aqui está aberta a porta à recuperação capitalista e ao regresso dos monopolistas.
Um mercado de valores transparente, contínuo e honesto é condição essencial da nossa adesão à CEE e, existindo na generalidade dos países de economia de mercado, a ele acorrem não só os chamados capitalistas, mas largas camadas da população, que, por essa via, encontram uma forma de investimento útil
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das suas poupanças, que urge promover, até como defesa contra .ª inflação.
Ainda dentro deste domínio ocorrerá referir que, finalmente, se encontram criadas as condições efectivas para se começarem a pagar as indemnizações devidas palas expropriações e nacionalizações, atribuídas pela Lei n.º 80/77,, cuja execução tinha vindo a ser incompreensivelmente retardada.
Não é também aqui a recuperação capitalista que está em causa. Quantos pequenos investimentos, dos milhares que existem neste país, vêem chegada finalmente a hora de se lhes começar a fazer justiça prática. Só quem conhece os dramas individuais de tantos desses pequenos investidores saberá compreender o efeito psicológico de confiança no futuro que esta medida irá fazer.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Isso vai ser muito bom!
O Orador: - Isto ainda relacionado com a possibilidade de mobilização dos títulos correspondentes às indemnizações, que irão trazer novas oportunidades para a criação de empresas, com estas a criação de postos de trabalho, com umas e outros o aumento da riqueza nacional e do rendimento a distribuir por todas as classes, incluindo as mais desfavorecidas.
Como tenho estado a falar de economia nacional, e por razões de economia, vou terminar estas breves considerações sobre alguns aspectos do Plano e do Orçamento para 1981 que me pareceram de especial relevo.
E porque de economia nacional se trata, terminarei por afirmar que são na realidade os valores de um projecto nacional que estão em causa.
Nacional sem exacerbado nacionalismo, feito à medida das nossas necessidades e possibilidades e de harmonia com os anseios da maioria do povo português.
Para que este projecto nacional seja levado a cabo faltar-lhe-á ainda uma condição fundamental, para além da capacidade do Governo, da justeza das soluções técnicas, da cobertura orçamental ou da competência dos serviços.
Mas essa condição não tem lugar nos documentos que apreciamos, a eles é extrínseca embora na realidade penso que exista. É a vontade dos Portugueses para realizarem em conjunto o grande projecto que se lhes oferece, esperando a sua participação consciente.
Tal vontade é real e efectiva. Apesar de alguns velhos do Restelo nela não crerem e até a não desejarem, irá levar a bom termo esta nova nau dos descobrimentos na época histórica que atravessamos: o descobrimento da capacidade do povo português em encontrar finalmente o seu caminho exacto, o descobrimento de que é chegada a hora de trocar a demagogia & a insensatez pelo trabalho e pela coerência, o descobrimento da nossa verdadeira identidade nacional no mundo difícil e agressivo em que vivemos, mas com uma mensagem de esperança em que acreditamos.
Aplausos do CDS do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Arruda.
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A autonomia da Região dos Açores é hoje um facto indiscutível, vivido e sentido pelas suas populações, donde emana a sua força e a sua razão. É nela também - reconhecem-no a Constituição Portuguesa e o Estatuto Autonómico- que se consubstancia a unidade do Estado.
Novo fenómeno político e jurídico-administrativo em Portugal, a autonomia traz consigo a carga da vontade colectiva do povo português, já que, elaborada pelos Açorianos, ela foi também ratificada nesta mesma Câmara pelos representantes da República.
Por isso mesmo ela é um projecto e uma experiência colectiva aplicada agora a duas .parcelas do território nacional. Por isso mesmo também ela nos aparece como um vínculo ou contrato entre as diversas realidades políticas, económicas e culturais da sociedade portuguesa, que seria lamentável e grave não se cumprir.
Assim, no que - toca ao Governo Regional dos Açores - na prossecução daquilo a que é obrigado -, este têm feito, desde a sua tomada de posse, um enorme e toem sucedido esforço para dotar as nove ilhas, do arquipélago com infra-estruturas (portuárias e aeroportuárias, por exemplo) que permitam um desenvolvimento harmónico da Região. Só com estas mínimas estruturas de base se poderá aspirar a um mais rápido desenvolvimento da economia regional.
Não nos poderemos esquecer que durante os tempos recuados da políptica portuguesa pré-25 de Abril os Açores foram completamente esquecidos e votados ao mais desumano abandono, o que. se traduziu no inevitável decréscimo da população açoriana, que em terras do continente americano, preferencialmente procurou melhores condições de vida. Na altura eram então os Açores simples moeda de troca. Hoje a. consciência democrática nacional exige, para seu bem, o reforço das autonomias.
É evidente que o futuro dos Açores depende, em grande parte, da recuperação rápida do atraso em que se encontram as infra-estruturas de transportes, do aproveitamento integral dos seus «cursos naturais e humanos, bem como da satisfação das necessidades oásicas da sua população. Deste modo, não poderemos correr o risco do despovoamento das ilhas mais carecidas, pois não faltaria quem, com intuitos velados, estivesse altamente interessado em aparecer cem fins que em nada beneficiarão a população açoriana e a nacionalidade portuguesa,
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Neste sentido, o Governo Regional dos Açores tem vindo a empreender obras de grande e significativo vulto, - tais como, a título de exemplo, a construção de portos nas ilhas do Pico, Flores, pistas para aviação comercial nas ilhas da Graciosa, Pico, S. Jorge e Corvo e um hospital na ilha do Faial. Tais empreendimentos, extremamente dispendiosos, atingem verbas muito elevadas, pelo que itera de haver uma substancial comparticipação do Governo Central, o que, aliás, começou a acontecer desde que a Aliança Democrática é governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Convém relembrar aos Srs. Deputados desta Câmara que, embora os Açores tenham uma população que ronda os 260 000 habitantes. estes habitam em ilhas por vezes muito distantes umas dias outras e requerem, porque, são portugueses, que o seu isolamento seja, a todo o transe, diminuído ao máximo, não só por um esquema de transportes aéreos e marítimos eficaz, mas também com estruturas próprias, que possibilitem encarar os problemas da saúde, da instrução, da cultura e todos os demais que uma população requer, para que viva na Europa em que nos queremos integrar com o necessário à sua dignidade. Somos, pois, uma realidade portuguesa, atlântica, europeia e ocidental a não esquecer ou descurar.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Assim, não se pode, nem se deve, ao que cremos, olhar ao número reduzido de habitantes. Há sim que fazer com que todos os que vivem nas ilhas atlânticas se sintam não só compensados pelo seu isolamento, mas também vejam nelas consolidar-se a verdadeira noção de pátria. Tal só será possível com mutilo critério, muito trabalho e, essencialmente, muito dinheiro, por serem estas as condições indispensáveis a uma boa vivência.
Há, pois, para bem de. todos, que criar na Região Autónoma dos Açores as indispensáveis condições, para que os seus naturais se radiquem e, com segurança, possam criar o seu futuro, evitando a diáspora que a emigração provoca.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Cabe-nos, assim, uma grande responsabilidade e, como porta-vozes, livremente eleitos, é nosso dever trazer a esta Assembleia o sentir da nossa gente.
É certo que nos Açores temos mm Governo próprio e estruturas administrativas próprias. Mas dada a dimensão dos problemas que se nos deparam, dada a instância dos mesmos e dadas as várias naturezas de que eles se compõem, tal Governo necessita evidentemente, do auxílio financeiro do Governo Central, porquanto, sem este auxílio, dificilmente poderemos aspirar a um desenvolvimento crescente da economia açoriana no grau que se deseja e que se justifica. E, se assim fosse, se essa comparticipação se não verificasse, não se. estaria, pois, a dar cumprimento ao estabelecido na Constituição e no Estatuto - diplomas que, como se disse, são a manifestação livre da vontade nacional, que timbram a vida das regiões.
Urge, pois, encontrar vias de solução entre os Governos Autónomos e o Governo Central, tendentes à criação de condições que permitam ultrapassar as dificuldades resultantes da insularidade que nos caracteriza. Ainda ontem, nesta Assembleia, deu entrada uma proposta de lei proveniente da Assembleia Regional dos Açores, que se debruça sobre o problema do suporte nacional dos custos dessa insularidade.
Estamos certos de que muito poderemos conseguir. Necessitamos que alguns anos decorram mas também de certa maneira, temos que correr contra o tempo, compensando aquele que se perdeu.
O arquipélago dos Açores tem as potencialidades que, postas em devida produção e aproveitamento, melhores condições de vida poderão oferecer aos seus residentes.
Partimos do muito pouco, ou mesmo do nada, considerando a unificação dada à Região, que até há pouco se dividia artificialmente em três distritos.
Contrariedades e reveses temos tido. O sismo de 1 de Janeiro de 1980 foi um duro golpe. É verdade que os auxílios foram muitos, mas, a realidade bem o demonstra, foram insuficientes. Foram milhões de contos que de um momento para o outro agravaram substancialmente as despesas da Região Autónoma dos Açores,
Embora a reconstrução das ilhas sinistradas tenha avançado com resultados surpreendentes, há ainda muito e muito para reconstruir, visto os prejuízos serem avultadíssimos. Há que despender muito dinheiro.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por .todas as razões expostas, vamos, confiados na magna importância de que elas se revestem e crentes, portanto, na sua aprovação, apresentar na Mesa desta Assembleia uma proposta de aditamento de uma nova alínea ao n.º 1 do artigo 9.º da proposta de lei do Orçamento Geral dó Estado, tendente, não a debelar, mas a atenuar toda a problemática apresentada.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, comunico à Câmara que acaba de entrar na tribuna do corpo diplomático o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros da República Popular de Moçambique, Joaquim Chissano, acompanhado de uma comitiva da qual fazem parte dois deputados.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Grupo Parlamentar da UEDS considera que a presente apreciação da lei das grandes opções do plano anual e a médio prazo e da Lei do Orçamento para 1981 se encontra condicionada pela natureza da própria iniciativa governamental.
A amálgama numa só proposta de lei das grandes opções de dois planos, o anual e o de médio prazo, desrespeita as directrizes constitucionais, impede diferentes posicionamentos face a um e ao outro, obstaculiza à apreciação adequada da sua execução.
Naturalmente que não negamos a necessária unidade substantiva dos dois planos, e não é por mero fetichismo formalista que consideramos inconstitucional este procedimento, agravado pelo facto de estarmos assim a criar um precedente que desvaloriza a própria função do Plano na nossa vida pública.
Temos, por isso, a opinião de que a observância do formalismo constitucional por nós requerida e pela maioria rejeitada não constitui qualquer obstrucionismo irreverente à acção do Governo, mas antes e tão-só a fidelidade à nossa Lei Fundamental e a garantia de que a preterição de regras constitucionais não se traduzisse em arbítrios e prepotências.
Assim não o entendeu a maioria, o que não espanta. Se nem ao próprio formalismo da revisão constitucional a «AD» pretendia sujeitar-se, por que acaso
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haveria de se sujeitar a uma mera disposição constitucional comum?
A constitucionalidade deste procedimento do Governo é, pelo menos, questionável, como o reconhecem mesmo certos sectores ligados à «AD». É, pois, sob este protesto que participamos no debate, mas aguardamos que os órgãos de fiscalização da constitucionalidade não deixem de emitir um juízo sobre tão relevante matéria.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O que significa afinal discutir as opções do plano a médio prazo? O Governo e a maioria sugeriram que em torno desta discussão se perfilassem as opções políticas e ideológicas que quanto ao modelo de sociedade cada força política ou bloco de forças políticas perfilha. Pela nossa parte, aceitamos gostosamente o desafio ainda que o contributo do Governo e da maioria fique aquém de tais propósitos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O que nos separa do projecto da (AD», ou melhor dizendo - como ficou demonstrado pela intervenção do Sr. Deputado do CDS que me antecedeu - do projecto económico do CDS, que a «AD» vem aqui zelosamente apoiar neste plano a médio prazo, pode ser entendido em três domínios fundamentais: separa-nos da «AD» e deste plano o entendimento da relação que deve existir entre os sectores de propriedade e a função que a cada um deles se comete no quadro do funcionamento do sistema económico em globo; separa-nos da «AD» e deste plano a leitura que fazemos da problemática do crescimento e do desenvolvimento económico e, consequentemente, do papel que o sistema de planeamento deve desempenhar;...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: -... finalmente, separa-nos da «AD» e deste plano a lógica de organização do próprio processo produtivo, nomeadamente ao nível das formas e métodos de organização do trabalho ao nível da empresa.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - O que significa, pois, o «modelo AD» nestes três domínios?
Em síntese, poderíamos dizer que a «AD» e o plano que ora aqui apresentou exprimem uma frouxa tentativa de sistematização de um modelo conservador--liberal, mais conservador que liberal na actual conjuntura sócio-económica.
No domínio dos sectores de propriedade, quer o plano quer a complementar proposta de lei de delimitação de sectores, que dentro em breve iremos apreciar, assentam em três pressupostos fundamentais, dos quais discordamos:
1.º A redução do sector público da economia, desarticulando os seus sectores fundamentais de acção, nomeadamente o sector bancário, os seguros e as industrias de base, consignando-se-lhe assim uma mera função supletiva, responsável apenas pelos sectores deficitários, que, por o serem, não seduzem o investimento privado;
2.º A afirmação do sector privado como mola propulsora do desenvolvimento económico, o que, sendo feito à revelia da nossa própria Constituição, encerra ainda a agravante de apontar para uma situação de manifesta falta de protecção à iniciativa privada nacional, nomeadamente às pequenas e médias empresas, o que será aproveitado, directa ou indirectamente, pelos grandes grupos económicos estrangeiros.
Não deixaria, aliás, de ser interessante saber como é que o Governo, defendendo o primado da iniciativa privada no desenvolvimento económico nacional, poderá aspirar a que por essa via se corrijam as assimetrias regionais actualmente existentes, pelas quais são responsáveis, no fundamental, esses mesmos empresários privados e a lógica"da maximização do lucro por que se regem em exclusivo!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - 3.º e último. A definição de uma política económica animada pela crença mítica na plena eficácia do livre funcionamento dos mecanismos espontâneos típicos das economias de mercado: É o retorno a um neomonetarismo serôdio, à salazarenta obsessão do equilíbrio orçamental à custa do próprio crescimento da economia, à submissão dócil das preocupações sociais e culturais, à lógica inelutável da maximização do lucro.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Neste contexto, a inflação aparece como a espada de Dâmocles de toda a política económica, a cuja contenção, meramente conjuntural e artificiosa tudo, mas mesmo tudo, se sacrifica.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Estes três pressupostos da acção económica do governo da «AD» resultam, no essencial, da peculiar leitura que Governo e maioria fazem da .problemática do crescimento e do desenvolvimento económico. Com efeito, a mera leitura dos instrumentos legislativos que agora nos são apresentados mostram-nos um governo e uma maioria que acreditam até à ingenuidade no curso ineludável do crescimento da nossa economia sob o impulso da integração no Mercado Comum Europeu.
Mas para tal desenvolvimento o Plano não aponta metas tangíveis, não arrisca previsões nem tentativas de quantificação dos esforços a desenvolver, não se percebe bem se por inépcia, se por receio ou se por indiferença!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Talvez seja por isso que a p. 6 do documento que contém a proposta de lei se pode ler: «É de admitir, desde já a utilidade, se não a indispensabilidade, de vir a proceder oportunamente, ao longo do ano de 1982, a uma revisão profunda de conteúdo das grandes opções e do plano de médio prazo, a fim de garantir a sua contínua adequação aos interesses de desenvolvimento da economia portuguesa.»
O Governo confessa a própria falta de confiança que tem na suas grandes opções e revela assim que este plano a médio prazo é, na sua própria óptica, insuficiente e pouco seguro nas vagas metas para que aponta.
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A ausência de questionamento sobre a lógica e o ritmo do desenvolvimento económico é manifesta, se não mesmo gritante. Veja-se, por exemplo, o domínio das fontes de energia, que hoje se encontra no centro das preocupações de todos os governantes da Europa Ocidental. Que opção energética tem este governo? Qual vai ser o peso das nossas contas com o exterior das importações de energia no período de 1981-1984? Qual vai ser, em termos quantitativos, a evolução possível do preço do petróleo nos próximos quatro anos? Como é possível avançar números quanto ao crescimento do produto nacional bruto sem ter em linha de conta esta realidade de base?
O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Ainda não ouviu as respostas?
O Orador: - A ausência de afirmações explícitas neste domínio deve-se a involuntário esquecimento, ou pretende o Governo a posteriori desculpar-se com o aumento do preço do petróleo para o não cumprimento dos objectivos que indica no plano a médio prazo?.
Neste domínio fundamental, o Governo limita-se a preconizar o desenvolvimento do «potencial tecnológico nacional para a produção e utilização das formas de energia futuramente predominantes no nosso sistema energético», afirmando, mais adiante, que promoverá «acções adequadas conducentes à tomada de uma opção nacional relativamente à produção de energia eléctrica por via nuclear».
Significa isto que o Governo já tem uma opção clara em matéria energética, a ponto de se preconizar o desenvolvimento tecnológico de formas de produção de energia futuramente predominantes sem que essas formas futuramente predominantes sejam explicitamente enunciadas?
Significa isto que o Governo já tomou uma opção favorável à energia nuclear e apenas ainda o não disse publicamente porque está a explicar ao PPM que a energia nuclear será a garantia da restauração da monarquia em Portugal?
Vozes da UEDS: - Muito bem! Risos do PPM.
O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Por outro lado, a Governo não explicitou ainda qual a matriz de desenvolvimento por que se rege a sua política económica. Sendo manifesta a impossibilidade de num curto espaço de tempo, virmos a atingir os níveis de desenvolvimento económico vigentes nos países da Europa Ocidental, cumpre perguntar ao Governo:
O modelo de desenvolvimento preconizado é aquele que foi aplicado nos países da Europa Ocidental na conjuntura do pós-guerra? Teremos de percorrer, numa situação conjuntural à escala planetária profundamente diversa, essas mesmas etapas?
Se sim, como resolver então a contradição insolúvel entre o arquétipo e a realidade concreta?
O Governo da «AD» agita, pois, doces amanhãs que cantam, fundados numa lógica desenvolvimentista e crescimentista aparentemente responsável, cujos objectivos últimos não se vislumbra como serão alcançados.
{Mas o Governo não parece preocupado com tal circunstância: «temos a maioria parlamentar connosco, e isso basta-nos», dirão.
Doce ilusão, acrescentarei eu, se me permitem. Porque, de facto, a concretização de qualquer política económica só pode ser alcançada por uma de duas vias fundamentais: ou forjando consensos sociais alargados que constituam o bloco de apoio às. acções de política económica e social preconizadas, e essa será a essência da democracia económica e social por que todos os socialistas democráticos se batem ou então recorrendo ao autoritarismo e à repressão, à negação da própria vivência democrática e ao sufocamento da própria sociedade civil, calcada aos valores tecnocráticos, cuja denúncia foi ontem aqui feita, com o brilhantismo que lhe é peculiar, pela Sr.ª Deputada Natália Correia.
A arrogância com que o Governo se apresentou a este debate, a intransigência com que se encaram as opiniões das oposições, não deixam muito claro por que alternativa das que referi a dinâmica do «modelo AD» acabará por se reger ...
Não deixa de ser espantoso como é que num documento desta extensão e importância não encontramos uma única vez que seja o questionamento dos riscos e perigos que a assimilação mecanicista de modelos alheios, como é que não perpassa a mínima reflexão sobre o descalabro irreversível da corrida consumista em que se encontram as sociedades contemporâneas, sejam elas ocidentais ou do Leste, sobre os riscos depredadores da Natureza e da própria qualidade de vida que comporta um industrialismo entregue às apetências da iniciativa privada.
Vezes da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Reflexões estas que não resultam de qualquer utopia idealista, mas que, pelo contrário, se encontram desde há vários anos no centro dos debates económicos e sociais nos países da CEE.
Como contraponto, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano veio-nos prometer que na moderação alcançaremos o quadrado mágico do desenvolvimento, um espaço de esperança que a «AD» pretende construir.
O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Ainda bem!
O Orador: - O «modelo AD», consubstanciado neste plano, permite-nos dizer que, quando chegarmos a esse espaço de esperança, ele já lá não estará e teremos de mudar de sonho a meio da vida! O melhor será mudar de governo ...
O quadrado mágico resume-se assim a um modesto ângulo, e ainda por cima obtuso ...
Finalmente, uma terceira dimensão nos separa da «AD» e do seu plano: a da organização do processo produtivo e dos métodos de trabalho.
Trata-se de um domínio de matérias que aparentemente não tem pleno cabimento na discussão do plano a médio prazo. Mas a verdade é que este plano pressupõe uma situação no domínio da organização do trabalho que não é ainda aquela que existe actualmente no nosso país.
É que o verdadeiro poder, o terreno concreto e real de libertação da sociedade civil e também o da empresa, das relações que ao nível de cada unidade de
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produção se estabelecem entre os agentes económicos. O que pressupõe, no «modelo AD», o controle absoluto da entidade patronal sobre a organização do trabalho e a livre disponibilidade dos postos de trabalho à custa da segurança no emprego.
Vozes da UEDS: - Muito bem! Vozes do CDS:-Não é verdade!
O Orador-Se o «modelo AD» for lógico e coerente, dentro em breve aqui teremos um «pacote laboral» complementar deste plano para garantir a sua plena vigência também ao nível da empresa. É uma mera questão de tempo...
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pelo que atrás fica dito, e ainda pelo muito que ficou por dizer por manifesta falta de tempo, votaremos - se ainda fosse necessário dizê-lo - contra as propostas de lei das grandes opções do plano anual e a médio prazo e do Orçamento para 1981.
Votaremos contra por fidelidade ao texto constitucional.
Votaremos contra por inalienável dever político e moral para com os nossos eleitores.
Votaremos contra por respeito para connosco próprios.
Aplausos da UEDS. do PS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Anacoreta Correia.
O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Deputado António Vitorino, vou fazer-lhe três perguntas muito simples.
Começarei, no entanto, por dizer que o deserto que ontem foram as bancadas da oposição está visível na sua fogosa intervenção em tudo quanto se refere à política industrial e energética do Governo. Creio bem que se o Sr. Deputado estivesse presente e tivesse ouvido o Sr. Ministro da Indústria e Energia, Baião Horta, esse facto possibilitar-lhe-ia evitar dizer algumas das coisas, que disse no seu discurso.
Disse o Sr. Deputado - e tem razão- que há três conceitos fundamentais que separam o projecto da AD do projecto das oposições. Mas, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, essas diferenças situam-se nestes planos: em primeiro lugar, o projecto da AD é um projecto pragmático e de bom senso, e o projecto das oposições é um projecto utópico - e não basta ser utópico, pois tem a utopia arvorada em dogmatismo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Isto vale por dizer - e esta será a segunda questão que lhe coloco - quem é que é conservador: serão os Srs. Deputados, que insistem em aplicar fórmulas que têm estado a ser ultrapassadas, ou seremos nós, que procuramos encontrar fórmulas para o futuro que conduzam a melhor justiça social e a maior bem-estar?
Vozes do CDS e do PSD: -Muito bem!
O Orador: - A terceira questão que lhe coloco é a seguinte: existe de facto uma diferença fundamental de conceitos sobre o planeamento e os planos. Ai está a razão de ser a AD a apresentar pela primeira vez ao País e a esta Câmara umas grandes opções do plano a médio prazo, e não a oposição, que não teve capacidade para o fazer até agora. Não será está, portanto, a diferença significativa que existe entre o conceito de planear e a forma de o fazer no que respeita à AD e à oposição?
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, queria ainda dizer, Sr. Deputado António Vitorino, que não é sem estranheza e preocupação que eu vejo carrear argumentos que aqui tem sido trazidos sistematicamente pelo PCP sobre as intenções da AD. Não gostaria de concluir que a identificação de posições é tão grande que o seu grupo parlamentar seja o condutor dessas intenções e dessas ideias para o outro grupo parlamentar em que se integra!
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Devo acrescentar ainda que, para nós, que hoje estamos no Governo - Governo que dispõe nesta Câmara de uma maioria parlamentar -, as eleições têm o significado de uma escolha objectiva feita pelo povo português. Como tal, não estamos dispostos a ver essa maioria ser posta em dúvida cada vez que há um debate parlamentar desta natureza.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado António Vitorino desculpar-me-á que diga, mas, para nós, a consulta popular tem o significado que os candeeiros têm durante a nobre, ou seja, indicam um caminho, ou seja, - não ião apenas um local onde as pessoas se encostam para não caírem!
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino, dispondo apenas de dois minutos.
O Sr. António Vitorino (UEDS):-Sr. Deputado Anacoreta Correia, fogosa ou não, a minha intervenção foi sincera e corresponde ao meu pensamento político. Ora, isso em democracia é suficiente para merecer respeito, mesmo por parte dos adversários.
Vozes da UEDS e do PS: -Muito bem!
O Orador: - Mas, se V. Ex.ª me vem falar no pragmatismo, no bom senso da AD, que na realidade deve ser considerado não como apanágio de uma só bancada, mas deve ser entendido como preocupação constante da construção e da consolidação do nosso regime democrático, terei de lhe recordar - embora eu não o quisesse - que durante quarenta e oito anos, neste país, nos disseram que as alternativas do Poder eram utópicas e que só o poder constituído era pragmático e tinha bom senso. É isto o que eu não gostaria de ver repetido nesta Assembleia.
Aplausos da UEDS, do PS e da ASDI.
Tenho bem pouco tempo, mas mesmo assim farei mais duas observações.
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É falso que a oposição, nomeadamente o PS que integra as bancadas da FRS -, não tenha feito nunca nenhuma tentativa de definir um plano a médio prazo, que, se ainda me permite a minha opinião, considero ter sido melhor fundamentada do que o plano que era nos é apresentado. Esse plano, chamado «plano Manuela Silva», não foi discutido nesta Assembleia porque entretanto o Governo caiu, o que não significa que não tenha havido esforços de tentativa de planeamento.
Mas estou de acordo com o Sr. Deputado em que é na verdade uma diferente concepção de planeamento que está em causa. Foi precisamente isso que eu tive a oportunidade de dizer na minha intervenção.
Por outro lado, não considero que tenha colocado problemas que estejam ultrapassados ou que sejam de natureza eminentemente conservadora. Limitei-me a referir questões e problemas sobre os quais tenho & sinceridade e a honestidade de dizer que para eles eu próprio não tenho respostas completas. Simplesmente, penso que haveria vantagens em que todas as forças políticas debatessem questões como a energia, por exemplo, que são questões que não dizem respeito a nenhuma opção ideológica, mas sim a um problema que importa ao futuro de todos os portugueses. Foram questões como esta que fui levantar em forma de questão, tentando ver se ainda aí seria possível algum diálogo. Devo deduzir das suas palavras que o Sr. Deputado entende que não.
Finalmente, quanto ao anátema que pretendeu lançar sobre a minha intervenção, de que eu estaria a carrear argumentos de outro grupo parlamentar, digo-lhe apenas duas coisas: a primeira é que não sou gestor de negócios de ninguém, defendo as posições do meu partido, que, se V. Ex.ª quiser, pode criticar mas enquanto posições da UEDS, e não tentando lançar sobre ela o anátema de serem posições alheias, de haver manipulações e organizações que são telecomandadas por outras.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador. - Finalmente, gostava de dizer, nesse sentido, que este debate sobre o plano anual e as grandes opções a médio prazo e o Orçamento Geral do Estado para 1981 deveria constituir um exemplo de diálogo democrático, e não um exemplo de anátema, como aquele que o Sr. Deputado acabou de dar.
Aplausos da UEDS, do PS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Informo a UEDS de que esgotou o tempo de que dispunha para hoje. Tem a palavra o Sr. Deputado Anacoreta Correia.
O Sr. Anacoreta Correia (CDS):-Queria apenas dizer ao Sr. Deputado que nada lhe consente ver nas minhas palavras alguma falta de atenção para a sua sinceridade e para a sua honestidade. Não é isso que está em causa, nem foi isso o que eu quis pôr em causa.
O que quero dizer é que em política o que parece também é. Ora, das suas palavras, ditas com toda a sinceridade, podem inferir-se algumas das conclusões que retirei.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Leu bem o Salazar!
O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - O Sr. Deputado lá sabe!
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr. Presidente, começarei por lhe perguntar se posso usar da palavra, pois parece que o meu grupo parlamentar não dispõe de tempo.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª poderá utilizar o tempo de que o seu grupo parlamentar dispõe para amanhã. Simplesmente, o tempo de que os grupos parlamentares dispõe para amanhã é para ser usado na discussão na especialidade, segundo o programa estabelecido. Não vejo inconveniente em VV. Ex.ªs gastarem o tempo de que dispõe para amanhã, mas penso que ficarão limitados na sessão de amanhã.
Se assim o desejar, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, vou lavrar um protesto relativo à intervenção do Sr. Deputado Anacoreta Correia;
Eu acreditava que o tempo em que, à falta de outros argumentos, se lançava sobre aqueles que tinham posições divergentes das posições governamentais o anátema -do ponto de vista do Governo e não obviamente do ponto de vista daqueles que eram acusados ou, pelo menos, do nosso - de serem comunistas ou criptocomunistas tinha passado.
Vejo agora que também nesse aspecto vamos paulatinamente regressando ao passado. Com efeito, o que o Sr. Deputado do CDS fez não foi identificar - o que não nos assusta - determinadas posições eventualmente idênticas e assumidas pelo PCP. Nós não temos nenhum complexo em relação a isto nem nenhum receio de reconhecer identificações seja com quem for quando elas existam.
O que o Sr. Deputado pretendeu insinuar foi quo nós" éramos a correia de transmissão do PCP dentro da FRS.
O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Não foi isso
Vozes da UEDS: - Foi isso, sim!
O Orador: - As suas palavras estão registadas e V. Ex.ª terá ocasião de as ler, a fim de verificar que tenho razão.
Era contra isto que eu queria protestar, era isto é que queria deixar claro. Acrescentarei, como dizia há pouco, que não nos perturbam, nem muito nem pouco, as identificações pontuais com o PCP ou com qualquer outro partido. É demasiado evidente e claro para a opinião pública e para os deputados aqui presentes que, a menos que se utilize a pura e simples má fé, essa correia de transmissão não passa de um argumento demagógico.
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Mas, para que também fique claro e porque complexos não nos movem, gostaria de dizer que, independentemente das divergências - profundas e que não datam de hoje, mas de há muito - que temos com o PCP, também temos pelos comunistas portugueses o respeito e admiração que nos ficou de nos termos encontrado lado a lado com eles na resistência contra o fascismo, coisa que, infelizmente, não posso dizer de todos os deputados que se encontram neste hemiciclo.
Aplausos da UEDS, do PS, da ASDI. do PCP e do MDP/CDE.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho.
O Sr. Ministro do Trabalho (Nascimento Rodrigues): - Sr. Presidenta, Srs. Deputados: Melhorar as condições de vida dos Portugueses, através de um aumento do nível médio de vida que reduza o atraso que nos separa actualmente dos outros povos da Europa, democrática, é uma das grandes opções do plano a médio prazo, cuja proposta de lei o Governo submete à apreciação e decisão desta Assembleia.
É neste contexto que gostaria de referir alguns aspectos da política sectorial directamente relacionada com o Ministério a meu cargo.
Partirei do princípio, que pressuponho pacífico, de que a melhoria das condições de trabalho e o aumento das potencialidades de emprego produtivo e remunerador se inserem, naturalmente, no objectivo mais vasto a que acabei ide aludir.
Importa então destacar alguns dos pressupostos e condições essenciais para a consecução daquelas metas. Isto exige que se procure detectar, embora sumariamente, atentas as limitações de tempo, as linhas mais visíveis da evolução recente das relações de trabalho no nosso país para as encarar no âmbito das grandes opções submetidas à Câmara. As duas principais fontes de regulamentação das condições de trabalho são, como é sabido, a lei e os convenções de trabalho e por isso se suscita a necessidade de actuar uma e outra no seu posicionamento respectivo, encarando-as à luz dos objectivos de política social e económica global.
A legislação do trabalho, na parte referente à regulamentação do contrato individual do trabalho, assenta ainda, em larga medida, em dispositivos provenientes de 1969. A eles se aditou um conjunto legislativo avulso, fundamentalmente emitido em 1975, 1976 e 1977. Daqui resulta uma situação de emaranhado legislativo, onde os juslaboralistas não raro se vêem atulhados em complexos raciocínios de interpretação e de combinação de esquemas velhos com ideias novas e onde os próprios trabalhadores e empresários se sentem confrontados com a pouca clareza e a menor coerência de conjunto do regime legal que se lhes faz aplicar. Dispenso-me de sublinhar o quanto tudo isto acarreta em termos de conflitos, evitáveis, de interpretação e de aplicação de normas legais.
O processo de elaboração das leis do trabalho tem entre nós, como é sabido, um suporte constitucional de profundo significado, que se traduz no direito de
participação das organizações sindicais e das comissões de trabalhadores nessa mesma elaboração. O que, entretanto, sucedeu foi que a maior parte da legislação avulsa vigente foi emitida em momentos anteriores ao da entrada em vigor da Lei n.º 16/79, de 26 de Maio, que regulamenta a forma de participação constitucionalmente assegurada. Pode dizer-se, assim, que, para além dos dispositivos sobreviventes do período corporativo, outros, marcados embora pela traça democrática da fase iniciada posteriormente, não recolheram plenamente o peso influenciador da participação das estruturas representativas dos trabalhadores.
Foi com a consciência deste condicionalismo genérico que avancei, aquando do debate do Programa do Governo ,nesta Câmara, com a sugestão de se estabelecer, no futuro, um processo mais enriquecedor de preparação de revisões legislativas no campo do trabalho e do emprego.
Sem prejuízo nunca da fórmula participativa constitucionalmente garantida e regulada pela lei ordinária, afigura-se-me ser mais consentâneo com a transparência e autenticidade democráticas, que se devem impulsionar em todas as áreas de relacionamento social, o estabelecimento de um esquema mais vasto às análise, de debate e participação efectiva dos parceiros sociais na preparação de orientações adjuvantes da política legislativa lateral.
Apraz-me informar a Câmara de que esta sugestão - corporizada no lançamento da ideia de criação de uma comissão consultiva tripartida em que tivessem assento representantes dos parceiros sociais, do Ministério do Trabalho e personalidades estranhas ao Estado e às organizações sindicais e empresariais de reconhecida competência no domínio do direito do trabalho e da política social - vem colhendo uma receptividade suficiente e encorajadora da parte de alguns dos parceiros sociais já consultados, no âmbito das conversações que com eles tenho estabelecido.
Se, tal como o Governo desejaria, for possível daí corpo a esta iniciativa, penso que se poderá afirmar com justiça que se abrem entre nós perspectivas novas e de autêntica mudança qualitativa no quadro do relacionamento social. Não julgo que algum português, algum cidadão, algum trabalhador ou algum empresário que verdadeiramente preze o ideal democrático possa deixar de encarar esta eventualidade como um salutar passo em frente no processo de consolidação plena da nossa democracia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em regimes pluralistas -já tive ocasião de o afirmar por várias vezes- o conflito é parte intrínseca da vivência política, económica e Social. Mas não se antevêem alternativas mais válidas à sua superação o não se vislumbram processos mais sérios de auscultação dos interesses colectivos e de definição participada dos interesses gerais da comunidade que não sejam os inspirados por essa vontade firme e por essa orientação clara de organizar o «face a face» entre todos os intervenientes e de suscitar entre eles, em liberdade, o diálogo responsável que o País deles espera.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Já é tempo de acabarmos com a «originalidade» de um sistema em que os parceiros sociais têm assumido uma postura de costas voltadas e uma atitude de isolacionismo no relacionamento triangular ou. bilateral, cuja prossecução é exigida pelos difíceis problemas que temos de saber resolver no campo do emprego e do trabalho.
Deve esperar-se, que uma revisão legislativa levada a cabo segundo parâmetros de discussão social alargada possa constituir o ponto de partida para um ordenamento mais coerente e mais justo das relações de trabalho. Mas é obvio que as convenções colectivas continuarão a constituir uma fonte primacial da regulamentação do trabalho do nosso país. E por isso não posso deixar de dedicar também a este assunto algumas palavras.
Se há tendência que, com grau de razoável certeza, é lícito destacar na evolução dos últimos anos, essa é certamente a da valorização dos métodos negociais na conformação das relações de trabalho.
Esta valorização assume-se em dois sentidos: por um lado, pelo facto de, gradualmente, vir a assistir-se a uma quebra assinalável e positiva dos instrumentos emanados da Administração - as PRTs -, que constituem, como é sabido, formas de intervenção administrativa, cuja raiz histórica entronca na filosofia política do corporativismo; por outro lado, pelo facto de vir a constatar-se um aumento graduai no número de CCTs celebrados em cada ano, a maior parte das quais em negociações directas e isentas de conflitualidade especial.
De facto, e sem querer maçar a Câmara com uma avalanche de dados, permitir-me-ia registar apenas, como comprovativo das minhas afirmações, o seguinte (até ao Boletim do Trabalho e Emprego, de 15 de Março de 1981):
Número de PRTs Número de CCTs
Em 1978 ..... 68 216
Em 1979 ........... 26 258
Em 1980 ...... 13 316
Em1981 ....................... 3 67
Não quereria, no entanto, deixar de assinalar que esta salutar movimentação no campo negocial suscita alguns problemas que importa ponderar.
Em primeiro lugar, o próprio volume de convenções colectivas negociadas ou conciliadas em períodos diferentes coloca a questão de saber se não seria conveniente, no futuro, ir reduzindo aquilo que hoje parece ser uma excessiva pulverização dos instrumentos convencionais agrupando-os ou fundindo-os por sectores de actividade ou por subsectores mais homogeneizados. Tenho para mim que existiriam possivelmente vantagens numa tal alteração: poderiam atenuar-se e eliminar-se a prazo assimetrias e disparidades nas condições de trabalho (o que constitui objectivo perfilhado pelas opções do Plano), com os efeitos benéficos daí decorrentes, quer para o indispensável sentimento de justiça social entre os trabalhadores, quer para o necessário estabelecimento de regras de mais correcta concorrência entre as empresas. Mas parece-me óbvio que a inwlaíiva de um tal reordenamento deve assentar na liberdade e na concertação dos próprios parceiros sociais e no quadro de necessidades que possam ser comungadas de uma certa «globalização» da temática das relações industriais.
Esta «globalização» imporia - e este é o segundo aspecto fulcral que desejaria abordar- uma atenuação efectiva do tempo de vigência real das tabelas salariais convencionais. Com efeito, se é verdade que o vector contratual das relações colectivas em vindo a acentuar-se, como demonstrei, não é menos verdade que há um caminho importante a percorrer no sentido de se obter, tanto quanto possível, uma maior celeridade nos processos negociais de revisão anual.
Têm-se escutado reclamações, em certa medida justificadas, quanto à vigência efectiva superior a um ano das tabelas salariais convencionais. Mas, se essas reclamações não deixam de ter cabimento, importa recordar que o mecanismo legal regulador do processo de negociação colectiva foi estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro, diploma da autoria do governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo. E é curioso registar que no preâmbulo desse decreto-lei se afirma que «foram acolhidas as críticas relativas à morosidade e burocratização do processo negocial, criando-se dispositivos que permitem o seu aoeteaimemío». A conclusão só pede ser uma de duas: ou as sugestões feitas pelas organizações consultadas vieram a «velar-se na prática como pouco adequadas às realidades da contratação ou o acolhimento dessas mesmas sugestões não passou de invocação formal enganadora.
Como quer que seja, o Governo está consciente de que a justiça social e a normalidade das relações de trabalho exigem uma tradução prática do princípio da revisão salarial anual das convenções colectivas de trabalho.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não se dispensará o Governo, para o efeito, de adoptar as providências legislativas que se justificarem. Mas seria ingenuidade ou demagogia supor-se que aquele objectivo é atingível exclusivamente pela via das alterações legais correspondentes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A sua consecussão passa, primacialmente, por uma nova atitude das próprias organizações sindicais e empresariais (ou das empresas, nos casos de acordos colectivos), atitude voltada para um enquadramento das negociações salariais no contexto global dos vários e complexos factores de ordem económica e social envolventes da contratação.
O Governo tem uma política económica e social que visa a melhoria das condições de vida dos Portugueses. Mas não esconde quanto se torna imprescindível o aumento do investimento e a melhoria da produtividade para que a nossa economia se expanda e modernize, criando os postos de trabalho que são tão indispensáveis à atenuação do flagelo do desemprego.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os últimos dados estatísticos revelam uma ligeira descida da taxa global de desemprego.
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É necessário, porém, incrementar acentuadamente a criação de novos .postos de trabalho e viabilizar muitos dos que precariamente subsistem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este é o desafio maior com que todos nós nos defrontamos, porque o desemprego -já o disse nesta Câmara - é uma afronta à dignidade pessoa] de cada homem,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ...uma limitação da liberdade individual e um agente corrosivo da estrutura democrática da sociedade.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
E é também neste contexto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se insere a chamada de atenção para a necessidade de no futuro se concatenarem melhor as variáveis diversas postas em causa pela política de negociações colectivas. Parece-me perfeitamente natural e legítimo que as associações sindicais se preocupem com a melhoria do estatuto salarial dos trabalhadores e assumam posições de reivindicação nesse sentido. Mas é importante - e é importante sobretudo no plano da defesa global dos interesses de todos os trabalhadores - que as reivindicações se expressem em compatibilização com o objectivo da redução da taxa de inflação, sob pena de regresso à situação de anos anteriores, em que a perda do poder de compra dos salários foi patente face ao agravamento brutal do índice de preços no consumidor.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E é igualmente importante que essa globalização da abordagem e da discussão negocial dos temas da negociação colectiva se processe em termos de efectiva participação dos parceiros sociais na resolução concertada dos problemas do emprego e da formação profissional. Questões tão delicadas como as do aumento dos postos de trabalho, da mobilidade profissional e das perspectivas de carreiras profissionais, da política salarial e da melhoria das condições de organização e de prestação do trabalho não devem continuar a ser encaradas isolada e fraccionadamente.
A liberdade negocial, componente indissociável que é da liberdade sindical, pressupõe uma consciência clara de que a negociação é luta e é ajustamento, voluntária e responsavelmente assumido. E, quando o compromisso se assume em clima de respeito integral pelos valores democráticos das sociedades pluralistas e no quadro de uma resposta adequada à magnitude da crise que as economias de todo o Mundo atravessam, é lícito afirmar que ele é ainda, e fundamentalmente a expressão mais acabada e mais positiva de preservação da democracia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É nesse pressuposto fundamental e com esse objectivo básico que devem ser encaradas as grandes opções da política do trabalho e emprego submetidas a esta Câmara. É nesse pressuposto e com esse objectivo que o Governo tem feito apelo e se tem demonstrado disposto a criar as: condições necessárias para que uma concertação social alargada se instale no País. É tempo de responder a este desafio do futuro, na liberdade e na solidariedade, pelo progresso social e económico de Portugal.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontramo-nos de novo sem inscrições, pelo que terei de me socorrer do critério que foi estabelecido de atribuir a palavra aos partidos pela ordem crescente da sua representatividade aqui nesta Assembleia.
Sendo assim tem a palavra o S. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei do OGE para 1981 que o Governo apresenta a esta Assembleia respeita, nos seus aspectos mais relevantes, as linhas de orientação que presidiram à governação reaccionária do ano transacto. Se no OGE para 1980 era muito saliente uma certa demagogia e o eleitoralismo a cobrir as medidas antipopulares, o actual já não tem tão grande preocupação e a política repressiva e antipopular aparece mais claramente. O Governo joga a fundo na divisão, na criação de situações de desigualdade que contribuam para encobrir as injustiças praticadas. Lançam-se iscas a certos estratos dos trabalhadores para melhor atingir os interesses vitais da sua generalidade.
Esta proposta de lei de OGE para 1981 é uma clara concretização da política da AD: agravar as condições de vida dos trabalhadores, estrangular o sector empresarial do Estado, aumentar enormemente as despesas improdutivas e para os aparelhos de repressão sendo insuficientíssimas as verbas atribuídas a serviços básicos, como a educação, a saúde e segurança social, os transportes, etc. ...
As medidas de política económica subjacentes a este orçamento apontam para a elevação acentuada de diversos bens e serviços, nomeadamente de grande essencialidade, que dificultarão ainda mais a prossecução de uma taxa de inflação de 16 %, apontada pelo Governo, que se apresenta cada vez mais como um artifício destinado a conter nesse nível os aumentos de salários dos trabalhadores.
Em relação à política fiscal, o OGE não traz quaisquer alterações de fundo. As reduzidas modificações de alguns impostos são altamente demagógicas, pois contrastam com os incentivos aos capitalistas, particularmente para a constituição de sociedades de investimento, e o enorme peso dos impostos indirectos, pagos essencialmente pela população trabalhadora.
Além disso, as alterações introduzidas não repõem sequer as situações derivadas da inflação, para logo a seguir brindarem o sector nacionalizado com subsídios que se situam muito aquém das necessidades decorrentes do carácter social dos serviços prestados pelos mesmos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que salta sobretudo à primeira vista neste OGE é o enorme escân-
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dalo que continua a ser a atribuição de verbas elevadíssimas para as forças Armadas e de segurança e ordem públicas, que se vêm constituindo cada vez mais como sorvedouro insaciável de grossas fatias do Orçamento. O montante de 60 milhões de contos atribuído àqueles corpos repressivos situa-se logo a seguir aos encargos com a dívida pública, que levam à sua conta nada menos que 87 milhões de contos.
A UDP não se espanta com a verba atribuída às forças armadas e aos outros corpos repressivos, pois essas são as exigências da NATO e do Sr. Reagan, com quem o Governo tanto se identifica, dispondo-se a tudo fazer para não perder tão sinistra amizade. Mas deve ficar bem claro é que essas despesas significam menos educação, pior saúde e assistência, piores transportes e ainda maior dependência face à NATO e o acentuar do papel do nosso país como peão do imperialismo americano. Dizer que isto tem algo a ver com os interesses do nosso povo só dá para os senhores da AD entenderem.
Os produtos de preços subsidiados pelo Estado que antes compunham o chamado «cabaz de compras» ficam agora reduzidos a quatro, respondendo o Governo assim às exigências dos grandes patrões do comércio para liberalizar os preços de produtos essenciais.
É ridículo o argumento do Governe quando pretende fazer crer que o «cabaz» beneficiava sobretudo os turistas ou que na CEE não há produtos subsidiados. De facto, em relação ao que interessa ao Governo, a CEE é argumento para tudo. Mas a realidade é bem simples: o nível de vida dos trabalhadores vai ser gravemente afectado, não sendo compensados com medidas noutros serviços. £ os subsídios directos em abonos e pensões de que o Governo fala só virão em Agosto e Dezembro, se, entretanto, até lá o Governo não decidir «esquecer-se».
A manutenção do mesmo nível dos subsídios às empresas públicas constituirá uma forma eficaz de as levar ou a aumentarem fortemente os respectivos preços ou, em alternativa, a apresentarem défices de exploração empolados, que constituirão, como vem acontecendo, pretexto para mais ataques ao sector nacionalizado e formas de estrangulamento do sector empresarial do Estado.
Fica bem claro no OGE o desprezo do Governo pelo sector dos transportes, onde o Estado dispõe de grande peso e meios. Fala o Governo num plano nacional de transportes, sob a égide do Banco Mundial, mas não ficamos a saber, no concreto, o que isso é. Não se fala no alargamento do «passe social», apesar de a AD ter feito essa promessa nas últimas eleições. Que soluções nos aponta? Ridiculamente, mas coerentemente, propõe a legalização do «transporte pirata» com o interior, isto é, das actividades dos candongueiros do sector dos transportes.
Fica ainda claro que o Governo abandona à sua sorte os pequenos e médios agricultores atingidos pela seca e a geada pela ridicularia do subsídio que propõe no OGE.
Chegamos ao ponto de cerca de um terço das despesas nada terem a ver com a satisfação das necessidades essenciais da população, antes se destinando a funções que, se não se apresentam claramente hostis, pelo menos, a sua essência é antipopular.
Refiro-me às forças armadas e repressivas, bem como aos encargos com a dívida pública, que, atingindo quase os 600 milhões em finais de 1980, virão a atingir cerca de 730 milhões de contos no final do ano corrente.
A política antipopular que vem sendo prosseguida tem-se traduzido nisso mesmo: endividamento crescente do Estado, como forma de cobrir défices orçamentais cada vez maiores, sem que isso se traduza em melhorias efectivas nas condições de vida do povo português. De facto, caberia perguntar: em que sectores da sociedade portuguesa e da Administração Pública se têm feito sentir melhorias substanciais que o crescente endividamento do Estado levaria a supor? Têm tido os funcionários públicos aumentos decentes que reponham o seu poder de compra? Funcionarão os serviços de saúde melhor do que há alguns anos atrás? E o ensino, a assistência social, o apoio aos desempregados? A realidade mostra à evidência que o acumulador de dívidas do Estado não tem servido para melhorar efectivamente as condições de vida do povo português, mas para, de uma forma ou de outra, aumentar os lucros dos capitalistas.
Basta referir o caso dos funcionários públicos, que estão em luta e ontem se manifestaram junto a esta Assembleia, cujas reivindicações a UDP apoia, porque são justas.
Face a esta situação sombria, que já se antevia, a UDP sempre se bateu por uma política orçamental coerente com a defesa dos interesses das camadas populares mais desfavorecidas. Assim, temos proposto uma política fiscal fortemente repressiva sobre os lucros dos capitalistas que lhes faça pagar a crise em que mergulharam o País, porque entendemos como imoral a situação existente, em que à sombra da crise e beneficiando dela se, acumulam grandes fortunas e uma minoria arrecada larga fatia do rendimento nacional, enquanto no pólo oposto milhões de portugueses se batem na amargura do desemprego, dos contratos a prazo, das condições de vida humilhantes, da falta de casa, das reformas de miséria, etc.
Defendemos igualmente que a distribuição das despesas obedeça a uma estrutura bem diferente da que actualmente se verifica. Em que as verbas para a saúde, o ensino, a assistência social e restantes rubricas respeitantes à satisfação das necessidades populares sejam reforçadas em detrimento da defesa nacional e dos encargos com a dívida pública.
Porque a proposta do Orçamento para 1981 vai representar a continuação da política da AD de ataque ao que resta do 25 de Abril, em particular as nacionalizações e a Reforma Agrária, porque este orçamento faz parte integrante da política do grande patronato e do imperialismo, adaptada à situação portuguesa e à crise capitalista em que o País se retrate, a UDP vota contra, alertando os trabalhadores paira as consequências nefastas da aplicação deste orçamento, que nem os salpicos de demagogia que o caracterizam permitirão esconder.
O Sr. Presidente: - Não há inscrições.
Pausa.
A ASDI pretende intervir agora?
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O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, nós temos apenas uma intervenção que programámos para logo à tarde.
O Sr. Presidente: - Como estamos sem inserirmos ...
O Sr. Pinto Nunes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito pretende usar da palavra, Sr. Deputado? Para uma intervenção?
O Sr. Pinto Nunes (PSD): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Pinto Nunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Qualquer que seja a óptica ideológica por que se analise o Orçamento Geral do Estado não será possível ignorar o desequilíbrio em que se encontram as finanças do Estado, expresso não só no montante do défice corrente como no facto de a soma das despesas com pessoal, com os juros da dívida pública, representar cerca de 63 % das despesas correntes.
A recuperação desta situação é tanto mais difícil por quanto, como ninguém deve ignorar, em economia não pode haver saltos demasiado bruscos. Na verdade, a multiplicidade de variáveis em presença, a contínua flutuação da sua incidência no processo total, a imprecisão ou mesmo desconhecimento, em tempo útil, da resultante de milhões de microdecisões que se entrechocam e mutuamente se influenciam, são factores determinantes dos estrangulamentos mais diversos no processo de desenvolvimento económico e social do País. E não se diga que este cenário é exclusivo da economia portuguesa ou, mais geralmente, da economia de mercado, pois tal afirmação seria simplesmente do mais completo primanismo.
O montante do défice corrente e a impossibilidade estrutural de o reduzir de repente de forma drástica, o fatalismo da expansão continuada dos encargos com a dívida pública e a indispensabilidade de se satisfazerem níveis de investimento público sem os quais as perspectivas de melhoria social estariam comprometidas, relegam as críticas da oposição à proposta de orçamento do Governo para os domínios da incoerência ou do secundário.
Da incoerência, porque qualquer reforço substancial de uma dada dotação do Orçamento apresentado passa apenas pelas seguintes alternativas de compensação: ou o aumento igualmente substancial do défice ou o corte drástico em outra ou outras dotações propostas.
Ora, onde poderiam ser razoavelmente aceites cortes substanciais? Nas dotações dos Ministérios da . Defesa? Da Administração Interna? Da Educação? Dos Assuntos Sociais? Do Trabalho? Da Habitação e Obras Públicas? Não vale a pena continuar, não resta mais nenhuma com dimensão suficiente. É, como é óbvio, o aumento substancial do défice seria incoerência pura.
Por conseguinte, as críticas da oposição só poderão, racionalmente traduzir-se em alterações bem modestas à proposta de Orçamento Geral do Estado e então estaremos, sem qualquer dúvida, nos domínios do secundário.
Deste plano de fundo limitativo destacam-se, entretanto, algumas notas de optimismo de carácter mais global que é justo salientar. Referimo-nos à redução do défice em termos de produto interno bruto, à redistribuição e mesmo redução da carga fiscal em termos individuais, à correcção de assimetrias sociais e regionais explicitamente citadas pelo Governo. Mas não só: dos diferentes aspectos que se poderiam abordar deter-nos-emos em três, que a nosso ver merecem algumas reflexões construtivas. Em primeiro lugar, consideraremos as finanças locais não quanto à aplicação integral da respectiva lei pelo Governo, que não pode estar em causa, ainda que este tenha utilizado os factores mínimos legalmente previstos.
Uma voz do PSD: - Muito bem.
O Orador: - Referimo-nos, muito concretamente, ao mundo de expectativas criadas nas populações e nas autarcas com a publicação da Lei das Finanças Locais, referimo-nos às frustrações de toda a ordem que mais ou menos por lodo o lado se registaram D. este respeito, referimo-nos ainda aos problemas decorrentes de -uma situação nova, em termos de responsabilidade, poderes e exequibilidades, para a qual - tem de se dizer - só alguns estariam devidamente sensibilizados e preparados, já que ninguém nasce ensinado e, neste campo, a prática era muito reduzida.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - De facto, a implantação do Poder Local começou para dar lugar a um verdadeiro alvoroço de inventariação cuidadosa e esforçada, em diversidade e dimensão, das carências de cada uma das autarquias.
A grandeza dos problemas detectados gerou a ânsia de os resolver depressa e desenvolveu a esperança de que as Finanças Locais a tudo permitiriam acudir, mas desenvolver também um estado de espírito de alheamento, mais ou menos generalizado, quanto à capacidade das finanças do Estado para lhes fazer face. Surgiram, então, as frustrações a que há pouco aludimos, decorrentes dos mais limitados meios financeiros efectivamente postos à disposição das autarquias pela Administração Central.
Mas - há que dizê-lo - não só essas. Avultaram também as resultantes da falta de conhecimento adequado de factores tais como o período necessário ao planeamento e lançamento de qualquer obra. a falta de capacidade de resposta de muitas empresas adjudicatárias, alguma indecisão na fixação de prioridades mais facilmente concretizáveis, a insegurança quanto ao momento de disponibilidade das verbas que seria preciso pagar, alguma rigidez das normas orçamentais e a própria lentidão da reacção do mercado fornecedor local para se adaptar à súbita possibilidade de expansão.
Pode dizer-se que, na generalidade, -as excepções confirmarão a regra - as autarquias portuguesas sofrem os problemas da transição para uma vivência autonómica mais consciente e mais responsável e pagam, através de algumas das frustrações há pouco
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assinaladas, o preço da sua identificação com a realidade nacional.
O processo de transição está longe de estar esgotado e certamente ainda por alguns anos testemunharemos os múltiplos aspectos - muitos positivos e alguns negativos- da transformação mais beneficamente revolucionária da Nação portuguesa no pós-25 de Abril, que a consolidação do Poder Local.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Na evolução do processo certamente se introduzirão correcções, da mais diversa ordem, no esquema em vigor para as finanças locais.
Sugere-se uma desde já: que a participação das autarquias nas finanças do Estado se calcule através das receitas deste e nunca das suas despesas. É que o sistema actual é incontestavelmente de efeitos destrutivos quanto à indispensável convergência entre o Poder Local e o Poder Central, no que toca aos interesses da Nação.
Um segundo tema a nosso ver merecedor de reflexão refere-se ao investimento. Neste campo assistiu-se, com desnecessária frequência, a estrangulamentos de toda a ordem, e um dos mais importantes respeita à penúria de projectos económica e socialmente válidos, com possibilidade de lançamento imediato. Já em pleno 1975, no auge das dificuldades financeiras do País, um Ministro do V Governo Provisório reconhecia, surpreso, que afinal havia dinheiro mas não havia projectos.
É certo que o Sr. Ministro das Finanças disse, nas suas intervenções, que se se atendesse às solicitações apresentadas pelas empresas públicas, seriam necessários 800 milhões de contos para se financiar o respectivo investimento no período do Plano. Mas acrescentou também que 44 % dessas solicitações incidiam sobre o primeiro ano, o que de imediato evidencia a inconsistência de boa parte dessas solicitações.
Deste modo, todas as contribuições de projectos novos sensatamente estudados e construídos devem contar à partida com o melhor apoio da Administração Central. E quantas vezes o melhor apoio consiste, muito simplesmente, na eliminação de perdas de tempo, sejam elas burocráticas ou decorram das necessárias definições e decisões políticas!
Permita-me a propósito salientar nesta Assembleia e nesta oportunidade o êxito que constituiu a iniciativa conjunta da Caixa Geral de Depósitos e do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais ao abrir, para pequenas e médias empresas, um concurso de projectos industriais, com atribuição de prémios significativos para os que melhor servissem o interesse nacional e que se traduziu na apresentação de cerca de 140 projectos, com um valor de investimento da ordem dos 6 milhões de contos, criando perspectivas de 6 mil novos postos de trabalho.
E merece também referência, numa altura em que se fala na vulnerabilidade das nossas pequenas e médias empresas relativamente no formidável potencial de CEE, a circunstância de. a grande empresa pública CTT/TLP reconhecer, numa visão a vinte anos de que será a sua participação no desenvolvimento do País, que a capacidade de resposta aos seus planos não deverá assentar exclusivamente na expansão dos seus meios próprios. Abre-se, assim, à iniciativa privada um mercado novo envolvendo a criação de 8500 novos empregos só até 1985, dos quais 5000 efectivos, distribuídos por todo o País.
É ainda pertinente abordar aqui, e a propósito do investimento, uma questão que a nosso ver se reveste de dimensão nacional e que pode ser objecto de algumas medidas por parte do Governo.
Trata-se da formação de técnicos através de estágios pós-licenciatura. Não nos referimos a estudos complementares, normalmente tratados, mal ou bem, através da concessão de bolsas de estudo. Preocupa-nos a formação profissional de grande parte das pessoas que, tendo concluído os seus cursos médios ou superiores, ficam a aguardar uma possibilidade de emprego e, conscientes das limitações da sua falta de experiência profissional, «agarram», pelas conhecidas dificuldades da nossa economia, a primeira oportunidades que lhes aparece. E quantas vezes com total desajustamento relativamente às vocações e às capacidades próprias... e, sobretudo, com tão grande desperdício se se tiver em conta a nossa penúria de técnico convenientemente preparados.
Ora, o sector empresarial do Estado detém hoje as maiores empresas do País, algumas delas, pelo menos, com tradições antigas no organização de estágios para os níveis a que nos vimos referindo. Por que não mobilizar as amplas potencialidades que de tal resulta, nomeadamente quanto à larga cobertura dos sectores da actividade económica? Por que não incentivar também as empresas privadas quanto à organização sistemática de estágios?
O Governo tem na sua mão instrumentos poderosos de persuasão para este efeito, que poderão ir dos simples benefícios fiscais até outros incentivos muito mais elaborados como a mobilização, para o efeito, de ajudas de pré-adesão à CEE, concedidas pela Comunidade, e até - porque não? - a própria autorização de provisões para estágios, a regulamentar em termos de equiparação a investimentos de reconhecido interesse público.
O último tema que queremos abordar respeita ao problema do emprego.
Também aqui o Governo se apresenta com uma nota de optimismo, propondo-se reduzir significativamente, ao longo dos próximos quatro anos, o nível de desemprego que nos aflige.
Este propósito é particularmente pertinente quando as perspectivas da nossa adesão à CEE dão lugar desde a formulação de simples receios de aumento do desemprego actual, por falência das empresas mais débeis, até à apresentação das teses mais catastróficas sobre o assunto.
A verdade é que nada que possa contribuir para o controle de tal problema deve ser negligenciado, até porque já há indícios, nomeadamente na construção civil e noutras profissões, em certas regiões, de dificuldades de contratação de pessoal a prazo mais ou menos curto.
Disse-se há pouco que a mobilização tanto das empresas públicas como de empresas privadas para a efectivação de estágios assumia importância inestimável para a eliminação da penúria de técnicos capazes de assegurar o ritmo de investimento de que o País carece.
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Contudo, o grau de utilidade da ampliação das possibilidades, de estágios é muito mais elevado.
Assim, no presente momento assiste-se, por um lado, à solicitação sistemática de técnicos com experiência e a insuficiência da oferta dá lugar ao aumento em espiral das remunerações oferecidas, sem que o problema se resolva, e, por outro, ao estiolar - seja no desemprego ou em funções não desejadas - de uma massa de recém -licenciados, vítimas de insuficiência da sua preparação.
As pequenas e médias empresas têm certamente vagas de técnicos nos seus quadros. Contudo, ou não podem competir como os níveis de remuneração em vigor para quem tem prática ou não têm qualquer interesse em utilizar os serviços de quem a não possui.
Esta situação traduz-se em maior vulnerabilidade para as pequenas e médias empresas e também, sem qualquer dúvida, para o País. E no entanto a resolução, pelo menos parcial, do problema poderá estar na intensificação dos estágios de formação on job.
Gostaria de ouvir do Governo uma palavra quanto às suas intenções, a curto e a médio prazo, nesta matéria.
E a propósito da vulnerabilidade das pequenas e médias empresas gostaria também de pôr à consideração do Governo o problema - possivelmente diminuto quando comparado com as grandes questões nacionais, mas sem qualquer dúvida esmagador para tantas pequenas e médias empresas - que é a amortização, das suas dívidas ao Estado e à Previdência.
O problema que se coloca é o da conveniência de tratamento bonificado, tanto em termos de período de amortização como, e sobretudo no que toca às taxas de juro aplicadas, da recuperação daquelas dívidas, pelo menos até certo limite, mesmo modesto.
Poderá argumentar-se que a maioria dessas empresas não tem futuro, não corresponde às necessidades reais do País, não tem condições aceitáveis de desempenho de um verdadeiro papel social. Simplesmente, a maioria poderá ser tudo isto, mas a verdade é que assegura ainda um papel vital no momento presente: proporciona emprego.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não se pede para elas o perdão das suas dívidas, pede-se compreensão devidamente controlada. E não cremos que se tratasse apenas de um acto de generosidade do Governo, considerámo-lo também um acto - pequeno embora - de sobrevivência social.
Uma última ipalavra sobre os contratos de viabilização.
Sem dúvida que é indispensável apreciar, com bases tecnicamente adequadas, a capacidade de sobrevivência economicamente válida das empresas que procuram negociar o seu contrato de viabilização.
Dessa apreciação algumas, ou muitas, poderão vir a ser tecnicamente condenadas ao desaparecimento e dificilmente se encontrarão razões que contrariem tais decisões.
Todavia, permitimo-nos lembrar que uma qualquer organização pode ser encerrada de um momento
para outro, mas leva certamente muito tempo a pôr de pé.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os reflexos deste facto, quer para o nível de emprego quer para o nível global de actividade do País, não são de desprezar, mas é óbvio que não podem ser aqui mais detidamente aprofundados. Termino, pois, manifestando ao Governo a minha total confiança no seu bom senso.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - Não há inscrições. O PPM deseja intervir?
O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra para uma intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação das regiões autónomas tem-se degradado substancialmente com os governos da Aliança Democrática.
Protestos do PSD.
Utilizada com grande relevo, quando a AD se encontrava na oposição, a situação das regiões autónomas, estas cedo foram remetidas para segundo plano quando a AD chegou ao poder. Numa primeira fase, ainda se verificava o peso dos deputados do PSD eleitos pelos Açores e pela Madeira, mas tão depressa se veio a formar uma maioria que os dispensa - como referiu Freitas do Amaral, que os interesses insulares deixaram por completo de ser acautelados nesta Assembleia.
O ano passado, aquando da discussão do OGE, foi necessário que a oposição - nomeadamente o Partido Socialista - avançasse com propostas para a cobertura dos défices e para o apoio à reconstrução nos Açores. Muito a custo, a maioria foi obrigada a aceitá-las dada a conjuntura parlamentar. Este ano, com a maioria consolidada sem os deputados insulares, o que se verifica?
Em primeiro lugar, um programa de governo que praticamente não refere as regiões autónomas. Em segundo lugar, o aumento generalizado das tarifas de carga e de passageiros para as ilhas, a incapacidade para definir uma articulação entre a -agro-pecuária continental e insular, a improvisação permanente no que diz respeito à integração das regiões autónomas na CEE e a falta de um conceito global de negociação quanto aos desenvolvimentos do acordo das Lajes.
E agora? Agora uma proposta de orçamento que corta as necessidades de financiamento dos Açores em 3,3 milhões de contos. Com efeito, o défice orçamental adoptado pela Assembleia Regional dos Açores - no essencial resultante dos investimentos previstos pelo plano regional- era de 5,4 milhões de contos. O Governo da República apenas se dispõe a financiar investimentos. - incluindo os que estão já
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considerados no plano de âmbito nacional - até ao montante de 2,1 milhões de contos. A isto se chama a solidariedade do governo da Aliança Democrática com os governos regionais!
A bem dizer, os investimentos regionais - que já haviam sido drasticamente reduzidos pelo Governo Regional ao retirar do plano o porto oceânico da Praia da Vitória e o novo aeroporto de Ponta Delgada - ficarão paralisados em 1981 por culpa do Governo Central.
Assiste-se, aliás, hoje a uma revitalização de preconceitos centralistas e a uma campanha organizada contra as regiões autónomas que visa o desgaste das experiências de regionalização que ali se processam.
Os sectores mais conservadores da nossa vida política, que se albergam na AD e, portanto, se encontram também no Governo, utilizam a política orçamental e as restrições financeiras para lançar as regiões autónomas no endividamento interno e externo e comprometer a prazo as possibilidades do seu próprio desenvolvimento. Será, então, o esvaziamento final da autonomia democrática e o regresso a formas mais clássicas de controle remoto no terreno político, económico, social e cultural. Tal como em outras circunstâncias do passado, o ataque financeiro às autonomias regionais visa objectivos institucionais que estão inscritos no programa real dos interesses conservadores.
Pretendendo uma fundamentação tecnicamente correcta para o cálculo teórico das despesas regionais, a proposta do OGE parte de pressupostos tão falsos como seja a carácter abstracto da capitação da despesa pública. Com efeito, através de tal noção perpetua-se o desenvolvimento das áreas desenvolvidas e mantém-se o atraso das áreas atrasadas, onde o esforço de investimento não deve ser igual mas sim maior. Além disso, uniformizar a situação dos Açores e da Madeira é, no mínimo, desconhecer a geografia - há que adicionar, no caso dos Açores, o factor da dispersão territorial de um arquipélago com nove ilhas, a qual implica custos adicionais derivados da necessidade de multiplicar equipamentos e reforçar particularmente o sector dos transportes e das comunicações.
As regiões autónomas não pedem nem esperam esmolas. Reclamam o direito ao desenvolvimento e a igualdade de oportunidades entre cidadãos de todas as regiões. A demagogia feita em torno dos défices regionais, no sentido de enfraquecer as reivindicações insulares, ignora que, bem ou mal, os Açores e a Madeira são as duas únicas regiões do País que têm clarificada a respectiva realidade orçamental, o que não acontece com as restantes regiões. Certamente o défice do meio milhão de portugueses que vive nas Regiões Autónomas é, em termos proporcionais, bem menor que o défice do conjunto das empresas públicas implantadas na área de Lisboa e será certamente muitíssimo inferior ao custo de sectores inteiros da Administração Pública cuja utilidade se assemelha bastante duvidosa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desenvolvimento das Regiões Autónomas ficará congelado em 1981 se a proposta do OGE não for revista. Está nas nossas mãos modificá-la. Com realismo e sem demagogia, façamos as necessárias alterações, de modo a conceder aos Açores e à Madeira as possibilidades financeiras para se libertarem do subdesenvolvimento.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Jaime Gama: Nós não entendemos como pode iniciar a sua intervenção dizendo que, desde que a AD é governo, as regiões autónomas se têm degradado. E não o entendemos porque, como é do conhecimento do Sr. Deputado, nas últimas eleições o Partido Socialista perdeu um deputado no círculo eleitoral dos Açores -de dois deputados passou para um - e isto é uma prova muito clara de que a sua afirmação não corresponde à verdade.
Aplausos do PSD e ao PPM.
Por outro lado, o Sr. Deputado vem justificar a posição do Partido Socialista, que, no caso concreto, vem a reboque da dos deputados do PSD nos Açores, que já fizeram as suas intervenções em que apresentavam uma proposta dê aditamento para uma verba maior para a reconstrução das zonas atingidas, e portanto pensamos que há que ter uma certa ponderação e não embaraçar em políticas demagógicas como o Sr. Deputado acaba de fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama para responder, se o desejar.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era para, muito brevemente, utilizar o direito de resposta.
Esta intervenção do Sr. Deputado Manuel Arruda é o exemplo típico da dificuldade em que se encontram os PSDs das regiões autónomas desde que ...
Risos do PSD.
..com licença, Srs. Deputados!
Como eu ia dizendo, desde que a Aliança Democrática constitui uma maioria que os dispensa nesta Câmara.
No fundo, a situação dos governos regionais do PSD foi extremamente favorecida com os governos socialistas. E foi-o na realidade porque, nessa altura, os PSDs regionais contavam com o coro das alianças do PSD nacional, que utilizavam os governos regionais como uma espécie de porta-aviões políticos em relação ao continente e à situação política nacional, e os governos da República facultavam aos governos regionais os meios financeiros para realizarem um conjunto de investimentos! que, desde que a Alian-
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ca Democrática se encontra no Poder, têm sido limitados e cerceados. Essa é a realidade!
Vozes do PSD: - Olhe que não!
O Orador: - Essa situação é tão drástica e tão grave que são os próprios governos regionais que agora têm, perante as populações regionais, que omitir a própria política do Governo da República e regressar das audiências em Lisboa apresentando, como grandes conquistas, declarações retóricas à imprensa onde se não avança nada em nenhuma matéria. Aliás, a capacidade contestatária que existia quando os governos centrais eram do PS encontra-se hoje completamente limitada.
Se um governo PS comparecesse aqui no Pagamento apresentando cortes orçamentais em relação aos orçamentos adoptados pelas assembleias regionais como aqueles que acabam de ser feitos pela Aliança Democrática, o PSD e o CDS protestariam e erguer-se-iam num coro de lamentações contra essa política.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Olhe que não! ...
O Orador: - Mas, como os cortes são feitos pelo PSD e pelo CDS, há que disfarçar essa situação apresentando como grandes conquistas aquilo que, na realidade, não é mais do que grandes derrotas. De resto, esta é uma das particularidades da situação política presente no que se refere à articulação entre o governo da Aliança Democrática e 95 Governos Regionais dos Açores e da Madeira.
E os Governos Regionais dos Açores e da Madeira, porque estão identificados politicamente com o modelo global de sociedade que a Aliança Democrática protagoniza, subordinam as suas reivindicações e a óptica do interesse regional a essa solidariedade política essencial e perante as populações regionais não fazem mais do que apresentar como coisas boas aquilo que, na realidade, são coisas más.
Este Orçamento, se fosse apresentado por um governo socialista causaria uma vaga de protestos por parte da Aliança Democrática, mas, naturalmente, ela considera-o o melhor Orçamento do Mundo! Pena é que os deputados regionais do PSD, quer os dos Açores quer os da Madeira, não assumam esta posição na defesa do interesse regional, procurando fazer transitar o debate para questões políticas puramente marginais e não admitindo a questão essencial.
Neste Orçamento os interesses regionais são lesados, a Aliança Democrática impede os programas de investimento adoptados pelas assembleias regionais, é responsável pelo congelamento dos investimentos políticos nos Açores e na Madeira em 1981 e esta situação não pode ser ocultada, tem de ser evidenciada.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado Manuel Arruda
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Para fazer um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Manuel Arruda (PSD): - Eu queria protestar contra as declarações do Sr. Deputado Jaime Gama e lembrar-lhe que quando o PS foi governo da República não houve cobertura do défice da Região Autónoma do Açores.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não nos podemos esquecer deste facto e aliás, o Sr. Deputado não tem moralidade para vir aqui apregoar a cobertura do défice.
Por outro lado, sempre que o PS foi governo a autonomia regional foi cerceada e foi-o não só pela dificuldade que se encontrou para a transferência de serviços periféricos, que só se verificou cem o governo da. Aliança Democrática, o que prova que este governo tem sabido ver as vantagens da autonomia, pois é com esta autonomia que nós poderemos aspirar a dar melhores condições de vida à população açoriana.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto às declarações do Sr. Deputado Manuel Arruda penso que não é do âmbito desta Assembleia perpetuar um debate de campanário ...
De qualquer forma, no tocante às questões políticas essenciais, devo dizer que, da minha parte, aguardo com a maior curiosidade a proposta de revisão constitucional da Aliança Democrática relativamente às regiões autónomas, particularmente as posições que nesse debate assumirá e segundo parceiro da Aliança Democrática, o CDS. Nessa altura nós falaremos, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: - Continuamos sem inscrições. Há pouco tinha perguntado ao PPM se não desejava intervir e agora pergunto ao PCP.
Pausa.
Como o PCP não pretende intervir agora, pergunto o mesmo ao CDS.
Pausa.
Também no CDS ninguém pretende intervir. O PSD acabou de intervir, assim como o PS.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas creio que o critério que a Mesa está a seguir está errado, pois a questão não é se se
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pretende intervir, mas que se tem de intervir, sob pena de se perder o respectivo tempo quando não houver inscrições voluntárias.
O Sr. Presidente: - Bom, isso não se tem posto assim.
O Orador: - Ontem, quando o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida estava a presidir à sessão, a ASDI não estava em condições de intervir e passou-se à frente. Portanto, não sou eu que vou colocar o problema nesses termos.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, acho que em vez de estarmos aqui a inquirir sobre quem quer intervir, uma vez que faltam apenas quinze minutos para as 13 horas, interrompíamos agora para o almoço, com o compromisso de a sessão recomeçar às 15 horas.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, lamento muito mas não estou de acordo, porque o debate foi planeado para terminar às 21 horas e por este sistema não sei quando terminará.
O acordo estabelecido era de que não havendo inscrições voluntárias seriam chamados, por ordem crescente, os partidos que tivessem tempo para intervir e assim deve ser feito e quem não intervir perde o tempo.
O Sr. Presidente: - Creio que os únicos partidos que ainda não intervieram hoje foram o PPM e a ASDI.
Pausa.
Bem, Srs. Deputados, eu não vou tomar medidas coercivas, de modo que suspendo a sessão e recomeçamos os trabalhos ...
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, V. Ex.ª está no pleno uso do seu direito e pode suspender a sessão. Simplesmente há uma ilação política que nós, Partido Social-Democrata, tiramos e que é a de que, afinal, é a oposição - que se queira da falta de diálogo democrático, da falta de debate suficientemente esclarecedor sobre o Orçamento e as grandes opções do Plano - que dá a imagem cabal de que não tem capacidade nem para discutir essas grandes opções.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os trabalhos estão suspensos até às 14 horas e 50 minutos.
Eram 12 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está reaberta a sessão.
Eram 75 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O texto que vou ler não é da minha autoria, mas da autoria do deputado António Sousa Franco, que não pôde comparecer em virtude de se encontrar doente.
É do seguinte teor:
Sr. Presidente e Srs. Deputados: É bom sinal que o Governo possa apresentar à Assembleia uma proposta de lei do plano a médio prazo, enquadrando a proposta de lei do plano anual e a proposta de lei do Orçamento. A estabilidade governativa, mesmo assente numa série de equívocos, é em si positiva. A clareza também o é. Por isso será também um bom sinal que as opções do Governo sejam distintas das que poderiam recolher o voto da zona da oposição em que nos situamos. É o que sucede com os documentos que tão apressadamente temos de discutir como apressadamente tivemos de apreciar.
É evidente que, no tempo de que dispomos, não é possível fazer uma discussão aprofundada no plano político nem no plano técnico. Não nos consola que estas propostas o não mereçam, dadas a sua fraqueza técnica e a enorme vacuidade que as caracteriza sob o aspecto político. Como dizia o meu companheiro Magalhães Mota a propósito das velhas leis de meios do Estado Novo, também nesta lei de grandes opções do plano votamos palavras. Votamos palavras e não opções quantificadas. Votamos palavras e não políticas definidas.
O Governo e a maioria promulgaram em poucos dias a discussão das grandes opções do plano a médio prazo, que nem por serem «grandes opções» poderiam ser bem concretas, precisas e claras nos objectivos, princípios e estratégias, o que não são - amalgam-nas com a lei do plano e a lei do Orçamento. O Governo cometeu com isso uma inconstitucionalidade, e evidente. Mas do prisma substancial é para nós bem mais grave o que se verifica: e isso significa que com tal política se tentou evitar a discussão aprofundada da natureza substancial e verdadeira das propostas apresentadas a esta Câmara.
As principais conclusões políticas que tiramos e delas só podemos concluir por um voto claro de que a elas se opõe como alternativa.
Ao apreciar este documento importa perguntar se se trata das grandes opções de um plano democrático ou de um plano tecnocrático? A resposta infelizmente tem de ser pelo segundo termo da alternativa. Estas grandes opções são um documento de gabinete, que não foi objecto de
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ampla participação dos, representantes dos mais diversos interesses nacionais. O processo de preparação destas grandes opções do plano foi um processo totalmente centralizado e burocratizado, sem participação das populações, ao contrário dos princípios de elaboração de um plano democrático mais próximo dos velhos planos de fomento cujo rasto omnipresente não é difícil discernir na pobreza deste documento.
Ora para os sociais-democratas independentes o plano é outra coisa. O Plano «constituiria o instrumento fundamental de acção da política económica nacional, nele se definindo, por via amplamente participativa, as grandes finalidades e meios daquela política... O Plano não pode ser elaborado unicamente por um órgão central que o imponha depois à colectividade de maneira rígida e burocrática. Deve antes ser - em conformidade com uma verdadeira concepção democrática - amplamente participativo e de elaboração descentralizada, com audiência das instâncias regionais, das várias categorias sócio-profissionais, e dos consumidores».
Ora nem estas grandes opções - nem o Plano propriamente dito que delas decorrerá - têm nada a ver com este quadro dos requisitos e com um plano democrático, de que um social-democrata tem de se prevalecer. Bastaria isto para serem rejeitadas estas grandes opções, documento de elaboração centralizada, burocrática e tecnocrática. Nem diga o Governo que lhe faltou tempo, pois quinze meses são bastantes para pôr em execução. mecanismos mais descentralizados e participativos de elaboração do Plano. Nem diga que a participação pode ser substituída pela mera consulta na cúpula do Conselho Nacional do Plano. Se o Governo assim quis proceder lá terá as suas razões. Mas bastaria o modo dirigista e não participativo como nasceu para rejeitarmos este instrumento de planeamento tecnocrático.
Com tal forma, que conteúdo encontramos na proposta das grandes opções?
Após todas as transformações verificadas continuam sem dúvida os sociais-democratas a considerar que «o objectivo do Plano é a criação de condições materiais que permitam a cada cidadão dispor de iguais oportunidades, no plano material e cultural, para a sua livre realização, o que requer o aumento do rendimento nacional. Nestes termos, o Plano deve assegurar o crescimento da produção nacional e a criação de novos empregos, maior igualdade pessoal e regional no acesso às profissões, iguais oportunidades no acesso à instrução e à cultura e segurança no trabalho, na saúde e na velhice».
Em conjunto com este enunciado nítido, o leque de iniciativas pretende mencionar um pouco cada uma das necessidades nacionais, resultando indefinido e localiza entre os objectivos, que por vezes confunde com medidas, um conjunto tão amplo de todas as possibilidades de escolha que não corresponde a uma verdadeira política clara e coerente. Por outras palavras, não estamos perante uma política económica clara e definida: tenta escolher todos os objectivos, criando um modelo de política económica caracterizado por tudo propor mas nada quantificar com coerência. Isso, reservou-o o Governo para si. Mais uma razão para lhe não darmos, como oposição, um voto de confiança.
Mas naquilo em que tem opções a proposta é contrária às escolhas sociais-democratas para os próximos quatro anos. O próprio Conselho Nacional do Plano acentuou que a necessidade de «uma maior taxa de crescimento da produção e do emprego e a melhoria da distribuição do rendimento» deveriam ser objectivos a considerar.
Embora as grandes opções não quantifiquem estas variáveis, elas apresentam-se pelas expressões utilizadas e hierarquizadas segundo opções conservadoras, designadamente pela prioridade dada a certos mitos da política económica conservadora - como o do estrito equilíbrio orçamental - sobre uma estratégia de expansão ao serviço do homem; define-se a prioridade de um objectivo claro de crescimento que a opção europeia, tão propagandeada mas tão pouco pensada, torna imperativo, mas subalternizam-se as reformas qualitativas (será que a qualidade de vida definhou mal se transformou num Ministério?), a repartição concreta dos frutos do desenvolvimento e o emprego, etc., etc.
Enfim, as grandes opções do Plano deviam representar neste momento as linhas orientadoras da evolução da nossa sociedade até meados da década de 80. Onde enquadram elas, porém, o Plano Energético Nacional? Que têm a ver com a necessária reconversão da nossa agricultura do tempo do latifúndio e do tempo da revolução para uma agricultura justa e de produtividade tipo europeu? Onde estão a nova política industrial e a nova política de qualidade de vida? Onde está uma política cultural? Onde está uma política de habitação e de urbanismo?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes documentos merecem-nos, como sociais-democratas independentes, clara rejeição. Continua a gestão da crise, não se inicia a construção, conjuntamente com todos os portugueses válidos, de um novo projecto de sociedade. Põe-se a claro a política económica conservadora deste governo que aos trabalhadores e ao povo em geral vai custar bem cara, sem perspectivas de desenvolvimento e de justiça social.
Por isso, como sociais-democratas temos de votar contra.
Na esperança de que, de tantas experiências falhadas, o nosso povo saiba tirar, com a sua sabedoria, a intenção e o projecto de um novo Portugal, de um Portugal em que todos nos empenhamos em liberdade e solidariedade.
Aplausos da ASDI, do PS e da UCD.
O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o. Sr. Deputado Azevedo Soares.
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda obriga-me a tecer alguns comentários. Todos
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ouvimos a mensagem dirigida a esta Assembleia pelo Sr. Presidente da ASDI. Registamos essa mensagem, mas ela obriga-nos a fazer alguns comentários.
Em primeiro lugar - e por isso me limito a fazer comentários e não a pedir esclarecimentos -, ela não foi mais do que um eco distorcido da intervenção do Sr. Deputado João Cravinho.
Que nos trouxe de novo esta intervenção? Novos queixumes, novas críticas ao Plano em termos puramente genéricos e não especificados, chegando ao ponto de criticar as grandes opções do Plano em áreas que ainda ontem aqui foram exaustivamente abordadas pelo Governo, sem que da parte da oposição tenha havido a mais pequena crítica, pergunta ou dúvida quanto a esse programa - refiro-me, designadamente, à habitação.
Vozes do PCP: - O debate ainda não acabou, Sr. Deputado!
O Orador: - Depois de ontem termos ouvido aqui uma brilhante intervenção do Sr. Ministro da Indústria e Energia, que mereceu, ela também, comentários favoráveis da oposição, ...
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): -Da imprensa!
O Orador: - ...depois de termos ouvido uma síntese do Sr. Ministro das Finanças que colocou o problema na sua sede própria...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sede própria, Sr, Deputado!
.Risos do PCP.
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito, se a SEDES o incomoda tanto, o problema é seu.
Mas, como ia dizendo, depois destas intervenções cios Srs. Ministros, vem agora a ASDI perguntar onde está a política de habitação e tentar dizer que não há planeamento, quando ainda ontem o Sr. Ministro das Finanças aqui mesmo referiu que, por exemplo, o planeamento do investimento das empresas públicas foi correctamente programado para os próximos quatro anos com um investimento de 480 milhões de contos e que não faria sentido afectar, logo no primeiro ano, 44% desse investimento. Isto é pura demagogia, é brandir armas que não tem qualquer seriedade política e que não são próprias desta Câmara.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, eram estes comentários que desejava fazer acerca da intervenção proferida pelo Sr. Deputado Jorge Miranda.
Mas é evidente que não poderei deixar de registar também que as próprias bancadas da oposição não têm primado pelo seu interesse neste debate, antes se têm escusado em meros pretextos, como seja a ausência de participação. E perguntarei às bancadas da oposição, que se encontram tão vazias se antes do ataque que fazem neste momento à ausência de participação não terá havido o ataque à não apresentação do Plano.
Relativamente a um governo que pela primeira vez apresenta e traz à discussão a esta Assembleia as grandes opções do Plano a médio prazo não é pura demagogia vir aqui referir menor participação na sua elaboração? Isto é, quando um governo traz pela primeira vez à Assembleia as grandes opções do Plano, não. será antes de louvar essa atitude e esse governo, em vez de se procurar, capciosamente, num ponto ou noutro, encontrar dificuldades ou deficiências?
Os Srs. Deputados da oposição, à falta de capacidade e de vontade política para atacarem as grandes opções do Plano, agarram-se apenas ao argumento da ausência de participação, procurando, por formas por vezes insidiosas, divisões onde elas não existem. Esta não é, Srs. Deputados, forma de discutir seriamente as grandes opções do Plano.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Há mais um Sr. Deputado que deseja pedir esclarecimentos. O Sr. Deputado Jorge Miranda prefere responder imediatamente ao Sr. Deputado Azevedo Soares ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Luis Coimbra.
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Jorge Miranda: Fiquei, digamos, um pouco confuso - talvez seja do adiantado deste debate - sobre os seus conceitos de planeamento.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Já estava!
O Orador: - De facto, penso que se trata de um mandato constitucional e, partindo do princípio de que existe uma maioria nesta Câmara, o Governo é estável e coerente, pelo que me deixou confuso a sua dúvida de ele poder ou não apresentar um plano. E nesse sentido ponho em dúvida os seus conceitos sobre o plano tecnocrático e plano democrático. Pergunto, pois, ao Sr. Deputado Jorge Miranda se entende que um plano democrático consistiria em apresentar a esta Assembleia o somatório dos interesses sectoriais, que dariam, no seu conjunto, um plano, ou se isso não seria antes regressarmos aos planos corporativos.
Por outro lado, um exemplo significativo de que este plano não é, convencionalmente, entendido como democrático no mau sentido, mas no bom sentido, é o facto de ele assentar numa maioria democrática e ter sido elaborado de uma forma razoavelmente participada, dado o curto espaço de tempo que houve para a sua realização. É que, se o Governo apresentasse o plano a médio prazo daqui a seis meses, como muito bem disse o Sr. Deputado Azevedo Soares, aí estaria a oposição a clamar que o plano estava atrasado seis meses e que ao fim de dois anos já devia estar elaborado.
Perguntar-lhe-ia se considera um plano tecnocrático cortarem-se ou estabelecerem-se novos critérios para os investimentos do sector empresarial do Es-
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lado, com uma clara definição de prioridades, inclusivamente em política industrial e em política energética, ontem apontadas pelo Sr. Ministro da Indústria. Cestaria, portanto, Sr. Deputado, que esclarecesse esta Câmara sobre o seu conceito de plano democrático e de plano tecnocrático.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda para responder, se assim o entender.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conforme disse no início, não se tratou de um texto me, mas de um outro deputado que, por motivos de doença, não pôde comparecer. Não se tratou, obviamente, de uma mensagem, mas de uma intervenção que tem o direito de ser respeitada como qualquer outra intervenção.
Gostaria apenas de frisar dois pontos: em primeiro lugar, os senhores são a maioria e nós somos oposição, os senhores assumem-se como maioria e quem se situa na oposição assume-se como oposição. As perspectivas são diferentes e, naturalmente, também elas deverão ser respeitadas. O jogo democrático assenta no respeito de maioria e de oposição, de maioria que é o Governo e de oposição que é minoria. E o povo. julgará nas próximas eleições.
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?.
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Peço imensa desculpa de o interromper, mas o problema é este: a questão que levantei foi a de se perguntar aqui onde está a política de habitação depois de o Sr. Ministro da Habitação ter feito uma longa exposição, não comenta sequer pela oposição.
Vozes do PCP: - Calma, Sr. Deputado!
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - E depois de o Srs. Ministros das Finanças e da Indústria terem feito o mesmo, pergunto se tem algum sentido fazer hoje a intervenção que deveria ter sido proferida pelo Sr. Deputado Sousa Franco. E o que quer dizer com isso, Sr. Deputado?
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Ele não tem estado cá, como é que pode saber?
O Orador: - Sr. Deputado Azevedo Soares, naturalmente, quando, se faz a pergunta «onde está a política?», queremos referir-nos a uma política que corresponda a determinados objectivos, porque política existe mesmo quando não se pretende fazer efectivamente política, e importante, mesmo quando não há medidas ou quando se vêm apenas com palavras, podará haver política. A política, afinal, existe sempre.
Quanto à concepção de planeamento democrático ou tecnocrático, naturalmente não se trata de discutir a competência e a legitimidade do Governo, como Governo democraticamente investido que é, para apresentar uma proposta de lei do Plano, mas de entender o planeamento democrático na riqueza do seu conteúdo constitucional, abrangendo não apenas a capacidade de iniciativa de um governo democrático para apresentar perante uma assembleia democraticamente eleita as grandes opções do plano, mas também a participação, a descentralização e a regionalização.
Em relação ao corporativismo, tenho a dizer-lhe que essa palavra não me mete medo, na medida em que signifique reconhecimento da pluralidade de interesses sectoriais e participação desses interesses na formação de unia vontade geral. Corporativismo neste sentido não me mete medo e é exactamente esse o conceito que está na base do Conselho Nacional do Plano.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.
O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Ouvi com agrado as palavras do Sr. Deputado Jorge Miranda, mas tenho uma concepção diferente de planeamento democrático. Penso que planeamento democrático é exactamente a existência de um mínimo de balizas, mas que sejam viáveis, não havendo um optimismo, quanto a mim, exagerado - e esse si tecnocrático, mecanicista e seguidista, a esta de cópia de extrapolações do que acontece noutros países mais evoluídos do que o nosso e da OCDE - como acontece em grande pane do parecer do Conselho Nacional do Plano.
De facto, em virtude de as condicionantes do nosso modelo de desenvolvimento e de o nosso plano a médio prazo estarem fundamentalmente dependentes da situação e da evolução internacional, nomeadamente a situação do problema da energia e de outros problemas que o Sr. Deputado Jorge Miranda deve com certeza conhecer tão bem como eu, penso que um planeamento democrático, ao contrário de um planeamento tecnocrático, é aquele que apresenta margens possíveis de poder ser corrigido, a par e passo, com o andar do tempo e de poder estabelecer metas diferentes, inclusivamente rias suas várias fases intercalares. Isso é que é, para mim, um planeamento democrático e será uma execução democrática do plano, e este plano a médio prazo abre claramente essas hipóteses.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, antes de usar da palavra, poderia informar-me de quanto tempo disponho?
O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. O seu partido dispõe de 5 minutos e 30 segundos. Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção na sequência dos comentários agora feitos pelos Srs. Deputados Azevedo Soares e Luís Coimbra.
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Em primeiro lugar, creio que a intervenção que foi feita pela minha bancada e que é da autoria do Sr. Deputado Sousa Franco é rigorosamente uma intervenção - e uma intervenção que é apresentada no contexto deste debate. Não se trata de uma mensagem dirigida à Assembleia, mas, pelo contrário, de uma intervenção, sujeita, como foi, ao debate e à controvérsia e que se destaca, pela afirmativa, de declarações que outros dirigentes partidários fazem em entrevistas a jornais estrangeiros e em que, aí sim, sem controvérsia nem possibilidade de debate, criticam as instituições democráticas portuguesas em termos que merecem o repúdio dos democratas em geral.
Vozes da ASDI, do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: -.Em segundo Lugar, gostaria de salientar que o desinteresse por este debate é evidente, e é-o não por deficiência das oposições, mas por deficiência do próprio debate é pelo modo como ele se orientou desde o início. E não nos venham agora dizer que não interviemos ou que não perguntámos determinadas coisas em relação a certas afirmações. Certamente o Sr. Deputado Azevedo Soares espera silenciar corripletamente! as oposições para então podei concluir que elas estiveram caladas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não é esse o nosso conceito de democracia, pelo que gostaríamos que este debate tivesse tido reais condições de efectivação e de participação e nessa altura com certeza que ele poderia ter outro interesse e outra vivacidade.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, um plano é democrático não apenas quando permite a sua correcção não apenas quando a sua execução é controlada ou fiscalizada, mas quando na sua própria elaboração e formação participam todos os sectores da vida social.
O Plano é também, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma actividade da sociedade civil de que tanto se fala. São as regiões que têm de ter aí a sua intervenção - e a Constituição consagra-o. São os indivíduos na sua vida profissional que também têm de ser ouvidos e ter também uma intervenção. É todo esse contributo, que é o contributo de uma sociedade, que faz com que o plano seja democrático. O plano nunca será inteiramente democrático enquanto for elaborado no silêncio dos gabinetes e apresentado de supetão na Assembleia da República.
O Sr. César Oliveira (UEDS):-Muito bem!
O Orador: - Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria salientar, em relação a este debate, em que muita coisa apesar de tudo ficou dita, que nós gostaríamos que em casos futuros -e ainda bem que essa situação foi aqui invocada- pudéssemos ter, por exemplo, da parte de todos os membros do Governo, a abertura e a frontalidade com que ontem o Sr. Ministro da Indústria abordou os problemas do seu sector. Creio que ai está um bom exemplo que todos ganharíamos em poder seguir. Penso, portanto, que só é preciso termos condições para que de facto estes debates possam ter um real interesse, interesse que de outra maneira não podem ter. E, como todos os deputados não ignoram, neste momento ainda não dispomos de todos os elementos complementares para o estudo do Plano.
Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para fazer um curto protesto, dado que o Sr. Deputado Magalhães Mota me atribuiu a intenção de silenciar as oposições.
Eu respeito as oposições, Sr. Deputado Magalhães Mota, mas sei distinguir a dimensão das oposições e aqueles a quem foi oferecido um lugar em pé na última carruagem.
Uma voz do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, há pouco não quis entrar em considerações sobre a intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda, intervenção, aliás, feita por outrem. Apenas deixei uma leve crítica a esse facto - e julgo que isso faz parte da nossa actividade -, porque não me parece que seja prática desta Assembleia os deputados virem aqui ler intervenções de outrem. Mas, se é essa a concepção que o Sr. Deputado Magalhães Mota tem da Assembleia da República, ela não é a minha, porque quando inter-venho faço-o por minha responsabilidade, por minhas palavras e não apenas como uma boca da cabeça de outros. V. Ex.ª poderá estar nesse plano, roas eu não estou, Sr. Deputado.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, deseja responder imediatamente ou aguarda as perguntas que o Sr. Deputado Luis Coimbra lhe deseja fazer.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Aguardarei, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Luis Coimbra.
O Sr. Luis Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota já nos esclareceu talvez um pouco mais sobre o pensamento da ASDI em termos de planeamento.
Se de facto o Sr. Deputado Magalhães Mota veio reconhecer que há possibilidade de controlo de gestão democrática deste plano a médio prazo e portanto abre perspectivas democráticas, não só em termos de planeamento como em termos políticos, à gestão e ao controlo de gestão deste plano, penso que «pregou no deserto» quanto à sua elaboração. O Sr. Deputado Magalhães Mota tem toda a razão em falar
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numa participação descentralizada e regional na elaboração democrática de um plano. Agora eu pergunto como é possível fazer-se um plano democraticamente elaborado, ou seja de forma descentralizada, em existência de um pressuposto constítucional, que por acaso já foi objecto de um projecto de lei do Partido Socialista, relativo à definição das regiões Plano e que trata de toda a mecânica da produção do planeamento democrático.
Na realidade o Sr. Magalhães Mota nunca apresentou nesta Assembleia, que eu saiba, desde 1975, nenhum projecto nesse sentido e neste momento não há meios legais para se fazer um planeamento democrático. A não ser que o Sr. Deputado Magalhães Mota pretenda dizer que « Plano não devia ser do Governo, mas sim dos gabinetes de apoio técnico às autarquias ou dos diversos departamentos que existem hoje a nível da Região Centro, do Gabinete de Planeamento do Algarve ou do Gabinete da Região Norte, no fundo todos eles dependentes do Ministério da Administração .Interna, em especial os GATs.
Ora, como forma de criação do Piano - e, repito, sem a existência das regiões Plano -, julgo que mais longe o Governo não poderia ir neste momento, por vazio constítucional.
Vozes do PPM e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para responder, se assim o entender. Dispõe de 2 minutos e 30 segundos.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: Responderia, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado Luís Coimbra e faço-o com muito gosto.
Remetia-o directamente para o artigo 94.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República, em que se diz o seguinte:
2 - A elaboração do Plano é coordenada por um Conselho Nacional do Plano e nela devem participar as populações, através das autarquias e comunidades locais, as organizações das classes trabalhadoras e entidades representativas de actividades económicas.
3 - O implemento do Plano deve ser descentralizado, regional e sectorialmente, sem prejuízo da coordenação central, que compete, em última instância, ao Governo.
Todos sabemos que as regiões não estão instituídas, mas poderemos perguntar-nos se não poderia ter sido feito algum esforço ao longo destes quinze meses para que a implementação do Plano fosse descentralizada e para que a sua elaboração fosse feita com a participação das populações, através das autarquias, das comunidades locais, das organizações das classes trabalhadoras, etc.
Quanto ao Sr. Deputado Azevedo Soares, responder-lhe-ei muito simplesmente o seguinte: desde que a carruagem seja democrática, nós nau temos nenhuma dúvida em nela figurar, mesmo que seja no último lugar e em pé. O que não andamos nem precisamos de andar nunca é às boleias da democracia.
Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Cardoso.
O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros de Governo, Srs. Deputados: Não temos qualquer dúvida em aderir plenamente aos princípios fundamentais do plano a médio prazo e às respectivas grandes opções, em que já se insere o Plano para 1981, por corresponderem, de facto, às orientações mais convenientes para a construção do projecte de sociedade junta e de economia livre que a Aliança Democrática, propôs ao povo português e que este maioritariamente aprovou em 1979 e ratificou, ainda mais expressivamente, em 1980.
A análise, mesmo superficial, dos princípios fundamentais de ordem política, económica e social em que assuma o projecto, bem como dos grandes fins a prosseguir no período 1981-184 e do comportamento tendencialmente recomendável das principais variáveis, macro-económicos, conduz necessariamente à conclusão de que sem um sector agrário forte e progressivo não será possível a indispensável expansão económica global do País e o progresso social de todo o povo português.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Acresce ainda que, tendo em conta que várias das políticas preconizadas visam a atenuação das disparidades existentes no rendimento e na riqueza, protegendo, em especial os grupos economicamente mais débeis, o fortalecimento do sector agrário justificar-se-á também sob esta óptica, porquanto a grande maioria dos agricultores portugueses, sejam proprietários ou rendeiros, situa-se ainda nestes grupos mais desfavorecidos.
Parece-nos correcta e viável a hipótese base de evolução proposta para o quadriénio em causa, a qual corresponde a um crescimento do produto de 5 % ao ano; uma expansão do investimento à taxa média de 8 %; uma gradual e sucessiva desacelaração da inflação, e um decréscimo da taxa de desemprego para cerca de 6% da população activa em 1984. Pressupõe-se, para o alcance dessas metas, que o sector agrícola atinja em 1984 valores reais de produção 18 % superioras aos actuais, ou seja, uma taxa média ás crescimento anual de 4,5 %.
Salvaguardando a probabilidade de ocorrência de condições climatérias calamitosas como as do corrente ano agrícola, consideramos dentro das nossas possibilidades conseguir um progresso daquela ordem, atendendo aos baixos níveis actuais de algumas produções e à relativa facilidade de introdução de tecnologias e correcções inteiramente disponíveis, embora o tenhamos de reputar como muito difícil. Para o alcançar torna-se porém absolutamente indispensável fazer incidir na agricultura um esforço muito especial e de grande torno, que vai desde a motivação e participação interessada dos agricultores, desde a urgente racionalização dos serviços do MAP e a correcta administração dos seus quantiosos recursos humanos, até ao conjunto das grandes acções, quase todas enunciadas no capítulo sectorial da agricultura inserido na orientações gerais de política económica e social, das quais destacaremos as referente aos mercados e preces, às infra-estruturas físicas para racionalização dos circuitos comerciais, ao associativismo,
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à extensão rural e ao crédito agrícola. Mas nós queremos que o Estado apoie, ajude, facilite, promova a actividade empresarial agrícola mas nunca que a ela se substitua, porque acreditamos na virtualidade e nas comprovadas possibilidades da propriedade e da iniciativa privadas, em especial ,na agricultura, onde têm clamorosamente falhado todas as tentativas colectivistas.
À primeira vista parecerá que o OGE para 1981 contraria desde logo os propósitos de tal esforço. É que, enquanto as despesas globais previstas para 1981 aumentarão de 20,5% em relação às de 1980, o sector da agricultura, silvicultura e pescas será dotado em 1981 com um aumento de apenas 11,8%, considerando a classificação orgânica, ou de 14,9%, considerando a classificação funcional, inferiores, portanto, à taxa de aumento global. Todavia, não julgo correcta essa ilação desde que se definam claramente as prioridades de acção no sector e aí se concentrem, ordenada e coordenadamente, todos os meios materiais e humanos, tendo a coragem de adiar, suspender ou até suprimir tudo o que é menor, secundário, supérfluo ou inconveniente, como aliás exige a gestão na carência a que se referiu o Sr. Ministro da Agricultura e Pescas.
A intensificação e a melhoria dos serviços regionais do MAP, que foram concebidos para uma maior aproximação ao agricultor, terão de ser palavra de ordem e preocupação de todo o momento. Em particular, a completação da montagem e a activação de um esquema adequado de extensão rural, que seja prático, flexível, bem concebido, actuando de forma coordenada e integrada, constituirá, sem dúvida, um dos principais motores das transformações sociais e económicas desejáveis para o meio rural e terá papel primordial no desenvolvimento e no crescimento económico e social que se ambicionam. A preocupante falta de contacto dos serviços com os agricultores tem de acabar sem demora, sob pena de tudo falhar e de comprometei gravemente o nosso futuro.
Outra prioritária concentração de esforços terá de fazer-se no domínio do associativismo agrícola em todas, as suas formas, privilegiando a promoção e consolidação de um cooperativismo consciente e livre no que toca à produção, à transformação, à conservação e comercialização dos produtos e ao crédito. Todos sabemos que a agricultura portuguesa, complexa e atrofiada como está, carece para a sua racionalização, modernização, reconversão ou transformação e para a promoção económica e social dos agricultores de forte participação do cooperativismo. Este será, inegavelmente, uma importante via para a maior parte dos nossos agricultores poderem encontrar soluções para muitos dos seus problemas. Felizmente que os governos da AD estão a ser os que verdadeiramente fomentam e protegem o cooperativismo, embora outros o tenham, indevidamente, apregoado muito mais.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Impõe-se, contudo, que não demore mais a aplicação -das medidas excepcionais englobadas num programa prioritário de apoio e fomento das cooperativas agrícolas, em ordem a permitir a mobilização dos fundos e das fontes de financiamento, que os estudos já realizados apontam como efectivamente justificados, para acudir à situação económica e financeira difícil em que várias unidades cooperativas se encontram, em particular um grande número de estações fruteiras.
No que toca a preços e mercados, concordamos com a orientação preconizada para a política de preços, de predominância no mercado dos preços reais, mas terá de evitar-se a todo o custo que a percentagem deixada na mão dos intermediários, sejam parasitas ou não, atinja valores inadmissíveis, lucros claramente especulativos, que redundam quase sempre em grave prejuízo para os produtores agrícolas, tornando diminuta ou nula a equidade na distribuição dos rendimentos, quer do trabalho, quer do capital. É óbvia a necessidade de eliminar progressivamente os monopólios de importação e comercialização de produtos detidos pelo Estado. Mas é preciso, até à luz da CEE, que se proceda à instalação de um sistema de intervenção no mercado dos produtos agrícolas que, garantindo o funcionamento normal da concorrência, permita o escoamento de excedentes sem deixar aviltar os preços e assegure o abastecimento público. Aliás, haverá que, gradualmente, ir ajustando o sistema de preços nacional à política de preços, da CEE, por forma a promover o aumento da produção de bens em condições de competitividade a nível europeu, que organizar os mercados agrícolas, orientando-os na perspectiva da política agrícola comum, e que montar rapidamente o Sistema de Informação de Mercados Agrícolas (SIMA).
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao crédito agrícola, é sobejamente conhecido que ele constitui actualmente, sem dúvida, a mais poderosa alavanca do fomento agrário nacional e, consequentemente, tem enorme influência no desenvolvimento económico-social global do País e na obtenção de maior justiça social. Ora acontece que esse crédito, apesar dos muitos esforços desenvolvidos recentemente, não tem um mínimo de eficácia, continua demasiado complexo e exigente nada convidativo para os agricultores. Felizmente que o VI Governo Constitucional, tendo em atenção a proximidade dos agricultores às suas caixas de crédito agrícola mútuo e os contactos estreitos destas cooperativas com a lavoura, decidiu chamá-los à participação activa, em parte inteira, no novo sistema de crédito à agricultura, como aliás elas há muito reclamavam. E o VII Governo, para além de proporcionar a instalação imediata de uma fase de regime provisório e transitório, regulamentado através de circulares do Banco de Portugal e do IFADAP, e de ter já aprovado um importante decreto-lei que antecipa a revisão do regime em vigor quanto à determinação do crédito social das caixas, prepara-se para proceder à reforma global do sistema do crédito agrícola mútuo, à atribuição, efectiva às caixas do estatuto das instituições especiais de crédito e à submissão da sua actividade creditícia às regras do sistema de financiamento é agricultura, passando elas a participar integralmente no SIFAP.
Vozes do CDS: - Muito-bem!
O Orador: - Continuamos seguros de que será o crédito agrícola mútuo, com o prometido e desejado
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apoio do Ministério dás Finanças e do Plano, do Ministério da Agricultura e Pescas e do Banco de Portugal, que irá, em plena concorrência com os chamados mas até agora desconhecidos guichets verdes» da banca nacionalizada, proporcionar finalmente à actividade agrícola a distribuição atempada dos valores disponíveis para crédito a curto, médio e longo prazo, de modo a aumentar a produção agrária e a proporcionar um maior bem-estar aos agricultores e seus familiares. Aliás, se não se eliminarem rapidamente os estrangulamentos do crédito agrícola ficará gravemente comprometida a realização das acções contempladas com auxílios financeiros internacionais, como sejam as respeitantes ao Plano do Crédito Agrícola do Alentejo, ao Plano de Florestação, aos Projectos de Desenvolvimento Rural Integrado, aos Projectos Hidroagrícolas, ao Programa de Calagem, Fertilização e Pastagens e às denominadas Acções Comuns de Pré-Adesão à CEE, em que tantas esperanças se depositam.
Apraz-nos registar a decisão do Governo de conseguir a estabilização económica e social na Zona de Intervenção da Reforma Agrária, por forma a relançar e impulsionar o investimento. Sem prejuízo da necessidade de introduzir alterações à lei de bases gerais da Reforma Agrária, nomeadamente no que respeita aos critérios de pontuação, aos indivisos e à retroactividade da lei, e também à Lei do Arrendamento Rural, segundo critérios que conduzem a contratos equitativos e adaptados às condições específicas de cada região, tal como a Aliança Democrática prometeu no seu Programa Eleitoral de Governo,...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - ... e de orientar a distribuição das terras expropriadas de uma maneira racional e justa, privilegiando a constituição de explorações familiares modernas, é altura de inflectir as preocupações dominantes para os problemas da subutilização da terra e para a obtenção, sem atingir o direito de propriedade, de um adequado redimensionamento das explorações nas regiões minifundiárias, mediante fortes incentivos à integração cooperativa horizontal de estabelecimentos agrícolas e a outros, sistemas de cooperação, ou pelo recurso a operações de emparcelamento de prédios e de explorações ou outras adequadas. A Reforma Agrária consiste em «alterações na estrutura agrária capazes de conduzir a maior justiça, isto é, a menor desigualdade na fórmula de repartição do rendimento social agrícola entre os participantes na produção», pelo que se torna óbvio que são mais prementes e complexos os problemas do minifúndio do que os da Zona de Intervenção, embora menos passivos de especulação política, até porque dessas regiões está dependente uma muito maior quota-parte do produto agrícola bruto.
Aplausos, do CDS, do PSD e do PPM,
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe interrompê-lo.
As pessoas que se encontram na galeria e que pretendem ler o jornal é conveniente que o leiam lá fora ou que o arrecadem, porque não é aqui o lugar próprio para ler o jornal.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado.
O Orador: - Por último, e porque não me resta mais tempo, gostaria de chamar a atenção de todos os responsáveis para um facto particularmente relevante. Atendendo a que a estratégia do desenvolvimento a médio prazo deverá ter em conta o efeito da subida dos preços do petróleo e que a dependência do sector da agricultura e pescas, relativamente ao petróleo, se situa em cerca de 98 %, torna-se essencial estudar, planear e começar a empreender profundas alterações estruturais e tecnológicas com vista à redução da dependência energética, tanto mais imperiosas quão grave é a escassez de aproveitamentos energéticos de origem nacional.
Sr. Presidente, Srs. Membros, do Governo, Srs. Deputados: Este Orçamento e estes planos inserem-se Paramente no espírito de mudança e no processo de construção da sociedade que a Aliança Democrática prometeu erguer e levar por diante. Estamos certos de que este governo, tal como o seu antecessor o fez, continuará a trabalhar para construir um Portugal diferente, baseando a sua acção na liberdade e na solidariedade nacional, na revalorização da sociedade civil e na construção do Estado democrático.
Aplausos do CDS. do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Transportes e Comunicações.
O Sr. Ministro dos Transportes e Comunicações (Viana Baptista): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: O debate das propostas de lei do Plano e do Orçamento, nas suas dimensões anual e de médio prazo, requer a explicitação das grandes linhas que determinam a forma como o Governo se propõe exercer a garantia da satisfação do interesse público e os critérios que usará para a atribuição do esforço financeiro do Estado.
Nas orientações gerais da política económica e social, os objectivos da política de transportes e comunicações são enunciados sinteticamente em termos de «aproximação das ilhas ao continente, das regiões entre si e do País à Europa», o que significa, efectivamente, garantir a acessibilidade indispensável às necessidades sociais das populações e reduzir os condicionamentos ao progresso económico resultantes do isolamento de algumas regiões.
Além disso, o crescimento desordenado das zonas metropolitanas tem vindo a criar uma procura crescente dos transportes, sem que tenha até agora sido possível corrigir tal tendência e afigurando-se difícil responder com uma oferta de capacidade adequada. Por outro lado, é inaceitável que a implantação de indústrias criadoras de novos postos de trabalho fora das zonas de alta concentração encontre como factores condicionantes a ausência total, ou a insuficiência grave, das vias de acesso ou de escoamento dos produtos, bem como a necessidade de uma espera crescente nas instalações de comunicações essenciais ao exercício das actividades comerciais.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador. - A natureza destas funções requer investimentos de grande envergadura, um planea-
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mento integrado e um controlo de funcionamento eficiente. Por isso, dificilmente podem ser satisfeitas fora do Estado, o qual terá necessariamente que exercer a função de garante através da Administração Pública; porém, e para além disso, na actual conjuntura económica e política de Portugal a função de empresário está também cometida essencialmente ao Estado, através do sector público empresarial. É importante explicitar desde já que consideramos esta função de Estado-gerente apenas em termos supletivos.
Frequentemente aprecia-se este sector como um grande agente de emprego, de investimento e de consumidor de recursos financeiros, cujas perturbações ou deficiente funcionamento, repercutidos na vida diária das populações, se imputa sistematicamente à responsabilidade do Governo.
A acção fundamental do Governo, neste tal como noutros domínios, deverá ser, antes de mais, normativa e fiscalizadora e, em seguida, a de optimizar o esforço financeiro do Estado para apoiar a satisfação das reais necessidades dos cidadãos. Para tanto impõe-se uma planificação de médio prazo em que seja possível compatibilizar um conjunto de medidas de
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... e esqueceu-se deliberadamente a responsabilidade que incumbe a quem decide ser .empresário de actividades essenciais a nível nacional Deixou-se instalar a; falsa noção de que um serviço público de interesse social deve tender para ser gratuito.
Foi assim que a Aliança Democrática veio encontrar, um conjunto de empresas públicas descapitalizadas, com infra-estruturas e equipamentos degradados, consumindo o capital no dia-a-dia em pagamento de salários e na cobertura de encargos financeiros de empréstimos de curto prazo. Reportando-se apenas a 1978 (porque dos anos de 1975 a 1977 nem vale a pena falar...) citarei que o total das dotações de capital , do Orçamento Geral do Estado para cobrir operações relacionadas com saneamento financeiro, com investimentos e com infra-estruturas de longa duração se cifrou em pouco mais de 3,6 milhões de cantos, que em 1979 foram reduzidos a 2,9 milhões de contos. Num primeiro esforço, levado a cabo em 1980, tivemos de mobilizar para os mesmos fins mais do dobro, ou seja, cerca de 6,2 milhões de contos, valor que terá de se manter sensivelmente constante até 1983. Privilegiando o saneamento financeiro, será possível reduzir continuadamente o peso dos encargos resultantes da descapitalização para vir a associar definitivamente as dotações de capital do Estado aos programas do investimento indispensável à modernização do sistema de transportes e comunicações.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Referindo apenas o subsector dos transportes interiores, em 1979 os encargos financeiros ascendiam a 16 % dos custos totais, absorvendo só por si mais de metade dos subsídios; foi já possível, em 1980, reduzir essa mesma percentagem para 8,5%, a qual, em 1981, descerá já para 6,5%.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Será por esta via que as empresas poderão ficar dotadas de uma estrutura financeira adequada, e esta actuação terá de ser completada em sectores de infra-estruturas pesadas, como é o caso do transporto ferroviário, com a transferência para o Estado dos bens dominiais. Será por este modo que as dotações de capital poderão vir a ser correctamente associadas aos investimentos, os quais contarão também com meios de autofinanciamento gerados por uma política de preços adequada aos custos operacionais. Estes custos operacionais vêm representando uma percentagem crescente dos custos totais, tendência esta que será difícil alterar em consequência dos aumentos da energia e dos equipamentos, factores em que a nossa dependência externa é infelizmente muito grande e que impõem, como necessário, um grande esforço de racionalização e de produtividade.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador - A questão mais importante neste domínio é, contudo, a selecção do ponto de equilíbrio entre subsídios e preços, ou seja, verdadeiramente, a da distribuição dos custos entre o utente e o contribuinte. A esta matéria fixámos já uma opção clara para o médio prazo, a qual se resume em atribuir subsídios, apenas e rigorosamente, em função da utilidade social do serviço prestado; mas esta utilidade social será definida e resultante da imposição de obrigações por parte do Estado. A nossa opção consequente é a de impor apenas a obrigação de explorar e ía obrigação tarifária aos transportes sociais interiores de passageiros e aos transportes entre o continente e as regides autónomas, devendo as indemnizações compensatórias ser corrigidas em cada ano em função dos coeficientes de ocupação em relação à oferta. Planeamos que a percentagem dos custos coberta por subsídios se mantenha a níveis não superiores a 25 %. Optámos, portento, por atribuir a totalidade do esforço de subsidiação aos transportes sociais interiores de (passageiros e aos transportes para ás regiões autónomas. É por isso, Sr. Presidente e Srs.. Deputados, que é possível manter o valor absoluto dos subsídios a nível sensivelmente constante em termos nominais; a concentração do esforço de subsidiação nestes domínios reflecte, pois, opções muito claras de privilegiar o social e a solidariedade na correcção das desigualdades derivadas da insularidade. O Estado não subsidiará os défices das empresas públicas mas, sim, algumas das funções que elas desempenham na medida da sua contribuição para o bem público; bem público que não será certamente a conservação de organizações em que aquilo a que alguns chamam postos de trabalho mais não são,
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muitas vezes, que seguros de desemprego suportados pelos contribuintes.
Concretamente, «m 1981, o suporte pelo Orçamento Geral do Estado de indemnizações compensatórias para os transportes urbanos eleva-se a 3,6 milhões de contos, para os extra-urbanos interiores a 3,5 milhões de contos, enquanto para os transportes aéreos e marítimos entre o continente e as regiões autónomas tal suporte ascende a 2,2 milhões de contos. Não se contemplam outros subsídios para além destes, admitindo-se como excepcional que factores de conjuntura ou imposições de interesse nacional possam vir a justificar outra atitude, como poderá, eventualmente, ser o caso de protecção aos nossos emigrantes ou dê incentivos quantificáveis à actividade turística ou do comércio externo. Fora deste quadro bem definido, todas as outras actividades de transportes e de comunicações deverão ser auto-sustentadas; assim, os transportes de mercadorias deverão, progressiva mas rapidamente, vir a reflectir os custos reais, especialmente quando associados a projectos de exploração industriais. As empresas de transportes (exteriores terão de se organizar em termos de competitividade nos mercados internacionais.
No domínio específico das telecomunicações, impõe-se um esforço muito grande que me permitiria qualificar mesmo de histórico no investimento associado à modernização tecnológica, como também na construção de equipamentos rodoviários, ferroviário» e nos estaleiros navais, estão planeadas acções articulando as necessidades do sector de transportes com as capacidades existentes e a desenvolver nas indústrias nacionais.
A política precisa de concentração das indemnizações compensatórias e a execução prioritária das acções de saneamento financeiro permitirão dotar as empresas do sector com as condições necessárias ao investimento! Dentro da coerência do Plano, a formação bruta de capital fixo entre 1981 e 1984 deverá totalizar mais de 187 milhões de contos. No Plano de Investimento e de Desenvolvimento da Administração Central assumem posição relevante os investimentos em infra-estruturas portuárias. A situação oceânica do nosso país e a importância daí derivada, em termos nacionais e europeus, justificam também que se atribuam verbas importantes não só às obras marítimas das infra-estruturas de transporte mas também a outras a elas associadas, como são as que interessam a pesca e a própria defesa da costa contra a erosão natural. Entre 1981 e 1984 no conjunto dessas obras será investido um total de 17,6 milhões de contos em obras que se distribuem por toda a costa e em que assumem posição de relevo, entre outras, Aveiro, Figueira da Foz, Portimão, Olhão, etc. Pela primeira vez procura-se integrar o conjunto das necessidades em termos de complementaridade regional e de ligação a outras infra-estruturas do sistema de transportes. Será importante referir que o investimento em infra-estruturas e equipamentos constitui condição necessária, mas não suficiente; com efeito, ele será ineficaz se não for associado a acções de organização, gestão e disciplina de acesso às actividades ligadas aos portos, como condições essenciais ao suporte das nossas exportações.
A atribuição de fundos públicos, bem como a responsabilização do Estado por financiamentos externos associados a programas desta dimensão, justificam a exigência de uma gestão rigorosa, em que todos os esforços se concentrem no objecto principal das empresas e na função primordial dos órgãos da Administração Pública. O Governo não pode permitir a atribuição de verbas para a simples cobertura de défices onde não poucas vezes estão incluídos indiscriminadamente os resultados de actividades nacionalizadas por acaso ou por opções políticas inaceitáveis.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador - O Estado apoiará a satisfação do interesse público, mas - permitam-me que o refira - não suportará as floristas ou peixadas nacionalizadas numa noite de 1975.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
Risos do PCP.
A gestão rigorosa pode ser exigida uma vez que definimos opções políticas dará e que esclarecemos com precisão a posição do Estado na assunção das suas responsabilidades como empresário. Só assim teremos autoridade moral para exigir dos trabalhadores um esforço sério e continuamente acrescido de produtividade; só assim se poderá imputar aos gestores, a quem se confiam parcelas tão importantes dos dinheiros públicos, uma responsabilidade efectiva pelos resultados. Quando se permitiu que os subsídios fossem consumidos indiscriminadamente, e se aceitou que os défices não cobertos continuassem a crescer até ao nível de 9 milhões de contos por ano, quando se preferiu pagar toda e qualquer reivindicação, mesmo que ofensiva da equidade do tratamento entre os cidadãos de um mesmo país, quando se desligou a política salarial da política de contenção da inflação, o Estado, verdadeiramente, demitiu-se da sua posição de garante do interesse público e deixou ao Governo da Aliança Democrática uma bem pesada herança.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o governo de que faço parte não recusa assumir a solução de tão graves problemas. Antes se propõe atacá-los com perseverança, que só num plano de médio prazo poderá dar frutos.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Alguns destes problemas resultam da ausência de outras (políticas e só poderão ser corrigidos ou atenuados por transformações estruturais, como é o caso de uma autêntica e séria política de ordenamento do território. A tendência .vertiginosa para a concentração rife pólos de emprego e para a repulsão de pólos de habitação gerou uma procura crescente nos transportes pendulares suburbanos; recordo que estes absorvem mais de 20% do total da subsidiação que é indispensável conter, pois não é justificável acrescer o seu suporte à custa dos cidadãos contribuintes de zonas do País ainda privadas da acessibilidade aos centros de emprego e de educação. Tão-pouco é economicamente comportável, nem
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desejável, construir soluções técnicas onerosas para responder a uma procura crescente em exponencial. É evidente que transformações estruturais, no plano do ordenamento físico, ma diversificação de horários, ou no plano dos incentivos fiscais, orientadas para inverter estas tendências não produzirão efeitos mesmo no médio prazo. Esta a razão da qual alguns investimentos de carácter intercalar serão levados a cabo com vista a utilizar potencialidades existentes. Sr. Presidente, Srs. Deputados: As limitações de tempo não permitem um desenvolvimento mais pormenorizado « objectivo idas principais opções que venho resumindo. Creio, contudo, que terão contribuído para esclarecer esta Assembleia sobre a forma como o Governo se propõe aceitar as limitações existentes no início de um período de quatro anos e levar a efeito o que considera mais importante para corrigir uma estrutura deformada por uma vocação estatizante irresponsável. Transformá-la em verdadeiros e eficientes meios de suporte para o desenvolvimento da sociedade portuguesa é o nosso objectivo. Assegurar o cumprimento das responsabilidades do Estado perante os cidadãos Portugueses, cuja maioria democraticamente nos confiou o governo, é a nossa tarefa que só pode ser corrigida e enriquecida pela crítica construtiva dá Assembleia da República.
Aplausos do PSD, do CDS e PPM.
Durante esta intervenção reassumiu a presidência, o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Sacramento Marques tinha pedido a palavra há pouco, mas a Mesa não viu.
O Sr. Sacramento Marques (PS): - Exactamente, Sr. Presidente. Mas acontece que agora não se encontra presente o Sr. Deputado Carvalho Cardoso, a quem queria pedir esclarecimentos.
O Sr. Presidente: - Nesse caso fica com a palavra reservada para quando o Sr. Deputado Carvalho Cardoso se encontre na sala.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em matéria de segurança social, o Orçamento Geral do Governo «AD» é de miséria.
As eleições já passaram, agora chegaram as facturas. Para novos aumentos é necessário aguardar que, quando houver outra vez eleições, a «AD» distribuirá umas benesses pré-eleitorais. Até lá, paciência... Os reformados e outros beneficiários esperem que 6 Governo tem outras prioridades, tem outros interesses a servir.
Que diferença de discurso, de projecto, de intenções e até de palavras de um ano sem eleições comparado com um ano de eleições! Que diferença do ano passado para este ano! Mas outras diferenças existem também em matéria de segurança social. Certamente repararam que os ministros da «AD», que têm a Europa da CEE sempre na boca, que por vezes parece mesmo que, em vez do Largo das Cortes em Lisboa, estamos no Parlamento Europeu, em matéria de segurança social esquecem-se da Europa e trazem aqui um orçamento em que a saúde significa 3,8 % do produto interno bruto e a segurança social 8,6 %, enquanto em França, por exemplo, números de 1977, a saúde significava já 6,8 % e a segurança social 17,1 % e na RFA a saúde era 7,2 % e a segurança social 20,2 o/o.
Como se vê, o orçamento «AD» está longe da Europa, está por metade. É que a invocação do modelo europeu só lhes convém, só o fazem quando se trata de atacar os direitos dos trabalhadores ou as conquistas revolucionárias de Abril ou a Constituição.
O Sr. Silva Graça (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - O orçamento da segurança social apresentado é pura e simplesmente um orçamento de manutenção - o que significa deterioração.
Se de outro governo se tratasse e de outra política, poder-se-ia pensar que, perante o agravamento das condições de vida das classes trabalhadoras, perante os tectos salariais, perante a descida dos salários reais, perante o desemprego e a escassez de primeiro emprego, perante as dificuldades crescentes dos trabalhadores, seria de, através da segurança social, tomar medidas de redistribuição mais justa da riqueza nacional para atender e proteger direitos das classes e camadas mais desprotegidas da população.
Mas isso seria exactamente a negação da política do governo Balsemão, seria o Governo a fazer a política da oposição. Seria, imagine-se, o Governo a servir o povo e o progresso social do País em vez de servir o capital e os latifundiários que representam e os interesses de classe que defendem.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Não apoiado!
A Oradora: - É assim que o orçamento da segurança social apresenta-se no fundamental auto-suficiente e o seu financiamento provém das contribuições dos trabalhadores e das entidades patronais, ao contrário do que sucede na Europa e do preceituado na Constituição, artigo 63.º E o mais grave é que o Governo ainda se vem gabar disso. Mais: o orçamento da segurança social ainda comparticipa em despesas que deveriam ser directamente do OGE. Esta questão não é pouco importante, porque, com o orçamento dito auto-suficiente, os benefícios continuarão magros e a segurança social pouco mais será que a Previdência.
Em sede de análise do orçamento da segurança social, disse o Ministro que o montante das dívidas à Previdência passou de 30,3 milhões para 28,2 milhões de contos e que a recuperação de dívidas ascendeu a 13 milhões! Passou de 30 milhões para 28 milhões e o Dr. Carlos Macedo disse, e até entregou o discurso por escrito, que recuperaram 13 milhões! Então quando é que deixaram agravar a dívida, Sr. Ministro? Ou será que de 28 para 30 são 13 na tabuada da «AD»? A verdade, porém, é que nem recuperaram os 13 milhões, pois nestes estão incluídas as letras em desconto na banca nacionalizada, nem o agravamento da dívida é só de 11 milhões.
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As vigarices das contas da segurança social tem que ser aqui claramente denunciadas para que os trabalhadores saibam como é gerido o seu dinheiro ...
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: -... 1.º O governo da «AD» afastou dos organismos executivos da segurança social os representantes dos trabalhadores como preceitua o artigo 63.º da Constituição (ainda em Dezembro o fez na Caixa Nacional de Pensões).
2.º O Governo esconde as contas da segurança social aos deputados da oposição. Basta, por exemplo, dizer que, depois das numerosas diligências que fizemos para conseguir obter as contas mensais da segurança social, qual não foi o nosso espanto quando no mês de Setembro, em vez da folha respeitante à evolução das dívidas, encontrámos um papel a dizer que a folha deixava de ser publicada.
3.º Elaborámos um requerimento nos termos regimentais para saber a evolução do montante em dívida e um chefe de gabinete de alguém do MAS responde-nos, por carta de correio dirigida ao Grupo Parlamentar do PCP, que a dívida é de 30 milhares de contos para 28 milhares, os mesmos números que o ministro dá em milhões.
É nesta carta, deste chefe de gabinete de alguém do MAS, em resposta a um requerimento do PCP, que recebemos a recusa do fornecimento da lista das empresas devedoras de mais de 10 mil contos à Previdência.
Na Comissão, fomos, entretanto, esclarecidos de que esta recusa era motivada por uma questão de deontologia. Mas, como se viu, ao Sr. Ministro só interessam os princípios deontológicos quando se trata de defender o grande capital, a quem serve, para esconder os grandes devedores, porque, para lançar uma provocação ao PCP, o Dr. Carlos Macedo esqueceu-se logo da deontologia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Não nos surpreendeu a provocação e consideramo-la uni facto natural (diria mesmo intrínseco) na trajectória política do seu autor. Em fins de 1980 fantaseava o Dr. Carlos Macedo que Soares Carneiro teria sido convidado para Primeiro-Ministro! Mas já em 1976, quando dissidente do PPD, imputava autocracia psicológica a Sá Carneiro, esquecendo-se aí da deontologia médica numa entrevista ao Jornal Novo, onde de resto abjurava o transformismo socializante para onde o autocrata Sá Carneiro pretendia empurrar o PPD.
Eis no que está convertido em 1981 o ardoroso dissidente defensor do socialismo democrático «m 1976. Deixe-se de provocações baratas, Sr. Ministro, e forneça aos deputados da oposição a lista dos devedores à Previdência, dos grandes devedores, dos que devem mais de 10 mil contos, que o Sr. Ministro conhece-a bem. Procurar escondê-los é lesar os beneficiários da Segurança Social.
E quanto à situação, só os partidos perante os encargos sociais dos seus funcionários, a coisa é séria, Sr. Ministro, prende-se com o regime legal dos partidos e não deve servir para baixas finalidades de chantagem e diversão política. Face à situação do CDS, por exemplo só é estranho (ou, se calhar, não), que tenha vindo meter-se num terreno não escorregadio. Quem tem telhados de vidro, Sr. Ministro, não atira pedras.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP apresentará propostas de alteração a este orçamento de miséria que tornem claras quais as alternativas que preconizamos em matéria de política social. Não podemos, no entanto, deixar de denunciar que, aos 75 000 reformados rurais, o Governo vai mantê-los na miséria, esquecendo-se da promessa eleitoral que fez de os equiparar ao regime geral da Previdência. Mais: o Governo vem mesmo queixar-se do regime pouco contributivo dos rurais e anunciar um previsível aumento da taxa de contribuição destes trabalhadores.
É um escândalo!
O PCP preconiza a necessidade da integração dos homens e mulheres que toda a vida trabalharam no campo, dando-lhes acesso a direitos sociais iguais aos dos restantes trabalhadores. Mas o governo da «AD» neste orçamento faz o contrário.
Os reformados e os restantes beneficiários da segurança social não vão também ficar muito melhor tratados pelo governo da «AD». E não venham, Srs. Ministros, dizer que é assim porque não há mais descontos, porque não há mais dinheiro. O PCP quer tornar claro que a questão não é haver mais ou menos dinheiro para os reformados, não é haver mais ou menos dinheiro para financiar a segurança social; a questão está nas opções políticas que são tomadas. O governo Balsemão propõe 8 milhões de contos em juros aos capitalistas e agrários, propõe escandalosas isenções fiscais às sociedades de investimento. Nós, PCP, propomos aumentos de pensões de reforma para as tornarmos dignas e propomos isenções fiscais para proteger os deficientes.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Propomos que a pensão mínima do regime geral seja aumentada para 5250$ e as pensões superiores à pensão mínima sejam aumentadas 750$, que a pensão social e a pensão dos rurais sejam aumentadas para 4500$, o que não é sequer irrealista nem impossível.
A grande diferença - e volto a dizê-lo - está nas opções políticas que se tomam: este Governo optou pelo capital e nós somos o partido dos trabalhadores.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE e protestos do PSD, do CDS e do PPM.
A Oradora: - Não me admira nada que os serventuários do capital gritem. É natural.
Por isso traremos aqui o caderno reivindicativo da Intersindical em matéria de segurança social. Depois verei como votam, Srs. Deputados.
Protestos do PSD, do CDS e do PPM.
Mas traremos também algumas das principais reivindicações dos deficientes, pois é bom que fique claro que o Governo, em sede de OGE, esqueceu-se que este é o Ano Internacional do Deficiente. E, como, quando reparam, é tarde e as prioridades são outras, o Sr. Ministro chega à Assembleia da República e anuncia pomposamente que, em relação aos
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deficientes, o Governo vai fazer o que já está feito! E os deputados da «AD» bateram-lhe palmas. Santa
ignorância!
Vozes do PSD: - Ah!!!
A Oradora: - A única medida séria com que a «AD» «comemorou» o Ano Internacional do Deficiente foi pôr os deficientes, que não são pensionistas, a pagar as taxas moderadoras dos SMS.
Da família, da Secretaria de Estado da Família e do seu orçamento não vale a pena gastar tempo, pois a Sr.ª Secretária de Estado informou que se trata de uma verba simbólica, de uma Secretaria de Estado simbólica, enfim de uma simbólica propaganda à família da «AD».
Risos do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este governo tem a vida curta. Este governo vai e está a desgovernar. Este governo vai explorar mais os reformados, os deficientes e outros sectores mais desprotegidos da população, este é o governo do capital, dos intermediários e dos latifúndios.
Por isso, este governo não vai durar muito.
Por isso, terá o destino que merece - a rua.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.
O Sr. Valdemar Alves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A Sr.ª Deputada Zita Seabra, como é costume, com a garra e a genica que lhe são próprias e a demagogia a que já nos habituou, levantou alguns problemas relativos à Segurança Social.
É claro que neste campo, em termos (de comparação desportiva - e perdoem-me a comparação -, estamos a jogar em *casa. Se melhorias sociais houve, não há dúvida nenhuma que elas se devem aos governos da AD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para o provar vou mencionar alguns inúmeros, pois a Sr.ª Deputada limitou-se a fazer comparações com apartes da CEE e sobre o OGE nada disse.
Assim, em 1980 o orçamento da Segurança Social era de 105 milhões de contos. Neste momento, Embora conheçamos as dificuldades e a precariedade do orçamento em relação às necessidades do País, é de 125 milhões.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Só!
O Orador: - Como falou nos deficientes e uma vez que estamos no Ano Internacional do Deficiente, lembro-lhe que o aumento verificado na verba que
é destinada aos deficientes para 1981 foi de 17 milhões de contos para 22 milhões e 400 000 contos.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - É só milhões!
O Orador. - Em relação à terceira idade, de que tanto falou, em 1980 e verba que lhe era destinada era de 39 milhões de contos, neste momento estão previstos no Orçamento 50 milhões de contos.
E a prova disto é que que elementos do Conselho de Gestão do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social - que, como sabe, é composto por quinze elementos - votaram a favor. Só quatro votaram contra, o que não admira nada: foram os três da CGTP e um do MURPI.
Em relação às pensões sociais e, inclusive, aos próprios deficientes, posso dar-lhe números relativos a 1979, 1980 e 1981.
Hm 1979, gastaram-se 12 milhões e 466000 contos; em 1980, 19 milhões e 162 000 contos; e para 1981 temos previstos 23 milhões e 143 000 contos, o que representa um aumento de 20,8%.
É evidente que não vou gastar muito tempo, até porque é escasso, mas, em relação à recuperação das dívidas à Previdência, digo-lhe em números muito rápidos, que em 1973 as dívidas à Previdência eram de 1,6 milhões de contos; «m fins de 1974, 2,2 milhões de contos; em 1975, 7,3 milhões de contos; em 1976, 12,5 milhões de contos; em 1977, 18,3 milhões de contos; em 1978, 21,9 milhões de contos; em 1979, 30,3 milhões de contos, o que representava 46% da receita do mesmo ano.
Com as recuperações que já fizeram, no fim do ano de 1980 as dívidas à Previdência eram só de 28,2 milhões de contos, o que representa 30% da receita do mesmo ano. Se nesse ano tivéssemos mantido o ritmo de crescimento da dívida, ela teria sido de 41,5 milhões de contos, ó que representaria 46% da receita total.
Sr.ª Deputada, ainda posso esclarecer que> o saldo dos contribuintes devedores, em 31 de Dezembro de 1979, era de 30,379 milhões de contos e as contribuições declaradas foram de 93,5 milhões de contos, o que representa 123,873 milhões de contos, e foram cobrados precisamente 95,7 milhões de contos. Isto representa um decréscimo 15,5% em relação à dívida total.
Em relação às pensões de velhice, por exemplo, apelamos ao Governo para que, dentro das suas possibilidades, as aumente, porque também sentimos estes problemas e achamos que é justo o aumento, ao contrário do que pode pensar. Mas digo-lhe que a evolução média da pensão do regime geral da Previdência aumentou - não tanto como nós quereríamos, mas aumentou. Para o provar, vou dar-lhe números desde 1973.
Em 1973 a pensão média era de 1 382$00; em 1977 era de 2 755$; em 1979, era de 3 416$; em 1980 passou para 4053$; e em 1981 prevê-se que passe para 4500$.
Estes números - e muitos outros lhe podia dar, Sr.ª Deputada - são para lhe demonstrar que o Governo, no sector da segurança social, está no bom caminho, está mo caminho seguro. E é a certeza destes números que nos dá a garantia do futura. Estamos nó caminho seguro - só não vê quem não quer ver; o pior cego é aquele que não quer ver. Todavia, o povo português vê, está com os olhos abertos, - sabe o caminho que estamos a trilhar e estou certo que sobretudo as condições de vida das pés-
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..soas mais carenciadas irão ser melhoradas graças à acção do governo da AD.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Deputado se inscreveu, tem a palavra para responder, se assim o desejar, a Sr." Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Estava sempre a ver quando é que o Sr. Deputado terminava dizendo que os reformados ainda deviam dinheiro ao governo da AD. Só faltava essa, com tantos milhões na sua intervenção, Sr. Deputado!
Mas o que se passa é que as pensões de reforma continuam miseráveis. Como é possível, Sr. Deputado, viver-se com 2400$, como vivem actualmente os pensionistas rurais (e são 750 000)?
O Sr. Deputado acha que está óptimo, que o governo fez imenso, que os rurais estão a viver bem! O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social, pá Comissão de Saúde e Segurança Social, até disse mais: disse que eles deviam passar a descontar mais!
Portanto, o Governo está satisfeito, os Srs. Deputados da AD vão sair daqui satisfeitos. Até vão dormir descansados! Mas os reformados, esses vão continuar na miséria com os 2 400$ por mês. Os rurais e o reformados do regime geral vão continuar com a sua miserável pensão mínima.
Sr. Deputado, se o ano passado a AD previu, na véspera das eleições, distribuir algum desse dinheiro pelos reformados, este ano o Orçamento que prevê é um orçamento de miséria. E os reformados no nosso país - é preciso ter consciência disso- estão a viver muito mal, estão a viver em condições que são indignas para pessoas que trabalharam toda a vida e contribuíram - enfim, de uma maneira até altamente dolorosa para todos nós- para o desenvolvimento do nosso país. A AD está satisfeita. Os reformados responderão à satisfação que o Sr. Deputado aqui vem trazer.
Mas, em termos financeiros, digo-lhe uma coisa, Sr. Deputado. V. Ex.ª disse, muito satisfeito, que este ano a segurança social tinha 125 milhões de contos. Pois é, são 125 milhões de contos que resultam da contribuição de quem trabalha, não resultam do financiamento do OGE, porque o OGE vai financiar os 8 milhões de contos de indemnizações de juros aos capitalistas! Para os reformados, Sr. Deputado, nem um tostão! E é isto que nós aqui trazemos.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE e protestos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.
O Sr. Valdemar Alves (PSD): - É evidente que a Sr.ª Deputada mais uma vez, com a habilidade que lhe reconhecemos, deturpou tudo aquilo que eu disse.
Risos do PCP.
Ninguém disse que estava satisfeito com as pensões. Reconhecemos que as pensões são pequenas. Mas a verdade é esta: é que, apesar de pequenas, fomos nós que as estabelecemos e são as maiores de sempre. Só isso! E propomo-nos ainda melhorá-las substancialmente; por isso se estabeleceu o princípio da anualidade na revisão das pensões. É isso que as pretende fazer, é isso que se vai fazer. Portanto, nada de confundir as situações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP):-Sr. Deputado Valdemar Alves, gostaria só de lhe dizer que a confusão é apenas sua.
Protestos do PSD.
O Sr. Deputado vai sair daqui muito satisfeito com a situação dos reformados; pela parte que me toca, vou sair daqui profundamente magoada e preocupada quando o Sr. Deputado votar contra, nomeadamente, as propostas de alteração que o PCP propõe. O Sr. Deputado está de acordo que essas tais pensões de reforma continuem tão baixas e que se dê 8 milhões de contos para indemnizar os juros do capital?
Vozes do CDS: - Isso é cassette!
A Oradora: - Isto é uma questão de opções políticas, não é uma questão de distribuição de verbas, Sr. Deputado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Protestos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Constâncio.
O Sr. Vítor Constâncio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Afirmei no início deste debate a minha relutância em nele participar, pela ausência de conteúdo dos documentos apresentados, pela escassez de tempo para pedir e receber informações adicionais, pelas limitações impostas à discussão orçamental pela própria Constituição. Disse então o que de essencial há a dizer sobre os textos em discussão - apontar as suas clamorosas insuficiências. Limitar-me-ei hoje a especificar alguns pontos.
Registo com agrado a concordância que parece ter sido expressa pelo Governo sobre a necessidade de se alterarem as disposições que regulam a apresentação do Plano e do Orçamento. A dignidade do Parlamento exige que este conheça, discuta e vigie «m maior pormenor a actividade da Administração. É necessário que a Assembleia passe a conhecer com maior detalhe o orçamento de cada Ministério e proceda à sua discussão. Que acompanhem o Orçamento relatórios mais circunstanciados sobre programas de investimento, sobre a situação do sector empresarial do Estado e sobre as contas do Tesouro. As varias comissões parlamentares deverão discutir os orçamentos dos Ministérios correspondentes, avaliando assim a forma como são gastos os dinheiros públicos, mesmo que, à semelhança do que acontece noutros países, a votação da Assembleia para fins de autorização legal
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de receitas e despesas venha a incidir apenas sobre as grandes verbas que hoje em dia são aprovadas.
A próxima revisão constítucional deverá permitir, portanto, a introdução de inovas disposições, que, pelo nosso lado, não deixaremos de apresentar.
Quanto ao plano a médio prazo, será necessário ser também um pouco mais específico acerca do que a Assembleia deve apreciar, para além de eliminar a ficção de o tentar ligar rigidamente ao período de cada legislatura.
Talvez desse modo não voltemos a ser confrontados com a pobreza dos documentos desta vez apressadamente aposentados peto Governo. Afirmei já que em termos de metodologia e de conteúdo dão os mais insuficientes desde que existe planeamento «m Portugal.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - É verdade, e verdade!
O Orador. - Apresentando como grandes opções plenitudes generosas sobre todos os aspectos que podem afectar o bem-estar da sociedade e apontando objectivos económicos sem qualquer hierarquia de prioridades, o texto apresentado não equaciona verdadeiramente opções num. deixa antever quais as grandes linhas de solução dos problemas nacionais. Pouco mais é que -um programa genérico de governo, como o que discutimos aqui há pouco tempo, acompanhado de um exercício econométrico de gabinete, com alguns números dispersos e incompletos.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quando crítico a ausência de estudos de base que o fundamente, não é tanto a exercícios de diagnóstico que me refiro, ao contrário do que pensou o Sr. Ministro das Finanças, mas antes a análises quantificadas a nível sectorial que verdadeiramente equacionem as várias soluções concretas possíveis sobre a evolução pretendida para o futuro. A sua inexperiência torna impossível fundamentar opções, pensar políticas e preparar projectos que venham a dar conteúdo ao Plano a elaborar seguidamente.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Não é plano nenhum!
O Orador - A filosofia geral que está por detrás do documenta apresentado parece ser a de que o mero crescimento, económico determinado pelas forças do mercado resolverá os problemas que defrontamos. Ao Estado caberá apenas ocupar-se dos grandes equilíbrios económico-financeiros, o que introduz uma perspectiva restritiva de moderação, bem evidenciada pela intervenção inicial do Sr. Ministro das Finanças. O crescimento deverá ser moderado para não forçar os equilíbrios globais da economia. Resulta daí uma manifesta falta de ambição e de voluntarismo, que, ao contrário deveriam sempre estar presentes na elaboração de um plano. E neste ponto o que é criticável não são tanto os números, mas sim a disposição revelada. O que importa não é tanto saber se os 5 % de crescimento são ou não insuficientes, já que nada de qualitativo se alterava no texto se essa previsão falhasse e o crescimento fosse de 4 % ou 6%. Só que, se dão se planeia para mãos, muitas vezes os resultados acabam por focar aquém do que teria sido possível. A preocupação com as imitações introduzidas pela indispensável preocupação com os grandes equilíbrios económico-financeiros poderia ficar para os ajustamentos anuais à conjuntura.
Não nos preocupemos pois, com os números apresentados, aliás sem qualquer compromisso firme, pelo Governo. Vejamos antes se a preparação das chamadas grandes opções serviu para equacionar as soluções possíveis aos grandes problemas nacionais.
Uma questão tão fundamental como é a do emprego, primeira grande necessidade social a satisfazer é tratada superficialmente através da introdução de uma hipótese de escolha sobre o andamento da produtividade, escolhida arbitrariamente, para produzir um certo resultado na evolução do emprego. Essa hipótese de crescimento da produtividade representa unia continuidade do crescimento ocorrido no passado recente e não se vê como é compatível com a ligeira aceleração do crescimento do produto e a modernização das estruturas produtivas postuladas em várias armações. A ausência do indicações sobre o padrão sectorial de crescimento permite duvidar que haja algo de sério por detrás daqueles números. No domínio das medidas de política, apenas se reafirma a continuidade dos esquemas de incentivo existentes, que são manifestamente insuficientes. Um plano feito hoje em Portugal que não procure atacar com seriedade o problema estrutural do desemprego quase que não vale a pena ser elaborado.
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - É evidente!
O Orador - O mesmo se pode dizer de um plano a médio prazo que não analise devidamente de forma quantificada a questão energética nacional.
Sendo Portugal um dos países mais dependentes da importação de petróleo, o problema assume particular acuidade, pelos efeitos que pode ler, nomeadamente na balança de pagamentos. Que fontes alternativas devem ser estimuladas e em que escala, qual a proporção dos usos finais que deve ser satisfeita pela electricidade, quais os esquemas de preços e subsídios favoráveis à introdução de fontes novas alternativas, qual o esforço de investimento (requerido pelos vários programas possíveis. É difícil preparar opções para um plano a médio prazo sem ter resposta a estas e outras questões.
O Sr. Ministro da Indústria (reconheceu ontem a importância destas questões e fez sobre elas considerações acertadas, mas, ao fazê-lo, reconheceu também que nas opções do Plano não existe qualquer resposta.
O mesmo se pode dizer sobre a forma como se atacam os problemas de produção alimentar, questão que também condicionará de forma decisiva as possibilidades do nosso crescimento. Os diagnósticos estão feitos. Interessa agora saber como se utilizarão os instrumentos e quais as prioridades. De outro modo não se encontra fundamento para o crescimento do produto agrícola à taxa optimista de 4,4 % ao ano. Qual a reforma do crédulo agrícola e a sua ligação à modernização das explorações? Conhecendo as distorções e a irracionalidade económica, do nosso sistema de preços e subsídios agrícolas, em que direcção se Ara revê-lo para alcançar os objectivos seleccionados? Qual o programa que alterará a estrutura de dimensão das explorações agrícolas no Norte e no Centro do
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País? Quais os programas que promoverão a qualificação dos recursos humanos no sector, estimulando em especial o aparecimento de jovens empresários agrícolas?
Sem analisar estas questões e estabelecer prioridades, os objectivos de produção referidos no texto não tem significado real e a preparação para o embale da adesão à CEE, que escandalosamente não é analisado, não se fará a tempo.
O Governo apenas se apressa a realizar a eliminação dos monopólios estatais de comércio externo em certos produtos básicos, oito ou nove anos antes da adesão os tornar necessários. Promoverá assim bons negócios para o sector privado, mas, no plano global, teremos uma orientação supérflua do investimento para o sector comercial, níveis de stocks a nível nacional mais elevados, dificuldades na regularização dos mercados.
No que respeita à industria, também em vão se procurarão imitações precisas sobre o padrão de crescimento sectorial desejado, apenas se notando nas referências genéricas que são feitas, a p. 195, a ausência dos sectores de produtos intermediários de base.
Algo mais adiantou o Sr. Ministro da Indústria, porém ainda, insuficiente e tardio.
A inexistência de um modelo de crescimento industrial e agrícola referir-se claramente no capítulo que trata da -política de investimento. Refere-se aí a necessidade de avaliar com critérios de eficiência económica os grandes projectos, mas isso não chega para fazer escolhas sectoriais sobre a distribuição de recursos financeiros escassos. Por outro lado, elogiam-se os esquemas de incentivos existentes e prevê-se a sua continuidade. Se um plano serve para alguma coisa, é precisamente para fundamentar prioridades sectoriais e adequar-lhes o programa de investimentos públicos e os esquemas de incentivos ao investimento. O Governo propõe a continuidade dos existentes (com excepção do da habitação, parece); logo, a preparação dias grandes opções não levou a nenhumas alterações. E, no entanto, os esquemas de incentivos são dispersos, pouco selectivos, isentos de nacionalidade económica global. Diz-se nesse capítulo que o investimento na agricultora tem prioridade e, no entanto, ele é hoje menos favorecido do que o investimento industrial. O esquema do SIII tem prioridades sectoriais discutíveis, desfavorece a substituição de importações, trata igualmente as exportações tradicionais, e as modernas, que urge estimular, concede incentivos de montante excessivo, servindo, assim, indiscriminadamente para baixar o preço do capital, qualquer que seja o investimento. Não é, assim suficientemente orientador dos investimentos e, quanto ao estimulo genérico, pode dizer-se que a maior parte dos investimentos beneficiados far-se-iam na mesma sem o Estado despender em subsídios e isenções fiscais, por vezes, mais do que o valor do próprio investimento.
O modelo implícito no texto governamental pode, pois resumir-se nos seguintes pontos:
1) O desenvolvimento basear-se-á fundamentalmente, no sector privado, orientado pelas forças, do mercado, sendo a redução da importância sector público promovida explicitamente grande objectivo económico, independentemente de qualquer preferência de padrão sectorial. Parte-se da hipótese de que, se o sector público usar em geral menos recursos, estes serão usados pelo sector privado para investir. Isto quando a realidade da crise internacional aponta em sentido contrário.
2) O padrão sectorial de crescimento preferido é o que está implícito nos esquemas de incentivos existentes, que privilegiam os sectores de indústrias ligeiras de exportação, quer sejam tradicionais, quer sejam modernas e mais avançadas tecnologicamente. As indústrias básicas, as potencialidades da substituição de importações e do mercado interno são postas em segundo plano. Apenas a exploração e aproveitamento de recursos naturais aparece valorizada;
3) Para estimular o investimento privado o Estado subsidia-o fortemente e as taxas de lucro são protegidas por uma política salarial de contenção, não se procurando nenhuma melhoria na repartição funcional do rendimento, que, segundo o Sr. Ministro das Finanças, não é prioritária. Não se prevê também nenhuma reforma institucional que consolide ou promova a intervenção dos trabalhadores nas decisões económicas, não lhe concedendo nenhuns direitos de cidadania quanto à política de investimentos que a contenção salarial, aumentando os lucros é suposta ajudar a financiar.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: A verdade é que, se é certo que ao nosso desenvolvimento é indispensável um sector exportador dinâmico, é necessário estimular prioritariamente mente as exportações modernas tecnologicamente mais evoluídas, visto que as tradicionais têm procura externa com fraco crescimento e são objecto de concorrência de países menos evoluídos. Por outro lado, existem oportunidades de substituição de importações em termos competitivos e de alargamento do mercado interno, que não devem ser menos prezadas. Finalmente, Portugal necessita no actual estádio de desenvolvimento de, fortalecer o seu sector de produtos intermediários básicos. Existem, assim, diferenças substanciais de ênfase entre o que o Governo preconiza e o que o País necessita. Os actuais esquemas de incentivos; aos investimentos devem ser revistos e os programas de investimento público estimulados.
O Governo revela, porém, uma atitude verdadeiramente obsessiva contra o sector público, que só pode ter origem em razões de preconceito ideológico. O Governo abandona a perspectiva constitucional do controle do poder económico pelo poder político e, ao apressar-se a abrir ao sector privado a actividade bancária quer de novo privilegiar o grande poder económico privado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador. - Ao falar de redução do peso do sector público empresarial aparece determinado a diminuir-lhe as possibilidades de investimento e diversificação, remetendo-o para as actividades menos rentá-
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veis e reservando as melhores em produções directamente associadas a investimentos para o sector privado. Vejam-se os casos da siderurgia, da indústria química e petroquímica e dos cimentos. E, no entanto, o Pais necessita de um sector público dinâmico, que possa desenvolver sectores básicos de industrialização e manter o nível de investimento, independentemente de considerações de avaliação privada sobre o respectivo clima. Deveria ser possível discutir esta problemática de uma forma objectiva, sem recorrer a chavões ideológicos, dada a importância do que está em causa. Não importa discutir se o sector público é ou não o motor do desenvolvimento, porque o investimento privado continuará a ter maior peso no conjunto da economia. Não se pretende fazer a defesa das empresas públicas, isentando-as de exigentes objectivos de gestão, no domínio da produtividade, do investimento, dos resultados de exploração.
Mas não se pode aceitar, porém, as mistificações usadas pelo Governo para denegrir o sector público.
O Sr. António Arnaut (PS):- Muito bem!
O Orador.- Não basta dizer que as empresas públicas são ineficientes porque só remuneram em 5 % os 200 milhões de contos que valiam à data das nacionalizações, como salientou o Sr. Ministro das Finanças. Isto é esquecer que têm um grande peso no sector nacionalizado indústrias de base (como a siderurgia e a construção naval) que estão em crise internacionalmente e dão prejuízo em muitos países, ou empresas de transporte com problemas estruturais antigos ou resultantes da descolonização. É também evitar referir a recuperação que desde 1977 muitas das empresas públicas vêm fazendo.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador - Não basta, por outro lado, acentuar com sentido crítico que as empresas públicas tem que aumentar a produtividade do trabalho, quando não se apresentam dados que provem que isso não tem acontecido. Nem se pode exigir que a produtividade aumente mais nas empresas públicas que na economia em geral.
De resto, o conceito de produtividade aparente do trabalho, medido pelo quociente entre o valor acrescentado e o emprego, não tem grande significado nalgumas delas e não existem, infelizmente, dados de produtividade física. Nesta óptica, mesmo empresas com problemas quase insolúveis como a CP apresentam melhorias por que realizam hoje mais tráfego com menos trabalhadores do que em 1975. É mistificador esperar que seriam possíveis em muitas empresas públicas aumentos de produtividade muito acima da média nacional por forma a resolver com isso os seus problemas de rentabilidade e de autofinanciamento ou de contenção do aumento dos preços. Há que ter em conta as estruturas de custos, a evolução dos vários componentes, o aumento da produtividade normal da economia e a política de preços que o Governo impõe para avaliar objectivamente da performance das empresas públicas.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Os textos apresentados pelo Governo sobre o plano anual e o Orçamento Geral do Estado reflectem as
mesmas opções de base já referidas, embora o seu conteúdo deixe algumas dúvidas sobre a possibilidade do seu cumprimento. É sempre arriscado fazer previsões em. economia sobretudo em tempo de crise e incerteza, e a maioria tem-se entretido a sublinhar os pretensos erros cometidos pela oposição o ano passado. A verdade é que não nos enganámos tanto como isso. Previmos que défice da balança de pagamentos seria de cerca de 1 bilião de dólares, e não os 700 milhões que previa o Governo, e assim foi. Previmos que o Orçamento era irrealista e não seria cumprido, e de facto o consumo público cresceu em volume cerca de 7 %, e não os 5 % previstos, enquanto o défice global, em vez de representar 9,5 % do PIB, se elevou para cerca de 11 %. Errámos aparentemente na taxa de inflação. Efectivamente, em Janeiro, no debate do Programa do Governo, pusemos em dúvida, o objectivo dos 20 %, ressalvando, no entanto, desde logo que talvez fossem possíveis se o Governo revalorizasse. Isso aconteceu, e, por outro lado, o ano agrícola apresentava-se favorável e as disposições sobre o mais estrito controle directo dos preços conduziram a que, em Março, quando da interpelação do PS ao Governo, já considerássemos os 20 % como alcançáveis. Se a taxa de inflação veio a situar-se abaixo disso, tal deve-se essencialmente ao ano agrícola, que não dependeu da política do Governo e possibilitou a queda da rubrica de alimentação que (pesa 50 % no índice) de 28 % em 1979 para 10,4 % em 1980. Por outro lado, a política artificial de controle de preços contribuiu também decisivamente para o resultado alcançado.
Tudo tem, no entanto, o seu preço. Era fácil prever que a prioridade concedida à inflação afectaria o crescimento e que após as eleições se assistiria a forte aceleração dos preços. De facto, exportações e índices mensais de produção industrial começaram a desacelerar na segunda metade do ano passado e os preços, nos três meses que se seguiram às eleições (Dezembro a Fevereiro), cresceram à taxa média mensal de 2,4 %, ou seja, a uma taxa anual de 30 %. Como dissemos, a população paga agora a factura do ano eleitoral.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E estão para vir os efeitos da radical revisão do «cabaz de compras», do mau ano agrícola, do aligeiramento do controle de preços exigido pelos empresários.
Por razões aritméticas, que já assinalei em tempo oportuno, os 16 %, em média, este ano, poderão ainda ser possíveis ou ser apenas ligeiramente excedidos, mas o crescimento dos preços durante o ano será superior. E o Governo insiste em impor aumentos salariais de 16 % nas empresas públicas e até inferiores na Administração Pública. Entretanto, promete compensar a revisão do «cabaz com o aumento de algumas prestações sociais, das quais se excluem aparentemente as pensões, a acreditar nas datas anunciadas pelo Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.
Tal seria, em princípio, correcto se pudesse ser aplicado devidamente, concedendo prestações directas a todas as pessoas e famílias abaixo de determi-
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nado nível de rendimento, como acontece nalguns países. Em Portugal, porém, não temos a informação estatística indispensável para realizar tal operação com a generalidade e a precisão requeridas, pelo que a política anunciada não passa do uma tentativa de mistificação.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Dúvidas se poderão também levantar este ano quanto à realização dos objectivos de crescimento e da balança de pagamentos.
As exportações estão em desaceleração desde meados do ano passado e o Governo recusou-se a responder sobre as medidas que tencionava tomar para as estimular, num ano em que a procura internacional crescei menos que o ano passado. Por outro lado, o Governo apresenta um orçamento com forte diminuição do crescimento do consumo público e com uma contribuição para o investimento público que diminui em termos reais.
As várias componentes da procura final não parecem, assim, susceptíveis de evoluir de acordo com os números previstos pelo Governo, sobretudo quando se considera ainda o mau ano agrícola e a eventual confirmação da desaceleração do produto industrial.
Por outro lado, quanto à balança de pagamentos, para além da dúvida sobre as exportações, os números apresentados não incluem ainda os efeitos previsíveis da seca sobre as importações, pelo que o défice poderá ser excedido.
A economia e a população pagarão este ano os efeitos de gestão eleitoral e da má conjuntura internacional. Ao actual Governo serão assacadas as culpas. Com razão, aliás. Trata-se afinal da simples continuidade de um governo da mesma maioria. As distinções entre o governo anterior e o actual são apenas uma questão interna na AD, onde será certamente muito discutida, mas não interessa à oposição, que não se deve imiscuir nesses assuntos.
Aplausos do PS e da UEDS.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: O que de fundamental há a dizer sobre o Orçamento Geral do Estado diz-se em poucas palavras. De reflecte a perspectiva conservadora do Governo sobre as finanças públicas.
O Sr. Manuel da Costa (PS): - Muito bem!
O Orador: - Herdando um défice global do sector administrativo do ano anterior de cerca de 11 % do produto interno, a opção essencial a que se subordina o presente Orçamento é reduzir aquele défice para cerca de 9 %. Isto num ano em que os juros da dívida pública aumentam 65,5 %, passando à representar cerca de 16 % da despesa do Estado (na óptica das contas nacionais). Para alcançar aquele objectivo prevê-se um aumento da pressão fiscal, embora ligeiro, porque, apesar de esta ter aumentado o ano passado em 3 pontos, a mitologia requer que se diga que a AD baixa sempre os impostos, nunca os aumenta.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - Neste caso, o actual governo estava politicamente «predeterminado», para usar a expressão do Sr. Ministro das Finanças noutro contexto, a propósito do Orçamento.
Deste modo, a solução só podia estar do lado da despesa, e aí é fácil cortar sobretudo no papel, quando se está disposto a afectar as funções do Estado. Os resultados são os seguintes, tomando como bom o número de 16 % para a inflação: contribuição do OGE para os investimentos do Plano da Administração Central, menos 8,5 %, em termos reais; contribuição do OGE para os investimentos do sector empresarial do Estado, menos 21,3%, em termos reais.
Segundo a classificação funcional das despesas, numa perspectiva de execução e em termos reais: segurança e assistência sociais, menos 24%; transportes e comunicações, menos 28 %; educação, menos 4 %; agricultura, menos 1 %; saúde, menos O %; transferências correntes, numa óptica de execução, menos 6%; transferências de capital, também numa óptica de execução, menos 22 %.
Nestas últimas usa-se o truque de nada prever para o Fundo de Fomento de Habitação, estando orçamentados no ano passado 5 milhões de contos. Como o Fundo pertence à Administração Central e deve recorrer directamente ao crédito, o resultado é o mesmo em termos de finanças públicas, mas assim o OGE fica mais apresentável...
Estes números creio que falam por si e transmitem toda a ironia da afirmação do Governo de que «o OGE vai dedicar-se à satisfação das necessidades sociais básicas».
A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Que graça!
O Orador-Reconheço que as finanças públicas portuguesas se encontram numa situação difícil e que é necessário executar a prazo uma política gradual de redução do défice. Concedo que não era fácil a tarefa de elaborar este ano o OGE, mas não creio ser realista tentar precisamente este ano a redução que o Governo se propôs.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador - Os preconceitos ideológicos e económicos do Governo é que dão verdadeiro fundamento ao Orçamento proposto.
O Sr. Ministro das Finanças afirmou na reunião que teve com a Comissão de Economia, Finanças e Plano que «o défice orçamental é sempre um entrave ao desenvolvimento e nunca um estímulo».
Na sua intervenção neste debate defende que o Estado deve passar, a curto prazo, «a gastar apenas o que as suas receitas lhe permitem», para além de várias afirmações que têm implícito o julgamento de que as despesas públicas são sempre improdutivas, mesmo quando se trate, por exemplo de investimentos das autarquias locais...
Trata-se, aparentemente, da mitologia do equilíbrio orçamental, fundamentada talvez na teoria monetarista segundo a qual a despesa pública, quando conduz a défice, limita-se a substituir despesa privada e não estimula a economia, apenas rouba recursos que e sector privado aplicava melhor. Tal teoria, que não
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se aplica, de resto, quando o défice é financiado por criação monetária e está tecnicamente por provar noutros casos, não pode ser aceite por nenhum socialista.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não porque se defenda que os défices tenham que ser sempre cada vez maiores, mas porque devem ser enquadrados na conjuntura global, devem ter em conta os efeitos estimuladores da actividade económica e dos investimentos, bem como a perspectiva da satisfação das necessidades sociais.
A transformação da sociedade num sentido mais progressivo requer a (intervenção racionalizada do Estado, ao contrário do que pretende a filosofia liberal, que a AD assumiu inteiramente e que já caracterizei em intervenções anteriores nesta Assembleia.
O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!
O Orador: - Estão a iludir-se e a tentar iludir-nos com o que se passou o ano passado, em que, após anos de excessos, o Governo pôde baixar os impostos e, porque era ano eleitoral, aumentar o consumo público em 7 %, em termos reais, e as transferências correntes em 24 %, também em termos reais.
Após as eleições, temos agora a verdadeira face da AD: mitologia do equilíbrio orçamental a prazo, objectivo explícito de redução do sector público, ausência de preocupação prioritária com a melhoria da repartição funcional do rendimento, mesmo a médio prazo.
Sem vontade interventora do sector público, sem reformas sociais, sem planeamento voluntarista» não haverá progresso económico e social que sirva os interesses da população.
A firmeza com que nisto acreditamos é a mesma que nos leva a rejeitar as propostas do Governo.
Aplausos do PS, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Alberto Xerez,
O Sr. José Alberto Xerez (CDS): - Sr. Deputado Vítor Constâncio, devo dizer-lhe que ouvi o seu discurso com a máxima atenção. De qualquer maneira, gostava de lhe fazer algumas observações relativamente a ele.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Faça, faça!
O Orador - Mais uma vez vou ser chato, vou para o campo dos números. Felizmente que o Sr. Deputado me deu também essa hipótese, falando insistentemente neles.
A propósito de alguns argumentos que utilizou tão intensamente durante a sua alocução, vou relembrar alguns dos números que se verificaram durante o balanço em que o Partido Socialista esteve no Governo.
Assim, por exemplo em relação aos impostos indirectos - e já só para focar um imposto que é tão caro ao Partido Socialista -, aquilo que verificamos é que em 1975 o peso dos impostos indirectos em relação ao produto interno bruto era de 10,9 %, passou para 13,2 % e estabiliza-se mais ou menos a esse nível durante o resto dos governos socialistas.
Em relação ao consumo público, que é outra variável tão cara ao Partido Socialista, tinha um nível de 16,3 % em 1975, e em 1978 tinha apenas um nível de 14,3 %.
Em relação às transferências de capital, que é outra variável tão cara ao Partido Socialista, tinham um nível de 1,6 % em 1975 e estabilizaram em 1,5 % em 1978.
Refiro isto só para lhe dar uma ideia acerca da contradição fundamental entre certos aspectos que o Sr. Deputado Vítor Constâncio refere que se verificam no Orçamento e a evolução de variáveis económicas que lhe são tão caras durante o tempo da gestão socialista.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - O Sr. Deputado esteve com certeza no Conservatório!
O Orador - Um outro aspecto que eu queria focar refere-se à banca privada. Acho extremamente curioso que o Sr. Deputado Vítor Constâncio esteja tão preocupado com a abertura da banca privada neste país, quando neste momento temos bancos estrangeiros em Portugal a operar. Não percebo qual é o seu nacionalismo.
Ainda um outro aspecto que eu queria referir, e que também acho curioso, é o do novo leitmotiv que hoje foi encontrado neste debate. À falta de argumentos, no meio do carácter difuso do modelo da oposição, aparece hoje um novo leitmotiv, as prioridades sectoriais, que é completamente endeusado, quo é arvorado em novo objectivo fundamental de tudo, pretendendo-se, à base dele, rebater o modelo consistente das grandes opções do Plano.
Não me queria alongar mais, mas parece-me que tudo o que foi dito é demasiado vago, direi mesmo romântico, embora seja agradável.
O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas.
O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (Luís Barbosa): - Sr. Deputado Vítor Constâncio, não me compete responder a V. Ex.ª, pois julgo que é ao Sr. Ministro das Finanças que competirá fazê-lo. De qualquer forma, ao ouvir uma das suas afirmações finais, não posso deixar de fazer um comentário que me sai quase que espontaneamente.
Durante o II Governo Constitucional - era o Sr. Deputado Vítor Constâncio Ministro das Finanças - enviei-lhe um dossier com várias sugestões para resolver alguns dos problemas que eu considerava mais importantes para desbloquear aspectos sensíveis da nossa economia. Recebi por interposta pessoa, neste caso concreto pelo falecido deputado e Ministro engenheiro Amaro da Costa, o seu comentário: era demasiado voluntarista o dossier que eu lhe enviara.
Passados alguns anos, trocámos de posições. Estou eu no Governo e o Sr. Deputado Vítor Constâncio acha este governo pouco voluntarista. Quando há alguns anos atrás estava o Sr. Deputado no Governo, eu nem sequer era deputado e era acusado nessa
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altura de muito voluntarista. Como os tempos mudam, Sr. Deputado!
/lisos do CDS.
Alguém que conhece bem o Sr. Deputado dizia há uns tempos que V. Ex.º além de todas as qualidades que possui, tem também um tremendo defeito: costuma aprender quando bate com a cabeça na parede. De tanto que tem aprendido, tenho de considerar que muito tem batido com a cabeça na parede.
Risos do PSD e do CDS.
O Sr. António Vitorino (UEDS): — Essa é de mau gosto!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vítor Constâncio, há pouco esqueci-me de lhe perguntar se dese> java responder no fim a todas as questões.
O Sr. Vítor Constâncio (>PS): —Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.
O Sr. Luís Beiroco (CDS):—Sr. Deputado Vítor Constâncio, ouvi com a maior atenção a sua intervenção, que como sempre, se caracterizou por aquela competência técnica e pela moderação que todos lhe admiramos nesta Casa.
No entanto, não .posso deixar de fazer dois pequenos comentários. Primeiro, para salientar que de facto -houve uma clara clivagem entre a sua intervenção e outras intervenções da bancada das oposições, e mesmo da bancada do seu partido. Segundo, para referir que a crítica que faz ao Governo, por este ano, em tempos que todos sabemos serem difíceis, ter feito um esforço rigoroso para reduzir o défice corrente, releva certamente, de no fundo, ter talvez uma certa nostalgia de quando conduziu — aliás com resultados positivos — um plano de estabilização e ter sido talvez aí que não conseguiu grandes resultados.
Não é certamente em louvor de qualquer mitologia que o Governo assim procede. É por ter consciência perfeita de que é preciso fazer isso para que se possa prosseguir, em bases sãs, um processo de desenvolvimento em Portugal e um processo que conduza à melhoria das condições de vida do povo português. Creio que, se o Governo este ano faz isso em circunstâncias difíceis e com grande coragem, o governo da Aliança Democrática poderá fazer melhor em próximos anos se a conjuntura e as circunstâncias forem mais favoráveis. v*
Vozes do CDS, do PSD e do PPM: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra, o Sr. Deputado Vítor Constâncio.
O Sr. Vítor Constâncio (PS):—Sr. Presidente, Srs. Deputados: As questões que me foram postas reconduzem-se, no fundo, todas a uma só: à pretensa contradição entre, por um lado, as minhas opiniões no tempo em que estive no Governo e o comportamento dos governos do PS e, por outro, as afirmações que hoje aqui produzi De três formas diferentes,
foram essas as questões que, no fundo, me foram postas. Vou responder com muito gosto.
Em primeiro lugar, é fácil ter opiniões diferentes sobre a economia quando a conjuntura económica é diferente. Enfrentámos em 1977, e suponho que disso ninguém pode ter dúvida, um desequilíbrio externo que representou cerca de 9% do produto interno, bruto e que foi, logo a seguir ao da Noruega, o mais elevado que nesse ano, em termos relativos, se verificou no Mundo. Conjuntura, portanto, de crise aguda, que já vinha, de resto, de alguns anos atrás e que exigia, obviamente, a aplicação de medidas que conduzissem a um reequilíbrio da balança de pagamentos, mesmo se isso não passasse de um objectivo intermédio, para, uma vez obtido esse reequilíbrio, se poder entrar, como na altura se disse, numa segunda fase de expansão e crescimento económico. Segunda fase a que, infelizmente, a evolução política não permitiu que tivéssemos chegado.
É, pois, fácil explicar as opiniões diferentes quando se está a analisar conjunturas diferentes. De modo ^gum a situação dos equilíbrios económico-financeiros globais da economia portuguesa é hoje idêntica à que era em 1976, em 1977 e em 1978, altura em que o PS esteve no Governo.
Além disso, não estamos aqui a discutir só a conjuntura, estamos também a discutir as grandes opções de um plano a médio prazo. E aí, presumivelmente, haveria que tentar planear com alguma ambição, mesmo se a evolução conjuntural em anos subsequentes obrigasse, por natureza das coisas, a ajustar num sentido mais restritivo.
Quando refiro um pouco mais 'de ambição, faço notar que na minha intervenção nem sequer pus directamente muito em causa o objectivo dos 5 %. Não creio que sejam os números concretos que tenham realmente importância. Estamos numa pré-, visão que tem uma margem de erro, e de facto interessa mais a atitude com que se encara e planeia ó médio pr.azo da nossa economia do que os números concretos e precisos.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Aliás, a este propósito, permito-me responder também mais em concreto ao Sr. Ministro da Habitação e Obras Púbacas. Recordo-me perfeitamente daquilo que descreveu, mas, infelizmente talvez para o Sr. Ministro, recordo um pouco mais. Recordo que estávamos no início de 1978, a econc*-mia portuguesa atravessava uma das crises financeiras mais graves das últimas décadas e o Sr. Ministro da Habitação e Obras Pútficas apresentou um dossier do Gabinete de Estudos do CDS com perspectivas de crescimento da economia de 8 % ao ano a médio prazo.
Sr. Ministro, de facto não há exagero algum na afirmação que então fiz de que essas sugestões — e dissero, aliás, de forma bem eufemística— eram voluntaristas. Realmente, se não eram voluntaristas, como a sua intervenção parece pressupor, pergunto--Ihe então por que é que hoje, em conjuntura, apesar de tudo, um pouco mais favorável, o Governo não apresentou aqui um plano a médio prazo com taxas de crescimento de 8 %.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
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O Sr. Ministro dá Habitação e Obras Públicas: - Sr. Presidente, peço a palavra, só para fazer um curto reparo.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas: - Sr. Deputado Vítor Constâncio, é que entre 1978 e 1980 gastaram-se recursos que poderiam ter possibilitado nessa altura um crescimento a um ritmo diferente, além de que a conjuntura internacional não era em 1978 tão grave como é em 1981.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): -Muito bem!
Vozes do PS: - Não diga asso, Sr. Ministro!
O Sr. Presidente: - Suspendemos agora os nossos trabalhos por trinta minutos.
Eram 17 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Irei dividir a minha exposição em dois aspectos fundamentais, dado o teor das perguntas que me foram feitas.
Em primeiro lugar, irei responder a algumas questões aqui formuladas no tocante ao sector da saúde, repetindo mais uma vez que esta Câmara, dentro de poucas semanas, irá assistir a um debate sobre esse «ema, em virtude da interpelação pedida pelo Partido Comunista. No entanto, tenho o maior gosto em esclarecer desde já alguns pontos fundamentais que aqui foram levantados e que apenas obedecem ou à incapacidade de compreensão das questões ou a pura demagoga.
Uma voz do PSD: - Às duas coisas!
O Orador: - Como todos sabemos, no problema da saúde começamos por questionar o problema do financiamento do sistema de saúde. Quando todos falam em Serviço Nacional de Saúde, quando, em termos de pura política de saúde, o Serviço Nacional de Saúde tem como paradigma o esquema inglês, exclusivamente dependente do Orçamento Geral do Estado, o Governo, «eu em especial, considero que isto está errado. Hoje, todos os países evoluídos do mundo livre consideram que isto está errado, e por isso estranho que nesta Câmara, em 1981, ainda haja quem pense que o Orçamento Geral do Estado pode ser a grande solução dos problemas da saúde.
Quando olhamos para a maioria dos países da Europa Ocidental, sabemos que parte dos orçamentos para a saúde vêm do Orçamento Geral do Estado e outra parte de um seguro social. São, pois, estas modificações que queremos introduzir, dado que os Estados não tem possibilidades económicas para isso sem que haja uma comparticipação viva e efectiva par parte da sociedade civil no tocante aos gastos da saúde. Todos nós sabemos que entre os diferentes sistemas de saúde aqueles que são sujeitos a reembolso têm menores gastos do que aqueles que são sujeitos a uma gratuitidade total.
Por outro lado, quando aqui se foca o antigo 64.º da Constituição, quando aqui se refere a Lei n.º 56/79 era bom que nós, de uma forma ponderada, de uma forma calma, de uma forma objectiva, disséssemos claramente a esta Câmara quem é que efectivamente paga os serviços de saúde: somos todos nós, contribuintes. E, para que o pagamento possa ser visto de acordo com a condição sócio-económica de cada um, temos de institucionalizar um regime que não permita, através da gratuitidade, proteger ricos e pobres, proteger quem muito tem e quem nada tem, como é aquele que apenas serve a demagogia de uma esquerda completamente ultrapassada e que não corresponde às realidades actuais.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Também aqui foram referidas - vejam bem! - como fontes de financiamento as taxas moderadoras. É preciso não conhecer absolutamente nada do que são sistemas de saúde! Todos os países a começar na Rússia, passando pela Finlândia e pelos países da Europa Ocidental e acabando nos Estados Unidos, têm taxas moderadoras. Estas servem apenas como cordão sanitário, para moderarem - daí o seu nome - o acesso exagerado aos cuidados de saúde, nunca podendo ser vistas como fonte de financiamento.
Senão vejamos: amues destes aumentos - como sabem, não são da minha autoria, mas, se não existissem, eu tê-los-ia, feito - as taxas moderadoras de então faziam arrecadar cerca de 64 000 contos. Actualmente arrecadam-se 460 000 contos. Qualquer pessoa que tenha um mínimo de consciência da economia do sistema de saúde sabe que 460 000 contos a mais ou a menos nada resolvem.
Risos do PCP.
Em todo o caso, posso adiantar que com a introdução das taxas moderadoras conseguimos em quinze dias - porque é esse o levantamento feito na primeira quinzena de Fevereiro, dado que entraram em vigor no dia 1 desse mês -, num total de 490 000 consultas, uma redução de cerca de 48 000, fora todos os reflexos de reacção em cadeia no tocante a exames complementares, porque, normalmente, quem vai a uma consulta traz, como todos sabem uma receita que implica medicamentos e uma outra que implica exames complementares.
Uma voz do PCP: - Que culpa tem o doente?
O Orador: - Por outro lado, os problemas da saúde passam, ao contrário daquilo a que este país assistiu, de uma forma espantosa e atónita pela revitalização dos cuidados diferenciados, quer dizer, pela revitalização dos hospitais centrais e distritais.
Fala-se em cuidados primários, mas esquece-se que Portugal desde há muito vive numa bipolarização de consumo de cuidados médicos: por um lado, uma população que já consome os cuidados mais sofisticados e, por outro, uma população que apenas tem acesso aos cuidados primários.
O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!
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O Orador: - Segundo suponho, Portugal não é, e por decisão política não pretende ser, um país do Terceiro Mundo. E, se de facto os cuidados primários são essenciais e se a promoção da saúde e a prevenção da doença são medidas essenciais, Portugal também não pode esquecer, como pais europeu que é e que se quer integrar na CEE, de que necessita, a par destes cuidados, de ter cuidados sofisticados, de ter cuidados diferenciados, porque as apendicites ou outros cuidados do mesmo género continuam a existir, independentemente de termos ou não bons cuidados primários.
Aquando da apresentação do Programa do Governo tive ocasião de referir que uma das preocupações deste governo era a revitalização dos hospitais centrais. E porquê? Em primeiro lugar, porque os hospitais distritais são 42, como sabem, dos quais 24 são dos melhores hospitais da Europa em termos de. (instalações e de equipamentos.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não me diga!
O Orador: - O problema dos hospitais distritais não é, pois, um problema de instalações e de equipamento, é sim, um problema de povoamento em termos dos diferentes estratos sócio-profissionais da saúde.
Já no tocante aos hospitais centrais, o problema é completamente diverso. De entre os 9 hospitais centrais temos 7, excluindo os 2 hospitais psiquiátricos, em profunda degradação. Mas, olhando para a zona a que maior número de doentes tem acesso, a zona da Grande Lisboa -que, em termos médicos e não administrativos, se chama área metropolitana de Lisboa, que abrange uma população de 2 500 000 indivíduos e que tem como pólo noroeste Mafra, como pólo nordeste Benavente, como pólo sudeste Palmela e como pólo sudoeste Sesimbra -, esta quadrícula tem, em termos dos ratio internacional, um défice de 2400 camas.
Sabendo nós que é a esta zona que tem acesso a maior parte dos doentes da periferia -porque somente 10 % dos doentes da periferia têm acesso a Lisboa -, temos de fazer um grande esforço quer em relação aos hospitais degradados que (temos, quer em relação a novas camas que precisamos de instalar. Daí que esteja em construção o Hospital do Barreiro, que se vai associar ao Hospital de Almada, e que se vá arrancar com o novo Hospital Ocidental de Lisboa, situado no Restelo, que servirá uma zona altamente populosa, Almada, com cerca de 120 000 habitantes.
Há outro aspecto extremamente importante, aqui foi focado de uma maneira triste por uma pessoa que deve conhecer bem estes assuntos. Quando o Governo se refere à transformação do grande ambulatório com a extinção dos Serviços Médico-Sociais, é evidente que não se trata, pura e simplesmente, de passar os Serviços Médico-Sociais para os centros de saúde. O Sr. Deputado Fernando Vieira, meu ilustre colega, sabe, ou devia saber, que um dos graves problemas deste país passa por esta zona do grande ambulatório, que tem cerca de 25 milhões de consultas por ano e que abrange as consultas externas hospitalares - o chamado (ambulatório hospitalar» e, sobretudo, o ambulatório extra-hospitalar, que passa pelos Serviços Médico-Sociais e pelos centros de saúde.
Os Serviços Médico-Sociais estão em profunda rotura, não prestando os cuidados de saúde para que foram criados. E por isso não é mera demagogia transformar os cuidados médicos de base e inseri-los nos locais próprios, que são os centros de saúde, deixando, para além das muitas especialidades de base - pediatria, obstetrícia, ginecologia e clínica geral -, o resto para o ambulatório hospitalar, conforme nós pretendemos fazer.
O Governo assim está a trabalhar neste momento e em breve anunciará, em termos muito concretos, a criação da carreira de generalista, fundamental para que os centros de saúde tenham vida e possam prestar cuidados de saúde capazes. Ao contrário do governo do partido do Sr. Deputado Fernando Vieira, que tudo fez para liquidar a carreira de generalista, nós vamos implementá-la.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado - dizem-me que o tempo é curto -, queria apenas dizer o seguinte: é evidente que a periferia obedece a uma grande opção, que também constitui uma grande opção deste governo por mim já referida: o provimento dos seus quadros. Mas aqui, Srs. Deputados do Partido Socialista e do Partido Comunista, a opção é clara: ou é uma requisição administrativa militarista ou é uma requisição através de normas claras, concretas, em termos de rendimentos mensais e de carreiras. É esta a opção do Governo. Nós não obrigamos ninguém a ir para a periferia. Vamos, sim, tamponar a zona central e criar condições reais na periferia para que as pessoas possam ir para lá trabalhar de acordo com as necessidades dessa mesma periferia.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Em paralelo, foi aqui referido o problema da política do medicamento. Já disse - foi pena que o Sr. Deputado que fez a referência se tivesse esquecido - que o sector crónico dos doentes que necessitam de uma terapêutica diária é um dos aspectos da política deste governo relativa ao medicamento, ou seja, estipular que este sector seja completamente gratuito. Em Portugal o problema do medicamento não é o consumo exagerado - nós somos o país da Europa com o menor consumo de medicamentos per capita -, mas sim a distorção do respectivo mercado. Este ano estão previstos para esse fim cerca de 11 milhões de contos, o que corresponde a 45 % do orçamento dos Serviços Médico-Sociais, sendo Portugal, repito, o país que consome menos medicamentos. O problema é, pois, de distorção. Teremos que fazer três grandes sectores em que os doentes crónicos sejam completamente protegidos, em que tenham um acesso totalmente gratuito ao medicamento, como é o caso dos diabéticos e dos doentes reumáticos crónicos.
Outra zona - e essa sim é a grande viragem, a grande revolução, digamos, no bom sentido da palavra - é a comparticipação do Estado, que não tem que comparticipar em todos os medicamentos, alguns dos quais são anti-saúde e outros são profundamente obsoletos, naqueles medicamentos que são essenciais à cobertura da patologia, e mais nada. Os restantes,
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dado que estamos num Pais de mercado, serão vendidos, prevendo também o Acordo de Nuremberga que, como o Sr. Deputado sabe, como meu colega, uma das condições fundamentais é a liberdade de prescrição- já não é a mesma a liberdade de prescrição do Estado.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador - Tinha mais coisas para dizer sobre saúde, mas deixá-las-ei, com muito gosto, para o debate sobre saúde que brevemente irá ter lugar nesta Assembleia e em que estarei ao dispor dos Srs. Deputados o tempo que quiserem.
A finalizar a minha intervenção, responderei à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
É triste que a Sr.ª Deputada distorça a realidade, é triste que pelo menos de há dois anos para cá venha dizendo o mesmo e que não atenda à realidade que tem defronte dos olhos...
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - O Sr. Ministro não vem dizendo o mesmo desde há dois anos?
O Orador: - Desculpe, Sr.ª Deputada, mas agora estou eu a falar.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Foi só um aparte.
O Orador: - É curioso que, quando a Sr.ª Deputada lamenta que o Orçamento Geral do Estado não comparticipe no orçamento da segurança social, provavelmente se esquece de metade do défice do abono de família dos rurais e das pensões dos ferroviários, em que, como sabe, o Orçamento Geral do Estado comparticipa.
Quer aquando da discussão do Programa do Governo, quer na apresentação do Orçamento Geral do Estado, disse claramente que era fundamental caminharmos para uma via em que o Orçamento Geral do Estado comparticipasse no orçamento da segurança social. Mas mesmo sem essa comparticipação conseguimos o que a chamada esquerda portuguesa nunca conseguiu, ou seja, equilibrar as finanças da segurança social e, através desse equilíbrio, dar mais prestações sociais, aumentar nomeadamente as pensões de reforma - mas não só de reforma - enquanto os senhores, durante anos e anos, falavam e nada conseguiam.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - E é estranho que o MURPI - possivelmente a Sr.ª Deputada fala em nome dele, uma vez que tem a ver com o seu partido - venha neste momento pedir aumento das pensões. E eu apenas refiro o seguinte pormenor: os aumentos que o MURPI desejaria correspondiam, nada mais nada menos, do que a todo o orçamento da segurança social em 1979 e a 45 % do actual. Veja-se assim como poderíamos nós satisfazer as necessidades dos restantes indivíduos, que são todos os cidadãos portugueses que, de uma maneira ou de outra, estão a coberto da segurança social.
A Sr.ª Seabra (PCP): - É falso.
O Orador: - Direi ainda que também estranho que à Sr.ª Deputada tenha aqui referido falhas do Governo em relação aos deficientes, dizendo que nós esquecemos o Ano Internacional do Deficiente, quando pela primeira vez se apresentou, de uma maneira clara, objectiva e não demagógica, um conjunto de medidas respeitantes ao deficiente, em relação ao qual, só no tocante a pensões, este orçamento da segurança social tem cerca de 20 % de aumento em relação ao do ano passado.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador - Sr.ªDeputada, no que diz respeito às suas provocações em relação a pessoas que já morreram e em relação à política do País, digo-lhe apenas que, independentemente de quaisquer oscilações pessoais que me queira atribuir, em relação ao seu partido fui sempre muito firme e essa é uma política que me orienta claramente.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
O Orador - Para finalizar, quando a Sr.ª Deputada refere que as taxas moderadoras não protegem os deficientes, direi que possivelmente a Sr.ª Deputada não leu com atenção o Despacho n.º 57/80, porque uma das suas alíneas, que permite a gratuitidade em relação a taxas moderadoras, refere-se aos deficientes e a outros extractos sociais que, no total, são cerca de 2 milhões e que, esses sim, como o despacho o prevê, deveriam estar protegidos em relação a estas medidas. Os restantes pagam de acordo com as suas possibilidades, porque quem quer saúde paga-a, independentemente da sua condição, excluindo as chamadas classes desfavorecidas.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Chamadas?!
O Orador: - Por outro lado, também gostaria de acentuar que é altura de inflectirmos o rumo doentio, dado que aqui foi referido o rumo doentio da saúde - expressão que há muito utilizo-, de o Estado continuar a ser um empregador obrigatório dos diferentes extractos sócio-profissionais.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.
O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, prezados colegas: Não vou intervir neste debate, vou apenas prestar um esclarecimento à Câmara, para que não fiquem sem resposta duas afirmações que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais fez e que são autênticas enormidades.
A primeira é a de que o sistema de saúde a que vulgarmente se chama a medicina convencionada ou do seguro de saúde fica mais barato do que o Serviço Nacional de Saúde, isto é, o serviço de saúde que assegura a prestação de cuidados de saúde em termos de gratuitidade.
Na Inglaterra, onde vigora, como sabem um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, os dispêndios com a saúde são cerca de 4 % do produto interno bruto. Na República Federal da Alemã-
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nhã, onde vigora um sistema de medicina convencionada - que certamente o Sr. Ministro gostaria de ver transplantado para Portugal, mas isso não vai acontecer-, as despesas com a saúde são 8 % do produto interno bruto. Poderemos discutir isto com mais pormenor daqui a dias durante a interpelação ao Governo que irá ter lugar nesta Câmara.
Outra afirmação; que carece de um esclarecimento é a de que as taxas moderadoras não funcionam como fonte de financiamento. Infelizmente funcionam, Sr. Ministro, porque os aumentos verificados nas consultas dão ao Estado, como já tive oportunidade de dizer noutra ocasião, aquando da discussão do Programa do Governo, mais de 500 000 contos de receita. É pouco certamente em termos absolutos, mas é muito porque esse dinheiro sai do bolso de pessoas que não podem pagar e que porventura terão de empregar as suas magras economias ou as suas reformas de miséria no pagamento dessas taxas moderadoras.
Mais escandaloso ainda é o aumento verificado nos meios auxiliares de diagnóstico, designadamente a criação de novas taxas onde o Governo vai também buscar mais de 500000 contos. Tudo isto se provará oportunamente. O Ministério dos Assuntos Sociais tem os elementos estatísticos que permitem tirar estás conclusões.
Mas ainda mais escandaloso, meus senhores - talvez, o Sr. Primeiro-Ministro não o saiba - é o Ministério dos Assuntos Sociais ter imposto recentemente um aumento das taxas pagas pelos serviços do Estado aos meios auxiliares de diagnóstico da ordem dos 40 %, aumento esse que não foi reivindicado pelos proprietários dos laboratórios, ou seja, pelos interessados. E até, Sr. Ministro dos Assuntos Sociais - olhe cá para mim ...
Risos do PSD, do CDS e do PPM.
Não se riam porque isto não tem graça nenhuma e é verdadeiramente escandaloso.
Dizia eu, pois, quê o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais tem na sua mão uma exposição de um dos maiores laboratórios da Europa, situado em Lisboa, a impugnar esse aumento por o considerar verdadeiramente excessivo e escandaloso. Não sei se V. Ex.ª já despachou esse requerimento. O Governo resolveu aumentar, de uma forma unilateral, e contra a própria vontade dos interessados, as taxas que a Previdência paga pelas radiografias, pelas análises, etc. E é por isso que o Governo vem aumentar as taxas moderadoras, justamente para ir buscar cerca de 1 milhão de contos, para os colocar directamente na mão ou no bolso desses senhores.
Com certeza não foi por acaso - já agora vem a talho de foice dizer - que essa convenção foi assinada na ausência do presidente da comissão administrativa dos Serviços Médico-Sociais, que não concordou com esses aumentos.
Eram estes esclarecimentos que eu queria que ficassem consignados no Diário desta sessão. O futuro se encarregará de pedir contas a este governo..
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais pode ser um bom médico, mas nesta matéria da saúde fez um mau diagnóstico e por isso a terapêutica não pode ser boa.
Aplausos do PS, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, estava convencida de que quando o Sr. Ministro tomasse a palavra viria esclarecer as verbas do Ministério dos Assuntos Sociais para que pudéssemos, através de um esclarecimento, saber qual é a distribuição das várias verbas pelo Ministério dos Assuntos Sociais e conhecer mais em pormenor qual é a política de saúde deste governo. Isto uma vez que foram vãos todos os esforços que fizemos ^m comissão para conhecermos a distribuição das verbas do Ministério dos Assuntos Sociais, tendo-nos dito o Sr. Secretário de Estado de Saúde que aquilo não tinha nada que saber: era mais 20 % que no ano passado em cada uma delas e o Governo, ao longo do ano, iria vendo a forma de transferir verbas de um lado para outro. Era, assim, uma espécie de mercearia de província, porque os supermercados já não são assim geridos.
O Sr. Ministro, pelo contrário, teceu uma série de considerações sobre a política de saúde que em breve serão discutidas nesta Assembleia aquando da discussão da interpelação sobre saúde pedida pelo PCP. Por isso iria apenas fazer-lhe algumas perguntas e rebater algumas das questões que colocou em relação à situação financeira e ao debate do Orçamento Geral do Estado em matéria de saúde.
E digo-lhe, Sr. Ministro, que a oposição, e particularmente o meu partido, não conhece quais são as verbas de que dispõe o Ministério do:> Assuntos Sociais, excepto a verba global que vem referida no Orçamento Geral do Estado. Pela primeira vez isto acontece num debate sobre saúde.
Não irei tecer considerações sobre a política de saúde que definiu.; Penso que a sua frase quase final reflecte a política do Governo e reflecte exactamente aquilo contra que nós, PCP, lutamos: «quem quer saúde paga-a». Sr. Ministro, nós pensamos que a saúde é um direito.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Não percebeu, Sr.ª Deputada.
A Oradora: - Faltava cá o Sr. Deputado José Vitorino para explicar!
Nós pensamos que a saúde é um direito inerente aos cidadãos. E quando o Sr. Ministro aqui chega e diz, elogiando a política do governo da AD, que houve um abaixamento nas consultas, di-lo com o ar de quem quer fazer acreditar que isso se traduz em melhoria do bem-estar e da qualidade de vida dos Portugueses. Sr. Ministro, quantos desses 40000 portugueses não puderam ir às consultas porque não tinham dinheiro para pagar a taxa moderadora? Quantos desses portugueses têm um melhor serviço de saúde desde que existem as taxas moderadoras?
E quando nós aqui referimos que as taxas moderadoras servem para financiar, não queremos dizer que são para financiar a saúde, para financiar o orçamento da saúde do Ministério, são, sim, para financiar a medicina convencionada. E em relação a isto, Sr. Ministro, esclareça - já fizemos esta pergunta e não obtivemos resposta - quanto é que o Governo prevê gastar lera 1981 com a convenção dos
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radiologistas, com a convenção dos analistas, com a convenção dos médicos da medicina convencionada. É para isso que o Governo não tem dinheiro, pelo que cria as taxas moderadoras para financiar os barões da medicina.
Quanto ao orçamento da segurança social, fico satisfeita por o Sr. Ministro dizer que há dois anos que digo a mesma coisa. Não é só de há dois anos para cá, Sr. Ministro, é de há vinte. O Sr. Ministro é que só me conhece há dois anos.
Fico também satisfeita por saber que o Sr. Ministro não diz o mesmo desde há vários anos. Vai dizendo coisas diferentes, inclusive em relação à própria política de saúde que preconiza.
Mas em relação ao orçamento da segurança social há que clarificar o seguinte: o Sr. Ministro de que o Governo tem uma política em relação aos deficientes. Nós dissemos que o que o Governo faz é considerar como benefícios aos deficientes aquilo que já existe, aquilo que já está legislado, aquilo que já de há muito tempo os deficientes têm. Em comemoração do Ano Internacional do Deficiente é que não há nada de novo.
Quanto às taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais, em relação às quais o Sr. Ministro afirma que os deficientes estão isentos, reafirmo o que disse na minha intervenção: estão isentos os deficientes que têm pensões, na estão isentos os deficientes que não têm pensões, que estão no activo e que necessitam de cuidados médicos especiais. Era a esses que eu me referia quando disse que a principal medida que o governo da AD tomou em relação as deficientes foi, exactamente, a de lhes aumenção aos deficientes foi, exactamente, a de lhes aumentar a taxa.
Não me resta muito tempo, mas referirei ainda, que, quando o Sr. Ministro diz que eu represento aqui ou defendo as mesmas reivindicações do MURPI
- uma das habituais «bocas» do Sr. Ministro -, devo dizer que é com muita honra que o faço. É que eu trago aqui as reivindicações do MURPI e o Sr. Ministro traz as do capital. É só essa a diferença.
Aplausos do PCP e do MDP/CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, se assim o entender.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais; - Vou ser muito breve em virtude; do pouco tempo de que o Governo dispõe.
Sr. Deputado António Arnaut, eu não falei em medicina convencionada, falei em reembolso. A medicina do reembolso é também chamada de avença, por questões de ordem psicológica de mercado. Quem sente o pagamento dos custos de saúde tem de facto uma noção mais exacta do que aquele que se acoberta com uma gratuitidade que protege, repito, ricos e pobres.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - E o pagamento?
O Orador: - No tocante às taxas moderadoras - e aqui respondo ao Sr. Deputado António Arnaut e à Sr.ª Deputada Zita Seabra -, é falso que essas taxas tenham sido criadas para pagar a medicina convencionada.
Relativamente a radiologistas e analistas, como sabem, nada têm a ver com a convenção estabelecida entre os Serviços Médico-Sociais e a Ordem dos Médicos. Há muito que os Serviços Médico-Sociais já tinham convenções. Apenas se deu um aumento do preçário de acordo com as necessidades e o aumento de material e por isso, quando se diz que é para pagar, quando todos nós sabemos que essas convenções andam à volta de uns 3 milhões e 400 000 contos, é porque de facto não se quer ver as contas.
Por outro lado, estranho que se refiram às taxas moderadoras quando a Lei n.º 56/79, tão do carinho do Partido Socialista e do Partido Comunista, estipula essas taxas moderadoras - por isso não estamos a inventar nada. Mas, mesmo que essa Lei não se referisse, às taxas moderadoras, eu implementaria essas mesmas taxas, pois considero que é a única forma que há para controlar o abuso do acesso aos cuidados de saúde.
O Sr. António Arnaut (PS): - Dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. António Arnaut (PS): - É só para perguntar ao Sr. Ministro se a Lei n.º 56/79, em relação à qual teve um certo acanhamento em chamar-lhe a Lei do Serviço Nacional de Saúde, só lhe interessa na parte respeitante às taxas moderadoras.
O Orador: - Não, não foi isso que eu disse - deixe-se de sofismas, Sr. Deputado. Disse apenas que as taxas moderadoras são um princípio consagrado nessa lei e agora o Sr. Deputado arvora-se em príncipe da ingenuidade em relação a essas taxas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Entretanto a Sr.ª Deputada Zita Seabra, como é típico do Partido Comunista, nunca percebe aquilo que é razoável.
Risos do PSD, do CDS e do PPM.
Uma voz do PCP: - Pois é! Os que têm dinheiro vão ao médico, os que não têm não vão.
O Orador: - Eu disse que a saúde é um direito de todos os cidadãos. Só que será um direito escalonado de acordo com a sua condição sócio-económica. E isto nada tem a ver com o princípio da gratuitidade, da universalidade e da integralidade que define o Serviço Nacional de Saúde, conforme a Lei n.º 56/79 estipula.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Em termos do orçamento da saúde, queria só referir que os valores orçamentados no ano passado foram de 36 milhões e 969 000 contos. Este ano são de 45 milhões, o que dá um acréscimo de 21,9%. A taxa de inflação era de 24% e este ano é de 17 %. Temos, por aqui, os ganhos garantidos.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.
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O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, desculpe-me, mas V. Ex.ª esqueceu» -se - só por esquecimento é que posso justificar a omissão - de me informar se é ou não verdade que uma clínica de diagnóstico impugnou, por excessiva, a nova tabela de preços que o Governo fixou, para os meios complementares de diagnóstico.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Então põe em dúvida as suas próprias palavras?
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Com toda a lealdade, Sr. Deputado, informo-o de que apenas tenho conhecimento disso através de uma fotocópia do documento. O requerimento oficial não chegou ainda ao meu Ministério.
O Sr. António Arnaut (PS): - Os serviços estão atrasados!
Risos.
O Orador: - Sr. Deputado e antigo Ministro dos Assuntos Sociais, se os serviços funcionam mal, só é pena que V. Ex.ª não os tenha posto a funcionar bem quando por lá passou.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Depois das brilhantes afirmações proferidas pelo Sr. Ministro dos Assuntos Sociais seria quase desnecessária esta minha Intervenção.
Uma voz do PCP: - Então não fale.
O Orador: - Penso, no entanto, que devemos precisar alguns pontos. Quando surgem vozes do PCP a pedir que eu não fale, isso só revela um pouco do totalitarismo que sabemos existir sempre dentro deles.
Aplausos do PSD e risos do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal possui hoje no campo da saúde uma situação extremamente degradada e que só por maquiavelismo pode ser atribuída à actual maioria.
A taxa de mortalidade infantil encontra-se extremamente elevada (38,9 % em Portugal contra 9,2 % na Suécia); possuímos um número insuficiente de técnicos do sector e, embora nos aproximemos do excesso de médicos, existem grandes faltas em algumas especialidades e uma grave assimetria regional na distribuição de meios e técnicos com superconcentração nos centros de Lisboa, Porto e Coimbra.
Os hospitais distritais e concelhios estão subaproveitados, funcionando frequentemente como hospícios os hospitais centrais estão saturados; os serviços de urgência dos grandes centros aproximam-se da ruptura; as taxas temporais de internamento são extremamente elevadas; possuímos uma péssima gestão dos recursos com um enorme excesso estatístico nos meios complementares de diagnóstico e uma situação anárquica nos medicamentos.
Disparidade que não é exclusiva da área da saúde e que se revela em variadíssimos outros dados estatísticos desde o número de telefone aos carros, passando pelo consumo de electricidade, e pelas redes de saneamento, etc.
Sabemos todos que os resultados na saúde não são só resultados dos meios materiais e humano do sector.
Os níveis de saúde de uma população dependem de um quadro global de qualidade de vida dependente de várias realidades: redes de abastecimento domiciliário de água, de esgotos, habitação, higiene e quadro sanitário do meio, educação, alimentação, etc.
Poder-se-á pensar que, perante a evidência da situação, era desnecessário este apelo à realidade existente.
Acontece que se ouvem, com frequência, tantos discursos políticos irrealistas sobre a matéria que considerei absolutamente necessário relembrar às pessoas a real situação em que nos encontramos.
Só por evidente má fé ou completa ignorância se pode acusar a actual maioria como culpada desta realidade, tanto mais que, durante o ano de 80, o anterior governo proeurou, embora com medidas conjunturais, e logo não resolutivas, beneficiar o quadro que herdara.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A título de exemplo, recordo: a criação dos Serviços de Atendimento Permanente, que facilitaram a milhares de pessoas cuidados médicos imediatos e funcionaram como adiamento da situação de ruptura dos serviços de urgência e consultas externas dos hospitais; o facto de se ter iniciado o serviço médico de base condicionada, que melhorou em muitas regiões o atraso de consultas nos postos das «caixas»; o ter-se tentado pela primeira vez levar especialistas para os hospitais distritais, embora com resultados inferiores aos previstos e desejados; o ter-se acelerado a construção de alguns hospitais e centros de saúde concelhios.
O antigo regime, totalitário, de estreita visão corporativista, nunca teve como prioridade uma política de saúde.
Após 1974 transformou-se a saúde em bandeira política, em fácil recurso de discursos demagogos, em acção de projecção pessoal de políticos incapazes de uma visão global.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Falou-vos aqui um deputado socialista da Constituição. Ora, a «constituição» ficou fértil, neste sector, em bem-intencionadas frases, que nós na generalidade, subscrevemos, mas que foram transformadas em letras mortais pelos diferentes governos mais ou menos socialistas, mais ou menos presidenciais.
«Orientar a sua acção para a socialização dos sectores médico-medicamentos» quiseram os contribuintes; manteve-se a legislação corporativista das farmácias; não se racionalizaram os gastos em medicamentos e análises; não se criou uni formulário nacional de medicamentos com um quadro legal que possibilite que se comparticipem os medicamentos in-
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dispensavas, se possível com tendência para a gratuitidade - e, contrariamente ao que disse um deputado socialista, independentemente da idade do utente - « que se deixe de pagar placebos.
Perguntou, comi ironia e bastante hipocrisia, o Sr. Deputado Vidigal Amaro por que é que, já que se obrigam os utentes a pagar taxas moderadoras e não se obrigam também os médicos a pagar uma (taxazinha moderadora» -por causa dos gastos nos meios complementares de diagnóstico. Ora, eu gostava de recordar ao Sr. Deputado que, em termos de saúde, por diversos factores, se gasta bastante em meios complementares de diagnóstico. V. Ex.ª sabe que nos Serviços Médico-Sociais é escasso o tempo para consulta e que muitos médicos, por um certo comodismo, por uma certa violência das pessoas que exigem as análises; por falta de tempo para fazer as histórias clínicas, abusam dos meios complementares de diagnóstico.
Risos do PS e do PCP.
Nessa relação médico-doente, que se pretende humanizada, as taxas moderadoras poderão ser um óptimo factor tamporizante do abuso dos meios complementares de diagnóstico, sem que portanto haja necessidade de serem os medites a pagarem-na.
Na Constituição lê-se também que se deve «Garantir o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de medicina preventiva», mas os governos ditos progressistas desprezaram os trabalhadores, nunca tendo feito uma política de saúde ocupacional. Manteve-se a legislação de 67, desprezou-se a recomendação da OIT, continuou-se com uma medicina de trabalho digna de país esclavagista. Isto feito pelos mesmos que, defendendo a prevenção, deixaram de comparticipar, por exemplo, os medicamentos para prevenir a cárie.
«(Garantir a eficiente cobertura hospitalar e médica do País», lê-se também na Constituição. No entanto, as estatísticas sobre a distribuição dos médicos e das camas tomam desnecessário qualquer comentário, mas não posso deixar de lembrar que, se hoje alguns concelhos possuem médicos, tal facto se deve, na sua maioria, ao Serviço Médico à Periferia que foi criado por um social-democrata.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Foi para melhorarmos esta realidade que os Portugueses nos elegeram.
Nas propostas de lei em discussão são formulados objectivos e acções que merecem o nosso total apoio e, estamos certos, da maioria da população.
Por serem do conhecimento desta Câmara, prescindimos de uma exaustiva numeração, mas, chamamos a vossa atenção para as seguintes prioridades.
Coordenar os diversos subsistemas de saúde que existem no País, visando obter uma maior eficiência, maior justiça e melhores cuidados médicos;
Criar um serviço de saúde raciona], geral e universal, em que falsos conceitos de gratuitidade não sejam fonte de injustiça social e em que exista uma relação médico-doente humanizada; ...
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ...
Reestruturar as carreiras do pessoal do sector, redignificando e desfuncionalizando, procurando garantir o pleno emprego às novas gerações de técnicos;
Diminuir as assimetrias regionais em técnicos e meios, preenchendo e alargando os quadros dos hospitais distritais e centros concelhios;
Promover campanhas de educação sanitária, incentivar a saúde preventiva, beneficiar os serviços de saúde materno-infantil, de saúde mental e de planeamento familiar e alterar o quadro legal da medicina do trabalho de acordo com as recomendações internacionais e melhorar a reabilitação, acelerando a formação de técnicos.
Promover a recuperação dos hospitais centrais;
Introdução de uma gestão mais eficiente dos hospital, racionalizar os gastos nos meios complementares de diagnóstico e terminar com a anarquia no sector dos medicamentos.
Estas medidas senão, par si só, se firmemente executadas perfeitamente capazes de diminuir o peso da saúde no OGE. A proposta de lei do orçamento atribui à saúde mais cerca de 20 % que o OGE de 80. Este aumento percentual, embora já superior à inflação, verá o seu valor real aumentado se se fizer uma clara política de contenção de gastos.
Teremos de cumprir o nosso mandato, deixando a verborreia • pseudo-revolucionária e realizando uma política social democrática de clara, séria e pragmática socialização da medicina.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não basta, na saúde, fazer diagnósticos e formular uma terapêutica.
Outros serão - e foram - capazes de o fazer.
A diferença está em que a queremos executar e temos esperança de que conseguiremos.
O futuro julgará, tal como já julgou nas últimas eleições. Estou, pois, certo de que a política dia saúde, em 1984, merecerá o voto favorável do povo português.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Herberto Goulart.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O dia que foi retirado a este debate parlamentar tem servido aos oradores governamentais como pretexto para travar as suas explicações, como pretexto para não responderem a algumas questões com o argumento da falta de tempo.
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A nós, MDP/CDE, foram-nos dados precisamente setecentos e vinte segundos para intervirmos sobre as propostas de lei do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1981. E para uma utilização dos quinhentos e quarenta segundos ainda disponíveis vou limitar-me a fazer uma opção, que naturalmente não é uma opção entre as confusas grandes opções do Plano, mas sim uma opção por uns simples comentários ao Orçamento Geral do Estado para 1981.
Comecemos por uma referência à decomposição do défice orçamental.
O défice corrente, aumentando mais de 11 milhões dei contos, passa a representar 45,2 % do défice global, quando no Orçamento corrigido de 1980 não ia além de 40,9 %.
Em contrapartida, o défice de capital, aumentando apenas uns milhões de contos, diminui para 54,8 % do défice global, quando no Orçamento corrigido do ano anterior se cifrava em 59,1 %.
Isto é, a contenção do défice orçamental é feita à custa das despesas reprodutivas, e não das despesas correntes. Para quem já afirmava, quinze meses atrás, no Programa do VI Governo, a necessidade de racionalizar os serviços públicos e melhorar a sua eficiência, esta forma de conter o défice orçamental, contrariando inclusive objectivos proclamados nas grandes opções, é bem comprovativa da inoperância dos governos da AD quanto às projectadas melhorias do funcionamento dos serviços públicos.
Justificou o Sr. Ministro das Finanças e do Plano esta anómala situação com o argumento de serem rubricas de difícil contenção numa política de curto prazo. Seria fruto de elevada percentagem, mais de 60 % no conjunto, das despesas com pessoal e dos encargos com a dívida pública no total das despesas correntes.
Mas como explicar o aumento superior a 60 % dos encargos com a dívida pública entre 1980 e 1981? São os défices orçamentais «dos anos anteriores» (no plural) ou foi o agravamento brutal da divida pública, em 1980, por responsabilidade do Governo AD?
Não terá sido por esta mesma razão que ficou sem resposta o esclarecimento solicitado pelo meu companheiro Raul de Castro na sexta-feira passada de qual a parte do aumento de encargos com a dívida pública resultante das decisões do Governo quanto a indemnizações aos ex-proprietários de bens nacionalizados?
E como explicar que na proposta orçamental para 1981 os encargos com pessoal aumentem apenas 14,11 % relativamente ao Orçamento revisto de 1980?
É conhecida a política salarial do Governo: imposição por via indirecta e disfarçada de um tecto salarial de 16 %. Isto é, o Governo utiliza-se das empresas públicas e dos seus trabalhadores para impor uma política salarial restritiva e de exploração das classes trabalhadoras.
Hoje também já é claro que o VII Governo pretende utilizar os trabalhadores da função pública para alcançar aqueles objectivos.
O Governo quer fazer de «figurino de patrão exemplar a quer aproveitar a revisão salarial da função pública para contrariar o que entende por arei» indicações salariais exageradas» (maneira sofisticada de evitar a expressão própria de «tecto salarial»). Para o conseguir não se importa de transforma as negociações salariais da função pública em pseudo-negociações e em fazer dos trabalhadores da função pública meros instrumentos da sua política.
Na verdade, à proposta dos sindicatos de um aumento salarial anual médio de 22,17 % o Governo contrapôs o ridículo aumento de 11 %, recusando-se a aumentar, uma vez mais, as diuturnidades, além de não adiantar qualquer aumento no subsídio de refeição.
Os trabalhadores da função pública, que ainda ontem, frente a esta Assembleia da República, manifestaram o seu protesto e a sua indignação, apenas querem que os seus salários não continuem a decrescer, como tem sucedido nos últimos anos. Pretendem apenas que seja reposto o seu poder de compra. Serão estas «reivindicações salariais exageradas»?
As duas situações quo acabei de citar são demonstrativas dos interesses que este governo serve e a que está submetido: pague-se aos monopolistas e latifundiários à custa do sacrifício do orçamento público, tramem-se - os trabalhadores, em particular os da função pública, para aliviar o Orçamento das despesas.
Parafraseando uma expressão que citámos anteriormente: «é tudo para os amigos, nada para os trabalhadores.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O OGE/81 é também exemplar de como o Governo concretiza o seu anunciado princípio de promover a justiça social.
O aumento de 23,5 % das receitas fiscais previstas relativamente às cobradas em 1980 é superior ao aumento planeado para o PIB a preços correntes, o que prova o aumento da carga fiscal, mas de uma fiscalidade que se exerce predominantemente sobre os rendimentos do trabalho. A evolução previsível para o imposto profissional, por exemplo, é de um acréscimo de cerca de 35 %, enquanto para a contribuição industrial vai pouco além dos 24 %.
A este propósito seria, aliás, interessante saber-se quanto são as despesas fiscais dó Estado com os incentivos fiscais resultantes do sistema integrado de incentivos ao Investimento da Lei n.º 3/72, para os sectores de actividade não abrangidos pelo sistema anterior ou do artigo 44.º do Código da Contribuição Industrial. Ver-se-ia quanto, pela via dos incentivos fiscais, da tributação sobre os rendimentos de capital são subtraídas quantias fabulosas às receitas do Estado.
Das injustiças fiscais o articulado da proposta de lei do Orçamento é exemplo flagrante; mas o pouco tempo disponível força-nos a abordar tal questão apenas durante a discussão na especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os subsídios às empresas públicas, a título de indemnizações compensatórias pela prestação de serviços sociais abaixo dos custos reais, cujo montante já no Orçamento de 1980 fora fortemente contestado pelas próprias empresas, sofre uma nova redução de mais de 300 000 contos.
Mesmo com a improvável taxa de inflação projectada pelo Governo, verifica-se uma redução, em termos reais, na ordem dos 17 %.
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As empresas públicas destas áreas serão, mais uma vez, forçadas ao recurso crescente ao crédito bancário, ainda pela razão adicional do crescimento das suas actividades. O Governo dificulta-lhes as actividades... e depois cá estará a criticá-las, porque o que é preciso é armazenar argumentos contra as empresas públicas ou o sector empresarial do Estado.
O OGE e a lei do orçamento são a melhor expressão aos reais objectivos governamentais no campo económico para 1981: promover um crescimento insuficiente do produto, agravar a distribuição do rendimento, continuar uma política de hostilidade ao sector empresarial do Estado, alargar a concessão de benesses ao capital privado nacional e estrangeiro, promover uma distribuição menos equitativa da carga fiscal.
A grande opção que o Governo anuncia para o plano a médio prazo de melhorar o nível dos Portuguesas começa logo, em 1981, por ter o sentido da sua verdadeira leitura - melhorar o nível de vida de alguns portugueses, mas não o da grande maioria da população.
Aplausos do MDP/CDE, do PCP e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Debate-se nesta Câmara um conjunto de três peças respeitantes a uma mesma lógica e uma mesma sistemática: plano a médio prazo, plano a curto prazo e Orçamento Geral do Estado para 1981.
Debatem-se três aspectos respeitantes a uma mesma realidade e com uma mesma inserção e sistematização, com os objectivos que respeitam a anos distintos, mas com uma mesma lógica, o que justifica que sejam debatidos em conjunto. Debate que é feito perante todos os órgãos de comunicação social, incluindo a televisão, e que, portanto, não é furtado de modo algum à compreensão, à análise, à visão dos cidadãos portugueses.
Diz-se que, como primeira vantagem, como primeiro mérito político deste Governo, o facto de se apresentarem grandes opções de um plano a médio prazo é já por si uma vitória. Assim é e é-o até à face da Constituição.
É curisoso, para não dizer aparentemente paradoxal, que sejam as forcas políticas que menos se identificam com a Constituição a afirmar, ao fim e ao cabo, o seu respeito pela Constituição.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - E dizemos aparentemente paradoxal porque a questão em Portugal não está no discurso político do cumprimento da Constituição, mas antes no modo como o respeito pela Constituição é verificado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Nesse aspecto a acção do Governo da Aliança Democrática, em consonância com o objectivo constitucional, é meritória.
Poderia o Governo apresentar grandes opções de um plano a médio prazo se não tivesse uma maioria parlamentar a apoiá-lo? Poderia o Governo nessas circunstâncias tomar a atitude que tomou ao apresentar as grandes opções?
A nosso ver, a existência de uma maioria parlamentar ajuda, apoia, mas não é condição necessária nem suficiente para a apresentação de grandes opções a médio prazo.
E não é condição necessária, visto que - e a história portuguesa demonstra-o - governos minoritários que consigam obter um consenso social e político que traduza uma adesão a essas opções podem fazê-lo. E foi nessa perspectiva, naturalmente, que o Partido Socialista, quando era governo minoritário, o tentou.
Não é condição suficiente, visto que em Portugal já houve governos fora do âmbito da Aliança Democrática onde existia uma maioria parlamentar, mas onde, todavia, o exercício político da apresentação de grandes opções não foi efectivado. Ou seja, não decorre somente da existência de uma maioria parlamentar a apresentação de grandes opções do Plano, decorre, sim, de duas circunstâncias simultâneas, melhor se diria, subjacentes à existência de uma maioria parlamentar. São elas, em primeiro lugar, o exercício de uma vontade política em querer comprometer-se com o futuro e, em segundo lugar, a existência de um modelo claro de concepção, gestão e funcionamento do próprio sistema.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - São essas duas características que, a nosso ver, devem ser realçadas e destacadas pelo facto de o governo da Aliança Democrática apresentar grandes opções de médio prazo.
Daqui se infere automaticamente que o consenso social requerido pode ser estabelecido na base de uma proposta do Governo, mas, de seguida, abarcando sectores sociais e sectores políticos que nada tenham a ver com a óptica do Governo, que se perfilem até como oposição, mas que, na prática, estão minimamente de acordo com algum travejamento fundamental dessas mesmas opções, dessas mesmas propostas.
O consenso existiu e até certo ponto foi alargado no dia 5 de Outubro do ano passado, quando um governo da Aliança Democrática viu reforçada a sua maioria política, o que significa que o teste de realizações que 1980 celebrou traduz uma aprovação prévia da própria opinião pública portuguesa ao travejamento das grandes opções que o governo, para quatro anos, iria naturalmente apresentar à Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Nesse sentido, pode-se falar até de um certo consenso político prévio por parte da população portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Debater as grandes opções do plano a médio prazo e debater um modelo de sociedade, é debater um mo-
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delo de vida, é, em certa escala, reconstruir, em grau próprio e com uma natureza própria, o debate do Programa do Governo. A grande admiração manifestada ontem por um deputado do Partido Socialista peio conteúdo inovador do Programa do Governo discutido há bem pouco tempo nesta Câmara foi natural perante esse mesmo carácter inovador aqui presente e hoje explicitado.
Mas que diz a oposição, que dizem as seis oposições, ao governo da Aliança Democrática relativamente ao conteúdo das opções do plano a médio prazo e a curto prazo? A perplexidade nesse aspecto é total, porque certas oposições dizem que o projecto da Aliança Democrática, consubstanciado com variáveis instrumentais neste plano, é claro - disseram mesmo que é demasiado claro -, enquanto para outras não existe e para outras ainda é ambíguo. Ou seja, perante o conteúdo fundamental das grandes opções, a posição perfila-se de modo distinto, de modo até contraditório consigo própria, o que mais não revela do que o seu desejo de contemplar, de analisar, de estudar e de discutir este plano, desejo que é, sim, ele próprio diferenciado e contraditório.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Três tipos de críticas fundamentais foram lançados pelas oposições. Tentaremos sobre cada uma delas explicitar o nosso ponto de vista.
A primeira diz que estas grandes opções a curto e a médio prazo são incorrectas na formulação, na apresentação, na sistemática, na maneira como foi concebida a óptica de planeamento.
Srs. Deputados da oposição, a oposição que VV. Ex.ªs manifestam ao Governo, ao projecto da Aliança Democrática, não é só uma oposição de programa, não é só uma oposição de conteúdo, é, inevitavelmente, também uma oposição quanto à concepção e ao planeamento. O que a oposição faz é pedir ao Governo que assuma como sua a concepção que a oposição tem da sua óptica de planeamento. O que a oposição pede é que o Governo não seja governo, que se demita de ser Aliança Democrática e passe a ser oposição na concepção do planeamento. O que a oposição solicita é que o Governo se perverta a si próprio, é que o Governo anule o próprio sentido político da óptica de planeamento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Para este governo, e tal como nós o entendemos, três aspectos fundamentais estão contemplados nas grandes opções. Em primeiro lugar, está fixado um conteúdo normativo para o sector público empresarial e para o sector público administrativo. Esse conteúdo normativo foi explícito, foi claro, foi transparente. Melhor, na maior parte dos casos, em relação a intervenções dei membros do Governo, não houve criticas, não houve divergências de fundo, não houve sequer abordagem dessas concepções explícitas. Essa era a grande missão das grandes opções e foi cumprida.
A segunda missão era apontar um certo trilho, um certo caminho para a sociedade portuguesa, ou seja a indicação de que o Plano, na nossa concepção, deve introduzir e dirigir para a sociedade civil. Nesse sentido, com a formulação de objectivos gerais, de grandes opções, até de quantificações para as variáveis macroeconómicas, é evidente que qualquer agente político, económico e social sabe, a partir deste momento, qual é o caminho em que voluntariamente, volitivamente, o Governo aposta, se empenha, até porque claramente o manifesta. Nesse sentido, o Governo cumpriu o seu segundo objectivo.
Mas há ainda um terceiro objectivo que o Governo tem quando apresenta as grandes opções do Plano. Não se tratará apenas de fixar objectivos, não se tratará apenas de fixar normativos, imperativos, para o próprio sector público. Trata-se também de fixar regras de jogo.
Eu compreendo no Sr. Deputado João Cravinho, quando cita a França, a sua angústia e dificuldade em dizer: «Veja-se como na França há um conjunto de grupos, de comissões a trabalhar e a preparar um certo número de objectivos.» Mas, Sr. Deputado João Cravinho, a realidade portuguesa em 1981 é a da vivência de uma das últimas fases de um período de transição de um processo revolucionário para um processo democrático. Em processos democráticos estabilizados, naturalmente, o grau de preparação, de definição de outras circunstâncias, para além da definição das regras de jogo, é relevante, mas em Portugal, que vive ainda hoje uma situação de indefinição relativa nalgumas áreas, em que porventura a mais importante para os agentes políticos, e sobretudo económicos e sociais, é a fixação clara de regras de jogo. Nesse aspecto, o Governo cumpriu bem o seu terceiro objectivo, ao explicitá-las de maneira clara e inequívoca.
Em segundo lugar, a oposição critica a debilidade de informações, de metas quantificadas sectoriais para as grandes opções. Vai-se ao ponto, como disse há pouco o Sr. Deputado Vítor Constâncio - e eu lamento que, julgo que por doença, ele não se encontre nesta Câmara...
O Sr. Manuel da Costa (PS): - Que piada!
O Orador: - Não é piada, Sr. Deputado. Foi com esse argumento que foi solicitada a alteração, proposta pelo próprio Partido Socialista, para que um deputado nosso cedesse o tempo de palavra ao Sr. Deputado Vítor Constâncio, e assim a cedemos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A questão como ele a colocou, ou seja que a grande debilidade deste plano residia na ausência de metas quantificadas sectoriais que legitimavam a opção global, aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há uma autêntica inversão até da própria sistemática prevista na Constituição em relação à obrigação desta Assembleia. É que esta Assembleia não aprova o Plano, aprova, sim, grandes opções, segundo as quais o Governo elaborará os planos. E o que o Sr. Deputado Vítor Constâncio veio aqui pedir foi o contrário: o Governo que faça o Plano, que indique o Plano, que indique as directrizes internas, porque depois disso, sim, então poderemos analisar em globo o próprio Plano. O que o Sr. Depu-
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tado Vitor Constâncio se permitiu e pediu foi uma pubversão do quadro institucional em que, ao fim e ao cabo, se move a Assembleia da República Portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com essa posição nós não nos identificamos. Identificamo-nos, sim, nesse aspecto com o cumprimento daquilo que a Constituição nos solicita.
«Debilidade na apresentação de dados quantificados sectoriais» - dizia o Sr. Deputado. Ora, da conjugação da primeira com a segunda critica apresentada pelo PS resulta uma posição exposta pelo Sr. Deputado João Cravinho e que é a seguinte: há falta de elementos, há uma certa incaracterização, no seu ponto de vista. É preciso pôr os gabinetes, as comissões a estudar, a preparar melhor os objectivos, de modo a que daqui a algum tempo venham novamente a esta Câmara as grandes opções e daqui a dois anos se tenha um plano.
É uma perspectiva que respeito, mas com que não concordo, porque, ao fim e ao cabo, o que está em contraponto entre mim próprio e o Sr. Deputado João Cravinho é o contraponto entre a tecnocracia e a ideologia. Porque, ao fim e ao cabo, quando se pretende demorar dois anos a apresentar grandes opções, o que se pede é que na sociedade portuguesa não se reduzam as margens de incerteza, o que se pede é que na sociedade portuguesa não se diminuam as áreas conflituais, as áreas de atrito, as áreas de incerteza. Um plano é um redutor de incertezas. Por isso, é preferível fazer como faz o Governo, e como a própria oposição reconheceu através da voz da Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio, que disse que o Governo não podia fazer melhor. Pois não, o Governo prefere apresentai um compromisso político em relação a opções de fundo para a sociedade portuguesa a aguardar dois anos e manter até essa altura a incerteza. Aquilo a que o Governo se comprometeu foi reduzir as incertezas, apresentando um plano, que não é perfeito, apresentando grandes opções, que naturalmente podem ser melhoradas, mas que reduzem o carácter de incerteza para os agentes económicos e sociais.
No fundo, o que está em causa é a opção entre mais comissões, mais trabalho, mais gabinetes, mais tecnocracia e a redução da incerteza, a clarificação do espaço político, do espaço económico, do espaço social para a sociedade portuguesa segundo a concepção ideológica que nos norteia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Ao fim e ao cabo, é o contraponto entre a ideologia e a não ideologia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, se em relação a esse aspecto a crítica da oposição é incompreensível, mais ela se torna incompreensível quando vários deputados do Partido Socialista, e até infelizmente um deputado da UEDS, manifestam preocupação pelo facto de o Governo em 1982 se comprometer a alterar, eventualmente o conteúdo das grandes opções a médio prazo.
Eu entenderia facilmente esta critica por parte do Partido Comunista, já que no espectro político português o pensamento deste partido em relação ao problema da inter-relação de Portugal com o estrangeiro se aproxima bastante da concepção do Dr. Franco Nogueira, ou seja, há uma aproximação sistemática entre a maneira como o Partido Comunista vê a nossa ligação ao exterior e outras perspectivas passadas.
Porém, não compreendemos como é que hoje o Partido Socialista, que se pretendeu e se posicionou em Portugal em 1977 como o arauto da ligação à CEE, com o reconhecimento implícito do carácter de abertura da sociedade portuguesa ao estrangeiro, pode criticar o facto de o Governo atender à evolução de várias variáveis que condicionam o desenvolvimento económico português - mormente a crise internacional, o grau das importações, das exportações, das remessas dos emigrantes, da vinda de turistas, todos esses aspectos em que a economia portuguesa é super-abundante em elementos de aproximação com o estrangeiro -, isto fé somos uma sociedade aberta. Como é que o Governo daqui a um ano, face à evolução de variáveis que lhe escapam e cujo comando político não é das entidades governamentais portuguesas, se pode eximir à necessidade imperiosa de rever esse conteúdo face às evoluções exógenas ao próprio modelo português?
Não é, Sr. Deputado António Vitorino; um exercício de falta de confiança do Governo. É, sim, um exercício de autêntico realismo por parte do Governo Português.
Aplausos do PSD.
A oposição, nesse aspecto, não tem razão, tal como não teve razão noutros. Não o tem, de resto, na terceira crítica sistemática que faz à proposta de lei do Plano, crítica que, aliás, é curiosíssima.
Diz a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio que não existem objectivos sociais neste plano. Eu respeito todos os Srs. Deputados, porque todos representam uma fatia do eleitorado português, mas não posso deixar de discordar e de tirar ilações políticas do que aqui se quer dizer. O que a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio queria dizer era o seguinte: há um conjunto de grandes opções que legitimam objectivos económicos e sociais. Ou seja, a Sr.ª Deputada pretendia tratar objectivos económicos em paralelo com objectivos sociais. No fundo, isso ainda são resquícios de uma certa tecnocracia marxizante que consiste em colocar o económico em paralelo com o social.
Na nossa concepção não há objectivos - disse a Sr.ª Deputada. Claro que não, porque, naturalmente, para os objectivos sociais toda a formulação social está presente nas grandes opções do Plano, isto é, os grandes objectivos económicos são meios instrumentais para se atingirem as grandes opções. Basta lerem as alíneas a), b), c) e d) - e dispenso-me de citar t página - para que VV. Ex.ªs aí contemplem presentes as grandes opções respeitantes às satisfações sociais.
Nós não tratamos os objectivos sociais em paralelo com os objectivos económicos. A nossa concepção ideológica é a de que os objectivos económicos - o valor da taxa de inflação, o crescimento do produto, da poupança interna, do investimento, do saldo da balança de transacções correntes e mais outros objecti-
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vos económicos: - são meios, são instrumentos de que o Governo se serve para atingir, em última análise, o fim a que se propõe em política, isto é, a satisfação social e humana de cada cidadão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que está em causa é uma opção diferenciada entre uma ideologia personalista e uma tecnocracia com laivos mais ou menos marxizantes.
Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Em relação à questão dos objectivos sociais, não podemos deixar de ficar perplexos com o Sr. Deputado João Cravinho quando diz: «Que espanto! Por que é que o Governo coloca nas grandes opções a existência de objectivos sociais?»
O Sr. João Cravinho (PS): - Eu não disse nada disso, Sr. Deputado!
O Orador: - Isso vem em todos os planos, isso vem em qualquer plano.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Deputado, eu não disse nada disso!
O Orador: - Leia o que V. Ex.ª disse. Se calhar já se esqueceu, o que é mau.
Risos do PSD.
O Sr. João Cravinho (PS): - Mas cite, se faz favor. Isso são palavras suas.
O Orador. - Não, Sr. Deputado, é a sua intervenção de ontem.
V. Ex.ª disse que considerava uma situação deveras notável - estou a citar - o facto de se apresentar no Plano como grandes opções a existência de objectivos sociais por parte do Governo.
O Sr. João Cravinho (PS): - Isso são palavras suas. Cite as minhas, se faz favor.
O Orador: - Sr. Deputado, vamos confrontar depois, se quiser. Depois da minha intervenção vamos confrontar aquilo que V. Ex.ª disse. Está no Diário.
O Sr. João Cravinho (PS): - Confronte agora, Sr. Deputado. Prove a afirmação.
O Orador. - Fá-lo-emos depois da minha intervenção.
O Sr. João Cravinho (PS): - Não faça citações que não é capaz de comprovar.
O Orador - Quer dizer, quando o Governo coloca como objectivo social a satisfação de necessidades fundamentais da população, o Governo 6 liberal--conservador, mas, se não colocar nessa altura a satisfação de objectivos sociais, então mais uma vez a oposição diz que o Governo é liberal-conservador.
Ou seja, o Governo é sempre liberal-conservador, quer coloque a satisfação de necessidades sociais fundamentais, quer não coloque.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Ao fim e ao cabo, o juízo político dado a este governo não é dependente daquilo que ele propõe, não é dependente daquilo que ele pretende, é, sim, dependente do juízo que cada partido ou que cada individualidade possa fazer em relação ao seu conteúdo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Deputados: Retirando) dois tipos de intervenção, concretamente a intervenção do Sr. Deputado Vítor Constâncio e as intervenções dos Srs. Deputados da UEDS Lopes Cardoso e António Vitorino, podemos considerar este debate um certo vazio por parte dos partidos da oposição. Certo vazio que eu diria mesmo, em alguns casos, uma certa desertificação. Foi por isso com razão que certos Srs. Deputados, que não só o Sr. Deputado João Cravinhho, falaram de desertificação neste debate.
É evidente que essa desertificação existiu e foi de duas naturezas por parte da oposição, ressalvando, como já disse, essas intervenções. Foram uma desertificação físicas e uma certa desertificação substantiva. Desertificação física que até se traduziu na própria intervenção do Sr. Deputado João Cravinho, quando da tribuna disse que sentia vergonha. Só que não sentiu vergonha pelo Plano, sentiu vergonha, isso sim - e eu compreendo-o perfeitamente -, por verificar que, enquanto falava, a maior parte do seu partido «desertificava» das suas próprias bancadas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Mas, independentemente da desertificação física, houve uma desertificação substantiva por parte dos partidos da oposição, com ressalva daqueles que referi.
O Governo formulou estratégias, estratégias de preços, estratégias de comércio externo, estratégias de transportes, de trabalho, de indústria, de tecnologia, de saúde, de segurança social, e na maior parte das vezes falava um membro do Governo e a resposta que a oposição lhe dava era o silêncio. E o que é mais confrangedor verificar, na área das relações laborais, na área do trabalho, campo privilegiado para os chavões do Partido Comunista, após o. Ministro do Trabalho ter exposto a política do Governo, a política que enforma as grandes opções do Plano a médio e a curto prazo, o silêncio foi total por parte do PCP.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Partido Comunista grita lá fora, mas aqui, em face da explicitação da política do Governo, silencia, escamoteia, reduz-se àquilo que é: um zero.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
A maior parte do conteúdo da oposição no seu discurso prima ou pelo silêncio ou pela semântica. A maior parte das críticas do Partido Socialista são
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críticas de semântica, são críticas de manuseamento de conceitos, são críticas laterais à substância, são críticas que fogem ao cerne e ao conteúdo do debate, que devia ser o debate do modelo de sociedade, isto com excepção do Sr. Deputado Vítor Constâncio. Aliás, a propósito da intervenção do Sr. Deputado Vítor Constâncio - seja-nos lícito dizer -, percebemos a brandura relativa das suas críticas, até uma quase aceitabilidade do próprio modelo, já que parte das críticas que conformam a sua intervenção são críticas que respeitam à metodologia, à inserção, que respeitam a objectivos, mas que não são críticas sistemáticas em relação ao modelo. As únicas críticas frontais ao modelo que aqui foram apresentadas - seja-nos permitido referir isso -com prazer - foram-no por parte da UEDS, o que significa que muitas vezes não será por parte de um partido pode ter poucos deputados que a riqueza do próprio debate não se pode engrandecer. E a tal ponto o dizemos que perante o tipo de intervenções do Partido Socialista, de mera semântica ou de certa aceitabilidade do modelo proposto pela Aliança Democrática, no âmbito da FRS, a única força que claramente se opõe, que critica, que discute, que questiona o modelo é a UEDS. Permitam-me que, glosando um pouco o tema, diga que não considero que a FRS seja um mau negócio político, já que através da inserção concreta de VV. Ex.ªs há um comando ideológico na FRS por parte da UEDS.
Aplausos e risos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Isso é «reinar» e reinar é um princípio monárquico, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tipo de intervenção e de crítica que a UEDS e o Sr. Deputado Vítor Constâncio fizeram justificam da nossa parte alguns momentos de reflexão e a tentativa de resposta às mesmas. Para já o contraponto entre as duas situa-se exactamente na área da crítica ideológica ao modelo e do aperfeiçoamento deste.
A crítica do Sr. Deputado Vítor Constâncio é uma crítica de aperfeiçoamento do modelo, mas inserindo-se no modelo, enquanto a crítica da UEDS é uma crítica frontal ao modelo. Politicamente, não deixa de ser curioso percebermos que, afinal, o posicionamento de alguns dos que dentro do Partido Socialista criticam o modelo, não frontal e abertamente, mas antes procurando um aperfeiçoamento, ou seja, dos que mais se inserem na lógica do sistema político, económico e social proposto pela Aliança Democrática, são curiosamente aqueles que dizem que rejeitam uma aliança com a própria Aliança Democrática. Não deixa de ser poeticamente paradoxal que quem se perfila mais próximo do modelo seja quem mais recusa a aproximação política. Ilação política importante», a que mostra a mitologia que muitas vezes existe: no comportamento de alguns deputados do Partido Socialista. E aqui, sim, podemos falar de mitologia, porque não se trata aqui de equilíbrios orçamentais, mas de equilíbrios políticos não consumados, se bem que aberta e claramente não enunciados. Nesse sentido, ponhamos em contra ponto as duas versões.
Ao fim e ao cabo, a crítica do Sr. Deputado Vítor Constâncio é a de que as grandes opções do Plano não contemplam em profundidade e claramente a abertura à CEE e a preparação dos mecanismos de Portugal para essa adesão. Porém, a crítica da UEDS é sistematicamente diferente: é dizer até que ponto é que todo o modelo não está condicionado por parte da AD à própria previsão de inserção de Portugal na CEE, até que ponto é que o nosso crescimento não e condicionado e até que ponto é que isso é ou não prejudicial aos próprios interesses portugueses, já que isso pode significar uma transposição mecanicista, como VV. Ex.ªs disseram, do modelo para Portugal.
Aqui perfilam-se dois comportamentos políticos, duas versões, duas atitudes, por parte da FRS, substancialmente diferentes.
Responderei, naturalmente, à da UEDS, porque à do Sr. Deputado Vítor Constâncio a resposta é simples: em cada capítulo sectorial das grandes opções do Plano a médio e a curto prazo estão em cada área e sector contempladas as próprias acções que o Governo se propõe em cada um dos âmbitos.
Relativamente à UEDS, a resposta terá de ser um pouco mais longa. Não sentimos que em Portugal - e isso foi transparente na intervenção do Sr. Ministro da Indústria e Energia, engenheiro Baião Horta - haja uma cópia e uma adaptação do modelo. Pelo contrário, houve até uma referência extremamente importante, quando se diz que o facto de termos tido experiências estrangeiras com erros é para nós uma vantagem, pois permite-nos encetar uma experiência que evite, até certo ponto, os riscos e os erros dessas experiências noutros países.
O segundo aspecto da crítica da UEDS relativamente às grandes opções do plano a médio prazo situa-se na área do sector público e na área da também chamada mitologia da contenção do défice do Orçamento. Sobre isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, devo dizer que por parte do governo da Aliança Democrática, por parte do projecto desta, não há uma ideia de diminuição do sector público, há antes uma ideia de revalorização. Se continuássemos com a situação actualmente existente, iríamos, sim, encontrar daqui a alguns anos as empresas públicas portuguesas no mercado competitivo e sem capacidade de resposta, iríamos encontrá-las em situação de aniquilação. Por isso, Sr. Deputado Vítor Constâncio, o Governo não pede ao sector público produtividade superior à que pede ao sector privado, pede igual. O que não pode é aceitar uma menor produtividade do sector público em relação ao sector privado. O Governo pede ao sector público complementaridade e articulação, não pede diminuição de papel nem de estatuto. Nesse sentido, quando alguns falam em aniquilação do sector público, nós dizemos racionalização, redimensionamento, revitalização. Não se trata, como disse o Sr. Deputado António Vitorino, de diminuir os instrumentos que o Estado tem através do controle da banca e dos seguros, instrumentos políticos da sua intervenção na sociedade. Nada disso. Trata-se, sim, de criar condições análogas noutros sectores, de modo a que o próprio papel do sector público possa ser beneficiado pela concorrência. Devemos dizer, Sr. Deputado, que não nos movem ideias preconcebidas contra o sector público. Pelo contrário, como sociais-democratas, somos a favor de uma concepção do sector público não debilitadora do mesmo, mas estimuladora. É por isso que uma ideia de
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competitividade, a que seremos obrigados daqui a algum tempo e com que VV. Ex.ªs não concordam, mas com que concorda a maioria da Câmara, obriga a que isso se faça desde já, porque se não os riscos políticos, económicos e financeiros serão muito maiores no futuro.
Daqui não se pode, pois, inferir uma lógica de maximização do lucro. Não há sistemas de maximização do lucro hoje em dia nas sociais-democracias, não há sistemas de maximização do lucro absoluto na maior parte dos países ocidentais. Há, sim, sistemas de relativização do lucro. Assim, V. Ex.ª não pode invocar esse argumento como argumento que nos pertença.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dois perfis, duas concepções, duas abordagens por parte da FRS. Ao fim e ao cabo, maior mérito para a própria Aliança Democrática.
Como partido social-democrata, por aquilo que ouvimos do Governo, por aquilo que ouvimos em particular de algumas intervenções - seja-nos lícito registar quer a intervenção do Ministro dos Assuntos Sociais, quer as intervenções dos Srs. Ministros dos Transportes, do Trabalho e da Indústria -, permitam-nos que digamos que o espírito e a prática social-democrata não precisam de ser postos na gaveta para que Portugal progrida.
O teste foi feito o ano passado, o teste frutificou. Os arautos da desgraça, esses que prognosticavam guerrilhas, querelas, crises, guerras civis, esses passaram. A nossa maioria alargou-se e consolidou-se. O teste em 1980 foi positivo, a esperança para 1984 mantém-se.
Hoje estamos quase no fim do Inverno. Não foi o inverno do nosso descontentamento. É, sim, o início de uma primavera de esperança em todos nós e para todos nós.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Está esgotado o tempo do Partido Social-Democrata.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nós temos nesta Câmara, no dia de hoje, 72 minutos para discutir as grandes opções do Plano, o Orçamento e o mais que for, teríamos 90 minutos para discutir uma simples ratificação. Isto explica muita coisa. Teremos de ser sumários. E porque terei de ser sumário, quero dizer ao Sr. Deputado Ângelo Correia que tive um certo prazer, gozo até, em ouvi-lo, porque me pareceu que o Sr. Deputado Ângelo Correia deve estar ligeiramente equivocado. Olhando para o que se disse ontem, peço desculpa a V. Ex.ª pela referência que vou fazer. Temos, pelos vistos, um Ministro da Defesa a mais e um Primeiro-Ministro a menos. O Sr. Deputado Ângelo Correia agiu como se estivesse a encerrar o debate, como se fosse o autor da proposta que aqui estamos a discutir. Muitos parabéns, Sr. Deputado!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito .bem!
O Orador - Mas queria dizer que sé temos porventura dois Primeiros-Ministros, segundo as hierarquias da AD, eu não o reconheço. E portanto é ao Governo que está aqui presente, autor da proposta, que eu me dirijo para perguntar, pura e simplesmente, uma vez que o Plano é um redutor de incertezas, uma vez que este Governo quer ter o mérito de não aumentar a confusão -e não o consegue, como se vê -, ao Sr. Ministro das Finanças e do Plano ou ao Sr. Primeiro-Ministro o seguinte: uma vez que se anuncia desde já que as grandes opções do Plano que vamos votar agora, tão grandes elas são, para o ano já, infalivelmente, serão substituídas, quais serão aquelas que o virão a ser?
Eu compreendo que se ajuste o Plano, compreendo que se ajustem até objectivos. O que não compreendo é que, no momento em que se quer reduzir a incerteza - pelos vistos no plano do Sr. Primeiro-Ministro Ângelo Correia -, tendo-se anunciado grandes opções que valem por quatro anos, o Governo venha logo dizer: isto é a brincar, para o ano é que é a sério.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muitos comentários eu teria a fazer à intervenção do Sr. Deputado Ângelo Correia. Porque o tempo é escasso, limitar-me-ei apenas a dois.
O primeiro é para dizer ao Sr. Deputado que não fomos nós que afirmámos que o Governo pretendia copiar o modelo, europeu. É o Governo, na p. 120 do plano a médio prazo, quando diz muito taxativamente: «assegurar para os Portugueses o modelo europeu e ocidental de sociedade.) A César, pois, o que é de César.
A segunda questão que eu queria pôr é a seguinte: confundem-se duas coisas. O que nós questionámos foi o propor-se, a meio do percurso, a mudança das grandes opções. Que haja que ajustar os mecanismos de Plano, acertar as acções programadas, ajustar mesmo um certo número de objectivos do médio prazo em função das variações conjunturais, de acordo. Agora, o que para nós surge como algo de enigmático é que, no percurso da aplicação do Plano, as grandes opções possam deixar de ser, como aqui se diz, «melhorar as condições de Vida dos Portugueses, promover a satisfação das necessidades sociais, melhorar as condições de educação, atenuar as assimetrias regionais, aproximar Portugal do nível de desenvolvimento dos restantes países da Europa Ocidental». Aí, de facto, não vemos como é que o Governo, no percurso da aplicação do Plano, vai mudar essas opções. Já agora não será mau que o Governo tivesse deixado antever quais são essas opções, porque senão para os senhores - não para nós, que iremos votai contra - será passarem um cheque em branco quanto àquilo que são as opções deste Governo da Aliança Democrática, o que talvez pouco os preocupe.
Vozes do PS:- Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Constâncio.
O Sr. Vítor Constâncio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Infelizmente não tive o prazer de ouvir toda a intervenção do deputado Ângelo Correia,
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embora deva dizer que na parte que ouvi me diverti o suficiente. Eu nunca sei, nas intervenções do deputado Ângelo Correia, que aliás conheço pessoalmente bastante bem, quando é que efectivamente o hei-de levar a sério.
Entreteve-se ele a dissertar sobre as pretensas diferenças de abordagem, quanto a modelos de desenvolvimento, entre a minha intervenção e a intervenção de deputado António Vitorino. É algo que deixo para a leitura mais atenta de ambas as intervenções, pois não tenho agora tempo de desmontar toda a falsa argumentação que desenvolveu o deputado Ângelo Correia. No entanto não deixo de lhe reconhecer algum conhecimento desta matéria de duplicidade e de dualidade de modelos. Certamente ele esta muito preocupado com aquilo que eu próprio sublinhei no primeiro dia deste debate, a propósito de algumas das grandes opções, implícitas nestes documentos do Plano e do Orçamento apresentados pelo Governo, conterem um conjunto de princípios que de facto dificilmente me parece poderem ser aceites por um social-democrata consequente.
Referi-me a uma certa mitologia de renascimento, pelo menos aparente, das vantagens, da necessidade do equilíbrio orçamental, da redução do papel do sector público, da não importância excessiva, não prioritária, da melhoria da repartição funcional do rendimento, etc. De facto o Sr. Deputado proeurou rebater isso em certo sentido, mas, especialista que se tornou em dualidade de modelos, a certa altura disse que o objectivo da Aliança Democrática de maneira nenhuma era o de reduzir o papel do sector público, antes de o racionalizar, revitalizar e expressões equivalentes. No entanto, nas grandes opções do plano a médio prazo, há três níveis: os princípios fundamentais; as grandes opções, e os objectivos económicos, a pp. 123 e 124. Precisamente a um nível de grande solenidade e importância, a par de coisas como o crescimento do produto, do investimento produtivo, da diminuição da inflação, do aumento dos salários reais, etc., há um grande objectivo económico das grandes opções da Aliança Democrática: limitar o crescimento do sector público.
Vozes do PS:- Muito bem!
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou V. Ex.ª, como lhe disse aquando da sua intervenção, o tempo do seu partido previsto para hoje. Qualquer intervenção que faça ou é por cedência de outro partido ou é para descontar no tempo de amanhã.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Nós cederemos tempo ao PSD, Sr. Presidente.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É o partido da simpatia!
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - E não só.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ângelo Correia, o Partido Popular Monárquico tem 10 minutos e 30 segundos que V. Ex.ª parece poder utilizar.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM). - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Nós, evidentemente, contamos com uma certa parcimónia no uso do nosso tempo.
Risos.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado queria ainda reservar algum tempo?
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - O caso fica inteiramente ao critério do Sr. Deputado Ângelo Correia.
O Sr. Presidente: - Nos termos em que V. Ex.ª põe a questão, só o Sr. Deputado Ângelo Correia poderá determinar a extensão da cedência que lhe é feita.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Em primeiro lugar. no âmbito da solidariedade da Aliança Democrática, agradeço ao Partido Popular Monárquico. Responderei, pois, rapidamente às questões que me foram colocadas.
Relativamente à questão do Sr. Deputado João Cravinho, gostaria de citar a frase que ele proferiu ontem na tribuna, que é esta: «é ou não é um lugar-comum, por exemplo, escrever que é uma das grandes opções do Plano melhorar as condições de vida dos Portugueses? Com certeza que o Governo não poderia apresentar como grande opção do Plano o contrário».
O Sr. João Cravinho (PS): - Não foi isso que eu disse.
O Orador: - Sr. Deputado, as palavras são diferentes mas o conteúdo é rigorosamente o mesmo, ou seja, querer figurar a grande opção, melhorar as condições de vida dos Portugueses nas grandes opções do Plano. É ou não é o que está cá escrito?
O Sr. João Cravinho (PS): - É diferente.
O Orador: - Meu Deus! Enfim!
Quereria, em relação ao Sr. Deputado Vítor Constâncio, dizer três coisas.
O Sr. Deputado Vítor Constâncio caracterizou em três pontos a chamada opção que um social-democrata ou um socialista tem para recusar este plano. O primeiro e a repartição funcional do rendimento não ser considerada como opção prioritária. Não o é em termos formais, mas é-o na exacta medida em que o consumo privado suba, em que os salários reais sejam positivos, ou seja, em que o ritmo de inflação possa ser menor que o próprio rendimento de cada cidadão. É evidente que se criaram as condições materiais para a realização dessa repartição funcional. Eu só pergunto como é que V. Ex.ª pode então ser
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socialista. A repartição funcional respeitante à parte de salários no rendimento nacional era, em 1975. 61,8%, passou a 60% no ano seguinte; passou a 55 % quando V. Ex.ª foi Ministro; passou a 52 %, depois a 50 %, sempre com o apoio de V. Ex.ª Foi preciso chegar o governo da Aliança Democrática para de 50 % subir novamente para 52 % a parcela dos salários no rendimento nacional. Pergunto: como é que V. Ex.ª podei ser socialista durante cinco anos, quando se verificava o oposto. Nós, sim, podemos ser sociais-democratas, no momento em que a inversão da tendência das repartições do rendimento, com o peso que existe no sector salarial, é mais ampla.
Em relação ao sector público, a expressão que nós manifestámos, o conteúdo que nós quisemos introduzir, é evidente. Mais: quando o Plano implica que haja aquilo a que o Sr. Deputado chamou redução do sector público, não e esse o sentido que o Governo tem dessa proposta, já o esclareceu. O que o Governo disse é que a percentagem que se mantinha tio sector público, essa sim, seria a mesma. Haveria um crescimento em termos reais, mas a ponderação do sector público, essa, era a mesma. Isso tem lógica - tem lógica no nosso modelo, tem lógica para uma concepção social-democrata. E é por isso que nós privilegiamos a iniciativa privada como motora. Porque, reparem, a obtenção das variáveis exportação, o combate ao próprio desemprego, não pode, hoje em dia, conseguir-se com o sector público. Quanto é que um multiplicador de emprego do sector público é superior ao do sector privado? Cerca de cinco a dez vezes. Se nós fôssemos manter uma preponderância ou um ingrediente mais acelerado por parte do sector público, nunca poderíamos atingir a resolução do problema do desemprego. Estaríamos, ao fim e ao cabo, a contrariar uma óptica de resolução de uma chaga social. É pela conjunção destas duas circunstâncias que o sector público não pode ter, proporcionalmente ao sector cooperativo e privado, um acréscimo de meios financeiros relativamente à proporção actual.
Terceira e última razão: a mitologia orçamental. Sr. Deputado, eu não gostaria de ler a V. Ex.ª o relatório do orçamento de quando VV. Ex.ªs estavam no poder, mas já agora leria rapidamente. Está publicado. Diz apenas isto: «Pelos efeitos indirectos que é susceptível de determinar sobre a procura global e as importações, a redução do défice corrente do sector público constituiu uma das preocupações essenciais em que assentou a definição da política de finanças públicas.» É o governo PS, não é o nosso. Ou seja, na nossa concepção, o objectivo é rigorosamente o mesmo. Não que nós tenhamos a mitologia de chegar ao valor zero no défice corrente, mas sim tendo a preocupação de fazer diminuir as despesas correntes, no sentido de as aproximar das receitas. Porque, se assim não for, Sr. Deputado Vítor Constâncio, das duas uma: ou a carga fiscal sobre os cidadãos aumenta, e estamos a cair numa situação, injusta para com os cidadãos, ou então estamos a criar situações inflacionárias, que, ao fim e ao cabo. potencialmente, os vão prejudicar na mesma. É por essas razões que continuamos sociais-democratas, é por essas razões, e numa óptica social-democrata, que nós apoiamos as grandes opções.
Aplausos tio PSD. do CDS e do PPM.
Q Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Constâncio.
O Sr. Vítor Constâncio (PS): - É muito breve Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou tentar desiludir o deputado Ângelo Correia nem a sua bancada. As discussões virão com o tempo. Apenas algumas precisões sobre aquilo que ele neste momento afirmou. Em relação aos problemas do défice, aquilo que referi hoje na minha intervenção era, evidentemente, o défice global do Orçamento, como se percebe lendo o texto, e não o défice corrente.
Em segundo lugar, eu disse claramente e com toda a frontalidade - é óbvio - que a situação das finanças públicas portuguesas exige que se adopte, a prazo; uma política de redução graduai do défice do Orçamento. Disse-o, não - tem nada de especial. Tudo está na questão de grau. Tudo está na obsessão que só revela contra o défice e que se erige como que em objectivo: a eliminação, a prazo, do défice, independentemente das conjunturas, das necessidades, da política de investimento, etc. Esse é que é o ponto. E foi isso que eu quis discutir com seriedade, como se vê. Quanto ao défice corrente, diz o Sr. Deputado que as grandes opções não o pretendem eliminar. Não é assim. É indicado que tendencialmente, no plano a médio prazo, o défice corrente deve tender para zero, ao passo que o consumo público sobe 3 % em termos reais. Isto significa de facto, para ser verdade, que a carga fiscal tem de aumentar bastante durante o período do plano a médio prazo. Este um ponto em que faço apenas uma precisão, numérica neste caso, àquilo que o Sr. Deputado afirmou, visto que, quanto às suas ilusões a propósito da compatibilidade desta política e destes documentos com uma óptica social-democrata, como digo, o futuro encarregar-se-á de o esclarecer.
Vozes do PS: - Muito bem!
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Gomes. No tempo do seu partido previsto para hoje, o Sr. Deputado dispõe ainda de 6 minutos.
O Sr. Sousa Comes (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Srs. Deputados: Neste debate estão em causa, por um lado, as grandes opções do plano de médio prazo e do Plano Anual e, por outro, o Orçamento para 1981. Mas não existe distinção clara e precisa entre o médio prazo e a conjuntura anual, na sua própria discussão, por vontade impositiva da maioria. Se para o Governo e para a maioria que o apoia, especialmente por parte do PSD - ao menos pela voz do Sr. Deputado Ângelo Correia -, não é aceitável ou não tem justificação promove uma discussão de fundo sobre as soluções para os problemas de médio prazo, com a autonomia e a profundidade que tais questões merecem, cabe-lhes assumir essa responsabilidade. Quanto a nós, tendo em conta as condicionantes externas, de resto tão sublinhadas pelo Governo, e as dificuldades próprias das estruturas portuguesas, julgamos que teria sido
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útil promover uma discussão aprofundada e um debate autónomo sobre os grandes problemas nacionais e as soluções alternativas de médio prazo para os mesmos. O empobrecimento que resulta dessa opção não serve, quanto a nós, o interesse dos Portugueses em geral, Portugueses que, em última análise, são aqueles que vão viver do resultado das opções do Plano. Tem ainda o Governo referido como facto relevante na discussão em causa a existência de uma maioria que garantirá de forma estabilizadora a aprovação e a concretização das grandes opções. Longe de nós negar as virtualidades que tal situação oferece ao Governo. Só que não nos parece que a complexidade das questões um causa fique simplificada com a incapacidade em assumir as dificuldades, de tratar os problemas de médio prazo numa óptica estrutural, e que o seu debate, em termos políticos alargados, não seja feito com maior profundidade, designadamente no âmbito das comissões parlamentares. Queremos entretanto aproveitar esta oportunidade para referir algumas opções de médio prazo do Orçamento anual ligadas aos problemas do quadro de vida, da regionalização e do reforço do Poder Local.
Em primeiro lugar, a questão do ordenamento físico e qualidade de vida. Não obstante a importância que o Governo diz querer dar a uma política de qualidade de vida, não encontramos na proposta de grandes opções qualquer concretização quanto aos critérios de base que num quadro de médio prazo deverão orientar a definição dessa política de ordenamento.
Torna-se por isso difícil uma discussão sobre os objectivos que deverão conduzir a política de médio prazo, no que se refere a infra-estruturas sociais e económicas para o nosso país, designadamente os equipamentos colectivos, a habitação e urbanismo, a acessibilidade, a própria protecção do ambiente.
Tomemos o exemplo da habitação. O que sobre esse capítulo o Governo nos oferece na sua proposta de grandes opções é muito pobre. Por um lado o texto refugia-se na enumeração de aspectos de generalidade, não se comprometendo excessivamente na definição de objectivos (50000 fogos/ano, é a única meta qualificada e não se ousa sequer enunciar um quadro coerente de medidas de política a serem realizadas no âmbito do médio prazo.
Acontece até que quando se declara que no período do Plano se fará a inversão das tendências que estão na origem da actual situação de défice habitacional, logo se demonstra que nada disso sucederá, quando a nível macroeconómico se estabelecem metas de crescimento do investimento na habitação a ritmos insuficientes e quando se fixa o volume de construção anual de fogos praticamente ao mesmo nível do passado recente.
Dos 50 000 fogos/ano, o Governo compromete-se a promover por iniciativa da Administração Pública, a construção de 10000 fogos/ano. Como se vai concretizar esse objectivo? A que estratos sociais se destinam essas habitações? Qual o destino regional dessa promoção? São questões sem resposta no quadro das grandes opções.
O Governo reconhece a necessidade de se dispor com grande prioridade de solo urbanizável. Mas com que política urbanística isso será feito? E com que actuações na gestão nos planos da urbanização? Reconhece ou não o Governo aos municípios a sua competência privilegiada nesta matéria, e aceita ou não dar às autarquias os meios e recursos para poderem desempenhar essa atribuição. São estas questões que importaria discutir, no quadro de objectivos de médio prazo, com metas e medidas de política devidamente seriadas. Mas são estas as questões, entre tantas outras, que não encontram suporte no texto do Governo.
Tivemos entretanto ocasião de ouvir ontem o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas anunciar algumas medidas da política que pensa adoptar de imediato, designadamente: um novo regime de crédito à aquisição de casa própria; a revisão do regime de arrendamento; a criação de sociedades de investimento imobiliário; a reforma do Fundo de Fomento da Habitação.
Não é altura de uma análise aprofundada sobre o mérito de tais iniciativas, nem tão-pouco o momento de questionar o Governo sobre a suficiência dessas medidas, mesmo na perspectiva de curto prazo. Só que gostaríamos que o Governo nos desse o quadro de referência em relação ao qual se torne possível avaliar não só da bondade das soluções como da sua capacidade de dar resposta efectiva à resolução deste problema dramático, que é a situação da. habitação no nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um segundo grupo de questões que gostaríamos de referir a terminar prende-se com a política de regionalização e descentralização e ainda com a aplicação da lei das Finanças Locais em 1981.
Se há questão que deveria ter um tratamento cuidado na definição de um política de médio prazo é a questão da regionalização. Ora sucede também neste capítulo que o texto da proposta das grandes opções é manifestamente demonstrativo da incapacidade do Governo em formular objectivos seriados de uma política de regionalização.
Tal política é muito mais que a simples referência às desigualdades e assimetrias regionais, ou à necessidade de um desenvolvimento regional equilibrado.
Dissemos, a propósito do programa do VII Governo, que algumas afirmações dos responsáveis do novo executivo, permitiam esperar algo de positivo na definição de uma política de desenvolvimento regional e de defesa da descentralização. A verdade é que o texto da proposta do Governo das grandes opções vem quebrar negativamente essa expectativa. Não podemos por isso deixar de criticar a total ausência de uma preocupação sistemática de referência a metas de regionalização de descentralização em toda a proposta do Governo.
Mas a maior prova de desconfiança em relação à descentralização e ao reforço efectivo do Poder Local é dado pela aplicação que o Governo entendeu efectivar em 1981 à Lei das Finanças Locais.
São conhecidos os grandes princípios a que obedeceu a aplicação dessa lei: reconhecimento de autonomia financeira das autarquias com a garantia da transferência de recursos para assegurar o cumprimento das suas obrigações, e estabelecimento de
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critérios de equilíbrio entre a despesa do Estado e as despesas a cargo das autarquias.
Ora estes princípios aqui aprovados com a unanimidade de todos os partidos são sistematicamente postos em causa na aprovação anual do Orçamento. Também este ano, seguindo o caminho já iniciado o ano passado, o Governo não aceita cumprir o estabelecido pela Lei n.º 1/79.
Não tem o Governo razão ao afirmar que sã faz a aplicação integral da lei ao retirar das despesas de bens e serviços as despesas referentes a pessoal, para efeitos de cálculo do montante do fundo de equilíbrio financeiro. Sobre o assunto veja-se a interpretação dada desde o. primeiro momento pelos representantes de todos os partidos na formulação do articulado da lei, vejam-se as próprias declarações nesta Câmara em 1979 de representantes do PSD e do CDS, veja-se enfim o texto do parecer da Comissão Constitucional.
Pode o Governo dizer que não concorda com essa lei, que não a aceita. Dada a maioria de que dispõe nesta Assembleia poderá mesmo alterar essa lei. Mas. mais uma vez, desmentirá as suas promessas de reforço do Poder Local.
O Governo refere ainda dois tipos de argumentos had hoc para defesa da aplicação limitada que faz da Lei n.º 1/79: os municípios têm visto os seus recursos aumentar de forma muito grande nos últimos anos. Está subjacente a isto a ideia de que os municípios não sabem gastar o dinheiro que tem recebido. E um segundo argumento de que a aplicação integral da lei faria aumentar de forma incomportável o défice das contas públicas.
Ora vejamos: se é verdade, como o disse o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, que de 1973 para cá os municípios viram as suas receitas aumentar de forma significativa a verdade é que também as despesas do Estado aumentaram no mesmo período de cerca de 60 milhões para 300 milhões de contos, e que a percentagem global de recursos públicos à disposição dos municípios se manteve sempre numa discreta percentagem de 8 % a 12 % ao longo desse período, se tivermos em conta as comparticipações feitas pela Administração Central aos investimentos municipais até 1979.
Quanto ao défice adicional do OGE gerado com a atribuição aos municípios para investimento das dotações, de fundo de equilíbrio financeiro, na totalidade, tal situação não é inevitável. Diremos, a título de exemplo, que o sector público administrativo, de acordo com os objectivos macroeconómicos que o Governo apresenta na sua proposta, realizará em 1981 um volume de investimento de cerca de 68 milhões de contos. Nada impede que o Governo, que diz defender a descentralização, faça a repartição dos investimentos entre a Administração Central e a Administração Local com respeito pela Lei das Finanças Locais, sem aumentar, assim, o défice. Mas nada impede também o Governo de aceitar aumentar o défice de capital, coisa muito diferente de se continuar, como até hoje se tem feito, a aceitar-se pacificamente, apenas, o aumento do défice corrente: Há, como se vê, alternativas possíveis. O que não parece haver é vontade política de descentralizar e de reforçar o Poder Local.
Estas, entre outras, serão algumas das razoes para o voto de rejeição, que, como já foi anunciado, daremos às propostas do Governo.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sousa Gomes, durante a sua intervenção terminou o tempo atribuído hoje ao seu partido, tendo começado já a descontar no de amanhã.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A presente discussão das propostas de lei das grandes opções e do Orçamento para 1981 representa já uma significativa ilustração da amputação do debate democrático e do cerceamento dos direitos da oposição que a «AD» quer impor e fazer reinar na Assembleia da República.
A drástica redução dos tempos de intervenção imposta pela «AD» aos partidos que se opõem ao Governo (os partidos da coligação governamental não mostraram grande interesse em intervir no debate que se juntou à tardia apresentação das propostas de lei à ausência de documentação indispensável à sua correcta apreciação, à inexistência de condições minimamente válidas de análise em comissão, tem em vista dificultar tanto quanto possível o esclarecimento, o desmascaramento e a denúncia da verdadeira natureza antidemocrática, antipopular e antinacional da política económica, financeira e social que o governo «AD»/Balsemão se propõe seguir.
A «AD» teme sobretudo que chegue ao País a refutação cabal que os partidos da oposição fazem da sua desastrosa política. É por isso que limitou drasticamente a reportagem televisiva dos trabalhos parlamentares e impôs a eliminação dos tradicionais magazines da televisão comportando a antologia diária das posições de cada partido e seleccionados sob a responsabilidade destes. E é assim que, na sua ânsia de manipular, vimos aparecer no Telejornal de ontem à noite como a grande figura deste debate o deputado Adriano Moreira. Não sabemos de quem partiu a iniciativa, mas a verdade é que ela se reveste de um raro e espantoso simbolismo. Constitui, seguramente uma homenagem ao papel singular do CDS e, quiçá, ao Sr. Deputado em questão, na génese, na filosofia, na elaboração, na apresentação e na defesa das propostas de lei em discussão. Mas representa, acima de tudo, a caracterização de uma forma inimaginavelmente sugestiva da essência da política económica, financeira e social que as propostas comportam e sobretudo, de modo muito especial, da sua direcção - o 24 de Abril.
O discurso da «AD» sobre estas matérias mudou significativamente no lapso de um ano. Há um ano atrás, era ainda a contestação amargurada daquilo a que, chamava o Estado patrão, agora, já se assume abertamente como patrão do Estado e como a voz do Estado dos patrões.
Não admira, por isso, que todos os Srs. Ministros ergam nas suas intervenções o pendão da cruzada contra os aumentos de salários, procurando estabelecer aqui a teoria do tecto salarial de 16% e das práticas de boicote e bloqueamento da contratação
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colectiva que querem impor aos trabalhadores da função pública, que ordenam nas empresas nacionalizadas, que apoiam e estimulam nas empresas privadas, com a determinação indisfarçável de aumentar ainda mais a parcela dos lucros.
Não admira, também, que o Sr. Ministro das Finanças tenha levado tão longe o seu papel de advogado da repressão salarial que foi à SEDES declarar em primeira mão que vetara qualquer aumento superior a 16%, que vem à Assembleia da República vender a tese de que a correcção da brutal injustiça na repartição dos rendimentos é incompatível com o incremento do investimento e a consequente diminuição do desemprego, quando o contrário é que é verdadeiro, como se sabe e como o próprio Sr. Ministro não ignora.
Não admira, finalmente, que, em face de uma política tão marcadamente ao serviço dos grandes patrões, os trabalhadores portugueses tenham de fortalecer os movimentos de resistência e lançar-se em grandes lutas em defesa do seu poder de compra, dos seus direitos e outras conquistas sociais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Tão saliente como a cruzada contra os aumentos de salários é, nos textos das propostas e nos discursos ministeriais, o ataque implacável ao sector nacionalizado.
Ao mesmo tempo que prepara os dispositivos legais para abertura ao grande capital das empresas e dos sectores mais apetecíveis pela sua rentabilidade ou posição estratégica, a «AD» e o seu governo tardam e limitam o pagamento das indemnizações compensatórias, das empresas públicas, dificultam-lhes a obtenção de crédito, impõem-lhes uma política de preços ruinosa, bloqueiam-lhes os planos de desenvolvimento, recusam a posse aos gestores eleitos pelos trabalhadores.
Como foi demonstrado pela bancada do PCP (e façamos a justiça de o dizer) e por. deputados de outros partidos da oposição, as propostas de grandes opções não têm consistência. Aliás, cabe sublinhar que as propostas são de pouco-mais-ou-menos, sempre suficientemente vagas, para deixar as mãos livres ao Governo e permitir que o Governo garanta, de qualquer maneira, que cumpriu. Enfim: opções de propaganda!
Mas, quanto a nós, não é isto o mais importante. É que se não tem grandes opções, a «AD» tem grandes obsessões: a cruzada contra os salários, o ataque às nacionalizações, a ofensiva contra a Reforma Agrária.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O objectivo tornou-o a AD» transparente pelo seu programa eleitoral, pelos seus programas do Governo, pela sua actuação governamental. Mas resulta mais impressivamente ilustrado com os textos agora trazidos à Assembleia da República. O objectivo é a reconstituição dos monopólios, a recuperação dos latifúndios, a restauração do capitalismo monopolista de Estado. É o que custa ouvir.
Uma voz do CDS: - É a cassette.
O Orador: - Não é por acaso que estas propostas são acompanhadas pelo estabelecimento de novos esquemas de revisão inconstitucional da Constituição, do relançamento de novas intrigas e confrontações institucionais e de novos planos de desestabilização, em suma, de retomada da ofensiva contra as liberdades e o regime democrático, sustada e derrotada em 7 de Dezembro.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Demonstrámos noutras intervenções que, a par dos planos para a destruição do sector empresarial do Estado, o Governo protege e estimula, por todas as formas, mesmo as mais escandalosas (como acontece com a prodigalização de isenções fiscais às sociedades de investimento), o renascimento de velhos e o nascimento de novos grupos financeiros.
Vem a propósito referir as «predeterminações». que o Governo invocou para justificar alguns aspectos desastrosos da sua política, designadamente os défices orçamental e da balança de transacções correntes e o serviço de dívida pública.
Significativamente, o Governo não aludiu a esta terrível predeterminação que é o nosso gigantesco atraso. E, no entanto, o relatório que acompanha a proposta das grandes opções transcreve de publicações internacionais alguns quadros comparativos da nossa situação com a de outros países europeus em diversos graus de desenvolvimento. Refere o PIB per capita, o consumo privado por habitante, o número de telefones por 1000 habitantes, a taxa de mortalidade infantil, a esperança de vida à nascença, a taxa de escolaridade dos 15 aos 19 anos, a taxa de estudantes do ensino superior.
Em todos estes quadros figuramos em último lugar dos países citados, em alguns casos a meio caminho, e sabemos todos que figuramos em último lugar da escala europeia.
O Sr. Luis Martins (PSD): - É o terramoto!
O Orador: - Sabe-se quem é o réu deste crime contra o povo português: o fascismo, que nos oprimiu durante quase meio século. Mas sabe-se também que a política económica, financeira e social que conduziu a este dramático resultado foi muito parecida àquela para que de novo nos querem empurrar.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador - O povo português não precisa de fazer uma nova experiência. Basta!
A política económica, financeira e social que o Governo anuncia nas grandes opções e os financiamentos constantes do OGE para 1981 não melhoram as condições de vida dos Portugueses, não promovem a satisfação das necessidades sociais, não melhoram as condições da educação e do acesso dos jovens à vida activa, não atenuam as assimetrias regionais, não aproximam Portugal do nível de desenvolvimento económico e social dos países da Europa Ocidental, não reforçam nem modernizam a estrutura produtiva, não corrigem os efeitos sociais negativos do processo de desenvolvimento económico.
Muito ao contrário, a amostra de quinze meses de governo da «AD» e as propostas de lei em discussão
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apontam para o agravamento dos défices ruinosos do OGE, das balanças comercial e de transacções correntes, da dívida externa e interna, degradam as prestações sociais, defraudando os direitos dos reformados, pensionistas e idosos, agravando as contribuições dos rurais e o seu afastamento do regime geral, propõem-se pagar. 8 milhões de contos de juros de indemnizações a ex-agrários e ex-monopolistas, preparando-se para lhes servir ao mesmo tempo um escandaloso perdão de juros de mora e das próprias dívidas fiscais, reduzem a quatro produtos o «cabaz de compras», cortando radicalmente e sem contrapartida os subsídios para os produtos de primeira necessidade, preparando o aumento generalizado dos preços a taxas largamente superiores às invocadas para a repressão salarial, entregam, à gula privada a saúde dos Portugueses, degradando os serviços públicos e aumentando as taxas dos Serviços Médico-Sociais, arruinar o Fundo de Fomento da Habitação, fazendo da política de habitação o festim dos promotores imobiliários dos grandes patrões da construção civil, sonegam cerca de 36 milhões de contos às autarquias locais, anunciando uma próxima revisão da Lei das Finanças Locais que consagra o esbulho.
Esta política, os seus pressupostos, princípios abstractos objectivos e metas só podem ter a nossa mais. firme oposição.
O Grupo Parlamentar do PCP votará naturalmente contra as propostas de lei das grandes opções e do Orçamento para 1981.
Uma voz do PSD: - Obrigado!
O Orador: - Não nos limitamos a fazer um desmascaramento e uma denúncia firme das orientações que as propostas comportam. Apresentamos nas intervenções que produzimos os grandes princípios de uma política alternativa e já apresentámos na Mesa um vasto conjunto de propostas de alteração às grandes opções para 1981 e ao OGE que são a concreta demonstração de que, tomando por base e respeitando as novas realidades criadas pela Revolução de Abril com o empenhamento dos trabalhadores e do povo português, é possível debelar as nossas maiores dificuldades e encetar os caminhos do desenvolvimento e do progresso social.
Do conjunto destas propostas salientamos, pela sua incontestável urgência e premente justiça, as que dizem respeito à eliminação do regabofe de isenções e reduções aos grandes grupos económicos, à criação de normas de protecção fiscal das pequenas e médias empresas, à actualização das prestações a que têm direito os reformados, pensionistas e idosos e as propostas que no Ano Internacional do Deficiente visam dar relevo à protecção fiscal dos cidadãos portadores de deficiência. Não podíamos igualmente deixar de colocar esta Câmara perante o imperativo de, dar integral cumprimento à Lei das Finanças Locais e de corresponder às justas reivindicações dos trabalhadores da função pública.
Com a rejeição das propostas de lei do Governo e com a apresentação das nossas propostas de alteração queremos significar que, ao mesmo tempo que tudo faremos para conseguir a queda e a substituição do governo «AD»/Balsemão, estamos firmemente seguros de que há reais condições para uma alternativa ao Governo, a maioria, a política da «AD», e faremos tudo para. com as demais forças democráticas, concretizar essa alternativa e assim prosseguirmos o 25 de Abril na nossa terra.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pulido.
O Sr. João Pulido (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uso da palavra para tomar parte no debate que decorre de imperativo legal a impõe a discussão e aprovação das propostas de lei apresentadas pelo Governo à Assembleia da República sobre o Plano e Orçamento para o ano de 1981.
E, da matéria em apreço, ir-me-ei debruçar, ainda que fugidiamente, pois a escassa dezena de minutos de que disponho, obviamente, me limitará a uma análise crítica, um tanto superficial, bem diferente da que desejaria fazer, mas que o condicionalismo assinalado, por inexorável, impõe e limita, no modo e no tempo. Debruço-me sobre um problema da maior relevância e transcendência política, em sistema democrático e de direito, como o que temos e desejamos reforçado, para bem dos Portugueses e de Portugal. Refiro-me concretamente a finanças locais.
Procurarei, ainda que genericamente, uma abordagem honesta e de reflexão, à luz de cristalina transparência, que em sistema deste tipo de vida política se permite e até se exige e aconselha seja praticada, para que se possa concluir, ou não, em exegese correcta, se o caminho apontado como o mais acertado é trilhado e seguido, e dar-se conta da firmeza na execução de um programa que havia sido prometido. O mesmo que dizer-se de uma realidade que pode ser alcançada como vontade expressa de um povo que fez a sua opção política, porque sabe o que quer e rejeitou o que não pretende.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei do Plano e Orçamento ora em apreço são documentos que consubstanciam em realidade a mudança pela AD oferecida aos Portugueses e que estes, em Outubro último e pela segunda vez consecutiva, maioritária e inequivocamente, desejaram referendar e escolher; porque ansioso, o povo, por se reencontrar consigo próprio e ambicioso, porque desejoso de arrancar para uma dinâmica de vida política, económica e social conducente a um melhor bem-estar e abastança em que a paz e a liberdade de consciência e de acção sejam vectores de uma realidade palpável e democrática, sem tergiversações, e em que os golpismos e aventureirismos não sejam possíveis àqueles que alimentem sonhos tenebrosos ou pesadelos maquiavélicos totalitaristas.
E esse povo, que em nós outros confiou e nos concedeu segundo mandato de governar, e agora por quatro anos, aí tem a demonstração de que a AD tinha razão quando preconizava no programa que a solução para os problemas que a afligiam, e ainda afligem, todo o povo português - mas todo, sem excepção - teria de passar por linha bem diferente e diversificada em filosofia política, económica e
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social da seguida pelos governos que antecederam os da Aliança Democrática.
Analisem-se e comparem-se as propostas de lei dos vários planos e orçamentos que vieram a esta Casa apresentados por esses anteriores executivos e cuide-se de ver quão diferente e o realismo destes e daqueles.
Aqui, porque conjugado com as possibilidades e capacidades de um povo e recursos de uma Nação, que reflecte as realidades da conjuntura e se conjuga com a necessidade imperiosa e inadiável de uma «mudança» (aliás prometida e em marcha) para um melhor bem-estar e prosperidade de um povo, a quem tudo se prometeu de bom, como fruto da Revolução de Abril, mas muito pouco ou quase nada do real e concreto alardeado fora concretizado.
Com o executivo do primeiro governo da Aliança Democrática, o povo português toma consciência de si próprio e das realidades possíveis do exercício capaz e eficiente e demonstra em curtos meses a sua capacidade governativa, a realidade do seu programa e o acerto na gestão da coisa pública.
O povo português vê renascer a sua esperança em escassos meses de eficiente governação e não hesita, como à saciedade provou, desta segunda vez, de maneira exuberante e espectacular, sem sombra para dúvidas, em apostar na Aliança Democrática. Reitera a confiança no governo da Aliança Democrática, porque sabe que este Governo executará, como o seu imediato predecessor o fez, o programa que se comprometera a levar a cabo.
O povo português sabe, e por experiência, que o governa AD só promete o que lhe é possível executar, com realismo e autenticidade democrática, tendo em vista atingir o que é possível, com coerência e firmeza, sem utopias ou demagogias que se não quadram e compadecem com a índole e o querer de um povo que preza uma tradição pluricentenária, arreigada na sua sensibilidade de consciência e confirmada e apoiada em uma inteligência a que repugna o caminho de «certa aventura», que lhe viria a negar o direito de ser o que escolheu e pretende que lhe seja assegurado - a liberdade de vivência democrática e social, personalista e cristã.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros dó Governo: Uma das questões mais polémicas parece ser a que decorre da aplicação da Lei das Finanças Locais no OGE para 1981. Por outras palavras e melhor dito: pretende-se fazer crer ao povo português que o Orçamento em apreço e apresentado a esta Câmara não contempla as autarquias com as verbas que pela Lei n.º 1/79 o Governo deveria inscrever e vir a transferir do OGE para a área jurisdicional dos municípios.
Ora, tanto pelo que os documentos em apreço nesta Assembleia da República reproduzem, como pelas palavras proferidas, há dois dias, pelo Sr. Ministro das Finanças perante todos nós traduzem, aí são fixados os meios financeiros atribuídos às autarquias locais que virão a possibilitar, através do OGE, recursos de valor superior aos do ano de 1980.
Com efeito, no ano transacto esses recursos em dotações foram de 30 milhões de contos e para 1981 atingem 37 milhões de contos, o que se salda em um aumento absoluto de 23 % a mais relativamente ao ano anterior. Significa isto um aumento muito superior ao crescimento real de todas as restantes despesas.
E convenhamos que, sem ter a preocupação de um equilíbrio orçamental, mas sem esquecer, contudo, que os défices tem limites técnicos, menos que se quisesse ignorar a realidade, as consequências reflectidas nos mercados de capitais a que o Estado tem de lançar mão seriam altamente prejudiciais para o País se o Governo não fosse sensível a essa realidade e comedido, e prudente na elaboração da proposta de lei.
Esta atitude governamental reflecte igualmente a imagem da Administração, quer a nível interno ou projectada no exterior, e significa a preocupação manifestada pela orientação seguida em aplicação de medidas que jamais alguém pode apelidar de demagógicas.
O Governo, e acertadamente, visa os interesses do Povo, que lhe compete defender, e procura compatibilizar, descentralizando, a Administração Central e Local, pois as duas devem ser solidárias na prossecução dos interesses do povo português e do todo nacional.
A descentralização em sistema democrático tem a ver, e muito, como todos sabemos, com a transferência de verbas para o Poder Autárquico.
Sem se verificar essa transferência mão haverá autêntica descentralização, pois o sustento e outro de vida autárquica se torna impossível por falta de recursos financeiros compatíveis com a vida autonómica que é apanágio de uma descentralização.
Se não há independência de meios financeiros, fenece a autonomia política autárquica e a descentralização seria um bluff, um mito e uma fantasia, e não passaria de uma loa inaceitável em democracia autêntica, tal como a pretendemos e defendemos e a maioria do povo português a deseja, quando nos mandatou como seus representantes legítimos nesta Câmara. Mas isso não significa, todavia, que não sejamos ponderados nos nossos anseios de descentralização financeira e queiramos, a todo o transe, menosprezada ou ignorada a real situação económica do País e as dificuldades imensas que enfrenta, não ser considerado o aspecto do todo orçamental e o condicionalismo que e bom senso lhe impõe e, sem ponderar as consequências, fossem usados critérios que iriam prejudicar o investimento produtivo, diminuir o crédito à economia, prejudicar a criação de empregos pelo aumento desmesurado do défice orçamental, como referiu no seu discurso o Sr. Ministro das Finanças.
Se há defensores de uma descentralização autárquica, autêntica e consciente, nós a defendemos intransigentemente. Mas também defendemos com igual vigor e intransigência a ponderação e a sensatez a aplicar, pois não ignoramos a história da galinha de ovos de oiro!
E na discrepância interpretativa da Lei n.º 1/79 há uma responsabilidade que cabe a esta Câmara legislativa, e a nenhum outro órgão de soberania. O seu a seu dono e não queiramos enjeitar a culpa que nos cabe!
Concretamente, quero referir-me à lei das competências e das atribuições, que, se tivesse sido já discutida e aprovada, não se estaria hoje, qual «cavalo de batalha», com divergências interpretativas sobre leis tão importantes como a Lei das Finanças Locais.
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E, sem dúvida, não menos importante teria sido a revisão da Lei n.º 1/79, que, aliás, ela própria prevê, em prazo há muito ultrapassado.
Deste modo, com a experiência da sua aplicação, teria sido melhorada e adaptada à realidade do País que somos e da capacidade financeira disponível para uma efectiva e segura descentralização de atribuições, como, aliás, dentro de ajustada contribuição, o Governo fez, nos limites da possibilidade, para o desenvolvimento das regiões autónomas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Têm VV. Ex.ªs, Srs. Membros do Governo, consciência perfeita e clara da opção do indeclinável dever na defesa dos legítimos interesses das populações e da dificuldade na implicação prática e correcta da Lei das Finanças Locais.
Os necessários suportes legais para uma perfeita aplicação, com os benefícios efectivos e práticos daí decorrentes, ainda não existem.
Contudo, ponderada e sensatamente, e sem atropelar o espírito da Lei n.º 1/79, encontrou o Governo fórmula para conciliar os verdadeiros interesses nacional, respeitando o império da Lei das Finanças Locais e compatibilizando-a, na execução, com os interesses dos povos, cuja defesa será sempre pomo de honra para um governo que governe, fiel à ortodoxia dos princípios, programáticos e que o povo mandatou, em acto histórico, solene e público, em 5 de Outubro do ano passado.
E porque somos parte desse povo e legitimamente também aqui o representa mos, o Partido do Centro Democrático Social, um dos parceiros da Aliança Democrática, apoia o seu Governo e votará favoravelmente as propostas de lei do Plano e do OGE -para 1981 apresentadas pelo Executivo à Assembleia da República e aqui em debate.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Uma primeira palavra nesta intervenção para o Sr. Ministro da Administração Interna, que se tem revelado silencioso e distante, tanto no Programa do Governo como agora. Perguntar-lhe-ei se é este o fundo de equilíbrio financeiro que calculou quando, sabendo o volume das despesas correntes e de capital, fez os primeiros cálculos pelo percentual mínimo que a Lei das Finanças Locais define. Perguntar-lhe-ei se, quando escreveu, ou mandou escrever, no Programa do Governo que este Governo era pela «aplicação cuidada da Lei das Finanças Locais», eslava a pensar que o cuidado era este, o cuidado de defraudar, de retirar mais de 30 milhões de contos aos valores que são geridos pelos 305 municípios, pelas 4035 freguesias, pelos mais de 65 000 eleitos. Lembrar-lhe-ei, Sr. Ministro, que era útil, nas palavras que diz aqui e fora daqui, que anuncia nos jornais oficiais do seu partido, ter em conta esta realidade crescente que é o Poder Local em Portugal, realidade que - faço-lhe essa justiça - naturalmente o preocupa e se esforça por conhecer.
Uma segunda palavra é ainda para o Sr. Ministro da Administração Interna, para lhe dizer que o seu colega de Governo e da AD, que não de partido. Dr. Morais Leilão, tem destas coisas das finanças locais um entendimento e uma óptica que já conhecerá, mas de que lhe recordo alguns traços essenciais. A sua primeira preocupação é a óptica do défice possível. Sabe-se como é. Um ministro de um governo com estas opções faz opções de cortes e de adiamentos de verbas nuns lados, faz opções de adiantamentos e de reforços noutros, precisamente ao contrário daquilo que muita gente faria neste país. Um ministro de um governo com estas opções intenta deflacionar, no fundo, gastos públicos, designadamente os que, sendo para resolver carências de há muitos anos, podem, na sua óptica, esperar mais uns anitos ou mais uns decénios, intenta deflacionar os custos do Estado à custa do dinheiro que não lhe é caro, o que se reflecte nos esgotos, nas redes de água, nas estradas, nos mercados, nos calcetamentos, nas habitações e no betume, coisas que preocupam tanta gente, principalmente urbana, por esse País fora. Aliás este Governo, apesar do caciquismo, apesar da forma como os governos Mota Pinto e Sá Carneiro defraudaram o Poder Local, ...
Uma voz do PSD: - E o governo Pintasilgo?
O Orador: - ... não sabe nem sonha o que vai por esse País fora de iniciativas locais em vários municípios.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Desmultiplicaram-se os escalões decisórios e a Lei das Finanças Locais, que o meu camarada de bancada Veiga de Oliveira considerou marco histórico, marcou de facto, com os seus financiamentos, uma certa alteração na panorâmica deste pais. Aliás o País tem hoje muitos mais buracos - não só os buracos em que os deputados da AD estão neste momento a pensar, que são os buracos feitos pelo Governo, mas também os buracos abertos para criar as infra-estruturas que o fascismo esqueceu ignominiosamente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Volto a referir: deflacionar o défice nas áreas que não são do interesse dos grandes é perspectiva de fundo das opções que levam à leitura que este Ministério AD-Balsemão faz do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Fazemos a justiça de pensar que não será por não dispor de máquina que as suas contas não acertam com as nossas contas, que não será por não ter lido o debate da Assembleia da República em 1978 para a aprovação da Lei das Finanças Locais que as suas contas não acertam com as nossas contas.
Não. As contas não estão certas para os senhores porque os senhores não querem acertar as contas, porque os senhores não querem cumprir a Lei n.º 1/79. O Sr. Ministro Morais Leitão e o Governo acham que é muito, acham que a lei é uma lei de mãos largas, acham que é uma lei feita sem preocupações de gestão, ou management, como diria o Ministro da Reforma Administrativa se descesse dos Estados Unidos aqui directo a esta Assembleia. É uma
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lei que alguns dos senhoras consideram desregradamente aumentadora das despesas públicas. E não é. É uma lei que impõe um percentual real das despesas públicas, feito pelas autarquias, não se aumentando o défice, mas alterando as entidades gastadoras. Os senhores sabem que uma das regras para diminuir e défice, enumeradas, aliás, pelos peritos internacionais que nos visitam e que vos aconselham, é esta: que os órgãos gastadores não estejam em condições de gastar e que a taxa de execução não seja cumprida senão num mínimo. Apontaram para algumas despesas 0,85, para outras 0,90, para outras 0,95, e nós sabemos, pelas contas gerais, que há taxas de execução a 0,70, 0,75, etc. Isto é, que o Orçamento seja para a Assembleia ver, que o Orçamento seja equivocamente feito para dar a ilusão de que vão ser feitas várias coisas, mas para que as contas gerais, mostradas depois no fim do ano, não lembrem o Orçamento que se fez. O Decreto n.º 252/I definia quais as competências de delimitação. O projecto de lei do Grupo Parlamentar do PCP volta a frisá-lo. Importa que a Assembleia da República o aprove com rapidez. O que é certo é que o Sr. Ministro levantou na sexta-feira uma falsa questão a propósito da apresentação deste Orçamento Geral do Estado.
Adiantava mais uma indicação: os senhores, muitos deputados dos Grupos Parlamentares do CDS e do PPD - o PPM ainda não existia nessa altura, em termos parlamentares -, ...
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Ah!
O Orador:- ... sabem que a Lei das Finanças Locais tem só uma leitura, não tem várias interpretações. Iria muito rapidamente equacionar porquê esta única leitura e porquê o equívoco da dupla interpretação apresentada o ano passado a esta Assembleia pelo Ministro Cavaco e Silva.
A agregação das verbas é indiscutivelmente a que transparece, como foi dito, aliás, há pouco pelo Sr. Deputado Sousa Gomes, dos cálculos apresentados nesta Assembleia aquando da discussão da lei, do parecer da Comissão Constitucional que é conhecido acerca da lei. É uma óptica. Nessa óptica coexistem duas ópticas de contas que raramente são ditas aqui: é a óptica das contas nacionais e a óptica da contabilidade pública. Tanto da óptica das contas nacionais que aparece, alias, no Programa do Governo, a p. 8, como na óptica da contabilidade pública - cito p. 58, quadro XVIII -, aparecem claramente despesas correntes em bens e serviços, em valores agregados, naturalmente com os serviços, com os gastos de pessoal incluídos, nem podia ser de outra maneira. Estes valores aparecem agregados em bens e serviços. Convido os Srs. Deputados do PSD, do CDS e do PPM, até amanhã, para a votação na especialidade dos artigos 45.º a 48.º, a verem os quadros I e VIII, com os valores agregados de despesa, com os bens e serviços não subcodificados, como na despesa processual, de acordo com o Decreto-Lei n.º 737/76, que é para aqui chamado muitas vezes com amplo desconhecimento e com grande ignorância daquilo que se está a discutir. São argumentos mal apanhados, feitos sobre o joelho, que os senhores não entendem e que desrespeitam a Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
A lei só tem uma leitura. À míngua de outras indicações, que o tempo urge. convém lembrar que neste orçamento de despesas cresceram as verbas classificadas - foi outra habilidade que foi feita aqui - em outras despesas correntes e em outras despesas de capital. Aí desagregaram. Desagregaram os quadros (vejo o quadro VI, p. 26). Classificam em outras despesas: outras despesas de capital e outras despesas correntes. Isso, na letra ingénua da lei, não faria parte do cálculo. Isso faria com que em 37 milhões de contos não fosse apurado o valor percentual de 18%. Isto prova até que ponto esta AD, ao ler as contas desta forma, está a utilizar todos os sofismas e se atreve a chamar a isto nova interpretação. É preciso descaramento, Srs. Deputados! Tenham tento, meus senhores!
Daí que hoje, terça-feira, de manhã, já tenha saído a defesa, eu atrever-me-ia quase a pensar e a sugerir, em play-back, das últimas intenções do Governo pela voz de dois deputados do PSD. Um exaltou-se com o facto de haver interpretações da lei. O que ele quer é que haja só uma leitura da lei, a do PSD. No fundo queria a revisão da lei, contraditoriamente, com medo de todos os anos ser alvo do desmascaramento quanto às contas que faz, uma lei que seja diferente desta para não ser possível a leitura unívoca, uma lei diferente desta para não ser desmascarado.
O outro deputado falou e disse: em vez de despesas, passa-se à apreciação dos 18 % sobre as receitas. São elementos realmente curiosas! A memória dos senhores é curta. Mas a memória curta tem limites. Tanto em 1978 como em 1979, deputados do PSD - lembro dois: o então deputado Bento Gonçalves e o deputado de hoje, presidente da Comissão de Administração Interna e Poder Local, Dr. Moura Guedes - não aceitaram o incumprimento da lei, aceitaram o adiamento cio cumprimento da lei.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu chamo a atenção de V. Ex.ª para a circunstância de que já está a falar há cinco minutos contando no tempo de amanhã.
O Orador: - Eu vou terminar já, Sr. Presidente. Só vou dar mais uma indicação ao Sr. Ministro Morais Leitão.
A lei só tem uma leitura. O Sr. Ministro Morais Leitão fugiu à questão, com a habilidade que lhe é reconhecida. Disse que o valor ia crescendo. Mas o que não diz é o valor real se a lei tivesse sido cumprida; o que não diz é qual é o valor percentual desses valores em relação às despesas que cresceram, o que não diz é que a inflação medida em termos de índices de revisão de preços de empreitadas é inferior aos índices afirmados pelos senhores como taxa de inflação. Meteu-se, entretanto, conhecido como é o seu interesse no âmbito dos futebóis nacionais, por maus caminhos e chegou a estar em nítida posição de fora de jogo com aquilo que disse da oferta de 35 000 empregos, que não são criados pelas autarquias locais. Amanhã não ficaria mal que os Srs. Deputados do PSD, do CDS e do PPM verificassem isto: não são apenas os problemas desta Assembleia, são problemas nacionais, são os problemas de 305 municípios, de 4035 freguesias. Era importante que amanhã, na dis-
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cussão na especialidade sobre os artigos 45.º a 48.ºinclusive, a Câmara, quando votasse, votasse uma coisa que interessa a milhões de portugueses e que diz respeito ao seu bem-estar, à qualidade de vida. para usar o nome de um dos ministérios emblemáticos desta AD.
Aplausos fio PCP e tio MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Fernando Amaral): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É apenas para dar uma resposta muito rápida ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, que me lançou um repto, só que o fez fora de tempo e está a jogar efectivamente off-side. Fê-lo fora de tempo na medida em que como a achega veio tão tarde, não me permitiu poder dar-lhe a resposta conveniente. Em todo o caso, dentro do tempo de que disponho, sempre procurarei dizer-lhe que efectivamente há uma leitura, mas não é a leitura do PCP, que e uma leitura distorcida, da Lei das Finanças Locais. Efectivamente, se tivermos presente o conteúdo dessa lei, haveremos de observar que, quando se fala em bens e serviços, dentro do conceito de expressão económica, bens e serviços são apenas bens duradouros, bens não duradouros e a aquisição de serviços. Só no domínio da conta é que aparecem as despesas de pessoal. Dentro deste conceito, o PCP não e capaz de enfileirar, nem de ver, precisamente porque é míope, nestas apreciações, não chegando, portanto, a ter a interpretação autêntica, precisa e ajustada da Lei das Finanças Locais. Por isso toda essa distorção e essas conclusões absolutamente fora de jogo e fora de tempo.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como ao longo destes dias foi mais uma vez demonstrado, o debate do Orçamento e das grandes opções do Plano, apesar de envolver complexas questões técnico-económicas, e acima de tudo, um debate político. Por isso, ele se realiza aqui, entre os legítimos representantes do povo português; por isso, a aprovação das leis do Orçamento e do Plano é da competência da Assembleia da República.
Não se estranhará assim, que, ao encerrar o debate, o Primeiro-Ministro aborde as coordenadas políticas em jogo, e que o faça resistindo à tentação de se circunscrever à conjuntura, por mais favorável que esta se apresente no momento ao Governo, e procurando um enquadramento na perspectiva correcta que é a de quatro anos - os quatro anos do Plano, os quatro anos do Governo, os quatro anos que vamos demorar para nos integrarmos totalmente, de pleno direito, no Mercado Comum.
A Aliança Democrática está no Poder, e estará pelo menos até 1984, porque a maioria dos portugueses pretende modificar o rumo negativo em que havia entrado o País.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mudar Portugal é o mandato que democraticamente nos foi conferido pela vontade popular e ao qual seremos intransigentemente fiéis.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E mudar Portugal significa acelerar o progresso económico e social no respeito pelas liberdades democráticas. Tal seria impossível no quadro da forçada colectivização imposta pelo Partido Comunista como forma de assalto ao poder e de controle totalitário sobre a sociedade.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas a modernização económica e social e a própria democracia política ficariam, também, fatalmente comprometidas se não fosse travada a tendência para a crescente estatização que, depois de 1975, sucessivos governos permitiram como aparente solução de facilidade para a premência dos problemas. Era preciso parar a fuga para a frente e foi isso que a Aliança Democrática fez. E foi isso que lhe deu a vitória em duas eleições legislativas, no prazo de um ano.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Outro é. na verdade, o nosso modelo de sociedade. Queremos para Portugal um país de homens livres, de homens responsáveis, capazes de assumirem a iniciativa e o risco. Queremos uma sociedade pluralista, onde existam condições para o exercício da criatividade pessoal. Queremos ultrapassar definitivamente o País arcaico que, em parte, ainda somos - e que se tem manifestado - na tendência para o paternalismo de Estado, seja sob a forma reaccionária anterior ao 25 de Abril, seja, depois, sob falsas aparências progressistas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Entendemos que as portuguesas e os portugueses tem direito a usufruir e a exercer a maturidade política e social que nos últimos anos demonstraram, sempre que lhes foi pedida ou possibilitada, sempre que as circunstâncias o exigiram, sempre que o seu país - o nosso país - precisou a esta maturidade. A modernização económica e a justiça social são condições indispensáveis para atingir tais objectivos, e por isso constituem vectores fundamentas dos documentos que vão ser votados.
Na nossa concepção, porém, modernizar a economia e promover a justiça social constituem tarefas de toda a sociedade e não apenas do Estado. Um Estado omnipresente, ao qual tudo se pede, desde o emprego à segurança contra riscos económicos, não é apenas um Estado potencialmente opressor porque limitativo das liberdades e da autonomia dos cidadãos - é também e sempre um Estado ineficaz.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E nós, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em Portugal, bem o sentimos. Não foi por acaso que o avanço de estatização coincidiu, entre nós,
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com a crescente incapacidade de o Estado dar resposta às carências colectivas.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Só por miopia política se pode ignorar que o combate da Aliança Democrática e do seu governo para autolimitar o Estado é, simultaneamente um combate para dignificar e reforçar o Estado, para o tornar justo e eficaz, para o transformar em algo que sentimos como nosso e não contra o qual necessitamos de viver em permanente situação de conflito.
É uma tarefa difícil, dadas as responsabilidades de toda a ordem que o Estado foi tomando sobre si e de que não pode libertar-se de um momento para o outro, sob pena de graves danos sociais. Mas é uma tarefa que o Governo levará a cabo e de que são passos importantes o Orçamento Geral do Estado para 1981 e as grandes opções do plano a médio prazo.
Os Governos anteriores aos da Aliança Democrática legaram-nos um Estado sobrecarregado de responsabilidades que temos de gerir mas que iremos firmemente limitar. Assim, podemos classificar o Orçamento Geral do Estado para 1981 como um orçamento de transição, onde já se conseguiu diminuir a incidência do défice orçamental no produto interno bruto, mas onde é ainda excessivo o peso das despesas correntes, inflacionadas, designadamente, por essa herança do passado que é o serviço da dívida pública.
É certo que os governos da Aliança Democrática se têm revelado gestores bem mais competentes do que os anteriores, sobretudo em relação ao Estado que nos legaram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Basta pensar, como exemplo, no que tem sido, e no que era até 1980, o rigor da execução orçamental.
Mas não nos contentamos com isso. O Governo tem um mandato a cumprir e esse mandato é o de modernizar Portugal, implantando uma autêntica democracia política, social e económica, de tipo europeu ocidental. Esse mandato será cumprido e está já a sê-lo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Nesse sentido apontam as grandes opções do plano a médio prazo para 1981-1984. Pela primeira vez desde o 25 de Abril, e graças à maioria da AD, vamos planear a médio prazo o nosso destino colectivo.
Não para impor um colete de forças aos agentes económicos e à sociedade civil em geral, mas, bem pelo contrário, para acelerar o fortalecimento dessa sociedade civil, dando condições aos Portugueses para finalmente assumirem em liberdade o seu futuro.
Acelerar o desenvolvimento económico, promovendo sistematicamente a modernização e a inovação, é uma das metas do Governo, expressa nas grandes opções do Plano. Melhorar o nível de vida dos Portugueses, reduzir o ritmo da inflação para os níveis correntes da Europa, combater o desemprego e satisfazer necessidades sociais básicas, são objectivos que prosseguiremos intransigentemente, sem nunca pôr em risco de ruptura as contas externas do País.
Incentivaremos o espírito de competitividade, indispensável numa economia aberta ao exterior como é a nossa, e consideraremos a concorrência como a primeira linha de defesa do consumidor. A referência ao mercado - que ao longo dos últimos anos se foi esbatendo pela sobreposição de numerosas e por vezes incoerentes intervenções estatais - terá de ser avivada, sob pena de cairmos na ineficiência.
Mas não sacralizarmos o mercado. O Estado intervirá para corrigir as injustiças e as assimetrias a que o livre jogo da oferta e da procura por vezes dá lugar.
O Sr. Moura Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A justiça social é, para o Governo, um valor tão importante como a eficácia económica.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Justiça social e eficácia económica não são, aliás, valores desligados e independentes. Só com eficácia económica se pode dar conteúdo palpável à justiça social. E se é verdade ter sido graças à Aliança Democrática que, pela primeira vez desde há cinco anos, melhoraram os salários reais e foram significativamente aumentadas as pensões sociais, também é certo que muito mais poderemos fazer se conseguirmos libertar o Estado das responsabilidades excessivas que o tem sobrecarregado.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Sectores como a educação, a saúde, as finanças locais, etc., são actualmente prejudicados por essas responsabilidades excessivas noutras áreas. Mais uma vez se torna claro que, na própria perspectiva de uma maior justiça social, a autolimitação do Estado é indispensável.
Para que a contenção, e ao mesmo tempo, a eficácia, do Estado possam ser plenamente conseguidas, algo terá, porém, de mudar no nosso ordenamento constitucional. A missão do Governo só poderá, ser cabalmente levada a cabo se for realizada uma autêntica reforma constitucional.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É certo que o Governo muito pode e deve fazer independentemente da revisão da Constituição. E tem-se feito: nunca foi, nem será, para nós, uma desculpa a invocar o aguardarmos pela revisão constitucional. É assim, por exemplo, que o Governo já submeteu a esta Assembleia uma proposta de lei alterando a actual delimitação dos sectores público e privado, proposta de lei inteiramente compatível com o actual ordenamento constitucional.
Também em matéria de poder local muito poderá ser feito - e iremos fazê-lo - sem esperar pela revisão da Constituição, e muito iremos fazer para que a descentralização de que todos falam seja finalmente aplicada na prática. Finanças locais, atribuições e competência das autarquias, associações de municípios, delimitação dos investimentos, são outros tantos
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marcos de um conjunto legislativo que permitirá, às populações decidirem e responsabilizarem-se sobre o seu próprio destino sem dependerem da aprovação paternalista e burocrática de Lisboa e do Terreiro do Paço. Todos os partidos, todos os órgãos de soberania falam da descentralização; nenhum a aplicou, porque todos a receiam. Nós não lemos medo da descentralização. Vamos demonstrá-lo e calar para sempre as vozes dos que só por ela clamam quando estão na oposição e sabem não poder aplicá-la.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
É evidente, no entanto, que embora haja várias áreas onde se pode desde já avançar, o projecto colectivizante subjacente a inúmeras disposições da Constituição, bem como as sequelas da legitimidade revolucionária consagradas no texto constitucional, constituem entraves reais à modernização económica e social da sociedade portuguesa e à instauração plena da democracia.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A revisão constitucional é uma tarefa desta Assembleia, em que o Governo não irá interferir, mas que acompanhará com todo o interesse. O Governo confia em que prevalecerão não só o bom senso como a consciência dos superiores interesses nacionais, tornando possível dotar o País de um ordenamento constitucional isento das actuais cargas ideológicas, que nos afastam do modelo de sociedade corrente nas democracias da Europa Ocidental.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A Europa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, constitui um termo de referência fundamental das grandes opções do Plano para os próximos quatro anos. Será durante este período, de facto, que se concretizará a adesão de Portugal às comunidades europeias.
Entrar no Mercado Comum era um sonho impossível no regime não democrático anterior ao 25 de Abril, como o foi no período gonçalvista. Hoje, apenas o Partido Comunista e a extrema-esquerda, a par das correntes de extrema-direita, se opõem frontalmente à adesão do nosso país à CEE.
Isso revela bem não estar em causa, apenas, uma opção económica. Está em jogo uma escolha de base sobre o modelo de sociedade que pretendemos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Quem é contra a democracia, tal como ela e entendida na Europa Ocidental, não pode ser favorável à entrada de Portugal no Mercado Comum.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este é o fundo da questão que, tantas vezes, se pretende disfarçar com pretensos argumentos económicos.
Para o Governo, entrar na CEE é uma prioridade de toda a sua política. O projecto de sociedade com base no qual foram escolhidos pelo povo os representantes da Aliança Democrática, nesta Câmara, para governar aponta inequivocamente para a Europa. Por isso mesmo, caso a CEE não existisse ou a ela não aderíssemos, nem por isso deixaríamos de defender para Portugal um modelo de organização política, económica e social de tipo europeu ocidental.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não que consideremos este modelo como a perfeição acabada; ele é, no entanto, o único capaz de compatibilizar a liberdade com as aspirações de progresso económico e justiça social.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas a CEE existe e a ela vamos aderir. Não a qualquer preço, como tenho repetidamente afirmado, mas acautelando os legítimos interesses nacionais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Somos conscientes do atraso económico e social que nos separa da Europa comunitária. Mas enquanto alguns agitam esse atraso como pretexto para se oporem à adesão à CEE -parecendo preferir uma resignada aceitação do nosso arcaísmo -, o Governo, bem pelo contrário, encara a entrada no Mercado Comum como o estímulo eficaz que irá acelerar o nosso desenvolvimento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Tal não sucederá automaticamente: o Governo criará as condições para que o desafio europeu possa transformasse num verdadeiro motor de mudança e da democratização em Portugal. Nesse sentido é orientada toda a política económica subjacente às grandes opções do Plano.
Sabemos estar perante uma grande oportunidade histórica, que só por incúria poderíamos deixar escapar.
O problema da nossa entrada na Europa - que é, acima de tudo, um problema de transformarmos rapidamente as nossas estruturas económicas e sociais, aproximando-as das europeias - não envolve apenas o Governo e o Estado. Trata-se de um problema nacional, que diz respeito a toda a sociedade civil.
E é porque o Governo reconhece a autonomia da sociedade civil e procura fortalecê-la, que pretendemos estimular o livre concurso das pessoas, instituições e grupos, e em particular dos parceiros sociais, na obra gigantesca de modernizar Portugal e integrá-lo na Europa, verdadeira tarefa histórica da nossa geração.
Existe uma ampla margem de consenso quanto a este objectivo, da qual apenas se excluem as forças da esquerda comunista e extrema-esquerda e da direita. Sem prejuízo de diferentes perspectivas e dos diversos projectos que naturalmente têm os parceiros sociais, temos à nossa frente um vasto terreno de potencial entendimento sobre alguns problemas básicos. Para tal, promoveremos, e estamos já a promover, o necessário diálogo, a que somente parecem
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negar-se, à partida, aqueles que - dizendo-se defensores dos trabalhadores - e mais não pretendem do que veicular uma estratégia política alheia não só às classes trabalhadoras como à própria Nação.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Pelo nosso lado e em atitude contrária, e como se lê nas grandes opções do Plano para 1981-1984, o Governo irá «estimular, nos planos social, económico e político, a prática do diálogo e da concertação, como meios privilegiados para superar os conflitos, reconhecendo como elementos fundamentais da vida democrática a autonomia dos sindicatos, das associações empresariais e de outras formas de associativismo».
É pena que certas forças tenham do diálogo uma outra concepção e se sirvam dos legítimos anseios de melhoria material dos trabalhadores para, prejudicando gravemente a colectividade, porem em causa o esforço do relançamento económico e de modernização em que estamos lançados. O Governo lamenta-o, mas não se intimida nem cederá à demagogia quando estão em jogo os interesses nacionais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mais do que isso, o Governo opor-se-á, por todos os meios legais e democráticos ao seu dispor, a qualquer tentativa de, simultaneamente, inviabilizar uma política salarial que visa melhorar o poder de compra dos trabalhadores e suas famílias, e afectar as condições de vida das portuguesas e dos portugueses, chegando ao ponto de, como neste momento acontece em Lisboa, os impedir de, em sua casa, cozinharem a sua comida.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os documentos que esta Assembleia dentro de momentos irá votar na generalidade representam passos decisivos da nossa caminhada, para um Portugal mais próspero, mais justo...
Vozes do PCP: - Para os capitalistas.
O Orador: - ...e mais europeu.
Não são pontos de chegada, mas pontos de partida para o enorme esforço de transformação que nos é pedido e em que o Governo porá todo o seu empenho.
Saberemos estar à altura da exigência da hora que atravessamos. Em democracia, transformaremos Portugal
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate.
Vamos passar à votação na generalidade da proposta de lei n.º 18/II - Grandes opções do Plano para 1981-1984 e grandes opções do Plano para 1981.
Submetida à votação, foi aprovada, com 126 votos a favor (PSD, CDS e PPM) e 66 votos contra (PS, PCP, ASDI, UEDS, MDP/CDE e UDP).
O resultado da votação foi sublinhado com aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Vamos agora votar na generalidade a proposta de lei n.º 19/II - Orçamento Geral do Estado para 1981.
Submetida à votação, foi aprovada, com 127 votos a favor (PSD, CDS e PPM) e - 66 votos contra (PS, PCP, ASDI, UEDS, MDP/CDE e UDP).
O resultado da votação foi sublinhado com aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Para que efeito pede a palavra. Sr. Deputado?
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - É para fazer uma declaração de voto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Antes de dar-lhe a palavra. Sr. Deputado, queria lembrar a todos VV. Ex.ªs que o trabalho que nos espera amanhã vai ser necessariamente prolongado. O número de propostas de substituição, de emenda, de aditamento, etc., que já deram entrada na Mesa permite fazer prever um trabalho continuado e que tem necessariamente de ser árduo para poder concluir-se amanhã. Pedia aos Srs. Deputados que eventualmente deixem a sessão antes do seu encerramento que amanhã estivéssemos a horas, de modo a podermos começar os trabalhos às 9 horas e 30 minutos.
Por outro lado, e até por consenso estabelecido entre os partidos, era da maior conveniência, para que a Mesa pudesse pôr um mínimo de ordem na preparação e na condução dos trabalhos, que todas as propostas de alteração, fosse qual fosse a sua natureza, dessem entrada na Mesa até ao início dos trabalhos. Suponho que todos os partidos estarão em condições de poder fazê-lo. Creio ter-se estabelecido também um certo consenso nesse sentido, e pedia a todos o melhor esforço para que fosse possível alcançar esse objectivo.
O Sr. Deputado Herberto Goulart, o seu partido dispõe ainda de um minuto e meio. Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente. é sobre o que o Sr. Presidente acabou de dizer.
Não há nenhum consenso, obviamente, para a entrega de propostas. Há consenso, sim, para discutir as propostas por blocos, e cada partido ou cada deputado pode, a todo o momento, antes da votação, apresentar novas propostas de alteração. Nem de outra forma podia ser. Portanto, independentemente de estarmos de acordo em fazer um esforço para apresentar as propostas até ao início da sessão, é óbvio que em qualquer momento da discussão sobre um determinado ponto se pode apresentar uma proposta. Mais, pode até isso vir a revelar-se uma necessidade reconhecida por todos.
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O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, e óbvio que o alcance da intervenção da Mesa era exactamente nesse sentido, que fossem enviadas para a Mesa com a maior brevidade todas as propostas que estivessem prontas. Se houver necessidade de fazer propostas de alteração no decurso do debate, com certeza que não estará no espírito da Mesa nem no de ninguém cercear essa possibilidade, que, evidentemente, se tem de manter até final. Em todo o caso, agradeço que V. Ex.ª tenha permitido à Mesa esclarecer este ponto, visto que. embora com o propósito de ser claro e julgando interpretar o que estava no pensamento da Assembleia, vê-se que houve vantagem, efectivamente, no esclarecimento.
Tem V. Ex.ª a palavra. Sr. Deputado Herberto Goulart.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Uma muito rápida declaração de voto para aproveitar o minuto e meio de que ainda dispõe o nosso partido e para evitar fazer uma declaração de voto por escrito para o Diário da Assembleia da República.
Disse o Sr. Primeiro-Ministro na sua intervenção de há pouco que modernizar a economia e assegurar o progresso social é uma tarefa de toda a sociedade, e não apenas do Estado. Estamos com isso seguramente de acordo. Mas disse mais: disse considerar serem excessivas as responsabilidades actuais do Estado, partindo naturalmente essa afirmação de uma concepção de Estado em que este não é uma entidade abstracta, mas uma entidade que se personaliza nos órgãos de poder versus uma sociedade que para nós é essencialmente a sociedade dos trabalhadores, dos agricultores, dos pequenos comerciantes, dos industriais, dos artesãos, dos quadros técnicos e da intelectualidade. Existe um divórcio entre estas duas realidades. Só a existência de tal divórcio pode levar de facto à concepção de que as responsabilidades actuais do Governo, do Estado, são incomportáveis para esse mesmo Estado. É o divórcio que afinal sempre existirá quando o Poder for dominado pela AD e que esteve bem demonstrado na forma displicente como a Sr. Primeiro-Ministro se referiu à justa luta dos trabalhadores da Petroquímica, à greve que eles têm vindo a realizar. É o mesmo divórcio que existe ainda nas grandes opções do Plano a médio prazo e para o ano de 1981. É o divórcio que impossibilitará o governo da AD de concretizar, de assegurar, uma planificação democrática e participada. É o divórcio que impedirá que, com estas opções, com este OGE que foi aprovado, com este governo no Poder, se chegue, de facto, a uma cooperação entre o Estado e toda a sociedade, para que o nosso país caminhe em direcção da democracia, caminhe em direcção de uma sociedade mais justa e mais feliz para todos os portugueses.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, também para uma declaração de voto. Dispõe de um minuto e meio para o efeito.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cobertura do debate pela televisão ou, por outra, a manifestação dessa cobertura lá para fora e demonstrativa do receio que o Governo e a AD tem em que as posições dos partidos da oposição sejam claramente dadas a conhecer ao povo português.
A UDP votou contra estas duas propostas de lei porque elas, em si, significam o reforço das condições de exploração do nosso povo. É totalmente impossível, e só a UDP aqui o disse, conseguir harmonizar os incentivos aos capitalistas com a melhoria das condições de vida dos trabalhadores, porque os capitalistas só investem desde que aumente a produtividade e, aumentada a produtividade -é uma lei desta sociedade -, o desemprego também aumenta, porque o desemprego é uma resultante da função entre o número global dos trabalhadores e a sua produtividade. Por outro lado, este governo lançou agora um novo mito, que é o mito do risco. E a UDP pergunta: risco para quem? Para os que trabalham? Risco para os pequenos e médios agricultores em relação à seca, em relação à exploração de que são vítimas pelos intermediários vorazes? Não, Sr. Presidente e Srs. Deputados. É um risco, veja-se bem, dos Srs. Capitalistas que o Governo, pressuroso cobre imediatamente com os seus incentivos ao investimento, que vai buscar ao bolso dos trabalhadores. Portanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que a UDP diz claramente é o seguinte: não é possível, na situação criada pelo 25 de Novembro, melhorar as condições de vida dos trabalhadores. Para que isso aconteça é preciso a luta firme para romper com essa situação política, abandonando a ilusão de que pode haver uma mudança para melhor nesta situação. Essa luta dos trabalhadores não pode ser só dirigida contra o Governo e contra a AD. Ela tem de ir mais além, tem que ser dirigida contra as estruturas capitalistas desta sociedade. Só assim, efectivamente, lutando contra o Governo e contra a AD, mas numa perspectiva de luta que vá mais fundo, que vá às estruturas da sociedade capitalista, é possível a melhoria das condições de vida dos trabalhadores.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Protesto. O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Veja-se a Albânia!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para apreciação dos dois diplomas e sua votação na especialidade continuamos os nossos trabalhos amanhã, às 9 horas e 30 minutos.
Cumpre informar, antes de encerrar a sessão, que deu entrada na Mesa o projecto de lei n.º 173/II, subscrito pelos Srs. Deputados do PSD Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos e Luís António Martins, sobre o estatuto do trabalhador-estudante.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 25 minutos.
Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
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António Augusto Ramos.
António Duarte e Duarte Chagam
António Vilar Ribeiro.
Arménio dos Santos.
Bernardino da Costa Pereira.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto de Oliveira Baptista.
José Augusto Santos da Silva Marques.
Júlio de Lemos Castro Caldas.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria Helena do Rego C. Salema Roseta.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires D. Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Partido Socialista (PS)
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António José Sanches Esteves.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Torres Marinho.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel dos Santos.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Vítor Manuel Brás.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano José Alves Moreira.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Diogo Pinto Freitas do Amaral.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Isilda da Silva Barata.
João Lopes Porto.
João da Silva Mendes Morgado.
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro.
José Girão Pereira.
José Vicente de Carvalho Cardoso.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos Calheiros Veloso Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Luísa Maria Freire Cabral Vaz Raposo.
Manuel A. de Almeida de A. Vasconcelos.
Manuel Eugénio Pimentel Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Comunista Português (PCP)
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
Armando Teixeira da Silva.
Carlos Alfredo Brito.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Odete dos Santos.
Partido Popular Monárquico (PPM)
Amadeu Domingos R. de Sá Menezes.
Gonçalo Pereira Ribeiro Telles.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mola.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António Manuel de C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Movimento Democrático Português; (MDP/CDE)
Herberto de Castro Goulart da Silva.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social-Democrata (PSD)
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
José de Vargas Bulcão.
Página 1650
1650 I SÉRIE-NÚMERO 45
Manuel da Costa Andrade.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Partido Socialista (PS)
Alfredo José Somera Simões Barroso.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Azevedo Gomes.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António José Vieira de Freitas.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Bento Elísio de Azevedo.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Joaquim José Catando Menezes.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Luís Amaral Nunes.
José Luís Ferreira Araújo.
Mário Alberto Lopes Soares.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Vital Martins Moreira.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
António Luciano Pacheco Sousa Franco.
o REDACTOR PRINCIPAL, Manuel Adolfo de Vasconcelos. - o CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.
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