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I Série-Número 59
Quarta-feira, 6 de Maio de 1981
DIÁRIO da Assembleia da República
II LEGISLATURA 1.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1980-1981)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE MAIO DE 1981
Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Secretários: Exmos. Srs. :
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Alfredo Pinto da Silva
António Mendes de Carvalho
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMARIO. - o Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.
Foi rejeitado um requerimento do Sr. Deputado Lopes Cardoso (UEDS) pedindo que, antes do início da intervelação ao Governo, fosse apreciado e votado um voto de pesar pela morte de Bobby Sands tendo-se pronunciado, a diverso titulo além do deputado requerente, os Srs. Deputados Oliveira Dias (CDS), Carlos Lage (PS). Mário Tomé (UDP) e Pedro Roseta (PSD).
Iniciou-se o debate da interpelação ao Governo, provocado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, sobre política de saúde e as medidas governamentais já tomadas ou anunciadas para o sector.
Após o Sr. Deputado Emílio Peres (PCP) ter aberto o debate, usaram do palavra, a diverso titulo, além do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo) e do Sr. Secretário de Estado da Saúde (Paulo Mendo), os Srs. Deputados José Ernesto (PCP), Carlos Brito (PCP), Vidigal Amaro (PCP), Zita Seabra (PCP), António Arnaut (PS), Jaime Ramos (PSD), António Galhordas (MDP/CDE), Octávio Cunha (UEDS), Amândio de Azevedo (PSD), Mário Tomé (UDP), Veiga de Oliveira (PCP) e António Lacerda (PSD).
Entretanto, foi lido pelo Sr. Deputado Armando Lopes um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados, que foi aprovado.
Finalmente, após ter anunciado a entrada na Mesa do pedido de ratificação n.º 79/II e dos projectos de lei n.ºs 204/II, 205/II, 206/II, 207/II, 208/II e 209/II. o Sr. Presidente encerrou a sessão às 21 horas e 5 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Augusto Faria aos Santos.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Duarte e Duarte Chagas.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando José F. Fleming d'Oliveira.
Francisco Mendes da Costa.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco José de Sousa Tavares.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
Germano Lopes Cantinho.
João Afonso Gonçalves.
João Aurélio Dias Mendes.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Pinto.
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José Adriano Gago Vitorino.
José Augusto de Oliveira Baptista.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
José Theodoro de Jesus da Silva.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ribeiro Arruda.
Manuel João Vaz Freixo.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Maria Helena do Rego C. Salema Roseta.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires D. Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Duarte Arnaut.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernando Marques R. Réis.
António Francisco B. Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Magalhães da Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Torres Marinho.
Fernando Verdasca Vieira.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Sais.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel dos Santos.
Manuel Trindade Reis.
Maria Teresa V. Bastos R. Ambrósio.
Mário Alberto Lopes Soares.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Virgílio Fernando Marques Rodrigues.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano José Alves Moreira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alberto Henriques Coimbra.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de C. Azevedo Soares.
Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
Américo Maria Coelho Gomes de ,Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
António Mendes de Carvalho.
Armando Domingos L. Ribeiro de Oliveira.
Carlos Oliveira e Sousa.
Daniel Fernandes Domingues.
Diogo Pinto Freitas do Amaral.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Eugénio Maria N. Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco G. Cavaleiro Ferreira.
Francisco Manuel L. V. de Oliveira Dias.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Isilda da Silva Barata.
João Cantinho M. Figueiras de Andrade.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Ferreira Pulido Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
José Alberto de Faria Xerez.
José Augusto Gama.
José Duarte de Almeida Ribeiro Castro.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
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José Vicente de J. Carvalho Cardoso.
Luiza Maria Freire C. Vaz Raposo.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Mário Gaioso Henriques.
Narana Sinai Coissoró.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Rui Biscaia Telo Gonçalves.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António José de Almeida Silva Graça.
António José M. Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do Carmo da C. Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Emílio Fernandes Alves Peres.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete Ferreira de Oliveira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Ernesto Ildefonso Leão d'Oliveira.
José Fernando V. Cabral Pinto.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel da C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António Cardoso Moniz.
António José Borges G. de Carvalho.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique Barrilaro Ruas.
José Victor M. Portugal da Silveira.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Fernando Dias de Carvalho.
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António Poppe Lopes Cardoso.
António César Gouveia de Oliveira.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Octávio Ribeiro Cunha.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
António do Carmo Galhordas.
Helena Cidade Moura.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
O Sr. Presidente: - Temos quórum.
Está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Estavam presentes o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo) e o Sr. Secretário de Estado da Saúde (Paulo Mendo).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, cerca das 15 horas entrou na Mesa um requerimento, subscrito pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, do seguinte teor:
Nos termos do artigo 66.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar da UEDS requer, sem prejuízo da ordem do dia, que seja apreciado, antes do início da interpelação ao Governo, um voto de pesar pela morte do deputado Bobby Sands, apresentado por este grupo parlamentar.
O voto, que creio já ter sido distribuído, é do seguinte teor:
Voto de pesar
A morte de Bobby Sands, deputado ao Parlamento Britânico e preso político, evidencia a necessidade urgente de serem criados os mecanismos que façam respeitar integralmente os direitos humanos.
A Assembleia da República exprime o seu pesar pela trágica morte do deputado Bobby Sands e apela ao Governo Britânico para que desenvolva todas as acções no sentido de evitar que situações como a de Bobby Sands venham a repetir-se.
O Grupo Parlamentar da UEDS: Lopes Cardoso - César Oliveira - Octávio Cunha.
O Sr. Presidente:-Cumpre, pois, salientar que a ordem do dia está estabelecida e que, nos termos do artigo 66.º do Regimento -que o próprio requerimento do Sr. Deputado Lopes Cardoso invoca -, só pode ser alterada se .porventura houver deliberação do Plenário nesse sentido, sem votos contra.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.
O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar não pode dar a sua aquiescência à alteração da ordem do dia prevista.
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O Sr. Presidente: - Parece-me que basta esta declaração para prejudicar a possibilidade de alteração da ordem do dia.
O voto será, portanto, apreciado na primeira reunião dos presidentes dos grupos parlamentares que vier a efectuar-se.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Lage (PS): -Sr. Presidente, a hierarquia dos diplomas agendados para a ordem do dia pode ser alterada através da votação feita em Plenário.
Se se tratasse de inclusão de matéria nova, teria de haver unanimidade; mas para haver mudança na colocação hierárquica dos diplomas em discussão basta haver uma simples deliberação por maioria.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os votos são objecto de consideração em período de antes da ordem do dia. ;
Para o dia de hoje foi estabelecido todo o tempo como sendo exclusivamente preenchido pela ordem do dia, que é, como V. Exa. sabe, uma interpelação ao Governo. A instauração de um período de antes da ordem do dia, que necessariamente teria de ser limitado à discussão e votação do voto em causa, implica uma modificação a uma ordem do dia já estabelecida para toda a sessão de hoje.
É nesse sentido que a Mesa, por unanimidade dos seus componentes, entende que qualquer constituição de um período de antes da ordem do dia implica preterição ou interrupção da ordem do dia. É por isso mesmo que a Mesa entende que, por aplicação do artigo 66.º do Regimento, só por uma votação da Câmara que não envolva votos contra é que hoje poderíamos instaurar um período de antes da ordem do dia com a finalidade de se discutir e votar o voto de pesar.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, não vou impugnar a decisão da Mesa, embora me pareça que, se a maioria pode deliberar que não há período de antes da ordem do dia, também poderá deliberar que, para um caso excepcional como este, se faça um curto período de antes da ordem do dia para se proceder à discussão e votação do voto, apresentado pela UEDS.
Por razões morais, humanitárias, pensamos que este voto devia ser votado e lamentamos profundamente que o CDS, invocando sentimentos cristãos que não se demonstram nestas atitudes, o venha impossibilitar. É nestas alturas que se verificam quais são os sentimentos humanitários e os valores que se professam.
O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!
O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.
O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que me parece bem clara a disposição do artigo 66.º do Regimento. Não vejo a que vêm as palavras do Sr. Deputado Carlos Lage e muito menos lhe atribuo qualquer espécie de competência para estar a pronunciar-se acerca de matérias do foro íntimo de qualquer deputado.
O Sr. Presidente: - Tem a .palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): É só para registar que o CDS, em vez de invocar a Bíblia, invoca o Regimento da Assembleia da República.
Vozes do CDS: - É evidente!
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, como subscritor do requerimento, peço a palavra para me prenunciar sobre a decisão acatada pela Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Exa. pode prenunciar-se , mas a Mesa não fez mais do que cumprir o Regimento, o que é independente das opiniões que a Mesa possa ter.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Eu sei, Sr. Presidente. A única coisa que eu queria dizer é que nós, pela nossa parte, nos vergamos às decisões regimentais. De facto, basta que haja um voto contra para que o nosso requerimento não possa ser aprovado.
Mas também quem acrescentar que nós, UEDS, não deixaremos que uma questão dessa natureza, que tem para nós uma transcendência muito grande, porque envolve opções de princípio, se possa enredar em questões meramente processuais. Quando está em causa a vida humana, quando estão em causa outras vidas humanas - porque o voto relativo ao deputado Bobby Sands não é um voto puramente platónico, de mágoa pelo seu desaparecimento, é uma advertência à situação em que se encontram, neste momento, outros presos políticos que os pode levar à morte dentro de breves dias -, não deixaremos que estas questões se enredem em questões formais nem nos escudaremos por detrás de questões formais para claramente assumirmos as nossas responsabilidades perante estes problemas.
Se outros se servem de questões puramente formais para fugirem às suas irresponsabilidades, é um problema que fica com eles.
Aplausos da UEDS e do PS.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - É para perguntar a Mesa se vai pôr à votação o requerimento apresentado ou se considera que a resposta do Sr. Deputado Oli-
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veira Dias, dizendo que não pode, em vez de dizer que não quer, vale pela votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o artigo 66.º do Regimento é expresso em dizer que só podemos modificar a ordem do dia por deliberação da Assembleia, sem votos contra. Como um Sr. Deputado declarou que o seu grupo parlamentar não estava de acordo com essa alteração, parece desnecessário proceder-se à votação do requerimento, por razões óbvias.
Se a Assembleia entender que se deve proceder à sua votação, assim o faremos.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, sem querer tomar partido na questão de fundo, há um ponto que nos parece extremamente claro e que sempre foi seguido por esta Assembleia. É que a ordem do dia só pode ser alterada por consenso.
Assim sendo, não se devera proceder a nenhuma votação.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe imensa desculpa, mas, no desejo que tenho sempre de usar maior cortesia para com todos VV. Exa. e de não privar seja quem for do direito de uso da palavra, a Mesa já decidiu que esta. questão é um caso flagrante de aplicação do artigo 66.º do Regimento.
A declaração peremptória de voto contra de um grupo parlamentar é o suficiente para mostrar que o problema está liquidado. Consequentemente, a Mesa incluirá a apreciação deste voto na primeira reunião dos presidentes idos grupos parlamentares que se vier a efectuar, para que ele seja agendado, com o consenso que a Mesa sempre pretende, pelo que não vamos perder mais tempo com um assunto que está arrumado.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Mas como o CDS teve oportunidade de expressar a sua opinião, queria só dizer que a UDP apoia o requerimento da UEDS.
O Sr. Presidente: - O CDS manifestou a posição que assumia. Não vai agora abrir-se uma discussão sobre esse ponto.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Fica então esclarecido que não se procede à discussão e votação deste voto por oposição do CDS e, parece-me, também do PSD.
Este esclarecimento era importante.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Não é verdade!
O Sr. José Vitorino (PSD):-O Sr. Deputado é um manipulador!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o único partido que até aqui manifestou posição quanto ao fundo da questão foi o CDS.
Volto a declarar que não darei a palavra a mais ninguém para a discussão deste assunto, pelo que passamos de imediato à interpelação ao Governo sobre saúde, pedida pelo PCP.
O Sr. Carlos Brito (PCP):-Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Carlos Brito (PCP) - É só para esclarecer o Sr. Presidente que o Governo não se encontra presente na Sala neste momento. Já aqui esteve mas neste momento não está presente.
O Sr. Presidente: -Vamos então aguardar um momento até que os membros do Governo tomem lugar na respectiva bancada.
Entretanto, tomaram assento na bancada do Governo os Srs. Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão), Ministro de Estado Ajunto do Primeiro-Ministro (Basílio Horta), Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo), Secretário de Estado Adjunto do Ministro de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (Franca e Silva), Secretário de Estado da Saúde (Paulo Mendo) e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros (Duarte Matias).
O Sr. Presidente: - Do partido interpelante, tem em primeiro lugar a palavra o Sr. Deputado Emílio Peres.
O Sr. Emílio Peres (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Antes de iniciar a minha intervenção, desejo, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, expressar o nosso profundo pesar pela morte de Bobby Sands, deputado eleito, ocorrida esta noite pelas razões que a Assembleia da República bem conhece e que a levaram, há alguns dias, a aprovar um voto sobre esta matéria.
Neste momento os deputados do PS, do PCP, da ASD1, da UEDS, do MDP/CDE da UDP e a Sra. Deputada Natália Correia (PSD), guardaram de pé, alguns momentos de silêncio.
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Cabe-me abrir a interpelação do Grupo Parlamentar do PCP sobre política de saúde.
E começo por tratar dos cuidados básicos de saúde. A AD e o seu governo deixaram cair a máscara com que iludiram e querem continuar a enganar muitos portugueses.
Recordam-se, do tempo das campanhas eleitorais, das promessas juradas de bem-estar, qualidade de vida (é de rir), saúde para todos, cuidados médicos melhores e humanizados? Recordam-se?
Pois o Ministro dos Assuntos Sociais pôs a descoberto a face da AD e disse: "Quem quer saúde paga-a." Afirmação verdadeira (esta sim), lapidar, didáctica. Com efeito, ensina-nos o pensamento da AD: a saúde não é direito: é mercadoria que se compra.
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tende e tem que dar lucro. Assim o querem os mercadores de medicamentos, de actos médicos, de .apetrechamento hospitalar, de diárias de hospitalização;
etc.
A população é pobre, não consome espontaneamente destas coisas com a frequência e desperdício convenientes para os grandes negócios? A pseudo gratuidade dos cuidados na doença tem sido o engodo para que os consumam. E já consomem.
Então a AD acha que é altura de lhes tirar 25 escudinhos aqui, o dobro, o triplo ou o quádruplo acolá só para serem observados (melhor, .para verem; o médico); já é um dinheirinho que dá para muita coisa. Mas que importa? Não estão a pagar já bastante mais pelo pão, pelo frango, pelo arroz e por tudo o, que têm de comer?
Vozes do PCP:- Muito bem!
O Orador: - Não vão ainda pagar mais? Então paguem pelo que se lhes fez e faz pensar que é saúde. O resto, mas não pode ser muito, saia..lá do OGE que é magro, desculpam-se os senhores da AD. E é, porque o aproveitamento dos recursos do País e d desenvolvimento económico estão em retrocesso ou estagnados, e os fundo públicos não se arrecadam dos grandes lucros; resultam em parte substancial de impostos directos e indirectos arrancados a bolsa de quem trabalha e mal tem para comer.
Sim, porque cerca de metade dós rendimentos dos trabalhadores, oh grande escândalo nesta Europa amiga, vai para a comidinha do dia-a-dia!
E a parte do OGE destinada à saúde Mo chegará para nada por estar a ser delapidada escandalosamente por várias razões, nomeadamente pelo brutal aumento de custos dos medicamentos e dos exames subsidiários que os serviços não realizam mas que compram ao sector privado sem -qualquer verificação de qualidade.
Vozes do PCP: -Muito bem!
O Orador: - "Quem quer saúde paga-a." Vergonhosa afirmativa de quem está contra a revolução triunfante do 25 de Abril, contra a Constituição que consagra o direito de o povo português ser gente.
As novas taxas moderadoras dos Serviços Médico--Sociais estão de acordo com o pensamento e com as práticas anticonstitucionais e antipopulares dos governos AD. O despacho que as regulamenta diz claramente que o regime anterior está desajustado não só do ponto de vista monetário. como quanto aos pressupostos com que havia sido estabelecido. O que importa é menos trabalho com maior receita. Nem sequer é para melhorar a qualidade dos serviços porque as caixas, com o assalto pela medicina convencional arquitectado pela AD, continuarão a ser para gente de segunda. Por outras palavras, não se deu aos médicos dos postos nem mais tempo para verem doentes, nem melhores meios, nem directivas para realizarem uma consulta digna, durante a qual, através de uma entrevista e de um exame cuidadoso, se aprofunda a razão do mal e se estabelece o tratamento eficaz. Diagnóstico clínico? Façam-se mas é exames subsidiários que engordam a actividade privada: o orçamento paga-os e agora também, de forma directa, os utentes. Terapêutica? O que interessa é consumir e desperdiçar medicamentos de efeitos "universais" e, quanto mais dispendiosos, melhor.
Vozes do PCP:- Muito bem!
O, Orador: - Então, a taxa moderadora para exames e tratamentos modera quem? Os médicos,,esses que deveriam ter possibilidades para ver bem os doentes de modo a moderarem o pedido de exames? Os doentes, por exemplo, para deixarem de abusar do gozo de andarem a fazer radioterapia para tratarem o seu cancro ou de se submeterem a biópsias para diagnóstico?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - No que respeita às taxas de consulta, parece que moderaram o número de inscrições. Quando o Governo vier dizer que a caixa moralizou o consumo de actos médicos, teremos que nos perguntar: Vivemos num paíse de masochistas que deixaram, de repente,, de sentir prazer em perder tempo e em ,torturar-se com incómodas bichas, ou vivemos num país de pessoas para quem 25$ ou 100$ fazem pensar se podem ou não ir ao médico ou chamá-lo a casa?
Vozes do PS: -,Muito bem!
O Orador: - No, que respeita às taxas para exames e tratamentos, passamos para o reino do terror. Como é que um trabalhador com baixa dispõe de 2 contos por: mês para um tratamento crónico? Como é que as famílias de fraquíssimos recursos que habitam os "saudáveis" bairros de -lata ou que se amontoam com os filhos em, quartos alugados (essas famílias que pertencem ; nas palavras doutas do Sr. Ministro, às "chamadas classes desfavorecidas") aguentam os contos de réis em que podem importar uma requisição de algumas análises ou de um exame radiografia)-mais completo? É preciso ir aos sítios onde estes dramas se vivem para se saber.
As multas (fugiu-me a boca para a verdade), as novas penalizações, as actuais taxas moderadoras não enganam ninguém. Servem para cobrir parte das; despesas com os serviços, aumentadas pela medicina convencionada e pela brutal elevação dos custos dos medicamentos. Constituem também o pagamento directo e imediato de uma fracção da factura dos meios de diagnóstico e tratamento, convencionados com a medicina privada. As taxas pagas pelos trabalhadores passam a prover parte do capital do empresário. Boa moral a da AD! .
O dinheiro das taxas, esta é a verdade, não se destina para melhorar o nível da assistência médica, e muito menos a daqueles que as não podem pagar.
Aos postos não chegou qualquer orientação que permita futurar novas instalações, novas condições contratuais, novas valências, novos horários e ou o cumprimento dos estabelecidos, novo estilo. Nada de novo!, Mas, de facto, algo há de novo. Um conjunto de directivas centrais que estimulam e aceleram a degradação dos serviços (a que se opõe a eficácia, boa vontade e sentido profissional de parte dos médicos e de outros profissionais) para que a
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medicina privada convencionada corroa a estrutura caduca e abalada.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado António Arnaut (PS).
A isca é essa burla fenomenal da escolha livre do médico (note-se: só quando não se consegue consulta nos postos nos três dias seguintes e sem garantia de poder voltar ao mesmo médico).
Os relativamente poucos médicos que abriram aos utentes das caixas um número limitado de consultas nos seus consultórios, trabalhando já nos postos muitos deles, todos eles tendo recebido ou continuado a sua preparação nas instituições oficiais, servem para os governos da AD agitarem a bandeira da humanização do contacto médico-doente e para iludirem os incautos fazendo-os crer que podem escolher o seu médico.
A qualidade dos serviços Médico-Sociais é o que é: má; e continua a deteriorar-se em consequência da má política de saúde que temos suportado e que agora está pior do que nunca, a ponto de ser possível que um posto que serve 37 000 utentes não tenha um só aparelho de tensões. Portanto, melhore-se; e quanto à actividade das caixas, reformule-se, redimensione-se e integre-se de forma progressiva, ordenada e eficaz num autêntico serviço de cuidados primários de saúde, aliás já bem estudado e já suficientemente legislado. O Governo tem é que cumprir a Constituição e as leis! A população, os trabalhadores de saúde e a legalidade exigem-no.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
A medicina das caixas é apenas curativa, concebida para tratar doentes ou para os despejar no hospital mais próximo. Mas a saúde é coisa bem diversa; não se confunde nem mesmo com tratar adequadamente e em tempo útil a doença. Saúde é bem-estar, é um estado de equilíbrio do ser humano. A saúde é bem que se promove ao mesmo tempo que se previne a doença ou, vá lá, quando cedo se detecta e trata adequadamente. Exige não apenas o conhecimento de doentes mas sobretudo e fundamentalmente o conhecimento das populações e do meio onde vivem. Possibilita também a indispensável relação humana entre médico e pessoa, doente ou ou não, porque facilita e promove o mútuo conhecimento que resulta de viver uma vida na comunidade onde se trabalha. Possibilita ainda esse mesmo bom conhecimento entre a população e os seus trabalhos de saúde. Queremos uma medicina para o José e para a Rosa e de modo nenhum para a pneumonia ou para a fractura.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado António Arnaut (PS).
A saúde é algo bem diferente daquilo que interessa aos senhores que suportam a AD e dela se sustentam. Para eles o que convém é o consumo médico lucrativo. De acordo com o pensamento do Ministro nem os hospitais escaparão de vender serviços. Tudo o mais, que é fundamental aliás, significa para esses senhores insuportável e oneroso gasto social. Para eles o homem não é o objectivo; serve apenas para obterem lucros.
Mesmo que morram milhares de crianças por ano, que o alcoolismo e a droga destruam centenas de milhares de portugueses, que a fome volte, que as doenças infecciosas mantenham entre nós o seu império, não importa aos senhores da AD a oferta de mão-de-obra que continua a ultrapassar as suas necessidades.
Apesar de todos os ataques, saúde, promoção da saúde, cuidados primários de saúde fazem carreira; o seu conteúdo ideológico e técnico corresponde a anseios da população e a necessidades que ela compreende e sente. No entanto, as nossas estatísticas de saúde são vergonhosas. Como consegue a AD descobrir meia face, a do humanitarismo regado pelo regador dos valores da democracia ocidental, e olhar-nos, a nós portugueses, de frente? Como é que a AD consegue destapar a outra meia cara e olhar sem vergonha (e, também, sem temor) aquela Europa onde deseja integrar-nos, por desgraça nossa, para ver garantida a sua ideologia monopolista e imperialista? A AD e o seu governo só o consegue baralhando conceitos e mentindo, e fá-lo.
Habitação, planeamento urbanístico, condições físicas e emocionais de trabalho, fruição de tempos livres, preservação do meio ambiente, adequação e qualidade de alimentos, cultura, educação para a saúde, conhecimento sanitário da população e seu acompanhamento médico, diagnóstico tempestivo, recuperação? Nada que lembre de perto ou longe criação e desenvolvimento de saúde.
Então, o quê? O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais disse-o: "A assistência dos Serviços Médico-Sociais já não corresponde às necessidades e aos interesses quer dos utentes, quer dos profissionais que aí trabalham pelo que serão extintos." Na sequência, as consultas de clínica geral e de especialidades básicas passarão gradualmente a ser exercidas nos centros de saúde e suas extensões e as restantes especialidades para o âmbito da (responsabilidade dos hospitais e (oiçam bem) da área convencionada. Nos centros de saúde trabalharão e dar-lhe-ão a funcionalidade exigida os médicos generalistas e os clínicos gerais, diz o Sr. Ministro. Por acaso, não sabemos bem o que sejam uns e outros, pois não se conhece qualquer estatuto profissional nem qualquer carreira.
O Governo magicamente vai meter os gigantescos Serviços Médico-Sociais com os seus 1700 postos e locais de consultas nos minúsculos duzentos e tal centros de saúde. A montanha vai regressar ao rato.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas, atenção, ainda nem todos os concelhos têm centros de saúde. Muitos apenas vegetam porque nem dispõem das valências com que deveriam estar guarnecidos nem conseguiram digulgar às populações a importância dos cuidados essenciais. Em quantos funcionam consultas de planeamento familiar, se atenta na medicina do trabalho, se desenvolvem programas de educação sanitária, nomeadamente no campo da higiene alimentar, se realizam visitas domiciliárias em horas adequadas, se coordena a engenharia sanitária e se colabora, com as autarquias, por exemplo?
Uma rede de cuidados primários de saúde habilitada com meios humanos e materiais para promoção de
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saúde e prevenção da doença, essa sim, seda capaz de acções profilácticas e pedagógicas, que moderariam a procura das valências curativas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Ministro, uma rede lógica e eficaz de cuidados primários não é só paira países do Terceiro Mundo. Também é para países capitalistas, mesmo para aqueles que são os modelos da AD. É escusado percorrer a literatura especializada; Basta ler um jornal médico americano de prestígio de âmbito geral, o New England Journal of Medicine, para que o Sr. Ministro se aperceba da crescente importância dada nesse país capitalista aos cuidados básicos e à atenta preparação de clínicos gerais capazes de se integrarem na comunidade e de compreender os seus problemas. A isso obriga, também lá, a necessidade de conter os altos custos da medicina curativa.
A eficácia da rede de cuidados primários de saúde e de toda uma política concertada para o bem-estar individual e colectivo é que deverá ser a taxa moderadora das valências curativas. A multa nas caixas afugenta, angustia, prejudica. Não educa nem promove saúde. Muito menos toma aptos os serviços para melhor atendimento parque libertos de uma demanda indiscriminada e abusiva, como o discurso ministerial dolosa mente nos quer fazer acreditar.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra a outro Sr. Deputado do partido interpelante, não pode a Mesa, com o apoio do sentido de imparcialidade e de cumprimento estrito dos seus deveres, mas de exigência de respeito pelas suas funções, deixar de salientar o seguinte: decidiu a Mesa que não havia oportunidade para que um voto apresentado pela UEDS fosse discutido e votado nesta sessão.
No entanto, pela forma como o Sr. Deputado Emílio Peres iniciou a sua intervenção e pela atitude que alguns Srs. Deputados tomaram a seguir, a Mesa, sem prejuízo do problema de saber qual o valor moral que esse voto poderia ou deveria merecer desta Assembleia, não pode deixar de salientar que, de uma forma que se reconhece hábil, se desrespeitou uma decisão que a Mesa tinha tomado.
Não pode, pois, a Mesa deixar de salientar esse facto porque lhe parece que, nesta Casa, onde as instituições democráticas devem acima de tudo ser preservadas, desacatar dessa forma uma decisão sua não representa, de modo nenhum, o melhor caminho.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Ernesto de Oliveira.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há cerca de ano e meio que ouvimos a AD eleitoral e governamental prometer a resolução dos problemas da saúde, em geral, e os da área hospitalar, em particular. É essa que aqui nos vai ocupar.
Não vamos nem queremos filosofar em torno de questões já há muito discutidas e que seriam o campo onde o Governo gostaria de se colocar. São questões concretas, problemas reais o que aqui trazemos, e desde já tornamos claro que não toleraremos ao Governo e seus apoiantes a utilização desta tribuna como se de um dos seus estúdios radiofónicos ou de TV ou da redacção de qualquer dos seus jornais se tratasse. Não vamos, pois, discutir promessas e intenções, mas, sim, a prática governativa da AD e denunciar frontalmente as suas consequências para a saúde do povo português.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Vamos aos factos. Tem a AD e seus governos desde os programas eleitorais e governativos, passando pelas intervenções nos órgãos da comunicação social, proclamado o seu empenho na autonomia visando a completa descentralização e responsabilização, da gestão hospitalar. Mas a prática tem sido outra. Restringe os orçamentos dos hospitais de forma tal que coloca muitos em risco de continuidade, provocando a sua asfixia financeira. Impede a transição de saldos do ano anterior para o seguinte, obrigando os gestores hospitalares a malabarismos financeiros para não serem espoliados de verbas que lhes são necessárias. Retém a .publicação e redimensionamento de quadros de pessoal, provocando a paralisia dos serviços, nomeadamente nos serviços administrativos e de apoio geral. Entrega a reestruturação, de acordo com a sua política de privatização do sector público, ao que chama o know-how americano. E como paradigma da sua vocação centralizadora, logo passadista, aí está essa ilegalidade -porque lhe são atribuídas funções sem que previamente tenha sido criado - a que se chamou Gabinete de Instalações e Equipamentos da Saúde (GIES). Nas palavras do Ministro em Janeiro, aqui na Assembleia da República, "a gestão deve ser centralizada para o planeamento e a supervisão e descentralizada nos aspectos executivo e operacional". Como a realidade é diferente! É de tal forma diferente que obriga a que este GIES tenha de dar parecer e decisão sobre a alteração de três portas no Hospital Distrital de Viana do Castelo, o que demorou, pelo menos, três meses. Hoje, praticamente, não se pode trocar uma lâmpada em qualquer hospital deste país sem que o Sr. Engenheiro Caetano, director do GIES, tenha que de Lisboa dar a sua autorização!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador - Existe uma lei desde 1977 que regulamenta os órgãos de gestão dos hospitais. Acontece porém, é que, estando já a maioria dos conselhos gerais constituídos, praticamente nenhum funciona, porque o Governo não indica o representante da Secretaria de Estado que a eles preside, o que leva a que -os conselhos de gerência funcionem na prática extrapolando as suas competências, em áreas de orientação global reservadas aos conselhos gerais, não constituídos.
Analisemos agora outra área: as urgências.
Da situação caótia e ruptura que a este nível se vive, dão-nos conta muitas intervenções ministeriais, preâmbulos de diplomas legislativos ou normativos, visitas de governantes e deputados e muitas posições expressas por médicos, enfermeiros e outros técnicos e, acima de tudo, o drama de todos os que a eles são forcados a recorrer.
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O ano passado, a AD criou com grande pompa os chamados SAP, mezinha milagrosa, receita de alquinista, que iria, de uma penada, acabar com a degradante situação dos bancos dos hospitais centrais. Visitámos os bancos, estivemos nos SAP, ouvimos, e a Comissão Parlamentar também ouviu, da boca dos responsáveis destes serviços o desmentido claro à demagogia do Governo. São uma fraude. Estimulam o consumo à urgência, aumentaram a procura dos bancos e, hoje, após a retirada dos especialistas hospitalares, em especial dos pediatras (por sinal logo a seguir às eleições), estão praticamente às moscas. As eleições já passaram e tudo se agravou.
Aplausos do PCP.
Mas, depois de vários planos de emergência para os Hospitais Civis de Lisboa, de que até hoje não foram divulgados resultados, eis que, em hora de aperto, o Ministro (qual lâmpada de Aladino!) tira da cartola mais uma solução brilhante do problema dos degradados hospitais centrais. Será o pôr a funcionar os 24 hospitais distritais, dos melhores da Europa ria boca do Sr. Ministro, e que estão mais do que subaproveitados? Será a criação da rede de cuidados primários que a AD destruiu há ano e meio e que já podia estar em funcionamento? Será o desbloquear da reestruturação do Hospital de Santa Maria e outros hospitais? Não, não é nada disso! É a construção futura de dois novos hospitais em Lisboa! É o Sr. Ministro capaz de nos facultar os estudos que o levaram a esta conclusão? Onde se fundamenta para garantir que são dois e não três ou quatro os hospitais necessários? Se são hospitais de grandes ou médias dimensões? Em que plano hospitalar se integram? E porquê no Restelo? A Amadora, grande centro populacional mesmo aqui à nossa porta, não tem sequer um centro de saúde. Na Maternidade de Alfredo da Costa, todos os dias nascem cidadãos portugueses originários, por exemplo, do concelho de Loures, filhos de mães que os dão à luz sentadas em cadeiras ou deitadas em corredores, porque no seu concelho como em tantos outros de grande população, não há qualquer maternidade. O Governo não nos pode facultar os estudos prévios que levaram a esta conclusão por uma razão simples. É que os não tem. E pretende com esta nova tirada apenas lançar uma cortina de fumo atrás da qual se disfarce a incapacidade para encontrar a solução pata problemas urgentes, ao mesmo tempo que se adia para o longínquo futuro a resposta às questões graves que hoje aqui são postas.
Passemos agora ao domínio dos recursos humanos. No sector médico, quando a AD chegou ao Governo, 78 º/o do total dos médicos e 82 % dos especialistas existentes no País concentravam-se nos distritos de Lisboa, Porto e Coimbra. A AD garantiu que resolveria este problema. O Ministro Leitão garantiu aqui na Assembleia 500 especialistas nos hospitais distritais até Setembro de 1980.
O Ministro Macedo declarou-se disposto a correr riscos de incompreensão por parte de sectores profissionais para atingir o mesmo objectivo. Inscreveu-se nos programas governamentais, nas intervenções ministeriais, nas entrevistas. Eis que vem de novo o Sr. Ministro à televisão, agora, dizer que não fará requisições administrativas e que, por isso, os especialistas não irão.
Os 1400 médicos do Hospital de Santa Maria continuarão com as suas 1200 camas, enquanto os 30 médicos do Hospital de Évora continuarão com as suas 450 camas!
Mas era preciso fazer as requisições administrativas, Sr. Ministro?
Não. E o Governo sabe-o bem. O Governo sabe que abriu concurso para os hospitais distritais em 30 de Maio de 1980. Sabe que os médicos concorreram. Sabe que as vagas foram preenchidas. E sabe até que havia -candidatos em excesso. Não atire as culpas para os ombros dos médicos! Diga antes que foi por sua incapacidade, porque tem dos profissionais médicos uma visão elitista e retrógrada, que lhes concedeu a possibilidade e os estimulou a que, depois de colocados, com posse tomada nos hospitais distritais, ficassem calmamente nos centrais, incentivados a isso pelo actual executivo.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Imaginem o Governo, os Srs. Deputados e a opinião pública em geral, se aos professores, aos magistrados e outros técnicos superiores, depois de colocados em qualquer ponto deste pais por concursos nacionais, a administração central os incentivasse a ficarem calmamente em Lisboa, Porto ou Coimbra, centros onde, a exemplo dos médicos especialistas, também se formaram! Esses técnicos iriam? Claro que não.
Não venha, pois, o Governo atirar as responsabilidades para os hospitais distritais, para as por si espoliadas autarquias locais, para os médicos. A responsabilidade da situação que actualmente se vive a nível dos hospitais distritais é exclusivamente sua, porque foi o Governo que a criou e a não resolveu. É que, quanto mais se degradarem as condições de funcionamento e os serviços prestados pelas instituições públicas hospitalares e de ambulatório, maior será a procura das actividades privadas.
Esta é a lógica política, maquiavélica e inconfessável do Governo, mas a que transparece a um olhar atento sobre a sua prática governativa.
A degradação progressiva dos hospitais centrais e regionais, o incentivo à exploração privada do direito à saúde do nosso povo, são ilustrados exemplarmente com o que a seguir se adianta.
Existem em Portugal mais de 1000 insuficientes renais crónicos. São doentes que para sobreviverem necessitam do recurso a uma de duas técnicas terapêuticas: ou à hemodiálise (rim artificial) ou à transplantação renal.
Para a hemodiálise é necessária uma prévia preparação cirúrgica, consistindo na abertura de uma comunicação entre uma artéria e uma veia, a partir da qual se fará a futura ligação periódica à máquina. É uma técnica cirúrgica perfeitamente ao alcance dos nossos hospitais centrais e de alguns distritais e dos técnicos médicos e cirurgiões que aí trabalham. Porque os serviços hospitalares trabalham dispondo de blocos operatórios com o máximo de utilização de quatro horas diárias, porque os mesmos médicos que trabalham nos hospitais trabalham também em clínicas privadas, o que fez o Governo? Uma convenção com as clínicas privadas altamente rentável
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para estas e de forma a que são praticamente só elas que realizam este tipo de cirurgia preparatória: Tudo o que foi oneroso e demorado estudo clínico e laboratorial do doente esteve a cargo dos dinheiros públicos. O que é rápido e altamente lucrativo passou para a iniciativa privada. Entretanto, vai-se difundindo a ideia nos doentes e na opinião pública em geral de que só a medicina privada é capaz, tecnicamente, de resolver os problemas de saúde do povo português.
Repare-se, no entanto, que são os mesmos médicos que trabalham nos hospitais os que vão trabalhar nas clínicas privadas.
Deve ser a isto, com certeza, que o Sr: Ministro, hipocritamente, chama a «saudável e estimulante concorrência entre a medicina pública e privada»!!
Aplausos do PC P.
Se atentarmos no que se passa com a transplantação renal, o panorama não é menos significativo.
Por um escandaloso despacho de l de Abril de 1980, o governo da AD decreta a obrigatoriedade de os hospitais estatais facultarem o acesso de equipas cirúrgicas privadas, nomeadamente a da Clínica dá Cruz. Vermelha, à colheita de órgãos em cadáveres entrados ou ocorridos naquelas instituições oficiais, com vista à futura utilização desses órgãos em transplantações.
Em seguida, o mesmo governo paralisa o projecto, já adiantado e, em parte, financiado pela Gulbenkian, para a criação de um novo serviço de nefrologia, virado também para a transplantação renal, do Hospital de Santa Maria. E, entretanto, do resultado do trabalho da Comissão Nacional de Hemodiálise, que existe há anos, nada se conhece.
Se integrarmos estes factos com a passagem para o Hospital de Santa Cruz da maior parte do pessoal técnico especializado em cirurgia cárdio -torácica do Hospital de Santa Maria e com os planos futuros, ainda mais ou menos secretos, da sua reprivatização e com o proliferar dos grandes centros de unidades privadas de hemodiálise ligadas a grupos financeiros nacionais e estrangeiros, tem-se a imagem precisa dós objectivos nefastos que este governo prossegue.
Tudo isto são factos que não podem ser desmentidos.
A desarticulação da gestão e autonomia financeira dos hospitais, agora mascarada com a promessa de abertura destes à obtenção de receitas próprias, à custa, como sempre, dos doentes.
A desastrosa política de formação e distribuição dos recursos humanos disponíveis, atirando para cima dos trabalhadores hospitalares o que é da exclusiva responsabilidade do Governo.
O entregar à iniciativa privada durante largo período a utilização exclusiva de modernas técnicas auxiliares de diagnóstico, como a tomografia axial computadorizada, entretanto paga à custa dos dinheiros públicos.
A passagem para as autarquias de responsabilidades que cinicamente lhes vedou. A degradação progressiva dos hospitais centrais, através do, estrangulamento burocrático das iniciativas que estes tinham iniciado visando a sua recuperação funcional e humanização.
A passagem para a iniciativa privada de técnicas de ponta, ao alcance dos serviços públicos, como forma de prestigiar aquela aos olhos dos utentes e. logo, de desmerecer as instituições oficiais.
A recente e despudorada chamada do know-how americano para a cooretização de todo o plano de semi ou total privatização de hospitais.
A mistificação aos olhos do povo português de que o Estado gasta de mais com a saúde e os hospitais e de que só o recurso e incentivo às formas privadas de exploração do sector podem melhorar os cuidados de saúde dos Portugueses.
São estas as linhas de actuação política na área hospitalar desta AD e deste governo.
É a desvergonhada degradação consciente e premeditada dos serviços públicos e o enaltecer mais ou menos velado, mas sempre subjacente, das virtudes da hospitalização privada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Portugueses têm de saber que, contrariamente ao que o Sr. Ministro diz, com os meios técnicos, financeiros e humanos disponíveis, é possível termos melhores hospitais e melhores cuidados de saúde.
Os Portugueses têm de saber, contrariamente ao que o Governo diz, que não é preciso ser-se rico para se ser tratado como humano quando se tem de recorrer a um hospital.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
Os Portugueses têm de saber que, contrariamente ao que o Governo diz, não há fatalismos na história e que já pagam o suficiente ao Estado para que este não os deixe morrer no corredor de um banco de hospital central ou num distrital sem especialistas, apesar de o Sr. Ministro dizer que é dos melhores da Europa.
Os Portugueses têm de saber que podem ter os seus filhos em condições de respeito pela sua dignidade humana sem que para isso tenham de recorrer às clínicas privadas.
Os Portugueses têm de saber que, contrariamente ao que o Governo diz, pode haver flores num hospital, a mão solidária de um amigo, uma cama com roupa lavada; ter um nome, e não ser a cama 29, uma janela com vidros, um sanitário limpo, um médico, um enfermeiro.
Os Portugueses têm de lembrar aos senhores do Governo que são gente! E que a verdade do que sentem na carne não pode ser obnubilada com sorrisos televisivos.
Os Portugueses têm de saber, e sabê-lo-ão, que tudo isto só é possível com uma nova política e um novo governo.
Sabê-lo-iam ainda mais depressa se o Governo permitisse que amanhã esta verdade se passeasse nas ruas, nas páginas dos jornais, nos programas da rádio ou nos noticiários da televisão que manipula!
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado António Arnaut (PS).
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A desas-
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trosa política do governo «AD»/Balsemão no campo da saúde não afecta apenas os utentes dos serviços de saúde.
Ela atinge também de maneira gravosa os próprios trabalhadores da saúde.
De facto, a esmagadora maioria desses trabalhadores sofre directamente as consequências de uma política que ignora os seus direitos profissionais, os obriga a exercer a sua actividade em condições muitas vezes sem um mínimo de dignidade e lhes imputa responsabilidades por carências, erros e defeitos de organização a que são alheios.
Vozes do PCP: -Muito bem!
O Orador: - Ao negar o direito à negociação colectiva, ao adiar a publicação das suas carreiras, ao fugir ao diálogo com os sindicatos representativos, ao adiantar promessas que não cumpre, ao iludir perspectivas de formação e promoção, ao protelar a saída de quadros de pessoal ou a sua aplicação, o governo «AD» pratica, de facto, uma política de injustiça social para com os trabalhadores da saúde. Sobre eles recai ainda a vivência diária com as deploráveis condições de funcionamento dos serviços, os múltiplos e quase sempre justificados protestos e reclamações dos utentes e ainda as acusações públicas dos ministros deste governo, esses, sim, os principais culpados da baixa rentabilidade dos serviços.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas faiemos, nestes poucos minutos, de alguns factos que afligem os profissionais de saúde e para os quais esperamos respostas muito concretas do Sr. Ministro, e não promessas falsas, como tem sido até aqui, normalmente, a sua conduta.
O compromisso assinado com os trabalhadores administrativos de até 31 de Dezembro de 1980 estarem colocados nos respectivos quadros não se verificou. Estamos em Maio, e nem uma única lista nominativa se encontra publicada. A promessa de novos quadros para Junho, que permitiria a ascenção na carreira e a possibilidade de admissão de pessoal para os locais onde, dramaticamente, a sua falta se faz sentir, está irremediavelmente comprometida.
Que dizer da chantagem -repito, chantagem - exercida pelo Sr. Ministro da Reforma Administrativa sobre os profissionais técnicos superiores de saúde? Depois de uma luta de anos para verem o seu diploma de carreiras publicado, o Sr. Ministro diz que só assina se os retroactivos datarem de Abril de 1980, e não de Julho de 1979, como é estipulado por lei.
Assim, o Sr. Ministro, sabendo muito bem o que faz, sem qualquer fundamento legal, rouba a estes técnicos nove meses de retroactivos, com a coacção de, se não aceitarem esta imposição, não publicar o decreto!
Como largamente foi difundido e propagandeado pelos órgãos de comunicação social, foram este ano reabertos os cursos para técnicos auxiliares de laboratório. Não é dito, porém, que passados quatro meses após o seu início, por um lado, a ausência de curriculum, a falta de docentes, de instalações e de
material didáctico em muitas disciplinas e, por outro lado, motivos de ordem económica levaram a um grande número de desistências dos alunos inscritos.
É esta uma das formas de perpetuar a falta destes técnicos no sector público, arranjando-se, assim, pretexto para recorrer ao sector privado, que prolifera e engorda e a cujos trabalhadores não é exigida nenhuma formação técnica, para exercerem as mesmas funções.
Será esta uma das formas de defender a «qualidade» para o sector privado que o Sr. Ministro preconiza?
Em relação ainda a estes técnicos, reafirmamos que não está a ser cumprida pelos caciques locais do governo «AD», nomeadamente em muitos hospitais concelhios, a legislação que se lhes aplica, sob pretexto de que os quadros do pessoal não estão aprovados!
Vozes do PCP: -Muito bem!
O Orador: - O mesmo se passa com o pessoal do apoio geral dos hospitais, que, após larga luta, viu as suas carreiras publicadas. Após ter sido ultrapassado o prazo nele estipulado, a não aplicação deste diploma de carreiras na grande maioria das unidades de saúde é uma flagrante demonstração da desinformação aos trabalhadores e da ingerência da «cacicagem local» na gestão nesses locais de trabalho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A «brincar», ou a «jogar ao gato c ao rato», tem a «AD» andado a fazer com os cerca de 20 000 enfermeiros. Se não, vejamos. Em 21 de Abril de 1980 prometeu o então Secretário de Estado Costa e Sousa a publicação das carreiras no prazo de um mês. Vai mais um ano! Vamos no 4.º projecto, documento esse que não satisfaz os totais interesses da classe, mas que foi assinado pêlos seus legítimos representantes para não «obstruírem» a publicação urgente de uma carreira de enfermagem. Tinha sido prometida a sua publicação para os fins de Março, princípios de Abril. Vem agora à TV o Sr. Ministro dizer que sai em Junho!
Após tantas falsas promessas, que credibilidade tem tal afirmação?
Também o diploma que regula o pagamento das horas extraordinárias e trabalho nocturno aos domingos e feriados ou não é cumprido ou, se o é, com a interpretação errada, mas sempre lesiva para os trabalhadores, nomeadamente nos hospitais concelhios e distritais.
A falta de profissionais de enfermagem é por todos reconhecida (nos cuidados diferenciados apenas estão satisfeitas 51 % das necessidades, nos hospitais distritais, 36 %, e nos serviços de assistência psiquiátrica, apenas 21 %). A este respeito, e como solução, o Sr. Ministro tenciona aumentar o número de docentes, mas não nos fala no melhor aproveitamento das escolas existentes ou na criação de novas unidades.
Não nos diz o que vai fazer das escolas onde funcionam os cursos de promoção, onde este mês começam os três últimos cursos. Os sindicatos pro-
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puseram que continuassem a funcionar como escolas de actualização e para cursos pós- básicos, proposta que até esta data não mereceu qualquer comentário do Sr. Ministro.
No que diz respeito aos médicos, duas grandes questões se colocam - carreiras médicas e reajustamento de letra.
Em relação às carreiras, processo por que vêm lutando há longos anos, que aguardam ansiosamente e que parecia começar à resolver-se com a legislação elaborada durante o V Governo Constitucional, a «AD» e seu governo mais não fazem que revogar os diplomas legais existentes e publicar, sob a forma de portaria, esse aborto legislativo que é a carreira do clínico geral/generalista.
Vem também agora o Sr. Ministro anunciar para Julho a publicação das novas carreiras médicas. Já não se estranha que o Sr. Ministro não ouça os técnicos a que essas carreiras dizem respeito. É o modo de funcionar do seu gabinete!
Mas duas questões pontuais queríamos colocar. Recentemente, nas primeiras jornadas de saúde pública, o director-geral de Saúde apresentou, verbalmente, um projecto de carreira de saúde pública que mereceu o mais vivo repúdio de todos os técnicos ali presentes. É esse o projecto da Secretaria de Estado da Saúde ou o projecto pessoal do Dr. Prado Quintino?
No que diz respeito às carreiras hospitalares, como não foi ouvida a opinião das associações de profissionais, será essa carreira a proposta pelo conselho nacional executivo da Ordem dos Médicos e que foi veemente repudiada pela esmagadora maioria dos médicos do quadro permanente dos hospitais centrais?
Não podemos aqui deixar de lembrar ao Sr. Ministro como se procesou este ano a colocação dos médicos policlínicos com estágio em saúde pública e dos médicos policlínicos do serviço médico na periferia.
Pela primeira vez, a sua colocação foi realizada por computador, deixando os próprios médicos e as suas comissões de curso de ter qualquer responsabilidade por essa colocação. O que se passou e o que se está ainda a passar é que o espírito de «equipa» deixou de existir, e que, para além disso, muitas e muitas localidades da periferia não foram contempladas com a colocação de médicos o que origina não só graves prejuízos para a saúde das populações, mas também gastos financeiros muitas vezes incomportáveis. Por outro lado, na periferia dos grandes centros existem como supranumerários muitos médicos policlínicos. (Pelos resultados obtidos, tudo leva a crer que tal computador terá sido programado com o programa da «AD»!)
Quero também realçar o facto, aliás aqui já abordado, do escândalo dos concursos e da colocação dos médicos especialistas nos hospitais distritais e que vem provar a falta de vontade política, de incompetência e demagogia deste governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sobre os médicos da carreira de saúde púbica, o seu futuro encontra-se assombrado. A técnicos formados na Escola Nacional de Saúde Pública e cujas funções são as de administradores dos serviços de saúde locais e responsáveis pela programação, execução e avaliação dos cuidados primários
de saúde - estruturadas na Conferência Internacional da OMS em Alma -Ata... se tivesse sido em Nova York!... - destina este governo os lugares de «polícia sanitário», em sentido lato, ou de médico de retretes e de croquetes, em sentido restrito, tudo à boa maneira de 1900.
Uma última questão.
Parece-nos difícil compatibilizar a intenção publicamente anunciada pelo Sr. Ministro de dignificar os lugares de chefia e direcção dos hospitais quando nos gabinetes se prepara um protocolo de acordo entre o Ministério da Educação e Ciência e o seu Ministério que impossibilita os melhores profissionais de ascenderem às direcções e chefias dos serviços.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os trabalhadores de saúde são elementos essenciais à execução de uma política correcta de saúde.
Ouvir e conhecer os seus problemas e anseios, dar-lhes justa resposta e condições de dignificação, estimular a sua participação na resolução dos problemas dos serviços e da saúde, são condições indispensáveis à implantação de um serviço nacional de saúde.
A política do governo «AD» relativa aos trabalhadores de saúde é a demonstração inequívoca de que este governo, contrariamente às suas promessas, não quer ou não é capaz de construí-lo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Que fique, pois, bem claro que para nós, PCP, a resolução dos graves problemas de saúde do nosso povo passa também pelo encontrar de justas soluções para os anseios dos trabalhadores de saúde.
Contrariamente ao que a «AD» e seu governo pretendem fazer crer, não são incompatíveis melhores qualidades de saúde para o nosso povo e um exercício mais digno das funções de todos os profissionais do sector.
Estamos certos de que estes não deixarão de integrar as suas lutas por um futuro melhor na luta mais geral do povo português por uma sociedade mais justa e fraterna, por isso mais democrática.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, que ainda dispõe de 22 minutos.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP considerou indispensável apresentar à Assembleia da República, através das três intervenções que acabam de ser produzidas, uma análise detalhada, concreta e documentada da situação da saúde em Portugal, tanto nas áreas de cuidados primários e cuidados diferenciados (hospitalares) como no que diz respeito aos problemas que afectam os trabalhadores da saúde.
As informações e apreciações que aqui trouxemos e traremos evidenciam as pesadas responsabilidades da AD e do seu governo pelas consequências da política que tem aplicado contra os interesses e a saúde dos Portugueses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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A Oradora: - O Grupo Parlamentar do PCP chamou o Governo à Assembleia da República para responder por essa política. E fizemo-lo pelas razões fundamentais seguidamente explicitadas e sintetizadas:
1.ª A AD está a fazer uma política de saúde ao serviço dos grandes comerciantes, intermediários da saúde e das multinacionais, e não ao serviço do povo e do País;
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora:
2.ª A AD reforça e agrava a diferenciação dos Portugueses entre pobres e ricos, reservando o direito à saúde só para quem possa pagá-lo (e pagá-lo cada vez mais caro);
3.ª As condições de saúde dos Portugueses pioram e os serviços .públicos degradam-se;
4.ª Não diminuem, antes se agravam, as diferenças entre o litoral e o interior, entre as grandes cidades e o resto do País;
5.ª A AD temi medo de discutir em público a sua política de saúde.
Esta política viola abertamente a Constituição e as leis em vigor e representa um dos traços fundamentais e gravosos da política geral, reaccionária e anti-popular do Governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Chamámos aqui o Governo para lhe exigirmos respostas tão claras como as perguntas muito concretas que lhe faremos.
Não venha o Governo apresentar novamente as desculpas do costume: que a culpa é da seca, que os erros vêm todos de trás e que a «AD» ainda não teve tempo para fazer nada. É que a «AD» é governo há ano e meio e o PSD é dos partidos da «AD» e de todos os partidos aquele que mais vezes e por mais tempo esteve no Ministério da Saúde. Basta constatar que o actual Ministro é a terceira vez que está no Ministério e o Secretário de Estado da Saúde a segunda!
A situação é, porém, ainda mais comprometedora para a «AD». É que sempre que neste Ministério esteve alguém da área que é hoje oposição, alguém que começasse a tentar resolver os problemas de saúde, os partidos da direita obstruíram e boicotaram essa política.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Quem não se lembra de que a aprovação da Lei do Serviço Nacional de Saúde foi um motivo decisivo para a .punhalada que o CDS deu no II Governo?
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora:-Quem não se recorda também da greve encabeçada pela Ordem dos Médicos durante o V Governo? Quem não recorda que a «AD», logo que chegou ao Ministério, revogou tudo, estragou tudo o que de positivo estava a ser realizado em
benefício da saúde dos Portugueses pelo governo da engenheira Lurdes Pintasilgo?
Aplausos do PCP, do PS. da UEDS e do MDP/CDE.
Mas vamos directamente à política da «AD», pois são as medidas e os factos dessa política que pretendemos discutir nesta interpelação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Constituição da República consagra no artigo 64.° que o Serviço Nacional de Saúde é geral, universal e gratuito. Apesar do sentido claro e unívoco da norma constitucional, a «AD» no Governo, mal passadas as eleições, cria as taxas chamadas «moderadoras» nos Serviços Médico-Sociais.
Usa o Governo dois argumentos essenciais para defender tal decisão, cuja inconstitucionalidade salta à vista.
Primeiro, diz que quer moderar o consumo excessivo de prestações de cuidados médicos. Mas quem é moderado através destas taxas? Quem eventualmente abusa de médicos, medicamentos ou de radiografias, ou quem não tem dinheiro para pagar as taxas e, por isso, deixa de ir ao médico ou de levar lá os filhos? Os que são moderados são aqueles mesmos que mais necessidade têm de cuidados de saúde, pois têm piores condições de vida. E as chamadas «taxas moderadoras» mão são assim tão pequenas como diz o Governo, pois há radiografias que, com as taxas, chegam a custar 1500$ ou 1600$.
O segundo argumento é ainda mais ridículo. Dizem sor injusto um serviço de saúde gratuito, porque ricos e pobres beneficiam deste facto! Aqui mesmo, nesta tribuna, já houve quem se atrevesse a dizer isto e até levou palmas! E, como é injusto que os ricos se sirvam de um serviço grátis, inventa-se uma taxa para que deixe ide, lá ir quem não a pode pagar - os pobres! Esta, «AD» do grande capital, do imperialismo, dos latifundiários, das indemnizações ao capital, quer agora fazer a redistribuição do rendimento nacional através das taxas moderadoras da saúde, ou, mais genericamente, por via dos serviços de saúde!!!
Ainda havemos de ver a 'transplantação desta brilhante teoria para a educação, e, como há filhos de ricos, que frequentam gratuitamente a escola pública, aí temos a «AD» a criar taxas moderadoras no ensino primário e básico!
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora:-Não! O Governo sabe tão bem come nós que a questão não é essa. Trata-se, sim, de levar à prática uma política de saúde ao serviço dos grandes latifundiários da medicina. O Governo assinou convenções com a direcção da Ordem dos Médicos que saem de tal forma caras e que representem financiamentos tão descomunais aos grandes laboratórios de análises, de radiologia, às multinacionais e a outros interesses privados que o orçamento para a saúde não chega. Temos provas desta acusação, que fazemos, e estamos dispostos a trazê-las aqui durante este debate. Temos números que mostram como o dinheiro público, que devia ser gasto em saúde, está a servir para enriquecer como nunca aqueles que fazem da saúde do povo o chorudo negócio.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
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Não admira, pois, quo o Ministro viesse confessar há dias que o OGE está esgotado no campo da saúde e que há que encontrar novas formas de financiamento. Será que os Portugueses estão a melhorar a sua situação de saúde e que os problemas, foram resolvidos? Não! É preciso, é necessário, que os Portugueses saibam e fiquem alertados para o facto de que este governo quer lançar um novo imposto, talvez um adicional , ao imposto complementar (como sugere o Ministro numa entrevista ao jornal A Tarde), talvez um seguro de saúde, como disse na televisão.
É falso que o OGE esteja esgotado! O que o OGE já hão dá, nem dará, é para pagar as convenções ruinosas que a AD anda a assinar com o sector privado, não dá para os lucros que os grandes laboratórios pretendem à custa do povo português ou paira saciar a gula das multinacionais de medicamentos.
Mas para tanto a AD e este governo têm que actuar na mais perfeita inconstitucionalidade e ilegalidade. Têm que passar por cima da Constituição e da Lei do SNS. É que a AD acha que só são para cumprir as leis que servem os seus interesses de classe. Se são leis progressistas, que servem os trabalhadores, a Ad, pura e simplesmente, não as cumpre, ignorados. Que seja do meu conhecimento, Srs. Deputados, a GNR ainda não foi ao Ministério dos Assuntos Sociais fazer cumprir a Lei do SNS, como vai ao Alentejo destruir a Reforma Agrária...
Aplausos do PC f e do MDP/CDE.
Liquidar o Serviço Nacional de Saúde e substituí-lo por um seguro de saúde é o caminho que o Ministro anunciou na televisão aos Portugueses, já tão sobrecarregados com descontos, impostos e taxas, e a AD diz: paguem mais! É um sistema que significa que quem item mais dinheiro compra melhor seguro, logo, tem mais direitos, tem melhor saúde. Não é de estranhar que assim seja, O Ministro dos Assuntos Sociais disse aqui na Assembleia: «Quem quer saúde paga-a.» E para que não tivessem restado dúvidas acrescentou que a «saúde é um direito de todos os cidadãos, só que será um direito escalonado, de acordo com a sua condição sócio-económica!!!»
Vozes do PCP: - É uma vergonha!
A Oradora: -São palavras que envergonham, e só elas mereciam a interpelação do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Ministro, como já foi referido, veio à televisão e disse que ia acabar com os Serviços Médico-Sociais e integrá-los nos centros 'de saúde e na convenção. É verdade, Srs. Deputados, na convenção, na medicina privada. Nós trazemos mesmo a sugestão para este Ministério passar de Ministério dos Assuntos Sociais para MAC, Ministério da Assinatura das Convenções.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Assim, a AD até tinha a vida facilitada, pois toda a gente percebia, até pelo título, a realidade: que este governo não está lá para melhorar, gerir, incrementar e humanizar os serviços públicos de saúde, mas para servir e defender os interesses de meia dúzia de barões, de multinacionais e outros sectores privados que fazem da saúde dos Portugueses um negócio. A totalidade das previsíveis consequências de tal política denunciá-la-emos no desenrolar do debate. Agora o que pretendemos desde já tomar claro é que o PCP acusa este governo de deixar, degradar os serviços públicos de saúde em benefício dos serviços privados.
Aplausos do PCP.
Acusamos a AD de estar a gastar fabulosas verbas com as convenções que assinou logo que as eleições passaram, enquanto os serviços públicos se degradam,
enquanto o povo é mal tratado e os serviços de saúde são uma vergonha.
Nos trabalhos preparatórios deste interpelação os deputados comunistas da Comissão de Saúde visitaram numerosos serviços em diversos pontos do País. É uma vergonha! No banco de S. José, por exemplo (e nesse estivemos lá com deputados de todos os partidos), vimos doentes acumulados em macas nos corredores. É uma visita a um mundo cão, Srs. Deputados. Entra um cidadão num banco do Hospital, é tratado por alguns dos melhores médicos que existem no País, usa o mais sofisticado material e aparelhagem técnica. E, quando fica melhor, é depositado numa maca no corredor, onde permanece sem comer, em medicação, cheio de frio, em condições sub-humanas, até ter vaga numa enfermaria ou até voltar a agravar-se o seu estado de saúde, entrar novamente em coma e ser visto outra vez e tratado por médicos óptimos, aparelhagem sofisticada e regressar para a maca do corredor, até ter vaga na enfermaria, ficar outra vez pior morrer ou cair da maca...
Vozes do PCP: - É uma vergonha!
A Oradora: - Mas esta situação, que não há palavras que descrevam, o banco de S. José, não é uma fatalidade que se abateu sobre o País como um terramoto. Tem solução. Já deviam e podiam ter resolvido a situação, mas a AD cancelou as medidas que estavam em curso para acabar com este panorama.
Visitámos maternidades, Srs. Deputados, onde as mulheres fazem o trabalho de parto sentadas em cadeiras, onde chegam a deitar duas numa cama só, maternidades onde há epidemias e não se sabe porquê, mas morrem crianças, maternidades onde mulheres são mandadas para casa vinte e quatro horas depois de terem o filho, alcançando um triste record europeu... Visitámos serviços de obstetrícia, como o do Hospital de Santo António do Porto, que enchem de raiva e de ódio quem lá vai, quem lá trabalha e quem lá está. Como é possível que os nossos filhos continuem a nascer em tais condições? Vimos hospitais ande não há talheres para os doentes, onde se passa frio e fome. Vimos um hospital, como o de Santa Maria, onde existem 1800 médicos para 1200 camas, que consomem mais de um terço do total da dotação financeira do Hospital! Vimos hospitais distritais a trabalharem a 20%, 30% ou 50 % das suas possibilidades, porque não têm médicos e restantes trabalhadores da saúde necessários ao seu funcionamento. Vimos a infelicidade e o medo marcado no rosto de todos aqueles que tiveram a desdita de ir parar à cama de um hospital. Vimos a angústia de quem leva uma vida trabalhando nestas condições.
Vozes do PCP: -Muito bem!
A Oradora: - Mas a situação em que se encontram os nossos hospitais, as condições em que as
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pessoas são tratadas, são problemas que têm solução, direi mesmo, soluções amplamente discutidas, que congregaram técnicos, políticos e democratas de todos os quadrantes em torno delas. Essas soluções estão até, na sua imensa maioria, transformadas em leis, projectos de leis, decretos ou despachos. Foram debatidas amplamente no País e aqui na Assembleia da República. Os jornais fizeram-se eco delas, o povo e o País conhecem-nas nas suas linhas gerais. Mas este governo e o anterior cancelaram-nas.
Se o Governo estivesse a implementar o Serviço Nacional de Saúde e a cumprir a lei, muitos destes problemas já estariam solucionados ou para lá caminhariam.
O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!
A Oradora: - No entanto, a AD manteve o sistema, manteve os Serviços Médico-Sociais a fazer uma medicina industrializada, desumanizada, direi mesmo, enlatada. Manteve desintegrados os diversos serviços que prestam cuidados primários de saúde e não promoveu a devida articulação entre os cuidados primários e os cuidados hospitalares. Manteve toda a dispersão de instâncias administrativas, de duplicação e descoordenação de serviços, toda a confusão de chefias e de áreas de intervenção. Assinou com a Ordem dos Médicos uma série de convenções para financiar a medicina privada.
Resumindo: a AD chegou ao Ministério dos Assuntos Sociais e agravou a irracionalidade da gestão do sistema de saúde, assumiu novas despesas e agora não tem dinheiro, nem sequer para gerir os serviços que existem, quanto mais para melhorar a saúde dos Portugueses. Daí resultam as soluções encaradas pela AD: pôr os utentes, pôr os Portugueses, a pagar mais, sejam as taxas que já estão criadas, seja o seguro de doença ou um adicional ao imposto complementar, nas palavras do Ministro.
A criação de uma eficaz rede de cuidados primários de saúde, que é a solução que todos os países desenvolvidos estão a pôr em prática, isso não anuncia a AD, porque isso não interesse à direcção da Ordem dos Médicos nem às multinacionais dos medicamentos, como o Sr. Ministro bem sabe.
Mas em matéria de pagamento dos médicos a AD também não vai moralizar a situação. Enquanto a Lei do SNS privilegia o exercício da exclusividade, do tempo completo dos médicos, e uma remuneração condigna que permita e facilite esta adesão à direcção da Ordem (que não à maioria dos médicos) interessa um sistema em que o médico possa continuar a ganhar a dois ou mais carrinhos: que sejam assalariados nos serviços públicos, onde façam uns «biscates», e sejam convencionados com o Estado a pagar-lhes a medicina privada. Mais, pretendem que esses «biscates» nos serviços públicos continuem a ser a acumulação do trabalho no hospital com mais umas «horas» nos Serviços Médico-Sociais, mais a gasolina e as «horas» da viagem, mais umas «horas» no centro de saúde e, por que não, uma «horas» no SAPs, num acumular sucessivo de horas, às quais há que juntar a convenção para os consultórios particulares.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Porque cancelou a «AD» o que havia sido feito e legislado para pôr um pouco de ordem e de moral nisto? O Ministro não defende uma «sã concorrência» entre o sector público e o sector privado. Defende, sim, a acumulação numa mesma pessoa todos estes serviços e ordenados. Defende que o sector público de saúde financie e seja o sustentáculo do sector privado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Os maus serviços de saúde que existem, os problemas de saúde que os Portugueses enfrentam, não são uma fatalidade do destino. A questão é uma questão de opção política. Para que isso fique claro apresentamos 13 perguntas ao Governo, para as quais pretendemos uma inequívoca resposta. E não vá, Sr. Ministro, refugiar-se na fuga às questões ou nas provocações que desviem e desvirtuem o sentido deste debate. Se o fizer, tomaremos daí as devidas ilações.
Passo a enumerar as questões:
1.ª A Constituição da República estabelece no artigo 64.º a gratuitidade e universalidade dos serviços de saúde. Como campatibiliza o Governo as multas a que chamou «taxas moderadoras» que estabeleceu para os Serviços Médico-Sociais com esses preceitos constitucionais?
2.ª A extinção dos Serviços Médico-Sociais e sua substituição por serviços de cuidados primários de saúde é uma medida planeada, programada e já legislada. A «AD» parou o processo e cancelou o que vinha sendo feito. Qual é, pois, a receita do Governo para integrar os postos dos Serviços Médico-Sociais nos centros de saúde, uma vez que revogou todas as medidas formuladas?
Será, Sr. Ministro, que os postos da «caixa» mudam, pura e simplesmente, de nome e, ainda por cima, lhes vai tirar especialistas para os hospitais e valências para a medicina privada?
3.ª Os SAPs eram o milagre pré-eleitoral da «AD» para descongestionar os serviços de urgência hospitalares e memorar os serviços de saúde dos Portugueses. Agora, que falharam na sua missão eleitoralista, que os especialistas após as eleições regressaram aos hospitais, para que é que servem e que destino vão ter?
4.ª Como é que o Governo vai fazer para dar seguimento à afirmação do Sr. Ministro de que a cada médico corresponderá um único posto de trabalho, mantendo o rendimento que actualmente aufere com pluriemprego?
5.ª Foi anunciado que as instalações dos Serviços Médico-Sociais iriam ser cedidas a médicos ou grupos de médicos para aí exercerem a medicina convencionada. Confirma o Sr. Ministro perante a Assem-
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bleia da República esta escandalosa intenção?
6.ª Acusamos o Governo de prejudicar a saúde dos Portugueses, deixando degradar os serviços, públicos em benefício dos grandes comerciantes da saúde, dos intermediários e das multinacionais. Está o Governo disposto a fornecer aos partidos da oposição durante este debate os textos das convenções que os governos «AD» assinaram com a direcção da Ordem dos Médicos e os cálculos das verbas previstas para cada uma delas?
7.ª É ou não uma vergonhosa política de liquidação dos serviços públicos de saúde em favor dos negociantes privados o facto de estarem a ser retiradas técnicas de ponta e altamente diferenciadas dos hospitais, como a transplantação renal, ou meios de diagnóstico fundamentais, como a tomografia axial computadorizada, quando não estão esgotadas as capacidades dos hospitais centrais?
8.ª Que medidas prevê o Governo tomar no sentido, de humanização dos hospitais e quando acaba com a urgência dos corredores dos bancos?
9.ª Em todas as intervenções públicas o Governo tem, pura e simplesmente, esquecido, ignorado, a caótica situação em que se encontram as maternidades. Com as taxas mais elevadas da Europa de mortalidade materna, neonatal, de deficientes resultantes de traumatismos obstétricos, não tem o Governo vergonha de ao fim de quinze meses nada ter dito, feito ou programado para resolver a situação?
10.ª Dos especialistas do País, 82 % estão colocados em Lisboa, Porto e Coimbra e os hospitais distritais estão subaproveitados por falta de técnicos. Será que o Governo considera que só Lisboa, Porto e Coimbra são Portugal e que o resto é paisagem?
11.ª Como é que o Governo concilia o facto de afirmar que respeita a autonomia administrativa e financeira dos hospitais com a existência do GIES, que obriga a autorização prévia toda a aquisição de equipamentos ou benefício de instalações, à autorização ministerial prévia para adquirir bens de mais de 50 contos, e a proibição da reversão de saldos?
12.ª Anunciou o Governo que tinha na manga a publicação para Junho das carreiras médicas. Vai ouvir sobre elas previamente os interessados? E a carreira dos enfermeiros, por que é que não está publicada já?
13.ª O tempo completo e a dedicação exclusiva são justíssimas reivindicações dos médicos e que vão moralizar a situação caótica existente. O facto de o Governo ainda não o ter posto em prática significa um desrespeito por aqueles que à saúde pública dedicaram a sua vida. Vai o Governo manter por quanto tempo esta situação?
Como já disse, pretendemos respostas claras. Não pretendemos com esta interpelação fazer cair o Governo. Mas vamos pô-lo mais doente ainda do que já está, particularmente depois das grandiosas jornadas do 1.º de Maio.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, por parte do Governo, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esperava que esta interpelação reflectisse, de facto, as grandes preocupações políticas sectoriais e que, mais uma vez, não se ficasse pelo enumerar de situações casuísticas e técnico-normativas, que servem a qualquer sistema de saúde e com as quais todos estamos de acordo.
Todos estamos de acordo na existência, ao melhor nível possível, dos diferentes cuidados de saúde; todos estamos de acordo na existência de instalações e equipamentos, desde os centros de saúde aos hospitais centrais; e todos estamos de acordo no preenchimento das vagas da periferia, portanto na necessidade de povoamento desta periferia. Mas esta Câmara, local de eleição fundamental para as grandes discussões políticas, não pode continuar a discutir assuntos tão sérios, apenas através do apresentar casuístico de um sector extremamente doente, que vem assim de há anos. Nós, Srs. Deputados, estamos no Governo para o modificar, mas não o podemos fazer em quatro meses, tempo há que estamos no Governo.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Vozes do PCP: - Estão há ano e meio!
O Orador: - É curioso verificar que as discussões por parte da oposição reflectem a sua incapacidade e quando esta pretende interpelar o Governo, como o fez, através da pobreza das intervenções que aqui acabamos de ouvir, eu, como membro do Governo, interpelo a oposição para discutir assuntos sérios, assuntos de fundo, assuntos de política sectorial.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Blá, blá, blá!...
O Orador: - Não é blá, blá, Sr. Deputado. Tenha atenção que vai aprender alguma coisa.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
O Orador: - O que interessa discutir é o modelo, é o tipo de serviço de saúde que corresponde às necessidades e às possibilidades do povo português. Não interessa adoptar figurinos estrangeiros - disse-o em 1975 -, não interessa adoptar posições maximalistas, através de discursos políticos altamente facilitadores, mas que a nada conduzem - e os exemplos pela Europa e pelo mundo são bem concludentes.
Interessa ponderar, calmamente, sobre as questões de fundo que nos rodeiam.
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De facto, o modelo preconizado através da Lei n.º 56/79 assenta essencialmente em três características: gratuitidade, universalidade e sistema integral. Disse-o aqui, e mais uma vez repito, que não me preocupa a gratuitidade que pretende cobrir todas as pessoas, independentemente da sua situação sócio-económica. Para mim, a justiça social é exactamente diferenciar entre quem nada tem e aqueles que muito têm.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Risos do PCP.
E por isso um sistema de saúde que considera que a gratuitidade é para todos, tenham muito, pouco ou nada tenham, é um sistema injusto e inviável e que países que, desde há muito, o adoptaram estão agora a abandonar. É que não há possibilidades económicas de dar a todos, em termos de igualdade no campo financeiro, os níveis de cuidados de saúde que cada vez são mais sofisticados, pois quando este princípio foi estabelecido estávamos muito aquém de determinados tipos de cuidados que hoje são altamente despendiosos e que nenhum Estado consegue suportar.
Esta é a grande questão que se põe hoje em todo o mundo livre, a não ser que a troquemos por um modelo que pretende a troco do Orçamento Geral do Estado, a troco de nivelar ricos e pobres, dar cuidados de saúde que não prestam, de acordo com as qualidades técnicas que hoje temos ao nosso dispor. A sociedade, qualquer que seja, tem de ser chamada à responsabilidade na participação dos gastos com a saúde. Em todos os sectores assim acontece e porquê esta posição miserabilista no sector da saúde, quando as realidades apontam para elementos completamente diferentes? Só, de facto, a demagogia, só a incapacidade de equacionar estas questões - para não lhe chamar outro nome - poderá continuar a preconizar um sistema que cada vez é mais contestado ao nível de todos os países, que pensam, que sabem e que pretendem uma verdadeira justiça no sector da saúde.
Nunca ninguém pôs em causa a universalidade. Todos estamos de acordo que todos os cidadãos de um país têm direito, através do mesmo acesso, ao mesmo tipo de cuidados. E ninguém também põe em causa o sistema integral, desde os cuidados primários ou extra-hospitalares, até aos cuidados diferenciados, tendo de haver uma complementaridade, uma interligação, para que não haja hiatos técnicos e em termos de política sectorial, a fim de prestar os melhores níveis possíveis de cuidados a todos os sectores da população.
Mas o que está em causa, reputo, é a questão de como é que vamos financiar todo um sistema que pretendemos ser o mais justo e que se adapte, de facto, às nossas características e às nossas possibilidades. Diria apenas para reflexão: como é que é possível continuarmos a pretender financiar o sistema através do OGE, que atingiu o limite máximo das suas possibilidades, sob pena da degradação do nível de cuidados ainda ser maior, sem pedirmos a quem tem que participe - e há várias maneiras de participar nos gastos da saúde - para continuarmos a troco do pseudo-Estado providência, a dizer determinados banalidades políticas, mas que não resolvem as nossas reais preocupações e os nossos problemas que aqui foram apontados casuisticamente e que qualquer um de nós muito bem conhece.
Uma cama de um hospital central custa hoje em média diária 2000$, um internamento de quinze dias custa em média 30000$, uma consulta hospitalar custa hoje cerca de 600$, uma urgência hospitalar custa cerca de 800$, e a nível dos hospitais distritais os valores são cerca de 10% dos que acabei de apontar.
Em matéria de instalações e equipamento, por exemplo, uma cama de um hospital central para que hoje se possa entregar «chave na mão» anda à volta de 4000 contos: e dos hospitais distritais à volta de 3000 contos. Não sei se os Srs. Deputados da oposição percebem o que estes números querem significar.
Vozes do PCP: - O senhor é que não percebe nada!
O Orador: - Por outro lado, com as disparidades em que estamos inseridos, temos que enquanto, por exemplo, nos Hospitais Civis de Lisboa gastamos com pessoal cerca de 1 580 000 contos, para investimentos em contrapartida temos gastos de 137 000 contos, o que é bem significativo do bloqueio em que nos encontramos. Por exemplo, no Hospital de S. João para 774 000 contos para pagamento de pessoal, há em contrapartida 29 000 contos para despesas de investimentos e no Centro Hospitalar de Coimbra - para citar apenas os mais frisantes - em relação a 34 000 contos de gastos com pessoal há investimentos da ordem dos 24 000 contos. As instalações degradam-se por isto mesmo. De facto, os desfasamentos estão aqui. O problema não é apenas de gastos, mas como disse há uma situação em que o Orçamento Geral do Estado atingiu os limites das suas possibilidades.
Ao contrário do que aqui foi dito, ninguém pretende instituir um imposto adicional. Falei na televisão em duas coisas: num seguro social ou na possibilidade de mobilizar verbas de fundos autónomos com disponibilidade para isso.
Mas os problemas da saúde passam também pelas questões da regionalização e da descentralização. Por isso o Governo, de uma maneira muito clara e pela primeira vez, disse que não é possível preconizar uma política de saúde viável que responsabilize as instituições e o pessoal que nelas trabalha se não dermos autonomia administrativa e financeira aos hospitais centrais e distritais, nesta primeira fase. E mais se disse que consideramos fundamental que a nível dos cuidados periféricos haja uma verdadeira integração, sendo para tanto criadas as administrações regionais de saúde, que integrarão todos os serviços periféricos e sob uma mesma chefia permitir-se-á que esses cuidados tenham uma ligação íntima com os cuidados diferenciados a nível distrital e a nível central.
Em relação a toda esta dispersão dos cuidados primários existentes entre nós, que já diagnosticámos e que já por várias vezes dissemos o que pretendemos claramente fazer, vai sair um diploma, como anunciarei na intervenção que fiz na televisão, que permitirá resolver esse problema, o que é bem claro da nossa intenção - e só não percebe quem não quer ouvir.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Por outro lado, dissemos que se torna urgente que o vínculo dos profissionais da saúde, em
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relação às instituições, seja estabelecido em moldes diferentes. Ao contrário do que a oposição aqui disse, e ao contrário de determinadas afirmações que apenas são demagógicas ou de facto, repito, não percebem, o que vamos dizendo através das nossas intervenções públicas, que são intervenções de compromisso e que não são apenas para dizer meia dúzia de coisas em termos políticos, não tendo a responsabilidade de as efectuar e de as realizar, é para realizar e por isso não admitimos que aqui se duvide da seriedade das nossas políticas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Vozes do PCP: - Tem-se visto!
O Orador: - Pode-se discordar em relação a determinados aspectos concretos da política sectorial, não se pode, de facto, pôr o problema em termos de menor seriedade por parte de quem afirma um determinado múmero de princípios que são sérios e que dizem respeito a todos nós.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PCP.
O Orador: - Quanto ao vínculo dos profissionais, como ia a dizer, a nível hospitalar - também o disse na televisão - vai procurar-se estimular ao máximo o trabalho em termos intensivos, o trabalho hospitalar prolongado. Vai-se estimular a profissionalização da medicina hospitalar e o vínculo destes profissionais em relação ao serviço será, com certeza, completamente diferente dos serviços periféricos, uma vez que aí estão em jogo não os serviços mas às populações. Enquanto que a nível hospitalar o vínculo se estabelece entre o profissional e a institituição onde trabalha, a nível periférico é entre ele e a população que tem a seu cargo. Por aqui passa uma questão de fundo que são as carreiras dos profissionais da saúde. Todas elas, desde os médicos ao pessoal de enfermagem, são fundamentais não só em termos de realização profissional e material, mas sobretudo para que por aqui possamos, não por via administrativa, como já o afirmei, e que seria se calhar o método que alguns deputados adoptariam, propor possibilidades profissionais e maternais para a realização de cada estrato sócio-profissional e deixemos a liberdade de escolha de cada um. Isto porque ao Estado apenas compete garantir as condições de trabalho e não tem de impor a deslocação de ninguém para nenhuma parte do território nacional.
O Sr. José Ernesto Oliveira (PCP): - Então e os professores e os magistrados?...
O Orador: - Essa política não a faço, está contra os meus princípios e contra a política que este governo defende.
Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Por isso o problema das carreiras em relação ao problema médico, nomeadamente em relação à carreira médico-hospitalar e à careira de generalista, que várias vezes foi defendida e explicada nesta Assembleia por este governo, tem essencialmente como pontos de diferença, em relação a tudo o que até agora tinha sido preconizado, a titulação independentemente do provimento das vagas e, por outro lado, serem garantidos aos profissionais os seus lugares nos hospitais apenas de acordo com as necessidades das instituições. Por isso vamos dar, também neste aspecto, autonomia às instituições hospitalares, para que sejam elas a poder escolher os profissionais que necessitam e não estarem à mercê de determinadas regras centrais que apenas as vão dificultando na sua vida do dia-a-dia.
O problema da carreira do generalista assentará, essencialmente, num ordenado base, tendo em conta outros fatcores como, por exemplo, a inospitalidade da região onde estão colocados e, para além disto, cada generalista ou clínico geral - e há que aqui esclarecer que o clínico geral é aquele que não entra na carreira de generalista e que pode depois da formatura optar por um lugar de clínica geral sem querer entrar em nenhuma carreira que lhes oferecemos ...
O Sr. Vídigal Amaro (PCP): - É uma carreira sem carreira!
O Orador: - ... terá a seu cargo um determinado grupo populacional pelo qual são responsáveis, como se faz aliás em muitos países.
Quando defendemos aqui - e disse-o na minha intervenção na televisão e mais uma vez aqui repito - a prioridade para os cuidados diferenciados, a nível sobretudo dos hospitais centrais e com especial relevo para a área metropolitana de Lisboa, o Governo fê-lo, não como aqui foi afirmado, por princípios demagógicos, não através de uma política que pretende construi edifícios unicamente com fins políticos, mas baseado em conhecimentos muito, concretos que, em termos resumidos, passo a explicar.
Ficará concluído em Junho próximo o Plano Director da Área Metropolitana de Lisboa, que teve nestes últimos meses, já sobre a égide deste governo, uma estimulação bastante acentuada. É a única maneira de, em termos objectivos, se saber perante uma situação hospitalar profundamente degradada, numa região em que existe uma maior concentração populacional, como é que havíamos de resolver a questão hospitalar e como é que havíamos de melhorar as condições das camas hospitalares desta área que hoje abarca cerca de 2 500 000 pessoas.
Através dos estudos efectuados com certeza, e ainda bem, com a colaboração de técnicos não americanos, mas suecos, chegou-se em tempo útil e muito mais rapidamente do que inicialmente estava previsto, em termos de curto e médio prazo como qualquer planeamento hoje tem de ser feito - porque planeamentos a longo prazo, como os Sr. Deputados sabem ou deviam saber, hoje ninguém os faz a não ser em termos meramente provisionais -, a conclusões que apontam de uma forma muito clara que a solução das camas hospitalares em Lisboa - em que os Hospitais Civis são uma parcela e que sem a melhoria de fundo desta política da área metropolitana em termos de camas hospitalares não encontrará resposta, e que por tabela não encontrará resposta o problema célebre do Banco do Hospital de S. José - só era possível através, por um lado, de medidas conjunturais que irão melhorar os Hospitais Civis dentro de
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um período próximo de quatro anos. E durante este período comprometemo-nos a arrancar com dois novos hospitais, um na zona oriental e outro na zona ocidental, projecto desde há muito concebido mas que não estava nem assente numa realidade objectiva de plano nem de acordo com a evolução demográfica da área metropolitana de Lisboa. Por isso, um será na zona do Restelo, tendo em vista um pólo de desenvolvimento populacional extraordinariamente activo neste momento que apanha a Amadora e Sintra e que abarca cerca de 400 000 habitantes, e outro na zona oriental que é importante para toda a zona chamada de Loures-Este e para todos os doentes que se dirigem dessa parte através do Hospital de Vila Franca de Xira para os Hospitais Civis de Lisboa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este estudo objectivo da área metropolitana de Lisboa é fundamental para que possamos arrancar e transformar a periferia dos Hospitais Civis de Lisboa, através de um plano de acção prioritária que eu anunciei, que não é possível através unicamente da resolução da chamada periferia através dos hospitais distritais e dos serviços de urgência que lhes estão acopulados, porque os Hospitais Civis têm também a sua própria periferia. Num hospital, como eu aqui disse, com cerca de 3000 camas, onde têm uma média de altas, por dia, de 60 doentes, é impossível trabalhar nas condições desejadas, pois estão completamente bloqueados e precisam de ajuda, porque esta instituição tem ainda muito a dizer em termos hospitalares, nomeadamente na área metropolitana de Lisboa.
Por isso demos a prioridade a uma zona profundamente degrada e só quem não sabe minimamente o que se passa no sector da saúde é que pode continuar a apregoar apenas a defesa dos cuidados primários e dos cuidados extra-hospitalares, que todos sabemos serem fundamentais. A prioridade ou opção, neste momento, em termos de arranque não quer dizer marginalização dos cuidados primários; apenas se pretende deitar a mão a uma zona profundamente degradada, sem a qual poderão os cuidados primários ser os melhores possíveis, mas se não tivermos cuidados diferenciados à altura das necessidades do povo português, não conseguiremos resolver os problemas sanitários da nossa população.
Todos sabemos que grande parte dos cuidados primários, ao contrário do que os Srs. Deputados da oposição afirmam, são problemas de saneamento básico, de habitação e de alimentação, mais do que problemas de saúde. Os problemas dos cuidados primários passam essencialmente por aí, e nós precisamos de continuar, para além de os garantir. Daí que façamos um esforço através da institucionalização da carreira de generalista e colocação de clínicos gerais nos centros de saúde e da transformação do grande ambulatório. Daí que se tenha afirmado, e repito, o desaparecimento dos Serviços Médico-Sociais, não como simples nomenclatura, mas porque é uma realidade que se impõe.
E temos medidas para obstar a esses problemas que durante o período do debate, com muito gosto, esclareceremos.
Agora isto não é possível manter-se se, em paralelo, não houver cuidados diferenciados à altura das necessidades do povo português. Todos estamos interessados na sua melhoria, todos sabemos perfeitamente as várias situações caóticas do sector. Por isso e que estamos a trabalhar, por isso é que as coisas irão ser modificadas. Mas não peçam que em três meses se modifiquem coisas que têm anos.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Três meses?! ...
O Orador: - Não peçam, se quiserem, que mesmo em doze ou quinze meses se resolvam problemas estruturais profundos que necessitam de meditação. A não ser, como é típico dos Srs. Deputados, que se façam as coisas sobre o joelho e assim facilmente, para enganar muitos, se resolvam questões que depois são bloqueadas a curto prazo porque não obedecem a estudos aprofundados, sérios e críticos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Resolver, só no papel!
O Orador: - Daqui se prende mais uma outra questão que é a da correlação, ou seja, toda a complementaridade entre o sector público e o sector privado. Nós dissemos várias vezes que não temos, nem em relação a um nem a outro, qualquer animosidade. Para nós quer um quer outro são fundamentais, são duas vertentes da mesma realidade, e sem eles não é possível instalar um Serviço Nacional de Saúde que viva da integração destes dois sectores e da sua complementaridade.
Todos sabemos, e muitos deputados da oposição sabem perfeitamente, pois vivem e trabalham no sector privado, que ele é fundamental para haver uma emulação com o sector público.
Estimular e prevenir determinados tipos de actuações no sector privado não quer dizer que venha a liquidar-se o Sector público, ao contrário do que os Srs. Deputados dizem. Os Srs. Deputados falam na necessidade de se criarem determinadas condições e até dizem que o sector privado desaparecerá à medida que o sector público for crescendo. Ora, isso só acontece num país que não põe opções claras, que não permite um sistema de saúde aberto e que permite sim, através de um estatismo ultrapassado, ...
A Sr.ª Zita Seabra (PCP) - Ih! ...
O Orador: -... impor determinados modelos que não nos servem, que são contestados em todos os países que vivem da liberdade e que conhecem muitíssimo bem como é que se pode, de acordo com as suas realidades, montar um serviço nacional de saúde.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Quanto às convenções, queria dizer em termos muito rápidos que, ao contrario do que aqui afirmaram - e repito que teremos aqui os números para vos mostrar-, a convenção é apenas a forma mais perfeita de articular o sector público com o sector privado, evitando a especulação e a comercialização deste último.
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A convenção é uma medida adoptada em todos os países e é uma medida preconizada na Lei n.º 56/79. Não percebemos porque não havemos de a estimular, desde o momento em que ela seja o único caminho que permite a verdadeira articulação, uma vez que traça objectivos, que propõe determinadas metas e que impõe determinadas regras para que o sector privado se possa efectivamente articular com o sector público.
Tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se materializará e encontrará a sua corporalização numa nova lei da saúde. E anunciei-o há já bastante tempo, pois, de facto, não é possível que esta Câmara continue a debater problemas de saúde, quando temos uma lei que vive de uma bandeira política e que se caracteriza por ser dogmática, programática e regulamentar.
A lei que apresentaremos a esta Assembleia para aqui ser discutida e votada caracteriza-se essencialmente por traçar as grandes linhas sectoriais, mas foge - tem de sair - deste espartilho dogmático, deste espartilho programático e regulamentar que compete aos executivos e que, por ser assim, inibe um princípio que para nós é caro, que é o da alternância do poder. É que cada vez que houver alternância no poder, uma lei que não diz respeito a quem ocupa o executivo, é evidente que vive sobre a tentação de ser modificada com todas as implicações estruturais e institucionais que daí advêm.
Por isso a lei de saúde que defendemos e que, quanto a mim, tem de ser aqui debatida, discutida e aprovada será uma lei que esteja para além dos aspectos político-partidários e para além dos aspectos regulamentares que dizem respeito ao Governo, será uma lei que trace, de uma maneira muito clara, as grandes linhas que nos regem e que regem o Sistema Nacional de Saúde, e não uma lei que se terá na tentação, como disse, de alterações constantes. Terá pois de obedecer, como a grande lei de base que é a Constituição, a grandes princípios que sirvam qualquer sector político-partidário que amanhã ocupe o executivo. Não como a actual que impõe regras, normas e espartilhos e que não permite que determinado tipo de serviços possa crescer, e que determinado tipo de cuidados de saúde, a todos os níveis, se possa desenvolver.
O estatismo poderá ser muito caro para os Srs. Deputados da oposição. Permitam-me que quem não é da oposição tenha concepções filosóficas políticas e sectoriais completamente diferentes.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais despendeu na sua intervenção vinte e sete minutos.
Srs. Deputados, como mais nenhum Sr. Membro do Governo deseja usar da palavra, faremos de imediato o intervalo habitual. Recomeçaremos às 17 horas e 40 minutos.
Está suspensa a sessão.
Eram 17 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.
O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado da Saúde: Os debates sobre saúde têm sido sempre muito vivos, polémicos e apaixonantes. Este, que me cumpre iniciar em nome do Partido Socialista, não foge à regra. Longe vai o tempo em que as mesmas forças políticas que ora aqui têm assento alcançavam facilmente a unanimidade na procura das soluções para os graves problemas que afectam um sector tão vital para o bem-estar do povo português. Foi por isso que o artigo 64.º da Constituição, que reconhece o direito à protecção da saúde como direito fundamental e, em consequência, impõe ao Estado a criação de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, mereceu o apoio de todas as bancadas! E foi o então PPD, na ânsia de afirmar a sua vocação socialista, quem acrescentou à proposta de socialização da medicina a da socialização dos sectores médico-medicamentosos!
Mudaram-se os tempos e mudaram-se algumas vontades. A história registará a hipocrisia de certos partidos e julgará da coerência dos que hoje se propõem revogar o que ontem aprovaram e aplaudiram!
Aplausos do PS, do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - O Mário Soares disse que só os burros não mudam de ideias!
O Orador: - Foi, por isso, útil e oportuna esta interpelação do PCP, que entendeu antecipar-se a idêntica iniciativa do meu partido, que eu próprio anunciei aquando da discussão do Programa do Governo.
A este propósito quero dizer que discordo inteiramente da opinião aqui expressa pelo Sr. Ministro, a respeito da natureza deste debate. Uma interpelação destina-se não apenas a discutir as questões de fundo, mas também a abordar as questões sectoriais e os problemas concretos.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Uma interpelação é uma forma constitucional de fiscalizar o Governo e é uma forma parlamentar de averiguar da fidelidade do Governo às leis vigentes e ao seu próprio programa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O discurso do Sr. Ministro - quero dizê-lo com toda a franqueza - foi decepcionante, foi, aliás, no seu estilo habitual.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E ele que verberou a chamada a esta discussão de problemas sectoriais por parte do PCP - falou o Sr. Ministro em oposição, mas até essa altura apenas tinha falado o PCP - caiu no mesmo vício que imputou aos deputados do PCP, trazendo para aqui também alguns problemas sectoriais, inclu-
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sivamente abordando em termos possidónios - devo dizê-lo - os gastos dispendiosos da saúde, numa visão mercantilista da questão, numa visão capitalista dos direitos sociais...
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - ... como se tivéssemos de nos preocupar excessivamente, quando se trata de garantir direitos fundamentais da pessoa humana, de quanto custa uma cama no hospital ou de quanto custa uma consulta.
Certamente que isso deve ser motivo da nossa preocupação. Na mesma lógica capitalista deveríamos perguntar quanto custa ao Estado uma aula de Geografia ou de História? Quanto custa ao Estado uma escola? Quanto custa ao Estado uma estirada? Quanto custa ao Estado um polícia que mantém a ordem e a segurança? Esta é uma visão capitalista, é a expressão extrema de um liberalismo económico que nós condenamos, é um absurdo!
Aplausos do PS, do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
As posições são, Sr. Ministro e Srs. Deputados, cada vez mais claras. A direita já não precisa - ou julga não precisar - de se esconder por detrás do biombo das conveniências. Despe-se impudicamente na praça pública e pavoneia a sua crua nudez, arremetendo furiosamente contra a Constituição e contra o Serviço Nacional de Saúde. Está certo. Cada um se bate pela sua dama. O PS defende um Serviço Nacional de Saúde para o povo. A AD, na sua lógica de classe, pretende um «sistema de saúde» que proteja a actividade privada. Não se trata apenas de desnacionalizar os bancos, devolver a terra aos antigos senhores, é preciso também reprivatizar a saúde, para que se complete a destruição das principais conquistas do 25 de Abril.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não compreendo é como sociais-democratas consequentes - que os há no PSD - possam alinhar, ao menos tacitamente, numa política tão contrária aos seus ideais.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador - A história, porém, não volta atrás. E talvez valha a pena, a este propósito, fazer aqui uma breve resenha de política de saúde das últimas décadas, para demonstrar que o Governo quer regredir pelo menos dez anos. O reconhecimento do direito à saúde, como direito fundamental, está intimamente ligado à luta pela democracia e pelos direitos sociais, pois respeita às necessidades básicas do homem, ao próprio direito à vida.
Tradicionalmente, a prestação de cuidados sanitários competia, de forma quase exclusiva, a instituições religiosas e de assistência, como as Misericórdias, que desempenharam, aliás, um papel relevante na sua época. Mas a par desta actividade meramente caritativa, começou a desenvolver-se, ainda que de forma incipiente, a clínica liberal a que, naturalmente, só as classes abastadas tinham acesso. O primeiro hospital público, o Hospital de Todos-os-Santos, hoje de S. José, só saiu da dependência da Misericórdia de Lisboa em 1851. Em 1944 ainda os nossos serviços de saúde dependiam em grande parte de iniciativa particular, pois o Estado apenas detinha os Hospitais Civis de Lisboa, Joaquim Urbano, do Porto, e os Hospitais Escolares de Coimbra e Lisboa.
Após a 2.ª Grande Guerra e quando, na Europa, o Estado já assegurava a responsabilidade pelos cuidados de saúde, mediante sistemas diversificados que cobriam toda a população, o regime fascista concede «benevolamente» a assistência médica gratuita aos «indigentes». Os municípios e as Misericórdias organizam então o rol dos portugueses descalços - cidadãos sem pátria, porque não há pátria digna desse nome que não garanta a seus filhos o pão, a liberdade e a justiça social. Mais tarde seriam criadas outras categorias para o internamento hospitalar, inspiradas na filosofia classista do regime, que parece ter ressuscitado no espírito do actual governo: a dos porcionistas, que pagavam uma parte do tratamento, e a dos pensionistas, que pagavam a totalidade. Pobres, remediados e ricos foi também uma das trilogias do Estado Novo que o Ministro Carlos Macedo pretende desenterrar dos escombros da ignomínia, a avaliar pelas suas declarações nesta Assembleia aquando da discussão do Programa do Governo disse o Sr. Ministro: «cada um deve pagar a saúde segundo a sua condição económica, os igualitarismos não levam a parte nenhuma», ou, na sua frase tristemente célebre: «Quem quiser saúde que a pague!»
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - É nesta lógica implacável que o preclaro titular do MAS afirmou na mesma oportunidade que o princípio da gratuitidade, consagrado no artigo 64.º da Constituição, não tem de ser extensivo a todos.
Retomou hoje a mesma ideia.
Voltemos, porém, à história. Estamos ainda em 1946, ano em que foi publicada a Lei n.º 2011, que estabeleceu as bases da organização hospitalar e permitiu a construção de hospitais concelhios e regionais. Foi uma política de fachada, de grandes edifícios, inaugurados com solenidade e pompa, para logo ficarem abandonados ou subaproveitados por falta de meios técnicos e humanos, e também pela ausência total de uma política de saúde ao serviço do povo. No mesmo ano foi também publicado o Decreto n.º 35 311, que criou a Federação das Caixas de Previdência e que deu origem ao primeiro serviço médico de nível nacional, cujas deficiências e méritos todos conhecemos e que, nessa época, cobria menos de um terço da população.
Entretanto, as críticas ao Governo por parte dos sectores democráticos vinham acentuando-se, especialmente quanto ao serviço de saúde. Talvez para atenuar essas críticas, foi criado, em 1958, o Ministério da Saúde, o que, pelo menos, permitiu que, pela primeira vez, o sector estivesse representado no Conselho de Ministros. Foi por esta altura que surgiu o movimento das «carreiras médicas», inspirado por razões profissionais e políticas e que constituiu uma autêntica pedrada no charco então reinante. Entre as dezenas de médicos que, sob o patrocínio da Ordem - como vão longe esses tempos em que o organismo representativo da classe era fiel aos interesses -, não
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contraditórios, da maioria dos profissionais e do povo! - lembro aqui os meus camaradas Miller Guerra, Fernandes da Fonseca e Mário Mendes, e o nosso colega aqui presente deputado do MDP/CDE António Calhordas. A ideia, de um serviço nacional de saúde foi lançada pela primeira vez, como única forma de garantir a cobertura sanitária do País e permitir carreiras profissionais estáveis e dignas.
O Governo ignorou completamente as justas reivindicações então apresentadas. Só em 1971, a publicação dos Decretos n.ºs 413/71 - Lei Orgânica do Ministério da Saúde - e 414/71 - carreiras profissionais - veio trazer alguma esperança à crónica, apagada e vil tristeza do sector da saúde. Aqueles diplomas reconheciam o direito à protecção da saúde a todos os cidadãos e a consequente obrigação do Estado de a assegurar, definiam uma política unitária da responsabilidade do Ministério, apontavam para a integração de todos os cuidados de saúde e propunham o planeamento global.
Está a ouvir, Sr. Ministro Carlos Macedo? Isto em 1971!
Infelizmente, a mentalidade tacanha ainda prevalecente, apesar da apregoada «primavera marcelista», e que parece não se ter apagado de muitos espíritos, como aliás hoje aqui podemos constatar, conjugada com a clássica obstrução da ala conservadora da Ordem dos Médicos, que aqui como em toda a parte sempre contrapôs aos legítimos interesses do povo os seus privilégios de classe, não permitiu realizar, essa política audaciosa para a época. E quando o fascismo caiu, em 25 de Abril de 1974 - sim, porque o fascismo caiu -, a saúde não passava de um filho espúrio da Administração Pública, era o retrato vivo da nossa vergonha colectiva, expresso nos piores índices sanitários da Europa, com destaque para a mortalidade infantil, que rondava os 50/1000.
Foi por isso que o Movimento das Forças Armadas, fiel ao espírito humanista da Revolução, e correspondendo às profundas ansiedades do povo, incluiu no seu programa a publicação das bases de um serviço nacional de saúde. A mesma preocupação foi interpretada pelo I Governo. Provisório que perfilhou essa importante medida e criou o Ministério dos Assuntos Sociais com as Secretarias de Estado da Saúde e da Segurança Social, o que permitia coordenar as duas áreas, afinal complementares.
É na sequência do compromisso histórico assumido pela Revolução de Abril que os deputados constituintes aprovam por unanimidade o artigo 64.º da Constituição que reconhece como todos sabem, mas não é demais repeti-lo, o direito à protecção da saúde como direito fundamental e impõe ao Estado a obrigação social de o garantir através do Serviço Nacional de Saúde que define como universal, geral e gratuito, que assegure a cobertura médica-hospitalar de todo o País e o acesso, em condições de igualdade, a todos os cidadãos.
E foi também por fidelidade ao 25 de Abril, à Constituição e às profundas aspirações do nosso povo, especialmente das classes trabalhadoras e reformados pobres, em cumprimento, afinal, do ideário do socialismo democrático, que o II Governo Constitucional de Mário Soares se lançou na grandiosa e patriótica tarefa de levar à prática o Serviço Nacional de Saúde, tarefa de que nunca abdicaremos, quaisquer que sejam as dificuldades, as pressões ou as seduções,
sob pena de nos negarmos como partido anticapitalista; que luta pela libertação da pessoa humana de todas as formas de opressão, desigualdade e exploração.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Foi ainda o II Governo Constitucional que estendeu os Serviços Médico-Sociais a toda a população que, assim e pela primeira vez em Portugal, viu garantido o acesso generalizado e gratuito aos serviços de saúde do Estado.
Demitido o II Governo, em consequência da crise aberta pelo CDS, - cuja ausência eu constato - estão pouco mais de meia dúzia de deputados na bancada, o povo tirará daqui as respectivas conclusões...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Estão cheios de saúde!
O Orador - Dizia eu que demitido o II Governo, em consequência da crise aberta pelo CDS, que se opunha à instituição do Serviço Nacional de Saúde, constante do programa aprovado pelo próprio CDS - e não falo aqui das pressões e até das chantagens que nessa altura foram tentadas exercer -, os socialistas continuaram coerentemente a sua luta e fizeram aprovar nesta Assembleia a Lei n.º 56/79.
A AD, porém, logo que chegou ao poder publicou o Decreto-Lei n.º 81/80, revogando todos os diplomas regulamentares do Serviço Nacional de Saúde aprovados pelo V Governo e prorrogando, até 15 de Setembro de 1980, o prazo para elaborar nova regulamentação. A AD não cumpriu esse compromisso e, como a Lei n.º 56/79 estabelecia o prazo de três meses para início da sua execução, o Serviço Nacional de Saúde deveria começar a implantar-se, no plano delineado pelo próprio governo da AD, em 15 de Dezembro, de 1980. Infringindo a obrigação legal e política assumida, e violando frontalmente a lei, por acção e omissão, a AD coloca-se em aberta rebeldia contra o direito constituído e desafia a ordem democrática e a Constituição da República!
Aplausos do PS.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Naturalmente que o Governo, legitimado pelo voto popular - e estou a adivinhar que daqui a pouco o Sr. Deputado Pedro Roseta me vai dizer isso -, tem o direito de alterar ou revogar, as leis em vigor.
Não se contesta. Mas não pode deixar de as cumprir, sob qualquer pretexto, enquanto as não substituir ou alterar.
Qual é, afinal, a política de saúde deste governo?
Pergunto aos Srs. Deputados e pergunto ao Governo aqui representado pelo Sr. Ministro dos Assuntos Sociais e pelo Sr. Secretário de Estado da Saúde, Dr. Paulo Mendo: qual é essa política?
Desfazer o Serviço Nacional de Saúde previsto na Constituição e regressar ao predomínio da actividade privada, à medicina concorrencial de cariz lucrativo é essencialmente curativo. Degradar o sector público e aniquilar os princípios fundamentais de qualquer serviço público de saúde, a generalidade, a universalidade e a gratuitidade. Estabelecer a convenção como
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base do sistema. Regressar, em suma, aos «bons velhos tempos» de antes da reforma de 1971. É a conclusão que resulta da prática política do Governo e das últimas tiradas de retórica do Sr. Ministro, quer no presente debate, quer na sua intervenção televisiva, a que ele também já se referiu, de 15 de Abril.
Nesta intervenção, cujas linhas gerais foram agora retomadas, o titular do Ministério dos Assuntos Sociais informou que o Governo vai tomar medidas de fundo para melhorar o rendimento dos serviços, alterar os hábitos de trabalho, proporcionar a realização profissional e humanizar os cuidados prestados. O PS apoiará, naturalmente, todas as acções que visem tais objectivos. Sabemos, porém, que, mesmo na concepção liberal do Governo, a política definida não conduz à melhoria dos serviços. São três as medidas anunciadas pelo Dr. Carlos Macedo: reformulação do financiamento do sector, alterações do grande ambulatório - ele queria dizer, talvez, cuidados primários, mas chamou-lhe de grande ambulatório - e preenchimento dos quadros de pessoal, especialmente na periferia.
Na concretização dessa política, o Governo propõe-se: criar um adicional ao Orçamento, que será ou a instituição de um seguro-saúde ou a transferência de verbas de fundos autónomos, que não especificou; extinguir os Serviços Médico-Sociais (1700 postos), transferindo as consultas gerais para os centros de saúde (cerca de 300) e os da especialidade para os hospitais e para o sector privado convencionado; preencher as vagas existentes sem o que chamou de «requisição administrativa», mas apenas pela criação de condições profissionais e materiais de colocação e mobilização; reforçar e ampliar a intervenção do sector privado, que deseja «pujante» - pasmem-se Srs. Deputados: «pujante»- através de, principalmente, novas convenções e estímulo à criação de consultórios de grupo; o sistema convencionado é, como se sabe, uma forma de exercício liberal da medicina, subsidiada pelo Estado... É isso que quer o Sr. Ministro; definição de uma política de medicamento, pela redução na comparticipação de 60 % para 40 % nos medicamentos importados, mas aumentando para 75 % a comparticipação dos considerados indispensáveis e sem similares nacionais, não se definindo o critério a adoptar para verificação da referida «indispensabilidade». E talvez este esteja um ponto que será objecto de esclarecimento, pelo menos assim o esperamos.
Entretanto, o Governo vai autorizar o aumento dos medicamentos em 40%, quando na altura em que essa medida foi anunciada pelos responsáveis do Ministério do Comércio, o Sr. Ministro Carlos Macedo disse não saber de nada - é natural que isso aconteça - e já sancionou igual aumento para os meios complementares de diagnóstico, situação que aqui há dias denunciei, pois os próprios interessados consideram excessivo esse aumento, facto que o Sr. Ministro me confirmou.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Vou analisar, com a rapidez que o tempo me impõe, algumas das medidas anunciadas, sem me deter em questões pontuais, já abordadas noutras oportunidades ou a problemas concretos que serão tratados pelos meus camaradas da bancada socialista. É minha intenção prestar um contributo, modesto mas sincero, para o presente debate.
O financiamento de um Serviço Nacional de Saúde digno desse nome tem de ser assumido pelo Estado, como decorre da Constituição. A gratuitidade impõe que não haverá pagamento directo dos utentes, pressuposto da igualdade de acesso, mas as taxas moderadoras não poderão funcionar como fonte de financiamento, Sr. Ministro. É por isso que condenámos na devida altura e continuamos a condenar com toda a veemência o seu aumento brutal e a criação de novas taxas, que são verdadeiramente limitativas da procura de cuidados de saúde por parte das camadas mais carenciadas, designadamente quanto a meios complementares de diagnóstico, cuja requisição nem sequer é da responsabilidade do doente.
O pagamento dos cuidados de saúde consoante a situação económica do utente -velha ideia do Sr. Ministro hoje aqui reafirmada -, embora com isenção para certos extractos populacionais, é o regresso à já referida trilogia do Estado Novo, que é os pobres ou indigentes, porcionistas e pensionistas. É essa a conclusão que se tira da sua intervenção, pois o Sr. Ministro diz claramente que deve haver um pagamento consoante a situação económica e eu digo que esse pagamento é mais feito consoante a situação social porque esta depende muitas vezes ou quase sempre da situação económica.
Ora, isto é o regresso à trilogia do Estado Novo, como é evidente; os Srs. Deputados vão ter oportunidade de me contestar e eu ficarei satisfeito se porventura não for essa a ideia do Governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Digo isto porque esse critério implica a divisão por classes. E, quanto a mim, o Estado quando assegura os seus serviços, quaisquer que eles sejam, deve tratar todos os cidadãos por igual. Naturalmente que se o Sr. Champaullimaud - por hipótese absurda - tomar um transporte público, o metro ou o autocarro, paga o mesmo que o reformado e o mesmo que eu porque o Estado não pode fazer distinção quando presta serviços à comunidade. Mas faz distinção certamente no sistema fiscal, taxando fortemente as classes mais desfavorecidas.
Srs. Deputados Sociais-Democratas, não será essa uma concepção social-democrata, ou os senhores não a reconhecem? Ela é, naturalmente, uma concepção socialista que eu perfilho.
Uma outra medida que o Sr. Ministro preconiza é a instituição do «seguro-saúde». Ora, a instituição do «seguro-saúde» baseia-se na mesma filosofia: quem tem dinheiro cobrirá todos os riscos; os pobres terão de limitar-se ao seguro geral obrigatório porque acontece o mesmo com todos os seguros. Nós transferimos para companhias de seguros certos riscos: por exemplo, as classes menos favorecidas que precisam de ter um automóvel, porque hoje o automóvel não é um luxo, fazem normalmente um seguro contra terceiros porque não podem cobrir todos os riscos, mas os ricos cobrem todos os riscos. É essa a filosofia do «seguro-saúde».
Contudo, na nossa concepção a doença não é um risco que possa ou deva, como os demais riscos, transferir-se para uma companhia ou uma instituição de seguros. A saúde é um bem colectivo, um direito fundamental, que não tem preço e que tem de ser garantido pelo Estado. E não se diga - como tantas
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vezes a imprensa de direito e a imprensa reaccionária têm dito, pois essa é uma das acusações demagógicas e não fundamentadas que nos fazem - que nós perfilhamos uma concepção estatal ou colectivista, pois quando nós, socialistas, falamos em Estado, naturalmente queremos significar o Estado democrático de direito, com a participação dos trabalhadores e dos cidadãos, e não excluímos a actividade complementar da medicina privada. Só que, em situações de carência, o cidadão não tem quem o proteja, salvo o recurso à caridade - e talvez os senhores queiram que se regresse à «caridadezinha» e até à organização de «chá canastas» para as pessoas que não podem pagar o seu internamento hospitalar ou as suas consultas, mas isso é um problema vosso.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, meus senhores, o cidadão, em situações de carência - e não há uma situação de carência mais grave do que seja a do doente - não tem quem proteja se não for o Estado. E naturalmente que o Estado tem de assumir no perfeito espírito de uma sociedade humanista avançada, a obrigação de assegurar o exercício efectivo do direito à saúde. É também por esta razão que o nosso modelo do Serviço Nacional de Saúde e, aliás, a filosofia da Constituição da República são profundamente democráticos e humanistas.
Quanto à extinção dos Serviços Médico-Sociais, estamos de acordo desde que isso represente a descaixificação da medicina. Esse é um dos objectivos da Lei n.º 56/79 que impõe a integração de todos os serviços prestadores de cuidados de saúde e considera como unidade básica o centro comunitário de saúde, destinado à prestação dos cuidados primários, no sentido definido pela Organização Mundial de Saúde. O Governo, porém, como mais uma vez hoje mostrou, ignora completamente o movimento mundial sobre cuidados primários e as conclusões da Conferência de Alma-Ata. Há tempos, num debate nesta mesma Assembleia, os Srs. Deputados da direita, ou melhor dito, os Srs. Deputados do PSD, do PPM e do CDS, insurgiram-se contra essas conclusões só porque a Conferência, realizada como sabem sob um alto patrocínio da ONU e da UNICEF, tinha sido efectuada na União Soviética - espero que hoje não usem o mesmo argumento.
Mas, a propósito, o anterior Ministro dos Assuntos Sociais, Morais Leitão - com quem, aliás, mantive sempre, e quero aqui dizê-lo, as relações mais cordiais, independentemente das divergências -, num debate televisivo que teve comigo, classificou as conclusões dessa Conferência, reconhecidas hoje por todos os Estados civilizados, como sendo «um atraso de vida». Não sei se o Sr. Dr. Carlos Macedo também considera essas conclusões como «um atraso de vida».
Mas, entretanto, por todo o Mundo, desde o Canadá à França, da Inglaterra à Suécia, se dá a maior prioridade à organização dos serviços de cuidados primários, articulando a prevenção e a cura, e com uma forte participação da comunidade. O Governo despreza as actividades preventivas e chega ao ponto de configurar o médico de saúde pública - como decorre da sua intervenção televisiva como mera «autoridade sanitária», uma espécie de polícia de mortos que certifica os óbitos e inspector de latrinas e matadouros, à moda inglesa do século passado ou portuguesa dos meados deste século!
Não basta, pois, mudar a tabuleta dos postos dos Serviços Médico-Sociais e anunciar demagogicamente a sua integração nos centros de saúde. É preciso realizar a integração no espírito de um Serviço Nacional de Saúde, salvaguardando a qualidade do atendimento pela criação de normas técnicas e pela avaliação permanente dos serviços prestados. Mas não é isso que o Governo vai fazer. Do que se trata é de introduzir no circuito o médico privado à actividade liberal - chamo a especial atenção dos Srs. Deputados de todas as bancadas para o facto de que no cerne desta questão está o problema que acabo de aflorar - através de várias formas, designadamente da convenção e dos consultórios de grupo. Nada temos - já o tenho dito várias vezes, mas repito - contra o exercício privado da medicina, ou de qualquer outra actividade lícita.
Contudo, dar aos mesmos profissionais a possibilidade absoluta de acumularem as suas funções nos serviços do Estado com a sua actividade particular e lucrativa é, conforme a experiência o mostra em todos os países do mundo, contribuir para a degradação do sector público da saúde. Naturalmente que o médico que da parte da manhã atende nos serviços públicos do Estado os seus doentes por não ter tempo ou por outra razão, especialmente porque tem da parte da tarde o seu consultório privado aberto, tende naturalmente a negligenciar os cuidados de saúde prestados nos serviços do Estado para aumentar a sua clientela. Isto é inevitável e não sucederia só com os médicos mas sim com todas as profissões em que fosse possível uma acumulação deste tipo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, o que o Governo quer é degradar o sector público, e se é assim está certo.
Eu estou a tentar dar-lhes algumas achegas. O Governo critica a oposição porque não apresenta alternativas mas nós, socialistas, temos há muito uma alternativa, temos um projecto coerente, constitucional e patriótico que é do Serviço Nacional de Saúde. Estou aqui no espírito, não direi de colaboração neste tipo de problemas, embora possa haver colaboração da nossa parte, e haverá, desde que o Governo a mereça e esteja, efectivamente, interessado em melhorar a saúde do povo português e é portanto nesse espírito que estou a apresentar-lhe algumas alternativas.
Portanto, o que há que fazer, Sr. Ministro, bem pelo contrário, é fomentar o regime da exclusividade através de remuneração compatível, dos incentivos de carreira, da segurança social e da valorização profissional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os consultórios de grupo ou sociedades encapotadas - não vejo bem o que serão consultórios de grupo, não sei se são realmente conjunto de médicos que se associam para emprestar no mesmo local os seus cuidados privados de saúde integra-
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dos no sistema convencionado - constituem outra machadada nos serviços públicos, com a agravante de possibilitar, ainda mais, a fuga aos impostos, porque, naturalmente, em consultório de grupo que funcionam como sociedades, os senhores doutores compram um automóvel e debitam-no como despesa da própria empresa fugindo assim aos impostos. Não bastando já os expedientes que hoje usam como, por exemplo, não se passa recibos, o Sr. Ministro acaba de anunciar que vai criar outro dispositivo importantíssimo nesse sentido. Mas esta, meus senhores, é a lógica da direita, o pagamento da factura é actual direcção da Ordem dos Médicos...
Vou agora referir-me ao velho problema do preenchimento de vagas na periferia. Temos actualmente 1 médico e 1 enfermeiro para 430 habitantes, segundo estatísticas oficiosas do Ministério - as estatísticas não estarão publicadas a esse título mas os elementos de que disponho provêm do próprio Ministério em publicações semioficiosas. Contudo, permanecem as graves assimetrias que todos conhecemos, que já denunciei várias vezes e que fazem com que 80 % dos médicos continuem apenas nas três maiores cidades portuguesas, enquanto no interior do País e mesmo no litoral subsistem largas faixas populacionais e geográficas sem a menor cobertura sanitária. A situação é lapidarmente descrita pelo Prof. Gonçalves Ferreira, reputado técnico do Ministério dos Assuntos Sociais no seu estudo publicado na separata dos Arquivos do Instituto Nacional de Saúde, vol. V, de que cito a p. 93:
Boa parte do pessoal, sobretudo médico e de enfermagem, reparte a sua actividade profissional por diversas dependências, em regimes de acumulação ou de horas extraordinárias praticamente incontroláveis [...]
A propósito disto, permita-se-me que introduza mais um elemento ainda a respeito dos gastos. O Sr. Ministro falou nos gastos das camas, das consultas e dos internamentos, mas não teve uma palavra para condenar os gastos supérfluos. Por exemplo, a respeito de horas extraordinárias, como o Sr. Ministro bem sabe ou talvez não saiba e eu informo-o, em 1979 só nos hospitais centrais e distritais, o Estado pagou 1 200 000 contos em horas extraordinárias, e há médicos - a culpa não é deles, eu não acuso pessoas mas critico o sistema - que recebem por mês 100 contos ou mais de horas extraordinárias. Ora, o mais grave é que muitas dessas horas não são realmente feitas.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Que vergonha!
Vozes do PSD: - Quem era Governo em 1979?
O Orador: - «Desta dispersão resultam multiplicações de estatutos profissionais, com baixos níveis de produtividade individual e por equipas. Igualmente grave é a sua irregular distribuição geográfica, fixando-se, em alta percentagem nas três maiores cidades do País e deixando que se acentue a rarefacção no interior do País e nas ilhas.
Os erros acumulados na gestão das diferentes carreiras profissionais conduziram a um agravamento das assimetrias na distribuição dos recursos humanos.
Os hospitais centrais continuam superlotados de médicos em regime de tempo parcial, enquanto na periferia a falta destes é enorme. O pluriemprego está generalizado e o posto de trabalho é frequentemente apenas um local de passagem para outros postos de actividade.» Isto são palavras de um reputado técnico do Ministério.
Perante esta situação, que o Sr. Ministro conhece bem, suponho, só há uma forma de resolver o problema e assegurar a cobertura de todo o País, onde não faltam instalações e equipamentos: criar carreiras nacionais para todos os técnicos de saúde, como acontece para os restantes funcionários públicos - e os Srs. Deputados da Aliança Democrática não se assustem com a categoria de funcionário público que eu dou a todos aqueles que trabalham para o Estado e que é, aliás, a classificação da própria Constituição; talvez não saibam que 98 % de todos os médicos portugueses trabalham para o Estado, logo são funcionários públicos e portanto não se trata de uma funcionalização no sentido que é gostoso para os senhores atribuir-me -, que permitam e imponham a sua colocação em qualquer lugar do território nacional, onde existam, como é óbvio, os recursos e condições indispensáveis. Não se trata de mobilizar estes profissionais, nem de proceder à sua requisição administrativa, mas apenas de seguir o critério de todos os concursos públicos.
Acabar-se-ão, assim, com os contratos a prazo, com o escândalo das horas extraordinárias, a superlotação de médicos nos hospitais centrais, preenchendo-se as vagas existentes nos distritais, que trabalham actualmente, com 60 % do pessoal. E sobretudo, garantir-se-á, ao «país real», tradicionalmente abandonado, uma das condições essenciais ao progresso e bem-estar: o direito à saúde.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A grande «medida» deste governo, que representa a cúpula de todas as acções já desencadeadas ou a desencadear - e a que ainda me não referi, pois queria deixá-la para o final desta intervenção - será a apresentação há tanto tempo anunciada a esta Assembleia de uma proposta legislativa que revogue a actual Lei do Serviço Nacional de Saúde e crie o «serviço de saúde» da AD. Não se trata de «revanchismo», diz o Ministro - disse-o na sua comunicação televisiva. Apetece-nos rir se o caso não for para chorar! Se os conservadores portugueses fossem como os britânicos, e respeitassem as leis democráticas, teriam, à semelhança dos seus pares ingleses - que aplicaram a lei do NHS aprovada pelo governo trabalhista de Bevan- respeitada a Lei n.º 56/79. Não o fizeram, porque lhes falta o sentido do Estado, a vivência democrática, o respeito pelos direitos fundamentais do povo português.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr Pedro Roseta (PSD): - É falso!
O Orador - Não sei é como poderá a AD fazer aprovar - já não digo promulgar - uma nova lei que se afasta dos princípios definidos pela Consti-
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tuição, certo como estou de que o seu artigo 64.º não será minimamente beliscado. O PS e os seus parceiros da FRS não o permitirão!
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Faço-lhe um desafio, Sr. Ministro: se quer, como afirmou na sua intervenção televisiva e hoje aqui repetiu, que uma lei desta natureza e importância não tenha um carácter sectário, nem colida com o princípio da alternância do poder, e não seja periodicamente sujeita a alterações conforme a maioria dominante, deixe estar a Lei n.º 56/79 e cumpra-a! Nenhuma lei é perfeita e esta poderá ser oportuna e eventualmente revista, conforme a experiência o aconselhar, à luz da melhoria, eficiência e dignificação dos serviços de saúde. O próprio programa da FRS assim o prevê. Mas, por favor, Sr. Ministro - e também Sr. Secretário de Estado da Saúde, cuja opinião favorável ao projecto socialista várias vezes expressou -, por favor, dizia, não tentem desvirtuar ou esvaziar a lei vigente do seu profundo sentido humanista, afrontando o preceito constitucional de um serviço nacional de saúde, geral, universal e gratuito, de cariz socializante - e só socializante, Srs. Deputados do PSD. Experimentem primeiro e corrijam depois.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Não escondo o meu cepticismo a este respeito. Mas seria desejável, em nome do interesse do povo, encontrar um espaço de consenso, se da parte do Governo houver seriedade e vontade política para o conseguir. Se quisermos evitar sectarismos e mudanças bruscas num sector tão sensível, respeitemos a Constituição, embora ela nos possa suscitar algumas discordâncias pontuais - a mim não. Porque a Constituição, meus senhores, é a verdadeira plataforma de entendimento entre os democratas portugueses.
ste é o teste da boa fé que proponho ao Governo e às forças que o apoiam, sobretudo ao PSD e ao PPM. É, de resto, o caminho imposto pela esmagadora maioria dos portugueses, profissionais e organizações de saúde - excluindo a actual direcção da Ordem dos Médicos -, autarquias, mesmo da AD, organizações populares e culturais, associações de reformados e deficientes, e pelas duas centrais sindicais: a UGT e a CGTP-Intersindical. Porquê, então, senhores do Governo e da maioria parlamentar, afrontar o sentimento dos Portugueses e tentar inverter o «devir» histórico?!
Os senhores vão retorquir que o voto popular do 5 de Outubro vos confere legitimidade democrática para alterar as leis. Não o contesto, embora pudesse contrapor o apoio generalizado da população ao Serviço Nacional de Saúde e pudesse, ainda, invocar as eleições presidenciais de 7 de Dezembro, que constituíram uma clara manifestação de apoio ao projecto e ao regime constitucional.
O povo tem, de facto, o Governo que quer. Mas perante a política desastrosa seguida pela AD e se mais este atentado à Constituição e aos interesses profundos do País se consumar, o povo não terá, com certeza, o Governo que quer nem que merece.
O Sr. Ministro ,- que é médico - sabe que, como disse Hipócrates, a doença é normalmente curada pelas próprias «influências» que origina. Também este Governo, que nasceu e continua gravemente enfermo, será «curado» por causa dos grandes males que está fazendo ao País...
Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, lamentar algumas afirmações do Sr. Deputado António Arnaut, pessoa que muito estimo, quando se referiu - procurando criar a divisão dentro do nosso grupo parlamentar - a sociais-democratas autênticos, dando a entender que haveria outros que o não seriam e procurando fomentar a divisão dentro do nosso grupo parlamentar. Eu aconselharia o Sr. Deputado António Arnaut a não procurar fazê-lo, até porque não o consegue, e, acima de tudo, a olhar para o seu próprio partido e a procurar uni-lo até porque hoje a sua equipa de saúde está frágil, o que nós, de alguma maneira, lamentamos.
Não vou comentar uma grande parte da intervenção do Sr. Deputado, mas fiquei com a certeza de que o Sr. Deputado, enquanto Ministro, não melhorou o presente de então. Não tomou medidas para melhorar o futuro enquanto Ministro, mas pelo menos aproveitou, para si, saber história da saúde em Portugal. Mostrou o Sr. Deputado uma grande preocupação sobre a rede de cuidados primários, mas quero dizer-lhe que a maioria tem esperança e a certeza de que este governo vai, pela primeira vez, cobrir o País de uma verdadeira rede de cuidados primários de saúde.
É isso que se pretende quando se afirmou, com uma linguagem que aparentemente pode parecer um pouco radical, a extinção dos Serviços Médico-Sociais e que os seus técnicos, nomeadamente a grande quantidade de pessoal administrativo e de pessoal de enfermagem seriam integrados nos Centros de Saúde onde iriam dar um grande apoio. Todos nós sabemos que há concelhos com boas unidades de Centros de Saúde que não podem dar cuidados completos porque têm por norma escassez de pessoal de enfermagem que sobra de alguma maneira nos Serviços Médico-Sociais onde prestam apenas serviços administrativos. Esta integração será um processo de se fazer pela primeira vez, e felizmente tinha de ser com um governo da AD a fazê-lo, uma rede de cuidados primários no País.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador - Falou depois o Sr. Deputado António Arnaut sobre o problema da exclusividade dos médicos. Gostava de lhe dizer que é muito do agrado do seu partido o Serviço Nacional de Saúde inglês e referiu até que tinha sido feito por um trabalhista. Recordo-lhe que o Serviço Nacional de Saúde inglês permite a adesão livre dos clínicos gerais ao Serviço Nacional de Saúde e permite também que esses médi-
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cos de clínica geral e os outros médicos especialistas façam o seu serviço de medicina privada, o que se compreende.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - E em Portugal?
O Orador: - Falou também com certo humor, o que eu compreendo por um certo desconhecimento do Sr. Deputado, sobre os consultórios de grupo. Queria dizer-lhe que esse mesmo Serviço de Saúde inglês fomenta os consultórios de grupo, e fomenta-os porquê? Porque sai muito mais barato em termos de apoio administrativo e de apoio de técnicos de saúde que não sejam médicos, como, por exemplo, os enfermeiros, etc. - e são eles que os fomentam. Seria perfeitamente errado que nós, aqui em Portugal, não aprendêssemos um pouco com a experiência daquilo que há de bom nos outros países e seria bom que não fizéssemos humor quando não se tem conhecimento, ou se se tem faz-se então humor de má-fé, o que penso que o Sr. Deputado não terá feito.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut, para responder.
O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Jaime Ramos, quem está a ser interpelado é o Governo, pelo que não vou deter-me em respostas a questões concretas e desde já advirto os ilustres colegas da AD de que não será esse o nosso objectivo nem o nosso papel porque o tempo de que dispomos é limitado. Em todo o caso, não quero deixar sem resposta algumas observações do Sr. Deputado Jaime Ramos, ilustre clínico do meu distrito. Eu não quis introduzir nenhuma divisão no seio... - não gosto muito desta palavra mas enfim... - da AD e muito menos no PSD. Não é disso que se trata e de facto reconheço que há sociais-democratas no seu partido, entre os quais o Sr. Deputado Jaime Ramos, a avaliar pelo nosso já longo conhecimento que muito me aprazo registar e até a nossa amizade.
O Sr. Deputado referiu-se a uma coisa que muita vez tem dito e porventura com alguma razão, reconhece-o com humildade, que enquanto fui Ministro os serviços de saúde não melhoraram ou pouco melhoraram. Eu estive no Governo menos de sete meses, graças à crise aberta pelo CDS,...
Uma voz do PSD: - Felizmente!
O Orador: - ... e como os Srs. Deputados sabem foi justamente porque o Partido Socialista, que é um partido honrado e que sabe assumir os seus compromissos, não cedeu nem uma vírgula - como eu dizia - que a crise se deu. Nós temos um projecto coerente e assumi-lo-emos até ao fim. Mas de facto os serviços não melhoraram muito. Em todo o caso alguma coisa se fez e pelo menos - já aqui o disse há pouco -, foi no II Governo Constitucional que pela primeira vez a população portuguesa ficou coberta de forma geral e gratuita pelos maus serviços que temos, é evidente, mas pela primeira vez ficou coberta e naturalmente a AD não vai revogar essa medida.
Por outro lado, o que o meu ministério se propunha era em primeiro lugar, como é evidente, necessário e intuitivo, definir uma política global de saúde e depois executá-la. Nós nessa altura tínhamos um horizonte, julgava eu, na minha ingenuidade de político da província, que nunca enjeito porque faço até questão de o afirmar: Conheço um pouco o País, sou um homem do povo e isso talvez me dê alguma vantagem em relação a outros políticos que apenas conhecem pouco mais do que os bastidores desta Assembleia ou dos sítios onde costumam encontrar-se nas recepções mundanas.
Não me deram tempo e ao fim de pouco mais de seis meses o CDS abriu a crise, não houve mais tempo de fazer aquilo que estava no nosso objectivo e que era o nosso compromisso. Por isso o Sr. Deputado não me venha dizer que durante o tempo em que assumi essas responsabilidades não se fez nada porque o Sr. Dr. Carlos Macedo ainda agora disse que não teve tempo de fazer e este governo já está há ano e meio. Bom, mas o Sr. Ministro poderá dizer que está apenas há quatro meses mas então isso quererá dizer que repudia a acção do Governo anterior, o que penso não ser o caso.
Risos.
Quanto à exclusividade dos médicos ou ao regime de tempo completo, é evidente, Sr. Deputado, que temos de criar incentivos a essa exclusividade. Só assim se podem melhorar os serviços de saúde. O Sr. Deputado invoca-me o sistema inglês que inspirou o nosso projecto. Quem inspirou fundamentalmente o nosso projecto foi a Constituição, mas buscámos também outras experiências. Se na Inglaterra esses clínicos livres podem exercer a actividade em termos complementares do seu exercício público, também aqui nos próprios termos de lei vigente isso é possível.
Simplesmente a base do Serviço Nacional de Saúde terá de ser os serviços públicos e só em casos excepcionais, quando esses mesmos serviços não possam prestar os cuidados de saúde, então é que a própria lei admite - e é natural que o faça -, o recurso à convenção, mas a base e a filosofia do sistema tem de ser a prestação dos cuidados de saúde pelos serviços públicos. E isso por uma única razão: é que desde que consideramos que a saúde é um direito fundamental como o direito à liberdade de expressão, à educação, ao trabalho e à liberdade religiosa, é óbvio que o Estado, qualquer que seja, tem de garantir esse direito e tem de o garantir através dos serviços públicos.
Também há instituições particulares de educação, mas em todo o caso é o Estado que garante, através dos seus serviços, esse direito fundamental que também é a educação. De resto, poderia também dizer-lhe o mesmo em relação aos países capitalistas da CEE que os Srs. Deputados costumam invocar e até trazer o argumento nesta altura em que nós nos preparamos para entrar na CEE. Claro que nós, socialistas, quando falamos na Europa é na Europa dos trabalhadores, não é na dos capitalistas. Mas mesmo nesses países da CEE, como o Sr. Deputado sabe, mais de 90 % dos médicos que prestam serviços nos hospitais estão a tempo inteiro. Bom, o tempo não me permite alongar mais, os meus camaradas ainda
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irão intervir e porventura eu, se ainda houver tempo. Meus senhores, não pensem que vamos desistir, a luta continua.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
Risos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes para proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O relatório e parecer é do seguinte teor:
Comissão de Regimento e Mandatos
Relatório e parecer
Em reunião realizada no dia 5 de Maio de 1981, pelas 14 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de Deputados:
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira (círculo eleitoral de Setúbal), por Francisco Mendes da Costa. Esta substituição é pedida por um período não superior a um mês.
Júlio de Castro Caldas (círculo eleitoral de Viana do Castelo), por Germano Lopes Cantinho. Esta substituição é pedida por um período não superior a cinco meses, a contar do dia 1 do corrente.
Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:
António José Tomás Gomes de Pinho (círculo eleitoral de Lisboa), por José Alberto de Faria Xerez. Esta substituição é pedida por um período não superior a quinze dias.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por maioria, com a abstenção do deputado da União Democrática Popular.
A Comissão: Mário Júlio Montalvão Machado (PSD), presidente - Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS), secretário - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) secretário -Anónio Duarte e Duarte Chagas (PSD) - Mário Marques Ferreira Maduro (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS)- João Alfredo Félix Vieira Lima (PS) - Afredo Pinto da Silva (PS) - Maria José Paulo Sampaio (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP)- Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - António Cardoso Moniz (PPM) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - Helena Tâmega Cidade Moura (MDP) - Mário António Baptista Tomé (UDP).
O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação do relatório.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PCP, do PPM, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e a abstenção da UDP.
Continuando o debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Calhordas.
O Sr. António Calhordas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não se estranhe que as minhas primeiras palavras como deputado do MDP/CDE na Assembleia da República, sejam para saudar o próprio Parlamento, expressão da vontade democrática de um país liberto pela luta heróica do seu Povo.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador - É com um misto de intensa emoção e alguma perplexidade que aqui participo na discussão do problema da saúde.
A emoção resulta de o poder fazer nesta Assembleia, depois de ao longo de anos, tantos quantos tenho de profissão, o ter feito nas mais diversas ocasiões e em múltiplos locais e circunstâncias.
A perplexidade surge pelo facto de virmos ouvindo da parte do responsável do Governo no sector da saúde, a defesa de conceitos e propostas de soluções que há duas dezenas de anos, o responsável governamental de então, noutros tempos e noutras circunstâncias em pleno fascismo, já evitava fazer para não cair na ridícula situação de ser considerado obsoleto e para não se colocar em frontal discordância com o pensamento dominante no largo movimento de opinião que à escala de todo o País então se constituiu.
Aplausos do PCP e MDP/CDE.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Serviço Nacional de Saúde (SNS) constitui de há muito em Portugal uma expressão que adquiriu a força de um fenómeno enraizado numa cadeia de acontecimentos e de um
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projecto inerente à transformação da própria sociedade portuguesa.
A manutenção da saúde de cada indivíduo, é hoje aceite, já não pode depender só da sua vontade ou das suas possibilidades. Transformou-se jurídica e politicamente nos nossos dias num direito existencial da pessoa humana, num direito social de cada cidadão e num dever do próprio Estado.
Trata-se de princípios que ninguém ousa desmentir ou contradizer mas que, todavia, quando transportados para a realidade da sua execução, sofrem uma clara distorsão porque se lhes junta subtilmente um feixe de eufemismos que reaparecem com o ar dos grandes e imutáveis princípios.
Assiste-se assim, aqui mesmo em Portugal e neste domínio a uma propositada deformação da Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde, aprovado nesta Assembleia em 1978, que procura com requentados conceitos impedir a sua implementação colectiva, desvirtuar a sua execução e enfeitá-la com os falsos valores de um humanismo personalista e abstracto e com brilhos ofuscantes de tecnocracia.
O resultado desta manobra não tem sido, porém, suficiente!
Daí que o actual governo anuncie então a sua modificação radical - uma nova lei de saúde - de acordo com a sua perspectiva de classe e as suas submissões a grandes interesses nacionais e internacionais que não são os do povo português.
A este propósito e perante este anúncio cabe-nos fazer ao Governo um claro desafio (é o segundo porque o Sr. Arnaut já fez o primeiro): fazer preceder a entrega nesta Assembleia da sua nova lei, do seu conhecimento e debate públicos por toda a população e sectores interessados.
Será o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais capaz de usar da coragem política e da clareza de processos que foram então usados pelo Dr. António Arnaut e pelo Partido Socialista quando se criou neste país uma riquíssima dinâmica à volta dos problemas da saúde?
Se se sente seguro, Sr. Ministro tenha essa coragem e essa iniciativa e veremos os resultados!
Vozes do MDP/CDE, do PCP e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem sido claro na discussão aqui realizada que o Governo tem da saúde o conceito ultrapassado do século XIX e da prestação dos cuidados médicos um conceito mercantilista, qualquer deles objecto hoje de críticas profundas e de tentativas de modificação das estruturas nos países da Europa capitalista, paradoxalmente aqueles que o Governo e os seus apoiantes querem tomar como modelos.
Mais uma vez e também aqui este governo se encontra de costas voltadas para os interesses do nosso povo e para a realidade do próprio País e da própria evolução do mundo que lhe é próximo, enterrado obsessivamente numa dinâmica de alienação de tudo o que tem a ver com o sector público.
Sem poder ou pretender no escasso tempo disponível abordar muitas das importantes questões que aqui se discutem, cinjo-me, por agora, apenas a duas das mais importantes coordenadas de orientação do Governo no sector da saúde.
A primeira diz respeito à atitude perante os Serviços Médico-Sociais (SMS).
Afirma-se com cariz demagógico a necessidade de os extinguir. Mas o que há muito propomos não é a sua extinção, mas a sua integração e o aproveitamento equilibrado das suas potencialidades e dos seus recursos materiais e humanos de forma a transformar a estrutura das caixas em centros de saúde comunitária ou extensões, de consulta ambulatória de uma rede hospitalar racionalizada e regionalizada, com estreitas ligações orgânicas e funcionais com os hospitais.
Só assim se criarão locais de actividade médica e de cuidados de saúde modernos e eficazes, completamente remodelados nos seus fundamentos, nas suas formas de trabalho, no seu equipamento profissional e técnico, nos seus objectivos e na sua interligação com as restantes estruturas sanitárias.
É isto que a população espera e deseja.
A população não repudia os postos das caixas, como não repudia os hospitais por eles terem esse nome ou por se tratar de uma medicina de Estado. Ela repudia-os pela qualidade dos benefícios que deles recebe e pelo ambiente de desconforto físico e moral que neles encontra, apesar dos esforços dos trabalhadores de saúde que neles actuam.
O que significa para o Governo fazer passar os Serviços Médico-Sociais para a área da medicina convencionada?
Será o eventual aluguer ou a venda de postos das caixas ao sector privado? Se é isto, além da alienação patrimonial que tal acto representa, como se garante que vá melhorar a qualidade da medicina praticada?
O MDP/CDE entende que o que se exige não é a afirmação populista da extinção dos Serviços Médico-Sociais para os substituir pela aventura de uma política de saúde mais dispendiosa, e os números hão-de vir no decorrer deste debate, de qualidade incerta e sobretudo incontrolável, mas sim, a profunda transformação dos Serviços Médico-Sociais nos moldes de uma medicina moderna ao serviço de uma saúde de qualidade e não da especulação da doença.
A segunda questão que se interliga aliás com a anterior refere-se à implementação nacional pelo próprio Estado de um esquema de «medicina convencionada», como subsistema de prestação de cuidados diferenciados. Parte o Governo do pressuposto, completamente errado, como já hoje aqui se demonstrou com argumentos irrefutáveis que me escuso de repetir, que será possível uma concorrência ou emulação vantajosa entre o sector público e o sector privado, quando a experiência tem demonstrado o contrário, pois são diferentes os critérios de actuação porque eles se regem.
Há 20 anos em Portugal, como o Sr. Ministro não deve esquecer, os médicos, postos perante a discussão séria e profunda destas questões, já não ousavam apresentar tais soluções, embora elas fossem naturalmente ao encontro do interesse de uns tantos, mas a discussão então era conduzida, antes de tudo, na perspectiva clara do interesse das populações e da saúde do País...
Vozes do MDP/CDE e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... o que não acontece agora com a discussão feita por este governo.
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Que tal esquema não corresponde de resto ao interesse real da grande maioria dos médicos já aqui foi demonstrado pelo número daqueles que aderiram ao sistema de convenção.
Tem de se concluir que quando um governo apresenta tal tipo de soluções pretende com isso alhear o Estado da saúde da população s de resto já aqui hoje o Sr. Ministro amplamente o demonstrou. O Governo entrega-a à iniciativa individual e à medicina privada! É ponto assente que o nível da saúde está inteiramente dependente do nível da medicina institucional pública, a única que tem capacidade para formar quadros e técnicos, não sendo a inversa verdadeira, contrariamente ao que o Sr. Ministro afirmava há dias na televisão e hoje aqui de novo insinuou.
Não se pretende com isto coarctar ou impedir a actuação realista da medicina privada, mas tão-somente considerar que não é ela uma actividade que ao Estado incumbe fomentar e financiar porque ela mais não é senão aquilo que a medicina pública não for.
O Estado não pode simultaneamente preocupar-se em fomentar uma e outra, pois terá forçosamente de optar, e a Constituição é clara e não permite saídas.
Posto isto, e a terminar, cabe neste sentido aqui fazer algumas perguntas pertinentes:
Como vê possível o Governo que as administrações de saúde dentro das atribuições de planear tudo quanto à saúde diz respeito com a autonomia e a autoridade que todos lhes queremos conferir, possam gerir e interferir no sector privado da saúde, por seu direito e natureza livre e não hierarquizado?
Sendo certo que a medicina pública, como se sabe, não escolhe nem pode escolher os doentes por critérios de rendibilidade - atende-os a todos sem excepção -, enquanto a medicina privada, sobretudo quando se trata de hospitalização, selecciona naturalmente os doentes, por critérios de rendibilidade - só aceita alguns -, pergunta-se: Em que bases serão estabelecidos os convénios com a hospitalização privada? Encontram-se de facto completamente esgotados os recursos e potencialidades do sector público e são os convénios apenas um factor supletivo ou de complementaridade?
Pensa o Governo que com a larga implementação da convenção se vai elevar a qualidade da medicina praticada, se desenvolve a investigação médica, se vai melhorar a preparação dos milhares de profissionais de medicina e da saúde e se lhes garante as indispensáveis condições de estabilidade profissional e de segurança social das suas carreiras, por que há tanto tempo se batem?
Aplausos do MDP/CDE, do PS, da ASDI, da UEDS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.
O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: - 1981 - Portugal. País situado na Europa.
18000 médicos, mais de dois terços residindo na zona litoral do País. Cerca de metade, exercendo cumulativamente funções nos Serviços Médico-Sociais, onde a principal tarefa é o preenchimento de uma receita - 2,4 receitas por doente que recorre aos Serviços Médicos-Sociais.
O doente já não vai ao médico para ser observado, vai a um balcão buscar uma receita.
A grande mistificação actual reside neste facto essencial: o doente munido de uma receita pensa que desta forma terá mais saúde.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Faltam cerca de 4000 enfermeiros para a promoção e preservação da saúde, mas existem cerca de 4000 enfermeiros preenchendo funções meramente burocráticas nos Serviços Médico-Sociais.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - 16 milhões de contos gastos em 1978 nos Serviços Médico-Sociais. Cerca de metade dessa verba consumida em medicamentos.
Portugal, país da Europa, detém um lugar cimeiro no pluralismo e na quantidade de especialidades farmacêuticas - muitas obsoletas e algumas de comercialização proibida nos países da CEE -, situação que para além dos riscos que faz correr ao cidadão origina um consumo espantoso per capita de medicamentos.
O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Qual o benefício deste investimento?
Continuamos a possuir as maiores taxas de mortalidade e morbilidade da Europa. Morresse, portanto, em Portugal mais, mais cedo mas paradoxalmente mais medicado.
Na área da medicina da zona geográfica onde trabalho, um número significativo de crianças, embora profusamente medicadas, chegam-nos com graves carências alimentares, por vezes causa de morte.
Quer isto dizer: é mais fácil em Portugal adquirir um medicamento caro e muitas vezes dispensável que certas proteínas essenciais baratas.
Vozes da UEDS, do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Neste Ano Internacional do Deficiente não podemos deixar de apontar um outro aspecto grave.
Em 1980 nasceram cerca de 180 000 crianças em Portugal, 5800 morrem na primeira semana de vida, 11 600 sobrevivem com deficiências permanentes e graves.
Em certos distritos do País 85 % dos partos passam-se sem qualquer tipo de assistência. E o grave é que numa percentagem significativa estes números poderiam diminuir para valores próximos dos da Europa Central se fosse implementado um sistema simples, lúcido e integrado de cuidados primários destinados à mulher grávida e ao recém-nascido.
Vozes da UEDS, do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não é segredo para ninguém que em matéria de saúde materna e infantil - pontos de referência fundamentais para apreciar a qualidade de
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vida de uma população - os nossos índices obtêm comparação com os dos países europeus há cerca de vinte e trinta anos.
Encontramo-nos assim nesta matéria em relação à Europa no pós-guerra.
O diagnóstico da situação é pois grave e o prognóstico reservado se não forem tomadas medidas terapêuticas corajosas, exequíveis e adequadas.
Para a UEDS a construção da clássica pirâmide de saúde tem obviamente de iniciar-se pela base - os cuidados primários de saúde.
Para a UEDS não é concebível que se inicie (como parece ser a vontade da actual maioria parlamentar) tal construção pelo vértice.
Arriscar-nos-íamos assim a curto prazo a constatar uma derrocada e a falência do investimento. E o grave é que mais uma vez quem pagará as consequências de tal política serão as classes mais carenciadas de cuidados de saúde.
É pois necessário que claramente cheguemos a um consenso sobre a necessidade de se considerarem os cuidados primários de saúde não como óptica maléfica de alguns espíritos perversos, mas sim como a solução correcta do problema como aliás tem sido provado pelas experiências feitas em todo e qualquer país onde, independentemente da ideologia política dos seus governantes, se pense realmente e com lucidez que o essencial tanto do ponto de vista da qualidade de vida do cidadão como do ponto de vista económico é promover a saúde, prevenir e cuidar da doença e reabilitar a deficiência por ela provocada...
A medicina curativa seria boa se curasse.
Vários riscos se correm, contudo, neste momento que nos fazem prever um prognóstico reservado e as medidas terapêuticas que vêm sendo aplicadas ou sugeridas apenas contribuem para um agravamento do estado de saúde do doente que é este país.
O que temos visto?
Em primeiro lugar, inexistência de uma real política de saúde. Existem apenas medidas fraccionadas quantas vezes contraditórias e frequentemente demagógicas. Tais medidas têm sido apresentadas não com a preocupação pedagógica de informar e formar os cidadãos, mas ao contrário de uma forma tantas vezes manipuladora e abusiva.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Esconde-se o diagnóstico ao doente e criam-se-lhe falsas esperanças.
Alguns exemplos: afirma-se que o utente será atendido de forma mais humanizada e eficiente nos serviços de atendimento permanente, mas mais não se fez do que transplantar para outros locais os mesmos vícios já existentes nos Serviços Médico-Sociais e nos bancos dos hospitais.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Inventou-se mais um balcão de receitas por onde o doente terá de passar.
Mais: quando nos países europeus, face ao clima económico frio que se vive desde 1972, o sistema convencionado é posto seriamente em causa propõe-se espantosamente para este país economicamente débil uma gentil imitação.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Tal sistema, que contactei de perto pessoalmente durante longos anos num país europeu, e caracterizado por dois elementos fundamentais: por um lado, alto custo não orçamentado e progressivo. Ausência de planificação. Incentivo ao exagero do número de consultas e excessiva medicalização. Por outro lado, necessidade de um controle rígido dos custos que não se prevê - antes pelo contrário - como será praticado no nosso país.
Sejamos claros: a UEDS entende e apoia duas medidas terapêuticas vitais para a resolução de alguns problemas de saúde em Portugal:
1.ª Criação urgente de um sistema de saúde cuja base seja constituída por uma rede integrada de cuidados primários de saúde;
Vozes da UEDS e do PCP: - Muito bem!
O Orador
2.º Criação de condições que permitam a fixação dos técnicos de saúde em tempo completo e dedicação exclusiva nas instituições de saúde.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador
Evidentemente que esta medida implica a profissionalização dos médicos nas instituições de saúde.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador. - No referente ao primeiro ponto e para não ferir susceptibilidades ideológicas de alguns, dir-lhe-emos que o consenso é universal. Por exemplo, nos EUA criaram-se dezenas de departamentos de medicina comunitária e de medicina da família nas faculdades de medicina.
Construíram-se e equiparam-se milhares de centros de saúde prioritariamente nas zonas mais desmedicalizadas. Mais perto de nós, o Conselho da Europa aprovou em 1977 a resolução sobre o clínico geral, elemento essencial para o desenvolvimento harmonioso e eficaz deste tipo de política de saúde.
Finalmente, em 1978 em reunião promovida pela OMS e pela UNICEF foi consagrado o princípio da relevância dos cuidados primários de saúde sobre qualquer outro sistema, isto se os países, independentemente dos sistemas de orientação política e económico preponderantes, pretenderem de facto o bem-estar das populações, dado que a saúde dos Portugueses não é propriedade dos partidos e muito menos do Governo.
Vozes da UEDS, do PS, do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!
O Orador. - As medidas propostas pela conferência da OMS e UNICEF foram e estão a ser aplica-
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das tanto por países de economia débil como por países de economia forte, demonstrando que tal filosofia não se aplica apenas aos países subdesenvolvidos e demonstrando também que os cuidados primários de saúde, vistos como uma ameaça por muitos responsáveis da saúde em Portugal, são efectivamente uma medida altamente eficaz de, fornecendo saúde e impedindo a doença, moderar significativamente o crescimento dos gastos neste sector, desde que devidamente planificado e orçamentado.
Parece lamentavelmente não o entender assim o poder executivo por razões que já anteriormente apontámos.
A UEDS pensa, portanto, que esta medida urgente - a integração de todos os serviços de cuidados primários (SMS, centros de saúde, dispensário do instituto maternal, etc.) numa unidade orgânica local - o centro de saúde - com órgãos regionais dotados de responsabilidades e autonomia efectiva e de importância vital para a promoção e conservação da saúde dos Portugueses.
O centro de saúde deverá, sem deixar de descuidar o sector curativo, orientar as suas acções no sentido do desenvolvimento dos conhecimentos que o cidadão deve ter para preservar a sua saúde e promover a saúde do seu agregado familiar e da comunidade onde se insere.
A responsabilidade dos cuidados primários deverá estar a cargo de clínicos gerais, enfermeiras de saúde pública e pessoal paramédico, prestigiado, profissionalizado e convenientemente retribuído!
Para tal será forçoso rever, a nível das escolas e das instituições de saúde, o tipo de formação pré e pós-graduado, actualmente degradado e desmotivador.
Uma última palavra sobre o segundo ponto: o profissional de saúde.
Não é pagando-lhes mal em vários locais ao mesmo tempo que os utentes e o Estado beneficiam. Acabe-se definitivamente com o escândalo e a ambiguidade que o pluriemprego representa - em particular, o pluriemprego médico.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador - Responsabilizem-se e dêem-se garantias sociais e económicas aos técnicos a trabalhar nas instituições de saúde.
Exija-se então o cumprimento dos seus deveres para com o cidadão e para com a instituição e tenha-se a coragem de resolver definitivamente o problema da responsabilidade civil dos técnicos de saúde.
Quem não estiver interessado em trabalhar nestes moldes continuará a ter um caminho - a medicina livre -, que poderá sem dúvida ter funções supletivas e ser prestigiada tal como se passa em muitos países da Europa, Europa com que os senhores da maioria tantas vezes enchem a boca, sem a conhecerem efectivamente. De uma Europa que, como aqui já foi afirmado por Teresa Santa Clara Gomes, nós queremos construir solidária, cívica e dialogante.
Uma Europa de bem-estar material, mas também a Europa dos bens de espírito e da cultura.
Em resumo, uma Europa, um país e uma política saudáveis, que se contraponham à política doentia que tem sido a política dos últimos governos no sector da saúde.
Como nos Serviços Médico-Sociais os senhores da maioria têm receitado, receitado receitas, mas não cuidam de dialogar com o doente nem de fazer o diagnóstico correcto e muito menos de impedir a doença.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e do MDP/CDE.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados...
O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Paulo Mendo): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Para fazer uma intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, V. Ex.ª fica inscrito e, na altura própria, ser-lhe-á dada a palavra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, o PCP não tem qualquer probelma em ceder a nossa vez ao Sr. Secretário de Estado, até porque, salvo o erro, todos os oradores que se encontram na Mesa são do PCP.
Portanto, de bom grado cedemos o nosso lugar ao Governo, reservando-nos para depois.
O Sr. Presidente: - Simplesmente, a seguir ao PCP está inscrito o Sr. Deputado Mário Tomé, depois um outro Sr. Deputado do PCP, ainda um orador do PSD - Sr. Deputado António Lacerda -, bem como ainda o Sr. Deputado Fernando Verdasca, do PS. e o Sr. Deputado Valdemar Alves, do PSD.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.
O Sf. Carlos Brito .(PCP): - Sr. Presidente, o que nós propusemos foi trocar o primeiro lugar na ordem das inscrições, que pertence ao PCP, com o Sr. Secretário de Estado da Saúde, mantendo-se os restantes lugares.
O Sr. Presidente: - Sendo assim e se estiver de acordo com esta troca, .-tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr. Presi-. dente, Srs. Deputados: Assistimos até agora a uma discussão sobre problemas de saúde que, como é habitual, incidiu sobretudo em problemas de cariz político, ...
Vozes do PCP: - Essa é boa!
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O Orador - ... sobre posições base de política geral que ultrapassam largamente a política de saúde.
Isto significa que continuamos com posições míticas sobre o que é o Estado, o indivíduo, a sociedade colectivista e a sociedade liberal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador. - Sistematicamente, partimos destes pressupostos para discutirmos e dialogarmos sobre problemas que são muito reais, muito difíceis de resolver e para os quais toda a lucidez é necessária.
Da parte do PCP ouvimos aqui uma sistemática acusação de tudo o que for privado, um sistemático endeusamento de tudo o que é Estado...
Vozes do PCP: - É falso!
O Orador: - Isso é evidente e não me admira.
Vozes do PCP: - Isso é falso!
O Orador: - Façam o favor de estar calados, sim?
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Protestos do PCP.
Ouvimos três intervenções, cada uma das quais jocosa. Sobretudo a primeira foi extremamente jocosa, a segunda foi um pouco técnica e a terceira foi um pouco romântica. Contudo, todas elas chegaram à mesma conclusão e todas elas se baseiam no mesmo princípio: nós temos a verdade, nós sabemos o que é preciso fazer, o nosso programa é este e viva o Estado.
A seguir a estas três intervenções, penso que entrámos um pouco mais nos problemas concretos, mais sérios e sobre eles gostaria de me pronunciar de uma maneira não ideológica, mas sim de um modo que penso ser culto de os abordarmos.
A saúde é como todos sabemos - e custa-me um pouco ver o Sr. Deputado António Arnaut negar isto -, muito cara. Infelizmente, todas as sociedades modernas têm de pensar no preço de uma cama.
O Sr. António Arnaut (PS): - Não neguei isso!
O Orador: - Infelizmente, o preço da saúde sobe de uma maneira vertiginosa, colocando-se actualmente a qualquer sociedade moderna - sobretudo àquelas que garantem com os dinheiros do Estado e com a participação do cidadão os cuidados de saúde - o premente problema de se saber até onde e que as sociedades modernas podem levar as despesas de saúde.
Portugal é, como todos sabemos, um país que não nada em dinheiro. Temos um Orçamento em que avulta o orçamento da saúde, que é dos maiores orçamentos parcelares do Estado - são 50 milhões de contos. Simplesmente, 50 milhões de contos para 10 milhões de habitantes é muito pouco. Isto dá qualquer coisa como 5000$/ano por habitante para que - e muito bem - Portugal, como sociedade moderna que é, garanta aos seus cidadãos todos os cuidados de saúde.
Ora, por 5000$/ano não é possível termos uns serviços de saúde capazes de responder a todas as solicitações, se pensarmos que em matéria de saúde um hemodialisado custa por ano 1000 contos, que um simples cateter - que se utiliza uma vez para fazer uma arteriografia cerebral e depois deita-se fora - custa 2000$, que um par de luvas custa 50$, que uma simples compressa custa 10$. É perfeitamente impossível, Sr. Deputado António Arnaut, deixarmos de pensar nisto.
O Sr. António Arnaut (PS): - E o Sr. Secretário de Estado só pensa nisso!
O Orador: - Em relação a estes dados é evidente que temos de pensar como vamos pagar a conta.
O Governo pensa que não é possível pagar toda esta factura através do Orçamento Geral do Estado. A saúde tem de encontrar fontes diversificadas de financiamento, tal como o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais já o disse.
É evidente que quem pensar, minimamente que seja, nos problemas da saúde chega à conclusão de que é preciso mais dinheiro.
Mas, como vamos aproveitar e rentabilizar este imenso orçamento? Aqui é que se coloca uma política de saúde. Ora, a política de saúde que em princípio este governo implementou e continua a implementar desde há três meses é uma política que já está definida como sendo de arrumo, de organização de toda a área de cuidados extra-hospitalares.
Na parte hospitalar essa política será orientada no sentido da dignificação das carreiras profissionais, da autonomia hospitalar e da capacidade de fazermos com que cada hospital utilize modernos métodos de gestão e de financiamento, conseguindo deste modo fazer com que, de empresas permanentemente deficitárias e subsidiadas, passem a ser verdadeiras empresas, com capacidade financeira própria.
O Sr. António Arnaut (PS): - Como se fossem empresas!
O Orador: - No que respeita à área do ambulatório, pensa o Governo - e penso que o Sr. Deputado Octávio Cunha leu o nosso programa - que esta área se vai traduzir por aquilo que, de um modo brutal - pois era ao mesmo tempo uma forma do nos responsabilizarmos -, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais traduziu por extinção dos Serviços Médico-Sociais.
Mas o que significa isto? Significa que consideramos que a área dos cuidados primários é de tal modo prioritária e importante que é absolutamente necessário criar carreiras dentro dessa área, dar autonomias e organizar os serviços.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas, como pensamos fazer isso? Pois, através da criação das administrações regionais de saúde, que mais não são do que uma nova forma de organização das administrações distritais de saúde, a maior parte das quais fui eu que criei, bem como através de uma administração coerente, regional e com uma única cabeça conseguir juntar obrigatoriamente os Serviços Médico-Sociais e os serviços dependentes da Direcção-Geral de Saúde.
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Estes serviços constituirão uma área de execução de cuidados de saúde no ambulatório, que serão executados numa unidade sanitária, que não põe problemas a ninguém neste mundo, chamada centro de saúde.
Este tipo de organização pressupõe, como é evidente, que quando se fala em Direcção-Geral de Saúde está a falar-se na Direcção-Geral de Saúde de cuidados primários, que se vai juntar às administrações regionais de saúde e aos centros de saúde. Mas não podemos esquecer que a Direcção-Geral de Saúde tem também - e por isso se disse que ela era uma autoridade sanitária - funções extremamente importantes de autoridade sanitária, que não têm sido desenvolvidas neste país e que nós pretendemos relançar a nível central de serviços.
Direcção-Geral de Saúde tem de ser, como autoridade sanitária que é, um órgão de Estado respeitado e cujas decisões sejam cumpridas, no que diz respeito a poluição de ambiente e a crimes permanentes contra a higiene pública. Esta Direcção-Geral tem de ser dignificada nestas tarefas. Ora, nós iremos fazê-lo.
Em relação a saber como iremos provar esta periferia, pois é evidente que não vamos enviar ninguém com guia de marcha para a periferia. Vamos criar um tipo de carreiras e de incentivos que façam com que o profissional de saúde escolha através de concursos os lugares que nós lhe atribuímos.
No que diz respeito ao ambulatório, trata-se de um problema que passa por uma redimensão ou, se quisermos, pela reestrutura de uma carreira já iniciada no tempo do primeiro governo da AD: é a carreira do generalista. Quanto a esta carreira, a esta imensa área do ambulatório onde este profissional vai exercer a sua profissão, pensa o Governo implementar e definir melhor o que está definido na Portaria n.º 444/80, ou seja, que definiu a carreira do generalista.
Esta carreira terá como lugar base o clínico geral, que terá a garantia de que não será desviado do seu local de trabalho - do trabalho que ele escolheu -, que será remunerado de acordo com uma letra da função pública; que será uma letra intermediária entre a letra do interno complementar e a letra do especialista. Este salário base terá outras remunerações acessórias, conforme o tipo de trabalho que executar.
Deste modo, o clínico geral poderá, se assim o quiser, ter remunerações acessórias diferentes. Além disto, ser-lhe-ão pagas as horas extraordinárias que forem feitas durante a noite em serviços de guarda, bem como terá ainda um pagamento por afastamento para áreas remotas e ser-lhe-á facultada toda a possibilidade de reciclagens. Por outro lado, pensamos ainda que em períodos determinados devem abandonar o seu serviço regressando a um centro, onde fará a sua preparação durante, pelo menos, quatro meses.
Além disso, toda esta área irá ser apoiada por institutos de clínica geral, o primeiro dos quais já vai surgir no Hospital de Santo António, no Porto, que serão centros de desenvolvimento cultural e de permanente acompanhamento destes profissionais, que consideramos serem os mais importantes de qualquer rede de cuidados de saúde.
Estes profissionais, clínicos gerais, terão como lugar hierárquico seguinte o generalista. Portanto, generalista é um especialista de clínica geral. Este lugar é conquistado por médicos que escolheram fazer esse internato de especialidade, ou seja, que escolheram esta área do ambulatório para especialidade.
Assim, já este ano estão 160 colegas a iniciarem este internato que, por se ter iniciado este ano, ainda apresenta imensas dificuldades no seu arranque. Contudo, ele irá melhorar. Actualmente está em curso a constituição de um grupo nacional de coordenadores, feitos por médicos de reconhecida competência na área, que acompanharão estes generalistas e o seu desenvolvimento curricular. Ora, eles próprios serão os júris dos exames dos futuros especialistas de clínica geral.
Juntamente com isto vamos também remodelar a carreira da saúde pública, que é, quanto a nós, uma carreira suficientemente importante para considerarmos que deve começar não pelo grau zero, com o médico recém-formado, portanto com o actual médico chamado P-l, mas, sim, deve assentar já num especialista com sérios conhecimentos dá área do ambulatório e da clínica dos cuidados primários de base.
Nessa medida consideramos que o, médico da saúde pública será um generalista para tal preparado.
Na área dos cuidados hospitalares, pensamos que a carreira hospitalar é uma carreira que tem de ser desburocratizada, que tem de ser simplificada. Pensamos sobretudo que se tem de lhe dar uma leveza e um capacidade de movimento ao nível dos profissionais, condições essas que não são compatíveis com o tipo de estruturas e concursos até agora realizados.
Nessa medida pensamos que os graus devem ser conquistados independentemente dos cargos e que, portanto, qualquer médico pode concorrer ao grau seguinte da carreira independentemente do cargo. Uma vez aceite ficará titulado. Uma vez titulado o médico, pensamos que para esse médico acaba o internato de especialidade e que ele adquire a sua titulação de especialista, cessando nessa altura o vínculo ao hospital e sendo-lhe dados alguns meses para que ele próprio concorra às vagas permanentemente em aberto nos hospitais distritais. Significa isto que não aceitamos que o hospital distrital tenha uma vaga de cardiologista, por exemplo, que apenas põe a concurso uma vez por ano. Se o hospital distrital tem necessidade de um cardiologista, tem-no permanentemente. Nessa medida consideramos que as vagas devem estar permanentemente postas a concurso para que o médico faça como aliás se faz em toda a parte do mundo. Um médico inglês, por exemplo, procura no fim do Lancet onde é que é necessário um sénior register e concorre.
Da mesma maneira, aqui, o médico depois de ter a sua especialidade cessa o seu vínculo ao hospital que o preparou e portanto fica obrigado a concorrer às vagas que existem na carreira e na rede hospitalar. Mas ele tem outra alternativa, evidentemente: seguir a clínica livre.
Ao mesmo tempo pensamos que a nível hospitalar é fundamental estimularmos a permanência do médico nas estruturas hospitalares através de uma forma de incentivos para a criação de horários e de formas de funcionamento nos hospitais que privilegiem os tempos completos, os tempos completos prolongados e os tempos exclusivos - são três formas de prestação de serviço médico nos hospitais que julgamos perfeitamente imprescindível pôr em prática no sentido de obtermos o máximo rendimento das nossas estruturas hospitalares.
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Isto significa que quando se diz extinguir os Serviços Médico-Sociais se que dizer isto tudo que acabei de dizer, significa que se têm de tomar medidas concertadas de estabelecimento de carreiras, de verificação de capacidade de gestão, de integração de serívços sem os liquidar, de concepção regional e bastante descentralizada de financiamento, pois só assim será possível realizar a tarefa a que nos propusemos e que foi iniciada por uma serie de estudos já efectuados durante o anterior governo.
A propósito quero dizer que uma das coisa mais importantes para o funcionamento dos hospitais com a autonomia que lhes queremos dar, que foi já implementada o ano passado e este ano vai estar em execução, é o seu financiamento por centros de custos. A partir de agora o hospital que mais produzir, o hospital que melhores índices tiver, o hospital que mais diversificar as suas tarefas terá, por cada uma delas, uma forma de pagamento real por custos de serviços em relação aos quais o hospital será inteiramente responsável, com a possibilidade de fazer a reversão dos saldos e de, portanto fazer planos a médio prazo.
É evidente que quando me dizem que isto é contraditório como por exemplo, os GIES (Gabinetes de Instalações e Equipamentos da Saúde), pois é, isto é contraditório com muitos dos princípios de que actualmente enferma a nossa função pública e em relação aos quais estamos dispostos a modificar e a criar o tipo de mecanismos leves e com capacidade de eficácia que façam com que não seja mais possível repetir-se a situação de que para se fazer uma porta se tenha de pedir autorização ao director-geral.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Mas quem é que criou os GIES, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que gritaria é esta?
O Orador. - E isto tem muito a ver com outra situação, ou seja, com a situação das convenções.
É evidente que considero que é um falso problema e uma perfeita mistificação de um assunto que não tem nada de extraordinário o considerar-se que a convenção é da direita ou da esquerda, ou faz não sei o quê ou não sei que mais. O problema da convenção, se por acaso ela for encanada como uma peça natural e obrigatória de qualquer gestão, significa simplesmente que o Estado, face a qualquer actividade de saúde que tenha de realizar, entrando em linha de conta exclusivamente com factores de qualidade, considerando que é fundamental ter-se permanentemente em equação uma questão primordial que é a dos custos-benefícos, chega à conclusão que determinada tarefa pode ser executada de uma maneira tecnicamente correcta e mais barata por alguém que não da rede estatal. É evidente que é filosofia deste governo que esta tarefa deve ser convencionada por quem a possa fazer... E não tenho de alargar desmesuradamente o Estado! Este fenómeno verifica-se em qualquer país da Europa e em relação ao pagamento à peça, digo, em relação aos pagamentos de convénios,...
Vozes do PCP: - Não emende, Sr. Secretário de Estado. Diga «à peça»!...
O Orador: - ... quero dizer-lhes que o medico que provavelmente mais ganha, na Europa é o holandês, que é pago a salário, que o médico americano da clínica Mayo é pago em salário, que os médicos das organizações de manutenção da saúde são pagos por capitação e que os médicos das organizações do medicaid medicare são pagos á peça.
Portanto, todos estes fenómenos, todas estas formas de pagamento não são mais do que instrumentos de gestão. O que é preciso é ver - e nesse caso acho muito bem que fiscalizem o Governo - se eles são ou não aplicados com proveito para o povo português.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Entretanto reassumiu a Presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado, serei muito breve. É que, de facto, o que eu quero é congratular-me - e espero que o Sr. Secretário de Estado não me mande calar, porque isto é um debate político - com uma afirmação de V. Ex.ª
É que, na verdade, o Sr. Secretário de Estado, nas suas primeiras palavras, distinguiu as diferenças que separaram as ideologias colectivistas das ideologias liberais. Ainda bem que o Sr. Secretário de Estado aqui vem dizer uma coisa que nós já vimos dizendo desde Novembro do ano passado, isto é, que este governo é um governo neoliberal e que nada tem a ver com a social-democracia.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para o mesmo efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Irei de seguida colocar algumas questões muito concretas, e sobre saúde, ao Sr. Secretário de Estado, não deixando, entretanto, de fazer um protesto pelas palavras iniciais que proferiu.
Nós estamos aqui porque fomos eleitos pelo povo, temos o direito de fazer as intervenções que queremos, temos o direito de dizer o que queremos, de discutir aquilo que queremos porque estamos num regime democrático.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas não de fazer calúnias!
A Oradora: - E, Sr. Secretário de Estado, se o candidato à Presidência da República cuja candidatura V. Ex.ª subscreveu, se o general Soares Carneiro tivesse ganho as eleições isso já não era assim.
Aplausos do PCP.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Tem de ir para a União Soviética.
A Oradora: - Passemos então à política de saúde, porque em matéria de democracia e de ideologia não
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aceitamos, lições de subscritores de candidatos fascistas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O social-fascismo é que é bom!
A Oradora: - Em matéria de política de saúde colocarlhe-ei algumas questões muito concretas, Sr. Secretário de Estado.
No início da sua intervenção, V. Ex.ª fez o mesmo que já tinha sido feito pelo Sr. Ministro: apresentou-nos o preço das camas dos hospitais, das seringas, de várias coisas, mas não nos apresentou o preço da quilo que pretendemos. É que nós não dizemos: «Viva o Estado!» Nós acusamos é este governo de estar ao serviço da medicina privada, de estar ao serviço dos grandes interesses privados, dos grandes laboratórios, dos grandes negociantes de raios X, das multinacionais de medicamentos que estes membros do Governo conhecem muito bem. É isso, Sr. Secretário de Estado, que nós acusamos. O preço da cama do hospital nós conhecemo-lo, há estatísticas publicadas. Mas diga-nos, Sr. Secretário de Estado, qual é o preço das convenções que a AD assinou com os grandes laboratórios de raios X, com os grandes laboratórios de análises.
Tenho aqui alguns números que pudemos apurar e que passo a citar, porque foi isto que motivou a interpelação que o PCP está a fazer. Aliás nós, na minha intervenção, desafiamos o Governo a apresentar aos partidos da oposição os textos das convenções que a AD assinou com a medicina privada e os cálculos que fez sobre os custos que vai gastar com essas convenções, que não são convenções normais e eu já vou explicar porquê.
Sr. Secretário de Estado, nós, quando se discute o financiamento do serviço de saúde, vamos ao fundo e vamos ver para onde é que a AD está a levar o dinheiro do povo português no campo da saúde, os tais 54 milhões de contos de que falou.
Tenho aqui vários casos de laboratórios privados, de análises e de raios X, e dispomos de alguns números. Por exemplo, o seu distrito tem um laboratório ,de análises, a quem os Serviços Médico-Sociais pagaram, em Fevereiro de 1980 762 881 contos e em Fevereiro de 1981 2 029 310$. Tenho referência a outro laboratório de análises - e se quiser digo-lhe os nomes - em que em Fevereiro de 1980 se pagaram 445 560 contos e em Fevereiro de 1981 528 565 contos; outro, de raios X, a quem em Janeiro de 1980 se pagaram 80 740 contos e em Janeiro de 1981 116 660 contos; um outro, de raios X, a quem em Janeiro de 1980 se pagaram 318 284 contos e em Janeiro de 1981 890 162 contos; um outro, de raios X, a quem se pagaram em Janeiro de 1980 528 1122 contos e em Janeiro de 1981 953 014 contos.
O Sr. José Ernesto (PCP): - É uma vergonha!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Assim o dinheiro não chega não!...
A Oradora: - Temos por exemplo, outro laboratório de análises a quem em Janeiro de 1980 se pagaram 310 785 contos e em Janeiro de 1981 862 875 contos.
Estes, Sr. Secretário de Estado, são alguns exemplos concretos de um único distrito, o distrito onde V. Ex.ª reside e que aqui trazemos apenas porque não dispomos de um número global nacional.
É o Sr. Secretário de Estado capaz de nos dizer quanto é que no mês de Janeiro de 1980 os Serviços Médico-Sociais pagaram, do dinheiro do povo, aos laboratórios privados de radiologia e aos de análises e quanto é que pagaram em 1981?
É capaz de nos dar esses números de Fevereiro, Sr. Secretário de Estado? É que é isto que motiva a nossa interpelação e é por isto que hoje o Sr. Secretário de Estado, tal como o Sr. Ministro, chega aqui e diz que o orçamento não chega. Pudera!... É evidente, que hão chega!
Então qual é a solução? Dizem: «Novas formas de financiamento!» e anunciam um seguro de saúde, o que é grave, porque, Sr. Secretário de Estado e Sr. Ministro, nos vossos discursos os senhores disseram que é natural pagar-se a saúde, é natural, é naturalíssimo! Então por que é que a educação é grátis?
O Sr. Ministro chegou mesmo ao ponto de dizer que isso do grátis é injusto porque os ricos vão e usam-se dos serviços grátis. Então põe-se a pagar e o que acontecerá é que os pobres deixar de poder lá ir porque não têm dinheiro para pagar.
Mas por que é que não metem taxas moderadas na educação?
É que foi uma grande conquista que os Portugueses conseguiram em Portugal depois do 25 de Abril; o assegurarem o princípio, da gratuitidade da saúde, o princípio de que a saúde é um direito e não qualquer coisa que se compra e se vende.
Na intervenção do Sr. Ministro foi dito que o Governo não garantia o princípio constitucional de gratuitidade mas que o da universalidade sim, senhor! Ora isto é perfeitamente ridículo, Sr. Ministro.
Como é que se pode garantir o princípio da universalidade sem garantir o da gratuitidade? É evidente que o varredor da Câmara Municipal de Lisboa tem o direito de ir ao Ritz passar uma noite, pois tem! Não tem é dinheiro para pagar o quarto.
É evidente que o varredor da Câmara de Lisboa tem o direito de ser operado no Hospital da Cruz Vermelha, não tem é dinheiro, logo à entrada, para pagar o depósito.
Risos do PCP.
Como é que se pode garantir o princípio da universalidade sem se garantir, Sr. Secretário de Estado, o princípio da gratuitidade? Agradeço-lhe que me explique.
Só mais uma pergunta. Nós não dizemos: «Viva o Estado! Abaixo a privada!» Os senhores é que dizem: «Viva a privada! Toda a massa para a privada! Todo o apoio à privada!» Mas, como não têm coragem para o dizer, escondem-no.
Disse o Sr. Secretário de Estado que é normal assim, que em todos os países desenvolvidos há convenções, que, enfim, isso é uma coisa normal. Mas isso não é verdade e o Sr. Secretário de Estado sabe que não é verdade.
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A adopção de um regime convencionado só é possível e economicamente aceitável se cessar por completo o actual assalariamento...
Neste momento o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais troca algumas impressões com o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
Bom... quando o Sr. Ministro acabar de falar com o Sr. Secretário de Estado continuo, porque senão estou a interpelar o quê?
Risos.
É que depois não responde aqui às minhas perguntas e vai responder para a Televisão e a seguir vem cá e diz: «Mas eu já disse na Televisão!...» É que nós estamos aqui para dialogar e espero que responda às perguntas muito concretas que lhe colocamos. Aliás, eu, na minha intervenção, fiz treze e até agora ainda não responderam a nenhuma.
Mas eu repito: disse o Sr. Secretário de Estado que isso da convenção é uma coisa normal, que há em todos os países e depois misturou convenção com pagamento à peça, que são duas coisas diferentes. Sr. Secretário de Estado, e se não são eu explico-lhe.
Risos.
A adopção de um regime convencionado só é possível e economicamente aceitável se cessar por completo o assalariamento - e então estamos de acordo - nos postos dos Serviços Médico-Sociais e centros de saúde, sendo substituído pelo pagamento em regime de reembolso ou convenção de montante acordado para cada acto.
Mesmo assim a prática convencionada tem sido fortemente criticada nos países onde existe - Bélgica, França e Alemanha. Atribui-se-lhe o inconveniente de multiplicar actos médicos desnecessários, tanto por iniciativa, do prestador como do utente.
O que se passa aqui, em Portugal - e era isso que nós queríamos que o Sr. Secretário de Estado explicasse com clareza -, é que a direcção da Ordem dos Médicos reivindica as duas coisas. Quer a convenção, para apoio à privada, e quer o assalariamento nos serviços públicos. Isso é que é imoral, Sr. Secretário de Estado, e é contra isso que nós estamos.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Nós não estamos em desacordo em que haja convenções, estamos em desacordo, isso sim, é em que se coma nos dois carrinhos, Sr. Secretário de Estado, e é isto que o Governo tem de explicar.
Está de acordo com as convenções, então acabe com o assalariamento; está de acordo com o assalariamento, então acabe com as convenções. Agora, vir-nos falar em sector privado e em sector público quando são os mesmos médicos que estão no público e no privado, quando a concorrência é entre os mesmos profissionais que estão de manhã nos hospitais - às vezes!... - que nós visitamos...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, o Sr. Secretário de Estado conhece muito bem o hospital que visitamos, onde, por exemplo, há um serviço onde os médicos são 14 e em que em cada dia está só um que assina o papel em nome dos outros todos, faz a assinatura dos outros todos...! E se o Sr. Secretário de Estado quiser eu digo-lhe qual é o serviço.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por último, o Sr. Secretário de Estado disse que iam acabar com os Serviços Médico-Sociais e integrá-los nos centros de saúde, mas há uma coisa no discurso do Sr. Ministro que o Sr. Secretário de Estado não repetiu. Por isso pergunto-lhe: o que é que está certo? É aquilo que disse o Sr. Ministro na Televisão ou é aquilo que V. Ex.ª diz aqui?
O Sr. Ministro na Televisão disse «[...] Acabam os Serviços Médicos-Sociais, integramo-los nos centros de saúde - metem-se 3000 postos de Serviços Médico-Sociais em 200 centros de saúde - e na convenção». Está aqui escrito no discurso que o Sr. Ministro fez na Televisão, e embora ele não tenha sido distribuído pelas vias normais, nós possuímo-lo.
Como eu dizia, isso está aqui escrito e agora o Sr, Secretário de Estado, quando falou, esqueceu-se desse «e na convenção». Mas, então, como é?
Quem é que tem razão? O que é que está certo? É aquilo que o Sr. Ministro disse na Televisão, e que é o mesmo que disse o Dr. Gentil Martins numa entrevista à Ordem dos Médicos, ou o que o Sr. Secretário de Estado acaba de dizer agora?
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, há mais oradores inscritos para pedirem esclarecimentos a V. Ex.ª O Sr. Secretário de Estado poderá responder sucessivamente a cada um deles ou poderá responder no fim, em conjunto.
Posso informar a Câmara que além do Sr. Deputado Mário Tomé, que vai em seguida usar da palavra, há mais quatro oradores inscritos para pedirem esclarecimentos.
A Mesa pede a V. Ex.ª o favor de a informar se pretende responder agora aos pedidos de esclarecimento de que foi objecto ou se se reserva para responder no final a todos.
O Sr. Secretário de Estado: - Respondo no fim em conjunto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há pouco tinha-me inscrito para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro mas, por, acaso, a Mesa não detectou o meu gesto. Assim, como o assunto a que me queria referir diz respeito tanto ao Sr. Ministro como ao Sr. Secretário de Estado, vou integrar os dois pedidos de esclarecimento.
No entanto, antes de formular os pedidos de esclarecimento queria fazer notar uma «pequena» diferença, que não é nada subtil, entre a opinião do Sr. Ministro e a opinião do Sr. Secretário de Estado, na medida em que o primeiro alega que as intervenções que foram feitas aqui não dizem respeito à política de fundo - são casuísticas, vão ao pormenor, o
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que não está bem - e o segundo, o Sr. Secretário de Estado, diz exactamente o contrário, acusando as intervenções de não irem directamente aos assuntos concretos e de se remeterem para questões de política geral de fundo ideológico. Portanto, há aqui uma contradição efectiva que não sei se quererão explicar, mas talvez não valha a pena porque esta é apenas uma forma de tentarem minimizar a interpelação e a actuação dos deputados da oposição.
Mas uma coisa que se verifica nestas intervenções dos membros do Governo - como noutras, aliás - é um permanente estado de inconstitucionalidade. Isto é, as perspectivas que aqui nos apontam, a política, que aqui nos apontam -nomeadamente neste caso da saúde- estão, logo à partida, feridas de inconstitucionalidade. Põem de lado a Constituição, dizem claramente e sem qualquer pejo que a gratuitidade do serviço de saúde - que para ser cumprida a Constituição tem de ser garantida - é uma coisa que não deve existir, dão todo o apoio à medicina privada - o que é contra a própria Constituição -, e, portanto, à partida consideram a Constituição revista antes de ela o estar, como, aliás, sempre têm feito.
Isto é uma coisa que nós devemos notar e o povo português deve estar atento à frontalidade - ao menos que se diga que é assim! - com que a AD e o seu governo espezinham e liquidam a Constituição no seu dia-a-dia.
Uma outra questão que é muito importante referir-se prende-se com o facto de se dizer que a medicina privada deve ser incentivada para permitir uma sã emulação com a medicina estatal, dizendo-se que não se quer a estatização, já ultrapassada, destas coisas.
Ora, o que se passa é que eu não vejo como é que poderá haver - mesmo nos termos capitalistas em que os senhores põem esta questão - essa emulação e essa competição, a não ser que me digam que se vai pagar também aos médicos que trabalham para o Estado em tempo inteiro - portanto funcionários públicos, como há bocado disse aqui o Sr. Deputado António Arnaut - 100 contos por mês de horas extraordinárias. Efectivamente, isso põe desde logo em questão a competitividade que existe no mundo em que vivemos e não vejo outra forma de ela existir nos vossos critérios.
O Serviço Nacional de Saúde, que impõe gratuitidade, é atacado pela AD porque ela diz que o Orçamento Geral do Estado não chega. E quanto a isso temos que perguntar ao Governo - porque foi o Governo e a AD que estabeleceram este Orçamento Geral do Estado - porque é que reforçaram verbas para as forças armadas e para as polícias e não reforçaram a verba para a saúde.
Mas este Orçamento Geral do Estado não chega porque não se vai aos lucros dos capitalistas e, pelo contrário, pelo que se vê aqui, pretende-se dar lucros não só aos capitalistas mas também aos médicos que fazem da medicina, um meio de acumulação de capital. É que não se vai para um sistema de impostos progressivos, como a UDP tem preconizado, para aqueles que ganham muito; o dinheiro vai para as convenções, como aqui foi demonstrado, e, finalmente, as próprias indemnizações, de 200 milhões de contos, em vez de serem postas ao serviço do povo português, a quem pertencem, são entregues aos grandes monopólios e aos grandes capitalistas.
São estas as razões fundamentais porque o Orçamento Geral do Estado não chega. E, para desculpar isto, diz-se - e depois dizem que não há ideologias aqui - que quem tem mais, quem tem uma posição racial, quem tem mais dinheiro, deve pagar mais.
Ora bem, já aqui ficou demonstrado por outros deputados que o direito à saúde não pode ser posto nestes termos, pois, desta forma, quase poderíamos chegar à seguinte conclusão: era bom que os ricos pagassem - e istojá aqui foi posto pelo Sr. Ministro - para poderem suprir as deficiências do Orçamento Geral do Estado e assim permitir os cuidados da saúde. E nesta perspectiva, seguindo este raciocínio, chegávamos à conclusão de que os ricos devem ser cada vez mais ricos para melhor poderem contribuir para a saúde do povo: Com certeza que não é isto que o Governo e a AD pensa!
A competitividade efectiva não é entre o serviço privado e o serviço estatal de saúde. Essa competitividade não existe efectivamente, pois embora o Governo esteja sempre a dar a entender que não gosta nada do Estado, porque ele é uma coisa má, a AD tudo faz para tomar conta do Estado na sua totalidade, para o utilizar ao serviço do sector privado, dos capitalistas e dos senhores da Ordem dos Médicos.
Essa competitividade existe efectivamente na disputa entre os barões da medicina para ver qual deles é que mais arrecada com este sistema da convenção e com os «serviços» que se diz prestarem à saúde e ao povo português.
Por outro lado, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado não se referiram ao papel da medicina preventiva, que actualmente, é importante em todo o mundo evoluído, fundamentalmente naqueles países em que os trabalhadores têm efectiva decisão do poder e que, em nossa opinião, tem um papel fundamental e um papel determinante na saúde dos trabalhadores, na saúde do povo.
É a partir do nível e do grau de desenvolvimento da medicina preventiva que efectivamente se pode garantir, de uma forma generalizada, a saúde e só depois aparecerão os outros estádios da medicina até à curativa. Portanto, eu queria perguntar qual é o papel efectivo que a AD e o seu governo atribuem à medicina preventiva e como é que a perspectivam.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Calhordas, também para um pedido de esclarecimento.
O Sr. António Calhordas (MDP/CDE): - Gostaria de, muito rapidamente, pedir quatro esclarecimenmentos ao Sr. Secretário de Estado, que, na sua intervenção, colocou aqui questões concretas, ao contrário da vacuidade e inconsistência de que se revestiu a intervenção do Sr. Ministro.
São os seguintes pedidos de esclarecimento que queria fazer: Estamos, todos de acordo que a saúde é muito cara e pergunto ao Sr. Secretário de Estado se, para a tornar mais barato, se deve dar maior prioridade aos cuidados diferenciados do que aos cuidados primários? Era este o primeiro ponto.
Segundo ponto: podem os clínicos gerais e generalistas a trabalhar nos centros de saúde entrar também
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na área da convenção? Podem trabalhar nos centros de saúde e, simultaneamente, na área da convenção?
Terceiro ponto: é legítimo que as convenções sejam feitas relativamente a actos que podem ser desempenhados pelo sector público?
O Sr. Ministro apresentou na televisão casos concretos, entre os quais o dos centros vasculares, que podem perfeitamente ter lugar no sector púbico, porque, por exemplo, as salas de operações dos hospitais centrais de Lisboa trabalham apenas ate às 13 ou 14 horas. Concretamente, e como exemplo, no meu serviço há dois meses que aguardamos a resposta a um pedido para trabalhar até as 16 horas, dispondo nós de médicos para isso, e até agora, as administrações não responderam!
Quarto ponto: a titulação a que o Sr. Secretário de Estado se referiu, é feita nos hospitais ou fora dos hospitais? E se é fora dos hospitais, quem a faz?
Aplausos do MDP/CDE, do PCP e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.
O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Dispenso-me de comentários sobre a exposição do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, que foi perfeitamente vazia de conteúdo, que não trouxe qualquer proposta e que me faz lembrar uma frase célebre do actual Sr. Primeiro-Ministro, que, durante a campainha eleitoral, ao chegar à Régua, fez explodir um calhau que estava no meio do rio e disse: está inaugurada a navegabilidade do rio Douro!
Risos da UEDS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
Mas, efectivamente, os assuntos que aqui se tratam são bem mais sérios e o Sr. Secretário de Estado abordou alguns. No entanto, lembrava-lhe apenas uma coisa: não sei se a referência a um discurso romântico era relativa à intervenção da UEDS, mas queria referir-lhe que uma fonte de oxigénio, simples, uma quantidade de açúcar, simples, e uma lâmpada para aquecer, simples, custam menos de 1000$ e, segundo os trabalhos da Hagberg, que trabalha há mais de trinta anos neste assunto, reduziam a nossa mortalidade infantil e os riscos de deficiências psicomotoras graves de 31/1000 para 12/1000.
Aplausos da UEDS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Para um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado que acaba de falar.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O protesto é justificado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque o Sr. Deputado fez afirmações que são altamente ofensivas da dignidade do Governo e da dignidade de pessoas, nomeadamente de deputados como eu próprio, que acompanharam o Sr. Primeiro-Ministro na cerimónia a que acabou de fazer referencia.
Aplausos do PSD.
Risos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
Contrariamente àquilo que disse, Sr. Deputado, a cerimónia teve justificação e teve significado político...
Vozes do PCP: - Teve, teve!
O Orador: - ... e as populações de Trás-os-Montes que marginam o rio Douro apreciaram-na altamente.
Risos do PCP e do MDP/CDE.
Devo dizer-lhe que está já adjudicada a obra de regularização do leito do rio Douro para permitir a sua navegabilidade até à barragem de Bagaúste e devo dizer-lhe também que esse acto político teve um alto significado, porque, mais do que as palavras, os actos dão a garantia de que as obras se fazem. - A navegabilidade do Douro, por esse acto e também pelas promessas formais do Governo, é uma realidade...
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Daqui a dez/anos!
O Orador - ... que acaba de contar com o apoio das comunidades europeias, porque é uma obra de que muito pode esperar o progresso das populações transmontanas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - É, portanto, extremamente grave e lamentável que um deputado desta Câmara se refira em termos tão chocarreiros a um acto que tem significado político, que as populações transmontanas apreciaram e que é, de entre todos, aquele que garante, de uma forma mais eficaz, que essa obra se vai realizar e que as populações do interior vão finalmente ver abertos novos horizontes para o seu desenvolvimento, em moldes idênticos aqueles de que já beneficiam as populações do litoral.
O Sr. Deputado foi muito infeliz, porque, dessa forma, mostrou não ter em devida conta uma obra e um projecto que é muito caro e por que muito se batem as populações transmontanas do interior.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Só demagogia!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Cunha, tem V. Ex.ª a palavra para contraprotestar, se o desejar.
O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Eu dispensava-me de comentários, porque, a saúde dos Portugueses é bem mais importante do que estas discussões estéreis,...
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O senhor é que provocou!
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O Orador: -... e eu deixei o serviço no meu hospital para vir trabalhar nesta Casa.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não parecer!
O Orador: - Lembrava-lhe, no entanto, que o dossier da navegabilidade do rio Douro ainda nem sequer foi entregue à CEE...
Risos do PCP.
... e portanto as coisas não estão assam tão avançadas. Acho também que já é tempo de as populações do interior beneficiarem de tantas promessas que lhes têm sido feitas e que nunca foram cumpridas, mas, repito mais uma vez, nós estamos aqui para tratar de problemas bem mais sérios do que esse.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Então porque é que brinca?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mais outro que faz o mal e a caramunha!
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pede a palavra para que efeito?
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Para interpelar à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O Sr. Deputado Amândio de Azevedo ainda há pouco - aliás no intervalo - me observava que a ordem de trabalhos era expressa e que o Sr. Presidente não deveria ter permitido determinado tipo de afirmações ou intervenções feitas por um meu companheiro de bancada, o que é discutível, mas é a opinião expressa pelo Sr. Deputado, e ele o confirmará, se assim o entender. O que é óbvio é que o Sr. Deputado da UEDS - perdoe-me mas não sei o seu nome, e isto não é por menos respeito por si, é porque tenho uma memória incrível para nomes -, de passagem, falou na boutade daquele dinamite posto no leito do rio Douro na Régua. E quanto à substância, Sr. Deputado Amândio de Azevedo, noutra altura eu lhe direi que o Sr. Deputado ou usou de má fé ou é totalmente ignorante relativamente à navegabilidade do rio Douro.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Ignorante é o senhor!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente, o que eu gostaria de saber é a que título o Sr. Deputado Amândio de Azevedo fez agora este longo protesto a respeito da navegação no rio Douro, quando estamos a discutir os problemas da medicina e da saúde em Portugal.
O Sr. Presidente: - A Mesa responderá ao que V. Ex.ª chamou de interpelação à Mesa, mas temos que verificar que, efectivamente, a fluidez dos conceitos com que no Regimento se definem as figuras ao abrigo das quais os Srs. Deputados podem usar da palavra permite situações um pouco heterodoxas como esta.
Sabe V. Ex.ª, Sr. Deputado, como sabem todos, que sempre que alguém pede à Mesa o uso da palavra para um protesto - e permitam-me o plebeiísmo da expressão, mas é apenas para dar mais força à ideia -, o que faltava era que a Mesa lha recusasse!
Só depois do desenvolvimento da intervenção do Sr. Deputado se sabe ou não qual foi, afinal de contas, o propósito que teve, e, por isso mesmo, a Mesa, que é a primeira vítima dessa mesma fluidez regimental - passe o eufemismo -, continuará a usar o critério que até aqui seguiu e deixa à consciência de cada um dos Srs. Deputados a fidelidade que devem ter na interpretação das diversas figuras regimentais, que permitam o uso da palavra, em homenagem ao bom funcionamento da Câmara.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Ernesto, de Oliveira.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Gostava realmente de pedir alguns esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, que falou há pouco.
São perguntas muito directas aquelas que vou fazer, a exemplo das que há pouco fizemos ao Sr. Ministro e que até agora não foram respondidas.
Assim, gostaríamos que, juntamente com as respostas a estas perguntas que vou formular, fossem dadas as respostas que exigimos para todas as perguntas que já fizemos.
O Sr. Secretário de Estado começou por falar, mais uma vez, em termos de custos de saúde. E essa é a nova ideia que a AD está a pretender vender a todo o custo: é que a saúde é algo demasiadamente caro para o povo português. Demonstrámos já aqui que isso é falso e estamos prontos a tornar a fazê-lo, e o que se passa é que efectivamente os dinheiros gastos com a saúde são dinheiros mal gastos e mal orientados, precisamente porque visam cumprir objectivos que já aqui foram denunciados.
De qualquer forma, o Sr. Secretário de Estado justificou a restrição de verbas que é necessário fazer na saúde com o preço de uma seringa, de uma compressa, enfim, com o preço de umas luvas, etc.
No plano de investimento e desenvolvimento da administração central relativo à Secretaria de Estado da Saúde para o ano de 1981 - que tenho aqui -, V. Ex.ª reserva uma verba de 300 contos para o plano nacional de prevenção da cárie dentária, ao mesmo tempo que destina uma verba de 800 contos para a remodelação do gabinete, instalações e equipamento, 800 contos para alcatifas do Sr. Engenheiro Caetano, contra 300 contos para um programa nacional de prevenção da cárie dentária!
O Sr. José Niza (PS): - Essa é boa!
O Orador: - Também vou pôr ao Sr. Secretário de Estado a seguinte questão: referiu V. Ex.ª a priori-
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dade que se deve dar aos cuidados primários. São de natureza política ou de natureza técnica as razões que levaram a Aliança Democrática, assim que chegou ao Governo, há ano e meio - e na sua fúria intempestiva contra toda a legislação que edificava o Serviço Nacional de Saúde e que vinha do governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, feita por técnicos competentes, e que, inclusive na área dos cuidados primários, estabelecia uma perfeita estratificação dessa área com uma definição de carreiras e de centros comunitários de saúde, que hoje já podiam estar em funcionamento -, a destruir tudo o que se referia ao Serviço Nacional de Saúde?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Destruiu e até hoje ainda não apresentou uma alternativa, a não ser as vagas promessas que o Sr. Secretário de Estado e o Sr. Ministro continuam a fazer.
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado falou da questão da regionalização dos cuidados de saúde, particularmente da abertura de vagas nos hospitais a título permanente. Tudo boas intenções, ideias às quais, em princípio, nada temos a opor. Mas ponho-lhe a seguinte questão, Sr. Secretário de Estado: em Maio de 1980 foi publicada pelo governo da AD uma portaria que criava 701 vagas nos hospitais distritais para médicos especialistas. Os concursos foram realizados, os médicos concorreram, foram colocados, tomaram posse - tudo isto durante o Governo da AD -, e hoje, desses médicos praticamente nenhum está nos hospitais distritais, ou seja, não é por vontade dos médicos que eles não estão nos hospitais distritais. A responsabilidade é vossa, porque os concursos foram feitos, as posses foram tomadas, os lugares foram distribuídos e hoje os hospitais distritais podiam ter médicos.
A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Muito bem!
O Orador - Portanto, é o governo da AD - e particularmente gostava de saber qual é a responsabilidade do Sr. Secretário de Estado nisto - que não faz com que os hospitais distritais estejam apetrechados humanamente, à altura de poderem prestar os cuidados de saúde que tecnicamente estão aptos a prestar.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Depois, o Sr. Secretário de Estado falou na carreira do clínico geral. «Carreira do clínico geral», não sei se por lapso seu, só lhe definiu um grau, que é esse, clínico geral, não tem mais nenhum. Então isto é uma carreira, Sr. Secretário de Estado? Conhece alguma carreira que só tenha um grau?
Risos do PCP.
A seguir, o Sr. Secretário de Estado falou no generalista como sendo um especialista em cuidados primários que vai resolver os problemas de saúde na área dos cuidados primários nos próximos anos. Portanto, é isto que realmente a AD prevê para curto prazo. Pergunto-lhe se confirma - porque sei que é essa a ideia do Governo - a abertura, nos próximos concursos para os exames de entrada para a especialidade, de 60 vagas de médicos generalistas a nível nacional. É com esses 60 médicos generalistas que o Sr. Secretário de Estado pensa resolver o problema do serviço médico à periferia?
Por último, o Sr. Secretário de Estado falou no GIES. Disse que o GIES era um dos instrumentos que vinham do passado. Se calhar até pensa que foram os gonçalvistas que o criaram! Não, Sr. Secretário de Estado, foi criado pela AD. Foi criado pelo governo da AD esse Gabinete de Instalação e Equipamento da Saúde, que é, neste momento, o órgão asfixiador de toda a autonomia hospitalar. Foi o governo de Sá Carneiro que o criou e, portanto, é a AD que o suporta. O Sr. Secretário de Estado, se não sabe, devia realmente saber que o GIES é da vossa autoria.
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, agora começo a perceber por que li no Expresso que começava a haver divergências entre o senhor e a Ordem dos Médicos, particularmente com o Dr. Gentil Martins. O Sr. Secretário de Estado disse que ia fazer carreiras hospitalares, nas quais as pessoas eram promovidas por mérito próprio. Tenho na minha mão uma circular informativa do Ministério da Educação, que diz assim, no seu artigo 7.º § 1.º:
A direcção dos serviços com o ensino será , atribuída com respeito pela seguinte ordem e prioridades: primeiro, o professor catedrático; segundo, o professor associado: terceiro, o chefe de clínica doutorado, e quarto, o chefe de clínica.
Portanto, quem passou anos e anos a trabalhar nos hospitais vem em quarto lugar na escala de preferências. Este, Sr. Secretário de Estado, deve ser um dos pontos que o senhor deve esclarecer com o Dr. Gentil Martins.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Secretário de Estado, disse que a intervenção do Grupo Parlamentar do PCP devia ter sido civilizada, culta e educada e que não foi. E eu terminava dizendo que civilizado, culto e educado não deve ser com certeza quem diz que a saúde do povo português é só para quem a pode pagar, ou, seja, que a saúde é para quem paga,...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Quem é que disse isso?!
O Orador: - ...e muito menos quem defende um sistema de saúde para esse mesmo povo (no qual a própria palavra choca) que se deve fundamentar essencialmente no pagamento à peça.
Isto, Sr. Secretário de Estado, na nossa concepção de civilização, cultura e educação não cabe.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Emílio Peres.
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O Sr. Emílio Peres (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou fortemente embaraçado para pedir este esclarecimento, porque há manifesta incongruência entre aquilo que diz o Sr. Ministro e aquilo que diz o Sr. Secretário de Estado, de maneira que terei de pegar nas duas versões da mesma coisa.
Risos do PCP.
Fiquei bastante escandalizado que o Sr. Ministro tenha dito na Assembleia da República muito menos do que disse na televisão. Provavelmente é porque o debate o assusta e na televisão, a sós, pode dizer aquilo que quiser.
Uma voz do PCP: - Isso é para português ver!
O Orador: - Agora, de qualquer maneira, há uma coisa que é extraordinária. Penso que o Sr. Ministro, pelas funções que desempenha e pelo facto de ser medico, não desconhece a importância das palavras que disse em oposição aquilo que disse o Sr. Secretário de Estado, porque disse exactamente o seguinte: que a prioridade das prioridades é o desenvolvimento de uma rede de cuuidados diferenciados de saúde - dessa rede privilegiaria os hospitais centrais e, dos hospitais centrais, os hospitas de Lisboa -, e, depois, veio com o preço das camas e da mobília. Mas a verdade é que este projecto de privilegiar a medicina diferenciada é realmente um projecto audacioso, que vai contra o parecer, de mais de centena e meia de países que assinaram as declarações finais da reunião da Organização Mundial de Saúde, em Alma-Ata. E estou com a tentação de dar a esta posição do Sr. Ministro, em pleno desacordo com todo o mundo civilizado, um nome - a «convenção de Lisboa», que é um atraso de vida, não há dúvida!
Risos do PCP.
A verdade é esta: é que o Sr. Ministro dessa maneira tem que arranjar muitas unidades hospitalares para dar cobertura aos doentes, que, entretanto, vão aumentar de número e de gravidade, por faltarem os cuidados primários de saúde. Na realidade, em Lisboa sobretudo, onde acorrem não só doentes da periferia próxima da cidade, mas também doentes de toda a parte do Pais, que pensam aí encontrar a Meca da sofistificação médica e, na realidade, encontram um banco de hospital atulhado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!
O Orador - Tem também que arranjar muitos hospitais - mais do que aqueles que naturalmente pensa, mais do que 2 -, por uma razão: é porque, trabalhando só quatro ou cinco horas por dia, é evidente que esses hospitais não têm rendimento.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!
O Orador - Se uma cama é cara, se o equipamento é caro, há que tirar o rendimento dele, e isso não se faz com trabalho a meio emprego.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Já chega!
O Orador - Não chega não!
Vozes do PCP: - Ainda há mais!
O Orador: - É evidente que assim não há dinheiro que chegue e o anúncio de novos impostos é preocupante. Na televisão não o disse o Sr. Ministro, mas na entrevista de deu a A Tarde referiu muito concretamente um adicional sobre o imposto complementar para cobrir as despesas de saúde. Afirmou, erradamente, que o meu partido é contra cuidados diferenciados de saúde, o que não é verdade. O meu partido é manifestamente a favor de um desenvolvimento harmónico e integrado de todos os cuidados de saúde e até de mais coisas: das condições sociais e gerais, que o Sr. Ministro referiu, que são fundamentais para criar saúde, para diminuir a tal dependência das valências curativas da medicina.
Em relação a este discurso, o Sr. Secretário de Estado, provavelmente de uma forma muito mais realista, fala de preferencia de resolver os problemas da periferia. Mas a verdade é que não é uma coisa nem outra. É da congregação do desenvolvimento harmónico de ambas as possibilidades que resultará uma melhor protecção para a saúde dos Portugueses.
O Sr. Secretário de Estado falou da carreira do generalista - que um camarada meu já desmontou - e do clínico geral, mas não recebeu este ano o curso de P5, o curso com maior número de médicos - 700 -, que entretanto não cobrem toda a periferia, porque as câmaras, conhecendo bem a importância dos policlínicos para a cobertura sanitária do País, abrem cada vez mais vagas no litoral, de maneira que o nosso serviço médico à periferia é cada vez mais litoral. Da mesma maneira que todos os especialistas que deveriam estar colocados nos hospitais distritais continuam ainda nos hospitais centrais, encarecendo desalmadamente os custos da medicina aí praticada.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado não recebeu os generalistas, mandou o seu chefe de gabinete recebê-los, que disse exactamente isto acerca da carreira de generalista: «Ainda não está definida, mas vai ser definida a carreira. O quer que seja, ver-se-á a seu tempo e terão a sua formação. Mas de certeza que vão chefiar os clínicos gerais.
Quanto ao clínico geral, falta definir a carreira e o estatuto. São nomeados por despacho, de acordo com as notas de formatura (perdem cinco anos de função pública e vão ser distribuídos segundo a nota de formatura do curso de Medicina). Mas serão nomeados por despacho, porque não há garantias de o Tribunal de Contas aceitar o seu provimento. Mas se não aceitar, os clínicos gerais virarão as populações contra o Ministro das Finanças da altura.» (Que é depois do tempo previsto para a duração do governo da AD, depois de quatro anos.) «Só terão direito a ser transferidos para outro local a partir de quatro anos de colocação ou para concorrerem às vagas que então houver de especialidades ou de generalistas.»
Agradecia que me esclarecesse sobre isto, Sr. Secretário de Estado.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, tem V. Ex.ª a palavra para responder aos sucessivos pedidos de esclarecimento.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso deixar passar em claro a primeira afirmação da Sr.ª Deputada Zita Seabra quando se referiu a não sei que ligações a fascismos esquisitos. Digo-lhe que, se o general Soares Carneiro fosse Presidente da República, com certeza que o ambiente democrático se mantinha e que, se por acaso os senhores estivessem no Governo, provavelmente eu estava na cadeia.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM e protestos do PCP.
Afinal, os Srs. Deputados do PCP querem ouvir as minhas explicações?
Em relação aos Serviços Médico-Sociais, quando o Sr. Ministro diz que eles seriam extintos e que uma parte passaria para os centros de saúde e outra parte seria convencionada, é evidente que está a falar de uma realidade existente neste país que é a convenção em relação aos médicas, que faz com que o desaparecimento dos Serviços Médico-Sociais tenha que ser estudado caso a caso, porque há médicos que trabalham lá com regimes e estatutos muito diferentes: A compatibilização desses estatutos impõe que o médico que, eventualmente, trabalha nos Serviços Médico-Sociais e, que não seja possível integrar num único sítio vai continuar a prestar o mesmo serviço que estava a prestar à caixa, com o mesmo número de doentes, mas em regime de convenção. Isso não significa de modo nenhum que os Serviços Médico-Sociais sejam dissolvidos em convenção. Como disse na minha primeira intervenção, a convenção, o convénio as formas múltiplas de pagamentos não são mais do que instrumentos de gestão que nós desprezaremos.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Nota-se!
O Orador - Em relação aos raios X e às análises, digo-lhe que não há nenhuma convenção do governo da AD. Os raios X e as análises são convenções que já duram há bastantes anos.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - E os aumentos!
O Orador: - ...que tiveram simplesmente actualizações. E acrescento que as actualizações se fazem porque os senhores sonegam valores, dizendo só quanto se paga, mas não dizem o que se faz. A área das análises representa 15 milhões de análises e a área dos raios X representa qualquer coisa como 8 milhões de análises, o que dava, em 1979, 300$ para o preço de uma radiografia e cerca de 100$ para o preço de uma análise.
Isto significa, portanto, que esses preços, em relação às zonas de custos hospitalares, são mais baixos do que as zonas de custos hospitalares em relação aos exames radiológicos e às análises.
Quanto à importância da medicina preventiva, isto respondendo ao Sr. Deputado da UDP, é evidente que a medicina preventiva é um marco fundamental de qualquer sistema de saúde. E, quando falamos em centros de saúde integrados, é evidente que nos queremos referir às duas vertentes que o centro de saúde tem de executar e que são a vertente da prestação de cuidados primários e a vertente de prestação de cuidados preventivos, no que diz respeito a higiene do ambiente, a educação sanitária, a planeamento familiar, a noções de puericultura, a tudo aquilo que defume um centro de saúde integrado.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): Não são cuidados primários!
O Orador: - Não, senhor. Saúde e medicina preventiva, é o que estou a dizer.
Vozes do PCP: - Já não há! Já não se usa!
O Orador: - Está bem.
A pergunta sobre se a prioridade é dada aos cuidados primários ou aos cuidados secundários, respondo que isto é um problema filosófico muito difícil de resolver.
Os cuidados primários destinam-se fundamentalmente à saúde da comunidade. É directamente sobre a comunidade que esses cuidados incidem e é através deles (e com menor investimento) que se conseguem diminuições bastantes notáveis nas taxas de morbilidade e no fundo,, nos indicadores de saúde de uma população. Portanto, é evidente que os cuidados primários são prioritários. Mas também é um facto que qualquer sociedade moderna garante, através das suas próprias leis, ao seu cidadão o direito de ser tratado. E, nessa medida, os cuidados secundários - o direito a medicina que se destina, não à comunidade, mas ao caso concreto, do cidadão - são igualmente prioritários.
Em relação a uma actividade específica programada por um governo, é evidente que se pode dar uma tónica em relação a uma situação conjuntural de necessidades. Ora, a situação conjuntural de necessidades, atendendo a que os hospitais centrais estão de tal modo degradados e necessitam de uma actuação prioritária nesse campo, obrigou este governo a pôr a ênfase devido neste capítulo.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Essa é boa!
O Orador: - Isto não significa de modo nenhum que se considerem os cuidados primários como secundários.
Em relação aos clínicos gerais e as carreiras, julgo, provavelmente por deficiência minha, que não me tornei claro. Na área do ambulatório existem graus: existe o clinico geral, existe o generalista, existe, se quiser ainda, toda a estrutura de saúde pública e aquilo que será chamado consultor de clínica geral, que será um terceiro grau.
O clínico geral pode passar a generalista se, com mais de uns tantos anos de carreira, no fim do internato da especialidade quiser concorrer àquele grau. Portanto, é evidente que há graus e a carreira do ambulatório processa-se nestes graus que acabei de enunciar.
Em relação à titulação das carreiras hospitalares, esclareço que a titulação dos hospitais é uma titulação hospitalar.
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Em relação aos métodos extremamene simples e muito úteis, focados pelo Sr. Deputado da UEDS, é evidente que estamos perfeitamente de acordo em que na área dos cuidados primários, uma atitude simples é, normalmente, extremamente produtiva. Para não ir-mos mais longe, lembremo-nos de qualquer campanha de vacinação e do que provoca e do que causa uma medicina preventiva. Isto não significa de modo nenhum que passemos a usar simplesmente estes métodos; e não desejemos para os hospitais portugueses a tumografia axial computorizada.
Em relação aos concursos para os hospitais distritais, tenho a dizer que os médicos não tomaram posse. Os médicos fizeram a opção e actualmente já estão para publicação os primeiros resultados finais desses concursos. No, entanto, tenho a dizer que, pela metodologia usada dos concursos que foram feitos a nível nacional, há, pelo menos, três que estão impugnados e as suas classificações não podem sair.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Essa é boa!
O Orador: - É, sim, senhor!
Risos do PCP.
Em relação ao tipo de carreiras e ao tipo de ligação que há entre o Ministério da Educação e Cultura e o Ministério dos Assuntos Sociais, é de notar que o decreta que está em estudo é um diploma que pretende articular, nos hospitais que prestam ensino, a carreira docente e a carreira assistência! Quando se refere aquela lista de prioridades que o Sr. Deputado apresentou, é preciso dizer que a carreira se vai basear, exclusivamente, na carreira assistêncial e que só poderá doutorar-se um especialista, só poderá ser professor um chefe de clínica.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não é verdade!
O Orador: - Finalmente, em relação a uma carreira de generalista muito estranha de uns PS que ouviram dizer não sei o quê do Tribunal de Contas, devo dizer que isso é pura loucura e não sei do que se trata.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Nem palmas houve!
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um curto protesto.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, V. Ex.ª usará da palavra para a finalidade que entender. Na certeza, porém de que, qualquer que seja o sentido do seu uso de palavra, o tempo será descontado, como sabe.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - É só para lamentar profundamente que, tendo o nosso grupo parlamentar apresentado uma série de questões muito concretas e claras, o Sr. Secretário de Estado nos tenha respondido nada,...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É falso!
A Oradora: - ..., não tenha respondido a uma única das perguntas, que muito concretamente lhe colocámos.
Vozes do PSD: - É falso!
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Os eternos insatisfeitos!
A Oradora: - Desafiámos o Sr. Secretário de Estado a dar-nos as contas de quanto é que os Serviços Médico-Sociais pagaram às convenções, segundo as novas tabelas, em Janeiro e Fevereiro, aos radiologistas, aos analistas e a outras convenções e o Sr. Secretário de Estado respondeu-nos quanto é que custa uma radiografia e uma análise. Isso já nós sabíamos, Sr. Secretário de Estado!
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Perguntámos-lhe sobre as carreiras... Enfim, fizemos-lhe toda uma série de perguntas, muito concretas e directas, para conhecermos qual era, claramente, o pensamento do Governo. O que nos surge é uma confusão. O Sr. Ministro diz uma coisa, o Sr. Secretário de Estado diz outra. Desdiz o que disse o Sr. Ministro. O Sr. Secretário diz que os cuidados primários são muito importantes, o Sr. Ministro disse - ee tenho aqui comigo o Diário da Assembleia da República que o comprova - o seguinte:
Cuidados primários? Mas Portugal não é, por opção política, um país do Terceiro Mundo!
Risos do Sr. Deputado José Ernesto de Oliveira.
Sr. Secretário de Estado, quem é que, na verdade, representa a política da AD? É o Sr. Secretário de Estado ou é o Sr. Ministro?
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Muito bem!
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Sr. Presidente, peço a palavra para dar um breve esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A oposição entrou agora numa tónica diferente. Pretende ver um diferendo entre mim e o Sr. Secretário de Estado.
Vozes do PCP: - E não é verdade?!
O Orador: - É pena não perceberem o que se diz.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - A culpa não é nossa!
O Orador - Quando se insiste, em demasia, nos cuidados primários, como se eles fossem os únicos cuidados de saúde sobre os quais temos que nos debruçar e promover um determinado número de
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mecanismos, é evidente -já aqui foi dito quer por mim, quer pelo Sr. Secretário de Estado, quer em várias intervenções- que há outra zona, extraordinariamente importante e que comporta os cuidados de saúde, que é a zona dos cuidados diferenciados, que, a nível central, está profundamente degradada, nomeadamente na área metropolitana de Lisboa.
Não há, portanto, nenhuma incompatibilidade. Só existe incompatibilidade na vossa cabeça, porque pretendem confundir aquilo que é bem claro e que nós, por mais de uma vez, já dissemos. Não há qualquer diferendo. É triste que os senhores estejam a pretender levar o debate para uma zona que não existe e que, por mais que expliquemos, não querem perceber. Isso é um problema vosso e eu, sobre esta área, não torno a intervir.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Bem explicado! O Sr. Ministro sabe, por acaso, o que é a Organização Mundial de Saúde?!
O Sr. António Lacerda (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma intervenção.
Sr. Presidente: -2- Sr. Deputado, V. Exa.º está inscrito a seguir ao Sr. Deputado Manuel Lopes, que, pela ordem pela qual as inscrições foram recebidas na Mesa, antecedeu imediatamente a sua inscrição.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): -Sr. Presidente, cedemos o lugar ao Sr. Deputado António Lacerda, uma vez que o PSD ainda não usou da palavra.
Vozes do PSD; - Muito obrigada!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Vá lá, disse uma coisa acertada!
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Não há regra sem excepção!
O Sr. Presidente: - Então, tem V. Exa.º a palavra, Sr. Deputado António Lacerda.
O Sr. António Lacerda (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de entrar no conteúdo cia minha intervenção, gostaria de saudar, em meu nome pessoal e em nome do meu partido, os novos deputados pertencentes aos partidos da oposição que, sendo médicos, decidiram abandonar os seus consultórios, presumo que apenas temporariamente - o que se lamenta - para vir dar o seu contributo a este importante debate.
O Sr. César Oliveira (UEDS):- Que simpático!
O Orador - Por último,...
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS):-Já?!
O Orador - ... quero lamentar que não possamos contar, entre nós, por ter resignado do seu lugar de deputado e filiado no Partido Socialista -isto a fazer fé nos relatos da comunicação social-, do Prof. Bragança Tender, deputado que nos habituámos a estimar e que, com toda a certeza, traria outra elevação nas intervenções dos partidos da oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem! Vozes de protesto do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pedia a VV Ex. que, durante a intervenção de cada um de vós, sem prejuízo do direito do aparte que está previsto, permitissem a exposição clara e audível da intervenção que estiver a ser feita, seja quem for quê a faça e que esteja no uso da palavra.
Tenha a bondade de continuar, Sr .Deputado.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Depois desta introdução, passaria a ler a pequena intervenção que preparei para hoje.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Falar de saúde em Portugal não é tarefa fácil, e não é tarefa fácil pois múltiplos são os problemas com que todo nos deparamos: trabalhadores da saúde, potenciais utentes dos seus cuidados. Simplesmente, se o bom senso e o amor à verdade facilmente nos levarão a concluir que a saúde vai mal em Portugal e que também neste sector algo, e algo de muito, substancial, é necessário que mude, e essa mudança, como mais adiante se verá, está já a operar-se com o governo da Aliança Democrática, o mesmo bom senso e o mesmo amor à verdade ter-nos-ão de levar à conclusão que a situação, que hoje se vive, é uma situação que vem de trás, uma situação que faz parte de uma herança passada, de um passado não apenas remoto mas também próximo, e que também neste sector demonstra à saciedade a profunda crise estrutural da sociedade portuguesa e a necessidade urgente de a reformar.
O Sr. Pedro Roseta (PSD):-Muito bem!
O Orador - Mas, para tal, nada melhor do que um governo imbuído não apenas de intenções mas de uma proposta e uma conduta reformistas, para tal, nada melhor, quase diria, por definição, do que um governo da Aliança Democrática com o programa de todos conhecido.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Sousa Marques (PCP):-Não estamos no Campo Pequeno!
O Orador - É fácil vir falar nas bichas para as consultas, dos hospitais a transbordar, de doentes instalados em condições deficientes, se não mesmo impróprias e desumanas, de equipamento técnico que não existe, ou, se existe, não é utilizado por falta de profissionais habilitados, da grande concentração dos trabalhadores da saúde nos centros urbanos, etc. Infelizmente, para nós, casos como o que recentemente se passou no serviço de urgência do Hospital de S. José e provavelmente em muitos outros. «Sãos Josés» espalhados por todo o país e, como tal, menos
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conhecidos, são passíveis de acontecer neste último quartel do século XX em Portugal. Mas de quem é a culpa? Deste governo?
O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): -Não?!
O Orador.-Do VI ou do VII Governos Constitucionais, os governos da Aliança Democrática que estão no poder unicamente há dezasseis meses?
Vozes do PS: -Não!!
O Orador:-Corno se o problema da saúde em Portugal se resolvesse no período de uma gestação normal...
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Duas!
O Orador - Exigir que se faça, em dezasseis meses, o que outros não conseguiram em vários anos ... Com uma diferença: com os governos da Aliança Democrática, trabalho é palavra de ordem.
Vozes do PS -Trabalho?!
O Orador - Para outros, que já por lá passaram, demagogia, foi a sua prática diária.
O Sr. Pedro Roseta (PSD)_ Muito bem!
O Orador: - Como se encher a boca do povo português com chavões, que o não eram, e que transmitiam anseios e aspirações legítimas do povo português antes de a sua utilização ter sido usada e abusada, tivesse o condão, que nem varinha mágica ou lanterna de desejos, de solucionar tão candente problema. Que lirismo, Srs. Deputados... A questão é que muitos desses chavões provêm de pessoas que de saúde pouco ou nada percebem, pessoas que nunca requentaram os hospitais (para além, naturalmente, das eventuais visitas a que estamos, as mais das vezes, involuntariamente, sujeitos, enquanto potenciais utentes, ou então que os conhecem de visitas oficiais, porventura investidos nas funções elevadas dos seus cargos, eventualmente ministeriais, com a televisão atrás juntamente com outros órgãos de informação social. Demagogia? Bastante. Propaganda partidária?
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Está a falar para o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais!
O Orador - Alguma. Promoção pessoal, promoção intrapartidária? Muita! E o que é lamentável é que a saúde de um povo seja usada como estandarte por partidos ou conjunto de pessoas que, à falta de melhor, e utilizando algo que é caro à população, mais não pretendem, as mais das vezes, do que alimentar ambições mesquinhas...
A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Não é o caso!
O Orador -... e, como tal, de legitimidade moral pelo menos duvidosa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esquecem-se, ou pretendem não se lembrar, de que tão importante como a medicina curativa é a medicina preventiva. Que saúde não é apenas a ausência de doença, mas também o bem estar social e mental. E, se entrarmos por este campo, se fizermos uma análise pregressa do que os partidos e individualidades que hoje estão na oposição mas que já estiveram no governo, desde o PS ao PCP, passando pelos deputados, entre outros, Lopes Cardoso e Sousa Franco, este no governo Pintassilgo, fizeram em matéria de promoção do bem-estar social e mental, então ficamos inteirados. Inteirados, como já está, aliás, o povo português. Se assim não é, como explica a oposição o apoio reforçado da Aliança Democrática nas últimas eleições legislativas?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. António Mota (PCP): - E em 7 de Dezembro?
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): -Que tristeza!
O Orador - Mas, se eu toco este assunto e o abordo por este prisma, e independentemente da justiça de que as minhas palavras enfermam pretendo, tão-somente, demonstrar, para quem tivesse dúvidas e não só devo dizer que a má fé não é de admitir, pois a ética parlamentar a isso não me permite, que o problema que hoje tratamos transcende largamente este governo e, por tal motivo, esta interpelação, feita a um governo com quatro meses de idade,...
Uma voz do PCP: - Coitadinho!
O Orador: -...é perfeitamente irrealista, despropositada e, como tal, votada a rotundo fracasso, como, aliás, as oposições nos vêm habituando.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Orador - Dizia o Dr. Mário Soares, então Primeiro - Ministro, que «temos de viver com aquilo que temos» e, assim sendo temos também nós, que nos habituar a viver com a oposição que temos.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Que é má!
O Orador: - Mazinha, e talvez por isso mesmo se encontram hoje ma oposição!...
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não desejaria terminar...
O Sr. José Niza (PS): - Mas já tinha começado?!
O Orador -... sem antes recordar às oposições, e muito particularmente ao partido interpelante, algumas das medidas já tomadas ou anunciadas para breve execução pelo VII Governo Constitucional, visando a prestação de cuidados de saúde com um mínimo de qualidade, dentro das disponibilidades e condicionalismos existentes. Assim, e como prioridade imediata do Governo, a adopção pronta de medidas que visem me-
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...lhorar o rendimento dos serviços e humanizar os cuidados prestados. Isto na perspectiva de que é fundamental a relação humana médico - doente e a confiança que este deposite naquele. Naturalmente que tal pressupõe, entre outras coisas, o preenchimento completo dos quadros dos serviços, nomeadamente, dos situados mais à periferia, por médicos e outros técnicos de saúde enquadrados em carreiras estimulantes, a quem sejam criadas condições de carreira. Neste sentido, e como foi anunciado, criar-se-ão condições para o desaparecimento do serviço médico na periferia, sendo tais vagas, existentes ou a criar, ocupadas por clínicos gerais e generalistas com um estatuto a definir. Simultaneamente, proceder-se-á à reformulação da carreira de médico de saúde pública, mediante a ministração de cursos de pós-graduação na Escola Nacional de Saúde Pública.
O Sn. Vidigal Amaro (PCP): - A definir!
O Orador - Não, Sr. Deputado, já definido. Tudo isto, naturalmente, para funcionar, numa estrutura integrada regional, as futuras administrações regionais de saúde, que, para além de planearem e gerirem todas as acções envolvidas na promoção da saúde (prevenção, tratamento e reabilitação), potencializem, aos mais baixos custos, os recursos existentes a nível oficial.
O Sr. Vidigal Amaro (PCD):- Essa é uma intenção!
O orador:- Resta, portanto, referir a colaboração que necessariamente, terá de ser feita e articulada com o sector privado...
A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- Negociado!
O Orador - ... sob uma preocupação básica. A qualidade e os benefícios prestados, por um lado; os custos que os contribuintes terão de suportar, por outro. Nesse sentido, e dentro deste espírito, irá o Governo estimular e fomentar a assinatura de convenções e convénios - aliás como foi há pouco referido naquela troca de impressões entre os deputados da oposição e o Secretário de Estado da Saúde com o sector privado, pretende-se aliar à economia a qualidade. Prestes a terminar, uma palavra particular de apreço por aquilo que consideraria uma boa nova para o povo português, pois de verdadeira boa nova se trata, comunicada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, da construção, ou entrada em funcionamento, de novos hospitais,
Risos do PCP e do PS.
que poderão e ajudarão a solucionar algumas carências com as quais nos vimos deparando.
Por último, e guardando para o fim, por ser, a meu ver, a medida mais importante, ...
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Isso é ridículo!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Ridículo é você, Sr. Deputado!
O Orador - ... a apresentação a esta Câmara, até final da presente sessão legislativa...
Vozes do PCP: -Isso é ridículo!
O Orador - Devo dizer aos Srs. Deputados que não me incomoda nadinha estarem para aí a falar, tentando perturbar a minha intervenção. O máximo que poderei fazer é solicitar ao Sr. Presidente para me descontar as interrupções. Tirando isso, podem continuar a barafustar, porque não há problema nenhum.
Dizia eu, por último, e guardando para o fim a parte, a meu ver, mais importante, a apresentação a esta Câmara, ainda durante a presente sessão legis-lativa, de uma lei de saúde que, nas palavras do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, será uma lei global, homogéna, coerente e eficaz, que permitirá institucionalizar a criação do Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Isso já foi dito!
O Orador:- Exactamente. Estou a citar o Sr. Ministro. Não estavam com atenção quando eu disse «citando».
PCP: - Isso é cassete!
O Orador:- Para todos os efeitos registo a vossa descortesia.
O Sr. Pedro Roseta (PSD):- Querem eles governar!
O Orador- Com tal apresentação, ficará cumprida a promessa -a dupla promessa - do que, em 1979, há quase dois anos, em nome do meu partido, aqui nesta Casa, na Assembleia da República, aquando da votação daquilo que, se tornou a Lei n.º 56/79, afirmei que brevemente...
O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Vão sair!
O Orador -...estaríamos no Governo, ...
O Sr. César Oliveira (UEDS) - Bruxo !
O Orador: - ...que brevemente seríamos maioria neste país, que brevemente iríamos apresentar a esta Assembleia uma lei quadro de Serviço Nacional de Saúde reformista, progressivo, realista,...
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Reaccionária!
O Orador: - ..., exequível e capaz de dar satisfação plena aos anseios do nosso povo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - E monárquico!
O Orador: - Concluindo, resta-me dizer que o diagnóstico está feito ...
O Sr. José Niza (PS): -E o funeral?!
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O Orador: - ... e que, com este governo, com este programa, com a maioria que o apoia, o prognóstico é altamente favorável.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: Srs. Deputados, chegámos à hora prevista para a suspensão dos nossos trabalhos. A sessão, continuará amanhã, às 9 horas e 30 minutos.
Além do dever de anunciar alguns diplomas que entraram na Mesa -o que farei de seguida-, queria recordar que, uma vez que a suspensão da sessão foi por se atingir o tempo regimentalmente fixado pára o seu termo, transitarão para amanhã os tempos, tal como ficou assente na conferência dos grupos parlamentares.
Devo ainda informar a Câmara de que entraram na Mesa o pedido de ratificação n.º 79/II, relativa ao Decreto-Lei n.º 90/81, de 28 de Abril, que revoga a legislação relativa à intervenção do Estado nas empresas - Decreto-Lei n.º 422/76, e legislação complementar, apresentado pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira e outros, do PCP, e os seguintes projectos de lei: n.º 204/11- Estatuto do objector de Consciência, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Lage e outros, do PS; n.º 205/II - Objecção de Consciência frente ao Serviço Militar, apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Miranda e outros, da ASDI; n.º 206/II - Estatuto do Objector de Consciência perante o Serviço Militar, apresentado pelo Sr. Deputado António Vitorino e outros, da UEDS; n.º 207/II- Criação da freguesia de Caparrosinha de Tondela, distrito de Viseu, apresentado pelo Sr. Deputado Alberto Henriques Coimbra, do CDS; n.º 208/II - Associações Nacionais e Regionais de Municípios, apresentado pelos Srs. Deputados José Augusto Santos da Silva Marques, José Gomes d'Abreu de Lima e Luís Coimbra e outros, respectivamente do PSD, do CDS e do PPM; e n.º 209/11 -Criação do concelho de Vizela, apresentado pelo Sr. Deputado Luís Coimbra e outros do PPM.
Srs. Deputados, continuaremos, como há pouco já anunciei, os trabalhos, amanhã, às 9 horas e 30 minutos.
Está encerrada a sessão. Eram 21 horas e 5 minutos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social - Democrata (PSD)
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
António Vilar Ribeiro.
Bernardino da Costa Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Partido Socialista (PS)
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Azevedo Gomes.
António Emídio Teixeira Lopes.
Bento Elísio de Azevedo.
Joaquim José Catanho de Menezes.
José Luís Amaral Nunes.
José Luís Ferreira Araújo.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Vítor Manuel Brás.
Centro Democrático Social (CDS)
João Lopes Porto.
Manuel A. de Almeida de A. Vasconcelos.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Comunista Português (PCP)
Vital Martins Moreira.
A REDACTORA DE 1.ª CLASSE, Cacilda Nordeste.
PREÇO DESTE NÚMERO 48$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA