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I Série - Número 19

Sexta-Feira, 27 de Novembro de 1981

DIÁRIO Da Assembleia da República

II LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE NOVEMBRO DE 1981

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários: Exmos. Srs. Valdemar Cardoso Alves
Guilherme Gomes dos Santos
António Mendes de Carvalho
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.

Ordem do dia. - Na primeira parte, o Sr. Deputado Gomes Fernandes (PS) fez a apresentação do projecto de lei n º 273/II - Centro Histórico do Porto -, da autoria do seu grupo parlamentar. Respondeu depois a pedidos de esclarecimento e protestos- dos Srs. Deputados César de Oliveira (UEDS), Carlos Robalo (CDS), Natália Correia (PSD), Ilda Figueiredo (PCP), António Moniz (PPM), Adriano Vasco Rodrigues (CDS), Magalhães Mota (ASDI), António Taborda (MDP/CDE), Montalvão Machado e Casimiro Pires (PSD).
Na segunda parte, concluiu-se o debate do projecto de lei n.º 230/II, da ASDI, sobre a defesa do ambiente e a protecção da natureza e do património, que foi rejeitado.
Intervieram, a diverso título (incluindo declarações de voto), os Srs Deputados José Manuel Mendes (PCP), Leonel Fadigas (PS), Luís Coimbra (PPM), Rogério de Brito (PCP), Natália Correia (PSD), Vilhena de Carvalho (ASDI), Gomes Fernandes (PS), Sousa Lara (PPM), Dias de Carvalho (ASDI), Oliveira e Sousa (CDS), Borges de Carvalho (PPM), Figueiredo Lopes (PSD), Magalhães Mota (ASDI), Portugal da Silveira (PPM), Henrique de Moraes (CDS), António Taborda (MDP/CDE), Casimiro Pires (PSD), Anselmo Aníbal (PCP), Sousa Marques (PCP) e António Mota (PCP)
Entretanto, o Sr. Deputado Pinto da Silva (PS) procedeu à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, sobre a substituição de deputados do CDS, que foi aprovado.
Durante o debate do projecto de lei acima referido o Sr Deputado Sousa Marques (PCP) interpelou a Mesa no sentido de que esta se informasse acerca de incidentes ocorridos na Covilhã durante a manhã.
Finalmente, após ter anunciado a entrada na Mesa de vários diplomas e de ter prestado informações em resposta à interpelação feita, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum.
Declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Vilar Ribeiro.
Armando Lopes Correia Costa.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Casimiro Pires.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Cunha Dias.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando Alfredo Moutinho Garcez.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando dos Reis Condesso.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
Joaquim Pinto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.

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Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Manuel Ribeiro Arruda.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Maria Manuela Dias Moreira.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Mário Dias Lopes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS)

Alberto Marques Antunes.
Alfredo Pinto da Silva.
António Duarte Arnaut.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco B. Sousa Gomes.
António José Sanches Esteves.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Torres Marinho.
Fernando Verdasca Vieira.
Guilherme Gomes dos Santos.
Joaquim José Catanho de Menezes.
José Luís Amaral Nunes.
Leonel Sousa Fadigas.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Trindade Reis.
Mário Manuel Cal Brandão.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Mendes Carvalho.
António Pedro Silva Lourenço.
Carlos Eduardo Oliveira e Sousa.
Carlos Martins Robalo.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
João Cantinho Andrade.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Pulido de Almeida.
José Augusto Gama.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Rui António Pacheco Mendes.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António José M. Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do Carmo C. Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel da C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António Cardoso Moniz.
António José Borges G. de Carvalho.
António de Sousa Lara.
Jorge Victor Portugal da Silveira.
Henrique Barrilaro Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Acção Social-Democrata Independente (ASDI)

Fernando Dias de Carvalho.
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)

António Ferreira Guedes.
António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

António Monteiro de Almeida Taborda.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por acordo estabelecido entre os grupos parlamentares, não há período de antes da ordem do dia.

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A primeira parte do período da ordem do dia consta da apresentação, pelo Partido Socialista, do projecto de lei n.º 273/II, referente ao Centro Histórico do Porto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes, para proceder à referida apresentação.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É objectivo primeiro desta minha intervenção, a apresentação do projecto de lei n.º 273/11, referente ao «Centro Histórico do Porto», apresentado à Mesa da Assembleia da República em tempo oportuno pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista e à volta do tema tecer considerações sobre problemas de interesse da cidade do Porto e da Região Norte.
Falar da cidade do Porto e do seu Centro Histórico é recuar no tempo ao sítio donde no século XI «houve nome Portugal»; é trazer à memória a importante fortificação que constituiu a «cerca sueva» do século v e de que ainda hoje resta a «Porta de Vandoma»; é relembrar a importância do ponto geográfico onde cruzava a estrada romana que ia de Lisboa a Braga e Astorga com o rio Douro, essa enorme via fluvial que mistura o seu temperamento de ira ou de lúdica serenidade com o sofrimento e angústia ou com a faina laboriosa das gentes ribeirinhas da nobre e leal cidade do Porto.
Confinada, até meados do século XVIII, ao perímetro da muralha fernandina do século XIV, a cidade do Porto encontrou nos Almadas a capacidade política e realizadora de abertura à modernidade e no comércio do vinho do Porto o suporte económico-financeiro do seu desenvolvimento, que se traduziria em obras de grande vulto urbano, do barroco e do neoclássico, que a História classificou como o período da «arquitectura e urbanismo do Vinho do Porto».
Estão lá presentes os Clérigos e o Paço Episcopal de Nasoni; a Praça da Ribeira e a Feitoria Inglesa de John Withead; o Hospital de Santo António de John Carr; estão lá os símbolos vivos da arquitectura do ferro que fez a transição do século, as pontes D. Maria e D. Luís e o Mercado de Ferreira Borges e a saudade do velho Palácio de Cristal; mantém-se ainda intacto no seu conjunto urbano, pese embora a falta de protecção ou de estudo e classificação sistemática, um dos maiores e mais ricos patrimónios arquitectónicos do século XIX que este país possui; ensaiaram-se, com êxito indiscutível, no coração maltratado mas forte da velha cidade -a zona da Ribeira-Barredo - importantes experiências no domínio da reabilitação urbana que vieram pôr a descoberto achados arqueológicos valiosíssimos, permitiram retomar tecnologias construtivas quase perdidas e dinamizar valores culturais de um quadro social e humano que são intrínsecos ao Porto, justificam o nosso passado e responsabilizam-nos quanto ao futuro.
Julgo estar, em síntese, traçado um quadro mínimo justificativo desta iniciativa, que se impõe ainda mais por:

1.º Estarem praticamente paralisadas as obras de renovação urbana da Ribeira-Barredo, com a apatia, a descrença e a sombria amargura do futuro instalados na população ribeirinha, no gabinete responsável pela operação e nos sectores produtivos que a materializavam no terreno;
2.º Não existir um planeamento mínimo, quer da Câmara quer do Governo, em matéria de urbanismo, habitação e equipamentos sociais para a cidade do Porto e especialmente para o seu centro histórico;
3.º Sentir cada vez mais a perda de poder político do Porto, no plano nacional e regional, situação que os seus cidadãos não aceitam, o desenvolvimento económico e social da região não se compadece, e o equilíbrio democrático dum Estado descentralizado e regionalizado impõe que seja ultrapassada.

Poder-se-á perguntar então, que tem a ver o «Centro Histórico do Porto» com tudo isto, ou doutro modo, que impacto terão tais factos na definição ou não dum projecto político para a cidade e para a região de que esta é indiscutivelmente «testa de ponte»?
Pois bem, responder-se-á que a reabilitação do centro histórico do Porto é um vector importante do futuro modelo de desenvolvimento da cidade: pela valorização do seu património cultural, histórico e arquitectónico; pela resolução de graves problemas de habitação e equipamentos sociais no seu tecido humano mais envelhecido e sacrificado; pela melhoria da sua capacidade de prestação de serviços a uma região que num tempo ainda longo não os poderá dispensar; pela recuperação da imagem e do prestígio internacional de cidade do trabalho e da cultura que o Porto era no princípio do século e que veio perdendo, duma forma mais grave porque mais acelerada nas duas últimas décadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É um facto, que julgo incontroverso hoje, que a cidade do Porto vive mais das recordações dum passado, rico de cultura, de dinâmica desenvolvimentista e de espírito liberal e insubmisso, do que propriamente de qualquer ideia força polarizadora dum projecto sócio-cultural e económico no qual ou possa vir a assumir um papel de liderança democrática e regionalmente indiscutível.
Se tal é evidente, também não o é menos a responsabilidade que, face à situação, devem assumir as forças políticas e económicas, empresariais e sindicais, associativos e culturais, que cada uma a seu modo desempenham um papel na vitalização da vida cívica e cultural da cidade.
Responsabilidade que implica a participação activa na formulação dum projecto de desenvolvimento para a região norte e para a cidade do Porto, que a esta restitua o prestígio político e cultural que já possui e àquela reconheça os direitos que muito justamente possui como criadora de uma fatia significativa da riqueza global do País.
A cidade do Porto e a região de que é testa de ponte debatem-se hoje, mais de sete anos depois de Abril, com alguns problemas estruturais cuja resolução não pode ser por muito mais tempo adiada, sob risco de agravar as injustiças sociais, bloquear o florescimento cultural, desvirtuar as potencialidades de crescimento económico e desmobilizar o espírito combativo daqueles que apostam na transformação participada e assumida com responsabilidade e com justiça.

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Começo pela cidade, afirmando que para mal desta e com a preocupante apreensão de todos os democratas que indignadamente a isto assistem, o Porto tem a mais incompetente e vergonhosa gestão municipal dos últimos vinte anos, politicamente desacreditada, socialmente ignorada, culturalmente provocatória e tecnicamente incapaz de resolver um único que seja dos graves problemas que afligem ao velho burgo tripeiro.
E estes têm vindo a deteriorar-se, nos campos da habitação, do saneamento básico e da limpeza urbana; dos equipamentos sociais e culturais; do gráfico urbano; da completa ausência de uma orientação de planeamento e gestão urbanística da cidade, onde já se gastaram algumas dezenas de milhares de contos com um Gabinete de Planeamento e Gestão Urbanística e nenhuma informação é dada à opinião pública sobre o que se está a fazer, de que estudos e propostas já se dispõe e que directrizes de futuro se apresentam para as próximas décadas.
Entretanto o movimento cooperativo de habitação, que recebeu um forte impulso da parte do anterior executivo camarário socialista, debate-se desesperadamente sem apoios da Câmara e do Governo; o projecto de recuperação urbana da Ribeira-Barredo está praticamente paralisado; o plano de limpeza da freguesia da Sé, exemplar pelo esforço de participação e consenso de forças sociais e culturais da freguesia à volta da sua junta, não avança por falta de resposta da Câmara; os buracos nas ruas multiplicam-se e o trânsito é cada vez mais caótico; a burocracia dos serviços camarários é a barreira que existe entre a Câmara e os cidadãos cresce; o velho Mercado de Ferreira Borges, exemplar único da arquitectura do ferro portuguesa, apodrece enquanto a Fundação Gulbenkian e os portuenses aguardam uma explicação sobre o modo como foram gastos os 20 000 contos com que aquela instituição dotou a Câmara para o arranque das obras de recuperação deste belo edifício; entretanto, dizem os jornais e ninguém desmente, que a Câmara vai abrir concurso de projectos para a Avenida da Ponte e Pedreira da Trindade, atirando para o lixo os projectos existentes e que custaram mais de 10 000 contos um dos quais da autoria de Siza Vieira, o melhor arquitecto português actual, tudo isto numa manobra que visa claramente e, como é evidente, já as próximas eleições autárquicas.
Em síntese, Sr. Presidente e Srs. Deputados:

Uma cidade que deveria assumir (e que tem que assumir!) no plano político-cultural, as potencialidades e aspirações económico-sociais de toda a vasta e diversificada região norte não tem hoje peso político e nega assim a sua história e o seu passado de inconformismo, de autonomia e de insubmissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passo agora à região, a que têm sido feitas muitas promessas não cumpridas e onde existem problemas estruturais graves, que a um deputado cumpre denunciar, na certeza de que com isso está a ser porta-voz de um tecido sócio-económico situado nas bissectrizes da democracia, do desenvolvimento regional e do aproveitamento das potencialidades locais; do reforço e da autonomia do poder local.
Os problemas mais graves que se põem à região norte, neste momento, dizem respeito à rede de transportes e comunicações regionais; ao bloqueamento dos terminais de tráfego marítimo e aéreo internacional; ao futuro de uma indústria de pequena e média dimensão face à entrada na Europa; à resposta que vier a ser dada, no âmbito de um necessário reordenamento do território e gestão das bacias hidrográficas, ao problema da regionalização.
A rede de transportes e comunicações regionais exige que sejam tomadas opções imediatas no que respeita aos chamados itinerários principais, de ligação do Porto a Famalicão/Braga e ao Nordeste Transmontano, para o que se torna importante completar, dentro da cidade do Porto, o troço essencial da via de cintura interna até Fernão de Magalhães, e fora da cidade o troço de via rápida da Maia, de forma a viabilizar as ligações ao Porto de Leixões e ao Nordeste Transmontano. Neste sentido, a cidade e a região exigem ao Governo o respeito pelos compromissos políticos assumidos e exigem à Junta Autónoma de Estradas a clarividência e a colaboração que esta não tem dado, até ao momento, para que os projectos saiam dos Gabinetes e as obras sejam realidade. Igualmente e na transposição do rio Douro para Sul, não pode aceitar-se o capcioso comportamento do Governo ao privilegiar a nova ponte ferroviária sobre o Douro e remeter para o futuro sempre incerto o problema da ligação rodoviária a nascente da cidade. O sistema de transportes terá de ser integrado, a solução técnica pode ser de uma ponte mista ou de pontes autónomas, mas autarquias directamente interessadas e a região não podem aceitar que a questão seja sofismada e a resolução do problema seja adiada.
No domínio dos transportes internacionais, é incompreensível o modo de gestão do Porto de Leixões, com bloqueamentos inaceitáveis e altamente perniciosos para a economia nacional; é preciso resolver o problema da barra do Douro ou então todo o projecto de navegabilidade deste rio não passa de uma farsa s o Porto e o Norte não pactuam comparsas, mesmo que o principal actor seja o político, actualmente Primeiro-Ministro. Impõe-se esclarecer porque não existem, neste momento já, melhores condições de funcionamento do aeroporto de Pedras Rubras, sendo do domínio público que existe, encaixotada há mais de dois anos, aparelhagem sofisticada para permitir melhorar as condições de aterragem dos aviões mas que não se sabe quando, nem de que modo, vai ser empregue.
O Porto e o Norte têm direito de exigir a melhoria das suas portas para a Europa e estas passam por Pedras Rubras, passam por Leixões e pelo Douro, por Aveiro e Viana, passam pelo Nordeste Transmontano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Partindo do coração da cidade do Porto, do seu Centro Histórico que é, a um tempo, alma e imagem desta «Mui nobre e invicta cidade» estendemo-nos à região que à sua volta gravita, no consciente pressuposto de que os problemas tratados são parte das mesmas preocupações e que a reabilitação do casco medieval, barroco e novecentista do Porto, é pedra-de-toque para uma nova concepção de cidade e para um assumido exercício de poder político que dignifique a riqueza arqui-

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tectónica e cultural e a capacidade de trabalho e espírito de bairrismo do sacrificado povo tripeiro.
O Partido Socialista está, com este projecto de lei, a assumir um compromisso com o Porto e com o País, pois tamanha riqueza, que se depara aos olhos atónitos daqueles que idos do Sul transpõem o Douro, sempre tendo a sensação que algo de diferente há nessa imagem, não pode ser alienada, como o tem feito a Câmara e o Governo. O Partido Socialista deu também, nesta matéria, provas concretas que a população ribeirinha melhor do que ninguém saberá testemunhar.
E o Governo do distrito teve, na altura, uma figura impar de humanidade e de dedicação democrática, que se impõe aqui relembrar, e que foi o meu camarada Mário Cal Brandão. É num gesto de elementar justiça que o deputado e o principal responsável pela recuperação urbana da Ribeira-Barredo, no seu momento mais emocionante, pois não poderia, neste momento e aqui, deixar de o fazer.
O presente projecto de lei é, neste enquadramento, uma peça mais para lembrar ao Governo e à Câmara Municipal do Porto as responsabilidades que têm para com a cidade e o seu povo. Não é uma peça juridicamente perfeita nem esse é o nosso objectivo. É um alerta, talvez o último alerta possível a esta Assembleia da República, para salvar uma cidade a que nos sentimos presos como cidadão, apaixonados como arquitecto e comprometidos como deputado. Se este alerta for ouvido, a voz do Porto será ouvida também num país que reencontrou a liberdade.

Aplausos do PS. do PSD, do CDS, do PCP e do PPM.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se os Srs. Deputados César de Oliveira, Natália Correia, Ilda Figueiredo, António Moniz, Adriano Vasco Rodrigues e Magalhães Mota, para pedir esclarecimentos e o Sr. Deputado Carlos Robalo, para fazer um protesto.
Tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Antes de mais, gostaria de felicitar o Sr. Deputado Gomes Fernandes e o Partido Socialista por esta iniciativa legislativa.
Sr. Deputado, ouvi atentamente a sua intervenção e gostaria de fazer-lhe uma pergunta e obter confirmação de uma interpretação que eu próprio fiz.
Porque é que o Sr. Deputado afirmou, várias vezes, estarem paralisadas as obras de recuperação da Ribeira-Barredo? Ou seja, qual a razão que V. Ex.ª pode aduzir para essa paralisação?
O Sr. Deputado falou a propósito do Centro Histórico do Porto e ligou isso, ao fim e ao cabo, com a regionalização, com a reivindicação de um poder local alargado, actuante e eficaz. Será que o Sr. Deputado considera que a recuperação e defesa do património do Centro Histórico do Porto assenta, em última instância, na tão propalada e falada regionalização?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Robalo, para um protesto.

O Sr. Carlos Robalo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A muita consideração que o Sr. Deputado Gomes Fernandes me merece, leva-me a que lhe faça só um brevíssimo protesto...

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Não sabe fazer mais nada!...

O Orador: -... até porque em termos de reunião de líderes dos grupos parlamentares, alterando a própria ordem do dia, todos os grupos parlamentares aceitaram que V. Ex.ª pudesse apresentar o projecto de lei sobre a criação do Centro Histórico do Porto.
Esperávamos, na realidade, que o Sr. Deputado apresentasse o referido projecto de lei, mas o que fez foi aquilo a que poderia chamar-se uma declaração política não muito rica, confundindo o Sr. Primeiro-Ministro e até o problema do aeroporto com o assunto a que o projecto de lei a apresentar se refere. É contra isto que protestamos.
Entendemos que as decisões dos líderes dos grupos parlamentares, em princípio, devem ser respeitadas e tinha havido um acordo, no sentido de hoje não haver período de antes da ordem do dia.
Estamos perante uma situação de excepção e só lamento que o Sr. Deputado, que nos habituou sempre a intervenções correctas sobre os temas em debate, se tenha aproveitado dela para um fim a que se não destinava, fugindo assim ao assunto sobre que versa o projecto de lei a apresentar.

Vozes do CDS:- Muito bem!

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Foi muito fraquinho!

O Sr. Carlos Robalo (CDS): -O Sr. Deputado não sabe que não funciono em cassettes?!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Lastimo muito, pela amizade que me liga ao Sr. Deputado Gomes Fernandes e pela admiração moral e intelectual que tenho por ele, ter de evocar a figura de protesto. É que eu gostaria que a apresentação do seu projecto de lei fosse mais purificada de carga política, Sr. Deputado, porque essas críticas comprometem, quanto a mim, a isenção cultural do projecto.
O Sr. Deputado sabe que estou autorizada a fazer-lhe este reparo, porque jamais misturei aqui política com cultura. Um projecto cultural deve ser, pura e simplesmente, um projecto cultural e não um pretexto para fazermos críticas ao Governo, embora o Sr. Deputado tenha todo o direito a fazê-las.
Permita-me um conselho, que não direi maternal mas amigo: aproveite para fazer ao Governo todas as críticas que entender, e como oposicionista deve fazê-las, mas nunca num projecto cultural!

Vozes do PSD: -Muito bem!

A Oradora: - Mas, passe esta amigável crítica, vamos ao principal.
Este projecto de lei tem, para mim, um valor paradigmático, pois levanta a questão dos centros nisto-

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ricos que estão a ser assaltados pela voragem urbanística.
Foi nesse novo-riquismo urbanístico, que Eça de Queiroz maravilhosamente retratou em «A Cidade e as Serras», que derrubou grande parte do velho burgo medieval do Porto. Aí se desenvolveu o comércio marítimo, que deu lugar ao nascimento de uma nova classe, a classe burguesa, que vem derrubar a velha ordem feudal, enriquecida com a força municipalista que mais tarde dá o fruto do liberalismo no Porto. Tudo isto são valores culturais, históricos e sociais, que estão associados a esse velho centro histórico do Porto. E tanto basta para que este seja também um desafio à edilidade portuense que tem fortes tradições a partir desse centro histórico. E aí congratulo-me porque a edilidade portuense tem uma oportunidade para mostrar que continua a defender os seus velhos pergaminhos e os interesses culturais da cidade, que ainda por cima estão intimamente associados à velha tradição municipalista do Porto, que tanto contribuiu para as liberdades em Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - No momento em que a gestão da Câmara AD, no Porto, é de facto catastrófica e assume aspectos que o povo do Porto não merece, é importante a iniciativa que o Partido Socialista trouxe aqui hoje.
É importante, pois, e reveste aspectos de interesse, nomeadamente a intervenção de apresentação que o Sr. Deputado fez, tendo em conta, por exemplo, todo o agravamento da situação, verificado hoje, no Porto. E esse agravamento não se verifica apenas no campo da cultura, mas também no da habitação, como referiu, no da paralisação de todas as obras de recuperação do centro de urbanização da zona Ribeira-Barredo e no da sua não extensão a todas as outras zonas. E pergunto ao Sr. Deputado se não está de acordo com a imediata recuperação de toda essa zona da cidade - nomeadamente em relação às freguesias da Sé, de Miragaia e de toda aquela zona ribeirinha, onde existe toda uma vida de uma população que tem tradições de séculos - que está a ser sistematicamente destruída e desprezada por essa gestão da Câmara AD.
Pergunto ao Sr. Deputado, por exemplo, se não considera ser isso ainda testemunho, também, da posição deste Governo em relação à regionalização.
O que pensa o Sr. Deputado quanto à questão da nova ponte, de que tanto se fala, em que nem sequer foram ouvidas as autarquias da zona?
Não pensa o Sr. Deputado, que um projecto destes deveria ter em conta toda a recuperação da zona ribeirinha da cidade e toda a recuperação, nomeadamente dentro desta iniciativa que o Sr. Deputado apresentou, do centro histórico da cidade?
Não deveria ter sido levado em conta tudo isto, pelo Governo, quando por exemplo pensou na construção de uma ponte naquela zona da cidade?
Dentro desta perspectiva, de recuperação das zonas ribeirinhas da cidade, não acha, Sr. Deputado, que está em causa, igualmente, o problema da falta de equipamentos sociais, o problema do lixo nessa zona e todo o desprezo que as populações dessa zona, os seus problemas e a resolução das suas mais prementes necessidades, têm merecido por parte da gestão da Câmara Municipal do Porto?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Moniz.

O Sr. António Moniz (PPM):- Cm nome do Grupo Parlamentar Popular Monárquico, não podia deixar de ter, para com o Sr. Deputado Gomes Fernandes, uma palavra que é um misto de protesto e de elogio. E assim é, por ter misturado alhos com bugalhos! Na verdade, misturar o problema das comunicações e ligações do Porto com o interior, com o problema do centro histórico, é talvez uma maneira um bocado despropositada de tomar uma posição política contra o Governo AD!
Sei perfeitamente que o Porto é a porta aberta para todo o interior e o Sr. Deputado sabe-o também. Por isso mesmo é que o nosso partido se tem batido pelo início imediato da construção da ponte ferroviária, que não interessa apenas à cidade do Porto, mas que é condição essencial para o desenvolvimento de todo o interior do país. Por isso é um crime estar a demorar-se o início de tal construção, invocando-se pretextos e problemas, principalmente quando os estudos dos transportes e das ligações ferroviárias estão feitos e se sabe perfeitamente, neste momento, qual a localização mais conveniente para a ponte ferroviária do Porto. Mas o Sr. Deputado foi injusto, e em relação a isso protesto, para com o esforço que o Governo AD tem desenvolvido quanto ao problema dos transportes e das ligações do Porto, tanto pela via marítima como pela via ferroviária.
A palavra de elogio, Sr. Deputado Gomes Fernandes, é porque em si vejo um dos homens que, apesar da demagogia de alguns anos, lutaram pelo Barredo, lutaram pela zona ribeirinha e lutaram pelo coração do Porto.
Não me esqueço que foi nesse centro histórico que decorreram passagens como a do Arco de Santana e onde, através dos tempos, se sedimentou o espírito de independência e de liberdade da Cidade Invicta. Por esta razão, o meu partido não pode deixar de elogiar V. Ex.ª e o seu partido, pela apresentação deste projecto de lei.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues.

O Sr. Adriano Vasco Rodrigues (CDS):- Ouvi com muito interesse a apresentação do projecto de lei, por parte do Partido Socialista.
Não posso deixar de, em nome do meu grupo parlamentar, me associar ao aspecto cultural que ele encerra, de o aplaudir e de felicitar o Sr. Arquitecto Gomes Fernandes, pois sempre se tem marcado como um dos lutadores pela defesa do património artístico da cidade do Porto e pela revitalização, como já foi referido e demonstrado, da Ribeira e do Barredo.
A importância histórica, cultural e artística da cidade do Porto, transcende a própria cidade, não só

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em termos nacionais mas também internacionais. Por isso, apoiamos este projecto que vai inserir-se também naquilo que hoje se defende, na Comunidade Económica Europeia, quanto à revitalização de cidades e quanto aos projectos preconizados pelo Conselho da Europa.
O vereador Baldaque, que está ligado à cultura do Porto, continuou a sua obra, em relação à recuperação da zona da Ribeira-Barredo e, por isso mesmo, aqui está o nosso testemunho de apoio ao seu projecto.
Gostaria, no entanto, de fazer-lhe algumas perguntas, Sr. Deputado.
Esse projecto, que procura revitalizar o Centro Histórico do Porto e que vai de encontro aos nossos desejos - falou-se da muralha fernandina e o Porto mantém ainda 2 terços dessa muralha, infelizmente encobertos, que é preciso recuperar e revitalizar - circunscreve-se só à parte monumental e artística, ou procura fazer-se também uma valorização do gabinete de história da cidade, transformando-o num verdadeiro arquivo histórico que possa, no lugar próprio, estar ao serviço da cidade e da cultura?
Por fim, no artigo 4.º do seu projecto de lei, excluiu-se a participação, que o meu partido considera ser fundamental, da representação de autarcas ligados às juntas de freguesia.
Eram estas as questões que queria colocar-lhe, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS, do PSD, e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Deputado Gomes Fernandes, creio que a inserção deste projecto de lei no âmbito da Assembleia da República merece um louvor generalizado, que já recebeu de várias bancadas, e que essa atitude é mais importante, à partida, no dia da sua apresentação do que eventuais críticas que o projecto possa merecer, na especialidade. Creio que essas críticas seriam aqui deslocadas e obviamente que vou fazê-las.
Gostaria de salientar -e faço-o sob a forma de pedido de esclarecimento- que a atenção sobre a recuperação do Centro Histórico do Porto é já, neste momento, um problema introduzido na Assembleia da República e é também um problema que, felizmente, merece a atenção dos mais importantes organismos internacionais, em matéria de recuperação de centros históricos. Este facto, creio eu, torna mais flagrante o desinteresse de alguns directamente interessados que como tal se têm mostrado, à revelia de tudo o que seria legítimo supor ou admitir, mais passivos ou mais desinteressados do que aqueles que assumem, como sendo também seu, um património - que não é só o Centro Histórico do Porto, mas que também tem algo a ver com a História de toda a Humanidade - e a tentativa de recuperação de centros históricos, que é de considerar modelar.
Quanto a esta concepção cultural de recuperação de centros históricos, podem pôr-se dois problemas: o do enquadramento de um monumento como tal e como ornamento de uma certa civilização, a que se está alheio, ou o da recuperação da monumentalidade, como recuperação cultural, como enquadramento vivo, como história de homens e, portanto, como alguma coisa que não é para exibir mas que é para viver.
Pergunto-lhe se está de acordo comigo neste aspecto.
O Sr. Deputado encontra alguma explicação política para o desinteresse pela recuperação do Centro Histórico do Porto? Creio que ela existe e que o universal só pode descobrir-se numa dimensão de socialização, em que os outros não lhe são estranhos, mas são a medida do nosso desenvolvimento ou da nossa mediocridade, de tal modo que a sua condição é o testemunho daquilo que somos e do que valemos. Gostaria, também, que desse esta perspectiva política.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (PCP):- Não podia deixar de fazer também um pequeno protesto, pois tinha ficado assente que hoje não haveria período de antes da ordem do dia e, ao fim e ao cabo, isso não se verifica.
Para além deste pequeno protesto, quero expressar ao Sr. Deputado Gomes Fernandes, apresentante deste projecto de lei, o nosso total apoio à intenção que lhe preside. Quero, no entanto, pedir-lhe alguns esclarecimentos.
Pela leitura muito sumária que pude fazer do projecto de lei -que repentinamente acabou de chegar à minha bancada- verifico que se limita a criar uma comissão e a delimitar a zona de protecção do património histórico do Centro Histórico do Porto. Pergunto-lhe se não será possível e mais aconselhável que ele tenha um conteúdo mais preciso e mais amplo, uma vez que se trata de um projecto importantíssimo, a nosso ver não só para a cidade do Porto mas para todo o património cultural deste país, que tão desprezado tem estado.
Quero pôr-lhe uma questão, que tem como experiência a zona de recuperação da Ribeira-Barredo, que é a de saber se o Sr. Deputado, que foi o primeiro comissário dessas obras de recuperação, tem conhecimento das razões que levam a que tais obras estejam praticamente paradas.
Ainda dentro deste aspecto, sabe também o Sr. Deputado que na recuperação destas obras existiram graves problemas sociais que foi necessário ir resolvendo e às vezes mal? Sabe que é uma zona de superpopulação que, em muitos casos, teve de ser retirada em bloco para a periferia da cidade? E por que é que isto, que também é um aspecto cultural importante, não está aqui previsto?
Por último, queria também perguntar-lhe, como também fez, suponho, o Sr. Deputado Adriano Rodrigues, por que razão, tratando-se de problemas do maior interesse para a população local, não estão aqui incluídos representantes autarcas das juntas de freguesia, cuja delimitação do perímetro do património histórico se pretende proteger.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

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O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado Gomes Fernandes, com muita admiração e muita amizade, quero felicitá-lo pela sua iniciativa.
Que o Porto tem carências de toda a ordem, as que o Sr. Deputado apontou e tantas outras, que o Porto não tem merecido, tal como o Norte do país, os favores dos governos centrais, são verdades absolutamente indiscutíveis. Por isso, mais uma vez o felicito pela sua iniciativa.
Permito-me, no entanto, fazer apenas uma observação: não politizemos o problema da defesa do Porto! Isso pode, porventura, dividir-nos na defesa desse mesmo nosso Porto! Vamos mas é congregar esforços, vamos retirar a política destes problemas e vamos ver se, todos juntos, seremos capazes de, efectivamente, levar a cabo o trabalho que o Porto e o Norte merecem e que, ao fim e ao cabo, o país merece.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes para responder.

O Sr. Gomes Fernandes (PS):- Sr. Presidente e Srs. Deputados: Começaria, de certo modo, por esclarecer e clarificar o sentido dos protestos e, digamos, demonstrar que eles não têm razão de ser.
Antes de mais, quero chamar a atenção para o facto de não ter havido um desvio, de fundo e de filosofia, no compromisso do meu partido e de mim próprio para com o meu partido na apresentação deste projecto de lei. E a prova evidente disso é a quantidade, profundidade, interesse e simpatia com que a generalidade dos Srs. Deputados se referiram a ele. Deste modo, penso que isso é a prova mais evidente de que não há razão para protesto, no sentido protestante do termo, nesta Assembleia. O projecto de lei é importante em si, por um lado, mas é também fundamentalmente importante pelo que pode significar para a cidade, para a região e para o país.
Na verdade, o projecto de lei não tem tanta importância por ele próprio -até tenho algumas dúvidas, que na altura própria as discutiremos aqui, sobre a sua formulação e sobre o seu articulado-, mas a sua importância resulta de construir nesta Câmara um facto político novo, que não pode deixar na mesma atitude o Governo e as autarquias. Essa é que é, efectivamente, a importância do problema e daí o seu relacionamento com uma carga política que, saliento, não foi uma carga partidária, pelo menos no sentido em que é convencionalmente utilizada, mas sim uma carga política introduzida na discussão deste tema.
Foi posta, nos pedidos de esclarecimento, que foram feitos, uma questão que é da razão da paralisação das obras da Ribeira-Barredo. Para responder ao Sr. Deputado César de Oliveira, que foi quem primeiro formulou esta. questão, pois outros Srs. Deputados também o fizeram, quero dizer-lhe que, como é óbvio, tenho uma opinião muito clara dessas razões, mas penso que não nos compete, unicamente a mim e ao meu partido, apontá-las.
Há falta de vontade política e há razões de incapacidade e de indecisão, para avançar com o projecto.
Foi aqui pedido um justificativo dessas razões e eu aponto números. Isto é, no fundo, uma forma bastante impessoal de mostrar a evolução desta operação, mas de qualquer maneira é uma forma mais positiva.
Antes de passar a números, devo dizer que não fui o primeiro comissário, mas o segundo e que, obviamente, estive ligado desde a raiz a este projecto.
Passando o ano de 1975, que foi o ano de arranque, não tendo portanto significado, em que se gastaram 2536 contos, no ano de 1976 -e a partir de Maio de 1976 assumi a responsabilidade de comissário - gastaram-se 25937 contos, em 1977, 55.700 contos, em 1978,75 300 contos, em 1979, 66 000 contos -devo dizer que a partir de Fevereiro de 1978 deixei a responsabilidade do gabinete- em 1980, 37000 contos e em 1981, 25.000 contos. Isto é significativo do estado em que o projecto se encontra. Quanto ao resto, penso que é de ver o que se passa por lá, falar com as pessoas e perceber-se-á melhor o problema.
Quanto ao problema das ligações deste projecto com a regionalização, que foi outro dos temas, pu-lo com uma certa carga, porque como regionalista que sou penso que a regionalização ultrapassa, às vezes, os próprios conceitos de enquadramento partidário. O Porto terá de assumir, nesta matéria, um papel de liderança política necessária, sem polarizar uma desconcentração de poder político, pois não é esse o objectivo da regionalização, mas sim o de assumir um espírito regionalista, de autonomia e de intervenção na vida nacional, pública e cívica, do Porto e da região, que existiu mas que neste momento está perdido.
Este é o sentido da ligação à regionalização.
O Centro Histórico do Porto é, como eu disse, ao mesmo tempo alma e coração da cidade e está, neste momento, praticamente a apodrecer. É preciso que tenhamos consciência que o Centro Histórico do Porto está a cair de podre e que se, efectivamente, não fizermos qualquer coisa para salvar o coração dessa cidade, não tenhamos ilusões que a região do Norte não será nunca uma região com uma autonomia e uma presença efectiva no país, a que tem direito e que deve assumir. Esta é que é a questão.

Uma voz do PS: -Muito bem!

O Orador; -A Sr.ª Deputada Natália Correia, a quem agradeço as referências feitas e até a simpatia da figura de protesto usada, referiu-se ao assalto aos centros históricos pela voragem de um modelo de urbanização, a que podemos chamar de um desenvolvimento urbano-industrial.
É evidente que efectivamente se trata de um assalto e de uma luta entre a cultura e a anticultura. E das duas uma: ou temos capacidade para assumir o nosso passado histórico, a nossa cultura e a nossa riqueza cultural -mais agora, que estamos confinados à Europa e aos arquipélagos dos Açores e da Madeira- ou não seremos mais do que um caixote do lixo da Europa, ou então não seremos mais do que um país terceiro-mundista metido num continente desenvolvido. É nesta perspectiva que devemos pegar naquilo que temos de muito valor -e já está demonstrado que sabemos recuperar, reabilitar e fazer aparecer à luz do dia e lançar para o futuro, em condições

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que causam a admiração da Europa e do mundo - e utilizar, se me é permitido o termo, como moeda de troca do nosso peso na cena internacional. Este é um aspecto importante, daí a pertinência da questão que a Sr.ª Deputada Natália Correia colocou. É uma questão pertinente, não seria eu a pôr isso em dúvida e a problemática dos centros históricos e da recuperação do património tem entre nós, de evoluir para uma assunção politicamente mais assumida, se me permitem o termo.
Foram feitas referências às tradições liberais e republicanas do municipalismo do Porto. Referi-as na minha intervenção e foquei, sobretudo, um facto que é grave e que é o de há vinte anos, pelo menos, o Porto não ter força política na cena portuguesa. Foi uma cidade que constituiu um pólo de desenvolvimento muito importante na viragem do século, foi praticamente a cidade que polarizou o nosso salto industrial e a nossa entrada na Europa industrial. Hoje não o é mas em condições para reocupar esse lugar, no país e na cena internacional, embora o não possa fazer do mesmo modo, mas pode reocupá-lo com base na mesma dinâmica, nos mesmos valores e na mesma capacidade e riqueza do seu povo e do seu casco histórico e urbano.
Foi referida pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo a questão da extensão a todo o centro histórico. Ora bem, o projecto de lei do Partido Socialista é uma forma de alargar isto, embora talvez não de uma forma totalmente correcta, a toda a zona, englobando cinco freguesias da cidade do Porto, todo o casco histórico que está praticamente limitado com a muralha fernandina mais a parte de Miragaia e a das Fontaínhas, no outro lado. Recorda-se aqui que esta é uma proposta que existe formulada desde Setembro de 1976, na altura pelos serviços de que eu próprio era responsável. O que é lamentável é que, desde essa altura até agora, tal proposta não tenha tido uma solução. Esse é que é o problema e sobre isso que todos, começando dentro de cada partido e das forças políticas e sociais da cidade, nos devemos debruçar para encontrar uma resposta para isto. A proposta passa por um alargamento às cinco freguesias, está formulada, é do domínio público e já veio nos jornais, e tem uma estratégia que permite uma intervenção diversificada nessas áreas, com a presença permanente dos representantes das autarquias locais e juntas de freguesia.
O projecto de lei não refere isso, mas deixa, pelo carácter transitório da comissão que é criada, a possibilidade de ela se alargar por si própria, incluindo os representantes das juntas de freguesia. Pretendeu-se, à partida, criar um núcleo para que ele, efectivamente, pudesse alargar-se.
Foi posta a questão da nova ponte e da sua ligação à zona ribeirinha. Penso que a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo não conhecia este projecto na sua globalidade. A questão da nova ponte ou das novas pontes, é um problema da cidade e, como tal, liga-se também a esta área, mas não está, específica e concretamente, intimamente ligada com ela.
Falou-se no lixo. Na minha intervenção referi uma experiência interessante que congregou todas as forças sociais e políticas do bairro da freguesia da Sé, à volta da sua junta de freguesia, e que está a aguardar despacho, há meses, nos gabinetes das câmaras. Quem por lá passa sabe como é a freguesia da Sé e como é difícil fazer á limpeza urbana nessa zona de ruas medievais, estreitas, e onde os métodos de recolha tradicional de lixo não têm possibilidade de intervenção.
O Sr. Deputado António Moniz disse-me que misturei alhos com bugalhos. Bom, cada qual tem o seu estilo e a sua linguagem. Essa não é propriamente a minha, mas dir-lhe-ei somente que misturei passado com futuro, passando responsavelmente pelo presente. Penso que com isto remato a questão.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Ele não percebeu!...

O Orador: - Foram feitas referências de que isto foi uma crítica ao Governo. Devo dizer que fiz uma referência responsável e responsabilizante ao Sr. Pri-meiro-Ministro. Responsável porque o Sr. Primeiro-Ministro assumiu a responsabilidade da defesa de um projecto pelo qual, devo dizê-lo, me tenho batido e que é o da navegabilidade do Douro. Isto independentemente dos seus vectores económicos que possam estar aqui num plano secundário relativamente à importância política que ele tem para o Norte. O Sr. Primeiro-Ministro assumiu essa responsabilidade e é bom que seja levada até ao fim, porque não pode haver de navegabilidade do Douro se não for resolvido o problema da barra do Douro e se não for articulada uma melhoria das suas condições com uma eficácia de funcionamento do porto de Leixões. Estas questões são importantes e é preciso assumi-las globalmente. Daí esta referência.
Foi também feito o elogio pelo Sr. Deputado António Moniz à luta que travei pelo projecto da Ribeira-Barredo. A isto responder-lhe-ei simplesmente que agradeço, mas que não se trata de uma luta que travei mas que travo e continuarei a travar. O Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues referiu-se a um vereador. Convém fazer aqui uma nota de justiça, e é sempre bom que se preste justiça, à participação de um deputado do CDS responsável pelo pelouro da cultura nesta zona e ao seu interesse por essa zona. No entanto, devo dizer-lhe que a responsabilidade de um vereador por um pelouro não é a responsabilidade da Câmara e a política desta, na sua maioria AD, não é a que tem sido desenvolvida, com poucos meios e de uma forma discreta, por este vereador.
O Sr. Deputado Magalhães Mota falou no interesse que organismos internacionais têm manifestado por este projecto e, de certo modo, na apatia, no desinteresse e indiferença que tem merecido internamente. Isto é efectivamente evidente e devo dizer aos Srs. Deputados que tenho tido algumas participações, mais como arquitecto do que como político, na divulgação deste projecto mesmo fora das fronteiras, onde tenho realizado algumas palestras sobre esta matéria. Reconhece-se hoje além-fronteiras -na Europa e, por exemplo, no Brasil, que vai uns passos à frente de nós, nesta matéria e noutras áreas - um interesse pela obra que está a ser realizada na Ribeira-Barredo, o que internamente, na generalidade dos centros do poder, ainda se não verificou internamente. Isto é um facto que é também histórico. Poderiamos ir buscar vários exemplos disso à História, mas não importa

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agora trazê-los aqui. Mas isto deve ser retirado e assumido por nós e deve ser procurada uma resposta para nos pôr, pelo menos, ao lado da Europa nas preocupações por esta matéria.
Devo dizer-lhe que o Conselho da Europa e a UNESCO têm dado todo o apoio a este projecto e têm solicitado impressões sobre ele e que, internamente, a Fundação Calouste Gulbenkian também o tem feito. A nível político é que está, neste momento, a indefinição.
Foi posta a questão da concepção cultural de recuperação. É evidente que o exemplo da Ribeira-Barredo serve. Demonstrou-se tal questão na prática - na altura até houve um litígio com arquitectos conceituados, dos quais referi um como sendo, neste momento, o melhor arquitecto português e com o qual estive em litígio na altura da direcção das obras por ter uma concepção diferente de recuperação - pois o que estava em causa era uma concepção cultural, global e integrada de recuperação. Hoje o termo mais 'correcto é «reabilitação» e na altura foi a resposta mais eficaz a curto prazo para as necessidades das populações, sem a qual ,não havia qualquer hipótese de viabilizar um projecto destes. A dinâmica encontrada foi a de procurar rapidamente no terreno e em poucos meses uma resposta que visasse recuperar as habitações e enquadrar essa resposta rápida numa perspectiva de futuro, que não fosse inviabilizada, mas que, pelo contrário, partisse dessa proposta para ser revitalizada. O termo «reabilitação», hoje comummente aceite pelos técnicos, é efectivamente o termo correcto e que reflecte, na prática e na teoria, toda a concepção cultura,! deste projecto de intervenção.
Às explicações políticas para o desinteresse, já me referi. Penso que os Governos e a Câmara -e lanço aqui um repto à maioria- não têm coragem política de parar um projecto destes, mas não têm tido um mínimo de capacidade e de vontade para o fazer avançar. Saliento aqui, também, a contribuição do anterior Secretário de Estado da Habitação, que está aqui presente, o Sr. Deputado Casimiro Pires que injectou, financeiramente, alguns apoios para que o projecto se mantivesse. No entanto, isso não representou, pese embora a boa vontade, uma transformação qualitativa na assunção política do projecto, mas obviou a sua agonia que pode transformar-se, a curto prazo, em morte. A nossa perspectiva é de que isto tem de ser um salto qualitativo para o futuro e que passará, numa primeira fase, por um alargamento a toda a área do centro histórico, às cinco freguesias que referi e passará, também, por esse alargamento nas bases de uma nova política de planeamento e gestão urbanística da cidade que neste momento está perfeitamente ao sabor de tudo.
O Sr. Deputado António Taborda, para além do pequeno protesto, que de certo modo perdeu peso e valor com as questões que colocou de seguida, referiu uma questão importante e que convém esclarecer.
Diz o Sr. Deputado que surgiram alguns problemas graves de carácter social na prossecução e, sobretudo; no início deste projecto tendo alguns deles sido mal resolvidos. Não queria polemizar esta questão, mas devo dizer-lhe que, globalmente, foram socialmente bastante bem resolvidos. Foram resolvidos com grande pragmatismo no terreno, foram resolvidos, de certo modo, um a um, não esquecendo que era preciso resolverem-se todos e foram, sobretudo, resolvidos com a participação permanente, democrática e responsavelmente assumida das populações, através dos seus representantes, na altura comissões e associações de moradores, e a partir de 1976, quando houve juntas de freguesia eleitas democraticamente, pelas respectivas juntas de freguesia. Foi esta a filosofia que se estendeu aos moradores que necessitavam das habitações e para quem elas eram recuperadas e aos proprietários que tinham sido expropriados, a quem não tinha sido dada uma palavra e a quem não se apresentou qualquer perspectiva de indemnização ou de pagamento do seu património. Foi neste diálogo, entre uma parte e outra que foi encontrada no terreno a solução, com a presença destas forças, frente a frente, que encontraram uma dialéctica capaz de retirar o essencial e deixar para trás o acessório.
O Sr. Deputado Montalvão Machado -e estou a procurar responder o mais possível a todas as questões, globalmente e não uma a uma - disse uma coisa com a qual estou, obviamente, em desacordo e penso que não era esse o significado e o sentido das suas palavras. O Sr. Deputado disse que devíamos retirar a política de um projecto destes. Entendo que devemos retirar a partidarização de um projecto destes e não a política, porque este é um projecto eminentemente político.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - E a razão porque introduzi uma carga política na minha intervenção de apresentação deste projecto de lei, não foi para tentar desvirtuar o compromisso da ordem de trabalhos assumido pelos grupos" parlamentares nem para partidarizar uma intervenção, mas foi, fundamentalmente, para lhe dar um enquadramento e uma carga política que merece, de forma a que responsabilize todos a nível local, inclusive, o meu partido, na gestão destas questões.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Penso que o drama que se passa neste momento na região do Norte e no Porto em especial, no plano político e na sua relação com o plano sócio-económico, é precisamente a falta da congregação de esforços. Temos é que saber o que é que podemos e queremos conjugar e com que objectivos. Penso que é preciso encontrar uma forma de gestão muito clara para o Porto e responsavelmente assumidas com a população. O Porto merece isso, exige-o e não tolerará, muito mais tempo, o adiamento desta situação. Penso que devemos clarificar o projecto de regionalização para a região Norte e entendermo-nos quanto ao que esse projecto deve ser, para que ele não seja uma mera bandeira e um mero acenar de conceitos de carácter eleitoralista, na altura das eleições, e para que não .seja uma mera transferência de poderes do Terreiro do Paço para a sede das Comissões de Coordenação regional, neste caso para a sede da Comissão de Coordenação da Região Norte, pese embora a qualidade técnica e profissional do seu responsável.
Temos de entender-nos quanto ao modelo que a região precisa para o seu desenvolvimento, quanto ao

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grau de participação e aos órgãos que devem agir e participar no estabelecimento dessa estratégia. Penso que se perderam já alguns momentos e que a questão da associação de municípios da área do Grande Porto tinha sido um passo significativo para dar uma primeira saída a esse problema. Penso que estamos muito a tempo de retomar o comboio certo. Esse retomar tem de ser um compromisso assumido com todas as forças económicas e sociais da região, tem de ser uma exigência a essas próprias forças, tem de ser, digamos, um pacto regional que passe não só pela boa vontade mas pelo compromisso, pela responsabilidade e pela formulação, no terreno, de projectos muito claros e de alternativas de desenvolvimento para a região. Trata-se, efectivamente, de dar poder político à região e não vamos escamotear isso. A região tem direito a ele, tem capacidade para o assumir e tem valores culturais, uma tradição e uma dinâmica de passado que lhe permitirão assumir uma perspectiva cultural deste poder e, de certo modo, até, emanar essa perspectiva para outras áreas do território nacional.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda em relação ao Sr. Deputado António Taborda que, em linhas gerais, perguntou se não seria possível um conteúdo mais preciso para alguns artigos do projecto de lei responderei que, é evidente que o projecto é uma plataforma para a discussão e que devemos congratular-nos por haver um generalizado consenso quanto à sua filosofia. Não se exige nem seria justo, neste momento, consenso quanto à sua forma, mas que a partir dele e pela melhoria da sua forma possamos actuar.
Este projecto visa também acelerar por parte da Câmara, por um lado, e por parte do Governo, por outro, uma tomada de posição inequívoca relativamente a esta questão. Se ela for assumida, este projecto obteve já o essencial da sua iniciativa e, de certo modo, poderemos considerar-nos satisfeitos. Penso, no entanto, que não devemos, em caso algum, partidarizar um projecto destes e devo dizer que deixo um pouco o desafio ao modo como foi conduzido no tempo em que os Governos socialistas tinham responsabilidades, a nível nacional e local, e no tempo em que fui, particularmente, comissário do Governo na área. Nunca o projecto foi, objectivamente, partidarizado mas penso não restarem dúvidas, neste momento, que toda a gente identifica o que está feito na zona da Ribeira-Barredo com o Partido Socialista. O que ninguém diz é que algum dia tivesse sido posta a bandeira do partido no gabinete que conduziu o projecto. Isso não foi feito. Foi, sim, aplicada na prática a filosofia que o meu partido defende para estas questões e a filosofia que o meu partido defende e defenderá para a renovação dessa cidade.

Aplausos do PS, do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pires.

O Sr. Casimiro Pires (PSD): - Pedi a palavra para um protesto suave e começaria por reconhecer a oportunidade da apresentação deste projecto de lei e por agradecer as amáveis referências que pessoalmente o Sr. Deputado me quis dirigir. Gostaria, no entanto, de colocar de algum modo a verdade dos factos. Penso que ganhamos todos, ganha o país e a Assembleia, se reflectirmos sobre as questões para o que o Sr. Deputado nos convidou, numa base de verdade completa.
Manda a verdade que se diga, que o projecto do Barredo nasceu não em 1975, mas muito antes de 1974 e que foi durante este período que se criaram condições, que se prepararam os estudos, que se prepararam os projectos, que permitiram numa fase seguinte -e não me importa muito saber quem executou- que ele tivesse algum desenvolvimento, designadamente nos anos de 1976, 77, 78 e 79.
A outra parte da verdade que importa repor, é que os Governos da Aliança Democrática conferiram a este projecto, como vinha acontecendo, a sua verdadeira importância. E enquanto que em 1979 os Governos não previram um tostão para financiar o projecto da Ribeira-Barredo, o Governo da Aliança Democrática conseguiu, através de uma transferência, porque era a única possibilidade existente em termos orçamentais, para esse projecto 60 000 contos. Devo recordar que a média de investimentos feitos no período anterior, e referido pelo Sr. Deputado Gomes Fernandes, foi da ordem dos 45000 contos por ano. Portanto, uma dotação que se situava ao nível das dos anos anteriores. Do mesmo modo, previram-se para este ano dotações com a mesma ordem de grandeza, quer através dos saldos existentes do ano anterior quer através das dotações previstas no Plano e no Orçamento Geral do Estado, que eram de 40000 contos, o que dava cerca dos mesmos 60000 contos.
Quero ainda referir a importância que conferimos às questões de renovação urbana, da reabilitação - como o Sr. Deputado referiu - e, permitir-me-ia acrescentar, da revitalização. Isto, numa perspectiva do próprio património histórico-cultural do País, porque ai de nós se deixarmos perder esse património, pois com ele poderá ir a própria identidade nacional.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contraprotesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria salientar que a reposição da verdade feita pelo Sr. Deputado Casimiro Pires não significa inverdade da minha parte.
Aliás, tenho escrito bastante sobre este assunto e sou o primeiro a situar a origem deste projecto não nos estudos que foram feitos em 1969 pela equipa liderada pelo arquitecto Fernando Távora -que orientou e que estabeleceu as estratégias para este estudo e que, politicamente, teve uma pedra em cima depois do 25 de Abril-, nas suas necessidades e no clima de rotura social a que chegou a zona da Ribeira-Barredo, o que implicou que a Câmara, nessa altura, tivesse de encontrar uma saída e uma resposta qualquer para o problema.
Por outro lado, o Sr. Deputado Casimiro Pires, que é um homem da estatística, referiu-se aos investi-

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mentos em termos estatísticos como' se a uma família de 4 pessoas que comesse uma maçã coubesse a cada uma, um quarto de maçã. Isso não é verdade, este valor é viciado, visto ter havido em 1975 um investimento inicial- de 2 SOO contos que obviamente vicia todos estes valores.
Ora, os valores que aqui referi são números precisos, são números originários do Gabinete, são os números oficiais. Ponho-os à disposição' de quem os quiser consultar, porque também foram postos à minha disposição e neste momento são públicos.
Quanto à questão da filosofia do que há a conservar e do que há a reabilitar, estamos de acordo e penso que a intervenção do Sr. Deputado Casimiro Pires serve mais como uma contribuição por parte do seu partido, para a disponibilidade de participar e colaborar nesse projecto. Nesse sentido, registámos e desde já nos mantemos abertos para isso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos a primeira parte da ordem do dia e vamos agora passar à segunda parte da ordem do dia que é a continuação do debate do projecto de lei n.º 230/11, apresentado pela ASDI, e que diz respeito à defesa do ambiente e protecção da natureza e do património.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A defesa do ambiente e protecção da natureza e do património é hoje, a um tempo, o nosso comum encanto e desencanto. Se não permanecemos insensíveis ante essas fontes de beleza, que nos ajudam a gostar de viver, a verdade é que em termos gerais, não assumimos ainda o realismo das atitudes necessárias. Continua a falar-se, muitas vezes demagogicamente, dos valores culturais a preservar, dos factores ambientais a defender, de quanto há de impreterível na exigência de proteger a natureza, mas pouco se tem feito no sentido de dotar as populações e o aparelho de Estado dos meios técnicos legais para ultrapassar o actual quadro de precariedades. Não basta olhar a paisagem e os monumentos, as águas, a fauna ou a flora, com o deslumbramento de um coleccionador de postais. Urge animizar, humanizar essa memória do tempo e do espaço, habitá-la dos gérmenes do futuro. Não há qualidade de vida sem a dinâmica das transformações sociais, sem a democracia diligente e participada que, no nosso país, vem sendo possível desde o 25 de Abril. Por isso, tantos se têm iludido e tantos visionam iludir os mais incautos. Como compatibilizar interesses tão antagónicos como os da efectivação de um teor de existência pautado pelo equilíbrio dos ecossistemas, pela valorização dos marcos do nosso percurso humano-histórico (não estimáveis em função de imediatos parâmetros de rendibilidade económica), e os do capitalismo mais selvagem ou da especulação mais desenfreada? Como harmonizar o redundante e não inovador discurso de certo combate ecológico com os atentados que ele mesmo acoberta, ou, não condenando, coonesta? Como arvorar, com plausibilidade e seriedade, os estandartes da ecologia e da protecção da natureza e do património se, concomitantemente, se milita em favor da política agressiva da AD, perpetradora de todos os atentados, favorecedora de todas as poluições, conivente com o assédio dos golpes dos grandes detentores do poder económico no urbanismo e na actividade industrial sem freio?
Para nós, comunistas, esta matéria não se confina aos estreitos limites de um desvelo passadista, ao lirismo lamecha, ao puro foro das realidades estéticas. Cientes de que o acervo que temos nas mãos é um testemunho do devir social, um reflexo multímodo da criatividade do nosso povo, um espelho das suas agruras e esperanças, uma mensagem que atravessou o clamor dos séculos e hoje descodificamos enquanto poesia, mas também enquanto resultado dos diferentes modos de produção, entendemos caber-nos a responsabilidade de o legarmos nas melhores condições possíveis aos que nos sucederem, assim contribuindo para o mais cabal desconstrangimento das malhas que ainda nos condicionam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador - O projecto de lei da ASDI, na medida em que afrontou esta problemática com um esforço a que não recusamos boa intenção, merece-nos alguns comentaríeis, mais ou menos genéricos, numa perspectiva construtiva, visando, pela forma do diálogo oportuno, dar a nossa participação com vista à melhoria das soluções preconizadas.
Afigura-se-nos, desde já, que o texto carece de uma sistematização mais clarificada. Confundem-se, frequentemente, os terrenos relativos à defesa do património com os do ordenamento rural e da política dos solos; a área das questões do património, que tem uma umbilical ligação com o escopo de finalidades do projecto, é, em regra, secundarizada, sendo múltiplos os casos em que aparece omissa, como, por exemplo, nos artigos 5.º, 30.º, 38.º 39.º, 40.º e 42.º, entre outros; a definição dos níveis de poluição não se lhe aplica, a não ser por via extensiva, sendo contudo, os actuais níveis fatais para muitos valores e conjuntos d« valores. Não será verdade que os gases poluentes derivados do intenso tráfego automóvel afectam o Mosteiro da Batalha e que a localização da estrada nacional faz perigar, de acordo com os técnicos mais qualificados, a sua estrutura? Poder-se-ia multiplicar o facto ilustrativo, sem dificuldade, com situações similares recolhidas em todo o País.
Pior, porém, é o projectado no artigo 6.º no tocante à competência do Governo e dos órgãos da administração pública. A nosso ver, uma correcta política, nestes domínios, passa pelo reconhecimento da capacidade legal das autarquias locais para actos que excedam, em muito, os simples executórios. Não obstante o n.º 2, a verdade é que se consagra mais uma delegação de competências do que uma faculdade originária, e esta é, do nosso ponto de vista, indispensável, já porque estende, com eficácia, o âmbito da descentralização do poder, já porque, em articulação com o que se advoga no n.º l do artigo 45.º do projecto, assim se estabeleceriam condições para uma intervenção não platónica das associações de defesa do património, do ambiente e da natureza, na definição das medidas atinentes ao complexo problemático em apreço.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Que a administração central regulamente a aplicação de uma lei como esta, detenha a possibilidade de, por via legislativa, adequar instrumentos idóneos à efectivação de uma justa política de ambiente, protecção da natureza e defesa do património, é, certamente, aceitável. Mas que o seu leque de atribuições, designadamente decisórias, não garroteie a intervenção do poder local, sempre enriquecedor e democraticamente fecundo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -O projecto que nos é presente aborda uma variada temática, com se disse, nele se inserindo elementos que intentam disciplinar assuntos que vão da protecção contra o ruído à densidade de construção e qualidade de arquitectura, pesando ainda, em todo o articulado, entre os artigos 10.º e 38.º, denominado «Acções Sectoriais», alguma normalização jurídica sobre reservas, parques, e, de forma geral, sobre ordenamento do território.
Ninguém ignora a confrangedora realidade que enfrentamos neste domínio, que, em muitos casos, pode e deve qualificar-se, no nosso país, como desordenamento territorial. É no panorama de um tal desordenamento -que exige um intenso reforço do esforço de reordenamento- que terão de ponderar-se alguns planos de propaganda que a AD, desde há tempos, vem agitando, no intuito de configurar novas «imagens» que tonifiquem a sua marca. Um destes planos é, claramente, o da estruturação dos poderes regional e local; um outro, o da definição dos poderes autárquicos. Já nos referimos a eles, de passagem, e à maneira, a nosso ver deformada, como o projecto de lei da ASDI os resolve.
Outras matérias, que têm sido alvo de regulamentos, dificilmente podem caber, por razões sistemáticas, numa lei quadro como esta. Recorde-se os artigos 41.º e 42.º que procuram, de modo apressado e incorrecto enquadrar franjas da problemática dos loteamentos, da construção clandestina, da demolição e degradação dos imóveis.
Na verdade, as soluções penalizatórias encontradas para o caso, por exemplo, das construções clandestinas, afiguram-se-nos, em certas situações excessivamente gravosas. Basta pensar no que aconteceria ao proprietário de um imóvel erigido, sem prévio cumprimento dos dispositivos legais, numa área que, todavia, não afrontasse os interesses que se visa acautelar com este projecto nem, num outro ângulo, os do condignamente estabelecido no concernente à urbanização. Em contrapartida, as sanções aplicáveis em razão de demolições ilícitas perfilham-se como insatisfatórias, ficando aquém do que hoje se consigna na lei.
Quanto à política de solos, a título cautelar, dir-se-á também não ser ajustada a sua inserção, nos termos previstos, num texto como este. Um certo voluntarismo (que os autores certamente reconhecem) sobressai ainda face à realidade existente. O artigo 33.º sublinha que «o património histórico e cultural do País será objecto de medidas especiais de defesa, de salvaguarda e valorização através de legislação especial». Quem conhece os actos administrativos que presidem às actuações dos órgãos competentes sabe dos interesses que se movem, das pressões que se fazem, não olhando a quem. Neste tipo de formação social é, de resto, difícil aceitar soluções tão permissivas.
Admite, por outro lado, o artigo 32.º, que o Estado através das autarquias, se substitua aos proprietários de jardins e reservas naturais, de edifícios ou monumentos nacionais, ou de sítios protegidos, na conservação dos valores, desde que estes sejam facultados à visita ou fruição públicas. Claro que a fruição cultural é um dos aspectos relevantes da democratização de uma sociedade, e, portanto, é positiva a ideia que subjaz ao articulado, decerto inspirada na legislação inglesa, a qual dispõe no sentido de serem os bens deste tipo fruíveis pelas populações durante uma fase do ano. A dúvida que se nos levanta é, face ao consagrado no n.º l, a de saber se também deverão habilitar-se às regalias previstas os proprietários que, umas quantas parcas vezes por ano, abrirem as portas a rápidas visitas. Não seria, no mínimo, de quantificar a contrapartida, exigindo alguma regularidade no acto de disponibilidade aludido? Tal como está escrito o artigo, não poderão os proprietários locupletar-se, indevidamente, com fundos públicos para beneficiações de alcance quase por completo privado?
Uma outra questão crítica, entre várias que poderia enunciar, e que o tempo me não permite por agora: no artigo 37.º disciplina-se normativamente o princípio da transferência de funcionários públicos e estipula-se, no n.º 2, que tal regra será aplicada a todos os excedentários, qualquer que seja o seu vínculo, conquanto se elabore, depois, no número subsequente, uma tabela de preferências. Pergunta-se: o funcionário do quadro, por exemplo, poderá ser transferido sem o seu acordo prévio? Pese embora o objectivo descentralizador que norteou, ao que cremos, o texto proposto, não será uma tal solução violadora de legítimas e adquiridas expectativas, e, por isso mesmo, gravosa para o actual estatuto social e familiar do trabalhador do Estado?
Finalmente, é nossa opinião que, tangendo embora o que é importante, a iniciativa da ASDI não contempla aspectos determinantes. Impor-se-ia uma legislação sectorial tanto quanto possível exaustiva, a regulamentação concreta das diversas parecias temáticas contidas neste articulado. Ë, seguramente, útil tentar elaborar, como se pretende, uma lei quadro, sobretudo quando se sabe que a maioria e o Governo não revelam outro empenho que não seja o de obstruir. Mas (interrogo) não teria sido curial ir mais longe e submeter a esta Câmara espécimes legislativos apropriados sobre cada uma das unidades problemáticas abordadas? Ter procedido, pelo menos, a uma justa delimitação de competências entre os diferentes órgãos intervenientes na esfera do presente diploma?
Malgrado estas e outras imperfeições, estes e outros caminhos erradamente escolhidos, o projecto de lei n.º 230/II, passível de amplos melhoramentos em sede de debate especializado no seio da Comissão pertinente, procura responder a uma necessidade premente e fá-lo, a nosso ver, de feição apesar de tudo, positiva. Sublinhem-se, a título ilustrativo, as boas achegas do artigo S.º, quando à consagração legal do direito de espaço e de antena às associações de defesa do ambiente e de protecção da natureza, de âmbito nacional (a que acrescentaríamos, desde já, sem claudicações, as que se conectam com o património), do

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artigo 29.º, que altera o Código Civil no seu regime específico dos ónus reais e servidão de vistas, do capítulo VII, que configura os direitos dos cidadãos e associações no concernente às áreas de que vimos tratando.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando o nazi-fascismo, na sua sanha anti-humanista, perpetrou arrasar a Polónia, pulverizou, quase inteiramente, as igrejas, os palácios, os museus de Varsóvia. Após a libertação, perante um país em escombros e com inúmeras carências imediatas a que urgia fazer face, o povo polaco e os seus governantes não hesitaram em imediatamente promover a reconstrução dos monumentos bombardeados. Porque eles eram um traço imperecível da sua identidade nacional e um património sagrado da Humanidade que não pactuara - nem pactuaria - com os obreiros negros da destruição.

Vozes da PCP: - Muito bem!

Porque era uma matriz de autenticidade e um símbolo do que no homem é mais perene.
Grave seria que, entre nós, mesmo quando os tempos são difíceis, não se desse o apreço devido ao património, à protecção da natureza (ameaçada por tanta mão barbaresca, ligada aos interesses de casta dos grandes possidente), à política de ambiente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não é de esperar muito deste Governo, e ver-se-ão, em breve, as verbas destinadas pelo OGE a este importantíssimo sector da nossa existência colectiva. Tanto bastará para aquilatarmos da sua política, da sua prática, da hipocrisia do seu discurso. Negativo seria que fosse, uma vez mais, inviabilizado um primeiro esforço, decerto insuficiente e eivado de inúmeras imperfeições, mas nem por isso de todo em todo menosprezável, para a preservação e vivificação do que é nosso.
Há muitas formas de destruir e muito quem queira destruir. Nós, PCP, nesta como em todas as frentes, somos claros: empenhamos a nossa energia, naturalmente crítica, para permitir o repensar das soluções, a construção de válidos edifícios legislativos. Apesar de tudo, cremos ser viável, com profundas alterações na sede própria, aproveitar o contributo da ASDI. Por isso não impediremos, com o nosso voto, que o trabalho prossiga e se venha a encontrar o melhor diploma possível.

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação pela ASDI do projecto de Lei n.º 230/II, sobre a «Defesa do Ambiente e a Protecção da Natureza e do Património» obriga-nos a tecer algumas considerações que reputamos importantes para a sua compreensão.
De facto, aquilo que está em causa é a discussão necessária da política de ambiente e de qualidade de vida, numa perspectiva de mudança e de construção
de uma nova sociedade. Necessidade tanto mais imperiosa quanto aquilo que se vislumbra no horizonte, a curto e médio prazo, por obra e graça do mau Governo que temos, afecta, irremediavelmente, a qualidade de vida dos portugueses.

O Sr. Silva Marques (PSD):- Não apoiado!

O Orador: - Sempre tão presente nos discursos oficiais e tão esquecida no dia a dia da governação!
Trata-se, pois, de encontrar e definir, os instrumentos que conduzam a civilização tecnológica a níveis de desenvolvimento adaptados às exigências do progresso económico e social, no respeito pelos valores ambientais e culturais de que hoje somos depositários e que temos a responsabilidade de transmitir às gerações futuras.
Na prática, trata-se de proceder a uma revolução nas mentalidades, de governantes e governados, e no modo de entender as relações do Homem com o meio, que o cerca e onde vive. É responder aos desafios do progresso sem receios do futuro e sem alienar a evolução económica, social e cultural das populações no sentido da sua progressiva libertação, no sentido da construção de um mundo melhor, mais livre, mais igual, mais fraterno. Numa palavra, no sentido da construção da sociedade nova por que lutamos.
O que significa que, no- caso presente, a discussão sobre o projecto de lei n.º 230/II não pode apenas cingir-se ao seu articulado -que é confuso! - mas ultrapassá-lo.
Porque os problemas do ambiente entroncam com questões fulcrais do modelo' de sociedade que desejamos para Portugal, a discussão sobre a problemática ambiental constitui um 'bom ponto de partida para sabermos que futuro desejamos para o nosso País e para os Portugueses.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: a defesa e melhoria do ambiente não pode ser apenas um conjunto de intenções piedosas. Tem de, indo mais longe, questionar os modos e os processos de desenvolvimento económico e social, e as próprias transformações estruturais da sociedade.
Não se trata apenas de protecção da natureza em sentido romântico; nem do combate a qualquer forma de poluição. Esta, como é sabido, não é uma causa, mas sim um efeito, E é ao nível das causas que devemos actuar.
Discutir nesta Assembleia a defesa do ambiente não pode significar, pois, apreciar apenas o articulado de um projecto de lei, nem as suas intenções, mas sim discutir, globalmente, o modelo de desenvolvimento e de sociedade que queremos para Portugal.
Se assim não for, de nada servirá aprovar uma qualquer lei de defesa do ambiente.
E isto, não pode ser escamoteado!
A defesa e melhoria do ambiente e da qualidade de vida passa, obrigatoriamente, pela assunção de um conjunto de medidas políticas e técnicas cujas implicações são, na vida da sociedade, naturalmente, profundas.
Porque apontam no sentido do futuro, do progresso económico e social e da promoção cultural das populações. O que põe em causa os modelos tradicionais da economia liberal e do capitalismo de Estado.

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A política ambiental e da qualidade de vida, como forma de colocar a economia e o desenvolvimento tecnológico ao serviço do Homem, corresponde, no mundo moderno e na sociedade portuguesa, a uma revolução cultural, serena e pacífica, que tem como ponto de partida um aprofundamento dos conhecimentos científicos da ecologia como ciência do relacionamento dos seres vivos com o meio onde vivem. E que tem em linha de conta as condições físicas, químicas e biológicas do meio, bem como os factores económicos, sociais e culturais, suas relações e efeitos, directos e indirectos, imediatos ou a prazo, no Homem e nos restantes seres vivos.
Por isso, uma sociedade nova, como aquela que defendemos, coloca as questões ecológicas e ambientais no primeiro plano das suas preocupações. Sem fetichismos, sem emotividade, sem complexos esquerdistas de burguesia bem pensante.
Por tal motivo, o Partido Socialista apresentou aqui, nesta Assembleia, na anterior sessão legislativa, o Projecto de Lei n.º 487/I «Lei Quadro do Ambiente e da Qualidade de Vida».
Que não foi aprovado, naturalmente!
No entanto, verificamos, ao ler o projecto de lei agora em apreciação, que o Projecto de Lei n.º 487/I foi retomado pelos deputados da ASDI, como já aqui foi dito pelo meu camarada e colega Gomes Fernandes.
E pena é que não tenha sido bem retomado; porque as alterações pontuais de redacção, os acrescentos e os retoques, tornam confuso o que deveria ser claro; inexequível o que deveria ser a aplicação geral e imediata; leviano o que deveria ser ponderado.
Os fins não podem, nem devem, justificar os meios. Pelo que uma boa intenção não pode, nunca, ser pretexto para a prática de uma má acção.
O Projecto de Lei n.º 230/II é deficiente do ponto de vista técnico; não é susceptível de aplicação prática, sem uma alteração legislativa profunda, que não prevê; não contempla uma concepção coerente de política ambiental; abrange matérias que só de longe poderão ter que ver com as questões em debate.
O Partido Socialista defende que as questões ambientais não podem ser vistas num enquadramento de curto prazo e demasiado sectorializado. Por isso, a sua posição no debate é balizada pela necessidade de se discutir, o mais amplamente possível, a temática em causa.
Porque a isso obriga o interesse nacional; porque disso dependem opções decisivas para a construção do nosso futuro e do modelo de sociedade que queremos para Portugal.
Nós acreditamos no futuro e no progresso. E acreditamos nos homens e nas mulheres deste País!

Aplausos do PS e da ASDI.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Coimbra (PPM):- Para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Luis Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Leonel Fadigas acabou por estar em sintonia com a intervenção que aqui produzi na última sessão.
Na verdade, o Sr. Deputado considera que é pena que este diploma não tenha sido bem retomado. Portanto, parece-me que o Sr. Deputado disse o mesmo que eu, ou seja, que os fins não podem nem devem justificar os meios. Parece-me que, tal como em intervenção anterior de um deputado comunista, se disse que este projecto de lei é confuso, que não está sistematizado. Estas questões são muito importantes, na medida em que se poderá vir ou não a aprovar na generalidade uma lei-quadro onde estas questões são importantes. Por isso, a sua discussão não poderia cingir-se ao articulado, devendo ultrapassá-lo, tal como muito bem disse o Sr. Deputado Leonel Fadigas.
Quando se discute uma lei quadro há questões de fundo que são fundamentais para se saber se podemos ou não aceitar, mesmo que minimamente, um determinado diploma.
O Sr. Deputado Leonel Fadigas concorda ou não comigo em que este projecto de lei, na medida em que apenas fala da defesa, da protecção e do equilíbrio dos sistemas ecológicos, tem na sua essência uma mentalidade conservadora? É que nós não queremos apenas o equilíbrio dos sistemas ecológicos; queremos também o desenvolvimento equilibrado desses ecossistemas.
Portanto, pergunto ao Sr. Deputado se concorda ou não que em questões de fundo e em relação aos próprios factores ambientais, pois há alguns muito mais vastos, este diploma não faz o desenvolvimento necessário. Não será que há aqui uma ausência total de ordenação de factores ambientais, como sejam factores de ordem paisagística, de ordem sócio-económica - desde a luz, a cor, a profundidade, o movimento, a própria cultura e a situação dos desperdícios -, as questões do recreio, da própria circulação, etc.? Será que estes não são também factores ambientais que, a não serem contemplados neste projecto de lei, tornam impossível que se aprove aqui uma filosofia de fundo, em termos conceptuais, na forma como me parece que o Sr. Deputado deixou transparecer, que é inaceitável sob o ponto de vista genérico da eventual aprovação deste diploma?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Leonel Fadigas, há mais oradores inscritos para pedirem esclarecimentos. V. Ex.ª deseja responder já ao Sr. Deputado Luís Coimbra ou prefere responder no fim a todos os interpelantes?

O Sr. Leonel Fadigas (PS): -Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): -Sr. Deputado Leonel Fadigas, parte do que eu pretendia dizer neste momento já foi dito pelo meu colega de bancada Luís Coimbra.
No entanto, V. Ex.ª veio na sua intervenção - que me merece, não direi 100%, mas quase, de apoio

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e concordância - colocar o problema fulcral deste debate e perante o qual este diploma nos coloca.
Com efeito, a filosofia do ambiente é a adaptação do desenvolvimento económico ou a procura que este desenvolvimento seja concordante com a manutenção da fertilidade, com a melhoria da qualidade dos recursos naturais ao dispor do homem.
O Sr. Deputado veio colocar o problema da filosofia ambiental, que pretende pôr o progresso tecnológico ao serviço do homem.
Nós compartilhamos inteiramente dessa sua preocupação. Pensamos que este é o ponto fundamental, do ponto de vista filosófico, que deve animar iniciativas deste tipo.
Assim, pensa o Sr. Deputado que essa filosofia que defendeu de algum modo, perpassa por este projecto de lei da ASDI, que é eminentemente reactivo.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Têm-se feito aqui várias considerações sobre o projecto de lei em análise, nomeadamente quanto às suas características conservadoras, tal como disse o Sr. Deputado Luís Coimbra.
Já na última sessão foram feitas acusações no sentido de que este diploma não tem em conta ou colide com toda uma série de legislação que existe, o que é um facto. Contudo, parece-me que não nos devemos perder excessivamente quanto ao essencial e que me parece deverá ser aqui tido em conta.
Existe já muita legislação sobre muitas das matérias que estão abrangidas neste diploma, legislação que é dispersa e ambígua. Tudo isto é um facto. Mas também é um facto que existe legislação para proteger a atmosfera da poluição, nomeadamente industrial No entanto, na prática os Governos não actuam no sentido de essas normas serem respeitadas.
Existe legislação no sentido de proteger as linhas de água, nomeadamente no que se refere aos esgotos industriais. No entanto, os Governos não actuam no sentido de a fazer aplicar.
Todos nós sabemos que existem estações depuradoras, de tratamento, em fábricas, nomeadamente em fábricas altamente poluentas, como é o caso das celuloses. No entanto, essas estações foram construídas para inglês ver - como se costuma dizer - e não trabalham, sendo os esgotos lançados com toda a sua carga poluente.
É preciso assumirmos com realismo estas questões, sem nos abstrairmos aqui das responsabilidades que cabem à política dos Governos no sentido de fazerem cumprir, pelo menos, a legislação já em vigor. Não vamos fazer recair sobre este diploma uma situação que decorre do próprio imobilismo da actividade governamental nesta matéria.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luis Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, fui citado pelo Sr. Deputado Rogério de Brito. Como tal, penso que algumas dessas citações não são inteiramente correctas, pelo que gostaria de dar um esclarecimento quanto a alguns dos temas aqui abordados pelo Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Coimbra, não posso, sem violar o Regimento, dar-lhe a palavra.

O Sr. Luis Coimbra (PPM): - Nesse caso, Sr. Presidente, terei de protestar contra esta intervenção do Sr. Deputado Rogério de Brito, até porque fui citado na sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, peco-lhe apenas que seja muito breve, Sr. Deputado.

O Sr. Luis Coimbra (PPM): - Sr. Deputado Rogério de Brito, a questão que o levou a fazer a citação do meu nome é pertinente. Contudo, penso que não podemos ficar pelas meias verdades, fugindo assim à verdade.
O Sr. Deputado Rogério de Brito sabe que quanto à política nacional de gestão do ar -Decreto-Lei n.º 255/80-, existem medidas que não estão implementadas, mas apenas porque a participação e o trabalho das autarquias, que é decisiva e fundamental em todo o processo, desde as áreas de intervenção prioritária do porto de Lisboa, Barreiro, Seixal, Sines, Estarreja, tiveram de ter todo um processo de regulamentação para possibilitar que as questões do ambiente e do combate à poluição sejam fundamentalmente de carácter participado, sobretudo através do poder local. Portanto, se não se pode andar mais depressa é porque o 25 de Abril encontrou este país numa situação de atraso e de subdesenvolvimento em relação à problemática do ambiente.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer que quando citei o Sr. Deputado Luís Coimbra foi unicamente para referenciar uma questão que aqui estava a ser levantada.
Contudo, tenho de dizer que não é desculpa para a passividade do Governo' o facto de se estar a proceder a regulamentações da matéria. Com efeito, o tempo passa e nada se faz. Por exemplo, citar-vos-ei mais um caso que tem que ver com o próprio equilíbrio e a estabilidade sócio-económica nos campos.
Ainda há pouco tempo foi aqui denunciado o problema da destruição de olivais no Vale de Vilariça e, no entanto, sabemos que em 1980 deveria ter sido implementada uma campanha de reconversão de novas plantações de olivais, bem como de aproveitamento dos já existentes, precisamente na região do Douro. Ora, o que é que se passou? Em vez desta campanha ser levada a efeito procedeu-se ao corte do mal pela raiz e destruíram-se os olivais.
Este é um exemplo de que em matéria de protecção do meio ambiente não se tem actuado.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram dirigidos, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

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O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Responderei muito brevemente às interpelações dos Srs. Deputados Luís Coimbra, Borges de Carvalho e Rogério de Brito. Para economia de tempo, fá-lo-ei globalmente.
Os Srs. Deputados Luís Coimbra e Borges de Carvalho levantaram a questão de saber se eu achava que o projecto de lei em análise era passível de um entendimento numa perspectiva conservadora, bem estimo saber se eu articulava os conceitos nele expressos, que aliás mereceram a concordância do PPM.
Pois bem, não se trata de colocar o diploma da ASDI numa perspectiva conservadora ou não. As críticas foram-lhe feitas já pontualmente pelo meu camarada Gomes Fernandes e por mim próprio.
Entendo que aquilo que quis dizer - e que mereceu algum consenso dos Srs. Deputados- é que as questões que se ligam com a problemática do ambiente são susceptíveis de serem um veículo de encontro de vontades políticas aqui expressas, no sentido de esta Câmara definir para Portugal um conjunto de bases legislativas que formulem um conceito jurídico e ordenamento destas matérias numa perspectiva lata e que se sirva do quadro de referência para a construção de uma sociedade nova e diferente, do mesmo modo como nós nos batemos.
Os aspectos pontuais - e aqui respondo ao Sr. Deputado Rogério de Brito - que têm que ver com a legislação avulsa que hoje existe, relativa ao controle pontual da poluição, deverão ser cumpridos. Contudo, não nos devemos esquecer que a problemática do ambiente e a definição de um conjunto de referências jurídicas não é necessariamente apenas em confronto de normas avulsas. Esse aspecto parece-me importante, uma vez que a aprovação por esta Assembleia de uma lei-quadro do ambiente e da qualidade de vida não substitui, antes impõe e exige de imediato a reformulação da legislação vigente sobre aspectos pontuais e a criação de outra legislação complementar, por forma a que não se crie uma lei-quadro de boas intenções, mas sim um instrumento jurídico coordenador das acções do sector público, do sector privado e, inclusivamente, de todos nós que, de uma forma ou de outra, temos uma intervenção directa na construção das novas paisagens e do ambiente onde queremos viver.
Apraz-me, no entanto, registar a concordância do PPM ao teor essencial da minha intervenção. Esta intervenção não visou negar a possibilidade de, a partir deste documento ora em discussão, suscitarmos um debate mais largo quanto à eventualidade de aprovação de uma lei-quadro do ambiente. Se bem entendi, esta consonância dos Srs Deputados Luís Coimbra e Borges de Carvalho' poderão dar a entender que o PPM não vê com dificuldade a possibilidade de iniciarmos aqui um debate profundo sobre este tema.

Vozes do PS e da ASDI: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia, para uma intervenção.

A Sr.ª Natália Correia ('PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos não hesitamos em conjecturar que a preocupação que toma relevo no projecto de
lei da ASDI é compartilhada por todos quantos têm assento nesta Assembleia.
Como muito bem disse o Sr. Deputado António Vitorino, a natureza é de todos. Discutir o sexo de um anjo que quer salvá-la à beira do túmulo que se abre para a tragar não será a atitude recomendada para testemunhar a solidariedade que deve unir os portugueses perante as ameaças que se abatem sobre o seu ambiente.
Neste aspecto, o projecto de lei da ASDI seria bem acolhido. Contudo, somos forçados a pôr-lhe reservas que derivam da ínfima importância que nele é dada à defesa e valorização do património histórico e cultural, precariamente contidas no seu artigo 33.º É claro que incorporando-se numa só iniciativa legislativa a natureza, o ambiente e o património histórico e cultural, uma dessas áreas teria de ser sacrificada.
A intenção cumulativa é culturalmente compreensível. Encarecer a natureza e a qualidade de vida é condição mesma de nos identificarmos com uma cultura que nos foi legada pela antiguidade clássica e que é reanimada no naturalismo que se afirma no renascimento do século XII, nomeadamente o naturalismo de Chartre, que vem impugnar a filosofia dogmática e depois vai reflorir no renascimento e no humanismo renascentista que padronizou a nossa cultura.
Mas se a defesa do ambiente e a protecção da natureza fazem parte do território cultural, tem os seus factores específicos, o mesmo acontecendo com o património cultural, especificidades que reclamam enquadramentos legislativos adaptados à diferenciação desses factores. De outro modo, uma das áreas ficará sempre prejudicada, como acontece neste diploma da ASDI.
De tal desenvolvida legislação está carecido o património cultural que só uma lei-quadro poderá remediar essa negligência.
Por conseguinte, achamos que a parte que neste projecto de lei contempla minimamente o património histórico e cultural, necessariamente diminuído pelas razões que expus, devia ser autonominada numa lei-quadro. A sua inclusão como parente pobre neste diploma diminui, quanto a nós, o merecimento desta iniciativa legislativa dos Srs. Deputados da ASDI.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr.ª Deputada Natália Correia, ouvi com a melhor das atenções e agrado a sua intervenção. Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que estou inteiramente de acordo com ela, no sentido de também eu reconhecer a necessidade instante de ser publicada uma lei-quadro que vá de encontro às suas preocupações, de defesa do património cultural.
Simplesmente, parece-me que as reservas postas ao nosso projecto não são, penso eu, no entender da Sr.ª Deputada -e peco-lhe um esclarecimento deste ponto - suficientes para pôr em causa todo o diploma. Estou de acordo, isso sim, que apenas em

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relação a um único artigo se .possa dizer que se vai para além dele próprio ao falar-se na defesa do património cultural. Penso, portanto, que este facto não poderá pôr em causa o restante do projecto de lei.
Que o tema tinha dignidade para constar de uma lei-quadro estamos de acordo. Mas se a sua inclusão neste diploma causa dificuldades, não vemos problema algum em retirar este preceito do diploma. Em todo o caso, tivemos o intuito de, em matéria onde também tinha cabimento o alertar para a necessidade de se legislar e definir as competências, actuações e responsabilidades da Administração Central, Regional e Local, enunciar o princípio. Portanto, não passamos senão da enunciação do princípio.
Seria ainda importante assinalar-lhe que, para além deste preceito -que não tem outro propósito que não seja o de chamar a atenção para a necessidade de legislar sobre essa matéria com carácter inovatório -, definimos as condições da criação de associações não apenas de defesa do ambiente, mas também de defesa do património cultural. Bastaria o simples facto da matéria inovadora da definição, atribuições e direitos das associações de defesa do ambiente e do património cultural para, a meu ver, justificar a inclusão no nosso articulado deste único preceito que se refere ao património cultural.
Na verdade, já que é um encargo que deve caber a todos, ou seja, a defesa do ambiente e do património cultural, será também através dessas associações e da possibilidade da sua criação que estaremos a contribuir para que essa defesa e protecção seja uma realidade.

O Sr. Presidente: - Para responder a este pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, é evidente que a inclusão das associações é muito importante. Contudo isso não é tudo.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sem dúvida!

A Oradora: - De acordo com o que eu já disse, o património exige uma lei-quadro. Parece-me, portanto, que devíamos dedicar a nossa atenção a uma lei que esgotasse toda a problemática do património. Como tal, esta questão não deve ser resolvida neste diploma.
Perguntou-me se este aspecto é só por si suficiente para que este diploma fique prejudicado na sua globalidade. Peco-lhe, Sr. Deputado, que faça essa pergunta às pessoas que têm a seu cargo julgar do mérito do projecto de lei no domínio da natureza e do ambiente. Eu falo apenas do aspecto patrimonial. Portanto, faço essa pergunta aos deputados da minha bancada que estão encarregados dessa missão, que não é minha.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr.ª Deputada Natália Correia, vou colocar-lhe um rápido pedido de esclarecimento precedido do reconhecimento -já feito por parte do próprio partido proponente- do indiscutível mérito da sua intervenção e da importância do desenquadramento da matéria versada numa lei destas.
Penso que a Sr.ª Deputada referiu um facto importante. Na verdade, a cultura não pode continuar a ser um parente pobre. As questões do património arquitectónico e cultural são questões eminentemente culturais. Nessa perspectiva, elas deverão progressiva e objectivamente ser enquadradas.
Nesse sentido, a diferença -que já assinalámos relativamente a este diploma da ASDI - que nos separa é que nós ligamos mais às questões, do ambiente, à qualidade de vida e entendemos que o património cultural - entendendo por cultural uma dimensão globalizante - deve ser objecto de uma iniciativa autónoma e verdadeiramente significativa, com a dignidade de lei-quadro que para tal matéria se impõe.
Na sequência da intervenção da Sr.ª Deputada podemos esperar, dada a qualificação que lhe é reconhecida, uma iniciativa do seu partido nesta matéria. Essa iniciativa, vinda da pessoa de V. Ex.ª seria particularmente bem recebida e aceite pela nossa parte.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Deputado Gomes Fernandes, é evidente que seria uma honra para o nosso partido poder elaborar essa lei-quadro. Mas eu vou mais longe e direi que as iniciativas legislativas que digam respeito às questões culturais devem, ser levadas a cabo de acordo com outros partidos. Mas talvez neste aspecto eu não esteja muito acompanhada.
Ouso manter publicamente este meu ponto de vista.
Julgo saber que o Sr. Ministro da Cultura e Ciência tem em preparação aquilo que chama uma lei do património. Como eu não acredito, digo mesmo mais, como me enfastiam as guerrilhas legislativas -já tive ocasião de dizer aqui nesta Assembleia que não interessa quem tem a iniciativa, mas sim que se faça algo - se o Governo se antecipar pois muito bem. Caso contrário, eu própria tomarei a responsabilidade de me empenhar nela, embora não seja tarefa para uma pessoa só, visto que é tão profusa, profunda e desenvolvida a legislação exigida pelo património que não a poderei elaborar sozinha. Espero que nessa altura tenha uma equipa a acompanhar-me.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alfredo Pinto da Silva para proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimento- e Mandatos.

O Sr. Alfredo Finto da Silva (PS): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor:
Em reunião realizada no dia 26 de Novembro de 1981, pelas 9 horas e 30 minutos, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:

Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (círculo eleitoral de Braga), por

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Maria Helena Vilela Lopes de Castro Pimenta de Castro. Esta substituição é pedida para os dias 26 e 27 de Novembro corrente, inclusive.

Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia (círculo eleitoral do Porto), por Valentim Tiago Lanhas Alves Lopes. Esta substituição é pedida para os dias 26 e 27 de Novembro corrente, inclusive.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro (círculo eleitoral de Lisboa), por Pedro Eduardo Freitas de Sampaio. Esta substituição é pedida para os dias 26 e 27 de Novembro corrente, inclusive.
José Alberto de Faria Xerez (círculo eleitoral de Lisboa), por Fernando Augusto Estêvão Larcher Nunes. Esta substituição é pedida para os dias 26 e 27 de Novembro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelo aludido partido nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados todos os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por maioria, com abstenção da União Democrática Popular.

A Comissão: Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS) - João Alfredo Félix Vieira Lima (PS) - Bento Elísio de Azevedo (PS) - Alfredo Pinto da Silva (PS) - Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - António Cardoso Moniz (PPM) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação deste relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente:- Na votação realizada não estava presente o Sr. Deputado da UDP. Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PPM):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, não queria deixar de ressaltar o mérito que tem a apresentação deste projecto de lei, mérito esse que pelo menos reside no levantamento das questões e, no fundo, na obrigatoriedade de que, se não forem aceites, haja a apresentação de alternativas.
Também devo dizer que estou de acordo com muitas das considerações já produzidas pelos Srs Deputados que me antecederam no uso da palavra, designadamente pelos Srs. Deputados José Manuel Mendes, do PCP, Leonel Fadigas, do PS, e Natália Correia, do PSD.
No entanto, não queria deixar de referir um ponto que já aqui foi considerado como quase uma excrescência dentro de todo este conjunto de questões, mas que é um ponto que me diz particularmente respeito, até como autarca que sou. Trata-se do problema dos clandestinos.
Dentro deste articulado, os proponentes apresentaram dois artigos relativos a urbanizações clandestinas, a loteamentos clandestinos e a demolições clandestinas. Tenho algumas reservas em relação a certos pontos do articulado que apresentaram, mas não gostaria de deixar de referir a urgência da apresentação da matéria legislativa sobre este domínio. É fundamental dotar os municípios da possibilidade de intervir nesta matéria. Admito que isso seja fora de uma lei quadro do ambiente, admito que em termos de sede não seja aqui o local adequado para o tratar, mas é fundamental tratar estes dois aspectos, sem os quais não há possibilidade, até em última análise, de defender o património e o ambiente, porque muitas vezes - isso pode dizê-lo por experiência própria- esses loteamentos clandestinos e, sobretudo, essas demolições clandestinas põem em causa grande parte do património que se quer preservar e defender.
Portanto, sem prejuízo das considerações que já foram tecidas pelos meus colegas dê bancada e das outras que subscrevo, não quero deixar de referir este ponto em particular, que me parece fundamental - repito - e para o qual peço a maior atenção de todos os colegas.

Vozes do PPM: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ecologia em geral é o estudo da Vida Animal e Vegetal, em relação com o meio ambiente.
No Projecto de Lei n.º 230/II preocupa-nos sobretudo a ecologia humana, onde o centro de interesses é o homem nas relações entre si e em relação com os animais, os vegetais e ainda com o ambiente físico e social que o rodeia.
O fim último é o homem -só ele pode estar na origem e no destino de desenvolvimento e não a produção ou o crescimento desta, pois o desenvolvimento não diz respeito em exclusivo à economia, mas também a outros factores de ordem social, cultural, ambientais, etc.
O desenvolvimento tem que ser humanizante e não homicida. O desenvolvimento tem que ser instrumento ao serviço do homem, razão porque os rés-

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pensáveis pela «coisa pública» «tem obrigação de o definir e balizar, não permitindo a criação de grupos, voltados apenas para a conquista de cada vez maior poder económico, à custa da violação dos mais elementares direitos dos indivíduos.
O verdadeiro desenvolvimento é, portanto, o aumento crescente e harmonioso da produção dos bens, postos ao serviço dos homens, no respeito pela defesa do ambiente, da protecção da natureza e do património.
O homem não é uma ilha, mas um membro de uma sociedade, onde o personalismo e o socialismo se encontrarão, se soubermos colectivamente respeitar as normas que se impõem para a preservação da água, se soubermos respeitar a vida dos rios e dos mares, a pureza do ar, tratando por técnicos possíveis os efluentes líquidos e gasosos, que são lançados pelas indústrias poluentes; se tratarmos devidamente os esgotos, os lixos, se evitarmos os ruídos, se planearmos os aglomerados humanos com a preocupação de promover a «humanização da cidade» evitando que o habitante das grandes e médias cidades fique distanciado do seu ambiente natural, criando por isso áreas verdes dotadas de espécies animais e vegetais; se soubermos ainda valorizar biologicamente o solo e salvaguardar a regeneração dos recursos naturais renováveis; se protegermos as paisagens naturais primitivas, as humanizadas, os valores culturais, estéticos e históricos nela incluídos; se soubermos proteger e desenvolver as florestas, reflorestando com espécies apropriadas todas as áreas, quer as que foram sujeitas a cortes, quer as vocacionadas à florestação e que se mantêm incultas; se soubermos a nda condicionar a higiene da alimentação, dos transportes, da habitação, do meio ambiente, teremos construído um mundo à dimensão humana onde será possível, a par da exigência do desenvolvimento, conceber a relação do homem como o Universo e dos homens entre si. Numa sociedade saudável, como queremos que seja a nossa, os economistas e outros técnicos, ao anunciarem o aumento dos índices económicos, devem começar por nos informar também da redução das taxas de contaminação do ar atmosférico, da não poluição dos rios e mares, da redução dos decibeis que medem os ruídos urbanos gerados pela indústria, pelo trânsito, etc.
Como consegui-lo:

1.º Pelo empenhamento do Governo na execução das determinações propostas no Projecto de Lei n.º 230/II em apreciação.
2.º Pela educação.
À educação cabe cada vez mais um papel decisivo na promoção das relações do homem com o meio ambiente e com a comunidade a que pertence. Infelizmente, a educação ainda é muitas vezes alienante, surgindo desligada do significado da vida.
Os governantes tem obrigação de a orientar de maneira a que ela suscite a tomada de consciência social e participação na resolução dos problemas colectivos; contribuindo deste modo para aumentar a capacidade da criação de novas ideias, de novas fontes de rendimento e de novas técnicas postas à disposição de todos.
A construção da «Sociedade do Futuro» encontrará, portanto, os seus alicerces na educação orientada para a livre doação de cada um, ao serviço dos outros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A saúde de uma população, de que tanto se fala, mas cuja globalidade parece ainda não ter sido apreendida por muitos responsáveis, não depende apenas da criação de hospitais ou de centros de atendimento de doentes, depende também e não em menor grau, do respeito para com as medidas preconizadas no nosso projecto-lei em discussão. Apenas alguns exemplos dos muitos que poderia apontar, pois o tempo escasseia:
Poluição do ar: Além das consequências directas - provocando lesões das vias respiratórias, amigdalites, conjuntivites -, os gases e os depósitos sólidos que permanecem em suspensão, prejudicam gravemente a atmosfera. A camada nebulosa constituída por finas partículas em suspensão e os gases aí existentes, absorvem grande parte dos raios solares que deveriam incidir sobre as cidades, reduzindo a insolação em 20 % no verão e 50 % no inverno. Além deste facto, a poluição modifica ainda a composição do espectro solar, pois os raios ultravioletas indispensáveis à síntese vitamina D, são absorvidos pelas partículas em suspensão. Na cidade de Paris a percentagem de raios ultravioletas é de 0,3 % enquanto nos arredores é de 3 %, com consequências graves para o desenvolvimento infantil e da saúde em geral. As áreas verdes, indispensáveis à oxigenação dos grandes centros urbanos, não terão também viabilidade se simultaneamente não houver tratamento dos gases industriais e dos da emanação dos motores de combustão.
Poluição das águas: tanto os mares como os rios estão sendo rapidamente poluídos por produtos químicos, biológicos e físicos que levam à destruição da vida animal e vegetal, quebrando o equilíbrio ecológico. Torna-se necessário tomar medidas enérgicas para que tal não venha a acontecer, pois os custos da recuperação são muito maiores dos que os das medidas profiláticas a adoptar.
Ruídos: Definidos como toda a sensação auditiva desagradável - os ruídos excessivos, são responsável por lesões várias, quer ao nível do aparelho auditivo, quer ao nível do sistema nervoso -fadiga, diminuição da audição e surdez- o ruído da cidade é suficiente para diminuir a audição - as tribos do Sudão têm aos 70 anos uma audição tão apurada como os nova-iorquinos aos 20 anos.
Ao nível do sistema nervoso, os ruídos provocam neuroses, sonolência, instabilidade e ainda perturbações neurovegetativas como arritmias, cardíacas, hipertensão arterial, perturbações digestivas, etc.
Em resumo, muito mais poderíamos dizer sobre este tão importante problema dos nossos dias - a interrelação entre a saúde e o meio ambiente. Contudo, todos conhecemos as influências nefastas da poluição do ambiente sobre o bem-estar dos indivíduos: são factores de ordem física, química, biológica e social que interferem, de forma extremamente grave, na saúde dos indivíduos e das populações. Como afirmámos, são problemas ligados à poluição do ar, que em alguns casos têm assumido proporções trágicas, os ligados à poluição química das águas, como todo o seu cortejo de efeitos indesejáveis; são

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os ligados à poluição dos locais de trabalho - por produtos químicos, por ruídos, por poeiras, etc. É também hoje largamente conhecido que muitos desses produtos são cancerígenos.
É urgente, portanto, tomar as medidas indispensáveis ao controlo rigoroso das quantidades do anidrido sulfuroso, de fumos, do chumbo, de ácidos fosfóricos e de sólidos depositados ao nível dos grandes aglomerados urbanos e dos complexos industriais, para sabermos onde estamos e para onde vamos.
Embora disponhamos já de algumas medidas sectoriais, a nossa população continua a sofrer as consequências das péssimas condições de saúde ambientais, por falta de uma lei global, uma lei quadro sobre esta matéria. Daí a nossa iniciativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não apoiado, pelo menos na generalidade, as medidas preconizadas, é não compreender o desenvolvimento, ou então estar comprometido com a produção própria do capitalismo anárquico e selvagem, do liberalismo feroz.
Atacar ainda o nosso projecto de lei, tal como foi aqui feito pelo Sr. Deputado' Luís Coimbra - porque ele preconiza medidas de descentralização, com valorização doutras regiões do território, não incluindo a zona de Lisboa -, é não compreender nada do verdadeiro desenvolvimento e da ecologia humana. £, se na execução das medidas preconizadas pelo projecto em discussão tiver de haver transferência de funcionários, ela será feita sem quebra dos princípios que lhe garantam os seus direitos, quer no campo familiar, social e económico.
O projecto de lei apresentado cria um novo padrão de vida e só será compreendido por aqueles a quem falta grandeza suficiente para equacionar os grandes problemas do desenvolvimento do homem no respeito mútuo entre a técnica, o meio cultural, a humanidade e o mundo.
Não compreender esta grandeza é que é ser conservador.
Ao defendermos estas medidas não pretendemos voltar às cavernas de uma sociedade pré-científica, mas antes pelo contrário promover um estilo inovador que venha a explorar determinadas técnicas, que têm como objectivo assegurar a prosperidade e a independência das pequenas células sociais, sem destruir o equilíbrio do meio natural. Estas novas técnicas são por vezes tão sofisticadas como as outras que desejamos substituir, embora algumas delas ainda não estejam tão desenvolvidas como desejaríamos.

Aplausos da ASDI e do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Sousa.

O Sr. Oliveira e Sousa (CDS): - Sr. Deputado Dias de Carvalho, o projecto de lei que estamos a discutir intitula-se «Defesa do Ambiente e protecção da natureza e do Património». Mas dentro das suas disposições, para além dos aspectos da defesa da natureza e do património, aparece como que uma série de outro tipo de articulado, nomeadamente algo que é quase uma reforma administrativa.
Portanto, pretende ser quase uma lei de bases de reforma administrativa, pretende ser quase uma lei de bases de ordenamento do território e até pretende
alterar um artigo do Código Civil que liga directamente até com direitos gerais de propriedade.
No entanto, o Sr. Deputado na sua intervenção focou apenas o aspecto da defesa do meio ambiente físico e da defesa da natureza. Já há pouco o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho tinha dito que se poderia retirar o problema da defesa do património. Agora parece-me que os proponentes também estariam dispostos a retirar toda a parte que não é de defesa do meio ambiente e da natureza.
Portanto, gostaria de perguntar se retirando tantas coisas ao projecto ainda ficará alguma essência daquilo que foi apresentado e que, no meu entender, me parece que está muito mal estruturado.

Aplausos do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Oliveira e Sousa, em relação à observação que V. Ex.ª faz, tenho a dizer-lhe que nos vinte minutos que o Regimento me concede não posso intervir em todas as questões colocadas por um projecto de lei tão volumoso e de uma importância tão grande como é este que a ASDI se propôs trazer ao Plenário.
Vejo que na realidade o Sr. Deputado não leu o projecto de lei, porque se o tivesse feito tinha encontrado na página 6 do seu articulado toda a defesa de uma agricultura ecológica e de desenvolvimento do ambiente, e não dos assuntos que aqui foquei mais por estar vocacionado para eles pela minha profissão, do que propriamente por outras razões e, sobretudo, porque também o tempo me escasseava.
Portanto, aconselho-o a fazer uma leitura não sectária, mas sim calma e serena. Verá então que tudo isso que o Sr. Deputado acaba de dizer está devidamente ordenado, bem como poderá verificar que no nosso projecto de lei se chama a atenção para todos esses problemas.

O Sr. Oliveira e Sousa (CDS): - Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?

O Orador. - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Oliveira e Sonsa (CDS): - Sr. Deputado pedi que me deixasse interrompê-lo só para lhe dizer que eu já li o vosso projecto - e li-o serenamente - e comparei essa leitura com a sua exposição.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto termos chegado à hora regimental para interromper os nossos trabalhos, suspendo a sessão, que recomeçará às 15 horas.

Eram 13 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Determinados temas há que nesta

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Casa costumam suscitar um entendimento de base quanto aos objectivos fundamentais que se pretendem atingir com os respectivos diplomas. Estão neste caso diversíssimos diplomas que nesta Casa têm sido aprovados por unanimidade, normalmente sobre temas que pelas suas características humanitárias ou mesmo políticas indiscutíveis, merecem a priori o apoio de todas as bancadas.
A questão do ambiente 'foi, até certo ponto, um caso paralelo. Tratava-se de uma temática nova a que ninguém pode deixar de ser sensível e aos poucos, à medida que essa temática foi sendo integrada nas preocupações governativas e políticas dos cidadãos, surgiu também a consciência crítica e a exigência conceptual que não permite mais que assuntos deste tipo provoquem um debate tão pacífico como aconteceria há tempos ou como o tema em si parecia aconselhar.
Além de tudo o mais, o presente projecto de lei é-nos apresentado precedido de um preâmbulo apaixonado, que é extremamente dura e insinua, ou até afirma, que quem não é meu amigo e quem não é por mim. é contra mim, quem não votar favoravelmente este projecto de lei está a fazer um voto político, acrílico, acéfalo ou o que se lhe queira chamar.
Não quero voltar a esse tema, até porque já aqui referi o preâmbulo. No entanto, devo dizer que é, de facto, o preâmbulo a razão não da rejeição do diploma pela nossa/parte, mas a razão de alguma dureza que o debate teve: a uma preâmbulo apaixonado corresponderá sempre uma argumentação contrária algo dura.
Convém, no entanto, nesta altura do debate tentar desapaixoná-lo e desdramatizá-lo. Não se trata de ao votarmos contra, exercermos aqui da nossa parte um voto tão só com características políticas, o que não quer dizer que pensamos que um voto meramente político possa ser ilegítimo. Terá alturas em que o será e outros momentos em que o não é. Aliás, de todas as bancadas tem havido, acerca dos mais variados projectos de lei, votos com características marcadamente políticas e que não se quadram directamente com a natureza dos diplomas em discussão.
Pretende-se que esto diploma seja uma lei-quadro do ambiente. Antes de mais põe-se a pergunta: o que é que se pretende de uma lei-quadro? Ora, uma lei-quadro é uma lei onde aprecem os grandes conceitos, as grandes definições e os grandes princípios que enformam uma determinada temática; onde aparecem as tarefas fundamentais do Estado em relação a um determinado tipo de problemas; onde através de preceitos de grande generalidade se procura que vários programas políticos possam, sem prejuízo da lei, exercer uma política coerente com ela.
No caso de uma lei-quadro do ambiente julgamos, como já aqui disse em outras alturas, que o grande objectivo deveria ser o de compatibilizar o desenvolvimento económico com a conservação da natureza e a qualidade do ambiente. Como é óbvio, uma lei deste tipo oferece dificuldades tremendas, como sejam de conceptologia, de sistematização e de normatividade - é, aliás, muito difícil encontrar normatividade quando se legislam sobre princípios gerais - que implicam uma grande exigência de rigor.
Quanto a este aspecto falou-se, não pouco, das iniciativas anunciadas pelo Governo ou pela maioria a este respeito, criticando-se que elas ainda não tivessem surgido e não tivessem dado entrada nesta Câmara. A maioria não tem qualquer dúvida de ou em «eu nome ou no do Governo aceitar essas críticas.
No entanto, é bom que se diga que essa demora, que nos é um pouco atirada à cara, resulta não do abandono 'do problema ou de se ter negligenciado a necessidade de se elaborar uma lei-quadro sobre o ambiente-embora uma lei-quadro do ambiente possa não ser absolutamente necessária no sentido de que não se venha a poder fazer outra legislação sem essa lei-quadro, mas aceitamos que seja necessária - mas deve-se, simplesmente, ao facto de nós próprios e o Governo pensarmos que, apesar de tudo, o óptimo seria inimigo do bom. Queremos fazer alguma coisa boa, mas isso implica profundas considerações, exigências de rigor e uma tão grande concentração e discussão interna que, naturalmente, leva o seu tempo.
Quanto ao presente projecto de lei em discussão, e falando na generalidade e sem dramatizar o problema, todas as intervenções aqui produzidas, tanto das bancadas da maioria como das da oposição e mesmo daquelas bancadas que afirmaram a intenção de voto favorável a este projecto, todas elas são unânimes em determinado tipo de críticas.
Em primeiro lugar, este diploma não faz as definições fundamentais que deveria fazer e a que pretende referir-se como, por exemplo, a definição de ambiente, das diferenças ambientais normalmente conhecidas por poluição, de recursos naturais, etc, etc.
Por outro lado, o presente diploma é prolixo nas matérias que trata, misturando coisas que deveriam ser objecto de diversas leis-quadro para as amalgamar numa mesmo diploma com profundidades diferentes que, evidentemente, não estão de acordo com a logicidade que um diploma desta natureza deveria ter. Mistura ambiente, urbanismo, habitação, património, autarquias locais e ordenamento, não havendo, portanto, a preocupação de estabelecer um esquema lógico que permitisse à Assembleia da República aproveitar um determinado esqueleto e um determinado tipo de ideias que seriam melhoradas em função das opiniões dos vários partidos.
O presente diploma tão depressa é genérico como vai quase ao pormenor regulamentar, abordando temas completamento desinseridos de uma lei-quadro e, particularmente, de uma lei-quadro do ambiente. Vai até às transferências de funcionários, à localização de serviços públicos, aos loteamentos clandestinos, às demolições e às normas de arquitectura, oferecendo-nos, pois, uma confusão com a qual não podemos concordar.
Além disso, o diploma em discussão não está ordenado por temas e não tem, apesar do que aqui foi afirmado, um critério lógico que presida ai elaboração do projecto de lei, não tem um conteúdo sistemático visível e existem graves erros de natureza técnico-científica. Em relação a alguns assuntos é quase exaustivo, como no caso da água. E neste caso, mal, porque quanto a este aspecto tem normas que talvez pudessem ter cabimento numa lei de recursos hídricos, mas que não tem com certeza cabimento numa lei-quadro.
Noutros aspectos, e tal como já aqui foi dito, resume-se a uma simples declaração de princípio como,

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por exemplo, no que se refere ao património que era título do diploma e depois não se encontra contemplado. Não é que nós pensássemos que esta seria a sede própria para tratar do património,, mas é que constando do título do próprio diploma é evidente que esse tema teria de ser tratado com tanta, ou pelo menos paralela, profundidade em relação a outros temas.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, desdramatizemos esta questão: não nos move -e isso está demonstrado por todas as intervenções que até agora aqui foram produzidas por 'nós ou por outros partidos- qualquer animadversão em relação à ASDI nem qualquer tipo de malevolência relativamente à oposição ou à ASDI em particular. Não estamos aqui de má fé, não se trata de uma posição maniqueísta da nossa parte 'nem há, fundamentalmente, qualquer espécie de voto político neste caso. Um voto político seria o contrário, seria votar a favor de um diploma com o qual não concordamos, mas que politicamente nos poderia ser conveniente votar.
Portanto, repito que não se trata de um voto político, mas apenas de um voto que tem a ver com a natureza e o conteúdo do diploma em si. Diria que o presente projecto de lei não é por nós aprovado porque não o merece ser, ou melhor, a sua intenção até merece ser aprovada, mas o diploma em si não o pode ser. Portanto, não digo que se trata de um problema de merecimento, até porque não quero fazer juízos de valor, mas tão-só de, em boa lógica política, jurídica e, fundamentalmente, de ambiente, pensarmos que ele não pode ser aprovado.
Aliás, este diploma, com as críticas que aqui já lhe foram feitas, poderia baixar a uma comissão e aconteceria que, para se poder obter algo aprovável por esta Câmara, teria de ser expurgado, pisado, virado ao contrário, sei lá, dividido em partes mas, fosse como fosse, o que não sairia com certeza, porque é impossível, de uma comissão especializada desta Assembleia era um diploma que tivesse fosse o que fosse a ver com o diploma agora proposto pela ASDI. E a ser assim isso não seria regimental, não seria lógico e nem a ASDI quereria, com certeza, assumir a paternidade de um diploma que já não era o seu.
Por todas estas razões e para que o debate fique definitivamente desdramatizado e desapaixonado, nós declaramos, mais uma vez, que a nossa intenção de voto se radica exclusivamente na natureza do diploma e no seu conteúdo e não em quaisquer considerações de ordem política que o preâmbulo do diploma até mereceria da nossa parte.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, permita-me que Mie diga que apreciei a sua intervenção pelo seu tom concordato e pela serenidade que teve, em contraste flagrante com intervenções anteriores da sua bancada. E desejava destacar o propósito por si assinalado de desdramatizar uma questão que eu ainda não vi dramatizada por nenhuma bancada senão pela sua. De modo que tomei a sua afirmação, ou porventura o remoque, como dirigida aos seus próprios; colegas de bancada.
Mas desejaria fazer ainda algumas observações e naturalmente também alguns pedidos de esclarecimento. Afirmou V. Ex.ª que diversas matérias têm obtido consenso geral nesta Assembleia da República e que uma delas, aquela que propiciaria até a obtenção desse consenso, seria matéria de importância semelhante à do ambiente. Desejo perguntar ao Sr. Deputado Borges de Carvalho quais foram, efectivamente, aqueles diplomas que tendo sido apresentados nesta Assembleia por diversas bancadas - eu citaria o PS e a ASDI e mais concretamente e poderia referir-lhe o projecto de lei do PS apresentado precisamente no dia do ambiente no ano passado, bem como dois outros projectos apresentados já este ano pela ASDI relacionados com o ambiente- tiveram o contributo válido da sua bancada no sentido de aderir a preocupações de defesa do ambiente?
Ou se, pelo contrário, não terá sido a sua bancada quem relativamente a qualquer um desses projectos, nomeadamente em relação àquele que foi apresentado no próprio dia do ambiente, ergueu uma bandeira contra a possibilidade de se obter consenso nesta Câmara em matérias como esta.
Por outro lado, V. Ex.ª afirmou ainda que a eventual) descida deste projecto lei à comissão especializada levaria a modificações de tal ordem que ele, porventura, se tornaria irreconhecível. Perguntar-lhe-ia se isso não tem acontecido a outros diplomas como, por exemplo, a um que virá muito proximamente a esta Assembleia e que resultou da proposta de lei do Governo sobre as condições da criação de freguesias e de novas autarquias locais? Se verificar, o diploma que irá resultar do consenso de todos os deputados desta Câmara representados na comissão não terá igualmente a menor parecença com o diploma inicial, mas salvou-se fundamentalmente a iniciativa.
Pergunto, pois, a V. Ex.ª se não seria capaz de ter largueza de ânimo para, com o seu saber, poder modificar a nossa intenção, que, aliás, o Sr. Deputado Borges de Carvalho afirmou que merece ser aprovada, num projecto em que o seu valioso contributo viria, provavelmente, a possibilitar um consenso geral desta Câmara.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, está mais um orador inscrito para lhe pedir esclarecimentos. Pretende responder imediatamente ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho ou prefere fazê-lo no final de todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Borges de Carvalho (PPM):- No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI):- Sr. Deputado Borges de Carvalho, ouvi as suas palavras que, na realidade, são bem diferentes das pronunciadas por alguns colegas do seu partido. Disse V. Ex.ª que o preâmbulo do nosso projecto de lei é apaixonado. É apaixonado, sim, mas não é sectário como algumas das posições aqui assumidas! E é apaixonado e apaixonante porque trata de um assunto de fundo da

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vida dos portugueses designadamente do bem-estar e da qualidade de vida.
É que sem serem resolvidos os problemas da poluição, da paisagem e da agricultura ligada ao ambiente, sem serem resolvidos os problemas da vida do homem, da vida das plantas e da vida dos animais, sem serem respeitados os ecossistemas, os portugueses não poderão ter uma vida válida e serão apenas, como já aqui foi dito, o caixote do lixo das grandes empresas que se pretendem montar no país, aproveitando-se da vossa incapacidade para definir linhas concretas para a nossa própria defesa. Ficaremos ao sabor da imposição dos outros se continuarmos atrasados em definir todas estas linhas. Por isso é que o nosso preâmbulo é, na realidade, apaixonante e apaixonado mas não é sectário, pois nunca a ASDI agiu aqui como um partido sectário e nem o pretende ser. O sectarismo vem, sim, de outras bancadas que não da nossa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho, para responder, se assim o entender.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM;: -Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, tomo nota da parte em que V. Ex.ª teve a bondade de, por alguma forma, elogiar a minha intervenção, o que lhe agradeço. No entanto, não nego que a intervenção do meu colega Luis Coimbra tenha sido dura e apaixonada e, por outro lado, aceito a carapuça que V. Ex.ª me pretendeu enfiar, na medida em que até comecei por dizer que havia, de facto, uma justificação' clara para essa dureza e paixão; é que nem toda a gente está na disposição de que lhe chamem maniqueísta, incompetente e não sei mais quê sem terem feito nada para isso. Ora, é isso que, de facto, V. Ex.as fazem no preâmbulo do vosso projecto de lei, isto é, dizem que quem não o votar favoravelmente é todas essas coisas e ainda muitas mais de que neste momento não me recordo.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI):- 'Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI):- V. Ex.ª entendeu ó projecto de lei como sendo d rígido ao PPM ou que se trata de um diploma que foi apresentado a esta Assembleia?

O Orador. - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, os epítetos que V. Ex.ª citam no preâmbulo do vosso projecto de lei é dirigido a todo e qualquer deputado que cometa o inenarrável crime de estar contra este diploma. Esse deputado, seja ele do PPM, do PCP, do PS ou seja de que partido for, é, nas vossas próprias palavras, um miserável, um incompetente e não sei mais quê. Esta é que é a verdade e, portanto, essas palavras não são dirigidas ao PPM mas a todos os deputados desta Câmara, pelo que, julgo eu, ser legítima a indignação de todos os lados relativamente ao preâmbulo do presente projecto de lei.
Portanto, se houve dureza e paixão que tentei desdramatizar na minha intervenção, e julgo que com algum êxito a avaliar pelas suas palavras, ela foi provocada por V. Ex.ª e não por nós.
Perguntou ainda o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho que consensos terão existido em matérias semelhantes. Apesar de ter uma memória muito fraca, tenho uma memória de galinha, posso citar vários: ainda há relativamente pouco tempo foram aprovados dois projectos de lei da iniciativa do Partido Comunista e no ano passado foram aprovados dois projectos de lei nossos. O projecto de lei do Partido Socialista não foi aprovado no ano passado por razões que muito cordatamente colocámos e essa é mais uma razão para que, do ponto de vista político, o presente projecto de lei não possa ser aprovado. É que não há partido nenhum que no ano passado tenha votado contra o projecto de lei do Partido Socialista que possa agora votar a favor deste, até porque ele é, na opinião de todas as bancadas, inegavelmente pior. Portanto, esta é uma daquelas questões que, para nós, não têm sequer discussão.
Quanto ao possível melhoramento deste diploma em comissão, devo dizer que na intenção clara, expressa aliás no meu discurso, de ser cordato e desapaixonado receio agora tê-lo sido talvez demasiado. É que se eu, eufemisticamente, disse que este projecto de lei, uma vez baixado à comissão, teria de ser virado ao contrário, pois foi esse o tipo de preocupações e de tom que quis dar à minha intervenção. Penso que devo agora dizer-lhe que este projecto de lei não pode nem deve baixar à comissão competente, porque ele não tem ponta por onde se lhe pegue para fazer dele seja o que for. Esta é a minha opinião muito sincera que não quis expressar há pouco, mas que V. Ex.ª agora impõe que diga.
O Sr. Deputado Dias de Carvalho diz que o preâmbulo não é apaixonado -Homessa! Não é lá agora ... -, mas que é apaixonante. Terá apaixonado V. Ex.ª, que se terá apaixonado pela sua própria obra, mas permita-nos que não compartilhemos desses sentimentos tão narcísicos.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI): - Eu disse simplesmente que o assunto era apaixonante e que o preâmbulo não era sectário.

O Orador: - Bom, concordo que o assunto é apaixonante, agora não penso que o preâmbulo não seja sectário. Aliás, o preâmbulo cita mesmo o sectarismo, pois numa das suas partes diz-se o seguinte: «A posição totalitária, símbolo da mediocridade e do sectarismo para quem nada pode existir fora do seu universo próprio, é também, em última análise, um teste à apregoada competência...». Ora, penso que não valerá a pena entrarmos em discussões deste teor.
É que um preâmbulo normalmente deverá servir, digamos, para conquistar a benevolência dos outros deputados em relação a um determinado diploma. Agora se é para suscitar a revolta e a animadversão, francamente, V. Ex.ª apaixonar-se-á talvez pelo seu escrito mas eu não. Por outro lado, O Sr. Deputado Dias de Carvalho, aquando do seu pedido de esclarecimento, fez uma declaração algo empolgada e algo empolgante sobre a defesa dos valores e outra coisas

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mais, declaração essa que considero ser realmente um bom discurso para um comício e que compartilharei, pois até sou capaz de fazer um discurso' desses. Resta é saber se este projecto de lei em si vai ao encontro dessas preocupações Qjue tão dramaticamente o Sr. Deputado aqui explanou. Eu julgo que não vai e foi por isso mesmo que fiz a minha intervenção, ou seja, para dizer que o presente projecto de lei não vai ao encontro dessas preocupações e, pelo contrário, vai, sim, gerar a maior das confusões no âmbito' dos problemas que pretendemos resolver, pelo que não havia qualquer espécie de possibilidade de encararmos a sua aprovação.

Aplausos do PPM.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, teju a palavra o Sr. Deputado Figueiredo Lopes.

O Sr. Figueiredo Lopes (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao fazer uma análise atenta do projecto de lei n.º 230/II, da ASDI, sobre a «Defesa do Ambiente e Protecção da Natureza e do Património», cumpre-me dar a este Parlamento a opinião que sobre o mesmo obtive:

A) Seu título não está correcto por pretender abranger áreas que não têm obrigatoriamente de constar de uma Lei Base sobre a política do ambiente.
B) Trabalho que se pretende de generalidades, entra contudo em pormenores que há que eliminar.
C) Pretende assumir-se, no seu preâmbulo, o Grupo Parlamentar da ASDI como arauto da política do ambiente em Portugal, chegado ao ponto de criticar o Governo ,de inoperante.

Será que para construir algo em Portugal, é necessário destruir primeiro os nossos adversários políticos? Para quê partir do princípio que o projecto irá ser rejeitado, como faz o seu preâmbulo, aproveitando aprioristicamente essa tese para, uma vez mais, criar barreiras, fazer poluição com qualificativos, apelidos totalitaristas, expressões como: «sectarismo», «democracia como disfarce ocasional» e «oportunismo».
Tenho a sensação, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este projecto de lei, ao ser elaborado, já estava derrotado na mente dos seus autores. Derrotado', apenas, porque eles assim já o sentiam, como poderemos concluir de todo aquele preâmbulo que é um autêntico abrir de hostilidades.
A oposição neste Parlamento passa também pelo Grupo Parlamentar da ASDI. Porém, eu pergunto: que quer dizer a frase «a iniciativa alheia é-lhe (ao Governo) insuportável porque põe a claro a sua incapacidade». Incapacidade para quê, Srs. Deputados do Grupo Parlamentar da ASDI? Para legislar? Para governar? Para lidar com a oposição?
Será que a capacidade aterrou e fez base somente junto dos Sociais-Democratas Independentes?
Costumam dizer em Teivas, minha aldeia natal na Beira Alta, que «presunção e água benta ceda um toma a que quer».
Vamos então a factos concretos:

Primeiro, voltando ao título, porque englobar tudo isto, ambiente, protecção da natureza, património, no mesmo projecto de lei? Que vai acontecer a tudo quanto já se encontra legislado nestas matérias? Mas será que a defesa e a valorização do património histórico e cultural, por exemplo, ficam salvaguardados com as 5 linhas e meia do artigo 33.º?
Segundo, que atitude teria de tomar o Ministério da Reforma Administrativa se fosse aprovado o texto do artigo 37.º em que, a propósito da defesa do ambiente, se proíbe a localização em Lisboa de novos serviços públicos e se determina que funcionários públicos poderão ser transferidos de localidade ou transitar para a administração regional e local.
Terceiro, fala-se no artigo 4.º na definição e direitos da associação de defesa do ambiente, do património e da protecção da natureza. Sem pretender entrar em polémica sobre a necessidade da criação de tais associações, aproveito, no entanto, para referir que, a nível das escolas, o assunto assume realmente, aí, sim, aspectos que urge salientar e potencialidades que urge igualmente incentivar.
Vou dar um exemplo sobre como os jovens em Inglaterra vivem a política do ambiente, que vem relatado no livro «The Pollution Handbook» editado pelo Advisory Center for Education com o patrocínio do Sunday Times e em que são protagonistas grupos de jovens que, durante um fim de semana, decidem, por exemplo, aderir ao programa de pesquisa de poluição de todos os rios a nível nacional. Que acontece? Milhares de jovens em grupos ou ao lado de suas famílias saem de sua casa e vão fazer testes à água do rio da sua área residencial.
Esta investigação tem dois objectivos:

1.º Dar aos jovens uma visão realista do problema do meio ambiente que eles vão herdar.
2.º Introduzir um novo método de testar níveis de poluição de água corrente e traçar um mapa nacional do estado dos pequenos, médios e grandes cursos de água. Parecem ser dois os objectivos, um educacional, outro social. Mas, na verdade, é apenas um: e esse é demonstrar que os complexos problemas do ambiente necessitam a atenção de cada um de nós.
Voltando ao articulado do projecto de lei em discussão, e desta vez ao artigo 6.º onde se diz: «compete ao Governo a definição de uma política global no domínio do ambiente». Afinal, eu pensava que o objectivo deste projecto de lei era exactamente o da definição de uma política global e que ao Governo competiria a definição das políticas sectoriais. Estarei enganado?
Prevê-se a criação de um orgão coordenador da aplicação da presente lei. Pergunto: Porque não atribuir tal missão à Secretaria de Estado do Ambiente a quem compete zelar por tudo o que respeita a ambiente?

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Ao falar-se no artigo 2.º da protecção de águas, diz-se que são abrangidas as seguintes categorias de água: de superfície, subterrânea, marinhas interiores, marinhas territoriais -portanto, marinhas e não marítimas, Srs. Deputados da ASDI - e quanto às águas sob jurisdição portuguesa que são as que vão das 50 às 200 milhas o que lhes acontece? Não temos compromissos por acordos internacionais?
Depois, no n. º 8 do mesmo artigo, fala-se das penas aplicáveis às unidades industriais mas não se fala das penas aplicáveis aos navios que diariamente cruzam as nossas águas poluindo mais ou menos à vontade?
Posteriormente, no artigo 15.º, fala-se da protecção da floresta, mas não se refere a técnica de protecção tão usada nos países evoluídos e que é a Silvopastorícia como medida de prevenção de incêndios. Mas onde pasta o gado não arde, esta é a grande regra - incentivo à criação de gado, floresta protegida, eis o que é a silvopastorícia, aspecto que não é contemplado no projecto de lei da ASDI.
Finalmente, pergunto: serão necessários três dias de debate parlamentar para um relatório sobre o meio ambiente, tanto tempo como o que é usual para debater um Programa de Governo? Exagerado, sem dúvida?
Para uma profunda reflexão de todos nós passarei a citar alguns exemplos da deterioração do nosso ecossistema que provam ser necessária uma Lei de Base do Ambiente.
O primeiro exemplo: nos países industrializados o barulho duplica de intensidade em cada período de 10 anos, o que pode trazer consequências graves de ordem fisiológica e psíquica.
Um segundo exemplo é o que aconteceu no rio Reno em que em 1969 cerca de 40 milhões de peixes foram mortos subitamente - e repito subitamente - após a queda acidental de um barril de produtos químicos tóxicos no rio Reno, junto à área do Lago Constança. Este acto foi acidental mas a população não reagiu, não prestando qualquer atenção às indicações feitas pelo Conselho da Europa, segundo as quais o Reno não era mais do que um esgoto a céu aberto.
Na verdade as análises que tinham sido feitas haviam detectado que o número de bactérias por mililitro de água era: de 30 a 100 no percurso da Suíça; de 2000 no Lago de Constança; de 24000 em Bona e de 100000 no ponto de entrada do rio Reno na Holanda.
O terceiro exemplo é o da contaminação pelo chumbo devido aos combustíveis. Uma análise de cristais de neve na Gronelândia mostrou os seguintes resultados: num período de 2550 anos de (800 AC a 1750 DC) detectaram-se 5 milésimos; num período de 190 anos (entre 1750 a 1940) detectaram-se 60 milésimos e, finalmente, num período de apenas 12 anos (entre 1940 e 1952) detectaram-se 185 milésimos.
Ainda um outro exemplo, este sobre a poluição atmosférica, sabe-se que a civilização moderna lançou para a atmosfera 12 milhões de toneladas de gás carbónico, dos quais mais de metade de modo irreversível Até ao ano 2000 pensa-se que o teor em anidrido carbónico atingirá os 25 %. Em quantidade normal, o gás carbónico é um dos factores de regeneração da terra. Mas os cientistas pensam que um crescimento desenfreado do teor de gás carbónico poderá ter efeitos muito sensíveis no clima.
Não está fora de questão admitir a variação de vários graus na temperatura da atmosfera terrestre. E lembramo-nos, Sr. Presidente, Srs. Deputados que o último período glaciar foi devido a uma queda de temperatura de cerca de 8 graus centígrados em relação à temperatura média.
Mais exemplos poderiam ser apresentados. Mas, na verdade, uma coisa é certa: a crise existe em Portugal e por isso cada vez mais se torna necessária uma Lei de Base do Ambiente. Esta crise corre o risco de ser definitiva para o destino do Homem, mais que todas as guerras ou lutas raciais. O que está hoje em jogo é a qualidade de vida e talvez mesmo, em definitivo, a possibilidade de o Homem viver na Terra.
Salvemos o Planeta Terra. Demos nós, como parlamentares conscientes, a nossa contribuição legislando no sentido de defender a vida da terra, o azul do céu e a limpidez das águas.
O Grupo Parlamentar do PSD tudo fará para que assim aconteça num futuro muito breve.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI):- Sr. Deputado Figueiredo Lopes, creio que um bom exemplo de uma certa confusão que resulta de toda a sua intervenção é a conclusão: a terra está em perigo, é preciso salvá-la, é preciso uma lei-quadro sobre o ambiente, logo vamos derrotar um projecto de lei-quadro sobre o ambiente. Esta conclusão de lógica transcendente e Kafkiana é, de facto, um exemplo de toda a sua intervenção. Gostaria de lhe fazer este reparo para principiar, porque não percebo a lógica da sua intervenção. E porque em toda ela ressaltou uma extremamente deficiente leitura, que é simples, do projecto de lei em causa, far-lhe-ia algumas perguntas.
Em primeiro lugar, disse o Sr. Deputado que o preâmbulo deste diploma acusava o Governo de incompetência. Ora, o preâmbulo diz assim: «A sorte de cada uma e de todas as iniciativas legislativas das oposições acaba por ser e é um teste da democraticidade dos governos e das maiorias que os sustentam e é também, em última análise, um teste à apregoada competência. Quem é realmente competente não receia em integrar e acolher ideias de outrem. É quem, na sua mediocridade, não pode suportar confrontos, que procura assegurar a censura na informação e a rejeição na generalidade das iniciativas alheias. A iniciativa alheia é-lhe insuportável, porque põe a claro a sua incapacidade.» Ora, não foi o Governo que foi atacado, pelo que pergunto será que o Sr. Deputado sentiu a carapuça enfiada?
Em segundo lugar, disse o Sr. Deputado que nada tem a ver com a política do ambiente o problema da localização nos grandes centros urbanos, como Lisboa por exemplo, de novos serviços públicos. Então o Sr. Deputado ignora que um dos factores degradantes do ambiente é precisamente a excessiva concentração nas grandes cidades e que um dos processos

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de resolução desse problema é o da transferência de serviços públicos para outros meios a que devem pertencer, através da descentralização e da regionalização.
Finalmente, uma última questão essencial: teve o Sr. Deputado Figueiredo Lopes o cuidado de comparar o projecto de lei em questão com o Programa do Partido Social Democrata? Se o fez, gostaria de conhecer as suas conclusões linha por linha, porque eu próprio farei essa análise dentro em breve.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Figueiredo Lopes, para responder, se assim o desejar.

O Sr. Figueiredo. Lopes (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, quero dizer-lhe que quando o seu projecto de lei fala em competência ou em competência entre aspas, para mim é a mesma coisa e creio que com isto a sua questão fica respondida.
Por outro lado, quando falo na política do ambiente que defendo, continuo a dizer que não estive aqui a querer baralhar, tendo sido a minha intervenção no sentido de que ela é cada vez mais necessária e não que a salvação é o projecto de lei n.º 230/II. Teremos que encontrar uma solução aproveitando, talvez, algumas achegas deste projecto de lei e com outras participações que virão de outros projectos, mas teremos que o fazer. Não estou a dizer que este diploma não pode vir a ter validade para uma futura Lei de Bases do Ambiente. Mas o que é certo é que o presente diploma, tal como está, não servirá para projecto de lei de bases do ambiente para Portugal.
Ao falar da excessiva concentração nas grandes cidades e na descentralização dos serviços públicos, estou plenamente de acordo consigo, mas devo salientar que quando o projecto se refere a estes aspectos está a entrar numa área que não é a do ambiente.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Deputado Figueiredo Lopes, quero perguntar-lhe se poderia concretizar qual é, no seu conceito, a área do ambiente.

O Orador:- Posso dizer-lhe até porque o senhor tem-na aqui definida.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não, diga-me é qual é o seu conceito?

O Orador: - Não! Digo é o que consta do projecto de lei, que é o que estamos a discutir.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não, diga qual é o seu conceito!

O Orador: - Diz aqui no projecto de lei que é o ar, a água, o solo, a flora e a fauna.

O Sr. Magalhães Moía (ASDI): -O Sr. Deputado discorda de nós e é por isso que estou a pedir-lhe para dizer qual é o seu conceito.

O Orador: -Sr. Deputado Magalhães Mota, o meu conceito de área de ambiente será igual ao seu, mas uma coisa é certa é que eu não posso fazer um projecto de lei de bases de ambiente e, através dele, pretender legislar sobre assuntos que dizem respeito à Administração Pública. Penso que não devemos entrar nesse campo e é por isso que estou a criticar o presente diploma e não por outras razões.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Mas que grande barracada!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista já deixou aqui clara a ideia de que este projecto de lei da ASDI não é uma peça tecnicamente correcta e contém mesmo bastantes imprecisões que não podem, em nosso entender, ser escamoteadas.
Salientamos também que no seu corpo mais válido o projecto em discussão assimila, na filosofia e na forma, o projecto de lei n.º 487/I, do PS, em tempo submetido à discussão nesta Assembleia e liminarmente rejeitado, praticamente sem discussão, pelos votos da AD e por iniciativa do PP>M.
Anunciamos por outro lado a intenção de retomar uma iniciativa legislativa nesta matéria na base do antigo projecto de lei n.º 487/I substancialmente melhorado na forma e no conteúdo.
Denunciamos, com responsável serenidade, o incongruente comportamento do PPM que vem bloqueando as iniciativas parlamentares nesta matéria, da parte da oposição enquanto no Governo, de cuja área há dois anos é responsável, não quer ou não consegue formular a esta Assembleia da República propostas válidas.
Finalmente, afirmamos que, para lá das críticas justas que formulamos, esta iniciativa da ASDI pode representar um passo importante para uma discussão desta temática no Parlamento, discussão que consideramos aberta, reputamos de oportuna e fundamental e para a qual manifestamos a disponibilidade e empenhamento do- Partido Socialista.
Impõe-se agora balizar, a propósito, algumas linhas de força da política do Ambiente e Qualidade de Vida do Partido Socialista que, fundamentando-se nos princípios constitucionais da defesa dos direitos dos cidadãos e na responsabilidade do Estado de garantir a melhoria da sua qualidade de vida, não ignora as carências ainda existentes no nosso tecido social; nos domínios da alimentação, do emprego, da habitação, da saúde e da segurança social, da educação e da formação; e a necessidade de promover um maior desenvolvimento da produção, aproveitando para o efeito, de um modo racional, as potencialidades económicas existentes no âmbito de um quadro disciplinador de planeamento democrático.
É preciso melhorar a qualidade de vida dos portugueses, combater as carências existentes e as distorções do desenvolvimento, através da anulação progressiva dos desequilíbrios entre regiões e sectores da população, da formulação de novas alternativas à sociedade urbano-industrial que atenuem a macroce-

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falia de Lisboa e Porto; aumentem as oportunidades nas regiões e ataquem as debilidades das nossas estruturas.
O Partido Socialista defende um crescimento do produto subordinado a uma política de desenvolvimento de raiz e valorização cultural, de melhor aproveitamento dos recursos existentes na base de um esforço de desenvolvimento regional que signifique a conquista de melhores padrões sócio-culturais de vida para as populações.
Em nosso entender não pode haver uma política de ambiente desligada de um correcto ordenamento do território, de uma opção descentralizadora e de regionalização do país, que aponte claramente medidas para conter o crescimento das grandes áreas metropolitanas e para melhorar os seus padrões de qualidade de vida; que apresente uma estratégia de redimensionamento dos restantes centros urbanos e de correcção das assimetrias de desenvolvimento existentes através da melhoria de infra-estruturas e de equipamentos nas áreas mais carenciadas; que. discipline o controle e uso dos solos; que defenda e aproveite os recursos naturais com destaque especial para a gestão da água e dos solos aráveis; que globalize uma política de conservação da natureza, de parques e reservas naturais, de espaços verdes e de defesa e reabilitação do património cultural e arquitectónico; que promova estratégias integradas de combate à poluição; que defina, num quadro de amplo debate nacional, uma política energética para o país, simulando e formulando diferentes opções, seus custos, riscos e vantagens.
Estamos a dar os primeiros passos institucionais em matéria de regionalização e de ordenamento do território e ao PS preocupa-o verificar que das filosofias do Governo nesta matéria não transparece uma espinha dorsal comum, quanto à imagem política, social e cultural do país no futuro.
Isto é tão mais preocupante quanto todos temos consciência de que em períodos de forte crise económica como a que atravessamos e que à incapacidade de gestão da maioria AD deve ser imputada, nem sempre há tempo e discernimento necessário para subordinar os projectos de crescimento económico a uma correcta e necessária óptica de desenvolvimento.
O Partido Socialista, como já aqui afirmou no debate, vai formular uma proposta a esta Assembleia, apresentando na Mesa um projecto de lei quadro do ambiente e da qualidade de vida que após este debate e alguns compromissos assumidos pelas diferentes bancadas espera que venha a ser a plataforma fundamental de discussão e de debate, de construção de uma lei quadro que obtenha um alargado consenso e que permita arrancar para uma tarefa legislativa e regulamentadora integrada ao nível do Governo.
Entendemos desde já como fundamental um alargado debate desta temática, às autarquias, associações especializadas da defesa do património natural e cultural, aos cidadãos em geral. O vector de participação das populações, de sensibilização da juventude e de consciencialização generalizada para estes problemas, que são afinal as grandes questões da vida e do futuro, é um vector fundamental da definição de uma política de ambiente e qualidade de vida e nestes termos o Partido Socialista privilegia-o.
Deste modo o comportamento do Partido Socialista face a este projecto de lei, em consonância com as nossas intervenções e com a atitude crítica e construtiva que aqui tivemos, é a de apoiar o presente projecto de lei na sua globalidade, pese embora, como na altura assinalaremos, as distâncias que dele nos separam mas reconhecendo também que na sua parte mais positiva ele retoma, como já aqui afirmámos, o espírito e, por vezes, a letra do nosso diploma aqui em tempos apresentado. E entendemos que a partir deste momento está aberta a discussão e criado o espírito para que, no âmbito do Parlamento e, mais alargado, no âmbito do tecido social e cultural nacional, se promova um debate e com isso consigamos obter uma lei quadro da iniciativa desta Assembleia que satisfaça a generalidade ou pelo menos a maioria dos portugueses. A partir daí estarão criadas as condições para se dispor de uma política de ambiente integrada e coerente, sendo assim possível a sua regulamentação e aplicação práticas.

Aplausos do PS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Silveira, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM): - Sr. Deputado Gomes Fernandes, V. Ex.ª na sua intervenção traçou um esquema dos temas que devem ser abordados numa lei do ambiente, dos quais eu citarei alguns, como a gestão da água, a política agrícola, o ordenamento, a poluição, a protecção dos solos agrícolas e outros. Concordamos completamente com a descrição que fez e ela, por si só, dá uma ideia da importância que uma lei do ambiente tem.
Nós pensamos -e certamente o Sr. Deputado Gomes Fernandes também estará de acordo - que nem o diploma que o PS apresentou aqui no ano passado nem o actual projecto de lei que estamos a discutir corresponde, minimamente que seja, a estes anseios. Neste sentido, e até tendo em atenção que o Partido Socialista tem já preparado um novo projecto de lei e que o Partido Social-Democrata também já anunciou que apresentará um diploma sobre a mesma matéria, perguntaria: não teria valido a pena que o PPM tivesse bloqueado dois diplomas que não correspondiam minimamente às necessidades e assim dar a oportunidade de se fazer agora um trabalho aprofundado que até, eventualmente, pode ser enriquecido com os debates que os dois diplomas, do PS e da ASDI, suscitaram. Não pensará o Sr. Deputado Gomes Fernandes que é assim?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI):- Dá-me licença, Sr. Presidente? É para um protesto.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Magalhães Moía (ASDI): - Sr. Deputado Portugal da Silveira, o meu protesto será feito sob forma interrogativa. Quando V. Ex.ª anuncia o propósito de bloquear duas iniciativas legislativas, creio estar aí uma confirmação de uma atitude que nós denunciamos. Mas, independentemente dessa posição, o que me importava saber - e essa é a forma interrogativa que este protesto assume - é se V. Ex.ª não pensa bloquear também as outras duas iniciati-

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vás legislativas seguintes, no sentido de que pode ser que apareça depois uma outra melhor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Silveira, para contraprotestar.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM):- Sr. Deputado Magalhães Mota, quero dizer-lhe que quem fez a acusação de bloqueamento pela parte do PPM não fui eu, mas o Sr. Deputado Gomes Fernandes e eu servi-me naturalmente da acusação que ele fez e que - e usei exactamente o advérbio de modo eventualmente - teria uma justificação.
Quanto às atitudes que o PPM possa vir a ter sobre os outros projectos de lei que aparecerem não tenho dúvida nenhuma em dizer-lhe que quando eles aparecerem nós nos pronunciaremos.

O Sr. Presidente:- Tem agora a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes para responder aos pedidos de esclarecimento formulados pelo Sr. Deputado Portugal da Silveira.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): -Sr. Deputado Portugal da Silveira, quero antes de mais fazer uma pequena correcção: a de que nós não nos referimos propriamente à defesa de uma política agrícola, porque, em nosso entender, isso não compete ao ambiente. Fizemos, sim, referência a uma defesa dos solos aráveis, matéria que pensamos pertencer efectivamente à área e à política do ambiente.
O Sr. Deputado em jeito de esclarecimento pôs a questão de saber se não valeu a pena a rejeição em tempos feita peio PPM ao nosso projecto de lei - e, pelo que vemos, agora também a rejeição do presente diploma - como contribuição positiva para obtermos, no quadro de uma melhoria, o novo projecto de lei quadro. Devo dizer antes de mais, se isso é um problema de consciência do PPM, que o Partido Socialista não tem de resolver os problemas de consciência do PPM. Esse é um problema interno, de modo que poderei, quando muito, dar-lhe a minha opinião. Ora, na verdade nós já aqui demonstramos que não consideramos positivo esse comportamento do PPM. E não o consideramos positivo, fundamentalmente, porque ele na altura foi acompanhado televisivamente por uma responsabilização do membro do Governo respectivo, que é do PPM, num frente a frente em que eu representei o meu partido -e em que as condições televisivas não foram as mais favoráveis, uma vez que me encontrava no Porto e portanto era um frente a frente à distância - e onde foi afirmado que o código do ambiente ia ser apresentado dentro de dias
É evidente que nunca tive ilusões de que o referido projecto fosse apresentado, até porque sei das dificuldades que no plano- do Executivo existem na formulação de uma proposta única e global, de forma a não se criarem quezílias entre os serviços. Por outro lado, sempre entendemos que o lugar de discussão e de intervenção de uma lei quadro é efectivamente a Assembleia.
Aliás, na altura o Sr. Deputado Luís Coimbra, disse numa intervenção que consta do n.º 63 do Diário da Assembleia da República, de 6 de Junho de 1980, p. 2874, textualmente o seguinte: «A verdade é que vai ser elaborada até ao próximo Verão...» -este Verão já lá vai há muito tempo atrás- «... o Código dos recursos naturais e ambiente que já está em avançado estado de estudo e para o qual vai ser pedida uma autorização legislativa».
Estas palavras não são minhas, retirei-as textualmente do Diário da Assembleia da República e foram produzidas pelo Sr. Deputado Luís Coimbra. Portanto, é só neste sentido que entendemos que uma rejeição pela rejeição não significa uma contribuição positiva e que só teria esse sinal se se tratasse de uma rejeição com o imediato lançamento de uma alternativa. Foi isso que o PPM não fez, nem vimos que até hoje a maioria o fizesse e é nesse sentido que discordamos, até porque, de resto, entendemos que cada um partido e cada assembleia tem a dinâmica e a capacidade de que dispõe e é dentro dela que se deve movimentar e desenvolver.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM): -Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM): - Sr. Deputado Gomes Fernandes, quando se anuncia para breve a apresentação de uma iniciativa e a mesma não é apresentada é porque de duas, uma: ou se tem consciência das dificuldades que estão em presença e esse anúncio para breve representa não mais do que uma intenção que na altura pode até estar presente, ou então essa intenção pode não concretizar-se por diversas razões. Neste caso, é porque fazer uma lei do ambiente é algo que não se compadece com a ligeireza com que muitas vezes aqui temos visto tratar o assunto.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, uso da palavra sob o uso regimental da figura de protesto, mas quero apenas dar um esclarecimento.
Queria referir que as palavras e o compromisso político aqui assumido não são do Partido Socialista e nem sequer o Partido Socialista está a pedir contas disso. O Partido Socialista está somente a trazer à colação um facto histórico. É que foi dito que a iniciativa iria ser apresentada até ao Verão daquele ano. O calendário estabelecido foi marcado pelo próprio PPM.
Para esclarecer um pouco melhor, queria ainda dizer que sentimos a dificuldade e a especificidade que tem a definição de uma política nesta área e do amplo debate e da profunda troca de impressões, discussão e cuidados de que ela deve ser rodeada. Nesse sentido, entendemos que todas as contribuições não são poucas para se obter uma solução mais correcta. Não é pelo facto de ter passado dois ou três anos sobre uma iniciativa que lhe dá melhor qualidade. Isso já não entendemos.
Na dialéctica e nas contribuições que forem encontradas, e portanto na responsabilidade que cada um assumir, é que resulta a sua qualidade. Daí a nossa observação.

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A minha intervenção não tem qualquer sentido crítico, para além de salientar que, daqui para a frente, esperamos que o comportamento seja diferente e que obviamente também os resultados o sejam.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: É pena que o ambiente, a natureza e o património tenham sido amalgamados num projecto de lei como este, agora presente a esta Assembleia. E é pena porque esses três valores merecem melhor cuidado do que aquele que presidiu à elaboração deste documento.
É pena que, ao pretender defender-se a qualidade de vida - intenção naturalmente subjacente e louvável ao articulado apresentado -, não se tenha atendido à qualidade do projecto, cujo fim seria concretizar essa intenção.
A primeira qualidade a exigir-se ao projecto de lei seria a de este ser realista, aplicável e portanto útil. A não ser assim, corremos o risco' da sua não observância, acarretando esta situação mais uma «machadada» na tão precária aceitação pelos portugueses de legislação sobre o ambiente.
O respeito e correspondente protecção do ambiente, da natureza e do património é uma questão essencialmente cultural, sendo a espécie humana tanto mais respeitadora daquilo que a rodeia quanto mais civilizada é.
Só se consegue defender verdadeiramente esses preciosos bens, sobre os quais a nossa atenção se debruça, com uma prévia e intensa pedagogia das populações, convencendo-as do real interesse de tal atitude.
Em Portugal algo tem sido feito nesse sentido, mas ainda estamos muito longe de uma situação aceitável, tendo todos nós muito a trabalhar.
Devo dizer que, nas aldeias, o rapazio ainda tem como prática generalizada a destruição de ninhos, os lavradores ainda usam indiscriminadamente os pesticidas, a maioria das pessoas não tem um respeito profundo pelas árvores. Nas cidades, as árvores são abatidas com geral concordância e alegria até.
A propósito, recordo o que há muitos anos ouvi a uma senhora inglesa que muito gostava de Portugal. Dizia ela que os portugueses quando desejavam construir um jardim a primeira coisa que faziam era abater as árvores, destruir toda a vegetação e só depois plantavam tudo de novo.
Esta descrição representa uma mentalidade em evolução lenta, mas ainda longe do- desejável.
Por tudo isto, a pedagogia de defesa do ambiente é importantíssima e tudo o que for feito de modo a entravá-la transforma-se em grave prejuízo para a causa que se pretende defender. Ora, é justamente esse o grave defeito que enferma este projecto de lei.
Pedagogicamente é deplorável que se apresente ao povo um projecto com as finalidades do actual, mas que previamente se julga que o mesmo não atingirá os resultados desejados.
Cria-se assim na opinião pública a ideia de «que isto do ambiente é matéria para literatura, pretexto para mostrar serviço, justificar posições políticas mas sem capacidade para realizações concretas».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que algumas intenções apresentadas no projecto de lei são positivas, aliás repetição de assuntos já versados nesta Câmara. Contudo, não nos podemos furtar a alguns reparos.
Consideramos lamentável que logo no primeiro parágrafo, das considerações prévias ao articulado, seja este projecto de lei poluído com as considerações feitas a propósito da «tese de que todo o projecto, só porque vindo das oposições, deve ser rejeitado».
Mesmo para os que estejam menos atentos isto é, por assim dizer, uma acusação à maioria AD, descabida, tão-somente porque, por várias vezes, aceitamos e aprovamos projectos vindos da oposição.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso «a posição totalitária, símbolo da mediocridade e do sectarismo», não nos serve, nem nos cria complexos que nos obriguem a ceder a chantagens legislativas que tais afirmações contêm.
No considerando 2, fala-se em «vendilhões do tempo». Nós juntar-lhe-emos o de «aldrabões de feira» que apregoam mercadoria com determinada utilidade, os quais na prática não possuem.
E é justamente isso que nós não desejamos num projecto com as finalidades do actual. Apregoam-se tantos benefícios... Mas por fim o derrube indiscriminado de árvores continuará e a água e o ar continuarão poluídos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao articulado propriamente dito, destaco que os artigos de uma lei definem-na e até o artigo 1.º tem como título (Definição).
Não é com certeza intenção do legislador atirar palavras ao vento (o que até poderá ser poluição sonora). Tem evidentemente o intuito de delimitar o âmbito da lei precisando sobre que aspectos este vai versar. Já não é um preâmbulo, é um artigo, por acaso o artigo l.º
Assim no n.º 2 do artigo 1.º, depois de definir o que é a qualidade de vida dos cidadãos, descreve os factores inter-relacionados de que depende.
Em quatro alíneas refere-se à adequação dos aglomerados urbanos, à alimentação, habitação, higiene, saúde, desenvolvimento económico, impacte da actividade agrícola, etc., etc.
Não são considerações prévias, é articulado com força de lei e, consequentemente, dentro do quadro da mesma, deverá ou poderá ser criada legislação sobre tantas e tão importantes matérias.
Este assunto demonstra quanto este projecto de lei constitui fantasia legislativa sem grande exequibilidade, contendo o perigo da sua não concretização e consequente descrédito público da defesa da matéria que desejamos preservar.
Também no n.º 4 afirma que nas regiões autónomas as disposições da presente lei serão adaptadas tendo em consideração o específico interesse regional e, designadamente, a sua inserção nas realidades humanas e económicas.
Isto quer dizer que só nas regiões autónomas isto deverá acontecer. Não desejo discutir a justeza deste artigo em relação às referidas regiões autónomas, mas o que considero inaceitável é que para o resto do território nacional não se proceda de igual maneira.

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Em Portugal não deve haver portugueses de segunda, quer estes sejam das ilhas, de Trás-os-Montes, do Minho, das Beiras, do Algarve ou mesmo de Lisboa.
Do artigo 7.º aparenta a criação de um segundo Ministério do Ambiente, provavelmente este dependente da Assembleia.
Com mais algumas leis deste género e a correspondente criação de Ministérios paralelos, teríamos em breve duas discussões interessantes: a do programa do Governo neste Palácio de São Bento e a do programa dos Ministérios sombra (AR), no Terreiro do Paço ou em Gomes Teixeira.
Os capítulos III e IV mostram que o ordenamento da matéria não é famoso.
Assim o artigo 8.º enumera os factores ambientais naturais objecto de medidas específicas. O primeiro é o ar, o segundo é a água.
No artigo 10.º legisla-se sobre o ar, no artigo 11.º, antes de se introduzir a água, há referências no som.
Ligeiro desarrumo, o mesmo acontecendo quanto à fauna que não está colocada em terreno apropriado, que logicamente seria a seguir às florestas, ou então estas deveriam estar incluídas só no artigo 26.º
Pequenos pormenores que até poderiam ser corrigidos aquando da discussão na especialidade, mas que demonstram que a qualidade de vida não foi tratada com qualidade.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: São estas as nossas preocupações.

Aplausos do CDS. do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Henrique de Moraes, faço-lhe um pequeno pedido de esclarecimento precedido -como não podia deixar de ser- do agradecimento pelos mimos de linguagem que pretendeu usar para classificar a nossa iniciativa. V. Ex.ª utilizou expressões desde «chantagem legislativa», «fantasia legislativa», «aldrabice de feira» e outras coisas do' género. Registamos, mas devolvemos à procedência os rótulos.
V. Ex.ª falou de poluição sonora. Devo dizer-lhe que tomo essas suas afirmações como uma poluição sonora.
Mas vamos aos pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª estranhou que o projecto de lei em discussão tenha, no seu dizer, «amalgamado» no mesmo articulado problemas que dizem respeito ao ambiente, à natureza e ao património. Pergunto-lhe se se deu ou não conta de que o projecto de lei pretendia desenvolver aquilo que consta do artigo 66.º da Constituição. Tem V. Ex.ª presente o que esse artigo dispõe? Se tem, pergunto se nesse artigo da Constituição não são tratadas todas as questões que referiu e que constam do projecto de lei.
E mais: estando-se praticamente em vésperas da discussão desse artigo na Comissão de Revisão Constitucional, pergunto-lhe se o seu partido propõe alguma alteração a esse artigo da Constituição que ao tema se refere.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Henrique de Moraes, há outro pedido de palavra. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Henrique d« Moraes (CDS): - Sr. Presidente, como já me levantei -não tinha visto o outro pedido de palavra -, se o Sr. Deputado Dias de Carvalho não me leva a mal, respondia já ao Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, quanto aos mimos que referiu e que diz que lhe enderecei, nomeadamente «chantagem legislativa» -e estou à procura na minha intervenção das palavras exactas mas não as encontro -, tenho a dizer-lhe que nós não cederemos a pressões desse género. Considero que o preâmbulo do projecto de lei pode ser tomado como uma chantagem legislativa e como pressão para que aprovemos o diploma.
Devo dizer que não acusei ninguém de «aldrabão de feira». Disse que tomava a expressão da mesma maneira como VV. Ex.as, ao fazerem o preâmbulo do projecto de lei, chamaram «vendilhões do tempo». Não nos sentimos atingidos por essa palavra, assim como penso que também VV. Ex.as não deveriam sentir-se atingidos porque eu não pretendi chamar «aldrabão de feira» a ninguém. Chamo apenas a atenção para que, ao aprovar-se um projecto de lei como o que está a ser discutido, possamos ser tomados como tal. Com certeza que não considero VV. Ex.as, nem nenhum dos deputados aqui presentes, «aldrabões de feira», nem aldrabões de parte nenhuma.
Em relação à amálgama, devo dizer que não tenho qualquer dúvida de que o artigo 66.º da Constituição obriga a que se trate destes assuntos em conjunto. Mas tenho a noção -se estiver errada peço que a corrija- de que uma amálgama é uma mistura e não' um ordenamento. Foi nesse sentido que apliquei a palavra. Não é por esses assuntos estarem contidos no projecto de lei que lamento, mas porque eles estão misturados de uma maneira que o meu partido não considera a mais feliz e a melhor. É com este conceito de amálgama que acusei o projecto de lei.

Vozes do CDS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI):- Sr. Presidente, era apenas para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Dias de Carvalho (ASDI):- Sr. Deputado Henrique de Moraes, V. Ex.ª disse que o nosso projecto de lei era uma fantasia. Na miragem do CDS, o projecto de lei poderá ser uma fantasia porque defende uma oligarquia dos poderes político e económico. O nosso projecto de lei defende uma justa distribuição da riqueza, defende uma desenvolvimento equacionado para toda a população, defende um desenvolvimento equacionado para todos os portugueses. Talvez isso seja uma fantasia para o CDS; no entanto, para a ASDI 6 uma realidade que todos nós temos de conquistar, e o povo português exige que assim seja.

Aplausos da ASDI e do PS.

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O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): - Sr. Deputado Dias de Carvalho, tenho a dizer-lhe que tenho alguma dificuldade em ligar aquilo que disse às acusações que me fez. Não vejo a forma como se pode extrair daquilo que disse a defesa de qualquer oligarquia. Compreendo perfeitamente o entusiasmo que pôs na defesa de uma justa distribuição das riquezas. Aliás, nós também pomos o mesmo entusiasmo. Considero que as intenções são as mesmas, já que acredito na sua palavra.
Mas justamente por pensar que o projecto de lei não vai distribuir harmonicamente a riqueza, que é o património e a defesa da natureza, é que o critico. O projecto de lei encerra - no nosso entender - em si erros que não vão permitir essa sua intenção.
A riqueza, que é o património e a defesa da natureza, não será bem distribuída/pelos portugueses com a apresentação de um projecto de lei que, tanto no meu entender como no entender do meu partido, não está bem concebido e daí as palavras de crítica que dediquei ao diploma em discussão.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: As questões que se prendem com a qualidade de vida, com o ambiente e a defesa ou conservação da natureza e do património, têm vindo, no nosso país, num contexto, aliás, que se inscreve quase à escala mundial, a ganhar um cada vez maior interesse e a conhecer uma cada vez mais esclarecida consciência por parte de um número sempre crescente de cidadãos.
Sendo esta uma realidade bem conhecida, acha-se ela subjacente, desde logo, no artigo 66.º da Constituição, preceito que veio a reconhecer e a dar cobertura constitucional a diversos direitos e deveres que se caracterizam pelo seu carácter eminentemente social.
Só que este preceito, tão inspirado que foi na sua formulação que nem a AD o põe em causa no- seu projecto de revisão constitucional, tem sido, a nosso ver, insuficientemente desenvolvido através da necessária legislação ordinária, por forma a obter-se uma atempada e correcta solução legal para muitos e instantes problemas em matéria de ambiente e qualidade de vida.
Com a consciência disso e porque nos contamos entre os cidadãos interessados na defesa do ambiente e qualidade de vida dos portugueses e empenhados na conservação e defesa do património' natural e cultural que a todos nós pertence e porque, por acréscimo, somos deputados nesta Assembleia, com as responsabilidades inerentes a estas para nós honrosas funções, mas também com o direito constitucional e regimental de iniciativa legislativa, é que viemos a subscrever e a apresentar à discussão em Plenário o projecto de lei n.º 230/II.
Foi por isso e só por isso.
Damos esta explicação à Câmara, embora talvez desnecessária, pelo respeito que ela nos merece. Damo-la ainda ao Sr. Deputado Luís Coimbra, que nos tratou e ao nosso projecto, com um desrespeito que julgávamos também não merecer - nem nós, nem o projecto. Mas sempre lhe diríamos -se estivesse presente - que estamos esperando pelo seu anunciado «Código do Ambiente». E se vier e quando vier, votá-lo-emos- favoravelmente se se mostrar melhor que o nosso projecto de lei. Será esta a resposta de adversários políticos que não usam punhos de renda nem falam com o rei, mas que têm o sentido das suas responsabilidades.
Para nós, a defesa do ambiente e a protecção da natureza e do património não. se compadecem com processos de intenções de possíveis realizações futuras, por melhores que elas sejam.
Não podem ainda compadecer-se com soluções encontradas na base da influência pessoal de quem tem o poder, seja para impedir a construção de torres sobre o Tejo, seja para resolver questões de localização de um qualquer museu ou «luna parque».
Num Estado democrático como o nosso e quando se trata de questões que têm a ver com todos, só a lei tem dom de império. E quando a lei não abarca todas as situações ou prevê insuficiente ou deficientemente sobre algumas delas, haverá que legislar.
É por isso que nos 'batemos. Daí também a nossa iniciativa legislativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vínhamos dizendo atrás que o artigo 66.º da Constituição, que trata do ambiente e da qualidade de vida dos cidadãos, é um daqueles preceitos constitucionais que tem sido insuficientemente desenvolvido através de legislação ordinária.
E é neste quadro jurídico-constitucional que o nosso projecto se situa em primeiro lugar.
Quando da discussão daquele artigo, na Assembleia Constituinte, assumiram-se posições e produziram-se afirmações importantes que têm muito a ver com o nosso projecto.
Por exemplo: quando o grupo parlamentar do então PPD introduziu o conceito de «ambiente de vida humano» a que todos em geral temos direito e se acha consagrado no n.º l do artigo 66.º, fica constitucionalmente coberto o «humanismo personalista» de que nos reclamamos e que ressalta do nosso projecto, já que também para nós é a qualidade de vida dos cidadãos .um projecto sobre o> Homem, que concebe as relações do homem com o universo e dos homens entre si como uma exigência de promoção humana, embora dependente de diversos factores como os que ficam apontados no antigo l.º desenvolvimento económico e social, impactes das actividades agrícola e industrial, urbanização, transportes, alimentação, habitação, saúde e higiene, educação, etc.
Aquele mesmo artigo da Constituição, ao fazer recair sobre o Estado a incumbência da prevenção e controle da poluição, do ordenamento do espaço territorial, da criação de reservas e parques naturais e de recreio e da promoção do aproveitamento racional dos recursos, através de organismos próprios e por apelo a iniciativas populares, vem a ser desenvolvido, no nosso projecto, ao tratarmos do empenhamento e da participação activa dos cidadãos e das associações de defesa do ambiente e do património.

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A «mobilização da iniciativa popular» que poderá ser feita utilmente através das associações de defesa do ambiente cuja definição e direitos se acham precisados no projecto, foi mesmo, na Assembleia Constituinte, fortemente apoiada pela Sr." Deputada Helena Roseta, de quem transcrevo, gostosamente, as seguintes passagens de uma sua intervenção.
Passo a citar, do Diário da Assembleia Constituinte n.º 59, p. 1793:

Não se trata apenas de um problema de caixotes de lixo. É um problema geral da sociedade.
Numa sociedade capitalista, sob o comando do lucro, há que produzir sempre mais, para vender mais, para consumir mais, em suma, para ganhar mais.
... O crescimento, como finalidade da economia mercantil, a ideologia do consumo obsessão, não só não correspondem aos anseios da pessoa humana como nem sequer podem ser procurados sem conduzir o mundo à catástrofe. O futuro da humanidade - de toda a humanidade e não apenas deste ou daquele país - é incompatível com o modo de produção capitalista.
Não se trata, no entanto, de contestar apenas o poder do lucro. É preciso contestar também o lucro do poder.
Continuo a citar:

A má qualidade de vida não é apenas consequência das estruturas da propriedade. É também consequência das estruturas de decisão.
Apoiamos a consagração da mobilização da iniciativa popular, pois a verdadeira transformação que se impõem não será feito por decreto.
Será na medida em que todos puderem intervir na determinação do seu destino e do seu futuro; na medida em que a sociedade colectiva é democraticamente atribuir às suas necessidades o verdadeiro valor; na medida em que os bens a atingir não sejam apenas os bens materiais - mas também os bens imateriais, gratuitos e património colectivo-, será nessa medida que construiremos uma sociedade sem alienação nem exploração, verdadeiramente humana e socialista.
É por estarmos de acordo com a Sr.ª Deputada Helena Roseta que tão longamente a citámos e aplaudimos.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Muito bem!

O Orador:- Mas gostaria de perguntar: que mudou desde então, neste domínio, no nosso país? Melhor qualidade de vida? Menos exploração? Mais espaços verdes na paisagem urbana, como já e muito bem preconizava o actual Ministro da Qualidade de Vida, em tese apresentada ao 3.º Congresso Republicano de Aveiro? Menos rios poluídos? Os solos menos degradados? Melhor ordenamento do território e mais racional aproveitamento dos recursos, disponíveis? Silenciar sobre estes e tantos outros problemas, adiar a sua solução, rejeitar iniciativas legislativas que vão de encontro a muitos deles, será mesmo solução?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nem tudo cabe fazer ao Estado, certamente. Por isso pomos a tónica na participação dos cidadãos em muitas das acções a empreender, nomeadamente através das associações de defesa do ambiente. Por isso alargamos também aos Governos das Regiões Autónomas e às autarquias locais, numa clara adesão ao princípio da descentralização, a partilha das incumbências que a Constituição comete, neste domínio, ao Estado. Mas a este caberá, naturalmente, o principal quinhão.
E porque há que preservar e defender todos aqueles factores que influenciam, isolada ou conjuntamente, a qualidade de vida das pessoas; porque há que prevenir, evitar ou impedir os efeitos de certas acções de impacte sobre essa mesma qualidade de vida e porque há ainda que punir os infractores das regras estabelecidas, pensamos de todo em todo que o projecto de lei n.º 230/II representa um sério contributo para os fins que se visam alcançar.
O meu companheiro de bancada Magalhães Mota destacou do projecto as suas principais linhas de força, os seus princípios e sistema.
A isso se deveria confinar o objecto da discussão na generalidade, nos termos do artigo 150.º do Regimento desta Assembleia.
Não irei cair, pois, na fácil tentação de responder «à letra» a críticas vindas sobretudo da bancada do PPM, artigo por artigo. Ficará para a discussão na especialidade, se for caso disso. Mas abro uma pequena excepção em relação àqueles nossos ilustres colegas do PPM. Coisas de somenos, é certo. Mas ilustrativas de um certo estilo. É que os Srs. Deputados Luís Coimbra: e Borges de Carvalho não aprenderam do pretor a clássica lição de não curar das coisas pequenas. Nem ligeiras e supostas faltas terminológicas lhes escapam E, assim, discursando ex cathedra, dizem que «protecção da natureza» é expressão que já se não usa e que falar em «meio ambiente» é partir o ambiente ao meio, o que será, talvez, doloroso para o ambiente...
Só que o seu discurso põe em causa a linguagem usada pelo próprio partido a que pertencem.
De facto, no Programa de 1974, do PPM, propõe-se a p. 37 - cito - subordinar a «expansão industrial à conservação do meio ambiente» e, a p. 57, fala-se da rigorosa prevenção (queria dizer-se, naturalmente, preservação), do meio ambiente e paisagens.
E será que a Secretaria de Estado do Ambiente pode chamar de «protegida», à paisagem de Sintra--Cascais, como o faz no Decreto-Lei n.º 292/81, e nós não podemos falar em termos de «protecção» da natureza?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de terminar esta minha intervenção com uma breve notícia da história parlamentar da Grã-Bretanha.
No século passado, foram apresentados no Parlamento inglês nada menos do que cinco projectos, em anos sucessivos, visando a que os fornos engolissem o seu próprio fumo. Todos eles foram rejeitados e não é difícil descobrir porquê.
Foi preciso que o smog inglês tivesse tornado insuportável a vida em muitas cidades para que, finalmente e só em 1956, o Parlamento aprovasse um projecto de «Lei do Ar Limpo».

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Nós gostaríamos que os projectos de lei sobre o ambiente, em Portugal, viessem a ter aprovação antes ainda de as situações se tornarem irremediáveis.
Ainda não perdemos a esperança.

Aplausos da ASDI. do PS e da UEDS.

O Sr. Presidente : - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Silveira.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM): - Sr. Presidente, talvez o meu pedido de esclarecimento seja um pouco marginal. Em todo o caso, fá-lo-ei.
O Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, referindo-se a um Congresso que se realizou em Aveiro em 1973, chamou-lhe republicano. Gostaria que me esclarecesse se houve equívoco ou se está convencido de que o Congresso se chamava Congresso republicano. É que esse Congresso no foi republicano mas democrático. Por isso lá estiveram monárquicos da oposição, tais como o Sr. Deputado Barrilaro Ruas. O actual Sr. Ministro de Estado da Qualidade de Vida também se inscreveu para participar nesse Congresso, contudo, não pôde estar presente porque, a meio do caminho, o comboio-automóvel onde ia com pessoas do Couço, foi interceptado. Por isso não pôde estar presente. No entanto a sua comunicação foi entregue no Congresso.
Gostaria, pois, que me esclarecesse se estava convencido de que o Congresso era republicano quando de facto foi democrático ou se foi por engano que o disse.

O Sr. Presidente : - Para responder, se assam o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Deputado Portugal da Silveira, eu nem sequer pretendia envolver pejorativamente a pessoa do Sr. Ministro de Estado da Qualidade de Vida - pessoa que muito prezo - acerca desse Congresso.
Pode tratar-se de um equívoco da minha parte mas neste momento não sei responder-lhe concretamente qual o nome do Congresso, apesar de lá ter estado. Contudo, para mim congresso republicano ou democrático é a mesma coisa.

O Sr. Aquilino Ribeiro (PS): - Muito bem!

O Sr. Portugal Silveira (PPM): - Não é a mesma coisa!

O Orador: - Para mim é a mesma coisa, Sr. Deputado.
Estava muito longe da minha intenção beliscar a pessoa do Sr. Ministro de Estado da Qualidade de Vida. Se bem reparou, citei-o elogiosamente. Só agora tive conhecimento de que ele não pôde estar presente ao Congresso mas, apesar disso, ele enviou uma tese que muito aprecio. Aliás, foi por a apreciar que o citei.
Penso ter esclarecido as suas dúvidas, Sr. Deputado Portugal da Silveira.

O Sr. Portugal da Silveira (PPM): - Com certeza.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 66.º da Constituição da República garante aos portugueses, no capítulo de Direitos e Deveres Sociais, a qualidade de vida que conduza à criação de um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.
O projecto de lei apresentado pela ASDI insere-se nesse esforço de, no caminho traçado pela Constituição, construir o suporte legal que vá permitindo a longa caminhada...
De facto, um longo caminho já se percorreu: desde a legislação patente no Código Civil, que se dirigia sobretudo à protecção da propriedade de cada um, passando pela legislação de 1970 onde se expressa já o problema do prejuízo para o conjunto de cidadãos, até ao projecto de lei agora apresentado pela ASDI que, com exactidão, faz depender a defesa do ambiente não só da educação e da capacidade de organização dos cidadãos, como dos mecanismos que forem criados, capazes de assegurarem a sua participação.
A sociedade democrática, disposta a defender as condições de vida das populações, contra a ganância do lucro, a indiferença pelos outros, contra toda a insensibilidade social, traz consequentemente para primeiro plano a defesa da qualidade de vida do homem e a defesa do ambiente que o rodeia.
Poderemos dizer então que a relação democrática do homem com o seu ambiente, como a relação democrática dos homens entre si, se estabelece num contexto da valorização mútua.
Por isso sublinhamos a afirmação do Deputado Magalhães Mota, na apresentação deste projecto de lei quando faz depender a eficiência da sensibilidade ecológica, do tipo de sociedade que se pretende atingir e se considera como opção política a defesa do ambiente.
De facto será pelo menos insensato reduzir a ecologia a um discurso xaroposo, espécie de caridade vertida sobre a natureza, se ao mesmo tempo se impregnar o discurso político e social de uma linguagem obscurantista, mítica, revanchista ou intolerante. A ecologia ficará negada aos governos, por exemplo, que invistam marginalmente na habitação, na saúde, na escola, na profissionalização, ou no emprego.
O projecto de lei n.º 230/II, agora em discussão, é parte integrante do esforço feito nesta Câmara para dotar o país de legislação que dinamize e dê corpo a uma mentalidade social que muito justamente se pretende criar.
Muito desse esforço foi inutilizado por razões que certamente são estranhas ao tema de que nos ocupamos, e que levaram a actos de destruição marcados pela intolerância mais primária. Referimo-nos especialmente ao projecto de lei n.º 487/I, do PS - Lei Quadro do Ambiente e Qualidade de Vida - rejeitada em Junho de 1980, ao projecto de lei n.º 493/I, do PCP - Associações de Defesa do Património Cultural- rejeitado na mesma data, aos projectos de lei n.ºs 184/II e 186/II, da ASDI, o primeiro que respeitava a constituição de uma comissão para elaborar um plano de salvaguarda e preservação arquitectónica paisagista e patrimonial da Zona

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Ribeirinha, rejeitado em Maio de 1981; o segundo sobre a Defesa do Património Natural e Cultural da Serra de Sintra, rejeitado recentemente em 11 de Novembro deste ano.
Muito desse esforço se esgotou também na apatia e falta de empenhamento político ou se quedou pelo caminho, manietado pelas contradições da coligação governamental. Assim, por exemplo: o projecto de lei n.º 121/I, do CDS, sobre regime jurídico e património arquitectónico histórico e cultural, sem seguimento, retomado pelo projecto de lei n.º 442/I, passado 2 anos (1980) baixou à Comissão em Junho de 1980, sem consequências; igual sorte teve o projecto de lei n.º 452/I da iniciativa do Grupo dos Reformadores, sobre protecção do Património Cultural e Natural. Também sem seguimento ficaram os projectos de lei do PCP, sobre defesa do património arqueológico (14/II) e associações de defesa do património cultural (15/II) e igual sorte conhecem os projectos de lei do PPM sobre impacte ambiental (49/II), deposição de resíduos nucleares em águas oceânicas (50/II). Ainda também sem seguimento o projecto de lei da ASDI, sobre poluição marítima por descarga de produtos petrolíferos.
E na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se alguma dúvida nos assalta quanto ao projecto de lei agora em discussão é o vazio legislativo que o irá absorver. Porque a validade desta lei quadro pressupõe uma autêntica rede legislativa sobre os mais variados temas, como por exemplo: os compostos químicos perigosos (aditivos alimentares, etc., ...) onde a legislação é insuficiente, quanto à quantidade e qualidade da água, com legislação antiga e inadequada, à poluição do ar, cuja legislação está por regulamentar, aos resíduos sólidos das actividades urbanas, indústria, agricultura, entre muitos outros.
Perigos iminentes cem que o cidadão comum topa em cada dia desde a falta de saneamento básico, a falta de água, até, por exemplo, às centrais de carvão que lançam a poluição pelo enxofre e a deposição de cinzas contra as quais se levantou recentemente a população de Viana do Castelo; as fábricas de papel, as fábricas de curtumes, as fábricas de fermentos; poluição companheira de trabalho daqueles que labutam nesses locais e que impesta a água e os ares de muita zona habitada, degradando a saúde dos homens e trazendo a morte aos animais.
A preocupação que honra esta Assembleia merece da parte de todos os deputados um esforço no sentido de vencer este sentimento de destruição e de vazio que fatalmente nos inspira tal situação.
Confiamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em que este projecto de lei seja aprovado, baixe à Comissão respectiva, seja beneficiado pelo trabalho de todos os deputados aí presentes, de forma a que possa finalmente desta Assembleia sair uma lei consensual que diga respeito ao bem-estar dos Portugueses.
Na pior hipótese se, por anquilosamento político, este projecto precisar de ser guiado por um projecto da maioria, ou por uma proposta do Governo, que eles venham de imediato e que em Comissão se juntem e frutifiquem.
Ou será que o projecto de sociedade defendido pela maioria não suporta mais do que o discurso ecológico, como música de fundo, e é incompatível com uma atitude real e concreta em matéria tão grave, tão urgente e tão evidente?

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pires.

O Sr. Casimiro Pires (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos para nós que o ambiente, como sector horizontal que é, sofre permanentemente as influências benéficas ou nefastas do próprio processo de desenvolvimento.
De facto, as determinantes do desenvolvimento dos sectores verticais, assim chamados, nem sempre ou quase nunca dão grande relevância aos sectores horizontais. É por isso que surge a necessidade de políticas autónomas em sectores como o emprego, o ordenamento do território e o planeamento físico, o ambiente, os salários e os rendimentos. Isto exactamente para que essas áreas possam definir os critérios que hão-de condicionar por si o próprio planeamento, a fixação dos objectivos e o desenvolvimento dos restantes sectores.
Diria tudo isto para fundamentar e vincar bem a importância e a urgência que ó PSD confere à existência de um quadro legal, que não só lei quadro, que defina as orientações e fixe os critérios que hão-de condicionar o desenvolvimento sectorial e global numa perspectiva de protecção e defesa do ambiente em perfeito equilíbrio com os valores sociais e culturais que defendemos e com as necessidades de desenvolvimento harmónico e racional do País.
Uma lei que correspondesse a estes objectivos teria a nossa plena concordância, independentemente da sua origem e autoria.
Não é, porém, este o caso do projecto de lei em apreciação. Mas não serei eu, contudo, que deixarei de reconhecer a oportunidade da iniciativa, como não deixarei de reconhecer no seu conteúdo o enunciado de alguns princípios e orientações de incontestável validade.
Não me importa analisar se tais princípios foram extraídos de um anterior projecto do Partido Socialista, como também não me importa analisar se o tal projecto do Partido Socialista integrou os mesmos princípios de projectos elaborados anteriormente pela Comissão Nacional do Ambiente.
O que importa, sim, é saber se tais princípios são correctos e realistas, se cobrem toda a área em causa, se estão devidamente ordenados e hierarquizados e se são coerentes entre si e com aqueles que estão ou deverão ser fixados para sectores afins.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este projecto de lei, na sua ânsia de abarcar tudo o que pudesse justificar a eleição - que parece ter sido feita pelos seus autores -, da qualidade de vida como o seu fulcro central, perdeu-se num emaranhado complexo da teia de relações intersectoriais, deixou de corresponder à sua designação e quase que se esquecem do ambiente, da natureza e do património que queria preservar e defender.

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A qualidade de vida é em si uma finalidade última do desenvolvimento. Para ela concorrem vários sectores e várias áreas de actividade e, entre elas, o ambiente, o ordenamento do território e o planeamento físico, o planeamento económico, a cultura, a repartição dos benefícios do desenvolvimento e até mesmo as relações externas de intercâmbio cultural e tecnológico. É portanto o ambiente um factor extraordinariamente importante em termos de garantir e melhorar a qualidade de vida, mas não é o único e nem sei mesmo se será o mais importante.
Não se trata portanto, a meu ver, de definir uma política de qualidade de vida; trata-se de definir e implementar políticas sectoriais e globais que contenham em si que a melhoria da qualidade de vida é a sua finalidade suprema. O ambiente é, como disse, uma das fundamentais, mas não é a única.
As objecções que teria a pôr ao projecto de lei são exactamente as incursões que pela via da apresentação de uma lei do ambiente se fazem em determinados sectores e áreas de actividade que nos parece melhor deverem ser objecto de um ordenamento jurídico próprio.
Não me parece, por exemplo, correcto - e talvez isto possa de algum modo responder às preocupações de há pouco do Sr. Deputado Magalhães Mota - que seja uma lei do ambiente que determina que deve ser elaborado um plano de ordenamento do território. Há toda uma área no domínio do ordenamento do território e do planeamento físico que deve, a nosso ver, ser objecto de um normativo próprio, de legislação própria. As relações que existem entre uma lei do ambiente e esse ordenamento do território apenas terão de ser salvaguardadas de um e de outro lado, nas respectivas legislações.
Sobre este aspecto, há ideias que do meu ponto de vista têm alguma gravidade, ou seja, quando no projecto de lei se diz que deve ser elaborado um plano de ordenamento do território e que esse plano de ordenamento do território será dividido «em planos regionais» (sic).
Parece-me que aflora aqui uma estranha concepção de planeamento e de desenvolvimento. É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os planos de desenvolvimento não são propriamente como os melões: não podem ser divididos em fatias, sem prejuízo de sacrificarem os seus próprios objectivos. Há um todo, há uma coerência, há uma lógica que não pode ser desprezada e que impede que um plano de desenvolvimento com essa lógica possa alguma vez ser dividido em fatias, como se pretende, através do plano de ordenamento do território referido no projecto de lei em discussão.
Não nos parece igualmente que seja uma lei deste tipo, fundamentalmente voltada para as questões do ambiente e da natureza, que deva recuperar para si disposições legais que melhor ficam noutras áreas, como seja as que se relerem à política de solos e expropriações ou as que se referem à política agrícola. Não tenhamos ilusões! Tentar fazer-se por uma lei do ambiente a preservação dos terrenos de elevada potencialidade agrícola, parece-me incorrecto e isso competirá à agricultura. Nós podemos, em termos de ambiente, utilizar terrenos de elevada potencialidade agrícola e nem por isso os pôr a produzir para a agricultura. Pode-se, por exemplo, instalar um espaço verde ou mesmo um jardim.
Parece-me, pois, que em termos de/preservação com o objectivo de produção a ideia deve nascer do próprio sector da agricultura e não propriamente ser imposta através de uma lei do ambiente.
O mesmo diria relativamente às referências e à incursão que se faz num outro domínio que me parece que também deve constituir um normativo próprio: é o caso da renovação urbana. Quando se fala em demolições, em clandestinos, etc. Penso que da parte da manhã foram feitas algumas referências a essa área. Há necessidade de se estabelecer um quadro legal que a reja e que a oriente, mas não é sede própria para isso uma lei especificadamente voltada para o ambiente.
O mesmo diria quanto a questões de arquitectura. E aqui faria um parêntesis para dizer que me parece muito mais importante fixar normas de arquitectura do que propriamente fazer intervir o arquitecto. Isto sem menosprezo para a qualificação técnica e a sensibilidade estética dos arquitectos.
O mesmo diria relativamente às normas que se reportam à localização de empresas. Não me parece que seja correcto utilizar um projecto de lei do ambiente e da natureza para fixar normas que melhor devem ficar na definição de uma política industrial e de ordenamento do território em ligação de uma com a outra.
Parece-me também - e já aqui foi referido mais do que uma vez - que não é através de uma lei do ambiente que se poderá alguma vez impedir a macrocefalia das grandes regiões urbanas do Continente. Muito menos uma lei onde caibam com propriedade normas sobre a própria reforma da Administração Pública, como é referido no projecto de lei.
Faço uma referência quase que final a um conceito que me parece de interesse mas que de algum modo, do meu ponto de vista, aparece distorcido no projecto de lei. Refiro-me à servidão de vistas.
Fixar e manter a servidão de vistas, em termos do indivíduo que tem a sua própria construção e que constitui essa servidão relativamente a prédios contíguos, é, a meu ver, prejudicar o sentido do colectivo em benefício do individual. Se de uma expansão ordenada e de interesse para a colectividade se tratasse, em termos do aproveitamento dessas propriedades contíguas, diria que belíssima ideia, sim, a servidão de vistas, mas do ponto de vista do colectivo!
Não me parece lógico que o projecto de lei, centrado sobre três grandes áreas - ambiente, natureza e património -, faça incursões desta natureza por sectores de actividade que - repito - devem ser, no nosso entender, objecto de quadros legais próprios, embora tenham ou devam ter as devidas interpretações com a área do ambiente e da protecção da natureza.
Terminaria com uma referência à área de defesa do património que já foi referida na parte da manhã mas na qual gostaria de insistir. Parece-me uma área extremamente importante que poderia ser tratada no âmbito de um quadro legal próprio. No entanto, a ser tratada, como o foi no projecto de lei, como objecto de um artigo que diz que «o património histórico e cultural do país será objecto de medidas especiais de defesa, de salvaguarda e valorização através de legislação especial que definirá e delimitará as competências, actuações e respectivas responsabilidades da

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Administração Central, Regional, e Local», sendo a única referência que se faz ao património, penso que ela poderia ser extensiva às outras duas áreas e construírem-se três artigos com o mesmo texto que acabei de citar. Dizia-se que «o património histórico e cultural, o ambiente e a natureza deverão ser objecto destes normativos «... e então teríamos uma lei com apenas três artigos, o que em todo o caso não corresponderia à importância da área e do sector que temos em apreciação.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado Casimiro Pires, V. Ex.ª definiu o ambiente em termos de horizontalidade, procurando fazer uma relação que se poderia chamar de material entre o ambiente, na horizontal, e os sectores de desenvolvimento, na vertical. É uma apreciação que não questionamos nesta sede e que registamos. Mas depois de considerar que isto é uma área matricial e onde se cruzam múltiplos sectores, salienta que o projecto de lei em discussão se perde na teia das inter-relações. Há aqui uma dialéctica que me parece menos brilhante da sua parte.
Se a atitude que a AO habitualmente toma nestas questões, que aliás já foi definida pelo Sr. Deputado António Taborda do MDP/CDE, intervenção essa que situa o ambiente como música de fundo, eleiçoeiramente apresentado em épocas, em momentos e em situações próprias, é a de definir defesas do ambiente nos tons que naturalmente algum ecologismo de pacotilha lhe serve, queria perguntar-lhe, designadamente face à sua interpretação primeira e face à sua consideração posterior sobre o projecto de lei, qual é a sistematização de matérias que consideraria como mais exequível.
Na nossa intervenção já adiantámos que temos reservas em relação a determinadas áreas, que consideramos que os normativos podem ser diferentes em relação a determinados subtemas. Mas V. Ex.ª criticou tantos subtemas que nos resta a dúvida sobre qual é que seria o conteúdo de uma lei que poderia apresentar algum dia - que vem longe certamente! - uma AD com o PPM que existe.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Deputado Casimiro Pires, fiquei de algum modo surpreendido com a sua intervenção na medida em que não me foi perfeitamente claro se considera que uma lei quadro do ambiente deve ter uma visão, tão completa quanto possível, em relação a todas as inter-relações de factores que no ambiente se podem situar, ou se, pelo contrário, a sua visão é mais limitativa. Se assim for - e parece-me ser, pela sua intervenção, em relação àquilo que foi exposto - gostaria de lhe perguntar concretamente, para além do aspecto do ordenamento do território e da protecção do património cultural, quais os aspectos que excluiria de uma lei quadro sobre o ambiente.
A segunda questão relacionada com a primeira, tem o seguinte fundamento: não pensa o Sr. Deputado que a preservação do património cultural, que o ordenamento do território, que a própria Administração Pública e a posição da Administração Pública perante estes factores têm a ver com a política do ambiente? Se assim for, não pensa que deverá ao menos haver numa lei quadro uma referência enquadradora sobre política do ambiente?
Em relação ao enquadramento do ordenamento do território na política de defesa do ambiente, V. Ex.ª conhece certamente o programa do seu partido. Remetia-o para a página 94 e pedia-lhe para me dizer se já discorda da inclusão do ordenamento do território relacionada com a política de defesa do ambiente.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Deputado Casimiro Pires, seguimos com atenção a sua intervenção, que foi aliás por parte da AD um facto qualitativo de algum significado neste debate.
Em primeiro lugar, gostaria que classificasse um pouco mais qual é a concepção de ambiente - é que a percebemos mas não totalmente - que enformou a sua intervenção". É uma concepção global que engloba todos os factores físicos, químicos, biológicos;, sócio-económicos, culturais, etc.? Ou é uma concepção exclusivamente biológica?
Falou o Sr. Deputado na horizontalidade da política de ambiente e na verticalidade das políticas sectoriais. Penso que a relação verticalidade/horizontalidade tem importância.
Por outro lado, referiu um aspecto importante, ou seja, a salvaguarda da ligação entre a política de ambiente e a linguagem no plano jurídico dessa política e a política do ordenamento do território. Nessa matéria, o nosso projecto de lei sobre o ordenamento do território e da prática urbanística encontra-se nesta Assembleia e já mereceu a aprovação na generalidade. O projecto de lei sobre a qualidade de vida, que agora apresentámos, conjuga e transfere de um lado para o outro esses conceitos no sentido da sua interligação para que os dois diplomas, tenham a mesma linguagem.
Referiu-se também à questão dos planos, ao ordenamento do território, ao planeamento urbanístico, à política de solos, às políticas, sectoriais e sua articulação com políticas de desenvolvimento. Gostaria de perguntar se o que acabei de referir representam vectores em relação aos quais? o PSD adere e enforma a sua política nesta matéria, ou se são simplesmente referências no teor da intervenção. É que se são vectores de política de fundo da parte do seu partido, devo dizer que aí está uma boa plataforma para nos encontrarmos no diálogo e na análise da lei do ordenamento do território e da prática urbanística onde isto está lá claramente expresso.
É evidente que a definição de normas arquitectónicas é mais importante do que a definição da intervenção do arquitecto, até porque o arquitecto só intervém sobre o território nacional pouco mais do

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que 1 % e não chegará tão cedo a ter uma intervenção significativa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já ultrapassámos 5 minutos da hora regimental para iniciarmos o período de 30 minutos de suspensão dos trabalhos. Contudo, se não houvesse nenhum inconveniente, daria agora a palavra ao Sr. Deputado Casimiro Pires para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Peço a, palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, ainda antes do intervalo e depois de ouvirmos as respostas do Sr. Deputado do PSD, eu pedia a palavra para fazer uma interpelação à Mesa, que penso importante e que só terá sentido útil se a fizer antes do intervalo.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. V. Ex.ª fica inscrito para uma interpelação à Mesa depois de o Sr. Deputado Casimiro Pires dar as respostas que entender convenientes.
Portanto, para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pires.

O Sr. Casimiro Pires (PSD): - Relativamente às questões levantadas pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal, a resposta é muito simples. Eu fiz uma caracterização que me parece correcta e até incontestável.
É evidente que me coloquei na perspectiva de chegar à fundamentação do interesse e urgência que vemos em que esta área do ambiente seja objecto de um normativo próprio. Como tentei dizer na minha intervenção, as várias intervenções sectoriais - chame-se-lhes verticais, utilizei a expressão para facilidade de raciocínio - não dão uma grande importância aos chamados sectores horizontais, designadamente o ambiente.
Mas referi-me a outros e, só a título de exemplo, para não me quedar por este, como foram a política de salários, os rendimentos, o emprego e o ordenamento do território. Todavia, quando a seguir referi a teia de relações inter-sectoriais - e eu compreendo as dificuldades do autor do projecto, porque se trata de uma matéria que tem de facto a ver com tudo ou com praticamente tudo, pois condiciona ou terá que condicionar, e só assim ela terá utilidade como definição de uma política própria do ambiente, as actuações nos outros sectores - entendo que é difícil delinear a fronteira entre aquilo que seria estritamente ambiente e as tais relações com os outros sectores.
O que eu quis foi que, em minha opinião, o projecto de lei foi longe de mais porque, de facto, incluiu normas próprias, objectivas e substantivas que me parece deveriam fazer parte dos tais outros normativos. Entendo que nesta área se deviam referir as relações que essa política de ambiente bem delineada terá de ter como condicionante, ou, se preferir de outra maneira, as normas e os critérios que os vários sectores de actividade deverão ter em conta em termos de ambiente.
Relativamente às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, que referiu a questão do património, do ordenamento do território, da administração pública, perguntando-me se isto tem ou não a ver com o ambiente, suponho que de algum modo a resposta já está dada.
Há de facto uma interligação directa entre a área do ambiente e todos os outros sectores de actividade. Porém o que não me parece correcto é que seja uma lei do ambiente a dizer que em Lisboa não se podem instalar mais empresas ou que os funcionários públicos têm que ser transferidos para a província. Era isto que queria dizer quando me reportava à questão das relações inter-sectoriais e às incursões que se fizeram noutros domínios de actividade.
Quanto ao problema do ordenamento do território e da política do ambiente em termos de Programa do PSD, devo dizer ao Sr. Deputado que, apesar de alguns elementos do então PPD o terem abandonado e terem dito que o PPD já não era um partido social-democrata ou que já não tinha um programa social-democrata, tentando deixar subentender que os que saíram é que tinham elaborado o programa, devo dizer-lhe, repito, que o autor desta parte do Programa, relativa ao ordenamento do território, fui eu, e ainda estou no Partido Social Democrata.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Além disso, dir-lhe-ei também que entendemos que se trata de uma área extremamente importante em ligação com o ambiente, mas que é objectivo de um ordenamento próprio que começa no ordenamento do território, que passa pelos planos regionais - mas não divididos como os melões, pois tal como há pouco disse não é possível fazê-lo sem quebra dos objectivos -, que passa pelos planos concelhios, planos de ordenamento e expansão dos aglomerados urbanos e pelos planos de pormenor de ocupação do espaço. Esse é o encadeamento lógico que, obviamente, também tem relações com o ambiente e com outros sectores de actividade, não havendo, em meu entender, numa lei do ambiente lugar para se dizer que se tem de fazer um plano de ordenamento do território, etc., etc., e muito menos para se dizer que deve ser dividido em fatias regionais.
Ao Sr. Deputado Gomes Fernandes, quando me pergunta qual é a minha concepção e a do meu partido sobre ambiente, e faz uma contraposição entre uma concepção global e uma concepção exclusivamente bio-física, dir-lhe-ei que a nossa concepção é uma concepção de ambiente global. Aliás, suponho que ela transpareceu de algum modo da minha intervenção quando disse que o ambiente tem de facto a ver com um mundo de coisas e que nessa perspectiva que deve ser elaborada uma lei do ambiente.
Com isto julgo que respondi também às questões sobre políticas de desenvolvimento, de solos, urbanização, sectores ...
O que eu poderia fazer era repetir aquilo que disse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sousa Marques, tem então agora V. Ex.ª a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros da Mesa: VV. Ex.ªs sabem muito bem que estou inscrito para participar neste debate.
Acontece que, há alguns minutos atrás, portanto alguns minutos antes de iniciar esta minha intervenção, tive conhecimento de factos extremamente graves que estão a ocorrer hoje. Por isso não posso deixar de fazer uma interpelação à Mesa e de lhe pedir que me deixe expor sucintamente os referidos factos, pedindo também a todos os Srs. Deputados a máxima atenção e a melhor compreensão para esta interpelação.
Esta manhã, cerca das 11 horas, uma carrinha, transportando dirigentes sindicais da Covilhã, foi perseguida por um veículo tripulado por dois patrões da empresa Ramiro e Fazendeiro que, quando passavam junto da Lanofabril (Borralheira), dispararam sobre a carrinha. Armados com uma caçadeira e uma pistola, aqueles indivíduos viriam mais tarde a disparar um tiro que feriu um dos trabalhadores, tendo ainda agredido e colocado em perigo de vida um outro trabalhador, estando, neste momento, ambos hospitalizados. Junto do Hospital concentraram-se centenas de trabalhadores, ignorando-se ainda o desenvolvimento da situação que, segundo nos dizem, e extremamente grave.
Exorto, pois, a Mesa desta Assembleia a adoptar diligências no sentido do apuramento urgente desta situação, a que, pensamos nós, a Assembleia não pode ficar alheia.
Penso que, durante a presente sessão, a Assembleia da República, através da Mesa, poderá ainda vir a ser informada acerca dos graves acontecimentos que acabo de relatar e aos quais, porventura, outros ainda mais graves se lhe seguiram ...
Uma última referência: o meu grupo parlamentar já comunicou com o Governo Civil de Castelo Branco que confirmo a existência de graves ocorrências na Covilhã e aproveitámos a ocasião para manifestar a nossa mais profunda preocupação acerca do que se está a passar.
Agradecemos pois que a Mesa tome também diligências e que dos resultados obtidos informe o mais rapidamente possível estai Câmara.
Obrigado, Sr. Presidente. Obrigado, Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa tomou nota da informação que nos deu e vai procurar obter mais dados sobre a situação que V. Ex.ª referiu.
Antes do intervalo, cumpre-me ainda informar que entraram na Mesa os seguintes diplomas: a proposta de lei n.º 73/II, relativa ao Orçamento Geral do Estado para 1982; e o projecto de lei n.º 277/II - Emprego dos deficientes físicos -, apresentado pelo PS.
Lembro aos representantes dos grupos parlamentares que, tal como ficou decidido na última reunião, nos devemos reunir no intervalo para se agendar a discussão da proposta de lei do OGE.
Finalmente, informo também a Câmara que no sábado 12 de Dezembro, pelas 11 da manhã, teremos a honra de receber nesta Casa o Sr. Presidente da República Francesa, visita cujo significado será desnecessário enaltecer pelo que será desejável a comparência de todos os Srs. Deputados.
Está suspensa a reunião.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Amândio de Azevedo.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, mas se nem sequer há quórum...?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é evidente que se V. Ex.ª não põe esse problema em termos formais, aguardamos um pouco mais e V. Ex.ª fará a intervenção.

O Orador: - Claro que não ponho, Sr. Presidente.

Pausa.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP já manifestou, em anterior intervenção do meu camarada José Manuel Mendes, a sua posição relativamente ao projecto de lei apresentado pela ASDI, neste momento em discussão na generalidade nesta Assembleia.
A nossa intervenção enquadra ainda uma declaração de voto que será, em princípio, produzida pelo meu camarada Veiga de Oliveira.
Nós já referimos de uma maneira geral os aspectos que consideramos positivos da iniciativa legislativa da ASDI, bem como algumas das insuficiências que quanto a nós nela se nos deparam e das divergências que dela nos afastam.
Pensamos que nesta breve intervenção poderíamos enquadrar a actividade dos comunistas nestas matérias bem como enquadrá-la em termos de um debate ideológico que lamentavelmente continua por fazer.
Há pouco realizou-se uma conferência do PCP sobre o poder local e fizeram-se numerosíssimas intervenções, que aliás serão publicadas proximamente num volume, sobre os problemas da ecologia, sobre os problemas do meio ambiente.
Para informação desta Câmara e, através dela e dos meios de comunicação social presentes, para informação do povo português, recordarei algumas posições que, quanto a nós, são extremamente importantes. A luta em torno destas questões é uma luta antiga que não tem apenas a ver com a realidade actual, é uma luta que vem de antes do 25 de Abril,, que se prolongou para além dele e que agora ganha novas formas e novas cores.
Dizia um camarada meu nessa conferência que apesar das difíceis condições de luta nunca deixámos de nos encontrar na denúncia, na organização da luta contra a poluição, por exemplo, no Barreiro e em Alhandra, na luta pelos baldios para que o povo os pudesse usufruir, na denúncia das florestações selvagens, dos crimes urbanísticos, da especulação imobiliária, dos bairros degradados, na luta por melhores condições de habitação e de vida, na luta pelo desanuviamento e a paz.

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Depois do 25 de Abril a participação de todos os democratas e em particular dos comunistas tem sido directa ou indirectamente extremamente importante, como por exemplo a nível do poder local, e alguns exemplos devem ser salientados: A implantação dos primeiros aterros sanitários em Portugal, em Vale de Milhaços, Barreiro, Setúbal, etc., a arborização e a criação de zonas verdes, com o apoio das populações em vários distritos; a acção contra as pragas infestantes (distrito de Setúbal), a luta contra a destruição dos areínhos e a fauna fluvial em Avinte no rio Douro; as preocupações pela intervenção directa das autarquias nas Comissões de Gestão do Ar (Sines, Barreiro, etc.); a luta pela recuperação da ribeira de Barcarena, do rio Jamor, do rio de Alenquer, da ria de Aveiro, do Sado, do Alviela, do Cávado, do Ave e do Leça, do Almonda em Torres Novas, com a constituição inclusive de uma Comissão de despoluição e limpeza geral do rio; a luta da população de Ferrei pelo direito de ser ouvida quanto à instalação, de uma central nuclear; as lutas contra a instalação da Soporcel em Salvaterra de Magos e na Figueira da Foz e tantos outros exemplos que foram referidos exaustivamente durante esta conferência.
Algumas notas importantes merecem ser dadas neste debate - até porque podemos dizer que neste campo o debate não tem sido rico - relativamente a quatro questões que são objecto de alguma diversão, de algum confusionismo quando se fala de ecologia.
Em primeiro lugar, quanto a nós não há uma «ecologia neutra».
A prática mostra que a solução dos problemas ecológicos está estreitamente ligada às questões sociais, económicas, financeiras e técnico-científicas.
Em segundo lugar só o socialismo abre perspectivas e está em condições de resolver cabalmente os problemas do ambiente. A rapina dos recursos naturais, o egoísmo e a anarquia engendrados pelo capitalismo - sistema hostil ao Homem e à natureza - torna impossível a sua solução completa. Mas consideramos que a luta pela solução, ainda que parcial, dos problemas ecológicos é uma obrigação dos comunistas e de todos os democratas. Aqueles que pensam desfrutar a natureza apenas «depois da revolução» em nada estão a contribuir para ela neste campo e com esses nós não estamos.
Em terceiro lugar, a atitude negativa contra todo o progresso científico e técnico, difundida por certos ecologistas, é um meio de diversão e um entrave à compreensão das verdadeiras causas dos problemas ecológicos. Desta concepção surgem as análises «tecnocráticas» das terceiras vias (nem capitalismo, nem socialismo), da teoria da convergência», do «crescimento zero», da «renúncia à civilização», do «regresso à natureza», da oposição entre a economia e a ecologia. Também aqui a análise de classe é o grande aferidor.
Por último e este é o quarto aspecto que queríamos referir, o estacionamento e o trânsito de armas nucleares em Portugal, bem assim como as experiências nucleares e a corrida aos armamentos são um perigo real para o nosso país e para o nosso planeta e devem ser tidos em conta em debates desta natureza.
Devemos por isso desmascarar aqueles que pretendem desviar os movimentos ecologistas destas questões (os complexos militares industriais e os grandes negociantes de armas, procurando que esses movimentos ecologistas em exclusivo dirijam os seus protestos contra as centrais nucleares.
No campo do debate ideológico em torno destas matérias é importante referir que no fundamental não há grandes novidades.
Fala-se hoje de uma segunda geração do pensamento ecológico mas esta segunda geração não significará mais do que a transição de um reformismo liberal, que em determinada altura do desenvolvimento histórico do capitalismo foi defendido, para um niilismo radical que agora aparece defendido por diversas fontes.
De facto, no fundamental estamos perante posições comuns sobre a «sociedade pós-industrial», a «sociedade tecnótrona», a «civilização super-industrial» e outras expressões equivalentes.
No fundamental, todos estes ideólogos que defendem determinados princípios e fundamentam determinadas ideias em torno destas questões, negando as esperanças da revolução científica e tecnológica, por um lado, e contraditando, por outro, esta à necessidade e à possibilidade de satisfação das necessidades económicas, sociais e culturais, têm uma ideia comum, se não quisermos dizer um desejo comum, que permanece como pano de fundo nos seus ditos discursos ecologistas: para a humanidade será preferível a morte da «civilização industrial ocidental», ou esta «catástrofe ecológica» anunciada, à transformação revolucionária do capitalismo e à vitória do socialismo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador:- São apontados como verdadeiros cavaleiros do apocalipse a explosão demográfica, o esgotamento dos recursos naturais, a degradação do ambiente, os cataclismos climáticos, como se tudo isto não pudesse ser ultrapassado pelas capacidades dos homens, pela sua inteligência e vontade, enfim, pela, transformação da sociedade em que esses homens se inserem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou terminar esta minha intervenção, mas antes gostaria de dar aqui um testemunho pessoal.
Há relativamente pouco tempo visitei uma pequena República da região do Mar Báltico, uma pequena República, bastante mais pequena, em área e em número de habitantes, do que o nosso país, uma República onde apesar de tudo se trabalha há bastante tempo nestas matérias.
Aí 4 % da área do território é constituída por locais protegidos. Nestes 86 000 ha protegidos existem quatro reservas, seis lagos protegidos, seis parques naturais, cinco locais de paisagem, 173 parques artificiais protegidos tal como centenas e centenas de árvores seculares e árvores exóticas. Nela existe ainda mais de duas centenas de espécies animais e vegetais protegidas.
As sociedades de conservação e defesa da natureza que existem nesta pequena República têm mais de 40 mil sócios individuais e mais de 1300 sócios colectivos.
Existe uma Universidade Popular de Defesa do Ambiente nesta pequena República da região do Bâl-

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tico, que tem 40 filiais espalhadas pelo território, onde 5 mil pessoas por ano frequentam os seus cursos e, curiosamente, todos os professores universitários têm a obrigação de frequentar este curso ministrado por esta Universidade que visa concretamente a defesa do ambiente.
Visitei uma empresa têxtil, a maior empresa ligeira desta região do Báltico, uma empresa com mais de 6500 trabalhadores que se situa perto da capital desta República e perto de uma cidade com 22 mil habitantes. E a que assistimos? Assistimos, tanto eu como o meu companheiro de viagem, a que o tratamento dos efluentes da fábrica e da cidadã são realizados numa mesma instalação que tem uma área ocupada de cerca de 6 ha, com uma capacidade de depuração de 16000 m3/dia, com uma eficiência que varia entre 90 a 97 %.
Este exemplo que vos dou e que me parece importante neste debate é o exemplo da República da Letónia, que eu visitei há bem pouco tempo.
Os Srs;. Deputados que tiverem oportunidade de contactar directamente com estas realidades podem perceber que há sociedades em que ainda há coisas para realizar, ainda há coisas para fazer, mas há muita coisa que no capitalismo nunca se pode fazer, que é impossível realizar, que os povos não tem a capacidade para realizar. Mas nestas sociedades, nestes países isso já foi possível realizar.
Eu terminaria, se me permitem o «exagero», com uma citação poética do Séc. XX:
«Tu sabes do prazer de caminhar com passo certo. Sei que sabes que sabes que sei. Caminhávamos. Ao ritmo das palavras frescas de tão naturalmente ditas. Ao compasso dos silêncios curtos...»
Eu, no meu optimismo histórico, penso que daqui a séculos aquilo que são hoje sonhos de poeta serão o dia-a-dia daqueles que vão desfrutar com prazer a vida numa sociedade nova.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem também a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando pela primeira vez intervim neste debate tive ocasião de referir, ainda que muito sucintamente, alguns aspectos históricos da evolução de posições, fora e dentro de Portugal, em relação ao enquadramento desta problemática. Fi-lo não para proporcionar aos Srs. Deputados, que o sabem tão bem como eu, alguns aspectos dessa súmula histórica mas para suscitar alguma reflexão e creio hoje que valerá a pena principiar por ela.
Na verdade, dizia eu, que desse tipo de actuações era possível descortinar, através dos tempos e concretamente do Século XIX para cá, o comportamento das várias situações e dos vários passos em relação à problemática do meio ambiente. Lembrava como essa problemática começou por colocar-se em termos de um certo romantismo de anti-industrialização, de protecção à natureza, entendida como regresso do Homem a um tipo de civilização de «bom selvagem», e, dizia eu também, como essa problemática depois evoluiu para a criação de jardins botânicos, de jardins zoológicos, de uma certa procura pelo contacto com outras civilizações e até por aquilo que também traduzia - e em termos de Século XIX -, por um lado, um certo exotismo mas, por outro também, um certo universalismo cultural.
Creio que é importante lembrar tudo isto recordando que muitas destas problemáticas continuam hoje a estar presentes. Quando pegava na nossa História, na história mais recente da discussão dos problemas do ambiente, lave ocasião de referir o contexto em que se situou a Conferência Mundial de Estocolmo, em 1972, e os problemas que aí opuseram os chamados países desenvolvidos perante os países do Terceiro Mundo.
Recordarei um aspecto particularmente impressivo desse debate: a certa altura - quem o recorda é um dos membros da Delegação Norte-Americana a propósito de um determinado pesticida- foi referido que um pesticida novo tinha provocado a morte de muitos peixes de uma ribeira para onde esses pesticidas tinham sido lançados e um representante do Terceiro Mundo disse-lhe: «Aqui está uma questão que é sinal evidente dos modos e problemas diferentes com que nos confrontamos. Provavelmente a população do meu país acharia que um pesticida desse tipo era extremamente útil porque nós precisamos de matar muitos peixes para comer.»
Creio que recordar esta história não é inútil neste debate, porque ela representa de facto, e também no enquadramento que procurei dar-lhe, as concepções diferentes, não só no tempo como no espaço, que a problemática do ambiente necessariamente envolve.
Creio que se outros méritos não tivesse o facto de esta discussão ter sido trazida à Assembleia da República é, só para mim e neste momento, motivo de satisfação.
Não compartilho da tese há pouco exposta por um dos representantes do PPM - o Deputado Portugal da Silveira - segundo a qual foi útil impedir o avançar de iniciativas porque outras mais perfeitas podem surgir.
Pela minha parte direi que considero mais importante que se tente abrir algum caminho e acender alguma luz do que se venha invocar que se tomaram grandes precauções, que se impediram grandes incêndios e grandes derrocadas. É, também aí, uma diferença de concepção. Creio que provavelmente neste espírito - e é uma crítica que gostaria de fazer com toda a simplicidade - os descobrimentos com certeza não se teriam efectuado porque o PPM teria evitado muitos naufrágios.

Risos.

A perfeição teria sido obtida, provavelmente!, as cautelas teriam sido tomadas mas ninguém embarcaria, ninguém tentaria partir à descoberta.
Creio que, ao fim e ao cabo -e aqui procuraria entroncar esta última intervenção -, o que está em causa é o modo como concebemos a defesa do ambiente e por isso tive ocasião de dizer que muito mais importante do que o debate, na generalidade, deste diploma muito mais importante do que considerar este ou aquele preceito do diploma, seria com certeza o modo como encarássemos esta proposta como desafio que nos é colocado.
Ninguém pôs em dúvida a oportunidade desta discussão, ninguém pôs em dúvida que na generalidade os seus objectivos eram louváveis, ninguém pôs em

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dúvida senão algumas razões de sistemática do enquadramento de uma ou outra disposição e depois criticaram-se disposições em particular.
Creio que isto é importante, e é importante como conclusão democrática porque quem entende que o Parlamento é não uma Câmara de registo, em que os deputados se limitam a apresentar os projectos e em que depois as pessoas efectivam um exercício de «levantados e sentados», em que rejeitam ou aceitam em bloco, mas que pelo contrário o Parlamento, como órgão essencial à democracia que é, pressupõe o debate naquilo que tem de enriquecedor para todas as posições, naquilo que tem de troca de contributos, naquilo que tem de possibilidade de todas as iniciativas serem postas em comum e enriquecidas pelo contributo de todos quem tem esta visão, que é não só do Parlamento mas que corresponde a uma coisa que eu dizia logo no primeiro dia, que é também a visão da democracia, que é a visão de quem entende que não tem a verdade toda nem a verdade no bolso mas está disposto a dar o seu contributo e a aceitar o contributo alheio, se assim pensarmos então creio que este debate terá valido a pena e que a discussão que aqui se travou se justificou amplamente.
Disse logo na minha primeira intervenção que o grande desafio deste debate era o modo como se encara a política do ambiente e, disse mais, que não é fácil compatibilizar os princípios da economia de mercado com uma política ambiental ambiciosa, porque o máximo do lucro, a orientação expansionista do sistema, o desejo de transferir custos, o predomínio dos valores individuais sobre os sociais dificilmente se harmonizam com uma política de ambiente.
Creio que é difícil impor custos adicionais que se não repercutem no incremento da produção e que pelo contrário diminuem os lucros e que por isso mesmo, porque assim é, é que os defensores de uma economia de mercado sem nenhuma intervenção do sector público, sem nenhuma planificação do sector público, forçosamente são levados a uma política do ambiente que é uma política de pormenor do ambiente, que é uma política de fachada, que é uma política afinal perfeitamente ilusória.
Na sua linha de rumo dizia o Eng. Ferreira Dias que, com certeza, até ficava muito bem pintar os muros da fábrica de branco ou de qualquer outra cor e fazer-lhe um jardim à entrada. Era bonito e não aumentava substancialmente os custos do produtor industrial.
Foi esta mesma lógica, que é a lógica pura do mercado, que aqui foi assumida nalgumas intervenções muito clara e frontalmente.
Para esses pretensos defensores do ambiente, o ambiente não pode ser mais do que esse caiar de alguns muros e fazer um jardim à porta da produção, ou, quando muito talvez colorir os fumos poluentes.
Gostaria por isso de dizer, com toda a sinceridade e clareza, que a questão que se põe se pode traduzir em termos que eu sintetizava deste modo: para alguns pretensos defensores do ambiente o que está em causa não é defesa do ambiente em geral, do ambiente que é património de uma sociedade, o que está em causa é a defesa do «seu» ambiente.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Isto é, o que está em causa, exclusivamente em causa, é que algumas pessoas que têm automóvel, que têm segunda residência, que têm acesso a esses bens possam continuar a usufruir deles com todo o conforto e toda a tranquilidade.
A concepção do ambiente que professamos tem de passar por este simples e significativo teste: se nós fizéssemos as contas e chegássemos à conclusão que era possível dar a cada um dos cidadãos portugueses um automóvel e uma segunda residência como é que se colocaria o problema do ambiente nesta Casa?
Esta é uma questão fundamental e essencial de uma política do ambiente, considerada como política global que põe em causa um projecto de sociedade, que põe em causa um tipo de comportamento perante a sociedade, que põe em causa a nossa concepção sobre o futuro que reservamos para os nossos concidadãos.
É extremamente fácil enquadrar a política do ambiente no tal ambiente protegido, reserva ou coutada para alguns, e é esse ambiente protegido que tem como significado directo e imediato que o ambiente seja aqui por vezes também tratado com o mesmo espírito de coutada.
Gostaria de salientar que precisamente por isso é que se entendeu que é dentro e na área do socialismo democrático que os valores, do ambiente podem ser preservados e defendidos. É por isso que se diz que a política de promoção social e de desenvolvimento integral implica que se assegure a cada cidadão uma contínua melhoria da qualidade de vida. É por isso que a problemática da qualidade de vida e do ambiente não é indiferente do número de casas que se constroem, do acesso ao ensino que se põe, do número de empregos que podemos oferecer.
Cheira mesmo a amarga ironia, tão amarga como a história dos peixes que no princípio evocava, que se procurem preservar alguns espaços verdes para que algumas pessoas possam viver bem quando outras não têm condições suficientes sequer para uma vida digna -e justa como aquela que lhes devemos.
Creio que é por tudo isto que o que se impõe é um programa global de defesa do ambiente, programa global que tem de ter em conta a interacção de todos os factores que em relação ao ambiente se desenvolvem. E gostaria, como há pouco disse, de assinalar um aspecto importante, e para nós não despiciendo, do projecto de lei que apresentamos nesta Assembleia. Esse projecto de lei proeurou corresponder e corresponde, ponto por ponto, linha por linha, ao Programa aprovado no Congresso de 1974 do então Partido Popular Monárquico.
Aí se dizia que o programa global de defesa do meio ambiente deve promover a instalação de um sistema nacional de controle que permite a detecção de fontes poluidoras e a avaliação da degradação efectiva do meio ambiente; facilitar e favorecer a inventariação, o estudo, a gestão e a preservação de todos os recursos naturais, especialmente os não renováveis; inclui, portanto, uma política energética que assegure simultaneamente o abastecimento do mercado, o desenvolvimento de novas formas de captação e transformação, tecnologias novas; o incentivo de uma política geral de conservação da natureza de espécies biológicas; uma política geral de luta contra a poluição industrial, pela adopção do princípio do pagamento dos custos de recuperação e tratamento pela

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entidade poluidora e pela definição de critérios nacionais de implantação de unidades produtoras; e, finalmente, a preservação da paisagem natural, o planeamento de novas paisagens compatíveis com o recreio das populações».
E, acrescentava-se, «que a execução desta política geral de conservação da natureza e defesa do meio ambiente e da qualidade de, vida pressupõe como essencial uma adequada campanha de esclarecimento e de educação, a difusão de uma sã e democrática atitude cívica de respeito pelo património natural comum, a articulação com os Serviços Médico-Sanitários, o urbanismo nacionalizado e suficientemente dotado de infra-estruturas, a rápida formação de especialistas na matéria, um adequado esquema de ordenamento do território».
A citação foi longa mas creio que valeu a pena para concretizar, ponto por ponto, que todos estes objectivos foram contemplados no projecto de lei submetido a esta Assembleia.

O Sr. Manuel da Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E é por isso, porque esta é a concepção de meio ambiente que politicamente perfilhamos, que podemos perceber com alguma facilidade algumas críticas, que podemos perceber o papel que o PPM para si reserva na defesa do meio ambiente e que vem sendo traduzido pelos sucessivos adiamentos do enfrentar de questões, pelo sucessivo bloquear de situações, pelo sucessivo ignorar das questões, das mais simples às mais complexas, que são apresentadas.
Continuamos sem ter uma palavra sobre a poluição dos nossos rios, continuamos por exemplo, sem resposta ao requerimento que fizemos sobre a posição em relação ao «Luna Parque» de Lisboa. Esse foi um requerimento que aqui apresentámos em 10 de Fevereiro de 1981, que é uma questão simples que merecia resposta...
Continuamos sem saber de toda uma série de questões porque este de facto é um problema político e porque a concepção de ambiente que está em causa não é apenas a concepção heráldica de quem limpa as pratas da família mas é uma concepção que vai fundo, que tem a ver com o futuro de cada um de nós e que tem a ver com o facto de um projecto político ser um projecto político conservador ou progressista.
Aí se dividem as águas, aí se separam as posições, aí se pode ver quem é e quem não é pela defesa do ambiente.

Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não existem na Mesa quaisquer outros pedidos de palavra para a discussão na generalidade deste projecto de lei n.º 230/11 - Defesa do ambiente e protecção da natureza e do património -, vamos de imediato proceder à sua votação.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do PS, da ASDI e da UEDS, votos contra do PSD, do CDS e do PPM e a abstenção do PCP (registando-se a ausência do MDP/CDE e da UDP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão abertas as inscrições para declarações de voto.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Moía (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A declaração de voto do meu grupo parlamentar era para ser produzida pelo meu camarada Veiga de Oliveira mas, dado o facto de ele estar ausente, passarei eu a lê-la.

É a seguinte:

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto de abstenção radica nas preocupações e objecções que oportunamente suscitámos nas intervenções que produzimos ao longo do debate. Pensamos, em particular, que em matéria de ambiente e património estamos perante a necessidade de um código que compreenda uma lei de enquadramento, leis específicas, regulamentos e o concomitante estabelecimento de ilícitos e de penas.
Definido o objecto, uma lei de enquadramento deveria, ante de tudo, definir as entidades intervenientes no processo e delimitar competências. Intervenientes são esta própria Assembleia, o Governo, o Poder Local, as Associações Cívicas, e as diversas pessoas físicas e jurídicas.
Competindo à Assembleia da República a lei de enquadramento e algumas leis específicas em razão dg matéria; competirá ao Governo a elaboração de regulamentos, a emanar através de instrumentos jurídicos adequados; competirá ao poder local cumprir e fazer cumprir as leis e regulamentos na sua área de actuação; às associações cívicas e às pessoas físicas o direito de participar na elaboração das medidas e o dever de contribuir para o cumprimento das disposições legais.
Ora este projecto, tal qual foi apresentado, não era nenhuma das realidades que poderia ser. Nem uma lei de enquadramento, nem colectânea de leis específicas, antes mescla de medidas, gerais e específicas, umas questionáveis ou muito questionáveis, outras pacíficas e razoáveis.
A nossa abstenção justifica-se por entendermos que seria possível através da introdução de alterações em Comissão, reconduzir esta iniciativa ao seu objectivo útil: produzir uma verdadeira lei quadro de defesa do património e do ambiente.
Tão urgente a consideramos que, pela nossa parte, aceitaríamos de bom grado partir da base que foi apresentada a esta Assembleia. Não é outro o sentido do voto do Grupo Parlamentar do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Sousa.

O Sr. Oliveira e Sousa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS sempre reconheceu e reconhece a importância da defesa do ambiente e da protecção da Natureza visando evitar a continuada degradação dos recursos naturais.
No entanto, entende que o projecto de lei n.º 230/II, que acabamos de votar, não constituía uma base de trabalho suficiente para permitir que dele se obtivesse uma lei quadro capaz para a defesa do ambiente.
De facto, ao longo da discussão ficou patente que

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todos os grupos parlamentares, incluindo o nosso, apontaram sérios erros, quer de definições, quer de sistematização, quer da introdução de matérias que não tinham nada a ver com o tema em questão, erros que à partida inviabilizavam uma aprovação do diploma. Daí o voto contra do CDS.

Vozes do CDS: - Muito bem:

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelas razões que aqui expusemos e também pelas razões que foram expostas pelos Srs. Deputados José Manuel Mendes e Sousa Marques, do PCP, Gomes Fernandes e Leonel Fadigas, do PS, votámos contra este projecto de lei.
Por virtude disto, chama-nos agora de «Velhos do Restelo» e dizem que não embarcaríamos nas caravelas do Infante. Não sei qual seria a nossa atitude nessa altura, Sr. Deputado Magalhães Mota, mas embarcar nas caravelas da ASDI, que à partida já estão cheias de escorbuto, é que não embarcamos com certeza.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Olhe que não! Há muita vitamina!

O Orador: - O Sr. Deputado Magalhães Mota, com a sua última intervenção, veio finalmente enriquecer, pela sua parte, este debate. Veio dizer-nos que um projecto de ambiente deve ser enformado por um projecto de sociedade e que não há política de ambiente se não houver preocupações sociais profundas quanto a essa política.
Mas, Sr. Deputado, devo dizer-lhe com toda a franqueza que se o vosso projecto fosse eco de algum projecto de sociedade - mesmo que esse projecto fosse socialista democrático ou social-democrata, como lhe queira chamar - não teríamos dúvida nenhuma em o votar favoravelmente. E se votámos contra ele foi porque, de facto, ele é um projecto de «Velhos do Restelo», é um projecto que caberia aqui há 100 anos, é um projecto que não é de 1981, repito, é um projecto de «Velhos do Restelo».
Porém, o mais espantoso desta votação, Sr. Presidente e Srs. Deputados, talvez não tenha sido o facto de nós termos votado contra. O que nos causou maior estranheza e perplexidade foi o comportamento do Partido Socialista.
De facto, numa primeira intervenção, o Sr. Deputado Gomes Fernandes teceu judiciosas considerações, na generalidade, acerca deste projecto -que levariam a tudo menos a pensar que votaria favoravelmente - e chegou mesmo a dizer que tinha outro projecto sobre o mesmo assunto que ia apresentar. Como é que se pode imaginar que se aprove hoje uma coisa que se vai amanhã contradizer com um novo projecto?
Isto é realmente demais para a nossa compreensão, Sr. Presidente e Srs. Deputados!
O Sr. Deputado Gomes Fernandes fez um protesto indicando onde é que o projecto da ASDI era cópia de um projecto do PS, e fê-lo com alguma indignação legítima. Mas, depois de dizer que este projecto ia adulterar o do PS introduzindo outros preceitos que não estariam certos, votou a favor do projecto da ASDI! Santa incoerência, Sr. Presidente e Srs. Deputados!
O Sr. Deputado Leonel Fadigas fez também uma importante intervenção sobre as bases filosóficas com que encara o problema do ambiente, bases filosóficas essas que - ele próprio o disse - não estão contidas no esqueleto ou melhor, naquilo que poderia ser um esqueleto deste projecto. E o Sr. Deputado Leonel Fadigas, depois disto tudo, votou a favor do projecto de lei da ASDI!
Há coisas que, de facto, nos ultrapassam!
Que coerência é esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que faz com que um partido liquide com intervenções seriíssimas um projecto de lei e depois vote a favor dele? Que coerência é esta? Será a coerência de uma solidariedade política? Será um estertor da FRS que, apesar de tudo, ainda mexe?
Não sabemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mas esta é uma pergunta que aqui deixamos expressa. Será isto uma solidariedade que vem dos resultados das eleições de Loures? Será uma solidariedade que vem do projecto de revisão da Constituição de 23 de Abril?
Não sabemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mas interrogamo-nos, com alguma perplexidade, acerca da coerência deste partido.
É, de facto, profundamente lamentável que pretendendo-se - não o Partido Socialista - acusar o PPM de vir aqui fazer um voto político em mera atitude de oposição à outrance aos partidos das bancadas da oposição, se venha depois cometer o erro de votar contra aquilo que se afirmou.
Nós votámos contra, Sr. Presidente e Srs. Deputados - e acabo a minha declaração de voto com esta afirmação -, não só pelos argumentos que aqui trouxemos mas principalmente pelos argumentos que aqui foram trazidos pelo PS. Somos coerentes e custa-nos às vezes não compreender a coerência dos outros.

Aplausos do PPM e de alguns Deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era apenas para uma breve declaração de voto que terá que ser um pouco mais extensa dadas as considerações que o Sr. Deputado Borges de Carvalho fez na sua declaração de voto acerca do meu partido que, como é óbvio, são indevidas, do nosso ponto de vista, lógicas e justas do ponto de vista do PPM, que tem o direito de se pronunciar conforme entender sobre esta matéria e sobre quaisquer outras.
O PS votou a favor deste projecto de lei na generalidade apesar das imprecisões e incorrecções técnicas que, de uma forma concreta, serena, frontal e objectiva, aqui apontou durante estes dois dias de

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discussão, como o próprio Sr. Deputado Borges de Carvalho reconheceu.
Entendemos que uma coisa é participar numa discussão activa e controversa e formular propostas e hipóteses alternativos, uma coisa é fazer críticas duras e cerradas e outra coisa é reconhecer o mérito das iniciativas, é entender que a crítica -embora cerrada, por vezes - não passa pela liquidação in limine ad adversário, seja ele quem for.
Este não é nem o estilo nem a lógica do PPM e da AD, mas é esta é a nossa lógica e é nesse comprimento de onda que nos queremos manter. Alguma coisa tem efectivamente que nos separar!
Por outro lado, a nossa perspectiva nesta discussão, como noutras, pauta-se por um combate a um certo obscurantismo. E o obscurantismo aqui é o pretender impedir ou pelo menos pretender reduzir a legitimidade de outrem para manifestar a sua vontade, para manifestar o seu ponto de vista e, sobretudo, para manifestar o seu direito à diferença e à discordância.
E é pelo direito à diferença e à discordância que nós, criticando e assumindo os nossos pontos de vista, criticando as posições diferentes e discordantes dos outros, não temos impedimentos para, no momento próprio, assumir, na globalidade, o mesmo caminho e a mesma posição de outrem.
O PS entende que a política de ambiente é, efectivamente, um desafio ao futuro e nós próprios temos - e dissemo-lo aqui - um projecto global de transformação das estruturas sócio-económicas e culturais da sociedade, formizámo-lo nesta área do ambiente e da qualidade de vida e, dentro de momentos, iremos entregar na Mesa da Assembleia o nosso próprio projecto.
Referimos aqui que íamos apresentar um projecto sobre esta matéria mas temos que reconhecer que talvez esta iniciativa da ASDI tenha contribuído também para acelerar a entrega desse projecto, que estava pronto e que só por meras questões formais ainda não tinha sido apresentado.
Nesse projecto definiremos objectivos e competências, definiremos os diferentes factores ambientais, quer naturais quer humanos, definiremos as acções a empreender no domínio da qualidade do ar, da protecção das águas, da defesa e valorização dos solos, da protecção da fauna, da flora, etc.
Entendemos que este nosso projecto é um desafio responsável a esta Câmara e um desafio que exige a formulação de alternativas que não podem manter-se liminarmente nos raciocínios que a maioria continua a fazer. Cremos que com ele está aberta a discussão e estão criadas condições para desta Assembleia nascer uma lei quadro que se alargue a toda esta problemática.
Quanto às razões por que o PPM diz que votou contra este projecto - no fundo votou contra pelas mesmas razões que nós, e outros partidos, votámos a favor - podem ser justas na perspectiva do PPM mas entendemos que deve ficar claro que cada qual deve encontrar justificações para os seus actos procurando não envolver nelas os actos, as atitudes ou os comportamentos dos outros que provêm, efectivamente, de factos diferentes.
Queríamos ainda salientar uma vez mais uma referência que há bocado aqui fizemos.
Durante este debate criticámos cerrada e duramente, como eu disse há pouco, o projecto de lei da ASDI e, independentemente disso, votámos a favor na generalidade quanto ao seu espírito porque, como também referimos, o espírito do nosso projecto de lei tinha sido assumido neste projecto de lei da ASDI.
Além disso, entendemos que a intervenção final do Sr. Deputado Magalhães Mota foi, para os deputados que estavam atentos e que reflectiram sobre ela, uma excelente contribuição no campo filosófico e no campo da definição de linhas de política para o trabalho futuro desta Assembleia. Neste sentido, consideramos que esta foi também uma peça importante na justificação da nossa votação.
O PPM, na altura em que «chumbou» o nosso projecto de lei, referiu aqui - e comprometeu-se a isso dando até uma data - que muito em breve apresentaria um documento alternativo correspondente. Não o fez e só diremos ao PPM que nos pode fazer as críticas que entender - está no seu pleno direito e até, do seu ponto de vista, talvez essas críticas sejam profundamente justas - mas nós repudiamo-las por profundamente injustas e queremos assinalar a diferença de critérios, de estilos e de coerência do nosso partido e das críticas que nos foram feitas pelo PPM porque afirmámos aqui que iríamos apresentar um projecto alternativo e vamos apresentar um projecto global para discussão, projecto esse que, dentro de momento, será entregue na Mesa.
Não fazemos como o PPM que criticou e contribuiu para «chumbar» um projecto aqui na Assembleia, comprometeu-se a apresentar um projecto alternativo e até este momento não o fez. Também aqui nós somos coerentes.

Aplausos do PS e da ASDI.

O Sr Sousa Marques (PCP): - Nem apresentará! Nunca apresentou nada de jeito!
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por consenso, ficou adiada para amanhã a discussão das ratificações n.ºs 99/II e 103/II - Decreto-Lei n.º 266/81, de 15 de Setembro, que regulamenta a associação de municípios.
Desejava informar a Câmara de que a Mesa proeurou ter algumas informações sobre o incidente aqui referido pelo Sr. Deputado Sousa Marques, do PCP, e as que obtivemos coincidem com a informação dada pelo Sr. Deputado havendo somente a acrescentar que o caso está entregue à polícia, que o agressor está preso e que os feridos foram para o hospital. O sócio do agressor foi também agredido mas parece que sem gravidade. O assunto está pois, entregue nas mãos da polícia.
Informo ainda que deram entrada na Mesa dois pedidos de sujeição a ratificação, a que foram atribuídos os números 110/II e 111/II, subscritos pelos Srs. Deputados Carreira Marques e Carvalho de Sousa, um sobre as cooperativas de produção e outro sobre cooperativas de consumo.

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Da ordem do dia de amanhã consta o projecto de lei n.º 220/II, apresentado pelo CDS, sobre o regresso ao serviço activo dos juízes de direito aposentados.
Não havendo mais nada a anunciar lembro os Srs. Deputados de que a sessão de amanhã terá início à 10 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Roque Bissaia Barreto.
Amândio Anes de Azevedo.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo,
Anacleto Silva Baptista.
António Duarte e Duarte Chagas.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Bessa de Morais Alão.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José da Costa.
Fernando José F. Fleming de Oliveira.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco de Sousa Tavares.
Germano Lopes Cantinho.
Henrique Alberto Nascimento Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Evangelista Rocha Almeida.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
José de Vargas Bulcão.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria Helena do Rego Salema Roseita.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Virgílio António Pinto Nunes.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
António Chaves Medeiros.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Gonçalves Janeiro.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Fernando Manuel dos Santos Gomes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Francisco Mesquita Machado.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Vítor Manuel Brás.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano José Alves Moreira.
Alberto Henriques Coimbra.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
Carlos Alberto Rosa.
Fernando Augusto Sanches Nunes.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Lopes Porto.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Luísa Maria Freire Vaz Raposo.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Maria Helena Vilela P. de Castro.
Mário Gaioso Henriques.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro Eduardo F. de Sampaio.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Valentim Tiago Alves Lopes.

Partido Comunista Português (PCP)

António Dias Lourenço da Silva.
Domingos Abrantes Ferreira.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

António José B. Cardoso e Cunha.
Carlos Mattos Chaves de Macedo.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro Almeida.
Marília Dulce Coelho Pires D. Raimundo.

Partido Socialista (PS)

António de Almeida Santos.
António Fernandes da Fonseca.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Mário Alberto Lopes Soares.
Parcídio Matos Summavielle Soares. -

Página 685

27 DE NOVEMBRO DE 1981 685

Centro Democrático Social (CDS)

João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Seabra Roseiro.
Maria José Paulo Sampaio.
Paulo Oliveira Ascenção.
Rui Eduardo Rodrigues Pena.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Armando Teixeira da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.

OS REDACTORES DE 1.ª CLASSE, José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz.

Página 686

PREÇO DESTE NÚMERO 48$00

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