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I Série - Número 8 Sexta-feira, 5 de Novembro de 1982
Diário da Assembleia da República
II LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1982-1983)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE NOVEMBRO DE 1982
Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Guilherme Gomes dos Santos
Manuel António da Almeida Azevedo e Vasconcelos
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 50 minutos.
Entretanto, a Assembleia saudou a presença na Tribuna dos membros da Comissão das Relações com os Parlamentos Nacionais e o Público, da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.
Iniciou-se e concluiu-se o debate da interpelação ao Governo, provocado pelo Grupo Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS), sobre política geral, centrando na política de informação e comunicação social e das medidas já anunciadas ou já tomadas em relação à ANOP,
E.P.
Após o Sr. Deputado Lopes Cardoso (UEDS) ter aberto o debate usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (José Alfaia), os Srs. Deputados Silva Marques (PSD), Jorge Miranda (ASDI), Jorge Lemos (PCP), Magalhães Mota (ASDI), José Niza (PS), Mário Tomé (UDP), Armando de Oliveira (CDS), João Corregedor (MDP/CDE), Arons de Carvalho (PS). Carlos Brito (PCP), Maria Adelaide Paiva (PSD), António Taborda (MDP/CDE), António Vitorino (UEDS), Natália Correia (PSD), Manuel Matos (PCP), César de Oliveira (UEDS), Jaime Gama (PS), Santana Lopes e Amândio de Azevedo (PSD).
Entretanto, foi lido e aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de deputados do CDS e do PCP.
Finalmente, após ter anunciado a entrada na Mesa do pedido de sujeição a ratificação n.º 221/II, o Sr. Presidente encerrou a sessão à 1 hora e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 50 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social Democrata (PSD)
Adérito Manuel Soares Campos.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. Andrade Azevedo.
Anacleto Silva Baptista.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Duarte e Duarte Chagas.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Carlos Dias Ribas.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Daniel Cunha Dias.
Fernando Alfredo Moutinho Garcês.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Mendes Costa.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Afonso Gonçalves.
João Evangelista Rocha Almeida.
João Manuel Coutinho de Sá Fernandes.
João Sousa Domingues.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Joaquim Pinto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Leite Machado.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
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Júlio Lemos Castro Caldas.
Leonardo Eugênio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Pereira.
Manuel Ribeiro Arruda.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Mário Dias Lopes.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Octávio Pereira Machado.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Victor Pereira Crespo.
Vasco Mascarenhas Grade.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons de Braga de Carvalho.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo José Somera Simões Barroso.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Duarte Arnaut.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco B. Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António Egídio Fernandes Loja.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Azevedo Gomes.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Fernando Verdasca Vieira.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Francisco Ludovico da Costa.
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito Morais.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul D'Assunção Pimenta Rego.
Sérgio Augusto Nunes Simões
Teófilo Carvalho dos Santos.
Vítor Manuel Brás.
Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Alberto Henriques Coimbra.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Mendes Carvalho.
António Paulo Rolo.
António Pedro Silva Lourenço.
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira.
Carlos Eduardo de Oliveira e Sousa.
Carlos Martins Robalo.
Daniel Fernandes Domingues.
Duarte Nuno Correia Vasconcelos.
Emílio Leitão Paulo.
Fernando Augusto Larcher Nunes.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
João Abrunhosa de Sousa.
João Cantinho de Andrade.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
Luís Aníbal de Azevedo Coutinho.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Luisa Maria Freire Vaz Raposo.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Narana Sinai Coissoró.
Rui António Pacheco Mendes.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José M. Vidigal Amaro.
Artur Mendonça Rodrigues.
Carlos Alberto do Carmo Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Talhadas.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel dos Santos e Matos.
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Manuel da Silva Ribeiro de Almeida.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria lida Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Rodrigues Pato.
Rosa Maria Alves Brandão.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM)
António Cardoso Moniz.
António José Borges de Carvalho.
Augusto Ferreira do Amaral.
Henrique Barrilaro Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Acção Social Democrata Independente (ASDI)
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ferreira Guedes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
António Monteiro Taborda.
João Corregedor da Fonseca.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
Neste momento, tomaram assento na bancada do Governo o Sr. Ministro para os Assuntos Parlamentares (Marcelo Rebelo de Sousa), o Sr. Ministro da Justiça e da Reforma Administrativa (Meneres Pimentel), o Sr. Ministro do Trabalho (Luís Morais), o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Luís Barbosa) e o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (José Alfaia).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para introduzir a interpelação ao Governo, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se há um sector da vida colectiva que, mais do que qualquer outro, permite aquilatar do grau de democraticidade de um regime, é, sem dúvida, o da comunicação social.
A liberdade de informação é sempre o alvo privilegiado dos sistemas totalitários e o controlo dos meios de comunicação social a meta apetecida de todos quantos, por uma via ou outra, pretendem assegurar a sua hegemonia política, cultural e económica.
E, se o lápis azul da censura é a forma última e no fundo também a mais primária de coarctar em definitivo a liberdade de informação, muitos são os modos, mais subtis uns, mais grosseiros outros, de se alcançarem os mesmos objectivos.
A inexistência do lápis azul da censura não significa necessariamente a existência de uma informação livre, pluralista, não manipulada. Se outros exemplos não existissem, três anos de governos AD chegariam para mostrar que assim é.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Um observador menos prevenido ao olhar o que tem sido o comportamento dos Governos A D no domínio da comunicação social seria talvez levado a interrogar-se sobre o que mais espanta, o que mais admira: se o seu impudor e desfaçatez, se a sua incompetência, se o seu desprezo absoluto pelas mais elementares regras da legalidade democrática - sem se dar conta que, afinal para além das suas aparentes contradições, esse comportamento é, tem sido sempre comandado por um objectivo claro, isto é, a destruição do sector público da comunicação social e a sua entrega aos grupos económicos de que o Governo é a expressão política e obedece, tem obedecido sempre, a uma regra simples: a de que não há que olhar aos meios para alcançar aquele objectivo.
Num discurso que ficou célebre, classificou um dia Afonso Costa, neste mesmo hemiciclo, com o a propósito e o sentido da fórmula breve e contundente de que não ignorava os segredos, o regime de então como uma "falperra de manto e coroa".
Com igual a propósito se poderia dizer hoje que este Governo transformou a comunicação social estatizada numa outra falperra, só que agora sem manto nem coroa, sem brilho, nem grandeza.
Uma rádio e uma televisão onde campeiam a incompetência, a mediocridade e o compadrio, onde diariamente se manipula e distorce a informação, onde se promove o analfabetismo sob uma única condição - a de que seja dócil e servil - onde como regra os profissionais dignos desse nome são marginalizados; uma imprensa estatizada a que se vão sistematicamente coarctando os meios de cumprir a sua tarefa, enquanto se aguarda que a degradação da qualidade arraste a consequente degradação económica e financeira que haverá de justificar o seu encerramento.
Ò modo de agir do Governo neste domínio tem sido repetidamente o mesmo, com etapas que claramente se demarcam no tempo.
Domesticar os jornalistas, enquadrar os insubmissos entre chefes, subchefes e contra-chefes, cortar aos rebeldes os meios indispensáveis ao exercício da sua profissão, são as sucessivas etapas que o Governo não hesita em percorrer sempre que necessário para alcançar os seus fins.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Quando a primeira fase não resulta e os jornalistas não se deixam domesticar e amedrontar, o Governo lança mão dos seus capatazes, grupos de incompetentes ou aprendizes que nas redacções tentam tomar os jornais.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Se nem assim as redacções são silenciadas o Governo para à 3.º fase, isto é, priva os jornalistas dos meios indispensáveis ao exercício da sua actividade. Os agentes da informação governamental, esses não sofrem de falta de meios, já que fazem as notícias que a AD quer, quando a AD quer e como a AD quer.
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Mas nem ainda assim o Governo atinge os seus objectivos, entra-se na última e derradeira fase, na fase da solução final, e extinguem-se as redacções, extinguem-se os órgãos de comunicação social.
Foi o percurso percorrido pela "Informação 2" da RTP; é o percurso que o Governo pretende fazer percorrer à ANOP.
Perante as dificuldades encontradas para a colocar ao seu exclusivo serviço o Governo não hesitou em optar pela sua extinção e substituição por uma nova empresa, concebida de uma ponta à outra de molde a garantir à AD o tão desejado controle da informação. Da mesma forma não hesitou em recorrer, mas justificar tal acto, a todos os subterfúgios, a todos os estratagemas, a todas as mentiras e à própria sabotagem económica da empresa.
O mesmo Primeiro-Ministro que em Janeiro de 1981. se propunha apoiar financeiramente a reorganização da ANOP (Programa do VII Governo - Primeiro-Ministro, Dr. Francisco Pinto Balsemão), o mesmo Governo que em Setembro de 1981, se comprometia perante esta Assembleia a favorecer o alargamento do espaço noticioso da ANOP no país e no seio das comunidades e a secundar financeiramente a sua actividade segundo contrato-programa a acordar (Programa do VIII Governo - Primeiro-Ministro, Dr. Francisco Pinto Balsemão), esse mesmo Primeiro-Ministro e esse mesmo Governo não hesitam em decidir a extinção da empresa e apadrinhar política e financeiramente (à custa do erário público, está bem de ver) a criação de uma nova agência noticiosa.
Decidem à revelia de tudo e de todos. Em matéria que pela sua importância decisiva para o regime democrático deveria ser sempre alvo do mais aberto e alargado debate, o Governo age na sombra dos gabinetes, escondido por detrás de uma cortina de falsas declarações que sucessivamente se contradizem, protegido por uma barragem de contra-informações em que o Sr. Secretário de Estado José Alfaia se revelou perito.
Decidem à revelia dos trabalhadores da empresa (o mesmo é dizer da Constituição da República que tornava obrigatória a sua audição).
Decidem à revelia do seu conselho de gerência que no dia imediato àquele em que o Governo anunciava a decisão de extinguir a ANOP se dirigia por carta ao Primeiro-Ministro nestes termos:
O conselho de Gerência da ANOP, perante informações contraditórias que lhe chegam, desconhece neste momento se o Conselho de Ministros decretou a extinção da empresa ou resolveu recomendar a cessação da sua actividade.
Estava-se a 30 de Julho. O Governo decidira na véspera extinguir a ANOP. O Conselho de Gerência nada sabia!
Decidem à revelia da opinião pública e à revelia de quaisquer estudos sérios tendentes à reestruturação da empresa sucessivamente anunciada pelo Sr. Secretário de Estado mas nunca tentada, nem concretizada.
Decidem à revelia da Assembleia da República perante a qual o Governo se comprometera a reorganizar e apoiar financeiramente a ANOP.
Decidem à revelia do Conselho de Informação para a ANOP, o qual na sequência de inquérito realizado, depois de ter ouvido numerosos órgãos de informação das mais diversas correntes ideológicas, emitia parecer, aprovado por unanimidade, isto é, aprovado não só pelos
representantes da oposição mas também pelos representantes da maioria, parecer esse em que se afirmava, entre outras coisas, que o serviço noticioso da ANOP era reconhecido como obedecendo a normas legais e constitucionais, com o consequente respeito pelo pluralismo, rigor, objectividade e independência de informação exigidas por lei, nela confiando os profissionais dos órgãos de comunicação social portuguesa.
Decidem à revelia do Presidente da República a quem, se ajuizarmos pelo comunicado daquele órgão de soberania de 14 de Agosto, o Governo com mais do que evidente má fé não terá hesitado em mentir ao ter o desplante de lhe assegurar que não determinara a extinção da ANOP, não obstante haver aprovado 15 dias antes a Resolução n.º 133/82, de 29 de Julho e ter anunciado, nessa data, que o encerramento da ANOP, figurava entre as decisões políticas então aprovadas pelo Conselho de Ministros, encerramento que seria aliás objecto de decreto-lei cinco dias depois.
Finalmente, pasme-se, decidem à margem de qualquer discussão séria no próximo Conselho de Ministros, se acreditarmos nas declarações de vários membros do Governo então trazidas a público.
Em 28 de Julho o Ministro de Estado Ribeiro Teles afirmava-se contrário ao encerramento da ANOP e assegurava:
O assunto não foi discutido no Governo.
No dia imediato o Governo decidia extinguir a empresa.
Em 28 de Agosto o Ministro de Estado João Salgueiro dizia desconhecer qualquer acordo financeiro do Governo com a agência Notícias de Portugal e proclamava a inexistência de verbas que pudessem servir de suporte a um tal acordo. Ao mesmo tempo Macedo e Cunha, então coordenador da Comissão Instaladora da nova agência, revelava a existência de um protocolo de acordo com o Governo e anunciava a sua assinatura para breve.
Em 2 de Outubro o Ministro para os Assuntos Parlamentares declarava a propósito do contrato entre o Governo a agência Notícias de Portugal que «como a questão não fora pormenorizadamente discutida em Conselho de Ministros» se sentia «à vontade para ter dúvidas de diversa natureza acerca das perspectivas futuras de uma tal solução". O contrato entre o Governo e a Notícias de Portugal fora assinado dois dias antes!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recapitulemos. Em 29 de Julho o Governo aprova a Resolução n.º 133/82, que prenuncia o encerramento da ANOP e torna público, através de comunicado emanado do Gabinete do Primeiro-Ministro, a sua decisão de pôr termo à existência daquela empresa. 15 dias mais tarde, a 14 de Agosto, o Primeiro-Ministro assegura ao Presidente da República que o Governo nada decidira naquele sentido. 5 dias depois o Conselho de Ministros aprova um decreto-lei cujo n.º 1 do artigo 1.º reza assim: «É extinta a Agência Noticiosa Portuguesa ANOPEP»!
Em 28 de Julho, segundo o Ministro Ribeiro Teles, a extinção da ANOP não fora ainda discutida em Conselho de Ministros. Em 29 de Julho o Governo decide a sua extinção!
Em 28 de Agosto o Ministro das Finanças ignora a existência de um projecto de protocolo entre o Governo e a agência NP que envolve despesas da ordem das centenas de milhares de contos.
10 dias depois é autorizada por portaria a contratação de serviços com a NP no valor de 320 000 contos!
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O Sr. Mário Tomé (UDP): - É isso. São centenas de milhar de contos!
O Orador: - Em 29 de Setembro o Governo assina o contrato com a NP; a 2 de Outubro, o Ministro para os Assuntos Parlamentares confessa que a questão terá sido pouco discutida em Conselho de Ministros!
Como exemplo do que significam para o Governo a transparência de processos, a assumpção clara de responsabilidades, a dignificação das instituições, dificilmente se encontraria melhor.
Quando um Governo perde a este ponto o respeito por si próprio que esperanças pode ter de ser respeitado?
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
Que credibilidade merece um Secretário de Estado que, ao longo de todo este processo, se revelou incapaz de assumir com dignidade o seu cargo e que, tal como a criança apanhada a «roubar o pote da marmelada», ou o finório surpreendido a vender a estátua de D. José, se refugia na mentira e assumindo o modo de quem se sente ofendido assaca aos outros as responsabilidades que são suas como quem grita «agarra que é ladrão» na esperança de distrair o polícia?
Aplausos da UEDS, do PS. do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
Exagero? Como classificar o comportamento de quem tem o supremo descaramento de fazer emitir pela Direcção-Geral de Informação, no dia 14 de Julho, um telex em que a propósito da ANOP se afirma «que até conclusão dos trabalhos em curso não deve ser dada divulgação prematura a hipóteses ainda em equação», quando ele próprio, poucos dias antes, se fizera «prematuramente», (a avaliar pelos seus critérios de 14 de Julho, que não os de 12 de Julho - o Dr. José Alfaia é mobile), eco de algumas dessas hipóteses em entrevista ao Diário de Notícias.
Telex em que se afirma também que tais hipóteses estão a ser estudadas «com base no acervo de documentos disponíveis(...), entre os quais exposições elaboradas pelo Conselho de Redacção e outras estruturas representativas dos trabalhadores", quando é certo que tal como o afirmam a comissão de trabalhadores, o conselho de redacção e os delegados sindicais da ANOP nenhum órgão representativo dos trabalhadores enviou ao gabinete do Dr. José Alfaia documento com o objectivo de ser incluído em qualquer estudo de reestruturação da empresa, quando é certo também que sempre o Sr. Dr. José Alfaia se recusou a receber os representantes dos trabalhadores da ANOP.
Telex onde finalmente se afirma que «em devido tempo será o conselho de gerência da ANOP informado e por via deste todas as estruturas da empresa», quando 15 dias depois, a 30 de Julho, no dia seguinte à aprovação pelo Governo do encerramento da ANOP, esse mesmo Conselho de Gerência se revelava em carta dirigida ao Primeiro-Ministro totalmente ignorante de tudo o que se estava passando em relação à ANOP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todo o comportamento do Sr. Secretário de Estado José Alfaia, como todo o comportamento do Governo se norteou neste caso pela preocupação evidente, de criar condições que tornassem irreversível o processo de degradação económica e financeira da ANOP e irreversível portanto o seu encerramento.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Histórias!
O Orador: - Na verdade entre o propósito de reorganização da ANOP que em Setembro de 1981, o Governo anunciava como uma das metas do seu programa no sector da comunicação social e a extinção da empresa que o decreto-lei aprovado 1 ano mais tarde procurava concretizar, que foi o caminho percorrido pelo Governo?
Tentou-se porventura a reestruturação da empresa? Procurou-se avaliar seriamente da sua viabilidade? Nunca, nem pelo Governo nem pelo conselho de gerência, foi realizado qualquer estudo de viabilidade económico-financeira da empresa, nem, ao contrário do que foi feito para outras empresas do sector, a ANOP foi declarada em situação económica difícil e objecto de acordo de saneamento económico e financeiro.
A situação da empresa e a sua evolução foi sempre do conhecimento do Governo, mas não obstante os desequilíbrios estruturais que não se ignoravam, não obstante a degradação económica e financeira que se ia acentuando, nunca o Governo exigiu dos sucessivos conselhos de gerência qualquer estudo tendo em vista avaliar da viabilidade da empresa, das necessidades impostas pela sua reorganização e restruturação, das possibilidades de uma sua melhor inserção no mercado da comunicação social.
Nunca com os órgãos representativos dos trabalhadores da empresa foram discutidas as possibilidades de contenção de encargos com pessoal ou quaisquer propostas de reestruturação.
O Governo não só deixou, com perfeita consciência do que passava, que a empresa caminhasse para uma situação de ruptura financeira como pela sua acção procurou acelerar esse processo.
Sem nunca ter aprovado o orçamento da empresa para 1982, o Governo atribuiu-lhe até ao mês de Julho verbas calculadas com base nos duodécimos correspondentes ao orçamento do ano anterior. Em Julho e Agosto concede-lhe uma verba correspondente aos duodécimos calculados com base num subsídio total de 200000 contos, que fora entretanto aprovado por resolução do Conselho de Ministros em 25 de Maio.
Posteriormente, (Resolução do Conselho de Ministros n.º 133/81, de 29 de Julho) o Governo anula aquele subsidio, substituindo-o por uma dotação de 115000 contos, tendo a ANOP recebido em finais de Agosto 20202 contos, parcela equivalente ao que lhe faltava ser pago na base daquela dotação.
Mais uma das muitas ilegalidades que enxameiam o processo ANOP, como claramente está demonstrado no recurso interposto para o Supremo Tribunal Administrativo pelo Centro Regional da ANOP da Madeira, e subscrito pelo Sr. Deputado Ferreira do Amaral.
Contudo, o diferencial entre os 115000 contos atribuídos em 29 de Julho, e a verba que anteriormente o Governo destinara à ANOP, teriam bastado à empresa para fazer face às suas necessidades entre Setembro e Dezembro do corrente ano.
Uma vez mais o objectivo é claro: provocar o estrangulamento financeiro da empresa e inviabilizar o seu funcionamento. Aliás, o Sr. Secretário de Estado José Alfaia não o esconde. Com um cinismo que só tem paralelo no seu impudor é sem pestanejar que comenta, nestes termos edificantes, a redução dos subsídios a
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conceder à ANOP: «Foi decidido atribuir um montante de subsídio à ANOP que não permitirá, dentro das condições que ela tem hoje, continuar a desenvolver a sua actividade. Isto significa que o Governo, dentro de uma linguagem de clareza, tirou dai as suas conclusões».
A confissão é transparente; mas se é este o entendimento que o Sr. Secretário de Estado tem de uma linguagem clara, compreende-se agora que com frequência use um dialecto em que a verdade e a mentira parecem ser para ele sinónimos.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É a incompetência.
O Orador: - Neste caso, aliás, não se tratava apenas de acelerar a ruptura financeira da ANOP; tratava-se igualmente de libertar verbas necessárias ao apoio da nova agência. De uma machadada matavam-se 2 coelhos.
Depois de ter carreado uma a uma as pedras tidas como necessárias para justificar o encerramento da ANOP, acelerando voluntariamente a degradação económica e financeira da empresa, os argumentos parecem fáceis ao Governo.
Diz-nos ele que o quadro do pessoal é manifestamente empolado, logo se acrescentando que a capitação dos encargos com o pessoal se eleva a valores incomportáveis (Resolução de 29 de Julho).
Só se não diz ë que o quadro do pessoal (agora considerado excessivo e com repercussões negativas na viabilidade económica da empresa) foi aprovado na vigência do VII Governo, governo AD, presidido pelo actual Primeiro-Ministro, Dr. Francisco Pinto Balsemão, por despacho do Dr. Luís Fontoura, Secretário de Estado.
Só se não diz que dos 261 trabalhadores recenseados e considerados agora como excessivos, 55 foram admitidos na vigência dos governos AD.
Só se não diz que em Setembro de 1982 (quando o quadro da ANOP era já o que hoje se considera empolado e incompatível) o Sr. Secretário de Estado José Alfaia anunciava, como uma das medidas que se propunha tomar de imediato, nada mais nada menos que o «alargamento dos quadros da ANOP»!! Era, muito provavelmente, a habitual clareza do Sr. Secretário de Estado.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É a incompetência!
O Orador: - No entanto, se com o quadro actual, aprovado pelo governo AD, os encargos com o pessoal atingem valores ditos incomportáveis, qual é a solução avançada?
Encerrar a ANOP e subsidiar uma nova agência noticiosa com verbas que atingirão nos 2 próximos anos 320000 contos, o que significa a atribuição de um subsidio de 1300 contos por trabalhador - se admitirmos que a nova empresa verá nessa base a garantir 123 postos de trabalho, como tem sido afirmado mas é altamente duvidoso- contra os 1044 contos por trabalhador, correspondentes à verba de 250000 contos considerada minimamente necessária no corrente pelo conselho de gerência da ANOP e aos 261 postos de trabalho aí existentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao mesmo tempo que se acelerava a degradação económica e financeira da ANOP o Governo ia montando a operação Porpress, hoje «Noticias de Portugal» - peça chave no processo de encerramento da ANOP.
Assim: contemporaneamente com a decisão do Governo de reduzir o subsídio previsto para a ANOP (o que permitia libertar verbas para apoio a nova agência), ao mesmo tempo que são atribuídos ao Secretario de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro com o pelouro da Comunicação Social e ao Secretário de Estado do Orçamento «poderes bastantes para procederem às diligências relacionadas com a eventual contratação da prestação de serviços noticiosos» é preparado o contrato-promessa de constituição de cooperativa «tendo por objecto principal a difusão pela imagem, pelo som ou pela imprensa de noticias e informações.»
Enquanto a 19 de Agosto, o Governo aprova o decreto--lei de extinção da ANOP, a 25 de Agosto, é anunciada a escritura de constituição da «NP -Notícias de Portugal».
A10 de Setembro é aprovada a portaria que autoriza o Governo a celebrar o contrato com a NP. A 29 do mesmo mês é anunciado o respectivo contrato.
A sabotagem económica e a asfixia financeira da ANOP pelo Governo iam de par com a criação da agência «Notícias de Portugal».
Com a assinatura do contrato entre o Governo e a NP, consumava-se mais uma das etapas do processo desencadeado pelo Governo, não obstante a permanência legal da ANOP dada a não promulgação do decreto-lei que determinava o seu encerramento.
Consumava-se mais uma etapa no desrespeito de todos os imperativos legais e dos mais elementares imperativos éticos. No desrespeito de todos os imperativos legais, porque a contratação de serviços de valor superior a 1000 contos tem, por força do Decreto-Lei n.º 211/79, de 12 de Julho, que ser obrigatoriamente submetida a concurso público e a portaria que autorizou a celebração do contrato com a NP (no montante de 320000 contos), é omissa quanto ao cumprimento dos requisitos necessários para que eventualmente tal concurso público pudesse ter sido dispensado.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Deve ter sido esquecimento!
O Orador: - No desrespeito dos mais elementares princípios éticos, porque dificilmente com eles se compadece a outorga pelo Estado de um subsidio de 320000 contos, sem concurso, a uma empresa em que é parte interessada o Sr. Primeiro-Ministro, por via do jornal Expresso de que é proprietário.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas há mais, Sr. Presidente, Srs. Deputados. É que no dia 2 de Setembro o Governo aprova o Decreto-Lei n.º 412/82, que no seu artigo 3.º expressamente veda aos serviços, independentemente do seu regime jurídico, relegarem para orçamento do próximo ano quaisquer encargos que venham a assumir a partir da entrada em vigor do referido diploma.
No entanto, o Governo, 8 dias depois, aprova igualmente uma portaria que implica compromissos financeiros para os anos de 1983 e 1984 - a portaria que autoriza o contrato com a «Noticias de Portugal».
É verdade que o decreto foi aprovado em 2 de Setembro. No entanto, só vem a ser publicado a 7 de Outubro,
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o que legalmente coloca o contrato Governo/NP ao abrigo do que nele se dispõe. Eticamente é mais uma entorse a juntar às muitas que assinalam o caminho percorrido pelo Governo em todo o processo ANOP.
Mais uma entorse a que quase imediatamente se soma uma outra, se não à lei pelo menos aos princípios de dignidade, de transparência de métodos e de clareza de atitudes que deveriam nortear a acção de qualquer governo que se respeite e respeite aqueles que pretende governar.
Decidida a extinção da ANOP, enviado para promulgação o respectivo decreto, o Governo que nestas coisas gosta de jogar pelo seguro, não vá o diabo tecê-las - e o diabo aqui chama-se General Ramalho Eanes, Presidente da República- enceta, através do conselho da gerência, um processo de despedimento colectivo com base na necessidade de reestruturação e viabilização da empresa - empresa essa que o Governo decidira extinguir - e invocando a necessidade de impedir que fossem postos em causa todos os postos de trabalho, quando o Governo ao extinguir a empresa-tinha exactamente posto em causa a totalidade dos postos de trabalho.
Aplausos da UEDS, do PS. do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os métodos do Governo são os que aqui ficaram enumerados quase exaustivamente e digo quase porque seria tarefa ciclópica coleccionar todas as contradições, todos os estratagemas, todas as infracções à legalidade democrática que o Governo foi acumulando ao longo deste processo.
Os seus argumentos quanto a inviabilidade económica e financeira valem o que valem, isto é, zero. Valem zero porque se não sustentam em qualquer estudo de viabilidade, coisa que o Governo inexplicavelmente (ou talvez não) sempre se recusou promover.
Valem zero e nada demonstram a não ser que em matéria de fazer o mal e a caramunha o Governo se comporta como delinquente habitual.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Muito bem!
O Orador: - Mas os argumentos do Governo não se limitam aos aspectos económicos e financeiros. Seria injusto esquecê-lo e eu não o quero esquecer.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - O VIII Governo ao fim de 1 ano de actividade e o Dr. Francisco Pinto Balsemão ao cabo de 2 anos de exercício do cargo descobriram que a Agência Noticiosa que, perante esta Assembleia, se comprometeram a apoiar financeiramente e cujo espaço noticioso se comprometeram a alargar era afinal porque «criada em 1975 na dependência do Governo» um «factor de distorsão no domínio da liberdade de informação». Assim reza o comunicado do Conselho de Ministros de 29 de Julho.
É caso para dizer, Srs. Deputados, «cruzes, canhoto», ao que a ingenuidade do Primeiro-Ministro e do Governo iam conduzindo: ao apoio financeiro e ao alargamento do espaço noticioso de uma agência produto acabado do «gonçalvismo»!
Mas porquê tanto tempo para entenderem o que hoje proclamam como evidência que não carece de demonstração?
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - São muito competentes!
O Orador: - É que em matéria de «gonçalvismo e de gonçalvistas» todo o cuidado é pouco e as surpresas são muitas.
Não é verdade que até o Sr. Ministro para os Assuntos Parlamentares afirmava em Janeiro que extinguir a ANOP - essa intolerável reminiscência do gonçalvismo- seria uma estupidez e que o Sr. Valy Mamede - militante tão declarado do PSD que lhe coubera a ingrata tarefa de gerir a ANOP por decisão, obviamente indeclinável, do governo do Dr. Pinto Balsemão -, afirmava (pasme-se até onde pode ir o poder de persuasão dos gonçalvistas, comunistas, socialistas e quejandos) que «o encerramento da ANOP ou a sua reprivatização seriam o maior golpe aos ideais do 25 de Abril» ?
Risos da UEDS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se não fosse demasiado grave tudo isto daria vontade de rir. No entanto, porque é demasiado grave façamos mais um esforço por levar a sério esta argumentação e este Governo.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - É um bocado difícil!
O Orador: - Diz o Governo que o estatuto jurídico da ANOP (empresa pública) revela-se inadequado à prossecução do seu objectivo, já que: coloca a agência na dependência directa do Governo: impede a indispensável participação directa e activa dos utentes na sua actividade; obriga-a a adoptar uma estrutura orgânica e funcional que lhe não é específica.
Tais são os argumentos que no domínio político o Governo vem brandir para justificar o encerramento da ANOP.
Para o Governo o estatuto de empresa pública é incompatível com a isenção e o pluralismo que exigem uma efectiva independência de poder executivo e é incorrecto à luz dos princípios que devem reger uma agência noticiosa de um país da Europa democrática. Já cá faltava a Europa democrática!
Mas então, Sr. Ministro, os estatutos das empresas públicas Rádio e Televisão são no entender do Governo incompatíveis com aquelas regras, incompatíveis com a isenção e o pluralismo? Se em seu entender o são, tenciona o Governo reprivatizá-las!
Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo: Porque insiste o Governo em fingir ingenuamente que confunde empresa pública com empresa governamental? Ou será que habituado a gerir o país como se de coisa sua se tratasse o Governo considera naturalmente como coisa sua as empresas públicas?
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - As empresas públicas, Srs. Ministros, Srs. Membros do Governo, existem para servir a colectividade e não o Governo. A obrigação deste é velar e providenciar para que elas prestem um tal serviço e não servir-se delas. Um Governo incapaz de o entender e incapaz de nesse quadro agir é um Governo incompatível com as regras que regem os países da Europa
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democrática, para usarmos o argumento que lhe é tão caro.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas se o estatuto de empresa pública retira a necessária independência à agência noticiosa, que independência tem uma agência privada que necessita dos subsídios estatais para sobreviver e em relação ao qual o Governo dispõe, por isso mesmo, do mais poderoso meio de controle e de persuasão?
Que garantias de isenção dá essa agência subtraída que fica, ao contrário da ANOP, ao controle da Assembleia da República?
Ao longo do debate teremos certamente ocasião de retornar a estes aspectos. Por agora apenas duas interrogações: Porque razão o estatuto de empresa pública impede que se encontre uma fórmula que, sem pôr em causa esse estatuto, permita uma participação dos utentes na fiscalização do cumprimento das suas obrigações fundamentais? Porque razão o estatuto de empresa pública obrigaria a agência a uma estrutura orgânica e funcional que lhe não é especifica?
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - É melhor não perguntar.
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vivemos hoje uma situação que se pode resumir nestes termos: O encerramento da agência ANOP foi inviabilizado, ao menos no curto prazo, pelo veto presidencial; a empresa encontra-se à beira de falência técnica por falta de verbas; as agências internacionais rescindiram os contratos que com ela mantinham; os jornalistas não dispõem de meios que lhes permitam exercer as suas actividades.
Aproximam-se as eleições autárquicas e a ANOP encontra-se incapacitada de fazer a sua cobertura. A nova agência não dispõe de meios que lhe permitam substituir a ANOP nessa tarefa. Perante isto, que atitude, que medidas se propõe tomar o Governo?
Vai prosseguir na sua política de facto consumado e promover a extinção de facto da ANOP, já que de direito o não pode fazer? Aqui fica a pergunta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O quadro que aqui deixamos traçado da actuação do Governo em relação à ANOP, dá-nos o direito, a nós e a esta Assembleia de esperar do Governo uma explicação clara, sem subterfúgios, meias verdades ou mentiras inteiras.
Vozes da UEDS e do PS- - Muito bem!
O Orador: - Duvidamos que a possa dar, do mesmo modo que a experiência nos faz duvidar que não a dando sejam ainda capazes, o Governo e Secretário de Estado para a Comunicação Social, daquele gesto a que um mínimo do respeito por si próprios e pelas funções que exercem os deveria obrigar, isto é, serem capazes, numa palavra, de se demitir.
A ver vamos, Sr. Presidente, Srs. Deputados!
Aplausos da UEDS, do PS, do PC P. da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na Tribuna deste Hemiciclo os membros da Comissão das Relações com os Parlamentos Nacionais e o Público, da
Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, que têm uma reunião em Lisboa, no nosso Parlamento. Em nome desta Assembleia, gostaria de apresentar os cumprimentos a tão ilustres parlamentares representantes das democracias da Europa.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PCP, do PPM, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra, mas entendo que, dentro das regras deste debate, não cabem, em princípio - a não ser que haja razões absolutamente excepcionais -, quaisquer intervenções na sequência das apresentações, quer do partido interpelante, quer relativamente à resposta do Governo. O debate propriamente dito iniciar-se-á após estas intervenções. Assim, se o Sr. Deputado estiver de acordo, fará a sua intervenção depois.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Vamos lá a ver!
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Só queremos a verdade!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (José Alfaia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É-me sumamente grato intervir perante o nosso Parlamento no debate que agora se inicia, porque isso é sinal inequívoco da força da nossa Democracia, que a todos cabe respeitar e defender.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM. Protestos do PCP e da UEDS.
À Assembleia da República - o órgão de soberania mais representativo da Nação, pois o que melhor reflecte as suas correntes de opinião - são devidos todos os esclarecimentos.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - É pena que nunca os tenha dado!
O Orador: - E prestá-los de forma clara e exaustiva é imperativo para quem elegeu como conduta governativa a firmeza e a transparência de processos.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Essa é boa!
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Fora!
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Que despudor!
O Orador: - Dessa forma os prestaremos.
Ponderaremos objectivamente todas as críticas das oposições, mas com franqueza devo dizer que, à partida, nos interessarão mais as vindas da oposição democrática.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Qual é que não é democrática?
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Cala a boca!
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O Orador: - Esta, porque o é, mais facilmente poderá contribuir para o enriquecimento e o melhoramento de um sistema duradouro de comunicação social no nosso País, do que a oposição comunista, para quem -e já o mostrou à saciedade, mesmo entre nós - a liberdade de informação e o próprio regime democrático em geral são apenas um estádio, uma mera passagem na sua idealizada trajectória de conquista de um poder totalitário.
Vozes do CDS e de alguns Si». Deputados do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos de Brito (PCP): - Conta lá quem è que está a meter ao bolso!
O Orador: - Mas a ponderação objectiva das criticas das oposições, o respeito que ao Governo merecem os suportes eleitorais dos seus opositores, nunca o farão abdicar, todavia, das suas concepções próprias e das acções adequadas à sua efectivação.
O Governo tem também o seu suporte eleitoral, de igual valimento e mais numeroso. Foi mandatado para governar de acordo com os seus próprios princípios e critérios e seria desvirtuar grosseiramente o sentido do voto popular,...
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não cumpriu!
O Orador: - ..., seria desvirtuar grosseiramente regras básicas da Democracia se governasse de acordo com princípios e critérios alheios.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Parece que o CDS não está de acordo!...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - lá perguntou ao CDS?!
O Orador: - Entre os democratas são sempre desejáveis e muitas vezes possíveis os mais alargados consensos, mas sempre que estes se não possam verificar, o Governo tem de agir dentro dos seus próprios princípios e de acordo com os seus próprios cânones. E no termo do seu mandato, em 1984 - porque, como disse a mais representativa personalidade da oposição, quem ganhasse as eleições iria governar o povo português, o único juiz, o julgará.
O Sr. SUva Marques (PSD): - Muito bem! O Sr. Mário Tomé (UDP): - Banalidades!...
O Orador: - Não será ousado prever que nesta interpelação vão incidir já as paixões características do período eleitoral que se avizinha. É um período de eleições...
Protestos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e da UDP.
... autárquicas, marcadas por um cunho muito específico; mas no universo político português e despontaram afirmações que revelam pretender-se delas extrair conclusões abusivas. Estamos conscientes desse facto e o povo português também. Por isso confiamos em que o povo vai discernir entre o que é pertinente a este debate e o que lhe vai ser espuriamente enxertado.
Vozes do PPM: - Muito bem!
Todavia, uma coisa será certa: colaboraremos para que ele decorra de forma elevada,...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Já o baixaste!
O Orador: - ..., única forma condizente com o prestigio da instituição parlamentar e o modo adequado de todos nós contrariarmos os que, pretendendo denegri-la, revelam má conformação com um regime de Liberdade.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Estamos à espera!
O Orador: - Postas estas considerações preliminares, entremos directamente no objecto da interpelação.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É melhor!
O Orador: - Estamos certos de que todos connosco comungarão no reconhecimento do papel relevante que a comunicação social desempenha no esclarecimento colectivo, dos direitos e obrigações, no qual assenta e se move a nossa Comunidade, no relato das frustrações e sucessos em que se esgota o presente e enriquece a História e na análise das oportunidades e dificuldades sobre as quais se constrói o futuro.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Palavras!...
O Orador: - Por assim ser, quanto mais dinâmica e criativa for a comunicação social, maior será a capacidade da nossa sociedade democrática para autogerar respostas renovadas e colectivamente assumidas na resolução dos múltiplos conflitos de interesses e perspectivas em que se equacionam os destinos do País. Mas para que esta seja dinâmica e criativa, é necessário garantir-lhe condições de liberdade e modernidade que são neste domínio, os 2 grandes propósitos do Governo, aliás claramente enunciados no seu programa.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vê-se! Vê-se!...
O Orador: - Deste modo, as grandes linhas de acção do Governo na área da comunicação social, por não publicamente afirmadas, têm sido: primeiro, adoptar medidas estruturais, promover alterações institucionais e criar condições de funcionamento ao sector que consolidam a sua independência em relação ao poder político,
Protestos do PS. do PCP. da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
..., sem, contudo, o subordinar ao poder económico, que garantam o justo equilíbrio de complementaridade e sucedaneidade no seu desenvolvimento tridimensional e que o aproximem do modelo consagrado no conjunto dos países da Europa democrática; segundo, alargar o acesso à informação a um universo tão amplo quanto possível de portugueses, aquém e além fronteiras, e ao dilatado espaço da língua portuguesa; terceiro, favorecer a criação de condições para que todos e cada um dos portugueses se possam encontrar e identificar no pluralismo da comunicação social; quarto, conjugar estas grandes linhas de acção com o rigor, a racionalidade e a
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eficácia que ao Governo são exigidos na aplicação dos dinheiros públicos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Nem fale nisso!
O Orador: - Só neste entendimento tem sentido julgar a acção do Governo e apreciar os resultados já obtidos.
A extinção da Secretaria de Estado da Comunicação Social e a criação...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Falemos da ANOP!
O Orador: - ... da Direcção-Geral da Comunicação Social -que passou a integrar, além dos serviços da anterior Direcção-Geral da Informação, todos os outros até agora directamente dependentes e orientados pelo membro do Governo com a sua tutela -virá objectiva e indubitavelmente limitar o espaço de intervenção directa deste membro do Governo. Permitirá, assim, uma dinâmica de desgovernamentalização da intervenção do Estado no sector, que passará a sediar-se a um nível essencialmente administrativo. E pela primeira vez, também foi feita a definição clara dos termos dessa intervenção e foram criadas condições para a sua execução de modo estável e integrado.
No que diz respeito aos meios audio-visuais, o Governo reconhece as virtualidades da iniciativa privada e o tradicional papel da Igreja nesta área.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - É só virtudes!
O Orador: - E reconhece igualmente a conveniência da presença do sector público, pelo que já definiu claramente os seus vectores de desenvolvimento. Assim, foram concluídos e têm vindo a ser executados os acordos de saneamento económico-financeiros da RTP e RDP, acordos que não se limitaram a estabelecer as medidas tendentes aos equilibrios patrimoniais e de gestão indispensáveis à sua autonomia, pois integraram, ainda, planos de investimento orientados para a expansão das respectivas áreas de cobertura, para a modernização tecnológica, para a melhoria do serviço público que prestam e para a projecção do nosso País além fronteiras. Contrastando com o imobilismo que caracterizou a segunda metade da década de 70, são já visíveis e sentidos pela população os resultados da execução dos planos definidos no período da nossa gestão.
Quanto à imprensa, tem vindo a ser igualmente definida, em termos claros e inequívocos, a filosofia política do Governo que defende a prevalência do sector privado, reconhecendo, embora, a necessidade de, no presente, preservar o equilíbrio atingido através da manutenção do sector público, pelas razões que adiante exporei.
De imediato apenas referirei que mantendo o subsidio ao papel e porte-pago - que abrangem tanto a imprensa de expansão nacional como a regional - atribuídos em estreito entendimento com as respectivas associações; acolhendo e estimulando a cooperação entre empresas, com vista ao racional funcionamento do sector, como já foi o caso da criação de uma distribuidora nacional; tendo prorrogado até fins de 1981 os prazos concedidos às empresas privadas do sector, de modo a permitir-lhes encontrar e negociar soluções que evitassem a precipitação de situações de ruptura, o Governo regista que, hoje, a imprensa privada cobre o vasto leque de opiniões que vão da extrema esquerda à extrema direita e que vem afirmando a sua posição no mercado nacional, face ao conjunto da imprensa estatizada ou participada pelo Estado, surgida no período pré-constitucional.
Sendo a filosofia política do Governo no sentido da prevalência do sector privado, que razões têm pesado para o Governo continuar a manter um sector público jornalístico? É que as empresas públicas jornalísticas existentes têm publicações que se contam entre as de maiores vendas no País. São publicações cujos títulos têm grandes tradições na sociedade portuguesa, beneficiando na sua difusão de enraizados hábitos de leitores. Assim, a sua precipitada reprivatização seria motivo de perturbação e poderia redundar no indesejável privilégio para uma qualquer corrente de opinião.
É por isto e pela necessidade de preservar o património que as empresas públicas jornalísticas representam que o Governo se não furtou a apoiar a indispensável renovação dos respectivos parques gráficos, facto sem precedentes, e a adopção de medidas visando garantir a racionalização e rentabilidade das suas explorações.
Mas se as razões que acabo de expor justificam, no da imprensa estatizada, a excepção à filosofia política que inspira o Governo, filosofia política que é genuinamente democrática, que tem consagração nos países democráticos e que, naturalmente, é repudiada por todos os regimes ditatoriais - sejam comunistas, terceiro mundistas, ou outros - a manutenção da agência noticiosa estatal ANOP, seria flagrante contradição, pelo que a seguir se expõe. Na verdade, a ANOP seleccionava e veiculava mais de 60% da informação divulgada pelos órgãos de comunicação social, determinando, pois, parte muito significativa do conteúdo do fluxo informativo global. Estes números, só por si, seriam suficientes para justificar, no caso da agência noticiosa, mais do que em qualquer outro, que ela não estivesse integrada no sector público, pois não se confundam as virtualidades de uma independência de facto, com a precariedade de uma independência formal que outros poderiam vir a infringir.
Acresce que a subsistência da ANOP - uma subsistência mal sã frustrou desde 1974 iniciativas de base cooperativa da esmagadora maioria dos seus utentes, solução esta, aliás, dominante nas sociedades que cultivam o principio da liberdade de informação.
Assim, não havendo razões decisivas para temporariamente se aceitar entorse aos princípios, a acção do Governo para ser coerente teria de ser a que foi - a de decretar a sua extinção.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Quer dizer que o programa é incoerente?
O Orador: - Esta a razão remota ...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - E a próxima?
O Orador: - ... da decisão tomada, a de concepção democrática da informação num Estado democrático.
Com razão próxima, outra se impôs no mesmo sentido.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - A saber:...
O Orador: - É que a ANOP, marcada desde a sua génese, em 1975, por vícios estruturais insanáveis, onerava desmedidamente, atenta a sua dimensão, o contribuinte português.
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O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não é isso o que diz o programa do Governo!...
O Orador: - Casavam-se, assim, a coerência com os princípios e a gestão saudável dos dinheiros públicos que, em última análise são dinheiros do cidadão contribuinte.
Vozes do PCP: - Poise!..., poise!...
O Orador: - A extinção da ANOP e a contrapartida dos compromissos exigidos à empresa cooperativa que vai responder às necessidades nacionais neste domínio, claramente definidos no Programa do Governo,...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A sua empresa!
O Orador: - ..., fazem economizar ao erário mais de 100 000 contos anuais...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - É falso!
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Prove!
O Orador: - ... o que, se em termos absolutos não é muito, é bastante em termos relativos, pois equivale a cerca de metade do que custaria a manutenção daquela agência noticiosa, a cinquenta por cento do montante de subsídio ao papel atribuído à imprensa portuguesa e à totalidade dos encargos com o porte pago para os jornais regionais e de expansão nacional.
Num período de crise económica,...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Lá vem ela...!
O Orador: - .... em que se impõe ao Governo administrar com muito rigor o património nacional, não podia nem poderei deixar de harmonizar a minha conduta nesta matéria com as exigências globais pois, não podia nem poderei deixar de dar resposta adequada às dificuldades que uns criaram e que outros não souberam ou não puderam resolver. Esta, como disse, a razão próxima uma razão de natureza económico-financeira que fundamentou a decisão da extinção da ANOP.
Certamente que os que têm do Estado uma concepção totalitária gritam contra a medida tomada. É lógico!
Vozes do PS e do PCP: - Oh!...
O Orador: - Certamente que os que são avessos à iniciativa privada e mesmo à iniciativa cooperativa e estão possuídos de um preconceito favorável à estruturação estatal da economia, embora o encubram, tudo têm feito para contrariar tal medida.
Vozes do PS e do PCP: - Oh!...
O Orador: - Certamente que os que esgotam as suas capacidades no puro jogo político e no labirinto político se estiolam, podem ter dificuldades em a entender, pois esquecem o lado económico da gestão das sociedades humanas, o quotidiano do homem, as suas canseiras, a dureza do sua vida.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Estás muito cansado! É um cansaço permanente!
O Orador: - Mas um Governo sério, que tem a responsabilidade das decisões sérias, não pode abandonar-se à facilidade das soluções nem pode vacilar na adopção dos comportamentos que, na sua perspectiva, são os únicos conducentes à recuperação da saúde de situações enfermas. Mas, por isso mesmo, e em contrapartida, tal Governo pode e deve denunciar à opinião pública a contradição de todos aqueles que, responsabilizando-o falsamente pelas dificuldades económicas que atravessamos, o atacam igualmente quando ele adopta as medidas adequadas a fazer-lhes face.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Vejam lá! Que ingratos!
O Orador: - É neste círculo vicioso que muitos desejam apertar o Governo, mas que ele com clarividência, com tenacidade e com a força da sua legitimidade democrática...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Não tem nenhuma!
O Orador: - ... vai quebrando. Deste modo, o Governo impedirá que a agitação se alimente de situações por si mesma criadas e por si mesma denodadamente defendidas.
Um aspecto houve contudo, quanto à extinção da ANOP, que nos foi particularmente doloroso enfrentar.
Protestos do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
E que nos teria feito retroceder se não estivéssemos profundamente convencidos de que trilhávamos o caminho certo.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Onde é que doeu?
O Orador: - Esse aspecto foi o da situação em que eram lançados os que a essa agência noticiosa estavam ligados por vínculo laborai.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Foi por isso que recebeu os trabalhadores?
O Orador: - Compreendemos e aplaudimos os impulsos de generosidade,...
O Sr. Mário Tomé (UDP): - São alheios a esses sentimentos!
O Orador: - ..., de fraternidade humana, de respeito para com os trabalhadores, valores com sentido, em si mesmos, para os democratas de todas as bancadas.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Todas não! O senhor não!
O Orador: - Mas, se este preito de justiça é devido, creio também que não será difícil aceitarem e reconhecerem que este Governo tem sempre presente tais valores nas suas decisões. Por isso, e também na área da comunicação social, foram e são os Governos da Aliança Democrática que decidiram vincular o Estado e afectar os meios necessários ao pagamento de indemnizações que se estão processando a largas centenas...
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O Sr. Mário Tomé (UDP): - São para os capitalistas!
O Orador: - ... de trabalhadores despedidos em 1979 do sector público da imprensa por Decreto-Lei do V Governo Constitucional presidido pela Sr.1 Engenheira Maria de Lurdes Pintassilgo.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Além de termos assegurado um estatuto laborai estável a várias dezenas de trabalhadores, empregados precariamente na extinta Secretaria de Estado da Comunicação Social.
Para construirmos o futuro temos de ser realistas no presente. Temos de ser honestos e corajosos:...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Honestos, sobretudo!
O Orador: - ... o problema do desemprego não pode resolver-se pelo subemprego ou pela ruína das empresas. Só espíritos demasiado simplistas o podem preconizar.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - É, despede para depois empregar!
O Orador: - O desemprego só pode combater-se pela criação de condições político-sociais que favoreçam o investimento produtivo, só pode combater-se pelo investimento produtivo que, alargando os postos de trabalho, possibilita a absorção dos desempregados.
Protestos da UDP.
Dizer-se o contrário é uma mistificação, é uma mentira que só serve para obscurecer uma realidade que importa trazer à luz do dia para que todos, com a perfeita consciência da mesma, compreendam o acerto da solução que seguimos.
Manter a ANOP só para ela sustentar um subemprego era onerar o tesouro público, melhor, o contribuinte português, com o pagamento de elevados encargos de pessoal em activos subempregues, encargos muito superiores aos atribuídos aos beneficiários do subsídio de desemprego. Era, assim, contribuir para manter flagrante injustiça social, contribuir para não clarificar uma situação que importava desnudar, era, enfim, pactuar com uma situação viciada e mal sã. Aliás, devo acrescentar que, a argumentar-se com o desemprego em que podem ser lançados os trabalhadores da ANOP pela sua extinção, é ignorar a realidade do sector, a sua grande mobilidade laborai, a sua aptidão de auto-renovação, é ignorar a capacidade demonstrada por este na absorção do acentuado crescimento registado pela classe jornalística que quadriplicou nos últimos 8 anos. Mas o Governo não o ignora. E os primeiros resultados estão à vista.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Ai estão, estão!
O Orador: - Se os que nos atacam não têm outros argumentos do que aqueles que têm sido expendidos, que continuem a atacar-nos; mas fiquem com a certeza de que nos não demoverão, apesar das obstruções e dificuldades levantadas, do propósito e do esforço sério de recuperar o País, nem de o dotar de estruturas que garantam e consolidem a liberdade e a independência da imprensa em Portugal, que assegurem aos profissionais da informação total distanciamento em relação a centros ou interesses exógenos à missão que exercem, condição necessária para que se garanta e consolide a democracia e liberdade dos portugueses.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM. Protestos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, durante a intervenção do Sr. Secretário de Estado vários Srs. Deputados pediram a palavra. Recordava, porém, que, na sequência de idêntico pedido de palavra do Sr. Deputado Silva Marques, entendo haver três momentos claramente distintos nesta interpelação: o da apresentação, com uma intervenção de 30 minutos por parte do partido que requereu a interpelação e outros 30 minutos por parte do Governo; o debate; e, finalmente, o encerramento. A minha interpretação é no sentido de que durante a apresentação e o encerramento não há lugar para pedidos de palavra.
Segue-se, assim, à fase de apresentação o período de debate, no qual estão fixados os tempos de que cada partido dispõe, sendo evidente que cada partido tem tempo disponível apenas durante o debate.
Na apresentação estão previstos 30 minutos para o partido apresentante que estão já esgotados. Aliás, devo dizer que foram ultrapassados, sendo esse tempo descontado no tempo de debate, pois é essa a forma mais correcta de não prejudicar nem o debate nem o partido apresentante. Também o Governo dispunha de 30 minutos, não tendo, porém, esgotado esse tempo, que não será, contudo, somado ao tempo de debate, segundo a minha interpretação.
Assim, vamos agora entrar no debate, pelo que vou dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos.
É esta a decisão da Mesa. Se algum dos Srs. Deputados pretende recorrer dela, faça favor.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, pretendo apresentar recurso dessa decisão. A interpretação da Mesa conduziria a que nunca se pudesse pedir esclarecimentos ao Governo, visto ele iniciar e encerrar o debate.
Vozes da UEDS - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Não é exacto, Sr. Deputado. O esquema do debate foi organizado em Conferência dos Presidentes dos Grupos Parlamentares e por alguma razão se distinguem a apresentação, o encerramento e o debate. Só neste último è que os partidos dispõem de tempo, não podendo assim, pedir a palavra fora desse período.
De qualquer modo, considero interposto o recurso.
Algum Sr. Deputado pretende usar da palavra antes de posto o recurso à votação? Naturalmente que o objectivo será ou para interpelar a Mesa, ou para levantar qualquer questão diferente da do Sr. Deputado Magalhães Mota.
Pausa.
Faça favor, Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a interrupção da sessão por 15 minutos.
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Protestos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ë regimental. Está suspensa a sessão por 15 minutos.
Eram 11 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 12 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Recapitulando a situação existente antes da interrupção, a Mesa entende que no período de apresentação não há lugar senão para a intervenção do partido interpelante e para a resposta do Governo, devendo verificar-se as intervenções dos Srs. Deputados apenas durante o período do debate. Da mesma maneira, no período de encerramento haverá 30 minutos para o partido interpelante e outros 30 minutos para o Governo. As intervenções dos Srs. Deputados devem, pois, fazer-se no período destinado ao debate.
A Mesa estava para declarar encerrado o período de apresentação e iniciar o período do debate quando o Sr. Deputado Magalhães Mota se propunha usar da palavra, ainda no período de apresentação.
Se, porventura, esta minha descrição não corresponde inteiramente à verdade, penso que o problema poderá ser resolvido se o Sr. Deputado Magalhães Mota concordar em que eu declare aberto o debate, depois, evidentemente, podem ser feitas todas as inscrições e, dentro deste regime especial, cada Sr. Deputado pode usar da palavra para os efeitos que entender por convenientes.
A Mesa informa que estão inscritos para o debate os Srs. Deputados Arons de Carvalho, Jorge Lemos, o Sr. Ministro Marcelo Rebelo de Sousa e, ainda, o Sr. Deputado António Taborda.
Há, ainda, outros Srs. Deputados que pediram a palavra durante as intervenções, quer do Sr. Deputado Lopes Cardoso, como é o caso do Sr. Deputado Silva Marques, quer do Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, como é o caso dos Srs. Deputados Lopes Cardoso, Jorge Miranda, Jorge Lemos, Magalhães Mota, José Niza e Mário Tomé.
Pausa.
Sr. Deputado Magalhães Mota, mantém o seu recurso da deliberação da Mesa?
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sim. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: explicada a situação, vamos passar à votação do recurso apresentado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, no sentido de serem admitidas intervenções durante o período de apresentação e, ainda, antes da abertura do debate relativas à intervenção quer - penso que é assim - do Sr. Deputado Lopes Cardoso quer à intervenção do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Dá-me licença, Srs. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado quer esclarecer algum ponto?
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, pretendo apenas dizer que entendo que as intervenções para pedir esclarecimentos iniciam o debate, dando, desde logo, inicio ao mesmo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, se assim é, estamos todos de acordo com o Sr. Deputado. A Mesa só não pode dar a palavra aos Srs. Deputados antes de aberto o debate, o que ainda se não verificou.
Quanto à posição do Sr. Deputado, há apenas um problema, que é o seguinte: evidentemente que a Mesa tem de respeitar a ordem das inscrições e não poderá fazer de outra maneira, a menos que os interessados estejam de acordo.
Se assim for, posso, de qualquer maneira, dar o debate por aberto e perguntar aos Srs. Deputados Arons de Carvalho e Jorge Lemos, ao Sr. Ministro Marcelo Rebelo de Sousa e, ainda, ao Sr. Deputado António Taborda, se aceitam que os Srs. Deputados inscritos em relação às intervenções já feitas os Srs. Deputados Silva Marques, Lopes Cardoso, Jorge Miranda, Jorge Lemos, Magalhães Mota, José Niza e Mário Tomé - façam, de imediato, as suas intervenções.
Pausa.
Interpreto o silêncio dos Srs. Deputados como anuência a esta alteração da ordem das inscrições e, nesses termos, dou a palavra ao Sr. Deputado Silva Marques, se ainda pretender usar dela.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Pretendo sim, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O interpelante, Sr. Deputado Lopes Cardoso e o seu grupo parlamentar, a UEDS, levam-nos à conclusão de que têm mais olhos que barriga. Isto porque, efectivamente, a interpelação diz respeito a um debate de política geral centrado na política de informação e comunicação social e o Sr. Deputado Lopes Cardoso praticamente não abordou este tema, espraiando-se quase exclusivamente sobre o dossier ANOP.
E, sem lhe negar o direito de o fazer, antes pelo contrário - não só tem o direito como, até, a obrigação de o fazer -, a verdade é que, em rigor, ele próprio não abordou o tema da sua interpelação.
E, na medida em que o abordou, fê-lo de forma a inquinar a própria interpelação ou o seu próprio alcance. Isto é, pareceu-me - e creio que não estou a fazer exagerado esforço - que o Sr. Deputado quis identificar objectivos programáticos no domínio da comunicação social com uma questão parcelar que é a da propriedade dos meios de comunicação social.
Se estamos de acordo quanto aos objectivos - a saber, objectividade, independência, pluralismo, valorização da cultura portuguesa, presença da cultura portuguesa e do País no mundo (e julgo que são também estes os objectivos do interpelante) - pergunto se o único caminho para os obter é o da propriedade pública dos meios de comunicação social, como me pareceu depreender da filosofia política do Sr. Deputado?
Ora, se assim é, devo dizer que nós, efectivamente, não temos essa filosofia política. E, não somos só nós, pois creio que esse é, neste momento, um dado assento e pacífico por esta Europa fora, ou por esse mundo democrático fora.
Relativamente a essa Europa fora, ou esse mundo fora
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não democrático, efectivamente, a ideia é contrária - a objectividade, a independência e o pluralismo asseguram-se através do Estado, e se possível, através do partido único. Mas nós, democratas, sabemos perfeitamente que esse meio ê o contrário do fim pretendido e que aqui não há possibilidade de separar o fim do meio.
E se a nossa finalidade é a objectividade, independência e pluralismo, o meio que nós preconizamos é diverso e em função das circunstâncias mas com uma certeza: a de que qualquer monopólio ou qualquer presença excessiva do Estado nesta matéria, em vez de contribuir para esse objectivo, prejudica-o.
Devo constatar -e calculo que ninguém me negará esse direito- que no campo democrático, quer da Europa quer do mundo, é precisamente em sentido contrário que se rema. É no sentido de se ter chegado à conclusão - aliás, por experiências feitas e não, apenas, em contraposição com o péssimo exemplo do mundo não democrático- de que o Estado hoje, e disso não há a menor dúvida, não é a garantia última da independência, da objectividade e do pluralismo.
Se V. Ex.ª, Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem um entendimento contrário, então deve dizê-lo expressamente porque a nossa opinião é exactamente diversa.
O Sr. Vítor Crespo (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Quanto aos resultados obtidos, nós entendemos que, sem pretender defender a perfeição das nossas acções - que não defendemos porque tal não faz parte da acção humana pois, não é uma sua característica mas dentro da relatividade de toda a acção humana, com nosso esforço para atingir aqueles objectivos que creio são comuns a todo o campo democrático (a objectividade, a independência, o pluralismo), nós temos dado passos em frente. Hoje, o grau de independência, pluralismo e objectividade da informação e, em particular, respondemos pela que é estatizada ou propriedade pública- não é inferior àquele que existia antes dos governos da actual maioria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª já ultrapassou o tempo regimental para pedir esclarecimentos. Agradecia-lhe, pois, o favor de concluir a sua intervenção.
O Orador: - Sr. Presidente, peço à Mesa que desconte no tempo global da minha...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não pode ser, não pode ser!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, não há uma rigidez absoluta.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Há rigidez! O Orador: - Eu termino, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Peço perdão, mas o critério é o de que não se pode exceder demasiado o tempo atribuído para a formulação de perguntas.
O Orador: - Sr. Presidente, se me der 30 segundos, eu termino.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
O Orador: - Concluindo... Risos do PCP.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a questão é esta: foi admitido que o debate seria aberto com um período de pedidos de esclarecimento ou de protestos em relação as intervenções já feitas. Foi pedido que os Srs. Deputados e o Sr. Ministro já inscritos para intervirem no debate cedessem a prioridade de que desfrutavam para se proceder a esse período de pedidos de esclarecimento ou de protesto.
Naturalmente que se compreenderia que neste período fossem usados os tempos regimentais, isto é, o máximo de 3 minutos para pedidos de esclarecimento ou para protestos. Creio, portanto, que o Sr. Deputado Silva Marques está a abusar completamente da generosidade...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Como, se eu já me calei?
O Orador: - ... dos deputados que, estando inscritos antes dele e do próprio Sr. Ministro, lhe cederam a palavra e está, afinal, a fazer uma coisa que não é senão uma intervenção de fundo no debate.
Creio, pois, que não é uma atitude de lealdade, nem, digamos, é uma manifestação de espírito democrático em relação à Câmara.
(Protestos do PSD).
E à boa vontade que houve no sentido de ele poder usar da palavra.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, eu vou terminar...
O Sr. Presidente: - Um momento, Sr. Deputado Silva Marques. Tenho de dar uma resposta ao Sr. Deputado Carlos Brito que interpelou a Mesa.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado Carlos Brito, que não há qualquer divergência entre aquilo que disse e a atitude da Mesa.
A Mesa chamou a atenção ao Sr. Deputado Silva Marques para o facto de o seu tempo se ter esgotado e pediu-lhe que concluísse a sua intervenção.
Naturalmente, o Sr. Deputado Carlos Brito não vai pretender que a Mesa corte a palavra precisamente quando se esgotam os 3 minutos a que os deputados têm direito para pedirem esclarecimentos, pois tal critério nunca foi adoptado nesta Assembleia, não foi adoptado em relação ao Sr. Deputado Lopes Cardoso nem foi adoptado em relação a nenhum outro Sr. Deputado. Contudo, mantém-se o critério de que cada Sr. Deputado dispõe de 3 minutos para pedir esclarecimentos; no caso de exceder esses três minutos, a Mesa pedirá ao orador que conclua a intervenção. Foi exactamente
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aquilo que fez, e renovo agora esse pedido ao Sr. Deputado Silva Marques.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Eu vou concluir a pergunta que, aliás, foi feita claramente. Talvez não tivesse sido a pergunta que V. Ex.ª desejaria, mas fiz uma pergunta ao interpelante.
E vou terminar não dizendo Deus nos livre do monopólio das interpretações da bancada do Partido Comunista porque estaríamos, realmente, perdidos relativamente à sua intolerância quando lhe convém, mas dizendo o seguinte: em termos globais...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Oh!...
O Orador: - Sr. Deputado, V. Ex.ª foi excessivamente intolerante relativamente às práticas aqui seguidas.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Pelo contrário, você é que está a abusar. É abusador!
O Orador: - É uma hipótese.
De qualquer modo, como dizia para terminar, relativamente aos passos globais dados nesta matéria, tem havido um progresso quanto aos objectivos pretendidos. É essa a questão que eu coloco ao Sr. Deputado interpelante.
Por outro lado, quanto aos instrumentos desses objectivos, direi que felizmente estamos muito longe e graças aos esforços da actual maioria- do tempo em que a 5.º divisão nos ensinava, quase diariamente e, em particular, aos agricultores portugueses, como se agricultava.
Aplausos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Adelaide Paiva tinha chamado a atenção da Mesa para o facto de se ter inscrito e não ter sido notado o seu pedido de inscrição.
A Mesa estaria disposta a conceder-lhe a palavra, uma vez que pretendia dirigir perguntas ao Sr. Deputado Lopes Cardoso. Todavia, como não se encontra no Hemiciclo, dou a palavra ao Sr. Deputado Lopes Cardoso para responder ao Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Silva Marques: - Diz o Sr. Deputado Silva Marques que a UEDS tem mais olhos que barriga.
Bom, pela parte que me toca, direi que sou capaz de ter mais olhos que barriga, pois, apesar da idade vou conseguindo não ter barriga.
Mas, para continuar a usar a linguagem anatómica do Sr. Deputado, eu diria que o Sr. Deputado tem mais garganta do que olhos. E tem mais garganta do que olhos porque consegue falar sem dizer nada e falar sobre coisas que não leu.
O Sr. Deputado leu, porventura, o requerimento apresentado ao Presidente da Assembleia a propósito desta interpelação? Se o leu, teria verificado que nele se refere expressamente a abordagem das questões relacionadas com a agência noticiosa portuguesa. De facto, o Sr. Deputado Silva Marques tem mais garganta do que olhos.
Por outro lado, V. Ex.ª fez-me uma pergunta cuja resposta conhece perfeitamente. Ponha a questão a si próprio com o mínimo de honestidade e de seriedade. O Sr. Deputado Silva Marques sabe perfeitamente que nem eu nem a UEDS defendemos o monopólio dos meios de comunicação social pelo Estado, sabe que eu não tenho lições de democracia a receber do Sr. Deputado, nem em matéria de comunicação social nem em matéria de quintas divisões. Não tenho nenhuma lição a receber do Sr. Deputado.
Aplausos da UEDS, do PS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Para um protesto. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu não tenho a menor dúvida em reconhecer que V. Ex.ª nada tem a ver com a S.º Divisão e, por isso, não era necessário dizê-lo.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Foi o senhor quem falou nela, Sr. Deputado.
O Orador: - Eu falei porque VV. Ex.ªs pretenderam introduzir...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Não foi assim. Sr. Deputado.
O Orador: - Perdão, Sr. Deputado, quem introduziu a generalidade do tema foram VV. Ex.ª. No vosso requerimento falam da ANOP. sem dúvida, mas, então, se queriam restringir-se a essa questão...
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Agora não fala!
O Orador: - ... perdão, isto não pode ser só a bela sem o senão!
Ora, se VV. Ex.ªs tivessem então tido uma preocupação de maior sobriedade, não generalizassem o tema da vossa interpelação.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É que falámos na ANOP, Sr. Deputado.
O Orador: - Sim, sem dúvida.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Mas não falámos - e o Sr. Deputado continua a não saber ler- na 5.º Divisão, Sr. Deputado.
O Orador: - Exacto. Mas eu falei na 5.º Divisão graças a VV. Ex.ª, que propuseram...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Não convém!
O Orador: - Exactamente. VV. Ex.ªs pretenderam
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- e foi por isso que eu disse que têm mais olhos do que barriga- um prato enorme para a ementa. Isto é, debate de política geral centrado na política de informação e comunicação social e das medidas já anunciadas ou já tomadas em relação à ANOP.
Portanto, eu não nego que W. Ex." quisessem trazer à colação a ANOP. Mas, o que não deveriam era exagerar nos vossos ímpetos de voo.
Portanto, se falei na 5.º Divisão, acho que foi com pertinência, visto que procurei corresponder à vossa pretensão, isto é, a um debate de política geral relativamente à comunicação social. Mas, na medida em que W. Ex." o não fizeram, eu disse - julgo que com alguma pertinência- que tiveram mais olhos do que barriga.
E, então, caberá a nós próprios fazer a pergunta: não estaremos perante um caso - digamos-, de gato escondido com o rabo de fora? Ou seja, no fundo, o que VV. Ex.ªs pretenderiam era, eventualmente, fazer um inquérito administrativo sobre o caso ANOP.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Administrativo?!...
O Orador: - Como entender! Não vou perder tempo sobre a questão. Agora, que VV. Ex.ªs tiveram mais olhos que barriga, não há a menor dúvida.
Entretanto, reassumiu a presidência, o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo, pelo que lhe peço o favor de abreviar a sua intervenção.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar. Quanto ao Sr. Deputado nada ter a ver com a 5.« Divisão, também é um facto!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, pretende pedir a palavra para responder, ou não deseja usar da palavra?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, esta intervenção não merece resposta que me leve a gastar o pouco tempo de que disponho. Isto não impede que mantenha a inscrição que tinha feito para colocar questões ao Sr. Secretário de Estado José Alfaia.
O Sr. Presidente: - Está exactamente na altura. Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Peço desculpa, não tinha entendido assim.
Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, não vou dizer-lhe que me desiludiu. Na minha intervenção anunciava, desde logo, as fundadas dúvidas que tinha quanto à sua capacidade de trazer aqui qualquer esclarecimento válido sobre o seu comportamento em relação à agência noticiosa ANOP.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, devo humildemente confessar-lhe que me espantou. E me espantou pela sua capacidade de se ultrapassar a si próprio em matéria de despudor, de
hipocrisia, de distorção dos factos, de não assunção minimamente clara das responsabilidades que lhe cabem em todo este processo.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
V. Ex.ª entendeu dever refugiar-se por detrás do programa do Governo e por trás da proclamação de que a AD e o Governo respeitam os seus compromissos.
Não foi um compromisso do Governo a que o Sr. Secretário de Estado pertence, assumido perante esta Assembleia, o de reorganizar e apoiar financeiramente a agência noticiosa de Portugal, ANOP? Como é que cumpriu esse compromisso?
Uma voz do PCP: - Esqueceu-se!
O Orador: - Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado acusa a ANOP desta coisa espantosa: é que a ANOP produz demais. Parece que, afinal, todo o mal está no facto de a ANOP produzir 60% a 70% das notícias veiculadas pelos meios de comunicação social portugueses. Se a ANOP produzisse pouco, tudo bem. Não fazia diferença a ninguém, gastasse o dinheiro que gastasse.
Por um lado, a produtividade é baixa. Por um lado produz pouco, por outro lado produz tanto que o melhor é encerrá-la!
E depois continua sem explicar uma coisa: se a ANOP, pelo seu estatuto de empresa pública, carece de independência face ao Governo, explique-me como é que uma agência que depende para sobreviver dos subsídios que lhe são dados pelo Governo pode ser independente em relação a esse Governo. Ou será que o Governo vai abdicar de qualquer controlo sobre o modo como são utilizadas as centenas de milhar de contos que concede a essa empresa?
Explique-me, Sr. Secretário de Estado, se for capaz!
Explique-me, também, como é que sem hipocrisia V. Ex.ª pode vir aqui trilhar o fado choradinho sobre quanto lhe custou e quanto lhe custa a situação dos trabalhadores da ANOP, depois de sistematicamente ter recusado qualquer espécie de diálogo com esses mesmos trabalhadores.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Se isso não é hipocrisia, então o que ê? Então em que é que ficamos?
Disse também o Sr. Secretário de Estado que a existência da ANOP era um factor que impedia o desenvolvimento de certas iniciativas, designadamente de índole cooperativa.
O Sr. Primeiro-Ministro não nos honrou com a sua presença. Não sei se por, finalmente num rebate de consciência, ter entendido que não devia participar no debate em torno...
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, se me permite, só mais 2 minutos.
O Sr. Presidente: - Pedia-lhe o favor de ser breve, Sr. Deputado.
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O Orador: - Como, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Peço-lhe o favor de ser breve, Sr. Deputado
O Orador: - Vou ser breve, Sr. Presidente. Dizia eu, talvez o Sr. Secretário de Estado me possa esclarecer já que o Sr. Primeiro-Ministro não está presente, não sei se por um rebate de consciência ter entendido que não devia participar num debate em torno de uma questão na qual é directamente interessado, como tive ocasião de ver, dado que por via do jornal Expresso é participante na cooperativa «Noticias de Portugal» - se, em matéria de iniciativas cooperativas, o Sr. Primeiro-Ministro chegou a dar alguma resposta ou a tomar alguma decisão a propósito da proposta apresentada em tempo útil pelos trabalhadores da ANOP, para estudo de uma solução cooperativa com a participação desses trabalhadores, ou se continua - como repetidamente ao longo do tempo o Sr. Primeiro-Ministro anunciou - a estudar a hipótese de discutir ou não discutir com os trabalhadores essa situação.
Há muitas outras questões a colocar, Sr. Secretário de Estado. Aqui ficam estas, as outras virão em tempo oportuno. As respostas, pelo exemplo que já nos deu, penso que continuaremos a aguardá-las para além deste debate. Com efeito, já não tenho quaisquer esperanças que ainda venha a dá-las no decurso dele.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, há mais deputados inscritos para pedirem esclarecimentos a V. Ex.ª Deseja responder imediatamente ou aguarda que lhe sejam formuladas as restantes perguntas?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Diz o Sr. Deputado Lopes Cardoso que eu não o desiludi. Mas. o Sr. Deputado Lopes Cardoso desiludiu-me...
Risos da UEDS.
O Orador: - ...e desiludiu-me em primeiro lugar porque a sua interpelação respeitava à comunicação social em geral e à ANOP em particular.
O Sr. José Vitorino (UEDS): - Esse é um argumento fácil!
O Orador: - E, sintomaticamente, foi esquecida a interpelação no que diz respeito à política de comunicação social em geral.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Espere aí, não se afogue!
O Orador: - Ora, por parte do Governo, é um sintoma positivo registar isso.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não foi só isso!
O Orador: - Mas desiludiu-me mais, porque cingindo-se à ANOP, e pelas perguntas que formulou, parece não conhecer alguns aspectos fundamentais desse mesmo processo.
O Sr. José Vitorino (UEDS): - É falso, mas não faz mal!
O Orador: - Em primeiro lugar, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que o Governo não confunde os meios com os fins. E quando o Governo no seu programa diz que deverá estabelecer um contrato-programa com a agência noticiosa para que ela possa servir o País junto das comunidades da língua portuguesa e junto das regiões...
Uma voz do PS: - Não é isso!
O Orador: - ... é porque a ANOP pode servir esse fim, se se desenvolver para esses vectores fundamentais.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Depois de extinta! O Orador: - Um momento, Sr. Deputado. O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Depois de extinta! O Orador: - Eu não o interrompi, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem, o Regimento não permite que se estabeleça diálogo.
O Sr. José Vitorino (UEDS): - Mas pode-se interromper sempre que quiser!
O Orador: - Ora, acontece que o Governo desenvolveu todos os esforços junto da ANOP para vir a estabelecer com ela um contrato-programa.
E se o Sr. Deputado conhecesse o processo da ANOP e as várias peças que o compõem saberia das negociações que o Governo teve em meados de Fevereiro, após a substituição do conselho de gerência, conheceria as directivas dadas ao conselho de gerência que o substituiu, no sentido de reformular o orçamento funcionamento daquela empresa, e saberia que tal conselho de gerência conseguiu reduzir um subsídio necessário - indicado como tal pelo anterior - de 325 000 contos para 250 000 contos.
O Governo explicou que não tinha recursos para um subsídio desse montante e tomou a iniciativa de estudar soluções alternativas. Soluções que passavam, nomeadamente, pela obrigação de os utentes da ANOP pagarem os serviços daquela em função da sua publicidade, segundo uma percentagem de 5% a 10%, o que permitiria incrementar consideravelmente as receitas da agência.
Havia, porém, uma condição primeira que se impunha por parte dessas empresas, designadamente, as estatizadas arquem se podia impor, no imediato, esta solução. É que algumas delas, acabadas de sair da situação económica difícil, exigiam que, perante esse sacrifício que lhes era imposto, e aos trabalhadores das mesmas, a agência aceitasse, também, ser colocada em situação económica difícil.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, nem o conselho de gerência nem os directores da agência e esses já o
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Governo os encontrou- aceitaram essa solução e ostensivamente disseram que poriam todos os seus lugares à disposição se esse fosse o caminho seguido.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, terminou o seu tempo. Faça V. Ex.â o favor de abreviar.
O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não há provas Sr. Secretário de Estado, é só palavra de honra.
O Orador: - Há, Sr. Deputado, há.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Estamos à espera.
O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, quero dizer-lhe também que é uma coisa bem diferente quando surge hoje uma agência de base cooperativa que estabelece um contrato de mera prestação de serviços e que tem mecanismos próprios para essa especialidade.
Esse contrato obriga apenas à satisfação objectiva de determinadas infra-estruturas e não compete ao Governo ou à Administração Pública interferir nessa matéria, a não ser para a verificação concreta da satisfação dessas condições de estrutura. Além disso, no contrato remete-se para uma entidade que, estabelecida na lei ou na Constituição, velará pelo rigor, objectividade e pluralismo dos órgãos de comunicação social e o contrato só por denúncia reiterada desse mesmo órgão será objecto de rescisão.
Quanto à proposta dos trabalhadores, tenho a dizer, Sr. Deputado, que o conselho de gerência foi formalmente mandatado para negociar com os trabalhadores e propôs-lhes que apresentassem uma proposta mesmo antes da aprovação em Conselho de Ministros do decreto-lei.
Foram dados 8 dias aos trabalhadores para formalizarem uma proposta que, pelos vistos, já tinha sido anunciada com 15 dias de antecedência. Só 3 semanas depois é que os trabalhadores apresentaram essa proposta e não conseguiram formular estatutos, não apresentaram a proposta de resolução concreta como cooperativa e tão pouco conseguiram dar um orçamento em bases sólidas.
Nem por isso, porém, o Governo recusou essa solução. Pediu aos trabalhadores que a detalhassem e fez-lhe um conjunto de perguntas a que não obtivemos resposta.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Peço a palavra, para pedir esclarecimentos.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado José Alfaia, ouvi com a maior atenção a intervenção que proferiu. Não vou comentá-la em todos os aspectos que contemplou. Outros companheiros da minha bancada e, eventualmente, eu próprio trataremos da problemática geral da comunicação social no nosso Pais.
Mas, no que se refere em particular à questão da ANOP, há um ponto que me causou uma profunda estranhesa e perplexidade: E a total ausência de consideração deste problema tendo em conta aquilo que a Constituição preceitua em termos de regime dos meios de comunicação social estatizados e aquilo que a Constituição preceitua em termos de distribuição de competências pelos vários órgãos de soberania.
O Sr. Secretário de Estado colocou o problema da ANOP apenas em termos de rendimento económico numa certa perspectiva. Não colocou o problema da ANOP na perspectiva global dos artigos 37.º e seguintes da Constituição e, em particular, do artigo 39.º, que garante a existência de um sector público de comunicação social. E não colocou o problema na perspectiva das finalidades que esse preceito constitucional consigna a tal sector público.
Por outro lado, ao referir-se ao problema da ANOP, V. Ex.ª não considerou o problema da necessidade de respeito de certos valores fundamentais do Estado de Direito. Um desses valores fundamentais é a não prática de factos consumados sem que os órgãos constitucionais competentes tenham emitido a última palavra. E isto foi o que aconteceu nitidamente no caso da ANOP com a criação de situações eventualmente irreversíveis de extinção sem que o órgão competente para promulgar o decreto-lei da extinção se tivesse pronunciado.
Mas há mais: eu tenho as mais fundadas dúvidas em que o Governo, por decreto-lei, possa extinguir a ANOP. Na verdade, a ANOP encontra-se contemplada em Leis da Assembleia da República e, em particular, em matéria dos Conselhos de Informação foi objecto de uma Lei da Assembleia da República.
Um desses Conselhos de Informação, que se manterá em vigor até à criação do Conselho de Comunicação Social, não poderia ser afastado...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Miranda, terminou o seu tempo, pelo que lhe peço o favor de abreviar a sua intervenção.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente. Como dizia, um desses Conselhos de Informação não poderia ser afastado, implícita ou explicitamente, por acto legislativo do Governo.
Gostaria que o Sr. Secretário de Estado respondesse, pelo menos, a estas dúvidas de constitucionalidade que acabo de formular.
Vozes do PS e da ASDI: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, tem V. Ex.ª a palavra, para responder, se assim o entender.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Sr. Deputado Jorge Miranda, esta matéria não é reservada à Assembleia e, na interpretação do Governo, há matérias que, não obstante estarem regulamentadas por Lei da Assembleia da República, têm que ser necessariamente revogadas por lei. E foi nesse sentido que aprovou um decreto-lei que apresentou para promulgação.
E óbvio que, no entendimento do Governo, só mediante a promulgação desse mesmo diploma é que se verifica a extinção da agência noticiosa ANOP e isso nunca foi posto em causa pelo próprio Governo.
O Governo explicitou as suas intenções. Preferiu não seguir uma política de menor verdade ao equacionar um
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conjunto de soluções para a ANOP que podiam vir, no termo, a determinar a sua extinção. E foi por isso que, num prazo de poucos dias, veio formular esse mesmo decreto-lei.
Por outro lado, quanto ao aparecimento de determinadas medidas de gestão que foram tomadas pela agência por iniciativa do próprio conselho de gerência ao abrigo da lei dos despedimentos e em que também foi rigorosamente cumprido aquilo que se estabelece na lei de base das empresas públicas, o que se passou foi que o conselho de gerência, preservando todos os sectores de informação, como foi determinado pela tutela, fez uma redução de efectivos procurando dimensionar a empresa aos recursos de que dispunha. Essas foram as medidas tomadas no seio da competência do conselho de gerência e no seio da competência do Governo ao abrigo da lei de bases das empresas públicas.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Secretário de Estado: No curto período de 3 minutos é difícil levantar todas as questões que a sua intervenção e os seus não esclarecimentos aqui deixaram no ar.
De qualquer modo, tentarei ser muito sucinto e pôr-lhe 3 ou 4 questões muito concretas.
Em primeiro lugar, face ao veto do Presidente da República do decreto do Governo que visava a extinção da ANOP, vai V. Ex.ª dotar a agência das verbas necessárias ao seu funcionamento? Vai V. Ex.ª pôr fim ao processo de despedimentos? Vai V. Ex.ª, por fim, reestruturar a empresa?
Segunda questão: V. Ex.ª referiu de maneira hipócrita, como já aqui foi dito, que se preocupa com o futuro dos trabalhadores da ANOP. Mas é ou não verdade, Sr. Secretário de Estado, que a decisão de extinguir a empresa e os pôr na rua foi sua? É ou não verdade que sancionou a carta que deu origem a esses mesmos despedimentos?
Terceira questão: o Governo atribuiu 320000 contos para a NP. Com que base? Que concurso foi feito para ser essa a agência contemplada? Houve algum?
Quarta questão: o Sr. Secretário de Estado falou aqui que o Governo tencionava estabelecer um contrato programa com a ANOP para levar a informação ao seio das comunidades e para os países de expressão oficial portuguesa em África. Mas, se V. Ex.1, por um lado, faz um decreto para extinguir uma empresa, como pode ao mesmo tempo dizer que queria estabelecer um contrato programa com a empresa que ia extinguir? Não acha que há uma contradição nas suas palavras?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, para responder, se assim o entender.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, importa esclarecer que não houve um veto do Sr. Presidente da República mas, sim, uma recusa de promulgação.
Risos do PCP.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Essa é boa! Explique a diferença.
Risos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Orador: - O que queria dizer-lhe, Sr. Deputado Jorge Lemos, é que não houve veto por inconstitucionalidade.
Em segundo lugar, quero dizer-lhe também, que, caso o decreto tivesse sido promulgado, isso teria necessariamente implicações no processo de despedimento colectivo. No caso de ser promulgado tê-lo-ia certamente, pois afectaria todos os trabalhadores e consequentemente o processo que se encontra em curso.
Nestes termos nada vem contrariar o prosseguimento desse mesmo processo.
Quanto ao que o Governo fará, dir-lhe-ei que sendo esta iniciativa da competência do próprio Conselho de Ministros e porque este ainda não reuniu depois da decisão do Sr. Presidente da República não me encontro habilitado para lhe dar qualquer resposta.
Por outro lado, quanto ao destino dos trabalhadores da ANOP, é evidente que o conselho de gerência, dentro da sua competência, tomou a decisão mas, sendo um acto extraordinário de gestão, nos termos da lei das empresas públicas, pediu autorização à tutela.
Em terceiro lugar, poderemos esclarecer, noutra altura mais adiantada do nosso debate, se os trabalhadores da ANOP que foram despedidos e outros que na própria agência era suposto manterem-se não têm estado a encontrar trabalho noutros lugares.
Por outro lado, quanto à questão que põe sobre o contrato com a «Notícias de Portugal», queria dizer-lhe que ele foi feito ao abrigo dos Decretos-Lei n.ºs 211/79, e 290/81, tendo em conta as disposições em matéria de concurso público nos próprios diplomas estabelecidos.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não fundamentadas!
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Diga lá quais são os fundamentos, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário de Estado está no uso da palavra e VV. Ex.ªs têm figuras regimentais para se oporem ao que possa ser afirmado. Peco-lhes por isso o favor de não interromperem o orador que se encontra no uso da palavra.
Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Sr. Presidente eu receio alongar-me um pouco, mas gostaria de ler a fundamentação.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Era o seguinte: eu gostaria, em primeiro lugar, que V. Ex.ª citasse a norma em que se baseia.
Em segundo lugar, queria perguntar-lhe porque é que foram estes cidadãos portugueses que constituem a NP os privilegiados? Porque é que foram estes os escolhidos? Porque é que foram estes os eleitos pelo Governo? Porque é que é a estes que o Governo resolve dar 320 mil contos? Porque é que não são outros portugueses?
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Eu pergunto se, neste momento, outro grupo de portugueses se constituir em cooperativa ou em sociedade de informação o Governo também lhes dará 320000 contos para exercerem a sua actividade num campo tão importante para o Estado e para a vida pública portuguesa. Porque é que foram estes e quem são estes para terem esse privilégio e esse estatuto de eleição?
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não se repita, Sr. Deputado!
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito, teria...
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado desculpe interrompê-lo mas a Mesa desejava colocar a seguinte questão: o Sr. Secretário de Estado está a responder a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Jorge Lemos. É evidente que o Sr. Deputado Carlos Brito interveio porque o Sr. Secretário de Estado assim o consentiu, mas será conveniente que a resposta seja dada ao Sr. Deputado que pede o esclarecimento e se depois houver mais esclarecimentos a pedido do Sr. Deputado ou de outro Sr. Deputado que o queira fazer têm que se inscrever na altura própria para usar da palavra.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, vou passar a ler a fundamentação:
Considerando a resolução do Conselho de Ministros n.º 133/82, de 29 de Julho, pela qual são conferidas ao Secretário de Estado Adjunto do Primeiro--Ministro com o pelouro da Comunicação Social e ao Secretário de Estado do Orçamento, poderes bastantes para procederem às diligências relacionadas com a eventual contratação da prestação de serviços noticiosos com entidades que, dando garantias de rigor, pluralismo e racionalidade de custos, contribuam para veicular a informação noticiosa ao espaço alargado de Portugal e das comunidades portuguesas, bem como aos países de língua portuguesa.
Considerando que os objectivos e fins estatutários da «Noticias de Portugal» satisfazem integralmente os princípios enunciados na referida resolução do Conselho de Ministros.
Considerando que a «Noticias de Portugal» oferece garantias não só de racionalidade de custos que lhe advêm da complementariedade da exploração entre ela própria e os seus cooperantes, onde se contam a maioria das empresas de comunicação social e a totalidade das empresas de telecomunicações portuguesas, mas também de rigor e pluralismo na prestação de serviços noticiosos por virtude de aptidões notórias e amplamente comprovadas ao longo dos anos pelos seus cooperantes no exercício da sua especial actividade.
O Sr. Presidente: - Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Secretário, mas terminou o seu tempo. Peco-lhe o favor de concluir.
O Orador: - «Considerando que, por outro lado, não existindo no País empresa que reúna essa tal ampla complementariedade de atributos no âmbito da comunicação social com vista a satisfazer os objectivos determinados pela já mencionada resolução do Conselho de Ministros de 29 de Julho, determina-se, nos termos dos artigos 4.«, 5.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 211/79, de 12 de Julho, e ao abrigo do artigo 21.º do mesmo diploma, conjugados com o artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 290/81, de 14 de Outubro, seja dispensada a realização de concurso público ou limitado.
Que seja autorizado o Director-Geral da Informação a outorgar em nome do Estado o referido contrato».
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Há-de me dizer onde é que, à face da Constituição, uma resolução revoga um decreto-lei?!
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto em relação ao esclarecimento prestado pelo Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado cita indiscriminadamente, para fundamentar a decisão de não pôr a concurso público a concessão dos referidos serviços, os n.º 4 e 5 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 211/79. Só que há uma diferença pois o n.º 4 comporta 6 alíneas entre as quais, por exemplo, as seguintes: quando a segurança pública interna ou externa o aconselhe, quando se trate de encomenda ou obtenção de estudos, ou então quando a obra ou o fornecimento só possam ser feitos convenientemente por determinada entidade em consequência de exclusivo legalmente concedido, patente de invenção, contrato anterior com o Estado, aptidão essencialmente comprovada em obras ou fornecimentos de que os novos sejam um complemento.
Eu gostaria de saber, Sr. Secretário de Estado, se são todas estas alíneas que militam na sua fundamentação ou se é apenas alguma delas para, em concreto, podermos ajuizar da sua decisão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para contraprotestar o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - É a última que o Sr. Deputado António Vitorino acaba de citar: serviços complementares.
Risos do PS, do PCP, da ASDI e da UEDS.
O Orador: - Serviços complementares e, inequivocamente, esta agência é a agência cooperativa de todos os órgãos de comunicação social portugueses. É, obviamente, um serviço complementar.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Voltou a dizer nada!
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Depois das intervenções que foi fazendo e dos esclarecimentos que nos deu creio que vai sendo preciso situar algumas questões visto que ao longo do tempo o seu pensamento foi evoluindo - e digo isto para ser simpático.
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Risos do PS e da UEDS.
O Sr. Secretário de Estado tomou posse como membro do Governo em Junho de 1981. Em Setembro de 1981, quando aqui foi apresentado o programa do Governo, não ignorava portanto, ou não devia ignorar, os problemas do seu sector. O programa do Governo declarava, a p. 3274 do Diário n." 101, da Assembleia da República, II série:
O Governo favorecerá também o alargamento do espaço noticioso da ANOP no país e no seio das comunidades e promoverá a intensificação da cooperação e intercâmbio com os países africanos de expressão oficial portuguesa.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - O pedido de esclarecimento que lhe faço. visto que isto consta do programa do Governo, é perguntar-lhe que acções concretas, que actuações precisas desenvolveu o Governo no sentido de favorecer o alargamento do espaço noticioso da ANOP no país, no seio das comunidades e na promoção e intensificação da cooperação e intercâmbio com os países africanos.
Depois p. 3275 - o Sr. Secretário de Estado acrescentou: «noutro domínio importante o Governo reorganizará a ANOP». Quer dizer que se tratava não de uma incumbência conferida aos trabalhadores da ANOP, não de uma incumbência conferida ao seu conselho de gestão, mas de uma incumbência do próprio Governo. E o que eu me pergunto é: como a cumpriu o Sr. Secretário de Estado?
A terceira e última questão que lhe queria colocar diz respeito ao tal concurso público que não fez a favor de uma empresa que só tinha estatutos, que ainda não tinha pessoas ao seu serviço e que, portanto, só por isso, pôde merecer, com base nos estatutos e num conhecimento pessoal que lhe não nego, o mérito da escolha do Sr. Secretário de Estado.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Esqueceu-se, esqueceu-se!
O Orador: - O que eu lhe pergunto é se, nos termos da igualdade de condições e de pluralismo que aqui apregoou em nome do seu Governo, e com a mesma dispensa de concurso público ou com concurso público, fornecerá em igualdade de circunstâncias os mesmos direitos públicos a qualquer outra empresa que surja no sector. É que, segundo a sua própria posição, só assim haverá liberdade de criação de empresas noticiosas.
Vozes da ASDI, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - E. pergunto-lhe, concretamente no caso muito claro e muito exacto da ANOP, se o Sr. Secretário de Estado, por força de, sem concurso, ter atribuído a outra agência 320000 contos, vai dotar de novo a ANOP com mais 320000 contos.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI. da UEDS. do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, para responder, se assim o entender.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, como há pouco disse, não podemos confundir os meios com os fins.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Outra vez?!...
O Orador: - Há compromissos programáticos que se assumem e os 3 sectores que o próprio Sr. Deputado apontou ao ler o programa do Governo são os vectores de acção do Governo. E estas foram as recomendações precisas dadas à ANOP.
Por outro lado, como já expliquei, sucede também que o Governo ensaiou um contrato programa com a agência noticiosa e tentou elaborar um orçamento que não conseguiu, na medida em que os custos de exploração impostos pela ANOP eram incomportáveis.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Disparate!
O Orador: - Foi nesse sentido que o Governo se sentiu obrigado a encontrar soluções alternativas que não pusessem em causa os objectivos programáticos de alargamento às comunidades, aos países de língua portuguesa e de integração no espaço nacional.
E recordo, Sr. Deputado Magalhães Mota, que o próprio Conselho de informação, num inquérito que fez à agência noticiosa, no qual reconhece o rigor objectivo e o pluralismo da informação da agência - que nunca foi posto em causa pelo Governo -, sublinha que a agência é insuficiente nas suas relações com o exterior e com as regiões.
E esse mesmo inquérito que o diz, isto é, aqueles vectores que são a razão de ser essencial da obrigação da ANOP, não são por ela cumpridos suficientemente.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Isso é incrível! O Orador: - Isso di-lo claramente o inquérito.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É incrível!
O Orador: - Por outro lado, quero dizer-lhe também que, como agências noticiosas e alternativas, há as agências em concorrência com a ANOP que são as próprias agências estrangeiras. Não pareceria asado que fossem essas que beneficiariam dum contrato com o Estado.
Por outro lado, a ANOP já tinha demonstrado que não poderia desempenhar tal função, com 40000 contos este ano, 140000 contos no próximo a preços de 1982 e 140000 contos em 1984, também a preços de 1982.
E, finalmente, o que me parece também realista é reconhecer que não só as agências noticiosas estavam dispostas a trabalhar com a NP como sucede que a NP integra 80% dos órgãos de comunicação social portugueses. E esse é um realismo sob pena de termos os trabalhadores da ANOP a trabalhar do 1.º andar para o 2.º andar.
O Sr. Presidente: - Há vários pedidos de palavra em relação a esta intervenção do Sr. Secretário de Estado. Inscreveram-se para o efeito os Srs. Deputados Lopes Cardoso, Jorge Lemos, Mário Tomé, José Niza e Jaime Gama.
Ora, acontece que a hora regimental de suspensão dos nossos trabalhos chegou, pelo que VV. Ex.ªs formularão as questões que desejarem após a reabertura da sessão, às 15 horas.
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O Sr. José Niza (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, uma vez que esta fase de pedidos de esclarecimento é um pouco autónoma em relação ao debate, queria perguntar se não se poderia terminar agora os pedidos de esclarecimento e depois na reabertura far-se-iam imediatamente as intervenções de fundo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que todos os pedidos de palavra agora solicitados são relativos a esta última intervenção do Sr. Secretário de Estado. Iríamos, portanto, prolongar os trabalhos desnecessariamente por mais 15 ou 20 minutos, ou até mais, com a consequente alteração dos horários regimentais.
Ora, a Mesa não vê razão para não suspender de imediato a reunião, uma vez que VV. Ex.ªs ficam inscritos, não perdendo o direito de usarem da palavra.
Está suspensa a sessão. Retomaremos os trabalhos às 15 horas.
Eram 13 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Para boa orientação dos trabalhos, a Mesa informa o seguinte: o Sr. Secretário de Estado respondeu a pedidos de esclarecimento formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota e em relação aos esclarecimentos prestados, solicitaram a palavra para protestar os Srs. Deputados Lopes Cardoso, Jorge Lemos e Mário Tomé.
Entretanto, em relação à intervenção inicial do Sr. Secretário de Estado tinham-se inscrito, para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados José Niza, Mário Tomé e João Corregedor.
Há ainda inscrições para intervenções de fundo dos Srs. Deputados Arons de Carvalho, Jorge Lemos, António Taborda e Mário Tomé.
A Mesa considerou esta situação e, sob pena de se eternizar o debate, resolve neste momento dar a palavra aos Srs. Deputados que se encontram inscritos. Mas a partir deste momento entender-se-á que os esclarecimentos serão pedidos pelos Srs. Deputados que se inscreveram para o fazer, receberão os respectivos esclarecimentos e poderão, se o entenderem, protestar em relação aos esclarecimentos que lhes forem dados.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, é para dizer que prescindo da minha inscrição para não prejudicar as intervenções dos oradores que se tinham inscrito anteriormente, pelo que solicitava a V. Ex.ª que me inscrevesse para uma intervenção, na qual me pronunciarei sobre os assuntos de que iria agora falar.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
A seguir encontra-se inscrito o Sr. Deputado Jorge
Lemos. Deseja protestar ou também se inscreve para uma intervenção?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não posso adoptar a atitude que o meu colega Lopes Cardoso adoptou, ainda que com grande pena, porquanto foram referidas...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já estava assente que em relação às inscrições operadas antes do intervalo para almoço seriam respeitados os pedidos de palavra.
Nestes termos, tem V. Ex.ª a palavra para um protesto" pelo tempo regimental.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Teremos oportunidade, em declaração extensa, de referir todos os aspectos de ilegalidade, de pouca transparência democrática que estão em torno de todo este caso-ANOP.
Mas era impossível que eu não usasse da palavra para protestar, quando nesta Assembleia da República um Secretário de Estado vem mentir sobre o teor de um parecer, de um relatório de um Conselho de Informação.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Referiu o Sr. Secretário de Estado que no parecer do Conselho de Informação se referiam aspectos de actuação insuficiente da ANOP. Desafio o Sr. Secretário de Estado a dizer-me o ponto desse parecer em que se fala de insuficiência.
Mas, ainda que assim fosse, as insuficiências de uma empresa pública de informação não se resolvem estrangulando essa mesma empresa, resolvem-se dando-lhe os meios técnicos e financeiros que ela necessita para poder suprir as carências que a sua actuação exige.
Neste momento, o Sr. Secretário de Estado sai da Sala.
E é pena que saia, Sr. Secretário de Estado, quando estou a falar consigo.
Vozes do PCP e do PS: - É uma vergonha!
O Orador: - É pena que não tenha os elementos que invoca nas intervenções que aqui produz.
Para que conste, o que se diz no relatório - e passo a ler- é o seguinte:
1.º O serviço noticioso da ANOP ê reconhecido como obedecendo às normas legais e constitucionais, com o consequente respeito pelo pluralismo, rigor, objectividade e independência da informação exigida por lei, nela confiando os profissionais dos órgãos de comunicação social portugueses;
2.º O serviço noticioso da ANOP é bem aceite pela generalidade dos órgãos de comunicação social portugueses;
3.º Verifica-se que a ANOP cobre eficazmente os acontecimentos nacionais, havendo elevada percentagem de aproveitamento do noticiário emitido, por parte dos órgãos de comunicação social;
4.º O serviço informativo referenciado no número anterior é considerado imprescindível por alguns órgãos de informação, fundamentalmente os de
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índole regional que dele fazem um aproveitamento da ordem dos 70% a 80%;
5.º Alguns órgãos de comunicação social consideram que, em determinados aspectos, a actuação informativa da ANOP poderia melhorar, principalmente no tocante ao noticiário regional e internacional;
6.º Os depoimentos recolhidos foram no sentido de reconhecer que o livro de estilo, regras de agência, métodos de trabalho em vigor na ANOP e respectivas fontes de informação por ela utilizadas não prejudicam o noticiário emitido por aquela agência noticiosa.
Isto significa que em nenhum aspecto é dito que o trabalho da ANOP é insuficiente. Diz-se que pode melhorar e é necessário que melhore, mas para tanto tem de haver a vontade política de respeitar o compromisso que V. Ex.1 assumiu perante esta Assembleia de reestruturar a ANOP. de lhe dar os meios financeiros para que ela possa cumprir as missões que constitucionalmente deve desempenhar.
Aplausos do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro--Ministro: - Só quero dizer ao Sr. Deputado que o n.º 5 fala por si, porque não se trata de uma questão menor mas sim da questão essencial do que deveria pautar a acção da agência, merece todo o relevo.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Essa frase não está lá!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não desmentiu o que eu aqui disse!
O Sr. José Niza (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, inscrevi-me cerca das 11 horas da manhã, o Partido Socialista ainda não interveio neste debate...
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem toda a razão. Simplesmente, tem acontecido que poucas intervenções têm suscitado um conjunto tão grande de pedidos de esclarecimento, protestos e contraprotestos.
Pedia, pois, a V. Ex.ª o favor de ter paciência de aguardar uns minutos...
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, desculpe mas eu penso que neste momento o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não pode ter essa paciência.
Estou inscrito a seguir fui confirmá-lo à Mesa - para formular um protesto em nome do meu grupo parlamentar e penso que não há nenhuma razão para protelar essa intervenção.
O Sr. Presidente: - Na verdade o Sr. Deputado encontra-se inscrito a seguir para formular pedidos de esclarecimento, mas há ainda duas inscrições para protestar que a Mesa resolveu atender.
O Sr. José Niza (PS): - Mas, Sr. Presidente, na condição de que este novo sistema instituído não vá arrastar...
O Sr. Presidente: - Não só não vai arrastar como evita o arrastamento que eventualmente viria a verificar-se.
Consequentemente, para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Secretário, (Risos) na sua intervenção de há pouco referiu-se aos custos incomportáveis de exploração da ANOP, em nítida contradição com aquilo que tinha acabado de dizer depois da apresentação deste pedido de interpelação, ou seja, que a ANOP seleccionava e veiculava mais de 60% da informação divulgada pelos órgãos de comunicação social e que isso era parte muito significativa do fluxo informativo global, dando, portanto, um grande peso a todo o trabalho desenvolvido pela ANOP.
Os custos incomportáveis a que o Sr. Secretário de Estado se refere têm sido, segundo já foi dito pelos próprios trabalhadores da ANOP. um verdadeiro subsídio para os órgãos de comunicação social estatizados que têm assim os serviços prestados pela ANOP a preços baratos, a preços acessíveis.
Por outro lado, quando o Sr. Secretário de Estado entrou para o Governo, a ANOP era rentável e bem dimensionada. 2 anos depois da permanência da AD no Governo a gestão desta agência foi considerada péssima, com altos custos e mal dimensionada.
Há 1 ano os trabalhadores da ANOP enviaram ao Governo um pedido no sentido de ser tomado em conta o que se passava, dado que os próprios trabalhadores estavam a sentir que a administração da ANOP não estava a ser a devida, não estava a ser aquela que, no seu entender, devia ser.
Pergunto, pois: que medidas tomou o Governo, nomeadamente o Sr. Secretário de Estado, em relação a esta tomada de posição dos trabalhadores ocorrida há mais de 1 ano?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Nunca o Governo se pronunciou pela qualidade informativa prestada pela ANOP. nem nunca o Governo deixou de reconhecer que a ANOP alimentava substancialmente a comunicação social portuguesa.
Recordo palavras minhas, especialmente aquelas a que o Sr. Deputado se referiu, em que eu dizia que a ANOP era o pulmão da comunicação social portuguesa. Isto é um facto que tem paralelo em outros países. E é precisamente por isso que o caso da agência noticiosa se torna, aí sim, tão sensível em termos políticos e daí que no enunciado de política de comunicação social que tive oportunidade de fazer no início desta sessão, tenha sublinhado essa matéria.
A afirmação destes princípios de filosofia política não significavam que uma decisão em relação à ANOP fosse tomada hoje, daqui a 2 , 3, 4 ou a 10 anos. E, como também foi explicado, se aquela era uma razão remota, a razão próxima eram as condições económico-financeiras em que laborava a ANOP.
Por outro lado, é também um facto que os preços pra-
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ticados pela ANOP são iguais ou superiores aos praticados por outras agências noticiosas como a Associated Press, a EFE e a Reuter, conforme consta de relatório do director-comercial da própria ANOP. E estes são fixados rigorosamente nos mesmos critérios dos preços fixados por aquelas agências.
Por outro lado, por parte do Governo, não só houve a decisão de fazer uma substituição do conselho de gerência da ANOP no sentido de lhe dar um novo uma nova dinâmica, como foi claramente explicitado nessa altura que a ANOP deveria virar-se e vocacionar-se essencialmente para o exterior. Isso foi afirmado porque é isso que está em linha com o Programa do próprio Governo.
Acontece, pois, que, à luz dessa realidade, é solicitado ao conselho de gerência que reformule o seu orçamento e proponha as linhas de acção para o futuro. E são nessas linhas de acção que as condições por ele preconizadas ultrapassam as capacidades que o Governo teria para apoiar tal iniciativa.
O aumento do subsidio em taxa percentual ultrapassava níveis efectivamente incomportáveis. Daí, todo um processo negociai que se desenvolveu e a que não foi possível, por parte da ANOP, responder positivamente para poder operar nas condições que financeiramente o Estado Português estava em condições de assegurar.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Niza para protestar.
O Sr. José Niza (PS): - Quero aqui registar um protesto do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, sendo assim que, lamentavelmente, iniciámos a nossa participação neste debate.
Este protesto tem a ver com o discurso inicial do Sr. Secretário de Estado, que nós entendemos ter sido o discurso da hipocrisia. Começando por, em nome do Governo, dizer que este respeitava a Assembleia da República, a prova é que, por aquilo que aqui estamos hoje a discutir, não só o Governo não respeita a Assembleia como, antes pelo contrário, a desrespeita e não tem por ela qualquer consideração democrática.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Na realidade, aquilo que aqui se passa é muito simples e é o seguinte: o Governo encontra-se hoje aqui não por iniciativa própria mas porque foi interpelado por um partido desta Assembleia - a UEDS - que, constitucionalmente, o obrigou a vir aqui. O Governo não veio, pois, pelo seu pé, foi trazido pela Assembleia da República, e isso é que é importante sublinhar.
Aplausos do PS, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Governo não faz nenhum favor em estar aqui, é obrigado a vir, constitucionalmente. E verificamos que o Governo, que na parte da manhã tinha na Câmara uma larga representação de ministros - talvez envergonhado e surpreendido com uma série de revelações que aqui ouviu, designadamente através da intervenção inicial do meu colega e camarada Lopes Cardoso -, se encontra neste momento apenas representado pelo Sr. Secretário de Estado José Alfaia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Verifico também que não só o Governo não apoia o Sr. Ministro, pelo menos aparentemente, mas também a bancada do CDS se encontra completa-mente deserta, naquilo que diz respeito à sua direcção, o que penso poderá ter como significado, um total afastamento do CDS em relação ao Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social.
Mas a questão fundamental do nosso protesto é a seguinte: o VII e o viu Governo apresentaram a esta Assembleia um Programa de Governo em que, no concernente à comunicação social e o Dr. Magalhães Mota leu há pouco essas partes do Programa - se corresponsabilizavam e responsabilizavam em resolver os problemas da ANOP relativamente ao fomento, à promoção das suas actividades e aos subsídios. Acontece que o Governo não só não fez isso como, pura e simplesmente, resolveu extinguir a ANOP.
E a questão que aqui se põe - que é uma questão de relacionamento entre dois órgãos de soberania - é esta: quais são as garantias que temos em relação a um Governo que vê aqui aprovado um seu Programa que depois não o cumpre?
E isto não tem só a ver com a oposição mas sim com toda a Câmara, com os partidos que apoiam o Governo, porque a questão que neste momento pode passar a pôr-se é a seguinte: o que é que resta, o que é que é válido, o que é que foi abolido no Programa de Governo aqui aprovado em Setembro do ano passado?
O Sr. Secretário de Estado não abordou minimamente esta matéria na sua intervenção inicial. E põe-se também a questão: como é que o Governo, de forma unilateral, rompe com o seu Programa sem sequer fazer uma consulta prévia à Assembleia? Porque é que o Governo entendeu exercer essas suas competências através de um decreto-lei, revogando a aprovação do seu Programa nesta Assembleia?
Esta é uma questão prévia que gostaria de ver esclarecida, independentemente das intervenções de fundo que o Partido Socialista fará no decorrer do debate.
Aplausos do PS. da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Para não alongar os nossos trabalhos, respondia sinteticamente o seguinte: nas vésperas da resolução ter sido tomada pelo Conselho de Ministros avistei-me com a Comissão Parlamentar para a Comunicação Social, a quem dei conta da problemática da ANOP...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Em que mentiu!
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - E o que é que disse à Comissão?
O Orador: - ... e avistei-me igualmente com o conselho de informação para a ANOP.
Em tal Comissão expus qual era a situação da agência noticiosa. Já nessa altura foi referida e explicitada qual a iniciativa que estava em curso no âmbito de todas as empresas da comunicação social e quais as alternativas que se ofereciam ao Governo nesta matéria, em termos de se prosseguir com a agência ou de se apoiar uma
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iniciativa alternativa, aquela ou outra que se perfilasse, conforme consta da própria resolução.
Por outro lado, como já tive aqui oportunidade de referir, não devemos confundir meros instrumentos com objectivos de uma política, e 6 nesse sentido que o contrato feito com a nova agência está em conformidade com a própria resolução do Conselho de Ministros e essa resolução com o que se estabelece no Programa de Governo.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - A resolução prevalece sobre o Programa do Governo!
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contraprotesto.
O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Niza (PS): - Trata-se de um contraprotesto muito breve que tem a ver com o seguinte: o Sr. Secretário de Estado trouxe aqui para a Assembleia uma nova figura de relacionamento político que é «avistar-se com».
O Sr. Secretário de Estado avistou-se com o Conselho de Informação para a ANOP, avistou-se, não sei a que distância, com a comissão de comunicação social e esqueceu-se, pura e simplesmente, de que estas questões devem ser discutidas no Plenário da Assembleia da República.
Há também uma figura que o Sr. Secretário de Estado deveria conhecer que é a da proposta de lei. E não foi apresentada a esta Assembleia nenhuma proposta de lei! O que o Governo entendeu fazer foi um decreto-lei.
Neste momento, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica (Lucas Pires).
Registo a alegria do Sr. Secretário de Estado por se sentir agora um pouco mais apoiado por um membro do Governo estava sozinho mas tenho a impressão de que não ouviu nada daquilo que eu disse.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Ó Lucas Pires, que grande frete!
O Orador: - E como não ouviu, reservo-me para posterior intervenção neste debate.
O Sr. Armando Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Armando Olheira (CDS): - Sr. Presidente, é para usar o direito de defesa em nome do meu grupo parlamentar porque o Sr. Deputado José Niza, no seu protesto inicial, se referiu ao Grupo Parlamentar do CDS.
O Sr. Presidente: - Faz favor.
O Sr. Armando Oliveira (CDS): - O Sr. Deputado José Niza iniciou a sua intervenção lamentando que o Partido Socialista se iniciasse neste debate na fornia de um protesto em relação à intervenção do Sr. Secretário de Estado.
Eu e o meu grupo parlamentar também lamentamos ter de intervir através do uso do direito de defesa por nos sentirmos ofendidos porque o Sr. Deputado José Niza -o que não lhe é peculiar se permitiu fazer um juízo de valor em relação à posição do CDS neste debate, o que não é legítimo.
No fim do debate o Sr. Deputado terá oportunidade de saber qual a posição do CDS. E assim como o Grupo Parlamentar do CDS não teria qualquer legitimidade para avaliar a posição do Partido Socialista por só nesta altura ter intervindo no debate, estou certo de que no fim deste debate o Sr. Deputado verá que o CDS está solidário com esta posição do Governo.
Aplausos do Sr. Deputado Silva Marques (PSD).
O Sr. Mário Tomé (UDP): - A gente já sabia!
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª, Sr. Deputado José Niza, foi interpelado pelo Sr. Deputado Armando de Oliveira no sentido de usar o seu direito de defesa, podendo, portanto, dar a explicação que entender pelo tempo regimental.
O Sr. José Niza (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Orador: - Não quis, de maneira nenhuma, ofender o Grupo Parlamentar do CDS. Se isso não ficou claro, ficá-lo-à a partir deste momento.
O que quis registar, e de forma positiva, no meu entender, é que na primeira fila do CDS, isto é, da direcção do seu grupo parlamentar, não havia nenhuma presença.
Vozes do CDS: - Estão cá atrás.
O Orador: - Ora, quis significar isso de forma positiva e como uma reacção perfeitamente lógica: era a de um total alheamento a uma corresponsabilização com um Secretário de Estado, que nem sequer é do CDS, interpretando isto como uma posição política do CDS.
Se não foi assim, foi bastante pior. Seria melhor que fosse o entendimento que eu tive.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Aquele estragou tudo!...
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, para um pedido de esclarecimento à intervenção inicial do Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: No contrato com a «Notícias de Portugal» o Governo atribui-lhe, até ao fim do ano, 40000 contos. Como parece que essa agência só agora vai começar a trabalhar e só com os serviços estrangeiros, o Governo vai pagar mais até ao fim do ano à «Notícias de Portugal» do que pagaria à ANOP para todo o trabalho que ela desenvolveria com as suas 10 agências e os 260 trabalhadores. Como é que o Governo explica isto?
O Sr. Secretário de Estado disse também há bocado que os trabalhadores da ANOP não tinham entregue qualquer proposta de formação de uma cooperativa quando viram ameaçada a ANOP.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Não, não!
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O Orador: - O senhor disse isso aqui. Toda a gente ouviu.
O Sr. Lopes Cardou (UEDS): - Disse, disse!
O Orador: - Então está a «rementir», quando diz que não disse. Há bocado mentiu dizendo que não recebera, agora diz que sim.
Se os trabalhadores não entregaram esse documento, foi porque o Sr. Secretário de Estado não os quis receber e ainda não respondeu i pergunta de porque é que não os recebeu. No entanto, foi entregue ao conselho de gerência a proposta de estatutos para a formação dessa cooperativa. Que è feito dessa proposta? E porque razão é que logo após a entrega dessa proposta foram avançados 40000 contos à «Notícias de Portugal».
Que pensa o Governo fazer dos equipamentos e móveis que pertencem hoje à ANOP? Vão também para a cooperativa especial «Notícias de Portugal» apoiada pelo Sr. Secretário de Estado?
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, e dado que isto é um debate sobre comunicação social em geral, queria perguntar-lhe como é que justifica a sua presença pessoal na atribuição do prémio a um programa da TV - Dossier Timor -, numa altura em que esse programa estava a ser objecto de inquérito por uma Comissão do Conselho de Informação para a RTP, o que no nosso entender constitui um flagrante desrespeito pelo funcionamento democrático desta Assembleia e pela missão que estava a desenvolver a Comissão de inquérito, dando com a sua presença de membro do Governo o aval ao programa que estava a ser alvo do inquérito.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado, para responder, se assim o desejar.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Em primeiro lugar, o contrato feito com a agência estabelece um pagamento a 3 anos revisível. Portanto, fixa qual o montante deste ano, com um montante inicial e todos os pagamentos subsequentes, pelo que a sua divisibilidade no tempo é em termos da administração que se deve fazer dos fundos que vão sendo pagos pelo serviço por ela prestada. É, pois, dentro deste horizonte temporal que deve ser feita a capitação mensal, para poder fazer comparações com a ANOP.
Por outro lado, também ê um facto que, tendo tido conhecimento de que os trabalhadores da ANOP pretenderiam fazer uma cooperativa, foi mandatado para o efeito o conselho de gerência, como esta manhã tive oportunidade de dizer, no sentido de iniciar tais negociações, o que teve lugar no dia imediato à sua tomada de posse. Foi-lhes dado um prazo de 8 dias e ao fim de 3 semanas entregaram, efectivamente, como disse esta manhã, um projecto de estatutos que, no entanto, não estava completamente formalizado, uma vez que das várias figuras alternativas de cooperativa a que se proporiam, reconheciam no termo que nenhuma delas satisfazia os interesses dos trabalhadores e remetiam para o Governo o encontrar uma solução.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - E a solução que o Governo encontrou foi extinguir a ANOP e pôr os trabalhadores no desemprego!
O Orador: - Por outro lado, pergunta também o Sr. Deputado qual o destino a dar aos equipamentos da ANOP. É um facto que a ANOP existe - a ANOP só pode ser extinta mediante um decreto-lei ou lei aprovada nesta Assembleia- e tem os seus equipamentos. É porque ela existe que coube ao conselho de gerência tomar as medidas necessárias, nos termos das leis das empresas públicas e da legislação em vigor, que permitissem viabilizar a continuação do seu funcionamento.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado que a seguir está inscrito para pedir esclarecimentos, desejava prestar à Câmara, desde já, uma informação que me parece de vantagem para que todos VV. Ex.ªs estejam prevenidos em função da boa orientação dos nossos trabalhos.
Como VV. Ex.ªs sabem, está simultaneamente reunida em trabalho, tal como nós aqui, a Comissão das Relações com os Parlamentos Nacionais e o Público da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, em cujo programa de trabalho está previsto um intervalo às 17 horas e 30 minutos, intervalo esse que a mesma Comissão aproveitará para um contacto com os representantes dos órgãos de comunicação social que se encontram na tribuna que lhes é atribuída neste Plenário. Para que não sejam privados de tomarem os elementos que bem entenderem sobre a reunião do Plenário e tenham toda a possibilidade de fazer esse contacto com a Comissão do Conselho da Europa que referi, o nosso intervalo será impreterivelmente, às 17 horas e 30 minutos.
Dou a palavra, para um pedido de esclarecimento, ainda em relação à intervenção inicial do Sr. Secretário de Estado, ao Sr. Deputado João Corregedor.
O Sr. Joio Corregedor (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de fazer as rápidas perguntas que tenho de fazer, já que o meu partido tem apenas 20 minutos e o Governo tem 230 minutos, queria dizer que o Sr. Secretário de Estado se refugia muito no Conselho de Informação. É um facto que o Sr. Deputado Jorge Lemos já lhe deu uma resposta, mas o Sr. Secretário de Estado voltou agora a referir o Conselho de Informação.
Realmente o Sr. Secretário de Estado foi duas vezes ao conselho de informação a requerimento meu e uma das vezes fui obrigado a invocar a lei perante o Presidente do Conselho de Informação para que o Sr. Secretário de Estado comparecesse, dados os sucessivos adiamentos de V. Ex.ª
A propósito das reuniões que teve connosco quero lembrar-lhe que o Conselho de Informação aprovou uma deliberação e nesse Conselho estão representados todos os partidos, incluindo o seu na qual se reconhece o importante papel desempenhado pela ANOP, pronunciando-se pela reestruturação da ANOP sem que sejam postos em causa os postos de trabalho- e manifestando a sua firme oposição a quaisquer projectos que tenham como objectivo o encerramento da ANOP.
Referiu-se, também, o Sr. Secretário de Estado ao prazo de 8 dias para os trabalhadores apresentarem os estatutos de formação de uma cooperativa. Queria lembrar à Câmara que, por exemplo, a «France Press», uma das agências noticiosas internacionais mais conhecidas, para elaborar o seu projecto de estatutos e o estudo económico demorou 12 anos. V. Ex.ª concede aos trabalhadores da ANOP 8 dias para apresentarem um projecto. Mas há resposta para isso: no dia 19 de Agosto o conselho de gerência deu 8 dias para os trabalhadores
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apresentarem a proposta de estatutos e o estudo económico; a resposta foi apresentada no dia 25 de Agosto, 6 dias depois, através de um memorando com as linhas gerais, dado ser impossível em 8 dias juntar todos os trabalhadores e discutir um documento desses, como o senhor naturalmente sabe; em 10 de Setembro, foi apresentado ao conselho de gerência o projecto de estatutos e orçamento de exploração da cooperativa para 1983 -os trabalhadores já tinham uma proposta para 1983 - e 12 dias depois o conselho de gerência apresentou uma nota crítica, a que os trabalhadores responderam, não havendo até agora qualquer tipo de resposta.
Isto é só para esclarecer a Câmara, pois não há nada, por vezes, como esclarecer. O conselho de gerência da ANOP está a assistir a este debate, o Sr. Coronel Tadeu Ferreira está lá em cima na tribuna, queira pois V. Ex.ª fazer-lhe estas perguntas.
Agora algumas perguntas muito rápidas. Qual o valor desta aventura para o encerramento da ANOP - e não se preocupe com a palavra aventura, porque é isso mesmo- em indemnizações e no equipamento? É verdade ou não que no contrato com a ANOP estão previstas correcções anuais, devido à taxa de inflação, e qual o seu valor relacionado com as quotas dos órgãos de comunicação social estatizados? Em que condições foi fornecido à ANOP o edifício da Televisão à Lapa? Como vai garantir a ANOP o pagamento dos vencimentos, sabendo-se que já não há dinheiro para pagar os ordenados deste mês? Vai ou não o Governo cumprir as suas obrigações, facilitando à ANOP as verbas necessárias e já solicitadas pelo conselho de gerência para a cobertura da campanha eleitoral das autarquias? Finalmente, quais as verdadeiras dívidas ao Estado da imprensa capitalista?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: - Em primeiro lugar, congratulo-me com a intervenção do Sr. Deputado, já que permitiu confirmar e esclarecer o que eu disse antes, de que efectivamente o conselho de gerência da ANOP iniciou negociações com os trabalhadores.
Em segundo lugar, queria sublinhar que desde há longa data se fala da necessidade de reformulação dos estatutos da ANOP. São de longa data os documentos disponíveis na Secretaria de Estado e produzidos por todas as instâncias dentro da agência noticiosa quanto à imperatividade da reformulação dos seus estatutos. Não é um acontecimento de hoje. É um acontecimento pensado de longa data e assim o reconhecem todos os directores da ANOP em relatório que me foi enviado em Julho.
Por outro lado. o contrato estabelecido com a «Notícias de Portugal» não diz em que termos é feita a indexação. Diz que será objecto de revisão, mas não fixa parâmetros de indexação.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Ainda por cima!
O Orador: - Em matéria de quotas, como o Sr. Deputado sabe, trata-se de uma cooperativa e como cooperativa é aberta...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Se o Sr. Deputado o permitir eu concluo este aspecto.
Tratando-se, dizia eu, de uma cooperativa e. como tal, o acesso é aberto e cada membro da cooperativa tem um e um só voto, independentemente do volume de serviço que utilize, independentemente da participação que tenha no capital dessa mesma cooperativa.
Quanto à cedência do edifício, tanto quanto eu sei, foi um arrendamento que a Radiotelevisão Portuguesa fez à agência, sendo a RTP como é. também, um membro cooperante.
Quanto à questão dos vencimentos, na medida em que o Governo foi surpreendido com a devolução do diploma, isso terá que ser objecto de debate em Conselho de Ministros, porque como sabe as verbas atribuídas às empresas de comunicação social e às empresas em geral, em matéria de subsídios de exploração, estão determinadas por resolução do Conselho de Ministros de 25 de Julho.
Em relação à cobertura das eleições autárquicas, é evidente que o Governo dará a essa matéria a maior atenção...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já está a dar e de que maneira!...
O Orador: - ... e dará garantias para que haja cobertura nas eleições autárquicas.
Protestos do PS, do PCP, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso. V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado tinha-me feito sinal de que me permitiria a interrupção momentos depois do meu pedido. Ora, não chegou a fazê-lo. seguramente, por lapso.
O Sr. Presidente: - Mas. Sr. Deputado, se ele não lhe permitiu a interrupção...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Foi por lapso. Temos sido tão complacentes com os lapsos do Sr. Secretário de Estado que V. Ex.ª podia ser também com este.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, pese embora o muito respeito que a Mesa tem pelo profundo conhecimento que V. Ex.ª tem do Regimento, o lapso não é figura regimental que atribua à Mesa a faculdade de lhe dar a palavra.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Exacto, Sr. Presidente. Resta saber se este Secretário de Estado é figura regimental. Acho que não, mas aceito a sua posição.
Protestos do Sr. Deputado Silva Marques (PSD), batendo com a palma da mão no tampo da carteira. Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a expressão que usei significava e referia-se a figura regimental. O aproveitamento que V. Ex.ª possa ter feito da minha expressão para lhe dar outro sentido nada tem a ver com o que a Mesa pretendia significar.
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Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A figura parlamentar da interpelação tem sido a fornia mais utilizada pelos grupos parlamentares para suscitar um debate sobre um tema candente da actualidade nacional.
Ela permite por um lado aos deputados expor os seus pontos de vista sobre esse assunto. Não menos importante é a circunstância da interpelação visar obrigar o Governo a esclarecer o Parlamento e o País.
A expressão obrigar não è neste caso demasiado pesada. Uma das características deste Governo, nas suas relações com o Parlamento, é o desprezo a que o vota.
O que digo pode ser provado. Tomemos o caso dos requerimentos dos deputados. Durante a II Sessão Legislativa, desde Outubro de 1981, até Setembro de 1982, os deputados desta Assembleia dirigiram um total de 176 requerimentos sobre matéria de Comunicação Social ao Governo ou às empresas públicas sob a sua tutela. Destes 176 requerimentos apenas 42. ou seja menos de um quarto, tinham sido respondidos até ao princípio desta sessão legislativa. Ficaram por responder entre outros, requerimentos sobre a reestruturação da RDP-Norte, acerca do corte do subsídio ao jornal Em Marcha, sobre o despedimento pela RTP do jornalista José Mensurado, sobre remunerações dos profissionais no sector público da comunicação social, sobre o encerramento de diversas delegações da ANOP, programa da RTP «Topo Giggio», contrato de viabilização do jornal O Dia, situação dos trabalhadores de A Tribuna, programa da RTP «Jornal Economia», parecer da comissão designada pelo Governo para estudar o problema da concessão de um canal da TV à Igreja Católica, condições de admissão do jornalista Torquato da Luz para director do 2." canal da RTP, admissão de jornalistas na RTP sem concurso, contrato entre a RTP e a Associação Cívica para a Revisão Constitucional para a produção de filmes, extinção da ANOP, critérios do subsidio ao papel, suspensão do jornalista da RTP, Pinto Coelho, critérios de montantes de créditos bancários fornecidos a empresas de comunicação social, etc., e te., etc.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Há diversos requerimentos que aguardam resposta do Governo há mais de l ano. Outros levaram meses a ser respondidos. O Governo precisou de mais de 7 meses, desde 13 de Novembro de 1981 a 23 de Junho de 1982, para enviar aos deputados uma simples cópia dos requerimentos da Igreja Católica, solicitando a concessão de um canal de televisão e continua, até hoje, a recusar-se a fornecer o parecer pedido vai para l ano da comissão designada para estudar juridicamente o problema.
Não vos tirarei mais tempo com esta face do estilo governamental. Apenas um exemplo, agora dos requerimentos contabilizados como sendo de resposta do Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para a Comunicação Social. A 3 perguntas acerca da ANOP, sobre se «o Governo estava em condições de garantir que a «terapêutica de fundo» de que falava o Secretário de Estado Dr. José Alfaia não afectaria a qualidade, o pluralismo e o rigor da informação produzida, e por outro lado os projectos de regionalização, expansão junto
da emigração e dos países de língua portuguesa e ainda sobre se o Governo entendia «terem sido tomadas todas as medidas adequadas à viabilização financeira da ANOP», respondeu o gabinete do Dr. José Alfaia com esta argumentação esmagadora: sim, sim e sim!
Risos.
Pouparei aos Srs. Membros do Governo o trabalho de procurarem o requerimento que citei para que possam, como é seu dever, responder agora cabal e detalhadamente às perguntas que lhe são dirigidas pelos deputados. No final da minha intervenção entregar-vos-ei um dossier contendo esse requerimento, a que juntarei todos os que foram feitos e não respondidos durante a II sessão legislativa.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - O diálogo e a concertação, o respeito pela opinião das minorias e pela própria liberdade de expressão não são os fortes deste Governo e o pior é que este estilo tem sido transmitido a quem dirige as empresas públicas de comunicação social.
Nestes anos de governação AD são já inúmeros os casos de jornalistas colocados na inactividade, suspensos ou pura e simplesmente despedidos, de programas suspensos, proibidos ou extintos, de exemplos de pura perseguição pessoal. Não é necessário ser exaustivo nesta matéria, já que os casos, na sua maioria, foram suficientemente divulgados. Lembrarei apenas alguns casos exemplares e mais esquecidos.
Todos se recordarão, por certo, da suspensão do programa da RDP «Praça Pública» em Fevereiro deste ano, depois de uma malograda entrevista com um dirigente da CGTP. Na altura, a RDP deliberou, além dessa suspensão preventiva proceder a um inquérito aos factos ocorridos entre a direcção de informação e os responsáveis pelo programa. Até hoje, nunca mais nada se soube desse inquérito, mas o programa continua suspenso e os jornalistas que o elaboraram, com uma competência e capacidade unanimemente reconhecidas, estão desde então na total inactividade.
Um outro exemplo, agora sobre a RTP. Por ter chamado ao Dr. Proença de Carvalho «Maquiavel à moda do Minho», no que terá sido extremamente comedido, diga-se de passagem, o jornalista José Mensurado foi despedido. Há algumas semanas, uma responsável por um programa das tardes de domingo lembrou-se de pedir a este jornalista que recordasse no programa um episódio relacionado com a sua passagem pelo jornal O Século. O resultado desta lembrança foi a deliberação tomada, segundo a qual os nomes dos convidados para programas em directo precisam de ser expressa e previamente aprovados pela Direcção de Programas. Moral da história: os adversários pessoais do Dr. Proença de Carvalho não podem ter acesso à televisão. Em contrapartida, não será necessário fornecer a lista de amigos, colegas de escritório e afilhados diversos que têm esse acesso garantido...
Vozes do PS, do PCP, da UEDS e da UDP: - Muito bem!
O Orador: - Um terceiro exemplo, também sobre a RTP. Há cerca de 1 ano a televisão passou a transmitir quinzenalmente um programa intitulado «Magazine de Cinema».
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Este programa que funcionava como uma espécie de guia do espectador, analisando os mais importantes filmes em exibição do nosso país, viria rapidamente a sofrer toda a espécie de pressões da direcção de programas. Depois de transmitir duas entrevistas com personalidades do mundo do cinema que um responsável da RTP resolveu catalogar como comunistas, o programa foi suspenso. O seu autor era José Vieira Marques, director do Festival de Cinema da Figueira da Foz desde 1972, membro do júri de vários festivais internacionais de cinema e mais um intelectual de valor indiscutível a que esta televisão fecha também as suas portas.
Vozes do PS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Um último exemplo, o do serviço de notícias do 2.º canal da RTP, o Informação 2. Este noticiário foi durante muito tempo um oásis de qualidade e de rigor informativo. A partir de certa altura, tudo foi feito para diminuir o impacto deste programa: primeiro, a substituição e afastamento dos responsáveis, depois a asfixia através das dificuldades de fornecimento do mínimo apoio material, mais tarde a recusa em autorizar a deslocação de enviados especiais (um exemplo apenas: um jornalista para acompanhar o debate sobre Timor-Leste na ONU), finalmente a suspensão do Informação 2 durante um mês e depois a sua mudança para o mesmo horário do Telejornal do 1.º canal. É claro que todos estes factos levaram à perda de audiência do Informação 2, justificação encontrada pelo Dr. Proença de Carvalho para acabar com ele.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é possível debater a política de comunicação social deste Governo sem abordar o caso ANOP. Ao fazê-lo, não pretendo comparar o que a AD prometeu no seu Programa de Governo ou em declarações de alguns dos seus membros sobre a matéria e o que afinal veio a ser feito. O caso ANOP é ainda muito mais do que o não cumprimento do Programa do Governo ou o desrespeito por esta Assembleia.
Ele começa por ser paradigmático do estilo de actuação deste Governo. Todas as medidas tomadas pelo Governo sobre esta matéria foram sendo escamoteadas aos principais interessados e ao próprio país até serem realizados.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Governo recusou-se a receber os trabalhadores da ANOP, não atendeu as suas reclamações e propostas, nem os consultou. Não ouviu o próprio conselho de gerência que nomeou. Não consultou o Conselho de Informação para a ANOP, violando expressamente a lei. Não ouviu o Conselho de Imprensa, violando igualmente a lei. Não disse a verdade - isto é, não anunciou a intenção do Governo de extinguir a ANOP- perante a Comissão Parlamentar de Comunicação Social - e aqui reponho a verdade- numa reunião que só se viria a realizar duas semanas depois de ser requerida por ausência nunca cabalmente justificada do Secretário de Estado, Dr. Alfaia.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Que vergonha!
O Orador: - Permitiu que sobre o futuro da ANOP fossem tecidas as mais hipócritas declarações, exemplos, entre outras, da entrevista do Dr. Macedo e Cunha ao Diário de Lisboa, em 26 de Agosto, em que este responsável pela nova agência insinua nada saber ou nada ter a ver com o encerramento da ANOP, ou das declarações no mesmo sentido anteontem proferidas ao Telejornal pelo Secretário Geral da NP.
O problema da extinção da ANOP não deve, no entanto, apenas ser visto pelo lado ético ou sob o prisma do debate acerca do modo de fazer.
Que terá levado o Governo a ir tão longe no caso ANOP? As principais razões invocadas têm sido, em primeiro lugar, por se considerar que ela estava «na dependência do Governo», sendo por isso, conforme se escrevia no texto da Conferência de Imprensa dada pelo Executivo a 29 de Julho, -passo a citar- «factor de distorção no domínio da liberdade da informação» e, em segundo lugar, de natureza económico-financeira: a ANOP teria um quadro de pessoal empolado, com uma capitação de encargos com pessoal insuportável e constituiria por estas e outras razões um encargo excessivo para os fundos públicos.
Analisemos um a um estes argumentos. Em primeiro lugar, a alegada dependência perante o Governo. Todos os estatutos das empresas públicas portuguesas de comunicação social as colocam na dependência do Governo, não apenas do ponto de vista financeiro, mas sobretudo por via daquilo que já agora foi designado nesta Assembleia por «cadeia hierárquica de controle político» que começa no Governo, passando pelos gestores que aquele designa livremente e acaba nas direcções e chefias mais ligadas à produção informativa. O caso da ANOP não é pois inédito, mas é singularmente o único que preocupa o Governo da AD.
Há de facto uma dependência do Governo, mas a lição a tirar é o da necessidade de mudar a forma de nomeação dos gestores e directores, retirando-a do livre arbítrio governamental. Pena é que a AD não tenha querido acolher as experiências estrangeiras sobre a matéria ou manifestado estas preocupações aquando da revisão constitucional.
O Governo pretende agora demonstrar a excelência da solução «cooperativa independente de utentes». Esta fórmula tem variadíssimos pontos fracos. É criada, fomentada privilegiada e financiada pelo Estado, numa clara violação dos princípios cooperativos. Tem uma forte componente de empresas estatizadas, com gestores nomeados pelo Governo e a ele fiéis que a controlarão politicamente, como já é visível na escolha das chefias de informação. Terá objectivos que têm a ver com os meros propósitos imediatos dos órgãos de informação que ocasionalmente dirijam a cooperativa e não com os interesses da opinião pública e do País. Visará obter pelo menor custo possível as informações e o tipo de notícias que os seus proprietários quiserem e não aquilo que o Pais exige. Afastará totalmente a ideia de serviço público, com um custo social suportado pelo Estado, desperto para a cultura portuguesa, atento ao desenvolvimento regional, às comunidades de emigrantes e à política externa do Pais nomeadamente nas suas relações com os novos países de expressão portuguesa. Poderá ser um serviço para alguns jornais, para esta rádio e para esta televisão segundo os seus critérios egoístas e ao sabor das suas influências e não um serviço para o País, para os milhões de consumidores de informação e para o povo português. Esta falsa cooperativa assim não serve.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
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Os argumentos segundo os quais a extinção da ANOP é explicada por razões de natureza económico-financeira são mais variados, mas menos convincentes ainda, tanto mais que demonstraram apenas claramente a enorme responsabilidade do Governo AD e os gestores por ele nomeados na degradação da situação da ANOP. O Governo é responsável pela situação financeira da ANOP, porque nunca lhe concedeu uma verba susceptível de permitir uma política de investimentos, quer para a expansão, quer para a modernização dos seus serviços. É responsável porque nunca compreendeu ou não quis compreender que o baixo preço do serviço que a ANOP presta aos órgãos de informação é uma forma de subsidio indirecto que tem de ser contabilizado a seu favor. É responsável porque permite que algumas empresas que devem milhares de contos à ANOP, casos da RTP, da RDP e da EPNC entre outros, financiem uma nova agência. É responsável ainda, porque por despacho do próprio Secretário de Estado Luís Fontoura foi aprovado e sancionado o quadro de pessoal da ANOP com o empolamento criado por uma gestão sem qualquer critério.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É verdade que a ANOP, tal como existia, constituía um pesado encargo para os fundos públicos, mas a total responsabilidade do Governo nessa matéria deveria torná-lo mais atento às razões que tornam a sua extinção uma medida arbitrária e injustificada, que arrasta mais umas largas dezenas de jornalistas e outros profissionais da informação para o desemprego. O Governo não pode, aliás, argumentar com o desconhecimento da situação que se vivia já que em Novembro de 1981, há precisamente l ano, o Conselho da Redacção solicitou, em exposição enviada à Secretaria de Estado das Finanças, a fiscalização da forma como os dinheiros públicos estavam a ser geridos na ANOP.
A ANOP exigiria, assim, uma reestruturação, tantas vezes solicitada pelos próprios trabalhadores e anunciada pelo próprio Governo. Ela e só ela permitiria manter o rigor informativo unanimemente reconhecido e elogiado por todos os órgãos de informação, por todos os profissionais do sector, por todas as forças políticas.
O Ministro Rebelo de Sousa disse no princípio deste ano à Rádio Renascença que a extinção da ANOP "seria uma estupidez". Tem razão o Ministro se analisarmos . apenas o desgaste que esta medida provoca na imagem pública do Governo e a quantidade de vozes discordantes que se levantam na própria AD. Mas esta «estupidez» do Governo não é tão inocente: o Executivo quer ver-se livre do sector público e conseguiu que a agência noticiosa portuguesa saísse desse sector; quis assegurar o controle dessa agência e conseguiu-o com a asfixia de uma agência e o início da outra, mudar as chefias e afastar alguns jornalistas com meros critérios políticos. A «estupidez», do Governo foi pois apenas relativa.
Sr. Presidente, Srs. membros do Governo, -constato que o Sr. Secretário de Estado está só; penso que o seu drama é nesta questão estar só - ...
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
Srs. Deputados: Já se passaram mais de dois anos sobre a publicação da Lei-Quadro da actividade publicitária. No entanto, o Governo ainda não se dignou constituir e empossar o conselho de publicidade, órgão a quem compete o exercício de funções da maior relevância na moralização dessa actividade. E bem preciso seria que o fizesse. O que se passa no domínio da publicidade, por exemplo, na RTP, deveria merecer desse conselho ou do próprio Governo uma atitude bem diversa da actual.
Os primeiros organismos a chamarem a atenção para o problema do completo desrespeito da legislação sobre publicidade foram os Conselhos de Informação. O Conselho de Informação para a Rádio, por exemplo, denunciou a seu tempo o que se passava naquele órgão de comunicação: diversas marcas eram anunciadas de forma ilegal e havia mesmo um contrato entre a Comissão Administrativa da RDP e uma empresa de tractores - de que tenho cópia que juntarei a este dossier - que visava a emissão de referências a essa marca de tal modo - cito o texto do contrato - «que não ostente na sua forma o seu cunho de mensagem publicitária». Esta forma ilegal de publicidade -que em qualquer pais europeu acarretaria pesadas sanções - terminou, mas prosseguem na radiodifusão os programas com música editada por esta ou aquela empresa discográfica ou com concursos que oferecem livros da livraria «x» ou «y».
A situação na RDP tem todavia melhorado nesta matéria. Ao invés, na Televisão, a publicidade ilegal invade cada vez mais programas e atinge formas cada vez mais descaradas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - São hoje diversos os programas com grande audiência que incluem publicidade ilegal, desde a promoção de empreendimentos turísticos até bebidas alcoólicas.
No entanto, foi na telenovela «Vila Faia» que a publicidade oculta atingiu maior dimensão, sucedendo-se as mensagens publicitárias dissimuladas. Posso fornecer-vos alguns dados sobre esta questão: no período de 26 de Agosto a 25 de Setembro, nos 25 episódios transmitidos, foram passados cerca de 200 planos com publicidade oculta - ou que a lei da televisão define como não tendo a assinalá-la um indicativo inequívoco. Posso prová-lo mostrando à Câmara fotografias de alguns desses planos.
Neste momento, o Orador exibe diversas fotografias.
Esta, por exemplo, é publicidade do Português Suave, que foi frequentíssima, conforme se recordam.
Esta mostra publicidade da GALP, que aparece em latas e num galhardete. Tenho pena que a fotografia seja relativamente pequena.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não se vê!
O Orador: - Fornecerei, depois, ao Sr. Secretário de Estado estas fotografias para ele poder ajuizar.
Aliás, toda a gente as pôde ver na Televisão na altura em que passaram.
Houve, por exemplo, publicidade a vários produtos da BDF: Nívea, 8X4, Limara, etc.
Também apareceu publicidade da Campal.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Agradeço a concessão da interrupção.
Apenas gostaria de propor que os documentos fossem reproduzidos no Diário da Assembleia de modo a que pudessem ser conhecidos por todos os deputados, inclusive por aqueles que não estão a ver bem as fotografias.
Aplausos do PS, do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
O Orador: - Agradeço, Sr. Deputado, a ideia que nos deu.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Arons de Carvalho desculpará a interrupção, mas devo dizer que, como se trata de um requerimento a Mesa terá que considerar a possibilidade legal e regimental de reprodução de imagens fotográficas.
Se for possível, o seu requerimento será atendido.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor de continuar a intervenção, Sr. Deputado Arons de Carvalho.
O Orador: - Esses 200 planos, a uma média de 6 por dia, publicitaram cerca de 3 dezenas de marcas das quais cito apenas algumas para avivar a memória: Compal, Farinha Branca de Neve, Português Suave, Renault, Mercedes, Correio da Manhã, Sumol, Aldeia Velha, Macieira, Centrei, etc. Poupo os Srs. Deputados à leitura das 30 e tal marcas, mas não pouparei o Governo à sua lista completa. Segue no dossier que entregarei e creio que a Assembleia gostaria de saber o que vai o Governo fazer dela.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Apenas sobre esta matéria mais alguns apontamentos: a violação das leis relativas à actividade publicitária é tão clara que houve sequências de imagens que continham nada menos do que três ilegalidades simultâneas. Por exemplo, em algumas cenas em que personagens bebiam 1 brandy com o rótulo da garrafa bem à vista. Primeira ilegalidade: a publicidade em causa era dissimulada e sem indicativo a assinalá-la (violação do artigo 11.º da Lei da Televisão e do artigo 6.º do Código de Publicidade). Segunda ilegalidade: a sequência continha imagens do acto de beber (violação do artigo 24.º do referido Código). Terceira ilegalidade: as imagens foram transmitidas antes das 21 horas e 30 minutos, sendo certo que o mesmo artigo proibe publicidade a bebidas alcoólicas antes dessa hora.
Uma outra referência elucidativa: houve na mesma telenovela publicidade dissimulada a diversas marcas de cigarros, o que a mesma lei proibe expressamente. Estou em condições de garantir à Assembleia que houve actores não fumadores na sua vida real que foram obrigados a fumar, rótulo do maço de tabaco bem virado para a câmara. Outros, a exemplo do actor João Perry, recusaram-se dizendo para encurtar razões: «Sou actor, não sou anunciante».
Mas volto a citar o Código de Publicidade, desta vez para referir apenas o disposto no artigo 35.º: a difusão de publicidade oculta ou dissimulada será punida com uma multa de 100 a 1000 contos...
Um último apontamento sobre esta matéria: enquanto que em Portugal é a própria empresa concessionária de publicidade, a Movierecord, com a plena conivência da Administração da RTP, quem fomenta e comercializa este tipo de ilegalidade a que eufemisticamente chama «publicidade de cena», em Espanha, aqui mesmo ao lado, a simples transmissão da cidade de Huelva, em Agosto passado, de um Festival da Canção Popular Espanhola patrocinado pelas «Galerias Preciados» levou a TVE a difundir uma rigorosa directiva, já aplicada posteriormente, reiterando a estrita proibição de qualquer forma de publicidade indirecta ou estática, com excepção neste último caso para as transmissões desportivas e taurinas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é pois o panorama em grande parte do sector público da comunicação social. A crítica cerrada que quisemos fazer não é porém a condenação desse sector público, mas a condenação da forma como o Governo o gere e controla.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - O PS continua a entender que o que está mal em muitos órgãos de informação não é o facto de eles pertencerem ao sector público mas a forma como o Governo AD se aproveita da circunstância de ter mecanismos para os controlar e manipular. Aliás, nesta matéria, não escapa ao PS a tendência existente nesta fase pré-eleitoral para tornar mais nítida ainda a utilização da cadeia hierárquica de controle político de que falámos atrás. Está na memória de todos a vergonhosa manipulação feita por ocasião das últimas campanhas eleitorais. Que ela se não repita!
Em qualquer circunstância, porém, o PS bater-se-á para que o actual sector público da comunicação social seja pluralista, rigoroso e cumpra a sua função de serviço público. A passagem de fatias desse sector público para o sector privado ou a sua gestão com critérios de pura comercialização, como respectivamente se fez com a Notícias de Portugal e como se anuncia no acordo de saneamento económico e financeiro da RDP querer vir a fazer com a Rádio Comercial merecem uma total reprovação.
Importa pois democratizar a comunicação social do Estado e torná-la verdadeiramente independente do Governo. Não pode continuar uma situação em que a maioria das direcções de informação e as diversas chefias deste sector não têm a confiança ou o apoio dos jornalistas. Não pode continuar uma situação em que os jornalistas não- são ouvidos para a reestruturação das redacções, nem para os seus próprios horários de trabalho. Não pode continuar uma situação em que os jornalistas não participam minimamente na marcação dos serviços e na orientação da publicação para que trabalham.
A legislação portuguesa garante hoje em teoria aos jornalistas direitos não muito comuns nos regimes mais liberais do nosso continente. Em matéria de sigilo profissional, conselhos de redacção, na chamada cláusula de consciência, a nossa legislação faz inveja a muita gente. Mas a situação real dos jornalistas portugueses é muito mais penosa. O mal-estar, a insegurança, o desemprego, a profunda desmotivação são hoje realidades bem mais palpáveis que se reflectem na informação produzida. Cito um comunicado do demissionário Conselho de Redacção da Rádio Comercial:
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Ninguém desta redacção se sente mobilizado. Manda-se gravar o telefonema do sindicato; manda-se aceitar o despacho do correspondente; espera-se o telex de agências. Quando o rei faz anos... telefona-se para a conferência de imprensa, ou para a personalidade nas bocas do mundo. Vir para a Sampaio e Pina é quase sempre uma obrigação penosa que se procura aliviar fazendo o mínimo possível durante o menor número de horas...
Continuo a citar:
Muito do que hoje se passa é a consequência inevitável de uma acção perfeitamente vergonhosa, em termos profissionais, dos responsáveis da empresa em geral e do departamento em particular, porque querem esta Redacção sem meios sem estímulos e sem tempo e espaço para produzir uma informação correcta e interessante. Não há carros, não há gravadores, não há estúdios, não há máquinas de escrever, não há revistas nem jornais. Não há sobretudo grelha para produzir mais, produzindo melhor. As tentativas para a elaboração de magazines e jornais especiais morreram nas gavetas de quem manda.
Este texto è elucidativo sobre a situação que se vive em muitas redacções e entre muitos jornalistas e, curiosamente, ela descreve o estado de espírito e a realidade existente naquela que fará porventura a informação mais bem feita e pluralista do País. Em outras redacções a situação é ainda bem pior. Há profissionais a quem há meses não é distribuído qualquer serviço ao mesmo tempo que são admitidos sem concurso jornalistas afectos a quem manda. As agendas das redacções são criteriosamente preparadas. Hoje, no Telejornal da Televisão por exemplo a manipulação reside mais no critério de selecção das notícias do que no seu conteúdo. Entretanto, o critério de escolha dos gestores, dos directores e das principais chefias não é o da qualidade, mas o da qualidade de serem da AD.
Cito, a terminar, um artigo do Expresso de há 2 anos em plena governação da Aliança Democrática: «Os nomes conhecidos dos novos dirigentes escolhidos pelo Governo para a comunicação social estatizada revelam duas coisas: que o Governo deixou congelado o ideal platónico de não intervir na informação estatizada e vai pretender retirar o maior proveito político possível da sua orientação; que portanto o Governo finalmente admitiu que a sua imagem pública corria o risco de ser muito menos favorável do que aquilo que seria de esperar atendendo à correlação de forças a nível político global.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Temos deste modo à frente da gestão das instituições informativas controladas pelo Estado pessoas escolhidas de acordo com um critério político e que obviamente actuarão em conformidade com esse critério». Resta-me dizer que o autor deste artigo é o Dr. Marcelo Rebelo de Sousa.
Aplausos do PS. do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
Terminada a intervenção, o Sr. Deputado Arons de Carvalho dirigiu-se à bancada do Governo entregando ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro
para a Comunicação Social (José Alfaia) o «dossier» que referiu durante a sua intervenção.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Arons de Carvalho, parece fácil criticar mas não é. Fácil é fazer demagogia ou, pelo menos, abordar certas questões.
Neste momento, ouvem-se alguns comentários pelo facto de se acenderem os holofotes existentes na Sala para as filmagens da televisão.
O Orador: - Claro, são os privilégios da maioria. Lá virá o vosso tempo e a vossa oportunidade, que aliás já tiveram.
Protestos do PS.
Meus caros amigos, estou longe do privilégio do Capitão Paulino. De maneira que já progredimos imenso.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - É a 6.º Divisão!
O Orador: - Não podiam pretender que, apesar de tudo, a maioria fosse tão desafecta dos bens terrenos do écran da televisão. Peço, portanto, que nos desculpem esses pecadilhos.
De qualquer modo, espero aparecer em grande plano.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Aparece, com certeza!
O Orador: - Sr. Deputado Arons de Carvalho, como eu estava a dizer, parece fácil criticar mas não é. É fácil fazer demagogia e sobretudo é mais difícil criticar quando se pretende, quando se devia ou quando eventualmente seria de esperar que essa crítica fosse a elaboração de uma alternativa de Estado ou de governo. É realmente difícil criticar sob o ponto de vista desta óptica. Já não vou pegar num expediente de gosto duvidoso, ou seja, o de o Sr. Secretário de Estado estar só.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Mais vale só do que mal acompanhado!
O Orador: - Sem dúvida, Sr. Deputado! Risos do PS.
Não vou discutir com VV. Ex.ªs a bondade das companhias.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por muito cordial que seja a vossa disposição recíproca, tenham a bondade de não estabelecer diálogo.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Silva Marques.
O Orador: - De qualquer modo, estará, V. Ex.ª, Sr. Deputado Arons de Carvalho, também só relativamente ao caso de O Século?
Peço-lhe desculpa por invocar um incidente já distante, mas foi V. Ex.ª que o referiu de corrida.
Está efectivamente só? Esteve de acordo com a medida governativa tomada relativamente ao jornal O Século!
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V. Ex.ª manifestou espanto quanto ao atraso da parte do Governo no envio dos documentos pedidos pela Comissão. Devo dizer que não contesto esse atraso, pois vivemos num País em que, em termos de atrasos burocráticos, eles são flagrantes. Se V. Ex.ª quiser reduzir a isso a sua crítica, não vai longe, pois neste ponto não é comigo que faz guerra.
O que é que o impressiona mais: o atraso por parte do Governo no envio desses pedidos de informação ou o atraso na entrega das indemnizações aos trabalhadores de O Século!
V. Ex.ª diz também que o Governo não responde aos requerimentos. Se quisesse fazer um esforço de alguma objectividade, teria tido eventualmente a iniciativa de nos dar uma panorâmica comparativa. Traga-nos as percentagens das respostas aos requerimentos relativamente aos governos anteriores e eu dou de barato que eventualmente seja o actual Governo que está em falta.
Penso que seria muito útil fazermos um esforço, não - como eu dizia há pouco- de crítica fácil, mas de enquadramento dos assuntos. V. Ex.ª devia ter tido esse trabalho. De qualquer modo, se tiver mais alguma indicação sobre essa matéria, seria muito útil focá-la para todos nós.
Diz ainda V. Ex.ª que a actual maioria é uma máquina esmagadora de perseguição política, que corre com os jornalistas, e te.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Quase todos!
O Orador: - Ah, quase todos. Já estamos no «quase».
Pergunto-lhe então o seguinte: considera que devia estar no «quase», ou a atitude crítica de V. Ex.ª é pelo facto de não estar no «quase». Desafio-o a analisar documentalmente a questão. O quadro geral dos colaboradores das empresas de comunicação social estatizadas 6 pluralista. Podemos discutir se a proporção do pluralismos podia ser maior ou menor. De qualquer modo, creio que é inquestionável que esse quadro geral é pluralista. Penso que é insustentável a acusação de que a actual maioria tem exercido uma perseguição sistemática por razões de natureza político-partidária.
Peço, pois, que me esclareça sobre estes assuntos.
Aplausos do PSD e alguns deputados do CDS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Arons de Carvalho, há mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Deputado Silva Marques, em relação à questão do estar só, devo dizer-lhe que mais vale só do que mal acompanhado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Então, está mesmo só!
O Orador: - Relativamente à questão das críticas que formulou em relação aos governos passados, devo esclarecê-lo que não temo a comparação entre os governos anteriores e o actual, nomeadamente por exemplo os governos socialistas, em matéria de comunicação social e a actuação deste Governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que eu queria assinalar neste momento é que esta interpelação é ao Governo da Aliança Democrática e não a qualquer outro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Na altura em que eram os governos socialistas que se sentavam na bancada do Governo, as vossas bancadas tiveram tempo para os interpelar e interrogar sobre matéria de comunicação social.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No entanto, não o fizeram e isso por alguma razão foi.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Muito bem!
O Orador: - Queria, além disso, dizer apenas o seguinte: o Sr. Deputado Silva Marques convidou-me, digamos assim, a pronunciar-me sobre o quadro geral dos colaboradores das empresas de comunicação social estatizadas sobre o pluralismo existente no actual Governo em comparação aos governos anteriores. Penso que não é a mim que compete neste momento estar a apresentar a prova daquilo que o Sr. Deputado quis provar. Se o Sr. Deputado tem os números, faça favor de os apresentar. O seu partido tem ainda muito tempo para o fazer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, o Sr. Deputado acusou-me de fazer demagogia em relação a alguns dos temas a alguns dos casos e a algumas das acusações que fiz. Contudo, não apresentou um só caso, não apresentou uma só prova de que aquilo que eu disse tinha sido demagogia.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para protestar.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Arons de Carvalho, eu não falei de casos passados; quem falou foi V. Ex.ª Foi por isso que me senti com alguma legitimidade para referir tal historicidade...
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - O Sr. Deputado Silva Marques lembra-se a que propósito é que eu falei, por exemplo, no jornal O Século"!
O Orador: - Para apresentar um pretexto político para perseguição de um homem que teve uma iniciativa jornalística.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - O Sr. Deputado não ouviu o meu discurso. Convido-o a lê-lo primeiro e depois falamos.
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O Orador: - Queira relembrar-me esse caso, por favor.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Eu falei no jornal O Século, apenas a propósito do jornalista José Mensurado, que foi lembrar à televisão um caso ocorrido em 1970 ou 1971. Isto nada tem a ver com o caso O Século.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Realmente esse é o único problema de O Século. O único problema de O Século é o José Mensurado!
O Orador: - Sr. Deputado Arons de Carvalho, eu não vou longe disso. Aceito imediatamente a sua versão. Agora quem, de facto, falou no jornal O Século foi V. Ex.ª
Risos do PS. do PCP e da UEDS.
O Orador: - Há-de permitir-me afirmar - porque é um facto - que quem me relembrou isso foi V. Ex.ª
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenham a bondade de criar o clima necessário para que o Sr. Deputado Silva Marques possa concluir a sua intervenção, visto que o Sr. Deputado a quem ele se dirige lhe poderá responder no uso dos mesmíssimos direitos.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado Silva Marques.
O Orador: - Tende paciência, Srs. Deputados. Não podeis ter a bela sem o senão. Seria maravilhoso que pudessem invocar todos os aspectos que entendessem e depois considerarem que da nossa parte devíamos pegar nuns assuntos e não noutros, embora W. Ex." pegassem em todos. Isso não pode ser. É realmente lastimável, mas é uma possibilidade da democracia.
De qualquer modo, quem fez as acusações foi V. Ex.ª, que acusou a actual maioria, entre outras coisas, de exercer perseguição política. Se coloca o problema no plano pontual, não vou negar a acusação, porque questões pontuais de perseguição política aceito que existam, até porque elas fazem parte das imperfeições humanas, mesmo da maioria que apoio. Não vai com certeza V. Ex.ª discutir comigo num plano tão rígido.
Mas fez uma acusação genérica. Aí, a quem compete a prova é a V. Ex.ª visto ser o acusador e não eu. Não inverta as regras do processo. Eu esbocei, aliás sem obrigação, uma demonstração de que era contrário àquilo que diz. É, pois, a V. Ex.ª que compete provar, com factos, que a actual maioria exerceu, de forma genérica, de tal forma que possamos também fazer a acusação genérica, de perseguição política sistemática.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho, se assim o entender.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Avivarei um pouco a memória do Sr. Deputado Silva Marques. Ele recordar-se-á certamente da suspensão dos programas «Praça Pública» e «A Par e Passo» e o afastamento dos jornalistas Mega Ferreira, Joaquim Letria, José Júdice, José Mensurado e tantos outros. Penso que provei, em
algumas partes do meu discurso, aquilo que de facto hoje se passa, devido à governação AD, nas empresas públicas de comunicação social.
Se o Sr. Deputado acha que no passado a situação era pior do que a actual, compete-lhe a si provar.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Eu já terminei, Sr. Deputado. Em todo o caso, permito-lhe que intervenha.
O Sr. Presidente: - A Mesa é que não pode permitir uma terceira figura de intervenção, para além da do protesto.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, por isso é que pergunto ao Sr. Deputado Arons de Carvalho se posso interrompê-lo.
Vozes do PS: - Mas eleja acabou!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, por muito que pese à Mesa, já não há interrupção de quem já acabou.
Vozes do PS: - Claro!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Deputado Arons de Carvalho, a sua intervenção foi uma boa mostra da actuação do Governo em determinados sectores da comunicação social. Mostrou bem até que ponto vai o carácter antidemocrático do Governo AD e a sua ânsia de manipulação da comunicação social.
Quanto aos princípios que expendeu, de uma forma geral, estou de acordo com eles. No entanto, queria perguntar-lhe como é que concilia esses princípios com a aprovação, juntamente com esta AD, em sede de revisão constitucional, da extinção dos conselhos de informação e da criação do Conselho de Comunicação Social na medida em que isso, em nosso entender, diminui e dificulta o controlo democrático do que se passa ao nível da comunicação social por parte das várias forças, principalmente por parte das forças minoritárias, que estão em presença nesta nossa terra.
Não acha que a existência dos conselhos de informação dava uma outra vitalidade, uma outra possibilidade de controle daquilo que se passa a nível da comunicação social, nomeadamente aquela que o Governo pretende manipular e controlar.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho.
O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Deputado Mário Tomé, é evidente que a solução encontrada para o Conselho da Comunicação Social não é, obviamente, a solução ideal. Seria óptimo que esse Conselho, por exemplo, pudesse eleger, ou designar ele próprio os gestores da comunicação social ou os directores da informação das empresas públicas da comunicação social.
No entanto, no meu ponto de vista, a solução encontrada, de substituição dos 4 conselhos de informação por
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1 conselho de comunicação social eleito por esta Assembleia por uma maioria qualificada de dois terços, aperfeiçoa os mecanismos de controle do Governo e da comunicação social visto que, como o Sr. Deputado bem ' sabe, os actuais Conselhos de Informação reproduzem em si próprios as maiorias e as minorias existentes ao nível desta Assembleia, ou seja, a maioria AD neste Parlamento é a maioria AD nos conselhos de informação.
Creio que, portanto, por esta e por outras razões - que foram na altura amplamente expendidas no debate da revisão constitucional a solução actual é melhor, é preferível, à solução anterior.
Uma voz do PS: - É óbvio!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos numa interpelação ao Governo sobre comunicação social centrada com particular atenção no caso ANOP. Outros camaradas da minha bancada desenvolverão outros aspectos relativos à comunicação social e à política da comunicação social. Nesta minha intervenção irei apenas referir o escândalo que se verifica em torno do caso ANOP.
Vozes da UEDS: - É uma vergonha!
O Orador: - Tanto mais que para o PCP esta interpelação tem um claro significado. O que aqui vai ser dito é que é urgente pôr fim ao escândalo do processo ilegítimo, ilegal e inconstitucional de tentativa de extinção da ANOP. Durante meses o Governo refugiou-se no segredo dos gabinetes, negou-se a receber os trabalhadores, ignorou o próprio Conselho de Gerência da empresa, desdobrou-se em evasivas e falsidades perante o Conselho de Informação para a ANOP, iludiu o Conselho de Imprensa, fugiu a qualquer debate sério perante a Comissão Parlamentar e recusou-se a vir ao Plenário da Assembleia da República a explicar o que se passava com a ANOP.
E só para que não fiquem dúvidas é bom dizer ao Sr. Secretário de Estado, ou avivar-lhe a memória, que, quando compareceu perante a Comissão Parlamentar de Comunicação Social cerca de 3 ou 4 dias antes da anunciada resolução de extinção da ANOP, o Sr. Secretário de Estado negou que fosse intenção do Governo proceder à extinção da empresa, falou sim em projectos alternativos, ou seja, quando lhe colocámos essa questão de uma maneira frontal o Sr. Secretário de Estado negou essa possibilidade. Idêntica atitude assumiu perante o Conselho de Informação na véspera do dia em que o Conselho de Ministros decidiu extinguir a ANOP.
O Secretário Alfaia veio hoje aqui finalmente. Não para esclarecer, mas para tentar que a Assembleia da República partilhe a lama em que diariamente se afunda com o seu Governo. Este Secretário chega ao ponto de hipocritamente vir aqui afirmar...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe interrompê-lo. Sejam quais forem as acusações que livremente V. Ex.ª possa ter que fazer ao Sr. Secretário de Estado, a designação legal do cargo que ele exerce é de Secretário de Estado e penso que é essa designação que V. Ex.ª deverá usar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É essa que lhe solicito o obséquio de usar...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - É excessivo, Sr. Presidente!
O Sr. Silva Marques (PSD): - É uma esperteza saloia!
O Sr. Presidente: - Sem prejuízo de todo o direito que V. Ex.ª tem de fazer -repito- as apreciações que entender, penso que é defesa dos mais elementares princípios manter esta designação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Peço-lhe que assim o faça e que respeite a solicitação que a Mesa lhe fez.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Para. em nome da minha bancada, fazer um protesto em relação à interrupção que o Sr. Presidente acaba de fazer à intervenção do meu camarada Jorge Lemos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Uma vez que é um protesto o Sr. Deputado no final da intervenção...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Era o que o Sr. Presidente, na minha opinião, devia ter feito.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, tenha a bondade de continuar.
O Orador: - Sr. Presidente, se me é permitido - pedia-lhe que não fosse contado no meu tempo - gostava de relembrar a V. Ex.ª que não alterei em nada o nome que é devido a um Membro do Governo. Creio que chamar-lhe «Secretário» é, de facto, referir o cargo que desempenha, ele é Secretário de Estado do Governo.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não insista, fica-lhe mal!
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Não seja carroceiro!
O Orador: - Poucas horas decorridas sobre o veto do decreto, sem cuja promulgação e publicação a extinção da ANOP não é legalmente possível, o Sr. Secretário Alfaia teve a ousadia de vir aqui dizer...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe desculpa de o interromper, mas volto a solicitar-lhe, em nome de um princípio que tem muito mais importância do que a posição conjuntural das pessoas que estão no Governo ou na oposição, que use a terminologia adequada pela mesmíssima razão que V. Ex.ª é, em todas as circunstâncias, credor do título de deputado e do respeito que
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nessas circunstâncias merecer à Câmara e à Mesa. É uma solicitação que lhe faço em nome de um principio e que muito, muito gostosamente, deveria V. Ex.ª acatar.
O Orador: - Sr. Presidente, tendo em conta o pedido de V. Ex.» e não a pessoa que desempenha o cargo, passarei a usar a expressão «Secretário de Estado».
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não arme em bondoso que nós não lhe admitimos essa bondade!
O Orador: - Dizia eu que o Sr. Secretário de Estado Alfaia...
Uma voz do CDS: - Está a ver como é lindo! Risos.
O Orador: - ... teve a ousadia de vir aqui dizer que apesar deste veto o Governo prosseguirá, à revelia da lei e contra as instituições democráticas, o seu plano de destruição da ANOP/EP.
A propósito gostaríamos de saber se a Secretaria de Estado do Emprego e o Ministro do Trabalho que esteve cá de manhã mas que já se foi embora - apôs o veto presidencial e o desmascaramento de toda a lama que envolve este processo, irá autorizar o despedimento colectivo da maioria dos trabalhadores da ANOP e eventualmente de todos eles conforme foi decidido pelo Sr. Secretário de Estado Alfaia.
Se se tivesse aqui apresentado de baraço ao pescoço, confessando a impossibilidade legal de prosseguir esse plano, se aqui tivesse vindo dizer que a ANOP deveria ser reestruturada, que lhe iriam ser concedidas as verbas necessárias ao seu funcionamento, que iria ser posto fim aos processos de despedimento, se tivesse assumido uma tal postura o Secretário de Estado Alfaia teria um bom precedente histórico e não faria nada de mais. Cumpriria a legalidade democrática.
Mas não foi isso que se verificou e bem ao contrário o Secretário de Estado insiste em apresentar-se perante esta Assembleia para proclamar a rebelião governamental e prosseguir a guerrilha institucional.
Pela nossa pane tudo faremos para que daqui não saia sem que fiquem cabalmente respondidas, clarificadas, esclarecidas e comprovadas todas as ilegalidades, todas as operações obscuras, todos os abusos de poder, todo o clamoroso atentado ao direito de informação, todas as implicações da operação que visa extinguir a todo o custo a Agência Noticiosa Portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das perguntas que mais incessantemente têm sido feitas ao longo destes meses é esta: por que razão se decidiu o Governo a arrostar com as consequências de um processo viciado por ilegalidades e nulidades insupríveis e que se inscrevem entre os aspectos mais gravosos e mais lamacentos de toda a actuação governamental.
A verdade é que a ANOP tem sido unanimemente reconhecida como uma Agência prestadora de serviços de qualidade e respeitadora dos princípios constitucionais e legais de independência e pluralismo. A ANOP tem um Estatuto aprovado por lei desta Assembleia que lhe tem garantido um funcionamento minimamente regular no conjunto das empresas públicas de comunicação social. A ANOP está submetida á fiscalização democrática desta Assembleia da República, do Conselho de Informação para a ANOP e do futuro Conselho de Comunicação Social. A ANOP poderia e deveria, ou melhor poderá e deverá, ser uma empresa em expansão não só no território nacional como no campo de ligação às comunidades e no espaço dos países de língua portuguesa.
Isto mesmo era reconhecido no programa deste Governo apreciado em Setembro de 1981, por esta Assembleia como já aqui foi referido-, o mesmo dizia o Sr. Secretário de Estado Alfaia em entrevista ao Diário de Notícias, no dia 11 de Setembro de 1982. Pergunta-se: mas porque alterou a sua posição? Que aconteceu às suas promessas? Ficaram pura e simplesmente no esquecimento. E daí perguntar-se que base legal e moral pode ter a acção deste Governo e particularmente deste Secretário de Estado que, não só não cumprem os objectivos definidos para ANOP, como a tenta destruir enquanto empresa pública e desviar para uma empresa, que se apresenta como privada, os fundos públicos que àquela eram devidos?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Que crédito político, legal e moral pode ter um Secretário de Estado e um Governo que, no prazo de menos de l ano, faz precisamente o contrário do que tinha escrito no programa que apresentou a esta Assembleia?
E quantos dos Srs. Deputados da maioria não se sentem defraudados perante uma tal actuação que põe claramente em causa qualquer postura política e parlamentar digna e a seriedade que é devida a esta Assembleia?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O Conselho de Informação para a ANOP, a que presido em representação do PCP, aprovou por unanimidade -portanto com os votos favoráveis da coligação que apoia o Governo e o Secretário de Estado - um relatório e parecer em que expressamente se reconhece que o serviço noticioso da ANOP obedece «às normas legais e constitucionais, com o consequente respeito pelo pluralismo, rigor, objectividade e independência da informação exigida por lei, nela confiando os profissionais dos órgãos de comunicação social portugueses». Mas não será por isso mesmo que o Governo optou por uma empresa privada, que ainda não funcionava, empresa que legal e constitucionalmente não está sequer obrigada a defender o pluralismo, nem a ser independente ou sequer rigorosa, nem sujeita a qualquer controle democrático? Porquê esta opção se não pelo simples facto de o Governo querer controlar a todo o custo o principal emissor de notícias? Certamente por considerar que até aí este ainda lhe fugia das mãos!
Mas que terá este Secretário de Estado a dizer sobre a qualidade dos serviços da nova empresa quando já hoje o Sr. Nuno Rocha, na sua coluna no Tempo, apelida de «incapazes» todos os que estão na NP? Relembre-se que o Sr. Nuno Rocha é um dos fundadores da NP!
Ainda há pouco, Srs. Deputados, ouvimos o Secretário de Estado Alfaia negar a pés juntos as intenções de destruir a ANOP e vir contar a esta Assembleia pela centésima vez a ridícula história de embalar que não tem cessado de entoar desde há meses. É preciso dizer ao Sr. Secretário de Estado que estamos na Assembleia da República a debater uma questão que é grave. Está em causa o futuro da ANOP, dos seus trabalhadores, da credibilidade da comunicação social do sector público.
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Está em causa o respeito pelas competências dos órgãos de soberania, a opção entre a legalidade democrática ou a inconstitucional política de ferro e fogo que só por si justificaria a demissão do Governo que ousa praticá-la.
A versão dos factos contida nas palavras que o Secretário de Estado Alfaia aqui produziu não tem ponta por onde se lhe pegue. É uma teia de inverdades, de omissões capciosas e até mesmo de puras mentirolas indignas desta Assembleia.
do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Às questões que lhe foram colocadas até agora, às imputações que foram feitas ao Governo, ainda não respondeu. Mas não pode sair daqui sem que esclareça, ou sem que alguém seu superior hierárquico, ou até mesmo seu acessor, explique um conjunto de aspectos' fundamentais: - Em primeiro lugar o Governo tem prosseguido ilegalmente e a frio uma política de estrangulamento da ANOP. Que tem o Secretário de Estado a dizer sobre a não atribuição dos 200000 contos previstos para a ANOP para 1982, na resolução do Conselho de Ministros de 25 de Maio de 1982, e sua misteriosa posterior redução para 115000 contos? Não se trata inegavelmente de estrangulamento económico da empresa e da inviabilização do seu funcionamento a partir de Setembro, curiosamente na mesma altura em que a nova agência criada pelo Governo se preparava para arrancar?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Que critério legal - volto a colocar a questão permitiu ao Governo publicar a resolução n.º 133/82, que desfalcou a ANOP em 85000 contos para os dar a uma empresa privada?! A ilegalidade é patente e encontra-se claramente demonstrada em recurso subscrito por um deputado do PPM - um deputado da maioria- que se constituiu advogado no processo, representado o Centro Regional da Madeira da ANOP, E.P.
É ou não verdade, Sr. Secretário de Estado, que é a própria Secretaria de Estado que reconhece implicitamente em documento datado de 27 de Setembro deste ano, que senão tivessem sido desviados os 85000 contos do orçamento inicialmente previsto para a ANOP, a empresa chegaria a Dezembro praticamente sem défice de tesouraria?
De asfixia se deve falar também quando o Governo promoveu o corte de serviços à ANOP pelas Agências UPI e Reuter. Este escândalo mereceu já o voto de protesto do Conselho de Informação competente em reunião ontem mesmo realizada.
Este Secretário de Estado apesar de devidamente alertado para os problemas deixou que a «Agência Noticiosa Portuguesa» fosse privada das principais fontes informativas em termos internacionais, com a alegada razão de falta de pagamento do serviço prestado. Não foi por mero acaso e coincidência que estas duas Agências - de há muito credoras da ANOP - decidiram cortar os seus serviços no preciso momento em que a «Notícias de Portugal» arrancava e com ela haviam estabelecido contrato. Que tem o Secretário de Estado a dizer sobre isto? Que garantias deu a estas Agências nos contactos que com elas teve em relação a pagamentos e contratos? A Assembleia da República tem o direito de ser esclarecida sobre esta matéria.
Em segundo lugar o Governo lançou-se no escuro processo de contratação de serviços a uma empresa privada, criada à custa dos dinheiros públicos.
Já aqui foi perguntado mas vale a pena insistir: qual a base legal, qual a legitimidade do Governo para contratar os serviços da nova empresa que criou? O Governo, este Secretário de Estado, não ignoram que o contrato para prestação de serviços celebrado com a NP - no valor de 320000 contos- não pode ser realizado sem haver concurso público, conforme determina o Decreto-Lei n.º 211/79, de 12 de Julho. Se não ignorou este decreto-lei onde está o concurso público? Claro que nem há concurso, nem empresas concorrentes.
Já agora, ao menos, que nos seja mostrado, já que nunca foi tornado público, o contrato assinado entre a NP e o Governo! E não se trata de mais um lapso deste desastrado Secretário de Estado que tantas vezes tem deixado ficar o rabo escondido com o gato de fora. É a pressa de destruir a ANOP, é a pressa de substituir a lei pelo compadrio e dar benesses à NP. É, no fundo, a pressa de controlar a informação e os seus profissionais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Para prosseguir este plano o Governo não tem hesitado em tentar falsificar perante a opinião pública e órgãos de soberania os dados do problema:
a) Proclamou que a ANOP dava prejuízo e era «inviável» em termos económicos. Mas se a situação era grave por que razão nunca foi, quer pela tutela, quer pelos conselhos de gerência, exigida a realização de um estudo de viabilidade económica-financeira da empresa, nem, à semelhança do que se passou com outras empresas do sector, estabelecido com a ANOP um acordo de saneamento económico e financeiro?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E não venha com o argumento, Sr. Secretário de Estado, de que foi o conselho de gerência que não aceitou a proposta que lhe fez. O Sr. Secretário de Estado sabe tão bem como eu que quem nomeia e demite os conselhos de gerência é V. Ex.1 e se tinha interesse em assinar esse acordo de saneamento económico e financeiro demitia o conselho de gerência que não aceitava a sua proposta e nomeava um outro que a aceitasse.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Governo deixou conscientemente que a situação da ANOP se encaminhasse para a ruptura financeira para mais facilmente poder vir a justificar a sua decisão de extinção da empresa.
b) O Governo alegou com particular insistência que o quadro de pessoal da ANOP era «excessivo». Mas com que credibilidade se poderão ouvir estas referências? A evolução da situação na empresa foi sempre do conhecimento da tutela. Mantém-se em vigor o despacho assinado em 29 de Abril de 1981, pelo então Secretário dê Estado Luís Fontoura que fixou o quadro de pessoal da Agência e proibiu novas admissões sem autorização prévia do Governo. É, pois, claro que se de um quadro excessivo se tratava tal se ficou a dever à acção de um
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Membro do Governo AD que o sancionou e que posteriormente permitiu novas admissões. Ou pretenderá o Secretário de Estado alijar responsabilidades lançando-as exclusivamente para as sucessivas equipas gestoras? Quer o Secretário de Estado Alfaia confirmar perante a Assembleia da República que sucessivamente as administrações presididas por um membro do PS, Eng. Tito de Morais, por um membro do PSD - Dr. Valy Mamede e por uma personalidade afecta ao CDS - Comandante Pinto Machado - (estes 2 últimos nomeados por Governos AD) tiveram actuações minoras? Se assim se passou por que não interveio V. Ex.ª na altura? Por que não a demitiu?
Desafiamos daqui o Secretário de Estado a que nos mencione uma única empresa do sector em que não haja problemas de quadros de pessoal, em que não haja situações que seja necessário corrigir. Significa isto que irá extingui-las todas?
O Governo não pode alijar responsabilidades na situação da ANOP porque foi conivente e sucessivamente informado dos problemas que se colocavam. A prová-lo o facto de o próprio Secretário de Estado por várias vezes ter citado documentos dos trabalhadores em que eram apontados graves erros de gestão. Apostado em socavar o normal funcionamento da ANOP o Secretário de Estado em nada contribuiu para a resolução dos problemas existentes e agravou-os deliberadamente.
c) Outro tema da campanha de falsificações do Governo é de que os vencimentos da ANOP seriam «exorbitantes» e de que haveria «excesso de chefias». Mas a verdade é que enquanto na ANOP, um redactor ganha o mínimo da tabela contratual - cerca de 26 contos, se verifica que na Agência agora criada pelo Governo se anunciam ganhos, na mesma categoria, de mais de 41 contos.
Para quem falava em racionalidade de custos convenhamos que se trata de um desgraçado exemplo. E quanto às chefias desconhecerá o Secretário de Estado que segundo notícias vindas a público, nos quadros redactoriais da nova Agência criada pelo Governo quase 50% dos lugares correspondem a cargos de chefia?! É outro exemplo desgraçado das falsificações governamentais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em todo o processo avultam a obscuridade das actuações e a espantosa pressa com que têm sido cometidas toda a espécie de ilegalidades. O processo seguido por este Secretário de Estado para destruir a Agência Noticiosa Portuguesa não tem paralelo em qualquer dos países europeus, que o Governo tão constantemente invoca. Em França, por exemplo, gastaram-se mais de 10 anos de profunda reflexão, como uma discussão participada por todos os interessados, antes que fosse definido o Estatuto da France Press. Em Portugal, o Governo AD fugiu ao debate parlamentar, recusou-se a trazer a questão à Assembleia da República autora do actual Estatuto da ANOP- o Secretário de Estado Alfaia negou-se a receber os trabalhadores da ANOP a discutir com eles o Estatuto e o futuro da sua empresa, fugiu ao debate no Conselho de Informação da ANOP, recusou-se a dialogar em termos positivos- com o Conselho de Imprensa. E quando veio aqui forçado por uma interpelação foi para repetir irresponsavelmente comprovadas mentiras e desafiar os órgãos de soberania, política pode ter um tal membro do Governo que tudo sacrifica, para atingir os seus propósitos de negociata, de falcatrua e de manipulação?
Vozes do PCP: - Muito bem!
Aplausos do PCP, da UEDS, do MDP e de alguns deputados do PS.
Atenta a comprovada e colossal ilegalidade da operação em que o Secretário Alfaia e o seu Governo estão empenhados, melhor se compreende a vaga de contestação que foi alvo e o isolamento a que esta acção governamental foi remetida. Enfrenta e enfrentará o repúdio e a oposição de todas as forças e personalidades democráticas deste país. E importa não esquecer que o Sr. Secretário de Estado apresenta-se aqui condenado pelos próprios sócio profissionais do seu partido que exigem a sua demissão, pela generalidade das autarquias - muitas delas de maioria AD-, por organizações sindicais nacionais e pelas duas organizações internacionais representativas dos jornalistas. Recebeu do Presidente do Governo Regional da Madeira, membro influente do seu partido, alguns dos mais brutais vitupérios de que alguma vez foi objecto um membro do Governo da República. Terá V. Ex.ª a coragem e a capacidade de nos dizer quem o apoia e quem paga o combustível que o faz correr?
Risos do PCP.
Terá V. Ex.ª a coragem de continuar a ser Secretário de Estado, depois de tudo o que se passou, depois de tudo o que aqui foi dito? Faço-lhe a justiça de pensar que V. Ex.ª já terá assinado o seu pedido de demissão!
Vozes do PCP: - Não assinou nada!
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Foi em nome da cultura que ele fez isto tudo!
O Orador: - A história da democracia e do jornalismo em Portugal há-de registar que à frente de um dos mais graves e sujos atentados à liberdade de informação em Portugal, contestada pela generalidade da classe dos jornalistas, se encontra um Ministro que enquanto director de um semanário enchia a boca com independência e um Primeiro-Ministro, curiosamente proprietário desse mesmo jornal e que, como é óbvio, participa na empresa recém-criada. Mais uma particularidade: num debate em que se fala de informação nenhum deles foi capaz de se manter até ao fim, ou melhor, um não esteve cá, outro fugiu a meio!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Da interpelação agora realizada resultará sem dúvida a conclusão de que deve ser reposta de imediato a legalidade democrática na ANOP, com a cessação imediata dos processos de despedimento, com a atribuição de verbas necessárias ao funcionamento da empresa e a efectivação da sua necessária reestruturação.
Mas perante um tal escândalo uma outra conclusão não pode deixar de ser tirada: um Governo que assim actua, um Governo que assim se rebela contra a legalidade democrática, não pode continuar à frente dos destinos de Portugal!
O Orador: - Que seriedade, que estatura moral e Aplausos do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nas circunstâncias que já tinha anunciado, são 17 horas e 30 minutos e impõe-se suspender a sessão. Em todo o caso, e porque o Sr. Deputado Carlos Brito tinha pedido a palavra para se dirigir à Mesa na altura em que entendi dirigir um apelo ao Sr. Deputado Jorge Lemos, aceito que o Sr. Deputado use desde já da palavra por esta razão extremamente simples: por imposição das minhas obrigações de Presidente desta Casa não poderei ser eu a reabrir a sessão e não faria sentido que V. Ex.ª tivesse uma observação a fazer à Mesa sem que eu estivesse presente para lhe responder.
Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, vou ser muitíssimo breve porque não quero prejudicar um debate com tanto interesse com uma questão regimental que, em todo o caso, entendo não dever deixar passar.
Reconheço ao Presidente da Assembleia da República o direito de chamar a atenção dos oradores quando entende que estes se desviam daquilo que são as práticas regimentais e constitucionais, enfim, a conduta de um deputado, mas penso que só excepcionalmente o Sr. Presidente poderá e deverá interromper um orador.
Creio que nas circunstâncias presentes a interrupção do Sr. Presidente era desnecessária, podia perfeitamente tê-la produzido no final da intervenção do meu camarada Jorge Lemos, na medida em que, tal como procedeu - e entendo que não deverá continuar a proceder assim -, prejudica a produção da intervenção, o seu alcance e até a sua audição pelos demais deputados, enfim, pela imprensa, pela assistência que nos acompanha e até a objectividade daquilo que queremos trazer à Câmara.
Era isto que queria dizer, Sr. Presidente, e é bom dizê-lo já, uma vez que iniciou ontem o seu novo mandato e, portanto, é bom que a questão tenha ocorrido hoje e que eu hoje possa, com toda á lealdade, dizer-lhe isto que, penso, é uma observação pertinente e que não deverá repetir-se sob pena de prejudicar os nossos trabalhos e, no caso concreto, de prejudicar o meu grupo parlamentar na Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, com o respeito que inalianavelmente reconheço a todos VV. Ex.ªs, de expressarem livremente a sua opinião, devo dizer-lhe que começo por lhe agradecer o reconhecimento que agora fez de que o Presidente tem o direito de interromper os Srs. Deputados quando entende que eles devem, por qualquer motivo, ser chamados à atenção por violação de quaisquer normas ou regras que devam ser respeitadas.
O critério que V. Ex.ª expendeu ... aceito que possa ser discutível ... o meu é este. Para além do que resulta da própria intervenção que fiz na altura, não quero deixar de prestar homenagem ao seu companheiro de bancada, Sr. Deputado Jorge Lemos, pela forma como aceitou o que em termos de apelo lhe dirigi. E direi a V. Ex.ª que a minha posição pode ficar agora completamente esclarecida com um exemplo que peço licença para usar: há nesta Casa 4 Srs. Vice-Presidentes, dos 4 maiores partidos que nela têm assento. Ora, se qualquer Sr. Deputado, de qualquer bancada, seja daquela donde saí para tomar a presidência, seja de qualquer outra, usar em qualquer momento, em relação a qualquer desses 4 Srs. Vice-Presidentes, uma designação que não seja essa mesma e a que de direito lhes compete, eu, se estiver no exercício das minhas funções, chamar-lhe-ei a atenção e começarei, tal como agora, por um apelo porque as razões de principio que me levaram a formulá-lo transcendem em muito as posições partidárias que em cada momento nesta Câmara, muito legitimamente aliás, se tomam e se defendem. E este o meu critério! Está suspensa a sessão por 30 minutos.
Eram 17 horas e 40 minutos.
Após o intervalo, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Amândio de Azevedo.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de Deputados.
Foi lido. É o seguinte:
Relatório e Parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
Em reunião realizada no dia 4 de Novembro de 1982, pelas 17 horas e 30 minutos, foram observadas as seguintes substituições de Deputados:
1) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:
Rogério Ferreira Monção Leão (circulo eleitoral de Lisboa) por Pedro Eduardo Peritas de Sampaio (esta substituição é pedida para os próximos dias 9 e 19 de Novembro corrente, inclusive);
2) Solicitada pelo Partido Comunista Português:
Armando Teixeira da Silva (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Gaspar Cardoso Martins (esta substituição é feita devido ao pedido de renúncia ao mandato de Deputado).
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos Partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por maioria, com ,a abstenção do Deputado da União Democrática Popular.
Vice-Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva (PSD) - Valdemar Cardoso Alves
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(PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS) - Bento Elísio de Azevedo (PS) - Manuel de A. de Almeida e Vasconcelos (CDS) - Luís Carlos C. Veloso de Sampaio (CDS) - Armando de Oliveira (CDS) - Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS) - Mário António Baptista Tomé (UDP).
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos que acabou de ser lido.
Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD. do PS. do CDS, do PCP. do PPM, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE e com a abstenção da UDP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Jorge Lemos, estão inscritos os Srs. Deputados Maria Adelaide Paiva e Armando de Oliveira.
Portanto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Adelaide Paiva.
A Sr.ª Maria Adelaide Paiva (PSD): - Sr. Presidente, Sn. Deputados, Sr. Deputado Jorge Lemos: Ouvi há pouco a sua intervenção, aliás idêntica à que processou o Sr. Deputado Lopes Cardoso, e verifico que a questão ANOP tem sido fulcral num debate que estava vocacionado para ser de política de comunicação. E não só fulcral, mais ainda, pois tem-se debruçado fundamentalmente, ou quase exclusivamente, sobre aspectos processuais.
No tocante a esses aspectos processuais, a que o Sr. Secretário de Estado já procurou responder, não irei pronunciar-me, até porque os desconheço, não tive parte activa neles, como é óbvio.
No entanto, no tocante à política de fundo, verificou-se uma omissão completa por parte desta Assembleia.
Depois de uma atitude de reflexão, verifica-se que a ANOP produziu informação que era recolhida pelos órgãos de comunicação social portugueses num número que não digo que seja um número estatístico correcto era, em termos de aproveitamento, de cerca de 60% da sua produção. Foi então aqui comentado que isso revelava que a ANOP funcionava muito bem, visto que cerca de 60% do seu material era recolhido.
Ora, isso é uma ilação um bocado fácil e, por outro lado, talvez se pudesse tirar a ilação de que os jornais funcionam insuficientemente, ou mesmo deficientemente, na medida em que apenas recolhem a informação e muitas vezes recolhem-na até sem qualquer aspecto critico ou jornalístico, limitando-se a reproduzir quase na íntegra os telexes recolhidos da ANOP.
Enfim, isso deve-se a factores vários sobre os quais pensava que iríamos aqui debruçarmo-nos, comentando-os sob o aspecto de política de comunicação social. Isto sim, isso seria interessante verificar. No entanto, relativamente a este aspecto, verificou-se uma omissão completa.
Um outro aspecto que gostaria de referir é que se fez tâbua-rasa de condicionalismos portugueses que são prementes. Todos sabemos que em Portugal a comunicação social, até 1974, viveu limitações frustrantes, que frustraram os jornalistas e os cidadãos, e que, de 1974 para cá, se vocacionou no sentido de uma política de informação voltada quase exclusivamente para aspectos políticas.
É cedo para fazer História, mas creio que é de referir que depois se criou um pessoalismo na comunicação social, havendo uma dissociação completa dos aspectos culturais; e era fundamental que reflectíssemos nesta Câmara sobre a conjugação dos meios de comunicação social e a parte da dinâmica cultural, pois praticamente todo o aspecto de comunicação social tem sido analisado nesta Câmara quase com um aspecto contábil, o que me faz doer porque se me afigura que os ataques aos valores culturais, esses sim, são quase que irreparáveis daqui a algum tempo se não nos debruçarmos sobre eles, e é a esta Câmara que compete debruçar-se. Ora, esta teria sido uma oportunidade muito boa e não sei se não será já tarde para o fazer, pois estamos quase no fim da sessão ou, pelo menos, muito adiantados nela.
Assim, gostaria de perguntar muito concretamente ao Sr. Deputado Jorge Lemos o seguinte: abstraindo os aspectos processuais, ainda não vi aqui atacada a questão de fundo que é a de saber se não significará um alheamento completo deste Governo o facto de aparecer constituída em cooperativa uma agência noticiosa, com a repercussão que esta tem -e possivelmente virá a ter, não sei qual o futuro- nos órgãos de comunicação social do País, em virtude das suas infra-estruturas, que permitem um aproveitamento tão grande quanto possível dessa comunicação, se isso não significará, dizia, um distanciamento tal que não se coaduna com o tão apregoado controlo da comunicação social que o Governo pretenderia. Não vi aqui atacada a figura legal encontrada, vi sim o aspecto processual.
Portanto, gostaria que o Sr. Deputado Jorge Lemos me dissesse se, efectivamente, isto não revela, à sociedade, um alheamento e um afastamento fundamentais do Governo no tocante a qualquer interferência na comunicação social deste País.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Irei ser muito rápido porque o tempo de que a minha bancada dispõe é extremamente escasso.
Quanto aos 60% de aproveitamento, Sr.ª Deputada Maria Adelaide Paiva, creio que a solução encontrada não vai resolver o problema. Se os jornais aproveitavam 60% da ANOP, irão agora aproveitar 60% da NP. Só que os 60% da ANOP que lá chegavam tinham o tal controlo democrático e estes 60% ou mais que irão escolher da NP não sei a que controlo estarão sujeitos.
A Sr.ª Deputada esteve presente numa conferência, à qual eu também tive oportunidade de assistir, em que um profissional do sector lhe demonstrou com números o que se passa em termos internacionais.
Quanto à questão da política cultural, creio que não ma deve pôr a mim, mas sim ao Sr. Ministro da Cultura que se encontra presente e que parece não querer falar, não se querer «sujar» neste caso.
Relativamente à questão de saber se a cooperativa foi a melhor fórmula encontrada, já tive oportunidade de explicar que o processo que este Governo utilizou para acabar com uma empresa pública e criar uma chamada cooperativa, - mas que de cooperativa nada tem -, é um processo a todos os títulos escandaloso e remeto-a para a minha intervenção.
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O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Armando de Oliveira.
O Sr. Amando de Oliveira (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, em 29 de Novembro de 1980 o Governo de então publicou o Decreto-Lei n.«557/80, referente à denominação dos Centros Regionais da ANOP na Madeira e nos Açores.
Durante a intervenção do Sr. Deputado esperava que se reportasse aos problemas da ANOP de 1980 e a este decreto-lei em relação ao qual o Partido Comunista pediu a ratificação, tendo sido o Sr. Deputado Jorge Lemos o seu primeiro subscritor. Lembro que este decreto-lei foi publicado em 29 de Novembro, tendo sido apresentado o seu pedido de ratificação aqui na Assembleia em 10 de Dezembro, e nesse mesmo dia foi enviado aos grupos parlamentares uma exposição do Sindicato dos Jornalistas em que a dado passo, se dizia o seguinte:
O Sindicato dos Jornalistas, representado pela sua direcção, vem junto de V. Ex.ª expor e requerer o seguinte:
1) O Conselho de Ministros aprovou, em 16 de Outubro de 1980, o regime especial para as representações da ANOP nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, cujo texto integra o Decreto-Lei n.º 557/80, publicado em 29 de Novembro;
2) Porém, tal regime especial vem contrariar o disposto na Lei n.» 19/78, de 11 de Abril (estatutos da ANOP, E.P.), no Decreto--Lei n.º 85-C/75, de 28/2 (Lei de Imprensa), na Lei n.º 62/79, de 20/9, e contraria a própria Constituição da República Portuguesa.
Seguindo a exposição do Sindicato dos Jornalistas, o seu ponto 5 diz o seguinte:
5) Ao admitir-se a possibilidade de contribuição financeira por parte do Governo Regional - a quem compete ainda «apreciar os orçamentos de exploração e de investimento antes da sua aprovação», reforça-se a dependência política com a dependência económica, não havendo sequer, neste caso, a obrigatoriedade de fazer inserir tal contribuição no OGE, conforme estipula o n.º 3 do artigo 16.º dos estatutos da ANOP. Com efeito, o novo diploma não prevê qualquer intervenção da Assembleia Regional para determinar a atribuição financeira da Região Autónoma aos centros regionais da ANOP.
E em determinado passo diz mais:
O Sindicato dos Jornalistas entende que, a aplicar-se o diploma agora publicado, passarão a existir uma agência noticiosa (ANOP) que se rege, no continente, por normas aceites nos países democráticos, e duas delegações regionais, que nas Regiões Autónomas se regem por normas de países autocráticos.
b) O Sindicato dos Jornalistas considera que o referido decreto-lei ofende a dignidade e a independência dos jornalistas do continente e das regiões autónomas e traduz uma aberrante e inaceitável forma de regionalização, pois que, a regionalização, no campo da informação, há-de constituir um factor de progresso traduzido em melhores condições de produção e recepção da informação, o que implica respeito integral pela legislação em vigor, nomeadamente no que respeita aos direitos dos jornalistas e da opinião pública.
Assim, vem o Sindicato dos Jornalistas solicitar a VV. Ex.ªs que sejam desencadeados os mecanismos necessários para sujeitar a ratificação do Plenário da Assembleia o Decreto-Lei n.º 557/80, de 29 de Novembro, cuja revogação se reclama, etc., etc...
Assim, Sr. Deputado Jorge Lemos, gostaria de lhe formular algumas questões: qual a razão por que o Partido Comunista não prosseguiu o seu pedido de ratificação a este decreto-lei, sabendo nós - e não é segredo para ninguém - que normalmente o Partido Comunista é, nesta Câmara, o porta-voz do Sindicato dos Jornalistas?
Gostaria também de saber se considera que o exposto nos n.º* 5 e 6, isto é, todo o ataque à gestão democrática que aqui vem consignado, já está ultrapassado.
Ora, dado que o Sr. Deputado Jorge Lemos também aqui referiu as posições do Governo Regional da Madeira em relação ao problema da ANOP, parecendo que apoia - pelo menos ao de leve as posições deste Governo, gostaria que me dissesse se também identifica essas posições com um despacho do mesmo Governo, de 17 de Fevereiro de 1981, que dizia o seguinte:
A ANOP foi, no Funchal, através de deturpações, distorções e omissões, aliadas a censuras na sede em Lisboa, uma peça da estratégia marxista do controlo de informação.
O decreto-lei agora posto em causa, obviamente pela opressão marxista, foi negociado e acordado entre os Governos Regionais, após as eleições de 5 de Outubro, ambos dotados de representatividade resultante da opressão popular.
Portanto, Sr. Deputado Jorge Lemos, agradecia-lhe que me respondesse a estas perguntas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, teria todo o gosto em responder is perguntas se tivesse compreendido o que foi perguntado. No entanto, como não percebi, não posso responder.
Risos.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Maria Adelaide Paiva, a Mesa informa-me de que V. Ex.ª tinha há pouco pedido a palavra. Assim, pergunto-lhe se ainda deseja usar dela.
A Sr.ª Maria Adelaide Paiva (PSD): - Sr. Presidente, queria usar da palavra para um protesto em relação à resposta do Sr. Deputado Jorge Lemos ao meu pedido de esclarecimento.
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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Adelaide Paiva (PSD): - O Sr. Deputado Jorge Lemos focou há pouco que, efectivamente, o controle democrático estava assegurado na informação produzida pela ANOP. Não vou pôr isso em causa, mas o Sr. Deputado sabe tão bem como eu, que é um pouco falacioso falar-se nisso porque o controlo democrático é muito difícil de detectar numa agência em que toda a comunicação que lá chega apenas uns escassos 15% são veiculados para o exterior porque é impossível trabalhar mais. E quem fez a detecção desses 15% e quais os critérios que usa, isso é, como o Sr. Deputado sabe, um assunto que foi basicamente focado no próprio Conselho de Informação e até agora nunca se conseguiu informação sobre ele.
Portanto, Sr. Deputado, deixemo-nos de palavras fáceis que por vezes nem sempre querem representar aquilo que representam, que podem levar a veicular informações menos concludentes e que até talvez o Sr. Deputado não tenha a certeza delas.
Assim, dou-lhe esse beneficio da dúvida porque efectivamente não estou a dizer que a ANOP funcionou pior ou melhor, pois não é isso o que está em causa. Porém, o que lamento é que a questão de fundo da ANOP não tivesse aqui sido abordada. Essa foi completamente mistificada, ocultada e prendemo-nos aqui ao longo deste debate com questões meramente processuais que não trazem muita luz à questão.
Pode-se dizer que foi melhor ou pior o processo adoptado, mas a questão de fundo fica para resolver, pois quando eu lha foquei o Sr. Deputado mandou-me reportar ao seu discurso que efectivamente também lá não a continha. Portanto, ficámos todos na mesma.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge de Lemos, se assim o desejar.
O Sr. Jorge de Lemos (PCP): - Sr.ª Deputada Maria Adelaide Paiva, creio que a melhor forma de fugir às questões concretas que estão neste debate é optarmos por discutir os conceitos filosóficos de cada um de nós sobre comunicação social. No entanto, não é essa a postura com que estamos neste debate.
Estamos neste debate porque há um Governo concreto que teve uma atitude concreta e não por questões de pormenor. Sr.ª Deputada, quando se pretende despedir 250 pessoas, quando se pretende fazer um negócio bastante escuro em que estão em causa 320000 contos atribuídos a um sector sem se saber como, não é apenas uma questão de pormenor.
Vozes do PCP e da UDP: - Muito bem!
O Orador: - Mas, mais do que isso, está em causa o que vai ser o pulmão de alimento dos órgãos de comunicação social portugueses. Sabemos com o que contávamos com a ANOP, tinha limitações, é certo, mas, de qualquer modo, o director de informação, o conselho de gerência, os próprios serviços estavam sujeitos a um controlo democrático. Neste momento tudo isso deixou de existir e é esse aspecto que tem que ser aqui verificado e que a Sr.ª Deputada insiste em não reconhecer.
Aplausos do PCP e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Segundo o requerimento do Grupo Parlamentar da UEDS, que é o partido interpelante, publicado no Diário da Assembleia da República, II série, n." 143, diz-se que se pretende uma interpelação ao Governo com vista à abertura de um debate de política geral centrado na política de informação, comunicação social, etc.
Ora, não sei como é possível fazer um debate de política geral não estando aqui presente o responsável directo pela política geral do Governo, isto é, o Primeiro-Ministro ou, pelo menos, o seu substituto legal, o Vice-Primeiro-Ministro. Não compreendo, e tenho a certeza que nenhum deputado compreende, mas acho sintomático da parte do Governo a falta dos seus principais responsáveis.
Em todo o caso, queria dizer que nos termos do artigo 2.º da Constituição, a República Portuguesa é um Estado de Direito democrático.
E é pressuposto essencial de um Estado de Direito que todas as forças sociais, desde os cidadãos aos órgãos de soberania, pautem a sua actuação pelo respeito estrito da legalidade democrática.
Ora, o que nós temos vindo a assistir é à recusa sistemática deste Governo em respeitar essa legalidade, violando-a constante e frontalmente.
2 exemplos, entre dezenas que poderíamos citar: na área da Reforma Agrária, os responsáveis do Ministério da Agricultura e Pescas têm proferido centenas de despachos que violam sistematicamente a lei que eles mesmos aprovaram. Deles têm sido interpostos recursos para o Supremo Tribunal Administrativo que têm sido na generalidade providos, por tais despachos estarem geralmente inquinados dos vícios quer de usurpação de poder, quer de vícios de forma.
Ora, até agora o Governo não cumpriu um só destes acordos do Supremo Tribunal Administrativo, actuando, pois, deliberadamente, fora do Estado de Direito.
Acresce que e é o curioso do caso- o insuspeito Professor Diogo Freitas do Amaral, Vice-Primeiro-Ministro deste Governo, no seu livro «A execução das sentenças dos Tribunais Administrativos», afirma, a p. 17 o seguinte:
Se os Ministros e os funcionários souberem que serão acusados e condenados nos Tribunais sem embargo das suas qualidades ou situações pessoais, decerto terão em maior conta os direitos alheios e maior escrúpulo na observância dos princípios jurídicos.
E continua o Professor Diogo Freitas do Amaral:
O Governo deve e pode ser responsabilizado civilmente e os seus Ministros e funcionários responsabilizados criminalmente no crime de desobediência.
Na área da saúde, recentemente, o órgão competente para o fazer o Conselho da Revolução decretou há pouco a inconstitucionalidade das chamadas «taxas moderadoras».
Pois no passado sábado o Ministro dos Assuntos Sociais afirmava, com o maior desplante ao semanário «Expresso» de 30 de Outubro, a p. 3 que «a taxa moderadora que incide sobre os medicamentos não vai acabar» e que, se for caso disso «o Governo publicará uma nova portaria repondo a anterior situação».
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Quer dizer, também neste campo o Governo, despudoradamente, se coloca fora do Estado de Direito através da pureza ascética da omissão...
Na área da comunicação social as ilegalidades praticadas pelo Governo são diárias, avultando recentemente a decisão, ilegal e inconstitucional, de extinção da ANOP, assunto que será tratado pelo meu companheiro de bancada, João Corregedor da Fonseca.
Na rádio-televisão são de todos conhecidas as arbitrariedades constantes aí praticadas e a diária e flagrante derrogação do artigo 39.º da Constituição, prática esta feita pelos seus responsáveis, a total inexistência de pluralismo quer na informação quer no tratamento dos mais diversos programas desde os sócio-políticos, os culturais e até os de pura diversão.
E neste sector gostaria de aqui trazer um caso que me parece exemplar: há cerca de 2 anos foi proposta à televisão pela Cinequanon uma série de 9 programas sobre o título genérico de «Viagem através do Homem» da autoria do médico e escritor António Terrinha e com a realização de Monique Rutler.
Aprovado finalmente, em Julho passado, o guião pela televisão, os primeiros seis programas foram entregues pela Cinequanon em Setembro passado, chegando a estar programados no novo mapa-tipo para serem emitidos às segundas-feiras, às 19 horas e 30 minutos, no 1.º Canal.
Chegou mesmo a vir anunciado nos jornais o primeiro daqueles programas para o dia 18 de Outubro passado. Porém, até à data, não chegou a ser emitido nem sequer se sabe se ò será algum dia. É que parece terem surgido dificuldades por, tanto um tal Dr. Uva como a Senhora Directora de programas, não concordarem com algumas afirmações aí feitas.
Um exemplo: aparecia um rapaz de cor negra a falar de planeamento familiar e relacionando este com o problema da fome. Teria de ser cortado porque - segundo aqueles responsáveis - «os pretos não sabem nada desta matéria» (sic). Uma jovem entrevistada na rua, também num desses programas que tratava do problema do aborto, referiu-se ao projecto de lei do PCP. sobre o assunto. «Corta. Aqui não se pode falar de política» (sic).
E depois destes e de outros varíadissimos cortes, que os ditos responsáveis da Televisão chamavam eufemisticamente sugestões, foi por eles dito que ou os produtores aceitavam tais «sugestões» ou os programas não passariam ou seriam relegados para o 2.º canal, para o fim da emissão e as relações entre a televisão e aquela produtora teriam de ser revistas.
Isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, chama-se, simultaneamente, censura e chantagem.
Mas o que eu pergunto ao Governo é se estes programas vão mesmo passar ou não, que é feito deles e se tal tipo de censura vai continuar num órgão de comunicação social como a Rádiotelevisão Portuguesa.
Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: Nesta interpelação centrada na questão da ANOP, há também, no entender do grupo parlamentar interpelante, um lugar para a RTP, cujo «manancial» justificaria, aliás, por si só, uma interpelação específica.
E começaríamos pela questão da publicidade, publicidade onde a RTP é tão pródiga -para não dizer mesmo propaganda -, sector fundamental para a Televisão, em termos financeiros, sobretudo se entendermos que este sector facturou em 1981 a soma de 1600000 contos onde, dado o impasse actualmente existente, no que diz respeito à Movierecord, se esboçam actuações, da parte do Governo, cujo escândalo pede messas ao escândalo que, em nosso entender, é o caso da ANOP.
O projecto da Rádiotelevisão Comercial previa originariamente a atribuição do exclusivo de comercialização da publicidade na RTP a uma empresa cujo capital seria detido em 80% pela RTP, deixando os restantes 20% à iniciativa privada.
Por despacho do Secretário de Estado José Alfaia (n.º 95/81), de 3 de Agosto, determina-se que a RTP «pode ceder até 80% do capital subscrito, da Rádiotelevisão Comercial, à entidade privada que em concurso público melhores condições ofereça». E perante esta mudança radical, de 360º, cabe-nos perguntar: qual a lógica desta alteração radical dos pressupostos do projecto da Rádiotelevisão Comercial? Que critério de rentabilidade económica da própria RTP, E. P. é que está subjacente a esta decisão? E esta decisão ou não, uma decisão que lesa significativamente a viabilidade económica de uma empresa pública, para depois lhe vir a dar o mesmo destino que hoje se dá à ANOP? É que a situação financeira e orçamental da RTP nos inspira, também a nós, fundadas preocupações.
O Conselho de Gerência da RTP, afirmou à Comissão Parlamentar de Comunicação Social, quando esta se deslocou às instalações da 5 de Outubro, que o seu exercício em 1981 se tinha soldado num lucro de 187000 contos.
Este «milagre económico», só comparável, decerto, ao milagre económico brasileiro - do actual conselho de gestão é propagandeado diariamente nos écrans da RTP, embora não seja ainda, sequer, do conhecimento público o relatório e contas para 1981, do referido conselho de gerência.
Logo, não se sabe como contribuíram para este autopropagandeado «lucro miraculoso» a aplicação do acordo de saneamento económico e financeiro, nomeadamente as isenções fiscais nele previstas e de que não puderam beneficiar as anteriores gestões; não se sabe como contribui para esse lucro a cobrança directa pela RTP das taxas, preparada por anterior gestão, mas de cujos louros se reivindica a actual gestão Proença de Carvalho, nem sequer os aumentos das próprias taxas, quer no que diz respeito ao preto e branco, quer no que diz respeito à cor; não se sabe, por exemplo, como são reprodutivos para a gestão deste conselho de gerência os investimentos maciços em reequipamento feitos pelas gestões anteriores, suportados por elas e que estiveram na base de alguns dos défices anteriormente registados. Finalmente, não conhecemos mas estamos ansiosos por conhecer quais as operações de habilidade contabilistica que foram feitas para este lucro (onde avultam, ao que se sabe, a subestimacão de diversas receitas, nomeadamente da publicidade, constantes dos cálculos provisionais).
O Sr. Secretário de Estado avaliza, perante esta Câmara, o quadro financeiro propagandeado pelo conselho de gerência? Tem o Sr. Secretário de Estado, conhecimento do relatório e contas? Corresponde esta realidade, autopropagandeada pela RTP, à verdade?
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No domínio da informação, em nosso entender, bastará atentar no caso da Informação 2 porque ele se nos afigura paradigmático. A sua destruição, pelo conselho de gerência, foi tentada em 2 tempos:
a) Em 1980, por coincidência 1 mês antes das eleições legislativas, o conselho de gerência tentou sufocar a Informação 2. Não conseguiu extreminá-la mas, pelo menos, conseguiu silenciá-la;
b) Agora, por coincidência também, o conselho de gerência aplica à Informação 2 a estocada final. Trata-se, indubitavelmente, de um plano de destruição da Informação 2 que se nós, deputados, fossemos meros estetas, meros apreciadores da elegância e da eficácia, teríamos que felicitar o hábil, o engenhoso e o longa e detalhadamente preparado plano do conselho de gerência, para extinguir a Informação 2. Só que nós não somos estetas, não vivemos num mundo de ingenuidade e o que fazemos aqui é denunciar não só a actuação do conselho de gerência mas também a passividade cúmplice da entidade tutelar, isto é, a sua Secretaria de Estado, perante o afastamento arbitrário dos responsáveis da informação, a par de transferências ilegais de trabalhadores, violando o que se dispõe na lei, perante a admissão casuística de jornalistas sem carteira profissional, outros pagos a cachei e outros, ainda, contratados a prazo, sem critérios e violando, clara e inequivocamente, o que se dispunha no artigo 10.º do acordo de saneamento económico-financeiro.
Cumpre perguntar: assistimos nós, verdadeiramente, à extinção da Informação 2 (de uma informação de qualidade com índices de audiência superiores ao do próprio Telejornal l antes da sobreposição horária e nos meios urbanos) ou assistimos apenas a uma mera acção de despejo das pessoas que faziam a Informação 2, para, dentro de poucos meses, instalar na S de Outubro, um novo lobby de informação no 2.º Canal, ao serviço do conselho de gestão?
Finalmente, estes factos fazem-nos pensar que está em curso um verdadeiro plano de destruição da RTP, paralelo ao da ANOP. que consiste na redução da capacidade de produção interna da RTP restringida, única e exclusivamente, ao sector da informação transformado, ele próprio, num mero sector de propaganda, e na aceitação da produção externa, sem qualquer critério nem preocupação de qualidade, virada para a concessão de lucros chorudos aos amigos de quem determina nestas coisas, à custa dos técnicos, dos equipamentos e até dos investimentos que são feitos pela própria RTP.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Cauciona o Sr. Secretário de Estado a reprivatização do miolo da programação da RTP, mantendo apenas o esqueleto, mantendo apenas os ossos, isto é, os centros emissores e retransmissores e nada mais? Ou seja, aquilo que verdadeiramente pode dar prejuízo? É o Sr. Secretário de Estado solidário com este projecto de destruição da RTP?
Sr. Secretário de Estado, gostaria de deixar claro neste ponto do debate que na nossa argumentação não nos movem objectivos ad odium, ou sequer, ad hominem. Nem sequer fazemos por ora considerações adjectivantes da sua própria, pessoal e directa - actuação. Diremos apenas que tudo o que temos presenciado, da sua parte, nesta matéria, é triste, é muito triste e nem sequer consegue chegar a ser fado...
O Sr. Secretário de Estado aparece, perante o pais, como o Kerensky da Comunicação Social estatizada. Mas fá-lo pensando que tutela quando, no fundo, Sr. Secretário de Estado, é o senhor que é tutelado, porque avaliza atribiliariamente com erros, incoerências e até com falsidades - a proliferação de um contra-poder de uma hidra de sete cabeças que, receamos, pode vir a sufocar em Portugal uma opinião pública devidamente informada. E sem a opinião pública devidamente informada, é a própria democracia que se sufoca. A responsabilidade é toda sua!
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A tentativa de controle da Comunicação Social tem sido imagem de marca de praticamente todos os governos que o nosso povo tem sido obrigado a aturar.
Desde os tempos em que se atacavam à bomba os emissores da Rádio Renascença sob controle dos trabalhadores até ao controle opressivo, nauseante e grosseiro, passando pela pirataria e estrangulamento financeiro, característicos do Governo AD, todos os métodos, dos mais refinados aos mais truculentos, dos mais solenes aos mais ridículos, foram utilizados para impedir os trabalhadores da comunicação social de desempenharem a sua missão em ambiente democrático, livre, responsável, participativo e criador.
Objectivo: impedir o acesso dos trabalhadores aos órgãos de comunicação social, orientar a informação, manipular as consciências.
Logo nos primeiros dias pós 25 de Abril, assistimos a um facto premonitório daquilo que está hoje acontecendo, com a escandalosa interrupção da emissão televisiva a partir da Feira das Indústrias, onde tinha lugar uma maravilhosa festa de alegria popular e criação artística, redimindo o nosso povo de 48 anos de obscurantismo, repressão e censura.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A política para a comunicação social do Governo AD, como de resto toda a sua política, tem vindo a apurar-se e a avançar para cometimentos cada vez mais ousados à medida que - por entre protestos e burburinhos, alegações e recursos, denúncias e inquéritos, pedidos e ameaças- vai consolidando, apesar de tudo, as suas posições, desarticulando resistências, dobrando determinações e corrompendo coerências, além de desfazer ilusões, também. Não nele, que já ninguém as tem, mas em hierática esfinge, que afinal se revela sem a grandeza do clássico, apenas um jesuíta dos sete costados.
De facto, se dúvidas houvesse, Ramalho Eanes «o providencial», não passa de um fariseu, direi melhor, de um pilatos, em todos os seus actos, como sempre o classificámos.
O veto presidencial nada significa em termos de salvação, de facto, da ANOP, em termos de garantia da sua continuidade, em termos de eficácia e de preservação dos
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postos de trabalho e daquilo que os trabalhadores e o povo português têm a esperar dela.
É um lavar de mãos, um «não me comprometa»! Mas, mais e pior do que isso, é também uma acha para a fogueira das ilusões, da expectativa, para afinal dar base política, à voragem da selecção natural que o Sr. Secretário Alfaia louvou no seu paleio enjoativo, hipócrita e sacaneta.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, dá-me licença?
O Orador: - Faça favor, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Peço-lhe o favor de se referir ao Sr. Secretário de Estado nos termos correctos: Secretário de Estado e não Secretário.
Peço-lhe o favor de evitar palavras que possam ser consideradas ofensivas da dignidade das pessoas aqui presentes.
O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
...Dizia eu, que sofrendo muito o Governo com os despedimento que impõe e não é só na ANOP, é na Quimigal, é na Lisnave, são milhares e milhares de trabalhadores que o Governo, com a mesma atitude hipócrita, pretende pôr na rua, pôr no desemprego - dizendo sempre que lamenta muito (para que os capitalistas, mais e mais, possam engordar, sofrendo o Governo muito com os despedimentos que impõe) é preciso, no entanto, deixar correr e engrossar esse rio caudaloso de mão de obra, de trabalhadores, que vai desaguar nas condições polítíco-sociais que favorecem «o investimento produtivo e alargam os postos de trabalho».
Os espíritos demasiado simplistas, como diz o Sr. Secretário, dos trabalhadores...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe o favor de não insistir. Não está a dirigir-se a um Sr. Secretário qualquer, está a dirigir-se ao Sr. Secretário de Estado. Portanto, é nesses termos que se lhe deve dirigir sob pena de não poder continuar a permitir-lhe o uso da palavra.
O Orador: - Eu não quero insistir, Sr. Presidente, mas há aí um partipris.
Risos gerais.
O Sr. Secretário de Estado é um Secretário, se fosse um Ministro eu diria o Sr. Ministro e o Sr. Presidente certamente não me interpelaria dessa forma.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado fará o favor de não julgar as pessoas mal e de não pensar que elas não têm possibilidade de avaliar o significado e alcance das expressões.
Essa expressão não é correcta para o Sr. Secretário de Estado. Faça favor de proceder correctamente, como é dever de todos os deputados.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, vou prosseguir a minha intervenção mas queria dizer ao Sr. Presidente e a esta Assembleia que .ºs deputados, nomeadamente, eu próprio,, também estamos um bocado fartos da forma como o Governo vem para aqui tecer as suas considerações, - dando sempre uma perspectiva pretensamente democrática - quando lá fora, onde estão os trabalhadores, o povo sofre, é obrigado já a passar fome, debaixo das ordens de governos e governantes como estes. Já não posso ter consideração por estes governantes, Sr. Presidente!
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Então vá-se embora!
O Orador: - Vou-me embora não, quem vai para a rua é o Governo, não sou eu!
Risos gerais.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Apresente uma moção de censura!
O Orador: - Dizia eu que os espíritos demasiado simplistas - como dizia, ou disse, há pouco, o Sr. Secretário Alfaia - dos trabalhadores...
O Sr. Presidente: - Oh, Sr. Deputado, não posso consentir que continue a proceder dessa forma e cortar-lhe-ei a palavra!
Peco-lhe imensa desculpa mas há regras nesta Assembleia para as pessoas se dirigirem umas às outras e o Sr. Deputado tem que as respeitar, aconteça o que acontecer, sob pena de ter que retirar-lhe a palavra.
Sr. Presidente, a minha insistência era apenas para provar a V. Ex.ª que não há qualquer intuito especial.
Risos.
Como ia dizendo, os espíritos demasiado simplistas dos trabalhadores - segundo disse há bocado o Sr. Secretário de Estado, Alfaia - ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... - e deste humilde orador, não vêem a grandeza do Secretário e querem tudo e já, de uma vez.
Os espíritos simplistas querem emprego, salário, condições de trabalho, etc. e não percebem que tenham primeiro que ser despedidos para depois serem reempregados!
O Governo, Sr. Presidente. Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, tripudia por sobre toda a legislação, por sobre a própria Constituição, apesar de a ter já moldada à sua vontade.
O caso da ANOP é exemplar quanto ao carácter, fora da lei, deste Governo. É também exemplar quanto ao carácter prepotente destes governantes.
A fúria contra o sector público e nacionalizado que tem caracterizado a política da AD e que recebeu o aval constitucional com a promulgação da Lei de Revisão Constitucional, desdobra-se naturalmente à comunicação social.
Quais serão as motivações últimas da liquidação do sector público, por parte da AD? No sector produtivo, para dar aos grandes capitalistas melhores condições de explorar, despedir e roubar. Por outro lado, previne a situação mais que provável de ser apeado do poder e ter de deixar de ser o vigilante eleito dos grandes capitalistas, em nome dos grandes capitalistas. Aproveita também para se retirar da posição incómoda de alvo privilegiado da luta reivindicativa das dezenas de milhar
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de trabalhadores das empresas públicas e nacionalizadas e assumir de forma mais credível o papel de árbitro imparcial...
No caso concreto da ANOP, os sectores do capital monopolista pretendem garantir a permanência do seu controle sobre os 60% da informação divulgada pelos órgãos da comunicação social, para além da vida efémera deste governo, obtendo desde já um volumoso financiamento à custa do erário público. Para isso põem o Secretário de Estado a dar o triste espectáculo que temos estado a desfrutar.
E como lhe pagaram os estudos para alguma coisa, ele arranja formas elaboradas de apresentar o assalto descabelado ao direito à informação do povo português;
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Mas fraco!
O Orador: - Ouçamo-lo: «...estes números - os bons de informação divulgada, que é veiculada e sistematizada pela ANOP -. só por si seriam suficientes para justificar que a agência noticiosa não estivesse integrada no sector público - portanto o melhor é dar todo este volume de informação ao sector privado, aos grandes capitalistas! - pois não se confundam as virtualidades de uma independência de facto, com a precaridade de uma independência formal, que será a da ANOP, que outras poderiam vir a infringir!!
Isto é, a independência formal da ANOP, poderia vir a ser infringida pelos outros, ou seja, por aqueles que irão substituir o Governo quando sair. E isso que, de facto, interessa que não aconteça. É que alguém, que não o Governo AD. possa de facto controlar, de uma forma eventualmente democrática, os destinos da ANOP, da comunicação social, da informação, no nosso país. ou seja. aqueles que os irão substituir.
Garanta-se, portanto, desde já. o controle directo do grande capital e dos seus homens-de-mão, sob a máscara da independência da informação.
Mesmo sendo Governo, a AD sabe que não estamos ainda no reino da arbitrariedade total, embora faça bastantes esforços nesse sentido e arranje boa colaboração. Por isso também sabe que determinados mecanismos, como este que o partido interpelante pôs a funcionar, levam ao seu desmascaramento e ao ridículo mais escangalhado dos governantes e daqueles que estão aqui hoje para responderem o que não são capazes de fazer- à interpelação da UEDS, perdendo qualquer credibilidade, por mais que o incansável Proença de Carvalho a tente promover.
Dai. o convir-lhe também que as maningâncias passam a ser feitas por agentes directos do capital, menos sujeitos a este tipo de fiscalização.
Mas não é só com a ANOP. a ofensiva do capital e do Governo.
Na RDP, depois da ofensiva iniciada em 1980 para domesticar a informação e afastar profissionais de reconhecida competência dos lugares de chefia, suspendendo arbitrariamente programas e jornalistas, caminha-se paulatinamente para a completa degradação dos serviços e das condições de trabalho e intervenção dos profissionais. Ouçamos os elementos demissionários da CA da RDP, Adelino Gomes, Gabriel Pires e Gabriel Correia acerca da eficácia do CA perante a actuação da administração: Ao parecer negativo quanto à nomeação de A. Ribeiro, o presidente do CA respondeu com a nomeação de A. Ribeiro. Ao parecer negativo do CA quanto à nomeação de J. C. Sousa, o chefe de departamento respondeu com a nomeação de J. C. Sousa. Ao parecer negativo sobre a reestruturação de Maio, responderam com a reestruturação de Maio, com mais pormenores como, por exemplo, nomear definitivamente o editor M. Lage como chefe de redacção, na mesma ordem de serviço que lhe retirava a chefia da Redacção, dando-lhe porém, a chefia de uns serviços que não existiam nem viriam a existir nos 6 meses seguintes. À denúncia deste significativo pequeno nepotismo, a administração respondeu concedendo ao mesmo chefe de redacção, sem redacção nem serviços especiais para chefiar, 20% sobre o ordenado, a título de isenção do horário.
Esta é a situação numa RDP, onde as estruturas representativas dos trabalhadores são, na prática, cilindradas pela prática das direcções e chefias censórias, incompetentes e corruptas.
Proença e Alfaia, Alfaia e Proença. Quem consegue pensar num sem que lhe ocorra logo o outro?
Alfaia corta o subsídio de papel ao jornal Em Marcha. Proença discrimina o jornal Em Marcha e, ao contrário do que faz com outros jornais, não possibilita, apesar dos protestos, o seu acesso às câmaras da TV por altura de passagem do 3.ª aniversário daquele jornal.
A política de manipulação do Governo, logo de Alfaia, tem como executor de elite Proença e como alvo privilegiado o movimento operário e popular, nomeadamente, a imprensa popular, sobre a qual cai, com maior violência, a arbitrariedade e o ódio à liberdade e às lutas dos trabalhadores.
O Governo AD e os seus homens de mão tratam de preparar condições, também ao nível da comunicação social, para levar por diante a burla eleitoral com que estamos ameaçados.
Proença, na vanguarda, preparou já milhares de famílias para a entrada matinal de mais propaganda AD, liminar ou ostensiva, para a aceitação de mais abjecções - do género dos filmes auticomunistas que passaram no primeiro canal durante semanas sucessivas -, para assistir diariamente ao relato das inaugurações com que o Primeiro-Ministro e outros vão encher o nosso monótono dia a dia e mostrar o muito que têm feito para além daquilo que todos já sabemos, ou seja, os ataques à liberdade, ao direito ao trabalho, ao nível de vida do povo, ao direito à habitação, à saúde e à educação. Porque, havendo Alfaias e Proenças, é esta de facto a política do Governo. É a liquidação do 25 de Abril!
É por isso que ele precisa, para sobreviver, de liquidar todas as résteas de controle democrático da informação, entregar a comunicação social nas mãos de verdadeiros censores e manipuladores sem escrúpulos, executores e carrascos da liberdade do nosso povo.
Como lutar contra isto? Que fazer? Deixá-los firmarem-se, implantar cada vez mais os seus homens de mão. os seus sinistros gestores, enquanto se olha angustiada e esperançadamente para as borbulhas do Presidente? Ou unir todas as forças democráticas e apoiar a luta dos operários que são hoje as maiores vítimas da brutal e reaccionária ofensiva do Governo? Apelar para a luta comum e firme que isole este Governo e o impeça de governar? A UDP acha que é este último o único caminho a seguir: Derrubar o Governo, apoiar a preparação de uma greve geral ampla e radical que obrigue os salteadores a largarem o poder.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Da arca perdida...
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.
A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Secretário de Estado: Das dúvidas que me são suscitadas pela pouca claridade que envolve a eventual e muito falada extinção da ANOP e a constituição de uma nova agência noticiosa, destaco algumas, o que, sublinho, faço inteiramente em meu nome pessoal, não envolvendo, de nenhuma forma, a posição deste grupo parlamentar.
O Sr. Aquilino Ribeiro Machado (PS): - Muito bem!
A Oradora: - No dia 25 de Setembro saiu uma portaria que autorizou o contrato firmado entre a Direcção-Geral de Informação e a nova agência noticiosa, ou seja, antes desta ser constituída.
Pode V. Ex.ª citar-me os princípios integramente cooperativistas que legitimam este arranque governamental de uma instituição cooperativa?
Estaremos perante uma cooperativa ou uma empresa veladamente estatizada sem o ónus das empresas públicas, considerando o forte peso das empresas estatizadas que são cooperantes da NP?
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Com o vultoso subsídio dado à NP pelo Governo não terá este aberto um precedente que moralmente o obriga a atribuir a outras cooperativas os benefícios e privilégios com que bafeja a nova agência?
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
Por outro lado. o Governo alegou como um dos fundamentos para contratar a prestação de serviços noticiosos noutra agência, o justo imperativo de uma informação isenta, pluralista, em suma e implicitamente, não enfeudada ao Estado.
Como é que o Governo concilia este seu estimável conceito de uma informação independente do Estado com as duas vias de controle que a nova agência lhe proporciona? Uma, política, através das administrações das empresas públicas que são cooperantes da NP, visto que essas administrações são nomeadas pelo Governo e outra, económica, mediante as verbas volumosas, verbas decisivas, que o Governo põe à disposição da nova agência.
O Sr. Aquilino Ribeiro Machado (PS): - Muito bem!
A Oradora: - Finalmente: No seu programa, o Governo comprometeu-se a reorganizar a ANOP e a secundá-la financeiramente. Que fez o Governo para cumprir este compromisso?
Porque não preferiu, em conformidade com a sua promessa programática, reestruturar a ANOP, o que seria mais pacífico em relação aos trabalhadores e mais económico do que animar uma nova agência para a qual contribui com a verba de 320000 contos, escalonada em 1982, 1983 e 1984.
Aplausos do PS. do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
Neste momento, o Sr. Deputado Leonel Santa Rita bate com as mãos no tampo da carteira.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Vá lá, bateu com a mão, não bateu com a cabeça...
A Oradora: - Não vale a pena patear. Creio que ainda não perdi o direito de falar!
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - A Sr.ª Deputada Natália Correia, entendeu, e bem. abordar na sua intervenção os aspectos que se relacionam com o carácter cooperativo da nova agência noticiosa.
Na verdade, o Governo, pela boca do Sr. Secretário de Estado, veio encher-nos os ouvidos com o carácter cooperativo da nova agência e com o empenho que o Governo punha, por essa razão, em protegê-la.
Sabe a Sr.ª Deputada, por ventura, o que se passa com a TSF, cooperativa de profissionais da Rádio? Sabe a Sr.ª Deputada que essa cooperativa já estava em funcionamento quando foi criada a nova cooperativa, já fornecia noticiários para a emigração, e que o Governo, pura e simplesmente, a ignorou?
Mas, pior que isso. sabe a Sr.ª Deputada que essa cooperativa, que neste momento está já a fornecer noticiário para diversas emissoras das comunidades portuguesas espalhadas no mundo, está confrontada com uma situação criada na Secretaria de Estado da Emigração? Isto é. a Secretaria de Estado da Emigração está. neste momento, a recrutar pessoal para montar um serviço, paralelo ao desempenhado por essa cooperativa, para fornecer directamente o noticiário a essas emissoras.
A Sr.ª Deputada sabia de mais este exemplo do carinho que o Governo dispensa, de facto, às cooperativas no nosso país?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - É comovente!
O Orador: - Se não conhecia, é com satisfação. Sr.ª Deputada, que aproveito a oportunidade para lhe dar conhecimento.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Dois pesos, duas medidas!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Américo de Sá.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.» Deputada Natália Correia.
A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, registo com muita pena o que me acaba de dizer, até por uma razão sentimental. Fui convidada, precisamente, para inaugurar o noticiário dessa cooperativa destinado aos emigrantes do Canadá e da América do Norte. Isso, atendendo à minha extracção açoriana, visto que, como sabe, nessas comunidades existem muitos açorianos. Tive esse prazer, essa honra e esse privilégio e o que me diz, realmente, deixa-me triste.
Prometo informar-me sobre esse assunto.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É só para um esclarecimento complementar.
A Sr.ª Deputada poderia, talvez, aproveitar para se informar também porque razão o Sr. Secretario de Estado da Emigração, desde Marco, se recusa a receber os cooperantes da cooperativa TSF, os quais lhe pediram uma audiência.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Ele, para receber, é só taco...!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Matos.
O Sr. Manuel Matos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Conforme já foi aqui repetidamente dito, o processo que tem vindo a ser debatido ao longo deste dia não trata, apenas, da questão da ANOP. Ele visa constituir uma peça fundamental de denúncia da política geral do Governo no que diz respeito ao problema da informação e da comunicação em geral.
Também não serei o primeiro a abordar a questão da RFP. Alguns Srs. Deputados já se anteciparam na denúncia da repressão e do papel deprimente que tem vindo a caber à RTP no processo de obscurantismo do povo português.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Secretário de Estado: O papel que a RTP vem assumindo no plano informativo, cultural e social da vida portuguesa, em crescente desafio ao simples bom senso dos cidadãos, justifica que a seu respeito e neste momento se perfile aqui algumas questões.
Nos termos da lei a «RTP constitui um serviço público* e tem como fins contribuir para a formação e informação do povo português, defendendo e promovendo os valores culturais do País, designadamente da língua portuguesa "bem como» contribuir para a promoção do progresso social, nomeadamente da informação e da recreação de todos os portugueses, no respeito dos direitos e liberdades fundamentais, com vista à edificação de uma sociedade livre, democrática e pluralista, de acordo com a Constituição da República e a Lei».
Sr. Presidente, Sr. Deputados, Sr. Secretário de Estado, em face da clareza destes objectivos, quem reconhece a TV que temos? Quem reconhece na RTP um «serviço público»? Quem vê nela um meio de defesa dos valores culturais do Pais. designadamente da língua portuguesa? Quem aceita que a TV promova o progresso social, nomeadamente através da formação e recreação de todos os portugueses, no respeito dos direitos e liberdades fundamentais?
É hoje cada vez mais claro que a RTP faz da manipulação o objectivo central da sua actividade. Não receia perante nada para levar tão longe quanto possível o domínio que vem exercendo sobre a consciência e vontade dos portugueses.
Este exercício maciço de violência ideológica de intoxicação, de degradação da consciência nacional acentua-se e exacerba-se à medida que se aproxima o período eleitoral e à medida que a política AD se torna impopular até à náusea.
Em obediência a este ímpeto de assegurar e manter o controle da opinião pública, são ultrapassados todos os limites e valores.
O que aconteceu com o alargamento do período de emissão ilustra o que se acaba de dizer.
Um Governo responsável que tivesse em alguma conta os interesses nacionais e não pensasse apenas em se perpetuar no poder, rodearia das maiores cautelas - nomeadamente no plano da racionalidade dos custos - uma decisão como esta de alargar a emissão ao período da manhã.
Qualquer cidadão sabe das pressões que foram exercidas, a partir da própria RTP, no sentido de poupar energia; as donas de casa foram estimuladas a usarem o ferro de engomar nas horas mortas da noite, a RTP teve como limite da sua emissão as 23 horas por imposição governamental.
Quando foi determinado o fecho da RTP às 23 horas as albufeiras estavam a 50% da sua capacidade.
Actualmente as albufeiras estão a cerca de 30% da sua capacidade. Mais: a energia importada é mais cara este ano, porque a Espanha nos impossibilitou de a adquirir directamente à França.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ainda mais: simultaneamente com o alargamento do período de emissão da RTP, o metropolitano, por razões de poupança de energia, reduziu o seu período de actividade diária.
De repente, todas aquelas medidas de poupança de energia são derrubadas como se se tivessem tornado subitamente falsas todas as razões em que assentavam. Mais e pior - o consumo de energia não só não é desestimulado como claramente elevado por coincidir com o período de funcionamento intensivo de todo o sistema de produção.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Concebe-se que um Governo com o sentido das responsabilidades pudesse assumir os riscos inerentes à elevação do consumo energético, se o valor intrínseco do produto televisivo, em termos dos fins legalmente prescritos à RTP, impusesse essa opção ao poder.
Mas há. aqui, alguém nesta Assembleia, alguém com um mínimo de exigência cultural, que reconheça um átomo de qualidade à produção televisiva, nomeadamente do período matinal?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Reconhece o próprio Sr. Secretário de Estado esse mínimo de qualidade às emissões que têm sido até agora realizadas de modo a poder ser iludido o verdadeiro fundo da questão que é, inequivocamente, o da manipulação?
A péssima qualidade do programa autoriza-me ainda um outro tipo de juízo: O Sr. Secretário de Estado colabora numa fraude cultural repugnante se admite que o público potencial a quem as emissões se destinam não é culturalmente exigente. A terceira idade, as crianças e os inválidos - a admitir que são o público predominante da emissão são um público tão digno como o da emissão tradicional. Tão digno, ainda que porventura mais frágil, mas por isso mesmo moralmente mais exigente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - Discriminá-lo com programas medíocres, estupidificantes, ainda piores do que os da restante emissão, só para entreter, é um comportamento inqualificável a todos os títulos.
Uma voz do PCP: - É um crime.
O Orador: - Isto para dizer, Sr. Secretário de Estado, que o oportunismo tem o seu preço. Pode render-lhe eventualmente mais alguns votos o senhor sabe que è eleitoralmente lucrativo investir pela RTP na solidão e na velhice -, mas tal opção coloca-o ao nível do pior traficante de chapeladas, para além de o tornar activo colaborador do analfabetismo cultural do nosso povo.
Aplausos do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
Haveria muito mais para dizer no tocante ao programa da manhã.
Para não sobrecarregar, apenas mais algumas questões muito concretas: É verdade que só em horas extraordinárias, cada emissão matinal custa a módica quantia de 250 contos diários?
É verdade que o custo mensal do programa ronda os 40 000 contos?
Pode V. Ex.ª identificar a função desempenhada pelo helicóptero? Será o de criar a ilusão de que está a emitir em directo?
Passemos, agora, ao plano da gestão e organização da empresa no seu plano global.
A imprensa afecta ao Governo e à própria TV vem criando a imagem duma RTP recuperada, economicamente desafogada.
Entretanto, esta imagem parece não jogar bem com certos dados relativos a pagamentos de salários.
Assim, a empresa terá recorrido a empréstimos bancários para pagamento dos meses de Marco e Outubro, pelo menos. Em que ficamos, Sr. Secretário de Estado?
Em todos os domínios, como é sabido, as opções de política económica do Governo são no sentido de privilegiar a iniciativa privada: os gestores AD na RTP não fogem evidentemente à regra, como aqui tem sido referido.
E é assim que nomeadamente no sector da produção e realização internas, a actividade dos Técnicos da RTP está reduzida ao mínimo, em proveito de grupos e entidades privadas que assim vêem crescer rapidamente os seus lucros e bens à custa do dinheiro do povo português.
E mais - a generosidade da administração da RTP, E.P., vai ao ponto de dispensar meios técnicos, humanos e financeiros da própria empresa aos interesses privados. Assim a EDIPIM terá beneficiado da cedência de 2 carros e (l de exteriores, outro de montagem) propriedade da RTP para utilizar nas suas produções que depois são vendidas à RTP com evidente beneficio da empresa produtora.
Vozes do PCP: - É uma vergonha!
O Orador: - Entretanto, o espaço do Lumiar está completamente desaproveitado, sem projectos sequer para utilização futura.
Ter-se-á chegado ao cúmulo de permitir à EDIPIM a aquisição de bobines da RTP para assim fugir ao pagamento do imposto de transacção.
Que medidas pensa tomar o Sr. Secretário de Estado para moralizar estas situações?
E que tem V. Ex.ª a dizer ao povo português - que paga a taxa - quanto ao facto de a RTP ceder ao capital privado 80% do produto da publicidade que passa na TV, como aqui já foi oportunamente referenciado?
No capitulo das condições de trabalho e de gestão de pessoal, é hoje comummente reconhecido o uso institucionalizado da política de compadrio descarado e terrorismo psicológico praticados pela política AD no interior da RTP.
Desde o não reconhecimento na prática da comissão de trabalhadores o representante dos trabalhadores no conselho fiscal continua por empossar, aliás, por motivos óbvios - até ao congelamento da actividade dos trabalhadores mais insubmissos e também mais competentes, até à admissão sem concurso de trabalhadores dóceis, passando pelo não reconhecimento dos conselhos de redacção, é todo um rosário de ilegalidades e arbítrios que reina na RTP. Que pensa V. Ex.ª fazer para repor a legalidade na empresa também neste domínio?
E a propósito de legalidade: para quando a reintegração dos saneados do 25 de Novembro, Sr. Secretário de Estado?
Aqui tem V. Ex.ª uma excelente oportunidade para fazer prova do seu arreigado amor à democracia, do seu tão proclamado respeito pelo Estado democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: A RTP é bem a imagem da política cultural e informativa deste Governo. Instrumento decisivo de mistificação, poderoso meio de comunicação ideológica, a RTP transformou-se num pântano de indignidade de que o Governo não pode hipocritamente irresponsabilizar-se.
O Sr. Aquilino Ribeiro Machado (PS): - Muito bem!
O Orador: - O funcionamento da RTP degradou-se de tal modo que hoje já se pratica abertamente a censura prévia no campo da simples produção de programas recreativos.
No plano da informação, o carácter dos serviços noticiosos é tão descaradamente dirigido, são tão repressivos os meios exercidos sobre os profissionais que a exercem, tão diversivos e charros os assuntos tratados que, se não fosse o estado de dependência cultural em que se encontra ainda uma boa parte da população portuguesa, o intuito da manipulação do Governo a si mesmo se anularia. Miseravelmente, o próprio Governo serve-se do estado de dependência em que o Salazarismo lançou o nosso povo para continuar a dominá-lo.
Só para ilustrar a concepção que a RTP tem da objectividade informativa, tenha-se em conta a fornia como o Telejornal principal da RTP deu, oportunamente, a noticia da atribuição do Prémio Nobel da Paz.
À cabeça do noticiário, com grande destaque, o locutor começou - «o Prémio Nobel da Paz afinal, não foi atribuído a Lech Walesa». A quem foi atribuído, de facto, o Prémio Nobel da Paz? Quem o quisesse saber teria que estar atento às pequenas notícias menores, lá para o fundo do noticiário.
Isto é, no mínimo, nauseabundo, Sr. Secretário de Estado.
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Vozes do PCP e da UDP: - Muito bem!
O Orador: - Não quero terminar sem colocar a V. Ex.ª uma questão a que dou grande relevo, porque ela tem a ver com a natureza do próprio regime democrático em que vivemos - pelo menos formalmente.
Essa questão é a seguinte: Há ou não há censura prévia formal, hoje na RTP?
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Há!
O Orador: - Para permitir a V. Ex.ª um melhor enquadramento da questão, não me dispenso de lhe dar conhecimento de uma nota de serviço dirigida aos produtores do subdepartamento de programas recreativos, datada de 20 de Setembro de 1982, portanto, fresquinha.
Passo a ler essa nota de serviço: «lembro novamente a todos os colegas que é absolutamente necessário dar conhecimento, por nota de serviço interna, no caso da ficha de programa ainda não estar completamente assinada, e obter autorização para a actuação de todos os intervenientes nos programas da sua responsabilidade antes de tomarem qualquer compromisso. Ninguém deverá ensaiar, gravar ou actuar em emissão directa sem que o produtor obtenha esta autorização e os intervenientes o contrato devidamente assinado.
O não cumprimento desta ordem será da inteira responsabilidade dos produtores dos programas».
Isto foi apenas para ajudar V. Ex.ª a enquadrar a questão de saber se há ou não há, hoje, censura prévia e formal na RTP.
Aplausos do PCP, da UEDS do MDP/CDE, da UDP e de alguns Srs. Deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado Silva Marques, a quem concederei de imediato a palavra com a reserva de que o Sr. Deputado Manuel Matos já não dispõe de tempo para lhe responder.
No entanto, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Manuel Matos. V. Ex.ª mostrou preocupações que enformam um espírito e uma filosofia democráticos que não estão em sintonia com a filosofia nem, se é possível uma diferença, com os modelos do seu partido.
Um segundo ponto: V. Ex.ª trouxe com uma facilidade, que talvez devesse merecer alguma contenção, um exemplo de manipulação de informação. Admitindo que esse exemplo é real - e efectivamente de manipulações está a nossa informação bastante cheia e devemos contrariar esse fenómeno -, pergunto-lhe, Sr. Deputado, por que não invoca um outro exemplo de manipulação da informação como é o caso de um jornal, que decerto lhe merece credibilidade V. Ex.ª me dirá se sim se não, mas eu julgo que sim - e que é o Diário de Lisboa, que ontem ou anteontem dizia em título: «MDP rompeu com APU em Viana do Castelo». Lendo o texto, mais a baixo, num pequeno parágrafo e em letras ainda mais pequeninas dizia: «o mesmo aconteceu em Santarém».
Ora, eu pergunto-lhe, Sr. Deputado, o que é que pensa relativamente ao fenómeno de manipulação jornalística, em geral, no nosso País.
Protestos do PCP.
Finalmente, disse V. Ex.ª, e com razão, que o oportunismo tem o seu preço. Eu pretendia apenas saber qual é o preço que W. Ex." estão a cobrar.
O Sr. Presidente: - Está inscrito a seguir o Sr. Deputado Sousa Lara.
O Sr. Sousa Lara (PPM): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso e uma vez que o Sr. Deputado Manuel Matos já não dispõe de tempo para responder...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso ficar indiferente perante a atitude da bancada do PSD, nomeadamente do Sr. Deputado Silva Marques, que, sabendo que o Sr. Deputado Manuel Matos não lhe podia responder, não hesitou, no entanto, colocar-lhe as perguntas. Essa é sempre uma das situações mais cómodas. O Governo já nos habituou a esse comportamento e a sua bancada também.
Perante isto, se o Sr. Deputado do PCP quiser usar o tempo da UEDS para responder ao Sr. Deputado Silva Marques, faça favor. Peco-lhe apenas que seja parco porque nós dispomos de muito pouco tempo.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Manuel Matos.
O Sr. Manuel Matos (PCP): - Agradeço-lhe muito, Sr. Deputado Lopes Cardoso, a facilidade que me concede, mas, de todo em todo, não devo lamentar o facto de não dispor de muito tempo porque, na verdade, não eram muito dramáticas as questões colocadas pelo Sr. Deputado Silva Marques.
Penso que os colegas empenhados nesta questão não sofrem um grande desaire ou têm um prejuízo acentuado pelo facto de eu não dispor de tempo para esclarecer as dúvidas postas pelo Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado do Partido Comunista só mostra que as observações que o Sr. Deputado Lopes Cardoso me dirigiu eram absolutamente descabidas.
Vozes do PCP: - Muito mal!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente,
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Srs. Deputados: Pedi a palavra para fazer uma interpelação à Mesa e para, simultaneamente, a informar de que há pouco, quando o meu camarada Jorge Lemos interveio, nós esperávamos que o Sr. Deputado Silva Marques, que tem estado particularmente activo nesta sessão -eu diria que tem estado particularmente activo neste período que se seguiu à sua eleição- interviesse para lhe respondermos. Mas nessa altura, como nós ainda dispúnhamos de tempo, ele não se atreveu a fazê-lo. Esperou que não tivéssemos tempo para agora intervir da fornia como interveio em relação à intervenção do meu camarada Manuel Matos e nos termos em que acabámos de ouvir.
Aplausos do PCP e da UEDS
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, V. Ex.ª pôs a questão como uma interpelação à Mesa, mas esta, é evidente, não pode dar-lhe nenhum esclarecimento.
Segundo diz, também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não me custa nada que passemos a fazer uma outra conjugação dos nossos tempos e que, nesse caso, a bancada do Partido Comunista, quando estiver próximo de esgotar o tempo de que dispõe, me avise para que eu possa intervir antes disso. Nessa altura terão a oportunidade de acabar depois de mim.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, para uma intervenção o Sr. Deputado João Corregedor.
O Sr. Joio Corregedor (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A construção e reforço da sociedade democrática necessita de um instrumento colectivo insubstituível: a comunicação social, livre de censuras, independente e rigorosa.
Para que esse instrumento se revele eficaz na consolidação da democracia impõe-se: a definição de uma política de informação que considere prioritariamente a cultura e a educação; uma política de informação que estimule os seus destinatários nos órgãos de comunicação; uma política de informação que revitalize publicações do sector público de carácter informativo e cultural idóneo; uma política de informação que apoie publicações destinadas a sectores cadenciados ou marginalizados; uma política de informação que dinamize a imprensa regional de forma a colocá-la integralmente ao serviço da democracia e que sirva para minimizar situações extremamente graves que subsistem neste sector onde se mantém em alguns casos o mesmo panorama retrógrado anterior ao 25 de Abril.
O país necessita de uma política de informação que inverta a passividade e incompetência oficiais responsáveis pela inexistência, junto dos emigrantes, de veículos de valorização cultural e informativa.
Mas o Governo AD assim não o entende. O Governo não está interessado no papel pedagógico da comunicação social. O Governo não se manifesta interessado em que a televisão, a rádio e a imprensa escrita produzam programas de índole educativa.
O Governo não cuida de impedir e travar as ideologias fascizantes que são utilizadas nos ataques à nossa democracia em nome de políticas restauracionistas.
O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Muito bem!
O Orador: - Não seremos tão ingénuos que pensemos que um governo como o da AD pretenda para o país uma comunicação social dignificada, livre, viva, actuante. desembaraçada, pedagógica, informativa, criativa e culta.
O Governo prefere, sem quaisquer preocupações de qualidade informativa, servir-se, sem qualquer pudor, da comunicação social nomeadamente da estatizada. Refira-se, a propósito, o escândalo da transmissão directa do texto lido pelo Primeiro-Ministro na ONU. O Governo reservou para si, que não para os portugueses, o satélite de transmissões televisivas entre o continente americano e a Europa, durante uma hora! - coisa rara em todo o mundo. Em Portugal não há memória de que alguma vez isso tivesse acontecido e já foram várias as entidades portuguesas que depois do 25 de Abril, discursaram nas Nações Unidas.
Nada justificava essa decisão a não ser a ânsia de busca de popularidade em época pré-eleitoral, de uma personalidade que de popular nada tem. A RTP, ou seja Proença de Carvalho, fez repetir diversas vezes esse programa. Foi uma festa, uma festa provinciana que só deve ter agradado às famílias da AD, à custa do erário público.
Já que falamos em televisão não podemos deixar de condenar, com veemência, a forma descarada como a TV é utilizada nos programas matinais, numa iniciativa que visa, apenas, efeitos eleitoralistas. De hora a hora, o massacre propagandístico governamental é uma constante. Esse mesmo programa matinal da televisão que tem sido criticado por pedagogos, psicológicos, professores, enfim por todos quantos têm preocupação pela cultura, pela educação, pelo ensino.
Homericamente, o Governo não olha a meios para atingir os seus fins. Perante esta programação matinal da TV perguntamos ao Governo se não está preocupado com o agravamento dos gastos com a energia em horas de franca laboração matinal. Ou será que o Governo, que tanto apregoa austeridade e a contenção das despesas, considera de somenos importância a energia gasta, em horas de ponta, a quebra de produtividade de quem em vez de trabalhar passa a ver televisão, e o que é extremamente grave, a entrega de muitas crianças ao pequeno écran em vez de estudarem?
Este é um exemplo da forma como a AD e o seu Governo encaram a política de informação. Controlar, manipular, instrumentalizar, governamentalizar a comunicação social, sem respeitar os mais pequenos valores culturais.
Mas vamos ao caso ANOP. O Governo não conseguiu controlar por dentro a ANOP, apesar de sempre ter colocado como responsáveis nos sucessivos conselhos de gerência homens da sua inteira confiança.
Através do Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro foram apresentadas titubeantes razões para justificar o método adoptado para travar o desenvolvimento da Agência Noticiosa Portuguesa.
O que está em causa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é tentar furtar à fiscalização da Assembleia da República, dos Conselhos de Informação (ou do Conselho de Comunicação Social, quando este surgir) o sector público da Comunicação Social. Impedir a cobertura de eleições com rigor e com independência.
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206 I SÉRIE - NÚMERO 8
 ANOP é a primeira atingida, sem contarmos com o escândalo da televisão.
Já pairam sombras bem negras sobre o Diário Popular, onde se pretende imprimir processo idêntico ao da Agência Noticiosa Portuguesa (é possível que o Dr. Balsemão tenha saudades do jornal onde iniciou as suas funções de patrão... que não de jornalista...); o Diário de Notícias e A Capital estão na ordem do dia (o Dr. José Alfaia já anunciou que o Anuário Comercial será retirado da EPNC, e por várias vezes se tem afirmado a necessidade de entregar A Capital ao sector privado); no tocante à RDP existem tentativas, bem avançadas, de entregar a RDP Comercial aos numerosos grupos de pressão económica interessados. Por outro lado não se aprova uma lei da rádio que tenha em conta as opiniões dos trabalhadores.
Antes de ser membro do Governo, o actual Primeiro-Ministro dizia-se «defensor da independência da informação». Foi vice-presidente do Conselho de Imprensa que tem por missão zelar pela independência da imprensa face ao poder político e económico. O Dr. Pinto Balsemão parece esquecido disso e tão nebulosa tem sido a sua actuação que numa das mais concorridas assembleias de jornalistas estes decidiram iniciar o processo tendente à sua expulsão do Sindicato dos Jornalistas do qual é o sócio n.º 138. E não houve votos contrários, apenas uma abstenção.
O processo desencadeado contra a ANOP - todos o dizemos! - não è transparente. Chega-se ao ponto de ouvir um membro do Governo, neste caso, o Dr. José Alfaia classificar a ANOP - e pasme-se, Srs. Deputados!... - de «funil invertido», de «filtre», defendendo a necessidade de «transformar este funil num cilindro»!
Valha-o Deus. Sr. Secretário de Estado... funil e ainda por cima invertido... Diga-nos, Sr. Secretário de Estado, cilindro para quê, para esmagar quem?
Quem fala assim e ocupa cargos governamentais necessariamente que não pode ser defensor de uma política de informação que considere prioritárias a cultura e a educação.
Pela linguagem utilizada pelo Dr. José Alfaia se verifica o conceito eminentemente culto e «superior» que este neófito da política tem dos trabalhadores da ANOP e da comunicação social.
O Dr. José Alfaia não tem sido coerente. Assim, em 3 de Agosto, perante a sua familiar (e ambicionada...) televisão, dizia que «os vícios de estrutura da ANOP são tão fundos que são vícios de morte, pelo que não é possível reconvertê-la». No entanto meses antes declarava ao Diário de Notícias:
À ANOP é reconhecido o papel fundamental que desempenha na dinâmica do sector pela elevada percentagem que lhe cabe no conteúdo informativo divulgado pela maioria dos órgãos da comunicação social.
Por isso, tem merecido e continuará a merecer particular atenção visando o seu crescente alargamento aos países onde as comunidades portuguesas têm maior expressão e aos países de expressão portuguesa valorizando o papel da ANOP no conjunto das agências noticiosas internacionais.
Em que ficamos, Sr. Secretário de Estado? Coerência é que isto não é.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito mais haveria a acrescentar. Não o permite porém o curto tempo de que dispõe o MDP/CDE. Por isso, formulamos apenas
algumas perguntas, na esperança de que o Governo não fuja ás respectivas respostas.
Como pensa o Governo, tentando encerrar a ANOP ou forçando à diminuição do fluxo noticioso da Agência, atingir os centros mundiais onde há grande concentração de emigrantes portugueses carenciados de informação?
Que pensa fazer o Governo dos acordos e protocolos assinados com países africanos nomeadamente com Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Cabo Verde?
Que pensa fazer o Governo para a ANOP dar andamento ao protocolo de cooperação, assinado em Setembro de 1981, entre a ANOP e a EBN (Embaixada Brasileira de Notícias)?
Que pensa o Governo das conclusões do inquérito promovido pelo Conselho de Informação, por proposta do PSD com uma adenda do CDS, em que os chefes de redacção, directores de informação de jornais, rádio e televisão do continente, dos Açores e da Madeira, consideram altamente positivo o trabalho da ANOP?
Considera o Governo um acto de boa política económica e financeira assinar um volumoso contrato com uma empresa que na altura não existia, que não apresentou trabalho, que não deu provas e que não se sabe se preencherá os requisitos necessários para as funções informativas? Será este um bom acto de gestão?
Finalmente, repito-lhe a pergunta que já lhe fiz há pouco e a que se esqueceu de dar resposta: Quais as verdadeiras dívidas ao Estado da imprensa privada portuguesa? Esperamos as respostas, Sr. Secretário de Estado.
Aplausos do MDP/CDE, do PCP, da UEDS, da UDP e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, concedo a palavra ao Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está aqui o Governo hoje por força de uma interpelação, isto é, foi preciso um grupo parlamentar da oposição usar dos seus direitos constitucionais e regimentais para que o Governo aqui viesse prestar-nos esclarecimentos a que de há muito temos direito.
Mas nem hoje o Governo nos esclareceu e hoje o Governo - ainda mais! - quis dar-nos a noção exacta de como entende a comunicação social. De facto, hoje todos podemos ter a certeza do modo como a televisão transmitirá este debate. Não é preciso ser adivinho para o supor e todos sabemos que pelo menos um vespertino estatizado, o jornal Capital, deu hoje na sua edição da tarde apenas o discurso do Sr. Secretário de Estado, ainda não proferido à hora do fecho da edição, mas não deu nem uma palavra do discurso do Deputado Lopes Cardoso, que abriu esta interpelação.
Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.
Vozes do PCP: - É uma vergonha!
O Orador: - A primeira questão que quero pôr ao Governo é a de saber se esse discurso foi transmitido à
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A Capital, por via da nova agência «Notícias de Portugal» ou pela solícita Direcção-Geral da Informação.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE, da UDP e da Deputada Natália Correia (PSD).
E foi neste contexto que o Sr. Secretário de Estado começou o seu discurso anunciando o seu respeito pela Assembleia da República.
Seria ocasião para o saudar se pudéssemos dizer: «Mais vale tarde que nunca», mas nem isso, Sr. Secretário de Estado!...
O Sr. Secretário de Estado não apresentou uma proposta de lei a esta Assembleia; o Sr. Secretário de Estado ilude a sua presença nas comissões parlamentares; o Sr. Secretário de Estado não responde aos requerimentos que lhe são formulados; o Sr. Secretário de Estado celebrou com uma agência noticiosa um contrato que se prolonga ao longo do tempo ignorando que é esta Assembleia que aprova o Orçamento Geral do Estado e que, portanto, só ela lhe permite dispor de verbas em 1983 e 1984.
Vozes da ASDI, do PS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado esqueceu também o Programa do Governo e as obrigações que aí assumiu. É que o Sr. Secretário de Estado várias vezes aqui falou em «confusão de meios e fins», mas se alguém a fez foi o Governo, se alguém a fez foi o Sr. Secretário de Estado, que atribuiu como missões do Governo e escreveu - e eu citei-lhe as páginas e o Sr. Secretário de Estado nada disse - «o Governo favorecerá também o alargamento do espaço noticioso da ANOP». O que lhe perguntámos foi o que fez deste programa, se também o meteu na gaveta como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares diz que deve fazer à social-democracia.
Risos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Secretário de Estado não está aqui apenas a dizer por que é que não cumpriu um programa do Governo; não está aqui a dizer por que é que não foi capaz de cumprir minimamente aquilo a que se comprometeu. Se apenas o Sr. Secretário de Estado estivesse em causa, facilmente nós o poderíamos dar como incapaz, inapto, não sendo minimamente suficiente para cumprir o programa a que se tinha comprometido. Mas esse programa foi aprovado em votação por todos os deputados da maioria, por isso compromete-os também a eles. Não há um único que esteja isento deste processo. Não é apenas a sua honra, Sr. Secretário de Estado, que está em causa, é a de todos os deputados que aprovaram este programa.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da Deputada Natália Correia (PSD).
As suas explicações, se explicações podem considerar-se, foram insuficientes e incapazes e porque o tempo escasseia limito-me a perguntar-lhe como lhe foi possível celebrar esse contrato já sabemos que com dispensa de concurso público, mas não o disse na portaria o Governo de que faz parte, o que nos permite supor tudo, inclusivamente que só depois deram pelo lapso - com uma organização que nesse momento não tinha directores de informação, que nesse momento não tinha jornalistas, que nesse momento não tinha meios e ainda por cima um contrato para pagamento de serviços, que obviamente não podiam sequer ser prestados.
Vozes da ASDI e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Não sei como é que o Sr. Secretário de Estado pode dar contas a esta Assembleia dos dinheiros públicos, que assim, levianamente, pelo menos, utilizou.
Vozes da ASDI, do PS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se aqui destacamos o caso da ANOP é porque se trata de um caso a todos os títulos importante. Importante porque permite mostrar como este Governo não hesita em actuar sem lei. Num Estado de Direito isso é impossível, mas o Estado de Direito é aqui ignorado porque o Sr. Secretário de Estado extingue a agência, recusa-lhe os meios, sem lei, sem orçamento, contra a lei, contra o Programa de Governo que aqui fez aprovar, contra aquilo a que se comprometeu sempre, publicamente, ao longo dos meses.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Secretário de Estado ultrapassa a lei e as regras, ultrapassa todas as explicações porque já encontrou várias, porque até «descobriu» que o estatuto da ANOP - mas só o «descobriu» depois de lhe ter prodigalizado elogios, depois da aprovação de um Programa de Governo em que prometia expandir a sua acção - era «gonçalvista», esquecendo-se que ele tinha sido ratificado por uma lei desta Assembleia da República.
Vozes da ASDI e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Secretário de Estado não convenceu ninguém, não se convenceu sequer a si próprio, não terá convencido nenhum dos membros do Governo que aqui vieram emprestar-lhe a sua rápida solidariedade.
Mas, Sr. Secretário de Estado, Srs. Membros do Governo, o que está em causa também aqui é um caso a vários títulos exemplar, porque do que se trata, ao fim e ao cabo, é da concepção deste Governo em relação à comunicação social, o que se trata é que a informação de origem governamental não pretende dar a conhecer essa origem. O facto mais verdadeiro pode servir de base à propaganda de acordo com o momento em que é dado, os factos que o acompanham, o silêncio que pesa sobre os outros.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Muito bem!
O Orador: - Mas o Sr. Secretário de Estado não permite sequer que as pessoas saibam qual é a fonte de informação que lhes é trazida, porque fá-los-ia receber as notícias de «olhos abertos», e a verdade é que só estamos numa sociedade livre quando o público dispõe de outras formas de controlar a versão oficial, pelo recurso a outras fontes.
O mundo em que vivemos, hoje e agora em Portugal, é um meio que o seu governo pretende transformar num
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«mundo artificial», em que à comunicação social da TV e das «Notícias de Portugal» - se fiquem a dever os nossos modelos e finalidades, a nossa moral social, até mesmo a ideia que fazemos do nosso próprio destino.
Por isso à televisão não são negados meios, por isso o «Bom dia Portugal» nos enche de notícias - pretensas notícias -, falsos factos, gastos incomportáveis, tudo isto porque não tem controle, porque é um modelo de comportamento que se pretende impor.
Não se podem esconder mazelas e o que o Governo faz - por não as poder esconder - é tentar aliciar os portugueses para um futuro em que elas não existirão: não há alojamentos, mas mostra-se às pessoas como poderão ser alojadas daqui por muito anos; ao trabalhador esgotado mostram-se férias nas Bermudas - é a integração social, a predisposição à aceitação, mais que ao combate.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Muito bem!
O Orador: - É isso que está em causa, é um corpo não de cidadãos, mas de súbditos, o que este Governo pretende.
Vozes da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP: - Muito bem!
O Orador: - Por isso a censura, por isso a manipulação, por isso o monopólio!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: falou-se várias vezes neste debate, que era patente a não solidariedade do resto do Governo com este seu Secretário de Estado. Direi no entanto assim, porque não absolvo este Governo das votações em que se comprometeu!
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O que penso é que está a ser sugerido ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para a comunicação social que, por solidariedade com o seu Governo, saia daqui e assine o seu pedido de demissão.
Vozes da ASDI e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Essa sugestão é consigo, mas aquilo que nos diz respeito e que nos importa é que, se deste debate e com este comportamento do Governo nada acontecer, então o que este Governo põe em causa, não é só a vida parlamentar em Portugal, é a vida democrática portuguesa.
Aplausos da ASDI, do PS. do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
Porque se for possível, com completa impunidade, que nada aconteça, que tudo permaneça como está que a ANOP continue «paulatinamente» a extinguir-se, que o Sr. Dr. Proença de Carvalho continue a gerir a televisão, que estes contratos com o «Notícias de Portugal» prossigam, que ninguém investigue ou averigue, que ninguém seja responsabilizado nem penalizado então a democracia, com certeza, estará a ser posta em causa pela cumplicidade, pela passividade, pelo silêncio de muitos de nós.
Aplausos da ASDI, do PS, do PCP. da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: estamos sobre a
nossa hora regimental e embora outros Srs. Deputados estejam inscritos para intervir, devemos, nos termos da decisão tomada na reunião dos lideres dos grupos parlamentares, interromper a sessão.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso pretende usar da palavra para que efeito?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Apenas para solicitar uma informação à Mesa, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Por favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Era para saber se o Governo está inscrito para intervir, antes do termo do debate.
O Sr. Presidente: - Neste momento não se encontra inscrito, mas a informação que tenho é a de que irá intervir, Sr. Deputado.
Vamos interromper a sessão nos termos aprovados na reunião dos líderes dos grupos parlamentares. Recomeçaremos os nossos trabalhos às 22 horas.
Eram 20 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 22 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Veio V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, ao que creio directamente do Abu-Dhabi, para o cargo que ocupa brilhantemente no Governo - pelo menos, no princípio era para ser brilhantemente.
Risos da UEDS e do PS.
V. Ex.ª teria vindo, a ajuizar por todo este debate, para fazer «coisas das arábias».
Risos da UEDS. do PS e do PCP.
Na verdade, tem feito «coisas das arábias», mas tão mal feitas, tão «carecas» -pois nem lhes soube pôr a «peruca» devida- que, de facto, acabou por não cumprir as promessas de brilhantismo com que veio dessas zonas do Médio Oriente para Portugal.
Queria começar a minha intervenção por lhe dizer que se fala aqui, nesta Assembleia, de comunicação social. E gostaria de trazer aqui à Câmara o exemplo mais espantoso de manipulação feita por alguém que eu acho que não é jornalista - pois só pode ser um mercenário da informação - no último telejornal das 20 horas na RTP.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Muito bem!
O Orador: - A primeira cabeça da notícia, dizia - ao mesmo tempo que mostrava a fotografia de V. Ex.ª, aliás hoje insistentemente publicada pela televisão nos «milhares» de serviços noticiosos que agora tem o seguinte: extinção da ANOP custa menos cem mil contos.
A seguir dizia-se que o debate não tinha sido conclusivo - «disseram-se umas coisas» mas não tinha sido conclusivo e depois tinha esta afirmação espantosa, com a mais despudorada «das sem vergonhas», que vou
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citar: «As intervenções dos deputados da maioria quiseram, sobretudo, pôr as questões de fundo».
Risos da UEDS e do PCP.
Estive aqui todo o dia, vi um ou dois afloramentos por parte da maioria, não vi nenhuma intervenção nem questão de fundo. Eis aqui, Sr. Secretário de Estado, um belo caso para V. Ex.ª tomar algumas providências! Mas a Comissão de Comunicação Social da Assembleia da República irá pedir o visionamento do referido telejornal para se fazer a «prova provada» da manipulação que, constantemente, é feita dos trabalhos desta Assembleia. E, depois vêm os senhores dizer que o Parlamento está desprestigiado! Os primeiros a desprestigiá-lo são os órgãos da comunicação social estatizada, sob as ordens de V. Ex.ª e do Governo da AD que nisso estão interessados!
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Deputado Arons de Carvalho denunciou, aqui, com clareza, casos gritantes de inserção na programação televisiva de publicidade dissimulada, à margem da legislação que regula a inserção dessa mesma publicidade.
Pergunto-lhe directamente, Sr. Secretario de Estado, (e este é um caso de sim ou não) VV. Ex.ªs, que tanto falam em Estado de direito democrático, que tanto «enchem a boca e os nossos ouvidos» com o exemplo da Europa, estão dispostos a proceder por forma a que à RTP sejam aplicadas multas - que o Sr. já reconheceu irem de cem a mil contos - por proceder, em termos de publicidade, completamente à margem da lei e ao arrepio da própria lei reguladora dessa matéria?
Está V. Ex.ª disposto a envidar esforços e a proceder de modo a que à RTP - à gerência do Sr. Proença de Carvalho sejam aplicadas as multas previstas na lei para casos de fraude e de fuga à legislação? Esta é a primeira questão.
Vozes do PS: - Está aí, também, o Sr. Ministro da Justiça!
O Orador: - Por outro lado, uma das coisas que me tem espantado é a presença, nesta Assembleia, de Membros do Governo. Veio primeiro o Sr. Ministro da Justiça e da Reforma Administrativa, depois a seguir creio que apareceu o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais - não sei se era por alguma questão de assistência, mas veio cá!...
Risos da UEDS, do PS e do PCP.
Veio, salvo erro, o Sr. Ministro do Trabalho, depois o Sr. Ministro para os Assuntos Parlamentares, finalmente apareceu o Sr. Ministro Angelo Correia - não sei para quê, mas apareceu...
Risos da UEDS, do PS e do PCP.
- ... depois, o Sr. Ministro Lucas Pires, 2 Secretários de Estado, ou seja, contabilizei, grosso modo e num apanhado imperfeito, pelo menos 7 ministros e 2 secretários de Estado.
Julgo que vinham na intenção de ver aquilo que prometia ser o one man show de V. Ex.ª Foram-se embora porquê? Porque acabaram por ver o half man show que V. Ex.ª deu e, envergonhados, foram-se embora. Eram para falar, não falaram e acabaram por desistir! Veja lá, V. Ex.ª, o trabalho em que os meteu!
Risos da UEDS, do PS. do PCP e da ASDI.
Debruçar-me-ia, agora, sobre o problema da rádio. Não existe lei da rádio, não existe estatuto para a RDP, mas não é por acaso. Este vazio legal é deliberado, e os sucessivos governos da AD e essa figura que é o Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para a Comunicação Social - parece que o Governo se ofende muito se não se diz o titulo todo! - preocupou-se com tanta coisa e não se preocupou ainda em fazer um estatuto para a rádio e uma lei da rádio, porquê?
Voz do PCP: - Estão no Governo há mais de 1 ano!
O Orador: - É que V. Ex.ª sabe, perfeita e claramente, que o vazio legal que deliberadamente criou permite-lhe gerir o que se passa na RDP caso a caso e, sobretudo, gerir caso a caso e conforme as vossas próprias conveniências a manipulação que é perpetrada, diariamente, na rádio portuguesa.
Vejamos alguns exemplos: todos os responsáveis - os chamados editores - pelos grandes blocos noticiosos são afectos à AD, salvo erro três do PSD e um do CDS.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Há uma única excepção: é o caso do noticiário das 23 horas e 30 minutos, onde o seu editor, ao que me consta, não tem filiação partidária. E isto não é por acaso. É que o noticiário das 23 horas e 30 minutos, é aquele que é ouvido pela classe política e não é. ouvido pela grande maioria da população.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - E VV. Ex.ªs, deliberadamente. puseram um noticiário isento e pluralista para que nós pensássemos que havia, na vossa comunicação social, um caso de pluralismo! E um falsidade, é um truque, que não podemos deixar passar em claro!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Assente lá para acabar com esse já amanhã!
Risos do PCP, da UEDS e da UDP.
Por outro lado, a presença de membros do Governo é constante. Chega-se ao absurdo de no mesmo serviço noticioso o Ministro Rebelo de Sousa comentar afirmações produzidas nesse mesmo noticiário por uma terceira pessoa. Isto porquê? Porque há alguém que mal apanha uma declaração na RDP que pode ser prejudicial ao Governo certamente levanta o telefone e diz: «Sr. Ministro, está aqui um senhor que diz coisas muito feias contra o Governo! Quer V. Ex.ª comentar estas declarações?». Deve ser este o estilo!
Risos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e da UDP.
Já aqui se falou do caso do programa «Praça Pública». Enquanto são afastados os profissionais quê faziam este programa, permanecendo há longos meses sem qualquer trabalho distribuído, foram, nos últimos dois anos,
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admitidos na RDP, antena 1, 60 jornalistas, a maioria dos quais da A Tarde, do O Dia e do Tempo, e quase todos com duplos empregos.
Vozes do PCP: - É uma vergonha!
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Não sabe?
O Orador: - Os noticiários de onda curta, os tais dirigidos a emigrantes que são uma das preocupações de V. Ex.ª, do Governo e do «famoso» Secretário de Estado José Vitorino.
Risos da UEDS, do PS e do PCP).
São uma vergonha, quer do ponto de vista do seu conteúdo, como do português que empregam e da própria gramática utilizada no «chorrilho» de palavras proferidas durante os noticiários.
É certo que a onda curta está completamente desprezada, mas os noticiários das ondas curtas, que são fundamentais para o emigrante que houve rádio, são controlados pelo CDS. É completamente vergonhoso, do ponto de vista da deontologia profissional.
As promoções na RDP, por exemplo, obedecem a dois critérios únicos e exclusivos: ser fiel à AD e ter furado algumas das greves que os jornalistas fizeram na rádio portuguesa!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, é caso curioso: todos os fura greves na RDP foram sistematicamente promovidos nos últimos anos. É caso para dizer: se o crime não compensa, furar greves, pelos vistos, compensa e muito.
Risos da UEDS. do PS e do PCP.
Na Rádio Comercial, um exemplo apenas: havia um programa da autoria de um jornalista - aliás, insuspeito pela parte da bancada da esquerda democrática-, chamado Fialho de Oliveira que fazia salvo erro, à l da manhã, uma crónica pequenina chamada «O recado». Houve pressões e mais pressões sobre o jornalista e sobre a direcção de informação da Rádio Comercial; o programa acabou há cerca de três semanas ou um mês, suspenso certamente porque a ironia e a mordacidade das criticas de «O recado» não convinham ao Governo, em vésperas de eleições autárquicas.
Na RDP Comercial foram proibidas expressamente as notícias e a cobertura de manifestações e concentrações sobre o caso ANOP. Estão proibidas! Há censura efectiva na RDP! Sobre o caso ANOP, exactamente! Está admirado, mas é assim!
Risos do PCP!
Igualmente sobre o caso RDP. É proibida qualquer cobertura, aquando de qualquer das greves gerais que têm sido decretadas.
No dia 30 de Outubro o chefe de informação da RDP Comercial, fez esta gracinha: há uma revista de imprensa pelas 17 horas e 30 minutos e verificou-se que no dia da extinção do Conselho da Revolução, no dia em que este cessava funções -acto que a UEDS, como é sabido, apoiou foi ele quem intencionalmente fez a revista de imprensa. Ele e outro senhor responsável pela informação da RDP que nunca entram sequer na redacção. Mas nesse dia resolveu fazer a revista de
imprensa. E o que é que disse? Referiu as notícias dadas pelo O Dia, A Tarde, o Diário de Lisboa, e te., e terminou a sua intervenção, a propósito da extinção do Conselho da Revolução, dizendo o seguinte: «Dos mortos não reza a história».
Na RDP Comercial, pretende-se abafar a informação, encurtar os seus tempos, impedir a sua coordenação, fazendo «tábua rasa» do conselho de redacção. Não há carros, gravadores, estúdios ou máquinas de escrever. Não há, sobretudo, espaço na grelha de programas para produzir mais e melhor informação.
Na antena l, com a excepção referida, o controle dos serventuários dóceis da AD e do Ministro Rebelo de Sousa; na RDP Comercial, a absoluta falta de meios e de espaço para produzir informação digna desse nome.
Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro com o pelouro da Comunicação Social: neste debate (que já vai longo) tenho-me preocupado porque sendo já duas as interpelações recentes em que participo directamente -uma, ao Ministro Angelo Correia e agora esta - pergunto o que é que há de comum entre as duas interpelações e entre os dois respondentes aos interpelantes. Fui pensando, pensando e cheguei à conclusão: já sei porque é que o Sr. Angelo Correia é Ministro da Administração Interna, é porque V. Ex.ª, Dr. José Alfaia, é Secretário de Estado Adjunto para a Comunicação Social!
Risos e aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e da UDP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César de Oliveira, de acordo com o seu pedido à Mesa esta não o interrompeu, mas devo dizer-lhe que V. Ex.ª gastou 2 minutos da intervenção final do seu partido.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado César Oliveira, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado César de Oliveira, não vou fazer uma observação geral à diatribe (no bom sentido da palavra) ou ao libelo (para elevar a linguagem) que V. Ex.ª acabou de proferir. Mas calma, porque se V. Ex.ª pretende utilizar - o que é legítimo - o estilo satírico, cuidado porque pode estar a sátira a cair-lhe em cima.
Queria pura e simplesmente informá-lo -uma vez que foi tão exigente relativamente aos erros ou às dificuldades do português de certos jornalistas- de que V. Ex.ª também pode dizer blagues.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César de Oliveira, se quiser responder, tem a palavra.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Esta deve ter sido uma das tais intervenções de fundo que a RTP há bocadinho comunicou que a AD fazia!
Risos e aplausos da UEDS, do PS, do PCP e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, nós estamos na fase das figuras regimentais...
O Sr. Silva Marques (PSD): - É para um protesto.
O Sr. Presidente: - Então, faça favor.
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O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado César de Oliveira, é preferível não fazer intervenções de fundo, sem,... sem...
Risos do PS e do PCP.
...sem acrobacias de português, exigindo aos outros aquilo que nós próprios não podemos dar. Portanto, V. Ex.ª há-de desculpar-me o estilo mais sóbrio e mais modesto. É que eu quis apenas chamar a atenção para o facto de que V. Ex.ª estava num voo que não tinha conseguido sustentar.
Relativamente às intervenções de fundo, se algum jornalista as qualificou como tal e se implicitamente se referiu a mim, devo dizer que a culpa não é do jornalista, visto que foram VV. Ex.ª mesmas que a classificaram como sendo de fundo...
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Não 6 de fundo. É de fuga!
O Orador: - ,.. e que protestaram contra o facto de eu estar a fazer uma intervenção de fundo no instrumento regimental do pedido de esclarecimento.
O Sr Lino Lima (PCP): - Não é a intervenção de fundo. É a intervenção no fundo!
O Orador: - Mas quem induziu em erro o jornalista foi, sem dúvida, a oposição.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César de Oliveira, se pretender contraprotestar, tem a palavra.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Augusto da Silva Marques, devo confessar que tenho sempre um grande dilema quando o ouço nesta Câmara, sobretudo quando o ouço no taco a taco do debate parlamentar que se segue às intervenções. É que, lembrando-me muitas coisas, de uma me lembro de certeza absoluta: não aprendi bastantes coisas daquilo que V. Ex.ª me quis ensinar!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Perdeu a ocasião!
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Niza.
O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, vou fazer uma intervenção de meio fundo porque não tenho tempo para mais!
Risos e aplausos do PS, do PCP, da ASDI e da UEDS.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No arquipélago Goulag da comunicação social em Portugal, o caso da ANOP é apenas uma ilha, um espaço noticioso que o actual Governo, por razões estratégicas, decidiu eliminar do mapa.
Porque tenho pouco tempo, não posso falar-vos de todo o arquipélago. Mas falarei de outra ilha, que em si própria mais do que uma região autónoma na comunicação social- é cada vez mais um continente estranho a Portugal e à democracia.
Vou falar-vos da «nossa» televisão.
Uma televisão que - ao contrário do que aqui disse o Secretário de Estado José Alfaia -, é hoje uma empresa pública viável e com equilíbrio económico-financeiro, não porque o deva ao actual Governo, ou aos governos da AD, mas porque antes, no final da década de 1970, outros governos prepararam e garantiram a sua actual situação.
É preciso que se diga que a era da televisão a cores começou em Portugal em 1978, isto é, antes da AD; é útil que se reafirme que toda a reconversão de equipamento técnico, aquisições de material moderno, instalações de serviços no imenso edifício da Avenida de S de Outubro, tudo isso foi feito antes da AD e, no caso concreto, sob a responsabilidade dos Governos socialistas; é ainda importante sublinhar que o sistema directo de cobranças de taxas e o próprio acordo de saneamento económico-financeiro da RTP foram preparados, ou instituídos, antes da AD.
Ê natural que o Sr. Secretário de Estado não saiba destas coisas porque nessa altura estava na África do norte, suponho eu.
E foi assim que, em 1979, quando a AD chegou ao Poder, da mesma forma que encontrou uma situação confortável no Banco de Portugal, encontrou também na RTP uma empresa dotada de todas as condições para um funcionamento normal e sem problemas de maior.
Significa isto que, quer o Dr. Cavaco e Silva, quer o Dr. Proença de Carvalho, tiveram o privilégio de herdar uma situação invejável cujo mérito exclusivo se deveu aos seus antecessores.
Esta é a verdade e era preciso aqui reafirmá-la.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A RTP é hoje cada vez menos uma televisão europeia e cada vez mais uma televisão da América Latina.
Na realidade, por responsabilidade e culpa da AD, está a instituir-se em Portugal um modelo aberrante e híbrido de televisão, que não tem paralelo em nenhuma democracia europeia.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Na Europa, a esmagadora maioria das televisões são serviços públicos, enquanto que na América Latina a regra é a inversa: a maioria são empresas privadas.
Confrontemos, por exemplo, 2 modelos bem distintos: o caso da BBC e o caso da TV-Globo. No caso da BBC temos uma televisão de excelente qualidade, de incomparável nível cultural, de inexcedível pluralismo democrático na informação que presta. No caso latino-americano temos na Globo uma eficaz máquina de fazer dinheiro, com um controle informativo mais rígido que o da própria censura brasileira. A BBC não tem publicidade nos seus programas. A Globo vive exclusivamente dela. E vive bem.
Entre estes dois modelos se move a televisão portuguesa, com a dupla vantagem de aproveitar dos dois aquilo que mais lhe interessa: como em Inglaterra, cobra as taxas; como no Brasil factura milhões em publicidade, cerca de 2 milhões de contos por ano.
Tudo isto somado, deveria levar à exigência de uma boa televisão. Ou, pelo menos, de uma televisão melhor, que é coisa que não temos, como já hoje aqui foi dito e redito.
No entanto - por intenção ou omissão -, os governos da AD permitiram que a RTP se fosse afastando da democracia para acostar aos modelos de um continente onde a democracia é ainda uma excepção e não a regra.
Hoje, a lógica da RTP é simples de caracterizar: a
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busca do lucro político e do lucro económico-financeiro. Por lucro político se pode entender, em síntese, tudo o que é contabilizado a favor do Governo da ÁD e contra dos outros (e quando falo dos outros, falo da oposição, necessariamente); por lucro financeiro se entende a preocupação obsessiva de obter resultados positivos - aliás fáceis-, com prejuízo do grande investimento cultural que a Constituição e as leis do País impõem à RTP.
Se o País pede democracia, a RTP dá-lhe publicidade e não só comercial, mas também publicidade política; se o País pede isenção e pluralismo, a RTP dá-lhe parcialismo e sectarismo, e extingue, por exemplo, a Informação 2, que foi um programa de informação exemplar em termos de televisão e que fará parte da história da televisão em Portugal; se o País exige respeito pela língua portuguesa, a RTP dá-lhe um espectáculo de analfabetismo, como é patente diariamente nas emissões, cada vez mais, e sobretudo nos últimos tempos; se o País deseja conhecer a realidade portuguesa, a RTP esmaga-o, em manobras de diversão, com os dramas do quotidiano mundial dos outros países; se o País exige qualidade, verdade e honestidade, a RTP oferece-lhe mediocridade, manipulação e compadrio.
Havemos de concluir - Sr. Presidente e Srs. Deputados - que esta televisão é deste Governo, mas não pertence a Portugal!
Agora temos televisão às 8 da manhã. E em relação a esta questão, o PS pergunta se é conciliável com a grave crise económica que o País atravessa, e que não é da responsabilidade dos governos socialistas e exactamente no momento em que o Governo vai apresentar um orçamento de guerra - a extensão das emissões televisivas para as 8 da manhã, com todos os custos financeiros que essa circunstância acarreta.
Será que se pretende ter uma televisão rica num país pobre? Será que, num país onde se trabalha pouco - segundo afirma o Governo -, se passará a trabalhar ainda menos e a consumir mais energia por culpa do mesmo Governo?
Além do mais, Sr. Secretário de Estado, para que ter televisão às 8 da manhã se ainda não havia televisão às 8 da noite? Para que encher a antena de programas avulsos - talvez na moda do estuo «Paga-Pouco» - se a única preocupação que se vislumbra é encher a barriga das antenas e fixar os consumidores ao pequeno écran para aumentar as receitas da publicidade e eventualmente ganhar as eleições autárquicas de 12 de Dezembro.
Tudo isto acontece com total complacência do Governo e sem um protesto, sequer, do Ministro da Cultura - que lamento não esteja aqui neste momento-, nem do Ministro das Finanças, de quem se esperava maior intervenção e maior preocupação. Mas, bem vistas as coisas, quem é o Ministro da Cultura em Portugal: o Dr. Lucas Pires ou a directora de programas da RTP, Dr.º Maria Elisa?
É que, ao pé de uma televisão que «avia» 16 horas de programas por dia para cerca de metade da população portuguesa, o que é ser Ministro da Cultura? Que importância é que isso tem, afinal?
Aliás, não foi por causa do programa cultural do Ministro Lucas Pires que o PS votou contra o Governo.
E, a não ser que essa parte do programa da Cultura também tenha sido revogada, como aconteceu às linhas que o Sr. Secretário de Estado escreveu sobre a ANOP aqui há uns meses atrás, o que se conclui da programação da RTP é que ela se caracteriza pela anticultura, pelo exercício da mediocridade intelectual e artística, pelo desprezo dos valores da cultura popular portuguesa, no sentido antropológico do termo e, sobretudo, pela desinformação.
Entre o Solar de Mateus e a RTP há 10 milhões de habitantes. E, enquanto o Governo da cultura se encerra, para reflexão, em solares, seminários, concertos e festivais, a televisão é aquilo que é, de manhã à noite.
Ou seja, a RTP é, em concreto, a principal força de oposição à política cultural do Governo. Isto é, a sua direcção de programas é uma espécie de Gabinete de sombra.
Mas, entre o Primeiro-Ministro e o presidente da televisão há, apesar de tudo uma diferença. De sentido de humor e de coragem! É que, enquanto que a RTP desafia diariamente os portugueses a «exigir uma boa televisão», o Primeiro-Ministro ainda não desafiou o eleitorado a exigir «um bom Governo».
Aliás, se o fizesse, acontecia-lhe o mesmo que aconteceu à ANOP.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e da UDP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado César de Oliveira pede a palavra para que efeito?
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Era para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor Sr. Deputado.
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, há pouco anunciei que a Comissão Parlamentar de Comunicação Social iria pedir o visionamento do tele-jornal de hoje. Acontece que quer os Conselhos de Informação para a RTP, quer a comunicação social têm, pedido sucessivamente vários visionamentos. Mas, quando os pedem, a RTP responde, quase sempre, que já foram desgravados.
Era bom que a Presidência da Assembleia da República comunicasse à RTP, o mais urgentemente possível, que não desgrave (é natural que até agora não o tenham feito!) o telejornal das 20 horas do dia 4 de Novembro.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques deseja intervir para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - É que, nos termos legais, há um prazo durante o qual não se pode proceder à desgravação. Se, por acaso, os Srs. Deputados detectaram casos em que a desgravação foi feita antes do prazo legal deveriam ter tomado as providências adequadas.
Protestos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César Oliveira, vou transmitir ao Sr. Presidente o seu pedido e, decerto, ele será tomado em consideração.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.
O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Depu-
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tados, Srs. Membros do Governo: A interpelação feita ao Governo sobre política de comunicação social, nomeadamente sobre o caso ANOP, veio demonstrar o completo fracasso da AD e dos seus governantes na condução de tão importante sector da vida nacional. Não admira. Quem tão clamorosamente falha em todos os aspectos da governação não poderia abrir qualquer excepção para a comunicação social, tanto mais que o responsável pela Secretaria de Estado respectiva, já deu as provas de irresponsabilidade suficientes para que qualquer Primeiro-Ministro responsável tivesse já procedido à sua substituição.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Salvo raras e honrosas excepções - que se ficam a dever ao profissionalismo dos jornalistas e não a quaisquer opções governamentais -, a comunicação social estatizada, e particularmente os seus grandes meios, tem sido posta ao serviço da propaganda política e partidária da AD no continente e do PSD nas regiões autónomas. Tal instrumentalização acelera-se de forma escandalosa em vésperas de campanha eleitoral e na proporção do desgaste e da falta de segurança que o executivo patenteia. A propalada libertação da sociedade civil não teve a menor sequência no que respeita à comunicação social. Em vez de pluralismo, temos uniformização. Em vez de objectividade, temos auto-elogio. Em vez de independência, temos controle. Em vez de debate, temos «comunicação ao País». Em vez de crítica, temos apologia. Em vez de modernização e reforma, temos antes estagnação e retrocesso.
Caso paradigmático é o da ANOP, empresa cujo trabalho jornalístico o PS sublinha com a autoridade que lhe advém do facto de nenhum dos seus jornalistas ser militante ou inscrito socialista. Descapitalizada e mal administrada por conselhos de gerência nomeados pela AD, vem esta agência noticiosa a ser inopinadamente desmantelada pelo Governo, para, em substituição, e com vultuosos financiamentos públicos, se criar uma nova empresa sob forma de cooperativa mas que não dispensará no futuro importantes subsídios orçamentais. Razões políticas e não financeiras, relacionadas com um projecto mal disfarçado de controle da informação, ditaram uma decisão que compromete gravemente o Governo e o- PSD em especial, pois, como é do conhecimento geral, o Secretário de Estado José Alfaia, simboliza de forma muito notória, particularmente pelo seu estilo, a ortodoxia dos que permanecem fiéis ao actual Primeiro-Ministro. Ao controle directo da televisão, da rádio e da maioria dos jornais, urgia acrescentar o seu controle indirecto ao nível da agência noticiosa por via de um sofismado processo de selecção de pessoal resultante da extinção da ANOP e da criação da «Notícias de Portugal». O PSD, isoladamente nas ilhas e em conjunção de esforços com os seus parceiros da AD no continente, é uma formação política sobre a qual se tem vindo a acumular um pesadíssimo rol de incompetências e atropelos na área da comunicação social. Estando em causa uma questão de regime, essencial para o funcionamento da vida democrática, há que apontar sem qualquer ambiguidade as responsabilidades particulares do Primeiro-Ministro -de quem depende a Secretaria de Estado - e do PSD, partido a que igualmente pertence o seu titular.
No processo ANOP, o Governo destruiu uma empresa que existia e prestava serviços satisfatórios para constituir outra que também necessitará de subvenções públicas para poder funcionar. Isto sem ter encarado a sério qualquer hipótese de reestruturação da empresa. Sem dúvida o Governo agiu de má fé porque a ANOP, se é certo que não estava ao serviço das forças da oposição, não se pode considerar que estivesse ao serviço da propaganda governamental, funcionando no diapasão de um serviço oficial de propaganda e relações públicas. A extinção da ANOP atinge, por isso, a dimensão de um grave atentado contra o regime democrático e as liberdades públicas e o desenrolar da actuação do Governo nesta questão deixa sérias dúvidas quanto aos métodos e processos de que esta coligação está disposta a socorrer-se para atingir os seus fins e se perpetuar no poder.
O caso ANOP, bem como a análise criteriosa do que se passa nas restantes empresas públicas de comunicação social, justificam que se reconsidere o seu modelo institucional de modo a torná-las verdadeiramente independentes dos Governos ou das maiorias políticas. Não existirá verdadeira democracia em Portugal enquanto um fortíssimo sector público de comunicação social estiver colocado à inteira mercê de nomeações governamentais. Neste aspecto a prática AD só reforça ao limite os exageros de um erro que se me afigura estrutural. A alternância política exige por outro lado que se regulamentem os direitos do governo e da oposição quanto ao acesso à comunicação social, particularmente à televisão e à rádio, e que se criem efectivos mecanismos de controle democrático sobre administrações, direcções e todas as modalidades de informação praticadas na comunicação social estatizada, desenvolvendo, aliás, algumas possibilidades abertas pela revisão constitucional e seguindo o exemplo de modelos consolidados como a BBC. A institucionalização da democracia é indissociável da institucionalização do pluralismo, da independência e da objectividade dos meios de comunicação social.
O Sr. Secretário de Estado acabou por ficar quase só neste debate. Mas a sua política é, não o esqueçamos, a política do Governo.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - De um governo que, tristemente, lhe não deu a solidariedade que devia. O facto de a AD não ser capaz de assumir uma política isenta no terreno da comunicação social só atesta que a AD é uma coligação sem um projecto político, cultural e espiritual onde tenham pleno cabimento as liberdades públicas. A democracia faculta à AD o exercício por vezes insolente do poder - mas a democracia não é um ideário enraizado na política de comunicação social praticada pelos governantes da AD. Por isso o PS não se sente vinculado aos compromissos tomados por este Governo em relação à recém-constituída cooperativa e reserva-se o direito, no caso de assumir responsabilidades governamentais, de reexaminar todo o dossier ANOP bem como as vantagens de uma agência noticiosa constituída sob a forma de empresa pública pluralista, objectiva e independente.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
O veto sobre o decreto-lei que extingue a ANOP abre à Assembleia da República a possibilidade de corrigir um gravíssimo erro do Governo. Teimará o Governo em permanecer arrogantemente nesse erro ou aproveitará para rever a sua política e aceitar discutir um novo modelo institucional de empresa pública de comunicação social?
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Não temos dúvidas, o Governo vai persistir no erro. E em vez de vetar decretos-leis, então, o que há a fazer é vetar sim o próprio Governo, demiti-lo, substituir e renovar a Assembleia da República, eleger outro governo, pôr de pé uma nova política. Quatro escrutínios para eleger o Presidente da Assembleia, o lamentável espectáculo do Secretário de Estado nesta interpelação, a nula solidariedade patenteada, a debilidade de argumentos produzidos pelo PSD, principal partido da coligação. É verdadeiramente o terreno inclinado para um fim sem glória - a AD falhou, os seus governantes ultrapassam tudo em incapacidade e falta de rigor, a ausência de convicção alastra no interior da maioria e está espelhada no rosto dos deputados presentes. Até quando o Primeiro-Ministro persistirá em arrastar o país para um desastre nacional?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Até quando Ministros e Secretários de Estado da AD confundirão Portugal e os problemas dos portugueses com os idílicos tempos de antena, que os amigos lhes concedem sob a forma de informação escorreita? Até quando a AD - esta AD que nada muda porque precisa é de ser mudada se manterá no poder?
Sr. Secretário de Estado, uma só conclusão deve V. Ex.ª retirar deste debate: o carácter imperioso da sua demissão. Demita-se. E leve consigo o Governo todo, porque também não é melhor.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, passamos agora ao encerramento do debate.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, era no sentido de interpelar a Mesa para lhe formular um pedido de esclarecimento.
Como é do conhecimento da Mesa e dos Srs. Deputados, o artigo 210.º do nosso Regimento afirma, no seu n.º 4, que o debate da interpelação «será encerrado com as intervenções do Primeiro-Ministro e de um representante do grupo parlamentar interpelante».
Solicitava da Mesa que informasse se tem alguma comunicação por parte do Primeiro-Ministro sobre se tenciona ou não, nos termos do nosso Regimento, encerrar o debate ou se o Sr. Primeiro-Ministro se dignou dar ao Sr. Presidente e a esta Assembleia qualquer explicação, face a este imperativo regimental.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em resposta à sua interpelação, informo-o de que a Mesa não tem nenhuma notícia no sentido de que o Sr. Primeiro-Ministro tencione estar presente no encerramento do debate.
Vozes do PS: - Já se demitiu!
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que isso significa de falta de consideração do Sr. Primeiro-Ministro por esta Assembleia não carece de qualquer comentário.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
Aliás, estamos habituados a este comportamento por parte do Sr. Primeiro-Ministro em relação à Assembleia. Parece que o Sr. Primeiro-Ministro tem horror a todas as instituições democráticas que não sejam aquelas que ele controla. Não é só a Presidência da República, como é também a Assembleia da República.
O Sr. Primeiro-Ministro gostaria provavelmente de governar sem Presidente da República e sem Assembleia da República, governar, enfim, a seu bel-prazer, como o Sr. Secretário de Estado pretende governar a ANOP.
No entanto, Sr. Presidente, já que o Sr. Primeiro-Ministro se não dignou comunicar nada a esta Assembleia, perguntaria ao Sr. Secretário de Estado, como único membro do Governo que se senta neste momento na respectiva bancada, se pode dar algum esclarecimento a esta Assembleia no que a esta matéria concerne.
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Secretário de Estado desejar usar da palavra, faça o favor.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (José Alfaia): - Sr. Deputado, é como Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para o pelouro da Comunicação Social que me encontro no Hemiciclo em sua representação e é assim que fiz a minha intervenção inicial e que tenho acompanhado todo o debate.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Secretário de Estado, não insisto. Já lá vão algumas horas que se coloca uma questão ao Sr. Secretario de Estado e o senhor «responde ao lado», não responde à questão.
Não foi essa a questão que agora lhe pus.
A questão que lhe coloquei foi no sentido de saber se o Sr. Secretário de Estado, como único membro do Governo que neste momento se senta nessa bancada, nos podia dizer alguma coisa sobre a posição do Primeiro-Ministro em relação ao papel que regimental e moralmente lhe cabia no encerramento deste debate.
O Sr. Secretário de Estado, como é seu hábito, a «alhos» respondeu com «bugalhos». Não vou, por isso, insistir. O que he digo é que o Sr. Secretário de Estado não pode constitucionalmente substituir o Sr. Primeiro-Ministro no encerramento deste debate e que nós não aceitaremos essa substituição.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
É que o Sr. Secretário de Estado, é irresponsável politicamente.
Vozes do PCP: - E não só!
O Orador: - Outros diriam não só. Limito-me a dizer que é irresponsável politicamente e que não pode substituir o Sr. Primeiro-Ministro no encerramento deste debate.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso,
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V. Ex.ª está já no uso da palavra para o encerramento do debate ou ainda não?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Obviamente que não estou no uso da palavra para o encerramento do debate, Sr. Presidente.
Pedi um esclarecimento à Mesa. A Mesa não estava em condições de mo dar, o que não é da sua responsabilidade, Sr. Presidente, nem da Mesa. Procurei sanar essa ausência de resposta por parte da Mesa pedindo uma resposta ao membro do Governo aqui presente, o qual foi também incapaz de me responder.
Registo-o.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença que interpele a Mesa?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social já exprimiu a posição do Governo e as condições em que aqui se encontra.
Penso que agora é a Mesa que deve dar a interpretação e o esclarecimento ao Sr. Deputado Lopes Cardoso sobre uma questão que já não é a primeira vez que se levanta e que ao Grupo Parlamentar do PSD parece bastante clara.
Consultando o Regimento, se é um facto que este, no preceito que o Sr. Deputado Lopes Cardoso citou, diz que os debates das interpelações devem ser encerrados pelo Primeiro-Ministro e pelo representante do grupo parlamentar interpelante, é também um facto -e fazendo uma interpretação sistemática que pelo menos um dos membros da sua bancada sei estar em condições de fazer-, que se consultarmos o Regimento, por exemplo em sede de moção de censura ao Governo e no que lá se prevê, se pode ai verificar, no artigo 203.º, n.º 3, que «O Primeiro-Ministro tem o direito de intervir imediatamente após e antes das intervenções previstas no número anterior...», isto é, das intervenções do representante do grupo parlamentar que apresentou a moção de censura.
É óbvio para qualquer de nós que a moção de censura é um instituto em que se efectiva a responsabilidade política do Governo perante este Parlamento muito mais agudamente do que nas interpelações, as quais, ainda para mais, se sucedem, como é sabido, a um número muito mais frequente e vulgar.
Seria inusitado e, creio, absolutamente despropositado que a respeito de cada uma das interpelações, as quais versam muitas vezes...
Protestos do PS e da UEDS.
Vejo que alguns Srs. Deputados estão a ficar crescentemente enervados. Pedia i Mesa que solicitasse maior calma.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa pensa que V. Ex.ª tem condições para ser ouvido. Faça favor de continuar.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Presidente, submeto-me ao juízo da Mesa, apenas com a ressalva de que estas condições não são aquelas que normalmente, pelo menos da minha parte, se proporciona a quem está no uso da palavra. No entanto, a cada um os seus critérios.
Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e do Sr. Deputado Lua Filipe Madeira, do PS.
Acrescentaria, portanto, que seria inusitado que sobre cada interpelação, figura que muitas vezes versa políticas estritamente sectoriais do Governo, o Sr. Primeiro-Ministro fosse obrigado a vir aqui encerrar cada uma das interpelações.
Isso era o que queria a oposição. A maioria não tem* essa opinião. O sr. Primeiro-Ministro também não a terá com certeza e por isso aqui não está. Não é por uma questão de maior ou menor respeito, de maior ou menor controle, até porque, Sr. Deputado Lopes Cardoso, até prova em contrário a maioria parlamentar apoia o Governo encabeçado pelo Sr. Primeiro-Ministro, Dr. Pinto Balsemão.
Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª fez a sua intervenção em termos de interpelação à Mesa. Assim, cumpre à Mesa responder-lhe.
V. Ex.ª deu uma explicação que é naturalmente a do seu Grupo Parlamentar, mas entendemos que não é à Mesa que compete dizer se o Sr. Primeiro-Ministro devia ou não estar presente. O Sr. Primeiro-Ministro tem sobre isso os seus próprios critérios que são de respeitar, mas à Mesa não compete pronunciar-se sobre tal matéria. O Sr. Primeiro-Ministro assume, naturalmente, as suas responsabilidades.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, o sentido da interpretação que o Grupo Parlamentar da UEDS faz do Regimento é claro e unívoco. Na realidade, o artigo 210.º, n.º 4, refere-se ao Primeiro-Ministro.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas V. Ex.ª vai certamente fazer a sua intervenção em resposta à do Sr. Deputado Santana Lopes. Ora, Sr. Deputado, não utilize a figura da interpelação à Mesa, pois a Mesa já marcou a sua posição em relação a este problema.
Se o Sr. Deputado deseja responder ao Sr. Deputado Santana Lopes, tem todo o direito de o fazer e poderá fazê-lo. Contudo, - repito -, não como interpelação à Mesa.
O Orador: - Tem toda a razão, Sr. Presidente. Confesso não ter estado suficientemente atento à sua observação antes da minha intervenção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 210.º, n.º 4, do Regimento desta Assembleia diz taxativamente respeito às interpelações. Não é, pois, necessário chamar à colação o, dispôs to no artigo 203.º sobre a moção de censura, na medida em que, bem ou mal, o regimento, quanto à moção de censura, confere ao Primeiro-Ministro uma faculdade, enquanto no artigo 210.º impõe uma obrigação. E, em termos jurídicos, faculdades são distintas de obrigações.
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Aplausos do PS.
Ora, o que aqui está em causa, Sr. Presidente, é saber se neste debate estamos ou não de acordo com o disposto no artigo 210.º. No seu n.º 1 diz-se que a abertura é feita por um membro do Governo - e nós não nos opusemos, nem nos podíamos opor a que a abertura fosse feita pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro com o Pelouro da Comunicação Social, porque, nos termos do artigo 186.º, n.º 1 da Constituição, o Sr. Secretário de Estado ainda é, por enquanto, membro do Governo!
Mas outra situação será aquela que diz respeito ao encerramento. Ai o regimento não fala de um membro do Governo, antes refere explicitamente o Primeiro-Ministro.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Há um precedente que o Sr. Deputado Santana Lopes podia ter invocado a seu favor, mas não o fez. Trata-se do facto de algumas interpelações nesta Câmara terem já sido encerradas, não pelo Primeiro-Ministro, mas pelo Ministro do sector sobre o qual versava a interpelação. Só que neste momento, nós, qualquer que seja a via de aproximação, chegaremos sempre à mesma conclusão: só o Primeiro-Ministro pode encerrar este debate!
O Sr. lorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - De facto, é o Primeiro-Ministro que ë responsável pelo sector da comunicação social, pois, como indica o próprio nome pomposo que usa - Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro com o Pelouro da Comunicação Social-, V. Ex.» depende do Primeiro-Ministro, superintendendo este sobre as suas obrigações, sendo V. Ex.ª um mero executante das deliberações do Primeiro-Ministro para a Comunicação Social.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mas há mais! É que nós estamos no quadro de uma interpelação que é uma forma de responsabilização política do Governo perante a Assembleia da República. E a Constituição é clara e inequívoca ao identificar os membros do Governo que têm responsabilidade política perante a Assembleia da República. O artigo 194.º diz que só o Primeiro-Ministro, o Vice-Primeiro-Ministro e os Ministros são politicamente responsáreis perante a Assembleia da República. Os Secretários de Estado são apenas, e tão-só, responsáveis perante o Primeiro-Ministro e o Ministro do sector correspondente. V. Ex.ª não ê politicamente responsável perante esta Assembleia da República; é-o, sim, o Primeiro-Ministro, do qual V. Ex.ª depende.
Assim, Sr. Deputado, bastaria invocar a Constituição da República e o Regimento. Posso, porém, ir mais longe. É que a Lei Orgânica do Governo que os senhores fizeram para se regerem a si próprios -o Decreto-Lei n.» 290/81, alterado pelo Decreto-Lei n.º 295/82- é, de todas as leis orgânicas do governo, aquela que consagra um estatuto de mais clara menoridade política aos Secretários de Estado. Porque é claro e inequívoco na letra da Lei Orgânica do vosso Governo -lei que os senhores elaboraram e pela qual deviam reger-se respeitando-a que os Secretários de Estado não têm qualquer responsabilidade política; têm apenas o exercício de funções delegadas pelo ministro de que dependem, sendo o Primeiro-Ministro responsável politicamente perante a Assembleia da República.
Invocando a vossa Lei Orgânica, invocando o Regimento desta Assembleia e invocando a Constituição da República - na parte, aliás, em que foi revista -, devo dizer, Sr. Secretário de Estado, que já teve oportunidade de emitir as opiniões que deveria ter emitido.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Muito bem!
O Orador: - Devia ter-se inscrito no debate, pois ouviu passivamente acusações que eu não toleraria sem ter reagido.
Aplausos da UEDS. do PS, do PCP, da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradecia-lhe que terminasse o mais brevemente possível.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar, até porque já entreguei a carta a Garcia...
Agora, Sr. Secretário de Estado, é tarde de mais. O Governo, antes de estar perante a Assembleia da República é que devia reflectir sobre a obrigação que tem de cumprir a lei. Nós só pedimos que se cumpra a lei. Nada mais.
Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Santana Lopes.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como o Sr. Deputado António Vitorino citou directamente a minha intervenção, queria dizer-lhe que, em matéria de responsabilidade política dos membros do Governo perante a Assembleia, é evidente que a opinião que exprimiu e defendeu é correcta. Mas em matéria de interpelação, instituto em que não se efectiva plenamente a responsabilidade política do Governo...
Protestos do PS, do PCP e da UEDS.
Como dizia, não se efectiva plenamente essa responsabilidade. O Governo é responsável e está aqui a prestar os esclarecimentos que a Câmara entenda solicitar a esse mesmo Governo, mas a efectivação plena dessa responsabilidade é através do instituto da moção de censura, no que à Assembleia da República respeita.
Vozes do PSD: -Muito bem!
O Orador: - Não confundamos as questões!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E o Sr. Secretário de Estado é tão responsável perante a Câmara para intervir durante o debate, em sede de interpelação, como para encerrar esse mesmo debate, se o Primeiro-Ministro assim o entender.
Em segundo lugar, queria dizer-lhe, Sr. Deputado António Vitorino, que já invoquei esse precedente quando a questão se levantou noutra ocasião. E cito
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ainda um outro precedente que tenho bem presente: quando o actual Primeiro-Ministro era Ministro Adjunto do então Primeiro-Ministro Francisco Sá Carneiro, num debate semelhante a este - também uma interpelação - foi o Ministro Adjunto que representou o Governo e que encerrou o debate. Nessa altura, os senhores não se lembraram desse estratagema político; só agora lhe deitam a mão. Não esperem que o aceitemos.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostava que o Sr. Deputado Santana Lopes explicasse à Câmara esse novo conceito de responsabilidade para intervir e também o de responsabilidade política. E já agora, gostaria de saber qual o tratado de Direito Constitucional em que estas duas figuras aparecem definidas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Santana Lopes.
O Sr. Santana Lopes (PS): - Sr. Deputado, como dizia um colega meu de bancada e talvez a resposta bastasse -, talvez num dicionário de língua portuguesa; porém, não me fico por aí.
É que os 2 institutos são radicalmente distintos, Sr. Deputado José Luís Nunes. Quer em matéria de interpelação, quer na moção de censura ao Governo, os 2 institutos são distintos, sendo as suas consequências também diferentes. E o Sr. Deputado sabe-o muito bem, porque se levássemos às últimas consequências o que o Sr. Deputado António Vitorino afirmou - e o Sr. Deputado José Luís Nunes também-nenhum membro do Governo poderia aqui usar da palavra. Seria o Primeiro-Ministro que teria que estar presente cada vez que há uma interpelação ou uma moção de censura, sendo só ele a poder usar da palavra.
A devida medida às coisas, penso que faz também parte...
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Primeiro-Ministro...
Risos do PSD.
Perdido, Sr. Deputado Santana Lopes. Não há problema nenhum; quando olho para a vossa bancada e vejo a ausência do Sr. Primeiro-Ministro penso numa figura de direitos reais em que os senhores são livremente substituíveis e jungíeis, ou seja, tanto faz que esteja lá um como outro. Portanto, foi daí que veio esta confusão.
A questão que ia pôr é a seguinte: é que não é assim! Não é absolutamente assim! O que se diz é que num voto de censura o Primeiro-Ministro deverá estar presente e depois pode escolher ou não a possibilidade de falar. Mas numa interpelação, o Primeiro-Ministro é obrigado a falar. E não se diga que a interpelação é um acto de controle do Estado e do Governo menos digno que a moção de censura.
A interpelação é um acto de natureza diferente mas tem dignidade. Era isto que eu gostava de dizer ao Sr. Deputado Pedro Santana Lopes.
E gostava de focar mais uma outra questão: quando lhe pedi que me dissesse qual a diferença entre as duas figuras - responsabilidade para intervir e responsabilidade política- quero dizer-lho com toda a franqueza que estava a fazer-lhe uma pergunta cavilosa, capciosa e sem qualquer espécie de fundamento. Era uma pergunta que pretendia significar que esta bancada não tomava a sério as definições e as proposições que o Sr. Deputado Pedro Santana Lopes aqui fez. Com a certeza de que - dada a sua preparação específica nesse campo- é nossa convicção que o Sr. Deputado também não toma a sério aquilo que está a dizer. Trata-se, no fundo, de uma má defesa numa péssima causa.
Quanto à questão da jungibilidade em matéria de líder, eu devolvo-lhe o cumprimento em relação ao seu secretário-geral.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quanto à questão da argumentação em relação aos dois institutos, não falei em maior ou menor dignidade, Sr. Deputado. Falei em natureza distinta e em consequências distintas. E, por isso mesmo, o problema da resposta por parte do Governo perante esta Assembleia, quando está em causa um ou outro instituto, põe-se também de maneira diversa.
Foi só esta a questão que eu foquei.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, pretende a palavra para que efeito?
O Sr. Silva Marques (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, V. Ex.ª deu por encerrado o debate. Este incidente, aliás esclarecedor sobretudo da parte da minha bancada, desenvolveu-se
Risos do PCP.
felizmente que em democracia tudo é relativo e não há verdades absolutas.
VV. Ex.ªs têm o direito de não concordar com o esclarecimento da minha bancada, aliás brilhantemente prestado pelo meu colega Santana Lopes. Mas, Srs. Deputados, nós também temos o mesmo direito relativamente a VV. Ex.ªs
Se me dão licença, eu estava a dirigir-me ao Sr. Presidente.
V. Ex.ª pôs de lado a figura das interpelações. Aliás, o Sr. Deputado Vitorino reintroduziu as intervenções, não sei a que titulo. Julgo que neste momento se põe apenas uma opção ao Sr. Deputado Lopes Cardoso: se deseja ou não intervir no encerramento do debate.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Está a interpelar a Mesa, ou está a interpelar-me?
O Orador: - Se deseja intervém, se não deseja não intervém; realmente o direito é de V. Ex.ª
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de
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lhe dizer, mas é a Mesa que está a dirigir os trabalhos e não abdica dessa função.
Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Só por coincidência é que a opinião da Mesa coincide com a de V. Ex.ª
Srs. Deputados penso que este pequeno incidente, agora verificado, tem como objectivo que cada um marque as suas posições. Julgo, pois, que as posições do partido interpelante, a UEDS, foram tomadas e assumidas pelo Sr. Deputado António Vitorino e que as posições do PSD foram tomadas pelo Sr. Deputado Pedro Santana Lopes.
Na verdade, esta discussão não nos leva a mais sítio nenhum, por isso penso que devo dar o debate por encerrado e conceder a palavra ao representante da UEDS para fazer o encerramento.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso está a pedir a palavra para que efeito?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, creio que ficou perfeitamente claro que o partido interpelante entende que o Sr. Secretário de Estado, face à Constituição e ao Regimento, não tem o direito de encerrar este debate.
Nunca o aceitaríamos, muito menos aceitaríamos que se mantivesse uma praxe que contraria o Regimento mas que foi aceite em relação ao Primeiro-Ministro. Isto é, que seja o Primeiro-Ministro a encerrar o debate quando O Regimento diz, numa interpretação clara e linear, que. o debate deve ser encerrado pelo partido interpelante. Muito menos aceitaríamos isso em relação ao Sr. Secretário de Estado.
Pretendemos saber qual é a posição da Mesa, pretendemos saber se a Mesa aceita esta infracção às disposições regimentais, às disposições constitucionais, à capacidade política do Sr. Secretário de Estado no quadro do Regimento, da Constituição e da própria Lei Orgânica do Governo, tal como foi aqui sublinhado pelo meu camarada António Vitorino.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em termos de interpelações, responder-lhe-ia o seguinte: penso que a Mesa não tem de aceitar nem deixar de aceitar isto ou aquilo. A Mesa limita-se a estar confrontada com a situação de não estar presente o Sr. Primeiro-Ministro. Naturalmente, cada um assume as suas responsabilidades e esta atitude significa, com certeza, que o Sr. Primeiro-Ministro entende que não é obrigatória a sua presença. Ou seja, do seu ponto de vista, o Sr. Primeiro-Ministro julga que não é obrigatória a sua presença, tal como já aqui foi defendido pelo Sr. Deputado Santana Lopes.
Uma voz do PCP: - É! É!
O Sr. Presidente: - Não tem, pois, a Mesa que fazer nada senão conceder a palavra ao Sr. Deputado.
Faça favor, Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem a palavra.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, penso que é dever elementar da Mesa e do Sr. Presidente fazer cumprir o Regimento. Foi para isso, entre outras coisas, que foi eleito e, sobretudo, é para isso que neste momento, está nessa Tribuna.
Pergunto à Mesa se entende que o uso da palavra para o encerramento do debate pelo Sr. Secretário de Estado respeita ou não o Regimento.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A Mesa tem obrigação de se pronunciar sobre isto.
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Então, vou interromper a sessão por alguns minutos para consultar a Mesa, Sr. Deputado.
Risos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vejo motivo para ri, já que a decisão é uma decisão colectiva e não uma decisão do Presidente.
Repito, Srs. Deputados, a decisão é colectiva e não apenas do Presidente. Portanto, a Assembleia deve aceitar esta interrupção.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Está, então, interrompida a sessão por alguns minutos.
Eram 23 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão. Vamos retomar os nossos trabalhos.
Eram O horas e 10 minutos.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a interrupção da reunião por mais meia hora, Sr. Presidente.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - O PSD não pode pedir outra vez a interrupção porque já usou esse direito.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é possível que sim. Como sabe eu não estive a presidir durante todo o dia e não tenho essa informação.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor Sr. Deputado.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar, se não estou em erro, pediu a inter-
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rupção dos trabalhos por quinze minutos. Temos, portanto, o direito de pedir a interrupção por outros quinze minutos, e é isso que fazemos neste momento.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, queria pedir, em nome do grupo parlamentar do CDS, a interrupção dos trabalhos por 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Está concedida, Sr. Deputado. Eram O horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Era 1 hora.
Pausa.
O Sr. Presidente: - O Governo já está representado visto que o Sr. Ministro da Justiça já compareceu.
No período de suspensão a Mesa estudou o problema e deliberou por maioria, conjugando as disposições do artigo 21.º do nosso Regimento e do artigo 18." da Constituição revista e que já está em vigor, que o Sr. Primeiro-Ministro se podia fazer representar, visto que o artigo 18.º da Constituição assim o autoriza. Entendemos, assim, que o Sr. Secretário de Estado pode encerrar o debate.
Concedo por isso a palavra ao Sr. Deputado Lopes Cardoso para usar da palavra para proferir a intervenção de encerramento.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, solicito uma interrupção de um quarto de hora.
O Sr. Presidente: - Está concedida, Sr. Deputado.
Era 1 hora e 5 minutos.
Após a interrupção, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Ribeiro de Almeida.
O Sr. Presidente: - Declaro reaberta a sessão. Era 1 hora e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Vamos agora entrar na parte final da interpelação. Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A decisão da Mesa -tomada ao arrepio de todas as disposições legais na matéria- de considerar válida a participação do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro com o pelouro da Comunicação Social (ele deverá pensar neste momento que é o Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro do pelourinho da Comunicação Social a que o amarraram) é uma decisão que se destina apenas a cobrir a inqualificável atitude do Sr. Primeiro-Ministro e do Governo perante este debate e perante esta Câmara.
Uma voz do PSD: - Não apoiado!
Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Inqualificável porque viola não apenas as normas legais que nos regem, mas porque viola também os mais elementares princípios da convivência democrática...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... e do respeito devido às instituições da República.
O Sr. Primeiro-Ministro nem sequer se dignou - e a mais elementar boa educação devia tê-lo conduzido a isso -, a informar o Sr. Presidente e, por via do Sr. Presidente, esta Assembleia, da sua indisponibilidade para estar presente, como lhe competia, nesta interpelação.
Isto viola a Constituição porque quando se invoca, como a Mesa o faz. o artigo 18.º da Constituição escamoteia-se este facto claro: é que esse próprio artigo remete claramente para o Regimento as condições do uso da palavra.
Vozes do PS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - E quanto às condições do uso da palavra, o Regimento é claro, preciso e não permite duas interpretações.
O n.º 4 do seu artigo 210.º especifica claramente que ao Primeiro-Ministro compete encerrar o debate de uma interpelação.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a habilidadezinha de invocar a Constituição e o seu artigo 180.º é a confissão implícita de que a Mesa e a maioria se não sentiam à vontade para invocar o Regimento pois sabiam claramente que este lhes negava qualquer espécie de razão. Só que esqueceram, como disse, que o artigo 180.º remete exactamente para esse Regimento.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: A boa vontade da UEDS no sentido de prestigiar esta Assembleia ia até ao ponto de aceitar que o Sr. Ministro da Justiça encerrasse este debate, ia até ao ponto de o aceitar e tinha-o aceite. E isto porque, como dissemos, os Secretários de Estado não são responsáveis politicamente perante esta Assembleia, ao contrário dos Ministros.
Porque é que esta solução que a UEDS se manifesta disposta a acatar não foi possível, não nos cabe a nós. cabe a outros, explicá-la.
Nós somos alheios, não nos imiscuímos, não temos nada a ver com as querelas internas de outros partidos nesta Assembleia.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Violada a Constituição, violado o Regimento pelo Governo, pelo Sr. Primeiro-Ministro, pela Mesa desta Assembleia, o respeito que temos por nós próprios, o respeito que temos por todos os Srs. Deputados e o respeito que temos pela democracia não nos permite continuar a dar cobertura ao processo que se desencadeou.
E é justamente no sentido de dignificar as instituições, recusando ser cúmplices passivos nos atentados à dignidade da Constituição, que para nós. Sr. Presidente, Srs. Deputados, o debate está encerrado.
Não participamos, recusamo-nos a participar, num
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debate realizado à margem da legalidade democrática. E porque o debate está encerrado. Sr. Presidente, só nos resta um caminho: abandonar este hemiciclo.
Aplausos do PS, do PCP, da AS Dl, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
Neste momento abandonaram a Sala os Deputados do PS, do PCP, da ASDI. da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, pedia-lhe o favor de não abandonarem a Sala, pelo menos por l minuto.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Não fazem cá falta nenhuma!
O Orador: - O Sr. Deputado deduziu argumentações que não têm nada a ver com o encerramento do debate e que gostaria de rebater.
Se não quer participar no encerramento do debate, deve dar oportunidade às outras forças políticas para contrariar as razoes que invocou numa fase em que o processo as não admitia.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Pareceu-me que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, fez novamente sinal à Mesa solicitando a palavra. Pergunto-lhe se assim é, apesar de os deputados da oposição estarem a abandonar a Sala.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Mesmo não sendo o meu apelo escutado pelos deputados da oposição e porque não se trata de fazer o encerramento do debate, mas sim de responder a argumentos que são contrários às posições defendidas pelo meu partido, mesmo assim, para que fique registado nesta Assembleia, solicito que, nomeadamente invocando o direito de legitima defesa do meu partido, me seja concedida a palavra para contrariar argumentos processuais e regimentais que foram invocados pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - O Lopes Cardoso é cobarde. Democracia não é cobardia!
O Sr. Presidente: - Como é evidente e tratando-se de uma interpelação, seria caso de dar o debate por encerrado. Mas uma vez que V. Ex.ª invoca o direito de defesa, a Mesa concede-lhe a palavra nos termos regimentais e pelo tempo correspondente ao exercício desse direito.
O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O problema que está aqui em causa, essencialmente, é o de saber se os ministros, que têm o direito de comparecer às reuniões plenárias da Assembleia da República, podem ou não ser substituídos pelos secretários de Estado. Não está aqui em causa o problema de saber quem è que tem ou não tem responsabilidade perante a Assembleia da República.
Poderia conceder que na ausência de um preceito específico a resolver o problema em questão se pudesse argumentar com a norma constitucional que define a responsabilidade dos membros do Governo. Mas toda essa argumentação é perfeitamente inútil quando encontramos na Constituição um preceito que resolve clara, expressa e inequivocamente o problema de saber se um determinado membro do Governo, um Ministro, pode ou não pode ser substituído nos debates parlamentares por 1 Secretário de Estado. Diz o artigo 180.º: «Os ministros têm o direito...» - friso bem que se diz «têm o direito» e não «têm a obrigação» - «...de comparecer às reuniões plenárias da Assembleia da República, podendo ser coadjuvados ou substituídos pelos secretários de estado. e uns e outros podem usar da palavra, nos termos regimentais».
Trata-se de um problema que foi abundantemente discutido no processo de revisão constitucional e é facto que a oposição se bateu denodadamente para que a maioria aceitasse que na Assembleia da República, a fim de prestigiar este órgão de soberania, só devia ser permitida a intervenção de ministros e nunca a de secretários de Estado. Prevaleceu - e não vou aqui dizer as razões por brevidade - a opinião da maioria, no sentido de que devia não só admitir-se que os ministros fossem coadjuvados pelos secretários de Estado, mas também substituídos. E prevaleceu esta opinião, essencialmente, com base na ideia de que o secretário de Estado ao coadjuvar ou ao substituir o ministro estava evidentemente a agir em nome dele e em sua representação e, portanto, a responsabilizar o próprio Ministro.
Isto significa que. em última análise, quem aqui está a responder perante a Assembleia não é o Secretário de Estado, porque ele é um mero representante, mas é o ministro ou o Primeiro-Ministro que ele representa.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso pretende que a parte final deste preceito destrói, afinal, aquilo que constitui a sua inteira substância, dizendo que nos termos do Regimento é o Primeiro-Ministro que encerra o debate.
Penso que esta argumentação não resiste a uns segundos de reflexão.
Há aqui um problema que é claramente resolvido pelo texto da Constituição, que é o de saber se os ministros podem ou não podem ser substituídos ou coadjuvados pelos secretários de Estado. É um problema que está expressa, clara e formalmente resolvido pelo n.º 1 do artigo 108.º da Constituição.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!
O Orador: - O que é que poderá querer dizer com «nos termos do Regimento»? Quer dizer que não basta afirmar que podem usar da palavra. É necessário saber como é que usam da palavra, quando usam da palavra, por que tempo, em que circunstâncias, por que formas, submetendo-se ou não a outras regras regimentais. Isto é o que significa a última parte «nos termos do Regimento». E perfeitamente absurdo pretender-se que este acrescento «nos termos do Regimento» vem destruir a norma que é o conteúdo essencial do preceito do artigo.
De resto, este preceito é perfeitamente justificado e o Sr. Deputado Lopes Cardoso não tem razão ao dizer que invocamos a Constituição e deixamos de parte o Regimento. Então é agora a oposição que pretende que o Regimento se sobreponha à Constituição?
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
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É um absurdo pensar-se que o Regimento da Assembleia da República obriga o Governo. O Regimento contém normas meramente internas que obrigam, única e exclusivamente, a Assembleia da República. Não podem daqui derivar direitos e obrigações, pelo menos substanciais, para o Governo, podem derivar, quando muito, direitos processuais e acessórios para que o Governo exerça os direitos que lhe são conferidos pela Constituição.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - De resto, nem o Regimento, nem a própria Constituição, porque isso não seria razoável, poderiam obrigar qualquer membro do Governo a vir aqui à Assembleia. Muito bem andou o legislador constitucional ao estabelecer um direito, não estabelecendo uma obrigação.
Daqui se deduz que a interpretação feita pela Mesa é uma interpretação perfeitissimamente correcta e é aquela que corresponde ao texto constitucional.
É pena que os Srs. Deputados da oposição não quisessem ao menos ouvir estas razões.
O Sr. Santana Lopes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Penso dos deputados da oposição, de qualquer maneira, são deputados que defendem seriamente as suas convicções, mas não têm direito é a ausentarem-se sem ouvir os argumentos em contrário invocados pelas outras bancadas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Somos os primeiros a lamentar a atitude da oposição. Essas atitudes não servem a democracia e muito menos servem o Parlamento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, para concluir, queria apenas dizer, de uma forma muito expressa, que tudo aquilo que eu disse não é mais, afinal de contas, do que a confirmação expressa -porventura com outros argumentos e por outras palavras - da posição que já aqui foi defendida, brilhantemente, na minha bancada pelos meus colegas Pedro Santana Lopes e creio que Silva Marques. São textos demasiado claros para que possam ser contestados por quem quer que seja.
Lamento, uma vez mais. que a oposição não nos tenha querido ouvir. Quem é democrata ouve pelo menos as razões dos outros, embora esteja muito convicto das suas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, cumpre à Mesa anunciar que deu entrada, sob o n.º 221/II, um pedido de ratificação, subscrito pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, relativo ao Decreto-Lei n.º 440/82, de 4 de Novembro, que aprova o regulamento disciplinar da Policia de Segurança Pública.
Encerrada, assim, a ordem do dia de hoje, o Plenário fica convocado para a sessão de amanhã, que terá início às 10 horas, com período de antes da ordem do dia, sendo o período da ordem do dia preenchido pela discussão e votação do 1.º Orçamento Suplementar desta Assembleia e das propostas de lei n.º 107/II, 124/II e 125/II.
Está encerrada a sessão.
Era l hora e 40 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Cipriano Rodrigues Martins.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Henrique F. Nascimento Rodrigues.
José Vargas Bulcão.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Maria Margarida Moura Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Natália de Oliveira Correia.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS)
Alberto Marques Antunes.
António Fernandes da Fonseca.
António José Sanches Esteves.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Fernando Torres Marinho.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Cardona Gomes Cravinho.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
José Gomes Fernandes.
José Luís Amaral Nunes.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Vergílio Fernando M. Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS)
Álvaro Manuel M. Brandão Estevão.
António Jacinto Martins Canaverde.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique Augusto Rocha Ferreira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Lopes Porto.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Paulo Oliveira Ascensão.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Partido Comunista Português (PCP)
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Manuel dos Santos e Matos.
Maria Odete dos Santos.
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Partido Popular Monárquico (PPM)
António de Sousa Lara.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS)
António César Gouveia de Oliveira.
União Democrática Popular (UDP)
Mário António Baptista Tomé.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD)
Álvaro Roque Bissaia Barreto.
Américo Abreu Dias.
António Vilar Ribeiro.
Bernardino da Costa Pereira.
Carlos Mattos Chaves de Macedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco de Sousa Tavares.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nicolau Gregório de Freitas.
Partido Socialista (PS)
António José Sanches Esteves.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Fernando Torres Marinho.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Luís Amaral Nunes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Vergílio Fernando M. Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS)
Adriano José Alves Moreira.
Eugênio Maria Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
João António Morais Leitão.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Partido Comunista Português (PCP)
António José de Almeida Silva Graça.
José Manuel da C. Carreira Marques.
A REDACTORA DE 1.ª CLASSE, Cacilda Nordeste e a REDACTORA DE 2.ª CLASSE, Maria Amélia Martins.
Rectificações ao n.º 1, de 20 de Outubro de 1982
Intervenção do Deputado do PCP José Manoel Mendes
Na p. 8, col. 2.V 1. 45, onde se lê «O Sr. Manuel Mendes (PCP)» deve ler-se «O Sr. José Manuel Mendes (PCP)..
Nas mesmas página e coluna, Is. 46 a 48, a citação «Um homem nunca devia mandar noutro homem, todos juntos é que vamos mandar na terra» deve ser reproduzida em forma de verso (dois versos), ou seja:
«Um homem nunca devia mandar noutro homem Todos juntos é que vamos mandar na terra».
Nas mesmas página e coluna, 1. 51, onde se lê «o percurso afectivo e o percurso militante» deve ler-se «o afectivo e o militante».
Nas mesmas página e coluna, II. 55 e 56, onde se lê «Na realidade, desde muito jovem ligado a formas de renovação da canção popular portuguesa» deve ler-se «Desde muito jovem, empenhado na renovação da canção popular portuguesa».
Nas mesmas página e coluna, 1. 57, onde se lê «grandes poetas da resistência e aos poetas portugueses» deve ler-se «grandes poetas da resistência, aos poetas portugueses».
Nas mesmas página e coluna, 1. l f., onde se lê «militante» deve ler-se «combativa».
Na p. 9, col. 1.º 1. l, onde se lê «fraternalmente» deve ler-se «lucidamente».
Nas mesmas página e coluna, 1. 3, onde se lê «belo timbre» deve ler-se «bonito timbre».
Nas mesmas página e coluna, 1. 4, onde se lê «era a um tempo o lirismo e a dramaticidade» deve ler-se «era, a um tempo, o lirismo e a dramaticidade».
Nas mesmas página e coluna, 1. 8, onde se lê «profundamente aberto» deve ler-se «profundamente consequente».
Nas mesmas página e coluna, II. 9 e 10, onde se lê «assumir» deve ler-se «firmar».
Nas mesmas página e coluna, 1. 10, onde se lê «da compreensão» deve ler-se «da força das suas convicções».
Nas mesmas página e coluna, Is. 11 e 12, onde se lê «era, no entanto, o homem que estava sempre no lugar certo quando era preciso que estivesse no lugar certo» deve ler-se «era o homem que estava sempre, quando era preciso que estivesse, no lugar certo».
Nas mesmas página e coluna, Is. 15 e 16, onde se lê «intervenção de saudade» deve ler-se «memória de saudade».
Nas mesmas página e coluna, Is. 17 e 18, onde se lê «com lágrimas daqui a depor-se na tumba do Adriano» deve ler-se «com lágrimas, daqui, a depor-se na tumba do companheiro e do amigo».
Nas mesmas página e coluna. Is. 23 e 24, onde se lê «assume o testemunho daqui deste lado da luta» deve ler-se «toma o testemunho, deste lado da luta».
Nas mesmas página e coluna, Is. 24 e 25, onde se lê «percorrer o mesmo transcurso» deve ler-se «percorrer o trajecto».
Nas mesmas página e coluna, Is. 26 e 27, onde se lê «da existência do Adriano Correia de Oliveira» deve ler-se «da existência e da arte do Adriano Correia de Oliveira».
Nas mesmas páginas e coluna, 1. 29, onde se lê «Por isso esta bancada, profundamente» deve ler-se «Por isso, esta bancada, duramente».
Nas mesmas página e coluna, Is. 30 e 31, onde se lê «que ocorreu a um querido amigo, a um fraterno companheiro» deve ler-se «de um querido e exemplar camarada».
Nas mesmas página e coluna, Is. 31 e 32, onde se lê «não pode neste momento deixar de entender» deve ler-se «não pode, neste momento, deixar de entender».
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Nas mesmas página e coluna, 1. 33. onde se lê «sejam» deve ler-se «são».
Nas mesmas página e coluna, 1. 35. onde se lê «produzia e que se destinava» deve ler-se «produzia e destinava».
Nas mesmas página e coluna, 1. 36. onde se lê «o sol claro» deve ler-se «o sol».
Nas mesmas página e coluna. Is. 38 a 40, onde se lê «assumimos como nossa responsabilidade não apenas a dor que nos ë legítima, mas a circunstância de termos que levar» deve ler-se «queremos como nossa não apenas a dor, que é legitima, mas a incumbência de levarmos».
Nas mesmas página e1 coluna. Is. 43 a 45. onde se lê «que ele ajudou a fazer, ou seja. os da mais alta dignidade humana, os da mais alta e profunda inteligência do canto, os da mais completa e aberta renovação» deve ler-se «que ele ajudou a nascer. Como quem diz: a mais alta dignidade humana, a mais clara e actuante inteligência do canto, a mais completa renovação».
Intervenção do Deputado do PPM António Moniz
Na p. 9, col. 2.º, 1. 11. onde se lê «ao Adriano» deve ler-se «do Adriano».
Nas mesmas página e coluna, 1. 12, onde se lê «tocar guitarra» deve ler-se «tocar guitarra em público».
Nas mesmas página e coluna, 1. 14, onde se lê «na modéstia dos quartos de estudantes que começou» deve ler-se «na modéstia dos quartos de estudantes, iguais àqueles onde ele morava, que começou».
Nas mesmas página e coluna, 1. 15, onde se lê «da música de Coimbra» deve ler-se «da música tradicional de Coimbra».
Nas mesmas página e coluna, 1. 19. onde se lê «a amizade acima de tudo» deve ler-se «a amizade, acima de tudo».
Nas mesmas página e coluna, Is. 20 e 21, onde se lê «A esse homem, que além de grande artista e que desapareceu, o PPM deixa aqui a sua homenagem» deve ler-se «A esse homem, que, além de grande artista, teve papel preponderante no processo de transformação do fado de Coimbra, o PPM deixa aqui a sua homenagem».
Intervenção do Deputado do PS Armando Lopes.
Na p. 28, col. 2.º. 1. l f., onde se lê «20 dias» deve ler-se «21 dias».
Na p. 29, col. 1.M. l, onde se lê «80 dias» deve ler-se «81 dias».
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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA