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I Série - Número 27
Terça-feira, 21 de Dezembro de 1982
DIÁRIO da Assembleia da República
II LEGISLATURA 3.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1982-1983)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE DEZEMBRO DE 1982
Presidente: Exmo. Sr. Américo Maria Coelho Gomes de Sá
Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Brás
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos 
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 17 horas e 50 minutos.
Prosseguiu o debate da proposta de lei n.º 106/II, que autoriza o Governo a legislar sobre património cultural português, tendo sido aprovada na generalidade e na especialidade.
Produziram intervenções, a diverso título (incluindo declaração de voto), além do Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica (Lucas Pires), as Sr.ªs Deputadas Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Teresa Santa Clara Gomes (UEDS), Amélia de Azevedo (PSD), e os Srs. Deputados Borges de Carvalho (PPM), César Oliveira (UEDS), Gomes Carneiro (PS), Lopes Cardoso (UEDS), Carlos Brito (PCP), Herberto Goulart (MDP/CDE), Martins Canaverde (CDS), Fernando Condesso (PSD), António Reis (PS), Veiga de Oliveira (PCP), Magalhães Mota (ASDI), José Manuel Mendes (PCP), Larcher Nunes (CDS), Sousa Lara (PPM), Mário Tomé (UDP), António Vitorino (UEDS), Barrilaro Ruas (PPM) e a Sr.ª Deputada Maria José Sampaio (CDS).
Entretanto, foi lido e aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, sobre a substituição de deputados do CDS.
Finalmente, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 35 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 17 horas e 50 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adérito Manuel Soares Campos. 
Álvaro Barros Marques Figueiredo. 
Álvaro Roque Bissaia Barreto. 
Amélia Cavaleiro M. Andrade Azevedo. 
Anacleto Silva Baptista. 
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Roleira Marinho.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arménio dos Santos.
Carlos Dias Ribas.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Mendes Costa.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha Almeida.
João Manuel Coutinho de Sá Fernandes.
Joaquim Cabrita Neto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Luís Figueiredo Lopes.
José Vargas Bulcão.
Júlio Lemos Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria Manuel Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida Moura Ribeiro.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Natália de Oliveira Correia.
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Nuno Aires Rodrigues dos Santos. 
Pedro Augusto Cunha Pinto. 
Pedro Miguel Santana Lopes. 
Reinaldo Alberto Ramos Gomes. 
Vasco Francisco Aguiar Miguel. 
Victor Pereira Crespo. 
Virgílio António Pinto Nunes.
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho. 
Alfredo Pinto da Silva. 
António Duarte Arnaut. 
António Fernandes da Fonseca. 
António Fernando Marques R. Reis. 
António Gonçalves Janeiro. 
António José Sanches Esteves. 
António Manuel Azevedo Gomes. 
António Manuel de Oliveira Guterres. 
Aquilino Ribeiro Machado. 
Carlos Cardoso Lage. 
Carlos Manuel N. Costa Candal. 
Eduardo Ribeiro Pereira. 
Fausto Sacramento Marques. 
Fernando Torres Marinho. 
Francisco de Almeida Salgado Zenha. 
Francisco Manuel Marcelo Curto. 
Jaime José Matos da Gama. 
João Cardona Gomes Cravinho. 
João Francisco Ludovico da Costa. 
João Joaquim Gomes. 
Joaquim José Catanho de Menezes. 
Joaquim Sousa Gomes Carneiro. 
Jorge Fernando Branco Sampaio. 
José Luís Amaral Nunes. 
José Manuel Niza Antunes Mendes. 
Júlio Francisco Miranda Calha. 
Leonel de Sousa Fadigas. 
Luís Manuel César Nunes de Almeida. 
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão. 
Luís Silvério Gonçalves Saias. 
Manuel Alegre de Melo Duarte. 
Manuel Alfredo Tito Morais. 
Manuel Francisco da Costa. 
Manuel da Mata de Cáceres. 
Manuel Rodrigues Masseno. 
Raul d'Assunção Pimenta Rego. 
Teófilo Carvalho dos Santos. 
Vítor Manuel Brás.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira. 
Américo Maria Coelho Gomes de Sá. 
António Jacinto Martins Canaverde. 
António Mendes Carvalho. 
António Pedro Silva Lourenço. 
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira. 
Carlos Eduardo de Oliveira e Sousa. 
Duarte Nuno Correia Vasconcelos. 
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro. 
Emílio Leitão Paulo. 
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira. 
Francisco Manuel L.V. Oliveira Dias. 
Francisco Manuel de Menezes Falcão. 
Henrique Manuel Soares Cruz. 
João José M. Pulido de Almeida. 
João Maria Abrunhosa de Sousa. 
João da Silva Mendes Morgado.
José Alberto Faria Xerez.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Maria José Paulo Sampaio.
Paulo Oliveira Ascenção.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Victor Afonso Pinto da Cruz.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira. 
Álvaro Favas Brasileiro. 
António Anselmo Aníbal. 
António José M. Vidigal Amaro. 
António José de Almeida Silva Graça. 
Artur Mendonça Rodrigues. 
Carlos Alberto do Carmo Espadinha. 
Carlos Alfredo de Brito. 
Custódio Jacinto Gingão. 
Ercília Carreira Talhadas. 
Fernando de Almeida Sousa Marques. 
Francisco Miguel Duarte. 
Georgete de Oliveira Ferreira. 
Jerónimo Carvalho de Sousa. 
Joaquim António Miranda da Silva. 
Joaquim Gomes dos Santos. 
Jorge Manuel Abreu de Lemos. 
Jorge Manuel Lampreia Patrício. 
José Manuel Antunes Mendes. 
José Manuel Maia Nunes de Almeida. 
José Rodrigues Vitoriano. 
Josefina Maria Andrade. 
Lino Carvalho de Lima. 
Manuel Correia Lopes. 
Manuel Rogério de Sousa Brito. 
Manuel dos Santos e Matos. 
Maria Alda Barbosa Nogueira. 
Maria Odete dos Santos. 
Mariana Grou Lanita da Silva. 
Octávio Augusto Teixeira. 
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Partido Popular Monárquico (PPM):
António José Borges de Carvalho. 
António de Sousa Lara. 
Henrique Barrilaro Ruas.
Acção Social Democrata Independente (ASDI)
Francisco Braga Barroso.
Joaquim Jorge de Magalhães S. Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António César Gouveia de Oliveira. 
António Manuel C. Ferreira Vitorino. 
António Poppe Lopes Cardoso. 
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
Helena Cidade Moura. 
Herberto de Castro Goulart.
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União Democrática Popular (UDP):
Mário António Baptista Tomé.
Entretanto, tomaram lugar na bancada do Governo o Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica (Lucas Pires), o Sr. Ministro para os Assuntos Parlamentares (Marcelo Rebelo de Sousa), o Sr. Secretário de Estado da Cultura (Gomes de Pinho) e a Sr.ª Subsecretária de Estado Adjunto para os Assuntos Parlamentares (Maria Luísa Antas).
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro Lucas Pires, V. Ex.ª pediu a palavra, no decorrer da sessão anterior, depois da intervenção da Sr.ª Deputada Natália Correia. Deseja usar já da palavra ou apenas no final?
O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica (Lucas Pires): - Uso da palavra no final das intervenções dos Srs. Deputados, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: O acto de pedir autorização legislativa a esta Assembleia tem, de imediato e à priori, a nossa total reprovação. O Sr. Ministro frustrou toda a esperança que as pessoas de boa vontade poderiam pôr num homem inteligente, culturalmente válido e que assumiu, no contexto anticultural da AD, o lugar de D. Quixote esgrimindo contra as velas do moinho.
Num agrupamento governamental, com as características do formalmente existente Governo, não há lugar para um Ministro da Cultura e V. Ex.ª acaba de o demonstrar à evidência, pedindo autorização para que o Governo legisle sobre matéria que se entende reserva da Assembleia da República, pelo seu âmbito extra-governamental, pela incidência nacional da sua acção.
O Sr. Ministro sabe que seria correcto entregar a esta Assembleia uma proposta de lei que baixaria seguramente à respectiva comissão onde se fariam as necessárias consultas públicas e onde se receberiam as propostas de alteração de todos os partidos.
Informam-me que o Sr. Ministro teria pressa em legislar; o mesmo aconteceu com um Ministro da Saúde a quem a maioria concedeu autorização legislativa para alterar a lei de bases da saúde. Os homens, mesmo com ideologias afins, e em qualquer circunstância, merecem-nos vários graus de consideração. Por isso gostaria de lembrar ao Sr. Ministro que em democracia a urgência paga-se cara e nesta matéria específica paga-se caríssima.
Somos um país riquíssimo em matéria de património cultural e não será possível destacar uma polícia para cada monumento, por maior que seja a reserva de efectivos do Ministro Angelo Correia. Há 4 anos existiam em Portugal conhecidos e com publicação ou em jornal ou revista, 60 000 estações arqueológicas considerando-se nessa altura a investigação arqueológica no período só até ao fim da dominação árabe. Isto é um exemplo de que qualquer acção no sentido de defender o património cultural terá que ter em conta a dinâmica e a força intrínseca das populações. O mesmo se poderia dizer quanto a colecções de louça, colecções de manuscritos, bibliotecas, etc. Isto quer dizer que as populações deverão participar na protecção e defesa do património cultural e não ser associadas às medidas de protecção tal como o Sr. Ministro propõe no seu projecto de decreto-lei.
Não haverá defesa possível do património cultural se não se tiver em conta a dinâmica e o amor das populações pelos seus próprios bens. O povo é o grande agente da cultura e como tal, o Sr. Ministro o reconhece formalmente quando refere a permanência e identidade da cultura portuguesa como padrão pelo qual se deve aferir a validade do património cultural. Simplesmente reconhecer intelectualmente é uma coisa, legislar de forma a aproveitar o fermento social é outra. Quando legisla, o Sr. Dr. Lucas Pires não é o Ministro da Cultura, é Ministro do Governo AD, parte de um corpo coerente que em todos os sectores tentou acertar o passo, sem conseguir.
O preâmbulo do seu decreto-lei, embora muito inferior em estilo àquilo a que o Sr. Ministro nos habituou, é um preâmbulo ao qual se adere intelectualmente com facilidade mas que dificilmente será servido pela teia institucional que releva do projecto de decreto-lei, naquilo que podemos julgar.
Na área da arqueologia, por exemplo, o projecto-lei do Partido Comunista Português entregue nesta Assembleia quando do pacote do património cultural - e não estou metida em ghettos ideológicos - tem várias vantagens em relação ao decreto-lei que o Governo prepara: é mais eficaz na medida em que propõe um esquema descentralizador e mais explícito por dar conhecimento da composição dos órgãos que formam esse esquema. O Sr. Ministro optou por um esquema institucional centralizador que irá burocratizar ainda mais a investigação em arqueologia, e remete, possivelmente, para lei regulamentar coisas tão importantes como a composição das comissões que têm funções consultivas ou fiscalizadoras.
O título III - Do fomento da conservação e valorização do património cultural, apresenta-se no pólo oposto: é uma listagem de conceitos organizados em artigos. Assim, este título sugere-nos as seguintes perguntas:
O ponto 3 do artigo 43.º refere-se às associações de defesa do património cultural? A pergunta pretende esclarecer certa contradição: essas associações foram consideradas pelo CDS como órgãos paralelos e não úteis quando da discussão do projecto-lei apresentado pelo Partido Comunista Português, de resto rejeitado pelos deputados do CDS e PSD e abstenção do PPM.
Por outro lado, foi aceite por esta Assembleia, na lei-quadro de freguesias, a inclusão de organismos de natureza cultural como importante contributo para a valorização que possibilitaria a passagem de uma freguesia a concelho. Por exemplo, perguntamos: esses organismos vão ser criados a nível central para que as populações a eles se possam associar ou vão ser considerados órgãos paralelos?
Dos pontos 4 e 5 do artigo 39.º infere-se que a investigação e formação ficarão ligados à universidade e a esquemas de formação, através da cooperação com o Ministério da Educação? Ou continuarão apenas dependentes do Ministério da Coordenação Científica?
A nossa posição como partido é que não há nenhuma possibilidade de o Ministério da Educação formar todos os profissionais necessários em Portugal. Em todo o caso, entendemos que qualquer formação terá de ser
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ligada ao Ministério da Educação e o diploma terá de ser dado através do Ministério da Educação.
E, finalmente, o ponto 1 do artigo 40.º pressupõe que os órgãos da administração local e central vão ser dotados de verbas específicas proporcionais à importância dos bens que integram o património cultural. Ou a expressão: deverão dotar os seus orçamentos, quer dizer que do dinheiro atribuído através da lei das finanças locais, cada ano mais ratada, será necessário tirar ainda essa verba? Ou vai o Governo rememorando os tempos antigos, subsidiar algumas câmaras especialmente?
Sr. Ministro, o meu partido considera de grande urgência o assunto do seu projecto de decreto-lei e, embora repudiando a forma como ele foi trazido a esta Assembleia não quis negar em nome dos muitos militantes do MDP/CDE que trabalham nesta área, um mínimo de colaboração, que neste momento se reveste de especial inutilidade. Lamenta profundamente que V. Ex.ª e o Governo a que pertence coloquem a Assembleia da República e o povo português em situações como a presente. Mas isso não é específico, é parte da luta que todos os democratas hoje travam em cada minuto que passa e que como todas as lutas justas, terminará por ser bem sucedida.
Aplausos do MDP/CDE, do PCP e do Sr. Deputado António Arnaut (PS).
O Sr. Presidente: - Está inscrita a seguir, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.
Tem a palavra.
A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Cultura: Para o grupo parlamentar da UEDS a discussão que hoje tem lugar nesta Câmara é mais um dos muitos gestos vazios de sentido com que órgãos democraticamente eleitos pretendem iludir o bom senso nacional.
Preparávamo-nos para discutir hoje aqui um pedido de autorização legislativa de um Governo em exercício pleno das suas funções. Em vez disso, somos confrontados com a continuação de um debate que, ao perder a sua vinculação ao tempo, perde também todo o seu significado material. Sabemos à partida que a proposta de lei que aqui se pretende votar não poderá passar à prática durante a vigência do Governo que a apresenta. E mesmo assim insiste-se em criar a ilusão de que se trata de um diploma de rotina. Como se nada de anormal se estivesse a passar no país... Como se o Governo e o Parlamento estivessem de perfeita saúde... «Nós por cá, tudo bem», gostaria a maioria de poder dizer ao país neste Natal, a sossegar o povo dos sobressaltos que continuamente lhe vai criando...
Ora em nosso entender, Srs. Deputados, há limites para o criar e alimentar de ilusão; há limites para o abuso da credibilidade do povo que aqui representamos. O Governo está demissionário e não tem, por isso, qualquer sentido manter o pedido à Câmara de autorização para legislar sobre património cultural.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
A Oradora: - Fiz parte de um governo que, sem estar demissionário, viu todos os seus decretos suspensos pela mesma maioria que hoje pretende atribuir poder de legislar durante um período de 90 dias a um governo que só formalmente continua ainda a existir. Não posso, por isso, e não pode também o meu grupo parlamentar, colaborar na farsa de um debate fantasma.
Preparámo-nos para intervir substantivamente na discussão de um projecto de lei quadro sobre património cultural. Partilhamos o sentido de urgência em relação à legislação nesta matéria de que o preâmbulo do projecto de decreto-lei se faz eco e teríamos o maior gosto em estabelecer aqui um diálogo sério e profundo com o Sr. Ministro Lucas Pires. Mas o nosso sentido de dignidade das instituições democráticas está acima de quaisquer condicionalismos deste tipo. Recusamo-nos a dar crédito de futuro a um governo passado, um governo que neste momento é apenas a sombra de si mesmo. Deixaremos, pois, para melhor ocasião, a nossa intervenção sobre questões atinentes ao património cultural. Debater um assunto de tão grande interesse nacional, na presente circunstância, seria brincar com coisas sérias. E nós, grupo parlamentar da UEDS, não costumamos fazê-lo.
Aplausos da UEDS, do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, os Srs. Deputados Amélia de Azevedo e Borges de Carvalho.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra, não propriamente para um pedido de esclarecimento quanto ao teor da intervenção da Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes porquanto ela é suficientemente clara para não suscitar qualquer tipo de esclarecimentos, mas apenas para fazer um protesto.
A Sr.ª Deputada referiu que fez parte de um Governo que também teve problemas com pedidos de autorização legislativa e que, inclusive, suspendeu a sua possibilidade de legislar mesmo quando estava demissionário. Eu quero dizer à Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes que, o caso em apreço não tem qualquer paralelo, porquanto não sei ao certo se este Governo está demissionário, uma vez que o Governo só está demissionário a partir do momento em que o Sr. Primeiro--Ministro apresentar, formalmente, o pedido de demissão ao Sr. Presidente da República, e não sei se é esse exactamente o caso.
De qualquer maneira, a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes esquece que este Governo é emanação de uma maioria parlamentar que está aqui presente e que legitima a formação deste ou de qualquer outro governo.
Por outro lado, quero também dizer à Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes que, para mim, como deputada, a defesa do património cultural do nosso povo é uma estética e, além do mais, uma exigência de identidade nacional. Está, portanto, acima de todas estas questiúnculas.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, deseja contraprotestar já ou ouve primeiro o Sr. Deputado Borges de Carvalho?
A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Prefiro contraprotestar já, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.» Deputada.
A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo, em primeiro lugar quero dar-lhe um esclarecimento pois entendeu mal o que eu disse relativamente ao governo de que fiz parte. Na verdade, tratava-se de um governo de transição e a Assembleia da República não esteve em funcionamento durante esse governo. Portanto, a sua referência a problemas com pedidos de autorização legislativa não faz qualquer sentido visto que o v Governo não fez pedidos de autorização legislativa a uma assembleia que não estava em funcionamento.
Eu disse apenas que o Governo, mesmo tendo legislado num período em que não se encontrava demissionário, viu suspensos alguns dos seus decretos-leis por uma maioria que agora da um crédito de futuro a um governo que todos sabemos estar já demissionário. E se a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo ainda tem dúvidas em relação a isso peco-lhe que se reporte aos órgãos do seu partido que, oficialmente, tomaram essa decisão.
Que eu saiba, o Primeiro-Ministro foi hoje, às 17 horas, recebido pelo Presidente da República. Temos, portanto, todas as possibilidades de tirar por conclusão que a demissão foi entregue, conforme o próprio Primeiro-Ministro ontem confirmou.
Em relação à urgência sobre legislação em matéria de património cultural, eu estou de acordo e disse-o aqui. A matéria relativa ao património cultural é uma matéria de suma importância, que merece todo o respeito da Câmara, e é justamente porque lhe devemos esse respeito que não devemos continuar um debate sobre ela, nas circunstâncias em que o estamos a fazer.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes é Deputada independente no Grupo Parlamentar da UEDS. Só assim se pode explicar que venha aqui impugnar esta discussão ou arguir da sua ilegitimidade quando o Grupo Parlamentar da UEDS, em reunião de líderes realizada há poucos momentos, aceitou que esta discussão aqui fosse travada.
Portanto, seria bom esclarecer se a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes fala em nome do seu grupo parlamentar, contrariando aquilo que o grupo acabou de aceitar, ou se fala como deputada independente.
Em segundo lugar, gostaria de registar que a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes considera anormal a situação em que vivemos e que fique este registo para sabermos dos conceitos de democracia parlamentar que a Sr.ª Deputada tem.
Por último, farei uma referência ao Governo de que a Sr.ª Deputada fez parte e que foi o mais acabado exemplo de abuso de poderes legislativos. É que meses depois de esse Governo já estar «morto» e «enterrado» ainda o Diário da República, estava cheio de normas provindas desse mesmo Governo. E a ASDI que o diga, já que ela própria apresentou aqui uma lei formulário precisamente para evitar esses abusos de que foi exemplo máximo - repito - o Governo de que a Sr.ª Deputada fez parte.
Vozes do PPM e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César Oliveira, poderá informar a Mesa das razões por que pediu a palavra?
O Sr. César Oliveira (UEDS): - É para dar uma explicação à Câmara, Sr. Presidente, uma vez que tal parece ser necessário em resultado da intervenção do Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estive presente na reunião de líderes dos grupos parlamentares em representação do meu grupo parlamentar e não impugnámos a continuação da discussão desta proposta de lei, porque ninguém introduziu a questão.
De facto, nessa reunião não se discutiu da legitimidade ou ilegitimidade, da utilidade ou inutilidade de se continuar esta discussão. Este problema não foi formalmente posto. Era só isto que eu queria dizer, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, julgo eu, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes.
A Sr.ª Teresa Santa Clara Gomes (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Direi unicamente que as minhas intervenções são sempre intervenções de Deputada independente no seio do Grupo Parlamentar da UEDS. Nesta circunstância o grupo parlamentar, como habitualmente, de resto, corrobora as afirmações que fiz e, portanto, creio que apoia aquilo que acabei de dizer.
Vozes da UEDS: - É claro!
A Oradora: - Assim, embora na reunião de líderes parlamentares o problema não tenha sido levantado, basta ele estar a ser levantado aqui, neste momento, para passar a ter sentido.
Quanto às outras referências que me foram feitas pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, eu considero que o ter dito que estamos numa situação que não é de normalidade não significa que não considere normal a demissão deste Governo. Considero isso normal e, de resto, já esperado e desejado por muitos portugueses.
Vozes da UEDS, do PS e do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Mas isso não significa que possamos continuar aqui a fazer de conta que essa demissão não está em causa e a dar um voto de confiança ao Governo para legislar num período de 90 dias, quando de facto sabemos que estamos perante um Governo a prazo, de alguns dias ou, quando muito, de semanas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho para interpelar a Mesa, creio eu.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa em 2 sentidos: primeiro, para que a Mesa esclareça a Câmara, de uma vez por todas, se ficou ou não ficou combinado em reunião de
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líderes parlamentares que a agenda se mantivesse e que a proposta de lei fosse apreciada até à sua votação; segundo, para perguntar a V. Ex.ª sob que figura regimental è que o Sr. Deputado César Oliveira usou da palavra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a figura regimental sob a qual o Sr. Deputado César Oliveira usou da palavra foi a conhecida liberalidade do Presidente.
No que se refere à questão de se continuar ou não a discutir a proposta de lei n.º 106/II, penso que terei de dar razão a ambos os Srs. Deputados, visto que na reunião de líderes se assentou em que as agendas de hoje e amanhã se mantinham e ninguém inviabilizou a possibilidade desta discussão.
Tem a palavra o Sr. Ministro Lucas Pires.
O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica
(Lucas Pires): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela minha parte gostaria de esclarecer a Câmara de que estou aqui exclusivamente por respeito a esta Assembleia e porque esta sessão da Assembleia tinha sido convocada para hoje à tarde.
Eu próprio conheço bastante bem as circunstâncias políticas em que decorre a discussão deste pedido de autorização legislativa. Permiti-me até, na primeira sessão a ela destinada, aludir jocosamente ao facto de me encontrar junto da porta... Portanto, tenho perfeita consciência disso. Simplesmente a minha condição de deputado, de membro do Governo, inclusive de constitucionalista, leva-me a pensar que o respeito pela própria vontade do Sr. Presidente da República, que é a última vontade soberana neste processo, me obrigaria a estar aqui no exercício das minhas competências e das minhas responsabilidades. Esta é porventura, de facto, uma interpretação excessivamente juridista da minha competência, da minha obrigação e da minha responsabilidade. No entanto, eu entendi que sem nenhuma indicação doutro tipo dada pelo Governo no seu conjunto ou, enfim, sem uma clara decisão do Sr. Presidente da República, no sentido da aceitação da demissão do Governo, eu deveria vir aqui. Assim, é nessas condições que aqui me encontro.
Devo, no entanto, esclarecer que a Assembleia pode ter inteiras garantias da minha parte, dadas aqui formalmente, de que nenhuma autorização legislativa concedida neste sector da Cultura será aproveitada por um governo de gestão para legislar. A Assembleia pode ter esta garantia.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Carneiro para interpelar a Mesa.
O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Sr. Presidente, levanta-se aqui uma questão processual que é particularmente importante.
O artigo 168.º da Constituição, no seu n.º 4, diz que as «autorizações legislativas caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas, com o termo da legislatura», etc.
A verdade é que o Sr. Primeiro-Ministro anunciou publicamente ao povo português que a sua decisão de pedir a demissão - o que arrasta consigo a demissão de todo o Governo - era perfeitamente irrevogável.
Sendo assim, a questão que ponho é se há legitimidade para nós estarmos aqui a discutir uma coisa que não tem qualquer sentido.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Claro!
O Orador: - Não se trata de o Sr. Ministro Lucas Pires vir aqui dar garantias de que não utilizará a autorização legislativa numa situação de governo de gestão, porque isso, é evidente!, não o poderia fazer de acordo até com a própria Constituição.
O problema que se levanta é, pois, repito, o de saber se há legitimidade de estarmos aqui a discutir este problema.
Esta é uma questão que deixo em aberto a quem de direito.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é efectivamente ao Presidente da Assembleia que cabe marcar a ordem do dia de cada reunião plenária que, como sabe, é normalmente marcada de acordo com os grupos parlamentares na reunião dos seus líderes. Foi assim que ainda há pouco, expressamente, se renovou a ideia de que a ordem do dia que estava marcada deveria manter-se. Portanto, nenhum dos grupos parlamentares levantou o problema que V. Ex.ª acaba de levantar e parece-me que, a menos que se sinta a necessidade de reunir de novo os líderes para decidir sobre esta matéria, a Mesa só por si não tem legitimidade para tomar uma decisão em sentido contrário.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, creio que V. Ex.ª colocou a questão como ela devia ter sido posta e o facto de a reunião dos líderes parlamentares não a ter abordado, como em meu entender a deveria ter abordado, não deve ser razão para que continuemos a persistir num debate que é vazio de sentido.
Não vou agora discutir se isso se discutiu ou não nos grupos parlamentares. Pela parte da UEDS, se não levantámos o problema fazemos o nosso mea culpa. Enganar, qualquer um se engana, mas persistir no erro já é mais grave!
A verdade é que esta discussão é totalmente destituída de sentido e mais destituída ficou quando o Sr. Ministro da Cultura deixou muito clara a garantia de que não utilizaria esta autorização legislativa a partir do momento em que o Governo passasse a funcionar como governo de gestão, isto é, a partir do momento em que o Governo se considerasse demitido. Quer isto dizer que nós vamos conceder uma autorização legislativa que já sabemos que vai caducar, que não servirá para nada, devendo, portanto, a discussão ser mais tarde reposta nesta Assembleia.
Assim, pergunto: que sentido tem, de facto, esta discussão?
Sugiro ao Sr. Presidente que, se não há outro meio, convoque uma reunião dos líderes parlamentares para que se assente quanto à metodologia a seguir, para que não persistamos numa discussão completamente destituída de sentido.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Representantes do Governo: Não estive na conferência dos grupos parlamentares, mas sei, em todo o caso, pelos representantes do meu grupo parlamentar, que a questão não foi suscitada na conferência.
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Naturalmente que, se considerarmos o problema de um ponto de vista estritamente jurídico e constitucional, esta discussão ainda tem cabimento, mas politicamente sabemos que assim não é.
Politicamente, todos temos informação bastante para saber que o Governo que pediu a autorização legislativa e que aqui a está a discutir não vai utilizá-la, a menos que houvesse uma completa reviravolta nos acontecimentos, e digo isto porque o Sr. Primeiro-Ministro já garantiu que a sua decisão é irreversível. Portanto, politicamente, não há nenhuma possibilidade de esta autorização legislativa vir alguma vez a ser utilizada pelo Governo que a pediu e pelo Governo que a discute.
Parece que nestas condições, este debate que gostaríamos de travar - e até o deputado do meu grupo parlamentar, que estava preparado para intervir, teria muito gosto em fazê-lo, em trazer os nossos pontos de vista sobre uma matéria que tanto nos interessa - já não tem razão de ser.
Esta autorização legislativa já não tem razão de existir. Por isso mesmo, Sr. Presidente, pensamos que seria absurdo que aqui, na Assembleia da República, se ignorasse esta coisa fundamental: é que, em consequência do resultado das eleições, o Primeiro-Ministro pediu a demissão e isso cria uma situação nova no país. Nós, da bancada comunista, regozijamo-nos com essas novas perspectivas que se criaram e é para aí que todos nós e o país estamos virados, e não para uma autorização legislativa que, politicamente, caducou.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto a algumas afirmações que aqui foram feitas, quero dizer que nós, na conferência dos grupos parlamentares, abordámos esta questão, não lhe tendo dado importância especial. Abordámos nestes termos: parece-nos que este debate, formalmente, é pertinente, não há ainda anúncio da aceitação do pedido de demissão do Primeiro-Ministro pelo Sr. Presidente da República e, portanto, em termos formais, o debate é perfeitamente pertinente. Aliás, não havia outra matéria agendada e por essa razão nele participámos, visto que não houve alteração da agenda do Plenário.
De facto, temos que reconhecer que este é um debate sem sentido. E isto porque suponho que a maioria, como sempre tem feito, vem conceder autorização ao Governo - mesmo que a nosso ver não se trate de matéria em relação à qual seja pertinente a concessão de uma autorização legislativa - e essa autorização perderá efeito, segundo parece, dentro de muito pouco tempo.
De qualquer maneira, interviemos neste debate na medida em que, estando agendado, nos parecia pertinente e com um ponto de vista diferente do da maioria. Participámos no debate para afirmar a posição de que votaremos contra a concessão da autorização legislativa e, portanto, a nossa intervenção foi fundamentalmente no sentido de nos pronunciarmos sobre matéria que é importante e que a nosso ver deveria culminar numa não concessão de autorização legislativa ao Governo, e esta teria significado. Poderá não ter significado prático a resolução final da Assembleia, mas para nós tem significado político a posição que tomámos nesta matéria, e daí que tenhamos intervindo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Martins Canaverde.
O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era para pedir a interrupção dos trabalhos por 30 minutos, para uma reunião de líderes.
O Sr. Presidente: - A interrupção é regimental, será defenda.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, peço desculpa mas tem primeiro de decidir-se se há ou não reunião de lideres. Quanto a mim, julgo que não deve haver. Se o Sr. Presidente quer interromper, não há reunião de líderes.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Da vossa parte é difícil porque não há líderes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se há ou não reunião de líderes é com o Presidente e não tem que se consultar a Assembleia, nesse sentido.
Aplausos do PS.
Está interrompida a sessão e haverá, imediatamente, uma reunião de líderes no gabinete do Sr. Presidente.
Eram 18 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 19 horas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo a Câmara de que na reunião dos líderes, que foi convocada neste intervalo a solicitação do Grupo Parlamentar do CDS, se entendeu que, não havendo, como não havia, consenso para a alteração da ordem do dia, teremos que continuar a discussão e o debate da autorização legislativa.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Era para comunicar à Mesa uma perspectiva de superação de algumas dificuldades que se geraram com este debate, apesar da conferência ter decidido pelo seu reinicio.
O Sr. Deputado Magalhães Mota, da ASDI, sugeriu que a maioria apresentasse um projecto de lei com dispensa de baixa à Comissão, se os outros grupos parlamentares o aceitassem, com vista a não criar um precedente. Isto permitiria que o projecto de lei fosse, ele próprio, objecto do debate e aprovado na generalidade, baixando depois a matéria à Comissão, onde efectivamente seria debatida e votada na especialidade, fazendo com que deste debate saísse não apenas uma autorização que pode ou não ser preenchida, mas uma lei que resolvesse de vez toda a problemática que se levanta com esta matéria.
Eu já agora gostaria de ouvir os deputados dos outros grupos parlamentares, uma vez que nós daríamos apoio a esta sugestão.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu penso que a Mesa não pode aceitar sugestões desse tipo a não ser que apareçam formalizadas.
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O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, sugeria então que o meu Grupo Parlamentar pedisse meia hora de intervalo, nos termos regimentais. Isso seria o tempo suficiente se, efectivamente, os outros grupos parlamentares entenderem que esse intervalo é necessário, para se fazer algum debate interno em termos de direcção ou de grupo parlamentar.
O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há aqui um mínimo de formalismo que nos cumpre respeitar.
Em primeiro lugar, é evidente que, surgindo esta proposta da parte da maioria, isto significa que automaticamente o Governo retira o pedido de autorização legislativa, mas é preciso que o Governo declare formalmente aqui à Câmara que o retira efectivamente. Só nessas condições terá sentido a apresentação de uma proposta da maioria, no sentido de virmos aqui a discutir um projecto de lei correspondente ao diploma que o Governo tinha apenso ao seu pedido de autorização legislativa. Mas, mesmo nesta perspectiva, nós consideramos que a apresentação, agora, na Mesa, de um projecto de lei correspondente ao texto do diploma anexo ao pedido de autorização legislativa do Governo inicia um novo processo legislativo e, em consequência disso, a conferência dos líderes dos grupos parlamentares deverá vir a agendar esse projecto de lei para uma data oportuna.
Da parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista existe toda a boa vontade no sentido de que se agende para data próxima a discussão desse projecto de lei. Mas não faz sentido e seria até um pouco caricato que, de repente, nós tivéssemos sido convocados aqui para discutir um pedido de autorização legislativa e nos víssemos confrontados com a discussão imediata de um projecto de lei.
Há um mínimo de formalismos a respeitar e a sugestão feita tem as suas virtudes, desde que estes formalismos sejam efectivamente respeitados.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta que foi feita, e que nos parece ainda insuficientemente desenhada, parece que comporta, neste momento, a apresentação de um projecto de lei com o preciso texto que acompanha o pedido de autorização legislativa do Governo, projecto esse que seria apreciado com dispensa de todas as formalidades. Isto, quanto a nós, viria a abrir um precedente em matéria de formalidades de duvidosa aceitação. Mas, mais do que isso, Sr. Presidente, queria lembrar à Câmara que os membros do Governo que neste momento aqui estão presentes não podem retirar o pedido de autorização legislativa, e não podem porque só o Conselho de Ministros pode deliberar enviar à Assembleia da República uma proposta de lei e só o Conselho de Ministros poderá retirar essa proposta de lei. Donde, os Srs. Membros do Governo sabem, tão bem como eu, que não podem neste momento retirar nada.
Por isso, se se mantém a proposta, com linhas pouco definidas, do Sr. Deputado Fernando Condesso, eu teria, do nosso lado, de pedir 10 minutos de intervalo para que o nosso Grupo Parlamentar se pudesse debruçar sobre a proposta e vir aqui trazer depois uma resposta devidamente ponderada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu queria chamar a atenção da Câmara para uma situação. Nós acabámos há 5 minutos de reunir em conferência de grupos parlamentares onde este problema se discutiu, mas esta hipótese não foi lá levantada de maneira nenhuma e, por isso, penso que estamos a perder tempo.
Vou conceder a palavra aos Srs. Deputados que me a estão a pedir, mas depois a Mesa tem que tomar uma decisão.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a solução que estamos tentando encontrar permitiria resolver duas coisas e que as objecções que ela merece poderiam ser, penso eu, ultrapassadas. Permitiria resolver, em primeiro lugar, o sentido e o conteúdo deste debate. Creio que, se bem que formalmente todos estejamos de acordo em que não se efectivou a demissão do Governo e que, portanto, formalmente a Assembleia da República poderá votar esta autorização legislativa, todos nós temos consciência de que politicamente essa discussão está um pouco esvaziada de conteúdo. E está tão esvaziada de conteúdo que o Sr. Ministro da Cultura já anunciou que em nenhum caso utilizaria a autorização legislativa, mesmo que ela viesse a ser concedida. Portanto, a Assembleia da República está aqui a fazer discursos para a acta...
Penso que isto não interessa rigorosamente a ninguém e, como tal, a Assembleia da República aproveitaria utilmente o seu tempo - e aproveitaria inclusivamente o trabalho das comissões competentes e dos deputados já inscritos para intervirem neste debate sem que ele sofresse nenhuma espécie de alteração no seu exacto alcance - se passasse a discutir o texto em concreto, que afinal se conhece, visto que fazia parte integrante do pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo.
Isso não é possível se for apresentado o projecto de lei, sabemo-lo todos, e ainda há pouco isso foi recordado pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira, mas é possível sob a forma de iniciativa legislativa dos deputados. Isso obrigaria, naturalmente, e para que não fosse constituído nenhum precedente, a que não só houvesse o despacho de admissão por parte da Mesa, como também a declaração expressa por parte de todos os grupos parlamentares de como não se opunham a esta alteração da ordem do dia, para que, conjuntamente com o pedido de autorização, passasse a ser discutido um projecto de lei hoje entrado e admitido.
Esse projecto de lei obrigaria também a dispensa, que também ela obriga a consenso mínimo, das formalidades de distribuição e publicação, e se todos estes consensos, repito, forem unânimes - e, por isso, penso que se houver precedentes será difícil que volte a repetir-se - penso que a discussão prosseguiria então naturalmente
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com um sentido útil, que seria o de a Assembleia da República se pronunciar em concreto sobre a defesa do património que a todos nós motiva e nos faz tão empenhadamente participar deste debate.
Daí o sentido da proposta que, pela nossa parte, apoiamos.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez para abreviar os nossos trabalhos, e porque o Sr. Deputado Magalhães Mota afirmou com toda a razão e muito claramente que a sugestão que avançava implicaria o consenso, isto é, o acordo de todos os grupos parlamentares, eu queria dizer que nós, pela nossa parte, não daremos o nosso consenso a uma solução deste tipo que quer tratar as coisas de afogadilho, embrulhadas umas com as outras, íamos, assim, sair de uma situação que nos parece não ter sentido para outra ainda mais esvaziada dele. E, então, se se entende que se deve, nas condições e com o significado que ela comporta, e parece que é o sentir, pelo menos, da maioria da Assembleia, discutir a inútil autorização legislativa a conceder ao Governo, discuta-se; se não, admita-se a retirada dessa proposta e a sua substituição por um projecto de lei.
Agora este esquema, em que não há urgência nenhuma que justifique este atropelar sucessivo de um mínimo de regras que devem presidir aos nossos trabalhos, é que me parece não ser possível. Não há nada que possa fazer-nos militar em favor de uma solução deste tipo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, face à posição assumida pelo Grupo Parlamentar da UEDS e assente que a solução sugerida pelos Srs. Deputados Fernando Condesso e Magalhães Mota só poderia resultar de um consenso unânime, nós não vamos naturalmente prosseguir nesta discussão, visto que estamos a atrasar desnecessariamente os trabalhos da Assembleia e vamos continuar com a nossa ordem do dia, que ainda há momentos foi ratificada na reunião dos líderes dos Grupos Parlamentares.
Está inscrito para fazer uma intervenção o Sr. Deputado José Manuel Mendes, do PCP, que tem a palavra.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uso da palavra para exprimir, em nome da minha bancada, algumas posições que gostaria que ficassem bem claras.
Desde há muito que tínhamos intenção de intervir neste debate, enunciando os nossos pontos de vista, que são bem conhecidos, que são claros e que são de longa data.
De todo o modo, face à circunstância verdadeiramente anómala em que se situa todo o quadro do debate, a nossa atitude, que foi expressa atempadamente pelo meu camarada Carlos Brito e posteriormente pelo meu camarada Veiga de Oliveira, não pode corroborar uma qualquer intervenção, neste momento, da minha parte. E isso porque, como é óbvio, nós estamos a favor da decisão que acaba, de algum modo, de ser tomada pela negativa nesta Casa e não podemos deixar de guardar para o momento considerado mais correcto, do ponto de vista político e do ponto de vista das instituições, o conjunto das intervenções que tivermos para fazer nesta matéria.
Anuncio, portanto, Sr. Presidente, a minha renúncia ao pedido de palavra.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Agora, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos que está pendente na Mesa.
Foi lido. E o seguinte:
Em reunião realizada no dia 20 de Dezembro de 1982, pelas 17 horas e 30 minutos, foram observadas as seguintes substituições de Deputados:
Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:
Luísa Maria Freire Cabral Vaz Raposo (círculo eleitoral de Lisboa) por Fernando Augusto Desterro Larcher Nunes (esta substituição é pedida para o dia 20 de Dezembro corrente inclusive); José Luís da Cruz Vilaça (círculo eleitoral de Braga) por António Mendes Carvalho (esta substituição é pedida por um período não superior a 19 dias, a partir do passado dia 18 de Dezembro corrente, inclusive).
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelo ' aludido Partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por maioria, com a abstenção do Deputado da União Democrática Popular.
A Comissão: Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Fernando José da Costa (PSD) - Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Jaime Adalberto Simões Ramos (PSD) - João Alfredo Félix Vieira Lima (PS) - Alfredo Pinto da Silva (PS) - Manuel de A. de Almeida e Vasconcelos (CDS) - Luís Carlos C. Veloso de Sampaio (CDS) - Armando de Oliveira (CDS) - Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Lino Carvalho de Lima (PCP) - Herberto de Castro Goulart da Silva (MDP) - Mário António Baptista Tomé (UDP).
O Sr. Presidente: - Vamos votar este relatório e parecer.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor
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do PSD, do PS, do CDS, do PCP, do PPM, da ASDI, do MDP/CDE e da UEDS e com a abstenção da UDP.
O Sr. Presidente: - Prosseguindo na nossa discussão, tem a palavra o Sr. Deputado Larcher Nunes.
O Sr. Larcher Nunes (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se o poder materializa a sociedade em Estado, a cultura é um dos mais vigorosos elementos de materialização da sociedade em comunidade. Esta funda-se pois naquela e ao adquirir a intemporalidade identifica-a.
Não merecerá, pois, discussão o saber do dever a fazer sobreviver, reviver, projectar e desenvolver o património cultural entendido no seu sentido mais lato.
Srs. Deputados, este dever tem sido infringido, malgrado os esforços realizados por alguns. Batida por vagas fortes de intempérie, votada ao esquecimento, essa herança que nos foi legada com o dever de transmissão tem sofrido um visível empobrecimento.
As normas positivadas desde o decreto de D. João v, que previa a salvaguarda das antiqualhas do Reino não tem sido suficiente para superar a destruição.
No presente, assumindo quer a forma passiva de incúria de impreparação e de ignorância, quer a adversidade positiva do surto demográfico e do lucro fácil, adiciona-se-lhe, por vezes, o desinteresse e mesmo a cumplicidade de certos titulares de entidades públicas facto que não pode deixar de merecer uma vigorosa reacção.
Os serviços públicos encarregados do património, ainda que contando pessoas dedicadas, são insuficientes e os primeiros a lamentarem a sua incapacidade de chegar a todos os pontos a que seria necessário.
São de todos conhecidas certas situações. Ainda há poucos dias recebi uma resposta esperançosa a um requerimento sobre a instalação do museu de Leiria de que algumas peças continuam a apodrecer no chão térreo. Mas já é decerto tarde para salvar, por exemplo, azulejos hispano-árabes que foram há uns anos no entulho, durante obras realizadas nas instalações onde se encontrava armazenado, o mobiliário apodrecido irrecoperavelmente e a pintura sobre vidro partida.
E permita-se-nos aqui referir também a título exemplificativo do património arquitectónico, a antiga igreja, do convertido em moagem, Convento de S. Francisco, em Leiria, cuja recuperação só agora se vai iniciar; a Quinta dos Marqueses de Belas, antiga residência real, cujo processo de deteriorização se vai acentuando, para não falar já do tão citado caso de Tibães ou do, transformado em aviário do exército, Convento dos Capuchos de Leiria, de que foram levantadas tampas sepulcrais nos claustros para plantar couves nos canteiros que outrora religiosamente haviam sepultado os frades.
Para alguns dos mais familiarizados com a legislação do património, a técnica tornou-se mesmo em permitir a destruição pelo mero abandono, por vezes com criminosa ajuda, para deixar de se justificar a classificação e a consequente protecção. Á política do facto consumado é hoje, neste campo, uma realidade infelizmente consagrada: depois da destruição invoca-se a inutilidade da classificação e consuma-se legalmente o que já fora preparado materialmente.
Srs. Deputados, não nos podemos iludir. Á verdade é que dez anos como estes últimos são passíveis de fazer quase desaparecer o pequeno património que faz a riqueza do nosso país.
E se referimos aqui o pequeno património, fazemo-lo porque os grandes monumentos, esses - supomos - não oferecem dúvidas na sua preservação.
Mas em Portugal o património não se consubstancia apenas nos grandes edifícios, assumam eles a grandeza dos Jerónimos, Alcobaça ou Batalha; em Portugal o património identifica-se também profundamente com a alma e a gentes, nos pelourinhos e nos cruzeiros, nos solares e nas habitações rurais, nas igrejas e nas capelas, na azulejaria e nas pedras armoriadas, nos arquivos e nas bibliotecas, no artesanato e no folclore, nos quarteirões contemporâneos e na arqueologia industrial.
Em Portugal o património é um pouco de todos nós que se vem esculpindo por formas variadas ao longo de uma demorada evolução.
Foram, aliás, situações como as supra mencionadas que vieram a traduzir-se, por forte reacção comunitária, no aparecimento de numerosos pequenos grupos de preparação assimétrica cujo objectivo é propugnar pela defesa dos valores históricos e culturais das suas regiões.
A defesa do património assume hoje, assim, por vezes, o carácter de polémica aguerrida entre quem sofre com sensibilidade a morte do irrecuperável, e indivíduos e entidades para quem outros escalões de interesse superam estes valores.
Conhecemos as dificuldades do Estado, das autarquias e dos particulares e julgamos que devemos pesá-las no equilíbrio das realidades, sendo esse também um aspecto que, a fim de evitar mais profundas fricções, qualquer lei base deve considerar e que a legislação complementar deve regulamentar, sob pena de ficarmos nos belos princípios... sabemos dos poucos recursos dos proprietários públicos ou privados e dos ónus impostos sem compensação.
Da situação a que se chegou permita-se-nos referir aqui dois casos que pela proximidade nos estão ligados. O caso já aqui falado da Torre de Tombo, cujas precárias condições são de todos conhecidas e em cujas instalações um incêndio faria desaparecer oito séculos de história sem meios de defesa adequados e para o qual só recentemente se começou a olhar em termos de eficácia, e Museu desta Assembleia, de que outro dia tive oportunidade de ver a principal estátua com os seus metros de altura, de gesso, à chuva, num depósito ao ar livre onde permanece desde que daqui foi levada.
Srs. Deputados, é neste contexto que surge o pedido de autorização legislativa acompanhado pelo projecto de decreto-lei que se propõe substituir a desordem normativa existente e o fulcro desse sistema, o Decreto n.º 20985, de 7 de Março de 1932, que prestou serviços importantes, é justo reconhecê-lo, mas cuja desactualização face às realidades se fazia, havia muito, sentir.
Ora, sendo esta uma questão em que supomos estar todos de acordo quanto ao fim, convém que observemos cautelosamente os meios.
Assim, merecem com certeza a nossa atenção e reflexão o conceito de consagrar o património e o alargamento da sua responsabilidade; a nova tipologia classificativa; as medidas de fomento e preservação e sanções adoptadas.
A primeira inovação é, com efeito, o alargamento do conceito de património cultural, no qual se englobam expressamente, pela primeira vez entre nós, os bens imateriais.
Por outro lado, a expressão «cultura portuguesa», permite que, numa lei condicionada por natureza à apli-
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cação territorial, não fique excluída a potencialidade da acção no mundo.
É que, Srs. Deputados, temos terra pátria, território que delimitamos, mas o nosso caso é daqueles que permite falar também duma mátria, espírito e identidade, espalhada pelo mundo, fundada nas gentes e na cultura, onde ojus sanguinis e o espírito superaram o jus solis.
Referiram-se-lhe Camões e António Vieira, continuamos a senti-lo passados séculos, realidade que esta lei não poderia esquecer.
É-nos grato ver também que a um alargamento do conceito de património correspondeu também um alargamento da responsabilidade da sua perservação, cujo eixo se desloca do Estado para a comunidade em geral, único garante global dessa defesa.
A segunda inovação a que aludiremos é, sem dúvida, um dos pontos de maior importância: a nova tipologia da classificação.
Nos imóveis ao lado da classificação de monumentos que vem substituir os dois graus existentes de monumentos nacionais e de imóveis de interesse público, que não tinham a justificá-los regimes jurídicos significativamente diferentes, surgem os conjuntos e sítios que permitirão uma mais eficaz e integrada defesa do património.
Com efeito, não é compreensível, em determinados casos, a preservação de edifícios isolados, que ficam desenquadrados e sujeitos aos problemas de escala pela alteração de um ambiente em que fiquem desintegrados.
Por outro lado, é ainda de frisar neste contexto o novo regime dos imóveis de interesse local.
Com efeito, o regime jurídico dos valores concelhios, consagrado na Lei n.º 2032, de 11 de Junho de 1949, não dava reais garantias sendo menos de que um escalão, uma ilusão para os serviços centrais. Dividem-se agora os 2 sistemas: o dos valores de carácter nacional e as classificações de mero valor local, a serem reconduzidas às próprias câmaras municipais, e que servirão de factor de empenhamento da autarquia municipal na defesa do património.
No respeitante aos bens móveis, consagrou-se também a figura de classificação, unitária ou conjuntamente, em colecção.
Um dos campos mais significativos desta lei, o mais vital para o património, é sem dúvida o das medidas de fomento para a conservação e valorização do património cultural.
Com efeito, da sua existência ou falta dependerá, em grande parte, o alcançar dos objectivos propostos, podendo-se considerar a sua actual inexistência concreta como uma das causas da realidade a que hoje se chegou.
São, pois, consagrados a este respeito 3 pontos fundamentais: as acções de levantamento, estudo, conservação e integração do património cultural e as acções de formação de técnicos, artífices e outro pessoal especializado; a consignação de percentagens do orçamento dos órgãos de administração central, regional e local, proporcional à importância dos bens que integram o património cultural sob sua responsabilidade, com objectivo de ocorrer à protecção, conservação, valorização e revitalização desses bens e participar financeiramente, quando for caso disso, nos trabalhos realizados nos mesmos pelos seus proprietários; o estabelecimento dos regimes fiscais apropriados. Parece-nos ser um ponto que deve merecer especial atenção. Com efeito, cada dia são mais os proprietários, públicos ou privados, que não têm meios para conseguir manter as casas sobre que, com a classificação, recaiem pesados ónus.
É, pois, socialmente justo e fulcral para a defesa do património que lhe sejam concedidos os meios para serem parte integrante da preservação do património que herdaram ou adquiriram que em grande quota parte sustentam com dedicação e muito sacrifício. E note-se que as medidas propostas têm de ser consagradas a breve prazo ou será inútil realmente legislarmos.
Só estas medidas, no contexto de outras como a consagração do regime especial do arrendamento dos imóveis classificados, alcançarão minorar as dificuldades existentes.
Por fim, cumpre destacar, no contexto das sanções, a responsabilização civil, administrativa e criminal dos funcionários ou agentes públicos do Estado, das regiões ou das autarquias, cujo efeito moralizador se fará, por certo, sentir.
Quanto aos proprietários, importa aqui relembrar que a sua efectiva responsabilização passará pela consagração penal do crime de destruição de bem próprio, que está por efectivar.
Não queria também deixar de referir algumas medidas importantes, como a consciência da especificidade do domínio arqueológico, o registo dos bens culturais e o averbamento de registo predial dos bens imóveis classificados, bem como a emissão dos livretes ou certificado de registo para os bens móveis classificados.
Na globalidade do diploma parece-nos, porém, que seria de atender a 2 aspectos convictos: o da consagração, em determinados casos a regular, do direito de preferência familiar, nos casos previstos no artigo 14.º, cujas realidades nos apontam como fundamental e que levantam quotidianamente questões. A família desempenha neste campo um papel capital, que urge estimular e que é insubstituível. Sejam-lhe, pois, concedidos os meios justos de manter ou fazer permanecer nas suas mãos aquilo que com o mais profundo empenho tenham defendido, reservando-se uma efectiva tutela, advinda da classificação, para os que não estão à altura das suas responsabilidades e deveres.
O outro, a da fundamental consagração das linhas de crédito bonificado. Propomos a este respeito a consagração de alterações, aliás, já propostas pela comissão encarregada de elaboração do decreto-lei.
No artigo 41.º, n.º 2, propomos o aditamento de duas alíneas, b) e d), em substituição das actuais, que seriam do seguinte teor:
b) Dedução, para efeitos do imposto complementar, até 20% do rendimento global, das despesas de conservação, recuperação, restauro e valorização dos bens classificados e dos juros das dívidas contraídas para a aquisição ou conservação de bens imóveis classificados.
d) O abatimento à matéria colectável em imposto complementar do proprietário ou detentor do imóvel, considerando-se, também, para esse fim e como despesa, os juros e as amortizações de empréstimos concedidos para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 12.º
Quanto ao n.º 3, propõe-se o seguinte:
3 - O Governo deverá promover o estabelecimento de regimes fiscais especiais, no caso de doa-
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coes ou outras liberalidades feitas a favor de instituições públicas ou de instituições particulares de utilidade pública que tenham por fim a preservação, a defesa ou a divulgação do património cultural.
Na mesma linha, propomos um novo artigo que é do seguinte teor:
1 - O Governo promoverá o apoio financeiro ou a possibilidade de recurso a formas especiais de crédito para obras e para aquisições, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 12.º e do n.º 2 do artigo 14.º, em condições favoráveis a proprietários privados, com a condição de estes procederem a trabalhos de protecção, conservação, valorização e revitalização dos seus bens imobiliários, de acordo com as normas estabelecidas sobre a matéria e a orientação dos serviços competentes.
2 - Os benefícios financeiros referidos no número anterior poderão ser subordinados a especiais condições e garantias de utilização pública, a que ficarão sujeitos os bens em causa, em termos a fixar caso a caso pelo Ministério da Cultura e Coordenação Científica.
Só com medidas concretas deste tipo poderemos, efectivamente, caminhar para a salvaguarda real do património.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nos fins do século passado dizia um membro do nosso Parlamento, referindo-se ao património a propósito da candente questão da Torre de Belém, que já não se encontrava isolado, pois estava acompanhado por mais cinco colegas. E acrescentava: «com V. Ex.ª Senhor Presidente o número vai crescendo e como uma bola de neve há-de aumentar de modo a podermos fazer alguma coisa de útil e de real dentro de breve prazo». Decorria a sessão de 5 de Maio de 1898.
Foi volvido quase um século e a promessa ficou por cumprir. Hoje são muitos mais de 6 os Deputados que se pronunciam pela salvaguarda do nosso tão ameaçado património, a cujo empobrecimento sistemático urge pôr cobro. A bola de neve cresceu tanto como as ameaças ao património. À sua dimensão fará, pois, aqui pender - por certo - correctamente para a solução legislativa adequada.
Sabemos, porém, que não bastam os princípios legislativos. Torna-se necessária a sua concretização e são necessários os meios reais e as condições ao desenvolvimento da actividade, sob pena de simples e total ineficácia dos preceitos consagrados.
É que não basta inventariar classificar ou arrolar, torna-se imperioso que existam condições reais de salvaguarda de património.
Que se façam os museus com carácter subsidiário e que se mantenha vivo o património que tem condições para tal, criando-se as necessárias medidas.
Pela nossa parte, Srs. Deputados, julgamos que este decreto-lei é um bom princípio, mas gostaríamos de esperar que não se esgote em si e constitua o início de um caminho adequado e seguro à realização da finalidade que urge alcançar e cujo devir saudamos esperançosamente.
Por último, não gostaríamos de deixar de recordar, no ambiente de hoje, que esta é, salvo erro, a quinta proposta apresentada pós 25 de Abril, que não chega a ser aprovada.
Aplausos do CDS, do PPM e de alguns Deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.
O Sr. Sousa Lara (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começo por felicitar o Governo pelo excelente trabalho que realizou no domínio, tão necessitado que é, da defesa e promoção do património cultural, apresentando um projecto de decreto-lei que se afigura como uma verdadeira lei-quadro do referido património.
O Sr. Castro Caldas (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Vivemos até ao presente momento numa situação profundamente carente de legislação adequada que permita às instâncias públicas poder decidir com celeridade e eficazmente, não só preservando da destruição do tempo e dos homens os monumentos que constituem a memória do nosso povo, por serem essenciais à nossa cultura, como também criando condições de valorização social e económica desses mesmos espólios, mantendo-os vivos no quotidiano das gentes e das comunidades, mais pelas funções que continuem a ter do que pelo registo daquilo que foram.
O governante que queira levar a cabo estes desideratos no Portugal de hoje terá de o fazer para além da lei, se não mesmo contra a lei. Daí a urgência desta legislação.
Um segundo elogio vai para esta Assembleia em geral e para a Comissão de Cultura, em particular.
É sempre grato para um crente nas insubstituíveis virtudes do parlamentarismo verificar, mais uma vez, o alto nível e a produtividade conseguida dentro da Comissão de Cultura desta Assembleia da República, na melhoria do texto anexo à proposta de lei. A equipa do Ministério da Cultura, mostrando a maior abertura para o acolhimento das propostas de alteração e aditamento formuladas por representantes de todos os quadrantes políticos, minimizou, em nosso entender, os inconvenientes decorrentes da fórmula adoptada para a discussão deste tema, que preferiu, por irrecusáveis motivos de celeridade e urgência, ao processo do projecto de lei-quadro do património cultural, a figura da autorização legislativa.
Em sede de comissão foram, assim, apresentadas as principais alterações e aditamentos que o meu grupo parlamentar entendeu dever sugerir para a melhoria do texto apresentado. Destacarei em primeiro lugar é relativamente à base 34.º, a sugestão relativa ao alargamento temporal da obrigação geral da participação de achado arqueológico, generalizando esse dever aos casos já verificados.
Por outro lado, no que toca à base 17.º, propusemos o estabelecimento de um prazo suficiente para a produção camarária dos planos de salvaguarda dos conjuntos ou sítios a classificar pelo Governo. Visa-se, realisticamente, incentivar os municípios à pronta produção sob sua responsabilidade dos referidos planos, e bem assim, na falta destes em prazo razoável, tornar concreta a transferência dessa responsabilidade para o Instituto do Património Cultural, embora em termos de elaboração oficiosa.
Parece-nos igualmente muito importante a incumbência, que propusemos coubesse ao Governo, de publicação do inventário do património cultural portu-
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guês classificado. Vêm, desde há bastantes anos, sendo publicados, sobretudo através das extintas «juntas distritais», inventários distritais do património artístico. Normalmente são obras de grande qualidade e interesse, mas de grande raridade e elevado custo.
Gora-se, assim, uma das suas principais missões potenciais, que é a da divulgação pedagógica. A ignorância é o pior inimigo do património cultural de qualquer nação.
O Sr. António Moniz (PPM): - Muito bem!
O Orador: - Caberá aqui, ainda, ressaltar a necessidade de rever o título relativo às sanções, em articulação com a lei penal geral, de forma a tornar mais eficaz o efeito de prevenção que se deseja obter destes preceitos.
Igualmente alertámos o Governo para a necessidade de equiparar a coisas indivisíveis as colecções e conjuntos classificados cuja integridade material não seja forçosa mas cujo significado se abale pela desunião das peças que os compõem. Nesta mesma lógica, cabem os arquivos de manuscritos familiares ou de instituições. A lei das sucessões terá de se adequar igualmente a esta necessidade.
Aliás, relativamente a arquivos particulares de interesse histórico, pensamos que seria interessante prever na lei a regulamentar oportunamente, modalidades de acordo entre o Estado e os proprietários para depósito desses arquivos, a pedido dos mesmos, em arquivos públicos, à semelhança do que acontece em vários países europeus, em face dos problemas resultantes da inadequação das modernas habitações para a conservação de tais arquivos e com as vantagens inegáveis que a sua disposição à consulta dos estudiosos viria permitir.
Quanto aos arquivos públicos penso ser oportuno referir a necessidade premente de providenciar a elaboração e publicação de índices dos seus fundos documentais mais importantes. Ainda hoje há nos arquivos públicos portugueses muitos metros cúbicos de documentação histórica que não tem qualquer utilidade prática, social e cultural, por não estar minimamente catalogada e inventariada. A feitura e publicação dos referidos índices permitirá aos investigadores nacionais e estrangeiros o acesso fácil à preciosa documentação que os nossos arquivos nacionais e distritais encerram, contribuindo, assim, para que esse nosso património monumental, único no mundo, sirva, valorizadamente, o engrandecimento da cultura.
Finalmente, gostaríamos de referir a necessidade de desenvolver regulamentação sobre a defesa e promoção do património etnográfico português. Essa regulamentação não envolve tão-só o Ministério da Cultura, pois ligar-se-á, forçosamente, com questões de emprego, de comércio interno e externo, de turismo e de educação. Daí que mereça um tratamento relativamente autonomizado, se bem que, do mesmo modo, urgente.
No que toca ao património construído e ao património etnográfico, quer de natureza material, quer espiritual, mostram-se de particular significado e valor as monografias locais. Infelizmente, ainda vastas zonas do país se não encontram retratadas em monografias locais. O interesse destas edições é, obviamente, multifacetado.
O ensino e o turismo são os seus principais beneficiários. Num país que tem grande parte da sua população activa radicada no estrangeiro, por motivos fundamentalmente económicos, muitas vezes com risco de progressiva desvinculação da sua comunidade originária,
a edição e divulgação de monografias locais pode ter um adicional sentido eminentemente patriótico, ético e social.
Uma última referência vai para as inúmeras associações de defesa do património que espontaneamente se têm constituído por todo o país, como testemunho do interesse das populações pelo futuro do seu passado colectivo. O carinho, dedicação e competência com que desinteresseiramente se têm empenhado na nova cruzada da salvaguarda do património cultural deve merecer, por parte das instâncias públicas centrais e locais, um apoio e uma atenção crescentes, como colaboradores a privilegiar numa dinâmica em que interessam sobretudo os objectivos e menos os instrumentos.
A cultura é uma área de entendimento para os portugueses. Integremo-nos afoitamente na sua irresistível força centrípeta e façamos o que deve ser feito bem e depressa.
Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.
O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É óbvio que não vou proferir aqui a intervenção que tinha inicialmente preparado para este debate na medida em que não faz sentido discutir aquilo que manifestamente já não existe na prática.
Limito-me a sublinhar que desta forma se confirma a tese que defendemos em sede de Comissão Parlamentar de Cultura e Ambiente: este pedido de autorização legislativa por parte do Governo representava, acima de tudo, uma prova de desconfiança na própria estabilidade governamental.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Lamentavelmente, nem com um pedido de autorização legislativa o Governo conseguiu ver aprovada dessa forma expedita uma lei-quadro de Defesa do Património, e digo «lamentavelmente» não por causa do Governo, como é óbvio, mas por causa do estado em que se encontra esse património que bem carecido anda de uma lei definidora da sua defesa. Esta lei que o Governo pretendia aprovar não era a melhor; no entanto, com as modificações que lhe pudessem ser introduzidas, com a colaboração de todos os grupos parlamentares, representaria um passo em frente no sentido da defesa do nosso património.
Estou convicto de que esta Assembleia da República poderá assumir em breve as responsabilidades que lhe competem nesta matéria por força da própria revisão constitucional uma vez que, não nos esqueçamos, na recente revisão constitucional foi cometida à Assembleia da República uma reserva de competência legislativa no que respeita às bases gerais do regime de defesa do património cultural. Há males que vêm por bem e o facto desta autorização legislativa estar já, na prática, anulada significa que a Assembleia da República assumirá por inteiro, assim estou certo, a sua responsabilidade nesta matéria.
Aplausos do PS, da ASDI, da UEDS e de alguns deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
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A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 106/II, que visa uma autorização legislativa, tem, quanto a mim, o mérito de apresentar à discussão e apreciação da Assembleia da República uma lei-quadro que reflecte uma noção moderna, europeia e humanista do património cultural. Congratulo-me, por isso, que seja uma proposta de lei do Governo a cuja maioria parlamentar pertenço.
Como já há pouco referi, quando diz um protesto relativo a uma intervenção da Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, cabe salientar que a defesa cultural do passado do nosso povo é, para mim e, penso, para todos os portugueses, uma exigência de identidade nacional. Creio, porém, que não será despiciendo chamar a atenção para a reflexão que nos merece, ou nos deve merecer, toda a problemática ligada à preparação do futuro do presente já que a conservação, a reabilitação e a descoberta do passado cultural consubstancia uma preocupação do futuro do nosso passado.
O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Cingindo-me ao plano mais restrito do património arquitectónico urbano, convém destacar que a sua protecção não pode deixar de ser enquadrada, ou melhor, integrada no urbanismo como recomenda a Carta de Veneza. Aí se inserem as grandes questões ligadas ao problema da recuperação dos imóveis dos bairros antigos dos velhos burgos que são o enquadramento natural e histórico das catedrais, das Torres, dos Palácios, dos Cruzeiros, em sumo, das velhas pedras.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Saliento aqui e agora o alto contributo que o Sr. Deputado Carlos Lage, do Partido Socialista, deu a esta matéria ao apresentar um projecto de lei sobre a recuperação da zona histórica da cidade do Porto, que eu, como deputada eleita pelo círculo eleitoral do Porto desde os tempos da Constituinte, saúdo, a despeito de sérias objecções que me merece e independentemente da anunciada apresentação de um outro projecto de lei do meu grupo parlamentar com o mesmo objecto.
É que subjacente àquela ideia da protecção do património está, não a ideia privatística da propriedade mas a concepção de que aquilo que é público deve ser recuperado solidariamente por todos e para todos, isto é, com um poder de atracção cultural capaz de integrar todos os homens.
Por isso quero lançar a ideia de que o ano de 1983, seja considerado o «Ano Português do Património Cultural», no ano em que se realiza em Portugal uma exposição de Arte, Ciência e Cultura do Conselho da Europa cujo tema será «As Descobertas Portuguesas e a Europa do Renascimento».
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Quero ainda sugerir que o Ministério da Educação e das Universidades e o Ministério da Cultura e Coordenação Científica, com a cooperação do Instituto do Património Cultural, publiquem em 1983, um manual escolar sobre o património cultural português.
O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Tal iniciativa teria a vantagem de interessar os jovens na protecção do património cultural globalmente considerado, como contribuiria ainda para a educação de adultos.
Creio, porém, que também seria desejável que se procedesse à divulgação de obras de arte antiga, contemporânea e moderna através de edições acessíveis às modestas posses da maioria dos portugueses. Além disso, também poderia haver a divulgação através de filmes, fotografias, vídeo, etc., o que seria um veículo altamente poderoso com vista à educação estética e à apreciação do alto valor que cabe à herança cultural legada.
Merece ainda a minha concordância a preocupação por parte do Governo da formação profissional, que teria de se revestir de um carácter altamente especializado, e não quero deixar de lembrar que, à sombra do Conselho da Europa, existe uma escola, chamada a Escola de São Sérvulo, que funciona na Ilha de São Sérvulo, em Veneza, que contribui para a recuperação da cidade de Veneza, e para a formação de profissionais para a recuperação de obras de alto valor histórico. Creio bem que o Conselho da Europa tem dado uma contribuição notável à recuperação do património arquitectónico e histórico, não só através da Conferência dos Poderes Regionais e Locais, como através de todas as actividades da sua Comissão de Educação e Cultura.
Suponho, portanto, que esta proposta de lei, que vai no sentido de ser criada a lei-quadro do Património Cultural Português, é uma ideia de grande oportunidade, tanto mais que, como já salientei, o próximo ano será o ano em que Portugal vai acolher o Conselho da Europa e uma exposição que, por certo, vai trazer ao nosso país grandes intelectuais e políticos tal como aconteceu em Florença com a exposição de pintura do «Cinquecento».
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Ministro da Cultura e Coodenação Científica, regozijo-me, portanto, com a apresentação desta proposta de lei. Como referiu no seu discurso, V. Ex.ª espera e deseja o contributo dos deputados na melhoria dessa proposta através de sugestões e propostas e para isso será desejável que todas as associações que tenham em vista a preservação do património cultural português tenham uma palavra muito significativa no que respeita a este tema que é do interesse, não só do Governo da Aliança Democrática, mas, sobretudo, do povo português.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há pouco mais de um ano, este Governo lançou-se na defesa de interesses reaccionários tentando mascarar essa defesa com ares de consenso e da qual a cultura seria factor fundamental.
Essa ingente tarefa foi de tal forma mal sucedida que os próprios promotores do consenso se zangaram entre si e, hoje, assistimos ao espectáculo de uma AD desagregada, com um PSD desorientado e em crise profunda; com um CDS tentando tirar os «cavalos da chuva» e sem grande coerência interna, embora se vá escudando por detrás do Sr. Professor; com um Primeiro-Ministro que
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desistiu de o ser sob a alegação que é preciso salvar o partido já que nada é capaz de salvar o Governo.
Aceitar discutir nestas condições o pedido de autorização legislativa presente ao Parlamento não tem qualquer sentido político nem sequer prático. Por estes motivos, prescindo do meu pedido de palavra, reservando a apresentação das posições da UDP para um momento mais oportuno e adequado à seriedade e relevância da matéria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Lucas Pires.
O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica: Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria, antes de mais, dizer o seguinte: é evidente que não seria com nenhuma espécie de prazer que eu viria aqui reinterpretar a fábula do leão moribundo. Vim para esta Assembleia realmente com o sentido de que estava a cumprir e a exercer normalmente uma competência constitucional com respeito pela Constituição, pelo Governo, pelo Presidente da República.
A verdade é que o Governo não caiu, o Governo não é sequer ainda um Governo de gestão, o Governo pode amanhã ou depois de amanhã, na plenitude da sua competência, aprovar decretos-leis e, no caso de haver autorizações legislativas, é evidente que o Governo pode, inclusive, convocar, propositadamente, um conselho de ministros para, no fundo, fazer actuar essas autorizações.
Portanto, embora o Primeiro-Ministro tenha anunciado ao país a sua demissão, o Governo ainda não caiu.
Além disso, é preciso que as instituições democráticas evitem o nervosismo, sobretudo em situações de crise. As instituições democráticas devem aguardar calmamente que o gongo soe para elas porem termo às suas funções. Ò gongo deste Governo não soou e, portanto, não podemos abandonar o barco, dando exemplos de demissionismo a todo o país.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Acho que as instituições democráticas devem desempenhar um papel exemplar perante o país, não apenas quanto aos conteúdos daquilo que fazem mas também quanto aos métodos e aos processos que usam. No fundo, foi o exemplo dessa presença que nós também pretendemos assegurar aqui.
Por outro lado, é claro que a Assembleia da República é soberana, e quando solicitei a palavra pela segunda vez a minha intenção era a de pedir licença para me retirar do Plenário até que a Assembleia decidisse se devia ou não votar esta autorização legislativa. A Assembleia estabelece, aqui, na sua própria casa, as regras do jogo que entender por convenientes e o Governo nada tem a ver com elas.
Aplausos do CDS, do PPM e de alguns deputados do PSD.
Aliás, se me é permitido fazer alguns comentários de constitucionalista, eu diria que este Governo não cai na Assembleia. Um Governo só cai na Assembleia através de uma moção de censura e, portanto, não podia nunca cair sob o pretexto de uma autorização legislativa.
Neste sentido, não se deveria permitir que um debate de uma autorização legislativa sobre o património cultural se transformasse exactamente num debate político que reconhecia e passava uma certidão de óbito sobre a queda do Governo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Julgo que essa atitude seria perfeitamente inadequada, e foi isso que quis sublinhar. De resto, na Constituição e no Regimento da Assembleia da República não existe a figura da caducidade política da autorização legislativa. Essa figura não existe de todo em todo, e portanto acho que teria sido um bom exemplo se todos os grupos parlamentares tivessem contribuído serena, e não nervosamente, para o debate deste diploma, até ao fim.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
Em democracia não há apenas que fazer coisas úteis, antes há que cumprir os vários deveres e, em primeiro lugar, é para isso que aqui estamos.
Quero ainda agradecer a contribuição que os vários grupos parlamentares deram para o debate desta questão. Julgo que grande parte dos problemas levantados poderão ser resolvidos com uma série de diplomas complementares, que são nada menos do que sete, e que estão pendentes no Conselho de Ministros para aprovação. Alguns deles contemplam questões aqui suscitadas, por exemplo, pelo Sr. Deputado do PPM, como as bibliotecas e arquivos -problema, aliás, também suscitado pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho -, outros dizem respeito ao horário dos museus, à condição dos funcionários e a vários outros aspectos da legislação do património cultural português.
No trabalho que tem sido desenvolvido pelo Ministério da Cultura há também uma permanente atenção e colaboração com as associações de defesa do património. O Sr. Secretário de Estado da Cultura esteve presente no II Congresso das Associações de Defesa do Património. Nesse congresso estiveram igualmente presentes vários representantes do Ministério da Cultura, foram colhidos vários ensinamentos que se destinavam a ser postos em prática. Existe, portanto, um trabalho que foi prosseguido.
Tive já ocasião de dizer que durante este ano o Conselho de Ministros aprovou uma resolução nos termos da qual todos os anos será escolhido um monumento nacional para o qual será votada, no Orçamento, uma verba especial. No próximo ano será o Convento de Cristo, em Tomar, para o qual está reservada uma verba de 29 000 contos para restauros imediatos. Há mais 4 monumentos numa lista de espera imediata, alguns, porém, exigindo recursos que não estariam disponíveis para o ano de 1983. É o caso, por exemplo, do Convento de Tibães, em relação ao qual, aliás, já foram tomadas medidas que me dispensaria de citar aqui.
Foram igualmente tomadas medidas quanto à sensibilização do património aqui aludida, e muito bem, pela Sr.ª Deputada do Partido Social-Democrata. Em relação aos emigrantes em particular foi realizada uma exposição com circulação nas principais capitais europeias onde se encontram os emigrantes portugueses, chamada «Casas novas, paisagens antigas», precisamente com o objectivo de os sensibilizar para o respeito pelo nosso património.
A 17.ª Exposição pode resolver problemas fundamentais de financiamento. Basta dizer que recentemente, no mês de Agosto, foi possível, através de uma
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técnica especial, duplicar o orçamento da 17.ª Exposição a fim de se poder restaurar cinco importantes monumentos na área de Lisboa.
Uma vez que o tempo de que dispunha está a terminar, não vou mais longe. Porém, quero apenas salientar que não houve nenhuma urgência neste pedido de autorização legislativa. Só existe uma coisa urgente, que é o património cultural português.
Esta autorização legislativa teve todo o sentido para quem percebe o profundo significado cultural dos próprios símbolos e daquilo que é a discussão dos temas que aqui se trataram a respeito do património cultural.
Agradeço, pois, a todos aqueles que colaboraram utilmente nesta discussão.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem, estamos sobre a hora regimental, mas só há neste momento 2 pedidos de palavra, julgo que para solicitar esclarecimentos ao Sr. Ministro, que penso não serem muito demorados. Sabendo-se que estava prevista a continuação da sessão para depois de jantar, parece-me que poderemos continuar os trabalhos até à votação e encerramento dos nossos trabalhos.
Visto que não há oposição, concedo a palavra ao Sr. Deputado António Reis.
O Sr. António Reis (PS): - Pedi a palavra para fazer um curió protesto face à intervenção que o Sr. Ministro da Cultura acabou de proferir.
O Sr. Ministro referiu-se ao nervosismo dos grupos parlamentares da oposição que puseram em causa o sentido útil do debate de hoje sobre o pedido de autorização legislativa do Governo. Se nervosismo houve esta tarde ele está inteiramente do lado da maioria parlamentar...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... que não hesitou, sequer, em fazer sua uma proposta no sentido de transformar, de afogadilho, um pedido de autorização legislativa num projecto de lei dessa própria maioria.
Vozes do PS, do PCP e da UEDS: - Muito bem!
O Orador: - Que maior prova de nervosismo, de hesitação, de incapacidade de resposta ao problema concreto que as oposições aqui levantaram do que esta atitude da maioria parlamentar?
Pela nossa parte, mantivemos uma atitude perfeitamente serena e calma até porque, como referi há pouco, estou convencido de que se o Governo não puder assumir as suas responsabilidades nesta matéria, em consequência da sua própria demissão que se antevê a curto prazo, a Assembleia da República saberá assumir as suas responsabilidades em matéria de legislação de defesa do património.
Não há, portanto, motivo para qualquer nervosismo da nossa parte. Saberemos aguardar o momento em que aqui, nesta mesma Câmara, assumiremos as nossas responsabilidades fazendo aprovar um diploma que defenda efectivamente o nosso património.
Por outro lado, devo referir também que não faz sentido o Sr. Ministro vir aqui falar-nos de qualquer Conselho de Ministros que se realize nos próximos dias para eventualmente fazer uso de uma autorização legislativa que hoje, eventualmente também, lhe seja concedida. Porque, como decerto não ignora, essa autorização legislativa, se vier aqui a ser aprovada, precisa igualmente de ser promulgada pelo Presidente da República, publicada no Diário da República, e só depois desse moroso processo burocrático é que o Conselho de Ministros poderá fazer uso da presente autorização legislativa. Ora, como é óbvio, nessa altura o Governo já estará morto.
Aplausos do PS, da UEDS e de alguns deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro Lucas Pires pretende responder imediatamente?
O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica: - Pretendo apenas dar um pequeno esclarecimento, que era o seguinte: não falei de nervosismo dos grupos parlamentares, disse sim que era preciso evitar o nervosismo em situações de crise por parte de órgãos do Estado. Foi isto que eu disse muito concretamente.
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é também para um protesto.
Em nosso entender, o Sr. Ministro da Cultura, com a interpretação que entendeu dever dar à atitude que o Grupo Parlamentar da UEDS tomou sobre este debate, procedeu apenas, publicamente, a uma desautorização da vontade política do Primeiro-Ministro em pedir a demissão. Não é responsabilidade de um grupo parlamentar da oposição que a decisão de demissão de um Primeiro-Ministro não tenha sido tomada em Conselho de Ministros mas, sim, no Conselho Nacional do respectivo partido.
Nós discordamos da sua interpretação constitucional. Na realidade, as autorizações legislativas caducam com a demissão do Governo - é o que diz o artigo 168.º, n.º 4, da Constituição - e por isso, em nosso entender, autorizar o Governo a legislar quando ele, Governo que é autorizado a legislar, se quer ir embora é apenas um mero exercício de masoquismo legislativo. Não terá a nossa colaboração nessa atitude masoquista.
Naturalmente que nesta matéria nós seremos aqueles que estamos mais calmos. Não estamos, pois, particularmente nervosos. Parece-nos, isso sim, que existe nervosismo em quem pretende aprovar de afogadilho uma autorização legislativa, por parte de quem, tendo neste momento clara e inequivocamente uma guia de marcha, não sabe se no futuro horizonte governativo pudera estar aqui a reeditar a iniciativa legislativa relativamente à qual, com tanta urgência, pretende agora forçar a votação.
Mas, pela nossa parte, podemos tranquilizá-lo porque o património cultural não depende deste Governo.
O Sr. Mário Tomé (UDP): - Felizmente!
O Orador: - A defesa do património cultural português não depende de facto desta iniciativa legislativa. Nós cá estaremos para garantir a legislação sobre esta matéria sem pressas excessivas e no respeito dos preceitos legais que é o que nos move na questão que levantámos.
Aplausos da UEDS e de alguns deputados do PS.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Lucas Pires para contraprotestar, se assim o entender.
O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica: - Sr. Deputado António Vitorino, quero apenas dizer que não quero estar atrasado nem adiantado. Eu estou aqui exactamente no meu passo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Julgo que alguns grupos parlamentares se quiseram adiantar. Eu simplesmente - repito - não me quis atrasar nem adiantar.
Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.
O Sr. Presidente: - Visto não haver mais oradores inscritos, está encerrado o debate.
Vamos votar na generalidade a proposta de lei n.º 106/II, que autoriza o Governo a legislar sobre o património cultural português.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM, votos contra do PCP, da ASDI e da U DP e as abstenções do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do Partido Comunista Português relativamente aos pedidos de autorização legislativa é conhecida. Não é de modo nenhum uma instituição que nos seja cara, bem pelo contrário pois normalmente a ele nos opomos com vigor.
No caso concreto não deixámos de ter em consideração o articulado com que era instruído este pedido de autorização legislativa por parte do Governo. Pareceu-nos que tal articulado constituía um primeiro passo que, com todo o trabalho que vinha sendo desenvolvido no seio da comissão, acabaria por se tornar verdadeiramente positivo no sentido da criação de uma verdadeira ordem jurídica do património cultural em Portugal.
Daí que, inicialmente, a nossa posição fosse no sentido de uma abstenção no momento da votação concreta.
Participámos activamente no debate em torno das soluções preconizadas pelo diploma no seio da Comissão de Cultura e Ambiente, demos o nosso contributo irrecusável e de modo pronto e solícito nos diferentes momentos por que passou o articulado em causa. Como sempre, estamos dispostos a considerar, ulteriormente, noutras sedes e nesta mesma Câmara, outras leis que venham a dar conteúdo concreto à necessidade da organização do nosso património. Não há da nossa parte qualquer espécie de demissionismo. Não se compreende por isso o teor das intervenções que sob esse aspecto foram produzidas pelo Sr. Ministro Lucas Pires e que eram, a meu ver, perfeitamente dispensáveis e claramente infelizes.
Não se compreende ainda por uma outra razão: é sabido que, concretamente, nesta matéria, o Partido Comunista Português tem dado, pelos mais variados meios, um contributo decisivo para a formação de ideias e para a constituição prescritiva de uma verdadeira ordem jurídica sobre o património cultural português. Basta lembrar iniciativas legislativas e intervenções da minha bancada em tempos que já lá vão e que continuam ainda hoje represtinados.
De qualquer modo, não poderíamos deixar de atender hoje às circunstâncias concretas em que este debate teve lugar. Estamos diante de uma situação em que o Governo quase já o não é, em que o Governo já não poderá utilizar eficazmente e com cabal legitimidade política o pedido de autorização legislativa que nos era presente, não se justificando portanto que aqui se processe a um debate aprofundado, perfunctório ou não, de uma matéria que de algum modo estava arredada da ordem das preocupações imediatas e se subtraía por inteiro à legitimidade de qualquer solução correcta face ao momento em que vivemos.
Foi isto que dissemos de um modo transparente, de um modo claro, de um modo frontal, o que não significa que tivéssemos sonegado o nosso contributo ou que nos tivéssemos afastado de uma participação correcta nestes domínios.
Uma vez mais chamo a atenção para a parte da intervenção do Sr. Ministro que, no tocante a estas questões, se me afigurou perfeitamente incorrecta.
Este Governo, que para bem do povo português não tardará a cair, não é de modo nenhum um património que interesse preservar. Bem pelo contrário, trata-se de um desconjunto absoluto de roídas, gastas e inconsistentes pedras que nem neste momento de despedida merecem de nós o chamado coup de chapeau.
Por isso não será de estranhar que, agravada toda esta matéria pelas circunstâncias concretas em que este debate ocorreu, a nossa posição tivesse sido justamente aquela, a do voto contra. Agindo de outro modo, isso significaria a nossa colaboração com um processo relativamente ao qual não poderíamos estar de acordo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas para dizer que a nossa abstenção não significa, de maneira nenhuma, uma tomada de posição em relação à substância da questão que aqui está a ser discutida, ou seja, o pedido de autorização legislativa e o texto que acompanha esse mesmo pedido.
A nossa abstenção quer demonstrar, muito claramente, o nosso alheamento face a um processo totalmente destituído de sentido, um processo que, como teve ocasião de dizer a Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, falando em nome do Grupo Parlamentar da UEDS, assume os contornos de uma farsa e tenta dar à maioria as ilusões de que carece para ir sobrevivendo: a de que o Governo continua, a de que o Governo não está demissionário, a de que concede autorização legislativa a um Ministério da Cultura, que não se vai sentando ao pé da porta esperando a oportunidade de sair, pois não terá tido a agilidade que outros seus colegas tiveram para abandonar o navio antes de ele soçobrar - honra lhe seja feita!
Nessa montagem, tendente a criar todas essas ilusões que podem dar uma alma nova à maioria, nós não colaboramos. É esse o sentido exclusivo da nossa abstenção: a não colaboração no processo que aqui se verificou esta tarde.
Aplausos da UEDS e do PS.
O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.
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A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: À primeira vista, neste debate o MDP/CDE teve um comportamento diferente dos outros grupos da oposição.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Muito bem!
A Oradora: - Isso advém de que a leitura da situação concreta e real leva-nos a respeitar formalmente as situações.
O nosso propósito de votar contra a autorização legislativa pedida pelo Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica, Lucas Pires, foi desde o primeiro momento em que lemos o seu pedido de autorização. Lamentamos muito que o tenha feito.
As leis do património cultural são da responsabilidade desta Assembleia, e, nestas circunstâncias, devia ser esta Assembleia a discuti-las publicamente. O Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica podia fazer as suas reuniões com as associações culturais, com as associações do património, e te.; contudo essas reuniões serviam apenas para o informar. Em matéria reservada da Assembleia da República, quem põe em discussão os projectos de lei ou as propostas de lei é a Assembleia da República, é a Comissão de Cultura e Ambiente. Desta forma, o processo estava errado.
A nossa discordância para com este Governo foi desde o primeiro dia. É evidente que aguardamos com boa vontade que a situação se modifique, e por isso nos bateremos como sempre o fizemos desde que o actual Governo tomou posse.
Em todo o caso é diferente tomarmos uma posição a priori do que tomarmos uma posição relativa à situação. Nós pensamos que tomámos uma posição relativa à situação e à nossa convicção de que a democracia representativa só tem realmente representatividade quando tem participação popular, e essa participação popular foi retirada pelo pedido de autorização legislativa.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Barrilaro Ruas.
O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PPM votou a favor desta autorização legislativa e lamenta que as circunstâncias do momento, ou a leitura talvez apressada dessas circunstâncias, feita por alguns grupos parlamentares, tenha obstado a que houvesse uma maior atitude de acolhimento face ao pedido de autorização legislativa, muito embora compreenda, sob um outro ponto de vista as objecções de princípio que podem ser feitas a um pedido de autorização legislativa nesta matéria.
Ultrapassando esse problema, parece ao PPM que seria um acto positivo de servir a cultura e o património cultural e os valores permanentes do país votar a favor da autorização legislativa e dar a este debate toda a altura, toda a dignidade com que tinha começado e ao qual, neste momento, hoje ainda, uma parte da oposição não se furtou.
O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, o PPM pensa que, seja qual for, em termos políticos, o destino do actual Ministro da Cultura e Coordenação Científica, a sua passagem pelo Governo na pasta da Cultura é uma passagem particularmente honrosa e significativa.
Vozes do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Foi certamente um momento de alto serviço aos valores e aos bens culturais deste pais aquele em que Francisco Lucas Pires trabalhou neste sector, que é um dos sectores fundamentais da vida portuguesa porque está para além de todas as ideologias, de todos os interesses de momento, de todas as disputas eleitorais ou parecidas com isso.
Vozes do PPM: - Muito bem!
O Orador: - Recordo uma palavra recente de Francisco Lucas Pires, ao dizer publicamente:
O Estado não pode ser um padrão da cultura, mas é necessário reconhecer que existe uma relação entre cultura e política. Ele deve proteger, estimular e salvaguardar os valores e os bens culturais.
Parece-me um princípio a aceitar profundamente por todos nós. O Estado não pode ser um padrão de cultura, mas deve servir essa cultura e nesse serviço está alguma coisa de fundamental e de permanente porque é a ligação das instituições políticas o que há de mais completo e de mais profundo, que é o corpo político, a comunidade nacional que o Estado deve servir.
Nesse sentido, o PPM louva a actuação do Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica e particularmente o cuidado com que apresentou o seu projecto de decreto-lei à Assembleia da República e a humildade com que reconheceu que esse projecto tinha deficiências às quais todos os grupos parlamentares podiam trazer achegas e complementos.
Como o meu companheiro de bancada, Sousa Lara, recordou há pouco, esse trabalho foi feito, como era natural, em sede de Comissão de Cultura e Ambiente por acção de todos os grupos parlamentares desta Casa.
Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde o início deste debate que marcámos uma orientação em relação ao pedido de autorização legislativa. Ficou patente na intervenção que, em nome do meu grupo parlamentar, o Deputado Vilhena de Carvalho fez que o pedido de autorização legislativa nos merecia críticas por ser um pedido de autorização legislativa, que também nos merecia críticas o articulado subjacente a esse pedido de autorização, mas que, apesar disso, os méritos que esse projecto anexo tinha e a consideração da urgência de um normativo em relação à defesa do património nos levariam naturalmente, em circunstâncias normais - sublinho, em circunstâncias normais-, a conceder a autorização legislativa solicitada.
Só que a Assembleia da República não pode ignorar as situações concretas. A Assembleia da República, pelo contrário, não pode fechar os olhos à realidade, não pode divorciar-se da realidade e não pode ser aquilo que seriam os Parlamentos típicos do século XIX afastados da
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vida, transformados numa oratória mais ou menos esvaziada de sentido, por muito brilho formal que tivessem, mas divorciados da realidade subjacente.
E a realidade subjacente com que aqui, nos confrontamos é que, independentemente das formalidades que resta cumprir, o Sr. Primeiro-Ministro está na situação de demissionário. Ele próprio teve o cuidado de esclarecer que não admitia nenhum retrocesso nessa posição. E se não nos cumpre, neste momento e neste lugar, criticar o facto de essa demissão não ter sido operada nos precisos e rigorosos termos constitucionais, mas ter sido anunciada através dos meios de comunicação social e ter sido traduzida em termos de conclave partidário, se isso é assim, também não é menos verdadeiro que não podemos ignorar essa situação.
E, como tal, porque o Governo cai com a aceitação do pedido de demissão, por força da alínea b), n.º 1, do artigo 198.º da Constituição, e porque as autorizações legislativas caducam com a queda do Governo - ver o n.º 3 do artigo 168.º da Constituição- não tem sentido a concessão desta autorização legislativa.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As autorizações legislativas, no nosso sentido constitucional, implicam uma relação dupla entre a Assembleia, que as concede, e o Governo, a quem são concedidas, e caducam com a queda do Governo e com a dissolução da Assembleia da República. E porque essa dupla relação existe, neste momento não faz sentido atribuir uma autorização legislativa a um Governo que, por via de se encontrar nesta situação, não deve nem pode utilizar essa autorização.
Por isso, o nosso voto, sendo um voto contra este pedido de autorização, significa não que repudiemos aquilo que antes dissemos em relação aos méritos da proposta mas sim, muito pelo contrário, hoje aqui, neste lugar, uma forma de prestigiar a Assembleia da República, não praticando actos inúteis e, como tal, não concedendo autorizações legislativas que não podem nem devem ser utilizadas.
Esse o sentido da nossa votação. E permitam-me já agora, Sr. Ministro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que enxerte nesta declaração de voto uma palavra de saudação neste último acto parlamentar em que V. Ex.ª, Sr. Ministro da Cultura e Coordenação Científica, está presente, nessa qualidade, como membro do Governo. Permita-me que o saúde, muito particularmente pelo contributo que deu para uma causa que é de todos nós e por aquilo em que pôde transformar este poder, excepcionalmente - repito, excepcionalmente - no seu caso, um acto de inteligência.
Aplausos da ASDI e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.
O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensava prescindir da palavra, mas já que me foi concedida direi alguma coisa.
A ordem do dia marcava a matéria em causa para debate e votação e não é desconhecível de ninguém que o Sr. Primeiro-Ministro anunciou a sua intenção de se demitir; incompreensível é que se venha criticar essa sua intenção. Uma coisa é a intenção, e o Sr. Primeiro-Ministro pode anunciá-la quando entender; outra coisa é a apresentação que é feita perante o Presidente da República. Será isso que acontecerá ou, por certo, já aconteceu. Penso que nada disso tem que ser comentado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Essa agora!...
O Orador: - O que pode ser comentado, isso sim, é que na previsão dessa demissão haja ou não interesse em estar aqui a fazer-se esse debate.
Nós admitiríamos que uma ou outra posição pudesse ser discutida, contudo o PPM opôs-se, e só com a sua aceitação é que a ordem de trabalhos podia ser alterada.
Devo dizer que não há nervosismo por parte da maioria. Nós admitimos, sob proposta da ASDI, que se pudesse hoje considerar essa matéria em termos de projecto de lei, permitindo assim que o Parlamento aprovasse, na generalidade, um projecto de lei que baixasse à comissão respectiva para aí ser debatido pela Assembleia.
É um lugar comum das intervenções dos Srs. Deputados da oposição desejarem que entre o menos possível de autorizações em matéria de reserva desta Assembleia e que, se possível, as coisas sejam debatidas em termos de projecto de lei ou de propostas de lei. Como o Governo não podia alterar o pedido de autorização legislativa que apresentou para uma proposta de lei com outro sentido, propus-me avançar com a ideia de hoje ser debatido um diploma de teor diferente. A oposição assim não entendeu e fizemos o debate que estava agendado. Se este debate vai ou não ter utilidade, isso já não é da nossa competência, ultrapassa o âmbito parlamentar. O Governo poderá ou não ter tempo de legislar através de decreto-lei; de qualquer maneira, nós cumprimos o nosso dever: aprovámos a autorização legislativa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma declaração de voto, Sr.» Deputada Maria José Sampaio.
A Sr.ª Maria José Sampaio (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria dizer, em nome do meu grupo parlamentar, que o CDS aprovou este diploma porque para nós era impossível não o fazer dada a proposta que aqui votámos, de alargamento da definição de património, da nova definição de quem é, em Portugal, responsável pela conservação, pelo restauro do património, isto é, o Estado, as autarquias e os cidadãos particulares.
Não podíamos, de facto, recusar o que no diploma nos é proposto sobre a utilização social do património e a nova categoria de bem cultural e material, que nos possibilitará a defesa não só da língua portuguesa, como da música, do canto, etc.
Quero ainda aqui lamentar que, pela primeira vez, uma parte da Assembleia não tenha votado um diploma que diz respeito à cultura.
Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à votação em conjunto, na especialidade, dos dois únicos artigos da proposta de lei n.º 106/II.
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Submetidos à votação, foram aprovados, com os votos a favor do PSD, do CDS, e do PPM, os votos contra do PCP, do MDP/CDE e da ASDI e a abstenção do PS e da UEDS (registando-se a ausência da UDP).
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, como é sabido, foi entregue, em devido tempo, ao Sr. Presidente da Assembleia da República, um pedido de impugnação de admissão da Proposta de Lei do Plano para 1983, subscrito por deputados do PCP.
O pedido de impugnação era fundamentado na inclusão de 2 artigos, o 4.ºe o 5.º - nessa proposta de lei - que eram autênticas propostas de lei de autorização legislativa - que versavam matérias autónomas, matérias que não se poderiam, de forma nenhuma, considerar como incluídas nas Grandes Opções do Plano, que essa proposta de lei deve ter como objecto.
Também nessa altura foi posta uma pergunta ao Governo, tentando saber se este retiraria ou não esses dois artigos da Proposta de Lei das Grandes Opções do Plano ou se depois faria propostas de lei de autorização legislativa autónomas.
É de grande importância que a Assembleia e a imprensa tivessem conhecimento disto porque a questão que se punha, caso o Governo não retirasse esses artigos e não automatizasse essas matérias, é que amanhã teríamos de discutir o recurso interposto pelo PCP, em devido tempo, invalidando assim a possibilidade de discutir uma outra proposta que aí está, uma proposta de lei de alterações ao Orçamento deste ano, que o Governo - em tempo oportuno também - fez entrar na Assembleia da República.
Temos, aqui, na nossa bancada, cópia de um ofício enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República em que se diz: «conforme deliberação do Conselho de Ministros, desta manhã, informo V. Ex.ª de que o Governo decidiu autonomizar os artigos 4.º e 5.º da Proposta de Lei das Grandes Opções do Plano, como propostas de lei de autorização legislativa. Em conformidade, serão amanhã enviadas para esse gabinete as correspondentes propostas».
Isto significa, naturalmente, que os artigos 4.º e 5.º são retirados da Proposta de Lei das Grandes Opções do Plano. Mas como nada disto foi ainda referido pela Mesa, a nossa interpelação é no sentido de que esta confirme ou infirme o que acabo de dizer, para que estejamos todos tranquilos e para que amanhã saibamos se vamos ou não discutir o nosso pedido de impugnação ou se vamos discutir, pura e simplesmente, a proposta de lei de alterações do OGE deste ano, conforme estava inicialmente programado.
Vozes do PCP: Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso responder à sua interpelação dizendo que está na Mesa um ofício do gabinete do Sr. Ministro para os Assuntos Parlamentares a informar, realmente, aquilo que V. Ex.ª tinha considerado como essencial para que o recurso do PCP já não tivesse sentido, isto é, retirar os artigos 4.º e 5.º da Proposta de Lei das Grandes Opções do Plano, como propostas de lei de autorização legislativa. Penso por isso que amanhã não haverá discussão do recurso do PCP.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, é exactamente isso mas com uma pequena nuance. O recurso do PCP existe, publica-se, simplesmente carece de objecto uma vez que o Governo transforma a Proposta de Lei das Grandes Opções do Plano numa outra - que já decidiu transformar, sem os artigos 4.º e 5.º- e que manda autonomamente as propostas de lei de autorização legislativa para a Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Penso que é só esse o sentido que tem que ser dado a este ofício, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, também nós tínhamos interposto recurso da admissão desta proposta de lei. O nosso recurso não abrangia apenas as razões relacionadas com os artigos 4.º e 5.º dessa proposta de lei, mas em todo o caso queria aqui confirmar que, atendendo à urgência que reconhecemos da discussão do Orçamento Suplementar para 1983, o nosso grupo parlamentar não põe objecção a que, com prejuízo daquilo que está disposto no Regimento, mas com o nosso consentimento expresso, o debate sobre a impugnação desta proposta se efective em data a agendar em reunião de conferência dos grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrámos a nossa ordem de trabalhos de hoje.
Retomaremos os nossos trabalhos amanhã às 10 horas, conforme está programado.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 35 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Afonso de Sousa Freira Moura Guedes.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
António Maria de O. Ourique Mendes.
Armando Correia Costa.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Cunha Dias.
Eleutério Manuel Alves.
João Afonso Gonçalves.
Joaquim Pinto.
José Mário de Lemos Damião.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Nicolau Gregório de Freitas.
Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos. 
António Magalhães da Silva. 
Avelino Ferreira Loureiro Zenha. 
Bento Elísio de Azevedo. 
Guilherme Gomes dos Santos.
Centro Democrático Social (CDS):
Álvaro Manuel M. Brandão Estevão. 
Carlos Martins Robalo.
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Fernando Augusto Larcher Nunes.
José Augusto Gama.
Rui António Pacheco Mendes.
Partido Comunista Português (PCP):
Manuel Correia Lopes.
Partido Popular Monárquico (PPM):
António Cardoso Moniz.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Amândio Anes de Azevedo. 
Américo Abreu Dias. 
António Duarte e Duarte Chagas. 
António José Cardoso e Cunha. 
António Vilar Ribeiro. 
Bernardino da Costa Pereira. 
Carlos Manuel Pereira Pinho. 
Cipriano Rodrigues Martins. 
Fernando Alfredo Moutinho Garcês. 
Fernando José da Costa. 
Fernando José Sequeira Roriz. 
Francisco de Sousa Tavares. 
Henrique F. Nascimento Rodrigues. 
João Vasco da Luz Botelho Paiva. 
José Augusto Santos Silva Marques. 
José Manuel Pinheiro Barradas. 
Manuel Ferreira Martins. 
Manuel Ribeiro Arruda. 
Mário Dias Lopes. 
Mário Júlio Montalvão Machado. 
Mário Martins Adegas. 
Mário Alberto Barradas do Amaral.
Partido Socialista (PS):
Adelino Teixeira de Carvalho. 
Alberto Marques Antunes. 
Alberto Marques de Oliveira e Silva. 
António Cândido Miranda Macedo. 
António Carlos Ribeiro Campos. 
António Emílio Teixeira Lopes. 
António Francisco B. Sousa Gomes. 
Armando dos Santos Lopes. 
Beatriz Cal Brandão.
Fernando Verdasca Vieira.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
José Gomes Fernandes.
José Jorge Gois Mendonça.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel António dos Santos.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Lopes Soares.
Mário Manuel Cal Brandão.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Vergílio Fernando M. Rodrigues.
Centro Democrático Social (CDS):
Adalberto Neiva de Oliveira.
Alberto Henriques Coimbra.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Daniel Fernandes Domingues.
Eugênio Maria Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
João Gomes de Abreu de Lima.
João Lopes Porto.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Luís Aníbal de Azevedo Coutinho.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Mário Gaioso Henriques.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Eduardo Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Partido Comunista Português (PCP):
António Dias Lourenço. 
Domingos Abrantes Ferreira. 
João Carlos Abrantes. 
José Manuel da C. Carreira Marques. 
Maria Ilda Costa Figueiredo. Octávio Rodrigues Pato.
Partido Popular Monárquico (PPM):
Augusto Ferreira do Amaral.
Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Manuel Tílman.
Os REDACTORES: José Diogo - Ana Maria Marques da Cruz.