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60 I SÉRIE-NÚMERO 4

Não foi com surpresa, porque era de todos conhecido que o PCP haveria de voltar com esse projecto.
Mas não deixo de lamentar tal atitude porque a pressa com que foi apresentado parece resultar menos do problema em si mesmo do que da preocupação em criar dificuldades à estabilização da sociedade portuguesa numa altura em que todos os esforços se devem fazer para ultrapassar a crise que a todos diz respeito e que deve ser tarefa do Governo e da oposição.
Há cerca de 30 anos que me preocupo com a problemática da família, e por ela tenho lutado, em particular no que se refere ao aborto, analisando as suas causas e defendendo acções concretas que garantam e promovam «o fundamentalíssimo direito à vida».
Integrado em movimentos familiares, conheço os dramas das gentes das nossas aldeias, das nossas vilas e. das nossas cidades.
No cerne do problema está a fragmentação da vida familiar, porque mais do que adoptar medidas que facilitem a destruição da vida, devemos procurar contribuir para a dignificação da família, para a sua segurança e para a eliminação progressiva dos problemas que aparentemente estão na base do aborto.
A defesa da vida não deve limitar-se a palavras nem a promessas vãs, mas exige actos visíveis e reais, nomeadamente a educação correcta das consciências, a moralização dos costumes e o desenvolvimento de uma adequada política económica e social.
Pretender defender a justiça social e ao mesmo tempo tornar lícita a destruição de um ser humano inocente, que existe no seio materno, é atitude que poucos compreendem, que muitos interpretam como má fé ou hipocrisia e que outros atribuem a ignorância.
Nas campanhas para legalizar ou despenalizar o aborto recorre-se sempre aos 2 argumentos que melhor se gravam na imaginação: o sentimento e o número. Apela-se para o sentimento mediante uma hábil apresentação de casos dramáticos de mulheres que abortam, fazendo esquecer as tragédias das vidas que não chegam a ver a luz.
No que respeita ao número, utilizam-se cifras de abortos clandestinos difíceis de comprovar, porque são clandestinos.
A aceitação do argumento do número de abortos para a sua despenalização implicaria aceitar também, pela mesma razão, a despenalização dos roubos, dos assaltos, tantos são os que se verificam nos tempos de hoje.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Essa já é velha!

O Orador: - Para além disso, não se compreende como pode defender-se a morte de um ser inocente alegando motivos humanitários, em vez de se reconhecer que o melhor remédio para aceitar «uma criança não desejada» é querê-la.
Acompanhei os debates que em Novembro aqui tiveram lugar e estudei a argumentação produzida contra este projecto, em particular as dos Drs. Oliveira Dias, Vilhena de Carvalho e do Prof. Jorge de Miranda,, que eu perfilho inteiramente, e a argumentação a seu favor pela Sr.ª Deputada Zita Seabra.
Creio que, nesta altura, não valerá a pena repeti-las, tanto mais que o que está em causa é a admissão ou não do novo projecto do PCP nesta Assembleia.
De qualquer maneira, gostaria de salientar a afirmação da Sr.ª Deputada Zita Seabra, não só aqui mas também numa intervenção na televisão:
Contra o aborto somos todos. Ninguém, em parte nenhuma, o considera um bem, um recurso que se encare com ligeireza.
E disse mais:
O aborto impede-se e evita-se com mais pão e não com cadeias; o aborto evita-se com planeamento familiar e educação sexual e não com prisões.
Mas a questão que se põe em relação à Constituição é que abortar com intencionalidade é matar e, portanto, violar o direito à vida. O eufemismo utilizado para substituir a palavra «aborto» por «interrupção voluntária da gravidez» é uma maneira de evitar o termo biologicamente correcto que é «matar».
Poderia servir-me da excelente declaração do Dr. Oliveira Dias, mas, neste momento, apenas me vou referir ao testemunho do Dr. Bernard Nathauson, conhecido médico de Nova Iorque.
O conhecimento dos progressos da medicina demonstrando a existência de uma vida humana no feto levou-o a confessar:

Dramaticamente tenho de reconhecer que o feto não é um bocado de carne; é um paciente.
E mais: graças aos estudos do ciclo da vida, dos hábitos, da psicologia, da sensibilidade e da fisiologia do feto, concluiu que ele respira, dorme e é sensível aos sons.
Para o Dr. Nathauson tornou-se inegável que o feto é um de nós, da nossa comunidade e portanto uma vida que deve ser protegida.
Nenhum argumento técnico-jurídico ou imposição da lei positiva pode opor-se à ideia de um direito à vida ou de um direito ao nascimento do ser humano em gestação.
Como afirma Franco Montora, governador de S. Paulo, no seu livro Introdução à Ciência do Direito, «bastaria ao nascituro ser titular de um único direito para que não pudesse ser negada a qualidade de pessoa».
Se se entende necessário proteger interesses patrimoniais do nascituro, mais se justifica a defesa da sua vida. E se se considera imperioso proteger a vida de todos os seres humanos, impõe-se tutelá-la com particular zelo em relação aos mais indefesos e frágeis desses seres.
Portanto, a tutela jurídica dispensada em termos genéricos à vida humana deve estender-se à vida humana intra-uterina.
«Ninguém pode legitimar a morte de um inocente sem minar as próprias bases da sociedade».
Interromper a gravidez e matar, violando portanto um dos direitos fundamentais do ser humano.
Seria lamentável que a nossa Assembleia da República, ao propor leis, lhe parecesse mais fácil propô-las para eliminar crianças do que para protegê-las.
As leis devem cultivar o respeito pela vida humana, o respeito pela responsabilidade e o respeito pela educação.
O recurso do CDS não tem outro significado se não opor-se frontalmente a um projecto de lei que contra-

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