O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 687

I Série - Número 18

Sábado, 9 de Julho de 1983

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE JULHO DE 1983

Presidente: Exmos. Sr. Basílio Adolfo de M. Horta da Franca

Secretários: Exmos. Srs. Leonel Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Azevedo de Almeida e Vasconcelos

SUMÁRIO

Antes do ordem do dia. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.
Deu-se conta do expediente e da apresentação de vários requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado Vítor Crespo (PSD) enalteceu a liberdade, a justiça social e a devoção pela causa dos direitos humanos, saudando aqueles que os protagonizam e que vão agora ser condecorados com a Ordem da Liberdade e respondeu no fim a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado César de Oliveira (UEDS), que também fez um protesto.
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Zita Seabra (PCP) alertou a Câmara para a grave situação de degradação da ria de Aveiro, preconizando a adopção de medidas urgentes para a sua defesa paisagística, para a defesa do seu valor económico, social e mesmo cultural. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Horácio Marçal (CDS), Rocha de Almeida (PSD), Barbosa Mota (PS) e a um protesto do Sr. Deputado Carlos Gracias (PS), que manifestaram o seu acordo com os problemas levantados pela oradora.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Comes de Pinho (CDS) criticou a prática do actual Governo e a indefinição de uma linha política, respondendo no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Lopes Cardoso (UEDS) o Carlos Lage (PS).

Ordem do dia. - Após ter sido lido, foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do CDS e do MDP/CDE.
Deu-se início à apreciação da proposta de lei n.º 16/III - Direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública e regime disciplinar da função pública -, tendo intervindo, a diverso titulo, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (José SanBento Menezes), os Srs. Deputados César de Oliveira (UEDS), Jorge Lemos, João Amaral e Anselmo Aníbal (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Sá da Costa (MDP/CDE), Narana Coissoró e Basílio Horta (CDS), Vítor Hugo Sequeira (PS) e Antunes da Silva (PSD).
O Sr. Presidente, após ter anunciado a entrada na Mesa de diversos diplomas e a ordem do dia da próxima reunião, encerrou a sessão às 13 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Almerindo da Silva Marques.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
Armando António Martins Vara.
Avelino F. Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Alberto R. Santana Maia.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá M. Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto F. Handel de Oliveira.

Página 688

688 I SÉRIE -NÚMERO 18

Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermímo Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo C. Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.
Jorge Manuel A. F. Miranda.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José dos Reis Borges.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Joaquim Rodrigues Masseno.
Manuel Laranjeira Vaz.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Sousa Ramos.
Maria de Jesus Barroso Soares.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Manuel Cal Brandão.
Nelson Pereira Ramos.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso Sousa Freire Moura Guedes.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. C. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Orneias Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cecília Pita Catarino.
César Augusto Vila Franca.
Daniel Abílio Ferreira Bastos
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Evangelista Rocha de Almeida.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonel Santa Rita Pires
Luís António Martins
Manuel António Araújo dos Santos»
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ferreira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos
Raul Gomes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Victor Pereira Crespo.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha
Carlos Alberto Gomes Carvalhas
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira
Raúl Jesus Ferreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Página 689

9 DE JULHO DE 1983 689

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Sousa Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António Gomes de Pinho.
António J. Castro Bagão Félix.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Fernando Chaves da Rocha Pereira.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Henrique Paulo das Neves Souto.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João António de Morais Silva Leitão.
João Carlos Dias M. C. de Lencastre.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Meireles de Barros.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomaz Cortez Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Tomás Rebelo Espírito Santo.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

José António Furtado Fernandes. Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

ANTES DA ORDEM DO DIA O Sr. Presidente: - Vai ser lido o expediente. Deu-se conta do seguinte:

Expediente Cartas

De Eduardo Luís da Costa Paquete, radioamador, residente em Odivelas, repudiando o teor do novo Regulamento do Amador de Radiocomunicações, por considerar que o mesmo viola uma das directrizes da União Internacional de Telecomunicações.
Da Sociedade de Assistência Técnica Administrativa e Comercial a Empresas, L.da, tecendo considerações diversas sobre as dívidas ao Estado e à previdência.
De José da Silva, residente no Porto, manifestando-se contra a obrigatoriedade do uso de placas identificadoras nos automóveis dos deficientes.

Ofícios

Do Sindicato dos Bancários do Centro remetendo um comunicado das 4 tendências daquele Sindicato sob o tema «Em defesa da Banca Nacionalizada».
Da Associação dos Agricultores de Mirandela, a enviar um comunicado no qual apoiam o novo Ministério da Agricultura, de quem esperam sejam encontradas soluções para os seus problemas, oferecendo para tal a sua colaboração.
Do Conselho de Informação para a RDP dando conhecimento do que de mais significativo e urgente se acha por solucionar e que cabe no âmbito das preocupações daquele órgão.
Da Assembleia de Freguesia de Leça da Palmeira remetendo fotocópia da moção aprovada em sessão de 12 de Junho findo, na qual se manifesta solidária com o Executivo da Câmara Municipal de Matosinhos.
Do Sindicato dos Trabalhadores dos Espectáculos capeando um manifesto sobre a concorrência de artistas estrangeiros.
Da Associação Portuguesa de Deficientes - Núcleo de Águeda - a enviar o texto da moção aprovada por unanimidade pelos deficientes do distrito de Aveiro, em reunião realizada no dia 25 de Junho findo, na qual se manifestam contra o Decreto-Lei n.º 235-D/83, por considerarem que não beneficia a generalidade dos deficientes.

Telegramas

Da Comissão de Trabalhadores dos Delegados Sindicais de l'Union des Assurances de Paris e dos Delegados de Secção e Comissão de Trabalhadores da Companhia de Seguros Bonança e um ofício da Comissão Cooordenadora Nacional das Comissões de Trabalhadores das Empresas do Sector de Seguros, repudiando a tentativa de abertura à iniciativa privada de sectores básicos da economia nacional.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos: reunião do dia 4 de Julho de 1983 - ao Governo e a diversos Ministérios (5), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Educação, formulado pelos Srs. Deputados Anselmo Aníbal e João Amaral; ao Governo (2), formulados pelos Srs. Deputados Carlos Brito, Margarida Tengarrinha e Joaquim Miranda; aos Ministérios da Defesa Nacional e da Educação (2), formulado pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho; aos Ministérios do Equipamento Social e da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Jaime Serra; aos Ministérios das Finanças e do Plano, da Indústria e Energia e da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Abílio Rodrigues.
Reunião do dia 5 de Julho de 1983 - ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelos Srs. Deputados Luís Monteiro, Carlos Miguel Coelho e Almeida Cesário; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e do Equipamento Social (2), formulado pelos Srs. Deputados Anselmo Aníbal e Odete Santos; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Pedro Alves; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Armando Oliveira; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e João Rodrigues; ao Ministério e às Secretarias de Estado

Página 690

690 I SÉRIE - NÚMERO 18

dos Transportes e do Tesouro (3), formulados pelo Sr. Deputado Figueiredo Lopes.

Reunião do dia 6 de Julho de 1983 - ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Octávio Teixeira e Gaspar Martins, respectivamente; aos Ministérios do Equipamento Social e Comércio e Turismo (2), formulados pela Sr.» Deputada Ilda Figueiredo; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho de Jesus Domingues; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelas Sr.ªs Deputadas Ilda Figueiredo e Odete Filipe.

Reunião do dia 7 de Julho de 1983 - ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Eleutério Alves, Custódio Gingão e outros.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Crespo.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serão amanhã condecoradas com a Ordem da Liberdade diversas personalidades.
A Ordem da Liberdade foi criada em Outubro de 1976 por um Governo presidido por Mário Soares e destina-se a contemplar os cidadãos que se distinguiram pelo seu amor à liberdade e pela sua devoção à causa dos direitos humanos e de justiça social.
Em nome do Partido Social-Democrata e dando expressão ao sentir dos seus militantes e do milhão e meio de portugueses que nele votaram, venho saudar os que no passado lutaram e os que ainda hoje lutam pela liberdade, pela justiça e pela defesa dos direitos humanos.
Faço-o, como é natural, em relação aos cidadãos portugueses mas quero envolver igualmente nesta saudação todos os que em qualquer parte do globo prosseguem e se dedicam a estes mesmos objectivos: Em Timor; na Polónia ou Chile; no Afeganistão ou na América Central.
As lutas pela liberdade, pela justiça, pela dignidade, pela defesa destes valores supremos não podem ser colocados aos serviços ou às conveniências de cada um.
Não se podem ter como correctas e justas se forem conduzidas por quem se coloca de um lado do espectro político e incorrectas e injustas quando levadas a cabo pelo lado oposto.
A liberdade tem um valor absoluto e moral.
Por isso vale a pena meditar nestas palavras de Virgílio Ferreira.
Por sobre tudo porém, é insensatez ou desplante decretar do alto de uma suficiência que tal moral é de primeira e tal outra é de segunda; que uma é para trazer ao peito, a outra para usar com as cuecas.
Aqueles que não forem capazes de se identificar, defender e se solidarizar com todas as lutas pela liberdade, desqualificam-se aos nossos olhos, não apenas porque os não querem compreender mas -pelo que para nós é mais grave - se dispõem a instrumentalizar em torno das suas conveniências uma das mais nobres aspirações dos homens, pela qual morreram ao longo dos tempos milhões de seres humanos ou foram martirizados, encarcerados ou perseguidos.
A liberdade é um conceito global, só existe quando cada homem for senhor dos seus destinos.
Não há liberdades parciais. E não nos venham falar em liberdade os que advogam figurinos únicos para um povo; uma só maneira de pensar e agir; coletes de forças mentais e que estão dispostos a mandar para praças ou internar em campos de concentração - por vezes eufemisticamente apelidados de reeducação- os que tem a veleidade de pensar diferentemente.
Não temos por isso por defensores da liberdade os que, embora lutando contra uma tirania, o fazem com o propósito de arrastar homens para as garras de outras tiranias.
A liberdade - como a entendemos e defendemos - é sinónimo de pluralismo ideológico. Liberdade e pluralismo têm no campo político a sua expressão visível num parlamento multipartidário. Para nós quem defende e prestigia o Parlamento luta pela liberdade. Quem não se coíbe dele abusar, de fomentar que sobre ele se façam juízos desfavoráveis que não correspondem à verdade, de o paralisar ou embaraçar por razões não legítimas, no nosso entender, não está com os direitos dos homens e com á justiça social.
Os combatentes pela liberdade e pela justiça fazem-no -como se diz no preâmbulo do decreto-lei que cria a Ordem da Liberdade- na «luta persistente, por vezes anónima em defesa de valores cívicos que a marcha da civilização trouxe ao primeiro plano da dignificação e exaltação do homem».
Por vezes anónima como se reconhece. É aqui o momento de incluirmos quantos não tendo chegado à imagem pública foram obreiros fundamentais dessa luta pela liberdade. E em particular os familiares das figuras políticas que os compreenderam, apoiaram e muitas vezes por eles se sacrificaram.
Porque se trata de matéria tão fundamental, que toca tão profundamente no quadro de valores é que entendemos que os que são distinguidos -e por isso mesmo se tornam símbolo dessa aspiração profunda dos seres humanos - o devem ser segundo rigorosíssimos critérios.
Para que os amantes da liberdade -jovens ou adultos- se possam neles rever como exemplo a seguir.
Nós, Partido Social-Democrata, regozijamo-nos por terem sido, no passado, e agora, agraciados militantes nossos. Regozijamo-nos e felicitamo-los.
De igual modo nos regozijamos e felicitamos com aqueles militantes de outros partidos e os que a nenhum partido pertencem, todos os que persistentemente, coerentemente e denodadamente lutam pela liberdade dos portugueses.
Mas não podemos deixar de exprimir a nossa surpresa e insatisfação por vermos incluídos nessas distinções personalidades que, sem embargo de um dado momento terem objectivamente colaborado na tarefa da libertação do povo, não podem, na globalidade dos seus comportamentos, ser classificados como persistentes e coerentes defensores da liberdade.
Não podem ser reconhecidos ou apontados como exemplos a seguir. É certo que a história é mais sábia e se encarregará de corrigir os erros dos homens. Mas não nos fica mal desejar que se não cometam erros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os valores essenciais - e entre eles encontra-se o da liberdade e a sua

Página 691

9 DE JULHO DE 1983 691

consagração - não devem ser apropriados por grupos, facções ou interesses.
Por isso aqui vim apenas enaltecer a liberdade, a justiça social, a devoção pela causa dos direitos humanos e saudar aqueles que correctamente e dignamente os protagonizam.

Aplausos do PSD, do PS. da ASDI e de alguns deputados do CDS.

Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes).

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): -O Sr. Deputado Vítor Crespo desculpar-me-á a frontalidade com que lhe vou colocar a minha pergunta.
Concordo com muitas das afirmações que V. Ex.ª proferiu, repetindo um estilo de actuação que é a terceira ou quarta vez que lhe noto, ou seja, discorda de a, b ou e, não nomeia quem é e acaba por fazer pairar sobre todos o labéu que V. Ex.ª disse não merecerem todos.
V. Ex.ª disse, pois, mais ou menos isto: a Ordem da Liberdade é muito boa -a Assembleia não tem de aplaudir ou deixar de aplaudir- e há uns que a merecem e outros que não a merecem. Mas, ao fazer isto, V. Ex.ª faz pairar a suspeita sobre aqueles que, no seu próprio critério, não a merecem, e é isto que eu gostaria de ver esclarecido.

Ou seja, se efectivamente há alguns cidadãos que vão ser condecorados e que não merecem a condecoração, então, V. Ex.ª tem a obrigação de dizer quem são para não pairarem suspeitas sobre aqueles que, no seu próprio critério, a merecem.
Era, pois, isto que eu gostaria de ver esclarecido.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Crespo.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): - O Sr. Deputado César de Oliveira notou que as minhas intervenções têm tido uma linha de rumo, o que é verdade. Defendo sempre, exclusivamente, ideias e nunca pessoas.
Por isso mesmo, alinhavei um conjunto de ideias, que são as minhas, e que, como disse, serão provavelmente subscritas pela grande maioria desta Câmara.
Quanto às pessoas que se enquadram ou não nessas ideias, devo dizer que estou a falar para uma Câmara inteligente que definirá pelos seus critérios, ou por outros, quais as pessoas que se integram ou não nos conceitos que desenvolvi.

Aplausos do PSD.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): -Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. César de Oliveira (UEDS: - Sr. Deputado Vítor Crespo, V. Ex.ª disse que a Câmara é inteligente. Obviamente que não me compete a mim estar a passar atestados de inteligência ou de não inteligência às pessoas.
V. Ex.ª falou, e muito bem, sobre ideias e até aí não há nenhum objecção. No entanto, devo dizer, com a máxima franqueza, que V. Ex.ª misturou as considerações e as concepções que acabou de proferir sobre ideias de liberdade, de justiça e de democracia - com as quais eu concordo - com suspeições que, pelo seu próprio raciocínio e pelo seu próprio discurso, acabam por recair sobre as pessoas.
Não tenho nenhuma polícia de informações, e julgo que V. Ex.ª também não a terá, para saber, de entre as pessoas que amanhã vão ser condecoradas, quais são aquelas que, segundo o seu critério, merecem ou não condecorações. Então, V. Ex.ª acaba por deixar um véu, porque segundo o meu critério poderá ser a pessoa a, segundo o critério do Sr. Deputado Carlos Lage poderá ser a pessoa b, etc., etc., e dessa forma nunca mais acabamos.
Assim, quero protestar veementemente contra esse estilo de actuação porque uma pecha que temos que radicar na nossa vida política é a de que a culpa é sempre dos outros e, ao fim e ao cabo, nunca afrontamos claramente aquilo que pensamos.
Sr. Deputado, o seu líder histórico, Dr. Francisco Sá Carneiro, teve o grande mérito de dizer a verdade com coragem e com frontalidade. Portanto, era bom que essa coragem e essa frontalidade fossem apanágio da direcção do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É na qualidade de deputada eleita pelo círculo de Aveiro que hoje gostaria de trazer à Assembleia da República um dos problemas mais sentidos e que mais inquietam os aveirenses: a situação da ria de Aveiro.
Na verdade, a ria, símbolo inequívoco e inseparável de Aveiro e sua região, já quase não é hoje a bela paisagem de há uma dezena de anos atrás, fonte de lazer e de uma riqueza imensa para as gentes que viviam nas suas margens.
A ria está abandonada, poluída e ameaçada e dia a dia assiste-se à sua morte, perante a passividade das entidades responsáveis e o alarme das pessoas que vão levantando a sua voz e fazendo soar o justo alarme.
Hoje, em muitos dos canais da ria já não há vida, já não há água: há esgotos e céu aberto! Os canais (e não só o que atravessa a cidade de Aveiro, mas quase todos os outros, que ainda há poucos anos inspiravam artistas e eram límpidos espelhos das suas margens) estão hoje de tal forma poluídos que tornam insuportável a vida das pessoas que habitam próximo das suas margens ou delas se aproximem.
Muitos campos que, ainda há poucos anos eram férteis, são hoje lagoas fétidas de desperdícios de fábricas. Espécies piscícolas desapareceram completamente e as que restam escasseiam cada vez mais ...
A ria degrada-se e em vez de fonte económica, centro de lazer e de melhoria da qualidade de vida, como o seria em qualquer país desenvolvido, é hoje já em muitas zonas fonte de perigos para a saúde dos cidadãos.
Não podem ser adiadas por mais tempo medidas de salvação da ria, Srs. Deputados. E o desenvolvi-

Página 692

692 I SÉRIE - NÚMERO 18

mento económico da região não é incompatível nem antagónico com essa defesa da ria no seu todo: defesa paisagística, defesa do seu valor económico, social e mesmo cultural.
Bem pelo contrário, é sinal evidente de subdesenvolvimento que um país se industrialize e urbanize na base da total depredação da natureza e da busca exclusiva do lucro imediato!
São 4 os perigos fundamentais que ameaçam ou destroem a ria de Aveiro: primeiro, a poluição industrial; segundo, a poluição urbana; terceiro, as obras de construção do porto de Aveiro e quarto a não adopção de medidas que protejam as mutações naturais da ria.
Antes, porém, de analisarmos brevemente estas 4 questões, permitam que comece pelo fundo do problema.
Não há, até hoje, uma entidade responsável pela ria, coordenadora e em que tenham assento as autarquias locais e não há sequer uma política global, nem um planeamento, nem uma definição" de objectivos que permitam coordenar a acção em defesa da ria.
A legislação em vigor, particularmente no que respeita ao controle da poluição das águas, é deficiente e baseia-se no princípio simplista que é proibido poluir. Ë, pois, também proibido poluir a ria de Aveiro! Mas como não estão definidos objectivos de qualidade, nem condicionadas as características dos efluentes rejeitados, este princípio de que «é proibido poluir» é completamente inoperante e os órgãos (vários e dispersos) responsáveis pela aplicação da lei não encontram soluções.
As autarquias não têm nenhuma competência na área da sua gestão e nem sequer são informadas dos planos ou projectos de outras entidades intervenientes. A ria não é, no fundo e até ao presente, considerada minimamente na sua importância económica, social e cultural, para a região de Aveiro, nem para o País. Se mais alguns anos passarem será sem dúvida demasiado tarde para a salvar ...
Mas regressemos aos 4 perigos fundamentais que ameaçam e destroem a ria de Aveiro. Comecemos pelo último.
O sistema natural que levou a que uma grande baía fosse transformada numa laguna não terminou. Basta recordar que só no século XVIII, reinado de D. Maria, a barra se fixou onde existe presentemente. A zona da actual laguna está a ser invadida por vegetação aquática e transformada em pântanos e sapais, por efeito da invasão das águas salgadas.
É, pois, necessário e urgente tomar medidas em defesa da ria. Mas essas medidas não terão grande significado se, em simultâneo, não separar e impedir mesmo o aumento constante da poluição industrial e urbana. Muito se tem dito e escrito sobre esta matéria. Direi apenas que pouco adianta tomarem-se sérias medidas de combate à poluição industrial se se mantiver todos os esgotos urbanos descarregando para a ria sem nenhum tratamento prévio. Mas direi ainda que as medidas que são urgentes e que têm sido largamente debatidas pelos técnicos não são em termos económicos e financeiros comportáveis para a exclusiva responsabilidade das câmaras municipais mais directamente interessadas.
A poluição industrial que afecta, ela também, tão dramaticamente, a ria não provém só das grandes empresas da região: são muitas e muitas as pequenas
e médias fábricas que vão poluindo os cursos de água mais importantes. Mas também os pequenos ribeiros estão sofrendo tais impactos ecológicos que em muitos casos morreram já.
Há, no entanto, algumas grandes empresas a PORTUCEL em Cacia, a NESTLÉ em Avança, o Parque Industrial de Estarreja e a Fábrica de Papel do Caima, que estão a ter um efeito muito importante no ecossistema da ria.
O aspecto mais grave e para o qual eu gostaria de alertar a Assembleia da República é que não existem elementos que permitam avaliar devidamente a situação. O Professor Aristides Hall do Departamento de Ambiente da Universidade de Aveiro escreveu sobre a matéria: «ao contrário do que já acontece por esse mundo fora, neste País não se é informado nem nos termos em que essas indústrias foram autorizadas a fazer descargas nas águas públicas, nem dos resultados das análises que obrigatoriamente deveriam ser feitas com periodicidade pré-estabelecida. O que um membro do público consegue saber é o que lhe é cochichado à mesa do café ou que, por artes mais ou menos detectivescas, vai obtendo daqui e dali».
Nem sequer se sabe o que é que as entidades responsáveis fazem dos resultados das análises que estas empresas são obrigadas a recolher por lei ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso que os deputados, os eleitos das autarquias e a população em geral conheça a situação e possa avaliá-la exactamente. Em democracia isso é um direito e mesmo um dever.
Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP irá recolher os elementos necessários e disponíveis. Por isso, hoje, juntamente com esta intervenção entregámos ao Governo 15 requerimentos ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - 15 requerimentos?

A Oradora: - Exactamente, 15 requerimentos, Sr. Deputado, que contêm algumas das principais questões para as quais a população exige resposta.

Aplausos do PCP.

Mas é também por esta razão que solicitámos já uma visita à PORTUCEL, e iremos ao Complexo Industrial de Estarreja, à NESTLÉ e ao Caima. Será também com esse objectivo que contactaremos as direcções-Gerais do Ambiente,, de Serviços Hidráulicos e de Portos, bem como, evidentemente, o Departamento de Ambiente da Universidade de Aveiro.
Nada disto teria, porém, significado senão pudesse-mos avaliar devidamente os imensos perigos óbvios que pairam sobre a ria devido à construção do Porto de Aveiro.
O novo porto tem sido considerado importante para o desenvolvimento de uma região, em forte crescimento industrial, como é Aveiro. Mas pelos elementos de que dispomos podemos afirmar que as obras estão a ser realizadas sem que existam o mínimo de certezas e de estudos que permitam avaliar as consequências das obras em curso.
Ninguém sabe exactamente se as obras alterarão ou não as marés, que consequências advirão do aumento da salinidade e das alterações decorrentes. E numa região tão plana basta uma pequena alteração de alguns centímetros da maré para que daí resulte o alagamento de campos que hoje produzem e que

Página 693

9 DE JULHO DE 1983 693

pertencem a pequenos agricultores da região. Ninguém sabe exactamente o que se irá passar com o aumento da salinidade e a espécies piscícolas características da ria. Mas em termos de paisagem, aí sim, sabe-se que o jardim do Odinout está já praticamente destruído e as belas palmeiras que ainda restam em breve serão submersas. Sabe-se já que as salinas que ladeiam a estrada de Aveiro para a Costa Nova, ou para a Gafanha da Nazaré, e que são imagem única, não só para os aveirenses, para quem visite a região, vão também desaparecer.
Sabe-se já que por causa dos molhos imensos de pedra que vão sendo despejados na ria, se estão formando bancos de areia entre as belas margens e a água da ria.
Sabe-se já que por cima das casas da Gafanha da Nazaré passará, algures, uma estrada e um caminho de ferro, pois tal figura no projecto de construção do porto.
Quando e como ignora-se ...
Em termos sociais também já se avaliam algumas consequências e nomeadamente a destruição da estrada que isolou as populações de S. Jacinto e da Torreira.
E sendo certo que os portos de Aveiro são importantes, não é certamente aceitável que a obra esteja em curso sem que se conheçam exactamente as suas consequências ecológicas e ambientais e sem que se analise e pondere, em termos de futuro, a ria de Aveiro.
Nesse sentido, solicitámos hoje ao Governo que nos faculte os estudos existentes sobre as consequências da construção do porto e as medidas cautelares tomadas e previstas em defesa da ria.
São, pois, Srs. Deputados, 2 os objectivos fundamentais que motivaram o facto de trazermos aqui hoje os perigos sérios que ameaçam a ria de Aveiro: juntar a nossa voz a todas as outras que em Aveiro se levantam já e exigirmos do Governo que nos faculte os elementos que permitam, a nós deputados, mas também aos membros das autarquias, avaliar devidamente a situação e ponderar a justeza das medidas propostas.
A importância que a ria tem para Aveiro, a sua inegável beleza, os milhares de pescadores que dela vivem e nela trabalham, o seu património ecológico, histórico e cultural, bem merecem que se juntem todos os esforços e meios em sua defesa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi como muito prazer que ouvi a Sr.ª Deputada Zita Seabra referir-se a um problema que nos preocupa a todos nós, homens de Aveiro, e com certeza também a todos, os deputados desta Câmara.
Tem razão a Sr.ª Deputada quando fala na poluição dessa bela zona que é a ria de Aveiro, que realmente não tem merecido a atenção dos governos anteriores e que está numa situação de degradação muito acentuada.
No entanto, depois de ouvir as suas palavras, gostaria de lhe formular 2 ou 3 perguntas. V. Ex.ª solicitou ao Governo os estudos sobre as obras em curso
no porto de Aveiro. Todos nós sabemos que esta é uma preocupação sentida por todas as pessoas, pois as obras arrastam-se há longo tempo, principalmente naquele pontão junto à Gafanha. A verdade é que 3 ou 4 empresas começaram as obras do pontão, continuaram e acabaram por parar, o que cria problemas terríveis até no aspecto turístico principalmente durante o verão. Portanto, quero também aproveitar esta oportunidade para fazer o meu protesto contra a paralisação das obras desse pontão.
Porém, há um ponto que queria focar e sobre o qual agradecia à Sr.ª Deputada que elucidasse a Câmara.
A ria de Aveiro tem imensas potencialidades que necessitam de ser desenvolvidas no aspecto paisagístico, turístico, agrícola e até de exploração industrial. Por exemplo, no que se refere à exploração do sal há problemas porque as salinas deviam ser propriedades rústicas e não propriedades urbanas como estão a ser consideradas pois isto sobrecarrega extraordinariamente os solos das salinas, o que faz com que esta indústria entre ainda mais em crise. A exploração do sal está realmente numa situação económica muito má, tal como a Sr.ª Deputada Zita Seabra e com certeza muitos deputados presentes sabem.
Nos problemas que a Sr.ª Deputada focou sobre a ria de Aveiro enquadra-se um outro problema que me parece ser muito importante. Refiro-me à ligação do porto de Aveiro à estrada Aveiro-Vilar Formoso. Como todos sabemos projecta-se, pelo menos fala-se nisso há muitos anos um caminho de ferro que - tal como disse há pouco - irá passar sobre as casas da Gafanha da Nazaré. Ora, o Grupo Parlamentar do CDS protesta veementemente contra esse traçado porque ele vai degradar a zona, vai criar problemas de circulação rodoviária na Gafanha e porque nos parece que há um outro trajecto que poderia ser feito entre as duas ilhas e que iria desenvolver a parte interior da ria.
Como a Sr.ª Deputada Zita Seabra não se referiu a esse aspecto, gostaria que me esclarecesse se, ao fazer este requerimento ao Governo, previu isso que considero ser de muita importância, não só para o porto de Aveiro como para toda a região.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, há mais inscritos. Pretende responder já ou no fim?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.

O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, em primeiro lugar, quero cumprimentá-la por tudo quanto disse e dizer-lhe que subscrevo inteiramente também tudo quanto aqui proferiu.
Quanto ao apelo que fez na parte final da sua intervenção, no sentido do juntar a nossa voz, aqui no Parlamento às dos autarcas e, ao fim e ao cabo, & da população ribeirinha da ria de Aveiro, quero também juntar a minha voz, porque desta forma poderá haver uma sensibilização da Câmara, do Governo e das entidades responsáveis para toda a grande e grave problemática da ria de Aveiro.
Devo dizer que nós, deputados do PSD eleitos pelo distrito de Aveiro, também estamos a preparar um dossier. Faço votos para que, com o dossier que a

Página 694

694 I SÉRIE - NÚMERO 18

Sr.ª Deputada e o seu Grupo Parlamentar prepararam, com os requerimentos que apresentarão ao Governo, com o nosso estudo e o vosso dossier, possamos ter a força de unir as conclusões e, em conjunto, trabalharmos por uma riqueza de que, ao fim e ao cabo, as terras de Aveiro dependem e que é também ex-libris de toda aquela região.
Uma vez que o Sr. Deputado Horácio Marçal aqui o referiu, queria também dizer que não podia deixar de estar de acordo com os problemas que colocou e que também estão pendentes.
Ao fim e ao cabo, posso concluir que os deputados de Aveiro estão ao redor de todo um problema que é preocupante. Da nossa parte, haverá inteira disponibilidade para, com a Sr.ª Deputada e com todos os outros deputados das outras bancadas, que todos, em conjunto, solucionemos aquele problema tão grave. Se assim não for, corremos o risco, como disse a • Sr.ª Deputada, de aqui há alguns anos termos um sapal ou um pântano e todas aquelas populações nunca mais poderem olhar a sua ria e orgulhar-se dela.

Aplausos do PSD e do Sr. Deputado do PS Igrejas Caeiro.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa Mota.

O Sr. Barbosa Mota (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Zita Seabra fez uma intervenção, tocando essencialmente em questões que a todos os aveirenses dizem respeito.
Naturalmente, nós deputados do Partido Socialista eleitos pelo círculo de Aveiro, também estamos de acordo com grande parte dos argumentos aqui utilizados pela Sr.ª Deputada Zita Seabra e, estando o Partido Socialista no Governo, procuraremos encontrar as soluções adequadas, através do próprio Governo e desta Assembleia, em colaboração com os restantes deputados que o quiserem fazer, para que seja evitada em Aveiro uma catástrofe ecológica que pode acontecer.
Há questões extremamente importantes, nós não deixaremos passar a oportunidade de termos no Governo exactamente um partido como o nosso, para tentarmos encontrar soluções adequadas à solução de grande parte daqueles problemas, naturalmente na medida do possível.

Aplausos do PS, de alguns deputados do PSD e do Sr. Deputado da UEDS César Oliveira.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, tem V. Ex.ª a palavra, para responder.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de agradecer as intervenções feitas e penso que delas se depreende que todos nós sentimos um ponto que é claramente comum: uma grande necessidade de informação para sabermos exactamente quais são os perigos que existem, que nível têm esses perigos e que medidas irão ser tomadas para obviar aos perigos que pairam sobre todo o sistema da ria de Aveiro.
Creio, acima de tudo, e depois de ouvir as intervenções das outras bancadas, que é possível exigir que nos seja facultada informação para que os deputados eleitos pelo círculo de Aveiro, na base dessa informação e dos elementos que existem, possam ponderar sobre quais as medidas que são necessárias preconizar para defender essa beleza do nosso distrito, que é a ria de Aveiro.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que todos ganhamos com isso e que é possível, apesar das divergências políticas e ideológicas que separam vários partidos que aqui têm assento, encontrar pontos comuns em torno de uma questão que é tão sentida para as populações e que não as divide, nem política nem ideologicamente.
A população de Aveiro, particularmente a população mais ribeirinha, aquela que vive mais próxima da ria de Aveiro, sente diariamente esta degradação, pois vê-a com os seus próprios olhos. Hoje em dia, a ria de Aveiro muda de ano para ano, modifica-se não só por aqueles factores que apontei - por exemplo a construção do porto-, como por outros motivos, sobretudo por não haver uma estrutura e um organismo coordenador que vele pela ria de Aveiro, no qual possam participar as autarquias. Porque só discutindo com os autarcas eleitos, sejam eles de que partido sejam, particularmente com os membros das câmaras que estão mais próximas da ria, é que se poderão resolver os graves problemas que foram referidos. Eles também não sabem exactamente o que é que se está a passar e que medidas vão ser preconizadas.
Assim, creio que será extremamente útil para a população e para todos nós que se juntem esforços e que se leve ao conhecimento dos deputados e dos autarcas a situação exacta em que neste momento se encontra a ria de Aveiro e os projectos que existem para obviar à sua destruição.
O Sr. Deputado Horácio Marçal citou uma questão que é importante: a da ligação do porto de Aveiro à estrada entre Aveiro e Vilar Formoso. Esta é uma grande reivindicação local. Nós, aliás - deputados dos vários partidos - tivemos oportunidade de visitar, durante a campanha eleitoral, a fábrica Renault e todos nós ouvimos o administrador da fábrica dizer que os camiões da Renault que vêm diariamente de França para Aveiro levam mais tempo a percorrer a distância entre Vilar Formoso e Aveiro do que a percorrer a distância entre Paris e Vilar Formoso.
Em termos de desenvolvimento industrial e de apoio àquela região, é fundamental a construção desta via rodoviária de ligação entre Aveiro e Vilar Formoso. Por isso queria associar-me ao que neste campo disse o Sr. Deputado Horácio Marçal. Penso que também aí temos pontos comuns, podemos fazer uma reinvidicação e um luta comuns para que, rapidamente, Aveiro conte com essa via de saída para a Europa e que tanto viria beneficiar a indústria local.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A terminar, gostaria de dizer o seguinte: só espero que da parte do Governo haja a mesma disponibilidade em nos facultar os elementos de que dispõe, porque nós sabemos que há outros de que nem o Governo nem sequer as entidades oficiais dispõem. Por exemplo, quando pergunto o que é que vai suceder depois das obras de construção do porto em matéria de aumento de salinidade ou de alteração das correntes, são os próprios técnicos que afirmam - e eu tive oportunidade de visitar as obras do porto e de participar recentemente num colóquio com o director

Página 695

9 DE JULHO DE 1983 69S

dessas obras - que os estudos eram demasiado caros, logo não forem feitos. Há af um vazio, não se sabe o que vai passar-se. É bom que tenhamos consciência dos estudos que não existem, mas também é bom que aqueles que existem sejam facultados a todos os deputados, particularmente aos deputados eleitos pelo círculo de Aveiro, para que possamos ponderar e avaliar esses estudos, sobretudo para se evitar que dentro de meia dúzia de anos a ria de Aveiro esteja transformada num pântano ou num sapal.
Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Deputados.

Aplausos do PCP e de alguns deputados do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Carlos Gracias (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Gracias (PS): - Sr. Presidente, não é bem para um protesto, mas para um quase protesto, chamemos-lhe assim.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra para um protesto.

O Sr. Carlos Gracias (PS): - Os problemas da ria de Aveiro são sensivelmente os problemas de todas as regiões com rias. Ê o que se passa no Algarve com o Alvor, é o que se passa com Portimão, é o que se passa com a ria de Faro, é o que se passa com a ria de Olhão, é o que se passa com a ria de Tavira. Todos os problemas decorrentes de uma poluição insensata, todos os problemas decorrentes da falta de protecção do meio ambiente, das espécies que vivem nessas rias. Eu uno os meus esforços à Sr.ª Deputada Zita Seabra e a todos os deputados eleitos pelo circulo de Aveiro para tomarmos providências quanto a esses perigos e pedirmos ao Governo que tome as necessárias medidas para evitar essas situações, porque estou convencido de que as rias não só pela sua beleza, mas também pelas suas potencialidades económicas, são um factor importante para o desenvolvimento económico do País.
Como todos nós sabemos, há países do mundo em que as rias são tomadas na devida consideração como repositórios de espécies piscatórias que ali vão buscar os lugares para a sua desova. Estou convencido de que a Sr.ª Deputada Zita Seabra tomou uma posição muito firme e que essa posição deve ser tomada por todos os deputados de regiões onde existam rias, e não só, lagoas, lagos interiores, etc. Todos falam em proteger as rias, os lagos e as lagoas mas o que é facto é que todas as pessoas que procuram essa beleza não têm o devido cuidado para evitar a poluição. Portanto, Sr.ªs Deputada Zita Seabra e Srs. Deputados de Aveiro, estou inteiramente à vossa disposição para unirmos esforços a fim de pressionarmos o Governo, e não só, as autarquias locais também, para que tomem em conta, na devida atenção, essa riqueza e essa beleza do nosso país.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- Sr. Presidente, acho que a figura regimental que posso utilizar é a do contraprotesto, portanto, vou fazer como que um quase contraprotesto.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Carlos Gracias, queria agradecer-lhe as suas palavras, porque realmente creio que, no País, há um problema geral de poluição e de inexistência de uma política geral de defesa da riqueza que advém da água que temos, que não sabemos proteger e que estamos, diariamente, a deixar afectar.
Conheço menos bem, mas conheço, os problemas da ria de Faro, da ria Formosa, e posso dizer-lhe que, para quem vê de fora, a situação é extremamente mais grave e mais perigosa na ria de Aveiro do que na ria Formosa.
A ria Formosa tem problemas de poluição que advêm fundamentalmente dos esgotos urbanos - é este o ponto fundamental- e até da indefinição de uma política para a sua defesa, mas a situação da ria de Aveiro é já, praticamente, de ruptura.
Na ria Formosa ainda se pode tomar banho, mas na ria de Aveiro é extremamente perigoso fazê-lo e em muitos sítios nem sequer nos podemos aproximar das suas margens, de tal maneira estão infectadas por esgotos industriais e urbanos e agora, mais recentemente, pela industrialização, pela criação do porto de Aveiro.
Portanto, estou de acordo com o Sr. Deputado quanto ao facto de que é necessário haver uma política geral, de todos nós, em defesa do património ecológico que temos - e no caso concreto, o das rias e lagoas -, mas é particularmente grave a situação que neste momento afecta a ria de Aveiro, e isto sem nenhum regionalismo ou bairrismo.
Assim, dentro dessa política geral que é preciso definir, há uma situação alarmante, que é a situação da ria de Aveiro.

O Sr. Presidente:- Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um mês passado sobre a posse deste Governo e quase 3 sobre as eleições de 25 de Abril, o CDS vê que se começam a confirmar, mais cedo do que seria de imaginar, as previsões que havia feito durante e após a campanha eleitoral.
Sobre a «maior maioria» parlamentar de sempre ergueu-se um Governo que não parece dispor de vontade política clara, de identidade programática suficiente, nem da decisão necessária para enfrentar a crise nacional.
E esta crise existe de facto, não já envolta nas roupagens da propaganda eleitoral, mas perceptível no degradar constante das nossas condições de vida, na corrosão progressiva dos alicerces da solidariedade nacional, e até no aparecimento de alguns sinais preocupantes de descrença nas virtualidades do sistema democrático.
Não é com a alegria de quem vê que os factos lhe dão razão que o CDS encara a presente situação.

Página 696

696 I SÉRIE - NÚMERO 18

O sentido das responsabilidades e a prática política de um partido que nos momentos mais críticos sempre soube optar pela sobreposição no interesse nacional a uma visão egoísta e sectária, levam-nos a encará-las com crescente preocupação e fundadas dúvidas.
Temos sido, desde as eleições, uma oposição clara, construtiva e eficaz, cujo primeiro objectivo não é o de derrubar o Governo, nem dificultar a sua acção, mas denunciar os seus erros e omissões, propor soluções diversas, enfim, formular um outro modelo de sociedade que acreditamos corresponder à natureza e aos interesses de uma grande parte do povo português, a única oposição com sentido nacional, susceptível de constituir uma alternativa política crível ao actual Governo de maioria e inspiração socialista, e, por isso mesmo, condição essencial da democracia e do princípio da alternância no poder.
Por isso, exprimindo pela nossa voz do País real, nos sentimos no dever, mais do que no direito, de trazer a esta Câmara o nosso juízo sobre as consequências negativas que da prática do actual Governo tem resultado para os portugueses e significar-lhe que para a continuação de tal política nunca poderá contar com qualquer compreensão da nossa parte.
Na Assembleia da República, um terreno que lhe deveria ser particularmente propício, talvez mesmo o único em que a coligação é seguramente maioritária, o Governo tem demonstrado uma fragilidade e inconsequência que consideramos alarmante e que ao tentai superar pela via da desvalorização da instituição parlamentar poderá acarretar o seu desprestígio e o desta Assembleia. Por isso verberamos que se tentem introduzir na prática parlamentar injustificáveis inovações de circunstância, como as de Ministros de Estado falarem em nome pessoal ou secretários de Estado revogarem decisões do Conselho de Ministros.
O Governo não foi ainda capaz de definir uma linha política consequente de combate à crise, o que se verifica na apresentação de pedidos de autorização legislativa que reformula ou retira e dos quais um único até agora discutido, a nosso ver, se poderá considerar inequivocamente merecedor de tal tratamento.
Mas mesmo esse debate - e refiro-me ao pedido de alteração da Lei de Delimitação dos Sectores- a postura envergonhada e semiclandestina do Governo e de quase todos os deputados da maioria parece significar que aquilo que deveria ser um acto histórico de reparação democrática dos erros revolucionários e a manifestação assumida de uma reconversão política que, por corajosa, mereceria o nosso respeito, se transformou, afinal, no cumprimento penoso de uma promessa imposta por um amplo movimento de opinião, de que o CDS foi, aliás, o principal protagonista político nos últimos anos, o que legitima que nos interroguemos sobre o seu verdadeiro alcance prático e que coloquemos a dúvida de saber se ele não é, sobretudo e ainda, uma última tentativa de sobrevivência do sistema económico socialista, agora com o socorro da banca privada.
O CDS estará, pois, atento à elaboração da legislação subsequente e à sua aplicação, que considerará um verdadeiro teste à democracia sobretudo depois da declaração aqui feita pelo PCP de «que em última análise quem decide se vai haver empresas privadas na banca, nos seguros» nos cimentos e nos adubos será a luta popular». Temos que reconhecer que o silêncio do Governo sobre esta matéria nesta Assembleia deu verosimilhança à ameaça da rua!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira condição para a superação da crise -têmo-lo dito e reconheceu-o, aliás, o Sr. Primeiro-Ministro - é o reforço da autoridade do Estado e do prestígio das instituições democráticas.
Também não é infelizmente positiva a acção do Governo neste domínio e pouco é o sentido de Estado até agora demonstrado.
A confusão entre questões partidárias e questões de Estado, a escandalosa luta política e pública pela partilha do poder e a distribuição dos lugares públicos por militantes de partidos da maioria, que tem sido anunciada e não desmentida, são algumas das medidas que censuramos, com veemência, e que o País não poderá suportar.
Como é degradante que nos queira habituar a uma espécie de censura prévia das declarações governativas, que parece traduzir não apenas uma desconfiança do executivo nos seus próprios membros, como um menosprezo pelo papel da informação e dos jornalistas na criação de uma opinião pública livre e esclarecida.
Mas mais grave talvez do que tudo isto, até porque menos perceptível aos olhos do cidadão comum, é a demissão da autoridade do Estado, traduzida na prática que se começa a generalizar de erigir a negociação, permanente, em processo normal de decisão, fazendo depender a vontade política do acordo prévio de grupos de pressão, que muitas vezes nem sequer são os verdadeiros parceiros sociais. Como vai o Governo executar uma política coerente de exigência, de verdade e de rigor por este processo é pergunta a que seguramente alguns Srs. Ministros desejariam já, neste momento, com certeza saber responder. Os casos da LISNAVE - aqui com a agravante da impunidade de violações graves de direitos fundamentais-, das greves nos transportes da área de Lisboa e da ANOP, são outros tantos exemplos da ausência de uma vontade política clara e competente.
A maior maioria parece afinal gerar um enorme vazio de poder.
É que se podem ganhar as eleições com um bom marketing político, mas um país em crise exige mais do que isso e o Governo não pode ser um prolongamento de uma comissão técnica eleitoral.
É por isso que a população do Norte não se deixa enganar com a instalação de 3 Secretários de Estado no Porto - Secretários de Estado e não de secretarias de Estado, sublinhe-se, porque todos os serviços se mantêm em Lisboa em vez de se proceder, como era devido, às descentralizações da decisão política e à valorização da autonomia regional.
Nem entende, por exemplo, a suspensão sem funda mento do concurso para nova ponte sobre o rio Douro, cujas graves consequências terão de ser claramente assumidas, a menos que se trate de um mero expediente para protelar indefinidamente a solução de um dos mais graves problemas da região, ou até, quem sabe, de uma mera questão pessoal.
A verdadeira concepção da autonomia dos poderes regionais, essa sim, encontra-se melhor expressa seguramente na intervenção pessoal do próprio Primeiro-Ministro no processo eleitoral do presidente da Comissão Regional de Turismo do Algarve.

Página 697

9 DE JULHO DE 1983 697

Em vão temos esperado medidas positivas do Governo para resolvei algumas questões concretas, como tinha sido prometido.
Mas afinal a que temos assistido? Ao aumento incontrolado dos preços, sem quaisquer medidas compensatórias; ao maior aumento algumas vez verificado em Portugal do custo dos factores de produção agrícola como as rações e os adubos, que chega a atingir, no caso destes, os 87 %, o que em conjunção com outros factores lançou a agricultura e os agricultores numa das crises de mais graves consequências. A destruição do efectivo pecuário, o aumento em flecha do preço de bens essenciais, como o leite e a carne, e a inviabilização de largos milhares de explorações agrícolas, eis os primeiros resultados da política económica que já começa a ser criticada pelos próprios deputados da maioria.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Será que os agricultores não têm o direito ao diálogo prévio? Será que isso acontece só porque eles não podem ou não querem fazer greve?

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, a subida generalizada dos preços parece indiciar uma aceleração da taxa de inflação, cuja contenção tinha sido conseguida nos últimos meses.
Em geral verifica-se que não há uma política global de rendimentos e preços.
Parecem igualmente despontar no horizonte inevitáveis aumentos de impostos, obviamente com argumentos de justiça social mas que, na prática, agravarão as condições de vida de todos. Perspectivas sombrias para os empreendedores e os consumidores a quem na Europa ninguém espera que seja o socialismo a resposta da esperança.
Pouco tempo foi, pois, necessário para que se revelasse o rosto do socialismo, ainda que social-democratizado. Aliás, as medidas que nós esperávamos, essas, ainda não vieram: o que foi feito na luta contra a corrupção? Para quando a regulamentação da lei que obriga à declaração dos bens de titulares de cargos políticos? Que medidas concretas para diminuir as despesas públicas e os privilégios injustos de natureza corporativa em que se destaca a classe dirigente? Ou será que a austeridade é apenas para os cidadãos e não começa pelo Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A causa estrutural das nossas dificuldades é o sistema socializante, de que o PS e o PSD são a expressão partidária mais próxima, e seria pois contraditório que a coligação destes partidos as pudesse resolver.
Num certo sentido, esta coligação parece mais um abraço de náufragos para evitar o afundamento do modelo de ambos do que o caminho para vencer a crise do País. E as contradições e ambiguidades que ela encerra e potência colocam a questão, que é talvez a grande questão a que este Governo ainda não respondeu, de saber se se pode governar um país abandonando os princípios e as ideias numa situação em que a crise é talvez, e sobretudo, uma crise moral.
Este quadro realista, mas preocupante, não alterará o nosso percurso. Ser oposição construtiva não é ser menos oposição, é sim outra forma de oposição! Não renunciaremos a nenhuma das nossas convicções. Temos uma proposta de progresso, de justiça e de liberdade para os portugueses. E perante a gravidade da situação proporemos a todos os que connosco compartilham as mesmas preocupações e idênticos objectivos, independentemente do seu posicionamento concreto, a conjugação de esforços para que seja possível viabilizar uma alternativa democrática e nacional às soluções socialistas do actual Governo, porque é preciso, sobretudo, não deixar morrer a esperança!

Aplausos do CDS.

Durante a intervenção, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (José San-Bento Menezes).

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Gomes de Pinho, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem-se reclamado o CDS de uma oposição construtiva ao Governo, que eu diria não sectária.
Mas a que é que nós assistimos? A algo que a mim me parece, no mínimo, bizarro. É que 20 dias após o Governo estar em pleno uso dos seus direitos - pouco mais de 20 dias passaram, se não me falha a memória, sobre a discussão nesta Câmara do Programa do Governo - o CDS vem acusá-lo, vem fazer o balanço da actividade deste e vem dizer que ele se revelou incapaz de debelar a crise, esquecido talvez que foi Governo durante 3 anos e que não debelou a crise, quanto muito terá contribuído para a agravar.

Vozes da UEDS: - Muito bem!

O Orador: - O CDS vem, por exemplo, reclamar pela luta contra a corrupção. Estamos de acordo, é fundamental!
Mas o que fez o Governo a que o CDS pertenceu durante 3 anos para impedir essa corrupção, para lutar contra ela? É ou não verdade, Sr. Deputado, que ao longo desses 3 anos em que o seu partido foi governo a corrupção se agravou?
Sr. Deputado, penso que, de facto, mudam-se os lugares, mudam-se as vontades e faço votos de que a vontade agora expressa pelo CDS, no sentido de tentar resolver os problemas com que o povo português se debate, no sentido de pôr cobro à corrupção e todas as boas intenções manifestadas pelo Sr. Deputado, se mantenham, se porventura - e eu faço votos de que assim não aconteça- o CDS voltar a mudar de lugar nesta Assembleia.

Aplausos da UEDS.

Página 698

698 I SÉRIE - NÚMERO 18

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero fazer um pedido de esclarecimento, antes quero formular um protesto.
O Sr. Deputado Gomes de Pinho veio hoje dar-nos uma amostra de endurecimento do CDS na oposição que, recentemente, foi anunciado ao País por um dirigem te (e até por um comunicado) do seu partido.
(Como demonstração de oposição e de endurecimento dessa mesma oposição, convenhamos que a intervenção do Sr. Deputado Gomes de Pinho não foi convincente. E não o foi porque, em primeiro lugar, forçou demasiado a «nota» nas críticas ao actual Governo. Aliás, mesmo essas são totalmente injustificadas. Por outro lado, está ainda fresca, na memória de todos nós, a massagem do CDS pelo Governo. O Sr. Deputado Gomes de Pinho falou como se o CDS não tivesse estado no Governo durante quase 3 anos e não tivesse qualquer responsabilidade na crise nacional, na crise dó País, que o Sr. Deputado, ele mesmo, aqui reconheceu e assinalou.
De facto, o CDS é um dos grandes responsáveis, provavelmente o maior, pelas dificuldades que se atravessam e não deu boa conta de si na sua passagem pelo Governo.

Uma voz do CDS: - O maior?! ...

O Orador: - Por conseguinte, deveria ter mais cuidado e maior ponderação nas críticas que aqui vem fazer.
Por outro lado, fica-lhe mal afivelar a «máscara de catão» e vir aqui invocar virtudes e moralidades que o CDS não demonstrou no Governo. O Sr. Deputado atacou o Partido Socialista porque este estaria a fazer uma divisão de lugares e de benesses entre socialistas e sociais-democratas. O que o CDS está, na verdade, a fazer é a tentar defender as centenas e centenas de militantes seus que, sem terem especiais aptidões, foram colocados, muitos deles, em determinados lugares por puro favoritismo e por puro apadrinhamento.
É essa a questão fundamental. O resto são puras difamações que não têm qualquer fundamentação real.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado Gomes de Pinho, fazemos votos para que o CDS se desenhe e perfile como oposição e venha, inclusive, a ser uma alternativa. Para isso, no entanto, terá de aguardar muitos e muitos anos, porque o CDS tem apenas 13 % de votos e esta coligação, que agora começou a criticar, tem possibilidades de durar, vai durar e vai resolver os problemas do País.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, a minha resposta vai ser muito breve, porque creio que os pedidos de esclarecimento e os protestos não justificam outra coisa.
Em primeiro lugar, quero dizer que o que está aqui, neste momento, a ser apreciado e julgado não é o Governo da Aliança Democrática, mas sim o Governo actual do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata.
Aliás, sobre o Governo da Aliança Democrática gostaria de lembrar aos Srs. Deputados, alguns, porventura, um pouco já esquecidos disso, que nunca o Primeiro-Ministro foi do CDS e que, mesmo pára além dos Governos da Aliança Democrática, nunca o CDS teve um seu militante como Primeiro-Ministro de Portugal. Se isso tivesse acontecido talvez não estivéssemos agora nesta situação.

Aplausos do CDS. Risos do PS e do PSD.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos esperado com bastante tranquilidade, diria mesmo que, talvez com mais tranquilidade e calma do que a maioria dos portugueses, que este Governo tivesse aproveitado os dias que já decorreram desde a sua tomada de posse - tendo já passado um terço dos 100 dias em que o PS se propunha tomar medidas extremamente importantes - para resolver alguns dos problemas do País.
Mas, o que o Sr. Deputado Carlos Lage ou qualquer outro aqui nesta Câmara não poderá negar é que o conjunto das medidas, avulsas e inconsequentes, que este Governo tomou veio provocar um substancial agravamento da situação, não se vislumbrando qualquer melhoria ou qualquer fundo no túnel negro onde continuamos a caminhar.
Esta é que é a realidade. Podem os Srs. Deputados tentar escondê-la mas o País, através das instituições representativas dos interesses dos grupos sociais mais relevantes, têm tornado claro que esse é o seu sentimento.
Ora, o CDS não pretendeu mais do que exprimir aqui esse sentimento.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - É preciso ter lata!

O Orador: - Não responderia a certas acusações infundadas do Sr. Deputado Carlos Lage, as quais são, aliás, menos próprias, porque entendo que esse tipo de acusações implica, pela sua gravidade, que quem as profira as prove.

O Sr. Carlos Lage (PS): - As suas acusações é que são infundadas!

O Orador: - O que V. Ex.ª disse não corresponde à verdade, pelo menos até que prove o contrário.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora entrar no primeiro ponto da ordem do dia. Vai ser lido pelo Sr. Secretário Reinaldo Gomes um relatório

Página 699

9 DE JULHO DE 1983 699

e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de alguns deputados.

Foi lido. É o seguinte:

Em reunião realizada no dia 8 de Julho de 1983, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de Deputados:

1) Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

José Augusto Gama (círculo eleitoral de fora da Europa) por Jorge Morais Barbosa (esta substituição é pedida para os próximos dias 12 a 15 de Julho corrente, inclusive).

2) Solicitada pelo Movimento Democrático Português/CDE:

Raul Fernandes de Morais e Castro (círculo eleitoral do Porto) por Artur Augusto Sá da Costa (esta substituição é pedida por um período não superior a l mês, a partir do dia 8 de Julho corrente, inclusive).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Luis Silvério Gonçalves Saias (PS) - Raul Fernando Sousela da Costa Brito (PS) -Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) substituída por Amadeu Vasconcelos Matias - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Francisco Manuel de Menezes Falcão (CDS) - Manuel António de Almeida de A. Vasconcelos (CDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos passar de imediato à votação do presente relatório.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos agora no primeiro ponto da ordem do dia, que respeita à apreciação da proposta de lei n.º 16/III - Direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública e regime disciplinar da função pública.
Tem a palavra, para apresentar o referido diploma, o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (San-Bento Menezes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vem o Governo, através das propostas de lei n.ºs 16/III e 17/III, relativas, respectivamente, «Ao direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública e regime disciplinar da função pública» e «medidas de política de emprego e de gestão de recursos humanos na função pública e descongestionamento para subsequente extinção do quadro geral de adidos».

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe o favor de interromper por 1 minuto.
Sr. Deputado João Amaral, para que efeito pede a palavra?

O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, era para um duplo efeito: ou para interromper o Sr. Secretário de Estado, se ele mo permitir, ou para interpelar a Mesa.
Aliás, digo já sucintamente, qual é o problema. Pelo que ouvi, o Sr. Secretário de Estado está a apresentar, simultaneamente, as propostas de lei n.ºs 16/III e 17/III. Ora, o que está neste momento em discussão é, e só, a n.º 16/III.
Foi neste sentido que coloquei a questão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem razão. O que está neste momento em apreciação é, efectivamente, só a proposta de lei n.º 16/III.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: - Srs. Deputados, visa o Governo através da proposta de lei n.º 16/III, em primeiro lugar, respeitar o compromisso internacionalmente assumido pelo Estado Português ao ratificar, através da Lei n.º 17/80, de 15 de Julho, a Convenção n.º 151, da Organização Internacional do Trabalho, relativa à protecção do direito de organização e aos processos da fixação das condições de trabalho na função pública, ratificação essa que pressupõe uma regulamentação no âmbito do nosso direito interno.
Em segundo lugar, visa o Governo dar cumprimento ao Programa do Governo, o qual de entre as principais medidas a adoptar em sede de Administração Pública e de modernização administrativa, se refere, explicitamente, à de regulamentar o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública.
O regime a instituir pretende disciplinar, clarificar, consagrar e desenvolver a prática negocial que vem sendo seguida com vista à fixação das condições de trabalho dos mencionados trabalhadores.

Página 700

700 I SÉRIE - NÚMERO 18

Antes de entrar numa exposição mais concreta desta matéria, convém fazer um breve resumo de direito comparado do que se passa em outros países em matéria de consulta e de negociação na função pública.
Assim, há países onde os funcionários públicos não têm o direito, nem individual nem colectivo, de participar por via da consulta ou da negociação nas decisões relativas às suas condições de trabalho. Países onde tais decisões são tomadas unilateralmente, pelo poder legislativo ou pelo poder executivo (é o caso do Afeganistão, da Bolívia, do Irão, etc.): isto muito embora, em alguns desses países os funcionários possam dirigir «representações» aos poderes públicos.
Há países onde vigora um sistema de consultas informais. Países onde se desenvolveu uma prática (não prevista nas suas leis) consistente em fazer consultas, mais ou menos regulares, com as organizações representativas dos funcionários, sobretudo acerca de projectos de lei. (É o caso do Sri Lanka e de alguns países da América Latina).
Há países onde vigora um sistema de consultas formais. Países onde se desenvolve um sistema oficial hierarquizado de consulta dos funcionários, por vezes por intermédio de organismos paritários. Importa referir que tais consultas podem ser facultativas ou obrigatórias mas que os referidos organismos paritários têm apenas poderes consultivos. (Tal é o caso da França, da Bélgica, da Holanda, da Suíça, etc.).
Há países onde existe um sistema de negociações colectivas de facto (não de direito). Países onde os organismos representativos dos funcionários obtiveram na prática das coisas, o direito de negociar colectivamente com o Governo e de concluir convenções colectivas relativas às condições de trabalho na função pública, embora os poderes de tais organismos permaneçam puramente consultivos (tal parece ser hoje o caso da França e da Dinamarca).
Há ainda países, onde vigora, com nuances várias, um sistema de consulta e participação nas decisões relativas à função pública. É o caso da República Federal da Alemanha, onde foi adoptado, para certas matérias, o direito de co-decisão para completar os processos de consulta em vigor relativamente às principais federações sindicais de funcionários. Ê também o caso de numerosos países socialistas onde os sistemas adoptados são um misto de consulta e de co-decisão (mas onde o direito dos funcionários de concluir acordos colectivos, embora reconhecido por lei em igualdade com outros trabalhadores, só muito raramente parece ser usado).
É ainda o caso da URSS, onde tal matéria é regulada pela legislação geral do trabalho.
Finalmente, abstraindo do caso muito particular do Reino Unido (conselhos whittley, instituídos a nível nacional, departamental e local), há países onde vigora um sistema de negociação colectiva regulada pela lei. Nesses países, as condições de emprego na função pública são determinadas, integralmente ou em parte, por via de negociações colectivas reguladas pela lei, sendo tais negociações entabuladas entre representantes dos poderes públicos, por um lado, e, por outro, organizações representativas do pessoal da função pública (é o caso, por exemplo, dos Estados Unidos da América, da Finlândia, da Noruega, da Suécia, da Austrália e da Nova Zelândia, todos também, com nuances diversas do ponto de vista do seu direito interno).
Desta exposição talvez um pouco excessiva do que se passa no domínio do direito comparado, interessa realçar que em nenhum caso, mas absolutamente em nenhum, vigora um sistema de contratação colectiva. O que existe é, e apenas nos países de sistema mais avançado, uma mera negociação colectiva.
A distinção entre negociação e contratação é um ponto fundamental. Trata-se de uma distinção de natureza jurídica. Ela significa, de uma forma muito simples, que sendo o processo de fixação das condições de trabalho na função pública um processo de concertação, através do qual se procura atingir, pelo consenso, um acordo, este acordo (escrito ou não), não tem a natureza de um contrato colectivo de trabalho e não produz, por isso, só por si, efeitos jurídicos. É sempre requerida a intervenção posterior de um órgão do Estado (seja o Rei ou Presidente da República, seja o Parlamento, seja o Governo, consoante os casos, mediante um acto legislativo. É o que se passa na Itália, na Suécia, na Finlândia e no Canadá) ou de uma autoridade pública superior à instância negocial (caso dos Estados Unidos da América).
Esclarecida a natureza do direito de negociação importa, finalmente, concretizar os objectivos que se pretendem atingir.
São esses objectivos: em primeiro lugar, reconhecer legalmente o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública relativamente às suas condições de trabalho; em segundo lugar, fixar os casos de obrigatoriedade de consulta das organizações sindicais; em terceiro lugar, determinar quais as questões que podem ser objecto de negociação (a título exemplificativo, podem ser objecto de negociação matéria de remunerações, de pensões e variados aspectos do regime da função pública, não podendo ser objecto de negociação, por exemplo, a criação ou extinção de serviços. A sua organização e funcionamento, a direcção e a repartição de tarefas no âmbito dos serviços, o recrutamento, a disciplina, a classificação de serviço, etc.); em quarto lugar, visa-se assegurar através dos organismos adequados o estabelecimento de relações com as organizações representativas dos trabalhadores da Administração Pública, incluindo mecanismos de diálogo e de concertação.
Por outro lado, através da proposta de lei n.º 16/III, introduzir alterações ao regime disciplinar da função pública.
Pretende-se, concretamente, em cumprimento do Programa do Governo: em primeiro lugar, redefinir os factos ilícitos passíveis de sanção disciplinar de uma forma mais clara e menos genérica e, por outro lado, definir novas formas de ilícito disciplinar do-«tipo ilícito de corrupção». A sofisticação dos comportamentos ilícitos requer, aqui, em contrapartida, o aperfeiçoamento e a actualização das definições; em segundo lugar, corrigir a dosimetria das penas no sentido do seu agravamento; em terceiro lugar, ultrapassar dificuldades de execução de carácter processual disciplinar que diversos serviços públicos têm colocado à Secretaria de Estado da Administração Pública, a maioria, aliás, já resolvidas pelo Despacho Normativo n.º 142/80, de 24 de Abril, mas que parece, dada a dignidade da matéria deverem ser integradas no próprio estatuto disciplinar.

Página 701

9 DE JULHO DE 1983 701

Finalmente, desejava sublinhar que o Governo está consciente que o combate à corrupção não passa apenas pela revisão do Estatuto Disciplinar. O combate a travar tem de o ser a todos os níveis, nomeadamente ao nível criminal e é um combate de toda a Administração contra uma perversão social que, a alastrar, mina os alicerces do Estado. Sublinha-se ainda que se tem perfeita consciência de que a esmagadora maioria dos trabalhadores da Administração Pública é proba. Esses trabalhadores, de resto, estão conscientes da gravidade do problema e da necessidade de o atacar.
Em relação à legislação que o Governo, com esta autorização da Assembleia, pensa produzir serão naturalmente ouvidas, tal como tem sido a prática nestes casos, as organizações sindicais do sector.

Aplausos do PS e do PSD.

Neste momento, assume a presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado, este pedido de autorização legislativa vem de encontro a uma reivindicação manifestada de há longa data - e que consideramos justíssima - pelos trabalhadores da função pública.
A sua intervenção esclareceu algumas das dúvidas que queria colocar-lhe, nomeadamente a relativa ao problema da consulta obrigatória, à qual, julgo, V. Ex.ª respondeu afirmativa e positivamente.
No entanto, gostaria só de pôr-lhe uma questão que, ao fim e ao cabo, é fundamental nesta matéria. O tipo de regulamentação que o Governo vai estabelecer para esta matéria poderá correr o risco - caso venha a ser exaustiva- de pôr tantas vaias ao próprio processo de negociação colectiva que pode retirar espaço de manobra à própria negociação. Pergunto-lhe, pois, que tipo de regulamentação se vai estabelecer. Flexível, sucinta, ou muito enumerativa e exaustiva? Ë que isto pode conduzir a que seja criada uma estrutura negocial leve, que possa permitir uma negociação mais flexível, ou então o inverso, e neste caso parecer-nos-ia ser negativo que isso sucedesse.
O meu agrupamento parlamentar irá dar o seu acordo a este pedido de autorização legislativa; contudo, gostaríamos que o Sr. Secretário de Estado ainda pudesse precisar mais o âmbito, o alcance deste pedido de autorização legislativa que nos parece fundamental e que visa satisfazer uma das 100 medidas - creio que a 81.ª com que o Partido Socialista se apresentou a sufrágio.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Secretário de Estado, começo por manifestar uma certa estranheza, sobretudo em relação às suas últimas palavras.

O Sr. Secretário de Estado apresentou-nos as linhas gerais de um conjunto de medidas - e já lá iremos - e referiu que, digamos, essas medidas iriam ser discutidas com as organizações representativas dos trabalhadores da função pública. Ora, uma primeira questão se me coloca: por que não ser esta Assembleia a organizar esse debate, por que não trazer o Governo a esta Assembleia uma proposta de lei material em que - como se fez, por exemplo, em relação à Convenção n.º 151 da OIT- pudesse ser a própria Assembleia da República a organizar as consultas às organizações representativas dos trabalhadores, a estudar as diferentes propostas e a chegar às soluções que tivesse por mais adequadas para o problema?
V. Ex.ª diz, ou melhor, o Governo diz, em matéria da alínea a) do artigo 1.ª do pedido de autorização legislativa, que com esta iniciativa visa desenvolver a prática negocial que vem sendo seguida.
Sr. Secretário de Estado, não é também sem estranheza que a nossa bancada ouve estas palavras. Até aqui creio que não se poderá dizer, com verdade e com rigor, que se tenha seguido uma prática negocial em relação aos trabalhadores da função pública. Inclusivamente, o partido de V. Ex.ª denunciou no passado o que foi a imposição, pelos Governos da AD, de determinadas medidas em relação aos trabalhadores da função pública!
Falo-lhe, por exemplo, no caso das tabelas salariais em que as organizações representativas dos trabalhadores foram confrontadas com um facto consumado! Não tiveram oportunidade de discutir, de negociar, as remunerações, as condições salariais, as condições de trabalho que lhe foram apresentadas pelo Governo, em legislação concreta!
Sr. Secretário de Estado, creio que se trata de um lapso de escrita quando, em relação à proposta de autorização legislativa que nos é apresentada, na segunda linha da alínea a) se refere o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública. Penso, Sr. Secretário de Estado, que estará de acordo comigo, quanto ao entendimento que dou e que é o de que o que se pretende dizer -e deverá ficar escrito- é: «o direito de negociação das organizações representativas dos trabalhadores da Administração Pública ou dos trabalhadores da função pública».
Penso que é isso o que decorre da nossa Constituição, é o que decorre da Convenção n.º 151 da OIT, que é referida neste pedido de autorização legislativa, e em cujo artigo 3.º se fixa com clareza que são organizações dos trabalhadores da função pública e não trabalhadores da função pública, em abstracto.
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, queria dizer-lhe que haverá muitas outras questões que o meu grupo parlamentar pretende trazer à colação quanto a este conjunto de pedidos de autorização legislativa, relativos à função pública, mas que com mais rigor serão colocadas aquando da discussão da proposta de lei n.º 17/III.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr r Secretário de Estado, reporto-me fundamentalmente à alínea b) da proposta de autorização legislativa.
De facto, se analisar os vários pontos dessa alínea, verifica que o que é proposto é a revisão de todo o regime, é a criação de novos factos, de novas formas de ilícito, a redefinição de factos ilícitos, a correcção da dosimetria das penas, é o ultrapassar dificuldades de execução e integrar lacunas.

Página 702

702 I SÉRIE - NÚMERO 18

Diria, Sr. Secretário de Estado, que para cumprir o preceito constitucional que determina que seja fixado o sentido não me parece suficiente o que aqui está escrito. Na redacção introduz-se, num dos 4 pontos, a definição de novas formas de ilícito de corrupção.
Devo dizer-lhe que me parece que as questões de corrupção poderiam e deveriam ser tratadas autonomamente, num quadro próprio, e sem as ligar de uma maneira tão brutal -peço desculpa da expressão - à situação dos trabalhadores da função pública.
De facto, pode ser necessário rever - não sei se é nem se não mas o Sr. Secretário de Estado dirá qual é o sentido - o regime disciplinar; o que me parece é que se isso for necessário deverá ter constitucionalmente um sentido que é o de garantir os direitos dos trabalhadores da função pública! Porque para definir novas formas de ilícito de corrupção, então estamos num outro campo - e essa é uma outra questão que eu também tinha pensado tratar.
Portanto, causa logo uma certa confusão a inserção em matéria de regime disciplinar de novas formas de ilícito de corrupção. E isto por uma razão simples: como o Sr. Secretário de Estado sabe muito bem, a corrupção é um crime previsto e punido pelo Código Penal. É um crime, evidentemente, da função pública. É punida a corrupção activa, e a passiva - os termos estão claros, estão definidos. E uma das penas possíveis é a pena de demissão, em certas circunstâncias.
O que é que se pretende então, Sr. Secretário de Estado? Retirar dignidade penal a esta matéria? Pretende-se descriminalizar, ou haverá algumas outras formas de corrupção não previstas? Se há, então porque não descreve quais são os tipos legais, quais são os tipos de infracção disciplinar que tem em vista?
Não seria mais importante que isso ficasse claro e esclarecido aqui nesta Assembleia, em termos de se saber exactamente aquilo que se vai fazer nesta matéria?
Não era melhor, Sr. Secretário de Estado, numa matéria tão delicada como esta, aparecer aqui com uma proposta material, com uma proposta de lei? Pode ter a certeza de que ela seria rapidamente agendada, tratada, discutida e, naturalmente, aprovada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS):- Apoiado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Ao situar o problema em termos de Direito Comparado, o Sr. Secretário de Estado avançou desde a fixação unilateral até à consulta e à negociação.
Eu queria perguntar-lhe, sob um ponto de vista de opinião própria -já que também a tem defendido em jornais, por exemplo, durante os anos de 1981-1982 -, se considera que as relações entre a Administração e os trabalhadores da função pública, no Portugal de 1981-1982, não assumiram, em vários aspectos, a forma de fixação unilateral das condições de trabalho por parte da Administração em relação aos trabalhadores da função pública, isto é, se a gestão da Administração Pública feita pelos titulares do Ministério da Reforma Administrativa, designadamente pelos Ministros Eusébio Marques de Carvalho e Meneres Pimentel, não foi de fixações unilaterais, ou seja, estádios primários destas fases pré-negociação.
Gostaria, pois, de saber qual é a opinião actual do Sr. Secretário de Estado sobre esses processos que foram utilizados no nosso país.
Em segundo lugar, queria referir-me à parte do objecto de negociação a que o Sr. Secretário de Estado aludiu, isto é, às várias matérias que são objecto de negociação.
Acontece que não fez referência a uma que na organização e na gestão dos serviços, tanto a nível de empresas como a nível de aparelho de Estado (aparelho de Estado central e aparelho de Estado local e regional), tem vindo a ser um ponto forte em todas as negociações. Quero referir-me às alterações organigramáticas, às alterações funcionais dentro dos quadros dos Ministérios, sabendo o Sr. Secretário de Estado - como bem sabe- que muitas vezes é por revisão organigramática e funcional que se promovem ou despromovem serviços, que se fazem ou refazem carreiras, que se promovem ou despromovem pessoas. De facto, e a título exemplificativo, refiro uma das técnicas utilizadas: despromover serviços é também alterar-lhes o conteúdo funcional - e os senhores sabem-no, certamente!
Ao pôr entre parênteses a revisão das estruturas organigramáticas e funcionais nas matérias que não são objecto de negociação, o Sr. Secretário de Estado tinha certamente isto em vista, porque pelos livros sabe que esta é uma das matérias importantes. Gostaria, portanto, de perguntar-lhe também, se, de facto, esse pôr entre parênteses significa alguma coisa a mais do que aquilo que proeurou dizer.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS):- Sr. Secretário de Estado: Em primeiro lugar, quero salientar e assinalar que a clareza da sua explicação nos permitiu ir um pouco mais longe sobre os objectivos do Governo ao pretender legislar nesta matéria.
No entanto, ficaram algumas dúvidas que se possível gostaríamos, ainda, de ver esclarecidas em aditamento à sua exposição inicial.
No que respeita ao primeiro ponto, à alínea á) do artigo 1.º da proposta ora em discussão, o Sr. Secretário de Estado, abordando o problema numa perspectiva de Direito Comparado, deu-nos a entender que nesta matéria se vai orientar, no cumprimento do que se encontra estabelecido na Convenção da OIT, e, portanto, para um sistema de simples negociações, como lhe chamou.
É isso, realmente, o que tenciona fazer o Governo?
E se é isso, qual o objecto dessa negociação? Poderá dar-nos alguns esclarecimentos? É que ficámos um pouco com a ideia que se trataria de matérias de natureza puramente quantitativa, de carácter remuneratório, pensões, etc. Será isso verdade? Qual o âmbito que a negociação vai ter, isto é, que tipo de funcionários vão ser abrangidos? Poderá fazer também algumas precisões complementares sobre este assunto?

Página 703

9 DE JULHO DE 1983 703

Seria bom, porque se trata de matéria da maior importância, Sr. Secretário de Estado. Em segundo lugar, e no que respeita à alínea b), o Sr. Secretário de Estado salientou, já no fim da sua exposição, e bem!, que não era desta forma que se combatia a corrupção.
Nós têmo-lo dito. Realmente, não é desta forma, Sr. Secretário de Estado! Ë de outras formas, são outros os métodos P usar para combater a corrupção. Fundamentalmente, no entender desta bancada, é diminuindo o poder de intervenção da Administração Pública que, em grande parte, se combate a corrupção.
Mas, Sr. Secretário de Estado, abordar o tema da corrupção, que é um tema de vital importância neste momento, e fazê-lo pela primeira vez em relação è função pública, é, pelo menos, infeliz.
E é, pelo menos, infeliz porque é criar no público a ideia de que, realmente, o cerne da corrupção se encontra nos funcionários públicos e na função pública. E esta bancada tem de pronunciar-se contra isto.
Por outro lado, quando o Sr. Secretário de Estado se propõe modificar as molduras do ilícito disciplinar do actual estatuto da função pública, levanta-se-nos esta questão: a corrupção ou delito de corrupção, tal como está definido, talvez de uma forma menos feliz, tem como moldura penal a pena máxima: a aposentação compulsiva. Se assim é, o que pretende o Governo nesta matéria? Pretende diminuir, despenalizar de outra forma, e de forma mais branda, o delito de corrupção?
É que isso parece estar em contradição com as próprias afirmações do Governo, feitas na nota justificativa e na sua intervenção.
Por outro lado, V. Ex.ª fez referência a outros temas e seria bom que esta matéria fosse apresentada a esta Câmara de uma forma integrada.
Eram estas as minhas questões, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Sá da Costa.

O Sr. Sá da Costa (MDP/CDE):- Sr. Secretário de Estado: O Governo propõe-se legislar sobre o direito de negociação colectiva. Se este direito for consagrado, virar-se-á uma página importante na vida dos trabalhadores da função pública e nas suas organizações sindicais.
Dir-se-á que não é sem tempo, visto que se trata da consagração de um direito que todos sabemos - penso eu - ser um direito fundamental consagrado na Constituição de 1976.
Todavia, a proposta aqui apresentada pelo Governo suscita-me algumas preocupações e levanta-me algumas questões.
O Governo fez tábua rasa da discussão que nos últimos anos houve em torno deste problema. Com efeito, o Governo apresenta aqui uma proposta que é, digamos, a enunciação de umas ideias muito gerais quando deveria - e deveria porque tinha possibilidades para isso se não estivesse de costas voltadas para esta discussão dos últimos anos - ter apresentado aqui uma proposta já devidamente articulada, um texto com o conteúdo total daquilo que pretende legislar sobre este tema. Não o fez e as questões que a proposta me levanta são muitas. Em todo o caso vou só enunciar apenas algumas.
O Governo fala em consagrar a prática, mas que prática? A prática da imposição unilateral das tabelas dos salários dos trabalhadores da função pública?
Por outro lado, ouvi com interesse a sua dissertação sobre Direito Comparado e notei-lhe uma preocupação, Sr. Secretário de Estado: a de descobrir ou tentar descobrir - permita-me que duvide da conclusão que tirou - que não há nenhum país da Europa e mesmo do Mundo que tenha um verdadeiro direito de negociação colectiva.
Já disse que me permito duvidar dessa conclusão, uma vez que o relatório que acabei de ler me referir que pelo menos a Noruega tem esse direito de negociação colectiva.
No entanto, a minha pergunta é esta: com que fins andou p. Sr,, Secretário de Estado a tentar descobrir quê não há nenhum país da Europa com verdadeiro direito de negociação colectiva?
Aliás, outra preocupação sua reside em procurar qual a verdadeira natureza do direito de negociação colectiva. Não sei quê preocupação é que move o Governo e o Sr. Secretário de Estado. Será que falar-se em negociação colectiva e não em contratação colectiva/como é prática dos sindicatos, significa que o Governo entende que o direito de negociação colectiva é um direito menor dos restantes trabalhadores, isto é, que direito de negociação colectiva não é a mesma coisa do que contratação colectiva? Será que é um direito menor?
Esta questão leva-me a que faça mais duas perguntas, Sr. Secretário de Estado.
A primeira consiste em saber qual o entendimento do Governo sobre este direito fundamental dos trabalhadores. Será que o Governo perfilha a ideia ou o entendimento de que os trabalhadores da função pública têm um direito menor, ou seja, que não têm o mesmo direito de negociação colectiva que os restantes trabalhadores? A segunda questão está em saber que interpretação dá o Governo ao conteúdo da Convenção n.º 151 da OIT, isto é, saber se esta Convenção consagra ou não um direito de negociação, um direito onde ai iniciativa das partes, onde o acordo final vinculativo das partes negociantes é para valer.

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Secretário de Estado, em face da sua exposição o que lhe queria perguntar relaciona-se com o direito de negociação e com o direito de contratação colectiva. É que, como devem todos estar lembrados, quando aqui se tratou da modificação da expressão «funcionários públicos», foi chamado à atenção de que esta modificação não era meramente verbalista, meramente formal. Esta modificação fazia com que os funcionários públicos passassem a ter o estatuto dos trabalhadores (e isto foi aqui claramente afirmado pelo Sr. Deputado Vital Moreira durante o debate da revisão constitucional), e, a partir daquela modificação, os trabalhadores da função pública, como trabalhadores que são (substantivos, portanto), passariam a ter todos os direitos originários dos trabalhadores.
Ora, um dos direitos originários dos trabalhadores previsto na Constituição, no n.º 3 do artigo 57.º, con-

Página 704

704 I SÉRIE-NÚMERO 18

siste, no seguinte: «Compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.» Portanto, se as associações sindicais dos funcionários públicos forem associações sindicais dos trabalhadores então têm o direito constitucional adquirido à contratação colectiva e não meramente à negociação colectiva.
Não sei se V. Ex.ª também pensa assim, mas porque pose vir a haver dúvidas, era bom que este problema ficasse desde já esclarecido.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra, se desejar, o sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: - Começando pelo Sr. Deputado César de Oliveira, que pôs a questão de saber se a regulamentação deste direito não iria criar peias ao processo e se a intenção do Governo seria a de flexibilizar ou não esta questão, a resposta é afirmativa.
Pretende-se, efectivamente, flexibilizar este processo negocial. A prática, aliás tem sido mais rica do que as regulamentações eventualmente existentes noutros países. Acho que isso resultou claramente da minha exposição sobre o Direito Comparado. O que me parece ser de evitar é que se negociei matérias que são de facto inegociáveis, como por exemplo, as relativas à estrutura da Administração, a grandes políticas concernentes á função pública, etc. Essas, de facto, não podem ser negociadas tal como o não são em qualquer parte do mundo.
Ao Sr. Deputado Jorge Lemos, que pôs a questão de saber porque razão não era a Assembleia da República a organizar o debate, devo dizer-lhe que a urgência que há em regular esta matéria, que é uma antiga reivindicação dos trabalhadores da função pública, levou, o Governo a optar por esta modalidade.
Quanto à referência ao desenvolvimento da prática negocial que vem sendo seguida e de com os governos da Aliança Democrática não teria sido seguida tal prática negocial, a minha resposta é a de que espero que se vá seguir agora tal prática.
Em relação à questão - que o Sr. Deputado pergunta, se não terá sido um lapso - do direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública, é evidente que nesta matéria os interlocutores privilegiados da Administração serão com certeza os sindicatos. Todavia pode vir a instituir-se, paralelamente ( e esse é um ponto em relação ao qual o Governo não tomou ainda uma opção), um organismo, eventualmente de natureza paritária, que permita a concertação destas matérias, não sendo, portanto, um órgão puramente sindical, a exemplo, aliás, do que acontece em vários países que referi.
O Sr. Deputado João Amaral afirmou, nomeadamente, que o sentido desta proposta de autorização não estaria claro. Não é propriamente uma proposta de autorização mas sim uma crítica. Todavia, julgo que na minha exposição inicial explicitei, na medida do possível, qual o sentido do pedido.
Em relação à pergunta sobre se não seria brutal introduzir o combate à corrupção ao nível disciplinar, devo dizer que ressalvei na minha exposição que combate á corrupção não passa só por aqui e, na minha opinião, nem passa fundamentalmente por aqui. Passa, a outros níveis, tais como o criminal. Todavia, há casos claramente detectados de corrupção no aparelho administrativo do Estado, -os quais têm de ser combatidos; tal como certamente pretendem os próprios funcionários, os próprios trabalhadores desses sectores. E aponto-lhe um caso: há um recente relatório do seu partido acerca desta matéria onde se afirma que as receitas fiscais que anualmente não são cobradas - eu também tenho conhecimento profissional desses casos, - atingem em determinadas repartições de finanças, valores próximos do milhão, dois milhões, de contos. Isto só é compreensível por conluio entre funcionários dessas repartições e os contribuintes mais importantes da área.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, sr. Deputado.

O Sr. João Amaral: - Então estamos de acordo. Esses funcionários «cabem» no artigo 420.º do Código Penal, relativo a «Corrupção passiva para acto ilícito», que revê e estatui que «o funcionário que, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou receber dinheiro, ou promessa, de dinheiro ou qualquer vantagem patrimonial que não lhe sejam devidos, para praticar acto que implique violação dos deveres do seu cargo, será punido com prisão de 1 a 6 meses e multa de 50 a 150 dias».
Se não quiser que «caibam» aqui, tem o n.º 3 do mesmo artigo, que respeita à «mera omissão, ou demora na pratica de acto relacionado».

O Orador: - Só que, a justificação dessas omissões, por esses funcionários, são sempre imputados, á falta de pessoal, ao excesso de trabalho, etc., numa linha de diluição de responsabilidade, ou seja; procura-se desculpar, um comportamento que não radica fundamentalmente aí.
Pretendeu ainda saber, se se pretende retirar dignidade penal à corrupção. É evidente que não, Sr. Deputado. O que se pretende é que as formas aliás cada vez mais sofisticadas de corrupção, sejam detectadas rapidamente a nível disciplinar; para que as entidades que têm possibilidade de exercer a acção penal possam agir. Se já houvessem ideias muito precisas acerca da descrição destas formas de ilícito, que, por vezes, não consistem em dádiva, nem em gratificação, mas sim em pura transmissão de informações; em relações a concursos por exemplo; o Governo certamente não teria pedido esta autorização legislativa.
Em relação ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal -, que perguntou a minha opinião -acerca do facto de as relações com os sindicatos, em 1981 e 1982 terem assumido a forma de uma fixação unilateral; a única coisa que eu posso adiantar é que a resposta a essa sua questão seria sempre subjectiva e que a minha opinião acerca dessa prática não é positiva.
Perguntou-me ainda se as matérias de alterações, organigramáticas e funcionais dos serviços seriam excluídas deste âmbito. Respondo dizendo-lhe que mesmo nos países de prática e legislação mais avançada nesta matéria - é o caso da Suécia - esses casos são excluídos. Aliás, não me parece legítimo no nosso

Página 705

9 DE JULHO DE 1983 705

país incluí-las na negociação cuja prática, como reconhecerá, é bastante atrasada.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito, do CDS, colocou-me várias questões. A primeira está relacionada com o sistema que se pensa pôr em prática em Portugal. Penso que em Portugal, sem prejuízo de se vir a institucionalizar uma instância consultiva, eventualmente do tipo arbitrai, o sistema será de negociações colectivas reguladas pela lei, ou seja, um sistema de negociações colectivas de direito. Embora não seja possível fazer o paralelismo com outros países, visto que mesmo nos países que têm estes sistemas a diversidade e muito grande, as matérias que se vão negociar são, de país para país, completamento diferentes, as opções divergem na medida em que não há uma linha ... isto é como que, no fundo, um direito de aperfeiçoamento.
Referiu ainda que o combate à corrupção não se fazia deste modo e que a diminuição em todas as áreas da intervenção do Estado -penso que estaria a pensar na área económica - iria combater essa mesma corrupção. Também eu julgo que isso é assim e que o combate à estatização é um problema mundial que hoje em dia ultrapassa os próprios regimes políticos, independentemente da ideologia reinante.
Por outro lado acusa-me de me ter sido infeliz ao ter dado a ideia que os funcionários são os culpados. Longe de mim tal ideia! Ressalvei no final da minha exposição precisamente o contrário. O que eu disse foi que, isso sim, há casos em que alguns deles, muito poucos, serão passíveis de culpa e que, por isso, há que separar o trigo do joio.
Em relação àquilo que se pretende em matéria de «dosimetria» das penas, há que pôr de parte a matéria criminal, visto que o crime de corrupção activa ou passiva compete ao Direito Criminal. Como sabe, o ilícito disciplinar é diferente; acerca dele não há tipicidade, não há uma fattispecie e, portanto, o que se pretende aqui é descrever de uma forma mais precisa aquilo que permita, nomeadamente aos dirigentes dos serviços, actuar com maior segurança perante comportamentos que assumam uma novidade e em relação aos quais não estavam habituados.
O Sr. Deputado Sá da Costa, do MDP/CDE, pretende saber qual a prática que vai consagrar. Como já respondi a essa pergunta nas respostas que dei ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, remete-o para o que acabei de referir.
Além dessa questão, o Sr. Deputado põe em dúvida o facto de não haver no mundo um sistema de negociação colectiva. Embora eu tenha feito um esforço na minha exposição para distinguir entre a negociação e a contratação, o Sr. Deputado, pelos vistos, não terá aderido profundamente à destrinça que há entre estas duas figuras. É que o direito de contratação colectiva é, de facto, diferente do direito de negociação. Neste, quando se chega ao fim da concertação, do diálogo, não há um contrato. O acordo, mesmo que seja escrito e nos países em que o é, embora haja países com um sistema de negociação colectiva de direito em que não há acordo escrito - como e o caso, creio, do Japão - mas, mesmo nesses, o acordo não vale por si só, isto é, não produz só por si efeitos jurídicos.
Suscitava ainda o Sr. Deputado Sá da Costa a questão de saber se os trabalhadores da Administração Pública não terão, nesta matéria, um direito menor. Julgo que não. Na minha opinião têm apenas um direito diferente. Nunca nos podemos esquecer de que os trabalhadores da Administração Pública estão ao .serviço do interesse público, estão ao serviço da Administração, e por isso lhes cumpre, em primeira linha, satisfazer, com o respeito das leis e do interesse público, os objectivos dos serviços onde se integram. Portanto, a situação é diversa da que se passa no sector privado.
Quanto a saber-se o que a Convenção da OIT, estatui, sou de opinião que ela consagre um direito de negociação colectiva mas que é compatível com mecanismos de concertação, seja através de comissões paritárias seja através de órgãos do tipo do Conselho Superior da Função Pública, como existia em França, etc. Portanto, é uma Convenção que dá grande margem de manobra para a regulamentação destas questões do ponto de vista do direito interno, como aliás não podia deixar de ser.
O Sr. Deputado Narana Coissoró, pôs a questão de saber se a alteração da designação constitucional de funcionários para trabalhadores da Administração Pública não teria como resultado que esses trabalhadores passariam a gozar de todos os direitos dos trabalhadores em geral, citando nesse sentido o ponto de vista do Sr. ex-Deputado Vital Moreira. Efectivamente, penso que não. Esses direitos são diferentes, e isso resulta da própria natureza e dos objectivos do Estado em que se integram a Administração Pública e os seus trabalhadores. Queria referir ainda que Portugal, embora com uma prática negocial atrasadíssima nestas matérias, foi, de uma forma que qualificaria de bizarra, o segundo país do mundo a ratificar a Convenção relativa à negociação e à fixação das condições de trabalho dos trabalhadores da Administração Pública, o que nos coloca numa situação muito singular.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para fazer um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem sido hábito nesta Câmara, penso que desde o início, utilizar a fórmula do protesto para no fundo se fazer um novo pedido de esclarecimento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Não é o caso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Está bem, não é o caso. Mas, se me permite continuar, direi que não é minha intenção alterar essa situação, até porque julgo que desde que com isso não haja perturbação da marcha normal dos trabalhos a Assembleia só tem vantagem em ser mais esclarecida. Contudo, e porque o assunto foi aqui levantado -e repito que não é minha intenção alterar a praxe, a não ser que a Assembleia assim o decida -, vou ler o artigo 96.º do Regimento

Página 706

706 I SÉRIE-NÚMERO 18

Que sob a epígrafe « Reclamações, recursos ou protestos»; reza assim:

O deputado que pedir a palavra para reclamação, recursos ou protestos, limitar-se-á a indicar sucintamente o seu objectivo e fundamento.

Posto isto, tem a palavra para formular o seu protesto, o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, o meu protesto baseia-se em três questões concretas. Em relação à questão da urgência, penso que é um falso argumento. V. Ex.ª tem 120 dias para publicar um projecto de diploma que já manifestou, perante a Câmara, que tenciona pôr à discussão pública das organizações representativas dos trabalhadores, e só depois disso é que o Governo vai avançar com o decreto-lei para dar cumprimento à autorização legislativa. É nosso entendimento que o mesmo poderia ser feito - e seria certamente mais bem feito! - pela Assembleia da República. Poderíamos estudar, no concreto as soluções propostas pelo Governo e num prazo curto, porque é uma matéria, que todos consideramos urgente, o problema seria resolvido.
Em segundo queria dizer-lhe que, se V. Ex.ª reconheceu nas suas palavras que o que consta da proposta de autorização legislativa não é exacto, ou seja, que o Governo não pretende desenvolver a prática seguida até aqui, é bom que isso não fique no texto que aqui vamos votar. É preciso que fique claro que será a partir de agora diferente, porque V. Ex.ª, reconheceu na sua intervenção que até aqui não tinha havido uma prática negocial, dando a entender que é isso que o Governo pretende implementar a partir deste momento. E se é isso, Sr. Secretário de Estado, se se vai optar pela negociação colectiva - e também seria bom que nos dissesse em que é que ela diverge da contratação colectiva, dado que em termos constitucionais o que está consagrado é a contratação colectiva - não podemos compreender como é que V. Ex.ª admite a existência de órgãos, que o governo estaria a estudar, de composição paritária quando a Constituição no artigo 57.º, n.º 3., é clara ao definir que é uma competência das associações sindicais o exercício do direito da contratação colectiva.

O Sr. Anselmo Aníbal: (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Queria fazer um protesto em relação a 2 pontos.
Em primeiro lugar, não há dúvida de que a proposta de lei de autorização legislativa adjectiva uma certa continuidade em relação à prática da fixação de condições feitas por anteriores governos.
Sr. Secretário de Estado, sendo conhecidas as suas responsabilidades no II Governo sendo sabidas as suas opiniões no decurso dos VI e VII Governos, parece ser de menos a sua adjectivação em relação a um processo anterior e mais significativo o facto de uma proposta de lei, no próprio articulado dizer que se irá disciplinar, clarificar, consagrar e desenvolver uma prática negocial que vem sendo seguida. Isto é um desígnio de continuidade, Sr. Secretário de Estado, que parece estar claramente em desacordo com as suas opiniões escritas, designadamente com aquela, que eu lhe referencio, publicada no Portugal Hoje, em que V. Ex.ª dizia claramente que com os governos da AD , continuarão os trabalhadores da função pública a ser considerados como trabalhadores de Segunda, e verão - e viram ! - agravadas as suas condições de vida.
Em relação à segunda parte, ou seja, à fixação de condições estruturais, organigramáticas e funcionais relativas aos órgãos da Administração Pública, queria dizer-lhe, que aquilo, que o Sr. Secretário de Estado, referiu em relação aos mecanismos de concertação, não o fez em relação a estas matérias. E nós, pelo menos, ,julgamos, que é uma afirmação extremamente discutível e que é um mau ponto de partida.
Dizer, que nem nas instâncias daquilo a que chamou de mecanismos de concertação, daquilo que referiu e apelidou como Conselho Superior da Função Pública não há espaço para um temário, como este, ou seja, para a renovação e implementação das estruturas organizacionais; para o refazer e o fazer de direcções gerais - sabido como é sabido que são esses processos que são praticados para fazer e desfazer, promover e despromover, - parece ser uma medida muito pouco cautelar, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, também peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente-. - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando a moderação não é apenas um estilo político mas também um aprofunda convicção sobre o relacionamento que deve haver entre as instituições e os órgãos de soberania, eu queria dizer que é cada vez mais difícil, em meu entender, ser oposição moderada, a este governo no que respeita ao perfil que as relações com o Parlamento estão a assumir. Já não falo, Sr. Presidente, no facto de uma legislação tão importante como aquela sobre o sector público e sector privado, onde sempre esteve presente, quando essa matéria foi anteriormente discutida nesta Assembleia, o Sr. Primeiro-Ministro ou pelo menos o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, isso não Ter acontecido.
Já não falo sequer de outros incidentes que posteriormente vieram a decorrer nesta Assembleia, sem prestígio para o Governo e para a Assembleia, como também em relação a este caso concreto, embora assuma aqui uma particularidade diferente, o Sr. Secretário de Estado honrou-nos com a sua presença e com uma intervenção que tentou ser clara.
No entanto, em matéria desta importância, que é uma matéria extremamente melindrosa, que foi objecto de várias horas de debate em vários Conselhos de Ministros, eu não me sinto esclarecido em relação a este tema. Isto para já não falar naquilo que era neste caso concreto, mais que justificável e que era que a proposta viesse acompanhada de um projecto de texto de articulado, como aliás, sempre foi hábito pelo menos em relação ao último governo.
Isso não aconteceu. Pode pensar-se que é uma questão de celeridade, mas há matérias em que, pela sua

Página 707

9 DE JULHO DE 1983 707

importância, mais vale andar devagar e bem do que depressa e mal.
Neste caso o problema que se coloca é simplesmente este: Qual o sistema que vai regulamentar as relações entre os trabalhadores da função pública e o Estado?
É o sistema de negociação, diz-nos o Sr. Secretário de Estado. Mas abrangendo que matérias? Com que tipo de processamento? Nomeadamente em termos salariais, como é compatível esse sistema com a política orçamental do Governo?
Em segundo lugar: quais os agentes dessa negociação? São os sindicatos, são comissões mistas? Nada se sabe, nada foi dito. Qual o processo dessa negociação? Ë um processo negocial puro com cambiantes de contratação colectiva, ou é um processo arbitral?
Sobre isso nada foi dito, ou se foi, foi muito pouco esclarecedora a intervenção do Sr. Secretário de Estado.
Finalmente, queria referir a confusão lamentável entre o ilícito penal e o ilícito disciplinar em relação a matéria tão grave como a corrupção. Isto para já não falar, como foi apontado pelo meu colega de bancada, em que é politicamente negativo começar-se precisamente pela função pública. Ou seja, é dar à opinião pública a ideia de que este tema se radica na função pública, quando, em minha opinião, isso não é verdade e é uma injustiça que é feita nessa sede à função pública.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, eu quase que me atrevia a sugerir ao Governo que retirasse esta proposta de lei e apresentasse a esta Assembleia uma outra que pudesse ser discutida e considerada como este tema merece e a que a função pública tem direito.

Aplausos do CDS.

O Sr. Sá da Costa (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sá da Costa (MDP/CDE):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que acabámos de ouvir aqui pela boca do Sr. Secretário de Estado é, no meu ponto de vista, extremamente grave.
O Governo acaba de negar o direito fundamental de negociação colectiva aos trabalhadores da função pública.
Este direito é um direito fundamental e como tal extensivo a todos os trabalhadores - penso que não haverá duas opiniões sobre este tema -, portanto o Governo prepara-se para violar a Constituição. Ouvimos também o Sr. Secretário de Estado - que tanto quanto me apercebi foi um pouco vago - dizer que o Governo não admite que a matéria negocial do direito de negociação da função pública seja, pelo menos, a matéria negocial de uma contratação colectiva dos trabalhadores de outros sectores. Embora isto não esteja aqui bem definido, parece-me que assim se pode concluir.
O direito fundamental da contratação colectiva - e aqui caberia dizer que, tanto quanto sei, a Constituição fala apenas em contratação colectiva, já que a palavra negociação colectiva não aparece em nenhum lado - tem de ser extensivo a todos os trabalhadores e, hoje, à função pública.
Portanto, o meu protesto teria de ser feito, porque o Governo, pela boca do Sr. Secretário de Estado, acabou de confessar que afinal a prática que pretende consagrar na lei é a prática da imposição, da negação e da confusão entre a mera participação e o direito a uma verdadeira negociação colectiva.
Ainda me permitiria, para fundamentar melhor esta minha opinião, trazer para aqui um facto de todos conhecido e que foi a posição do Governo Português na altura da aprovação da Convenção n.º 151 da OIT, quando o representante português pretendeu alterar essa Convenção propondo que a palavra «negociação» fosse retirada do texto, o que não veio a acontecer.
Este exemplo constitui mais um argumento para afirmar que o direito fundamental da negociação colectiva é um direito de todos os trabalhadores e que, como tal, terá de ser consagrado nesta regulamentação por que há muito os trabalhadores lutam.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Quando falei na questão da mistura, um pouco esquisita, entre ilícito disciplinar e corrupção, para a qual chamei a atenção, acho que lhe dei uma oportunidade para retirar essa referência concreta do âmbito da alínea b), mas o Sr. Secretário de Estado não o quis fazer. Não quis e assumiu como pôde aquilo que sabe, perfeitamente, ser uma monstruosidade jurídica. Porque das duas uma: ou estamos em sede de ilícito penal, e então pode punir quem corrompeu ou foi corrompido, ou se passa para a sede de ilícito disciplinar e só se pode punir pela via hierárquica e no fundo o que está é a premiar quem corrompeu. O Sr. Secretário de Estado sabe que esta é a questão concreta. Então, o que ficou da sua intervenção? O que ficou - e é contra isso que veemente protesto- foi um libelo sobre os trabalhadores da função pública e isso não se pode admitir, Sr. Secretário de Estado.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: - Começando por responder ao Sr. Deputado Jorge Lemos do PCP, que pôs em causa a urgência que o Governo teria em legislar sobre esta matéria, contrapondo que o mesmo poderia ser feito pela Assembleia da República, recordo-lhe que, segundo me informou o Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares, há cerca de 200 projectos de lei apresentados nesta Assembleia e que a meu ver e no ponto de vista do Governo seria difícil concatenar todos esses diplomas.
Com respeito à prática negocial, o Sr. Deputado Jorge Lemos perguntou novamente em que é que a contratação diverge da negociação. Já fiz a destrinça entre essas duas figuras e esses dois processos portanto remeto-o para aquilo que referi.
Quanto ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, que me pôs a questão de saber se vai ser consagrada a prática negocial que vem sendo seguida, a qual considera

Página 708

708 I SÉRIE-NÚMERO 18

ser negativa, referi que no meu ponto de vista essa prática negocial terá sofrido um eclipse com os governos da AD, e que neste momento é intenção do Governo retomar uma via de concertação.
Quanto à inclusão de matérias relativas à organização e gestão nomeadamente a nível de constituição de um eventual órgão consultivo julgo que essas matérias devem ficar no âmbito da competência do Governo, sob pena de nesta fase histórica, se anarquisar ainda mais a organização, e gestão da generalidade dos serviços, muito embora eu ache que ao nível da gestão efectiva e concreta dos serviços se podem, e devem pôr em prática sistemas de gestão por objectivos, naqueles casos em que isso se justificar.
Passando a responder ao Sr. Deputado Basílio Horta, do CDS, quanto ao primeiro grupo de questões que ele colocou, penso serem do foro exclusivo desta Assembleia, portanto não me cabe a mim responder.
Quanto à afirmação de que o processo que está na mente do Governo não é um processo muito claro, quero chamar a atenção para o facto de ele ser um processo negocial e colectivo, regulado pela lei e que, tal como acontece em quase todos os países, terá de ser um processo híbrido, que não dispensará eventualmente, a consulta a organismos do tipo paritário ou do tipo arbitral.
Quanto ao Sr. Deputado Sá da Costa que diz que o Governo, através de mim neste momento, negou o direito de negociação colectiva dos trabalhadores da Administração Pública concluo que apesar do meu esforço não percebeu a destrinça entre negociação e contratação. Queria, ainda chamar-lhe a atenção, para o facto de no caso de ser admitido nesta área o contrato colectivo, isso ir retirar competências à própria Assembleia da República.
Finalmente respondendo ao Sr. Deputado João Amaral, refiro, que sei perfeitamente que o ilícito penal e o ilícito disciplinar são coisas diversas, mas que irão Ter tratamentos também diversos - aliás do que se trata aqui é apenas do ilícito disciplinar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Hugo Sequeira.

O Sr. Vítor Hugo Sequeira(PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 16/III, que visa obter uma autorização legislativa sobre o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública, e regime disciplinar da função pública, merece-nos uma particular atenção, quer pela pertinência das matérias que em si mesmo consubstancia, quer pelas consequências que poderão advir da sua aplicação, sobretudo se tivermos em consideração que de importante matéria laboral se trata e a especificidade do sector a que se destina.
Se é um facto que uma Convenção da Organização Internacional do Trabalho constitui e tão-só a consagração de princípios e orientações sobre matérias e câmbios de aplicação não susceptíveis de leituras ou interpretações deturpadoras ou dilatadoras do seu conteúdo, é significado real, é, também um facto, que a inexistência de um diploma legislativo que estabeleça as suas normas regulamentadoras em muitos casos, gera, também situações de total anulação ou desrespeito desses mesmos princípios e orientações em claro prejuízo de quem deles devia beneficiar.
Não basta pois a ratificação de uma convenção pela ratificação, já que a sua aplicação automática é ilusória e assim sendo, tornasse necessária a adopção das normas jurídicas que permitam a transformação dos seus princípios em abstracto; no concreto dos efeitos e resultados de si decorrentes, em matéria de aplicação e utilização.
Todavia, é sempre melindroso regulamentar matéria desta natureza e âmbito - sem que esta afirmação ou reconhecimento, implique uma nota de desencorajamento a quem tem competência para o fazer, mas e apenas, uma chamada particular, de atenção aos membros do actual Governo que se propõem levar a efeito à presente regulamentação, e a quem daqui os sensibilizarmos para que o sapateiro não caia na tentação de ir além da chinela.
São sobejamente conhecidos os protestos das organizações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública, protestos que assumiram mesmo a forma de queixa jurídica nas instâncias da Organização Internacional do Trabalho, pela prática inobservante da Convenção, n.º 151, protestos, e queixas que poderão eventualmente vir de novo a ser observadas se uma excessiva regulamentação desta matéria, restringir direitos e liberdades que a Convenção consagra.
Esta situação é tanto mais delicada porquanto se destina a ser aplicada a uma área particularmente sensível, onde o ideal seria conseguir a harmonia entre os interesses do Estado e dos trabalhadores, que exige formas próprias de actuação e intervenção dos trabalhadores sem que daí resultem situações de preterimento ou de desfavor em relação aos demais trabalhadores dos restantes sectores de actividade.
E se é um facto que, em relação a esses demais trabalhadores dos restantes sectores de actividade, é bastante mais fácil estabelecer pela via legislativa as normas regulamentadoras da relação entre as partes, nomeadamente no que respeita a matéria de contratação colectiva de trabalho, pese embora, reconheçamos, a não consagração explícita deste direito dos trabalhadores da Administração Pública deve ser tida em especial conta a parte IV e o seu artigo 7.º da Convenção n.º 151 que estabelece os processos de fixação das condições de trabalho nos termos que passamos a transcrever:

Quando necessário devem ser tomadas medidas adequadas às condições nacionais para encorajar e promover o desenvolvimento e utilização dos mais amplos processos que permitam a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e às organizações de trabalhadores da função pública ou de qualquer outro processo que permita aos representantes dos trabalhadores da função pública participarem na fixação das referidas condições.

Colocamos um particular ênfase neste ponto pois a sua dimensão não pode, nem deve, ser objecto de interpretações que sujeitas a regulamentação, provoquem uma diminuição dos poderes dos representantes, dos trabalhadores da Administração Pública, já de si algo condicionados em relação aos demais trabalhadores pela -e uma vez mais sublinhamos - particularidade do sector em que laboram.

Página 709

9 DE JULHO DE 1983 709

No que concerne à regulamentação do regime disciplinar da função pública, embora as nossas preocupações não sejam tão profundas como as que acabamos aqui de expressar face à regulamentação da Lei n.º 17/80, também gostaríamos que ela não extravazasse os propósitos a que se circunscrevem os objectivos definidos e aos quais desde já declaramos a nossa inteira concordância.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A terminar, gostaríamos de salientar que este pedido de autorização legislativa se destinará nos seus efeitos e consequências a cerca de 400 000 trabalhadores da Administração Pública, razão porque sublinhamos uma vez mais o seu elevado grau de melindre e importância.
Estamos certos de que o Governo não deixará de tomar em devida consideração a necessidade de promover as indispensáveis condições, para uma efectiva audiência prévia à elaboração do diploma sobre «o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública e regime disciplinar da função pública», por parte das organizações sindicais representativas do sector e assim acontecendo se eliminarão no futuro incertezas e angústias no espírito dos trabalhadores da Administração Pública.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A minha intervenção tem por objectivo apontar e justificar o sentido do voto do meu grupo parlamentar.
Entendemos que este pedido de autorização legislativa ora em discussão representa uma forma de dar cumprimento ao Programa do Governo aprovado nesta Assembleia por uma ampla maioria. Assim, quanto mais não fosse por uma questão de coerência, o Grupo Parlamentar do PSD votará favoravelmente este pedido.
Mas acrescem duas razões para justificar esse voto. Por um lado, e em relação à regulação do direito dos trabalhadores de intervirem nas negociações, é importante, não obstante haver já uma prática mais ou menos seguida, fixar-se legalmente esse direito, com vista à melhor defesa dos interesses dos trabalhadores, em conjugação com interesses da Administração Pública.

Vozes do PSD: - Muito bem'

O Orador: - Em relação aos aspectos disciplinares e ao estatuto disciplinar, o Decreto-Lei n.º 191-D tem-se revelado de alguma forma inadequado, inadequação que se torna ainda mais gravosa se atendermos aos objectivos que o Governo se propõe levar a cabo no campo do combate à corrupção e outras fraudes.
Neste sentido, e porque estamos convictos de que o Governo legislará com subordinação aos princípios da legalidade, da eficácia, da moralidade e da moralização da Administração Pública, e porque acreditamos ainda que o Governo saberá salvaguardar os legítimos interesses de um tão elevado número de trabalhadores, iremos votar favoravelmente este pedido de autorização legislativa.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, estamos a atingir a hora regimental de encerramento da sessão, pelo que vou passar a referir os projectos e propostas de lei entrados na Mesa, que foram admitidos e que serão distribuídos pelos diferentes grupos parlamentares.
Assim, deram entrada na Mesa o projecto de lei n.º 186/III, subscrito pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso e outros Srs. Deputados da UEDS, sobre protecção radiológica e segurança nuclear, e as seguintes propostas de lei: n.º 18/III, que autoriza o Governo a elaborar o estatuto da Guarda Nacional Republicana; n.º 19/III, que concede ao Governo autorização para alterar parcialmente a lei de bases do Serviço Nacional de Saúde; n.º 20/III, que autoriza o Governo a legislar em matéria de delitos anti-económicos e contra a saúde pública; n.º 21/III, que concede autorização ao Governo para legislar em matéria de revisão da orgânica dos tribunais administrativos e fiscais e processos respectivos; n.º 22/111, que autoriza o Governo a legislar sobre o regime da suspensão temporária do contrato de trabalho, com o sentido de permitir a aplicação de medidas económico-financeiras que viabilizem as empresas, e n.º 23/III, que autoriza o Governo a legislar sobre a criação de uma taxa municipal de transportes colectivos urbanos e suburbanos, em municípios, associações e federações de municípios cuja população seja igual ou superior a 50 000 habitantes.
A próxima reunião plenária será na próxima segunda-feira. Haverá um período de antes da ordem do dia e o período da ordem do dia constará, no seu ponto n.º 1, da continuação da apreciação da proposta de lei n.º 16/III, que autoriza o Governo a legislar sobre o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública, e da discussão da proposta de lei n.º 17/III, que autoriza o Governo a legislar sobre política de emprego de gestão de recursos humanos na função pública e descongestionamento da subsequente extinção do quadro geral de adidos. O ponto n.º 2 da ordem do dia versará a apreciação da proposta de lei n.º 7/III, que autoriza o Governo a legislar sobre normas práticas restritivas da concorrência.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Dá-me licença, Sr. Presidente? Pretendia interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): Sr. Presidente, a fixação da ordem do dia e, nos termos regimentais, feita por V. Ex.ª, ouvida a conferência dos grupos parlamentares. Acontece que esta não foi ouvida para inclusão da matéria da proposta de lei de autorização legislativa sobre a concorrência. Assim, julgo que essa matéria não poderá ser incluída na próxima ordem do dia, já que - repito - não fomos ouvidos a esse respeito.
Em segundo lugar, queria dizer-lhe, Sr. Presidente, que deu entrada no gabinete de V. Ex.ª um ofício pedindo urgência para apreciação do nosso projecto de lei sobre a mesma matéria e ainda um outro ofício pedindo, nos termos regimentais -artigo 145.º do Regimento-, a discussão conjunta desse pedido de autorização governamental com o nosso próprio projecto de lei.

Página 710

710 I SÉRIE - NÚMERO 18

Assim, peço a V Ex.ª que me informe do despacho que mereceram estes dois ofícios, para que, no caso de terem sido indeferidos, com violação dos preceitos regimentais não podem imediatamente recorrer da sua decisão.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença? Peço a palavra, pois talvez possa esclarecer este

O Sr Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendo dever fazer uma correcção à primeira parte da intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota Não valerá a pena estar aqui a relatar os episódios surgidos à volta do agendamento da proposta de autorização legislativa sobre a defesa da concorrência e o projecto da ASDI sobre a mesma matéria. Acontece, apenas que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e o do PSD consideraram que essa matéria deveria ser agendada e sobre ela tomámos uma deliberação. Para evitar uma reunião formal da conferência dos líderes, com os incómodos que isso representava para todos, fizeram contacto em todas as bancadas - inclusive junto do Sr. Deputado Magalhães Mota - , dizendo que pretendíamos o agendamento dessa matéria e perguntando se não haveria objecções Não foram apresentadas quaisquer objecções, pelo que foi nessa base que eu pedi ao Sr. Presidente da Assembleia que fixasse - se assim o entendesse - esse ponto na próxima ordem de trabalhos. De outro modo, é claro que eu teria pedido unia reunião de líderes com vista ao agendamento desta matéria.
Foi apenas movidos pelo intuito de facilitar a vida aos Srs Deputados que procedemos desta maneira. Contudo, se o Sr. Deputado Magalhães Mota quer levar a questão às últimas consequências, nós pediremos uma conferências dos líderes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, se o entendimento for o de que o projecto e a proposta forem agendados simultaneamente, nada tenho a objectar.

O St. Veiga de Oliveira(PCP). - Sr. Presidente, peço a palavra.

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr. Veiga, de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados É claro, que a fixação da ordem do dia compete ao Presidente da Assembleia da República, mas ouvidos os grupos parlamentares. E se nós revelámos a nossa concordância no agendamento desta matéria foi no pressuposto fundamentado na informação do Sr. Deputado Carlos Lage, que nos (Consultou, de que não havia o desacordo de ninguém. Porque se há desacordo, há que fazer-se a reunião dos. líderes, para que o Sr. Presidente possa ouvir as suas opiniões. Finalmente, gostaria de dizer que, quanto à matéria despedido de urgência apresentado pela ASDI, tem que haver, um despacho, pois não podemos usar, o despacho de «não dar despacho»! É, aliás, uma das formas mais conseguidas de impedir um recurso.) De maneira, nenhuma podemos estar de (acordo com tal situação, e estou certo de que o Sr. Presidente dará oportunamente -- se for caso disso - o devido despacho e ir.

O Sr Nogueira de Brito (CDS): -Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS):- Sr. Presidente, também eu queria manifestar a opinião do meu grupo parlamentar nesta matéria.
Também nós fomos abordados pelo Sr. Deputado Carlos Lage, tendo dado o nosso acordo à inclusão desta matéria na ordem de trabalhos próxima, já que tínhamos como certo que não havia oposição a essa inclusão da parte de ninguém. Foi essa a nossa posição. Havendo, porém, discordância, também nós entendemos que ã questão deve ser levada à reunião dos líderes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foi minha compreensão que não haveria necessidade de fazer uma reunião dos líderes dos grupos parlamentares para incluir esta matéria na ordem do dia. Pelo que vejo, porém, parece que não é assim, pelo que, sem abdicar do meu direito de fixar a ordem de trabalhos, convoco uma reunião de líderes para a Sala do Conselho de Ministros, a realizar imediatamente.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. «Presidente dá-me, licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS) : - É só para prestar um; pequeno esclarecimento. Quando abordei os Srs. Deputados do PCP e do CDS fi-lo de boa-fé. Inicialmente perguntei ao Sr. Deputado Magalhães Mota qual a sua posição, dado que o Governo, o PS e o PSD queriam agendar esta, matéria. O Sr. Deputado Magalhães Mota disse que posteriormente,- iria fazer um ofício pedindo que fosse agendado o seu projecto de lei sobre a mesma matéria, não tendo, pois, objectado a que a proposta de lei em causa fosse incluída na ordem de trabalhos. Aquilo que ele pretenderia fazer, a seguir era requerer que o projecto também fosse discutido.
Portanto, houve - assim o compreendi que há uma atitude de anuência da sua parte, ainda que com a prevenção de que iria requerer o agendamento do projecto de lei, e foi por isso que me pareceu dispensável estar a pedir ao Sr Presidente a convocação de uma conferência de lideres parlamentares.
Verifico agora que teria sido melhor para todos ter feito esse pedido e quê este sistema não deverá repetir-se.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, (convoco uma) reunião de líderes dos grupos parlamentares a realizar de imediato.
Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Página 711

9 DE JULHO DE 1983 711

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
António Jorge D. Rebelo de Sousa.
Bento Elísio de Azevedo.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Francisco Manuel Marcelo C. Curto.
Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga.
José Luís do Amaral Nunes.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Augusto Sotto Mayor Leal Cardia.
Paulo Manuel de Barros Barrai.
Raúl d'Assunção Pimenta Rego.

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
João Luís Malato Correia.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Ângelo Ferreira Correia.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Manuel Maria Moreira.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

António Guilherme Branco Gonzalez.
Maria Odete de Jesus Filipe.

Centro Democrático Social (CDS):

Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
José Augusto Gama.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Artur Augusto Sá da Costa.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
António Gonçalves Ribeiro.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo.
João Joaquim Gomes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Narciso Rodrigues Miranda.
Manuel Filipe Pessoa S. Loureiro.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD):

Fernando José Roque Correia Afonso.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João M. Ferreira Teixeira.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Jorge Nélio P. Ferraz Mendonça.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Martins Adegas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alfredo de Brito.
Manuel Correia Lopes.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete Santos.
Raimundo do Céu Cabral.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Henrique António da C. Madureira.
João Gomes de Abreu Lima.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Helena Cidade Moura.

Os REDACTORES: Cacilda Nordeste - Leonor Caxaria Ferreira.

Página 712

PREÇO DESTE NÚMERO 52$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×