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I Série - Número 53

Sexta-feira, 25 de Novembro de 1983

DIÁRIO da Assembleia da República

III Legislatura 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

Presidente: Exmo. Sr. José Rodrigues Vitoriano

Secretários: Exmos. Srs.

Leonel de Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 50 minutos.
Continuou a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.º 46/III e 47/III relativas às grandes opções do Plano para 1984 e ao Orçamento do Estado para 1984, respectivamente. Intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministro do Equipamento Social (Rosado Correia), vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa (Mota Pinto), Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e Ministro da Indústria e Energia (Veiga Simão), os Srs. Deputados Hasse Ferreira (UEDS), Joaquim Miranda (PCP), Guido Rodrigues (PSD), António Rebelo de Sousa (PS), Azevedo Soares (CDS), Pinheiro Henriques (MDP/CDE), Tomás Espírito Santo (CDS), Leonel Fadigas (PS), Mário Adegas (PSD), Lopes Cardoso (UEDS), Octávio Teixeira, Carlos Carvalhas e Anselmo Aníbal (PCP), Miguel Anacoreta Correia (CDS), António Gonzalez (Indep.), João Abrantes (PCP), António Taborda (MDP/CDE), Margarida Tengarrinha (PCP), Hernâni Moutinho (CDS), Reis Borges e Amadeu Pires (PS), Carlos Brito e Silva Graça (PCP), Antunes da Silva (PSD), João Amaral (PCP), Luís Saias (PS), Carlos Espadinha (PCP), Magalhães Mota (ASDI) e Abreu Lima (CDS).

Finalmente, o Sr. Presidente encerrou a sessão era 1 hora e 10 minutos do dia seguinte.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 50 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro
Aníbal Coelho da Costa.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José Santos Meira.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Bento Elísio de Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Custódio das Neves Lopes Ramos.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.

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Henrique Aureliano Vieira Gomes. Fernando José Roque Correia Afonso
Hermínio Martins de Oliveira. Fernando Manuel Cardoso Ferreira
João de Almeida Eliseu. Fernando Monteiro do Amaral.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu. Fernando dos Reis Condesso.
João do Nascimento Gama Guerra. Francisco Antunes da Silva.
João Luís Duarte Fernandes. Francisco Jardim Ramos.
Joel Maria da Silva Ferro. Gaspar de Castro Pacheco.
Joaquim José Catanho de Menezes. Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jorge Alberto Santos Correia. João Domingos Abreu Salgado.
Jorge Lacão da Costa. João Evangelista (tocha de Almeida
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda. João Luís Malato Correia.
José de Almeida Valente. João Maurício Fernando Salgueiro.
José Augusto Fillol Guimarães. João Maria Ferreira Teixeira.
José Carlos Pinto Basto Torres. João Pedro de Barros.
José da Cunha e Sá. Joaquim Eduardo Gomes.
José Luís do Amaral Nunes. Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro
José Luís Diogo Preza. José Adriano Gago Vitorino.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida. José de Almeida Cesário.
José Manuel Nunes Ambrósio. José Ângelo Ferreira Correia.
José Maria Roque Lino. José António Valério do Couto.
José António Borja S. dos Reis Borges. José Augusto Santos Silva Marques.
Leonel de Sousa Fadigas. José Mário de Lemos Damião.
LitÍrio da Cruz Monteiro. José Silva Domingos
Luís Abílio da Conceição Cacito. José Vargas Bulcão.
Luís Silvério Gonçalves Saias. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro Almeida.
Manuel Filipe Pessoa Santos Loureiro. Leonel Santa Rita Pires.
Manuel Fontes Orvalho. Luís António Martins.
Maria Ângela Duarte Correia. Manuel António Araújo dos Santos.
Maria do Céu Sousa Fernandes. Manuel da Costa Andrade.
Maria da Conceição Pinto Quintas. Manuel Ferreira Martins.
Maria Luísa Modas Daniel. Manuel Filipe Correia de Jesus.
Maria Margarida Ferreira Marques. Manuel Maria Moreira.
Nelson Pereira Ramos. Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Paulo Manuel de Barros Barral. Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Raul d'Assunção Pimenta Rego. Mariana Santos Calhau Perdigão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito. Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros. Mário Martins Adegas.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz. Mário Júlio Montalvão Machado.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves. Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Rui Monteiro Picciochi. Pedro Augusto Cunha Pinto.
Silvino Manuel Gomes Sequeira. Pedro Paulo Carvalho Silva.
Teófilo Carvalho dos Santos. Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Victor Hugo Jesus Sequeira. Rui Manuel de Oliveira Costa.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa. Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD): Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Abílio Gaspar Rodrigues. Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos. Álvaro Favas Brasileiro.
Agostinho Correia Branquinho. António Anselmo Aníbal.
Amadeu Vasconcelos Matias. António Dias Lourenço.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira. António Guilherme Branco Gonzalez.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo. António José de Almeida Silva Graça.
António Augusto Lacerda de Queiroz. António José Monteiro Vidigal Amaro.
António Joaquim Bastos Marques Mendes. António da Silva Mota.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes. Belchior Alves Pereira.
António Nascimento Machado Lourenço. Carlos Alberto da Costa Espadinha.
António Roleira Marinho. Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
António Sérgio Barbosa de Azevedo. Carlos Alfredo de Brito.
Arménio dos Santos. Custódio Jacinto Gingão.
Carlos Miguel Almeida Coelho. Francisco Miguel Duarte.
Cecília Pita Catarino. Georgete de Oliveira Ferreira.
César Augusto Vila Franca. Jerónimo Carvalho de Sousa.
Cristóvão Guerreiro Norte. João António Gonçalves do Amaral.
Domingos Duarte Lima. João António Torrinhas Paulo.
Eleutério Manuel Alves. João Carlos Abrantes.
Fernando José da Costa. Joaquim António Miranda da Silva.

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Jorge Manuel Abreu de Lemos. Jorge Manuel Lampreia Patrício. José Manuel Antunes Mendes. José Manuel Maia Nunes de Almeida. José Manuel Santos Magalhães. José Rodrigues VitoriAino. Manuel Correia Lopes. Manuel Gaspar Cardoso Martins. Manuel Rogério de Sousa Brito. Maria Alda Barbosa Nogueira. Maria Luísa Mesquita Cachado. Maria Margarida Tengarrinha. Maria lida Costa Figueiredo. Maria Odete Santos. Mariana Grou Lanha. Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto de Sousa Gomes Almeida. Adriano José Alves Moreira. Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares. António José de Castro Bagão Félix. Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira. Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca. Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia. Francisco António Lucas Pires. Francisco Manuel de Menezes Falcão. Henrique Manuel Soares Cruz. Hernâni Torres Moutinho. Horácio Alves Marçal. João António de Morais Silva leitão. João Carlos Dias M. Coutinho Lencastre. João Gomes de Abreu Lima. João Lopes Porto. João Silva Mendes Morgado. Joaquim Rocha dos Santos. José Augusto Gama. José Luís Nogueira de Brito. José Miguel Anacoreta Correia. José Vieira de Carvalho. Luís Eduardo da Silva Barbosa. Manuel António de Almeida Vasconcelos. Manuel Jorge Forte Goes. Narana Sinai Coissoró. Tomás Rebelo Espirito Santo.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda. Helena Cidade Moura. José Carlos Pinheiro Henriques.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira. António Manuel C. Ferreira Vitorino. António Poppe Lopes Cardoso. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota. Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho. Rúben losé de Almeida Raposo.

No decorrer da sessão, estiveram presentes na bancada do Governo os Srs. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional (Mota Pinto) e Ministros de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e do Equipamento Social (Rosado Correia) e os Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes), do Orçamento (Alípio dias), do Planeamento (Mário Cristina de Sousa), da Alimentação (Montalvão Marques), das Comunicações (Raul Junqueiro) e da Habitação (Fernando Gomes).

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continuando a apreciação das propostas de lei n ºs 46/111 e 47/111 - Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1984 -, está inscrito, em primeiro lugar, para uma intervenção o Sr. Deputado Hasse Ferreira, a quem concedo de imediato a palavra.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Em primeiro lugar e como ponto prévio, gostaria de dar uma explicação à Câmara sobre a razão por que intervenho apenas agora, essencialmente sobre as grandes opções do Plano. Tal facto deve-se exclusivamente a ter sido solicitado para diversas trocas de impressões quer com colegas deputados quer com membros do Governo, por razões várias, trocas às quais acedi e que vieram a colocar esta minha intervenção agora e não no início da sessão de ontem como eu pretendia.
Vamos ao assunto.
A proposta que tem estado em discussão, a das grandes opções do Plano, engloba alguns aspectos preocupantes, agravados pela estrutura e pelo tipo de Orçamento de Estado antado pelo Governo.
Em meu entender surge enquadrada aquela proposta por uma óptica quase exclusiva e obcessiva de preocupação com o reequilíbrio das contas de Portugal com o exterior, com uma orientação de encaminhamento da política económica num sentido recessivo, da diminuição do investimento público, da contracção global do crédito, do aumento do desemprego.
Assim e por exemplo, a redução que atinge, na proposta do Governo, cerca de 29%, em termos reais, para 1984, da formação bruta de capital fixo, como consequência do Programa de Investimentos da Administração Central, que assim nos parece em via reduzida, parece-nos brutal e poder vir a inviabilizar projectos importantes.
O argumento que tem sido aduzido e que é expresso nas grandes opções do Plano de que a taxa de investimento em Portugal tem sido das mais altas da Europa, não colhe, em nosso entender porque o ponto de partida do nosso País é extremamente baixo, porque estamos com rendimentos médios por pessoa que oscilam entre um terço e um quinto dos países da CEE para onde se negoceia actualmente a entrada do nosso país.
Por outro lado, nas grandes opções do Plano refere-se uma política de modernização estrutural enunciada, o que é de certa forma contraditório com a inexistência de um plano de modernização estrutural que se promete apenas apresentar até ao fim de 1984. Tal contradição evidencia um dos aspectos mais preocupantes da actividade do actual Governo, na área

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económico-financeira, que é o da ausência de uma estratégia explicitada para o médio prazo, obcessiva e dominante que se revela a concepção centracionista do Sr. Ministro das Finanças, sem plano a médio prazo.
Propõe-se além disso, por exemplo, no que concerne ao sector empresarial do Estado, uma «clarificação do relacionamento funcional entre as empresas públicas e o Estado, na perspectiva de que a intervenção se efectue ao nível das decisões estratégicas», com o que nós, deputados da UEDS, concordamos, mas eu diria ainda que é necessário estender essa perspectiva de autonomização ao exercício da função do próprio gestor, em termos globais, libertando-o o mais possível das pressões partidárias no curto prazo, excessivamente intervenientes, por exemplo, ao nível das suas próprias nomeações. Como é necessário ouvir, em qualquer reestruturação, as propostas dos trabalhadores da empresa ou do sector, para além de, nalguns casos, as autarquias interessadas ou organismos representativos de consumidores.
Sem um sector público suficientemente dinamizado, sem a banca nacionalizada a funcionar efectivamente ao serviço dos grandes objectivos nacionais, sem o estabelecimento de algumas tréguas na «guerra santa» de carácter predominantemente ideológico entre o sector público e privado da economia, sem a dinamização das empresas privadas que tenham capacidade económica e a reconversão do restante aparelho produtivo, sem a travagem do desemprego, a evolução da economia nacional apontará não só para a diminuição do nível de vida médio dos portugueses, como para o comprometimento da capacidade de desenvolvimento a prazo do nosso país. Ou seja, a ausência de uma estratégia nitidamente definida que se articule com claros critérios de selectividade nos cortes propostos pelo Ministério das Finanças, poderá vir a comprometer significativamente a capacidade de desenvolvimento da economia nacional o que sobremaneira nos preocupa, a nós, deputados da UEDS.
É preocupante que se restrinja excessivamente a concessão de crédito, é preocupante a perspectiva de aumento do desemprego no curto prazo, é preocupante a incapacidade de o Ministério das Finanças propor uma estratégia a médio prazo, como é preocupante a obcessão financista que domina a actual política. Não se põe em causa, pela nossa parte, a necessidade de diminuir os desequilíbrios das contas externas, mas não podemos deixar de denunciar a incapacidade de formular uma política que pudesse fazer com que os portugueses aceitassem uma política de austeridade. Não refutamos, pois, a necessidade de uma política de austeridade, o que contestamos é que seja feita desta forma.
A austeridade imposta apenas com objectivos financeiros e sem contrapartidas sociais, nem objectivos mobilizadores, não poderemos senão responder com críticas que neste próprio debate, formulámos e tencionamos continuar a formular.
E num sentido complementar, não posso deixar de apoiar, a sugestão aqui expressa pelo deputado Amadeu Pires para que «se promova uma permanente informação - objectiva e acessível sobre as acções futuras, a lançar para reanimar a economia» ... Efectivamente, cito, «não é a publicidade da acção governativa que interessa, mas o aprofundamento da análise dos problemas que são do interesse de todos, a recolha das ideias válidas da pluralidade dos agentes económicos, o criar um clima de diálogo e de responsabilidade».
Assim, como apoio a necessidade afirmada pelo mesmo deputado de expressar mais claramente a política de apoio às pequenas e médias empresas», em diversos capítulos a menos que esse aspecto tenha deixado de fazer parte das orientações governamentais, num plano global.

Mas quanto à indústria, penso que, mais cedo do que tarde, serão evidentes à opinião pública a contradição entre as orientações do Sr. Ministro da Indústria, de desenvolvimento e modernização do aparelho produtivo nacional, e as orientações contraccionistas do Sr. Ministro das Finanças. Mas, enfim, guardamo-nos para que sejam expostas com mais clareza e profundidade as orientações preconizadas pelo Ministério da Indústria.

Temo-nos, no entanto, esforçado por compreender como virá a ser compatibilizada a programação apresentada pelo Sr. Ministro da Indústria e Energia com o plano de modernização que, até 18 meses depois da sua tomada de posse, o Sr. Ministro das Finanças se propõe apresentar para que possa efectivamente fazer juz ao nome que lhe cabe de Ministro das Finanças e do Plano. Veremos se essa compatibilização de intenções não será uma quadratura do círculo.

Entrando nalguns aspectos de ordem sectorial, eu gostaria de abordar a área dos transportes terrestres, extremamente importante como uma das infra-estruturas do desenvolvimento económico, na medida em que nós persistimos em defender essa perspectiva de desenvolvimento económico.

E assim eu diria ser de saudar nas grandes opções do flano a preocupação de definir com clareza a «vocação e âmbito de actividade» da CP. Já não será sem tempo que tal seja afirmado, nós não negaremos o nosso apoio às decisões que conduzam à modernização e racionalização da nossa empresa ferroviária. Chamamos a atenção para a necessidade de articular realmente a modernização do equipamento com a programação das empresas metalomecânicas portuguesas, designadamente do sector público e participado do Estado.

Alertamos ainda para a necessidade de se ouvirem atempadamente as populações e os seus órgãos representativos, designadamente os de carácter autárquico, quanto ao problema das linhas e estações a manter ou encerrar, ponderando cuidadosamente o equilíbrio entre os benefícios sociais e os custos económicos de situações existentes, ou a criar.

Relativamente à TAP, que me parece ser a outra grande empresa com problemas extremamente graves, as grandes opções do Plano ainda nos parecem demasiado vagas; parece-nos, pois, que urge tomar decisões rápidas quanto à sua viabilização e racionalização no curto prazo. As hesitações e indecisões neste domínio custarão ainda mais caro; há que tomar opções se não grandes pelo menos fundamentadas e urgentes.
Refiramos ainda por hora outra aspecto de ordem sectorial, de forma sucinta, no seguimento de debate aqui anteontem travado e de uma intervenção já aqui feita, há 2 meses, pelo líder da minha bancada, o deputado António Lopes Cardoso.

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E assim, no que se refere às opções para a marinha mercante, eu gostaria de entender a referência ao «estabelecimento de esquemas adequados de concorrência entre as empresas» como um caminhar no sentido de um programa coordenado de actuações das empresas portuguesas; se assim não for, se se mantiverem práticas de concorrência anárquicas entre empresas públicas nesta área, o sector não melhorará, antes piorará a sua situação.
Nós, deputados da UEDS, gostaríamos de ver efectivamente implementada uma «transformação profunda no modo de funcionamento das empresas do sector», mas atenção, é necessário que tal não corresponda ao desmantelamento das empresas, feito de forma directa ou enviezada.
Outra questão nos preocupa sobremaneira e que tem a ver com o referido «programa de modernização das frotas da marinha de comércio e das pescas» aproveitando as «capacidades produtivas disponíveis nos estaleiros nacionais». Efectivamente, conhecendo nós a situação existente em estaleiros nacionais de grande importância, como o da Sebenave e o da Lisnave, parece-nos relevante a preocupação expressa, bem como a que se refere, eu não diria a «disciplinar» mas sim a «incentivar» a celebração de contratos a prazo entre o armamento e os grandes importadores ou exportadores do sector público. Mas como compatibilizar tal orientação com perspectivas de reprivatização total ou parcial, de organismos de comércio externo de determinados produtos, é a questão que aqui deixamos.
Muito mais se poderia dizer sobre este sector. Resumiria, exprimindo a convocação de que é necessário terminar com a navegação sem rumo da nossa marinha mercante.
Em intervenções posteriores no quadro deste alargado debate em Plenário e na comissão procuraremos prosseguir com algumas referências sectoriais; não me quero alargar mais neste momento, mas não querendo, no entanto, terminar esta intervenção sem voltar a referir uma contradição que parece começar a evidenciar-se entre as intenções desenvolvimentistas de certos governantes e a política restritiva do Sr. Ministro das Finanças. A este aspecto também procuraremos voltar, ulteriormente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, muito obrigado pela vossa atenção.

Vozes da UEDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Joaquim Miranda, tem V. Ex.ª a palavra para uma intervenção.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: O Governo PS/PSD insiste e pretende mesmo agravar a política que conduziu a nossa indústria d situação desastrosa em que hoje se encontra. E o que ressalta dos propósitos enunciados nas grandes opções do Plano de que se destacam o decrescimento do produto interno bruto o decréscimo do investimento, a diminuição do consumo público e a estagnação do consumo privado, para além da forte redução do programa de investimentos da Administração Central.
O Governo vai, diz-se, nas grandes opções do Plano «reduzir sensivelmente o ritmo de crescimento do crédito» e quer introduzir mecanismos de maior selectividade na sua concessão; pretende reduções reais das verbas orçamentadas para as indústrias extractiva, transformadora e da construção civil, inscritas em sede de distribuição funcional das despesas.
Esta política recessiva, significa, Srs. Deputados, o naufrágio da indústria nacional. O Governo espera certamente, que dos escolhos e da ruína das pequenas e médias empresas, possa,resultar a tomada do poder económico pelo grande capital.
Não é por acaso que o Sr. Ministro da Indústria gosta de afirmar que é nas épocas de grande crise que se fazem as grandes transformações estruturais. Isto é: é nessas épocas que se procederá a concentração e à centralização do capital.
O Governo porém, não assume abertamente uma tão desastrosa política e envereda mesmo pala mistificação e pela demagogia:
Apregoam-se novos estudos, novos programas, novos projectos novos diplomas, sendo certo que de concreto, nada, mas nada mesmo, se refere. E o caso, entre outros, do novo programa de investimentos integrados das pirites. E o caso do Plano Energético Nacional, versão 1983. Quando vão, senhores deputados terminar de vez os estudos, as propostas, e se passa à fase de concretização?
Apontam-se direcções prioritárias na actuação d0 Ministério da Indústria e Energia, tais como de expansão da estrutura tecnológica de apoio à .indústria e mesmo o apoio decidido às pequenas e médias empresas.
Mas como é isso possível, se nas próprias grandes opções do Plano, a p. 51, se limita a programa de investimentos da administração central ao máximo de 58 milhões de contos, o que significa uma redução em termos reais de 29 % e com cuja verba, e passo a citar as grandes opções do Plano quase só se permitirá a continuação dos programas em curso e mesmo assim ajustados àquele nível de financiamento?
E a este propósito, talvez o Sr. Ministro da Indústria e Energia, na intervenção que irá fazer, dado que está inscrito desde o primeiro dia nos dirá qual o valor das verbas que propôs ao Sr. Ministro das Finanças e qual o valor por este aprovado para a concretização das políticas de transformação estrutural referidas nas grandes opções do Plano para a indústria e para a energia?
Talvez o Sr. Ministro da Indústria possa nessa altura desmentir que há reduções para 1/10 nas verbas para o Sistema Nacional de Qualidade; para um sétimo nas verbas para o incremento das energias renováveis; ou, para metade nas verbas para o apoio às pequenas e médias empresas, para a expansão do Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI) e para a prospecção de minérios? E a este propósito convém registar que as porcentagens ontem aqui referidas pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento falariam a realidade já que não é legítimo comparar o OGE inicial para 1983, quando já foi revisto, com o agora proposto para 1984. Por outro lado, quais e quando vão ser criados os novos centros tecnológicos de apoio a sectores industriais tradicionais em crise, preconizados nas grandes opções do Plano? De que verbas dispõe o Ministério da Indústria e Energia para este efeito?
Que se pretende, objectivamente, com as chamadas Empresas de Investigação e Desenvolvimento? Apoiar

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as pequenas e médias empresas e as empresas públicas ou apoiar, com os dinheiros públicos, o fortalecimento de grandes empresas industriais de forma a torná-las embriões de futuros monopólios?
Como vai ser possível expandir o Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI), como se refere nas grandes opções do Plano se a verba que lhe é destinada foi substancialmente reduzida relativamente à proposta feita pelo Ministério da tutela? Também no que concerne às indústrias extractivas e para além de algumas referências imprecisas, o Governo não explicita, com objectividade, os projectos que possui e bem assim os investimentos que neste campo pretende efectivamente ver concretizados.
Quanto ao Plano Energético Nacional é significativo que as grandes opções do Plano não se refiram minimamente ao aproveitamento dos nossos recursos hidroeléctricos.

Vozes da bancada do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente é de sublinhar que o Governo apregoa programas de reconversão de diversos sectores industriais, que carecem efectivamente de medidas urgentes de apoio, como os têxteis, indústrias florestais, cerâmica e vidro e electromecânica! Mas como, vai o Governo consegui-lo se anuncia, ao mesmo tempo, restrições ao investimento, a continuação das elevadas taxas de juro e a diminuição da procura?
Este não é, Srs. Deputados, o caminho do desenvolvimento industrial: é o caminho das falências em série, e o caminho das concentrações forçadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também no que diz respeito ao sector comercial, e entrando neste sector, o Governo invoca a cada vez mais distante adesão à CEE e invoca a urgência em desenvolver o que chama de uma correcta política de mercado, ou de preços reais, para prosseguir a política tortuosa, já anteriormente trilhada pela AD. Nada refere nas Grandes Opções do Plano quanto a mercados abastecedores, à rede de frio ou ao programa nacional de recolha e abate de gado; nada referem quando à necessidade de dar resposta ao escoamento de produtos agrícolas. O Governo tão-só procura diminuir a procura interna, nomeadamente de bens essenciais. Por isso reduz bruscamente as transferências do Orçamento do Estado para o Fundo de Abastecimento que passam de 16 milhões de contos em 1983, para 3,5 milhões de contos em 1984, com todo o rol de consequências gravosas que daí decorrerão particularmente para as camadas da população de mais fracos recursos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - O Governo pretende dar satisfação aos interesses de algumas grandes empresas industriais e de algumas multinacionais já instaladas no País e para isso avança com a desactivação de organismos de coordenação económica e com o desmantelamento de importantes empresas públicas.

Voz da bancada do PCP: - É um escândalo!

O Orador: - As recentes decisões do Governo relativamente à EPAC, AGA e ao IAPO, são disso prova indesmentível e envolvem o executivo num verdadeiro escândalo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O volume de negócios das empresas e organismos em causa é de cerca de l60 milhões de contos anuais. É esse chorudo negócio que há quem queira passar para o campo de manobra de uma ou de outra multinacional e de meia dúzia de grandes empresas industriais de rações, de oleaginosas e de refinação de açúcar. Na legislatura anterior esta Assembleia não concluiu o inquérito parlamentar à anterior tentativa de levar a cabo este atentado ao interesse nacional.
Mas é bom recordar que a AD apenas conseguiu levar por diante uma parte deste escândalo, no que respeita à AGA, com a atribuição de quotas de importação de açúcar ...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!

O Orador: -... no oligopólio constituído pelas três refinarias SORES, SIDUL e RAR.
Hoje, acrescem as razões para inquirir, até ao fundo, as responsabilidades e os interesses que estão por detrás deste escândalo que prossegue e se aprofunda.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, o Governo cria uma Comissão Interministerial para os Mercados de Produtos Alimentares (CIMPA), por resolução do Conselho de Ministros, publicada em 29 de Outubro de 1983, cujas atribuições, entre outras, consistem na apresentação de, e passo a citar, «propostas de transição faseada das actividades económicas dos sectores sujeitos a comércio monopolista do Estado para uma estrutura de mercado de tipo comunitário» - e continuo a citar - «em colaboração com a Direcção-Geral do Comércio, a apresentação de uma proposta de definição das condições estruturais mínimas de acesso à actividade por parte dos agentes económicos privados, cooperativos e públicos».
Mas, «gato escondido com o rabo de fora», como se tais propostas tivessem sido já apresentadas pela CIMPA, em 31 de Outubro (3 dias depois da Resolução do Conselho de Ministros), e por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e do Plano, da Agricultura, Florestas e Alimentação, da Indústria e Energia e do Comércio e Turismo, é retirado ao IAPO, a partir de 1 de Junho de 1984, o direito exclusivo de importação de sementes oleaginosas e outras matérias-primas.
Entretanto e por despacho do Ministro do Comércio e Turismo, a quota de importação de açúcar atribuída desde 1982 às grandes empresas refinadoras passará de 25 % para 50 % no próximo ano.
Porquê, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, toda esta pressa? Talvez aqui se compreenda e é significativo o apoio entusiástico - e mesmo o aplauso - que o CDS ontem deu à intervenção do Ministro do Comércio e a esta política? Também aqui a política da AD continua em boas mãos.
Numa situação de crise económica acentuada no País; numa fase de forte recorrência a mecanismos de proteccionismo a nível internacional e de recurso crescente a esquemas de compensação; sendo conhecido que, particularmente o comércio de cereais, é dominado a nível internacional por meia dúzia de transnacionais; e sabendo-se, para além de tudo isso,

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que o que está em causa não é, nem de perto nem de longe, a liberalização de importações, mas tão-só a transferência das mesmas do sector público para as mãos da Lusograin, no caso dos cereais, de três refinadoras, no caso do açúcar e de duas ou três empresas de oleaginosas, como se podem aceitar umas tão gravosas decisões?

E preciso, Srs. Deputados, investigar as razões destas pressas, porque as consequências são previsíveis e inevitáveis: é o aumento dos preços de produtos essenciais e o aumento da inflação; é o controle dos mecanismos de formação de preços por parte de grandes empresas; é o ataque brutal aos interesses de pequenas e médias empresas industriais e comerciais e dos pequenos e médios agricultores; é a redução do poder de compra de vastas camadas da população.
Esta política, que perpassa pelas grandes opções do Plano e pela intervenção do Sr. Ministro do Comércio e Turismo, ontem aqui proferida, compromete o desenvolvimento do País e colide mesmo com algumas prioridades macro-económicas definidas pelo Governo. O desmantelamento da EPAC, da AGA e da do IAPO determina, inevitavelmente, a substituição do recurso a crédito externo a longo prazo par crédito a curto prazo; reduz a capacidade negocial do País; impede a concretização da necessária recuperação da marinha mercante nacional que depende, como reconhecem as Grandes Opções do Plano e como reconheceu o Sr. Ministro do Mar numa reunião com a Comissão Parlamentar da Economia, Finanças e do Plano, passo a citar «da celebração de contratos a prazo entre o armamento e os grandes importadores ou exportadores do sector público», ou seja precisamente a EPAC, a AGA e o IAPO.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, entre a demagogia, os cortes drásticos das verbas orçamentais e os escândalos, inscreve este Governo as políticas industrial e comercial que, pelas suas características e pelos seus resultados desastrosos, só pode merecer a nossa mais firme oposição.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues para pedir esclarecimentos.

O Sr. Cuido Rodrigues (PSD): - Sr. Deputado Joaquim Miranda, ouvi com atenção a sua intervenção e dela extraí alguns pontos aos quais me referirei.
Relativamente aos centros tecnológicos, o Sr. Ministro da Indústria e Energia oportunamente dirá o que entende sobre o assunto. Agora, queria apenas lembrar-lhe que efectivamente já existem e já estão em funcionamento 2 centros tecnológicos: o Centro de Apoio à Indústria Metalomecânica, no Porto, e o Centro de Apoio à Indústria, à Cerâmica e Vidro, em Coimbra.
Esses centros são financiados em 50 % por vários organismos do Estado e em 50 % por Associações profissionais da Indústria. Portanto, mais do que uma intenção, são efectivas realidades. Era para este facto que queria chamar a atenção do Sr. Deputado.
Por outro lado, disse V. Ex.ª que o Orçamento não prevê apoios à indústria, nomeadamente às pequenas e médias empresas. 0 Sr. Deputado, mas por vezes, apoios não significam exclusivamente fornecimento de meios financeiros; muito mais importante do que o fornecimento de meios financeiros é apoiar as empresas em «massa cinzenta», ajudá-las a obter financiamento, ajudá-las a fazer reestruturações de implantação, ajudá-las sobre todos os pontos de vista das suas carências.
E evidente que as empresas quando vêm ter com os organismos do Estado, especializados, vocacionados na matéria, vêm normalmente apresentar um problema de carácter financeiro. Simplesmente é nossa obrigação analisar globalmente o que elas pretendem e dar o apoio correcto.
Por outro lado, Sr. Deputado, reestruturar, fazer transformações estruturais, não significa, de maneira nenhuma, que se vise acabar com as pequenas e médias empresas. Há sectores em que as próprias transformações estruturais são transformações que visam privilegiar as pequenas e médias empresas. Não significam, de forma nenhuma, privilegiar grandes empresas. Há sectores nacionais, como todos sabemos, em que o futuro é efectivamente um futuro de pequenas e médias empresas, que funcionem em produtos de alta qualidade e média série.

O Sr. Presidente: - Para um protesto tem a palavra o Sr. Deputado António Rebelo de Sousa.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quero protestar porque, em primeiro lugar, na sua intervenção o Sr. Deputado do Partido Comunista fez um processo de intenção em relação à intervenção do Sr. Ministro da Indústria e Energia, para além de ter revelado o desconhecimento do que se passa em termos de formação de preços quando, a certa altura, se referiu à diminuição das verbas correspondentes ao fundo do abastecimento sem ao mesmo tempo tentar explicar como é que os preços poderiam ser subsidiados sem que houvesse necessidade de recorrer a qualquer forma de financiamento, que por via indirecta não pudesse por sua vez lesar também o próprio contribuinte. Aliás nós gostaríamos de saber como é que seria realmente possível, com a aplicação de um modelo tipo proteccionista como o que é defendido pelo Partido Comunista Português, evitar a existência de fortes tensões inflacionistas internas. E porque, contrariamente ao que tem sido aqui afirmado, jamais foi dito por qualquer deputado do Partido Socialista que por exemplo, a sobretaxa tivesse efeitos motores negativos nas importações; o que se disse foi que teria, isso sim, efeitos motores negativos no que respeita às tensões inflacionistas internas.
Portanto, para além de todos estes aspectos nós não podemos deixar de protestar pelo facto de se ter feito um processo de intenção relativamente à intervenção aqui produzida pelo Sr. Ministro da Indústria e Energia e peço desculpa visto que a intervenção não terá sido proferida aqui no hemiciclo mas foi aqui referida. De qualquer forma, ao falar-se na reconversão das estruturas produtivas não se está obviamente - e é importante salientar isto- afalar na destruição das pequenas e médias empresas. Aliás quem tenha, porventura, estudado alguns autores, como é o caso, por exemplo de Chenery, que tem falado das chamadas regularidades, sabe perfeitamente que, para além das chamadas economias de escala, que de facto condu-

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zem à necessidade de um redimensionamento empresarial, há também a diversidade; e nas economias que estão numa fase superior de desenvolvimento económico, o que se verifica muitas vezes é que se pode e se deve contar com o desenvolvimento de pequenas e médias unidades industriais.
Finalmente, confundir saneamento financeiro com recuperação capitalista monopolista é também, a nosso ver, prova de má fé e de ignorância.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - A maior prova de ignorância é você quando fala.

O Orador: - E é também por essa razão que manifestamos aqui o nosso protesto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda para responder, se assim o desejar.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao Sr. Deputado Cuido Rodrigues, que diz existirem já 2 centros tecnológicos, dir-lhe-ei que o que temos nas Grandes Opções do Plano é que vão ser criados mais centros tecnológicos. E nós o que perguntamos é isto: Como? Com que verbas se as que são propostas pelo Ministro da Indústria e Energia foram cortadas pelo Ministro das Finanças e do Plano? Esta é a questão concreta que se coloca e a resposta gostaríamos de a ouvir, depois, do Sr. Ministro.
Refere ainda que não são só os apoios financeiros que podem salvar as pequenas e médias empresas e refere muitas outras coisas: a «massa cinzenta», etc. etc. Mas como é que o Governo vai colocar ao dispor das pequenas e médias empresas essa mesma «massa cinzenta» e outras coisas sem meios financeiros? Esse é a questão que se coloca, Sr. Deputado.
Por outro lado, diz que o Governo vai apoiar - e com isto já respondo também ao Sr. Deputado António Rebelo de Sousa - as pequenas e médias empresas, que as não vão destruir; mas como é que não vão destruir as pequenas empresas e médias empresas se elas já estão a falir em série? Esta é que é a realidade concreta. Se o investimento vai diminuir, se o acesso ao crédito vai ser dificultado, se a procura também vai ser diminuída, como é que vão sobreviver as pequenas e médias empresas, como é possível salvá-las e apoiá-las?
Quais são as empresas que podem, enfim, sobreviver a esta situação que nos é aqui traçada pelas Grandes Opções do Plano que o Governo nos apresenta?
Quanto ao Sr. Deputado António Rebelo de Sousa sempre gostaria de lhe dizer o seguinte: fala-me na questão da formação dos preços, na questão da inflação. O que eu lhe posso dizer é que nunca se poderá controlar a inflação e o aumento brutal dos preços entregando empresas públicas como a EPAC, a AGA e o IAPO, que coordenam a formação desses mesmos preços, a empresas privadas, monopolistas algumas. Isso é que é impossível de coordenar com uma intenção possível ou pensável de querer diminuir a inflação.
Por outro lado, também refere que as pequenas e médias empresas não serão destruídas. Já respondi a essa questão mas sempre repito que elas já estão a ser destruídas, destruição que, com o programa que aí temos, se vai acentuar mais.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza, desde que o tempo seja descontado no seu.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Sr. Deputado, desculpem-me, mas parece-me que o Sr. Deputado se está a esquecer de que existem várias formas de mercado e nada nos garante que quando se vai substituir uma situação de monopolismo por parte de uma empresa pública, essa substituição se faça também por uma situação de monopolismo por parte de uma empresa privada. E sabe também com certeza que sempre é preferível uma forma de concorrência perfeita, ou próxima da perfeita, ou de oligopólio mesmo assim, em termos das diversas formas alternativas de mercado, a uma situação da monopólio tout court.

O Orador: - Sr. Deputado, em relação a essa questão da substituição das empresas públicas por empresas privadas, e particularmente no que se refere à EPAC, eu remeto-o para as posições do Partido Socialista aquando do debate do inquérito aqui feito sobre essa matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Aí verá quais foram as posições concretas do Partido Socialista sobre esta mesma matéria. E penso que não é necessário dizer mais.
Quanto à última questão que referiu, eu gostava apenas responder desta forma, Sr. Deputado: leia um pouco menos livros, mas atente mais à realidade concreta do nosso país, pense um pouco e assim conseguirá, na verdade, ter a possibilidade de ter uma noção mais exacta do que vai por este país e quais os resultados que determinarão estas medidas que o Governo aponta.

Vozes do PCP: - Muito bem! Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Rebelo de Sousa.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Agora esteve a transcrever dos livros mas não conseguiu fazer a ligação.

Risos do PCP.

Voz do PSD: - Tão pequeno e faz tanto barulho.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Começo por dizer que se a má educação fosse poder, nós provavelmente estaríamos na oposição e o Partido Comunista no poder.

Aplausos do PS e do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Para se proceder a uma análise criteriosa da proposta de lei do Orçamento do Estado importa atender não apenas aos modelos de estabilização con-

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juntural alternativos, como também - e conforme já tive a oportunidade de salientar aquando da discussão e aprovação, na generalidade, das propostas de lei referentes à introdução do imposto extraordinário sobre os rendimentos do trabalho, bem como sobre outras matérias colectáveis - à necessidade de articulação das políticas de curto prazo com modelos coerentes de crescimento, a médio e longo prazos.
Como é do conhecimento geral - e conforme já foi dito e redito, embora nem sempre com a indispensável consciência quanto às implicações advenientes dessas mesmas constatações de facto, a economia portuguesa confrontava-se, aquando da tomada de posse do Governo de coligação PS/PSD, com uma situação particularmente crítica, susceptível de ser caracterizada pela consideração dos seguintes aspectos fundamentais:
1.º forte desequilíbrio externo, com um défice da balança de transacções correntes da ordem dos 3200 milhões de dólares em 1982, sendo ainda admissível (em princípios de 1983 e na pressuposição de uma não actuação ao nível das variáveis explicativas da evolução das exportações e importações de bens e serviços), uma forte tendência para o agravamento da estrutura manifestamente desequilibrada do nosso comércio externo, tendência esta preocupante para uma economia virada para um efectivo esforço integração na Comunidade europeia.

2.º Incremento do endividamento externo, o qual chegou a atingir cerca de 15 000 milhões de dólares, valor este que, apesar de ficar aquém da situação de dependência externa em que se encontram economias que se proclamam paradigmas do Socialismo, passou a ser de molde a que se justificasse um maior e mais racional esforço de gestão da dívida externa;

Existência de uma situação de desequilíbrio interno, manifestada quer ao nível do mercado de consumos intermédios quer ao nível do mercado dos bens e produtos finais, a qual se traduzia, nomeadamente, através de tensões inflacionistas dificilmente controláveis, sem que, pela via da oferta e procura internas e do mecanismo dos preços, se conseguisse suscitar a regulação da oferta e procura internas de molde a operar-se a «separação de águas» entre empresas economicamente viáveis e empresas economicamente inviáveis;
Existência de uma taxa de desemprego artificial, da ordem dos 8 % a 9 % da população activa, sabendo-se, todavia, ser extremamente reduzido o ritmo de crescimento dos índices de produtividade e significativamente elevado o nível de subemprego ou de desemprego oculto (verdadeira herança de uma concepção colectivista de funcionamento da economia, de acordo com a qual mais vale a mentira do emprego fictício, porque significa uma potencial integração num certo tipo de enquadramento social, do que a verdade do desemprego inevitável que

deve ser transformado em repto ao investidor num sentido de mudança e de modernidade);
5 º Aumento sistemático dos desequilíbrios orçamentais, sintoma de uma certa incapacidade reorganizativa da Administração Pública, por um lado, e decorrência do agravamento dos encargos da dívida pública, por outro lado, encargos esses também eles resultantes, em parte, dos desequilíbrios advenientes de uma política incorrecta em relação ao nosso sector exportador e ao investimento.

Dada a situação de partida, então existente, haveria, obviamente que proceder a uma hierarquização de objectivos de política económica conjuntural, optando-se, de seguida, pelo modelo de estabilização mais conforme com a mesma e mais ajustável à realidade que nos cerca.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Esta é do Friedman.

Risos do PCP.

O Orador: - A primeira tentação possível - descrita de forma lapidar, nos últimos textos de Diaz Alejandro e de Katseli consiste na defesa dos modelos «populistas», mais próximos do chamado modelo de substituição de importações, que, conforme sabemos, parece ser caro ao Partido Comunista Português, mas criticado pelo Partido Comunista Francês, certamente por razões superiores que a «justa lula do proletariados e a «emancipação das massas» se encarregarão de trazer à luz do dia. Esse modelo caracteriza-se pela consideração dos seguintes aspectos essenciais:

A taxa de crescimento do produto interno bruto deve aumentar (suponha-se para o caso português uma taxa da ordem dos 3 % ao ano);

2 º O desemprego deve diminuir, quer por força da pressuposta reanimação da actividade económica quer pelo incremento substancial do investimento público, podendo, inclusive passar-se por um novo agravamento do défice orçamental;
3 º O desequilíbrio externo deve ser combatido pela introdução de novas barreiras aduaneiras ou de restrições quantitativas à importação e não através da contenção da procura interna global ou do instrumento taxa de câmbio;
4 º O investimento deve ser redinamizado através de uma baixa substancial da taxa de juro, controlando, por via administrativa, os movimentos de capitais;
5 º A dívida externa deveria, por sua vez, ser renegociada numa posição que corresponderia, no essencial, a um congelamento da amortização da mesma e do próprio pagamento dos juros, correndo-se o risco de incumprimento, como aliás já tem sido em economias de capitalismo de Estado;
6 º Os salários reais deveriam aumentar a fim de se compensar a perda de procura externa;

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7.º As tensões inflacionistas advenientes de uma oferta interna rígida e dos aumentos salariais deveriam ser controladas por via administrativa, recorrendo-se em caso de necessidade ao relacionamento.

Eis, enfim, Srs. Deputados o modelo alternativo ao do Governo - susceptível de ser considerado qualitativamente diferente e não apenas divergente em aspectos pontuais ou quanto à maior ou menor intensidade das medidas a adoptar - que os defensores do modelo populista de substituição de importações defenderiam para o nosso país, tal como já o defenderam para a União Indiana, para a Argentina ou para o próprio Brasil (para já não falarmos na aplicação clássico-convencional deste modelo na União Soviética durante a época estaliniana tão cara a certos deputados).

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Só disparates!

O Orador: - Vejamos, então, quais seriam as consequências da aplicação deste modelo para a economia portuguesa: em primeiro lugar e contrariamente ao que tem vindo a ser afirmado pela bancada do PCP, a elasticidade das importações em relação ao produto interno bruto apresenta-se elevada, sendo o nível de actividade económica a variável explicativa principal do comportamento das importações de acordo com os t-tests feitos para os mais diversos modelos econométricos, inclusive para os que comportam a utilização de equações de desfasagem distribuída.
Deste modo, se o PIB crescesse a uma taxa de 3 % ou mesmo de 2 % ou 1,5 %, em 1984, as importações aumentariam, em termos reais, anulando todo e qualquer incremento das exportações, o qual já de si, não se apresentaria tão significativo quanto seria desejável se se optasse pela política de não depreciação do escudo preconizada pelo Partido Comunista Português. Por outro lado, não se verificando uma atenuação do défice externo, estaríamos, seguramente, confrontados com um agravamento não controlado do endividamento externo, diminuindo, de forma drástica, a nossa capacidade de captação de empréstimos externos no mercado internacional e caminhando-se para uma situação de ruptura financeira.
A caminhada para essa situação de ruptura financeira seria, ainda, bem mais rápida se a política cambial aplicada fosse a política cambial defendida pelo PCP, afigurando-se, desde já, útil chamar a atenção para o facto de que se comete um erro lamentável (para mais, quando se trata de políticos responsáveis) quando se afirma que a desvalorização do escudo não produz efeitos indutores positivos no nosso comércio externo em virtude da elasticidade procura-preço das exportações se apresentar relativamente rígida para a generalidade dos bens que canalizamos para o exterior, esquecendo-se do que o essencial consiste na condição Marshall-Lerner ...

Risos do PCP.

... segundo a qual importa atender, simultânea e conjugadamente, aos efeitos produzidos nas importações e nas exportações, devendo o somatório das elasticidades ser superior a um, o que, em boa verdade, sucede no caso português.
Mais: sendo certa a caminhada acelerada para uma ruptura financeira, logo estariam seguramente criadas, a prazo de algum tempo, as condições propiciadoras a uma quebra nos fornecimentos externos, aliás, à semelhança de que tem vindo a suceder em economias tão diversas como a de certos países latino-americanos e as de países africanos a cujo destino, por sinal, jamais poderemos estar indiferentes.
Em decorrência desta evolução previsível da economia nacional, o desemprego poderia diminuir, no curto prazo, para logo voltar a aumentar, assim que as empresas de dependentes de imputs provenientes do exterior começassem a experimentar grandes dificuldades.
Paralelamente, o incremento significativo, a curto prazo, do investimento público (medida teoricamente destinada a suprir a incapacidade de resposta que existiria, porventura, do lado da iniciativa privada) só poderia ser conseguida à custa de um agravamento do défice orçamental, o qual - como já tive oportunidade de explicar - teria, seguramente que ser financiado por uma de duas vias: primeira, através do recurso ao crédito externo, agravando-se ainda mais a situação de endividamento; segunda, ou, em alternativa, através do recurso do crédito interno, nomeadamente a partir da subscrição de títulos do tesouro, sendo todavia evidente que o mais provável consistiria na afectação por via indirecta, dos plafonds de crédito ao sector privado da economia.
Restaria, obviamente, uma terceira possibilidade, a qual consistiria numa aposta num, ainda, maior aumento das receitas fiscais, quer através da tributação directa, diminuindo o rendimento disponível das famílias, quer através da tributação indirecta, aumentando, nesse caso, as tensões inflacionistas e contrariando-se o objectivo de incremento dos salários reais.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - A diminuição dos salários reais já está a ser feita por este Governo.

O Orador: - Simultaneamente, convirá não esquecer que a aplicação de uma política de tipo proteccionista, com a reintrodução de direitos aduaneiros, iria provocar -conforme refere Anne Kruegger num estudo que elaborou sobre o modelo de «substituição de importação - um aumento no rátio entre o preço de importação e o chamado preço doméstico que, para economias com um sector de bens de equipamento insuficiente, se traduzirá necessariamente, num agravamento suplementar da taxa de inflação interna, com efeitos indutores negativos na competitividade do próprio sector exportador.
Os efeitos negativos produzidos no que concerne à competitividade das exportações implicaria o recurso à desvalorização, a qual por seu turno produziria novas tensões inflacionistas internas, gerando-se, conforme já referi nesta Assembleia, um processo cumulativo de inflação-desvalorização-inflação-desvalorização» que Parkin descreveu, pormenorizadamente, em cinco fases distintas, tomando, ainda, em conta o gap temporal compreendido entre as solicitações da procura e as respostas de ajustamento da oferta. Para mais, a argumentação segundo a qual a aplicação de um modelo de substituição de importação em nada colidiria com a nossa pertença à EFTA e com o Acordo de Comercio Preferencial celebrado com a CEE só poderá ser reveladora de ignorância, uma vez que a aplicação das cláusulas de salvaguarda não pode

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ser eternizada no tempo e que a constituição de zonas de comércio livre implicará sempre a eliminação de barreiras aos fluxos internacionais de bens, não fazendo, por outro lado, sentido defender a execução de um modelo de «substituição de importações», apenas, por um ou dois anos, como se afigura evidente.

Por outro lado - e já não se entrando na análise dos possíveis efeitos decorrentes da eventual aplicação de medidas de retaliação por parte dos nossos principais parceiros comerciais -, a defesa da redinamização das nossas estruturas produtivas a partir de tinia política financeira desenquadrada do sistema financeiro internacional apresenta-se como algo de utópico não fazendo qualquer sentido pensar-se na eficácia de um controle administrativo da fuga de capitais (a não ser em modelos colectivistas em que todo o sector exportador e todo o sector importador são controlados pelo Estado), bem como em não atender à inevitabilidade de uma certa articulação entre as taxas de juro reais praticadas no mercado internacional e as taxas de juro reais praticadas internamente.

Finalmente, uma política de altos salários reais, na presente conjuntura nacional, articulada com uma política de controle administrativa dos preços só poderia conduzir, dada a impossibilidade de se registar um forte acréscimo na produtividade do sector exportador, a uma diminuição da competitividade das exportações, aumentando, por conseguinte, o risco de se enveredar pelo processo cumulativo de «inflação-desvalorização-inflação». O caso da França - uma economia cujo grau de desenvolvimento e capacidade de reconversão das estruturas produtivas internas se apresenta, de longe, superior à da economia portuguesa - constitui um exemplo elucidativo do que vimos a este propósito afirmando.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em síntese, afigura-se-nos correcto concluir que num modelo de estabilização de tipo expansionista, a articular com um modelo de substituição de importação, só poderia acarretar - mesmo para uma taxa, relativamente moderada da ordem de 1,5 % ou 2 % de crescimento do PIB, para 1984, e tendo como pressuposto uma certa capacidade de incremento do grau de aproveitamento da capacidade produtiva instalada-uma agudização da situação de desequilíbrio externo, o agravamento do endividamento face ao exterior e um maior risco de ruptura financeira, a aceleração de um processo cumulativo de «inflação-desvalorização-inflação», o aumento dificilmente controlável do défice orçamental e, a médio e a longo prazos, o contrário daquilo que os defensores deste modelo se propõem defender, isto é, o incremento do desemprego e a degradação do nível de vida (mais pela via de uma inflação galopante e da introdução do racionamento como elemento limitativo da maximização da utilidade do consumidor do que pela via directa da contenção salarial e da variação na carga fiscal).

Logo, não sendo o modelo expansionista adequado à conjuntura portuguesa, nem sendo o modelo de substituição de importações, preconizado ao que parece pelo Partido Comunista Português capaz de permitir a necessária redinamização das estruturas produtivas internas, importará saber quais, então, as alternativas susceptíveis de implementar no futuro, quer em termos de modelo de estabilização conjuntural, quer em termos de estratégia de crescimento, a médio e longo prazos.
Quanto ao modelo de estabilização, não fazendo sentido lógico a aplicação de um modelo de tipo expansionista, só se afigura realista proceder à execução de uma política de controle da procura interna global e não de mera tentativa de controle selectivo da procura, tal como chegou a ser tentado - mas sem sucesso- aquando da aprovação do primeiro conjunto de medidas de política económico-financeira por um Governo Constitucional, em finais de Fevereiro de 1977, salvo erro. A aplicação de um modelo de controle da procura global (à semelhança do que já viria a suceder em 1978) implica, necessariamente, a contenção dos gastos públicos e a redução, em termos reais, do défice orçamental, a imposição de plafonds de crédito (embora com a indispensável flexibilidade, por forma a que sectores porventura considerados prioritários não venham a ser negativamente afectados) e uma certa diminuição do próprio rendimento disponível das famílias, através da acção concertada a desenvolver ao nível da tributação, por um lado, e de uma política salarial adequada, por outro lado.

O que poderia, então, discutir-se seria a intensidade das medidas a adoptar, que não o seu sentido fundamental, bem como os critérios de escolha utilizados em matéria tributária e de gastos públicos.
O argumento, vindo da área política do CDS, segundo o qual não se preconiza, nesta proposta de lei do OGE, uma redução tão significativa quanto seria desejável para os gastos públicos só poderá partir do pressuposto da existência de uma certa elasticidade ou flexibilidade nas despesas orçamentais, o que, como é do conhecimento geral, não corresponde à realidade, pelas seguintes razões:

Em primeiro lugar, porque os encargos com a dívida pública ocupam, hoje em dia, uma posição de grande peso relativo aos gastos públicos, tratando-se de uma despesa insusceptível de ser significativamente reduzida, nos tempos mais próximos;
Em segundo lugar, porque as despesas com a função pública só poderão ser substancialmente reduzidas a partir de uma profunda reorganização da Administração Pública, apresentando-se difícil ir muito além do que se propõe o actual Governo, se atendermos a que tal reorganização da Administração Pública não pode ser levada a cabo em meses ou, até mesmo, num ano;

Em terceiro lugar, porque não faria sentido reduzir, ainda mais, as despesas de capital em termos reais, uma vez que se pretende conciliar a contenção necessária da actividade económica com a implementação simultânea das indispensáveis reformas estruturais (inclusive de acordo com uma perspectiva de compensações, a prazo, dos custos sociais que os portugueses terão que suportar, no presente).

Quanto à linha de argumentação utilizada pelo CDS no sentido de se procurar dar a entender que a política tributária do Governo deveria ser distinta da que tem sido preconizada, conviria, desde já, atender aos seguintes níveis de análise: apresenta-se aleatória quanto aos resultados a obter, a opção que privilegia

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a tributação indirecta, havendo ainda a considerar os potenciais efeitos inflacionistas daí decorrentes; e, por outro lado, convirá, em qualquer circunstância, não contribuir para o agravamento de uma deficiência de tipo quase «estrutural» na nossa política orçamental, a qual consiste no peso excessivo da tributação indirecta no montante global das receitas tributárias.

Deste modo e sendo certo que não existe uma alternativa válida ao modelo de estabilização defendido pelo Governo PS/PSD, quer por parte do PCP quer por parte do CDS, convirá ainda mencionar alguns aspectos que se prendem, mais directamente, com a política monetária e financeira.

Uma das críticas da oposição tem consistido no facto de a taxa de juro real se apresentar excessivamente elevada, nada se dizendo, todavia, em desabono da política cambial de depreciação deslizante do escudo que tem vindo a ser posta em prática. Aliás, quanto a este último aspecto, só o PCP tem levantado algumas questões (em obediência ao modelo tendencialmente autárquico que propõe para Portugal), desconhecendo, todavia, a lógica dos movimentos internacionais do factor produtivo capital, a inevitabilidade de continuarmos a ser uma pequena economia aberta e a condição de Marshall-Lerner, conforme já referi, relativa ao somatório das elasticidades «procura-preço» das importações e das exportações -havendo, até por sinal, alguns contributos positivos de autores como Findlay sobre esta matéria e aplicáveis às relações entre regiões com graus de desenvolvimento desiguais.
Mas, voltando à questão da taxa de juro real, importará desde já convir que a mesma se apresenta superior em cerca de 2 % a 3 % à taxa de juro praticada na generalidade dos nossos parceiros comunitários, o que sendo de per si significativo, se torna possível compreender numa primeira fase em que se pretende que o «choque contraccionista» produza mais efeitos, sem prejuízo, todavia, de um ulterior ajustamento, logo que comecem a ser sentidos sinais de uma recuperação, com garantias de durabilidade, da economia portuguesa.

Mais importante do que esta questão, poderá vir a ser, no entanto, a reconversão do sistema financeiro, quer através da introdução de alterações tidas por convenientes no sector bancário quer por via da abertura de certos sectores de economia à iniciativa privada.

Pode a opinião pública ser, desde já, esclarecida da intenção de socialistas e sociais-democratas quanto à defesa dessa mesma reconversão e, ainda, no que concerne à criação de condições propiciadoras a médio prazo, de um incremento de investimento privado, nacional e estrangeiro, atendendo-se não apenas a mecanismos indirectos (como o dos incentivos fiscais) como também a eventuais ajustamentos a introduzia na legislação relativa ao investimento estrangeiro e à implementação de projectos de desenvolvimento das infra-estruturas básicas nas regiões tidas por «prioritárias».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se, no curto prazo, é o modelo preconizado pelo Governo o que mais se adequa à realidade económica portuguesa, também a médio e longo prazos, apenas, um modelo,de especialização nas exportações industriais e serviços poderá vir a produzir as transformações estruturais que desejamos (por contraposição ao modelo de substituição de importações e ao modelo de especialização nas exportações primárias, o qual, aliás, só faria sentido se fôssemos grandes produtores de uma qualquer matéria-prima escassa e dificilmente substituível no mercado internacional).

Um modelo de especialização nas exportações industriais e nos serviços implicará o apoio simultâneo a sectores básicos e a sectores de ponta, tentando-se superar as indivisibilidades tecnológicas, através da cooperação com exterior e do aprofundamento da investigação, havendo, ainda, que repensar a articulação dos tempos livres com a emergência de novas actividades e tentando-se um forte incremento da produtividade, inclusive através da própria institucionalização de prémios e da introdução de novos incentivos aos factores produtivos trabalho e capital.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: para além do significado óbvio da ausência de alternativas consistentes à política do Governo, importa, finalmente, retirar ainda um outro significado e uma outra conclusão da apresentação de uma proposta de lei do OGE tão corajosa como aquela que estamos a discutir na Assembleia da República.

Em boa verdade, a nova política económica do Governo socialista e social-democrata significa não apenas a vontade de colocar o interesse nacional acima de interesses partidários ou de grupo como também a vontade de romper com o espartilho da burocracia e com uma concepção colectivista radical de funcionamento da economia, de acordo com a qual o Estado deveria - paternalisticamente falando, qual empresa de seguro de risco garantir, por princípio, a cobertura dos défices de empresas inconvenientemente geridas a fim de garantir, ainda que artificialmente, um pseudo-pleno-emprego.

Mais: pretende-se, pela primeira vez, superar uma situaç5o em que os parceiros sociais - aqui, com culpas para muitos empresários e para muitos sindicalistas - propendem sempre à partida, para iniciar toda e qualquer negociação, pelo recurso à intervenção do Governo, o que só contribui para o imobilismo económico e social.

Estamos, por conseguinte, numa época de viragem, pelo menos no que se refere ao desassombro com que se assumem as grandes opções de política económica. É caso para se dizer que, depois de clarificada a questão da natureza democrática do regime político, em 25 de Novembro de 1975, depois de clarificado o sistema de alternância no exercício do poder, com predomínio claro do poder civil sobre o poder militar, através da revisão constitucional, entretanto operada, se está agora no início de uma fase de clarificação do sistema económico e social; trata-se, por conseguinte, da materialização, no campo da economia, do que foi a revisão constitucional no campo político. Nem mais nem menos.
E não serão as manifestações de contestação sistemática que roçam a ilegalidade democrática, nem tão pouco as previsões catastrofistas de alguns dirigentes políticos que nos intimidam.
Aqueles que em 1975 afirmavam não ser possível a democracia parlamentar em Portugal; àqueles que, em 1977, consideravam ser inaplicável o que apelidavam de legislação «contra-revolucionária», na delimitação dos sectores, como na reforma agrária; àqueles que

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proclamavam a necessidade de se «vir para a rua» impedir a revisão constitucional; enfim, àqueles que sempre falharam em relação às suas promessas, inclusive, em relação às que fizeram ao seu próprio e citorado - sendo quase de. prever que quando afirmam que A ou B não poderão vir a ser Primeiro-Ministro ou Presidente da República é porque, quase seguramente, o irão ser-não daremos a oportunidade de inviabilizar a possibilidade de se exercer, em consciência e com eficácia, a governação do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saibamos aproveitar este debate para esclarecer as alternativas existentes e para ajudar a definir os caminhos do futuro, sem confundir a crítica objectiva e construtiva com a crítica sistemática e despida de interesse, em termos do bem-estar colectivo, na certeza de que nós, socialistas, sabemos qual a razão de ser da nossa opção e os objectivos que nos animam. E, mais, consideramos que só com realismo, com uma política de rigor, devidamente fundamentada e que não esqueça o desiderato da transformação da sociedade, se tornará possível fazer face ao desafio que nos é lançado e que iremos vencer.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira(UEDS): - Sr. Deputado Rebelo de Sousa, apreciei, pela clareza, a sua intervenção, mas o desassombro com que se introduzem as alterações económicas que V. Ex.ª defendeu entusiasticamente é, em meu entender, um desassombro que poderá lançar sobre a economia portuguesa perspectivas bastante sombrias.
Vão vou entrar na polémica que V. Ex.ª introduziu sobre concepções económicas estalinistas e de economia de mercado, embora me pareça interessante a sua prossecução, nesta ou noutras instâncias.
De qualquer forma, V. Ex.ª discorda e crítica que o modelo que qualificou de estalinista corresponde a uma alternativa política ao projecto do Governo (e relembro que nada tenho a ver com as concepções estalinistas nem com as concepções que lhe opôs). Então, a questão está em saber quais as concepções que o Sr. Deputado opõe à ideia ou opção estalinista.
O Sr. Deputado, ao dizer que se deve opor a um emprego artificialmente mantido um desemprego inevitável, apelando ou insinuando portanto a uma clarificação das relações económicas em termos de suprimir radicalmente situações de subemprego, fez com que surgisse esta minha dúvida: em contrapartida a concepção que qualificou de colectivista ou estalinista, onde é que V. Ex.ª - que tem sido um dos deputados que tem procurado introduzir aqui uma certa clarificação ideológica - resvala da social-democracia para o liberalismo puro?
Nas sociais-democracias avançadas ha uma extrema preocupação com aquilo que o não preocupa, ou seja, em diminuir os níveis de desemprego pelo lançamento das mais diversas actividades, de carácter social, de utilização de mão-de-obra com carácter de articulação entre a política de obras públicas e as previsões a médio prazo - que é o que falta aqui - das evoluções do desemprego, etc. Isto é que é social-democracia avançada, Sr. Deputado.

Gostaria, portanto, que V. Ex.ª esclarecesse este ponto porque esta é, para mim, uma das questões centrais em termos da própria segurança e defesa do regime democrático. Até que ponto este país, com o grau de subdesenvolvimento que tem, aguenta a elevação do nível de subemprego?
Que isto não preocupe alguns deputados de outras bancadas, enfim, não aceito para mim mas admito. Já em relação ao Sr. Deputado gostaria que clarificasse este problema.
Falou V. Ex.ª no modelo de estabilização apresentado na proposta. Pela nossa parte, não negamos a necessidade de uma política de austeridade e de um modelo de estabilização. Só gostaria de lhe pôr uma questão a este respeito e à qual V. Ex.ª responde ou não, como quiser, agora ou mais tarde (só lhe peço para não responder no corredor tal como, desde ontem ou anteontem, passou a ser moda): se por hipótese o Sr. Ministro das Finanças propusesse o crescimento zero e não a redução do produto, que tipo de consequências julga V. Ex.ª que isso teria em termos da evolução da economia nacional, designadamente para os próximos 2 anos? E fiquemo-nos pelos 2 anos já que se o Governo não vai mais longe nós, que somos simples deputados, também não temos obrigação de ir mais longe.
Para terminar, poder-me-ia dizer alguma coisa sobre quais os motivos por que o controle' selectivo da recessão da procura tentado há alguns anos não teve sucesso? Estou de acordo consigo em como não teve sucesso, mas gostaria que me desse a sua perspectiva sobre qual a razão por que não teve. Esta questão é, na realidade, fundamental para se saber se é ou não possível aplicar, na situação actual, um controle desse tipo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, há mais pedidos de esclarecimento. Deseja responder agora ou apenas no fim?

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de colocar dois conjuntos de questões ao Sr. Deputado Rebelo de Sousa.
Em primeiro lugar, queria ler algumas passagens do debate do Orçamento de 1982 em que um deputado do Partido Socialista referia que «(...) em 7 º lugar, uma política orçamental diferente - em vez de um objectivo de reduzir o défice de 11 % do produto nacional para 8,5 % adoptaria uma redução menor, para 9,5 % (...)» e dizia mais adiante que «(...) do lado das despesas, isso daria para evitar o aumento substancial das taxas a pagar pelos medicamentos, para aumentar um pouco mais os funcionários públicos, para aumentar os prémios de emprego no âmbito de uma política mais activa do que a actual, no domínio das medidas diversas do fomento do emprego (...)», terminando desta maneira: «(...) Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Ficou feita uma crítica à política da AD, ficou denunciado o perigo de alarmismo excessivo quanto à crise, ficaram definidas as

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grandes linhas de uma alternativa. Porque somos diferentes, temos soluções diferentes». Será que por não serem tão diferentes quanto desejava esse deputado do Partido Socialista não encontraram soluções diferentes, antes agravaram as mesmas soluções? Será por isso que não é esse Sr. Deputado que nos vem aqui falar mas o nóvel Deputado socialista Rebelo de Sousa?
Sem querer entrar nas questões ideológicas levantadas pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, acho que é capaz de ter havido alguma precipitação na inflexão do percurso político. Esta era a primeira questão que gostaria de lhe colocar.
As outras questões têm a ver com a relativa simplicidade com que o Sr. Deputado tentou, de uma penada, demonstrar que o CDS não tinha alternativa em termos de política económica-financeira, o que só revela algum cuidado da sua parte em não ir um pouco mais fundo e mais longe, sob pena de lhe ser difícil negar a existência dessa mesma alternativa.

Neste momento, o Sr. Deputado Rebelo de Sousa troca impressões com o Sr. Deputado Carlos Lage.

Sr. Deputado António Rebelo de Sousa, posso dizer-lhe que o deputado do Partido Socialista que citei foi o Dr. Vítor Constâncio.
Se necessitar de mais qualquer esclarecimento, posso tentar dar-lhe!...

Risos do CDS.

... Em relação à manutenção dos níveis da despesa pública, ainda ontem o Sr. Deputado Bagão Félix teve oportunidade de aqui referir que a despesa pública, retirando as despesas com a dívida pública e da segurança social, tinham, em relação ao Orçamento executado (previsível) de 1983, um crescimento de 27,2 %. O problema é que a redução da despesa pública não é, na sua concretização, um objectivo político pronunciado por este Governo, porque um aumento de 27,2 % em relação ao Orçamento de 1983 significa que o Governo não considera possível, e mais do que isso desejável, fazer reduções dessa despesa pública.
É evidente que as razões apontadas por V. Ex.ª são de alguma forma limitativas de uma mais forte redução dessa despesa, mas o que não pode é deixar de ser um objectivo. E é aqui que nós temos as alternativas.
O Sr. Deputado tem toda uma perspectiva de despesa com capital, por exemplo, que tem a ver com a manutenção de todos os projectos em causa, não havendo, portanto, qualquer atitude nova por parte do Governo em relação a essas despesas com capital. Mesmo em relação às despesas correntes a única coisa que há no Orçamento é uma redução fictícia, porque inexequível neste Plano, das despesas correntes do Estado.
Quanto à receita, Sr. Deputado, não é perigoso aumentar a tributação indirecta, antes pelo contrário. O Orçamento e a previsão do Governo partem da falsa ideia de que é possível aumentar as receitas através da tributação directa e isso está em manifesta contradição com a retracção económica para que o próprio Governo aponta.
Por outro lado, quando o Governo quer reduzir o consumo, privilegiando a tributação directa, o que está no fundo a fazer é a penalizar a poupança e, portanto, a criação de riqueza para investimento, ou seja, ao não aumentar a tributação indirecta está, na realidade, a evitar uma maior penalização desse mesmo consumo.
São estas as contradições existentes entre o discurso, genérico e global, de política económica e os instrumentos que o próprio Governo procura utilizar para os alcançar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Deputado Rebelo de Sousa, irei colocar-lhe apenas uma pergunta, na medida em que o meu partido já dispõe de pouco tempo.
Em 1984 a dívida externa irá subir, ninguém dúvida. A balança de pagamentos ainda não poderá ser equilibrada, muito embora se reduza o valor do seu saldo. A questão é a seguinte: não considera V. Ex.ª inevitável que daqui a um ano se tenha que negociar crédito externo, como agora se fez com o FMI, e se tenham que discutir Grandes Opções do Plano e OGE que pouco se distingam deste?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rebelo de Sousa, tem a palavra para responder, se desejar.

O Sr. Rebelo de Sousa (PS): - Srs. Deputados, agradeço as perguntas que me colocaram, sendo também certo que interpreto os silêncios como correspondendo a uma atitude de espírito equivalente à de que quem cala consente.

Risos do PCP.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Pode dar-nos a bibliografia, primeiro?

O Orador: - Quanto à primeira questão que aqui foi colocada pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, queria dizer que compreendo o ponto de vista aqui expresso, segundo o qual deve ser uma preocupação dos sociais-democratas e dos socialistas o combate ao desemprego.
No fundo, julgo que a questão que V. Ex.ª coloca é a seguinte: eu expliquei que é preferível a uma situação de emprego artificial uma situação de desemprego, mas do ponto de vista da justiça social isso é incompreensível porque há uma certa tradição histórica no sentido de o Estado, através de investimentos públicos em infra-estruturas básicas, tentar assimilar mão-de-obra liberta pelo sector privado da economia, tendo em vista reduzir a taxa de desemprego.
Isso é tudo verdade, mas quero dizer-lhe que me parece muito mais adequado, por exemplo, defender-se a existência de sociedades holding de gestão de recursos humanos que pratiquem uma efectiva formação profissional daqueles que estão desempregados e os canalizem rapidamente para novos sectores da actividade produtiva e para novos empreendimentos, desde que eles continuem, por esta via, enquadrados na sociedade e continuem a sentir-se, de alguma forma, úteis à comunidade como um todo. Nesta perspectiva, é então talvez preferível, penso, a situação de desempregado, desde que estejam a ser devidamente assistidos, desde que haja um fundo de desemprego e sociedades de gestão de recursos humanos que preparem a sua canalização para outros sectores da actividade

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produtiva, desde que haja um subsídio de desemprego justo e, por esta via, se criem condições de uma certa durabilidade dos novos empregos que venham a ter no futuro.
Esta situação é capaz de ser preferível à situação de emprego artificial em que existem, por exemplo, salários em atraso.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Já são 470 000, Sr. Deputado.

O Orador: - Outro problema aqui referido foi o do crescimento zero.

Devo confessar que, pessoalmente, sou um pouco mais optimista do que o Sr. Ministro das Finanças no que respeita às previsões relativamente ao produto interno bruto, isto é, julgo - como talvez também outros Srs. Deputados - que a inflexão na actividade económica nacional já se começou a verificar e que num curto espaço de tempo vai ser possível atenuar algumas das medidas de política económica de tipo contraccionistaque já foram adoptadas. Julgo até que, ao chegarmos ao final de 1984, constataremos não uma redução do PIB de 1 %, mas provavelmente uma taxa de crescimento à volta dos zero por cento ou até um pouco superior. Mas, enfim, mais vale prevenir do que remediar, pelo que compreendo que não se tenha pretendido ir muito longe nas previsões.
A terceira questão colocada é a do controle selectivo da procura. De facto, o controle selectivo da procura não tem surtido efeito e explico porquê. Segundo as análises levadas acabo por vários autores não tem surtido efeito fundamentalmente por causado chamado efeito demonstração-imitação, o qual leva a que, não havendo um controle da procura global, os consumidores continuem muitas vezes a preferir bens provenientes do exterior a bens nacionais. Para além do mais, há a considerar um aspecto, que é fundamental: é que, mesmo havendo uma expansão da procura relativamcrite aos bens nacionais e não relativamente aos bens provenientes do exterior, a verdade é que isso vai reflectir-se no aumento da produção de bens que são orientadas para a procura interna, mas no que respeita ao sector de bens de equipamento continua a ser necessário recorrer a bens de equipamento provenientes do exterior. Daí haver, também por essa via, um efeito negativo no que respeita à balança de transacções correntes, pelo que é necessário articular não só o controle da procura global como também uma certa desaceleração do crescimento do PIB com a política relativa às importações.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Azevedo Soares, a primeira reporta-se a uma intervenção de um meu camarada do PS, feita em 1952, que terá defendido a tese de que o défice do OGE poderia ser, nessa altura, porventura um pouco maior do que aquele que era sugerido pelas bancas da Aliança Democrática.
Acontece, entre outros aspectos que não me cabe estar aqui a comentar, que a oposição na altura não conhecia, pelo menos da maneira como hoje nós, Partido Socialista, conhecemos, a situação económico-financeira do país. O Sr. Deputado tem que reconhecer que isso corresponde inteiramente à verdade. Nós não tínhamos acesso a certos dossiers, não tínhamos acesso a determinadas situações, pelo que, não só nós mas também certos responsáveis que estavam no Governo, só mais tarde se aperceberam da situação efectiva existente em termos da economia nacional.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Isso é passar um atestado de ignorância!

O Orador: - Não se está a passar qualquer atestado de ignorância, Sr. Deputado, mas apenas de ter consciência das nossas próprias limitações, atitude que só fica bem a quem sabe o que é estudar e até onde se deve ir em cada momento consoante as próprias possibilidades.
Uma outra questão levantada pelo Sr. Deputado Azevedo Soares reside no facto de não haver propriamente um objectivo, por parte do Governo, de reduzir as despesas públicas.
De facto, esse problema foi aqui levantado pelo Sr. Deputado Bagão Félix, mas devo, todavia, referir que aquele Sr. Deputado - com o respeito que nos merece porque fez uma belíssima intervenção, independentemente de podermos ter discordado dela esqueceu o impacto dos encargos da dívida pública, bem como a existência de certos gastos públicos que são claramente rígidos e a dificuldade que haveria em se conseguir explicitar quais são, em concreto, as despesas que poderiam ser diminuídas. Gostaríamos que o CDS o dissesse detalhadamente porque, inclusive no debate na especialidade, é perfeitamente possível que em relação a um ou outro caso pontual venhamos a reconhecer razão à oposição.
A terceira questão levantada é a da tributação indirecta face à opção tributação directa. Devo dizer que este frade-off entre tributação indirecta e tributação directa se deve colocar nestes termos: o aumento da tributação directa, em meu entender, não penaliza fundamentalmente a poupança em vez de penalizar o consumo. A propensão marginal a consumir é, no nosso país, bastante elevada, como é também bastante elevada a propensão média. Considero que a redução do rendimento disponível pela via do aumento da tributação directa vai, na realidade, penalizar mais o consumo do que a poupança e considero ...

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Isso seria assim em condições normais, numa economia a funcionar em termos normais e não num ambiente de crise excessiva criada, em nosso entender, pelo Governo nesta matéria.
E evidente que a tributação directa pode afectar mais o consumo quando a marginalidade da utilização dos rendimentos directos nessa matéria tem um equilíbrio. Agora, quando se gera um determinado estado psicológico é evidente que, contrariamente ao objectivo do Governo, o que vai provocar é um aumento do consumo, limitando essa matéria.
O problema é este, Sr. Deputado: enquanto V. Ex.ª se coloca aqui essencialmente na perspectiva de resolver um problema de desequilíbrio externo vai com essa política agravar desequilíbrios internos, sem estar, portanto, a criar condições para resolver a prazo a situação da economia portuguesa.

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O Orador: - O Sr. Deputado está, portanto, a colocar o acento tónico nas chamadas expectativas e a dizer que, se do ponto de vista da propensão marginal a consumir se justifica a minha posição, já se houver uma expectativa de instabilidade económico-social o comportamento do consumidor poderá ser diferente.
Aí também me permito divergir do Sr. Deputado porque a minha interpretação é a de que, com esta política, se poderá estar até a incutir mais confiança quanto a uma certa estabilidade a prazo da economia nacional do que aconteceria se se continuasse a prosseguir a política económica e financeira que tinha vindo a ser prosseguida até à tomada de posse deste Governo. Mas isto é uma questão de interpretação.
Para além do mais, penso até que o problema não está tanto na formação de poupança. Como o Sr. Deputado sabe, sobretudo em termos de poupança canalizada para as instituições de crédito, até existe, porventura, poupança a mais - o que não existe é a capacidade de orientar reprodutivamente essa mesma poupança. Mas isto tem a ver com outra questão que é a da dinamização do mercado de capitais.
Quanto à pergunta do Sr. Deputado do MDP/CDE, devo dizer que, em meu entender, não é inevitável um Plano e um OGE semelhantes a estes, muito pelo contrário, será graças a este OGE e a este Plano que nós iremos, muito provavelmente, inviabilizar ou evitar um OGE e um Plano para 1985 semelhante aos actuais.

Uma voz do (PCP): - Acredito, acredito!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ontem tinha ficado assente uma reunião dos líderes dos Grupos Parlamentares para esta hora, pelo que convoco os Srs. Deputados líderes dos grupos parlamentares para essa reunião, a efectuar com o Sr. Vice-Presidente Fernando Amaral.
Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse (Ferreira (UEDS): Na realidade, é um protesto para saudar o optimismo do Sr. Deputado António Rebelo de Sousa quanto à evolução do produto interno bruto, bastante mais optimista que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, e para agradecer a sua explicação para as razões do insucesso anterior do controle selectivo da procura, embora se possa questionar sobre se é ou não uma explicação absolutamente cabal.
A questão central a abranger neste protesto é o desemprego. A redução do desemprego não se põe só em termos da utilização e do enquadramento social dos desempregados: põe-se em termos da sua contribuição para o produto.
E diferente o estar a dar formação profissional, o estar a fazer investimentos humanos naqueles que não têm actividade mas que não estão a produzir nada, em vez de estar a empregá-los em obras ou serviços que têm um valor determinado. Em termos de se aumentar ou não o produto, o impacto económico é totalmente diferente.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PSD): - Dá-me licença, Sr. Deputado.

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PSD): - Eu não disse isso. O que disse é que é pelo menos preferível essa situação à situação de subemprego em que também não há contribuição para o produto e em que, por vezes, até há simultaneamente atrasos no pagamento dos salários.

O Orador: - Não vou discutir agora se é ou não preferível. Penso que a situação de atraso sistemático no pagamento dos salários é uma situação ilegal e ilegítima que deveria ser combatida por todas as formas, e que não está a ser, mas não vou, nesta troca de ideias, abordar ou enquadrar este aspecto.
O que digo é que se a solução que preconizou poderá resolver alguns problemas de enquadramento social, não resolve um outro problema (que, aliás, foi utilizado largamente em vários países, por exemplo, a Suécia, o que lhe permitiu durante quase toda a década de 70, manter níveis de desemprego baixíssimos): a utilização prevista - e porque são investimentos de certa monta têm de ser lançados com tempo - durante largo período de uma parte da mão-de-obra que, pela lógica da economia liberal, ficaria desempregada, utilização essa que se traduziria em actividades produtivas concretas ou na prestação de bens ou serviços, portanto numa criação de valor determinado.
A sua solução pode resolver uma parte do problema, tem alguma validade, designadamente para um país com níveis de formação profissional tão baixos como o nosso, mas não será suficiente, desde logo se se entrar numa perspectiva de aumento de desemprego, como se está a entrar.

O Sr. Presidente: - Se deseja contraprotestar, tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado António Rebelo de Sousa.

O Sr. António Rebelo de Sousa (PS): - Sr. Presidente, é efectivamente para um ligeiro contraprotesto, embora o protesto do Sr. Deputado tenha sido feito em termos perfeitamente correctos, pelo que não merecia uma contraprotesto.
Todavia, utilizo esta figura regimental para dizer mais uma vez que aquilo que afirmei e continuo a afirmar: é que considero ser preferível uma situação de orientação do desemprego friccional ou de algum dcscrnprego estrutural para sectores que sejam devidamente enquadrados por um bom subsídio e uma boa formação profissional, do que uma situação de subemprego na qual tambEm não há contributo directo e imediato para o produto interno bruto ...

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Dá-me licença. Sr. Deputado.

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Hasse (Ferreira (UEDS): - Até aí estou de acordo consigo, mas o problema - e este é o cerne da questão - é o de saber se depois o Estado tem ou não um papel no lançamento disso. Se não tem, se corta o crédito e não deixa a economia expandir-se, então são só intenções.

O Orador: - Claro, mas a diferença entre aquilo que defendo e aquilo que o Sr. Deputado acabou de defender é que eu penso que o Estado deve depois

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jam, de facto, reprodutivos e rentáveis e não para subsídios que visem manter as empresas que já provaram que não são minimamente rentáveis. Essa é a diferença. E isto deve fazer-se a posteriori através da canalização dessas sazicdades de gestão de recursos humanos para novos sectores de actividade produtiva.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Tomás Espírito Santo.

O Sr. Tomás Espírito Santo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mais uma vez venho abordar o problema da água em Portugal. De uma maneira geral este problema tem a honra de primeira página nos meios de comunicação social apenas em situações de crise como a da escassez de água que tivemos nos últimos anos ou quando há cheias, como aconteceu no último fim-de-semana. Fica para os jornais da província, ou para uma ou outra notícia local dos grandes jornais, o drama permanente daquelas gentes que ainda não têm água ao domicílio e o daquelas com uma rede deficiente de abastecimento público de água.
Vem as secas ou vêm as cheias. Aí estão as grandes notícias; as grandes reportagens; o alvoroço dos governantes; as medidas de emergência; as promessas para o futuro.
O fenómeno passa e, à parte esforços individuais ou circunstâncias do governo ou das autarquias, o progresso na melhoria da situação é muitíssimo lento, se não nulo.
Em Setembro fiz aqui uma intervenção para alertar esta Assembleia e os governantes para a anarquia que se verifica no domínio da água e para a necessidade de se tomarem medidas urgentes no sentido da adopção de um sistema de gestão nacional de recursos hídricos, visando não só optimizar as suas utilizações para delas se colherem os maiores benefícios para a colectividade como também minorar os efeitos das secas ou das cheias.
Infelizmente a tragédia que caiu sobre a grande Lisboa veio reforçar as preocupações e os pontos de vista que aqui vim expender.
Como então disse:

Não são novas e desconhecidas as preocupações pela resolução do problema da água, como não são novas e desconhecidas as situações angustiantes que dele resultam e que frequentemente se repetem como se repetem as esperanças e expectativas na sua resolução.

Desta vez, essas esperanças e expectativas parecem ser multiplicadas porque vimos o Sr. Presidente da República, o Sr. Presidente desta Assembleia, o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro da Administração Interna, a acompanhar a evolução e as consequências do temporal; assistimos, nesta Assembleia, a louváveis manifestações de solidariedade para com todos os que foram afectados por aquela tragédia; e os meios de comunicação social, para além das grandes reportagens, deram grande ênfase à sugestão do Sr. Presidente da República para a criação de uma comissão de inquérito avançando até o nome do arquitecto Ribeiro Telles para dela fazer parte.
É justo aqui referir o excelente trabalho dos serviços de protecção civil a quem presto a minha homenagem.

Tudo muito bem; mas a verdade é que o País já está habituado ao alvoroço dos governantes, às manifestações de solidariedade e às promessas sem resultados palpáveis pelo menos no que se refere às causas do problema e ao seu equacionamento.

Não sei se a comissão de inquérito vai encontrar algo de novo para além da não existência de uma política de organização e aproveitamento racionais do espaço; para além da descoordenação dos serviços com responsabilidades no domínio da água (e são cerca de meia centena); para além do espírito de quinta existente na Administração Pública, e não só; para além da não existência de um sistema de gestão dos recursos hídricos, para não falar na ausência de uma vontade política para resolver este problema.

Em tempo normal todos os serviços se mostram muito ciosos das suas competências sem que delas abdiquem o que quer que seja; em tempo de crise parece comportarem-se como pilatos.
A minha primeira pergunta a que a tal comissão de inquérito poderá procurar dar resposta é: que medidas foram tomadas quando um técnico do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica anunciou na TV, com antecedência, a possibilidade de temporal com forte precipitação?
Seguidamente, pergunto: porque é que esse mesmo Instituto não emitiu através da TV informações frequentes sobre a evolução do temporal? Em alguns países sempre que se verifica um fenómeno como o que nos flagelou, há emissões, pelo menos horárias, para informar o público e serviços da sua evolução.
E certo que a maneira infeliz e bizarra como o boletim meteorológico está a ser apresentado na TV, recorrendo a bonecos, não dá muita confiança ao público.

Risos do Sr. Deputado Costa Andrade (PSD).

E mais bizarro é ainda o facto de, quando já se previa a melhoria das condições meteorológicas, um locutor do telejornal dizer, segundo uma fonte do Instituto de Meteorologia, «o tempo vai melhorar».
Então não devia ser o próprio Instituto a, oficial e formalmente, dar esta informação?
Mas o que fundamentalmente está em causa é a falta de mecanismos de coordenação dos serviços com responsabilidades no domínio da água e, o que é mais grave, a resistência ao estabelecimento de tais mecanismos.
E o pior é que a situação tende a eternizar-se.
Há projectos de estudos que estão em curso, como se disse já no Congresso da Ordem dos Engenheiros que se está a realizar no Porto sobre a Engenharia e o Ambiente, e alguns até são objecto de acordos com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Organização Mundial de Saúde e Unesco, sem que ministérios e serviços eventualmente interessados tenham deles conhecimento ou neles participem.

O requerimento que fiz ao Governo sobre este assunto ainda não teve qualquer resposta.

Urge encarar de frente o problema da água que não pode ficar à mercê de caprichos dos serviços e do tal espírito de quinta. O problema é muito sério pois tem implicações sociais, económicas e políticas.
O CDS está empenhado na sua solução e para isso não só por meu intermédio alertou esta Assembleia para o assunto, como também apresentou um projecto de lei a que a Comissão de Equipamento Social deve-

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ria dar prioridade. Em tempos os jornais anunciaram que o Conselho de Ministros se tinha debruçado sobre este assunto. Até hoje, porém, nenhumas acções são conhecidas. Esperamos que o nosso projecto seja encarado com uma atitude diferente da que acabou por caracterizar o procedimento sobre o Projecto de Lei de Bases da Segurança Social.
Ao examinar as propostas de lei do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano para 1984, não se apercebe até que ponto o problema da água vai ser considerado com a prioridade que o assunto merece. É certo que quanto às Grandes Opções se diz na p. 51:

Na medida em que as limitações orçamentais o permitirem, desenvolver-se-ão neste sector (Obras Públicas) um conjunto de acções e programas tendentes a apoiar e dinamizar a construção de infra-estruturas básicas. em particular as vias de comunicação e obras hidráulicas.

Será que se continua a insistir no conceito de que as obras hidráulicas é que são o mais importante para a resolução do problema da água? O grande erro que se tem cometido está na confusão que se faz entre recursos hídricos e recursos hidráulicos. Os recursos

hidráulicos são uma parte a considerar numa gestão global e integrada dos recursos hídricos, mas não mais importante, embora dispendiosas.

Na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1984, atribui-se, para as despesas das Direcções-Gerais do Saneamento Básico, dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos e do Instituto Nacional de Meteorología e Geofísica, respectivamente, a verba de 122,3 820,2 e 511,9 milhões de escudos.

Estas direcções-gerais devem ter uma acção importante no sistema que venha a ser adoptada para a gestão dos recursos hídricos.

Quanto à Direcção-Geral do Saneamento Básico que está sem director-geral há já alguns anos, o quase moribunda, será que a verba atribuída é para manter a chama dos que nela trabalham, ou corresponde a uma intenção de a reconverter de maneira a adaptar às circunstâncias actuais, designadamente no que se refere ao apoio às autarquias?
No que se refere à Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, conviria esclarecer esta Câmara quanto aos princípios em que se baseia a sua acção no futuro, designadamente no que se refere às grandes e pequenas barragens.
Relativamente ao Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, parece que a verba atribuída (511,9 milhões de escudos) não está na proporção do rendimento de trabalho que, sem dúvida, poderia contribuir grandemente para o desenvolvimento sócio-económico do país. Diz-se que uma grande percentagem (fala-se em 80 %) da verba que lhe está atribuída se destina ao pagamento de salários. Será assim?
Por último quero referir-me às dotações atribuídas ao Ministério da Qualidade de Vida, as quais, segundo o parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente, são, em matéria de investimento, exíguas.
Sendo um Ministério relativamente novo, fundamentalmente vocacionado para a coordenação e articulação inter-departamentais, e que em matéria de recursos hídricos devia ter uma importante missão a desempenhar, não sei até que ponto poderá ir com essas exíguas dotações na implementação de uma política de ambiente, ainda não inteiramente definida, mas que convém concretizar, para defesa do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida dos portugueses.

Aplausos do CDS.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. (Leonel (Fadigas (PS): - Sr. Deputado Tomás
Espírito Santo, ouvi atentamente a sua intervenção,
que, no fim de contas, vem ao encontro de muitas
preocupações do Governo, que estão expressas nos
próprios documentos que foram apresentados à Assembleia, e que, aliás, foram expressas, também, pelos Srs. Membros do Governo, quando vieram à Comissão
de Equipamento Social e Ambiente prestar esclarecimentos e dar informações de grande utilidade para a preparação do próprio documento.
Suponho que o Sr. Deputado não esteve presente nessa reunião, mas queria pôr-lhe, concretamente, a seguinte questão: não pensa V. Ex.ª que mais importante
do que estarmos a entrar numa discussão acerca da má colocação de alguns serviços quanto à gestão da a água - e eles são muitos -, será antes implementar
o que está já em curso nas acções do Governo, articulando a gestão da água com o ordenamento do território e com a optimização de recursos existentes em
vários ministérios?
Essa é uma linha de acção que irá ser seguida.
Portanto, não pensa o Sr. Deputado que esse será
o melhor caminho para, com os mínimos custos, tirar-mos o máximo rendimento?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Tomás Espírito Santo.

O Sr. Tomás Espírito Santo (CDS): - Sr. Deputado
Leonel Fadigas, a resposta é muito breve.
É evidente que se o Governo está a tomar medidas
que vêm ao conhecimento público depois de uma inicia
tiva do CDS (que realmente também está preocupado
com este assunto), nós congratulamo-nos com o facto
e esperamos que na Comissão de Equipamento Social
e Ambiente o assunto seja devidamente discutido.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Dá-me licença que o
interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Deputado, mas o
relator da Comissão e um deputado do CDS!

O Orador: - Eu entrei para a Comissão há uma semana, ou há 15 dias, mas de qualquer maneira V. Ex.ª sabe que nós estamos interessadíssimos no
assunto. Apresentámos um projecto de lei, elaborámos
já outro em continuação do primeiro e esperamos che
gar a uma conclusão boa para o País. Isso é que interessa acima de tudo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Mário Adegas.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quando

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se tem obrigação de conhecer minimamente o estado actual da economia portuguesa e se observa o seu deficiente funcionamento, consubstanciado em diversos desequilíbrios das variáveis macroeconómicas principais, o que se exige por parte dos responsáveis políticos, máximo dos deputados desta Assembleia da República, é a análise serena das questões emergentes de tal situação, com grande rigor e seriedade políticas e também, sempre que possível, com adequada fundamentação técnica.
É o que vou tentar fazer, por disciplina pessoal e de acordo, também, com a orientação e tradição do Grupo Parlamentar do PSD a prosseguir e a aperfeiçoar, conforme exigências do nosso eleitorado e coerência programática.
Com efeito, torna-se necessário estudar com profundidade e com seriedade as questões existentes, com procura sistemática das melhores soluções para os problemas com que se defronta o nosso país.
Da apreciação das grandes opções do Plano para 1984, é possível concluir que os objectivos imediatos da política económica e financeira do Governo são a redução significativa do défice externo e a travagem do défice do sector público administrativo, fazendo com que um e outro se situem a níveis compatíveis com a dimensão da nossa economia.
Ora, se existe um significativo consenso para a prossecução de tais objectivos, as divergências surgem, porém, quando se trata da aplicação das medidas concretas que hão-de possibilitar o combate vitorioso aos respectivos desequilíbrios ou excessos, normalmente através da não aceitação, com óbvia incoerência, das consequências negativas e, portanto, desagradáveis, das medidas tomadas ou a prosseguir.
Trata-se, afinal e no concreto, de aoeitar que nas grandes opções do Plano as duas questões fulcrais se devem denominar, com mais propriedade, como exigências prioritárias, acompanhadas, a alguma distância, de verdadeiras opções, essas sim com possibilidades de hierarquização ou de escolha de alternativas.
Aceitemos, pois, que a inflexão está em curso e vai ser prosseguida na direcção da indispensável estabilização da economia com o regresso a uma situação de menor desequilíbrio de períodos anteriores, que, por mim, gostaria de caracterizar como de relativos e precários dado o elevado índice de artificialismo em que se baseavam.
Como quer que seja são muito meritórios os esforços do Governo e especialmente do Sr. Ministro das Finanças e do Plano quando mete ombros a tarefa de tal magnitude e exigência, só sendo de lamentar que as soluções tenham de assumir o carácter de drásticas e inevitáveis por, a nível político, se dispensar escassa atenção aos diagnósticos de economistas, agentes económicos e mesmo quadros políticos normalmente subalternizados sempre que no passado, durante a época revolucionária e pósrevolucionária, se referiram aos perigos e prejuízos futuros do evidente e quase certo desregulamento da economia como consequência dos ataques à já de si muito deficiente estrutura produtiva existente e ao desmantelamento dos esquemas de funcionamento.
É, pois, imperativo nacional apoiar o Governo nesta tarefa, ultrapassando divergências de qualquer natureza e reserva, então com justificada propriedade, para os projectos ou programas de reactivação da economia as aceitáveis divergências de modelo ou de programas de acção que assegurem a retoma do investimento, as componentes pública e privada deste, as formas e ritmos do combate ao desemprego, a política fiscal a prosseguir, etc., etc.
O Ministro das Finanças e do Plano vem garantindo com serenidade ao País - e a seriedade que a grave crise económica e social que atravessamos exige - que tenciona implementar a partir dos meados do próximo ano o Programa de Recuperação Financeira e Económica e o Programa de Modernização da Economia Portuguesa no âmbito do principal compromisso político assumido pelo Governo perante o País.
Deste modo, atrevo-me a considerar que será essa a altura oportuna para, em ambiente de verdadeira co-responsabilização nacional, se proceder ao alinhamento, hierarquização e aprofundamento das diversas opções, quer no plano global quer no dos planos sectoriais ou dos programas de acção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao que ficou dito e antes de me debruçar de forma directa sobre algumas questões financeiras directamente ligadas ao Orçamento do Estado para 1984, na sua apreciação na generalidade, quero aqui deixar duas observações adicionais que considero essenciais para o bom êxito da política conjuntural em curso, com insuficiente acompanhamento na área governativa, com inadequado apoio partidário e com reduzido enquadramento institucional.
São elas o nível insuficiente que normalmente se atinge na aplicação das políticas económicas, mesmo quando correctamente definidas; o deficiente apuramento dos resultados e a inadequada apreciação da intervenção dos agentes responsáveis pela implementação das medidas ao longo de todo o tempo da sua aplicação ou vigência, quer a nível de empresários e trabalhadores quer a nível político.
Não desenvolvo, neste momento e neste lugar, o muito que, julgo poderia testemunhar era apoio desta preocupação que pessoalmente assumo com a convicção, porém, de que muito boas «cabeças» a não subscreverem na prática, convencidos como estão de que o País pode ser gerido com diagnósticos sucessivos apoiados em adjectivações modernas mas sem conteúdo prático e com cenários rotativos que os agentes económicos não assumem e a que a própria comunicação social dá guarida e relevo indevido, também por falta de profissionalismo em muitas questões e ocasiões cruciais para a vida portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos conhecem a situação de bloqueio em que se encontra a economia portuguesa, o qual implica, como se sabe, que a apreciação e discussão do Orçamento do Estado se faça duma forma fortemente condicionada.
Com efeito, o controle do défice total e a sua fixação em 172,6 milhões de contos, ou seja, 6,1 % do produto interno bruto, inferior portanto ao fixado para o ano corrente, é um ponto chave que julgo desnecessário discutir.
Do mesmo modo, parece-me correcta e de acordo com as realidades a compressão das despesas correntes. Mas aqui e sem embargo da adequada escalpelização no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano, julgo ser indispensável manifestar alguma preocupação porquanto considero ser necessário ir mais longe e de forma mais realista ao fulcro do bloqueio financeiro em que nos encontramos.

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O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Explicando-me melhor: quando, como acontece no Orçamento do Estado, os encargos da dívida atingem um terço dos encargos totais, há que proceder a uma desinibida apreciação de todas as despesas na sua classificação orgânica para concluir sem complexos e também sem receios de qualquer natureza, analisando melhor o montante global das despesas militares ou paramilitares quando estas atinge o muito elevado valor de 68 milhões de contos, como se assinala no quadro vi, sob a rubrica «Defesa Nacional».

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não se trata, ao contrário do que numa apreciação aligeirada me pode vir a ser atribuído, de discordância da existência de forças armadas de prestígio, disciplinadas e com os meios adequados de funcionamento e assunção das suas responsabilidades específicas, mas, sim e somente, de provocar a interrogação sobre a racionalidade de todas as despesas inseridas no Orçamento do Estado nesta fase da nossa história e das opções a fazer mesmo na área exclusivamente financeira, que é a que nos é exigida neste momento.

Por outro lado, quero deixar assinalado, não obstante a minha total e inequívoca concordância com a política delineada pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano, que mantenho muitas dúvidas, como já disse, acerca do nível atingido pela execução das políticas económicas entre nós mesmo quando obtidos consensos significativos na sua definição geral.
Com efeito, e num desejo de melhor compreensão, principalmente por parte dos nossos eleitores, como é possível obter a indispensável adesão às políticas de rigor em curso, quando, por exemplo, ainda recentemente se admitiu, em locais de trabalho da maior responsabilidade na execução da política económica e financeira, que o imposto extraordinário não fosse descontado a uma camada restrita de trabalhadores no mês de Novembro ou de Dezembro, mas sim dividido
em duodécimos durante o ano de 1984, em clara infracção a princípios fundamentais dos indicadores macroeconómicos e promotor de desigualdades inqualificáveis e preocupantes no âmbito dos próprias contribuintes, ou seja, neste como em muitos outros casos, dos que menos apoios usufruem?

Vozes do PSD: - Muito beml

O Orador: - Ou quando se permite, naturalmente com bem elaboradas justificações técnicas que pessoalmente me não convencem, a concessão de incentivos financeiros - custos a suportar obviamente pelo Orçamento -, por exemplo, para aquisição de habitação por parte de funcionários públicos e de empresas públícas a exercerem funções transitórias no estrangeiro com ordenados ligados directa ou indirectamente ao próprio Orçamento, equiparando-os aos verdadeiros emigrantes quando são substancialmente diferentes os contratos de trabalho e a proveniência dos respectivos rendimentos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ou quando se permite o desenvolvimento de entorses na concessão de regalias excessivas e pouco ou mesmo mal fundamentadas em algumas empresas públicas de sectores eventual ou aparentemente apenas mais fortes em obediência a critérios de discutível concorrência ou de rácios de produtividade de trabalho ou rentabilidade geral não suficientemente demonstrados e convenientes?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É que, Sr. Ministro das Finanças e do Plano, as suas tarefas, não obstante o mais que evidente e excepcional esforço já desenvolvido por V. Ex.ª, estão, ainda e a meu ver, no princípio. Porque V. Ex.ª tem de ter, além da solidariedade do próprio Governo e das bancadas da maioria - normalmente abundante no campo das palavras oficiais ou oficiosas que se pronunciam -, uma solidariedade real de cada um e de todos, nas oficinas, nos escritórios e nas repartições públicas e, principalmente, nos gabinetes de chefia e de direcção na Administração Pública e nas empresas públicas, para que se torne válido e efectivo o esforço que se está a exigir, por inevitabilidades conhecidas e exigência nacional, a todos os portugueses.

Aplausos do PSD e do PS.

Por mim é o que farei e por isso faço este testemunho, que não quero transformar em apelo, mas que considero ser a forma mais correcta de apoio e solidariedade. E referirei, em complemento, que esse pensamento é a vontade do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Voltando à análise directa do Orçamento, no campo das receitas parece-me que não se poderia ir mais longe, face ao bloqueio da economia em termos quantitativos contemplados no crescimento das receitas fiscais. Mas considero ser necessário e urgente ir mais além, ao longo do próximo ano, no aperfeiçoamento qualitativo a prosseguir.
As expressões do combate à evasão e fraude fiscais estão gastas aqui no Parlamento e nas referências pouco técnicas e mal preparadas frequentemente referidas na comunicação social.
Os estudos da reforma fiscal são lentos mesmo que sejam ou tenham sido brilhantes no passado. Foi história contada nos centros do poder político a existência, em 1979, de um psicólogo contratado para se pronunciar, já nessa altura, sobre o ritmo insatisfatório dos trabalhos da criação dos impostos únicos, quer das pessoas colectivas quer das pessoas físicas!
Por isso aqui manifesto o meu apoio para que alterações significativas e melhorias inadiáveis sejam conseguidas nesta área fulcral das nossas finanças públicas onde abundam os estudos, as reflexões e os bons técnicos, mas em que se exige implementação e aplicação concreta, e em tempo útil, de decisões importantes.
Todos estes assuntos e outros que aflorei, designadamente a revisão dos incentivos financeiros e fiscais, estão contemplados na proposta de lei n º 47/111, pelo que, em termos meramente formais, poderiam deixar de ter sentido os comentários, em jeito construtivo,

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que avancei. Mas quero repisar que o faço na óptica da execução da política orçamental, sector em que, respeitando embora o esforço meritório de muitos, se impõe uma controlada ruptura com os processas existentes, fazendo com que verdadeiros critérios de racionalidade económica e responsabilização, não meramente formal, sejam a pedra angular de toda a transa formação.

Aplausos do PSD.

Os especialistas do bom enquadramento orçamental têm de se transformar em especialistas de rigor do custo financeiro e social em termos modernos ...

O Sr. Silva Marques (PSD): -Muito bem!

O Orador: - ... e o meu testemunho é que isso não existe, logo e para começar, nesta própria Assembleia da República, nos gabinetes dos próprios Ministérios, ou seja raros são os bons exemplos em termos reais.

Vozes do PSID: - Muito bem!

O Orador: - A equidade e a racionalização em matéria de receitas fiscais estão assinaladas na p. 12 da proposta de lei de cuja apreciação me estou a ocupar. Quanto me seria agradável poder dizer daqui, desta Tribuna, que o nível razoável a atingir será convincente durante o próximo ano. Seria, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, uma obra notável de V. Ex.ª se tal conseguir e, em minha opinião, seria mesmo inclusivamente mais marcante do que o acerto que me parece indiscutível, e por isso o apoio, da própria boa definição já feita da política económica e financeíra para o nosso país que vem sendo executada com competência.
Finalmente, e agora sim uma discordância, que, aliás, desenvolverei nas reuniões de trabalho da Comissão de Economia, Finanças e Plano. Esta refere-se ao imposto complementar das pessoas físicas cuja existência neste momento só pode aceitar-se, e mesmo assim com muitas dificuldades, por não ser fácil a dispensa da receita fiscal correspondente.
É que, Sr. Ministro das Finanças e do Plano, quem desejar o melhor exemplo de falta de equidade fiscal tem, no referido imposto, o exemplo mais acabado e perfeito na sua abundante imperfeição. Com um manto de complementaridade atinge substancialmente os rendimentos do trabalho que são, hoje e agora, no nosso país, os rendimentos indiscutivelmente mais insuficientes e menos «sobrantes», mesmo na óptica macroeconómica que tanto preocupa, e bem, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.
É difícil a solução para combater o grave entorse existente?
Naturalmente que sim; de contrário seria lamentável a sua manutenção com a configuração actual.
As razões técnicas e os estudos justificativos existem e se não nos acautelamos até outros estudos de justificação se farão!
Mas a conclusão inequívoca é esta: o imposto complementar não tributa os rendimentos reais e efectivos do povo português em jeito de complementaridade. Tributa sim, de forma predominante, os rendimentos do trabalho por conta de outrem que é coisa bem diferente, mesmo comentando o facto, como estou a fazer, em termos quase exclusivamente financeiros.

O Sr. Basilio Horta (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E por isso parece-me pouco provável prever que a tributação global possa vir a beneficiar de rectificações aumentativas e moralizadoras - e que, portanto, mereceriam o meu apoio -, a partir dos denominados sinais exteriores de riqueza.
E a minha discordância é muito simplesmente esta: como pode ser implementada uma medida de tal natureza, de difícil execução, desejando-se um aumento provável ou mesmo quase certo da matéria colectável, e isentar montantes certos, muitas vezes de rendimentos sobrantes, que legalmente estão e continuarão a estar, nos termos da proposta, isentos de tributação?

O Sr. Silva Msequda (PSD): - Muito beml

O Orador: - Adepto das intervenções curtas e, sem falsa modéstia, capazes de acrescentar algo sobre outras muitas reflexões aqui feitas, evitando, porém, repetições dispensáveis, quis, em meu nome de deputado e de cidadão responsável em área específica pelo funcionamento eficaz de economia portuguesa, dar o meu contributo para o aperfeiçoamento que se impõe no campo das finanças públicas e designadamente na apreciação do Orçamento do Estado.
Considero ser esta a forma mais construtiva de apoiar o Governo e de uma forma especial o Ministro das Finanças e do Plano, de quem o País muito pode e deve esperar no rumo, que deve ser prosseguido por todos, de clarificação do funcionamento da economia, na qual o grau de intervenção individual, quando competentemente exercida, se pode tornar o complemento indispensável ao êxito das políticas, quer global quer sectoriais.
O PSD, posso afirmá-lo com conhecimento adequado das suas principais opções, acompanhará firmemente o Governo na implementação de todas as medidas necessárias ao actual combate às dificuldades existentes, consubstanciado neste Orçamento de travagem, e ao relançamento económico que, com certeza, se seguirá, desde que nos mantenhamos coesos, atentos e eficientes quer na política quer nos muito variados postos de intervenção na actividade económica, lugares onde, aliás, muitas vezes se decide do êxito ou inêxito das políticas ainda que quando bem delineadas.
Aprovaremos, portanto, e desde já, na generalidade o Orçamento do Estado, testemunhando o correspondente apoio ao Governo: E na passada devemo-nos nós, Deputados do PSD, comprometer também, porque o Orçamento é de todos e para todos os portugueses, a contribuir 'para a sua eficaz execução nos campos do rigor, da racionalidade e da co-responsabilidade.

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faltam 3 minutos para as 13 horas e há quatro Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos.
Penso que se deveria fazer agora o intervalo para almoço, ficando a formulação dos pedidos de escla-

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recimento para a parte da tarde. Há alguma objecção a que assim se proceda?

Pausa.

Não havendo está suspensa a sessão até às 15 horas.

Eram 13 horas.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Luís Nunes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, V. Ex.ª deseja fazer uma interpelação à Mesa?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acabo de receber há momentos, na sequência de um pedido de entrevista que já me tinha sido formulado há mais de uma semana, a comissão organizadora do encontro de trabalhadoras rurais que vai ter lugar no próximo fim-de-semana em Évora. Foi-me relatado este caso insólito que tive ocasião de confirmar: estas trabalhadoras, ao dirigirem-se à entrada desta Assembleia, anunciando que vinham contactar os grupos e agrupamentos parlamentares, viram apreendida, pelos serviços de segurança da Assembleia, a documentação que traziam destinada a ser entregue a esses grupos e agrupamentos parlamentares.
Penso que se trata de um facto perfeitamente intolerável. Suponho que será, sem dúvida, um abuso no exercício e no cumprimento, por parte dos serviços de segurança, de ordens que tenham, eventualmente, recebido da Presidência desta Assembleia. Não posso admitir que as ordens venham no sentido de apreender esta documentação, e peço a atenção da Mesa para a situação que acabo de relatar; solicitando à presidência que tome as medidas necessárias para que factos do mesmo teor não se venham a repetir.

Vozes da UEDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, desconheço os factos que V. Ex.ª acaba de denunciar. A posição da Mesa e a minha posição pessoal é, como sempre, de confiança total nos serviços da Assembleia, até que, ouvidos estes, se verifiquem actos que possam merecer crítica ou censura. Vou tratar de verificar os actos que V. Ex.ª denunciou e darei conhecimento público dos factos que se passaram e das medidas que vão ser tomadas para os evitar, no caso de eles, como certamente penso, corresponderem à realidade.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença. Risos.
Sr. Presidente?

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Evidentemente que eu não exijo da Mesa, que tenha, pelo menos, a mesma confiança nos deputados que tem nos serviços de segurança da Assembleia. O que eu, no fundo, pretendia exactamente da Mesa era que ela se informasse e consequentemente tomasse as medidas que julgasse apropriadas, e cuja natureza eu me reservarei o direito de julgar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, não é a Mesa que tem de ter confiança nos deputados, são os deputados que têm de ter confiança na Mesa.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Deputado Custódio Gingão pede a palavra para que efeito?

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Para no mesmo sentido fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este caso que o Sr. Deputado Lopes Cardoso acaba de referir passou-se com trabalhadoras agrícolas do meu distrito. Fui eu quem, após ter sido informado da atitude tomada pela segurança da Assembleia, me dirigi à segurança para perguntar o que é que se estava a passar. E a agente da polícia em serviço mostrou-me os documentos que havia apreendido às operárias agrícolas, documentos dos quais tenho aqui exemplares e que eram para ser entregues aos grupos e agrupamentos parlamentares aos quais tinham pedido uma audiência, que foi concedida.
É um direito dos cidadãos o de contactarem os seus representantes, ou seja, os deputados e de lhes fornecerem os documentos que entendam necessários para o conhecimento cabal das suas responsabilidades como deputados da Assembleia da República.
Não é a primeira vez que isto acontece - já tem acontecido com jornalistas e com outros cidadãos. Nesta medida, entendemos que é inadmissível que isto volte a acontecer e pedimos à Mesa que tome providências para que factos desta natureza não se repitam para bem dos cidadãos e desta Assembleia, enfim, da vida parlamentar.

Nozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Custódio Gingão, a resposta que lhe dou ê a mesma que dei ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, uma vez que V. Exª interveio de forma idêntica.

Vamos investigar o assunto e daremos conhecimento brevemente, de uma forma informal, à Assembleia do que se passou.

Mas, já que V. Ex.ª exibiu um documento, pedia-lhe o favor de o fazer chegar à Mesa. Sei que os métodos audiovisuais estão muito em voga, mas a distância impediu-me de ver do que se tratava.

Para pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Mário Adegas estão inscritos os Srs. Deputados Hasse

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ferreira, Lopes Cardoso, Octávio Teixeira e Carlos Carvalhas.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Hasse ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discordando, como é óbvio, de diversos aspectos que o Sr. Deputado Mário Adegas referiu, penso que a sua intervenção aborda algumas questões relevantes, designadamente no que respeita à não mobilização dos portugueses para uma política de austeridade, ponto de vista que partilho independentemente da nossa discordância, já expressa, contra as formas como está a ser aplicada essa austeridade.
Para além de outros casos que d. Ex.ª referiu e partindo do princípio de que de facto a austeridade, a aplicar-se, tem de ser bem distribuída - o que parece que não está a acontecer, independentemente, portanto, das decisões que aqui foram tomadas e contribuíram, de certa forma, para o agravamento das injustiças fiscais, como foi o caso das leis que esta Assembleia aprovou, designadamente da lei contra e qual nós votámos o imposto dos chamados 2,8 % -, gostaria que esclarecesse - porque não percebi se foi referido - qual é o caso que referiu do imposto cujo pagamento em duodécimos estava previsto para além das datas que aqui fixámos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Mário Adegas entendeu referir-se na sua intervenção á imposição dos sinais exteriores de riqueza tal como ela vem prevista no Orçamento e fê-lo manifestando a sua discordância ou pelo menos, se bem entendi, as suas reservas pela dificuldade de implementação que eventualmente o mecanismo proposto teria.
A questão que eu lhe ponho é a seguinte: não pensa, Sr. Deputado, que as críticas que o dispositivo proposto merece vão muito mais longe do que as simples dificuldades de implementação? Não acha, Sr. Deputado, que, tal como está previsto, este imposto, para além de não ter nenhum significado prático, é iníquo e profundamente ilógico?
Este imposto não tem nenhum significado prático porque, concretamente no que diz respeito às habitações como sinal exterior de riqueza. Sabendo nós os valores que figuram - os rendimentos colectáveis -, nas matrizes os limites fixados retiram qualquer significado prático a esta medida.
Mas para além disso, não será iníquo e ilógico o dispositivo proposto? Ilógico e, simultaneamente, iníquo quando, por exemplo, considera como sinal de riqueza uma habitação com piscina com um rendimento colectável superior a 250 contos, mas não considera essa mesma habitação com um rendimento colectável, em teoria, de 500 contos se, porventura, não tiver uma piscina.
Não se entende a lógica desta medida, não se percebe se se trata de um problema de hidrofobia ou se, mais do que um instrumento fiscal, se integrará mais na campanha «Poupe água» do que num dispositivo de ordem fiscal!...

E não é iníquo que se confunda o valor da habitação com o rendimento necessário para a sua manutenção?
Admitamos, Sr. Deputado, que há anos atrás um cidadão qualquer comprou uma habitação, ou a obteve por herança ou por não importa o quê, com um rendimento colectável como este. O problema que se põe neste momento é o de saber se os rendimentos de que ele dispõe lhe permitem ou não manter essa habitação. Não tem nada a ver com a aquisição da habitação ou com o seu valor, Sr. Deputado.
Mas a falta de lógica vai mais longe, Sr. Deputado! É que se considera como sinal de riqueza a detenção de uma viatura que tenha um valor global superior a 1800 contos, adquirida há menos de 5 anos e admite-se que, se ela já tiver 5 anos, o seu valor, e portanto o valor desse sinal de riqueza, é de um quinto, isto é, de cerca de 360 contos, e não é esse valor mas sim 80 % dele. Quer dizer que um proprietário de um automóvel que é avaliado, como sinal exterior de riqueza, no montante de 80 % de 360 contos, ou seja. 200 e tal contos, é considerado detentor de um sinal exterior de riqueza enquanto outro, que tenha adquirido no próprio ano um veículo que lhe tenha custado 1700 contos, não é detentor de nenhum sinal exterior de riqueza.
Não se percebe também a lógica dos 70 % ou 80 dos valores decrescentes ao longo do tempo. Quais são os critérios e qual é a lógica?
A imposição da propriedade de determinados bens deve ser feita por via ou do imposto predial ou do imposto de aquisição de viaturas e, até, por rectificação dos valores matriciais e nunca através deste processo artificioso e ineficaz.
Penso que se confundem duas coisas: a utilização do sinal exterior de riqueza como instrumento de controle fiscal por parte de quem deve cobrar os impostos e, inclusivamente, mecanismos de revisão obrigatória das declarações de rendimentos em função desses sinais exteriores de riqueza. Penso que é, efectivamente, necessário que se possa provar, com clareza, como é que, com um rendimento - passo a caricatura - de 100 contos por ano, se adquire um veículo de 1800 contos nesse ano. Isto é uma coisa completa mente diferente de colocar uma taxa sobre o veiculo de valor superior a 1800 contos. Esse imposto é o imposto de circulação. Aumente-se esse imposto ou diminua-se; actue-se é de forma a que não se venha criar, através de um imposto que é ineficaz, iníquo, ilógico e que não tem consistência, uma vaga cortina de fumo, dizendo que se está a tributar a riqueza para fazer passar por, detrás dessa cortina de fumo a tributação real soba os rendimentos daqueles que trabalham.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Deputado Mário Adegas teceu algumas críticas ou, se quiser, fez algumas análises críticas, que considerou pontuais, a alguns aspectos do Orçamento. Permita-me que lhe diga que os aspectos que referiu são pontuais enquanto exemplos, mas vão ao encontro daquilo que é para nós uma questão de fundo e sobre a qual temos vindo a incidir as nossas intervenções desde o início deste debate, que é, ao fim e ao cabo, o problema da equidade e da justiça fiscais.

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O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quem é que vai pagar a austeridade e os rigores deste Orçamento, não em termos de elaboração rigorosa mas em termos de rigores de contracção de despesas e de aumento de receitas? Quem é que vai pagar o aumento da carga fiscal que existe neste Orçamento?
Por isso, embora sejam exemplos e casos pontuais, referem-se à questão de fundo: afinal, que justiça é esta?
O Sr. Deputado referiu o problema dos incentivos e considerou que, do mal o menos, já está prevista no Orçamento a revisão dos incentivos. No entanto eu gostaria de lhe chamar a atenção para o seguinte que a revisão dos incentivos e benefícios fiscais tem sido prevista, de há anos a esta parte, em todos os Orçamentos mas a sua revisão prática até hoje é nula. Quanto muito, a revisão tem sido feita no sentido do agravamento das receitas do Estado.
Gostaria ainda de lhe colocar algumas questões concretas, para além do problema global da reformulação do sistema fiscal, e nomeadamente a criação de novos impostos como, por exemplo, o imposto sobre a fortuna e o imposto sobre o património. Aliás, esta questão até é interessante na medida em que, se eu aplicar dinheiro numa habitação tenho de pagar imposto sobre o património na forma de contribuição predial, mas se o aplicar em ouro estou livre de pagas qualquer itriposto. Este é o tal problema do incentivo que nós aqui várias vezes temos focado, o do incentivo à aplicação meramente financeira, incentivo à aplicação meramente especulativa.
As questões concretas que gostaria de lhe coloca eram estas: em termos desse princípio de fundo, dessa equidade, dessa justiça fiscal, o que é que o Sr. Deputado entende com aquilo que sucede em- termos de previsão de receitas para imposto profissional? E não vou explicitar aquilo que já referi várias vezes em termos de evolução de massa salarial e de evolução do imposto profissional. Como é que o Sr. Deputado considera o facto de que, pelo segundo ano consecutivo e para efeitos de dedução do imposto complementar, não tenha sido alterada a verba do rendimento do trabalho? Como é que o Sr. Deputado encara tudo isto com o decrescimento da sobretaxa de importações de 30 % para 10 % neste preciso ano e como é que encara o facto de os incentivos fiscais em 1982, numa primeira aproximação do Ministério, ultrapassarem os 25 milhões de contos?

O Sr. Presidente: -Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quero dizer que na galeria que se encontra à minha direita estão presentes, a fim de assistirem à reunião plenária, alunos da Escola Secundária de D. Filipa de Lencastre. Saudando-os e saudando a sua presença nesta Casa, como é de timbre e tradição, gostaria de sublinhar que em breve estes nossos concidadãos, e cidadãos de pleno direito, terão oportunidade de, também aqui, tomar lugar como deputados, se algum dia desejarem seguir; neste plano, a carreira e a intenção do serviço público, que é o que nos anima e pelo qual esta Assembleia existe.
Muito obrigado pela vossa presença.

Aplausos.

Tem então a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Na sua intervenção, o Sr. Deputado Mário Adegas falou em rigor e em qualidade técnica de algumas intervenções. É sobre este último aspecto sobre a qualidade técnica dos documentos aqui apresentados ou seja, as grandes opções do Plano para 1984 e o Orçamento do Estado, que gostaria de ouvir a sua opinião.
Por outro lado, sobre a questão da justiça social já foi posta aqui a questão de as receitas previstas no Orçamento com maior carga serem as do imposto profissional. A pergunta que gostaria de lhe colocar é esta: como é que o Sr. Deputado julga umas grandes opções do plano cujos projectos que se encontram enumerados e cuja modernização e alteração de estrutura não têm tradução financeira mínima no Orçamento do Estado?
A segunda questão, que não é de somenos importância, é a seguinte: como é que o Sr. Deputado considera o rigor e a qualidade técnica destes documentos? Estando nós em vésperas da aprovação de umas grandes opções do Plano que causam preocupações até a membros da sua bancada e da maioria, pela diminuição do produto interno bruto e que, com a alteração da revisão orçamental aqui feita e com a aprovação do Orçamento suplementar, segundo os nossos cálculos, aumenta a diminuição do produto interno bruto - o produto interno bruto passa de - 1,4 % para - 3 %, o que é mais do dobro -, não seria altura de o Ministro das Finanças dizer se estes cálculos estão ou não certos e se não estão corrigi-los? É que é totalmente diferente que o produto interno bruto para 1984 decresça para - 1,4 % ou para - 3 %. Pergunto-lhe, pois, qual é o rigor e a qualidade técnica destes documentos do seu Governo.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Mário Adegas, comunico à Câmara que chegou à Mesa um requerimento do Partido Comunista Português em que se requer uma conferência de representantes dos grupos parlamentares com o objectivo de discutir o agendamento da discussão do projecto de resolução n.º 16/111, relativo à criação de uma comissão eventual de solidariedade e apoio às vítimas das cheias dos temporais, matéria cuja urgência consideramos manifesta.
Nesta medida, aquilo que o Partido Comunista Português pretende é uma reunião urgente dos líderes parlamentares.
A Mesa determinou que fosse enviada a todos os grupos parlamentares uma fotocópia deste requerimento, esperando que, no mais breve espaço de tempo possível, comuniquem à Mesa se estão ou não em condições de reunir para tratarem desta matéria, durante o intervalo. No caso afirmativo, convoco essa reunião.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas para responder às interpelações que lhe foram feitas.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Srs. Deputados: Agradeço antecipadamente o facto de terem formulado as perguntas, que me permitem, em alguns casos, esclarecer o que eu quis dizer na minha intervenção.
Em primeiro lugar, vou responder às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira. Efectiva-

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mente, na minha intervenção, eu quis significar - e mantenho - que, ainda que exista alguma mobilização no País para as medidas de restrição que vamos viver, nunca é de mais insistir para que elas sejam fomentadas, desenvolvidas e, especialmente, acompanhadas nos locais mais adequados. E os locais mais adequados são, em meu entender, a Administração Pública, as suas chefias - de modo que, por exemplo, nas despesas públicas tenham a racionalidade efectiva da mesma despesa, o seu sentido financeiro e social -, as empresas públicas e, enfim, os agentes económicos respectivos. Estou convencido de que não obstante em termos políticos o Governo, normalmente, ter essa preocupação, se trata, de uma matéria em que nós, portugueses, estamos muito longe de ter atingido um plano razoável.
Portanto, não fiz nenhuma crítica ao Governo no sentido de dizer que ele não tem essa preocupação; apelei - e o sentido da minha intervenção tinha essa marca - foi para a melhoria dessa mobilização.
E o que eu sinto, quer numa empresa pública que dirijo quer nos corredores da Assembleia, é que nós, mesmo sendo participantes activos na vida política do País, muitas vezes não temos a coerência fora aqui do Plenário para a mobilização geral de que o País precisa. Acho que é bom que nos empenhemos, de facto, nessa mobilização.
Quanto ao facto de eu ter referido que tinha preocupações - e tenho - de que na aplicação das medidas não haja rigor na distribuição dos custos, dir-lhe-ei que esse é também um problema de eficiência do País. Penso que todos nós estamos convencidos de que é assim mas, muitas vezes, ou porque estamos no poder ou na oposição, não assumimos como deve ser essas desigualdades e essas deficiências de funcionamento. Ou quando estamos no poder temos complexos ou responsabilidades e arranjamos as justificações para dizer que não é preciso fazer melhor, ou quando estamos na oposição dizemos que nada se faz e que ninguém tem preocupações, o que também não é verdade. O que eu penso é que é oportuno que na vida prática de cada um de nós - como empresários, como trabalhadores, como políticos sejamos mais coerentes. A minha opinião é a de que a nossa coerência não é muito elevada.
Quanto à questão do pagamento do imposto extraordinário em duodécimos, não vou referir em que reunião é que isto se passou, mas foi numa reunião em que estavam muitos dos responsáveis pela vida económica e financeira do País. O Sr. Ministro das Finanças já tem conhecimento do facto e foram já tomadas providências para que esta falha não se se verifique. Mas eu, ao exemplificá-la, não quis escamotear uma realidade, ou seja, a de que pelo menos existiu um perigo, existiu pelo menos um entorse de mentalidade grave: o de que não se via que realmente estávamos perante um facto que na prática contrariava em tudo, na coerência, aquilo que era de esperar.
Se tem de haver um imposto extraordinário que pesa sobre os trabalhadores, é preciso que aqueles que têm menos protecção não sejam os que vão suportar em Novembro e em Dezembro esse encargo e esse sacrifício, e que outros, por terem mais poderes de reivindicação ou por estarem num enquadramento mais adequado e mais próximo do poder, o não suportem. Não valerá a pena estarmos aqui a desen-
volver este problema, pois, na reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano torná-lo-emos a abordar e então, numa comissão mais restrita, poderei exemplificar ainda com mais pormenor o que se passou.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, ao contrário do que eu imaginava, creio que não fui entendido na minha exposição. Estou efectivamente de acordo em que venha a estabelecer-se uma tributação que contemple ou que tenha em atenção os sinais exteriores de riqueza. Aliás, num aparte do meu discurso referi que concordo com isso por ser uma atitude moralizadom.

No entanto, tal como o Sr. Deputado referiu - e penso que o meu texto assegurará isso -, creio que esta atitude é de muito difícil implementação. Tanto assim é que vou maçar a Câmara com um exemplo que, estou convencido, tecnicamente tem justificação: poderia acontecer que, a ser aprovada essa proposta - se vier a ser aprovada e não pejo nenhum inconveniente nisso, embora pense que na aplicação prática não vai ter efeito -, um cidadão deste pais que tivesse à porta meia dúzia de - carros Mercedes, um avião de turismo ou mesmo um barco, o que constitui um ostensivo sinal exterior de riqueza, e que morasse em frente a uma repartição de finanças de Portugal, quando este cidadão, por sua iniciativa ou por iniciativa da repartição de finanças, viesse a confrontar-se com a tributação deste sinal exterior de riqueza, poderia acontecer que ele dissesse ao balcão da repartição de finanças o seguinte: «Não, eu tenho apenas um rendimento de 500 contos por dia. Portanto, posso ter esses carros.» Ora, se a repartição de finanças confirmar que estes 500 contos por dia estavam isentos do pagamento de qualquer imposto, e para tal bastava que ele provasse que esses 500 contos por dia eram resultantes de juros de depósitos a prazo ...

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado Mário Adegas, não pus em dúvida que V. Ex.ª aceitasse o principio de que os sinais exteriores de riqueza fossem um factor a ter em conta na tributação. O que me pareceu foi que o Sr. Deputado tinha reservas quanto à possibilidade de o implementar.
Contudo, a questão está em saber se aquilo que o Orçamento propõe é, de facto, a tributação dos sinais exteriores de riqueza. Eu penso que não é. E a questão que o Sr. Deputado levantou talvez não seja a de ir tributar a presença,dos Mercedes por essa via ínvia que o Orçamento propõe com toda a falta de lógica e com toda a iniquidade. Penso que o caso dos automóveis demonstra isso, porque o detentor de um automóvel que é avaliado pelo fisco em 360 contos, desde que o mesmo tenha 5 anos, é considerado como detentor de um sinal exterior de riqueza. No entanto, se eu tiver comprado nesse ano um carro de 1800 contos, não tenho sinal nenhum exterior de riqueza. Talvez o que esteja errado e que importa corrigir e que tem alguma eficácia prática ê que eu në(r) pudesse declarar ao fisco que tinha 500 contos de rendimento por dia numa situação que me isentava totalmente de impostos.

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No fundo - e aí o Sr. Deputado há-de concordar comigo -, o que nós estamos é a escamotear o real problema, a deixar que quem tenha rendimentos de 500 contos por dia em depósitos à ordem esteja isento de impostos e fingir que os estamos a tributar por uma outra via, que que não tem rigorosamente nada a ver com a realidade.

O Orador: - Sr. Deputado, no fundo nós estamos de acordo!
O que eu quis referir na minha intervenção foi que considero prioritária a tributação dos rendimentos reais. Ora, como através do imposto complementar, que tem características de complementariedade, isso não está assegurado, creio que seria muito mais lógico que quer o Governo, que está obrigatoriamente empenhado, quer esta Assembleia se preocupassem em melhorar a tributação correcta e não aleatória - porque os sinais exteriores de riqueza são perigosos - e se empenhassem em melhorar o nosso sistema através da tributação dos rendimentos reais, em vez de uma fuga em frente, como parece estar a acontecer.
Não quero discordar de que os sinais exteriores de riqueza - que, em todo o caso, exigem uma disciplina e uma eficácia muito grandes - venham a ser abandonados. Contudo, penso que é uma manobra de diversão em Portugal que em vez de resolvermos os problemas concretos fujamos deles e façamos a inventariação de questões diferentes.
Foi apenas isto o que eu quis assegurar na minha intervenção e que mantenho, embora no aperfeiçoamento possa vir a concordar que venham também a tributar-se os sinais exteriores de riqueza, que podem ser carros ou qualquer outra coisa, como, por exemplo, o número de viagens que se faz por ano ao estrangeiro. É que pode haver pessoas que não queiram ter carros mas tenham outra preferência. Por exemplo, em 1975 eu era acusado de ter comprado uma vivenda em Cascais. Ora, por que ê que eu, sendo de um quadro superior, não tinha direito a comprar uma vivenda em Cascais? Teria sido preferível que, em vez de ter comprado uma casa em Portugal, tivesse feito alguma fuga de dinheiros para o estrangeiro, ou tivesse comprado um carro, ou tivesse feito um certo número de viagens ao estrangeiro? É, pois, preciso que quando chegar a altura de nos pronunciarmos ou de apreciar esses problemas, o façamos sem paixões ideológicas e sem o desconhecimento das realidades concretas. Foi esse o sentido da minha intervenção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, devo dizer que fiz análises pontuais. Estamos numa apreciação da proposta na generalidade e eu próprio referi que penso que nós, sobretudo os que somos membros da Comissão de Economia, Finanças e Plano, devamos aproveitar as reuniões da Comissão, quer públicas, quer outras, para pormenorizarmos melhor alguns dos pontos. Porem, na análise na generalidade temos de referir coisas pontuais e mesmo assim a título exemplificativo.
Reconheço, e na bancada do PSD não temos qualquer dificuldade em o reconhecer, que se corre o risco - aliás, infelizmente corre-se sempre esse risco em épocas de austeridade - de que a maior quota de custo venha a cair sobre os trabalhadores. E ninguém deve ter medo de reconhecer que, infelizmente, isso pode ter de acontecer por inevitabilidade. Só que as inevitabilidàdes em democracia e em política devem ser combatidas e foi isso também o que eu quis acentuar.
Contudo, temos de ter a coragem de dizer que, embora a austeridade não caia exclusivamente sobre os trabalhadores, pelo menos as camadas da população com ordenados mais baixos se arriscam a ser mesmo os maiores pagadores da crise.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto às revisões de incentivos não efectuadas que o Sr. Deputado se referiu, devo dizer que eu também quis exemplificar e dar o meu apoio à sua aceleração.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado, eu não critiquei o facto de serem questões pontuais. O que eu abordei aqui, embora as tivesse referido como pontuais, foram questões de fundo, porque a questão de fundo é a da equidade da justiça fiscal.

O Orador: - Temos de fazer revisões de incentivos e sem complexos, porque todas elas têm o seu tempo de promulgação e de prova. Na prática, podem ser desactualizadas. Portanto, os incentivos que existiram para aguentar empresas, exportações, até, quer fiscais quer financeiros, podem ter perdido o significado. Há uma grande tendência no nosso país e na nossa Administração para se deixarem deteriorar as coisas. Portanto, pode ter acontecido que o sentido prioritário e bom que elas tinham se possa ter perdido.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas referiu-se ao rigor e às qualidades técnicas dos documentos. Ora, penso que há alguma qualidade técnica que nos vai permitir fazer uma análise qualificada na Comissão da Economia, Finanças e Plano. Se o Sr. Deputado ao referir-se a qualidades técnicas quiser significar que há muitos aperfeiçoamentos a fazer, estou inteiramente de acordo. Contudo, considerei suficientes os dados informativos que a Câmara tem.
Em relação ao imposto profissional, devo dizer que nós, nesta Assembleia, gostaríamos mais de verificar que o aumento das receitas fiscais fosse conseguido não à custa do aumento daquelas que provêm do imposto profissional. Contudo, penso que isso teria ficado de certa maneira subentendido na minha intervenção, porque creio que, a haver mais carga, deve ser no imposto de capitais e noutros, não no imposto profissional.
Em relação aos problemas tratados nas grandes opções do Plano, devo dizer que realmente não me pronunciei muito sobre eles porque tive a preocupação de centrar na minha intervenção apenas o seguinte: as políticas estão formuladas quer nas grandes opções do Plano quer no Orçamento e eu, como economista e conhecedor do funcionamento da Administração Pública, temo que o grau de eficácia daquilo que nós próprios aprovamos não venha a ser elevado. Por isso,

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o meu apelo ao Governo - que até poderia ter aspectos de crítica - é no sentido de que o que precisamos de aperfeiçoar é a eficácia ...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Sr. Deputado está de acordo comigo em que esta não é uma questão de somenos importância.
É muito diferente anunciar ao País que em 1984, vamos ter um decréscimo do produto interno bruto de 1,4 % e um decréscimo de 3 %. Essa é que é a questão.

O Orador: - Sr. Deputado, é evidente que não pude evitar que V. Ex.ª formulasse essa pergunta. Contudo, como ela não foi referida na minha intervenção, creio que neste caso ela não foi bem dirigida. Essa pergunta deve ser formulada aos membros do Governo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Lopes Cardoso e Custódio Gingão: V. Ex.ª, interpelaram há pouco a Mesa sobre alguns factos que se teriam passado quando certos cidadãos que pretendiam contactar V. Ex.ª e os vossos partidos viram apreendido o material que :raziam com eles. Ora, tendo pedido ao Sr. Secretário que fizesse um breve inquérito sobre o que se passou, fui esclarecido do seguinte:

1) Os serviços da Assembleia não se aperceberam de que esse material se destinasse a ser entregue aos Srs, Deputados, mas pensaram que se poderia tratar de material ou volantes de propaganda;
2) No entanto, o Sr. Deputado Custódio Gingão, tendo-se responsabilizado a trazer esse material, não foi impedido, como não poderia ser porque era um direito de V. Ex.ª;
3) A convicção da Mesa é a de que os contornos internos de materiais trazidos por cidadãos que desejam contactar com os Srs. Deputados sejam melhor definidos, de forma a evitar incidentes como aqueles que V. Ex.ª referiram.

Muito obrigado Srs. Deputados Lopes Cardoso e Custódio Gingão por terem advertido a Mesa e o Plenário desses factos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento Social.

O Sr. Ministro do Equipamento Social (Rosado Correia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dar uma explicação à Câmara no que respeita à ausência de outros Srs. Ministros. Como sabem, o Conselho de Ministros esteve reunido toda a manhã a tratar de uma matéria que merece toda a nossa atenção e que é a que diz respeito às A intempéries que assolaram esta zona da área da Grande Lisboa. Portanto, segundo creio, ainda continuam ocupados e esse é o motivo de não se encontrarem presentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As verbas atribuídas ao Ministério do Equipamento Social na proposta de lei do Orçamento do Estado enquadram-se, naturalmente, na linha geral de contenção premente das despesas públicas adoptada pelo Governo para enfrentar e superar as graves dificuldades financeiras nacionais. Neste contexto, a prossecução dos fins visados pelos diferentes sectores do Ministério - a Habitação e Urbanismo, as Obras Públicas, os Transportes e as Comunicações -, e expressos no Programa do Governo, será, inevitavelmente, subordinada, com seriedade e rigor, aos limites orçamentais traçados para a área do Equipamento Social.
O Governo herdou, nas áreas da Habitação e Obras Públicas, um volume muito elevado de compromissos contratuais a satisfazer. As dotações orçamentais terão de ser prioritariamente destinadas â satisfação desses compromissos: ao pagamento das dívidas do Estado, à conclusão das obras em curso - procurando evitar descontinuidades sempre gravosas - e aos trabalhos complementares necessários à plena utilização social dos diferentes empreendimentos.
Na área dos Transportes e Comunicações, o Governo deparou com um passivo acumulado de 235 milhões de contos no conjunto das empresas públicas do sector, e esse é um dado que não pode ser ignorado no quadro da política de racionalização e viabilização do sector público empresarial que está a ser elaborado e implementado.
Neste condicionalismo, a primeira tarefa que se impôs ao Governo foi, de facto -também neste sector -, a de «arrumar a casa», e esperamos tê-la concluído com êxito em prazo não muito alongado. Nem por isso, no entanto, deixarão de persistir as dificuldades, e o relançamento verdadeiro e duradouro que desejamos exigirá do Governo a adopção de uma política de gestão criteriosa e rigorosa dos investimentos, que não repita erros do passado e crie decididamente as condições da recuperação económica nacional a médio e a longo prazos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São suficientemente conhecidos os agudos problemas existentes nos domínios da habitação e construção. Se, por um lado, as necessidades habitacionais não param de aumentar e se são elevadas as carências em equipamentos e infra-estruturas básicas, verificam-se cíclicas situações de crise do sector empresarial da construção civil e obras públicas, como aquela a que actualmente se assiste.
E nesta matéria constata-se que se tem acentuado a sua dependência quer do crédito quer do investimento público, com alterações de estrutura, desde 1974, que agravam a fragilidade do referido modelo. Assim, em 1981 a produção do sector da construção foi em cerca de 35 % de obras públicas, enquanto que em 1974 era apenas de 18 %; a produção de habitações decaiu de 42 000 fogos novos em 1974 para cerca de 38 000 em 1981, enquanto que, em sentido contrário, o peso da habitação promovida directamente por entidades públicas passou de 4 % a 5 % para 15 % a 20 %; a percentagem de habitação nova destinada ao mercado de arrendamento era de 55 % a 60 % antes de 1974, tendo praticamente desaparecido na actualidade; o número de fogos objecto de empréstimo para casa própria, que não atingia os 10 000 por ano no período de 1972-1975, cresceu em flecha e elevou-se a 49 000 em 1981, englobando a totalidade da produção habitacional e uma componente significativa de casas antigas vendidas aos inquilinos.

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Neste contexto, era inevitável que o sistema financeiro não pudesse continuar a suportar volumes tão substanciais de procura de crédito, traduzido na sua maior parte em crédito a longo prazo e com crescimentos anormais dos saldos respectivos. Por outro lado, o montante de subsídios a cargo do OGE assumia valores incomportáveis, verificando-se que nem sempre os beneficiários eram aqueles que o sistema devia ajudar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao quadro descrito, as grandes orientações sectoriais, se devem incluir medidas de resultados a curto prazo que atenuem os efeitos da situação recessiva, não podem, contudo, deixar de ter, desde já, uma vertente importante de alterações estruturais.
Assim, e tendo em conta que o investimento público directo não pode ser utilizado, nas actuais circunstâncias, como instrumento de melhoria conjuntural, há que tomar medidas de outra natureza, visando obter efeitos positivos ao longo do ano de 1984.
No sensível domínio da habitação, essas medidas visarão sobretudo dois objectivos fundamentais:

O relançamento da promoção de habitação social e, em geral, a promoção de habitações de custos moderados;
Uma nova eficácia para o sistema de crédito ã aquisição de habitação própria, desde já enquadrado nas alterações estruturais que o Governo pretende introduzir.

No que diz respeito ao primeiro objectivo, pode afirmar-se que praticamente há cerca de 2 anos que não há lançamento de novos empreendimentos de habitação social, quer por agentes promotores públicos, quer por cooperativas e privados, estes através dos contratos de desenvolvimento. Este facto, para além de contribuir para a crise do sector da construção, ajudou a empolar o número de promotores de casas para o mercado livre de venda, com custos mais elevados e agravando a pressão sobre o crédito à aquisição de casa própria. Socialmente, reduziu fortemente a oferta de habitações para as famílias de rendimentos abaixo da média.
Foram já criados os instrumentos legislativos e tomadas as providências orçamentais necessárias para que o Fundo de Apoio ao Investimento para a Habitação (FAIH) possa financiar, em 1984, o arranque de cerca de 12 000 novos fogos de habitação social, esperando-se que por parte dos promotores respectivos (cooperativas, municípios e empresas privadas) haja suficiente dapacidade de resposta. O Ministério do Equipamento Social dar-lhes-á o apoio necessário, e dentro em breve será publicada legislação que torne de novo operativa a figura dos contratos de desenvolvimento para a habitação.
Neste ponto, gostaria de manifestar o meu decidido empenhamento em pôr cobro a situações que considero claramente lesivas do Estado - e do bem público, no domínio dos fogos sociais construídos no passado ao abrigo de contratos de desenvolvimento, porque não é admissível que habitações construídas ao abrigo desse regime possam vir a atingir preços de mercado da ordem dos 3000 e 4000 contos, como tem sucedido. Trata-se de uma evidente distorção dos fins que o Estado deverá prosseguir como promotor directo ou indirecto, de habitação social e também neste domínio

O Governo terá de moralizar, para garantir uma mais eficiente gestão dos recursos disponíveis.
Outro ponto que gostaria de referir é o de que, já durante a vigência do IX Governo Constitucional, foram concluídos pelo ex-Fundo de Fomento da Habitação, 3025 fogos, envolvendo 1 982 000 contos.
Do mesmo modo, foram já despachados reforços de financiamento às Cooperativas de Habitação Económica e Associações de Moradores, no montante global de cerca de 2 milhões de contos, o que permitirá a conclusão de 4976 fogos, para além de equipamentos integrados nos edifícios habitacionais, em 1983.
Por outro lado, com o conjunto de diplomas no domínio do financiamento à habitação já aprovados pelo Governo, e em vias de publicação, pretende-se a reformulação do sistema de crédito à aquisição de casa própria, adaptando-os aos condicionalismos existentes e limitando os inconvenientes de toda a ordem que no passado recente lhe têm sido apontados.
Assim, para além de uma maior progressividade das prestações, que melhor adeque os encargos respectivos com a capacidade de solvência da maior parte das famílias carentes, na sua regulamentação guardar-se-ão os esquemas a utilizar, de acordo com a natureza da habitação (privilegiando a de menores custos), com o nível de rendimentos das famílias, visando-se ainda privilegiar o apoio aos jovens casais em busca de habitação. O jogo conjunto de todos estes aspectos deverá conduzir:

A diminuição ou estabilização do valor médio dos empréstimos, o que significará financiar maior número de fogos para os mesmos volumes de crédito, isto é, não pressionar o aumento dos plafonds para acréscimo do número de contratos;
A reorientação da oferta de habitações para escalões de custo mais conforme com o perfil da procura, travando o crescimento anormal que nos últimos anos o preço de venda das habitações tem vindo a conhecer (cerca de 50 º/> ao ano na Grande Lisboa e Grande Porto).

As associações do sector têm vindo a manifestar acentuadas preocupações pela existência de um eventual stock elevado de fogos sem comprador. Embora seja difícil quantificar e caracterizar esse stock, e independentemente do volume que atinja, não se pode deixar de considerar esse problema com as cautelas necessárias, e tendo em conta que é sempre delicado adoptar medidas que distorçam ainda mais o modelo de promoção privada. Pensa-se, contudo, que, com a reformulação do Decreto-Lei n.º 435/80, ao tornar-se operacional o referido sistema de financiamento, e ultrapassada a fase de quebra na concessão de empréstimos à casa própria, aliás determinada em parte por razões de reequilíbrio dos activos das instituições especiais de credito, poder-se-á garantir em 1984 um volume de afectação de recursos suficientemente elevado para proporcionar o escoamento das habitações já acabadas ou a lançar proximamente no mercado.
A situação deteriorada em que se veio a encontrar o ex-Fundo de Fomento da Habitação obrigou a prestar-lhe especial atenção, não só pafa conclusão dos programas em curso, que ascendem a mais de 30 000 fogos, como para encontrar adequadas soluções ao seu

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elevado activo e passivo financeiros e património habitacional.
Entre os novos instrumentos criados com vista a alcançar um embaratecimento dos custos de construção, quero salientar o inovador regime da habitação evolutiva e de auto-acabamento, o qual permitirá aos próprios utentes concluir a sua própria habitação ã medida das suas possibilidades e desejos, tornando possível uma redução em mais de 30 % dos custos de construção dos fogos promovidos e apoiados pelo Estado, e assim erguer um maior número de habitações com os mesmos recursos financeiros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se se justifica adoptar medidas de resultados imediatos, há que preparar igualmente todo o leque de reformas estruturais, designadamente no quadro da política habitacional, no sistema decisório das obras públicas e na modernização do sector produtivo da construção.
Em termos de política habitacional e tendo como objectivo a introdução de maior justiça e equidade no esforço que a generalidade das famílias deve fazer com a habitação, haverá que:
Obter-se um novo equilíbrio no mercado, relançando, na medida do possível, uma fracção mínima de mercado de arrendamento;
Garantir-se a oferta adequada de alojamentos de características sociais, parecendo aconselhável que se tenha em vista que, pelo menos, um berço da produção habitacional global seja de habitações sociais;
Implementar-se uma estratégia efectiva de reabilitação e recuperação do parque existente;
Assegurar-se a disponibilização de solos urbanos num contexto da eficácia desejável em matéria de planeamento e gestão urbanística.

A revisão do regime de arrendamento urbano, cujos instrumentos legislativos ficarão concluídos a curto prazo, desempenha um papel primacial em todo este contexto de alterações estruturais. A reformulação do sistema assenta numa abordagem - programática e será rodeado de todas as cautelas para que não venha originar roturas e impactos gravosos, quer na solvência das famílias quer em termos macro-económicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No domínio das Obras Públicas, a necessidade de um cada vez melhor aproveitamento dos escassos recursos disponíveis impõe que três preocupações norteiem todos os procedimentos decisórios:
Primeira - a sua clara justificação social e a sua plena utilização a mais curto prazo;
Segunda - a importância que os empreendimentos assumam para o desenvolvimento regional, e a correcção das mais gritantes assimetrias regionais, no quadro do interesse nacional;
Terceira - a passagem para as autarquias como princípio descentralizador e de maior equidade, mas como participações possíveis a atribuir a associações recreativas, desportivas e culturais, o que espero que esta Assembleia venha a considerar na próxima alteração da Lei das Competências Autárquicas.

riosa com base em prioridades bem definidas e garantir-se uma adequada eficiência na aplicação dos fundos orçamentais.
Sendo certo que, apesar de todos os esforços que se irão realizar para maximizar o aproveitamento dos recursos disponíveis, não se poderá evitar uma travagem no lançamento de novas obras, torna-se oportuno destacar neste momento, pela sua importância, entre os empreendimentos de maior significado com execução programada para 1984, os seguintes:
O início da construção da nova ponte ferroviária sobre o Douro, no Porto, com a qual se superará um importante obstáculo ao desenvolvimento económico regional e nacional;
A construção de novos troços dos itinerários principais Setúbal/Faro, Porto/Bragança e Aveiro/Vilar Formoso, vias rápidas indispensáveis ao desenvolvimento das regiões interiores, e à correcção das assimetrias regionais;
O lançamento de um número significativo de obras de conservação e beneficiação da rede viária;
A ampliação dos aeroportos do Porto e de Faro, com vista a garantir a superação dos actuais estrangulamentos e a adequação dessas infra-estruturas aeroportuárias às exigências previsíveis do desenvolvimento do tráfego aéreo num horizonte temporal dilatado;
O lançamento de 15 novas escolas preparatórias e secundárias, incluindo as que beneficiam das ajudas comunitárias de pré-adesão, assegurando-se por outro lado, a conclusão do elevado número de obras em curso, cerca de 60, e prevendo-se para o 2 º semestre do próximo ano, se as condições financeiras o permitirem, a adjudicação de cerca de 60 novas escolas secundárias;
O prosseguimento das obras de aproveitamento hidráulico na Bacia do Mondego, na Cova das Beira, na barragem do Azigo, Marvão e Castelo Branco, e o arranque da construção da Estação de Tratamento de Águas Residuais de Coimbra;
O prosseguimento do plano integrado de aproveitamento dos recursos hídricos do Algarve, com destaque para o lançamento da importante adução Beliche/Tavira, tratasse, de um plano que exigirá um investimento plurianual de ordem dos 15 milhões de contos, e se estenderá até 1990, incluindo, para além da conclusão da barragem de Beliche e respectivas estruturas hidráulicas complementares, a construção da rede de rega do sistema Beliche/Odeleite, o lançamento da barragem de Odeleite e infra-estruturas complementares, e o novo sistema Funcho/Odelouca, com construção da barragem e execução coordenada das infra-estruturas. No seu conjunto, este plano integrado irá resolver os problemas do abastecimento de água no Algarve, criar condições para a rega de mais de 20 000 h e beneficiar significativamente as outras actividades económicas regionais.

Neste contexto, ir-se-á implementar a melhoria do O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço que me desculpe esta interrupção, mas, em primeiro lugar, verifico investimentos, que alguns dos Srs. Deputados não conseguem acom-

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ganhar a intervenção de V. Ex.ª em virtude da rapidez com que ela é feita.
Contudo, em segundo lugar, também verifico que alguns Srs. Deputados não conseguem ouvir convenientemente V. Ex.ª em virtude do barulho que se faz na sala.
Ora, aos segundos pedia que criassem as condições de silêncio para que V. Ex.ª pudesse ser ouvido e a V. Ex.ª pedia que lesse mais devagar para que as suas propostas e proposições pudessem ser entendidas.

O Orador: - No que se refere ao sector da construção, as medidas a adoptar terão em vista estimular a modernização da sua estrutura produtiva, não esquecendo que, a médio prazo, se farão sentir efeitos concorrenciais provenientes da integração europeia. Para isso proceder-se-á:

Ao incentivo ao reajustamento da estrutura empresarial e à sua especialização;
A revisão do sistema de acesso à actividade da indústria da construção civil e empreiteiros de obras públicas;
A reformulação dos esquemas fiscais existentes, de modo a incentivar a melhoria da estrutura tecnológica e o reequipamento das empresas;
Ao estímulo e apoio da actividade de'empresas da construção em mercados externos;
Ao apoio e acções de formação que visem a melhoria do nível da mão-de-obra e da capacidade de gestão.

E, neste domínio, não quero deixar de garantir, até porque se trata de um debate em que está primordialmente em foco a correcta distribuição e aplicação dos dinheiros públicos numa época deausteridade, que serão tomadas, no âmbito do Ministério do Equipamento Social, todas as medidas necessárias a uma efectiva moralização do regime de concursos e empreitadas, que se deseja e exige aberto, transparente e isento de qualquer tipo de discriminações. Nesta matéria, será ainda preparada a revisão dos instrumentos legais que não se adequem inteiramente ao objectivo enunciado.
Sr. Presidente, Srs. Deputado: Temos consciência de que, nos limites consentidos pelas dotações orçamentais, será possível prosseguir uma política coerente e articulada, nos vários ramos de actividade abrangidos pelo Ministério do Equipamento Social, sem esquecer os planos de recuperação e viabilização das empresas públicas do sector, com destaque para os casos da CP e da TAP que exigirão, alias, do Estado um significativo esforço financeiro.
Este Ministério não esquecerá, entretanto, a sua vocação de apoio ao poder local, quer seja intervindo com determinação e sentido do interesse nacional no domínio do planeamento territorial, quer apoiando as acções intermunicipais integradas em programas de desenvolvimento regional, quer ainda dando às autarquias o apoio possível nesta fase de transição para uma desejável e significativa ampliação das competências e recursos do poder local.
As tarefas que nos propomos exigirão determinação e coerência, mas estamos certos de alcançar os objectivos.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro do Equipamento Social, os Srs. Deputados Pinheiro Henriques, Anselmo Aníbal, Anacoreta Correia, António Gonzalez, João Abrantes, Lopes Cardoso, Hasse Ferreira, António Taborda, Margarida Tengarrinha, Hernâni Moutinho, Reis Borges, Amadeu Pires e Duarte Lima.
Portanto, tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Dinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Ministro, as questões que lhe pretendo colocar são no domínio dos transportes.
Nesse domínio, o aspecto que se nos afigura como 0 mais importante é a gritante descoordenação que existe mesmo entre as empresas públicas do sector. O caso mais flagrante nesta matéria da descoordenação são os chamados «Expressos rodoviários», que na sua generalidade, até são ilegais, e que se vêm praticando por empresas públicas e privadas.
Qual será a actuação do Governo a nível da promoção da coordenação dos transportes e do fomento da utilização dos transportes públicos? Por esta via também se pode contribuir para o equilíbrio da balança de pagamentos, visto que se poderá produzir a diminuição do consumo de energia que, como iodos sabemos, é importada.
Gostaria ainda de fazer referência a um estudo que foi realizado há alguns anos e que se intitula «Plano Nacional de Transportes». Ora, a questão que gostaria de lhe colocar a este respeito era a seguinte: qual a opinião do Governo sobre este estudo e em que medida é que ele será utilizado para a elaboração do Plano para o próximo ano?
V. Ex.ª, Sr. Ministro, referiu-se à viabilização das empresas públicas no sector, particularmente na TAP e na CP. Assim, gostaria que me esclarecesse se dentro das medidas previstas consta o encerramento de linhas. Se consta, que critérios se adoptarão e que condições, nomeadamente em termos de alternativa de transportes públicos, no caso do caminho de ferro, serão estabelecidas?
Relativamente à Rodoviária Nacional, o Governo entende dever prosseguir a política de diminuição do volume de indemnizações compensatórias, mesmo em termos nominais, enquanto lhe retira actividades que poderiam ser rentáveis?
Que perspectiva para a actividade de transportes de mercadorias na Rodoviária Nacional?
Gostaria ainda, Sr. Ministro, que me dissesse se também se procederá à divisão desta empresa em outras de menor dimensão.
Finalmente em relação à TAP, perguntar-lhe-ia qual é a perspectiva do seu desenvolvimento, particularmente, qual é o papel que cabe à cooperação com o mercado africano, incluindo acordos de cooperação técnica.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ministro do Equipamento Social: - No fim, Sr. Presidente.
Contudo, queria pedir aos Srs. Deputados o favor de fazerem os pedidos de esclarecimento mais lentamente, pois não consigo anotar todas as perguntas.

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O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro, tentar-se-á que a interpelação seja mais lenta.
Os Srs. Deputados ouviram o apelo do Sr. Ministro e, portanto, coíbo-me de dizer mais o que quer que seja sobre a matéria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Anibal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Ministro do Equipamento Social, achamos que o facto de ter falado como falou assinala que V. Ex.ª aceita ser gestor da penúria.
Realmente, em termos orgânicos globais, as verbas do seu Ministério que em 1983 eram de 46,4 milhões de contos, passaram em 1984 para 39,5 milhões de contos, ou seja, o senhor vai gerir a penúria de ter menos 7 milhões de contos numa área decisiva para a qualidade de vida e para o bem-estar dos portugueses. Entretanto, segundo nos parece, o Sr. Ministro tenta ultrapassar isto indicando-nos um cardápio de intenções e estendendo-se num estendal de projectadas inaugurações, designadamente na área das obras públicas.
Assim, gostaria de lhe perguntar o seguinte: se no domínio da habitação, que em termos orgânicos tem 6 milésimos do Orçamento do Estado, que no domínio da classificação funcional baixa em 47 % em termos reais, como é que V. Ex.ª vem aqui, com alguma ligeireza - permita-me a expressão -,indicar um relançamento da habitação social e a criação de fogos a preços moderados?
Como é que o Sr. Ministro, num sector como o dos transportes que, em termos reais e em valores também funcionais, baixa 14,4 %, vem fazer o estendal de projectadas inaugurações - até meteu o itinerário principal nº 4, Porto-Bragança, certamente para tentar responder a ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Anselmo Aníbal, peço desculpa por o estar a interromper, mas alguns Srs. Deputados estão-se a queixar de que não o conseguem ouvir convenientemente, o que creio ser consequência de algum ruído que está a acontecer na Assembleia.

O Sr. António Taborde (MDP/CDE): - É do som!

O Sr. Presidente: - Ah, é do som, Sr. Deputado!
Infelizmente o atraso tecnológico do País não permite à Mesa resolver esses problemas de um momento para o outro.

Risos.

De qualquer forma, temos de nos adaptar às condições objectivas. Portanto, Srs. Deputados, apesar de o som ser mau, façamos tábua rasa desse problema e criemos as condições de silêncio necessárias para que o Sr. Deputado Anselmo Aníbal possa ser ouvido par todos em especial e pelo Sr. Deputado António Taborda em particular.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu ia no itinerário principal n.º 4 e estava a perguntar ao Sr. Ministro como é que com facilidade ele se refere aqui do transporte de Setúbal a Faro e das 15 novas escolas, das quais - tanto quanto sabemos - 10, é que estão apresentadas com um financiamento comunitário.

Falou muito pouco dos transportes e comunicações - julgo que o Sr. Secretário de Estado das Comunicações poderia dizer algo mais. De facto, em termos do PIDDAC, a indeterminação e a falta de rigor são muito grandes - aliás, como foi reconhecido pela IX Comissão da Assembleia da República em reunião que tivemos com o Sr. Ministro e com dois das quatro Secretários de Estado do seu Ministério.
No entanto, gostaríamos de saber se, em termos de determinação do PIDDAC, há alguma listagem mais pormenorizada que nos possa adiantar neste momento neste debate.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Ministro do Equipamento Social, registo que deu um grande desenvolvimento ao problema da habitação, coisa que já a proposta de lei, apresentada pelo Governo, das grandes opções do Plano não fez exactamente devido à carência daquilo que eu pensa ser uma política do Governo relativamente à habitação.
Há, no entanto, algumas questões que queria pôr em concreto. Na p. 53 da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1984, diz-se que o orçamento do Fundo Especial de transportes terrestres atingirá 7,6 milhões de contos, e que poderão conceder-se transferências para as empresas públicas do respectivo sector, especialmente para o Orçamento do Estado. Na p. 30 do mesmo diploma, diz-se que o Fundo Especial de Transportes Terrestres transferirá 2,3 milhões de contos com o objectivo de fazer face a despesas de carácter reprodutivo.
Gostaria de ser esclarecido sobre o exacto sentido do que se entende por esta transferência para «fazer face a despesas de carácter reprodutivo».
Gostaria também de ser esclarecido sobre outros dois pontos. Primeiro, se a resolução do Conselho de Ministros, a que eu atribuo grande importância até pela ligação que tenho com o Algarve, relativamente ao problema do aproveitamento dos recursos hidráulicos, está devidamente contemplada no Orçamento do Estado de forma a que o Plano tenha a exequibilidade dentro dos prazos previstes nessa resolução do Conselho de Ministros. Segundo, sobre o ponto da situação actual da ponte sobre o Douro e o problema do financiamento do Banco Europeu de Investimentos.
Finalmente, gostaria de saber - e peço desculpa de não serem duas, mas três as questões que quero colocar - se, relativamente à junta Autónoma das Estradas, estão previstas verbas que possibilitem a reparação dos danos que a rede viária sofreu com os recentes temporais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António GonzaLez (INDEP.): - Sr. Ministro do Equipamento Social, relativamente ao LNEC - e há uns dias levantei aqui essa questão -, gostaria de saber se a verba inscrita no Orçamento para esse Laboratório sempre é de 135 139 contos como inicialmente está prevista, ou se passou para 395 000 contos,

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verba essa que, creio, o Sr. Ministro informou verbalmente. É que se a primeira verba inviabiliza totalmente o funcionamento de todos os projectos que existem em carteira, a segunda, que seria igual à de 1983, mesmo assim é bastante baixa.
Quanto ao Fundo de Conservação e Protecção de Recursos Hídricos, gostaria de saber se está concebido um estudo sobre a contaminação de toalhas aquíferas subterrâneas em relação à instalação de lixeiras, sejam ou não sépticas, nas proximidades de zonas de infiltração. Sei de muitos casos em que boa toalhas aquíferas subterrâneas estão para sempre contaminadas pelas lixeiras sépticas, muito bem intencionadas mas que estão a contaminar grandes quantidades de água.
Em relação ao aeroporto de Faro, gostaria de saber se afinal existe ou não um projecto de ampliação desse aeroporto e, em caso afirmativo, em que direcção vai estender-se. Esta questão é importante porque para os ecologistas e investigadores do ambiente tal ampliação iria afectar uma zona ecológica extremamente sensível, nomeadamente a zona de sapais da ria Formosa.
Quanto à Junta Autónoma de Estradas, que verbas existem para a reparação de tantas estradas que se encontram extremamente danificadas, estradas essas que se situam inclusive na área da Grande Lisboa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Ministro do Equipamento Social; dada a superficialidade da sua intervenção, gostaria de lhe pôr duas questões muito concretas.
Primeira questão: inicialmente estavam previstos para a obra de aproveitamento hidroagrícola do Vale do Mondego apenas 5 milhões de contos. Já se gastaram 20 milhões de contos e não estão sequer concluídas as obras do leito central, e muito menos o domínio do rio Alva e da sua barragem, faltando ainda dominar os vales secundários dos rios Fouja, Arunda e Pranto e construir os leitos periféricos - direito e esquerdo de modo a garantir não só o domínio das cheias mas, sobretudo, a evitar a perda de tudo o que está feito e que já custou ao país os referidos 20 milhões de contos.
Garante o Sr. Ministro, com as verbas inscritas no Orçamento do Estado, a continuidade da obra do vale do Mondego ou, pelo contrário, corre-se o risco de se perder tudo aquilo que já está investido, dadas as interrupções e lacunas que a obra tem e que o Sr. Ministro deve conhecer? A mesma questão se põe quanto ao que disse relativamente à Cova da Beira.
Segunda questão: um quartel de bombeiros custa, em média, 50 000 contos. O Governo tem estado a comparticipar em cerca de 80 %, o que significa, em termos reais, uma verba de 40 000 contos que o Governo atribui a essas instituições.
O equipamento mínimo das corporações de bombeiros tem sido uma das apregoadas preocupações deste Governo. Normalmente, com os recentes temporais, ficou bem patente que esses equipamentos mínimos não são de possível aquisição com essa verba e estão até muito longe de o ser.
Pergunto-lhe: qual é a verba inscrita e destinada à construção de novos quartéis de bombeiros, e, bem assim, quantas corporações podem aspirar a este devido

benefício, para além, evidentemente, dos critérios que sabemos existirem de atribuição de prioridades na concessão dessas verbas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Ministra do Equipamento Social, duas questões muito concretas em relação às quais permitir-me-ia pedir-lhe os esclarecimentos possíveis.
O Sr. Ministro enumerou um rol de empreendimentos no sector das obras públicas no que diz respeito ao aproveitamento dos recursos hídricos. Creio, no entanto - e eu procurei ouvi-lo com a atenção possível e, portanto, não se trata de lapso da minha parte -, que não referiu a barragem do Sabugal no aproveitamento da Cova da Beira.
Sabendo o Sr. Ministro, melhor do que eu, que essa barragem é uma peça chave para o aproveitamento de recursos hídricos, pergunto-lhe se está posta de parte a ideia de lançar este ano o concurso para a barragem e arrancar com as obras.
Podia informar-me também se está totalmente posta de parte a ideia de, a curto prazo, arrancar com a nova ponto sobre o rio Lima? O Sr. Ministro sabe a idade, mais do que centenária, da actual ponte que atravessa o rio Lima e sabe que os benefícios das novas pontes sobre o rio Douro e, eventualmente, sobre o rio Minho poderão vir a ser limitados pela existência de um gargalo de estrangulamento entre estes dois atravessamentos - o Douro e o Minho.
Pelas informações de que disponho - e o Sr. Ministro dir-me-á se estão ou não correctas -, em 1982 o Prof. Edgar Cardoso terá rescindido o contrato que o ligava à junta Autónoma das Estradas para realizar o projecto da ponte. Neste momento, não sei sequer em que estado de avanço está o projecto - aliás, nem eu sei nem os próprios autarcas da Câmara Municipal de Viana do Castelo porque também é do meu conhecimento que o presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo tem feito várias diligências junto da Junta Autónoma das Estradas para ser esclarecido sobre esta matéria, sem até este momento ter conseguido obter qualquer resposta.
Agradecia, pois, que me esclarecesse sobre as duas questões muito concretas que lhe coloquei.

O Sr. (Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Ministro do Equipamento Social, quanto ao problema da habitação, solicitava-lhe que fornecesse a esta Assembleia mais alguns elementos no que se refere á orientação global preconizada quanto à revisão do regime de arrendamento urbano.
Relativamente ao que o Sr. Ministro apontou quanto às obras públicas, os critérios e as orientações globais preconizados parecem-me correctos. O problema surge depois na sua calendarização, o que se relaciona, obviamente, com as verbas disponíveis.
Nesse sentido, gostaria, para concretizar, que me desse uma previsão quanto à evolução prevista para a auto-estrada Setúbal-Faro. O que é que está previsto? Em que fase estará no final de 1984 ou mesmo no final

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de 1985? Quando estará prevista a sua conclusão? A importância deste aspecto relaciona-se com o facto de o prolongamento da auto-estrada que ligará Setúbal ao Algarve ser uma promessa eleitoral.
Trata-se de um ponto em relação ao qual agradecia um esclarecimento concreto do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Ministro do Equipamento Social, o nosso tempo é muito escasso pelo que tentarei ser extremamente sintético.
Ouvi atentamente a sua exposição que me pareceu recheada de boas intenções, mas não mais do que isso V. Ex.ª, falando longamente no problema da habitação, um problema extremamente grave deste país - sabe-se que cerca de 40 % da mão-de-obra activa está ligada a este sector -, referiu duas linhas de actuação do Governo: o relançamento da construção social e a nova eficácia na aquisição para habitação própria através da reformulação do sistema de crédito à habitação. Sr. Ministro, tudo isto está certo no campo das intenções mas, como eu aqui disse a propósito de um outro Ministério, parece-me que isto não passa de música celestial. Eu queria, no concreto, saber o que é que o Governo vai fazer, já que a habitação é uma das primeiras prioridades do Programa do Governo.
Exercendo, durante longos anos, V. Ex.ª, como autarca, na segunda cidade do país - o Porto -, funções directamente ligadas a este sector, perguntava-lhe, concretamente, se é ou não verdade que um dos problemas fulcrais da habitação é o da questão da municipalização dos solos. Neste sentido, o que é que o Governo pretende fazer para melhorar o problema da habitação?
Falou também na revisão do regime de arrendamento urbano. Estamos na discussão do Orçamento, isto é, estamos na discussão do concreto. Nesse sentido, gostaria de saber, embora em linhas gerais, como é evidente, mas concretamente, qual é a intenção do Governo para a revisão do regime de arrendamento urbano.
Vários ministros vêm aqui falar de programas que estão ou podem estar em execução, e para não fugir à regra, V. Ex.ª falou nas vias rápidas Porto/Bragança e Vilar Formoso/Aveiro. Devo dizer-lhe que, finalmente, sobre uma das vias rápidas que referiu já tive ocasião de obter uma resposta franca e concreta do Sr. Secretário de Estado do Planeamento: a de que, quanto à via rápida Porto/Bragança, não há dinheiro do PIDDAC para a construção dessa via. Penso que seria boa intenção do Governo mas, se para 1984 não há possibilidades de se construir essa via, por que razão falam nela? Para que é que estamos a falar numa coisa que sabemos que não vamos fazer? Isto é pura demagogia, Sr. Ministro.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Por último, queria fazer-lhe uma pergunta sobre um problema que afecta, de certo modo, a investigação tecnológica neste país.
Como V. Ex.º sabe, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil é das poucas «coisas» científicas e técnicas que existem neste país com autoridade inter-

nacional. Constata-se que, em relação ao ano passado, há no seu orçamento um corte de 400 000 conto para os programas a desenvolver durante o ano. O que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre isto? Qual é a política do Governo quanto ao LNEC?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Ministro do Equipamento Social, uma coisa são intenções e papéis, outra são obras de pedra, cal e cimento.
Pergunto-lhe: é ou não verdade que no PIDDAC do seu Ministério não se dá cobertura às obras dos sistemas de aproveitamento das bacias hídricas do Algarve, cujo estudo já está feito há muito tempo, e que destas a única obra que estava a ser feita - a do Beliche - está parada e os trabalhadores estão há vários meses sem salário;
Em relação ao Alqueva, foram ou não cortadas as verbas para as barragens do Monte Novo e o aproveitamento hidráulico da Velegia, que são complementares do Alqueva?
É tudo, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hernâni Moutinho.

O Sr. Hernâni Moutinho (CDS): - Sr. Ministro do Equipamento Social, duas perguntas muito rápidas por razões de tempo.
V. Ex.ª falou, de passagem, na via rápida Porto/Bragança, uma questão que, aliás, já foi referida pelo Sr. Deputado António Taborda. Um membro do Governo disse há dias que a via rápida Porto/Bragança só lá para o ano ...

Neste momento, algum público presente nas galerias manifesta-se, gritando e exibindo cartazes, onde se lia: «CPP Fome», «Exigimos salários», «Não à destruição da CP Pesca».

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Guardas o favor de fazerem evacuar as pessoas que estão a manifestar-senas galerias.

Os manifestantes continuam a gritar.

É favor fazerem evacuar só as pessoas que se estão a manifestar, obviamente.
Está suspensa a sessão.

Eram 16 horas e 54 minutos.

Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 58 minutos.

Srs. Deputados, gostaria de lhes dizer que, como era de esperar, a maioria das pessoas que se encontra nas galerias teve, perante este incidente, o comportamento que é de esperar de cidadãos portugueses: simultaneamente firme, digno e respeitoso. E minha convicção que ele vai continuar e foi por isso que pedi às autoridades o favor de dispersarem e fazerem evacuar somente as pessoas que se estavam a manifestar.

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Quando, há pouco tempo, houve idêntico incidente, tive ocasião de lhes dizer que tomaria a iniciativa de apresentar a S. Ex.ª, o Sr. Presidente da Assembleia da República, uma pequena informação pelos acontecimentos e uma relação das medidas a adoptar. Creio ser oportuno dizer a V. Ex.ª que essa informação foi feita e vai ser entregue, apenas me falta assinar. Simplesmente, não vou avançar o seu conteúdo porque seria indelicado avançar o conteúdo de uma coisa antes de o seu destinatário ter tido conhecimento dele.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hernâni Moutinho, que há pouco estava no uso da palavra, e queira desculpar esta interrupção, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Ministro do Equipamento Social, como há pouco estava a perguntar, a via rápida Porto/Bragança estará concluída apenas, como disse há algum tempo um membro do Governo, lá para o ano 2000, sendo cisto que esta via rápida será um factor relevantíssimo no desenvolvimento e progresso do nordeste transmontano, de Trás-os-Montes, e não só?
Em segundo lugar, quanto à extinção anunciada de vias estreitas - e V. Ex.ª não falou nisso na sua intervenção -, uma das contempladas será, eventualmente, a linha do Tua. Considerando que em muitas épocas do ano o comboio é o único meio de transporte que se tem para se chegar a Bragança, pois não há outros meios de transporte alternativos para se chegar àquela região; considerando os milhões de passageiros que para lá se dirigem; considerando que o nordeste transmontano é uma região isolada, pergunto se acha que se deve fechar essa linha.
De facto, o nordeste transmontano não esperaria grande coisa do Governo; o que não aceita é que lhe tirem aquilo que tem, concretamente a linha do Tua que já existe desde 1887.
Pergunto, pois, ao Sr. Ministro o seguinte: vai a linha do Tua ser extinta ou vai manter-se?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Iria colocar, ao Sr. Ministro do Equipamento Social, algumas questões erra três áreas que se me afiguram, neste momento, especialmente significativas.
Gostaria que o Sr. Ministro nos esclarecesse, em primeiro lugar, se foi ou não obedecida a calendarização estabelecida pela Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos nos aproveitamentos hídricos relativos ao Algarve. Pergunto isto, porque penso que quando o Sr. Ministro enunciou algumas realizações, tinha apenas em conta as lançadas em 1984, para as quais o serviço responsável indicou a sua execução temporal, já que a partir de 1985, será exigido um maior esforço financeiro para essas obras.
Queria também perguntar ao Sr. Ministro, qual é a participação do Ministério do Equipamento Social no projecto do Alqueva, na medida em que penso que, neste momento, esse problema está a ser analisado só pelo ponto de vista da EDP.
Creio saber que estará nas intenções do Governo, no que diz respeito às suas linhas orientadoras para o sector dos transportes, proceder não só a uma melhor coordenação intermodal, como proceder também a uma análise correcta de todos os aspectos relativos a sistemas alternativos, quando o funcionamento de qualquer linha ferroviária possa, eventualmente, vir a ser questionado.
Por outro lado, gostaria também que o Sr. Ministro dissesse algo sobre o Plano Nacional de Transportes em curso, nomeadamente se a posição do Governo é, dado o quadro de referência que consta desse plano, utilizá-lo para as linhas de orientação de política.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Pires.

O Sr. Amadeu mires (PS): - Sr. Ministro, ouvi com atenção a sua exposição e verifiquei que tanto V. Ex.ª como o seu Ministério manifestam grande sensibilidade no que diz respeito à preocupante questão das assimetrias regionais que existem no nosso país.
Tinha algumas questões muito concretas para formular a V. Ex.ª nesse sentido, algumas das quais já forma aqui focadas por outros Srs. Deputados, mas de qualquer forma não deixarei de aqui também as colocar.
A primeira questão que gostaria de apresentar, diz respeito a saber qual é a orientação geral e o contributo que o seu Ministério irão dar para a redução progressiva dessas acentuadas assimetrias regionais, dado que o sector de que V. Exa é responsável, pode, nesse sentido, ter uma influência e uma intervenção muito grande.
Em particular, essas questões referem-se à chamada via rápida Bragança-Porto. Em relação a ela gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se, no âmbito das ajudas de pré-adesão à CEE, está prevista qualquer verba para aplicar na construção dos troços previstos no âmbito do itinerário principal n. º 4. Caso seja possível, ao nível do Ministério, começar a planear as grandes obras de infra-estruturas, quando pensa o Sr. Ministro que se poderia ter o itinerário principal Bragança-Porto terminado, para que acabem os martírios que o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado bem conhecem das deslocações Porto-Bragança e, também, das ligações Coimbra-Bragança.
Um outro problema bem a ver com o apoio tecnológico à indústria de construção, pois sabe-se que existe em discussão, no âmbito do Governo, um plano tecnológico de apoio à indústria.
A minha pergunta erra no sentido de tentar saber se o LNEC - organismo que pode apoiar um sector importante da construção e dos seus materiais, com reflexos evidentes na redução dos custes de construção e na melhoria da sua qualidade -está em condições de poder vir a beneficiar também dos financiamentos previstos nesse plano tecnológico para a indústria. Se assim for, quais são os programas que pensa lançar para apoio ao desenvolvimento da indústria e dos materiais de construção?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento Social, para responder, se assim o desejar.

O Sr. `Ministro do Equipamento Social: O Sr. Deputado Pinheiro Henriques fez algumas perguntas no âmbito dos transportes. Quanto aos aspectos ilegais, queria dizer que está pronta a legislação que vai pôr em ordem a situação e permitir uma coordena-

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ção no campo dos transportes; a mesma já está entregue no Ministério do Comércio e Turismo e logo que tenha a apreciação será enviada a Conselho de Ministros para discussão e aprovação.

Incluiu-se no Plano Nacional de Transportes a recuperação de algumas empresas e esperamos que esses resultados venham a ser atingidos, na medida em que no sector das empresas foi feito um estudo global de viabilização para todas elas. Neste momento, está a dar-se prioridade à CP e à TAP, dado serem empresas em situação de ruptura.

Quanto ao encerramento de algumas linhas e estações, não vou dizer que o problema não possa a vir a ser considerado. Contudo, isso exige um debate permanente, a ser feito pelas autarquias e, inclusivamente, com os Srs. Deputados nas respectivas comissões. Logo que tenhamos o plano pronto a ser discutido - que pensamos vir a acontecer brevemente - solicitaremos um debate às comissões parlamentares da especialidade.

Algumas Câmaras já contactadas estão a apresentar-nos projectos alternativos de transportes para servir as suas áreas e o Governo, encontra-se, naturalmente, aberta à discussão com as autarquias e à procura conjunta dessas mesmas alternativas.
O Sr. Deputado Pinheiro Henriques fez perguntas sobre o problema das indemnizações da Rodoviária Nacional. O Sr. Deputado que já pertenceu à RN e que acompanhou, sem dúvida, o desenvolvimento da empresa, tem com certeza, conhecimento que a RN está a recuperar.
Apraz-nos felicitar essa recuperação, dado que, em termos de empresas de transportes, são todas deficitárias e, portanto, é natural que as indemnizações compensatórias no sector da RN sejam mais reduzidas do que noutras empresas em situação de ruptura financeira e onde é necessário acudir permanentemente, inclusive para pagar salários.
Quanto ao redimensionamento da RN, é possível que o problema seja encarado dentro de alterações de macro-estrutura, no âmbito da viabilização que pretendemos para a própria empresa.
Foi-me feita uma pergunta sobre a TAP, no que concerne ao aeroporto de Faro. Quanto ao aeroporto de Faro, cujos projectos foram discutidos com as comissões respectivas e com a participação, entre outros, do Ministério do Ambiente, julgo que foram considerados os aspectos que referiu.
Foram aqui muito falados os itinerários principais. Como nós sabemos, neste Plano demos prioridade ao interior, porque vencer as barreiras que hoje existem, entre a orla do litoral mais desenvolvida e o interior, só é possível com acessos cada vez mais rápidos e mais disponíveis.
Penso que alguns dos Srs. Deputados da bancada do Partido Comunista não compreenderam que estas grandes vias anunciadas são vias muito dispendiosas. A IP-4 ronda os 15 milhões de contos, a IP-5 pouco menos é, sendo a primeira constituída par 15 troços, cada um deles na ordem de 1 milhão e meio a 2 milhões de contos. É, pois, admissível que dentro do plano que apresentamos, estes empreendimentos sejam feitos ao longo de vários anos. No entanto, podem ficar desde já com a certeza, que alguns troços vão começar. Um pequeno troço da IP-4 está já em curso - não é, portanto, uma utopia -, um outro de Lampaços/Roças está também para ser brevemente adjudicado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Agradeço a interrupção, mas queria pedir o favor ao Sr. Ministro de usar uma linguagem inteligível para a maioria dos deputados. Quando o Sr. Ministro fala em IP-5 eu, pelo menos, fico na mesma e penso que acontece o mesmo a muitos deputadas, dado que não somos do métier.

O Orador: - Faço a tradução. Os grandes itinerários principais deslocam-se quer na perpendicular do País, quer na horizontal e, neste caso, estávamos a falar nos que atravessam horizontalmente o País. A IP-4 parte da ligação Porto/Bragança até Valladolid indo ter à via internacional que vai ligar ao centro europeu. Isto foi acordado em negociações com o meu colega da vizinha Espanha, que terá de avançar com a mesma ou com a maior velocidade na construção do troço por parte da Espanha.
Desta forma o troço Lampaços/Roças vai realmente avançar e estamos, neste momento, em negociações quanto ao financiamento do troço principal que é o do Marão isto é, Amarante/Campeã, que é realmente o troço mais difícil de todos, já que vencendo o Marão entramos no plaleau.
Tudo isto está dependente do financiamento e de negociações, mas estamos no meio dessas negociações. Ainda há pouco estive numa reunião com o Banco respectivo e o que posso dizer é que a nossa abertura consiste em andar para a frente e não em andar para trás.
Quanto à IP-5, Aveiro/Vilar Formoso, pretende-se também ligar à componente espanhola e dirigir-se, igualmente, para a grande via até Madrid, fazendo a ligação com o centro europeu. Já estão adjudicados dois troços principais dessa via, ou seja, Viseu-Celorico e Guarda-Vilar Formoso. Estamos na fase das expropriações de um troço muito difícil, Albergaria/Viseu, e estamos interessados, em 1984, em avançar com alguma parte desse troço, dada a impossibilidade de avançar com todo, já que rondará os 2 milhões e meio de contos.
C importante dar conhecimento de que existe o financiamento para o Algarve. Nas negociações com o Banco Europeu de Investimentos, realizadas há 2 dias, foi garantido o financiamento e até um aumento da participação financeira bancárias estrangeira.
Com esse aumento, consideramos que, dentro do estudo do PIDDAC que estamos a realizar, poderemos ter a possibilidade, ainda em 1984, de lançar esta 2 ª fase que falta do Algarve.
Se conforme é do compromisso já estabelecido na Cimeira Luso-Espanhola, Portugal lançar em 1985 a ponte sobre o Guadiana e a Espanha a ponte sobre o Minho, teremos a grande auto-estrada envolvendo a Península e que conduz também ao centro da Europa.
Não há dúvida nenhuma que estamos a reduzir assim o custo da interioridade, e só podemos vencer essas assimetrias avançando rapidamente com a facilidade de ligação entre a orla marítima e o interior.
Quanto aos grandes empreendimentos que temos em curso, quase todos ligados ao sector hidroagrícola,

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quer do Algarve, da Cova da Beira ou da zona de Macedo, baseiam-se no mesmo principio. São empreendimentos de grande vulto, com as obras já em curso, e pretendemos que em 1984, não só essas obras não parem, como avancem mais uma fase do empreendimento.
Isto passa-se no Algarve com o empreendimento do Beliche que está em curso. Se o empreiteiro não efectua os pagamentos, como foi aqui perguntado, o Estado nada tem a ver com .isso, porque tem pago sempre ao empreiteiro. O que pretendemos é lançar agora a adutora do Beliche, que é uma nova obra a lançar em 1984, que está prevista no nosso empreendimento e que ronda umas centenas de milhares de contos.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Em 1984?

O Orador: - Em 1984, Sr.ª Deputada.
Foram-me feitas perguntas quanto à listagem do PIDDAC e quanto ao sector da habitação. Quero referir que houve realmente que dar prioridade ao sector da habitação. O que eu não compreendo é que da bancada do Partido Comunista existam estas dúvidas, quando sabe perfeitamente que o Partido Socialista tem sido líder na condução do processo da habitação social e sabe que o Governo está pela primeira vez, interessado em retomar a paragem que se deu nestes últimos 2 anos neste campo. Eu disse isso mesmo na minha intervenção, isto é, que não houve habitação social nestes últimos 2 anos e que as cooperativas e as autarquias não tiveram financiamentos. Sr. Deputado Silva Graça, dá-se agora a possibilidade de serem lançados 12 000 fogos durante 1984, o que significa um esforço muito grande, nomeadamente num período em que se atravessa uma crise económica.
Foi-me perguntado por uma Sr.ª Deputada se defendemos a municipalização do solo. Sempre foi um principio e está contido no nosso Programa, já que para baixar o custo do terreno habitacional os municípios devem aumentar a sua bolsa de solos. Posso acrescentar que já foi aprovado um diploma que vai criar um plafond de 2 milhões de contos, que permitirá às autarquias a aquisição de solos para os poderem infra-estruturar e, ao mesmo tempo, fazer baixar o custo do solo. Só nos resta esperar que isto faça baixar a especulação e que não sejam as próprias autarquias a promover essa mesma especulação, como às vezes acontece.
Foi também perguntado o que se passa com a nova ponte sobre o rio Douro. Foi necessário, depois de analisado no Conselho Superior das Obras Públicas e em Conselho de Ministros, retomar o processo. Foram determinadas as orientações para o relançamento do concurso e, neste momento e como estava previsto, estão a ser ouvidos os empreiteiros, o liming já está elaborado com vista a que em 15 de Maio estejam agre, ciadas as propostas dos concorrentes, que poderão apresentar alternativas àquele projecto ou mesmo um novo projecto.
Falou-se também se a Junta Autónoma das Estradas tem verbas para acudir com urgência à situação de catástrofe que se abateu sobre a grande área metropolitana de Lisboa. Quem acompanhou o desenrolar das intervenções que foi necessário fazer nestes dias, sentiu que a JAE estava presente em todos os itinerários e concelhos e que vieram mesmo brigadas de Beja e Leiria e foram reforçadas as zonas de Santarém.

A JAE elaborou uma muito correcta estimativa global de custos, que ronda os 450 000 contos, para intervenção imediata e essa verba foi já hoje apresentada a Conselho de Ministros.
Quero também referir que o sector dos edifícios públicos foi também muito atingido, já que muitos imóveis públicos necessitam de uma urgente intervenção, assim como muitos palácios que constituem património importante a ser defendido. O encargo com tudo isto aproxima-se dos 112 000 contos.
No que respeita ao problema habitacional, nomeámos em cada concelho as pessoas conhecedoras dos problemas, para in loco fazerem um levantamento correcto e verem quais as possibilidades de se acudir imediatamente às necessidades.
Quanto ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil, eu mesmo levantei o problema ao considerar insuficiente a verba de 135 000 contos, mas ficou entendido com o Sr. Ministro das Finanças e do Plano que logo no primeiro Orçamento suplementar seria dada a cobertura indispensável para que não houvesse obstáculos no sector de investigação e no de apoio internacional que o LNEC presta.
Posso dizer, ainda, que existe uma comissão que está debruçada sobre os estudos dos recursos hídricos.
Sobre as obras do vale do Mondego, quero afirmar que se encontram entre as grandes obras que não estão paradas, que têm tido continuidade e que vão ter em 1984. Quero lembrar ao Sr. Deputado João Abrantes que não é obra para se fazer num só ano, nem em 2 ou 3, são sim obras que estão em curso.
No que concerne os quartéis de bombeiros e outros equipamentos, se o Ministério do Equipamento Social pode intervir nalguma melhoria das condições de vida do interior, é sem dúvida, no equipamento social. Como sabem, os quartéis de bombeiros têm merecido uma atenção muito especial e em 1984 continuam a ser feitos todos os que estavam em curso e vão ser lançados mais.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Muito obrigado, Sr. Ministro, por me ter concedido a interrupção.
Sr. Ministro, havendo mais de 100 pedidos de construção de novos quartéis de bombeiros, qual é a verba e quais são aqueles que poderão ir avante?

O Orador: - Sr. Deputado, tenho muito gosto de, em particular, no meu Ministério, lhe mostrar o respectivo dossier, a fim de que possa analisar os que já estão previstos, mas não me peça agora de memória que lhe responda quantos são e quantos vão ser construídos.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, creio que lhe respondi já à pergunta relativa à ponte sobre o Lima e lhe disse que o estudo prévio está aprovado. Mas tenho que lhe dizer, também, que o projecto levará, ainda, todo o próximo ano para ser concluído.
O Sr. Deputado Hasse Ferreira, questionou sobre o regime de arrendamentos urbanos. Posso dizer-lhe que temos um primeiro estudo já entregue, que vai ser brevemente debatido e constitui um assunto, como

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sabe, que merecerá um debate a nível de associações e autarquias.
Como me estão a pedir brevidade vou terminar, pois creio que respondi de um modo geral aos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para um protesto.
O Sr. Ministro do Equipamento Social ia responder-me quando foi interrompido por falta de tempo. Como tenho ainda tempo e não é rábula nenhuma, peço pois ao Sr. Presidente para debitar ao tempo da UEDS o tempo que o Sr. Ministro levar a completar a resposta que me deu, dado que quando fiz a pergunta estava interessado em conhecer a resposta. Sr. Ministro ficámos no estudo prévio da ponte sobre o Lima e gostaria de saber se vai ser contratado o projecto e quando é que estará pronto, e quando se poderá prever o início da obra.
Como é que o Sr. Ministro compatibiliza o arranque da ponte sobre o rio Minho e da ponte sobre o rio Douro para a via rápida, mantendo o estrangulamento na ponte sobre o rio Lima, se estas obras não forem lançadas com um mínimo de coordenação e simultaneidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, em primeiro lugar, o Sr. Ministro ainda dispõe de tempo e não é necessário a sua amável e gentil oferta. De qualquer forma, muito obrigado Sr. Deputado, mas acontece que não cabe à Mesa fazer um cômputo dos deve e haver, mas simplesmente registar os tempos e de facto a Mesa tem sido, como é seu dever, o mais generosa possível.
Sr. Ministro, há outros Srs. Deputados que desejam ainda interpelar V. Exª Quer V. Exª responder já ou espera para ver como se desenvolve o debate?

O Sr. Ministro do Equipamento Social: - Aguardo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Ministro.
O Sr. Deputado Hernâni Moutinho deseja usar da palavra para que efeito?

O Sr. Hernâni Moutinho (CDS): - Para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um protesto o Sr. Deputado Hernâni Moutinho.

O Sr. Hernâni Moutinho (CDS): - Queria dizer ao Sr. Ministro do Equipamento Social, muito rapidamente, que lhe fiz uma pergunta concreta sobre a linha do Tua e V. Ex.ª não sei se voluntariamente ou por esquecimento, não respondeu.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, não havendo mais ninguém inscrito para interpelar V. Ex.ª poderá o Sr. Ministro responder se o desejar.

O Sr. Ministro do Equipamento Social: - Agradeço, em primeiro lugar, a disponibilidade de tempo que o Sr. Deputado Lopes Cardoso me concede e darei de seguida mais alguns esclarecimentos.

O estudo da ponte sobre o rio Lima está em marcha, o estudo prévio está realmente aprovado, mas como referiu o Sr. Deputado ela insere-se no melhoramento de toda a via que passa por Vila do Conde, Póvoa, etc. O que está previsto e em andamento, neste momento, é o desvio Vila do Conde/Póvoa, que pensamos que estará concluído em 1984. Cremos, pois, que a data de lançamento da obra da parte sobre o rio Lima será em 1985.
O Sr. Deputado Hernâni Moutinho pergunta-me o que se passa com a linha do Tua. Como sabe esta linha está incluída dentro do plano de viabilização da CP. O estudo tem uma primeira fase já elaborada, vai seguidamente entrar numa discussão em que as autarquias vão ser ouvidas e o Sr. Deputado, no caso de estar interessado, poderá participar nesse debate e daí sairá, sem dúvida, um consenso que ajudará a melhorar e a viabilizar a própria CP, sem prejudicar as populações do interior que são as mais atingidas.
Quanto ao diploma das rendas, ele terá de vir a esta Assembleia logo após a sua discussão pelo Governo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares pede a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Para fazer uma breve pergunta à Assembleia.
Seguiria, normalmente, a intervenção do Sr. Deputado Luís Saias, como seria normal no princípio da alternância. Acontece que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa tem compromissos assumidos e ou intervém agora ou não poderá intervir nem hoje nem amanhã, porque estará fora de Lisboa. O Governo não queria que isto acontecesse, em todo o caso, sem o consentimento da Assembleia. Se a Assembleia estiver de acordo, pois manteremos o nosso convénio com o Sr. Deputado Luís Saias; se a Assembleia estiver em desacordo manter-se-á, necessariamente a ordem das inscrições.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, creio que esse assunto estava já resolvido. De qualquer forma, vou pô-la a todos os partidos.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, como é natural, teremos o maior prazer em ouvir o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional.
Contudo, de acordo com o critério que vem sendo adoptado neste debate, nomeadamente em relação à matéria da agricultura, consideramos que esta é a altura oportuna para os diversos grupos parlamentares fazerem as intervenções que tinham planeado sobre a área à qual se referiu o Sr. Ministro do Equipamento Social.
Pelo nosso lado, temos projectada uma intervenção sobre esta matéria, que gostaríamos que tivesse lugar antes de o Sr. Vice-Primeiro-Ministro usar da palavra, para que haja um mínimo de organização no debate. Temos feito todo o esforço para que assim seja e para que as diferentes matérias sejam abordadas, neste debate na generalidade, com um mínimo de sectoriza-

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ção, que possa dar ao País a imagem adequada do que pensa o Governo e os partidos, nomeadamente os da oposição, sobre esses sectores.
No caso concreto entendemos que o Sr. Deputado Vice-Primeiro-Ministro deve fazer a sua intervenção, mas apenas após ser esgotado o debate da matéria agora em discussão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos tentar conciliar os pontos de vista expressos pelo Sr. Deputado João Amamal e pelo Sr. Ministro Almeida Santos, uma vez que o Sr. Deputado Luís Saias já tinha dado o seu acordo à troca com o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
Estão inscritos neste momento os seguintes oradores: Srs. Deputados Luís Saias, Anacoreta Correia e Anselmo Aníbal, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, os Srs. Deputados Carlos Espadinha e Antunes da Silva, o Sr. Ministro da Indústria e Energia, os Srs. Deputados Alberto Avelino, Magalhães Mota e António Taborda, o Sr. Ministro do Mar e o Sr. Deputado Silva Graça.
Assim, a Mesa gostaria de saber qual o tema que estes oradores irão abordar, razão pela qual concedo a palavra ao Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. (Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, o tema que vou abordar não é relacionado com a intervenção do Sr. Ministro Rosado Correia.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Anacoreta Correia irá abordar o mesmo tema ou um tema diverso?

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - É o mesmo tema, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Anselmo Aníbal ...?

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - É o mesmo tema, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Espadinha ...?

Vozes do PCP: - É outro tema, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Antunes da Silva ...?

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, a minha intervenção é sobre a administração interna e poder local.

O Sr. Presidente- - O Sr. Deputado Alberto Avelino ...?

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, a minha intervenção é sobre o Plano e o Orçamento do Estado.

Devido a deficiências técnicas, a resposta do Sr. Deputado Alberto Avelino, não foi escutada pela Câmara.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira ter a bondade de utilizar outro microfone.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Concretamente, Sr. Presidente, a minha intervenção abordará problemas relacionados com as autarquias.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sua insistência venceu os defeitos da técnica.

Risos.

O Sr. Deputado Magalhães Mota ...?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não é sobre o tema em discussão que irei fazer a minha intervenção Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Taborda ...?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - É um tema diverso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Graça ...?

O Sr. Silva Graça (PCP): - Abordarei um tema diverso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sobre o tema concreto em discussão, relativo ao Ministério do Equipamento Social, irão produzir intervenções os Srs. Deputados Anacoreta Correia e Anselmo Aníbal.
Estamos quase na hora regimental do intervalo. Assim, sugeria à Mesa que, atendendo ao interesse que todos temos em ouvir o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e ao interesse metodológico das intervenções - problema sublinhado pelo Sr. Deputado João Amaral adiássemos um pouco o intervalo regimental até que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro fizesse a sua intervenção.
Assim, pergunto ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro se poderá usar da palavra após as intervenções dos Srs. Deputados Anacoreta Correia e Anselmo Aníbal.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro de Defesa Nacional (Mota Pinto): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Presidente, nós cedemos a nossa vez ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, mas iríamos complicar e não simplificar o problema, uma vez que o Sr. Deputado Anselmo AntõaI não está de acordo em ceder a sua vez.

Vozes: - E o intervalo?

O Sr. lEneesidente: - O intervalo, como é óbvio e dadas as circunstâncias, ficará adiado para data mais oportuna.

Risos.

Tem a palavra, o Sr. Deputado Anacoreta Correia.

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O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dadas as circunstâncias de tempo, lerei apenas um extracto da minha intervenção, pedindo licença para depois entregar na Mesa a intervenção na totalidade, para constar do Diário.
Das ideias expostas nas grandes opções do Plano e do discurso do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, verifica-se que se prevê para 1984 que o consumo privado desça 1 5 %, que a redução da formação bruta de capital fixo desça 9 % e que o consumo público mantenha o seu nível.
Por nós, estamos de acordo em que é condição sine qua non para a melhoria da economia portuguesa fixarem-se os objectivos: redução do défice da balança de transacções correntes, redução do défice orçamental e proceder às alterações estruturais da nossa economia.
Simplesmente, pensamos que quando se escolhe deliberadamente - e o Sr. Ministro afirmou que entre as várias alternativas estas eram as opções do Governo que é o consumo privado que vai reduzir, o consumo público que vai estagnar e que a formação bruta de capital fixo (FBCF) vai ser reduzida drasticamente, nós estamos em completo desacordo com esta escolha de prioridades, pois que qualquer que seja o ponto de vista sobre que estas opções sejam observadas, mesmo ideológico, elas significarão, obviamente:
Um aumento relativo das despesas públicas no total da despesa interna;
Um maior atraso da economia portuguesa, na medida em que a formação bruta de capital fixo diminui.

Ficamos com algumas dúvidas se se quer realmente proceder a alterações estruturais ou se este Orçamento não vai, pelo contrário, permitir a rápida consolidação de um modelo económico, cujos resultados estão à vista ...
O sector do equipamento social sofre, entre todos, o maiccorte orçamental - quase 35 % em termos reais -, sendo de prever uma visão catastrófica para o sector em 1984.
Relativamente ao sector da construção civil - que quase não é dependente do exterior - sabe-se que representa directamente 7 % do PIB, 55 % da FBCF e 10 % do emprego e, considerados os seus efeitos intersectoriais, atingem-se os 25 % do PIB e 30 % da população activa.
Foi este sector um dos escolhidos para sofrerem a redução orçamental - sem se terem provavelmente medido as consequências ao nível das falências e do desemprego. Neste sector, pelo menos, o cenário que adivinhamos joga deficientemente com o pretendido objectivo de terminar com o ciclo das paragens e arranques (STOP AND GO). Referimos o que já dissemos aqui nesta Tribuna, ainda não há meses: corremos o risco de ter as contas equilibradas a médio prazo, num país inerte e talvez perdido economicamente.
Ficamos mesmo na dúvida se vão ser lançadas algumas novas obras em 1984.
No domínio das estradas, no domínio das obras hidráulicas e no domínio dos portos, hospitais, escolas, etc., podemos afirmar que os montantes inscritos nos parecem insuficientes sequer para a conclusão das obras em curso, e isto não tendo em consideração as dívidas do Estado para com outros agentes económicos.
No domínio dos transportes, perguntamos: existe realmente a vontade e a coragem de serem a CP, a TAP e a Marinha Mercante agora no Ministério do Mar - estes os dois pontos nodais de actuação do Governo no sector? De que forma vai o Governo actuar?
E uma palavra sobre a habitação:
Vemos com muita preocupação que o Governo prevê para a habitação e urbanismo 30 milhões de contos contra os 46 milhões de 1983, ou seja, cerca de metade da despesa do ano anterior em termos reais.
Não é assim com certeza que se ajuda a ultrapassar a carência de 700 000 fogos existentes no País!
Este é o resultado da utopia se ter pretendido que fosse apenas o Estado a solucionar este problema. Os erros pagam-se com o tempo.
Afirmamos que, neste quadro de desarticulação, mesmo a conjunção dos 4 vectores de actuação existentes neste domínio (Estado, autarquias, cooperativas e sector privado - habitação própria e aluguer), serão incapazes sequer de suster o agravamento da situação.
Podemos até compreender que o Governo reconheça que esta não é uma das suas prioridades - embora a população portuguesa pense que deveria ser -, mas já não compreendemos que mantenha espartilhado um dos vectores de actuação que no passado chegou a responder por quase 50 % da oferta habitacional e que hoje está praticamente desaparecido.
Referimo-nos à necessidade da revisão da actual legislação da Lei do Arrendamento Habitacional.
Isto é, na habitação, como noutros sectores, o Estado não faz, nem deixa fazer!
Queremos dizer claramente, para evitar interpretações distorcidas, que o mercado de arrendamento não é para o CDS senão uma parte da solução do problema, fundamental, mas não a decisiva.
A política de habitação que o meu partido propõe, inclui várias soluções e vários vectores de actuação todos dirigidos a objectivos comuns.
Permito-me recordar as suas bases:
1) Implementação e regulamentação do sistema de crédito poupança-habitação;
2) Revisão de legislação sobre rendas para fins habitacionais;

Criação de novos mecanismos de captação de poupanças;

4) Produção de solos urbanizados;
5) Reformulação do quadro fiscal do sector;
6) Actualização da regulamentação técnica;
7) Introdução de novas disposições legislativas;
8) Disponibilização de recursos assegurando um ritmo de crescimento da componente do crédito destinado à habitação;
9) Estabelecimento de programas no domínio habitacional envolvendo de forma empenhada as autarquias locais, o sector cooperativo;
10) Reconhecimento inequívoco da importância económica e social da indústria de construção civil e dos efeitos multiplicadores.

Esta análise e crítica às grandes opções do Plano e ao Orçamento do Estado ficaria incompleta se não fizermos uma referência às empresas públicas.

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Dadas as suas dívidas, o seu défice e os seus encargos financeiros, o sector empresarial do Estado constitui índubitavelmente um factor de empobrecimento do País.

Importa, portanto, denunciar esta situação, reafirmando inequivocamente que o CDS recusa, em princípio, que a actividade empresarial seja desenvolvida pelo Estado nos moldes actuais, de forma contrária ao funcionamento do mercado e da livre iniciativa, admitindo casos específicos em função de objectivos claramente explicítados de acordo com a orientação política, económico-social, ou seja, empresas de prestação de serviços públicos essenciais ou de componente estratégica.

Relativamente às empresas de transportes, há algumas que estão claramente situadas no âmbito das que prestam serviços públicos essenciais, como é corrente ser admitido em todos os países da Europa - mesmo nos mais liberais - e não seria justo deixar de referir a diminuição progressiva do esforço do Estado a seu respeito, designadamente nos últimos 4 anos.

Desejo ainda chamar a atenção de que, para o sector dos transportes, será inconveniente, como a carta de intenções do FMI deixa prever, proceder a novos aumentos tarifários.

Os recentes aumentos, muito gravosos para a população, de 30 %, apenas fizeram subir em 5 pontos (59 para 64) a cobertura dos custos pelas receitas. Estamos já próximos da zona da procura rígida, havendo casos de diminuição de receitas com aumentos tarífários. Portanto, a solução estará na contenção de custos e aumentos de produtividade, o que implica reformas estruturais nessas empresas, que duvidamos que o Governo tenha a coragem de fazer.

Antes de terminar, gostaria de reafirmar:

As opções do Governo para 1984, ou seja, os seus objectivos dominante, instrumental e de evitar o stop and go parecem-nos correctos, mas a forma como se pretende atingi-las não, pois que:

1 º Há um reforço do papel do Estado na vida económica do País. É curioso que membros do Governo elogiem a política económica da Sr.ª Thatcher, por um lado, mas, por outro, parecem não compreender que os défices orçamentais se combatem precisamente diminuindo a despesa - ou, sobretudo, a forma como ela se faz - e a intervenção do Estado na vida económica;
2 º Corremos sérios riscos de ter o aparelho produtivo seriamente danificado.
3 º O Governo não conseguiu o pacto social, vencido pelas suas contradições. Como tal, procura comprar a tranquilidade social aparente de grupos de interesses restritos â custa dos contribuintes, mas especialmente dos agricultores, dos pensionistas, e das pessoas com rendimentos fixos.

A minha última palavra será de novo sobre a redução do FBCF. Afirma-se nas últimas páginas das GOP que a sua redução não resulta numa situação anómala, uma vez que a nossa taxa de investimentos tem sido uma das elevadas da Europa.

Srs. Membros do Governo: Sejamos realistas!

Enquanto nos países desenvolvidos da Europa mais de 90 % das infra-estruturas físicas do ano 2000 estão já construídas, em Portugal, temos dúvidas que tenhamos, sequer, 50 %.
1-Há, pois, necessidade de recuperar o atraso.
Enquanto no início dos anos 70 se discutia nesses países a «opção zero» de crescimento, o nosso país está em condições estruturais próximas do subdesenvolvimento.

Não podemos esquecer, por exemplo, os movimentos migratórios internos, a pressão que é exercida junto dos sectores secundário e terciário pelos oriundos do sector primário, designadamente da agricultura.
Esta situação é particularmente gravosa nas áreas metropolitanas. Só à Grande Lisboa afluem anualmente mais de 60 000 pessoas, sem as infra-estruturas e um plano de conjunto que estejam pensados. Os resultados tivemo-los tragicamente, à vista, nos últimos dias.
Falar em adiar certos investimentos - repetimo-lo é continuar a optar pela distorção, e subdesenvolvimento pela inverdade e pela discriminação entre os portugueses.

É remediar os efeitos sem curar as causas.
É, finalmente, continuar a deixar carregar no horizonte nuvens ameaçadoras de tensões sociais e políticas muito graves.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Anibal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ouvimos o Sr. Ministro do Equipamento Social, ouvimos as suas respostas aos esclarecimentos que lhe foram solicitados e em alguns casos não houve resposta8.
Em primeiro lugar, nas áreas da habitação e urbanismo, das obras públicas e transportes, as grandes opções, que se quantificam nas propostas de leis n.ºs 46 e 47/111, são grandes opções de penúria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Penúria, em primeiro lugar, nas próprias dotações globais - já aqui foi referido -, visto que o actual Ministério trabalhará com 39,5 milhões de contos, quando, em 1983, trabalhou com 46,4 milhões de contos, isto é, trabalhará com menos 7 milhões de contos em valores nominais e com menos 30 % em valores reais.
Penúria, em segundo lugar, em todo o conjunto relativo, às obras públicas. Gerir-seão as obras públicas, num valor calculado em 29,4 milhões de contos, em mera manutenção de subsistência, como, aliás, foi dito pelo Sr. Secretário de Estado perante a 9 º Comissão.
As várias direcções-gerais, a junta Autónoma de Estradas, o LNEC, a Comissão para as Novas Instalações das Forças Armadas, solicitaram verbas muito superiores - na ordem dos 40 % a 50 % -,frisou-se que era necessário cerca de 40 % a mais em relação às que foram dotadas para os diversos organismos.
Os cortes existentes, feitos na orientação da manutenção dos valores nominais, terão exemplos que devem ser dados, exemplos verdadeiramente «exempla-

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res». Não serão lançados, segundo os dados que se recolheram e devido à indeterminação e à falta de rigor do PIDDAC, obras tão diversas como o novo edifício do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, o empreendimento do bloco hospitalar do Instituto de Oncologia do Norte, os novos empreendimentos no domínio das construções escolares, a não ser 10 unidades que beneficiam das ajudas comunitárias da CEE; serão suspensos, segundo os dados que se possuem, obras tão diversas como as obras no Hospital Distrital de Guimarães, as aquisições de terrenos e projectos de ampliações na rede auxiliar de Famalicão, Mirandela e Feira, obras em recursos e aproveitamentos hidráulicos, como há pouco foi salientado pela minha camarada Margarida Tengarrinha.
Também, apesar do que aqui se disse, apesar das suas parciais explicações e apesar dos « 15 troços», há dúvidas globais em relação à exequibilidade, a partir de 1984, do itinerário principal-4 e dos troços da estrada nacional Setúbal-Faro, para não falar da cintura interna do Grande Porto, facto que o Sr. Ministro, como ex-vereador da Câmara Municipal do Porto, deve conhecer.
Esta penúria que vale o que vale na própria dificuldade de os sectores de actividade minimamente empenhados aceitarem e assumirem os cortes brutais, não se pode dizer que se aceitam e se assumem os cortes brutais referindo «boas intenções para os ultrapassar».

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Tudo isto está inserido numa política de gravame económico para o País, de receituário «fmiesco» ...

O Sr. Jorge lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... de uma produção nacional que se diminui, de uma formação bruta de capital fixo que se diminui em valores que rondam os 10 %.
A penúria chega, em terceiro lugar, à construção de habitação e consequentemente a todo um importante mundo de empresas da construção civil de volume de emprego extremamente significativo. Essa construção de habitação, por iri,ciativa central, está gravemente desmuniciada: há uma diminuição brutal de verbas e, na prática, fixam-se meras limitações administrativës e pseudolegislativas à Secretaria de Estado - aliás, significativamente a nosso ver, o próprio Secretário de Estado não veio à 9 º Comissão dar esclarecimentos. A oferta pública estará, em termos de PIDDAC, limitada às verbas a gerir pelo Ministério das Finanças e do Plano através do Fundo de Apoio ao Investimento para a Habitação: são 4 milhões e meio de contos que, perante os problemas habitacionais, sobre ser ridícula, inviabiliza qualquer intenção que se anuncie para promoção de habitações de custos moderados e para a promoção, que calculou em mais de um dezena de milhares de fogos - só agora o fez -, de habitação social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É, aliás, notória na definição desta política de penúria na área da habitação, a prevalência do Ministér4o das Finanças e do Plano, onde aparece inscrita a verba do Fundo de Apoio ao Investimento para a Habitação. Esta prevalência sublinha, certamente, a intenção de tais verbas serem verbas ligadas a compromissos decorrentes de créditos havidos e, tudo dito, releva da política global de contracção da produção a natural falência de empresas de construção civil e do consequente desemprego num sector importantíssimo e vital.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A política de habitação a nível municipal é, também, uma política de penúria e o Sr. Ministro, bem pude dizer que a administração local é uma potencial produtora de fogos habitacionais, que é uma produtora decisiva de solo urbanizado, mas quando se condena, de acordo com o receituário do FMI, a administração local a uma gestão de penúria, a um desmuniciamento dos recursos técnicos e materiais, é natural que as intenções não tenham nada á ver com a realidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Um município de Lisboa que, por exemplo, tem para produção de habitações 2 milhões, é desmuniciado e esbulhado em outros tantos milhões, não podendo fazer o lançamento atempado das adjudicações necessárias, reflectindo-se tudo isto também na gravíssima situação embora agora chorem lágrimas de crocodilo - provocadas pelas intempéries e calamidades nas grandes áreas urbanas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Penúria, em quarto lugar na área dos transportes. São áreas apresentadas ensaiando um maior rigor de gestão, mas envolvidas, de imediato, pela manutenção pura e simples, a nível de gastos administrativos sectoriais e de plano, de 5 milhões de contos, seis milésimos do Orçamento de Estado. Os valores afirmados, na classificação funcional, da ordem dos 27,7 milhões de contos, que se traduz em termos reais, como diminuição de 14,4 % em relação ao orçamento de 83 nesta área, identificam bem, entretanto, um peso muito relativo de um sector tão nevrálgico e decisivo para a qualidade de vida e para o bem-estar dos portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Tudo isto é independente dos orçamentos de penúria para o sector empresarial do Estado, designadamente a nível de subsídios, com os 13 milhões de contos que aparecem identificados numa conta - que não é um valor da proposta de lei n ,O 47/111, mas que foi obtida posteriormente-, sendo destinados 1,8 milhões para as empresas de transportes o que é claramente redutor para um sector tão vital.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, todas essas áreas têm fortíssima correlação com a qualidade de vida de milhões de portugueses e portuguesas. Pouco se poderá esperar com este Orçamento de pe-

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núria, pouco se pode esperar de quem se coloca de joelhos perante a política «fmiesca> mais primária.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O próprio Ministério da Qualidade de Vida que continua a sua feição predominantemente emblemática agora entrego a António Capucho, gere 12 décimas milésimas do Orçamento do Estado ... isso vale o que vale.

Risos do PCP.

Esta gestão e esta opção de penúria não nos serve. Aliás, cada vez mais, as portuguesas e os portugueses, aceitam, cada vez menos, ser compelidos a viver em penúria e em insegurança e lutarão contra esta política reafirmada pelo actual Governo nestas propostas de lei.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. João Amaral (PCP): - Então o Sr. Ministro do Equipamento não responde?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, nesta Casa os Membros do Governo e os Srs. Deputados respondem quando entendem dever fazê-lo.

O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, limitei-me a fazer uma pergunta, ao Sr. Ministro e não à Mesa. Tenho o direito de perguntar ao Sr. Ministro se não responde às perguntas concretas que foram colocadas pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal na área do equipamento social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - E a Mesa esclareceu V. Ex.ª, embora a pergunta tenha sido feita sob a forma de aparte, que os Srs. Deputados desta Casa e os Srs. Ministros respondem quando entendem dever fazê-lo.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministeo e Ministro da Defesa Nacional (Mota Pinto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Defesa Nacional é actividade a desenvolver pelo Estado e pelos cidadãos, com carácter permanente, global e interministerial para garantir - e nós queremos que essa garantia se efective no quadro democrático - os elevados valores da independência nacional, da integridade territorial, da liberdade e da segurança das populações de Portugal.
Um governo responsável tem o dever de satisfazer as necessidades de todos os cidadãos que querem viver em liberdade, em segurança, em paz e ver assegurados os objectivos da independência e da integridade da sua Pátria. É esse seguramente o caso do Governo Português.

Para alcançar tais objectivos, designadamente para contribuir para a manutenção da paz, Portugal prossegue as seguintes acções:

1) Contribuição para a melhoria das relações internacionais, actuando no plano diplomático;
2) Participação num esforço comum para uma actividade dissuasora da guerra, mediante uma política de defesa firme e eficaz.

Em suma, a política de defesa nacional, e política coerente, é elemento indispensável à sobrevivência e à segurança do nosso país.

Q Sr. António Lacerda (PSD): - Muito beml

O Orador: - Para o actual Governo de coligação - e seguramente para todos os patriotas - a defesa nacional alicerça toda a sua construção na noção de pátria. É que a Defesa Nacional Portuguesa será frouxa e será frágil, perderá boa parte do seu sentido se não assentar numa esclarecida e muito vincada ideia de pátria, de Pátria Portuguesa, que incorpore no presente o seu passado glorioso, que incorpore no presente a sua cultura que ao longo dos séculos se foi formando e diferenciando, que incorpore uma maneira de ser ou de estar que a individualiza, que incorpore, no presente as aspirações do povo e um projecto de vida futura, comum e solidário entre os seus membros.

Aplausos do PS e do PSD.

Certamente que a Pátria comporta, no seu seio, a diferença ideológica, a divergência de opinião, e por isso é desejável que a sua defesa, e a solidariedade colectiva que esta traduz, seja definida, em termos tais, que não flutue com a alternância do poder político que o regime democrático permite, isto é, que seja realidade estável e permanente, que não oscile com o conjuntural ou o ocasional.
Assente a vontade e o esforço de defesa no sentimento patriótico e ná consciência do dever geral de para ela contribuir, logo ressalta a importância dos seus vectores não militares, designadamente a formação escolar, a estabilização e o desenvolvimento económico e social, a preservação dos valores culturais, a educação cívica, a comunicação social, a política de emigração, etc, etc.
Dentro deste quadro, porém, é inegável que a instituição militar permanece ainda como a mais específica e significativa componente da Defesa Nacional - e, de todo o modo, é a ela que, após a necessária preparação e afrontamento, cabe a intervenção decisiva, quando as ameaças se convertem em agressão real ou iminente.
Por isso o Governo dedica às forças armadas particular atenção, com a perfeita consciência do seu alto serviço, do seu não quantificável serviço, à comunidade.
Não se estranhará, por isso, que o Orçamento da Defesa Nacional contemple quase exclusivamente os encargos com as forças armadas.
Surgem, por vezes, vozes menos esclarecidas a advogar a redução das forças armadas a uma dimensão exígua, com o argumento dos encargos financeiros que elas representam para o erário público. Tais vozes

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esquecem, todavia, que é dever indeclinável de todo o cidadão português, enquanto tal, contribuir para a defesa do seu próprio país, porque é a nós portugueses que, antes do mais e acima de tudo, cabe a defesa de Portugal. Seria, além de cegueira, insofismável indignidade nacional confiarmos a outros a defesa do que é nosso. Além disso, além da necessidade da existência das forças armadas, é da máxima conveniência que as mesmas sejam dotadas de modo a responderem com eficácia a qualquer agressão e a poderem vigiar atentamente o respeito pela soberania nacional, na terra, no ar e no vasto mar que são nossos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É que o próprio auxílio dos aliados ao nosso país será sempre mais eficaz e mais em tempo, se as nossas próprias forças armadas forem capazes de oporem resistência e susterem o ímpeto inicial de qualquer ataque. Por tudo isto, é para o Governo ponto inquestionável dever o país estar dotado de forças armadas capazes de defenderem a soberania nacional.

Acentue-se, aliás, que ao invés de uma ideia que se pretende propagar, a percentagem dos efectivos militares portugueses no conjunto da população se situa num nível inferior à média de um vasto conjunto de países. Assim, aquela percentagem, no que toca a Portugal, é de 0,63 %, enquanto na Itália é de 0,65 %, no Reino Unido de 0,57 %, na Turquia de 1,21 %, na França de 0,90 %, em Espanha de 0,90 %, na Grécia de 1,86 %, na Dinamarca de 0,59 %, na Noruega de 1,05 %, na República Federal Alemã de 0,80 %, nos Estados Unidos da América de 0,91 %. De sublinhar que em países do Pacto de Varsóvia r percentagem é, por exemplo, na Bulgária de 1,80 %, na Checoslováquia de 1,31 %, na União Soviética de 1,85 %. Todos estes elementos são extraídos da publicação The Milítary Balance, de 1983-1984, editada pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Londres.

Convém também recordar a todos aqueles que são propensos à visão quase exclusivamente económica das sociedades humanas que as forças armadas constituem elemento propulsor da economia nacional, na medida em que fomentam o progresso científico e técnico e na medida em que postulam o desenvolvimento industrial e tecnológico nos sectores mais carecidos, a fim de evitar a excessiva dependência externa. Podem, igualmente, as indústrias e os serviços nacionais directamente ligados à Defesa Nacional, contribuir significativamente, pela via da exportação, para a melhoria da nossa balança de pagamentos.

Convém igualmente sublinhar a vasta gama de serviços que as forças armadas prestam, em tempo de paz. Vão enumerar-se alguns, não a título de justificação mesmo suplementar da sua existência, pois, a sua missão principal, a Defesa Nacional, só de per si as impõe. Enumeram-se, porém, para que tudo fique mais claro e compreensível e permita juízos mais esclarecidos: a abertura de estradas e levantamentos topográficos; o lançamento de pontões; os estudos hidrográficos e cartográficos; o apoio às marinhas mercante e de pesca; as operações de busca e salvamento de náufragos; o transporte aéreo de doentes e acidentados; o auxílio no combate a incêndios; a formação profissional, designadamente de quadros altamente especializados, etc, etc., etc.

Tudo isto sem olvidar, como as intempéries recentes infelizmente no-lo vieram recordar, a sua decisiva, estóica e quantas vezes exemplar participação no esforço de emergência e de apoio á prevenção e atenuação dos efeitos das calamidades.

A propósito desta referência, feita à actuação exemplar e decidida das forças armadas nas graves intempéries que recentemente fomos vítimas, quero deixar a este Parlamento uma informação de que o Conselho de Ministros, que hoje de manhã reuniu, aprovou medidas legislativas que vão no sentido de organizar a coordenação das acções a promover e a executar para a atenuação e recuperação dos danos produzidos pelas inundações.

Aplausos do PS e do PSD.

Decidiu, desde já e num primeiro momento, abrir uma dotação de 2,5 milhões de contos para crédito bonificado à reparação de casas, estabelecimentos industriais e comerciais e explorações agrícolas afectadas.

Aplausos do PS e do PSD.

Decidiu afectar verbas para a reparação das infra-estruturas que têm de ser reparadas a fundo perdido pelo Orçamento do Estado.
Decidiu igualmente continuar contactos, já empreendidos desde o início da tragédia, com instituições internacionais, como por exemplo, o Fonds de Reétablissement do Conselho da Europa, com a Comunidade Económica Europeia, com organismos da Organização das Nações Unidas, bem como outras organizações internacionais, tendo em vista perspectivas sólidas e seguras para obter um montante de verbas que nos permitirão, a fundo perdido ou pela via do financiamento, dar resposta às imensas tarefas que nos aguardam.
Estas acções serão, num primeiro momento, coordenadas no âmbito do MAl pelo Serviço Nacional de Protecção Civil e, nas esferas das competências respectivas, pelos diversos Ministérios.
Voltando ao tema inicial da minha intervenção, dir-vos-ei que certamente que as verbas despendidas com as forças armadas têm de ser proporcionadas à situação económico-financeira do país. Mas uma justa proporção tem de ser mantida. A própria dignidade das forças armadas repugnaria constituírem elas desproporcionado esforço financeiro da nação como também à dignidade da nação repugnaria que as suas forças armadas fossem ineficazes. O Governo garante o justo equilíbrio numa situação de grave crise económica. Esse justo equilíbrio consta do Orçamento apresentado.
O montante global das despesas com a Defesa Nacional é no Orçamento do Estado para 1984 de 68,738 milhões de contos, dos quais cerca de 3,4 milhões de contos têm contrapartida em receita.
Deve reter-se a ideia de que esta verba atribuída às forças armadas, sendo substancialmente inferior ao que corresponderia às necessidades estimadas, se situa, porém, acima do crescimento nominal da média dos departamentos. Obviamente, no quadro de um Orçamento de rigor, este acréscimo nominal superior à média é, ainda assim, bastante baixo (-1-13,4 % do que em 1983), o que significa, evidentemente, uma clara redução em termos reais.

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O Governo ponderou e decidiu com equilíbrio, no estreito espaço de manobra que a conjuntura obriga, valorizando a importante prioridade que merece a Defesa Nacional, mas tendo a consciência de não estar a poder assegurar dotações correspondentes ao mérito e à capacidade do elemento humano das forças armadas portuguesas.
A percentagem das despesas com a Defesa Nacional no conjunto do Orçamento do Estado cifra-se em 7,07 % da despesa global contra 7,81 % em 1983, 8,38 % em 1982, 9,73 % em 1979, 31,71 % em 1974. Esta percentagem é claramente inferior à grande maioria dos países.
E se tomarmos como ponto de referência o produto interno bruto, as despesas militares calculadas segundo critérios da NATO, correspondem a 3,3 % (segundo um critério nacional que não inclui gastos com a Guarda Fiscal, Guarda Nacional Republicana, pensões de reforma de militares e a pessoal civil reformado das instituições militares, a percentagem cai para 2,45 %). Ora, comparativamente, a relação entre as despesas militares e o produto interno bruto é de 2,6 % na Itália, 5,1 % no Reino Unido, 5,2 % na Turquia, 3,0 % na Noruega, 6,7 % na Grécia, 6,0 % nos Estados Unidos, 5,2 % na Jugoslávia, de 5,9 % na RDA, 11 a 13 % na União Soviética.
Estes dados demonstram eloquentemente a falsidade de algumas ideias fabricadas, com que se procura, por vezes, iludir a opinião pública.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo está, porém, consciente de que os Portugueses, por quererem ter pátria, querem Defesa Nacional e querem umas forças armadas dignificadas e eficientes. Por isso, à medida que a recuperação económica se for verificando, os baixos índices hão-de ser corrigidos com equilíbrio e com decisão.
Estas são as elucidações pertinentes na apresentação à Assembleia da República do Orçamento da Defesa Nacional - apresentação que o Governo faz no quadro da inserção das forças armadas no Estado democrático, decorrente da Lei da Defesa Nacional.
Com a consciência de ter de se mover dentro dos parâmetros de um Orçamento de rigor, o executivo, ponderando todas as circunstâncias, agiu com equilíbrio dentro das possibilidades. Na feitura deste Orçamento, como no dos futuros, o Governo tem sempre presente que a Defesa Nacional e o seu custo são o preço da independência de Portugal, na paz e na liberdade. Para tão altos valores, reconheçamos que é um baixo preço.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreverem-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Carlos Brito, António Gonzalez, César Oliveira, Azevedo Soares, João Amaral e Magalhães Mota.
São 18 horas e 10 minutos, creio interpretar o sentido da Câmara - se cometer algum erro VV. Ex.ªs me dirão - e as necessidades de actuação do Sr. vice-Primeiro-Ministro se der imediatamente a palavra, antes do intervalo, aos interpelantes, permitindo que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro responda de seguida.

Pausa.

Como parece não haver oposição a este princípio continuamos os nossos trabalhos e, por isso, faremos o nosso intervalo regimental mais tarde.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, ouvi com atenção a sua intervenção e notei que não nos quis poupar a alguns valores doutrinários bem conhecidos no seu discurso, levamos isso à conta de um «conceito abrangente» de Defesa Nacional.

Risos.

Reparei, também, que ponteou o seu discurso com alguns elogios às forças armadas. A propósito dir-lhe-ia que bem gostaríamos que esses elogios do Governo às forças armadas se traduzissem numa conduta verdadeiramente estabilizadora e não ao contrário, como muitas vezes tem acontecido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, gostaria de lhe fazer um pedido de esclarecimento. A fl. 29 do relatório que precede a proposta de lei do Orçamento de Estado afirma-se no último parágrafo «por sua vez o capítulo de transferências correntes engloba principalmente receitas consignadas aos departamentos militares, de harmonia com compromissos assumidos na ordem internacional e avaliadas em 3,4 milhões de contos».
Isto aparece com uma forma um tanto misteriosa, tratam-se de compromissos internacionais - o Sr. vice-Primeiro-Ministro tinha sublinhado no seu discurso «a nós portugueses cabe a Defesa Nacional» e nós estamos de acordo com isso - mas o que é que isto significa? São compromissos internacionais com quem? Com a NATO? Com os Estados Unidos da América?

Vozes do PSD: - Com o Pacto de Varsóvia!...

O Orador: - Referem-se à Força Rápida de Intervenção? Tem alguma coisa a ver com os rumores que circulam acerca de uma nova base em Porto Santo? Tem alguma coisa a ver com as Lages, com a base de Beja?
Gostaríamos de esclarecer este ponto, Sr. Ministro, visto que entendemos que as verbas orçamentais e as verbas orçamentais para as forças armadas devem corresponder, efectivamente, a um esforço para a garantia da paz e não para qualquer coisa que nos possa comprometer com operações belicistas que ponham em causa a nossa segurança e a paz do Mundo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Vice-Primeiro-Ministro, gostava de saber qual a opinião do seu Ministério relativamente aos objectores de consciência. Milhares e milhares de jovens, muitos já com estudos universitários completados e com planos de integração na sociedade, assistem à destruição, ao adiamento irremediável ou ao atraso, por perda de oportunidade, dos seus projectos, por causa da vida militar.

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Vamos ou não modificar a situação existente relativamente ao problema «objectores de consciência»?
Segunda questão: o empréstimo que foi aqui aprovado, em Julho, de cerca de 5 milhões de contos, para aquisição de equipamento militar, dito de defesa, está já incluído nesta verba de 68 milhões e 724 000 contos para a Defesa Nacional?
Se estão, gostaria de saber se já se sabe o que vamos comprar? Irão ter, fundamentalmente, finalidade de apoio à sociedade civil, como indicou na sua intervenção? Esse material é em primeira ou segunda mão, visto ser conhecida a nossa posição de compradores de sucata no estrangeiro?
Ainda há pouco tempo, junto de «Verdes» alemães, tive conhecimento de que somos conhecidos, sob o ponto de vista militar, pelos «sucateiros da Europa»!
Gostava de saber se sempre se confirma a avalizada opinião, emitida pelo Sr. Deputado Angelo Correia aquando de uma outra minha pergunta feita aqui em Junho, de que esses 5 milhões de contos serviriam para comprar melancias.

Risos.

Não estou a ver muito bem como é que se pode aplicar essas cucurbitáceas para fins de Defesa Nacional!

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.
Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: Ouvi com atenção a sua intervenção. Não serei eu quem negará a habilidade de V. Ex.ª na formulação do seu discurso e na escolha do próprio dia em que é feito - 24 de Novembro, véspera do 25 de Novembro, dia em que V. Ex.ª certamente participará em alguma cerimónia militar. Compreendo a legitimidade e até o tacto desta sua escolha, criando a ambiência própria a uma boa recepção, amanhã, em alguma unidade militar ...

Risos do PS e do PSD.

Mas deixemos esse pequeno pormenor, que de facto, em matéria e em sede de Orçamento - como agora se diz, pois há essa mania das sedes -,...

Risos do PS.

... não vem propriamente ao caso.
V. Ex.ª disse algumas coisas que, eu diria, são verdades elementares para todos os portugueses. Congratulo-me com elas - não sei se comungarei dalgumas delas, mas de outras comungarei. E gostaria de lhe colocar algumas questões, em matéria de política de defesa nacional nas suas repercussões orçamentais.
Uma das discussões a ter aqui, que nunca foi feita - aliás, creio eu, nós falamos muito mas discutimos pouco-, é em relação a que tipo de forças armadas e a que tipo de interesses essas forças armadas devem ser dirigidas. Refiro-me concretamente, por exemplo, à fiscalização da nossa Zona Económica Exclusiva, o
que pressupõe, por exemplo, um desvio nas despesas tradicionais das Forças Armadas Portuguesas. Ou seja, nós queremos equipar de facto a Marinha de Guerra Portuguesa, de modo a poder eficazmente zelar pelo acautelamento dos interesses portugueses na nossa Zona Económica Exclusiva, ou queremos continuar a privilegiar outros sectores que, de facto, não cobrem interesses fundamentais que Portugal tem que salvaguardar? De facto, nunca fizemos essa discussão. Não vejo que V. Ex.ª se tenha referido a estes problemas na sua intervenção.
O Orçamento - o meu negócio não é números, como é sabido - é árido nesta matéria. Nas chamadas GOPs -e no dicionário de siglas, que eu procuro sempre ter à mão, estão as GOPs, como agora se diz e de que os membros do Governo também gostam muito -, nada vem sobre esta matéria. É um assunto que repito de fundamental importância. Ainda ontem vimos aqui o Sr. Ministro das Finanças e do Plano - e também o Sr. Deputado João Salgueiro o fez aqui - insistir no problema da defesa do mar português. Isto tem a ver com a política de defesa nacional e, de facto, passa-se por isto quase como «cão por vinha vindimada» e nunca se discutem estes problemas.
Gostava de lhe fazer uma outra pergunta, que não tem directamente a ver com o Orçamento - e isto para terminar, porque já estou a ver o vermelho no sinal luminoso; mas eu costumo ser rápido e peco-lhe que não me interrompa, Sr. Presidente. É que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa tem aproximadamente 15 dias para apresentar 7 diplomas fundamentais ao país, que estão previstos na Lei da Defesa Nacional, e tem mais 6 meses para apresentar outros 7. Ou seja, são 14 diplomas, que têm a ver, indirectamente, com as despesas orçamentais. O que é que V. Ex.ª nos tem a dizer sobre isso? Qual é, e se o Governo a previu, a incidência desses diplomas em matéria de Orçamento do Estado?
Por último, é evidente que, quando se fazem quadros comparativos da população com as forças armadas, do Orçamento com os gastos militares, etc., há dados que não se podem escamotear. Quando V. Ex.ª refere, por exemplo, a Grécia, a Turquia e outros países que estão ao nosso nível, não esqueça que eles têm situações militares a resolver e que Portugal, directamente, não tem. Portanto, quando fala em % da população grega ou quando diz que o orçamento militar da Grécia é mais elevado, ainda que comparativamente, do que o português, não nos podemos esquecer de Chipre, da questão do mar Egeu, da luta ancestral que opõe a Turquia à Grécia. A questão que é importante saber é se o dinheiro que gastamos nas forças armadas - esta é uma questão que V. Ex.ª, se calhar, hoje 24 de Novembro, não vai poder responder ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª arrisca-se a terminar a sua intervenção no fim do mês, se continua nesse caminho.

Risos gerais.

O Orador: - De qualquer modo, Sr. Presidente, devo-lhe dizer que o Regimento da Assembleia da República prevê os 3 minutos, mas o meu grupo parlamentar tem tempo que V. Ex.ª descontará.

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Portanto, não estou a prejudicar ninguém, não estou a infringir o Regimento; estão a descontar o meu tempo, e V. Ex.ª deixa-me colocar as questões que eu quiser colocar ao Sr. Ministro da Defesa Nacional. Porque não prejudico o trabalho, porque é o meu depoimento que vê diminuído a sua duração.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, V. Exª conhece a maneira como a Mesa actua e a liberalidade que põe nesse tipo de actuação. Simplesmente, V. Ex.ª depois da defesa eloquente que acaba de fazer, está evidentemente a prejudicar o funcionamento normal das inscrições. Está combinado que este tipo de interpelações seja de 3 minutos par deputado. E V. Ex.ª não ultrapassou, de forma nenhuma, o risco, mas pôs-lhe o pé tangencialmente. Eu acreditei na palavra de V. Ex.ª; peço-lhe agora o favor de a cumprir.

O Orador: - O Sr. Presidente sabe como é: Eu tirarei o pé da tangente para não fazer nenhuma secante a V. Ex.ª

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Faça favor de continuar.

O Orador: - O Sr. Presidente, entretanto, teve a virtude de me baralhar no meu raciocínio.

Risos gerais.

Não era o seu objectivo. Sei do fundo do coração que não era esse, mas, de facto, quem foi vítima da secante fui eu e não V. Ex.ª.

Risos gerais.

Portanto, a questão era se o dinheiro que gastamos nas forças armadas é aquilo que deveríamos gastar e se, porventura, não deveria ter outra aplicação aquele que gastamos. E isto tem a ver com a Zona Económica Exclusiva, com a protecção das águas costeiras, etc. etc. Não são, por exemplo, duas ou três vedetas que andam na costa do Algarve que a podem proteger eficazmente.
Era esta discussão, que provavelmente não pode ser feita aqui hoje, que era importante ter. Ora, solicitava a V. Ex.ª que a tivesse alguma vez aqui, no Parlamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: Serei muito breve, porque estamos aqui a discutir o Orçamenta Geral do Estado, e V. Ex.ª veio aqui fazer um discurso, não de explicação ou de justificação desse mesmo Orçamento na parte respeitante à Defesa Nacional, mas, um pouco estranhamente, de justificação da existência de forças armadas, o que é uma matéria completamente fora de causa - julgo eu - para a maioria esmagadora dos deputados presentes, ou mesmo para todos, e do povo português. Portanto, seria desnecessário um esforço tão grande para justificar o que está por si mesmo

justificado. É evidente que é lamentável que, quando pela primeira vez o Orçamento do Estado respeitante às forças armadas é, na sua formulação, da responsabilidade exclusiva do Governo - e, portanto, com uma maior capacidade da Assembleia para a apreciar -, também pela primeira vez a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional não se tenha reunido para apreciar esse mesmo Orçamento.
E é aqui, Sr. Ministro da Defesa Nacional, que eu lhe gostaria de colocar uma questão, para ver se nos podemos entender.
Não interessa tanto fazer aqui comparações de percentagens e de índices em relação a países estrangeiros, em matéria de Defesa Nacional. Interessava sim, fundamentalmente, saber a que opções de Defesa Nacional corresponde a arrumação das verbas no orçamento das forças armadas. Essa é que é uma questão essencial, porque isso é que tem a ver com uma verdadeira política de Defesa Nacional, que continuamos serenamente a aguardar que seja definida. E é exactamente por isso que gostaríamos de saber se este Orçamento está elaborado de acordo com eventuais opções de Defesa Nacional, vindas de períodos anteriores à revisão constitucional, ou se, nesta matéria, já houve alguma alteração nesse aspecto e se, portanto, a sua arrumação corresponde a uma outra visão, a uma outra preocupação, isto é, se o Governo tem algumas opções em matéria de defesa nacional.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também penso que esta era uma ocasião útil para discutirmos, não o montante global do orçamento das forças armadas, mas a sua aplicação em relação àquilo que com ele se pretende. E, a propósito disso, gostaria de perguntar ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional para quando se prevê a possibilidade de discussão, na Assembleia da República, do conceito estratégico de Defesa Nacional, previsto no artigo 8 º da Lei de Defesa Nacional. De facto, sem que exista um conceito estratégico de Defesa Nacional, em que sejam definidos os aspectos fundamentais da estratégia global do Estado e a consecução dos objectivos de política de Defesa Nacional, faremos sempre discursos mais ou menos vagos, faremos mais ou menos apelos patrióticos, mas continuaremos sem ter nenhuma opção quantificada sobre as missões, as tarefas, a necessidade dessas tarefas, por parte das forças armadas.
Em segundo lugar, lembraria também ao Sr. Vice-Primeiro-Ministro da Defesa Nacional que, nos termos do artigo 26º da Lei de Defesa Nacional, está previsto que o orçamento das forças armadas corresponderá a normas de planeamento e a normas de gestão, que deverão ser aprovadas. Ou seja, deverá existir um planeamento a médio prazo, em termos a definir por lei, quanto à previsão das despesas militares a efectuar no reequipamento das forças armadas e nas infra-estruturas de defesa. Esses planos de investimento público deverão ser aprovados pela Assembleia da República, e a proposta de Orçamento anual do Ministério da Defesa Nacional incluirá obrigatoriamente o estabelecido em cada ano por essas leis de programação. Quer dizer, V. Ex.ª veio apresentar-

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-nos uma proposta de Orçamento que ainda não tem em conta nenhuma espécie de programação, que não tem em conta nenhum objectivo estratégico e que, portanto, é apenas uma sugestão à Assembleia para que, nos termos das antigas Leis de Meios, vote uma verba global.
Não tenho - para terminar - as mesmas preocupações do Sr. Deputado César Oliveira em relação aos diplomas complementares da Lei de Defesa e aos seus custos orçamentais, porque penso que um desses diplomas é o Regulamento das Continências e Honras Militares, cuja incidência no Orçamento não é, creio, grave, a menos que venha a ser objecto de algum imposto extraordinário por continências.

Risos gerais.

Mas, esperando que assim não aconteça, direi em todo o caso que, em relação às duas matérias que referi, a minha preocupação é grande. E, já agora, porque V. Ex.ª, Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional, expôs um conceito global de defesa com o qual concordo, perguntar-lhe-ia, concretamente em relação às negociações que estão a decorrer no que respeita às Lajes, se houve da parte do Governo português alguma cedência, designadamente quanto à exclusão da jurisdição portuguesa, em matéria laborai, referente aos trabalhadores portugueses.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional para responder às interpelações que lhe foram feitas.

O Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional: - O Sr. Deputado Carlos Brito, antes de me colocar uma questão, aproveitou, como é seu hábito - e digo isto porque também falou em hábitos meus -, para tecer uma série de considerações, que - dir-se-ia - era mesmo o mais importante da sua intervenção.
Começou por dizer que eu fiz elogios às forças armadas. Não fiz! Expus objectivamente uma posição que, como cidadão cônscio da importância que tem a missão de Defesa Nacional, cabe a este vector fundamental. E suponho que houve, da parte do Sr. Deputado Carlos Brito, um lapso sonoro, porque, se não me engano, ao referir-se à intervenção do Ministério da Defesa Nacional, queria dizer «conduta estabilizadora» e, enganando-se, meteu um prefixo antes da palavra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, enfim, esses lapsos sempre existem ...
A seguir, referiu que, a fl. 29 do relatório, se fala em «compromissos assumidos no plano internacional», que eram 3 400 000 contos. Eu fiz referência a esse aspecto na minha intervenção. Disse que havia 68 milhões de despesas globais, das quais 3,4 milhões tinha contrapartida em receitas. Justamente, queria fazer referencia a este aspecto. Isto diz respeito, como o Sr. Deputado Carlos Brito ficará a saber, a uma série de despesas que são adiantamentos, pré-financiamentos. Portugal pertence a uma aliança de povos que se uniram para defender a liberdade - a Aliança do Tratado do Atlântico Norte - e, no quadro dessa aliança, são necessárias por vezes - e há uma comparticipação da NATO - infra-estruturas, como acontece por exemplo com o Aeródromo de Cortegaça, com o aeródromo de Porto Santo, etc. E o processo de racionalização das despesas implica, muitas vezes, que haja um pré-financiamento, um adiantamento do tesouro português, para ser depois reembolsado dessas verbas. Essas são as tais verbas com contrapartida; são essas as tais coisas misteriosas, sobre o qual o Sr. Deputado Carlos Brito aproveitou para tecer considerações e para se ligar ao nuclear e invocar toda uma série de fantasmas que não têm nada a ver com a realidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado António Gonzalez colocou a questão do objector de consciência. O Governo tem já agendado este projecto de proposta de lei, para depois de discutido em Conselho de Ministros ser convertido numa proposta de lei e ser aqui apresentada na Assembleia da República. Trata-se de uma proposta equilibrada que, nos termos da Constituição, vai efectivamente possibilitar que seja emitida uma decisão que distinga os casos de autêntica e verdadeira objecção de consciência dos casos fraudulentos, de traficância com a consciência própria, na tentativa de procurar um mero alibi, um mero pretexto comodista, para se eximir ao serviço militar. Será o poder judicial a pronunciar-se nessa matéria e, naturalmente, que terá lugar, para quem for considerado efectivamente objector de consciência, a prestação de um serviço cívico, de duração e de penosidade igual ao serviço militar - como, aliás, é bem aceite pelos autênticos objectares de consciência.
Fez, ainda, uma referência a verbas que diziam respeito a auxílio externo e que aqui foram objecto de um pedido de autorização, em Julho, antes da interrupção da actividade parlamentar. Estas verbas são verbas incluídas num fundo de auxílio para aquisições militares, a juro extremamente baixo, da ordem de 1% ou 2 %. São pois verbas, praticamente sem juros, destinadas a adquirir material que permita reequipar, com dignidade e eficácia, as Forças Armadas - a entidade financiadora desses empréstimos é, os Estados Unidos da América.
O Sr. Deputado César Oliveira referiu que eu tinha escolhido bem o dia para falar. Se eu falasse amanhã, talvez fosse melhor.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Olhe que não!

O Orador: - Mas, em todo o caso, de futuro, vou passar a recorrer ao Sr. Deputado César Oliveira - se me permite - para me aconselhar sobre o timing das minhas intervenções, visto que me parece que tem uma sensibilidade especial para o timing das intervenções.

Risos do PSD.

Disse que eu tinha realmente dito, aqui, algumas verdades elementares. É evidente! Entendo que, nestas matérias, o essencial não deve ser vir aqui procurar-se uma originalidade forçada ou uma originali-

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dade a todo o custo. Os assuntos que a realidade nos coloca são assuntos que se devem tratar e ser abordados. Não se deve fugir a tratá-los de uma forma elementar só para se ter a pretensão de se procurar uma originalidade fictícia.
As suas considerações são pertinentes quanto à necessidade de o Orçamento dever estar enquadrado numa série de opções. Mas compreenderá que todas essas opções levam tempo. Rigorosamente a sequência é esta - e o Governo está a defrontá-la-: definição de um conceito estratégico de Defesa Nacional, do qual deve descender um conceito estratégico militar, do qual têm de descender leis de programação militar, das quais tem de descender uma ideia sobre um sistema de forças e um dispositivo, e do qual descenderá um Orçamento. E será quando as coisas se fizerem com toda a racionalidade possível. Mas o Governo - e lembro que tomou posse quando a Lei de Defesa Nacional já tinha mais de 6 meses de vigência, sem estas questões estarem tratadas - está em condições de, muito proximamente, lançar o primeiro alicerce, que é o conceito estratégico de Defesa Nacional, do qual descende o conceito estratégico militar e no qual se definirão efectivamente as grandes prioridades.
Note-se, porém, que nunca poderemos evitar o estarmos agarrados a certos constrangimentos da realidade; não podemos construir um conceito como quem o desenha numa folha de papel em branco. Nós temos uma situação concreta, isto é, tivemos uma guerra colonial. Isso implicou um certo número de distorções em relação ao que deveria ser um exército que se tivesse de preparar para um outro tipo de defesa nacional, mas é uma realidade que existe. Existe um certo número de efectivos e, obviamente, não se pretenda que, em termos militares, se adopte um certo tipo de soluções que, por exemplo, para o funcionalismo público civil, não estão de forma nenhuma encaradas, nem estão na mente dos Srs. Deputados e do Governo. Os constrangimentos da realidade sempre terão de pesar um pouco. Um conceito estratégico de Defesa Nacional insere-se num tempo e espaço determinados. Sempre terá de ser um pouco influenciado pela realidade, mas vai ser feito e dele descenderão todas essas outras operações que, numa sequência lógica, conduzirão ao Orçamento perfeitamente integrado.
As leis do objector de consciência do serviço militar estão em condições de poderem ser apresentadas, mais ou menos, dentro do prazo - mas não ignora certamente que este governo «passou» na Assembleia em fins de Junho, e a lei previa 1 ano, no pressuposto de um governo que estivesse em plenitude de funções. Mas nós iremos cumprindo os prazos - haverá uma ou outra lei em que possivelmente isso não acontecerá.
Estou de acordo com a sua referência em relação à situação especial da Grécia e da Turquia, mas eu não me referi só à Grécia e à Turquia. Referi-me a outros países, como a Noruega, a Itália, etc. E para concluir o quê? Que a percentagem, em termos do Orçamento do Estado e de produto interno bruto, é, em Portugal, inferior à média de uma vasta gama de países - e citei países da NATO e do Pacto de Varsóvia, para que as coisas ficassem bem claras.
Falou também na Zona Económica Exclusiva - suponho que disse exclusiva e não explosiva ...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Pode ser explosiva!

O Orador: - É que não sabia se tinha ou não feito uma ironia e fiquei, por isso, com a dúvida se tinha dito exclusiva ou explosiva.
Toda a acção desencadeada no patrulhamento e na vigilância da Zona Económica Exclusiva que é, em si mesma, não uma acção de defesa contra ameaças externas, mas uma missão suplementar das Forças Armadas, está a ser feita. E é um domínio onde terá certamente de ser incrementado o nosso esforço. Mas tudo isso também terá de estar ligado ao conceito estratégico militar e ao conceito estratégico de Defesa Nacional.
O Sr. Deputado Azevedo Soares disse que eu tinha vindo justificar a existência das Forças Armadas. Não! Eu não vim justificar a existência das Forças Armadas.
Fiz apenas uma elucidação, porque há ideias feitas, há ideias que correm sobre a questão do peso relativo dos custos com as Forças Armadas em relação a outros indicadores. Não vim, obviamente, justificar a existência das Forças Armadas. Sei perfeitamente que o Sr. Deputado Azevedo Soares não é um pacifista. Certamente, como eu e como outros, acha que a paz é um bem precioso que deve ser defendido através da criação de meios dissuasores eficazes para se conseguir esse objectivo.
Portanto, sabia que não tinha de me justificar, mas quis centrar-me na relação entre custos/Forças Armadas, o montante geral do Orçamento e o produto interno bruto, e creio que isso é útil porque as ideias que correm não são coincidentes com este meu ponto de vista. E mesmo hoje ouvimos aqui pontos de vista que, pelos vistos, não afinavam pelo diapasão que corresponde à realidade das coisas.
Quanto à questão de não ter havido um contacto prévio com a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, devo dizer que estou inteiramente à disposição dessa comissão para na discussão na especialidade prestar todos os esclarecimentos no que toca aos aspectos que referi, no sentido de os concretizar mais, e no que toca a muitos outros que não referi, tais como: repartição de despesas com o pessoal e com o material dos vários ramos das Forças Armadas, percentagem do pessoal que está em cada ramo, enfim, evolução dos orçamentos das Forças Armadas desde 1974 até agora ou mais para trás se se quiser, estabelecimentos fabris das Forças Armadas, reequipamento que, como sabe, é em larga medida resultante de ajuda externa, muitas vezes reduzida a fundo perdido.
Pergunta ainda se a minha intervenção é consoante com o espírito resultante da nova Lei de Defesa Nacional. Bom, é evidente que esta lei, no que ela significa de subordinação de integração das Forças Armadas no Estado Democrático, é um valor de ordem política, o que sublinhei nesta minha intervenção.
Quanto ao facto referido pelo Sr. Deputado de pela primeira vez o orçamento das Forças Armadas não ter sido apreciado na Comissão competente desta Assembleia, ao contrário do que aconteceu noutras ocasiões, não sei rigorosamente se é esta a primeira vez. É que não sei se o Orçamento Provisório que vigorou em 1983, já foi feito depois da Lei de Defesa Nacional.
Mas eu próprio acentuei esse aspecto político fundamental de o Governo aqui estar com o Ministro

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da Defesa, que não funciona apenas como elemento de ligação entre uma estrutura autónoma, que alguns pretenderam manter residualmente como uma estrutura fora do quadro do Estado democrático, mas como elemento integrador desse Estado democrático, no qual estão integradas as Forças Armadas dentro do princípio da subordinaç5o destas ao poder político.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E evidente que, nesta medida, a minha intervenção se situa neste contexto e nesta circunstância.
Creio já ter respondido a algumas questões que o Sr. Deputado Magalhães Mota me colocou. Entretanto, estou de acordo consigo quanto às considerações que teceu no sentido de que o Conselho de Defesa Nacional tem de ser prioritário. Mas Roma e Pavia não se fizeram num dia! Nós vamos começar com essa metodologia porque entendemos ser essa a metodologia correcta.
Referiu-se ainda ao artigo 26 º Bom, em Portugal o orçamento das Forças Armadas visa despesas correntes porque nós não temos PIDDAC para as Forças Armadas. E necessário que se criem leis de programação militar, mas isso insere-se naquela cadeia que defini há pouco. Estou inteiramente de acordo, essa é uma tarefa de futuro e que não pode ser feita neste momento.
Quanto à questão que me colocou relativa è Base das Lajes, peço-lhe que esteja tranquilo pois nessas negociações nunca haverá, da parte do Governo português, qualquer abdicação da jurisdição portuguesa, no que toca aos litígios que se prendam com questões de carácter laboral ou com questões que digam respeito ao estatuto das pessoas que, sendo portuguesas ou estrangeiras, vivam em Portugal.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Nunca haverá?! Mas há! Na Base os trabalhadores portugueses não são abrangidos por leis portuguesas)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos de seguida proceder ao nosso intervalo, pelo que suspendo a sessão por 30 minutos.

Eram 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 50 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Basílio Horta.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a
palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Indústria pediu-me para lhe ceder a minha vez no uso da palavra, justificando esse seu pedido pela necessidade de ter de se retirar daqui a bocado em virtude de outros compromissos que tem.

Pela minha parte aceito esta troca, se a Câmara não tiver nada a opor.

O Sr. João Amaral (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faz favor.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, uso da palavra para dizer que da nossa parte não há oposição relativamente à troca de vez no uso da palavra acabada de anunciar.
Permito-me no entanto observar que a grande parte das dificuldades que têm sido criadas ao entendimento correcto e adequado do sentido do debate resultam precisamente do facto de não estarem a ser respeitadas as indicações - e não os compromissos, evidentemente - que resultam da conferência dos lideres parlamentares sobre o sentido, a área e o tipo de intervenções que em cada dia, e de acordo com uma certa sequência, foram definidas.
Trata-se neste caso de um direito do Sr. Deputado Luís Saias ao qual não nos opomos, mas gostaria que este comentário ficasse registado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Obviamente que não quero entravar os trabalhos, mas uso da palavra apenas para dar conta da seguinte situação: o Sr. Deputado Hasse Ferreira teve de se ausentar por um quarto de hora depois de em conjunto termos verificado no «menú» dos oradores que o Sr. Ministro só seria «servido» após serem proferidas quatro intervenções.
Portanto, a antecipação da intervenção do Sr. Ministro obriga a que o Sr. Deputado Hasse Ferreira não possa vir a colocar-lhe questões. Mas paciência ...!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes): - Sr. Presidente, é só para dizer que o Sr. Ministro da Indústria e Energia se encontra inscrito desde o primeiro dia do debate e que a sua marcação tem sido sucessivamente adiada por motivos vários, pelo que esta troca me parece aceitável.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da Indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria da Energia (Veiga Simão): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar quero agradecer a gentileza de VV. Ex.ªs por me concederem a palavra fora do meu tempo.
As propostas de lei do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano para 1984, são, como afirmou o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, instrumentos essenciais da política económica de curto prazo, que o Governo foi obrigado a assumir, em face da situação financeira em que o País se encontrava em junho passado.
As medidas restritivas de emergência que foram tomadas durante este ano e as previstas no orçamento para o próximo ano permitirão recuperar a confiança

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externa, determinarão uma apreciável contenção do consumo interno e das importações, atingindo-se assim, o objectivo de reduzir o défice da balança de transacções correntes e o ritmo de endividamento externo.
Deste modo espera-se concluir a primeira fase da política económica do Governo, caracterizada pela implementação do programa de gestão conjuntural de emergência, o qual envolveu intervenções directas designadamente na política cambial, nos preços, no crédito, na fiscalidade, no investimento e nas despesas públicas.
Este período de austeridade rigorosa, iniciado em junho e que se prolongará por 1984 é, sem dúvida, um período difícil, que exige pesados sacrifícios a todos os cidadãos, criando sérias dificuldades a milhares de famílias portuguesas. É obrigação do Governo minimizar, na medida do possível, os efeitos desta crise em relação aos mais desfavorecidos e desprotegidos e tendo em particular atenção a criação de novos postos de trabalho para os jovens.
O Governo prossegue esta política económica porque não se lhe oferece nenhuma outra alternativa válida devidamente articulada no tempo que permita assegurar a sobrevivência do País, tendo-se mesmo impedido a rotura no equilíbrio do sistema económico nacional. Foi a alternativa do Governo que nos garantiu acesso a créditos externos imediatos para a aquisição de bens alimentares e energéticos, evitando-se o colapso da vida normal da sociedade ...
Esta política de rigor e de sacrifício foi apresentada
no discurso de posse do Governo pelo Sr. Primeiro-Ministro, tem sido reiterada pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro e é objecto de concordância no seio do Governo.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano tem assumido a maior parte da responsabilidade na execução desta política, designadamente nas áreas monetária, de fiscalidade e orçamental, tendo sempre contado com o apoio e solidariedade de todos os membros do Governo.
A política sectorial nas áreas da indústria e da energia para 1984, insere-se naturalmente neste quadro de austeridade selectiva, a qual não trata exclusivamente da gestão conjuntural. Por isso, a lei das grandes opções do Plano e as dotações do Orçamento do Estado, prevêem desde já um conjunto de programas de acção orientado para a concretização de transformações estruturais da economia portuguesa.
Na verdade, uma via de desenvolvimento sadia, não pode sujeitar-se a períodos cíclicos de enormes défices da balança de transacções correntes, e por isso o período de austeridade deve aproveitar-se para iniciar a reestruturação e a modernização do sistema produtivo, canalizando-se para esse fim a maior parte dos recursos financeiros disponíveis.
No caso da indústria e energia, tem havido o maior cuidado em prosseguir esta política, o que se traduz nas seguintes linhas fundamentais de actuação:

1 º Aprovação da Lei de Desenvolvimento Industrial, da Lei de Opções Energéticas, da Lei de Minas e Águas Minerais e do Plano Tecnológico de Apoio à Indústria Transformadora;
Com base nestas leis e planos será concluído, até fins de Abril de 1984, um documento sobre «A Política Industrial para a Próxima Década» onde serão claramente explicitadas as acções concretas. Assim, a reestruturação, modernização e expansão do sistema industrial português e dos diferentes sectores serão analisadas em grande pormenor.
As leis mencionadas serão oportunamente submetidas à apreciação da Assembleia da República que, deste modo, desempenhará um papel decisivo na definição da política de desenvolvimento industrial.
A lei das grandes opções do Plano contempla na área das indústrias extractivas a elaboração do plano mineiro nacional, com incidência nos programas de prospecção do carvão, do urânio, e sobretudo, no programa integrado de aproveitamento das pirites, o qual equacionará a fase mineira e também a fase industrial (metalurgia do cobre e indústrias a jusante).

Na área da indústria transformadora serão iniciadas ou intensificadas as seguintes acções:

Criação e implementação de centros tecno16gicos (têxteis, indústrias metalúrgicas, da cerâmica e vidro, da madeira, da cortiça e calçado) e do instituto nacional de design;
Criação e implementação dos serviços de extensão industrial e dos centros de desenvolvimento industrial do interior;
Criação de empresas de investigação e desenvolvimento nas áreas da microelectrónica e da biotecnologia;
Reestruturação dos sectores tradicionais, designadamente dos têxteis, do vidro, da cerâmica. e da electromecânica ...;
Desenvolvimento das indústrias florestais e agro-alimentares.

Na área energética serão desenvolvidos os seguintes programas específicos para além da aprovação da Lei de Opções Energéticas e do respectivo plano:

Maximização da participação da indústria nacional, de modo a responder às solicitações que advirão do plano energético;
Conservação e diversificação de energia com incidência na indústria, transportes e habitação;
Criação de empresas de investigação e desenvolvimento com incidência nas economias de energia e energias renováveis;
Aproveitamento intensivo das novas potencialidades hidroeléctricas;
Modernização do sistema tecnológico com vista ao acompanhamento e possível implementação das diversas componentes energéticas constantes do plano.

A política de apoio às pequenas e médias empresas é o pilar essencial à recuperação económica intensificando-se durante o próximo ano a abertura de uma frente à inovação industrial, o estímulo a novas iniciativas empresariais, o aproveitamento optimizado dos recursos naturais e a formação especializada dos trabalhadores.
A estratégia de ataque à crise, enquadrada na política económica, exigirá uma activa actuação do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais

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(IAPMEI) e do Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI), que serão devidamente reestruturados de forma a permitir uma actuação mais eficaz e uma maior participação das associações industriais, num quadro de descentralização e participação técnica e administrativa.
A modernização dos serviços do Ministério da Indústria e Energia privilegiando a formação de umes equipa de técnicos qualificados capazes de participar na difusão da política industrial e na sua implementação através de uma assistência técnica e tecnológica eficiente, será uma das nossas grandes preocupações.
Por outro lado, e para a consecução destas acções, o Ministério da Indústria e Energia tem em curso em relação ao Sector Público Industrial um processo de racionalização baseado em critérios de rentabilidade, de reagrupamento de actividades existentes e de selectividade de investimentos de acordo com as prioridades da política industrial.
Os grandes projectos industriais terão a devida resolução até fins deste ano, tal como foi definido no Programa do Governo.
O sector privado aparece em todas estas iniciativas como factor decisivo no desenvolvimento industrial o imprescindível na modernização e reestruturação do sistema produtivo.
Com os meios financeiros atribuídos, com a participação da iniciativa privada e de investimentos estrangeiros estamos seguros de que será possível iniciar as reformas estruturais necessárias.
O Governo, perante a grave crise que se atravessa tem em curso medidas de saneamento de emergência destinadas a rentabilizar as empresas com viabilidade técnico-económica. A grave situação criada a algumas empresas derivada das cheias será urgentemente analisada e tomadas medidas convenientes de emergência.
Srs. Deputados, torna-se necessário que nos caminhos novos da modernização, as empresas, públicas e privadas, cooperem entre si e com organismos personalizados do Estado, num espirito de grande participação designadamente no que respeita à promoção da criatividade e da inovação do sistema produtivo.
Pela primeira vez na história a Europa deixou de ser a fonte principal das inovações científicas e tecnológicas. A Europa, como Portugal, está sujeita a um enorme desafio.
É altura do nosso país repensar as suas estruturas, dando um salto qualitativo que lhe permita integrar-se na revolução tecnológica e participar no espaço europeu da indústria e da tecnologia, de forma a afirmar-se com personalidade própria. Temos a ambição de ser um país de qualidade, onde a principal riqueza seja, sem dúvida, a inteligência e a capacidade do nosso povo.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se vários Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Ministro, depois de ouvir a sua intervenção ficou em nós uma convicção que já tínhamos após termos analisado as proposta de lei das grandes opções do Plano e do Orçamento de Estado para 1984. E essa convicção reforçou-se agora: é que existe uma grande discrepân-

cia entre aquilo que se aponta e aquilo que, de facto, se quer concretizar.
Na verdade, quer as grandes opções do Plano, quer a intervenção do Sr. Ministro da Indústria, o que aqui nos trazem são projectos de lei, são planos, são programas, são estudos, mas não nos trazem nada de concreto.

A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta é a questão fundamental e daqui decorre também uma questão que coloco ao Sr. Ministro.
Fala-se na reestruturação da nossa indústria. Estamos de acordo! É necessária, é mesmo urgente e há hoje sectores que passam por situações extremamente difíceis. Mas a questão que se coloca é esta: é com este Orçamento, é com estas verbas orçamentadas, nomeadamente para o Ministério da Indústria e Energia, que vamos conseguir um apoio para essas mesmas indústrias, para esses mesmos sectores?
Na intervenção que hoje fiz colocava algumas questões muito concretas. Nomeadamente, gostaria que o Sr. Ministro confirmasse ou desmentisse algumas informações de que dispomos.
Por exemplo, no Sistema Nacional de Qualidade a redução das verbas é da ordem de um décimo entre aquilo que foi proposto pelo seu Ministério e aquilo que foi aprovado pelo Ministério das Finanças. Para energias renováveis a redução foi de um sétimo, isto é, entre aquilo que foi proposto e aquilo que efectivamente o Ministério vai ter a diferença é de apenas um sétimo e a redução será da ordem de metade, de 50 %, no que respeita, por exemplo, à prospecção de minérios, à questão do LNETI e, inclusivamente, no apoio às pequenas e médias empresas.
Gostaria, pois, que o Sr. Ministro confirmasse estas questões. De resto, há uma outra questão. Mas como reestruturar a nossa indústria se, de facto, aquilo que consta destas propostas de lei, como orientação prioritária deste governo, é a redução do investimento, é a maior dificuldade no acesso ao crédito, é a diminuição da procura? Se tudo isto se verificar, como relançar neste momento a nossa indústria?
Estas são questões que gostaríamos de ver respondidas com objectividade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Ministro da Indústria e Energia, V. Ex.ª fez um discurso que mais se integraria, não na parte do Orçamento que estamos a discutir, mas na parte das grandes opções do Plano.
Veio falar-nos de uma política de reestruturação industrial para a próxima década e eu queria cingir-me a um ponto muito concreto. Falou, entre as várias leis de opções, cujo estudo, segundo disse, estaria concluído em Abril de 1984, na Lei das Opções Energéticas.
Como V. Ex.ª sabe, há muito que os países industrializados adoptaram políticas energéticas que se caracterizam pela diversificação e racionalização da utilização das matérias-primas, registando-se um retorno ao carvão, não só na produção da energia selectiva,

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como também noutras indústrias em que a conversão produtos petrolíferos/carvão é a mais fácil.
Simultaneamente, foram lançadas grandes campanhas de racionalização dos consumos energéticos. Portugal, como sabe, é extremamente dependente do exterior no sector energético, contra uma certa dependência noa combustíveis líquidos - mais de 70 % do consumo energético -, atingindo a importação de petróleo mais de um quarto das importações do nosso país e contribuindo assim fortemente para o desequilíbrio da balança de transacções correntes.
Perguntava-lhe, em primeiro lugar, Sr. Ministro, se o Governo considera que é salutar ou irrelevante este nível de dependência do exterior, principalmente depois do choque petrolífero de 1973.
Em segundo lugar, que política é que o Governo entende dever encetar em 1984, a nível de diversificação e racionalização da utilização das matérias-primas, no capítulo da energia?
Por último, que pensa o Governo fazer no concernente ao capítulo das energias alternativas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António G Em relação ao nuclear, para quando o amplo debate sobre o plano energético que o Sr. Primeiro-Ministro, aqui, aquando do debate do Programa do Governo, nos prometeu?
Que apoio pensa o Governo dar à investigação sobre energias alternativas aplicáveis em Portugal, a curto e a médio prazos, e à aplicação dos resultados dessa investigação prática?
Que incentivos vão ser dados às indústrias nacionais de fabricação de equipamentos para instalações agro-pecuárias, etc., como nalguns casos já se fazem, embora em termos pioneiros e com bons resultados?
Em relação às minas, que controlo se vai fazer sobre as empresas que exploram as nossas jazidas mineiras e que, sem respeito por esse património nacional, inviabilizam filões já expostos em minas, como por exemplo é o caso de 2 poços das minas de volframite da Borralha que foram inundadas sem se Acautelar a sua utilização futura?
Não devia, pois, ser permitido tal facto e devia haver uma inspecção rigorosa das nossas minas para se evitar delapidação desse património.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Srª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - O Sr. Ministro veio aqui referir um conjunto de estudos, um conjunto de projectos, um conjunto de planos de reestruturação de sectores. Já nos habituámos a ouvir aqui vários antecessores do Sr. Ministro referir algo de semelhante, com o mesmo nome ou com nome idêntico, mas até hoje nada disso se concretizou, o que, mais uma vez, não vai acontecer.
No entanto, mesmo que acontecesse, as consequências para a indústria continuariam a ser nulas no próximo ano, porque apenas anunciou estudos, projectos, e também porque no Orçamento não existem verbas que permitam concretizar seriamente qualquer reestruturação que tenha em conta, de facto, os interesse dos pequenos e médios empresários deste país e os interesses nacionais.
De qualquer modo, e Sr. Ministro falou também numa questão que tem muito a ver com o desenvolvimento industrial do País, e que são os grandes projectos industriais, afirmando que até ao final deste ano seria dada uma resposta. Mas então queria perguntar-lhe Sr. Ministro, como é? Nós estamos neste momento a discutir, aqui na Assembleia da República, as grandes opções do Plano e o Orçamento e o Governo e o Ministro da Indústria e Energia ainda não sabem o que é que vai ser decidido quanto aos grandes projectos nacionais! Ou seja, as verbas que neste momento estão em discussão e que dentro de dias terão de ser votadas não têm em conta esses grandes projectos nacionais? Ou vão, porque foi já tomada uma opção que não se quer dar a conhecer a esta Assembleia?

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Ou se não tem, como é?
O Sr. Ministro está aqui a dizer que se vão tomar medidas, apenas para não dizer qual é a posição que o Governo, e que é dizer não ao Plano Siderúrgico Nacional, é dizer não à metalurgia do cobre, é dizer não ao projecto de Alqueva, ao da beterraba sacarina e outros idênticos? Se é isso, Sr. Ministro, porque não dizê-lo já, em vez de se estar aqui a fazer demagogia, a tentar enganar os deputados desta Assembleia e o povo deste país?!

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas além disto, queria ainda referir outra coisa.
Como sabe, na previsão para o próximo ano, há uma redução dos investimentos do Plano, em termos reais, da ordem dos 37 %.
Queria perguntar-lhe, Sr. Ministro da Indústria e Energia, dessa redução de 37 %, em termos reais, de investimentos para o Plano, o que é que fica ainda para o Ministério da Indústria e Energia e o que é que o Sr. Ministro pensa que poderá ser possível fazer, tendo em canta a verba que lhe cabe. Era bom que esta Assembleia fosse informada disso.
Um outro aspecto que queria focar, diz respeito à energia. Como sabe, no Plano, nem sequer há uma linha sobre o aproveitamento dos recursos hidroeléctricos. Ora, sabendo nós, que cerca de 50 % das potencialidades do Pais em recursos hidroeléctricos estão por aproveitar, gostaria de perguntar-lhe o que pensa o Ministério da Indústria e Energia sobre este assunto. Quanto é que vai orçamentar em concreto, para resolver este problema no próximo ano, tendo em conta que vários estaleiros de barragens poderiam estar a funcionar, poderiam estar a ser construídos e não estão, estão paralisados! O que é que, de concreto, se vai passar no próximo ano em relação a este problema.

O Sr. poão Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Ainda quanto à energia, mas agora quanto aos projectos de poupança de energia.

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Como sabe, técnicos e trabalhadores de várias empresas têm apresentado ao Governo propostas concretas de poupança de energia. Gostaria de saber qual é a posição do Ministro da Indústria e Energia em relação a esses projectos de poupança de energia.
Em concreto, queria colocar-lhe uma questão que o meu camarada Carlos Carvalhas, já levantou quando aqui produziu uma intervenção. Temos informações de que em Sinos há, neste momento, máquinas para queimar carvão mas não há carvão. E sabemos, por outro lado, que em algumas cimenteiras há, neste momento, carvão mas não há máquinas para o queimar. Sabemos que isso está a causar ao País muitas e muitas centenas de milhares de contos por ano! Quando é que este problema vai ser resolvido, Sr. Ministro?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Lencastre.

O Sr. João Lencastre (CDS): - Sr. Ministro, ouvi com muita atenção o discurso que V. Ex.ª fez, com o brilho e o espírito criativo de que costuma dar provas. Fiquei apenas desapontado com o facto de não ter falado na Sr.ª Thatcher. Eu estava à espera disso, porque me constou que quando regressou de Inglaterra teria dito que recolheu inspiração da Sr. Thatcher, quando afirmou que é nos períodos de austeridade que se fazem as verdadeiras revoluções. Por isso estava à espera que o Sr. Ministro fizesse o anúncio de reprivatizações de extinção de direcções gerais, e de extinção de fundos. Pelo contrário, o que ouvimos dizer foi que se vão criar mais centros tecnológicos, que se vão formar empresas de investigação e desenvolvimento, de biotecnologia, de electrónica, da expansão do LNETI, de centros de formação, de institutos de design, de centros disto e daquilo!
Gostaria de saber, Sr. Ministro, como concilia as duas coisas, e com que meios vai fazer face a isto tudo que nos anuncia.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Ministro da Indústria e Energia, se os programas e os projectos que V. Ex.ª referiu vão constar de propostas de lei a submeter à aprovação desta Assembleia - já após transcorrido o 1 º trimestre do ano que vem-, pergunto que critérios se seguirão para a elaboração do Plano anual de 1984, visto que esse Plano terá de estar pronto antes disso.
Quando se define a política de investimentos do IPE, refere-se a promoção de novos investimentos em áreas de alto risco e sectores preferenciais para a dina. mização estrutural da economia portuguesa. A questão que me surge é a de saber de que áreas e de que sectores preferenciais se trata.
Por outro lado, pretender-se-á que o IPE associe aos seus investimentos investidores privados?
Será o IPE que arrancará com os núcleos de empresas de tecnologia avançada, que o Sr. Ministro referiu em Londres?
Também, em notícia divulgada por um jornal, se diz que o Sr. Ministro já dispõe, neste momento, do estudo de viabilização do projecto de pirites de Neves Corvo. Pergunto-lhe: se assim é, quais são as principais conclusões desse estudo?
Finalmente, direi que nas grandes opções do Plano se traduz a preocuparão do Governo - particularmente no que se refere aos transportes terrestres - em dar especial atenção ao fornecimento de equipamentos da indústria nacional. Pergunto-lhe se isto será só em relação aos transportes terrestres, uma vez que consta - e gostaria de confirmar essa informação - que o sector da Defesa Nacional está a importar veículos que poderiam ser construídos pela Metalúrgica Duarte Ferreira.

O Sr. Presidente: - Finalmente, para pedir esclarecimentos, dou a palavra ao Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Ministro, pedia-lhe só que me esclarecesse um pouco mais sobre a sua intenção, no que respeita aos serviços ou à rede de extensão industrial.
Vem mencionada, em meu entender de maneira não suficientemente alargada, nas grandes opções do Plano, uma preocupação com o apoio às pequenas e médias empresas, em relação às quais existem instrumentos de apoio, designadamente o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais - instituto no qual nunca trabalhei, apesar de, profissionalmente e por várias vezes ter com ele colaborado e que desempenha uma actividade muitas vezes em colaboração com empresas e outras instituições públicas ou parapúblicas.
Ainda hoje vários dos meus colegas e Srs. Deputados disseram que era necessário não só fazer um investimento em termos económicos, mas também em termos humanos.
Portanto, a capacidade de intervenção e de apoio às pequenas e médias empresas, em meu entender - e gostaria de ouvir a opinião do Sr. Ministro sobre isso - estaria ligada com a capacidade de intervenção desse instituto, que continua a reger-se pelas regras da administração pública, pelo menos em larga medida, ou seja, continua a pagar os mesmos salários que a função pública, apesar das propostas que têm sido apresentadas para alterar esta situação.
Queria, pois, perguntar ao Sr. Ministro o que é que pensa sobre este assunto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da indústria e Energia.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Srs. Deputados, vou tentar sintetizar as respostas, porquanto uma discussão prolongada sobre todas as questões que me colocaram, naturalmente que levaria muito tempo e muitas delas serão discutidas a breve prazo.
Começarei pelo Sr. Deputado João Amaral ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, agradeço o cuidado, mas não lhe fiz nenhuma pergunta!

O Orador: - Desculpe, enganei-me.
O Sr. Deputado Joaquim Miranda perguntou-me o que é que se vai fazer de concreto, apesar de todos os caminhos apontados.
Talvez vá ficar admirado, mas vou dar-lhe uma ideia daquilo que se pretende iniciar, na certeza de que

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nestes períodos não devemos fazer tudo de afogadilho, mas devemos calendarizar, devidamente, as coisas no tempo.
Assim, por exemplo, no que diz respeito a centros tecnológicos, começaram já a construir-se os dois primeiros, um nos terrenos de Ramalde no Porto, Centro Tecnológico das Indústrias Metalúrgicas, outro em Coimbra, onde se está a adaptar uma antiga fábrica para o Centro Tecnológico da Cerâmica e do Vidro. E ainda este ano se iniciará o Centro Tecnológico da Madeira.
Durante o ano de 1984 lançaremos todos os outros, o que significa que este conjunto dos centros tecnológicos, que deveriam estar concluídos em 3 anos, vão estar concluídos em 5.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Ah!!...

O Orador: - Mas, desde já, vamos iniciar a construção de alguns, por diferentes fases e aproveitando da melhor maneira os meios disponíveis.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Ministro, diga exactamente quais vão ser iniciados e que verbas lhes vão ser destinadas.

O Orador: - Os Centros Tecnológicos da Cerâmica e do Vidro, têm uma participação da indústria privada e das autarquias, na ordem de grandeza de 45 000 contos e por parte do Estado há uma participação, em 1984, de 100 000 contos.
No que diz respeito ao Centro Tecnológico das Indústrias Metalúrgicas, ainda se conseguiu durante o ano de 1983, atribuir 50 000 contos e no próximo ano terá 100 000 contos.
A construção total e equipamento destes centros, orça à volta de 250 000 contos.
No que diz respeito aos outros a que fiz referência, serão atribuídos durante o ano de 1984, para início da sua construção 25 000 contos a cada um.
Mas os centros tecnológicos não são estruturas públicas. No Ministério não foi criada - e peço desculpa de ligar agora a resposta à pergunta do Sr. Dr. João Lencastre - uma única estrutura da administração pública.
Quer os centros tecnológicos, quer as empresas de investigação e desenvolvimento, são organismos que, no primeiro caso, são instituições de utilidade pública que têm a participação de organismos personalizados do Ministério da Indústria, em ligação com associações industriais, ficando, ao fim do período de investimento, a cargo de uma administração conjunta, com maioria de iniciativa privada e sendo auto-suficientes. Não existe a criação de mais um único lugar de funcionário público. Portanto, é falso tudo aquilo que, se diz contrariamente a esta filosofia.
Por exemplo, a primeira empresa de investigação e desenvolvimento está criada. É uma empresa privada, que tem a participação da Tabaqueira, da Centrel, e do Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial.

A empresa de investigação e desenvolvimento de biotecnologia, que será criada no início do próximo ano, terá também parceiros do sector público e do sector privado, mas são empresas que se regem pelas leis do domínio privado.
O Sr. Deputado Joaquim Miranda perguntou também se as verbas para o Sistema Nacional de Qualidade e para as energias renováveis eram superiores ou inferiores às do ano anterior.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Ministro, não foi isso que perguntei!

O Orador: - Pois, mas queria dizer-lhe que as verbas a atribuir em 1984, para estes domínios, vão ser superiores às do ano anterior, além de estar previsto um empréstimo do Banco Mundial, na área da conservação e diversificação de energia, que vai intensificar as investigações e o desenvolvimento destas iniciativas.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Ministro, desculpe mas não foi isso que perguntei. O que lhe perguntei foi qual a diferença entre as verbas propostas pelo Ministério e as verbas aprovadas pelo Ministério das Finanças.
Esta é que foi a questão que coloquei.

O Orador: - Sr. Deputado, como sabe, todos nós sonhamos com grandes verbas. As verbas que estão aprovadas, são as possíveis. Está, em 1984, a fazer-se um esforço maior de que o que foi feito em 1983, neste domínio. E no que diz respeito ao projecto que se correlaciona com o empréstimo do Banco Mundial, as verbas vão ser quase duplicadas. Não lhe vou dizer as verbas que estiveram em discussão desde o início do Orçamento.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença?

O Orador: - Não, desculpe, agora não!
A filosofia do Ministério, também no que diz respeito à conservação de energia, é de desenvolver uma acção coordenada, lógica e devidamente estruturada. Por isso mesmo vão ser feitas uma série de auditorias energéticas em empresas industriais de vários sectores, que se iniciarão também em janeiro de 1984. Para além dos projectos relacionados com esquemas de poupança de energia, vai dentro em breve iniciar-se o 5 º esquema de apoio, com algumas incidências mais importantes nas áreas tecnológicas, de forma a que se oporem reais transferências de tecnologia para o nosso país.
Pela primeira vez vão ser feitas auditorias energéticas, nos diversos sectores industriais.
Por outro lado, VV. Exªs devem ter conhecimento de que no Orçamento do Estado não estamos a discutir todas as verbas que vão ser envolvidas no sector público, designadamente algumas que dizem respeito ao PISEE. Consequentemente, é através do PISEE que vão ser feitos os financiamentos da maior parte dos grandes projectos industriais. Na altura devida elegi serão aqui discutidos.

A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

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O Orador: - Agora não, desculpe!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É que não estamos a discutir as verbas, mas devíamos estar)
É que esta é a sede própria!

O Orador: - Lá será minha senhora! Como sabe, não é!
Quando se fala no aproveitamento dos recursos hidro-eléctricos, não há razão alguma porque já se iniciou a discussão da intensificação do aproveitamento dos recursos hidroeléctricos em Conselho de Ministros e dentro em pouco conhecerão o programa do aproveitamento desses recursos que vai ter investimentos de uma certa ordem de grandeza.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mas aqui nas grandes opções do Plano não está nada disso!

O Orador: - Também não entendo o problema de haver e não haver carvão na central da EDP, que ainda não começou a funcionar.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mas como é que vai para lá?

O Orador: - O primeiro grupo da Central da EDP estará pronto em junho do próximo ano. Estar a dizer que não há carvão para a fazer funcionar não é verdade.
Por outro lado, no que diz respeito ao Sr. Deputado António Gonzalez, queria dizer-lhe que o debate sobre o plano energético terá lugar aqui na Assembleia da República, esperando o Governo apresentar a Lei das Grandes Opções Energéticas e o plano energético, até fins de lane•ro de 1984.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Não chegam lá!

O Credor: - Tomei nota, com atenção, dos problemas que levantou no que diz respeito à inspecção rigorosa das minas.
O Ministério da Indústria e Energia tomou já a iniciativa de uma lei que diz respeito à higiene e segurança no trabalho, de uma forma mais concreta e mais rigorosa.
O decreto-lei, no que diz respeito às minas de urânio, já foi também aprovado em Conselho de Ministros.
O Sr. Deputado João Lencastre colocou alguns problemas interessantes, designadamente no que diz respeito às lições que aprendi em Inglaterra.
A Inglaterra, independentemente dos seus governos conservadores ou trabalhistas, é sempre um país onde se podem aprender belas coisas quanto a realizações.
E, portanto, não são específicas dos governos conservadores nem dos governos trabalhistas!
No entanto, queria dizer-lhe que o desenvolvimento de empresas de investigação e desenvolvimento de tecnologias avançadas e a criação de centros de tecnologias e formação, que este governo vai fazer em diversas cidades do País, se destina a colocar lá coisas simples como: computadores e software que com aplicação na agricultura, nos serviços, na indústria, por forma a desenvolvermos acções concretas para o primeiro emprego, para uma formação mais qualificada dos jovens dos 18 aos 24 anos de idade. É uma realização que aprendi com muito gosto em Inglaterra e que será transposta para Portugal, adaptada naturalmente às conveniências e por forma a minimizarmos um problema grave que é o do desemprego na idade dos 18 aos 21 anos de idade, perante a situação de não acesso ao ensino superior e perante o estado de desenvolvimento económico do País, o que dá origem, como sabe, a que tenhamos problemas sociais graves nesta área da juventude.
Vamos fazer isso, e vamos fazer um incentivo. Um incentivo às associações patronais, um incentivo aos sindicatos ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Uma política de auxílio aos sindicatos?! ...

O Orador: - ... para cooperarem nessas realizações, para os sindicatos auxiliarem ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Uma ingerência!...

O Orador: - ... e serem auxiliados!
Os serviços da extensão industrial, também não são, mais uma vez, estruturas da Administração Pública nem tão-pouco vão corresponder a infra-estruturas físicas de grandes dimensões.
Todos nós sabemos que, em diversas associações industriais, nas autarquias existem deficiências em técnicos qualificados.
As experiências estrangeiras mostram-nos como determinado tipo de especialistas podem observar em determinadas áreas, designadamente nas do interior, a situação das indústrias, por forma a trabalhar como se fossem médicos genera!istas - technical ofcers no mundo anglo-saxónico- e que permitirão uma assistência mais consciente e colocar essas estruturas, autarquias ou associações industriais, em ligação com os laboratórios nacionais ou com os serviços centrais, designadamente também com o IAPMEI, por forma a que essa assistência técnica e tecnológca seja mais eficiente.
.Queremos, acima de tudo, criar neste país uma rede de técnicos qualificados que sejam capazes de se debruçar in loco sobre os problemas reais da indústria e, deste modo e ao mesmo tempo, conseguir que sejam fixados nessas regiões.
O apoio às pequenas e médias empresas, como eu já disse, é o grande pilar da política do Governo e não vamos reestruturar o IAPMEI ou o LNETI de modo a criar mais serviços e mais organismos. Vamos fazer com que participem na gestão e na administração do IAPMEI e do LNETI também associações industriais, por forma a que a política se desenvolva de uma maneira mais efectiva e com a participação de parceiros sociais, que são, neste caso, muito importantes.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Ou seja, o Ministério da Indústria ao serviço dos Mellos!

O Orador: - Naturalmente que chamar Mello a um pequeno empresário, é uma tentativa de mau gosto.

Aplausos do PS.

O Orador: - De facto, eu estava tentado a chamar Mello à Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

Risos do PS.

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A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Por acaso não me chamo isso. Sou Ilda Figueiredo.

O Orador: - Srs. Deputados, naturalmente que os grandes projectos industriais e as grandes leis têm de ser traçadas e definidas sem pararem as realizações, por muito pequenas que sejam.
Nós não podemos parar a indústria para fazermos leis de desenvolvimento industrial. O que temos é obrigação de lançar os nossos caminhos e, ao mesmo tempo, imbuir as realizações actuais de um espírito novo que corresponda a essas transformações estruturais.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito beml

O Orador: - Digam agora que não é possível.
Quando aqui vier o Orçamento de 1985, eu direi aquilo que se fez, para gosto de VV. Ex.ªs, que tanto agora criticaram.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Ministro fará isso nos jornais, não aqui!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Nem com tanto optimismo dura tanto tempo.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos 3 Srs. Deputados para, ao que suponho, protestarem relativamente aos esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro da Indústria e Energia.
Como já temos cerca de 14 minutos de atraso relativamente à hora regulamentar de encerramento da sessão, peço-lhes que sejam tão breves quanto possível.
Tem, pois, a palavra para um protesto, o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Ministro, muito brevemente, pretendo fazer-lhe um protesto de incompreensão relativa.

Risos.

Ou seja, eu não apanhei, como diria o Sr. Deputado Rogério de Brito, o substrato ...

Risos.

... da questão da rede de extensão industrial, do serviço de extensão industrial.
Percebi a sua ideia e o objectivo do Sr. Ministro ficou, para mim, perfeitamente claro. A minha dúvida é se o Sr. Ministro já tem, para a respectiva concretização, algum modelo organizativo, uma vez que apenas me disse que não era um serviço público; ou, se não tem ainda esse modelo, ele existe apenas em termos de projecto, digamos assim.
Era este o meu primeiro protesto, como disse, um protesto de incompreensão parcial.

O Sr. Ministro da Indútria e Energia: -0 Sr. Deputado faz-me lembrar o Estebes, com essa do substracto.

Risos.

O Orador: - E, é!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço desculpa, mas queria pedir aos Srs. Deputados e ao Sr. Ministro que não estabelecessem diálogo, apesar de este diálogo se estar a processar com bastante espírito de humor.

Uma voz do PCP: - Isto não é o futebol!

Outra voz do PCP: - Não é do Sporting!

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Hasse Ferreira, faça favor de continuar o seu protesto.

Uma voz do PCP: - O Sr. Ministro vai para o lugar do João Rocha?

O Orador: - Perguntam-me aqui se o Sr. Ministro vai para presidente do Sporting. Eu suponho que não ...

Risos.

... embora talvez não fosse mau para o Sporting, sem menosprezo pelo João Rocha.

O Sr. Ministro da indústria e Energia: - Só do Académico!

O Orador: - Eu falei no substrato porque o deputado Rogério de Brito citou hoje esse famoso comentador que agora está processado judicialmente.
A segunda questão que me leva a protestar é em relação ao IAPMEI. O meu problema não é tanto a preocupação com a participação dos parceiros sociais, pois essa participação depende do modo como for concebida. De facto, se o que se pretende com o IAPMEI é apoiar as pequenas e médias empresas, a maneira como for concebida a participação de parceiros sociais - que o não sejam - pode, eventualmente, diminuir o peso do apoio a essas pequenas e médias empresas. Este é um problema real. Eu não vou citar nomes, mas é um problema.
A questão é diferente, pois eu suponho que há propostas de alteração do próprio estatuto do IAPMEI. Portanto, o que eu queria saber era se, em relação a estas propostas, o Sr. Ministro pretende adiantar hoje alguma perspectiva.
Era só isto que eu desejava saber.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deseja contraprotestar imediatamente ou só no final?

O Sr. Ministro da indústria e Energia: - Contraprotesto já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Sr. Deputado, peço desculpa por não poder dar-lhe todas as indicações sobre a futura estrutura do IAPMEI e dos serviços correlacionados, mas tenho muito prazer em lhe facultar os decretos-leis em questão.

Uma voz do PCP: - Mais um para o corredor!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um protesto a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro, o meu protesto baseia-se, principalmente, no seguinte:
Sr. Ministro acaba de sonegar a esta Assembleia informações fundamentais para a discussão das grandes opções do Plano e do Orçamento ...

O Sr. Porge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... e não demonstrou como é que, com uma redução de 37 % nos investimentos do Plano, é possível levar à prática o conjunto de ideias que aqui trouxe, já que, na minha opinião, o que aqui trouxe não foi mais do que ideias.
Por outro lado, o que vai acontecer, em concreto, quanto aos grandes projectos? Que se passa com aquilo que vai, de facto, ser inscrito no Plano de Investimentos do Sector Empresarial do Estado?
É inadmissível que num momento destes, nada nos seja dito sobre esta questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deseja contraprotestar imediatamente ou no final, uma vez que há ainda outro protesto?

O Sr. Ministro da Indústria e Energia: - Aguardo o final dos protestos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para um protesto, o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Ministro, quero protestar em virtude de o Sr. Ministro ter deixado completamente em claro todas as perguntas formuladas pela minha bancada.
Se em relação à área da energia - e até certo ponto -, isso se pode compreendem pela referência que fez à futura discussão do plano energético, penso que faria sentido dar resposta às perguntas que eu próprio lhe coloquei.
E lembro-lhe que as questões que colocámos são relativas ao papel do IPE, ao estudo de viabilização do projecto de pirites Neves Corvo e uma outra questão concreta e pontual relacionada com a Metalúrgica Duarte Ferreira.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deseja usar da palavra para contraprotestar?

O Sr. Ministro da dndústpie e Energia: - Sr. Presidente, eu preciso que me dêem mais tempo para poder contraprotestar.
De outra maneira, darei individualmente e com muito prazer, os elementos que me foram pedidos e em relação aos quais eu iria agora contraprotestar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper por agora os nossos trabalhos.
Recomeçaremos às 22 horas e 15 minutos.
Está interrompida a sessão.

Eram 20 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está reaberta a sessão.

Eram 22 horas e 40 minutos.

Depois do intervalo, reassumiu a presidência, Sr. Vice-Presidente José Vitorino.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado Silva Graça.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A conferência de líderes considerou em termos meramente indicativos, obviamente sem nenhum compromisso, que a tarde de hoje seria dedicada à discussão na generalidade das questões relacionadas com o desenvolvimento regional e com equipamento social e ambiente.
Neste quadro, introduzo em nome do Partido Comunista Português, uma questão central do desenvolvimento regional que é o financiamento das autarquias.
Infelizmente não está presente nenhum membro do Governo em representação do Ministério da Administração Interna, já que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano remeteu para este Ministério a resposta às perguntas que em devido tempo fizemos, aquando da intervenção inicial do Sr. Ministro das Finanças e do Plano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este Orçamento do Estado para 1984, no tocante ao poder local, é, a um tempo, ilegal, de miséria e discriminatório.
Ilegal já que assenta no pressuposto de que a Lei n. º 1/79, Lei das Finanças Locais, se encontra revista e a nova lei promulgada e publicada, o que não é verdade. Ora se não existe outra Lei de Finanças Locais, que não seja a Lei n.º 1/79, o que qualquer Governo respeitador da legalidade democrática deveria fazer era tão-só aplicá-la.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É essencial que o Governo responda perante a Assembleia da República, perante as autarquias e perante o país à pergunta que tornamos a formular e à qual aliás o Sr. Ministro das Finanças e do Plano admitiu estar aberto a uma solução. Qual é a solução? Como é que a proposta de lei do Orçamento do Estado vai ser revista por forma a dar cumprimento à Lei nº. 1/79?
Este Orçamento é um orçamento de miséria porque o que acontece, de facto, é que as autarquias locais verão, em 1984 as suas verbas reduzidas e os seus encargos aumentados. Se não vejamos:
As parcelas que totalizam os 80,7 milhões de contos com que o Governo procura lançar uma cortina de fumo que encubra a realidade são as seguintes:.

Transferências correntes e de capital-51,5 milhões de contos;
Novas competências dos municípios-26,5 milhões de contos;
Verbas à disposição da administração central2,7 milhões de contos.

A primeira parcela corresponde às alíneas b) e c) do artigo 5 º da Lei de Finanças Locais. A verba

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51,5 milhões de contos resulta da aplicação do artigo 39.º da Proposta de Lei do Orçamento.
Para explicar a forma como chegou a esta verba o Governo não hesita em fazer demagogia e demagogia perigosa, ao dizer que decidiu aproximar-se do mínimo de 18 % fixado na Lei n.º 1/79. Nada mais falso, Sr. Presidente e Srs. Deputados. E que, o que o Governo não diz é que teve o cuidado de reduzir prévia e substancialmente o conjunto das despesas sobre as quais incide a percentagem de 17 %. Vai mais longe. Afirma no Orçamento que a verba para investimentos é de 58 milhões de contos. Mas para efeitos de cálculo de transferências para as autarquias considera apenas 4,5 milhões de contos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se a Lei n.º 1/79, fosse cumprida, como aliás o PS prometeu ao eleitorado, as autarquias locais receberiam 133,9 milhões de contos em vez dos 51,5 apontados neste Orçamento. O esbulho é, portanto, este ano, para as mesmas competências, de mais de 82 milhões de contos. O maior de sempre!
Mas não se fica por aqui este Governo. Procurando «encher o olho» dos autarcas e das populações carenciadas, sorna à verba de 51,5 milhões de contos o montante de 26,5 milhões de contos para, de acordo com o artigo 42 º da Proposta de Orçamento fazer face às novas competências nos domínios do «ensino primário e da acção social escolar». No Relatório justificativo da Proposta afirma-se que aquela verba se destina «designadamente a satisfazer os encargos com o funcionamento das escolas primárias e postos escolares». O que é que o Governo quer dizer com isto? Significa tão-só a transferência de responsabilidades no tocante a investimentos e despesas de conservação em escolas primárias e postos escolares, o que aliás consideramos correcto, ou procura-se também lançar para as costas das autarquias os encargos com os professores e outros trabalhadores? É legítima esta preocupação. Só um exemplo: o Governo antes de transferir as competências do IASE - Instituto de Acção Social Escolar - para as autarquias, reduz previamente a sua dotação orçamental, passando de 4 milhões de contos em 1983 para 3,3 milhões de contos em 1984 (uma diminuição real de 31,7 %).
Política descentralizadora, sim. Procurar sub-repticiamente descentralizar a crise, não.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vejamos agora como este Orçamento é discriminatório.
Como é que as verbas são distribuídas pelos municípios? Na Lei n.º 1/79, os critérios de distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro são objectivos, claros e de fácil entendimento. Além disso a proposta de lei do OGE continha sempre, em anexo, os indicadores a que se refere a alínea d) do n.º 2 do artigo 9 º da Lei de Finanças Locais.
O que é que verificamos nesta proposta de Lei do Orçamento? O gravíssimo precedente da não publicação desses indicadores, o que torna impossível qualquer cálculo de repartição das verbas pelos municípios. Mas comparando o que os municípios receberam em 1983, com o que vão receber em 1984, fica claro a forma discriminatória como o Governo pretende distribuir o bolo.
Vejamos alguns exemplos. A nível de distritos verifica-se que Beja, Évora e Setúbal recebem a mais, respectivamente, 12 %, 9% e 8 %, enquanto o Algarve 20%. A nível de concelhos, e tomando como exemplo só o distrito de Lisboa, verifica-se que a Amadora terá um aumento nominal de receitas de 3 %, Loures e Vila Franca de Xira, 4 %, enquanto Cascais receberá mais 11 % e Sintra 14 %. Não é necessário recordar quais as forças maioritárias nos diversos distritos e concelhos referidos.

Vozes do PCP: - E o compadrio! É um escândalo!

A não ser revisto o Orçamento do Estado, articulando-o com a Lei n.º 1/79, todos os eleitos das autarquias locais ver-se-ão impossibilitados de levar por diante os seus planos de actividade e de honrarem assim os compromissos que assumiram perante as populações que os elegeram.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Estas sentirão as suas condições de vida agravarem-se. E a situação é tão toais alarmante neste momento, quanto é sabido que há poucos dias, numerosos concelhos dos distritos de Lisboa, Setúbal e Santarém foram dramaticamente fustigados pelos temporais e cheias que assolaram esta importante área do território nacional. Os prejuízos são incalculáveis. As perdas em vidas e haveres muito graves.
O Governo face a esta situação tem de assumir as suas responsabilidades, a primeira das quais é garantir os meios financeiros aos municípios atingidos para que as respectivas câmaras municipais possam levar por diante os seus planos de emergência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E tem meios legais à sua disposição para o fazer de imediato. Basta que accione o n.º 2 do artigo 16 º da Lei n .º 1/79, que permite excepcionalmente, em casos de calamidade pública, a concessão de auxílios financeiros directos às autarquias locais afectadas. Vai o Governo fazê-lo? Se sim, por que formas, com que montantes, com que critérios, com que prioridades? A Assembleia da República, o país, as populações e os eleitos dos concelhos dramaticamente atingidos exigem que o Governo, hoje e aqui, responda com clareza e sem ambiguidades também a esta questão.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este Orçamento proposto pelo Governo PS/PSD é bem o reflexo da sua política centralizadora, na continuidade, aliás, dos diversos Governos AD.
E um Orçamento também nesta área tão sensível imposto pelo Fundo Monetário Internacional.
Mas o poder local democrático nascido com o 25 de Abril, soube resistir até hoje a todas as ofensivas desencadeadas pelos diversos Governos de direita.
O mesmo acontecerá com esta. A alternativa democrática a este Governo acabará por se impor, sendo então possível consolidar e aprofundar o sistema jurí. dico-constitucional que enquadra o funcionamento descentralizado, autónomo e eficaz das autarquias locais.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Antunes da Silva pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. João Amaral (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja a palavra, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa no sentido de saber se na lista de inscrições está prevista ou se já está feita a inscrição do Sr. Ministro da Administração Interna para alguma intervenção sobre a questão das finanças locais, questão que nós aqui trouxemos, neste momento.

O Sr. Presidente: - Essa inscrição não está feita, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Contra factos não há argumentos. O Governo não responde. O Governo não sabe de finanças!

O Sr. João Amaral (PCP): - Não está. Não é assunto que preocupe o Governo.

Uma voz do PSD: - Ninguém lhe perguntou!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Antunes de Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também eu próprio gostaria de fazer a minha intervenção sobre esta matéria, após a intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna. E até por uma razão muito simples: é que poderei fazer observações que deixariam de ter razão de ser depois de eventuais explicações que o Sr. Ministro disse.
O Partido Social-Democrata é o partido português com maior implantação na área do poder local. Por essa razão e por outras, a que não são alheias quer a sua linha programática quer a sua prática política, a problemática do Poder Local Regional em geral e das finanças locais em especial, merece-nos uma acuidade muito grande e até um tratamento preferencial.
Entendemos o exercício do poder local como forma superior de exercer a democracia e como a emanação mais directa e imediata da vontade das populações.
Entendemos ainda que o poder local como motor de desenvolvimento local e regional e nessa medida assume para nós especial relevância.
O Governo, através da proposta de lei que consagra as grandes opções do Plano revela uma vontade política de prosseguir o reforço do poder local embora com as lintitações materiais que, realisticamente, temos de reconhecer e que têm a sua expressão na parte que diz respeito 1 proposta de Lei do Orçamento do Estado para 1984, que adiante analisaremos.
Perante as dificuldades que o Governo enfrenta é imprescindível usar imaginação e valer-se de vontades políticas que convergem para o engrandecimento e prestígio do poder local.
Meritórios exemplos têm sido dados por algumas Comissões de Coordenação Regional cuja intervenção nos Programas de Desenvolvimento Regional deve ser realçada e dela muito continua a esperar-se para o progresso do pais.
Meritória é também a intenção do Governo em realçar esses Programas de Desenvolvimento visando com eles uma progressiva correcção de assimetrias e de desigualdades dos portugueses na fruição de bens e serviços básicos, como é salientado na proposta de lei que consubstancia as grandes opções do Plano.
A propósito, cumpre referir com agrado que os Programas Integrados de Desenvolvimento Regional, de que são exemplos os de Trás-os-Montes, da Cova da Beira e do Baixo Mondego sejam considerados instrumentos privilegiados - diríamos nós - de política regional visando alcançar os objectivos citados. Assim considerados esses programas, é dever dos poderes públicos corresponder com a atribuição de meios que tiverem ao seu alcance.
Outras medidas se perspectivam no que diz respeito ao desenvolvimento regional.
E cumpre aqui referir que o Governo prevê rever o sistema de investimentos intermunicipais e deverá fazê-lo de forma a transformar e a consagrar esse sistema como factor de desenvolvimento mediante a adopção atempada de adequados planos, que permitam a utilização e real aproveitamento dos meios que o fundo comunitário ligado ao desenvolvimento regional possa proporcionar ao nosso País.
Através destas breves notas queremos significar o nosso apoio ao documento em análise - as grandes opções do Planoconcretamente à política regional, esperando que a intenção do Governo, de reforço da política regional no âmbito político, administrativo e económico se transforme em realidade para bem do povo português.
Relativamente às grandes opções do Plano referiram-se medidas que a serem implementadas decididamente merecem o nosso apoio. Todavia isso não nos inibe de manifestar algumas preocupações-relativamente às finanças das autarquias locais de referir pontos da proposta de lei do Orçamento do Estado nesse âmbito que devem ser complementados ou mesmo reformulados em sede própria, como aliás já foi reconhecido pelo próprio Governo.
Para tal tarefa os deputados do PSD contribuirão com o seu apoio empenhado.
Quando da, análise do Orçamento do Estado para 1984, no seio da Comissão de Administração Interna e poder local, os partidos ali representados, sem deixar de avançar algumas considerações, reservaram a sua posição final para o debate em Plenário e em fase subsequente em comissão especializada.
Cumpre, assim, tomar posição sobre o conteúdo da Lei do Orçamento no que às Finanças das autarquias locais respeita.
Da análise da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1984 consta:
Que em aplicação do regime das finanças locais consagrado no artigo 39 º, serão transferidas para os municípios 51,5 milhões de contos, o que representa um aumento relativamente ao ano corrente, de apenas 5,025 milhões de contos, o que não é sequer suficiente para fazer face ao agravamento de custo, pelo que consideramos que não sendo este orçamento desejável é, com certeza, o possível face aos condiciona

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lismos existentes; Constata-se ainda a previsão de uma verba destinada a dotar as juntas de freguesia de instalações próprias no montante de 250 000 contos. Esta dotação representa um decréscimo de 20 000 contos relativamente a 1982 e relativamente a 1981 um decréscimo de 147 000 contos.

Porém, ao longo dos últimos anos tem sido feito um esforço considerável nesta área e dele resultou já a satisfação de inúmeros pedidos, tendendo assim, o número desses pedidos a decrescer e, em conformidade, o volume da respectiva dotação.
Uma vez mais, não sendo esta a dotação desejada, ela é, com certeza a que o Orçamento do Estado comporta.
Constata-se ainda que, para além destes benefícios directos, outros existem que assumem relevância e representam uma melhoria relativamente aos anos anteriores sem que, apesar de tudo, possam considerar-se suficientes. Deles se destacam:

Bonificações de juros relativos à linha de crédito aberta na Caixa Geral de Depósitos a favor dos municípios;
A inscrição de uma verba de 2 milhões de contos em «Investimentos do Planou;
O reforço da linha de crédito oportunamente negociada;
O acesso dos municípios ao financiamento através do Fundo de Apoio ao Investimento para a Habitação.
Fica-nos contudo a expectativa de que o Governo procurará melhorar este elenco de benefícios, como demonstração da sua confiança no dinamismo, capacidade de trabalho e de iniciativa dos nossos autarcas.

O Governo terá de saber aproveitar em benefício das autarquias a acção que deve ser desenvolvida pelos organismos regionais que dele dependem nomeadamente as Comissões de Coordenação Regional e dos Gabinetes de Apoio Técnico que os integram.
O apoio desses organismos às autarquias traduz-se em largos milhares de contos sem se onerar mais o Orçamento do Estado.
Adiantaremos agora alguns pontos concretos que nos merecem algumas observações:

Por não estar ainda em vigor a lei de revisão da Lei de Finanças Locais, a Lei n.º 1/79, suscita-se a questão de falta de fundamento legal do artigo 39 º da Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 1984 - defendem alguns;
Esta disposição, a ser aprovada, revoga tacitamente as normas correspondentes da Lei de Finanças Locais - defendem outros.

Nesta, como noutras matérias, entendemos que deve fazer-se uma tentativa de clarificação e nesse sentido sugere-se a introdução de norma revogatória da parte correspondente da Lei de Finanças Locais a introduzir em momento e sede próprias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sem prejuízo da apreciação desta matéria no que respeita aos montantes que dela resultam, afigura-se-nos correcta a sua manutenção, porquanto ela tem o mérito de, uma vez por todas, definir de forma clara as bases de cálculo das verbas a transferir para os municípios. A propósito desta matéria, tanto quanto sabemos, a lei de revisão prevê uma percentagem variável a fixar em cada ano, sem limites máximos nem mínimos, o que se nos afigura incorrecto.
Entendemos, por isso, desde já manifestar a opinião de que em caso algum poderá o Governo fixar uma percentagem a que corresponde um volume de transferências inferior ao do ano imediatamente anterior e que este princípio deve ser consagrado expressamente naquele diploma legal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Também o conteúdo do artigo 42 º nos merece algumas observações:
Diz o referido artigo que:

São transferidas para os municípios, em 1984, novas competências nos domínios do ensino primário e da acção ,social escolar. E diz-se no n º 2 do citado artigo que «para o financiamento do exercício das novas competências referidas no número anterior, serão utilizadas as respectivas dotações orçamentais inscritas no orçamento do Ministério da Educação».
A filosofia que o citado artigo encerra, entendida como manifestação de vontade política de descentralizar e desconcentrar poderes, afigura-se-nos louvável.

Todavia, se essa vontade política não encontra condições de viabilidade para na prática frutificar ela pode transformar-se em factor negativo na actuação das autarquias locais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porque, por um lado, a maioria dos municípios não dispõe de estruturas adequadas a já, no próximo ano, pode vir a arcar com maiores e mais amplas responsabilidades nesse âmbito.
Por outro lado a proposta do Governo pressupõe uma certa divisão de responsabilidades. E, diríamos nós, onde as responsabilidades se diluem ninguém é responsável.
Desta forma defendemos que a proposta de lei do Orçamento deve ser reponderada no que se refere a atribuição de novas competências previstas no artigo citado.
Finalmente quanto às finanças distritais temos sérias preocupações para não dizer angústia.
Prevê-se, em sede da Lei de Revisão das Finanças Locais a observação de 0,5 % das receitas dos municípios para fazer face às despesas das assembleias distritais e por isso a proposta de Orçamento é omissa na matéria.
A concretizar-se tal medida ela virá a provocar um sério revês para os já magros recursos dos municípios e por isso terá de encontrar-se outra solução.
Neste sentido deixamos para ponderação a hipótese de tais encargos virem a ser suportados pelos Orçamentos privativos dos Governos Civis, que mercê de recentes medidas viram substancialmente aumentadas as suas receitas próprias.

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Caso afirmativo deve a Lei do Orçamento do Estado consagrar tal solução para 1984.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Silva Graça.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Deputado Antunes da Silva, V. Ex.ª começou a sua intervenção com um ar triunfal dizendo que o seu partido era o partido mais forte e com maior implantação a nível de autarquias.

Vozes do PSD: - É verdade

O Orador: - Mas falou como se não respeitasse minimamente aquilo que é fundamental, ou seja, a autonomia administrativa e financeira das autarquias locais.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não se exalte

O Orador: - O Sr. Deputado disse ao Parlamento - e, se não disse, faça o favor de nos esclarecer que a lei em vigor é a Lei n.º 1/79, Lei das Finanças Locais e que o Orçamento do Estado não está de acordo com essa lei.
Aliás, à mesma conclusão chegou a Comissão de Economia e Finanças, cujo relatório ouvimos ler ao Sr. Deputado João Salgueiro.
As minhas perguntas são-lhe feitas, já que o Governo não responde.
Como é que o Governo vai repor a legalidade? Como é que o Governo vai fazer coincidir o Orçamento do Estado com a única lei de finanças locais existentes, a Lei n.º 1/79?

Aplausos do PCP.

Em segundo lugar, queria fazer-lhe uma outra pergunta fundamental e que tem a ver com os recursos financeiros das autarquias.
Na p. 37 da proposta de lei do Governo diz-se que os investimentos do Plano - e eu disse-o na minha intervenção - são 58 milhões de contos. Contudo, para efeitos de cálculo das transferências para as autarquias e de acordo com a lei, consideram-se como investimentos apenas 4,5 milhões de contos.
Como é que o Sr. Deputado explica este fenómeno?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Antunes da Silva, há ainda um outro pedido de esclarecimento.
O Sr. Deputado responde já ou prefere aguardar e responder no final?

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Respondo no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Antunes da Silva, suponho que nos devemos congratular pelo facto de, com a intervenção do meu camarada Silva Graça e com a sua própria intervenção, estar finalmente aberto nesta Assembleia o debate sobre as questões relativas ao poder local.
Apesar disso, não podemos deixar de criticar o facto de, estando marcado para hoje - com carácter

indicativo, é certo - o debate sabre as questões de desenvolvimento regional, o Sr. Ministro da Administração Interna não tenha comparecido aqui para explicar a esta Câmara, quais as linhas com que coseu o Orçamento, na parte em que por ele é responsável.
Em segundo lugar, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que ouvi com muita atenção tudo o que disse nas linhas e nas entrelinhas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E o que não disse

O Orador: - Nas linhas e nas entrelinhas deixou o apoio na generalidade.
E bom que se registe esse apoio na generalidade, para sabermos que, na generalidade, o PSD está de acordo com o Orçamento.
Mas também é bom que se diga que, de alguma maneira, quando acentuou que estava de acordo na generalidade nos deixou uma dúvida: e na especialidade, está ou não de acordo?

O Sr. Fernando Amaral (PSD): - A paciência é uma grande virtude!

O Orador: - Quais são, concretamente, as propostas de alteração que o PSD vai apresentar e que correspondem, nos subentendidos da sua intervenção, às dúvidas e reservas que têm na especialidade?

Protestos do PSD.

Eu suponho pelos apartes que alguns Srs. Deputados da bancada do PSD estão afazer - e isto é uma pequena nota que fica registada no Diário da Assembleia da República - que estão a entender mal a minha intervenção.
Apesar de tudo, suponho que seria importante que o Sr. Deputado lhes distribuísse a sua intervenção, para ver se entenderam e conseguiram perceber quais foram as dúvidas e reservas presentes na sua própria intervenção.

Aplausos do PCP.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Entenderam!

O Orador: - Em terceiro lugar, queria pôr-lhe ainda outra questão muito simples. O seu partido, pela pessoa do então Ministro da Administração Interna, o Sr. Deputado Angelo Correia, iniciou um debate nacional acerca da regionalização. O debate teve o destino que teve, até porque o balanço desse debate não era - pode dizer-se - muito favorável às ideias do Sr. Ministro.
Entretanto, há um facto novo: no Orçamento, tal como ele é apresentado, as assembleias distritais são financiadas, ao contrário do que sempre sucedeu até aqui, não por verbas do Orçamento correspondentes ao cômputo das receitas do Estado em geral, mas pelas verbas das autarquias. É 0,5 % da verba correspondente às alíneas tal e tal, daquilo a que as autarquias têm direito, que vão financiar as assembleias distritais.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se isto corresponde ao desenho que o Governo e os partidos que o sustentam - neste caso o PSD - fazem daquilo que vai ser a regionalização. Isto corresponde já a um abrir cami-

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nho para que a regionalização seja feita à custa das verbas das autarquias?
Ou, pelo contrário, não deverá ser feita aqui, nesta Assembleia, a proposta concreta dos cerca de 250 000 contos necessários ao financiamento das assembleias distritais, no sentido de essa verba ser proveniente de dotações do Orçamento, em vez de provirem das verbas que, de direito, pertencem às autarquias?
O Sr. Deputado subscreve connosco essa proposta?

Vozes do PCP: -Muito bem!

Uma voz do CDS: - Vai buscar apoio!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Vou ser muito rápido, dado o pouco tempo de que dispomos. Espero que os Srs. Deputados do Partido Comunista não me levem a mal por isso.
E vou começar, exactamente, por responder ao Sr. Deputado João Amaral.
Em relação às linhas e às entrelinhas, cada um fará a sua leitura. Em relação às propostas concretas - e peço-lhe desculpa - o Sr. Deputado terá de aguardar, embora, se quiser tirar das entrelinhas da minha intervenção alguma coisa o possa fazer, adiantando, assim, as propostas dela saídas.
De qualquer forma, e em lermos concretos e definitivos, terá necessariamente de aguardar o momento oportuno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação à matéria dos orçamentos das assembleias distritais, penso que fui bem claro na sugestão que dei. E, igualmente por razões de tempo, permita-me que lhe diga apenas que não entendo que a matéria orçamental determine, seja sob que forma for, qualquer tipo de regionalização.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pois claro que não!

O Orador: - Em relação às perguntas do Sr. Deputado Silva Graça e quanto ao problema de sermos ou não o partido de maior implantação a nível de autarquias, isso está demonstrado.
Relativamente à pergunta que me coloca sobre investimentos do Plano, permita-me que lhe sugira, Sr. Deputado, que dirija essa pergunta ao Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Amaral (PCP): - Boa resposta!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, ao que julgo para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Nogueira de Deito (CDS): - Sr. Presidente, muito embora tendo consciência da,violência que a minha proposta representa para o Sr. Deputado Luís Saias, que já adiou hoje uma vez a sua intervenção, tenho a impressão que o esforço de racionalização deste debate do Orçamento que estamos a tentar fazer devia

continuar. De facto, nós temos inscrito para proferir uma intervenção um membro do nosso Grupo Parlamentar, o Sr. Deputado João Abreu Lima, cuja inscrição está um pouco mais para a frente. Ora, acontece que o Sr. Deputado João Abreu Lima vai falar sobre este mesmo tema.
Portanto, propunha ao Sr. Deputado Luís Saias - sendo certo que já lho propus directa e pessoalmente - e também à Assembleia que aceitasse a antecipação no debate da intervenção do Sr. Deputado Abreu Lima, para que pudessemos concentrar este tema. E isto, tendo em conta que foi neste mesmo sentido que procurámos organizar este debate na reunião de líderes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, com a devida vénia, permitia-me fazer uma outra sugestão: sugeria que adiássemos o debate sobre esta matéria até ao momento em que o Governo esteja capacitado para nele participar.
De facto, isto transforma-se num debate um tanto ou quanto surrealista. É que se discute o Orçamento - que é da responsabilidade do Governo - e, com razões de peso, o Sr. Deputado Antunes da Silva do PSD disse há pouco a um deputado da bancada do Pa:- tdo Comunista: «pergunte ao Governo». Só que eu olhei para a bancada do Governo e, neste caso concreto, o Ministro da Administração Interna não estava presente.
Perguntava-me como é que o Sr. Deputado do Partido Comunista Português poderia satisfazer a sugestão, legítima, do Sr. Deputado da bancada do PSD.
Por isso, penso que talvez fosse caso de adiarmos o debate.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, penso que o esforço feito em relação ao debate sobre agricultura foi louvável. De facto, enquanto esse debate decorreu contámos com a presença permanente do Sr. Ministro da Agricultura florestas e Alimentação, e, por isso, congratulo-me por tal facto.
Agora fazer-se este debate do Orçamento na ausência de esclarecimentos por parte do Governo, tem pouco sentido. Não estamos a debater um projecto de lei da iniciativa da Assembleia da República. Estamos a debater o Orçamento, que é da responsabilidade do Governo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, pediu a palavra, não é verdade?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sim, Sr. Presidente, desejo usar da palavra.
Todavia, como o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para dar explicações à Câmara, nós gostaríamos de o ouvir primeiro.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro de (Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Srs. Deputados, devo dizer-lhes que embora talvez mal representado, o Governo está presente.
O problema do Governo é apenas o de que não foi notificado de que a matéria hoje em discussão era

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sobre este assunto. Aliás, só à última hora foi decidida a prorrogação dos debates, por isso contávamos que o debate sobre a matéria em apreço decorresse amanhã.
De qualquer modo, poderei prestar os esclarecimentos que estiverem ao meu alcance, com uma condição: o Governo já tem pouco tempo e, nesse caso, talvez os partidos queiram dar-nos o tempo necessário para podermos responder.
Eu não sou um especialista em matéria de finanças locais, mas como clínico geral dos problemas políticos do Governo, estou ao dispor da Assembleia para responder às perguntas que me queiram formular, mesmo nesta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pretendo também pronunciar-me sobre esta questão.
Muito brevemente diria, sem querer entrar em polémica com o Sr. Ministro Almeida Santos -até porque o caso não é para isso - que o Governo sabia disto, porque o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares esteve presente na reunião em que se combinou e assentou a programação dos trabalhos. E sabia também que a tarde de hoje era dedicada às questões do desenvolvimento regional e do equipamento social.
Portanto, não vamos criticar o Governo porque ficou perfeitamente assente que, tanto por parte do Governo como por parte de qualquer partido, havia inteira liberdade.
Portanto, não há nenhuma critica a fazer. O Governo entendeu não usar o seu tempo dentro desses parâmetros e não temos nenhuma crítica a fazer quanto a isso.

O Sr. Ministro desculpar-me-á, mas o que interessa, neste caso, é assentar no seguinte: do nosso ponto de vista, a proposta do CDS é razoável na medida em que o debate parlamentar sobre esta questão está aberto. E neste momento, está reforçado ou, melhor dizendo, estão reforçadas as condições para que tal debate se desenvolva, pela posição do Sr. Ministro ao dizer que estava capacitado para nele intervir, visto que, como clínico geral, poderia perfeitamente atender à questão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Queria apenas reforçar o que disse há pouco.
A nossa ideia é que, como só já temos 20 e poucos minutos, queríamos aproveitá-los amanhã para uma intervenção, ou do Sr. Ministro da Administração Interna ou da Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica. De facto, pareceu-nos que devíamos fazer no último dia uma intervenção, além do fecho, razão por que não nos preocupámos em estarmos hoje aqui presentes em força.
De qualquer modo, o Governo está representado. Se os Srs. Deputados entenderem que eu posso ou devo pronunciar-me sobre as perguntas que queiram formular-me, terei muito gosto em responder-lhes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, se ainda deseja usar dela.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, neste sentido quero dizer que tendo em atenção a disponibilidade que através do Sr. Ministro de Estado se revela, no sentido de o Governo poder fazer amanhã uma intervenção nesta matéria, e também na lógica da intervenção do Sr. Deputado Lopes Cardoso, nós não vemos razão - por muito que custe a alguns partidos aqui representados - para alterarmos a ordem das inscrições. Nesse sentido, o Sr. Deputado Luís Saias manterá a ordem de inscrição para produzir a sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que o Sr. Deputado Luís Saias não está de acordo com a alteração da ordem de inscrições, creio que não adiantaremos muito mais em continuarmos esta discussão.

Todavia, vou dar a palavra aos Srs. Deputados João Amaral e Lopes Cardoso antes de prosseguirmos a discussão.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que, da nossa parte, não há nenhum inconveniente em que o Sr. Deputado Luís Saias exerça o seu direito, na medida em que está inscrito.

Lamentamos apenas que a questão não seja resolvida nos termos mais adequados.

Entretanto, e em relação aos 20 minutos de que o Governo dispõe para amanhã, sempre pensámos que esses minutos fossem reservados para a importante área social, onde se incluem nomeadamente, as questões de trabalho, da segurança social, da saúde e da educação, sobre as quais o Governo não disse, até agora, uma única palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Rigorosamente nada!

O Orador: - Portanto, nós estranhamos este facto, e não podemos deixar de o registar, pois que, sendo hoje o dia reservado para o equipamento social e desenvolvimento regional, o Governo entenda reservar o seu tempo para amanhã para a matéria das finanças locais. E estranhamos que sendo o dia de amanhã o reservado para a área social, o Governo entenda prescindir, desde já, de apresentar o seu orçamento para a referida área.

Quanto à posição do Sr. Deputado Jorge Lacão, não temos qualquer dúvida quanto ao exercício de direitos regimentais.

Portanto, se o Sr. Deputado Luís Saias entende que deve proferir a sua intervenção, não seremos nós que questionaremos, minimamente, esse direito.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Muito obrigado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Era só para agradecer ao Sr. Deputado Jorge Lacão o facto de ter invocado a minha lógica. No entanto, refiro que essa é a lógica da minha proposta.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Só nos resta registar a indisponibilidade do Partido Socialista, estranhar a ordem que o Governo está a pretender imprimir à sua intervenção nos debates e lamentar não termos tido possibilidade de dialogar com os partidos. Interessa-nos muito dialogar com os partidos presentes nesta Assembleia sobre este tema importante e fulcral no Orçamento do Estado respeitante ao ano de 1984, mas contra a vontade do Partido Socialista e contra a ordem das inscrições nada podemos. Portanto, nada faremos. Registamos apenas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem. a palavra o Sr. Deputado Luis Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: É caso para dizer, em especial ao CDS, finalmente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Portugal é um país vocacionado para o mar quer pela grandiosidade da nossa história marítima quer pela nossa posição geográfica sobre a amplidão do Atlântico quer pela extensão e riqueza das nossas costas quer sobretudo pelo carácter, cultura e memória colectiva do nosso povo. O mar foi o nosso caminho para o mundo, o mar é a ligação natural entre as partes integrantes e indissolúveis do solo pátrio - a faixa continental
as ilhas atlânticas. Foi o mar que nos deu grandeza e dimensão. Navegando fizemos as descobertas, escrevemos a história, cimentámos a nossa nacionalidade. A nossa história evidencia, de facto, que a grandeza do povo português sempre dependeu do mar, sempre lhe adveio do mar.
E agora, nesta época em que vivemos, mais uma vez dependemos, em grande medida, como Povo, do aproveitamento que saibamos fazer das potencialidades que o mar nos oferece. Da expansão e consolidação das nossas actividades marítimas -comércio, pesca e exploração de outros recursos marinhos - depende o futuro de Portugal.
O dilema, Srs. Deputados, a meu ver, é este: ou aproveitamos as potencialidades que o mar nos oferece, ou não sairemos da apagada situação a que chegámos. O passado de Portugal foi, indiscutivelmente, o mar e o futuro de Portugal está, podem crer, no mar.

Risos.

Neste domínio das actividades marítimas, o nosso País vive, porém, uma contradição que é preciso ultrapassar. Na realidade, se por um lado é certo que temos condições naturais e humanas excepcionalmente favoráveis ao florescimento das actividades marítimas, por outro lado, verifica-se que essas actividades estão no nosso País em franca decadência.
De facto, as pescas portuguesas debatem-se com dificuldades de toda a ordem: envelhecimento das frotas, diminuição das capturas, redução da população activa do sector, degradação económica das empresas, etc., etc. Por seu turno, a marinha de comércio nacional ainda está pior: fraquíssima participação do pavilhão português no transporte de mercadorias de e para o país, desactualização da frota e situação financeira desesperada das empresas. A indústria de construção e reparação naval, essa, todos o sabem, está de há muito em risco de colapso iminente.
Ora, é absolutamente necessário ultrapassar esta situação. O bem do país reclama dos órgãos de soberania visão larga das nossas actividades marítimas e uma actuação prática, em conformidade. Temos, Srs. Deputados e Governo que me escuta, de ousar planear com desenvoltura, à medida das nossas grandes potencialidades, da nossa vocação marítima e da nossa história de homens do mar.

Risos.

O Partido Socialista, é-me grato dizê-lo, compreendeu isto há bastante tempo. E, em consequência, assumiu uma clara posição de liderança no ressurgimento das nossas actividades marítimas. Essa liderança traduziu-se, em primeiro lugar, na iniciativa de apresentar e defender nesta Casa a Lei das 200 milhas (Lei n.º 33/77, de 28 de Maio), que alargou o mar territorial para 12 milhas e estabeleceu a Zona Económica Exclusiva das 200 milhas. Foi uma iniciativa patriótica, oportuna, criadora de novas potencialidades e origem de esperanças, a que nos incumbe, agora, dar realidade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A declaração da Zona Económica Executiva foi uma resolução histórica do Estado Português, que por certo honrou o partido que a propôs, mas que sobretudo honrou este Parlamento que a aprovou, creio que por unanimidade.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Outra medida de grande alcance, também posta em prática neste Governo, foi a constituição do Ministério do Mar. A criação do Ministério do Mar é, obviamente, um acto político de importância transcendente. É, sobretudo, a afirmação clara e concludente da vontade do Governo de conferir à gestão das actividades ligadas ao mar a eficácia, os meios e a responsabilização de que só um ministério específico pode dispor.
Na realidade, com as pessoas agrilhoadas, como andavam, ao peso da agricultura, e com a marinha do comércio e os portos em promiscuidade com os outros transportes, as actividades do mar padeciam de uma subordinação fatal ao seu desenvolvimento.
Portugal tem, pois, pela primeira vez na sua História o seu Ministério do Mar.
A criação do Ministério do Mar deu voz forte, ao nível do Governo, aos negócios do mar, e, do mesmo passo concluída que seja a sua organização, dará corpo às estruturas orgânicas adequadas à importância dos interesses em jogo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Motivo de grande preocupação nacional tem sido o nosso relacionamento pesqueiro com a vizinha Espanha. Na verdade, as relações com a Espanha nesta área eram injustas e insustentavelmente prejudiciais para, Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - O Convénio Luso-Espanhol sobre Pesca Marítima, de 9 de Dezembro de 1969, aprovado por Marcelo Caetano, foi um acto da maior gravidade para as pescas portuguesas, cujas nefastas consequências os governos democráticos saídos do 25 de Abril têm procurado minorar, com a única e infeliz excepção do Protocolo Adicional de 24 de Setembro de 1981, como foi oportunamente salientado nesta Câmara.

Nesta área do nosso relacionamento pesqueiro com Espanha entrou-se agora no caminho certo, ou seja, no caminho da defesa esclarecida e firme, ainda que sem escusados chauvinismos, dos interesses nacionais. Isto mesmo foi ontem salientado nesta Câmara por um senhor deputado do PSD.

É justo que fique aqui uma palavra de grande apreço pelo trabalho da equipa portuguesa que na recente Cimeira Luso-Espanhola sustentou as nossas posições.

Nesta matéria, o facto mais relevante acontecido foi talvez a tomada de consciência da importância fundamental para o nosso país de defender os seus recursos pesqueiros e a actuação conforme do Governo com o apoio de fado o povo. E que todos compreenderam que, com a poderosa frota espanhola a actuar nas nossas águas, como o vinha fazendo, se caminhava para o esgotamento dos nossos recursos pesqueiros.

Com o estabelecimento da ZEE, a criação do Ministério do Mar e, agora, o alivio da pressão espanhola sobre os nossos pesqueiros, construímos, pedra a pedra, nesta Casa e nos Governos, os alicerces do ressurgimento das nossas pescarias e do nosso comércio marítimo. Há agora que arrancar com energia. É evidente, porém, que a política de «estabilização financeira» e de «rigorosa austeridade», que o Governo corajosamente impôs para 1984, não permite larguezas orçamentais para o próximo ano. Todos lamentamos a austeridade nesta área tão carecida de investimento, mas todos compreendemos e aceitamos a necessidade dessa austeridade.

No entanto, pesem embora as restrições orçamentais necessárias em 1982, há muitas coisas que, mesmo assim, podem ir sendo pensadas, preparadas e feitas, enquanto aguardamos os Programas de Recuperação Financeira e Económica e de Modernização da Economia, e um Orçamento menos restritivo, o que, aliás, já se vislumbra para 1985.

Nesta ordem de ideias de fazer muito e gastar pouco, afigura-se-me oportuno elaborar, no próximo ano, legislação de que o sector está muito precisado.

Sem intuitos de ser exaustivo, citarei, a título de meros exemplos, como áreas carecidas de legislação, as seguintes: a protecção dos recursos, onde se engloba o estabelecimento de épocas de defesa de pesca para certas espécies; a criação de zonas de reserva, onde seja proibida a pesca e que sirvam de criadores; o condicionamento do uso de algumas artes de pesca, como o tresmalho, a revisão da malhagem do arrasto costeiro; a fiscalização das nossas águas, onde é reclamada legislação preventiva e repressiva das transgressões, e a reposição, que se me afigura oportuna, dos Tribunais Marítimos; a defesa contra a poluição aquática, nas suas variadíssimas formas - hidrocarbonetos, efluentes domésticos e industriais, etc. Isto, sem falar ainda, em matéria legislativa, da grande tarefa nacional que seria a aprovação por este Parlamento de uma lei de fomento das pescas, que servisse de «farol legislativo a toda a nossa actividade pesqueira futura».
Ainda nesta ordem de ideias de ir fazendo com pouca despesa, o ano de 1984 deve ser o ano da con-i solidação da estrutura do Ministério do Mar e dai regionalização dos serviços, deve ser o ano do lançamento do ensino superior das pescas, deve ser o ano da preparação - que é urgente - da nossa entrada na CEE, agora liberta do fantasma e dos direitos históricos espanhóis, deve ser o ano da intensificação da nossa actividade diplomática no sentido de estabelecer e consolidar acordos de pesca, com terceiros países. O ano de 1984 deve ser também - tem de ser, Srs. Membros do Governo aqui presentes - o ano da clarificação e da reorganização do sector empresarial do Estado na área do mar (pescas, industrialização e comercialização de pescado e marinha de comércio). E a própria frota pesqueira nacional existente pode ser rendibilizada, em muito, sem investimento significativo. Basta que em vez de operar apenas um quarto ou um terço, quando muito, das horas que o ano tem, exerça a faina da pesca por mais tempo.
Isto é possível, Srs. Deputados. É preciso querer, é preciso fazer.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. João Abrantes (PCP): - Contra isso só uma pastilha para o enjoo.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Deputado Luís Saias, ouvi a sua intervenção e muito rapidamente vou colocar-lhe 6 questões, já que - segundo sabemos pela voz do Sr. Ministro Almeida Santos -, mais uma vez, o Sr. Ministro do Mar fica a nadar nas águas próximas de S. Bento.
Seria de esperar que, devido à importância que tem para o sector, o Acordo Luso-Espanhol de Pescas merecesse uma clara definição por parte do Governo. Mas isso nem sequer é referido nas Grandes Opções do Plano. No entanto, já se vai ouvindo que o Governo pretende avançar para a formação de sociedades mistas com os armadores espanhóis. Que solução é esta, Sr. Deputado?

Nós daríamos o mar, o peixe e, na melhor das hipóteses, alguns trabalhadores e a Espanha ficaria com a parte leão, com os seus barcos, os seus pescadores a pescarem nas nossas águas. Ao fim e ao cabo, tal seria como aconteceu até Dezembro de 1982.
Não é verdade que os navios das empresas nacionalizadas há muito se encontram paralisados e que no Orçamento do Estado não está nenhuma verba para actualizar esses barcos? É preciso, ou não, reconverter a frota existente e construir novas embarcações convenientemente equipadas para o aproveitamento dos recursos da nossa ZEE? Onde é que estão as verbas para isso, Sr. Deputado? Temos, ou não, trabalhadores hábeis, com provas dadas, que estão sem trabalho? Temos estaleiros navais que estão paralisados e uma zona económica para aproveitar, e não - como há dias quando da nossa interpelação, nos disse o Sr. Ministro do Mar- para aguardar inexplorada para depois os nossos netos comerem.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Era mais um disparate!

O Orador: - Em relação ao Plano Nacional de Pescas, as Grandes Opções nada dizem. Tal e qual como eu, o Sr. Deputado, quando apareceu o tal Plano Nacional considerou que aquilo era mais uma série de documentos, alguns até mal elaborados.
Onde estão por exemplo, e quais são, as verbas orçamentais para melhoramento dos portos secundários de Sesimbra, Sines, Vila do Conde, etc.?
Onde estão as verbas para o apoio ao desenvolvimento das pescas, por exemplo, às da sardinha artesanal, do atum de largo e à do arrasto costeiro, Sr. Deputado Luís Saias?
Onde estão as verbas para pagar os salários dos trabalhadores da CPP e Gel-Mar, que há 8 meses não recebem? E ainda hoje foi visto a sua manifestação aqui em frente a esta Assembleia. Quando é que são pagos esses salários?
Eis algumas questões a que gostávamos de obter resposta pela sua voz, já que não vamos ter oportunidade de ouvir o Sr. Ministro do Mar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Baias (PS): - O Sr. Deputado Carlos Espadinha faz algumas perguntas. Disse que seriam 6, mas afinal parece que são mais. S6 sobre salários são 4 ou 5. No entanto, procurarei responder, apesar de algumas destas perguntas deverem ser feitas ao Governo.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - O Ministro não fala! ...

O Orador: - Penso que fala esta noite.
Quanto ao acordo com a Espanha, o Sr. Deputado Espadinha por certo sabe tão bem como eu a história deste acordo, sabe que temos estado a viver as consequências de um mau acordo feito pelo Governo de Marcelo Caetano e sabe, também, que depois do 25 de Abril os governos democráticos procuraram corrigir esta situação.
A verdade é que só agora, através do Governo vigente, houve oportunidade de clarificar posições em relação à Espanha.
É justo dizer aqui que o Governo do Dr. Balsemão, quando se apercebeu de que o protocolo adicional de 1981 lesava os interesses nacionais, proeurou, a partir daí, travar essa situação. No entanto, só agora, com a cimeira Luso-Espanhola houve oportunidade para o Governo português dizer aos espanhóis que não se fazia o acordo, nos termos que a Espanha queria, o que a meu ver foi uma atitude firme, patriótica - e que é de louvar - deste Governo.
Efectivamente, teme falado em sociedades mistas, e o Sr. Deputado tem receio que estas sociedades possam vir a prejudicar os interesses portugueses. No entanto, penso que as sociedades mistas podem ser úteis a Portugal. desde que sejam devidamente acautelados os nossos interesses. Tendo o Governo dado mostras de tanta firmeza, discernimento e clarividência nesta matéria, face aos espanhóis, penso que se vier a negociar a constituição de sociedades mistas isso será feito, também, com a maior firmeza e defendendo os interesses nacionais.
Quanto às empresas nacionalizadas, sei que estão parados navios dessas empresas - e é pena que o estejam. Como o Sr. Deputado Carlos Espadinha ouviu, na minha intervenção referi que entendia ser 1984 o ano da clarificação da posição do Estado em relação às empresas nacionalizadas no sector das Pescas. E o Sr. Deputado sabe bem que na minha opinião as empresas nacionalizadas do sector das Pescas deveriam ser objecto de um saneamento económico e financeiro e que a frota nacionalizada devia ser posta a trabalhar.
Quanto aos portos, a verdade é que Portugal é um país relativamente bem apetrechado em matéria de portos de pesca. Basta olhar para o que se passa no Algarve e ver que desde Vila Real de Santo António até Sagres temos excelentes portos de pesca. Aliás, neste momento decorrem obras em 4 ou 5 portos. Além disso, está também em construção o porto de abrigo da Nazaré e há obras em curso em Sines.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Olhe que não!

O Orador: - Seja como for, em matéria portuária, o País tem feito, desde há anos, um esforço a todos os títulos notável.
Finalmente, pergunta-me onde está o dinheiro para pagar os salários que estão em dívida nas empresas nacionalizadas de pesca. Penso que o Sr. Ministro do Mar talvez lhe possa dar resposta, porque eu não o sei fazer.

O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Fiquei sabendo pela voz do Sr. Deputado Luís Saias que o Partido Socialista está de acordo que, com a continuação da discussão do acordo luso-espanhol, se avance para a constituição de sociedades mistas. Isto, para que os espanhóis ainda venham explorar mais as nossas águas do que fizeram até 1980. E, como consta, para além dos espanhóis estão os alemães, os japoneses e os americanos. É isso que ficámos sabendo.

Vozes do PSD: - E os russos!

O Orador: - Para terminar, pergunto ao Sr. Deputado Luís Saias onde é que estão as verbas do Orçamento para pôr em actividade toda a frota paralisada, há uma série de meses, das empresas nacionalizadas.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. !Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, é um contraprotesto o mais enérgico possível. Protesto contra a distorção que o Sr. Deputado Carlos Espadinha fez daquilo que eu disse. O Sr. Deputado está a imputar-me afirmações que não fiz, de forma nenhuma, no que se refere às empresas mistas de pesca. Em primeiro lugar, não disse que defendia a constituição de empresas mistas de pesca. Disse é que tinha confiança no Governo no sentido de essas empresas serem aceites, com os interesses nacionais devidamente acau-

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telados. Esta confiança resulta da firmeza com que o Governo defendeu os nossos interesses nas negociações que teve recentemente com os espanhóis.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a estrutura do Orçamento do Estado, tal como a discutimos ainda este ano, é -passo talvez o exagero da expressão - muito próxima de uma estrutura do Orçamento dos anos 30, embora com a introdução de novas chaves classificativas. Esta não é uma responsabilidade de alguém em particular, mas de todos nós que votámos uma Lei de Enquadramento do Orçamento em 1977 que não foi, como'aliás a Constituição antes da sua reformulação também não era, particularmente audaciosa em matéria financeira e fiscal.
Criámos, portanto, um sistema - ou melhor, mantivemos um sistema- mais preparado para o controle financeiro e jurídico, do que para a eficácia das despesas. Foram fundamentalmente critérios de controle contabilístico e da legalidade das despesas que preocuparam a nossa legislação financeira, muito mais do que critérios de rentabilidade e de eficácia das despesas desenvolvidas. E, na verdade, ainda hoje a estruturação por categorias de despesas de que dispomos não questiona a necessidade dos serviços, nem a sua dimensão, assim como também não põe em causa as missões que lhes são confiadas. Não confronta custos com benefícios, não evidencia custos de inactividade, não permite avaliar as despesas pelo proveito que delas se tira.

Temos, portanto, em termos da nossa disciplina financeira, critérios que são - e todos havemos de o reconhecer - naturalmente insuficientes para um perfeito controle da eficácia e da actividade da Administração. É perfeitamente possível, pelo modo como estão organizados os nossos controles financeiros, manter em funcionamento anos seguidos um serviço cuja real utilidade já desapareceu. E não é preciso andar muito para trás na nossa história financeira e nos nossos diplomas orçamentais, para todos encontrarmos casos como este: em 1970, por exemplo, ainda era possível encontrar no orçamento da então Secretaria de Estado da indústria, verbas destinadas para o caminho de ferro de Rio Maior que tinha fechado logo após a Segunda Guerra Mundial!

Risos da ASDI, PS e PSD.

Ainda hoje é possível encontrar coisas tão aberrantes, e que às vezes vão sendo contrariadas casuisticamente, como, por exemplo, uns célebres impressos utilizados pela Comissão de Explosivos que a Imprensa Nacional fornecia ao preço de 1$, devolvendo a mesma Comissão de Explosivos à Fazenda Nacional X70. Gastava, portanto, mais no impresso do que na importância que devolvia.
Coisas destas não são infelizmente anedóticas, mas apenas revelam como os instrumentos de que dispomos não são os mais adequados. A conclusão a tirar disto é que o sistema de que dispomos em matéria orçamental pressupõe - e este é o ponto importante - que o Estado tem que assegurar, e para todo o sempre, os encargos das actividades que alguma vez lhe foram cometidas. Ou seja, o sistema de que dispomos gera uma tendência sempre crescente das despesas públicas. E como se nenhum serviço pudesse terminar, como se todos eles estivessem justificados por natureza e, como tal, fôssemos acumulando, pelo simples facto da sua existência, a necessidade das suas despesas.
Creio, Sr Presidente e Srs. Deputados, que não é possível continuar com esta situação. Tive ocasião de salientar, no debate aqui feito a propósito da criação de impostos extraordinários, como o défice do sector público administrativo, que era em 1979 de 98,6 milhões de contos, tinha crescido para 127,4 milhões de contos em 1980, passando a 166,2 em 1981, para em 1982 já ser de 178,5 milhões de contos. As despesas com pessoal, ao nível exclusivamente da administração central, que em 1979 eram de 82,04 milhões de contos, já eram em 1980 de 99,67, situando-se em 1981 no valor de 123,69 e em 1982 correspondiam a 150,98 milhões de contos. Ou seja, há aqui um ritmo de crescimento das despesas que é, havemos de confessar, insustentável. E não é apenas o problema deste crescimento das despesas que nos deverá preocupar. O problema, é que o sistema de que dispomos impede também o reajustar de recursos naturalmente escassos. Se continuamos a manter estruturas inúteis e ultrapassadas, o peso na repartição de recursos dessas mesmas estruturas haverá naturalmente de afectar outras mais dinâmicas, mais capazes e, afinal, mais úteis.

No Orçamento, acrescentarei, não aparecem também os resultados obtidos em contrapartida das despesas do Estado. E este é um problema crucial do controle político que um parlamento deve exercer em relação a um orçamento. Não conhecendo os resultados efectivos obtidos pela realização de uma despesa, o controle político é necessariamente vago e ineficaz. E creio que seria aqui ocasião de termos bem presente uma regra que muitas vezes era enunciada, e que talvez tenha caído um pouco em desuso, que é uma lembrança, de algum tempo, de acordo com a qual os parlamentares devem ter consciência de que toda a despesa pública representa um imposto sobre os seus concidadãos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O Orçamento aparece, portanto, como uma soma das despesas por Ministério. E, por isso mesmo, porque ele aparece como resultado das várias despesas e porque em relação a muitas delas não dispomos de instrumentos de controle, creio que se tornará necessário - e este debate terá sublinhado isso à evidência- que o debate político que fazemos sobre o Orçamento passe a ser completamente diferente daquele que temos realizado até hoje.
Na verdade, pensamos que é necessário que o debate político sobre o Orçamento do Estado possa ser travado de tal modo que em relação a cada despesa seja possível verificar politicamente da sua eficácia e rentabilidade.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não creio, Sr. Presidente, e Srs. Deputados - e com isto quero explicar muito claramente

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uma situação -, que o facto de este debate ter corrido assim, ou de ter sido organizado assim, seja responsabilidade particular de quem quer que seja. E se estou particularmente à vontade para dizer isto, é porque defendia uma opção em relação à organização do debate diferente daquela que foi seguida. Quererei, no entanto, aqui sublinhar - agora que muitas críticas são fáceis, porque é sempre muito fácil fazer história depois da história feita - que a proposta de organização deste debate também não saiu da bancada governamental. Penso que é importante sublinhar este aspecto, que é importante dizê-lo, e se todos nós temos de nos penitenciar em relação a um debate que, embora com melhorias em relação a debates anteriores que importa assinalar, decorre ainda de um modo que podíamos considerar - como ontem sintetizámos de acordo com um comentador conhecido - em que «tudo vai ao monte e com fé em Deus» ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Os que são crentes!

O Orador: - Os outros vão com fé no Dr. Ernâni Lopes!

Risos.

Creio que, por outro lado, teremos ficado com uma lição exemplar sobre as modificações necessárias a introduzir-lhe em anos futuros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um ponto essencial que cumpre destacar neste momento, é o de saber em que medida o sistema fiscal que possuímos é, também ele, adequado. Direi que, como facilmente resulta para todos nós, o sistema fiscal que temos é insuficiente para cobrir as despesas públicas e não parece possível que possa subir muito mais. Todos nós temos consciência de que se terá chegado a algum limite em relação à carga fiscal e também creio que se poderá concluir que este sistema fiscal não parece dar indícios de resolver a nossa situação.
Importa igualmente assinalar que o acréscimo das rcccitas fiscais foi superior à taxa média do produto interno bruto, mas foi inferior à do crescimento das despesas. Só foi possível por aumento das taxas, pela criação de adicionais ou de novos impostos, por aumentos nominais de rendimentos e por via da inflação.
Por outro lado, não há aquilo que os fiscalistas chamam «equidade horizontal», ou seja, verifica-se que as pessoas com o mesmo rendimento pagam diferentes impostos e assim, havemos de confessar, também se estimula a fraude.
Tributam-se exageradamente os rendimentos do trabalho, há discriminação nas diversas formas de rendimentos do capital, privilegiam-se as aplicações passivas em vez das aplicações activas - é neste momento mais rendoso, em termos de pura lógica capitalista, colocar dinheiro a prazo do que criar uma nova empresa- e creio que esta distorção da política fiscal em relação à política económica merece ser assinalada por esta Câmara.
O efeito das contribuições para a segurança social está também por avaliar em termos económicos, mas sabe-se que contribui - e o Ministério da Indústria e Tecnologia tem dados sobre esta matéria - para que se faça a instalação de unidades produtoras ou o desenvolvimento de sectores com intensidade de capital superior à que seria desejável na nossa situação.

Uma conta é extraordinariamente simples de fazer. Um grupo de trabalho há anos reunido fez um esforço de levantamento de um programa sobre substituição de importações. Aplicando os dados desse estudo, chegaríamos à dupla e triste conclusão de que qualquer empresário não seria tentado a fazer o investimento necessário para essa substituição de importações - com os resultados que isso traria para a nossa economia e até em relação ao emprego criando postos de trabalho- por duas razões fundamentais: primeiro, porque o mesmo Ministério da Indústria e Tecnologia e o Ministério das Finanças e do Plano, partindo do princípio que não há produção nacional desses mesmos produtos, lhe concede isenções sobre os direitos de importação ou, pelo menos, reduções substanciais nesses direitos; segundo, porque mesmo considerando os direitos de importação, o simples facto dos 24 %de prestação para a segurança social se traduzem em tornar pouco aliciante a criação desse investimento, dessa empresa e desses postos de trabalho, face a uma importação mais fácil.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Creio que o elenco que tracei é suficiente, em termos de uma análise que não pretende ser exaustiva, para justificar como precisamos de uma reforma, e de uma reforma profunda, em relação à elaboração, preparação e discussão do Orçamento do Estado. E esse é singularmente, dirão alguns, para quem apresentou um elenco de críticas - mas penso que isso tem, pelo menos, alguma coerência - um dos méritos do Orçamento que nos é apresentado: o de precisamente, não iludir esta situação e permitir a esta Assembleia ter esperança de que este Orçamento será o último que nos poderá ser apresentado nestas condições. Creio que este é um mérito e não pequeno, pelo menos do meu ponto de vista, apesar de não ter iludido críticas em relação a um sistema que considero particularmente defeituoso.
Parabéns, pois penso que, quer o Plano que nos foi apresentado, quer o Orçamento que nos é presente, estabelecem princípios e directrizes que permitem supor com algum fundamento que há uma intenção séria de modificar este estado de coisas.

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Pela nossa parte é possível introduzir, e desde já, no Orçamento do Estado para 1984, algumas modificações que, sem terem a pretensão de poder atingir problemas mais fundos como aqueles que enunciei, podem em todo o caso corrigir algumas assimetrias mais importantes. Penso que será esta a ocasião azada para que a Assembleia da República faça executar uma sua deliberação e que, com as correcções salariais a que isso dê origem, crie a obrigatoriedade de tributação de todos os portugueses pelos seus rendimentos de trabalho, incluindo na tributação os funcionários civis e militares.

Vozes da ASDI e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Haverá, por outro lado, que ter em atenção que na situação dos reformados há situações que não são as tradicionais que costumam ser anunciadas em termos de reformas. São as situações de reformas acumuladas com o exercício de profissões activas ou as reformas que excedem em muito os salários médios e até os salários elevados da população portuguesa. E também essa situação precisará de merecer a nossa atenção e algumas correcções, porque é ele justiça.

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O Sr. Fernando Amaral (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Haverá que introduzir alterações em relação ao regime do imposto complementar para que, desde já, esse regime tenha em conta a correcção de uma desigualdade flagrante entre aquilo que são as situações familiares e as situações individuais. Há que introduzir um esforço sério, que é também um esforço de rigor e de moralização, em especial em relação ès actividades exercidas ao nível estadual, na definição de um sério regime de incompatibilidades em relação ao exercício da função pública.

Vozes da ASDI e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este aspecto é particularmente importante e creio que deverá merecer a atenção de toda a Câmara. É também altura de, a este propósito, se ter a coragem de em matéria de incompatibilidade e de orçamentos ter em conta a própria situação deste órgão de soberania que é a Assembleia da República.

Vozes da ASDI e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste momento e lugar, uma vez que a matéria já foi utilizada, talvez valha a pena chamar a atenção, porque a notícia escapou ignorada, que o Parlamento Suíço procedeu a uma análise dos custos de todos os parlamentos europeus. Na análise desses custos fez um trabalho extremamente sério, visto que não só começou por considerar o número de deputados em relação ao número de cidadãos - e não apenas em relação ao número de eleitores -,mas avaliou todos os custos, incluindo vencimentos dos deputados, subsídios de apoio para habitação e para viagens, pagamento aos funcionários dos próprios parlamentos e todos os gastos de funcionamento dos vários parlamentos, para depois ponderar esses dados em relação ao número de deputados por habitante. Este dado foi ainda ponderado com outro, qual fosse a actividade parlamentar avaliada pelo número de sessões.
Pois bem, quando muitas vezes se diz mal da eficiência, operatividade e até dos custos do Parlamento Português, creio que seria importante que deixássemos aqui transcritos os resultados desse estudo, porque enquanto a Assembleia Nacional Francesa é o parlamento mais caro da Europa, segundo estes dados, o Parlamento Português figura honrosamente como aquele que menos custos introduz no orçamento geral do respectivo Estado ...

Vozes da ASDI, do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... e também como aquele em que o número de sessões realizadas vem em terceiro lugar, ou seja imediatamente abaixo do número de sessões realizadas no Parlamento Grego e na Câmara dos Comuns Inglesa.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Creio que o dado é suficientemente importante para que, e peço desculpa de hoje não 0 poder fazer, amanhã os serviços de apoio do meu Grupo Parlamentar façam distribuir pela bancada da comunicação social e por todas as bancadas desta Câmara o resultado deste estudo.

Vozes da ASDI, do PS, do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há ainda uma última e importante modificação que interessará considerar nesta discussão do Orçamento do Estado para 1984. E que creio bem que deveremos encarar de frente uma tese que fez a sua escola, que fez até um grande sentimento jurisprudencial. Refiro-me à tese sobre as autorizações legislatit as inseridas no Orçamento do Estado. O Dr. Cardoso da Costa sustentou, e o Supremo Tribunal Administrativo concordou, que as autorizações legislativas incluídas no Orçamento não tinham o mesmo tratamento das autorizações legislativas normais da Constituição. Por razões de natureza programática da Lei do Orçamento, por razões de um quadro fixo que também explica a «lei travão», por motivo de as autorizações concedidas serem entendidas como autorizações ao Governo e não n um governo em especial, entendia o Sr. Dr. Cardoso da Costa que as autorizações legislativas incluídas na Lei do Orçamento não tinham o regime normal.
Creio que as consequências da aprovação da Lei do Orçamento por esta Assembleia, se traduzem rigorosamente na impossibilidade de nesta lei se conterem autorizações legislativas. Ou seja, o Governo já tem que legislar na sequência da aprovação da Lei do Orçamento pelo Parlamento e, portanto, haverá que introduzir na própria lei todas as disposições de natureza orçamental que entendermos por necessárias. As consequências deste princípio são importantes, e creio que também me cumpria salientá-las nesta intervenção sobre a generalidade do Orçamento do listado.
Termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, realçando uma vez mais uma nota que referi há pouco. Perante defeitos que considero fundos e estruturais - e alguns dirão que exagero, mas manterei a afirmação de que vem dos anos 30 - sem modificações profundas neste sistema financeiro e orçamental, visando muito mais um controle jurídico e de legalidade de que um controle de eficácia de despesas, em que o próprio esquema da responsabilidade foi pensado não como responsabilidade pela eficácia das despesas mas pelo cumprimento das leis financeiras, creio que, perante este quadro, temos pela primeira vez algumas razões de esperança para pensar que ele poderá ser modificado e profundamente. E creio que isso é um ponto suficientemente importante para merecer o aplauso deste Parlamento.

Aplausos da ASDI, do PS, do PSD e do deputado
da UEDS César Oliveira.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pretende usar da palavra para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - Para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Magalhães Mota, é muito breve o meu pedido de esclarecimento. Obviamente que o Sr. Deputado tem o direito de vir aqui à Assembleia aplaudir o Orçamento e as grandes opções do Plano que o Governo apresentou, e foi o que fez.

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O que me parece, e é o único ponto que questiono, é que o Sr. Deputado pode fazer esse aplauso, mas num quadro em que, apesar de tudo, não questione a postura que os partidos da oposição assumiram em relação à organização do debate. (Não entendi, e é o único ponto que tenho em dúvida, porque é que o Sr. Deputado Magalhães Mota para aplaudir o Orçamento e as grandes opções do Plano do Governo precisa de questionar a postura em que se colocaram os partidos da oposição em relação ao debate? E isto por uma razão simples: é que se alguma coisa correu mal neste debate foi exactamente o facto de, por responsabilidade do Governo e dos partidos da maioria, o debate não ter correspondido aquilo que coneretamente foi definido na conferência de lideres.

Concretamente, o Sr. Deputado Magalhães Mota viu que para hoje as questões que estavam inscritas eram as do desenvolvimento regional e do equipamento. Porque é que o Sr. Ministro da Administração Interna - e pergunto-lhe isto a si Sr. Deputado Magalhães Mota, visto que está com uma posição que genericamente lhe permitirá responder - porque é que o Sr. Ministro da Administração Interna não veio hoje aqui explicar o orçamento do seu Ministério? Por que é que não veio explicar que no orçamento do seu Ministério era feita uma certa opção, nomeadamente numa lei que não existe?

Finalmente, Sr. Deputado, o debate do Orçamento tem de ser melhorado, deve ser melhorado, mas que não haja qualquer espécie de confusão em que ele será melhorado a partir do momento em que os partidos que intervêm, e particularmente os da maioria que suporta o Governo e ele próprio, respondam à organização que é definida. E ela foi definida, no caso concreto, na conferência de líderes. Enquanto isso não suceder, obviamente que não haverá um debate inteiramente organizado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Deputado João Amaral, creio que há pouco foi mesmo V. Ex.ª quem teve ocasião de explicar que, tendo aceite e proposto -corrigiria eu - uma organização do debate meramente indicativa, nada tinha a protestar pelo facto de essas indicações, que não eram obrigatórias, não serem respeitadas.

Ora, eu direi bastante mais: direi que a proposta do Partido Comunista Português, bastante mais modesta no seu rigor do que aquela que nós próprios tínhamos apresentado, impedindo a discussão das propostas de lei ministério a ministério e preferindo antes a discussão por áreas e indicativa, proporcionava que a discussão nunca pudesse ser tão aprofundada e tão rigorosa como será a discussão ministério por ministério que eu proponho, e que espero que o Sr. Deputado e a sua bancada passem a apoiar a partir da discussão deste Orçamento.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

Vozes do PCP: - Não é verdade! É falso!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na Mesa dois pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, pelo que dou a palavra ao Sr. Secretário da Mesa para proceder à sua leitura.

O Sr. Secretário (Roleira Marinho):

Ex.º Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n. º 1628, processo n.º 83/78, Secção P., de 9 do corrente, do Tribunal Judicial da Comarca de Caminha, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, comunico a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar deliberou emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Luís Diogo de Azevedo Preza a depor como testemunha no processo em referência.

Ex.º Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 801-A, processo n.º 229/81, 1.º Secção, de 9 do corrente, do 7 º juizo Correccional da Comarca de Lisboa, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, comunico a V. Ex.º que esta Comissão Parlamentar deliberou emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Raul Rego a depor como testemunha no processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação conjunta destes dois pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos.

Consultada a Assembleia, as autorizações foram concedidas por unanimidade.

O Sr. Secretário (Roleira Marinho): - Encontra-se também na Mesa um requerimento do Sr. Deputado Jaime Ramos, que é do seguinte teor:

Projecto de lei n.º 248/111

Ex.º Sr. Presidente da Assembleia da República:

Ao abrigo das disposições regimentais (artigo 133 º), requero autorização para retirar o projecto de lei sobre os serviços locais de radiodifusão sonora por via hertziana com o objectivo de imediatamente apresentar com o Sr. Deputado Dinis Alves um outro projecto de lei com os mesmos fins.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, suponho que isto é um requerimento que necessita apenas de um parecer do Sr. Presidente. Por conseguinte, não é necessário ser votado.

O Sr. Dorge Lemos (PCP): - Claro, isso é um direito do deputado!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira «curiosidade», cha-

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memos-lhe assim, deste Orçamento do Estado, é a sua não conformidade quer com o artigo 108 º da Constituição quer com a Lei de Enquadramento Orçamental. São disso exemplo, entre outros, os artigos 8 º, 11 º, n.º 2, 12 º, 26 º, 27 º, etc., da proposta de lei em discussão, cujo articulado se inseriria melhor numa «Lei de Meios» do antigamente ou se, noutros casos, seria perfeitamente dispensável neste contexto.
Uma outra «curiosidade» - esta também extremamente grave - relaciona-se com o capítulo das finanças das autarquias locais.
Aqui, a proposta de lei do Orçamento vai mais longe e, como se diz na p. 54:

As relações entre o Orçamento do Estado e a administração local em 1984 deverão processar-se de harmonia com o novo regime das finanças 1ocais, cuja revisão se encontra em vias de conclusão, tal como o estabelecimento do regime de delimitação e coordenação das actuações em matéria de investimentos públicos.

Quer dizer, fez-se um Orçamento, nesta parte, com base em leis inexistentes, em leis que o são só no domínio da pura imaginação especulativa do Governo, e, por esta via puramente imaginativa, revoga-se a Lei n º 1/79 e a Lei de Competências das Autarquias.
E tudo isto num domínio que nem sequer é da competência do Governo, mas desta Assembleia da República!
Se a moda pega, Srs. Deputados, poderemos cair nas situações mais absurdas. Basta que um Membro do Governo pense - basta pensar Srs. Deputados -, por exemplo, em criar um «serviço nacional de protecção contra os discos voadores» ou contra a «mosca varejeira» e de imediato manda inscrever uma verba para tal efeito no Orçamento, já que como pensa que o Governo tem maioria nesta Câmara é, desde logo, como se a respectiva lei estivesse já aprovada e - oh! horror dos horrores dos juristas!... - publicada no Diário da República, uma vez que o Governo parece não ligar nenhuma importância ao artigo 122 º, n.º 2, da Constituição!
Isto, Srs. Deputados, não é ficção mas é o que resulta directamente deste Orçamento, p. 54, e do Fundo de Equilíbrio Financeiro para 1984.
Tal Fundo, como se vê, teve como fundamento um projecto de decreto-lei, ao que parece aprovado em Conselho de Ministros e enviado, para apreciação, aos presidentes das câmaras municipais.
Em relação a tal projecto, a primeira nota negativa é a de que o Governo se «esqueceu» de divulgar os seus projectos relativamente à percentagem - a afectar a cada indicador, como se se tratasse de pormenor irrelevante.
A segunda é a de que ao substituir indicadores objectivos por indicadores susceptíveis de considerável tratamento subjectivo, este Governo reforça o poder de arbítrio, em detrimento da isenção. Tanto mais que a não expressão, no decreto ou projecto de decreto, das percentagens de cada um desses indicadores, de subjectiva e complexa determinação, propiciaria manipulações por objectivos inconfessos.
A terceira, e última, reside no facto de, ao entregar na Assembleia da República a lista das verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro que caberiam às autarquias em 1984, o Governo nada ter divulgado sobre as bases e modos de aplicação dos novos critérios, a que os deputados devem ter acesso e sobre os quais devem e podem exercer controle.
Quanto ao projecto de delimitação de competências entre a administração central e a local em matéria de investimentos, assiste-se à tentativa de sancionar, através do Orçamento, o princípio de afectar novas competências ao aparelho de Estado local que, em última análise, se traduzem na simples transferência de despesas, até agora a cargo do aparelho de Estado central, com o funcionamento de actividades inerentes aos equipamentos colectivos localizados na área das autarquias.
O Orçamento do Estado de 1984, transfere já as verbas para custear o funcionamento das escolas primárias sem que daí resulte vantagem significativa para os educandos, os educadores e as autarquias, a não ser na autonomia destas para recrutar o pessoal não docente, cuja «produção», não sendo, como a do pessoal docente, centralizada, permite que as autarquias assegurem, por essa via, certa promoção de emprego junto da população local.
Em contrapartida, o financiamento das «novas competências» é a única componente significativa da evolução das verbas transferidas para as autarquias, já que, deduzindo os 26,5 milhões de contos que lhes correspondem e os 480 000 contos constantes da bonificação de juros, os 51,75 milhões de contos que integram o Fundo de Equilíbrio Financeiro correspondem a uma variação de 10,9 % em relação a 1983, contra 12,9 %, verificada no âmbito do aparelho de Estado central, taxa que se eleva para 18 % se se tiver em conta a referida verba de 26,5 milhões de contos que, transferida embora para as autarquias, corresponde a assegurar um segmento do serviço de educação: o ensino primário.

A diferença de tratamento dado pelo Governo ao aparelho de Estado central e às autarquias é assim reveladora da discriminação que, em seu critério, estas sofrem em dotação orçamental.
Efectivamente, tendo em conta a taxa de inflação, a variação da dotação das autarquias para fazerem face às competências inerentes à aplicação da Lei das Finanças Locais, corresponde à contenção no assumir destas. Por outro lado, com fundamento na expectativa do reforço das tendências da descentralização, o Governo transfere para as autarquias competências que libertam o aparelho de Estado central de funções de natureza burocrática.
Gora-se assim o desenvolvimento das potencialidades das autarquias em matéria de intervenção activa na colmatação das carências detectadas no âmbito social, através de um processo integrado e coerente de planeamento local e regional. Em vez disso, assiste-se à demagógica integração no Orçamento do Estado de uma dotação de 2 milhões de contos para o PIDR, geridos pelas CCR! 2 milhões de contos que significam 50 % do montante inscrito nos investimentos do Plano para o Gabinete da Arca de Sines!

Por tudo isto, em nosso entender, o diagnóstico deste Orçamento permite identificar a demagogia do Governo em matéria de descentralização.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Está inscrito a seguir o Sr. Ministro do Mar. Contudo, visto não estar presente penso
que não irá fazer a sua intervenção..

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O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Não fará a sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Visto isso, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. joão Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Suponho que esta noite estamos na situação de abordar questões da maior relevância e que, por razões que talvez nos escapem, têm estado relativamente escondidas. Foi o que sucedeu com a aplicação da Lei das Finanças Locais e é o que sucede também com o objecto da minha intervenção que é o da situação dos trabalhadores da função pública.

É bom que fique claro: os trabalhadores da função pública são triplamente vítimas desta política, da política deste Governo, do Orçamento que aqui está e que em 3 vertentes passo a explicar.

Primeira vertente: os trabalhadores da função pública são vítimas desta política porque vão sofrer como todos os trabalhadores as consequências dos cortes nos orçamentos da saúde, da educação, da segurança social, da habitação, etc. Não vale a pena acrescentar nada a esta questão. Está dita, redita e, suponho, compreendida por todos os deputados desta Assembleia, especialmente os da maioria.
Segunda vertente: os trabalhadores da função pública vão ver diminuídas as suas condições de vida de forma directa e indirecta.
De forma directa: a verba prevista para a rubrica «pessoal», aos custos salariais actuais, no Orçamento é de 197 milhões de contos. A verba prevista para os orçamentos vai sair de uma dotação provisional que não passa de 37 milhões de contos. Nessa verba provisional há uma parte para despesas correntes e uma parte para despesas de capital. A parte para despesas de capital - e suponho que não estou a dar novidade nenhuma aos membros do Governo que aqui estão presentes - é de cerca de 9 milhões de contos, o que significa que a verba que realmente está prevista para os aumentos dos trabalhadores da função pública não passa de 28 milhões de contos, o que, sobre os 197 milhões de contos que são o total da verba pessoal que será gasta aos custos salariais actuais, não corresponde a mais do que 12,5 % de aumento. É uma pergunta a, fazer, Srs. Ministros: Confirma-se isto? É esta a percentagem de aumento prevista para os trabalhadores da função pública ou é outra a ideia do Governo?
Terceira vertente: os trabalhadores da função pública vão ser confrontados com uma situação muito complexa: é que eles são na prática os peões que vão enfrentar os cidadãos quando tiverem que responder aos cortes sociais nos diferentes sectores das prestações socais a que o Estado é obrigado, na educação, na saúde e nos outros sectores.
Quando os cidadãos se apresentam perante o guichet e perguntam ao Estado como é que ele responde às questões que lhe põem, é ao trabalhador que ali está que eles exigem responsabilidades.
Não tenhamos dúvidas, Srs. Deputados, de que na situação concreta que está criada, com os cortes que são feitos, a resposta que esse trabalhador vai dar vai ser muito difícil.
Neste breve espaço que vos tomo, Srs. Deputados, queria ainda, apesar de tudo, salientar 3 aspectos.

Em primeiro lugar, resulta destas 3 vertentes que uma das questões centrais é a de que para um Governo como este, que quer contrair a despesa a níveis inferiores ao nível de sobrevivência dos cidadãos, é óbvio que tem de ser definida. uma política em relação aos trabalhadores da função pública que os faça pagar administrativamente o preço da crise.
Em segundo lugar, para quem, como este Governo, pretende colocar em stand by ou lay-off um conjunto grande de trabalhadores, é óbvio que pensará em relação aos trabalhadores da função pública e, nomeadamente, conjugando com a situação que eles enfrentam, retirar a ideia de que as dificuldades são grandes, de que eles não são competentes, para assim poderem ser despedidos ou colocados no famigerado quadro de excedentes.
Finalmente, em terceiro lugar, não é fácil ao Governo negociar com os sindicatos. Por isso, é fácil compreender a razão de o Governo rejeitar um princípio que é constitucional, por força de normas legais e por compromissos internacionais assumidos, que é o da obrigação de negociar. Contudo, o Governo não o fez, nem o vai fazer. O Governo está noutra onda. O Governo está na onda exacta de prender e de remeter para julgamento sumário os trabalhadores da função pública.
É contra isto que, evidentemente, protestamos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, se me permite, o Governo foi directamente interpelado e eu gostaria de responder embora saiba que só a título do pedido de esclarecimento é que posso intervir. No entanto, peço-lhe que consinta que preste um breve esclarecimento ao Sr. Deputado João Amaral, até como homenagem pessoal pelo apreço que tenho por ele.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado João Amaral, as contas que fez provavelmente estão bem feitas - não estou a controlá-las. Queria só dizer-lhe que o Estado aceitou o princípio da negociação colectiva com os trabalhadores da função pública e não, de facto, o princípio da contratação colectiva.
Será negociada com eles a massa salarial, mas neste momento só lhe posso dizer que não será necessariamente apenas 12,5 %. Não lhe posso é dizer até onde é que pode ir, não saberia dizê-lo, mas não será necessariamente só 12,5 %. Não vale a pena criar alarme nesse domínio!
De qualquer modo tenhamos consciência de que este Orçamento é um orçamento de crise, é um orçamento de rigor e que nos últimos 10 anos o funcionalismo público duplicou. É provável que o Governo tenha de pedir aos seus funcionários alguns sacrifícios e é também natural que eles estejam dispostos a aceitá-los.

Risos do deputado Octávio Teixeira (PCP).

Ouvindo os Srs. Deputados - compreendo que assim seja - reclamar para cada sector, para cada departamento mais verbas, o Orçamento teria de ser

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outro, não de rigor, não de crise, mas um orçamento em que o défice seria o dobro ou o triplo daquilo que é.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não, não! Não é preciso!

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado, não há razão para alarme; estejamos, no entanto, conscientes de que também a função pública tem de assumir alguns sacrifícios, e que este Orçamento é um orçamento de sacrifícios ...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Para alguns!

O Orador: - ..., um orçamento de crise, um orçamento de rigor.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um sacrifício mistério!

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, agradeço-lhe o apreço mas, muito mais do que isso, agradeço-lhe que tenha vindo à lide para falarmos das questões dos trabalhadores da função pública. Seria lamentável que num debate com esta importância não falássemos de 400 000 pessoas, cidadãos, que esperam definição para a sua situação.

Não fiz na minha intervenção mais do que imputações. Imputei ao Governo uma tripla responsabilidade: a dos «cortes» que em geral os trabalhadores da função pública vão sofrer como os outros - quanto a isso estamos esclarecidos; - a questão, que o Sr. Ministro não pode resolver e que resulta do facto de serem eles que estão na primeira linha, serem eles a «cara» que está perante os cidadãos quando eles exigirem as prestações sociais e elas forem negadas; e a questão dos direitos concretos desses trabalhadores.

O Sr. Ministro deu-me esperanças e eu acho que é bom sublinha-las: o Sr. Ministro diz-me que «não é 12,5 %, mas é mais». É bom que isso seja dito directamente aos trabalhadores da função pública.

Vozes do PCIP: - Muito bem!

O Orador: - Eles estiveram à porta da residência do Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Primeiro-Ministro mandou 23 trabalhadores/dirigentes sindicais da função pública para o Tribunal de Polícia. Oh, Sr. Ministro, 23 trabalhadores para o Tribunal de Polícia por uma resposta tão simples como essa de «que estava disposto a resolver com eles a questão e que não era um aumento de 12,5 %»? ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro Almeida Santos, diga ao Sr. Primeiro-Ministro que não é assim que se resolvem as questões com os trabalhadores, nomeadamente com aqueles que são um importante sustentáculo da nossa administração, do nosso sistema, isto é, os 400 000 trabalhadores da função pública; diga-lhe que é através do diálogo e não do envio para o Tribunal de Polícia que poderá resolver os problemas dos trabalhadores da função pública.
Concordará comigo?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Ministro para responder.
e

O Sr. Mlflsteo de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado, com certeza que concordo em que o diálogo é preferível a qualquer outra solução. Por isso aceitámos o princípio da negociação colectiva.
O que o Sr. Primeiro-Ministro fez foi uma coisa muito simples: foi não aceitar que os funcionários reivindiquem direitos, perturbando o trabalho de um órgão de soberania à porta desse mesmo órgão de soberania.

Protesto do PCP.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Estavam em vigílía!

O Orador: - Se o Sr. Deputado algum dia for Governo - provavelmente não será - verá que os órgãos de soberania têm o direito de não ser perturbados no seu trabalho por manifestações, que, de uma forma geral, nem são previamente anunciadas. Não confunda isso com diálogo porque se há pessoa dialogadora na política portuguesa é com certeza o Primeiro-Ministro que temos.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Bom, Srs. Deputados já não sei que figuras regimentais se hão-de agora utilizar, unas, considerando que o Sr. Ministro fez um pedido de esclarecimento - a que o Sr. Deputado João Amaral respondeu - e um protesto, dou-lhe a palavra, Sr. Deputado, para contraprotestar.

O Sr. João Amarai (PCP): - Sr. Ministro, nós conhecemos a geografia desta zona e supomos que estar no passeio em frente da saída do parque do Palácio de São Bento não perturbará assim tanto, tanto o Sr. Primeiro-Ministro que o impeça de pensar nas malfeitorias que anda par aí a fazer. Ele pensa nelas, fá-las e não tenham nenhum problema com isso.

Protestos do PS.

Mas o problema que aqui se põe é este: sem divergir, considero que a questão da negociação é central e tem uma inscrição orçamental.
O Sr. Ministro deu aqui aos trabalhadores da função pública - e eu sublinhei-o - uma ideia positiva, no sentido de que afinal não era esse o limite orçamental. Mas, Sr. Ministro, onde é que se encontra, concretamente, a provisão orçamental que permita este «para mais de 12,5 %, 13 % ou 14 %»? Onde é que ela está? Qual a rubrica onde se inscreve?

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O Sr. Ministro de Estado e altos Assuntos Parlamentares: - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Vejo que o Sr. Deputado acredita pouco nas virtualidades técnicas do Sr. Secretário de Estado do Orçamento!

Risos do PCP.

O Orador: - Devo dizer que não tenho grandes problemas quanto a isso, mas já que estamos a falar de «acreditar» digo-lhe uma coisa: Sr. Dr. Almeida Santos -desculpe que o trate por senhor doutor -, deve ser das últimas pessoas que acreditam no Dr. Mário Soares, nomeadamente na sua capacidade de diálogo com os trabalhadores da função pública!

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que serei com certeza a última que deixará de acreditar, mas creia que também há muita gente que acredita nele.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Abreu Lima.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, ao elaborar o Orçamento do Estado, adopta de forma inequívoca, no capítulo que consagra às finanças das autarquias locais, o critério de não aplicar a Lei n.º 1/79, para a determinação das verbas, que hão-de ser transferidas para os municípios.
Sucede, porém, que a Lei n º 1/79 encontra-se em vigor e a sua não aplicação total, em troca da substituição por conceitos, princípios e normas, que não têm qualquer relevância jurídica nem estão publicadas, nem são conhecidas, tanto pelas autarquias, como por esta Assembleia, constitui, além de uma desconsideração para com os municípios e o poder local, uma ofensa e um mau procedimento para cone este Parlamento.
Constitui infeliz leviandade, para não dizer grosseiro comportamento, a atitude do Governo de pôr de parte e não aplicar uma lei, aprovada por unanimidade por esta Assembleia, e que representa um significativo marco e constitui a grande concretização da desoentralização administrativa em Portugal, sem haver outra disposição legal que, concreta e correctamente, a substitua.
A Assembleia da República concedeu, em junho do corrente ano, uma autorização legislativa, abdicando de uma prerrogativa, que lhe é muito própria e específica, nos ternos da Constituição, para alterar a Lei nº 1/79, mas o que é facto indiscutível e insofismável é que o País inteiro, esta Assembleia e as autarquias municipais, a quem tal alteração em grande parte se dirige, desconhecem a natureza, a dimensão e a filosofia das alterações reais, que irão substituir a lei, que ainda se encontra plenamente em vigor.
Isto constitui um abuso, representa uma arbitrariedade e envolve uma desconsideração para com o País, para com o poder local e para com este órgão de soberania.

E não se invoque a circunstância, absolutamente inconsciente, como sendo uma via do conhecimento da lei, que futuramente pode vir a vigorar o facto de o Ministério da Administração Interna ter enviado às assembleias municipais um projecto de texto para estas analisarem as alterações a introduzir à Lei n.º 1/79 e pronunciarem-se sobre o seu conteúdo e terem ainda mandado reunir bastantes dias mais tarde, à laia de emenda mal feita e de remendo mal cosido, as câmaras municipais, nos ,respectivos governos civis, para também darem as suas opiniões e formularem as suas críticas, numa curta reunião de um meio dia, sobre os mesmos projectos de revisão.

O texto apresentado para análise constitui, necessariamente e só, uma hipótese de possíveis soluções, sendo susceptível de beneficiar das alterações que as 610 autarquias municipais podem ter sugerido ao longo dos documentas, que enviaram ao Ministério da Administração Interna, a não ser que tudo isto seja para deitar poeira nos olhos dos portugueses, enganar as autarquias locais e significar que o Sr. Ministro da Administração Interna já esteja decidido a guiar-se, exclusivamente, pela sua cabeça e pela sua vontade sem qualquer atenção para com os pontos de vista dos órgãos autárquicos, como sucedeu, infelizmente nestes últimos tempos, com a proposta de lei para a criação de municípios, a qual além de estar mal feita, de ser incorrecta, e de conter preceitos, absolutamente inconstitucionais, foi elaborado nas costas das autarquias, vindo o Partido Socialista acabar por reconhecer, em frágil e débil recurso no decorrer da desconcertada apreciação, que houve, na comissão de administração interna e do poder local, a necessidade de ouvir as autarquias municipais sobre o seu conteúdo.

Isto revela bem, a leviandade, a inconsistência e a superficialidade com que o Sr. Ministro da Administração Interna trata dos problemas do seu Ministério e da sua falta de respeito pela descentralização administrativa.
A pobre Lei das Finanças Locais - que transformou tantas esperanças dos municípios em realidades, que tornou em prática corrente o preceito constitucional, que proclama a descentralização administrativa pelo reforço da autonomia financeira -, acabou por ser enterrada viva, ou ficar emparedada, no arquivo do Ministério da Administração Interna para dar lugar ao capricho deste departamento governamental com base em princípios, conceitos e critérios muito próprios da alcova do Ministério da Administração Interna, mas desconhecidos deste Parlamento, das autarquias, do Presidente da República que nada promulgou e, sobretudo, do povo português.

Uma decepção para quem se empenha no poder local e um insucesso para quem defende, vive e se entusiasma com a descentralização administratival
Como se não bastasse a enormidade de definir o montante das receitas municipais a transferir do Orçamento do Estado e fazer a sua distribuição pelas câmaras municipais do País, invocando futuros preceitos legais, ainda se propõe o Governo transferir 26,5 milhões de contos à custa e por força de um futuro regime de delimitação e coordenação das actuações da administração central, regional e local, em matéria de investimentos públicos, que não tem, nem vida, nem força legal, e que é totalmente ignorado e desconhecido deste Parlamento!

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Diz-se no Orçamento do Estado que no valor global de 80,7 milhões de contos com o que se pretende constituir uma estrondosa e corajosa generosidade destinados a financiar actividades a cargo das autarquias locais incluem-se, pela primeira vez, verbas respeitantes a novas competências da administração local - precisamente 26,5 milhões de contos - para satisfazer, designadamente, os encargos com o funcionamento das escolas primárias e postos escolares)
Em que consiste a nova competência atribuída aos municípios? Traduzir-se-á num mero acto de pagadoria dos professores primários e na satisfação das despesas da acção social escolar, substituindo-se estes à Caixa Geral de Depósitos? Se não vai mais além deste simples acto de pagadoria, que nunca representa uma descentralização do poder, que competências atribui e envolve? O que advém, em acréscimo de competência, às câmaras municipais através dos singelos e lacónicos tenros em que estes 26,5 milhões de contos vêm mencionados no Orçamento do Estado sem lei, sem regras, sem disciplina, sem atribuições, sem normas, que os sustentem?
Reparte-se esta competência entre a administração central e local?
Em que medida,em que termos, sobre que matérias? Em relação a quem? Aos professores? Aos alunos? Quem o sabe? Quem o define? Como e por que parâmetros se avalia e dimensiona a justeza e suficiência dos 26,5 milhões de contos?
Que competências perde a administração neutral 8 que novas competências ou novas funções passam a exercer as autarquias municipais?
A proposta de lei do Governo é, neste ponto, incompreensível e inaceitável e revela mais uma vez o desleixo e a inconsequência com que o Ministério da Administração Interna encarou e trata os problemas da administração local.
O Governo propõe a transferência de 80,6 milhões de contos para as autarquias locais, nas quais estão incluídas, como já vimos, 26,5 milhões de contos para fazer face aos encargos com as anunciadas novas competências no domínio do ensino primário e postos escolares; restam, para atender e satisfazer, as acções e as actividades municipais, que se enquadram na esfera de competências que já há anos vem pertencendo às câmaras municipais, 51,5 milhões de contos.
Estes 51,5 milhões de contos, representam o menor aumento de receitas municipais verificado nos últimos 5 anos, em relação ao ano anterior.
Com efeito, de 1983 para 1984 o aumento das receitas municipais será, apenas, de 4,767 milhões de contos, porque não podemos deixar de considerar que o Governo se propõe dar execução ao artigo 22.º do projecto de alteração à Lei n .º 1/79, apresentado recentemente, às autarquias locais, onde se prevê que as finanças distritais passem a ser alimentadas por uma verba iguala 0,5 % do Fundo de Equilíbrio Financeiro, o que no caso concreto de 1984 representa um valor de 257 485 milhões de contos, a deduzir aos 5000 milhões de contos de acréscimo anunciado pelo Governo, representando, assim, um simples aumento de receitas de 10,2 %, em relação a 1983.
Tudo nos leva a pensar que o Governo está mesmo disposto no próximo ano a defraudar as autarquias locais e a lesar os municípios nestes 257 485 milhões de contos, fazendo transferir para as assembleias distritais 0,5 % do valor do Fundo de Equilíbrio Financeiro, visto que na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1984, em apreciação, não se prevê, como aconteceu nos anos anteriores, uma verba destinada às assembleias distritais a sair directamente do Orçamento do Estado.
O Governo aguarda, simplesmente, que a esperada alteração à Lei n. º 1/79, seja publicada para depois dar execução ao conteúdo do artigo 22 º, preparando-se subrepticiamente para esbulhar os municípios dos 257 485 milhões de contos, nada referindo, tranquilo e inocentemente, na proposta de lei do Orçamento do Estado de 1984.
A verba de 51,5 milhões de contos, destinada às receitas municipais para 1984, representa 17 % das despesas do Orçamento do Estado, enquadradas nas rubricas previstas no artigo 39 º da proposta de lei n.º 47/111.

O primeiro aspecto é saber por que é que o Governo estipulou 17 % quando, para exactamente as mesmas despesas de natureza económica, até de âmbito menos restrito, a Lei n.º 1/79, fixou a percentagem mínima de 18 %?

Será que este Governo considera a Lei n.º 1/79, demasiado generosa para com as autarquias locais? Como posso eu, porém, pensar ou admitir tal redução, se a responsabilidade da elaboração do capitulo orçamental das «finanças das autarquias locais», compete, como é natural, a um ministro e a uma secretária de Estado do Partido Socialista, que tanto se encresparam e afadigaram neste Parlamento e em entrevistas públicas, escritas e televisivas, contra o não cumprimento da Lei das Finanças Locais pelos govemos da AD, responsabilizando esse não. cumprimento por gravíssimos prejuízos causados aos municípios?
Como entender então que estes mesmos senhores, agora membros do Governo, reduzam a taxa mínima de 18 %, prevista na Lei das Finanças Locais, para 17 %, donde resulta o menor acréscimo de receitas dos últimos 5 anos quando os aplicam exactamente às mesmas despesas, que anteriormente defendiam dever ser consideradas?
O segundo aspecto é o seguinte: enquanto o n.º 3
da Lei n.º 1/79, ao referir-se às «transferências» esti
pula que nas «transferências correntes» se incluem
as parcelas correspondentes à totalidade dos impostos,
referidas na alínea a) do artigo 5 º e à participação
nos impostos mencionados na alínea b) do mesmo ar
tigo e para as «transferências de capital», apenas ex
clue a parcela mencionada na alínea c) do artigo 5 º,
diferentemente no n º 2 do artigo 39 º da proposta
de lei n.º 47/111 do Orçamento do Estado para 1984,
exceptuam-se nas «transferências correntes», além das
transferências para as autarquias locais, as transferên
cias para as empresas públicas e nas «transferências
de capital» excluem-se, além das transferências para as
autarquias locais, as transferências para as regiões au
tónomas.
Assim, este n.º 2 do artigo 39 º do Orçamento do Estado vem estabelecer um princípio definidor e de graduação de despesas, no domínio das transferências, de âmbito muito mais restrito que o âmbito definido na Lei n.º 1/79, pois, agora, os valores excluídos são mais numerosos, envolvendo as transferências correntes para as empresas públicas e as transferências de capitais para as regiões autónomas, o que leva a reduzir, pelas contas que fiz, a base de incidência ou de aplicação

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2308 I SÉRIE - NÚMERO 53

dos 17 %, previstos na proposta do Orçamento do Estado, para 1984, de 310,522 milhões de contos para 302,940 milhões de contos, conduzindo, assim, a uma redução das receitas municipais de 1,290 milhões de contos (17 % de 7,582 milhões de contos).
É inadmissível que se considere o volume de despesas do Orçamento do Estado para aplicação da taxa de 17 %, definidora das receitas municipais, diminuída dás transferências de capital para as regiões autónomas!
Como estas transferências de capital representam dotação para cobrir os défices orçamentais das regiões autónomas, significa que as autarquias locais do continente são afectadas pelos défices das regiões autónomas, acontecendo que as finanças locais serão, tanto mais reduzidas, quanto maiores forem os défices das regiões autónomas.
É inacreditável tal procedimento e critério e não posso deixar de protestar aqui, publicamente, contra tamanha injustiça e menosprezo pelo poder local, alertando todos os municípios para tão nefasto tratamento.
Foi distribuído, há dias, pela Secretaria de Estado da Administração Autárquica, uma relação da repartição do Fundo de Equilíbrio Financeiro, previsto para 1984, no montante de 51,497 milhões de contos, por cada um dos 275 concelhos de Portugal continental e globalmente pelas duas Regiões Autónomas dos Açores e da Medeira.
Não sabemos que critérios presidiram a esta distribuição, não sabemos que carências foram consideradas, não sabemos como, umas e outras, foram quantificadas?
Não terá a Assembleia da República o direito de conhecer os índices ponderados e adoptados para a repartição das receitas?
Vai a Assembleia da República aceitar esta repartição, feita por novos critérios, diferentes dos que estão em vigor, que é determinada por um novo sistema de carências, aferidas por indicadores que se desconhecem que é fruto de novas percentagens, de que nem sequer há quaisquer indícios, que contém em si, provavelmente, uma base, comum a todos os municípios, de que se ignora o respectivo limiar ou valor?
E tudo isto elaborado e, exclusivamente, pelo Ministério da Administração Interna, a latere da Assembleia da República, só para dar a ideia de que se é dirigente, rápido e actuante.
Não posso deixar de referir a discrepância muito significativa, que se verifica entre o n.º 5 do artigo 39 º da proposta de lei n.º 47/111, agora em apreciação, e o n.º 9 do artigo 43 º da Lei n. º 2/83, do Orçamento do Estado para o ano em curso.
Pela Lei do Orçamento do ano em curso só pode ser deduzido uma percentagem às importâncias a transferir para os municípios ao abrigo da alínea c) do artigo 5
da Lei n.º 1/79, para fazer face à dívida dos municípios para com as entidades do sector público-tão financeiro, só quando tais dívidas estejam reconhecidas por sen. tença judicial, mas também quando tal declaração tenha sido solicitada pelos tribunais competentes.
Pela proposta de lei agora em apreço, reconhece-se ao Governo a faculdade de deduzir por iniciativa sua uma percentagem à importância a transferir para os municípios, a título de transferências correntes, para fazer face às suas dívidas a entidades não financeiras do sector público, bastando, apenas, que as referidas dívidas estejam reconhecidas por sentença judicial

transitada em julgado, sem se exigir que tal dedução só se efectue quando solicitada pelo tribunal competente.
Não podemos estar de acordo com a atribuição de tal faculdade ao Governo, à margem e ao arrepio de respectivo processamento jurídico.
Antes de terminar quero chamar a atenção para a necessidade de atribuir aos municípios uma posição mais forte e uma acção muito mais decisiva na constituição das comissões de avaliação criadas para a determinação da matéria colectável para a definição da contribuição predial e para acelerar a inscrição dos prédios nas matrizes.
Não ë aceitável que, constituindo a totalidade da contribuição predial, tanto rústica, como urbana, uma receita exclusiva dos municípios, não usufruam ou disponham estes de uma capacidade de intervenção na avaliação da matéria colectável muito mais decisiva do que aquela de que tem presentemente, pois está, praticamente, confiada aos elementos do Ministério das Finanças e do Plano a faculdade de influírem, decisivamente, na determinação de receitas que pertencem, na sua totalidade, às autarquias locais.
Pelas razões invocadas, o meu partido votará contra estas decisões do Orçamento do Estado.

Aplausos do CDS.

O Sr. 1Presüdente: - Srs. Deputados, cabe-me informar que deram entrada na Mesa e foram admitidos os seguintes projectos de lei n.º 249/111, apresentado pela Sr.ª Deputada Margarida Marques e Manuel Laranjeira Vaz, do PS, sobre associações de estudantes do ensino superior; 250/111, apresentado pelos mesmos Srs, Deputados, sobre associações de estudantes do ensino secundário; 251/111, apresentado pelos Srs. Deputados Horácio Alves Marçalo e Bagão Félix, do CDS, sobre a criação da freguesia de Paredes do Bairro, concelho de Anadia, e 252/111, apresentado pelos Srs. Deputados Jaime Ramos, do PSD, e Dinis Alves, do PS, sobre serviços locais de radiodifusão sonora por via hertziana. Estes diplomas baixam às respectivas comissões.
Srs. Deputados, amanhã a sessão terá início às 10 horas e a ordem do dia será a continuação do debate e votação na generalidade das propostas de lei sobre as grandes opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1984.
Está encerrada a sessão.

Era 1 hora e 10 minutos do dia seguinte.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):

João Joaquim Gomes. Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Daniel Abílio Ferreira Bastos. Jaime Adalberto Simões Ramos. Joaquim dos Santos Pereira Costa.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique Cardoso Pereira Morais. Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

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25 DE NOVEMBRO DE I983

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Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Cândido Miranda Macedo
António Gonçalves Janeiro.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo.
José Manuel Torres Couto.
José Martins Pires.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Laranjeira Vaz.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Fernando José Alves Figueiredo.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
Manuel Pereira.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Victor Pereira Crespo.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):
Luís Filipe Paes Beiroco.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos enviado à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 24 de Novembro de 1983, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitadas pelo Centro Democrático Social:

João António de Morais Sarmento Moniz (círculo eleitoral de Viseu) por João da Silva Mendes
Morgado (esta substituição é pedida para os dias 24 e 25 de Novembro corrente, inclusive);
António José Tomás Gomes de Pinho (círculo eleitoral de Lisboa) por Henrique José Cardoso de Menezes Pereira de Moraes (esta substituição é pedida para os dias 24 e 25 de Novembro corrente, inclusive);
João Lopes Porto (círculo eleitoral do Porto) por Adalberto Manuel da Fonseca Neiva de Oliveira (esta substituição é pedida para o próximo dia 25 de Novembro corrente).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez quê se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - Joaquim Eduardo Gomes (PSD) - António Roleira Marinho (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - Octávio Augusto Teixeira (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - Manuel António de Almeida de A. Vasconcelos (CDS) - José Carlos Queirós Henriques (MDP/CDE) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

s Redactores de 1.ª Classe: Maria Leonor Caxaria Ferreira - José Diogo.

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PREÇO DESTE NUMERO 156$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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