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I Série - Número 87

Quarta-feira, 21 de Março de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE MARÇO DE 1984

Presidente: Exmo. Sr. José Rodrigues Vitoriano

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
António Roleira Marinho
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente e da apresentação de requerimentos.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE), referiu-se aos problemas que se colocam ao ensino da língua portuguesa em alguns países, nomeadamente em Espanha, tendo respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Lemos Damião (PSD).
A Sr.ª Deputada Zita Seabra (PCP), também em declaração política, fez uma análise da situação social do país, criticando a política económica do Governo. Respondeu no fim a protestos dos Srs. Deputados José Luís Nunes (PS) e Cecília Catarino (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Menezes Falcão (CDS), referiu-se a diversos aspectos relacionados com o abastecimento de energia eléctrica ao pais por parte da EDP.
Finalmente, também em declaração política, o Sr. Deputado Roque Lino (PS), abordou questões de política florestal no nosso País e as consequências que têm para a floresta, as cheias, as secas e os incêndios.

Ordem do dia.- Foi rejeitado o recurso, apresentado pela ASDI, sobre a admissão da proposta de lei n.º 63/III, que concede ao Governo autorização legislativa para definir, em geral, ilícitos criminais e penas. Intervieram, a diverso titulo (incluindo declaração de voto), além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino), os Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), António Taborda (MDP/CDE), José Magalhães (PCP). Luís Beiroco (CDS). José Luís Nunes (PS) e Montalvão Machado (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura
António Gonçalves Janeiro.
António José Santos Meira.
António Manuel Carmo Saleiro.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Fernando Tomás dos Santos Ferreira.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.

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Frederico Augusto Händel de Oliveira
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra
João Luís Duarte Fernandes.
José Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda
José de Almeida Valente.
José António Borja S. dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Joaquim Pita Guerreiro.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tiro de Morais.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Amónio Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
César Augusto Vila Franca.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia
Fernando Manuel Cardoso Ferreira
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira
Francisco Manuel Costa Fernandes
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva

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Joaquim Comes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Lino Paz Paulo Bicho.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Simões Areosa Feio.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Eugênio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
João Carlos Dias M. Coutinho Lencastre
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
Joaquim Rocha dos Santos.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Bei roço.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Goes.
Manuel Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
Helena Cidade Moura.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Rúben José de Almeida Raposo.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Têxteis, Lanifícios e Vestuário de Portugal, a enviar um relatório sobre a situação económica e social do sector têxtil, referente ao 2.º semestre de 1983.
Do conselho de informação para a imprensa, a remeter fotocópia do parecer sobre o «Anteprojecto Governamental da Lei de Imprensa, elaborado não em seguimento de pedido directo do Secretário de Estado Adjunto do Ministro de Estado, mas por sua espontânea iniciativa.
Da Assembleia Municipal de Castro Daire, a transcrever uma proposta na qual faz és entidades competentes um veemente apelo para a continuação do posto da PSP naquela localidade, pelo que de indispensável ele representa no policiamento da zona urbana, salvaguardando valores e vidas de muitos cidadãos.
Da Assembleia Municipal de Lagos, a remeter transcrição de uma moção sobre a instalação de equipamentos militares na região algarvia, contra a qual manifestam o seu mais profundo desacordo e protesto.
Da Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia, a remeter fotocópias de duas moções, nas quais se manifestam contra a atribuição da área de Vila da Feira ao hospital daquela localidade, por considerar que o mesmo não tem estruturas para dar cabal cumprimento ao que lhe é exigido e solicita a colocação de médicos da carreira de clínica geral suficientes à cobertura sanitária das populações que servem.
Da Câmara Municipal de Cadaval, a enviar uma moção na qual repudia de forma veemente a decisão da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos de fazer tributar em Imposto Profissional, Complementar e Fundo de Desemprego o valor das senhas de presença pagas ou atribuídas aos eleitos das autarquias locais.
Do conselho de informação para a Agência Noticiosa Portuguesa, E. P. (ANOP), a enviar para apreciação, o relatório daquele conselho referente às actividades do ano de 1983.
Da Junta de Freguesia de Santa Maria de Lamas, Feira Norte, a enviar documentação que considera importante para justificar a pretensão que manifestam de que a 2.ª Repartição de Finanças do Concelho da Feira, se situe naquela localidade.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos:

Aos Ministérios da Indústria e Energia e do Trabalho (2), formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; ao Ministério do Equipamento

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Social, formulados pelos Srs. Deputados Leonel Fadigas, João Carlos Abrantes e Zélia Pinto Bilhato, respectivamente; ao Ministério do Trabalho, formulados pelos Srs. Deputados José Manuel Mendes, António Mota e Hernâni Moutinho, respectivamente; aos Ministérios do Mar e do Comércio e Turismo (2), formulados pelo Sr. Deputado Dorilo Seruca; ao Governo e a diversos Ministérios (5), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelos Srs. Deputados Manuel Fernandes e Anselmo Aníbal; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelos Srs. Deputados João Corregedor e Helena Cidade Moura; ao Ministério da Indústria e Energia, formulado pelos Srs. Deputados Dias Lourenço, Álvaro Brasileiro e Luísa Cachado; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado João Amaral; à Secretaria de Estado e Fomento Cooperativo, formulado pelos Srs. Deputados lida Figueiredo, Gaspar Martins e António Mota; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Rui Picciochi; ao Ministério da Educação, formulada pela Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Zélia Pinto Bilhoto; aos Ministérios das Finanças e do Plano e do Trabalho (2), formulados pelo Sr. Deputado Santos Correia.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra, a Sr. Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em declaração política nesta Assembleia no passado mês de Fevereiro, pretendemos chamar a atenção do governo e da opinião pública para o facto de no Brasil, se tentar aniquilar paulatinamente a nossa cultura, de tal modo que os próprios professores brasileiros da literatura portuguesa consideram em perigo os seus postos de trabalho.
O MDP/CDE entende a gravidade deste facto não apenas no sentido do enfraquecimento de laços e de valores culturais, mas no perigo que representa para a identidade nacional, o esvaziamento de um património histórico que é a nossa mais importante referência cultural.
Em recente notícia vinculada pela comunicação social, afirmava-se que a Secretária do Estado da Educação, integrada na comitiva do Presidente da República à África, teria prometido colaborar na resolução dos problemas do ensino da língua portuguesa. Desejaríamos que tal atitude expressasse uma acção racional do governo e fosse significante da consciência de que é urgente contribuir para a solução de um problema que não só está longe de ser encaminhado como, a nosso ver, não ganhou ainda aos olhos do poder a dimensão política que a grandeza de significado e o potencial de futuro lhe conferem.
Há dias também os jornais noticiaram, por outro lado, o cancelamento da saída de 4 professores cooperantes que se destinavam à formação de professores de português em Moçambique.
O Sr. Ministro da Educação revelou uma total ausência de sensibilidade perante o que representa a missão humana, solidária, universalista e patriótica que aqueles, e muitos outros professores, terão de desempenhar para que seja dada, por nós, parte interessada, uma contrapartida útil, à decisão dos governos da nova África de escolherem a língua portuguesa, como língua nacional.
Dignificar a nossa descolonização é a tarefa histórica que nos cabe neste momento, tal como noutros tempos nos coube sulcar os mares e descobrir as terras.
A 10 anos do 25 de Abril, o MDP/CDE teima em considerar as transformações geradas pela revolução, não como um património estático que o tempo delapida, ou como um tecido manchado a que é preciso extrair as nódoas, mas como um todo social e político que, com firmeza, é necessário assumir e aculturar. Os desleixes, a fraqueza, a inconstância das atitudes e dos pensamentos, a instabilidade das decisões, a insegurança nos modelos sociais tomados pelos vários governos, não só têm enfraquecido a democracia, empobrecido o País, sacrificado o povo português, amortalhado esperanças, como têm bloqueado o nosso contributo na busca de uma nova ordem mundial, que é necessário encontrar.
A afirmação da nossa língua em países estrangeiros, tal como a alfabetização em Portugal, deveriam ser tarefas apaixonantes e naturais. A fraca energia posta neste campo revela um bloqueio social e um descrédito na capacidade de fazer a que uma série de políticas erradas têm conduzido o Governo.
Reveladora desta situação de paralisia é o vazio da política de alfabetização em que nós próprios, nesta Assembleia, temos colaborado. É grave, e altamente significativo, que os membros do CNAEBA eleitos em Junho de 1983, ainda não tenham tomado posse. Os problemas do País que tem a ver, com a sua própria existência são relegados, enquanto nos embrulhamos num jogo internacional onde a nossa pequenês, a nossa insegurança e o nosso apego aos pequenos problemas cada vez nos tornam mais laterais face ao mundo de hoje.
A língua portuguesa é hoje, no contexto de morbidez em que o poder político se afunda, possivelmente o único bem de exportação que não traz implicações negativas à nossa balança de pagamentos. Só por isso, nestes tempos, deveria ser louvada!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa ida à Espanha, integrados numa delegação da Assembleia da República fez-nos sentir de novo e noutro contexto a acuidade deste problema.
Será oportuno dizer-se que os elementos que mais detalhadamente nos levaram ao conhecimento da situação da língua portuguesa em Espanha, assim como toda a documentação de que fizemos entrega na Comissão de Educação e Cultura, os ficamos a dever ao interesse com que o Sr. Presidente da Assembleia da República, que chefiava a delegação, acompanhou os problemas e às boas condições de trabalho que por sua intervenção nos foram criadas.
O MDP/CDE expressa aqui os seus agradecimentos ao Sr. Presidente da Assembleia da República Tito de Morais e também a sua convicção de que os grandes problemas nacionais podem e devem unir

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todos aqueles que não só se reclamam da democracia, mas na sua vivência diária, dela são testemunho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação da língua portuguesa é a seguinte muito resumidamente e como símbolo: os jornais espanhóis trazem o anúncio:
Se quer aprender português dirija-se à Casa do Brasil.
Havia uma única licenciatura em língua e literatura portuguesa em toda a Espanha: na Universidade de Salamanca, em comparação com 6 de italiano (proximamente 8), 20 e tal de francês, 30 e tal de inglês e 5 de alemão.
Em todas as reuniões da Comissão Mista para a aplicação do Convénio Cultural realizadas desde 1971 até 1983, a parte portuguesa pediu a criação de licenciaturas em língua e literatura portuguesa na Universidade de Madrid, Central de Barcelona, Santiago da Compostela, Granada e Salamanca; a parte espanhol acolheu favoravelmente o pedido.
Os espanhóis, por seu lado, pediram a criação de licenciaturas em língua e literatura espanhola em Lisboa, Coimbra e Porto.
Criaram-se já as de Lisboa e Porto e foi inaugurada este ano uma secção de literatura espanhola na Universidade Nova de Lisboa que não tem Faculdade de Letras mas de Ciências Humanas e Sociais.
Na Espanha existem cursos de Filologia em 27 Universidades e durante a nossa estada, portanto, muito recentemente, foi criada a segunda licenciatura em língua e literatura portuguesa em Granada.
Existe ensino de português nas licenciaturas de Românicas e Hispânicas com leitores ou professores contratados que não podem dedicar-se ao português, em exclusividade, pois não têm possibilidade de promoção nesse campo.
Nas escolas universitárias, que existem para além das Faculdades, a situação é igualmente de vazio. Foi criada em 1947 uma cadeira de português na Escola Central Superior de Comércio de Madrid. Em 1955 preenchido o lugar que foi abandonado em 1973, por incompatibilidade de funções quando o seu professor, assumiu o cargo de professor-adjunto da Universidade de Madrid. Desde então, o lugar não foi nunca mais preenchido embora a Escola tenha alargado o seu âmbito e seja hoje a Escola de Estudos Empresariais de Madrid. O mesmo aconteceu em escola idêntica na Corunha, que se encontra vago desde que o seu titular se aposentou em 1979.
Quanto ao ensino liceal, foram criados nos anos 50, 5 cadeiras de português: 2 em Madrid, t em Sevilha, as outras em Santiago de Compostela e Salamanca. A de Santiago foi preenchida em 1960, a de Salamanca em 1977. As outras 3 nunca funcionaram. O professor da cadeira de Santiago por incompatibilidade de funções do seu titular ficou vazia, e até hoje, não foi aberto concurso para o seu provimento.
A escola primária não existe para portugueses e uma deputada das Astúrias lembrou que o ensino da própria língua e da língua espanhola seria condição de equilíbrio para os adolescentes de Gerona, por exemplo. Isso os afastaria da delinquência.
Esta situação construída pelas ditaduras não pode continuar numa relação equilibrada entre estados democráticos, conscientes e representantes da dignidade dos 2 povos.
A aprendizagem do português em Espanha vai morrendo por falta de estímulo e ausência de relações culturais. A criação urgente do instituto de estudos portugueses em Madrid, a acção de livreiros e editores, a dinamização da comunicação social através de bons representantes num e noutro País reatariam, pelo menos, as relações existentes no final do século XIX e primeiras décadas do século XX. Lembramos que a revista Ocidente, fundada pelo grupo dos Vencidos da Vida. tinha uma grande parte da edição nas duas línguas; foi assim que o Crime do Padre Amaro se editou simultaneamente em português e em espanhol; também o jornal O Povo Catalão fazia a crítica sistematizada dos livros saídos em Portugal.
Durante as ditaduras de Franco e Salazar as ligações que interessavam eram outras, as fronteiras serviam então para trocar informações e denunciar os homens.
É necessário institucionalizar as relações culturais que são hoje uma forte via de afirmação e de solidariedade. O problema dos adidos culturais e dos conselheiros de imprensa põe-se em todos os países; é preciso rapidamente encontrar meios orgânicos que tornem possível a sua acção.
É necessário para que estas situações aviltantes desapareçam que uma política de confiança em nós próprios, de independência e de afirmação, informe as acções do Governo.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e dos Srs. Deputados Fernando Amaral e Lemos Damião (PSD).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, quis V. Ex.ª brindar-nos com uma intervenção que eu reputo de preciosíssima, na medida em que veio aqui trazer à colocação um tema que á maior parte dos portugueses pouco ou nada diz.
Creio que V. Ex.ª explicitou hoje e aqui o nosso orgulho de sermos portugueses porque veio pôr a tónica da sua intervenção numa causa que nos diz muito: um povo que tem uma língua que se chama português, um povo que tem o orgulho de ver essa língua falada por 200 milhões de pessoas é um povo que devia ter muito orgulho em estar no mundo.
E o que é certo é que, cada vez mais, nós nos deixamos perder por esse mundo fora, cada vez mais nós fazemos acordos de cooperação e culturais com vários povos, mas cada vez menos nós nos impomos ao mundo.
Sr.ª Deputada, trouxe aqui uma questão que nos preocupa muito, o que, efectivamente, quando em Espanha, aqui a 2 passos, queremos aprender o português, temos de nos dirigir à Casa da Cultura Brasileira. Se é certo que o Brasil e Portugal são povos irmãos, parece que a pureza da língua não está no brasileiro mas sim no português, no português de Portugal. Por isso mesmo, louvo a sua atitude, louvo a coragem que teve de trazer à Assembleia da República uma questão tão candente como essa e agradeço-lhe, como português, que a tenho feito.
É certo que temas como este parecem desinteressar esta Câmara, mas nem por isso a intervenção de

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V. Ex.ª ficou menos valorizada. A minha bancada agradece-a pela minha voz.
Entretanto, queria pôr à Sr.ª Deputada uma questão. Ainda hoje é uma realidade que a CNAEBA, embora os seus membros tenham sido eleitos em 1983, ainda não tomou posse. A que é que V. Ex.ª atribui este desencanto, este desinteresse pelos valores essenciais da cultura que são, ao fim e ao cabo, valores primários do conhecimento do português em Portugal? E é por isso que nós não podemos estranhar que lá fora a pureza da língua seja desvirtuada, que o português «ande de rastos» porque, cá dentro, também nós não cuidamos de dar aos portugueses que ainda não têm acesso à cultura, ou que na sua época não tinham sequer conhecimento do que era falar bem o português, essa mesma cultura e continuamos a permitir que sejam incultos, pois que uma comissão tão importante como a CNAEBA também, ainda hoje, não cuida de resolver o problema dos 25 % de analfabetos que temos em Portugal.
No entanto, parece-me positivo que, quer na Universidade Nova de Lisboa, quer em Granada, haja cursos de língua e literatura tanto espanhola como portuguesa. Creio que isto é positivo e é pena que este exemplo apontado por V. Ex.ª não se multiplique por todos os países com quem Portugal mantém laços e relações de cooperação e amizade e, nomeadamente, relações culturais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Agradeço as suas palavras, Sr. Deputado Lemos Damião, e penso que elas expressam o sentimento dos deputados da Comissão da Educação. Não há o hábito de fazer declarações políticas nas comissões especializadas, mas seria talvez útil fazê-lo, para não estar a «massacrar» os Srs. Deputados com temas que não estão tão dentro do vosso próprio trabalho - e não digo dentro do vosso interesse, mas do vosso trabalho.
De facto, penso que tudo aquilo que me disse, Sr. Deputado, se pode ver através dos olhos da Comissão de Educação desta Assembleia.
O problema da CNAEBA deve ser lá posto, com lealdade, pelos partidos que integram a Comissão Permanente, porque são esses que têm que dar a posse. Penso também que, quanto ao problema do analfabetismo, a Comissão de Educação, tão assoberbada que tem andado com os problemas das escolas, não tem, talvez, equacionado o problema na sua profundidade. E aquilo que os Ministros da Educação têm dito sobre o assunto - e eu tenho estado, infelizmente, sistematicamente, na oposição - nada tem de pedagógico, nada tem de verdadeiro ou de responsável.
A insensibilidade à política cultural e aos problemas da língua tem na base um bloqueio político que nós estamos a sofrer e que, possivelmente, ainda vamos continuar a sofrer. Não há élan suficiente para a afirmação da língua - a língua é qualquer coisa que diz respeito ao nosso íntimo - e o facto de esse élan não existir deve alertar os partidos que estão interessados em estabelecer a democracia em Portugal.
Quanto à cátedra de Granada, que foi estabelecida na véspera de nós sairmos de lá - por coincidência, é evidente -, tanto por esforços meus como dos outros deputados da delegação e do Sr. Presidente da Assembleia da República, falámos do assunto, inclusivamente com Filipe Gonzalez- e até tivemos um bom embaixador que se esforçou extraordinariamente para levar a coisa a bom termo, mas que infelizmente, saiu de lá, e falámos também com o Ministro dos Negócios Estrangeiros. Enfim, fizemos todo o possível para alertar as autoridades sobre o assunto.
A verdade é que o espanhol tem afastado de Madrid o ensino do português. Isso, como sabemos, é vital. Eu sou do tempo de Menendez Pidal, em Madrid. que tinha uni grupo de professores portugueses que normalmente trabalhavam com ele, ou de Dâmaso Afonso, já mais anteriormente, em Santiago de Compostela. Havia, de facto, um tipo de relações que se mantinham ainda desde o tempo da República Espanhola e que depois foram cortadas pelas relações entre as duas ditaduras.
Agora é preciso reconhecer que nós temos que dar o nosso contributo, é preciso fazer o Instituto dos Estudos Portugueses e é preciso, sobretudo - e é já a segunda vez que nós chamamos a atenção desta Câmara sobre isso - definir bem e estruturar convenientemente os serviços dos adidos culturais e conselheiros culturais nas Embaixadas. É que há muito dinheiro que se gasta e há muito dinheiro que se perde, e, de facto, eles devem ser os grandes responsáveis nesta área, quando são, actualmente, simples funcionários orgânicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que se limitam a enviar relatórios, que eventualmente alguém no Ministério lerá, mas que estão dissociados da política cultural portuguesa, o que parece uma situação um pouco estranha.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O povo português está hoje a viver como há muitos anos não vivia, e isso e um sentimento generalizado e uma verdade indesmentível porque sentida e vivida dramaticamente pela esmagadora maioria dos cidadãos.
A taxa de inflação ultrapassou os 33% em 1983, os desempregados traduzem-se em 500 000, 600 000 trabalhadores têm contratos a prazo, 150 000 têm os salários em atraso, a exploração, a fome e a miséria instalam-se em muito lares de portugueses.
O Governo do PS/PSD está a governar contra o povo, contra os interesses nacionais, está a levar o País a um verdadeiro desastre. Por isso mesmo cresce o descontentamento, a indignação, cresce a resistência popular.
Importa que a Assembleia da República discuta e conheça devidamente a gravidade da situação e o que o Governo está a fazer deste país e dos portugueses.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Indiferentemente e incapaz de resolver qualquer problema nacional, o Governo anuncia novos agravamentos das já degradadas condições de vida. A 1 de Abril aumentarão os transportes. Transportes que durante o ano anterior aumentaram mais de 40%! Os portugueses que andem a pé! Tal

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aumento é incomportável para os orçamentos familiares. Mas não ficam por aqui!
Anuncia-se também, o aumento do pão!
Estará o Governo consciente que hoje o pão é de novo o alimento básico de muitas famílias? Aumenta evidentemente o consumo de pão e baixa o consumo da carne, do peixe, dos ovos e até do frango. Os hábitos alimentares dos portugueses estão a mudar à força e ao ritmo do aumento do custo de vida. Basta olhar o país para nos apercebermos que isso não se passa só com a classe operária, o campesinato ou com os desempregados, mas até na cidade os quadros, os trabalhadores de serviços e empregados têm o almoço reduzido ao galão, ao rissol e à sanduíche! «Comer sentado é um luxo»! Come-se ao balcão, de pç e mal. E que se passa em casa dos trabalhadores sem salário? E em casa dos trabalhadores desempregados? Srs. Deputados, o aumento do pão não é comportável!
Há dias, numa reportagem de uma revista feminina sobre as consequências do desemprego na vida familiar, a jornalista colheu novamente uma frase conhecida e que não é de romance: várias mulheres testemunharam que hoje não se sentam à mesa porque a comida não chega para todos e justificam-se dizendo que já almoçaram!
O pão é uma alimento básico das famílias que não têm posses económicas e mesmo assim fala-se num aumento para 75$ o quilo. Que vão comer os portugueses, Srs. Deputados? Batatas a 50$ ou 60$ o quilo?
Mas não fica por aqui o Governo do PS/PSD.
Submete a debate público uma proposta de decreto-lei das rendas de casa com aumentos que podem chegar a 300%! Inacreditável esta proposta, tanto mais que no momento presente se sofre as consequências da política dos sucessivos governos que conseguiram tornar impossível para a maioria dos cidadãos o acesso ao crédito para habitação própria e habitação social e coisa que não existe, pura e simplesmente. Rendas de 500$ podem subir para mais de 3470$, dizia há dias um jornal! E é verdade!
A grande e única preocupação do Governo no campo da habitação é, pois, pôr os inquilinos a pagar mais de 300 % de renda pelas casas que habitam por vezes há dezenas de anos!
Darei apenas só mais um exemplo da tal política de austeridade que demonstra quem está efectivamente a pagar a crise! O Governo aumentou o preço dos medicamentos e vai «poupar» vários milhões de contos à custa da saúde dos portugueses. Numa pretensa medida de racionalização do sistema, o Governo embolsa uns milhões ... Assim, depois de reter durante meses e vergonhosamente a decisão do Tribunal Constitucional sobre a inconstitucionalidade da taxa dos medicamentos, o Governo só deixa publicar o acórdão quando já tem no bolso uma medida mais gravosa.

Vozes do PCP: - É uma vergonha!

Servindo-se de um decreto, divide os medicamentos em «úteis», «menos úteis» e «inúteis», e comparticipa-os de acordo com essa tabela. Mas é o doente que vai comprar o remédio que sabe que o medicamento que vai escrito na receita pelo seu médico é muito útil ou só meio útil? É o doente que vai pagar, que deve decidir que o farmacêutico só lhe venda 2 dos 3 remédios que leva prescritos pelo médico
porque o outro pouco lhe faz à doença? Entendemos que não! O doente paga e paga mais.
Temos dito aqui dezenas de vezes como é que o Governo pode poupar em gastos com medicamentos sem lesar, antes beneficiando o utente. É necessário racionalizar as embalagens que estão estudadas pelas multinacionais para nunca acertarem com a dose necessária; é necessário um formulário nacional rigoroso e não a verdadeira lista telefónica que hoje existe em Portugal ...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... e em que se chega ao ponto de estarem comercializados medicamentos que não o estão no seu país de origem; é necessário o efectivo controle de preços; é necessário criar um sistema da unidose, pelo menos nos hospitais ... Mas a diferença, Srs. Deputados, é que nas medidas que preconizamos restringem-se os fabulosos lucros das multinacionais e nas decididas pelo Governo ataca-se a carteira dos portugueses!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Há dias, assistiram-se novamente a cenas esquecidas na Avenida da Liberdade. Generalizou-se a solidariedade e a indignação, as portas abriram-se novamente, das janelas gritou-se, unanimemente, protestos perante uma carga policial sobre os trabalhadores da SOREFAME.
Duas senhoras «finas» olharam a manifestação dos trabalhadores e gritaram da janela: «se fossem trabalhar em vez de andarem em manifestações ...». Criaram uma tal onda de indignação que o autocarro teve de as deixar em terra. Ê que os trabalhadores da SOREFAME trabalham e recebem 10 contos de vez em quando. E não dão de comer aos filhos de vez em quando, e não podem pagar a renda de casa de vez em quando, nem vestir-se e calçar-se de vez em quando ...
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
E o Governo que faz, Srs. Deputados? Responde com os cassetetes da polícia de choque! Como já tinha feito aos trabalhadores da Reforma Agrária, da SETENAVE. da LISNAVE, aos Vidreiros da Marinha Grande. Mas que Governo é este que consente que se trabalhe sem se receber, que quer despedir 1800 trabalhadores da SOREFAME, 1000 da SETENAVE, não sei quantos mil das câmaras municipais e muitos outros. Que Governo é este que manda a polícia de choque contra trabalhadores com salários em atraso e nada faz aos patrões que não pagam. Já prendeu algum? Que Governo é este que tem os trabalhadores por inimigos, por subversivos como escrevia a nota da reunião do Conselho de Ministros. Que Governo é este para quem a lei e a ordem só são para cumprir pelos trabalhadores, sob ameaça de repressão e para quem os patrões são sempre respeitáveis vítimas das dificuldades que o País atravessa? Que Governo é este que faz guerra social ao povo e só defende os grandes capitalistas, os especuladores? Que Governo é este que se ajoelha perante os americanos e ameaça a independência nacional?

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Vozes do PCP: - É uma vergonha. Um escândalo!

A Oradora: - Que Governo é este que só cumpre a;; decisões dos tribunais se convém à sua política e que ignora, por exemplo, os 230 Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo favoráveis aos trabalhadores da Reforma Agrária?
Mas o Governo engana-se, como se enganam sempre os governos cuja força esteja nos cassetetes, no atropelo da liberdade. Isso é uma prova inequívoca da sua fraqueza.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A consciência dos trabalhadores, do povo, não se confunde com o servilismo de alguns.
E mesmo quando o Governo se apressa a criar serviços de informações, «autoridade nacional de segurança» e pretende mudar a lei da greve e manipular a comunicação social, não pense que cala o descontentamento popular. Os cassetetes, os serviços de informações, as mordaças não matam a fome a ninguém ...
Mas o mais grave de tudo isto é que o Governo não está nada preocupado com a situação social.
Os americanos estão muito contentes com os resultados da política económica do Governo gabava-se o Primeiro-Ministro nos telexes vindos de Nova Iorque.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É uma vergonha!

A Oradora: - Pudera, Srs. Deputados, se não hão-de estar! Os portugueses é que não estão!
Mas o Governo tem outras preocupações. Um coro de vozes que vai do CDS ao PS responsabiliza por todos os males da nossa economia as nacionalizações e a Constituição da República. Chegámos ao ponto de a imprensa portuguesa transcrever quais são as 24 empresas públicas que os americanos querem ver liquidadas.

O Sr. João Amaral (PCP):-Um escândalo!

A Oradora: - E de a imprensa portuguesa dizer que Mário Soares oferece aos EUA o Centro de Rastreio de Satélites no Alentejo, depois de já ter oferecido jóia, debaixo de uma onda de protestos que percorre o Algarve. E de a imprensa portuguesa dizer que o Secretário do Orçamento foi pedir autorização a Washington para poder baixar a taxa de juro em Portugal. E de Veiga Simão anunciar que a empresa SEARS (presidida por Frank Carlucci até há pouco chefe da CIA) se vai instalar em Portugal! Que do mesmo Ministro deixou agora constar sem desmentir que os americanos nos querem vender centrais nucleares que custariam 250 milhões de contos, de tecnologia ultrapassada, desnecessárias e perigosas. Ou de se anunciar, como grande conquista do Governo, a instalação cá de bancos estrangeiros, a começar por 3 bancos americanos.
E de se andar a pedinchar pelo estrangeiro uma ruinosa integração no Mercado Comum, como se faz neste momento em Bruxelas!
E de o Presidente do Governo Regional da Madeira dizer que a instalação de mísseis nucleares na Região
é uma «questão de preço». As concessões do Governo não são só do domínio económico, são também do domínio político e militar.
Por que não divulga o Governo ao povo e por que sonega inconstitucionalmente à Assembleia da República o Acordo das Lajes?

Vozes do PCP: - Muito bem!

Que facilidades está o Governo a conceder em matéria de utilização dos nossos portos por submarinos atómicos equipados com mísseis nucleares e por que não diz se é verídico que concedeu ou vai conceder os nossos estaleiros para a reparação dos navios e aviões de guerra americanos? É real a construção de uma nova base em Porto Santo?

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É tempo de dizer «basta!» ao Governo do PS/PSD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Assim o entendeu na análise que fez da situação política o Comité Central do PCP na sua última reunião quando afirma que as condições objectivas estão maduras para a queda do Governo PS/PSD e para que surja uma alternativa.
O que o PCP propõe, as soluções que aponta, as formas de luta que preconiza, estão em absoluta conformidade com a Constituição e a legalidade democrática, e a concretização de uma alternativa depende da determinação, da iniciativa, da vontade e da luta dos portugueses.
É exactamente para dar a conhecer ao país essas conclusões, já que a comunicação social estatizada, particularmente a televisão, nos silenciam, como ainda agora fizeram ao ignorar, pura e simplesmente, o comício do Pavilhão dos Desportos no qual usou da palavra o Secretário-Geral do PCP e apesar de expressamente convocada, iremos realizar uma jornada nacional de esclarecimento em todo o país nos próximos dias 23, 24 e 25.
Iremos aí explicitar não só a situação social existente, porque essa o povo conhece-a, vive-a, mas as políticas alternativas e a alternativa política a este Governo do PS/PSD.
E se julgam que silenciam a gravidade da situação nacional enchendo os ouvidos dos portugueses com a guerra entre Mota Pintos e Mota Amarais enganam-se, como se enganam se julgam que o país acredita na propaganda governamental de que os portugueses não lutam e estão desmobilizados.
Lutam e lutarão mais se esta política continuar.
Ontem foram os camponeses que trouxeram os seus problemas a Lisboa, numa manifestação de muitos milhares vindos de todos os pontos do país, que o Governo não se dignou receber. Os professores e a juventude já anunciaram iniciativas suas como meio de se fazer ouvir.
O 25 de Abril, no X Aniversário da Revolução, e o 1.º de Maio irão ser, sem dúvida, a prova de que o povo português está decidido a defender o regime democrático e a independência nacional. Serão a prova de que a luta continua e continuará até à formação de um Governo que assegure uma política ao serviço do povo e de Portugal!

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram, suponho que para pedir esclarecimentos, informo a Câmara de que, de visita à Assembleia da República, se encontram nas galerias, a assistir aos nossos trabalhos, estudantes da Escola Secundária de Queluz, da Escola Secundária de Monserrate (Viana do Castelo) e do Externato Frei Luís de Sousa, de Almada.

Aplausos gerais.

Suponho que para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não, Sr. Presidente. Farei o chamado protesto por dever de ofício e não tal como eu o entendo porque não tenho nada a protestar contra esta intervenção.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Então para que é que protesta?!

O Orador: - Vou já explicar, Sr.ª Deputada.
Não tenho nada a protestar contra esta intervenção porque a figura regimental do protesto implica que haja qualquer coisa que vá além do legítimo exercício do direito à crítica e eu não ouvi nada que extravasasse esse exercício.
De qualquer forma, gostava de dizer que a sua intervenção não é motivo para protesto, porque se trata do mesmo discurso que tenho ocasião de ouvir nesta Assembleia há cerca de 2 anos a esta parte.

Uma voz do CDS: - Só?!

O Orador: - Porquanto, se por acaso eu tivesse ocasião de protestar contra um discurso que é sempre igual, teria que fazer protestos sempre iguais e cairia no pecado que assaco à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
Por outro lado, perante um conjunto de coisas que são uma caracterização da realidade que exclue a alternativa para a superar, um conjunto de processos de intenção perfeitamente sem sentido, a amálgama de factos que não têm nenhuma ligação uns com os outros e depois a afirmação que se destina à divulgação da reunião do comité central do PCP, isto não deixa nenhum plano à imaginação. Não é susceptível de protestos, não é susceptível de esclarecimentos, não é sequer susceptível de repúdio porque repudia-se aquilo que é novo... Isto não tem sequer o venerável selo de que há alguma coisa que seja nova.
No entanto, há um único pequeno ponto que poderá ter interesse e que diz respeito à existência de condições maduras - é a habitual Langue de bois, a Língua de madeira, de George Orwel - para derrubar o Governo, dizendo que a alternativa do PCP responde à Constituição da República.
Já tive ocasião de fazer uma declaração política sobre esta história da alternativa do PCP quando ela constava só das teses do congresso do PCP, tendo dito que não há nenhum Governo de Salvação Nacional que não passe por partidos políticos e que os partidos políticos nesta Câmara, na sua esmagadora maioria, não aceitam essa teoria do «Governo de Salvação Nacional». Isso seria uma coisa feita contra os partidos e contra a Assembleia da República.
Enfim, gostava de lhe dizer, Sr.ª Deputada Zita Seabra, que me veio à memória um filme chamado Casablanca, com Humphrey Bogart, em que ele fazia o papel de um homem da resistência que, para a servir, dirigia a polícia de Vichy. E quando havia atentados e ordenava que se efectuassem prisões, ele dizia assim: «prendam os suspeitos do costume».
Pois bem, o discurso da Sr.ª Deputada Zita Seabra é o discurso do costume: não merece comentários, não merece protestos, não merece esclarecimentos, não merece interpelações; merece tão só que eu diga, por dever do ofício, porque a tanto me obriga a situação política, que não estamos de acordo.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, como há mais um orador inscrito, pergunto-lhe se deseja responder já ou no fim.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado José Luís Nunes, relativamente ao meu discurso, pergunto-lhe como é que ele podia ser outro se a política não mudou. Ë que há 2 anos a política era a mesma da de agora. O que mudou foi o seu discurso, porque olhe que há 2 anos o Sr. Deputado fazia discursos bem parecidos com o que acabei de fazer.

Vozes do PCP:- Muito bem!

A Oradora: - Portanto, quem mudou foi o PS.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr.ª Deputada, quando nós dizíamos que o Governo da AD era péssimo e quando o PCP dizia que o Governo da AD era péssimo, por mais incrível que pareça, estávamos a dizer coisas completamente diferentes.

Risos do PS, do PSD e do CDS.

A Oradora: - Sr. Deputado, apesar de tudo, saliento-lhe algumas diferenças: enquanto que há 2 anos, quando aqui trazíamos a situação social, não podíamos dizer, por exemplo, que 150 000 trabalhadores tinham salários em atraso; hoje, infelizmente, temos que o dizer. Isto mostra a gravidade que existe da situação social.
Ao falar-me em Casablanca, lembrei-me de Marrocos. É que eu tenho um amigo que me costuma dizer isto: «este país está a ficar pior do que Marrocos». E isso é verdade, Sr. Deputado. Quando, por exemplo, atravessamos a Baixa de Lisboa e vemos a quantidade de pessoas a vender as mais variadas espécies de artigos, num nítido sintoma de crise social que afecta o país, faz bem recordar-se do filme Casablanca, porque nós estamos quase numa situação idêntica.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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A Oradora: - Quanto ao Governo de Salvação Nacional, devo dizer que, quando da intervenção que na altura fez sobre o nosso congresso, tive oportunidade de lhe explicar - e repito-o agora - que as propostas do PCP cabem perfeitamente no quadro democrático e constitucional. É exactamente no quadro da democracia e no do regime constitucional que pretendemos que seja encontrada uma saída e uma solução para a crise.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - O que dizemos é que este Governo não pode continuar, muito menos com esta política porque ela está a levar o país à situação que aqui trouxemos e que tem que ser trazida da maneira como o colocámos ou de outras.
Acredito que achasse muito interessante e inovador que eu aqui fizesse um discurso centrado no facto de quem é que tem mais votos: se Mota Amaral, se Mota Pinto, e que discutíssemos se os 40 % de um são mais do que os 40% do outro. Ao ouvir-se a comunicação social estatizada, dir-se-ia que o país está reduzido a essa questão e que ela é neste momento a grande questão nacional.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas não é, Sr. Deputado. A grande questão nacional não é essa. Se para si poderia parecer um discurso altamente inovador e interessante que o PCP se metesse nessas questões internas, nós não achamos e pensamos que as questões que nós aqui hoje trouxemos ...

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr.ª Deputada, por favor, acuse-me de tudo: chame-me reaccionário, chame-me conservador, mas não me chame pessoa com mau gosto. Ê que eu não considero que uma questão dessas fosse inovadora e interessante.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - interessante não é, mas diria que inovador está o PCP. Ora, não são esses, em nosso entendimento, os graves problemas que afectam o País e, por mais que queira escamotear, a situação social que neste momento se vive e que afecta muitos e muitos milhares de trabalhadores não pode deixar de ser trazida a esta Câmara, tantas vezes quantas forem necessárias. E digo mais: traremos mais vezes e faremos mais vezes este ou outro discurso igual.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino, não sei se para pedir esclarecimentos se para protestar.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - É para protestar. Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada Zita Seabra, lamento imenso não ter ouvido a sua intervenção mas, quando aqui cheguei, os meus colegas transmitiram-me que a Sr.ª Deputada afirmou que o Presidente do Governo Regional da Madeira terá dito que a instalação de mísseis no arquipélago da Madeira seria uma questão de preço.
Quero, em primeiro lugar, pedir à Sr.ª Deputada que me diga o dia, a ocasião e o contexto em que terá sido feita essa afirmação porque, pessoalmente, não acredito nela. Se alguma vez foi feita alguma afirmação nesse sentido, não foi com o sentido que a Sr.ª Deputada lhe deu.
E mais: tenho a impressão que faz uma acusação extraordinariamente grave que merecia que fosse documentada nesta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se assim entender, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr.ª Deputada Cecília Catarino, só espero que quando lhe entregar essas declarações que a imprensa transcreveu, pois é evidentemente na base da imprensa que nós conhecemos as declarações do Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira e também Presidente do PSD regional ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Simplesmente!

A Oradora: - .... que a Sr.ª Deputada se indigne e junte a sua à nossa voz para que na Madeira não sejam instalados mísseis que podem pôr em perigo, não só a Região Autónoma da Madeira como o nosso próprio país.
As declarações do Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira são sempre muito curiosas e o que ele diz não se escreve ... Mas neste caso até está escrito, pelo que lhe posso oferecer as declarações que a imprensa transcreveu e espero que a Sr.ª Deputada se junte a nós para impedir que esses mísseis sejam instalados na Madeira, seja a que preço for, porque eles põem em perigo a Região Autónoma da Madeira e a nossa independência nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Menezes Falcão.

O Sr. Menezes Falcão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 15 de Junho de 1983, ao abrigo das disposições regimentais em vigor, requeri ao Governo, através do Ministério da Indústria, que me fossem fornecidas da Empresa Pública Electricidade de Portugal, EDP, vários elementos que habilitassem a formular um juízo correcto sobre o que se passa no sector responsável pelo abastecimento de energia eléctrica ao país.
Pretendia saber que tipos de assimetrias tarifárias se verificam a nível nacional, quantos e que tipo de consumidores beneficiam de taxas reduzidas ou estão isentos do pagamento do consumo de energia eléctrica, e ainda qual o montante das dívidas à EDP por parte dos receptores em alta ou média tensão, nomeadamente as empresas públicas e as autarquias locais.
Embora estejamos em presença de uma análise de características sectoriais, não podemos abstrair das

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múltiplas implicações que ela tem na vida económica nacional a todos os níveis.
O problema e muito mais complexo do que parece à primeira vista. Vejamos porquê.
Seria particularmente útil que as considerações que pretendo fazer, tivessem apoio nos elementos requeridos ao Governo, há precisamente 9 meses.
Considerando que tal propósito não vingou e a paciência na espera chegou a termo, importa concluir que a gestação da resposta ficou pelo caminho e já não virá à luz do dia.
Registe-se a manifestação de falta de respeito pelos direitos dos deputados, o que equivale a dizer pelos preceitos regimentais e pelos cidadãos que confiam neles.
Mas nem por isso faltam elementos de apreciação, resultantes do contacto directo com factos concretos e alguns conhecimentos em segunda mão, em que as eventuais imprecisões serão da responsabilidade do Governo, que não quis ou não pôde responder àquilo que se lhe perguntou.
Toda a gente sabe e sente quanto pesam os sucessivos agravamentos impostos para o consumo de energia eléctrica e combustíveis.
Curiosamente, enquanto que a valorização do dólar e a desvalorização do escudo funcionam como escudo defensivo da ofensiva dos preços do petróleo e seus derivados, todas as portarias do Ministério da Indústria e Energia, destinadas a brindar os consumidores com novos preços, contêm um preâmbulo com argumentos bebidos na mesma fonte.
Certamente por se ter em conta que o cidadão menos familiarizado com progressões geométricas, não deixa de ter uma noção de progressões aritméticas, associa-se à incidência dos preços do fúel nas centrais térmicas, a seca dos últimos anos a fala-se em «repercussões extremamente gravosas no custo de produção de energia eléctrica, que não foram atempadamente repercutidas na tarifa».
É claro que o cidadão comum não lê estes e outros justificativos reproduzidos em decalcomania à razão de duas vezes por ano; e argumenta que, com mais ou menos periodicidade, o S. Pedro continua a debitar a água às albufeiras pelo mesmo preço e que, sendo a seca de 1 ano razão de agravamento anormal, os anos de cheias seriam de reposição da normalidade, o que não acontece.
Já há quem pague mais de energia eléctrica do que de renda de casa!
No entanto, o aumento das rendas de casa está condicionado, mas o «senhorio» das albufeiras só tem que repetir o texto preambular e completar a nova portaria com novas tarifas.
Aceitamos que o que fica dito se assemelha a pinceladas de tonalidade demagógica.
E é por isso que cabe aqui esta afirmação muito séria: Pertenço ao número daqueles que davam a camisa, jejuavam a pão e água e andariam a pé para salvar a já perdida independência da economia nacional, se tanto fosse pedido a todos, mas a todos os portugueses.
Onde todos pagam nada é caro e a independência da Pátria não tem preço!
O que não é possível é aceitar a credibilidade de uma orgânica em que cada poder económico é um Estado em desafio ao Estado. Em que cada potência
reivindicadora abafa e espezinha os que não têm poder reivindicativo; em que o Estado patrão negoceia a justiça distributiva no mercado de votos.
O que não é possível, o que é pura fantasia, é admitir a possibilidade de sobrevivência de um país em que a vida é para uns um calvário e para outros uma corte de Herodes.
E não venham alguns chamar-nos, mais uma vez, carpideiras ou Madalenas, porque não seremos nós a colocá-los no papel de Pilatos!
Mas deixemos as alegorias e retomemos as assimetrias.
Bem podíamos todos pagar os impostos para todos, se não fosse dizimada com a tributação de hoje a matéria tributável de amanhã.
Bem podíamos ter os salários em dia se o Governo não aceitasse, pacificamente, que as falências é que estão em atraso, deixando ir para o prego a massa falida.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Bem poderia a generalidade dos gestores libertar-se do ferrete de ignomínia que os responsabiliza por má gestão, se os deixassem gerir.
Vamos ser mais concretos, exemplificando: um determinado número de empresas, das muitas centenas que vivem na dependência dos combustíveis gasosos e da energia eléctrica, faz a sua ginástica de corda bamba e aguenta-se no balanço desta tempestade económica à custa de muitos sacrifícios, nomeadamente os daqueles que recebem os salários mínimos ou atrasados.
Ao dar da meia noite de um determinado dia do calendário governamental, os custos de produção são agravados por portaria - directa ou indirectamente, objectivamente ou por arrastamento - em 20%.
Os fornecedores de combustível e de energia eléctrica respondem à chamada com prontidão. O mercado consumidor entra em pânico e fica surdo, mudo e quedo.
Impotente, paralisa e estrangula!
O Estado banca espreita a situação e suga os que ainda têm por onde sangrar. As EDP e outros mais, ao abrigo da competente legislação protectora dos feudos, ameaça com o «crês ou morres» e vai debitando juros de mora por piedosa benevolência.
E depois vem o Governo dizer que a solução está nas falências e que os gestores é que são maus!...
E nós perguntamos: quem provocou as falências? Quem geriu mal?
Bem sabemos que a estas perguntas, o Governo responderá com o sábio argumento que já veio a este Parlamento por outras vias: «Que não deve confundir-se a árvore com a floresta».
Resta saber quantas são as árvores abatidas e se o Governo já se apercebeu do fogo que lavra na floresta!...
Para introduzir a conclusão, uma palavra a brindar a administração da EDP tão solícita a propor portarias ao Governo que, logicamente, começou por responder com umas tantas e agora parece assiná-las todas de cruz.
As últimas, e mais penosamente significativas, são de Julho de 1983 e de Janeiro do ano corrente.

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Mais penosas e significativas por terem atingido níveis incomportáveis, já que o consumidor perdeu o passo na capacidade de resposta.
É evidente que a EDP precisa destas actualizações tarifárias para garantir o abastecimento e manter os seus quadros sem reivindicações, com benefícios de classe privilegiada e com custos de administração e manutenção que suplantam os níveis europeus, como também não lhe interessa que a nossa energia seja a mais cara ou das mais caras da Europa.
É que as dívidas à EDP por parte dos que não podem ou dos que não querem pagar, somam mais de 50 milhões de contos.
O Governo, não confirma, nem nega!
E são esse milhões que se vão buscar em agravamentos sucessivos de taxas ao público consumidor indefeso, Vamos lá fazer a greve do consumo! ...
Não custa pagar o que devemos e todo o cidadão deve os custos do seu consumo.
O que não deve, e custa pagar, é o que devem os privilegiados, num ambiente administrativo de flagrante injustiça social, arbitrariedade total e manifesta degradação moral.
Por outro lado, pergunta-se à EDP quanto paga de indemnizações que deve pelos vultosos prejuízos levados às empresas onde interrompe o fornecimento com os primeiros chuviscos do Outono, por falta de indispensáveis cuidados de conservação e limpeza, que, no Verão, deveriam ser dispensados aos sistemas de distribuição.
Pergunta-se à EDP, quanto paga pelos prejuízos resultantes da irregularidade do abastecimento, onde equipamentos e produtos em trânsito de fabricação, ficam danificados ou inutilizados com culpas atribuídas ao vento que sopra do Norte, do Sul, ou do Oeste e nunca por culpa das redes deterioradas e mal assistidas.
Aquela empresa pública responde com contas de juros por facturas em atraso.
É neste circuito que nos encontramos com a colisão entre causas e efeitos.
E as multidões concentram-se em frente do Palácio da Assembleia da República, como se os Deputados tivessem nas mãos a Lâmpada de Aladino ...
Concentrações que agitam bandeiras pretas. Talvez muitas em manifestação encomendada; mas basta que algumas signifiquem, efectivamente, fome, para que haja que pedir responsabilidades a alguém.
Certamente a muitos, mas principalmente a quem tem a responsabilidade de usar as regras ditadas pelo Povo, para conduzir o povo às regras de viver.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Roque Lino.

O Sr. Roque Lino (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Penetrar na floresta e percorrê-la por escassos 10 minutos poderá parecer um acto inútil, apesar da vantagem óbvia de não me perder na densidade dos seus problemas e dos seus temas. Problemas que apontam para as opções possíveis ou necessárias de uma adequada política florestal. Temas que se prendem com o posicionamento do homem frente à mata como ecossistema, como factor de produção e como fonte de serviços.
Não obstante a escassez de tempo, direi o que me parece essencial, hoje que se comemora o dia mundial da floresta.
As cheias, as secas e os incêndios repetem-se ciclicamente como se fossem uma fatalidade. Confrontado com tais catástrofes, o homem convence-se que tem de viver de mãos dadas e amarradas com essas calamidades, falando silêncios de revolta, esboçando gestos de paralisia, desesperando na angústia da esperança.
Em rigor, trata-se de fenómenos da natureza que o homem pode eliminar ou atenuar, do mesmo modo que sempre dominou o meio físico onde habita. Isso tem muito a ver com a própria estrutura da floresta, com o seu reordenamento e com a prevenção contra os fogos. Com efeito, muitas daquelas calamidades são consequência de uma utilização deficiente e desordenada do solo, já que o homem, frequentes vezes, planta árvores para exercer actividades lucrativas de curto prazo, do mesmo modo que as destrói por razões semelhantes.
Exemplos concretos de uma e outra atitude temo-los na cultura intensiva de certas espécies aptas para a indústria da celulose. Ê o caso do plantio de eucaliptos em solos de aptidão agrícola ou florestal diferente. Temo-los também no abate sistemático de árvores, quer por razões de urbanismo selvagem, como por razões de reconversão cultural inapta. E isto, para não falarmos na vaga assustadora de incêndios, muitos dos quais têm origem criminosa, estranhamente por razões económicas.
Ora uma política florestal correcta, que situe o Homem no centro das suas preocupações, deve visar a protecção do solo, a conservação da água e a regularização dos caudais, através do revestimento florestal com espécies que reduzam a velocidade de escoamento das águas e permitam a sua fixação.
Mas se a floresta deve funcionar como chapéu de chuva contra certas calamidades, nem por isso ela deixa de ter uma função económica essencial. Estou a referir-me à floresta de exploração enquanto fonte de produção de bens e de serviços. No primeiro caso, para frisar apenas o peso da mata na economia nacional, sabemos que a floresta concorre com 18% a 20% do total das nossas exportações. No que toca, por exemplo, aos serviços prestados pela floresta, integrada pelas áreas silvestres contíguas, ela propicia um habitat natural para a silvopastorícia, é fonte de recursos cinegéticos e aquícolas e alarga consideravelmente as zonas de exploração papícola.

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Muito bem!

O Orador: - Podemos, pois, afirmar que a floresta é o sangue e o pulmão do homem, já que a vida humana e indissociável da existência de maciços florestais organizados.
Aproximadamente 3 milhões de hectares em Portugal estão cobertos de floresta, o que corresponde à terça parte do território. Cerca de metade desta superfície é constituída por resinosas, nas quais avulta o pinheiro bravo, que ocupa 934 800 ha nos distritos de Viseu, Coimbra e Castelo Branco, 301 900 no norte e 61 900 no sul do País. O eucalipto cobre uma área de 214 000 ha.
Se considerarmos que há 1.2 milhões de ha incultos, aptos para culturas florestais, e que só no dis-

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trito de Castelo Branco existem 350 000 ha, reflorestáveis, teremos uma ideia aproximada do quanto falta fazer para dar alma e riqueza à paisagem portuguesa, onde 90 %, da mata é de formação natural e 10%
de mata instalada.

Riqueza que não passa, apesar de tudo, de pobreza franciscana, tendo em conta a estrutura da floresta portuguesa e o seu deficiente aproveitamento. Dividida como está por 600 000 proprietários, cabe a cada um uma unidade de dimensão média de 2 ha, o que dificulta a sua exploração e a extensão florestal. Cerca de 2 % pertence ao Estado enquanto o poder local dispõe de 10 %.

Para simplificação da análise das deficiências estruturais, mencionarei os dados recolhidos de diversos estatutos do engenheiro Azevedo Gomes, Secretário de Estado das Florestas, em particular no que toca ao diagnóstico do subsector. Enumera, entre outros, a pobreza da composição e estrutura florestais; a existência de espaços marginais para o cultivo agrícola, a beneficiar com a floresta de uso múltiplo; a debilidade da estrutura produtiva industrial; a catástrofe incendiária; e, finalmente, a transferência para a indústria pesada da madeira de grandes parcelas agricultáveis. E, todavia, o Orçamento Geral do Estado apenas contemplou o subsector com 750 000 contos, quando em 1983 o PIDAC havia sido mais generoso: 1 200 000 contos.

Debruçar-me-ei, de passagem e por falta de tempo, apenas sobre duas daquelas deficiências estruturais, a saber: os incêndios e o arrendamento ou a compra de terras pela indústria pesada. Comecemos por esta.

A dependência económica dos produtores florestais, quer por falta de crédito acessível, quer pelo efeito devastador dos incêndios, quer ainda pela enorme dificuldade na colocação do lenho, tem tido como consequência que muitos deles se deixam vencer pela fatalidade do sistema.

Não raro e nessas situações, as grandes empresas de celulose adquirem por compra ou por arrendamento áreas extensas, onde praticam culturas intensivas de rotações curtas que são, em muitos casos, atentatórias de um desenvolvimento florestal equilibrado. Para além da cultura exclusivamente virada para a actividade lucrativa, mas não para uso múltiplo, inverte-se a própria dinâmica do emprego.

Permito-me transcrever aqui um excerto de uma carta que me escreveu um Amigo, o Dr. José da Silva, colaborador habitual do Jornal Comarca da Sertã. Diz ele:

A compra e o arrendamento de solos devastados por incêndios, bem como de extensas áreas muitas vezes aptas para a agricultura, para a exploração intensiva da indústria florestal (eucaliptos, designadamente), por parte das fábricas de celulose, deixa ficar a dúvida sobre a sobrevivência de modestos produtores madeireiros da zona do Pinhal, que não vêem assegurada a colocação do lenho.

São palavras para meditar.
Penso que uma das formas de dinamizar as explorações individuais e familiares, com vista à extensão florestal, passa pela sensibilização, promoção e apoio dos proprietários florestais, em ordem à criação de

formas de associativismo, para que haja áreas florestais contíguas, bem dimensionadas e apoiadas financeira e tecnicamente.

Aplausos do PS.

Oxalá venha a vingar a proposta legislativa, que sabemos está a ser preparada pelo Secretário de Estado das Florestas, no sentido de limitar a compra e o arrendamento, por empresas industriais, de terras cuja produção seja superior a 10 % do respectivo auto-abastecimento. Oxalá, repito eu, para que a economia da transformação não mate a economia da produção florestal.
E quanto aos incêndios? Quais as suas causas? Como combatê-los? E aterrador verificarmos que a floresta portuguesa vem ardendo desde 1973, no Centro e no Norte, à razão de 50 000 ha por ano, com um máximo de 82 000 ha em 1975, quando no período de 68/73, a média anual não ultrapassava os 10 000 ha É aterrador atravessar a zona que vai desde Castelo Branco até Coimbra, pela serra da Lousã, e olhar para uma paisagem que mais se parece com um pesadelo lunar. As causas são múltiplas e há que combatê-las com firmeza. Mencionarei apenas que, segundo elementos de que disponho, há uma relação inequívoca entre as áreas da floresta ardida e a exportação de lenho em bruto.
Foi afirmado num colóquio realizado na Sociedade de Ciências Agrárias de Portugal, cujas conclusões vêm publicadas na A Capital, de 25 de Julho de 1983, que "devemos assumir os incêndios florestais como consequência inevitável da nossa condição mediterrânica, pelo que há que contrapropor-lhes um conjunto de medidas, tais como: melhoria dos sistemas de alerta em simultâneo com a capacidade de resposta; desenvolvimento de técnicas de prevenção; criação de medidas especializadas no combate aos incêndios". Também a Câmara Municipal da Sertã aprovou um documento em 12 de Outubro de 1983, no mesmo sentido, pondo a tónica na maior eficiência e operacionalidade das forças de combate ao incêndio, designadamente as policiais e parapoliciais.
Aguardemos pela escrupulosa aplicação das regras consagradas nos Decretos-Leis n.º' 368-A/83, de 4 de Outubro, e 9/84, de 6 de janeiro. Se elas forem respeitadas e até melhoradas em ordem e impedir a exportação de materiais lenhosos ardidos, sem limitações de nenhuma espécie, talvez certos grupos comerciais deixem de provocar incêndios para obtenção de lucros fáceis. Essa, pelo menos, a filosofia daqueles diplomas. E quando os criminosos forem identificados, há que puni-los sem atenuantes e atirá-los para as cadeias do nosso sistema prisional.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Comecei por abordar o tema da floresta situando o homem no centro dela. frei concluir da mesma forma, mas agora com particular incidência nos desequilíbrios regionais, designadamente no que toca ao homem. actor e sujeito passivo dos custos de interioridade.
O homem do interior vive lado a lado com a árvore. Planta-a e vê-a crescer. Espera dela os frutos do trabalho, olha nela a esperança resignada no amanhã. Colhe dela a cereja e a azeitona, extrai-lhe a cortiça e a resina, apanha os frutos que escaparam das geadas, abraça no tronco o abraço do cansaço. Sofre

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se ela morre no estio da doença, sua quando a corta para as máquinas do consumo. E quando, anos a fio, não se cansa de a olhar, chora se a vê partir por entre labaredas de fogo. São essas as imagens da minha infância.
E, depois de uma vida de trabalho, o homem do interior envelhece a olhar para o horizonte por onde ela viajou. A caminho de outros braços. Daqueles que a não fizeram nascer mas que a usufruem; daqueles que a não viram crescer, mas a compram para viver; daqueles que a não viram morrer, mas que vivem por ela ter morrido.
Quando em Portugal se fala dos desequilíbrios regionais, em pólos de desenvolvimento e em custos de interioridade, pergunto se não estaremos a ser hipócritas. Entre a serrania e o litoral, o campo e a cidade, a aldeia e Lisboa, o poder de compra varia na razão de 1 para 2.
Há, então, que perguntar se não é o homem do interior que alimenta, em parte, os cofres exaustos do Banco de Portugal com as remessas que envia de terras longe que demandou. Há que perguntar se não é o homem do interior que produz a floresta e concorre assim com 20% para o total das nossas exportações. Há que perguntar como seria Portugal se a riqueza que flui dos caminhos perdidos do interior não fosse transportada e aplicada preferencialmente nos grandes centros urbanos do litoral.
E ao fazer tais perguntas, há que saber quando se estabelecerá o equilíbrio na troca de bens e serviços entre a orla marítima e o interior. Bem sabemos que as modificações estruturais da economia não se introduzem de um dia para o outro. Também sabemos que Roma e Pavia não se fizeram num dia.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Nem numa noite!

O Orador: - Mas quero acreditar que este Governo tudo fará para reduzir distâncias e aproximar os homens. Por isso, e para concluir, relembro que o Governo se comprometeu no programa aprovado nesta Assembleia da República a «aumentar qualitativamente a produção de bens florestais no contexto de uma incisiva política de aproveitamento em uso múltiplo dos espaços não agricultados».
Só que a desesperança tarda em ser esperança. Apesar de amanhã chegar a Primavera.

Aplausos do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS e da AS Dl.

O Sr. Presidente: - Ficam inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados João Abrantes, Antunes da Silva, Corregedor da Fonseca e António Taborda.
Srs. Deputados, ultrapassámos já a hora regimental para o período de antes da ordem do dia porque havia declarações políticas que tinham de ser produzidas hoje.
Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento que, em termos regimentais, pede o prolongamento do período de antes da ordem do dia, subscrito por alguns deputados do PCP.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - É que é a segunda vez que o PCP apresenta um requerimento solicitando o prolongamento do período de antes da ordem do dia, e nós leremos inexoravelmente de votar contra se o PCP não nos disser qual é a urgência que justifica o prolongamento, caso em que votaremos a favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Em primeiro lugar, quero, em nome da minha bancada, manifestar a surpresa face à questão agora colocada pelo Sr. Deputado José Luís Nunes.
É das primeiras vezes, senão a primeira vez, que na Assembleia da República qualquer grupo parlamentar quando entende pedir o prolongamento do período de antes da ordem do dia em virtude de ter uma intervenção que tem interesse em produzir tem de informar as restantes bancadas do conteúdo da mesma.
Portanto, se a minha bancada solicitou o prolongamento é porque, em virtude de não ter podido intervir no período normal como era do seu interesse, considera dever fazê-lo num espaço especial de prolongamento do período da ordem do dia.
Agora, logicamente que compete à maioria exercer o seu direito de voto sobre se concede ou não o prolongamento. Não nos compete a nós - e isso seria um mau hábito - informar a Câmara do sentido do nosso pedido de prolongamento sempre que a elo quiséssemos recorrer.

O Sr. José Luís Nunes (PS): Sr. Presidente. Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado, mas pedia-lhe que fosse rápido na sua intervenção.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - O Sr. Deputado Jorge Lemos e talvez um bocado novo nestas andanças e na verdade o que se passa e que eu não quero, de forma nenhuma, saber o conteúdo da intervenção do PCP, nem me passa tal ideia pela cabeça; sabê-lo-ei quando a referida intervenção for produzida.
Mas o que é habitual quando um grupo parlamentar pretende apresentar um requerimento deste teor e dar uma satisfação aos outros grupos parlamentares dizendo que se considera essencial fazer uma intervenção sobre determinado assunto para a qual não há tempo disponível. Nesse caso, inequivocamente, sem qualquer outro intuito, nós daríamos o nosso assentimento. Mas sempre que apareça um simples requerimento sem qualquer fundamentação ou acordo prévio, nós votaremos contra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu dar-lhe-ei ainda a palavra, mas após a sua intervenção submeterei imediatamente o requerimento à votação.
Faça favor.

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, deixaria de lado a questão da «novidade nestas andanças», gostaria era que o Sr. Deputado José Luís Nunes desse então essas indicações à bancada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista porque ainda na última reunião eu tive o cuidado de, em nome do meu grupo parlamentar, colocar a questão da necessidade do prolongamento e a resposta foi inexoravelmente «não».

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de prolongamento do período de antes da ordem do dia, subscrito por deputados do PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP, do CDS, do MDP/CDE, da UEDS e do deputado independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem sido entendimento comum e correcto desta Assembleia que o exercício, por parte dos diferentes grupos parlamentares, das prerrogativas de prolongamento do período de antes da ordem do dia e como que um tácito direito potestativo.
Aparece agora a bancada do Partido Socialista a defender uma tese de todo em todo preocupante, que é a de que, primeiro, o partido interessado em produzir uma determinada intervenção terá de informar os outros grupos parlamentares da urgência e do conteúdo da intervenção propriamente dita. Ora, isto não faz sentido, é uma aberração e a seu tempo, noutras circunstâncias, teremos a oportunidade de demonstrar porquê, de resto com toda a facilidade.
Acontece, no entanto, que a Comunicação que tinha para produzir e que vem sendo dificultada, através de votações como a de hoje, pelo bloco governamental tem a ver com uma questão extremamente grave, que e a de, ao arrepio das normas regimentais, se manter a Comissão de Administração Interna e Poder Local com uma matéria como a da criação de municípios, como a da lei-quadro de criação de municípios, em perfeito «banho maria», congelando-a, com todo o significado político de que isso se reveste.
A maioria não resolveu as suas crispações, não foi idónea ao ponto de se pôr de acordo quanto a algumas questões centrais que envolvem não tanto a criação de municípios como, sobretudo, a elevação de Vizela a concelho. E, por isso mesmo, porque se trata de uma atitude para além do mais politicamente irresponsável, e porque se trata de um gesto claramente anti-regimental, o Partido Comunista Português apresentará na Mesa um requerimento que suscitará a questão de, em conferência de líderes, no local apropriado, e de acordo com a competência prevista no n.º 1 do artigo 179.º da Constituição, se proceder à inscrição urgente numa das próximas ordens do dia da discussão e votação na especialidade da proposta de lei n.º 45/III.
Trata-se de uma iniciativa que visa não só repor a regimentalidade dos trabalhos da Assembleia, repor a legalidade do funcionamento desta Câmara e, do mesmo modo, porque disso nos reivindicamos com inteireza, defender o prestígio das instituições democráticas.
Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma democracia degrada-se quando permite que os jogos de corredor, os golpes de rins da obscuridade, se substituam à clareza do debate e à apresentação dos problemas concretos com que se vitaliza uma sociedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Podemos mais acrescentar que todo o poder se desacredita, descaracteriza e põe em causa na justa medida em que não e capaz de, sintonizado com o real, dar respostas atempadas e justas aos diferentes problemas que se vão levantando.
O que se está a passar em torno da questão de Vizela e, até por todos os expedientes semelhantes àquele que acabámos de assistir, alguma coisa que não pode deixar de merecer a nossa profunda reprovação e o testemunho da nossa mais profunda inquietação democrática.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao sentido de voto do PCP a favor do requerimento que apresentou, ele é decorrente não apenas do exercício lógico de um seu direito como também do aproveitamento normal, lúcido e coerente de praxes de convivência democrática há muito havidas nesta Casa que só agora uma maioria crispada e dia para dia menos capaz de resolver os seus problemas e os do País vem questionar.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como VV. Ex.ªs tiveram ocasião de verificar, esta declaração de voto que acabámos de ouvir foi um autêntico abuso de direitos!

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E ficamos por aqui! Mas é evidente que, pela nossa parte, não haverá contemplações para idênticos abusos de direitos!

Aplausos do Sr. Deputado Luís Beiroco do CDS.

Em segundo lugar, quero dizer que a lei é para ser cumprida, e sê-lo-á inexoravelmente!
Não negaremos a nenhum grupo parlamentar - repito, a nenhum grupo parlamentar- o direito de pedir a prorrogação de período de antes da ordem do dia para produzir a intervenção que entender. Porém, o que nós consideramos que é praxe regimental é que se diga:
Temos uma intervenção que consideramos essencial e assim desejamos fazê-la.
Aliás, se nós tivéssemos sabido sobre que assunto versava a intervenção do PCP - e aquilo que o Sr. Deputado José Manuel Mendes fez foi um processo de intenção que não qualifica esta Assembleia nem o Grupo Parlamentar Comunista, antes desqualifica

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quem o faz, porque nós não sabíamos sobre que é que os Srs. Deputados pretendiam intervir -,teríamos votado a favor do requerimento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado sabe que isso não é verdade!

O Orador: - Não é nenhum direito potestativo e o que se exige é uma escolha entre duas urgências.
E nós, entre a urgência da ordem do dia e a urgência da prorrogação do período de antes da ordem do dia, pura e simplesmente, decidiremos sempre a favor da urgência da discussão da matéria constante da ordem do dia, excepto se algum grupo parlamentar invocar, pública ou privadamente, como se quiser - dentro de um princípio de elegância que sempre utilizámos -, que tem urgência em fazer uma intervenção.

Agora, requerimentos como este ou cheques assinados em branco, a partir de hoje não votaremos mais nenhum!

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é também para uma declaração de voto?

O Sr. Malato Correia (PSD): - Não, Sr. Presidente. É para, ao abrigo das normas regimentais e em nome da minha bancada, pedir a interrupção dos trabalhos por 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede que a interrupção se some ao intervalo ou que o substitua?

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, nós pretendíamos que a interrupção se somasse ao intervalo.

O Sr. Presidente: - Antes de interromper a sessão, lembro aos Srs. Deputados que foi convocada para o período do intervalo uma conferência dos líderes parlamentares com o Sr. Presidente.
Está suspensa a sessão até às 17 horas e 55 minutos.

Eram 16 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do primeiro ponto da ordem do dia consta a apreciação do recurso da ASDI sobre a admissão da proposta de lei n." 63/111, que concede ao Governo autorização legislativa para definir em geral ilícitos criminais e penas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para uma intervenção.

O Sr. 1`,,Zagalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Solicitou o Governo, pela proposta de lei nº 63/1(1, autorização legislativa para definir em geral ilícitos criminais e penas, isto é, para legislar em relação às matérias que constituem exclusiva competência da Assembleia da República nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 168 º da Constituição.

'trata-se, naturalmente, de matérias que não caem na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia. Esta pode, portanto, autorizar o Governo a legislar nestas matérias.

O objectivo deste recurso não é, assim, naturalmente pôr em causa aquilo que não ignoramos que a Constituição permite.
Mas, chateando a atenção desta Câmara para que o mudo progressivo como se vai deixando esvaziar de competências, concedendo em vez de autorizações legislativas que a Constituição prevê, autênticos "cheques em branco" que não controla, é, não ;ó uma demissão, como, o que é mais grave, mais um golpe vibrado na instituição parlamentar e no que ela representa - e deve representar- para a vida democrática.

Provavelmente, não se terá ainda reflectido suficientemente, que de todas as propostas de lei apresentadas pelo Governo na actual legislatura -e recorremos do despacho de admissão da n.º 63 - mais de metade são de autorizações legislativas.

Não ignoramos que, com alguma monotonia, são antes de mais justificadas por necessidade de ganhar tempo. Não falta quem, aproveitando a ocasião, sublinhe a traço grosso o contraste com a conhecida lentidão do processo parlamentar. A verdade é que tão curioso argumento principia por esquecer todo o tempo decorrido desde que o Ministro, os seus técnicos e assessores, numa palavra, o Ministério - que, por menor que seja tem mais técnicos e assessores do que todo o Parlamento - começaram a trabalhar uma ideia até que os seus estudos e trabalhos tomaram forma suficiente para o fazer vir ao Parlamento pedir uma autorização legislativa.

Quantos meses terão decorrido e que se ocultam nesta comparação de celeridade dos processos legislativos?

Nem se diga que é de outro modo, porquanto seria simplesmente injurioso imaginar que o Governo "usasse" a Assembleia da República para lhe pedir autorizações legislativas sem saber bem para quê ou sequer se seriam necessárias.

Há - e tem que haver - um trabalho prévio ao pedido de autorização que, inclusivamente, e em muitíssimos casos, começou em Governos anteriores, como é habitual e normal no início da actividade de um Governo.
Mas o argumento da celeridade é também menos verdadeiro, contabilizando-se o tempo que os Governos consideram necessário para aprovar em Conselho de Ministros - visto que a única forma de aceitar a constitucionalidade de alguma legislação do actual Governo, elaborada ao abrigo de autorizações legislativas, é considerar que o Governo tem por certo que o prazo da autorização se conta com a aprovação em Conselho de Ministros e não com a publicação da norma - a legislação para que solicitaram autorização parlamentar.

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Por exemplo, o actual Governo solicitou 5 autorizações legislativas para um período de 90 dias e foi o mínimo que pediu.
No caso presente, pede-nos, por exemplo, 180 dias.
Onde está a celeridade, mesmo sem se somar este tempo ao que decorreu antes da apresentação da proposta.
Onde está, em especial, a vantagem de tempo colhida pelo Governo, cujas propostas de lei que não são de autorização, são de imediato agendadas, discutidas, votadas.
Vejamos alguns exemplos. A proposta de lei n.º 1/III, do Conselho de Comunicação Social, foi admitida em 24 de )unho, e estava publicada no Diário da República, de 6 de Setembro. A proposta de lei n.º 5/III, sobre o regime de asilo, foi admitida em 30 de Junho e estava publicada no Diário da República, de 12 de Agosto. A proposta de lei n.º 34/III - estou a seguir n ordem cronológica e a citar todas as propostas de lei, portanto, os hiatos da numeração correspondem a pedidos de autorização .,. como eu estava a dizer, a proposta de lei n.º 34/III, sobre transferência de verbas, entrou em 13 de Julho, e estava publicada em 7 de Setembro. A proposta de lei n.º 39/III, sobre o imposto de locais nocturnos, foi admitida em 14 de Setembro, e publicada em 14 de Outubro, o mesmo acontecendo com as propostas de lei n.º 40, 41, 42, 43 e 44, todas sobre impostos.
Poderíamos prosseguir uma a uma para poder concluir que o argumento da celeridade é inteiramente falso e não vala a pena usá-lo.
Há uma excepção e valerá a pena salientá-la tão evidentes são as razões da excepção: é a proposta de lei n.º 45/III, sobre a criação de municípios, que. admitida em 13 de Outubro, e aprovada na generalidade em 18 do mesmo mês, ainda não viu a luz do dia...
A actividade do Governo não aparece, portanto, como paliativo para as deficiências e a morosidade do processo parlamentar, que são realidades mas não particularmente em causa quando é governamental a iniciativa legislativa.
O fenómeno não é deste Governo, nem é sequer exclusivamente português!
E, assim sendo, como é, não valerá a pena escamotear realidades ou procurar portas falsas.
Não estamos em liberalismo, não entendemos que a harmonia social, o progresso e a justiça decorram naturalmente do livre desenrolar das relações sociais, em que por isso legislar surgia como um último recurso ou um meio de reconhecer ou consagrar práticas sociais.
Ë a ideia de que, cada vez mais e mais depressa, é preciso inovar criando novos ordenamentos sociais que está na base dos poderes legislativos assumidos pelos Governos.
Aqui, como na Inglaterra, na Holanda, na Bélgica, na França, na Itália, na RFA, nas democracias escandinavas e nos próprios EUA, o mecanismo da autorização legislativa porque faz ainda apelo à lei originária do Parlamento, procura escapar à contradição democrática essencial que consistiria em excluir os representantes do povo de certas escolhas - porquanto legislar é também escolher - cuja importância e urgência as torna essenciais.
Mas se a experiência está generalizada, as criticas também. As autorizações legislativas «no plano doutrinal, atentam contra o princípio de que só os representantes do povo podem introduzir na ordem jurídica novas limitações e, no plano político, por privarem as oposições de ao menos emendar, quando não impedir, a aprovação de textos que só a tolerância de uma maioria, por definição episódica, faz subtrair à transparência do debate», para citar a síntese de um grande constitucionalista contemporâneo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, por assim ser, que a Constituição da República impõe, no n.º 2 do artigo 168.º, que as leis de autorização legislativa definam «o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização», isto é, numa palavra, que a Assembleia dê orientações ao Governo relativamente à lei que o autorizou a elaborar.
Basta ler a proposta de lei n.º 63/III, para verificar que não é sequer possível o cumprimento deste preceito da Constituição face àquilo que se propõe.
Porque o Governo explica pretender «autorização legislativa genérica» - o sublinhado é meu - «para elaborar diplomas em matéria de penas, definindo crime e penas dentro de parâmetros determinados».
Isto é, os deputados que votem esta lei poderão estar a autorizar o Governo a definir como crime a construção clandestina ou a inscrição no Benfica ou o facto de os trabalhadores da ANOP, uma vez mais sem salários, teimarem em que a agência, aprovada por lei, deve continuar a existir. Os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos são assim encarados...
Rigorosamente, se um só dos senhores deputados - e repito um só - for capaz de explicar alto e bom som, que conduta, ou condutas, se pretendem definir como crimes, este recurso não terá razão de ser e é apenas a proposta que carece de alterações para que fique clara.
Mas se assim não for, se não há aqui nenhum deputado que possa responder, então este pedido não devia ter sido admitido e ninguém o deverá votar.
Porque quando o Governo, prometendo-nos ser comedido, nos diz tratar-se «de uma medida indispensável para assegurar a função legislativa do Governo, de modo a permitir que as normas por ele elaboradas prevejam sanções adequadas quando forem transmitidas» está a dizer-nos que o Governo pretende legislar sobre matérias de competência da Assembleia quotidianamente. Ou melhor dizendo, o Sr. Ministro da Justiça está, com esta proposta, a confirmar o deputado Fernando Condesso. Não será o CDS a liderar a revisão constitucional que, por meios como este, se está já operando! ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Diz-nos o Governo ser esta autorização habitual. É, infelizmente, verdade, embora se compreenda melhor quando a Assembleia não está em efectivo funcionamento.
Só que do argumento não se tira mais do que a reincidência ... Ou melhor, tira-se mais, porque esta proposta de autorização legislativa reproduz quase palavra por palavra a proposta de lei n.º 33/III.
Assim sendo, parece que também não poderá deixar de entender-se que o Governo está também a violar o n.º 3 do artigo 168.º da Constituição.
A utilizarmos entendimento idêntico ao que, para efeitos da aplicação do n.º 3 do artigo 170.º da Constituição temos usado, estaria a ser ensaiado um meio constitucionalmente interdito de utilizar mais do que uma vez uma autorização legislativa.

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Pelos argumentos expostos, Sr. Presidente, entendemos que a proposta não deveria ter sido admitida por claramente inconstitucional.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem?

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Poderá parecer estranho que o Governo comece por dizer que o recurso da ASDI tem uma grande virtude: chama a atenção para o facto de ser útil e necessário construir, em sede parlamentar, uma doutrina interpretativa do artigo 168 º da Constituição, nos termos decorrentes da revisão constitucional, interpretação essa que, naturalmente, deve ser fiel ao espírito da revisão constitucional, mas que deve ser também uma interpretação equilibrada, ponderada e de bom senso, atentas as finalidades das competências legislatívas próprias, por um lado, do Governo e, por outro lado, da Assembleia da República.
As autorizações legislativas são, indubitavelmente, matéria sensível, porquanto se trata de um instrumento jurídico que estabelece a articulação em concreto entre a competência legislativa própria do Parlamento e a competência legislativa do Governo, quer quando se trate do exercício de competência concorrencial, quer quando se trate de o Governo ser habilitado a legislar em matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República.
Não se trata agora aqui de debater a maior ou a menor celeridade com que o Governo tem utilizado as autorizações legislativas conferidas pela Câmara. Não é esse o objecto do recurso e se enveredássemos por esse caminho teríamos que entrar indubitavelmente no campo de um largo leque de recriminações mútuas, na apreciação da celeridade do processo legislativo governamental, mas também da celeridade do processo legislativo parlamentar, que não é, neste momento, o interesse do Governo.
Em maior ou em menor grau, as autorizações legislativas são um factor de atrito, por via de regra, entre a oposição e o Governo, quer porque ao instituto das autorizações está subjacente uma relação de confiança política - e é natural que a oposição não tenha grande confiança política no Governo -, quer porque a definição do objecto das autorizações se depara sempre com uma certa tensão: por outro lado, a prudência cautelar do Parlamento e, por outro lado, uma certa tendência, característica dos governos, de alargar a esfera de competência que lhe é delegada.
Mas como pressuposto fundamental deste debate, gostaria de dizer que as autorizações legislativas não são, nem podem ser, consideradas formas de espoliar o Parlamento das competências legislativas. Isto porque, desde logo, a lei de autorização é votada na Assembleia da República; porque a lei de autorização está sujeita ao controle preventivo e ainda ao controle sucessivo da constitucionalidade, a cargo do 'tribunal Constitucional; porque o decreto-lei de utilização da autorização legislativa está, também ele próprio, sujeito a fiscalização preventiva e a fiscalização sucessiva da constitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional; porque o decreto-lei de utilização da Au-

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torração legislativa, como todo e qualquer decreto-lei, pode sempre e a qualquer momento ser sujeito à recusa de ratificação pela Assembleia da República; porque o Parlamento pode, em todo e qualquer momento, revogar a autorização, tal como pode legislar sobre a mesma matéria antes de utilizada pelo Governo a autorização legislativa - revogando assim implicitamente a lei de autorização- ou mesmo depois, através da revogação do próprio decreto-lei de utilização da autorização legislativa.

Esta enumeração - que, aliás, não pretende ser exaustiva - visa demonstrar essencialmente que o sistema constitucional comporta válvulas de segurança em profusão, que garantem também nesta sede o primado legislativo do Parlamento sobre as competências legislativas do Governo.

Este percurso pelo instituto das autorizações legislativas não impede que tenhamos que ser claros sobre um ponto: as autorizações legislativas não põem em causa o primado legislativo da Assembleia da República. O sistema constitucional reprova, nos termos do artigo 168 º, autorizações em branco, através da necessidade constitucional de definição do sentido, do objecto e da extensão da autorização.

Mas gostaria de chamar a atenção para o facto de os limites do que se deva entender por objecto, sentido e extensão não serem limites esclarecidos claramente no texto constitucional, mas sim limites que só podem ser determinados através da doutrina parlamentar e através da jurisprudência das instituições encarregadas da fiscalização da constitucionalidade.

Ora, o que se passa no sistema português é que ele não consagra a plena equiparação das leis de autorização legislativa à lei quadro ou às leis de bases, ao contrário do sistema espanhol, que no artigo 82 º da sua Constituição prevê que a delegação legislativa só pode ser feita através de uma lei de bases em que o Parlamento tem que indicar os princípios fundamentais segundo os quais se deve pautar a utilização da autorização legislativa por parte do Governo. No sistema português, ao invés, o que se entende é que deve apenas ser definido o objecto e o sentido.

É algo de bastante mais moderado, é algo de muito menos injuntivo para o exercício da actividade legislativa do Governo. E até há alguns autores que defendem que quando o Governo usa poderes ao abrigo de uma autorização legislativa ainda está a legislar na esfera da sua competência própria, porque haveria uma competência própria originária do Governo que apenas estaria sujeita à condição de a Assembleia da República votar uma lei de autorização.
A prática constitucional portuguesa é, pois, a fonte de todas as definições destes limites sobre o objecto, a extensão e o sentido das autorizações legislativas. E se é verdade que a prática constitucional concreta portuguesa seguida até este momento se tem mostrado contra as autorizações em branco, também tem consentido a concessão de autorizações legislativas genéricas, visando outorgar ao Governo a faculdade de cominar sanções no quadro do exercício da sua actividade legislativa normal.
Não há normas nem sanção. As sanções são, de facto, conaturais à existência das próprias normas. E quando se dá o poder de estatuir sem o correspectivo poder de sancionar, é um pouco dar com uma mão aquilo que se tira com a outra.

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doutrina tem sido seguida sem grandes hesitações, pacificamente, tanto antes da revisão constitucional como depois da revisão constitucional, havendo exemplos vários: antes da revisão, inúmeros; depois da revisão, o caso da proposta de lei n.º 33/III, já citada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, que foi aprovada na generalidade em 16 de julho de 1983 (vide o n.º 2.5 do Diário da Assembleia da República). com os votos a favor do PS, do PSD, da ASDI e da UEDS, as abstenções do PCP, do CDS e do MDP/CDE, e sem votos contra, tendo-se registado resultados idênticos na votação na especialidade e na votação final global, sem que na ocasião se tivessem suscitado questões de inconstitucionalidade.
O Governo foi comedido na utilização da proposta de lei n.º 33/III, para além deste comedimento, gostaria de acrescentar que quanto à proibição da inscrição no Benfica, essa, nunca, porque estaria contra a minha vocação clubística.
A proposta de lei n.º 63/III, reproduz integralmente, como foi sublinhado, a proposta de lei n.º 33/III, e a subsequente Lei n.º 27/83. Mantém-se, assim, o Governo fiel à interpretação doutrinária que a Câmara tem seguido até aqui.
Não se nega .naturalmente, a legitimidade de quem possa colocar dúvidas, e teremos de chegar à conclusão de que a ASDI evoluiu de opinião desde julho do ano passado ate hoje, tendo feito uma interpretação diferente do texto constitucional. O Governo, que apesar de tudo é uma estrutura mais pesada que a ASDI, evolui mais lentamente e ainda não chegou à mesma opinião.
Não defendemos uma interpretação laxista da Constituição. De tão genéricas, as autorizações, poderiam passar, de forma deslizante, a ser meras autorizações em branco. Isso, de facto, nunca.
Também pensamos que não se pode cair no extremo oposto, isto é, de tão rigoristas na interpretação do texto e da letra do texto esvaziar-se o sentido da eficácia da actividade legislativa do Governo c. de forma deslizante, chegar-se ao Governo de Assembleia, em que só a Assembleia teria poderes legislativos, a que acresceriam depois os poderes governativos comuns e normais.
Até aqui tem-se reconhecido que este tipo de autorização genérica, que hoje está em debate, constitui uma «questão existencial» das competências legislativas próprias do Governo, razão de ser da própria competência concorrencial do Governo e da Assembleia da República.
Isto é sublinhado, aliás, pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira, que no debate na proposta de lei n.º 33/III, dizia, a p. 1013 do Diário da Assembleia da República, de 16 de Julho de 1983, ser «evidente que não podemos definir com rigor o limite ou a extensão da delimitação de ilícitos; terá de se retirar sempre essa delimitação a partir da delimitação das penas que são autorizadas ao Governo e isso terá sempre de ser feito em comparação com a legislação penal que existe».
Em função deste critério, aliás adiantado pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira, esta autorização não é uma autorização em branco. A determinação dos crimes e das penas que em potência podem ser objecto desta autorização legislativa sempre se poderá fazer a contrario, a partir da dosimetria referenciada com exactidão no artigo 2.º
O Governo pede, pois, à Assembleia da República que, neste momento e nesta ocasião, mantenha a doutrina que tem vindo a expender nestes últimos sete anos, sem prejuízo, naturalmente, de estarmos dispostos a repensar, para o futuro, este problema, reconhecendo que das duas uma: ou o sistema constitucional, em face de uma interpretação rigorista, e imperfeito e paralisante do Governo e, por isso mesmo, deve ser o próprio sistema constitucional a ser alterado; ou, pelo contrário ,o sistema constitucional comporta a leitura que o Governo faz, atentas as inúmeras válvulas de segurança existentes e as limitações e garantias decorrentes do conjunto do articulado da própria proposta de lei apresentada.
O Governo submete-se, naturalmente, ao juízo da Câmara, sem prejuízo de se mostrar disponível para introduzir na especialidade alterações que minimizem os riscos apontados pelos recorrentes, sem com isso neutralizar a actividade legislativa normal do Governo. É para essa actividade legislativa normal do Governo que carecemos desta autorização legislativa, não havendo nenhuma intenção de espoliar as competências legislativas próprias da Assembleia, mas apenas a intenção de garantir os meios e os instrumentos necessários a uma eficaz acção governativa.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Secretário de Estado, apenas alguns pedidos de esclarecimento porque também entendo que o resultado desta discussão deve consistir em saber que autorização concede esta Assembleia.
Disse V. Ex.ª que um dos poderes de que a Assembleia dispõe - e isso é exacto em teoria - é o de fazer uma lei sobre a mesma matéria, revogando, assim, a autorização legislativa. Só que, no caso presente, perguntar-lhe-ia, Sr. Secretário de Estado, qual a matéria sobre que esta Assembleia pode legislar. É esta a dúvida, porque precisamente a autorização legislativa é de tal modo genérica que não sabemos que autorização estamos a conceder.
Em segundo lugar, disse V. Ex.ª que a nossa Constituição estabelece um regime diferente da Constituição espanhola, por exemplo. E isso é um facto. Mas e artigo 201.º da nossa Constituição, quando trata da competência legislativa do Governo, é claro ao eliminar, a hipótese do Governo estar a usar de uma competência própria, porque na alínea b) estabelece-se que ele tem competência para fazer decretos-leis em matéria de reserva relativa da Assembleia da República mediante autorização desta. O esquema da lei quadro está previsto na alínea c):
Fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam.
Quer dizer, temos 2 regimes: o das leis quadro e o das autorizações legislativas.
A revisão constitucional veio, por seu turno, introduzir uma regra de precisão que é a da definição do sentido das autorizações legislativas. Daí que a nossa tradição talvez não tenha 7 anos e daí que, talvez, não se possa invocar senão a proposta de lei n.º 33/III.

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Então qual é o sentido desta autorização? Onde e que a Assembleia fixa - para citar um comentário de constitucionalistas - «os princípios-base, as directivas e os critérios que devem orientar o Governo na produção legiferante, evitando assim os cheques em branco na emanação das leis autorizadas»?
Não há normas sem sanção, disse o Sr. Secretário de Estado, tendo sido esse também o argumento utilizado pelo Sr. Ministro da Justiça ao pedir aqui a autorização legislativa referente a proposta de lei n.º 33/III. Mas se assim é, se não há normas sem sanção, então caímos numa de duas: ou a Constituição precisa de ser revista - e não o será por esta via -, ou são estas autorizações legislativas que não devem ser pedidas nestes termos genéricos e vagos.
Um último ponto que lhe queria recordar, Sr. Secretário de Estado, é que a proposta de lei n.º 33/III. demonstra-nos, precisamente, na sua aplicação prática, que a Assembleia deveria ser mais restritiva nos critérios de autorização legislativa que concede.
Na verdade, e lembrando rapidamente, a autorização legislativa contida naquela lei veio a ser utilizada em 3 casos: para o regime jurídico da suspensão do contrato de trabalho, para a alteração do regime de julgamento e punição do crime de emissão de cheques sem provisão e restrição do uso de cheque e para atribuir a natureza de crimes públicos a crimes de difamação, injúria e outras ofensas contra órgãos de soberania e respectivos membros.
Creio que são 3 casos totalmente diversos e 3 casos para os quais, necessariamente, o Sr. Ministro da Justiça não chamou a atenção desta Câmara, não nos pediu autorização legislativa para isto nem a Assembleia lha concedeu. Creio que conceder esta autorização legislativa seria fazer uma repetição, seria, certamente, cairmos na tal matéria dos cheques em branco.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, há ainda mais inscrições para pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou apenas no final?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Secretário de Estado, ao contrário do que eu pensava, V. Ex.ª fez aqui -ou tentou fazer- uma teoria geral das autorizações legislativas, designadamente, uma interpretação governamental do artigo 168.º, n.º 2 da Constituição.
Quando V. Ex.ª tomou a palavra, julguei que iria justificar a autorização legislativa pedida, uma vez que o próprio articulado deste pedido de autorização legislativa não nos esclarece grande coisa.
V. Ex.ª disse que havia uma tensão natural entre o Governo e a oposição parlamentar no referente às autorizações legislativas e que, portanto, não podia ser concedida toda a espécie de autorização legislativa, pois esta, em princípio, pressupõe uma relação de confiança. Disse, também, que o Governo compreendia bem que essa relação não pudesse funcionar quando estava em jogo o Governo e a oposição, como e óbvio.
Mas. para além dessa tensão natural e no caso concreto deste pedido de autorização legislativa, verifica-se que a Câmara e todos os seus deputados, para votarem esta autorização, para além dessa relação de confiança, terão de ter um sentido mínimo daquilo que vão autorizar.
Não lhe parece, Sr. Secretário de Estado, que este pedido de autorização é tão vago que não deixa qualquer hipótese de fundamentar o sentido da autorização, a não ser que se trata de matéria de ilícitos criminais? Mas acontece que nem sequer esses ilícitos criminais estão aqui discriminados. Pelo contrário, na alínea a) do artigo 1.º da proposta de lei governamental fala-se em definir, em geral, ilícitos criminais ou contravencionais, no exercício da sua actividade legislativa.
Com um pouco de boa vontade, esta autorização legislativa dava poderes ao Governo para fazer um novo Código Penal, para definir todos os ilícitos criminais ou contravencionais!
Sr. Secretário de Estado, gostaria de lhe fazer, concretamente, uma pergunta -se e que V. Ex.ª pode e está em condições de esclarecer esta Câmara, pois parece-nos que, neste momento, algo de grave se passa com este pedido de autorização. Isto é, entendemos que o responsável departamental e ministerial que fez este pedido de autorização é que deveria vir aqui justificá-lo. E esse responsável não está presente.
Mas como V. Ex.ª representa nesta Câmara o Governo, na sua totalidade, e para que eu possa ser esclarecido acerca daquilo que vou votar, pergunto-lhe o seguinte: é possível especificar, minimamente, quais são os ilícitos criminais sobre que o Governo pretende legislar?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Srs. Deputados, começando do fim para o princípio, sem qualquer menosprezo pelo perguntante. dir-lhe-ia, Sr. Deputado António Taborda, que não quis fazer uma teoria geral das autorizações legislativas. Se o Governo cair tão depressa quanto o Sr. Deputado António Taborda deseja, dentro em breve devo estar a regressar às minhas lições de Direito Constitucional e de Direito Administrativo da Faculdade de Direito de Lisboa e, aí, lerei ocasião de fazer teoria geral que o Sr. Deputado, numa intervenção tão modesta como a que proferi, me quis imputar.
Queria, apenas, dizer-lhe que a ausência do Sr. Ministro da Justiça deriva de compromissos anteriormente assumidos.
Não estamos a discutir a questão de fundo, estamos a discutir o pedido de autorização legislativa. Em matéria de constitucionalidade, talvez eu não seja a pessoa mais habilitada para falar sobre essas matérias, mas foi em mim que o Governo delegou essa competência.
Sr. Deputado António Taborda, se V. Ex.ª acha que, com boa vontade, se poderia fazer a revisão do Código Penal com base nesta autorização legislativa, devo dizer-lhe que o seu laxismo penalista me assusta, porque isso significaria que no Código Penal Português as sanções máximas que poderiam estar previstas seriam as que decorrem do artigo 2.ª da proposta de autorização legislativa, isto é, 3 anos de prisão e 20 milhões

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de escudos de multas. Seríamos, decerto, o país mais tolerante em matéria de Código Penal. Por essa via. provavelmente, não estaríamos a prevenir e a reprimir a criminalidade.
Sobre a questão do fundo, não nego - e com isto respondo simultaneamente ao Sr. Deputado António Taborda e ao Sr. Deputado Magalhães Mota - que os termos em que esta autorização legislativa está redigida são vagos. Não nego isso. É uma questão característica das autorizações genéricas.
Simplesmente, esta autorização genérica visa essencialmente habilitar o Governo à faculdade de recorrer a mecanismos sancionatórios, sem que, a par e passo, tenha de sujeitar à apreciação da Assembleia da República propostas de lei quando se trata do exercício de competências que lhe são próprias, porque são competências exercidas no âmbito da competência concorrencial entre o Governo e a Assembleia da República. No fundo, trata-se de garantir que o Governo esteja habilitado com uma autorização que possa utilizar a par e passo, sem que isso signifique que a Assembleia se alheie dessa mesma utilização, porque sempre existem todos os outros mecanismos a que eu fiz referência, para que a Assembleia da República chame o Governo à responsabilidade por uma utilização indevida ou desnecessária desta mesma autorização legislativa.
De facto, o Sr. Deputado Magalhães Mota tem razão: não é possível à Assembleia da República antecipar-se ao Governo e legislar em matéria penal porque, neste momento, não sabemos quais vão ser as matérias sobre o qual o Governo vai utilizar esta autorização legislativa.
Mas o reverso também é verdade, isto é, sempre que o Governo utilizar esta autorização legislativa e por força da Constituição qualquer sanção que o Governo aplique ao abrigo desta autorização legislativa - tem que fazer referência explícita no diploma de utilização que é ao abrigo desta mesma autorização legislativa que comina uma determinada sanção. E sempre assistirá à Assembleia da República a faculdade de revogar essa autorização legislativa, porque será sempre matéria de competência concorrencial, sempre será matéria sobre a qual a Assembleia da República poderá ter a última palavra.
Acrescento, ainda, que não disse que as leis de autorização legislativa no sistema português se possam comparar à lei quadro no sistema espanhol. Disse exactamente o contrário, ou seja, não há no sistema português a cominação constitucional do que a lei de autorização tenha de ser tão especiosa, quanto têm de ser as leis de habilitação no sistema espanhol que, inclusivamente, são até designadas por leis de bases.
Mas o que eu ainda gostaria de dizer e que para quem entenda - e parece ser o caso dos deputados perguntantes - que o Governo não pode utilizar autorizações legislativas, há que reconhecer que, de duas uma: ou essa é uma solução bem fundada, isto e, o Governo não deve ter nem a mais íntima competência sancionatória própria - e nesse caso, o Governo, pura e simplesmente, não pode legislar em nenhum domínio de matérias onde a estatuição da norma pressuponha a estatuição da sanção correspectiva; ou, então, teremos de chegar à conclusão de que será necessário ficarmos à espera da revisão constitucional, alterar o artigo 168.º, n.º 2, relativizar o que nele se contém.
para que então o Governo possa estatuir em termos de sanção.
Ora, não é que o Governo venha dar razão a ninguém nem que o Sr. Deputado Fernando Condesso tivesse dito aquilo que o Sr. Deputado Magalhães Mota disse, pois o que teremos de concluir é que quem não tem razão é o CDS porque s<_5 a='a' constituição='constituição' quer='quer' económica.br='económica.br' rever='rever'> Talvez o repto que eu gostaria de lançar fosse o seguinte: como é que será possível redigir uma norma de autorização que permita satisfazer as preocupações que o Governo vem aqui explicitar, isto é, estar munido dos instrumentos sancionários mínimos que dêem razão de ser e de existir à sua actividade legislativa quotidiana? Como será possível redigir uma norma deste tipo, no respeito do artigo 168.º, n.º 2, da Constituição, na interpretação que dele é feito pelos Srs. Deputados9
Em nosso entender, a redacção que aqui está pode não ser famosa - para utilizar uma expressão -, pode não ser a mais especiosa ou a mais concreta e concretizada, mas é, pelo menos, uma redacção concretizável, com limites impostos - os decorrentes do artigo 2.ª da proposta - da dosimetria das penas. Não é possível utilizar esta autorização legislativa para criação dê crimes ou para estatuição de penas que não sejam aquelas que são consentidas pelos estritos limites do artigo 2.ª da proposta de lei agora em apreciação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Taborda, para que efeito está a pedir a palavra?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Secretário de Estado, pedi a palavra sob a forma de um protesto, em primeiro lugar, porque V. Ex.ª acabou por não responder à minha pergunta fulcral que era sobre quais são os ilícitos criminais.
Na sua resposta, V. Ex.ª remeteu para o artigo 2.ª da proposta e falou da dosimetria das penas.
Portanto, sabemos apenas que o Governo não pode estabelecer penas que ultrapassem, no máximo, 3 anos.
Queria ainda dizer ao Sr. Secretário de Estado que quando falei de fazer um novo Código Penal, disse «com boa vontade». Disse-o desta maneira para apresentar em jeito de caricatura o vazio desta proposta de lei.
A verdade e que quanto a ilícitos criminais continuamos sem saber quais são. Quanto aos ilícitos que forem encontrados pelo Governo, sabemos só que a respectiva penalização não pode ir além dos 3 anos de prisão e dos 20 milhões de escudos de multa.
O Sr. Secretário de Estado aceitou que os termos desta proposta são vagos e podem não ser famosos. Tentou explicitar que, se era assim, os deputados perguntantes entenderiam que o Governo não pode utilizar qualquer autorização legislativa.
V. Ex.ª sabe, tão bem como eu, que não é esse - nem foi esse - o sentido da revisão constitucional nem o do artigo 168.º n.º 2 da Constituição quando nele se incluiu a palavra «sentido». Como V. Ex.ª sabe, tão bem como eu, houve então uma grande discussão.

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O argumento dos partidos que nesse momento estavam no Governo para que as autorizações não trouxessem consigo o projecto de decreto-lei, foi o de que isso iria ou poderia paralisar a actividade legislativa do Governo. Mas, daí a chegar-mos a este extremo de nem sequer se dizer qual ou quais são os tipos de ilícitos criminais sobre o qual se vai legislar, parece que vai um abismo.
Era a este propósito que gostaria de saber qual é, de facto, o sentido desta proposta de lei de autorização legislativa. É que, na verdade, entre um projecto de decreto-lei e definir, em geral, ilícitos criminais vai um abismo total, e não o é preciso -nem me parece que seja necessário - fazer uma revisão constitucional ou a revisão do artigo 168.º, n.º 2!
O Governo já tem utilizado várias vezes o critério de fazer acompanhar os pedidos de autorização legislativa, não só de uma definição mínima daquilo que pretende legislar como, até, de protestos de decreto-lei sobre que pretende legislar.
Portanto, não é necessário essa revisão constitucional. O que é necessário, neste caso concreto, é que haja uma definição mínima do sentido e do objecto desta autorização legislativa.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, fiquei tranquilo quanto aos sócios do Benfica, mas não quanto aos dos outros clubes desportivos que, não gozando da simpatia do Sr. Secretário de Estado, podem ver a sua filiação objecto de definição como crise dessa filiação.
De facto, o Sr. Secretário de Estado disse-nos - e bem - que não sabemos quais são as matérias sobre o qual o Governo vai usar esta autorização. É precisamente por isso que não devemos nem podemos concedê-la, porque estaremos muito claramente no campo das autorizações em branco. E dir-lhe-ia que estamos também muito perto daquilo que, a propósito da legislação do Governo Crips, se dizia:
O Governo quer dispor de uma autorização em carteira, que não sabe bem para quê e nem sequer se será precisa.
Em relação a isto, corresponde necessariamente a uma diminuição dos poderes do Parlamento conceder autorizações desta natureza. E nem se diga que, com isso, o Governo fica incapaz de exercer a sua actividade legislativa normal, porque precisamente aquilo que pressupõe a definição de crimes é uma alteração da ordem jurídica, por determinada conduta ser considerada suficientemente grave para que exija, da parte do Estado, a elaboração de uma sanção. Se assim é, se há portanto uma inovação na ordem jurídica em causa para reprovação de determinadas condutas, será necessário que se conheçam quais essas condutas e que a Assembleia da República intervenha sobre essa matéria, sob pena de serem os próprios direitos, liberdades e garantias a poderem ser colocados à exclusiva disposição do Governo, contra o espírito da nossa Constituição.
Era essa a razão da nossa intervenção e é, por isso mesmo, que pensamos que esta matéria deve ser conscienciosamente debatida pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começando agora pelo princípio - pelo Sr. Deputado António Taborda -, lamento discordar do Sr. Deputado. A interpretação que faço do artigo 168.º, n.º 2, e da introdução da expressão «sentido» na sua redacção, não é a que o Sr. Deputado faz, nem é a que me parece legítimo extrair do texto do debate da revisão constitucional. A introdução da expressão «sentido» não significa a obrigação de os governos apresentarem anexos de projectos de decretos-lei. Não é uma obrigação constitucional, mas apenas, em meu entender, um procedimento correcto dos governos perante as assembleias, quando se pedem autorizações legislativas.
A expressão «sentido» significa, essencialmente, que as autorizações legislativas devem conter não apenas o objecto, a matéria sobre que incidem, mas também o sentido dialéctico da transformação que vai ser introduzida, isto é, a evolução que vai decorrer na ordem jurídica da utilização dessa autorização legislativa. Será talvez, na melhor das hipóteses, uma aproximação à consagração dos princípios e critérios orientadores de utilização da autorização legislativa.
Quanto aos ilícitos a que se vai aplicar, a proposta de lei contém um critério. O Sr. Deputado pode discordar dele, mas a proposta contém um critério. Diz-se na proposta:
Definir em geral ilícitos criminais ou contravencionais, aos quais são aplicadas penas na estrita equiparação com os ilícitos de gravidade semelhante que já se contêm na legislação penal geral.
Isto é, sempre que se tratar de inovar, sempre que se tratar de criar um novo crime ou uma nova contraordenação, ter-se-á que ter em linha de conta os ilícitos já existentes na legislação penal em vigor de gravidade semelhante e ter-se-á que utilizar a dosimetria penal correspondente.
O Sr. Deputado pode considerar este critério manifestamente insuficiente, mas a Assembleia pode, por exemplo, responsabilizar um Governo que, ao abrigo desta autorização legislativa, tenha criado um novo crime, ao qual tenha aplicado uma pena que seja manifestamente desigual à pena que a legislação penal geral aplica a crime já previsto no Código Penal actual. O critério contido nesta proposta de lei pode levar até à consideração da inconstitucionalidade de um decreto-lei de utilização de autorização legislativa.
Quanto à observação do Sr. Deputado Magalhães Mota, sou um benfiquista não sectário e, portanto, não me movem objectivos de perseguição de qualquer outro clube. Tenho o maior respeito pela sociedade civil, na qual se incluem obviamente os clubes desportivos e, nomeadamente, as equipas de futebol. E permita-me desejar ao Futebol Clube do Porto e ao Benfica os melhores sucessos na jornada europeia de amanhã.
Mas gostaria de dizer que o Governo também não utilizará esta autorização legislativa para punir os

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clubes que, amanhã, não passarem nessa difícil prova europeia.

Risos.

É evidente que o Sr. Deputado Magalhães Mota tem razão no seguinte ponto: não é possível determinar exaustivamente, à partida, as matérias sobre as quais vai incidir esta autorização legislativa - nem eu disse que era possível. Neste ponto, estou de acordo consigo.
Onde divergimos é no facto de o Sr. Deputado Magalhães Mota achar que isto é uma violação incomportável dos direitos e das garantias dos cidadãos. Ora, considero que o sistema jurídico-constitucional português tem as válvulas de segurança necessárias e suficientes para garantir que um Governo não deixará de fazer um uso responsável desta autorização legislativa. Se eventualmente prevaricar em função dos critérios constitucionalmente consagrados, a Assembleia deve responsabilizar o Governo, face a uma utilização indevida dessa mesma autorização legislativa. É esta a nossa diferença de opiniões.
Em meu entender, a Assembleia da República não tem o monopólio da guarida, guarda e protecção dos direitos dos cidadãos: o Governo está tão vinculado à garantia dos direitos dos cidadãos como a Assembleia da República. Se eventualmente o Governo fizer utilizações abusivas desta autorização legislativa, a Assembleia pode e deve responsabilizá-lo, em termos políticos e, até, legislativos, revogando pura e simplesmente a autorização legislativa e a legislação utilizada no rescaldo desta autorização legislativa.
Mas não quero concluir sem deixar de proferir uma palavra para futuro - permitam-me a expressão. Por uma questão de honestidade intelectual, devo reconhecer que as razões invocadas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota merecem ponderação. Porque das duas uma: ou o sistema constitucional é um espartilho e então haverá que o alterar, para garantir o mínimo de eficácia, constituindo isso provavelmente uma via preferível, pois aí se estatuiriam, de uma vez para sempre, os limites objectivos da capacidade sancionatória do Governo o que sempre seria mais seguro através da via legislativa do que através das vias interpretativas; ou temos de consentir que ao Governo assiste uma capacidade de interpretação dúctil do artigo 168.º da Constituição, sem que daí resulte inelutavelmente uma espoliação das competências legislativas da Assembleia da República. Esta é uma questão sobre a qual, em meu entender, vale a pena meditar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que o recurso interposto pela ASDI nos vem colocar e que tem estado a ser debatida é esta: pode haver autorizações legislativas genéricas, de mais a mais em matéria criminal? O Governo pode vir à Assembleia da República pedir autorização para criar crimes e penas sem dizer que crimes quer criar e que penas quer fixar (ou, pelo menos, em que sentido vão as alterações criminais que pretende)?
Sucede que, como já aqui ficou comprovado, a ideia de uma proposta genérica é o que há de mais contrário u própria noção de autorização legislativa a que subjaz a ideia da especificidade - e em matéria criminal ainda mais, uma vez que aí a reserva de competência parlamentar funciona como uma verdadeira garantia dos cidadãos, assegurando-lhes que fica vedada ao Governo a criação de ilícitos e penas, salvo quando haja autorização que obedeça a certos e rigorosos requisitos. É um limite para os órgãos de soberania e uma garantia para os cidadãos.
Por isso mesmo, até à revisão constitucional, a concessão de autorizações a Governos para prever crimes e penas, nos seis casos em que se registou (Leis n.ºs 4/76, 51/77, 17/78, 40/78, 25/80 e 12-1/81), fez-se com obediência a requisitos de carácter muito restritivo; construiu-se uma doutrina interpretativa, nada dúctil, traduzida em 4 pontos.
1.º Essas autorizações foram sempre delimitadas não como autorizações para legislar autonomamente em matéria criminal, mas como instrumentos para legislar subsidiariamente, concedidos ao Governo para poder desempenhar melhor a sua competência legislativa própria - e apenas esta -, nas matérias em que não carece de autorização, mas que possam exigir o uso de instrumentos penais para melhor garantir a sua eficácia. Através destas autorizações, não se visava permitir ao Governo rever o Código Penal, a legislação penal, mas fazer com que o Executivo, que constantemente estabelece regras de actuação em inúmeras esferas, ficasse autorizado, em certos casos e em termos restritos, a prever punições para os que infrinjam essas regras, sem ter de vir à Assembleia - única entidade competente em matéria penal - pedir caso a caso uma autorização. Este era o primeiro requisito que a Assembleia adoptou na primeira legislatura para admitir, condicional e restritivamente, autorizações desta natureza.
2.º Entendeu-se sempre estar vedado aos governos, em qualquer caso, a possibilidade de fixar penas maiores.
3.º Considerou-se que o campo dos ilícitos a criar nestes termos deveria restringir-se àqueles a que, pela sua menor gravidade, aferida segundo os padrões comuns na legislação penal vigente, pudessem corresponder penas até ao máximo de 2 anos.
4.º Admitiu-se autorizar o Governo a criar crimes e penas em vez da Assembleia da República, mas só justificadamente nos períodos em que esta não estivesse em funcionamento. Estando a Assembleia da República em funcionamento, entendeu-se que o Governo poderia sempre obter com urgência a aprovação das normas penais necessárias ou a autorização para as aprovar por decreto-lei, não se justificando autorizar em branco, ainda que dentro de uma determinada moldura.
Esta interpretação visava salvaguardar, quanto possível, a regra da reserva da competência parlamentar em matéria criminal, partindo do princípio de que o Governo não goza sequer de competência em matéria contravencional. Visava-se compatibilizar o monopólio parlamentar em matéria penal com eventuais imperativos de não paralização da actividade legislativa própria do Governo em períodos de interrupção - e apenas nestes - dos trabalhos parlamentares. Importa

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fazer o balanço do uso destas autorizações e da experiência realizada ao abrigo desta interpretação.

A avaliar pelo número escasso de vezes que foram invocadas pelos governos para emanar decretos-leis, os riscos reais de paralisação não eram tão relevantes quanto esta interpretação pressupôs. A esta esforçada interpretação da Constituição não correspondeu uso que comprovasse a necessidade. E, pior ainda, aquilo que fora encarado como um mal necessário a restringir ao mínimo possível, revelou-se um mal desnecessário, uma concessão inútil e perniciosa às debilidades dos governos no planeamento das suas necessidades em matéria de instrumentos penais. Provou-se bem que os governos podem pedir e obter com celeridade máxima autorizações específicas desde que diligenciem nesse sentido de forma atempada.

Talvez por isso a revisão constitucional - e este é um aspecto a ponderar com particular atenção neste debate- não consagrou qualquer cláusula de aceitação de autorizações penais genéricas como um mal necessário ou de atribuição ao Governo de poderes menores em matéria criminal. A revisão constitucional veio fazer apenas 3 coisas:

Veio alargar a reserva de competência da Assembleia em matéria criminal (por força da extinção do CR);
Permitiu ao Governo criar ilícitos de mera ordenação social e fixar coimas;
Simultaneamente aperfeiçoou-se (restringiu-se) o regime das autorizações legislativas.

Restaria acrescentar que clarificou-se o regime de funcionamento da Assembleia da República.

Nestas condições, cremos ser necessário reflectir de novo sobre esta matéria, reequacioná-la. Entendemos que não só não há necessidade de autorizações penais genéricas, como ainda que fossem necessárias teriam deixado de ser constitucionalmente, possíveis. Não se vislumbra como, face às actuais normas, possa o Governo vir à Assembleia pedir uma autorização que não fixe o sentido da alteração a introduzir na ordem jurídica. Um pedido desses não passaria na fronteira por impossibilidade de resposta às 3 perguntas fundamentais que se formulam a quaisquer autorizações legislativas.
Qual o seu objecto? "todas as matérias na esfera penal, todos os ilícitos a que possa caber pena até 3 anos".
A limitação pela dosimetria não pode em rigor, e só por si, constituir uma limitação real - como aliás alguns dos oradores, incluindo o Sr. Secretário de Estado, reconheciam. A ser limitação, seria uma limitação sumamente débil.
Por outro lado, não se pode acrescentar, como vi há pouco fazer, que o limite será o que for - seria fraco -, mas o Governo é virtuoso e, portanto, não há problemas; ou, se o Governo porventura pecar, aqui estará a Assembleia para o responsabilizar. Creio que é ironia nas presentes circunstâncias, designadamente face à existência de uma maioria com estas características, chamar pela efectividade de um tal mecanismo de fiscalização.
A segunda pergunta também os pedidos de autorização genérica não podem responder. A segunda pergunta é: que princípios e critérios vai o Governo observar?

A resposta que aqui foi dada é: "os que entender, os que achar bem". Pergunta-se: o Governo vai fazer proliferar ilícitos novos, rever os existentes, vai subir ou descer penas? A resposta é: "é o que for preciso, é o que se considerar na altura, logo ponderaremos". Face ao que dispõe actualmente o artigo 168 º da Constituição não é resposta aceitável.

Terceira pergunta: que utilização da autorização é que o Governo vai fazer? Parcelada ou não parcelada? O Governo responde:

Todas as que forem precisas, enquanto não caducar a autorização está de pé e é para ser usada 5, 10 ou 20 vezes.

Também isto não é resposta.
E uma autorização desta que o Governo nos veio pedir, para usar durante 180 dias.

Durante 180 dias o Governo quer poder fazer quantos diplomas entender em matéria da competência reservada da Assembleia, as vezes que entenda, sobre os problemas que escolha e da forma que tiver por boa, ainda que seja péssima. Nós não o saberemos senão quando soubermos ao ler o Diário da República, nem poderemos prever coisa alguma porque apenas nos dizem isto a nós e aos cidadãos: durante 180 dias o Governo irá criar os ilícitos criminais que lhe aprouverem, não podendo apenas prever penas superiores a 3 anos, devendo ser cuidadoso, prudente e inteligente para criar os ilícitos tendo em consideração os lugares paralelos constantes do nosso direito penal.

Pode isto ser? Face ao artigo 168.º da Constituição não pode ser.
No entanto, já pode ser. Já depois da revisão constitucional foi aprovada, em Junho de 1983, a Lei n.º 27/83, que veio estabelecer por 180 dias o que o Governo agora pretende que renovemos por mais 180. E isto é grave.

Primeiro, porque a autorização genérica concedida já por si excedia em muito os apertados requisitos que na legislatura anterior haviam presidido às relações com os governos nesta matéria. Aparentemente esta autorização abria caminho à elaboração de legislação autónoma e não apenas subsidiária, o campo dos ilícitos a criar foi alargado, foi ampliada desmedidamente a duração da autorização por forma a coincidir com largos períodos de funcionamento efectivo da Assembleia.

Em segundo lugar, a experiência de utilização desta autorização pelo Governo é um verdadeiro desastre não há nisto nenhum exagero. Claramente não serviu para o que a pediram. Mas serviu para no dia 24 de Fevereiro o Governo publicar um decreto-lei que criou um novo crime a latere do Código Penal e da sua filosofia: o crime de injúria e ultraje a membros de órgãos de soberania presentes em reuniões ou ajuntamentos públicos. Tudo isto para dar cobertura, aliás pessimamente, ao lamentável episódio de Coimbra, em que o Primeiro-Ministro revelou simultaneamente um fenomenal desconhecimento da lei penal em vigor e uma inaceitável concepção dos direitos, deveres e dispo
nidade dos magistrados portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - A Lei n º 27/83. foi usada para reeditar aqueles episódios tristes que transformavam em lei do Reino os lapsos dos monarcas. E mais nada.
É para isto que o Governo quer ter em carteira mais autorizações genéricas? Dir-se-á que não, que foi uma excepção, uma emergência, um desatino, um remedeio, que aconteceu: o Governo olhou ü volta e, em vez de vir -i Assembleia - onde deveria ter vindo -,agarrou na primeira autorização que lhe pareceu poder servir de pretexto e usou-a para este efeito.
Mas comprova-se que, para além de não ter cobertura constitucional, representa um risco inaceitável depositar nas mãos de um Governo destes (que tão mal resiste às tentações) poderes para durante 6 meses criminalizar não se sabe o quê ,nem como. Não pode ser.
De resto, em matéria penal o Governo não só tem legislado a esmo, como marginaliza ostensivamente a Assembleia. O Sr. Ministro da justiça passa por aqui os minutos necessários para obter as autorizações genéricas - claro - que lhe permitam passar o resto do ano no Gabinete a fazer o que ainda se está para ver. Entretanto, a ratificação do Código Penal está bloqueada aqui na Assembleia e a posição do Governo sobre o Código Penal vai variando entre os comunica dos do Conselho de Ministros e as entrevistas ministeriais avulsas e contraditórias.
É preciso dizer, por outro lado, que em geral o Governo tem multiplicado os casos de abusos das autorizações legislativas que pediu e obteve, o que vem agravar o já desolador panorama da actividade legislativa da Assembleia, aqui lembrado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota. A conversão da Assembleia em câmara de delegação de poderes no Governo é indesmentível. Se estamos a caminho de alguma coisa, não é de um Governo de Assembleia, mas do seu contrário.
Se aqui tivessemos o tal computador ele revelaria perante os olhos de todos que desde o início da legislatura, a Assembleia aprovou 20 autorizações legislativas autónomas (uma das quais genérica e as outras 19 recaindo sobre 51 matérias). A isto somaram-se mais de 80 autorizações para aprovar legislação económica, financeira e fiscal à sombra do Orçamento. Fora isso a Assembleia aprovou por iniciativa do Governo as 7 leis do pacote fiscal, 3 empréstimos, duas alterações ao Orçamento de 1983, o Orçamento para 1984 e as grandes opções do Plano, uma prorrogação de prazo para entrega das declarações dos titulares de cargos públicos, restrições aos direitos dos membros das forças policiais e as leis de enquadramento do Orçamento e do Conselho de Comunicação Social. Nenhum decreto-lei governamental foi alterado por qualquer lei de ratificação. Aguardam publicação as leis das maternidade, planeamento familiar e interrupção voluntária da gravidez (são a única excepção a este rol de desgraças).
Se há órgão de soberania cuja actividade legislativa corra riscos de paralisação, esse órgão é certamente a Assembleia da República e não o Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às autorizações legislativas, o abuso governamental da utilização foi ao ponto de o Governo ter aproveitado a lei de autorização para rever o regime das empresas públicas para alterar inconstitucionalmente a lei das comissões de trabalhadores. É um escândalo tal que o Grupo Parlamentar do

PCP já solicitou ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade do diploma.
Depois disto, dizer-se que o sistema tem válvulas de segurança é pura ironia. O sistema tem válvulas de segurança, mas estão entupidas e o que temos visto é o alastrar do excesso, da insegurança e do abuso.
Vamos supor, porém, que o Governo não enveredava por esta via de abuso e que estava aberto a procurar encontrar formas de minimizar os riscos de abuso. Ainda aí caberia sempre perguntar onde levaria uma orientação que se traduza em facultar ao Governo poderes legislativos indelimitados em matéria penal, que é da reserva da Assembleia, atribuição essa por vários meses coincidindo com o funcionamento pleno da Assembleia.
A resposta é pura e simplesmente esta: se aceitasse-mos isto a Assembleia estaria realmente a conceder ao Governo uma autorização permanente para legislar em matéria penal e a atribuir de facto ao Governo uma competência que a Constituição não lhe reconhece. Isto chama-se revisão constitucional, isto chama-se inconstitucionalidade. Basta fazer as contas.
A autorização aprovada no início da legislatura caducou em 6 de Março. A agora pedida caducaria em Outubro de 1984. A seguinte em Abril de 1985, etc. E por aí adiante ... É um absurdo. Seria uma delegação permanente e só faltava que os governos tomem posse e peçam logo autorização para toda a legislatura, o que seria uma manifestação de optimismo na sua sobrevivência e de empenhamento na emanação de normas penais.
Onde a Constituição só permite autorizações caso a caso, por medida, o Governo quer autorizações pronto a vestir, para ficarem no guarda-fatos governamental e saírem em dia de chuva ou dia de sol consoante couber. Neste jogo de azar penal, tanto nos poderiam aparecer no Diário da República decretos-leis com penas benévolas, como circunspectos e penosos diplomas, como o aprovado por mor do Primeiro-Ministro como recordação da visita a Coimbra.
Não pode ser. O PS lá terá o seu candidato presidencial pronto a vestir, mas em matéria de autorizações legislativas a nós, Assembleia da República, só nos está autorizado talhar por medida o que nos encomendem concretamente. O Governo primeiro meça e depois peça. Esta proposta é o contrário disso. Não mede nada e pede de tudo, para usar qualquer coisa sem que se saiba o quê, nem como, nem para quê. Nestes termos e com estes fundamentos, votaremos favoravelmente o recurso interposto pela ASDI.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção começa por fazer referência a uma declaração do Sr. Deputado José Magalhães.
Penso que todos podemos tentar tirar efeitos políticos de situações concretas. Mas o que me parece perfeitamente inadmissível é que se pretenda retirar do facto de o Governo ter decidido criar uma situação criminal no que diz respeito às injúrias aos tituladores dos órgãos de soberania, resultante de um facto acontecido com o Sr. Primeiro-Ministro, as con-

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colusões que V. Ex.º tentou retirar. Trata-se de uma atitude que só se pode justificar por demagogia política, mas não pelo sentido das responsabilidades.
O Sr. Deputado não terá o desplante de dizer que considera que as injúrias aos titulares dos órgãos de soberania, na circunstância que o decreto-lei publicado pelo Governo prevê, devam passar incólumes. Decerto que o Sr. Deputado não pode incriminar este Governo pelo facto de se ter preenchido uma lacuna no sistema jurídico existente atinente à forma de punição das injúrias aos titulares dos órgãos de soberania.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na opinião do Governo, a proposta de lei que está apresentada preenche os 3 critérios que até aqui têm sido chamados 3 colação para tomar decisões nesta matéria.
Trata-se de legislação subsidiária para uso de competência própria, e apenas para estes casos: competência própria do Governo e competência concorrencial entre o Governo e a Assembleia da República - critério pelo qual o Governo ao abrigo da Lei n.º 27/83, sempre se pautou e nunca dele se desviou.
A utilização da autorização legislativa e da Lei n.º 27/83 não foi feita apenas em 3 casos, como já aqui foi dito, mas em dezenas de casos em que foram utilizados os mecanismos conferidos pela Lei n º 27/83.
Em segundo lugar, trata-se de impor até 3 anos, pois nunca o Governo apresentou aqui qualquer pedido para que fosse concedida uma autorização genérica sobre penas superiores a estas que acabei de referir. Também aqui se respeitou escrupulosamente o critério que a Assembleia em 7 anos emitiu. Trata-se de penas que, em nosso entender, prefiguram uma situação de menor gravidade e isso resulta, com clareza, da dosimetria constante do artigo 2 º da proposta de lei.
Quanto à questão de no passado estas autorizações legislativas terem sido pedidas em período de férias, gostava de chamar a atenção para o facto de que da utilização dos 6 meses que nela é proposta, 4 desses meses recaem em período de férias parlamentares. Obviamente que a Assembleia pode reduzir o período de utilização. A Assembleia até pode votar, na especialidade, que esta lei de autorização legislativa só entre em vigor no dia 15 de Junho e que, portanto, só pode ser utilizada entre 15 de Junho e Outubro, ou seja, os 180 dias, mas apenas a contar a partir do momento em que a lei entrar em vigor. Essa b uma faculdade que assiste à Assembleia da República no debate na especialidade, mas que não tem a ver com o critério de constitucionalidade.
Constatamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Partido Comunista mudou de opinião quanto aos critérios a utilizar. Mudou de opinião quanto aos critérios que tinha utilizado na votação da proposta de lei n.º 33/111, mudou de opinião quanto aos critérios que levaram à elaboração da Lei n .I 27/83, mudou de opinião quanto se absteve aquando da votação da proposta de lei n.º 33/111, votação essa que já foi feita ao abrigo de um normativo decorrente da revisão constitucional.
Registamos, pois, esta mudança de opinião, registamos que sobre esta matéria há bancadas que suscitam agora dúvidas que no passado não suscitaram e que, como já referi, o Governo não deixará de ponderar devidamente este facto.

Porém, creio que não se pode incriminar a Governo pelo facto de os mecanismos de fiscalização do Governo em concreto estarem "entupidos", para utilizar a expressão que há pouco o Sr. Deputado José Magalhães utilizou. Esses mecanismos existem, estão consagrados na Constituição e podem ser accionados a qualquer momento. E não me parece boa doutrina dizer que esses mecanismos só teriam plena eficácia quando o Governo fosse minoritário, isto é, que os mecanismos de controlo da Assembleia da República sobre o Governo não fazem sentido só pelo facto de estar apoiado numa maioria parlamentar, porque senão teríamos que chegar à conclusão de que só seriam genuinamente democráticos os governos minoritários, e essa é uma tese que o Governo não pode aceitar em nome dos princípios que regem o funcionamento do Estado democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo pensa que em função dos argumentos expostos, o requerimento da ASDI, que considera inconstitucional a proposta de lei n.º 63/111, deve ser rejeitado, embora na discussão na especialidade estejamos dispostos a estudar as alterações que se mostrem necessárias e úteis para minimizar os eventuais e hipotéticos riscos que foram suscitados no decurso do debate deste recurso de impugnação.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procurámos retirar as ilações adequadas de 2 factores: por um lado, a revisão constitucional que, nessa matéria, tem implicações que me dispenso de repetir; por outro lado; da própria experiência de interpretação e aplicação do normativo já nesta legislatura. Tanto os resultados de um factor como do outro aconselhariam a negação da possibilidade de concessão pela Assembleia de autorizações genéricas.
lamentável que, face a isto, o Governo venha contestar aquilo que é incontestável. De tudo o que afirmei, só há uma coisa incontestável, porque é matéria de facto: é que o Governo, ao servir-se da Lei n.º 27/83, para fazer o decreto-lei que instituiu o crime de injúrias e ultraje a membros de órgãos de soberania em ajuntamento ou reunião pública, invocou mal, abusivamente, uma disposição que não lhe conferia poderes para criar autonomamente normas que significam uma revisão do Código Penal. Isso significa, pois, a violação da primeira condição i que o Governo disse querer submeter-se agora. Isso quer dizer que o Governo, agarrado numa inocente autorização genérica, restrita, para fins limitados e subsidiários, autorização maravilhosa que lhe permite produzir muitas centenas de diplomas - que o Sr. Secretário de Estado aqui invocou mas não provou fez de frente, embora envergonhadamente, uma alteração ao Código Penal em matéria controversa. Permita-me que lhe diga: fê-lo com os pés, isto é, fez uma alteração lamentável do ponto de vista técnico.
Perguntar-se aqui se devem permanecer incólumes os crimes contra os titulares dos órgãos de soberania, é lamentável, é crasso. E isto porque esses crimes estão previstos no artigo 168 º que remete para o 165 º,

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ambos do Código Penal. A única dificuldade que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Secretário de Estado Vitorino tiveram é que, tal qual o Código Penal os encara, não eram crimes públicos, dependiam de queixa. S. Ex." ignorava que tinha de apresentar um queixa; S. Ex.º ficou incomodado por se ter esquecido ou não saber que precisava de apresentar uma queixa e resolveu corroborar, emendar ou rasurar isto, que é uma questão de facto, de lapso, de eventual não conhecimento de uma norma, numa verdade transformada pela força da lei.
Lacuna do sistema jurídico, Sr. Secretário de Estado? Que lacuna? O sistema jurídico não tem lacuna nenhuma. Apenas prevê que os crimes de difamação ou injúria têm carácter semipúblico. E tão inocente e tão simples como isso. Ora, o que o Governo fez foi construir um ripo criminal totalmente obstruso - se quiser analisá-lo, vale a pena -, pois é uma aberração completa em que mistura elementos típicos do ultraje com elementos típicas da injúria, exige a presença do membro do órgão de soberania em questão, afasta requisitos de intenção e de dolo e depois suprime o elemento de necessidade de queixa. Portanto, contestou a única coisa que não se pode contestar.
Os pressupostos em nome dos quais o Governo aqui vem pedir esta autorização genérica não se verificam. O Governo tem competência para criar contraordenações e coimas, o Governo tem a possibilidade de vir à Assembleia pedir com urgência autorizações legislativas, o Governo não corre risco nenhum de paralisação. É um fantasma, é um pressuposto que não se verifica.
Em segundo lugar, a Assembleia, ainda que gostasse, ainda que quisesse, ainda que aspirasse a dar ao Governo essa autorização, não podia porque só lhe pode dar aquilo que o Governo, circunstanciada e fundamentadamente, lhe peça quanto ao sentido.
Este Governo, pela sua prática, apenas comprovou riscos, perigos. Em todo o caso, ainda que não houvesse esses perigos, não podíamos conceder essa autorização.
Eram estas as reservas que tínhamos e mantemo-las.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tenho a pretensão de convencer o Sr. Deputado José Magalhães. Em primeiro lugar, porque o Governo não legisla por temperamento; pois isto não é uma questão de "birras"...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Parece que sim!

O Orador: - Não é não, Sr. Deputado.
Em segundo lugar, a qualificação do crime de injúrias e ultraje aos titulares dos órgãos de soberania, se a si o preocupa pouco enquanto titular de um desses órgãos - de que acho, aliás, que deve continuar a ser, tendo a dignidade correspondente a essa posição -, preocupa o Governo.
Daí termos legislado neste sentido, pois consideramos que não é possível continuar a ser complacente

com situações que só contribuem para denegrir a imagem das instituições democráticas. Foi por isso que tomámos essa atitude.

Aplausos do PS e do PSD.

Mas aguardamos que os Srs. Deputados do Partido Comunista suscitem a ratificação do decreto-lei que criou esse crime e que, eventualmente até, suscitem um projecto propondo a sua revogação.

Vozes do PCP: - Não criou o crime!

O Orador: - Quanto às questões que têm a ver com a constitucionalidade da proposta de lei n.º 63/III, agora em apreciação, o Governo reafirma que existe uma coincidência total do seu conteúdo com o conteúdo da proposta de lei n.º 33/II1, discutida nesta Câmara já posteriormente à revisão constitucional.
Não é, pois, legítimo vir invocar as ilações adequadas da revisão constitucional, para considerar que aquilo que em julho, após 8 meses de vigência dessa revisão, era constitucional agora passou a ser inconstitucional. Isto é, com a mesma certeza com que no passado o Sr. Deputado considerou constitucional certo procedimento, hoje rotula-o de inconstitucional.
O Governo pensa que a tradição doutrinária da Câmara deve subsistir, até nova alteração que resulte de um juízo seguro - e não de um juízo emocional -, sobre o sentido concreto da sua capacidade sancionatória no exercício da sua actividade legislativa normal.
É esse, Srs. Deputados, o sentido desta proposta de lei em relação à qual, aliás, já manifestámos a disponibilidade de estudar alterações na especialidade.

Entretanto, assumiu u Presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação do recurso apresentado pela ASDI.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP, do CUS, do MDP/CDE, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e com a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para proferirem declarações de voto, estão inscritos os Srs. Deputados Luís Beiroco, José Luís Nunes, Montalvão Machado e José Magalhães.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente o recurso interposto pelo Agrupamento Parlamentar da ASDI por considerar que a proposta de lei nº 63/IIY, viola o disposto no n.º 2 do 168 º da Constituição, que exige que os pedidos de autorização legislativa solicitados pelo Governo a esta Câmara indiquem com clareza o objecto, o sentido e a extensão da autorização legislativa a conceder.
Com efeito, entende o Grupo Parlamentar do CDS que o sentido da autorização legislativa não se encontra definida com o mínimo de rigor.

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O CDS nunca entendeu, nem entende, que o Governo tenha de anexar ao seu pedido o projecto do decreto-lei que vai elaborar ao abrigo da autorização legislativa. Entende, no entanto, ser necessário que o sentido em que o Governo vai legislar seja indicado com clareza à Câmara.
Ora isso não acontece, pelo que do que efectivamente se trata é de passar ou não um cheque em branco ao Governo. E o CDS entende que o Governo não merece confiança para tanto .

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei breve.
Votámos contra o recurso interposto pela ASDI louvando-nos nos termos e nos fundamentos das razões expressas pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, na intervenção que proferiu nesta Assembleia,
De qualquer forma, gostaríamos de juntar a esse somatório de fundamentos e de razões, mais uma: é que a alínea c), do nº 1 do artigo 168 º da Constituição, confere à Assembleia da República competência para "a definição dos crimes, penas, medidas de segurança e respectivos pressupostos, bem como processo criminal". Ora, como as leis de autorização legislativa são, manifestamente, transferências da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República para o Governo, não se vê que haja qualquer inciso constitucional que proíba essa transferência de competência nos termos. mesmo latos, constantes da citada disposição.
Poderia o Governo ter pedido ou formulado uma autorização mais restrita, mas não o entendeu assim. Agora importa menos verificar se a Constituição consagrou as soluções mais adequadas, do que verificar, tão somente. se a proposta de lei do Governo é ou não constitucional.
Assim, pronunciamo-nos pela sua constitucionalidade, sem qualquer espécie de dúvidas, estando no entanto certos que a questão muito ganhará em ser apreciada de jure condendo. Mas, de jure condito, a questão afigura-se-nos pertinentemente resolvida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata votou contra o recurso interposto pela ASDI, fundamentalmente porque entende que não há violação do artigo 168 º da Constituição, pelas razões já aqui largamente expostas.
Entendemos que tais autorizações. como esta que foi pedida pelo Governo, são perfeitamente legais. Com efeito, pensamos que não se trata de passar um cheque em branco ao Governo, na medida em que este nos merece toda a confiança. Aliás, no dia em que ele não nos merecer essa confiança, seremos os primeiros a tirar-lha.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Creio que houve uma sensível mudança de tom entre a intervenção inicial do Governo nesta matéria, em que se mostrou cheio de dúvidas, admitindo até as dificuldades imensas de construir uma doutrina dúctil que permitisse respeitar a Constituição e aquilo que, por destempero e com escassa ponderação, acabou por ser a sua posição final, ainda que com uma abertura às reconsiderações, que esperamos firmemente que seja explorado naquilo que é explorável.

Em nossa opinião, face ao actual regime constitucional, é impossível fazer passar autorizações genéricas, uma vez que elas não respondem aos 3 requisitos do artigo 168 ^ da Constituição.

Poder-se-á dizer que a Constituição é demasiada exigente. Mas então, como disse o Sr. Deputado José Luís Nunes, a questão é relevante. de jure condendo, mas não o é neste momento e há que encontrar a forma de cumprir a Constituição. E cumprir a Constituição é não conceder cheques em branco. Dizer "nós temos confiança no Governo e, portanto, damos-lhe tudo" poderá ser uma declaração de paixão mas, não é uma declaração constitucional.
Finalmente, poder-se-á dizer que dar ao Governo um cheque com uma provisão até 500 contos não é dar um cheque em branco, mas a Constituição é que não sabe o que isto é.
Portanto, em matéria de cheques em branco não temos o poder de os emitir, ainda que com o limite monetário fixado pela dosimetria que o Governo agora nos propõe.
Em Junho passado, esta questão foi aqui debatida, pela primeira vez, sem ponderação bastante das implicações da revisão constitucional - é preciso dizê-lo e reconhecê-lo para tirar as devidas conclusões. As nossas reservas então expressas foram, se bem se lembram - e o Governo nesta matéria lembra-se mal -, neste sentido: em primeiro lugar, de acautelar que o Governo nunca usasse estas autorizações de forma autónoma, mas sempre subsidiariamente: em segundo lugar, para garantir que o Governo as usasse por um curto prazo, ou seja, durante a interrupção dos trabalhos parlamentares. Isto, como se sabe, não aconteceu de forma alguma: em terceiro lugar, era nosso receio de que se registassem abusos flagrantes, o que se verificou de maneira mais clamorosa.

O Governo não tem defesa possível e é lamentável, demagógico e não aceitamos que venha colocar à Assembleia da República a questão nestes termos: ou corroboram o decreto-lei que aprovámos ao abrigo desta autorização (mal!), ou então não se interessam pela defesa da honra, da dignidade e do prestígio dos órgãos de soberania.
Isto. sim, é que é demagogia intolerável!

O Sr. João Amaral (PCP): - E chicana!

O Orador: - Pensamos que o decreto-lei do Governo é uma obra jurídica lamentável, escrita em cima do joelho e feita com uma falta de cuidado impressionante, tutelando mal aquilo que devia ser tutelado bem.

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Se o Governo tinha propostas nesta matéria, então viesse aqui à Assembleia da República colocar aos partidos com assento parlamentar e aos deputados a questão de revermos o Código Penal, no sentido de melhorar as incriminações t até o sistema, porque parece que o Sr. Secretário de Estado não percebeu que o que esteve sempre em jogo foi, apenas, o facto de que o Código Penal, aprovado pelo Governo anterior, não dar carácter público a estes crimes, fazendo-os depender de queixa.
A questão é tão simples como isto! O que o Governo não compreendeu - e teve que resolver desta forma tortuosa e dificultosa - foi o mecanismo através do qual a acção penal é introduzida em juízo. Então, fez esta obra lamentável e ao fazê-la - é preciso que fique claro - excedeu tudo o que uma autorização deste tipo pode permitir. Ou será que o Governo e os Srs. Deputados da maioria governamental - em que os criminalistas fizeram um silêncio notável - entendem que se pode, ao abrigo de uma autorização genérica, fazer uma alteração ao Código Penal como esta que, neste sentido, é um bom (péssimo!) exemplo?
Se assim for, isso quer dizer que o Governo poderá fazer durante 180 dias todas as alterações ao Código Penal que entender, desde que não exceda a dosimetria de 3 anos e que, usando da consabida inteligência, crie ilícitos de gravidade semelhante aos que hoje existem no Código Penal com penas previstas até 3 anos. Isto é alguma espécie de delimitação, Srs. Deputados?
Quanto a nós não é nenhuma delimitação e ainda que tivéssemos uma confiança cega no Governo - que certamente não temos - estaríamos constitucionalmente inibidos e tolhidos em lhe conferir uma tal autorização.
Resta então, Srs. Deputados, agora que este recurso não obteve provimento, saber o que é que o Governo e a maioria governamental vão fazer.
Pensamos que o que deveríamos fazer era não conceder a autorização. Esperamos ver agora que espécie de emendas, melhoramentos, restrições ou aperfeiçoamentos é que a maioria governamental pretende deitar nesta manta bem rota, cujos resultados estão à nossa vista, nessa aberração monumental que não nos prestigia nem a nós nem a ninguém e menos ainda, obviamente, ao Governo que a aprovou.
Fazemos votos e tentaremos contribuir para que não se consuma o pior e para que, tanto quanto possível, se evite que a Assembleia da República seja envolvida na concessão de autorizações que poderiam vir a permitir reeditar episódios tão lamentáveis como o que hoje conduziu a esta discussão, que também cia própria teve aspectos lamentáveis.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o ponto seguinte da ordem do dia seria a apresentação por parte do PCP dos projectos de lei n.ºs 278/III e 279/III.
Dado que não haverá tempo para fazer essa apresentação, vai-se proceder à leitura dos projectos de lei que entraram e foram admitidos pela Mesa.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Foi admitido pelo Sr. Presidente e baixou à 1.ª Comissão o projecto de lei n.º 305/III, da iniciativa do CDS, sobre a alteração à Lei n.º 75/79. de 29 de Novembro (Lei da Radiotelevisão).
A sua entrada na Mesa já tinha sido anunciada na sessão anterior.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser anunciada a ordem do dia para a sessão de amanhã, que tem início às 10 horas.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Da primeira parte do período da ordem do dia consta a apresentação, pelo PCP. dos projectos de lei n.ºs 278/III, que aprova medidas tendentes à efectivação dos direitos das mães a que se refere o artigo 1884.º do Código Civil, e 279/III, que garante à mulher grávida o direito » acompanhamento pelo futuro pai durante o trabalho de parlo, a votação dos relatórios da Comissão de Regimento e Mandatos sobre os pedidos de autorização para que os Srs. Deputados Magalhães Mota, Marques Mendes e Angelo Correia deponham em tribunal na qualidade de testemunhas e a apreciação do pedido de urgência, solicitado pelo PSD. para a discussão e votação do projecto de lei n.º 177/III, sobre o prazo de caducidade em acções de resolução de contratos de arrendamento.
Da segunda parte, consta a apreciação da proposta de lei n.º 55/11 í, sobre os serviços de informação, a ratificação n.º 8/III, do PCP, sobre o Decreto-Lei n.º 508/80, de 21 de Outubro, que regula o contrato de serviço doméstico e a apreciação do projecto de lei n.º 177/III, do PSD, sobre o prazo de caducidade em acções de resolução de contratos de arrendamento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, como tivemos há pouco oportunidade de manifestar na conferência de líderes, gostaríamos de saber ao abrigo de que disposição regimental foi alterada a ordem de inscrição das matérias na segunda parte da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não foi alterado nada. A ordem do dia foi anunciada agora e é da competência do Presidente da Assembleia da República, como o Sr. Deputado sabe, fixar a ordem do dia.

O Sr. Jorge Lemos (PCP):-Sr. Presidente, peço de novo a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a ordem de trabalhos para a reunião de amanhã não foi uma ordem anunciada hoje de novo. É uma ordem que transita de anteriores reuniões plenárias em que já havia matérias inscritas na ordem do dia.
Portanto, no nosso entender, teria que se respeitar o que já estava inscrito na ordem do dia e inscreverem-se as novas matérias que devessem fazer parte da agenda.
Aliás, existem instrumentos regimentais que permitem à Assembleia alterar o regime de inscrições

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da ordem do dia, mas esse não é o caso que neste momento nos é presente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que o Sr. Presidente, depois de ouvida a nossa opinião na conferência dos líderes, tem o poder de fixar unia ordem de trabalhos, embora essa ordem possa mesmo alterar a sequência de ordens de trabalhos anteriores.
Daí que penso não abusar das minhas atribuições ao fixar esta ordem de trabalhos.
Contudo, qualquer grupo parlamentar, qualquer deputado, tem o direito de impugnar a ordem de trabalhos fixada. Não lhes tiro esse direito.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Parece que estamos a fazer diálogo, mas de qualquer modo faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Sr. Presidente, não é um diálogo. São interpelações à Mesa, uma vez que a minha bancada ainda não se considera esclarecida sobre as razões que a levaram a alterar o ordenamento das matérias inscritas na segunda parte da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Creio que o Sr. Deputado pode esclarecer a sua bancada, na medida em que assistiu à última reunião de líderes que tivemos.

O Orador: - Sr. Presidente, o que posso esclarecer - e creio que deveria ser também esclarecido à Assembleia - é que não houve consenso para que as matérias inscritas na ordem do dia fossem alteradas, ou seja, que o ordenamento das matérias fosse alterado.
O consenso não se verificou sobre esse ponto, daí que estejamos a colocar estas questões à Mesa.

O Sr. Presidente: - Com efeito não houve consenso, mas o Presidente não é obrigado a seguir o consenso. Foi o que se passou.
O Sr. Deputado tem, evidentemente, se quiser, todo o direito de impugnar amanhã a ordem de trabalhos.
V. Ex.ª pode explicar à sua bancada o que se passou e ela ficará certamente esclarecida.
Não havendo mais nada a tratar, declaro encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Luís do Amaral Nunes.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Torrinhas Paulo.
Maria Luísa Mesquita Cachado.

Centro Democrático Social (CDS):

Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
Horácio Alves Marcai.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Eurico Faustino Correia.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José Manuel Torres Couto.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Filipe P. Santos Loureiro.
Maria Angela Duarte Correia.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia,
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Victor Manuel Caio Roque

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Agostinho Correia Branquinho.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de Orneias Ourique Mendes
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando dos Reis Condesso.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro
José Adriano Gago Vitorino.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Manuel Pereira.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Francisco António Lucas Pires.
José Augusto Gama.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.

PREÇO DESTE NÚMERO 75$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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