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I Série-Número 134

DIÁRIO da Assembleia da República

Sexta-feira, 6-de Julho de 1984

III LEGISLATURA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE JULHO DE 1984

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais
Secretários: Exmo. Sr. Luis Abílio da Conceição Cacito
António Roleira Marinho
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às l1 horas.
Prosseguiu-se a apreciação do recurso interposto pelo PSD , da inclusão na ordem do dia do projecto de lei n.º 45/III (ASDI), sobre o regime do estado de sítio e do estado de emergência. Intervieram no debate a diverso titulo, os Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP). Magalhães Mota (ASDI), José Luís Nunes (PS), José Vitorino (PSD), António Taborda (MDP/CDE), Ferraz de Abreu (PS), Marques Mendes (PSD), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Luís Beiroco (CDS) e José Manuel Mendes (PCP).
Prosseguiu igualmente a discussão e votação, na especialidade, do projecto de lei n.º 177/III, do PSD, sobre o prazo de caducidade em acções de resolução de contratos de arrendamento. Intervieram, a diverso título, incluindo declaração de voto, os Srs. Deputados José Magalhães (PCP), Narana Coissoró (CDS), Odete Santos (PCP), Lopes Cardoso (UEDS) , Jorge Lemos (PCP), Magalhães Mota (ASDI), José Luís Nunes (PS), João Amaral e José Manuel Mendes (PCP), Carlos Lage (PS), Hasse Ferreira (UEDS) e Montalvão Machado (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 11 horas

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácia Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António José Santos Meira.
António Manuel do Carmo Saleiro.
Armando António Martins Para.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Belmiro Moita da Costa.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico José Carvalho Figueiredo.
Eurico Faustino Correia.
Ferdinando Laurenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Augusto Sé Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Händel de Oliveira
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Joaquim Gomes.
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Marta da Silva Ferro.

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Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Bastos Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Voz.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campas.
Agostinho Correia Branquinho.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Anacleto Silva Baptista.
António Augusto Lacerda de Queira.
António Coutinho Monteiro Freitas.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Jorge Nélio Ferraz Mendonça.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Fernando Gonçalves Riquito.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Vascd Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira

Partido Comunista Português (PCP):

Alvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota. Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.

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Francisco Manuel Costa Fernandes.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho Lima.
Lino Paz Paulo Bicho.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Paulo Simões Areosa Feio.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Duarte Nuno Correia Vasconcelos.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Goes.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro José Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
João Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira. Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da primeira parte da ordem do dia consiste na apreciação do recurso interposto pelo PSD da inclusão na ordem de trabalhos de hoje do projecto de lei n.º 45/III, da ASDI, sobre o regime do estado de sítio e do estado de emergência.
Trata-se da continuação do debate iniciado na sessão de ontem. Quando ontem se interrompeu o debate o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca estava inscrito para usar da palavra. Verifico, porém, que nem ele nem outro qualquer deputado do MDP/CDE se encontram na Sala.
Havia igualmente solicitado a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Deputado Jorge Lemos pretende usar da palavra em substituição do Sr. Deputado José Magalhães?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para dizer que eu também me tinha inscrito.

O Sr. Presidente: -Tem então a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Sr. Presidente, antes de fazer os pedidos de esclarecimento, gostaria de fazer uma observação: é que os pedidos de esclarecimento dirigiam-se a uma intervenção produzida pelo Sr. Deputado Marques Mendes, que não se encontra ainda presente e desconheço se tem ou não intenção de responder aos pedidos de esclarecimento. De qualquer modo, pediria à Mesa que tivesse isso em consideração e reservaria a minha palavra para o momento em que o Sr. Deputado Marques Mendes estivesse presente.

O Sr. Presidente: -Vou então dar a palavra ao Sr. Deputado Magalhães Mota, que é o primeiro orador inscrito para produzir intervenções.

O Sr. Magalhães Mote (ASDI): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com o que consta do Diário, ou seja, do registo da sessão, que foi distribuído por todas as bancadas, o discurso apresentado pelo Sr. Deputado Marques Mendes - e só posso considerá-lo como sendo do Sr. Deputado Marques Mendes e de mais ninguém pois trata-se de um recurso apresentado oralmente - diz o seguinte, quanto a fundamentos: "A razão fundamental dessa impugnação é que estamos em sessão complementar em virtude de uma deliberação desta Assembleia. Ora, esta matéria não está nela contida. Este projecto de lei não está contido na resolução que deliberou prorrogar esta Sessão Legislativa. Por outro lado, quando se invoca a conexão com a denominada lei de segurança interna e protecção civil entendemos que não existe essa conexão. Estas são fundamentalmente as razões

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por que entendemos que o projecto de lei em causa não deve ser incluído na ordem do dia."
Citei o texto que é, aliás, do conhecimento de todos os deputados.
Isto significa, pura e simplesmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não foi invocada qualquer violação de uma disposição regimental, que esta fundamentação é, portanto, inepta e que a Mesa não está naturalmente em condições de poder aceitar um debate desta natureza.
Trata-se pois de uma petição rigorosamente inepta que, como tal, não tem matéria suficiente para poder ser apreciada por este Plenário.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): -Muito bem!

O Orador:- Mas, num esforço para tentar ultrapassar esta situação, diremos, apesar de tudo, alguma coisa sobre esta aparência de recurso que a Assembleia resolveu admitir, numa fórmula em que, de algum modo, tudo foi posto rigorosamente em causa e quanto ao modo de recorrer nesta Assembleia da República.
Passou a aceitar-se que uma intenção de recurso vale como recurso, que um anúncio de uma intenção vale como recurso, que um sinal vale como recurso que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, provavelmente, teremos de estar particularmente atentos a todas as bancadas não vá haver um piscar de olhos, uma apresentação de uma flor na lapela, um sinal com um lenço ou com um leque que signifiquem, também, a interposição de recursos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: -É, com certeza, uma forma romântica de recorrer. O século passado foi pródigo nestes almanaques de sinais mas não parece ser uma forma particularmente curial para um Parlamento.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a fixação desta ordem do dia foi feita pelo Sr. Presidente da Assembleia da República no uso de uma competência que lhe é própria, ouvida a conferência dos grupos parlamentares, ou seja, nos precisos termos do artigo 64º do Regimento, mas com uma particularidade interessante: é que não houve qualquer oposição expressa a que esta fixação se efectivasse por esta forma, antes pelo contrário, como é do conhecimento de quem esteve na conferência dos grupos.
A fixação da ordem do dia obedece a uma prioridade regimental claramente definida e se os Srs. Deputados quiserem dar-se ao trabalho da ler a alínea b) do artigo 252º do Regimento verificarão que ele diz que entre as prioridades para discussão, prioridades absolutas fixadas nos próprios termos do Regimento, consta a dita das iniciativas legislativas referentes ao estado de sítio e ao estado de emergência. Trata-se também de um projecto em condições perfeitas para ser agendado e subir a Plenário - foi apresentado há mais de 1 ano, tendo pois decorrido o prazo fixado no nº 4 do artigo 144º.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É perante a clareza destes factos, é perante a clareza deste normativo que

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não oferece nenhuma dúvida de interpretação, que surge a espantosa impugnação que estamos a apreciar com os "fundamentos" que acabei de reproduzir.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira das causas pelas quais o Sr. Deputado Marques Mendes declarou fazer esta impugnação foi porque, no seu dizer, "estamos em sessão complementar por virtude de uma deliberação desta Assembleia". Ao longo do tempo nunca, até 1980, tinha surgido a questão de se fazerem subtis distinções entre os períodos de funcionamento desta Assembleia.

Pela primeira vez a questão foi colocada em 1980, mais precisamente na sessão do dia 19 de Junho, sessão em que, 4 anos volvidos de prática parlamentar, a reacção em relação a deliberação semelhante àquela que pretende motivar o pedido do Sr. Deputado Marques Mendes foi alvo do mais veemente combate parlamentar que imaginar se possa. Perdoarão VV. Ex.as que, por razões, que têm a ver com a seriedade e o respeito devidos a esta Casa, não reproduza as afirmações feitas nesse debate, que ou não diga das acusações que então foram formuladas em termos de democraticidade em relação àquilo que hoje se contesta.
Tenho aqui o Diário que estará à vossa disposição se alguém pretender contestar aquilo que estou a dizer.
Destacou-se nessa impugnação, pelo brilhantismo das raciocínios expostos, o Sr. Deputado Almeida Santos, que colocou a questão em termos tão simples como estes: "Poderão limitar-se as matérias a incluir num período de funcionamento da Assembleia para além de 15 de Junho? E respondia o Sr. Deputado Almeida Santos: "É evidente que não! É evidente que não porque não há um Regimento de aplicação sazonal. O Regimento não é uma fruta da época, o Regimento é sempre para ser aplicado. O Regimento não sofre distorções conforme o calendário, não está à mercê nem do calendário nem das maiorias".

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

OOrador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dizia ainda o Sr. Deputado Almeida Santos: "Entender-se que num período de tempo a Assembleia da República não pode exercer em plenitude as suas competências e tem de subordinar-se a um Regimento próprio e eventual, é a mesma coisa que transformar a Assembleia da República num órgão de soberania limitado durante um certo período de tempo".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tinha inteira razão o deputado que assim falava. Não pode, na verdade, transformar-se o Regimento, por vontade de uma qualquer maioria, num produto de época, num fruto sazonal. Não pode a Assembleia da República transformar-se num órgão de soberania limitado que só nalguns períodos de tempo está em plena actividade.

Isto passou-se em 19 de Junho de 1980 e acontece que, posteriormente, se faz a revisão da Lei Constitucional e que esta vem reforçar este entendimento, tornando-o insusceptível de qualquer espécie de dúvidas. De facto, de acordo com o n.º 1 do artigo 177 º na sua nova redacção, a sessão parlamentar dura 1 ano com início a 15 de Outubro. Isto significa que a Assembleia da República é um órgão permanente tal como exige o princípio democrático.

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Os deputados que fizeram parte da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional lembrar-se-ão, certamente, do debate que então travará e das razões que determinaram esta revisão. Gostaria, no entanto, de muito singelamente recordar, para os porventura mais distraídos, que a ideia que a revisão oonstitucional rejeitou expressamente - a da descontinuidade do Parlamento - ...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Muito bem!

O Orador: - ... pressupunha que este era um órgão de funcionamento intermitente, a funcionar por curtos espaços de tempo e só para resolver alguns assuntos. Era a definição de escola do órgão "Parlamento descontínuo".
Assim funcionavam as antigas Cortes mas assim não funcionam os modernos parlamentos.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Muito bem!

O Orador: - O princípio de que a Assembleia da República é um órgão permanente implica que o sistema de permanência tenha sido adoptado na Constituição em prejuízo do próprio sistema de sessões. O período em que nos encontramos é assim um péríodo em que, por decisão da própria Assembleia - e sublinho este ponto pois tem a ver com outra discussão travada nesta Câmara-, e não da sua Comissão Permanente, se entendeu prorrogar o seu período normal de funcionamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Convocada a Assembleia, como foi, os direitos dos grupos e agrupamentos parlamentares e de todos os deputados são iguais. O período em que a Assembleia funciona prolongando os seus trabalhos não pode ser entendido como um período especial em que só tivessem o direito de fixar a ordem do dia os partidos da maioria.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os direitos são iguais, o mesmo Regimento nos rege a todos.
A Assembleia da República não é uma sociedade anónima em assembleia extraordinária que só pode reunir para a matéria objecto da convocatória. A Assembleia da República não se confunde com o órgão de uma sociedade anónima ou sequer com o órgão semelhante de uma sociedade civil. Prorrogar é prosseguir, é prolongar. A Assembleia da República está em plena actividade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes mesmos argumentos foram aqui várias vezes expressos, e naturalmente com maior brilho do que aquele que lhes posso emprestar. Bastaria referir, por exemplo, a sessão de 12 de Outubro de 1981 em que esta mesma argumentação foi sustentada pelo actual Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Dr. António Vitorino e pelo Sr. Presidente em exercício neste momento na Mesa da Assembleia da República.

O Sr. Jorge lemos (PCP): -Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD): -Essa é excessiva!

O Orador: - Estamos, portanto, bem acompanhados neste entendimento.
Por outro lado, o Sr. Deputado Jorge Lacão teve o cuidado de salientar que, por se tratar de uma convocatória feita pela Comissão Parlamentar, esta teria, antes de se pedir a convocação, de apreciar as matérias para decidir se devia ou não convocá-la, havendo, portanto, aí, uma ligação que se estabelecia entre as matérias apreciadas pela Comissão Permanente e o objecto da convocatória. Ora, tal questão obviamente se não punha porque foi o próprio Plenário da Assembleia da República a fazer a convocação para o prolongamento dos seus trabalhos.
Creio que também este argumento merece o nosso assentimento neste momento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Torna-se assim evidente a todas as luzes que, face à prática desta Casa, face ao direito constitucional que nos rege, face ao nosso Regimento que é o mesmo em todos os tempos e em todas as ocasiões, o recurso interposto não tem a mínima razão de procedência, não tem qualquer fundamento jurídico-constitucional.
Por isso se compreende bem a dificuldade manifesta sentida pelos proponentes do recurso para indicarem um só preceito da Constituição ou do Regimento que tivesse sido violado! Porque não há! São eles que violam a Constituição e o Regimento quando formulam este recurso.
Mas se é claro e evidente para nós que a resolução invocada não pode ter o condão de substituir-se ao Regimento, não pode impedir a sua aplicação, não pode impedir a aplicação da Constituição, não pode transformar esta Assembleia num órgão diminuído, se isto é para nós evidente, podemos no entanto aceitar, para facilidade de raciocínio e para nosso desembaraço, que os Srs. Deputados tenham razão e que a resolução nos obrigue. E aceitando este absurdo, verifiquemos, no entanto, que o n .º 6 da resolução aprovada pela Assembleia da República diz o seguinte: "Qualquer outra matéria cuja urgência justifique o seu agendamento".

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ora aí está!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Ora bem, Sr. Presidente e Srs. Deputados o que é uma matéria cuja urgência justifica o seu agendamento? Não é, obviamente, uma decisão tomada em processo de urgência, não é ainda uma decisão tomada pela maioria, pois isso correspondia simplesmente a transformar a fixação da ordem do dia num arbítrio da maioria. Quem define a urgência mais e melhor que o próprio Regimento da Assembleia da República? Quem define a urgência mais e melhor que a própria lei que nos rege a todos e que tem um processo especial de revisão, que está em curso, que não pode ser alterada pela vontade de nenhum dos Srs. Deputados nem de nenhum grupo parlamentar nem de nenhuma maioria, sem cumprir as formalidades especiais para essa revisão do Regimento? Quem melhor do que o Regimento para definir a urgência?
Perdoe-se-me ainda que invoque o argumento: então, não foi por unanimidade da conferência que esta matéria foi incluída na fixação da ordem do dia? Então ainda querem mais urgências, Sr. Presidente e Srs. Deputados? Como é possível continuar a argumentar nesta matéria?

0 Sr. Silva Marques (PSD): -Muito bem!

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O Orador: - Mas se os argumentos que fundamentam este recurso são do ponto de vista jurídico-constitucional absolutamente inconsistentes devendo merecer rejeição imediata desta Câmara, mais importante do que isto será esclarecer a motivação política desta decisão.

Não é indiferente a esta Câmara que ela tenha de cuidar de saber dos porquês destes recursos, dos porquês da sua apresentação, do porquê desta forma enviesada e frágil de tentar, pela primeira vez na vida desta Assembleia da República, recorrer da fixação de uma ordem do dia.

Porquê? Nos corredores à volta desta Casa circulam variadas versões. Importa que elas não fiquem pelos corredores nem pelos segredos abafados dos Passos Perdidos, importa que, com clareza e frontalidade, as questões políticas sejam para aqui trazidas pois é este o lugar onde devem ser debatidas.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É preciso que saibamos se este processo referente ao estado de sítio e ao estado de emergência não pode ser agendado por o Governo entender dever ser ele a legislar sobre a matéria. Se esta for a justificação do recurso, se esta for a justificação que o Governo nos terá aqui que dar quando se iniciar esse debate, então, teremos de concluir duas coisas.

Primeira, que há aqui uma tremenda ineptidão porque este processo está pendente há mais de 1 ano, porque o Governo sabe que tem obrigação constitucional de legislar sobre o estado de sitio e o estado de emergência e depois de mais de 1 ano passado não está ainda em condições de apresentar um projecto
de lei.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Segunda - e mais grave - o entendimento de que só o Governo pode legislar sobre estas matérias transforma esta Assembleia da República num órgão legislativo subordinado, transforma a competência legislativa essencial numa competência e num atributo do Governo, e esse procedimento é uma clara e enviesada leitura dos textos constitucionais que não poderemos, de modo algum, aceitar.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma segunda versão que igualmente se coloca e que também se impõe clarificar é a de que a legislação proposta pelo Governo em relação às medidas de segurança interna não suporta o confronto com a definição do estado de sitio e do estado de emergência, únicas formas constitucionais de suspender direitos, liberdades e garantias.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - E se assim é também essa questão tem de ser clarificada porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, existe em Portugal uma longa tradição, que não desejarei ver repetida, no sentido de, por existirem outros modos de restringir direitos, liberdades e garantias, não se aplicar o estado de sítio eo estado de emergência. Um manual insuspeito de Ciência Política e Direito Constitucional - e refiro-me ao do Prof. Marcelo Caetano, 5ª ed. - a p. 482, dizia textualmente o seguinte: "O não se ter, na vigência

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da Constituição de 1933, feito uso da declaração de estado de sítio mostra que, de facto, as garantias individuais se acham à mercê do Governo.

Aplausos da ASDI, do PCP e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota inscreveram-se os Srs. Deputados José Luís Nunes, Jorge Lemos e António Taborda.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, antes de mais gostaria de sublinhar que pedi não só para fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota mas também uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Quanto à intervenção fica inscrito, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado Magalhães Mota, não vou responder a uma série de questões que o Sr. Deputado levantou porque o farei no momento próprio isto é, aquando da intervenção que irei produzir sobre esta matéria. Sobre isso estamos entendidos. Irei apenas tocar nos pontos que devem ser motivo de interpelação.
O Sr. Deputado falou sobretudo num leque como forma de interposição de recurso. Bom, como sabe existem outras formas de sinais. No século passado, ou melhor, em 1900, havia também aquelas senhoras que deixavam cair um lenço...- conhece com certeza a técnica - ...

Risos.

Uma voz: - E a liga!...

O Orador: - Quanto à liga trata-se de um caso diferente. O Rei de Inglaterra, quando alguém brincou com esse facto, transformou a liga na maior condecoração inglesa, que é a Ordem da Jarreteira sob o título "On n'y soít qui mal y pense" que em português se traduz par "Mal haja quem bem não cuida".
E mal haja quem bem não cuida é um pouco o tema da intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota. Primeiro lapso: é que nessa reunião do grupo parlamentar nós opusemo-nos a esta ordem de trabalhos. Estou à espera que chegue o nosso camarada que lá esteve, mas posso garantir-lhe que, antes e depois, discutimos o assunto e houve uma oposição. Agora o que não houve foi uma oposição de dar com um murro na mesa. Dissemos simplesmente que não aceitávamos, que estávamos em desacordo.
Posso garantir ao Sr. Deputado Magalhães Mota que isto se passou assim. De resto, o nosso camarada e colega que esteve presente em breve poderá esclarecer esse assunto.
Quanto às hipóteses políticas da não convocação da Assembleia, o Sr. Deputado acha que o que se deve dizer nos corredores se deve dizer na Assembleia. Pela minha parte, penso ao contrário, penso que o que se diz na Assembleia é o que se devia dizer, obrigatoriamente, nos corredores!...

0 Sr. José Lello(PS): - Muito bem!

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O Orador: -Mas isto são pontos de vista que não têm aqui discussão.
Sublinharei ainda o seguinte: em primeiro lugar, não sei o que é que o Governo pensa sobre esta matéria, mas tenho a certeza de que tem obrigação de pensar o que está escrito na Constituição. É isso que ele pensa.
Assim, é pura especulação dizer-se que isto se passa devido ao facto de o Governo, por exemplo, pensar que deve ser ele próprio a regular sobre o assunto. É evidente que o Governo não pensa uma coisa dessas.
Desejava chamar a atenção do Sr. Deputado para o facto de que quando atribuímos ao Governo, neste caso e só neste e entre aspas - faço essa justiça ao Sr. Deputado-, intenções que o Governo não tem, é facílimo fazer um discurso brilhantíssimo sobre essa matéria porque nós próprios definimos o campo de quem criticamos.
Simplesmente isto justifica-se e explica-se com uma nitidez clara: o Governo não tem essas intenções. Não sou porta-voz do Governo mas o Sr. Deputado poderá perguntar-lhe se ele pensa assim. Agora o que não se pode é transformar este debate num processo de intenções ao Governo e dizendo "Consta que o Governo pensa isto, isto e isto" - e estou de acordo consigo nesse aspecto, pois se o Governo pensasse o que o Sr. Deputado expressou seria obviamente contrário ao espírito da Constituição e do Regimento e depois de lhe atribuir essas intenções maléficas criticá-lo. O caso resolve-se, muito simplesmente, com esta afirmação: as críticas fazem-se perante factos e não intenções além de que o Governo não tem essas intenções. O que o Sr. Deputado Magalhães Mota fez foi arrombar uma porta aberta.
Por fim, quero referir uma última questão que é importante: o Sr. Deputado Marques Mendes está presente, é um brilhantíssimo jurista, não necessitando, portanto, de forma alguma, das coisas que irei dizer acerca dessa matéria, mas em todo o caso quero salientar que o requerimento de interposição de recurso feito pelo Sr. Deputado Marques Mendes não é propriamente um documento feito por um sinal ou por um leque.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - O documento de interposição do recurso é um requerimento que tendo todos os méritos que persa vir a ter e todos os defeitos que lhe possam vir a ser atribuídos - e que ficam na opinião de cada um dos Srs. Deputados -, foi inteligível, pelo menos, por quem tinha o dever de o compreender, a Mesa, que o inseriu na ordem de trabalhos. E se os Srs. Deputados se derem ao trabalho de ler o recurso ...
Ouvi agora o Sr. Deputado José Magalhães dizer "Outro que não percebeu o texto" ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É como o outro que não percebeu a história do talher!

O Orador: - Eu percebi a história do talher, Sr. Deputado. Mas agora a questão fundamental é esta: se os senhores se derem ao trabalho de ler o Diário que foi distribuído ontem, verificam que o Sr. Deputado Marques Mendes - e estou a citar de memória porque não tenho o tenho aqui comigo-

diz " Eu pretendo interpor recurso e entregarei o fundamento escrito amanhã" e que depois o Sr. Presidente da Assembleia da República afirma "O que eu entendo é que V. Ex.ª acaba de interpor um recurso".

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, terminou o tempo de que dispunha, pelo que tem que concluir com a maior brevidade possível.

O Orador: - Pecado confessado é mil vezes perdoado!
Portanto, isso está aí, logo, peço a atenção dos Srs. Deputados para o que o Sr. Presidente disse "Eu entendo que V. Ex.ª acaba de interpor um recurso ...". Enfim, não voltarei a falar sobre este assunto e por motivo muito simples, é que transitou em julgado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Transitou em julgado?!

O Orador: - Sim, Sr. Deputado, transitou porque houve um recurso do Sr. Deputado Magalhães Mota acerca desta matéria, sobre a admissibilidade do recurso interposto pelo Sr. Deputado Marques Mendes, e esse recurso não foi atendido pela Câmara.

Uma voz: - Então para que é que o trouxe?

O Orador: - Quem o trouxe foi o Sr. Deputado Magalhães Mota, não eu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, faz favor de concluir.

O Orador: - Fico-me por aqui, Sr. Presidente, embora tivesse mais a dizer. Mas já usei e abusei da palavra e não tinha o direito de o fazer, pelo que agradeço a sua compreensão.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra a qualquer Sr. Deputado, quero apenas sublinhar uma evidência: a Mesa só conhece a expressão escrita, a verbal, e quanto a código de sinais só conhece um sinal bastante prosaico, o do levantar o dedo, correspondente ao pedido de palavra, não mais.

Sr. Deputado Magalhães Mota, pretende responder já ou no final de todos os pedidos de esclarecimento? É que há mais deputados inscritos.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa no seguinte sentido: no início da sessão manifestei, em nome da minha bancada, que teríamos todo o interesse em colocar questões ao Sr. Deputado Marques Mendes, relativamente à intervenção que tinha produzido ontem, mas como ele não estava presente não insistimos em fazê-lo naquele momento.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Exª fará essas perguntas, se assim o entender, ao Sr. Deputado Marques Mendes após terminarem as questões ao Sr. Deputado Magalhães Mota e as respostas que ele entender dar.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Muito bem, Sr. Presidente. Se V. Exª me dá a palavra, então aproveitaria para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Presidente: - Para esse efeito, tem a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Magalhães Mota, farei um curto pedido de esclarecimento, uma vez que reservaremos para a intervenção que vamos produzir no debate o conjunto de considerações que sobre esta matéria se nos oferece produzir. De qualquer modo - e estando de acordo no essencial com o que V. Exª disse -, creio que houve um aspecto que o Sr. Deputado não terá sublinhado com a pertinência que, no nosso entender, devia ter sido posta. E esse aspecto é o porquê do recurso interposto pelo PSD. O que é que está em causa neste recurso? Porque é que, tendo em conferência de grupos parlamentares - e avanço já a opinião do meu partido - havia acordo unânime de que esta matéria fosse agendada, o PSD vem impugnar este agendamento?
Para além da descortesia para com o Presidente da Assembleia da República e a atitude vexatória a que pretende submeter os deputados do PSD, creio que há também uma razão política em torno desta questão. É que, no nosso entender, a maioria pretende criar um estado de excepção permanente, um estado de excepção que não decorre doa preceitos constitucionais, estado de excepção esse a ser utilizado quando e como o Governo entender, deixando por regulamentar o que regulamentado tem de ser, ou seja, o que a Constituição manda em matérias de estado de sítio ou estado de emergência.
E a pergunta que lhe faria, Sr. Deputado Magalhães Mota, é se esta impugnação não terá também a ver com a má consciência desta maioria face à atitude relapsa do seu governo que, passado mais de 1 ano sobre a apresentação a esta Câmara de um Programa de Governo que no ponto 2, Capítulo da Administração Interna e Segurança, Subcapítulo II - Segurança, ponto 3, das principais medidas relativas- à segurança interna dizia o seguinte: "Elaborar em cooperação com o Ministério da Defesa - isto o Ministério da Justiça e o Ministério da Administração Interna- uma proposta de lei sobre o estado de sítio e o estado de emergência".
Não será esta má consciência da maioria de ter um governo que há mais de 1 ano se comprometeu perante esta Assembleia a apresentar unha proposta de lei sobre matéria tão grave, e não o ter feito, que a leva a não pretender que seja discutida uma proposta de um partido, que não do Governo, sobre uma matéria tão importante como é a relativa ao estado de sitio e ao estado de emergência.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra para exercer o direito de defesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, exercerá o direito de defesa na altura própria, ou seja, quando estiver concluído o período de pergunta ao Sr. Deputado Magalhães Mota e respectivas respostas.

Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): -Sr. Deputado Magalhães Mota, qualquer um de nós teria muita dificuldade em rebater aquilo que não existe. V. Exª fez um extremo esforço para tentar rebater ou impugnar este recurso, o qual praticamente não foi alegado. Queria pois prestar-lhes as minhas homenagens pela maneira como o fez, porque teve que estar a descobrir por si próprio quais os motivos da impugnação deste despacho da Mesa.
Gostaria no entanto de lhe colocar uma questão: é que consultando a cópia dactilografada da sessão verifico que o Sr. Deputado impugnante falou fundamentalmente em 2 razões. E a segunda que apontou foi esta: "Por outro lado, quando se invoca a conexão com a denominada Lei de Segurança Interna e Protecção Civil, entendemos que não existe essa conexão ...". Ora, é evidente que o Sr. Deputado impugnante não fundamentou esta asserção, referiu-a "dando de barato" que assim era.
Uma vez que, no meu entender, existe uma conexão patente e real entre o projecto de lei de segurança interna e o projecto de lei da ASDI sobre o estado de sítio e, aliás, mais do que isso, no n º 3 do artigo 11 º da própria proposta de lei governamental se faz expressa referência ao estado de sítio e ao estado de emergência, gostaria que o Sr. Deputado, como um dos proponentes deste projecto de lei, desse alguns esclarecimentos à Câmara sobre a matéria da conexão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começando pela ordem das pedidos que me foram formulados, responderei desde já ao Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. Jorge Lentos (PCP): - Agora só para irritar o Sr. Deputado José Luis Nunes não está cá!

O Orador: - Bom, então passaria a inverter a ordem e entrava na questão concreta levantada pelo Sr. Deputado António Taborda. Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é para todos nós evidente no seio desta Câmara a conexão entre a lei de segurança interna e a definição do estado de sitio e do estado de emergência. Aliás é tão evidente que nenhuma das iniciativas pendentes em matéria de segurança interna deixa de fazer referência ao estado de sítio e ao estado de emergência; a própria proposta de lei do Governo o faz e também o projecto do CDS.
Assim, creio que a conexão é evidente para todos os proponentes, das iniciativas legislativas que aqui temos. Bastaria, aliás, pensar que a própria proposta de lei do Governo foi basear-se num texto espanhol de 1981, que é precisamente uma lei sobre o estado de

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sítio, o estado de emergência e o de segurança ou de alarme, conforme as definições, todos eles tratados no mesmo artigo da Constituição espanhola, ou seja, no mesmo artigo 55.°

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A mesma relação é estabelecida em todos os textos constitucionais que pudemos encontrar em termos europeus, e portanto creio que só o Sr. Deputado Marques Mendes poderá explicitar como é que não existe conexão entre a segurança interna e o estado de sítio e o estado de emergência que é precisamente o grau máximo da segurança interna.
Podia agora voltar à ordem normal dos esclarecimentos e responderia ao Sr. Deputado José Luís Nunes. Por mim, tenho que me congratular com a opinião da Mesa de que a lei que nos rege é o Regimento e que não há possibilidade de, na Assembleia da República, se introduzirem códigos de sinais. Tenho é pena que essa regra estrita não tenha sido ontem aplicada porque se tivéssemos aplicado o Regimento não estaríamos agora a discutir estas questões.
Também eu estou de acordo - e pedia ao Sr. Deputado José Luís Nunes que tivesse a bondade de se recordar que foi precisamente nesses termos que coloquei a questão - que importa clarificar razões e importa acabar com as especulações de corredor. Penso, aliás, que a intervenção do Sr. Deputado José Lufe Nunes já teve o mérito de esclarecer que é pura especulação, o dizer-se que o Governo pretendia reservar para si, ou pelo menos...

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Eu disse que era pura especulação, mas gostaria de sublinhar que disse mais: é que a mim como deputado, bem como ao meu grupo parlamentar, é indiferente as intenções do Governo acerca desta matéria, o que interessa é a interpretação que nós fazemos das normas regimentais.

O Orador: - Muito bem, por mim só tenho de me congratular com estas 2 manifestações: primeiro, com o desmentido; segundo, com a afirmação - sublinho gostosamente - de independência do Parlamento e de apreciação crítica livre por parte deste órgão de soberania.
Uma última questão levantou o Sr. Deputado José Luís Nunes, segundo a qual o recurso de interposição tinha sido percebido pela Mesa, o que era suficiente. Eu tratei da questão marginalmente, mas, em todo o caso, não gostaria de deixar de voltar a ela. De facto, o que o Sr. Deputado Marques Mendes disse foi «quero anunciar que o PSD, creio que em conjugação com o PS, vai impugnar a inclusão na ordem do dia...», ou seja, a Mesa tem de facto uma notável capacidade e percebeu várias coisas: primeiro, percebeu quem eram os subscritores do requerimento de impugnação, quando o próprio deputado que a anunciou tinha dúvidas sobre quem eram os subscritores e diz: «o PSD, creio - que em conjugação com o
PS ...», segundo, a Mesa percebeu que o Sr. Deputado tinha impugnado quando ele disse «vai impugnar», terceiro, a Mesa percebeu a fundamentação do recurso quando o Sr. Deputado disse que apresentaria os seus fundamentos por escrito na Mesa antes do início da sessão de manhã. Assim, só tenho que louvar a capacidade de percepção da Mesa que foi muito grande e que excedeu largamente aquilo que seria previsível. Quanto à pergunta do Sr. Deputado Jorge Lemos sobre o porquê do recurso do PSD, sobre se o Governo pretende um estado de sítio permanente ou se isso terá a ver uma má consciência de maioria face ao não cumprimento do Programa do Governo, bom, creio que cumprirá naturalmente à própria maioria e ao Governo explicarem-se das razões da sua posição, das razões do atraso .no cumprimento do programa de Governo e, em última análise, deverá ser o Sr. Deputado proponente do recurso a justificar as razões políticas pelas quais o apresentou.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra ao abrigo da figura de protesto. E digo sob a figura, porque não tenho motivo para protestar apertis Regimento, mas é o motivo que usualmente se invoca nesta Câmara.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, abusando da sua paciência, da sua lealdade parlamentar e da organização dos seus serviços, V. Ex.a importa-se de me emprestar esse documento para eu poder ler aqui o que citei de memória há pouco?
As palavras do Sr. Deputado Marques Mendes, são as seguintes, que passo a citar: «Para além disso, Sr. Presidente, queria anunciar que o PSD, creio que em conjugação com o PS, vai impugnar» ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não esqueça o «creio»!...

O Orador: - Sim, eu sei, aliás, li a expressão «eu creio». Mas como dizia «...vai impugnar a inclusão na ordem do dia de amanhã, do projecto de lei n.° 45/III, da ASDI, apresentando os seus fundamentos por escrito na Mesa antes do início da sessão de amanhã».
Vejamos a primeira questão relativa à expressão utilizada pelo Sr. Deputado Marques Mendes e que é esta: «creio que em conjugação com o PS...».

O Sr. José Magalhães (PCP): - É dubitativo!

O Orador: - Exactamente!

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - É evidente!

O Orador: - E depois suponhamos que o PS dizia no dia seguinte que era contra o recurso. Era ou não bastante que o PSD tivesse afirmado a sua intenção de recorrer?

Vozes do PCP: - Isso era diferente!

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O Orador: -Talvez fosse diferente politicamente, mas, para o Regimento, que é o que estamos a discutir, era igual.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É diferente a 2 ou a 3!

O Orador: - É diferente a 2 ou a 3 ou a 1. Como dizia Oscar Wilde " 2 é solidão e 3 é companhia".

Risos do PS e do PSD.

Em segundo lugar, diz o seguinte o Sr. Presidente: "O Sr. Deputado fez portanto a declaração de que impugna a inclusão na ordem do dia deste projecto de lei." Isto é o que aqui está; o Presidente entendeu perfeitamente e todos entenderam porque ninguém se opôs ao que disse o Sr. Presidente.
Quanto aos fundamentos, aí o Sr. Deputado tem razão, o Sr. Deputado Marques Mendes não se referiu a fundamentos; o que o Sr. Deputado disse foi que amanhã apresentaria os fundamentos por escrito. Não o fez, pois optou por apresentá-los oralmente. Ora, eu pessoalmente entendo que isto não viola o Regimento e a própria Câmara também assim o entendeu.
De qualquer forma, o Sr. Deputado, mesmo com o voto contrário da Câmara, tem o direito de ter uma opinião completamente diferente, a qual é perfeitamente válida. Agora, concordará comigo que isto é uma coisa e as coisas que o Sr. Deputado disse acerca desta matéria são ligeiramente diferentes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, para protestar contra a intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Jorge Lemos (PCP)- Sr. Deputado Magalhães Mota, esta é a única forma que tenho de me dirigir a V. Ex.ª depois de ter usado da palavra para pedir esclarecimentos. É evidente que não tenho razões para apresentar um protesto face às suas declarações mas, em face do silêncio da maioria e da não existência de fundamentação do recurso ora em discussão, creio que nos compete -trocando nós opiniões- tentar que a maioria, já que de sua iniciativa não o disse, justifique o porquê do recurso.
Certamente que uma das razões não pode deixar de estar ligada ao facto de o Governo, há mais de 1 ano, perante esta Câmara, ter assumido o compromisso de elaborar uma proposta de lei sobre matéria tão importante como a relativa ao estado de sítio e ao estado de emergência e, ao ver-se ultrapassado por um partido, não pretender fazer essa discussão com base neste texto, mas num outro texto que irá elaborar. Em nosso entender, o Governo neste momento está mais interessado em regulamentar um estado de excepção permanente que ele controle, que não tenha limites constitucionais, do que em regulamentar o que a Constituição determina.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, chamo a sua atenção para o facto de que não se devem desvirtuar as figuras regimentais. O Sr. Deputado podia pelo menos ter salvo as aparências, mas ao invés, disse que usava o protesto apesar de não ter razões para o fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para responder aos protestos.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): -Sr. Presidente, muito rapidamente e em termos de contraprotesto, o que eu disse foi que a Mesa em relação à declaração do Sr. Deputado Marques Mendes tinha demonstrado uma compreensão que revela grande capacidade porque ela descobriu quem eram os subscritores quando o Sr. Deputado anunciou: "O PSD, creio que em conjugação com o PS, vai impugnar ..." Percebeu também a Mesa que se impugnava quando o Sr. Deputado disse que iria impugnar; percebeu ainda quais eram os fundamentos pois admitiu o recurso - e só pode admitir uma coisa fundamentada quando o Sr. Deputado disse que apresentava os fundamentos no dia seguinte.
Foi portanto apenas isso que eu disse e repito agora sob a forma de contraprotesto. Penso que eram estes os esclarecimentos que devia ao Sr. José Luís Nunes.
Quanto ao protesto do Sr. Deputado Jorge Lemos, também sob a forma de contraprotesto, só me cumpre repetir aquilo que disse. Quer dizer, é a maioria e o Governo que têm de esclarecer este ponto. Eu diria que depois desta questão aqui colocada e depois de o ter sido da forma frontal como foi, mal ficaria a este governo se viesse já para as "calendas gregas" apresentar uma proposta de lei sobre a matéria do estado de sítio e do estado de emergência. Penso que aquilo que lhe cumpre fazer dignamente se tem realmente algumas divergências em relação ao projecto que está na Mesa - é apresentar proposta de alteração e vir à Assembleia discuti-las. É assim que procedem os governos em democracia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, para uma intervenção à Mesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, interpelava a Mesa no seguinte sentido: penso que temos a ganhar com a aplicação uniforme das figuras regimentais. Creio que a Mesa teve razão quando me alerta para o facto de eu poder ter usado incorrectamente a figura do protesto, mas penso que deve utilizar os mesmos métodos em relação a todos os oradores intervenientes, designadamente o orador que -me antecedeu na formulação de um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, se acaso o orador que o antecedeu também foi expresso em afirmar que não ia protestar, eu naturalmente alargo a esse mesmo orador as considerações que lhe fiz. Só por desatenção não me apercebi disso. Devo dizer, aliás, que sou a favor da vivacidade do debate, e penso até que o sistema do pedido de esclarecimento e do protesto pode evoluir para o estilo de contestação, da réplica e da tréplica, mas enquanto tivermos estas figuras regimentais, pelo menos, devemos salvaguardar as aparências e não invocar a figura do protesto para, logo em seguida, se dizer que não se vai protestar. É só isto que se deve evitar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino para exercer o direito de defesa relativamente a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Jorge Lemos ao Sr. Deputado Magalhães Mota.

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O Sr. José Vitorino (PSD): - Já começam a ser usuais nesta Assembleia as más compreensões, ou as más interpretações do que se passa nas reuniões de líderes. Eu não quero fazer processos de intenção, mas de qualquer maneira isto começa a ser preocupante.
O Sr. Deputado Jorge Lemos referiu que a maioria, e designadamente o PSD, tinha estado de acordo com o agendamento do projecto de lei n.º 45/III, e isso é uma falta de verdade.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, não é!...

O Orador: - E eu gostaria de ver, da parte da bancada do PCP, e nomeadamente do Sr. Deputado, até por relações que se devem gerar nas reuniões de líderes, uma posição de rigor em relação àquilo que aí se passa. Aliás, sobre esta matéria nunca houve equívocos: assim, da primeira vez que o problema foi posto nós pronunciámonos contra o agendamento e dissemos que, se o Sr. Presidente quisesse agendar o projecto de lei n.º 45/III, nós não poderíamos impedir esse agendamento. Mas desde logo declarámos que o PSD e o PS iriam impugnar esse agendamento. Esta foi a primeira fase do processo, e não há aqui nenhuma descortesia nem nenhuma deslealdade em relação ao Sr. Presidente.
Na segunda fase do processo, quando a questão foi novamente posta para se saber quando é que se havia de agendar o projecto de lei n .º 45/III o que nós dissemos foi que não havia razão para o desagendar mas voltámos a referir que o iríamos impugnar. Portanto não é verdade que tenhamos alguma vez estado de acordo com o agendamento do projecto de lei n.º 45/III.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, para dar explicações.

O Sr. Jorge (Lemos (PCP): - Eu creio que, sobre esta matéria, não vale a pena prolongarmos muito o debate, mas tenho presente que na conferência em que o Sr. Presidente decidiu, ao abrigo de um direito constitucional, fixar a ordem do dia, fê-lo com o acordo de todos os grupos e agrupamentos parlamentares. Lembro-me inclusivamente de um deputado da maioria ter dito: "Não nos opomos ao agendamento, mas na altura própria impugnaremos a ordem do dia. Mas o que saiu da conferência de líderes, por consenso, foi que ninguém se opunha ao agendamento,...

O Sr. José Vitorino (PSD): -Não é verdade!...

O Orador: - .. . com a ideia de que depois, no uso dos seus direitos regimentais, cada partido impugnaria, se o entendesse. Mas houve consenso - e a questão foi ontem colocada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, e bem, e o Sr. Presidente firmou-o novamente - pois ninguém se opôs a que a matéria fosse incluída na ordem do dia. Logicamente - e o Sr. Deputado José Vitorino certamente não me desmentirá o PSD reservou-se o direito e informou a conferência que iria impugnar, mas não se opôs à fixação daquela ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, talvez competisse ao Presidente da Assembleia dar uma informação nessa matéria. Simplesmente, quem presidiu a essa conferência foi o Sr. Presidente Tito de Morais. Eu vim abrir a sessão em sua substituição e, por conseguinte, a Mesa não está em condições de se pronunciar sobre essa matéria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Eu estive na reunião de líderes da semana passada aquando do agendamento do projecto de lei da ASDI, e da lei da segurança interna. Nós sempre nos opusemos àquele agendamento, mas o Sr. Presidente entendeu que o devia agendar. Assim, agendou de facto o projecto da ASDI e igualmente a lei da segurança interna para quarta e quinta-feira. Isto foi o que se passou nessa reunião, embora não saiba o que se passou nas reuniões posteriores às quais já não assisti. Contudo, o nosso partido sempre se opôs aquele agendamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes, para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, pretendia começar por dizer que me atrasei por razões de serviço e portanto não pude estar presente à hora regimental de início da sessão.
Queria, no entanto, dizer que creio que esta matéria está já suficientemente esclarecida e queria também desde já rectificar uma afirmação que ontem aqui foi produzida pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, que teve a amabilidade e a gentileza de depois, mais tarde, vir ter comigo e dizer que lendo melhor o texto das minhas declarações não era assim como ele entendia. Assim, depois de ler aquilo que consta do Diário, verifica-se que aquilo que tinha sido considerado como uma interrogação do Sr. Presidente não era de facto uma interrogação, mas uma afirmação. É, de facto, o que lá consta, foi de facto uma afirmação, daí que não tenha havido necessidade de fazer mais nada, até porque ninguém se opôs.
O Sr. Presidente entendeu claramente que se tratava de um recurso e, por conseguinte, disse seguidamente - o que também consta do Diário - "em face do recurso interposto, a agenda da ordem do dia para amanhã é a seguinte ... ", mencionando o recurso.
Creio portanto que isto está esclarecido. Aliás, ontem o Sr. Deputado Magalhães Mota interpôs recurso dessa decisão. Ora, se assim não fosse não haveria esta necessidade e teríamos estado aqui a perder tempo com esse recurso.
O que se procura efectivamente é protelar, protelar e estarmos aqui as 2 horas da primeira parte da ordem de trabalhos.
Quanto aos fundamentos, já os refen. Por solicitação da Mesa repito, da Mesa - e do Sr. Deputado Narana Coissoró, recordei novamente esses fundamentos, os quais foram explicitados, a propósito do curso pelo meu colega de bancada Fernando Condesso. Creio, assim, que a matéria está mais que esclarecida.
Porque a matéria está mais do que esclarecida, não prqlongaremos mais este debate, a manos que surja algum pedido de esclarecimento que efectivamente aborde qualquer assunto que não tenha sido ainda analisado.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, perante o que V. Ex.ª acaba de dizer, cumpre-me informá-lo de que os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e Jorge Lemos não prescindem de usar da palavra para lhe formularem pedidos de esclarecimento, na sequência da rememoração que V. Exª fez das suas declarações iniciais ontem, neste Plenário, mas, como é óbvio, V. Ex.ª responderá ou não conforme entender. Essa é uma faculdade sua.
Agora gostaria que o Sr. Deputado Narana Coissoró esclarecesse a Mesa das razões por que pede a palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, é para confirmar e dar um esclarecimento sobre aquilo que o Sr. Deputado Marques Mendes acabou de dizer.
É que efectivamente ontem, depois da minha intervenção, procurei o Sr. Deputado Marques Mendes e mostrei-lhe as duas leituras que o que ficou registado no Diário pode ter: uma como sendo interrogativa e outra como sendo afirmativa.
Portanto, não admiti imediatamente que não era interrogativa. Nessa altura ele apresentou-me outros argumentos para me convencer de que aquilo seria uma afirmação e não uma interrogação, argumentação a que não respondi. Admiti simplesmente - e continuo a admitir -que o que consta do Diário tem as 2 interpretações que já refen.
Daí que eu não possa, de forma alguma, negar qualquer das 2 interpretaçães.
Era apenas isto que queria dizer, Sr. Presidente, e agradeço-lhe o ter-me permitido fazê-lo.

O Sr. Presidente: -Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Corregedor João da Fonseca(MDP/CDE): Sr. Deputado Marques Mendes, V. Ex.ª disse que já estava tudo esclarecido, mas acontece que a fundamentação que apresentou anteontem tem apenas 6 linhas no texto do Diário da Assembleia da República, nas quais diz não aceitar este agendamento por não constar da deliberação da Assembleia por considerar que não há conexão com a denominada proposta de lei de segurança interna. É evidente que não bastam esses argumentos e daí que eu lhe vá colocar algumas questões, a que responderá se entender.
Assim, a primeira pergunta é esta: Sr. Deputado Marques Mendes, considera ou não que o Sr. Presidente da Assembleia da República marcou para a ordem do dia o projecto de lei n º 45/III, em total respeito pelo arrtigo 179 º da Constituição?
Foi ou não a ordem do dia fixada obedecendo às prioridades de matérias definidas no Regimento?
A haver impugnação da marcação, ela deveria ser fundamentada no desrespeito pela prioridade regimental. Pergunto-lhe, pois, Sr. Deputado Marques Mendes: onde houve desrespeito pela prioridade regimental?
Verifica-se ou não, Sr. Deputado Marques Mendes, que essa marcação foi feita respeitando precisamente a prioridade regimental, como a ASDI havia solicitado e como muito bem entendeu o Sr. Presidente da Assembleia?
Qual é a interpretação de V. Ex.ª para o artigo 252º, alínea b), do Regimento, que considera também como prioridade a lei sobre o regime do estado de sítio e de emergência?

Sr. Deputado, neste momento e em nossa opinião, está determinada consitucional e regimentalmente a ordem do dia. Segundo o princípio de estabilidade da ordem do diia (artigo 66º, nº1, do Regimento), ela apenas pode ser preterida por deliberação da Assembleia sem votos contra. É ou não assim, Sr. Deputado?
Já agora, faço-lhe outra pergunta para a qual gostaria de ouvir uma resposta. A propósito do início deste debate, houve aqui um Sr. Deputado de outra bancada que declarou que não admitia processos de intenção ao Governo. Acontece que anteontem o Sr. Deputado José Vitorino - e é pena que ele não esteja agora na bancada - me declarou pessoalmente, à entrada desta Câmara, que a única razão que levou o seu grupo parlamentar a impugnar a ordem do dia marcada pelo Sr. Presidente se ficava a dever ao facto de o Governo estar interessado em apresentar na próxima Sessão Legislativa uma proposta de lei de conteúdo idêntico. Mas disse mais: lá para Outubro, princípios de Novembro, nós teremos cá essa proposta de lei.
Sr. Deputado Marques Mendes, foi ou não foi essa a verdadeira razão que levou o PSD a impugnar a ordem do dia marcada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República?

O Sr. Presidente: -Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que nós mantivemos a inscrição para pedir esclarecimentos porque a maioria, concretamente o PSD, sobre a questão da impugnação da ordem do dia praticamente disse zero e era bom que, numa matéria de tão grande importância, não pudessem restar dúvidas sobre a razão ou falta de razão da impugnação que o PSD pretende fazer da ordem do dia marcada.
Passando agora aos pedidos de esclarecimento, quero dizer, parque é bom que fique registado, que quem perturbou o debate, que quem perturbou o normal funcionamento da Assembleia da República não foram os partidos da oposição mas, sim, a maioria ao interpor recurso de uma decisão do Sr. Presidente tomada nos termos constitucionais e regimentais.
Do que pudemos ver da fundamentação feita, ou da falta de fundamentação, dos motivos que invoca para impugnar a ordem do dia, eles seriam 2: em primeiro lugar, a matéria não está contemplada na resolução aprovada para o prolongamento da sessão legislativa e, em segundo lugar, a matéria não tem conexão com a proposta de lei de segurança interna.
Creio, Sr. Deputado Marques Mendes, que a sua argumentação não colhe.
Em primeiro lugar, o ponto 6 º da Resolução prevê que neste prolongamento do período normal de funcionamento da Assembleia possam entrar e ser agenciadas quaisquer outras matérias cuja urgência justifique o seu agendamento e creio, Sr. Deputado Marques Mendes, que as urgências não podem ser definidas ou pela maioria ou pela oposição. A ser assim, cairíamos no livre arbítrio. As urgências estão definidas no Regimento e estão-no precisamente no quadro das prioridades que têm de ser respeitadas pelo Sr. Presidente da Assembleia da República quando marca as ordens do dia.
Ora o Sr. Deputado Marques Mendes certamente não ignora que uma das prioridades que tem assento

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regimental é precisamente a matéria sobre o estado de sítio e o estado de emergência. Era bom que o Sr. Deputado Marques Mendes lesse o artigo 252º do Regimento, concretamente a alínea b), para que não restassem dúvidas sobre essa matéria.

Quanto ao segundo argumento, ele também não colhe. É porque o vir-se aqui dizer que se impugna a admissibilidade e a inscrição na ordem do dia do projecto de lei nº 45/III, porque ele não tem relação com o que se está a discutir das duas uma, Sr. Deputado Marques Mendes: ou o PSD, na pressa de impugnar, não leu com cuidado a proposta de lei de segurança interna ou está a tentar fazer do resto da Assembleia um conjunto de tolos, que não leram a proposta de lei de segurança interna. E que, lendo a proposta de lei, é o seu artigo 34 º que diz: "Os regimes de estado de sítio e de emergência serão regulados por lei especial". Ou seja, Sr. Deputado Marques Mendes, é a própria proposta de lei que aponta para a necessidade de existência de uma lei sobre o estado de sítio e o estado de emergência. Então, e V. Ex.ª vem-nos aqui dizer que a matéria não está conexionada e que por isso o projecto de lei apresentado pela ASDI não deve ser agendado?!...
Sr. Deputado Marques Mendes, em face das interrogações que lhe deixo, eu gostaria que, de uma vez por todas, o PSD explicasse as razões de fundo que o levaram a apresentar a impugnação da ordem do dia.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito breve, pois, como já havia dito, não vou entrar de novo em problemas que já aqui foram explanados.
Mas, para que nem o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca nem o Sr. Deputado Jorge Lemos possam dizer que não tive para com eles a delicadeza que qualquer colega desta Assembleia me merece, vou tecer algumas considerações.
Relativamente ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca e a propósito do facto de a fundamentação da impugnação ser apenas de 6 linhas, começarei por adiantar que não é por muito se dizer nem por muito se escrever que se tem mais razão.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado mede as razões pela quantidade, pela extensão, pois bem..., esse é um critério que é seu e que ficará com V. Ex.ª
Quanto à questão do desrespeito pela prioridade regimental - e este foi um ponto abordado também pelo Sr. Deputado Jorge Lemos-, direi que VV. Ex.as talvez não atendam àquilo que foi dito. Nós estamos, ao abrigo de uma resolução, numa sessão suplementar, e ao abrigo dessa mesma resolução estão definidas as matérias a debater.
Invocou o Sr. Deputado Jorge Lemos que o n º 6 da citada resolução fala em qualquer matéria urgente que se justifique. Ora bem, um problema pode colocar-se: quem é que justifica?

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - É o Regimento!

O Orador: - Não, não é o Regimento! Se fosse o Regimento, ter-se-ia dito "nos termos das prioridades regimentais". No entanto, não foi isso que se disse, mas sim que era necessário que se justificasse a urgência.
Voltando ao que disse o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, gostava de salientar gue não sei que conversa pessoal porventura terá tido com o meu companheiro José Vitorino, pelo que, sobre essa matéria, ele se pronunciará. De facto, não costumo andar a escutar as conversas dos outros.
Sr. Deputado Jorge Lemos, devo dizer que, em relação à expressão por si usada "se os outros são tolos", eu não me considero em tal situaçção, como não qualifico nenhum deputado desta Assembleia nesses termos. Se V. Ex.ª assim julgou, o problema é seu e, se me quis atingir, devolvo à procedência.

Vozes do PCP: - Devolva, devolva!

O Orador: - Sr. Deputado, tenho que dizer que VV. Ex.as entenderam tão bem, tão bem os fundamentos do recurso que já ontem o Sr. Deputado Carlos Brito no pedido de esclarecimento ao meu companheiro Fernando Condesso e, hoje, V. Ex.ª nestas perguntas referiram exactamente estes mesmos pontos e justificaram que, por um lado, era urgente e, por outro, havia conexão. Logo, perceberam perfeitamente a fundamentação. Não podem dizer que a não perceberam, não podem dizer que não está fundamentada, porque tanto a perceberam que até a rebateram. Ora, não se rebate aquilo que não se percebe, não há maneira de se rebater aquilo que se não percebe.
Se há conexão só porque um determinado preceito que V. Ex.ª referiu diz que o estado de sítio e o estado doe emergência serão regulados par lei especial, se só isso é conexão, bom, é um critério de V. Exª que eu respeito. Se se diz que serão regulados por lei especial, então a conexão não existe para ser debatida em conjunto, já que para haver conexão num debate em conjunto é necessário que a matéria vise o mesmo objecto.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O .Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, o que V. Ex.ª disse em resposta aos pedidos de esclarecimento da minha bancada é extremamente grave, porque nunca tínhamos ouvido - e ouvimos agora a um deputado do PSD dizê-lo pela primeira vez - que quem define o que é urgente nesta Casa não é o Regimento, mas sim, caso a caso, a maioria de um determinado momento.
Isto é extremamente grave, Sr. Deputado Marques Mendes, porque se há coisa que deve interessar aos deputados desta Casa é saber as leis por que se regem. E as leis por que se regem estão inscritas no Regimento da Assembleia da República, o qual tem um processo de revisão próprio, e não pode ser através de uma resolução votada à pressa que se revê essa mesma disposição regimental. Relativa às prioridades,aliás, definidas no Regimento.
E não podemos sair daqui, Sr. Deputado Marques Mendes, pois: o Regimento fixa prioridades e essas prioridades têm que ser cumpridas. Se o Presidente

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as viola, nós temos todo o direito de recorrer; mas se o presidente as cumpre -como aconteceu neste caso -, temos o direito de acatar as normas regimentais.
Quanto à segunda questão, a conexão que existe é tão evidente que quase dispensa comentários. De facto, é o próprio objecto que está em discussão. O Governo traz uma proposta de lei em que visa criar um Estado de excepção limitativo de direitos e liberdades dos cidadãos e a Constituição define claramente que os casos em que podem ser limitados os direitos e as garantias dos cidadãos são o estado de sitio e o estado de emergência.
Daí que não possamos entrar na criação de estados de excepção não previstos constitucionalmente antes de termos regulado a figura constitucional do estado de sitio e do estado de emergência. A conexão é o próprio objecto da discussão, Sr. Deputado Marques Mendes.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedop da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Marques Mendes, muito obrigado pelas respostas que me deu, mas houve algumas explicações que não forneceu, como por exemplo qual a interpretação que dá ao artigo 252 º, alínea b), do Regimento.
Por outro lado, V. Ex.ª disse que a resolução da Assembleia da República que decidiu pela prorrogação desta sessão legislativa até ao dia 14 de Julho (mas, ao que parece, vai até ao dia 27) não contempla esta matéria.
Gostava de lhe pedir o favor de interpretar o artigo 6 º dessa resolução, que diz "qualquer outra cuja urgência justifique o seu agendamento". Como é que o interpreta?
Já agora, pergunto-lhe como entende o facto de estarem marcadas para hoje as eleições da CNAEBA. Será esta uma matéria urgente que esteja contemplada na resolução adoptada no dia 14 de Junho?

Vozes do CDS: -Boa!

O Orador: -Nós entendemos, Sr. Deputado, que aquilo que se passa com a CNAEBA é verdadeiramente escandaloso. Essa comissão já devia ter sido eleita e estar a funcionar há meses, porque tem uma missão fundamental neste país. V. Ex.ª entende que é uma matéria urgente que está abrangida pela resolução que nós adoptámos no dia 14 de punho?

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): -O Sr. Deputado Jorge Lemos quis pôr na minha boca uma afirmação que eu não fiz. Diz que é extremamente grave afirmar que o Regimento não se aplica. Eu não disse isso. O que disse é que o n.º 6 da resolução permite agendar qualquer matéria que, pela sua urgência, se justifique.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Posso interromper, Sr. Deputado?

0 Orador: - Faça favor.

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado, teremos de convir que a determinação da urgência -e V. Ex.ª estará certamente de acordo comigo - só pode advir do que diga a lei que rege esta Casa; ou V. Ex.ª considera que seria aceitável que o que está escrito nesta resolução fosse lido da seguinte maneira: qualquer outra matéria que a maioria entenda dever ser discutida?
É isto que a maioria pretende ler no n º 6 da resolução?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso mesmo, esse é que é o problema!

O Orador: - Não, Sr. Deputado Jorge Lemos. A urgência ou matéria urgente, tal como a entendo, é aquela cujos factos se justificam realmente pela sua natureza, ou pelo que for, como urgentes. Quem o considera como urgente, pergunta o Sr. Deputado? O Regimento faz um enquadramento, faz a parte processual do debate, etc. Não tem nada a ver uma coisa com a outra, visto que pode haver uma determinada prioridade que neste período suplementar venha a ser considerada, pelas mais diversas razões, muito mais urgente do que outras questões. Não esqueçamos que estamos numa sessão suplementar.
Portanto, há que distinguir a urgência quando se trata de factos que, pela sua natureza ou por quaisquer outras razões, efectivamente justifiquem o seu agendamento.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quem o define?

O Orador: - Quem o define? Está no Regimento: é a conferência de líderes e o Sr. Presidente. Mas é igualmente óbvio que se pode discordar das decisões tomadas nessa sede e, portanto, proceder-se ã impugnação.
Sr. Deputado, V. Ex.ª tem o seu critério, que eu respeito, mas tem que respeitar e habituar-se a respeitar os critérios dos outros. Se o Sr. Deputado quer, com o seu critério, impor a verdade, tenha paciência mas não o pode fazer. Ninguém tem a verdade absoluta ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O que os senhores estão é a violar o Regimento!

O Orador: - ... e por isso é que funciona a regra das maiorias.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Ora essa!

O Orador: -Às vezes os Srs. Deputados até têm razão. Nós muitas vezes até vos damos razão, quando a têm ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É o caso!

O Orador: - ..., o que não acontece muitas vezes, mas enfim!
O meu contraprotesto em relação ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca justifica-se por ter dito, embora por outras palavras, aquilo que tinha acabado de dizer o Sr. Deputado Jorge lemos.

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Quanto à interpretação do Regimento devo dizer, Sr. Deputado, que não estamos aqui em lições de Regimento ou em lições de outra natureza.
Quanto à CNAEBA, não sei o que se passou, mas suponho que o Sr. Presidente, de acordo com o estabelecido na conferência de líderes, entendeu que era urgente agendar essa eleição. Além disso, é uma matéria que não interfere sequer na ordem de trabalhos, visto que é uma eleição que se faz em simultâneo com o decurso normal dos trabalhos.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador:- Tenha a bondade.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): O Sr. Deputado acabou de dizer que o Sr. Presidente entendeu por bem agendar.

O Orador: -Não, não disse isso. O que afirmei foi que o Sr. Presidente o fez de acordo com o estabelecido na reunião de líderes.
lá no que diz respeito à outra, houve logo desacordo de dois partidos, como há pouco foi referido. Aliás, na acta dessa reunião vinha a menção de que o PS e o PSD iriam impugnar. Daí que desde logo tenham surgido dúvidas quanto a esse agendamento.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca fez aqui algumas afirmações, em relação às quais eu diria que, por uma questão de ética e de princípios, não tenho por hábito invocar ou divulgar o tear de conversas informais ou particulares, pelo alto valor que lhes atribuo nas relações humanas e entre os indivíduos.

Por isso mesmo, não confirmo nem desminto aquilo que o Sr. Deputado disse quanto a eventuais causas que teriam levado à impugnação do projecto de lei n.º 45/III.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Por variadas vezes, o Sr. Deputado Marques Mendes referiu, nas suas sucessivas intervenções, o período suplementar de funcionamento da Assembleia da República.
Ora, pediria à Mesa que proceda à leitura do artigo 177 º da Constituição, de modo a recordar a todos os Srs. Deputados que já não há nenhum período suplementar de actividade da Assembleia da República e que, portanto, toda a argumentação que pretenda basear-se num período suplementar é inválida.

Vozes do PCP e do deputado da UEDS Lopes Cardoso: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Magalhães Mota deveria ter-se inscrito para uma intervenção ou para exercer uma outra figura regimental. Sem avaliar a pertinência das suas declarações, julgo que não foi adequada a figura que utilizou.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que quase tudo já foi dito neste debate, pelo que vou procurar ser o mais breve possível, apenas para marcar a posição de um grupo parlamentar nesta matéria.
Vou deixar de lado, portanto, questões como a de saber se o recurso foi ou não interposto, a de saber se, no caso de ter sido efectivamente interposto, foi ou não tempestivamente interposto, a de saber se fora do período normal de funcionamento da Assembleia (e não em sessão suplementar, como se tem dito) há regras diferentes para a fixação das ordens do dia.

Sendo assim, vou procurar concentrar a minha argumentação apenas quanto a um dos fundamentos do recurso: o de não haver conexão. Aliás, os recorrentes, que disseram não haver conexão pela voz do Sr. Deputado Marques Mendes, não explicaram por que motivo não havia conexão.

Nós entendemos que há conexão. Há, em primeiro lugar, conexão objectiva, porque em ambos os casos -quer no caso de regime de estado de sitio e do estado de emergência, quer no caso da lei de segurança interna- a matéria nuclear de que esses 2 diplomas se irão ocupar tem a ver com os direitos fundamentais.

No caso do regime do estado de sítio e do estado de emergência, trata-se da suspensão dos direitos fundamentais. A Constituição regula com extrema minúcia as condições em que pode ser declarado o estado de sitio e o estado de emergência e regula ainda a forma pela qual são suspensos os direitos, liberdades e garantias, estabelecendo, inclusivamente, os direitos que não podem ser alvo de suspensão.
No caso da lei de segurança interna, o que se pretende é, perante situações excepcionais, habilitar o Estado afazer face a novas formas de criminalidade organizada, entendendo-se que essa nova tarefa do Estado tem que exigir, a título excepcional e em condições definidas por lei, a existência de algumas limitações ao exercício de alguns direitos.
Há aqui, claramente, uma conexão entre estes 2 diplomas.
Haverá ainda uma segunda conexão objectiva que tem a ver com o questão extremamente relevante do papel das Forças Armadas em ambas as circunstâncias.
Nós sabemos que a Constituição declara, no n.º 6
do artigo 275º, que a lei regulará o emprego das
Forças Armadas na vigência do estado de sítio e do
estado de emergência; sabemos também que a missão
que constitucionalmente está atribuída às Forças Ar
madas é a defesa militar da República. Será, portanto,
um problema relevante o saber em que condições é
que as Forças Armadas poderão ou não ser utilizadas
em matérias que tenham a ver cor n a segurança in
terna e, portanto, em casos excepcionalmente defi
nidos na lei.

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Este será, quanto a mim, o segundo ponto de convergência objectiva entre estas funções.

Mas existe também aquilo que eu, talvez um pouco impropriamente, pudesse chamar como uma convergência subjectiva.

Todos estamos recordados que, quando o Governo invocou a urgência para a necessidade da discussão da sua proposta de lei de segurança interna, o fundamento dessa urgência residia no facto de o Estado de direito democrático se poder encontrar desarmado face a uma situação grave provocada pela emergência de novas formas de crime organizado, sobretudo o terrorismo.

Ora, se o Governo considera que o Estado democrático pode estar desarmado nessas circunstâncias, cabe aqui perguntar se não considera também o Governo que, ao não ser elaborada por esta Assembleia uma lei reguladora do estado de sítio e do estado de emergência, o Estado pode estar também desarmado, e talvez em circunstâncias muito mais gravosas como são os casos em que pedem ser decretados o estado de sítio e o estado de emergência, os quais vêm determinados no nº 2 do artigo 19º da Constituição os casos "de agressão afectiva ou iminente por forças estrangeiras, de grave ameaça ou perturbação da ordem constitucional democrática ou de calamidade pública".

Tudo isto nos leva a considerar que existe uma clara conexão entre as matérias reguladas par ambos os diplomas e que, além disso, além de existir uma clara conexão, existiria também, do nosso parto de viste, todo o interesse político em que as matérias pudessem ser reguladas simultaneamente.
Não vemos mesmo qual é, afinal, o fundamento que o Governo e a maioria que o apoia passam ter para não estarem interessados em que a discussão se faça conjuntamente.
Não querendo, obviamente, fazer qualquer processo de intenção e recusando-me mesmo a admitir que este Governo, de que nós somos oposição mas que consideramos ser um Governo democrático, queira efectivamente não regular o estado de sítio e o estado de emergência para atingir os mesmos efeitos que se podem atingir através do decretar desses estados de excepção em circunstâncias normais, recusando-me a admitir isso; penso que, provavelmente, o Governo e a maioria não querem a discussão neste momento apenas porque não existe uma proposta de lei do Governo sobre esta matéria e porque este considera que numa matéria tão importante tinha a obrigação - como efectivamente pensamos que tinha- de ter já apresentado a esta Câmara uma tal proposta de lei.
Mas o facto é que não o fez - e não o fez durante um lapso de tempo bastante longa - e esta Câmara tem um projecto de lei apresentado pela ASDI que a generalidade dos grupos e agrupamentos parlamentares sempre consideraram ser um óptimo projecto de diploma.
Dai que não se compreenda que estas matérias- o estado de sítio e o estado de emergência - não possam ser discutidas neste momento, partindo-se do projecto de lei da ASDI, que, como todos os projectos ou propostas de lei, pode ser modificado e aperfeiçoado em consequência das discussões na generalidade e na especialidade, discussões essas em que o Governo poderia participar, trazendo aqui as suas sugestões.

É esta, realmente, a questão política que está por detrás do problema jurídico-constitucional que aqui se tem discutido acerca do agendamento deste diploma na ordem do dia.

Não se compreende que as urgências que são sentidas para uma coisa não sejam sentidas para outras porventura mais importantes. Sobretudo, não se compreende que, em matérias onde havia toda a vantagem para toda a gente em serem discutidas em conjunto, a Assembleia e, sobretudo, o País, por uma simples razão de prestígio -parque não houve iniciativa do Governo-, vão ser prejudicados.
Esta é também uma razão política para votarmos contra o recurso interposto pela bancada do PSD e ao qual, de certo modo, o Partido Socialista aderiu.

Aplausos do CDS, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP):- Sr. Deputado Luís Beiroco, ouvi com toda a atenção a intervenção que acaba de produzir e na qual aduziu mais uns quantos argumentos importantes para clarificar o seguinte: há conexão material óbvia entre a discussão das diferentes iniciativas legislativas relacionadas com a segurança interna e a protecção civil e o projecto de lei apresentado pela ASDI que visa regulamentar o estado de sítio e o estado de emergência.
Uma questão que se levanta é a de saber, tendo como referência o n.º 3 do artigo 19 º da Constituição - que prevê que o decreto do estado de sítio e do estado de emergência estabeleça com bastante rigor o elenco preciso de limitações às liberdades públicas, os contornos do quadro legal restritivo nascido desse tipo de situação anómala da vida democrática-, se pode ou não pode ser contrabandeada, numa lei de segurança interna e de protecção civil, uma amálgama de normativos, que seriam sempre inconstitucionais muito embora haja quem os vise introduzir, que acabariam por, na prática, consolidar um estado de sítio e um estado de emergência à revelia de uma qualquer legislação adequada, desde logo constitucionalmente conformada, com os perigos daí derivados para a democracia no nosso país.
Esta é uma questão que julgo pertinentíssima e que pode bem demonstrar, em certa medida, o carácter de conveniência da prévia discussão, não do decreto-lei, neste caso inexistente porque o Governo não agiu, mas do projecto de lei proposto pela ASDI para regulamentação do estado de sítio e do estado de emergóncia.

Um outro problema que se me suscita era o de apurar se o Sr. Deputado Luís Beiroco contesta as afirmações que têm vindo a ser produzidas, suponho que um pouco irresponsavelmente, ao longo desta manhã, segundo as quais se mantém na nomenclatura constitucional, no edifício constitucional português, no que toca à Assembleia da República, o regime da sessão suplementar legislativa.
A não existir uma tal figura, que obviamente me parece de todo em todo banida do nosso normativo constitucional, gostava de saber se será possível adoptar-se a constituição de um Regimento constritivo que

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acabe por redundar na existência de um verdadeiro "parlamento intermitente", castrado de muitas das suas faculdades, de muitas das suas possibilidades e, mais do que isso, peiado na legitimidade de intervenção na vida pública e na esfera legislativa. Para todos os efeitos, não constituirá isto uma óbvia afronta à entidade parlamentar e ao peso que o Parlamento joga no quadro das instituições democráticas à face da Constituição Portuguesa?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Beiroco, pretende responder já ou no final dos restantes pedidos de esclarecimento?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Luís Beiroco, a sua intervenção foi, como habitualmente, esclarecedora para o debate.
No entanto, neste conjunto de confusões que para aqui se têm travado, aparece um ponto (os outros, focá-los-ei na minha intervenção) que tem de ser esclarecido: o problema da conexão.
Tem sido dito aqui que não há conexão, mas eu pertenço ao número de pessoas que pensa que há conexão. Há efectiva e óbvia conexão entre a lei de segurança interna e outra coisa ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Até que enfim!

O Orador: - Não é até que enfim, Sr. Deputado. Eu sempre me tenho inibido de dizer a evidência, mas quando é necessário também a digo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Mas os seus parceiros é que fundamentaram o recurso dizendo que não há conexão!

O Orador: - O problema da conexão é evidente, Sr. Deputado!
Simplesmente a questão está em saber se há ou não há, na relação entre um diploma e outro, um problema diferente, qual seja -utilizando uma terminologia não totalmente exacta- o problema da questão prévia.
É ou não é absolutamente prévio, forma ou não forma uma questão prévia a discussão e a aprovação de uma lei do estado de sítio e do estado de emergência? Se se diz que forma uma questão prévia - e eu penso que não-, é evidente que a lei do estado de emergência tinha que ser previamente aprovada para depois poder haver uma lei de segurança interna. Penso que isto não é assim. Se, por acaso, se admite a simples conexão, que maniffestamente existe, mas não se admite a existência de dependência absoluta de uma questão prévia, então não fica condicionada a aprovação da lei anterior à discussão da lei de segurança interna. Quer dizer, mesmo havendo a conexão, que é patente, podem discutir-se separadamente e de forma diferenciada os dois diplomas.

Lembrando-me de um episódio da nossa vida comum, quando ambos frequentámos a Faculdade de Direito, posso estabelecer o seguinte paralelo: é desejável e necessário que o direito penal seja feito primeiro e o processo penal depois, mas pode acontecer, o que não traz grandes inconvenientes, que primeiro se faça exame de processo penal e depois exame de direito penal (não sei se se recorda destas discussões do tempo do 5º ano da Faculdade de Direito).
Penso que havendo essa conexão, que existe, repito, não há nem questão prévia nem subordinação absoluta, pelo que o Parlamento pode discutir as duas leis numa ordem diferenciada, ordem que o Grupo Parlamentar do PS pretende.
Quanto às outras questões importantes que foram levantadas, como foi o caso das suscitadas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota e por outros Srs. Deputados, responderei ou procurarei responder dentro da intervenção que pretendo fazer e para a qual me inscrevo desde já.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Luís Beiroco, dirijo-lhe um curto pedido de esclarecimento, uma vez que as questões de fundo já foram colocadas pelo meu companheiro de bancada, deputado José Manuel Mendes.
De qualquer modo, não deixaria de iniciar este pedido de esclarecimento referindo o facto de constatarmos que a maioria nos continua a espantar! Com efeito, a maioria, através do PSD e com o apoio do PS, apresenta um recurso sobre a inscrição de uma determinada matéria na ordem do dia, e um dos alegados fundamentos que invoca seria a não existência de conexão entre a proposta de lei de -segurança interna e o projecto de lei de estado de sítio e de estado de emergência.
Hoje, porém, um dos subscritores desse recurso vem-nos dizer que, afinal, acha que há conexão!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Não é um subscritor, Sr. Deputado!

O Orador: - Se não é subscritor, pelo menos, apoia-a!
De qualquer forma, a questão que queria colocar ao Sr. Deputado Luís Beiroco era esta: definido que está - e "clarinho" - em termos constitucionais que a Assembleia da República não funciona intermitentemente (e creio que ninguém questionou este ponto) considera ou não o Sr. Deputado que, quando a Assembleia vota uma resolução no sentido de alargar ou de prolongar o seu período normal de funcionamento e quando inscreve nessa resolução algo como um ponto 6º dizendo que "será inscrita na ordem do dia qualquer outra matéria, cuja urgência justifique o seu agendamento", a única leitura possível é de que a urgência tem de ser aferida em termos regimentais, ou seja, tendo em conta as prioridades e as urgências que o próprio Regimento estabelece?
Considera ou não V. Ex.ª que uma leitura diferente desta viria distorcer as normas democráticas de funcionamento da Assembleia e permitir a uma qualquer maioria que, caso a caso e de acordo com o seu

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interesse, fizesse agendar as matérias que pretendia ver discutidas e impossibilitar aquelas que os outros agentes parlamentares, no quadro do Regimento, entendiam ser urgentes e prioritárias para o regime democrático?
Era esta a questão que lhe queria colocar, Sr. Deputado Luís Beiroco.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder às questões que lhe foram formuladas, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. (Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar por responder ao Sr. Deputado José Manuel Mendes e de me referir à primeira questão que colocou, ou seja, a de saber se, através de uma lei de segurança interna, se pode afinal vir regular as matérias que o n.º 3 do artigo 19º da Constituição contempla para o caso do regime do estado de sítio e do estado de emergência.
É evidente que pode, Sr. Deputado, só que, nesse caso, a lei que o fizesse seria totalmente inconstitucional, porque, como é óbvio, nenhuma lei fora do regime do estado de sítio ou do estado de emergência, sejam quais forem as circunstâncias, pode suspender direitos fundamentais.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Admitimos que, em circunstâncias excepcionais e de acordo com princípios de necessidade e de proporcionalidade, possa haver limitações do seu exercício sempre que houver conflitos ou colisões de direitos; porém, não admitimos, em caso nenhum, que fora dos regimes de estado de sítio ou de estado de emergência possa haver suspensão dos direitos fundamentais.

Vozes do CDS- Muito bem!

O Orador: - Segunda questão: o Sr. Deputado José Manuel Mendes perguntou-me a opinião sobre se, depois da revisão constitucional de 1982, se mantém ou não a figura da sessão suplementar.
Bom, eu entendo claramente que não, pois ficou bem definido que o período de funcionamento da Assembleia é de um ano, com um período normal de trabalhos entre 15 de Outubro e 15 de Junho. O que pode existir, em meu entender, é o prolongamento do período normal de funcionamento, mas não há sessões suplementares. E, não as havendo, é evidente que também não podem existir dois Regimentos, dois tipos de normas regimentais ou dois capítulos do Regimento: um para as sessões normais e outro para as sessões suplementares.
Em relação ao que disse o Sr. Deputado José Luís Nunes, começo por me congratular muito que o Sr. Deputado tenha reconhecido haver, realmente, conexão!

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Dá-me licença, Sr. Deputado Luís Beiroco?

0 Orador: -Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Ó Sr. Deputado, eu até devia sublinhar o seguinte: há conexão entre isso que disse e outras coisas como, por exemplo, entre a reforma do Código de Processo Penal e a legislação de polícias, conexões há!

O Orador: -Quanto à outra afirmação que o Sr. Deputado José Luís Nunes fez, ou seja, sobre a questão de saber se o regime do estado de sítio e do estado de emergência é uma questão prévia relativamente a uma lei de segurança interna, queria dizer que é evidente que considero que não o é, pois não há uma relação de subordinação entre uma matéria e outra.
O que existe, na nossa opinião, é toda a vantagem política, dadas as muitas conexões materiais existentes, em que essas matérias sejam discutidas em conjunto, pois há um certo número de soluções que podem ser muito melhor ponderadas e muito mais afinadas se estivermos deparados com ambos os problemas e a legislar para ambas as situações, do que se fizermos a lei de segurança interna e formos só depois regular a lei do estado de sítio e do estado de emergência.
Portanto, estamos aqui inteiramente de acordo.
Agora quero recordar ao Sr. Deputado José Luís Nunes que eu estava a argumentar contra os fundamentos de um recurso, e esse fundamento é a não existência de conexão!

O Sr. Jorge (Lemos (PCP): - É isso!

O Orador: - Ninguém colocou como fundamento do recurso essa outra questão e, pela minha parte, tenho que argumentar contra ele. Só que não disponho de certos dons de poder saber quais são as intenções dos recorrentes e os seus fundamentos, para além daquilo que afirmaram.

O Sr. José (Luís Nunes (PS): - Dá-me licença que o interrompa de novo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - V. Ex.ª permita-me fazer uma nota muito breve: é que, num recurso, o próprio Tribunal pode dar provimento ao recurso com uma argumentação jurídica e de direito diferente da expendida pelo recorrente.

O Orador: - É verdade, Sr. Deputado, mas então temos de considerar que neste caso, e já numa fase adiantada deste debate, houve, realmente, da parte dos apoiantes uma ajuda aos recorrentes. Registamos!
Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lemos que me põe o problema de saber, face à resolução e ao seu ponto 6º, como é que a urgência deve ser apreciada, gostaria de dizer duas coisas.
Em primeiro lugar, penso que a Assembleia da República e, nomeadamente, o Plenário da Assembleia da República, pode, ao determinar a prorrogação dos trabalhos, pode estabelecer prioridades. Aliás, não faz sentido que seja de outra maneira!
Mas é evidente que, uma vez que nessa resolução se inclui um ponto em que se diz "outras matérias

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cuja urgência seja considerada», para aferir em concreto as matérias que podem ou não, em cada caso, serem consideradas urgentes, terão de ser seguidos os critérios que constam do Regimento, porque não há dois regimentos. Há um Regimento em vigor e é a esse que todos nos devemos ater!

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Seguindo a ordem de inscrições, para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois do debate aqui travado e sobretudo depois de brilhantíssima intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota, lembro-me a despropósito - como o Sr. Deputado Magalhães Mota vai ter a bondade de notar, absolutamente a despropósito - as palavras que foram usadas pelo advogado de Dreyfus no julgamento em que foi condenado.
É que, perante uma acusação perfeitamente desmesurada e sem sentido - e diante da gravidade dessa acusação -, ele dizia: «Chegou o momento em que o meu constituinte vai ter que se defender das terríveis acusações que sobre ele impendem!»
E digo isto, apesar de o Sr. Deputado Magalhães Mota não Ter feito terríveis acusações e nem nós estarmos na situação de réus nem tão-pouco a nossa posição ser anti-regimental ou indefensável!
O debate foi extremamente esclarecedor e quero sublinhar que foi dos melhores debates a que tenho assistido nesta Assembleia e dos mais profundos. Vamos, portanto, tentar situá-lo como deve ser.
Em primeiro lugar, vamos pôr de lado os processos de intenção no sentido de saber se o Governo quer «contrabandear», quer violar... - a Assembleia, claro -, etc.

Risos.

Esses problemas não estão em causa, pois não se fazem debates parlamentares com base em processos de intenção! O que o Governo quer e deve querer - e é minha convicção de que é essa a sua vontade - é respeitar a Assembleia da República e a Constituição. Mas aqui o que me preocupa é respeitar também a Assembleia e a Constituição, pois o Governo não me dá conta das suas intenções sobre esta matéria. E preocupa-me, ainda, sobretudo, respeitar o Regimento.
Afastado esse conjunto de fantasmas, vamos ver, muito brevemente, o que é que se deve pensar acerca destas matérias.
Em primeiro lugar, é evidente que a figura da sessão extraordinária foi retirada da Constituição. Isso é evidente! No entanto, o Sr. Deputado Luís Beiroco trouxe aqui um problema importante que eu gostaria de desenvolver.
É que, quando é convocada uma sessão, e aqui importa lembrar que não se trata de uma sessão suplementar, como foi dito por certas bancadas que se opõem à nossa posição, mas sim de um prorrogamento da Sessão Legislativa, embora não seja unívoca a precisão terminológica, portanto, dizendo melhor, quando há um prorrogamento da sessão relativamente à sessão extraordinária, podem-se dar 3 factos.
Em primeiro lugar, pode-se dar o facto dessa sessão ser convocada sem nenhuma ordem de prioridades de modo que é simplesmente convocada assim: «Decide-se prorrogar a sessão.» Nada impede que isto seja feito!
Em segundo lugar, a sessão pode ser convocada com ordem de prioridades, como foi o caso.
E finalmente em terceiro lugar - para que não se venha argumentar com este fundamento, que aliás não tinha razão de ser invocado mas que daqui a pouco poderia sê-lo-, a competência dada ao Presidente da República que poderia ser utilizada como argumento a contrario sensu e que está estabelecida no n.° 4 do artigo 174.°, é uma competência excepcional e para actos não prioritários mas especificados, atribuída, conforme todos os comentadores sublinham, geralmente para actos próprios.
É assim que deve ser entendida!
Portanto, afastados estes fantasmas, põe-se a seguinte questão: que metodologia é que a Assembleia utilizou para fazer a convocatória? A Assembleia da República utilizou uma metodologia de prioridades.
Eu, dentro daquele processo de «desordem criadora» - desculpem-me a expressão - que caracteriza por vezes a organização desta bancada, estou a procurar o suplemento, e o que é que isto dá?

Risos.

Dá que, inclusive na proposta de resolução, a Assembleia não utiliza a expressão «prioridades», mas vai mais longe e refere a expressão «fins específicos». E contra estes «fins específicos» não podem, de fornia nenhuma, prevalecer as prioridades do Regimento.
Sobre isso o texto é claro, nítido e evidente!

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Ê e não é!...

O Orador: - Depois o Sr. Deputado dirá o ponto em que talvez não seja, mas ainda lá não cheguei!

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Mas é e não é!

O Orador: - O Sr. Deputado, como diria William Shakespeare: «Ou é ou não é!»

Risos.

De modo que sobre este caso, como dizia, não prevalecem de forma nenhuma as prioridades do Regimento. Quer dizer, portanto, que o Presidente da Assembleia da República não pode incluir a discussão da lei do estado de sítio e do estado de emergência à frente, por exemplo, da conclusão das matérias já anteriormente apuradas que é o n.° l ou n.° 2, n.° 3, n.° 4 ou n.° 5. Por aí, é totalmente evidente!
No entanto, e aqui é o tal ponto em que a discussão se pode colocar, há um n.° 6 e este diz assim: «Qualquer outra matéria cuja urgência justifique o seu agenciamento.»
E a questão está somente aqui: quem é que define o carácter de urgência para os efeitos do n.° 6 da resolução da Assembleia da República?
Acabo de ver o Sr. Deputado Nogueira de Brito a apontar-me, creio que para o Céu,... mas penso que talvez seja para o Sr. Presidente da Assembleia da República, que é uma figura mais terrena...

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O Sr. Presidente -Não é propriamente uma figura celestial, mas também ...

O Orador: - Participa e comparticipa! E se o Sr. Deputado Nogueira de Brito estava a referir com o seu gesto que era o Sr. Presidente quem define essa questão, tem toda a razão. De facto, é o Presidente da Assembleia da República que define, ou que poderá definir, nesta como em qualquer outra matéria, esse carácter de urgência. Ele fê-lo e a sua decisão é perfeitamente legítima. Mas essa decisão é recorrível. E não só não estamos de acordo com essa definição de carácter de urgência, como também não estamos de acordo que esse assunto seja, nos termos em que foi definido - e porque a urgência só pode ser política - politicamente urgente. Nós não estamos de acordo com isto, por razões que não quero nem tenho que explicar aqui!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ah, bem!....

O Orador: - O Sr. Deputado pode tirar as conclusões que quiser, mas regimentalmente é um direito que me assiste! E, de facto, não estou de acordo com a decisão do Sr. Presidente da Assembleia da República, embora ele tenha legitimidade para a tomar. Por isso, recorri dessa decisão.
E sobre isso, eu e o Sr. Deputado Nogueira de Brito - embora ele agora se tenha expressado por gestos, o que aqui parece ser ainda duvidoso como meio de expressão - travámos já um debate esta manhã.
Já, por outro lado, o Sr. Deputado Magalhães Mota tem um posição diferente, pois diz que, quando o Presidente da Assembleia da República aprecia a urgência, o faz no exercício de um podes vinculado. Quer dizer, o Presidente da Assembleia da República tem que aplicar, nestes casos também, os critérios de prioridade que estio definidos no Regimento.
Gostaria de chamar a atenção aos Srs. Deputados para uma questão conceitual que me parece importante. É que prioridade é uma coisa e urgência é outra!
A expressão "prioridade" está definida no plano político geral, ao passo que a expressão "urgência" está referida a um momento conjuntural concreto.
Dito de outra forma, e se os Srs. Deputados me desculparem estas espúrias preocupações materialistas que vou ter ocasião de exprimir, e numa linguagem mais terra-a-terra, direi que pode ser mais prioritário para a minha formação cultural - e é-o de certeza - ouvir a 5º Sinfonia de Beethoven, mas, neste momento é mais urgente ir almoçar!

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Acho bem!

O Orador: -Não sei se desta forma um pouco extremista, mas de maneira nenhuma desresponsabilizante ou descaracterizante - pois estava a tentar definir uma oonceptologia correcta - consegui expressar claramente o meu pensamento.
Em conclusão, poderei resumi-lo deste modo: em primeiro lugar, o Presidente da Assembleia da República tem todo o direito de fixar ou definir o conceito de urgência política; segundo, não obedece a una poder vinculado porque as normas do Regimento definem

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prioridades e não urgências - e as prioridades são definidas num plano político geral e não num plano conjuntural; em terceiro lugar, essa decisão do Presidente é recorrível; e, finalmente, julgo que dei sobre isso a imagem que me pareceu conveniente.
Esta posição que, ao contrário do que alguns dos Srs. Deputados disseram, tem dignidade regimental é fundamentada e legítima, é aquela que, em nome do meu grupo parlamentar, tive a honra de defender aqui.
No que se refere aos fundamentos apresentados pelo Sr. Deputado Marques Mendes, queria dizer que não vamos entrar a fundo nessa matéria.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ainda bem!

O Orador: - Muito simplesmente gostaria de deixar 2 notas.
É que, na altura em que o Sr. Deputado Marques Mendes expressou os seus fundamentos, ele utilizou, muito naturalmente, determinados termos com expressão equívoca.
Mas, mesmo que não fosse assim - e o nosso ponto de vista é de que é, e, para tanto, baseamo-nos nas suas intervenções-, não estávamos inibidos, como não estaremos e como a Assembleia certamente não estará, de votar o recurso por razões de direito, independentemente dos fundamentos por que o recurso é feito.
Gostaria ainda de deixar uma questão muito simples, sobre a qual creio que não há motivo para controvérsia e todos os Srs. Deputados terão, neste ponto, de estar de acordo comigo: é que, em relação aos recursos da Assembleia da República, não funciona o princípio da deserção por falta de alegações, basta somente uma muito simples fundamentação seja ela qual for.
Depois a Assembleia poderá desenvolver, aumentar, modificar ou aderir ao recurso com outra fundamentação. Posso estar de acordo em que uma determinada decisão é recorrível, com fundamentos diferentes daqueles porque outro grupo parlamentar a fez.
E mais ainda: isto funciona: mutatis muntantis em relação aos chamados votos da Assembleia da República em que muitas vezes votamos um determinado voto independente, e às vezes até contrariamente, dos considerandos.
Espero que assim fique clara a nossa posição sobre esta matéria - ia pedir desculpa por ter abusado do tempo, mas desta vez não cometi esse "feio pecado" e a minha intervenção, Sr. Presidente e Srs. Deputados, termina aqui.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos chegados à hora regimental para interrompermos os nossos trabalhos para almoço e chegámos também ao termo das 2 horas da primeira parte da ordem do dia.
Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Luís Munes os Srs. Deputados José Manuel Mendes, Jorge Lemos, Narana Coissoró, Magalhães Mota, Nogueira de Brito, José Magalhães e António Taborda.
Os Srs. Deputados que acabam de se inscrever na sequência da intervenção do Sr. Deputado José Luís

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Nunes formularão os seus pedidos de esclarecimento, se assim o entenderem, amanhã na primeira parte da ordem do dia.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra para
interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Penso que tinha sido entendimento geral, e o Sr. Presidente da Assembleia da República já o tinha manifestado em reunião de líderes, que este período era de 2 horas e que ao fim dessas 2 horas terminava o debate respectivo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não tenho a mínima informação nesse sentido, embora não a ponha em dúvida.

O Orador: - Aliás, ontem mesmo o Sr. Presidente da Assembleia referiu isto durante a citada reunião.
Julgo, por isso, que se devia passar à votação, Sr. Presidente.

O Sr. José Magalhães (PCP): -O Sr. Deputado está desfasado disto tudo!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino requer que se passe à votação?

O Orador: - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, creio que resolverei o assunto, se V. Ex.ª me der a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - É que, se seguíssemos a orientação do Sr. Deputado José Vitorino, o resultado não seria que se terminaria o assunto com passagem de imediato à votação, mas sim que isto tinha que ficar para ser discutido amanhã.
Essa era a conclusão lógica da sua intervenção, mas não é a nossa.
Pensamos, portanto, que este debate não pode ser feito no período das 2 horas que entretanto já passaram e, por isso, o debate tem de ser prolongado para a parte da tarde. Se se entendesse que era essa a consequência, isto tinha que continuar a ser discutido.

O Sr. Presidente,: - Portanto, se bem compreendi, o Sr. Deputado José Luís Nunes sugere o prolongamento da primeira parte da ordem do dia?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não, não sugiro.
A informação que eu tenho é que não houve essa deliberação das 2 horas e, portanto, a decisão do Sr. Presidente de continuar à tarde está certa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que não vale a pena prosseguirmos com estas interpelações à Mesa.
Já tomei uma deliberação no sentido de que a sessão está interrompida e que recomeça às 15 horas.
Entretanto, a primeira parte do período de antes da ordem do dia da sessão de amanhã incluirá a continuação do debate sobre esta matéria e a respectiva votação.
Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputadas, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Presidende Tito de Morais.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, fazendo uso de uma norma regimental, que não desviarei para fins que a adulterem, pedia a V. Ex.ª que tivesse em consideração os factos que rapidamente vou aduzir, as conclusões que tirarei e a pergunta final que lhe formularei, em tempo extremamente curto, como verá.
Na última quarta-feira, em sede de Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, foi suscitada, peto meu grupo parlamentar, a necessidade de emissão de um parecer sobre a proposta de lei n º 71/III, que tem como objecto a segurança interna e a protecção civil.
Caberia também à Comissão apreciar os outros projectos de lei sobre a mesma matéria, que estavam pendentes na Câmara, e desde agora o projecto de lei apresentado pela ASDI, também includível pela circunstância de entretanto, ter sido apresentado.
Nessa quarta-feira a nossa proposta não obteve vencimento e na quinta-feira recolocá-mo-la. Porém, quando a Comissão se preparava para apreciá-la, discuti-la e votá-la, tal não foi possível por falta de quórum.
Por outro lado, cada um de nós, em suas casas, foi confrontado, no fim de semana, com um telegrama, enviado pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, no qual se fixava um prazo, que expirava na terça-feira última, para a elaboração do parecer relativo a estas matérias.
Na reunião que então se efectuou, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias entendeu que, por escassez de tempo, não tinha condições para levar a bom termo a incumbência que havia saído da conferência de líderes e que o Sr. Presidente convalidara ao abrigo das seus poderes regimentais.
Esta deliberação foi assumida com votos contrários de vários Srs. Deputados, entre os quais os membros do Partido Comunista Português presentes na Comissão. Acresce que neste momento estamos confrontados com o facto de que a proposta de lei sobre segurança interna e protecção civil, bem como os projectos de lei que, entretanto, deram entrada na Assembleia, serão apreciados na próxima terça-feira, de acordo com a agenda que foi estabelecida.
Pensamos que é fundamental que a Comissão elabore os pareceres, como é de regra e como só prestigia

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a actividade desta Câmara. Contudo, entendemos também que cabe ao Sr. Presidente a fixação de um novo prazo compatível, por um lado, com a agenda e, por outro, com o decurso do tempo de que, entretanto, ainda dispomos para a produção de trabalho útil.
Cremos que há condições para que tal aconteça e entendemos que, se necessário for, pudemos reunir na sexta-feira, no sábado e no domingo. O Regimento que a maioria bem vindo a impor a esta Assembleia não expurga a possibilidade de se trabalhar aos sábados, domingos e dias feriados, de modo que existem todas as condições para que se torne possível dar, atempadamente, cumprimento ao despacho que vier a ser produzido pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
Por isso mesmo, interpelo-o no sentido de saber se, sim ou não, está na disposição de proceder à fixação de um novo prazo e, no caso de não estar, permitia-me, em nome do meu grupo parlamentar, apresentar na Mesa um requerimento para a consideração global, por parte dos Srs. Deputados, deste problema que acabo de suscitar.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): -Peço a palavra, Sr. Presidente. É também para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de perguntar à Mesa se já se encontra nesta Câmara o plano de recuperação económico-financeira.

O Sr. Presidente: - Não tenho conhecimento disso, Sr. Deputado.

O Orador: - Nesse caso, Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria de dizer o seguinte: dificilmente compreendo que, tendo o plano de recuperação económico-financeira sido apresentado num órgão como o Conselho da Concertação Social, não tenha sido entregue, pelo menos em paralelo, a esta Assembleia, ...

O Sr. p(r)pge Lemos (PCP): - Muito bem! Tem toda a razão, é um escândalo!

O Orador:- ... que julgo ter sido eleita por sufrágio directo, ou seja, por sufrágio popular.
Para além disso, o referido documento foi também distribuído à imprensa, pela qual tenho a maior consideração, mas que julgava ser apenas o quarto poder. É que assim já não sei se nós somos o quinto, o sexto ou o sétimo ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Tem toda a razão!

O Orador: - O problema que se põe neste momento é que o cidadão comum, o nosso eleitor, tem-nos questionado sobre o que pensamos do Plano e, como é natural, olha-nos com ar estranho quando lhe respondemos que não conhecemos esse documento - pelo menos eu não o conheço.
Aliás, embora não goste de levantar aqui este tipo de incidentes, devo dizer que já nâo é a primeira vez que factos desta natureza sucedem. Com efeito, por exemplo, a lei das rendas foi posta à discussão pública muito antes dos deputados desta Assembelia terem dela conhecimento. Também neste caso diferentes organismos nos pediram audiência para expressarem os seus pareceres sobre essa matéria, ao que tivemos de responder que ouviríamos com atenção as suas opiniões mas que, na verdade, nem sequer conhecíamos o diploma em questão. Foi do próprio gabinete do Sr. Ministro do Equipamento Social - a quem, suponho, nem sequer incumbia essa obrigação- que tiveram a deferência de nos enviar o referido documento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Hasse Ferreira, desculpe-me interrompê-lo, mas creio que V. Exª pediu a palavra para interpelar a Mesa e não para fazer uma intervenção política.
Daí que lhe peça que faça a sua interpelação em termos concisos, como é regimental.

O Orador: - Vou já terminar em termos concisos, Sr. Presidente.
É dificilmente compreensível que, em vez de o ter feito aqui, o Sr. Ministro das Finanças tenha exprimido inflexões na orientação política e económica no Instituto de Altos Estudos Militares. É que já não estamos no tempo dos discursos na "Sala do Risco".
Não é, pois, compreensível que esta Assembleia não receba os documentos simultaneamente quando estes são postos à discussão pública.

Aplausos da UEDS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, não sei qual é a forma regimental - e a de interpelação à Mesa ou a de protesto - que posso utilizar neste momento para me expressar sobre as declarações produzidas pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira. O que considero é que, pelo seu teor, essas declarações não podem deixar de ser objecto de um protesto por parte do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, creio que há outros Srs. Deputados inscritos para interpelarem a Mesa e, portanto, dar-lhe-ei a palavra depois.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, é para responder ao problema colocado pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. Presidente: - Só o pode fazer sob a figura de interpelação à Mesa, Sr. Deputado. E isto se o Sr. Deputado entende que a Mesa não procedeu como devia.

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O Sr. Raúl Rêgo (PS): -Não, Sr. Presidente, quero usar da palavra pelo mesmo motivo que o fez o Sr. Deputado José Manuel Mendes e, portanto, trata-se de uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado. Peço-lhe, no entanto, o favor de ser conciso.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, entendo que, de facto, a Comissão deve reunir, mas desde que possua o texto definitivo do projecto de lei, porque, por enquanto, não o conhecemos. Creio que a votação foi adiada exactamente para se proceder à modificação desse diploma.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, parece-me que a questão que se põe neste momento é esta: foi discutido o problema do agendamento da proposta de lei sobre segurança interna, assim como também o foi o problema relativo ao relatório, tendo o Sr. Presidente decidido que não era obrigatório o relatório para que esse agendamento se fizesse.
Acontece que V. Ex.ª entendeu agendar esse diploma para a próxima semana, decisão com a qual estamos de acordo. De qualquer modo, se alguma outra alteração se verificar, ela terá de ser feita por consenso e deverá ser discutida na próxima reunião de líderes, que, aliás, está marcada para as 17 horas e 30 minutos de hoje.
Penso, portanto, que não se deverá permitir que se inicie hoje aqui na Assembleia um debate sobre esta matéria, porque isso só vai servir, ao fim e ao cabo, aqueles que querem impedir por todos os meios que a lei de segurança interna seja discutida.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, o meu pedido de palavra é essencialmente para me expressar sobre a intervenção do Sr. Deputado Hasse Ferreira, porque, relativamente à interpelação que foi feita pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes, naturalmeme que o Sr. Presidente lhe irá dar uma resposta.
A intervenção do Sr. Deputado Hasse Ferreira, feita a pretexto de uma interpelação à Mesa, contém juízos de valor sobre a actuação do Governo, que não podemos ouvir em silêncio porque são destituídos de qualquer fundamento e apenas jogam com aparências.
E explico porquê: o Governo está a elaborar um plano de recuperação económico-financeira, cujo anteprojecto entregou no Conselho da Concertação Social. Ora, a propósito disto, o Sr. Deputado Hasse Ferreira vem dizer: " Aqui d'el-rei que o Governo não o entregou nesta Câmara! Está a subalternizá-la!"
Para além disto, o Sr. Deputado faz analogias verdadeiramente abusivas, historicamente incorrectas e moralmente inaceitáveis como, por exemplo, a dos discursos na "Sala do Risco" e ourtos fantasmas históricos que o Sr. Deputado não devia invocar aqui.
De facto, o Governo pode, se quiser, enviar aos partidos documentos que ainda não estão formalizados. Isto é algo que perde ser objecto de crítica ou de juízos de valor por parte de qualquer grupo ou agrupamento parlamentar. Porém, do meu ponto de vista, o Governo só tem de enviar para a Assembleia da República propostas de lei e quando tiver uma proposta de lei sobre o plano de recuperação económico-financeira, naturalmente enviá-la-á a esta Câmara.
Se quiser, o Sr. Deputado Hasse Ferreira pode queixar-se em nome do seu partido por ele ainda não ter recebido esses documentos, e até o pode fazer ao abrigo do chamado direito de os partidos serem informados.
Agora dizer, como parlamentar, que se ofendeu esta Casa é perfeitamente inaceitável e é, naturalmente, um exagero da sua parte.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente. É para usar do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, uso da palavra ao abrigo do direito de defesa porque penso que foram feitas aqui afirmações demagógicas sobre as minhas considerações.
A referência que fiz à "Sala do Risco", que, obviamente, se refere a circunstâncias históricas diferentes, não tem a ver com este facto mas com o facto de o Sr. Ministro das Finanças ter feito um importante discurso, em que anunciava uma série de aspectos significativos, perante as instituições militares e não aqui nesta Assembleia.
Portanto, contrariamente ao que foi dito não se trata de uma crítica global ao Governo.
Penso que há-de haver alguém que seja responsável por esta situação e mantenho a afirmação que fia de que considero ser uma situação anómala a de não serem enviados aos parlamentares os documentos que foram postos à discussão pública. Aliás, como já referi, na questão da lei das rendas foi o próprio gabinete do Sr. Ministro do Equipamento Social que teve a atenção de suprir essa falta, enviando os respectivos documentos a diferentes deputados, aos grupos parlamentares e à Comissão de Equipamento Social e Ambiente.
Por outro lado, eu próprio já fiz diligências para obter este plano de recuperação económico-financeira.
Portanto, não se trata aqui de fazer demagogia; trata-se, sim, de estranhar uma situação.
O Sr. Deputado Carlos Lage encontrou na interpelação que fiz uma agressividade que ela não tinha. A minha interpelação tem unicamente a ver com esta simples constatação: a de que o parlamentar não tem, efectivamente, na sua mão um plano que foi entregue a vários órgãos e que está em discussão pública.
Foi sobre isso que interroguei a Mesa, pois admiti a hipótese de que estivesse na Mesa para ser distribuído. Não estando pensando que se trataria de um lapso do Governo, e antes que se crie esse hábito, levantei o problema. Vejo que, mesmo que se trate de um lapso do Governo, há na Assembleia quem ache que esse é o procedimento normal.

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Registo e lamento, mas gostaria que não houvesse qualquer confusão quanto à intenção com que produzi esta interpelação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que tenho de vos lembrar que não está estabelecido um período de antes da ordem do dia na sessão de hoje. Daí que, embora os Srs. Deputados estejam no seu direito de interpelarem a Mesa e de invocarem o direito de defesa por se considerarem ofendidos, apelo aos Srs. Deputados para que não abusem do direito de interpelação à Mesa, sobretudo com problemas com os quais a Mesa nada tem a ver.
Neste momento encontram-se inscritos, para interpelarem a Mesa, os Srs. Deputados Jorge Lemos, João Corregedor da Fonseca, Narana Coissoró e Lopes Cardoso.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, efectivamente inscrevi-me para interpelar a Mesa mas, tendo em conta o apelo que V. Ex.ª acaba de fazer, prescindo da palavra.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, às 15 horas e 30 minutos de hoje o meu grupo parlamentar entrou em contacto com o gabinete do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para perguntar se, porventura, possuíam o documento lido e tornado público através dos órgãos de comunicação social pelo Sr. Ministro das Finanças. O gabinete do Sr. Secretário de Estado informou-nos que não o tinha mas que logo que o recebessem nos enviariam o referido documento.
Apesar disso, peço ao Sr. Presidente que, se possível, solicite ao Governo a cópia da intervenção do Sr. Secretário de Estado sobre o plano de recuperação económico-financeira, na medida em que necessitamos dela.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado José Manuel Mendes acerca do parecer sobre os projectos de lei relativos à segurança interna, gostaria de dizer que a apoiamos totalmente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, não era nossa intenção intervir nesta discussão mas, desde o momento em que - sob a figura do direito de defesa do Governo solicitado por um partido da maioria- foi generalizado e debate, não podíamos deixar de dar a nossa opinião sobre este problema.
Entendemos que, efectivamente, o Governe pode fazer as consultas que entender antes de enviar qualquer documento à Assembleia da República.
Porém, o Governo sem criado à sua volta determinados conselhos e determinados órgãos que não estão previstos na Constituição e a quem tem vindo a dar como verificamos, mais regalias do que aos deputados desta Câmara. Em nosso entender, o Conselho da Concertação Social é um órgão inconstitucional, do qual o Governo se serve come uma antecâmara para dialogar em monólogo, isto é, consigo próprio.
Que o Governo lhe entregue documentos e receba outros, enfim, que faça o que quer, isso é com ele. Agora, publicar um documento nas órgãos de comunicação social, do qual todo o País toma conhecimento, sem que os deputados desta Câmara tenham um mínimo conhecimento do que se passa no País sobre um tema tão importante como este, parece-nos ser, pelo menos "inético", num Governo democrático. Entendemos que seria uma cortesia para com os deputados desta Assembleia - e lembro que a maior parte dos ministros são também deputados - que o Governo desse, pelo menos, um conhecimento informal aos grupos parlamentares daquilo que iria ser anunciado ao País como uma sua intenção.
A verdade é que os órgãos de comunicação social, no seu legítimo direito, têm vindo bater à nossa porta dizendo: "O Sr. Ministro chamou-nos e entregou-nos este documento; O que é os senhores pensam sobre ele?". E nós não podemos responder porque o ignoramos. Julgo que não estamos num estado totalitário ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, desculpe-me interrompê-lo, mas não está aberto nenhum debate sobre esse problema.
V. Ex.ª pediu a palavra para interpelar a Mesa e eu aproveito para dizer que a Mesa não tem nada a ver com este assunto.
Se os Srs. Deputados quiserem obter informações do Governo sobre esse problema, poderão fazê-lo dirigindo-se ao Governo por intermédio da Mesa. Agora, o que não podem é levantar aqui um problema dessa natureza com intervenções que, realmente, são muito valiosas mas que estão fora da ordem de trabalhos. Portanto, não posso continuar a permitir essa situação e o Sr. Deputado desculpar-me-á mas, realmente, não é possível à presidência fazer um atropelo tão evidente à ordem de trabalhos estabelecida.
Daí que solicite ao Sr. Deputado o favor de terminar rapidamente a sua intervenção.

O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar rapidamente. Mas acontece que não sabia que V. Exª entendia que, como Presidente desta Assembleia, não tem nada a ver com este assunto. Estava a colocar aqui um problema ético das relações do Governo para com os deputados e, já que não posso falar com mais ninguém, dirigi-me ao Presidente desta Assembleia como deputado e como defensor dos direitos éticos e não apenas jurídicoss dos deputados
De qualquer modo, muito obrigado pela sua explicação, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, mas o facto é que esse assunto não está incluído na ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso. Agradecia que o Sr. Deputado interpelasse a Mesa de uma forma concisa e concreta sobre um problema que tenha realmente a ver com a Mesa.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, vou interpelar realmente a Mesa, na medida em que vou abordar questões que têm a ver com ela e procurarei ser conciso.

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A minha interpelação é no sentido de pedir à Mesa o favor de solicitar ao Governo que distribuísse aos deputados uma cópia do plano de recuperação económico-financeira.
Já não digo que o distribuísse pelo mesmo motivo que o fez ao Conselho da Concertação Social e à imprensa, mas, pelo menos, a título de cortesia, tendo em atenção o tipo de relações que devem existir entre o Governo e os parlamentares.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, há pouco o Sr. Deputado Jorge Lemos referiu algo que me inibiu de usar da palavra porque, no fundo, disse aquilo que eu ia dizer.
A figura da interpelação à Mesa dever ser usada para invocar preceitos do Regimento em relação aos pontos da ordem de trabalhos que se está a tratar.
Ora, tudo isto que está a ser alvo desta discussão está fora da ordem de trabalhos. Portanto, requeiro a V. Ex.ª que entremos de imediato na ordem de trabalhos e, se for necessário, farei um requerimento nesse sentido para ser votado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente. É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, no uso dos nossos direitos regimentais e tentando não abusar deles, fizemos uma interpelação à Mesa -que foi no sentido exacto da interpelação à Mesa- através do meu camarada José Manuel Mendes, solicitando de V. Ex.ª uma resposta.
Pelo nosso lado, não temos intenção em prolongar o debate e nesse sentido prescindimos até de um outro pedido de interpelação, correspondendo ao apelo de V. Ex.ª. Contudo, gostaríamos de obter resposta relativamente à primeira interpelação que fizemos.
Uma vez obtida essa resposta, logicamente passaremos à ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente: - Quando os Srs. Deputados derem oportunidade ao Presidente para responder às interpelações que foram feitas, nessa altura responderei.

Pausa.

Bom, parece-me que essa oportunidade foi dada agora.
Em relação ao parecer da Comissão sobre a proposta de lei n º 71/III, gostaria de começar por dizer que, ao contrário do que foi afirmado, este diploma não está agendado.
O assunto foi, realmente, tratado na conferência de líderes parlamentares mas não está agendado e só o será quando for anunciado em Plenário. Dou este esclarecimento para que as coisas fiquem bem claras.
Em relação ao parecer da Comissão, entendo que ele não é indispensável para que a proposta de lei possa ser agendada. Aliás, o Regimento não se refere
à obrigatoriedade de se obter um parecer da Comissão para se poder agendar uma proposta de lei.
Quanto ao facto de a Comissão ainda não ter dado o parecer, com efeito, dada a urgência manifestada, sobretudo por parte do Governo, do agendamento desta proposta de lei e unia vez que o assunto já tinha sido discutido em Plenário aquando da impugnação da sua admissão e que a proposta de lei está na Comissão desde o dia 14 do mês passado, pareceu-me que não exagerava fixando à Comissão o prazo que fixei.
Mais: a Comissão estava convocada para reunir nessa segunda-feira - aliás, ela foi convocada aqui no Plenário- e limitei-me a pedir ao Vice-Presidente, que nessa altura me substituía, uma vez que eu não me encontrava em Portugal, que confirmasse essa convocação para, mesmo assim, se poder obter um parecer da Comissão.
Tive conhecimento de que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, reuniu ,na tarde do passado dia 2, tendo sido discutida a possibilidade de se dar um parecer sobre a proposta de lei n.º 71/III, bem como o ofício do Presidente da Assembleia da República sobre o mesmo assunto.
Foi, porém, votada uma proposta no sentido de, dada a escassez de tempo, o referido diploma seguir para o Plenário sem parecer da Comissão.
Portanto, são estes os elementos de que disponho para poder decidir sobre o agendamento desta proposta de lei -repito, para poder decidir.
Em relação aos problemas que foram levantados acerca do plano de recuperação económico-financeira, pelo facto de os Srs. Deputados desconhecerem esse ante-projecto e manifestarem o desejo de dele tomarem conhecimento - o que é perfeitamente natural e legítimo -, vou oficiar ao Governo, através do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, comunicando esse desejo que foi aqui manifestado, até porque esse documento parece ser já do conhecimento de outras entidades.
Creio que respondi a todas as interpelações que me foram feitas.

O Sr. Lates Cardoso (UEDS): -Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, não que isto tenha, em meu entender, grande importância no aspecto das suas consequências práticas, na medida em que regimentalmente os projèctos podorão ser discutidos sem o parecer da Comissão, mas não queria deixar de chamar a atenção que, segundo o meu ponto de vista, a reunião que o Sr. Presidente referiu que teria tido lugar no passado dia 2 é uma reunião que se fez à margem da necessária convocatória.
Isto porque, concretamente e no meu caso, tive conhecimento de que o Sr. Presidente teria solicitado ao Vice-(Presidente que convocasse a reunião, o que o Sr. Vice-Presidente não fez, pois até hoje estou à espera dessa convocatória. Ora isso levou-me legitimamente a supor que não haveria reunião na segunda-feira, dado que fui alertado de que deveria haver uma convocatória, a qual nunca teve lugar.

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Portanto é legítimo concluir que, na verdade, não pode dar-se como realizada essa reunião de segunda-feira da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, uma vez que ela não foi convocada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que esse problema poderá resolver-se na própria Comissão. Mas o que ó facto é que na reunião plenária de sexta ou de segunda-feira passada ficou aqui decidido que todas as comissões reuniriam na segunda-feira.
O meu telegrama ao Vice-Presidente era simplesmente para o alertar para esse facto e para a necessidade dessa reunião.
Estavam inscritos os Srs. Deputados José Luís Nunes e José Vitorino, que, no entanto, prescindiram do uso da palavra.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, não vou deixar de corresponder ao apelo que reiteradamente vem formulando à Câmara e vou ser breve.
Acontece que a interpelação que produzi obteve uma resposta que me não satisfaz, pelo que me sinto no direito de apresentar, em nome do meu grupo parlamentar, na Mesa, e vai seguir de imediato, um requerimento para que se aprecie em concreto a situação que aqui sustentei.
O Sr. Presidente não ignora que é de extrema importância política, para além de legitimo e conforme às normas regulamentares, a elaboração de um parecer sobre diplomas que tenham baixados à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, como a qualquer outra Comissão, antes que eles venham a ser alvo da apreciação na generalidade no Plenário.
O Sr. Presidente dá uma informação à Câmara, que de resto eu conhecia, mas bom foi que tivesse sido dito por si, no tom claro e, mais do que isso, responsabilizante, com que o fez. Isto é, ainda não está agendado para
terça-feira o debate sobre a proposta de lei governamental de segurança interna e protecção civil bem como os restantes diplomas conexos.
Por maioria da razão, sobra tempo para que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, trabalhe activa, construtiva e responsavelmente, e emita os pareceres, indispensáveis no plano político e no plano da regimentalidade, , para que esse debate não seja um debate travado na ausência de um elemento clarificador oriundo de sede idónea, com o prestígio que deve ter uma Comissão como aquela a que pertenço e cuja reunião agora pretendo suscitar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Está na Mesa um requerimento, que prescindi de ler para que os Srs. Secretários, se o Sr. Presidente assim o entender, procedam à sua leitura, e, seguidamente, seja considerado como se impõe.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, vou pôr à votação o requerimento depois de o mandar distribuir pelas várias bancadas, mas posso responder-lhe imediatamente que a solicitação do Sr. Deputado pode vir da própria Comissão.
£ é à própria Comissão que compete solicitar um adiamento do prazo porque achou que o prazo não era suficiente. O presidente solicita isso ao Presidente da Assembleia e depois se resolverá sobre o assunto. É o próprio presidente da Comissão que tem poderes para fazer isso embora o prazo até já esteja cedido, mas não creio que isso seja uma dificuldade insuperável. Contudo, o requerimento que mandei distribuir vai ser posto à votação da Câmara.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, pela nossa parte dispensamos a distribuição desse requerimento, desde que a Mesa o leia, para se votar imediatamente, para não estarmos a perder tempo. Aliás, tudo isto é um pouco à margem dos trabalhos, salvo sejam.

Vozes do PCP: - Não é, não!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o requerimento acaba de dar entrada na Mesa e atenderei à sua solicitação logo que possível.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Desejo ainda interpelar a Mesa apenas para clarificar uma situação que eu julgava que estava clara e para provar, se é que tal é necessário, a regimentalidade do instrumento adoptado por esta bancada e a boa fé em que ele assenta.
De facto, o Sr. Presidente procedeu à fixação de um prazo, no uso das suas competências regimentais, prazo esse sobre que a Comissão, através de uma votação maioritária, entendeu tripudiar de acordo com a história a que há pouco narrei e que suponho que os Srs. Deputados poderão não ter interesse em ouvir recontada. Caso seja necessário, terei todo o prazer em fazê-lo.
Substancialmente, isto significa o seguinte: a Comissão decidiu não emitir nenhum prazo, nenhum parecer - do nosso ponto de vista, muito mal - e decidiu fazê-lo à revelia da fixação do prazo efectuada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, entendendo que o prazo era escasso.
Nós continuamos a considerar que o prazo, já anteriormente marcado, era suficiente.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Não pode, não pode!

O Orador: - Aquela Comissão recusou-se a pedir a prorrogação desse prazo. Neste momento compete ao Sr. Presidente da Assembleia da República a fixação de um novo prazo e como eu sei que o Sr. Presidente não tem intuitos obstrucionistas como outros Srs. Deputados desta Câmara...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -... é a si que me dirijo e a mais ninguém.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do requerimento que deu entrada na Mesa.

Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, nos termos regimentais, determinou V. Ex.ª, que à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, fosse fixado um prazo, que expirava no passado dia 3, para emissão dos pareceres relativos aos diferentes diplomas sobre segurança interna e protecção civil.
Alegando escassez de tempo, a Comissão deliberou, apenas com o voto favorável do PS, não produzir os referidos pareceres.
Ocorre, entretanto, que a discussão da proposta de lei n º 71/III, bem como das iniciativas legislativas com ela relacionadas, do projecto de lei do CDS foi adiada para a próxima terça-feira, o que veio possibilitar a reconsideração, em sede de Comissão, da decisão por ela assumida quando a elaboração de pareceres.
Nestes termos, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, solicitam a V. Ex.ª, se digne, no uso das suas competências regimentais, fixar à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, um novo prazo, no quadro dos dias disponíveis.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como sabem os requerimentos não têm discussão, de forma que o vamos votar imediatamente.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, este requerimento tal como está redigido não é para ser votado, é um requerimento dirigido a V. Ex.ª e, como tal, a única coisa que V. Ex.ª tem a fazer é despachar negativamente ou positivamente.

Nozes do PCP: - É isso! É isso mesmo!

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Nunca falei em votação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é precisamente para referir o que foi dito pelo Sr. Deputado José Luís Nunes, mas permita-me só que diga o seguinte: nós solicitámos de V. Ex.ª uma tomada de posição que, no nosso entender é urgente, mas que V. Ex.ª transmitirá quando entender.
Do nosso lado restará a consideração das figuras regimentais que entendermos para, no momento adequado, face à posição que V. Ex.ª assumir, actuarmos. Agora não temas é que votar um requerimento que apenas solicita que V. Ex.ª considere um novo prazo à Comissão.

O Sr. Prsidente: - Srs. Deputados, antes de entrarmos na continuação da discussão do projecto de lei n.º 177/III, quero comunicar que adiei as eleições que estavam previstas para hoje por faltarem candidaturas para completar os elencos, de maneira que este número ficará adiado para uma próxima sessão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, tendo em conta a pedido que V. Ex ª fez de que se usassem as figuras regimentais no estrito respeito pelo Regimento, pretendo interpelar a Mesa e vou ser extremamente curto no referente, mas trata-se de matéria que tem a ver com a ordem do dia e sobre a qual o meu grupo parlamentar precisa de obter uma resposta de V. Ex.a
Em conferência de líderes de grupos parlamentares ontem realizada, face à proposta de lei n.º 69/III, que está inscrita na ordem do dia - proposta de lei que visa autorizar o Governo a legislar sabre imunidades jurisdicionais e benefícios aduaneiros e fiscais relativa à utilização da Base das Lages pelas forças americanas nos Açores-, suscitou-se a questão de a Assembleia da República não estar em condições de poder votar esta proposta de autorização legislativa sem que primeiro conhecesse o texto do acordo firmado entre o Governo português e o Governo das Estados Unidos da América, como contrapartida ao qual o Governo nos apresentava aqui a proposta de lei.
Tivemos oportunidade, por iniciativa de V. Ex.ª, de solicitar a comparência de um membro do Governo encarregado das relações com o Parlamento que se empenhou em contactar o Sr. Ministro da Defesa no sentido de saber se seria ou não possível distribuir aos diferentes grupos parlamentares o texto desse mesmo acordo.
São 16 horas e 15 minutos, Sr. Presidente. Aproxima-se o momento do início da discussão dessa proposta de lei e não tivemos, nem da parte de V. Ex.ª nem da parte do Governo, qualquer tipo de informação sobre os elementos ontem solicitados.
Para a boa organização das nossos trabalhos e para que não tivéssemos que levantar esse ponto quando iniciássemos a discussão da proposta de lei - o que iria complicar logicamente o andamento dos trabalhos da Assembleia- solicitávamos a V. Ex.ª que nos informasse, se estiver e condições de o fazer, sobre o que se passa quanto ao pedido que foi feito em relação à distribuição do texto do acordo da Base das Lages.

O Sr. Presidente: - Podia considerar a intervenção do Sr. Deputado como uma impugnação à ordem dos trabalhos, pois que isto está aqui incluído, mas não foi o caso. Daí penso que este problema que o Sr. Deputado levantou, e que esclareceu completamente o Plenário sobre aquilo que se passou, terá cabimento - se efectivamente não se trata de uma impugnação - quando chegarmos à discussão desse ponto, nessa altura então será preferível verificarmos se assim é.
No entanto, não é regimentalmente impeditivo discutir-se este ponto do assunto sem termos dele conhecimento. Quando chegarmos ao ponto referido, falar-se-á então do problema que agora expôs, se estiver de acordo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não, não estou de acordo, Sr. Presidente!

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O Sr. Presidente: -Como parece que não está de acordo, dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que se tinha inscrito certamente para dar explicações sobre esta questão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Se o Governo vai falar, ouçamos o Governo!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Vitorino): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Lemos: Nos termos regimentais a interpelação que o Sr. Deputado fez à Mesa só pode ser entendida num espírito construtivo de contribuir para o aceleramento e para a clareza do debate da proposta de lei do Governo, e não como uma forma de impugnação dessa proposta ou de obstaculização ao debate da mesma.
O que já ontem tive ocasião de esclarecer em conferência dos líderes parlamentares, e reafirmo hoje perante a Câmara, é que o texto do acordo celebrado entre o Governo português e o Governo dos Estados Unidos da América quanto à utilização da Base das Lages nos Açores é do conhecimento público na medida em que foi publicado no Diário da República, 1 ª série, e o Governo naturalmente facultará a todos os Srs. Deputados o texto integral desse acordo bem como a troca de correspondência subsequente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral tinha-se inscrito para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): -Era para fazer um pedido de esclarecimento subsequente à intervenção do Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado considera que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares interviu?

O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, não foi qualificado de outra forma, portanto é uma intervenção. Dito de outra forma, o Sr. Secretário de Estado inscreveu-se e falou, logo fez uma intervenção e eu pretendia fazer um pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidnte?

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, eu desejava fazer um ponto de ordem à Mesa.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, qual é a figura regimental ...

O Sr. Presidente: - Bem, os Srs. Deputados querem-me obrigar a seguir o Regimento à letra, artigo por artigo, alínea por alínea, não é?

Aplausos do PSD.

Vozes do PSD: - Já chega de bagunça!

O Sr. Presidente: - Houve uma interpelação à Mesa do Sr. Deputado Jorge Lemos, o Sr. Secretário de Estado quis ter a amabilidade de esclarecer o Sr. Deputado Jorge Lemos e fê-lo certamente em melhores condições do que aquelas que a Mesa teria para lhe responder.

O Sr. Jorge Lemos (PCP)-Fez mal e não respondeu. A questão é essa!

O Sr. Presidente: - Respondeu como entendeu que devia responder. Não está aberto debate nenhum sobre este problema, de maneira que sobre este assunto não dou a palavra a mais ninguém.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): -Peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: -Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, compreendo o seu ponto de vista e não serei eu quem lhe irá criar dificuldades para a aplicação do Regimento. E devo dizer que se o Sr. Secretário de Estado António Vitorino quisesse usar da palavra para, em nome da Mesa, responder à interpelação do meu camarada Jorge Lemos não teria outra solução senão dizer exactamente que era isso que queria fazer.
Por isso vou fazer uma interpelação à Mesa no seguinte sentido: o Sr. Secretário de Estado disse aqui uma inverdade. Disse que o acordo estava publicado no Diário da República e isso é falso. O que está publicado é uma simples troca de notas que não inclui materialmente o acordo.
O que eu queria - e já foi requerido pela nossa bancada - era que a Mesa respondesse se, na sequência da troca de opiniões que houve na conferência de líderes, na sequência do que foi levantado nessa conferência sobre a necessidade de ser conhecido o conteúdo global do acordo e após o compromisso do Governo de dar conhecimento desse conteúdo antes que se procedesse à discussão e votação da alteração legislativa, isso foi feito.
E digo mais, Sr. Presidente, e de uma forma muito breve: se o Sr. Presidente considera ou não útil que se reavive a memória do Governo em relação ao que se passou ontem e à necessidade de, neste momento, ser feita a entrega total do acordo em termos de ser possível essa discussão, sob pena de se criar um incidente no inicio da discussão da proposta de lei, o que não tem nenhum sentido.
Como muito bem sublinhou o Sr. Secretário de Estado, na sua intervenção, trata-se de um espírito construtivo em relação à organização dos trabalhos. E é nesse sentido que interpelo o Sr. Presidente no sentido de saber quando é que será dado a conhecer aos diferentes agentes da actividade parlamentar o con. teúdo integral do acordo segundo o qual Portugal aliena parte da sua soberania em relação à área da Base das Lages.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Afinal, o Igrejas Caeiro é que não leu!

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quem não leu foi o Governo ou leu mal e devia ler bem!

O Sr. Presidente: - Continuando a discussão do projecto de lei n.º 177, o Sr. Deputado José Magalhães havia pedido a palavra para responder ao Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Jorge Lemos (PCP) : - Sr. Secretário de Estado, é melhor providenciar no sentido de distribuir o acordo! Não esqueça!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de se reunirem as condições necessárias para a continuação dos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado Narana Coissoró teve ocasião ontem de proceder perante a Câmara à leitura de um texto que nos parece elucidativo de algumas das dificuldades que a iniciativa legislativa singular do Sr. Deputado Montalvão Machado acarreta.
Na verdade, o extracto que leu do debate do processo de urgência revela que não há unanimidade quanto à qualificação rigorosa, do pondo de vista jurídico, da lei que agora se está parturejando nestas circunstâncias que são, quanto a nós, totalmente inadequadas. É o quê isto que agora se vai fazer?
O extracto que o Sr. Deputado leu, quanto a nós pertinentemente, refere a dado passo na fala do Sr. Deputado Correia Afonso - que não se encontra agora na Sala mas que a produziu na altura própria, aliás como está atestado - a seguinte observação: trata-se de fazer uma interpretação autêntica da lei. E insiste nisto de várias formas.
Ora isso coloca-nos a seguinte questão: isto é carrear um dado para os trabalhos preparatórios com vista naturalmente à futura interpretação da lei. Todos sabemos qual é a importância dos trabalhos preparatórios, face a uma moderna teoria da interpretação das leis mas, em todo o caso, importa acautelar que não há nenhum fundamento, nenhum cabimento para a interpretação que o Sr. Deputado Correia Afonso veículou para a acta com intenções que me coíbo de julgar.
Na verdade, não cabe à Assembleia da República, ao contrário do que acontecia à Asaembleia Nacional, interpretar leis, fixar-lhes o sentido; a Assembleia da República faz leis e essas leis entram em vigor nos termos e com os efeitos que a própria Assembleia fixa ou, quando não o faça, de acordo com as regras gerais que se encontram estabelecidas, designadamente a partir do Código Civil. É esta a regra, são estas as balizas.
Em todo o caso o Sr. Deputado Narana Coissoró veio alertar para um aspecto que nos preocupa particularmente, que são as indefinições. E o silêncio da bancada do PSD corrobora porventura uma certa vontade de perpetuar essas indefinições quanto à entrada em vigor, quanto à eficácia jurídica da lei que agora se está fazendo.
Por isso é que proporemos um normativo tendente a apurar aquilo que nesta matéria deve sair daqui bem claro, já que, se o PSD quer vibrar um golpe
interpretativo numa orientação que o Supremo Tribunal de Justiça acaba de aprovar por assento, que o faça de caras e em toda a sua dimensão, sem nenhuma vacuidade e sem nenhuma indefinição. É esta a nossa posição.
Se a Assembleia da República quer entrar em conflito institucional, afrontar o Supremo, usar abusivamente da faculdade legislativa e propiciar um choque, que era totalmente evitável e que, ainda por cima, carreia, uma injustiça no bojo, que o faça. Mas, se quer fazê-lo, faça-o frontalmente; não o faça inviamente, sob a capota, mas sim claramente. E a nossa proposta destina-se a clarificar isso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado José Magalhães, sob a forma de protesto, tenho de continuar por, algum tempo este debate, já que o proponente do projecto não nos dá quaisquer respostas. Porque entendemos que há uma alteração do Código Civil no instituto da caducidade que é principalmente - 48 horas depois de ter sido publicado o assento uma questão extremamente importante sobre o jogo de lealdade entre os órgãos de soberania, para a melhor interpretação das leis e, até, porque todos estamos interessados em que se faça uma lei que sirva a todos e não apenas a alguns, quero colocar ao Sr. Deputado José Magalhães alguns problemas que ele aflorou mas não respondeu. Peço isto, infelizmente, porque quem me deveria responder era o proponente do projecto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Já que a bancada da maioria se mantém silenciosa, temos que continuar o debate, para dignificação desta Câmara e para que, pelo menos, nas actas, se saiba que a Câmara discutiu profundamente o problema até quanto lhe foi dado discutir.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães V. Ex.ª sabe que, depois da Revolução de 1974 e da revisão do Código Civil, mantiveram-se os artigos 768 º e 769 º do Código de Processo Civil. O primeiro, no n.º 3, diz assim: "Desde que haja conflito de jurisprudência, deve o tribunal resolvê-lo e lavrar assento, ainda que a resolução do conflito não tenha utilidade alguma para o caso concreto em litígio, por ter de subsistir a decisão do acórdão recorrido, qualquer que seja a doutrina do assento". Isto significa que, à face do nosso ordenamento jurídico, a interpretação das leis foi totalmente retirada à Assembleia da República para ser exclusivamente entregue aos tribunais, porque este é o dispositivo posterior à revisão que se operou depois da Constituição de 1976.
Logo no artigo seguinte - o artigo 769 º -diz-se no n.º 1 o seguinte: "O acórdão que resolva o conflito é publicado imediatamente na I ª série do jornal oficial e no Boletim do Ministério da Justiça." Isto é, tem dignidade legislativa. Diz o n.º 2: "O presidente do Supremo enviará ao Ministro da Justiça

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uma cópia do acórdão, acompanhada da alegação do ministério público, dos acórdãos anteriores, invocados como fundamento do recurso e das considerações que julgue oportunas".
Quer dizer, a tirada do assento por sua vez desencadeia um novo processo legislativo, em que o Supremo tem que mandar o assento para o Ministro da Justiça, acompanhado de uma alegação do ministério público, para saber o que é que o Governo entende deliberar sobre este assento. Este processo legislativo ainda não está concluído e queria saber se esta Assembleia da República pode interromper um processo legislativo em curso desencadeado pelo assento e previsto no artigo 769 º, para declarar aqui uma lei e inutilizar uma outra lei, sem qualquer fundamento.

O Sr. Presidente: -Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, a questão que acaba de introduzir careceria realmente de uma reflexão um pouco aprofundada. A questão que acaba de introduzir é a do próprio valor jurídico dos assentos, matéria que, como sabe, tem sido objecto de atenção pela doutrina portuguesa é conhecido, e ainda está em curso de publicação, o famoso estudo do Prof. Castanheira Neves sobre esta matéria- e que não é simples de trinchar e de dirimir.
Em todo o caso, parece possível apurar-se se a revisão constitucional, uma vez que é a ela que nos temos de referir como padrão último para as balizas constitucionais desta matéria, excluiu ou não excluiu - essa é a questão - a elaboração de assentos. Qualquer que seja a resposta a esta questão, que é complexa inclinar-me-fa para colocar em dubitativo a legitimidade da emissão de assentos, dada a maneira como está configurada a conformação do ordenamento jurídico e o poder legislativo, que é da Assembleia da República primacialmente -, a verdade é que o Código de Processo Civil, nos preceitos que o Sr. Deputado Narana Coissoró citou, está em vigor, pelo menos, aparentemente, e não foi declarado inconstitucional com força obrigatória geral.
Portanto, após a publicação do assento, nos termos do artigo 769 º do Código de Processo Civil, está previsto que o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça envie ao Sr. Ministro da Justiça cópia do acórdão. O acórdão é publicado na Iª série e, nos termos do artigo 2 º do Código Civil actual, a doutrina fixada nos assentos tem força obrigatória geral-sabemos isto. Este é o primeiro aspecto.
Segundo aspecto: os tribunais estão sujeitos a este comando que lhes foi emitido-nos roermos constitucionais. Obviamente a Assembleia da República é soberana e, se o entender, pode destruir, isto que acaba de ser edificado, pode forçar uma interpretação totalmente oposta, pode fazer o que quiser -por isso mesmo é que é uma assembleia legislativa e que os tribunais não o são.
No entanto, isso coloca melindrosos problemas de aplicação da lei no tempo. O assento entra em vigor e é vinculativo. E esta lei entra em vigor a partir de quando? Produz efeitos em relação a que casos? Produz efeitos em relação a que processos e como? Em relação aos processos já pendentes, a todos ou aos processos introduzidos até há data em que tudo isto se verifica? Ou devemos excluir a aplicação deste preceito a certos processos já entrados, mas ainda não julgados? O que é que se deve fazer?
A não ser que estejamos a partir do princípio de que, de acordo com certa interpretação, esta lei, diga o que se disser, se aplica a todos os casos. Isto é um pequeno ardil forense, que espero que não esteja a ser utilizado nesta Câmara e nesta sede. A Assembleia da República deve fazer leis claras, e não deixar para interpretações, que são porventura rendosas mas que são de outro foro e de outra estrutura, a clarificação do sentido dos preceitos legais. E então diria que, se isso acontecesse porventura, este processo, que já está bastante manchado por coisas indignas, ficaria completamente manchado por algo que, suponho, não tem precedentes no funcionamento institucional do Parlamento em Portugal.
Esperamos profundamente que isto não se faça e, para isso, propomos - e esperamos que a bancada do PSD saia do seu mutismo - que se aprove uma norma em termos muito abertos ou noutros termos quaisquer, mas que clarifiquem por a+ b qual é o sentido desta afronta ao Supremo Tribunal de justiça que os senhores do PSD e, pelos vistos, do PS querem perpretar contra o nosso voto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção será aliás a resposta deste contraprotesto do meu camarada José Magalhães, que colocou aqui algumas perguntas que não foram respondidas durante todo o debate pelo proponente do projecto, o qual se mantém impassível perante o levantamento de questões de grande acuidade.
A questão prende-se de facto com a aplicação desta lei no tempo, porque, tendo no pedido de urgência os Srs. Deputados do PSD insistido em que este projecto era uma interpretação autêntica, donde se seria levado a concluir que cria uma lei interpretativa, percebo perfeitamente que, numa pergunta que lhe coloquei já neste debate, o Sr. Deputado Montalvão Machado tenha respondido que isto era uma lei nova.
A lei nova -diz o Código Civil - não é retroactiva. Mas isto não resolve o problema, porque há situações em que a lei nova se aplica a factos passados e não há retroactividade. Sobre este problema, que a maioria desta Câmara não quer debater e que, no entanto, deu origem a que Baptista Machado escrevesse um volume apenas sobre 2 ou 3 artigos do Código Civil que com isto se prendem, é necessário fazer aqui algumas considerações e concretizá-las, para que a maioria diga e responda aqui o que quer com este projecto.
Passarei agora a citar Baptista Machado no livro que refen.

Uma voz do PS: -Vai ler o livro todo?

A Oradora: -Não vou ler o livro todo, mas, se calhar, o Sr. Deputado ganharia muito em ler algumas páginas, para saber o que vai aprovar de olhos vendados e que vai abrir, nos tribunais, um novo con

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flito. Se possível, terão que sair mais dezenas de acórdãos e um novo assento para resolver o problema que os senhores dessa maneira vão suscitar.
E explico concretamente que a situação que se coloca é esta: em relação aos processos que estão pendentes e em que ainda não houve nenhuma sentença ou acórdão, não sei se estará algum processo em tabela nalguma relação lá para Outubro e que se deva a isso a pressa de fazer aprovar esse projecto. Parece-me que sim.
Em relação aos processos pendentes e em relação àqueles casos em que, segundo o Código Civil, já expirou o prazo de caducidade à face deste novo assento, pergunta-se se realmente esses senhorios poderão vir intentar agora em tribunal uma acção baseada na nova lei que, se calhar, vai surgir do projecto de lei do Sr. Deputado Montalvão Machado.
Ora é a este problema, Sr. Deputado, que o livro de Baptista Machado dá resposta e é por isso que, na verdade, V. Ex.ª muito ganharia se ouvisse, já que não quer ler. É que, segundo Baptista Machado, quando sai uma lei nova que altera os pressupostos para propor em tribunal - e ainda não é o caso - uma nova acção, essa lei nova tem aplicação aos casos passados. Sobre este caso concreto dos prazos de caducidade para propor acções em tribunal - e, agora sim, passo a citar - diz depois Baptista Machado o seguinte: "Na hipótese de a lei nova vir prolongar um prazo deste mesmo tipo, é claro que se aplica a regra do n .º 2 do artigo 297 º do Código Civil. Mas há mais do que isto. Nas hipóteses a que nos referimos no § 1 º da secção anterior, o facto de se ter esgotado sob a lei nova um prazo extintivo por esta estabelecido conduzia à extinção definitiva do direito ou situação jurídica em causa."
E, depois, com base nessas considerações e em relação aos casos concretos dos prazos de caducidade, diz o seguinte: "Mas aqui, na esfera dos prazos extintivos de uma faculdade legal, não se passa o mesmo; aqui, se a lei nova vier prolongar o prazo, o titular do direito de acção que já havia caducado sob a lei antiga pode exercer esse direito se se não esgotou ainda o prazo mais longo estabelecido pela lei nova."
É isto, Sr. Deputado Montalvão Machado, que V. Ex.ª pretende? E isto, Srs. Deputados da maioria, que os senhores pretendem? Se pretendem realmente isso - e chego à conclusão que sim-, então pretendem coisas realmente muito graves, pretendem que se abram novos litígios e discussões em tribunal, novos acórdãos, novo assento e, se calhar, pretendem depois vir aqui propor, se ainda cá estiverem nessa altura, um novo projecto para resolver isso.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito mal!

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para mostrar que alguma coisa de misterioso há atrás do presente projecto de lei e desta discussão, bastaria-nos folhear a imprensa, tão atenta aos trabalhos da Assembleia da República nos últimos 5 dias em que tem vindo a ser debatido diariamente este projecto de lei. E que V. Ex.ª, tirando um jornal, não encontrará duas linhas seguidas sobre este debate. E isto, se é realmente a posição generalizada da bancada da comunicação social sobre este projecto de lei, é porque alguma razão há para não lhe dar um relevo nacional.

Risos do PSD.

É que os órgãos da comunicação social sabem que esse debate não dignifica a Assembleia da República e que este projecto de lei não deve ser levado ao conhecimento do público ...

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Orador: - ... porque lhe introduz tanta inquietação, muitíssima maior do que aquela que pretende resolver. Os silêncios são políticos, e os órgãos da comunicação social também são agentes políticos que estão aqui dentro desta Assembleia, porque, da maneira como eles tratam os debates aqui, têm relevância para todo o País. E esta posição sobre o que se passa, sobre o chamado Projecto Montalvão Machado, por todos eles tomada é uma boa prova de que algo de misterioso se passa à volta disso. Era bom que a comunicação social soubesse qual é o mistério e que dissesse à opinião pública porque é que não trouxe à luz do dia tudo quanto a oposição tem dito sobre esse debate e sobre a votação que hoje se vai fazer.

Risos do PSD.

Em segundo lugar, quero dizer à Sr.ª Deputada Odete Santos o seguinte: V. Ex.ª citou só o Baptista Machado, mas, para corroborar o seu ponto de vista, leia, por amor de Deus - e os Srs. Deputados da maioria leiam, por amor de Deus -, as notas de Abílio Neto ao Código Civil sobre a aplicação de assentos aos contratos, principalmente aos de arrendamento, para ver a própria divergência doutrinária, em que o Dr. Varela não concorda com Baptista Machado e em que a própria jurisprudência está dividida sobre a aplicação de leis.
Pergunto, Sr. Deputado Montalvão Machado: dopois de fazer aqui uma lei, vai-nos maçar dias e anos inteiros com novas leis para tratar agora para o futuro de todos os problemas de correntes jurisprudenciais que surjam em contrário? Todas as vezes que houver duas sentenças contraditórias, teremos aqui o Dr. Montalvão Machado com uma lei e solucioná-las!? Em que ficamos, Sr. Dr. Montalvão Machado?

Uma voz do PSD: - Ficamos calados!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É do que os senhores gostam!

Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, pareceu-me que o Sr. Deputado Montalvão Machado, quanto eu estava a fazer a minha intervenção, tinha

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feito um sinal para a Mesa no sentido de pedir a palavra, mas parece que afinal resolveu adoptar a solução mais fácil, que foi rir.

Risos do PSD.

Perante questões tão complexas como esta que estamos a debater neste momento, o Sr. Deputado Montalvão Machado e a bancada do PSD riem-se. Está tudo dito e nem sequer há comentários a fazer. Penso que os órgãos de comunicação social, possivelmente porque esta é uma matéria que em princípio poderá parecer um pouco complexa, já que engloba interpretações de um artigo do Código Civil, não terão apreendido na altura a perigosidade deste projecto.
Mas passemos adiante sobre este problema. O Sr. Deputado Narana Coissoró colocou aqui algumas questões com as quais efectivamente estou de acordo. A questão é complicada, como eu disse. Há centenas e centenas de linhas escritas sobre este problema, mas uma coisa parece que ficou clara neste momento: é que, sobre este assunto, o autor do projecto pretende que os senhorios que já tenham deixado passar o prazo de 1 ano, de acordo com o que o assento fixou, venham agora a triunfar em acções que têm propostas e ainda não decididas ou, naquelas acções que vão propor; pretende o Sr. Deputado Montalvão Machado que possam realmente optar por essa via e salvar alguns processos e conseguir despejos para outros ainda não propostos. Isso é o que sem dúvida o autor do projecto pretende.
De resto, iremos ver se sim ou não, porque iremos entregar na Mesa - esta redacção poderá não ser a melhor, mas, na altura própria, dissemos que o projecto deveria baixar à Comissão, para discussão na especialidade - uma proposta de aditamento de um novo artigo ao projecto, para que, na verdade, as situações já passadas, aquelas em que já decorreu o prazo de caducidade, não possam agora vir aos tribunais, beneficiando deste projecto de lei.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. Carlos (PS) : - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar de palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Lage (PS): - É para Interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lago (PS): - Sr. Presidente, peço a atenção de V. Ex.ª para o artigo 148 º do Regimento, que diz o seguinte: "O debate acabará quando não houver mais oradores inscritos ou quando for agrovedo pela maioria dos deputados presentes requerimento para que a matéria seja dada por discutida." Depois diz o artigo 149 º: "Não será admitido o requerimento previsto no artigo anterior enquanto não tiverem usado da palavra, pelo menos, no debate na generalidade, 3, e no debate na especialidade, 2 dos oradores dos partidos com deputados inscritos ou que queiram pronunciar-se."
Pergunto primeiramente à Mesa se há mais algum deputado inscrito de qualquer partido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, nesta altura só estão inscritos os Srs. Deputados José Manuel Mendes e Narana Coissoró, este último para formular uma segunda intervenção.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é que pretendemos formular um requerimento para que se ponha termo ao debate e se vote, na medida que este artigo do Regimento nos dá direito a que na especialidade apenas falem 2 oradores, no máximo, de cada grupo parlamentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por conseguinte, enviaremos um requerimento à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, mas não há requerimento.

Vozes do PS e do PSD: - Já está na Mesa!

O Sr. Presidente: - Perdão, Srs. Deputados, já está realmente na Mesa.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr. Presidente, é para pedir à Mesa o favor de inscrever o Sr. Deputado Hasse Pereira e igualmente a mim próprio para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acaba de entrar na Mesa um requerimento do seguinte teor:
Ao abrigo das disposições conjugadas doa artigos 148 º e 149 º do Regimento, os deputados abaixo-assinados requerem o termo do debate deste, ponto de especialidade do artigo único do projecto de lei n º 173/III, e a sua consequente votação

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Deseja usar da palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar está inscrito - e já lhe tinha sido dada a palavra - o nosso companheiro de bancada José Manuel Mendes, que inclusivamente já tinha iniciado a

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sua intervenção quando o Sr. Deputado Carlos Lage anunciou que iria apresentar o requerimento. Esta é a primeira questão.
Segunda questão: a conjugação dos artigos 148. º e 149 º do Regimento, diz que o requerimento para termo do debate só pode ser admitido pela Mesa no caso de terem intervindo, no debate na especialidade, 2 dos oradores por cada partido que estejam inscritos. Ora, verifica-se que, neste momento, não está reunida a condição prevista neste artigo do Regimento.

Vozes do PSD: - Está!

O Orador: - Logo, não pode ser admitido o requerimento formulado pela bancada do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage deseja usar da palavra?

O Sr. Carlos Lago (PS): - Sr. Presidente, o que o Sr. Deputado Jorge Lemos disse foi aquilo que eu disse. Evidentemente que se houver oradores de outros grupos parlamentares este requerimento só pode ser votado quando não houver mais inscrições ou quando tiverem falado dois oradores por cada grupo parlamentar.
No entanto, e já que estamos a discutir um ponto que não é de somenos importância, começo por perguntar à Mesa o seguinte: Sr. Presidente, este projecto tem processo de urgência? E que eu também já tive a honra de presidir à sessão quando se fez um debate em volta deste projecto, mas, de facto, não verifiquei se tinha processo de urgência. Se tiver processo de urgência todo o sistema de discussão se altera. Trata-se de um lapso que, provavelmente, cometi na Mesa, não me apercebendo de que tinha sido concedido o processo de urgência.

O Sr. Presidente: - Tem sim, Sr. Deputado.

O Orador: - Então, peço ao Sr. Presidente - e eu lamento não ter tido conhecimento, não observei isso, e o Sr. Presidente também não deve ter reparado que o projecto tinha processo de urgência - para usar a alínea e) do artigo 246 º do Regimento, ou seja a regra supletiva no caso de processo de urgência.
A alínea e) diz: "Na discussão na especialidade cada deputado só poderá usar da palavra uma vez, excepto o autor ou um dos autores da proposta de alteração, e o tempo de duração da palavra será reduzido a metade."

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tem a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Era para pedir è Mesa se poderia recordar os fundamentos do processo de urgência.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Os fundamentos e os termos!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, são os artigos 243 º, 244 º, 245 º e 246 º do Regimento. Quer que os leia?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Não, Sr. Presidente. Salvo erro, ou por confusão da minha parte, o processo de urgência foi admitido, foi fundamentado e foi discutido com base em que havia uma divisão de critérios dentro da jurisprudência portuguesa, e era para pôr termo a essa divergência de critérios, que já não existe, que este processo tinha urgência.

O Sr. Presidente: - Eu tenho necessidade de um assessor jurídico para resolver estes problemas ...
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Outro problema que esta manhã aqui foi posto, e bem, e que iremos discutir amanhã de manhã, foi sobre se os critérios normais do Regimento prevalecem nesta sessão de prolongamento da Assam da República.
O Dr. José Luís Nunes trouxe aqui um problema, segundo o qual os critérios de urgência para o prolongamento da sessão extraordinária são diferentes daqueles que vigoram para a sessão normal. Este problema de urgência foi de uma sessão normal e nós queremos saber se agora se aplica o Regimento ou se aplica a urgência do período de prolongamento da sessão extraordinária.

Risos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, era, exactamente, para, como o Sr. Presidente tinha aventado na sua intervenção, tanto quanto eu percebi, dilucidar a questão que está suscitada sobre o regime ao abrigo do qual se está a fazer o debate e para exprimir a opinião da nossa bancada sobre essa matéria porque agimos num determinado pressuposto de regularidade processual que, cremos, não foi informado, ao contrário do que me parece quase aventar o Sr. Deputado Carlos Laje.

O Sr. Presidente: -Paz favor.

O Orador: - Sr. Presidente, nós consideramos que foi particularmente importante que tivesse sido esclarecido que o regime solicitado pelo PSD para o debate deste projecto tinha a sua matriz, a sua causa, no facto de haver um conflito jurisprudencial que era importante talhar, trinchar, pôr termo. Esse pressuposto cassou e, para nós, pareceu perfeitamente banal e adequado que a Câmara revogasse, implicitamente, o regime deliberado em momento anterior e, consensualmente, sem impugnação de ninguém, aqui orássemos todos, na medida tida por necessária, e útil, para esclarecer aquilo que importava esclarecer.
Infelizmente, o PSD, que tinha responsabilidades particulares, discursou menos do que devia para esclarecer, sobretudo quando havia novas e importantes questões a dilucidar. Em todo o caso, todos nós nos comportámos, não como se estivéssemos submetidos a um regime de encurtamento, de rigidez, mas como, se pelo contrário, entendessemos que estavam plenamente em vigor as disposições gerais para o debate na especialidade e, na fase anterior, na generalidade, da iniciativa legislativa agora em apreço.

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O nosso parecer é, pois, em primeiro lugar, que tinha cessado o fundamento de urgência requerida pelo PSD é, em segundo lugar, que ainda que isto não acarretasse o efeito automático de revogação, da deliberação sobre o regime de tramitação, a Câmara unanimemente alterou e, na prática, adoptou um regime contrário, com o que claramente revogavam qualquer regime de guilhotina, eventualmente já aprovado ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... e que, neste momento, o lembrete dos Srs. Deputados do PS para cessar este debate será, por ventura, um dcsenrainganço, mas não é feliz nem é útil para a clarificação daquilo que é importante clarificar. E muito mais gostaríamos que os Srs. Deputados, em vez de obrigarem a Câmara a este debate processual, que é interessante, permitissem à Câmara algo ainda mais interessante e mais útil, que era expender, com a exposição de razões que toda a gente entenda aduzir, se quiser ou se as tiver, os argumentos úteis para clarificar esta lei que os senhores querem aprovar para destruir um assento.
Não é todos os dias que em Portugal se destrói um assento! Que se faça isso de maneira clara, frontal e rica, para que a magistratura não possa dizer que o Parlamento faz, de maneira sombria, sotuma e sem argumentos, aquilo que tinha o dever de fazer esclarecidamente, fundadamente, uma vez que os autores da iniciativa não têm argumentos. Quer-se esconder isto?
Sr. Presidente, a nossa sugestão é a de que este debate prossiga nos termos normais, consoante consensualmente estava estabelecido até este momento, e esperemos que não seja interrompido. É esse o nosso parecer e é esse o nosso voto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não sou jurista como sabem, não me vou embrenhar em discussões desta natureza. Eu penso que vale ter um pouco de bom senso.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Interpreto este requerimento da seguinte forma: o Sr. Deputado José Manuel Mendes já tinha pedido a palavra quando entrou o requerimento, pelo que terá a palavra para proferir a sua intervenção.

Os Srs. Deputados que estão inscritos, para além de dois por cada partido, não terão mais a palavra.
Mas se durante o debate houver deputados de partidos que não tenham ainda feito inscrição, e até 2, eu dar-lhes-ei a palavra.
É assim que eu interpreto o Regimento.

O Sr. José Luís Nunes (PS): -E interpreta bem, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Este requerimento não impede que Srs. Deputados dos vários grupos parlamentares que ainda não tenham intervindo no debate não o possam fazer, uma vez aprovado o requerimento. O Regimento diz: "... ou mesmo com deputados inscritos ou que queiram pronunciar-se", de forma que
creio que deputados de cada grupo parlamentar inscrevem-se agora, depois de votado o requerimento, e terão direito à palavra.
Agradecia que me deixassem pôr à votação este requerimento ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não pode, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - ... mas estou a ver já uma quantidade de Srs. Deputados a pedirem a palavra para interpelar a Mesa.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, queria manifestar a V. Ex.ª o meu espanto pela notável pleiade de "barristas" que eu vejo nesta Sala. Embora isto aqui no Parlamento possa ter muita força porque lança a confusão, não teria força nenhuma num tribunal, perante uma auditoria juridicamente mais informada.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Começa pelo Sr. Deputado!

O Orador: - Os meus parabéns, Sr. Deputado! O Sr. Deputado tirou coelhos de cartolas como eu nunca vi na vida!

O S. Narana Coissoró (CDS): - Só trago uma! Notável!

O Orador: - Houve algumas que eu não esperava, que nunca imaginei.
De qualquer forma, o que se passa é que o requerimento, tal como está formulado, não invoca o processo de urgência. Portanto, como não estão ainda reunidos os pressupostos para a votação desse requerimento ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Para a admissão!

O Orador: - Para a admissão desse requerimento! Muito bem! Vamos a isso! eu penso que esse requerimento não deve ser ainda admitido pela Mesa neste momento, nem votado.
Entretanto, nós vamos fazer chegar à Mesa um outro requerimento, invocando o processo de urgência, porque não há revogações tácitas, nem por consenso, de decisões da Assembleia da República, para ser votado imediatamente quando entrar, sem discussão. Até lá, nós teremos de nos conformar com o que está aí escrito, e o Sr. Deputado José Manuel Mendes tem, obviamente, direito a usar da palavra.

O Sr. Presidente: - Se eu bem interpretei o Sr. Deputado José Luís Nunes, os Srs, Deputados que subscrevem este requerimento retiraram-no.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - O requerimento foi retirado, e muito bem, e não tem qualquer espécie de sentido ou de acolhimento aquilo que foi entendido como a interpretação que V. Ex.ª deu a um requerimento não votado e que não poderia ser admitido nos

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termos de condicionar o uso da palavra aos grupos ou agrupamentos parlamentares, neste momento. É bom que isto fique registado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O requerimento podia ter sido admitido, e devia tê-lo sido.

O Sr. João Amaral (PCP): -Sr. Presidente, não podia ser admitido!

O Sr. Presidente: - Mas não vamos discutir esse assunto.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, parece que agora há um concurso de bons sensos: ao bom senso de V. Ex.ª, que nós muito prezamos, sobrepôs-se o bom senso do líder parlamentar do PS, que também muito prezo. Mas fiquei sem saber se o requerimento feito em primeiro lugar está lá ou já foi retirado.

O Sr. Presidente: - Foi retirado, Sr. Deputado!

O Orador: - O segundo requerimento que entrou substitui o primeiro ou é um novo requerimento?

O Sr. Presidente: - Não tenho mais nenhum requerimento na Mesa, Sr. Deputado.

O Orador: - Em terceiro lugar, pareceu-me que V. Ex.ª fazia uma distinção entre aqueles que pediram a palavra antes do requerimento retirado e depois do requerimento retirado. Em que situação estou: antes do requerimento retirado ou depois do requerimento retirado? É para saber em que lei vivo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado sabe muito bem que está inscrito e que, na devida altura, terá direito à palavra.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao usar da palavra, neste momento do debate, a primeira afirmação que gostaria de produzir é esta: estamos perante um dossier totalmente em aberto. O Sr. Deputado Montalvão Machado, no uso de um direito que ninguém lhe nega, apresentou, na Musa da Assembleia da República, um projecto de lei concreto, o qual temos vindo a discutir e que suscitou a posição de fundo de muitos dos interventores que me antecederam mas, sobretudo, tem feito aflorar questões jurídicas, de natureza nodal que, pelos vistos, o proponente e as bancadas da maioria pretendem não considerar, de modo ostensivo.

Aplausos do PCP.

O Orador: - O silêncio do Sr. Deputado Montalvão Machado e das bancadas da maioria governamental é politicamente escandaloso, é extremamente significativo e inatende às razões jurídicas aqui levantadas por vários oradores, que querem aquilatar da profundidade do que se pretende e estudar, com todo o rigor, o conjunto de problemas que envolve o projecto de lei em debate.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, não encerraremos esta discussão sem fazer tudo, mas tudo, para que o Sr. Deputado Montalvão Machado saia das declarações genéricas e contraditórias que produziu até agora e venha à liça, com argumentos concretos, responder a cada tuna das interpelações concretas, formuladas pela minha bancada e por outras bancadas, no decurso dos dias que vão contados sobre a discussão da iniciativa legislativa que quis apresentar na Assembleia da República.
O Sr. Deputado intentou aparecer, no plano institucional, no plano político, como o defensor de um consenso existente entre senhorios e inquilinos, entre as duas partes mais directamente interessadas em toda esta questão. Provámos que isso não é verdade. Sabia-se já qual era a posição assumida pelos inquilinos, pelos senhorios e por muitos advogados portugueses, para além, naturalmente, das forças políticas com assento nesta Casa. Aproximámo-nos do final deste debate. Até ao momento em que eu uso da palavra, as dúvidas que havia foram avolumadas, as perplexidades tornaram-se, no mínimo, suspeições ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Muito bem!

O Orador: - ... a oposição que se generalizou, por irrespondida, constitui um elemento mais do que bastante para que relutemos a aprovação sub-reptícia de um normativo como este.

Aplausos do PCP.

O Orador: - O debate, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não pode, neste instante, compadecer-se com palavras alheias à precisão, mesmo àquela que se exige na qualificação política dos actos perpetrados por cada qual. Por isso, e indo à questão central, nós temos de insistir num complexo de questões que apontam para a reflexão, para a ponderação e não para o aprovar, de modo absolutamente impensado e imaturo, soluções que, de modo algum, estão testadas como sendo correctas.
A larga controvérsia no domínio da doutrina e da jurisprudência aconselharia, por parte de quem quer, à elaboração, de estudos, de cuidados profundos, que não se coadunam com o casuísmo de determinadas situações jurídicas concretas e, pior, com a tentativa de validação de um ponho de vista que é, ele mesmo, gérmen de larga polémica.
Aquilo que o Sr. Deputado Montalvão Machado fez, na prática, foi trazer a esta Câmara a posição dos vencidos do assento do Supremo Tribunal de Justiça, para fazer com que ela, por força da capacidade legiferante do Parlamento Português, se transforme, por artes e malas-artes, numa tese vitoriosa. Isto é, sob todos os ângulos e também do ângulo jurídico, inqualificável. Não é, pois, por acaso que todos sabemos que subsistem sem resposta acusações candentes aqui produzidas. Mas abordemos um outro núcleo problemático.

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Ao abrigo da proposta do Sr. Deputado Montalvão Machado, o n.° 2 do artigo 297.° do Código Civil, sobre a alteração dos prazos, conjugado com as regras de interpretação das leis, aplicar-se-ía a situações que, no passado, tivessem feito decorrer os prazos normais e que hoje pudessem considerar-se extintivas.
Ë de presumir que o Sr. Deputado conheça o texto do Dr. Baptista Machado sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil. Esse texto é, justamente, considerado por todos os juristas que têm em apreço o trabalho qualificado que se vai produzindo, e, por muito que possa oferecer dificuldades e até objecções, não pode deixar de ser tido em conta. Ora, a determinada altura, diz o Sr. Dr. João Baptista Machado: «Como conclusão das considerações feitas neste parágrafo (o da obra. Suponho que os Srs. Deputados prescindirão que eu leia o tal longo parágrafo que antecede estas conclusões), podemos, pois, assentar no seguinte: a) tratando-se de um prazo para a aquisição de uma faculdade legal, não têm aplicação as regras do artigo 297.° - embora, no caso de a LN vir prolongar o prazo da LA, e este se achar em curso, se chegue a um resultado idêntico àquele a que se chegaria por aplicação do n.° 2 daquele artigo;» A alínea b) e esta alínea é particularmente relevante no contexto do debate que estamos a travar, diz:

b) Tratando-se de prazos de caducidade de uma faculdade legal, as ditas regras são aplicáveis - salvo norma de transição que disponha outra coisa, como acontece, segundo vimos, com o artigo 19.° da Lei de Introdução. Não sendo este o caso e verificando-se a hipótese desta alínea b), aplicar-se-á a regra do n.° 1 ou do n.° 2 do artigo 297.° conforme, em concreto, a aplicação da LN se traduza numa redução ou numa alargamento do prazo da LA.
Diferentemente, porém, do que se verifica com os prazos de prescrição, de caducidade ou de extinção pelo não uso de um direito subjectivo, o facto de se ter verificado o esgotamento do prazo da LA e, portanto, a caducidade do direito de acção antes da entrada em vigor da LN, não obsta a que o alargamento do prazo estabelecido por esta lei possa aproveitar ao antigo titular de tal direito - direito este que, portanto, renascerá com a entrada em vigor da LN, se o prazo mais longo previsto por esta ainda não tiver expirado. «Fim de citação.»

A citação não foi tão extensa como poderia ter sido. De toda a maneira ela é já bastante esclarecedora.
Vamos admitir, por exemplo, que um conflito entre um qualquer senhorio e um qualquer inquilino, transcorrido no tempo há mais de 19 anos (e digo 19 como poderia dizer 25 ou outra idade que todos nós prezássemos muito), e que, de acordo com o artigo 1094.° do Código Civil, e com a interpretação que dele foi feita no assento do Supremo Tribunal de Justiça, por muito que possamos discordar de alguns aspectos pontuais, estaria, neste momento, inteiramente caducada, sem viabilidade de poder ser recolocada no foro judicial para reapreciação em toda a sua latitude, uma situação como esta, Sr. Deputado Montalvão Machado, a si me dirijo, à face do projecto de lei que nos apresentou, renasceria agora, poderia agora o senhorio, 19 anos passados sobre a data da caducidade para a interposição da acção, vir a tribunal dizer: - Eu quero fazer valer os meus direitos.
Á luz do assento do Supremo Tribunal de Justiça, tudo isto estava claro. À luz da proposta do Sr. Deputado Montalvão Machado, conformada com o n.° 2 do artigo 297.° do Código Civil, com os critérios que referi, e contra o assento do Supremo Tribunal de Justiça, também tudo está bastante claro.
A pergunta que, desde logo surge no espírito de quem quer e que se fez ao autor do projecto de lei, é esta: É exactamente este o objectivo que o Sr. Deputado Montalvão Machado visa? Não acautelou, minimamente, através de quaisquer outras formulações normativas, no seu projecto de lei, a possibilidade de ocorrência autênticas monstruosidades, com violação de expectativas legalmente protegidas, com fraude às expectativas de muita gente? Não acautelou as situações delicadíssimas decorrentes de um artigo como o que redigiu, tendo em consideração a aplicação da norma do Código Civil que citei, contra a interpretação do assento do Supremo Tribunal de Justiça? Então o propósito é fazer com que um caso, como aquele que referi, surja revitalizado, e portanto, com que o Sr. Deputado, brandindo um saco de cinzas, transforme a morte jurídica em vida, e, qual Fénix renascida, faça com que uma situação juridicamente morta, e bem morta, possa ser, ao cabo e ao resto, validada e recolocada para apreciação nos tribunais? É isto que pretende?
Ë bom que se diga, claramente, o que se deseja com este projecto de lei. Porque o que é facto é que, no curso de todo este debate, em que intervieram vários Srs. Deputados, de várias bancadas, tudo o essencial permanece sem resposta. O debate revelou várias coisas: revelou o silêncio constrangido das bancadas governamentais e, desde logo, o que é mais grave, o do Sr. Deputado Montalvão Machado; revelou a existência de crispações e até de objecções, no seio da maioria, ao texto proposto.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Revelou que há tentativas de fazer com que isto, que é novo, que é uma questão nova, apareça como algo de inocente e inócuo, mergulhado numa chicana parlamentar não alimentada pêlos partidos da oposição mas sim por aqueles que se eximiram, permanentemente, a prestar os esclarecimentos a que estavam obrigados, se quisessem travar um debate sério.

Aplausos do PCP.

E, neste contexto, tudo aquilo que, sendo controverso na doutrina, na jurisprudência e que, apesar de tudo, estando clarificado, de modo aceitável, pelas leis que nos regem, a vir a ser alterado, exigiria extraordinária ponderação, maturidade técnico-jurídica e aprofundamento de muito material heurístico, que todos nós deveríamos trabalhar, surge, nesta Câmara, para ser aprovado por via expeditista (como há um bocado disse, com desagrado do Sr. Deputado Igrejas

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Caeiro, mas vou repetir), sub-reptícia, na medida em que se não dão os esclarecimentos necessários e os Srs. Deputados vão votar «às cegas» ...

Aplausos do PCP.

.... e sem o mínimo de apreciação necessária, o que só desqualifica, em primeiro lugar, a Assembleia, em segundo lugar, os deputados que aprovam esta lei, e, em terceiro lugar, o próprio deputado proponente, se não for capaz de nos explicar, cabalmente, o bem fundado do que deseja.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não estamos no domínio de imputações, nem de processos de intenções; estamos no domínio do concreto e o desafio está feito. Formulámos questões políticas, jurídicas, às quais importa dar cabal atendimento e não contraditar, com evasivas de qualquer jaez ainda por cima contraditórias, como aquelas que foram aduzidas, até ao presente pelo deputado autor do projecto de lei.
Senão vejamos: o Sr. Deputado Montalvão Machado começou por advogar o carácter de lei interpretativa do seu projecto de lei, naturalmente pensando que uma lei interpretativa ainda teria cabimento no actual quadro constitucional. O Sr. Deputado Narana Coissoró teve, ontem, oportunidade de nos ler um extracto em que isso era amplamente demonstrado. Depois, enfim, recuou dessa posição e assume o carácter de Paladino de uma lei nova que, por via da aplicação das leis no tempo e beneficiando dessa mesma característica, gozaria do regime que eu tive oportunidade, tempestivamente, de expor.
Bom, tudo isto, é contraditório. Mais do que contraditório, tudo isto é demasiadamente probatório quanto às enormes dificuldades do Sr. Deputado Montalvão Machado ao defender o indefensável.
Somos chegados a um ponto do debate em que se impõe, com toda a clareza, que, sobre as questões jurídicas, as quais, como é óbvio, repousam em realidades muito claras - e já foi demonstrado por esta bancada de que lodo é que se pretende estar com a legislação que nos é proposta -, sobre as questões
técnico-jurídicas, dizia, se dilucide o que ainda é dilucidável.
Ora, impedir isto, sobre ser totalmente incompaginável com uma discussão responsável reprovando os requerimentos que há pouco foram adrede produzidos, e mal produzidos, sobre ser totalmente inadvogável à luz seja do que for, é, sem dúvida um elemento essencial para análise política dos resultados do debate que, não obstante, ido longe continua inteiramente em aberto.
Termino, pois, como comecei, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, afirmando que o dossier está em aberto e que quem pretender que ele está fechado, ou quem pretender fechá-lo sem o mínimo de esclarecimento, há-de levar às costas o bordão da completa capacidade do que quer ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - .... das obscuridades que, mal ajaezadamente, lhe ficam ao lado, e das responsabilidades técnicas e políticas, gravíssimas, de quem é capaz de acometer contra a sensatez e contra o direito e da justeza das posições políticas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa o seguinte requerimento: «Os deputados abaixo assinados requerem que se aplique, no debate de especialidade do projecto de lei n.° 177/III, o preceituado na alínea e) do artigo 246.° do Regimento.»
Seguem-se várias assinaturas, sendo a primeira do Sr. Deputado Carlos Lage.
Para elucidação dos Srs. Deputados vou ler o que diz a alínea e) do artigo 246.° do Regimento: «Na discussão na especialidade cada deputado só poderá usar da palavra uma vez, excepto o autor ou um dos autores da proposta de alteração, e o tempo de duração da palavra será reduzido a metade.»
Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado João Amaral?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, desejava interpelar a Mesa no sentido de requerer a informação sobre se esse requerimento foi admitido.

O Sr. Presidente: - Foi sim, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, esta é, de facto, uma situação insólita, e as situações insólitas merecem, pelo menos, um tratamento cuidadoso.
Eu peço a V. Ex.ª que tenha em consideração o seguinte: das duas uma, ou existe já um processo de urgência e essa norma é aplicável por si, ou não existe e então essa norma só pode ser aplicada depois de ser aberto um processo de deliberação de urgência, nos termos do artigo 244.° do Regimento.
O que eu requeiro a V. Ex.ª é que, se admitido o requerimento pensa pô-lo à votação, abra o debate nos termos do artigo 244.°

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha interpretação é a de que, tendo sido concedido o processo de urgência, se aplique automaticamente a alínea e) do artigo 246.° do Regimento. É evidente que não se começou a aplicar por lapso, do qual me penitencio, e naturalmente que também o Sr. Presidente da Assembleia porque não teve a informação a tempo de que estávamos perante um projecto ao qual foi concedido processo de urgência.
Naturalmente que esse requerimento é perfeitamente supérfluo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É supérfluo? Então retirem-no!

O Orador: - Pedi ao Sr. Presidente para aplicar a alínea e) do artigo 246.° que V. Ex.ª não aplicou, pelo que requeremos que se aplique agora. É este o

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sentido do requerimento e mais nenhum. É perfeitamente claro e todos compreendem o que está em causa e o que está em jogo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, eu pretendo ser muito breve nesta questão, que é um incidente.
Admito que o Sr. Deputado Carlos Lage e o Sr. Deputado José Luís Nunes, por precipitação, tenham apresentado o requerimento em questão. Admito também que o Sr. Presidente, por precipitação, o tenha admitido. Mas é bom que fique registado que este é um incidente inadmissível a qualquer título, que viola frontalmente o Regimento e que não abre qualquer espécie de precedente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É bom que isso fique completamente claro para que, noutras situações, alguém não possa vir, algum dia, invocar uma questão como esta. Se assim for, se isto não ficar decididamente esclarecido e se da parte de V. Ex.ª e da Mesa não houver um esclarecimento semelhante então o que eu roqueiro é que seja aberto o debate regimental, nos termos do artigo 244.° do Regimento. Que isto fique perfeitamente claro, para esclarecimento de qualquer cidadão que alguma vez leia o Diário da Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, creio que, na verdade, este requerimento é supérfluo e não deveria sequer ter sido admitido. Para mim, a questão coloca-se em termos muito simples. A não ser que estejamos enganados, a questão coloca-se-nos de uma fornia muito clara.
O Sr. Presidente confirmou que a Assembleia tinha adoptado o processo de urgência para discussão deste projecto de lei. A partir daí dever-se-ia ter aplicado o artigo 246.° do Regimento.
Aquilo que a bancada do Partido Socialista solicitou a V. Ex.ª foi que aplicasse o Regimento, o que eu penso ser obrigação da Mesa.
Se, porventura, a Mesa não respeita as regras do Regimento e decide prosseguir por outra via penso que à bancada do Partido Socialista não cabe fazer um requerimento, mas sim recorrer para a Assembleia de uma decisão da Mesa, que infringe as regras regimentais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Penso também que temos de estar necessariamente sujeitos ao Regimento e às regras, e só por consenso pode ser admitido que essas regras se ultrapassem, como já múltiplas vezes aconteceu nesta Assembleia. Se não há consenso temos que as respeitar em quaisquer circunstâncias, quer nos agradem,
quer nos desagradem, porque é a única defesa que cada um de nós pode ter aqui de ver respeitados os seus direitos e de não os ver variar ao sabor das vontades das maiorias.
Portanto, eu entendo que a Mesa deve aplicar o Regimento, deve aplicar o artigo 244.°, e se a Mesa não o fizer e se nenhum deputado tomar essa iniciativa,
tomá-la-ei eu, recorrendo para a Assembleia para fazer respeitar o Regimento, porque estou a fazer respeitar os meus direitos como deputado mesmo que, porventura, me seja desagradável, neste momento, o processo que venha a vingar.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, foi aqui dito pelo deputado Carlos Lage que tinha havido um lapso, e o lapso teria sido o de, em vez de se adoptar o regulamento de urgência, ter decorrido até aqui uma discussão sem carácter de urgência. Ora isto não é verdade, porque o Sr. Deputado Montalvão Machado lembrou-se de dizer, várias vezes durante este debate, - está registado - que fomos nós que votámos a urgência. Ora nós pedimos a baixa à Comissão para estes artigos serem lá trabalhados, tendo-nos sido então lembrado várias vezes que não podia baixar à Comissão porque estávamos no processo de urgência.
Não houve, portanto, qualquer lapso. O que houve foi benevolência da Mesa ao não coarctar os direitos dos deputados da oposição para que a discussão decorresse normalmente.
O que se está a verificar é que se quer Regimento para uma coisa que não está no seu espírito. Isto é, o Regimento prevê o diálogo entre oposição e a maioria para que, havendo uma intervenção colocada por um partido da oposição, a maioria responda. Mas o que se está aqui a verificar é uma fraude ao Regimento, pois a maioria não responde. A maioria defrauda o espírito do Regimento.
Naturalmente por causa disso é que a Mesa deve ter permitido à oposição algum tempo mais para debater esse problema, porque não podia ir para as «actas»
sub-repticiamente.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não é nada disso!

O Orador: - Aproveito também para dizer, Sr. Presidente, que concordo com a norma do bom senso que V. Ex.ª, lembrou, e que acima do Regimento e de todas as coisas está o prestígio desta Câmara e o bom senso do Sr. Presidente.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, faça favor de continuar a conduzir os trabalhos como conduziu até aqui porque não há lugar para qualquer recurso do nosso lado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa atitude foi transparente e foi de boa fé. Evidentemente que o requerimento teve o mérito de, pelo menos, verificar que há concordância em aplicar-se, quando invocado, o preceituado na alínea e) do artigo 246.° do Regimento.

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Sr. Presidente, nós retiramos o nosso requerimento desde que V. Ex.ª faça aplicar essa alínea.
Pensamos que há concordância nisso, e não vale a pena perdermos mais tempo com esta questão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, anunciei a entrada deste requerimento e a sua admissão porque o entendi como destinado a esclarecer uma situação. Na realidade, a discussão deste projecto de lei não se processou segundo o processo de urgência como devia ter acontecido. Sucede que, a determinada altura, foi levantado o problema de que não se estava a seguir o processo de urgência, e este requerimento chama a atenção para isso.
Daí que me parece desnecessário votar o requerimento, seguindo-se, daqui em diante, o processo de urgência que tinha sido votado.

Aplausos do Sr. Deputado José Luís Nunes (PS).

A sugestão do Sr. Deputado Narana Coissoró só teria, digamos, inteiro cabimento na hipótese de haver um consenso geral em que se não seguissem as regras de urgência, mas as regras do processo normal. Parece-me não haver esse consenso na medida em que foi apresentado este requerimento.
Assim, a Mesa não tem outra coisa a fazer senão penitenciar-se, se for o caso, e seguir o processo de urgência.

Aplausos do PCP.

ara interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª acaba de dizer que não foi seguido, desde o princípio, o processo de urgência. Ora, isto criou, naturalmente, a expectativa em todos os deputados de que teríamos duas intervenções.
Agora, de repente - é o que sucede nesta lei, é o espírito dela mesma - enquanto está a decorrer uma coisa, guilhotina-se de repente com uma nova medida aquilo que tinha criado justas expectativas.
Se nós soubéssemos que o processo não era este e que poderia ser guilhotinado de repente pela maioria tínhamos dito tudo o que queríamos dizer na primeira intervenção.
Mas desde que se criou esta expectativa por culpa da Mesa, nós achamos que não devemos ser defraudados nas nossas justas expectativas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, poderá ter inteira razão mas, na realidade, uma vez chamada a atenção da Mesa para este aspecto, a Mesa só por consenso geral é que poderá dar-lhe satisfação.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não há consenso! Vamos votar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, eu interpelava a Mesa no seguinte sentido: Em primeiro lugar queria dizer que aplaudimos a decisão de V. Ex.ª ao considerar inadmissível que fosse enxertada, no decurso de um debate, a questão de se abrir um novo debate sobre um processo de urgência que já estava definido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Presidente, queria lamentar, em nome da minha bancada, que a um debate que está a decorrer, no nosso entender com silêncio da parte da maioria mas dentro de um consenso e dentro de um espírito construtivo, a maioria lhe tenha tentado pôr fim, através de manobras dilatórias. Era isso que queríamos lamentar.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos à hora regimental do intervalo. Entretanto, tem ainda a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, tive o cuidado de perguntar a V. Ex.ª, depois de ter sido anunciado o requerimento, se me seria ou não concedida a palavra.
V. Ex.ª disse-me que sim, que estivesse descansado. Eu descansei, e V. Ex.ª acaba agora de dizer que não posso ficar descansado.

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão! Mas não é por minha vontade!
Sr. Deputado Lopes Cardoso, faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, V. Ex.ª levantou a questão de que seria possível este debate continuar a decorrer nos mesmos termos em que tinha decorrido até agora se para tal houvesse consenso. Gostaria de dizer que nós daríamos obviamente o nosso consenso para que ele continuasse.
Assim, faríamos também um apelo no sentido de que se esse consenso fosse encontrado estaríamos todos a beneficiar porque corresponderia a um muito pequeno prolongamento do debate. As questões ficariam muito claras e ninguém poderia ser acusado, com razão ou sem ela, de querer fazer cair de repente uma guilhotina sobre este debate.
Da nossa parte, damos esse consenso e fazemos esse apelo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o apelo está feito. Se desejarem
intervir ...
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, uso da palavra para corresponder àquilo que é, de algum modo, um apelo da Mesa e do Sr. Deputado Lopes Cardoso.
Parece-nos que entre 2 males será preferível que um debate prossiga com as regras com que se iniciou.
Portanto, tal como um desafio não pode desenrolar-se numa segunda parte com regras diferentes do que aquelas com que decorreu na primeira, parece-nos que não é este o momento de modificar as regras do jogo.

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Por isso, também nós daremos o nosso consenti* mento para que o debate prossiga com as mesmas regras com que se iniciou.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o general Humberto Delgado, quando confrontado numa conferência de imprensa sobre se demitiria ou não o Dr. Salazar, disse: «se for eleito, obviamente demito-o».
Em face do circunstancialismo evidente a nossa resposta é: obviamente não! E o consenso terminou aqui porque não há o nosso consenso!

Vozes do PCP: - Valente!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 35 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 19 horas.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, há neste momento, duas questões para resolver: a primeira tem a ver com a sequência do debate, a segunda com a organização da votação e com os diferentes incidentes que existem em torno da mesma.
Quanto à organização da votação, há um requerimento de baixa à Comissão, o qual deverá ser tido em atenção logo que o entregarmos.
Quanto à sequência do debate, não me parece que se possa resolver todo o problema que, neste momento, existe ao considerar-se que os Srs. Deputados Lopes Cardoso e Hasse Ferreira estão ausentes. Eles tinham-se inscrito para intervir e por isso há que considerar as inscrições que há, nomeadamente a desses 2 Srs. Deputados, que naturalmente irão contribuir para o debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, tomo a sua intervenção como tendo feito uma interpelação à Mesa.
Certamente V. Ex.ª verificou que, há pouco, antes de reabrir a sessão, tive o cuidado de pedir ao Sr. Deputado Octávio Cunha, da UEDS, que me dissesse o que é que se passaria relativamente aos Srs. Deputados Lopes Cardoso e Hasse Ferreira. Presumo que a Câmara ficou suficientemente esclarecida para entender que esses 2 Srs. Deputados não poderão usar da palavra. Isto porque um Sr. Deputado não está e o outro está ocupado.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, vejo-me obrigado a dizer que os meus camaradas prescindiram da palavra.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado pela informação, Sr. Deputado.
Vamos aguardar 2 minutos para que se consiga fixar o quorum necessário, a fim de procedermos à votação, visto não haver mais inscrições.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, eu já tinha anunciado que, em relação à tramitação da votação, iríamos apresentar um requerimento de baixa à Comissão.
Em relação ao debate, gostaria de fazer uma curta intervenção.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não pode!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª levantou há pouco uma questão quanto à organização do debate. Presumo que ela já estava fixada ao abrigo e no respeito da alínea e) do artigo 246.° do Regimento. Não temos, portanto, dúvidas quanto a esse respeito.
Quanto ao processo de votação, antes de ela se iniciar, a Mesa indicará aos Sn. Deputados quais são as propostas que irão ser votadas, assim como a respectiva sequência.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, certamente para interpelar a Mesa.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sim, Sr. Presidente. Era para, como há pouco anunciei, nos termos regimentais, me inscrever para fazer uma curta intervenção.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não pode!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apenas para me situar, agradecia-lhe o favor de me dizer qual é o ponto sobre o qual pretende intervir. É em relação a todas as propostas que estão em discussão e que depois irão ser objecto de votação?
Segundo penso é sobre esse tema. Não é verdade?

O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: Então tem a palavra, Sr. Deputado João Amaral.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Anunciei que ia fazer uma curta intervenção, e esse é de facto o meu objectivo ...

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, V Ex.ª deu a palavra ao Sr. Deputado João Amaral para um fim muito concreto sobre o qual nós não nos pronunciámos, ou seja, para fazer uma intervenção. Mas o Sr. Deputado João Amaral não pode fazer mais nenhuma intervenção, nos termos da alínea e) do artigo 246 º do Regimento, que se considera aplicável.
A alínea e) do artigo 246 º do Regimento, que tem como título "Regra Supletiva", diz o seguinte: "Na discussão na especialidade cada deputado só poderá usar da palavra uma vez, excepto o autor ou um dos autores da proposta de alteração, e o tempo de duração da palavra será reduzido a metade."

Pausa.

Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª tem razão. Ao consultar o Regimento, verifico que realmente pode usar da palavra. Esqueci-me que V. Ex.ª é o autor da proposta.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral vai desculpar-me, mas terei de dar uma resposta ao Sr. Deputado José Luís Nunes.
Sr. Deputado José Luís Nunes, quando concedi a palavra ao Sr. Deputado João Amaral parti do pressuposto de que não só o Sr. Deputado estava a pedir a palavra no uso do direito regimental que lhe é concedido, através da alínea e) do artigo 246 º do Regimento, como também no pressuposto de que ainda não tinha usado da palavra, visto que cada Deputado só a pode usar uma vez.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Eu enganei-me, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado João Amaral, e queira fazer o favor de desculpar este pequeno incidente.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Queira ter a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, pareceu-me ouvir da parte do Sr. Deputado João Amaral que ele ia falar sobre a proposta de aditamento, por si apresentada, de um n .º 4. Ora, neste momento, estamos ainda a discutir a proposta de aditamento de um novo n .º 2, proposta essa que ainda não se acabou de discutir, nem ainda se procedeu à sua votação. No entanto, eu sou proponente de uma proposta de alteração do n .º 3 do projecto de lei, antigo n º 2.
De modo que eu não sei se se segue ou não a ordem dos números, ou se cada deputado pode falar sobre todas as propostas, tenham elas que números tiverem.
Gostava de saber isso para que depois não haja confusões.

O Sr. Presidente: - Devo confessar, Srs. Deputados, que não tenho consciência exacta se o debate se abriu sobre todas as propostas apresentadas, ou se se está a seguir o método de, para cada uma das propostas, ser aberta a discussão.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, até agora seguiu-se a seguinte ordem: discutiu-se e votou-se o corpo do artigo; discutiu-se e votou-se o n .º 1; está agora em discussão a proposta de um novo n .º 2, apresentada pelo Partido Comunista, que é uma subdivisão do artigo n .º 2 do projecto de lei. Eu apresentei uma proposta de alteração global sobre o n º 2 do projecto de lei que passará a n .º 3 e depois terá que se discutir a proposta de um n º 4, apresentado pelo Partido Comunista.

O Sr. José Luís Nunes (PS): -Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Queiram-me desculpar, Srs. Deputados, mas não se trata rigorosamente de nada disto. Do que se trata é do seguinte: há uma discussão na especialidade que abrange os números do projecto de lei e as propostas de novos números, e este processo de discussão na especialidade não se vai redobrar número por número até à saturação final.
O Sr. Presidente deu - e muito bem- a palavra ao Sr. Deputado João Amaral, e eu penitencio-me porque não me apercebi que o Sr. Deputado João Amaral era autor de uma das propostas de alteração.
Portanto, resta-nos ouvir a palavra desse Sr. Deputado sobre qualquer assunto sobre o qual se queira pronunciar, ou sobre qualquer proposta de alteração de que seja autor. Nada mais! A seguir passa-se à votação ..., a não ser que, nas mesmas circunstâncias das do Sr. Deputado João Amaral, haja outro Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Em termos definitivos, concluo que a discussão é sobre todas as propostas que foram apresentadas na Mesa e sobre o texto do diploma que está em apreciação. Terminada a discussão, votam-se todos os números do diploma e as propostas apresentadas.

O Sr. José Luis Nunes (PS): - Exacto!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Sr. Presidente, não vou insistir em que se siga ou não aquilo que o Sr. Deputado José Luís Nunes quer.
No entanto, tem de se estabelecer a verdade e, se V. Ex ª consultar a acta, verá que o debate está a ser feito número por número. Primeiro, discutiu-se e votou-se o corpo do artigo, depois discutiu-se e votou-se o n .º 1; agora está em discussão a proposta de aditamento de um n .º 2, apresentada pelo Partido Comunista, depois discutir-se-á e votar-se-á o n .º 2 que passará a ser o n .º 3 do projecto de lei, etc.

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Eu não me importo que se use da palavra, contando que não sejam cerceados os direitos dos deputados. O que não poderei admitir é se se disser que eu já fiz uma intervenção e que portanto não posso intervir mais, não podendo apresentar a proposta que subscrevi.
Até agora intervim sobre a proposta de aditamento de um n.º 2, apresentada pelo Partido Comunista. Se a partir de agora, porque já intervim uma vez, eu não posso mais usar da palavra nem para apresentar a minha proposta, parece-me uma violência.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, houve a preocupação de simplificar, mas a Mesa é da opinião de que, em relação a cada proposta apresentada, tem que se abrir a discussão e a consequente votação.
É esse o critério que vamos seguir por ser aquele que está regimentalmente previsto.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, pedindo-lhe desculpa pela demora que causei devido aos esclarecimentos que tive que prestar.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, e Srs. Deputados, não vou obviamente colocar as questões que devem ser colocadas em torno do que parece ser uma deliberação da Mesa sobre este problema. Vou retomar o fio da meada.
A questão que se coloca, concretamente, neste momento, à maioria é a de se considerar ou não a relevância de um facto novo que se inseriu neste processo.
Devo dizer aos Sr. Deputados que no debate que ontem e hoje se travou se tentou, de alguma forma, misturar a análise; daquilo que nos devia preocupar com a análise e consideração de factores que são completamente exteriores à questão.
Alguém pode estar aqui a dizer que este debate e a forma cuidada e prolongada como tem vindo a decorrer tem a ver com outras questões. Esta é uma forma fácil de calar a consciência dos deputados da maioria que vão votar. Os Srs. Deputados da maioria não vão votar a velocidade maior ou menor com que vai entrar na ordem de trabalhos a proposta de lei de segurança interna.
Não é isso que vão aqui votar. O que vão votar é o normativo concreto que o Sr. Deputado Montalvão Machado, o silencioso deputado Montalvão Machado, aqui nos propôs.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E é bom que isso seja qualificado! Não procuremos iludir as questões!
A questão que está colocada na proposta do silencioso deputado é, a partir de um facto novo que é introduzido pelo assento, a seguinte: quando o Supremo Tribunal de Justiça, utilizando os meios legais em vigor e sem questionar a sua constitucionalidade, interpretou a lei num certo sentido, e o fez no momento em que decorre esta discussão, isso vai dar-lhe um claro conteúdo institucional. E não haja aqui um Sr. Deputado que procure razões laterais para ignorar isto.
O claro conteúdo institucional que aqui está colocado é o seguinte: a posição que a Assembleia da República e os deputados da maioria vão tomar face

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a isto confronta-se, directamente, com a interpretação dos textos legais que o Supremo Tribunal de Justiça, por via de assento, fixou.
Não vale a pena iludir esta questão com a da lei da segurança interna e com a velocidade com que ela entra no Plenário. É esta a questão que está colocada em primeiro lugar.
Os Srs. Deputados que votassem favoravelmente a proposta do Sr. Deputado silencioso não teriam desculpa nenhuma, em momento nenhum, perante a questão que o Supremo Tribunal de justiça nos coloca e que é esta: "nós, Supremo Tribunal, interpretámos a lei e os senhores, abusando de alguma forma do poder legislativo disseram que interpretámos mal."
É um escândalo!
A segunda questão também não se pode confudir com a velocidade com que a lei de segurança interna entra no Plenário. Não vale a pena tentar iludi-la com isso.
Ora, a segunda questão que se coloca é que, a partir do momento em que foi produzido o assento, surge uma outra questão no que toca à aplicação da lei.
A questão é simples: um certo inquilino, por exemplo, vive numa situação ilegal que é do conhecimento do senhorio e este tem um prazo para obter o despejo com esse fundamento. A jurisprudência questiona se esse prazo se contava a partir do conhecimento ou não. A partir do momento em que o Supremo Tribunal de Justiça disse que esse momento se conta a partir do conhecimento do facto, criou-se uma expectativa nas pessoas que são afectadas na sua vida quotidiana pela forma de regular esta situação e que se traduz na definição do que se pode chamar "uma situação de estabilidade", ou seja, porque o senhorio já sabia há 10, 20 ou 30 anos que não podia alterar a situação.
Essa é uma função fundamental da lei e não é com a história da lei de segurança interna que os senhores podem fugir a esta questão.
Uma função fundamental da lei é estabilizar o enquadramento jurídico das relações sociais, e essa foi a função que o Supremo Tribunal de justiça exerceu - e bem - fixando o assento.
Ora, a partir do momento em que o deputado silencioso mantém a sua proposta, a partir do momento em que mantém esta posição, a partir do momento em que, jogando com factores exteriores, quer fazer esquecer qual a questão que está aqui em debate, a situação que está criada é a de que uma lei como essa não servia para estabilizar as relações sociais, mas sim para o inverso, ou seja, para as instabilizar.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É exacto!

O Orador: - Não estou a dizer nada que não seja do conhecimento concreto de milhares de advogados e de centenas de juízes que existem neste país e que têm a exacta noção do que se está a passar aqui na Assembleia e da chicana que, no fundo, isto é.

Aplausos do PCP.

É justamente a questão da estabilização da relação jurídica que os Srs. Deputados da maioria têm que encarar frontalmente.
Tem aqui sido dito e redito que uma questão como esta merecia análise cuidada e ponderada. Nós dizemos, franca e lealmente, que o merece, antes que,

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no futuro, muitos venham pedir contas da irresponsabilidade que o deputado silencioso possa ter vindo a induzir a maioria a praticar.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Muito bem!

O Orador:- Também dizemos claramente que a irresponsabilidade não se traduz aqui senão em que há quem seja responsável pelo projecto de lei, há quem saiba qual o seu exacto alcance e há quem não explique nem responda às questões concretas que foram colocadas.
A questão concreta está agora exactamente resumida e é a seguinte: o Sr. Deputado passou da consideração de que a lei é interpretativa para a consideração de que a lei é nova. Mas o que se põe em causa -e isso já foi aqui dito e redito é que, tanto em sede de doutrina, como em sede de jurisprudência, há muita boa gente que diga - foi aqui citado um professor universitário que escreveu um livro inteiro sobre questões que andam à volta desta que, no caso concreto, com este tipo de prazos e funcionando em relação a este tipo de situações, a lei nova se aplica a esses prazos. Não se diz que a lei tem efeito retroactivo. Aí até pode o deputado silencioso fazer um ar ingénuo e tentar enganar com o silêncio a bancada da maioria, mas a questão não é a retroactividade. A questão é que o prazo continua a decorrer; o prazo que já estava precludido continua a decorrer por força a manter-se a situação que não está conformada com o código. No fundo, reabro-se a contagem do prazo e é novamente possível desestabilizar a relação social que o assento fixou.
Esta questão é concreta e tem a ver com a jurisprudência, com a doutrina e com o que tem sido dito.
Srs. Deputados, isto não merece nenhuma espécie de ironia, nem tem nada a ver com os incidentes regimentais, nem com as questões que se colocam em torno da organização de trabalhos da próxima semana. É uma questão muito séria que tem a ver com questões concretas que se põem aos cidadãos senhorios ou inquilinos e com a estabilização das relações sociais de alto alcance. É uma questão que não pode ser tratada desta forma encapotada, um pouco envergonhada e desvirtuada que é a de obter, a partir de uma questão exterior -organização de trabalhos da próxima semana, um assentimento para alguma coisa que tem real alcance nas relações sociais.
Srs. Deputados, a questão que se coloca é esta: defender a estabilidade das relações sociais, neste momento, é reponderar todas as soluções que estão colocadas no quadro da proposta do deputado silencioso. E é de fazê-lo seriamente em sede de comissão, o que não pode ser entendido como moeda de troca para outro tipo de operações, sejam elas quais forem.
Se os Srs. Deputados estão muito interessados em que entre a lei de segurança interna, coloquem a questão frontalmente, coloquem-a na conferência de líderes coloquem-a onde é preciso e como é necessário! Agora, não podem é votar uma lei destas por causa disso. Se alguém vos disse que a questão da entrada de lei de segurança, interna depende de votar favoravelmente esta questão, esse alguém enganou-vos em vários aspectos. Enganou-vos, em primeiro lugar, porque esse incidente não existe nesses termos e, segundo,porque vos vão tentar levar a votar uma solução iníqua, que não é adequada nem reflecte a verdade.
Esta questão que coloquei - e penso ter conseguido fazer-me ouvir por alguns Srs. Deputados - é uma questão séria.
Se o Sr. Deputado silencioso continuar podemos dizer que, neste caso, o silêncio é veneno! E é veneno virado contra as bancadas da maioria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Amaral, na sua intervenção, referiu-se ao nosos colega deputado, Dr. Montalvão Machado, chamando-lhe, por várias vezes, deputado silencioso.
V. Ex.ª não fez um único reparo.
Desejava interpelar a Mesa nos seguintes termos: aquilo que o Sr. Deputado Amaral disse hoje já o tinha dito anteriormente. Aquilo que o Sr. Deputado Amaral acaba de dizer, já o seu colega Manuel Mendes disse várias vezes. Aquilo que o Sr. Deputado Amaral disse, já o Sr. Deputado Magalhães disse várias vezes. Aquilo que o Sr. Deputado Amaral disse, já a
Sr.ª Deputada Odete Santos disse várias vezes.
O Sr. Deputado Montalvão Machado já explicitou aqui, várias vezes, a posição e a justificação deste diploma.
Pergunto a V. Ex.ª tal como o Sr. Deputado Amaral trata o Sr. Deputado Montalvão Machado por deputado silencioso, poderei passar a tratar o Sr. Deputado Amaral por, por exemplo, Sr. Deputado palavroso?

Aplausos do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem o seguinte sentido: entendo muito naturalmente que o Sr. Deputado da última fila do PSD - de que não me lembro do nome e por isso não o trato por nada ...

O Sr. Presidente: - É o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Orador: - O Sr. Deputado Costa ...

O Sr. Presidente: - Fernando Costa, Sr. Deputado.

O Orador: - Foi Costa que disse, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Fernando Costa, Sr. Deputado.

O Orador: - Exactamente, Sr. Presidente. Entendo perfeitamente que o Sr. Deputado Costa venha debitar para o Diário o seu mau humor.
Mas a única coisa que lhe pergunto, Sr. Presidente, é o seguinte: entende ou não a Mesa que a questão

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que está em debate é relevante ao ponto de o Sr. Deputado Montalvão Machado ter entendido introduzi-la na ordem do dia ao longo de todos estes dias?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não lhe vou responder se é relevante ou não, pois a conferencia de líderes também é responsável quanto a este problema porque agendou a matéria por a achar relevante. De resto, se também o Plenário julgou da sua urgência, foi porque entendeu que o diploma era relevante.
Quanto à observação feita pelo Sr. Deputado Fernando Costa, devo referir que, pessoalmente - já que a interpelação foi dirigida à minha pessoa, como presidente -, as primeiras expressões proferidas pelo Sr. Deputado João Amaral, no que se refere à designação do Sr. Deputado Montalvão Machado, não me feriram, mas as restantes começaram a preocupar-me um pouco. Entretanto, como o Sr. Deputado João Amaral deu por terminada a sua intervenção, achei dispensável chamar-lhe a atenção para lhe pedir o favor de não voltar a designar o Sr. Deputado Montalvão com o adjectivo com que o vinha qualificando. Realmente parece-me que a insistência pode ser julgada menos correcta.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, tenho o máximo prazer em tratar o Sr. Deputado Montalvão Machado com a consideração que é devida ã todos os Srs. Deputados e, nomeadamente, pelo seu nome.
O que fiz ao longo da intervenção, depois de o ter nomeado, foi uma qualificação política não me referindo a ele mas a um deputado como sendo o Sr. Deputado silencioso.
Se o Sr. Deputado Montalvão Machado enfiou o barrete, isso é com ele.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD:- Não, não!

O Sr. Presidente: - Bom, as palavras ficam com quem as profere e a responsabilidade será de cada um.
Srs. Deputados, vamos prosseguir os nossos trabalhos.
Como não há mais inscrições, o Sr. Secretário vai ler a disposição que vai ser submetida à votação.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para apresentar um requerimento à Mesa. Se o Sr. Presidente quiser posso lê-lo.

O Sr. Presidente: - Queira ter então essa bondade, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Requerimento.
O debate na generalidade e na especialidade do projecto de lei n.° 177/III, confirmou a necessidade de uma maior ponderação do regime jurídico a aprovar.
Considerando:
a) A longa controvérsia na doutrina e na jurisprudência sobre o objecto do projecto;
b) A não dilucidação de certas das suas implicações.
c) O silêncio pertinaz das proponentes quanto a argumentos suscitados durante o debate;
d) A publicação entretanto verificada de um assento do Supremo Tribunal de Justiça sobre a matéria (facto novo que só por si exigiria reconsideração);
e) As suspeições que poderiam recair sobre a Assembleia da República caso aceitasse aprovar, nestas circunstâncias, uma disposição que revogaria um assento do Supremo Tribunal de Justiça;
f) A necessidade de aprofundar o exame das questões melindrosas suscitadas durante o debate;

os deputados do Grupo Parlamentar do PCP abaixo assinados, propõem a baixa do texto das alterações pendentes à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para nova apreciação, nos termos regimentais.»

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira fazer o favor de entregar esse requerimento na Mesa para se proceder à sua imediata votação.
Presumo que todos os Srs. Deputados tomaram conhecimento do requerimento. Vamos, pois, votá-lo.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD e votos a favor do PCP, do CDS, da UEDS, da ASDI e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O requerimento que apresentámos na Mesa e que acaba de ser votado pressupunha esclarecimentos que foram dados pela bancada do PCP ao longo deste debate e pressupunha também uma situação de fundo que permanece inteiramente inextrincada, ou seja, a da necessidade de aturadamente considerar toda a problemática em apreço, dada a alta gravidade de que se reveste o conjunto normativo que está proposto e dado o interesse de ponderar, até à exaustação, as soluções mais correctas.
Demonstrámos a necessidade de que um tal procedimento, por parte da Assembleia da República, não pudesse deixar de ser assumido por cada um dos deputados. E fizemo-lo em defesa da bondade das soluções normativas mas também em defesa do decoro e do mínimo prestígio que uma Câmara democrática deve ter em todos os seus actos.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pensamos que, ao votar como votou, a maioria, que, de resto, se tem revelado, ao longo de toda esta discussão, particularmente acéfala e desinteressada do conhecimento do problema, mas apenas demonstrou, por um lado, a sua completa insensibilidade face à necessidade de pôr a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a funcionar utilmente em torno de questões pertinentes

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e demonstrou, por outro lado, que, de facto, o objectivo político que persegue é pertinaz, obscuro, inesclarecido.
Tal situação não ocorre com a minha bancada, que está neste debate para promover que tudo fique cabalmente líquido e para obter, até onde seja possível, o compromisso político de todos os que estejam dispostos a um trabalho honesto para que as leis que daqui saiam sejam leis tecnicamente apuradas, politicamente sensatas, juridicamente responsáveis.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de substituição...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de requerer à Mesa, dado que se vai proceder a uma votação, a verificação da existência de condições para essa mesma votação, designadamente, verificando o quorum.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. A Mesa vai verificar se há ou não quorum para a votação.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, solicito a V. Ex.ª 2 minutos a fim de chamarmos os Srs. Deputados que se encontram no Palácio, nos seus gabinetes ou noutros locais.

O Sr. Presidente: - Está bem, Sr. Deputado. Entretanto, a Mesa vai proceder à contagem dos Srs. Deputados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa já procedeu à contagem dos Srs. Deputados presentes e verificou a existência de quorum.
Vamos, pois, votar uma proposta de substituição do n.° 2 do projecto de lei n.° 177/III, apresentada pelo PCP, do seguinte teor: «o prazo de caducidade corre separadamente em relação a cada um dos factos».
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS, votos a favor do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez e a abstenção da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra esta proposta de substituição porque, depois dos esclarecimentos por nós pedidos
à bancada do Partido Comunista, não nos convenceram os argumentos por ela apresentados para esta separação.
Além disso, pareceu-nos que o nosso voto a favor desta proposta prejudicaria a nossa própria proposta de, globalmente, se manter a actual redacção aditada de um inciso que, a seu tempo, justificaremos.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, uma brevíssima declaração de voto.
Nós pensamos que as propostas que apresentámos, embora subdividindo o n.° 2 em dois números - 2 e 3 -, não trazem qualquer alteração significativa de conteúdo e de efeitos.
Por isso mesmo, as objecções postas a esta subdivisão não colheram ontem conforme ficou demonstrado no debate.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar o texto do n.° 2 do projecto de lei em discussão, que é do seguinte teor: «Ò prazo de caducidade corre separadamente em relação a cada um dos factos; tratando-se de facto continuado, só corre a partir da data em que o facto tiver cessado.»
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS e votos contra da PCP, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do Sr. Deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não esteve em causa durante o debate, por parte da nossa bancada, esta parte do artigo, na medida em que ela pressupõe, necessariamente, a definição do facto continuado.
O que interessa é qualificar em que circunstâncias este facto duradouro ou continuado poderá produzir efeitos em relação ao senhorio. É isto que fazemos em relação à proposta de aditamento por nós apresentada e, para vermos passar o nosso aditamento, tornava-se imprescindível que a parte nuclear do dispositivo estivesse contida no texto da lei. Foi por isso que votámos a favor deste n.° 2 do projecto de lei n.° 177/ III.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão e votação da proposta de aditamento apresentada pelo CDS, que diz o seguinte: «O prazo de caducidade corre separadamente em relação a cada um dos factos; tratando-se de facto continuado, só corre a partir da data em que tiver cessado quando não afecte apenas os interesses particulares do senhorio».
Está em discussão esta proposta.

Pausa.

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Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Durante o debate ocorrido nestes longos dias, foi já explicitada a razão principal por que nos batemos por este aditamento e vale a pena recordar, neste momento, os motivos principais da nossa posição.
O motivo principal é o seguinte: hoje em dia, o arrendamento, seja para habitação ou para fins comerciais ou industriais, deixou de ser puramente uma relação bilateral para ser uma relação que hoje se diz "triangular". Triangular porque não está apenas em causa o interesse do senhorio, não está apenas em causa o diálogo jurídico entre o senhorio e o inquilino, mas intervém um outro vértice, que é o interesse público. Este interesse público; traduz-se, em primeiro lugar, no devido aproveitamento, ou no mau aproveitamento do local arrendado.
Há interesses de ordem jurídica ligados ao próprio contrato de arrendamento. Isto foi sempre entendido assim e, por isso, a própria lei prevê, por exemplo, que o arrendamento não seja feito para fins, imorais, para fins ilícitos, para fins contrários à ordem pública, nem para nele funcionarem, por exemplo, masmorras particulares ou cárceres privados, nem para nele se guardar droga nem para guarda de quaisquer outros fins que prejudiquem a sociedade e que prejudiquem também os fins prosseguidos pelo direito.
Por isso mesmo, o contrato de arrendamento, tal como sucede num contrato de trabalho ou de família, deixou de ser uma relação ou um contrato bilateral para cada vez mais ganhar o foro da transição entre direito privado e direito público e ganhar também uma forma institucional, isto é, quando o senhorio e o inquilino entram nesta relação têm que acatar e aceitar, independentemente da sua vontade, determinadas consequências que são ditadas pela própria relação contratual do arrendamento.
Entendemos, por isso, que ele não deve ficar puramente ligado às regras normais da caducidade e da prescrição e que deve ser feito muito ponderadamepte na medida em que se desaloja um inquilino e se, faculta outra vez a entrega ao senhorio de um lugar ocupado por um ser humano ou por uma família. Isto, porque está em causa o interesse social e está em causa, não apenas o interesse do inquilino, não apenas o interesse do senhorio mas o interesse da própria sociedade para que determinadas relações jurídicas, como a do arrendamento, sejam estáveis e conformes à função social da propriedade.
Ora, sucede que, muitas vezes, o contrato de arrendamento atinge a natureza de um puro contrato privado, isto é, serve de arma de chantagem contra o inquilino por parte do próprio senhorio. O senhorio sabe, por exemplo, que morreu um determinado inquilino e que nessa casa está a viver uma filha desse inquilino ou outra pessoa; quando o próprio senhorio mora no prédio e com a sua passividade durante anos e anos perante esta situação, deixa passar o prazo para intentar a acção, criando objectivamente na consciência e na convicção do inquilino que se acomodou a esta nova situação e que, com o seu consentimento tácito, digamos assim, aceitou uma nova situação de arrendamento.

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Outras vezes sucede que é o próprio senhorio que, por alguma razão sem ser por meios formais incute no inquilino que ele pode mudar de ramo de negócio. Então quando chega a altura de aumentar a renda tenta obrigar, de qualquer forma, o inquilino a ceder às suas pressões invocando o direito de despejo chegando que tem na mão uma arma para o despejar. Os advogados sabem que, muitas vezes, a tentativa de conciliação nos tribunais portugueses -que é prévia, da contestação nas questões de arrendamento -tem servido mais para satisfazer os apetites chantagistas dos senhorios do que propriamente para chegar a um acordo.
E que esta tentativa de conciliação tem servido para, invocando essa mesma relação triangular, ser uma forma de pressionar um aumento ilegal da renda que, de outra forma não seria conseguido, e até, muitas vezes, para obrigar o inquilino a fazer um novo contrato de arrendamento com uma nova renda porque a lei se opõe ao aumento de renda tout court.
Ora, nós queríamos afastar este tipo de situações chocantes para a consciências de qualquer jurista, para a consciência moral de qualquer cidadão, para a sociedade e para a própria ordem jurídica.
Naturalmente que a Assembleia da República não devia embarcar em, soluções fáceis, globalizantes, unicitárias em que não se tomem em consideração estas realidades que, dia a dia, todos nós vivemos.
Quando no assento, 11 dos 17 juízes foram vencidos, foram-no em nome da estabilidade, da segurança e do interesse público. Pena é que esta lei, como hoje se disse aqui, tire um novo assento dos vencidos contra os vencedores.
Não direi que isto é um ultraje à magistratura. Naturalmente que não está em causa o ultraje à magistratura. E nossa função fazer leis, mas fazer leis boas, consentâneas com a natureza da própria situação, consentâneas com o interesse público, com a pobreza, com o inquilino que se convenceu de que realmente o senhorio aceitou a situação e que, por isso, pode viver livremente sabendo que a lei não é uma arma contra si mas uma defesa da sua própria pobreza, uma defesa da estabilidade da sua própria família, uma defesa da sua própria vida em sociedade.
Não vale a pena dar posses a grandes comissões de família e, por outro lado, prejudicar a família no seu dia-a-dia, dando aos senhorios manhosos uma arma contra os inquilinos indefesos.
Esta lei, mal interpretada, como vai ser, é uma lei manhosa contra os inquilinos honestos, a favor dos senhorios manhosos, e por isso ela poderá vir a ficar na história como a "lei da manha, a favor dos senhorios manhosos".
Não vale a pena dar parabéns a este ou àquele, mas deviamos dar parabéns a nós próprios fazendo uma boa lei. Mas esta lei não é boa, na medida em que não traz nada de novo, unicamente traz lei ou faz lei numa situação iníqua; depois de longos anos de estudo, depois de correntes jurisprudenciais se terem degladiado, depois de juristas terem intervindo e terem dado uma solução, faz tábua rasa de tudo quanto sucedeu neste país, como se fazer uma lei fosse meramente pegar no lápis e fazer do vencido vencedor.

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Muito mal! Muito mal!

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O Orador: - Pode ser muito mal, mas a lei é muito pior!
Não esperaríamos que um partido, que se titula a si próprio social-democrata, fizesse leis de capitalismo selvagem.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado! Não diga disparates!

O Orador: - Não esperaríamos que um partido que se diz defensor de reformas e reformista fosse introduzir na legislação portuguesa a lei mais conservadoramente retrógrada de que há memória.
E aqueles que os sociais-democratas acusam de conservadores e retrógrados foram afastados para que a lei atingisse o extremo do conservadorismo. Não sei se esta lei é própria da social-democracia, com certeza que não é do CDS...

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Era o que faltava!

O Orador: - ..., com certeza que não é desta Assembleia da República. Quando muito será uma lei da maioria, para uso da maioria, para uso de certos senhorios protegidos contra inquilinos indefesos.

Vozes do PSD: -Não apoiado!

O Orador: -- Por isso, pedimos este aditamento, pedimos a última atenção para que a Assembleia da República não faça uma lei manhosa a favor dos senhorios manhosos, que não aprove uma lei a que ainda se dão parabéns - como aqui ouvi - e que desprestigia o próprio autor do projecto porque estes parabéns colocam-no mal.
Não deviam fazer isto, Srs. Deputados, porque nós estamos aqui a legislar e não a felicitar um pelas obras boas ou más que faz, porque a lei é geral e abstracta, não é feita por uma pessoa, há-de ser votada por esta maioria, há-de aparecer como lei da Assembleia da República e naturalmente há-de pesar sobre todos nós -mesmo sobre a oposição- como se fôssemos autores desta lei.
Pela última vez, faço um apelo: meditem no interesse público que o arrendamento tem e vejam se nesta formulação que a Assembleia da República vai aprovar há uma gota sequer de protecção do interesse público. Uma gota sequer!
E votem conforme a vossa consciência de socialistas, conforme a vossa consciência de sociais-democratas, não votem no capitalismo selvagem.

Risos do PSD e do PS.

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Que chavões!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. Uosé Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado Narana Coissoró, desejava fazer-lhe uma interpelação muito breve. V. Ex.ª tem consciência certamente que não fez um apelo, mas sim um sermão.

Risos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E aquele silêncio? É uma homilia!

O Orador: -Não me vou pronunciar sobre todos os argumentos que o Sr. Deputado usou, porque já os ouvimos. Mas chamo a sua atenção para a seguinte frase, que espero que fique - como se diz em direito- registada para não mais ser retirada: "o apetite chantagista dos senhorios." E veja os advogados de defesa que têm neste momento, que distinguem entre o "de" aristocrático do " de" generalizante!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Deixe-se dessa dos advogados de defesa!

O Orador: - Quando o Sr. Deputado se dirigir aos seus eleitores democratas-cristãos não se esqueça que apelou à luta de classes, pela violência e pelo ódio.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - A expressão "o apetite chantagista dos senhorios" é uma expressão da luta de classes, que não tem sentido na boca de V. Ex.ª

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - É verdade! É verdade!

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Deputado José Luís Nunes não disse se queria pedir um esclarecimento ou se queria fazer uma afirmação de "confessionário" em público. Se pediu um esclarecimento, vou dar-lho, se simplesmente fez uma apreciação genérica sobre aquilo que eu disse terei de utilizar outra forma regimental.

O Sr. Presidente: - Eu interpretei como sendo um pedido de esclarecimento.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Então, como tenho o direito de responder um a um, ou globalmente, aos pedidos de esclarecimento, gostaria de, pelo grande prazer que tenho em responder individualmente ao Sr. Deputado José Luís Nunes, lhe responder desde já.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Deputado José Luís Nunes muitas vezes tem graça, mas não consegue, com a sua graça forçada, principalmente a esta hora, em que está muito cansado, forçar notas que não cabem no meu discurso.
Eu disse que esta lei pode vir a ser uma lei manhosa para uso dos senhorios manhosos e disse que pode haver senhorios - e amanhã a acta será publicada - que fazem chantagem sobre os seus inquilinos e que nós, advogados, até sabíamos como é que, muitas vezes, as tentativas de conciliação se tranformam em tentativas de chantagem. V. Ex.ª também o sabe.
Não há aqui nada relacionado com luta de classes. E se houvesse uma classe de senhorios chantagistas, eu daria combate a essa classe, e V. Ex.ª estaria comigo na primeira linha. Diga que não?!

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, tem a palavra para um protesto.

O Sr. José Luís Nunca (PS): -Sr. Deputado Narana Coissoró, o que V. Ex.ª pronunciou - e agora modificou, e muito bem -foi o seguinte: a tentativa de conciliação serve para exacerbar o apetite chantagista dos senhorios. O que o Sr. Deputado quer dizer é que serve para exacerbar o apetite dos senhorios chantagistas. A diferença que vai entre uma coisa
outra é um abismo.
A minha intervenção serviu só - metodologicamente e mais nada - para sublinhar até onde pode, às vezes, levar a paixão política de um debate.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Faço este pedido de esclarecimento para evitar intervir mais neste debate, dado o adiantado da hora.
Diria que partilho - sem utilizar, necessariamente, os mesmos qualificativos - os pontos de vista expressos pelo Sr. Deputado Narana Coissoró no que respeita à legislação do inquilinato e, concretamente nesta proposta, na necessidade de tratamento diferenciado dos interesses públicos e privados. Para poupar tempo, não repito essa argumentação, que seria certamente menos colorida e juridicamente menos fundamentada.
Espero que um número significativo de Srs. Deputados seja sensível à argumentação expendida e que pequenos incidentes verbais não impedissem um rociocírio e uma análise fria desta questão.
Efectivamente, esta é uma lei que, do meu ponto de vista, reintroduz uma prática do capitalismo selvagem que o antigo regime não permitiu e que e Aliança Democrática também não admitiu.
A adenda proposta pelo CDS permitiria limar os aspectos mais desagradáveis e nocivos deste projecto de lei. Esperar-se-ia da esquerda, do centro esquerda e do centro direita uma certa sensibilidade a esta argumentação. Não de todos os Srs. Deputados, é certo, até porque alguns podem não lhe ser sensíveis, mos, em geral.
A minha pergunta concreta é, pois, a seguinte: o Sr. Deputado pensa ter convencido a maioria, ou pensa que ela se manifestará e manterá fechada à sua, à nossa argumentação? E se se mantém fechada, por que motivo?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos à hora regimental do encerramento dos trabalhos mas, por consenso estabelecido na conferência das presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares, vamos prolongar estes trabalhos até è votação deste número da ordem de trabalhos. Espero que até às 9 horas isso se consiga.
Sr. Deputado Narana Coissoró, se deseja responder já, tem a palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS). - Sr. Deputado Hasse Ferreira, muitíssimo obrigado pelas palavras que disse.

Num problema destes, como em muitos outros, não ponho a questão entre a esquerda e a direita, porque não é, com certeza, monopólio da esquerda defender os interesses sociais, nem é monopólio ou obrigação da direita, defender as interesses privados.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Todos nós temos consciência plena de que estamos a viver em 1984, todos nós temos consciência plena de que estamos a viver 10 anos depois da Revolução, todos nós temos consciência plena daquilo que temos de fazer pelos Portugueses e para os Portugueses, por Portugal e para Portugal.
Por isso, nunca colocaria esse problema como um problema da direita ou da esquerda.
Como já disse, esta é uma relação triangular onde há interesses bilaterais e, a sobrepor a esses interesses bilaterais, há o interesse social.
Qualquer que fosse a interpretação deste interesse social, seria depois uma questão de cambiante entre o hemiciclo - entre o arco-íris constitucional, como dizem os italianos- saber até onde levar o interesse social, até onde levar o interesse da comunidade sobre o interesse bilateral do senhorio e do inquilino. E isto que nesta proposta não se faz, isto é, fecham-se deliberadamente os olhos, em 1984, a uma realidade que já ultrapassou esta lei há muito tempo.
Quer-se puxar o tempo para trás, quer-se puxar o tempo para 1973. E em 1973, como V. Ex.ª disse, e bem, esta lei não passava. Esta lei não passava, sob o governo de Salazar; esta lei não passava, sob o governo de Marcelo Caetano; esta lei não passava, sob o governo do Dr. Sá Carneiro; esta lei não passava, mesmo com os maus governos da AD, e vai passar com o péssimo governo socialista-social democrata.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Deputado Narana Coissoró, creio que este debate tem revelado -e cremos que isso é positivo, apesar de o seu resultado ser negativo em si mesmo - que, da parte da bancada do PSD, insolitamente, neste ano de 1984, nesta fase da sua vida interna, deste PSD que está aí, ao fim da sua trajectória histórica destes anos todos de muitas vicissitudes ...
O ponto em que o PSD está não é sequer de involução, já rompeu as fronteiras em matéria de reflexão sobre a problemática do arrendamento que se detinha há decénios de anos numa certa noção social do contrato de arrendamento e que já deixava de tributar, num sacrifício absoluto à propriedade privada em termos que são partilhados por sectores políticos e ideológicos muito diversas. A fronteira aí é realmente muito larga, e o que é estranho é que o PSD se ponha do lado de lá, sustentando concepções que não ouvíamos da boca de ninguém há muito, mas muito tempo ...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Desde 1909!

O Orador: - ..., e que nesta Câmara também não se faziam ouvir há bastos decénios. O corporativismo

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manchou sempre com uma hipócrita e bastante farisaica tonalidade corporativo-social certas coisas.
E, em certos caos, por razões que são muito complexas, evitou certas medidas que implicavam lesões directas de interesses de inquilinos, concepções essas que já não ouvíamos há muito tempo.
Não é a afirmação dessas concepções que é insólita. O que é insólito é o contrário, é a afirmação das concepções cavernárias e primitivas de elogio cego de um proprietarismo que não é já moeda corrente há muitos decénios e que aparece agora na primeira fila do PSD pela boca, absolutamente muda, do Sr. Deputado Montalvão Machado.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Muito mal! Muito mal!

O Orador: - Mas gostava de perguntar ao Sr. Deputado Narana Coissoró, para além destas questões que são chocantes e muito importantes, se não considera particularmente chocante esta amálgama e esta mistura do discurso do Sr. Deputado Montalvão Machado e até do discurso do Sr. Deputado José Luís Nunes, que bem gostaríamos de ter ouvido debruçar-se sobre a matéria de fundo, mas que esteve calado para depois vir lançar confusão sobre a situação existente neste campo, que é complexa e que não se compadece com o «dos» mas com o «de». Esta uma situação em que há diversos tipos de senhorios, diversos tipos de inquilinos e em que, portanto, falar em excessos em abstracto é irresponsável, é indigno, é inaceitável.
O Sr. Deputado Montalvão Machado e o Sr. Deputado José Luís Nunes, irmanados ao menos neste ponto, confundiram. A preocupação do PCP foi distinguir, separar. A proposta do CDS, pelos vistos, também visa separar.
Ora, pergunto ao Sr. Deputado Narana Coissoró porque escolheu a formulação concreta que leio na sua proposta, isto é, que «só corre a partir da data em que tiver cessado, quando não afecte apenas os interesses particulares do senhorio» e porque não disse, mais claramente, quais são os interesses que estão em jogo e que justificam o sacrifício relativo dos interesses do senhorio.
Temos uma proposta sobre essa matéria, que vamos fundamentar- dentro de minutos e que envereda, como o Sr. Deputado reparou, pelo enfatizar de um outro critério. O CDS escolheu, porventura, a outra face da lua ou, digamos, a outra maneira de encarar esta realidade. Gostaria de saber porquê.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, se deseja responder, tem a palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - V. Ex.ª fez-me uma pergunta sobre o PSD. Eu não sou do PSD, toda a gente o sabe!

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Era o que faltava!

Uma voz do PSD: -Graças a Deus!

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O Orador: - Graças a Deus! Graças a Deus!
Mas, já agora que V. Ex.ª perguntou, e como tenho aqui -e tenho o direito de ter, porque todo o cidadão deve ter os programas de todos os partidos democráticos - o programa do Partido Popular Democrático.

Uma voz do PSD: - Veja lá se aprende alguma coisa!

O Orador: - ... que, na p. 91, diz: «o Partido Popular Democrático preconiza uma política realista mas decidida de fomento da habitação, visando especialmente ... » e, entre outras, «promulgar leis de arrendamento que protejam os inquilinos contra arbitrariedades e especulações dos senhorios».

Aplausos de alguns deputados do PSD.

Ouçam e façam o favor de fazer mais leis como estas, para cumprirem o vosso próprio programa. E sejam, depois, sociais-democratas, Srs. Deputados!

O Sr. César Oliveira (UEDS): -Está a ofender o Bernstein!

O Orador:- Quanto à parte principal que nos interessa, queria dizer ...

Uma voz do PSD: - Leia o programa!

O Orador: - O mais importante é o debate e não o programa, que já não se vive no PSD.

O Sr. Malato Correia (PSD): -Não seja ordinário, arranje argumentos válidos!

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, naturalmente que há 2 critérios para definir a relação triangular que refen.
O terceiro vértice, depois do senhorio e do inquilino, pode ser o interesse público definido como tal, ou travar o senhorio contra as arbitrariedades de que aqui se fala e que demonstrei, que, muitas vezes, constituem a excepção ao normal jogo do arrendamento entre senhorio e inquilino.
O que quisémos, não foi enfatizar o interesse público, que vem por acréscimo, mas travar, como demonstrei na minha apresentação da proposta, para que não haja abusos de senhorios contra os inquilinos indefesos e para que, quando estivessem em causa apenas os interesses privados, esses interesses privados fossem vistos à luz de um critério restritivo de cessação do contrato e não, aumentando estes apetites, oxigenando esses apetites, metendo novo sangue nestes apetites, como faz a proposta do PSD que vai ser votada.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Que grande pedagogo!

O Sr. Presidente: - Para fazer um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, entendemos que a intenção que expri

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miu e que, em certa medida, partilhamos supõe uma ponderação cuidadosa do triângulo a que aludiu.
As situações que, neste domínio, podem existir são muito variadas, o tipo de conflito que pode existir é muito distinto. A questão é saber que critério, que valor superior deve ser invocado para trinchar, em desfavor de alguém e a favor doutrém, o conflito que está pendente. E é aqui que me parece que o critério proposto pelo CDS é insuficiente isto é, dizer «quando não afecte apenas os interesses particulares do senhorio» ... Bom, os interesses particulares do senhorio podem ser afectados em muitas circunstâncias e por muitas razões. Mas a grande razão para sacrificar o interesse particular do senhorio é quando a questão que está em jogo, não só o transcende a ele, e isto é só negativo, como, pela positiva, ponha em jogo a comunidade, ponha em jogo o interesse público, por exemplo na ocupação útil do fogo, por exemplo. Então, quando está em causa o interesse público na ocupação útil do fogo, não estão afectados apenas os interesses particulares do senhorio. Então porque não se diz claramente? Porque é que o CDS não assume?
Não é uma questão dramática nem pareceria ser contraditório com a maneira como colocou a questão da relação do inquilinato e do arrendamento urbano, fixar em letra de lei, claramente, que a razão por que, nesses casos, não se permite a prevalência do interesse do senhorio é porque está em causa um interesse que não é apenas do inquilino que está à sua frente, mas um interesse comunitário, mais geral, um interesse de carácter público.
Parece-nos que não há razão nenhuma para não o fazerem, a não ser um certo preconceito, que não vemos razão para ser evocado neste caso concreto.
É neste sentido que não entendemos e que nos parece débil o fundamento da posição que o CDS sustenta e nos parece preferível a redacção que apresentámos. Salvo o devido respeito, como é óbvio!

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado Narana Coissoró deseja responder, tem a palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Naturalmente que quando eu digo que não estão apenas em causa os interesses do senhorio é porque estão em causa outros interesses que já se sabe serem, públicos.
Portanto, eu fui pela formulação do ponto de vista privado; ficará a outros irem pela formulação do lado público.

O Sr. Lacerda de Queiroz (PSD): - Estou para ver a próxima «Folha CDS»!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Devia assiná-la, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Peço a palavra para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, penso que a intervenção que produziu teve a oportunidade de, uma vez mais, sa

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lientar, perante a Câmara, a necessidade que uma Assembleia da República democrática deveria sentir na defesa do bem fundado de uma lei, do ponto de vista técnico e político e, naturalmente, da consideração dos interesses públicos que nela se envolvem.
Partindo das considerações que produziu e da circunstância de ter chamado à colação um pouco daquilo que todos sabemos ser a prática dos tribunais no que toca às tentativas de conciliação e no que nelas se forja, gostaria de perguntar-lhe se, sem um acrescentamento do tipo daquele que nós propomos -que, como salientámos, é bastante similar ao que o Sr. Deputado propõe, salvaguardadas as diferenças já assinaladas-, sem a introdução de um tal aditamento, e com aquilo que já foi aprovado, considera ou não que resultam perigos para a estabilidade da relação jurídica, factores de instabilidade e, eventualmente, se não se poderá, até, configurar, em alguns casos, de modo chocante, uma verdadeira fraude às expectativas dos beneficiários de situações jurídicas já adquiridas.
Gostava ainda de o ouvir sobre se, dados os problemas já aqui aflorados quanto à aplicação da lei no tempo e aos conflitos que daí advirão, se imporia ou não um prazo bastante mais dilatado para a entrada em vigor do presente diploma.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS). -Sr. Deputado, naturalmente que estando em jogo o interesse público qualquer formulação seria boa.
Agora, se eu fosse fazer a lei, não me iria ater a esta formulação mas fazia algo completamente diferente que não enxertar este capitalismo selvagem no contrato de arrendamento que já é um contrato social. no Código Civil.
V. Ex.ª pergunta se eu poria mais esta ou aquela palavra. Pois bem, isso é muito difícil de responder porque a formulação actual é uma manta de retalhos. Acrescentar o que quer que seja a isto só aumentaria a confusão que é esta disposição.
No entanto, se tudo isto baixasse à Comissão como nós propusemos e votámos, estaríamos abertos para a procura de uma redacção muito melhor desta disposição, no sentido de satisfazer toda a Câmara e ser exemplar para o Código Civil, como ele bem merece.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o aditamento ao n.º 2, proposto pelo CDS.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD e votos a favor do PCP, do CDS, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez, registando-se a ausência do MDP/CDE.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente esta proposta do Grupo Parlamentar do CDS, ainda que ao longo de todo o debate tenhamos tido ocasião de expor, como o fizemos agora, as razões que, nesta matéria, nos separavam.
Pareceu-nos, todavia, que seria sumamente importante sublinhar, não apenas em palavras, mas através do voto, até que ponto ia a nossa disponibilidade para considerar soluções que estando distantes do ponto que consideramos mais adequado, estão, no entanto, mais próximas desse ponto, incomparavelmente, mesmo, mais próximas, do que a que acaba de ser sagrada, inscrevendo nos anais da Assembleia da República a aprovação de uma verdadeira nódoa injusta e favorecedora de abusos e prepotências.
É dingo da maioria mas é, em todo o caso, lamentável porque compromete mais do que esta maioria que o é, para este momento, a própria Assembleia da República e a sua história de elaboração legislativa.
Votámos, pois, favoravelmente uma formulação que não recobre todas aquelas facetas e não exprime os critérios que nos pareciam mais adequados. Em todo o caso, teremos ocasião de sublinhar, na altura própria, a formulação ou as razões que nos levaram a propor uma outra redacção cuja filosofia e cujos contornos serão explicitados, nos termos regimentais, na altura e na sede próprias.
Foi com este sentido, com este espírito e por estas razões que o Grupo Parlamentar do PCP, não recusou o seu voto à proposta que, infelizmente, acaba de ser rejeitada pela coligação governamental sem nenhuma discussão, sem nenhuma fundamentação, pela força bruta do voto e com fundamentos que ninguém conseguirá descobrir, avolumando, pois, suspeições de que sejam maus e bastantes maus. Creiam VV. Ex.as que lamentamos isso sinceramente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, ,Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É para uma declaracão de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamentamos que o último esforço por nós feito para minorar os gravíssimos defeitos desta lei e o insulto que ela representa para a magistratura portuguesa tenha sido inglório.
Bastava uma pequena frase que, juridicamente, era uma grande porta aberta, para que esta lei viesse a ser uma lei social e uma lei compaginável com os outros preceitos do código e não uma regressão no tempo que nem o código de Seabra admitia.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): -Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto.

0 Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente a proposta do CDS porque ela nos pareceu uma melhoria flagrante em relação ao articulado que nos é proposto.
Na verdade, como tivemos ocasião de dizer na intervenção que fizemos neste debate, pareceu-nos que este projecto nasceu mal no momento da discussão neste Plenário e cremos que essa opinião tem sido confirmada por este debate.
Pensamos que as soluções estavam mal estudadas, que são desadequadas a uma realidade que entretanto se alterou e pena foi que a Assembleia da República não tenha reponderado esta decisão atempadamente e que não tivesse, através da nova baixa à Comissão, poupado o Plenário a este trabalho desgastante e inglório e a ura debate contraproducente sem participação dos proponentes do projecto.
Sendo desejável que esta matéria tivesse sido aprofundada, que a matéria do arrendamento tivesse sido objecto da ponderação e estudo que ela impõe, que a própria realidade social -que é o problema da habitação em Portugal- tivesse sido ponderada, que a Assembleia da República tivesse ponderado a necessidade de adequar a sua própria legislação aos problemas de aplicação da lei no tempo surgidos por a publicação de um assento do Supremo Tribunal de justiça, e, apesar de tudo, creio que a solução proposta pelo CDS mitigava inconvenientes deste projecto, consagrava uma solução socialmente mais justa e, como tal, ele mereceu o nosso voto favorável.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): -Muito bem!

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: -- Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - É para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Srs. Deputados, está quase tudo dito. O voto do nosso agrupamento parlamentar foi favorável porque pensamos que a proposta apresentada pelo Centro Democrático Social, neste caso fazendo jus à designação social, vinha minimizar os aspectos negativos deste projecto de lei e vinha permitir que os casos de interesse social e público pudessem efectivamente ser ponderados de forma diferente dos casos em que são os simples interesses privados que se movem.
Já dissemos várias vezes que se o problema fosse o que foi levantado inicialmente (o prazo de caducidade ser curto) podia ter sido proposto o alongamento cio prazo; se o argumento fosse a interpretação dos tribunais, agora ele só subsiste quanto à retroactividade eventual da aplicação desta legislação que, se calhar, alguns vão defender.
A nossa interpretação é simples: o proponente deixou de participar nos debates porque não tinha qualquer argumentação a apresentar. Eu diria mesmo que tinha interesses a defender e que não tinha argumentação a apresentar.

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E que interesses afloram neste projecto de lei? São, talvez, os já não esperados e velhos interesses do capitalismo selvagem, aqui já bem denunciados por um partido que eu considero de centrodireita ou de direita, mas de uma direita moderna que compreende que o próprio capitalismo, para viver, não pode esmagar aqueles que eufemisticamente se costumam chamar os mais desfavorecidos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrou na Mesa uma proposta de aditamento de um n.º 3 a este artigo. Vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Artigo 1094."

I - .....................................................
2 - .....................................................
3 -Tratando-se de facto continuado, o prazo de caducidade corre a partir da data em que o facto tiver cessado apenas quando a resolução se funde numa violação contratual que prejudique também um interesse público na ocupação útil do prédio.

A Srª Odete Santos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sobre esta matéria continuamos a achar que é preciso avisar toda a gente daquilo que aqui se está a passar. Foram, na verdade, proferidas, durante o debate na generalidade, frases que estão registadas para não mais serem retiradas e que, claramente, indicam qual o espírito que presidiu à apresentação do projecto. Com efeito, na base deste projecto, está um sentido conservadorista e um saudosismo de épocas até anteriores ao código de Seabra e que não podem ser admitidos depois destes anos todos, depois dos avanços que a legislação de inquilinato sofreu através dos tempos pela introdução do interesse público na relação jurídica locativa.
Na verdade, durante esse debate foram produzidas frases gravíssimas, como dizer que é pouco o inquilino pagar 50 % de indemnização quando se atrasa, quantas vezes por culpa do senhorio, no pagamento da renda, esquecendo-se que 50 % equivale precisamente a 50 % de juros que excedem, portanto, e em muito, todos os outros juros legais. Foram pronunciadas frases contra a renovação obrigatória do contrato de arrendamento, renovação essa conquistada através das lutas sociais, nomeadamente durante o período da 1 ª República, como o PCP já teve ocasião de salientar.
O interesse público subjacente à relação de inquilinato está patente na nossa legislação actual, embora algumas alterações lhe tenham sido introduzidas, fazendo retrotrair essa relação. Essas alterações foram, nomeadamente, a revogação da legislação publicada em 1974 sobre contratos de arrendamento celebrados por via administrativa de prédios devolutos e ainda, para citar um diploma do tempo em que o PSD estava no governo numa outra coligação, a publicação da lei das rendas condicionadas que se aplica também

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a transmissões do contrato para filhos com mais de 25 anos, não se sabendo mesmo onde se foi buscar essa idade e o seu propósito.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Nem vale a pena perguntar!

O Orador: - Não vale a pena perguntar, até porque não havia resposta.
Ora, este projecto de lei vem afectar, na verdade, a segurança e estabilidade do contrato de arrendamento, segurança e estabilidade para que a nossa legislação tende.
Assim, a filosofia subjacente ao projecto de lei devia ser alterada e alterada com a proposta que nós apresentamos, onde se sublinha o interesse público na ocupação útil do prédio.
Era essa alteração que deveria, aliás, ter sido processada na Comissão de especialidade e que estaria de acordo com as alterações introduzidas na relação locativa.
Nesta época, apesar de tudo, ainda há vestígios, mesmo no próprio direito adjectivo, de uma visão contra o inquilino. Lembro, por exemplo, a tentativa de conciliação que só serve para uma tentativa de chantagem para se conseguir a celebração de novos contratos de arrendamento com rendas brutais e todas as disposições processuais que estão, na verdade, a precisar de urgente revisão e adequamento ao próprio princípio do contraditório que está, como é sabido, constitucionalmente previsto. Dentro destas, é gritante o caso do despejo provisório que é decretado durante a pendência da acção sem o inquilino se poder defender ...

Voz do PSD: -Todas as decisões são passíveis de recurso!

O Orador: - ... ou até o próprio despejo definitivo decretado sem julgamento.
Assim, a nossa proposta -que irá ser certamente derrotada por uma maioria que não atende à razão e que apresenta apenas a sem razão do seu número -, de facto, concilia-se com os interesses subjacentes à relação locativa e, em última análise, obedece também ao princípio constitucional esquecido no projecto de lei que é o princípio do direito à habitação e dos deveres do Estado na realização desse direito.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de aditamento do PCP.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e a asbtenção do CDS, registando-se a ausência do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, como bem se compreendia através do debate travado e como melhor se inferiu da intervenção da minha camarada Odete Santos, visávamos, com

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a nossa proposta, garantir meios de segurança jurídica que, para além do mais, atendessem às realidades de hoje - e não de há um século atrás - e que tivessem em conta a defesa daqueles que, como sabem, têm vindo a ser os mais agredidos pela prática judiciária e pelo insuficiente acautelamento, por via legal, de direitos que são constitucionalmente consagrados e dia a dia mais ,relevantes na vida em sociedade, quando desta temos uma visão não de claustrofobia mas de alargamento da grande massa das conquistas sociais e económicas dos Portugueses. Visávamos, do mesmo, modo, conseguir corrigir o que ainda podia ser corrigido, de modo a evitar o que há de mais profundamente iníquo, de mais profundamente anti-social e de mais perigoso na proposta aprovada, segundo a formulação do Sr. Deputado Montalvão Machado.

A Câmara agiu de modo contrário. Mais uma vez agiu mal, sobretudo porque, no que toca à esmagadora maioria daqueles que deram maioria a uma proposta sem razão, o que se verificou foi que agiram sem conhecimento de causa, o que é duplamente grave.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente.: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD)-. - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou procurar ter a calma bastante para proferir uma curta declaração de voto.

Pareceria mal dizer nesta Câmara que por vezes se perde tempo demasiado com qualquer problema. Mas a verdade é que havemos de concluir que com o projecto em análise se perdeu, talvez, tempo de mais.
Por isso mesmo é que em certa altura do debate silenciei. Não o fiz por menos respeito pelos Srs. Deputados desta Asscmbleia nem pelo valor do projecto que estava em causa, mas sim para não colaborar numa perda de tempo inútil e numa verborreia de palavras sobre palavras, repetidas dezenas e dezenas de vezes, que nunca nos levam a lado nenhum.

A Sr.º Amélia de Azvedo (PSD): -Muito bem!

O Orador: -Tudo aquilo que se disse aqui já tinha sido mais que respondido da minha parte.

As oposições fizeram as suas críticas no seu legítimo direito, mas repetiram-nas dezenas de vezes. Foram extraordinariamente repetidas.

Há um aspecto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que queria aqui focar. É que nem eu nem o meu partido recebemos lições de social-democracia absolutamente de ninguém e muito menos do PCP e do CDS.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Não queremos dar!

O Orador: - O nosso comportamento no passado, no presente e, se Deus quiser, no futuro será o penhor certo disso.
Uma última palavra, Sr. Presidente, para dizer que o projecto de lei em causa - que neste momento não é o meu projecto mas sim a lei desta Assembleia - ...

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O Sr. José Magalhães (PCP): - Ainda não! Seja mais modesto! Ainda tem de galgar muito!

O Orador: - ... não contém em si nenhum desrespeito pelos tribunais, porque o assento do Supremo Tribunal de Justiça é o primeiro a pedir que se faça uma lei nova para evitar os males que a lei antiga revestia e que eram todos os dias motivo de gritantes injustiças.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP)- Sr. Presidente, era para interpelar a Mesa.
Há pouco, durante a intervenção do meu camarada de bancada João Amaral, que insistentemente proeurou que viesse da bancada do PSD algum contributo para o debate, a Mesa ao ser interpelada por um dos Srs. Deputados do PSD, foi confrontada com o seguinte: o Sr. Deputado João Amaral tinha interpelado o Sr. Deputado Montalvão Machado ou alguém na bancada do PSD aludindo reiteradamente a um deputado silencioso, que o Sr. Deputado Montalvão Machado confessou ser.

Entretanto, o Sr. Deputado Montalvão Machado usou da palavra - e congratulamo-nos com o facto mas, ao fazê-lo, se por isso pedimos a palavra neste momento, em vez de exercer o seu direito à declaração de voto, que aliás há muito tempo esperávamos, e dar uma explicação à Câmara, veio qualificar o labor aqui desenvolvido de várias bancadas, sem a mínima colaboração da bancada do PSD ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pedia-lhe o favor de concretizar a sua interpelação à Mesa e não fazer uma intervenção à qual, como sabe, não tem direito.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado Montalvão Machado veio qualificar tudo aquilo que aqui tinha decorrido como « verborreia de palavras». Pela nossa parte, consideramos que isto é acintoso até para a própria imagem da Assembleia da República, sendo desprestigiante e constituindo um insulto para ela e para cada um dos que procuraram contribuir honestamente e como puderam para um debate do qual o Sr. Deputado Montalvão Machado esteve esplendorosamente ausente, só agora se tendo decidido a quebrar um silêncio que manteve, de forma ostensiva, durante todo o tempo, não tendo contribuído com um debate ou um argumento para uma discussão que tinha o dever de qualificar com a competência que lhe é reconhecida.

Lamentamos este facto e perguntamos à Mesa se considera esta qualificação verborraica compatível com a maneira como os trabalhos decorreram.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - É evidente que não, Sr. Deputado.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

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5806 I SÉRIE-NÚMERO 134

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Abstivemo-nos em relação à proposta do PCP porque, embora ela fosse aparentada com a nossa - até se disse aqui que era a outra face da mesma moeda -, não poderíamos aceitá-la na medida em que era demasiado vaga para aquilatarmos daquilo que se pretendia dizer com a expressão «interesse público».
Por outro lado, queria também dizer que não damos lições de social-democracia, de socialismo e de comunismo a ninguém. As únicas lições que damos são de coerência e gostaríamos também de as receber, porque não terá vergonha nenhuma em receber lições de honestidade, de pensamento, de coerência e de defesa de boas e justas soluções nesta Assembleia da República.
Lamento, finalmente, que todo o esforço que aqui foi feito para contribuir para aperfeiçoar uma lei no legítimo direito que cabe a cada deputado fosse considerado como verborreia. Lamento, igualmente, que, pela terceira vez em que interveio - só produziu três intervenções, uma grande e duas curtas - o Sr. Deputado Montalvão Machado viesse dizer uma coisa que rwo é verdade, ou seja, que o assento pedia uma nova lei. O que aqui se fez não foi uma nova lei, mas a tirar um novo assento contra o assento, o que, com certeza, não estava na mente dos juízes que fizeram o vencimento.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos na Mesa
uma proposta de aditamento de um artigo 3.º, que
contudo cai porque o n º 3 não foi admitido.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Presidente, se me permitisse, gostaria de clarificar o que aconteceu, justamente para evitar que o Sr. Presidente fosse obrigado a ler um texto sem prévia definição do seu significado actual. Penso que desta forma talvez facilitasse o trabalho da Mesa.

O Sr. Presidente: - Faz favor.

O Sr. José Magalhães (PCP): -O meu grupo parlamenntar pediu a requalificação desta proposta, que passa a ser de aditamento de um novo artigo 3.º em vez do 2.º Alterámos a ordem do posicionamento.
O meu camarada José Manuel Mendes informa-me, aliás, que essa emenda já terá sido feita sobre o próprio texto.
Por outro lado, a proposta mantém todo o seu sentido. Ela estava referida, originariamente, à proposta ele alteração que o meu grupo parlamentar tinha apresentado, mas ela aplica-se também, com o conteúdo que tem, ao texto que foi aprovado pela Assembleia na altura própria. E diz respeito ao âmbito e aos termos de aplicação da norma aprovada. Tem é que se ler a regra estabelecida rio n º 2 do artigo 1.º e não a do n.º 3 do artigo anterior. Com essa alteração a proposta mantém todo o seu significado.
Obviamente que o nosso aditamento de um artigo 3.º deve entender-se como o aditamento de urra artigo 2 º nos termos que defini agora. Portanto, aquilo que deveríamos votar a seguir era um artigo 2 º cuja epígrafe seria «entrada em vigor» e com o seguinte conteúdo: «A presente lei entra em vigor 180 dias após a publicação.»

1 SERIE-NÚMER0 134

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois do esclarecimento apresentado pelo Sr. Deputado José Magalhães, vou ler a proposta de aditamento, que diz o seguinte: «Propõe-se o aditamento de um novo artigo 2 º do seguinte teor: A regra estabelecida no nº 2 do artigo 1 º não se aplica às situações jurídicas em relação às quais à data de entrada em vigor da presente lei já tenha decorrido o competente prazo de caducidade.»
Está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, penso que o PCP já especificou que não será propriamente esse texto que vai ser discutido nem votado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, alterámos a numeração dadas as instâncias a que já procedemos no decurso do debate.
Este é o artigo 2.º, que tem a ver com a entrada erra vigor, e a redacção passou a ser, como corista do texto que o Sr. Presidente tem diante de si, a seguinte: «A presente lei entra em vigor por 180 dias após a sua publicação.»
Vem depois subscrita por 3 Srs. Deputados.
Suponho que ela tem precedência, até pelo número, no tocante ao debate, sobre a outra proposta, também nossa, que está na Mesa e que se mantém. Penso, assim, que era ela que devia ser discutida agora e procederemos à sua apresentação, se for caso disso, na altura devida, quando o Sr. Presidente nos der a palavra.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, eu li as propostas pela ordem de entrada, mas compreendo que houve uma alteração.
Para esclarecimento dos Srs. Deputados, e de acordo com o que foi referido, será votada, em primeiro lugar, uma outra proposta de aditamento do PCP, que já foi lida.
Em seguida, votar-se-á a segunda proposta de aditamento que está na Mesa.
Está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, direi muito brevemente que vamos votar a favor desta proposta tal como ela está especificada. Não se vê nenhuma vantagem em manter uma entrada imediata em vigor da lei e podem ver-se vantagens em construir-se um período de vacatio em que o regime jurídico possa ser melhor adaptado.
Nesse sentido votaremos a favor da proposta do PCP.
Gostaria de sublinhar uma realidade final. Na medida em que foi feita uma proposta, como agora o foi, construtiva e que consideramos integrada dentro do espírito do projecto de lei, não tivemos dúvida nenhuma em dar-lhe o nosso apoio e em votá-la, embora não seja efectivamente nossa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Hasse Ferreira pediu a palavra para intervir sob esta proposta que está em discussão?

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6 DE JULHO DE 1984

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sim, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que tudo o que nas circunstâncias actuais permita uma maior reflexão sobre as diferentes e complexas incidências deste projecto de lei, embora tenha havido alterações aqui propostas por vários Srs. Deputados que considerámos favoravelmente, mas que não foram aprovadas pela Assembleia, parece-me efectivamente positivo.
Quanto ao debate, diria, referindo-me ao comportamento dos vários grupos e agrupamentos, que ele não se pode classificar ou reduzir ao vocábulo genérico de «oposições». Isto porque sem falar já da posição do meu próprio agrupamento, penso que a posição da ASDI dificilmente poderá ser classificada como de oposição do Governo.
Poderá dizer-se que pensamos que «água mole em pedra dura ...» escuso de dizer o resto! A água não seria tão mole e sabemos que a pedra não é de forma nenhuma dura, ou, pelo menos, uma parte dela.
Parece-me, pois, adequado este tipo de disposição e saúdo a prudência e o equilíbrio manifestado pelo Sr. Deputado José Luís Nunes na curta intervenção que proferiu antes de eu falar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, era para dizer que se trata de uma norma secundária, chamada de direito transitório, que nada tem a ver com a economia do projecto e que vem simplesmente evitar um conflito de aplicação de leis no tempo.
Admiro-me é que o PS tenha feito desta norma um galhardete para dizer: «Até que enfim que surgiu uma norma construtiva!» Quando se trata de uma norma que é o «rabo do cabo»!

O Sr. Presidente: -Vamos proceder à votação da proposta de aditamento do PCP.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: -Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao longo de todo o debate procurámos explicitar que a aprovação deste normativo ou deste «contra-assento», como poderá ficar a ser conhecido, colocaria enormes dificuldades de aplicação da lei no tempo. E isto porque, como sublinhámos, e dispensa certamente qualquer reforço, o assento que foi publicado na 1ª série do Diário da República - como cabe, e tem força obrigatória geral, como é sabido- vai vincular os tribunais portugueses, devendo portanto ser aplicado nos termos da lei competente.
A publicação de uma lei com este teor, que vem ao arrepio da interpretação que é sustentada e vinculativa por força do assento referido vai criar uma situação de aplicação distinta.
Esta Assembleia vai legislar um pouco ao acaso e as situações que estão ou que vão ser criadas são de desigualdade de tratamento porque o assento diz uma coisa e o contra-assento diz outra.

Com a aprovação desta norma, que propusemos com intuitos de minorar as consequências de criar uma dilatada vacatio legis, está para saber -é esta a reflexão que coloco à Câmara - se a situação gerada vai ser de justiça ou injustiça relativa, ou de acrescida desigualdade de tratamento. Apesar de tudo, isto preocupa-nos bastante, e estaremos atentos na ponderação desta questão, porque agora o assento vai estar em vigor, pelo menos, até daqui a 180 dias, a contar da publicação.

Se bem me apercebo e se bem terei ponderado tudo aquilo que foi proposto e aprovado, a situação agora gerada é um pouco abstrusa. Em vez da injustiça de alguns dias vamos ter injustiças durante vários meses. Não sei quanto tempo é que vai mediar até à redacção final e depois até à promulgação eventual, se vier a ocorrer, ou fiscalização de constitucionalidade, se esta tiver lugar. Haverá ainda a publicação, o prazo natural para a entrada em vigor e, naturalmente, só 180 dias após isto é que este contra-assento entrará em vigor.

Acho verdadeiramente espantoso, e com isto concluía a declaração de voto do meu grupo parlamentar, é que um partido como o PSD, que requereu a urgência, que fez a Assembleia da República perder a paciência sem expender um só argumento, ao fim de um trabalho insano, de muita argumentação, de muito silêncio, ao fim de muito encher a boca e os ouvidos, tenha vindo a aprovar in extremis, para salvar a face, pois há situações difíceis em que é preciso fazer uma coisa e sofrer e pensar, porque a dignidade o exige, tenha vindo, por factos e acasos, a votar favoravelmente, in extremis uma coisa que transforma a urgência numa vacatio de 180 dias.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Numa lei que já está cheia de coisas abstrusas esta é a maior delas.

Aplausos do PCP.

O Sr. João Amaral (PCP): - Vai ficar na história!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, houve consenso para se prolongar a sessão até às 21 horas, mas dado que ainda está para discutir uma proposta de aditamento, suponho que estarão de acordo no sentido de se prolongar os trabalhos um pouco mais. Aliás, deu entrada na Mesa um requerimento que diz o seguinte: «O Grupo Parlamentar do PS requer o prolongamento da sessão até à votação final global do projecto em discussão.»

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, se houver consenso sobre a proposta que V. Ex.ª fez, argumentando que falta muito pouco tempo para terminar a discussão do diploma, obviamente que a votação do requerimento não terá razão de ser. Isto, se ninguém se opuser a que isto se faça rapidamente, em espírito de boa fé.

O Sr. Presidente: - Mas o que parece é que não há
consenso ...

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5808 I SÉRIE-NÚMERO 134

O Sr. José Luís Nunes (PS): -Então, vamos votar ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Sr. Presidente, falo em nome da minha bancada para informar que não damos consenso ao prolongamento da sessão e creio que tivemos grande compreensão pelos trabalhos da Assembleia aceitando trabalhar mais 1 hora.

Em segundo lugar, colocamos à Mesa a questão de admissibilidade do requerimento que foi apresentado pelo Partido Socialista. Os requerimentos para prolongamento. das sessões devem ser entregues até às 20 horas. Por consenso, já se tinha chegado ao acordo de terminar a sessão às 21 horas, logo, o período útil para apresentação do requerimento esgotou-se às 20 horas. Aliás, foi firmado e confirmado pela Mesa que a sessão acabaria às 21 horas.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, creio que a questão é extremamente simples. Numa reunião de líderes, em que houve consenso de todos os partidos, combinou-se que a reunião prosseguia até às 21 horas.Nós pensamos que os compromissos assumidos devem ser respeitados por toda a gente que neles participa. Portanto, pela nossa parte, a sessão termina às 21 horas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Isto é a imagem de uma determinada forma de trabalhar. Quero dizer-lhes que, por mim, prefiro, de toda a maneira, interromper a sessão às 21 horas e retirar esse requerimento, com as consequências que isso pode ter, do que tomar parte em qualquer aspecto de chicana processual. Toda a gente entende que com mais de 15 minutos isto ficava pronto, mas já que não há consenso sobre este assunto ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Para as más obras não contem com a nossa bancada!

O Orador: - Eu sei, Sr. Deputado. As más obras ... Um dia falaremos com mais calma sobre outras obras ...
Sr. Presidente, vamos retirar esse requerimento e continuar amanhã essa matéria, mas devo dizer que é melhor retirar esse requerimento do que assistir aqui a espectáculos como aquele que alguns dos Srs. Deputados nos proporcionaram há pouco.
Portanto, se os Srs. Deputados entendem que não podem estar mais 15 minutos para acabar esta votação, a acção fica com quem a pratica. Não vou insistir nisso nem colaborar numa chicana processual.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

I SÉRIE -NÚMERO 134

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, apesar da posição que o PS entender assumir em definitivo, achamos que não há razão para retirar o requerimento.

O problema é simples. Havia um agendamento previsto para hoje até às 21 horas, segundo vários pressupostos, um dos quais era o de que talvez até se chegasse a discutir o pa-imeiro pedido de autorização legislativa que o Governo tinha apresentado à Assembleia da República. O que acontece -e quem esteve na reunião de líderes esta tarde sabe-o bem- é que, a partir de amanhã de manhã, provavelmente até ao fim da sessão da manhã de terça-feira ou talvez por mais algum tempo, vamos entrar na discussão de pedidos de impugnação. E já o debate do projecto de lei nº 177/III vem arrastando-se há largas semanas ...

O Sr. João Amaral (PCP): - A culpa é vossa!

O Orador: - ..., sem dignidade para ninguém.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - Eu disse: vem arrastando-se há largas semanas. Foi a essa dignidade que me referi e não me estou a referir, em concreto, ao debate, a que não assisti.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Nota-se!

O Orador: - Não dignifica ninguém deixar o projecto de lei n.º 177/III «pendurado», desculpem a expressão, para daqui a 3 ou 4 dias, pois isso não serve a ninguém, não serve a Assembleia. De qualquer forma, isto atesta aquilo que são as palavras de boa vontade que vários partidos políticos sempre evocam -designadamente o Partido Comunista-, e o que acontece na prática, ou seja, obstrução permanente à rentabilidade efectiva dos trabalhos da Assembleia.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É a conhecida técnica da inversão!

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos. No entanto, permito-me dizer que já passa 1 minuto das 21 horas, já estando nós a prolongar os trabalhos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -Vou ser brevíssimo, Sr. Presidente. É apenas para que conste no Diário que assumimos um compromisso, o qual mantivemos na íntegra nos exactos termos em que o assumimos, mas que não estamos dispostos a ir para além desse compromisso. É um direito nosso e ninguém nos pode negá-lo. Tanto mais que a responsabilidade do que se passou e do que se está a passar não é nossa, mas da maioria que obrigou a Assembleia da República a discutir esta matéria na especialidade, impedindo que a comissão a votasse com calma.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes, mas dado que foi retirado o requerimento, estamos realmente fora da hora ...

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6 DE JULHO DE 1984

O Sr. José Luís Nunes (PS): -Ora bem, nós não
retirámos o requerimento. No entanto, cometi um
abuso e um erro e queria dizê-lo publicamente.

Uma voz do PSD: - Nós também assinámos...

O Orador: - Exacto, o requerimento não foi assi
nado só por nós. De qualquer forma, foi escrito por
nós, por mim, que sou o principal signatário, e man
tenho esse ponto de vista, apelando para os meus
colegas do PSD que nos acompanhem, como nós sem
pre os acompanhamos nesta questão. Se mantivermos
esta posição de ter de votar este requerimento podere
mos conseguir aquilo que queremos, ou seja, votar
uma lei que consideramos justa.

No entanto, quatro dias mais não terão nenhum
inconveniente. O que tem inconveniente, Srs. Deputa
dos, é que, publicamente ficou demonstrado e claro
que nós não fazemos obstrução parlamentar e que não
entramos em processos que - não gosto dos termos
«não dignificam», porque nunca os usei nem usarei -
não correspondem à nossa estatura e ao nosso sen
tido de estar presentes e enfrentar a vida.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas o PSD usa...

O Orador: - Assim, cedemos nesse ponto, porque
no fundo o nosso ponto de vista prevaleceu no essen
cial.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O sermão da
benção!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está na Mesa
um pedido do Sr. Presidente da Comissão dos Assun
tos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias,
que convoca para amanhã, dia 6, pelas 14 horas e 30
minutos, uma reunião daquela comissão em que a
ordem de trabalhos será sobre a proposta de lei sobre
segurança interna.
Srs. Deputados, a sessão amanhã terá início às
10 horas e a ordem de trabalhos na primeira parte,
será a seguinte: continuação da apreciação do recurso,
interposto pelo PSD, da inclusão na ordem de traba
lhos do projecto de lei nº 45/III, apresentado pela
ASDI, sobre o regime de estado de sítio e do estado
de emergência; apreciação do recurso, interposto pelo
MDP/CDE, da admissibilidade do projecto de lei
n.º 367/III, apresentado pelo CDS, sobre segurança
interna e protecção civil; apreciação do recurso inter
posto pelo MDP/CDE, da admissibilidade do projecto
de lei n.º 370/III, apresentado pela ASDI, sobre me
didas especiais de prevenção do terrorismo. Na se
gunda parte, far-se-á a continuação da discussão do
projecto de lei n.º 177/III, apresentado pelo PSD;
discussão do projecto de lei n.º 45/III, apresentado
pelo PSD; discussão das propostas de lei n.os 75/III,
69/III e 78/Ill, que são pedidos de autorização legis
lativa; proposta de lei n.º 71/III; projecto de lei
n.º 367/III, sobre segurança interna e protecção civil
e projecto de lei n.º 370/III, apresentado pela ASDI,
sobre medidas especiais de prevenção do terrorismo.
Esta ordem do dia é estabelecida dependendo dos
resultados dos recursos apresentados, os quais serão
discutidos na primeira parte da ordem do dia. Em

5809

conformidade com o resultado da votação, se manterão ou retirarão os diplomas que não puderem ser discutidos.
Ficou também assente que a parte que não for discutida amanhã transitará para a sessão seguinte.

Na reunião dos presidentes dos grupos parlamentares, ficou assente também que as comissões especializadas reunirão na próxima segunda-feira.

Não havendo mais nada a tratar, declaro encerrada a sessão.

Eram 21 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.

Partido Comunista Português (PCP):

Francisco Miguel Duarte.
João António Torrinhas Paulo.
Valdemar Rodrigues Henriques.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Leonel de Sousa Fadigas.
Rui Monteiro Picciochi.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Vieira de Carvalho.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Helena Cidade Moura.

AS REDACTORAS: Cacilda Nordeste-Ana Maria Marques da Cruz.

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PREÇO DESTE NÚMERO 145$00

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