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I Série - Número 3 Quarta-feira, 31 de Outubro de 1934 245
DIÁRIO da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.º SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1988)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE OUTUBRO DE 1984
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
SUMARIO. - O Si. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros
Em declaração política, o Sr. Deputado Lopes Cardoso (UEDS) referiu os problemas com que se debatem os trabalhadores da comunicação social Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento e protestos dos Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Zita Seabra (PCP) e Jorge Lacão (PS), tendo este ultimo respondido ainda a um protesto do Sr Deputado Nogueira de Brito (CDS)
Também em declaração política, o Sr Deputado João Amaral (PCP), após ter considerado negativa a actividade parlamentar do inicio desta sessão legislativa, deu contas das impressões que colheu junto de comunidades de emigrantes portugueses, em visita que efectuou ao Canadá Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento e protestos dos Srs. Deputados Carlos Lage e Igrejas Caeiro (PS), José Gama (CDS) e Figueiredo Lopes (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Rodolfo Crespo (PS) referiu-se à próxima adesão de Portugal a CEE, alertando para as adaptações que isso implica a nível económico, jurídico e social.
Após intervenções dos Srs Deputados Margarida Tengarrinha (PCP), António Macedo (PS), Raul de Castro (MDP/CDE), Octávio Cunha (UEDS) e Jaime Ramos (PSD), a Assembleia aprovou um voto de pesar pela morte do Prof Rui Luís Gomes, tendo produzido declaração de voto os Srs. Deputados José Luís Nunes (PS), Luís Beiroco (CDS) e Rúben Raposo (ASDI).
Foram igualmente aprovados dois outros votos de pesar relativos ao assassínio de que foi vítima o padre Jerzy Popielusko e apresentados, respectivamente, peto CDS e pelo MDP'/CDE. Intervieram na sua discussão os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), Raul de Castro (MDP/CDE), José Luis Nunes (PS). João Amaral (PCP) e Jaime Ramos (PSD) e produziu declaração de voto o Sr Deputado Lopes Cardoso (UEDS).
Ordem do dia. - Deu-se inicio à apreciação do pedido de urgência solicitado pelo PCP para discussão do Projecto de Lei n.º 27/III - Idade de reforma dos pescadores e anos de actividade, que foi apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Espadinha (PCP). Intervieram ainda no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Rocha de Almeida (PSD) e João Amaral (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 5 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Almerindo da Silva Marques.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António José Santos Meira.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
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Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco José Fernandes Leal.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Auretiano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Mana da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José da Cunha e Sá.
José Ferreira Pires Gestosa.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luis Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maximiano Almeida Leitão.
José Martins Pires.
Juvenal Batista Ribeiro
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luis Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Paulo Manuel Barros Barrai.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ovídio Augusto Cordeiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Mana da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Zulmira Helena Alves da Silva.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio S. Domingos Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Anacleto Silva Baptista.
António d'Orey Capucho.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida
João Luís Malato Correia
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís de Figueiredo Lopes
José Mário de Lemos Damião
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão
Leonel Santa Rita Pires.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Pereira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Mana Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Martins Adegas.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Serafim Jesus Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
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Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Ilda Costa Figueiredo Octávio Augusto Teixeira.
Zita Mana Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta França.
Eugénio Mana Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horário Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
José Amónio Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Góes.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE).
Raul Morais e Castro José Manuel Tengarrinha.
João Corregedor da Fonseca.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS).
António César Gouveia de Oliveira
António Poppe Lopes Cardoso
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Octávio Luis Ribeiro da Cunha.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho
Ruben José de Almeida Raposo.
Antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: Srs Deputados, o Sr Secretario vai proceder à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente Ofícios
Da Câmara Municipal de Aveiro, transcrevendo uma deliberação na qual manifesta, por unanimidade, a mais profunda congratulação pela homenagem prestada ao filho querido de Aveiro, José Estêvão, por esta Assembleia.
Do Conselho de Prevenção do Tabagismo, chamando a atenção para determinado ponto de um comunicado que envia, no qual manifesta a sua estranheza pela forma como foi recentemente abordada nesta Assembleia a questão da restrição ao uso do tabaco.
Da Câmara Municipal de Sines, a enviar fotocópia de documento que lhe foi dirigido pela organização representativa dos trabalhadores da EQUIMETAL, empresa fabril de equipamentos metálicos, sobre a progressiva degradação económica, financeira e social da empresa, a qual a Câmara manifestou a sua solidariedade.
Da Assembleia Municipal da Moita, a enviar um voto de repúdio contra o que considera como imobilismo existente por parte da Comissão Liquidatária do Fundo de Fomento de Habitação e do Ministério do Equipamento Social, num bairro cujas obras se arrastam há mais de 6 anos, quando junto a sua localização vivem famílias sem quaisquer condições de habitabilidade
Do Sindicato dos Trabalhadores de Seguros do Norte, dando conhecimento do teor de uma moção referente aos acidentes de trabalho, cuja integração no actual sistema de segurança social repudia
«Telex»
Do presidente da Câmara Municipal de Valongo, referindo-se a difícil situação de centenas de operários têxteis daquele concelho, o que coloca a autarquia em posição difícil perante tais problemas.
O Sr Secretário (Lemos Damião) - Nas ultimas sessões deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos dia 24 de Outubro - a Presidência do Conselho de Ministros, formulado pelo Sr Deputado Gomes de Pinho; ao Ministério do Mar e a Secretaría de Estado do Tesouro, formulado pelo Sr Deputado Carlos Espadinha, ao Governo e a diversos ministérios (no total de 4), formulados pelo Sr Deputado Seiça Neves, ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr Deputado Horácio Marçal, a diversos ministérios (no total de 3), formulados pelo Sr Deputado Jorge Lacão, ao Ministério da Saúde e à Secretaría de Estado do Emprego (no total de 2), formulados pelo Sr Deputado Manuel Fontes Orvalho
Dia 25 de Outubro - ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr Deputado João de Almeida Eliseu; a diversos ministérios (no total de 3), formulados pelo Sr Deputado Manuel Fontes Orvalho; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr Deputado Marques Mendes
Dia 26 de Outubro - à Secretaría de Estado da Administração Autárquica, formulado pelo Sr Deputado Manuel Fontes Orvalho; a diversos ministérios (no total de 3), formulados pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso; ao Governo, formulado pelo Si Deputado Jaime Ramos e outros; aos Ministérios da Administração Interna e da Justiça, formulado pelo Sr Deputado Licinio Moreira, aos Ministérios do Mar e do Equipamento Social, formulado pelos Srs Deputados Carlos Brito e Margarida Tengarrinha.
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Por sua vez, o Governo respondeu a requerimentos dos seguintes Srs. Deputados: José Vitorino, na sessão de 27 de Junho de 1983; Gaspar Martins, na sessão de 21 de Fevereiro; Manuel Fernandes e outros, na sessão de 23 de Fevereiro; Lino Paulo, na sessão de 30 de Março; Anselmo Aníbal e outros, na sessão de 17 de Abril; José Lello, na sessão de 16 de Maio; Reis Borges, na sessão de 23 de Maio; Magalhães Mota, nas sessões de 29 de Maio, 12 e 16 de Junho; Lacerda de Queiroz, na sessão de 20 de Junho; Silva Marques, na sessão de 10 de Julho; Horácio Marçal, na sessão de 11 de Julho; Marques Mendes e outros, na reunião da Comissão Permanente do dia 19 de Setembro; Octávio Teixeira, na reunião da Comissão Permanente do dia 27 de Setembro.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sublinhar a importância da comunicação social seria, por inútil, perder o vosso e o meu tempo.
Mas inútil não será, porventura, recordar, num momento em que os jornalistas portugueses lutam por um novo contrato colectivo, que a comunicação social só poderá corresponder de forma positiva à importância que é a sua num regime democrático, nele desempenhando o papel, ao mesmo tempo, formativo e informativo da opinião pública, se aos que nela trabalham forem dadas condições mínimas para que a sua acção se possa exercer com empenhamento e dignidade.
São frequentes as críticas de que é alvo a comunicação social, a sua qualidade e a sua isenção; críticas as mais das vezes justificadas, mas críticas que ignoram, também com demasiada frequência, o que são as condições de trabalho dos jornalistas portugueses; que com demasiada frequência esquecem que é insensato, para não dizer hipócrita, o exigir-se muito quando se dá quase nada.
O exigir-se independência, qualidade, formação, aos jornalistas, permitindo-se a contínua degradação das suas remunerações, forçando-se por essa via o recurso ao pluriemprego e recusando-se a reclassificação susceptível de conduzir à criação de uma verdadeira carreira profissional.
A par de uma remuneração digna, mas tanto ou mais importante do que ela, a criação de condições de dedicação exclusiva e a reclassificação profissional são hoje elementos essenciais a uma cada vez mais necessária transformação qualitativa da nossa imprensa falada e escrita.
Do modo como tem decorrido o processo de revisão do contrato colectivo do sector é legitimo concluir-se que disso têm clara consciência os jornalistas, mas que isso mesmo recusam as entidades patronais.
Se no plano teórico todos parecem reconhecer que «para a dignificação da profissão e a protecção dos interesses dos órgãos de comunicação social se deverá caminhar no sentido de eliminar o duplo emprego» (e estou a citar a cláusula 16.ª do contrato colectivo de trabalho actualmente em vigor), se nesse aspecto todos parecem de acordo no plano teórico, já quando se pretende ir mais longe, e passar das meras petições de princípio, à sua aplicação prática, a aparente unanimidade esboroa-se.
Ao fim e ao cabo, o regime actual não deixa de servir os que têm da actividade jornalística uma concepção que se reparte entre o jornal olhado como instrumento ao serviço exclusivo de interesses de grupo e a gestão das empresas de comunicação entendida como a procura de equilíbrios obtidos apenas pela redução de encargos, à custa que seja da qualidade do produto e pela angariação de subsídios.
O jornalista que se reparte por duas ou mais redacções é, para cada uma delas, um «jornalista barato»; se a qualidade se ressente e as receitas baixam, o caminho está traçado; reivindicam-se subsídios e é sempre possível negociar a independência contra a boa vontade da banca que mais do que nacionalizada é cada vez mais uma banca governamentalizada.
A proposta apresentada pelo Sindicato dos Jornalistas, em Fevereiro do corrente ano, com vista à negociação de um novo contrato colectivo, apontava como metas essenciais para um novo clausulado o contrato de exclusividade e a reclassificação profissional.
A resposta das entidades patronais - para além de uma ou outra nuance sem significado e que a economia desta intervenção me não permite que refira - foi pura e simplesmente a recusa de qualquer discussão sobre essa matéria e a contraproposta de um aumento salarial de 12 % (face a uma inflação que não descerá abaixo dos 28 %, e estou propositadamente a pecar por defeito).
Os seus argumentos são conhecidos: a crise do sector.
Não ignoramos essa crise. Mas não ignoramos também que a política que vem sendo seguida arrasta, inexoravelmente, as empresas da comunicação social para um círculo vicioso: na verdade, se a baixa de vendas tem a ver com a contínua redução do poder de compra dos Portugueses, tem igualmente a ver com a degradação da qualidade, ela própria consequência das condições de trabalho (que obviamente se reflectem nas condições de recrutamento, formação e independência) dos jornalistas.
Não cabe aqui, por óbvias razões de tempo, historiar o que foram as negociações conduzidas pelo Sindicato dos Jornalistas ao longo deste ano. Direi apenas que desencadeadas em Fevereiro, o sistemático boicote das entidades patronais conduziu a que hoje, 10 meses depois, o processo se encontre, a requerimento dessas mesmas entidades, na via administrativa e reduzido, de imediato, à estrita dimensão salarial.
Dimensão salarial importante, sem dúvida - já que o primeiro passo para a dignificação da profissão passa por um salário digno -, mas insuficiente para abrir caminho à definição de um estatuto do jornalista que tenha em conta a missão que lhe cabe.
E porque é importante, é legítimo esperar-se que a portaria regulamentadora que venha a ser publicada garanta no mínimo a manutenção do poder de compra em relação a 1983, o que, obviamente, implica a retroactividade a Janeiro de 1984, tal como o reclama o Sindicato dos Jornalistas.
Mas não basta. É necessário que garantia também o prosseguimento imediato das negociações do clau-
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sulado geral do contrato colectivo de trabalho, já que só através da sua revisão se poderá caminhar para uma real transformação qualitativa da nossa comunicação social.
Quiseram as organizações patronais, com a sua atitude de recusa do diálogo com os trabalhadores, remeter para o Governo o encargo e a responsabilidade de uma decisão.
O que for a atitude do Governo dir-nos-á, não tanto, nem tão-só, o modo como encara o problema da remuneração dos jornalistas, mas sobretudo qual é a sua concepção do papel que à comunicação social cabe em regime democrático, porque é isso que, no fundo, e para além das questões salariais, está em causa.
O Sindicato dos Jornalistas soube, sem as esquecer, colocar-se para além delas. Reconhecê-lo é, sem dúvida, prestar-lhe uma homenagem merecida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que aqui coloquei - e por isso mesmo a coloquei - é uma questão que ultrapassa, e muito, os meros aspectos corporativos.
Atrevo-me a dizer que é uma questão que envolve o próprio regime, porque não há regime democrático sem uma comunicação social independente e dignificada. E porque a comunicação social não é uma entidade abstracta, mas o resultado concreto e objectivo do labor dos que lhe dão a vida - os jornalistas -, não haverá comunicação social independente e digna quando se não criem condições para que esses mesmos jornalistas possam exercer a sua profissão com independência e dignidade.
Assim o saiba entender o Governo.
Aplausos da UEDS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, ouvi com bastante atenção a sua intervenção, com a qual estou de acordo.
V. Ex.ª levanta aqui, nesta Câmara, um problema importante que tem a ver com um dos mais sérios sectores da nossa vida. O que se passa actualmente no País, em termos de comunicação social, pode, infelizmente, ser classificado como idêntico ao que se passava no anterior regime, quer nas questões remuneratórias, quer nas péssimas condições de trabalho.
E não é só isso, Srs. Deputados. Actualmente, muitas vezes os jornalistas são já obrigados a recorrer à autocensura para poderem comunicar os seus textos, o que também é extremamente grave.
O que se passa com o contrato colectivo de trabalho dos jornalistas é inadmissível, Srs. Deputados. Há mais de 11 meses que os jornalistas não têm o seu contrato colectivo actualizado e as propostas do patronato são realmente ridículas.
É evidente que todos falam em independência da comunicação social, de todos os quadrantes querem uma comunicação social independente, mas muitos não deixam de exercer todo o tipo de pressões sobre a comunicação social.
Mas, Sr. Deputado Lopes Cardoso, já que se fala em independência da comunicação social, V. Ex.ª disse, e muito bem, que os jornalistas são, a exemplo do que acontecia no anterior regime, muitas vezes obrigados a recorrer ao pluriemprego.
Perguntava então V. Ex.ª como é que é possível exigirmos independência aos órgãos de comunicação social? Como é possível haver realmente independência perante o poder político e o poder económico, quando os jornalistas portugueses são os mais mal pagos do mundo, como é, aliás, facilmente verificável? Como é realmente possível exigirmos uma comunicação social viva, respeitável e dignificada, quando os jornalistas, e na generalidade os profissionais de toda a comunicação social, lutam com estes e outros problemas ainda mais graves?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, uma vez que há mais inscrições para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª responde já ou só no fim?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Respondo já. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Começo por agradecer ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca a amabilidade que teve em referir-se à minha intervenção e o facto de ter afirmado que a subscrevia integralmente.
Apenas lamento não poder responder do mesmo modo e dizer-lhe que subscrevo integralmente as palavras que acabou de pronunciar, porque não posso, de forma nenhuma, subscrever a afirmação com que o Sr. Deputado abriu a sua intervenção, dizendo que se vivia hoje uma situação idêntica á que se vivia no anterior regime.
Não, Sr. Deputado. Por muito criticável - e creio que critiquei e não poupei críticas -, a situação que actualmente se vive no nosso país não tem paralelo - não é possível estabelecer paralelo, sob pena de invertermos totalmente a escala de valores - com a situação que se vivia antes do 25 de Abril.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto à pergunta «como é possível, nas condições actuais, exigir dos jornalistas a independência que, em principio, a sociedade e o regime estão no direito de lhes exigir», creio que a resposta estava contida na minha intervenção.
Não é possível, e é um hipocrisia, exigir essa independência quando não se dão aos jornalistas as condições necessárias para que possam realmente ser independentes e exercer com dignidade a sua profissão.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito obrigado pelo seu esclarecimento, Sr. Deputado.
É evidente que quando referi que a situação da comunicação social e um pouco idêntica ao que se
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passava no anterior regime, referia-me claramente à situação profissional, e sobretudo material, dos jornalistas.
Antigamente, os jornalistas eram obrigados a ter dois ou três empregos, e hoje está realmente a acontecer o mesmo no sector da comunicação social. Era apenas isto que queria referir, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, antes de formular o meu pedido de esclarecimento, queria perguntar à Mesa como é que é contabilizado o tempo do pedido de esclarecimento que vou formular.
O Sr. Presidente: - A contabilização resulta do que determina o Regimento. Tem 3 minutos, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Zita Seabra: - Exactamente, Sr. Presidente, mas era só para saber se, em função do acordo que foi feito na conferência de líderes parlamentares, esses 3 minutos de que disponho para fazer o pedido de esclarecimento não são depois descontados .
O Sr. Presidente: - Não são, não, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, poderia dizer que subscrevia no fundamental as declarações que proferiu, nomeadamente no que respeita à situação da comunicação social - onde penso que, apesar de tudo, pecou por defeito - e às condições de trabalho dos jornalistas.
Só que, solidarizando-me em nome do meu grupo parlamentar com o que disse em relação às condições em que trabalham os jornalistas portugueses, e nomeadamente à negociação do seu contrato colectivo - que está há 11 meses para ser alterado e em cuja proposta a entidade patronal vai ao ridículo de propor um aumento de 12 % -, gostaria de lhe lembrar, Sr. Deputado, que, para além dos jornalistas, há também os gráficos.
Os gráficos estão exactamente na mesma situação contratual que os jornalistas e têm travado - e muito bem - a luta conjuntamente, pois estão nela interessados, tanto uns, como outros. Na verdade, se os gráficos não escrevem o que os Srs. Deputados dizem, imprimem essas mesmas palavras.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Não podemos esquecer que os gráficos também têm filhos, também comem, logo também os 12 % não chegam para eles.
Daí a minha questão em relação às condições de trabalho que parecem ser, na verdade, inaceitáveis na situação actualmente em vigor. Com uma taxa de inflação de 30 %, o aumento proposto no contrato colectivo de trabalho dos jornalistas - que estão hoje numa situação difícil, pois muitos deles têm os salários em atraso - não faz face à recuperação do poder de compra.
A segunda ordem de questões, Sr. Deputado, é a de que, na verdade, a comunicação social estatizada, e particularmente no que diz respeito à Televisão, está hoje pior do que nunca esteve, em termos de manipulação e de falta de isenção.
Chamo a atenção do Sr. Deputado e desta Câmara para a situação escandalosa em que se encontra a Televisão. Só diria que desde que este Governo entrou em funções e desde que tem a responsabilidade que tem hoje, o PCP teve em média, por mês, 3 minutos de televisão. Esta é a média do tempo que o PCP teve no Telejornal. E mais: ao todo, participou em dois debates na televisão, desde que este governo assumiu funções. Isto e inaceitável em termos de partido de oposição, é uma manipulação clara da opinião pública, pois o PCP representa aqui mais de l milhão de votos de eleitores portugueses.
Em anteriores governos, muitas vezes denunciámos aqui a situação que se vive nesse órgão fundamental de comunicação social que é a televisão, mas hoje ela está pior do que nunca. Em termos objectivos, isto é, de contabilização de tempo, está pior do que nos piores tempos do Sr. Proença de Carvalho. E ele era muito mau! Hoje está pior, e o PCP tem menos tempo directo de Telejornal do que tinha nesse tempo.
Exactamente em igual situação está o movimento dos trabalhadores. A luta dos trabalhadores que hoje está completamente ausente de toda e qualquer imagem televisiva no Telejornal (o noticiário fundamental) está completa e totalmente manipulada.
Era para isto que gostaria chamar a atenção da Câmara e dos Srs. Deputados. Penso que aqui, pelo menos, é possível que os democratas façam um juízo de valor em relação à situação anterior ao 25 de Abril - e também tenho o meu - e que, através dessa comparação, não escamoteiem a gravidade da situação que hoje se está a viver em termos de uma liberdade fundamental que é o direito a ser informado.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, se desejai, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Pretendo responder, embora não seja fácil, na medida em que a Sr.ª Deputada não me fez perguntas em concreto.
De facto, começou por fazer o que, de certo modo, poderia ser uma insinuação desagradável, ao chamar a minha atenção para o facto de eu não ter referido a luta dos gráficos porque eles não publicam os meus discursos.
Bom, Sr.ª Deputada, penso que nem sequer vale a pena responder a insinuações deste teor.
Quanto às questões que levantou relativamente à Televisão, devo dizer que a minha intervenção política durou os 10 minutos regimentais e que havia muita coisa sobre a qual teria de falar. O problema concreto que se discutia aqui era o da situação dos jornalistas, do contrato em causa e, indirectamente, o das repercussões que a situação em que vivem os jornalistas tem nos órgãos de comunicação social e na sua independência.
É óbvio que a Sr.ª Deputada aproveitou para fazer unia crítica à Radiotelevisão Portuguesa que eu subscrevo a 80 %, ou mesmo a 90 %. Todavia,
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continuo a considerar perfeitamente demagógico (desculpe-me o termo), perfeitamente manipulador da própria opinião pública, qualquer comparação entre a situação que se vive actualmente e a que se vivia antes do 25 de Abril.
A Sr.ª Deputada disse - e isso é seguramente certo - que o PCP teve, em média, 3 minutos por mês no Telejornal. Penso que é muito pouco, sobretudo em comparação com o tempo que é dado ao governo, que até já faz tempos de antena escamoteados - tivemos o prazer ou o desprazer de assistir noutro dia a uma curiosa intervenção do Sr. Ministro do Equipamento Social sobre a arquitectura da Taipa! Mas, Sr.ª Deputada, o Partido Comunista, por muito pouco que tenha tido, ainda tem 3 minutos na televisão; o Partido Comunista, antes do 25 de Abril, tinha muitos minutos nos parlatórios de Caxias, do Aljube e de Peniche! Por isso, Sr.ª Deputada, a situação não é a mesma.
O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, queria fazer duas brevíssimas correcções.
Em primeiro lugar, não insinuei nada - é injusto da sua parte dizer isso -, apenas assinalei que o Sr. Deputado tinha esquecido os gráficos.
Não sei se há dias o Sr. Deputado esteve ou não no eléctrico que circulou por Lisboa e para o qual foram convidados vários deputados, que participaram com muito gosto. Ora, nesse eléctrico, ao lado dos jornalistas estavam os gráficos.
É muito frequente este lapso: fala-se dos jornalistas, até porque estão mais em contacto connosco, e esquecem-se os outros, que constituem um sector fundamental, sem o qual não haveria comunicação social - o sector gráfico.
Em segundo lugar, o que eu disse relativamente à comparação com o 25 de Abril foi o seguinte: aquilo que havia antes - e que todos conhecemos - não nos deve fazer escamotear ou servir para atirar poeira para os olhos sobre aquilo que se passa hoje. O que fiz foi, exactamente, pôr de lado qualquer comparação com o antigamente e acentuar a gravidade do que se passa hoje, vivendo nós em democracia.
Foi este o sentido exacto das minhas palavras e não o de comparar e dizer que hoje estamos pior ou melhor do que antigamente - sobre isso, disse que tinha o meu juízo de valor. Mas, apesar de as situações não serem comparáveis, isso não nos pode fazer esquecer a gravidade do que se passa hoje num órgão de comunicação social tão importante como é a Televisão. E se o Sr. Deputado vê o Telejornal diariamente ou, pelo menos, de vez em quando, certamente não ignora a gravidade do que se passa e a total falta de isenção com que ele é feito.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se pretender, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Agradeço à Sr.ª Deputada ter-me esclarecido que não pretendia fazer insinuação nenhuma. Ainda bem. Fica encerrado o incidente.
Quanto à comparação com o antes do 25 de Abril, devo dizer que na minha intervenção não fiz qualquer comparação nem recorro ao período de antes do 25 de Abril para, porventura, escamotear a situação actual, se é que escamoteei alguma coisa. Não evoquei o antes do 25 de Abril, pois não sinto qualquer necessidade do passado para apreciar o presente. Não fui eu quem trouxe esse período para a discussão!
O Sr. Carlos Brito (PCP): - De acordo!
O Orador: - Foi, sim, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. E a Sr.ª Deputada, em seguida, voltou a retomar o tema, então totalmente a despropósito, na medida em que não houve nas minhas palavras qualquer referência nesse sentido, nem era minha intenção evocá-lo para discutir a situação presente.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Mas o Sr. Deputado falou nisso quando estava a responder.
O Orador: - Bom, mas a minha resposta ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca constituía uma questão entre mim e aquele Sr. Deputado! Só não o era se a Sr.ª Deputada considerasse que, para analisar a situação actual, havia, de alguma forma - e nesse caso concreto -, que estabelecer comparações com o regime de antes do 25 de Abril. E se há necessidade de estabelecer comparações, desculpe-me, Sr.ª Deputada, mas continuo na minha: por muito degradada e muito grave que seja a actual situação, da comparação continua a resultar um saldo positivo para a situação actual.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Basílio Horta.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lage pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente. Mas se V. Ex.ª não se importasse, cedia a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lacão para o mesmo efeito.
O Sr. Presidente: - Com certeza. Sr. Deputado.
Tem então a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão para formular um pedido de esclarecimento.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, considero que foi extremamente oportuna a intervenção de V. Ex.ª, ao pôr em relevo o facto de os jornalistas - do nosso ponto de vista, com total justiça - estarem a lutar pela dignificação das suas condições salariais e de trabalho. Extremamente oportuna, na medida em que, se nós deputados entendemos - e entendemos bem - que é adequado, do ponto de vista da defesa da própria dignidade das instituições democráticas, preocuparmo-nos com o nosso estatuto de representantes do povo, não podemos também, e por maioria de razão, desconhecer que uma classe tão sujeita a pressões de vária ordem, de natureza política ou de outra natureza equiparável, tem vindo aceleradamente a ver degradadas as suas con-
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dições profissionais, designadamente no que se refere às condições remuneratórias.
Estamos, por isso, totalmente de acordo com esta questão e penso que ela deve mesmo merecer uma reflexão mais profunda, com as implicações complexas que ela tem, por parte desta Câmara e talvez desde logo por parte da Subcomissão Permanente de Comunicação Social, que, como se sabe, está a funcionar no âmbito da Comissão dos Direitos, Liberdades e Garantias.
O Sr. Deputado referiu-se à questão do duplo emprego dos jornalistas. Ora, sabemos que, em muitos aspectos, esse duplo emprego resulta justamente de não haver condições salariais suficientemente dignas para que, no exercício da profissão num só local de trabalho ou num só órgão de informação, o jornalista possa ganhar nobremente a sua vida.
O que gostaria de lhe perguntar, Sr. Deputado, era o seguinte: do seu ponto de vista, deveria ser vedada ao jornalista a possibilidade de participação, de cooperação ou de trabalho em mais do que um orgão de informação - e, a ser assim, não estaríamos de acordo com esse ponto de vista - ou, pelo contrário, o que importa é debelar esse mal nas suas consequências negativas, sem prejuízo de dar ao jornalista toda a liberdade de expressão em todos os órgãos de informação onde ele entenda poder e dever ter acesso?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado Jorge Lacão, permita-me que comece por dizer - e desculpe a vaidade - que depois de ter ouvido a sua pergunta me senti confrontado (passe a expressão) com a intervenção que fiz, na medida em que ela parece ter valido a pena para alguma coisa. O facto de o Sr. Deputado ter levantado aqui a necessidade de esta questão ser aprofundada na Assembleia e, nomeadamente, na Subcomissão Permanente de Comunicação Social, faz-me pensar que, apesar de tudo, valeram a pena os 10 minutos que fiz perder à Câmara.
Quanto à questão concreta que me pôs, devo esclarecer o seguinte: ao contrário do que o Sr. Deputado possa pensar, sou totalmente avesso a todas as práticas compulsivas. Não defendo a obrigatoriedade da exclusividade. O que defendo e considero fundamental é que aos jornalistas que queiram exercer em exclusivo num determinado órgão de comunicação social a sua profissão, sejam dadas as condições para que o possam fazer, em vez de serem obrigados a desmultiplicarem-se por n redacções, por n órgãos de comunicação social para poderem ganhar a vida.
Esta é a questão fundamental: sejam dadas aos jornalistas que o quiserem - e estou certo de que muitos o quererão, porque essa exclusividade é, como regra, uma condição para o exercício da profissão - as condições que lhes permitam, de facto, optar pelo regime de exclusividade, coisa que hoje, a menos que tenham outras fontes de receita, não podem fazer.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa para saber qual a figura regimental a que tinha obedecido a intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão.
É porque se o Sr. Deputado Jorge Lacão fez uma intervenção, gostava de lhe pedir esclarecimentos; se pediu um esclarecimento, não posso perguntar-lhe nada.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lacão fez um pedido de esclarecimento, mas V. Ex.ª terá sempre, como muito bem sabe, outras figuras regimentais que lhe permitirão usar da palavra, se assim o desejar.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Bom, a minha imaginação não me permite, neste momento, encontrar a figura que possibilite colocar a questão ao Sr. Deputado Jorge Lacão. A não ser que eu prossiga na minha interpelação à Mesa para saber se poderia obter do Sr. Deputado Jorge Lacão uma informação ...
A preocupação que o Sr. Deputado Jorge Lacão, como deputado da maioria, revelou aqui pelas condições que permitam aos jornalistas exercer a sua profissão com independência e com dignidade é extremamente louvável. É uma posição de elogiar e com a qual nos congratulamos.
Pretendia saber é se o Sr. Deputado, enquanto deputado da maioria, tem mostrado igual preocupação junto do governo que apoia e se tem procurado, junto desse governo que apoia, que ele contribua também para a independência e a dignidade do exercício da profissão do jornalista.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - É que nós não estamos convencidos disso, e por isso muito estranhamos a intervenção (feita em forma de pedido de esclarecimento) do Sr. Deputado Jorge Lacão, muito embora nos congratulemos com o seu teor e com o facto de ter sido por ele produzida na Assembleia.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª não interpelou a Mesa, mas sim o Sr. Deputado Jorge Lacão. Nestes termos, dou a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lacão para responder, se desejar.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, permita-me que comece por dizer que fico sem saber se a questão que me suscita constitui uma forma enviezada, como toda a Câmara reparou, de o CDS se poder pronunciar sobre o assunto dos jornalistas ou se, realmente, é uma preocupação concreta do Sr. Deputado no sentido de saber quais as diligências que eu possa ter feito junto do Governo que apoio, como bem salientou, relativamente à resolução deste problema.
Quero dizer que, relativamente às minhas diligências particulares, não terei de dar, como é natural, conhecimento à Câmara. O que importa é saber as diligências que posso fazer como deputado desta Assembleia.
Julgo que a diligência essencial é aquela que transcorre das palavras que proferi no pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, ou seja, o
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compromisso da minha bancada de, no local próprio desta Assembleia, que é a Subcomissão Permanente de Comunicação Social, abordarmos em conjunto, com deputados de outros grupos parlamentares, e, designadamente, do seu, a posição que, do ponto de vista da Assembleia da República, todos possamos tomar com vista à solução de uma questão que, pelos vistos, é consensual e que deve merecer a máxima atenção e consideraçâo para o prestígio de uma classe de alta relevância em termos de formação de opinião pública e até de estabilização do funcionamento normal do Estado democrático.
Para esse efeito, tem o Sr. Deputado toda a minha disponibilidade, tal como espero contar com toda a disponibilidade do CDS.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quinze dias decorridos desde o início da sessão legislativa, um mês depois do recomeço dos trabalhos parlamentares, a Assembleia da República continua embrulhada nas confusões que resultam do desconchavo da actividade governamental e voltada (e mal) para o seu próprio umbigo.
A sessão legislativa começa mal. O prestígio da Assembleia resultaria de um trabalho que desse resposta aos problemas. Mas o Governo entendeu pôr a Assembleia a carimbar os seus próprios erros de gestão orçamental No buraco cada vez mais alargado do Orçamento, resultado da incompetência e de uma política de desastre, perde-se também a actividade da Assembleia.
O Sr José Magalhães (PCP): - É o descalabro'
O Orador: - A revisão do Regimento faz o resto. Na ânsia de calar a oposição e de lhe restringir os meios de intervenção, a coligação PS/PSD ocupa o tempo útil de trabalho da Assembleia da República e esvazia-a das suas reais funções.
Há 15 dias que deveria ter entrado na Mesa da Assembleia a proposta do Orçamento para 1985. A Assembleia da Republica oficialmente nada sabe. Pelos jornais, todos podemos ler que os desconchavos continuam, cada ministro puxa a brasa à sua sardinha e sobre proposta do Orçamento - meles!
Há que alterar esta situação.
Esta nova sessão legislativa tem de retomar os caminhos da normalidade. Em muitos campos. Exemplos, a criação de freguesias (adiada por culpa da coligação) esta bloqueada, como bloqueada esta a lei-quadro da criação de municípios (no que se inclui a criação de municípios como o de Vizela). Apresentámos requerimentos sobre a matéria, cuja votação se impõe para ser possível avançar Quanto à corrupção, e como foi reconhecido pelo ministro Almeida Santos e por deputados da coligação (designadamente o Sr. Deputado Carlos Lage), importa aprovar desde já os inquéritos parlamentares pendentes aqui na Assembleia ha muitos meses Os prazos estão mais do que esgotados e a Assembleia não pode deixar de os votar
O Sr. Dias Lourenço (PCP). - Muito bem!
O Orador: - A normalidade implica o pleno exercício das competências da Assembleia. Nesse quadro, o debate sobre o processo de negociação com a CEE não tem desculpas de adiamento. Pode o Governo estar arrependido de o ter solicitado, mas é o interesse nacional que o exige.
Srs. Deputados, este curto balanço não me dispensa de cumprir para convosco uma obrigação fundamental como deputado.
Pude, na primeira quinzena deste mês de Outubro, visitar e tomar contacto com comunidades de emigrantes portugueses no Canadá, concretamente em Toronto e Montreal.
Nesta intervenção procurarei dar a conhecer à Assembleia da República alguns dos problemas com que se defrontam esses portugueses
É justo fazê-lo, porque os emigrantes esperam de nós, da Assembleia, precisamente que conheçamos os seus problemas, que os debatamos e que contribuamos para a sua resolução. E e também oportuno fazê-lo, neste momento em que se avizinha a discussão do Orçamento de Estado e em que, por via disso, muitos problemas poderão ser resolvidos ou, o que será mau, mais uma vez adiados.
Não se revelou fácil para mim num espaço curto de tempo cumprir um programa que permitisse situar com inteiro rigor toda uma problemática que afecta comunidades de portugueses cujo numero e, sensivelmente, de 250 000 pessoas.
Procurei aproveitar o tempo que tinha, estabelecendo contactos muito diversificados e tanto quanto possível representativos.
Contactei as direcções de algumas das numerosas associações de portugueses. Tive entrevistas com representantes do Conselho das Comunidades Em sessões e encontros, procurei obter dados directos de um leque vasto de emigrantes Participei em reuniões de trabalho com responsáveis de organismos portugueses vocacionados para o apoio social, cultural e económico das comunidades Participei em entrevistas com responsáveis e jornalistas de alguns órgãos de comunicação social Ouvi, tanto quanto possível, responsáveis consulares e dos serviços de emigração portugueses Tive encontros com autoridades canadianas ligadas aos emigrantes portugueses, como e o caso de deputados da Câmara dos Comuns eleitos em círculos de forte expressão portuguesa, vereadores das Câmaras de Montreal e Toronto nas mesmas circunstâncias, serviços governamentais e a ministra da Emigração do Governo do Quebeque.
Durante alguns dias vivi, em português e como português, os problemas de dezenas de milhares de compatriotas nossos. Percorri a Dundas Street, a Rua Augusta, a St. Laurent Alojei-me em casa de portugueses, visitei os estabelecimentos comerciais e os restaurantes onde se fala português
As queixas vieram e são muitas. Diz-se no Canadá que e tempo de as autoridades portuguesas que visitam aquelas terras deixarem os hotéis luxuosos da zona da Baixa e se interessarem efectivamente com os problemas que afectam os emigrantes. Para que não suceda o que varias vezes ouvi dizer com sentido critico e bem gozado- que a saída do Canada, no aeroporto, «perdem o bloco de notas» ...
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Os emigrantes portugueses do Canadá trabalham em fabricas, em duros trabalhos da construção civil, em hotéis e restaurantes, na limpeza de grandes edifícios, no serviço doméstico. E também são comerciantes, empregados de serviços, homens e mulheres de mil ofícios em terras longínquas Definem--se a si mesmos Cito. «No nosso pais nós nos queríamos, a alqueivar as terras, à trabalhar as fábricas, a abrir as estradas, a construir as escolas e os hospitais de que tanto carecem as nossas cidades e as nossas vilas. E que, por faltarem, deixaram desocupados os nossos braços e nos foram apontadas as portas do exílio económico - a emigração.»
Só que, Srs Deputados, o exílio económico transforma-se rapidamente em exílio cultural se não forem tomadas as medidas necessárias E as comunidades portuguesas correm o perigo de se diluírem na sociedade canadiana, se o Pais e os responsáveis governamentais lhes virarem as costas
As reclamações são instantes pedem-se bibliotecas - e, em vez disso, a Secretaría de Estado da Emigração envia boletins de autêntica propaganda e promoção governamentais Pedem-se apoios para actividades culturais diversificadas - e vão escassos trajos regionais Pede-se um programa cultural seno, um adido cultural, a organização e programação da deslocação de significativas actividades culturais portuguesas (para beneficio directo da comunidade, mas também para que a cultura portuguesa seja conhecida e se afirme no Canadá) - e a resposta e o negligente silêncio e desinteresse
A coesão das comunidades mete-se pelos olhos dentro Mas a paciência tem limites
Como pode a segunda geração sentir e falar português se não existe um programa escolar empenhado, se a escola portuguesa que ai existe vive da iniciativa própria e se ate o material escolar que vai e muitas vezes insuficiente?
As autoridades canadianas implementam hoje um programa piloto, com o ensino da lingua-mãe meia hora por dia
Visitei uma escola canadiana em Montreal, uma escola com 45 % de alunos portugueses, onde esse programa esta a ser aplicado O director louvou os alunos e os pais pela colaboração que prestavam a escola Mas queixou-se os alunos não tinham acompanhamento suficiente, porque em casa dos pais só falavam português
E obvio o alcance desta observação O ensino do português serve, paia as autoridades canadianas, o mínimo de equilíbrio psicológico do aluno e da família Mas o objectivo e a sua integração na sociedade canadiana E, Srs Deputados, se nos importa equacionai as consequências disso, então são precisas armas fortes vontade política, programas de desenvolvimento da escola portuguesa, afirmação cultural própria
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP) - Muito bem!
O Orador: - E também conhecimento concreto da realidade do nosso pais Informação concreta, continua e pluralista Ou seja, o contrario do que sucede hoje
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP) - Muito bem!
O Orador: - As queixas dos profissionais da comunicação social e das direcções das associações são múltiplas A informação chega tarde, distorcida e governamentalizada; jornais que eram enviados pela Secretaría de Estado da Emigração deixaram de sê-lo, serviços formativos e noticiosos têm de ser pagos para serem transmitidos ou divulgados na comunidade portuguesa no Canada
O Sr José Magalhães (PCP) - Muito mal!
O Orador: - E por sobre tudo isto, as dificuldades constantes em resolver os problemas que se colocam aos emigrantes em Portugal, a falta de informação sobre os processos e dossiers, arrastando-se pelos tribunais e serviços da administração portuguesa, a inexistência de estruturas serias e eficazes que permitam ao emigrante obter resposta para as perguntas que faz e tem de fazer acerca dos seus problemas e questões
Como caso-limite, quase anedótico, a história que me contou um jovem que pretendia vir a Portugal e foi a serviços oficiais portugueses perguntar se teria problemas «militares» Resposta «Não sabemos, mas se for preso a entrada, e porque tem problemas!»
Isto não pode ser! Como não se pode admitir que, fechada a emigração, sejam as autoridades nacionais, aqui, em Portugal, a aconselhar a emigra cão clandestina, com passaporte de turista, abandonando portugueses a exploração, aos baixos salários, à falta de protecção social, ao risco da expulsão
Questões como as que acabei de referir não podem cair em saco roto Por isso mesmo, hoje entrego um conjunto de duas dezenas de requerimentos ao Governo Fico a espera de respostas urgentes
Vozes do PCP - Muito bem!
O Orador: - Srs Deputados O Canada e uma terra imensa, com perto de 10 milhões de quilómetros quadrados e apenas pouco mais de 24 milhões de habitantes Riquíssimo em recursos naturais, o Canada sofre, no entanto, hoje as sequelas e contradições do seu modelo sócio-económico O numero de desempregados ultrapassa l 600 000, aproximando-se dos 14 % Em escassos anos, o desemprego duplicou O lay-off e o desemprego são duras realidades com que se defronta um numero crescente de portugueses
O Sr Luís Beiroco (CDS) - E uma miséria, o Canadá!
O Orador: - A pergunta vem, naturalmente, por parte desses portugueses «Pode-se regressar a Portugal?» Que responderiam os Srs Deputados? Que praticamos em Portugal uma política de desenvolvimento geradora de novos postos de trabalho Que o credito e acessível e o investimento incentivado? Que existem programas de desenvolvimento regional capa/es de catalisar as poupanças dos emigrantes? Responderiam a algumas dessas coisas, Srs Deputados? A resposta e evidente não, porque nada disso esta em curso
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O retorno ao Pais torna-se, assim, longínquo. Talvez por isso, mais desejado. Cá e lá, Srs. Deputados, uma vida dura.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu pedido de esclarecimento resulta da primeira parte da intervenção do Sr Deputado João Amaral. A segunda parte da sua intervenção é bem mais interessante, pondo de parte as contradições que encontrou no capitalismo do Canadá.
O Sr. João Amaral (PCP): - Não fui eu que as encontrei, elas existem objectivamente!
O Orador: - Já as levava no seu raciocínio ideológico, como é evidente.
Pondo de parte essas contradições apriorísticas que encontrou no capitalismo canadiense, o Sr. Deputado João Amaral fez um interessante panorama da situação da nossa comunidade no Canadá. E sobre isso apenas tenho que sublinhar o valor do depoimento do Sr. Deputado João Amaral nesta Casa.
Quanto à primeira parte da sua intervenção, o Sr. Deputado João Amaral disse que a sessão legislativa tinha começado mal, sobretudo por causa das questões regimentais.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado João Amaral, que, na nossa opinião, começará menos bem, por causa das questões regimentais, para se desenvolver melhor e terminar bem. Julgamos que as alterações ao Regimento são condição para que a sessão legislativa seja melhor. E já agora pergunto-lhe: qual é a cooperação que o seu partido está disposto a dar para que a sessão legislativa seja melhor e para que as próprias alterações ao Regimento se processem mais rapidamente do que até à data?
Em segundo lugar, o Sr Deputado João Amaral levantou muitas questões, embora em poucas palavras, sobre o Orçamento para o próximo ano, fazendo alguns comentários depreciativos.
O Sr. Deputado João Amaral sabe perfeitamente que o orçamento do próximo ano é um orçamento de difícil concepção e definição, porque as receitas em Portugal não são o que se desejava, as despesas aumentam, e com certeza que o Sr. Deputado João Amaral não nos dará uma fórmula para contrair as despesas e para aumentar as receitas, porque isso significaria aumentar impostos ...
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Poderia não significar isso!
O Orador: - ... e, por outro lado, não aumentar as despesas significaria, naturalmente, não fazer as reacções sociais, nem os aumentos do funcionalismo público que, com certeza, detende.
Portanto, mais contradições do que aquelas que encontrou no Canadá julgo estarem subjacentes a este seu raciocínio.
Quanto às negociações com a CEE e ao medo que o Governo tem de as vir expor aqui à Assembleia da República, isso não tem consistência. Está previsto um debate nesta Câmara sobre a integração na CEE; esse debate será na próxima semana, por proposta que faremos na conferência dos líderes parlamentares.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Esse debate está assim previsto e, naturalmente, também na comunicação social, em colóquios, em debates públicos, e o seu partido terá com certeza a oportunidade de, nessa matéria, dar a sua contribuição.
Quero, aliás, dizer-lhe que o PCP, nesta matéria da CEE, está muito bem acompanhado: também a C1P tem posições semelhantes. São duas posições muito progressistas que se verificam na nossa sociedade.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Figueiredo.
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, ouvi com o maior interesse o relato da sua digressão turística ao Canadá, dado que, como V. Ex.ª sabe, o PCP nunca conseguiu eleger nenhum deputado pelos círculos de emigração, de forma que, como e evidente, não tem a representação dos emigrantes nesta Casa, que cabe maioritariamente ao PSD, como é do seu conhecimento
Fiquei muito satisfeito com a facilidade de deslocação e contactos que teve num país democrático como o Canadá, o que não acontece noutros países onde a dificuldade de contactos com as populações é muito maior, como V Ex.ª também muito bem sabe.
O Sr José Magalhães (PCP): - Os Estados Unidos, por exemplo, que não nos deixam lá ir!
O Orador: - O que queria realmente salientar e que não reconheço ao PCP representatividade para falar em nome da emigração, dado que essa emigração, como e do conhecimento generalizado, não lhe concede um voto suficiente para ter representação nesta Casa Muito pelo contrário, considero o PCP largamente responsável pela situação económica do País, nos períodos de desestabilização de 1975 e 1976.
Por esse motivo, V. Ex.ª só na qualidade de turista se pode dirigir ao Canada, ter os contactos que referiu, e estou crente que assim será durante bastantes anos.
Por outro lado, o PSD tem tido sempre responsabilidade na área da emigração, dado que é o maior partido a representar emigrantes na Assembleia da Republica e no próprio Governo. Não as enjeita, assume-as por inteiro e, agora mesmo, nos Estados Unidos - que o Sr. Deputado, seu colega, referiu há pouco -, estiveram todos os deputados eleitos pela emigração, dialogando com os emigrantes do Canadá, dos Estados Unidos e da Austrália, na primeira reunião do Conselho das Comunidades, que se realizou a 12, 13 e 14 deste mês. Aí debatemos os problemas sem facciosismo, com vontade constru-
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tiva, procurando encontrar as soluções na medida da disponibilidade do Pais e dos meios materiais de que dispomos para ir ao encontro dos problemas dos nossos emigrantes que, de facto, existem, mas que se resolvem pela vontade política, pela vontade concertada de todos os intervenientes, por uma discussão clara e lúcida desses problemas e não com demagogias que servem apenas fins político-partidários e que não têm qualquer relevância nos meios da emigração.
Por isso, Sr. Deputado João Amaral, quero dizer-lhe que afaste as suas preocupações porque nas sedes próprias onde os emigrantes têm a sua voz representada - no Conselho das Comunidades, que se realizou, como disse, nos Estados Unidos, e que vai ter a segunda sessão em França e a terceira em Fortaleza, no Brasil, com outros emigrantes -, os deputados eleitos democraticamente por esses emigrantes saberão, com certeza, na Assembleia da República, dar as respostas devidas aos problemas e aos anseios que nos põem.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Tem-se visto!
O Orador: - E compete-nos a nós, deputados, através do Orçamento do Estado, que vamos discutir, viabilizar os meios económicos indispensáveis para que o funcionamento das instituições postas à disposição dos emigrantes possam funcionar devidamente. E assim se verá quem está, realmente, a apoiar os emigrantes.
Portanto, eram estas as observações que lhe queria fazer e perguntar-lhe se, realmente, pensa que a sua intervenção tem uma representatividade para assumir nos termos em que a assumiu.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Raramente temos o privilégio de poder ouvir notas de viagem tão calorosas, tão coloridas, para nos dar o conhecimento de terras onde, muitas vezes, não podemos chegar com facilidade.
Por isso, antes de mais nada, queria agradecer ao Sr. Deputado João Amaral o prazer que nos deu e o cuidado que teve em as anotar, para dar conta da sua magnifica experiência.
Gostaria, em todo o caso, dada a minha ignorância sobre a matéria, sobre o aspecto que lhe vou perguntar, que me dissesse se existe no Canadá um partido Comunista e se, realmente, esse partido comunista está inserido na sociedade democrática, se a respeita e se, nas grandes capitais do Canadá, o partido comunista serve também, exactamente, para fazer a sua propaganda, dando cabo das paredes dos prédios para deitar os governos abaixo.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.
O Sr. José Gama (CDS): - Sr. Deputado João Amaral, quero felicitá-lo pela luta aqui travada em defesa da emigração, e felicito-o com tanto maior calor quanto é certo que o PCP tem tido, no resto do Mundo, nas últimas eleições, cerca de 3 97o dos votos e, realmente, esse facto não o tem impedido de aqui sempre se manifestar quanto a necessidades, direitos e aspirações dos emigrantes estão em causa.
Falou em muitos contactos que teve com os emigrantes, nomeadamente com o Conselho das Comunidades, e eu queria perguntar-lhe se, realmente, o Sr. Deputado está disposto a fazer inflectir a vontade do seu partido no sentido de, na próxima revisão constitucional, o levar a votar a favor da participação dos emigrantes nas eleições presidenciais.
Em segundo lugar, como sabe, circulam rumores de que a próxima reunião do Conselho das Comunidades, que terá lugar em meados de Novembro, em Paris, poderá realmente ser ferida no seu espírito de serenidade, de unidade e de espírito democrático, que devem presidir a uma reunião de tão magna importância.
Quero perguntar ao Sr. Deputado se tem conhecimento destes rumores e, no caso de se confirmarem realmente atentados a este espirito de serenidade e de abertura de espírito democrático, se o PCP, desde já, se oporá firmemente a que isso aconteça.
Quero finalmente perguntar-lhe se manifesta também a sua surpresa em relação às viagens que a Secretaria de Estado da Emigração tem promovido, nomeadamente na pessoa do Sr. Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, que foi ao Brasil a convite da Secretaria de Estado da Emigração e que aproveitou essa oportunidade para tecer considerações político-partidárias.
Pergunto-lhe se pensa que a Secretaria de Estado da Emigração deve continuar a patrocinar esse tipo de viagens e queria saber, concretamente, qual a posição do PCP.
O Sr. Presidente: - Finalmente, para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Figueiredo Lopes.
O Sr. Figueiredo Lopes (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, fico muito satisfeito por V. Ex.ª ter tido a oportunidade de visitar o Canadá. Mas, por outro lado, fico bastante apreensivo porque imagino a tanta demagogia que o senhor por lá deixou. Coitados dos nossos emigrantes! Se o senhor diz que da parte do Governo - nos boletins oficiais - se faz uma propaganda descarada do Governo, então o que terá o senhor feito no meio da nossa comunidade portuguesa?
Tenho aqui um exemplar desse boletim que referiu, que posso mostrar a qualquer dos Srs. Deputados desta Casa, para analisarem qual o tipo de propaganda governamental que é feita. Os boletins são cadernos que se chamam «Emigração» e este boletim está à sua disposição para provar, precisamente, que nele não são tratados problemas de ordem pessoal nem de propaganda governamental; são tratadas matérias de ordem técnica, pura e simplesmente.
Falou no problema escolar, que é um problema que, realmente, todos lemos de ter em atenção em todo o mundo da emigração portuguesa.
Na verdade - e se o senhor não sabia, fica agora a saber -, no Canadá, nos Estados Unidos, na
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África do Sul e na Austrália, a cultura portuguesa, o ensino do português está mais ligado à actividade privada. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que nesses países há associações que têm as suas próprias escolas, mas essas associações são apoiadas pelo Governo Português de tal modo que, no Canadá - não sei se visitou -, poderá ter visto, eventualmente, o coordenador escolar que foi enviado pelo Governo português para aquela área.
Quanto aos jornais, que não chegam, e que a Secretaria de Estado, eventualmente, terá cancelado, quero dizer-lhe que, realmente, isso é verdadeiro; mas é verdadeiro e a culpa é desta Câmara ...
O Sr. João Amaral (PCP): - É sua!
O Orador: - ... porque não conseguimos dotar a Secretaria de Estado da Emigração com aquelas verbas necessárias - várias dezenas de milhares de contos - para apoiarem os jornais, o envio dos jornais para os países onde existem comunidades portuguesas. Espero, portanto, que, no próximo orçamento para 1985, essa falha seja colmatada e que os portugueses no estrangeiro possam ter mais jornais portugueses, mais jornais democráticos ao seu serviço.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Nós é que esperamos que aprovem isso!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria, naturalmente, pelas questões relativas ao Canadá.
Devo dizer que a sensação geral que tive das perguntas que me foram formuladas, foi de que os Srs. Deputados que fizeram perguntas tinham a noção de que os problemas existiam, de que os problemas tinham de ser resolvidos e de que a minha intervenção tinha um conteúdo útil que mereceria, da vossa parte, outro tipo muito diferente de debate.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Infelizmente, o caminho seguido foi o pior. Foi a tentativa de utilizar a colocação de problemas sérios, que afectam portugueses que vivem longe, para divergir sobre questões que nada têm a ver com o assunto ou que têm muito pouco a ver com ele - o Sr. Deputado José Gama é disso exemplar. É exemplar quando, colocando a questão da eleição do Presidente da República, veio aqui demonstrar que, no fundamental, o que procura, com o seu partido, na política com os emigrantes, é influir sobre a política nacional e não resolver os problemas dos emigrantes, lá, onde trabalham, e as dificuldades que têm.
O Sr. Deputado Fernando Figueiredo relatou-nos o seu passeio turístico a Danbury e informou-nos de que também vai fazer um passeio turístico a França e outro a Fortaleza, no Brasil. Parabéns, Sr. Deputado.
Só que, em matéria do que é decidido nessas reuniões do Conselho das Comunidades, é bom que se pergunte e é bom que até interrogue o seu próprio partido sobre qual a razão por que foi feita a divisão em 3 zonas. Qual é o critério para juntar os Estados Unidos, o Canadá e a Austrália, que está, como é óbvio, muito próxima dos Estados Unidos? Ao fim e ao cabo, o que é que, para além do turismo que fez, resultou, em concreto, desse diálogo? O que é que, de concreto, está aqui a apresentar, na Assembleia, para resolver os problemas dos emigrantes?
Quanto ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro, é natural que queira obter informações acerca do leque partidário no Canadá. Aconselho-o a consultar a Embaixada do Canadá, onde terá uma informação acessível, pois essa Embaixada tem bastante documentação - tem até em português -, pelo que não terá qualquer dificuldade em ficar informado.
O que procurei trazer a esta Assembleia foram os problemas dos portugueses emigrantes no Canadá. O Sr. Deputado talvez estivesse com o botãozinho do rádio no ouvido e essa parte não ouviu; é costume, e perdoará que lhe dê esta piada, esta graça sem grande sentido, mas que tem, pelo menos, este sentido de registar que não foram esses problemas que quis levantar aqui.
Quanto ao Sr. Deputado Figueiredo Lopes, apesar de tudo tenho de o louvar, porque, no meio dessa pobreza, tentou, pelo menos, responder a 2 ou 3 questões: à questão do envio de documentos, à do envio de jornais e a uma outra.
Devo dizer-lhe que, respondendo, deu-me razão. E deu-me razão neste ponto, que é central: o que é de sublinhar em torno das dificuldades resolúveis em relação aos emigrantes é que foram feitos cortes no Orçamento que conduziram ao bloqueio, nomeadamente de projectos já em curso, e que são os senhores e a vossa política que, de há 8 anos para cá, são responsáveis pela situação.
Não queiram sonegar isto, não queiram enganar os emigrantes, não queiram fazer dos emigrantes pessoas ignorantes, como aqui disse um Sr. Deputado da bancada do PSD - não quero atribuir a nenhum deles a responsabilidade porque já não o recordo - dizendo que tinha ido lá dizer-lhes isto e aquilo.
Os emigrantes no Canadá têm os olhos suficientemente abertos em relação àquilo que se conversa com eles e há questões concretas que conhecem muito bem. Se não há serviços de apoio, se não há estruturas de apoio suficientes aos emigrantes, eles sabem perfeitamente que isso resulta do facto de terem sido feitos cortes no Orçamento em 1983, no Orçamento para este ano, que impediram a realização de projectos concretos.
São todos os senhores responsáveis disso: tanto os que estão no Governo, como os que estão no apoio ao Governo. São os senhores que aqui votaram o Orçamento, como aqueles que, membros do Governo, o propuseram. Talvez por isso fujam, muitas vezes, ao diálogo e ao debate concreto com os emigrantes, não tenham as portas abertas e procurem o silêncio e o remanso dos hotéis de luxo das baixas das grandes cidades que, como sabeis, são de difícil acesso a quem tem tarefas bem ingratas naquelas terras longínquas do Canadá.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - A proposta que fizémos, neste quadro, foi concreta e dirigida a uma situação concreta.
Vai ser aqui discutido, brevemente, o Orçamento. Está um desafio feito: vamos ver o que é que o PS e o PSD dizem, vamos ver o que é que o Governo apresenta.
Ficamos, no entanto, com uma certeza: virar as costas aos emigrantes do Canadá, virar as costas a uma política cultural séria, abandonar aqueles portugueses a uma política de integração que, naturalmente, as autoridades do Canadá têm todo o direito de promover, é diluir a política portuguesa no Canadá e perder aqueles portugueses como tal. Recordo que a questão se coloca fundamentalmente em relação à segunda geração e a aposta ou é feita agora e se ganha agora ou está definitivamente perdida.
Quanto às questões do trabalho parlamentar, Sr. Deputado Carlos Lage, mal lhe ficaria que, no seu habitual lugar de porta-voz dessas questões, não se levantasse.
Levantou-se para dizer pouco: para dizer que o Orçamento é complicado. Eu respondo-lhe de uma maneira simples- se o Orçamento é complicado, o Governo ou tem capacidade para resolver os problemas complicados que se apresentam ao povo português e ao País, ou então, como se demonstra no prática, o Governo não serve, não presta. Se o Governo não sabe resolver um problema tão complicado como o do Orçamento, então que Governo é que temos? Ou será que temos, de facto, um desgoverno e um desconchavo de ministros que barafustam uns com os outros, ou uma federação de ministérios - como já foi dito uma vez, aqui em Portugal, e por alguém da sua bancada - e não um Governo É isto, Sr Deputado
A acusação que lhe faço em relação ao Orçamento e óbvia. A lei está aprovada, existe A dificuldade é de hoje, de ontem, de sempre, mas, seja de quando for, cumpria ao Governo, apresentá-lo. Ora, o Governo, através da comunicação social, faz público testemunho que se não resolve este problema é porque é incompetente, é porque a luta interna ultrapassa as fronteiras dos interesses do Estado e e porque estamos a ser governados não com o respeito pelo interesse nacional, mas ao sabor de interesses particulares projectados em 1985, em 1984, seja em que tempo for, mas projectados fora do interesse nacional
Quanto a questão que o Sr Deputado me colocou sobre as alternativas para o trabalho da Assembleia em relação ao Regimento, devo dizer-lhe que está fora de questão o facto de discutir ou não o Regimento Discuta-se o Regimento com o prazo e com o timing que existe
Porém, o que estava fora de questão, e os Srs Deputados aprovaram isso aqui, era que a Assembleia se virasse exclusivamente para a discussão do Regimento e abandonasse as questões que se colocam ao País Porque e que continuam por aprovar os inquéritos parlamentares relativos a corrupção? Não há tempo? E o Regimento que impede que eles sejam discutidos? Porque e que não e feito o debate sobre a criação de freguesias que já ha tanto tempo foi prometido por VV. Ex.as mas que é constantemente adiado?
Sr. Deputado Carlos Lage, a questão do ordenamento dos trabalhos da Assembleia tem de ser vista na normalidade do exercício de funções da Assembleia Ora, a normalidade do exercício de funções implica para a Assembleia a assumpção do exercício pleno das suas competências. É, pois, isso o que os Srs. Deputados estão a impedir.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular protestos, ficam inscritos para o próximo período de antes da ordem do dia os Srs. Deputados Fernando Figueiredo, Carlos Lage e Igrejas Caeiro.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Rodolfo Crespo.
O Sr. Rodolfo Crespo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por vontade esmagadoramente maioritária do povo português representado nesta Câmara, Portugal começou a integrar-se nas instituições europeias logo apôs a entrada em vigor da Constituição da República que institucionalizou a democracia no nosso país. Em 1976 os parlamentares portugueses passaram a participar de pleno direito na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e o Ministro dos Negócios Estrangeiros a ter assento no Comité de Ministros daquela mesma organização. Entretanto, o I Governo Constítucional, em consonância com a Assembleia da República, encetava as negociações para a entrada de Portugal na CEE Oito anos volvidos, o primeiro-ministro assinava em Dublim o certificado de acordo que nos abre as portas da CEE em l de Janeiro de 1986, consagrando assim a plena vocação europeia do nosso pais.
A CEE tornou-se agora uma meta à vista, uma certeza. O mérito deste sucesso na consagração da vontade europeia de Portugal deve-se, sem dúvida, ao Primeiro-Ministro Mário Soares, que empenhou todo o seu prestígio nesse objectivo, mas deve-se também aos sucessivos governos constitucionais que desde o pedido de adesão se esforçaram por avançar nas negociações, como se deve ainda aos partidos que, quer no Governo, quer na oposição, apoiaram junto das organizações internacionais em que se filiam a vontade portuguesa de integração. E cito, porque e justiça, o Dr. Sá Carneiro, o Dr. Pinto Balsemão, o Prof Freitas do Amaral e o Dr. Lucas Pires. Não esqueçamos também os esforços da UGT, que sempre exprimiu a sua consonância com a adesão portuguesa e cuja acção junto da Confederação Europeia dos Sindicatos foi relevante.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Trata-se, pois, de um projecto nacional com profundas implicações no futuro da sociedade portuguesa. É por isso que hoje abordo aqui um problema que numa das últimas sessões já foi tema de uma intervenção por parte do meu colega e camarada Carlos Lage
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A próxima adesão de Portugal à CEE e hoje uma certeza. É, pois, necessário que a sociedade civil, no seu conjunto, se prepare para uma integração que implica profundas adaptações a nível económico, jurídico e social É dever desta Assembleia alertar a opinião pública para a necessidade de nos repensarmos face as regras de funcionamento comunitárias que nos obrigarão em relação aos outros países membros, mas que obrigarão também estes em relação a Portugal.
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O Sr. Primeiro-Ministro afirmou, o que é um facto, que «o desenvolvimento a médio prazo da economia portuguesa fica, desde agora, ligado ao processo de integração europeia, ainda que - como ele próprio acrescentou - a integração não vá resolver os problemas imediatos conjunturais». Isto significa que devemos repensar não apenas o quadro do nosso desenvolvimento numa perspectiva macroeconómica, mas também sectorialmente em função do mercado alargado que se nos abre, das regras desse mercado e das novas concorrências que despontam.
Naturalmente que isto vai significar um esforço para nos libertarmos dos hábitos proteccionistas a que nos habituou o regime fascista e cujo espírito ainda perdura, hábitos esses que são uma das causas do nosso relativo subdesenvolvimento económico. É uma aposta que exige energia e vontade, mas que está ao nosso alcance. Homens políticos, empresários, sindicalistas, partidos políticos, confederações patronais e sindicais, teremos todos que assumir as nossas responsabilidades.
Há quem pretenda que o quadro africano é a alternativa para a adesão de Portugal à CEE. Isso é um perfeito logro, porque as relações entre a Europa e a África em geral, e entre a Europa e a África de expressão oficial portuguesa em particular, uma vez subtraída ao quadro proteccionista que a ligava a Portugal durante o período colonialista, passa cada vez mais pela CEE no quadro da Convenção do Lomé, a que já estão associadas, de uma ou de outra forma, Guiné, Angola e Moçambique.
Basta olhar para os números e verificar o nível das trocas comerciais desses países e o lugar para que Portugal foi relegado por via da concorrência. O desenvolvimento das nossas potencialidades de relacionamento com África exigem outro enquadramento. Não nos iludamos!
Mas os números falam por si melhor do que qualquer discurso. Citemos alguns que são números do relatório sobre o desenvolvimento do Banco Mundial e, por isso, penso que não serão contestados: as exportações de Portugal para os países desenvolvidos eram em 1960 na ordem dos 56 % e em 1982 subiram para 81 %, dos quais cerca de 60% com os países da CEE. Isto quer dizer que as trocas comerciais de Portugal se têm incrementado em relação à CEE.
Porém, vejamos outros números, porque depois do 25 de Abril houve uma abertura aos países de Leste e talvez fosse bom que houvesse um incremento nessa direcção: em 1960, as trocas portuguesas com os países de Leste eram de 2 %; em 1982, eram de 2 %. Quanto aos países em desenvolvimento, nos quais englobamos a África de expressão portuguesa, porque o comércio é sobretudo feito com a África de expressão portuguesa, essas trocas eram em 1960 de 42 % e são hoje de 16 %. Ora, isto vem confirmar aquilo que acabei de afirmar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate que em breve vamos iniciar neste Parlamento sobre as implicações da adesão portuguesa à CEE deverá, a meu ver, ser sério, fundamentado e atravessar todo o tecido social português. Na próxima semana, o Governo virá a esta Câmara dar o início a esse debate. A nós, parlamentares, cabe assumir seriamente as nossas responsabilidades face ao País e colocar as organizações sociais e políticas face às suas próprias responsabilidades.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!
O Orador: - Acontece que nem sempre se tiram todas as consequências da nossa integração nas diferentes instituições europeias, mesmo quando se trata de direitos. Trago a este Parlamento apenas um exemplo que diz respeito ao Conselho da Europa: como sabem, tivemos recentemente alguns problemas em relação à emigração portuguesa em Espanha. Os portugueses que trabalham em Espanha não estão protegidos por uma legislação, qualquer que ela seja, e têm sido vítimas de medidas discriminatórias por parte do Governo Espanhol. Acontece que, no âmbito das migrações no Conselho da Europa, os diferentes órgãos propuseram aos países membros uma convenção sobre o estatuto jurídico dos trabalhadores migrantes, convenção essa que foi ratificada por Portugal e pela Espanha.
Ora, se a Espanha exige por parte dos outros países signatários do Conselho da Europa e da Convenção o respeito em relação aos emigrantes espanhóis, Portugal está no direito de exigir igual tratamento em relação aos emigrantes portugueses em Espanha, o que se não tem verificado, tal como o demonstram os constantes incidentes entre os trabalhadores emigrantes portugueses e as autoridades espanholas.
As autoridades espanholas dizem que não existe legislação sobre os trabalhadores imigrantes, nem sequer sobre os estrangeiros na ordem interna espanhola. Mas a Convenção do Conselho da Europa foi ratificada pelo Parlamento espanhol, vigora em Espanha, e se não existe legislação nacional espanhola a Convenção poderá estar na base de um acordo bilateral que o Governo Português está no direito de exigir, pois a Espanha tem de respeitar os seus compromissos internacionais.
Lanço, pois, desta tribuna um apelo ao Governo para que empreenda as acções necessárias junto do Governo Espanhol, para que em relação aos trabalhadores portugueses no seu país este cumpra os compromissos que firmou no âmbito do Conselho da Europa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este exemplo que aqui trouxe mostra quanto é necessário estarmos atentos. A nossa adesão às diferentes instituições europeias implica direitos e deveres. Assumamo-nos como portugueses na defesa dos interesses nacionais sem nos dividirmos por interesses partidários quando aqueles estão em jogo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E demos o exemplo ao nível do órgão essencial da democracia, que é este Parlamento onde nos exprimimos no debate nacional que implica a adesão de Portugal à CEE que é hoje uma certeza. Ë um projecto nacional assumido pela maioria do povo português.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Ficam inscritos para o próximo período de antes da ordem do dia, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Rodolfo Crespo, os Srs. Deputados Luís Beiroco, Carlos Carvalhas, Carlos Brito, Joaquim Miranda e Ilda Figueiredo.
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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, já ouvi por duas vezes a afirmação - a primeira foi por parte do Sr. Deputado Carlos Lage e a segunda por parte do Sr. Deputado Rodolfo Crespo - de que para a semana havia um debate sobre a CEE.
Ora, gostaria que a Mesa me informasse se tinha conhecimento de algum debate deste tipo fixado na conferência dos presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares. Creio, pois, que não há nada fixado nesse sentido e julgo que essa é uma perigosa interpretação do funcionamento de um novo Regimento que ainda nem sequer está aprovado. Quanto muito, haverá intenção de apresentar uma proposta nesse sentido, que admito que até mereça a concordância de todos, os grupos e agrupamentos parlamentares. Porém, isso já foi colocado por duas vezes nesta Assembleia como sendo um facto consumado e incontroverso. Daí me ter suscitado a dúvida sobre se já haveria qualquer acordo nesse sentido.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, até ao momento a Mesa não tem conhecimento de qualquer inscrição com esse tema.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, sobre a forma de interpelação à Mesa, peço a palavra para poder esclarecer o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, de facto a conferência de líderes parlamentares ainda não agendou formalmente a data em que se realizará esta discussão. Já por muitas vezes foi salientada a necessidade de conceder urgência a esta matéria e é nossa intenção propor a que o debate se realize para a próxima semana. Isto é algo no condicional, mas temos quase a certeza de que essa proposta irá ser aceite, dado o interesse que todos temos em que esta matéria seja discutida. Se houve alguma interpretação da nossa parte dizendo que o debate se irá realizar na próxima semana, fica registada a correcção, pois a nossa proposta é que seja para a próxima semana.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, no seguimento das duas interpelações que acabam de ser feitas, tendo presente o que foi deliberado na Comissão para a Integração Europeia e depois aquilo que foi discutido na Comissão Permanente quando esta resolveu dar a sua aprovação a um parecer da Comissão para a Integração Europeia, gostaria de ser informado sobre se já deram entrada na Mesa alguns dossiers da parte do Governo que contenham uma informação documental necessária ao bom andamento da discussão que o Sr. Deputado Carlos Lage anunciou que será proposta para a próxima semana. E isto, porque se tinha considerado indispensável que o Governo fornecesse elementos de informação aos grupos e agrupamentos parlamentares, no sentido de se poderem pronunciar sobre o debate.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, também peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, no sentido que já foi expresso pelos Srs. Deputados Lopes Cardoso e Carlos Brito de que não tínhamos conhecimento oficial de que estivesse previsto para a próxima semana qualquer debate relativo à adesão de Portugal à CEE, aproveito para dizer que nos consideramos satisfeitos quanto à informação dada pelo Governo, visto que este entregou à Comissão para a Integração Europeia uma actualização de todo o processo de negociação com uma descrição bastante pormenorizada sobre o estado das negociações.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero informar VV. Ex.as - aliás, iria fazê-lo antes do intervalo - de que às 17 horas e 30 minutos haverá uma conferência de líderes parlamentares no Gabinete de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República. Creio, pois, que essa será a sede própria para alguns dos esclarecimentos que agora foram pedidos obterem um cabal esclarecimento.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, sei que se encontram na Mesa 3 votos de pesar relativos ao falecimento do Sr. Prof. Rui Luís Gomes. Sei que o período de antes da ordem do dia já terminou, mas não seria a primeira vez que a Câmara estaria de acordo em votar votos deste tipo desde que as circunstâncias o justificassem.
Creio que as circunstâncias justificam inteiramente que a Câmara dê prioridade à discussão e votação desses votos, pois se o não fizer hoje só será possível na próxima semana. Reconheçamos, pois, que seria absurdo que apenas na próxima semana, dez dias após o falecimento do Sr. Prof. Rui Luís Gomes, a Câmara se debruçasse sobre o seu falecimento e lhe prestasse a sua homenagem.
Assim, sugiro a todas as bancadas que dêem o seu acordo para que se possam ainda discutir e votar os votos que se encontram na Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, informo V. Ex.ª de que neste momento se encontram na Mesa 4 votos de pesar: 3 deles são referentes ao falecimento do Sr. Prof. Rui Luís Gomes e um quarto é apresentado pelo CDS e é relativo ao assassínio do padre Popielusko.
Portanto, se não houver oposição por parte de nenhum grupo ou agrupamento parlamentar, proponho que sejam discutidos e votados os 4 votos de pesar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
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O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar não tem qualquer objecção a que assim se faça.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que os votos de pesar que estão pendentes têm significação um tanto diversa. No entanto, pela nossa parte não queremos formular qualquer objecção e aceitamos que os 4 votos sejam hoje discutidos e votados.
Contudo, gostaria de chamar a atenção da Câmara de que 3 desses votos se referem a problemas nacionais e pertinentes, mas o outro voto é um aproveitamento da situação.
O Sr. Presidente: - Se mais nenhum Sr. Deputado pretende pronunciar-se sobre este assunto, presumo que não há oposição por parte da Câmara em que sejam discutidos e votados estes 4 votos de pesar.
Pausa.
Visto não haver oposição, o Sr. Secretário vai passar à leitura desses votos de pesar.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - O PCP apresentou um voto de pesar do seguinte teor:
Voto de pesar
«A Assembleia da República manifesta o seu pesar pelo desaparecimento de Rui Luís Gomes e presta respeitosa homenagem à memória do ilustre cidadão e vulto insigne da cultura portuguesa.
Nascido a 5 de Dezembro de 1905, doutorado pela Universidade de Coimbra em Ciências Matemáticas em 1928, Rui Luís Gomes dedicou toda a sua vida no projecto de liberdade e de unidade das forças democráticas durante o fascismo e à defesa intransigente das conquistas populares depois do 25 de Abril.
Determinado, íntegro e coerente, figura destacada do MUNAF, do MUD e do MND, candidato à Presidência da República em 1951, Rui Luís Gomes foi preso várias vezes, perseguido e espancado pela polícia política e pelo regime que a sustentava.
Brilhante matemático, com vasta bibliografia científica, uma das mais proeminentes personalidades da ciência e da cultura deste século, Rui Luís Gomes foi demitido da Universidade pelo fascismo, em 1948. Obrigado ao exílio, leccionou então em diversas universidades da Argentina e do Brasil.
O 25 de Abril de 1974 abriu-lhe as portas de Portugal e o reconhecimento da sua vida de luta.
Foi reintegrado na Universidade do Porto e nomeado seu reitor vitalício.
Em 1981 foi condecorado com a Ordem da Liberdade.
A coerência e a integridade da vida e da luta de Rui Luís Gomes permanecerão como alto exemplo de dedicação empenhada na concretização das aspirações do povo português e do futuro democrático de Portugal.»
Voto de pesar apresentado pelo PS
«Faleceu o Prof. Rui Luís Gomes, desaparecendo do mundo dos vivos, que não da memória dos homens, um dos vultos mais ilustres do Portugal contemporâneo.
De facto, Rui Luís Gomes foi simultaneamente um grande sábio, um cidadão exemplar e um democrata coerente.
As suas contribuições científicas no domínio das matemáticas e da física quântica valeram-lhe reputação internacional nas décadas de 30 e 40, tendo leccionado, no exílio, aquelas matérias em várias universidades, onde se notabilizou como pedagogo e investigador.
Como cidadão e democrata, Rui Luís Gomes soube resistir à ditadura imobilista, que pretendeu silenciar, décadas a fio, a liberdade criadora na arte, na literatura, na ciência. Combateu a ditadura, sofrendo perseguições, prisões e o exílio. Mas amou sempre a sua Pátria e o seu povo, aos quais dedicou a sua vida.
A Assembleia da República não quer nem pode ficar alheia à morte de uma figura tão grande e tão nobre. Presta-lhe sentida homenagem, manifesta o seu mais profundo pesar e envia condolências aos seus familiares.»
Voto de pesar apresentado pelo MDP/CDE
«O Prof. Rui Luís Gomes, recentemente falecido, era uma das maiores figuras nacionais. Matemático de prestígio internacional, consagrado como reitor vitalício da Universidade do Porto, travou uma luta constante pela liberdade e pela democracia no nosso país, enfrentando durante longos anos as maiores vicissitudes, desde a prisão ao exílio.
Depois do 25 de Abril, continuou o seu consequente combate por uma sociedade mais justa, mais livre e mais fraterna. Tendo feito parte do Conselho de Estado, foi também distinguido com a Ordem da Liberdade.
A Assembleia da República não podia ficar indiferente ao desaparecimento do Prof. Rui Luís Gomes e por isso decide prestar-lhe a mais sentida homenagem recolhendo o seu alto exemplo de cientista e de cidadão.»
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em discussão estes 3 votos de pesar.
Para apresentar o voto de pesar que em primeiro lugar deu entrada na Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.
A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto de pesar e simultaneamente de homenagem à memória do grande lutador antifascista que foi Rui Luís Gomes traz para dentro da Assembleia da República o sentimento emocionado que percorreu o Pais desde o momento em que foi conhecida a notícia da sua morte.
Nesta Assembleia não poderá deixar de vibrar o eco do forte pesar colectivo que ontem percorreu as ruas do Porto, partilhado, no País inteiro, por todos os democratas, todos os antifascistas, todos aqueles que prezam a liberdade e algo de si deram por ela.
Recordamos uma vida de coerência exemplar. A difícil coerência de um homem de altíssimo valor na ciência e na cultura que sai do seu gabinete para as batalhas de rua ao lado do povo; a dura coerência de um professor expulso da cátedra que, atirado para as prisões da PIDE, não se deixa vencer nem
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pelas torturas físicas, nem pela tortura das mordaças à sua liberdade de pedagogo e cientista; a corajosa coerência de um patriota exemplar que não se deixou vergar pela caluniosa acusação de traição à pátria, exactamente por lutar pelo direito à autodeterminação e independência dos povos submetidos ao domínio colonial fascista português, e que, preso, julgado e condenado, nunca renegou esses nobres ideais; a coerência de quem pôs sempre o seu altíssimo prestígio não ao serviço de ambições pessoais mas sempre, numa total entrega de si próprio, ao serviço da unidade das forças democráticas, pelo derrubamento do fascismo e pela liberdade do povo português.
Recordamos aqui Rui Luís Gomes - uma vida inteira de luta e sacrifício pelas liberdades democráticas e pelo progresso social - quando o esquecimento, o silenciamento, são uma arma política que serve as forças do passado.
Pensamos que esta homenagem é tanto mais oportuna neste momento em que se acumulam as ofensas à memória dos que combateram contra a ditadura e em que são reabilitados responsáveis directos pelos crimes cometidos pelo fascismo.
Consideramos este voto como a expressão do respeito e gratidão dos trabalhadores e democratas portugueses pela memória do Prof. Rui Luís Gomes.
Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para intervir sobre o voto de pesar apresentado pelo Partido Socialista, o Sr. Deputado António Macedo.
O Sr. António Macedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista exprime o seu profundo pesar pelo falecimento de Rui Luís Gomes, nobre e destacada figura de lutador, que sofreu na carne e no espírito as mais cruéis violências do regime fascista e dos seus apaniguados e algozes.
Rui Luís Gomes, foi, por certo, uma das maiores vítimas do regime ditatorial de Salazar e de Caetano.
Contra ele foram disparadas todas as armas do despotismo num ataque cobarde e feroz, procurando aniquilar-lhe o ânimo e a firme determinação de prosseguir numa luta sem tréguas que visava libertar o povo português das algemas que o oprimiam e das misérias em que se afundava.
Forte e resoluto, Rui Luís Gomes aparou todos os golpes, suportou os vexames, as humilhações e os desafios com a consciência de que travava uma luta justa e necessária para a emancipação e dignificação da pátria e do seu povo irmão.
Foi um admirável e corajoso exemplo de bravo «resistente», sempre na barricada do combate pela liberdade, a justiça, a paz e o progresso social, e contra os tiranos, os corruptos, os serventuários dos poderosos, os usurpadores do poder.
Nesta Câmara política não podem ter lugar as falsas palavras, retóricas ou sectárias, e muito menos o empobrecimento da estatura de um homem que mais de que tudo com que se queira enobrecer e agigantar a sua figura, foi predominantemente um lutador pertinaz, apaixonado, sincero e convicto, numa entrega total às causas e reivindicações populares.
É perante essa figura de Rui Luís Gomes que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se curva respeitoso e lhe faz um último aceno de afectuosa, cordial e fraterna homenagem.
Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Para apresentar o voto de pesar do MDP/CDE, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raúl de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Professor catedrático da Universidade do Porto e matemático de prestígio internacional, teria sido fácil ao Prof. Rui Luis Gomes ter uma vida cómoda e simples.
Não foi, contudo, esta a sua opção. Portador de uma alta consciência moral, de um alto sentido de justiça e sempre identificado com os interesses do seu povo, o Prof. Rui Luís Gomes nunca hesitou em assumir as posições que se impunham à sua consciência fosse qual fosse o preço que por elas tivesse de pagar.
È assim que ele é demitido da Universidade em 1947 por ter enviado um telegrama a Salazar protestando contra a deportação para o Tarrafal de alguns operários grevistas.
Em virtude desta atitude e da sua posição constante de luta pela liberdade e pela democracia, não só conheceu numerosas prisões, agressões e vexames como 15 anos de exílio fora do seu país.
Depois do 25 de Abril, regressado a Portugal e aclamado como reitor vitalício da Universidade do Porto e passando a fazer parte do Conselho de Estado, o Prof. Rui Luís Gomes prosseguiu o seu combate pela liberdade e pela democracia, identificando--se sempre com os ideais de Abril, pelos quais constantemente lutou.
Aqueles que tiveram a honra de, durante tantos anos, participarem a seu lado, antes e depois do 25 de Abril, nas lutas por um Portugal livre e democrático, não podem deixar que aqui se esqueça a enorme projecção da sua figura.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Movimento Democrático Português apresentou um voto de pesar.
Mas, verificando, agora, que além do seu voto de pesar há também dois outros votos idênticos, concretamente do Partido Comunista Português e do Partido Socialista, propúnhamos à Câmara que estes 3 votos não fossem votados separadamente mas, sim, reunidos num só voto, de forma a evitar-se que se façam 3 votações em relação a 3 textos que, no fundamental, são idênticos.
É com esta proposta que termino esta minha intervenção.
Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP e da UEDS.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, na sequência da sugestão feita pelo Sr. Deputado Raul de Castro, no sentido de se fundirem os -3 votos de
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pesar, gostaria de dizer que consideramos ser razoável e mesmo necessário que se vote apenas um texto, pelo que estamos dispostos a fazer esforços nesse sentido.
Na verdade, não desconhecemos que nesta matéria as bandeiras partidárias devem baixar-se e, não obstante alguns afloramentos sectários de que tivemos conhecimento, não queremos, de forma nenhuma, inviabilizar a fusão dos 3 votos e, portanto, estamos de acordo em que se faça um pequeno esforço nesse sentido, o que, aliás, não será difícil dado que os votos não são incompatíveis
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Peço a palavra, Sr Presidente.
O Sr Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, e sob a forma de interpelação à Mesa, quero manifestar a nossa concordância relativamente à possibilidade de os 3 votos serem reunidos num único que traduza a opinião da Câmara
Em segundo lugar, gostaria de, em nome da minha bancada, fazer uma breve intervenção sobre os votos apresentados.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jaime Ramos, V. Ex.ª terá de aguardar que chegue a sua vez para produzir a sua intervenção.
O Sr. Carlos Brito (PCP)- - Peço a palavra, Sr. Presidente É para intervir sobre esta questão.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o meu pedido de palavra è apenas, e sem mais comentários, no sentido de dar o nosso acordo para que se constitua uma pequena comissão a fim de se redigir um único texto a partir dos 3 votos de pesar apresentados na Mesa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua a discussão conjunta dos 3 votos de pesar, aguardando a Mesa o texto resultante da fusão daqueles.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Octávio Cunha.
O Sr Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Com a morte de Rui Luís Gomes desapareceu um homem.
Ficaram desse homem intactas as ideias e a prática da solidariedade e da dignidade.
Saibamos compreender o que foi a sua vida e que os que ficam saibam não se deixar apodrecer no pântano da intolerância e do sectarismo, terrenos nunca pisados por Rui Luis Gomes, hoje património do nosso povo e do mundo, mas nunca - porque em vida nunca o foi - propriedade de quem quer que seja.
Que se deixe, hoje, Rui Luis Gomes descansar em paz, como em paz sempre soube viver com a sua consciência.
Aplausos da UEDS, do PS, do PSD, do PCP, do M DP/CDE e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.
O Sr. Jaime Ramos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata votará favoravelmente os votos de pesar pela morte do Prof. Rui Luis Gomes.
Com o nosso voto queremos prestar uma homenagem ao ilustre cientista que, por políticas não democráticas, foi obrigado ao ostracismo de viver, leccionar e exercer a sua profissão no estrangeiro, e ainda manifestar a nossa admiração pelo homem que, fugindo a comunidade, foi capaz de ser fiel aos seus ideais.
Porém, ao termos conhecimento da maneira como decorreu o cortejo fúnebre de Rui Luis Gomes, em que o Sr. Governador Civil do Porto, o Sr. Vice-Governador Civil do Porto, o Sr. Ministro da Educação e ainda o Sr. Secretario de Estado do Fomento Cooperativo foram impedidos, por elementos reconhecidamente ligados ao Partido Comunista - segundo as notícias veiculadas na imprensa -, de participar nesse mesmo cortejo fúnebre, a minha bancada não pode deixar de aqui lavrar um veemente protesto relativamente a essa atitude sectária
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, ao mesmo tempo que afirmamos aqui este voto de pesar, também deixamos um voto de protesto, porque e preciso que os pretendentes herdeiros da memória de Rui Luis Gomes não tenham o sectarismo de se assumirem como carpideiras únicas e como monopolistas da herança cientifica e humana deixada por Rui Luis Gomes
Contra os sectários que impediram que representantes e membros do Governo tomassem parte no cortejo fúnebre de Rui Luis Gomes, deixamos aqui lavrado o nosso protesto
Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegou o momento de procedermos à votação.
Porém, acontece que a Mesa ainda não recebeu o texto resultante da fusão dos 3 votos de pesar apresentados.
Nesse sentido, a Mesa propõe a VV Ex.as o seguinte votar-se-iam em conjunto os 3 votos de pesar, significando automaticamente a sua aprovação conjunta a aprovação do texto que vier a resultar da respectiva fusão. Outra alternativa seria interrompermos os nossos trabalhos, fazendo já o intervalo regimental, para depois avançarmos com a votação desse texto. Os Srs. Deputados decidirão o que entenderem por melhor.
O Sr. António Capucho (PSD)1 - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, a nossa bancada entende que não deve votar textos que desconhece e que, portanto, deve ser feito já o intervalo.
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O Sr. Presidente: - Penso que essa é, de facto, uma solução bastante mais razoável e, portanto, suspendo a sessão até às 18 horas.
Eram 17 horas e 20 minutos.
Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 20 minutos.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, ao abrigo dos disposições regimentais, requeiro a interrupção da sessão por 30 minutos.
O Sr. Presidente: - O requerimento é regimental, pelo que está interrompida a sessão.
Eram 18 horas e 21 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 19 horas.
O Sr. Presidente: - Vai ser lido o voto de pesar que resultou da síntese, tentada e conseguida, dos 3 votos de pesar apresentados a propósito do falecimento do Prof. Rui Luís Gomes.
Foi lido. É do seguinte teor:
Voto de pesar
«Faleceu o Prof. Rui Luís Gomes, desaparecendo do mundo dos vivos, que não da memória dos homens, um dos vultos mais ilustres do Portugal contemporâneo.
De facto, Rui Luís Gomes foi simultaneamente um grande sábio, um cidadão exemplar e um democrata coerente.
As suas contribuições científicas no domínio das matemáticas e da teoria da relatividade valeram-lhe reputação internacional nas décadas de 30 e 40. Demitido da universidade pelo fascismo, em 1948, leccionou, no exílio, em várias universidades, onde se notabilizou como pedagogo e investigador.
Como cidadão e democrata, Rui Luís Gomes soube resistir à ditadura imobilista, que pretendeu silenciar, décadas a fio, a liberdade criadora na arte, na literatura, na ciência. Determinado, íntegro, coerente, figura destacada do MUNAF, do MUD e do MND, candidato à Presidência da República em 1951, Rui Luís Gomes foi preso várias vezes, perseguido e espancado pela polícia política e pelo regime que a sustentava. Depois do 25 de Abril, continuou o seu consequente combate por uma sociedade mais justa, mais livre e mais fraterna. Tendo feito parte do Conselho de Estado, foi também distinguido com a Ordem da Liberdade.
Rui Luís Gomes amou sempre a sua Pátria e o seu povo, aos quais dedicou a sua vida.
A Assembleia da República não quer nem pode ficar alheia à morte de uma figura tão grande e tão nobre. Presta-lhe sentida homenagem, manifesta o seu mais profundo pesar e envia condolências aos seus familiares.
Os Deputados: António Macedo (PS) - Margarida Tengarrinha (PCP) - José Tengarrinha (MDP/CDE) - Octávio Cunha (UEDS).»
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à sua votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Para fazerem declarações de voto, inscreveram-se os Srs. Deputados José Luís Nunes, Luís Beiroco e Rúben Raposo.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sei quem dizia que Portugal era, aquele país em que só na morte os seus grandes homens conquistavam o devido reconhecimento. Não foi - felizmente! - esse o caso do Prof. Rui Luis Gomes.
O Prof. Rui Luís Gomes viu o seu mérito reconhecido, ao longo de toda a sua vida, de duas formas, quer pelas homenagens que lhe foram prestadas pelo povo português aquando do seu regresso a Portugal, quer pelas perseguições, que também foram uma forma de homenagem, aquando da sua candidatura à Presidência da República.
A vida exemplar do Prof. Luís Gomes bem justifica da parte desta Assembleia um cair de bandeiras partidárias ou outras, quaisquer que forem, sobre este assunto. Foi por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não tivemos dúvida nenhuma em contribuir para a fusão das diversas moções apresentadas e juntar os nossos votos numa última homenagem àquele que foi o Prof. Rui Luís Gomes.
Dito isto, importa que se compreenda definitivamente, como aqui já foi sublinhado pelo meu colega de bancada, Sr. Deputado Carlos Lage, que, de forma nenhuma, são admissíveis manifestações sectárias em volta da memória deste grande homem, e que todos aqueles que, como nós, tivemos ocasião de evocar a sua memória aqui, nesta Assembleia da República, têm o direito e o dever de o poder acompanhar até à sua última morada, sem que esse simples acto de respeito cívico e de amizade possa ser perturbado pelas manifestações sectárias de alguns energúmenos que não compreendem as regras de educação, de civilidade e de dignidade que, no fundo, rodearam a vida do Prof. Rui Luís Gomes.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente o voto de pesar apresentado pelos Partido Socialista, Partido Comunista e MDP/CDE.
O voto do CDS significou, por um lado, a homenagem que desejamos prestar ao Prof. Rui Luís Gomes, enquanto intelectual e homem de ciência de justa reputação, quer nacional, quer internacional;
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por outro, o respeito que sempre temos - e sempre teremos - pelos homens que, durante toda a sua vida, lutam pelas suas ideias, embora neste caso, como é óbvio, essas ideias não sejam as nossas ideias, embora esses ideais não sejam os nossos ideais.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Rúben Raposo.
O Sr. Rúben Raposo (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando uma das universidades portuguesas declara reitor vitalício um dos seus professores de maior nomeada científica, quando esse professor foi também exemplo de cidadão e de democrata, que pagou, com a prisão e com o exílio, a audácia e coerência de pensar e agir em prol da liberdade e da justiça social, distinguindo-se muito justamente com o galardão da Ordem da Liberdade, é justo que também nos inclinemos como cidadãos e como democratas, e o homenageemos no momento em que acaba de deixar o mundo dos vivos.
Juntamos, pois, o nosso voto de pesar e de homenagem ao de toda a Câmara pelo falecimento do Sr. Prof. Rui Luís Gomes.
Aplausos do PS, do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, não foi dito nem foi proposto, mas penso que estaria no sentido da Câmara, recolhermo-nos num minuto de silêncio perante a memória daquele que foi o Prof. Rui Luís Gomes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, a sugestão que acaba de dar é acolhida com interesse pela Mesa e vamos proceder a esse minuto de silêncio.
A Assembleia guardou, de pé, um minuto de silêncio.
O Sr. Presidente: - Srs, Deputados, segue-se agora a discussão e votação de um voto de pesar apresentado pelo CDS a propósito do assassínio do padre Jerzy Popielusko e um outro voto do MDP/CDE sobre o mesmo assunto. O voto do CDS já foi lido, já é conhecido da Câmara. Vai, portanto, proceder-se à leitura do voto apresentado pelo MDP/CDE.
Foi lido. É o seguinte:
Voto de pesar
«Embora admitindo não estarem suficientemente clarificadas as condições em que teria desaparecido o padre Jerzy Popielusko, o MDP/CDE vem apresentar a propósito deste acontecimento um voto de pesar e de condenação de todas as formas de terrorismo.»
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está aberta a discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à notícia, que podemos considerar unânime, se é confirmada pelo próprio Governo Polaco, do assassínio do padre Jerzy Popielusko, o CDS propõe a esta Câmara um voto de pesar.
Respeitando o padre Popielusko os valores e a doutrina da Igreja em que se integrava como sacerdote, foi, no entanto, como defensor ímpar dos valores do homem, do humanismo e da sociedade face à tirania do Estado que ele se evidenciou e tornou conhecido na Polónia e no mundo.
Integrou-se numa luta que já vai longa e que é a de todo o povo polaco, em defesa da sua dignidade, da sua liberdade e da liberdade de cada homem polaco face ao Estado opressor.
A morte do padre Popielusko vem tornar evidente, e infelizmente, que as notícias de normalização respeitantes à Polónia não correspondem infelizmente à verdade.
O padre Popielusko, que a CIA propagandeava, deu a sua vida pela verdade. Que os ideais do padre Popielusko, que o animaram e o fizerem viver, sobrevivam e obtenham vitória na Polónia e no mundo, é o voto que o CDS associa à sua proposta, proposta que espero ver acolhida por esta Câmara.
Aplausos do CDS, do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Para apresentar o voto do MDP/CDE, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Precisamente porque o voto apresentado pelo CDS não merece a nossa concordância, pelas razões que passarei a expor, é que o MDP/CDE apresentou outro voto de pesar.
Na realidade, o MDP/CDE, como várias vezes tem afirmado, condena frontalmente o terrorismo e portanto a morte violenta de qualquer cidadão, e neste caso a do padre polaco é um acto que merece a nossa condenação. Simplesmente, há no voto do CDS afirmações que não são verdadeiras, nomeadamente em relação à responsabilização dos dirigentes polacos, quando ainda hoje se afirmou em público a frontal condenação deste assassínio por parte do Governo da Polónia.
Assim, num dos jornais hoje publicados, pode ler--se que o Governo Polaco emitiu um comunicado em que reprova e condena energicamente o crime. O texto pede o castigo severo dos autores directos e indirectos deste grave delito, que atenta contra o processo de estabilização interna, contra as relações Estado-Igreja e a autoridade internacional da Polónia.
O voto do CDS é a conclusão de pressupostos de ordem ideológica que limitam a dimensão humana do acontecimento sobre o qual incide.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não poderemos aprovar o voto de pesar do CDS e por isso, repito, apresentámos um outro voto, condenando a morte deste padre polaco e condenando o terrorismo.
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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recomeça o que se passou num período da história desta Assembleia, isto é, em que pela inflação de votos muitas vezes a nossa manifestação de vontade, neste aspecto, deixou de ter aquele significado e aquela solenidade que se impunham. É minha convicção que, depois de uma cura de moderação, a Assembleia tem sabido usar de forma equilibrada e isenta este seu direito à apresentação de votos.
Vamos aprovar o voto de pesar apresentado pelo CDS e vamos fazê-lo porque o que se vota aqui, nesta Assembleia, é o voto e não os considerandos, muito embora nestes não vejamos nada que nos impeça de aprovar o voto apresentado pelo CDS.
O assassínio do padre Popielusko é um caso semelhante ao assassínio do general Humberto Delgado e as justificações que as autoridades polacas encontraram para este assassínio são semelhantes àquelas que em dada altura a PIDE encontrou para o assassínio do general Humberto Delgado.
Aplausos do PS, do PSD, do CDS e da ASDI.
Dito isto, direi ainda que vamos também aprovar o voto do MDP/CDE. E vamos também aprová-lo depois do esclarecimento que agora prestou o Sr. Deputado Raul de Castro. É porque sem esse esclarecimento poder-se-ia pensar que, a propósito do assassínio do padre Popielusko, se apresentava um voto de pesar e de condenação de todas as formas de terrorismo. O que o Sr. Deputado Raul de Castro agora acabou de explicar é o contrário: é que condena a morte do padre Popielusko e todas as formas de terrorismo. Nesse sentido, vamos votar também o voto do MDP/CDE.
Gostaria de fazer duas reflexões finais: não é a primeira vez que um sacerdote é assassinado no exercício do seu culto. Recentemente foi assassinado no Chile o padre Jarran, padre francês, que se encontrava dentro de sua casa a ler um breviário.
Sobre esse facto não podem restar dúvidas: foi o alto episcopado chileno e um dos bispos adjuntos - creio que o de Paris - que na missa em que se honrava a memória do padre Jarran desenvolveu esse tema.
Foi assassinado também, como se recordam, em El Salvador, monsenhor Romero, e infelizmente têm sido assassinados nos mais diversos lugares do Mundo diversos sacerdotes.
Falo em diversos sacerdotes para sublinhar que o sectarismo, o terrorismo, a maldade e a estupidez humana nada, absolutamente nada, respeitam.
Neste sentido, vamos portanto aprovar os dois votos que aqui foram apresentados, sendo certo que esperamos duas coisas: esperamos que os assassinos do padre Jerzy Popielusko sejam punidos. O ministro do Interior polaco declarou que eles poderiam, inclusive, ser condenados à morte. É nossa convicção de que se isso acontecesse pelo menos uma voz, que infelizmente não o pode fazer, pediria que tal não acontecesse - seria a do próprio padre Jerzy Popielusko.
Estes factos e estes crimes são próprios e ocorrem em conjunturas em que as instituições não funcionam e em que os princípios de liberdade não existem...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - São crimes próprios das ditaduras, gerados pelas ditaduras e que, como tal, podem estar para além da vontade dos ditadores; são tão repugnantes como aqueles de que foram vítimas Humberto Delgado e o deputado socialista Mateotti.
Neste sentido, vamos votar a favor dos 2 votos sem mais considerações.
Aplausos do PS, do PSD, do CDS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na ocasião do voto em discussão, o Grupo Parlamentar do PCP quer manifestar (de forma clara, incisiva e inequívoca) a sua condenação frontal, a sua repulsa, a sua indignação e o seu pesar em face do assassínio do padre Jerzy Popielusko.
Trata-se de um crime brutal que configura uma monstruosa provocação contra o Estado Polaco.
Morreu um homem. Para quê?
O resultado é o reacender da campanha contra a República Popular da Polónia, contra a Polónia socialista.
comentário a fazer a isto é assim evidente: reacender e animar com base e por causa do crime a campanha anti-Polónia é confessar que o crime compensa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Há, em primeiro lugar, que condenar firmemente o crime. Há, em segundo lugar, que condenar a provocação.
Acompanhamos sinceramente todos os que manifestam o seu pesar pelo assassínio do padre Popielusko. Mas separamo-nos claramente dos que instrumentalizam e manipulam o crime para alimentar a campanha contra o Estado Polaco.
Manipulação é o que foi feito pelo CDS, com o presente voto. Sem inocência. Porque o CDS - o mesmo CDS deste voto - esquece crimes inqualificáveis noticiados todos os dias e muito recentemente na imprensa. O CDS esqueceu a morte por enforcamento do preso político Aslan, assassinado pela ditadura militar turca e noticiado em Portugal no passado dia 26, sexta-feira. O CDS esqueceu os mortos e feridos vítimas do regime fascista da África do Sul e noticiados nos jornais ainda no passado dia 24 de Outubro. O CDS não se preocupou com o massacre de Joanesburgo, nem com as experiências dos Estados Unidos com armas químicas no Amazonas (em relação às quais existem acusações de mais de 7000 mortos).
Quer o CDS, com o seu voto, manifestar decisivamente o seu pesar? Não, o CDS não quer isso. Quer acima de tudo alimentar a provocação.
Com o nosso voto, rejeitamos a provocação e manifestamos o nosso profundo pesar pelo crime de que foi vítima o padre Popielusko.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Sr. Presidente, Srs Deputados: O mundo livre tem, com elevado espírito de revolta, acompanhado o rapto e as notícias da morte do padre Popielusko.
A bancada social-democrata comunga deste estado de revolta e indignação.
Antes de o CDS ter apresentado este voto nós próprios hesitámos sobre se deveríamos ou não propor um voto idêntico Não o fizémos porque no nosso intimo não quisemos silenciar a esperança de que, indiferente à notícia oficial do seu assassínio, o seu corpo possa ainda aparecer com vida
Se tal não suceder, o que nos parece muito provável, ao votarmos favoravelmente este voto de pesar, fazemo-lo com o desejo veemente de que o corpo deste mártir pela liberdade e pela justiça no seu pais apareça e que aos seus restos mortais o povo polaco, liderado nas suas mais legítimas aspirações pelo Sindicato Solidariedade, possa prestar a sua homenagem e o seu agradecimento.
O Sr. Manuel Moreira (PSD)- - Muito bem!
O Orador: - Este voto de pesar também é de esperança. Esperança de que o sacrifício e o sofrimento do padre Popielusko não tenham sido em vão
O padre Popielusko foi um homem capaz de lutar pela liberdade contra a tirania e contra a ortodoxia, e os radicais não lhe terão perdoado.
Este Parlamento, livre e democrático, tem a obrigação de erguer a sua voz e manifestar à Embaixada Polaca a profunda indignação do povo português, indignação que não só exige a punição dos autores materiais do crime mas também a punição moral dos seus responsáveis ou dos responsáveis pelo clima político de falta de liberdades publicas que permitem crimes semelhantes
Aplausos do PSD, do PS, do CDS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Srs Deputados, vamos passar a votação dos votos apresentados, sendo a mesma feita pela ordem de entrada.
Vai ser votado o voto apresentado pelo CDS
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI, votos contra do MDP/CDE e a abstenção do PCP
O Sr Presidente: - Vai agora ser votado o voto apresentado pelo MDP/CDE
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do M DP/CDE e da ASDI e abstenções do PCP, do CDS, da UEDS e de 3 deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Lopes Cardoso
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS). - Sr. Presidente, Srs. Deputados- Votámos favoravelmente o voto apresentado pelo CDS pelas mesmas razões que nos têm levado a manter nesta Assembleia e fora dela uma posição de absoluta coerência na condenação de toda a espécie de crimes contra a humanidade e de atentados contra os direitos humanos, provenham eles donde possam provir.
Abstivemo-nos em relação ao voto apresentado pelo MDP/CDE, primeiro porque a nossa posição estava claramente definida quando votámos favoravelmente o voto apresentado pelo CDS e, segundo, na medida em que o voto apresentado pelo MDP/CDE, de certo modo, faz depender o pesar do esclarecimento das circunstâncias.
Pela nossa parte, sejam quais forem as circunstâncias que vierem a confirmar-se quanto a morte do padre Popielusko, não é isso que fará alterar o nosso voto de pesar.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos imediatamente à apreciação do pedido de urgência requerido pelo PCP para a discussão e votação do Projecto de Lei n.º 21/III - Idade de reforma dos pescadores e anos de actividade.
Para justificar o pedido de urgência, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha, que dispõe de 15 minutos.
O Sr Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados O Grupo Parlamentar do PCP requereu a urgência para o debate do Projecto de Lei n.º 27/III sobre reforma dos pescadores por duas razões fundamentais em primeiro lugar, porque ha 3 anos que aqui se discute este problema e ele não foi ainda definitivamente resolvido, pela simples razão de os partidos da maioria terem transferido para o Governo tal responsabilidade
O Sr. Presidente: - Um momento, Sr Deputado Carlos Espadinha.
Srs. Deputados, o ruído que se faz ouvir na sala é excessivo e há uma grande agitação na Câmara Peço aos Srs. Deputados para retomarem os vossos lugares e ouvirem com a devida compostura a intervenção do Sr. Deputado Carlos Espadinha
Faça favor de continuar, Sr Deputado Carlos Espadinha
O Orador: - Em segundo lugar, porque e urgente acabar com as injustiças que se verificam actualmente face à situação existente e de que são vítimas centenas de pescadores.
Importa que não restem duvidas sobre o que se tem passado, desde a primeira vez em que este projecto foi discutido na Assembleia da República.
Em 10 de Dezembro de 1981 a Assembleia da República apreciou e votou, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP, o Projecto de Lei n º 218/II, que fixava em 55 anos a idade limite a partir da qual os pescadores poderiam pedir a reforma
Este projecto de lei foi rejeitado pelos partidos da então AD, que deste modo impediram que tosse atendida uma das mais justas e sentidas reclamações da classe piscatória.
Nessa altura os deputados que votaram contra não puseram em causa a justeza do projecto, tive-
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ram mesmo dificuldade em justificar o seu voto, referiram a necessidade de estudos (que por sinal já estavam feitos) e, para tranquilizarem as consciências, prometeram que o Governo iria publicar uma portaria que contemplava as soluções constantes do projecto de lei do PCP, que dava corpo às reivindicações dos pescadores. Entretanto, foi publicada no Diário da República a Portaria n.º 1091/81, de 22 de Dezembro, que, como se sabe, mereceu a discordância dos pescadores. Como na altura da discussão tínhamos alertado, as reivindicações dos pescadores foram frustradas!
Perante este facto, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou novo projecto de lei, o Projecto de Lei n.º 381/II, em que, sobre a questão das reformas, eram retomadas as principais e justas reivindicações do sector.
Este projecto foi apresentado em Plenário, não tendo porém sido discutido em face da dissolução da Assembleia da República.
Entretanto, em Janeiro de 1983 foi publicada a Portaria n.º 98/83, que, contemplando embora algumas das questões enunciadas no projecto do PCP, não satisfaz inteiramente as reivindicações dos pescadores, que continuam a ser prejudicados, particularmente aqueles que mais tempo têm de actividade, já que não lhes é contado o tempo de trabalho anterior a 1970, altura em que as suas contribuições para a Previdência foram consideradas como tal.
É precisamente este o aspecto mais importante do nosso projecto; ou seja, para além da fixação da idade da reforma aos 55 anos, pretende-se que os anos de actividade efectiva sejam considerados como anos de entrada de contribuições para a Previdência, desde que se confirme que descontaram sempre para a Caixa de Previdência e Abono de Família dos Profissionais da Pesca ou para a ex-Junta Central das Casas dos Pescadores.
A não ser contemplada tal pretensão, os pescadores que actualmente se encontram em idade de requerer a reforma, e todos aqueles que a requereram em anos anteriores, continuarão a receber pensões de miséria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os pescadores do nosso pais têm sido e continuam a ser tratados com a maior injustiça. A esmagadora maioria deles ia para o mar logo a partir dos 10 anos de idade.
No entanto, só com 14 anos é que se conseguiam legalizar em termos de garantias sociais, isto porque só era permitido tirar cédulas marítimas com essa idade, momento a partir do qual podiam fazer parte dos roles de matrícula.
Eu próprio passei por essa situação.
Só então eram tidos em conta os descontos para a Previdência, mas já tínhamos deixado atrás de nós 4 ou 5 anos de trabalho com descontos.
Aqui, Srs. Deputados, importa dizer que descontávamos então para a ex-Junta Central ou para a Caixa dos Profissionais de Pesca. E o mais curioso é que precisamente até 1970 nós, pescadores, ainda descontávamos mais do que qualquer trabalhador deste país, isto porque, além dos descontos que fazíamos por lei, ainda descontávamos uma parte por embarcação, quantia que entrava directamente nos cofres das Casas dos Pescadores.
Por isso não há nada que justifique que sejamos marginalizados em relação a outros trabalhadores.
Não estamos a exigir nada a que não tenhamos direito.
Poderia dar aqui exemplos de muitos pescadores com mais de 45 ou 50 anos de trabalho sempre nos quadros do mar, com as prestações em dia, e que quando se reformaram tiravam salários médios na ordem dos 22 a 25 000$ e até mais, estão hoje com reformas de 6500$ e 7200$. Isto è ou não uma injustiça, Srs. Deputados?
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É ou não urgente pôr fim a esta situação indigna?
Os pescadores portugueses não têm culpa que os seus descontos tivessem sido desviados para outros fins.
Os pescadores portugueses não podem ser culpabilizados por aqueles que através da exploração da sua força de trabalho enriqueciam.
Os pescadores portugueses não podem ser punidos em termos de reformas pelo facto de indivíduos ligados ao regime fascista, como o Sr. Tenreiro (hoje candidato ao reingresso nos quadros por recente disposição governamental), se terem abotoado com os dinheiros dos pescadores.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É justo que os Srs. Deputados de todas as bancadas tenham em conta o que è a dureza da vida do mar, seja ela na pesca costeira, local, como longínqua. É verdade que há umas mais desgastantes do que outras, mas de um modo geral toda ela é dura. Penso que todos vão ter isto em conta e que este pedido de urgência que aqui trazemos será aprovado por todas as bancadas.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ninguém pode com legitimidade pôr em causa o direito que assiste àqueles que, ao fim de dezenas de anos de trabalho, pretendem receber uma reforma digna e justa, para que não tenham que andar à esmola ou viver à mercê dos filhos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Evidentemente que não é só este problema que afecta os pescadores, existem muitos mais e também com gravidade, como, por exemplo, o caso da segurança no mar, os apoios de salvamento em terra, a inexistência de um regime jurídico de trabalho a bordo, as escolas de pesca, etc.
São problemas que merecem ser resolvidos. Sobre todos eles os governos têm feito promessas, mas mais nada do que promessas.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista tudo fará para que o problema que hoje trazemos à Assembleia e todos os outros que aqui referi sejam discutidos neste Plenário e se acabe com as injustiças que são praticadas sobre aqueles que ao longo de uma vida de trabalho tudo fizeram e fazem para o desenvolvimento do País.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida para uma intervenção.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de iniciar a intervenção que preparei sobre este assunto, não quero deixar passar em claro - porque começam a ter piada estas coisas - que o Partido Comunista sempre que tem conhecimento de que o Governo tem uma portaria pronta, exactamente sobre o problema dos pescadores ...
Risos do PCP.
... vem aqui agitar a bandeira de avançar em defesa das classes trabalhadoras e, no caso concreto dos pescadores, para dizer das duas uma: ou «morrem da doença ou da cura». «Fomos nós que avançámos e, porque o fizémos, o Governo apresentou a portaria», para dizerem de seguida «que avançam com a portaria e não nos dizem nada, que desconhecíamos». São de facto situações que registo e que gostaria que ficassem registadas no Diário da Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - E fica bem registado. Há 3 anos que vem sendo registado! ...
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A adopção do processo de urgência para apreciação do Projecto de Lei n.º 27/III parece não se justificar pela seguinte ordem de razões:
Conforme o próprio preâmbulo do projecto de lei refere, a Portaria n.º 98/83, de 29 de Janeiro, contempla já a situação especialmente desgastante da actividade de pesca consagrando reduções à idade normal para reforma e valorizando especialmente os períodos de trabalho em campanha.
Encontra-se já pronto para apreciação final um novo projecto de portaria que visa melhorar a protecção social concedida aos profissionais da pesca e que tem em conta a experiência da aplicação da Portaria n.º 98/83.
Daí que se afigure desnecessária a atribuição do processo de urgência ao projecto de lei apresentado pelo PCP.
No que se refere ao projecto em si e às medidas que nele se apresentam, não são as mesmas mais vantajosas do que as propostas contidas no projecto de portaria já preparado, excepto no que se refere à contagem dos anos de efectivo serviço como equiparados a anos com entrada de contribuições - artigo 4.º do projecto em discussão.
Quanto a esta proposta haverá, porém, algo a dizer.
Assim:
A passagem dos pescadores para o regime geral da Segurança Social, efectuada em 1970, foi uma medida extremamente importante para aqueles profissionais que se viram assim equiparados aos restantes trabalhadores por conta de outrem. O tempo de actividade até aí exercido e que havia sido objecto de descontos para a então Junta Central das Casas dos Pescadores, embora não contando para efeitos de cálculo do valor da pensão do regime geral, não é, no entanto, ignorado.
De facto, os profissionais da pesca que não chegaram a entrar no regime geral mantêm o direito à pensão pelo chamado regime dos fundos de previdência.
No que se refere àqueles que passaram a ser beneficiários do regime geral, também a pensão regulamentar dos fundos de previdência a que teriam direito é adicionada à pensão regulamentar do regime geral. Só que o valor do somatório è normalmente inferior ao valor da pensão mínima do regime geral que lhe é, de facto, atribuída.
Embora se pudesse reconhecer como socialmente justificado, em termos absolutos, a contagem de todo o tempo de actividade dos profissionais da pesca para efeitos do cálculo da pensão do regime geral, já o mesmo se não pode entender em termos relativos.
De facto, os trabalhadores agrícolas têm uma situação bastante mais grave já que, não tendo na sua esmagadora maioria, inscrição no regime geral mantêm apenas o direito às pensões do regime especial de previdência dos trabalhadores rurais e mesmo aqueles que foram eventualmente abrangido como beneficiários do regime geral por serem trabalhadores permanentes não têm, também, o seu tempo de actividade abrangido pelo regime especial contado para efeito do cálculo global da pensão atribuída pelo regime geral.
O que se deixa dito quanto aos trabalhadores rurais è válido, aliás, para muitas outras actividades abrangidas tardiamente pelo sistema de segurança social, cujo âmbito pessoal foi sendo alargado por fases, e que, por isso, irão ter pensões que consideram apenas períodos restritos de actividade quando esta se terá desenvolvido, de facto, ao longo de muitos mais anos sem que houvesse correspondentes descontos para o regime geral de Segurança Social.
A medida preconizada no projecto do PCP teria, para além do que se deixa aflorado, repercussões financeiras sem dúvida importantes que se afiguram incompatíveis com a presente conjuntura.
E se o que acabo de expor se refere tão-só à análise do diploma no campo formal, não poderei deixar de referir um ou outro aspecto de ordem política.
Mais uma vez é latente, da parte do PCP, a tentativa de esvaziar de sentido o esforço que neste campo o meu partido tem vindo a desenvolver no campo da acção social.
Fomos nós, PSD, que sempre lutámos, com passos seguros e conscientes, para que aos trabalhadores e aos Portugueses fosse dado, e continue a ser dado, o mínimo de condições de vida e de respeito pelos seus direitos, enquanto agentes activos no mundo laboral ou em situação de reforma, doença ou incapacidade.
Sempre nos encontrarão, Srs. Deputados do PCP, deste lado da luta e neste esforço.
Mas aguardamos que o PCP deite mão do seu direito regimental e ajude este projecto, para então expendermos estes e outros factos sobre o assunto.
Até lá são estas as considerações que, numa rápida abordagem, resultam da análise do Projecto de Lei n.º 27/III, pelo que não votaremos favoravelmente o pedido de urgência para o projecto de lei em causa.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Espadinha, tem V. Ex.ª a palavra para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Deputado Rocha Almeida, já é a terceira vez que este projecto de lei é discutido na Assembleia da República e há aqui uma questão que tem uma certa piada: cada vez que trazemos o problema aqui, os senhores vêm sempre anunciar que há qualquer coisa que ninguém conhece.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Se eu soubesse se alguém a conhece ou não, naturalmente não a traria aqui. Aliás admiro-me bastante porque ainda há pouco tempo as organizações sindicais estiveram em contacto com o Ministério, em relação ao problema, e não lhes foi dito nada. É essa a questão principal. Cada vez que nós levantamos a questão, os senhores fogem! E acontece o que sucedeu em casos idênticos: só arranjam confusão. Primeiro, veio a Portaria n.º 1081, que nada adiantou -pelo contrário, arranjou uma tal confusão que os pescadores preferiram continuar sem as reformas do que andar pelas capitanias e organizações à procura dos documentos que justificassem os anos ao serviço da pesca, etc. Essa foi a confusão que arranjaram devido à variação de percentagens de actividade para actividade.
A portaria que realmente considerou algumas das questões contempladas no nosso projecto de lei foi a Portaria n.º 98/83, que, no entanto, deixa nas mesmas condições de pensão de miséria os pescadores que tinham direito às suas pensões pelos anos de actividade e anos de desconto para a Caixa.
Quero dizer ao Sr. Deputado que estamos de acordo que seja estabelecido a todos os trabalhadores um critério para que não recebam as tais pensões de miséria, que não andem a pedir esmolas ao canto da rua e a viver à mercê daqueles que os querem ajudar. Quanto a isso estamos de pleno acordo.
E se o Sr. Deputado quiser podemos discutir todos esses problemas. O meu Grupo Parlamentar está nessa disposição.
O que eu não acredito, Sr. Deputado, é que já esteja pronta - e se está mostre-ma - uma portaria. Os senhores vão fugir de um lado para o outro, tal como estão a fazer actualmente na Secretaria de Estado das Pescas, para arranjar um projecto que combata o nosso sobre o regime jurídico. Será essa a mesma atitude?
Sr. Deputado, mesmo que o nosso projecto não tivesse mais nada, pelo menos obriga-os a fugir. E é devido à nossa luta - do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e dos trabalhadores piscatórios, filiados nos seus sindicatos e organizações - que os senhores ainda fazem qualquer coisa.
É sobre isso que eu pergunto: já está para sair a portaria que vem a englobar todas estas questões que reivindicamos no nosso projecto de lei?
Aplausos, do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral também para pedir esclarecimentos.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado, o meu pedido de esclarecimento é muito breve e reporta-se à parte final da sua intervenção, em que referia a possibilidade de uma marcação da agenda, para efeito de discussão deste projecto de lei!
Em relação a isto, eu queria perguntar ao Sr. Deputado o seguinte:
Primeiro, se tem conhecimento de que com o voto e por proposta do seu partido as marcações dos grupos parlamentares foram substancialmente diminuídas.
Segundo, se entende que a matéria é materialmente importante para os beneficiários directos do que está proposto, se a forma mais simples, directa, concreta e razoável. de resolver o problema não era alterar a posição de voto que anunciou e votar favoravelmente a urgência da discussão deste projecto de lei!
O Sr. Presidente:'- Sr. Deputado Rocha de Almeida, tem V. Ex.ª a palavra para responder.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado Carlos Espadinha, em primeiro lugar, não quero deixar passar em claro uma afirmação que aqui fez de que andamos a fugir pela Secretaria de Estado das Pescas aos trabalhadores e aos sindicatos. Quero dizer-lhe que, sobre este assunto, não tive necessidade de me dirigir à mesma Secretaria, já que se trata de um assunto da Segurança Social.
Em outras palavras, como deputado, tenho-me dirigido à Secretaria de Estado das Pescas e não tenho visto o Sr. Secretário de Estado e o seu Gabinete a fugirem de ninguém. Pelo contrário, vi serem recebidos os trabalhadores sindicalizados e, inclusivamente, o Sr. Deputado. Então, recebem toda a gente e não fogem!
Risos do PSD.
Quanto à referência de que viemos sempre aqui anunciar a portaria, eu limitei-me a constatar um facto e o Sr. Deputado tem sido testemunha disso.
Quando em 1981 apresentaram aqui o primeiro projecto de lei foi, de facto, referido pela minha bancada que estava uma portaria pronta a sair e tal acabou por acontecer (Portaria n.º 1081). Afinal, não falámos de cor e não viemos aqui dizer que saía aquilo que não iria sair.
Da segunda vez, foi pela minha própria voz que anunciei a saída da portaria - na altura era Secretário de Estado da Segurança Social o Sr. Deputado Bagão Félix.
E aqui tenho um reparo a fazer: saiu com um bocadinho de atraso mas não sei quais as dificuldades formais que teve. A verdade é que saíram e não informámos a mais ou a menos, mas aquilo que era efectivamente verdadeiro.
E hoje, mais uma vez, estou confrontado com a situação 'de lhe dizer que vai sair uma portaria. O Sr. Deputado diz que eu venho informar sobre a mesma coisa, mas das duas vezes que o informámos, Sr. Deputado, elas saíram. E não há duas sem três, logo desta vez também irá sair - a portaria está pronta e só falta levar à votação global e final.
Quanto ao Sr. Deputado João Amaral, a pergunta que me fez acaba por vir a favor da filosofia
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que aqui expendi. É que, efectivamente, tenho conhecimento de que foram diminuídas as possibilidades dos números de marcações. Mas o Partido Comunista, sacrificando as poucas marcações que tem e fazendo a marcação, tem aqui uma rica oportunidade para mostrar aos pescadores que isto é urgentíssimo e, portanto, sacrificar as suas próprias marcações. Melhor exemplo não podia dar aos pescadores do que este: sacrificar os direitos de marcação com este assunto, que considera, hoje e neste momento, tão importante para os pescadores.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - É um protesto curto e óbvio: quem tem uma rica oportunidade de demonstrar o seu empenho na resolução dos problemas dos pescadores é V. Ex.ª, Sr. Deputado Rocha de Almeida, e a sua bancada, votando a favor da urgência.
Não queira mistificar o que é evidente, não queira enganar os pescadores.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Em relação à segunda pergunta, a de se saber porque não mudamos o sentido de voto, respondo-lhe de uma forma muito simples: é que, enquanto os senhores agendam ou não, a portaria já estará a dar resposta naquilo que para nós é essencial e que é a problemática dos pescadores.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rocha de Almeida, atendendo a que há um outro protesto que lhe é igualmente dirigido, pensa V. Ex.ª responder já ou no final?
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Respondo a ambos no final, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Sendo assim, passo a dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Espadinha, que também se inscreveu para protestar.
O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Deputado Rocha de Almeida, quero começar por esclarecê-lo de que, na primeira parte do pedido de esclarecimento que lhe fiz há pouco, não disse - e até estava longe de pensar - que o Sr. Secretário de Estado ou os seus colaboradores andavam a fugir de um lado para o outro.
Eu disse foi que os senhores, cada vez que nós apresentamos aqui o assunto da reforma dos pescadores, andam logo a fugir pelos gabinetes à procura de arranjar uma portaria ou uma outra coisa qualquer para depois virem aqui dizer que ela está prestes a sair.
Foi isto que quis dizer e não outra coisa.
Sobre esta questão, creio que o Sr. Deputado pensará, tal como eu, que a Assembleia da República é realmente um órgão legislativo - é para isso que nós aqui estamos.
Portanto, ao trazermos aqui este projecto, estamos a fazê-lo dentro daquilo que é a nossa actividade e voltaremos cá com ele sempre e todas as vezes que não sejam aceites as reivindicações que propomos aqui, pois só com estas reivindicações aceites poderemos ver o problema resolvido.
O Sr. Deputado referiu que vai sair uma portaria que regulamentará esta matéria, mas penso que seria muito melhor votarmos este projecto, nomeadamente o pedido de urgência que apresentamos para a sua discussão e votação, pois assim adiantaríamos provavelmente meses de trabalho, já que essa portaria não virá cá para fora tão cedo como o Sr. Deputado Rocha de Almeida disse.
Podemos, realmente, dar aqui um grande passo nesse sentido.
Por outro lado, se a portaria, mesmo saindo, não vier beneficiar as nossas reivindicações - e, neste caso, não vier responder ao interesse dos pescadores de se poderem reformar com uma reforma digna -, voltaremos aqui à Assembleia da República até que seja realmente satisfeito aquilo a que os pescadores têm direito.
É isto, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar em relação aos Srs. Deputados que sob a forma de protesto o interpelaram, tem a palavra o Sr. Deputado Rocha de Almeida.
O Sr. Rocha de Almeida (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, não vou entrar, em primeiro lugar, em apreciações sobre a forma adjectivante com que quis ou tentou definir a nossa posição - até porque todos os epítetos que lhe lançou eu retribuo-lhos -, mas dir-lhe-ei, simplesmente, que o problema é ambivalente.
Os senhores è que o trazem aqui ...
O Sr. João Amaral (PCP): - Os pescadores é que o trazem aqui!
O Orador: - ..., os senhores é que o assumiram e têm ao vosso dispor uma forma regimental de discutir o problema, isto é, os senhores agendam-no e nós discutimo-lo.
Pela nossa parte, estamos disponíveis e eu disse exactamente isso na parte final da minha intervenção.
Quanto ao Sr. Deputado Carlos Espadinha, está reposta a verdade, e só isso. Folgo em ouvir dizer que, de facto, a Secretaria de Estado das Pescas está atenta, è atenciosa e respeitadora na audição dos trabalhadores.
E por aqui me fico. Isso basta-me, pois da reposição da verdade das coisas todos nós ganhamos, até o Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Seguidamente, está inscrito para intervir neste debate sobre o pedido de urgência o Sr. Deputado Raul de Castro.
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Julgo, no entanto, ser oportuno lembrar aos Srs. Deputados que é previsível que a intervenção que se segue possa ultrapassar as 20 horas, de modo que perguntaria aos vários grupos parlamentares qual a vossa posição relativamente à eventualidade de a sessão se prolongar um pouco mais, ate à conclusão do debate sobre o pedido de urgência.
O Sr. Luís Saias (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, na verdade faltam apenas 5 minutos para as 20 horas e é previsível que a intervenção do Sr. Deputado Raul de Castro demore mais do que esse tempo, para além dos pedidos de esclarecimento que possivelmente irão ter lugar.
Sendo assim, penso que ganharíamos em terminar a sessão agora, deixando a intervenção do Sr. Deputado Raul de Castro para a próxima reunião. Isto, para não estarmos a fazer as coisas de afogadilho.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Raul de Castro pretende usar da palavra sobre esta questão?
O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, pretendo apenas dar o esclarecimento de que a minha intervenção será rápida.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Entretanto, o Sr. Deputado Jorge Lemos pede a palavra?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quero apresentar a nossa posição sobre este assunto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, terminámos agora uma conferência de grupos parlamentares e não foi vista a necessidade de prolongar a sessão.
Realmente, não sei se não haverá outras intervenções depois daquela que o Sr. Deputado Raul de Castro vai fazer, mas é sempre possível que elas surjam e penso que é mau principio estarmos a prolongar os trabalhos.
Portanto, o nosso entendimento é consentâneo com a posição do Sr. Deputado Luís Saias, tanto mais que ainda haverá anúncios a fazer e alguns provavelmente demorados.
Por tudo isto, creio que seria melhor terminarmos aqui a nossa sessão.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu a palavra para se pronunciar também sobre esta questão?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, não vou tomar mais tempo, mas a nossa opinião è também a de que se deveriam terminar os trabalhos por agora, prosseguindo depois, oportunamente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, parece-me existir convergência por parte dos representantes dos grupos parlamentares que se pronunciaram, no sentido de se interromper a sessão, passando a intervenção do Sr. Deputado Raul de Castro para amanhã, assim como outras intervenções que surjam sobre esta matéria.
Nestas circunstâncias, passo a anunciar a ordem do dia para a sessão de amanhã. A sessão iniciar-se-á às 10 horas e, entre esta hora e as 12 horas, prosseguir-se-á na discussão das alterações ao Regimento da Assembleia da República. A sessão da tarde iniciar-se-á às 14 horas - e não às 15 - e prolongar-se-á até às 19 horas.
Como é evidente, este horário da tarde visa esgotar a discussão na especialidade e a votação final global da proposta de Lei n.º 87/III - Alterações ao Orçamento do Estado para 1984.
Foi esta a decisão da conferência dos líderes dos grupos parlamentares e os Srs. Deputados ficam assim a saber como organizar as vossas vidas amanhã. O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, parece-me que interromper este debate não é a melhor solução.
Assim, dada a situação de facto criada, creio que seria preferível, em termos de agenda para a sessão de amanhã, que na primeira parte - de manhã, portanto - se concluísse este debate e depois, então, passaríamos à discussão e votação das alterações do Regimento.
Suponho que, apesar de tudo, o tempo que este debate vai demorar não será muito.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, aquilo que referi corresponde à decisão da conferência de líderes dos grupos parlamentares, mas, naturalmente, não estavam então a ter em conta a interrupção do debate de hoje.
Por esta razão, creio que, realmente, é melhor concluirmos amanhã o debate deste pedido de urgência.
Nessas circunstâncias, se não houver oposição, o primeiro ponto da sessão de amanhã será ...
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - É para uma ligeira interpelação à Mesa, no sentido de saber se está informada sobre o que foi resolvido na conferência de líderes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, eu não assisti à conferência de líderes, mas tenho aqui uma pequena nota onde constam os resultados dessa reunião.
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Ora, foi justamente a leitura dessa nota que acabei de fazer e se houve alguma incorrecção, agradeço que o Sr. Deputado nos dê a sua contribuição para melhor esclarecimento deste assunto.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, se me permite, queria apenas significar o seguinte: na conferência de líderes ficou estabelecido qual era a ordem de trabalhos para a sessão de amanhã, mas se V. Ex.ª introduz agora nesse mesmo período a continuação da sessão de hoje, terá todo o direito de o fazer.
Pela minha parte, apenas estou a lembrar ao Sr. Presidente aquilo que ficou estabelecido em conferência de lideres e mais nada.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, naturalmente que a conferência de líderes não poderia ter conhecimento do que se passou aqui nesta sessão e o ponto em que estamos é que falta apenas uma intervenção para concluirmos um processo de urgência, o que está manifestamente ao nosso alcance fazer da parte da manhã.
No entanto, se houver objecções a esta metodologia, não tenho nenhuma dificuldade em fazer uma correcção à mesma.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que, como é natural, nós gostamos sempre de sair às 20 horas, que é a hora regimental, mas creio que não ganhamos nada em deixar matéria em suspenso quando, segundo a previsão feita, este debate demoraria mais de 10 minutos ou um quarto de hora.
É que a alternativa é enxertar isto amanhã no debate sobre o Regimento, um pouco à revelia do que ficou decidido na reunião de líderes, e se não for discutido amanhã, corre-se o risco de ele ficar ai adiado sine die, acontecendo-lhe o mesmo que aconteceu a outros projectos que estão suspensos já com horas e horas de debate.
Julgo que não era demais, dado que os Srs. Deputados Raul de Castro e Ruben Raposo têm intervenções curtíssimas para fazer, tal como já o afirmaram, que, estabelecendo como limite às 20 horas e 30 minutos, se acabasse hoje o debate, para amanhã começarmos logo com as alterações ao Regimento.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, quero esclarecê-lo, uma vez que na altura, segundo creio, o Sr. Deputado não se encontrava na sala, de que fiz exactamente essa proposta à Câmara e ela foi rejeitada.
Naturalmente que o Sr. Deputado volta a referir o mesmo, mas penso que já é extemporâneo.
O Sr. Deputado Luís Saias pede a palavra para que efeito?
O Sr. Luís Saias (PS): - Era para apresentar a posição do Partido Socialista em relação a esta matéria. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Saias (PS): - A nossa posição é a de que o debate de hoje deve ser interrompido agora, como, aliás, é entendimento já manifestado por quase todos os grupos parlamentares.
No entanto, não fazemos oposição a que na sessão de amanhã se conclua o debate e a votação de pedido de urgência apresentado pelo PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, estou mais uma vez de acordo com o Sr. Deputado Luis Saias.
Risos.
A questão não foi colocada em conferência dos líderes dos grupos parlamentares, pois, como é lógico, o entendimento era o de que o debate deste primeiro ponto da ordem do dia terminaria hoje e amanhã continuaríamos com a discussão e votação do segundo ponto, ou seja, as alterações ao Regimento.
Portanto, tal como se previra, vamos continuar amanhã a ordem do dia de hoje.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que não é necessário prosseguirmos nestes esclarecimentos.
Mantenho a decisão de amanhã se iniciar a sessão às 10 horas, com â conclusão do debate sobre o pedido de urgência hoje iniciado. Em seguida entra a ordem de trabalhos já anteriormente anunciada à Câmara.
Antes de encerrar a sessão, dou a palavra ao Sr. Secretário da Mesa para fazer o anúncio de alguns projectos e propostas de lei que entraram na Mesa.
O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Sobre o Projecto de Lei n.º 391/III - Equivalência do ensino ministrado nos seminários menores, que deu entrada na Mesa no passado dia 25 de Outubro, S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República exarou o seguinte despacho:
«Considerando o parecer que fora solicitado ao Exmo. Sr. Auditor Jurídico, admito o presente projecto nos termos do n.º l do artigo 136.º do Regimento.
Comunique-se, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do mesmo artigo.
Baixe à 1.ª Comissão.
29 de Outubro de 1984. - Fernando Amaral.»
Entraram igualmente na Mesa o Projecto de Lei n. º 393/III (da iniciativa do Sr. Deputado Rui Monteiro Picciochi e outros, do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata) - Isenta as autarquias locais do pagamento dos emolumentos previstos na alínea m) do artigo l.º do Decreto-Lei n.º 54/71, de 25 de Fevereiro, que foi admitido e baixou às 5.º e 10.ª Comissões, e a Proposta de Lei n.º 89/111 - Aprova a Lei Orgânica do Ministério Público, que foi admitida e baixou à 1.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 5 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Carlos Augusto Coelho Pires.
Gaspar Miranda Teixeira.
Nelson Pereira Ramos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
António Maria Orneias Ourique Mendes.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Partido Comunista Português (PCP):
António Anselmo Aníbal.
Carlos Alfredo de Brito.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
Manuel Correia Lopes.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Paulo Areosa Feio.
Centro Democrático Social (CDS):
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
Francisco António Lucas Pires.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Lopes Porto.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António Manuel Azevedo Gomes.
Eurico José Palheiros Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Cecília Pita Catarino.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Partido Comunista Português (PCP):
António Guilherme Branco Gonzalez.
António da Silva Mota.
José Manuel Antunes Mendes.
José Rodrigues Vitoriano.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Vieira de Carvalho.
Narana Sinai Coissoró.
As REDACTORAS: Ana Maria Marques da Cruz Maria Leonor Caxaria.
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