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DIÁRIO

da Assembleia da República

I SÉRIE - NÚMERO 24

Quinta-feira, 6 de Dezembro de 1984

III LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE DEZEMBRO DE 1984

Presidente: Ex.mo Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Ex.mos Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Concluiu-se a interpelação ao Governo, requerida pelo PCP, com vista à abertura de um debate de política geral centrado predominantemente sobre política educativa, tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e dos Srs. Secretário de Estado do Ensino Superior (Pinto Machado) e Secretária de Estado-Adjunta do Ministro da Educação (Maria Helena Carvalho Santos), os Srs. Deputados Octávio Cunha (UEDS), Zita Seabra e Jorge Lemos (PCP), César Oliveira (UEDS), Rogério Fernandes (PCP), Lemos Damião (PSD), António Costa, Helena Valente Rosa, Jorge Ferreira Miranda, Agostinho Domingues, Cunha e Sá e Laranjeira Vaz (PS), Adriano Moreira (CDS), Amélia de Azevedo (PSD), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Jorge Patrício (PCP), Marília Raimundo (PSD), Jorge Góis (CDS), Dinis Alves (PS), Manuel Fernandes (PCP), Antas de Barros, José Vitorino e Carlos Miguel Coelho (PSD), Odete Santos e Anselmo Aníbal (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Luísa Cachado (PCP), José Cesário (PSD), António Gonzalez (Indep.), Morais Barbosa (CDS) e Jorge Lacão (PS).
Encerrou o debate, em nome do partido interpelante, a Sr.ª Deputada Zita Seabra (PCP) - que após o intervenção do Sr. Ministro da Educação exerceu o direito de defesa - e, em nome do Governo, o Sr. Ministro da Educação (José Augusto Seabra).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 22 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente (Carlos Lage): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Américo Albino da Silva Salseiro.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
António Manuel Azevedo Gomes.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeira Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Gatanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.

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José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Zulmira Helena Alves da Silva.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Amândio S. Domingos Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Francisco Dias Costa.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
João Domingos Abreu Salgado.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP)

António Anselmo Aníbal.
António José Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Luísa Cachado.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Paulo Areosa Feio.
Rogério António Fernandes.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira.
Carlos Sousa Nunes Silva.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Gomes de Abreu Lima.
João António Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

João Corregedor da Fonseca.
Helena Cidade Moura.
Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

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O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento ontem formulados ao Sr. Ministro da Educação, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Pinto Machado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Educação, Sr.ª Secretária de Estado: Para mim, enquanto Secretário de Estado do Ensino Superior, este debate toca-me essencialmente como ocasião privilegiada de prestação de contas de 5 meses e meio de actividade governativa, contados a partir do debate de 14 de Junho, aquando da interpelação ao Governo feita pelo MDP/CDE.
Tenho dito muitas vezes, e penso-o sinceramente, que faz parte da essência da democracia a prestação de contas. Diria que a democracia é o regime sócio-político em que ninguém usufrui do privilégio de ser dispensado de prestar contas, mas também é o regime em que a todos é garantido o direito de se ser ouvido na prestação de contas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É o regime da convivência, da responsabilidade e a responsabilidade é o outro nome da liberdade.
O privilégio de alguém ser dispensado de prestar contas abre o caminho à tirania, mas também a denegação do direito fundamental de prestar contas abre o caminho para que o Poder seja tomado pelos medíocres intelectuais e pelos corruptos morais, abrindo assim também o caminho à tirania.

Aplausos do PSD.

Estou, portanto, aqui, como Secretário de Estado do Ensino Superior, perante os legítimos representantes dos Portugueses, a cumprir serenamente, sem receio nem perturbação, o dever de prestar contas, mas também a exercer briosa e firmemente o meu direito fundamental de prestar contas. E a propósito de prestação de contas, não posso deixar - porque faz parte desta atitude - de referir o que ontem uma Sr.ª Deputada aqui afirmou lendo um texto, segundo o qual eu me aproveitava do meu cargo de Secretário de Estado do Ensino Superior para legislar em proveito próprio. É uma acusação gravíssima e completamente falsa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A ver vamos!

O Orador: - Os abonos atribuídos aos professores do ciclo clínico, pelo Decreto-Lei n.º 312/84, de 26 de Setembro, são exactissímamente os mesmos que eram atribuídos pelos decretos-lei números 72/81 e 310/82, que tiveram de ser referidos neste decreto, na medida em que revoga toda a legislação anterior sobre a matéria. E trata-se do pagamento de serviços prestados ao Ministério da Saúde. Estamos num regime pelo qual - penso eu - a prestação de serviços adicionais tem de ter um pagamento adicional: serviços clínicos, serviços de direcção de departamentos hospitalares e em quantitativos que saem muito barato aos Portugueses.
Aliás, é exactissímamente a situação que existe na carreira hospitalar: os médicos da carreira hospitalar têm abonos suplementares, que podem incluir o abono de exclusividade, que é acumulável com uma gratificação que recebem quando são contratados como docentes convidados das Faculdades de Medicina.
E quando o Sr. Secretário de Estado Paulo Mendo, médico hospitalar, elaborou estes diplomas, ninguém disse que ele estava a legislar em proveito próprio.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Até que ele fez um despacho!...

O Orador: - Aliás, não há nenhum docente do ciclo clínico em exclusividade. São tão "sedutores" estes abonos suplementares que não há em Portugal, infelizmente, um único docente do ciclo clínico em exclusividade.
O que este decreto-lei introduziu de novo foi agravar a carreira do ciclo clínico das Faculdades de Medicina, impondo a obrigatoriedade de que, para grau da carreira docente universitária, o docente tenha de prestar provas na carreira hospitalar. Penso que é o único caso no funcionamento do Estado em que, para se ascender numa carreira, se obriga à prestação de provas que, se forem negativas, determinam a exclusão da carreira docente da carreira hospitalar.
E foi por isso - mas que diferença de comportamento!... - que, quando apresentei este projecto de solução ao Ministro da Saúde, ele me apertou a mão e disse: "Concordo consigo, porque isso é um projecto sério, porque se baseia realmente na competência através de provas dadas."

Aplausos do PS e do PSD.

Risos do PCP.

Aliás, se se não pode legislar em proveito próprio, ou se isto é em proveito próprio, não sei o que vou fazer relativamente à proposta que recebi do Sindicato dos Professores que me incita a legislar, aumentando os vencimentos dos docentes universitários!? ... Como sou docente universitário, estou impedido de o fazer? Então mais vale ir para a Secretaria de Estado do Ensino Superior um docente do ensino secundário.
Mas quero dizer mais: não sou clínico...

A Sr.ª Zita reabra (PCP): - Olha que esta!...

O Orador: - ... mas, sim, professor de Anatomia e não recebo um tostão através de qualquer abono hospitalar. Portanto, mesmo que este decreto-lei viesse aumentar aquilo que recebem os docentes de Medicina - o que é falso -, eu continuaria a receber o mesmo que recebe qualquer professor universitário, visto que não sou docente hospitalar.

O Sr. José Vitorino (PSD): - A ignorância e a má fé dos caluniadores é uma grande coisa.

O Orador: - E por uma segunda vez me fazem passar por clínico, porque convém para agora, caluniando-me como governante, conspurcar o Governo e, em 1972, para me mobilizarem para Angola, e, assim, calarem a minha voz.
Trata-se - repito - de uma calúnia infame, gravemente difamatória da minha dignidade de governante e de cidadão, de que não abdico. Foi o ataque

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mais vil que recebi na minha vida e recebi-o - lamento dizê-lo - nesta sede da representação nacional.

Aplausos do PS e do PSD.

Vai mal a democracia quando as prerrogativas legítimas dos parlamentares, para salvaguarda da sua independência, são aproveitadas para atingir um direito fundamental do Homem, que é o direito ao bom nome, que é algo tão importante como o direito à vida. Atentar contra o bom nome de um homem é como que pretender matá-lo.

Aplausos do PS e do PSD.

Na interpelação de Junho, apresentei as linhas gerais do que, integrado no Programa do Governo, era a política a nível da Secretaria de Estado do Ensino Superior, e não vou naturalmente repeti-lo. O que eu disse então foi que a partir dessa altura se entrava na fase de ataque aos problemas de fundo. E uma política de fundo tem, à partida, duas determinações, isto é, um enquadramento da situação concreta por dois vectores fundamentais: um que lhe determina prioridades, outro que lhe impõe limitações.
Como aqui já foi referido ontem - disse e repito -, a situação do ensino superior em Portugal define-se por uma palavra que se chama "irracionalidade". E não vamos procurar bodes expiatórios para esta situação, que vem já de antes do 25 de Abril e que se foi agravando progressivamente após ele, apesar de terem passado pelo Ministério da Educação, a nível de ensino superior, quer nas equipas governamentais, quer na Direcção-Geral do Ensino Superior, pessoas das melhores que temos no domínio da educação. Não é agora ocasião para procurar responder à pergunta de saber-se como foi isso possível, mas o que é certo é que pessoalmente não tenho vocação para bode expiatório.
Vou dar-lhes meia dúzia de exemplos desta irracionalidade.
Em 10 anos houve uma expansão do ensino superior, em que se passou de 4 universidades, 2 escolas superiores de belas-artes, 2 conservatórios de música, 1 Instituto de Alta Cultura, 1 Instituto Português de Oncologia e 1 Observatório Astronómico Nacional para uma situação de 9 escolas nas universidades antigas, 6 universidades e 2 institutos universitários, 3 escolas a integrar a curto prazo em universidades, 2 escolas de ensino artístico na Madeira, 4 institutos superiores de contabilidade e administração, 3 institutos superiores de engenharia, 2 centros do Instituto Português de Oncologia, 1 Instituto Português de Ensino à Distância, 1 Instituto de Higiene e Medicina Tropical e 1 Instituto de Investigação Científica Tropical. Tudo isto se passou sem planeamento, sem fundamentação, sem recursos humanos, sem recursos financeiros e sem avaliação do progresso.
Nós temos 12 universidades, enquanto esse país "pequeno e atrasado" que é a Suécia tem 7.
Para instalações e equipamentos de tudo aquilo que existe ou que foi já determinado que existisse - e não referi, por esquecimento, as escolas superiores agrárias de Bragança, de Castelo Branco, de Coimbra e de Santarém, as escolas superiores de educação de Bragança, de Castelo Branco, de Faro, da Guarda, de Leiria, da Madeira, do Porto, de Santarém, de Vila Real e de Viseu e as escolas superiores de tecnologia e gestão de Faro, de Setúbal e de Tomar -, uma primeira estimativa dos custos de montar tudo isto e de recuperar os edifícios degradados das instituições universitárias - alguns possivelmente terão de ser recuperados de raiz, isto é, terão de ser derrubados e construídos de novo -, aponta para 30 milhões de contos, e o PIDDAC este ano, para acções neste domínio, foi de 2 milhões de contos...

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Exacto!

O Orador: -... , do que resulta que faltariam 15 anos para cumprir o que foi determinado desta forma irresponsável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O orador: - Cursos que produzem desempregados - por um lado, por excesso de oferta e, por outro lado, por o perfil profissional ser inadequado às reais necessidades; escolas superiores de educação prontas para abrir, mas que não se sabe bem o que vão fazer; acesso ao ensino superior caracterizado por uma sucessão de regimes muitas vezes produzidos à última hora em relação à data de ingresso dos candidatos, passando-se todo o processo na Direcção-Geral do Ensino Secundário com total marginalização do ensino superior, e um regime actual desajustado e iníquo; indefinições institucionais - não há uma lei orgânica nem para o IPO, apesar de este existir desde 1933, nem para os estágios universitários; não se sabe qual é a posição no sistema educativo dos institutos superiores de contabilidade e administração e dos institutos superiores de engenharia; a autonomia universitária, consagrada na Constituição, ainda não está efectivada; determinações do estatuto da carreira docente universitária, de 1980, tais como os artigos 28.º e 75.º, ainda não estão regulamentados; a situação de centenas de alunos da Escola Superior de Belas-Artes do Porto, que desde 1980 estão à espera da "carta de curso", porque lhes é exigido um estágio que a Escola não é capaz de realizar; um orçamento ordinário exíguo, em que mais de 80 % é para pagar a pessoal - dá a impressão que o sistema educativo é uma serviço nacional de emprego e não está ao serviço da Educação -, espartilhado por rubricas contabilísticas, rígido, à base de duodécimos e com impedimentos ou dificuldades de realização de transferências de tal maneira que o dinheiro, por um lado, falta, e, por outro lado, sobra - parece o cúmulo da irracionalidade -, e a ausência total de orçamentos por objectivos, etc.

Não admira, pois, que o primeiro objectivo que me foi marcado e que tenho procurado cumprir com coragem e com determinação seja o de não aumentar a irracionalidade, o de não deixar ao meu sucessor uma irracionalidade maior que aquela que encontrei, o que significa, na maior parte dos casos, dizer "não" a muita coisa, embora muito me custe fazê-lo.

O segundo objectivo consiste em introduzir firme e irreversivelmente a racionalidade.
Assim, no que respeita à expansão do ensino superior e face aos números de necessidades financeiras que apontei, está a ser preparado um despacho - e para um caso particular está já elaborado - que indica os requisitos a que deve obedecer qualquer proposta de criação ou de um novo estabelecimento de ensino ou de um novo curso. Posso dizer-lhes, por

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exemplo, que para a eventual criação de uma escola superior agrária em Viana do Castelo a sua criação terá de ter interesse para o desenvolvimento agrícola da região do Minho, designadamente do Alto Minho. Por outro lado, deverá atentar-se na capacidade do mercado regional de trabalho relativamente aos cursos a ministrar, em termos prospectivos e do número de diplomados integráveis por ano; nos objectivos educacionais e profissionais; nos plano de estudos e métodos de avaliação da aprendizagem e do ensino; nas necessidades em pessoal docente e técnico e metodologia da sua formação e recrutamento; no custo de infra-estruturas, nomeadamente em instalações e equipamentos; no número aconselhável de alunos a admitir anualmente, tendo em vista o aproveitamento dos formandos e a sua inserção futura na actividade produtiva regional e nacional, e nos encargos financeiros totais com as instalações e seu faseamento pluri-anual.
Em relação às escolas superiores de educação, propõe-se remeter um processo, que a equipa conhece exclusivamente pela Direcção-Geral do Ensino Superior, para a coordenação directa do Sr. Ministro da Educação, através de uma comissão coordenadora, na qual estão representadas as escolas superiores de educação e as diversas secretarias de Estado e as direcções-gerais intervenientes. As escolas superiores de educação - em relação às quais não tenho agora tempo de dizer muito - são, sem dúvida, capazes e vão ter um tal impacto no sistema educativo que podem abalá-lo de tal maneira que é preciso um extremo cuidado em lançá-las a fim de evitar possíveis cataclismos graves.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente às definições institucionais, direi que o anteprojecto do estágio universitário se encontra pronto e que a lei orgânica do IPO está já em circulação para apreciação em Conselho de Ministros. Por outro lado, ser-me-á apresentado no fim da próxima semana o documento final que tem, por unanimidade, o consenso dos institutos superiores de contabilidade e administração, isto é, de professores universitários no domínio da economia, e da Associação de Contabilistas, para a breve publicação do decreto-lei que institucionaliza e define a posição do sistema educativo desses institutos, e, na sua linha, dos institutos superiores de engenharia.
Estão também em Conselho de Ministros o decreto-lei e projecto de decreto-lei correspondentes, respectivamente, aos artigos 28.º e 75.º do Estatuto da Carreira Docente Universitária.
Está já resolvido, por despacho meu, o problema dos alunos de Arquitectura do Porto; está em fase adiantada de elaboração a legislação sobre problemas de prescrições, transições de ano e de precedências; está já em plena execução um despacho que criou um grupo de trabalho que está a contactar as associações de estudantes para tentar acabar com esta situação, a todos os títulos deseducativa, de viverem de subsídios que, em cada ano, nunca se sabe se e quando vão ser dados.
Com isso pretende-se que passem a ter uma verba que lhes permita a aquisição de infra-estruturas de autofinanciamento.
Sobre o regime de exclusividade e de dedicação plena ao ensino, informo que está também a ser tratado por um diploma, que já se encontra em avançado estado de elaboração, o mesmo acontecendo com o Instituto Superior Particular e Cooperativo.
Quanto ao Conselho de Reitores e ao Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, com quem trabalho quase continuamente, conseguiu-se arranjar instalações para a sua sede, e, assim, dignificá-los, e publicou-se num decreto-lei que, na linha da autonomia universitária, confere aos reitores, por direito próprio, uma série de poderes. Quanto ao Estatuto da Autonomia Universitária, o projecto elaborado pelos reitores ser-me-á entregue ainda, segundo penso, na próxima semana.
Conseguiu-se - tudo o indica - um reforço substancial de verba para a investigação científica, quer através das dotações a conceder às reitorias, quer sobretudo através do INIC. A este propósito direi que está em fase de anteprojecto uma reformulação da Lei Orgânica do INIC, que, sobretudo, o coaduna ao estado actual da ciência, da inovação tecnológica e da acção fomentadora que a investigação científica deve ter em Portugal.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à colaboração interministerial, quero referir que, para além da excelente colaboração com o Ministério da Saúde - e assim termino esta minha intervenção, embora tencione pedir a algum partido da maioria que me ceda alguns minutos para falar ainda na questão relativa ao acesso ao ensino superior -, tudo indica que vai ser possível, pela primeira vez, o ensino superior ter um orçamento, embora infelizmente demasiado restritivo, em função dos objectivos. Nesse orçamento a desagregação dos montantes foi feita pela Secretaria de Estado do Ensino Superior, com flexibilidade de aplicação entre rubricas entre verbas. Digamos que se trata de um "orçamento-envelope", dando às instituições universitárias e a outras do ensino superior a capacidade da sua gestão, acabando assim com a situação irracional que é, por exemplo, a de o equipamento de investigação científica pagar direitos alfandegários como se se tratasse de artigos de luxo.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para protestar em relação ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, porque é a única figura regimental de que dispõem, inscreveram-se os Srs. Deputados Octávio Cunha, Zita Seabra, Jorge Lemos, César Oliveira, Helena Cidade Moura, Rogério Fernandes, Paulo Areosa e António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado proferiu uma intervenção ou respondeu a pedidos de esclarecimento?

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado respondeu a pedidos de esclarecimento, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sendo considerado assim, Sr. Presidente, como não tenho figura regimental para pôr questões ao Sr. Secretário de Estado, terei de prescindir do uso da palavra.

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O Sr. Presidente: - A figura regimental de que os Srs. Deputados dispõem é, naturalmente, a do protesto.

Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não compreendo como é que o Sr. Secretário de Estado pode ter respondido a pedidos de esclarecimento uma vez que não usou da palavra e os pedidos de esclarecimento que foram feitos foram dirigidos ao Sr. Ministro da Educação.

Vozes do PSD: - Foram à equipa!

O Orador: - Não me recordo de, até agora, em circunstâncias semelhantes e em sede de interpelação, o Sr. Ministro poder, desta maneira, transferir os pedidos de esclarecimento para o Sr. Secretário de Estado.
Naturalmente, o Sr. Secretário vai intervir e depois podem-se-lhe pôr os pedidos de esclarecimento. Senão, cria-se uma situação um tanto estranha.
Da nossa parte, estamos dispostos a admitir que o Sr. Secretário de Estado tenha falado como reforço da intervenção do Sr. Ministro, mas então pomos a questão de lhe podermos colocar alguns pedidos de esclarecimento. Parece-nos que isto é o que minimamente se pode exigir.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, julgo que não será uma embirração da minha parte referir que ontem o Sr. Ministro disse que muitas das questões iam ser respondidas em intervenções dos Srs. Secretários de Estado presentes, o que acho muito bem, mas que é diferente de considerar a intervenção do Sr. Secretário do Ensino Superior como uma resposta a pedidos de esclarecimento que lhe foram dirigidos, porque, de facto, eles não existiram.
Por exemplo, dirigi pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da Educação, o Sr. Ministro respondeu ou não, mas remeteu para intervenções posteriores o esclarecimento de muitas dúvidas que tínhamos formulado. Acho perfeitamente isso correcto e ninguém pôs em causa a faculdade e a legitimidade do Sr. Ministro assim proceder, mas isso não tem nada a ver com o considerar a intervenção do Sr. Secretário de Estado como resposta a pedidos de esclarecimento que, de facto, não existiram.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Vitorino pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Vitorino (PSD): - É para fazer um pedido de esclarecimento quanto à intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito relativa à qualidade da intervenção do Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Sendo assim faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, julgo que, neste momento, o que aqui se está a passar não tem o mínimo de fundamento nem a mínima razão de ser e que apenas confirma o sentido em que determinadas forças políticas, ou deputados, exercitam, aqui, o seu direito a interpelar o Governo.
O que de facto se passa é que as interpelações são feitas ao Governo e não a este Ministério ou àquele secretário de Estado. O Governo faz-se aqui representar através do Gabinete respectivo - neste caso o Gabinete do Sr. Ministro da Educação - e o Sr. Ministro da Educação disse, expressamente, que o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior responderia a questões relacionadas com o âmbito da sua Secretaria de Estado.
Se respondeu ou não às questões, esse é outro aspecto, mas, de qualquer forma, exerceu o seu direito regimental, pelo que o Governo está em conformidade com aquilo que lhe é exigido. Portanto, não há fundamento, neste caso, para as críticas do Partido Comunista, como também não há razão - como já está demonstrado - para muitas outras críticas que o PCP aqui formulou na matéria concreta que está em discussão.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Irrito (PCP): - Sr. Presidente, é para explicar melhor à Mesa o nosso ponto de vista e a nossa posição sobre esta matéria, uma vez que, como se verifica, ela foi mal entendida.
A nossa posição só tem um objectivo que é o de facilitar o debate e, uma vez que houve esta "fala" - digamos assim - do Sr. Secretário de Estado, o que queríamos era ter a faculdade de lhe pôr questões. É só isto!
O Sr. Deputado José Vitorino diz que a interpelação é feita ao Governo. Evidentemente que é. Somos o partido interpelante, está ali a equipa do Governo, mas temos de nos submeter a certas regras que nos são impostas pelo Regimento, e a equipa governamental tem de proceder da mesma forma.
Suponhamos que os Srs. Secretários de Estado seguiam-se agora em respostas a pedidos de esclarecimento. Isso até prejudicava outros oradores eventualmente inscritos e que, digamos, têm a justa expectativa de usar, agora, da palavra.
Portanto, parece-me que as intervenções do Governo, muito embora ele possa funcionar como uma equipa - e não será da nossa parte que haverá qualquer objecção -, têm de se sujeitar às regras regimentais. Assim, do nosso ponto de vista, facilitaria o debate, a discussão e o aprofundamento das questões se pudéssemos, agora, colocar pedidos de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado. E porque isso é regimental, parece-nos que é uma aspiração legítima e que deverá ser contemplada.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: A Mesa tem algumas dúvidas sobre a interpretação da figura regimental utilizada pelo Sr. Secretário de Estado.

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Nestas circunstâncias, parece-me que o mais razoável é perguntar ao Governo como é que entende a intervenção do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior. Como resposta a pedidos de esclarecimento ou como uma intervenção, com as características inerentes a cada uma das figuras? Segundo a resposta do Governo, a Mesa actuará.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendi a minha intervenção como uma primeira fase de respostas a interpelações, isto é, o que aqui se está afazer é uma interpelação a uma política, não é uma interpelação a casos pontuais.
Pergunto-me como deverá ser em França, onde penso que há umas 60 universidades e não sei quantos institutos de tecnologia. Como é que o respectivo ministro poderá saber, concretamente num momento como este, se em determinado sítio se partiu um vidro, entra frio, houve um professor que se constipou e por isso teve de pedir baixa?
Assim, a minha intervenção foi, primeiro que tudo, para integrar as questões que me foram postas e que anotei aquando da exposição da política global. Isso é que me parecia importante, ou seja, dar o enquadramento necessário. De resto, estou perfeitamente disponível, se o tempo me for concedido, para responder a outras questões que anotei, tais como as relativas à Faculdade de Direito no Porto, ao acesso ao ensino superior, aos institutos superiores de contabilidade e administração e de engenharia - embora pense que a isto já terei respondido -, e às escolas superiores de educação.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado pela informação, Sr. Secretário de Estado.
Srs. Deputados, ouvidas as palavras do Sr. Secretário de Estado, sobre o sentido da sua participação no debate, vou dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos para lhe formularem pedidos de esclarecimentos.
Nestas circunstâncias, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, permita-me antes de mais uma pequena introdução.
Não diga, V. Ex.ª, que não é político. V. Ex.ª é político e é-o porque é inteligente e é informado. E porque é inteligente e informado, sabe que a teoria do conhecimento e a teoria política são inseparáveis. Sabe também que toda a teoria política encerra, implicitamente, na teoria da percepção do mundo social e esta teoria organiza-se de modo análogo ao que se encontra nas teorias de percepção do mundo natural.
Por isso, diria, para simplificar, que nascer, respirar ou fazer amor é político, como é político tudo o que o homem faz desde que toma consciência de si próprio.
E dizia-lhe isto porque não queria continuar a ver degradada a ideia de ser político ou de fazer política. São duas ideias e dois termos degradados a nível nacional que é necessário recuperar, pois, para nós, fazer política é participar, ao fim e ao cabo, de uma maneira construtiva e com aquilo que de melhor temos, na construção de um país mais possível, mais solidário e mais agradável para viver.
Há, no entanto, duas questões muito breves que gostaria de lhe pôr. V. Ex.ª disse que já teria resposta para uma delas, esperamos que ela seja em breve fornecida à Câmara. A questão tem a ver com a que foi posta pelo meu camarada César Oliveira no início da interpelação, referindo que o Governo distribui subsídios a universidades e entidades privadas, no domínio do ensino.
No Porto e na zona norte, V. Ex.ª sabe que há uma quantidade considerável - os números existem e V. Ex.ª conhece-os - de cidadãos portugueses que têm de se deslocar para Coimbra e para Lisboa para poderem frequentar a Faculdade de Direito.
É uma reivindicação de há muito a criação de uma faculdade, ou a instalação de um curso de Direito numa das faculdades já existentes no Porto. Gostaria de saber, da sua parte, qual é a resposta que dá a estas exigências, sabendo que, estando o Estado a subsidiar a Universidade Livre e a Universidade Católica, para aí serem fornecidos cursos de Direito, não se entende que, em particular na Universidade Livre, os alunos estejam a pagar cerca de 7000$ de propinas por mês e o Estado não crie as estruturas suficientes para que este problema possa ser ultrapassado.
Provavelmente o Governo tem uma resposta a dar a esta questão e eu gostaria de a ouvir directamente de V. Ex.ª
O outro problema diz respeito, mais uma vez, ao protocolo sobre os docentes e a carreira hospitalar.
Do meu ponto de vista, V. Ex.ª não precisava de apresentar argumentos porque o seu passado e o seu presente provam que V. Ex.ª nunca legislaria no sentido de se favorecer a si próprio como professor da Faculdade de Medicina do Porto.
O decreto-lei que V. Ex.ª subscreveu levanta, no entanto, algumas implicações. Elas não têm, do meu ponto de vista, a ver com os honorários dos professores da Faculdade de Medicina; têm, sim, a ver com outro problema que preocupa os médicos que estão na carreira hospitalar. É que, parece-nos, fica aberta a porta à penetração na carreira hospitalar por portas e travessas, se me permite.
Assim, qualquer professor da universidade poderá ir buscar um médico menos classificado, por exemplo, a um hospital periférico, traze-lo para o seu serviço e a partir daí introduzi-lo na carreira hospitalar, passando por cima de outros profissionais que tenham obtido classificações mais elevadas nos concursos. Gostaria que explicitasse melhor este problema e nos dissesse se, de facto, isto é possível ou não.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, gostaria de lhe colocar algumas questões concretas, referentes a factos que pude verificar nas visitas que fiz a vários estabelecimentos de Ensino Superior e nos contactos que tive, desde reitores a associações de estudantes.
A primeira questão, que toda a gente nos colocou, tem a ver com a degradação das instalações.
Encontrámos desde, por exemplo, a Faculdade de Economia de Coimbra que está instalada num barracão pré-fabricado - quando vai ser construído um

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novo edifício para a Faculdade de Economia de Coimbra, porque aquilo não são condições para funcionar nada e muito menos uma faculdade de Economia? -, até à Faculdade de Engenharia do Porto que tem ao lado um anexo a construir desde o tempo em que Veiga Simão foi ministro da Educação, com 3 trabalhadores que vão pondo de vez em quando um pequeno tijolo num edifício que nunca mais tem fim.
Gostaria ainda, Sr. Secretário de Estado, de lhe colocar uma outra questão sobre a Universidade de Aveiro. Há uma indefinição total do que é que se pretende com a Universidade de Aveiro. Nos contactos que fiz, aquando da visita a essa universidade, as questões foram muitas e começaram pela situação das instalações.
Desde 1977 que não se construiu mais nada na Universidade de Aveiro, a não ser o resultante do investimento do Banco Mundial, mas também o seu objectivo está completamente indefinido, isto é, que professores vai formar. É, porque já lá há alunos que não sabem o que é que lhes vai acontecer. Tal como as escolas superiores de educação, também o CIFOP tem uma situação de indefinição completa.
Eu pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado, quando é que vai implementar as construções mínimas da Universidade de Aveiro e o que é que vai fazer do CIFOP, que está, neste momento, numa situação caricata? É que, como parou a construção dos restantes edifícios da Universidade de Aveiro, o CIFOP, que tem como objectivo desde o início, como foi acordado com o Banco Mundial, formar professores nas áreas dos cursos que existem na própria Universidade de Aveiro, está, neste momento, altamente subaproveitado.
Por último, Sr. Secretário de Estado, gostaria de abordar a questão do decreto-lei referente aos professores das Faculdades de Medicina. Na verdade, Sr. Secretário de Estado, foi com grande surpresa que tanto os docentes universitários, de todas as faculdades, como os médicos da carreira hospitalar souberam da saída deste decreto-lei.

A Ordem dos Médicos protestou e considera que não foi ouvida (tenho aqui o seu comunicado), os sindicatos dos médicos protestaram e não foram igualmente ouvidos e o que se passa é que este decreto-lei suscitou o mais vivo repúdio em 2 sectores fundamentais de vida nacional, a saber, nos médicos de carreira hospitalar, que se consideram seriamente lesados por este decreto - e é o próprio Ministro da Saúde que o reconhece e que diz "que há uma situação generalizada de agitação" - e nos restantes professores universitários, que dizem que são colocados numa situação de completa e total desigualdade em relação aos docentes das Faculdades de Medicina.

Isto é inteiramente verdade tanto mais que os docentes universitários em Portugal estão mal, estão numa situação indigna e dificilmente podem, com o nível de vencimentos e com as condições em que trabalham, exercer aquilo a que se poderia chamar um trabalho sério tanto no campo da docência como no campo da investigação científica.

E, Sr. Secretário de Estado, a acusação que aqui nos faz não deve ser feita só a nós, porque em todo o lado onde fomos, tanto professores universitários, dos mais variados sectores e das mais variadas faculdades, como médicos nos fizeram esta acusação muito simples: o Sr. Secretário de Estado beneficiou a sua faculdade, beneficiou a faculdade de onde é originário.
Isto é uma realidade evidente e, Sr. Secretário de Estado, dir-lhe-ía como à mulher de César: "Para ser sério não basta sê-lo é preciso parecê-lo também." Há aqui uma situação evidente de privilégio, através de um decreto-lei, dos docentes da Faculdade de Medicina, sem consultas a ninguém, nem aos médicos, que têm uma palavra a dizer sobre isto porque são prejudicados com este decreto-lei (particularmente os assistentes hospitalares, mas não só), nem aos restantes docentes universitários.
Por tudo isto, o Grupo Parlamentar do PCP apresentará, no fim deste debate, um projecto de lei para revogar este decreto que consideramos ser profundamente injusto e que cria uma situação inaceitável em relação à situação que já vinha detrás e que, quanto a nós, não tinha nem a urgência nem a premência que o Sr. Secretário de Estado lhe deu, ultrapassando todas as estruturas, particularmente as representativas destes sectores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Dr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, foi com algum interesse que a nossa bancada aguardou a intervenção de V. Ex.ª Pensámos que nos traria dados novos a acrescer à radiografia, ou melhor, ao exame de anatomia, que tinha feito em Junho, quanto à situação do ensino superior. Constatamos, com mágoa, que continuamos ao nível do diagnóstico, que as medidas concretas para a resolução dos problemas continuam por adoptar e que as que se conhecem têm muita gravidade.
Começaria por lhe colocar a questão do acesso ao ensino superior, V. Ex.ª teve oportunidade de dar conhecimento à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, em condições que me dispenso de comentar em sede do Plenário, o preâmbulo de uma nova portaria.
Nessa altura, foi unânime a posição dos membros da comissão de educação de considerar que as soluções propostas não poderiam ser aceites nos termos em que eram colocadas, designadamente, era inaceitável que não fosse tido em conta a meio do ano todo um processo de avaliação contínua a que estavam sujeitos os alunos que neste momento frequentam o 12.º ano.
O Sr. Secretário de Estado não disse nada sobre isso, esperemos que agora diga alguma coisa e, creio que, face à posição assumida por unanimidade na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, deveria tirar daí as necessárias ilações quanto ao sentimento desta Câmara relativamente ao acesso ao ensino superior.

Uma segunda questão, Sr. Secretário de Estado: falou-nos que há grupos de trabalho e comissões a tratarem dos institutos superiores de engenharia, de Contabilidade e dos Serviços Sociais; mas já há, ou não, qualquer coisa definida sobre isso? Vamos continuar na indefinição? Resolvem-se os problemas criando grupos de trabalho?
Uma terceira questão é a da autonomia universitária. O Sr. Secretário de Estado e o Governo de que faz parte tencionam ou não trazer a esta Câmara uma proposta de lei que possa, conjuntamente com outros projectos pendentes, definir o enquadramento da autonomia universitária?

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Considera ou não V. Ex.ª que a autonomia universitária não pode ser plenamente assegurada enquanto se continuarem a verificar, como tem acontecido, os estrangulamentos financeiros a que está sujeita a universidade portuguesa?
E, termino com esta pergunta: o Sr. Secretário de Estado lamentou os cortes orçamentais que foram impostos à sua Secretaria de Estado, mas de quem é a culpa da elaboração dos orçamentos? Quem é que faz as propostas? Quem é que inclusivamente admite, em papel timbrado do Ministério, que se apresentem projectos de orçamento com défices iniciais, como sucedeu com o orçamento do Ministério da Educação?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, começo por me congratular com o rigor e a frontalidade com que V. Ex.ª fez a intervenção que proferiu, o que, em relação ao dia de ontem, é manifestamente uma novidade.
Por outro lado, é óbvio que Portugal é um país pequeno, com recursos limitados, e todos sabemos as dificuldades económicas e financeiras com que nos defrontamos. Exactamente por isso, julgo imperioso e cada vez mais urgente definir prioridades, e essa definição tem de se basear num projecto político que responda aos problemas nacionais.
V. Ex.ª não estará em desacordo comigo em que uma dessas prioridades é o sistema educativo e a preparação do dia de amanhã, que passa, aliás, por aí. É por isso mesmo que, a título de exemplo, lhe coloco esta questão: V. Ex.ª falou em 30 milhões de contos necessários para resolver o problema das instalações do ensino universitário. Dou como certo esse número que V. Ex.ª apresenta, mas não seria, por exemplo, uma forma de financiar essa necessidade (de 30 milhões de contos) cancelar a encomenda de 30 aviões A-7, que já se sabe que vêm para cá com motores que vão ser substituídos e que vão custar, a breve prazo, aproximadamente uma quantia de 30 milhões de contos?
Não se poderia levantar aqui a questão de definir claramente prioridades? Ou será que há que satisfazer as pretensões da Força Aérea, em nome de desígnios que ainda não vislumbrei claramente?...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Fernandes.

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, eu não diria que traçou aqui a anatomia do ensino superior mas, sim, que fez a sua dissecação. Contudo, poderíamos ainda dizer - utilizando uma imagem respeitante à sua profissão - que se ficou pelo diagnóstico. Remédios não apontou!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A perspectiva em que o Sr. Secretário de Estado se coloca é a perspectiva deste Governo, é uma filosofia de desaceleração.
V. Ex.ª referiu vários aspectos da expansão do ensino superior nestes últimos 10 anos - notarei de passagem que algumas das escolas que diz existirem só existem no papel, embora representem custos, situação, aliás, altamente negativa -, mas preocupa-se fundamentalmente com os custos e não com o produto.
É um facto que a Universidade portuguesa absorve elevados investimentos; creio, no entanto, que a questão que se deverá colocar não é essa mas, sim, a de se saber o que é que ela produz. E o que ela produz, neste momento, é uma situação em que em variados cursos há profissionais que não têm colocação - como o Sr. Secretário de Estado referiu - e em que existem altas taxas de insucesso.
Na generalidade das escolas portuguesas, há alunos que não conseguem, devido ao regime de estudos e à situação a que estão submetidos, concluir os seus cursos senão com grandes atrasos. Esta situação, altamente negativa, é, a meu ver, a questão central do funcionamento do ensino superior, questão que deverá ser equacionada e não propriamente a questão dos cursos.
Em alguns pontos, muito concretos, o Sr. Secretário de Estado não foi nada conclusivo. Por exemplo, em relação às escolas superiores de educação limitou-se a dizer-nos que o assunto - se bem compreendi tinha transitado para uma comissão dependente directamente do Sr. Ministro.
Bom, mas em 5 meses e meio de governo - que são quantos, salvo erro, o Sr. Secretário de Estado tem nessa função - já havia tempo para saber que professores e para que graus de ensino vão formar as escolas superiores de educação, atendendo até ao facto de que a Escola Superior de Educação de Viseu está em funcionamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Qual é o destino profissional dos alunos que lá estão? Esta situação arrasta-se e, de facto, o Governo não nos traz aqui qualquer proposta concreta.
A mesma questão pode ser posta em relação aos cursos que originam desempregados. Podia citar vários casos, mas citarei apenas o dos alunos de Sociologia do ISCTE - aliás, esta questão está a preocupar imenso os recém-licenciados, como é natural. O que é que o Governo vai fazer em relação a este problema? Também quanto a isto não obtivemos qualquer resposta.
O Sr. Secretário de Estado referiu-se aos custos do equipamento importado, que, pelos vistos, vai ser desonerado do imposto que absurdamente lhe é tributado como "material de luxo" - digamos assim. E os preços dos livros estrangeiros para os estudantes do ensino superior, que, no mínimo, custam em média 2000$, terão escapado à acção do Governo?
Finalmente, queria concluir com uma pergunta de carácter pontual. Foi recentemente entregue à Faculdade de Ciências de, Lisboa um novo edifício na cidade universitária, que não oferece condições de segurança e em que o curso de Química ainda não pôde começar as suas actividades.
Gostaria de saber se o Sr. Secretário de Estado tem alguma coisa para nos dizer a este respeito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

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A Sr.ª Helena deidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, se me é permitido e pedindo desculpa ao Sr. Secretário de Estado, prescindo do uso da palavra por falta de tempo do meu partido.
O Sr. Presidente: - Com certeza. Tem, então, a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, as perguntas que lhe quero dirigir situam-se nas minhas preocupações como deputado eleito por Viseu. Distrito do interior, Viseu também no domínio do ensino tem graves carências, das
quais não são menores as das instalações escolares.
Algumas decisões que neste ano e neste campo foram tomadas resolverão outras tantas situações, mas muitas outras ficarão por resolver; situações difíceis e mesmo graves, como por exemplo as do ensino secundário de Viseu ou o caso das crianças do Caramulo, lugares e freguesias vizinhas, cujas dificuldades são tão evidentes que o Sr. Ministro não teve dúvidas em louvar uma criança que por acaso encontrou no caminho da Serra do Caramulo.
Cremos, aliás, que esta atitude do Sr. Ministro há-de ter, a curto prazo, outro tipo de resposta, mais justa, sob pena de se permitirem juízos menos correctos quanto ao louvor que concedeu.
Mas o problema que nos leva a formular algumas questões é naturalmente o que se prende com o ensino superior. Temos a funcionar uma escola superior de educação e apercebemo-nos de que, aqueles que têm tido a responsabilidade da sua instalação muito têm lutado por essa escola. O Sr. Ministro, aliás, não deixou de
a referir no seu discurso. Porém, em Julho passado, em resposta a um requerimento que eu havia formulado em Fevereiro, era-me informado que a 30 de Maio de 1984, portanto este ano, se tinha reunido pela primeira vez a Comissão Coordenadora das Escolas Superiores de Educação, a qual em breve definiria o perfil do professor a formar nessas instituições. A minha pergunta é, pois, a de saber qual o esta do actual desse problema, qual a solução a que se chegou, se é que já se chegou a alguma solução.
Ainda nesta matéria, o discurso do Sr. Ministro leva-me a fazer uma outra pergunta. Diz o Sr. Ministro que a validade do projecto das escolas superiores de educação não está afectada no seu todo e
que essas escolas irão por diante. Porém, mantêm-se até ver as escolas do magistério primário. Parece-nos um projecto com larga dose de indefinição mas não é isso o que agora me preocupa. O que queria saber era se há alguma ideia sobre o futuro da Escola do
Magistério Primário de Lamego com a qual os lamecenses naturalmente se preocupam. Por fim, naquele meu requerimento de Fevereiro, punha a questão da nomeação da comissão instaladora da Escola Superior de Tecnologia de Viseu prevista para entrar em vigor em 1984. Na resposta, aludia-se a escassez de verba e à necessidade de estudos para definir prioridades. Adiantava-se que tinham sido "solicitadas informações ao Director-Geral da Indústria e ao presidente da Comissão de Planeamento da Zona Centrou (sic!).
Pergunto: já foram fornecidos os elementos solicitados? Se foram, permitem que a Escola Superior de Tecnologia seja incluída como prioridade? Queria dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, e por intermédio de V. Ex.ª ao Governo que Viseu não vai prescindir dessa escola, nem permitir que o assunto se adie indefinidamente. O interior do País não pode ser o pobre a quem, à falta de esmola, se dá o conforto das palavras. Viseu não quer palavras de conforto!

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, previno o Governo de que dispõe de 15 minutos do tempo que lhe foi atribuído.

Tem, pois, a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Instado do Ensino superior: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente não vou ter tempo de responder a todos os pedidos de esclarecimento...

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Tem que contratar um técnico de gestão de tempo!

Risos.

O Orador: -..., mas em relação à Faculdade de Direito do Porto remeto para a resposta que dei, e que já foi publicada no "Diário da Assembleia", ao Sr. Deputado Adriano Moreira, e outros do CDS, sobre este assunto. Quanto à Universidade do Porto, o Conselho Científico está a estudar o problema e ainda não se pronunciou - não há portas travessas porque o ingresso na carreira docente universitária já não se faz por cooptação mas por concurso público. Ainda em relação ao pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Zita Seabra, elimino todas as referências que insiste em fazer ao decreto-lei há pouco referido e digo-lhe apenas que não é essa a posição que conheço da parte do Conselho de Reitores, com quem me reuni extraordinária e especialmente no Ministério só por causa desse assunto.

Não conheço esse protesto apocalíptico, ignoro-o por completo, excepto o do presidente do conselho directivo de uma faculdade do Porto.

Em relação ao Sr. Deputado Jorge Lemos, gostaria que algum grupo parlamentar me cedesse uns minutos para poder tratar do problema do acesso ao ensino superior. Referi o estado em que está o problema da autonomia universitária e aguardo que na próxima semana o projecto do Conselho de Reitores me seja entregue.

Agradeço as palavras do Sr. Deputado César Oliveira com quem estou inteiramente de acordo: uma política é a definição de prioridades e esse é o aliciante duma política, sobretudo em período de austeridade.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Rogério Fernandes, de tudo aquilo que V. Ex.ª referiu, irei tocar apenas em 2 pontos.

O problema do insucesso no ensino superior é um problema importante que já vem, lembro-me dum trabalho do Prof. Miller Guerra e Sedas Nunes sobre este assunto, de antes do 25 de Abril, e creio que em grande parte está ligado também ao sistema de ingresso no ensino superior. Recebi a Faculdade de Ciências de Lisboa que, a meu pedido relatou essa situa-

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ção, que parece não ser tão catastrófica e que está em vias de ser resolvida a muito breve trecho.

O Sr. Presidente: - Informo o Governo de que a ASDI lhe ofereceu 5 minutos do seu tempo.
Para uma interpelação à Mesa, tem agora a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, aproximamo-nos rapidamente das 12 horas e os tempos disponíveis ainda são bastantes. Embora não se trate do problema de serem muitos ou poucos para aquilo que há para debater, são muitos para o limite que se estabeleceu para este debate - 8 horas.
Há também partidos que já gastaram uma parte substancial do seu tempo, como resulta de um controlo que se pode aqui fazer, de modo que pensamos que a não ser que haja reduções nos tempos de cada um dos partidos, terão que ser tomadas algumas medidas a tempo. Daí que se possa eventualmente convocar uma reunião de líderes ainda para que antes do final da sessão da manhã, se saiba qual a melhor maneira de resolver este problema.
Pela nossa parte, julgamos que não se deverá deixar andar o processo normalmente, embora haja aqui um acordo para que os partidos gastem metade do tempo até ao final da manhã, o que julgo não ser fácil. Parece-nos que há várias soluções possíveis: ou começar a sessão da tarde mais cedo, ou eliminar o intervalo da tarde e para além disso garantir desde já, que falem os partidos que gastaram menos tempo até agora.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - O PSD!

O Orador: - De qualquer maneira, parece-me que o melhor é fazer essa reunião de líderes ainda antes do final da sessão da manhã para reequacionarmos todo este problema. Julgo que nos favorece a todos e ao próprio debate.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é conveniente evitar um debate sobre esta matéria e por isso convoco uma conferência de líderes para as 14 horas e 30 minutos, para, nessa sede, se analisar a questão dos tempos. Peço que não interrompamos o debate com questões de natureza pessoal pois só faz atrasar mais os nossos trabalhos. No entanto, se insistem em pedir a palavra...
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, eu já tinha solicitado o uso da palavra anteriormente. Creio que o problema contemplado pelo Sr. Deputado José Vitorino já foi abordado pela conferência dos presidentes, por isso, pela nossa parte, entendemos que não há razão para rever aquilo que tinha sido estabelecido.
Ficou assente que às 20 horas se iniciará a fase final da interpelação, independentemente da situação quanto à utilização dos tempos por cada partido. Entendemos que a solução permanece válida, atemo-nos a ela e não participaremos em nenhum outro tipo de solução.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para nos manifestarmos também sobre a questão colocada pelo Sr. Deputado José Vitorino.
Em nosso entender, o acordo que foi estabelecido em conferência de líderes deve ter em conta o evoluir do debate e creio que não ficaria bem à Assembleia da República se partidos ficassem sem a possibilidade de expressar os seus pontos de vista sobre a matéria em debate.
Não será, portanto, da parte do PCP que haverá qualquer tipo de obstáculo a que, confrontado com a impossibilidade de cumprir um acordo que achamos realista numa determinada fase do processo, o acordo possa ser revisto, mas com a ideia de que, como compreenderão, o partido interpelante não poderá abdicar do já magro tempo de que dispõe e não deixará de colocar as questões pelas quais requerem esta interpelação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa.

O Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, nós, Partido Socialista, estamos perfeitamente abertos à reunião que se propõe; só queríamos informar que demos 8 minutos ao Governo e que há portanto 8 minutos a descontar do nosso tempo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vou dar a palavra a mais ninguém para se pronunciar sobre esta matéria e convoco uma conferência de líderes parlamentares para as 14 horas e 30 minutos.
Agradeço ao Sr. Deputado José Vitorino que não insista no pedido de uso da palavra pois estamos a perder muito tempo com esta questão é não é o Plenário o melhor lugar para a resolver...

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, a questão é esta: o PSD não propôs cortes de tempo para nenhum partido e isso ficou claro no que eu disse. O que parece é que há que prevenir e acautelar a tempo, e uma das soluções possíveis será, para além de eliminar o intervalo da tarde, começar a sessão às 14 horas e 30 minutos. Por isso, permito-me sugerir que a reunião de líderes seja marcada para as 12 horas e 30 minutos para se ver se isso se justifica. Não estou em desacordo com a solução proposta pelo Sr. Presidente, parece-me, no entanto, que esta é mais prudente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Vitorino, a única dificuldade é que não encontro ninguém para fazer a reunião às 12 horas e 30 minutos, isto é, não vejo na sala nenhum Sr. Vice-Presidente que possa presidir a essa reunião.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa.

O Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, não estou de acordo com o facto da sessão acabar às 12 horas e 30 minutos pois pode acontecer que após a reunião de líderes não se chegue ao consenso de a sessão começar mais cedo. Acho, portanto, que se a sessão acabar meia hora antes estamos com prejuízo de tempo.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mantenho a decisão de convocar a conferência de líderes para as 14 horas e 30 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, permita-se-me que saúde os alunos da Escola Secundária do Monte de Caparica que estão a assistir a este debate sobre política educativa. Entendemos que esta política deve ser para os alunos com vista a proporcionar-lhes melhores condições futuras.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Devem estar contentes com o que aqui se está a passar!...

O Orador: - Para contentar o Partido Comunista Português quero saudar o Sr. Deputado Rogério Fernandes e a Sr.ª Deputada Luísa Cachado, que nos honraram com a sua presença e por isso mesmo, hoje tal como ontem, o Partido Comunista Português está de facto "reforçado"!
O Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Convém começar por referir, antes de mais que esta interpelação ao Governo requerida pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista sobre a política educativa se insere numa estratégia que pouco ou nada tem a ver com a educação e os seus reais problemas, mas sim com objectivos políticos bem determinados, surgindo na sequência de outras acções levadas a efeito por si ou por interpostas organizações que lhe são afectas.
A educação é tão-só um pretexto e a interpelação não é mais do que o remate de todo o processo que se vem desenvolvendo desde o início do ano escolar centrado em dificuldades pontuais na abertura do ano lectivo corrente.
E é tanto assim, que no requerimento apresentado, para além da afirmação genérica e vaga de que o "sistema educativo em Portugal está a atingir uma situação caótica", o grupo parlamentar do partido interpelante limita-se a citar 3 ou 4 questões epidérmicas e menores das muitas que afectam, de verdade, o sistema educativo português, perdendo-se em considerações ambíguas, indefinidas e risíveis cujo debate em nada contribuirá como se tem demonstrado para a tomada de medidas de fundo concretas e coerentes que o povo português e, muito especialmente, a juventude portuguesa gostariam e desejariam ver tomadas.
Usando linguagem metafórica, dir-se-ia que o partido interpelante se mostra histérica e emotivamente assustado com o estardalhaço provocado pelo rebentar da granada para esconder as responsabilidades que tem no premir do gatilho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas os Portugueses (façamos a justiça de o reconhecer) não são ingénuos para se deixarem facilmente iludir com manobras de diversão.
Já aquando da anterior interpelação sobre o mesmo assunto, levada a efeito por iniciativa do grupo parlamentar do MDP/CDE, foi afirmado que se estranhava que aqueles que têm largas culpas no processo degradativo do sistema educativo vistam agora o manto angélico da inocência e venham pedir contas de factos que são da sua responsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A mesma estranheza cumpre hoje manifestar aqui bem como denunciar a hipocrisia que subjaz à interpelação presente.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Hipócrita é você! Isso é uma honra!

O Orador: - Muito obrigado! Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É evidente que o sistema educativo português se aproxima de uma situação de ruptura.
Uma análise atenta e imparcial conduz qualquer espírito minimamente esclarecido a uma tal conclusão.
Não é difícil verificar que o insucesso escolar aumenta assustadoramente; que o abandono escolar precoce é cada vez maior; que o cumprimento da escolaridade obrigatória não é plenamente assegurado; que a qualidade do ensino se encontra degradada; que os programas escolares não têm um mínimo de coordenação entre si; que os planos de estudo estão desajustados da realidade sociocultural portuguesa; que não existe uma política do livro escolar; que é deficiente, muito cara e exageradamente politizado o sistema de formação de professores dos ensinos preparatório e secundário; que a estrutura administrativa é ferozmente centralizadora e estupidamente burocratizada; que há organismos centrais em número demasiadamente elevado e que, para além de desnecessários, apenas complicam e dificultam a tomada de medidas adequadas e em tempo oportuno; que o sistema de gestão escolar não é democrático, mas anárquico e, por isso, não funciona eficazmente; que a rede escolar não corresponde às reais necessidades do País, já que numas zonas há salas de aulas a mais enquanto noutras o seu número é insuficiente; que o absentismo dos docentes atinge índices inaceitáveis, escandalosos e até criminosos; que a distribuição do pessoal administrativo e auxiliar é irregular, sobejando aqui funcionários que fazem falta ali; que o início das aulas em alguns casos não coincide com a abertura do ano lectivo devido a carências de natureza vária, algumas inexistentes, outras fabricadas; que os serviços de inspecção não actuam eficazmente, umas vezes por comodismo, outras por indiferença, sempre por desmotivação; que a educação especial, além de ser uma farsa, é um subsector do ensino aproveitado por manipulações espúrias por parte de indivíduos pouco escrupulosos; que a educação de adultos é também uma farsa que sai demasiado cara ao erário público e, consequentemente, ao contribuinte; que o ensino técnico, por razões eminentemente ideológicas, é atacado à direita e à esquerda, aqui, porque insuficiente, ali, porque discriminatório; que o acesso ao ensino superior é uma fonte de injustiças, de manigâncias e de corrupção; que o ensino básico é o somatório de ciclos de costas viradas uns para os outros em vez de constituírem uma unidade coerente, equilibrada e assente no pragmatismo; que o estatuto da carreira docente, para além de se apresentar sob a forma de uma manta de retalhos, não e motivador nem estimulante para os professores, sendo a promo-

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ção destes na carreira feita na base do critério do envelhecimento, quando devia sê-lo na base de critérios de assiduidade, de empenhamento e de competência; que a educação pré-escolar não passa, por enquanto, de um bem intencionado projecto; que a ambiguidade e a indefinição campeiam no campo dos conceitos e dos princípios; que as leis da psicopedagogia se imolam na área da demagogia em holocausto a interesses espúrios; que os direitos dos alunos são sacrificados ao que se convencionou apelidar de "conquistas dos professores"; que as colocações destes não se processam atempadamente; que existem docentes profissionalizados a exercerem funções administrativas enquanto as aulas são ministradas aos alunos por meros curiosos e oportunistas sem formação cientifica, didáctica, pedagógica e humana bastante ao desempenho de uma função altamente especializada e exigente; que o ensino é tutelado por diversos ministérios e também pelo da Educação; que este, o Ministério da Educação, se preocupa com vários problemas nacionais e às vezes com o ensino; que a instabilidade governativa não permite sequer a execução de planos a curto prazo; que a empolada politização dos cargos dirigentes da Administração Pública se traduz em instabilidade nos serviços, que, etc.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Esta!!
Ora não há ninguém dotado de um mínimo de honestidade intelectual e moral e de algum respeito pela verdade que, de boa fé, se atreva a responsabilizar o actual Governo pelo estado em que se encontra a educação em Portugal. Mas ousa fazê-lo o PCP e seus acólitos, porque fazendo-o, prepara-se para retirar dividendos políticos dos resultados, que agora se manifestam, dos actos que, antes, calculada e deliberadamente praticou.

Risos do PCP.

O Orador: - Disse alguma coisa Sr. Deputado Manuel Lopes? O representante dos trabalhadores disse alguma coisa? Como parece que não, posso continuar.
Sr. Presidente. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É fácil, é muito fácil apontar erros e denunciar males, sobretudo quando estes se manifestam com toda a evidência aos olhos de quem quer que seja, especialista ou leigo.
É fácil e é desonesto, sobretudo quando, como fez o Partido Comunista, se denunciam os mais espectaculares que não os mais relevantes e se pretende com a denúncia do acessório esconder o essencial.
Mais do que constatar factos, importa localizar as suas causas para se proceder ao tratamento adequado. Mas esta atitude não interessa ao PCP; e não lhe interessa, porque sabe bem onde se localizam e não lhe convém eliminá-las.
Pelo contrário, convém-lhe mantê-las tais como estão para "fazer flores" denunciando os seus efeitos. Aliás, não é preciso a ajuda de lanternas nem de lupas para as detectar: a olho nu se descobrem, bastando um breve exercício de memória para recordar os seus autores.
É claro que, como de costume, não faltará o clamor de certas vozes a insinuar que se está a esquecer deliberadamente o longo período "obscurantista" de mais de 50 anos anterior à revolução dos capitães.

Enganam-se, porque não só não esquecemos os erros por actos e omissões então cometidos, como também não esquecemos, até porque é do conhecimento de quantos à educação têm dedicado o seu tempo e esforço, que já antes de 1974 pontificavam no Ministério da Educação, ocupando lugares de carreira, muitos dos elementos que ainda hoje lá se encontram e que são responsáveis por medidas que, por desajustadas na realidade sociocultural portuguesa, empurraram o sistema educativo para a situação degradada em que se encontra e de que não é fácil sair a médio prazo, quanto mais de um dia para o outro.
Ora toda a gente sabe que o imediatismo não se coaduna com o processo educativo e a ajuizar pela prática sistemática do PCP e seus acólitos, a juventude portuguesa está condenada ao ensino que temos por muitos anos mais.
Aliás, na sequência do desenvolvimento da estratégia montada pelo partido interpelante que culminou com esta intervenção sobre a política educativa, o País tem assistido, entre amargurado e atónito, ao espectáculo degradante e previamente preparado dos edifícios escolares com vedações rebentadas, vidros estilhaçados, salas assaltadas, polícias à porta, alunos sem aulas, tudo apresentado como sendo o resultado da pretensa ineficácia do Governo que não contrata contínuos ou escriturários para as escolas.
E pretende-se fazer o povo acreditar que é aí que residem os grandes males, as grandes carências do ensino.
Ora é preciso dizer ao País inteiro que as escolas têm órgãos de gestão a quem compete zelar pela sua administração e que se o sistema de gestão não é o mais eficaz, a culpa pertence a quem o estabeleceu em forma de decreto-lei e não aos governos que se esforçam por cumprir o que nele se estabelece, embora revelando falta de coragem.
É preciso avisar o País de que se os órgãos de gestão de mais de dois terços das escolas são formados por professores que só contrariados aceitam tal função que desempenham sem interesse nem motivação, isso se deve ao sistema vigente legalmente estabelecido de que o Governo actual não é responsável.
É preciso informar o País que se os órgãos de gestão das escolas mudam todos os anos por ausência de motivação dos elementos que os integram, com todas as consequências que uma tal descontinuidade acarreta, isso é da responsabilidade dos autores da disposição legal que suporta o sistema.
É preciso esclarecer o País que a ambiguidade e a indefinição que caracterizam a gestão das escolas são a consequência normal e lógica da ambiguidade e da indefinição subjacentes à filosofia do diploma legal vigente sobre a gestão das escolas.
Mas, pasme-se! - o partido interpelante não denuncia estas indefinições e ambiguidades. E não as denuncia, porque elas interessam à estratégia do PCP que vem agora, com alarido nunca ouvido, agitar o espantalho das escolas que não abrem, consciente de que a não abertura dessas mesmas escolas é o resultado de uma medida e de uma situação que não deseja modificar.
É o estardalhaço do rebentar da granada para esconder o dedo que premiu o gatilho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr.ª Odete Santos (PCP): - Que grande frase!

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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quanto neste aspecto específico se verifica acontece também noutras áreas. Quem, interessado na realidade do ensino primário, está em contacto com os docentes deste nível de ensino e alguma vez se preocupou em recolher e analisar os dados da sua experiência, sabe que um dos factores que mais contribuem para o aumento do insucesso escolar é a sua organização no sistema de fases.
Os professores sabem que é assim e é importante referir que os verdadeiros e únicos técnicos da educação de que há conhecimento são aqueles que exercem a sua tarefa junto dos educandos, isto é, os professores; estes sim, é que são os técnicos e não os que passam o dia sentados nos gabinetes, divorciados dos problemas da escola e do ensino.
Ora é preciso que o País saiba que o partido interpelante é responsável por esta medida implantada em 1974-1975 e é preciso também que o País tenha conhecimento de que um dos responsáveis por ela afirmou publicamente que o sistema reduziria drasticamente o insucesso escolar, como consta na publicação onde a afirmação foi feita.
Na verdade, nesse ano o insucesso escolar baixou, mas por força da obrigatoriedade de passagem de todas as crianças do 1.º para o
2.º e do 3.º para o 4.º anos de escolaridade.
E foi tanto assim, que no ano seguinte, o insucesso aumentou para números superiores aos que se verificaram no ano de 1973/1974 e desde então nunca mais parou de subir.
Entretanto, o partido interpelante refere que é "particularmente grave o insucesso" escolar, mas numa atitude hipócrita, não ousa ir ao cerne da questão.
O partido interpelante afirma que o abandono escolar precoce aumenta, mas não tem a coragem de confessar que uma das suas causas se situa numa medida de que é também responsável, qual é a da extinção - refira-se que através de uma circular - do ensino técnico e que foi tomada por mera demagogia e em obediência a preconceitos ideológicos e não tendo em conta os reais interesses do País e muito particularmente da juventude portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O arrolamento de situações idênticas poderiam continuar. Prosseguir, porém, tornar-se-ia fastidioso e nada adianta, porque quanto se disse basta para demonstrar a estratégia do partido interpelante cujos objectivos não se centram na melhoria real do ensino nem na defesa dos interesses e direitos da juventude, mas tão-só na criação de instabilidade e de insatisfação para alcançar outras finalidades. E para tanto ao PCP tudo serve, nomeadamente a instrumentalização dos alunos, dos pais, dos professores, numa palavra, da escola.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para interpelar o Sr. Deputado Lemos Damião os Srs. Deputados Helena Valente Rosa, Jorge Lemos, Jorge Ferreira Miranda, Agostinho Domingues e Cunha e Sá.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa.

O Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Deputado Lemos Damião, felicito-o pela sua intervenção no que respeita ao inventário que fez sobre o estado em que se encontra o sistema educativo e que é do conhecimento de todos nós. Além de mais, concordo consigo quando diz não ser só esta equipa a quem devemos pedir contas e soluções para as nossas angústias.
Há no entanto afirmações que V. Ex.ª fez que eu gostaria de ver clarificadas. Por que razão afirma o Sr. Deputado que a Inspecção actua com desmotivação? Por que razão afirma que a educação pré-escolar é apenas um projecto? É que, efectivamente, em 1982-1983 tínhamos 1800 lugares de jardins de infância criados e de há 2 anos para cá temos 1000 lugares de jardins de infância por criar. Portanto, não podemos considerar que é um projecto: podemos isso, sim, é concluir que é um projecto que está interrompido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge hemos (PCP): - Sr. Deputado Lemos Damião, ao ouvi-lo, retirando do contexto da sua intervenção os dislates anticomunistas de "puxa-palmas", dir-se-ia que é o PSD que está a interpelar o Governo, mas não se esqueça, Sr. Deputado, ser o seu partido responsável pela Educação há pelo menos 4 anos e que o que temos verificado é que os problemas não se resolveram e até se agravaram!
Quanto a questões a colocar-lhe, não tenho praticamente nenhumas, porque o Sr. Deputado repetiu-se ao trazer-nos aqui uma segunda versão do que já tinha dito em Junho aquando da interpelação suscitada pelo MDP/CDE. Gostava, no entanto, de lhe lembrar o seguinte: quando V. Ex.ª saúda as crianças de uma escola que aqui estão presentes, tenha cuidado com essa saudação! Está a saudar as crianças de uma escola prevista para 42 turmas onde funcionam 62; de uma escola que não tem refeitório porque faltam os funcionários do IASE; de uma escola da qual o conselho directivo alertou para o problema há mais de 1 ano, em que a Secretária de Estado do Ensino Básico, adjunta do Sr. Ministro da Educação, se comprometeu, a 6 de Setembro, resolver o problema da falta de funcionários mas em que - e estamos em 5 de Dezembro - 3 meses depois o problema continua na mesma. Portanto, quando saudar, meça as suas palavras, Sr. Deputado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira Miranda.

O Sr. Jorge Ferreira Miranda (PS): - Sr. Deputado Lemos Damião, falou V. Ex.ª nos professores não habilitados nas carreiras. É evidente que o sistema de serviço desses professores não os integrou; tal como é evidente que não podem indefinidamente continuar a exercer a profissão de professores sem habilitação própria. No entanto, há algumas perguntas que gostaria de fazer a V. Ex.ª: estará V. Ex.ª de acordo em que há que obrigar a Administração a estabelecer contratos com esses professores para que, num prazo a definir, possam adquirir as habilitações que lhes faltam?
Estará ou não V. Ex.ª de acordo em que deve haver um compromisso da parte do ministério em profissionalizar esses professores, em tempo determinado é evidente, que por seu lado garantiriam um período

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de trabalho no ensino, em função do tempo gasto na aquisição das habilitações?
Por último, estará V. Ex.ª ou não de acordo em que esta situação tem de ser analisada com cuidado pois as condições são diferentes, conforme V. Ex.ª sabe, no que diz respeito à localização geográfica dos referidos professores, ao seu grau de formação científica, etc., etc.?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Deputado Lemos Damião, eu gostaria de começar por lhe dizer que é com bastante mágoa que lhe vou fazer esta pergunta. Faço-a com mágoa pela amizade que lhe tenho, mas não posso deixar de o fazer exactamente pela consideração que tenho por si e dadas, inclusivamente, as suas funções de presidente da comissão da Educação.
Sr. Deputado, eu gostaria que me esclarecesse, a esta Câmara e ao povo português, sobre se a interpretação que dei ao seu discurso está correcta. Gostaria de me convencer que de facto a minha interpretação é errada e é nessa preocupação que me dirijo ao Sr. Deputado. Estou convencido de que o Sr. Deputado, pela sobrecarga de trabalho que todos lhe reconhecemos em múltiplos afazeres, com a sua capacidade de trabalho e de desmultiplicação, talvez tenha sido conduzido a trazer a esta Câmara uma análise da situação política nacional que não corresponde à realidade.

É que, Sr. Deputado, e face à interpretação que dei, deixou-me a convicção de que vê a situação escolar em Portugal como uma situação caótica que enferma de males totais. Pareceu-me que o Sr. Deputado apenas põe o problema de saber a quem atribuir as causas da situação. Ora, se há muitos males na situação escolar em Portugal, o que não creio é que haja uma situação caótica e entendo que uma descrição pessimista, quando não corresponde a uma descrição real da situação, não ajuda a resolver os problemas. Diga-me, portanto, Sr. Deputado, se a sua visão, que me pareceu ser a de que tudo está de tal maneira mal que já não tem conserto, é realmente aquilo que quis dizer ou se, pelo contrário, perdendo-se na preocupação de a quem atribuir as causas, carregou demasiado nas tintas, podendo essa sua análise ser prejudicial mesmo ao próprio regime democrático.
Sr. Deputado, na sua qualidade inclusive de presidente da Comissão de Educação, agradecia que me esclarecesse. Aliás, tenho a certeza, por aquilo que de si conheço, pela sua responsabilidade pelo empenhamento que lhe reconheço, de que o Sr. Deputado vai esclarecer-me melhor e esclarecer a Câmara para que não fique essa visão de algo de catastrófico que realmente não creio ser a realidade.
Isto independentemente da análise que possamos fazer de muita coisa que está mal e que até é atribuível à equipa ministerial.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha e Sá para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Cunha e Sá (PS): - Sr. Deputado Lemos Damião, já que falou de sistema educativo, gostaria de lhe fazer uma pergunta.

As questões ou os pedidos de esclarecimento que têm sido até agora formulados obedecem a uma perspectiva diferente da minha e isso por 2 motivos de natureza diferente: quanto ao primeiro, ele justifica-se porque não sou nem nunca fui docente e encontro-me pouco ligado a assuntos da pedagogia e da didáctica; relativamente ao segundo motivo que referi, ele deve-se à minha posição de pai, e é nessa que me mantenho, logo de mero cliente do Ministério da Educação. Assim, e após este preâmbulo, eis a questão sobre a qual gostava de ouvir a opinião do Sr. Deputado: o número de disciplinas ou matérias com que se confrontam os alunos dos 6.º e 7.º anos de escolaridade obrigatória é tão rigoroso que, acrescido da circunstância - reconhecida por todos - da falta de instalações provoca que os horários se estendam pelo dia todo, conduzindo a que esses mesmos alunos, após o regresso a casa - por vezes com deslocações mesmo muito longas -, já cansados, tomem a sua refeição da noite e façam à pressa os deveres de casa (vulgo "trabalho de casa", que são por vezes muito extensos. Quer isto dizer, no meu entender, que a situação em causa os faz perder hábitos de estudo que já vinham do ensino primário. Trata-se de um problema com que concretamente me confronto, daí que, consideradas as questões apresentadas e talvez com uma certa ingenuidade pedagógica - repito, ingenuidade pedagógica -, pergunto se não poderia ser diminuído ou mais racionalizado o período de permanência na escola de alunos de um grau etário entre os 10 e os 13 anos de idade. Ou será que poderiam ser reduzidas as próprias disciplinas?
Esta é, a meu ver, uma questão muito concreta, que foge às questões da alta pedagogia e da alta didáctica. Aliás, até lhe digo que por vezes confundo pedagogia com didáctica, ou pelo menos quase.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs., Deputados, Srs. Membros do Governo: Começando por responder ao meu amigo, Sr. Deputado Agostinho Domingues, direi que a minha intervenção, como tiveram ocasião de verificar, e só neste contexto, não teve outra finalidade que não fosse caricaturar, ao fim e ao cabo, toda uma situação, toda uma acção orquestrada e montada pelo Partido Comunista. Por isso mesmo, permiti-me, com a minha intervenção, fazer ironia. É porque em termos educativos não concebo, não admito, nem aceito de maneira alguma que os assuntos sejam tratados sem seriedade.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Era bom que tratasse com seriedade!

O Orador: - E na qualidade de presidente da Comissão de Educação, tenho dado provas, ao longo dos meses, de que fazemos um esforço bastante substancial, bastante acentuado para que toda a parte ideológica seja, ao fim e ao cabo, um tanto ou quanto diluída, para defesa dos interesses dos alunos. Por isso mesmo comecei, Sr. Deputado Jorge Lemos, por saudar as crianças, que são, ao fim e ao cabo, no sistema educativo português, os últimos que são alvo da

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preocupação de toda a gente. Toda a gente se preocupa com tudo menos com as crianças, e quando saudei as crianças que aqui estão, saudei as crianças de todo o País, os alunos de todas as escolas portuguesas. Estas crianças para mim representam isso, daí o facto de eu nunca ter instrumentalizado, nem deixarei que se instrumentalizem, as crianças.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Vocês, comunistas, fizeram isso!

A Sr.ª Odete Mantos (PCP): - Mas são exactos os números que o Jorge Lemos deu.

O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, respondi, segundo creio, ao partido interpelante. Esse foi o meu objectivo e por isso estranho muito que seja o Partido Socialista que me venha agora interpelar. É que o partido interpelante é o PCP, sendo o PS e o PSD solidários com a equipa governativa.

Aplausos do PSD.

Quem está a ser interpelado é o Governo.

Risos do PCP.

Não há aqui quebra de solidariedade, Srs. Deputados, pois o que nós queríamos aqui ouvir, por parte do Partido Comunista, era a discussão de problemas sérios, sectorialmente ou até por temas. É que nós não temos medo, estamos preparados e os senhores sabem isso. De resto, a prova de que o Partido Comunista queria tirar dividendos políticos desta interpelação é que à minha intervenção apenas veio a terreiro o Sr. Deputado Jorge Lemos como porta voz daquela bancada. Isto é sintomático, esta é a minha vitória:

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado, V. Ex.ª acusa o Partido Comunista de querer tirar dividendos políticos da interpelação, isso é legítimo da sua parte, mas também é legítimo que o Partido Comunista queira tirar dividendos políticos da interpelação. Mas... e o PSD?... Será que nunca quer tirar dividendos políticos de nada?

Risos do PCP.

O Orador: - O PSD quer resolver os problemas da educação do País, porque em primeiro lugar está o País e só depois o PSD.

Aplausos do PSD.

Mas, Srs. Deputados, só lhes quero dizer que a educação é uma questão demasiado séria para ser tratada de ânimo leve e numa perspectiva eminentemente política. Nós entendemos que estes assuntos têm de ser tratados numa perspectiva mais eminentemente técnica; por isso o que queríamos era que o PCP viesse aqui e fizesse perguntas como estas: tem o Governo cumprido o preceito constitucional que consagra a liberdade de ensinar e aprender?

Vozes do PCP: - Não!

O Orador: - Tem o Governo cumprido o programa que apresentou nesta Câmara e que foi votado sobre a política educativa?

Vozes do PCP: - Não. Nem isso!

O Orador: - Ó Srs. Deputados, se acham que não, consultem-nos. O que nós concluímos é que, por via das questões que colocou, o que o Partido Comunista quis foi colocar aqui um somatório de questões que enunciou ontem. Foram 21 Srs. Deputados que se inscreveram ontem para, através de pedidos de esclarecimento, fazerem um julgamento popular de uma pessoa que acidentalmente é Ministro da Educação. Mas enganaram-se, Srs. Deputados, porque nós não consentimos isso; é toda a equipa governativa, é todo o Governo que está em causa. Não, por aí não vamos, Srs. Deputados. Se VV. Ex.as quiserem tratar com seriedade estas questões...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Já não se pode interpelar o Governo!

O Orador: -... - e aqui é que há hipocrisia aqueles 232 requerimentos que apresentaram na Mesa tinham-nos apresentado previamente. Então, sim, teriam aqui a resposta certa. Mas, mais: será que algum dia a equipa ministerial fechou as portas do Ministério para que os Srs. Deputados, usando dos seus direitos regimentais - que os têm efectivamente não tivessem a possibilidade de colher as informações que aqui pediram?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Estão proibidos?

O Orador: - Quanto aos Srs. Deputados do Partido Socialista, penso que com isto lhes respondi.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa para um protesto.

A Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria que o Sr. Deputado Lemos Damião entendesse que quando, em nome do Partido Socialista e em meu próprio, lhe fiz estas perguntas, tive o cuidado de o elogiar com toda a sinceridade sobre a sua atitude e honestidade. Assim, protesto contra as suas palavras porque efectivamente o Partido Socialista está tão empenhado na coligação quanto o PSD, daí que não se possam tirar ilações de determinadas palavras. E não vamos mais longe do que aquilo que aqui se está a fazer!...
Trata-se de um debate sobre educação, que está a ser discutida como tal, e por isso as questões que coloquei ao Sr. Deputado Lemos Damião são de carácter técnico.
Perguntei-lhe concretamente, porque não entendi e gostaria de saber a sua opinião, por que é que o Sr. Deputado disse que a inspecção está desmotivada e que a educação pré-escolar é apenas um projecto. Foi só isto, que lhe perguntei. Portanto tratou-se de questões técnicas.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

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O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora não tenha muito tempo para responder, pois temos mais 4 intervenções para fazer, quero dizer à Sr.ª Deputada Maria Helena Valente Rosa - que muito estimo e admiro - que a bancada do Partido Social-Democrata, pela minha voz, se congratula com as palavras de V. Ex.ª quando diz que está emprenhada, como nós, em manter esta coligação e em manter o Governo.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Está tudo empenhado!... Lá isso está.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Cai um, cai tudo...

Risos do PCP.

O Orador: - Quanto ao que diz respeito à parte educativa, quando quiser podemos tratar do assunto, só que de momento não tenho tempo para lhe responder. Pelo facto peço-lhe desculpa.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Houve tempo em que, no pórtico do Ministério da Educação, e perpetuando palavras de Almeida Garrett, se lembrava que não pode haver educação que não seja eminentemente nacional. Não se trata de um conceito formulado por qualquer inimigo da liberdade, nem por quem não defendesse e justificasse os direito e liberdade de aprender e ensinar, e não tivesse por seguro que a democracia da sociedade civil tem um apoio fundamental no direito e igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar. Mudaram de lugar os serviços, ficou esquecido no velho edifício a inscrição, e há motivo para perguntar se o conceito também por lá ficou, agarrado às mortas letras de bronze, e tão morto quanto elas.

Quando o Ministro da Defesa, confrontado com as incorporações que agora chegam às fileiras já de maior idade, experientes da vida política, habitualmente com um passado de opções e acção partidária, reconhece a necessidade de fazer aprender o Hino Nacional e reimplantar o culto da bandeira, existem motivos reais para perguntar ao Governo se o aparelho escolar, em todos os níveis, tem a preocupação e a ocupação suficientes de manter vivo o sentido nacional na herança cultural que deve transmitir e acrescentar. Trata-se de uma questão que deveria merecer um respeito maior do que é revelado nos divertimentos ideológicos com que de vez em quando se aproxima, por exemplo, o 1.º de Dezembro, para o considerar um conceito de passadismo do regime em vez de uma ocasião de meditar em comum sobre a restauração das nossas forças, energias e dignidade no mundo de hoje, e que deveria merecer uma decisão superior às hesitações frequentemente detectadas sobre se deve comemorar-se, e como, o 14 de Agosto, como se a lembrança devesse incomodar mais os vizinhos do que o eventual esquecimento magoará os portugueses inquietos com a manutenção da viabilidade independente de Portugal.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - É uma excelente atitude cívica aceitar estar no Governo por devoção ao patriotismo, como repetidamente nos tem sido dito, mas parece mais urgente, ao menos como pressuposto do sacrifício, manter vivo o valor invocado, para que não falte quem entenda o trajecto da governação, e lhe possa conceder um crédito positivo na avaliação final que certamente pretende. Julgo fazer justiça ao Ministro da Educação adiantando que ele participa nestas inquietações, e que as tem manifestado, e por isso a pergunta oportuna e pertinente é a de saber se pensa que o precioso aparelho que lhe está confiado corresponde aos objectivos proclamados, se não há razões inquietantes para pensar que a identidade nacional é vítima de erosão, que nos diga que dificuldades e resistências encontra no aparelho que Governa, se obedecem, se cooperam, que meios lhe faltam para salvaguardar os valores fundamentais cuja defesa lhe foi pessoalmente confiada.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Tem-me parecido que a debilitação progressiva dos nossos recursos ameaça conduzir-nos para a categoria internacional de Estado exíguo, e que a responsabilidade causal é primeiro do sistema real em que politicamente vivemos, o qual guarda pouca relação com a necessidade da revisão constitucional em que mais se fala, e depois das resistências ilegítimas às correcções necessárias. A primeira barreira contra essa degradação progressiva do nosso estatuto internacional está na vontade e determinação da população e esta depende muito fundamentalmente da participação e fé em valores que estão em primeiro lugar, no aparelho do Estado, entregues à responsabilidade do Ministério da Educação. Esperamos do Ministro que nos diga, sem reservas, por que é que a guerrilha ocupa a cena toda, sem nos deixar ver se e como é conduzida a guerra contra a deterioração do aparelho do ensino, e para tornar existenciais, e não apenas proclamados, os direitos de ensinar e de aprender garantidos a todos os portugueses.
Em nome da oposição, pedimos-lhe que diga tudo, que nos fale abertamente das suas lutas e das suas feridas, que estas angustiantes questões estejam integralmente na responsabilidade dos órgãos da soberania, a Assembleia da República que lhe pergunta e o Governo em nome do qual responde, porque estas não são questões que possam andar apenas pelas cimeiras dos directórios dos partidos, onde cada vez mais parece residir o poder efectivo, com os órgãos constitucionalmente responsáveis à espera do que acordem, e o País cansado de esperar para saber qual é finalmente o programa do Governo que elegeu.

Aplausos do CDS.

O Orador: - Porque, entretanto, os sectores da maior importância, sobretudo no ensino superior, o sistema real vai sendo construído à deriva, e temos mais do que razões para estar alarmados com as consequências que a comunidade portuguesa vai sofrer em curto prazo, ou já começou a sofrer. A questão que escolho, entre muitas que outros certamente abordarão, diz respeito aos efeitos do "numerus clausus", uma medida tradicionalmente recusada pelas autoridades académicas portuguesas mas que hoje vigora, não baseada numa relação averiguada entre capacidades de

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ensino e as necessidades previsíveis da comunidade mas simplesmente determinada pela capacidade de recepção dos estabelecimentos existentes.
Lembrarei ao Sr. Ministro que esta é uma questão que não é nova e foi prevista pela Universidade em 1970, no parecer do Conselho Universitário da Universidade Técnica de Junho de 1971, sobre as linhas gerais da reforma do ensino superior e do qual tive a honra de ser relator. Encontra-se entre outras passagens a seguinte, que passo a citar:

[...] a democratização do ensino, que é urgente, não implica a massificação em nenhum dos seus aspectos. Em primeiro lugar, não significa o acesso indiscriminado, sem plano e sem apreciação de vocações. Tal situação não seria útil para o País, nem para a Universidade, nem para os estudantes perdidos em tentativas para as quais não têm vocação. O exame e encaminhamento das capacidades e vocações deve ser uma fase do sistema de acesso aos cursos e às carreiras.

A democratização também não significa que os centros de ensino devam satisfazer sem limite toda a procura. A universidade entende que não é de admitir um sistema de "numerus clausus" que elimina, por falta de capacidade de recepção, os pretendentes, mas sabe que existe uma relação inviolável para cada unidade de ensino entre os meios disponíveis em pessoa e material e a procura. A única solução aceitável é a de manter um permanente programa de desenvolvimento do equipamento universitário que acompanhe a tempo o desenvolvimento da procura. De outro modo, seremos levados a soluções tecnicamente excelentes mas praticamente inúteis. O estrangulamento do sistema será a regra.
E, mais de uma década passada, Srs. Deputados, é no estrangulamento do sistema que nos encontramos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Às portas do aparelho estadual ficam cada ano milhares de candidatos, não porque não correspondam às exigências da qualidade mínima sobre as quais não pode haver transigência, mas porque simplesmente não existe vaga que lhes possa ser concedida. O resultado visível e inquietante é que a liberdade de ensinar, um direito fundamental para a defesa de legítimas concepções do mundo e da vida, a que respondem por exemplo as universidades católicas em todo o mundo, é exercida para simplesmente preencher os vazios que o Estado deixa, para recolher os deserdados do ensino oficial, para oferecer uma esperança concreta que o Estado recusa.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - E porque os investimentos exigidos pelo ensino não estão ao alcance fácil de uma sociedade pobre, visto que parece inteiramente fora da realidade portuguesa imaginar que teremos alguma universidade do tipo fundação, que é frequente nas comunidades ricas, acontece que a iniciativa privada tem de concentrar-se nas áreas onde as exigências de investimento inicial são moderadas, e deste modo oferece uma gama de opções que não guarda relação nem com as vocações, nem com as necessidades da
comunidade, sem sequer com o "numerus clausus". Os candidatos, agradecidos por terem ao menos essa oportunidade, escolhem entre o que lhes é oferecido, e não aquilo que procuraram em vão, e definitivamente, porque o tempo passa, lhe foi recusado. É por isso que, por exemplo, enquanto se discute, sem resolver, se o Porto terá a sua faculdade de Direito estadual a que tem direito, dispomos ali já de duas faculdades privadas, e a afluência de candidatos aumenta de volume em todos os centros privados de ensino na mesma área. Quantos dos candidatos que quiseram vir a ser engenheiros, ou médicos, ou veterinários, ou agrónomos, serão futuros licenciados em humanidades, apenas por que é aquilo que podem escolher? E que desequilíbrio, quantitativo e qualitativo, não está a ser produzido em relação às necessidades previsíveis da comunidade portuguesa? Que futuro está reservado, no plano da realização individual e da participação no futuro colectivo, a uma geração obrigada a escolher sob o signo do acaso, e que entra hoje nas escolas para praticar o seu primeiro acto profissional depois do ano 2000? Acontece ainda que, admitindo que o Estado recolhe os melhores talentos ao abrigo do "numerus clausus" a escolha posterior, que interessa tanto aos jovens como aos pais, e que dirige à iniciativa privada, tem de somar o talento à capacidade financeira de suportar os custos, e não está provado que as duas exigências coincidam pela ordem das capacidades e vocações.
A iniciativa privada oferece aquilo que está ao seu alcance, mas não está ao seu alcance evitar este facto, nem está dentro do interesse nacional que o facto permaneça e alastre.
Estamos num domínio em que parece evidente que o orçamento real do ensino ultrapassa muito largamente o Orçamento do Estado, com a excessiva diferença a cargo das famílias que todavia pagaram todos um imposto que lhes dá direito a um serviço que o Estado não presta.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não se trata da escolha do ensino livre para defesa de uma concepção do mundo e da vida, trata-se de uma escolha imposta pela insuficiência e incapacidade do sistema. Parece justo e urgente que se restitua às famílias o imposto indevidamente cobrado sem contrapartida e que o cheque de ensino seja introduzido na legislação portuguesa para ajudar a minorar tão evidente discriminação, proposta que o CDS faz hoje a esta Câmara.

Aplausos do CDS.

O Orador: - Nesta tão anormal situação em que o sistema vai sendo criado à deriva, não deveria o Governo descuidar-se em definir legalmente as exigências que devem satisfazer as autoridades académicas do ensino privado e dizer quais são, não pode adiar a definição de uma carreira académica no mesmo ramo do ensino, não pode ser exigente nas qualificações e graduações dos investigadores e docentes do ensino que têm a seu cargo, e deixar também à deriva a formação da pirâmide privada que vem substituir a sua ausência, preencher os seus vazios e que, em contrapartida dessas exigências, precisa de um estatuto que lhe garanta os direitos, sobretudo o direito da, autonomia pedagógica e científica, seja qual for a en-

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tidade titular do estabelecimento. Já que o aparelho oficial do ensino não poderá rapidamente responder às exigências da comunidade, que ao menos se decrete aquilo que é possível, no sentido de ajudar a viabilizar, com justiça, a iniciativa privada, usando o cheque de ensino, e que se defenda a qualidade dessa iniciativa contra improvisações que nascem do estado de necessidade em que se encontra a juventude quando pretende exercer o direito ao ensino e o Estado lhe fecha as portas.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Adriano Moreira, independentemente do meu acordo ou desacordo com algumas das concepções ideológicas que perpassam através da sua intervenção, quero reconhecer a seriedade e o rigor com que expôs à Câmara os seus pontos de vista. Assim, quero a esse propósito colocar-lhe duas questões.
Falou V. Ex.ª de valores inerentes ao sentimento de independência nacional, e referiu alguns. Não lhe parece que a existência real da independência nacional, neste caso concreto, se mede exactamente pela capacidade de os professores decidirem, passo a passo, o seu destino, independentemente da consideração de que a internacionalização da economia e todos os problemas geram um mundo em que - como Teillard de Chardin dizia - hoje cada um, em sua casa, tem na sua frente a totalidade do mundo. Não lhe parece, Sr. Deputado, que o valor da independência nacional, que V. Ex.ª referiu e contra o qual não tenho nenhuma objecção, tem que ser acrescido da prática real da decisão e participação dos problemas, que a todos afectam e que nos dizem respeito?
A segunda questão que lhe queria colocar é esta: tendo V. Ex.ª falado da iniciativa privada a nível de estabelecimentos de ensino universitário, não considera que a iniciativa privada neste domínio tem que ser integrada num projecto político nacional, devendo posteriormente obedecer a uma planificação que indique quais são os cursos prioritários, quais as zonas de acção que devem ser salvaguardadas, quais, de facto, as prioridades que decorrem desse projecto nacional? É que só assim é que se porá termo ao caos da proliferação do "salve-se quem puder", a um certo oportunismo, que eu julgo que V. Ex.ª reconhece existir na iniciativa privada no domínio do ensino universitário.

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero saudar o Sr. Deputado Adriano Moreira pelo rigor da sua intervenção e ainda pelo mérito intelectual da mesma, e não resisto à tentação de juntar a minha voz à sua no sentido de lançar um repto ao Sr. Ministro da Educação para aqui, em sede própria, dizer se efectivamente, dentro do sistema educativo, aqueles que dele dependem lhe obedecem e se cooperam para a defesa e salvaguarda dos valores essenciais que presidem, ou devem presidir, a esse mesmo sistema de ensino. Se há resistências ilegítimas as correcções necessárias que é preciso introduzir, penso que esta Câmara merece que seja dita a verdade e toda a verdade.
Por outro lado, desejo que o Sr. Deputado me possa dar quaisquer elementos ou quaisquer explicações acerca dessa sua ideia, que representa o chamado "cheque de ensino", que, como afirmou, no fim de contas deriva do facto de ser imposta aos alunos uma escola, que é afinal derivada da insuficiência e incapacidade do sistema educativo.

Portanto, o que eu acima de tudo pretendia era, por assim dizer, uma ideia mais rigorosa, mais concreta, se possível fosse, acerca desse mesmo problema, dizendo-lhe de antemão que me congratulo vivamente que tenha posto aqui esta temática do ensino privado a todos os níveis e, ainda, das dificuldades que evidentemente atravessa, nomeadamente no que respeita à definição do estatuto da carreira docente no ensino privado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira para responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Se VV. Ex.as permitem, começarei por responder à Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
Assim, em primeiro lugar, agradecendo muito a solidariedade que deu às minhas sugestões e, em segundo lugar, respondendo muito concretamente sobre o projecto de lei do "cheque de ensino", dir-lhe-ei que este foi elaborado com cuidado - está inclusive entregue já na Mesa - e penso que o mesmo será suficientemente explícito.
Além disso, acrescentarei, apenas, que não se trata de uma novidade criada em Portugal, trata-se de trazer para o País um instituto que já existe em vários países, não obedecendo sempre, naturalmente, às mesmas regras, de acordo com as diferenças culturais em cada país. Aquilo de que se trata é de assumir que é dever do Estado assegurar o ensino igual em igualdade de oportunidades e combinar isso com a liberdade de educação. Trata-se, portanto, de admitir que toda a comunidade paga solidariamente para que esse direito e a obrigação do Estado sejam exercidos em relação a todos os portugueses, isto no que toca ao nosso País. E uma maneira sadia de o conseguir é a de o Estado ter uma avaliação real do custo do ensino por aluno e por ciclo e de, na medida em que ele próprio, Estado, não pode satisfazer a procura que é obrigado a satisfazer, restituir às famílias o custo que toda a comunidade pagou para um serviço que não recebeu, de modo que a comunidade organize, supletivamente, esse ensino.
É evidente que o "cheque de ensino" só pode ser utilizado para ensino e que tem de respeitar os limites normais da escolaridade.
Mas em Portugal o que vejo ainda como consequência possível, correspondendo a uma necessidade que não se verifica noutros países, é que, se nós alargarmos o conceito de ensino privado de uma maneira razoável, como tentamos no nosso projecto de lei, o próprio poder local pode participar nessas iniciativas, porque vai ter a segurança da procura, o funcionamento, que é fundamental, vindo da comunidade que ele serve. Então, o poder local encontra-

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rá também um estímulo para participar no desenvolvimento e estabelecimento da rede escolar em relação aos seus vizinhos, pelos quais é mais responsável.
O princípio de justiça parece-me inteiramente evidente, tal como os benefícios com um poder local responsável também me parecem evidentes.
Por outro lado - e aqui começo já a responder ao Sr. Deputado César Oliveira - julgo que temos de reconhecer que a liberdade de ensinar, que corresponde ao direito de defender uma concepção do mundo e da vida - as famílias têm o direito de querer que os seus filhos sejam socialmente integrados de acordo com as matrizes que a elas lhes parecem melhores, podendo, por isso, escolher as suas escolas -, essa liberdade, dizia, está a ser confundida com o direito de ensinar, pois que este está a desenvolver-se não por causa das necessidades de defesa de concepção do mundo e da vida, mas por causa dos vazios que o aparelho do Estado manifesta constantemente.
Referindo-me justamente à faculdade de Direito do Porto, que o Sr. Secretário de Estado mencionou durante a sua intervenção (penso que vou de encontro às suas palavras, embora não tenha tido ocasião de o ouvir porque nesse momento não estava no hemiciclo), devo dizer que continuamos sem resolver o problema de uma tal faculdade de Direito, a qual deve nascer, principalmente, do exercício da autonomia universitária da Universidade do Porto. Mas, entretanto, nascem 2 faculdades privadas no Porto para tapar o vazio que aí existe. Ora, o Estado não pode continuar ausente no Porto!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Universidade do Porto tem de exercer a sua autonomia e tem de satisfazer este vazio, que não pode continuar a existir naquela cidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente que este facto também poderá ajudar a reconduzir ao exercício sadio quer da liberdade de ensinar quer do direito de ensinar. E porquê? Porque as instituições privadas talvez desta maneira possam orientar-se exclusivamente para a satisfação de uma necessidade colectiva e não para satisfazer a angústia de quem procura um lugar numa escola, seja que escola for.
Tenho a certeza de que, neste momento, a comunidade portuguesa já atingiu um desequilíbrio, no que toca à formação, que dificilmente vai ser sanável. Se compararmos as necessidades do País - aí está um bom estudo para ser quantificado, por exemplo nos domínios do ensino do Direito - com o número de alunos que só este ano procuraram o ensino do Direito, porque é aquele que lhes é oferecido e não aquele que eles quereriam ter, nós temos de aceitar que estamos a perder vocações, a violentar personalidades e a desservir os interesses da comunidade.
Quando digo isto faço-o também, mesmo que conscientemente a ele não me tenha referido, pensando no Chardin, que o Sr. Deputado César Oliveira citou, porque, como não é segredo para si, foi um autor que teve muita influência na minha formação.
E quando falo na viabilidade independente de Portugal, falo na viabilidade independente de Portugal de 1984. Mais: falo numa viabilidade independente que, do meu ponto de vista, não pode ser negada; eu não aceito a negação disso.
Portanto, esse valor é para mim fundamental e não pode desaparecer, não pode ser enfraquecido, não pode ser vítima de erosão. Penso até que uma das principais responsabilidades na defesa desse valor está no aparelho de ensino, o qual - e aqui acompanho a intervenção do PSD - foi intencionalmente deteriorado no sentido de atingir esse valor.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E nós vemos e sofremos essas consequências na juventude portuguesa!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo quando insisti em que estamos a ser vítimas mais do sistema do que da Constituição, cuja revisão se pede, é porque a democracia, do ponto de vista da democracia cristã, começa na sociedade civil. De facto, é na sociedade civil que nós em primeiro lugar somos iguais.
Ora, a sociedade civil portuguesa é cada vez mais desigual. Nós estamos perante injustiças gritantes que nunca conheci no meu País. São cada vez menos aqueles que têm privilégios em face daqueles que sofrem mais necessidades.

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E isso eu verifico à entrada da escola. É porque são poucos os que são escolhidos e são milhares os que são chamados.
Isto é uma servidão da sociedade civil portuguesa.
Nós, mais que a liberdade, o que precisamos de pedir para a sociedade portuguesa neste momento é a libertação destas subjugações sistémicas que justamente o que estão a impedir é que se manifeste aquilo que o Sr. Deputado César Oliveira e eu próprio consideramos um valor fundamental: a vontade do povo português livremente manifestada sem subjugações sistémicas, que são servidões que não podemos admitir.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

O Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em 3 anos, 3 interpelações ao Governo centradas na política educativa da responsabilidade de ministros do PSD, ora em coligação com o CDS, ora com o Partido Socialista.
O PS, o MDP/CDE e agora o PCP, vêm interrogando os governos sobre uma mesma política selectiva, desligada do desenvolvimento do País, sem coordenadas lógicas e sem responsabilidade social.
Para além destas interpelações feitas ao Governo através deste órgão de soberania, todos os dias se poderá dizer que a política educativa tem sido negativamente questionada por todas as estruturas sindicais de professores, associações de professores católicos, associações de pais e estruturas políticas de juventude, sendo o repúdio desta política alcançado no dia 20 de Novembro a sua fase histórica com a greve quase total dos estudantes do ensino superior.

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A Comissão de Educação e Cultura desta Assembleia tem dado provas, na análise dos problemas educativos, de que existe uma convergência de opinião no repúdio às políticas educativas quer no governo AD quer agora no governo PS/PSD.
A atitude conjunta de todos os partidos face à portaria que regulamenta o acesso ao ensino superior corresponde ao protesto generalizado de todos os partidos representados nesta Assembleia da República por uma das características mais vincadas da política da AD e da política do actual Governo, a progressiva selectividade do ensino e o afunilamento crescente na formação de técnicos de nível superior.
Infelizmente, a proposta expressa pelo MDP/CDE, que teve o apoio geral dos partidos, não ficou registada na acta da Comissão, mas será por nós tornada pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é uma situação que foge à análise circunstancial dos problemas e remete para a análise tipológica das estruturas.
O MDP/CDE não faz insinuações nem retira ilações da situação; quer apenas remeter à responsabilidade desta Assembleia algumas considerações que poderão eventualmente perspectivar e desenrolar esta nebulosa.
Na verdade, a dinâmica da liberdade nas revoluções portuguesas deste século (5 de Outubro de 1910 e 25 de Abril de 1974) apresentou-se com um forte conteúdo cultural.
As reformas dos primeiros governos logo a seguir à instauração da República estruturaram o ensino técnico superior, tentaram a generalização do ensino primário e multiplicaram de imediato escolas infantis, ao mesmo tempo que se desenvolvia a consciência cívica face à educação e se dinamizava o espírito de voluntariado. O combate ao analfabetismo e a cultura literária do povo impuseram-se como um dever nacional.
As associações culturais surgiram nos bairros das grandes cidades e na mais escondida aldeia. A prática da música, do teatro, o ensino da literatura e a fundação de bibliotecas juntaram em torno de todas estas actividades os intelectuais mais representativos.
Terá de se dizer que todos os grandes escritores, os grandes professores, todos os grandes historiadores e estudiosos desta época participaram neste movimento cultural e a sua obra ficou ligada à luta popular pela democratização da cultura e do ensino.

De tal modo que depois da implantação da ditadura foram precisos 4 ou 5 anos antes que o assassinato eficaz das instituições de ensino e cultura fosse consumado.
A verdade é que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como é do conhecimento desta assembleia de democratas, o espírito de luta por uma cultura e por uma educação popular criou raízes durante a resistência ao fascismo.
Nessa altura, num país quase nada industrializado e apesar da fraqueza do movimento operário, os intelectuais uniram-se ao povo. Durante a ditadura, nas zonas onde se engrandecia a força operária, assistiu-se ao crescimento do movimento cultural apesar de esta força brotar no contexto duma industrialização mergulhada na injustiça e na exploração da mão-de-obra barata.
Esta resistência cultural não foi talvez estranha ao carácter profundamente obscurantista que tomou a ditadura em Portugal, em comparação, por exemplo, com a Espanha que durante o franquismo expandiu a rede escolar, efectivou 8 anos de escolaridade obrigatória e acabou com a analfabetismo.
Aqui, em Portugal, presidiu aos destinos da Nação um professor universitário, discípulo da boa tradição inquisitorial portuguesa, conhecedor dos mecanismos capazes de amesquinhar um povo sob o ponto de vista económico, social e cultural.
A revolução do 25 de Abril foi precedida de uma verdadeira revolução estudantil e de uma explosão escolar que o governo moribundo não foi capaz de dominar. No ano da revolução e nos 3 anos seguintes esta explosão escolar não deixou de aumentar, tendo sido acompanhada de profundas transformações dos valores sociais. Nasceu uma escola nova onde a relação aluno-professor foi definitivamente alterada, a gestão das escolas tornou-se democrática, apesar de algumas pressões políticas em contrário, a relação entre a escola e o meio alterou-se e a autonomia da universidade é hoje um dado adquirido.
Infelizmente os governos constitucionais não tiveram a sensibilidade de quanto seria importante institucionalizar este dinamismo social que a escola lhes oferecia. Deram fracas respostas pontuais e, não tendo a possibilidade de edificar uma política global capaz de aproveitar este dinamismo social, perderam um precioso aliado, a escola.
Depois de 1980 a educação foi totalmente bloqueada pelas contradições políticas das coligações governamentais.
Salvo raras excepções, em breves situações transitórias e nada significativas, os ministros da Educação, contestados por todas as estruturas sociais e políticas de todos os partidos, navegam como um piloto automático, aparentemente independente da razão humana, direitos ao neo-obscurantismo. As várias intervenções do Sr. Ministro da Educação ontem feitas colocaram-se já neste terrível terreno do neo-obscurantismo.

O Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Não apoiado!

A Oradora: - Os partidos políticos no poder evitam uma confrontação com a realidade e aninham-se à sombra de uma oposição envergonhada (vide a intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião).
A contestação assim generalizada é um grave sinal da profundidade e da extensão do problema e também um sintoma de rotura eminente do sistema, de uma fractura entre o movimento social, os valores profissionais, as necessidades de realização individual e o bloqueio da escola.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os técnicos de educação desta Casa sabem que se a rotura do sistema ainda não se efectuou visivelmente é pelo enorme esforço de muitos professores que, criando autonomia nas suas próprias escolas, são capazes de gerar o ambiente pedagógico que mantém viva a sua função de educadores. De tal modo que poderemos dizer com verdade que mais uma vez em Portugal o ensino se mantém apesar de e contra o poder político.
É, pois, este potencial educativo que urge retirar das mãos nefastas deste Governo, porque não será fácil no contexto institucional que existe e dentro da estrutura do sistema escalavrado, distorcido, mordido, esfarrapado e remendado por montanhas de despa-

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chos, portarias de todos os tamanhos, feitios e confusões, construir a escola democrática de que necessitamos.
A edificação progressiva de tal escola exige profundas transformações na política global e nos objectivos sociais, mas todos nós estamos conscientes de que nos poderíamos desde já pôr de acordo sobre uma hierarquia de prioridades que define a solução dos problemas mais graves.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ministro que neste momento ocupa a pasta da Educação representa um episódio, diremos ele é consequência, das pobres escolhas do Governo.
Cabe a esta Assembleia a definição do sistema educativo, cabe a esta Assembleia a fiscalização dos actos do Governo, cabe a esta Assembleia exigir, com as razões válidas que deputados de todos os partidos conhecem, a demissão do Ministro da Educação.
A interpelação ao Governo centrada na política educativa é um acto que nobilita as funções desta Assembleia e pelo qual nos associamos com gosto ao Partido Comunista, mas é um acto que só actuaria pela positiva no caso de os partidos do Governo assumirem com coerência e sem falsos farisaísmos as suas responsabilidades.
O MDP/CDE nunca desistirá de trabalhar com tenacidade na procura de soluções que resolvam o problema chave da sociedade portuguesa.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!

A Oradora: - O MDP/CDE considera o homem o primeiro e o mais importante valor social; a luta para criar estruturas de participação social que assegurem ao homem a possibilidade de exercer como indivíduo, inserido numa colectividade o seu papel transformador, é para nós tarefa fundamental. A educação é nas sociedades de hoje um direito essencial do cidadão e um dever prioritário do Estado.
Por estranho que pareça ao MDP/CDE, o Partido Socialista, autor de 2 projectos de lei do sistema educativo, autor de um importante projecto de lei da criação do Instituto de Investigação e Inovação Educacional, que deixou de resto cair em 1981, não inclui nas suas negociações com o PSD, pelo menos na listagem que veio a público, a discussão dos projectos de lei de bases do sistema educativo, há 4 anos congelados nesta Assembleia.
O MDP/CDE entende que as contradições dos governos de coligação levaram o povo português já ao cúmulo do sofrimento e comprometeram já o seu futuro. O MDP/CDE tem consciência da gravidade da situação; por isso lhe parece inadiável a tomada clara de uma posição.
O Ministro Seabra é para nós, como já disse, apenas um episódio nefasto; importante é saber se os partidos agora coligados foram capazes de fazer entender a esta Assembleia e ao povo que os elegeu que sociedade querem construir e que futuro projectam para Portugal.
Foram estes partidos capazes de explicar se desejam continuar a atolar-nos no circunstancial ou se pretendem encontrar um caminho no diálogo que leve ao atenuar de imediato os problemas fundamentais do sistema educativo?
Não foram.

As suas divergências com a política governamental não surgiram suficientemente conscientes, suficientemente profundas e suficientemente alarmantes para dinamizarem, para além da camaradagem partidária, a responsabilidade cívica, a responsabilidade política e, em muitos casos, a responsabilidade profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta interpelação joga-se muito no regime democrático.

Vozes do PSD: - Ah!

A Oradora: - Como historicamente todos sabemos se numa área consensual e prioritária, como a educação, esta razão não bastou para se encontrar o caminho do diálogo e a seriedade das soluções resta, no entender do MDP/CDE, ao Sr. Primeiro-Ministro aproveitar o Natal para ir a Belém oferecer a sua demissão.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Isso é que era bom!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de suspender a sessão, vou indicar os tempos de que o Governo e cada grupo e agrupamento parlamentar dispõe: o Governo, 26 minutos, contando já os 8 minutos cedidos pelo PS e os 5 minutos transferidos pela ASDI; PS, 29 minutos; PSD, 32 minutos; PCP, 25 minutos; CDS, 15 minutos; MDP/CDE, 1 minuto; UEDS, 10 minutos; ASDI, 20 minutos; Sr. Deputado independente António Gonzalez, 10 minutos. Estes tempos não incluem o espaço dedicado ao encerramento do debate, onde o partido interpelante e o Governo dispõem, cada um, de 30 minutos.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão, que reabre às 15 horas.

Eram 13 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, na sessão da manhã o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior teve oportunidade de referir que, caso fosse atribuído mais tempo ao Governo, nomeadamente por parte das bancadas da maioria que o apoia, estaria na disposição de prestar mais alguns esclarecimentos à Câmara, designadamente quanto ao problema do acesso e do ingresso no ensino superior.
Para o Grupo Parlamentar do PCP poder organizar a sua intervenção neste debate e dado que temos muito pouco tempo, gostaríamos de perguntar à Mesa se o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior já está inscrito, uma vez que a Mesa informou antes da suspensão da sessão que o PS e a ASDI tinham cedido ao Governo 13 minutos.

Portanto, para boa organização do debate e para que possamos reservar algum tempo para um diálogo

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que certamente será construtivo, pretendemos saber se o Sr. Secretário de Estado já pediu a palavra para ,intervir.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior está inscrito em 9.° lugar, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laranjeira Vaz.

O Sr. Laranjeira Vaz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em 7 de Novembro de 1975 o então deputado constituinte José Augusto Seabra afirmava nesta tribuna:

Eu penso que nós devemos também reconhecer a maioridade das juventudes dos diferentes partidos aqui representados, que, com a sua especificidade própria, colaboram com os partidos de que fazem parte na luta pelo seu ideário, na luta pêlos seus objectivos políticos.
Quaisquer que sejam essas juventudes, nós temos o dever de reconhecer que elas não têm um papel secundário, não têm um papel subalterno, não têm um papel puramente instrumental em relação aos respectivos partidos, possuindo pelas suas próprias características de organizações juvenis um sangue próprio, um entusiasmo, uma força que lhes dão muitas vezes nas lutas partidárias actuais um papel de relevo.

Deputado do Partido Socialista, é em nome de uma dessas juventudes a Juventude Socialista, que hoje subo a esta tribuna, para participar nesta interpelação e começarei por afirmar que não é possível falar de política educativa sem a correlacionar com um projecto de desenvolvimento global do País e para cada uma das suas regiões.

O Sr. João Fernandes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, não se pode falar de desenvolvimento regional sem tomar em consideração uma política educativa, cuja fragilidade ou inadequação são, muitas vezes, uma das causas de estagnação ou deterioração económica.
Tendo presente os baixos níveis de formação técnica, a insuficiência do sistema de formação escolar e extra-escolar, designadamente no domínio das saídas profissionais, a evolução previsível das estruturas de mão-de-obra e correlativas exigências de uma cada vez mais adequação entre emprego e formação, um projecto de crescimento industrial que acelera a substituição de uma produção arcaica e anquilosada por outro com características sofisticadas que utiliza tecnologias avançadas, impõe-se aqui uma questão: quais as respostas que o Ministério da Educação Oferece, considerando a educação como um factor decisivo para a reconstrução do País, pois dela depende a preparação da juventude para a vida activa, ou seja, o futuro deste País? Sem pretender ser exaustivo, passarei a analisar alguns aspectos sectoriais da política educativa.
Que futuro para o ensino técnico-profissional, apresentado como grande obra do Sr. Ministro, que está longe de satisfazer as necessidades da componente pro-fissionalizante do ensino unificado? Será que uma vez mais se preferiu realizar uma experiência desgarrada, onde os estudantes funcionam como «cobaias»? Não deixa de ser preocupante constatar-se que em turmas de 15 alunos, com um orientador, professores com razoável formação e condições de trabalho, se verifiquem índices de reprovação na ordem dos 20 %, o que significa, a manter-se, que apenas passados 3 anos essas mesmas turmas tenham apenas 9 alunos, admitindo que nenhum se deixou aliciar, em qualquer estágio, pelo mercado de trabalho. É importante que se esclareça quem «lucra» com esta estrutura do ensino técnico-profissional.
Recusamos que se preencham lugares de professores com indivíduos não preparados ou pior ainda com pessoas para quem a ausência de saídas profissionais os empurra para o ensino. Mas onde estão os resultados do empenhamento que V. Ex.ª anunciou na concretização do estatuto da carreira docente não universitária? Não será razoável criarem-se incentivos económicos e, essencialmente, pedagógicos à deslocação de professores?
Assumimos a modernização do sistema educativo seguindo o princípio da educação permanente aproveitando todos os espaços e pessoas de modo a contrabalançar o estatismo da instituição escolar tradicional e a criar formas de pluralismo educativo, pelo que consideramos como meio para tal a existência de um conselho nacional de educação que não pode ser, de forma alguma, uma «muleta» de qualquer ministro e que urge implementar.
Defendemos que todas as crianças deficientes que não possam ser integradas em escolas normais deverão ter garantido o direito (e não a caridade) de receberem uma educação adequada. Quando haverá condições para que as estruturas experimentais existentes sejam dimensionadas segundo as reais necessidades do País?
Consideramos o princípio da educação permanente fundamental na preparação para a vida activa. Onde estão instrumentos, tais como a Universidade Aberta, ou por que não se debate o que é, o que se quer ou como se quer o chamado ensino superior politécnico?
As únicas autoridades da escola são sempre os componentes do corpo escolar - docentes, discentes e funcionários. Daí que o sentido participativo da gestão democrática tenha de ser reforçado. Para quando rever os decretos de gestão, designadamente consagrando a eleição directa dos representantes dos alunos no conselho directivo, o fim da interdição de candidatura a alunos repetentes ou a obrigatoriedade da convocação dos alunos para todas as reuniões do conselho directivo?
Há que fomentar a participação dos jovens na sociedade, nomeadamente apoiando a ocupação dos seus tempos livres, nomeadamente através das suas associações inscritas no Registo Nacional de Associações Juvenis do FAOJ. Mas será fomentar a participação juvenil o FAOJ não cumprir os seus compromissos financeiros com tais associações, forçando-as a recorrer ao crédito bancário, empurrando-as para a insolvência? Ou ainda, será criar condições para a participação juvenil, alimentar processos nebulosos como o do GACDU? Pensamos que não; e é conveniente lembrar V. Exa., Sr. Ministro, da urgência que há em conhecer-se publicamente as conclusões do inquérito à GACDU que parece conter matéria do foro criminal e disciplinar, como é necessário que V. Exa. esclareça a sua posição nestas matérias.

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Finalmente, desejaria abordar a questão do acesso ao ensino superior. É inegável que o actual esquema de acesso deve ser alterado. Todavia, não é admissível que uma nova regulamentação exclua, em absoluto, as qualificações do ensino secundário, como não é aceitável que se exija a obrigatoriedade de uma prova de Português para todos os alunos, sem a criação de condições prévias que salvaguardem as legítimas expectativas dos alunos e dos encarregados de educação. De resto, como se compreende uma ruptura com o sistema vigente de acordo com o texto do projecto de portaria a introduzir no final do 1.º período lectivo? Por outro lado, será justo sujeitar os candidatos ao ensino superior que aguardam o seu ingresso a novas regras, quando uns optaram, para entrar no curso que desejavam, por aguardar 1 ano para beneficiarem da respectiva bonificação legal e outros, que podiam entrar nas faculdades fora da sua área, não o fizerem por dificuldades económicas, ficando igualmente a aguardar 1 ano?
O tempo é limitado, daí que tenha que ser breve. No entanto, algumas questões aqui levantei, sem, no entanto, ter de lamentar em nome da juventude socialista que as respostas do Ministério da Educação têm sido até ao momento um discurso ambíguo, tal como considerar os Serviços Sociais Universitários como uma empresa pública degradada e corrupta, sem que se conheçam as sanções aplicadas aos agentes dessa degradação e dessa corrupção, a nomeação de comissões das quais se continua e, por certo, continuará à espera de resultados; a publicação de despachos como o da criação de núcleos de orientação que demonstra a clara incapacidade de dar uma resposta frontal a tão grave problema, privilegiando-se, talvez, a facilidade e, mais grave ainda, descaracterizando-se faculdades que se estão vocacionadas para orientação, não são faculdades de orientação. Deixemos os factos falar por si. A retórica, se bem que interessante, já nos basta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vou terminar. E desejava terminar como comecei, citando o deputado constituinte José Augusto Seabra:

E eu quero dizer que, se alguém um dia disse que "o futuro pertence à juventude" e mesmo, até, que a luta pelo socialismo é a luta pela juventude no mundo", a verdade é esta: a juventude não pode ser apenas uma figura de retórica. A juventude tem de ser a juventude real, viva, na sua diversidade social, na sua diversidade ideológica, na sua diversidade temperamental. Sim, a juventude é, além do mais, uma forma de ser, um entusiasmo, algo que vivifica por vezes o nosso quotidiano de adultos ainda não, felizmente, espero-o, perdidos para o futuro.

Aceitando que ainda hoje V. Ex.ª acredita na juventude real, na sua forma de ser e no seu entusiasmo vivificante, a Juventude Socialista convida-o para um debate público, através dos meios de comunicação social, sobre a política educativa.

Aplausos do PS, do MDP/CDE, da UEDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.

O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Debrucemo-nos sobre os problemas que existem e se acumulam no ensino nocturno para trabalhadores. A acção dos sucessivos governos, incluindo o actual, tem-se caracterizado por um total desprezo pelo ensino nocturno e por uma completa marginalização e esquecimento dos problemas e reivindicações dos trabalhadores-estudantes, pondo em causa um direito constitucional, um esforço pessoal, uma necessidade para o País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo nada fez para garantir e promover o acesso dos trabalhadores ao ensino. Senão vejamos: foram abertas mais escolas à noite? Foram criados mais cursos nocturnos no ensino superior que possibilitem uma mais vasta possibilidade de opção?
Não. Nada disto foi feito!
Quanto dinheiro foi despendido para o apoio social aos trabalhadores-estudantes? A resposta é: nenhum.
Se o apoio aos estudantes diurnos é já de si insuficiente, para os trabalhadores-estudantes ele é nulo. Que saibamos nem um tostão.
E o Governo sabe que entre os trabalhadores-estudantes existem muitos que não recebem salários ou que estão no desemprego porque foram despedidos? E que muitos deles têm responsabilidades familiares?
O Governo não considera que é necessário e urgente apoiar o esforço e a dedicação desse milhares de jovens e adultos?
Infelizmente, o exemplo mostra-nos que não!
Mas deste Governo já nada nos surpreende.
É que nem sequer se preocuparam, nem preocupam em divulgar e fazer cumprir a Lei n.º 26/81 - Estatuto do Trabalhador-Estudante -, aprovada por esta Assembleia.
O processo foi desencadeado após a apresentação de um projecto de lei do Grupo Parlamentar do PCP, mas lembramos que essa lei foi votada pelos partidos da maioria.
Já nem sequer aplicam hoje, aquilo que aprovaram ontem!
Sabemos que em muitas empresas não são concedidos aos trabalhadores-estudantes os direitos e regalias estabelecidos no estatuto.
O mesmo se passa nas escolas. É por exemplo o caso da Escola José Falcão, onde o respectivo conselho directivo, como nos referem os trabalhadores-estudantes, não cumpre a lei porque não está de acordo com ela. Depois, defende-se, dizendo que mandou um ofício ao Ministério da Educação a perguntar como deveria actuar, e como ainda não recebeu resposta não a aplica.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo?

O Orador: - É uma actuação escandalosa! Como escandalosa é a passividade governamental face a situações de claro e deliberado desrespeito desta lei da República!

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Mas quanto ao estatuto há mais. É que o Governo está obrigado, por força da aplicação do artigo 12.º da Lei n.º 28/81, a promover a criação de um organismo ou serviço ao qual, na área da educação, competirá o tratamento das questões específicas dos trabalhadores-estudantes.
Quase 4 anos após a entrada em vigor da lei, este organismo continua por criar. Que pensa o Governo fazer?
Será que o Governo só aplica as leis da República quando lhe convém?
Mas desta vez digam qualquer coisa. Não nos voltem a deixar sem resposta como tem vindo a suceder por diversas vezes!
Não se resumem os problemas dos trabalhadores-estudantes apenas ao incumprimento do estatuto. Os problemas são mais vastos.
Continua sem se dar resposta aos programas escolares e aos métodos pedagógicos inadequados.
Aplicaram ao ensino nocturno o 12.º ano, que sendo mau para o ensino diurno é pior para o nocturno.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Cresce a selectividade no acesso ao ensino superior, sem serem encaradas medidas que tenham em conta a especificidade e as características do ensino para trabalhadores.
A formação e reciclagem dos professores, tendo em conta essas características e especificidades não é feita.
Em muitas escolas, devido à superlotação, passam-se compulsivamente alunos do diurno para o nocturno, provocando dificuldades no convívio e na aprendizagem pela diversidade de interesses e comportamentos.
Perante tais problemas, é natural que o número de trabalhadores-estudantes tenha vindo a decrescer.
Confrontados com uma situação que os obriga a inúmeros sacrifícios, quase sempre sem resultados positivos, ficam desencorajados para prosseguirem e muitos desistem de continuar os seus estudos.

E mais desencorajados ficam, quando chegam à escola e encontram a cantina fechada. Fechada porque, ou não existem verbas ou porque não foram abertos concursos para colocação de pessoal. E que fazem? Ou comem quando chegam a casa depois das aulas, já fora de horas, ou comem umas sandes e bebem uma cerveja e um café, no bar da escola, se o houver, porque não há dinheiro para mais.

Mais desencorajados ficam quando no fim das aulas têm de se deslocar para casa a pé, porque não existem transportes. Isto para já não falar daqueles que pelo mesmo motivo já nem sequer se matriculam para a frequência das aulas.
Mais desencorajados ficam quando chegam à porta da biblioteca e vêm que o respectivo horário não contempla as suas necessidades e voltam para trás com o sentido de frustração de quem precisa consultar um livro e não pode.
É ou não verdade, como já foi referido noutra intervenção, que tudo isto leva a que turmas que começam com 30 trabalhadores-estudantes no fim do ano acabam com 3, 2 ou mesmo 1?

E quando se tenta proibir, como acontece em muitas escolas, o direito de associação e a respectiva actividade associativa dos trabalhadores-estudantes, como forma de defenderem os seus direitos e lutarem pela resolução dos seus problemas, é justo perguntar: Por que razão existem tais situações e por que motivos não actua o Governo por forma a repor a legalidade?
Será, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que estes problemas são muito difíceis de resolver?
E, mesmo que o fossem, não entendem que é necessário desenvolver o esforço e trabalhar no sentido de equacionar soluções? Nós entendemos que sim.
Mas assim não considera o Governo! E como tal deve ser responsabilizado!
Criar mais dificuldades, aniquilar garantias, obstaculizar o direito de acesso dos trabalhadores aos diferentes graus de ensino, não se coaduna com as directrizes constitucionais nem com a necessidade de desenvolver económica e socialmente o nosso país.
Essa filosofia política é defendida e praticada por quem tem dos trabalhadores a ideia de que estes só devem e só servem para trabalhar.
Quem assim pensa e actua não pode governar Portugal.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vem aqui o Partido Comunista Português, ao abrigo das disposições regimentais da Assembleia da República, interpelar o Governo com vista "à abertura de um debate geral centrado predominantemente sobre a política educativa".

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É da Constituição, minha senhora!

A Oradora: - Procedimento normal em qualquer democracia ocidental, veleidade vã em qualquer pseudodemocracia do Leste e que se pagaria caro, muito caro mesmo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Direito reconhecido a qualquer partido normal em democracia, lamentável procedimento habitual e quase único do Partido Comunista Português, que, na lógica férrea dos seus objectivos ocultos, é capaz de tudo e lança mão de tudo para desestabilizar, corroer as bases do viver democrático, para, numa política de "terra queimada", se aproveitar das ruínas que espalhou, do descontentamento que provocou, da revolta que por todos os meios soprou e alimentou.

Aplausos do PSD.

A Oradora: - Aparece-nos hoje aqui como advogado de acusação, fero e duro, quando devia, em grande parte, sentar-se no banco dos réus como grande responsável de muitos males que imputa a outros, de grandes problemas em cuja génese ele aparece como principal factor.
Exemplo elucidativo... o problema da educação.

Protestos do PCP.

A Oradora: - É melhor estarem calmos, Srs. Deputados, porque há mais.

Aplausos do PSD.

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A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O IX Governo Constitucional apresentou neste Parlamento em 24 de Junho de 1983 um programa de política de educação que mereceu o apoio maioritário desta Câmara. Não mereceu o apoio do Partido Comunista Português, e isso é para nós uma garantia do seu sentido realista, na melhor perspectiva do interesse e formação dos nossos jovens e da salvaguarda dos valores fundamentais da nossa cultura e história. É que são outros os critérios do Partido Comunista Português, está apontada para outro alvo a mira do PCP. Sentimo-nos no bom caminho quando são divergentes os nossos caminhos.
O programa então aprovado é um programa para realizar em 4 anos, que não são de mais para alcançar metas e objectivos almejados, antes o Grupo Parlamentar do PSD sempre teve consciência de que mesmo em 4 anos de legislatura não poderiam atingir-se tais objectivos em percentagem que se pudesse considerar óptima e satisfatória, pois sabe que é complexo o problema da educação, vastas e extensas as suas implicações, muitas e de longo tempo as suas causas. Não é problema de hoje, criado pelo Governo que temos, não é sequer de ontem... É velho de algumas décadas, anterior ao 25 de Abril e agravado logo após esta data, e aí aparece-nos sintomaticamente o PCP como principal responsável. Precisamos de edifícios escolares? Mais alguns se teriam construído, se não tivesse havido necessidade de reparar muitos então fortemente danificados.

Aplausos do PSD.

Há necessidade de mudar programas? Ter-nos-ia sido mais fácil se primeiro não se tivesse sentido a urgente necessidade de alijar tanta "ganga" perniciosa com que o gonçalvismo contaminou os programas de então.

Aplausos do PSD e do PS.

Uma voz do PCP: - E o Viriato!

A Oradora: - Já lá vamos, Sr. Deputado. Também vamos ao Viriato.

Também no campo da educação foi triste a "herança" de uma época em que o PCP foi tirano cheio de arbitrariedades. Todos os cidadãos o sentiram e muitos o sofreram na sua carne.

Aliás, o "quadro negro" da educação desde há muito tem vindo a ser feito por todos os quadrantes ideológicos. É obra de muitos anos, de muita incúria, de muitos reformadores de ocasião. Não é problema de hoje... Não é da responsabilidade de um só governo.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD assume plenamente as suas responsabilidades em matéria de educação. Mas não aceita, por injusto, atribuir a qualquer ministro da Educação ou equipa ministerial a responsabilidade inteira, ou até principal, da crise do ensino no nosso país.

Aplausos do PSD.

Hoje e aqui, o principal problema não é acusar equipa do Ministério da Educação da grave crise que vive o ensino; é, antes, investigar ou perguntar se essa equipa, com o seu tempo de vigência e com os recursos de que dispunha, poderia ter feito mais e melhor. Só disso a poderíamos acusar ou condenar, e nunca assacar-lhe responsabilidades que a muitos outros pertencem.
Sabemos que há descontentamento em professores e alunos, pais e encarregados de educação. Sentimos a razão de muitas das suas queixas, a acuidade de muitos problemas.
É pois necessário dar-lhes as soluções adequadas. Porém tal não se conseguirá se não se contar com a compreensão e esclarecida opinião de todos os partidos empenhados em construir e não em demagogicamente destruírem. E, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, toda esta Câmara conhece qual a posição e intentos do Partido Comunista Português nesta... como aliás noutras questões.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Criticar é fácil... Mas jamais poderemos objectivamente analisar a crise da educação no presente, deixando no olvido as suas variadas causas - umas remotas, outras mais próximas e algumas recentes. Não podemos colaborar com pessimismo
doentio, na crítica pela crítica, nas atitudes demagógicas que fomentam a instabilidade e criam o vazio.
Somos tolerantes, mas achamos que cada um tem de assumir as suas responsabilidades, e sempre pensámos que o magno problema da educação, pela complexidade da sua natureza, pela variedade dos seus factores, pela sua extraordinária projecção na vida presente
e no futuro da vida da Nação, é problema que se impõe a todo o cidadão consciente, a todo o partido democrático que preze o bem da Pátria e se deve situar acima de divisões e querelas secundárias. Não significa isto que todos tenhamos de estar de acordo em todos os aspectos do problema. A análise das divergências levará construtivamente à melhor solução.
A educação diz respeito hoje a todos, todos lhe estamos ligados, porque professores, pais, encarregados de educação, alunos, mas, sobretudo, porque acreditamos, nós, sociais-democratas, nos valores da educação que, por dentro, enriquecem a alma de um povo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com qualquer sistema educativo existiram, existem e hão-de existir sempre imperfeições; temos presentes as dificuldades económicas e financeiras que o País atravessa e que consideramos em grande medida responsáveis por muitos males do sistema educativo português.
Mas não temos, como tive oportunidade de referir anteriormente, a memória curta.
Nós, sociais-democratas, não esquecemos ainda os longos anos em que o ensino serviu para veicular uma ideologia fascista, uma educação antipartidária e antidemocrática. Mas, por outro lado, também não esquecemos o anarquismo e o populismo do período
dito revolucionário e as responsabilidades que o partido - hoje interpelante - teve no período seguinte ao 25 de Abril e durante anos. Lembramos ao Partido Comunista Português a passagem pelo Ministério da Educação de pessoas próximas do PCP, seus militantes ou simpatizantes e que nos deixaram algumas a "heranças".

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

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A Oradora: - Há muito mais, Srs. Deputados, é melhor terem calma!
Recordamos ao PCP que foi nessa altura que se pretendeu imprimir no ensino primário uma só ideologia, que se introduziram nos manuais escolares textos de Fidel Castro, Samora Machel, etc., em vez de Camões.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

A Oradora: - É verdade, Srs. Deputados, e VV. Ex.as sabem-no bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É mentira!

A Oradora: - É verdade! O senhor sabe bem que sim! Eu estava lá e sei! Sendo, como é do conhecimento geral, até perseguidos alunos não afectos ao PCP.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É ridículo e caricato!

A Oradora: - Caricato foi o que os Srs. Deputados fizeram!

Aplausos do PSD.

E caricato, Srs. Deputados, foi também o célebre serviço cívico estudantil, que é da vossa responsabilidade.

Aplausos do PSD.

Quem é que já não recorda o sistema de avaliação de conhecimentos caracterizado pelas passagens administrativas?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Agora não existem?

A Oradora: - Esta, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, foi a política de educação que o Partido Comunista Português, hoje partido interpelante, nos apresentou.
Nós, sociais-democratas, jamais criticaremos por criticar nem cairemos em pessimismos doentios nem seremos demagogos. Antes saberemos criticar construtivamente e dar sugestões para modificar situações que consideramos menos correctas.
Nós, sociais-democratas, defendemos que se siga uma política educativa de consenso nacional, como está, aliás, consignado no Programa do Governo. Não pretendemos impor ideologicamente programas nem temos os objectivos - que outros intimamente cultivam - de transformar a educação num instrumento para impor qualquer poder totalitário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É por isso que nos apraz registar que o Governo, através do Ministério da Educação, tenha feito um despacho para que o Hino e a Bandeira Nacionais fossem respeitados nas nossas escolas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isso é que é uma grande medida!

A Oradora: - É uma medida que não vos agrada, claramente.
De igual modo nos apraz registar a criação da disciplina de Educação Cívica. Porém, Sr. Deputado, acreditamos que os sectores que em 1974-1975 tentaram, através da disciplina de Introdução à Política, condicionar ideologicamente os alunos no sentido totalitário não concordem, obviamente, com esta medida.
Para nós, sociais-democratas, foi um acto de coragem a prioridade dada pelo Governo à institucionalização da via profissional, e não apenas profissionalizante, do ensino secundário, através de um plano de emergência para a reorganização do ensino técnico que permita a satisfação das necessidades do País em mão-de-obra qualificada, bem como a prossecução de uma política de emprego para os jovens.
Todos sabemos que em Portugal se destruiu o pouco que existia no domínio do ensino técnico e que não havia uma formação técnica adequada a uma profissão. Com a implementação dos cursos profissionais de um ano acrescido de meio de estágio - que já está a decorrer - procurou-se uma formação mais acelerada, necessária especialmente em regiões do interior e numa perspectiva descentralizada, que conjuga a formação na escola e nas empresas; com a dos cursos técnico-profissionais de 3 anos dá-se aos jovens um ciclo complementar adequado ao ingresso na vida activa. Mas também neste domínio, como noutros, sabemos que quem destruiu o ensino técnico neste País não poderá estar agora do nosso lado.
Nós, sociais-democratas, não podemos deixar de salientar a colaboração dada pelo Governo, através do Ministério da Educação, ao Ministério do Trabalho e Segurança Social no processo de lançamento da aprendizagem, que se destina aos jovens que já abandonaram a escolaridade obrigatória e por várias razões (entre outras, as sócio-económicas) não podem continuar os seus estudos pela via geral.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nós, sociais-democratas, sabemos que muitas vezes se fazem as coisas previsíveis, não as desejáveis.
Sabemos que o número de escolas é ainda insuficiente e que o nosso parque escolar está degradado. Mas não deixamos de reconhecer os esforços que os sucessivos governos têm vindo a fazer desde 1980, dando prioridade às construções escolares com programas que permitiram que se passasse de cerca de 10 a um número de cerca de 50 novas escolas por ano.
Sabemos que o ensino, na sua globalidade, é ainda demasiadamente teórico e que há que reformular programas e conteúdos, embora consideremos que o ensino técnico-profissional é um marco assinalável na transformação do ensino em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Haja decoro!

A Oradora: - Sabemos que o ensino pré-primário não cobre ainda de uma forma desejável e necessária todo o território nacional, pese embora os esforços desenvolvidos nesta área e que, finalmente, irão traduzir-se no próximo ano no desbloqueamento de mais de 3 centenas de jardins-de-infância, correspondendo assim aos esforços feitos pelas autarquias e que

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não foram até aqui acompanhados pelo Estado por razões financeiras.
Sabemos das deficiências que existem a nível da erradicação do analfabetismo, embora conheçamos o decreto-lei sobre a escolaridade obrigatória, que prevê forças de controlo como o recenseamento e a caderneta escolar além de um esforço prolongado para manter o programa do leite escolar.
Sabemos que não existe ainda a garantia de igualdade de oportunidades que sempre defendemos e pugnámos nomeadamente pela modificação do critério de ingresso no ensino superior, estando embora cientes das dificuldades na resolução deste problema, que se arrasta vão anos.
Sabemos que a formação dos docentes não é ainda a desejável e de há muito defendemos uma formação superior para todos os professores de todos os graus de ensino, embora conheçamos também as dificuldades desta solução, especialmente no que diz respeito a questões orçamentais. Compreendemos, entretanto, o realismo político que presidiu à manutenção do funcionamento e do ingresso nas escolas do magistério primário.
Sabemos que a qualidade de ensino passa por professores com formação adequada e, sobretudo, motivados para o exercício da sua nobre missão; por isso, acreditamos que o estatuto da carreira docente do ensino não superior - que os professores sociais-democratas de há muito vêm reivindicando e em que vêm trabalhando - virá, finalmente, trazer a dignificação da docência e instituir uma verdadeira carreira para todos os professores. Conhecemos o interesse do Ministério da Educação por esta matéria e esperamos que em breve se torne realidade.
Sabemos que a profissionalização em exercício tem de ser rapidamente reformulada, pois não responde minimamente às necessidades do nosso ensino.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sabemos isto e muito mais.
Mas também sabemos que não vem de agora e que este Governo é-o há 1 ano e meio. As coisas são o que são, embora gostássemos que fossem diferentes. Conhecemos as possibilidades que temos, embora não sejam as que gostaríamos de ter. Não faremos, porém, jamais, a crítica pela crítica. Preferimos a crítica construtiva e, sobretudo, somos realistas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A situação crítica que o País vive nos mais importantes sectores da vida nacional exige a atenção, o estudo, a ajuda de todos os portugueses, que se honram de tal nome, e de todos os partidos democráticos que visam o bem nacional. É tempo já de o Partido Comunista Português deixar de atentar, por todos os processos ao seu dispor, fora e dentro desta Câmara, contra a estabilidade política.

Aplausos do PSD e do PS.

É de exigir que o Partido Comunista Português ajude de maneira construtiva o estudo objectivo dos problemas, procure a melhor solução possível, e não faça deles motivo de agitação nas ruas, de perturbação na governação e de atitudes demagógicas e negativas nesta Câmara.
Nós, sociais-democratas, jamais seguiremos por esse caminho.
Estudamos os problemas e proporemos as soluções possíveis e aconselháveis.
Queremos ajudar a geração dos nossos filhos a subir para a vida, valorizando-se no estudo, na sua formação omnímoda e integral, no amor da Pátria, no respeito pelos outros, na preparação de um futuro melhor, embora para isso... não possamos contar com o Partido Comunista Português.

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr.ª Deputada, o intelectual e professor José Augusto Seabra é uma pessoa respeitada como tal. O Ministro da Educação José Augusto Seabra tem cometido erros que nós temos apontado e criticado.
O intelectual José Augusto Seabra merecia uma defesa bem mais adequada do que esta.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito Bem!

Vozes do PSD: - Muito mal!

O Orador: - A intervenção que acabámos de ouvir vai contra tudo aquilo que é aceitável nesta Câmara. Foi uma intervenção de uma intolerância terrível, fruto talvez de frustrações e recalcamentos profundos.
À esquerda, e como tal falo, não pertence dar exemplos nem lições a ninguém. A esquerda fala por si e quando fala tenta fazer entender o que são a tolerância e o diálogo.

Vozes do PSD: - Nota-se!

O Orador: - Esta intervenção foi o contrário da tolerância e do diálogo. A intervenção que acaba de ser feita é uma intervenção que dará seguramente direito à Sr.ª Deputada a um lugar cimeiro na nomenclatura de qualquer país totalitarista.

Protestos do PSD.

O Orador: - Como penso que esta intervenção não traduz o pensamento dos sociais-democratas portugueses, cedo 5 minutos do tempo do meu partido à Juventude Social-Democrata para tentar repor a verdade nestes aspectos.

O Sr. Presidente: - Para responder à interpelação do Sr. Deputado Octávio Cunha, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Deputado, não me senti minimamente ofendida, porque penso que o que o Sr. Deputado disse é uma manifestação clara do síndroma do frentismo de esquerda e nada mais.

Aplausos do PSD.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado César Oliveira pede a palavra para que efeito?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, para o exercício do direito de defesa da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.a a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cada um faz as afirmações que faz. Esta Câmara é uma Câmara política e qualquer um, nesta Câmara, pode fazer a leitura política que entender.
O meu camarada Octávio Cunha fez uma leitura política do discurso da Sr.ª Deputada do PSD. Está no seu legítimo direito, como está a Sr.ª Deputada do PSD no legítimo direito de dizer o que entender da leitura política.
Eu, por exemplo, quero dizer-lhe que a sua intervenção é claramente uma intervenção na lógica da Aliança Democrática, na lógica de reconstrução da AD, posição que o PSD nunca abandonou nem vai abandonar.
Portanto, esta é a minha leitura política, faço-a aqui nesta Câmara e se entender que isto é um aviso à navegação, de facto, é um aviso à navegação.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não diga disparates!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Marília Raimundo.

A Sr.ª Marília Raimundo (PSD): - Sr. Deputado, também não me sinto ofendida, porque isso, para mim, é uma leitura às cegas. E toda a gente sabe, há muito tempo, qual é o meu posicionamento político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Cunha pede a palavra para que efeito?

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Sr. Presidente, eu queria que a Mesa ficasse esclarecida sobre este aspecto: as intervenções que o meu partido faz nesta Câmara não são para ofender ninguém. São intervenções políticas em que nós defendemos os nossos princípios e aquilo em que acreditamos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de esclarecer a Câmara, não a Mesa.

O Orador: - Eu estou a esclarecer que a Mesa achou por bem aceitar por duas vezes os termos utilizados pela Sr.ª Deputada quando dizia que não se sentia ofendida.
Ora, tanto eu como o meu camarada César Oliveira não pretendíamos ofender a Sr.a Deputada. Que isso fique claro. Nós não estamos aqui para ofender ninguém e muito menos os Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Gois.

O Sr. Jorge Gois (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Governo é hoje aqui interpelado em função da política educativa.
E é certo que o sector da educação tem constituído nos últimos tempos um dos domínios em que a deterioração tem sido mais rápida, mais evidente e até mais assustadora.
Mas este acto parlamentar ocorre em circunstâncias estranhas. Não tanto pelo estado a que a educação chegou pela mão do Sr. Ministro Seabra e em conjunto pelo actual Governo mas antes por não sabermos, tendo em conta a situação geral, o ponto a que chegou o relacionamento entre os partidos da maioria e essa nova novela das cimeiras, que veio preencher o vazio da hora de jantar de grande número de famílias portuguesas, se há sequer Governo para interpelar, e, especialmente, se o titular da pasta da educação não deixará de figurar no rol dos personagens quando da conclusão desse absurdo e inaceitável folhetim.
A interpelação sempre valerá, ainda assim, para reflectir sobre a gravidade da situação no sector do ensino e em caso de alteração do Governo, ou do ministro, para clarificar retrospectivamente responsabilidades políticas perante esta Câmara e perante o País.
O que assume uma importância pedagógica recolocando a discussão dos problemas nacionais na sede própria, nomeadamente nesta Assembleia, com a clareza, a transparência e a responsabilização exigíveis, ao invés de aceitar que o poder se reduza aos estados--maiores partidários, longe da fiscalização e do conhecimento do País, e como se São Bento tivesse dado lugar ao Largo do Rato e à Rua de Buenos Aires.
É bem verdade que o sistema do ensino reflete com fidelidade a sociedade em que se integra e que o ensino em Portugal, em larga medida, reflecte os bloqueamentos, as contradições e as incertezas do conjunto da sociedade portuguesa.
A sociedade portuguesa tem vindo a viver uma crise difícil e profunda e é patente que o sistema de ensino, para além dos problemas de ordem meramente conjuntural, debate-se com um rol imenso de questões e de vícios de natureza claramente estrutural.
São aspectos directamente relacionados, já que a educação carece de um quadro de referência e, para além desse, de um quadro de destino, que hoje poucos ou talvez nenhuns consigam precisar.
Entendemos que na educação tão importante é a função de conservação e transmissão de um legado cultural como a de criação das condições indispensáveis à inovação social, mediante a abertura de perspectivas de progresso e transformação da colectividade.
Mas a educação hoje, em Portugal, nem assegura a conservação do substrato patrimonial e cultural da Nação portuguesa nem prepara as novas gerações para enfrentar os desafios da história, despertando o gosto pelo talento, pela inteligência, pelo risco e pela criatividade.

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E duvidamos muito da eficácia do ensino que vem sendo ministrado para garantir a formação geral e o aperfeiçoamento básico do cidadão.
Por outro lado, se é verdade que o sistema criou, desde 1974, um vazio lamentável no domínio da educação profissionalizante, permitindo até afirmar que é o próprio sistema de ensino um dos mais poderosos factores de desemprego juvenil, começa hoje a ser claro que não é a fórmula de ensino técnico-profissional, que durante tanto tempo foi usada como bandeira pelo Sr. Ministro, para nos últimos tempos, e estranhamente, ter deixado de ocupar um lugar relevante nos seus habituais tempos de antena, que permitirá assegurar uma educação para o trabalho e formação profissional.
Porque os currículo são demasiado dispersivos e absorventes, não havendo a apreensão nem de uma experiência técnica nem de uma experiência teórica. Porque os cursos em vigor não têm em geral uma tecnologia actual, caracterizando-se, pelo contrário, por uma clara e preocupante desactualização de meios. Porque cada vez há mais dúvidas quanto a saber se aos cursos introduzidos corresponde mercado de trabalho, nomeadamente quando existe uma óbvia sobreposição com cursos de formação profissional acelerada, a ser ministrados pelo Ministério do Trabalho, e até pelas Forças Armadas, não havendo, como vai sendo infelizmente regra, qualquer articulação interdepartamental. Finalmente, porque cada vez é mais nebulosa a inserção de mais esta experiência pedagógica no contexto global do sistema de ensino.
Não se aceita também que a educação não tenha ganho ainda um estatuto de prioridade nacional, nomeadamente no que respeita aos respectivos meios orçamentais. Sem ignorar a crise, e defendendo a estagnação, se não a diminuição da despesa pública, o que não tem, aliás, ocorrido, como ficou bem patente com a discussão do último orçamento suplementar, o que se exige é a visão nacional de considerar a educação a área privilegiada de investimento, no sentido de que é onde mais profundamente se podem alicerçar as bases do progresso nacional e da modificação da sociedade portuguesa do duplo ponto de vista da mentalidade e das estruturas sociais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São inúmeros os problemas estruturais que afectam o sistema de ensino em Portugal, sendo impossível, por razões de tempo, enumerá-los a todos, diagnosticar todas as situações e apontar princípios e perspectivas de soluções.
Mas se é certo que os serviços centrais do Ministério continuam intocados e intocáveis, na sua burocracia, gigantismo e ineficácia, sem que qualquer medida descentralizadora tenha sido tentada, se é verdade que o ensino politécnico continua a não existir, para lá dos diplomas e das comissões instaladoras, o que não deixa de ser verdade é que os programas continuam a ser o que são e que em matéria de livros escolares todos são penalizados - editores, estudantes e famílias. Que o problema dos professores continua em aberto, nomeadamente no que respeita à respectiva formação, sem que qualquer estatuto tenha ainda visto a luz do dia.
O certo é que os problemas se não resolvem com mais grupos de trabalho, com mais comissões e com mais discursos e intervenções pontuais, exigindo-se um modelo global e coerente que defina metas e objectivos a prazo. No fundo, tudo aquilo que o Sr. Ministro da Educação não foi capaz de fazer.
O que tem muito a ver com a inexistência de uma lei de bases, que o Sr. Ministro considera não ser prioritária, preferindo a política do imediato, do remendo, do casuísmo sem nexo e sem qualquer sentido de projecto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de terminar, gostaria de focar ainda 3 aspectos que assumem particular relevância no momento presente.
O primeiro tem a ver com a questão dos equipamentos. Não se negam as dificuldades e a escassez de recursos, mas é em nome da racionalização e da optimização desses mesmos recursos que importa definir prioridades.
Como continuar a aceitar o sistema vigente, em que o planeamento reside num ministério e a responsabilidade noutro? Como aceitar que apesar da encenação à volta da abertura do ano lectivo haja alunos sem aulas e muitos outros frequentando estabelecimentos sem o mínimo de condições pedagógicas? Quais as novas escolas que irão ser construídas? As da lista distribuída pelo Sr. Ministro Rosado Correia aquando da discussão do orçamento suplementar ou as pretendidas pelo Sr. Ministro Seabra?
E como explicar aos jovens e às famílias a situação de ruptura que se vive nomeadamente na área da Grande Lisboa?
E no tocante à questão da insegurança nas escolas, que inquieta com toda a razão um número cada vez maior de alunos e respectivas famílias, que respostas encara o Ministério, e em geral o Governo? Como aceitar que a frequência de um estabelecimento de ensino envolva tais riscos e comece a perfilar-se como um autêntico acto de coragem? Que país começa a ser este, Srs. Deputados?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma última reflexão referente à situação que se tem vindo a viver na universidade portuguesa, em resultado da portaria que aumentou os preços das cantinas universitárias, em consonância, aliás, e é importante que isto seja dito, com a resolução aprovada em Conselho de Ministros, certamente por cautela do Sr. Ministro Seabra em responsabilizar e vincular todo o Governo, a começar pelo Sr. Primeiro-Ministro e pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
Já tivemos oportunidade, em intervenção proferida nesta Câmara a 16 de Novembro, de expor a nossa posição sobre uma decisão que contrariou o compromisso do Sr. Ministro da Educação com a Comissão Coordenadora Nacional das Associações de Estudantes, para além de fazer tábua rasa da proposta emanada do Conselho de Acção Social do Ensino Superior.
A pressão dos estudantes, das suas associações e, em geral, da opinião pública levou o Governo a suspender tal medida. Fazemos votos de que a suspensão dê lugar à revogação e à implementação da proposta do Conselho de Acção Social do Ensino Superior.
E mais um episódio de desnorte e de falta de capacidade de diálogo. E como sempre sucede nestes casos, à inflexibilidade sucedeu-se inevitavelmente o recuo total e em toda a linha.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gravidade da situação que se vive no sector da educação é angustiante. Foi até possível chegarmos a uma situação em

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que todas as vozes estão de acordo, pelo menos em público - estudantes, organizações de juventude, professores, famílias -, de acordo na reprovação do ministro, do seu estilo e da sua política.
Dezanove meses de ministro Seabra chegaram para agravar as coisas, para verificar um alto grau de incumprimento do estabelecido no próprio Programa do Governo e para revelar que não existe qualquer projecto educativo.
Esta interpelação não assume a natureza de um exame. Porque em 19 meses de avaliação contínua o Sr. Ministro Seabra está claramente chumbado aos olhos da opinião pública, aos olhos do País.
E é por isso que nesta interpelação só há que dizer - basta!

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Dinis Alves.

O Sr. Dinis Alves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Educação: Os estudantes do ensino superior viveram nas últimas semanas momentos de tensão provocados essencialmente pela aprovação e publicação de uma portaria oriunda do Ministério da Educação com o objectivo de engordar os preços das magras refeições servidas nas cantinas e o consequente aumento das bolsas.
A universidade portuguesa, vivendo de há uns anos a esta parte um período de relativa acalmia, soube, com a mesma dose de vigor quanto a de correcção, dizer não à execução de tal portaria.
Uma greve geral com a participação de 97,5 % de estudantes demonstra bem a amplitude da recusa, que teve além do mais a chancela do Conselho de Acção Social do Ensino Superior, com reitores e vice-presidentes dos serviços sociais em sintonia com os estudantes.
Sintomático o facto de todas as principais organizações políticas de juventude terem declarado guerra aberta às intenções do texto ora suspenso, com realce para a Juventude Socialista e Juventude Social-Democrata, organizações de juventude que dimanam dos partidos integrantes do actual Governo.
Tal convergência de posições não poderia ter por base uma mera irreverência de estudantes birrentos e ingratos, como o Sr. Ministro chegou a declarar, subestimando a bom subestimar a força dos estudantes universitários portugueses. E se a portaria se encontra agora de quarentena, bom será que se aproveite a sua letargia para, com frieza e sentido de responsabilidade reflectirmos em conjunto sobre o melhor caminho a percorrer tendo em vista a reformulação global dos serviços sociais universitários.
Que o Ministério da Educação perca uma batalha, menos mal se a razão estava do lado dos vencedores. Mas mau será se uns e outros não souberem aproveitar em conjunto de ilacções várias que esta contenda fez subir à tona. Que assim não seja, e não será o Sr. Ministro a ser declarado persona non grata: o próprio sistema de acção social universitário será declarado sistema non grato; o luto académico transbordará das margens do Mondego. As greves, as manifestações suceder-se-ão, a agitação generalizar-se-á e só não será o dilúvio, porque da agitação das águas emergirá por certo uma nova política educativa e de apoio social aos estudantes.
Actualmente, todo o estudante do ensino superior público beneficia do apoio do Estado, todo o universitário é, mesmo que mitigadamente, um bolseiro. Assim se cumpre o princípio da universalidade traduzido no apoio indirecto a todos os estudantes em geral.
A Juventude Socialista tem, por seu lado, uma visão diversa do Ministério da Educação no que concerne à implementação do princípio da justiça social.
O conteúdo deste princípio esgota-se no apoio directo aos estudantes mais carenciados, sob a forma de bolsa de estudo e isenção de propinas. Só que, em nosso entender não devem ser os estudantes não bolseiros entendidos tout court a arcar com os encargos do subsídio aos mais carenciados.
Recusamos a dicotomia bolseiro/não bolseiro. Na classe de bolseiros encontramos alunos, uns muito, outros razoavelmente e outros pouco carenciados.
Na classe dos não bolseiros encontramos estudantes muito desafogados, desafogados e outros rasando já a fronteira da atribuição da bolsa de estudo.
Não é justo, portanto, que se trate a todos por igual.
Não é correcto que o aumento das bolsas se tenha verificado no passado recente pela diminuição do número de bolseiros, como não é justo que o justo aumento das bolsas seja suportado através do aumento do preço das refeições, servindo a receita advinda do aumento para cobrir os novos encargos resultantes do engordar das bolsas. Em suma, o aumento das bolsas de 7 000 estudantes seria suportado pelo sacrifício dos restantes 70 000.
O parecer da Direcção de Finanças do Ministério da Educação é bem explícito neste capítulo: poderemos concluir que o aumento do valor do preço de refeição para 90$, 95$ ou 100$ proporcionará aos Serviços Sociais uma situação de desafogo financeiro para poderem arcar com o encargo consequente do aumento das bolsas de estudo e alteração das capitações.
Linguagem fria e calculista, colocando no mesmo prato da balança todos os estudantes não bolseiros, desde o mais abastado ao simples remediado.
Para a consecução de uma política de apoio social coerente importa ainda ter em atenção toda uma outra série de factores:
Os sectores dos Serviços Sociais que despendem maior volume de verbas são os refeitórios, bolsas e administração. A verba despendida com a administração é superior a metade da despendida com as bolsas. A administração gasta mais sozinha que a soma dos gastos dos Serviços Médico-Sociais, procuradoria, livraria, infantários, sector gráfico, oficinas, transportes, associações e empréstimos. No entanto, a receita destes serviços é 3,8 vezes superior à da administração.
Perguntamos: não será possível uma contenção nos gastos da administração, de molde a libertar verbas a canalizar para as bolsas de estudo?
Se os Serviços Sociais possuem tarefas específicas que podem ser desempenhadas por estudantes (o que já acontece como excepção), porque não fazer da excepção regra, distribuindo trabalhos pêlos estudantes mais carenciados, passando estes a auferir um ordenado que os liberte em parte da necessidade de uma bolsa de estudo?
Porque não enveredam os Serviços Sociais por uma política mais agressiva na diversificação das suas actividades, alargando o campo das actividades gerado-

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rãs do mínimo de lucro, como aconteceria com a impressão de sebentas e o fornecimento de fotocópias, por exemplo?
E importa que realcemos ainda um outro aspecto. Os Serviços Sociais não apoiam apenas os estudantes. Não são estes os únicos gastadores famélicos das verbas do Estado. Serviços há cujo usufruto é possível também para professores e funcionários, como é o caso dos supermercados e infantários.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Um sistema diferente, e este sim, de verdadeira justiça social importaria na obrigatoriedade da apresentação da declaração de rendimentos do agregado familiar de todo o estudante no acto da matrícula, independentemente de ser ou não candidato a bolseiro.
O montante irrisório e meramente simbólico das propinas actuais poderia ser aumentado, mantendo-se a isenção para os mais carenciados.
O montante das propinas a pagar não seria universal, mas sim estabelecido de acordo com o maior ou menor rendimento do agregado familiar, ou melhor, da respectiva capitação. No quadro traçado o estudante, bolseiro ou não, seria taxado de acordo com a sua capitação, e pagaria mais o mais desafogado, e menos o que vive com maiores dificuldades.
Proceder desta forma é sem dúvida diferente da intenção de taxar indistintamente à boca da refeição o não bolseiro rico do não bolseiro pobre.
A Juventude Socialista gostaria de ver aqui hoje definida pelo Sr. Ministro qual a sua quota de responsabilidade quanto à autoria da Portaria n.° 863-A/84.
E não considera, Sr. Ministro, que a suspensão da mesma, para que se criem condições de efectivo diálogo, é o reconhecimento de que V. Ex.ª não soube ou não quis promover esse diálogo? De tal forma o não quis promover, de tal modo se empenhou na defesa da portaria, que à mesma hora em que o Sr. Primeiro-Ministro assinava a sua suspensão, o Sr. Ministro da Educação defendia acaloradamente o texto em entrevista concedida a um semanário.
Muito mais se poderia dizer sobre esta questão, mas não nos queremos alongar.
Estamos certos de que, depois deste passo em falso, o Ministério da Educação, caso insista na senda do sacrifício pelo sacrifício, saiba ao menos dialogar com os estudantes e com os reitores, tenha na devida conta as opiniões emitidas pelo Conselho de Acção Social do Ensino Superior.
Promovendo um diálogo franco, ouvindo sem sobranceria as propostas dos diferentes parceiros universitários, o Ministério da Educação encontrará por certo a melhor solução com vista à resolução rápida do problema em causa.
Assim o saiba, e assim o queira fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para interpelar o Sr. Deputado Dinis Alves, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com agrado a intervenção do Sr. Deputado Dinis Alves e poderia apoiar muitas das considerações que fez.
Mas a questão que gostaria de lhe colocar é a seguinte: tivemos hoje conhecimento pêlos jornais de um comunicado da Juventude Socialista - que vem citado, por exemplo, no Jornal de Noticias, do Porto -, no qual se acusa a interpelação do PCP de suscitar, facilitar ou obrigar a uma certa solidariedade governamental, isto é, a uma certa unidade governamental, em torno do Sr. Ministro da Educação, quando ele estava com os «patins para andar», usando a linguagem corrente estudantil.
Pergunto-lhe, pois, Sr. Deputado, o seguinte: se, por exemplo, apresentarmos aqui uma recomendação ao Governo ou ao Primeiro-Ministro, no sentido de que o Ministro da Educação seja imediatamente demitido, atendendo a tudo aquilo que o Sr. Deputado disse e isso bastava, o Sr. Deputado subscreverá connosco essa mesma recomendação?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem posta a questão!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dinis Alves.

O Sr. Dinis Alves (PS): - Sr.a Deputada, pelas indicações que tenho, a nossa bancada não tem tempo disponível para lhe responder.

Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Manuel Fernandes.

O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A prevenção da deficiência e a reabilitação devem fazer parte, como componentes integrais e altamente prioritários, de qualquer política nacional, social e económica e de quaisquer planos de desenvolvimento.
Uma comunidade atenta ao bem comum, interveniente na resolução dos problemas da saúde, do desporto, da educação e da cultura, facilitará a gradual e completa integração de um deficiente desde criança até à idade adulta, passando pela via do ensino, dos tempos livres até à integração laborai.
A Constituição da República acolheu estas ideias e expressamente determina que incumbe ao Estado «promover e apoiar o ensino especial para deficientes» [artigo 74.°, n.° 1, alínea h)].
Caberá perguntar: será que este Governo fez algo para que tal objectivo constitucional se concretizasse? Que fez, designadamente, o Ministério da Educação no domínio da educação e do ensino especial?
Vejamos as questões concretas:

Continua por regulamentar a Lei n.° 66/79, sobre educação e ensino especial, que previa, entre outros aspectos, a regionalização dos serviços e um diploma sobre o estatuto dos docentes e de outros profissionais do sector;
Não se promovem os cuidados primários de saúde com vista à prevenção da deficiência, nem o levantamento das deficiências nas primeiras idades, idades essas em que se dão as grandes transformações na criança. Nessa fase, as condições negativas influenciam de uma forma

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decisiva o seu desenvolvimento e a falta de estímulos educativos conduz ao agravamento da deficiência;
Continua por definir uma política global que projecte a educação dos deficientes com vista à sua integração na vida activa;
Não são cumpridos os prazos de entrega dos subsídios às CERCI, provocando deste modo o seu estrangulamento económico.

Por outro lado, continua por definir uma política de formação de docentes e outros profissionais do sector.
Mantém-se um "numerus clausus" apertadíssimo para o ingresso no Instituto de António Aurélio da Costa Ferreira, que especializa os docentes para todo o País (onde só são admitidos por ano cerca de 50), ao mesmo tempo que mais de 2000 docentes estão a trabalhar no ensino especial sem preparação especifica e esperando indefinidamente a sua oportunidade de formação.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - É claro!

O Orador: - Entretanto, o período de sensibilização, que já tinha a insuficiente duração de 3 meses, é reduzido para um período ridículo de 1 semana.
Como se tudo isto já não bastasse, é negada a criação de um quadro próprio de docentes, que continuam em colocação especial, através de destacamentos ou requisições. Desta forma, o Governo nega a estes profissionais a definição de uma carreira compatível, atribuindo-lhes um irrisório subsídio de especialização que varia entre os 300$ e os 800$, definidos por diplomas datados dos anos 40 e 60!
Tudo isto provoca a desmotivação e o afastamento de profissionais experientes, que assim regressam ao ensino regular, provocando-se uma grande mobilidade que se vai reflectir negativamente na qualidade de atendimento e ensino.
A tudo isto acresce ainda que nos últimos anos o Estado não só não tem investido no ensino oficial, como tem incentivado a proliferação de instituições privadas, muitas das quais só podem subsistir com os dinheiros públicos, não havendo, em muitos casos, qualquer controlo das verbas nem da qualidade pedagógica.
Também no sector da educação e do ensino especial é necessário alterar o rumo sob pena de estarmos a hipotecar o futuro de muitos milhares de portugueses. Façamo-lo sem demora, antes que seja tarde!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antas de Barros.

O Sr. Antas de Barros (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: De interpelação em interpelação, de contestação em contestação, se vão consumindo forças, gerando dúvidas, criando descontentamentos e fertilizando o campo onde poderá florescer, se não houver juízo, a tentação de destruir um sonho lindo que nasceu na madrugada de 25 de Abril de 1974: a democracia.
Está na hora de lançarmos um alerta a todos os portugueses para que não se deixem mais manipular por aqueles que, prometendo o céu, mais não têm feito que preparar meticulosamente a nossa entrada no inferno. O povo português, o povo do Portugal real, aquele que trabalha de sol a sol, que quer pão, paz e liberdade, do Norte, do Centro ou do Sul, diz-nos claramente e em crescendo: basta!
E é por isso, Srs. Deputados, que temos que saber encontrar em conjunto o rumo certo, o Norte do progresso, da criação de riqueza, da justiça social, para que não sejamos varridos por alguma lestada destruidora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não há governo, nem ministros, nem alianças, nem coligações que consigam implementar políticas de desenvolvimento em clima de instabilidade constante, de manipulação permanente, de recalcamentos, de confrontos ideológicos e de lutas pelo alcance e posse do poder.
Chegou a hora de dizermos clara e frontalmente às forças antidemocráticas: chega; e, já agora, deixem-nos em paz, que temos de continuar a reconstruir Portugal; já nos chega ter de comer os frutos envenenados das árvores que outros plantaram em tempo oportuno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos consciência plena de que nem tudo vai bem na educação em Portugal. E nem podia ir. É que a partir do início de 1975 foi tamanha a anarquia, a confusão, a balbúrdia que quase destruíram totalmente as estruturas do edifício escolar.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Antes era óptimo!

O Orador: - Foi o rodopio dos ministros da Educação, e, tanto quanto posso recordar, houve de tudo: ministros civis e militares, ministros por 3 meses, por 5 meses, por 1 ano, criando legislação e anulando outra com uma velocidade tão espantosa que certamente fariam as delícias dos espectadores do Grande Prémio do Estoril.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Ainda bem!

O Orador: - Destruir era a palavra de ordem; e a tal ponto se destruiu que os nossos jovens chegam à vida militar desconhecendo os símbolos da Pátria, como sejam o Hino Nacional e a Bandeira de Portugal, à sombra dos quais foram nascendo e interiorizados muitos dos valores que fazem parte da nossa idiossincrasia.

Aplausos do PSD.

Destruiu-se apressadamente o ensino técnico, criaram-se centenas de cursos opcionais, sem um mínimo de preparação dos respectivos professores; escancararam-se as portas das escolas do magistério e das universidades; fizeram-se licenciados a esmo, sem qualquer qualificação que não fosse a ideológica.
Penosos têm sido, de então para cá, os caminhos da reconstrução. Penosos porque as sequelas são enormes, as forças algo diminuídas, o ânimo abalado, mas não vencido. E, como se isto não bastasse, herdámos

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de então para cá um tecido no Ministério cheio de células cancerosas, a necessitar do tratamento adequado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Urge que de uma vez por todas se fechem os rombos e se comece a pôr o barco a navegar. Neste aspecto, justo é realçar a acção de Sottomayor Cardia e Vítor Crespo como os primeiros que tentaram tapar os furos e estancar as águas da confusão.
As populações estão ávidas do verdadeiro progresso, de estruturas novas, organizadas, ponderadas e voltadas para o futuro, já que os alunos que hoje frequentam as nossas escolas serão os homens que governarão Portugal no ano 2000. O interior do País espera com impaciência que lhe seja reconhecido, de facto, o estatuto da interioridade e lhe sejam dadas condições para que os seus filhos não tenham mais de demandar outras paragens, como Coimbra, Lisboa, Porto, consumindo os parcos haveres familiares.
Foi por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que Viseu e o meu distrito, cujas potencialidades e tradições são de todos bem conhecidas, rejubilaram com a abertura da sua Escola Superior de Educação e esperam ansiosos a abertura efectiva do seu instituto superior politécnico.
E aqui cabe uma referência especial para o papel que as escolas superiores de educação haverão de ter e que constituem uma proposta inovadora que irá necessariamente promover a qualidade do ensino infantil e básico em Portugal, como consta no programa preliminar das escolas superiores de educação de Maio de 1978. E cabe também referir que temos de fazer um esforço para formarmos um professor que de base tenha a mesma formação superior, com as consequentes especializações posteriores, como, aliás, acontece com os outros cursos superiores.
E cabe também aqui referir que apenas se pretende, e cada vez mais é essa a vontade da equipa ministerial, dignificar a carreira docente, de que os actuais professores do ensino primário têm sido os heróicos pilares.
É preciso que o ânimo não lhes falte, Srs. Membros do Governo, já que a sabedoria, o engenho e a arte se lhes reconhece.
E disso são prova mais que evidente as dezenas de escolas primárias, preparatórias, secundárias e superiores de educação que por esse Portugal além foram construídas. Que o negue quem puder ou ousar. Poderá alguém de boa fé e pés assentes no chão contestar o enormíssimo esforço que tem sido feito em Portugal desde 1980 no campo da educação, com falhas que se reconhecem e têm de ser corrigidas para o dotar com novas e modernas estruturas voltadas para a Europa a que queremos pertencer de pleno direito?
Temos hoje universidades em Braga, Porto, Aveiro, Coimbra, Lisboa, Évora, Faro, Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada. Existem institutos universitários, criados e a funcionar, em Vila Real e Covilhã. A rede de estabelecimentos de ensino superior politécnico abrange Bragança, Porto, Viseu, Guarda, Coimbra, Castelo Branco, Leiria, Tomar, Santarém, Setúbal, Faro e Funchal, alguns dos quais a implementar em breve e outros já a funcionar. Completou-se a construção dos edifícios para as Escolas Superiores de Educação de Leiria, Porto e Castelo Branco.
Sendo o Ministério da Educação o mais sensível de todos, por no seu bojo caberem os problemas económicos, políticos e sociais, já que tem a ver com os pais, os filhos e os professores e chega a todos os caminhos deste Portugal com 846 anos de história, compreende-se, que, por isso mesmo, seja sempre o mais atacado e a forma mais directa de se malhar no Governo por inteiro. É isso, Srs. Deputados, o que se pretende, e nada mais.
Assim, temos de fazer um enorme esforço, todos nós, Srs. Deputados da fatia democrática, para salvarmos este país, prenhe de importantes valores morais e culturais que outros tentaram destruir e ainda tentam, mas que não conseguiram nem conseguirão jamais.
Agora é tempo de arregaçar as mangas. Como afirmou Francisco Sá Carneiro, "acima dos partidos está a democracia e acima da democracia está Portugal".

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.º Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE) - Sr. Deputado Antas de Barros, o meu partido não dispõe de tempo, mas foram nos concedidos mais 5 minutos. Assim, queria apenas perguntar-lhe, já que tenho uma informação diferente em relação à sua intervenção, quantas Escolas Superiores de Educação e quantos Institutos Superiores Politécnicos estão a funcionar. Há quanto tempo foram nomeadas as comissões instaladoras respectivas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Antas de Barros.

O Sr. Antas de Barros (PSD): - Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, tinha muito prazer em discutir com V. Ex.ª a questão que me colocou mas, pela informação que tenho do meu partido, não disponho de tempo.

O Sr. Rogério Pinho (PCP): - Aí está a resposta adequada para quem não sabe o que responder!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa.

A Sr.ª Helena Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É com justificada apreensão que se assiste a duas interpelações sobre política educativa no espaço 6 meses.
É com justificada apreensão que quase todos os dias somos confrontados com críticas sobre a situação escolar do nosso País, através dos órgãos de comunicação social, e assistimos a manifestações públicas de desagrado sobre determinadas medidas tomadas pelo Ministério da Educação.
Se a memória não nos falha, constatamos que nada disto é inédito e que estamos perante situações que não trazem consigo qualquer novidade.
Aqueles que, pelas suas funções, têm estado mais ligados a este Ministério sabem as dificuldades que se deparam na gestão de uma casa tamanha. Nunca se consegue tê-la arrumada!

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Além disso, este é talvez o Ministério mais criticado porque dele todos falam, dele todos se queixam, porque a todos atinge: alunos, professores, funcionários, pais, em suma o País.
Mais, apesar das tentativas de desconcentração e de descentralização que se vêm ensaiando há anos, em regime experimental, mantêm se as suas características demasiado centralizadoras.
É efectivamente um Ministério difícil de governar. Não há períodos de pausa nem de descanso, ou por que é altura de exames, ou de colocação de professores, ou de matrículas ou, e especialmente, porque é altura de se iniciar o ano lectivo.
E todos queremos, já não digo o melhor, mas o estritamente necessário aos nossos filhos e sobretudo ao País.
Mas este mesmo país tem que ser informado a tempo e a horas sobre as dificuldades que surgem, sobre os atrasos com que não se contava, sobre as razões por que falta o pessoal de apoio, qual a justificação por que não se consegue montar um regime de segurança nas escolas, etc. Mas tem que ser informado, Sr. Ministro, nacionalmente, da situação real, do que se fez e do que não se conseguiu e mesmo do que não se fez e porquê.
Mas não nos parece ter sido esta a atitude da sua equipa, no início do ano lectivo, quando se apresentou ao País, na televisão, a declarar que a situação estava praticamente normalizada.
Ora, de acordo com dados que nos foram fornecidos posteriormente pela Sr.ª Secretária de Estado-Adjunta e pelo Sr. Ministro, a realidade era bem diferente.
Será que nessa altura, o que seria lamentável, ainda não estava feito o ponto da situação?
É que na primeira semana de Outubro apenas 14% das escolas preparatórias e secundárias abriram totalmente e em meados do mesmo mês cerca de 80 estavam por abrir e outras tantas só tinham conseguido uma abertura parcial.
E em princípios de Novembro, o que é grave, ha via 25 000 alunos sem aulas e, o que é mais grave, mais de uma dezena de escolas sem data prevista para abertura e, mais grave ainda, sem hipótese de solução.
Mas concretizemos com alguns exemplos:
Há razões, e leram-se no jornal, por que a Escola Preparatória do Pinheiro não tem alunos inscritos: os postos de telescola das redondezas não foram extintos no devido tempo. Será que os pais e as autarquias foram devidamente esclarecidos? Pode se permitir que nesta data esteja uma escola sem alunos, com pessoal, e com postos de TV a funcionar com os alunos que deviam estar naquele estabelecimento de ensino directo?
Há escolas, como as Preparatórias de Ribeirão e Forjães, com menos de 100 alunos, enquanto nos grandes centros urbanos há 3000 e mais alunos em escolas dimensionadas para metade!
Como funcionou a rede escolar? Como foi feito o inventário de carências? Respeitaram-se prioridades?
Faia se de turmas com 30 e 40 alunos. É verdade que existem!
E aquelas de que não se fala e que têm 15 e menos? Veja-se o que acontece com os cursos nocturnos e com as turmas do ensino técnico profissional.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): Muito bem!

A Oradora: Não se monta um sistema de segurança eficaz. Mas gastam se centenas de milhares de contos em material danificado e não se dá aos alunos a escola a que têm direito.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): Muito bem!

A Oradora: Onde está a coerência de tudo isto?
Efectivamente, a muitas das questões que lhe têm sido postas, o Sr. Ministro pode responder que lutou com falta de verbas, o que o levou a solicitar um orçamento suplementar bastante avultado.
Não há dúvida que à educação deve ser atribuído o máximo de verbas possível para fazer face aos problemas existentes.
Dados, porém, os condicionalismos da crise económico financeira mais se impõe ainda a necessidade de um escalonamento de prioridades e de uma rigorosa gestão das verbas atribuídas.
Terá sido esta a política adoptada?
Por exemplo, foram tomadas medidas restringindo as deslocações?
Nós até somos de opinião que há problemas que se resolvem mais depressa no próprio local. Mas trata se de resolver e não de ir visitar, auscultar ou prometer.
Por que não aliviar a estrutura pesada e onerosa com que foi lançado o ensino técnico profissional? Grandes comissões, professores de psicologia contratados para trabalhar a par ou em vez de professores com o curso de orientação profissional e que nas mesmas escolas estão subaproveitados, gratificações, reduções de tempo lectivo, etc.
A verdade é que, Sr. Ministro, lançou o ensino de que o País precisava, aliás, mérito que ninguém ousará recusar-lhe, dando assim cumprimento ao mencionado no programa do Governo, aprovado nesta Assembleia.
Conseguidos os fins em grande parte por um empenhamento pessoal do Sr. Ministro, serão aceitáveis alguns dos meios utilizados?
Uma mais eficiente gestão dos recursos disponíveis, bem como a sensibilização de todas as entidades en volvidas não teriam possibilitado, por exemplo, a criação dos já tão falados 1000 jardins de infância que se encontram prontos e equipados pelas autarquias, sabendo-se que existem perto de 500 educadoras de infância sem colocação?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): Muito bem!

A Oradora: Não seria isso dar um grande passo no combate ao insucesso escolar?
E que medidas foram tomadas para transformar a profissionalização em exercício num processo mais realista, menos pesado para as escolas, para os professores e para o Estado?
Grandes culpas se podem atribuir ao número cada vez maior de equipas que têm passado pelo Ministério da Educação, dando origem a um trabalho descontínuo e a uma perda de tempo irreparável.
Pode, evidentemente, dizer-se que a ausência de uma lei de bases do sistema educativo, traçando as grandes linhas orientadoras da política educativa tem contribuído para o avolumar de experiências avulsas e de opções descoordenadas.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista já apresentou nesta Assembleia o seu projecto que espera

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ainda ver debatido e votado na presente sessão legislativa, o que irá permitir a implementação de uma política educativa coerente que possibilite às crianças, jovens e adultos terem a educação que merecem, dentro dos condicionalismos existentes, e adaptada à realidade do nosso país.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): Vamos a isso!

A Oradora: Naturalmente, o reconhecimento das dificuldades e da urgência de soluções para muitos dos problemas básicos da educação e a vontade que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista exprime de tudo fazer no sentido da superação de tais dificuldades tem um pressuposto fundamental: os socialistas sempre agirão no quadro de uma inequívoca solidariedade política no seio da maioria, em franca cooperação com o governo e manifestando uma disponibilidade para o diálogo recíproco, visando o aprofundamento construtivo de todos os problemas com a equipa do Ministério da Educação.
E este é um trabalho que deve ser prosseguido com firmeza, sem submissões à lógica maximalista das oposições e sem tibiezas perante o significado destrutivo - sempre destrutivo - do comportamento político do PCP.
A tarefa é desta maioria. A responsabilidade é desta maioria. Dentro dela e por ela, o PS não desistirá de prosseguir o seu trabalho a bem da Educação.

Aplausos do PS e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante um debate extremamente sério e uma situação do País tão ou mais séria do que o debate em curso.
Estamos perante uma maioria que tem a obrigação de governar o País em solidariedade, como é óbvio.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - E desgoverna!

O Orador: - O que está aqui em causa é uma interpelação ao Governo, à política de todo o Governo em matéria de Educação, desde o Primeiro-Ministro até a outros Membros do Governo.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É exacto!

O Orador: - Através do Ministério da Educação - com o qual, obviamente, todo o gabinete Ministerial é solidário -, está o Governo a ser interpelado. Não há aqui parcelas estanques, no seio do Governo.
O PSD faz uma única pergunta à direcção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista: será esta a solidariedade que reclamam?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Valente Rosa pretende responder?

A Sr.ª Valente Rosa (PS): - Sr. Presidente, quanto tempo tem o PS disponível?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o PS dispõe unicamente de 2 minutos.

A Sr.ª Valente Rosa (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não estou, de maneira nenhuma, de acordo com o Sr. Deputado José Vitorino. Aliás, chamo a sua atenção para este parágrafo que tive o cuidado de ler, com a ênfase que me foi permitida:

Os socialistas sempre agirão no quadro de uma inequívoca solidariedade, no seio da maioria e em franca cooperação com o Governo, e manifestam uma disponibilidade para o diálogo recíproco, visando o aprofundamento construtivo de todos os problemas com a equipa do Ministério da Educação, qualquer que ela seja.

0 Sr. Luís Saias (PS): - Muito bem!

Aplausos do PS.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - E o orçamento suplementar?

O Sr. Presidente: Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

0 Sr. José Vitorino (PSD): - Obviamente, que uma equipa é uma equipa: começa no primeiro-ministro e vice-primeiro-ministro e acaba no secretário de estado. A solidariedade não se enuncia, pratica-se, o que não tem acontecido aqui.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho, que dispõe de 10 minutos cedidos pela UEDS e pela ASDI.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria agradecer à UEDS e à ASDI a concessão de tempo, permitindo deste modo viabilizar a minha intervenção nesta Câmara.
Queria, porque houve um diferendo entre o Sr. Deputado Octávio Cunha e a Sr.ª Deputada Marília Raimundo, sublinhar que o facto de a JSD ter várias vezes opiniões diferentes do PSD não pode pôr em causa, em circunstância alguma, a unidade do partido.
Em segundo lugar, queria dizer que a minha intervenção não constitui nenhuma desautorização, ou sequer em sentido contrário, daquela que a Sr.ª Deputada Marília Raimundo aqui produziu, que considero uma social-democrata da primeira hora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queria também saudar o Sr. Ministro da Educação, com quem desde há muito tempo não tenho oportunidade de discutir os problemas da Educação.
Queria, a este propósito, ressalvar o respeito e a admiração que sempre nutrimos pelo perfil cultural e intelectual de José Augusto Seabra. Não esquecemos, porém, que aqui sentado não está o homem intelectual, mas o governante e é nesse sentido que nos iremos pronunciar.
Governante de quem muitos pedem a cabeça e talvez seja essa uma, porventura a não mais importante, motivação política do partido interpelante. Contudo, isso sugere-nos uma outra reflexão: O que é uma interpelação parlamentar? O que é que ela deve ser no quadro institucional e constitucional?

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Para nós é claro que, no plano institucional, a Assembleia da República pronuncia-se sobre a queda global do governo através de um procedimento próprio, que á a moção de censura. Mas a demissão e a nomeação de ministros, como é sabido, é da competência do Sr. Primeiro Ministro.
A interpelação, no nosso entender, deve ser entendida como a avaliação, por parte da Câmara, da forma como o Governo está a interpretar o seu próprio Programa e, eventualmente, apresentar sugestões no sentido de lhe corrigir o rumo. É neste sentido uma contribuição positiva e correctora, de que gostaríamos de passar a fazer algumas observações.
Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a interpelação não é um exame. O Sr. Ministro da Educação não vai ser classificado pela forma como respondeu ou responde aqui, e neste momento, nesta
Câmara. Sem dúvida na classificação final da actividade do Sr. Ministro da Educação teremos também em boa conta ou numa outra conta aquilo que se tem feito na gestão do seu Ministério.
Diríamos talvez que o Governo, em particular o Sr. Ministro da Educação, pode contar com aquilo que não quer conceder aos estudantes que pretendem ingressar no ensino superior. Contarão connosco não com um exame circunscrito na altura de uma interpelação mas com uma avaliação contínua, severa, mas leal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ainda tive a ingenuidade de pensar que valeria a pena fazer um discurso muito pela positiva, definindo grandes traços, numa filosofia do sistema educativo que deveríamos ter. Creio que não tenho tempo para o fazer, tendo em conta, principalmente, o ambiente geral desta interpelação e em que tal poderia parecer deslocado. Até porque concordamos com praticamente tudo o que o Programa do Governo prevê. Importa, pois, expressar as
discordâncias quanto à forma como esse Programa foi traduzido por actos do Executivo e questionar do porquê do seu incumprimento em diversas áreas.
E, Sr. Ministro, porque estamos numa interpelação sobre política geral - embora mais vocacionada para as questões de Educação -, irá falar-se em política educativa, na política da juventude e de investigação científica, responsabilizando o Governo no todo, aqui representado pelo Ministro da Educação.

É lugar comum dizer que o desenvolvimento educativo do povo condiciona a sua prosperidade material, cultural e humana. E é facto que são os países mais desenvolvidos os que mais investem na educação.
Já outros, durante estes 2 dias, com maior brilhantismo e autoridade que eu, se pronunciaram a este propósito. Creio que um dos problemas maiores com que a sociedade portuguesa se defronta é o papel secundarizado e minorizado que a educação tem dentro das nossas preocupações: senão vejamos a questão das prioridades.
Já o Sr. Deputado César Oliveira o referiu, hoje ou ontem, a propósito da questão das verbas do Ministério da Defesa. Nunca se questionou sobre as prioridades do desenvolvimento e atribuição das verbas do Orçamento do Estado.
A questão ou agendamento da lei de bases ou outras matérias de educação ou os tempos de debate com que estamos constrangidos e que levam a que este momento fale com tempos cedidos por outros partidos são muito lisonjeiras para a forma como todos nós inclusive esta Câmara tem encarado as questões da educação.

O Sr. César Oliveira (UEDS): Muito bem!

O Orador: Recordo que uma delegação desta Assembleia, alguns meses atrás, foi a Madrid em deslocação oficial. O Sr. Presidente das Cortes de Madrid dizia que estavam a discutir a Lei de Bases do Sistema Educativo Espanhol. Com todas as inscrições, nas Cortes, provavelmente, o debate seria superior a 2 meses. Na altura, questionei-me se na Assembleia da República fôssemos discutir a lei de bases, que limitações de tempos e que tempo é que, nos critérios da avaliação política, saberíamos dar a tão importante questão, que condiciona inevitavelmente o nosso futuro.

O Sr. César Oliveira (UEDS): Muito bem!

O Orador: A ligação ao desenvolvimento do País, à formação e à valorização dos cidadãos leva a questionar sobre a ligação do sistema do ensino com o desenvolvimento do País, a valorização dos recursos humanos, a projecção para a frente, sabendo se que qualquer reforma do sistema de ensino não tem reflexos a curto prazo, mas pelo menos 10 anos após a sua introdução.
É, pois, nessa linha que temos de interrogar o Governo em matéria do sistema educativo, no sentido de saber que resposta tem dado às principais orientações de carácter geral que definem o seu próprio Programa. Poderei citar as assimetrias regionais, a justiça social e a integração na CEE.
Quanto à Lei de Bases do Sistema Educativo, o Sr. Ministro deixou o campo aberto a esta Câmara e apenas disse que só em último caso é que o Governo tomaria a iniciativa. Porém, referiu-se à procura de um grande consenso nacional como intenção política do Governo, pelo que pergunto se não deveria também caber um papel mais interventivo ao Governo submetendo uma proposta de lei e promovendo, com mais meios - que tem - na Assembleia da República os esforços tendentes à criação desse consenso.
Quanto à questão dos Serviços Sociais Universitários e do preço das refeições - à laia de resposta ao Sr. Deputado Paulo Areosa, quando referiu que eventualmente a maioria haveria recuado nesse particular - devo dizer que foi a maioria, pela voz dos Srs. Deputados Luís Monteiro e Laranjeira Vaz, que nesta mesma tribuna pediu ao Governo para recuar em relação a uma portaria, que pela primeira vez e pela nossa voz aqui foi criticada por ter algumas lacunas e incorrecções.
Quanto à questão do ingresso no ensino superior, iniciativa comunicada formalmente a esta Câmara, através da Comissão Parlamentar de Educação, pelo Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, devo dizer que é um facto que existem disparidades natas no ensino secundário entre o Norte e o Sul, o Litoral e o Interior e, eventualmente, mais algumas que não têm tanto a ver com as assimetrias de desenvolvimento ou regionais.

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Porém, essa questão será tão relevante ou tão determinante que podemos condicionar o ingresso e o acesso ao ensino superior apenas pelo exame de admissão? Temos dúvidas que assim seja e até temos dúvidas que uma matéria desta importância possa ser constitucionalmente legislada só pelo Governo. Depois de um debate que queremos que seja mais detalhado na Comissão Parlamentar de Educação, poderemos mesmo admitir a apresentação nesta Câmara de uma iniciativa legislativa sobre essa matéria.

Vozes do PSD e do PS - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao ensino técnico-profissional que garantias de saída pensa o Ministério da Educação que são susceptíveis de ser dadas a todos os estudantes que optaram por este tipo de ensino?
O ensino politécnico é outra saída necessária para a acentuação da tónica e do vector profissionalizante em relação à vida activa no ensino. O que é que vai acontecer ao ensino politécnico? Vai ou não continuar o processo já iniciado há alguns anos?
O Sr. Ministro teve ocasião de referir, com contornos que merecem a nossa concordância e o nosso aplauso, a política de desenvolvimento do ensino juvenil. No entanto, em relação a esse particular, gostaria de saber como é que vai ser a nova lei orgânica do FAOJ, se é que ela vai sair?
Em relação à atribuição de subsídios às AE (Associações de Estudantes) - aliás, na linha das observações que o Sr. Deputado Laranjeira Vaz fez a propósito de subsídios ao FAOJ -, e a partir do momento em que o Ministério da Educação, com uma autoridade que ninguém discute, concede subsídios às associações de estudantes, como é que elas podem ficar retidas por determinações de outros departamentos governamentais, nomeadamente da Secretaria de Estado do Orçamento? O Governo é colegialmente responsável e tem de assegurar que as AE não poderão ser estranguladas economicamente por disposições que não podem merecer a nossa concordância.

Vozes do PSD: Muito bem!

O Orador: - Quanto à liberdade de ensino, concordamos na essência com tudo o que o Sr. Ministro disse. Assegurar a liberdade das opções é uma obrigação do Estado democrático.
O Sr. Ministro disse que o Governo teria uma política de juventude depois de falar com as organizações de juventude. Gostaria, pois, de lhe chamar a atenção para o seguinte exemplo: na República Federal da Alemanha o Ano Internacional da Juventude obteve uma dotação extraordinária que foi posta à disposição das organizações de juventude. E em Portugal o que é que se faz? Cria-se mais uma comissão junto do Governo para preparar grandes manifestações para comemorar o Ano Internacional da Juventude. Se o Governo quer assumir directamente a tutela destas organizações, por que é que não as atribuiu à Comissão Interministerial da Juventude, que já estava constituída? Aliás, houve um Sr. Deputado da oposição que disse que esta Comissão era constituída por certas pessoas que no tempo de antena da Televisão se tinham pronunciado contra a política do Governo. Pensei que a oposição pudesse questionar
o facto de o Governo nomear para o Conselho Consultivo pessoas que fossem excessivamente próximas dele. Admirei-me porque, pelos vistos, a oposição criticou exactamente o contrário.
O facto de o responsável do ensino do português no estrangeiro ter sido demitido significa uma mudança de política? Se assim for, em que sentido?
As organizações de juventude, esbatendo diferenças que as dividem, conseguiram, num grande esforço de consenso, reunir-se à volta de uma comissão que está a surgir, que é a Comissão para o Conselho Nacional de Juventude. Que apoio pensa o Governo dar a esta matéria?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para concluir a minha intervenção, gostaria de dizer que compreendemos, mau grado a nossa impaciência natural, que não se pode fazer tudo num dia e até podemos
compreender que se trabalhe mais devagar se nos explicarem a razão e apontarem os obstáculos.
Porém, o que não será sério é esperar que a Câmara e o País assistam sem informação à passividade e à lentidão nas tomadas de decisão. E menos se pode esperar que uma organização de juventude que se preze possa sustentar politicamente um Governo que não restitua a esperança à juventude. Para isso demos lealmente um prazo e na devida altura falaremos.

Aplausos do PSD e do PS.

0 Sr. Presidente: Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Paulo Areosa e Jorge Goes. Porém, devo informar estes Srs. Deputados de que o PSD já esgotou o tempo de que dispunha e, por conseguinte, o Sr. Deputado Carlos Coelho não poderá responder.

O Sr. Paulo Areosa (PCP): - Nesse caso prescindo, Sr. Presidente.

0 Sr. Jorge Goes (CDS): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar cede 1 minuto do tempo que ainda dispõe para que o Sr. Deputado Carlos Coelho possa responder.

0 Sr. Presidente: - Então faça favor de formular o pedido de esclarecimento, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Goes (CDS): - Sr- Presidente, Srs. Deputados: Este debate tem sido aquilo que tem sido, não houve ainda uma voz que viesse a público nesta Câmara durante esta interpelação defender a política do Sr. Ministro da Educação. E, para cúmulo de tudo, aparece agora um Sr. Deputado da JSD também com um discurso que enferma de uma tonalidade claramente crítica.
Esse Sr. Deputado começa por dizer que desde há muito que não tem oportunidade para discutir com o Sr. Ministro os problemas da educação, começa por distinguir no Sr. Ministro a faceta de ministro e de intelectual, distancia-se em relação ao incumprimento do Programa do Governo, faz uma série de críticas pontuais, nomeadamente em termos da portaria do ingresso do próprio ensino técnico-profissional, da política do FAOJ e do subsídio às associações de estudantes.
Sr. Deputado Carlos Coelho, a pergunta que lhe quero formular
fá-la-ei em nome da clareza e da pró

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pria ética política: muito claramente, e em termos muito simplistas, qual é a posição da JSD face ao Sr. Ministro? Apoia o ou não, nomeadamente à luz de um anúncio recente feito pela JSD nesta Assembleia, em que concedeu ao Governo um prazo de 6 meses para mostrar aquilo que valia? O prazo está esgotado. Ora, há ainda apoio ou já não há apoio? Como é que a JSD articula, nomeadamente, a posição que veio veicular nesta Assembleia com a sua responsabilização a nível dos centros de decisão do Governo, nomeadamente em termos de gabinetes ministeriais e de outros órgãos governamentais?
Faço esta pergunta em nome da clareza, da ética e de uma época que não deve deixar de estar presente, especialmente por parte de quem representa aqui uma geração mais nova, e que tem de se perfilar na política de uma outra forma, até para ter a legitimidade para tentar trazer aqui um outro discurso.
Não será esta forma de fazer política, nomeadamente da banda da JSD e do PSD, que acaba por explicar aqui cenas caricatas, como aquela a que temos assistido durante esta interpelação e em que tem sido possível ao Partido Socialista, partido maioritário
desta coligação, distanciar-se claramente da política ministerial no tocante à educação? Isto será um episódio restrito que só se verifica hoje ou será a mera sequência de outras situações parlamentares?
O Partido Socialista mostrou durante este debate uma forma de estar na maioria e uma forma de estar infelizmente, na política em Portugal.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, além do minuto que o CDS lhe tinha concedido para V. Ex.ª poder responder aos pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado César Oliveira também lhe
ofereceu 1 minuto do tempo elástico da UEDS. Portanto, dispõe de 2 minutos para responder.

Risos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado Jorge Goes, em primeiro lugar gostaria de corrigir uma afirmação que V. Ex.ª fez quando disse que o prazo concedido pela JSD ao Governo já estava esgotado. Porém, com a ética que teve ocasião de me assinalar e balizar, o Sr. Deputado concordará que é um prazo muito elástico. O meu colega, Sr. Deputado Pedro Pinto, fez uma intervenção referindo se ao prazo de 6 meses em Novembro passado, pelo que creio que esse prazo terminará em Abril do próximo ano, isto é, se não estou em erro e se ainda sei fazer contas.
Em relação à intervenção que produziu e ao distanciamento que V. Ex.ª encontrou em relação à política do Governo, devo dizer que V. Ex.ª não está a perceber muito bem qual é a função de uma interpelação ao Governo. Se eu fosse fazer um discurso laudatório ou elogiar as atitudes do Sr. Ministro, certamente que não o faria no período de uma interpelação ao Governo.
Tentei definir e porventura com insucesso, uma vez que V. Ex.ª não entendeu o meu entendimento de uma interpelação ao Governo, sobretudo por parte da maioria, a fazer avisos à navegação, servindo-me dos pontos em que poderemos ter uma atitude mais crítica em relação ao Sr. Ministro, o que não significa que tudo aquilo que o Sr. Ministro tenha feito seja de reprovar ou seja uma atitude negativa em relação à qual devemos tirar o nosso apoio.
Quanto à preocupação manifestada por parte do Sr. Deputado no sentido de saber se ainda apoiamos ou não o Sr. Ministro da Educação, deverei dizer que para nós a questão da Educação é uma questão global do Governo. Portanto, e como tive ocasião de dizer, no fim dos 6 meses, que através de uma intervenção tivemos oportunidade de conceder ao Governo para resolver os problemas relacionados com a educação, conversaremos sobre o suporte político que a JSD, como uma organização política de juventude responsável, poderá ou não dar a este Governo.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Educação.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Educação (Maria Helena Carvalho Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Do texto da interpelação ao Governo decorriam 13 ou 14 questões, agora acrescidas com mais uma enorme série de perguntas pontuais. Entre ontem e hoje é impossível somar a série de questões a que haveria que responder pontualmente. Portanto, pelas limitações de tempo que já são conhecidas, tentarei sistematizar ou responder com objectividade e seriedade de propósitos, agrupando essas questões em apenas 5 áreas, dentro da minha área de competência.
Essas questões serão as seguintes: o insucesso escolar, que é simultaneamente o primeiro ponto da interpelação e corresponde nas suas linhas gerais e à sua intenção ao primeiro ponto do Programa do Governo; quanto à segunda questão tentarei falar da abertura dos anos escolares; a terceira questão diz respeito ao problema da juventude; a quarta questão refere-se à Lei de Bases do Ensino e, se tiver tempo, acrescentarei qualquer coisa que não foi perguntado, mas que me parece importante aliás, foi ligeiramente abordado numa das últimas intervenções, que é o problema do ensino do português no estrangeiro.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Junho de 1984 dizia o Sr. Ministro de Estado, a encerrar a interpelação à política da educação, que o Governo tinha "o exacto conhecimento da situação" e que estávamos "justamente apreensivos com ela". E fazia ele próprio a síntese de carências, não ignorando as dificuldades reais existentes na educação pré-primária, na educação especial, na escolaridade obrigatória, no ensino do Português no estrangeiro, na formação dos professores.
Sem pessimismos, mas com a sua forma acutilante de questionar os problemas, deixava a ideia de todo um País a construir, de toda uma política de educação a implementar. E tinha, com certeza, razão. Não é impunemente que ainda existe em Portugal uma taxa de analfabetismo que ronda os 17 %, embora decrescendo sensivelmente de ano para ano, com nítidas diferenças por grupos etários tendencialmente diminuindo nas jovens gerações, mas ainda com bolsas que - ultrapassam os 20 000 analfabetos no grupo dos 15 aos 24 anos, com oscilações de interessante análise sociológica, mas que têm comido ao Orçamento do Estado parcelas da ordem dos 200 000 contos anuais.
A formação e a profissionalização dos docentes tem sido uma tarefa lenta e com custos de vária ordem,

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mas atingiu no ano passado a meta dos 50 % e temos agora quase
60 % de professores profissionalizados o que não quer dizer que todos estejam colocados nos sítios certos pois dos lugares criados para efectivos nas escolas preparatórias, de 15 058 só 12 917 foram ocupadas, havendo um "excedente" de profissionalizados de
1 181.

Serão suficientes estas duas questões para, se houvesse dúvida, nos apercebermos que não é fácil nem rápido acertar as coisas da educação.

Por isso, uma interpelação em Junho feita pelo MDP/CDE e outra em Dezembro pelo Partido Comunista Português podem apenas ser entendidas como o reflexo do fogo em que o Ministério da Educação tem sido mantido, até por que se outra interpelação não houve em Setembro foi por que o bom senso de alguns deputados o impediu.

Todos sabemos e os interpelantes também - que a educação não se constrói nem se altera em períodos de 3 meses e que só a médio ou a longo prazo se podem fazer avaliações de política educativa. A que o Ministério da Educação delineia neste momento é a que consta do Programa do Governo, aprovado nesta Assembleia e para ser executada durante uma legislatura. Ainda em Junho eram referenciados os números de salas de aula e de escolas necessárias, numa ordem de grandeza aparentemente superior às nossas capacidades de resposta. Pois mesmo sem "planos de emergência" foi possível, com muito esforço, ao Ministério do Equipamento Social e ao Ministério da Educação, aceitar o desafio de abrir o ano escolar dentro das datas normais, informando consecutivamente os alunos, os pais e os professores do evoluir da situação, lutando ainda contra a maré de pânico que muitos órgãos de informação tentaram estabelecer junto das famílias.
0 Ministério da Educação não esperava grandes dificuldades no ensino primário e no ensino preparatório, até porque os fenómenos naturais da demografia portuguesa começam a indiciar uma diminuição de frequência nesses ensinos, embora a situação não
esteja perfeitamente equilibrada numa relação população/escola, pela apetência natural à escolaridade aumentada por parte de novos extractos populacionais.
Mas o mesmo não aconteceu no ensino secundário. E neste ensino os problemas vão manter-se nos próximos anos. São os números em relação com as capacidades orçamentais - e até empresariais que nos aconselham a não ser optimistas. Referindo apenas os 2 últimos anos - 1983 e 1984 - houve um aumento de matrículas no ensino secundário da ordem dos 32 000 alunos em 1983 e 31 000 em 1984. Isto é, admitindo os números como uma globalidade, sem ter em atenção aumentos regionais e diversificados, seria necessário, só para estes novos alunos, ter construído cerca de 20 grandes escolas o ano passado e mais 20 grandes escolas no presente ano. E o equipamento exactamente para estes alunos de um ensino mais exigente? E os professores? E a escola primária? E o ensino preparatório? Na verdade, aquilo que o Ministério da Educação, juntamente com o Ministério do Equipamento Social, tem em execução neste momento são 71 escolas a nível nacional, das quais cerca de 20 estão a ser construídas numa segunda fase.
Apesar de todos estes problemas conjugados e dando resposta a uma exigência cada vez maior relativamente às questões de educação, pode reconhecer-se que, mercê de um grande empenhamento de
funcionários, de directores gerais, de conselhos directivos, de autarquias e dos governadores civis, foi possível até 8 de Outubro abrir para cima de 80 % de escolas em todos os ensinos e em todo o País.
Verifiquei há pouco, por uma intervenção produzi da pela Sr.ª Deputada Maria Helena Valente Rosa, que estes meus números precisam de ser explicados. Eles correspondem à análise sistemática, dia a dia, feita pelos serviços centrais do Ministério da Educação, com a ajuda e com todas as disponibilidades de meios possíveis pela Inspecção Geral do Ensino, que desde as vésperas do dia 1 de Outubro até ao dia 30 de Novembro diariamente, e nos últimos tempos semanalmente, fez chegar a documentação referindo escola a escola. Assim, parece-me que a informação do Ministério da Educação não peca nem por defeito, nem por precipitação, nem por ignorância da situação.
Mas, se o baixo número de abertura das aulas em 1 de Outubro devesse ser de alguma maneira analisado neste momento quando afinal as nossas preocupações já se devem dirigir para o ano lectivo de 1985/1986 e também para o ano de 1986/1987, como pedi aos directores gerais que fizessem, porque em planeamento tem que ser assim...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vê-se! Vê se!

A Oradora: - Na verdade e porque se trata de uma pessoa que me merece a maior consideração, milita no mesmo partido que eu, saiu há 10 meses do Governo, é alta funcionária do Ministério da Educação...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, isso é baixo!

A Oradora: -..., estranho que desconheça que aquilo que esta equipa fez foi pôr no terreno alguma coisa que cerca de um ano antes tinha sido delineado. É, pois, isso o que neste momento se está a fazer em relação ao próximo ano lectivo. Como já referi, apontando já para 1986/1987 pela necessidade efectiva de um planeamento que tenha em consideração principalmente uma rede escolar porque, na verdade - e ninguém o ignora neste país -, há escolas superlotadas e há escolas quase sem alunos.
É, pois, de um planeamento que precisamos. E aqueles que aqui estão, pela sua competência própria de representantes do País, têm que saber - e sabem-no por experiência própria - que é no terreno que se começa a detectar o que são as necessidades reais. Na verdade, é preciso conhecer bem o País, a sua evolução demográfica, as necessidades de rede escolar para, a longo prazo, se fazer uma análise da política de educação.
Contrariamente ao que se lê no ponto 6 da interpelação, o Governo revelou capacidade e conhece as reais necessidades do País porque foi no terreno que procurou conhecer a realidade. Creio que também será conhecido de todos os presentes que por volta de Julho/Agosto se fez um acerto com os governos civis e com as autarquias, no sentido de se fazerem reuniões locais com todos os autarcas do País e com todos os conselhos directivos das respectivas regiões. Pessoalmente contactei com 149 autarquias e com os

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respectivos autarcas e conselhos directivos dessas áreas. Nessa viagem de trabalho pelo País pude verificar como a dinâmica de uma reunião pode levar ao exaustivo levantamento de pequenos problemas, em que surge mais a vontade de sobressair junto ao vizinho carenciado do que a discussão do essencial. Mas foi ainda, e essencialmente, contando com o brio profissional dos conselhos directivos e dos professores que as escolas abriram - quando podiam abrir, sem falsos problemas e sem falsas pressões.
Analisada a situação em 30 de Novembro, pode verificar-se que das 266 escolas que não abriram até 8 de Outubro, estavam a abrir sucessivamente até 30 de Novembro. E este ritmo vai continuar até Janeiro, porque na verdade não foi possível conseguir que os empreiteiros entregassem as escolas antes desse prazo.
No entanto, a partir de Janeiro ficarão apenas por concluir obras da Escola Secundária de Santo André, no Barreiro, e da secção da Escola Secundária de Paço de Arcos, em cerca de 1000 alunos na região de Lisboa. O resto do País deixa, entretanto, de ter problemas. No entanto, esperamos encontrar nestes dias próximos uma solução diversificada para esses problemas residuais do lançamento do ano lectivo. E estou preocupada com estes problemas residuais porque, enquanto houver jovens sem escola, tenho que estar preocupada, apesar destes números significarem 0,1% do universo do l 500 000 estudantes do ensino não superior. Se me permitem, gostaria apenas de perguntar: qual é o problema português que está resolvido a 100%?-

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Pessoalmente entendo esta interpelação como uma oportunidade de informar a Assembleia da República, os Srs. Deputados e a opinião pública sobre qual é exactamente o ponto da situação e a análise que o Ministério da Educação faz das suas próprias dificuldades, ao mesmo tempo que deve revelar quais as suas preocupações em matéria de política da educação, quais as propostas novas e os trabalhos em curso.
E dentro do tempo disponível, não deixarei de responder objectivamente às perguntas formuladas.
Parece-me preferível seguir este método do que copiar a papel químico a interpelação de Junho.
Estaríamos certamente todos de acordo se eu dissesse simplesmente que tudo tem ido mal na educação. Mas para lá desta frase quase já sem sentido, tente-se detectar o que exactamente vai mal! Poderíamos talvez pensar numa instabilidade da vida política, mas parece-me que não será este o momento de fazer isso.
Preferia fazer outro tipo de questão. Talvez o mal mais profundo esteja num desajustamento entre a sociedade e a escola. Porém, é toda à sociedade que se mostra apetente em relação à escola; é toda a população que ambiciona aí introduzir os seus filhos e se se mostra reticente é em relação a algumas alterações. A sociedade prestigia a escola quando lhe bate à porta e quer entrar.
Por outro lado, é a própria escola que se interroga querendo sossegar-se sobre se estará cumprindo as suas obrigações. E o Ministério da Educação procura entender-se com a escola, ajustando-se não a um esquema ideal, mas tendo em atenção os condicionalismos em que se move toda a vida sócio-económica e cultural portuguesa.
E de acordo com esses condicional! s mós, muitas vezes o Ministério da Educação não pode estabelecer nem prioridades rigorosas, nem cumprir planos arriscados, com a necessidade indiscutível de gerir o quotidiano da maior empresa nacional com meios artesanais em que à partida qualquer dos últimos ou futuros orçamentos apresenta 85% das verbas para salários, com menos de 15% para funcionamento. Que margem nos fica para a inovação e para a modernização? E, no entanto, nós sabemos que só a modernização será a palavra chave do nosso sistema educativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quando se fala em educação, e, naturalmente, depois dos alunos, ponho em primeiro lugar os professores. E já uma vez escrevi - quando há poucos anos era oposição a um governo AD - que a educação será o que os professores quiserem. Repito-o, não ,em tom de desafio, mas como reconhecimento, como pedido de entendimento e de concertação, mas é preciso que os professores saibam o que querem relativamente à educação e ao ensino e a uma política, para que possam ser os condutores de uma renovação de mentalidades abandonando definitivamente esquemas corporativos, que apenas conduzem á que outros pensem por eles.
E naturalmente são os professores o primeiro elemento decisivo para a debelação desse mal que é o insucesso escolar. Mas quando se fala de insucesso escolar temos que considerar que ele têm raízes profundas, raízes de origem social, problemas de natureza económica e cultural, mas que, no imediato, exigem do ministério um estudo aprofundado sobre a escolaridade obrigatória, a política do livro, a modernização do sistema educativo com a introdução das novas tecnologias ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Mais uma comissão!

A Oradora: - Já existe, Sr. Deputado!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ah! já existe! Então não são 30; são 31!

A Oradora: - ..., a colocação de professores em termos diferentes, pensando por exemplo numa situação que pode alterar grandemente os chamados lançamentos dos anos lectivos - por isso escolhi o plural. Considerámos que tudo vai mal num hipercriticismo que é muito português, mas estamos em condições de detectar a situação normal, aquilo a que poderíamos chamar de escolas estáveis.
Contrariamente àquilo que possa ser a vossa informação pessimista, a verdade é que podemos detectar, no panorama e na rede escolar portuguesa, cerca de 60% de escolas a que poderemos chamar escolas estáveis, quer dizer, atingiram a sua normalidade. Têm um número estabelecido de turmas, o que significa um número normal de professores em relação ao ano anterior, significando isto que não será preciso mexer tudo, no próximo ano e, logo, essas escolas poderão ser menos um problema, reduzido em 60%, no próximo ano lectivo. Talvez não seja andar muito, mas é com certeza uma concepção diferente.

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Será também uma concepção diferente - como estamos fazendo neste momento ao alterarmos o Decreto-Lei n.º 581/80 colocar os professores em menos fases do que no ano anterior em que ainda existiram 4 fases de colocação de professores. Este facto levou a que a colocação de professores se prolongasse até Novembro, que é uma realidade que o Ministério da Educação reconhece. Tentaremos no próximo ano diminuir essas fases, para que os professores estejam colocados mais cedo e, principalmente, para que estejam colocados nos sítios onde preferentemente queiram estar. Isto, para evitar aquele mal que é conhecido de todos: o enorme absentismo dos professores. Aliás, o absentismo também não é tão grande como isso. Na verdade, fazendo contas - e só o meu tempo não permite que vos revele completamente os meus "dossiers", mas que estão à vossa disposição, veremos que, por exemplo, no ensino primário, onde se considera um enorme absentismo de professores e que aparentemente existe, porque os números são muito grandes, a alteração entre as perspectivas de Setembro - em que não houve nenhum lugar vago e em que sobravam alguns professores as de agora em que existem 85 lugares vagos, pelo que quase já não sobram professores, revelam um absentismo de 5%.

O Sr. Lemos Damião (PSD): 4,07%!

A Oradora: - Posso perguntar a qualquer empresa de 150 000 funcionários se o absentismo dos seus funcionários é mais alto ou mais baixo do que numa gestão normal de uma empresa de produção.
Quando falamos de educação - e eu procuro pensar nessa linha quando me debruço estudando o problema - vejo o Ministério da Educação como uma enorme empresa que é preciso gerir de uma
outra maneira. Teremos que começar por fazer a detecção de uma situação.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Só agora?

A Oradora: - Mas também - e em muito curto tempo teremos ocasião de pedir isso à Assembleia da República - é preciso que o Ministério da Educação seja dotado de meios, que ultrapassem os meios artesanais a que eu há pouco me referia, para podermos ter uma informática no Ministério, que nos permita detectar com muito mais facilidade, para resolver com muito maior rapidez.
Relativamente a estes problemas de escolaridade obrigatória, queria ainda apontar uma outra medida. Na verdade, ainda não está constituído o grupo de trabalho...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Mais um?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Outro?

A Oradora: -..., mas já se fizeram muitas reuniões. É o problema da alteração da política do livro. Tive ocasião, como faz parte das minhas funções, de ter algumas reuniões com as associações dos livreiros. Ora, aquilo que apenas consegui para o ano lectivo em curso foi que os livros subsistem apenas - e este "apenas" é um número, não significa uma qualificação - l4%, contrariamente aos 60 % de subida que os livreiros me propuseram numa primeira reunião.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Secretária de Estado, previno que o Governo já só dispõe de 8 minutos.

A Oradora: Eu vou gastar só mais 3 minutos para dar os 5 minutos ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior para falar do acesso ao ensino superior.
A política do livro é qualquer coisa que me preocupa. Terei ocasião quando criar um grupo de trabalho...

Vozes do PCP: - Outro!

A Oradora: - ...num despacho que será publicado, pelo que todos os Srs. Deputados irão, com certeza, estar atentos.
Queria agora, não deixar sem resposta qualquer coisa que foi muito objectivamente perguntado ontem. Trata se do problema da educação cívica e o problema da segurança.
Relativamente à segurança, penso que estão ainda todos lembrados do pequeno escândalo, que constituiu "manchete" de jornal, que foi o problema do Ministério da Educação ter negociado com determinada empresa, "Os Audazes", a segurança piloto de algumas escolas. Foi uma solução pontual, necessária, cujos "dossiers" revelam a importância dessa tomada de atitude. Mas o Ministério da Educação considerou que não devia prosseguir esse tipo de política. Aquilo que se está fazendo neste momento é criar um gabinete - o título já existe, mas o gabinete foi constituído por uma pessoa, mas assinei hoje um despacho nomeando uma segunda pessoa que constitui o gabinete.
Este gabinete está encarregue de fazer, por enquanto, o seguinte: apresentar ao Governo propostas de solução para o problema da segurança. Devo dizer-lhes, que algumas dessas propostas apontam para o seguinte: uma situação piloto nas regiões onde se revela uma maior dificuldade de segurança, que será com certeza um paliativo para o enorme problema, mas que irá custar de imediato ao Ministério 12 000 contos. Um processo estendido a nível
nacional como se espera que seja possível fazer entre 1985 e l986 - custará ao País 400 000 contos.
Estou a dizer-lhes que são apenas projectos que serão base natural de discussão nesta Casa. Nas visitas que fiz ao País, tive a sensação que os próprios conselhos directivos e os autarcas estavam pedindo ao Ministério da Educação para além daquilo que este Ministério tem obrigação de dar. Este Ministério tem obrigação de fazer a segurança dentro...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Secretária de Estado, devo dizer lhe que já está a consumir os últimos 5 minutos de que o Governo dispõe.

A Oradora: - Só mais um minuto para dar um apontamento muito ligeiro daquilo que nós tentamos fazer quanto à educação cívica.
A educação cívica será uma cadeira anual, obrigatória, que percorrerá todos os anos do ensino secundário, desde o 5.º e até ao 11.º ano. Prevê-se para ela um programa muito aberto.

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Respondendo concretamente ao que me foi perguntado - não tenho tempo para mais -, direi apenas que estamos perfeitamente atentos à sobrecarga horária dos alunos. Contudo, eles não irão ter sobrecarga de horários por causa dessa cadeira. Pelo contrário, o que se passará é que os alunos irão ter os próximos anos uma diminuição de carga horária em outras cadeiras, ultrapassando mesmo este problema levantado pela educação cívica.
Lamento não poder utilizar o tempo de que o Governo ainda dispõe, pois que ele é necessário para se esclarecer o que o Governo pensa sobre o acesso ao ensino superior.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para interpelar a Sr.ª Secretária de Estado os seguintes Srs. Deputados: César Oliveira, Rogério Fernandes, Zita Seabra, Helena Cidade Moura, Odete Santos, Anselmo Aníbal, Corregedor da Fonseca, Gaspar Martins e Luísa Cachado.
Srs. Deputados, estamos chegados à hora do nosso intervalo regimental. Deste modo, as perguntas serão formuladas depois do intervalo, assim como as respostas da Sr.ª Secretária de Estado.
Previno, no entanto, os dirigentes dos grupos parlamentares e o Governo de que dispõem dos seguintes tempos: Governo tem 5 minutos, o PS 2 minutos, o PSD 4 minutos, o PCP 19 minutos, o CDS 3 minutos, o MDP/CDE 6 minutos, a UEDS 4 minutos, a ASDI 15 minutos, e o Sr. Deputado independente dispõe ainda de 10 minutos.
Srs. Deputados, está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a apalavra o Sr. Deputado César Oliveira, que é o primeiro dos Srs. Deputados que se inscreveram para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Secretária de Estado, Helena Carvalho dos Santos.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate tem decorrido, em certos momentos, sob o signo do mais perfeito surrealismo. É espantoso mas é verdade. Há pouco, aquando da intervenção da Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa, houve alguém do PSD, da bancada direita do PSD, que se levantou afirmando que a Sr.ª Deputada Helena Valente Rosa não tinha prestado solidariedade ao Governo. Em seguida, fala o representante da JSD, que se distancia - e o problema é dele - do Governo, e a bancada e a direcção do PSD, queda-se muda sem dizer nada. Enfim, critérios que atestam o surrealismo que grassa nalguns partidos da coligação ou, pelo menos, num desses partidos.
A minha questão é mais simples e mais comesinha, Sr.ª Secretária de Estado. Devo começar por dizer-lhe que lamento ter de colocar esta questão a V. Ex.ª, isto porque distingo os membros do Governo. Sei distinguir ministros e secretários de Estado - orgulho-me disso e assumo essa distinção - e, por tal, é lamentável ter que pôr o problema a V. Ex.ª, visto não poder pô-lo a mais ninguém.
Ontem perguntei qual o critério do Ministério da Educação e do Sr. Ministro José Augusto Seabra, para atribuir subsídios. Citei uma série de subsídios atribuídos, que não foram desmentidos e que, portanto, existem. A Assembleia tem o dever de reclamar a explicitação desses critérios e o Governo tem a obrigação estrita de dizer quais são os critérios que presidem à atribuição de subsídios. Não quero deixar passar em branco esta questão. Dir-me-á V. Ex.ª que não é nada consigo. Se calhar não é. Compreendo isso muito bem, mas o Governo e o seu Ministério não me deixa outra alternativa senão a de lhe pôr o problema a si.
Mas há mais! A escola do Pinheiro, já citada pela Deputada Helena Valente Rosa, tinha 7 alunos; a escola do Ribeirão, em Braga, tinha 50 alunos; a escola do Pinheiro, no Porto, não tinha aluno nenhum; a escola de Paços de Brandão - que eu ontem citei - não tem nenhum aluno; e continuam a ser pagos 60 contos por mês ao externato de Santa Maria de Lamas. Porquê Sr. Ministro? Faça favor de explicar, porque é que se passa o mesmo em Alter do Chão, porque é que se passa o mesmo em Albergaria-a-Velha. Estas respostas, é que tem que as dar, não pode fugir-lhes. Admito que V. Ex.ª não tenha tempo de explicar à Assembleia quais os critérios utilizados na atribuição de subsídios e estas anomalias de haver escolas sem alunos e de se continuar a pagar subsídios ao ensino privado. Admito que não tenha tempo, mas pergunto: está o Governo, e particularmente V. Ex.ª, interessado em vir à Comissão de Educação explicar isto tudo, tim tim por tim tim? Se está, agradecia que o dissessem alto, para ficar registado na acta.
A Sr.ª Secretária de Estado adjunta do Ministro da Educação: - Com certeza que estamos interessados!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.a Secretária de Estado: A questão fundamental que pretendemos colocar com esta interpelação, em termos de ensino público, e particularmente em toda a área do ensino obrigatório, é que a política deste Governo, em vez de cumprir o preceito constitucional que garante a democratização do ensino, o acesso e o êxito escolar - estou a citar de cor a constituição - a todas as crianças, está, a nível do próprio ensino básico, a criar e a incentivar as desigualdades, a elitização, a afastar os filhos dos trabalhadores, dos camponeses e das classes desprotegidas do sistema de ensino.
Apresentámos os números do insucesso escolar, do abandono escolar, a descida da acção social escolar e o que esperávamos da parte da Sr.ª Secretária de Estado, já que o Sr. Ministro não respondeu, era que em cada uma destas áreas nos dissesse que medidas é que o seu Ministério tomou para obviar a esses problemas. Ora, a Sr.ª Secretária de Estado, quando nos respondeu, o que nos disse foi que criou um grupo de trabalho e que essa questão está em estudo. A Sr.ª Secretária de Estado frisou umas 4 ou 5 coisas que estão em estudo, inclusive, vem dizer, um ano e meio depois de estar este Ministro no Governo, que estão em estudo as carências da rede escolar.

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O Sr. Ministro do Equipamento Social quando aqui esteve, há dias, durante o debate da revisão orçamental, dizia-nos que estão perfeitamente definidas quais são as carências da rede escolar. Mais: deu-nos uma fotocópia onde se discriminavam os projectos, de todas as escolas que vão ser construídas, que por acaso em nada coincidem com as carências escolares que detectámos na rede escolar nem com as graves distorções da mesma. Por exemplo, no projecto do Sr. Ministro do Equipamento Social não está prevista a construção de nenhuma escola no distrito de Setúbal, a não ser uma que já lá está construída e que se situa na parte sul do distrito.
A questão é esta, Sr.ª Secretária de Estado: em relação ao insucesso escolar, em relação ao ensino especial, em relação à educação física, afirmámos aqui que desde 1980 que não se constróem ginásios, havendo até um despacho do então Ministro das Obras Públicas isentando as escolas de serem construídas com ginásios. O que é que estão a fazer agora, que medidas estão a tomar?
Em relação à acção social escolar, que medidas estão a tomar para lhe garantir o apoio ao nível do ensino obrigatório, para garantir a escolaridade obrigatória e para diminuir estas taxas. Isto porque, evidentemente, não queremos milagres, já o disse o meu camarada Rogério Fernandes, mas queremos pelo menos medidas para baixar o insucesso escolar.
A Sr.ª Secretária de Estado não se referiu, como aliás até agora nenhum dos membros do Governo que falaram, à situação dos trabalhadores-estudantes. É dos casos mais graves e dramáticos que encontrámos. Sr.ª Secretária de Estado, neste momento, os trabalhadores-estudantes nem sequer contam para as verbas atribuídas às escolas do ensino secundário. É como se não existissem, pois nem para a verba da escola são contados nem têm cantinas. O meu camarada Jorge Patrício fez já uma intervenção, colocando as questões fundamentais. Até agora não obtivemos nenhuma resposta sobre o que é que se está a fazer em relação aos trabalhadores-estudantes. Eles têm os mesmos programas de ensino, estudam por livros de meninos pequenos, têm um horário mais reduzido, estão na escola desde as 18 horas até às 24 horas e não têm onde comer, comendo apenas uma sandwish antes de para lá irem.
Que medidas tomou, pois, este Governo, para obviar à situação gravíssima em que se encontram os trabalhadores-estudantes? Não me diga Sr.ª Secretária de Estado, por amor de Deus, que criou um grupo de trabalho para estudar o assunto. Ao fim de ano e meio, já é tempo de exigir que algum desses grupos de trabalho faça qualquer coisa. Nunca vi, por exemplo, vir aqui uma equipa ministerial e trazer tantos assessores - inclusive, ontem, com alguma claque -, tendo nós, há pouco, contado daqui, 25. Estão cá há dois a assistir aos debates, o que até lhes faz bem, pois passam a conhecer melhor os problemas reais do País. Com tantos grupos de trabalho, e foram constituídos mais de 30, ainda não se fez nada, ainda continua tudo em estudo? Eram estas as perguntas muito concretas que pretendíamos ver respondidas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Fernandes.

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, na realidade, lastimo ter de dizer que também a Sr.ª Secretária de Estado não trouxe aqui nenhuma perspectiva nova em relação à resolução dos problemas da educação.
A primeira questão que lhe coloco tem a ver com o analfabetismo. Sou representante do PCP no Conselho Nacional de Alfabetização e Educação Básica de Adultos, mas esse Conselho, por motivos que não têm nada a ver com o meu partido, não funciona há mais de um ano. Por consequência, ignoro completamente qual foi a evolução da situação desde Setembro de 1983 a Setembro de 1984. Vou, no entanto, colocar-lhe a questão, dado que a Sr.ª Secretária de Estado a levantou. Qual é a situação, em matéria de cumprimento do plano de Alfabetização? Em Setembro de 1983, o então director-geral da Educação de Adultos, declarou que o plano nunca tinha sido cumprido. Gostaria de saber qual foi a evolução que houve este ano, tendo em conta que o Ministro da Educação declarou, em Setembro, perante o CNAEBA, que se o Governo lhe atribuísse os recursos financeiros previstos no plano, ele os recusaria por entender que as metas do plano não eram realistas. Essa declaração foi feita na véspera do Dia Internacional da Alfabetização, na sala do Senado da Assembleia da República. Ora bem, gostaria então de saber que verbas o Sr. Minisro da Educação teve e como é que as aplicou durante este ano?
Em relação à abertura do ano lectivo verifico - foi aqui dito pela Sr.ª Secretária de Estado - que o Ministério não tinha previsto dificuldades nos ensinos primários e preparatório, dado que as taxas de evolução demográfica levariam a prever uma diminuição do número de alunos. A propósito, gostaria de corrigir um número que a Sr.ª Secretária de Estado deu, pois em meados de Novembro faltavam no País 95 professores do ensino primário e não 85 - é uma diferença de 10 que deve ser devida a um erro de soma dos serviços do Ministério.
Ora bem, em relação ao restante, o que disse a Sr.ª Secretária de Estado é que tudo vai continuar na mesma. Nos próximos anos não vamos conseguir resolver o problema. Ora isto é muito pouco. E muito pouco para um Governo, seria muito pouco até para um técnico do Ministério da Educação. O diagnóstico das dificuldades, em matéria de construções escolares, está feito no Ministério da Educação, sendo apontado pêlos técnicos do mesmo que não é só a degradação da situação financeira que explica a situação em que nos encontramos. As alterações dos programas de execução e alterações das prioridades, alterações essas que derivam de razões de carácter político e não técnico, estão desde há muito identificadas no Ministério com sendo um factor obstrutivo à resolução dos problemas da construção escolar.
O Sr. Ministro da Educação poderá consultar no Ministério pessoas que até são afectas ao seu partido - algumas e bem próximas de si -, que também sabem desta matéria, e ver se este aspecto é ou não confirmado.
Gostaria que o Ministério da Educação tomasse aqui o compromisso de que as prioridades não serão alteradas pelo facto de o ministro se deslocar aqui ou acolá e fazer promessas, como vem sendo hábito.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Em relação aos professores, a Sr.ª Secretária de Estado disse que aguarda que eles façam novas propostas.
Pergunto-lhe lhe se teve oportunidade de ler e reflectir sobre os abundantes materiais que os professores, de todas as regiões do País, têm produzido sobre as suas aspirações, sobre os problemas do dia a dia e, até, sobre as formas práticas de resolver muitos desses problemas.
Finalmente, em relação à profissionalização em exercício, o que ontem aqui foi apontado justifica fundas apreensões. A perspectiva que se desenvolveu foi a de redução do número de lugares de profissionalização em exercício, o que é contrário às necessidades do sistema de ensino. E é tanto mais contrário quanto a Sr.ª Secretária de Estado, com injustiça devo dizer atribui o insucesso escolar, fundamentalmente, à preparação dos professores.
Foi isso que declarou, há pouco, na sua intervenção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr.ª Secretária de Estado, penso que o Ministério da Educação não está sob fogo cruzado; está, sim, sobre o cruzamento de agulhetas de bombeiros porque, de facto, o Ministério da Educação está a arder e com ele está a arder o País.
Neste ataque ao incêndio, muitos funcionários do Ministério se têm queimado. Não digo arriscar a própria vida mas, pelo menos, a sua vida profissional. Em todo o caso, fazem-no com gosto e não hesitam em continuar a fazê-lo.
Se o Sr. Ministro não se importar, peço a sua atenção para o que quero dizer porque vou referir qualquer coisa que V. Ex.ª citou com inexactidão e que explica a quantidade de sucessivas interpelações feitas ao Ministério da Educação.
O Sr. Ministro citou - referindo a sua querida OCDE, também minha - que a brevidade da duração das equipas ministeriais encoraja a abordagem de problemas difíceis e complexos através de um bombardeamento à distância de propostas administrativas, mais do que através de um processo...".
O Sr Ministro - que é um homem de letras sabe que as citações devem ser feitas no seu contexto e o contexto em que esta afirmação é feita, no relatório da OCDE, é em crítica ao governo do Professor Vítor Crespo que despachava por decretos-lei vindos de autorizações legislativas, e é do seguinte teor: "Dentro de um quadro amplo de autorização legislativa, os ministros governam por decreto. De facto, os mecanismos de controlo e de equilíbrio dos diferentes sectores da Administração, instituídos constitucionalmente, tornam o recurso aos decretos uma tentação.
A brevidade da duração das equipas ministeriais encoraja a abordagem...", seguindo se aquilo que V. Ex.ª disse.
Acontece que, de facto, o seu Ministério ou o Ministério do Sr. Ministro peço desculpa - não governa por decretos para não dar trabalho ao Conselho de Ministros.

O Sr. Ministro de Educação: - Está bem informada!

A Oradora: - 0 Sr. Ministro deve ser um Ministro extremamente cómodo, que deve entrar e sair dos Conselhos de Ministros sem abrir nem fechar a boca porque faz tudo por despacho normativo. E basta isso!
Se o Partido Comunista não tivesse tomado a iniciativa desta interpelação, fa-la-íamos nós e poderemos vir a fazê-lo dentro de pouco tempo.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!

A Oradora: - Só há, enfim, é inutilidade porque, de facto, as respostas não vêm.
Mas bastaria o seu despacho normativo de Agosto de 1984, com a definição de ensino profissional, para lhe perguntarmos o seguinte: que política está a fazer o Ministério da Educação nesse capítulo, que ainda não foi explicado, apesar dos meus esforços e dos requerimentos que, desde logo, apresentámos?
Bastava que se perguntasse qual é a política inerente à portaria de acesso ao ensino superior, para termos motivo para uma nova interpelação.
Bastava, ainda - e neste momento dirijo me directamente à Sr.ª Secretária de Estado, em forma de pergunta , a política inerente à educação de adultos. Que política está inerente à educação de adultos para que o coordenador da alfabetização de Santarém que era um técnico - tenha sido abusivamente substituído por um administrativo?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, não posso, na verdade, fazer um quadro exaustivo a respeito do distrito de Setúbal, não por falta de dados, mas por absoluta falta de tempo.
No entanto, V. Ex.ª fez aqui algumas afirmações que me sugeriram duas ou três questões.
Em primeiro lugar, V. Ex.ª afirmou, em relação ao distrito de Setúbal que, a partir de Janeiro, só não ficaria resolvido o problema da Escola Secundária de Santo André.
Sobre isto, gostava de lhe fazer algumas perguntas.
Já vimos ontem como se faz o planeamento das escolas no Ministério da Educação: a primeira fase do planeamento é fazer um decreto-lei dizendo que se cria a escola tal neste caso a do Fogueteiro - embora não haja terreno, nem absolutamente nada.
Ora, esses alunos que iriam para a Escola Secundária do Fogueteiro são em número aproximado de 800 e, também vimos ontem fotografias mostrando que, neste momento, esses alunos, que afinal estão destinados à Amora parece ser apenas uma questão de geografia - apenas têm garantida a existência de buracos nesse focal, para instalar a escola e mais nada
V. Ex.ª garante que, em Janeiro, estes alunos, que até aqui não têm tido aulas, já estão com aulas na Amora e não no Fogueteiro?

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A segunda questão que lhe quero colocar relaciona se com o Barreiro.
V. Ex.ª sabe que há 700 alunos do 7.º ano unificado que estão sem aulas; sabe também que a Câmara Municipal do Barreiro pôs à disposição do Ministério da Educação uma escola primária, que é nova, pois foi acabada de construir na Urbanização da Compave, e que o Ministério só teria que a equipar e devolver à Câmara no fim do ano lectivo.
O Ministério da Educação recusou esta proposta da Câmara e os alunos continuam sem aulas. Pode explicar me porquê?
Mas tenho ainda duas questões a colocar-lhe, Sr.ª Secretária de Estado.
Como no seu Ministério se faz um planeamento assim a tão longo prazo, V. Ex.ª deve saber das reivindicações da população do Pinhal Novo que exige, com dados concretos e provando a sua necessidade, uma escola secundária nesta localidade.
O que nos pode dizer a respeito disto? Para quando está programada esta escola?
Por último, vou colocar lhe uma questão relacionada com a abertura do ano escolar.
A Sr.ª Secretária de Estado sabe da existência em Setúbal de uma escola preparatória que funciona também para o ensino secundário, a escola de Aranjuez, que abriu este ano lectivo. Por dentro do quintal da escola passa a linha do caminho de ferro, sem qual quer vedação, para onde as crianças podem correr na brincadeira e onde podem ocorrer sérios desastres.
Sr.ª Secretária de Estado, o que pensa fazer o Ministério da Educação em relação a isso?
Depois disto tudo, como é que, realmente, podem falar - como o ministro da Educação falou e mesmo V. Ex.ª na infância e na juventude se prezam assim tão pouco a infância e a juventude?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, a senhora é membro de uma equipa ministerial que já vai em segunda edição, e numa segunda edição já desfalcada por atribuladas relações funcionais que se vivem nos baixos e nos altos da Avenida de 5 de Outubro.
Mas nós não detalhamos as relações funcionais, detalhamos o funcionamento e, realmente, há uma míngua de explicações em relação ao funcionamento, que é de menos. E é de menos nisto: os senhores consideram pontual a verificação atempada dos casos e a verificação das situações nas escolas quando quereriam, naturalmente, que nós interpelássemos apenas no sentido das generalidades mais generalizantes, das letras mais letradas, do estruturalismo da genética da formação do Sr. Ministro. Mas não o fazemos por que os problemas são concretos.
Como deputado do distrito de Lisboa e como vereador da Câmara Municipal de Lisboa, ao percorrer o distrito cujo aparelho escolar tem 150 escolas nos ensinos preparatório e secundário e 15 000 professores em 15 municípios, tenho sentido e temos detalhado situações que roçam a face, não só do incrível como desajustam qualquer imagem de uma pretensa capacidade da parte dos senhores.

Não sendo maniqueístas, não dizendo "tudo mal, tudo bem deste lado", temos a dizer e de acentuar que os senhores são imagem viva da mais desastrosa incompetência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mesmo na gestão dos recursos humanos, dos recursos financeiros e dos recursos materiais que os senhores têm.

Vozes do PCP: Muito bem!

O Orador: - Gostaria de lhes colocar duas questões, uma na óptica da "gestão macro" - que a Sr.ª Secretária de Estado acentuou -, uma óptica que é, de facto, surpreendente para quem contrapôs argumentos desses, mas que situa, naturalmente, a capacidade intelectual aqui presente.
V. Ex.ª salientou a oferta do aparelho escolar e eu quereria colocar, não só um problema de rede, como o problema daquilo que é o parque actual - que, naturalmente, conhece de alguns exemplos. E sobre isto colocar-lhe-ia ainda a seguinte questão: não quereriam fazer mais uma comissão para estudar o estado das obras e o estado das escolas feitas recentemente?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como está aí, na bancada do Governo, o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas - que de adjudicações e empreitadas conhece como ninguém e que tem excelentes relações funcionais com o Sr. Ministro do Equipamento Social...

Risos.

...o arquitecto Rosado Correia -, talvez pudéssemos fazer um grupo interministerial em que os senhores e o Ministério do Equipamento Social fizessem um estudo dos edifícios actualmente existentes - não da rede, isto é, daquilo que deve existir mas dos edifícios actualmente existentes , de forma a conseguir trazer a esta Assembleia uma informação detalhada. Talvez se soubessem as razões de algumas adjudicações e a incapacidade e a incompetência que os senhores trazem sobre os vossos ombros!

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Só mais uma indicação e mais uma pergunta: ainda na óptica do pontual, há exemplos e exemplos; Olivais 11, em Lisboa, por exemplo, tem neste momento uma capacidade para alguns milhares de alunos. É, sem dúvida, uma escola feita com alguma megalomania - e contrasta com Olivais 1, que está superlotada -, para alguns milhares de alunos e tem, actualmente, apenas 400 alunos, possuindo corredores de 140 metros e 7 funcionários auxiliares.
Os senhores fazem também aí uma gestão que é, de facto, uma gestão da incompetência.
Apesar de tudo, quereria saber as vossas respostas a estas duas questões.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito mal!

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0 Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr.ª Secretária de Estado, antes de mais nada, verifico que o Sr. Ministro do Equipamento Social não compareceu a esta interpelação e creio que alguma coisa teria a esclarecer a esta Câmara sobre as questões por nós ontem suscitadas, nomeadamente, pela minha bancada.
Como está presente o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, V. Ex.ª ou o Sr. Secretário das Obras Públicas como a bancada do Governo entender responderá às minhas perguntas.
A Sr.ª Secretária de Estado declarou que só faltam concluir as escolas de Santo André, no Barreiro e de Paço de Arcos. Ontem, o Sr. Ministro disse que faltaria algo mais e até referiu vários atrasos motivados pela crise - essa célebre palavra crise - de empresas de construção.
Portanto, perante esta declaração de V. Ex.ª, gostaria de lhe fazer uma pergunta: sabia-se que há um ano faltavam 8 550 salas de aulas, sendo 5 448 nos ensinos primário, preparatório e secundário unificado. Qual é a situação actual, Sr.ª Secretária de Estado?
O Sr. Ministro remeteu ontem este esclarecimento para VV. Ex.ª dizendo que, hoje, os Srs. Secretários de Estado responderiam a essas perguntas. Gostaria de saber se têm esses elementos.

Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, gostava de saber qual foi e já coloquei esta pergunta ao Sr. Ministro por duas vezes o plano de emergência para 1984, que não foi assinado pelo facto de o ministro do Equipamento Social não ter querido assiná-lo.
Uma vez que temos cá o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, talvez ele possa dar essa explicação.
Além disso, gostava que fosse explicado claramente a esta Câmara quem controla as construções escolares e porquê os planos de emergência. Porque é que também não se aplica um planeamento exigível em qualquer organismo oficial, nomeadamente, no que diz respeito a concursos públicos claros, transparentes, e não estes planos de emergência que são adjudicados de uma forma que me parece muito pouco condizente com as exigências da administração pública?
Finalmente, uma última questão que tem a ver com o Orçamento do Estado. O que é que se vai passar no domínio das construções escolares quanto ao Orçamento do Estado do próximo ano? Que verbas vão ser contempladas nesta matéria? Vai ser um Orçamento realista ou vamos, uma vez mais, assistir ao panorama que aconteceu este ano, com orçamentos suplementares, com planos de emergência e sem a existência de um planeamento rigoroso e realista?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gaspar Martins.

O Sr. Gaspar Martins (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, na sua intervenção, pintou-nos um quadro cor de rosa. Mas a realidade que eu conheço - a do meu distrito, o distrito do Porto, mostra-me que esse quadro é uma mancha negra. É por isso que gostaria que a Sr.ª Secretária de Estado me dissesse - e não vou fazer perguntas difíceis - se, na verdade, a partir de Janeiro do próximo ano de 1985, vão deixar de existir, no meu círculo eleitoral, os problemas que a seguir lhe vou referir.
Inexistência ou não funcionamento de cantinas como, por exemplo, na Escola Preparatória de Alfena, de Freamunde inaugurada há pouco tempo pelo Sr. Ministro Seabra, apesar de estar em funcionamento desde Janeiro deste ano -, na de Marco de Canaveses, de Grijó e as secundárias de Soares dos Reis, Alexandre Herculano e a secção de Aldoardo, Leonardo Coimbra, no Porto?
Quando vão ser pagos os subsídios de refeições. É que, por exemplo, na Escola Secundária de Águas Santas todos os alunos, mesmo os dos escalões A e B, pagam o preço por inteiro.
Inexistência de instalações gimnodesportivas nas escolas de Vila do Conde, Grijó, Baltar, Marco de Canaveses, Felgueiras e a tal de Freamunde, inaugurada há pouco tempo pelo Sr. Ministro Seabra.

0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Reinaugurada!

0 Orador: - A Escola Secundária de Ermesinde tem aulas no pavilhão gimnodesportivo da Palmieira, distante vários quilómetros e não dispõe de transportes.
Outro problema é a má distribuição dos alunos: alunos com 14 anos são transferidos para o ensino nocturno, como aconteceu nas escolas de Matosinhos e de Maria Lamas ou deslocados do ensino secundário para escolas preparatórias, como aconteceu em Gaia e em Gondomar.
Isto para não falar na tal superlotação: a Escola Preparatória Soares dos Reis, dimensionada para 800 alunos, tem 1200; a Escola Secundária da Maia tem 2500 alunos, sendo a sua capacidade de 1000 alunos; a Escola Secundária de Padrão da Légua tem turmas sem aulas de Educação Visual e Trabalhos Oficinais por falta de instalações.
E acerca de instalações degradadas: já fiz 2 requerimentos sobre a Escola Secundária de Ermesinde - e desde 1980 que falo no assunto -, que continua a ser um armazém alugado por 200 contos mensais, sem quaisquer condições pedagógicas; a Escola Fontes Pereira de Melo, as escolas n.os 1 e 2 de Gaia, as preparatórias de Paredes, Paços de Ferreira, Valbom, Lixa, Baltar, a Irene Lisboa e Pêro Vaz de Caminha.
Finalmente, a nomeação das educadoras de infância: só em Vila Nova de Gaia há 25 salas de jardins de infância encerradas.
E, já agora, que anunciou que o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior vai intervir a seguir e como também está presente o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, gostaria de saber o que se passa, por exemplo, com a Faculdade de Engenharia. É que ainda há dias, um professor e os seus alunos tiveram de fugir apressadamente - e ainda bem - porque o tecto começou a cair lhes em cima. A cantina está suportada por barrotes e, entretanto, num imóvel anexo - a Parque-Auto - que estava em obras de readaptação para alargamento da mesma faculdade, o empreiteiro atrasa-se vários anos na conclusão dessas obras, o director das construções escolares do Norte propõe a rescisão do contrato com o empreiteiro e, superiormente, é indeferida a rescisão.

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Para concluir, apesar da resolução em 1980, com carácter urgente, da criação da licenciatura em Direito na Universidade do Porto, o que foi feito a esse respeito?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A última Sr.ª Deputada inscrita para pedidos de esclarecimento é a Sr.ª Deputada Luísa Cachado, a quem dou a palavra.

A Sr.ª Luísa Cachado (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, as nossas questões eram muitas, mas o tempo não permite que as possamos colocar nova e repetidamente, como fizemos ontem e hoje. Essas questões continuam sem resposta.
De qualquer modo, vou insistir apenas numa questão, que é a da profissionalização. Já que a Sr.ª Secretária de Estado se recusou a fornecer a esta Assembleia os números verdadeiros, nós vamos fornecer esses dados. Peço-lhe apenas que os confirme, ou seja, que, pelo menos, tenha a dignidade de dizer que são estes e não aqueles que há cerca de um quarto de hora ou meia hora aqui afirmou.
Para o biénio de 1984-1986, as vagas abertas para a profissionalização são as mais baixas desde 1974, e posso referir-lhe os números: 739 vagas para o en sino secundário e 585 vagas para o ensino preparatório. Dou lhe também os números de 1983-1984: para o ensino preparatório 1 427 vagas e para o ensino secundário 1 544 vagas. A diferença é grande. Esta é a atitude tomada face à profissionalização, ou seja, um decréscimo (a Sr.ª Secretária de Estado pode fazer as contas).
As assimetrias regionais acentuam-se - efectivamente, não estão a desaparecer - porque diminuíram as vagas para a profissionalização, exactamente nas zonas mais carenciadas. Estas medidas apenas têm em atenção o seguinte e que também desmente aquilo que há pouco foi dito: a existência de 46 % de professores não profissionalizados no ensino preparatório e 50 % no ensino secundário.
E era só isto que eu lhe queria dizer, Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado-Adjunta do Ministro da Educação: - Quero aproveitar menos do que os 5 minutos de que disponho para dar ainda a oportunidade ao Sr. Secretário de Estado de falar sobre o acesso ao ensino superior, que é uma questão importante. As questões que me foram agora colocadas repetem aquilo que durante todo o dia de hoje e de ontem foi sucessivamente perguntado e a que não se respondeu, não porque se não quisesse responder mas porque questões pontuais deste tipo não são aquilo a que propriamente se pode chamar uma interpelação sobre a política de educação.
De qualquer forma, referiu o partido interpelante que tinha organizado um dossier de 200 requerimentos. Penso vir a ter oportunidade de lhes responder com a urgência necessária e de acordo com a sua própria importância. Apesar de tudo, foram colocadas duas ou três questões em relação às quais não devemos sair desta Assembleia sem algum esclarecimento, principalmente quando elas não correspondem à verdade.

Em relação às escolas que estão já adjudicadas, concursadas, ou para as quais se vai abrir concurso em Dezembro, num total de 71 escolas, 3 delas são no distrito de Setúbal.

A Sr.ª Odete Santos: Em que sítios?

A Oradora: Agradecia que o partido interpelante tomasse nota deste facto que não corresponde ao que afirmou. Posso referir que essas escolas são concretamente na Quinta da Nova Telha, no Fogueteiro e em Alvalade do Sado.
Na verdade, foram aqui colocadas algumas questões, e de tal maneira que somos obrigados a dizer que alguns dos números apresentados não correspondem à verdade e algumas das dúvidas são revelações de menos boas intenções quando se referem a dados ultrapassados ou a situações desconhecidas.

Vozes do PCP: - Quais?

A Oradora: Direi apenas que, por pura coincidência, recebi, hoje, à hora de almoço, quando fui ao Ministério, uma carta do conselho directivo da escola de Penacova - uma das escolas de que se falou aqui. Esta escola que tem 350 alunos refere que brevemente vai ter novas instalações, pelo que precisaria de ser considerada com mais alguns funcionários. No entanto, fazendo as contas à relação funcionário/aluno, verifica-se que esta escola tem 1 funcionário para 54 alunos, o que é uma média semelhante à da escola da Caparica - que também hoje foi aqui falada onde há 1 funcionário para 64 alunos.
Na generalidade, um dos problemas que tem sido bastante especulado ultimamente é o da falta de funcionários nas escolas, como se de facto o mais importante numa escola não fosse os professores mas, sim, os funcionários.

A Sr.ª Zita Seabra: - O mais importante numa escola são os alunos!

A Oradora: A média nacional da relação funcionário/aluno é de 1 funcionário para 33 alunos, e no ensino secundário de 1 para 43. E se não podemos viver de médias porque vivemos com pessoas, devo no entanto dizer que os números limites que conheço se referem a escolas onde existe 1 funcionário para 26 alunos e 1 para 100, o que nos permitirá dizer, à vontade, que são erros graves os que aqui se têm proferido sobre o assunto.
Também aqui ontem foi referido que a legislação nos impede de transferir funcionários para fora do seu concelho. De facto, existem concelhos, como o de Lisboa, onde só com muita agressividade se conseguem transferir funcionários. Se a Assembleia da República nos permitir alterar esta situação, poderemos então revê-la.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Para transferir deficientes das Forças Armadas?

A Oradora: - Quando há pouco tentava falar no problema da segurança nas escolas, queria deixar bem presente que um dos esquemas em hipótese - e com certeza aquele pelo qual nos iremos decidir - dotará as escolas de 4 funcionários-guardas por escola que

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assegurarão o serviço 365 dias por ano, 24 horas por dia. Como sabem, em rotatividade são necessárias 4 pessoas para assegurar esse serviço. Esta é uma aspiração das escolas que vêem aqui a satisfação de algumas das suas necessidades. Contudo, é preciso não fazer confusão entre funcionários de segurança, guardas-portão, e vigilantes, com funcionários contínuos ou de outro tipo de apoio pedagógico como seja, por exemplo, o da limpeza. Na verdade, nos nossos dias, em escolas que têm que trabalhar em
regime de turnos é muito difícil fazer a limpeza. Também aí temos de encontrar outras soluções que estão a caminho.
0 facto de já não dispor de tempo impede-me de concluir. Contudo, e em relação ao Sr. Deputado Rogério Fernandes vou dar lhe 3 folhas de um "dossier" que a Direcção-Geral de Educação de Adultos me forneceu com os últimos dados a propósito do decréscimo do analfabetismo em Portugal. É uma maneira indirecta de prestar este esclarecimento à Câmara.

0 Sr. Presidente: - Para um protesto tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira, dispondo de um minuto.

0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Um minuto mais outros 5 que a ASDI teve a bondade de me conceder, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Quer dizer, Sr. Deputado, que a UEDS, que tem vindo a fazer transferência de tempo, recebe agora uma transfusão de tempo. Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr.ª Secretária de Estado, só lhe peço que diga ao microfone, claramente, para todos os Srs. Deputados entenderem - e poderia aplicar-se a outra gente, mas neste caso concreto são deputados que o Ministério da Educação está disposto, no mais curto prazo possível, a vir explicar à comissão de educação o critério de concessão de subsídios, concretamente ao ensino particular.
Em relação ao pessoal auxiliar, questiono sobre o que é que V. Ex.ª pretende transferir de umas escolas para as outras. Sabe a Sr.ª Secretária - e os deficientes das Forças Armadas têm pleno direito a trabalhar - que boa parte do pessoal auxiliar existente nas escolas são antigos deficientes das Forças Armadas? É esse pessoal que quer utilizar para as referidas e desejadas transferências?

A Sr.ª Secretária de Estado-Adjunta do Ministro da Educação: - Digo lhe que sim. Estou disposta a esclarecer a comissão de educação sobre esse assunto.

O Sr. Presidente: - O Sr Deputado César Oliveira pede a palavra para que efeito?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - É para fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
Dos 6 minutos de que a minha bancada dispunha, concedo 2 minutos à Sr.ª Secretária de Estado para que possa responder às questões que coloquei.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado César Oliveira, parece me que essa "contradança" de tempos já começa a ser um pouco irrisória.
Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário, dispondo de 4 minutos.
0 Sr. Deputado Lemos Damião pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, desejo unicamente informar que o Partido Socialista, generosamente, nos concede mais 2 minutos.

0 Sr. Presidente: - Tem então a palavra, o Sr. Deputado José Cesário.

0 Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: "Portugal é um país em que os velhos não têm presente e os jovens não têm futuro." Tais palavras, proferidas pelo Dr. Francisco Sá Carneiro em 1978 poucas vezes possuíram a actualidade e a oportunidade de que hoje se revestem.
Efectivamente, a ausência continuada de uma política geral de investimento no futuro tem provocado situações de inequívoca frustração e martirização para as populações deste país, sendo porém os jovens aqueles que mais facilmente têm sido atingidos por tal estado de coisas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - É assim com um profundo sentimento de alarme e de temor, embora com reduzida surpresa, que tomámos recentemente conhecimento de que no nosso país há cerca de 83 000 jovens que consomem frequentemente droga e que metade dos que possuem entre 12 e 22 anos ingerem amiudadas vezes bebidas alcoólicas. Tais dados, aliados à preocupante evolução dos índices de criminalidade e de prostituição, são os sinais mais claros de uma juventude que se degrada progressivamente, inserida numa sociedade em que os valores tradicionais são hoje algo que começa a ser profundamente desprezado.
Com tal cenário, não nos espantará a crise que desde há muito se vive no sector da educação e que não será mais do que o reflexo, puro e simples, dos problemas com que o País se tem debatido em termos políticos e económicos.
De facto, embora tivéssemos em 1974 sentido uma grande esperança no sentido de uma mudança de há muito desejada, rapidamente essa esperança deu lugar a uma enorme desilusão. Os homens em que
acreditáramos logo se mostraram perfeitamente incapazes de operar essa mudança, surgindo de imediato certas forças que,
apropriando-se do poder político do Estado, preferiram fazer enveredar o País pelo caminho de um aventureirismo totalitário de um esquerdismo retrógrado que nada tinha a ver com o sentimento do nosso povo e a vontade por ele manifestada.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Jamais nos esqueceremos das prepotências então cometidas pelos autores do serviço cívico estudantil, pelos novos revisores e censores dos programas escolares, em suma, por todos aqueles que pensaram que ideologizando a educação e o ensino poderiam condicionar a vida e o pensamento dos futuros homens de Portugal.

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Não temos por isso grandes dúvidas que grande parte dos problemas hoje sentidos radicam a sua génese nesse período revolucionário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porém, não fique a ideia de que pretendemos ignorar os erros cometidos posteriormente por técnicos dos mais variados sectores no campo da educação. Se o fizéssemos estaríamos a recusar uma das mais importantes vertentes do nosso pensamento - o criticismo.
Não podemos assim pôr de parte as críticas que foram e são feitas aos diversos responsáveis por este sector, sem esquecer que nós mesmos fomos pioneiros nalgumas delas. Mas que não fiquem dúvidas que a perspectiva da acusação gratuita e demagógica, desacompanhada de qualquer proposta alternativa concreta, é por nós radicalmente recusada. Não podemos mesmo deixar de frisar o facto de que alguns dos acusadores de hoje depressa deixariam de possuir credibilidade para o ser, se olhassem para dentro de si mesmos e fizessem a sua própria autocrítica. Talvez então muitas questões se esclarecessem!...

Aplausos do PSD.

Talvez por isto mesmo não aceitamos que o ministro José Augusto Seabra seja crucificado perante os olhos da opinião pública como o único responsável pelo actual estado de coisas. Os erros que porventura tenha cometido são também os erros de todos os que com ele trabalham ou trabalharam e têm ainda raiz em tudo aquilo que o ministério foi e tem sido ao longo de todos estes anos. Seria mesmo óptimo que não se apontasse apenas os lados negativos da sua gestão e que nos lembrássemos que medidas houve que, pelo cariz reformador de que se revestiam, não podem ser de modo algum esquecidas, citando-se de entre elas e nomeadamente a criação do ensino técnico-profissional e o lançamento e incremento da Comissão Interministerial para a Juventude.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porém, ficaríamos mal com a nossa consciência se não nos referíssemos a algumas situações vividas no Ministério e que impõem uma tomada de posição da nossa parte.
Em primeiro lugar, queria destacar os problemas sentidos no âmbito da educação pré-escolar, em que se verifica uma situação perfeitamente caricata e desajustada num país europeu ocidental. Em 12 de Novembro passado, os últimos indicadores quantitativos conhecidos informavam-nos que havia 681 educadoras de infância desempregadas enquanto várias centenas de jardins completamente equipados esperam que alguém se digne autorizar a sua abertura oficial. Os pais das crianças desesperam por vê-las desocupadas, as educadoras vivem uma degradante situação de desemprego, as autarquias vêem frustrados os seus investimentos e o Ministério não supera um desafio que se propunha levar por diante - o desenvolvimento da educação pré-escolar. Cumpre-nos perguntar: a quem aproveita tal situação?
O PSD não pode assim deixar de gritar bem alto a sua exigência de que tal questão seja rapidamente superada.
Mas outro problema nos preocupa seriamente. Sente-se hoje ao nível do ensino primário uma necessidade premente de uma revisão do "curriculum" existente e de uma redefinição dos programas. Efectivamente o grau de exigência científica deixa hoje muito a desejar, sendo fundamental dar a algumas áreas uma dimensão diferente da que hoje possuem. Nomeadamente, parece-nos elementar incrementar o ensino da língua e história maternas, mudando assim um pouco o sistema que os tempos do pós-25 de Abril nos impuseram.

Aplausos do PSD.

Finalmente, não nos parece de mais frisar alguns problemas que se mantêm numa certa indefinição ao nível do ensino básico: urge definir com precisão o estatuto da carreira docente não superior, de modo a sabermos definitivamente quem pode e deve ser professor;

O Sr. Jorge Miranda (PS): - Muito bem!

O Orador: - O esquema de formação de professores tem de ser clarificado, dando absoluta prioridade ao desenvolvimento do plano de criação das escolas superiores de educação; os concursos de professores efectivos e não efectivos devem ser alterados no sentido de se evitar as grandes deslocações e de se premiar a graduação profissional; devem ser criados incentivos aos professores deslocados ou colocados em zonas desfavorecidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sob o nosso ponto de vista, os problemas sentidos no ensino básico pelos jovens são os principais factores influenciadores da sua vida académica e da sua futura condição profissional pelo que de modo algum poderão ser ignorados ou desprezados.
Assim, e porque acreditamos que o actual Governo ainda pode fazer muito do que propomos, aqui deixamos este alerta que esperamos que seja entendido como tal e se não perca nas paredes desta sala...
E para que não fiquem dúvidas o PSD reitera claramente pela minha voz o apoio à actual equipa ministerial para a educação e ao Governo em geral.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Cunha. No entanto, lembro-lhe que o Sr. Deputado José Cesário não dispõe de tempo para responder ao pedido de esclarecimento que vai agora formular.

O Sr. Octávio Cunha (UEDS): - Lamento o facto, Sr. Presidente.
Continuamos no domínio do surrealismo ou, então, não se percebe o que é que se passa com a coligação governamental. Por um lado uns têm o direito de criticar. Por outro lado, outros não têm esse direito.

Vozes do PSD: - É a democracia, Sr. Deputado.

O Orador: - Também acho que sim e por isso mesmo é que penso que o Sr. Deputado José Vitori-

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no não devia ter-se insurgido, como há pouco o fez, aquando da intervenção da Sr.ª Deputada do Partido Socialista.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Aquilo que penso é o que está aqui em causa - e o Sr. Deputado representante da Juventude Social Democrata tocou precisamente no problema - é a discussão de uma política global para o ensino no nosso país. E esses problemas não foram efectivamente abordados de uma maneira adequada. Foram abordados problemas extremamente importantes, que são pontuais, mas de tal maneira se repetem que passam a também ser problemas globais foram levantados pelo Partido Comunista, entregues ao Ministério e aos quais este dará seguimento, conforme promessa da Sr.ª Secretária de Estado e do Sr. Ministro.
De facto, há aqui uma situação que tem que ser esclarecida, não só em relação ao problema da educação mas também ao problema global da política neste país. Aí, mais uma vez, devemos dizer que
estamos confusos com esta situação. Isto porque quando se afirma que "os velhos não têm presente e os jovens não têm futuro", isso é verdade e estamos de acordo. Mas é um elemento do Partido Social Democrata que o afirma, não sou eu. É de uma grande responsabilidade fazer afirmações destas, para mais quando é um membro de um partido do Governo que as faz.
Quando se fazem críticas à política global do Ministério da Educação, como o fez o representante da Juventude Social Democrata, é evidente que elas têm de ter uma resposta política. Quando se fazem intervenções correctas, como o fez a Sr.ª Deputada do Partido Socialista, elas exigem resposta política. Nesta altura o Sr. Ministro está confrontado com uma situação extremamente grave, e muito precisa, pelo que tem de ver definida a sua posição no seio do Governo. Digo lhe com toda a franqueza, Sr. Ministro, que eu no seu lugar, nesta altura, perguntaria ao Governo: O que é que estou aqui a fazer? Efectivamente, depois de tudo isto, poucas soluções lhe restam senão fazer um balanço com o Governo e perguntar lhe se tem confiança em si. Isso tem de ser claro para o País. O que se passa consigo passa se também noutros ministérios e o País começa a estar cansado de um certo número de indefinições, no que diz respeito às escolhas das prioridades, que o meu colega César de Oliveira aqui apontou, as quais não são feitas, bem como às escolhas de progresso globais para sectores importantíssimos, como são o do trabalho, o da educação, o da saúde, o da assistência social etc.
Não pedimos que este Governo tenha a política que queremos. O que continuamos a pedir e a exigir é que o Governo tenha políticas definidas que possamos controlar, avaliar e reformular, se necessário, quando elas estão inadequadas. Nesse aspecto, Sr. Ministro, as críticas que aqui foram feitas à política global do Ministério da Educação têm de ter forçosamente uma resposta política.

0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

0 Sr. António Gonzalez (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Intervir num debate como este, em que não só este Ministério, e com ele todo o Governo, mas igualmente as políticas educacionais dos últimos anos são analisadas de acordo com os frutos que deram, é assaz difícil em apenas l0 minutos.

É no campo da educação, portanto na formação das mentalidades dos futuros construtores deste país que convergem as qualidades e defeitos das políticas passadas e se reflectem os objectivos futuros das políticas presentes.

De uma forma simplificada vou tentar resumir a visão dos ecologistas organizados no âmbito dos Verdes a propósito da educação que temos e da que gostaríamos de ter e pela qual lutaremos.

A educação não é uma ilha isolada, antes pelo contrário, ela constitui uma malha em que se cruzam nos estabelecimentos de ensino as influências do ambiente familiar do aluno, com as da vida social, cultural, económica, etc., do bairro ou cidade onde vive. Ali se entrelaçam também com as provenientes da comunicação social, nomeadamente a televisão pela força atractiva pedagógica que lhe dá a imagem.

Se analisarmos estas influências num caso concreto português, encontramos situações tão graves que justificariam uma urgente acção interministerial, em estreita colaboração com as organizações de estudantes, professores e pais, com uma energia e uma vontade política que não encontramos neste Governo, autêntica manta de retalhos, tão diversas são as perspectivas de desenvolvimento do País dos seus ministros.

Assim, a nível da família, as dificuldades são tais que de milhares e milhares de casos (que não podem ser considerados lares, mas sim espaços mínimos para instalação de famílias) saem crianças e jovens mal alimentados e sofrendo as consequências de cada vez maior luta e esgotamento dos pais (salários em atraso, desemprego, baixa do poder de compra, aumento de preços do material escolar, dos passes sociais, etc.). Essas consequências transformam-se numa desmotivação crescente para os estudos, gerando o fenómeno dos alunos inadaptados e mesmo a rejeição da própria sociedade que não corresponde nem de longe àquilo que sonharam, se é que tiveram direito ao sonho nos primeiros anos da sua infância.
A nível do bairro e cidade, as viagens à pressa no trânsito, num ambiente agressivo e desumanizado, desprovido de zonas verdes (e as que existem são inseguras), aumenta no jovem a rejeição e endurece-o prematuramente, desenvolvendo nele a ideia subconsciente de que se encontra numa selva contra a qual tem de lutar.

É a agressividade e o espírito de compressão que dostroem o seu oposto, o da cooperação. Essa cooperação surge, porém, subvertida e integrada na luta pela sobrevivência contra a "cidade selva", ou seja a formação de bandos de crianças e jovens que se dedicam à criminalidade (roubos, venda de droga e prostituição) e à violência gratuita, à destruição, ao fim e ao cabo, de uma sociedade que os reforma e depois os reprime. São os ataques e os roubos a outras crianças, até dentro das próprias escolas, são as destruições selvagens efectuadas nelas durante a noite, etc.... Esta situação não é aqui trazida por masoquismo social; é uma ferida que alastra e contagia tai

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vez para toda a vida um número cada vez maior de crianças e jovens, os homens e mulheres do amanhã.
Caberia aqui perguntar por uma política governamental de ocupação dos tempos livres dos jovens, lacuna que algumas autarquias, com todas as suas conhecidas dificuldades económicas, vão tentando suprir, o que apesar de tudo é ainda incompreensivelmente insuficiente. Qual o papel do Governo?
A nível dos estabelecimentos de ensino, a criança depois de um percurso por vezes muito longo como em vastas zonas rurais, ou enervante como em muitas urbes chega a uma escola em que se vai amontoar com os colegas, quantas vezes em salas frias ou demasiado quentes, conforme a época do ano, não faltando as infiltrações quando chove.
Material didáctico de Ciências da Natureza, Física e Química, laboratórios e mesmo ginásios, onde estão em grande número de escolas?
Estamos novamente numa educação livresca em que a experimentação depende da carolice de professores que não desistem dos seus projectos de ensino. Exemplos existem de professores pagarem dos seus bolsos os produtos químicos necessários para as experiências laboratoriais.
E o professor, qual a sua preparação pedagógica, como está a sua motivação para o ensino e com que dificuldades se depara para ensinar? Má preparação pedagógica. A já falada falta de materiais para as práticas. Idem para a desmotivação dos alunos. Cada vez maior dificuldade para efectuar visitas de estudo ou experiências mesológicas. Falta de segurança nas escolas. Algumas existem em que bibliotecas, arquivos, secretarias são ciclicamente destruídas, apesar das grades nas janelas e portas reforçadas. Algumas escolas parecem fortes.
Guardas privados colocados nessas escolas são agredidos, ameaçados e os seus cães envenenados. Aqui mesmos na zona de Lisboa, bandos organizados e violentos de jovens entram nas escolas durante o dia e desafiam professores, empregados e alunos. Com medo das represálias muitos sabendo-se indefesos calam. Casos conheço em que se organizam grupos de segurança, no desespero e raiva, perante a incapacidade das autoridades para punir tais bandos, tendo havido feridos de parte a parte.

Situações de violências isoladas e pontuais estão a tornar-se em crónicas, como se pode ver pelos meios de comunicação social e pelos alarmes lançados por professores e alunos desses estabelecimentos de ensino que são cada vez em maior número.

Gostaria de deixar bem claro que não consideramos ser esta violência só um mal em si mas, sim, que ela é antes a consequência das várias doenças da nossa sociedade consumista em que os seus mecanismos dinâmicos estão entregues a um estado incompetente e às forças incontroláveis de uma economia privada, egoísta e submissa às orientações, manobras económicas e pressões com origem exterior ao País e que nada têm a ver com os anseios e necessidades do nosso povo.

Mas voltando ao nosso professor, como pode ele devotar-se se como ser humano ele sofre a própria degradação das suas condições de vida, se tem de grandes distancias percorrer todos os dias de e para a escola ou se está longe dos seus como acontece com todos aqueles que são colocados a centenas de quilómetros da sua casa? E que dizer do próprio conteúdo do que ensina, deslocado das realidades da região em que está trabalhando? Porque não se implementa uma educação que parta das realidades locais e não de modelos que nada dizem aos alunos, sejam eles do interior, das zonas costeiras ou da cidade?

Novas pedagogias têm sido propostas mas os burocratas da educação é que sabem. Uma educação virada para a cooperação entre os povos, para a compreensão das realidades regionais e nacionais, para uma alimentação regional para combater o consumismo, para difundir o ideário do cooperativismo e da paz. Onde está tudo isso? Onde estão esses objectivos? Que prática vemos? E, para terminar, que dizer da acção da televisão que temos, que para além de uma ou outra rara série didáctica não tem a menor preocupação quanto às imagens que transmite no sentido de colaborar com uma educação integrada e interdisciplinar para uma nova forma de viver?

Enquanto não se compreender este processo e não for corajosamente enfrentado como um todo, não por um ministério mas, sim, com a colaboração de todos, estaremos a levar a cabo uma política educativa e imediatista de remendões e da qual nada há a esperar a médio e a longo prazos.
É pois, preciso mudar de política geral do País, urgentemente e por um caminho que tenha que ver com o desenvolvimento das regiões e contando preferencialmente com as nossas capacidades naturais, técnicas e humanas.
Então, e, naturalmente, com o refluxo das populações que se amontoam hoje nas cidades, para o resto do País, muitos dos problemas com que hoje nos defrontamos numa cidade que "rebenta pelas costuras", estarão mais ao nosso alcance se o Poder Central descentralizar realmente não só as competências mas igualmente os meios para os enfrentar, de forma muito mais económica e socialmente justa, da que se tem verificado até aqui.
E porque não acreditamos na vontade política do actual elenco governamental para mudar esta situação, não peço ao Sr. Ministro da Educação que se demita, mas sim que todo o Governo o faça e dê lugar àqueles que sejam capazes de dinamizar e canalizar para a reconstrução deste país as energias, as vontades e as ideias de um povo como o nosso, num país ainda maravilhoso como Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há por aí tanta ideia perdida.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Morais Barbosa.

O Sr. Morais Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro, conhecido como Estatuto da Carreira Docente Universitária, fixa uma percentagem do vencimento correspondente à respectiva letra como remuneração complementar dos professores universitários que optem pelo regime conhecido como "regime de dedicação exclusiva". Quer isto dizer que qualquer professor universitário que opte por tal regime fica impedido de exercer qualquer outra actividade remunerada e de receber qualquer outra remuneração acessória com excepção de direitos de autor, ajudas de custos ou pagamentos de

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conferências e cursos breves. Nada mais se lhe exige em troca da exclusividade.
0 Decreto-Lei n.º 312/84, de 26 de Setembro, criou porém para os docentes de Medicina um regime especial. Assim, os docentes de Medicina providos em lugares das instalações hospitalares ou dos estabelecimentos de saúde, ainda que na qualidade de
supranumerários, ficam obrigados à prestação das funções assistenciais próprias do respectivo cargo na instituição ou estabelecimento correspondente e simultaneamente ao exercício das funções previstas no Estatuto da Carreira Docente Universitária. E essas funções serão exercidas dentro do tempo de serviço a que os interessados estão obrigados na instituição ou estabelecimento de saúde correspondente, com direito, nestas condições, a vários abonos complementares que podem chegar a duplicar-lhes o vencimento.
Não está em causa, quanto a nós, o Decreto-Lei n.º 312/84, e aproveito esta oportunidade para dizer ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior que me dissocio das críticas de carácter pessoal que aqui e lá fora lhe foram feitas e que são perfeitamente injustas e deslocadas.

Aplausos do PSD.

O Orador: - Dizia eu que não está em causa este decreto lei e está tanto menos em causa quanto é verdade entendermos que a actividade docente universitária é das mais mal remuneradas pelo Estado
português. Torna-se urgente introduzir-lhe correcções adequadas, sobretudo se compararmos os vencimentos dos docentes universitários com os de outros funcionários. Resisto à tentação de dar quaisquer exemplos, mas seriam numerosos os que poderia citar de pessoas, que, com menos habilitações, com menos
exigência de qualidade, auferem vencimentos muito superiores às de um professor catedrático, o qual teve de fazer uma licenciatura, um doutoramento, concursos e atingiu o topo da carreira que é, na função universitária, general e ganha como major.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Ora essas condições servem para justificar que não se ponha em causa esse decreto-lei. E não se põe também porque tem de entender-se como correcta a justificação constante do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 312/84, nomeadamente quando afirma que a formação dos médicos deve ser de alta qualidade e assegurada por um corpo docente competente e isto como justificação do regime especial atribuído aos docentes de Medicina.
Mas igualmente entendemos que não deve ser menor ou de menos elevada qualidade a formação de quaisquer outros licenciados (engenheiros, químicos, advogados, economistas, etc.), e não admitimos que no espírito do legislador estivesse a ideia de que ela deve ser assegurada por um corpo docente menos competente. A competência deve ser igual em todas as escolas, e nenhum estudante, de qualquer curso, merece menos benefícios de elevada competência dos seus mestres, nem pode ser condenado a receber um ensino menos digno.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sendo assim, queremos acreditar que o Governo se disporá a tornar extensivas ao ensino de outras matérias e à formação de outros agentes as mesmas exigências de qualidade e competência reconhecidas pelo Decreto-Lei n.º 312/84, para a
Medicina, seus professores e estudantes. Para tanto, torna-se indispensável rever as condições do regime de dedicação exclusiva, na versão que se anuncia para breve do Estatuto da Carreira Docente Universitária e talvez até antes dela. Admito que quando se introduziu a figura da exclusividade se pensasse que o ensino poderia ser de melhor qualidade se os professores não se dedicassem a outra actividade que não a de ensinar, daí o
atribuir-se-lhes essa percentagem. Mas este mesmo decreto-lei a que me estou a referir vem demonstrar o contrário: o exemplo da Medicina prova ter se reconhecido que a qualidade de docente pode ser melhorada pelo exercício de actividade conexa - e não serão apenas os médicos que podem desempenhar actividades conexas e úteis à sociedade. Finalmente, e por falar no regime de exclusividade não pode deixar de constituir flagrante injustiça o negar-se aos docentes universitários convidados, em regime de tempo integral, o direito de subsídio de exclusividade de que beneficiam os docentes de carreira. Professores catedráticos, professores associados, assistentes, convidados porque não fizeram a carreira toda a partir de assistentes estagiários, ou porque a tendo feito ingressaram depois - por dificuldades burocráticas - pela via do convite, estão impedidos de receber esse subsídio. A verdade é que desempenham exactamente as mesmas funções, têm exactamente as mesmas responsabilidades. Pensamos que a trabalho igual deve atribuir-se remuneração igual. A revisão do Estatuto da Carreira Docente deverá também eliminar tal discriminação, que parece inspirada em espírito corporativo.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado Jorge Lacão está inscrito para uma intervenção. Acontece, no entanto, que o PS já esgotou o seu tempo. Mas em virtude da ASDI lhe transferir 10 minutos, o Sr. Deputado Jorge Lacão dispõe desse tempo para intervir, pelo que lhe dou a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao longo do debate desta interpelação foi patente algum estado de insatisfação dos deputados e dos próprios membros do Governo, relativamente a problemas candentes no sector educativo. Ninguém consciente dos problemas nacionais negará, seguramente, que entre os graves problemas nacionais avultam também alguns graves problemas na área da educação. Escamoteá-lo seria, politicamente, uma atitude irresponsável.
O importante é, seguramente, sabermos com que objectivo final foram os problemas da educação ventilados nesta interpelação ao Governo.
O Sr. Presidente da Assembleia da República manifestou a sua preocupação pela circunstância da Assembleia não dever ser uma câmara de eco do Governo. Deste debate, poderá seguramente concluir-se que, se algo aqui se passou, não foi a demonstração de que a Assembleia da República é uma câmara de eco do Governo ou, sequer, que a maioria que o apoia é uma câmara de eco de qualquer política sectorial mente definida por ele.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Todavia, é necessário que saibamos que a posição aqui assumida pela maioria e, no caso concreto, pelo Grupo Parlamentar do PS teve, como não poderia deixar de ser, a preocupação construtiva de alcançar o cumprimento do próprio programa
governativo. E manifestou, aqui o reitero, total solidariedade à equipa do Ministério da Educação, na convicção de que o nosso objectivo é comum e de que será em conjunto que alcançaremos o cumprimento integral do disposto no Programa do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os deputados do PS que intervieram neste debate manifestaram, claramente, que não ignoram as dificuldades, tendo mesmo feito um inventário de várias delas. Elas são de ordem diversa. É necessário dar coerência ao sistema de ensino no nosso país. Essa incoerência, que agora existe, tem, como aqui já foi referido, antecedentes históricos, alguns deles bastante arrastados no tempo. E será estultícia pretender que a culpa dessa ausência de coerência é desta equipa do Ministério da Educação ou deste Governo. Mas se a culpa não é dele, a responsabilidade de resolver esses problemas terá, naturalmente, de ser partilhada em simultâneo pelo Governo e pela maioria que o apoia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A educação é, obviamente, um tema mobilizador da opinião pública nacional. Ele afecta, como foi aqui referido, os alunos, os pais e os professores. É uma questão essencial na organização da própria sociedade e afecta particularmente a juventude. Não admira, por isso, que numa situação de crise grave, esta tenha sobre os temas da educação uma atitude particularmente crítica. O que seria de estranhar é que, quer os deputados que representam a juventude do PS, quer - creio poder também dizê-lo - os que representam a do PSD, não manifestassem aqui a sua posição crítica perante as questões da educação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Recordo o exemplo de um outro ministro da Educação, de um anterior governo do PS, relativamente ao qual muitas das críticas que lhe foram na altura feitas, algumas delas de forma contundente, se revelaram alguns anos depois nem sempre carecidas do mesmo fundamento que, na actualidade, pareciam ter.
Para implementar políticas de reforma é necessário ter coragem, designadamente para saber ouvir, de forma serena, as críticas que se lhe fazem e para prosseguir, também serenamente, na implementação dessas mesmas políticas.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

É para isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Grupo Parlamentar do PS manifestará permanentemente a sua solidariedade. Aliás, é significativo verificar que os deputados da comissão de educação, representando todos eles os diversos grupos parlamentares, fazem dela uma das comissões mais particularmente activas da Assembleia da República. Certamente, porque este tema, com todo o seu leque de problemáticas, é mobilizador da opinião pública, da juventude e dos próprios deputados, que com esta temática têm uma especial afinidade. Todavia, Srs. Deputados, é preciso não sermos politicamente ingénuos. Há que saber distinguir, de forma clara, objectivos. Os da maioria têm de ser e só podem ser, na perspectiva de reforço dessa mesma maioria, significativamente sérios, profundos e construtivos. Nisto nos distanciamos, obviamente, do objectivo final desta interpelação, da iniciativa do PCP.
O PCP já nos habituou a instrumentalizar todos os problemas do País para alcançar um objectivo para o PCP considerado essencial: derrubar o Governo.
Isso não, Srs. Deputados do PCP! Os problemas nacionais e, em concreto, os da educação não serão resolvidos com mais instabilidade política ou com mais hiatos na política governamental.

Aplausos do PS.

É por isso que não corremos a apanhar as canas dos foguetes que outros, inoportunamente, gostam de deitar. E é essa a razão, Srs. Deputados do PCP, por que claramente os desacompanhamos no vosso objectivo de, pedra por pedra, desgastar esta equipa governamental!
Estamos preocupados com as políticas e com a sua orientação, mas manifestamos solidariamente essa mesma solidariedade e confiança para que os actuais membros deste Governo, sem excepção, levem à prática o compromisso que assumiram perante o País e perante a Assembleia da República que os apoiou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com esta preocupação de clarificação de linhas de orientação política que o PS e o PSD têm vindo a encontrar-se para clarificar de uma maneira positiva os seus próprios objectivos de política a prosseguir a curto e a médio prazo, numa perspectiva de reforço da coligação.
É essa perspectiva de reforço da maioria que aqui nos deve, mais uma vez, tornar conscientes de que este papel e as dificuldades devem ser distribuídas de uma forma equitativa, pelo Governo e pelos grupos parlamentares que o apoiam. No final, seremos todos co-responsáveis pelos êxitos do Governo e pelos seus eventuais fracassos.
0 que não aceitaremos é que numa fase intermédia da execução de uma política, numa fase mais difícil para um ministério ou para um ministro, se ponha em causa um ou outro. Não foi nem será esse o propósito, nesta ou noutra circunstância, da bancada do PS.

Aplausos do PS.

Em conclusão, cooperámos nesta interpelação ao Governo, sem rebuços para fazer o inventário das dificuldades. Carreamos muitas das dificuldades que consideramos urgirem correcção e um ataque, tanto quanto possível, rápido.
Fizemos isto conscientes de que no final, feito esse inventário, esta maioria deve sair daqui mais confiante em si própria, mais solidária com o Governo e mais empenhada em prosseguir e resolver as dificuldades do futuro.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.

0 Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Se o Sr. Presidente me consentisse, gostaria, utilizando a gentileza da

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ASDI, que me cedeu alguns minutinhos, de fazer aqui uma breve consideração.
Na minha presença e num momento em que o Governo não tinha a possibilidade de intervir, foi aqui posta em dúvida a solidariedade dos membros do Governo, e não necessariamente dos aqui presentes, para com o Sr. Ministro da Educação e a sua equipa. Logo me pareceu que haveria de haver um momento para responder e penso que o momento é este, porque dado que pedi insistentemente ao Sr. Ministro da Educação o favor de ser ele e não eu a encerrar esta interpelação, corria-se o risco de esse facto vir a ser interpretado, exactamente, como uma demonstração de falta de solidariedade do Governo ou de mim próprio para com ele e a sua equipa. O que pretendo dizer é apenas que isso não está nem nunca esteve em causa nem pode ser facilmente questionado, porque uma dessolidarização não se inventa. Ou existe ou não existe e esta, de facto, nunca existiu nem existe.
Daí, então, alguma explicação (e não uma justificação, porque não tenho de a dar) acerca da razão porque pedi ao Sr. Ministro da Educação que fosse ele a encerrar o debate e não eu.
Primeiro, por uma antecipação do respeito pela vontade desta Assembleia. A Assembleia da República entendeu e muito bem que devia alterar no Regimento o dispositivo que exigia que fosse o primeiro-ministro a encerrar as interpelações, certamente por ter entendido que, sobretudo quando se trata de matérias especializadas, deve ser um especialista e não um clínico geral a encerrar a matéria. Só teremos a ganhar com isso.
Por outro lado, fiz um esforço tão grande, fiquei tão cansado e senti-me tão vazio depois da última intervenção que fiz aqui, que ficava agora colocado perante esta situação: ou maçar os Srs. Deputados, dizendo lhes coisas sem interesse, ou repetir o que
tinha dito, admitindo que tivesse algum interesse.
Optei na verdade, em virtude de mais essa razão, por pedir ao Sr. Ministro da Educação que dissesse, como vai com certeza dizer, coisas mais interessantes do que eu poderia acrescentar àquilo que da outra vez disse.
Penso que as interpelações devem ser cada vez mais interpretadas como um facto normal da vida desta democracia e deste Parlamento e que não devem provocar a interrupção da vida normal do governo. Não é preciso que estejam aqui os ministros todos, mas apenas aqueles que sejam significativos o bastante, para que não seja posta em dúvida a coesão da equipa governamental e a solidariedade de todo o governo, a começar pelo primeiro-ministro, relativamente ao ministro que esteja a ser interpelado. Por isso, as discussões de interpelações que versem sobre matéria na especialidade devem ser, sempre que possível e como regra, encerradas pelo próprio ministro responsável pela pasta que esteja fundamentalmente em causa.
Por último, porque por uma razão de egoísmo, que me será perdoado, prefiro naturalmente ouvir o Sr. Ministro da Educação falar de educação do que sujeitá-lo a ela a, sobre isto, ouvir-me falar a mim.
Era esta a explicação que queria dar à Câmara.

plausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - No encerramento do debate, dispõem quer o partido interpelante quer o governo, de 30 minutos.

Tem a palavra o representante do partido interpelante, a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Chega ao fim esta interpelação ao Governo. E foi importante que tenha sido centrada sobre as questões de ensino!
Demonstrámos de forma concreta, exaustiva e indesmentida que o sistema de ensino entrou em completa desagregação e que dele são as principais vítimas as crianças e jovens das classes populares e dos sectores intermédios.
Demonstrámos que toda a política deste Governo não visa a reconstrução do sistema de ensino. Assenta na redução das verbas da educação, para reduzir a procura escolar, conduzindo à elitização cada vez mais acentuada do sistema de ensino. Ficou claro que a execução dessa política, designadamente no ensino superior, conduziria inevitavelmente às mais drásticas restrições de acesso, sobretudo se fossem impostos (como quer o Governo) os novos exames de aptidão.
Demonstrámos a profunda degradação do parque escolar em todos os níveis de ensino, a superlotação das turmas, a proliferação de regimes escolares diferenciados, a falta de material escolar.
Demonstrámos o não cumprimento da escolaridade obrigatória em si mesma, já insuficiente, e a elevação das taxas de insucesso e abandono escolar em todos os graus de ensino.
Demonstrámos a insuficiência da formação dos professores e a degradação das suas condições de trabalho e de vida.
Demonstrámos que as estruturas de ensino especial e dos esforços das CERCI's exigem o apoio urgente que lhes tem sido negado por este Governo.
Demonstrámos que os esforços do Poder Local não têm correspondência nas acções do Governo quanto à educação infantil pré-primária.
De tudo resultou a comprovação dos perigos da política que tem sido seguida no sector da educação e a necessidade de lhes pôr termo urgentemente. Seabra tem de ir para a rua. Mas isso não basta.
A oposição que o Governo merece é global. O ministro da Educação é um exemplo particularmente ilustrativo do que é o governo do PS e do PSD e dos caminhos para onde leva o País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Não é só a educação que está numa situação alarmante como ficou demonstrado ao longo destes 2 dias de debate.
A política de educação só condiz com a restante política governamental que o País também rejeita.
Realizada num momento em que a crise da coligação paralisa as instituições, a interpelação do PCP permitiu fazer uma outra demonstração de grande significado político: é que enquanto os problemas nacionais se agravam dia a dia os responsáveis do Governo e da coligação enchem os ouvidos dos portugueses, as páginas dos jornais, com as suas tricas e partilhas de poderes, jogos de influências e desalmadas ambições pessoais. E os grandes problemas nacionais e a crise que o País atravessa, Srs. Deputados? E o Orçamento do Estado que devia estar votado daqui a 8 dias e não foi ainda entregue, e os salários em atraso, e o desemprego, e a situação de rotura económi

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ca e financeira, e as casas que não há, e os preços que sobem, e os salários que não chegam para comer?
O País, esse vive um pesadelo e assiste a um espectáculo que só é pena ser uma tragédia. Perante o isolamento social do Governo e o avolumar dos problemas os partidos da coligação passam-se para a oposição! Os PS's cu1parn os PSD's, os PSD's culpam os PS's. O balanço final esse é indesmentível: uns e outros ao fim de ano e meio de governação são responsáveis pelo estado a que o País chegou!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Mas mais grave é que submetendo todos os interesses nacionais e do povo ao sonho de um primeiro-ministro que sonhou ser Presidente da República, o PS se dispõe a tudo e a agravar ainda mais a política que vem sendo seguida.
E aí teríamos, se lá chegassem, a lei de segurança interna para amordaçar os descontentes, a escandalosa lei dos aumentos das rendas de casa e uma lei eleitoral que lhes perpetue o Poder...
E teremos a seu tempo a demissão de uns "Dirceus" que paguem a factura não dos auscultadores nos confessionários, mas dos desastres governamentais.

Aplausos do PCP.

É, porém, para nós comunistas chegado o momento de dizer basta a esta política, a este Governo!
Com a interpelação que agora se encerra pretende-mos, por um lado, mostrar documentadamente onde nos tem conduzido o actual Governo e apresentar, por outro lado, as linhas fundamentais de uma política democrática para o sector.
É agora possível dizer que os dois objectivos foram realizados. O grupo parlamentar trouxe à Assembleia a realidade existente nas escolas, os mais graves problemas com que se defronta o sistema, a avaliação das consequências de cada medida tomada ou não tomada pelo Ministério numa gama imensa de informação que só foi possível pelas visitas e deslocações realizadas por todo o País pelos deputados comunistas, mas também pelo que nos fizeram chegar as organizações do PCP, em especial as da juventude e dos professores, e muitas outras entidades e cidadãos que se nos dirigiram para que aqui colocássemos os problemas, por vezes angustiantes, com que se defrontam. Foi precisamente isso que fizemos, nas nossas intervenções, nas múltiplas perguntas ao Governo, nos mais de 300 requerimentos que apresentámos, nos projectos de lei que iremos depositar na Mesa.
O ministro, pelo seu lado, revelou uma preocupação exclusiva: fugir por todas as formas ao debate, planar acima de todas as questões. Ocupou-nos o tempo citando a esmo relatórios internacionais, debitando entre lapsos e confusões, os lugares comuns daquilo a que chamou um pensamento "estruturalista, funcionalista e reformista".
Mas ninguém ouviu anunciar uma só medida para enfrentar questões que aqui todos reconheceram existirem. Nada! Para o ministro está tudo como tinha de estar, a Europa espanta-se mesmo connosco e até quer copiar-nos... Chegámos a ouvir que no País, em Portugal, uma vaga de fundo implora ao ministro Seabra que continue por favor a fazer o sacrifício de se aguentar na 5 de Outubro.

Mas é significativo, Srs. Deputados, que esta seja a primeira interpelação, que nos recordamos, em que o Primeiro-Ministro nem sequer tenha passado por cá.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: A realidade é, porém, diferente daquela que apresenta o Sr. Ministro Seabra e a Assembleia da República ficou consciente dela. Neste ano e meio o sistema de ensino degradou-se mais ainda perante a irresponsabilidade de um ministro que tem da interpelação a ideia de um somatório de vacuidades e de governações, a ideia de um somatório de inaugurações.
Ele aparece em todas, não perde uma inauguração e não só de escolas, de estátuas, de homenagens póstumas e futuras, de estradas, de lances de estradas, de cidades, de tudo o que for inaugurável. Quando se trata de escolas, ou de pavilhões pré-fabricados o ministério envia mesmo um ofício sobre as letras a dourado e mais dizeres que devem conter as placas (pagas pela escola, evidentemente!). E o ministro discursa, discursa mesmo muito, por todo o País. Sobretudo, como os órgãos de comunicação social podem não estar todos lá, o Ministério envia todos os discursos por "telex" para todas as redacções. E então descobrimos escolas inauguradas duas vezes com um ano de diferença, escolas inauguras pelo vice-primeiro-ministro e, posteriormente, pelo ministro da Educação vários ministros para inaugurar uma mesma escola ou escolas inauguradas e que não funcionam como a de Carrazeda de Anciães.
Mas a outra fobia ministerial é a formação de grupos de trabalho. Grupos de trabalho para tudo. Para o ensino artístico, para os institutos de serviço social (ISSS), para o Instituto de Alfabetização, para a abertura do ano lectivo, para a orientação escolar, para o ensino especial, para o estatuto da carreira docente superior, para o estatuto dos educadores de infância, para o estatuto dos professores do ensino básico, para a reinserção das línguas e cultura clássicas, para a reorganização de serviços do ensino especial, para a reconversão da Academia de Música de Setúbal, para a lei quadro dos estádios universitários, para o enquadramento dos ISCAS, etc., etc. (a enumeração fica incompleta e a confusão é tal que há mesmo despachos criando grupos de trabalho coordenadores de grupos de trabalho anteriormente constituídos). Que fizeram? A que conclusões chegaram? O que já resolveram? Quanto custam estes grupos de trabalho? Ninguém sabe. Mas aí fica a sugestão. Que se constitua imediatamente um grupo de trabalho que averigúe o que fizeram as muitas dezenas (mais de 30 contamos nós) de grupos de trabalho criados na 5 de Outubro pelo ministro Seabra. O ministro alegou que as questões vêm de trás. É uma péssima defesa para quem agravou tanto os problemas e uma acusação ao seu próprio partido e ao PS. É que há 9 anos que, com uma breve interrupção, a pasta da educação é da responsabilidade do PS ou do PSD aplicando uma política que não pode continuar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A situação caótica que vivemos resulta em primeiro lugar do facto deste sector não ser considerado uma prioridade orçamental. De ano pa

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ra ano reduzem se em termos reais os gastos com a educação. As verbas previstas no Orçamento do Estado, os investimentos no sector, nomeadamente nas construções escolares. Isto significa, Srs. Deputados, que está a ser hipotecado o futuro do País numa perspectiva de desenvolvimento e até de bem estar cultural (só Salazar consideraria um bem inestimável a ignorância e disse-o). Mas a redução das despesas reais com a educação acarreta e arrasta novas despesas. A criança que vive a quilómetros da escola, que está armazenada num edifício, que não tem cantina onde comer, está condenada ao insucesso escolar, e arrasta-se ao longo de anos para conseguir cumprir (se não desistir antes) a escolaridade obrigatória. Face a isto o Governo reduz ainda mais as verbas com a educação (em vez de as aumentar) e faz, assim, um decreto-lei isentando crianças do cumprimento da escolaridade obrigatória, o que abre a porta a verdadeiros crimes.
Basta que uma autoridade sanitária (um bombeiro, chega, Sr. ministro?!) ou escolar a considere deficiente e o Estado lava as mãos.

O Sr. Presidente: - Dá me licença, Sr.ª Deputada?
Apelo aos Srs. Deputados que haja silêncio.

A Oradora: - Tanto aos Srs. Deputados como aos Srs. Membros do Governo. E talvez fosse bom lembrar lhes que não estamos no recreio, apesar de estarmos a falar de ensino.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Penso que os Srs. Membros do Governo não terão culpa de os Srs. Deputados andarem, constantemente, junto da bancada governamental.

A Oradora: - Ainda gostava de saber que "cunhas" é que estarão a meter. Se ainda for para as escolas...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, penso que o seu comentário é inoportuno e inadequado. Faça favor de prosseguir.

A Oradora: - Sr. Presidente, eu dizia "cunhas" no bom sentido, tendo dito mesmo que se fossem para umas escolas lá no distrito, não era mau.
Como eu ia dizendo, basta que uma autoridade sanitária ou a escola a considere deficiente para o Estado lavar as suas mãos.
Este decreto-lei envergonha o País, causa uma justa indignação com largo eco aqui na Assembleia (e o Ministro silenciou a questão). É uma conclusão essencial deste debate. A necessidade de urgente
revogação do diploma e nesse sentido apresentaremos hoje mesmo o correspondente projecto de lei. Ele é porém o espelho das linhas orientadoras da política educativa do Governo e traduz exemplarmente uma das questões fulcrais evidenciadas por esta interpelação: a política do Governo em vez de assegurar a igualdade de oportunidades e de êxito escolar -
sublinho êxito escolar - como estabelece a Constituição, faz o inverso. Mas a Constituição da República diz mais: "O ensino deve ser modificado de modo a superar qualquer função conservadora de desigualdades económicas, sociais e culturais."
A política seguida é o inverso disso: exclui, selecciona, afasta do sistema as crianças e jovens oriundos das classes e camadas trabalhadoras. Diga o ministro - se é capaz -, uma única medida tomada inserida na perspectiva de democratização da educação. Para este Governo os trabalhadores estudantes não existem, não existem oficialmente e não mereceram nenhuma referência durante este debate. Nem contam para as verbas distribuídas às escolas (que as recebem em função dos estudantes diurnos). As escolas não têm
cantinas a funcionar à noite. "Comemos sandes" explicam-nos os trabalhadores estudantes que chegam às 18 horas e partem à meia noite. Estudam por livros de meninos pequenos, têm os mesmos programas e menos horas lectivas, não têm quotas de entrada na universidade e, por exemplo, nunca conseguem a nota para concorrer aos "numerus clausus" com os do ensino diurno.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

A Oradora: - Não têm material pedagógico de apoio. Têm no fundo e apenas uma enorme força de vontade para nesta situação ainda persistirem!
Na lógica inconstitucional e antipopular do Governo "o ensino é para quem o puder pagar", e tudo começa logo no infantil.
A interpelação do PCP trouxe para o Plenário da Assembleia da República esse escândalo que é a existência de 1000 jardins escola construídos e equipados que aguardam há num ano a assinatura de uma portaria de colocação de educadores que estão entretanto no desemprego. Não somos só nós a colocar a questão, mas o Governo não respondeu. O ministro Seabra não só não se indigna pelo facto de o ministro das Finanças não assinar a portaria como até fez logo teoria proclamando a vantagem de as mães ficarem ocupadas com os filhos, que há muito desemprego feminino.
A acção social escolar está reduzida a uma insignificância. No ensino obrigatório foi transferida juntamente com os transportes para as autarquias sem os devidos meios e com resultados gravíssimos Basta referir que milhares de crianças ficaram sem nenhum transporte porque a escola que serve a sua aldeia está no concelho vizinho do local de residência, nenhum dos municípios assumindo o encargo!
Há um ano, o ministro chamado à Assembleia para discutir com os deputados o aumento do preço das refeições nas cantinas universitárias justificava esse aumento com a necessidade de aumentar as verbas da acção social escolar do ensino básico!
Um ano depois volta a fazer o mesmo, com a mesma justificação, e no entanto as verbas da acção social escolar do básico baixaram também!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

A Oradora: - Felizmente que a luta estudantil forçou o ministro a um enorme recuo e à suspensão da malfadada portaria!
No entanto, nas visitas que realizámos pelo País os professores colocaram nos a situação de crianças subalimentadas, com fome, sem rendimento escolar. Crianças que se deslocam das aldeias de manhã cedo e ficam sem comer horas a fio quando bem necessitavam de um suplemento alimentar a meio das aulas.

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Mas isso que é considerado um luxo insustentável pelo Governo, tem urgentemente de ser considerado na Assembleia da República!
O ministro tentou novamente fazer a demagógica comparação entre as verbas gastas com os estudantes do ensino básico e as atribuídas ao ensino superior que considerou elevadas. Mas a verdade é que as residências escolares são poucas e hoje um quarto numa cidade com universidade custa entre 12 000$ e 15 0005 por mês. Encontrámos estudantes do ensino superior deslocados para Aveiro ou Coimbra, por exemplo, que alugam um quarto para 2 ou para 3 cujas condições de aluguer incluem apenas a dormida. Faltam aos estudantes locais de estudo ou de permanência durante o dia, já que nas universidades, elas também superlotadas, é impossível encontrar um local onde estudar ou onde estar.
A selecção é cada vez mais feita numa base económica - eis uma das conclusões fulcrais desta interpelação. Valeria a pena fazer as contas de quanto gasta por mês uma família com um filho numa
universidade longe de casa, com alojamento, alimentação, livros escolares e transportes, para só se falar do essencial.
É preciso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, dizer que em 1980 o Ministério despendia apenas do seu orçamente 3,7 % em bolsas e subsídios e 3,8 % em outros serviços sociais.
Estes números estão a baixar e isto é inaceitável! Nas condições que o País atravessa e para cumprimento do preceituado na Constituição quanto à democratização do ensino, a acção social escolar tem de ser uma prioridade política.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: O debate que agora se encerra permitiu concluir que um dos factores de degradação do sistema é a situação do parque escolar. Colhemos em todo o País numerosos exemplos que trouxemos aqui demonstrando insofismavelmente que a abertura do ano escolar foi uma catástrofe. O Ministério decreta todos os anos em Setembro que as escolas estão abertas em Outubro, e as escolas abrem em cada ano em condições piores, em condições mais degradadas. O ministro Seabra nada fez ao longo do ano para garantir as condições mínimas que permitissem abrir o ano lectivo e em Setembro, Outubro, o ministro ameaça de forma verdadeiramente inadmissível, responsabilizando os conselhos directivos pelas situações existentes. Repetiu essas calúnias na Assembleia da República e nós já dissemos, mas queremos repeti-lo, que se nós encontrámos no País pessoas dedicadas ao ensino e fazendo esforços imensos para que ele não paralise foram e são os conselhos directivos das escolas. E todos. Sejam de esquerda, de direita, de qualquer quadrante.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O ministro Seabra, porém, em vez de reconhecer isso mesmo intimida, grita e cria-lhes um clima insustentável que muitos dizem não poderem aguentar mais. Aqui na Assembleia da República responsabilizou-os mesmo pelos actos de vandalismo que são praticados por marginais nas escolas. E nós repetimos que têm de acabar esta transferência de responsabilidades para cima daqueles mesmos que são um pilar do sistema de ensino. E têm de haver medidas!
Só na região norte, de um total de 227 escolas necessárias 32 % não estão construídas; no Centro, das 189 necessárias 63 % não estão construídas; em Lisboa e Vale do Tejo, de 135 escolas necessárias 57 % não estão construídas e no Sul, das 56 necessárias, 50 % não estão construídas. Isto é, 48 % das 607 escolas necessárias não estão construídas.
Estes são os dados oficiais que existem no Ministério. Não era necessário constituir um grupo de trabalho para fazer o planeamento das necessidades, porque ele está feito há anos e está actualizado.
E há escolas que estão construídas e que não têm alunos. Ao exemplo trazido pelo Sr. Deputado César de Oliveira acrescentamos o da Escola Preparatória do Ribeirão, em Braga, que tem 75 alunos inscritos e de Forjães que tem 57 e do Pinheiro, no Porto, que não tem alunos, tal como a de Pataias. Nesta última os 38 alunos que havia foram deslocados para a Nazaré e para Leiria.
Urge também resolver situações escandalosas como as que encontrámos nas visitas preparatórias desta interpelação. Fomos encontrar a Faculdade de Economia de Coimbra a funcionar em pré-fabricados; a de Engenharia do Porto tem um anexo em construção desde o tempo em que Veiga Simão foi ministro da Educação e as obras ainda não acabaram, nem acabarão tão depressa; na de Ciências, de Lisboa, o novo bloco não funciona por falta de condições de segurança e o curso de Química ainda não se iniciou; a Faculdade de Letras de Lisboa afunda-se no solo; na Universidade de Aveiro não se constrói nada desde 1976 e a do Algarve funciona com 2 anos lectivos em instalações provisórias para apenas 1 ano.
Srs. Deputados: Há uma situação de calamitosa insuficiência na rede escolar e o ministro nem uma palavra dedicou ao assunto!
Da interpelação do PCP resulta ainda uma importante contribuição para a denúncia das condições pedagógicas em que se trabalha nas escolas portuguesas. O sistema de ensino está, no aspecto curricular, caótico. Os professores não são em regra preparados para ensinar a totalidade das matérias que leccionam. O ensino é, do primário ao superior, livresco, desligado da vida, e da prática profissional futura. Tudo existe e é feito tendo em vista (e mal!) um ensino superior a que só poucos têm acesso.
Os velhos conceitos retrógrados e reaccionários reintroduzem-se em força nos programas escolares e o ministro não hesita em declarar numa entrevista que a educação sexual deve ser leccionada na disciplina de religião e moral.

O Sr. Lemos Damião (PCP): - Haja Deus!

A Oradora: - A lei sobre educação sexual continua por aplicar e regulamentar com total desprezo pelos prazos fixados pela Assembleia da República.
Quanto aos currículos, não estão articulados nem a nível vertical nem horizontal, o que dificulta a assimilação das matérias e não é feita a aplicação dos conhecimentos. Os jovens andam na escola e todos os dias perguntam "para que é que, isto me interessa"! E simultaneamente vão servindo de cobaias dos ministros que vão passando. É o caso daqueles que seguiram a via profissionalizante e que dela saíram sem profissão e sem acesso ao ensino superior!

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Mas que gosto podem ter pela escola que frequentam se nesse espaço superlotado, sem um lugar para o convívio, os jovens se amontoam tantas vezes em salas e corredores que nem são limpos por força das restrições à admissão de pessoal e suportam uma brutal carga horária?!
Ginásios há cada vez menos. Continua em vigor o despacho de 13 de Novembro de 1981 que suspende indefinidamente a construção de instalações gimnodesportivas nas escolas. Há já neste momento 172 escolas preparatórias e 111 secundárias que não dispõem de instalações que permitam a prática do desporto, tão importante para a formação global dos jovens. Foi chocante o silêncio governamental sobre esta matéria (similar, aliás, ao que manteve quanto ao ensino artístico).
Mas a questão fundamental que aqui colocamos é que as medidas tomadas pelo Ministério Seabra afastam do sistema de ensino milhares de crianças, de jovens, numa brutal selecção de classe e que se agrava a reprodução pelo sistema das diferenças e desigualdades existentes na sociedade. E não é por incapacidade embora a incapacidade e o desconhecimento dos problemas pela equipa desfalcada de Seabra tenham ficado vivamente espelhados neste debate. É uma opção política, é uma opção de classe.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Não é admissível que num momento em que as taxas de repetência se agravam e constituem prova clamorosa do fracasso da política educativa a que o País tem estado sujeito, o Governo não tenha dito sobre o assunto uma só palavra. A taxa de repetência no ensino primário é de 40% na 1.ª fase e 30% na 2.ª

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Quem é o culpado?

A Oradora: - A nível europeu, Srs. Deputados, esses valores estão próximos dos 5%. 0 mal não está nas crianças portuguesas, mas nos ministros e no sistema que impõem ao País e que conduz a que no ensino preparatório haja taxas de repetência que rondam os 20% no 5.º ano e os 18% no 6.º, acompanhadas de elevadas taxas de abandono: l2% no 5.º ano e 23% no 6.º ano!
Não é, pois, de espantar esta afirmação que aqui fizemos sem desmentido oficial: o analfabetismo persiste mesmo em jovens dos 14 aos 20 anos. E a única justificação que o ministro deu para a inépcia governamental no combate ao analfabetismo e na educação recorrente foi a "hibernização do CNAEBA", aliás, da responsabilidade do partido do ministro.
As crianças deficientes são igualmente deixadas ao abandono.
Apesar dos graves problemas com que se debate o ensino especial e que aqui trouxemos, ninguém do Governo lhes deu qualquer resposta.
O ministro Seabra falou sim, e essa é sua preocupação, no aumento de verbas do Ministério para o ensino particular o que é de uma enorme gravidade no momento em que a rede pública apresenta carências tão brutais e as crianças filhas dos trabalhadores, de camponeses nem ao ensino obrigatório têm acesso garantido.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Dos docentes também o Governo disse nada. Não só o PCP, como deputados de várias bancadas, colocaram a questão do futuro das escolas superiores de educação e salientaram a aberração que é o facto de 6 anos após a sua criação ainda não estar definido para que servem, que professores vão formar e para que sistema. Nada! Nenhuma resposta sobre o estatuto da carreira docente do ensino não superior, nenhuma perspectiva de reposição do poder de compra degradado por imposições salariais como os agora anunciados "aumentos" de 15,7%. O ministro aproveitou, sim, para ameaçar com restrições à profissionalização em exercício e ao completamento de habilitações.
Procurando negar a realidade caótica das escolas, o Governo
acusou-nos de uma visão apocalíptica das coisas. Vá dizer isso aos pais, Sr. Ministro, aos estudantes, aos professores, aos que vivem no dia a dia o drama das escolas.
Ficou inquestionavelmente demonstrada a urgência de uma lei de bases do sistema educativo. O Governo ainda não a propôs, ano e meio depois de tomar posse e é inadmissível que o ministro venha aqui dizer que a Assembleia da República não a aprovou ainda. Poderiam ser tomados por base os projectos pendentes do PCP, do PS, do MDP? E o PSD estaria de acordo com o projecto do PS? Poderia tomá-lo por base da actual coligação? Evidentemente que não! 0 Governo foi incapaz de elaborar uma proposta...
Mas nós consideramos que a Assembleia da República pode, deve e tem de debater e aprovar as bases do sistema educativo e nesse sentido apresentaremos um projecto de deliberação fixando para o efeito os termos e prazos adequados!
0 Grupo Parlamentar do PCP ao tomar a iniciativa desta interpelação, na sua preparação e concretização guiou-se pela preocupação de dar voz aos justos protestos e reivindicações que se manifestam nas lutas dos estudantes, dos professores e dos demais trabalhadores do ensino e para trazermos aqui a expressão das queixas e reclamações de pais e famílias, das mais largas camadas do nosso povo que legitimamente aspiram a um ensino aberto às jovens gerações e capaz de responder às necessidades do País.
Não se estranhará que salientemos, pelo profundo carácter unitário e expressão nacional, a luta dos estudantes em torno dos serviços sociais e contra o aumento dos preços das cantinas, a que prestámos desde a primeira hora o nosso apoio, incluindo com iniciativas parlamentares.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Queremos reafirmar agora expressamente a nossa activa solidariedade à greve de Letras e a todas as lutas dos estudantes e professores contra o saneamento de José Manuel Tengarrinha.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reafirmamos igual mente o nosso apoio às lutas dos professores actualmente em curso contra a degradação do ensino, pelo estatuto, a profissionalização e o aumento de vencimentos e que assumiu grande expressão combativa na manifestação do passado dia 28 de Novembro.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

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Não temos dúvidas de que são estas grandes acções colectivas e iniciativas de massas onde se manifesta tão expressivamente a vontade dos mais directamente interessados que se preparam as condições para a concretização de uma política alternativa à política desastrosa do ensino seguida pelo ministro Seabra e pelo governo do PS/PSD.
Importa salientar, porém, que o caos que esta interpelação permitiu revelar em relação à política de ensino (realidade que muito poucos se permitirão contestar) é, exactamente, o que se passa nas outras áreas da acção governativa. A resistência e a oposição das massas, cresceu, também correspondentemente.
A luta popular está em ascensão por todo o lado, cresce a iniciativa dos democratas (muitos que a desilusão desmotivou retomam o caminho à intervenção), surgem novas formas de participação política e a alternativa democrática vai-se assim definindo no horizonte.
O plano de subversão a curto prazo que os 2 partidos se aprestam para assinar é que constitui uma grande ameaça ao regime democrático.
As forças democráticas são, porém, capazes de pará-la e
derrotá-la, conseguindo afastar o governo do PS/PSD e substituí-lo por um governo verdadeiramente democrático.
Isto é fundamental para assegurar uma vida nova nas escolas e o prosseguimento do 25 de Abril em Portugal.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, o Partido Socialista solicita 20 minutos de intervalo.

O Sr. Presidente: - É um direito que o Partido Socialista tem. Está concedido o intervalo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para manifestar a nossa surpresa por este pedido de intervalo. Até agora nunca aconteceu que, a meio desta fase especial do debate, que se chama encerramento, se tenha feito um pedido de interrupção.
O que seria lógico, curial e elegante, do ponto de vista parlamentar, é que este pedido de interrupção tivesse sido feito antes de entrarmos no período de encerramento.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, é um direito potestativo do Partido Socialista.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Naturalmente. O Sr. Presidente já tomou uma decisão, nós não vamos contestá-la nem recorrer dela, mas queremos sublinhar, perante a Assembleia da República e perante o País, o inusitado desta situação e a sua originalidade, a qual, certamente, tem um significado político.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Está suspensa a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: Está reaberta a sessão.

Eram 21 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, atendendo às circunstâncias criadas pelo inusitado pedido de suspensão da sessão, por parte do Partido Socialista, e para ponderarmos na nossa posição final, pedimos mais meia hora de intervalo.

O Sr. Presidente: - Está concedido.

Está suspensa a sessão.

Eram 21 horas e 5 minutos.

0 Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 21 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

0 Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, não vou pedir um intervalo de meia hora.
Pretendo fazer só uma interpelação, no sentido de saber se a Mesa vai continuar a aceitar este exercício dos direitos potestativos dos grupos parlamentares e dos deputados sem lhes fazer uma observação
Primeiro, houve um pedido para um intervalo de 20 minutos para ver um programa televisivo. Depois, houve uma maneira pouco imaginativa de responder a esta interrupção. Isto desprestigia a Câmara, a Assembleia, o País e a democracia.

O Sr. Presidente: Para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que, do nosso lado, consideramos ser também verdadeiramente desprestigiante para a Assembleia da República que, no momento em que se vai encerrar uma sessão destas, se faça um pedido de interrupção, como nunca tinha sucedido nesta Casa. Reunimos o nosso grupo parlamentar, decidimos não inviabilizar que o Sr. Ministro fale, mas não podemos deixar de manifestar o nosso veemente protesto, porque consideramos que isso não é prestigiante para a Assembleia, para os nossos trabalhos nem para a forma como deve decorrer uma interpelação ao Governo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para proceder ao encerramento do debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (José Augusto Seabra): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: No encerramento deste debate sobre política geral do Governo, que incide particularmente sobre política educativa, como deputado eleito que também sou, estando embora a exercer funções governativas, não poderei deixar de dirigir uma saudação a todos os Srs. Deputados que participaram neste debate.
Se o artigo 183.º da Constituição que nos rege estipula que os deputados, por meio de uma interpela

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cão ao Governo, têm o direito de provocar a abertura de debates sobre política geral, isso significa que, de facto, o objectivo central de uma interpelação deve ser o debate. Aliás, basta ler o artigo 210.° do Regimento desta Assembleia para se verificar que, por várias vezes, de uma forma anafórica, se repete que «O debate será aberto com as intervenções de um ou mais representantes do grupo parlamentar interpelante» (...) e (...) «não poderá exceder duas reuniões plenárias (...)»

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Leia o resto.

O Orador: - (...) E que «será encerrado com as intervenções do Primeiro-Ministro (...)» ou, agora, segundo parece, de um ministro.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isso não diz. Leia bem, porque não diz.

O Orador: - Aliás, queria corrigir aquilo que foi dito aqui, por na verdade já participei numa interpelação sem a presença do Sr. Primeiro-Ministro. Temos a presença, em nome do Governo, do Sr. Ministro de Estado, que aqui está, a quem agradeço não só a gentileza mas a abertura que revela, em termos políticos, ao dar ao próprio Ministro da Educação a oportunidade de encerrar os debates.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Francamente!

O Orador: - O que é uma interpelação?
Acabámos de ver. Mas uma interpelação supõe interlocutores. Antes de mais, importa saber de quem parte a interpelação. Mas ela parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, assim como a primeira interpelação, feita em Junho, partiu do Movimento Democrático Português.
Se a interpelação parte deste partido a quem se dirige? Dirige-se ao Governo, E é em nome do Governo que eu aqui falo com a solidariedade do Sr. Primeiro-Ministro, do Sr. Vice Primeiro-Ministro e de todos os ministros que compõem o actual Governo, maioritário, que emanou de eleições livres e que, portanto, representa o País.
Temos os interlocutores. Vejamos agora o fim visado pela interpelação. Esse deveria consistir em, através do debate, esclarecer os Sr s. Deputados representantes eleitos do povo e, através deles, o País.
Será esse o fim real desta interpelação?
Para saber qual é o fim real da interpelação importa perguntar: a quem aproveita ou pode aproveitar a interpelação? É evidente que a interpelação aproveita ou pode aproveitar ao próprio partido interpelante. Mas pergunto mais: a interpelação não pode também aproveitar aos inimigos da democracia em geral?

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como eu disse no início da minha intervenção, não poderá, inclusive, ser esta interpelação um meio de criar um colapso no âmago de alguns que pensavam ser uma crise de coligação?
Não fomos nós, Governo, que escolhemos este momento...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Foi, foi!

O Orador: - ... embora um conjunto de circunstâncias, como eu disse, tenha criado um contexto em que a interpelação aparecia no cerne de uma situação complexa, a qual o Sr. Primeiro-Ministro, pela televisão, acaba de esvaziar.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A ver vamos, com diz o povo!

O Orador: - E isso já permitirá, penso eu, que o encerramento deste debate não seja feito sob o signo de uma paixão, de um excesso, mesmo de um excesso de expectativa, por parte do partido interpelante.
A afirmação de solidariedade por parte dos dois grupos parlamentares da maioria e do Governo bastou para reduzir a zero essas expectativas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, mesmo assim, o partido interpelante não se privará, estejamos seguros, de pretender fazer determinados aproveitamentos. Vê-lo-emos na sua imprensa, através dos canais que domina e, até, no próprio Ministério da Educação onde esse partido dispõe de uma máquina organizada...

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Lá vou ser saneado outra vez!
O Orador: - Mas eu, que sou cidadão, deputado eleito e Ministro da Educação devo dizer que considero saudável que tenha havido este debate, porque em democracia é preferível sempre que os grandes problemas do País sejam discutidos numa instância como esta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O País que nos escuta, através da televisão, dos jornais...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Nem isso!

O Orador: - ... e, sobretudo, através dos representantes eleitos do povo tenha oportunidade de, pedagogicamente, tratando-se de educação, se encontrar perante pontos de vista diferenciados acerca de uma crise profunda do nosso sistema educativo, que não se poderá reduzir, como eu disse, a qualquer epifenómeno de circunstância. Apenas é lamentável que, podendo tratar-se de um debate pedagógico, a linguagem do partido interpelante seja o exemplo, mesmo, da antipedagogia.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Ou seja, uma linguagem dogmática, fanática mesmo, que não recusou em recorrer à falsidade, à calúnia e à difamação.
Eu, como Ministro da Educação de Portugal, não posso permitir que uma figura da estirpe do Prof. Pinho Machado, professor universitário, Secretário de Estado do Ensino Superior de Portugal, seja manchada...

Aplausos do PS e do PSD.

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O Orador: -... com afirmações que na verdade se voltam contra aqueles que as utilizam.

O Sr. António Capucho (PSD): - É isso mesmo!

O Orador: - Mas essa linguagem ainda teve outra característica, o que eu poderia designar por obliquidade da perfídia, que consistia em tentar instilar, entre os grupos parlamentares da maioria, o germe do que poderia ser uma discórdia. Simplesmente, o sentido político responsável dos deputados da maioria, a sua atitude patriótica e a sua lucidez evitaram que esses germes pudessem proliferar. Pelo contrário, estou em crer, Srs. Deputados do partido interpelante, que o efeito foi exactamente o contrário.

Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: Isso porque, na realidade, o fim real da interpelação não era discutir os problemas da educação em Portugal, mas sim, se possível, criar mais divisões...

Vozes do PCP: - Mais?!

O Orador: - ...e, eventualmente, o próprio colapso do Governo.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Mas a antipedagogia ainda se manifestou mais profundamente naquilo que eu designaria pelo caos dos argumentos. Porque se o partido interpelante fez alusão a um caos educativo, que eu penso que não existe, porque o País, em termos de educação, tem muitos problemas, muitas dificuldades, mas está a funcionar.
E o que é certo é que o caos dos argumentos retóricos, lógicos ou pseudológicos, foi tal, que, na verdade, podemos descortinar nessa argumentação várias contradições, desconexões e mesmo até aquilo que chamaria de desorientação. É claro que há sempre aquele método que consiste em disparar "às cegas" para todos os alvos. Talvez, justamente por isso, o "alvo" tivesse falhado!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não aponte para nós!

O Orador: - É que, na realidade, não houve, quanto a mim, uma coerência nem retórica nem ideológica por parte do partido interpelante. Este partido diz se marxista-leninista, mas basta nos conhecer o "a, b, c," do marxismo para sabermos que, segundo a teoria marxista, não são as superestruturas que condicionam as infra-estruturas! Não é um Governo - que é superestrutural - que explica uma situação que se verifica num contexto sócio-económico e cultural!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o partido interpelante procedeu como se, na realidade, fosse este Governo - que tem um ano e meio de duração - o responsável por uma situação que eu na minha intervenção mostrei que tinha atrás de si pelo menos 15 anos, já que a referi a 1968, isto é, ao momento do alargamento da escolaridade obrigatória para 6 anos.

Assim, com o desenvolvimento do sistema educativo que entretanto se verificou aquilo que o Prof. Adriano Moreira chamou de "uma massificação" - em que não houve uma orientação nem um planeamento, registou-se um enorme afluxo a esse sistema educativo. Isso era uma justa ambição de muitos jovens, só que o Estado não dispunha nem de estabelecimentos nem de professores nem mesmo, até, de uma administração de educação moderna.
E se queremos ser objectivos e, como sabem os Srs. Deputados marxistas-leninistas, a objectividade é uma regra do método científico que perfilham...

Risos do PSD e do CDS.

O Orador: -...se quisermos ser objectivos, teremos que dizer que o Partido Comunista Português está em pleno ilogismo ao defender que são os últimos os responsáveis,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... quando se tomarmos não o horizonte de 15 anos, mas o horizonte de 10 anos que é o da democracia portuguesa, verificaremos - como aqui foi mostrado por vários deputados - que o Partido Comunista tem muitas responsabilidades pelo que chama de "caos educativo", na medida em que procurou impor em Portugal um sistema económico, social e político que felizmente o povo português recusou democraticamente.

Aplausos do PS e do PSD.

0 Orador: - E também aí quero dizer que o Partido Comunista falhou em 1974 e 1975, porque em vez de ter analisado as causas profundas da crise da sociedade portuguesa, pretendeu ocupar o aparelho de Estado e, através deste, impor a sua própria ideologia.

Aplausos do PS e do PSD.

0 Orador: - E falhou! Falhou, apesar de ter, Sr. Deputado Rogério Fernandes, não ministros mas simulacros de ministros, como o Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Mas eu nunca fui ministro, nem tão pouco secretário de Estado!

Vozes do PSD: - Mas foi saneador!

O Orador: - Apesar de ter procurado condicionar ideologicamente os programas, de se ter aproveitado do serviço cívico estudantil...

Protestos do PCP.

0 Orador: -... de ter, inclusivamente, levado a "autos de fé" certos livros...

Aplausos do PS e do PSD.

Protestos do PCP.

Vozes do PSD: - Saneador!

O Orador: - E, sobretudo, de ter tentado desnacionalizar a nossa educação, pondo a ao serviço de

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ção ao Governo, têm o direito de provocar a abertura de debates sobre política geral, isso significa que, de facto, o objectivo central de uma interpelação deve ser o debate. Aliás, basta ler o artigo 210.º do Regimento desta Assembleia para se verificar que, por várias vezes, de uma forma anafórica, se repete que "0 debate será aberto com as intervenções de um ou mais representantes do grupo parlamentar interpelante" ( ... ) e (...) "não poderá exceder duas reuniões plenárias."

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Leia o resto.

0 Orador: -( ... ) E que "será encerrado com as intervenções do Primeiro-Ministro (...)" ou, agora, segundo parece, de um ministro.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isso não diz. Leia bem, porque não diz.

O Orador: - Aliás, queria corrigir aquilo que foi dito aqui, por na verdade já participei numa interpelação sem a presença do Sr. Primeiro-Ministro. Temos a presença, em nome do Governo, do Sr.
Ministro de Estado, que aqui está, a quem agradeço não só a gentileza mas a abertura que revela, em termos políticos, ao dar ao próprio Ministro da Educação a oportunidade de encerrar os debates.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Francamente!

O Orador: - O que é uma interpelação?
Acabámos de ver. Mas uma interpelação supõe interlocutores. Antes de mais, importa saber de quem parte a interpelação. Mas ela parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, assim como a primeira interpelação, feita em Junho, partiu do Movimento Democrático Português.
Se a interpelação parte deste partido a quem se dirige? Dirige-se ao Governo. E é em nome do Governo que eu aqui falo com a solidariedade do Sr. Primeiro-Ministro, do Sr. Vice-Primeiro- Ministro e de todos os ministros que compõem o actual Governo, maioritário, que emanou de eleições livres e que, portanto, representa o País.
Temos os interlocutores. Vejamos agora o fim visado pela interpelação. Esse deveria consistir em, através do debate, esclarecer os Srs. Deputados representantes eleitos do povo e, através deles, o País.
Será esse o fim real desta interpelação?
Para saber qual é o fim real da interpelação importa perguntar: a quem aproveita ou pode aproveitar a interpelação? É evidente que a interpelação aproveita ou pode aproveitar ao próprio partido
interpelante. Mas pergunto mais: a interpelação não pode também aproveitar aos inimigos da democracia em geral?

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como eu disse no início da minha intervenção, não poderá, inclusive, ser esta interpelação um meio de criar um colapso no âmago de alguns que pensavam ser uma crise de coligação?
Não fomos nós, Governo, que escolhemos este momento...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Foi, foi!

0 Orador: -... embora um conjunto de circunstâncias, como eu disse, tenha criado um contexto em que a interpelação aparecia no cerne de uma situação complexa, a qual o Sr. Primeiro-Ministro, pela televisão, acaba de esvaziar.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - A ver vamos, com diz o povo!

0 Orador: - E isso já permitirá, penso eu, que o encerramento deste debate não seja feito sob o signo de uma paixão, de um excesso, mesmo de um excesso de expectativa, por parte do partido interpelante.
A afirmação de solidariedade por parte dos dois grupos parlamentares da maioria e do Governo bastou para reduzir a zero essas expectativas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - Mas, mesmo assim, o partido interpelante não se privará, estejamos seguros, de pretender fazer determinados aproveitamentos. Vê-lo-emos na sua imprensa, através dos canais que domina e, até, no próprio Ministério da Educação onde esse par tido dispõe de uma máquina organizada...

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Lá vou ser saneado outra vez!

0 Orador: - Mas eu, que sou cidadão, deputado eleito e Ministro da Educação devo dizer que considero saudável que tenha havido este debate, porque em democracia é preferível sempre que os grandes problemas do País sejam discutidos numa instância como esta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Orador: - O País que nos escuta, através da televisão, dos jornais...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Nem isso!

O Orador: -... e, sobretudo, através dos representantes eleitos do povo tenha oportunidade de, pedagogicamente, tratando se de educação, se encontrar perante pontos de vista diferenciados acerca de uma crise profunda do nosso sistema educativo, que não se poderá reduzir, como eu disse, a qualquer epifenómeno de circunstância. Apenas é lamentável que, podendo tratar se de um debate pedagógico, a linguagem do partido interpelante seja o exemplo, mesmo, da antipedagogia.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Ou seja, uma linguagem dogmática, fanática mesmo, que não recusou em recorrer à falsidade, à calúnia e à difamação.
Eu, como Ministro da Educação de Portugal, não posso permitir que uma figura da estirpe do Prof. Pinho Machado, professor universitário, Secretário de Estado do Ensino Superior de Portugal, seja manchada...

Aplausos do PS e do PSD.

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uma ideologia que não era senão a cobertura de um imperialismo estrangeiro.

Aplausos do PS e do PSD.

Protestos do PCP.

O Orador: - Alguns poderão aceitar certos aspectos do marxismo em termos metodológicos.
Eu, porém, não sou marxista e afirmei na minha intervenção quando da apresentação do Programa do Governo sobre a política de educação que me inspirava no personalismo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O personalismo, segundo foi teorizado e praticado por Emmanuel Mounier.
E o que é que leio no "Manifesto Personalista" de Emmanuel Mounier? Em primeiro lugar, que "o Estado não tem o direito de impor, mediante um monopólio, uma doutrina e uma educação. Cada família espiritual que justifique o mínimo de crianças para educar, tem direito aos meios eficazes para assegurar às crianças a educação da sua escolha".

Vozes do CDS: - Mas isso é nosso!

O Orador: - É esta educação que queremos para Portugal: uma educação livre, uma educação não estatizada, mas na qual o Estado também tem o seu papel, porque - continua Emmanuel Mounier -:
"(...) é normal que um Estado organize por sua iniciativa, como o imposto comum, uma escola não dogmática para os que não queiram vincular-se a nenhuma das famílias espirituais".

normal! E eu que sou laico e que tenho uma formação laica, acho que o Estado deve, ao mesmo tempo, respeitar as famílias espirituais que querem ter um ensino próprio e assegurar aos cidadãos que não pertencem a nenhuma família espiritual o direito à educação e ao ensino.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, mais do que isso, diz ainda Emmanuel Mounier: "não menos normal é que o Estado exerça sobre as escolas distintas da escola estatal um serviço público de controle e tome as medidas necessárias para que esse controle seja efectivo. Todos os estabelecimentos privados, inclusive os que vivam dos seus próprios recursos, são tributários desse controle mínimo."
É o que estabelece a nossa Constituição que consagra, por um lado, a liberdade de aprender e de ensinar e, por outro lado, o necessário controle do Estado sobre todo o ensino, na medida em que ele também é tributário do próprio Estado.
Isto, porque há um pressuposto segundo Emmanuel Mounier que é importante: o da igualdade de condições de ingresso dos alunos das escolas não estatais, com os alunos das escolas do Estado.
Assim, o Estado - diz Mounier - "sem mantê-las em sentido próprio, compensaria as escolas privadas do gasto que poupam às escolas do Estado".

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - É por isso que o Estado tem de pagar a factura!

0 Orador: - É este, Srs. Deputados, o princípio fundamental que norteia a nossa política educativa.
E quero dizer que no dia em que abra em Portugal o congresso do ensino particular e cooperativo eu, como Ministro da Educação, saúdo esse congresso, saúdo os professores e os responsáveis dessas escolas e, sobretudo, saúdo as crianças que têm direito, através das suas famílias, a uma educação livre, com igualdade de oportunidades, sem por isso diminuir em nada o papel do Estado, já que este terá sempre a possibilidade pois é uma instância nacional de verificar se são respeitados os direitos democráticos desse ensino.
E assim, não teremos no nosso País algo que neste momento é muito pernicioso, ou seja, crises como as que se verificaram em França e em Espanha.
Queria, por isso, dizer - pois é bom que sejamos patriotas e que reconheçamos também o que fazemos de positivo - que é bom que não haja em Portugal uma questão religiosa e muito menos por causa do ensino.
Aplausos do PSD, de alguns deputados do PS e do deputado da ASDI Ruben Raposo.

0 Orador: - Mas o Estado deve assegurar, antes de mais, o ensino obrigatório e, para lá deste, deve também assegurar as possibilidades de acesso a outros graus de ensino, quer a montante, quer a jusante do ensino primário e do preparatório.
Por isso tenho de reconhecer - e já o fiz publicamente - que o Estado ainda não fez tudo a montante, porque na verdade ainda não dispomos de uma rede suficiente de jardins de infância.
Tínhamos os Jardins Escolas João de Deus que, aliás, também eram de origem privada e agora estamos a lançar jardins escolas ou jardins de infância...

0 Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Agora?!...

0 Orador: - "Agora", Sr. Deputado, não é simplesmente "hic et nunc!" É também no sentido mais amplo da palavra!
Fazêmo-lo através do Estado que tem a seu cargo alguns jardins de infância e também através do Ministério do Trabalho, para lá mesmo do Ministério da Educação.
Concordo em que o papel das autarquias é aí relevante e queria dizer que pela minha parte fiz o meu dever no Ministério da Educação ao assinar duas portarias sobre esta matéria.
Mas a verdade é que assumimos o Governo num período de austeridade e isso foi reconhecido no próprio programa. Portanto, eu assumo também as responsabilidades e não pretendo aliená-las. Assumo-as! Nós não pudemos fazer aquilo que era necessário, mas vamos fazê-lo no próximo ano porque essa lacuna já está corrigida no Orçamento.
0 Estado ainda não pode assegurar a escolaridade obrigatória de 9 anos que faz parte de um projecto de lei de bases de um dos partidos da maioria que gostaria aqui de saudar. Trata se do projecto de lei de bases do ensino do Partido Socialista.

0 Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isto é um discurso de saudações!

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O Orador: - Mas o Estado tem em conta que a escolarização já ultrapassa largamente os 6 anos e as maiores dificuldades que nós tivemos, quer no ano transacto, quer neste ano ainda, são derivadas do facto de a escolarização no 7.º e 8.º anos se ter processado antes mesmo de se tratar de uma escolaridade
obrigatória.
Os estudos feitos no Ministério comprovam-no, mas houve evidentemente uma certa imprevidência em pensar-se que o ritmo de alargamento da escolarização seria mais lento, já que existiram zonas, como é normal - nomeadamente zonas urbanas e mais evoluídas - onde esse fluxo se desenvolveu muitas vezes sem um controle.
E mais, para lá do ciclo unificado que, quanto a mim, foi um erro do pós 25 de Abril...

O Sr. Rogério Fernandes (PCP): - Está no programa de todos os partidos!

O Orador: -... porque pôs o País perante um mito de um ensino igual para todos, houve que assegurar no ciclo complementar - no 11.º e 12.º anos de escolaridade uma escolarização que, inclusive, não estava orientada em termos escolares e profissionais. Daí que tivéssemos que corrigir esse erro, através de um plano de emergência para o ensino técnico-profissional que, aliás, correspondia aos programas dos 2 partidos do Governo.
Era a primeira das 100 medidas de entre aquelas que se referiam à educação, apresentadas pelo Partido Socialista, e era uma medida que eu defendia como social-democrata desde a Assembleia Constituinte, onde fui um pugnaz lutador por esse tipo de ensino, inscrevendo-me contra aquilo que se viria a verificar que era, justamente, a destruição do ensino técnico-profissional.
Mas nós que somos realistas, apesar de termos reconhecido o erro que consistiu em acabar com as escolas técnicas, aproveitámos um aspecto que tinha algo de positivo nas transformações operadas em 1974 e 1975: a criação de escolas onde não existisse a separação entre os jovens do ensino técnico e os jovens do ensino liceal.
Contrariamente ao que acontece na União Soviética em que, na realidade, e como demonstrei, há 3 tipos de escolas: uma escola geral, uma escola técnica-profissional e uma escola especializada.
É que nós somos realistas. Sabemos analisar os erros, mas também sabemos tirar deles o que pode haver de positivo e é isso que interessa hoje.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que foi reconhecido pelos países da OCDE e pelos países que participaram na Conferência Internacional da UNESCO, em Genebra, é que nós conseguimos em Portugal, apesar de tudo um
sistema que tem potencialidades que deveremos explorar.
E hoje os 200 cursos profissionais ou técnico profissionais que estão a funcionar no continente ou nas regiões autónomas são cursos que coexistem com a via geral de ensino. Há, inclusivamente, uma componente geral nesses cursos, ao lado de uma componente específica e de uma componente tecnológica, equilibrando nós - como recomendam os pedagogos - uma formação geral, humanística, digamos, com uma formação técnica e especializada, assim resolvendo o grande problema que é o de encontrar uma síntese harmoniosa entre esses dois tipos de formação.
Reconheça-se que esse é um aspecto do programa do actual Governo que foi cumprido - que está a ser cumprido -, para lá até daquilo que inicialmente prevíamos, como saberá, por exemplo, o Sr. Director-Geral do Ensino Secundário que foi um dos grandes obreiros desse ensino.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.

O Orador: - Mas aí está a grande viragem do sistema educativo e não me refiro a casuísmos, justamente porque quero buscar o essencial.
Essa grande viragem da política educativa está ligada a uma política de trabalho, a uma política de emprego e a uma política de formação profissional. Ela é mesmo um exemplo - desculpem-me que lhes diga de novo, mas gosto de citar os textos - do que a OCDE recomendava no exame à política educativa que teve lugar, é bom sabê-lo, no fim do mandato do anterior governo.
Essa recomendação foi realizada na prática e sê-lo-á ainda mais, pois teremos de articular esse ensino com os Ministérios da Indústria e Energia, da Agricultura, da Saúde e mesmo com outros aspectos da vida portuguesa, como a própria formação nas Forças Armadas. Isto sem esquecer que devem participar nesta viragem os estabelecimentos do ensino particular e cooperativo.
Já agora aproveito, Sr. Deputado César Oliveira, para lhe dizer que os subsídios que foram dados ao Colégio dos Carvalhos ou ao Colégio Nuno Álvares, de Santo Tirso, foram subsídios para lançar cursos técnico profissionais que, aliás, nos ficaram baratos...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Baratíssimos!

O Orador: -...porque esses colégios conseguiram também obter o contributo de empresas da região que estão a participar neste esforço comum.
É claro que para lá disso é necessário actuar no âmbito do ensino superior nomeadamente no sector do ensino superior politécnico que temos de reajustar, porque - e aí concordo inteiramente com a
posição do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior há que evitar que aconteça ao ensino superior politécnico aquilo que aconteceu ao sistema educativo: Temos de equilibrar as universidades tradicionais com um ensino superior de outro tipo em ligação com o desenvolvimento regional.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E por isso é que há dias, em Trás-os-Montes, não numa universidade, nem num instituto superior politécnico, mas num instituto universitário, tivemos o exemplo de como era possível pôr o ensino superior a colaborar no próprio projecto do ensino técnico-profissional. Na realidade, o Instituto Universitário de Trás-os-Montes e Alto Douro, reconhecido pela Holanda, pelos EUA e por outros países como sendo de alto nível, vai colaborar na cobertura de todo o Norte do País com escolas agrárias.

Aplausos do PS e do PSD.

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O Orador: - Escolas que são necessárias para fazermos face ao desafio da Comunidade Económica Europeia.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - Srs. Deputados, caros concidadãos, queria terminar aqui mesmo no realce deste ponto: nós temos de analisar a futura lei de bases do ensino do nosso país no quadro da perspectiva da entrada na Comunidade Económica Europeia.

Aplausos do PS e do PSD.

O Orador: - E, por isso, defendendo os valores do patriotismo, da nossa língua, da nossa civilização e da nossa cultura, terminarei repetindo aquilo que já disse nesta Câmara, citando Afonso Duarte: "Quero ser europeu num canto qualquer de Portugal!"

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

0 Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Zita Seabra pediu a palavra para que efeito? Lembro lhe, Sr.ª Deputada, que o debate está encerrado.

A Sr.ª a Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, acontece que o Sr. Ministro da Educação, ao falar, caluniou pessoalmente membros da nossa bancada...

Protestos do PS e do PSD.

O Sr. Raul Rego (PS): - O debate está encerrado!

A Oradora: -...dos quais expressamente citou o nome.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro fez afirmações em relação ao meu grupo parlamentar e, nomeadamente, no que diz respeito a ligações estrangeiras que consideramos serem uma ofensa à nossa honra e dignidade.

Protestos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada pede a palavra para exercer o direito de defesa?

A Oradora: - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para esse efeito, tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Ministro da Educação, na intervenção de fecho do debate, em vez de apresentar a sua política de ensino ou de responder às questões concretas que lhe foram colocadas pelos deputados, fez inaceitáveis ataques pessoais e calúnias contra deputados desta Assembleia, nomeadamente em relação ao meu camarada Rogério Fernandes - que, aliás, referiu como ex-ministro que nunca foi, nem sequer secretário de Estado.

Vozes do PSD: - Mas foi saneador!

A Oradora: - É inaceitável e inadmissível aquilo que o Sr. Ministro disse!
Mas é também por nós considerado como verdadeiramente inaceitável que o Sr. Ministro, logo nas primeiras palavras do seu discurso, comece a dizer que há membros do meu partido no seu Ministério.

Vozes do PSD: - Mas gastam o dinheiro das inspecções a andar de automóvel!

A Oradora: - Que eu saiba, Sr. Ministro, vivemos em liberdade e em democracia. Os funcionários do seu Ministério têm o direito constitucional de terem o partido que muito bem entenderem e, felizmente, que hoje podem ser comunistas, sociais-democratas, podem ser do CDS, podem até não ter partido nenhum. Mas é grave, Sr. Ministro, que tenha dito isso no tom ameaçador em que o proferiu. É grave e não pode deixar de merecer da nossa parte o mais vivo protesto.
Uma última questão, Sr. Ministro. Quando se esperava da parte do Governo, como aliás tem sucedido e sucedeu na última interpelação sobre a educação, que ouvíssemos um discurso de Estado sobre os problemas de ensino, o Sr. Ministro usou a tribuna desta Assembleia para fazer um comício.

Vozes do PSD: - Não apoiado.

A Oradora: - Consideramos que isso não prestigia esta Câmara, nem prestigia V. Ex.ª Mas essas palavras ficam com quem as profere.

Aplausos do PCP.

Vozes do PSD: - Isso já não é defesa'

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Educação, pretende dar explicações?

O Sr. Ministro da Educação: - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa vai anunciar os projectos que deram entrada na Mesa.

0 Sr. Secretário (Boleira Marinho): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 406/III, da autoria da Sr.ª Deputada Zita Seabra e outros deputados do Partido Comunista Português, que aprovam medidas tendentes à suspensão da desigualdade de tratamento entre a carreira docente e as demais carreiras médicas e a reposição de condições de equidade entre os docentes das universidades; projecto de lei n.º 407/III, da autoria do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros do Partido Comunista Português, que aprova medidas tendentes a garantir a existência de instituições para educação física e desporto nas escolas preparatórias e secundárias; projecto de lei n.º 408/III, da autoria da Sr.ª Deputada Zita Seabra e outros do Partido Comunista Português, que propõe a revogação do Decreto Lei n.º 301/84, de 7 de Setembro, que põe em causa os dispositivos constitucionais que asseguram o efectivo cumprimento da escolaridade obrigatória a todos os cidadãos.
Deu ainda entrada na Mesa um projecto de deliberação, apresentado pelo Partido Comunista Português, que aprova medidas tendentes a garantir com carácter de urgência a apreciação e votação das iniciativas legislativas referentes a bases gerais do sistema educativo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fui também informado que a eleição de um juiz para o Tribunal

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Constitucional será feita na reunião plenária do dia 13. A candidatura já apresentada mantém-se válida, sem prejuízo do aparecimento de outras.
Esta é informação que vem da conferência dos líderes parlamentares.
A sessão de amanhã iniciar-se-á às 10 horas com a discussão dos diplomas sobre o estatuto dos deputados - projecto de lei n.º 267/III, apresentado pelo PCP; projecto de lei n.º 331/III, apresentado pela UEDS; projecto de lei n.º 392/III, apresentado pelo PS e pelo PSD -, sendo também discutido o estatuto remuneratório dos titulares políticos, isto é, a proposta de lei n.º 88/III e o projecto de lei n.º 400/III, do CDS.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, faça favor.

0 Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, não sei se ouvi bem a ordem do dia de amanhã, mas há período de antes
da ordem do dia.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não estive na conferência dos líderes, mas vejo que todos concordam. Por conseguinte, amanhã a sessão iniciar-se-á com período de antes da ordem do dia.
Srs. Deputados está encerrada a sessão.

Eram 22 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Torres Couto.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Ovídio Augusto Cordeiro.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Victor Hugo Sequeira.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Ângelo Ferreira Correia.
José António Valério Couto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Bento Gonçalves.
José Vargas Bulcão.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Maria Moreira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Guilherme Branco Gonzalez.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Hernâni Torres Moutinho.
Jorge Manuel Sarmento Barbosa.
José Miguel Anacoreta Correia.
Manuel Jorge Forte Goes
Manuel Augusto Lemos.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Almerindo da Silva Marques.
António Cândido de Miranda Macedo.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Eurico Faustino Correia.
José Luís do Amaral Nunes.
José Maria Roque Lino.
José Maximiano Almeida Leitão.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rui Monteiro Picciochi.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Agostinho Correia Branquinho.
António Maria Orneias Ourique Mendes.
Fernando José da Costa.
Leonel Santa Rita Pires.
Manuel da Costa Andrade.

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Mário Júlio Montalvão Machado.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Francisco António Lucas Pires.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Lopes Porto.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Narana Sinai Coissoró.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
enviado à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 5 de Dezembro de 1984, pelas 19 horas e 40 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de deputados: solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

Joaquim Rocha dos Santos (círculo Eleitoral do Porto) por Manuel Augusto Lopes Lemos. Esta substituição é pedida para os dias 5 a 7 de Dezembro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, José Luís Nogueira de Brito (CDS) - Bento Elísio de Azevedo (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - Luís Silvério
Gonçalves Saias (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

OS REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - Carlos Pinto da Cruz José Diogo.

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