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I Série Número 25
Sexta-feira, 7 de Dezembro de 1984
DIÁRIO
da Assembleia da Republica
III LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE DEZEMBRO DE 1984
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 45 minutos.
Antes de ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos, de respostas a alguns outros e do expediente.
Em declaração política o Sr. Deputado César Oliveira (UEDS) referiu-se à crise política que se desenvolveu na coligação governamental e à crise económica social e moral que o País atravessa.
No fim respondeu a pedido de esclarecimento e protestos dos Srs. Deputados Jaime Ramos e Silva Marques (PSD) Raul de Castro (MDP/CDE) e António Meira (PS) e aos Srs. Deputados Amélia de Azevedo e Silva Marques (PSD) que usaram do direito de defesa.
Também em declaração política o Sr. Deputado Morais Barbosa (CDS) referiu a 3ª reunião do Conselho das Comunidades Portuguesas que se realizou em Fortaleza no Brasil e a situação dos emigrantes portugueses neste país tendo no fim tecido considerações gerais sobre questões relativas às comunidades portuguesas de emigrantes e sua isenção no pais de acolhimento.
Igualmente em declaração política o Sr. Deputado José Vitorino (PSD) referiu acções a levar a cabo pelo Governo no sentido de moralizar e dignificar os órgãos da Administração Pública com vista a sanar a intranquilidade e incerteza dos cidadãos na eficácia do Estado.
Também em declaração política o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) teceu criticas a actuação do Governo e deu conta das conclusões da 19.ª assembleia regional do Algarve do PCP.
Ainda em declaração política o Sr. Deputado Gil Romão (PS) deu conta de alguns dos problemas com que se debate o distrito de Portalegre e de algumas medidas que preconiza para a solução destes.
Ordem do dia. - O Sr. Deputado Álvaro Brasileiro (PCP) procedeu à leitura de um relatório dando conta dos trabalhos da comissão de agricultura e mar durante o mês de Outubro.
Após ter sido rejeitado um projecto de deliberação apresentado pelo PCP relativo ao processo de debate e votação dos projectos de lei n.ºs 226/III, do PCP, 331/III da UEDS e 392/III do PS - Estatuto dos Deputados - e da proposta de lei n.º 88/III e do projecto de lei n.º 400/III do CDS - Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos -, iniciou-se a discussão, na generalidade, destes Diplomas. Intervieram, a diverso título incluindo declaração de voto, além do Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos), os Srs. Deputados Jorge Lemos e José Magalhães (PCP), Carlos Lage (PS) , José Manuel Mendes (PCP), Luís Saias (PS), Lopes Cardoso(UEDS), Joaquim Miranda (PCP),Manuel Queiró (CDS), António Capucho (PSD), Carlos Brito (PCP), Raul de Castro (MDP/CDE), Gomes de Pinho (CDS) e José Luís Nunes (PS).
0 Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 45 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
António Manuel Azevedo Gomes.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto Hãndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
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João de Almeida Eliseu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Martins Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Ovídio Augusto Cordeiro.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Caio Roque.
Zulmira Helena Alves da Silva.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho.
António Francisco Dias Costa.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel .António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mora.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Alberto Ribeiro Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sonsa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
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Alexandre Carvalho Reigoto.
António Gomes de Pinho.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Jorge Manuel Sarmento Barbosa.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Miguel Anacoreta Correia.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Corregedor da Fonseca.
José Manuel Tengarrinha.
Raul Morais e Castro.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social Democrata Independente (ASDI):
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos requerimentos e respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nas últimas sessões deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos:
Dia 29 de Novembro de 1984: ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Handel de Oliveira e outros; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e Secretaria de Estado da Emigração, no total de 6, formulados pelo Sr. Deputado Custódio Gingão.
Dia 30 de Novembro de 1984: a diversos ministérios no total de 4, formulados pelo Sr. Deputado Custódio Gingão; ao Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Cunha e Sá; à Comissão de Regimento e Mandatos, formulado pelo Sr. Deputado Ferreira Martins; a diversos ministérios, formulado pelo Sr. Deputado José Vitorino.
Dia 4 de Dezembro de 1984: aos Ministérios do Mar e do Equipamento Social, no total de 3 formulados pelo Sr. Deputado Nunes da Silva; a diversos Ministérios, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Pereira Lopes; ao Governo, no total de 2, formulados pelo Sr. Deputado Jaime Ramos; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Marques Mendes; a diversos ministérios, no total de 2, formulados pêlos Srs. Deputados Guerreiro Norte e José Vitorino; a diversos ministérios, no total de 6, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Educação, no total de 3, formulados pela Sr.a Deputada Helena Cidade Moura; ao Ministério da Educação e do Equipamento Social, no total de 264, formulados por vários Srs. Deputados do PCP.
Dia 5 de Dezembro de 1984: a diversos ministérios, no total de 3, formulados pelo Sr. Deputado Nunes da Silva.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
Lino Paulo, na sessão de 7 de Maio; lida Figueiredo, nas sessões de 8 de Maio e de 11 de Julho; António Mota, na sessão de 11 de Junho; João Abrantes, na sessão de 26 de Junho; Magalhães Mota, nas sessões de 18 de Julho e 31 de Outubro; José Magalhães e outros, na reunião da Comissão Permanente do dia 27 de Setembro; Margarida Marques e outros, na sessão de 10 de Outubro; Paulo Areosa e Jorge Patrício, na sessão de 17 de Outubro; Jorge Góes, na sessão de 30 de Outubro; Hasse Ferreira e Jorge Lemos, na sessão de 8 de Novembro.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Da Câmara Municipal de Aljustrel, a enviar cópia de uma moção, exigindo que, no Orçamento do Estado para 1985, as autarquias sejam dotadas com as verbas correspondentes às novas competências.
Do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Químicas do Sul, a remeter uma moção aprovada em plenário pêlos trabalhadores da Fábrica de Explosivos da Trafaria, na qual repudiam a política anti-trabalhadores e de recuperação monopolista e capitalista seguida pelo Governo.
Petição
N.° 36/III - de Eugênio Matos de Oliveira e outros (Portline e Transinsular) - CTM/CNN, de Lisboa. Expondo a situação relativa à criação de empresas de transportes marítimos Portline e Transinsular, emergente da publicação do Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, em prejuízo das CTM/CNN, sugerindo o pedido de ratificação do citado diploma, a sua recusa e a suspensão imediata da sua aplicação.
Telex
Da União dos Sindicatos de Faro e da União dos Sindicatos de Leiria, transcrevendo moções, nas quais exigem a tomada de posse dos corpos gerentes eleitos para a Mútua dos Pescadores.
Da subcomissão de trabalhadores da Portucel, de Setúbal, com uma moção propondo o derrube do Governo e a unificação de todas as lutas para o reforço do combate dos trabalhadores contra as medidas reacccionárias do Governo e do patronato.
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O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está a chegar ao fim, ao que parece, a crise política que, nas últimas semanas, se desenvolveu na coligação que governa o País desde os inícios do Verão de 1983. Independentemente dos resultados a que conduziram as negociações que se vêm realizando - e que analisaremos na devida altura - importa nos hoje reflectir sobre alguns dos aspectos emergentes dessa mesma crise e trazer à Câmara algumas considerações sobre o enquadramento global dos acontecimentos das últimas semanas.
A crise política da coligação ocorreu no quadro de uma crise global e profunda de toda a sociedade portuguesa e releva, sobretudo, da incapacidade desta mesma coligação em definir um conjunto de políticas coerentes, determinadas a partir de um projecto comum da coligação, projecto político capaz de rasgar horizontes e caminhos e que, de facto, nunca existiu. A origem desta crise deve-se, pois, à completa ausência de uma resposta global que a coligação, passadas que foram as medidas tendentes a restabelecer o equilíbrio financeiro externo, não soube e não pode encontrar.
Crise económica marcada por quebras significativas na produção e no investimento, no poder de compra, pelo avolumar dos défices, pela situação asfixiante e bloqueada em que vive a maioria das empresas.
Crise social materializada nos salários em atraso, no aumento do desemprego, no crescimento da violência, da criminalidade, da delinquência e da prostituição, no horizonte negro e vazio de esperança que se abre à juventude, na situação cada dia mais difícil em que vive a maioria esmagadora dos portugueses.
Crise moral que se verifica no alastramento da corrupção, das comissões de inquérito que nada apuram, na irresponsabilidade com que se esbanjam dinheiros públicos (vide os 200 milhões de contos malbaratados denunciados pelo Ministro Veiga Simão), nos sucessivos escândalos de desfalques e contrabando que ultimamente têm vindo a lume, num salve-se quem puder onde floresce o individualismo mais egoísta e onde crescem o compadrio e o oportunismo.
Crise política onde, velada ou abertamente, se vai advogando a rotura com o sistema político plasmado por uma Constituição revista há pouco menos de 2 anos, crise política que permite já que militares, tal como fez o general Carmona em 1925, façam a afirmação de que a «Pátria está doente».
Esta crise global mede se também pela pirueta política substituindo a verticalidade, pelo golpe de teatro sabiamente encenado em vez da clareza da proposta, pelo discurso político simulado em lugar de um projecto político mobilizador de vontades. As últimas semanas comprovaram, de forma irrefutável, o que acabei de dizer: a jogada política, a simulação, o golpe de força, a intoxicação da opinião pública e nebulosidade ocuparam o lugar da clareza, da transparência, da verdade, da assumpção frontal das posições.
Neste quadro global, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em que ninguém assume as culpas e os erros, desenvolve-se também uma campanha orquestrada, e que cada dia se reforça, e que tem por objectivo denegrir as instituições parlamentares, o sistema de par tidos e a própria democracia. Parte-se da crítica, muitas vezes justa, aos comportamentos políticos para insinuar a necessidade da rotura com a democracia representativa, seja pela via de um messianismo redentor construído em torno de um qualquer personagem e de uma União Nacional modernizada, seja pela via da mudança radical já claramente insinuada, entre outros, pelo Dr. Alberto João Jardim.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a esta crise global que afecta a sociedade portuguesa, a coligação não respondeu porque não pôde definir e propor aos portugueses um projecto político coerente. Esta impossibilidade radica-se nas contradições que decorrem da coexistência, na coligação, de um neo-liberalismo atabalhoado, envergonhado que não pode assumir-se plenamente sob a pena de perder os últimos resquícios social-democratas com um socialismo democrático que perdeu perspectivas e dimensão, e que não tem sabido renovar-se e inovar. Esta contradição e estas limitações ficaram bem evidenciadas no decurso 1o debate aqui travado aquando da discussão do Orçamento Suplementar. É esta, creio, a grande e inultrapassável dificuldade que não apenas explica as raízes mais profundas da crise política da coligação como explica, também, a tentativa de, através de um sem número de medidas concretas, sem coerência interna, desgarradas e não baseadas num projecto político global, fazer sobreviver uma coligação em que, diga-se o que se disser, um dos parceiros, o PSD, estará sempre num outro comprimento de onda.
Não temos ainda conhecimento dos resultados do acordo renegociado que parece que vai presidir à acção da coligação. Tememos, no entanto, que tais resultados possam vir a traduzir-se num conjunto de panaceias que, longe de curarem o doente, apenas venham prolongar-lhe a doença e aumentar-lhe os sofrimentos; isto é, receamos que o ataque ao sector empresarial do Estado, as alterações à legislação laboral e outras medidas de carácter mais ou menos neoliberal e pontual venham constituir o saldo mais significativo das negociações em curso com previsíveis e dramáticos efeitos no agravar da crise social que já se vive.
Pensamos que se torna desesperadamente urgente a definição de soluções concretas que respondam à necessidade de reconversão da produção industrial e agrícola, ao desafio de um sistema educativo em condições de propiciar a criatividade e imaginação exigidas pelo nosso tempo, à valorização das potencialidades do território e do homem português, à necessidade de relançar a participação e mobilização dos cidadãos num esforço colectivo para superar dificuldades e vencer os obstáculos decorrentes de um atraso económico, social e cultural com raízes velhíssimas. Estas soluções não serão, certamente, obra de iluminados ou de meia dúzia de cabeças bem pensantes. Terão de ser obra colectiva e passarão, seguramente, pela regeneração das práticas e dos hábitos políticos. A sua eficácia dependerá da clareza com que participem de um projecto político global que lhes dê a coerência e a dimensão históricas indispensáveis à sua transparência e à sua força mobilizadora. É certo que serão diferentes as soluções como serão diferentes os projectos que correspondem às diferentes concepções, à diversidade dos interesses das classes e dos grupos sociais. Mas julgamos urgente, indispensável e inadiável pôr fim à mistificação e às águas turvas onde proliferam os oportunismos e se poderão desenvolver, sem
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apelo nem agravo, os germes que já existem e que podem pôr em causa a própria democracia.
Uma das grandes lições desta crise política na coligação é a de que se torna cada dia mais imperioso esclarecer e aprofundar, o mais exaustivamente que se possa, os projectos políticos que animam, ou deve riam animar, as distintas forças políticas que se defrontam.
A crise global da sociedade portuguesa só pode ser resolvida quando houver os projectos políticos globais que dêem resposta e perspectivas de futuro aos angustiantes problemas que hoje preocupam os portugueses; e os projectos políticos só serão eficazes quando conseguirem constituir maiorias políticas e sociais que não ponham em causa a sua coerência interna e sus tentem a sua estabilidade É este, creio, o trabalho difícil e árduo a que todos deveremos meter ombros enquanto temos tempo de evitar a completa degradação das condições de vida e de trabalho e o desprestígio das instituições e da própria democracia
A solução não está na permanente turbulência política e na exigência de reformas estruturais que nada reformam e que só se reivindicam para satisfação dos grupos de pressão e das clientelas. A solução não está no constante «bota-abaixo» e na constante reivindicação de eleições antecipadas mesmo que com quadro político alterado. A solução não deverá estar e não está no permanente ilusionismo político que consiste em tirar coelhos mortos de uma cartola cheia de trocadilhos e frases bombásticas vazias de conteúdo.
A solução está, isso sim, num esforço colectivo e criador que assente na coragem política e na determinação, na transparência e na verdade das práticas políticas, no desapego ao poder, na frontalidade das posições assumidas
Pela minha parte, pela nossa parte, consideramos que as forças do socialismo democrático detêm ainda a potencialidade e a capacidade para se renovarem, renovando as suas propostas e as suas energias criadoras. A nossa aposta, ontem como hoje, parte da consideração de que é possível ao socialismo democrático renovar-se de modo a poder dar respostas que de novo reacendam a esperança que já quase se apagou.
Seria bom que, ao entrarmos no início da segunda década após o 25 de Abril, cada um de nós, cada força política fosse capaz de responder positivamente ao desafio que é a coerência, a transparência de propósitos e de práticas políticas, a clareza serena e frontal das posições sem fingimento. Julgo ser esta a melhor resposta aos que, velada ou abertamente, apostam na degradação da situação política e das forças partidárias para melhor inculcarem o seu próprio projecto pessoal ou aos que, de forma mais encoberta, constróem os caminhos da destruição da democracia.
Aplausos da UEDS e de alguns Srs. Deputados do PS.
0 Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.
0 Sr. Jaime Ramos (PSD): - Sr. Deputado César Oliveira, em primeiro lugar, o meu protesto relativamente à forma como o Sr. Deputado acusou o meu companheiro de partido e Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim. É que é preciso dizermos muito claramente que as propostas de alteração do sistema e de ruptura com ele, formuladas pelo Dr. Alberto João Jardim, são sempre feitas dentro de um quadro democrático e não de uma forma golpista.
Como político, ele tem tanto o direito de ser a acção que defende a mudança e o aperfeiçoamento do sistema como o Sr. Deputado tem o direito de ser a reacção conservadora!
Vozes do PSD: Muito bem!
O Orador: - Quanto à maneira como o PSD se tem comportado nesta crise política e nesta coligação e quanto à acusação que o Sr. Deputado fez de que estamos noutro «comprimento de onda», fazendo lembrar aqueles que dizem que estamos com um pé dentro e outro pé fora, queria dizer lhes que estamos empenhados nesta coligação e que estamos empenhados em apoiar este Governo. Só que não se trata de um apoio neutro, como aqui provámos claramente. Não é um apoio acéfalo ou um apoio acrítico mas, sim, um apoio exigente, que não passa pela subjugação do nosso partido e muito menos pela perda da nossa identidade ideológica e programática.
Como o Sr. Deputado disse e há uma dualidade tão ambígua na sua intervenção! é necessário aprofundar o projecto global com a discussão dos projectos individuais dos partidos É isso que nós pretendemos querendo renegociar o projecto deste Governo e a sua actuação.
No fim destes 18 meses, era necessário que os partidos se juntassem e redefinissem aquilo que vai ser o futuro próximo. É isso que estamos a tentar fazer com muita clareza, com muita transparência, no sentido de aperfeiçoarmos e mantermos a coligação.
Queria dizer lhe, ainda, a propósito das eventuais críticas que formulou em relação a alterações estruturais, que todos temos necessidade de defender na sociedade portuguesa um quadro de reformas sucessivas que visem aperfeiçoá-la Não são exigências desgarradas e a prova é este processo de renegociação da sociedade.
Neste protesto queria ainda associar a minha voz a uma parte muito pequena da sua intervenção, isto é, quando fala em se desbaratarem dinheiros públicos. Lembro-lhe, a este propósito, que a minha bancada por várias vezes solicitou ao Sr. Ministro Veiga Simão que nos explicasse o que se passa com este problema dos 200 milhões de contos. Fico muito satisfeito com o facto de também o Sr. Deputado falar no assunto e, assim, tentarmos em conjunto saber realmente o que se passa.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, para contraprotestar, o Sr. Deputado César Oliveira.
0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Jaime Ramos, em primeiro lugar, muito obrigado pelos pedidos de esclarecimento que me formulou.
Em segundo lugar, devo dizer-lhe que está longe de mim a ideia de impedir quem quer que seja de advogar as soluções que entenda dever advogar em relação à crise que todos vivemos. Não é isso que está em causa como também não pode estar em causa a ilação e a leitura políticas que eu faça das soluções advogadas.
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Quando o Sr. Dr. Alberto João Jardim advoga uma mudança radical no sistema político plasmado pela Constituição, está no seu pleno direito, tal como eu estou no meu pleno direito de duvidar e de pôr reticências ao sentido político último da mudança proposta pelo Dr. Alberto João Jardim Portanto, parece que estamos todos esclarecidos nesta matéria.
Agora, o que eu entendo é que, quando forças políticas como o PSD, como o Dr. Alberto João Jardim e como o CDS, apesar de a Constituição ter sido revista há 2 anos, andam sistemática e permanentemente a reivindicar nova revisão da Constituição, mais não fazem do que invocar para si próprios um álibi que explique a sua própria incapacidade.
Nessa altura, ao fazerem-no, é como se dissessem: «A culpa é sempre dos outros; nós não temos culpa nenhuma; nunca fomos governo e, portanto, nunca assumimos nenhum erro nem nenhuma culpa! A culpa é da Constituição!»
Sr. Amélia de Azevedo (PSD): - Ainda bem que reconhece!
O Orador: - E andamos permanentemente a atirar as culpas para os outros: era «a longa noite fascista», era o «gonçalvismo», era o Conselho da Revolução; agora é a Constituição, são as leis do trabalho, é uma série de coisas.
É o Sr. Deputado que o diz, não sou eu!
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Faça favor, Sr. Deputado.
0 Sr. Jaime Ramos (PSD): - Mas o Sr. Deputado César Oliveira reconhece claramente que, durante estes anos em que estivemos no Governo, houve algumas alterações estruturais que quisemos implementar na sociedade portuguesa e que não conseguimos por culpa da Constituição, nomeadamente no domínio económico.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Já lá vamos, Sr. Deputado!
Julgo que não há ninguém nesta Câmara que não seja partidário de reformas Todos nós somos partidários de reformas. Aliás, num certo sentido, a luta parlamentar é exactamente a luta por reformas e eu assumo ser reformista
Sra. Amélia de Azevedo (PSD): - Oh! lá, lá!
O Orador: - Simplesmente, o meu reformismo tem um objectivo, isto é, não quero reformas por reformas ou reformas que visam apenas satisfazer clientelas.
Sra. Amélia de Azevedo (PSD): - Quais clientelas?!
O Orador: - E havemos de ver, por exemplo, na reforma da lei do inquilinato proposta por VV. Ex.ª, o que é que ela visa resolver, que clientela visa satisfazer.
São estes fenómenos que têm que ficar claros. Por isso advogo que todos nós devemos ser coerentes, devemos dizer que reformas queremos e qual o projecto político que defendemos. Não tenho nada contra o facto de haver um partido liberal em Portugal, mas que se assuma.
É que admito que o vosso discurso político programático seja social-democrata mas o discurso concreto, as intervenções feitas aqui pelos Srs. Deputados Mário Adegas e Pedro Santana Lopes durante o debate do Orçamento - e tiro o meu chapéu ao Dr. João Salgueiro que foi o menos liberal de todos - foram a apologia clara de soluções liberais Assuma o PSD a sua vocação liberal! Não vem nenhum mal ao mundo por isso! Mas que cada força política se assuma claramente como aquilo que é para que todos possamos ficar esclarecidos e para que o povo português possa ter a certeza de quem escolhe, daquilo que escolhe e em quem vota Acabe-se com o discurso político simulado!
Houve aqui, em todo o processo que se seguiu ao 25 de Abril, um empurrar dos partidos para a esquerda, que noutras circunstâncias posso até explicar, mas há que regenerar, há que redefinir, cada um deve assumir coerentemente o seu próprio projecto político. Sem isto, vamos todos para o fundo e, infelizmente, talvez já não se possam pedir responsabilidades históricas a alguns - por já cá não estarem - pelo buraco em que todos nos metemos!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado César Oliveira, o que pretendo é que o Sr. Deputado me diga qual é a solução que propõe, pois a conclusão a tirar do seu discurso é a necessidade de um esforço colectivo sem turbulência
Ora, eu tenho dificuldades em imaginar esse esforço colectivo sem turbulência, dá-me a impressão que, se não houver turbulência, é capaz de não haver esforço!
Mas, como do seu discurso não consegui tirar mais nenhuma conclusão, gostaria que me esclarecesse, ou seja, que me dissesse qual é o esforço colectivo sem turbulência e sobre o que é que se vai exercer esse esforço. Talvez seja aí que deva começar a enumerar as suas propostas concretas de reformas.
Sendo certo, como acabou de afirmar, que todos nós somos reformistas, então, diga o Sr. Deputado quais são as suas propostas concretas de reformas para ficarmos a saber sobre que é que vai incidir esse esforço e para vermos se poderá existir o tal esforço colectivo sem turbulência.
0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
0 Sr. César Oliveira (UEDS): - O Sr. Deputado Silva Marques - que conheço há muitos anos, tal como ele me conhece - fez uma habilidade: juntou partes da minha intervenção que não estavam juntas.
Eu não disse que o esforço era feito sem turbulências, Sr. Deputado. O que disse, foi que era necessário acabar com a mistificação da permanente turbulência política para mascarar coisas O esforço colectivo vai ser duro, vai ser difícil e, certamente, vai ser turbulento.
Sr. Deputado, não tenho tempo para me alongar sobre este assunto mas, se quiser, podemos organizar
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um colóquio para falarmos. Aliás, já temos estado juntos em colóquios e já temos falado.
De qualquer modo, há uma coisa que agora lhe posso dizer: há meia dúzia de cabeças bem pensantes que como que por milagre, «tiram da cartola» - como faz o CDS - as soluções políticas milagrosas com que vêm resolver os problemas do País.
De modo nenhum poderemos estar aqui, sistematicamente, a inventar frases bombásticas - também como faz o CDS e alguns dirigentes e militantes do seu partido - pensando que, por um passe de mágica, tudo se resolve. Não é assim que se ultrapassam os problemas.
De facto. Sr. Deputado, rejeitei algumas soluções mas, neste instante, considero que metermo-nos em campanhas eleitorais e situações desse género poderá contribuir para agravar ainda mais a situação em que vivemos.
Ao fim e ao cabo, a minha solução repousa na necessidade e na exigência da coerência de cada força política, e isso, para mim é uma condição prévia: ou cada força política sabe renovar-se, sabe apresentar-se ao eleitorado e ao povo o português tal como é, - e então, posteriormente, é possível discutir e encontrar pontos comuns entre as forças políticas que assim o entenderem - ou isto não é possível e, então, caminhamos para um buraco que nos há-de afundar a todos.
Até agora a situação tem sido a desta segunda alternativa. Não temos sabido renovarmo-nos, não temos sabido encontrar as respostas globais ao nível de um projecto político que dê força, dimensão, transparência e clareza às propostas concretas
Advogar apenas propostas concretas - como parece que aconteceu na cimeira governamental onde o PS apresentou 24 propostas e o PSD respondeu com 57 e mais 12 - não soluciona o problema. Aliás, o Sr. Deputado certamente que estará de acordo comigo se eu disser que nenhuma destas 90 e tais propostas tem em si a clareza, a transparência e a dimensão que lhe dê a força mobilizadora para participar num projecto político claramente perceptível por todos os portugueses.
Assim, a minha condição prévia é a seguinte: vamos clarificar e aprofundar os projectos políticos de cada um e, em seguida, definir as soluções concretas para os problemas. Entretanto, não criemos uma situação que possa ser propícia - e o Sr. Deputado entende de certeza absoluta o que quero dizer - a aventurismos ou a golpismos de vários matizes e conotações.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.
0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado César Oliveira, até porque nos conhecemos há bastante tempo, V. Ex.ª não há-de estranhar que eu proteste.
Sr. Deputado, não é necessário apresentar propostas concretas, é mesmo inútil fazê-lo! Onde é que se vai estabelecer o acordo sobre as propostas concretas? A uma mesa de técnicos, longe das turbulências?
Sr. Deputado César Oliveira, basta, realmente, passar-mos a ser coerentes? Será que antes, cada um de nós, não era coerente à sua maneira? Repare, Sr. Deputado, se fosse apenas esse o problema, o programa de cada um de nós era a coerência!
Quando o Sr. Deputado diz que é preciso passarmos a ser coerentes para que o povo português nos compreenda melhor, está a partir do princípio de que o povo português não nos está a compreender bem. Porém, estou convencido precisamente de que o povo português nos compreende a todos perfeitamente, nós é que julgamos que o povo não está a compreender tudo o que se passa.
Diz o Sr. Deputado que não convirá haver agora eleições, porque isso será uma turbulência. Então, se não são necessárias novas eleições, cada um deve concretizar as propostas que tem para as soluções da situação política portuguesa. Ora, o Sr. Deputado faz um apelo genérico à coerência, ao esforço colectivo, mas, meu Deus, isso não tem utilidade prática! O que convém é, precisamente, dizermos quais são as nossas propostas concretas e ver se é possível fazer um esforço para as concretizar sem turbulência.
Julgo, que, nessa altura, teria de haver unanimidade e que, aí, a turbulência até teria o seu efeito benéfico. O que não será benéfico é o discurso genérico sem a concretização das propostas
O Sr. Presidente: - Para um contra protesto, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado, Silva Marques, falei uma vez em turbulência, e V. Ex.ª só fala em turbulências! É o contágio, certamente, é o contágio! Aliás, o Sr. Deputado, está hoje muito meteorológico!
Sr. Deputado, ponho-lhe a seguinte questão: vamos discutir aqui, na Assembleia da República, o que devemos produzir quer a nível industrial, quer a nível agrícola?
Alguma vez viu o seu partido, o CDS ou os conservadores portugueses interessados em discutir aqui o que é que se deve produzir em Portugal?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Nem verá!
O Orador: - Não, V. Ex.ª o que viu sempre discutir foi se se devia produzir com a banca privada ou com a banca pública, se havia de ser com a revisão constitucional ou sem ela! Foi isto que V. Ex.ª sempre viu discutir aqui! Nunca viu discutir nesta Câmara que produção agrícola e industrial devemos ter, pois isso nunca foi discutido!
VV. Ex.ªs não querem discutir, o que querem são álibis para provocar, sucessivamente, situações mais à direita, que não se sabem onde terminante
0 meu alerta foi neste sentido, Sr. Deputado, e é apenas um: vamos ser verdadeiros! Aliás, o seu partido teve um grande exemplo de um homem que falava verdade, dizia o que pensava e não fazia o discurso simulado - já várias vezes o disse aqui no Plenário e assumo-o -, o Dr. Francisco de Sá Carneiro, e o seu êxito explica-se por isso, por ter tido a coragem de dizer o que pensava e o que queria.
Mas não é isso o que se passa hoje, pois VV. Ex.ªs fazem um discurso atabalhoado - como já disse -, sem um fio condutor que Ilumine esse vosso projecto político!
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Deixe lá, o povo gosta!
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O Orador: - O povo gosta?! O povo gosta?! Eis aqui o exemplo da mediocridade nacional que a Sr.ª. Deputada Amélia de Azevedo acaba de provocar nesta Assembleia! Como o povo gosta vamos, então dar lhe toda a porcaria, porque ele gosta! É isso que VV. Ex.ªs fazem aqui, neste Parlamento e em Portugal.
Protestos do PSD.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Peço a palavra para exercer o direito de defesa, Sr. Presidente
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - O Sr. Deputado César Oliveira já nos encheu bastante os ouvidos esta manhã com a sua retórica
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Há pouco, tive ocasião de dizer que o povo gosta. Porquê, Sr. Presidente e Srs. Deputados? O povo gosta muito simplesmente porque, partindo das nossas linhas programáticas, com um programa aprovado em Congresso e com sucessivos programas apresentados ao País aquando da constituição de governos, nós conseguimos ter o seu apoio, o que aliás, está demonstrado pelos resultados eleitorais.
Enquanto o Sr. Deputado César Oliveira consegue ser eleito porque está integrado em listas do PS, nós, Partido Social-Democrata, fomos sempre eleitos directamente pelo povo português!
Aplausos do PSD.
Admito que o Sr. Deputado César Oliveira não goste de ouvir estas palavras...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Gosto! Gosto!
A Oradora: Mas isto corresponde exactamente à verdade. O povo português gosta e o que nós queremos é que o povo esteja em consonância connosco.
Não fazemos discursos abstractos, fazemos discursos para o povo e o povo tem aderido às nossas propostas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Pergunto à Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo se o povo gosta que o PSD invoque 26 vezes o marxismo no seu programa! Pergunto se o povo gosta que o PSD defenda no seu programa a interrupção voluntária da gravidez e depois venha aqui juntar a sua voz às vozes mais reaccionárias da sociedade portuguesa!
Protestos do PSD.
Pergunto se o povo gosta que o PSD defenda e se congratule, a nível de programa - posso prová-lo quantas veres quiserem -, com a nacionalização da banca e outras nacionalizações e depois tenham a prática que na realidade assumem!
Pergunto se o povo gosta - também posso citar várias vezes estes documentos - que o partido de V. Ex.", em Junho de 1974, se tenha vangloriado de ter sido o primeiro partido português a falar em reforma agrária e tenha agora uma prática política contrária!
Protestos do PSD.
Sei que o PSD tem êxito eleitoral e sei que fui eleito - e honro-me disso, nunca disse o contrário - como independente nas listas do Partido Socialista.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Para estar sempre contra o PS?!
O Orador: - Honro-me de ter sido eleito como independente e honro-me de as listas por onde fui eleito serem do PS. Nunca reneguei isso e não é hoje que o faço.
Posso discutir com V Ex.ª porque é que o PSD tem êxito e até poderíamos discutir isso indefinidamente. Admito que o PSD está metido no tecido social português, mas isso tem uma explicação: não será porque o PSD herdou boa parte de caciquismo eleitoral do antigo regime? Não será porque o PSD herdou os quadros da União Nacional e da Acção Nacional Popular? Não estará aí a explicação?
Protestos do PSD.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente:
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente foram feitas graves acusações à minha bancada ...
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, V. Ex.ª já exerceu o direito de defesa.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, nessa altura exerci o direito de defesa pessoal. Agora tenho o direito de exercer o direito de defesa em nome da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - O Sr. Deputado César Oliveira fez aqui afirmações que são profundamente injuriosas para o meu partido, para a coerência programática e princípios que defendemos.
O Sr. Deputado referiu que nós invocámos 26 vezes o marxismo no nosso programa, Não, Sr. Deputado, no nosso programa dizemos que temos em conta as análises marxistas, como também temos em conta os princípios humanistas e todos os repositórios que são a base da social-democracia. Nós, Sr. Deputado, por muito que lhe custe, somos sociais-democratas, e isso parece que lhe dói, mas é a verdade.
Por outro lado, quero dizer lhe, Sr. Deputado, que não defendemos propriamente a nacionalização da banca, mas sim a nacionalização dos principais meios de produção. Leia o nosso programa, Sr. Deputado, porque certamente nunca o leu!
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Sr. Deputado César Oliveira, não defendemos a involuntária da gravidez No nosso programa está dito, expressamente, que temos de ter em conta a revisão da penalização do aborto, o que é uma coisa diferente, e o Sr. Deputado sabe o bem porque isso já foi rejeitado aquando da discussão da proposta de lei sobre o aborto
O Sr. Deputado sabe que temos tido uma actuação que corresponde exactamente ao conteúdo do nosso programa E as propostas a que o Sr. Deputado se referiu, que foram sempre defendidas aberta mente pelo nosso saudoso fundador Francisco Sá Carneiro, foram propostas que certamente, ao tempo, o senhor foi capaz de renegar e criticar Hoje verifica que elas tinham toda a razão de ser, porque eram elas que se adequavam à realidade política do país
Sr. Deputado, não se esqueça também que na revolução do 25 de Abril fomos «engasgados» com tanta nacionalização e que o nosso processo político tem sido ao contrário do processo que se tem seguido noutros países Passámos por uma esquerdização aguda, por um certo infantilismo revolucionário e agora temos que corrigir os excessos
Sr. Deputado César Oliveira, não partimos de uma economia liberal para uma economia social democrata, porque se tivéssemos partido por essa via teríamos que fazer reformas noutro sentido, com um carácter acentuadamente social É isso que propugnamos, Sr. Deputado
Agora, o que temos de fazer é digerir muitas das indigestões que apanhámos com esse tal esquerdismo revolucionário e é por isso que hoje apresentamos uma feição no sentido da reprivatização de certas em presas e de conferirmos mais potencialidades à iniciativa privada Ora, isto não é propriamente liberalismo económico, é realismo, tendo em conta a situação de crise económica e financeira que se vive neste país.
Aplausos do PSD.
0 Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira
0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo, muito obrigado por mais esta sua intervenção que permite esclarecer o que pensamos, o que acho que é inútil.
Em relação ao programa do seu partido, a sua intervenção foi tão eloquente que me dispenso de fazer qualquer comentário!
Quanto ao liberalismo e às propostas que VV. Ex.ªs propugnam, sei que querem corrigir a situação em que vivemos e há muita coisa a corrigir Estou de acordo que houve em Portugal um processo de esquerdização global, até dos partidos políticos, que importa que seja reajustado, mas, para isso, é necessário pormos a prática de acordo com os princípios programáticos
Cometi muitos erros, como toda a gente cometei, V. Ex.ª se calhar também, e é bom que todos os assumamos Simplesmente, quanto à vossa reivindicação de retorno à iniciativa privada, dir-lhe-ía que VV. Ex.ªs não propõem o sentido social desse retorno mas sim a protecção estatal, o proteccionismo do Estado à iniciativa privada O que VV. Ex.ªs querem é implementar uma iniciativa privada parasitária do Estado, como sempre existiu em Portugal
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, na última sessão em que houve período de antes da ordem do dia fiquei inscrito para efectuar um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Lage.
Pretendia saber quando terei oportunidade de o fazer, se hoje ou se terei de aguardar por nova sessão em que haja período de antes da ordem do dia
O Sr. Presidente: Sr. Deputado, hoje não tem, fatalmente, essa oportunidade, porque as inscrições são para declarações políticas, as quais têm prioridade
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente, De qualquer modo, pretendo continuar inscrito
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Sr. Deputado António Meira pede a palavra para que efeito?
O Sr. António Meira (PS): - Sr. Presidente, eu tinha me inscrito para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado César Oliveira. Gostava de saber se a Mesa anotou esse meu pedido.
O Sr. Presidente: - A Mesa anotou, Sr. Deputado, mas ainda não chegou a altura de conceder a palavra a V Ex.ª para esse efeito.
O Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Pedi sim, Sr. Presidente, para exercer o direito de defesa
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª é titular desse direito e melhor do que ninguém pode julgar da conveniência ou da pertinência do uso da palavra para esse efeito Por isso, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Silva Marques (PSD): - As situações assim o obrigam, Sr. Presidente. De facto, o Sr. Deputado César Oliveira entrou por um tino de apreciação sobre os caciquismos de que o seu partido seria herdeiro, pelo que sou obrigado a exercer o direito de defesa em virtude de alguma parte me caber também nessa matéria.
Há, realmente, um problema de caciquismo, mas o PSD resulta precisamente da ruptura com o caciquismo.
Não vejo motivo para uma ruptura apenas parcelar com o caciquismo no da União Nacional Mas, Sr. Deputado, e o caciquismo do «reviralho» antigo? É aceitável só porque é do «reviralho» e do antigo?
Ora, o PSD representei precisamente a ruptura com esse imobilismo de fundo ou, se quiser, com o caciquismo, relativamente ao qual me recuso a distinguir é exactamente a recusa dessa distinção que está na matriz do PSD: é a recusa do caciquismo e da sua identificação com o imobilismo.
0 Sr. Deputado César Oliveira não compreende as razões dos meus pedidos de esclarecimento e dos meus protestos 0 seu discurso e o seu apelo à coerência
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só teriam algum sentido se V. Ex.ª aceitasse as consequência turbulentas do apelo à incoerência Mas quando o Sr. Deputado, depois de ter feito um apelo à coerência, se limita a apresentar exemplos de incoerência da minha bancada e da bancada do CDS, pergunto-lhe: essa sua incoerência é um horror à turbulência? Essa sua postura é, afinal de contas, o esforço colectivo sem turbulência? Se assim for, então é um preço drástico para o seu apelo, porque é o preço da incoerência em flagrante delito, isto é, em pleno apelo à incoerência.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado Silva Marques, devo dizer que o seu discurso me cansou Estou como que a ofegar por causa das suas evocações com trocadilhos Até parecia que estava a ouvir falar o Dr. Lucas Pires!
Risos.
15to apenas em relação aos trocadilhos, entenda-se!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Dê mais exemplos de incoerência!
O Orador: - Sr. Deputado, em relação ao caciquismo, registo que nessa matéria o PSD é inovador. Não tenho mais nada a dizer.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado César Oliveira, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado César Oliveira, ouvi com bastante interesse a intervenção política de V. Ex.ª, a qual se apresenta claramente dividida em duas partes: Uma com o diagnóstico da actual situação política e outra com as soluções que o Sr. Deputado defende.
Queria pedir-lhe alguns esclarecimentos, sobretudo no que se refere à parte do diagnóstico da actual situação política.
0 Sr. Deputado afirmou recear que o ataque ao sector público e às leis laborais não viessem resolver, mas antes agravar, a actual situação que se vive no nosso país.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se V. Ex.ª receia ou se tem a convicção segura de que esse ataque às leis laborais e ao sector público virá, efectivamente, não atenuar, mas agravar a crise em que o nosso país actualmente vive.
Em segundo lugar, queria perguntar-lhe se, ao referir-se à actual situação política, V- Ex.ª conclui ou não que o actual Governo, com os sintomas de decomposição periódica que apresenta e com os resultados da sua governação, que, aliás, aqui referiu, não serve, carecendo, por isso, de ser substituído.
0 Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Meira.
0 Sr. António Meira (PS): - Sr. Deputado César Oliveira como historiador que é sabe muito bem que muitos dos Seus colegas têm defendido que a História não se repete enquanto outros, porém, defendem o contrário Em que ficamos? Para si, a História repete-se ou não? E no caso de entender que se repete, como parece querer sustentar na sua angustiada e pessimista intervenção, gostaria que me indicasse quais são, para si, os factores fundamentais e presentes que estão a impulsionar tal repetição. Repetição que julgo que ninguém com consciência democrática quer.
0 Sr. Presidente: - Para responder, se desejar, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
0 Sr. César Oliveira (UEDS): - Srs. Deputados, muito obrigado pelos pedidos de esclarecimento que me fizeram, e, se o Sr. Deputado Raul de Castro não se importar, vou começar por responder à questão altamente importante que me colocou o Sr. Deputado António Meira, meu prezado amigo e camarada.
Salvo erro, foi Hegel quem disse que História, quando se repete, ou é uma farsa ou é uma tragédia. E a História pode repetir-se.
Nós verificamos que em Portugal existe, por um lado, uma democracia cujas raízes são altamente débeis e, por outro, uma sociedade onde classes médias são política e socialmente muito importantes.
Ora, é nessas classes médias política e socialmente muito importantes que, normalmente, se em a constituir a base de apoio social para a ruptura com a democracia, e é nessas classes com situações do dia a dia muito difíceis - a minha intenção foi pessimista e angustiada, reconheço-o -, que as forças reaccionárias jogam no sentido de as desmobilizar. Tais classes sentem-se espartilhadas, à esquerda por um projecto político que não há e à direita pelo medo da oligarquias. Ora, o que essas classes médias querem é segurança, tranquilidade e algum bem estar.
O Sr. Deputado repare em certa imprensa portuguesa, repare no combate que ela faz ao Parlamento e diga-me se os ingredientes que utiliza nesse combate não são dirigidos à mobilização dessas classes médias contra a democracia, contra o parlamentarismo. Repare, por exemplo, no problema do Estatuto do Deputado, na situação da remuneração do deputado e no problema das críticas que certa imprensa - o Correio da Manhã, o Tal e Qual e outros - fazem a este propósito à própria instituição parlamentar Será que isto, ao fim e ao cabo, não serve para vir carrear material destinado a fomentar nas classes médias a base social de apoio, ontem como hoje historicamente, para essa ruptura? Não ser ,- irá isto para lhe aumentar a sensação de insegurança, a sensação de instabilidade, a sensação de pavor? 15to está a ser feito em Portugal ...
Mais: isto passa-se hoje tal como se passou ontem. De facto, se V- Ex.ª ler o Diário de Lisboa de 1921, na primeira página, e comparando a experiência de Mussolini em Itália e de Primo de Rivera em Espanha, entre 1921 e 1924, encontra, em letras garrafais: «Quem é que há-de salvar Portugal?»
Repare, Sr.ª Deputado, como se procura identificar certas instituições com os salvadores da Pátria Não será esta uma outra constante que se verifica?
Repare em certas posições da CIP, por exemplo, que tia ordem de trabalhos da sua, reunião de ontem (ou de hoje, não sei bem) tinha uma alínea que tratava da viabilidade do Regime Democrático.
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Repare em certas afirmações de certos militares - e eu digo os seus nomes: General Lemos Ferreira e General Silva Cardoso. Será que as suas afirmações não serão também elementos para carregar no sentido da instabilidade?
Repare em certas posições da Igreja em Portugal. Não servirão elas também para aumentar a insegurança e a instabilidade das classes médias?
A História pode repetir-se em Portugal. Mas, tal como V. Ex.ª diz, creio que não poderá haver ninguém com consciência democrática que não diga:
Basta, vamos pôr cobro a isto e vamos começar por nos reformar e regenerar a nós próprios, porque é essa a melhor resposta que damos à reacção e às forças que de novo querem em Portugal uma ditadura.
Aplausos da UEDS, do PS e do deputado Lacerda de Queirós (PSD).
Sr. Deputado Raul de Castro, tenho a certeza absoluta de que o ataque às leis laborais e ao sector público aumenta e agrava a crise social.
Vamos discutir isto até ao fim, porque esta questão está relacionada com uma intervenção da Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.
É bom que se veja em que circunstâncias é que se atacam as leis laborais e o sector público. Numa situação de expansão da economia, numa situação de riqueza, em que havia riqueza para distribuir, se calhar a minha posição em relação às leis laborais não era aquela que expresso neste momento porque havia oferta de emprego, havia expansão económica e, portanto, os despedimentos individuais, por exemplo, poderiam ter um outro sentido.
Mas neste instante, nas situações concretas da sociedade portuguesa, e tendo em atenção a experiência da história económica, política e social recente, alterar as leis laborais, nomeadamente propiciando os despedimentos indiscriminados, seria contribuir para agravar uma crise social que já é grande, pois que nos encontramos numa época de refluxo económico, em que a expansão económica não existe.
Foram estas as razões que me levaram a dizer o que disse - e perdoe-me a extensão desta minha intervenção, mas queria que ficasse claramente expresso o meu pensamento.
Em relação à substituição deste Governo, devo dizer que o essencial para nós é que haja uma política clara e minimamente coerente, mas o facto é que não houve e, em minha opinião, não pode haver.
Se V. Ex.ª me põe a questão frontalmente, digo-lhe que este Governo deve ser substituído; se V. Ex.ª ainda pretende saber mais do que isso, digo-lhe muito claramente que, em minha opinião, o Partido Socialista deve assumir a responsabilidade por um novo governo e por uma nova política.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Morais Barbosa.
O Sr. Morais Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A realização da 3ª reunião do Conselho das Comunidades Portuguesas que acaba de ter lugar em Fortaleza, no Brasil, sugerir-me-ia uma declaração de fundo sobre a problemática da emigração portuguesa.
Não é este, todavia, o momento adequado para o fazer, pelo que me reservo para outra oportunidade.
Neste momento, quereria apenas salientar alguns, poucos, aspectos que me parecem particularmente relevantes.
Em primeiro lugar, é de realçar o facto de esta reunião se ter realizado no Brasil. Tal circunstância permitiu pôr em relevo a grande comunidade lusíada constituída por Portugal e pelo Brasil e permitiu, ao mesmo tempo, entender que os problemas dos portugueses residentes no Brasil são bem diferentes dos que enfrentam os nossos compatriotas emigrados noutros países.
Começa logo pelo problema da língua que não se põe: a língua comum facilita imediatamente a inserção dos portugueses na sociedade brasileira.
Por outro lado, existe o estatuto de igualdade que o Brasil atribui aos portugueses que o requererem e que permitiu que tivéssemos encontrado como organizador principal desta reunião um português que goza desse estatuto e que está profundamente envolvido na política brasileira, sem deixar de estar envolvido na comunidade portuguesa e nos seus problemas.
15to levar-nos-ia a encarar de maneira global as distinções que é preciso fazer entre emigração e imigração, mas este não é o momento oportuno para tal, bastando agora dizer que é preciso levar em linha de conta esta questão e não tratar as comunidades emigradas exactamente da mesma maneira, como se todas tivessem os mesmos problemas e as mesmas dificuldades. Daí que qualquer programa cultural que se projecte não possa ser global para as diversas comunidades, mas sim um programa devidamente estudado e estruturado em função das necessidades particulares de cada uma delas.
É esta a primeira nota que desejava deixar aqui bem expressa, insistindo com grande relevo na existência da comunidade lusíada, que é, afinal, o alargamento da própria comunidade portuguesa.
Queria também salientar o papel particularmente importante que em toda a actividade da emigração, mais particularmente da Secretaria de Estado da Emigração, deve ser atribuído à rede diplomática e consular.
Posso dizer - e ninguém que tenha participado na reunião do Conselho me desmentirá - que a grande figura da reunião do referido Conselho foi o Embaixador de Portugal no Brasil, que não foi convidado para participar nos trabalhos do Conselho, mas apenas para um jantar num dia e para outro uns dias depois. No entanto, o Sr. Embaixador, por iniciativa própria, deslocou-se a Fortaleza, não para jantar mas sim para trabalhar com todos os participantes. Foi mais assíduo do que vários dos participantes, e o seu profundo conhecimento do Brasil e da situação dos portugueses nesse país permitiu-lhe fornecer informações de que outras pessoas, que deveriam ser igualmente ou mesmo mais responsáveis, não tinham conhecimento. Pode ter sido algo incómoda a intervenção do Sr. Embaixador, mas foi a intervenção de um diplomata de carreira altamente prestigiado, que sabe o que está a fazer e que, sobretudo, tem a grande qualidade, que é própria dos diplomatas mas que também deveria sê-lo de quantos se dedicam aos problemas da emigração: a de ver os problemas numa perspectiva exclusivamente nacional e sem procurar, por
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isso, retirar quaisquer dividendos partidários da sua acção e das suas intervenções.
Como terceiro ponto, quereria dizer que, se é já um facto, como acabo de assinalar a diversificação das comunidades portuguesas no estrangeiro, é um facto também que não podemos ocupar-nos e preocupar-nos apenas com os problemas das comunidades portuguesas emigradas há mais ou menos tempo.
Foi o Prof. Adriano Moreira quem em Portugal reconheceu pela primeira vez, e até hoje com maior clareza e visão de Estado, não só a importância das comunidades portuguesas mas também a das comunidades descendentes de portugueses e das comunidades culturalmente filiadas na tradição portuguesa.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador :- São 3 realidades distintas, e são 3 realidades que é preciso levar em conta se quisermos entender globalmente o problema da «nação peregrina em terra alheia», (retomo aqui uma expressão do Prof. Adriano Moreira). Os problemas destes 3 tipos de comunidades são igualmente diferentes, não podem ser ignorados e devem ser atendidos em qualquer programa cultural que se pretenda pôr em prática no estrangeiro, no âmbito da emigração. É bom não esquecer que felizmente a imagem de Portugal no estrangeiro não é dada apenas pelo Governo português, não é apenas a imagem do Estado Oficial português - a imagem é transmitida, sobretudo, pelos portugueses e seus descendentes mais ou menos próximos.
Outro aspecto que não desejaria deixar passar aqui despercebido é um para o qual se tem chamado muito pouco a atenção: a relevância extraordinária da missionação da Igreja Católica portuguesa nos países para onde portugueses emigram. Estão longe da Pátria, adaptam-se a outros hábitos, podem praticar outra língua, mas a Igreja portuguesa continua a ser um dos pontos de reunião dos portugueses, dos seus descendentes, dos filiados culturalmente no portuguesismo. No entanto, creio que não tem sido prestada justiça suficiente ao papel da missionação portuguesa nos países de acolhimento.
Enfim, fala-se bastante em Portugal dos emigrantes, mas receio que na maior parte das vezes em que isso se faz se pense menos em portugueses e mais em potenciais enviadores de divisas. É certo que têm sido proporcionadas aos emigrantes várias facilidades mas por detrás de quase todas me parece estar esse objectivo.
Ora, os emigrantes são - e podemos vê-lo por toda a parte - profundamente solidários com Portugal.
Estão profundamente empenhados em conhecer e viver a realidade portuguesa. Só é preciso sabermos qual a realidade que queremos proporcionar-lhes - se são realidades descobertas mais ou menos à pressa para fazer programas ou se é a realidade nacional. Mas tal solidariedade deve ser recíproca e isso verificou-se, de maneira particularmente expressiva, no Congresso dos Emigrantes Madeirenses que se realizou em Junho último no Funchal e em que se sentiu o empenho e a solidariedade entre todos os residentes na Madeira e os madeirenses residentes fora. Gostaria de ver isso num nível mais vasto, nível nacional.
Considerando a grande importância que para tudo tem o ensino, para lá de outros factores que já apresentei, o meu grupo parlamentar vai apresentar um projecto de lei que tem a ver com o reconhecimento das escolas portuguesas no estrangeiro em regime de reciprocidade. Creio que com isso daremos um grande passo para estreitar laços de solidariedade, laços esses que não devem ser apenas dos portugueses que aqui estão para os portugueses que estão fora - e esta expressão «o emigrante» assume determinadas conotações pejorativas que desejaria ver abolidas - mas laços de uma solidariedade que deveria ser extensiva a todos os portugueses residentes em qualquer lado. Concluiria esta intervenção, lendo apenas umas linhas de um texto do Prof. Adriano Moreira, que tem já alguns anos mas que continua a ser perfeitamente actual - tem exactamente 20 anos, pois é de 1964. O texto, curto, é este:
Se fosse possível que os portugueses descendentes de portugueses ou filiados na cultura portuguesa, que povoam os EUA, soubessem e se inquietassem com os que povoam a França, e estes com os de Malaca, e estes com os do Canadá, e estes com os da África do Sul, e estes com os do Japão, e todos uns com os outros, e todos os que vivem em território sujeito a soberania lusíada, ou portuguesa ou brasileira, teríamos ao redor do mundo uma força moral não agressiva, convergente, praticante da regra da igualdade do género humano cheia de amorosidade, cristãmente ecuménica, podendo ser extremamente eficaz pela observância da regra de que não são as nossas palavras mas as nossas obras que rezam. Uma força tecida mais pela internacionalização da vida privada que pelo propósito dos governos, precisando da ajuda que cabe nos deveres da autoridade política, mas inteiramente a política, porque apenas e exclusivamente comprometida com a maneira lusíada de estar no mundo.
Aplausos do CDS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Morais Barbosa.
Inscreveu-se para interpelar o Sr. Deputado Morais Barbosa, o Sr. Deputado José Vitorino. No entanto, tendo terminado o período de antes da ordem do dia o Sr. Deputado fica inscrito para próxima sessão.
Está ainda inscrito, para pronunciar uma declaração política, o Sr. Deputado José Vitorino.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um governo, qualquer governo, tem a óbvia obrigação de resolver os problemas dos cidadãos e do país. E para além do que se poderão chamar as grandes medidas de política, tem a obrigação de garantir a moralidade e o mais completo sentido de responsabilidade a todos os que directa ou indirectamente de si dependem, procurando assegurar:
Defesa da vida dos cidadãos;
Defesa da propriedade;
Defesa da justiça e da igualdade;
Defesa da moralidade, na administração;
Rapidez nas decisões;
Confiança aos cidadãos e em particular os agentes económicos.
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Por isso e para isso deve esforçar-se por planear e organizar os serviços. Mas não pode, em quaisquer circunstâncias, abdicar de accionar, de facto, todos os órgãos e mecanismos de fiscalização e inspecção nas áreas da sua tutela.
E da maneira como for capaz de o fazer resultará a credibilidade ou desprestígio dos departamentos, serviços, órgãos e seus agentes e, por via progressiva, daqueles que exercem o poder político, pelas responsabilidades que sobre os seus ombros recaem a propósito de um eventual mau, desonesto ou lento funcionamento da máquina administrativa do Estado.
Sabe-se o que acontecia em Portugal antes do 25 de Abril, em que tudo ou quase tudo o que era menos lícito e menos legítimo era «abafado», restando para apresentação e encenação pública alguns «casos exemplares» para procurar fazer crer aos cidadãos da isenção das decisões dos órgãos e da conduta dos responsáveis. É esta, aliás, uma característica universal dos regimes antidemocráticos ou ditatoriais, desde os fascistas aos comunistas, em que a força da opressão e do partido único permitem um efectivo controle e programação, por parte da classe dirigente «do quê», «do como» e «em que momento», tornam públicos tais casos. Doseiam assim a propaganda e a demagogia através da comunicação social que comandam, comummente associada com a mentira, como forma de convencerem ou, pelo menos, manterem em estado de dúvida o espírito dos cidadãos oprimidos. E o absurdo e intolerável atinge-se quando tais poderes procuram fazer reverter a favor da imagem de um regime, e dos poderes autocraticamente assumidos, situações que o próprio regime proporcionou ou directamente provocou, como aconteceu por exemplo com o caso Humberto Delgado em Portugal ou com a morte do Padre Popieluszko na Polónia, cada um com as suas características próprias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Situação diversa é ou deve ser aquela que se verifica nos regimes democráticos. Como tenho salientado em várias oportunidades, entendo que o regime democrático e a solidez das suas instituições e a credibilidade dos seus agentes dependem da capacidade e da coragem para se tomarem as medidas de política adequadas, mas dependem também, e muito, da transparência e do exemplo de conduta das estruturas públicas.
E se este exemplo não for dado, então toda a estrutura democrática começa a ficar fortemente abalada e corroída nos seus alicerces mais profundos. É que, além de prejuízos directos que podem acarretar para o País, lançam a suspeição de incapacidade ou de irresponsabilidade e pior que isso, de injustiça ou de imoralidade, com o correspondente alheamento e afastamento dos cidadãos pelas coisas da causa pública democrática.
O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!
O Orador: - E este é um vírus terrível, que abala espíritos, destroi a força moral e que pode ir «desapegando» os cidadãos de princípios democráticos elementares. Tem-se assim, que em democracia, para lá da participação e corresponsabilização de todos os cidadãos, a conduta dos agentes que têm obrigação de servir a comunidade, desde o Presidente da República até ao mais humilde contínuo ou mulher da limpeza, mas nem por isso menos dignos, é elemento essencial.
Muitos foram naturalmente os vícios herdados na administração pública do antes do 25 de Abril e muitas são as medidas que se requerem para a sua descentralização, desconcentração, modernização e para uma maior produtividade. Enfim, medidas para os tornar menos burocráticos, mais transparentes e mais eficazes.
Contudo, e além disso, no dia-a-dia não se poderão deixar de pedir responsabilidades e inquirir quanto a causas de situações mais evidentes e graves, assim como incentivar e premiar os mais competentes e diligentes. E tal torna-se necessário para corrigir maus funcionamentos, garantir o progresso e impedir a impunidade de quem serve mal. Defender-se-á assim a imagem do regime; e evitar-se-á que recaia sobre a maioria dos que desempenham funções públicas o odioso ou acinte de negligência ou outro tipo de suposições desprestigiantes, por causa do comportamento de alguns.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É sabido que muito do que se ouve e especula contra o Governo, governantes e outros responsáveis, e que atenta contra a sua dignidade e honorabilidade, é feito com fins demagógicos, falsos e caluniadores, mas ainda assim, e por isso mesmo, se exige uma real capacidade para desmistificar tal conduta, através do apuramento da verdade.
E face a uma situação de certa intranquilidade e incerteza que, por vezes, ao longo dos anos, tem vindo a verificar-se em Portugal e que abala a confiança dos cidadãos e a credibilidade e eficácia do Estado justifica-se da parte do Governo:
1) Eliminar todos os serviços que correspondam à duplicação ou triplicação de funções idênticas;
2) Rever a nível de cada ministério e nas relações entre os vários ministérios os critérios funcionais para evitar conflitos de competências e diluição de responsabilidades por vários órgãos;
3) Reapreciar nos seus aspectos funcionais e orgânicos os vários serviços que a nível do Estado têm poderes de inspecção, dotando-os de meios humanos e colocando-os a coberto de quaisquer pressões;
4) Tomar as medidas convenientes para que os órgãos existentes para fiscalizar a gestão da administração pública dêem conhecimento público das principais acções desenvolvidas e das medidas tomadas em relação aos que não as cumprem;
O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!
O Orador: -
5) Garantir que, em particular, a Alta Autoridade Contra a Corrupção, apresente rapidamente conclusões sobre alguns dos processos. É indiscutível o seu interesse pedagógico, «obrigando» a saírem a público certas situações menos claras, como tem vindo a assistir-se, mas exige-se também que se conclua sobre «quem» é responsável e sobre «o quê». Caso contrário, será mais um órgão criado sem efeitos práticos para reforço na confiança dos cidadãos e até, mais grave
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muito se chorou
vinha posse as respostas e secretarias de Estado às perguntas que considerar satisfatórias dadas pelo Ministério
ao tratamento que
Faro, já tenho de
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semprego também indevidamente atribuídos. É preciso e exige-se que se faça mais, mais e muito mais.
O País e o regime, para lá dos governos de cada momento, justificam que isso se faça com determinação, não é o Governo deste momento que está em causa, são as próprias instituições.
Caso contrário, Sr. Presidente, Srs. Deputados, cair-se-á na degradação progressiva, e poderá chegar-se se a um ponto em que será difícil, ou impossível, corrigir seja o que for, imperando então a pior de todas as soluções e de todos os males em democracia, que é o «deixa andar porque já não há nada a fazer». E por certo nenhum democrata está interessado nisso!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para interpelar o Sr. Deputado José Vitorino, o Sr. Deputado Carlos Brito, que fica com a palavra reservada para uma próxima oportunidade.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ficámos a saber desde ontem à noite que a coligação tem estado a fazer o exame de consciência. Demorado tem sido ele pois já se arrasta desde meados do mês passado o que prova os grandes pecados que pesam na consciência da coligação.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O Governo, esse deve estar em retiro pois deixou de cumprir obrigações constitucionais e legais indisfarçáveis.
Assistimos a esta coisa paradoxal que é o Governo e a coligação se entreterem a congeminar calendários para isto e para aquilo e esquecerem-se de cumprir os calendários que lhe são impostos pela Constituição e a lei, como os que se referem à apresentação e aprovação do Orçamento do Estado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O ano de 1985 vai iniciar se, assim, com duodécimos o que é um vivo testemunho da estabilidade governativa que o primeiro-ministro apregoa.
Ficámos a saber também que o primeiro-ministro é só primeiro-ministro. Não se percebe por isso por que é que ficou tão zangado com as declarações de oposição das distritais do PSD ao candidato presidencial Mário Soares, que pelos vistos não é.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Nem tão-pouco, se percebe, por que se apresta a pagar um preço tão alto para calar os recalcitrantes assumindo como suas e do seu partido as reclamações mais descabeladas do PSD, em muitos pontos o verdadeiro caderno reivindicativo do grande capital e da direita - desde a liberalização das rendas à revisão da legislação laboral passando pela Lei de Segurança Interna.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!
O Orador: O primeiro ministro reconhece, no entanto, que a barca governamental está em dificuldades, que o Governo de coligação é uma maçada. O exame de consciência vai assim continuar.
Deixemos por agora o Governo e a coligação governamental e falemos de iniciativas onde verdadeiramente se estuda, trabalha e luta para encontrar soluções para os problemas do nosso povo e do nosso país.
Vozes do PCP: Muito bem!
O Orador: No passado fim de semana realizaram-se duas assembleias de organizações regionais do meu partido: a da organização do distrito do Porto e a da organização do Algarve.
Noutra altura falaremos das conclusões da assembleia de organização regional do Porto do PCP, hoje como deputado eleito pelo círculo de Faro proponho me dar à Assembleia da República uma notícia breve sobre os trabalhos e conclusões da primeira assembleia regional do Algarve do PCP, já que a comunicação social estatizada, especialmente a rádio e a televisão, que costumam correr pressurosas quando qualquer do dois partidos da coligação dá um suspiro em Faro, permitiram-se não estar presentes e não dizer uma palavra sobre a assembleia dos comunistas do Algarve.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): É um escândalo, uma vergonha!
A primeira assembleia regional dos comunistas algarvios verificou tanto as enormes potencialidades de desenvolvimento que o Algarve apresenta, como os gravíssimos problemas com que se debate em todas as áreas económicas e sociais mais significativas.
Debaixo de um fino verniz de prosperidade que exibe em algumas zonas do litoral turístico, o Algarve esconde gritantes assimetrias e gravíssimas carências, atrasos e retrocessos que o colocam em muitos aspectos ao nível das regiões mais deprimidas do País.
Esta situação tem-se agravado nos últimos anos e com os últimos governos, não havendo neste momento um só sector de actividade económica da região que não sofra os nefastos efeitos da crise económica e financeira que o País atravessa.
A situação da indústria algarvia é particularmente preocupante. Contribuindo apenas com 20% para a formação do PIB na região, o panorama da indústria algarvia é de absoluta regressão.
O surto da construção civil em grande parte associado ao turismo encobriu durante anos este panorama, mas com a entrada em crise também deste sector, assinalado por várias falências e despedimentos de trabalhadores o descalabro industrial do Algarve aí está inteiramente a descoberto.
Esta situação atinge sobretudo e gravemente os trabalhadores: mais 13 000 desempregados e cerca de 3000 trabalhadores com os salários em atraso, além de muitos outros que aceitaram a reforma ou o despedimento depois de terem sido remetidos às situações mais dramáticas.
Mas salientemos, fazendo justiça, que muitos empresários que apostam seriamente no desenvolvimento do País e no desenvolvimento da região algarvia, são também duramente atingidos pela crise e nalguns
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casos compelidos a suspender actividades, bem contra sua vontade.
Grave é também a situação na agricultura e nas pescas. Há por aí quem seja capaz de pensar que nada disto interessa pois o futuro do Algarve está no turismo.
Com efeito, o sector terciário, onde avulta o turismo, contribui com mais de 52% para a formação do PIB regional e ocupa mais de 47% da população activa algarvia
Acresce que se realizam no Algarve 40% a 50% das receitas nacionais do turismo.
Simplesmente, por muito que se queira valorizar o turismo, e nós queremos, o carácter dominante que ele assume na economia algarvia, longe de ser um motivo de confiança, é razão de insegurança. Conhece-se a vulnerabilidade desta actividade e a vulnerabilidade das regiões que a ela se entregam em regime de monocultura Conhecem-se por fim a vulnerabilidade do nosso turismo que alguns episódios recentes puseram em evidência e onde jogam forte a anarquia, a especulação, o aventureirismo, onde nada se avançou no sentido de um plano nacional de turismo e no que toca ao Algarve no sentido de um plano integrado de desenvolvimento regional
A assembleia dos comunistas algarvios chamou a atenção para as condições extremamente precárias que se verificam nos domínios da habitação, da saúde, do ensino, da segurança social e dos transportes e portos, bem como para as profundas carências que subsistem na área do saneamento básico.
A assembleia insistiu em considerar como problema central do Algarve o abastecimento de água às populações, à agricultura, ao turismo e à indústria. Em face dos sinais já dados pela natureza, quaisquer adiamentos ou demoras na construção das barragens algarvias e na concretização de outras medidas de gestão dos recursos hídricos têm de ser consideradas como grave atentado às condições de vida das populações do Algarve.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE
Os comunistas algarvios aprovaram um vasto programa de medidas em todos os domínios onde se decide o futuro do Algarve e o bem estar das suas populações, com destaque para as pescas e as conservas, a agricultura e o turismo.
Neste quadro, atribuímos a maior importância à luta por uma verdadeira regionalização como instrumento de descentralização administrativa e financeira.
Trata-se de um verdadeiro caderno reivindicativo para o Algarve, que nos dispomos a debater e a enriquecer com outras forças políticas.
Mas torna-se evidente que as soluções para os grandes problemas do Algarve não podem ser encontradas com o presente Governo.
Ano e meio de experiência desastrosa não deixa dúvidas a este respeito Assim, seja qual for o ângulo de apreciação da situação do País, sectorial como ontem fizemos, ou regional, como agora fazemos, a necessidade de nos desembaraçarmo-nos do presente Governo impõe-se como um objectivo fundamental.
A ele os comunistas algarvios dedicarão o melhor do seu esforço, como deliberaram na sua primeira assembleia regional.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE
O Sr. Presidente: - Pediu a palavra, para interpelar o Sr. Carlos Brito, o Sr. Deputado José Vitorino, que fica inscrito para a próxima sessão.
Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Gil Romão
O Sr. Gil Romão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como deputado pelo círculo de Portalegre, preocupa-me obviamente tudo quanto diga respeito a este distrito, aos problemas com que actualmente se debate ou ao encontrar fórmulas de apoio e estímulo ao desenvolvimento de que carece para que nos permita encarar com mais optimismo e esperança o futuro.
Em Portalegre reflectem se os problemas próprios da interioridade, sinónimo do isolamento e das dificuldades nos vários sectores de actividade, que determinam forçosamente a vida de quantos residem e labutam em cada um dos 15 concelhos.
A agricultura é de longe a principal actividade económica da região, definindo-se o meio rural como quadro de vida preponderante das populações que esperam os apoios indispensáveis que possibilitem e garantam uma melhoria das condições de vida.
Nos últimos anos, e sobretudo através do dinamismo das autarquias locais, minimizaram-se e conseguiram resolver se - com o atraso de décadas, diga-se problemas básicos da região Ultrapassados estes e adquiridas muitas outras infra-estruturas que dignificam o poder local democrático, ficou positivamente influenciado o padrão de vida nos meios rurais.
De uma maneira sucinta, direi mesmo telegráfica, apresento aqui algumas das preocupações da região, que o Governo, interessado no desenvolvimento regional, deverá continuar a ter em conta.
No campo agrícola existem questões de âmbito geral que têm a ver com a moralização do sector. Reflectem-se na região e passam, por exemplo, por garantir que as distribuições de terra sejam feitas com critérios de equilíbrio e justiça a verdadeiros pequenos e médios agricultores, que a cultivam e que produzam riqueza e não àqueles que a deixam completamente abandonada ou só para pastagens.
A política de créditos e subsídios à lavoura deverá ter, necessariamente, um rigoroso acompanhamento e fiscalização pelos serviços do ministério para que conduza a critérios justos e para que a sua aplicação se faça efectivamente no sector e não seja abusiva e indevidamente utilizada.
A conseguir-se isto, a par de um efectivo apoio técnico às cooperativas ou agricultores, com a presença dos técnicos, num verdadeiro serviço de extensão rural, no terreno e não nos gabinetes, inverter-se-ão muitos dos vícios. Poupar-se-ão meios e criar-se-ão incentivos e estímulos para que os agricultores, através da cooperação nas suas associações e com os organismos vocacionados a apoiá-los, procurem o desenvolvimento e modernização da agricultura.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na concordância com as opções do programa de governo para o sector agrícola e no apoio inequívoco que lhe concedemos, não deixamos, contudo, e num sentido positivo, de constatar que muito tempo foi perdido e que se esperam do Ministério da Agricultura medidas urgentes que invertam a passividade de muitos dos seus agentes naquela região e se crie a regra de ouro da confiança recíproca com os agricultores.
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Só a transparência dos métodos motivará quem trabalha e penalizará no futuro os que se aproveitam, na confusão, das águas turvas que permitem negócios chorudos com grandes margens de lucro na comercialização de bens agrícolas ou na utilização dos créditos e subsídios Só é possível gerar riqueza aproveitando devidamente os recursos actuais e planeando os investimentos a médio e longo prazo.
Assim, se o perímetro de rega do Caia onde labutam muitos pequenos agricultores e seareiros com problemas graves e diversos e, desde logo, com a incerteza do direito à posse ou arrendamento da terra está a ser aproveitado a 40 % ou 50 % da sua potencialidade, tanto pela área irrigada como pelas culturas utilizadas, ele deve merecer uma reorganização e regulamentação convenientes; também se torna necessário dar execução aos projectos da barragem do Pisão, de importância relevante para os concelhos de Crato e Alter do Chão, bem como da barragem de Apertadura, no concelho de Marvão.
É com satisfação que podemos afirmar que este Governo percebeu a importância destas duas barragens e desbloqueou recentemente esta velha aspiração das populações, de há muito estranhamente ignorada e de vital importância no distrito.
A barragem da Apertadura foi já objecto de concurso público. Estas obras potenciarão importantes áreas de regadio e contribuirão para o abastecimento de água às populações, por exemplo do concelho de Portalegre.
No campo da florestação existem zonas com características próprias ao seu desenvolvimento, como a serra de São Mamede, mas deverão tomar se medidas severas que contrariem o contínuo alargamento de plantações de eucaliptos, sobretudo em zonas com aptidões agrícolas mais rentáveis, como em Gavião, Ponte de Sôr ou Nisa.
Tais plantações têm uma acção negativa no ordenamento biofísico destas zonas, de que resulta a degradação do solo e a desertificação populacional que lhe está associada. Ou seja, é essencial o fomento, protecção e ordenamento da floresta e também, cabe aqui dizê-lo, da vida selvagem, nomeadamente da cinegética que, com o abuso dos prevaricadores, da inexistência real de fiscalização e protecção, e às vezes mesmo com a complacência dos tribunais, a curto prazo será exterminada.
Nas últimas décadas, também neste distrito se deu o fenómeno da emigração ou da fixação em Lisboa e noutros centros industriais de quantos tentaram escapar a uma vida ainda mais difícil, dura e altamente carenciada.
Os pólos industriais no distrito situam-se nos maiores aglomerados populacionais: Portalegre, Elvas, Ponte de Sôr e Campo Maior Como região do interior e essencialmente agrícola carece de suficientes unidades industriais, vitais ao progresso e fixação das populações. A par do apoio as unidades industriais existentes e incentivos a novos investidores, só através da exploração, valorização e transformação dos recursos naturais - nomeadamente, com unidades transformadoras integradas na produção e que, naturalmente, propiciaram indústrias agro-alimentares - será possível encarar o desenvolvimento da região em apreço.
Para ilustrar o que acabo de referir, e no sentido de incrementar a pecuária, torna-se urgente a concretização do matadouro, agora denominado Matadouro Regional do Alto Alentejo. A sua localização neste distrito, facilitada na conjugação de esforços das autarquias, justifica se plenamente pelas potencialidades de crescimento da região.
Ao fomentar-se este sector económico, não se poderão esquecer outras áreas de real significado, como o são os recursos naturais, desde os granitos de Alpalhão ou Monforte ao urânio de Nisa, isto só para mencionar alguns deles.
A beleza natural desta região, aliada à hospitalidade peculiar das populações alentejanas, reflectem as potencialidades turísticas do distrito. Portalegre, Castelo de Vide - a Sintra do Alentejo - a vila medieval de Marvão, com uma paisagem deslumbrante, ou ainda as barragens de Montargil e Caia (para me limitar apenas a estas zonas), são determinantes vectores de riqueza que importa implementar com o concurso interessado das autarquias, dos empresários, sem esquecer a Comissão Regional de Turismo de São Mamede.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O progresso e o desenvolvimento harmonioso do homem é indissociável do ensino e da cultura. A primeira linha de combate travamo-la contra o analfabetismo. Nunca será demais a conjugação de esforços entre as entidades, a todos os níveis, no sentido de procurar meios de protecção e divulgação dos valores regionais e encontrar fórmulas de apoio a quantos, com apetências culturais, queiram estudar e interessar-se pelas riquezas da comunidade.
Preservar o artesanato, o folclore, enfim, o património cultural do distrito, é um dever que se nos impõe. As riquezas arqueológicas, por exemplo, são valiosíssimas e um grande número, desde as pinturas rupestres situadas no concelho de Arronches e que constituem os únicos abrigos pré históricos do género no País, até testemunhos de civilizações do neolítico, idade do ferro, ou romana, sitas em Santo António das Areias, Crato, Nisa, Ponte de Sôr, Aranenha ou ainda a vila lusitano romana, situada em Torre de Palma, no concelho de Monforte.
Em relação ao ensino, e para além de problemas de natureza muito diversa, como a falta de equipamento, constata-se nos últimos anos um progresso significativo materializado na criação de novas escolas ou graus de ensino em alguns concelhos.
Deve assinalar-se, no que concerne ao ensino preparatório, a urgência em acelerar o processo do seu funcionamento nos concelhos de Marvão e Monforte. Este último, que sofreu de grande morosidade na sua criação, parece ter o problema em bom ritmo para finalmente se iniciar a respectiva construção.
Contudo, existe ainda uma questão delicada e importantíssima para a região que -se arrasta há vários anos e que urge ser rapidamente desbloqueada. Refiro-me concretamente a uma aspiração justa do distrito de Portalegre: o funcionamento da sua Escola Superior de Educação, que constituirá um factor fundamental no desenvolvimento do distrito.
Nada justifica o atraso e indefinição na sua instalação, tanto mais que, para o efeito, existe o edifício do antigo Liceu de Portalegre, que necessitará apenas de obras de adaptação.
Uma outra questão, de fulcral significado para a expansão do distrito, diz respeito às vias de comunicação, nomeadamente rodoviárias e ferroviárias, que
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com a sua melhoria ou alargamento permitiriam uma ligação mais rápida com outras zonas do País.
Integrado no plano nacional de vias de comunicação que o Governo parece encarar com determinação e eficácia, o alargamento e restauração da estrada entre Portalegre e Estremoz, de há muito desajustada ao tráfego, foi finalmente objecto da atenção do actual Governo O primeiro troço, no sentido de Estremoz-Portalegre, foi já a concurso, pelo que se espera do Governo as medidas tendentes a que, com a maior celeridade, esta ligação a Portalegre e Espanha alcance na sua totalidade.
Obras de restauro entre Monforte e Fronteira ou a construção da nova ponte e acessos entre Ervedal, Figueira e Barros, no concelho de Avis, são prioridades que, tomadas rapidamente em conta pelos serviços responsáveis, facilitarão a curto prazo aquelas ligações
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portalegre é um distrito com dificuldades mas também com recursos, como ficou demonstrado num exausto estudo integrado de desenvolvimento que foi levado a cabo com a colaboração da maioria das câmaras municipais
Ainda que de maneira sucinta, a que a circunstância do tempo obriga, proeurou-se aqui caracterizar este distrito e dar a conhecer a esta Câmara alguns dos problemas que temos acompanhado, de acordo com o compromisso assumido com as populações.
Estamos convictos de que o Governo não ficará indiferente a algumas das questões suscitadas, na certeza de que, numa conjugação de esforços a todos os níveis de responsabilidade, o desenvolvimento regional e bem-estar da população será uma certeza a breve trecho.
Aplausos do PS
O Sr. Presidente: - Em relação à intervenção que acaba de pronunciar o Sr. Deputado Gil Romão, inscreveram-se os Srs. Deputados Vasco Miguel, Joaquim Miranda, Soares Cruz, Malato Correia e António Gonzalez, que ficam inscritos para uma próxima oportunidade.
Srs. Deputados, entrando agora no período da ordem do dia ...
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, pretendia questionar V. Ex.ª em relação ao período da ordem do dia.
Entende a nossa bancada - e gostava de submeter isso mesmo à apreciação da Câmara - que talvez não fosse conveniente começarmos a discutir problemas de tão relevante importância faltando apenas 20 minutos para o intervalo Por conseguinte, sugeríamos a V. Ex.ª que não se começasse agora essa discussão, tanto mais que o Governo está ausente da sua bancada e julgamos que deverá estar presente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Soares Cruz, pela minha parte não acato a sua sugestão porque entendo que se pode iniciar imediatamente o período da ordem do dia Contudo, se os restantes grupos parlamentares tiverem uma opinião idêntica à que V. Ex.ª manifestou, não tenho objecções a colocar à interrupção da sessão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, pretendia apenas dizer que, da nossa parte, não há qualquer objecção a que adoptemos a sugestão do Sr. Deputado Soares Cruz, uma vez que o Governo não está presente e estará em discussão uma proposta de lei.
O Sr. Presidente - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, nós também pensamos que a sugestão que é feita pelo Sr. Deputado Soares Cruz é perfeitamente pertinente. Quanto a nós, há até uma razão que sobreleva todas as demais, a ausência do Governo quando se pretende discutir uma matéria em que a sua intervenção é tão importante, tão relevante e tão polémica. Por isso mesmo, pensamos que o debate não pode iniciar-se sem a presença e apresentação da proposta do Governo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na medida em que os dirigentes dos grupos parlamentares que se pronunciaram até agora o fizerem no sentido de interrompermos agora os nossos trabalhos, mantendo-se em silêncio os restantes, tomo a decisão de interromper a sessão, que recomeçará às 15 horas com uma ordem de trabalhos já conhecida.
Está suspensa a sessão.
Eram 12 horas e 40 minutos
Após o intervalo, reassumiu a Presidência o Sr. Deputado Fernando do Amaral.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou fazer umas simples comunicações, que são as seguintes:
A Comissão de Educação, Ciência e Cultura, no cumprimento do respectivo preceito regimental, informa de que só terá disponibilidade de enviar os relatórios que lhe respeitam a partir do próximo mês;
A Comissão dos Negócios Estrangeiros e Emigração não reuniu durante o mês de Outubro.
Para dar cumprimento ao mesmo preceito regimental, peço ao Sr. Deputado Álvaro Brasileiro que, como presidente da Comissão de Agricultura e Mar, tenha a bondade de ler o relatório que me foi presente.
O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP):
Relatório dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar durante o mês de Outubro
Dando cumprimento ao artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, a Comissão
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Parlamentar de Agricultura e Mar apresenta ao Plenário o seu relatório de actividades durante o mês de Outubro
Durante este mês esta Comissão reuniu duas vezes (dias 19 e 23 respectivamente), dando andamento ao expediente e a outros trabalhos nela pendentes, como, por exemplo:
Solicitações
No dia 19 de Novembro de 1984 foi aprovado solicitar ao ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação a sua presença na Assembleia da República para uma reunião com a Comissão de Agricultura e Mar para uma troca de impressões alusivas à problemática agrícola, assim como à deslocação desta Comissão a Trás-os-Montes e Alto Douro, nos dias de 27 a 29 de Fevereiro de 1984, e a Entre Douro e Minho, nos dias 9 a 11 de Abril de 1984, e cujos relatórios foram envia dos ao Ministério acima citado.
Idêntica solicitação foi endereçada ao Ministério das Finanças e do Plano.
Foi também solicitado ao Sr. Presidente da integração Europeia o envio de fotocópias de todo o material disponível relativo às negociações com a CEE-
Representações
No dia 7 de Outubro, e a convite do Secretariado dos Baldios do Centro e Norte, uma delegação composta pelos Srs. Deputados Sá Morais, João Abrantes e Cunha e Sá representaram a Comissão Parlamentar de Agricultura na Conferência Nacional dos Baldios, que se realizou em Viseu, e cujo relatório foi entregue a esta Comissão e dado conhecimento aos Srs. Deputados.
Audiências
No dia 30 de Novembro de 1984, foi recebida em audiência uma delegação da Federação dos Agricultores do Distrito de Santarém, a qual expôs aos Srs. Deputados a grave situação em que se encontra a agricultura naquele distrito, com especial relevância para os problemas dos rendeiros do Monchão do Escaropim, sito na freguesia de Muge, concelho de Salvaterra de Magos.
O Sr. Presidente: Srs. Deputados, queria ainda informar VV. Ex.ªs que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares não esteve presente na
Câmara na parte da manhã porque não sabia que tinha terminado o período antes da ordem do dia. Entretanto, vinha a caminho quando tomou conhecimento de que os trabalhos tinham sido interrompidos.
Estão, pois, em discussão, na generalidade, os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 266/III, apresentado pelo PCP; projecto de lei nº 333/III, apresentado pela UEDS, e o projecto de lei n.º 392/III, apresentado pelo PS e pelo PSD, todos eles relativos ao Estatuto do Deputado, e a proposta de lei n.º 88/III, e o projecto de lei n.º 400/III, do CDS, relativos ao Estatuto Remuneratório dos Deputados e outros Titulares de Cargos Políticos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos para interpelar a Mesa.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): Sr. Presidente, antes de se dar início ao debate que V. Ex.ª acaba de enunciar, solicitava que fosse dada a palavra ao meu companheiro de bancada José Magalhães, já que há uma questão prévia que gostaríamos de colocar em relação a esse debate.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, na sequência do pedido formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, era apenas para anunciar à Mesa que iremos entregar de imediato um texto tendente a que a Assembleia possa deliberar, neste momento, sobre o processo de debate e votação destas iniciativas legislativas relativas ao estatuto remuneratório dos deputados e outros titulares de cargos políticos uma vez que, como V. Ex.ª sabe, a ordem do dia de hoje integra, por um lado, 3 projectos de lei referentes ao estatuto dos deputados (respectivamente da autoria do PCP, da UEDS e do PS/PSD) e, simultaneamente, inclui também, como segunda componente, a apreciação e eventual votação de um projecto de lei do CDS relativamente ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos e a proposta governamental nº 88/III, com o mesmo objectivo.
Entendemos que o processo de apreciação e de votação destas duas questões deveria ser diferenciado e, nesse sentido, iria apresentar à Mesa da Assembleia um texto tendente a que o Plenário possa debruçar-se e deliberar sobre esta questão.
Queria, pois, apenas anunciar que esse texto será entregue, e procederei, de imediato, ao seu depósito na Mesa da Assembleia.
O Sr. Presidente: - Queira, pois, Sr. Deputado, apresentá-lo na Mesa para se lhe dar entrada e, porventura, prosseguir os termos correspondentes à diligência requerida.
Pausa.
Srs. Deputados, deu já entrada na mesa o projecto de deliberação apresentado pelo PCP.
Posso, desde já, referir à Câmara as razões substanciais deste projecto de deliberação, que propõe o seguinte:
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitirá, no prazo de 30 dias, o parecer regimental relativo à proposta de lei nº 88/III (alterada) e ao projecto de lei nº 400/III, instruindo-o com todos os elementos de informação e demais documentação que entenda pertinentes e necessários.
Vai ser fotocopiado e distribuído pelos Srs. Presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares, para que depois se possam pronunciar sobre ele.
Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz, para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, no fim da sessão da manhã evoquei a ausência de um membro do Governo. Queria dizer apenas que ao fazê-lo
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não tinha em mente qualquer atitude crítica em relação à sita ausência e, pese embora a muita consideração que tenho pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, sabia que a todo o tempo ele poderia chegar.
No entanto, também achei que, funcionalmente, não tinha grande utilidade para o Parlamento começar a discutir aquele assunto faltando tão pouco tempo para a hora da interrupção dos trabalhos.
O Sr. Presidente - Sr. Deputado, fico-lhe grato pelo esclarecimento que prestou.
Devo referir que S. Ex.ª o Sr. Secretário de Estado me tinha procurado devido a esse problema. Contudo, o Sr. Secretário da Mesa já me tinha explicado a situação, e foi por isso que fiz, no início da sessão, um pequeno comentário.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, gostava de ser esclarecido pela Mesa sobre o porquê deste compasso de espera. Porque é que não iniciamos o debate dos projectos que estão agendados?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estou à espera não só das inscrições mas também daquele documento que foi apresentado pelo PCP, que mandei fotocopiar para distribuir pelas bancadas para que possam ter dele conhecimento e pronunciar-se sobre o mesmo. Mas desde o início que o debate está aberto.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, temos uma ordem de trabalhos estabelecida e não foram apresentados recursos à mesma. Estamos, pois, em condições de retomar os trabalhos, sem qualquer hesitação.
Vozes do PS. - Muito bem!
O Orador: - Está-se numa fase de apresentação dos projectos, e creio até que o primeiro a ser apresentado é o do Partido Comunista por ser o mais antigo.
Devemos normalizar a nossa sessão e retomar rapidamente a ordem de trabalhos, a qual já está definida. Logo, não há razão nenhuma para hesitar!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado Só que não há pedidos de inscrição
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, para uma interpelação à Mesa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, na sequência daquilo que disse o Sr. Deputado Carlos Laje, queria dizer o seguinte: nos termos regimentais, os partidos têm direito a fazer a apresentação ou no início do debate ou, em alternativa, e se o requererem, no prazo de 5 reuniões plenárias após a apresentação dos projectos
Como V. Ex.ª deve estar recordado - vejo que o Sr. Deputado Carlos Lage não está, fizemos a apresentação do nosso projecto de lei devidamente, e em tempo, nas 5 reuniões plenárias subsequentes à sua apresentação. É, pois, bom que fique esclarecido que a apresentação do nosso projecto de lei já foi feita.
A segunda questão refere-se ao projecto de deliberação que apresentámos, que coloca uma questão prévia que nos parece ser do interesse de toda a Assembleia. Entregámo-lo, estamos dispostos a dar conhecimento do seu conteúdo à Assembleia, através da sua leitura, mas entendemos que este compasso de espera se justifica plenamente, a partir do momento em que V. Ex.ª entendeu distribuir esse texto por todos os grupos parlamentares Se causar alguma dificuldade procederemos à sua leitura, com base no texto original.
De qualquer forma, a questão que colocamos tem a ver com a consideração pela Assembleia da proposta de lei nº 88/III e do projecto de lei nº 400/III, do CDS, e não com aquilo que está ou não inscrito na ordem do dia.
Nestes termos, Sr. Presidente, entendemos que o debate que suscitamos é relevante e que tem todo o assento Não se pode, evidentemente, iniciar o debate sem ter em conta o nosso projecto de deliberação.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, a ordem do dia foi estabelecida e vamos procurar cumpri-la.
O facto de aqui estarmos num compasso de espera não é da nossa responsabilidade. Quem tivesse o direito ou a intenção de apresentar os projectos que o fizesse.
Mandei fotocopiar, para ser distribuído pelas bancadas, o projecto de deliberação que foi apresentado apenas para que, depois, quando tivessem de se pronunciar sobre ele, as bancadas tivessem já uma maior consciencialização acerca dos termos em que foi requerido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, em termos puramente formais, não há absolutamente nada que impeça o início da nossa reunião para se debater a matéria agendada.
O Partido Comunista não quer fazer uma primeira intervenção sobre os seus projectos Está no seu direito.
Seguem-se, creio eu, os diplomas da UEDS, do Partido Socialista e do PSD e, por fim, a proposta do Governo e o projecto do CDS.
O projecto de deliberação agora apresentado pelo Partido Comunista segue os seus trâmites e não tem nada que ser discutido neste momento.
Não há nenhuma impugnação da ordem de trabalhos. Estamos, pois, a assistir a processos que me dispenso de qualificar.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, o texto que apresentámos está qualificado, e bem, como projecto de deliberação mas é, realmente, um texto que visa aplicar o disposto no artigo 150º do Regi-
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mento. Temos o direito de, neste momento, o fazer, e é importante que tal seja feito.
Não pode ser contestada ou negada a efectivação do mecanismo aí previsto e entendemos que o momento pertinente e adequado para suscitar a questão é este e não outro Solicitávamos, aliás, que o texto fosse lido ao Plenário da Assembleia da República, uma vez que, creio, isso facilitará a percepção dos objectivos e dos direitos regimentais que neste momento exercemos.
O Sr. Presidente: Srs. Deputados, na sequência da nova interpelação feita pelo PCP devo reafirmar que a discussão dos diplomas que anunciei está aberta.
Quando os Srs. Deputados entenderem que se devem inscrever façam no, para iniciarmos a discussão do tema.
O Sr. Deputado José Magalhães invocou o artigo 150º. Respeitá-lo-emos na altura própria, ou seja, logo que me seja presente o projecto de deliberação.
Tem de novo a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, o momento adequado é agora. E inscrevíamo-nos já para o efeito!
O Sr. Presidente: Só porque não há mais ninguém! O artigo 150.º, diz «até ao anúncio da votação ... » e estamos muito longe disso -... «podem 10 deputados, pelo menos, requerer a baixa do texto a qualquer comissão para efeito de uma apreciação, no prazo que for designado».
Portanto, continua em aberto a inscrição dos Srs. Deputados para a discussão dos projectos e propostas de lei que anunciei.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.
O Sr. Carlos Lage (PS): Sr. Presidente, antes de mais o Partido Comunista tem de rectificar o seu documento que não está em condições de ser admitido já que não tem 10 assinaturas.
O Sr. João Amaral (PCP): - Já está rectificado!
O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): Na Mesa não está!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos num impasse perfeitamente incompreensível Estava convencido de que, neste momento, iriam ser feitas as apresentações dos diversos documentos pela sua ordem de entrada. Afinal, não é isso que se passa?
Verifico que o autor do projecto que primeiramente entrou na Mesa - o Partido Comunista - não quer intervir neste momento O Sr. Deputado Lopes Cardoso ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, para não adiantar as suas considerações ...
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, estou a fazer considerações com vista a pedir a palavra para proceder à apresentação do projecto do Partido Socialista.
O Sr. Presidente: É que o PCP já apresentou o projecto, Sr. Deputado. Logo, não o pode apresentar de novo.
O Sr. Carlos Lage (PS): Sr. Presidente, não estou a falar em apresentação mas numa primeira intervenção.
O Sr. Jorge lemos (PCP): - Quer que façamos uma segunda intervenção?
O Sr.º João Amaral (PCP): - A apresentação foi bem feita. Não se aplica o Regimento como o Sr. Deputado quiser!
O Orador: - É lógico que se dê a palavra, para intervir em primeiro lugar, ao partido que entregou primeiro o projecto.
É, assim, que tem sido feito.
Protestos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, o PCP já apresentou o projecto e os outros partidos é que têm agora o direito de fazer a apresentação dos seus projectos se o desejarem e se se inscreverem para tal.
Em primeiro lugar, estariam os autores dos projectos restantes, para fazerem a sua apresentação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso para interpelar a Mesa.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, a questão que eu colocava é se é entendimento da Mesa que o requerimento de baixa à Comissão, apresentado pelo Partido Comunista Português, será votado no termo do debate, isto é, quando não houver mais nenhum orador inscrito - e, nessa altura, o Plenário decidirá se o aprova ou não - ou se a Mesa pensa submeter à votação este requerimento desde já ou em qualquer circunstância.
Se o entendimento da Mesa for coincidente com o meu, isto é, que este requerimento deve ser posto à votação terminado o debate, se o Sr. Presidente mo permite e se não houver nenhum orador inscrito usarei, muito brevemente, da palavra para apresentar o projecto de lei da UEDS.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é entendimento da Mesa que logo que seja apresentado o projecto de deliberação ele será notado.
Contudo, isso não prejudica de modo nenhum, a discussão que sobre os mesmos diplomas os Srs. Deputados queiram manifestar.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço desculpa - o defeito será seguramente meu mas eu não entendi a decisão da Mesa.
O Sr. Presidente, disse:
A Mesa entende que o projecto, logo que seja apresentado, será votado.
Então, significa que o vamos votar imediatamente!
O Sr. Presidente: - Se ele for presente.
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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Mas ainda não foi, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Foi apresentado mas foi retirado porque não estava em forma legal. Contudo, ele voltou de novo à Mesa.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Então, no entendimento da Mesa, ele irá ser votado imediatamente?
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, considero que o entendimento que a Mesa estava afazer cio momento da votação não corresponde à disposição regimental aplicável. O que essa disposição diz é que esta iniciativa regimental só pode ser apresentada até ao anúncio da votação. Não diz que tem que ser votada depois da discussão! E socorro-me dum principio, de funcionalidade da Assembleia e de aproveitamento dos dados processuais para dizer que se o projecto é apresentado no início da votação e se se trata de votar se a matéria é ou não inscrita na ordem do dia ou se baixa à Comissão, então, o princípio que deve funcionar é o de o projecto ser votado desde já e não depois, para que fique claro aquilo que está em discussão.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral presumo que foi essa a orientação que a Mesa seguiu.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, penso que houve algum equívoco da sua parte em relação àquilo que referi. Com efeito, recebi inicialmente um projecto de deliberação que mandei fotocopiar e distribuir para que depois fosse apreciado devidamente pela Mesa. Entretanto foi alterado, está legal pelo que estamos em condições de nos podermos pronunciar sobre ele.
Ele deve ser votado de imediato, o que não irá prejudicar o desenvolvimento da discussão dos diplomas que foram anunciados.
O Sr. Secretário vai, pois, ler o projecto de deliberação apresentado pelo PCP.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - É o seguinte:
Projecto de deliberação sobre o processo de debate e votação das iniciativas legislativas relativas ao estatuto remuneratório dos deputados e outros titulares de cargos públicos.
1 - No dia 26 de Outubro deu entrada, foi admitida, numerada e mandada publicar a proposta de lei nº 88/III, relativa ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos. Na mesma data, a proposta foi mandada baixar à 1.ª Comissão, de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para a emissão de competente parecer, nos termos regimentais.
O processo de emissão de tal parecer iniciou-se, desenvolveu-se e concluiu-se na primeira reunião da Comissão posterior à baixa, com preterição de todas as demais matérias há muito pendentes na agenda da Comissão, em que se inclui elevado número de iniciativas legislativas, algumas em fase de votação na especialidade. Foram rejeitadas nessa reunião da Comissão, realizada em 7 de Novembro de 1984, todas as propostas no sentido de que a Comissão levasse a cabo um levantamento de elementos informativos e demais estudos que instruíssem condignamente o parecer a submeter a plenário. Foi sugerida, designadamente, a obtenção da documentação de direito comparado frequentemente invocada para justificar certas soluções constantes da proposta governamental, tal como foi sugerido que a Comissão elaborasse com rigor os cálculos das implicações orçamentais do estatuto remuneratório proposto.
Debalde, porém: a Comissão deliberou por maioria, aprovar de imediato um texto sumário, sem conteúdo relevante, inteiramente inadequado à complexidade e importância institucional, política e técnica das questões suscitadas pela inibitiva do Governo.
Tudo foi operado com invocação da necessidade de um célebre debate em plenário, incompatível com estudos e trabalhos de comissão mais demorados ...
2 - Decorrido 1 mês, a proposta sobe hoje a Plenário que representa uma relevante alteração em relação ao invocado para fundar a opção tomada em 7 de Novembro.
Assim:
O Conselho de Ministros, reunido em 22 de Novembro, deliberou remeter à Assembleia da República um conjunto de alterações à verba originária da proposta de lei nº 88/III. As alterações foram admitidas no dia 28 de Novembro, não tendo sido objecto de apreciação pela comissão parlamentar competente;
O Grupo Parlamentar do CDS depositou na Mesa da Assembleia da República, no dia 27 de Novembro, o projecto de lei nº 400/III, sobre «remunerações dos titulares de cargos políticos», o qual foi mandado baixar, nesse mesmo dia, à 1.ª Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
3 - Neste quadro, não se encontram reunidas as condições necessárias e adequadas ao debate das iniciativas em referência pelo Plenário da Assembleia.
E não só o lapso de tempo decorrido desde 26 de Outubro confirmou as melindrosas implicações e a complexidade das questões suscitadas, como a proposta de lei nº 88/III, já não tem o conteúdo pressuposto pela Comissão Permanente especializada que sobre ela se pronunciou. Por seu lado o projecto de lei nº 400/III, do Grupo Parlamentar do CDS, não está sequer instruído com o parecer regimental.
Impõe-se, pois, que seja determinada baixa à Comissão que permita suprir a não verificação dos requisitos necessários ao debate em Plenário.
4 - Acresce que a proposta de lei nº 88/III e o projecto de Lei nº 400/III não poderiam nem deveriam ser agendados para debate simultâneo em Plenário com os projectos de lei nº 266/III do PCP, nºs 331/III, da UEDS e 392/III, do PS e PSD, todos relativos ao Estatuto dos Deputados.
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De facto não se verifica entre as iniciativas coincidência de objecto, salvo se for entendido que a matéria remuneratória é a questão central, determinante e justificadora de todo o debate, o que de forma alguma pode admitir-se.
O objecto do estatuto dos deputados nem se esgota nem tem como aspecto principal e crucial as respectivas remunerações. E o regime remuneratório proposto pelo Governo e pelo CDS não abrange apenas os deputados mas uma pluralidade de titulares de cargos políticos, a qual pode ainda ser ampliada, ajustada, porventura reduzida.
A apreciação conjunta de iniciativas com tais diferenças de natureza e de objecto não só carece de justificação como propicia distorções que a todo o custo importa evitar.
5 - A baixa à Comissão das iniciativas referidas não inviabiliza os trabalhos do Plenário, que pode e deve debruçar-se sabre o estatuto dos deputados que constitui objecto dos 3 projectos referidos.
Nestes termos, propõe-se:
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitirá no prazo de 30 dias o parecer regimental relativo à proposta de lei nº 88/III (alterada) e ao projecto de lei nº 400/III, instruindo-o como todos os elementos de informação e demais documentação que entenda pertinentes e necessários.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste projecto de deliberação.
Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS, da UEDS e da ASDI e votos a favor do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado Independente António Gonzalez.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Teria sido importante e útil para o trabalho desta Câmara que o debate que daqui a momentos se iniciará não abrangesse, nos termos em que previsivelmente vai suceder, a questão do estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, designadamente do estatuto remuneratório dos deputados, dadas as condições que se verificam. Não estão preenchidos os requisitos necessários, regimentais e adequados em todas as dimensões - política, técnica e institucional - para que esse debate se inicie e decorra em parâmetros adequados.
Desde logo, verifica-se a circunstância única e porventura insólita de, numa matéria deste melindre, o Governo ter vindo, poucos dias depois de ter apresentado a versão originária ela sua proposta, introduzir-lhe uma alteração que tem implicações no que diz respeito à questão das remunerações dos deputados e não de outros titulares de cargos políticos e, simultaneamente, alterar-lhe o seu conteúdo quanto à dimensão das entidades abrangidas.
Ocorre ainda que um partido com assento nesta Câmara deliberou apresentar um projecto de lei sobre esta matéria. Só que, ao contrário daquilo que decorre do Regimento, esse projecto, que tem objecto similar e até filosofia coincidente com a do Governo, não foi objecto de qualquer parecer da Comissão competente.
Devo lembrar que não faremos finca-pé neste ponto. Mas bem poderíamos fazê-lo, porque, em bom rigor, este projecto não poderia sequer ser discutido, uma vez que, aplicando-se-lhe o prazo de baixa à Comissão de 30 dias, só ao fim desse prazo é que poderia ser dispensado o parecer para início da sua discussão em Plenário.
Não estão, pois, preenchidas não só condições regimentais estritas, como outras condições que seriam propícias a uma adequada perspectivação das questões que irão ser debatidas daqui a momentos.
Goraram-se - e devo dizer que o lamentamos profundamente - todos os esforços para que, mesmo em relação à versão originária da proposta do Governo, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitisse um parecer em que fossem equacionadas e perspectivadas as implicações da proposta do Governo - são muitas e gravosas -, arrolados os elementos de informação necessários, recapitulada a tramitação de iniciativas similares - que, como os Srs. Deputados sabem, foram polémicas e se goraram -, aduzidos elementos de Direito Comparado, tantas vezes invocados, até numa perspectiva confusionista. Importaria que, no começo deste debate, o Plenário tivesse presente todos estes elementos num relatório, objectiva e competentemente feito pela Comissão que tem essa missão nos termos do nosso Regimento.
Não foi querido que a Comissão exercesse as suas competências. Srs. Deputados, bem cabe pensar nisto, para que servem as Comissões Parlamentares se, em relação a questões melindrosas, importantes e de melindrosas implicações, até orçamentais, não exercem o seu dever mínimo, elementar e primacial de elaborar um simples relatório, onde, honestamente - porventura sinteticamente, mas com competência -, se elenquem os principais problemas com que o Plenário terá de ir defrontar-se?
Entendemos, pois, que a alteração de circunstâncias que se verificou com a apresentação de um projecto novo e com as alterações à proposta do Governo e o lapso de tempo decorrido demonstraram que a complexidade desta matéria exigiria um bom trabalho preparatório, que não houve. E, Srs. Deputados, não tenham dúvidas nenhumas de que isso vai pesar no debate.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Entendemos ainda que o facto de se miscigenar duas questões - o Estatuto do Deputado e as remunerações dos diversos titulares de cargos políticos - é negativo e confusionista e reduz a questão do Estatuto do Deputado à questão das suas remunerações, o que é péssimo, institucionalmente negativo e muito lesivo para o prestígio abalado da Assembleia da República.
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Esta diligência do nosso grupo parlamentar visou precisamente que o debate não se iniciasse em condições nefastas e perniciosas à boa perspectivação nos termos em que ele deve decorrer e à boa colocação perante a opinião pública, que nos está a ver, de algumas questões que chegam distorcidas e que vão começar a ser debatidas com distorções ou, pelo menos, sem os aclaramentos que bem seriam necessários.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não se dirá que não tenhamos colocado ao Plenário um instrumento apto a evitar aquilo que, em nosso entender, é nefasto. Não o quiseram, vamos ao debate. Esperamos e fazemos votos para que alguns dos principais inconvenientes que decorrem desta opção ainda possam ser evitados. Faremos todos os esforços nesse sentido. Estejam certos disso.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra este projecto de deliberação apresentado pelo PCP por se nos afigurar ser uma forma de obter, enviesadamente, uma impugnação que não foi nem atempada nem regimentalmente formulada.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Vozes do PCP: - Boa piada!
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, suponho que não há mais inscrições para declarações de voto...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que até agora não se registou mais nenhuma inscrição.
Mais algum dos Srs. Deputados deseja formular declaração de voto?
Pausa.
Sr. Deputado, uma vez que não há mais inscrições, pode prosseguir.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, requeiro à Mesa a leitura dos relatórios: o relatório relativo aos 3 projectos de alteração ao estatuto dos deputados e o relatório relativo à proposta de lei nº 88/III, visto que não existe relatório em relação à versão actualizada da proposta de lei nº 88/III, nem em relação ao projecto de lei nº 400/III, da iniciativa do CDS.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, é só para pedir a dispensa da leitura dos relatórios.
O Sr. Jorge Lemos (PCP)-. - É um escândalo!
O Orador: - Uma vez que aqueles que existem estão publicados, não me parece razoável voltar a ler aquilo que devia ser do conhecimento geral. É nesse sentido que formulo este requerimento.
O Sr. Presidente: - Também penso que sim, Sr. Deputado. Só que não posso julgar procedente o requerimento, porque regimentalmente temos que ler os pareceres.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, acho extremamente curioso - e interpelo a Mesa nesse sentido - que o Sr. Deputado requeira o contrário daquilo que requeri. Tenho o direito de requerer a leitura dos relatórios, pelo que esta questão está completamente fechada.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, também me parece que sim. Não era necessário o comentário que acabou de fazer.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos referidos pareceres.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - É do seguinte teor o parecer sobre as alterações ao estatuto dos deputados (projectos de lei n.ºs 266/III, do PCP, 331/III, da UEDS e 392/III, do PS/PSD):
Comissão de Regimento e Mandatos
Subcomissão para o estudo das alterações ao estatuto dos deputados
Relatório e parecer relativo ao:
a) Projecto de lei nº 266/III (alterações ao estatuto dos deputados), apresentado pelo PCP e publicado no Diário da Assembleia da República, 2ª série, nº 75, de 20 de Janeiro de 1984;
b) Projecto de lei nº 331/III (estatuto dos deputados), apresentado pela UEDS e publicado no referido Diário da Assembleia da República, 2ª série, nº 1 15, de 9 de Maio de 1984; e,
c) Projecto de lei nº 392/III (estatuto do deputado), apresentado pelo PS e PSD, entrado em 26 de Outubro de 1984 e ainda não publicado no Diário da Assembleia da República.
A subcomissão para o estudo das alterações ao estatuto dos deputado, reunida hoje, para apreciar os referidos projectos de lei resolveu, por unanimidade dos seus membros presentes, cuja re-
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lação consta do respectivo livro de presenças, que os 3 projectos em causa estão em condições legais e regimentais de subir ao Plenário.
Nestas circunstâncias a subcomissão propõe à Comissão de Regimento e Mandatos que aprove este relatório e, em consequência, emita o seguinte parecer:
Os projectos de lei n.ºs 266/III, 331/III e 392/III estão em condições de subir ao Plenário.
Este parecer é subscrito pelo Sr. Deputado Luís Saias, coordenador da subcomissão para o estudo de alterações ao Estatuto do Deputado.
É do seguinte teor o parecer sobre a proposta de lei n.° 88/III, que regula o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos:
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Parecer sobre a proposta de lei n.° 88/III - Regula o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos
A proposta de lei n.° 88/III, relativa ao Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos, e sobre a qual é emitido parecer durante a própria reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, prevê as compensações a que têm direito os respectivos titulares enquanto no exercício desses cargos políticos, bem como as subvenções que alguns daqueles receberão quando, em determinadas circunstâncias, cessarem esse exercício.
Além de evidenciar uma preocupação de unidade e articulação nesta matéria, ao reunir no mesmo texto a previsão relativa a vários cargos políticos, nomeadamente Presidente da República, Membros do Governo, Deputados à Assembleia da República, Ministros da República para as Regiões Autónomas, Membros do Conselho de Estado e Governadores Civis, a proposta de lei n.° 88/III também prevê o Estatuto Remuneratório dos Juizes do Tribunal Constitucional porque os equipara àqueles Titulares.
O sistema de remuneração que se contém na proposta de lei n.° 88/III, para os titulares de cargos políticos e equiparados, respeita os dispositivos constitucionais e legais e, em consequência, está em condições de subir ao Plenário.
Este parecer é subscrito pêlos Srs. Deputados Correia Afonso, o Relator, e Luís Silvério Gonçalves Saias, o Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, é para proceder à leitura da declaração de voto que em tempo reservámos para o Plenário, sobre o parecer relativo a proposta de lei n.° 88/III.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Deputados do PCP, membros da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, votaram contra o parecer relativo à proposta de lei n.° 88/III, o qual resultou de uma deliberação tomada pela maioria, no dia 7 de Novembro, poucas horas após a admissão da proposta governamental, e não tem quaisquer esteios de razoabilidade e credibilidade em que se apoie. Ele emanou, com efeito, da vontade indisfarçada de fazer aprovar, sem discussão, uma proposta de lei cujo melindre não pode deixar de reconhecer-se. A matéria de fundo da iniciativa governamental é constituída pelas remunerações dos titulares de cargos políticos, com particularíssimo relevo para as dos deputados. Sobre o assunto havia, à partida, outros debates na Câmara, intervenções institucionais de órgãos de soberania, uma reacção muito viva da opinião pública. O País atravessa um período grave, mergulhado numa crise profunda que o PS e o PSD acentuam, há situações salariais de gritante injustiça, um generalizado clamor contra a drástica redução do poder de compra das populações.
Impunha-se, no mínimo, que, atento este quadro, a Comissão ponderasse as soluções ensejadas na proposta de lei, sobre elas emitisse um juízo circunstanciado e assente num trabalho qualificado. Por isso nos batemos. Advogámos a imperiosidade de um relatório que espelhasse o confronto de posições, carreasse elementos informativos, enunciasse o saldo intelectual de estudos sérios e responsáveis. Insistimos para que se obtivessem os cálculos e fundamentos preparatórios que, sabia-se, o Governo elaborara. Manifestámos todo o interesse no exame técnico e politicamente idóneo dos problemas, caso a caso considerados. Ao longo de duas profiosas horas, a maioria da Comissão pronunciou-se, contra tudo o que tem sido a sua praxe, pela emissão de um fraseado inócuo que fica aquém do que é exigível a um colectivo de juristas e personalidades que se supõem dotados de meridiana estatura cultural. A isso chamou pomposamente parecer e democrático designou o processo que o precedeu, legitimando suspeições desprestigiantes, uma vez que métodos tão céleres e expeditivos, não usados para outros efeitos, só são accionados precisamente quando está em causa o aumento das remunerações dos deputados e outros titulares de cargos políticos.
Na verdade, a propósito de projectos de lei ou de impulsos legiferantes do Governo, a Comissão nomeia, com prazos pré-fixados, em regra fartos, relatores individuais ou subcomissões.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Assim acontece sempre. Desta feita, contudo, quis a maioria de desastre que nos coube em má sina agir «rapidamente e em força» - obviamente entre comas o «rapidamente e em força».
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!
O Orador: - As nossas propostas e sugestões depararam, a cada instante, com uma atitude pertinaz: não à produção de um texto substantivamente meritório, capaz de fornecer aos deputados das diferentes bancadas um dossier de reflexão que os habilitasse a formar uma opção consciente. Para o PS e o PSD,
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bem como para outros partidos, as coisas eram extremamente fáceis. Tão fáceis que geraram, apesar das advertências do PCP e da sua perseverante acção moralizadora, o espécime lamentável que o hemiciclo acabou de ouvir e que foi votado com a nossa formal e categórica oposição...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Uma vergonha!
O Orador: - ... , em nome da transparência dos actos, do rigor, da qualificação técnica e do prestígio da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, bem como da Assembleia da República em que ternos lugar.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, V. Ex.ª a vai desculpar que lhe pergunte se está efectivamente na disposição de fazer a apresentação do projecto de que é autor.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Com certeza, Sr. Presidente!
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Amaral (PCP): - É para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias deliberou solicitar ao Governo os estudos preparatórios que foram feitos para a apresentação desta proposta.
Esses estudos foram do conhecimento público através de notícias publicadas em jornais e semanários - sublinho os semanários -, normalmente mais bem informados do que os deputados desta Assembleia. Houve semanários que tiveram conhecimento de um estudo elaborado no âmbito do Governo, comparativo dos vencimentos dos Srs. Deputados e membros do Governo em diferentes países, segundo suponho pelo menos da Europa.
A Comissão deliberou requerer esses estudos ao governo e tenho conhecimento de que, no próprio dia 7 de Novembro em que foi aprovado o relatório que acabou de ser lido, portanto há 1 mês, requereu ou, se quiser de uma forma mais macia, solicitou ao Governo o envio desse relatório.
O que pergunto ao Sr. Presidente, em jeito de interpelação, é se esse estudo chegou à Assembleia. Ou então requeiro que V. Ex.ª pergunte ao Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias se ele eventualmente terá chegado a esta Comissão.
O Sr. Luís Saias (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Pede a palavra para se pronunciar sobre esta questão, Sr. Deputado?
O Sr. Luís Saias (PS): - É sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, efectivamente a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não deliberou, mas sugeriu que se pedissem ao Governo os estudos que serviram de base a esta proposta de lei. Nesse mesmo dia, por ofício dirigido ao Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares, a Mesa da referida Comissão solicitou esses estudos, se os houvesse.
A verdade é que este ofício não teve satisfação até hoje.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, apesar de tudo, convinha que o Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Sr. Deputado Luís Saias, esclarecesse se ao menos foi acusada a recepção do ofício.
Risos do PCP.
Protestos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Saias, pretende responder?
O Sr. Luís Saias (PS): - Pretendo sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. Luís Saias (PS): - Sr. Deputado João Amaral, é louvável a sua boa disposição - penso que terá dito isto para fazer espírito , mas a resposta já estava dada: não houve da parte do Governo satisfação a esse ofício. Quando digo satisfação, digo satisfação de qualquer ordem.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se pretende usar da palavra sobre o mesmo incidente, presumo que ele deve .ser dado por arrumado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o assunto está arrumado neste sentido: o Governo não respondeu a uma legítima reivindicação e solicitação da Assembleia da República. O Governo fez estudos e, mudo e quedo, não informou a Assembleia dos estudos a que procedeu.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, leia a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não creio que valha a pena abusar da vossa paciência e alongar-me demasiado, quer para justificar a apresentação pela UEDS de um projecto de alteração ao estatuto dos deputados, quer para apontar as grandes linhas desse nosso projecto.
Há uns meses atrás, entendemos aproveitar o facto de, por via da revisão do Regimento e de um ponto de vista meramente formal, se tornar obrigatória a revisão do estatuto, na exacta medida em que eram suprimidas do Regimento matérias que passariam a ser incluídas no Estatuto do Deputado, para propor que se introduzissem simultaneamente no Estatuto do Deputado alterações que, em face de uma já longa experiência de quase 8 anos de funcionamento da Assembleia e da aplicação do actual Estatuto do Deputado, se pareciam justificar.
As grandes linhas que presidiram à elaboração do nosso projecto de estatuto (proferimos apresentar um projecto de estatuto a meras alterações, para que se tivesse uma ideia de conjunto e surgissem desde logo sistematizadas as diferentes disposições) vão fundamentalmente nos seguintes sentidos: alargamento do quadro de incompatibilidade do exercício do mandato de deputado; alteração no regime de substituições temporárias; alargamento das garantias do exercício do mandato; alterações no actual regime de reembolso das deslocações. Na parte que diz respeito à remunerações e garantias sociais dos deputados, estabeleceu-se, por um lado, a remissão para lei especial da remuneração dos deputados, mas introduzindo-se, desde logo e simultaneamente, uma proposta tendente a ter em conta na remuneração dos deputados o facto de eles exercerem ou não outras actividades remuneradas, e, por outro lado, a introdução de uma subvenção vitalícia a adquirir em determinadas circunstâncias.
Quanto ao alargamento das incompatibilidades, o projecto da UEDS aponta no sentido de tornar o mandato incompatível, determinando a suspensão automática do mandato nas exatíssimas circunstâncias em que hoje isso se verifica, por exemplo, para o exercício de funções governamentais, em relação aos membros dos conselhos de gestão das empresas públicas, aos directores de institutos públicos e aos presidentes de câmaras municipais e vereadores a tempo inteiro.
Em nosso entender, este problema das incompatibilidades, como todos eles, não é um problema de fácil solução e susceptível de soluções indiscutíveis. Devo dizer que ponderámos seriamente a questão e que hesitámos. Porque, se a criação e o alargamento do regime das incompatibilidades tende a apontar no sentido de garantir uma maior exclusividade de dedicação dos deputados à Assembleia da República, não escondemos o facto de que há que procurar aqui um meio termo susceptível de evitar que se acentue o divórcio entre o deputado e o País e de que se tende a criar e a contribuir para a profissionalização de uma classe política de certo modo desligada das realidades.
Nesse aspecto, penso que, nomeadamente, a presença de autarcas aqui é indiscutivelmente um contributo útil para o funcionamento da Assembleia. Mas, por outro lado, também temos consciência de que é difícil o exercício simultâneo de funções por vezes extremamente absorventes.
Optámos por esta solução e estamos abertos a discuti-la, na certeza de que não tem uma solução fácil e de que este problema da ligação do deputado ao País real tem a ver com o Estatuto do Deputado. Mas, sobretudo, tem a ver com a questão do sistema eleitoral e, nomeadamente, do sistema de exclusividade de apresentação de candidaturas para esta Assembleia dado aos partidos políticos. É uma questão que hoje não está em causa, mas que, segundo penso, terá de ser debatida aqui mais cedo ou mais tarde.
De qualquer modo, optámos por esta solução.
Também no mesmo sentido e com consciência de todos estes problemas, optámos, no que diz respeito ao regime de remuneração, pela introdução de uma disposição que tende a reduzir o vencimento dos deputados que exerçam outras funções remuneradas. Se estamos firmemente apegados a este princípio, não estamos seguramente apegados à fórmula através da qual propomos a sua concretização e estamos também abertos na discussão na especialidade, sem pôr em causa o princípio, à procura de outras fórmulas eventualmente mais adaptadas a esta questão.
Em relação ao regime da suspensão temporária, fomos também para uma solução e uma proposta que não nos satisfaz, mas que, segundo penso, é uma proposta moralizadora de um hábito que pouco a pouco se foi instalando nesta Assembleia, que tende a esvaziar o sentido do mandato de deputado e que acaba por ter reflexos no próprio prestígio da Assembleia: a suspensão do mandato por 24 horas, 48 horas e 72 horas. Propomos um prazo mínimo de 15 dias. Pensamos que é um prazo reduzido, mas também pensamos que de qualquer forma, se vier a ser aprovado, é um passo importante no caminho de corrigir a anomalia que a prática foi criando.
Quanto às garantias para o exercício das funções de deputado, nomeadamente garantias de ordem logística, elas estão consubstanciadas no artigo 13.º do nosso projecto de lei, pelo que não me pronunciarei mais sobre elas.
Outra questão que também é abordada - para a qual, sem entrar em detalhe, me permitiria apenas chamar, desde já, a atenção dos Srs. Deputados, tendo em vista a discussão na especialidade - é o esquema de reembolso dos transportes dos deputados, nomeadamente em veículos próprios, que é significativamente alterado. A ser aceite esta alteração, tal poderá conduzir a economias substanciais por parte da Assembleia e permitirá clarificar, sem ambiguidades, a utilização desse benefício por parte dos próprios deputados.
Em relação à subvenção vitalícia, não se faz, no fundo, mais do que adoptar um sistema semelhante àquele que existe hoje em numerosos parlamentos -- senão em quase todos - europeus. Aliás, a nossa proposta veio a ser acolhida na proposta do estatuto remuneratório, praticamente em idênticas condições, por parte do Governo. No entanto, queria apenas chamar a atenção para o facto de ela ser claramente distinta daquela que tinha sido aqui aprovada anos atrás e que - essa sim - me parecia conter privilégios e benesses perfeitamente inaceitáveis.
Já que estou no uso da palavra, e se o Sr. Presidente mo permite, diria ainda que, em relação aos 2 outros projectos de estatuto do deputado, submetidos, hoje, aqui, a debate, do PCP, do PSD e PS, a nossa posição será a de votar, na generalidade, ambos
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favoravelmente, porque julgamos que ambos trazem contributos importantes para a elaboração de um texto final e ambos podem constituir, juntamente com o nosso, uma boa base de trabalho para a discussão na especialidade.
Finalmente, queria ainda - sem abusar da vossa paciência - deixar aqui duas ou três palavras sobre o diploma que é, sem dúvida, o mais polémico daqueles que estão hoje sujeitos a debate: a proposta de lei do Governo sobre o estatuto remuneratório dos detentores de cargos políticos.
Permitam-me que comece por dizer, Srs. Deputados, que julgo que qualquer de nós preferiria muito mais não ter que debater esta questão, não ter que se pronunciar sobre ela, não ter, ao fim e ao cabo, que ser juiz em causa própria. No entanto, penso que é uma responsabilidade que devemos assumir sem complexos, serenamente e recusando qualquer espécie de demagogia.
Seria muito mais cómodo que a questão fosse remetida para outro órgão de soberania, mas nesta matéria há necessariamente que haver um órgão de soberania que assuma a responsabilidade final, e esse não poderia deixar de ser a Assembleia da República. Aliás, se, porventura, fosse o Governo a legislar, não faltaria quem nos viesse acusar amanhã de nos estarmos a vender ao Governo ou de estarmos a ser tentados de ser comprados pelo Governo.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É uma responsabilidade que nos cabe e, por conseguinte, não a devemos enjeitar, mas assumir com serenidade e com consciência os problemas.
Acrescentaria que, à partida, a UEDS é favorável - dizemo-lo sem ambiguidades e sem equívocos - à revisão do estatuto remuneratório dos deputados.
Mais não houvesse, o simples facto de os próprios critérios que presidiram à fixação em vigor terem sido, na prática, totalmente subvertidos - e recordo que o princípio que foi privilegiado nessa altura foi o de dar aos deputados o maior vencimento da função pública, hoje esse princípio foi subvertido, dado que há numerosos funcionários públicos que auferem vencimentos superiores aos deputados.
Se outras razões não houvesse - e, de nosso ponto de vista, há - só essas já justificavam que se revisse a nossa situação; a situação dos deputados, no que diz respeito às suas remunerações.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, parece-nos também lógico - e por aí se devia ter começado - que a fixação dos vencimentos constituísse um todo, não fosse objecto de leis avulsas, e constituísse uma resposta global e coerente, no que diz respeito aos detentores de cargos políticos. Daí também a nossa posição favorável quanto à fórmula adoptada pelo Governo de, na sua proposta de lei, nos avançar com a remuneração do conjunto dos cargos políticos. Portanto, aperceber da coerência, ou até da incoerência, das várias soluções, mas tomá-las tendo em conta que se devem articular.
Há, sem dúvida nenhuma - e os Srs. Deputados que tiveram ocasião de ver as propostas de alteração que avançámos em relação à proposta de lei do Governo, já disso se terão apercebido - divergências na especialidade, algumas delas, do nosso ponto de vista, significativas. Divergências que não vou agora apontar em pormenor, mas citarei apenas uma que tem a ver com a estrutura global da proposta de lei: é o nosso total desacordo quanto a algo, que é extremamente ambíguo na proposta de lei. E que a proposta de lei refere-se a remuneração dos detentores de cargos políticos e, assim sendo, não deveria sequer falar nos magistrados, porque é tão absurdo falar dos magistrados como o seria falar da remuneração dos militares. E ou o Governo pretenderia apresentar um estatuto remuneratório dos órgãos de soberania, nessa altura haveria que incluir os magistrados.
Esta solução híbrida de referir os magistrados num documento que nada tem que ver com eles, para justificar, em seguida, a introdução nesse diploma de algo que não cola com o objecto do diploma, contido na epígrafe - « A remuneração dos juízes do Tribunal Constitucional» -, parece-me ser altamente equívoco. Assim, parece-me que há que optar: ou se legisla em relação aos órgãos de soberania e incluem-se os magistrados, ou se legisla apenas numa visão menos lata, em relação aos detentores de cargos políticos e excluem-se os membros do Tribunal Constitucional.
Penso que a adopção de soluções híbridas acaba por pôr em cheque a clareza e a lógica do próprio diploma.
Também nos parecem concretamente exageradas certas disposições do estatuto remuneratório. De qualquer modo, pensamos que é uma base de trabalho e, nessa medida, não votaremos contra a proposta de lei do estatuto remuneratório apresentada pelo Governo e, seguramente, viremos a dar o nosso voto à proposta que venha a subir à Comissão, se, na especialidade, forem acatadas algumas das propostas de alteração que reputamos fundamentais.
Muito obrigado, Srs. Deputados.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Joaquim Miranda pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, era para formular alguns pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Presidente: - Só um momento,Sr. Deputado.
Pediram também a palavra os Srs. Deputados Carlos Lage, João Amaral e José Magalhães. Como estão inscritos para, igualmente, formularem pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, gostaria de lhe colocar algumas questões relacionadas com o projecto da UEDS referente ao estatuto dos deputados. Na verdade, abordou algumas das questões que lhe vou colocar, mas abordou-as, naturalmente, de forma sintetizada e gostaria de uma explicação mais aprofundada. Refiro-me, particularmente, a 2 ou 3 números do articulado do projecto-lei da UEDS e, desde logo, no que respeita à questão das remunerações dos deputados.
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Foi entendimento da UEDS remeter este problema das remunerações para lei especial, em que, portanto, se englobassem todos os titulares de cargos públicos. Porém, nesse mesmo artigo, há um nº 2 que, de facto, me causa alguma estranheza e sobre o qual gostaria de ter alguma explicação. É que refere o seguinte:
Em caso de acumulação de funções remuneradas, os deputados auferirão o equivalente a um terço da remuneração que lhe venha a ser atribuída nos termos do número anterior.
De facto, esta questão não me aparece suficientemente clara, tanto mais por que me parece que se há acumulação, não deverá haver acumulação de vencimentos e, como tal, este nº 2 não me parece nada explícito. Portanto, gostaria, de facto, de ter uma explicitação para ele.
Por outro lado, o Sr. Deputado referiu a questão das deslocações e apontou para alternativas diferentes às hoje existentes, que se referem no projecto da UEDS. Refiro particularmente aquelas que têm a ver com a não atribuição de abonos por transporte de automóvel, desde que a residência do deputado seja em determinados concelhos, para além daqueles que hoje já são tidos em conta no actual Estatuto do Deputado.
Ora bem, a questão que lhe coloco é a seguinte: porquê estes concelhos que aqui se indicam - o caso, por exemplo, do Porto, Vila Nova de Gaia, Gondomar, Matosinhos, Valongo, Coimbra - e não outros? Qual o critério seguido, que indica estes e não outros? Por exemplo, eu estava a pensar que poderá ser pela questão de transportes rápidos, em termos de comboio ou avião. Mas se é assim, então porque não também Aveiro, Santarém, o concelho da Maia? Portanto, parece-me que era bom haver aqui, de facto, uma explicitação em relação a esta questão.
Finalmente, queria suscitar aqui uma questão um pouco diferente, que é a seguinte: já referi, há pouco, que foi opção da UEDS remeter para lei especial a questão dos vencimentos dos deputados. Entretanto, e em sede de estatuto de deputados, aparece-nos o artigo 27.º, em que se fazem equiparações aos deputados, equiparações essas que atingem diversos titulares de determinados cargos públicos.
A questão que colocava é a seguinte: como é que se explica que, em sede de estatuto dos deputados, e, nomeadamente, quando, em termos de remunerações, se remete para lei especial, apareça aqui esta equiparação de outros cargos públicos, em sede de estatuto dos deputados?
Eram estas as questões que gostaria de lhe colocar.
O Sr. Presidente: - Pretende responder de imediato ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento, Sr. Deputado?
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, eu preferia, talvez, responder de imediato, pelo facto de ser mais rápido e não me esquecer de nada.
O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - A primeira questão diz respeito ao dispositivo a que, há pouco, me referi, sobre a redução do subsídio ou do vencimento - como lhe queiramos chamar -, no caso de exercício de outra acumulação de vencimentos.
O Sr. Deputado é bastante mais radical do que eu, pois propõe que não haja acumulação de vencimentos. No entanto, na realidade eles existem. E isto porque não há acumulação de vencimentos quando o deputado exerce funções públicas, mas nada impede um deputado de exercer funções no sector privado e de acumular os vencimentos auferidos neste sector com o vencimento de deputado; portanto, há acumulação. Daí a razão da nossa proposta que, como lhe disse, é um princípio e não uma proposta fechada.
Nós temos uma posição fechada quanto ao princípio e não quanto à fórmula. A fórmula que adoptámos - e apenas para lembrar aos Srs. Deputados foi um plágio; foi um plágio de nós próprios e de todos os Srs. Deputados, pois é exactamente o dispositivo que esta Assembleia aprovou - salvo erro, por unanimidade - para os membros do conselho da comunicação social. No entanto, estamos abertos a encarar o problema.
Por outro lado, o Sr. Deputado Joaquim Miranda perguntou qual a razão de serem aqueles concelhos e não outros.
Também aqui, Sr. Deputado, estamos abertos a outros concelhos. O concelho da Maia foi um lapso, pois o critério que utilizámos nesta primeira aproximação foi, de facto, no sentido de escolher concelhos que dispõem de transportes rápidos e de fácil acesso a Lisboa. Admitimos, no entanto, que tal enumeração possa ser alargada pois, aceites os princípios, estamos - como disse - abertos à discussão e ao aperfeiçoamento na especialidade.
O Sr. Deputado pergunta também porque é que se faz a equiparação.
Repare que a equiparação que aqui se faz não tem nada a ver com a remuneração. Aqui, a equiparação faz-se para efeitos do disposto nos artigos 24.º e 26.º, que têm a ver, não com a remuneração, mas com a subvenção vitalícia.
Portanto, não há contradição entre o facto de remetermos a remuneração para uma lei especial e referimos aqui isto. Quanto muito, Sr. Deputado, pode levantar a questão - que é também uma questão para ser sanada na especialidade - de se é esta a melhor sede para referir a própria subvenção vitalícia - que é referida no estatuto -, ou será, porventura, uma lei de remuneração dos titulares de cargos políticos, mas contradição não há.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, torna-se extremamente difícil, neste quadro, fazer uma intervenção que tenha em conta aquilo que está em discussão. E isto porque o que está em discussão são, de facto, duas matérias diferentes: por um lado, o estatuto dos deputados e, por outro lado, o estatuto remuneratório dos cargos políticos.
Em boa verdade, Sr. Presidente, eu deveria ter 6 minutos para fazer este pedido de esclarecimento, visto tratar-se de duas matérias diferentes.
O Sr. Presidente: - Mas, com V. Ex.ª sabe, não tem; só tem três.
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O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu já sabia que me ia dizer isso. Eu deveria era ter 6 minutos, porque a discussão que aqui se está a travar tem duas componentes diferentes. Vou cingir-me a uma delas, que é a do estatuto dos deputados.
Suponho que é inquestionável, por parte de todos nós, o facto de certas matérias que tratam do estatuto dos deputados serem reequacionadas, em ordem a conseguirmos, desde logo, melhor capacidade de intervenção dos deputados na vida geral e, por outro lado, a garantir melhores condições de trabalho.
Esses dois objectivos estão, e vão estar, dissociados da questão do estatuto remuneratório. Eu coloco-lhes questões só em relação, portanto, ao que deve ser revisto, em meu entendimento, no estatuto dos deputados.
A primeira questão que lhe coloco é a seguinte: entende ou não o Sr. Deputado Lopes Cardoso que a proposta que apresentou não completa o quadro desejável de intervenção dos deputados, quando não prevê a possibilidade de serem garantidos meios aos deputados - nomeadamente salas, possibilidades de reunião e outros -, através de autoridades dependentes do Governo - governadores civis, etc. - que lhes permitam o melhor contacto com os eleitores?
Em segundo lugar, queria perguntar-lhe se não acha, Sr. Deputado, que na sua proposta são também insuficientes os meios previstos para intervenção dentro de serviços públicos - institutos públicos, empresas públicas, etc. - que permitam o conhecimento directo, por parte do deputado, das realidades que aí se vivem.
Em terceiro lugar, Sr. Deputado, queria perguntar-lhe se não é de separarmos estas questões daquilo que de mais, ou de menos, enfim, proveitoso poderá ser para o deputado, que é o considerar quanto ganha o deputado para fazer aquilo que deve fazer e que resulta do mandato que tem a partir da eleição.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado João Amaral, o Sr. Deputado começou por dizer que se referiria apenas ao estatuto dos deputados e acabou por se referir também ao estatuto remuneratório. Mas adiante.
O Sr. Deputado perguntou-me se acho que a nossa proposta é incompleta. Eu não julgo ter a verdade agarrada por uma mão e, obviamente, penso que ela é incompleta, mas, curiosamente, os dois aspectos que o Sr. Deputado referiu - acesso a salas postas à disposição pelos governadores civis e possibilidade de presença nas empresas públicas -, estão contemplados. Muito rapidamente, permito-me ler-lhe o nº 2 do artigo 13º do nosso projecto:
Para melhor concretização do disposto no número anterior devem os governadores civis, quando para tal solicitados, colocar à disposição dos deputados as necessárias instalações.
O nº 3 do mesmo preceito estatui o seguinte:
Os deputados no exercício das suas funções têm direito de acesso e livre trânsito nos locais de funcionamento dos serviços da administração central e local, dos institutos públicos e das empresas públicas ou com participação do Estado, bem como das empresas concessionárias de serviços públicos.
No entanto, há, seguramente, outras falhas que não estão referidas no nosso projecto e que o Sr. Deputado também não referiu. Espero que, do esforço conjunto dos deputados na Comissão da Especialidade, elas possam ser preenchidas.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não é, seguramente, o estatuto remuneratório o mais importante. No entanto, não o subestimo e digo-lhe mais: é que penso que é importante que o estatuto remuneratório seja analisado à luz do estatuto do deputado em sentido restrito. E isto porque aquilo que forem as obrigações do deputado, em termos de estatuto, pode condicionar a nível remuneratório dos deputados. Não são, como pode parecer à primeira vista, duas questões totalmente separáveis e que não tenham rigorosamente nada a ver uma com a outra.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, muito obrigado por me conceder a palavra.
De facto, vou protestar neste sentido: eu não me referi ao estatuto remunerário, Sr. Deputado Lopes Cardoso; o que considerei foi que as soluções que apontou como contidas no seu projecto, no que diz respeito aos meios de acção dos deputados, é o que nos deviam preocupar aqui. Eu perguntei ao Sr. Deputado e o Sr. Deputado não me respondeu, se não era de separar completamente essa questão da outra, que diz respeito ao estatuto remuneratório. Em jeito de protesto, eu devo dizer ao Sr. Deputado que acho que elas devem ser, efectivamente, separadas. O que ganham, actualmente, os Deputados da Assembleia da República não está em questão, nem é objecto de discussão, quando aquilo que é fundamental é conceder aos deputados os meios de acção para poderem exercer o seu mandato.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem
O Orador: - E se o Sr. Deputado Lopes Cardoso combinar o estatuto remuneratório com as normas, introduzidas no Regimento, de votação de hora fixa e de abaixamento do quórum, então poderá compreender perfeitamente que o caminho traçado não é o de chamar os deputados ao trabalho.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O que procuramos aqui é considerar meios de intervenção do deputado, que garantam um trabalho efectivo e de modo algum a criação de situações de privilégio.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma contra protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Eu começaria por contra protestar, dizendo ao Sr. Deputado que, ao contrário do que o Sr. Deputado afirmou - disse que
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não respondi -, eu respondi muito claramente. O Sr. Deputado entende que as questões devem ser totalmente separadas e é uma opinião que respeito. Eu disse-lhe que entendia que as duas questões não devem ser separadas.
Devo, aliás, dizer-lhe que o Sr. Deputado, no final da sua intervenção, carreou alguma coisa em meu favor. Quando me chamou a atenção para que a leitura do estatuto remuneratório dos deputados, ou daquilo que é proposto, devia ser feita tendo em conta já não o estatuto dos deputados, mas o Regimento. O Sr. Deputado disse-me: se ler aquilo que é proposto à luz da redução do quórum, etc., chegará à conclusão de que o caminho traçado não é o de chamar os deputados ao trabalho. Assim, veio acabar, de certo modo, por carrear argumentos a meu favor, no sentido de que tudo isto constitui, de facto, um conjunto que, se puder ser apreciado em conjunto e, em cada caso, ter em conta as soluções que nos outros casos foram adoptadas, é positivo e vantajoso.
Dozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, é evidente que a revisão do estatuto votado é um ensejo de que, necessariamente, a Câmara reflicta sobre o papel que todos devemos aqui desempenhar e sobre as competências da Assembleia. Só que sucede que o vamos fazer no momento em que a Assembleia da República sofre um profundíssimo desprestígio, resultante da forma como não têm sido exercidas as suas competências, designadamente devido à governamentalização e à paralisação que assistimos.
Por outro lado, vai entrar em vigor, daqui a uns tempos, um Regimento que propicia factores de asfixia da vida parlamentar e da demonstração ao País do que é que serve o Parlamento, colocando dúvidas sobre para que é que servem os deputados. E é este o momento que a coligação escolhe para proceder aos aumentos.
A UEDS, num quadro de profunda crise social em todos os indicadores - desemprego, situação salarial, etc. -, vem dar a sua adesão a que, para além da necessidade de resolver problemas - diz a UEDS, e nisso estará de acordo connosco e com outras pessoas - é preciso desbloquear a questão dos impedimentos à acção do deputado, é necessário alargar as incompatibilidades, é necessário criar - creio que o ouvirei dizer isso, pois ainda não o ouvi - condições de trabalho, etc., etc. No entanto, vem dizer que é preciso fazer os aumentos dos deputados. E ouvi da sua boca um argumento surpreendente: temos de o fazer porque há funcionários públicos que ganham muito dinheiro; mais do que os deputados - pode lá ser. E há gestores privados que ganham muito.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, há até milionários que ganham incomparavelmente mais - todos o sabemos. Mas é isso que, neste momento da vida da Assembleia da República, pode ser alegado para justificar aumentos...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... no actual quadro de crise social, com o desprestígio que para a função parlamentar acarreta a prática a que a Assembleia tem estado submetida? Vem o Sr. Deputado dizer que a questão das remunerações é uma das questões centrais na actual fase da vida parlamentar?
Sr. Deputado Lopes Cardoso, é politicamente grave e conduz a resultados, que são os que estão pressupostos na proposta governamental - Deus sabe com que objectivos - e ainda temos bem pouca imagem de qual o sentido profundo e todas as implicações, designadamente em relação ao funcionamento do sistema partidário, do sistema eleitoral, em relação ao funcionamento das eleições, que estão no bojo desta proposta.
O que é curioso é que a UEDS faça isto - porque é complexo e muito melindroso - e venha argumentar, dizendo, um pouco em estilo de arcabuz, que é preciso aumentar os deputados porque há funcionários públicos a ganhar mais que os deputados.
Sr. Deputado Lopes Cardoso, não se pode entender esta questão nestes termos; isto não é uma competição com a função pública e menos ainda com o sector privado. Estará perfeitamente errado que não haja, por exemplo, uma lei nacional de limitação de rendimentos máximos - foi suprimido isso da revisão constitucional e não devia ter sido. No entanto, colocada a questão nestes termos e na actual situação social e política do País, o que nos parece grave é colocar a todo o País, como questão importante, central e fundamental, com a qual nos vamos debater, não o trabalharmos mais e melhor, mas o ganharmos mais; ganharem alguns dos senhores mais.
Gostava de o ouvir sobre isto.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado, eu posso ter dito muitos disparates mas, seguramente, não disse o disparate que o Sr. Deputado me atribuiu. Terá sido outro...
Não justifiquei o aumento dos deputados pelo facto de haver funcionários públicos que ganham mais. O que eu disse é algo de diferente: é que o critério que presidiu ao actual regime já foi subvertido. Foram aqui aduzidos argumentos para fixar um determinado nível remuneratório que, pela prática, foram subvertidos.
Quanto a fazer disto uma questão central, Sr. Deputado, quem faz disto uma questão central não sou eu mas sim o Sr. Deputado e a bancada do Partido Comunista Português!
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É falso!
Uma voz do PS: - É de mais!
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, será, realmente, de mais ou «de menos» mas parece-nos inteiramente inaceitável que se impu-
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te à bancada do PCP a responsabilidade de agigantar, avolumar e hiperbolizar a questão dos aumentos dos deputados.
Hiperbólicos são os aumentos propostos, Sr. Deputado! Inaceitável é ter havido, no actual quadro social e político, uma iniciativa governamental no sentido de promover isto, que corrobora os altos vencimentos governamentais...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... e que aumenta escandalosamente os vencimentos dos deputados, não considerando todo o melindroso conjunto de implicações (ou considerando-os bem demais) que isto tem em relação ao prestígio da Assembleia da República e ao cabal exercício das nossas competências!
Queria o Sr. Deputado Lopes Cardoso que olhássemos para o lado e que assobiássemos enquanto isto acontece? Queria o Sr. Deputado Lopes Cardoso que disséssemos «enfim, há uns aumentozitos, mas também há por aí quem ganhe tanto..., portanto, boa tarde, ganhemos todos, comamos todos o mesmo bolo orçamental»? Sr. Deputado Lopes Cardoso, fará V. Ex.ª o que entender, votará a favor do que quiser, ficar-lhe-á muito bem (ou muito mal)!
Pela nossa parte, denunciaremos, por todos os meios e até ao fim, o que aqui se pretende fazer. E mais: lutaremos para que se exerçam todos os mecanismos constitucionais no sentido de que isto não se venha a efectivar, porque seria um atentado contra o prestígio da Assembleia da República e contra o funcionamento das instituições, que já têm demasiados factores que as perturbem.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para apresentar a proposta de lei nº 88/III, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. (Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, eu já tinha dado a palavra ao Sr. Ministro de Estado mas, apesar disso, tem V. Ex.ª a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, há pouco colocaram-se algumas questões acerca das apresentações.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Ó Sr. Presidente, V. Ex.ª já tinha dado a palavra ao Sr. Ministro!
O Orador: - Parece-me que o Sr. Deputado Costa Andrade está nervosíssimo mas eu explico ao Sr. Presidente o que é que se passa.
Colocou-se aqui a questão de apresentarmos ou não o nosso projecto de lei. Foi esclarecido pela Mesa que, uma vez que já tínhamos exercido esse direito regimental, não o podíamos voltar a fazer.
A questão que se coloca aqui, neste momento, é a de saber porque é que o PS e o PSD, que não exerceram o direito regimental de apresentação, não são convidados a exercê-lo ou, sendo convidados, porque é que não o exercem.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Essa agora!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, a Mesa não tem autoridade sobre os Srs. Deputados para os obrigar a fazer as apresentações. 15so depende exclusivamente deles, é um direito potestativo. Portanto, eles fazem-no se o quiserem fazer, e se dei a palavra ao Sr. Ministro de Estado é porque fui informado, aqui na Mesa, de que S. Ex.ª o Sr. Ministro pretendia a palavra para esse efeito.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Fica registado!
O Sr. Presidente: - Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já quase vai sendo um hábito para mim estar aqui a pronunciar-me e a dialogar convosco, umas vezes do lado do Governo e outras vezes do lado da oposição, sobre as remunerações dos membros dos órgãos de soberania. Salvo erro, é a terceira ou a quarta vez que tal acontece.
Na primeira vez, eu era membro de um Governo que já sabia que ia cair e que, portanto, não estava a fazer defender nenhum princípio ou solução em causa própria. Vim aqui defender o aumento do vencimento dos ministros de 27 600$ para 40 000$.
Já então houve quem encontrasse nisso um exagero terrível, uma violação do princípio da igualdade na distribuição dos rendimentos, no exemplo que a classe política não dava, na circunstância de haver necessariamente - e infelizmente para todos nós - miséria no nosso país, etc.
Apesar de tudo, com votos contra, votos a favor e abstenções, o ordenado dos ministros lá subiu para 40 0005 e eles puderam, então, nessa altura, deixar de recorrer tanto à família, já na eminência de terem que recorrer à caridade pública.
Risos do PCP.
Noutro momento, tratava-se de uma proposta de lei, apresentada pela então AD, de correcção dos vencimentos dos deputados e também do Presidente da República.
Discutimos o assunto até às 4 ou 5 horas da manhã, o meu partido, que estava na oposição, sugeriu algumas correcções mas votou: votou a solução final que viria a ser vetada pelo Sr. Presidente da República.
Se nessa altura a vontade maioritária da Assembleia tivesse sido respeitada e não tivesse sido exercido o legítimo direito de veto pelo Sr. Presidente da República, não estaríamos agora, porventura, a discutir aqui este problema. Teria sido feita a correcção anual e, nessa altura, os deputados teriam passado a ganhar - em meu entender, legitimamente - tanto como os Secretários de Estado, o que hoje seria mais do que o que aqui se propõe e que vamos discutir.
O Sr. António Capucho (PSD): - Exacto!
O Orador: - Portanto, tudo isto nasce da circunstância de, em tempo oportuno, ter sido legitimamente exercido o direito de veto pelo Sr. Presidente da República.
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Recentemente, houve aqui uma outra discussão em que, creio, não intervim, embora tenha estado um pouco na génese dessa medida que foi a correcção (justíssima) do vencimento do Sr. Presidente da República, que nessa altura já ganhava menos do que alguns dos seus colaboradores mais directos da sua Casa Civil e da sua Casa Militar.
Era um desprestígio para as instituições democráticas que um Presidente da República ganhasse qualquer coisa como 60 000$. Apesar disso, essa solução foi apodrecendo, também em nome de uma certa demagogia que acha que a classe política deve ser penalizada porque estar no poder já é, em si, uma remuneração suficiente. Não obstante, exige-se esforço, exige-se zelo, exige-se dignidade, exige-se independência, exige-se seriedade, mas sujeitam-se os agentes políticos a situações de verdadeira carência familiar.
De qualquer modo, penso que, quase por unanimidade, fez-se a correcção justíssima do vencimento do Sr. Presidente da República.
A partir daí, tínhamos o vértice da pirâmide e voltámos a tomar consciência de que faltava uma unidade sistémica na remuneração dos membros dos órgãos de soberania ou da classe política, como se queira chamar, embora eu não goste muito desta designação. Tratámos, então, de conceber um sistema em que, a partir desse vértice, se construísse a pirâmide com critérios de justiça.
O Governo entendeu que devia ser ele a tomar uma iniciativa neste domínio porque, embora a competência para aprovar os aumentos e as correcções dos vencimentos dos membros dos órgãos de soberania caiba (e muito bem!) à Assembleia da República e a decisão tenha que ser, por força da Constituição, uma decisão, de algum modo, em causa própria e também, de algum modo, em causa alheia -, achou que ela não deveria partir daqueles que se teriam de pronunciar também sobre o seu próprio vencimento.
Assim, entendeu o Governo que devia ser ele a construir uma hipótese de pirâmide e, perfeitamente à vontade, mandou para aqui uma proposta que pode ter defeitos, pode ter vantagens - a última palavra cabe aos Srs. Deputados - mas em que o Governo está tão à vontade que, por exemplo, se essa proposta for aprovada, eu, na qualidade de Ministro de Estado, ganharei mais 3800$, o que é o preço de um dos bons charutos que fuma, todos os dias, o Fidel Castro em Cuba.
Aplausos do PS, do PSD, e da ASDI.
Portanto, também não se pode dizer que o Governo tenha feito uma proposta em causa própria. Essa mesma correcção dos 3800$, não nasceu tanto da necessidade de corrigir para mais o vencimento dos ministros mas da necessidade de encontrar uma percentagem em relação ao vencimento do Presidente da República. O Governo resolveu construir a pirâmide por escalões a partir do vencimento do Presidente da República. Assim, em relação a esse vencimento 0 Presidente da República ganhará 80 %, o primeiro-ministro 75 %, os ministros 65 %, os secretários de Estado 60 % e os subsecretários de Estado 55 %. Os deputados, segundo a proposta do Governo e contra a proposta que aqui foi aprovada e que foi vetada - mas, certamente, não por essa razão -, ganharão menos do que ganhariam nessa altura, porque agora nem sequer ficam equiparados a um subsecretário de Estado quanto mais a um secretário de Estado. E continuo a dizer - como, aliás, disse na altura em que estava na oposição - que não vejo sérias razões para que um deputado, eleito directamente pelo povo português, e sendo assim o seu mais legítimo representante, ganhe menos do que um subsecretário de Estado ou mesmo do que um secretário de Estado. Continuo a não ver razões para isso mas, enfim, é um ponto de vista pessoal que é contestável.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Pensou-se também que a classe política, assim denominada - embora eu continue a não gostar da designação; prefiro mais a expressão «carreira política» porque penso que devemos definir uma carreira e não tanto uma classe -, não deve continuar a ser uma expressão de amadorismo, como até aqui tem sido um Portugal, em que as pessoa interrompem a sua profissão sem nenhuma garantia quanto ao futuro, desequilibram a sua vida profissional e, por vezes, familiar, deixam de poder prestar assistência de espécie alguma à sua família, enfim, sacrificam tudo e mais alguma coisa para depois a sociedade lhes dizer: tem paciência, já te chega a glória de seres ministro, ou secretário de Estado, ou deputado, passa a tua fomezinha porque também há por aí fome neste país. E já sei que, com certeza, há quem, demagogicamente, venha dizer: mas como, nesta oportunidade em que há salários em atraso, em que há miséria, em que há carências fundamentais no domínio da habitação e da saúde...
Vozes do PCP: - Muito bem.
O Orador: - Estou de acordo que essas carências existem e que há algum fundamento para nos preocuparmos com isso. Também sei que normalmente se diz «os ricos que paguem a crise», embora me pareça que não seja bem o caso da classe política, que não está, com certeza, integrada na classe dos ricos.
O que eu entendo é que se estamos à procura de uma oportunidade para dignificar a classe política, para também fazer justiça à classe política, para termos uma classe política ao nível das outras democracias, às quais queremos pertencer e emparelhar no âmbito da CEE, se assim é, se queremos ultrapassar a fase do amadorismo, a fase do biscate, a fase de estarmos aqui um bocadinho e irmos fazer uma minuta ou acabarmos de assinar um projecto, se é essa a nossa concepção de classe política nunca mais teremos democracia em Portugal.
Eu podia dizer, como disse Jesus Cristo - mas não o farei -, «pobres sempre os haverá». Mas um socialista não pode dizer isto porque já se demonstrou que é possível não haver pobreza. E há, de facto, países onde não há pobreza no sentido em que o bom Jesus Cristo encarou o problema.
Mas o que eu penso é que um socialista tem de combater a pobreza e deve fazê-lo.
O meu ponto de vista é que aquilo que se gasta a mais com a dignificação da classe política, é menos do que metade, um terço, um quarto, e até um quinto do que se paga em qualquer das democracias europeias. 15to porque continuaremos a ser os políticos europeus, de longe, mais mal pagos. Basta dizer, por exemplo, que em Espanha a relação entre o
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salário de um deputado e o salário mínimo nacional é de 1 para 9, enquanto em Portugal, hoje, está a baixo de 1 para 4. Com a correcção que o Governo propõe ficará apenas na relação de 1 para 5, já que somos, porventura, um dos países que tem um leque salarial mais estreito e que isso é, porventura, responsável pela circunstância de não termos, além de políticos profissionais, além de políticos que não fazem da política uma carreira, e que deviam fazer, bons gestores, bons directores-gerais, bons quadros na função pública. Tudo isso um dia terá, porventura, que ser analisado e discutido.
Assim, na minha opinião aquilo que se poderia poupar, não fazendo agora a justa correcção dos vencimentos da classe política, não vinha, com certeza, resolver nenhum dos problemas que nos amarguram ao nível da pobreza, da miséria, do atraso na saúde, do atraso na educação, do atraso na habitação. Pelo contrário, a dignificação da classe política, a valorização da classe política, o darmos à classe política a possibilidade de trabalhar em full-time - e já vai havendo muitos deputados que trabalham em full-time, que só se dedicam a isto é a mais nada, e era bom que houvesse cada vez mais deputados que só se dedicassem a exercer o seu mandato e a mais nada...
Vozes do PS e da ASDI: - Muito bem!
O Orador: - ... -, tornando-se cada vez mais prestigiada independente, contribui fortemente para a solução dos problemas da miséria, da pobreza, da educação, da saúde, enfim, de tudo aquilo que nos aflige.
Este é o ponto de vista do Governo e é também o meu. Até ver, não acho que esteja errado.
Também não me sinto à vontade para dizer aos Srs. Deputados «sofram, abstenham-se. Em homenagem a uma certa demagogia, façam como os lírios do campo que, como sabem, não cuidam da sua própria subsistência e resplandecem em todo o seu esplendor». Não vos peço que façais isso pela simples razão de que, porventura, tendes família, tendes filhos e tendes necessidades. É preciso que, na verdade, um deputado, que quando quis ser deputado não aceitou, com certeza, ser um franciscano, não passe a ser também um homem de sandálias que se inscreveu num convento trapista. 15so é que não pode ser!
Srs. Deputados, dito isto, gostaria apenas de dizer - e não estou aqui, evidentemente, para tecer grandes considerações, pois a proposta do Governo explica-se por si própria - que, relativamente a este diploma, houve três posições distintas: a do PCP, a da UEDS e a do CDS.
Gostaria de dizer uma palavra sobre cada uma destas posições.
O PCP, fiel à sua maneira de ser e ao seu posicionamento na política portuguesa, mais uma vez é por tudo o que seja contra e é contra tudo o que seja por.
Aplausos do PS e do PSD.
O Partido Comunista acha que é uma incoerência da classe política, num momento em que há tantos problemas, fazerem-se estas correcções, ainda que dentro de parâmetros mais do que mínimos em relação às democracias europeias em que nos colocamos. «Por amor de Deus, o que é preciso é resolver o problema dos salários em atraso!» Como se com os 80 000 contos/ano que isto vai custar (ou nem tanto) pudéssemos resolver algum problema salarial.
Mas qual é, afinal, a posição do PCP? É esta: contra tudo, não se aumente nada. E nós até sabemos porquê: é que da outra vez o Sr. Deputado e meu querido amigo engenheiro Veiga de Oliveira disse-nos aqui que isto era irrelevante para o Partido Comunista. Lembro-me muito bem de ele ter dito que os deputados comunistas não ganham mais nem menos qualquer que seja a correcção que se faça: eles ganham aquilo que ganhavam antes de serem deputados, o que, obviamente, pode ser mais do que aquilo que os Srs. Deputados ganham.
Risos do PS, do PSD, do CDS e da ASDI.
Normalmente, não será. Faço-vos essa justiça.
Portanto, tudo aquilo que for a mais eles doam ao seu próprio partido. Mas então eu não percebo, entram em contradição! Desculpem esta ironia mas, de vez em quando, é preciso fazer um pouco de humor.
Até parece que, opondo-se o Partido Comunista a que esse dinheiro entre no partido e preferindo que ele permaneça no Orçamento do Estado, querem afirmar que o dinheiro é mais bem administrado pelo Governo do que pelo próprio Partido Comunista.
Aplausos do PS, do PSD e do CDS.
Agradeço-vos essa prova de lucidez.
Risos do PS, do PSD, do CDS e da ASDI.
Quanto ao CDS, penso que entrou em crise de arrependimento porque quando aqui subscreveu a proposta que nós, com alterações, melhorámos um pouco - se me permitem uma invocação histórica -, a vossa proposta era francamente mais gravosa para o erário público e mais benéfica para os deputados do que esta proposta apresentada pelo Governo. Então, se nessa altura esta proposta mereceu a vossa concordância, porque é que esta agora não a merece?
Tenho a impressão de que o CDS sentiu necessidade de se demarcar um pouco da proposta do Governo, por razões que respeito. Porém, devo dizer-vos que também me impressiona muito o grau de convergência do PS e do CDS com a proposta do Governo. Julguei que, ao fim de um ano e meio de política impopular e de austeridade, o CDS se tivesse distanciado do Governo mais do que os 5 07o em que agora se distancia.
Vejamos o que é que faz o CDS: nalguns pontos sobe 5 %, noutros desce 5% e no conjunto tanto faz como fez. Duvido que haja alguma economia no conjunto da vossa proposta. Penso que não valia muito a pena distanciarem-se só aquele passinho dos 5% e, realmente, melhor seria que tivessem dito «bom, embora com algumas discordâncias na especialidade, vamos votar e manter a proposta do Governo». Foi o que fizemos da outra vez e foi, talvez, mais coerente da nossa parte. Espero, em todo o caso, que possamos chegar a um entendimento no sentido de que, apesar de tudo, todas as propostas têm aspectos positivos e, a meu ver, devem ser tomadas em conta. Não vamos agora partir do princípio de que a perfeição está na proposta do Governo e de que os defeitos estão nas propostas da oposição.
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Em 60 % a vossa proposta é uma reprodução textual da proposta do Governo, o que, se em matéria de feitura de leis não estivesse afastada a figura do copyrights, significaria que estamos na presença de um flagrantíssimo plágio. Mas quem ler a vossa proposta e não tiver presente a proposta do Governo há-de julgar que é vosso aquilo que em 60 % é da proposta do Governo.
E mais: para além desses 60 %, mais 20 % a 25 % - eu fiz as contas e peço-vos que conferireis - é quase textualmente a proposta do Governo, com pequeninas nuances formais que não têm grande significado.
O Sr. António Capucho (PSD): - São só vírgulas!
O Orador: - Vejamos quais são as alterações que têm um bocadinho de significado e qual é a única que tem algum significado.
Sem significado inclui, por exemplo, o facto de o Provedor de Justiça ser equiparado aos titulares dos cargos políticos, o que, para mim, é altamente discutível. O Provedor de Justiça tem o seu estatuto próprio e não me parece que devamos misturar um estatuto autónomo e próprio de um cargo que é discutivelmente político com o dos titulares dos cargos políticos.
Por outro lado, como o CDS seguiu a proposta do Governo antes da correcção que nela Introduzimos, ainda mantém a equiparação dos governadores civis a titulares de cargos políticos. É apenas uma questão de a aproximação ter sido feita um pouco antes do momento em que fizemos essa correcção.
O projecto de lei do CDS eleva as despesas de representação do Presidente da Assembleia da República de 40 % para 50 %. Vá lá, aqui não são 5 % mas sim 10 % (e para mais)! Por outro lado, retira-lhe o direito a residência oficial. Não sei o que é que o Sr. Presidente da Assembleia da República pensa a este respeito, mas considero que, se o Primeiro-Ministro tem direito a residência oficial, o Presidente da Assembleia da República, que é a segunda figura da hierarquia, também o deve ter.
É equiparado o vencimento do vice-primeiro-ministro ao dos demais ministros, tirando-lhe os 5 % da praxe. Não sei se isto terá grande justificação, na medida em que o vice-primeiro-ministro é a segunda figura da escala dos governos.
Reduz, o projecto do CDS, os vencimentos dos secretários de Estado em 5 %; reduz o vencimento dos vice-secretários de Estado, também, em 5 %; fixa em 25 % as despesas de representação dos Vice-Presidentes da Assembleia da República, o que constitui mais 5 % do que aquilo que é proposto pelo Governo; eleva as ajudas de custo dos juízes da letra A da função pública, equiparando-as às dos membros do Governo. Parece-me que isto é misturar o Estatuto dos Juízes, dos Magistrados com o estatuto da classe política, dado que, embora eles sejam membros de um órgão de soberania, não são membros da classe política. Faz o mesmo em relação aos deputados e eleva para 65 % do ordenado do Presidente da República o vencimento do Provedor de Justiça o qual, em meu entender, penso que não deveria estar aqui - e para 30 % as suas despesas de representação. Ainda reduz em 5 % o vencimento dos governadores civis e dos vice-governadores civis.
Portanto, entre o projecto do CDS e a proposta do Governo há uma oscilação de 5%. Na verdade, penso que não valia muito a pena terem-se dado ao trabalho de fazer um projecto tão vasto e tão complexo. Bastaria, apenas, que discutissem com os vossos camaradas de Parlamento estes aspectos de pormenor que, é claro, estão sempre em aberto. Então, sim, o vosso projecto teria relevo.
Inclui, ainda, este projecto do CDS, uma cláusula final - que, aliás, é comum ao projecto da UEDS -, no sentido de postcipar a entrada em vigor do diploma, sendo a correcção relativa aos deputados feita gradualmente em 3 fases. Assim, no primeiro ano a correcção será equivalente a 40% do vencimento do Presidente da República, no segundo ano a 45 % e no terceiro ano a 50%. É uma proposta simpática para o Governo se, na verdade, os Srs. Deputados quiserem minimizar o esforço financeiro que ao Governo pareceu justo. Se entenderem que devem postcipá-lo ou graduá-lo no tempo, o Governo terá de agradecer e felicitar-vos por esse vosso gesto de generosidade.
Não obstante, a proposta do Governo é aquela que formulou e mais nenhuma outra.
Quanto à UEDS, quase que também poderia dizer o mesmo, embora, desta feita, ela se situe um pouco do outro lado deste bloco central em volta da proposta do Governo.
O vosso projecto reduz em 5% - de 40% para 35 % - as despesas de representação do Presidente da Assembleia da República, o que, penso, não valia a pena. Também reduz em 5 % as despesas de representação do primeiro-ministro, assim como as despesas do vice-primeiro-ministro, do ministro de estado, do ministro dos Negócios Estrangeiros e restantes ministros. Quanto ao ministro de Estado, pela parte que me toca, têm total liberdade.
No que respeita à subvenção mensal vitalícia, que no projecto do Governo tem um limite de 80%, a UEDS sobe para 100%. Só isto compensa todas as reduções de 5 % que preconiza para os casos anteriormente referidos e ainda ficamos a gastar mais dinheiro do que aquele que se quis poupar.
A subvenção mensal vitalícia não é acumulável com pensões e reformas pelo exercício de funções públicas de gestor público, segundo o projecto da UEDS, enquanto que na proposta do Governo é acumulável. Ponho-vos o problema de saber se será constitucional a regra da não acumulação. Então, um indivíduo que foi durante 15 ou 30 anos funcionário público e ganhou o direito a uma reforma perde-a para poder ter aquela correspondente a uma outra função que ele exerce para além desta e diversamente desta? Lembro o artigo 50.º, nº 2, da Constituição da República, segundo o qual ninguém pode ser prejudicado na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tem direito em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos.
Quanto ao subsídio de reintegração, o Governo preconiza que seja atribuído 1 mês em cada semestre, enquanto que a UEDS propõe 1 mês em cada ano. Aqui há, de facto, uma economia, embora não significativa.
Relativamente ao subsídio de sobrevivência, são atribuídos os mesmos 75% da proposta do Governo, mas conjuntamente, o que implica mais, pela razão simples que o Governo faz uma separação de metade para a esposa, metade para os herdeiros menores. Os herdeiros menores, à medida que atingem a maiori-
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dade, perdem esse direito. Portanto, a conjunção, a meu ver, reforça a despesa e não a reduz.
Quanto à morte sem direito a subvenção vitalícia, o Governo propõe 40% e a UEDS sobe para 75%. Aqui a nossa divergência é de 35%, mas para mais, não para menos.
Os ex-Presidentes da Assembleia da República e os ex-primeiros ministros só têm direito a subvenção mensal vitalícia desde que tenham exercido o mandato por 4 anos, enquanto que a proposta do Governo não sujeita o direito a essa subvenção ao tempo de mandato.
Quanto à entrada em vigor do diploma - ao que quase se podia reduzir os vossos projectos, sinceramente o digo, embora sem quebra de respeito, até porque acho que, apesar de tudo, há neles, elementos favoráveis que devem ser tidos em conta no cômputo das vantagens e desvantagens da proposta do Governo -, lá está, também, a mesma proposta que prevê no primeiro ano 40%o só para os deputados, no segundo ano 45% e no terceiro ano 50%.
Se a Assembleia entender que deve, na verdade, dar ao Sr. Ministro das Finanças esta prenda de Natal, o Sr. Ministro das Finanças agradecerá.
O que é preciso, sobretudo, é pormos termo a esta situação, sem demagogia é com toda a sinceridade, que é a dos deputados - e já não digo de outros membros da classe política - ganharem menos do que os chefes das Casas Civil e Militar do Presidente da República, menos do que os chefes de gabinete dos membros do Governo, menos do que os chefes de gabinete dos grupos parlamentares, dos nossos próprios grupos parlamentares, menos do que os governadores civis e vice-governadores civis, só com a excepção dos Governadores Civis de Lisboa e Porto, menos do que os presidentes das câmaras, só com a excepção de Lisboa e do Porto, menos do que os vereadores a tempo inteiro, com a excepção dos pertencentes às Câmaras de Lisboa e do Porto, menos do que todos os directores-gerais e equiparados, menos do que todos os sub directores-gerais e equiparados, menos do que todos os juízes de direito, mesmo os de 1. a instância.
Esta lista poderia ser alargada, mas foi aquilo que eu, à pressa, entendi poder coligir. Portanto, já vêem até que ponto foi levada a preocupação de alguma demagogia nesta matéria, sujeitando a classe política a remunerações que, ria verdade, lhe acarretara alguma indignidade.
Sei que a dignidade dos deputados não vem só daquilo que ganham, vem, também, em todo o caso, daquilo que ganham.
E preciso que o deputado tenha uma remuneração justa, minimamente justa, porque é o caso dado que não chega a ser verdadeiramente justa se a compararmos cora as remunerações em vigor noutros países.
E aí têm, Srs. Deputados, aquilo que entendi dever dizer-vos. Não é talvez muito importante nem vos ajudará muito mas é a reacção do Ministro de Estado, em representação do Governo e em defesa de tinta proposta do Governo que, sem demagogia, uma vez mais assumimos.
A partir de agora a proposta está entregue aos Srs. Deputados, os Srs. Deputados farão dela o que quiserem, como é óbvio, quer corrigindo-a para atais, quer corrigindo-a para menos. Para menos, o Governo ficará agradecido. Parir roais, o Governo, conhecendo-vos como conhece, ficaria sinceramente admirado.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Pediram a palavra, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Manuel Queiró, Lopes Cardoso, João Amaral, António Capucho, Carlos Brito, José Magalhães, Joaquim Miranda e Raul de Castro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Ministro de Estado, V. Ex.ª fez, na sua intervenção, algumas considerações sobre o nosso projecto. Não vou, neste pedido de esclarecimento, defender o nosso projecto, pois ele será oportunamente defendido por uma intervenção da nossa bancada.
Desejava apenas fazer ligeiros comentários aos que o Sr. Ministro fez, em tom de brincadeira, sobre aquilo que seriam as reais diferenças entre o nosso projecto e a proposta governamental.
Nomeadamente, voltou a fazer-se nesta Câmara uma tentativa de comparação entre 2 diplomas como se as diferenças se pudessem analisar do ponto de vista quantitativo.
Sabe o Sr. Ministro e sabe esta Câmara, com certeza, que os diplomas se podem diferenciar qualitativamente de modo decisivo, sem que essas diferenças se possam, no seu articulado, dividir em termos quantitativos.
Já que se fala de diferenças, de copyrights e de plágios, eu começaria - e este é o meu primeiro pedido de esclarecimento - por perguntar ao Sr. Ministro se as propostas de alteração que o Governo apresentou a meio ou no decurso de todo este processo porque de um processo e de uma história se trata, ou já existe um processo e uma história na discussão destes projectos - não tiveram a ver também com um plágio, ou, digamos, com uma tentativa de aproximação, ou até, se quisermos, de antecipação de posições públicas que o meu partido vinha assumindo ou de que o Governo vinha tomando conhecimento.
Gostaria de saber se essas propostas, nomeadamente a proposta de alteração que retira as despesas de representação dos deputados, não tinham, precisamente, a ver com isso. Se não tinham nada a ver com isso, queira o Sr. Ministro explicar à Câmara porque é que o Governo, poucos dias depois de ter feito essa proposta, faz Lima proposta de alteração era que a retira.
Vozes do CDS: - Muito bem.
O Orador: - É claro que o Sr. Ministro repetiu os argumentos que já ouvi em várias instâncias. Muitos deles são de considerar, mas não vou fazer uma critica de fundo. Iria até passar por cima de todos esses argumentos acerca da pirâmide da carreira política.
O que é certo é que o Sr. Ministro, ao invocar todos esses argumentos formais, também passou por cinta de uma verdade política fundamental que está aqui e que tem a ver também com as propostas de alteração que o Governo fez. É que de toda esta pirâmide, de todo este exercício formal, de todo este edifício que se queria construir, resultava uma verdade política fundamental para a opinião pública. E todos os políticos aos quais sejam indiferentes os refle-
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xos que, na opinião pública, possam ter as suas atitudes, não estão a revelar grandes exercícios de coerência, estão, a meu ver, a revelar a sua irresponsabilidade enquanto políticos. 15to porque existe uma relação dialéctica com a opinião pública. O exercício pedagógico é preciso fazer-se também a esse nível.
E havia uma verdade política fundamental. Na proposta inicial do Governo, resultava, em todo este edifício, que os deputados eram confrontados na opinião pública com um aumento, ao contrário dos outros titulares de órgãos de soberania, que era inabsorvível pela opinião pública. E nem era preciso fazer história nem invocar propostas passadas. Qualquer pessoa sabe, se tiver que explicar isto detalhadamente lá fora, que era inabsorvível pela opinião pública a explicação deste salto remuneratório, mesmo para correcção de anomalias - e podemos discutir isso serenamente e com todos os argumentos que quiserem -, que constava da proposta inicial do Governo.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro de Estado, V. Ex.ª pretende responder já ou no fim?
O Sr. Ministro de Estado: - Sr. Presidente, responderei no fim.
O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - O Sr. Ministro entendeu fazer um cotejo entre a proposta do Governo e as propostas de alteração da UEDS, nomeadamente o projecto de estatuto. No entanto, gostaria de chamar a atenção de V. Ex.ª que o prisma como encarou esse cotejo falseava a realidade objectiva.
Nós não reduzimos nada, objectivamente, quanto às despesas de representação dos membros do Governo. A proposta do Governo é que as aumenta. Nós propomos como despesas de representação uma percentagem que é a percentagem actual. O Governo aumenta em relação à percentagem actual. Nós não reduzimos, o Governo é que aumentou.
Não aumentámos nada no que diz respeito à pensão vitalícia e a todo o seu regime. O Governo é que reduziu. E aí estamos de acordo.
A nossa proposta é anterior à proposta do Governo. O Governo apresentou uma proposta com valores reduzidos em relação à nossa, que mereceu o nosso acordo. E tanto o mereceu que não fizemos nenhuma proposta de alteração em relação a essa matéria. Aí estamos com o Governo, agradecemos as alterações que o Governo fez, reduzindo a nossa proposta. Nós não aumentámos nada em relação à proposta do Governo.
E Se cotejo há, já agora, não queria entrar nessa discussão da especialidade, lembrava apenas que a5 diferenças não ficam só aí. Em termos concretos, a proposta da UEDS suprime, por exemplo, as despesas de representação para os presidentes dos grupos e agrupamentos parlamentares, suprime o benefício da subvenção vitalícia para o exercício de quaisquer funções públicas remuneradas e não apenas para aquelas que constam na enumeração do Governo, estabelece, desde logo, limites para acumulação da pensão vitalícia - o Governo remete-os para decreto-lei regulamentar -, isto apenas para mostrar que as nossas diferenças não se ficam por aí.
Depois, há uma outra diferença que é de filosofia. O Sr. Ministro referiu - e tem o meu total acordo que o CDS incluiu indevidamente o Provedor de Justiça no seu projecto, na medida em que, tratando-se de um estatuto remuneratório de cargos políticos, o Provedor de Justiça não deveria ter aí lugar.
De acordo, Sr. Ministro. Mas, penso que na mesma lógica, e defendi isso daquela tribuna, deveria ter levado o Governo a retirar da sua proposta de lei os juízes do Tribunal Constitucional, inclusive a referência que faz, e que é totalmente descabida, aos magistrados judiciais. Tratando-se de uma proposta de lei dos detentores de cargos políticos, é tão absurdo fazer referência, do meu ponto de vista, aos magistrados, como eu disse há pouco, como fazer referência aos oficiais do exército ou a quaisquer outros.
Portanto, estamos de acordo com a crítica que fez quanto à inserção do Provedor de Justiça, mas penso que deveríamos ir mais longe e suprimir também os juízes do Tribunal Constitucional, ou então incluir todos e transformar o estatuto remuneratório dos detentores dos órgãos de soberania.
Esta situação híbrida é que me parece dificilmente defensável.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegados à hora do intervalo regimental, suspendo a sessão por 30 minutos.
Eram 17 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, ainda não há condições de silêncio.
O Sr. Presidente: - Bem fazemos por isso, Sr. Deputado.
Pausa.
Estão reunidas as condições para o Sr. Deputado formular o seu pedido de esclarecimento.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, se esse é o entendimento da Mesa eu não vou discuti-lo. Pedia é que, apesar de tudo, houvesse as condições de silêncio necessárias.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, já estão reunidas as condições necessárias para que possa usar da palavra.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: Suponho que quando V. Ex.ª levantou a questão dos seus próprios vencimento,; e do seu curto aumento, deduziu um elemento novo: ficámos todos comovidos com o estado de pobreza que aqui exibiu perante a Assembleia da República. Tomamos boa nota, Sr. Ministro de Estado, do estado de pobreza de V. Ex.ª
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No entanto, devemos dizer que apesar de tudo o curto aumento de mais de 3000$ sempre servirá para pagar uma das garrafas de vinho que, enfim, em restaurantes finos e adequados à função ministerial, são fornecidos para o bom gosto das refeições que VV. Ex.ªs tomam.
Tanto quanto se percebeu da intervenção de V. Ex. e parafraseando aquilo que diz, a postura do Governo e a do Sr. Ministro de Estado, que defendem a proposta do Governo, é de se estar por tudo o que seja a favor. É excelente, Sr. Ministro de Estado, tudo, ou seja, um bocadinho mais, aí está V. Ex.ª e a maioria a favor, ou seja, «por». É uma postura. Não será talvez a mais adequada à situação do País, mas é uma postura e, digamos, ao menos tiveram a frontalidade de a colocar perante o País.
Há um aspecto concreto da intervenção do Sr. Ministro de Estado que merece uma observação.
Disse o Sr. Ministro de Estado que, dados os baixos vencimentos da função pública, tínhamos maus directores-gerais. Devo dizer, Sr. Ministro de Estado, tanto quanto percebi das suas queixas acerca do estado de pobreza em que vive, temos é talvez maus ministros, que não ganham o suficiente e, portanto, que não são capazes de exercer a sua profissão.
Sr. Ministro de Estado, desculpar-me-á - não será talvez o seu caso -, mas tem sido suficientemente exibido aqui um manifesto estado de incompetência. Ainda ontem aqui o tivemos com o Sr. Ministro Seabra. E, já que não se pode aumentar a estatura de um ministro, talvez aumentando o vencimento se consiga que o ministro Seabra passe a ser um bom ministro.
Uma voz do PSD: - Olhe para si!
O Orador: - Antes de entrar na questão que lhe queria colocar, colocar-lhe-ia uma outra.
O Sr. Ministro disse aqui que esta proposta era menos gravosa do que aquela que apresentou a AD. Sr. Ministro, a proposta inicial do Governo, que demorou 1 ano e meio a parturejar, é de valor idêntico à da AD. Os senhores demoraram 15 dias a tentar corrigi-la, depois da reacção do País. Mas aquela, que demoraram 1 ano e meio a conceber, é de valor idêntico à da AD. Não queiram mistificar as questões.
Finalmente, a questão que lhe queria colocar. O Sr. Ministro colocou-se aqui na postura de dizer que não ia ajudar nada no debate. Foi assim que concluiu a sua intervenção. Concordo consigo.
Onde é que o Sr. Ministro podia ajudar? Em primeiro lugar, respondendo ao pedido que lhe foi dirigido pela Comissão no sentido de enviar os estudos feitos pelo Governo. O Sr. Ministro citou várias questões, estudos feitos, referindo o salário mínimo nacional e outras questões. Então o Expresso tem acesso a esses estudos e a Assembleia da República, que tem de votar a proposta de lei, não tem? Sr. Ministro, o Expresso agora é um agente parlamentar privilegiado?
Neste mesmo quadro, Sr. Ministro, não há algum vício de raciocínio quando compara o salário mínimo nacional com o valor dos vencimentos dos deputados dos diferentes países. Não seria, pelo contrário, de comparar, por exemplo, o rendimento per capita dos diferentes países C os problemas concretos existentes nesses países com aquilo que ganham os deputados?
Sr. Ministro, a questão que aqui se coloca tem a ver não só com a dignidade das instituições, mas também - e até talvez fundamentalmente - com a situação do País. O Sr. Ministro de Estado Almeida Santos tem obrigação, como ministro que é, de conhecer a situação do País em comparação com outros países que têm outros níveis de vencimentos. Não queira, Sr. Ministro, enganar-nos com comparações como a do salário mínimo e a dos salários dos deputados, porque estas questões vão muito mais longe. Deste modo, Sr. Ministro, teria valido a pena, em sede de comissão, tê-las estudado aprofundadamente com os estudos que VV. Ex.ªs tem e que escondem a esta Assembleia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: Em primeiro lugar, queria felicitá-lo pela sua intervenção, muito lúcida e sadia. A pergunta que lhe quero fazer tem a ver com o facto de eu não ter sido deputado na altura em que foi aprovado um diploma, depois vetado pelo Sr. Presidente da República. Assim, pedia-lhe que me refrescasse a memória. É mesmo exacto que o CDS votou nessa altura favoravelmente o diploma em causa, no qual o vencimento dos deputados era equiparado ao dos secretários de Estado, sendo certo que agora fica abaixo na proposta do Governo, do vencimento dos subsecretários de Estado.
O Sr. (Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro Almeida Santos: Já o ouvi por diversas vezes discursar sobre esta matéria. Por isso mesmo os seus argumentos não comportam grande novidade. Sei que tem convicções profundamente arreigadas em relação a este assunto. Sabemos, por isso mesmo, que não o convenceremos com os nossos argumentos e nem sequer o comoveremos.
Em todo o caso, lamento é que o Sr. Ministro se comova cada vez menos - hoje, tivemos essa sensação com a realidade do País - e entenda que são demagógicas todas as observações que procuram referenciar os vencimentos dos titulares de órgãos políticos, tomando como referência essa realidade do País.
Talvez não fosse mau discutirmos um pouco acerca disso.
O Sr. Ministro disse-nos que com esta proposta vai ganhar apenas mais 3000$ do que ganha actualmente.
Talvez fosse interessante - uma vez que o Governo não facultou à Assembleia da República os documentos que em boa altura pedimos - que o Sr. Ministro nos desse o quadro dos vencimentos actuais dos membros do Governo. Por exemplo, o Sr. Ministro vai ganhar mais 3000$, mas quanto ganha agora? O País talvez não saiba e talvez fosse bom esclarecer isso. Quanto ganha o primeiro-ministro? Quais são as despesas de representação? Tem ou não tem despesas especiais de representação? Quais são as des-
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pesas de representação que ganha quando sai para o estrangeiro? Por exemplo, quanto custou ao País a viagem ao Japão?
Vozes do PSD: - O que é que isso tem a ver com isto?
O Orador: - Quais foram as despesas de representação auferidas nessa altura pelos membros do Governo?
Era bom, na verdade, que tornássemos como ponto de referência a questão do salário mínimo nacional. Por exemplo: quantos salários mínimos nacionais ganha o Sr. Ministro Almeida Santos? E o Sr. Primeiro-Ministro? Quantos salários mínimos nacionais ficará a ganhar um deputado em Janeiro do próximo ano se a proposta do Governo vingar?
Talvez se abordarmos estes dados tenhamos um quadro mais rigoroso da situação.
O Sr. Ministro diz também que os titulares dos órgãos de soberania e os deputados são aqueles que menos ganharas em relação ás democracias europeias. E os outros? E os trabalhadores, os funcionários públicos, os membros das Forças Armadas, os membros das forças de segurança? Compare com a vizinha Espanha, por exemplo, e vai ver quais são as diferenças. Portanto, creio que isso é uma boa referência.
Lamento, Sr. Ministro, que V. Ex.ª tenha ironizado - não é que nós não aceitemos a ironia como uma forma adequada de discutir aqui na Assembleia da República e uma forma adequada ao debate parlamentar - a propósito de afirmações de um camarada meu que neste momento não está presente, que é o meu camarada Veiga de Oliveira ...
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Ainda é seu camarada?
O Orador: - ..., deformando as suas declarações e, a partir daí, eregiu um argumento que as pessoas podem tomar a sério contra o meu partido.
Creio que não seria mau, da parte do Sr. Ministro, que houvesse a correcção das afirmações que produziu.
Na verdade, não são as contas do meu partido que estão aqui em apreciação.
O Sr. Malato Correia (PSD): - Havia de ser bonito!
O Orador: - São as contas da República. E em relação às contas da República temos todo o direito de interferir. Não é que as contas do meu partido sejam vedadas, mas o seu direito de interferir nessas contas, Sr. Ministro, é mais contestável.
Por isso mesmo, estamos dispostos a discutir esta questão com a dignidade e a importância que ela reveste, perante um país que está atento numa questão que considera extremamente melindrosa. E, sem abdicar da ironia que é saudável no debate parlamentar, tratemos destas coisas bem a sério porque de coisas muito sérias estamos a tratar,
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: Creio que V. Ex. confirmou hoje que se está transformando num especialista em desdramatização. Qualquer dia havemos de o ouvir dizer face a uma tempestade séria e grave que são uns ventinhos ...
No caso concreto, vem-nos dizer: aprovem estes aumentos não têm de ser franciscanos, o País sofre, há crise de desemprego, não há casas, etc. Enumerou bem os problemas. São esses e outros mais, porventura mais graves. Mas, «votai os aumentos; se já os tivessem votado, não tinham que os votar,» o que é um achado do ponto de vista lógico.
E exibe uma espantosa falta de argumentos, porque o ouvimos dizer coisas do género: «ternos que emparelhar com as democracias!» E as diferenças que nos separam em relação a certos indicadores económicos, Sr. Ministro?« E temos que dar à classe política mais, para que ela exista, não há probidade, não há zelo, não há dignidade sem pingos rendimentos!» Tratemos de os assegurar à custa do erário público.«É preciso acabar com o biscate». Mas, Sr. Ministro Almeida Santos, o estatuto dos deputados que está ensejado não acaba como o biscate. E devo dizer-lhe, fomenta-o! E gravissimamente!
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Biscate, melhor pago aqui e porventura melhor pago no exterior.
E espantosamente V. Ex.ª vem argumentar a criação de uma casta que tem sem dúvida privilégios, mas em relação à qual não temos nenhuma garantia que tivesse obrigações efectivamente aplicáveis.
É chocante medir a diferença entre isto e esses tempos em que era apregoado como virtude descer ou subir uma honesta calçada, a pé ou de eléctrico, e ir para os palácios do poder dessa forma, com a cabeça coberta honestamente.
Há realmente uma diferença grande de filosofia e de perspectiva.
Choca particularmente que o Sr. Ministro não tenha dito uma palavra sobre a moralização dos gastos públicos e do Governo em particular, como já aqui foi perguntado e bem. Neste tempo de crise, choca que não tenha dito uma palavra sequer sobre aquilo de que depende, efectivamente, a Assembleia. 15to é, as condições adequadas de trabalho e, designadamente, a famosa e velha questão das instalações e outras, em relação às quais o Governo tem também meios e responsabilidades que estão por efectivar.
Finalmente e é sobre isto que concretamente o gostaria de questionar, impressionara duas coisas.
O Sr. Ministro faz um pouco o papel de serpente que chega à Assembleia fazendo a clássica cena da tentação e diz: «votai os aumentos.»
Mas os aumentos têm estes dois efeitos, Sr. Ministro: em primeiro lugar, agravam o desprestigio ela Assembleia, que certamente ficará a acompanhar melhor o Governo, que desprestigiado está. Mas isso é grave do ponto de vista do prestígio do Parlamento como tal; em segundo lugar, denigre a imagem pública cio deputado, engrossando o caldo de cultura de não sabermos, bem o quê. Seria bom que o Sr. Ministro, sobre essa matéria, se pronunciasse. Quiçá da revisão da Lei Eleitoral, quiçá da destruição do princípio da
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representação profissional, quiçá da diminuição do número dos deputados?
Não é possível escamotear que, neste momento, fazer o Parlamento aprovar uma lei com este conteúdo tem estas duas consequências e estes dois objectivos. Quando o Governo o vem propor, é bom que diga, precisamente, o que pensa sobre estas duas exactas implicações da sua proposta, que é gravíssima.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro Almeida Santos: V. Ex.ª começou por referir que tudo estaria bem, ou melhor, que tudo já estaria bem se não tivesse sido vetada a anterior proposta da Aliança Democrática visando, exactamente, a questão das remunerações dos deputados.
Nesse aspecto gostaria de dizer ao Sr. Ministro que o que está mal não é esse veto. O que está mal é que também nesta matéria, como noutras, este Governo siga as pisadas que a AD já trilhou.
Mas, todo o raciocínio inicial do Sr. Ministro assenta nesta questão: estabeleceu-se o vértice da pirâmide e agora tudo é fácil e linear.
Penso que talvez o mais importante neste momento, seja dizer isto: como é que se estabeleceu esse vértice da pirâmide? E com que bases?
Para quem esteve, nomeadamente, no grupo de trabalho desta Assembleia que trabalhou na questão das remunerações do Presidente da República sabe perfeitamente que os valores encontrados pela maioria tiveram como base os altos vencimentos de que o Governo já dispõe.
O Sr. João Amaral (PCP): - Essa é que é a questão.
O Orador: - Esta é que é a realidade. Portanto, Sr. Ministro, foram tidos em conta esses altos vencimentos de que o Governo já dispõe. E aqui cabe dizer isto: o Sr. Ministro vem-nos dizer que não são aumentados. Pudera, vem é consolidar aquilo que consegue este esquema do vértice da pirâmide.
Mas, é que para além de elevados, esses vencimentos dos membros do Governo são vencimentos conseguidos, em boa medida, de forma irregular e ilegal.
Relembro ao Sr. Ministro o que dispõe a Lei nº 44/78, nomeadamente no seu artigo 2.º, que se refere claramente à questão das actualizações dos vencimentos dos membros do Governo. Aí diz-se claramente que essas actualizações só entrarão em vigor «quando aprovadas por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei por ela ratificado». Ora, o Sr. Ministro sabe perfeitamente que muitas das actualizações dos vencimentos dos membros do Governo foram feitas à margem do que esta legislação estabelece.
Determinou-se o tal vértice da pirâmide, como lhe chamou o Sr. Ministro, com base nos altos e irregulares vencimentos dos membros do Governo. E agora vêm-se pendurar todos os outros vencimentos, precisamente, nesse vértice da pirâmide. O que ressalta daqui e é importante concluir é que com esta forma habilidosa, mas que na verdade não pode passar, o que o Governo consegue são aumentos extremamente elevados para os deputados. E consegue também, embora o Sr. Ministro diga que não terá grandes aumentos, consolidar aquilo que alcançou de forma irregular e ilegal, que são os vencimentos dos membros do Governo.
Era bom que o Sr. Ministro se referisse a este aspecto.
Vozes do PCP: - Muito bem?
O Sr. (Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.
O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): - Sr. Ministro de Estado, se fosse lícito adoptar o mesmo tom bem-humorado que V. Ex.ª adoptou, começaria por lhe perguntar se finalmente o Governo pôs de lado a percentagem dos 16 % para o aumento dos funcionários públicos e vai agora aplicar ao funcionalismo público a mesma percentagem que propõe para os deputados. Porém, creio que esta matéria é demasiado séria para poder ser tratada em tom jocoso.
Assim, gostaria de saber se o Sr. Ministro tem a noção de que sobre estes aumentos poderia usar o mesmo tom jocoso que usou aqui se estivesse a explicar as razões do Governo a qualquer grupo de cidadãos fora da Assembleia da República.
V. Ex.ª referiu-se ao facto de os políticos portugueses serem os mais mal pagos dos políticos europeus. Quererá isto significar que o Governo vai passar a estabelecer aumentos para todas as camadas da população na base daquilo que se ganha nos países europeus? Ou vai manter uma dualidade de critérios: uns aumentos para os deputados e membros do Governo e outros aumentos para as restantes classes da população?
Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo dizer que me sinto muito honrado pela quantidade e qualidade das perguntas que me foram formuladas. Oxalá as respostas que vou dar estejam ao mesmo nível.
O Sr. Deputado Manuel Queiró referiu-se ao facto de a proposta do CDS, que invoquei, ter diferenças qualitativas e não só quantitativas. 15so é verdade, mas, se somar as quantitativas às qualitativas, verificará que só reforçam o sentido das quantitativas e não o contrário - a minha apreciação foi global e tomou em conta umas e outras.
Perguntou ainda se as propostas de alteração apresentadas pelo Governo tiveram ou não que ver corri posições públicas do CDS na parte em que há uma redução substancial das despesas de representação para os deputados em geral e apenas foram consagradas mais modestas despesas de representação em relação a algumas categorias de deputados que desempenham funções especiais nesta Assembleia e com a condição de as desempenharem em exclusivo. Devo dizer que o Governo não teve conhecimento de nenhuma proposta apresentada pelo CDS nesse sentido. Tivemos,
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sim, uma vaga notícia de que havia problemas internos no CDS relativamente a este assunto, mas considerámo-los como sendo uma questão interna do CDS em relação à qual não tínhamos de nos meter.
Contudo, devo informar que a proposta de redução das despesas de representação surgiu pela primeira vez numa reunião de líderes parlamentares em que estavam presentes os líderes do PS e do PSD e eu próprio, e depois disso essa proposta foi tida por boa pelo Governo. Devo acrescentar que essa proposta foi ao encontro de um estado de espírito que já se desenhava no Governo - aliás, a proposta do Governo data de 22 de Novembro e a proposta do CDS é de 27 de Novembro. Às vezes somos bons a adivinhar, mas nem sempre!
Reflexos na opinião pública, relação dialéctica, irresponsabilidade de quem não os tiver em conta. Como Governo que somos, temos de ter em conta a dialéctica da opinião e temos de respeitar a opinião pública como democratas que somos. Mas ai do governo que, apesar de tomar em conta a vontade do povo português desde logo expressa num acto eleitoral e depois, através de manifestações de vontade de vária ordem de cidadãos organizados em grupo através da imprensa, não tenha vontade própria sobre problemas concretos! Não será um governo, mas sim qualquer coisa atrelada a outra coisa.
O Sr. Deputado também referiu que a explicação deste salto remuneratório era inabsorvível pela opinião pública. Não tenho essa visão pessimista da sensatez do povo português, nem creio que ele vá premiar aquilo que considero uma posição de algum modo demagógica de quem, não podendo deixar de concordar com a razoabilidade desta proposta, tende - ao contrário do que já fez antes - tomar atitudes públicas que vão ao arrepio disso que considero uma sensatez mínima. Em minha opinião não vejo nesse facto ofensa para quem quer que seja!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso disse que faço um falso cotejo entre a proposta do Governo e a da UEDS. Porque é que o Sr. Deputado Lopes Cardoso pôde fazer esta afirmação? A proposta da UEDS é anterior à do Governo e, portanto, como a proposta do Governo tem percentagens mais baixas do que a da UEDS, foi o Governo que desceu e não a UEDS que subiu.
Porém, o que eu quis realçar foi que entre uma proposta e a outra há diferenças, ora para mais, ora para menos, sem me ter pronunciado sobre a relação de anterioridade ou de posterioridade. Em todo 0 caso, quero dizer que a proposta da UEDS relativamente à proposta que foi votada na Assembleia e vetada pelo Sr. Presidente da República, essa, sim, baixa porque lá estavam 80 %, a UEDS subiu para 100 % e o Governo recuperou a proposta-limite dos 80 %.
Também é verdade que quando falo em menos de 5% nas despesas de representação me refiro a um cotejo entre as duas propostas .sem formular um juízo de anterioridade e posterioridade. O que interessa é que a UEDS quer menos 5 % do que o que o Governo quer. É, pois, isto que separa a UEDS do Governo, o que, na verdade, é uma convergência bastante notada.
Creio que foram estes os problemas que me colocou. Portanto, está de pé tudo o que afirmei, embora corrigido no que se refere à relação de anterioridade/posterioridade.
O Sr. Deputado João Amaral reprovou o facto de eu usar uma linguagem que se pode considerar irónica, mas que é sempre construtiva. Devo, pois, dizer-lhe, Sr. Deputado, que é esta a minha maneira de escrever e de falar e que não vale a pena ter esperança que mude, que passe a vir à Assembleia muito sisudo, muito circunspecto, a fazer daqui uma ladainha, um velório. Não sou capaz disso, nem nunca o serei, mesmo quando reconheço que os problemas são extremamente sérios, como é o caso. Só que há maneiras irónicas de tratar problemas sérios: a ironia tem por vezes uma força que a sisudez não tem. Lembro-me de escritores célebres que usaram a ironia e que ainda hoje conseguem ser mais demolidores de alguns aspectos de sociedades que tanto eu como o Sr. Deputado combatemos.
Com uma certa ironia, o Sr. Deputado refere que eu cumprimento o meu estado de pobreza. É verdade que não sou extremamente pobre, também não sou extremamente rico, mas sou moderado. Se tivesse aquilo que me é atribuído era mais feliz do que sou, porque não creio que a riqueza cause a infelicidade a ninguém. Podia ser mais generoso do que sou, e, de algum modo, sou generoso. Não fiz profissão de pobreza. Aliás, devo dizer-lhe que odeio a pobreza. Não odeio os pobres, mas sim a pobreza em si, e quando fiz a minha opção socialista tal facto esteve na base dessa opção.
Porém, vir aqui ironizar com o meu estado de pobreza quando um ministro português ganha 100 000$, desculpar-me-ão, mas isso não é um argumento sério!
Vozes do PCP: - Não ganha 100 000$, ganha muito mais!
O Orador: - Srs. Deputados, o meu ordenado é de 100 000$, mais 30 000$ para despesas de representação. Só que essas são despesas vinculadas porque hão-de partir do princípio que um ministro - para mal dos seus pecados - tem mesmo despesas de representação. Aliás, pela parte que me diz respeito, devo dizer que não gasto ao Estado nem mais um tostão além do que este me paga. É bom que isto fique entendido, porque não faço com que o Estado tenha mais despesas comigo a não ser as que ele me dá para custear as despesas.
O Sr. Deputado João Amaral há-de reconhecer que não há exagero na remuneração de um ministro num país em que, apesar de tudo, há vencimentos da ordem dos 200 000$ a nível dos gestores públicos ou a outros níveis.
Cotejando, sobretudo, o vencimento de um ministro português com o de um ministro de qualquer democracia da Europa, temos de reconhecer que somos de longe os mais modestos e os mais comedidos. Portanto, se há reparos a fazer nessa matéria, eles não serão certamente ao Governo Português.
Quando referi que há maus directores-gerais, o Sr. Deputado perguntou-me se não será por isso que haverá maus ministros. Devo, pois, dizer que admito que muitas pessoas que por vezes têm sido convidadas pelos seus méritos individuais para pertencerem ao Governo ou para serem deputados, se tenham recusado por não serem capazes ou não lerem possibilidades para renunciarem às condições que tem na sua
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vida profissional. Admito que não queiram deixar de ser advogados, engenheiros, gestores públicos, etc., porque têm encargos a que têm de fazer face.
O Sr. Deputado disse ainda que a nossa proposta não é menos gravosa do que a da AD, pois tem valor idêntico. Peço-lhe, pois, que faça um cotejo não em valores absolutos, mas sim em valores de 1980 ou 1981 com valores de hoje. Faça a correcção e, nessa altura, verá qual delas é manifestamente mais gravosa. Contudo, o que está neste momento em causa não é a proposta que foi apresentada pela AD, mas sim a proposta do Governo.
Perguntou-me ainda se a proposta do Governo corresponde ao pedido da comissão no sentido de enviar os estudos que foram feitos. Não tenho conhecimento de nenhum pedido que me tenha sido formulado no sentido de enviar qualquer tipo de estudos que tenham sido realizados. Peço-lhe, pois, que fundamente por escrito esse pedido.
Quanto às notícias publicadas no Expresso, não me posso referir, até porque não sou persona grata, nem tenho acesso privilegiado nem a esse nem a qualquer outro jornal.
O Sr. João Amaral (PCP): - Ora, ora! Ainda no outro dia deu uma entrevista para esse jornal!
O Orador: - Pediram-ma e dei-a!
Quanto ao vício de raciocínio, salário mínimo e vencimentos de deputados, devo dizer que o que fiz foi apenas uma relação, e se o Sr. Deputado a põe em causa, desminta-me se tem elementos para tal. O que referi foi que, mesmo em termos de salário mínimo, o ordenado do deputado português, cotejado com o vencimento dos deputados de qualquer democracia da Europa, está muito abaixo. E dei exemplos: dei 1 para 9 em Espanha, dei 1 para 6,5 em França, poderia dar 1 para 4 ou 5 na Inglaterra, e disse-lhe também que neste momento a relação é de 1 para 4 ou 4,5 e ficará de 1 para 5 ou 5,5. Porém, se em vez de usar o salário mínimo o Sr. Deputado quiser usar o salário médio, que é outro critério, chegará às mesmas conclusões: Portugal é um país que está abaixo de qualquer país europeu.
Não se pode fazer um cotejo em valores absolutos, pois não terá significado, mas quando se coteja um vencimento com salário mínimo e médio, a comparação é perfeitamente legítima e não tem defeito.
O Sr. Deputado também disse que tenho a obrigação de conhecer a situação do País. Creio, pois, que a conheço, menos mal e uma das coisas que conheço na situação do País é uma classe política que não está suficientemente prestigiada, que não está suficientemente profissionalizada e, portanto, é preciso deixar o amadorismo em que temos vivido e passarmos a poder ser políticos ao nível europeu, porque daqui a pouco teremos de começar a conversar diariamente com políticos europeus - aliás, já de certo modo estamos a conversar com eles.
O Sr. Deputado António Capucho pediu-me para lhe refrescar a memória. Não se trata de refrescar a memória, uma vez que não pode ter memória de um facto que não presenciou. Devo, pois, dizer-lhe, Sr. Deputado, que o projecto da AD - de que lhe posso dar os traços gerais, mas creio que talvez não valerá a pena estarmos a entrar nessa questão com profundidade - foi não só proposto pelos dois partidos da AD como votado por esses mesmos dois partidos e pelo PS, depois de termos discutido aspectos pontuais e de termos introduzido nesse projecto algumas correcções. Essa discussão levou-nos a uma maratona até às 4 ou 5 horas da manhã e talvez não tenha havido a serenidade suficiente para termos feito um estudo aprofundado de todas as implicações desse projecto. A realidade foi essa e não vale a pena estarmos a escondê-la.
O Sr. Deputado Carlos Brito disse que os meus argumentos. não tinham novidade. 15so é natural, pois é já a terceira vez que me pronuncio aqui sobre esta matéria e, por conseguinte, a capacidade de originalidade não poderá ser muita. Em todo o caso, creio que não fui tão maçador como quanto se possa pretender. Porém, também pergunto como é que se pode ser original numa matéria que já é tão repetitiva.
O Sr. Deputado afirmou ainda que me comovo cada vez menos com a realidade do País. Ora, isso não é verdade. Aliás, devo dizer que tanto o Sr. Deputado como os restantes membros do partido a que pertence não têm o privilégio nem o exclusivo da comoção. Se V. Ex.ª pretende que é mais bem formado do que eu ou de qualquer outro Sr. Deputado, isso é uma presunção sua, respeito-a, na sua maneira de ser - e devo dizer-lhe que até creio que é uma pessoa bem formada. Porém, não deve duvidar da boa formação dos outros. Se o Sr. Deputado me conhecesse minimamente, sabia que aquilo que disse não se adapta à minha maneira de ser.
Referiu-se ao quadro dos vencimentos actuais, perguntou quanto é que eu ganhava, quanto é que me era dado para despesas de representação e quanto é que custou a viagem ao Japão. Ora, Sr. Deputado, isso consta da lei! Será que um deputado tem legitimidade para perguntar a um membro do Governo aquilo que está numa lei que ele próprio fez? Em todo o caso, vou informá-lo que um ministro ganha 100 000$.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - 104 000$!
O Orador: - Não Sr. Deputado, não ganha 104 000%, mas sim 100 400$, e para despesas de representação tem ainda 30 5005. Se os Srs. Deputados acham que tal quantia é um exagero, um escândalo, esse é o vosso ponto de vista. Estou certo que não será esse o ponto de vista do sensato povo português, que sabe perfeitamente que, apesar de tudo, a classe política é suficientemente importante e até diminuta em número para que aquilo que se lhe atribua não tenha grande expressão económica e possa ter grande expressão política.
Não sei quanto é que custou a viagem ao Japão. Portanto, para V. Ex.ª saber quanto é que custou, terá de fazer um requerimento ao Governo.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já fizemos.
O Orador: - Contudo, no mundo de hoje e num país que está a procurar relacionar-se, abrir mercados e perspectivas por esse mundo fora, é um pouco provinciano que se julgue que é poupando na farinha e gastando no farelo que se resolvem os problemas nacionais.
O Sr. Deputado pediu-me ainda para fazer uma comparação com a vizinha Espanha em termos de re-
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muneração dos deputados. É, pois, com muito gosto que a farei, na medida em que eles estão na relação de 1 para 9 no que diz respeito ao salário mínimo. Em . Espanha, um deputado ganha cerca de 4 vezes mais em valores nominais do que ganha um deputado português.
Disse também que eu tinha deformado as declarações do ex-deputado Veiga de Oliveira. Se realmente eu tivesse feito isso ficaria muito penalizado, na medida em que - como todos sabem, pois afirmei-o aqui - tenho grande amizade e estima por esse ex-deputado, ex-ministro, meu companheiro de ministério e em momentos bem mais difíceis do que este.
O que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira disse foi o seguinte:
Todos sabem, porque é público, que qualquer que seja o subsídio que votem e outras condições materiais, nós não auferiremos delas. Todos sabem, porque é público, que nós aqui nesta bancada somos pagos por forma a não sermos prejudicados em ralação a outra profissão anterior ... Não melhoramos nem pioramos pelo facto de sermos deputados - é uma condição que impomos a nós próprios -, e o excedente, que é razoável mesmo hoje em face destas condições que impomos a nós próprios, destina-se à actividade geral do partido, ao esclarecimento, à propaganda, ao proselitismo político que, naturalmente, é uma actividade justa e politicamente legítima para qualquer partido.
O Sr. Deputado José Magalhães disse que sou um especialista em desdramatização. Muito obrigado pelo elogio! Eu poderia dizer que o Sr. Deputado é um especialista em velórios ...
Risos.
... poderia dizer que é uma talentosíssima carpideira ...
Risos.
... etc. mas não digo nada disso!
O Sr. Deputado disse que eu não tinha argumentos e o exemplo apresentou foi o argumento que invoquei no sentido de que deveremos «emparelhar» com as democracias europeias. Compreendo e respeito que V. Ex.ª não tenha esse propósito nem essa preocupação. No entanto, eu tenho e, por essa razão, disse o que disse.
V. Ex.ª também disse que o Estatuto não só não evita o «biscate» como o fomenta. Rendo sempre homenagens à sua inteligência e às suas qualidades de grande deputado - que já é e certamente continuará a ser cada vez mais -, mas não compreendi o que e que queria referir. Quereria dizer que quanto mais ganha um deputado, que quanto mais segura a sua independência, que quanto mais ele é dignificado e responsabilizado, porque há medidas no Estatuto não remuneratório para o obrigar ou vincular a uma presença mais assídua, etc. porque há medidas correctivas de alguns erros que todos temos cometido - e eu fui deputado e tornarei a sê-lo se o Governo não durar tanto como creio que vai durar -, que isso não elimina o «biscate», o part-time? Se é essa a sua lógica, então a minha não tem nada a ver com a do Sr. Deputado José Magalhães.
V. Ex.ª refere-se ainda à criação de uma «casta». Porém, eu até afastei o designativo de classe política, quanto mais o designativo de «casta»! 15so é pôr-me na boca aquilo que expressamente não quis dizer e até afastei na sua versão mais moderada.
Depois disse que é subir a calçada a pés descalços ou quase descalços para os palácios do Poder. Sr. Deputado, isso é uma visão idílica da República de 1910, que por acaso até falhou. Se calhar, se andassem de automóvel e se tivessem imposto mais algum prestígio ao povo português em termos de ostensividade e respeitabilidade ...Eu também admiro os «bons barbichas» da 1 República pela maneira como enfrentavam as dificuldades económicas de então.
Devo, pois, dizer que creio que esta proposta do Governo, não estando provavelmente ao nível do que ganharia um ministro da 1.ª República, se fizer a correcção das moedas, Sr. Deputado, provavelmente terá alguma surpresa.
Quanto à moralização de gastos públicos, deve dizer que o Governo tem essa preocupação. É certo que não teve grande êxito nesse domínio, mas isso já foi dito e reconhecido pelo Sr. Primeiro-Ministro e por outros ministros. Portanto, na próxima proposta do Orçamento vamos insistir nesse sentido, pois temos essa preocupação e lamentamos não termos podido ir mais longe do que já fomos nesse domínio. Há alguma coisa a fazer nesse campo e reconheço que é nele onde se podem conseguir economias significativas. Não é poupando aquilo que se deve à classe política, constituída por umas centenas escassas de pessoas, não é tirando-lhes aquilo a que legitimamente têm direito que possivelmente se vão equilibrar as despesas públicas; elo contrário, desequilibrar-se-á a sua função e é mais importante ela poder ser exercida em melhores condições do que em péssimas, tal como hoje acontece.
Depois, o Sr. Deputado chamou-me «serpente» dizendo que agravo o desprestígio da Assembleia da República. Sr. Deputado, não se especialize em adjectivos fortes porque se me conhece um pouco -- e eu não vou qualificar esse seu aspecto -, sabe que nunca rastejei nem rastejo.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Disse também que a proposta denigre a imagem pública do deputado. Sinceramente que não entendo isso! Aliás, creio que o que disse é pura demagogia, são palavras, não são factos, não é verdade e, do meu ponto de vista - e peço-lhe desculpa se o vou magoar -, não é uma maneira séria de argumentar.
Perguntou-me pela Lei Eleitoral e devo dizer-lhe que oportunamente ela será discutida. Portanto, não me peça para lhe dizer qual vai ser a Lei Eleitoral, porque também não sei.
O Sr. Deputado Joaquim Miranda disse que a base foram os altos vencimentos de que o Governo dispõe. Não, Sr. Deputado, desculpar-me-á que lhe diga, mas a base foi uma coisa chamada vértice de uma pirâmide para o vencimento do Presidente da República. Não confunda! O Governo encontra-se a meio dessa pirâmide, pois antes dele está o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República, o Primeiro-Ministro - com algum destaque que, aliás, merece - e o Vice-Primeiro-Ministro. Só depois é que
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vem o Governo até ao nível ligeiramente acima dos deputados - e aí talvez a proposta do Governo possa pecar, pois, apesar de tudo, os deputados são 250 e os membros do Governo são algo menos. Aliás, devo dizer que aquilo que se propõe agora é, como disse, menos do que aquilo que hoje ganharia um deputado se tivesse vingado a proposta da AD apresentada em 1980.
Também já fiz a demonstração de que só por manifesto exagero e falta de realismo é que se considera que um ministro em Portugal ganha muito.
Depois, refere-se à forma irregular e ilegal como foram utilizados os vencimentos do Governo. Porém, não entendi o que queria dizer com isso e terá de fazer o favor de me esclarecer porque o que acontece é que as actualizações foram feitas no valor de 27 600$ para 40 000$ através de uma lei da Assembleia da República onde se prevê a actualização anual ao mesmo nível da actualização dos vencimentos do funcionalismo público. Portanto, onde é que está a ilegalidade? Se agora se legislar de outro modo - e só a Assembleia o pode fazer - será uma lei a corrigir outra lei. Onde é que está a ilegalidade disto? Confesso que não pude acompanhá-lo nesse seu raciocínio que deve ser tão subtil que - se calhar já estou um pouco desactualizado em matéria de interpretação de leis - não pude alcançar.
O Sr. Deputado Raul de Castro pergunta se o Governo pôs de lado a percentagem dos 16% para o aumento dos funcionários públicos. Cada vez que se aumenta 1% na percentagem correctiva dos funcionários públicos, o erário público tem de dispor de cerca de 3 200 000 contos.
Não fiz o cálculo rigoroso, mas creio que os vencimentos que vêm propostos na proposta do Governo nunca ultrapassarão uma verba anual entre 80 000 contos e 100 000 contos. Estamos a discutir realidades que não têm comparação possível e, portanto, não vale a pena fazer demagogia verbal!
Espero que o Sr. Deputado não confunda jocosidade com ironia. A ironia reivindico-a, mas a jocosidade não! Fui sério na maneira irónica de colocar as questões e não me digam que, apesar de tudo, não é mais agradável estarmos a discutir com alguma ironia do que com aquela rotundidade e obtusidade de uma carpideira dizendo que está tudo mal, que está desgraçada, etc. Ora, isso nem sequer é construtivo e creio que o optimismo também tem um papel na política.
Quanto a saber se vamos aumentar todas as camadas da população ao nível dos europeus, já referi que mesmo depois desta correcção ainda ficamos abaixo dos níveis europeus. Também já disse que a classe política é a classe política e o resto do País é o resto do País.
O Governo fará o possível para governar melhor do que até hoje, e certamente que os Srs. Deputados irão fazer o possível por prestigiarem cada vez mais esta instituição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Porém, não vale a pena partir do princípio de que esta Assembleia se prestigiará à medida que for sendo cada vez mais pobre. Tal facto não é verdade, e um deputado não é um frade capuchinho nem calçou sandálias para entrar num convento franciscano.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para protestar os Srs. Deputados Manuel Queiró, Lopes Cardoso, João Amaral, Carlos Brito e José Magalhães.
Portanto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Sr. Ministro, à guisa de protesto, gostaria de formular alguns comentários suscitados pelas respostas de V. Ex.ª e até pelo pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Capucho.
Tanto o Sr. Deputado António Capucho como o Sr. Ministro se mostraram preocupados com aquilo que foi a posição dos partidos em 1981, e disseram que nessa altura o CDS apoiava uma versão do estatuto remuneratório que implicava a equivalência do deputado ao secretário de Estado e que hoje nem sequer apoiam uma versão que o coloca abaixo do subsecretário de Estado. Daí essa preocupação sentida pela incoerência do CDS.
Visto também não ser Deputado em 1981, tal como o Sr. Deputado António Capucho, e daí a minha aceitação passiva da informação há pouco dada pelo Sr. Ministro no sentido de que o PS se teria pronunciado favoravelmente apesar de na primeira instância ter sido corrigida com algumas hesitações, mas depois apoiou essa versão do estatuto com as modificações na especialidade.
Porém, tenho em meu poder uma fotocópia do Diário da Assembleia, em que na votação final global o projecto foi aprovado com os votos a favor do PSD, CDS e PPM e com votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UEDS e com abstenções do PS e da ASDI. Ora, se o PSD votou a favor, como é que ele aceita agora defender uma posição substancialmente diferente, visto que antes aprovava a equivalência do deputado a secretário de Estado, mas hoje aprova uma versão que faz equivaler a remuneração do deputado a bem abaixo de subsecretário de Estado? O PSD aceita isso porque também é sensível aos argumentos da oportunidade política, porque sabe que não é apenas o fundo da questão que está em causa; porque sabe que o momento em que as questões são colocadas e o enquadramento geral do País é importante. Só que nós, Sr. Deputado António Capucho, ainda fizemos uma extensão superior desse juízo de oportunidade política.
Risos do PSD.
Na verdade, não aceitamos o aumento percentual em 1985 que decorre do estatuto que os Srs. Deputados querem aprovar.
O Sr. Ministro disse - e bem - que as comparações em absoluto não fazem sentido, tias as comparações relativas fazem-no. É por isso que nós dizemos que não basta considerar em absoluto aquilo que é justo, porventura, atribuir ao deputado. A comparação relativa do que ele ganha e, face à opinião pública, propor um aumento percentual inabsorvível, já é unia observação pertinente que o meu partido faz.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs., Deputados, Sr. Ministro de Estado: Muito rapidamente, queria começar por lhe dizer que se eu disse que o Sr. Ministro tinha feito um cotejo falso não 0 queria dizer, mas sim, que tinha feito um cotejo hábil.
Mas, vamos deixar de lado a questão dos 5º70, pois ela revela, no fundo, como o Sr. Ministro disse, uma grande convergência. Muito gostaria a UEDS que em termos de política global as nossas divergências em relação ao Governo se ficassem, tão-só, na ordem dos 5%. Infelizmente assim não acontece - e digo infelizmente pelo menos para nós.
Já agora, para que tudo fique claro, diz-me o Sr. Ministro que acabámos por ir mais longe no subsídio do que se tinha ido na proposta que veio a ser aprovada aqui e depois vetada pelo Sr. Presidente da República e que fixava um tecto de 80%, enquanto que nós admitíamos agora um tecto de 100%. Volto a ,dizer que nos congratulamos pela perspicácia do Governo ao propor apenas 80% - e terá o nosso voto -, mas devo dizer-lhe que aquilo que foi aqui aprovado era bastante mais gravoso, porque permitia por exemplo que ao fim de 3 legislaturas os deputados passassem imediatamente a auferir duma subvenção vitalícia de 20%. De qualquer modo estamos muito longe daquilo que a UEDS propôs.
Depois, o Sr. Ministro deixou cair - e eu não faço questão, penso que teremos ocasião de discutir isso na especialidade - uma questão que tinha sido suscitada por V. Ex.ª a que é o problema da localização apropriada ou não do Provedor de Justiça neste diploma. Por arrastamento, a questão que eu suscito é a de ser este ou não o lugar próprio para estarem integrados os juízes do Tribunal Constitucional e, inclusive, se fazerem referências à magistratura judicial.
Por outro lado, ficaram também em claro muitas das outras diferenças que assinalei entre a proposta de lei e aquilo que são as nossas propostas de alteração. De qualquer modo, penso que são divergências ultrapassáveis e, como tal, não são de ordem a levarmos a votar contra a proposta do Governo. Já aqui o disse, não votaremos contra. Pelo contrário, teremos ocasião de na comissão da especialidade debater todas estas questões.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: O Sr. Ministro de Estado deu um esclarecimento, uma resposta directa a todas as perguntas que lhe foram feitas e deve-se-lhe homenagem por isso.
Contudo, portou-se nesse contexto como o actor Peter Sellers se portava no filme Goodbye, Mr. Chance: falou com seriedade, era um de seriedade; só que estava a falar de jardinagem e nós estamos a falar de uma coisa diferente, Sr. Ministro. V. Ex. esqueceu aquilo de que estamos a falar - falou de jardinagem - e não falou do que estávamos a falar. Quer exemplos? O Sr. Ministro disse: os ministros ganham pobremente 100 contos...
Vozes do PCP: - Coitados!
O Orador: - ... e esqueceu que ganhavam o dinheiro que ganham a título de representação e com isenção fiscal. Sr. Ministro, a quanto é que corresponderia o vencimento de 104 contos, mais despesas de representação, se V. Ex.ª tivesse que pagar imposto profissional?
Por outro lado, o Sr. Ministro disse com ar cândido que a proposta de lei n.º 88/III não é igual à proposta da AD. De facto, não é! Mas aí estamos na jardinagem. Vamos aos factos. Essa proposta é igual ao decreto aprovado pela Assembleia, ou melhor, é equivalente a esse decreto que resultou da proposta da AD. Quanto a isto, Sr. Ministro, já estamos a falar numa linguagem relativa à realidade.
Outro ponto, que é o que concerne aos estudos, disse o Sr. Ministro que não recebeu o ofício. O Sr. Ministro não esteve aqui no inicio dos trabalhos? Pois não, se estivesse, decerto ouviria o Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias dizer que remeteu ao Governo, no dia 7 de Novembro, o oficio. Se o Sr. Ministro não recebeu nós não temos culpa disso. Simplesmente, não vamos tratar ou negociar com o Governo na base daquilo que o Sr. Ministro recebe ou vê em cima da sua secretária. Assim não pode ser. O Governo recebeu esse oficio, pois ele foi enviado pela Comissão. Mesmo que não tivesse sido enviado, mesmo que alguma questão se pusesse em relação a isso, se o Governo fez uma proposta na base de um estudo, por que é que nós, deputados, que temos que apreciar, não temos direito a esse estudo?
Quarta questão de jardinagem: O Sr. Ministro fala de vícios de raciocínio. Diz que existem vícios de raciocínio. A questão que se põe, a questão central, Sr. Ministro, não é a de comparar o salário mínimo nacional - que é muito diferente, é de 1 para 10 em países da Europa - com o salário dos deputados. A questão que se põe é de comparar o Produto Nacional Bruto per capita e a diferente situação dos países. E o que eu lhe pergunto neste quadro, Sr. Ministro, é se se chamar esse indicador que resultados vai ter. Nomeadamente, no que toca também a outro indicador, que é o da percentagem em relação às receitas fiscais do Estado relativas às das despesas de representação seria interessante comparar. O que é que o Governo acha mais importante: apresentar esta proposta de lei de aumento dos deputados e de consolidação dos aumentos ilegais que o Governo tem vindo a fazer ou apresentar as 16 medidas que o Sr. Ministro de Estado aqui anunciou há mais de 6 meses, relativas aos salários em atraso - das quais muitas eram da competência desta Assembleia - e que continuam na gaveta à espera da solução protelada de problemas reais do povo português?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro Almeida Santos: Quero fazer um protesto muito breve.
Começo por lhe agradecer o facto de ter reposto a verdade ao ler as declarações do meu camarada Veiga de Oliveira. Quanto a isso não temos nada a objectar. Essa e a verdade e não aquilo que o Sr. Ministro anteriormente tinha sugerido nas considerações com que precedeu as afirmações que atribuiu ao meu camarada Veiga de Oliveira.
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O Sr. Ministro falou depois de provincianismo, de demagogia, etc. Demagogia, Sr. Ministro, é querer apresentar esta consolidação dos vencimentos altos - altos para o nosso meio, altos para Portugal - dos membros do Governo. Na verdade, um aumento de 20 ou 25 contos corresponde àquilo que é o vencimento de muita gente do nosso país, mesmo superior ao salário médio dos portugueses. É demagogia querer apresentar o aumento dos vencimentos dos deputados como um factor de progresso do País, de desenvolvimento nacional. 15to é que é demagogia, Sr. Ministro.
Ao mesmo tempo considera que são muito razoáveis todos os sacrifícios que se exigem aos trabalhadores e às demais camadas da população. É perfeitamente justificável na opinião do Sr. Ministro que os ministros e os deputados ganhem mais e que todos os outros se sacrifiquem cada vez mais.
Foi com esta filosofia que nós chegámos onde chegámos, é assim que os portugueses estão a viver cada vez pior. Foi com esta filosofia que chegámos ao desastre para que este Governo arrastou o Pais. Daqui, Sr. Ministro não sai e isto é a prova provada, de que com este Governo os portugueses não vão lá e não terão a melhoria das condições de vida que desejam.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: Acusei-o de banalizar e de desdramatizar - ou de tentar fazê-lo e isso é grave neste momento, e pode vir a ser dramático - o impacto dos aumentos que são propostos pelo Governo para os titulares dos cargos políticos no prestígio da Assembleia da República. O Sr. Ministro replicou-me, com alguma graça, que nesta bancada temos um pouco o hábito de gatos pingados, adoramos velórios. Devo dizer-lhe que isso é ironia excessiva. A maioria, a coligação, acaba de aprovar um Regimento que, esse sim, pode converter o trabalho da Assembleia num verdadeiro velório.
O Sr. João Amaral: - Muito bem!
O Orador: - 15to é gravíssimo e V. Ex.ª não pode permitir-se brincar com coisas destas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Devo dizer, de passagem, que teremos muito gosto em ser gatos pingados e não deixaremos de comparecer ao velório do Governo de V. Ex.ª...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... , que esperamos tenha lugar em breve. 15so, contudo, é outra questão.
Quanto às questões que lhe tínhamos colocado, o Sr. Ministro voltou a insistir - tem esse direito e naturalmente não se pode ter sempre imaginação - em alguns argumentos que são um pouco chocantes. Com efeito, é chocante ouvir um governante dizer que há indignação popular, mas que isso são resmunguices do povo e que ele acaba por se habituar, que os aumentos são sensatos, etc., quando no País a indignação é verdadeira, é real e será cada vez maior, Sr. Ministro.
Por outro lado, ouvi-o dizer que isto é bom para garantir uma classe política profissionalizada, não amadora, em full-time. O estatuto que acaba de ser proposto pelo partido de V. Ex.ª garante que as incompatibilidades que quer estabelecer só o venham a ser para a próxima legislatura. De momento permite as acumulações todas que são possíveis. É possível .ser gestor, director de institutos públicos, etc. e deputado. 15to, e ter um aumento inteirinho que VV. Ex.ªs pretendem atribuir ao Parlamento, ao mesmo tempo que as regras sobre quorum e a votação à hora do chá das 5 permita que as pessoas passem por aqui para votar apenas, sem participar nos trabalhos, sem que se garantam simultaneamente mecanismos de fiscalização e de efectivação do cumprimento dos deveres dos deputados.
15to não é ficção, nem gosto meu pela ironia e pela caricatura, é triste e negramente a verdade. Se a classifico de dramática, a palavra está mesmo certa, é-o e ainda pode ser pior.
Concluo, portanto, Sr. Ministro, por lembrar-lhe que faltam as respostas às 2 perguntas que lhe formulei.
A imagem da serpente não tinha, naturalmente, o sentido que lhe imputou. Tinha o sentido da tentação. Devo dizer que retiro a imagem, porque não se pode tentar quem arde por comer a maçã, como é o caso da coligação que, lamentavelmente, aqui se senta.
O que fica de pé são as perguntas que eu lhe fiz. Há exemplos históricos de governos que em tempos de crise se dirigem aos parlamentos e propuseram baixas de salários, para além das baixas resultantes da inflação. Se isso foi, por vezes, um gesto simbólico, um gesto demagógico, o gesto que o Governo que V. Ex.ª representa vem tomar é muito pior, porque é a assumpção faraónica e arrogante de atamentos que terão desastrosas consequências, se forem para a frente, o que fazemos votos não aconteça.
Vozes do PCP: - Muito bem.
O Sr. Presidente: - Visto não haver mais protestos tem a palavra, se desejar responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tratarei propriamente de contra protestar, até porque em parte as intervenções dos Srs. Deputados, a meu ver, só formalmente revestiram a natureza do protesto.
Foi o caso, por exemplo, do Sr. Deputado Manuel Queiró, que se alguma coisa protestou pareceu-me que foi contra o Sr. Deputado António Capucho, da bancada do PSD, e não contra mim. Deu-me, no entanto, uma novidade que eu lhe agradeço e corrijo-me, pois tinha a ideia de que o PS tinha acabado por votar a favor, mas lembro-me agora que, efectivamente, a abstenção foi, na altura - porque posto o problema de que se votássemos contra haveria uma retirada da proposta e o PS não quis inviabilizá-la na sua última formulação - de certo modo, uma cor-
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responsabilização para com o projecto. Muito obrigado, pois, por me ter avivado a memória.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Não tem de agradecer, Sr. Ministro.
O Orador: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso disse que o cotejo não foi falso e melhorou um pouco no seu comentário: disse agora que foi apenas hábil entre aspas com certeza, no sentido de pouco malabar. Mas não o foi, pois eu dei números, disse concretamente onde é que subia os 5 % e onde é que descia os 5 %. Também não tenho grandes dúvidas de que esta percentagem não é a da divergência da UEDS em relação a este Governo em matéria de política global. Mas diria que, apesar de tudo, não é tão grande como às vezes o Sr. Presidente pretende fazer crer.
Disse-me ainda que era pior do que a proposta da AD. Devo dizer-lhe que a proposta da AD começava por dizer que ao fim de 3 legislaturas, no subsídio que estipulava - e chamava-lhe salvo erro subsídio de risco - se atingia 20% e depois 50% por cada ano mais. 15to veio a ser corrigido, quanto às 3 legislaturas; não 25%, mas 20% ...
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Ministro, a proposta ia mais longe. Ao fim de 3 anos eram 25%, cada ano mais 5% e ia até 100%.
O Orador: - É o que eu estou a dizer, Sr. Deputado. Começava por 3 anos, sendo que no 3.º ano eram 25%, por cada ano mais 5% e ao fim de 18 anos atingia-se 100%. Mas, na sua proposta, ao fim de 18 anos atingem-se 100% e na do Governo ao fim de 20 anos atingem-se 80%. É uma pequena diferença, mas em todo o caso faça favor de a creditar ao Governo.
O Sr. Deputado João Amaral invocou Peter Sellers, um grande actor. Quem me dera ter o seu talento.
O Sr. João Amaral (PCP): - Está quase!
O Orador: - Como jardineiro não sou lá grande coisa, mas também gostava de saber jardinagem, pois que a arte de jardinar, de cultivar a beleza, também tem que ver alguma coisa com a oratória política.
De todo o modo, não fui eu que disse que os ministros ganham pobremente. Eu não disse isso! O Sr. Deputado é que disse que os ministros, coitadinhos, ganham pobremente. O Sr. Deputado disse que eu era um pobre! Eu respondi-lhe que não sou tão pobre como diz, mas também não sou tão rico como me julga. É verdade que não se paga imposto profissional, mas paga-se imposto complementar, privilégio do qual também os funcionários públicos gozam.
Quanto à proposta ser igual ao decreto da Assembleia da República, não é verdade. O decreto da Assembleia da República, apesar de tudo, mesmo na sua formulação final e actualizado aos tempos de hoje seria manifestamente mais gravoso do que esta proposta.
O Sr. João Amaral (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - A questão que se coloca em relação ao decreto da Assembleia da República de 1981 é uma questão de fazer contas. O decreto previu para os deputados 70 % do vencimento do Presidente da Assembleia da República, que era 10 % superior ao vencimento do primeiro-ministro. Se o Sr. Ministro de Estado fizer as contas chega a um valor igual ao que é proposto por V. Ex.ª ou pelo Governo na proposta, ou seja, um valor de 50% do vencimento do Presidente da República. Sr. Ministro, se quiser uma máquina de calcular e se quiser que façamos agora e aqui as contas poderá certificar-se disso. Posso garantir-lhe que esse é o valor a construir a partir da proposta do Governo.
O Orador: - Faça as contas e vai ver que tem uma surpresa. Em primeiro lugar, não se tratava nada de vencimento em relação ao primeiro-ministro. Tratava-se de o Presidente da Assembleia da República ter 1,1%...
O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!
O Orador: - ... em relação ao vencimento do primeiro-ministro, e o deputado tinha 70% do subsídio do Presidente da Assembleia da República ...
O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!
O Orador: - ... e não do primeiro-ministro, porque se entendeu que tal subsídio devia ser aferido por um elemento do próprio Parlamento e não por um elemento do Governo. No entanto, tivemos a preocupação de adoptar o critério da equiparação e isso foi tornado muito claro, porque o que se discutiu foi o critério nominal e não o critério real ao vencimento de um secretário de Estado. Deste modo encontrou-se a percentagem que estaria mais próxima do vencimento de um secretário de Estado e encontrou-se a percentagem redonda de 70%. Face ao cálculo do que ganharia hoje um secretário de Estado, Sr. Deputado, e veja quanto é que seria.
Quanto ao resto já se viu que é na verdade mais gravosa.
Tenho a dizer que não recebi ofício nenhum ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - É inacreditável!
O Orador: - É um facto, não lhe posso dizer que o recebi, a culpa será dos meus serviços, será de alguém, não sei, mas estou disposto a assumir a culpa, sendo que a verdade é que não conheço esse oficio, é a primeira vez que oiço falar dele. Não estava aqui no início da sessão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Para que serve um secretário de Estado?
O Orador: - Serve para muita coisa e inclusivamente para cometer alguns erros, como o Sr. Deputado e todos nós.
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Depois, pede-me uma coisa perfeitamente esquisita, ou seja, que faça o cotejo com o Produto Nacional Bruto. Quer dizer, o Sr. Deputado que, quando se quer saber se um vencimento de uma entidade de um país é maior ou menor que o de outro país, vai fazer-se o cotejo em percentagem com o Produto Nacional Bruto. Nunca tinha ouvido, é uma novidade, fica consagrada no Diário da Assembleia da República, talvez haja quem esteja interessado nisso.
Risos do PSD.
O Sr. João Amaral (PCP): - É o rendimento per capita, Sr. Ministro, é a divisão do Produto Nacional Bruto pelo número de habitantes!
O Orador: - Se estamos no domínio dos salários vamos para outros domínios para quê, Sr. Deputado do? Não vale a pena estar a confundir-nos o entendimento.
O Sr. Deputado Carlos Brito achou certa a minha transcrição, a minha referência ao que tinha dito o Sr. Deputado e meu querido amigo Veiga de Oliveira. Depois, apesar disso e não sei porquê, criticou-me. Quando eu esperava que me dissesse que me pedia desculpa porque, no fim de contas, eu nada tinha adulterado, manteve-me a crítica. Só pode ser pelo facto de ter feito uma ironia - quiçá má, quiçá de mau gosto - ao dizer que os Srs. Deputados caem na contradição de achar que o dinheiro é mais bem administrado pelo ministro das Finanças do que pelo vosso próprio partido. Mas isso é óbvio. Foi só ironia o que eu fiz, mas o que eu disse foi rigorosamente afirmado aqui pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira e agora mesmo confirmado pelo Sr. Deputado. Eu bati certo, não diga o contrário.
O salário médio neste país são 37 500$. Um ministro ganha 3 vezes o salário médio deste país e isto fica 1/3 abaixo das médias da generalidade dos países das democracias europeias.
Vozes do PCP: - É isso e os salários em atraso.
O Orador: - Uma vez mais remeto para elas - é uma mania que eu tenho, mas os Srs. Deputados comunistas perdoar-me-ão.
O Sr. Deputado José Magalhães andou à volta da dramatização e disse que a minha ironia é excessiva. Desculpará, mas a dosagem pertence-me fazê-la, pois ainda não chegámos à censura.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Está no Regimento!
O Orador: - Quanto ao velório do Governo, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que não tenho dúvidas nenhumas que nesse dia o Sr. não faria de carpideira mas, pelo contrário, tocaria bombos. Contudo, também lhe digo uma coisa. O Sr. Deputado anda há tanto tempo a desejar a queda do Governo, a anunciá-la há tanto tempo e para todas as semanas, que penso que quando ela finalmente acontecer - e se calhar é mais tarde do que o Sr. Deputado deseja - acaba por ser tinia frustração, porque já lhe não dará goro nenhum
Aplausos do PS e do PSD.
Eu pediria aos Srs. Deputados que me dessem licença, peço que compreendam, mas tenho de me ausentar. Não é por menos respeito para convosco, não é por menos interesse pelo diálogo que com certeza vão travar. Mas fica aqui o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares a substituir-me e com certeza intervirá com mais capacidade e inteligência do que eu.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. (Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Quero sugerir ao Sr. Ministro de Estado que - independentemente de se ir embora, e compreendemos as razões que terá desse instruções aos seus serviços para sei distribuído aos grupos parlamentares o estudo que foi feito pelo Governo para basear a proposta que apresentou, visto que mostrou uma intensa disponibilidade e que o único argumento que encontrou para justificar a sua não distribuição foi o de não ter tido conhecimento do ofício da Comissão.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro tem a palavra, se desejar.
O Sr. Ministro: - É só para dizer que eu não sou responsável pelas afirmações que faz o Expresso. Eu não disse que o Expresso falou verdade relativamente a qualquer estudo em concreto. Há eventualmente alguns elementos e tenho muito gosto em fornecer aqueles que tenho. Provavelmente não terá o gosto de ver um estudo com muitas folhas e muitas pastas. Não será necessário a meu ver, para fazer as ligeiríssimas correcções que foram feitas. Não é preciso torturarmo-nos muito para chegar às conclusões que chegámos.
Como já disse, não sou responsável pelas afirmações do Expresso, embora o Expresso seja jornal relativamente sério.
O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei nº 400/III, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Não fora poder ser considerada pelo Sr. Presidente tinia inaceitável violação das regras regimentais, começaria por dizer a V. Ex.ª que a minha intervenção, embora sob a forma e utilizando o pretexto regimental de apresentação do diploma, se destina não tanto a explicitar aqui o seu conteúdo, mas sobretudo a tornar clara a razão política que o justifica e o fundamenta.
Trata-se, com efeito, de um diploma que, pela própria natureza das matérias que contempla, é seguramente do conhecimento de todos os Srs. Deputados. Provou-se, aliás, já durante este debate, que o Governo também o conhece.
Trata-se de um diploma cujos princípios inspiradores estão claramente expressos no seu preâmbulo e cuja elaboração é produto de uma reflexão que foi partilhada em muitos aspectos e ao longo de muitos meses, inclusive, com deputados de várias outras ban-
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cadas. O projecto é conhecido e não carece assim de ser detalhadamente apresentado.
Algumas dúvidas, porém, que dentro e fora deste Parlamento se levantaram, levam-me a abordar agora o que julgo ser o problema político fundamental que está subjacente à tomada de posição do meu partido e que este projecto exprime.
Desejaria, portanto, começar por declarar, que é sem qualquer tipo de preocupações que omito todas as outras referências. Para nós, CDS, é adquirida a certeza de que no presente momento há significativas anomalias no estatuto dos deputados e na regulamentação da remuneração dos titulares dos cargos políticos. Não apenas temos esta ideia clara, como entendemos também que é urgente corrigir essas anomalias. É igualmente adquirido por parte do meu partido que a persistência da actual situação é um dos factores de ineficácia da Assembleia da República como órgão de soberania, de degradação da dignidade dos seus membros e, por isso mesmo, constitui um motivo de enfraquecimento do regime, que nela tem um dos seus pilares fundamentais. 2, portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, diametralmente diferente a nossa perspectiva daquela já expressa pelo PCP.
E não será necessário tornar mais evidente essa discordância, até porque ela assenta em concepções substancialmente diversas do que é a própria democracia e de qual é, nela, o papel do Parlamento.
Por isso, pela nossa parte, recusamos transformar este debate numa demagógica discussão, que apenas contribuiria para debilitar as instituições democráticas e servir os interesses daqueles que continuam a sonhar subvertê-las e um dia substituí-las.
Designadamente em matéria do estatuto remuneratório dos deputados, das posições do Governo e dos partidos que constituem a actual maioria parlamentar o que nos separa? Aparentemente pouco, na realidade quase tudo.
A questão é para nós muito simples, mas essencial e politicamente muito relevante. O Governo entende que a grave crise económica que o País atravessa, com as suas repercussões sociais evidentes, não deve condicionar os reajustamentos a que é necessário proceder. E com essa atitude não julga prejudicados os objectivos gerais de dignificação parlamentar que com ela se propõe atingir.
O CDS entende que a situação que atravessamos é de tal modo grave que as injustiças sociais que dela decorrem são tão sensíveis e palpáveis, que o primeiro acto de dignificação deste Parlamento tem de ser o de assumir a própria crise, solidarizando-se com ela e com as suas consequências e recusar para si o que de antemão sabe que os outros portugueses não vão poder obter nos tempos mais próximos.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Para o Governo é indiferente, ou pelo menos pouco relevante, que a correcção das anomalias se faça com incidências orçamentais significativas, precisamente no ano em que o Pais atinge o maior défice da sua história e em que os salários reais da maioria dos portugueses atingem a quota mais baixa da última década.
Para os deputados democratas-cristãos esta circunstância não pode deixar de ser profundamente ponderada. É, aliás, uma atitude que os nossos princípios impõem e que temos coerentemente tentado levar à prática em todas as nossas intervenções parlamentares e políticas em que consideramos que o Estado deve dar o exemplo de austeridade e em que consideramos que o controle das despesas públicas tem de continuar a ser a primeira linha do nosso combate pela resolução dos problemas nacionais.
Para o Governo este é, porventura, um mero problema administrativo ou financeiro e, no máximo, um pequeno problema político. Para o CDS este é, em substância, um problema moral. Por isso, o CDS diz sim à correcção das anomalias existentes e diz não ao aumento imediato das remuneração que o Governo propõe. Por isso, o CDS diz sim a um projecto que com realismo adequa a urgente necessidade de alterar estruturas anquilosantes e de vencer preconceitos passadistas às realidades concretas no País que hoje somos. Diz não à proposta do Governo, que cavaria ainda mais o fosso existente entre o país real e o país político. No momento em que esta Assembleia faz um significativo esforço para tornar mais eficaz a sua tarefa legislativa e fiscalizadora, atrairia inevitável e justamente sobre ela a incompreensão e a crítica da opinião pública.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quer nós queiramos, quer não, quer o Governo queira, quer não, a questão dos aumentos dos titulares dos cargos políticos é neste momento um problema politicamente relevante. E não pensem que a atitude que o meu partido assume e que se traduz na apresentação do projecto alternativo foi uma atitude fácil. Discutimo-la profunda e democraticamente, ponderámo-la desde as estruturas locais até aos órgãos máximos do partido e, finalmente, assumimo-la com uma coesão e identidade de que me orgulho aqui de exprimir.
Vozes do PSD: - 15so é verdade?
O Orador: - Fazemo-lo, aliás, na convicção de que estamos a prestar um serviço à democracia. Porque ser democrata não é apenas a capacidade de interpretar o que legitimamente o povo quer, mas também saber sentir com ele e procurar uma identificação crescente entre esse povo e, as instituições que o representam.
Creio que esta Assembleia e o País compreendem a nossa atitude. Gostaria até, ainda, que fosse legítimo esperar do Governo e da maioria que o apoia uma atitude de bom senso, de que aliás não pretendemos ter o exclusivo. Não alterou já o Governo, na sequência do anúncio das nossas posições, uma das mais onerosas normas na sua proposta?
O Sr. José Vitorino (PSD): - É falso!
O Orador: - Haverá quem interprete esta atitude como uma vitória política do CDS.
O Sr. António Capucho (PSD): - Levem a taça!
O Orador: - Foi-o seguramente e temos de o dizer, por muito que custe aos Srs. Deputados do PSD. Mas o mais importante para nós, para a democracia e para o interesse nacional é que o Governo tenha reconhecido o seu erro e o tenha emendado.
Vozes do CDS: - Muito bem!
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O Orador: - Pode o Governo afobar-se em encontrar argumentos em defesa da sua proposta e pode ainda, tentando explicá-la demasiadamente, retirar do nosso debate o centro da verdadeira questão. Para nós a questão é simples e uma coisa é certa: a aprovação do projecto do CDS não implicará qualquer aumento de encargos da Assembleia da República no Orçamento do Estado do próximo ano. E mais, o nosso diploma reduzirá significativamente os encargos com os titulares dos restantes cargos políticos. Pode o Governo dizer-nos o mesmo da sua proposta? Não é verdade que a proposta do Governo implica, só para o próximo ano, um aumento de encargos na ordem dos 100 000 contos?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deixei de lado uma extensa e fundamentada exposição sobre outros pontos em que assumimos posições substancialmente diversas da proposta do Governo. Fi-lo, aliás, propositadamente para delimitar com clareza, perante VV. Ex.ªs e perante a opinião pública, aquilo que nos separa do Governo e fi-lo também consciente de que outra atitude poderia não servir apenas o esclarecimento do debate, mas também e sobretudo o interesse daqueles que o querem desvirtuar.
As posições são, pois, bem claras. A cada um as suas responsabilidades.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Durante a intervenção do Sr. Deputado Gomes de Pinho inscreveram-se para fazerem pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Joaquim Miranda, António Capucho, Lopes Cardoso, João Amaral e José Magalhães.
Assim, e seguindo a ordem acabada de indicar, dou a palavra ao Sr. Deputado Joaquim Miranda.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Deputado Gomes de Pinho: Dificilmente poderíamos ter nesta Câmara uma intervenção tão sem conteúdo como aquela que o Sr. Deputado acabou de fazer.
E naturalmente que assim aconteceu pois, na verdade - e embora o Sr. Deputado começasse por dizer que tem uma perspectiva diferente da do PCP -, o que não disse é que toda a filosofia e conteúdo do projecto do CDS é, no fundamental, a filosofia e o conteúdo da proposta governamental. Esta é que é a questão de fundo! Daí a forma engasgada e sem conteúdo com que o Sr. Deputado interveio neste debate.
O Sr. Deputado fez também um grande arrazoado à volta da democraticidade com que o problema foi debatido no CDS. Mas todos nós conhecemos os grandes dramas que existiram no seu partido relativamente a esta questão. 15so é que todos conhecemos!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas dramas para quê se, na verdade, aquilo que aqui temos é quase uma cópia da proposta governamental?
OS Srs. Deputados apregoavam muito a questão da moralização e agora vem o Sr. Deputado falar sobre a importância da contenção das despesas pública. Mas que moralização, que contenção das despesas públicas?
Por exemplo, no que respeita aos vencimentos dos deputados, o CDS toma como bons os valores do Governo. Simplesmente, aplica-os em 3 doses ou em doses reduzidas e, entretanto, embora não o tenha referido, logo vai encontrar uma forma de recuperar essas mesmas diferenças. Então explique-me, Sr. Deputado - porque certamente fizeram as contas, quanto vai custar a mais o vosso projecto no que respeita, por exemplo, às ajudas de custo?
Vozes do PCP: - E isso!
O Sr. João Amaral (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - As ajudas de custo, tal como elas estão neste momento, são de 2950$. Mas o CDS aponta para a equiparação às ajudas de custo dos membros do Governo, que são de 3440$, isto é, um acréscimo de quase 500$!
Esta situação, Sr. Deputado Gomes de Pinho, traduz-se num aumento para a grande maioria dos deputados da Assembleia da República de cerca de 10 contos por mês, por deputado.
Vozes do PCP: - 15to é que é moralidade!
O Orador: - Ora, que moralidade e que contenção das despesas públicas o CDS nos propõe! Para isto era melhor não terem apresentado qualquer projecto, Srs. Deputados do CDS.
Vozes do PCP e do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Gomes de Pinho pretende responder já ou no fim dos outros pedidos de esclarecimento?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Prefiro responder já , Sr. Presidente
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Começo por agradecer, muito penhorado, ao Sr. Deputado Joaquim Miranda do PCP a oportunidade que me dá de esclarecer a Câmara de algumas das outras diferenças substanciais que existem entre a nossa proposta e aquela outra apresentada pelo Governo.
De facto, ao contrário do que aconteceu nesta última, nós propomos o aumento das ajudas de custo dos deputados. E eu perguntaria aos deputados desta Câmara - salvo, talvez, aos do PCP pois terão, porventura, meios de alojamento colectivo próprios do seu partido ...
Risos do CDS,
O Orador: - ... que deputado da província consegue viver em Lisboa dignamente com a actual ajuda de custo? Se o Sr. Deputado me responder a esta pergunta, talvez lhe possa posteriormente esclarecer outras questões.
Por que, Srs. Deputados, nós assumimos aqui com a clareza e frontalidade que são necessários, para que a função do deputado seja aqui exercida dignamente, que ele tenha à sua disposição os meios financeiro mínimos. Mas não assumimos aqui a perspectiva funcionalizante e burocratizante que o listado confere aos deputados, ao atribuir-lhes uma ajuda ele custo permanente. Assumimos a atitude de dignificar o exerci-
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cio da função eminentemente política do deputado e essa prende-se com o funcionamento da Assembleia e com as responsabilidades que são inerentes a esse funcionamento.
Gostaria que o Sr. Deputado Joaquim Miranda me dissesse - se é que sabe - quais são os custos médios de alojamento e de alimentação em Lisboa. Se V. Ex.ª me disser quais são esses custos, talvez possa achar a sua pergunta inaceitável ou, pelo menos, desnecessária.
Mas há, de facto, uma diferença fundamental de perspectivas entre a nossa proposta e aquela outra apresentada pelo Governo quanto a esta matéria. Essa diferença é evidente, é sensível e é compreensível pela generalidade dos portugueses, porque se perguntar a qualquer português que tem de se deslocar a Lisboa, seja quadro de empresa, seja funcionário público, quanto é que gasta, a resposta que lhe dará, Sr. Deputado, é que não é com 2900$ que consegue sobreviver.
Por maioria de razão, isso não deve acontecer com um deputado, que não deve ser sujeito a uma indignidade que pode pôr em causa o próprio exercício das suas funções.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Joaquim Miranda pretende usar da palavra para que efeito?
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Para protestar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito rapidamente e apenas para dizer isto: o Sr. Deputado veio aqui justificar aquilo que nós próprios dissemos, isto é, retirou de um lado e pôs no outro. Encontrou, portanto, uma forma de aumentar em 10 contos por mês a generalidade dos deputados desta Câmara.
E isso que nós registamos, Sr. Deputado!
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Gomes de Pinho pede a palavra para contraprotestar?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Exactamente Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - O Sr. Deputado Joaquim Miranda continua a confundir - o que é, aliás, estranho na sua bancada de trabalhadores e representantes de trabalhadores - duas coisas que no Direito de Trabalho são liminarmente diferentes: confundir vencimento com ajudas de custo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Faz parte da massa salarial, Sr. Deputado!
O Orador: - Lamento que o Sr. Deputado o faça, pois seguramente na negociação de um contrato colectivo de trabalho V. Ex.ª não o faria - os trabalhadores não deixariam que o Sr. Deputado o fizesse.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Porventura por isso será julgado por eles, não por mim!
Mas o que lhe queria dizer é que também não é verdade a conclusão que o Sr. Deputado tira daquilo que eu disse. Para além do mais, esqueceu outra coisa. Na verdade, com esses aumentos todos e com essas redistribuições de verbas, há uma coisa que o nosso projecto salvaguarda: é que o Orçamento da Assembleia da República não pode aumentar. E essa é a diferença fundamental! Gostava que o Sr. Deputado me dissesse se está ou não de acordo que a alteração do estatuto dos deputados não traga um aumento de encargos para o Estado. Era esta pergunta que lhe queria deixar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado Gomes de Pinho, ouvi-o com muita atenção e confesso que a sua intervenção me surpreendeu, pois nada acrescentou à perplexidade que provocou, não só a mim como à minha bancada, a vossa iniciativa.
Folheei «para trás e para a frente» e não vi grandes novidades, para além da proposta de diferimento no tempo do aumento da letra dos deputados. Para além desse ponto, encalham numa percentagem qualquer relacionada pelo vice-primeiro-ministro, aumentam 5 % nuns lados e diminuem 5 % noutros, abordam as despesas de representação, mas, enfim, nada de francamente inovatório.
Com franqueza, não percebo como é que se anda a «incendiar» o País ...
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - A incendiar o País?
O Orador: - ... e depois se vem aqui falar em que a opinião pública não tem capacidade de absorção!
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não vou fazer comentários sobre a vossa «entrada de leão» relativamente a esta matéria. Disseram disto o que «Maomé não disse do toucinho» e agora vêm com um projecto que não é radicalmente diferente do nosso.
Sr. Deputado Gomes de Pinho, já que a vossa grande preocupação é orçamental - e nós compreendemo-la - gostaria que quantificasse o que é que exactamente pretendem poupar ao Estado no primeiro ano, para ver se as minhas contas são diferentes das vossas.
Ia ainda fazer considerações sobre as ajudas de custo, mas o Sr. Deputado Joaquim Miranda já disse o que havia a dizer sobre esse ponto - e o que disse é correcto.
Assim, queria mais uma vez insistir na pergunta de há pouco: o que é que pensam poupar ao Estado com
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o vosso projecto no primeiro ano, ou seja, 1985? Acabarei dizendo, parafraseando alguém que vos é caro, que, com toda a franqueza, o vosso projecto não parece mais que a proposta de lei do Governo travestida.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado António Capucho, creio que há algumas lamentáveis confusões na sua intervenção.
A primeira é a de que não fomos nós que andámos a «incendiar» o País. Aliás, agradeço-lhe esse elogio que nos fez, mas confesso-lhe com alguma modéstia que estou convencido que nós não tínhamos capacidade para «incendiar» o País e para provocar sobre esta matéria a reacção que de facto houve e que o Sr. Deputado acabou agora de reconhecer, chamando-lhe «incêndio».
Não fomos nós que incendiámos o País, Sr. Deputado! O País reagiu, porque, apesar da crise, permanece são, não perdeu o bom senso ou o sentido de equilíbrio e sabe distinguir entre aquilo que é correcto, necessário e mesmo essencial para dignificar a função dos titulares dos cargos políticos e aquilo que acha que é exagerado, desproporcionado e que não tem em linha de conta a nossa real situação.
O Sr. Deputado, porventura excessivamente assoberbado nas negociações que o seu partido mantém com o seu parceiro de coligação, esquece que, para além desse cenário complicado e difícil que são essas negociações,, há um país e que esse país reage. E um dos deveres dos partidos democráticos é, pelo menos, o de interpretarem essa reacção.
E é bem mais importante que essa interpretação e a expressão dessa reacção se faça aqui, pelas vozes democráticas, do que se desenvolva noutro contexto e por outras vozes.
Já que o Sr. Deputado António Capucho me pede um número, dir-lhe-ei que, de acordo com as contas que fizemos, a nossa proposta economiza em 1985 cerca de 67 000 contos, relativamente à proposta do Governo.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Penso que esse é um número significativo, mas gostaria de lhe dizer que não é apenas o número que neste momento importa - é o sentido desse número. Trata-se de esta Assembleia ser ou não ser capaz de assumir ela própria e antes de mais o próprio sentido da crise, solidarizando-se com ela.
Podemos dizer ao País que vamos poupar pouco. Agora o que importa é que se diga que temos consciência que ele está a sofrer uma crise e que essa crise que todos os portugueses sofrem não legitima que gastemos mais.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Capucho pretende usar da palavra para que efeito?
O Sr. António Capucho (PSD): - Para um contra protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado Gomes de Pinho: de uma forma muito breve, pretendo protestar a minha perplexidade perante aquilo que nos separa: segundo o CDS são 60 e «picos» mil contos!
O Sr. Presidente: - Segue-se no uso da palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Gomes de Pinho: Foi pena que o Sr. Deputado não tivesse referido as tais diferenças entre o projecto do CDS e a proposta do Governo - as tais diferenças que, numa leitura rápida, a maior parte dos deputados que intervieram se não aperceberam.
Porém, do meu ponto de vista, elas até existem e não se limitam apenas ao escalonamento dos encargos.
Não vamos agora discutir o significado real desse escalonamento da proposta do CDS, na medida em que ele é compensado por outras disposições. Mas aquilo que queria realçar não tem nada a ver com os números. O próprio Sr. Deputado Gomes de Pinho já disse: «deixemos os números, há coisas por vezes mais importantes para o País».
Creio que é exactamente aí que vale a pena sublinhar algumas das diferenças entre a proposta do Governo e o projecto do CDS que, no meu entender, mereciam ser esclarecidas.
Por exemplo, o CDS «deixa cair» uma alteração introduzida pelo Governo - e que nós consideramos positiva - que vai no sentido de não atribuir despesas de representação aos vice-presidentes e outros deputados, salvo se exercerem o mandato em exclusividade de funções.
15to não tem nada a ver com os números, tem a ver com uma proposta e o CDS deixa, pura e simplesmente, cair esta alteração.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Um outro exemplo: a proposta do Governo, no seu artigo 21.º, estabelece um mecanismo, em meu entender «coxo», quanto às faltas, que corresponde também a uma filosofia. O mecanismo é «coxo», acho que deve ser revisto, mas o propósito é louvável. O CDS «deixa cair» o propósito e nem sequer justifica porque o faz. Não são números, Sr. Deputado, são filosofias.
Por outro lado, parece que o CDS está hoje muito preocupado com a situação económica do País. mas não estava em 1981 quando apresentou uma proposta sobre a matéria.
É óbvio que não vou perfilhar a teoria de que em 1981 nós vivíamos numa situação próspera que permitia ao CDS subscrever a proposta de que todos nós estamos lembrados, pois isso equivaleria a dizer - o que para o CDS será grave - que depois de 2 anos de governo AD, com a participação do CDS, tinhamo-nos encaminhado para uma situação catastrófica em que temos de andar a contar os tostões.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
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O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, agradeço muito as questões que me colocou porque elas permitem-me continuar a explicitar o pensamento do meu partido, o que, aliás - como referi inicialmente -, só não fiz na intervenção da apresentação porque quis centrá-la sobre aquilo que considerei serem as questões essenciais.
Na verdade, relativamente às duas questões que levantou e que considera que o CDS não contempla no seu projecto, queria dizer que realmente não são por nós contempladas aqui porque entendemos que elas deviam ser objecto de tratamento no estatuto dos deputados. Pensamos, pois, que é nessa sede e em proposta de alteração que ou foram já entregues na Mesa ou estão para sê-lo que o meu partido as vai tratar.
Quanto à questão - já, aliás, várias vezes referida - da posição que o CDS tomou em 1981 relativamente a este problema, gostaria de dizer a V. Ex.ª que talvez o meu partido não tenha mudado. O País, porém, mudou mais sobre essa matéria que o meu partido e a responsabilidade não é seguramente do CDS.
O Sr. Presidente: - Segue-se no uso da palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Gomes de Pinho, está demonstrado que o aspecto mais relevante do vosso projecto de lei é a semelhança com a proposta do Governo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - E que o aspecto onde é, realmente, significativa a diferença - e devemos sublinhá-lo porque é importante dizê-lo - é no timbre do papel. E um aspecto que tem dignidade suficiente para dizer que são realmente «diferentes»!
Só que, para além desse aspecto, há um outro muito relevante que lhe passo a expor.
Os Srs. Deputados, que invocaram aqui uma postura de dignificação da função parlamentar, foram o único partido que nenhuma norma adiantou no que toca às condições do exercício do mandato e nomeadamente a questões centrais, como a das incompatibilidades, como a dos meios de actuação dos deputados em relação à utilização das salas, etc. Tudo o que os preocupou foi a «massa», foi o dinheiro e mais nada! Sobre as questões concretas do exercício do mandato não têm nada a dizer!
Ó Srs. Deputados, mas que espécie espantosa de dignificação da função parlamentar encontraram para se exprimir nesta Câmara! É a forma de dizer os deputados ganham mais, ganham mais, mas aos bochechos! É essa a vossa forma, é essa a perspectiva que têm da dignificação da função parlamentar? É tudo o que têm a dizer sobre isso?
Ou será que isso terá alguma coisa a ver com antigas posturas do CDS, que colocou aqui, com um tema de debate na Assembleia, a compatibilidade de certo tipo de funções - por exemplo, provedor de não sei que - e a de deputado? É que o fez, em tais termos que o PSD teve de a votar para que um certo deputado vosso pudesse ser ao mesmo tempo deputado e provedor do que era.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!
Vozes do CDS: - Olha quem fala! Essa é muito boa!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Realmente esperava ouvir muita coisa durante este debate, mas confesso que a coisa que mais me espanta é agora ver uma súbita convergência do PSD - ao que me parece - com o PCP sobre esta matéria regimental.
Protestos do PSD.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Está com ciúmes!
O Orador: - Gostaria de dizer ao Sr. Deputado João Amaral que a sua imprudência foi tão pouco leninista e tão pouco nos hábitos do seu partido que foi total! E não só houve imprudência como distracção, o que também não é habitual em V. Ex.ª e na sua bancada - faço-lhe essa justiça.
É que acabei de dizer ao Sr. Deputado Lopes Cardoso que essas e outras matérias são, em nosso ver, tratadas em sede de estatuto dos deputados e aí temos muitas propostas para apresentar, como aliás acontecerá com VV. Ex.ªs e com outros grupos parlamentares. É, portanto, nessa sede que iremos discutir a bondade das nossas propostas e consequentemente das vossas também. Lá iremos, esteja calmo.
Pela nossa parte posso-lhe dizer até que não seremos dos grupos parlamentares mais afectados com as propostas de rigor que aqui iremos defender.
Por outro lado, o Sr. Deputado continua a escamotear a tal questão fundamental e que, pelos vistos, para si e para o seu partido é irrelevante. De facto, em 1985, o nosso projecto implica um aumento de vencimentos sobre o montante actual de 7%, que são obrigatoriamente compensáveis com a redução de encargos no órgão Assembleia da República. Sendo assim, esse aumento não se pode traduzir num aumento de encargos deste órgão para o Orçamento do Estado. Paralelamente a proposta inicial do Governo traduzia-se num aumento de 54% segundo creio. Ora, para o Sr. Deputado isto é irrelevante! E esta situação surpreende-me, se é que me posso ainda surpreender com alguma das atitudes do Partido Comunista Português.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra para que efeito
O Sr. João Amaral (PCP): - Para um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Surpreendido deve estar o País, por
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um partido que acaba de reclamar publicamente a demissão do Governo vir aqui, através do seu grupo parlamentar - não sei se é o partido, se é o grupo parlamentar pois ainda não percebi -, subscrever a proposta do Governo no que toca ao estatuto dos titulares dos cargos políticos. Surpreendido ficará o País e com boas razões! Talvez considere afinal que a fala do seu partido é uma forma de sustentar o Governo e pouco mais.
Só que, e para além disso, farisaico será, Sr. Deputado - e desculpe-me ser tão brutal -, dizer que os Srs. propõem a contenção do Orçamento quando ao mesmo tempo propõem o aumento real dos vencimentos dos deputados. Propõem um aumento directo no que respeita ao vencimento base e um aumento indirecto através das ajudas de custo.
O que é que os Srs. propõem então? Que os funcionários da Assembleia passassem a ganhar menos para poderem suportar o aumento de vencimento dos deputados e ao mesmo tempo ficar equilibrado o orçamento da Assembleia da República?
Se é isso que propõem, é bom que o digam claramente! Aliás, veremos quando o orçamento da Assembleia for votado quais são as propostas de alteração que os Srs. apresentarão.
Finalmente, Sr. Deputado, neste jogo de enganos em que estamos, é bom que fique claro o seguinte: os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do CDS não propõem nada de substancialmente diferente daquilo que agora nos propõe o Governo.
De facto, propõem um aumento de vencimentos dos deputados e, para além do que o Governo adianta, propõem um aumento das ajudas de custo de que ninguém ainda se tinha lembrado.
Os Srs. Deputados do CDS ficarão satisfeitos com esse aumento. De qualquer forma, registo que toda a questão que coloquei em termos da vossa postura neste debate - e designadamente no que toca aos vossos interesses, de bancada - foi completamente sonegada! Concretamente, referi-me à compatibilização - de funções entre o exercício de provedor da Santa Casa da Misericórdia e a função de deputado.
Uma última palavra: têm propostas sobre o estatuto dos deputados? Grande novidade! Propostas sobre o Estatuto do Deputado existe aqui há 10 meses, Srs. Deputados! Então só agora é que se lembraram delas, depois de serem aqui solicitados e até criticados por não as terem apresentado?
15to são desculpas de mau pagador!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado João Amaral: Já estamos habituados a que o seu partido nos queira aqui dar lições de ideologia, de moral política, etc., agora lições de táctica ou de estratégia, talvez seja demais, Sr. Deputado!
As nossas propostas são apresentadas quando quisermos, quando acharmos mais oportuno, e devo dizer-lhe que achamos mais oportuno encararmos globalmente o estatuto remuneratório e o estatuto dos deputados do que encarar as duas coisas separadamente.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Então continuem!
O Orador: - Agora percebemos a vossa atitude: é que os Srs. não querem alterar substancialmente nada do estatuto dos deputados - quer no seu estatuto remuneratório quer funcional - porque a Assembleia da República não é para o Partido Comunista o primeiro lugar de luta política. É um lugar coadjuvante ou acidental! Porém, para nós, esta é a primeira fronteira da luta política, é a primeira linha do nosso combate político de oposição ao Governo.
E desiluda-se o Sr. Deputado João Amaral se tem qualquer dúvida quanto à nossa atitude de oposição ao actual Governo. Aliás, em breve nós teremos seguramente oportunidade de ver aqui claramente quem é que está em oposição, quem utiliza os mecanismos parlamentares para exercer essa oposição, quem é que é coerente e consequente com as suas posições.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - De resto, e ainda a propósito de coerência, gostaria de lembrar ao Sr. Deputado - e faço-o lendo a declaração de voto que proferimos na altura da aprovação do estatuto remuneratório do Presidente da República - o que já dissemos nesta Câmara: «A Assembleia da República deveria ter aproveitado esta oportunidade para normalizar inovadoramente, como é da sua competência, o estatuto dos titulares dos órgãos de soberania. incluindo o regime das respectivas remunerações».
O nosso pensamento sobre esta matéria é conhecido há muito tempo, Sr. Deputado. Entendemos que a situação é injusta, é incorrecta e que afecta efectivamente o funcionamento da Assembleia e a eficácia da acção política dos nossos deputados, porque não temos pejo nenhum em dizer que os deputados que aqui exercem as suas funções nos partidos democráticos normalmente têm de viver do salário de deputado ou das ajudas de custo que recebem, o que, porventura, pode não acontecer em relação a outros partidos.
Não gostaria de entrar em discussões pessoais, mas em todo o caso talvez lhe seja útil um esclarecimento: o então Sr. Deputado Pedro de Vasconcelos - suponho que era a ele que se referia - suspendeu o mandato quando iniciou as suas funções de provedor na Misericórdia de Lisboa.
O Sr. Manuel Queiró (CDS): - Mais uma «barraquinha»!
O Sr. Presidente: -- Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Gomes de Pinho, ao apresentar um projecto de lei igual ao do Governo, com alguns retoques, o CDS revelou realmente o notável .sentido táctico na sua primeira linha de combate político, que quero realmente saudar. Parabéns CDS, é um grande caminho! Mas, Sr. Deputado, não nos faça rir. Depois de um parto dificílimo .sai-nos um projecto mal enjorcado que os Srs. Deputados estão continuamente a retocar. Recebo continuamente aqui na bancada papéis que vêm alterar o artigo tal, porque se esqueceram de um aspecto, depois metem outro, tiram ... Mais calma, Srs. Deputados!
O CDS tem realmente corrido a foguetes, nós todos o Sabemos, mas lança-os com uma mão, agarra-
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-os com outra, estoiram-lhes nas mãos e faz discursos manetas como aquele que ouvimos fazer.
Porque é completamente delirante, passe a expressão, um partido que pugnou por aumentos dos deputados em todas as circunstâncias políticas, na AD, depois da AD, etc., vir fazer-se de vestal e pudicamente dizer: não queremos aumentos agora, e coisa e tal. E depois metem-nos encapotadamente através das ajudas de custo, que é uma forma farisaica ele assumir as questões. Este é o primeiro aspecto.
Segundo aspecto. O Sr. Deputado deixou cair completamente as 12 medidas de moralização administrativa que tinha anunciado à imprensa, se não estou em erro, nas vésperas da apresentação do projecto de lei. Portanto, o projecto de lei que nos apresenta aqui é uma coisa truncada em relação ao sonho moralizador que o CDS anunciou ao País. É um farrapo em relação ao que foi anunciado, e um farrapo mau, porque é igual à proposta do Governo.
Terceira questão. O projecto de lei não traduz uma reflexão de muito tempo, porque resulta de uma pirueta casual dos últimos instantes. Pirueta essa mal feita, porque ainda está inacabada, e inconvincente, porque o CDS não tem legitimidade nenhuma nesta matéria, dados os seus antecedentes.
O CDS não prova sequer que não quer aumentos, como demonstrou o meu camarada Joaquim Miranda. Quer esses aumentos recatada, diria, e hipocritamente. O CDS diz que quer aumentos faseados e o Sr. Deputado Gomes de Pinho até tem um projecto que diz isto, que é monstruoso: far-se-á um aumento - o tal que equivale a 40 %, neste ano -, mas não haverá aumento do Orçamento da Assembleia ela República. O que quer dizer que os aumentos que tiverem de ser feitos hão-se ser à custa do corte de verbas noutros serviços, o que é, naturalmente, contribuir para a degradação do funcionamento da Assembleia da República e é uma forma de fazer reverter em benefício individual de deputados aquilo que devia ser aplicado em despesas de interesse comum e na defesa do exercício pleno das competências da Assembleia, que não goza, certamente, de excesso de verbas em certos serviços. Em todo o caso, não é legítimo canalizá-las para o efeito que o CDS pretende.
Pergunto, então. Sr. Deputado Gomes de Pinho, que sentido é que faz confrontar a Assembleia da República com uma proposta inçada de vícios, como estes que acabei de apontar, para além de todos os outros que já ficaram enumerados na nossa intervenção. Pergunto quem se quer enganar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado, também acredito que uma mentira repetida muitas vezes pode acabar por parecer verdade. Simplesmente, quem diria isto tinha um pressuposto que o Sr. Deputado, visivelmente, não usou nesta sita intervenção: é que a mentira tem que ser verosímil.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Vamos a isso, corrija.
O Orador: - Estamos de acordo.
E as mentiras que o Sr. Deputado aqui utilizou - e peço desculpa de utilizar esta expressão, que o Sr. Deputado compreende melhor do que eu -, não têm qualquer verosimilhança. Portanto, não estou minimamente incomodado com aquilo que o Sr. Deputado disse. 15so não retira em nada o mérito político do nosso projecto de lei e não altera em nada os seus objectivos e pressupostos.
O Sr. Deputado estará, porventura, um pouco preocupado com a circunstância de o CDS ter sabido, no momento oportuno, interpretar, de uma forma simultaneamente necessária à defesa das instituições democráticas e à própria dignificação do Parlamento interpretar aquilo que é considerado, genericamente, um sentimento popular generalizado.
Entretanto, gostaria de lhe dizer que nós entendemos que, para tornar eficaz e rigorosa a gestão desta Assembleia, são necessárias muito mais que 12 medidas, as quais o Sr. Deputado nos imputa, tuas que não apresentámos. Deve ser um lapso seu ou dos seus serviços. Ninguém no meu grupo parlamentar anunciou essas 12 medidas. O Sr. Deputado deve estar a fazer confusão com algumas das muitas medidas do bloco central, já só deve, mesmo, ver medidas. Nós não anunciamos medidas, mas fazemos propostas e essas são bastante mais que 12.
Devo dizer-lhe que nós temos consciência de que para moralizar o funcionamento desta Assembleia - e eu digo isto num sentido amplo e com o sentido das responsabilidades - é necessário alterar muito do seu funcionamento.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Muito obrigado, Sr. Deputado, por me deixar interromper.
Estou perplexo. O Sr. Deputado disse algumas coisas com as quais eu estou de acordo, nomeadamente há bocado. Primeiro começou por dizer que iam apresentar tinia série de medidas e voltou a afirmá-lo. A seguir disse que o CDS considera que o estatuto se dos titulares dos cargos políticos e o estatuto dos deputados devem ser apreciados em conjunto. De acordo.
O que me espanta é que, tendo o CDS esse entendimento, nos venha dizer o que pensa sobre o estatuto remuneratório e não nos diga rigorosamente nada sobre o que pensa do estatuto dos deputados, para que possamos fazer a tal apreciação global, que o Sr. Deputado é o primeiro a defender.
O Orador: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, usei da palavra para apresentar o projecto de lei sobre o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, apresentado pelo meu partido. Portanto, quis-me limitar, e auto limitei-me drasticamente nessa apresentação a tratar daquilo que consideramos ser a questão fundamental desse estatuto. Mas a discussão, quer do estatuto remuneratório, quer do estatuto dos deputados, para nós, ainda não começou. Ela vai começar, continuará e será seguramente muito aprofundada. Portanto, teremos oportunidade de fazer uma análise integrada dos 2 diplomas comparando essa análise com a análise dos diplomas apresentados pelos partidos. Julgo que a sua observação é correcta, embora eventualmente não seja tempestiva.
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Queria concluir dizendo ao Sr. Deputado José Magalhães que não é à custa do funcionamento dos serviços que nós pensamos ser possível fazer reduções substanciais nos custos de funcionamento da Assembleia. Creio que o Sr. Deputado partilhará também da minha opinião.
O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que quando o Sr. Deputado Gomes de Pinho utilizou a palavra mentira era realmente como uma expressão, sob pena de termos de nos entender durante todo o tempo que for necessário até esclarecermos, cabalmente, perante a Câmara o que estamos a dizer, ,cada um de nós, e ficar cabalmente demonstrado quem é que mente, na acepção que utilizou.
Limitei-me a ler o artigo 10.º - ao pressupor que V. Ex.ª o tinha lido - do projecto de lei que V. Ex.ª a assinou. Se o leu, digo-lhe que isso implica aumentos que podem cifrar-se em cerca de 10 contos por mês para os deputados, aplicando a tabela que está prevista na portaria que rege, neste momento, as ajudas de custo dos membros do governo. É isto rigorosamente. E penso que essa forma de aumentar os deputados, não sendo transparente, sendo indirecta e um pouco sub-reptícia, é uma forma inadequada para colocar a questão, por parte de quem o queria fazer abertamente.
Se querem colocar abertamente a questão dos aumentos assumam plenamente a responsabilidade de que o querem fazer, dizendo claramente ao País que isso se vai repercutir num aumento de x. Não podem é recuar, apressadamente, quando alguém diz que esse aumento se vai efectivar.
Creio que estaremos entendidos quanto a esta questão e tenho altas dúvidas que haja sentimento popular de apoio a este aumento encapotado que o CDS propõe. Haja modos nestas matérias.
Outra questão é em relação aos encargos da Assembleia. O Sr. Deputado Gomes de Pinho certamente confirmará que o artigo 36.º do vosso projecto de lei, se ainda não foi alterado, diz: «os encargos resultantes da aplicação do presente diploma durante 1985 não poderão implicar qualquer aumento global das despesas do orçamento da Assembleia da República». Quer isto dizer que os recursos financeiros para granjear o aumento individual, que é preconizado para este ano, hão-de ser obtidos através da gestão das verbas que estão previstas, da desafectação das que sejam necessárias e das compensações que, eventualmente, se tornem imprescindíveis. E nós consideramos que esta óptica é duplamente nefasta. Primeiro, porque consagra aumentos, que são diferentes daqueles que já haveriam por força dos aumentos da função pública; e, segundo - tão ou mais grave do que isso -, porque vem afectar a possibilidade de funcionamento adequado dos serviços da Assembleia da República, que certamente dispensam cortes como aqueles que o CDS quer apresentar.
Como última observação quero referir que o CDS tem realmente propostas que são ou mal pensadas ou de uma gravidade política enorme.
Ouvir o Sr. Deputado é perceber o carácter precário e frágil das razões políticas e do processo de trabalho que preside ao tal sentido táctico sensacional, que o CDS supostamente exibiria na Câmara, mas que nem o próprio grupo parlamentar reconhece e o povo português, certamente, também não. Aludo às propostas, que eu gostaria de conhecer um pouco mais aprofundadamente que o CDS tem em matéria de transportes. Se se confirmarem certas observações, elas seriam muito mas muito inquietantes, a não ser que o Sr. Deputado esteja em condições de desmentir a existência de quaisquer propostas nesta matéria, neste momento. Muito gostaríamos de o ouvir falar sobre esta matéria, que é certamente escaldante.
O Sr. Presidente: - Para contra protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - O Sr. Deputado gostaria de me ouvir falar sobre essa matéria, mas isso não vai acontecer. Lamento muito desiludi-lo, mas essa matéria será objecto de tratamento em altura própria, e quem determina a altura de se tratarem as questões que aqui levantamos somos nós, não é a sua bancada.
Gostaria de esclarecer o Sr. Deputado que é óbvio que, quando utilizei a expressão mentira, me referia - como o Sr. Deputado percebeu, obviamente, se não teria invocado outro tipo de argumentos - a uma mentira política. E creio que esse expediente é perfeitamente legítimo no seu partido. Como é óbvio, não é com sentido pejorativo, pessoalmente, que utilizei essa expressão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Gomes de Pinho, o que queria perguntar-lhe é se está disposto a fazer perante as Câmaras, digo, perante a Câmara, as contas respeitantes à aplicação do artigo 10.º do seu projecto de lei, que aqui está por seu punho, e a portaria que regulamenta neste momento as ajudas de custo. E o Sr. Deputado confirmará se há, cabalmente, aquilo que eu lhe disse sobre o aumento indirecto, encapotado, induzido, resultante dessa proposta que formulou. E chame a isto verdade política ou o que lhe apetecer, porque já estamos no reino do arbitrário.
O Orador: - Sr. Deputado, pela primeira vez estou de acordo consigo desde que começámos este diálogo. Perante as câmaras, eu muito gostaria de fazer essas contas, mas infelizmente, parece que não o vamos poder fazer. No entanto, isso são problemas a que nós e o vosso partido também somos alheios, reconheço.
A verdade é que quando eu dizia que havia uma mentira política, digamos, na sua intervenção, foi porque o Sr. Deputado começou por dizer que o nosso projecto de lei era igual à proposta do Governo e isso é que é profundamente falso. O nosso projecto de lei é, como já aqui ficou amplamente demonstrado ao longo desta discussão, Substancialmente diverso da proposta do Governo. A menos que V. Ex.ª entenda, porventura, como o Sr. Deputado António Capucho entendeu, que 67 000 contos não é nada. Até compreendo que para o Sr. Deputado António Ca-
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pucho 67 000 contos seja pouco, mas para si acho um bocado mais difícil de entender, mas enfim.
Risos do CDS e do PCP.
A verdade é que V. Ex.ª continua a querer confundir algumas coisas e continua a querer imputar-nos os aumentos que resultam da nossa proposta, em circunstâncias, aliás, que não queremos encapotar. Queremos dizer ao País que os deputados da província recebem de ajudas de custo 2900$. Não temos pejo nenhum em dizer isso ao País. E temos a certeza que o País percebe que essas ajudas de custo sejam aumentadas, porque nenhum cidadão normal acredita que seja possível um deputado viver em Lisboa decentemente e dignamente com esse dinheiro. Não temos pejo nenhum em dizer que há matérias que devera ser revistas e que isso se faz em nome da dignidade e da eficácia da Assembleia.
O que nós queremos dizer é que mesmo esses aumentos vão ser compensados não à custa da redução dos orçamentos para os serviços de apoio à Assembleia, mas à custa de compensações obtidas por uma gestão mais rigorosa das verbas que estão afectas aos próprios deputados.
Volto a perguntar-lhe se V. Ex.ª não está de acordo, como eu, que algumas dessas verbas são geridas de forma incorrecta ou, pelo menos, pouco rigorosa.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José (Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutem-se hoje, na generalidade, os seguintes diplomas:
a) Projectos de lei n.ºs 266/III, 331/III e 392/III (PCP, UEDS, PS e PSD) alterações ao Estatuto dos Deputados;
b) Proposta de lei nº 88/III e projecto de lei nº 400/III (CDS) - regime remuneratório cios titulares dos cargos políticos.
Muito embora o regime remuneratório dos deputados venha incluído num regime remuneratório geral que abrange os titulares dos cargos políticos, afigurou-se vantajoso discutir, simultaneamente, este acervo de diplomas em ordem a obter um conjunto de ideias sobre os deveres e os correlativos direitos.
Trata-se de uma matéria delicada, não, e conforme se poderia, numa breve e pouco profunda análise, pensar, porque se discutem remunerações e direitos, (nas, sobretudo, porque se põem algumas importantes questões da natureza do Estado.
O Estatuto dos Deputados dir-nos-á o que são os deputados na ordem jurídica portuguesa.
Não as pessoas individuais que, em cada momento, ocupam as cadeiras do hemiciclo de São Bento, mas sim os arquétipos que o legislador definiu em ordem a implementar um determinado sistema de governo democrático.
O estatuto remuneratório dir-nos-á quais as condições remuneratórias que oferecemos aos titulares dos cargos políticos cio Estado em ordem a criarem-se condições para um exercício correcto da sua função.
No ordenamento constitucional vigente, a Assembleia da República dispõe de uma enorme gama de poderes que, penso, seria ocioso enumerar.
O deputado dispõe, só por si, de um enorme poder de decisão. Controla os actos do Governo, que pode censurar ou destituir. Tem poder de iniciativa legislativa das mais diversas formas. Representa os interesses dos seus eleitores, servindo de elo de ligação entre os cidadãos e o Governo.
Graves responsabilidades que devem ser exercidas com uma grande ponderação e um exacto sentido do interesse nacional.
O exercício da função de deputado implica uma grande independência de julgamento das ideias e dos homens.
Que não se confunda, porém, independência com irresponsabilidade em relação ao partido de que faz parte e que, ao propor as listas à eleição, foi também sufragado pelo eleitorado.
A independência de julgamento do deputado aparece, assim, referida ao seu partido político no seio do qual tem, muitas vezes, de defender uma opinião para que ela se torne a opinião do seu grupo parlamentar.
Serve só esta breve nota para dizer que quantas vezes deputados menos intervenientes no plenário são aqueles a quem certas leis mais devem, dado o seu empenhamento no seio do seu grupo parlamentar.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
O Orador: - À independência do deputado são inerentes:
a) As imunidades;
b) O regime de incompatibilidades;
As primeiras permitem colocar o deputado ao abrigo das perseguições que lhe forem feitas pelo exercício da sua função.
Foi-se aqui muito longe, pois seria intolerável que mesmo por actos exteriores à função um deputado pudesse ser preso ou detido sem autorização da Assembleia.
Exceptuam-se os crimes puníveis com pena maior, em caso de flagrante delito.
Mas o que está em causa é dar ao deputado não um sentimento de impunidade mas a garantia de que as suas tomadas de posição não poderão ser objecto de qualquer sanção criminal.
Neste sentido, os projectos de lei apresentados não inovam significativamente, limitando-se quase tão-só a consagrar o que está determinado.
As incompatibilidades levantam, porém, alguma divergência, das quais a mais importante será, talvez, a incompatibilidade do exercício da função de deputado com a função de presidente da câmara ou vereador a tempo permanente.
Dir-se-á que o sistema vigente não possibilita a acumulação do exercício das duas funções, e bem, mas dir-se-á também que essas funções não são, no essencial, incompatíveis, como bem o demonstra a figura do deputé-maire no sistema francês.
Enfim, o projecto do PCP alarga substancialmente as incompatibilidades de modo, a nosso ver, inaceitável.
Importa que fique bem clara a seguinte ideia: o regime de incompatibilidades deve ser suficientemente largo para garantir a independência de julgamento dos deputados, alheios a quaisquer interesses que não sejam os interesses do povo português; porém, não
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deverá cair em formas extremistas que impeçam, a presença nesta Assembleia da República de cidadãos de alto valor técnico, moral e profissional, que urge aproveitar plenamente.
Deste perfil constitucional do deputado ressalta o estatuto remuneratório.
Liminarmente, afigurou-se necessário definir os contornos essenciais do estatuto remuneratório partindo do topo para a base.
Estabelece-se, assim, um sistema articulado de vencimentos e um regime de garantias sociais para os detentores dos cargos políticos.
Vencimentos e garantias sociais são inerentes a um desempenho adequado de um mandato.
Os primeiros, os vencimentos, exprimem o vínculo existente entre o deputado e o Estado no que se refere ao exercício parlamentar.
Não se queira um parlamento diminuído e sem condições de funcionamento, em que os deputados seriam uma espécie de res nulius ou, pior do que isso, uma aparência que pretenderia ocultar a realidade de centros de decisão exteriores.
Não é por acaso que nos sistemas fascistas e comunistas não existem deputados tais como os entendem as democracias ocidentais.
Em Portugal, o Presidente da Assembleia da Republica é eleito por voto secreto, e já aconteceu em sucessivas votações.
Noutros países, as eleições fazem-se por mão levantada ou por aclamação e não demoram mais de 3 minutos...
As garantias sociais são, por um lado, a justa compensação para quem, ao serviço do País, se viu prejudicado nas sitas ocupações profissionais normais.
Combatem ideologicamente as garantias sociais dos deputados aqueles que, resignando-se à existência de um parlamento, desejam punir aqueles que dele fazem parte e cometeram o feio pecado de se «meterem» em política ...
Por outro lado, as «garantias sociais» criam as condições necessárias à renovação inerente a tudo o que é vivo.
Situadas estas questões de natureza constitucional, importará saber se é justo e adequado o sistema proposto pelo Governo.
Não na base de conceitos abstractos, mas tendo em conta a realidade do Pais.
C) sistema remuneratório permite responder a uma questão: qual a posição do deputado na hierarquia do Estado?
Se prevalecesse a ideia de um peso remuneratório superior da Administração, os caminhos não seriam claros na democracia portuguesa. Entraríamos no reino da nomenclatura, sairíamos do reino da liberdade.
Neste como noutros campos é necessário combater o miserabilismo e compreender a necessidade de criar condições para que qualquer cidadão possa optar por uma carreira política.
Importa, igualmente, compreender que um deputado é um representante do povo, titular de um órgão de soberania, e não um funcionário do Estado, a quem deve servir e a cujos critérios tem de obedecer. Quando se fala de aproximação dos níveis de remuneração e garantias sociais praticados nas democracias, está-se a falar, principalmente, de uma importante questão do Estado.
Foi o que tentámos demonstrar!
Dito isto, importará sublinhar a nossa abertura para acolher soluções que se mostrem mais adequadas.
A UEDS e o CDS apresentam projectos que, no essencial, se sobrepõem à proposta do Governo.
Não vemos, porém, nesses projectos uma filosofia diferente da proposta governamental.
Sublinhámos até, e no que respeita ao CDS, que é nossa convicção que o seu projecto de lei tem menos a ver com o estatuto remuneratório dos titulares dos órgãos políticos e mais a ver com o facto de o CDS ser, agora, um partido de oposição.
O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Muito bem.
O Orador: - É minha convicção de que o Grupo Parlamentar do CDS tem consciência perfeita de que assim é.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deixam-se aqui sumariamente enunciadas as questões que se afiguram pertinentes em debate na generalidade.
É nossa convicção de que a aprovação do projecto de lei do PS e do PSD e da proposta do Governo contribuirá para tornar clara esta problemática aos olhos do povo português.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Estão inscritos para formularem pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados João Amaral, José Magalhães, Joaquim Miranda e Azevedo Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado José Luís Nunes, a sua intervenção causa-me uma enorme dificuldade, porque parte de um pressuposto que não demonstrou.
Começa o Sr. Deputado por dizer que é vantajoso discutirmos juntamente aquilo que classificou como alínea a), ou seja, todos os projectos de lei que se referem às alterações ao estatuto dos deputados, e a alínea b), que se refere à proposta de lei nº 88/III e o projecto de lei n.º 400/III, apresentado pelo CDS, diplomas sobre o regime remuneratório dos titulares dos cargos políticos. Estão bem definidas as questões: são duas alíneas, duas coisas diferentes. E o Sr. Deputado começa por dizer que é vantajoso discuti-las em conjunto.
Pergunto, então, por que é que é vantajoso discutir esses diplomas em conjunto. Não seria vantajoso discuti-los em separado? Primeiro discutiríamos os problemas que se colocam ao nível do Estatuto do Deputado e, em seguida e pontualmente, questões que possam ser colocadas, por proposta do Governo ou do CDS, sobre o regime remuneratório dos cargos políticos.
Quando o Sr. Deputado faz a apresentação - pelo menos meia apresentação, visto que é subscritor conjuntamente com o PSD - do projecto de lei sobre alterações ao Estatuto do Deputado, poderíamos pensar que teríamos justificação para uma questão que nos parece central.
Pergunto por que é que no vosso projecto de lei, que é um documento que procura não alterar o Estatuto, mas substituir o Estatuto actual, são totalmente eliminadas as normas referentes ate Estatuto remuneratório dos deputados. Será porque os senho-
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res estavam combinados com o Governo em relação à proposta de lei nº 88/III? É porque uma e outra se completam, explicitamente, dessa forma?
No vosso projecto de lei, V. Ex.ª, particularmente o Sr. Deputado, que foi o apresentante, propõem algumas incompatibilidades, nomeadamente a de gestor público. Fazem reviver aquilo que a AD, nomeadamente o PSD e o CDS, fez terminar em 1980.
Perguntamos se o Sr. Deputado considera, ou não, que a solução é justa. No caso de considerar que é assim, gostaríamos de saber por que é que ela não entra em vigor de imediato. Por que é que esperam pela próxima legislatura para a pôr em vigor? Esperam que uma outra formação venha novamente alterar aquilo que agora vêm propor?
No que toca ao regime de incompatibilidades em geral, o Sr. Deputado falou do estatuto de independência e considerou excessivo aquilo que nós propúnhamos. Porquê? Então acha excessivo que um deputado não possa ser consultor de empresas que estão em concursos com o Estado? Considera excessivo que um deputado não possa ser administrador de empresas participadas pelo Estado? Não considera que esse tipo de incompatibilidade é uma garantia de independência do deputado, nomeadamente face ao seu relacionamento com um outro órgão de soberania, que é o Governo, o qual, por missão constitucional, tem por obrigação, dever e missão de vigiar?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - O Sr. Deputado João Amaral pergunta-me porque é conveniente definir o Estatuto do Deputado e depois por que é conveniente definir a remuneração.
Respondo que é por 3 ordens de razões.
Primeiro porque, como dizia o general Mõdershow, no livro A Fábrica de Oficiais, de Hans Helmut Kirst, não será absurdo incluir boas maneiras num programa em tempo de guerra. Ele dizia: «Não pode ser absurdo porque está no programa.» Eu direi que não posso ser absurdo porque isso está na ordem do dia. E está na ordem do dia por algumas razões, a primeira das quais é evidente: é que é necessário primeiro definir o contorno da figura, os poderes, etc., e depois os princípios na base dos quais o Estado vai remunerar.
Em segundo lugar quero dizer que não fiz a apresentação do projecto de lei, mas sim uma intervenção no debate. A apresentação é uma faculdade à qual o Grupo Parlamentar do PS renunciou.
O Sr. João Amaral (PCP): - Não sabia!
O Orador: - Julgava que o Sr. Deputado tivesse concluído do facto que nós não fizemos nenhuma apresentação. Mas é necessário estar a explicar às pessoas, mesmo quando elas são inteligentes e têm prática parlamentar, a evidência.
Risos do PS e do PSD.
Por que é que no nosso projecto de lei são totalmente eliminadas as normas referentes ao estatuto remuneratório? Muito simplesmente porque pensamos que uma das vantagens desta proposta do Governo é ser um estatuto remuneratório articulado que diz respeito a todos os órgãos de soberania. Dito de outra forma, sempre pensámos que não devia haver uma definição de remunerações para os deputados isolada da dos restantes órgãos de soberania. 15to por razões de Estado, de política geral e de filosofia.
Pergunta-me, em terceiro lugar, por que é que adiamos essas incompatibilidades para a próxima legislatura.
É muito simples: porque do nosso ponto de vista são inconstitucionais. Não se trata, de forma nenhuma, de retirar o mandato ou de ferir expectativas, como já ouvi dizer em intervenções menos felizes, embora fora desta Câmara. Trata-se apenas do seguinte: o povo português sufragou ou elegeu uma lista com determinados elementos e talvez votasse de uma forma diferente se lhe tivesse sido apresentada uma lista com outros elementos. Era uma forma de eliminar ou de quebrar o mandato a um deputado, que - e é isso o mais grave de tudo - não está prevista na Constituição nem tem qualquer controle constitucional.
Penso que o estatuto das incompatibilidades é excessivo no quadro das relações da administração central, regional e local, institutos públicos, empresas públicas, de capitais públicos, participados pelo Estado ou concessionárias de serviços públicos, etc., porque devemos, pura e simplesmente, compreender que Portugal não é tão rico de valores que possa confiná-los e desperdiçá-los de uma forma tão excessiva. O que quero dizer é que há pessoas nesta Câmara que são gestores públicos ou que exercem outras funções, as quais têm uma grande qualidade e competência profissional, e que a Assembleia só ganha em tê-las como deputados.
15to significa que o regime das incompatibilidades não é uma entidade fixa e imutável, mas sim modificável, conforme as circunstâncias o impuseram. É muito natural que, num futuro próximo, esse regime das incompatibilidades possa ser alargado, à medida que as coisas se forem modificando. Mas esse alargamento implica também uma redefinição mais clara e com outros contornos da carreira de deputado, que aqui não está feita.
Era isto, muito brevemente, o que se me oferece dizer.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Eles já perceberam!
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado José Luís Nunes, em relação à primeira questão que lhe coloquei, no sentido de saber por que é que era vantajoso, respondeu-me como La Palisse, dizendo-me que era vantajoso porque era vantajoso. Acrescentando, candidamente, que isso era bom para todos nós, porque encontra-se sempre uma feição optimista nas questões!
Só que o problema que aqui estamos a tratar é sério e vou pegar, precisamente, no que o Sr. Deputado acabou de dizer ao terminar a sua intervenção, para basear o meti protesto.
A questão que se coloca é a seguinte: que tipo de deputado queremos no nosso país real, com as dificuldades e com os problemas que tem? Queremos um deputado independente, interessado nos problemas e a tempo inteiro ou não?
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O que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se, para encontrar o homem honesto, que não quer parecer mas que o é e que é capaz de se dedicar ao País, é necessário acenar-lhe com mais dinheiro. Será preciso acenar-lhe com mais alguma coisa do que aquilo que já hoje está consagrado no Estatuto do Deputado? Será preciso dar mais dinheiro para esses homens de grande valor técnico virem cá?
Pergunto, Sr. Deputado, com toda a franqueza, se valerá a pena que essas altas figuras técnicas venham aqui para ganhar mais dinheiro. Ou devemos considerar que o papal de deputado, no quadro do País real que somos, implica também, para o deputado e para o cidadão que quer assumir essa função, o dever de assumir por inteiro as responsabilidades do exercício completo do mandato ao nível do vencimento e dos subsídios que hoje existem? Concorda ou não com isto, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Começaria por me referir à afirmação do Sr. Deputado, de que eu respondi como La Palisse, dizendo-lhe que isso não é verdade, porque expliquei as razões por que é que entendi que a discussão devia ser nessa ordem.
Mas vou-lhe dizer, Sr. Deputado, que La Palisse era um homem de grande espírito e de grande inteligência e que só os seus sucessores é que criaram a figura do Monsieur de La Palisse, ao porem em epitáfio fúnebre, que dizia o seguinte: «Monsieur La Palisse est mort, est mort devant Pavie, mais avant d'être mort il était encore en vie.» 15so significa que um homem que gozou sempre de boa reputação pode ver-se, depois de morto, completamente liquidado.
Aplausos do PS e do PSD.
Pergunta o Sr. Deputado se é preciso acenar com mais dinheiro para o deputado se interessar pelas questões reais. Essa questão mostra o abismo que separa o meu ponto de vista do Sr. Deputado João Amaral. Do ponto de vista do Sr. Deputado, o dinheiro é uma coisa pecaminosa.
O Sr. João Amaral (PCP): - 15so não é verdade, Sr. Deputado!
O Orador: - Ouvi-o até ao fim, Sr. Deputado, e concluí isso mesmo. Ou seja, que para si o dinheiro é uma coisa pecaminosa, que deve ser dada a conta-gotas e com limitações.
Na minha intervenção, mostrei, entre outras coisas, que isso não é assim e que há, por exemplo, uma diferença fundamental entre a classe política e a nomenclatura. Ninguém pegou neste pequeno desafio.
Em segundo lugar, referi que nos estados fascistas e comunistas não havia deputados e que em certos parlamentos ou sovietes se elege o presidente em 3 minutos e por aclamação. Este é que é o deputado que não queremos.
Obviamente que para se obrigar uma pessoa a renunciar em parte à sua carreira profissional e a vir aqui, ficando sempre diminuída, não é necessário, como o Sr. Deputado disse, acenar-lhe corri mais dinheiro, mas sim dar-lhe condições para um exercício digno da sua função de deputado. Dito de outra forma, é necessário que ele possa aqui viver de acordo com a forma por que concebe a sua própria filosofia do Estado. 15to em termos latos e de interpretações genéricas e não em termos excessivamente individualistas.
Aqui têm, portanto, aquilo que penso sobre a função de deputado e a razão por que julgo ser este debate tão importante.
O Sr. João Amaral (PCP): - 15so resolve-se com mais 30 contos?
O Orador: - Se quiser, respondo-lhe a essa questão!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Nunes: Quem o está a ouvir até pode ter, por vezes, a imagem de que em Portugal, neste momento, ir para deputado, por assim dizer, é como ingressar no Convento das Carmelitas Descalças. Mas a situação está longe disso. O Sr. Deputado acha que os rendimentos advenientes das remunerações directas, indirectas - era interessante que se debruçasse um pouco sobre estas e do regime das acumulações - que o Sr. Deputado entende que não deve acabar, porque tem uma concepção bizarra da assunção do mandato e até das circunstâncias constitucionais aplicáveis - são pouco pingues, tendo, portanto, de ser radicalmente aumentadas para aumentar a categoria e eficácia dos deputados e até para evitar, como há pouco dizia o Ministro Almeida Santos, a proliferação do biscate.
Só que, Sr. Deputado, as disposições que tem presentes, subscritas pelo seu partido, não conduzem a esse resultado, podendo até, conjugadas com o Regimento, produzir o efeito contrário, uma pez que se faz proliferar a possibilidade de part-time e de não presença na Assembleia da República, em qualquer das suas esferas de trabalho útil. Creio que este assunto devia ser ponderado e que não se dei ia passar pela questão tão ligeiramente.
Tentou, por outro lado, traçar uma fronteira um pouco bizarra, que deve ser analisada, entre os que apoiam a proposta do Governo e os que a não apoiam. Estariam na facção dos apoiantes os que querem a exaltação do Parlamento, a sua eficácia, etc. Já vimos que não! No outro lado, estariam os que o querem denegrir, os que não gostam dele, etc. E a situação resumir-se-ia a isto.
Creio, Sr. Deputado, que se trata de uma delimitação incorrecta. Penso que estarão de um lado, nesta Câmara, todos aqueles que se empenhem, sinceramente, em tentar resolver os problemas que são bloqueios efectivos ao prestígio da Assembleia. 15so implica, por exemplo, suprimir os entraves ao exercício dos nossos poderes de fiscalização, garantir condições de trabalho adequadas e operatividade para que as comissões parlamentares funcionem e exerçam as suas competências. Significa realmente um empenhamento que resulta também de factores políticos. Quem não tem uma orientação política que permita concretizar determinados projectos e que resolva, efectivamente, os problemas do País, nem com o melhor estatuto dos deputados faria o que quer que fosse de útil para o
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povo. Creio, assim, que a fronteira que traçou está mal traçada e é forçada.
A pergunta que lhe dirigia, sobretudo, para além das outras interrogações que lhe deixei, era a seguinte: tomada neste momento - e o Sr. Deputado reconhecerá que as dimensões que a crise económica e social atinge são graves e preocupantes - esta medida suscitará inevitavelmente, a ser adoptada nestes termos, não só indignação justa como considerável perturbação a vários níveis e com toda a legitimidade. Creio que inevitável, face a isso, que a carga do desprestígio que o Parlamento já sofre não se aligeire mas se agrave. E que em vez de uma imagem de deputados mais empenhados e mais activos só prevaleça a imagem do mais bem pago, mas não, certamente, do mais produtivo nem mais empenhado na resolução dos problemas, dada a maneira como estão a ser exercidas as competências da Câmara.
Por outro lado, esta repercussão da aprovação de legislação como esta tem ainda um outro efeito colateral muito preocupante e que é o de agravar e adensar a pergunta seguinte: O que é que estão a fazer tantos deputados a ganhar tanto dinheiro, naquela Câmara, que não se vê coisa nenhuma do que fazem a não ser péssimas leis para o País, que agravam as dificuldades que ele sente em todas as esferas, restringem direitos, etc.? 15to criou o caldo de cultura para uma perigosa operação que vise, designadamente, subverter as regras constitucionais em matéria de representação proporcional.
Deixo-lhe esta pergunta: não considera justificável esta preocupação e, neste sentido, muito perigosa esta iniciativa que, com tanta sobranceria, disse ser inócua e desejável?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, diz o Sr. que tracei uma fronteira entre aqueles que são a favor da proposta do Governo e os que são contra. Eu não fiz nada disso, mas sim o contrário. O que disse foi o seguinte: A UEDS e o PS apresentam projectos que, no essencial, se sobrepõem à proposta do Governo. Não vemos, porém, nesses projectos uma filosofia diferente da proposta governamental.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é nessa parte, Sr. Deputado!
O Orador: - Então faça favor de dizer em que parte é que é, porque talvez tenha lido mal o meu texto.
Risos do PS.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Terei todo o gosto nisso, mas nem me pronuncio sobre esse último aspecto!...
É a parte em que o Sr. Deputado, depois de aludir à questão das incompatibilidades, se debruça sobre as garantias sociais. É precisamente na parte final do parágrafo em que se dedica a essa matéria.
O Orador: - Essa parte do texto diz o seguinte: «As garantias sociais são, por um lado, a justa compensação para quem, ao serviço do País, se viu prejudicado nas suas ocupações profissionais normais.
Combatem, ideologicamente, as garantias sociais dos deputados aqueles que, resignando-se à existência de um parlamento, desejam punir aqueles que dele fazem parte e cometeram o feio pecado de se meterem em política ...»
15to está aqui escrito, mas nunca pensei que o Sr. Deputado José Magalhães enfiasse uma carapuça dessas! A carapuça para V. Ex.ª era a nomenclatura! Enganou-se! Esta era para a extrema-direita!
Riso do PS e do PSD.
Esta era a carapuça habitual que se vendia no tempo em que eu era estudante da escola primária e em que se dizia: «Só o chefe é que manda»!, «não se metam em política que ela não dá pão a ninguém! », etc. Ouvia-se dizer que fulano de tal meteu-se na política e destruiu a sua vida.
O Sr. Deputado, que é mais novo do que eu, deve ter ouvido estas coisas. Talvez a diferença de idade entre nós, que não é muito significativa - pelo menos olhando V. Ex.ª para mim e eu para V. EX.ª ... -
Risos do PS e do PSD.
..., explique a situação. Esta carapuça não era para V. Ex.ª e, portanto, enganou-se!
V. Ex.ª falou em indignação justa, considerável perturbação, etc. É evidente que isso poderá acontecer se as coisas não forem bem explicadas. Quando elas o são, não há indignação justa nem injusta, nem há considerável perturbação.
Quanto ao problema da capa de desprestígio, não penso que o Parlamento seja uma instituição desprestigiada. Ele é o bei de Tunes em Portugal, que as pessoas acordam, de vez em quando, em desancar, como Eça de Queirós referia num dos seus livros famosos.
Desanca-se, é certo, de vez em quando o Parlamento e os políticos, mas isso faz-se em qualquer país da Europa. E temos que ter consciência de que isso também faz parte da democracia, porque a alternativa a isto é o silêncio e o campo de concentração.
Aplausos do PS e do PSD.
Dizia eu, portanto, que quanto à lei de alteração do número de deputados e da alteração do método de Hondt, se trata de questões que não têm que ver rigorosamente nada com este ponto. Desconheço que haja qualquer intenção de apresentar um projecto de lei sobre a matéria.
Lembro-me, no entanto, de uma história que era assim: «nunca pensámos numa coisa dessas, mas já que falaram...» E depois vinha a história! Ora, em relação a esta questão, nunca tinha pensado nessa hipótese, não está dentro das minhas preocupações, mas quem sabe se não será uma ideia a ponderar.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado José Luís Nunes, um dos traços porventura mais preocupantes do debate, da maneira como tem decorrido até agora, é não só uma insensibilidade como até uma certa arrogância e sobranceria face aos efeitos que está
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a provocar no País a proposta que o Sr. Deputado acaba de, acaloradamente, defender. Vêm de diversos quadrantes, têm amplo eco popular e isso é inegável, não valendo a pena tentar ignorar esse fenómeno, dizendo que sempre houve protestos.
Há pouco, ouvimos o Sr. Ministro Almeida Santos glosar um pouco o mesmo tema, referindo-se que as pessoas sempre protestaram, que já deviam ter sido feitos os aumentos, que as pessoas se habituam, os ministros vão ganhar mais, podendo por isso ser pessoas mais competentes, etc.
É, creio eu, uma perspectiva que subalterniza, subvaloriza e pretende reduzir um fenómeno que existe, que é grave e que é justo.
Digo-lhe que é justo porque uma Assembleia que se fecha de tal forma à situação dramática que o País vive, que sem pestanejar e de maneira fria decreta aumentos como aqueles que estão propostos, é uma Assembleia que está divorciada do País, de maneira nítida e clara.
Um segundo aspecto que me parece de assinalar no discurso que produziu - e independentemente do espírito core que tenha redigido o pedaço de prosa que me leu há pouco, a leitura objectiva que ele pode acarretar é, em meti entender, ambígua e perniciosa é o mito, particularmente grave, de que os aumentos equivalem a garantia de eficácia.
15to porque a aplicação do Regimento e deste estatuto conduz precisamente ao contrário, ou seja, aos biscates, à acumulação e à falha da efectiva execução dos deveres constitucionais que impendem sobre nós.
Ouvi da boca do Sr. Ministro Almeida Santos as mesmas palavras que tem na sua intervenção, porventura com um espectro mais largo, quando ele dizia que o que era preciso era não penalizar a classe política e garantir-lhe o zelo, a dignidade e a seriedade através do aumento de rendimentos.
Cremos que se trata de uma concepção muito perigosa, que isola a Assembleia daquilo que o País sofre neste momento, indo acarretar, certamente, acrescido desprestígio.
O Sr. Deputado José Luís Nunes diz-me que esse desprestígio não existe. Penso que este é o sinal mais claro da atitude de alheamento completo e brutal e de uma insensibilidade chocante - talvez se deva ao facto de o Sr. Deputado ter vindo de fora há pouco tempo - em relação à maneira como neste momento se vive, e se vive mal, no País em relação ao qual temos a responsabilidade de ser deputados.
Ligo-lhe que é com certa mágoa e repulsa que digo o que acabei de dizer.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para contra protestar, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
O Sr. José (Luís Nunes (PS): - Bem, aquilo que o Sr. Deputado fez foi uma intervenção.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Foi uma crítica!
O Orador: - O Sr. Deputado fez uma intervenção e tem todo o direito de afazer. Não deixa de ser uma prova de democracia que estejam aqui, nesta Assembleia da República, a discutir um assunto destes.
Lembro-me que em 1975, por exemplo, este assunto foi tabu durante uns 2 ou 3 meses, não sendo as pessoas capazes de o assumir. Chegou-se portanto, segundo parece, à hora da verdade!
Quanto à repulsa que isso lhe provoca, tenho que de novo louvar um pouco a nossa diferença de idades, porque nos meus tempos a expressão « manifestação de repulsa» tinha um conteúdo que, evidentemente, o Sr. Deputado não quer de forma nenhuma deixar de sublinhar. Não é o ponto de vista do Sr. Deputado.
O Sr. Deputado pode manifestar a sua repulsa como muito bem entender e o Parlamento ouviu-a. A sua intervenção, discutida afundo, teria muito por onde se lhe pegasse, mas há um tema que lhe vou deixar para meditação.
O Sr. Deputado João Amaral interrompeu-me, à pouco, e perguntou-me se era com 30 contos que este assunto ia ser resolvido. Ouvi essa pergunta e não respondi.
que a questão não é essa. Dizia eu, numa intervenção, que mal vai o País em que a Administração em matéria de vencimentos prevalece sobre os órgãos eleitos. É uma forma de caminho para o totalitarismo. É o que se chama a nomenclatura, que não se caracteriza só pelo vencimento que recebe, mas sobretudo pelo privilégio que tem em relação à maioria da população. E como não tem controle nem na comunicação social, que não existe como liberdade, nem na televisão nem nos órgãos do poder, nem de nada, acontece que se vai viver no reino da economia paralela, da nomenclatura e do privilégio absoluto.
Digo-lhe, Sr. Deputado, que um parlamento é um órgão como a judicatura, como o governo, que dispõe em grande parte dos destinos de um país. É bom que ganhe condições para que eles sejam minimamente eficazes. Aquilo que estas propostas contêm são condições mínimas.
Quanto à minha arrogância e sobranceria, talvez assim seja. Não somos nós próprios que somos indicados para nos caracterizarmos e retratarmos. Penso, no entanto, que o PCP não tem grandes razões para criticar quem quer que seja, usando estes termos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos à hora de encerrarmos os nossos trabalhos. Ficarão reservados os pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Joaquim Miranda e Azevedo Soares.
O Sr. Deputado Secretário vai referir os diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: Projecto de lei n.º 409/III, dá iniciativa do Sr. Deputado Adriano Moreira e outros, do CDS, que versa sobre a reciprocidade entre escolas portuguesas e estrangeiras; projecto de lei n.º 410/III, da iniciativa cio Sr. Deputado João Amaral e outros, do PCP, que versa sobre a isenção das autarquias locais do pagamento de preparos e emolumentos de taxas e impostos do selo, nos actos praticados no serviço de registo predial; proposta de lei n.º 90/III de iniciativa do Governo, que visa autorizar o Governo a celebrar, com o Banco Europeu de Investimento, empréstimos e outras operações de crédito, até ao montante de 150 milhões de escudos, para financiamento das construções da ponte ferroviária sobre o rio Douro, do troço Amarante
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-Campeã, na estrada nacional Porto-Bragança, bem como de outros projectos de infra-estruturas, designadamente nas áreas rodoviárias, portuárias e turísticas; resolução nº 18/III, de iniciativa do Governo, que aprova para adesão o Tratado da Comunidade Ibero-Americana da Segurança Social, assinado pelos governos dos países que integram a área de acção da Organização Ibero-Americana de Segurança Social, em 17 de Março de 1982, na cidade de Quito.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os nossos trabalhos recomeçarão amanhã, às 10 horas, com a mesma ordem do dia.
Srs. Deputados, está encerrada a Sessão.
Eram 21 horas.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Alberto Manuel Avelino.
Almerindo da Silva Marques.
António da Costa.
António Gonçalves Janeiro.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Laranjeira Vaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Monteiro Picciochi.
Victor Hugo Sequeira.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio Gaspar Rodrigues.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
João Luís Malato Correia.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Bento Gonçalves.
José Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Manuel da Costa Andrade.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Serafim Jesus Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
João António Torrinhas Paulo.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Areosa Feio.
Rogério António Fernandes.
Zita Maria Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
António José de Castro Bagão Félix.
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Carlos Sousa Nunes Silva.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Hernâni Torres Moutinho.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Lopes Porto.
José Luís Nogueira de Brito.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel Jorge Forte Goes.
Manuel Leão Cestro Tavares.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António Cândido Miranda Macedo.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Bento Elísio de Azevedo.
Eurico Fausto Correia.
José Maria Roque Lino.
José Maximiano Almeida Leitão.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Fernando José da Costa.
Francisco Antunes da Silva.
Raul Gomes dos Santos.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Luísa Cachado.
Maria Odete Santos.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
João Gomes de Abreu Lima.
Narana Sinai Coissoró.
Relatórios e pareceres da Comissão de Regimentos e Mandatos enviados à Mesa para publicação
Em reunião do dia 6 de Dezembro de 1984, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitada pelo Partido Socialista:
António Manuel Chambica de Azevedo Gomes (círculo eleitoral de Lisboa) por José Maximiano Albuquerque de Almeida Leitão. Esta substituição é pedida por um período não superior a 3 meses, a partir do
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próximo dia 11 de Dezembro corrente, inclusive.
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
António Maria de Ornelas Ourique Mendes (círculo eleitoral dos Açores) por Pedro Paulo Carvalho Silva. Esta substituição é pedida ao abrigo da alínea d)) do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, a partir do dia 6 de Dezembro corrente, inclusive.
Joaquim dos Santos Pereira da Costa (círculo eleitoral do Porto) por Serafim de Jesus Silva. Esta substituição é pedida para os dias 6 e 7 de Dezembro corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos, que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - Beatriz Cal Brandão (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - José Manuel Mendes (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
Em reunião realizada no dia 6 de Dezembro de 1984, pelas 15 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitada pelo Partido Social-Democrata:
Mário Martins Adegas (círculo eleitoral de Aveiro) por José Augusto Ferreira de Campos. Esta substituição é pedida para os dias 6 a 13 de Dezembro corrente, inclusive.
Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:
Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Leão Rosas Castro Tavares. Esta substituição é pedida para os dias 6 e 7 de Dezembro corrente, inclusive.
Horácio Alves Marçal (círculo eleitoral de Aveiro) por Carlos de Sousa Nunes da Silva. Esta substituição é pedida para os dias 6 e 7 de Dezembro corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Secretário, José Manuel Mais Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CUS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Manuel Fontes Orvalho (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - António Nascimento Machado Lourenço (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - Joaquim Eduardo Gomes (PSD) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) Francisco Menezes Falcão (CDS) - António Poppe Lopes Cardoso (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
OS REDACTORES: Maria Amélia Martins - Ana Maria Marques da Cruz - Carlos Pinto da Cruz.
PREÇO DESTE NÚMERO 160$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA. E. P.