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I Série -Número 41
Quinta-feira, 24 de Janeiro da 1985
DIÁRIO da Assembleia da República
III LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE JANEIRO DE 1985
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs.
Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Prosseguiu o debate, na generalidade, das propostas de lei n. ° 94/III - Grandes Opções do Plano para 1985 - e n.° 95/III - Orçamento do Estado para 1985 -, tendo intervindo a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Eduardo Pereira) e dos Srs. Secretários de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques) e do Desenvolvimento Regional (Joaquim Nogueira), os Srs. Deputados João Lencastre (CDS), César Oliveira, Hasse Ferreira e Lopes Cardoso (UEDS), Almerindo Marques (PS), Pinheiro Henriques (MDP/CDE), Carlos Carvalhas (PCP), Lobo Xavier e Bagão Félix (CDS), Raul Castro (MDP/CDE), Octávio Teixeira (PCP), Domingues Azevedo (PS), Manuel Fernandes e Anselmo Aníbal (PCP), Abílio Curto (PS), Horácio Marçal, Luís Beiroco e Abreu Lima (CDS), Virgílio Pereira (PSD), Magalhães Mota (ASDI), Nogueira de Brito (CDS), Guido Rodrigues (PSD), Alberto Avelino (PS), Marques Mendes (PSD) e Carlos Lage (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 40 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Abílio Aleixo Curto.
Abílio Nazaré Conceição.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Almerindo da Silva Marques.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Custódio das Neves Ramos.
Edmundo Pedro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco José Fernandes Leal.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Hãndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Luís Duarte Fernandes.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José António Borja dos Reis Borges.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
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José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Manuel _ Luís Gomes Vaz.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Isabel Nunes Cabral.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Nuno Álvaro Freitas Alpoim.
Paulo Manuel Barros Barrai.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Zulmira Helena Alves da Silva.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Monteiro Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Pedro de Barros.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Manuel Pires das Neves.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Licínio Moreira da Silva.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Alexandre Carvalho Reigoto.
António Filipe Neiva Correia.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
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José Luís Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Goes.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Carlos Pinheiro Henriques.
José Manuel Tengarrinha.
Raul Morais e Castro.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Lencastre.
O Sr. João Lencastre (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Para os que, como eu, ainda pensam que Portugal pode ser salvo dentro deste regime, as Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1985 constituem motivo de grande preocupação por 5 razões fundamentais.
Primeira razão: a complacência.
No meio da maior recessão dos últimos anos, o Governo parece contente porque satisfaz, ainda para além do que era necessário, a principal exigência dos credores estrangeiros, ou seja a redução do défice da balança de transacções.
Para o Governo parecem males menores a diminuição da produção, a baixa do poder de compra dos Portugueses, principalmente a dos que têm rendimentos fixos, a queda dramática do investimento, o aumento do número de trabalhadores com salários em atraso, a perigosa derrapagem das finanças públicas, a vacilação do sistema bancário.
Segunda razão: a falta de rigor e de credibilidade.
Como não estar preocupado quando o Governo apresenta esta proposta de lei com 3 meses de atraso e quando as previsões que incluiu nas propostas do ano anterior são tão espectacularmente desmentidas pelos factos. A inflação sobe cerca de 30% em vez dos prometidos 24%, o défice orçamental é excedido em 44%, o investimento afunda-se a 20% e não a 11,9%, o consumo privado cai ainda mais que o previsto enquanto o consumo público continua a crescer alegremente.
A avaliar pelos resultados de 1984 que credibilidade atribuir ás previsões de 1985? É pelo menos duvidoso que, sem medidas estruturais para que obviamente não há vontade política, seja possível compatibilizar um aumento da procura interna de 3,4 % com um défice da balança de transacções de 1 bilião de dólares. É pelo menos duvidoso que seja possível conter o défice orçamental ao nível de 335 milhões de contos: a previsão das receitas correntes parece optimista com os seus 26 % de aumento em relação a 1984, como parece optimista a previsão de despesas apesar do aumento de 32%.
Optimista também, e seguramente tão irrealista como a de 1984, a previsão de 22% da taxa de inflação para, 1985. Infelizmente os défices alargados do Orçamento e da balança se encarregarão de a tornar irrealizável.
A terceira razão para preocupações é a ausência de um projecto.
Dir-se-ia que as Grandes Opções do Plano seriam a sede e a ocasião próprias para, na lógica política dos partidos do Governo, serem apresentadas as grandes linhas de um plano a médio prazo. Nada. Fala-se de condicionantes, fala-se da gestão conjuntural e passa-se rapidamente às políticas sectorial que mais não passam, na sua grande maioria, de votos pios em linguagem tecnocrática: vagos, conformados e desmobilizadores.
A quarta razão de preocupação é a ausência de reformas estruturais.
Onde estão, por exemplo, articulados, em bases minimamente credíveis, as reformas da legislação laborai ou a do arrendamento ou a do mercado de capitais ou a da agricultura ou a do sistema tributário?
Permanecem miragens permanentemente prometidas, permanentemente adiadas.
Finalmente a quinta razão, talvez a mais importante, de grande preocupação é o aprofundamento de um modelo económico cada vez mais estatizante, burocrático e socializante.
Com efeito, que pensar de uma política que agrava cada vez mais a despesa pública e que portanto tem de aumentar os impostos e a dívida pública? O sistema tributário penaliza o trabalho e a poupança, agora ainda mais castigada com o agravamento do imposto de capitais e a redução das taxas de juro dos depósitos a prazo. Não se diga que se optou pelo trabalho contra o capital. É argumento hipócrita porque grande parte dos depósitos são pequenas economias de centenas de milhares de portugueses que só uma imaginação delirante poderia descrever como capitalistas. O resultado é que se espoliam esses portugueses de economias arduamente conseguidas, já que a taxa líquida real de juro é negativa. Nem se diga que se trata de empurrar as poupanças para outras aplicações quando essas não existem, ou melhor, existem noutros países. Não pode ser isso que o Governo pretende.
Mas esta é apenas uma das preversões do nosso sistema fiscal que penaliza quem trabalha, quem poupa e quem investe.
Quanto ao agravamento da dívida pública, a outra fonte de financiamento da despesa pública, só pode, como é evidente, conduzir à cada vez maior atribuição dos recursos do País ao Estado, em detrimento do sector privado.
Em 10 anos, em escudos constantes, o recurso ao crédito interno aumentou de uma vez e meia e ao crédito externo de 10 vezes, e a ratio serviço de dívida-receitas cresceu de 6% para 61 %.
Um governo que aprova o desequilíbrio da alocação de recursos a favor do Estado contra o sector privado, não pode proclamar que quer fazer o contrário. Gostaria que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Vice-Primeiro-Ministro e os deputados da maioria que não são especialistas destas matérias compreendessem que é esta a realidade, mascarada, talvez, por entre a confusão e a profusão dos números.
Seria bom que nos dissessem com coragem se é isso que querem.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Neste tipo de debates é costume, à falta de melhores argumentos, pôr a questão: mas, partindo do
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princípio que os argumentos apresentados são válidos, tem o CDS uma alternativa para propor ao País.
O CDS não foge a esta questão e tem, ao longo destes 18 meses, enunciado as grandes linhas e às vezes até as medidas concretas, do que entende dever ser uma política alternativa. Fê-lo, por exemplo, há um ano na discussão das Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado de 1984, fê-lo recentemente na moção de censura ao Governo.
Mas nunca é demais repetir.
Nós entendemos que a única alternativa eficaz é um sistema económico baseado na iniciativa privada e na afectação de recursos pelos mecanismos do mercado.
A crise permanente em que temos vivido, caracterizada pelos desequilíbrios interno e externo, só será resolvida pela disciplina financeira do Estado e consequente eliminação do financiamento monetário do défice público, isto é, do endividamento do Estado junto da banca, sem o que não haverá reequilibrio durável da balança de pagamentos, mas sim o "ioiô" do stop and go, nem redução da inflação, nem criação de novos empregos.
O modelo de crescimento deverá ser liderado pelas exportações e baseado nos produtos onde temos vantagens comparativas como, por exemplo, os produtos florestais, a pesca, o turismo e os produtos agro-alimentares.
Um modelo aberto de economia melhorará a qualidade dos nossos produtos e serviços e promoverá a especialização dos produtos.
A redução da dependência e vulnerabilidade da economia exigirá uma maior capacidade de adaptação e flexibilidade na afectação de recursos produtivos - o capital e o trabalho.
A modernização e a racionalização do sistema económico passam, em primeiro lugar, pela transferência de recursos do sector público para o sector privado. É imperiosa a contenção das despesas do sector público administrativo e impõe-se a reforma da administração pública: deveria fazer-se a concessão da exploração de certos serviços, a eliminação de certos departamentos, a desburocratização de processos e a despartidarização, moralização e motivação da Administração.
Haverá que ter coragem e vontade política para resolver os problemas das empresas públicas. Para bem do consumidor e do contribuinte a maior parte das empresas na posse do Estado terão de ser privatizadas ou encerradas, se inviáveis.
Deverão afastar-se todas as formas de intervenção estatal que desvirtuem os mecanismos de mercado e "administratizem" a economia. Por outro lado haverá que exigir do Estado a indispensável eficácia nas infra-estruturas básicas.
Deve merecer especial atenção a eliminação de bloqueamentos fundamentais que são hoje travões fortíssimos do desenvolvimento económico. Em primeiro lugar, a rigidez da contratação do trabalho que reduz a produtividade, impede a mobilidade e dificulta a reestruturação da economia, desencoraja a criação de novos postos de trabalho e trava o crescimento dos salários. Em segundo lugar, a falta de um mercado de capitais como estímulo à poupança e suporte ao investimento. Em terceiro lugar, as leis do arrendamento que devem ser revistas no sentido da lógica do mercado que relançará a construção, com enormes benefícios sociais. Em quarto lugar, o sistema tributário em que os impostos directos são de tal maneira progressivos que se
pode falar da confiscação e não da tributação - e isto a um nível que em outros países seria o da pobreza -, e em que a poupança e o investimento são penalizados e não incentivados.
A forma mais eficaz e mais duradoura de corrigir desigualdades consiste em facilitar o acesso à propriedade, incluindo o apoio à aquisição de habitação própria, o estimulo à criação de novas empresas e a viabilização da participação no capital, das pequenas empresas.
A redistribuição por via fiscal é também eficaz e viável desde que moderada e selectiva.
Uma política redistributiva deverá ainda incluir a melhoria dos bens e serviços públicos mas restringir a aplicação dos regimes de subvenção apenas aos que deles necessitem.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em face do que fica dito e das criticas tanto da oposição como da própria maioria e do parecer do Conselho Nacional do Plano, atrevia-me a esperar do espírito patriótico do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Vice-Primeiro-Ministro que este Orçamento fosse retirado para ser revisto como merece e para que as Grandes Opções fossem meditadas e explicitadas nas vias de progresso de que Portugal precisa.
Se assim não for, faço um apelo a todos os deputados para que sobreponham o interesse do País à disciplina partidária e que, com coragem e lucidez votem contra estas propostas de lei que não travam a corrida de Portugal e dos Portugueses para ruína e não lhes dá objectivamente nenhuma esperança.
Aplausos do CDS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Pereira.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, falou V. Ex.ª em complacência... Pois devo dizer-lhe que complacência temos tido nós todos em relação a certas afirmações e posições assumidas aqui na Câmara!
Pela minha parte não estou disposto a ser complacente com V. Ex.ª e desejo perguntar-lhe o seguinte: como explica V. Ex.ª o ter assumido a presidência do Instituto de Participações do Estado se pensa como pensa? Das duas uma: ou V. Ex.ª foi para o Instituto para sabotar as participações do Estado...
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: -... ou V. Ex.ª foi para lá com outros
desígnios que tem de explicar à Câmara.
Vozes da UEDS e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Pela minha parte não estou disposto a permitir a demagogia com que V. Ex.ª sistematicamente tem vindo a intervir nesta Câmara. V. Ex.ª tem obrigação de explicar aos Srs. Deputados e ao País, através deles, quais foram os seus desígnios ao aceitar a presidência do IPE, porque V. Ex.ª, então, terá sido altamente responsável pela sabotagem que tem havido no sector público em Portugal.
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V. Ex.ª não pode eximir-se a explicar-nos aqui qual foi o seu desígnio e o seu objectivo ao assumir e aceitar, no quadro que critica, com a Constituição que critica, com o modelo económico implícito na Constituição, que também critica, a presidência do IPE. Se V. Ex.ª pensa como dia que pensa, não a poderia aceitar
Portanto, V. Ex.ª aceitou a presidência com desígnios de sabotagem, ou outros, que tem de explicar à Assembleia da República.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
O Credor: - Segunda questão: V. Ex.ª fala da iniciativa privada. Explique-me, então, uma coisa: que iniciativa privada tem sido obstaculizada institucionalmente e porquê? Em que é que a Constituição e o seu modelo económico têm impedido a iniciativa privada? Em quê? Quais são os projectos de iniciativa privada conhecidos de V. Ex.ª que não puderam ser implementados devido ao modelo económico da Constituição? Aponte-me um só, Sr. Deputado!
Vozes do UEDS e do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tema palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, o meu camarada César Oliveira já fez um enquadramento global das quest8es que formularemos a V. Ex.ª e, portanto, colocar-lhe-ei apenas uma questão muito precisa.
V. Ex.ª referiu a necessidade de efectuar uma transferência de recursos do sector público para o privado, se bem entendi. Gostaria de saber qual o tipo de metodologia que V. Ex.ª defende: a entrega, pelas entidades do sector público, das acç8es e das participações nas empresas mais lucrativas? E com que critérios financeiros? Com concurso público ou com a entrega pura e simples ao que tem a cor dos olhos mais bonita?
Era este tipo de critérios que gostava de ver esclarecido por V. Ex.ª, para que fique claro o tipo de transferências que visa com as propostas que apresentou. De facto, é preciso que fique claro se a concepção que V. Ex.ª defende é a de deixar para o sector público aquilo que não dá lucro, aquilo em que nenhum privado se quer meter, pondo desta forma o sector público a funcionar como uma "enfermaria" de empresas, que mal começam a ser rentáveis são vendidas!
Gostaria que V. Ex.ª explicasse os critérios de transferência para o sector privado de acções, que defende. Gostaria que a sua concepção ficasse mais clara para que o Parlamento e os Portugueses percebam que tipo de defesa dos interesses privados pretendem aqui introduzir alguns deputados...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - ... e mesmo se essa defesa se refere ao interesse privado em geral ou de certos interesses privados.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, creio que já era altura de deixarmos de parte as fórmulas mistificadoras, a demagogia e o recurso a alibis para esconder os problemas reais.
Sobre o alibi permanente do sector público já o meu camarada César Oliveira o questionou, nomeadamente sobre o tal modelo fechado que impede a iniciativa privada e que nem o Sr. Deputado, nem ninguém, nos explica onde está fechado e quais são os verdadeiros obstáculos que se colocam à iniciativa privada neste pais.
O Sr. Deputado reivindica também transferências do sector público para o privado, esquecendo a realidade que vivemos das transferencias permanentes do sector público para o privado, nomeadamente através da banca e das dezenas e dezenas, se não mesmo das centenas de milhões de contos que o sector privado deve à banca nacionalizada e que, no fundo, são transferências do sector público para o privado! Mas adiante !... Com recurso ao argumento demagógico e mistificador, veio o Sr. Deputado dizer que é necessário rever as rendas de casa para criar e permitir que funcione a lógica de mercado", onde se encontra a solução milagre para os problemas da construção civil.
O Sr. Deputado sabe tão bem como eu e como qualquer de nós que a construção civil, aquela que conta, já está hoje submetida a um regime de puro mercado. As rendas são livres para todas as novas construções e são essas que podem funcionar como estimulo à construção civil. Porém, a prática demonstrou, mais uma vez, que isso é um mito e que a liberalização das rendas, por si só, não leva rigorosamente a lado algum!
Não arrombe portas abertas, Sr. Deputado) Procure encontrar, de facto, soluções para os problemas reais( Essa porta já está aberta e, finalmente, abriu-se sobre o nada!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Mangues (PS): - Sr. Deputado João Lencastre, como sabe - aliás, não faço senão o meu dever - estou sempre atento às intervenções dos deputados da oposição, elementarmente porque quero colher desses deputados aquilo que parece razoável ser colhido. Só que do discurso do Sr. Deputado não fui ainda capaz de colher nada!
Gostaria, pois, que, passando um pouco à concretização, me dissesse o que pensa, de facto, sobre 3 questões, ou melhor, sobre 2, pois uma já foi mais ou menos aqui tratada e há dias tivemos até oportunidade de o fazer em termos públicos.
E isto porquê? Porque podem fazer-se afirmações genéricas, que têm teoricamente receptividade, mas o importante é depois a sua concretização. Ou seja: gostaria que o Sr. Deputado fizesse o favor de me informar, e à Câmara, sobre quais os actos que têm vindo a ser praticados e que levam ao aumento da estatização e da administrativação da economia e ao aumento daquilo a que chamou socialização, até para eu ficar mais satisfeito pois se, de facto, há socialização ficarei satisfeito. De qualquer modo, gostaria que precisasse os factos, pois podemos até estar de acordo.
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O Sr. Deputado disse também que o CDS tem alternativas. Ainda bem! Apresente-as claramente ao País e por ele será julgado e apreciado.
Mas já agora que estamos a discutir o Orçamento e as Grandes Opções do Plano, diga-me concretamente quais são as alternativas do CDS para eu as ponderar, para o Governo as ponderar. Quais as alternativas do CDS relativamente à evolução da dívida pública, à evolução das despesas correntes, quais as que cortaria e porquê, quais as receitas que aumentaria e onde, e assim sucessivamente?
Estou convicto de que quem fala com tanta segurança tem, com certeza, elementos concretos sobre esta matéria!
Por último, um ligeiro apontamento. Quando o Sr. Deputado fala em resolver o problema das empresas públicas, penso que tem a unanimidade desta Câmara. Agora, como o resolver? Pretende dar-nos elementos mais concretos?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Lencastre.
O Sr. João Lencastre (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UEDS pareceu ficar muito zangada com o meu discurso, o que não me espanta pois está na lógica da UEDS.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Não tenha dúvidas!
O Orador: - O Sr. Deputado César Oliveira interpela-me - não sei se de forma muito legítima mas admitamos que sim - sobre as minhas motivações ao aceitar a presidência do antigo IPE.
As minhas motivações foram claras e explicitadas no meu discurso de posse, que terei muito gosto em mandar ao Sr. Deputado César Oliveira. Devo dizer-lhe que fui convidado para exercer esse cargo no governo da Aliança Democrática que tinha, talvez, uma filosofia política diferente da actual maioria, do actual "bloco central".
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Mas não tem a certeza?!
O Orador: - Não há nenhuma contradição entre a minha ideologia, entre as ideias que defendo e a aceitação da presidência do IPE, onde tinha como missão - aliás, aprovada pelos Srs. Ministros da tutela transformar o Instituto numa entidade mais empresarial, tendo, para isso, sido criada uma empresa de capitais públicos, para além de melhorar a gestão das empresas que estavam subordinadas ao IPE, o que foi conseguido nalguma parte e também - isso talvez o espante mas devia conhecê-lo - alienar as participações do Estado em muitas das empresas que faziam parte do IPE. 15to é uma coisa que o Sr. Deputado César Oliveira talvez desconheça mas que o Sr. Deputado Hasse Ferreira, que trabalhou ou trabalha ainda no IPE, certamente não desconhecerá.
É a isto que o Sr. Deputado chama sabotagem? Se é, não me parece que esse seja o termo que descreva o cumprir uma missão que me foi incumbida pelo governo e que, como lhe disse, consistia, entre outros objectivos, em privatizar certas participações do Estado.
Portanto, não há qualquer contradição. Parece-me, sim, que da parte do Sr. Deputado César Oliveira há ignorância ou demagogia.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Não sei se anotei todos os pontos focados pelo Sr. Deputado César Oliveira, mas parece-me que houve um, referente à revisão da Constituição, que não referi no meu discurso - provavelmente o Sr. Deputado não o ouviu com atenção.
De facto, o CDS defende a revisão da Constituição, já a propôs por diversas vezes, e a razão fundamental para essa revisão seria uma retoma de confiança do País na economia. Não acreditamos que com os espartilhos que actualmente existem na economia portuguesa seja possível haver uma confiança que a relance e essa é uma das razões. Por outro lado, pensamos que o sector privado é mais eficaz e mais reprodutivo que o sector público - aliás, os resultados estão à vista tanto em Portugal como noutros países.
Não sei se pretendemos ser muito originais mas o que propomos para Portugal, no fundo, são as mesmas medidas que têm sido implementadas com grande efeito, que têm dado resultado noutros países como, por exemplo, na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos, talvez até na própria Espanha, de cujo Governo actual provavelmente o Sr. Deputado César de Oliveira gostará mais. Portanto, não propomos nada de extremamente original!
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - A ignorância da juventude é um espanto!
O Orador: - Não ouvi o seu comentário mas talvez depois queira falar.
O Sr. Deputado Hasse Ferreira pergunta-me como propomos que se faça a transferência do sector público para o privado. Há que fazer uma distinção entre as participações do Estado, portanto, das empresas ou do sector empresarial do Estado, e a economia em geral.
Quanto à economia em geral, o que me parece trazer este Orçamento, como tive ocasião de salientar, é a predominância do Estado sobre o sector privado pois, com o recurso à dívida pública e com a dívida pública colocada na banca, irá sobrar muito pouco crédito para dar ao sector privado! Aí está uma discriminação ou uma escolha, se quiser, contra o sector privado.
No que se refere à alienação das participações do Estado, seja das empresas nacionalizadas - quando tal for legalmente possível - seja das outras, defendo que ela se faça da maneira que for mais adequada a cada caso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Há uma receita universal!
O Orador: - Não, não há uma receita universal para estas coisas, como o Sr. Deputado deve saber, se conhece alguma coisa de economia e de finanças. Provavelmente, se houvesse um mercado de capitais, uma receita possível seria colocar as acções dessas empresas nesse mercado. Mas isso também não é original. Convinha que os Srs. Deputados se informassem um pouco mais sobre o que se passa nos outros países, pois foi isso que sucedeu recentemente, com grande sucesso, na Grã-Bretanha, em relação à empresa de telecomunicações. Não é nada de muito original!
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Haverá casos em que se deverão fazer concursos, haverá casos em que se farão negociações particulares, mas não há receitas rígidas nem receituários monopolistas, neste caso.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso informa-me que a construção não será relançada se houver uma lei de arrendamento, pois o que deve ser relançado já o está, existem já as rendas livres. Foi assim que o entendi: como há rendas livres, o mercado está já a funcionar e, portanto, não vale a pena fazer uma lei das rendas ou, pelo menos, essa lei do arrendamento não vai promover a construção. Não sei se se trata de uma interpretação correcta, pois parece-me que não corresponde à verdade e que é preciso uma lei do arrendamento. Aliás, julgo que hoje, a própria maioria o defende e até calendariza essa lei do arrendamento. Por outro lado, também não me parece que haja já rendas livres. Houve alguma liberalização de rendas no regime de rendas condicionadas, mas parece-me um grande exagero dizer-se que, hoje em dia, em Portugal existe um sistema de rendas livres, pelo menos, para a habitação privada.
Quanto ao Sr. Deputado Almerindo Marques, que disse não ter sido capaz de colher nada do meu discurso, não sei se o problema é meu ou se é do Sr. Deputado. Enfim!...
Mas fez-me depois algumas perguntas que têm a ver com a questão de saber quais são os actos - não sei se deste Governo ou do Orçamento - que demonstram a estatização da economia.
Sr. Deputado Almerindo Marques, é fácil responder-lhe. Este Orçamento vem no sentido da estatização, como tive ocasião de explicar, na medida em que, ao fazer uma alocação de recursos que favorece o sector público, vai evidentemente no sentido da estatização e contra a privatização.
Depois, perguntou-me, classicamente, quais as despesas que eu cortava e quais as receitas que aumentava, o que propunha como alternativa. Ora, talvez me socorra da resposta que o Sr. Deputado João Salgueiro deu no seu corajoso discurso de ontem: é que não posso dar-lhe respostas destas em 5 minutos, nem estamos no local oportuno para o fazer.
O Governo, que estudou durante vários meses o problema, é que devia ter alternativas. Nós, se algum dia voltarmos a ser governo, apresentaremos então essas alternativas.
Quanto à maneira de resolver o problema das empresas públicas, de acordo com a minha óptica, penso que já respondi a esta questão relativamente a um outro Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado César Oliveira.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, começo por lhe dizer que, se a ignorância da juventude é um espanto, a ignorância dos que já são menos jovens é mais espantosa ainda. E que V. Ex.ª diz que houve bons resultados nos EUA - não sei se V. Ex.ª alinha ou não naquele grupo chamado "Chicago's boys portugueses", é natural que sim -, na Inglaterra e em outros países. Mas V. Ex.ª e ignora completamente a formação da sociedade portuguesa contemporânea, a inexistência em Portugal de uma política... V. Ex.ª ignora, por exemplo, que em Portugal, polémica entre livre-cambismo e proteccionismo foi sempre ganha, e não foi por acaso, pelo proteccionismo.
Será que na Inglaterra V. Ex.ª encontra 62,4 % das unidades industriais, registadas como tal, empregando até 10 operários? Não encontra, Sr. Deputado! Mas cá, sim, é o que tem! 15to é, V. Ex.ª quer, em Portugal, uma iniciativa privada que sempre beneficiou do Estado.
Porque é que existiu o condicionamento industrial durante tantos anos? Porque é que, em 1945, Ferreira, Dias teve de ser afastado, por se aproximar em alguns sectores das posições que V. Ex.ª agora defende? Será que isto acontece por puro acaso?
Tenha consciência, Sr. Deputado, de que a política que V. Ex.ª preconiza - o CDS tem que o assumir, tal como também as pessoas do PSD que o defendem -, os despedimentos, o encerramento das empresas públicas, as medidas drásticas que propõe só são compatíveis, em Portugal, com um regime de ditadura. É que V. Ex.ª não pode despedir, não pode fechar empresas públicas num regime democrático! E não pode porque não tem condições que permitam à iniciativa privada tornar supletiva a função que é exercida pelo Estado!
Convença-se, Sr. Deputado, que só num regime de ditadura é que V. Ex.ª consegue levar até ao fim o projecto político que defende.
Haveremos de ver - lamentavelmente talvez tenhamos que assistir a isso - no momento em que as vossas reivindicações, quer institucionais, quer no que respeita à revisão da Constituição, forem satisfeitas, o fracasso a que, de facto, elas conduziram e nessa altura talvez vejamos alguns deputados dessa bancada a pedirem uma mudança drástica do regime político. É que, de facto, só com uma ditadura é que o vosso projecto consegue ser efectivamente implantado na sociedade portuguesa.
É esta a questão fundamental e é isto que cumpre denunciar aqui nesta Assembleia.
Vozes da UEDS: - Muito bem!
Uma voz do CDS: - Não apoiado!
O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado João Lencastre prefere responder só no final, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, parece-me que, de facto, o Estado e os organismos e empresas dele dependentes podem alienar participações em empresas. Mas recordo o discurso - que ainda guardo - que V. Ex.ª proferiu no dia da sua tomada de posse em resposta ao discurso do Sr. Ministro das Finanças, seu correlegionário, Dr. Morais Leitão, e conheço os documentos produzidos durante a sua gestão.
Porém, quero lembrar-lhe que se pode vender, se pode fazer desinvestimentos, se pode e deve fazer investimentos; se pode alienar e se pode fechar empresas, tendo em atenção as particularidades estruturais da nossa economia, que o meu camarada César Oliveira referiu mas que V Ex.ª parece ignorar. Aliás, desculpe-me mas V. Ex.ª exibe aqui uma cultura livresca em relação ao que é a economia portuguesa que não é compatível com a situação real desta. É que não basta conhecer o que se passa nos EUA e em Inglaterra!
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O Sr. Soares Cruz (CDS): - Mas não se deve ignorar!
O Orador: - Embora pior do que o Sr. Deputado vou conhecendo alguma coisa do que se passa na Europa e talvez porque passo cá mais tempo que V. Ex.ª, conheço melhor o que aqui se passa.
Vozes dai UEDS: - Muito bem!
O Sr. Lucas Pires (CDS): - 15so é o "orgulhosamente sós"!
O Orador: - Ó, Sr. Deputado Lucas Pires, quanto ao "orgulhosamente sós", as conotações com o pensamento da extrema-direita salazarista estão mais próximas da sua bancada do que da minha.
Já no tempo do "orgulhosamente sós" eu me batia contra o regime e, enquanto alguns Srs. Deputados da sua bancada ocupavam altos cargos em empresas, eu era expulso de todas as Universidades. Portanto, a conotação com o "orgulhosamente sós" deixo-a ai para a sua bancada!
Aplausos da UEDS e do PS.
O Sr. Lucas Pires (CDS): - 15so confunde-se com o socialismo nacional!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco, fomos nós que ficámos incomodados porque, em democracia, não nos queremos acomodar a uma nova ditadura que espreita por detrás das melifulas palavras que o Sr. Deputado João Lencastre aqui proferiu!
Aplausos da UEDS e do PS.
Não estou a acusar o Sr. Deputado João Lencastre de defender ou de ter um pensamento de extrema-direita no plano político. Estou, sim, a dizer que a aplicação política rigorosa das suas propostas, tal como as formula, não é viável num sistema democrático. Os senhores estão convencidos que, transformando a economia portuguesa, poderão passar dos 12 % ou dos 14 % de votos que têm a um grande partido. Não podem! A economia portuguesa não suporta as vossas propostas
Vozes do CDS: - E vós?!
O Orador: - Nós somos socialistas e integramo-nos num bloco que teve, nas últimas eleições, dois milhões de votos. Somos socialistas!
Uma voz do CDS: - São apêndices!
O Sr. César O11velra (UEDS): - Mais vale ser apêndice...
O orador: - Do que não ter apêndice!
Risos.
Politicamente falando, claro... Se calhar, o que fazia falta a VV. Ex.ªs era um pequeno partido de extrema-direita, situado ainda à vossa direita, que vos desse alguma cobertura face à moderação da posição de alguns dos vossos dirigentes.
Mas continuando: V. Ex.ª, Sr. Deputado João Lencastre, foi nomeado presidente do IPE, que depois foi transformado. Não tenho nada contra esse projecto de aumento em investimento e participações do Estado nem estou a criticar, neste momento, essa transformação. O problema é que ele se passou a chamar "Investimento e Participações do Estado", e, na sequência lógica de algumas das suas propostas, dever-se-ia ter passado a chamar "Desinvestimento e Alienações do Estado". É que V. Ex.ª foi nomeado e aceitou ser presidente de um conselho de gerência e não de uma comissão liquidatária!
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Quanto à questão das alienações, estou de acordo consigo quando diz que pode haver vários critérios. Mas há um critério que predomina e que tem de ser defendido a todos os níveis, desde a administração central à local, a todos os níveis em que o Estado ou as autarquias estejam presentes, e que é a regra da transparência.
Ora, a regra da transparência tem de ser seguida pelo Estado nessa alienação de participações, nesses desinvestimentos ou nos novos investimentos. O Estado tem de ser uma pessoa de bem também nas relações que tem com as entidades privadas. E é o cumprimento dessa regra que é preciso exigir, a todo o momento, aos gestores públicos e aos gestores autárquicos.
E, para não ultrapassarmos o quadro deste debate, neste momento, por aqui me fico.
Vozes do UEIDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Também para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Deputado João Lencastre, devo ter-me explicado muito mal, porque o Sr. Deputado não entendeu nada do que eu disse, ou então fingiu não entender. Se calhar foi isso. É que a demagogia dificilmente resiste a uma análise serena e minimamente cuidada.
Ora, eu não disse que era desnecessária uma lei das rendas, nem me pronunciei sobre o assunto. O que eu disse foi que é perfeitamente demagógico apresentar o problema da lei das rendas e da liberalização do mercado das rendas como o "abre-te Césamo", da construção civil, porque a prática já mostrou que não é assim. Ao assunto, o Sr. Deputado disse nada!
Mas o que verdadeiramente me espantou na sua argumentação foi a razão decisiva que arranjou para provar que é necessária a lei das rendas. O Sr. Deputado disse que a prova de que essa lei é tão necessária está no facto de a própria maioria lhe ser favorável. Por essa lógica, Sr. Deputado, ainda o vou ver votar o Orçamento no fim deste debate porque a maioria vai votá-lo. E como a maioria, por definição, de acordo com as suas palavras, tem sempre razão, o Sr. Deputado terá de reconhecer essa razão e votar também este Orçamento!
O Sr. Presidente: - Também para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado João Lencastre, queria apenas registar 2 ou 3 notas da sua intervenção.
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A primeira delas traduz-se no facto de, entre as várias alternativas possíveis, ter escolhido a estatização. Ora, o que referiu não é estatização. A estatização é coisa bem clara, bem determinada, de conteúdo inequívoco, de acordo com a literatura especializada.
Relativamente às alternativas, compreendo que cite o Sr. Deputado João Salgueiro e que adie as alternativas que ó CDS tem. De qualquer modo, gostaria que confirmasse se esse adiamento é para a sede própria, para a comissão de especialidade, onde, presumo eu, surgirão as alternativas propostas para as áreas que referi.
Queria concluir dizendo-lhe, com sinceridade que proeuro colher as posições das oposições e ninguém tem o díríto de pôr em causa esta minha atitude pessoal. Por outro lado, queria ainda dizer que a agressividade nunca colhe.
O Sr. José Gama (CDS): - Para quem é essa?
O Orador: - Obviamente, para quem me estou a dirigir.
A agressividade - repito - nunca colhe. É pública a agressividade que o Sr. Deputado põe nas suas intervenções e como eu não tenho comportamento similar, apenas quero registar que a agressividade nunca colhe.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado João Lencastre.
O Sr. João Lencastre (CDS): - Vejo que a bancada da UEDS continua bastante agressiva a respeito das ideias que expresso.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Exactamente!
O Orador: - O Sr. Deputado César Oliveira que é, segundo julgo saber, o historiador da classe operária, fez...
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça o favor.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Agora, e devido às intervenções de V. Ex.ª nesta Câmara, estou-me a dedicar particularmente ao estudo da construção do Estado Novo e do salazarismo, abandonando a história da classe operária.
O Orador: - 15so só me leva a crer que o Sr. Deputado César Oliveira confunde o liberalismo, que é o que eu defendo, com o salazarismo, o que me parece ser uma grave confusão ideológica.
Mas o que acho muito mais grave é que os Srs. Deputados da UEDS aqui venham dizer que, em Portugal, a única alternativa liberal ao actual sistema é uma ditadura quando o que está na origem da ditadura é, sim, o descalabro económico a que uma certa ideologia, que os senhores subscrevem, tem levado Portugal.
Aplausos do CDS.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Está a ver! Está a ver!
O Orador: - Devo dizer ainda ao Sr. Deputado César Oliveira que as minhas linhas básicas programáticas económicas não passam por despedimentos de pessoal. Não é objectivo do liberalismo despedir pessoal, pelo contrário, o seu objectivo é criar postos de trabalho. Está, portanto, mais uma vez enganado.
O Sr. Deputado Hasse Ferreira falou na minha cultura livresca.
De facto, aqui, não resisto a referir que o Sr. Deputado Hasse Ferreira tem sido, julgo eu, professor ou instrutor do CIFAO, que é um organismo que funciona junto do IPE, um apêndice do IPE.
Ora, eu tive oportunidade de ser gestor de várias empresas em Portugal e também no estrangeiro. Aí, colhi alguma experiência, que não me parece tratar-se de cultura livresca, e gostaria de saber que experiência tem o Sr. Deputado Hasse Ferreira que não seja livresca.
Quanto à observação que o Sr. Deputado Almerindo Marques fez quanto à minha agressividade, está no seu direito, não lho contesto.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Queria explicar, para que fique claro, que, ao contrário do que fizeram outras pessoas, interrompi o meu contrato no IPE. Porém, não foi só lá que ensinei, mas também em duas Universidades do Estado.
Por outro lado, tenho uma experiência de empresa que, se V. Ex.ª quiser, pode comprovar pedindo ao IPE o meu curriculum, quando voltar a ser seu presidente num próximo governo da AD ou quando for ministro das Finanças nesse governo da AD. É que estamos já preparados para tudo! Paciência! Apesar de tudo, esta solução seria melhor que outras que também já aventámos...
Já suportámos um governo da AD, pode ser que venha a haver outro e que seja V. Ex.ª o ministro das Finanças. Longe vá o agouro, mas, enfim, o que se há-de fazer?!
Ou, então, se quiser, envio-lhe o meu curriculum ou até lho dou pessoalmente.
É claro que não comparo a minha experiência profissional com a do Sr. Deputado, que é muito mais longa. Mas o que acontece é que, em meu entender, as propostas que V. Ex.ª faz nas intervenções que aqui apresenta radicam-se, não na experiência que tem, mas em preconceitos ideológicos que o fazem alterar a perspectivação em que efectivamente se insere.
Era apenas isto que eu queria dizer. Conheço, grosso modo, a sua experiência e o seu curriculum impressionante e é exactamente por isso que reajo assim. Se se tratasse de um deputado sem qualquer experiência de empresa a dizer aqui o que V. Ex.ª disse, eu não me incomodava. Talvez lhe fizesse uma pergunta ou talvez não lhe fizesse nenhuma. Agora, o Sr. tem particulares responsabilidades porque é um gestor com uma experiência extraordinária.
A minha tese, que V. Ex.ª certamente rejeita, é que o Sr. Deputado se apresenta aqui movido por razões ideológicas e não baseado na sua experiência.
Mas o Sr. Deputado João Lencastre não respondeu a nada do que eu perguntei e levou a questão ad
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hominem, o que eu não quis fazer. Não pus, sequer, em causa, a sua capacidade e o seu curriculum, disse apenas que as suas propostas provêm de uma cultura livresca, o que não considero impróprio para um deputado. Pelo contrário, penso que é de apreciar.
De qualquer modo, quero lamentar que V. Ex.ª tenha levado a questão para uma regra de autoridade: «não respondo às tuas perguntas porque tenho mais experiência do que tu». Ora, isso é que eu não posso aceitar num parlamento. O Sr. Deputado não respondeu às minhas perguntas e tentou desviar-se para a comparação dos currículos porque sabe que, se aprofundarmos a questão, não tem razão. Foi por isso que invoquei o direito de defesa e não admito que seja dada uma resposta ad hominem numa situação em que estamos a discutir política.
O Sr. Deputado também já nos tinha acusado de termos preconceitos ideológicos e é isso que lhe devolvo. Não pus em causa, de maneira nenhuma, a sua competência, o que ponho em causa é que as propostas políticas que aqui faz estejam directamente articuladas com a experiência profissional que V. Ex.ª tem.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Lencastre deseja responder?
O Sr. João Lencastre (CDS): - Não, Sr. Presidente.
O Sr. José Gama (CDS): - É melhor mandar o curriculum pelo correio!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr s. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não creio surpreender ninguém dizendo que não é fácil discutir os documentos das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado, uma vez que também não é novidade para ninguém que o País vive desde há anos uma crise grave e que não era pensável que se pudesse sair dessa crise em meses ou mesmo em 2 ou 3 anos.
A verdade é que se trata da discussão de documentos essenciais para a execução da política do Governo. E porque se trata de documentos essenciais, exige-se que esta Câmara os discuta com seriedade, sem demagogia, com responsabilidade e, sobretudo, com o sentido que tem de discutir estes documentos nos meados de Fevereiro, como nós presumimos vir a acontecer.
Todos sabemos - e é importante que todos tirem daí a ilação devida - que o País não tem condições para apresentar um orçamento que seja mais favorável aos objectivos que todos os Srs. Deputados defendem - é justo que aqui o reconheça -, ou seja, a melhoria da vida dos Portugueses em geral, o relançamento da economia e, naturalmente, a eliminação progressiva, com maior velocidade do que a que tem sido possível, dos grandes estrangulamentos da nossa sociedade.
Naturalmente que o Grupo Parlamentar do PS tem, relativamente à discussão destes documentos, uma visão global, pelo que não vai poder circunscrever-se a questões meramente conjunturais, isto é, a questões que se esgotam no ano a que dizem respeito os documentos, nem tão-pouco vai desinserir esta discussão dos aspectos políticos mais gerais que envolvem quer a aprovação, quer a não aprovação - se esse fosse o caso -
dos documentos em discussão. O PS jamais separará as questões políticas e o ano político das opções que toma na discussão e votação dos documentos em análise.
Feito este pequeno intróito, que podemos qualificar como considerações prévias, passemos à análise dos documentos em causa.
Nas propostas que nos apresenta, o Governo afirma procurar que a economia do País venha a ter um crescimento moderado, na ordem dos 30%, e que será seu objectivo a redução do ritmo inflacionário para 22%.
Ora, a primeira questão que se pode pôr é a de saber se alguém tem dúvidas quanto ao acerto dos objectivos enunciados, embora se possa discutir a sua quantificação.
Outra questão que também se pode colocar é a de determinar se a execução e a prática política do Governo serão as necessárias para a concretização daqueles objectivos.
Por parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, poderá desde já o Governo saber que recebe apoio crítico, apoio sistemático, às efectivas realizações dos objectivos a que o Executivo se propõe e que pretende ver ratificados nesta Assembleia.
Naturalmente que não me vou espraiar em considerações, pelo menos por agora, sobre o acerto destes objectivos.
Podemos, portanto, passar a uma outra questão, em relação à qual devemos fazer perguntas claras, do tipo «sim ou não».
Quem igonora que este Orçamento tem que reflectir as grandes dificuldades existentes há anos, antes e depois de 1974, sentidas pela economia portuguesa? Quem as ignora ou quem não as ignora?
Não vou exemplificar, mas recordo o já tão debatido problema da dívida e das suas consequências, e lembro, por exemplo, as próprias questões estruturais da economia que vêm de há muitos anos. E até faço uma pergunta concreta sobre uma questão importante: quem não reconhece os próprios preconceitos ou conceitos culturais de uma sociedade que há largos anos sempre e sempre pensou viver à «mesa do orçamento»?
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quem ignora - e é importante que se fique a saber quem - as dificuldade da economia por virtude de razões externas?
Não vale a pena dizer porquê, mas a verdade é que a economia portuguesa está muitíssimo interligada e interdependente das economias estrangeiras. Só para exemplificar, devo fazer notar a dependência, em virtude da dívida, face à cotação do dólar e à evolução das taxas de juro internacionais.
Quem tem dúvidas sobre os aspectos não positivos deste Orçamento? Ninguém. O próprio Governo, quando apresenta o Orçamento, sabe - e di-lo através da exposição do Sr. Ministro das Finanças e do Plano - das dificuldades e das fraquezas do Orçamento.
Mas aos grupos parlamentares - e é assim que entendo a função dos partidos que apoiam o Governo e os da oposição - importa apresentar alterações concretas para que sejam valoradas politicamente pela Assembleia e pelo País, em geral.
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Como diminuiriam o défice que ora se apresenta? Se atacavam a redução do défice pelo lado das despesas, quais as despesas que reduziriam? Se o atacavam pelo lado das receitas, quais as receitas que aumentariam?
Naturalmente que o Grupo Parlamentar do PS apoiará todos os esforços no sentido da redução do défice. Mas entendamo-nos: reduções do défice que sejam não só política, mas também socialmente aceitáveis.
Não temos sobre qualquer espécie de matéria conceitos axiomáticos - e, por isso, a nossa abertura nestes precisos contornos é total.
Obviamente, e desde já, o PS apoia as evoluções de algumas despesas correntes que tiveram crescimento significativo. E quem não as apoia que o diga: diga se apoia ou não as verbas que terão de ser afectadas ao funcionamento das autarquias, diga se apoia ou não as verbas que têm de ser afectadas à remuneração dos funcionários, tendo em conta o pressuposto da eliminação das reduções dos salários reais. É necessário que se saiba quem não apoia este objectivo do Governo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se o PS lamenta e tudo fará para combater o défice, pergunta-se: não haverá alguma contradição quando defende o aumento destas despesas? Jamais, não há nenhuma contradição! O que o PS entende é que a resolução dos problemas do País, que não são possíveis de resolver num só ano, passa, como já tivemos oportunidade de dizer nesta Câmara, por um efectivo combate a todas as despesas correntes que são supérfluas e cuja continuidade se não justifique, sejam quais forem as causas dessas despesas. O PS combate e dispõe-se aprofundar e eliminar os exageros que se verificam na afectação dos subsídios. preciso eliminar da sociedade portuguesa a concepção de quase caridade, que não de gestão, que se traduz na atribuição de subsídios a tudo e a todos...
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ..., sejam eles destinados a empresas públicas ou a empresas privadas.
Aplausos do PS e do PSD.
Às empresas públicas importa só, e só, atribuir indemnizações compensatórias - o resto é com os gestores. Mas deixem os gestores gerir! As empresas privadas só é legitimo atribuir subsídios quando os empresários assumam riscos excepcionais e de verdadeiro interesse para a comunidade.
Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PS atacará sistematicamente e exige do Governo mais vigor na luta contra a fuga aos impostos; o PS apoiará a racionalização de todas as despesas que se fazem em Portugal e que carecem de efectivas melhorias na sua concretização.
O Sr. António Macedo (PS): - Muito bem!
O Orador: - Naturalmente que o PS apoia a reestruturação do aparelho administrativo e do sector empresarial do Estado. Que fique claro, de uma vez por todas, que discutiremos com todos os partidos a forma de o conseguir e que exigiremos a aplicação das medidas concretas. Mas vamos às questões reais, sem as iludir com afirmações genéricas ou de natureza meramente ideológica.
A outra salda para a contradição aparente está na necessidade de desenvolver a economia portuguesa.
Nesta matéria, também tenho preocupações relativamente à execução deste Orçamento, preocupações que devem ser assumidas por todos nós, sem nenhum preconceito, sem andarmos à caça "de quem é quem" e "de quem tem culpa do quê". Neste momento, e independentemente da sua génese, o que se verifica é que esta matéria constitui um problema de Portugal e dos Portugueses.
Para desenvolver a economia torna-se necessário, como é óbvio, passar aos actos. No sector da agricultura, no sector da habitação e obras públicas, nos sectores exportadores. O que importa é passar, de facto, aos actos. Os governos têm de governar, os parlamentos têm de exigir e fiscalizar esses governos. Que cada um de nós cumpra, portanto, o que a cada um lhe cabe.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PS assume, sem preconceitos - e há vários anos o faz -, a necessidade de criar condições para a iniciativa privada, condições que permitam aos empresários terem confiança. E é importante que essa confiança lhes seja transmitida, desde logo pelo Governo, com convicção e a partir do momento em que apresente as suas posições em termos públicos. Mas tal confiança deve também ser transmitida aos Portugueses e aos agentes económicos por esta Câmara. No entanto, esta Assembleia só pode transmitir essa confiança quando criticar frontalmente e, ao mesmo tempo, assumir em termos responsáveis a função que lhe cabe, ou seja, dar instrumentos ao Governo para que este possa actuar e criar condições de confiança em todo o País.
Permito-me chamar a atenção para o que é necessário fazer no campo da dinamização do mercado de capitais, tendo em conta, sobretudo, o que nos é proposto, em termos fiscais, na tributação dos juros dos depósitos a prazo.
Teremos que ver este fenómeno como estando integrado na dinamização do mercado de capitais e articulá-lo convenientemente.
Permito-me, pois, chamar a atenção de todos, e do Governo em especial, para este aspecto.
Penso que a função desta Câmara ficaria incompleta se não fizesse algumas considerações sobre o que tem sido a prática em Portugal dos Orçamentos do Estado e sobre o que devemos fazer para que esta prática seja melhorada. Refiro-me, concretamente, ao controle da execução dos orçamentos.
Em sede própria, proporemos medidas que permitam ao Parlamento acompanhar melhor a execução deste Orçamento e mais: que permitam apoiar o Governo, e o Ministério das Finanças em especial, na execução orçamental.
Não podemos continuar a assistir passivamente, com poucos meios para o evitar - porque os factos nos são
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presentes a posteriori -, a desvios de execução orçamental da magnitude daqueles a que o País vem sendo habituado.
É conveniente que tenhamos isto bem presente na discussão do Orçamento e não só relativamente ao Orçamento: eu lembraria também, e em especial, o caso dos fundos e serviços autónomos.
O Governo não nos pode apresentar de novo situações como as que se verificaram em anos recentes no que respeita à execução dos orçamentos destes fundos e serviços autónomos. Recordo em especial o Fundo de Abastecimento, pelo significado fundamental que ele traduz, quer em termos sociais quer em termos financeiros, uma vez que, como sabem, é este fundo que articula a política de preços.
Se me fosse permitido concluir, sintetizando o que queria transmitir à Câmara, diria que temos de trabalhar neste Orçamento para que ele venha a ser a peça fundamental de co-responsabilização do Governo e do Parlamento perante o País: o Governo pela sua efectiva realização e o Parlamento pela efectiva concretização das medidas que vierem a ser aqui aprovadas.
O Grupo Parlamentar do PS tem a disponibilidade completa para concretizar estes objectivos.
Sejamos capazes, pois, de transmitir a todo o País e aos agentes económicos a confiança, que é a peça fundamental para o relançamento da economia portuguesa.
Essa confiança só se conseguirá se o Governo e o Parlamento discutirem, com lealdade e reciproca responsabilidade, os problemas que são agora nossos, mas que, de facto, são sempre de todos os Portugueses.
Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, queria apresentar, em nome do meu grupo parlamentar, o protesto por uma circunstância que, infelizmente, parece repetir-se vezes de mais nesta Câmara.
De facto, sucede que o deputado do meu partido que acaba de intervir, vice-presidente da Comissão Parlamentar de Economia e Finanças e Plano, vice-presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que exprimiu da tribuna a posição do Grupo Parlamentar do PS, não viu a sua intervenção ser coberta pela Radiotelevisão Portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - E é nossa dúvida saber se, nestas circunstâncias, é possível fazer a cobertura de um debate com regras de objectividade mínimas.
Tem sido nossa posição relativamente a esta questão procurar nunca empolar medidas de retaliação da nossa parte face ao órgãos de comunicação social. Mas se noutros momentos pudemos compreender o estado de crispação de algumas bancadas por não verem intervenções suas, consideradas essenciais, cobertas pela televisão, não podemos deixar também de apresentar o nosso protesto por uma falta gravíssima que inevitavelmente reflectirá uma ausência de objectividade na cobertura do que aqui se passou.
Aplausos do PS e da ASDI.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa não dispõe de qualquer informação acerca das razões que motivaram a não cobertura da Radiotelevisão Portuguesa desta parte do debate. Mas a Mesa vai imediatamente tomar as providências necessárias para determinar o que se passa, transmitindo de seguida a informação adequada.
Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, pretendia associar-me aos protestos efectuados pelo Sr. Deputado Jorge Lacão.
De facto, já várias vezes temos protestado contra a forma como a Radiotelevisão Portuguesa cobre os trabalhos desta Assembleia. E julgo que o temos feito indiscriminadamente, fossem quais fossem os grupos parlamentares que estivessem em causa.
Queríamos, portanto corroborar as palavras do Sr. Deputado Jorge Lacão e ainda ir mais longe, dizendo que aquilo que se passou com esta última intervenção dá um pouco a imagem do que se tem passado relativamente ao conjunto dos debates sobre os quais a televisão não tem prestado a atenção mínima que a importância deste debate justificaria por parte de um órgão de comunicação tão importante como é a Radiotelevisão Portuguesa.
Aplausos do PS e da UEDS.
O Sr. Presidente: - Igualmente para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, independentemente do facto que o Sr. Deputado Jorge Lacão acabou de referir, o Partido Social-Democrata sempre manifestou as maiores reservas e os mais firmes protestos pela deficiente cobertura que, em qualquer circunstância, a televisão faz dos trabalhos parlamentares.
Sempre as administrações da RTP prometeram que a cobertura dos trabalhos da Assembleia seria revista. No entanto, há vários anos que essa revisão não se tem verificado, o que lamentamos.
O que o Sr. Deputado Jorge Lacão referiu é apenas um pormenor, naturalmente importante, de um contexto que rapidamente deve ser ultrapassado para a dignidade da democracia, de que esta Assembleia é um expoente fundamental.
O Sr. Presidente: - Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que foi levantada reporta-se à falta de cobertura pela televisão da intervenção do Sr. Deputado Almerindo Marques.
Já estamos habituados a que a televisão não dê cobertura às nossas intervenções e às de outros partidos da oposição e compreendemos que neste caso haja estranheza por parte do Partido Socialista, porque ele está habituado a ter cobertura televisiva das suas intervenções, coisa que a oposição não tem.
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De qualquer forma, naturalmente que nos associamos à interpelação feita à Mesa a propósito da actuação da televisão, mas não queremos deixar de dizer que mesmo quando a televisão está presente também interpelamos a Mesa e a própria televisão pela discriminação que ela faz quanto à cobertura dos debates. É evidente que quando estão no uso da palavra deputados da maioria a televisão acende as luzes e filma as intervenções; mas quando são deputados da oposição, a televisão ignora-os.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este assunto encerra 2 aspectos: falta de cobertura do debate pela televisão e marginalização dos deputados da oposição, situação que é igualmente intolerável.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria de manifestar a esta Câmara, mais uma vez, a nossa estranheza pelo comportamento da televisão, mas também, por outro lado, a nossa estranheza pela atitude que o Partido Socialista tomou hoje relativamente ao comportamento da televisão neste debate.
É que, na realidade, em circunstâncias semelhantes, o CDS, em nome da dignidade desta Câmara e da liberdade de informação, levantou aqui este problema por mais de uma vez e não em defesa dos nossos próprios interesses, mas em defesa do interesse da dignidade desta Câmara. E nessas mesmas circunstâncias, e ainda há bem pouco tempo, a bancada do Partido Socialista acusou o CDS de promover a ingerência do poder legislativo na televisão!
Fica agora demonstrado que, na realidade, essa acusação na altura não passava de pura demagogia e assentava apenas na circunstância de o Partido Socialista então, porventura, se sentir beneficiado ou protegido por essa atitude da televisão.
Mas a realidade, a sequência dos factos, veio demonstrar que estávamos com a razão e que quando a televisão, como acontece agora, não tem qualquer tipo de critério para comandar a sua actividade, até aqueles que julgam beneficiar dessa ausência de critérios podem vir a ser prejudicados.
É este o risco da arbitrariedade, o risco da ilegalidade em que a televisão portuguesa continua a viver, o risco da partidarização completa e total em que se encontra a televisão portuguesa.
Penso, portanto, que os principais responsáveis por esta situação não têm, pelo menos, legitimidade moral e política para agora a virem aqui denunciar.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, parece-me útil que não abramos agora um debate relacionado com esta matéria, em prejuízo do debate sobre o Orçamento de Estado que estamos a realizar.
Em todo o caso, como o Partido Socialista foi citado, para exercer o direito de defesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas para salientar que esta Câmara já votou a constituição de duas Comissões de Inquérito à RTP, uma de iniciativa do CDS e outra de todos os grupos parlamentares.
Assim, demagogia foi o que ouvimos agora nas palavras do Sr. Deputado Gomes de Pinho, porque se o Partido Socialista se tivesse oposto ao pedido de inquérito suscitado pelo CDS, então, o Sr. Deputado teria razão. Mas a nossa prática não foi essa e é de salientar que enquanto o CDS esteve no Poder algumas vezes se opôs a iniciativas do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que na altura estava na oposição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas não é esta a nossa atitude de momento. Estamos na maioria e não inviabilizámos qualquer iniciativa do CDS. Quando aqui se suscitou um incidente relativamente a uma deficiente cobertura por parte da RTP, participámos conjuntamente na subscrição para a formação de uma segunda comissão de inquérito, que está em curso, e nunca aqui negámos a legitimidade de qualquer grupo parlamentar defender os seus direitos relativamente à possibilidade de expressão dos seus pontos de vista, designadamente através da RTP.
Temo-nos insurgido, isso sim, quanto ao aproveitamento, do nosso ponto de vista por vezes abusivo, que o CDS, e designadamente o Sr. Deputado Gomes de Pinho, aqui tem feito relativamente à televisão, quando, para além de uma queixa, tem feito outras intervenções que visam orientar os próprios critérios de programação por parte da RTP. Nisso obviamente que não participámos, não participamos, nem participaremos!
Temos direito à queixa que aqui fizemos e reconhecemos o direito de outros a outras queixas de teor semelhante. Para além disto, tudo é demagogia, Sr. Deputado Gomes de Pinho!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mais uma vez apelo para que não abramos aqui um debate sobre esta matéria. Mas parece-me que o Sr. Deputado Gomes de Pinho tem o direito de dar explicações e por isso concedo-lhe a palavra.
Faça favor, Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, não se trata propriamente de dar explicações nem de estabelecer um debate. Trata-se apenas de referir que me parece que o Sr. Deputado Jorge Lacão tem a memória curta e, portanto, apenas lhe sugeria que lesse as suas próprias intervenções sobre esta matéria no Diário da Assembleia da República.
Penso que isso bastará para o esclarecer quanto à coerência das suas e das nossas posições.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, creio que o incidente aqui criado pelas palavras do Sr. Deputado Jorge Lacão é um claro exemplo do que tem sido
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a política da actual coligação para a comunicação social do sector público, designadamente para a Radiotelevisão Portuguesa.
Por outro lado, esta situação é também um claro exemplo do que é o funcionamento de um órgão de comunicação social, no caso concreto a RTP, sem qualquer tipo de critérios objectivos, sem qualquer regra de pluralismo.
A nossa voz tem-se levantado nesta câmara variadíssimas vezes para alertar que este facto tem de ser alterado. Este modo de funcionar na televisão não pode continuar. Até aqui a maioria, porque não se tem sentido prejudicada, não tem estado connosco. Porém, hoje o feitiço começa-se a virar contra o feiticeiro!
E este é um claro exemplo, está demonstrado, quão longe estamos da apregoada universalidade do Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, Almeida Santos!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Almerindo Marques, tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Deputado Almerindo Marques, começo por me referir a uma das afirmações que produziu acerca das dúvidas sobre o acerto dos objectivos enunciados.
O Sr. Deputado perguntou se alguém poderia ter dúvidas sobre tal acerto. Pois, Sr. Deputado, é o meu caso. Tenho dúvidas sobre o acerto de tais objectivos.
Começaria por notar que mantendo-se ainda a tónica sobre os objectivos de natureza conjuntural, de qualquer forma há uma certa inversão em relação àqueles que foram apontados para o ano anterior.
O crescimento de 3 % do produto interno bruto aparece agora como o objectivo fundamental, seguido de um objectivo de 22 % para a evolução da inflação. Em relação ao objectivo prioritário, ao objectivo n.º 1, ou seja, à evolução do produto interno bruto, pergunto: Porquê 3 %? Porque não 5 % ou mais?
É que a questão, na minha óptica, não deve ser equacionada nestes termos. A questão deve ser equacionada em termos daquilo que estruturalmente se pretende com este Orçamento do Estado e com estas Grandes Opções do Plano.
Portanto, o que era necessário era uma visão de mais longo prazo para que este Orçamento de Estado e estas Grandes Opções do Plano pudessem ser um instrumento para atingir objectivos que se situariam para além de tudo aquilo a que dizem respeito.
Por aí passaria então a discriminação de objectivos, talvez o crescimento do produto interno bruto, mas com o desenvolvimento de sectores, visando fundamentalmente o equilíbrio a prazo das nossas contas externas.
De qualquer modo, a questão fulcral deste Orçamento de Estado e destas Grandes Opções do Plano é bem mais vasta, na minha opinião: é a questão da sua viabilidade, da sua credibilidade. Não se vê, por exemplo, como é que sem um choque exógeno será possível conseguir esta evolução para o produto interno bruto.
Não me parece que da forma como está orientado o Orçamento em relação às rubricas de capital seja susceptível promover tal evolução do PIB e, por outro lado, não se vê por que razão é que a iniciativa privada, que até ao momento não respondeu, poderia agora ser estimulada em relação ao investimento.
Por outro lado está também em causa saber-se à custa de quê, de que sacrifícios e quais as consequências económicas e sociais da concretização destes objectivos. Quais são as medidas que, de facto, serão consequentes com a sua consecução?
Falou V. Ex.ª também no corte das despesas correntes do Orçamento. Estamos de acordo em que é necessário reduzir o Orçamento corrente, mas a questão que lhe queria colocar é a seguinte: V. Ex.ª defende o corte nas despesas de pessoal da função pública? Através de quê? De despedimentos? Da redução dos salários reais?
Por outro lado, o Sr. Deputado também defende o corte nos subsídios e, tendo em conta estas duas matérias, pergunto-lhe: o que propõe para não agravar as condições de vida daqueles que já neste momento passam fome? Acha que este Orçamento com as suas verbas para a Segurança Social, Saúde e Educação poderá, de alguma forma, amenizar a situação dramática que hoje se vive em algumas zonas do País, como, por exemplo, recentemente assinalou o Sr. Bispo de Setúbal em entrevista radiofónica?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almerindo Marques, deseja responder de imediato ou no fim dos outros pedidos de esclarecimento?
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sendo assim, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Almerindo Marques, V. Ex.ª começou por dizer que nesta Câmara todos estaríamos de acordo com os objectivos propostos pelo Governo, poderíamos era não estar de acordo quanto às metas quantitativas fixadas.
Mas uma coisa não tem a ver com a outra. Já aqui demonstrei que a possibilidade de crescimento do PIB de 3 % não tem qualquer suporte técnico. Quanto à inflação, mantendo-se a política de desvalorização do escudo e por aquilo a que nos habitou o Governo, tanto faz estar lá 22 % ou 20 %! No ano passado referia-se uma taxa de inflação de 24 % e a inflação real foi de 30%!
Depois, Sr. Deputado, quanto às opções, poderemos estar de acordo com algumas, mas essas não são fundamentais. Há outras que consideramos mais fundamentais, como seja o melhoramento das condições de vida da população, porque a economia não é para aumentar a produção e o desenvolvimento em abstracto! E o que este governo tem feito é retirar dos bolsos das camadas mais desfavorecidas para encher os cofres do grande capital! Esta é que tem sido a política deste governo.
Depois, o Sr. Deputado refere que o Governo pensa que é necessário mais rigor, que é necessária a racionalização das despesas. Mas, Sr. Deputado, que rigor é este? O rigor dos buracos orçamentais como tivemos aqui o ano passado, em Outubro? O rigor de um défice 90 % superior ao do Orçamento inicial? Que rigor é este quando toda a gente sabe que o Orçamento tem défices ocultos e que o défice real vai ser muito superior àquele que aqui está referido porque estão subestimadas as receitas e as despesas, como o Sr. Deputado sabe?
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O Sr. Deputado gosta de perguntar à Câmara - já ontem o fez, assim como outros deputados do PS, e hoje tornou a fazê-lo - como aumentar as receitas.
Quer a resposta, Sr. Deputado? Vou-lhe dar alguns exemplos: pegue na página do Orçamento referente ao Ministério das Finanças e do Plano em que se refere a rubrica despesas para o Alqueva, a que se atribui a verba de 38 000 contos (isto quando temos o défice de energia que temos), e onde, simultaneamente, se consagra uma verba de 55 000 contos para compra de viaturas. Não está em causa que o Estado não necessite de viaturas, o que está em causa é a disparidade de verbas! Este é um exemplo.
Quer mais exemplos desta enormidade, Sr. Deputado? V. Ex.ª desconhece que foi dito por um secretário de Estado, numa entrevista, que o Estado gastava em viagens ao estrangeiro 4,5 milhões de contos, Não está em causa que o Estado não necessite de fazer viagens. O que está em causa é que numa altura de austeridade se façam viagens neste montante, que corresponde quase à modernização da Cometna.
Como é que o Sr. Deputado defende, e este governo tem a coragem de apresentar, o artigo 42,º, que é o artigo do Sr. Santos Silva, em que se reduz a taxa de selo para beneficiar esse senhor, que é o representante do Banco de Investimentos?! Não é esta uma redução de receitas?
E qual é o combate que fazem à fuga fiscal? E à sob refacturação?
Sr. Deputado, não volte a fazer essa pergunta porque estes exemplos são claros e seria muito bom que o Governo ou os Srs. Deputados da maioria o dissessem claramente.
Por isso pergunto-lhe, Sr. Deputado: como pode, sendo vice-presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, votar em coerência este Orçamento, quando conhece o "saco sem fundo", os défices que ele contém?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lobo Xavier.
O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Sr. Deputado Almerindo Marques, ouço sempre com muita atenção as suas intervenções, porque lhe cabem geralmente as difíceis missões de defender o que ninguém quer defender.
O Sr. Deputado pediu aqui que discutíssemos com serenidade estes documentos que ora se apresentam à Câmara. Pois quer ainda mais serenidade, Sr. Deputado Almerindo Marques? Esta Câmara esperou mais 3 meses do que devia esperar; aguentou, sem rasgar as vestes, que este Orçamento fosse discutido nos estados-maiores dos partidos, em reuniões várias, que toda a gente conhecesse o Orçamento menos ela; esta Câmara aguentou, e resistiu a ver, a ligeireza com que se processava a discussão do Orçamento no seio do próprio Governo, em que os ministros iam reivindicando sucessivamente mais verbas para os seus ministérios! Quer mais serenidade, Sr. Deputado?
Parece, Sr. Deputado, que a nota dominante do discurso da maioria é pedir à oposição que forneça alternativas, como aliás foi ontem habilmente sugerido pelo Sr. Ministro de Estado. Bom, quem devia ter alternativas, e teve tempo para as ter, era realmente a maioria, porque conhece este documento e os problemas que rodearam a sua execução.
A maioria e o Governo regressaram à velha técnica de que a culpa vem de muito longe, que a culpa disto já não são só os governos da AD, vai a mais 10 anos atrás.
Por outro lado, o Sr. Deputado Almerindo Marques diz que a sociedade portuguesa sempre pensou viver à "mesa do Orçamento". Não é verdade, Sr. Deputado. Diga tudo menos isso, porque isso não é verdade. A sociedade portuguesa passou realmente a querer mais e mais, criou-se uma nova mentalidade social, os Portugueses pretendem mais e mais prestações sociais, mas por culpa de uma certa propaganda. 15to não é de sempre!
O Sr. Deputado há pouco perguntava que passo foi dado em frente no sentido da socialização, qual foi o passo que foi dado em direcção ao socialismo. A isto respondo-lhe, Sr. Deputado: A penalização dos depósitos a prazo prevista neste orçamento não é senão uma forma de canalizar a poupança para a compra de títulos da dívida. Ai está um passo em frente na direcção da socialização!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.
O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Deputado Almerindo Marques, ouvi a sua intervenção com muita atenção e com todo o respeito que me merecem as suas opiniões e penso que, apesar de tudo, embora inteligente, ela foi feita com grande falta de convicção. De facto, é difícil defender o que não é minimamente defensável!
Mas, Sr. Deputado, concretamente gostava de lhe fazer 3 perguntas relativas à sua intervenção. A primeira tem a ver com a seguinte questão: considera, como vem no descritivo da proposta de lei do Governo, que este Orçamento é "uma possível base de um relançamento económico", Com o consumo público a crescer muito mais do que o privado -, enfim, 3 % ou 4 %, um bocado ao sabor dos humores dos responsáveis governamentais, porque, como se tem visto, têm variado as percentagens de um dia para o outro? Considera que este Orçamento é uma base de relançamento económico, Sr. Deputado?
Segunda questão: gostava de recordar aqui algumas passagens da intervenção do Sr. Deputado na discussão do Orçamento suplementar de 1984. Dizia então V. Ex.ª que:
Naturalmente, também o Partido Socialista não deixa de reconhecer os graves riscos que resultam de um défice como aquele que nos é presente e, sobretudo de uma situação que vai ser somada aos défices do passado, isto é, à longa e volumosa dívida pública que o País já tem contraída.
Sr. Deputado, está satisfeito com este défice que é superior em 33 % ao défice do Orçamento revisto e 90 % em relação ao défice do Orçamento inicial para 1984?
A terceira questão refere-se ao que V. Ex.ª dizia também nessa sua intervenção de há uns meses:
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é o dever principal desta Assembleia, o de criar condições para que no Orçamento de 1985 se entre já em consideração com as nossas críticas, bem como que o Governo venha, também, com propostas concretas para ultrapassar melhor e, se possível, elimi-
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nar as situações estruturais, que conduzem sistematicamente - e todos os anos - a reforços orçamentais e a aumentos de défices de montantes como este de que acabamos de tomar conhecimento.
Considera o Sr. Deputado que estão implícitas nesta Opções do Plano e neste Orçamento as tais reformas profundas que podem inflectir este estado de coisas?
Uma última questão, embora já um pouco fora destas linhas gerais. O Sr. Deputado falou em dinamização do mercado de capitais. Considera V. Ex.ª que é possível, para além do vocabulário que é costume nestas propostas, dinamizar efectivamente o mercado de capitais sem disciplinar financeiramente o Estado?
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado Almerindo Marques, em primeiro lugar, queria salientar que a defesa acalorada que o Sr. Deputado aqui fez do Orçamento começa a permitir retirar uma conclusão um tanto estranha deste debate, ou seja, que quem mais defende o Orçamento é o Partido Socialista. Efectivamente, não vale a pena estar a recordar as palavras que o Sr. Deputado João Salgueiro proferiu aqui ontem, seguidas de múltiplas intervenções de deputados da bancada do Partido Socialista, para se chegar à conclusão um pouco estranha de que, efectivamente, parece ser o Partido Socialista quem mais defende este Orçamento.
Relativamente a algumas afirmações aqui feitas pelo Sr. Deputado, queria fizer-lhe que não é o plano da admissão da seriedade pessoal com que elas foram feitas que para mim está em causa, mas o que posso é deixar de comparar as afirmações que o Sr. Deputado fez com a realidade da própria actuação do Governo da maioria.
Quando o Sr. Deputado fala na sociedade que vive à "mesa do Orçamento" parece-me que o termo sociedade é um pouco amplo e não sei se se refere apenas aos gestores nomeados pelo Governo, se também aos que procuram restos de comida nos caixotes de lixo. Gostaria de saber, todos estes que vivem à "mesa do Orçamento" e fazem parte da mesma sociedade.
O Sr. Deputado referiu a fuga aos impostos - e evidentemente que estamos de acordo em que se deve travar e impedir a fuga aos impostos - mas eu gostaria de saber que medidas foram adoptadas pelo Governo e pela maioria, por exemplo, no que diz respeito aos milhões de contos de débitos à Caixa de Previdência.
O Sr. Deputado falou nos subsídios às empresas públicas como se isso fosse o único aspecto que permite equilibrar a gestão dessas mesmas empresas. Mas o Sr. Deputado sabe perfeitamente que a difícil situação das empresas públicas não resulta apenas dos subsídios e que, portanto, isso não corresponde, de forma alguma, à realidade.
Da sua intervenção o que fica é o aspecto um pouco ingénuo quanto à coincidência da realidade com essas questões. O Sr. Deputado isola as afirmações éticas que faz da realidade e da prática do Governo e da maioria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques, para responder aos pedidos de esclarecimento, se o desejar.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tentarei responder a todas as perguntas que me foram formuladas e se possível associarei uma ou outra que tenha alguma similitude.
Em relação ao. Sr. Deputado Pinheiro Henriques, direi que eu próprio, na intervenção que fiz - e poderá depois confirmá-lo -, disse que em relação aos objectivos era legítimo ter dúvidas quanto à quantificação. Porém, em meu entender, não as havia em relação aos objectivos. É legítimo que as pessoas tenham divergências quanto mais dúvidas. E citei dois casos, embora pudesse citar outros objectivos condicionantes que vêm nos documentos em análise. Diz-me que não há articulação com o longo prazo. Obviamente que há carências, e esse foi um dos aspectos sobre o qual já a própria Comissão de Economia se pronunciou.
Quanto ao desenvolvimento por sectores, que servirá de base às pensões do Governo, é uma boa oportunidade de aprofundarmos esse tema nesta Assembleia e obter esses elementos - a própria Comissão de Economia já os obteve e poderemos discutir essa previsão, agora por sectores. Eu próprio farei esse trabalho, dir-lhe-ei desde já.
Quanto à viabilidade e à credibilidade, creio sinceramente que todos nós temos opiniões valorativas - a sua é uma, a minha será outra e procurei deixá-la expressa, mas não creio que se possa também concluir da inviabilidade do crescimento só porque há uma determinada evolução no orçamento de capital. Há elementos de dinamização das sociedades - e citei-lhe o exemplo, aquele que considero mais importante, o elemento confiança-segurança - que são fundamentais. O que disse na minha intervenção, e volto a sublinhar, tanto mais que isto é uma posição dirigida ao Governo, é que o importante é que o Governo empenhe todos os esforços para fazer jus aos objectivos que propõe a esta Câmara. E aí todos estamos de acordo.
Quanto ao corte das despesas correntes diz que está de acordo e pergunta-me, quanto às despesas de pessoal, de que é que depende a minha posição. Sr. Deputado Pinheiro Henriques, defini a minha posição na intervenção que fiz e nessa altura acrescentei que tinha em conta o subobjectivo do Governo relativo à evolução dos salários reais, posicionando-me sobre essa matéria.
Naturalmente que me posicionei também em relação aos subsídios, embora de uma forma genérica que é, obviamente, sempre imperfeita, como o são as enunciações genéricas das ideias. Disse que os objectivos fundamentais dos subsídios devem ser, no que respeita às empresas públicas, estabelecidos só e só quando se fundamentam em indemnizações compensatórias por prestação de serviços sociais valorados politicamente pela comunidade e em relação às empresas privadas esclareci, também, que estes objectivos devem ser os de compensar riscos excepcionais que os empresários tomem relativamente a interesses sociais também politicamente avaliados. São estes os princípios genéricos, que pecam naturalmente por generalidade mas não por intencionalidade última das mesmas.
Quanto ao que o Sr. Deputado propõe para não agravar as condições de vida, citando verbas da saúde, da segurança social e da educação, dir-lhe-ei, em primeiro lugar, com a responsabilidade com que as coisas devem ser tratadas, que é óbvio que se o País tivesse mais recursos podia fazer mais; mas cada sociedade tem os recursos que têm e a obrigação fundamen-
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tal que lhe cabe é desenvolvê-los primeiro e depois distribuí-los com equidade e justiça.
Também para não o surpreender, nem fugir às suas questões, devo dizer-lhe que com os efectivos custos destes 3 sectores a comunidade tem o direito de exigir mais prestação de serviços sociais e melhor qualidade nessa prestação de serviços. Pode crer que o PS também se empenhará nesta matéria.
Gerir bem os recursos que são escassos é um acto, desde logo, patriótico e fundamentalmente de progresso. O que não podemos é ter visões maximalistas num país com um nível de desenvolvimento como o nosso, com as dificuldades que tem e algumas delas desde há longos e muitos anos.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas diz, obviamente, que está em desacordo com as metas. Não tenho nada a acrescentar a esse desacordo porque o que perguntei foi se havia desacordo quanto aos objectivos qualitativamente enunciados. Referi até que todos podemos estar em desacordo quanto à sua quantificação. E ainda quanto à qualificação dos objectivos, Sr. Deputado Pinheiro Henriques, voltando um pouco atrás para ser mais preciso, perguntava: porque não 5 % em vez de 3 % ou mais. Obviamente que também gostaria de o poder dizer, mas o Sr. Deputado Pinheiro Henriques, como todos nós, sabe que os estrangulamentos da sociedade portuguesa levam a que, infelizmente, haja uma correlação muito estreita - infelizmente mais estreita que a que poderia existir hoje, e entenda-se o que quero dizer com isto, porque já se poderiam ter eliminado algumas dessas situações - entre desenvolvimento económico e aumento da actividade interna e défices da balança de transacções correntes. Portanto, o que podemos, honesta e tecnicamente falando, é perguntar se os 3 % são ou não possíveis, quer para mais quer para menos, e o que cabe ao Governo é ir acompanhando o processo, na medida das suas possibilidades, com a sociedade e as estatísticas que tem e com a correspondência que tem dos agentes económicos, e saber se pode ou não ir elevando esta taxa, com as restrições que são conhecidas.
De certo modo, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, e quanto às outras opções fundamentais que podemos discutir, acho que algumas delas constam das propostas do Governo, nomeadamente em relação aos salários reais e em relação às opções dos sectores que se privilegiam, mas, naturalmente, em condições que podem ser melhoradas. Aí estamos todos de acordo.
Mas, Sr. Deputado, não venha dizer que a política do Governo tem sido encher os bolsos do grande capital, porque aí não posso deixar de lhe dizer, com toda a sinceridade, que diminui a razão da sua intervenção. É evidente que há decisões erradas e não as quero minimamente pôr em causa, mas o importante é que digamos quais. O Sr. Deputado deve ter com certeza algumas a apontar, terei outras, agora o que não se pode é concluir, abusivamente, que se estão a encher os bolsos do grande capital. Julgo que isso é uma expressão com cidadania histórica mas que tem pouca aderência à realidade; terá alguma, mas não toda!
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado, conhece a distribuição dos rendimentos em Portugal?
O Orador: - Sr. Deputado, em relação à distribuição dos rendimentos no passado...
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - No passado não, no actual!
O Orador: - No passado, isto é, refiro-me aos anos mais próximos. A distribuição de rendimentos no passado resultava de uma política de restrição. Maior do que aquela que foi prevista? Sem dúvida, e sobre esses aspectos todos nós temos o direito de nos posicionar criticamente.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Com rigor!
O Orador: - Com rigor, Sr. Deputado!
Peço-lhe que me poupe tempo, a mim e à Câmara, ouvindo as minhas citações feitas por outros deputados sobre a posição que tenho nesta matéria e o conjunto de afirmações que fiz na minha apresentação inicial. É evidente que considero elemento importante - e tem de ser preocupação fundamental do Governo - a execução deste Orçamento e dos fundos e serviços autónomos que lhe estão associados.
Quanto aos exemplos que o Sr. Deputado deu, vamos discutir isso na especialidade, mas não pega, em termos de conclusão definitiva, citar despesas para o Alqueva, 50 000 contos e para compra de viaturas, 55 000 contos, porque esses valores dependem da valoração das despesas e a que se destinam. Concretamente, podemos até concluir em sentido inverso àquele que pressupõe o seu exemplo.
Quanto às despesas das viagens ao estrangeiro no montante de 4,3 milhões de contos, dir-lhe-ei também que o próprio Governo manifestou aqui, por intermédio de um dos seus membros, que achava este número exagerado. Não seria de modo nenhum minimamente inteligente - e dêem-me esse benefício - dizer que o não acho também exagerado.
Na minha intervenção de há pouco, disse que o Governo tinha de fazer mais e convencer-nos de que estava a fazer tudo relativamente...
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Posso interrompê-lo?
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, penso que este aspecto talvez seja importante. Como eu estava a dizer, referindo a minha intervenção, é dever do Governo fazer mais e convencer-nos de que mais será feito no combate à fuga fiscal e à corrupção. 15to apesar de o Governo já nos ter dado números sobre volumes de impostos e sobre o número de processos em curso nos tribunais respectivos.
Quanto a votar com coerência este Orçamento, pode crer que votarei, Sr. Deputado, e pode crer também que o meu voto de coerência resulta exactamente da compatibilização e da tomada em linha de conta de todos os valores que estão em jogo quando num parlamento se discutem e votam documentos como este que estamos a discutir, para a execução da política do Governo.
Disse também, na minha intervenção de há pouco, que não tinha uma visão parcial das coisas, uma vez que tomo em conta o aspecto económico, financeiro e também político, sendo, portanto, coerente o meu voto.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, jamais votaria de outra maneira!
Sublinho que há momentos nas sociedade em que se
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isolamos uma das componentes, podemos ficar curados do fígado mas morremos de doença de estômago!
Sr. Deputado Lobo Xavier, penso que devo começar por lhe agradecer a amável referência que fez e dizer-lhe que o meu pedido de serenidade não é para o passado, porque em relação ao passado, com todas as consequências que daí advêm, lhe afirmo que estou de acordo consigo, tem havido serenidade. Porém, o que também lhe afirmo é que na discussão que cabe aqui e sobretudo na discussão na especialidade, na Comissão respectiva, que vai seguir-se. Se se mantiver a mesma serenidade, vamos com certeza ter menos questões de divergência e mais questões de convergência. Já foi assim em anos anteriores porque nós, portugueses, muitas vezes, começamos a discutir sobre questões relativamente às quais não temos divergências. A serenidade que referi é, pois, para o futuro.
Creio que o facto das oposições não sugerirem alternativas é uma atitude política óbvia, que pode assumir, cabendo também depois ao País julgá-las politicamente, é óbvio.
O CDS poderá adiar por dias essas sugestões mas na Comissão; na discussão na especialidade, ou tem opções ou não, apresenta-as ou não, com a valoração final que acabei de enunciar. Penso que não está em desacordo com isto.
Sr. Deputado, quando referi o passado - o volto a dizer que foi apenas isso que pretendi - quis apenas deslocar o debate das áreas do «encontramos sempre alguém culpado» para as áreas do que o que existe é dos Portugueses e tem de ser resolvido pêlos Portugueses, de hoje para diante.
Agora, Sr. Deputado, compreenderá que tenho alguma legitimidade para dizer duas coisas: primeiro, que jamais falei em termos de culpa, sublinhei-o por exclusão, dizendo que não é uma questão de culpas. Porém, as situações existem e cada um de nós as valorará na sua origem. A propósito cito dois escritores portugueses - que estarão talvez mais em consonância com o que eu disse do que com o que o Sr. Deputado disse relativamente ao comportamento cultural da sociedade portuguesa e sobre a «mesa do Orçamento». São eles Oliveira Martins e Eça de Queirós, embora não goste de fazer citações, porque não tenho tempo para ler todos os autores e, obviamente, serei injusto para os que não cito.
O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de concluir, Sr. Deputado. O seu tempo para responder aos pedidos de esclarecimento terminou.
O Orador: - Acelerarei, Sr. Presidente, mas gostaria ainda de dar algumas respostas, se me der licença.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Deputado Bagão Félix, a sua subjectividade contrasta com outras subjectividades; para uns tive pouca convicção na minha intervenção, para outros fui acalorado! Creio que não fui nem uma coisa nem outra; a posição que assumi é uma posição política global, tendo em conta os aspectos em causa e os pressupostos que inicialmente apresentei à Câmara.
Perguntou o Sr. Deputado se este Orçamento é uma base de relançamento económico, citando depois o consumo político. Sr. Deputado, o Orçamento não é uma base em termos de exclusividade, isto é, como condição necessária e suficiente. Agora, o que o Orçamento também não é, por si, é um elemento impeditivo. Poderemos aperfeiçoá-lo, venham os tais contributos; por mim não deixarei de fazer esforços para os dar.
Quanto às citações que fez e que lhe agradeço, das minhas posições aquando da discussão do Orçamento suplementar para 1984, continuo a dizer exactamente o mesmo: os problemas são os défices e - disse-o na minha intervenção - ninguém pode estar tranquilo e satisfeito com os volumes destes défices!
Quanto à outra citação, referente ao nosso desejo de que o Governo corresponda às nossas críticas, dir-lhe-ei, Sr. Deputado: com a mesma franqueza que me é habitual, que o Governo correspondeu parcialmente, sejamos justos, apresentando um conjunto de medidas que vêm acompanhar o Orçamento. Poderemos discuti-las uma outra vez e voltar a estar então em desacordo ou não; deixemos isso para mais tarde e vamos ver o que continuará ou não a dividir-nos.
Pela minha parte, quando digo que o Governo correspondeu parcialmente, é porque penso que ele poderia ter correspondido mais.
Por outro lado, penso que não é possível dinamizar o mercado de capitais sem disciplinar o Estado. Agora, as frases têm um valor absoluto quando enunciadas, mas o que é importante é introduzir um processo que leve à sua concretização. Temos que iniciar a dinamização do mercado de capitais e, obviamente, temos que o acompanhar com a dinamização dos métodos a introduzir para disciplinar o Estado. A propósito, devo referir que foram propostas já algumas medidas para esse efeito. Serão as suficientes? Penso que não. Será possível aplicar outras? Veremos, na concepção global que o Grupo Parlamentar do PS tem para os documentos em análise, em termos do que for apresentado.
O Sr. Deputado Raul Castro optou por uma versão subjectiva e agradeço-lhe a referência à minha seriedade pessoal. Porém, chamou-me ingénuo, o que não é dos piores defeitos, e disse que fiz uma valoração ética. É uma concepção que tenho também da política e, assim, a ética entrará na minha lógica política e no meu comportamento, e concretamente quanto a estas questões.
Disse também o Sr. Deputado que o PS é quem mais defende o Orçamento do Estado. Fiz uma intervenção em nome do meu grupo parlamentar e a valoração final há-de ser feita nas votações e, sobretudo, nas intervenções de todos os grupos parlamentares da maioria e da oposição ao longo do processo da discussão que vai seguir-se.
Quanto à fuga aos impostos, essa é uma pergunta que pode ser ilustrada mais concretamente - embora já me tenha referido a ela - pêlos ministros sectoriais respectivos, quer se refiram questões de evolução da segurança social, quer questões aduaneiras ou o que quer que seja.
Já justifiquei a minha posição relativamente à «mesa do Orçamento». Porém, esclareço que chegar a uma «mesa» varia em probabilidades quanto aos grupos sociais e às pessoas. Ao longo da história, infelizmente, o que tem acontecido muitas vezes é que os que se sentam à «mesa» variam, mas é sempre uma luta para o conseguir fazer. De qualquer modo, penso que esta discussão não valoriza o nosso debate concreto das propostas, mas tenho muito gosto em discuti-la noutro local e certamente que não deixarei de aprender com a
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vasta cultura que o Sr. Deputado possui, de onde colherei elementos que ignoro, com certeza.
Quanto aos subsídios as empresas públicas, penso já ter respondido, pois é também pública a minha posição e não vale a pena explicitá-la de novo. Não considero, minimamente, que as empresa públicas só tenham a ver no seu funcionamento normal com questões de subsídios; só que, para sintetizar, diria que creio que as empresas públicas têm de ser postas a funcionar em termos adequados, em termos de efectiva prestação de serviços e produção de bens para a sociedade, em termos valorados positivamente pela comunidade política.
É isto tão-só o que queria dizer sobre as empresas públicas.
Espero ter respondido a todos os Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Deputado Almerindo Marques, V. Ex.ª concordou que, de facto, poderia haver outros objectivos, outras alternativas; concordou que as quantificações poderiam ser diferentes. Concorda até, certamente, que as quantificações não têm base técnica, assim como também concorda que o défice é muito elevado e que há, eventualmente, défices ocultos.
Também concorda que há despesas que deveriam ser cortadas e que o Orçamento, no que se refere às despesas e às receitas, devia ser melhorado. Mas diz também: «deixemos esta questão para a discussão na especialidade».
No entanto, diz isso com tanta falta de convicção que até teve que se embrulhar um bocado para explicar a coerência da votação.
Pôs de lado a parte técnica e, quanto à parte política, demonstrou então que é por ter que suportar este fardo - que é este Governo! - que vai votar em coerência.
Posto isto, gostaria de dizer o seguinte: assistimos aqui, ontem, à intervenção do Sr. Ministro das Finanças defendendo, com convicção, o Orçamento do Estado, assim como assistimos à posição das bancadas do PSD ao darem aquelas palmas à intervenção do Deputado João Salgueiro. Hoje, vemos o Partido Socialista, pela voz do Sr. Deputado Almerindo Marques, defender também, com aquela fortíssima convicção, este Orçamento.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Enorme!
O Orador: - Com enorme convicção!
A pergunta que faço é a de saber quem é que, de facto, está com este Orçamento e com estas Grandes Opções do Plano.
Começo a pensar, por aquilo que até agora vi, isto é, pelos abanos de cabeça, que só o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro de Estado Almeida Santos é que estão a favor do Orçamento e das Grandes Opções do Plano! Parece-me que são só esses dois é que defendem este Orçamento e estas Grandes Opções do Plano!
É possível que alguns ministros levantem a mão timidamente e digam: «eu também, eu também». No entanto, não têm grande convicção!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim entender, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, faça os julgamentos subjectivos que entender relativamente ao posicionamento das pessoas e dos grupos. Na minha opinião, os posicionamentos têm outro momento, pelo que não faço mais considerações sobre esses juízos.
Porém, já faço considerações ao repudiar as suas sínteses. É que eu não disse o que o Sr. Deputado referiu ter sido a minha posição... Mas iríamos muito longe se fôssemos discutir isso.
No entanto, lembro-me dessa dos défices ocultos...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas há défices ocultos?!
O Orador: - Um momento, Sr. Deputado.
Como estava a dizer, lembro-me dessa dos défices ocultos, assim como de outras e, Sr. Deputado, coteje o que eu disse com a sua síntese e vai ver que essa, sim, é uma boa matéria para não estarmos indiscutivelmente de acordo.
Sr. Deputado, na minha intervenção falei do Orçamento, dos fundos autónomos, dos serviços autónomos e penso que cada vez é mais legítimo dizer que não é correcto falar de défices ocultos. Há, isso sim, situações de défice conhecidas - e o Governo vem dizendo quais são -, há situações de défice conhecidas, volto a sublinhar, que estão, naturalmente, a ter um tratamento por parte do Governo.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Quais são os défices ocultos?!
O Orador: - Ó Sr. Deputado, não vamos agora estabelecer diálogo. Com certeza que vamos ter outra oportunidade, em sede própria, para o fazer.
Creio que as coisas são como são e falar, hoje, em défices ocultos não é já tão correcto. Obviamente que pode haver défices ocultos. No entanto, como sabe, já não é oculto no sentido da intencionalidade mas, provavelmente nalgumas áreas, no sentido da realidade, ou seja, por deficiência técnica da sua determinação.
Reconheço que não é muito procedente falar aqui, na Assembleia da República, para o País inteiro, em termos de défices ocultos. Isto é, esse processo de abordagem é contrário à responsabilidade política que esta Assembleia deve assumir.
Porém, se há défices ocultos, vocês devem dizê-lo concretamente, devem dizer onde. O Governo dir-vos-á o défice que há e qual a forma que tem para o eliminar, ele dir-vos-á a génese, a evolução e as propostas que tem.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ele recusa-se a dizer!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, está inscrito o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
No entanto, como faltam apenas 10 minutos para interrompermos a sessão, pergunto se nestes 10 minutos que faltam consegue fazer a sua intervenção.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Em 10 minutos, não, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Nesse caso, penso que podíamos suspender, desde já, os trabalhos e continuaríamos às 15 horas.
Pausa.
Como não há oposição, está suspensa a sessão.
Eram 12 horas e 5O minutos.
Após o intervalo, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.
Eram 15 horas e 40 minutos.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no seguinte sentido: há uns 15 dias. V. Ex.ª, muito justamente, chamou a atenção dos Srs. Deputados pela falta de quórum, o que não lhe permitia iniciar a sessão.
Agora, se V. Ex.ª me permite e com a frontalidade que me caracteriza, devo comunicar-lhe que há uns 15 ou 20 minutos estávamos à espera dos membros da Mesa para que a sessão da Assembleia da República fosse reiniciada.
O Sr. Presidente: - Tomo em consideração as palavras frontais que V. Ex.ª, habitualmente, costuma utilizar. As que acaba de proferir ficarão registadas, no entanto devo convir que não são inteiramente oportunas.
O Presidente da Assembleia esteve a trabalhar. Infelizmente, não tem o dom da ubiquidade, e espero que, mais uma vez, V. Ex.ª tenha a condescendência de saber compreender e aceitar que nem sempre as coisas podem correr com a brevidade que desejamos.
Em todo o caso, fica registado o comentário feito por V. Ex.ª
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no seguinte sentido: ao longo dos trabalhos em diversas comissões, foi prometido, por vários membros do Governo, designadamente pelo Sr. Ministro do Equipamento Social, que seriam enviados, até à passada sexta-feira, os elementos de desenvolvimento de aspectos que constam, designadamente, do anexo ao Orçamento sobre projectos plurianuais e que não se encontram devidamente esclarecidos nesse dossier. Sucede que hoje já é quarta-feira, 16 horas, e esses elementos ainda não chegaram.
Aproveitamos a presença de membros do Governo para, através de V. Ex.ª, sabermos o que se passa, porque, como será compreensível, para a organização do nosso trabalho, para a melhoria de todos os trabalhos da Assembleia e para conhecimento dos deputados, é urgente que tais materiais sejam enviados às diferentes bancadas.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Eduardo Pereira): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - É sobre a questão levantada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, que pretende pronunciar-se?
O Sr. Ministro dm Administração Interna: - Sr. Presidente, não vou dar directamente resposta à pergunta do Sr. Deputado Jorge Lemos.
Queria saber se a bancada do Grupo Parlamentar do PCP recebeu os elementos que eu próprio tinha prometido ao Sr. Deputado João Amaral e a outros. É que eu enviei-os para a Mesa, pelo que queria saber se foram distribuídos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, devo também informar V. Ex.ª que o Sr. Secretário Leonel Fadigas, segundo ele me diz, na qualidade de presidente da Comissão do Equipamento Social e Ambiente, recebeu alguns elementos e que os mandou distribuir pelas restantes comissões.
O Sr. Secretário vai procurar saber se os elementos foram ou não distribuídos. No entanto, ele diz-me que houve uma determinação nesse sentido.
O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. João Amaral (PCP): - Era para informar o Sr. Ministro da Administração Interna que já recebi as três folhas que me enviou, o que agradeço. Como sabe, são simples fotocópias de documentos já distribuídos à Assembleia, no quadro dos anexos enviados oportunamente.
Devo dizer-lhe, Sr. Ministro da Administração Interna, que se me mandou mais elementos, então ainda não os recebi.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dm Administração Interna: - Também lhe mandei os elementos do ano anterior para que pudesse comparar, Sr. Deputado. Esses elementos não faziam parte de nenhum documento da Assembleia. Mandei-lhe os elementos do ano anterior para comparar.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, recebemos, de facto, um conjunto de folhas do Ministério do Equipamento Social. Contudo, o que recebemos não, corresponde ao que foi pedido, ou seja, tinha sido pedido ao Sr. Ministro do Equipamento Social que fossem detalhados os projectos anuais com despesa inferior a 50 000 contos, que não vêm referenciados no documento geral que nos foi distribuído.
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Quanto aos elementos que nos tinham sido prometidos para a passada sexta-feira, continuamos sem os receber, e eles são fundamentais para uma análise completa do Orçamento.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, o Sr. Presidente da Comissão do Equipamento Social e Ambiente está a dizer-me que os mandou distribuir, mas ainda não o foram.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, e queira V. Ex.ª desculpar o equívoco que há pouco se verificou.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Analisado o conteúdo das Grandes Opções do Plano e do Orçamento uma só conclusão é possível: Elas confirmam a total incapacidade já anteriormente demonstrada pelo Governo, para dar resposta adequada ao profundo agravamento da crise económica e financeira em que o próprio Governo mergulhou o País nos vinte meses que já leva de actividade.
O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Não apoiado!
O Orador: - A gravidade da situação económica e financeira do País atingiu tal nível, que hoje não é possível encarar a sua solução num horizonte de curto
prazo. A resolução necessária dos grandes problemas que afligem a economia nacional, e designadamente os estrangulamentos representados pelo peso da divida
externa e dos seus encargos (que consomem já 45 % das nossas exportações e correspondem a um ano e meio de remessas de emigrantes) e a situação financeira degradada do Estado e da generalidade das empresas públicas e privadas, exigem políticas, medidas e acções imediatas, mas que se prolongarão e terão efeitos por um razoável número de anos. Por isso mesmo tais acções e medidas só terão resultados positivos se, para além de uma orientação de política económica
adequada aos interesses nacionais, puderem ser articulados e coordenados num plano de médio prazo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Comprovadamente isso não é possível com este Governo. Ele foge dos planos como o Diabo da cruz, preferindo entreter-se com múltiplos e nunca
finalizados programas de emergência, de gestão conjuntural, de modernização, de regeneração, de reestruturação, etc.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os resultados estão à vista. O Governo não sabe ainda que medidas tomaria em 1955 e muito menos sabe que calendarização iria seguir se se
mantivesse até ao final do ano. Entretanto, a deterioração e degradação económica, financeira e social vai-se agravando e o País é empurrado aceleradamente para a inviabilização e para a dependência externa mais
humilhante.
As Grandes Opções do Plano apresentadas confirmam cabalmente o referido. A proposta não é mais que um conjunto de afirmações sectoriais desarticuladas entre si, aqui e acolá entremeadas de declarações de intenções por demais cansativas, pois há muito proclamadas e nunca concretizadas. Mas se é um facto a
desarticulação das políticas sectoriais entre si e destas com as políticas horizontais, designadamente, as políticas monetária, cambial e orçamental, é igualmente verdade que elas aprofundam as orientações que conduziram à recessão, agravaram a crise económica e fizeram emergir em toda a sua dimensão a gravíssima situação financeira em que o País, o Estado e a generalidade das empresas financeiras e não financeiras hoje se encontram.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!
O Orador: - No que respeita à proposta de Orçamento é já evidente, e ainda agora o debate se iniciou, que ninguém acredita nele. Nem o próprio Governo. Ninguém duvida que o Orçamento apresenta um défice fortemente subavaliado, e que se pressupõe logo no momento da sua elaboração a futura apresentação de uma proposta de revisão orçamental, ou melhor, de apresentação de um autêntico orçamento suplementar para os últimos meses do ano.
Os exemplos que o demonstram são múltiplos e evidentes. A cobrança prevista de imposto profissional, com um aumento de 36%, é matemática e materialmente impossível. A não ser que o Governo tivesse em mente um imposto extraordinário que sacasse parte substancial do subsidio de férias. O que sinceramente não acreditamos... por ser ano de eleições várias. Como sobreavaliadas estarão receitas de alguns impostos indirectos, calculadas na perspectiva de cobrança durante todo o ano, o que não será possível. Mas a subavaliação do défice e a não credibilidade deste Orçamento assenta, fundamentalmente, na objectiva e propositada insuficiente dotação de algumas despesas. Para cálculo dos encargos com juros e amortizações da divida pública externa, o Governo utiliza a cotação média do dólar de 175$, o que significa que, durante o ano, não haveria praticamente qualquer desvalorização do escudo em relação àquela moeda.
Mas, nas Grandes Opções do Plano, na rubrica rendimentos de capitais, isto é, na rubrica de juros da balança de transacções, o mesmo Governo prevê uma cotação média de 181$50, mais realista, se o dólar não continuar a revalorizar-se em relação à generalidade das outras moedas.
Como não é crível que os Ministérios da Educação e da Agricultura possam funcionar com aumentos nominais inferiores a 9%, o dos Negócios Estrangeiros com apenas mais 4,1 %, o do Equipamento Social com uma diminuição nominal de 0,4%, e que a verba para pensões e reformas aumente apenas 12,5%. São, aliás, significativos a este respeito os pareceres elaborados pela generalidade das comissões especializadas desta Assembleia.
Acresce ainda que, mais uma vez, o Governo persiste em não orçamentar os encargos com bonificações de juros relativos à aquisição de habitação e à poupança-crédito, e que este ano poderão montar a 40 milhões de contos.
Apesar de estas e outras subavaliações, o aumento real do défice para 336 milhões de contos e 9,5% do PIB é significativo. Mas a maior gravidade desse défice não reside propriamente na sua dimensão, mas, fundamentalmente, no facto de resultar do aumento de 60% do défice corrente e de tal agravamento ir a par
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e reduções orçamentais (em áreas social e economicamente importantes) e do agravamento da carga fiscal.
E não procure o Governo escudar-se simplisticamente com o peso crescente dos juros da dívida. É que estes decorrem do nível de taxas de juro internas e do ritmo de desvalorização cambial que resultam directamente da política económica e financeira do Governo.
Mais: o nível da dívida e dos seus encargos atingiu já dimensão de tal modo grave que exige medidas de fundo que o Governo não foi e não é capaz de propor.
Nem se tente responsabilizar as empresas públicas. As dotações de capital são reduzidas em 13,4% e as indemnizações compensatórias mantêm o mesmo nível real de 1984, apesar dos 7 milhões de contos atribuí-los às duas novas empresas do Governo para a marinha mercante, ao mesmo tempo que pretende lançar para o desemprego mais de 1700 trabalhadores.
O Sr. José Lemos (PCP): - Um escândalo!
O Orador: - Agora como antes, não é o sector empresarial do Estado que vive à custa do Orçamento mas o inverso, designadamente pela acumulação de centenas de milhões de contos de dívidas do Estado, e sem pagamento de juros!
Nem acene o Governo com os encargos com pessoal que, não representando mais de um terço das despesas correntes, não terão, certamente, aumentos superiores
22%, muito longe, por exemplo, do aumento de 72% as despesas com aquisição de serviços, rubrica em que tudo cabe, mesmo coisas cuja explicitação levaria, por certo, a tão veementes quanto injustificados protestos o Governo e das bancadas governamentais.
Entretanto, as despesas com habitação e equipamentos urbanos reduzem-se em termos reais e a promoção directa da habitação desaparece rapidamente, enquanto se delapidam anualmente dezenas de milhões de contos em bonificações de juros de um sistema demonstradamente falhado e orçamentalmente incomportável num futuro próximo.
As verbas para a promoção e desenvolvimento das pescas são praticamente inexistentes e a agricultura, essencial à redução dos défices externos, continua a depender tão-só das condições climatéricas, pois não há cotações para a sua modernização e desenvolvimento.
A grave recessão em que há 2 anos consecutivos foi lançado o sector da construção não tem resposta adequada por parte do Orçamento, já que as verbas para obras públicas ficam muito aquém do mínimo exigido, situando-se a um nível real inferior ao de 1979. E já que falamos no Ministério do Equipamento Social, convirá lembrar e chamar a atenção dos Deputados para o anexo relativo aos programas projectos plurianuais.
O anexo que foi presente à Assembleia da República não está, nem de longe nem de perto, em condições poder ser votado por esta Assembleia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Não podem ser votados projectos que não sejam plurianuais, não podem ser votados projectos-plurianuais que não tenham qualquer dotação no
Orçamento do Estado. Apenas tratamos do Orçamento de Estado, e só isso pode ser votado.
Aplausos do PCP.
Sobre a indústria não vale a pena falar. Nas Grandes Opções do Plano refere-se que é um sector-chave para o desenvolvimento, contudo não aparece nas suas prioridades. Aliás, significativa é a ausência completa do Sr. Ministro da Indústria nos debates desta Assembleia em relação as Grandes Opções do Plano e ao Orçamento do Estado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É significativo!
O Orador: - Mas, se no campo das despesas o Orçamento é muito mau, o panorama não muda no âmbito da fiscalidade. O total de impostos a pagar em 1985, ultrapassa em 240 milhões de contos os suportados em 1984, aumentando a carga fiscal de 30,5 % para 31,2%. Também aqui há dois pesos e duas medidas. O chamado «aligeiramento da carga fiscal sobre as famílias» é um logro. É certo que são actualizados ao nível da inflação, os escalões dos impostos profissional e complementar. Mas é igualmente certo que, os impostos sobre o consumo, são o reverso desta medalha. No total, a verdade explicitada nas previsões de cobrança apresentadas pelo Governo é que as famílias portuguesas vão pagar em 1985, mais 72 milhões de contos que em 1984, ou seja, mais 1,3% em termos reais se os seus rendimentos aumentassem 22%. O imposto sobre o valor acrescentado que o Governo pretende implementar a partir de Julho vai tributar fortemente produtos essenciais e de amplo consumo, até agora isentos, incluindo bens alimentares, electricidade, livros e produtos farmacêuticos, ao mesmo tempo que se isentam profissões liberais que consabidamente apresentam das maiores fugas ao imposto profissional. O mínimo que desde já se pode exigir é que o IVA não seja implementado este ano, e que a sua lista de taxa zero seja alargada a todos os bens essenciais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, tal como já o afirmámos no ano transacto, é inadmissível que um imposto que pretende alterar profundamente o regime da fiscalidade indirecta, possa ser implementado sem a necessária discussão na sede própria que é esta Assembleia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Inversamente à sobrecarga real das famílias portuguesas, a proposta de Orçamento mais uma vez beneficia os rendimentos de empresa. Elimina o imposto extraordinário sobre algumas despesas das empresas. Reduz de 15 para 12% o imposto de capitais sobre os lucros. Reforça os benefícios e as deduções fiscais em matéria de contribuição industrial. Propõe um conjunto de isenções claramente destinado a beneficiar uma única empresa, a Sociedade Portuguesa de Investimentos, e elimina o adicional de 15% sobre o imposto de mais-valias.
Vozes do PCP: - Muito bem! Um escândalo!
O Orador: - Mas o dado mais flagrante e escandaloso é o valor das isenções em matéria de contribuição industrial de que continuam a beneficiar as empresas exportadoras, e que nada tem a ver com o hipotético apoio à competitividade dos produtos nacionais nos mercados externos. Na verdade, e comparando as evo-
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luções previstas para a contribuição industrial e para o imposto extraordinário sobre lucros, pode concluir-se que os benefícios em matéria de contribuição industrial significam, só em 1985, uma perda de receita fiscal superior a 30 milhões de contos. Verba que o Governo pretende compensar com a tributação dos depósitos dos emigrantes, e cujas possíveis consequências parece não terem sido plenamente ponderadas. É esta a justiça fiscal do Governo, é esta a política de classe que prossegue. É esta uma das causas do agravamento dos défices.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A dívida pública directa atinge já os 1800 milhões de contos. Se lhe adicionarmos a dívida acumulada actual dos diversos fundos autónomos, atingiremos certamente os 2400 milhões de contos. O que significa que, no final de 1985, a dívida total da administração central não será inferior a 3000 milhões de contos, verba que assusta e dá que pensar a quem minimamente se pr
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Outros aspectos que focou respeitam aos benefícios à contribuição industrial. Estaria de acordo com V. Ex.ª se me focasse a equidade com que estes benefícios são realizados em sede de contribuição industrial. Mas no momento em que temos as nossas empresas totalmente descapitalizadas, em que o investimento baixa e em que grassa o desemprego, acho que será uma leitura errada, e que caminharemos cada vez mais para o fosso se efectivamente não apoiarmos o investimento e a criação de unidades produtivas.
Por outro lado, V. Ex.ª também criticou a redução, em sede de IVA, da «lista I» do actual Código do Imposto de Transacções. V. Ex.ª saberá, possivelmente, que o IVA não é genuíno português; obedece a normas comunitárias, a normas da CEE e é de louvar que o Governo Português, através da Comissão de Instituição do IVA, apesar de não ter conseguido que essa taxa fosse de zero, tenha salvaguardado os efeitos que tinha para as famílias portuguesas de menor rendimento a tributação de bens essenciais, grande parte dos quais estão neste momento isentos.
São estas as questões que lhe queria colocar.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, de facto o PCP faz sempre aquilo que acabou de fazer agora e que continuará a fazer durante o debate: diz as verdades!
Vozes do PCP: - Muito bem!
Uma voz do PS: - A casseite!
O Orador: - É isso que não gostam!
O Sr. Deputado cai no erro em que caíram outros seus camaradas ao longo deste debate, que é o de afirmar que o PCP não apresenta proposta alternativa.
Como o tempo é curto, dir-lhe-ia apenas que este Orçamento não tem ponta por onde se lhe pegue. Não se podem fazer remendos a este Orçamento porque não está em causa apenas a questão das verbas, mas sim a questão da sua orientação.
Por isso, pergunto-lhe o seguinte: como é que é possível apresentar, em uma, duas ou três semanas, um Orçamento alternativo completo, sem o apoio do aparelho do Estado? É capaz, Sr. Deputado? É evidente que ninguém o pode fazer. Basta dizer que, com os apoios que tem, o Governo levou meses e meses a preparar este Orçamento. E apresentou-o mal, mesmo muito mal; muito mau é o seu conteúdo.
Não é possível apresentar uma alternativa completa em termos do Orçamento - friso-o - no prazo de duas semanas.
Agora, Sr. Deputado, quanto à alternativa em termos de política económica, de política fiscal, de grandes políticas, há muito tempo que vimos expondo essas políticas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Em relação à questão do sistema fiscal, o problema da reforma de fundo é uma das tais medidas de fundo que é preciso tomar e que não vem sendo tomada. Há anos que há comissões para nomear. Até podem dizer que este ano já foi nomeada uma,
mas veremos se durará muito tempo. Houve até comissões já nomeadas - estou a ver sentado na bancada do Governo um ex-ministro das Finanças e do Plano que nomeou uma comissão, a qual, logo a seguir à sua saída do governo, foi extinta -, etc.
Mas o problema que se coloca é o seguinte, Sr. Deputado: na ausência dessa reforma de fundo, onde é que são feitos os agravamentos? Por que razão a orientação dos agravamentos é sempre para os mesmos impostos? É apenas porque é mais fácil sacar cada vez mais? Mas não vêem que as famílias e os trabalhadores, que cada vez são mais sacados em termos de impostos, são cada vez mais agravados e já não têm possibilidade de sofrer mais nem é possível sacar-lhes mais? Isto tem limites, Sr. Deputado!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Isto é que é um PS!
O Orador: - Coloca-se também o problema da equidade na contribuição industrial.
Este problema é interessante. Raciocinando mesmo em termos de equidade entre empresas, por que razão é que as tais empresas descapitalizadas e em situação financeira difícil, que são, de um modo geral, as que trabalham para o mercado interno, são tributadas em contribuição industrial? Por que motivo é que as empresas que não têm ou têm menos dificuldades financeiras, que apresentam mais lucros e que estão em melhor situação financeira, são isentas de contribuição industrial, quando é consabido que, no ano de 1984, os lucros das empresas exportadoras não tiveram comparação possível com os lucros das empresas que não exportam? Porquê, Sr. Deputado? Responda a isto.
É um problema de equidade, não só em relação aos trabalhadores e às famílias, mas também em relação às próprias empresas que laboram para o mercado interno.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, o PCP diz as verdades, na versão do Sr. Deputado. Talvez diga as «suas» verdades, mas para nós não é verdade; talvez sejam as vossas, mas não são as nossas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Manifestamente!
O Orador: - E ainda bem que não são.
Diz o Sr. Deputado que não é possível a apresentação de um Orçamento alternativo. Ó Sr. Deputado, eu não lhe iria pedir tanto! Pediria, pelo menos, que tivesse a coragem de tornar em sentido positivo a força e a inteligência que o Sr. Deputado tem para criticar. Mas não iria exigir ao Sr. Deputado que fizesse um Orçamento novo - por amor de Deus!
O Sr. Deputado refere que as medidas de fundo não estão a ser tomadas. Ó Sr. Deputado, não tenhamos a veleidade de querer fazer num ano, em Portugal, por exemplo, a imposição do imposto único. É extremamente difícil, Sr. Deputado. Basta ver o tempo que a Comissão que trabalhou o imposto sobre o valor acres-
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centado levou a elaborar a transposição para o nosso pais de um documento que está criado a nível de países da Comunidade Económica Europeia.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Transposição má!
O Orador: - V. Ex.ª refere também que a recolha de receitas é sempre feita à custa dos trabalhadores peço-lhe perdão se não faço a transcrição total das suas palavras. Discordo desse ponto de vista quanto a este Orçamento, porque efectivamente ele não corresponde à verdade, e aqui reside o meu protesto.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Já leu o Orçamento?
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Domingues Azevedo, em relação à última questão ou dúvida que levantou quanto à carga fiscal sobre os trabalhadores, não pense que a carga fiscal sobre os trabalhadores é apenas o imposto profissional e o imposto complementar. Não se esqueça das receitas que pagam para a Segurança Social e para o Fundo de Desemprego e os impostos indirectos. Não se esqueça disso. Faça as contas e depois veremos. Pela minha parte, já fiz as contas, por isso, posso fazer esta afirmação.
Em relação à questão da nossa crítica positiva, julgo que, quanto às tais alterações pontuais, o Sr. Deputado já tem experiência para não duvidar de que o PCP apresenta sempre, na sede própria, na discussão na especialidade, muitas e variadas propostas concretas para alterações pontuais. Tem feito isso em todos os anos, em todos os Orçamentos. Mas mesmo que todas elas fossem aprovadas, isso não resolveria o problema de fundo do Orçamento, porque ele é, de facto, um problema de filosofia, um problema de orientação global.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, quanto à questão do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), não sei, sinceramente, se o Governo terá possibilidade de o implementar em Julho, até porque não sei se já estão resolvidos, por exemplo, os problemas dos equipamentos electrónicos, dos computadores, etc. Apesar de já ter havido concurso, e dado que os grupos de pressão também querem um bocado, etc., não sei se isto já está resolvido, designadamente se já conseguiram fazer a subdivisão pelos diversos grupos de pressão.
Mais importante do que isso, o Sr. Deputado refere que há um problema de comunidades, da CEE - já nem coloco a questão de fundo, que é a de saber a que é que estamos sujeitos perante eventuais determinações da CEE. Mas nem isso é verdade. Nenhuma taxa zero é igual em todos os países da actual CEE.
Ouvi uma parte do debate ontem havido na televisão, e cito-lhe o exemplo dos livros na Grã-Bretanha, que é flagrante. Na Grã-Bretanha, os livros estão em taxa zero; aqui querem-lhes meter 8 %. Pode, pois, comparar as taxas zero de todos os impostos de todos os países do IVA e ver as diferenças que existem.
Leiais grave do que isso, a Comissão do IVA esteve baiada, em termos da "lista 1" (taxa zero), pelas negociações que o Governo já havia feito com a CEE. 0
Governo, ele próprio, tomou a iniciativa de propor às comunidades uma determinada lista de taxa zero. 15to é grave por parte do Governo, que não deveria ter tomado uma atitude destas.
Mas, independentemente de outras questões, mesmo isso não constitui nenhum bloqueamento à alteração da taxa que nos foi apresentada.
Para além do mais, não estamos na CEE e não sabemos se alguma vez lá iremos e quando isso será, se assim for.
Mais do que isso, Sr. Deputado, nenhum dossier está encerrado. 15to é importante. A Assembleia da República pode e deve alterar a "lista 1 " (taxa zero) do imposto sobre o valor acrescentado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Gostaria de dizer, a abrir esta intervenção, que não posso deixar de salientar o facto de alguns dos dignos parlamentares que hoje se indignam com o elevado défice orçamental, que poria em risco o próprio Estado português, não terem erguido a sua voz desaprovadora, associando-se, por exemplo, à nossa, quando na discussão do Orçamento anterior denunciámos a quebra da produção, em termos de produto interno bruto por ele prevista e a correlativa diminuição de salários, em termos gerais, de diminuição da remuneração do factor trabalho que a estrutura do Orçamento do Estado e a orientação das Grandes Opções do Plano preconizavam.
Porque, Sr. Presidente, Srs. Deputados, se ainda há bem pouco, no passado mês de Dezembro, a bancada da UEDS, tal como outras, não deixou de manifestar a sua não aprovação dá política governamental, entendida globalmente, nós recordaríamos aqui o sentido do nosso voto, já no Orçamento e Grandes Opções do Plano de 1984.
E, então, em - Dezembro de 1983, dissemos: "A UEDS está de acordo com a realização de uma política de austeridade, que visa a diminuição dos desequilíbrios financeiros das contas de Portugal com o exterior. Pensamos, no entanto, como já dissemos, que esta austeridade, além de não estar bem distribuída, fecha as portas do desenvolvimento que urge. São, na nossa perspectiva, exageradas as restrições ao investimento, e as pequenas alterações introduzidas no debate na especialidade não foram suficientes para alterar a óptica excessivamente recessiva da política económico-financeira do actual Governo."
Hoje em dia, o Governo considera terminada a fase de estabilização financeira, que nós insistimos em chamar também de "recessão económica" e propõe-se lançar a economia numa fase de crescimento moderado. Esse crescimento, moderado em principio, iria num sentido que nós consideramos positivo, embora também tenhamos sérias reservas quanto à forma e aos montantes em que o défice orçamental se agrava, porque está de facto a atingir zonas perigosas.
Mas aqui façamos um distinguo.
A nossa demarcação face a este Governo e face a esta política económica é claramente diferenciada em
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relação às propostas restritivas que o CDS defende e que, em meu entender, o Sr. Deputado João Salgueiro parcialmente endossa.
Se é certo que a crítica feita quanto ao aumento das despesas não reprodutivas é correcta, não é menos certo que a crença mirífica numa redenção económica e num desenvolvimento que tenha por base a iniciativa privada parece-nos uma utopia perigosa.
Assim como condenamos qualquer perspectiva liquidacionista face ao sector público, assente numa filosofia económica velho-liberal requentada, não significando tal facto que não apoiemos a ideia de efectuar alguns dos investimentos no mesmo sector público, investimentos esses que foram decididos ou apoiados em boa medida, por alguns dos que são hoje dos inimigos mais ferozes desse mesmo sector público.
Outro ponto em que não posso deixar de insistir é o seguinte: insiste o Sr. Ministro das Finanças em se congratular com o efeito de ter reduzido drasticamente o défice da balança de transacções correntes. Tão drasticamente que ultrapassou largamente os próprios compromissos assumidos com o Fundo Monetário Internacional. E nós insistimos em criticar o Sr. Ministro e o Governo, porque tal abaixamento do défice de transacções correntes, efectuado muito para além do necessário e proposto, esteve associado a enormes malefícios de natureza sócio-económica, nomeadamente a brutal quebra do nível de vida, a descida global da produção, a redução do investimento produtivo. A economia portuguesa levará anos a recuperar dos erros cometidos em 1984, nomeadamente os concernentes à quebra de investimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não se contesta, como já foi dito, a gravidade do endividamento do Estado português, preocupa-nos bastante o défice deste Orçamento do Estado. Gostaríamos de lembrar, no entanto, que sem um aumento significativo e continuado da produção nacional, sem um acréscimo progressivo da capacidade exportadora da nossa economia, não se podem criar as condições que venham a levar à redução daquele défice, a conduzir à diminuição daquele endividamento. É à reconstrução económica, é à maior utilização da capacidade produtiva conjugada com a expansão dos investimentos nos sectores onde exista capacidade competitiva que poderemos ir buscar recursos que permitam, no médio prazo, proceder a reequilíbrios financeiros, numa óptica estrutural. Se não tivermos essa visão, será de facto o risco permanente dos ciclos curtos de stop and go que, em regime de democracia plurarista institucionalizada, tenderão a ajustar-se aos movimentos eleitorais.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Independentemente de também pensarmos que o Governo Português deve juntar a sua voz àqueles que na arena da economia internacional reclamam um repensar no plano mundial, nomeadamente das economias de mercado e mistas - mas não só - do papel do dólar na economia internacional e um articular mais cuidadoso das variáveis taxas de juro e de redesconto nos países mais desenvolvidos, endividamento global dos países do Terceiro Mundo e países periféricos da Europa e estrutura das organizações financeiras mundiais.
Mas o Governo da República e, nomeadamente, o Ministério das Finanças e da conjuntura - já que não há plano, pelo menos a médio prazo - terão também de ponderar seriamente nas consequências de uma continuada política de depreciação da moeda, como base essencial para a competitividade das nossas exportações.
Num plano sintético, que é o desta intervenção, lembraria, por um lado, que só se ganha competitividade no médio prazo e de forma sólida, se se aumentam significativamente os níveis de produtividade ou se se conseguem economias de escala ou derivadas de um efeito acumulado de experiência que permita reduções significativas de custos. E estes últimos efeitos só serão de razoável previsibilidade em sectores nos quais a economia portuguesa disponha de vantagens comparativas e portanto de elevado grau de competitividade.
O próprio controle da inflação e a redução acentuada desta taxa só serão possíveis, por um lado, se se verificar um muito mais vigoroso controle na área da formação dos preços (e aí uma criteriosa aplicação de um IVA - o que não parece ser o caso da proposta - não seria necessariamente negativa), mas seria indispensável uma repressão às manobras especulativas e um encurtamento e racionalização de circuitos de distribuição. Mas, por outro lado, uma acentuada diminuição da inflação só será possível com a alteração de orientações na política seguida quanto à depreciação monetária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Voltemos à estrutura do Orçamento que discutimos e às orientações das Grandes Opções do Plano, que o acompanham. Sinteticamente, lembraríamos também que não nos choca particularmente o aumento dos gastos públicos, mas pensamos que esse aumento deveria preferencialmente ser canalizado para fins de investimento e não para a manutenção e o crescimento, quase vegetativo, dos sectores mais burocráticos da administração pública. A reforma desta administração é algo em que se vai falando sempre, de governo em governo, mas que não se faz. É certo que é mais difícil reformar a burocracia do que criá-la, mas é preciso pôr mãos à obra.
Referiria ainda, e para que fique bem claro, que nós não temos nada contra o relançamento económico, ainda que feito de forma moderada, mas preocupa-nos, como aqui já foi dito, a sua desinserção de uma política de médio prazo e choca-nos a ausência de um modelo explícito de crescimento da economia. Há, pois, um hiato largo entre os objectivos propostos e as políticas sectoriais expostas, e continuamos a não entender as incapacidades políticas, que não técnicas, que estão na base desse hiato.
Enquanto se mantiver em branco o quadro de desenvolvimento previsto para a nossa economia, o Governo e, nomeadamente, o Ministério das Finanças e os outros da área económica, mais não poderão fazer do que uma navegação à vista, pequenos trajectos, sem ambição. Para um povo que descobriu as índias e o Brasil é pouco, como é pouco para uma economia e uma sociedade que vão tentando entrar, embora de lado, que não de peito feito, na Europa das comunidades.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Como também expresso reservas, já manifestadas em comissão especializada, quanto à timidez da formulação relativa às variações salariais previstas, formulação que visará talvez cobrir infracções
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aparentemente pequenas como a que ontem mesmo se verificou com o funcionalismo público e dar ao mesmo tempo satisfação às exigências das organizações sindicais.
Mas depois da quebra brutal do poder de compra verificada em 1984 o mínimo que se pode exigir é, de facto, uma garantia de que esse poder de compra não voltará a ser reduzido; no entanto, a redacção não garante, insinua.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros de Governo: Algumas questões pontuais merecerão, dada a sua relevância, uma referência, embora rápida.
Parece-me absurdo o que está proposto quanto à penalização dos depósitos dos emigrantes, a menos que, num acesso de generosidade extrema, se pretenda aconselhá-los a depositar as economias no país onde trabalham ou nalgum país vizinho. Se assim fosse, estaríamos retroactivamente a apoiar na prática a posição em tempos expressa pelo Sr. Bispo de Bragança quanto aos depósitos dos emigrantes.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
O Orador: - Não nos merece confiança, nomeadamente, a parte do Orçamento que se refere ao Ministério da Educação e aconselharíamos o Ministério das Finanças a revê-la à lupa, para que não voltemos a ser confrontados com pedidos de reforços orçamentais para pagar ordenados de pessoal dos quadros permanentes.
Parece-nos globalmente correcta a política que está prevista para a área dos transportes e temos ainda várias dúvidas nalgumas áreas do equipamento social, que certamente o debate em Comissão poderá contribuir para esclarecer.
Quanto a outros capítulos do Orçamento, a nossa posição não é necessariamente uniforme, como se verá na continuidade dos debates em Plenário e em comissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Espero ter contribuído minimamente, na perspectiva do meu agrupamento parlamentar, para o clarificar de posições neste debate orçamental que estamos a travar.
Aplausos da UEDS e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica.
A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques): - Sr. Presidente, é esta a primeira vez que tenho o ensejo de tomar a palavra nesta tribuna desde que V. Ex.ª foi eleito Presidente da Assembleia da República. Permita-me, pois, que aproveite esta oportunidade para lhe testemunhar, Sr. Dr. Fernando Amaral, a minha muita consideração e apreço.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr.a Secretária de Estado.
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É este o primeiro Orçamento do Estado elaborado após a publicação da nova Lei de Finanças Locais - o Decreto--Lei n.° 98/84, de 29 de Março, e apesar das dúvidas que alguns de vós manifestaram, creio poder agora demonstrar que as correcções introduzidas à Lei n.° 1/79 se justificaram.
Actualmente, novos impostos revertem para os municípios - como é o caso do imposto de mais-valias, que passa este ano a ser receita municipal - e o Governo propõe um valor para o Fundo de Equilíbrio Financeiro que só por si é bastante superior à soma dos montantes concedidos a este título nos anos de 1979 e 1980 e que representa o maior acréscimo anual, nas verbas transferidas do Orçamento do Estado para as autarquias, de sempre: 14 milhões de contos.
Alguns afirmam que ninguém está satisfeito com este Orçamento. Tal só pode significar que todos nós ambicionamos ter sempre mais para dar, mais para nos podermos lançar em novos projectos, para avançar mais rapidamente em realizações que ontem já vinham tarde.
Mas não posso também deixar de vos dizer que, no respeitante às finanças locais, o Governo foi mais longe do que muitos julgaram alguma vez possível.
Disse a muitos autarcas, ao longo deste últimos meses, que nós, no Ministério da Administração Interna, não iríamos desistir, porque sempre acreditámos ser possível alcançar a verba de 65 milhões de contos para as autarquias. E ganhámos.
Esta não foi apenas uma vitória nossa, mas também de todas as entidades envolvidas neste processo: das autarquias, da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, do Governo e da própria Assembleia da República, se tal proposta vier a merecer a vossa aprovação.
Há vários meses que os cálculos efectuados no Ministério da Administração Interna indicavam este valor, o qual mereceu a concordância do conselho directivo da Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
Também o conselho geral desta Associação, onde estão representados municípios de todos os partidos, deliberou por unanimidade, em 6 de Novembro de 1984, propor ao Governo que o Fundo de Equilíbrio Financeiro a transferir para as autarquias em 1985 apontasse para 65 milhões de contos.
Não vos vou dizer que esta vitória foi fácil. 1985 será ainda para todos nós um ano de dificuldades financeiras em que os encargos da dívida pública restringem extraordinariamente a margem de manobra do Governo.
Houve, portanto, que escolher os sectores que deviam ter maiores possibilidades de actuação.
O Governo tem sucessivamente afirmado que reconhece no poder local um papel decisivo na consolidação da democracia e na melhoria na qualidade de vida dos Portugueses, pelo que, de entre os diversos sectores, decidiu privilegiar as finanças locais.
Este enorme esforço financeiro a favor das autarquias que agora vos propomos, representa afinal e apenas, o reconhecimento pelo Governo do trabalho produzido pêlos 305 municípios portugueses, em consequência da dedicação de milhares de autarcas, cujo labor contínuo permitiu em 10 anos recuperar o atraso de décadas.
Os 65 milhões de contos constituem pois uma grande aposta do Governo no poder local.
Este acréscimo de receitas irá permitir realizar mais obras, mas tem de servir também para que as câmaras municipais se reestruturem administrativa e financeiramente - o Governo já publicou e irá publicar mais lê-
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Legislação neste sentido - por forma a pagarem as suas dívidas às empresas fornecedoras e à banca.
Se queremos um poder local mais forte e mais prestigiado temos, simultaneamente, de ter uma administração local que cumpra os seus compromissos financeiros.
A administração autárquica contribuiu para criar ou manter em funcionamento empresas, sobretudo ligadas á construção, que geram milhares de empregos. Estes 65 milhões de contos a atribuir em 1985 às autarquias são também uma forma de apoio indirecto às empresas fornecedoras de bens e serviços, bem como ao sector da construção civil.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após estas considerações genéricas convidar-vos-ia agora a analisarem comigo o capítulo deste Orçamento relativo às finanças locais.
Repararão em primeiro lugar que, apesar deste significativo aumento de receitas para os municípios - volto a recordar, o maior de sempre -, a percentagem das despesas do Estado a transferir para as câmaras municipais como Fundo de Equilíbrio Financeiro é, em 1985, de 13,6 % contra 17 % em 1984.
Como se pode compreender tal facto?
Já tive a oportunidade de demonstrar na Comissão Parlamentar de Administração Interna e Poder Local que esta circunstância resulta de ter sido diferente a caracterização, em 1984 e 1985, de três rubricas que integram este cálculo, as quais são só por si responsáveis por 79 % do acréscimo verificado.
Com efeito, entre 1984 e 1985, as transferências correntes do sector público aumentam 50 %, as transferências de capital do sector público duplicam e os investimentos decuplicam. Tal facto resultou, essencialmente, como não podia deixar de ser e a análise do texto o documenta, de alterações verificadas na sua caracterização.
Se retirarmos estas 3 parcelas, cujo conteúdo se alterou nos últimos 2 anos - o que, portanto, inviabiliza a comparação - constataremos que a percentagem das despesas públicas que constituem o Fundo de Equilíbrio Financeiro é, em 1984 e em 1985, praticamente idêntica.
Espero Srs. Deputados, que esta explicação vos tranquilize. que, também nós, no Ministério da Administração Interna, só o ficámos depois de compreendermos que os dados não eram comparáveis.
Explicado este primeiro aspecto gostaria, agora, de vos falar das novas competências descentralizadas no final do ano passado: os transportes escolares e acção social escolar.
À semelhança do que foi feito em 1984, também o Fundo de Equilíbrio Financeiro relativo a 1985 integra uma parcela destinada a financiar estas competências, desta vez, no entanto, referente à totalidade do ano.
Ao contrário, porém, do que foi feito no Orçamento do Estado para 1984, optou-se agora pela explicação da verba a atribuir a este título a cada município - embora esta não constitua uma receita consignada - para que os executivos municipais não tenham dúvidas desta vez sobre o montante recebido.
Muitos dos que agora me escutam, e sobretudo aqueles que são autarcas, estarão certamente recordados, e nós no Ministério da Administração Interna tão cedo não o esqueceremos, o que se verificou nesta matéria no ano passado.
Todas as câmaras municipais receberam então mais 2 % no seu Fundo de Equilíbrio Financeiro para fazer face às despesas com os transportes escolares e acção social escolar do último trimestre de 1984. Como, porém, esta verba não vinha discriminada, muitos municípios não orçamentaram esta despesa pois desconheciam os seus custos.
Quando em meados do ano nos apercebemos desta situação, teve o Governo de encontrar mais 775 000 contos para que estas competências pudessem com êxito ser descentralizadas.
Alguns de vós, que nos acompanharam mais de perto, sabem quanto foi difícil. Mas também aqui ganhámos.
Este ano, os critérios de distribuição desta verba, que atinge o montante global de 3 milhões de contos, mais 44 % do que o despendido pelo Estado e autarquias em 1984, são exactamente os que a lei manda, ou seja, os do Fundo de Equilíbrio Financeiro, com as restrições de não se aplicarem, quer aos municípios de Lisboa e Porto, quer aos das regiões autónomas.
Importa ter em atenção que de acordo com o Decreto-Lei n.º 229/84, de 5 de Setembro, que descentraliza para os municípios os transportes escolares, as câmaras municipais, assessoradas por uma comissão consultiva de transportes escolares, passarão a ser responsáveis apenas pelo transporte dos alunos residentes nos seus municípios e não, como se verificou até ao final de 1984, responsáveis pelo de todos os alunos das suas escolas, independentemente do município de onde proviessem. Este facto faz com que da comparação das receitas agora transferidas, com a anualização da que foi enviada no último trimestre de 1984 para esta finalidade, algumas câmaras vejam a sua receita reduzir-se. Tal acontece, na generalidade dos casos, porque as suas despesas também diminuirão, pois são normalmente municípios que têm escolas secundárias, onde afluem os alunos dos concelhos vizinhos.
Sabemos que estão a surgir problemas, o que é natural, pois esta é a primeira descentralização que se efectua, acompanhada dos respectivos meios financeiros. Por isso tivemos a preocupação de os acrescer substancialmente.
Estudaremos cuidadosamente as situações verificadas para ajuizar da necessidade de virem a introduzir-se medidas correctivas.
Não deixa de ser curioso, no entanto, notar algumas das reacções havidas. É que quando em anos anteriores se deram novas responsabilidades às câmaras municipais sem os correspondentes meios financeiros - como foi o caso das escolas primárias - houve uma acatação generalizada e agora é que surgem os protestos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Outro ponto sempre polémico nesta matéria, respeita à aplicação dos critérios de transferência do Fundo de Equilíbrio Financeiro para cada município.
Tendo o Orçamento do Estado de 1984 adoptado já os critérios que vieram a ser considerados na nova lei de finanças locais, pareceria à primeira vista que o aumento de receitas seria idêntico para todos os municípios.
Ora assim não é.
Com efeito em 1983, poucos meses depois deste Governo ter iniciado funções, mudámos no Orçamento do Estado os critérios relativamente aos previstos na Lei n.º 1/79, mas tivemos de utilizar os indicadores
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disponíveis no Ministério da Administração Interna, alguns de 1977, 1975 e 1951, outros ainda anteriores.
Um ano de trabalho permitiu-nos actualizar muitos dos indicadores disponíveis, que passaram a ser calculados de acordo com os valores mais recentes entre
tanto publicados, quer pelo Instituto Nacional de Estatística, quer por outros ministérios responsáveis pela produção destes valores.
Foi já entregue ao presidente da Comissão Parlamentar de Administração Interna e Poder Local o conjunto dos dados utilizados, com indicação expressa da sua fonte, dos valores relativos a cada município e das alterações dai resultantes relativamente ao ano anterior.
Estas alterações de valores provocam inevitavelmente nos presidentes das câmaras as seguintes reacções: aqueles cujas variações se situam perto da média nacional, não se manifestam; os que vêem as suas receitas fortemente acrescidas, consideram que desta vez é que os cálculos estão correctos e que portanto nada há a dizer. Mas aqueles cujas receitas aumentam menos do que a média, protestam da forma mais enérgica e não há director-geral, deputado ou membro do governo que lhes escape: telefonam, escrevem, vêm, mandam emissários, mas não desistem.
É uma saudável manifestação de liberdade e de vontade de defender os seus interesses que há que reconhecer.
Mas, mais uma vez, aqui nos limitámos a fazer o que a lei manda, ou seja, adaptar progressivamente os indicadores à evolução da situação económica e social que caracteriza o município.
Da análise destes dados poder-se-á constatar que 7 municípios passariam a ter em 1955 uma receita inferior à de 1954, neste caso não pela actualização dos indicadores, mas em consequência dos novos critérios adoptados pelo Decreto-Lei n.º 95/54. Eram municípios que já no ano anterior estavam nestas circunstâncias e cujas receitas foram então corrigidas para que não tivessem uma receita inferior à de 1953.
A proposta que vos fazemos agora é a de que não só nenhum município tenha em 1955 uma receita inferior à do ano anterior, mas ainda que esta seja pelo menos 10 % superior à de 1954, acrescida da verba destinada aos transportes e Acção Social Escolar, como é natural.
Iremos assim beneficiar os seguintes 19 municípios que estavam nestas duas condições: Ílhavo, São João da Madeira, Barrancos, Vila Velha de Ródão, Tábua, Peniche, Campo Maior, Marvão, Alcanena, Benavente, Entroncamento, Ferreira do Zêzere, Golegã, Vila Nova da Barquinha, Alcochete, Moita, Montijo, Seixal e Sines que no conjunto receberão mais 229 560 contos do que a simples aplicação da Lei das Finanças Locais lhe atribuiria.
Para se encontrar cobertura financeira para esta proposta, retirou-se aos municípios cuja receita mais aumenta, uma percentagem na parte do seu acréscimo que ultrapassa os 30 %, isto é, um município cuja receita aumentasse por exemplo 35 %, passa agora a aumentar 35 % para que nenhum município tenha um acréscimo de receita inferior a 10 %. Estão 57 municípios nestas circunstâncias.
Dois anos após a adopção dos novos critérios, é já possível determinar as alterações provocadas por este sistema. Verifica-se assim que Faro é o distrito onde o aumento de receitas em relação aos critérios da Lei n.º 1/79 é mais acentuado, pois, ao fim de 2 anos os municípios algarvios têm, no seu conjunto, um acréscimo de receitas superior a 60 %.
Depois dos lamentáveis acontecimentos verificados no Algarve no Verão passado, onde a inexistência de um sistema de saneamento básico conveniente chegou a provocar graves problemas à população local e aos turistas, só podemos concluir que os novos critérios vieram contribuir para a correcção das distorções mais gritantes.
Para além do distrito de Faro, onde o crescimento turístico pressiona a realização de infra-estruturas não só para a população residente, mas também para a flutuante que ciclicamente o visita, preocupação que só a nova lei veio a contemplar com a inclusão expressa de um critério relativo ao sector de turismo, verifica-se que são os distritos do interior do País ou os que maiores atrasos registam, aqueles onde os aumentos dos últimos 2 anos são mais significativos. Temos assim com acréscimos superiores à média nacional e a seguir ao de Faro, Bragança, Castelo Branco, Guarda, Viana do Castelo, Beja, Viseu, Coimbra, Vila Real e Évora.
Abaixo da média nacional situam-se os distritos mais desenvolvidos, com câmaras de maior dimensão, onde os impostos directos sobrelevam muitas vezes o próprio valor do Fundo de Equilíbrio Financeiro, ou onde muitas das principais carências estão já em vias de solução.
Esta análise feita a nível distrital obviamente omite resultados de municípios neles integrados cujos acréscimos são bastante diferentes. São por exemplo os casos de Castelo de Vide, em Portalegre, e Grândola, em Setúbal, cujos aumentos de receitas em relação a 1953 são de 70 %, ou de Esposende, em Braga, com 60 %, Vagos, em Aveiro, com 66 %, Vila Nova de Ourém, em Santarém, com 53 %, Alvaiázere, Nazaré, Batalha e Figueiró dos Vinhos, em Leiria, todos com aumentos superiores a 50 %, só para dar exemplos de municípios integrados em distritos de crescimento inferior à média nacional.
Municípios houve, porém, francamente beneficiados, que em 2 anos registaram acréscimos no Fundo de Equilíbrio Financeiro superiores a 60 %. São os casos de Albufeira, Castro Marim, Vila do Bispo, Mira, Penedono, Vila Nova de Paiva, Castelo de Vide, Castro Verde, Grãndola, Loulé, Vagos, Portimão, Oleiros, Esposende, Miranda do Douro e Lagoa.
Este objectivo do Governo de privilegiar as regiões do interior do Pais e as zonas mais carenciadas, mereceu o ano passado a vossa aprovação. Por isso a prosseguimos.
Em relação aos municípios das regiões autónomas foi previsto um acréscimo de receitas idêntico à média nacional, cabendo às respectivas assembleias regionais a fixação dos critérios de distribuição da receita por cada um dos respectivos municípios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas vos falaria de mais 2 assuntos.
O primeiro respeita ao facto do Orçamento prever uma verba para fazer face à concessão de auxílio financeiro excepcional definido no n.º 2 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 95/54, e que vos recordo, se refere a calamidades públicas, autarquias negativamente afectadas por investimentos da administração central, recuperação de zonas de construção clandestina e desbloqueamentos graves nas áreas de transportes e bombeiros municipais. A verba de 300 000 contos inscrita com esta finalidade não é elevada, mas permitirá de qualquer
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modo obviar de uma forma muito mais rápida e eficaz a situações que venham, pelo Governo, a ser incluídas nestas rubricas.
O segundo e último assunto diz respeito aos subsídios para construção de sedes de juntas de freguesia.
Sobre esta matéria definiu o Governo uma política de fomento de construção de sedes de juntas de freguesia que revistam a forma de equipamentos colectivos, centros cívicos que reunam os diferentes serviços necessários a qualquer comunidade.
O País não é suficientemente rico para construir edifícios que só serão utilizados de tempos a tempos.
Mesmo a este nível há que compatibilizar a indispensável dignificação dos órgãos, com a rentabilização em termos económicos e sociais dos meios financeiros disponíveis.
Assim, o apoio do Ministério da Administração Interna neste domínio é, se me permitem a expressão, apenas o estímulo à construção destes equipamentos, pois só concede 1500 contos por freguesia. Mas agora, de acordo com a nova legislação podem a segurança social, a saúde, a educação, os transportes, as comunicações e os desportos contribuir, cada um através do seu equipamento próprio, para a realização destas obras.
Todos juntos, ministérios, câmaras municipais, freguesias e população, estamos, pois, a construir as novas sedes das freguesias.
Também para a atribuição destes subsídios o Governo optou pela definição de critérios objectivos.
Compreenderão certamente os Srs. Deputados que havendo 4050 freguesias e dentro em breve 4096, é impossível ao Governo saber quais são aquelas onde é mais urgente, mais justo e mais premente a instalação das sedes das respectivas juntas.
Entende este Governo que acabou o tempo dos presidentes das juntas virem ao Terreiro do Paço ou a, São Bento solicitar a mercê do subsídio.
Vozes do PS e da UEDS: - Muito bem!
A Oradora: - Descentralizar significa transferir competências, receitas, mas também responsabilidades.
Considerámos, por isso, que devia competir ao executivo municipal a indicação das prioridades para a atribuição dos subsídios, as quais sempre que possível foram seguidas.
Por outro lado e apesar deste programa estar em vigor desde 1980, ainda havia 70 municípios que nunca tinham conseguido receber qualquer financiamento para este fim. Assim, adoptamos como segundo critério a atribuição a todos os municípios nestas circunstâncias de pelo menos um subsídio.
Podemos agora dizer que no final de 1984 e relativamente aos municípios que definiram prioridades, não há nenhum caso em que pelo menos não tenha havido uma sede de junta de freguesia subsidiada.
Finalmente, tentámos aproximar a proporcionalidade entre o número de subsídios por partido ou grupo de cidadãos, e os respectivos resultados eleitorais.
Fizemos então em 1984 um programa de 2 anos e que compromete parte das receitas para este fim, em 1985.
Como, no entanto, as verbas destinadas a este programa previstas no Orçamento do Estado para 1985 atingem 500 000 contos, ou seja, duplicam em relação ao ano passado, poderemos prosseguir com eficácia este ano a construção de sedes de juntas de freguesia.
Com que critérios, perguntar-me-ão agora VV. Ex.ªs
Do mesmo modo, ouvindo os municípios, que confirmaram as prioridades indicadas ou definiram outras. Teremos ainda em atenção outros critérios que se prendem essencialmente com o número de subsídios por município, relativamente às freguesias aí existentes e ao aumento de receitas do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Outras situações que venham a surgir e que mereçam do ponto de vista do Governo também importância prioritária, serão naturalmente atendidas, sobretudo as resultantes de compromissos já anteriormente assumidos.
Espero, Srs. Deputados que atentem no facto de pela primeira vez se terem definido critérios objectivos para a concessão de subsídios para as sedes das juntas de freguesia e de estes se basearem no primado da descentralização e da responsabilização dos autarcas e em princípios de equilíbrio e equidade.
Termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dizendo-vos que o esforço que toda a equipa do Ministério da Administração Interna tem vindo a realizar ao longo destes últimos 19 meses tem contribuído, como creio que é a convicção da grande maioria de entre vós, para dignificar e fortalecer o poder local, acrescentando novas competências e mais meios técnicos e financeiros às autarquias.
É que nós temos, meus senhores, a profunda convicção de que este é o caminho certo.
Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr.ª Secretária de Estado, desejava formular algumas perguntas, a primeira das quais corresponde manifestamente a uma crítica, também partilhada pela Comissão Nacional do Plano, que se refere ao seguinte: por que razão é que nas Grandes Opções do Plano não aparece qualquer referência a uma política de regionalização?
Em segundo lugar, desejo perguntar-lhe como justifica o Governo o crescente desmuniciamento financeiro das autarquias que resulta do Orçamento, sobretudo tendo em conta as novas atribuições que lhe são conferidas e o indispensável reapetrechamento em meios humanos e técnicos de que carecem os órgãos do poder local.
Crê o Governo que os 3 milhões de contos atribuídos para o financiamento de transportes escolares e acção social escolar são suficientes para o efeito? E como é que são suficientes?
Desejava ainda fazer-lhe outra pergunta, Sr.ª Secretária de Estado. Foi fixada em 13,6 % do valor global do Orçamento a dotação para as autarquias, quando, na vigência da Lei n.º 1/79, neste aspecto revogada, era estipulada a percentagem de 8 %, o que contraria todas as reivindicações feitas ao Governo nesta matéria por diversas autarquias.
O estipulado no artigo 53.º da proposta de lei do Orçamento, que permite o desconto de verbas nas transferências para os municípios, representa a assunção pelo Governo do seu inevitável endividamento decorrente da política do Governo?
Finalmente, uma última pergunta: quais os critérios adoptados no Orçamento do Estado para a distribuição da verba do Fundo de Equilíbrio Financeiro das autarquias?
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Porque não foram indicados os critérios, nem sequer os indicadores sintéticos?
É ou não verdade que a redução prevista no artigo 55.° do Orçamento introduz ainda maior ambiguidade e, portanto, maior discricionariedade na actuação do poder central neste domínio? A estas perguntas agradecia que me fosse dada resposta.
O Sr. Presidente: - V. Ex.ª Sr.ª, Secretária de Estado, pretende responder já a este pedido de esclarecimento ou no fim de todos os outros?
A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Se me permite, Sr. Presidente, respondo no fim.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, dou a palavra ao Sr. Deputado Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica, antecipando-me a algumas questões que colocarei na intervenção que posteriormente irei produzir, aproveito esta oportunidade para lhe pedir alguns esclarecimentos e fazer, desde já, algumas considerações.
Logo no início da sua intervenção a Sr.ª Secretária de Estado referiu que as verbas que se encontram no Orçamento do Estado, nomeadamente os 65 milhões de contos - dos quais 62 milhões de contos são distribuídos pelo Fundo de Equilíbrio Financeiro -, constituem uma vitória do poder local.
Mas que vitória, Sr.ª Secretária de Estado? Que vitória é essa, quando um conjunto de municípios continua, mesmo com a alteração que ontem à tarde entrou aqui, na Assembleia da República, a receber verbas inferiores a 10%? Será que, com esse aumento inferior a 10%...
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Não é verdade!
O Orador: - É verdade sim, Sr. Ministro! Um conjunto de municípios continua a receber verbas ligeiramente inferiores a 10%.
Será que com esses 10% algum desses municípios pode iniciar qualquer obra nova? Será que com esses 10% se dá cobertura, pelo menos, ao aumento da massa salarial que justamente se espera que os trabalhadores das autarquias locais venham a ter direito em breve?
Sr.ª Secretária de Estado, na realidade, esta é uma falsa vitória! Estas verbas apontam para o empobrecimento do poder local...
O Sr. Abílio Curto (PS): - Não apoiado!
O Orador: - ..., para a sujeição do poder local às directrizes do Governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Com certeza que não foi o Sr. Presidente da Câmara de Barquinha, que é deputado, que disse o «não apoiado»! Foi, com certeza, o Sr. Presidente da Câmara da Guarda que o disse!
Mas, por exemplo, quando a Sr.ª Secretária de Estado...
O Sr. Abílio Curto (PS): - Fui eu, fui!
O Orador: - Pois foi, pois foi!
Como ia a dizer, quando a Sr.ª Secretária de Estado referiu que estas diferenças têm em vista beneficiar, por exemplo, os concelhos do interior que têm maiores dificuldades, pergunto-lhe como é que justifica isso quando, na realidade, a nível geral, a média dos 62 milhões de contos corresponde a um aumento de 20,4% em termos nominais? Por exemplo o direito de Bragança ter um aumento médio de 18,7% e o de Vila Real de 17%. No entanto, o distrito de Faro, que não é do interior, tem um aumento médio de 31%.
Se descermos ao nível dos municípios, também aí podemos verificar que, por exemplo, Campo Maior, Marvão, Barrancos e Vila Velha de Ródão, que também não são concelhos do litoral, têm aumentos na casa dos tais 10%. E, por exemplo, Albufeira que tem um aumento superior a 40%?!
Como é que a Sr.ª Secretária de Estado coordena esta situação com a tal intenção de beneficiar o interior?
Por outro lado, Sr.ª Secretária de Estado, gostaria de lhe colocar uma questão relativamente à verba prevista de 3 milhões de contos para a Acção Social Escolar.
No Orçamento do Estado do ano passado foi atribuída à Acção Social Escolar uma verba de 4 200 000 contos, dos quais 926 000 contos foram transferidos para o Fundo de Equilíbrio Financeiro. O Governo ficou, para os primeiros 3 trimestres do ano passado, com a possibilidade de gerir, em média, 3 300 000 contos.
Como é que agora o Governo pretende que o poder local, tendo essas competências, fique só com 3 milhões de contos para gastar durante o ano de 1985?
Eram estas as questões que lhe queria colocar, Sr.ª Secretária de Estado.
O Sr. Presidente: - Estão ainda inscritos, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica, os Srs. Deputados Anselmo Aníbal, Abílio Curto, Horácio Marçal, Luís Beiroco, Pinheiro Henriques, Abreu Lima e Virgílio Pereira.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica, permita-me dizer-lhe que o seu discurso está tingido de um tom eleiçoeiramente optimista e que se funda, a nosso ver, em 2 equívocos base que me permitia sublinhar e sobre eles pedir-lhe esclarecimentos.
O primeiro equívoco é que a Sr.ª Secretária de Estado assentou todo o seu discurso nas variações nominais como se se tratassem de variações reais. Ou seja, sabendo que os valores do aumento nominal têm, em regra, uma repercussão negativa nos valores reais, sabendo que os municípios vão sair, segundo os valores apresentados no Fundo de Equilíbrio Financeiro, mais desmuniciados que em 1984, como é possível a Sr.ª Secretária de Estado apresentar-se a esta Assembleia com um discurso optimista em relação a 275 municípios do continente e a 30 municípios das regiões autónomas, que não aprenderam a democracia nestes meses e que
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já têm um conhecimento demorado das realidades financeiras em que assenta a sua gestão?
O segundo equívoco, Sr.ª Secretária de Estado, é este: como sabe, V. Ex.ª e a proposta de lei do seu Governo potenciam o arbítrio na distribuição das verbas para as juntas de freguesia.
Disse a Sr.ª Secretária de Estado que já não é tempo de os senhores presidentes e de os senhores vereadores virem ao Terreiro do Paço. Naturalmente, continuará o tempo em que o Sr. Ministro Eduardo Pereira - que gosta dessas coisas -, ou a Sr.º Secretária de Estado ou, quiçá, outros valores ainda mais altos, irá de cheque em mão, em alturas eleiçoeiras, dizer que aquele é a benesse do poder central.
Porém fica por entregar a esta Assembleia a listagem das juntas de freguesia que os senhores irão, calendarizadamente, contemplar.
Viu-se, em sede de comissão, o que é que devia ser feito a esse respeito. Aceitamos até uma ou outra ideia que potenciou. Mas queremos a listagem, exactamente para evitar os actos eleiçoeiros.
Por outro lado, em relação aos programas integrados de desenvolvimento regional, os 5,3 milhões de contos indicados é um valor mínimo. Para além disso, ficou por saber quem é que coordena, a nível do aparelho de Estado, esses programas integrados de desenvolvimento regional.
Por último, relativamente ao artigo 18.º, referente às calamidades e a outros tipos de intervenção, gostaríamos de saber quais são as acções que, desde já, estão previstas em relação às alíneas desse artigo que não dizem propriamente respeito a reflexos de calamidades.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Abílio Curto.
O Sr. Abílio Curto (PS): - Sr. a Secretária de Estado da Administração Autárquica, primeiro que tudo queria congratular-me pela forma clara como V. Ex.ª expressou aqui as situações em matéria de poder local e daquilo que está contemplado nas Grandes Opções do Plano e no Orçamento do Estado para 1985, e também pela forma como definiu os critérios aferidos para distribuição e aplicação da Lei de Finanças Locais em matéria de poder local para 1985.
Por outro lado, fiquei com a sensação de que, quando V. Ex.ª fez a exposição em relação a algumas competências transferidas em 1984, designadamente no que toca aos transportes escolares e à Acção Social Escolar, não fez referência a uma situação que é conhecida em todo o País e que se refere, concretamente, ao aquecimento escolar.
A Sr.ª Secretária de Estado sabe perfeitamente como está, neste momento, a situação e o "passar a bola" (passo o termo) do poder central para as autarquias locais em matéria de aquecimento escolar.
Nunca esta competência foi atribuída às câmaras municipais. Desde sempre o poder central assumiu a responsabilidade pelo aquecimento escolar.
Relativamente às competências agora transferidas para as câmaras municipais não foi feita nenhuma referência ao pagamento dos encargos com o aquecimento escolar. Ora, todos os Srs. Deputados conhecem - e o Pais também - a situação difícil por que
passam, neste momento, as crianças das escolas primárias em todo o País, nomeadamente nas zonas do interior.
Pergunto, pois, à Sr.ª Secretária de Estado o que é que concretamente tem a dizer sobre esta situação e se pensa ser possível deitar rapidamente mãos à resolução deste problema ou se o mesmo se vai arrastar.
Gostaria ainda de dizer à Sr.ª Secretária de Estado que, contrariamente ao que foi aqui afirmado, não há nesta exposição que V. Ex.ª fez nenhuma ambiguidade nem nenhum discurso eleiçoeiro.
Parece-me que a clareza com que expôs as situações é mais do que suficiente para demonstrar que esta é, efectivamente, uma vitória do poder local, sendo a prova cabal de que o Governo se dispôs a dialogar com o poder local, em termos da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Efectivamente, pela primeira vez na história do poder local em Portugal, contrariamente ao que disse o Sr. Deputado Manuel Fernandes, o Governo e o poder local estão de acordo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Que vergonha!
O Orador: - Já agora, já que V. Ex.ª, Sr. Deputado Manuel Fernandes, fez referência à Câmara Municipal da Guarda, lembro-lhe as referências que aqui foram feitas às Câmaras Municipais de Beja e de Évora, que são comunistas e que têm uma percentagem de longe superior àquela que foi aqui referida. Por outro lado, Sr. Deputado, pergunto-lhe se, já que fez referência à Câmara Municipal de Vila Nova de Barquinha, não quer fazer referência também às câmaras que foram aqui citadas em matéria de contemplação pelo Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Não há nenhuma ambiguidade na aplicação dos critérios e dos índices aqui aferidos, na medida em que eles foram claramente expostos e expressos a todos os deputados que integram a Comissão de Administração Interna e Poder Local e também à Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Ainda em relação a esta questão, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Manuel Fernandes e ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal que a aplicação dos 65 milhões de contos este ano no Orçamento do Estado vem ao encontro da reivindicação tomada por unanimidade em conselho geral da Associação Nacional de Municípios Portugueses, onde, curiosamente, estão representados alguns autarcas eleitos pela APU.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não faça distorção do que lá foi aprovado! Não foi nada disso que o Sr. Deputado acabou de dizer!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica, ouvi a sua intervenção com muita atenção pela consideração que V. Ex.ª me merece. No entanto, ficaram-me algumas dúvidas e daí a razão desta minha intervenção neste debate.
Em primeiro lugar, gostaria de manifestar o meu apoio e a minha satisfação pelo critério seguido pelo Ministério da Administração Interna no que concerne ao incremento da construção, nas juntas de freguesia, de centros colectivos, que, realmente, são obras que a maior parte das nossas freguesias necessitam.
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Espero que essa distribuição criteriosa e objectiva se faça com a devida antecedência e que as prioridades estejam de acordo com as necessidades das populações, para que se evitem interpretações do tipo daquelas que já aqui, nesta Assembleia, foram feitas, algumas talvez maldosas.
Tal como outros elementos desta Assembleia, também estou altamente preocupado com as verbas atribuídas aos municípios. Como a Sr.ª Secretária de Estado referiu, muitas câmaras têm manifestado preocupação relativamente à diminuição das verbas que lhes são atribuídas pelo Fundo de Equilíbrio Financeiro. Com efeito, os 10% que são atribuídos a 19 dessas câmaras são muito inferiores à taxa de inflação e, portanto, na realidade, elas recebem menos de 20% daquilo que foi referido.
Os casos concretos que chegaram até à Comissão de Administração Interna e Poder Local, através de outros deputados, concretamente de São João da Madeira, de Águeda, de Aljustrel, de Maia, de Vendas Novas, de Tábua, de Ílhavo, etc, constituem as 19 câmaras que têm protestado.
Nesse sentido, gostaria de, resumidamente, perguntar à Sr.ª Secretária de Estado como é que essas 19 câmaras, cuja maioria aprovou atempadamente o seu orçamento contando com determinadas verbas para a sua acção, hão-de agora proceder, na medida em que, realmente, elas não têm culpa do atraso verificado na apresentação e aprovação do Orçamento do Estado para 1985.
Era, concretamente, esta a pergunta que gostaria de fazer à Sr.ª Secretária de Estado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica, deixando de lado um mundo de questões que a sua intervenção suscita, mas que talvez tenham mais cabimento numa discussão na especialidade do que numa discussão na generalidade das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado, gostaria de começar por salientar o contraste claro entre o discurso que aqui ontem ouvimos do Sr. Ministro das Finanças - o qual, não obstante todas as reversas e criticas que fazemos a este Orçamento, respeitamos -, que foi um discurso austero, enfim, um discurso para dar conta a esta Câmara das dificuldades reais que as finanças do Estado atravessam.
Em contrapartida, o discurso de V. Ex.ª, Sr.ª Secretária de Estado, foi um discurso eufórico, de festa. Enfim, foi um discurso de uma grande vitória. É precisamente a propósito de uma grande vitória, e porque uma vitória implica sempre um vitorioso e um derrotado, que lhe pergunto quem foi neste caso o derrotado. Terá sido, porventura, o Sr. Ministro das Finanças?
A segunda questão que gostava de lhe colocar, Sr.ª Secretária de Estado, tem a ver com a possibilidade de - dada a situação das finanças públicas portuguesas -, em futuros orçamentos, ser ou não ser possível manter o nível de transferências para o poder local que este Orçamento consagra. Não estão, efectivamente, em causa, as funções, muito relevantes, do poder local, está sim em causa a necessidade de aplicar recursos que, infelizmente, são cada vez mais escassos.
Pergunto a V. Ex.ª se considera ser possível, nos próximos orçamentos, continuarmos com este nível de transferências de recursos, ou se, realmente, este Orçamento é, nesta matéria, caso isolado e é, realmente, o Orçamento de um ano de eleições para o poder local.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr.ª Secretária de Estado, tem sido orientação expressa do Governo - e foi aqui alardeada pela Sr.ª Secretária de Estado - a preocupação de alargar o âmbito de intervenção do poder local. Um dos domínios onde isso tem sido claro tem sido o dos transportes, e é sobre ele que me irei pronunciar.
Nem sempre a extensão das competências das autarquias locais em matéria de transportes tem sido isenta de algumas dificuldades - como é conhecido - particularmente, no que diz respeito aos transportes escolares.
A pergunta que, nesta matéria de transportes escolares, coloco é a seguinte: O que é que se fez para salvaguardar para, no fundo, impedir que este ano volte a haver o mesmo tipo de problemas que houve durante o ano passado?
Para além disso, e de uma forma mais global, perguntava-lhe se é orientação do Governo alargar ainda mais, durante o presente ano, as competências das autarquias locais em matéria de transportes. Se assim for, quais são as perspectivas, para que áreas é que vai estender-se a competência das autarquias, e como se procederá para tanto?
Finalmente, uma questão que diz respeito ao financiamento dos transportes. O alargamento da intervenção das autarquias - eu, pelo menos, parto do principio que é essa a orientação do Governo - pressupõe capacidade para financiar os serviços de transportes existentes na área das mesmas autarquias. Está criada a taxa municipal de transportes - e esse poderá ser um meio em relação aos transportes urbanos -, no entanto, ainda não está regulamentada. Para quando a regulamentação? 15to, para que as autarquias possam, efectivamente, vir a aplicar esta taxa.
Por outro lado, nem todas as autarquias terão o mesmo tipo de intervenção, pelo menos de imediato, nesta matéria - existem algumas autarquias que têm serviços municipalizados de transportes e em relação às quais se colocam problemas de viabilização. Em relação a estas, qual será a comparticipação do Estado, não só do ponto de vista financeiro mas também do ponto de vista técnico, para a superação da difícil situação actual?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima.
O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr.ª Secretária de Estado, não vou discutir o problema do montante das verbas atribuídas aos municípios. É evidente, é axiomático. É inquestionável que há uma melhoria para os municípios de 25% e, portanto - se poderia ou não ser mais eu não sei, é um problema que me ultrapassa -, tenho de me congratular com esse montante que foi atribuído aos municípios.
Posto isto, existem apenas alguns pontos sobre os quais quero pedir esclarecimentos.
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Está incluída nesta verba uma verba de 3 milhões de contos para transportes escolares, que suponho estarem indicados sob a rubrica "Acção Social Escolar". Mas os 3 milhões de contos são só para transportes ou também abrangem outra assistência que as câmaras tenham de dar aos alunos dos seus municípios? Os 3 milhões de contos foram distribuídos, segundo informação de V. Ex.ª, se a memória me não engana, segundo os mesmos critérios, pelos municípios, isto é, atendendo à distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro pelos mesmos municípios. Se assim é, ponho a seguinte questão: Estarão correctas essas distribuições? Esses critérios estarão certos?
Suponha V. Ex.ª que há - e é verdade! - municípios em que todos os transportes escolares dos, alunos podem ser feitos em transportes públicos. E socorrendo-me do meu distrito aponto o caso do concelho de Viana do Castelo, onde não há transportes especiais, enquanto outros casos há, em que o transporte dos alunos é todo feito à custa de circuitos especiais, que são incomparavelmente mais caros, e, socorrendo-me mais uma vez do meu distrito, aponto o caso de Arcos de Valdevez. Sendo assim, estará certo aplicar a esta distribuição o critério do Fundo de Equilíbrio Financeiro? Parece-me que não!
Ora, tendo sido considerado que os transportes são uma atribuição de uma competência aos municípios, como podem as câmaras exercer a sua competência se não têm a faculdade, por sim mesmas, ou em associação com outros municípios, de, por exemplo, regularem os alvarás dos transportes colectivos? Falta isso para que exista, de facto, uma competência. De outra maneira não há, e suponho que isso é uma falha.
Outra pergunta que queria fazer tem a ver com o facto de no ano passado se ter atribuído, como forma de competência - que não é uma verdadeira competência! -, os transportes escolares. Mas a lei da delimitação de competências prevê outras competências. Pergunto, pois: Porque é que não foram atribuídas este ano outras competências às autarquias?
Queria ainda perguntar - e eu não sei se o facto de se considerar que a capitação nos impostos directos é um critério correcto da distribuição das verbas pelos municípios estará inteiramente exacto, e deixava isto pendurado para reponderação - se não, é nas capitais de distrito que está concentrado o maior recebimento de impostos directos. Não há uma desproporção entre o que se cobra nas capitais de distrito e as suas populações do interior? Se assim for, essa capitação - na medida em que a distribuição é directa não vem desfavorecer os municípios do interior, em favor daqueles que já estão no litoral ou que são capitais de distrito?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Pereira.
O Sr. Virgílio Pereira (PSD): - Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica, gostaria que V. Ex.ª me informasse, assim como aos meus colegas eleitos pela Região Autónoma da Madeira e à Câmara, quais as razões por que a fatia que cabe à Região Autónoma da Madeira, dos totais inscritos nesta proposta de lei orçamental quanto a transferências correntes e transferência de capitais relativas ao Fundo de Equilíbrio Financeiro, é de 2 % e no que diz respeito, por exemplo, à Região Autónoma dos Açores é de 3 %.
Parece-me que há qualquer injustiça nesses critérios, e ela não se verificar, obviamente que ficaremos elucidados se V. Ex.ª se dispuser a informar-nos.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretária de Estado, como V. Ex.ª, com certeza, demorará mais de 5 minutos a responder, pediria à Câmara que fizéssemos o intervalo desde já e V. Ex.ª responderá em seguida, isto é, cerca das 18 horas.
Peço, entretanto, aos representantes dos grupos e agrupamentos parlamentares o favor de comparecerem no meu gabinete para tratarmos de um assunto relacionado com um documento que recebemos - incidente sobre a problemática que se levantou, quer da parte da manhã, quer da parte da tarde - e que se referia à comunicação social.
Está suspensa a sessão.
Eram 17 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 40 minutos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica para responder às questões que lhe foram formuladas.
A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Sr. Presidente, se me permite, não responderei às perguntas pela ordem de formulação das mesmas porque há temas que são comuns e gostaria de responder em primeiro lugar ao Sr. Deputado Luís Beiroco.
Começou V. Ex.ª, Sr. Deputado, por me perguntar, quando considerei que o Orçamento, na parte das autarquias, era uma vitória, de quem era a derrota. Sr. Deputado, quero dizer-lhe que entendo que não há derrotados.
O Orçamento, como sabe tão bem como eu, é um plano financeiro que traduz opções políticas. O que houve foi que escolher, entre os diversos sectores, aqueles em que valeria a pena apostar-se. Este Governo decidiu apostar no poder local. Penso que foi uma vitória do Governo, mas foi também uma vitória das autarquias, e, como dizia há pouco, se os Srs. Deputados concordarem, será uma vitória desta Câmara.
Agora respondo ao Sr. Deputado Raul Castro.
Em primeiro lugar, gostaria de focar um aspecto que é comum a várias perguntas que me puseram, curiosamente, quando no ano passado estive aqui na Assembleia a tratar do Orçamento. A proposta do Governo na altura apenas trazia um aumento de 5 milhões de contos e os Srs. Deputados estavam muito mais atentos e interessados no que nós estávamos a tratar. Desta vez, que eu vos trago um aumento de 14 milhões, verifico que, realmente, as pessoas não estão tão interessadas. Penso que os problemas estão nos ouvintes dado que me puseram muitas perguntas que eu tinha resolvido no texto. Mas tenho muito gosto, Sr. Deputado Raul Castro, em voltar a falar no assunto.
Perguntou-me se 3 milhões de contos são suficientes no que se refere aos transportes escolares e à Acção Social Escolar. Também o Sr. Deputado Manuel Fernandes e o Sr. Deputado Abreu Lima me colocaram perguntas sobre esse assunto. Gostaria que ficasse claro este aspecto. Em primeiro lugar, a verba que o Sr. Deputado Manuel Fernandes focou - os 4 milhões de contos do ano passado e os 926 000 contos - englobava
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o leite. Ora, o leite só num trimestre orçou em 326 000 contos. Efectivamente, os 775 000 contos, que nós distribuímos no último trimestre para transportes e Acção Social Escolar, representam mais 30 % do que aquilo que o Instituto de Acção Social Escolar gastou nos dois trimestres anteriores. Então, o que nós estamos a distribuir em transportes escolares e Acção Social Escolar - os 3 milhões de contos - representam, em relação ao ano de 1984, um aumento de 44 % pois, então, a verba havia sido de 2 milhões e 75 000 contos, Há, portanto, um aumento muito maior do que seria de prever.
Perguntou-me como é que eu justifico o facto de este ano haver 13,6 % de despesas de administração para autarquias e de o ano passado ter havido 17 %. Eu não vou repetir tudo o que disse porque já expliquei tudo o que se passa - o Sr. Deputado poderá ler o texto do meu discurso, que terei muito gosto em lhe dar. O que se passa é que as rubricas, que servem de base ao cálculo, as 3 rubricas fundamentais, divergem. São diferentes no seu conteúdo, nos anos de 1984 e 1985, não sendo portanto possível fazer esta comparação da forma como está a ser feita. Eu disse que se tirássemos as 3 rubricas, que são responsáveis por 80 % deste aumento, os valores que conseguiríamos encontrar seriam praticamente idênticos em 1984-1985.
Perguntou-me, em relação ao endividamento, como é que nós faremos as deduções. Nós só faremos deduções que forem decididas pelos tribunais, isto é, deduções que forem julgadas e decididas em tribunal. Só assim poderemos fazer quaisquer deduções.
O Sr. Deputado Manuel Fernandes não concorda quando eu digo que esta é uma vitória para o poder local. São pontos de vista - nós raras vezes estamos de acordo, como se tem visto - mas eu penso que se 14 milhões de contos a mais para as autarquias - nunca houve nada que se parecesse com o aumento que houve este ano - não é bom, Sr. Deputado, não sei realmente o que é que o será.
Além disso, nós conseguimos chegar exactamente à verba que a Associação Nacional dos Municípios nos tinha pedido. Portanto, consideramos que foi uma vitória para todos e até para Associação Nacional dos Municípios, que conseguiu que. o seu objectivo viesse a ser alcançado.
O Sr. Luís Beiroco (CDS): - É um verdadeiro Pai Natal!
A Oradora: - Disse-me que havia municípios que estavam a receber apenas 8 % a mais e não 10 %. Eu já tive oportunidade de explicar que nós fazemos as comparações em relação ao que o Fundo de Equilíbrio Financeiro nos disse e isso, efectivamente, dá os valores que aqui estão e que eu referi.
Gostava de chamar a atenção dos Srs. Deputados de que deixei na Comissão de Poder Local, ao Sr. Presidente, todos os indicadores que nós utilizámos este ano, o que permite, portanto, compreender muitas das divergências verificadas.
Como disse há pouco, estamos a aplicar a Lei das Finanças Locais tal e qual como a lei o estabelece. Se os Srs. Deputados pretendem que alteremos a Lei das Finanças Locais, então esse é outro ponto de vista que pode vir a ser estudado, mas não é isto que está em causa. Efectivamente, a aplicação da Lei das Finanças Locais provoca estas variações de critérios de que há pouco vos falei.
Creio que, de uma forma genérica, também respondi e alguns dos equívocos que o Sr. Deputado Anselmo Aníbal referia. Creio que não são equívocos, mas os senhores, por mais que tentemos explicar, encontrarão sempre uma forma de considerar equívoca qualquer situação que é clara.
Penso que não há equívoco nenhum, penso que realmente, o que estamos a propor é a melhor solução e, sobretudo, é, dentro das possibilidades, a melhor solução possível.
Em relação ao arbítrio na concessão de subsídios às sedes das juntas de freguesia, já tive oportunidade até de mandar pessoalmente ao Sr. Deputado Manuel Fernandes a lista da distribuição das juntas de freguesia no ano passado. Assim que o Orçamento for aprovado, teremos a possibilidade de distribuir as novas verbas e elas serão também entregues a todos os Srs. Deputados, se estiverem interessados.
Perguntou-me ainda se havia uma discriminação para as outras alíneas, relativamente ao n.º 2 do artigo 18.º
Terão de ser decisões do Conselho de Ministros. Portanto, só com resoluções do Conselho de Ministros é que poderemos utilizar estas verbas. Assim, nessa altura, serão previstas as suas utilizações.
O Sr. Deputado Abílio Curto fez uma intervenção - que não posso deixar de agradecer - e focou um aspecto que, penso, é bastante importante, sobretudo para os municípios do Norte do País; aqueles onde o frio mais se faz sentir: é o problema do aquecimento das escolas.
Efectivamente, até agora, o aquecimento das escolas não foi da competência municipal. Nós estamos a estudar atentamente, com o Ministério da Educação, este problema e, se não estivesse hoje aqui, na Assembleia da República, estaria, neste momento, com o Sr. Ministro da Indústria e com a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Educação, com o fim de encontrarmos uma solução para este problema que está a ser posto. Amanhã, espero ter esta reunião e encontrarmos uma solução que será depois comunicada, no mais breve espaço de tempo possível, às câmaras municipais destas zonas.
O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!
A Oradora: - O Sr. Deputado Horácio Marçal está preocupado com o aumento não suficiente verificado em algumas câmaras.
Sr. Deputado, o problema é este: em todos os anos, com a aplicação das leis, há câmaras que aumentam mais e menos que a média nacional. E isto verificou-se ainda o ano passado, quando houve uma série de câmaras cujo aumento de receitas não ultrapassou os 2 %. No entanto, todas foram capazes de fazer o seu orçamento. É claro que isto exige adaptação, cria algumas dificuldades - estamos bem cientes disso -, mas as câmaras terão de se adaptar.
O que acontece é que havia câmaras que, com os critérios anteriores, recebiam francamente mais do que seria normal; e é aí que se verificam alterações.
Chamo, por exemplo, a atenção para o caso de São João da Madeira, já que estamos em Aveiro - tenho aqui dois deputados de Aveiro à minha frente. São João da Madeira é um município muito pequeno e que, pela Lei n.º 1/79, tinha uma receita enormíssima. Este ano, para que não tenha um aumento inferior a 10 %, vamos aumentar as receitas de São João da Madeira
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em mais de 40 000 contos. É, portanto, uma câmara cuja receita está sucessivamente a ser distorcida, face aos outros e à custa dos outros, porque anteriormente receberia mais do que aquilo a que tinha, efectivamente, direito.
O Sr. Deputado Pinheiro Henriques falou-me também dos transportes escolares - penso que, em termos genéricos, algumas das dúvidas estão esclarecidas - e pergunta-me o que é que se passa com os critérios aliás, o Sr. Deputado Abreu Lima também levantava o problema dos critérios.
Efectivamente, o que a lei manda é distribuir as verbas de acordo com os critérios da Lei das Finanças Locais, portanto, de acordo com os critérios do Fundo de Equilíbrio Financeiro. No entanto, quero dizer aos Sr. Deputados que, no Ministério, fizemos ensaios alternativos. Admitimos, por exemplo, a hipótese de distribuirmos pelo número de crianças com menos de 18 anos, ou de substituir, nos critérios do Fundo de Equilíbrio Financeiro, o número de eleitores, precisamente pelo número de habitantes com menos de 18 anos. Os resultados foram estes: os grandes municípios viam as suas receitas aumentadas e distritos inteiros, praticamente todos do interior - todos os municípios -, viam as suas receitas diminuídas.
Como esta receita não é uma receita consignada, ela é uma receita para ser gasta em transportes escolares ou em outros objectivos que as câmaras entendam. Gostaria ainda de chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de haver câmaras que, por exemplo, estão a gastar o dinheiro dos transportes escolares fazendo lares. Não é obrigatório encontrar esta solução; têm é que resolver os problemas dos transportes. Esta receita não é consignada e, não sendo uma receita consignada, tem de ser distribuída de acordo com os mesmos critérios da Lei das Finanças Locais e do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Perguntou-me se, em 1985, alongaríamos a descentralização a outros aspectos.
Quero dizer ao Sr. Deputado que nós não propomos descentralizar novas competências no ano de 1985, mas consolidar estas que já existem. Este é um ano para verificarmos se a forma como a descentralização foi feita, nestes dois sectores, está ou não correcta, para, se assim for necessário, introduzirmos alterações. Em 1986 esperamos ter tudo preparado para, efectivamente, lançarmos novos aspectos na descentralização, o que não quer dizer que, no sector dos transportes e em termos legais, não venhamos a avançar nessa matéria, sobretudo em termos de regulamentação e de competências que, neste momento, são de direcções-gerais e que passarão a ser das autarquias. É um aspecto que não tem a ver com verbas, mas com competências.
Em relação à taxa municipal dos transportes, estamos, neste momento, a estudar a sua regulamentação. O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e eu, temos vindo a fazer reuniões nos distritos para discutir com as Câmaras a forma como esta transferência deve ser feita. Já fomos aos distritos de Braga, de Coimbra e, proximamente, iremos ao distrito de Faro.
Finalmente, o Sr. Deputado Virgílio Pereira, da Madeira, fez-me uma pergunta a respeito das verbas a transferir para esta região autónoma: porquê 2% para a Madeira e 3% para os Açores?
Sr. Deputado, a resposta é simples: estas verbas foram calculadas de acordo com as verbas que já anteriormente eram transferidas para estas regiões e têm a
ver com o número de municípios existentes em cada uma delas. Como todos sabem, a Madeira tem 11 municípios, os Açores têm 19 e é, portanto, normal que haja uma diferença entre as verbas transferidas para a Madeira e para os Açores. Ainda hoje de manhã tive oportunidade de falar com o Sr. Secretário Regional das Finanças da Madeira, onde estes aspectos foram analisados a contento, penso eu, de ambas as partes. Portanto, creio que os Srs. Deputados da Madeira, ou dos Açores, podem estar descansados, pois penso que a solução que encontrámos foi, efectivamente, a melhor solução que podíamos tomar.
Srs. Deputados, espero ter respondido, da forma possível, às vossas perguntas que, aliás, não foram desta vez complicadas. E realmente não foram complicadas porque a proposta do Orçamento é, no sector das finanças locais, em 1985, efectivamente, uma boa proposta.
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, voltando novamente à vitória para o Poder Local, e até para a Associação Nacional de Municípios, e aproveitando também para esclarecer uma afirmação do Sr. Deputado Abílio Curto, diria que não sei se a Sr.ª Secretária de Estado e o Sr. Deputado Abílio Curto têm conhecimento dos termos da moção aprovada pelo conselho geral da Associação Nacional de Municípios Portugueses, órgão deliberativo da Associação Nacional de Municípios. Este órgão aprovou por unanimidade, na sua reunião de 6 de Novembro de 1984, em Peniche, uma moção em que reclamava do Governo, para 1985, transferências de verbas para as autarquias superiores em, pelo menos, 30% aos valores transferidos em 1984, acrescidos do valor integral correspondente a todos os novos encargos que o Poder Central se prepara para transferir para os municípios.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Com certeza, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Falta ler a última parte do período que diz: "(...) até 65 milhões". Quer dizer, é melhor consultar o resto dos apontamentos.
O Orador: - Sr. Ministro, ou redigiram mal ou fizeram mal as contas. E isto porque quando se diz "aumento de verbas às autarquias superiores em, pelo menos, 30%", vai obter-se uma verba de 72 milhões, em números redondos. É assim, Sr. Ministro, é uma questão de fazer as contas; é uma questão de aplicar 30% a 5,747 milhões, fazer as contas, e verificar que dá um número de 72,471 milhões.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Por outro lado, Sr.ª Secretária de Estado, também aproveitava para lhe colocar uma outra questão, porque há pouco ficou no ar a ideia do beneficio às câmaras de presidência APU, como disse o Sr. Deputado Abílio Curto referindo Évora e Beja.
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Será que o Sr. Deputado Abílio Curto não tem conhecimento que o Seixal, Loures, Sines, Montijo, Moita, Barrancos, Benavente, Alcochete, Vila Franca de Xira, Amadora, que são 20% das câmaras de presidência da APU, têm aumentos iguais ou inferiores a 10%?
O Sr. Abílio Curto (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Abílio Curto pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Abílio Curto (PS): - Sr. Presidente, para utilizar a figura do direito de defesa.
O Sr. Presidente: - Em relação a quê, Sr. Deputado?
O Sr. Abílio Curto (PS): - É que foi citado aqui o meu nome e tenho a impressão que foram distorcidas algumas das afirmações que fiz.
O Sr. Presidente: - Faça favor de usar da palavra no sentido que referiu.
O Sr. Abílio Curto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para protestar, ou defender-me, em relação à acusação que me foi feita pelo Sr. Deputado Manuel Fernandes pelo seguinte: o Sr. Deputado Manuel Fernandes citou uma reunião, havida no dia 6 de Novembro de 1984, do conselho geral da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, a que eu presidi.
Queria dizer ao Sr. Deputado Manuel Fernandes que o que se passou nessa reunião em Peniche foi, exactamente, o que está escrito pelo punho do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Mora, eleito nas listas da APU. Aliás, tenho aqui uma fotocópia do texto que serviu para depois se mandar um telex para as entidades competentes. Esta moção foi feita pelos colegas da APU, do CDS, do PSD e do PS, foi aprovada por unanimidade, e, se V. Ex.ª me permitisse, lia-lhe só uma parte que - não sei, talvez por esquecimento -, tenha omitido. O Sr. Deputado não assistiu a essa reunião; estou perfeitamente à vontade para lhe dizer que o que se passou é o que está aqui e não aquilo que disse o Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenha paciência, mas V. Ex.ª vai ter depois a oportunidade de dar explicações.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - Mas é que me facilitava. Eu só queria pedir ao Sr. Deputado para, em vez de ler só a parte final, ler tudo.
O Orador: - Tanto me faz, eu posso ler-lhe tudo se o Sr. Presidente me der autorização para isso.
É que o comunicado é bem claro. Penso que é bem claro que o que diz aqui - escrito, como digo, pelo punho do Sr. Presidente da Câmara de Mora - é que o Fundo de Equilíbrio Financeiro a transferir para as autarquias, em 1985, seja no mínimo igual ao registado em 1984, acrescido da taxa de inflação prevista para este ano e dos encargos previstos para as novas competências, verba que aponta ara um total não inferior a 65 milhões de contos. É o que está aqui e é aquilo que realmente aconteceu.
Penso que estavam presentes oito presidentes de câmara, dos diferentes partidos políticos, e não podem vir agora aqui tirar outras conclusões porque penso que isso é passar um diploma de insanidade mental a quem lá esteve, o que me parece não ser correcto.
Foi inclusivamente mandado para todas as câmaras do Pais e foi corrigido.
Finalmente, queria dizer ao Sr. Deputado Manuel Fernandes que o Sr. Deputado falou aqui de outras câmaras que não beneficiam da percentagem das Câmaras de Beja, Évora e outras. Mas, já agora, dou-lhe um conselho: veja, no cômputo geral, quais são as câmaras municipais beneficiadas, em relação ao Fundo de Equilíbrio Financeiro, em termos de percentagem, e depois verá que chega à mesma conclusão a que eu cheguei: não são as câmaras socialistas, nem tão-pouco as câmaras do PSD, mas são as câmaras da oposição que, no cômputo geral, estão mais beneficiadas que as outras.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): - O Sr. Deputado Abílio Curto acabou de ler na parte final do documento o seguinte: "não inferior a 65 milhões". Ora, não inferior a 65 milhões é, por exemplo, 72 milhões.
O Sr. Ministro ala Administração Interna: - Ou 300 milhões!
O Sr. Abílio Curto (PS): - 65 milhões!
O Orador: - E, por outro lado, o Sr. Deputado leu "não inferior a 65 milhões" e eu lembro a V. Ex.ª que 72 milhões é, por acaso, não inferior a 65 milhões. Noutra perspectiva, a taxa de inflação deste ano não foi - segundo julgo - de 21 % ou de 20,4% - e estávamos em 1984, pois essa reunião verificou-se em Novembro de 1984.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - A inflação foi inferior a 30%.
O Orador: - Por outro lado, em relação à questão das câmaras mais e menos beneficiadas, tive o cuidado de fazer também esse mesmo estudo que o Sr. Deputado fez e verifiquei igualmente que, por exemplo, Albufeira e Aljezur são câmaras com beneficio superior a 40% e - segundo penso - pertencem ao Partido Socialista.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Abílio Curto (PS): - Vila do Bispo? E Vila Real de Santo António?
O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
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O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Secretária de Estado: A primeira pergunta que eu tinha formulado não obteve resposta.
A primeira questão colocada dizia respeito às razões pelas quais nas Grandes Opções do Plano não aparece qualquer referência à regionalização. Ora, como a Sr.ª Secretária de Estado sabe, pois eu tive até o cuidado de chamar a atenção, tal problemática foi salientada pelo Conselho Nacional do Plano, afirmando-se a fl. 6 do parecer "que se reitera a omissão absoluta relativamente a uma política de regionalização".
Ora, apesar de se tratar não só de uma pergunta minha, mas também de um relatório critico do Conselho Nacional do Plano, não me apercebi que a Sr.ª Secretária de Estado tivesse respondido a isto.
Somente mais um esclarecimento: em relação ao aumento que a Sr.ª Secretária de Estado invocou, isto é, mais 44% para os transportes, queria dizer a V. Ex.ª que se trata de uma competência nova das autarquias em tal matéria, como a Sr.ª Secretária de Estado sabe.
Por outro lado, não ignoro que a taxa de inflação atingida o ano passado foi de 30%. Logo, o que fica para uma competência nova das autarquias no âmbito dos transportes, é um aumento de 14%. Ora, é com um aumento deste tipo que as autarquias vão fazer face aos encargos com uma competência nova em matéria de transportes?
O Sr. Alberto Avelino (PS): - Não há revisão de preços!
O Orador: - Era esta a pergunta que eu deixava à Sr.ª Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica.
A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Sr. Deputado, peço-lhe desculpa por não ter respondido à sua pergunta.
Desde já, passarei à segunda questão. Nós sempre entendemos que as câmaras podiam fazer melhor e mais barato aquilo que até à presente data foi da competência da administração central. Nós destinámos um aumento de 44% às câmaras porque é o primeiro ano em que tal competência lhes é atribuída e, afinal, ao duvidarmos que as câmaras sejam capazes de fazer melhor e mais barato, estamos a colocar em causa todos os princípios que até agora defendemos. Cremos que os 44% são perfeitamente suficientes para que as câmaras na generalidade levem a cabo e bem esta nova competência.
Em relação ao primeiro aspecto que o Sr. Deputado colocou, peço-lhe desculpa por não ter respondido. Mas, como é um assunto que ultrapassa o domínio da minha Secretaria de Estado, eu pediria ao Sr. Ministro da Administração Interna que fizesse o favor de lhe explicar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, pedia-lhe também desculpa por não lhe explicar agora. Penso que se verificarão outras intervenções nesta matéria e se o Sr. Deputado me permitisse, quando houvesse outras alocuções, pessoalmente ou o Sr. Secretário de Estado daremos as explicações relativamente ao desenvolvimento regional.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Houve ontem um momento do debate - e, talvez, um só -, em que todos os deputados terão sentido alguma inveja do Sr. Ministro das Finanças e do Plano.
Refiro-me ao facto de o Sr. Ministro das Finanças e do Plano não ter dedicado boa parte do seu discurso a explicar-nos as razões do atraso da apresentação da proposta de lei do Orçamento do Estado na Assembleia da República. Acontece que se se tratasse de um assunto nosso - deputados da Assembleia da República - não faltariam as acusações de termos gasto demasiado tempo a discutir em vez de agir, de ter havido faltas de quórum ou atrasos no início das reuniões, enfim, de ter havido uma daquelas múltiplas acusações de que os parlamentos são normalmente alvo e que, infelizmente, os governos não costumam ser os menores acusadores.
Creio que depois deste facto não mais é possível, por exemplo, que se venha a solicitar uma autorização legislativa colocando em causa a celeridade dos trabalhos parlamentares. Estes últimos têm o seu ritmo e a sua eficácia. Em relação aos trabalhos do Governo o mesmo se diga. Creio que se o exemplo para alguma coisa serve é para que todos compreendamos as dificuldades uns dos outros.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que vale a pena começar precisamente por aqui. Acredito que a razão justificativa do atraso da apresentação desta proposta de lei é por si só dos deputados da Assembleia da República como de todos os Portugueses. Na verdade, é difícil elaborar um Orçamento de Estado e é cada vez mais tarefa árdua na grave situação em que vivemos.
Creio, por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a serenidade de que se falava hoje de amanhã no modo com esta Assembleia encarou o atraso tem esta justificação: a Assembleia da República sabe, porque tem obrigação de saber - mas é importante que as razões sejam explicitadas para que todos as possamos conhecer, como eu dizia e repito-o -, que é cada vez mais difícil elaborar um Orçamento do Estado. E é cada vez mais problemático elaborar um Orçamento do Estado porque, tal como ontem afirmava o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, trata-se de um Orçamento de despesas já feitas na sua maior parte e infelizmente, mas por dolorosa realidade que não podemos ocultar nem desconhecer.
Tratam-se de despesas realizadas, porque boa parte do Orçamento do Estado é condicionado pela dívida pública e, portanto, há uma condicionante à partida que não pode ser nem ignorada nem minimizada e que leva a sobrecarregar necessariamente o Orçamento estadual.
Creio que, inclusivamente, outros factores poderão referir-se também. E factores esses que tornam também extremamente difícil que em relação a um Orçamento do Estado se apresentem alternativas. No fundo, o Orçamento do Estado é um trabalho longo e delicado, que exige a colaboração de muitos serviços e departamentos a utilização de instrumentos que, infelizmente, todos sabemos não serem sequer suficientemente aperfeiçoados. Pessoalmente, já tive a ocasião de dizer como o Orçamento português continua a ser pre-
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parado em boa medida segundo as regras do Conde de la Villette, ou seja, de 1830, em França. Ora, como todas as técnicas orçamentais modernas não são susceptíveis ainda de serem introduzidas entre nós como, portanto, os orçamentos são cada vez mais de continuidade, em vez de serem de profunda renovação e alteração, que necessariamente deveriam ser. Para além destes condicionalismos já de si importantes, muitos outros se reflectem.
São condicionalismos de toda a ordem: por exemplo, aqueles que vêm de factos que ultrapassam o âmbito desta Assembleia e para ela são trazidos como factos consumados. Exemplificando, a contratação da função pública e um aumento fixado em uma determinada percentagem foi um facto dado, anunciado ontem em plena discussão do Orçamento do Estado na Assembleia da República. Temos um facto consumado, que nos é lançado sobre a Mesa e que, portanto, também ele dificulta a construção de alternativas.
Ainda há pouco a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica nos demonstrava a coincidência de números a que tinha chegado com a Associação de Municípios, ou seja, nos 65 milhões de contos. Estamos perante outro facto consumado, também ele a colocar em causa a possibilidade de encontrar alternativas por parte da Assembleia da República.
No entanto, creio Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o facto maior é aquele que comecei por apontar, ou seja, a parte crescente e suficientemente progressiva que a dívida pública vem assumindo no Orçamento estadual. A fim de dar uma ideia meramente quantitativa, diria que de 1980 para esta parte o pagamento de juros pelas dúvidas do Estado cresceu em 5 anos 8 vezes; os encargos com as amortizações, algumas das quais adiadas, cresceram no mesmo período 12 vezes. Esta progressão geométrica não pára de crescer e, como as receitas do Estado não podem de perto nem de longe acompanhar esta progressão, a dúvida pública cada vez mais angustiante que a todos nós sem excepção "anda a assaltar", é de saber que possibilidade vai tendo o Estado de solver os seus compromissos a curto prazo.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o problema de uma dívida interna e externa que em 1973 pouco excedia os 50 milhões de contos e, 10 anos mais tarde, em 1983, era da ordem dos 1300 milhões de contos, dá só por si uma ideia da dimensão do nosso problema e da sua progressão. Se considerarmos todo o peso da dívida estatal, incluindo as responsabilidades assumidas por avales e, por exemplo, pelos fundos autónomos, teremos assim uma dimensão da dívida que eu direi "pecar por defeito" se a avaliarem em mais de 2000 milhões de contos. Este número, 2000 milhões de contos, é não apenas um encargo sobre o Orçamento do Estado deste ano e sobre a nossa geração como também sobre as gerações futuras. Essa é uma responsabilidade que nos cabe assumir também.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que nos aproximamos e muito perigosamente, de uma situação em que mais do que o Governo - qualquer que ele seja, quaisquer que sejam os seus méritos -, é a dívida quem nos governa.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a simples consideração destes números nos leva a uma segunda ordem de considerações.
Há cerca de um ano o Sr. Ministro das Finanças e do Plano anunciava aqui - refiro-me à sessão de apresentação do Orçamento do Estado para 1984 -, como,
o segundo dos grandes objectivos da sua política o da redução do défice orçamental de cerca de 6,1 % do produto interno bruto e do sector público administrativo para cerca de 6,3 %. E diria, desse segundo objectivo, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano as seguintes palavras que passo a citar:
Está em jogo, efectivamente, a capacidade do Estado para assegurar um certo número de operações importantes de gestão da economia. Assim, desde logo, gerir as suas próprias finanças - designadamente, no que respeita ao controle das despesas -, adoptando os mecanismos de gestão adequados e que deverão ser implementados. Está, por outro lado, em jogo a capacidade do Estado para reduzir a marcha do seu endividamento, evitando um acúmulo da dívida pública que tornaria inviável, no limite do absurdo, o próprio estabelecimento do Orçamento do Estado. Está também em jogo a capacidade do Estado para reduzir os efeitos do consumo público sobre a própria procura de empréstimos externos e de importações e, consequentemente, sobre a balança de pagamentos.
Estas palavras do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, há uma ano proferidas nesta mesma Câmara, mereceram o nosso aplauso. E porque o mereceram, dificilmente compreendemos que, numa situação com a gravidade que tem aquela que descrevi, se aumente ainda mais este ano o défice e a dívida já existente e a fraca capacidade que já tínhamos de gerir um Orçamento do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se esta é a primeira e fundamental crítica que temos a dirigir ao Orçamento do Estado para 1985, tal como nos é apresentado, gostaríamos ainda de acrescentar que, precisamente porque a situação é esta, na parte restante do Orçamento do Estado - isto é, aquela que não é absorvida pela dívida - imperioso se tornaria gerir e actuar com maior sentido de economia e de eficácia.
Creio, portanto, que dificilmente se percebem quaisquer atrasos, por mínimos que sejam, em relação a actuações nesse sentido. Qualquer solução era urgente, provavelmente ontem e há 10 anos! E por isso mesmo, cada dia que passa só agrava essa urgência e torna indispensável essa actuação.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
O Orador: - O problema do Estado entronca aqui. Creio Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não me será levado a mal que diga que o problema do Estado vem sendo encarado em Portugal, nos últimos tempos, como algo que tem mais a ver com a relação entre o adolescente e os pais - em termos psicanalíticos - do que com a teoria política. Creio que o Estado está a funcionar, ao mesmo tempo, como objecto de todas as seduções e de todas as rejeições: dirige-se contra o Estado toda a agressividade nascida das frustações da vida social e, ao mesmo tempo, coloca-se no Estado todas as esperanças de melhoria da vida colectiva.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
O Orador: - Creio que há também um sentimento generalizado, no mais alto grau, de que do Estado se deve aproveitar tudo quanto se puder! E creio que este sentimento colectivo generalizado não só não é salutar
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- nem é o sentimento ideal para uma vida colectiva sã -, como representa aquilo que, em termos económicos, se traduz por um processo de acumulação. Solicitado por todos os grupos de pressão, o Estado acaba por ceder aos mais ruidosos ou aos mais fortes. Mas o peso das vantagens adquiridas por determinado grupo apenas serve para estimular as reivindicações dos restantes. Se A conseguiu, porque é que não hão-de B ou C também conseguir? E nesta escalada sem limite direi, muito simplesmente, que nada é mais irreversível do que os benefícios adquiridos por uma profissão ou categoria social.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que talvez um retrato cruel mas verdadeiro de uma certa situação do País que somos, e em que vivemos, tenha sido dada pela posição assumida por alguns trabalhadores das finanças, que explicavam aos órgãos de comunicação social que se reservavam o direito de não cobrar impostos se acaso lhe fossem retiradas regalias.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este tipo de situações, por aquilo que têm de profundamente anti-social e anticolectivo, não podem passar sem reparo, qualquer que seja a tribuna em que esse reparo é feito!
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
O Sr. Alberto Avelino (PS): - Muito bem!
O Orador: - E creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que por isso mesmo a reforma da administração pública é inadiável e que à medida que se processam, por exemplo, operações de desconcentração ou de descentralização não se justifica que se mantenham e permaneçam os serviços que a desconcentração ou a descentralização deveriam ter feito terminar.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não é possível, não é desejável, não é salutar que ao mesmo tempo que as autarquias vêem aumentadas as suas competências, essas mesmas competências esvaziadas sejam mantidas por organismos cujo conteúdo e acção já não se percebe quais sejam, verdadeiramente.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados,
que também aqui o Orçamento do Estado para 1985 deveria ter ido mais fundo e mais decididamente. Existem tantas duplicações de serviços, tantos organismos para fazerem a mesma coisa - ou para discutirem qual deles é competente "para fazer o quê" -, que mal se percebe que esse problema, conhecido e identificado, não seja de imediato resolvido.
Para dar um exemplo simples, diria apenas das competências em matéria de construções escolares, existentes no Ministério do Equipamento Social e no Ministério da Educação - que continuam a ter planeamentos diversos e separados no tempo e também acções diversas sobre a mesma matéria. Poderia multiplicar, até à infinidade, alguns desses exemplos.
Mas quero referir-me, ainda, a um outro aspecto muito concreto em que muito mais fundo se poderia ter ido na proposta do Orçamento do Estado. Refiro-me ao modo como os dinheiros públicos são administrados e à nem sempre total transparência do modo como essa utilização é feita.
Não tenho dúvidas em encarar de frente e aqui - porque penso que é aqui o lugar próprio para tratar desta matéria - que todos sabemos, e dizemos que as actuações de alguns departamentos, que evitam concursos públicos, que os fazem de forma camuflada ou indirecta, são, não apenas uma forma de criar despesas excessivas para o Estado como, inclusivamente, uma forma de contribuir para um dos cancros da sociedade portuguesa. Refiro-me, concretamente, à corrupção.
Creio que o Orçamento de Estado tem de tomar uma posição definida, esclarecendo que mal se percebe, por exemplo, como é que estando os empreiteiros de obras públicas portuguesas classificados em relação ao volume de obras que podem realizar - e detendo para isso os correspondentes alvarás - que partem do pressuposto da apreciação das suas capacidades de ordem financeira, da sua capacidade técnica (incluindo o equipamento de que dispõe e o corpo técnico de que são servidos) mal se percebe que existindo este quadro legal - ainda recentemente utilizado e revisto - se utilizem e abusem de processos que constituem os chamados concursos de pré-qualificação. Para quê? Para pôr em causa as qualificações que os próprios alvarás constituem? Ou para permitir que, num conjunto menos vasto de concorrentes - que sempre será menos vasto do que o do concurso público aberto -, mais facilmente esses concorrentes se entendam e possam, por isso, defraudar o Estado em preços maiores? Para conseguir uma dilação do prazo de resposta? Para quê, afinal? E se esta questão não for completamente dilucidada, em termos de Orçamento de Estado, então estamos a contribuir necessariamente para o agravamento de despesas provocando, pelo menos, actos inúteis.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que no Orçamento do Estado, precisamente porque os recursos são escassos, para além de medidas tão simples - como aquelas que acabo de propor - outras mais, e de rigor, são indispensáveis.
Não é mais admissível que a Assembleia da República volte a ser confrontada com uma situação de deslizar do Orçamento de alguns ministérios; não é mais admissível que a Assembleia da República possa ser confrontada com a situação de ministérios em que, à partida, se considerou impossível o cumprimento do Orçamento do Estado, tal como ele foi fixado. Se assim é, reveja-se o Orçamento do Estado, mas que não haja ministérios a dizerem-nos que logo, de entrada, contaram com um défice inicial porque o Orçamento votado não era suficiente para corresponder às despesas efectuadas.
Há aqui uma responsabilidade pessoal de cada responsável por sector, que tem que geri-lo dentro de princípios de racionalidade, de economia e de eficácia de gestão que a todos nos são impostos, mas particularmente aos mais responsáveis.
0 Sr. Vilhena Carvalho (ASDI): - Muito bem!
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O Orador: - Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Governo contará por parte desta Câmara, e sem excepção, com todo o apoio para todas as medidas de rigor e disciplina orçamental que queira introduzir, de modo a que o acompanhamento da situação se faça de tal modo que não mais sejam possíveis esses "deslizares".
E creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se já bastantes sugestões aqui fui deixando, uma mais me poderá ainda ser pedida: neste Orçamento, onde estão despesas concretas para cortar e onde estão receitas concretas para aumentar?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temo que a previsão das receitas neste Orçamento esteja a ser feita de forma demasiadamente optimista e que, designadamente, não seja possível atingir os montantes calculados para a cobrança do imposto profissional, visto que esse aumento de cobrança pressuporia um aumento percentual de vencimentos e de rendimentos, que está muito para além das previsões mais optimistas que possam ser efectivadas.
Mas queria dizer que, para além dos seus defeitos concretos - e tem-nos certamente e alguns deles penso que poderão e deverão ser corrigidos -, há uma profunda alteração neste Orçamento, que tem a ver com os impostos indirectos e que é introduzida pelo imposto sobre o valor acrescentado. Creio que a substituição desse imposto, neste momento, corresponderia a uma profunda rejeição do Orçamento do Estado, tal como ele foi concebido. Porque não seria possível modificar o quadro de receitas que ele implica sem a sua consideração. Mas isto posto, não impede que considere que o cálculo concreto de algumas das taxas do imposto sobre o valor acrescentado está mal efectuado e que, independentemente das negociações efectuadas com a CEE, bem ou mal feitas, importará que o imposto sobre o valor acrescentado seja revisto, por exemplo, em relação aos medicamentos e aos livros.
Gostaria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de falar agora no lado das despesas e, portanto, de dizer que alguns cortes, também ai, poderão ser efectuados. E penso que sim, com toda a frontalidade e clareza, porque penso que nas despesas correntes da Administração é possível introduzir critérios de maior austeridade e maior rigor. Penso também que - e este também dá uma margem, apesar de tudo, bastante lata - é possível considerar que outro rigor teria naturalmente este Orçamento se não estivéssemos em ano eleitoral.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que esta simples consideração permitirá, necessariamente, introduzir alguns cortes orçamentais. Talvez não seja este o ano mais adequado para se inaugurarem tantos quartéis de bombeiros, talvez não seja este o ano mais adequado para se realizarem iniciativas de tipo similar.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!
O Orador: - E talvez tenhamos todos alguma coisa a ganhar poupando naquilo que é supérfluo para podermos ter para aquilo que é necessário.
Aplausos da ASDI e de alguns Srs. Deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Ouvi atentamente a exposição do Sr. Deputado Magalhães Mota e gostaria de lhe fazer algumas perguntas, sobretudo para me documentar melhor sobre a posição da ASDI, relativamente às questões que levantou ou, pelo menos, em relação a algumas delas.
O Sr. Deputado falou da questão concreta da corrupção, depois de descrever os processos de concursos. Gostaria de perguntar se V. Ex.ª tem presente que na última alteração do Orçamento foram introduzidas, na parte final do ano, algumas orientações traduzidas em lei. Queria saber se ainda considera que essas orientações legais podem ser aperfeiçoadas.
Como segundo ponto, pergunto-lhe se tem presente o facto de, numa determinada altura, haver um representante de um ministério que referiu a célebre questão do défice inicial. Gostaria de saber se hoje entende que esse problema se põe com a mesma acuidade com que se colocou na altura, tendo em conta, exactamente, a discussão que então se fez e as conclusões a que se chegou, as quais foram, obviamente, não só técnicas, mas políticas. Em face disso, pergunto-lhe se a ASDI pensa participar em sede própria, isto é, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, nas reuniões, de modo a que fique de vez documentada a intervenção da ASDI sobre esta matéria.
Quanto às previsões de receitas, que classificou algumas delas como previsões optimistas, ponho-lhe uma questão à qual agradecia que desse resposta: neste momento tem já dados suficientes para poder fazer essa afirmação?
Quanto às despesas, também um pouco no sentido que referi, quanto à questão do défice inicial, citado por um dos representantes do Ministério da Educação, gostaria de saber se tem propostas concretas e se participará em sede própria, ou seja, em comissão especializada - quanto aos problemas de critério de maior austeridade e rigor, porque, Sr. Deputado, o exemplo que deu pode proceder, mas não sei se procede. No entanto, mesmo que proceda, é uma verba tão irrisória que terá o exemplo da moralidade em global. Mas no concreto não resolve, de facto, os pro4lemas financeiros do País.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado Magalhães Mota, não quero deixar de sublinhar o agrado com que ouvi boa parte da sua intervenção. No entanto, no que toca a este Ministério "borrou" um bocadinho a pintura ao dar como exemplo a inauguração de quartéis de bombeiros. Penso que foi, digamos, um exemplo mal escolhido e que não quereria com certeza referir-se em especial aos quartéis de bombeiros e aos bombeiros. Saiu-lhe bombeiros, mas talvez estivesse a apontar para outra força qualquer.
O Sr. Alberto Avelino (PS): - Para o Presidente da República!
O Orador: - Mas como há pouco o Sr. Deputado Luís Beiroco também fez uma pequenina observação em relação às verbas das autarquias, perguntando claramente se não havia um pouco de demagogia e de eleitoralismo este ano e se se pensava manter nos anos se-
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guintes este tipo de política, eu gostava de dizer, sob a forma de pedido de esclarecimento e como intervenção própria, que não há eleitoralismo nem nos quartéis de bombeiros, nem em relação à política que o Ministério da Administração Interna pretendeu introduzir no Orçamento deste ano. É absolutamente claro que a verba das autarquias resulta de um arranjo da verba geral de investimentos, com outra arrumação, digamos mais feliz. Eu diria que cada escudo nas autarquias produz quase dois escudos na administração central, e isso é de aproveitar. Portanto, pedia ao Sr. Deputado Magalhães Mota que fizesse o favor de corrigir o "tiro", porque me parece que lhe saiu um pouco errado.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, gostaria de colocar-lhe duas questões, uma respeitante à receita e outra respeitante à despesa.
No que respeita à receita, V. Ex.ª deixou aqui claramente afirmado que a rejeição, porventura, do imposto sobre o valor acrescentado - que já está legislado, como V. Ex.ª sabe, tendo o CDS já requerido a ratificação de respectivo diploma por esta Câmara seria suficiente para implicar uma rejeição do Orçamento. Registo a afirmação.
No entanto, V. Ex.ª fez algumas observações sobre este novo imposto - apesar da propaganda que se tem feito de que se trata de uma pura substituição fiscal -, e essas observações incidiram principalmente sobre as isenções. Entendeu o Sr. Deputado que se devia rever a lista das isenções para se incluírem os medicamentos e os livros. Estou de acordo. Mas não entende V. Ex.ª como altamente escandaloso, no imposto, a possibilidade que o Estado se outorga a si próprio de ficar em dívida para com os particulares, indefinidamente, pagando-lhes uma taxa de juro de 2%, quando na circunstância contrária lhes exige uma taxa de juro de 3 %? Gostaria que se pronunciasse sobre isto.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - No que respeita à despesa, V. Ex.ª falou sobre o modo como alguns responsáveis na área da Administração Pública, designadamente do Governo, fazem despesas e apontou para a necessidade de uma responsabilização pessoal, tanto quanto me foi possível ouvir. Queria colocar-lhe agora esta questão, Sr. Deputado Magalhães Mota: Está V. Ex.ª de acordo com o Sr. Dr. Salgado Zenha, elemento do Partido Socialista, que foi ao ponto de responsabilizar criminalmente, pela forma como faziam despesas, alguns membros do nosso governo?
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Srs. Deputados, agradeço as questões que me foram formuladas, que me permitem concretizar alguns aspectos daquilo que disse.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado Almerindo Marques pergunta-me se conheço as orientações que foram fixadas aquando da aprovação da alteração do Orçamento de 1984. Conheço e creio que essas orientações vão no bom sentido e podem ser aperfeiçoadas. Aliás, importa que o sejam e importa também que sejam transferidas para este Orçamento, visto que poderia discutir-se se a sua vigência era apenas temporal e fixada em 31 de Dezembro de 1984, e não que se prolongasse no tempo.
Mas creio, Sr. Deputado Almerindo Marques, que compreenderá a minha preocupação quando verifico que elas não são cumpridas e que, por exemplo, o concurso para as novas instalações da Universidade Nova de Lisboa foi feito através de uma pré-qualificação em vez de um concurso público. 15to, apesar dos valores em causa estarem perfeitamente contidos dentro da orientação que tive o gosto de aprovar.
Quanto ao problema aqui surgido do défice inicial, creio que foi explicitado - em Comissão de Economia, Finanças e Plano, precisamente na revisão do Orçamento de 1984 - que não era apenas de 2 milhões, como o Sr. Secretário de Estado de então vinha dizendo, mas de bastante mais. Aliás, como o Sr. Deputado Hasse Ferreira e eu próprio tivemos ocasião de demonstrar nesse debate.
Creio que estamos, portanto, no resvalar do Orçamento do Estado, que se traduziu não numa insignificância, como o Sr. Deputado bem sabe, mas em valores de vários milhões de contos. E isso aconteceu com os Ministérios da Educação, do Equipamento Social e com vários outros.
Creio, portanto, que o problema tem gravidade e que o facto de a questão ser posta aqui e agora, obriga, necessariamente, na sequência da discussão que travámos em comissão e também aqui em Plenário, a que não mais seja possível a qualquer sector governamental vir dizer-nos que o Orçamento aprovado pela Assembleia da República correspondeu a qualquer défice inicial dentro do seu ministério, use-se ou não a expressão com rigor. Não é possível. O concerto de opiniões que certamente foi feito no Governo, a justificação de prioridades que aqui acabou por ser votada, comprometem-nos a todos e a cada um e comprometem fundamentalmente os responsáveis directos pela gestão de cada Ministério.
Quanto ao problema da previsão de receitas ser ou não optimista, devo dizer que não sei se os dados de que o Sr. Deputado Almerindo Marques dispõe são melhores do que os meus - e certamente que serão e se lhe permitem corroborar a informação do Governo de que a sua previsão de obtenção de receitas é realista. Se assim for, gostaria de os conhecer, porque os que conheço sobre a cobrança de receitas verificada até Outubro de 1984 pela Direcção-Geral de Contabilidade Pública não permitem supor que em matéria de imposto profissional seja possível atingir os números que constam da previsão governamental.
Assim, se V. Ex.ª possui outros números, teria muito interesse em os conhecer e verificar em que base assenta a previsão que foi estabelecida.
Creio que o Sr. Ministro da Administração Interna, na preocupação de negar o eleitoralismo, talvez tenha enfiado uma "carapuça" excessiva, porque não referi que era o Ministério da Administração Interna que fazia os quartéis de bombeiros. O Sr. Ministro da Administração Interna tem a obrigação de conhecer tão bem como eu que quem faz os quartéis de bombeiros é o Ministério do Equipamento Social, é o Sr. Secre-
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tário de Estado das Obras Públicas quem lança os concursos para os quartéis de bombeiros. Então, V. Ex.ª vem assumir essa negação de eleitoralismo por causa dos quartéis de bombeiros? Oh, Sr. Ministro! V. Ex.ª só tem no seu Orçamento uma transferência para o Serviço Nacional de Bombeiros. Portanto, são coisas muito diferentes e eu não as confundo!
O Sr. Deputado Nogueira de Brito colocou-me duas questões em relação ao imposto sobre o valor acrescentado. Devo, pois, dizer que dei 2 exemplos de situações que considerava erradas no imposto sobre o valor acrescentado. Contudo, disse uma coisa que tenho a certeza - e por isso a quero sublinhar -, ou seja, que de tal modo alteraria a previsão de receitas a substituição do imposto sobre o valor acrescentado por outro qualquer imposto, mesmo que fosse a manutenção do imposto de transacções, que isso tornaria inviável o Orçamento do Estado tal como ele está concebido e, portanto, corresponderia na prática à sua rejeição.
Aliás, a Assembleia da República aprovou por forma sucessiva orientações quanto ao imposto sobre o valor acrescentado. Algumas delas terão sido mal executadas e cumpridas - é, por exemplo, o caso dos livros ou dos medicamentos -, mas a verdade é que há uma série de orientações assumidas ao longo do tempo que se traduzem na criação desse imposto.
Quanto ao pagamento pelo Estado pela forma como está concebido no diploma sobre o imposto sobre o valor acrescentado, o Sr. Deputado tem a minha concordância em relação à crítica que fez.
Quando me referi à responsabilidade pessoal pela gestão de cada departamento ministerial, estava a pôr em causa um aspecto muito concreto e a dizer que o Orçamento é uma responsabilidade colectiva, mas depois há um responsável directo pela gestão do Orçamento dentro de cada ministério, que é o ministro do respectivo ministério. Foi nesse sentido que me referi à responsabilidade pessoal. Contudo, devo dizer que não me repugna - porque tal corresponde ao espírito da Constituição, que prevê expressamente a responsabilidade dos titulares dos cargos políticos e prevê essa responsabilidade não apenas em termos pessoais, mas também em termos criminais pelos actos ilícitos praticados - que aquilo que corresponde a um acto ilícito, tal como é definido na Lei de Enquadramento Orçamental, seja passível de procedimento criminal.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, agradeço-lhe os esclarecimentos que V. Ex.ª me deu e gostaria de dizer que em relação ao défice inicial e ao problema da corrupção, as respostas que foram dadas permitem concluir que a ASDI irá colaborar de forma a que as coisas se não venham a repetir.
Quanto às dúvidas que o Sr. Deputado levantou sobre dados que eventualmente eu possua, mas V. Ex.ª não, devo dizer que não os possuo. Por essa mesma razão coloquei a questão ao contrário, ou seja, formulei-a de forma a saber se o Sr. Deputado já tinha elementos que lhe permitissem fazer a afirmação. Pela minha parte, creio que os elementos que existem não são suficientes, mas permitem esclarecer nos termos precisos em que a Comissão de Economia, Finanças e Plano se pronunciou.
Quanto aos critérios que solicitei que avançasse sobre o maior rigor e mais austeridade, posso presumir que a ASDI, a seu tempo, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, avançará com propostas concretas no sentido de critérios mais austeros e rigorosos na gestão das despesas públicas.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mote (ASDI): - Sr. Deputado Almerindo Marques, agradeço a oportunidade que V. Ex.ª me dá para, mais uma vez, dizer que desde há vários anos que na Assembleia da República temos pugnado pelo rigor e pelo controle nas despesas. Temos apresentado variadíssimas propostas nesse sentido e variadíssimas sugestões nessa ordem de ideias. Portanto, não será este ano que iremos deixar de o fazer! Pelo contrário, dentro da modéstia das nossas possibilidades, não negaremos o nosso contributo no sentido de tentar melhorar as situações que consideramos erradas ou menos correctas.
No campo do rigor e da austeridade, creio que será possível - e o debate na especialidade o poderá demonstrar - introduzir critérios e julgo terem mais interesse os critérios gerais a que possamos chegar do que as disposições casuísticas sobre este ou aquele ponto. Contudo, devo dizer que estou convencido de que poderemos chegar a aperfeiçoamentos sucessivos.
Quanto à matéria do imposto profissional, a verdade é que não possuo outros dados senão os resultados da cobrança de 1984, com data de Outubro, e uma conta simples que é verificar qual o aumento calculado no Orçamento do Estado e qual a percentagem de rendimento que seria preciso aumentar para que esse aumento também se pudesse vir a verificar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1985 deram entrada nesta Assembleia da República, quando se encontra já esgotado o período de vigência daquilo que foi designado Programa de Gestão Conjuntural de Emergência.
Estranhamente - como já tivemos oportunidade de referir -, não é nelas efectuado o balanço da política subjacente àquele programa, nem apresentada justificação para o agravamento que se regista face às expectativas Grandes Opções do Plano para 1984 e carta de intenções ao Fundo Monetário Internacional e que seria perfeitamente evitável.
As Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1985, aparecem desinseridos de qualquer projecção marcoeconómica de médio e longo prazo.
O Governo respeitou religiosamente a tradição herdade dos que o antecederam, ignorando os preceitos constitucionais nesta matéria e, designadamente, o disposto no artigo 93.º da Constituição, que refere que da estrutura do plano, para além do plano anual, devem constar os planos de médio e longo prazos.
Poderá alguém dizer que o Governo tem, para o seu próprio uso, um quadro de longo e médio prazo em que inserem as Grandes Opções do Plano para 1985.
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A verdade, porém, é que o único quadro oficial desse tipo que se conhece é o constante do plano de recuperação financeira e económica (que desapareceu da cena inexplicavelmente) e tentar a compatibilização entre os 2 documentos é tarefa inglória.
Por outro lado, o prometido plano de modernização da economia ainda não apareceu à luz do dia e é impossível tentar saber se as orientações do Governo em matéria económica e financeira são coerentes com a modernização que preconiza para a economia portuguesa.
O que podemos afirmar, sem dúvida, como já referimos em intervenção anterior, é que não se vislumbra compatibilização entre o cenário macroeconómico desenhado nas Grandes Opções do Plano de 1985 e os seus objectivos prioritários por um lado e, por outro o Orçamento do Estado, tal como nos é apresentado.
É irrealista pensar que se assegura um crescimento económico de cerca de 3 % à custa de uma política que, numa conjuntura recessiva como é presentemente a nossa, coloca o essencial do esforço de investimento no sector privado, que tem, ele próprio, uma taxa de crescimento em volume (2,5 %) superior à taxa global (2 %).
Nas Grandes Opções do Plano diz-se que "uma condicionante importante à reformulação da política económica para 1985 será a preocupação de impedir que as necessidades de financiamento do sector público alargado ultrapassem um máximo considerado admissível por forma a garantir as disponibilidades de crédito necessárias ao relançamento do investimento privado".
Aqui a opção é clara.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O MDP/CDE reconhece ao sector privado um papel fundamental no desenvolvimento económico do País e considera que a política económica e financeira do Estado deve garantir, apoiar e incentivar a contribuição dos empresários que apostem, e se integrem, numa actividade empresarial normal, não especulativa, nem fraudulenta.
Pensar, porém, que tais empresários reagem primeiro que o sector público ao esforço de investimento e, sobretudo, que o farão sem o estímulo do sector público através dos seus projectos próprios e de uma política de crédito adequada, que não é definida, é pura ilusão (na melhor das hipóteses), ou é tentativa condenável de iludir a problemática central do crescimento económico nacional.
Nesta perspectiva, é impensável o crescimento previsto de 2,9% do produto interno bruto, a menos que se verificasse uma aceleração muito significativa das economias, das quais estamos essencialmente dependentes, que impulsionasse ainda mais as exportações portuguesas.
A verdade é que esse cenário não é provável nem contemplado nas Grandes Opções do Plano e, por outro lado, o processo de crescimento assente nessa estratégia acarretaria para poder ser viável, crescente desvalorização da força de trabalho nacional e crescente dependência externa.
No Orçamento do Estado, a modéstia das dotações para projectos dinamizadores da economia e a subvalorização dos investimentos no sector empresarial do Estado são factores de estrangulamento do crescimento da economia.
Com as Grandes Opções do Plano propostas pelo Governo, a economia portuguesa não vai crescer, talvez nem sequer estagnar, mas regredir. O cenário de "crescimento moderado" que o Governo nos propõe é inatingível através das orientações definidas no Orçamento em discussão.
A este respeito, cabe perguntar porque é que o Governo, de versão para versão, vem piorando a sua perspectiva de crescimento da economia portuguesa.
Em documentos cronologicamente tão próximos, o produto interno bruto desce de 3,1 % no Plano de Recuperação Financeira e Económica para 3,0 % na primeira versão das Grandes Opções do Plano para 1985 e, em curtas semanas, para 2,9 % na versão definitiva, depois da apreciação do Conselho Nacional do Plano.
É caso para nos darmos por satisfeitos pela pressa em proceder à discussão e votação, por não passarem mais alguns dias antes da entrega das Grandes Opções do Plano na Assembleia da República, pois talvez assim se evite nova queda do produto interno bruto.
De qualquer modo, o que está à vista é a persistência de uma política restritiva, sem horizontes, uma política em que o vector recessivo global se alia a uma filosofia capitalista neoliberal, ao arrepio da ordem constitucional vigente, consoante se deduz das políticas conjunturais e sectoriais propostas pelo Governo nas Grandes Opções e no Orçamento do Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Se as Grandes Opções para 1985 nos propõem um cenário modesto de crescimento e, ainda por cima, falho de credibilidade, nada nos trazem de prometedor do ponto de vista global da evolução da sociedade portuguesa.
O MDP/CDE tem afirmado sempre a distinção entre crescimento e desenvolvimento económico.
O desenvolvimento contém o crescimento, mas não se reduz a ele, implica a transformação da qualidade de vida dos cidadãos nos seus múltiplos aspectos materiais e espirituais e tem como componente essencial a progressiva melhoria da satisfação das necessidades básicas da população como vector de justiça social e factor de desenvolvimento.
A política de austeridade que tem vindo a ser seguida, em sintonia com as orientações do Fundo Monetário Internacional e que atinge essencialmente as camadas sociais de menores rendimentos ou de rendimentos fixos, não é inflectida nas Grandes Opções do Plano para 1985.
Perante as críticas de que o Conselho Nacional do Plano se fez eco, a versão definitiva das Grandes Opções do Plano passou a dizer que não era desejável que os salários reais descessem em 1985 e que se deveria evitar uma nova quebra dos salários reais.
Na prática, porém, as orientações e as medidas de política propostas pelo Governo, apontam para nova redução do poder de compra dos Portugueses no ano em curso.
O exame conjunto das medidas de política fiscal, de preços, de rendimentos, permite concluir que esta afirmação de intenção do Governo não passará de boas palavras.
Tudo indica que o aligeiramento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho, que contempla essencialmente os efeitos da inflação, seja anulado, ou mesmo ultrapassado, pelos efeitos da tributação da despesa, especialmente pela introdução do imposto sobre o valor acrescentado tal como se encontra delineado.
Também a redução do ritmo de inflação para 22% não é compatível com as actuações ao nível da poli-
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tica de preços e de comercialização que as Grandes Opções do Plano preconizam.
Nestas, diz-se que "a política de rendimentos... promoverá uma repartição mais equitativa dos rendimentos, sobretudo dos grupos mais vulneráveis, assegurando-lhes um crescimento mais rápido e impedindo a degradação do respectivo nível de vida".
Entre estes grupos encontram-se, sem dúvida, os pensionistas que, atingidos, por uma inflação média de 30% em 1984, viram as suas pensões crescerem apenas 18%, a partir de Dezembro.
O Orçamento do Estado para 1985 (e parece que também aqui a descoordenação é patente!) refere taxativamente que para as pensões em geral se admite, em Dezembro deste ano, aumentos iguais, em percentagem, aos que foram ultimamente efectuados, ou seja, no caso dos pensionistas do regime geral, aumentos de 18% contra uma inflação prevista de 22%.
Aliás, o Orçamento do Estado prevê para as prestações de segurança social no seu conjunto, um aumento de 21,1 %, inferior à taxa de inflação, mesmo que ela se contenha nos limites previstos.
Como conciliar esta orientação do Orçamento de Estado com a afirmação, constante das medidas de política sectorial no domínio da segurança social, de " garantia dos ajustamentos quantitativos das prestações familiares e das pensões, tendo em vista a manutenção do seu poder de compra?"
A política de segurança social proposta pelo Governo não só não contribui para assegurar a manutenção do nível de vida dos grupos mais desfavorecidos como, pelo contrário, acentuará a sua degradação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As Grandes Opções do Plano e o Orçamento de Estado estão desarticulados. É um facto.
Contudo, detecta-se que ambos os documentos são coerentes, na inobservância dos preceitos constitucionais de regionalização e reforço do poder local.
Nas Grandes Opções não há qualquer referência a uma política autónoma de descentralização e os projectos em execução ou previstos assentam muito mais nas possibilidades concretizadas ou antevistas de auxilio externo do que das necessidades planeadas do desenvolvimento regional.
Agrava-se a tendência de desmuniciamento financeiro das autarquias, ao mesmo tempo que se lhes conferem novas atribuições e novos encargos e se fica indiferente perante as necessidades, imperiosas, de reapetrechamento dos órgãos do poder local.
As situações de endividamento das autarquias resultantes desta política, desta opção, que se traduz na atribuição de 13,6% do total do Orçamento de Estado, em vez dos 18% previstos na Lei n.º 1/79, encontram-se obviamente previstas, com o mecanismo do "desconto" que o Orçamento do Estado consagra no artigo 53.º
Na linha da subalternização do poder local, o Orçamento do Estado agrava o poder discriminatório do Governo relativamente à distribuição das verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro no artigo 55.º
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não analisaremos nesta intervenção as políticas expressas no Orçamento do Estado nos domínios da saúde, do ensino, da habitação, dos transportes, etc, mas é de acentuar aqui a conclusão geral de que o grau de satisfação das necessidades básicas de largos sectores da população portuguesa vai sofrer nova redução com as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1985 que o Governo propõe ao Parlamento.
É ilusória a imagem que com este Orçamento do Estado, com estas Grandes Opções do Plano se pretende criar de que 1985 será melhor, mais próspero para os Portugueses, será o ano do arranque da recuperação económica, lenta mas segura.
Com mais desemprego, menores salários, pior segurança social, desbaratando recursos tão escassos em investimentos desenquadrados de um plano global de acção, de facto inexistente, não é a recuperação que se inicia, é o futuro que continua a hipotecar-se.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As Grandes Opções do Plano para 1985 prevêem um crescimento efectivo da formação bruta de capital fixo, isto é, do investimento, de 2% relativamente a 1984, prevendo-se um crescimento de 2,5% no sector privado e de 0,8% no sector público, sendo neste de 1% no sector público administrativo e de 0,5% no sector empresarial do Estado. Esta expectativa insere-se numa previsão de crescimento económico moderado de cerca de 3%.
Estamos perante um cenário muito diferente do vivido em 1984 em que, relativamente ao ano anterior, o investimento diminuiu 20 pontos percentuais estimando-se a redução do produto interno em 1,6%.
Estamos, assim, em 1985 na presença de um cenário de efectivo relançamento moderado da economia com pequeníssimo crescimento do investimento que não compensa nem de longe a contracção verificada em 1984. Será este cenário de possível concretização? As suas componentes serão compatíveis entre si e serão elas próprias compatíveis com a realidade que conhecemos e com a que podemos perspectivar?
Deixo de lado, de momento, o sector empresarial do Estado, o qual pela sua importância será objecto de uma intervenção especifica da minha bancada. Vejamos o que se tem passado no sector privado dos últimos anos até aos tempos mais recentes.
Os subsectores exportadores têm nitidamente florescido, sendo disso exemplo o calçado, a cortiça, os têxteis em parte, etc. As unidades dependentes do mercado interno face à contracção da procura têm definhado, enfrentando problemas inicialmente financeiros e posteriormente económicos sucessivamente agravados. O sector da construção civil e os subsectores a montante enfrentam os maiores desafios da história económica recente do País.
Que se fez para alterar este estado de coisas e reestruturar e incentivar a indústria?
Utilizou-se o regime geral de incentivos ao investimento, o SIII, que apresentava 3 componentes valorativas, a componente da valia económica do projecto, a componente da prioridade sectorial e a componente da prioridade regional, cada uma delas com pontuações variando por degraus entre 0 e 10.
O sistema começou por não ter efeitos pois no primeiro ano em que foi utilizado não foi possível, por insuficiência na rubrica orçamental, pagar as bonifica-
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ções a quem as havia requerido e a elas tinha reconhecidamente direito. Ainda actualmente os atrasos processuais e nos pagamentos são enormes.
Por outro lado, a tramitação do processo era de tal forma burocratizada e complicada que desmotivou os potenciais investidores que nela passaram a descrer.
Por outro lado o entrosamento das 3 componentes do sistema com várias pontuações parcelares levava à diluição dos méritos ou deméritos do projecto pelo que se foi verificando que pela maneira como estavam elaborados todos os projectos tinham valia superior ao meio da escala. A função selectiva do sistema perdeu-se e tudo passou a ter incentivos desde que os projectos fossem de apresentação coerente e elaborados por quem dominasse os mecanismos do sistema.
Utilizou-se os financiamentos sem juro da Secretaria de Estado do Emprego para manutenção de postos de trabalho, bem como os subsídios para premiar a criação de postos de trabalho. No primeiro caso para além de um saneamento financeiro admitia-se uma componente de investimento para correcção de estrangulamentos na produção, melhoria de qualidade, etc., enquanto no segundo caso a criação de postos de trabalho derivava da concretização de um efectivo investimento produtivo. Estes apoios ajudaram a aguentar muitas empresas, mantiveram muitos postos de trabalho embora não tenham atingido globalmente os seus fins últimos: a consolidação do emprego pelas mudanças estruturais.
Utilizou-se as figuras dos contratos de viabilização e dos saneamentos financeiros os quais integravam também uma normalmente pequena componente de investimento. Os seus resultados são na quase totalidade extremamente tristes: adiaram colapsos e não conseguiram as almejadas mudanças estruturais. .
Utilizaram-se as ajudas de pré-adesão da CEE e programas similares, através do IAPMEI, por exemplo, com subsídios ou financiamentos reembolsáveis atribuídos a projectos de expansão nitidamente válidos. Foram úteis mas, pela sua limitação, representaram uma gota de água no oceano das necessidades da indústria.
Entendemos que a incentivação e apoio ao sector privado terá de se realizar com maior intensidade sim, mais realisticamente sim, mas com menos Estado, com menos burocracia, com a redução das complexas cadeias de tramitação, dos pareceres, dos memorandos, das comissões e grupos, sem obviamente se perder o rigor da avaliação.
Vou abordar 5 pontos que considero fundamentais: acima de tudo e antes de tudo o Estado tem, ele próprio, de saber e definir realmente o que quer; definir os produtos ou grupos de produtos que possuem competitividade internacional permitindo a captação de divisas com balanço cambial favorável e cuja produção interessa ao País incentivar. Definir os produtos que integrarão as tecnologias do futuro e onde se terá de investir para permitir a nossa sobrevivência industrial a médio prazo e cujos custos de produção o País terá que assumir como parcela de um investimento para o futuro. Definir os produtos que estão na fase de declínio que não interessam já ao País e que terá de ter a coragem de deixar cair reconvertendo as unidades fabris que os produziam.
Tudo isto são coisas concretas e não retórica. Está-se a lidar com factos reais, com produtos reais e não com abstracções ou, ainda pior, tentando transformar em realidade os nossos desejos.
Assim, em primeiro lugar, o Estado terá de ter, uma política industrial clara, efectiva, assumida, válida num período de tempo que permita a actuação com alguma segurança dos investidores.
Seguidamente o Estado terá de criar os incentivos adequados que conduzam os investidores a actuar nos produtos, com as tecnologias, nos locais, nos sectores que foram definidos e que mais interessam ao desenvolvimento económico do País. Os incentivos não têm de ser, não deverão ser, incaracterísticos, tipo amálgama, que premeia tudo o que é investimento.
Os incentivos deverão ser perfeitamente claros para o investidor e para quem os tem de outorgar, implicarem regras de jogo límpidas, serem as ferramentas privilegiadas da política industrial do País.
Em segundo lugar o Estado disporá de uma panóplia de incentivos ao investimento clara, reflectindo a política industrial definida, de fácil compreensão e aplicação para todos os interessados. O Estado terá de criar as infra-estruturas de apoio necessário para que a indústria funcione e os produtos tenham credibilidade no País e no exterior. Infra-estruturas necessárias, imprescindíveis, são o ter à disposição vias de comunicação, telefones, telex, energia, água, esgotos, remoção de lixos industriais, etc. Mas não só!
É indispensável a criação de infra-estruturas técnicas e tecnológicas que permitam certificação de qualidade dos produtos, aprovação de protótipos, comprovação da qualidade das matérias primas, comprovação de não poluição, e que, para além de tudo, façam ou ajudem a efectuar investigação aplicada na área dos produtos ou das tecnologias utilizadas, nos estudos de mercado ou nos próprios estudos de viabilidade dos projectos. Estas infra-estruturas serão da indústria e viverão de e para a indústria. O Estado criou-as ou ajudou a criá-las. Tais como os telefones, os telex, elas serão auto-suficientes e só terão razão de existir se forem prestando os serviços para que foram criadas.
Em terceiro lugar, o Estado criará as infra-estruturas técnicas e tecnológicas que apoiarão a indústria que se pretende incentivar ajudando-a a consolidar-se e a desenvolver-se. Finalmente, como se conseguirá o êxito, isto é, como se conseguirá fomentar o investimento privado com menos Estado, com menos interferências, com menos tramitação e com garantia de rigor na aplicação dos recursos postos à disposição? Em minha opinião com o estabelecimento de contratos - programa entre o Estado e uma empresa ou um grupo de empresas a incentivar em que fiquem perfeitamente definidas no tempo do curto e do médio prazo, as metas a atingir, facturação, exportação, número de trabalhadores, investimento, etc., bem como as contrapartidas concretas a atribuir em incentivos. E, um contrato obriga ambas as partes: assim como o Estado concede os incentivos para em termos do interesse nacional as empresas atingirem determinadas metas, assim o Estado cobrará penalizações reais, concretas, se essas metas não forem atingidas.
Em quarto lugar, o Estado actuará directamente com o mínimo de burocracia estabelecendo contratos-programa bem definidos com empresas ou grupos de empresas, contratos esses que responsabilizam ambas as partes com vista a serem atingidos determinados objectivos concretos, reais, definidos no tempo. Ambas as partes assumirão as suas responsabilidades efectivas, não platónicas. Esta responsabilização significará me-
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nos Estado, menos intervenção do Estado e mais rigor na aplicação dos dinheiros de todos nós.
Como envolvente de tudo isto o Estado terá de criar a confiança necessária ao investimento. Ninguém se abalançará ao investimento industrial, quando dispõe de mais ou menos áreas reais alternativas de investimento, se não confiar no futuro, na melhoria do estado de saúde da economia, na expectativa da redução da inflação, na expectativa do estabelecimento de sãs relações sociais, se não vir à sua volta clima generalizado de confiança. Basta atentar no clima psicológico que foi decisivo largamente para o relançamento económico dos Estados-Unidos, mesmo com a manutenção de elevados défices orçamentais e com dificuldades acrescidas de exportação.
Em quinto lugar, mas condição primeira e constante de toda uma actuação coerente, o Estado terá de criar no País e nomeadamente nos operadores económicos o clima de confiança no futuro indispensável a qualquer relançamento do investimento que o mesmo é dizer ao relançamento da economia portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao estudar as Grandes Opções do Plano para 1985 apresentadas pelo Governo e a sua tradução financeira, o Orçamento do Estado para 1985, ressaltando nomeadamente os projectos do PIDDAC com as suas transferências para o sector privado, verifiquei que algumas das ideias que aqui explanei estão aí contidas, umas mais ou menos explicitamente, outras apenas implicitamente, não sendo perfeitamente claro o seu peso na política económica e duvidosa a prioridade que lhe é concedida. Pela intima ligação que tenho ao sector, estabelecendo ponte entre os operadores privados e os organismos da tutela, conheço algumas medidas cuja concretização se iniciou ou se pretende implementar a curto prazo. No entanto, para o observador médio, atento e interessado mas menos familiarizado com a terminologia técnica, para o potencial investidor, em suma, não ressaltam claramente as linhas concretas da política industrial, a estratégia de actuação escolhida pelo Governo nesta importante área, bem como o esqueleto das ferramentas a utilizar para a sua concretização.
É esta informação difusa ou expressa em termos cabalísticos que a minha bancada desejaria ver explicitada e clarificada na discussão na generalidade a que estamos a proceder e na discussão na especialidade a realizar posteriormente.
Nomeadamente quereríamos obter resposta às seguintes questões: quais os novos produtos ou subsectores a criar no País tendo em conta todas as condicionantes afloradas nas Grandes Opções do Plano? Quais as tecnologias de ponta em que vamos apostar e quando? Quais são as apostas do Governo nesta área? quais os produtos ou subsectores a reestruturar, modernizar e ou reconverter? Em quais decide o Governo utilizar as suas ferramentas de apoio e incentivo? Qual é o sistema de incentivos que vai ser utilizado? Quais são as principais linhas de força do mesmo? Quando estará operacional? Estão corrigidos os erros nomeadamente a burocracia e a actuação difusa do anterior? Quais as infra-estruturas de apoio técnico e tecnológico que vão ser criadas? Parques Industriais? Centros Tecnológicos? Quando? Que serviços prestarão? O que poderá o sector privado esperar concretamente delas? Como prevê o Governo promover uma efectiva desburocratização das actuações nesta área, assegurando-se
da correcta utilização dos meios outorgados, financeiros e outros, em última análise pertença dos contribuintes? Como conseguirá o Estado desburocratizar-se a si próprio, contrariando os seus efectivos e aumentando a sua eficiência e o seu rigor? Como prevê o Governo recriar a confiança dos operadores económicos especialmente na área sensível do investimento? Só o conseguirá se apresentar casos concretos exemplares que possam servir de paradigmas aos indecisivos e, mais, a todos nós nesta Assembleia e àqueles que têm responsabilidades nos organismos de apoio e promoção da indústria.
Eu e a minha bancada, que temos estado atentos a toda a problemática do investimento no sector privado, o qual consideramos o grande motor da economia, não deixaremos de apoiar inequivocamente o Governo na concretização das medidas de fundo, das medidas estruturais que, aliás, ao longo do tempo temos vindo a reclamar.
A reflexão sobre estes comentários, a introdução de beneficiações, bem como a explicitação e a clarificação dos pontos que atrás referi, de nível qualitativo mas com a correspondente imputação das verbas, só beneficiarão as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1985 tornando estes documentos verdadeiros programas de acção de política industrial.
Porque apoiamos o Governo e queremos o seu êxito, desejamos que nestes documentos fundamentais seja concedida uma maior relevância e prioridade a uma política industrial.
Srs. Membros do Governo, se o Governo a que VV. Ex.ªs pertencem, que eu e a minha bancada apoiamos, tiver êxito como desejo e conseguir conduzir a economia do País, em 1985, num cenário de crescimento moderado de 3 pontos percentuais, tenho a certeza absoluta que o investimento do sector privado, motor da economia, terá crescido bastante mais que os 2,5 pontos percentuais que VV. Ex.ªs prevêem. Outras componentes da despesa final serão certamente muito diferentes.
A minha bancada tudo fará no sentido de ajudar o Governo na concretização de um cenário de relançamento económico, que o mesmo é dizer de criação acrescida de riqueza com distribuição justa, com diminuição do desemprego e com a instalação no País de um são clima de confiança.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Zita Seabra pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Desejo fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu grupo parlamentar está a receber, certamente à semelhança do que deve estar a acontecer com os restantes grupos parlamentares, uma série de telefonemas de pessoas indignadas perante uma nova morte que se verificou na Escola de Telheiras.
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Hoje mesmo foi atropelada uma outra professora, que veio a falecer. É, na realidade, o segundo professor que morre nessa situação desde o início deste ano lectivo. Há dias, foi atropelado um aluno que está ainda hospitalizado. É uma verdade que estamos a discutir o Orçamento do Estado, pelo que a questão não se insere propriamente neste debate. Mas creio que, perante a indignação que há no País a Assembleia da República - e uma vez que está também presente o próprio ministro da Educação - deve, naturalmente, tomar medidas e dar uma satisfação às pessoas. Com efeito, não se pode conceber que, em menos de dois meses, morram, por esta situação, duas pessoas. Uma outra, um aluno, faleceu também no ano passado.
Assim sendo, apelamos ao Governo, à Câmara Municipal de Lisboa e também à Assembleia da República, de onde talvez se possam fazer, igualmente, alguns esforços para que se responda às pessoas, sossegando-as, e se diligencie no sentido de impedir que esta situação se agrave. É pelo facto de os pais dos alunos da escola em questão estarem verdadeiramente alarmados que temos recebido múltiplos telefonemas.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, certo é que também nos confrange a situação que descreve e certamente o Governo irá tomar posição conveniente, bem como o fará a Câmara Municipal a que V. Ex.ª apelou. No entanto, entendo que não devíamos incrustar o problema no desenvolvimento deste debate porque vai certamente distorcer a preocupação que temos em ganhar tempo num problema que também é fundamental.
O Sr. Ministro da Educação pretende, porventura, tomar alguma posição em relação a este problema?
O Sr. Ministro da Educação Augusto Seabra): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas possa dar a informação, que é útil para a Câmara, de que acabei de tomar a decisão de suspender o funcionamento da escola em questão, por uns dias, pois a sua situação preocupa imenso o Ministério da Educação, embora ela não seja da nossa responsabilidade. No entanto, para mim o problema não é de responsabilidade, mas sim o de evitarmos situações como esta. A Câmara Municipal de Lisboa é que tem competência nessa área. Fizemos-lhe sucessivos ofícios. O último que recebemos dizia-nos que no dia 21 do corrente iriam começar as obras de construção de uma passagem aérea. Fizemos um novo ofício à Câmara Municipal de Lisboa no sentido de que ela a providencie o mais rapidamente possível porque, como Ministro da Educação, não permitirei que se continue a verificar situações como esta, embora o facto não seja da responsabilidade do meu ministério e tenhamos tomado as medidas convenientes. Agradeço, mesmo, esta oportunidade de informar que determinei a suspensão das aulas nessa escola e de que oficiei ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa para que, como há longos meses temos vindo a pedir, sejam tomadas as providências necessárias.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Hasse Ferreira ainda pretende usar da palavra?
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Não vamos, porventura, generalizar a situação. O Sr. Deputado desculpar-me-á, mas o problema foi aqui avançado; o Governo, entidade que de algum modo foi aqui interpelada juntamente com a Câmara Municipal, respondeu. Se vamos fazer declarações, distorceremos, certamente, o natural desenvolvimento do debate em questão.
No entanto, se insiste, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Penso que sou o único vereador da Câmara Municipal de Lisboa presente na Sala, neste momento.
Recebi, na própria segunda-feira, a comissão de pais e uma comissão de alunos da Escola Secundária de Telheiras.
Foi aqui levantado pela Sr.ª Deputada Zita Seabra um problema, foram dadas explicações pelo Sr. Ministro da Educação. Penso que será curial trazer também aqui uma informação, sem a qual o assunto ficará distorcido. Foi nesse sentido, ou seja, para dar explicações à Câmara, que pedi a palavra.
Vou tentar ocupar o menos tempo possível, mas penso que não ficaria bem com a minha consciência se, nestas circunstâncias, não usasse da palavra; se eu não estivesse presente no hemiciclo a situação seria outra, mas estou no hemiciclo e, por isso, penso que devo usar da palavra.
O Sr. António Capucho (PSD): - Não sei se está aqui alguém da junta de freguesia!
O Orador: - Para que isto fique bem claro, queria dizer o seguinte: embora sendo, aparentemente, um assunto da competência do trânsito, lamento ter que dizer que - em meu entender - as informações prestadas em reunião da Câmara Municipal pelo Sr. Presidente da Câmara relativas às reuniões realizadas com o Ministério da Educação não são coincidentes com as informações que o Sr. Ministro da Educação aqui prestou neste momento.
O Sr. António Capucho (PSD): - 15to realmente é caricato!
O Orador: - Mas queria dizer que este problema do atravessamento das ruas junto às escolas coloca-se já há muito tempo e que, ainda em 1983, a Câmara Municipal de Lisboa tomou a decisão de mandar construir 6 viadutos, em vários pontos da cidade, e de encarregar o presidente da Câmara de controlar directamente essa execução.
O presidente alterou a ordem de construção dos viadutos, pelo que, já em Novembro do ano transacto, o grupo de vereadores socialistas, no qual me integro, exigiu que o viaduto relativo à Escola Secundária de Telheiras fosse, efectivamente, passado para prioritário e propôs que o mesmo fosse instalado até ao fim das férias do Natal.
O problema foi novamente levantado na passada segunda-feira porque recebemos essa série de reclamações de pais e de professores. A informação do Sr. Presidente da Câmara - que não está aqui presente, apesar de ser deputado mas com o mandato suspenso foi a de que surgiram dificuldades construtivas.
Em reunião com os pais dos alunos, a Câmara chegou à conclusão de que devia haver uma protecção especial da polícia; a comissão de pais queixava-se que a polícia era extremamente ineficaz na zona e, portanto, o vereador da segurança - que é do PSD -
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prestou-se a desencadear, imediatamente, as diligências necessárias a uma protecção especial por parte da polícia.
Nestas condições, não penso que deva fazer juízos de valor, pois já fiz na Câmara os juízos sobre a quem competem as responsabilidades. Penso que isso seria inadequado, mas é adequado dar aqui este tipo de explicações sobre a situação actual.
Não quero ir mais longe e identificar responsabilidades neste domínio. Penso que essas responsabilidades existem mas, acumulando eu as funções de vereador da Câmara Municipal de Lisboa e de deputado, devia a esta Câmara e - se o problema é nacional, como disse a Sr.ª Deputada Zita - ao País esta explicação mínima.
Eu próprio tenho uma familiar muito próxima, aluna da Escola Secundária de Telheiras. Foi até esta uma das razões que me levou a não ter querido meter-me mais cedo no assunto. Mas, a partir do momento em que o assunto assumiu esta gravidade, tenho exigido, em várias reuniões da Câmara, a resolução rápida deste assunto. Infelizmente, até agora sem êxito. Espero que este seja mais um factor para acelerar a montagem do viaduto, cuja estrutura metálica até já está construída, tratando-se apenas de um problema de colocação.
O Sr. Presidente: - Para um interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, voltando ao Orçamento, queria interpelar a Mesa para colocar uma questão, que é a de saber se a Mesa não diligenciará com vista a que o Governo esteja aqui representado, no debate do Orçamento, pelo Sr. Primeiro-Ministro ou pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro e a equipa do Ministério das Finanças esteja presente para ouvir este debate.
Pergunto-me que sentido terá o debate, nesta Câmara, da proposta do Orçamento, sem a presença dessa equipa. É que estão aqui dois Srs. Secretários de Estado, mas nem o Sr. Ministro das Finanças nem o Sr. Secretário de Estado do Orçamento estão presentes.
Sr. Presidente, é esta questão que deixo à Mesa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª deixou a questão à Mesa, mas não é da competência da Mesa providenciar, porventura, sobre a questão que colocou.
Entretanto, a sua afirmação ficou registada.
O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, pedi a palavra porque, se V. Ex.ª mo permitisse, gostaria de dar uma explicação ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, o Governo está representado, nomeadamente, pelo Ministro dos Assuntos Parlamentares que só se deslocou lá dentro por uma obrigação inadiável.
O Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Vice-Primeiro-Ministro têm passado por aqui na medida compatível com obrigações que têm: o Governo não pode parar só porque se está a discutir o Orçamento, sob pena de o Orçamento ser inútil.
Penso que o Governo tem estado presente em medida suficientemente significativa para se não pôr em causa uma atitude menos respeitosa para com este Parlamento.
Era só isto que eu queria significar.
Para além disso, estão presentes, neste momento, dois elementos da equipa das Finanças, além de outros ministros, secretários de Estado e, sobretudo, o Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares, que faz a ligação normal entre o Parlamento e o Governo.
Penso que não está em causa nenhuma atitude de menos respeito. As palavras que forem proferidas não cairão, com certeza, em saco roto e o Governo estará atento, com certeza, a todas as críticas que aqui forem feitas ao Orçamento.
De qualquer modo, lembro ao Sr. Deputado Nogueira de Brito que escolheu mal o momento para fazer esta crítica ao Governo, pois não sei bem se não estaremos presentes em maior número do que o Grupo Parlamentar do CDS.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Mas peço-lhe que seja breve na resposta, independentemente da figura regimental que, neste caso, não tem importância.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, não sei bem que figura hei-de usar para responder ao Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, mas suponho que o Sr. Ministro fez confusões - que são lamentáveis - comparando os números de presenças do Governo e do meu grupo parlamentar.
Na realidade, a minha pergunta destinava-se a pôr em destaque um aspecto focado pelo Sr. Ministro de Estado: é o desrespeito do Governo perante a Câmara, na forma como tem estado presente no debate do Orçamento.
A maior parte dos discursos feitos neste debate na generalidade dirigem-se à equipa do Ministério das Finanças, dirigem-se à orientação superior do Governo e dirigem-se, na equipa do Ministério das Finanças, a quem teve a responsabilidade da elaboração do Orçamento.
Sr. Ministro, pergunto-lhe se, nessa perspectiva, haverá substituições possíveis e se bastará que haja alguém para levar o recado para que, na realidade, as palavras não caiam em orelhas moucas.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares, se desejar responder ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, tem a palavra.
O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares - Sr. Presidente, só mais uma palavra, para dizer o seguinte ao Sr. Deputado Nogueira de Brito: espero que não tenha reagido mal - não costuma fazê-lo - à graça final.
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Mas não coloque, Sr. Deputado, o seu reparo no plano moral. Às vezes abusa-se do discurso moral e peço-lhe que não cometa esse abuso.
De qualquer modo, queria dizer-lhe que não está em causa qualquer atitude de menos respeito e o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tiveram razões justificativas para não poderem estar aqui, neste momento.
É óbvio que há razões inelutáveis, tais como, uma pessoa ter de se deslocar; foi esse o caso e, amanhã de manhã, um deles ou os dois estarão aqui. Esteja tranquilo, Sr. Deputado, mas, por amor de Deus, não nos pregue lições de moral porque isso não lhe fica bem.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.
O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No final da última sessão legislativa apressaram-se o PCP e, com menos pressa, o CDS no pedido de ratificação do pacote autárquico, isto porque a legislação sobre matéria autárquica era, diziam o PCP e as forças suas apoiantes, "o fardo autárquico", "o pacote antiautárquico", "a antiautonomia do poder local" e outras expressões de oposição cega e costumada a qualquer acto do Governo.
Da nossa parte e desde o pedido de autorização legislativa pelo Governo a esta Assembleia, sempre defendemos a sua causa, no pressuposto democrático de que qualquer lei não é eterna e muito menos, aqueles princípios legais de exiquibilidade duvidosa, por vezes mesmo difícil.
Ao ratificar o pacote autárquico, reconheceu a grande maioria dos deputados a justeza do articulado, a clareza dos seus princípios e o reforço do poder local, reforço esse na maior soltura de actuação, na descentralização de poderes do Terreiro do Paço, no reconhecimento das autarquias locais como pessoas adultas, capazes de se gerirem sem a tutela constante do Governo Central para qualquer acto da sua administração.
Como em tudo, os frutos de imediato foram parcos, mas de substância - o Decreto-Lei n.º 116/84 fornece, pela primeira vez, a capacidade às autarquias de aprovarem os seus quadros de pessoal próprios. Os transportes escolares, agora a cargo das câmaras municipais, funcionam melhor que anteriormente e com um cunho acentuadamente social não atingido até então, embora lhe reconheçamos algumas falhas; a actuação das autarquias na Acção Social Escolar, agora alargada com novas competências em matéria de refeitórios, alojamento em agregado familiar e de auxílios económicos destinados aos estudantes. Porém, o fruto mais importante é, sem dúvida, o montante proposto a atribuir pelo Fundo de Equilíbrio Financeiro no Orçamento do Estado para 1985.
É o reconhecimento, sem dúvida, pelo Governo do poder local como o grande suporte da democracia; é o reconhecimento pelo Governo do trabalho desenvolvido pelos municípios perante as populações que servem; é o reconhecimento pelo Governo do poder local como comparticipante na melhoria, em todas as circunstâncias do povo português.
Por outro lado, as autarquias locais reconhecem que trabalhando isoladamente e reivindicando na mesma circunstância não tinham a força devida para negociar ou pelo menos para tornar razoáveis as suas reivindicações. Assim, dentro deste espírito de união, tiveram o seu congresso e formaram a Associação Nacional dos Municípios Portugueses e elegeram os corpos directivos que têm sido o verdadeiro interlocutor junto do poder central em tudo o que se relaciona com matéria autárquica e regional. E foi, certamente, na existência de nova legislação autárquica, em simultâneo com a criação da ANMP que se deu novo impulso, sendo-nos permitido realçar a boa capacidade de diálogo e entendimento entre este parceiro social e o Governo, de que resultou o montante agora proposto no Orçamento do Estado.
O montante global proposto este ano atinge 66 100 000 contos que, comparados com o valor proposto no Orçamento do Estado do ano anterior, nos dá a diferença para mais de 14 053 000 contos, valor e percentagem jamais atingidos.
Realce-se também o montante proposto de 500 000 contos para subsidiar a construção de juntas de freguesia que, diga-se, são os verdadeiros motores e dinamizadores de acção local, nomeadamente no mundo rural.
Discutível um ou outro critério e algum desequilíbrio na distribuição município a município, a que esta Assembleia não será certamente insensível na apresentação de propostas de correcção que, eventualmente, possam surgir.
Quanto à política regional, não podemos em consciência ter a mesma posição apologética que tivemos para a política autárquica. Gostaríamos bem de frisar que nada nos move contra a equipa do MAI ligada a este sector, que, diga-se, tem criado material legal para o desenvolvimento e dinamização da política regional.
A questão que se põe não é de execução material mas da filosofia política existente nas Grandes Opções do Plano.
Toda ela está eivada de falta de ousadia, sem perspectiva para a entrada de Portugal na CEE. São curtas as medidas para implementação da política de desenvolvimento regional aprovado pelo Governo há cerca de um ano.
Como é possível ter-se em carteira projectos para cobrir os fundos comunitários que nos caberão após a adesão ao Mercado Comum?
Que medidas estão aprontadas para preparar a máquina técnico-administrativa para a maximização deste benefício?
Para quando a definição do ministério ou ministérios coordenadores das verbas do FEDER?
Porque não se acentua a ideia já proposta de considerar Portugal como uma região única no âmbito da CEE para efeitos de acesso aos fundos comunitários? Ou desconhece-se como actuou a Grécia neste campo e que tão bem foi sucedida?
Quanto às acções de investimento pouco ou nada se apresenta de novo, limitando-se as Grandes Opções do Plano a apresentar os planos integrados de desenvolvimento regional que já vêm de alguns anos, cabendo a parte leonina apenas aos Planos de Integração de Desenvolvimento Regional do Baixo Mondego e da Cova da Beira e, com menos evidência, ao Plano de Desenvolvimento Rural de Trás-os-Montes.
Então que resposta há para os PIDRs do Oeste estremenho e do triângulo Torres Novas-Tomar-Abrantes?
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São respostas que gostaríamos de encontrar para satisfação mínima às nossas pretensões neste sector para a entrada na CEE.
Referiremos, por último, a verba disponível para as intermunicipais que, quanto a nós, peca por ser parca e estaremos receptivos a eventual proposta de alteração. Caso contrário, não poderão as autarquias fazer face a obras que, embora do seu âmbito, são impotentes, em termos financeiros e técnicos, para enfrentar.
Cito apenas dois exemplos: esgotos e estações depuradoras e captação e distribuição de água à região do Porto, afectada que está com as captações actuais.
Embora interrogativos nesta parte final, sempre adiantaremos que, quanto a nós, e no respeitante à política local e regional, é o orçamento melhor apresentado nos últimos 5 anos.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.
Sr. Presidente Srs. Deputados Srs. Membros do Governo: Em 20 de Junho de 1983, o Sr. Primeiro-Ministro ao apresentar nesta Câmara o Programa do Governo afirmou, e com total cabimento, que "é preciso agir com coragem e resolução sobre a conjuntura, travando a corrida para o abismo em que o País se encontra, e inflectir decisivamente o sentido de marcha, de modo a reconstruir, em bases sólidas, e a prazo razoável, a economia nacional".
Efectivamente tanto os problemas conjunturais como os estruturais carecem de ser encarados e atacados com coragem e determinação, com uma inquebrantável vontade política, superando e sobretudo evitando bloqueamentos, e, com um redobrado apelo à inesgotável criatividade do povo Português, de modo a encontrar-se novas formas de transformar a sociedade nacional e criar condições económicas e sociais que traduzam um maior bem estar e justiça para os Portugueses.
Sobre todos nós, sobre a nossa geração, pesa a tremenda responsabilidade de assegurar o futuro que tão justificadamente se anseia, respondendo à confiança depositada no regime democrático e na correspondente capacidade decisória e participativa de governantes e governados.
Não ousamos dizer que a situação que vimos atravessando nestes últimos anos tem melhorado o quotidiano de cada cidadão, nem nos atreveremos a esconder que os Portugueses, por este nosso país fora, começam a sentir na carne grandes dificuldades e que, em alguns casos, se inicia um perigoso processo de descrença, processo esse alimentado por quem nele busca uma forma hábil, mas tremendamente insidiosa, de combater o regime.
Por isso, quando os representantes livremente eleitos pelo povo português - a quem cabe a obrigação de saber dar tradução às suas legítimas esperanças e aos seus justos anseios - são chamados nesta hora a debater as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1985, têm o indeclinável dever de travar esse debate plenamente conscientes da situação real do País.
Mas têm também de ter a consciência de que em momentos difíceis, como o actual, nem sempre é possível obter todas as soluções desejadas, pois a mudança que todos desejamos tem de ser operada com corajoso e simultâneo ataque às deficiências conjunturais e estruturais da sociedade; quedarmo-nos por aquelas é insuficiente, mas é difícil avançar nestas sem se enfrentarem aquelas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquela "coragem" a que aludiu o Sr. Primeiro-Ministro tem de ser criadora e inovadora, mas tem, apesar da real crise económica e social, de ser revelada em comportamentos que sejam capazes de a prazo, tão curto quanto possível, darem provas inequívocas de que se está a travar uma luta que vale a pena travar, fazendo com que os seus frutos se comecem a repercutir na vida económica, financeira e social dos cidadãos, abrindo-lhes perspectivas de um novo e mais justo futuro.
Embora há muito se não ouça praticamente falar em regionalização, como grande motora do progresso das populações e de uma correcção de reais assimetrias e injustiças que reinam no País, apesar disso muito se tem falado de política de desenvolvimento regional; entendo eu que esta está muito intimamente ligada àquela, mas considero também que uma verdadeira e séria política de desenvolvimento regional, a implementar pelo poder central, com a necessária e indispensável colaboração activa e interessada do poder local, tem de ser na verdade um importantíssimo factor de desenvolvimento, de progresso, de justiça social e da resolução dos graves problemas que afectam importantes sectores da nossa população.
Na verdade, como se afirmou em 1981 no Livro Branco sobre a Regionalização, "o problema da regionalização e do desenvolvimento regional constitui, hoje, um dos principais desafios políticos que se deparam à democracia portuguesa".
A este desafio tem de ser dado o tratamento que as assimetrias regionais impõem e os interesses dos Portugueses exigem, e daí que, esse problema deva ser encarado resoluta e corajosamente, nele se empenhando o poder central com esse grande motor de progresso que é o poder local, aproveitando as capacidades e a arreigada e antiquíssima tradição municipalista, eivada de profundo espírito de liberdade e democracia.
Quando vimos ser criada uma Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, nomeadamente no âmbito do Ministério da Administração Interna e a par com a administração autárquica, quisemos acreditar que na verdade a política de desenvolvimento regional iria ter efectivamente muito a ver não só com a regionalização, como também com esse pilar fundamental do regime democrático e de uma resolução correcta dos legítimos interesses das populações, já que as autarquias e o desenvolvimento regional mantêm um forte e iniludível traço comum.
Porém, ao lermos o que consta da proposta de lei n.º 94/III, sobre as Grandes Opções do Plano, no tocante à "Política de Desenvolvimento Regional", ficamos preocupados.
Uma correcta e corajosa política de desenvolvimento regional é um processo extremamente importante - quando implementada na dimensão que esse próprio conceito comporta - para atacar, não só os problemas conjunturais em que vivemos, mas também para simultaneamente construir e de forma sólida e irreversível os alicerces da resolução de problemas estruturais conducentes à efectiva e desejada mudança da sociedade portuguesa, sobretudo quando caminhamos para a Europa da CEE.
Ao iniciar a leitura desse capítulo logo deparamos com a afirmação de que "prosseguirá, em 1985, a intenção de desenvolvimento regional" - e a menos que
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se trate de deficiência de redacção - não podemos deixar de manifestar a nossa perplexidade.
Estamos de acordo que o desenvolvimento regional é prima facie uma importante via de promoção de desenvolvimento económico pela maximização do aproveitamento dos recursos endógenos das diferentes zonas do País e que através dele se corrigem "disparidades na fruição de bens e serviços essenciais", e se vai "fomentando as acessibilidades em diferentes parcelas do território".
Só que isto tem de ter uma rápida e corajosa concretização prática, não sendo aceitável que limitemos em 1985 uma tal política a uma mera intenção!
Queremos crer, porém, que, quando aí se alude às linhas mestras aprovadas nos primeiros meses de 1984, o Governo não pretende quedar-se apenas por uma intenção, mas quer ir mais longe.
Apesar disso, ao determo-nos no mais que aí se diz, ficamos convictos que, ao fim e ao cabo, em 1985 mais não se fará que dar continuidade à execução dos denominados programas integrados em curso desde 1983; é certo que aí se fala na "intenção" de lançar novos programas, mas a verdade é que nada nos é revelado quais eles sejam e seus objectivos, sem embargo de apenas vaga, e hipoteticamente, se aludir ao vale do Lima, ao Norte alentejano e à ria Formosa.
O efectivo aproveitamento dos recursos endógenos das várias zonas do País, e tantos existem, e da mais variada ordem, impõe nesta fase crucial da vida portuguesa uma grande coragem e determinação na elaboração e lançamento de novos e rentáveis planos de efectivo desenvolvimento regional, não tanto, por vezes, pela sua grandeza quantitativa, mas pela sua real importância qualitativa.
Sendo, em nosso entender, a política de desenvolvimento regional - que justificou inclusivamente a criação no âmbito do Governo de uma Secretaria de Estado - um relevante factor de combate às carências regionais, e consequentemente, um importante meio de combate à crise nacional, não podemos deixar de dizer que era imperioso encontrar, neste capítulo, algo de mais arrojado e avançado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aí se refere que no âmbito dos Planos Integrados de Desenvolvimento Regional (PIDR), quer em curso quer hipoteticamente a lançar, se despenderá uma verba da ordem dos 5,8 milhões de contos; porém, nem toda essa verba é financiada pelo Orçamento do Estado, já que outras fontes de financiamento, ainda que menores, são mencionadas no PIDDAC.
Porém, não podemos deixar de referir que no nosso ponto de vista o modo como se concretiza uma tal política de desenvolvimento regional não se mostra como a mais adequada, podendo antes traduzir-se em potencial gerador de bloqueamentos, com graves repercussões nos objectivos dos planos em causa.
As verbas destinadas aos PIDRs são atribuídas a vários ministérios, sendo precisamente o Ministério da Administração Interna, onde se integra a já referida Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, o que de menos verbas dispõe.
Ora, ou há efectiva e real coordenação na realização atempada das acções que fazem parte dos planos integrados, ou então, se cada responsável as realiza apenas quando entende o desfasamento daí resultante terá perniciosas repercussões nos objectivos almejados.
Daí que consideremos que as verbas de cada PIDR deveriam, e deverão, ser englobadas pelo seu total numa só rubrica, cabendo ao respectivo departamento governamental a sua gestão e uma eficaz execução do respectivo plano.
É que, em nosso entender, a coordenação e responsabilização pela realização atempada das respectivas acções, tendo em conta inclusivamente a intervenção que obviamente nesses planos têm as respectivas comissões de coordenação regional, dependentes juridicamente do Ministério da Administração Interna, deverá caber exactamente a este ministério, através do respectivo responsável por uma tal política, tanto mais que às autarquias locais cabe uma valiosa participação e colaboração na realização desses planos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Previamente definidas e projectadas todas as várias acções a empreender, a existência de um único coordenador responsável pela correcta e tempestiva execução dos projectos em causa impõe-se, até por uma razão lógica.
Os vários departamentos governamentais têm necessariamente de intervir, e de intervir activamente, no estudo e elaboração dos projectos integradores dos planos de desenvolvimento regional, quer sob o ponto de vista técnico quer sob o ponto de vista financeiro, mas a concretização das acções não pode ficar depois ao sabor de cada departamento.
A questão que aqui suscitamos não se mostra resolvida nas duas propostas de lei em debate, e por isso a suscitamos, esperando que ao fazê-lo seja ainda possível resolvê-la de forma eficaz e de modo a evitar hipotéticos futuros bloqueamentos.
Além disso, uma eficiente e desejada política de desenvolvimento regional, a levar a cabo pela respectiva secretaria de Estado em estreita colaboração com as autarquias locais, elemento precioso que é imprescindível a uma tal política, não se esgota na elaboração e execução de tais planos integrados. Na realidade, inúmeras outras acções de aproveitamento das potencialidades endógenas das várias regiões do País teriam de ser tidas em conta, das quais se colheriam benefícios e se resolveriam problemas regionais, com importante repercussão positiva na economia nacional.
Não se aflora na proposta de lei n.º 94/III esse aspecto da política de desenvolvimento regional, omissão que consideramos grave, já que dela extraímos a ilação de que o Governo não só o não encarou como não o coloca nos seus objectivos para 1985.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de finalizar estas observações, diremos que os denominados investimentos intermunicipais poderão, em grande medida, traduzir um outro relevante aspecto dessa política de desenvolvimento regional, e daí o nosso acordo ao implemento de apoio a esses investimentos, quando, devidamente analisados, eles se enquadram efectivamente num tal desenvolvimento.
Mas surpreende-nos, e gostaríamos de sobre isso ser esclarecidos, que nas propostas de lei em debate se atribua a esses investimentos o montante de 2,5 milhões de contos, quando é certo que ainda em 3 deste mês aqui aprovámos a proposta de lei n.º 91/III, e em cujo debate foi afirmado, pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro, que do montante do empréstimo a obter em 1985 junto do Fonds de Réétablissement uma verba
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muito superior à referida se destinaria à "comparticipação da administração central em investimentos intermunicipais", verba essa a rondar os 4 milhões de contos.
Como uma tal comparticipação para esse efeito tem necessariamente de constar do respectivo Orçamento, poder-se-á concluir que se não vai contrair tal empréstimo, ou então que o seu destino, pelo menos quanto aos montantes aí indicados, não terá as aplicações então discriminadas.
Porque acreditamos nas reais virtualidades de um poder local democraticamente forte, e porque pensamos que o desafio do desenvolvimento regional, numa política nacional intimamente colaborante e participada com aquele, é um processo extremamente importante para atacar a conjuntura e mudar as estruturas actuais da sociedade portuguesa, temos de convir que a proposta de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1985, neste domínio, se situam aquém do necessário.
Esperamos, contudo, que muito se possa ainda melhorar, aliás na sequência do esforço bem patenteado nas verbas incluídas no Orçamento do Estado para as autarquias locais, esforço que demonstra o testemunho e o apreço pela obra por elas desenvolvida e a esperança no respectivo prosseguimento. Esse esforço louvável do Governo dá-nos a convicção que também no domínio específico do desenvolvimento regional a levar a cabo pelo Governo se encontrará no lugar próprio a abertura indispensável a uma considerável melhoria dos textos, neste capítulo.
Uma vez que um representante do Ministério da Administração Interna aqui usou já da palavra, mas sem aflorar algumas das dúvidas que aqui suscito, ficaria extremamente grato que elas ainda pudessem ser esclarecidas para proveito desta Câmara e para podermos melhor alcançar muito do que foi afirmado e que consta do documento das Grandes Opções do Plano.
Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, registámos o tom vincadamente crítico da sua intervenção em relação às propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado, designadamente em matéria de desenvolvimento regional.
Registámos também que o entendimento do Sr. Deputado, em matéria de estrutura organizacional e decisória de suporte em relação ao desenvolvimento regional, devia ser sediada na Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, que está aliás entregue a um militante do seu partido.
Mas, para além destes 2 registos, gostaríamos de suscitar, dando continuidade e sequência ao seu tom vincadamente crítico, 3 questões.
Quanto à primeira questão, o Sr. Deputado sabe que estamos numa área de arbítrio no que concerne à possibilidade das divisões das verbas, tanto das que estão consignadas no Orçamento do Estado, como daquelas que provêm de financiamentos de outras fontes, designadamente do FEDER. Perspectivada desta forma a possibilidade de arbítrio, o Sr. Deputado Marques Mendes analisou aquilo que foi o detalhe e a discriminação dos 5,3 milhões de contos em relação aos programas integrados de desenvolvimento regional. Assim, pretendíamos perguntar-lhe, em primeiro lugar, se considera que é correcta a distribuição, em termos da realidade consignada na proposta de lei?
Em segundo lugar, perguntávamos se, em valores para aquilo que se chamam as acções preparatórias, considera minimamente ajustado, dando como certa a inexistência de projectos em carteira já assinalados pelo Sr. Deputado Alberto Avelino, que ao Ministério da Administração Interna esteja entregue uma verba de apenas 8000 contos para acções preparatórias no domínio dos programas integrados de desenvolvimento regional?
Por último, Sr. Deputado Marques Mendes, os investimentos intermunicipais foram daqueles que nós criticámos mais vivamente, designadamente pela possibilidade do arbítrio e da discriminação positiva, para uns, e negativa, para outros, em relação ao conjunto dos municípios portugueses e em relação ao conjunto de áreas do nosso país.
Tem presente, naturalmente, a distribuição dos 2 milhões de contos dos investimentos intermunicipais de 1984. Daí que lhe pergunte, Sr. Deputado Marques Mendes, se sabe alguma coisa da distribuição previsível dos 2,5 milhões de contos consignados em 1985 para a distribuição dos investimentos intermunicipais. Se o Sr. Deputado sabe alguma coisa, o que nos diz, qual o seu parecer e qual é a sua afirmação sobre a razoabilidade ou irrazoabilidade dessas discriminações positivas e negativas, que são feitas a municípios portugueses?
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional (Joaquim Nogueira): - Sr. Deputado Marques Mendes, a sua intervenção, bem como outras intervenções anteriores, nomeadamente a do Sr. Deputado Alberto Avelino, suscitam-me algumas dúvidas. Daí a necessidade do pedido de esclarecimento.
Os Srs. Deputados não ignoram certamente que a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional é um departamento novo na Administração Pública portuguesa, mas dentro da orgânica do Governo. Além disso, não ignoram VV. Ex.ªs que a política de desenvolvimento regional não é propriamente uma política sectorial, mas horizontal, com as dificuldades inerentes a qualquer política deste tipo, ou seja, a necessidade de um esforço de coordenação, compatibilização de acções e de convergência de vários sectores e de vários ministérios, o que dificulta naturalmente a acção neste domínio.
Por outro lado, certamente que os Srs. Deputados não ignoram que neste momento - e há que reconhecê-lo com toda a frontalidade - no Governo ainda há dúvidas sobre o arranjo institucional da entidade directamente responsável pela política de desenvolvimento regional. O Governo tem ponderado seriamente esta questão, que é difícil, extremamente complexa, mas também bastante importante, o que justificará porventura o facto de não haver ainda uma decisão final sobre esta matéria.
Quanto à referência que foi feita às Grandes Opções do Plano, devo dizer com toda a honestidade e frontalidade, que me julgo portador, que a mim próprio
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me chocou a expressão de que "o Governo prosseguirá a intenção do desenvolvimento regional". Devo dizer que se fosse eu a redigir esse capítulo das Grandes Opções do Plano jamais teria utilizado uma expressão dessa natureza, porque ela é inexacta, para não dizer infeliz. Todavia, a política de desenvolvimento regional está já consubstanciada numa resolução do Conselho de Ministros - n.º 21/84, de Março - e no programa de recuperação financeira e económica, o qual contém um capítulo de política de desenvolvimento regional, onde o Ministério da Administração Interna participa de forma activa e onde tem realmente propostas muito concretas, as quais negarão a expressão de que o desenvolvimento regional será uma mera intenção em 1985.
Como não disponho, infelizmente, de muito mais tempo queria aproveitar os momentos que me restam para dizer o seguinte: em primeiro lugar, quanto à matéria relativa a investimentos intermunicipais, os Srs. Deputados consideraram que a verba era insuficiente. Ora, sobre isso tenho de dizer que partilho dessa opinião. Simplesmente o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano não são um documento legislativo que resulte da minha vontade ou da vontade individual do ministério, resulta da vontade colectiva do Governo. E, se alguma coisa puder ser feita nesta matéria, respeitando ainda assim a vontade colectiva do Governo, eu próprio ficaria muito grato aos Srs. Deputados e com certeza que as autarquias também.
Queria igualmente contestar veementemente que houvesse qualquer arbítrio na atribuição das verbas dos investimentos intermunicipais. É que as verbas inscritas não o são discricionariamente, pois os critérios estão fixados na lei. Contudo, consideramos que esta pode ser melhorada, por isso queria pedir esse esclarecimento aos Srs. Deputados: será que VV. Ex.ªs têm consciência de que na Lei das Finanças Locais se determina a revisão dos investimentos intermunicipais?
Sobre isto, posso dizer que o Ministério da Administração Interna tem neste momento duas propostas em Conselho de Ministros, no sentido de que a distribuição de verbas para novos programas será feita de acordo com nova legislação, a qual garantirá, mais do que a anterior, uma distribuição equitativa pelas diferentes comissões de coordenação regional do País, uma vez que se vai garantir a plurianualidade.
Para terminar, não direi do desenvolvimento regional, como parece que os Srs. Deputados queriam dizer, como o filósofo disse do mundo ou seja, "o mundo como é não devia existir, e como devia ser, não existe". O desenvolvimento regional vai ser uma realidade, porque há acções pensadas e que vão ser executadas, mas não constam das Grandes Opções do Plano. Assim, espero que todos façam a justiça de acreditar que o secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, se considerasse que o desenvolvimento regional em 1985 seria uma mera intenção, não aceitaria ser por mais tempo secretário de Estado.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Marques Mendes, V. Ex.ª tem razão quanto à questão de fundo, ou seja, não existem em Portugal programas ou projectos de desenvolvimento regional dignos desse nome.
No entanto, creio que o Sr. Deputado Marques Mendes, tendo razão na questão de base, não fez um enquadramento inteiramente correcto das considerações que formulou e das críticas que dirigiu ao Governo. Digo isto pelas seguintes razões: em primeiro lugar, o Sr. Deputado Marques Mendes sabe que os chamados planos de desenvolvimento regional surgiram nos últimos planos de fomento como um desdobramento no espaço dos investimentos programados e numa tentativa de compatibilização sectorial.
Depois do 25 de Abril, a indefinição institucional em matéria de projectos e de programas é total. Por conseguinte, do que se trata neste momento, é de uma total indefinição institucional, pelo que é muito difícil não só pedir responsabilidades, mas também fazer críticas sobre programas e projectos que não existem.
Aquilo que, neste momento, está contido nas Opções do Plano são programas ou projectos de desenvolvimento pontuais, que foram surgindo por iniciativa mais dinâmica de algumas zonas do País, mas que, de forma nenhuma são projectos de desenvolvimento regional.
De facto, penso que esta indefinição institucional só seria correctamente ultrapassada se fossem criadas as regiões administrativas. Essas regiões administrativas não foram criadas e há uma completa inércia do Governo e do poder central - de todos os Governos em criá-las, o que, creio, nos virá a criar algumas dificuldades e alguns embaraços para o futuro.
Mas, por outro lado, também existe uma indefinição orgânica, ou seja, neste momento existem comissões de coordenação regional, às quais competiria, de alguma maneira, lançar as linhas desses programas e existem, no Ministério das Finanças e do Plano - ao que suponho no respectivo departamento de planeamento - algumas ideias ou algumas intenções nesse sentido.
Portanto, estamos numa indefinição completa, que pode ser manietadora e paralisadora de um correcto planeamento de desenvolvimento regional e que pode, até, comprometer os nossos interesses ao integrarmos a CEE, na recepção das importantes verbas do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.
Por isso, Sr. Deputado Marques Mendes, acho que temos à nossa frente um desafio. E é nesse sentido que interpreto o seu discurso: criar o quadro institucional adequado para o lançamento dos projectos de desenvolvimento regional, que devem ser participados pelas autarquias e não impostos às autarquias de forma burocrática e centralista, e definir, para cada região, segundo a sua problemática interna de desenvolvimento, as metas, os objectivos e os meios a empregar.
Esse desafio existe, é um desafio à maioria - ao PSD e ao PS - e também ao Governo. Neste caso, é muito difícil assacar responsabilidades, em particular, ao Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, dado o panorama que, em breves traços, acabei de traçar.
Mas, no fundo e no que diz respeito a essa carência do desenvolvimento regional - ideias, projectos e programas para o realizar -, estou de acordo com o Sr. Deputado Marques Mendes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, se desejar responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra.
O Sr. Marques Mendes (PSD): - Srs. Deputados, irei responder quase telegraficamente - permitam-me que assim faça - para não gastar muito tempo.
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Começaria por responder ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal - e aproveito para referir que este assunto também foi focado pelo Sr. Deputado Carlos Lage - sobre o problema das críticas. Efectivamente, se viram nas minhas palavras uma crítica, eu chamar-lhe-ia crítica de exigência. É que tenho a impressão de que, neste aspecto, devemos apoiar e exigir, pois tal como eu disse na minha intervenção temos de saber interpretar os anseios, as esperanças e as necessidades das populações. Para isso temos de exigir que se faça cada vez mais e cada vez melhor.
O facto de o Sr. Deputado Anselmo Aníbal ter referido que tentei elevar alguma das posições do Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional por ser militante do PSD não esteve em causa, pois ainda agora foi dito que não seriam justas as críticas que fiz ao Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional.
Portanto, logo aqui há a visão de que, afinal, não é isso que está em causa, nem sequer esteve no meu pensamento. Está em causa, sim, algo totalmente diferente.
Quando eu disse, na minha intervenção, que vi criada - e vimos todos - neste novo Governo a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, foi na suposição - evidente, lógica e era o que constava na altura - de que haveria um departamento governamental chefiado por um membro do Governo que teria a seu cargo, exactamente, essa política do desenvolvimento regional. Política essa que, em meu entender, e tal como disse na minha intervenção e foi agora reforçado pelo Sr. Deputado Carlos Lage, está intimamente ligada também com as regiões e, portanto, com a regionalização. Disse até, na minha intervenção, que infelizmente se vem deixando de falar nela há muito tempo. O que eu quis foi exigir que o Governo actuasse neste aspecto do desenvolvimento regional, porque ele tem, como se sabe, largas repercussões e implicações não só no quotidiano das populações, como também na própria economia da região e na economia nacional, além de influir ainda no progresso social e económico das populações.
A propósito dos investimentos intermunicipais e do arbítrio, queria dizer que referi claramente que os investimentos intermunicipais têm o meu pleno apoio, mas apenas quando eles estão voltados à política de desenvolvimento regional. Não há aqui arbítrio porque tem de haver análise, ponderação e a transparência que um regime e um Governo democrático como o nosso, que apoiamos, deve ter e que nós próprios deveremos também acompanhar.
Quanto aos projectos que há em carteira, queria dizer que lamentei claramente que nas Grandes Opções do Plano se fizesse, no fundo, apenas alusão aos projectos que já vêm sendo lançados e que outros, que embora sendo quantitativamente menores são qualitativamente importantes, não fossem por diante. No entanto, as portas não estarão fechadas e, como o Sr. Secretário de Estado aqui referiu, de acordo com a resolução que o Governo já tomou nos princípios de 1984, será possível levar a cabo ainda esses projectos.
Finalmente, queria registar as palavras do Sr. Secretário de Estado a propósito de uma coisa que realmente me chocou e a que me referi na minha intervenção, que é o problema da intervenção.
Registo assim pela palavras que disse, a propósito de se tratar de uma expressão infeliz, que terá sido um lapso. Eu também concluí - e é o que consta da minha intervenção - que ao falar-se de planos integrados e noutras acções, que espero que se levem por diante, terá havido um lapso e que se terá querido dizer outra coisa, tendo as palavras atraiçoado o espírito de quem porventura redigiu o texto.
A nossa convicção e a nossa esperança é de que essa política de desenvolvimento regional seja efectivada sem ambições de obras de fachada e sem ser imposta, mas sim elaborada com plena participação das autarquias locais, porque elas são o grande motor da vida regional e também as entidades que conhecem melhor, no dia-a-dia, os interesses, os desejos e as necessidades das populações. Foi isto que disse claramente na minha intervenção e creio, pelas interpelações que me fizeram, que estamos todos de acordo, ao fim e ao cabo, e que não há divergências neste domínio, com o que me congratulo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa reunião de hoje.
A sessão de amanhã terá início às 10 horas.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 20 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Francisco Igrejas Caeiro.
João Joaquim Gomes.
José Carlos Pinto Basto Torres.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria Helena Valente Rosa.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
António Nascimento Machado Lourenço.
Arménio dos Santos. Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Pereira Lopes.
Luís António Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário Martins Adegas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
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Partido Comunista Português (PCP):
António Guilherme Branco Gonzalez.
João António Torrinhas Paulo.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Helena Guilherme Bastos.
Paulo Areosa Feio.
Centro Democrático Social (CDS):
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Bernardo Lobo Xavier.
Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
João Lopes Porto.
José Augusto Gama.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Narana Sinai Coissoró.
Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Ruben José de Almeida Raposo.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Mário Augusto Sottomayor Cardia.
Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Vargas Bulcão.
Luís António Pires Baptista.
Manuel da Costa Andrade.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Rogério Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Serafim de Jesus Silva.
Partido Comunista Português (PCP):
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Centro Democrático Social (CDS):
Joaquim Rocha dos Santos.
José António Morais Sarmento Moniz.
Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos enviado à Mesa para publicação
Em reunião realizada no dia 23 de Janeiro de 1985, pelas 18 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes (círculo eleitoral de Lisboa) por Luís António Pires Baptista. Esta substituição é pedida por um dia (23 de Janeiro corrente).
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes (círculo eleitoral de Lisboa) por Victor Manuel Dias Pereira Gonçalves. Esta substituição é pedida para os dias 24 e 25 de Janeiro corrente.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.
A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Secretário, Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) - José Maximiniano de A. Almeida Leitão (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - José Augusto Santos Silva Marques (PSD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Luís Filipe Paes Beiroco (CDS) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
OS REACTORES: Maria Amélia Martins - Ana Maria Marques da Cruz - Carlos Pinto da Cruz.
PREÇO DESTE NÚMERO 168$00
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.