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DIÁRIO da Assembleia da República

Sábado 13 da Abril de 1985

III LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984.1985)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE ABRIL DE 1985

Presidente: Exmo. Sr. José Rodrigues Vitoriano

Secretários: Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
José Mário de Lemos Damião
José Manuel Mala Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Concluiu-se o debate sobre a integração de Portugal na CEE, tendo intervindo, além do Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares), os Srs. Deputados Jogo Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Lucas Piles (CDS), Carlos Brito (PCP). João Salgueira (PSD) e Carlos Lage (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs., Deputados:

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
António Manuel do Carmo Saleiro.
Beatriz Almeida.
Cal Brandão.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusta Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lago.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Frederico Augusto Hãndel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Herminio Martins de Oliveira.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Joaquim Gomes.
João Luís Duarte Fernandes.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luis Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José. Manias Pires.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da- Conceição Carito.
Luís Silvério Gonçalves Saias..

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Manuel Filipe Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel Sarros Barral.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Agostinho Correia Branquinho.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernando Salgueiro.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Augusto Seabra.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Odete. Santos.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria Seabra Roseira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Eugénio Maria Nunes.
Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar dá Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Ruben José de Almeida Raposo.

O Sr. Presidente: - Vamos iniciar a última fase sobre a integração de Portugal na CEE, isto é; o seu encerramento.
A ASDI e a UEDS prescindem do uso da palavra e, por isso, dou a palavra ao MDP/CDE, na pessoa do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como prevíamos o debate imposto pela maioria, a pedido do Governo, decorreu de uma forma que pouco ou nada concorreu para o esclarecimento e análise das graves questões concretas que decorrem da adesão à Comunidade.

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O debate caracterizou-se mais por um série de intervenções laudatórias e abstractas da. maioria e do CDS do que pela apreciação dos diversos dossiers que constituem o processo de integração na CEE.

Foi notória a falta de preparação do debate, que deveria ter ocorrido na sede mais adequada, ou seja, na Comissão Parlamentar especializada.

Imposto pelos Grupos Socialista e PSD um tempo de debate extremamente limitativo, isso impediu, também, que os trabalhos tivessem decorrido de forma mais positiva, o que demonstra que o que efectivamente se pretendia era a montagem de um cenário para, a partir de agora, se acenar em campanhas eleitoralistas. com a afirmação de que a Assembleia da República já discutiu a CEE e a integração portuguesa.
Nada mais falso.

A verdade é que às questões colocadas ao Governo - quer o PS, quer o PSD preferiram o discurso elogiativo sem se preocuparem com os pedidos de esclarecimento ao Governo... -, os poucos ministros que intervieram deram respostas insuficientes e a maior parte das vezes evasivas.
Muitas questões ficaram por esclarecer como as que dizem respeito aos dossiers CECA, CEEA, união aduaneira, fiscalidade, problemas orçamentais, relações com terceiros países, agricultura, pescas, movimento de capitais, questões económicas e financeiras, sistema monetário, Banco Europeu de Investimentos, livre circulação de trabalhadores e política social, direito de estabelecimento e prestação de serviços, aproximação de legislação, exercício do Direito Privado, dossier ambiente, defesa do consumidor, questões institucionais, política regional, transportes e relações Portugal/Espanha. E sobre esta última questão, temos sérias dúvidas de que os interesses do País venham a ser devidamente preservados e defendidos.
O Partido Socialista e o CDS, ao impedirem a preparação do debate na Comissão de Integração Europeia, impossibilitaram que tais temas tivessem sido aprofundados com a presença dos membros de governo e do próprio Sr. Dr. António Marta.
Embora necessária, uma iniciativa deste género que deveria ter sido promovida há muito mais tempo e ainda antes da conclusão das negociações, para que esta Câmara pudesse ser devidamente esclarecida acabou por se revelar inútil e de reduzida importância quando o que se impunha era um debate profundo perante uma questão de Estado que deveria ser tratada numa outra dimensão e não subordinada aos interesses político-partidários.
Sempre defendemos que um problema tão sério; como o das negociações de Portugal com a Comunidade Económica Europeia deveria ser, objecto de amplos debates que tivessem por principal finalidade a do esclarecimento das situações mais complexas. Sempre entendemos que assim deveria ser - e pensamos - depois do que ontem se passou na Assembleia da República é que o Governo deve muitas e muitas explicações ao País.

Ficou patente que a organização do debate e os outros métodos adoptados pela maioria parlamentar do PS e do PSD, que coarctaram drasticamente as possibilidades de intervenção, ao limitarem os tempos dos grupos parlamentares, não visavam o esclarecimento publico sobre esta matéria.
Ao terminarem, hoje, os trabalhos parlamentares relacionados com a adesão de Portugal à CEE fica-nos a certeza de que apenas muita superficialmente os assuntos foram discutidos: E para essa superficialidade concorreu, também,. o facto de os responsáveis pois duas das pastas governamentais mais significativas - Agricultura e Mar - não terem intervindo impossibilitando-se os respectivos Ministros de prestarem os esclarecimentos necessários, e murros são. Os Ministros de dois dos sectores de maior relevância e de maior controvérsia quanto à forma ,como foram negociados os dossiers das pescas e da agricultura não puderam ser interpelados pelos deputados, o que demonstra como o Governo pretendeu apenas um debate com intenções políticas bem definidas, desprezando o esclarecimento sério - e oportuno.

Aliás, esta actuação não surpreende já que durante cerca de g anos, tantos quantos demorou a negociação com a Comunidade, nunca os sucessivos governos se prestaram a organizas debates - ou reuniões onde todos os problemas relacionados com a adesão fossem devidamente apreciados, em tempo oportuno, depois de se proceder a uma informação adequada. Não se promoveu esse tipo de reuniões na Assembleia da República, nem houve a preocupação de se canalizar para os sectores produtivos, como os da agricultura e das pescas, para as -organizações de trabalhadores e da indústria: completos dados informativos sobre a forma como decorriam as negociações e Sobre as consequências negativas previsíveis que a integração acarretaria.

Nada foi feito e se esse debate acabou por se realizar de forma precária, isso ficou a dever-se à intenção do Governo; nomeadamente do Sr. Primeiro-Ministro (cuja obsessão pela. CEE foi unia constante), de obter, dividendos políticos e propagandísticos.

O País sabe que se vai aderir à CEE sem que haja um conhecimento real do que é a Comunidade, do que. ela representa para Portugal e para os Portugueses.

E não deixa de ser curioso termos ouvido o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros afirmar que, quem tiver interesse em ser identificada sobes esta matéria, se deve dirigir a organismos ministeriais onde, segundo declarou, existe alguma informação. Quer dizes, para responsáveis governamentais, se existem lacunas informativas, isso fica a dever-se: aqueles que não procuram esclarecimentos respectivos.

E, assim, com toda a tranquilidade o Governo alija essa responsabilidade que lhe compete.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo. A adesão à Comunidade Económica Europeia processa-se numa altura em que a situação económica do País é das mais graves, com falências em série de pequenas e médias empresas com centenas, de milhares de desempregados, mais de 100 000 trabalhadores
a quem é devido o salário, inúmeras situações de subemprego, dificuldades acrescidas para os jovens que saem das escolas e não arranjam ocupação; um ensino caótico, o que também é muito grave, sem que se vislumbre, por parte da Governo a adopção de medidas que concorram decisivamente para o desenvolvi
mento económico do País, para o aproveitamento das nossas riquezas, e fiara, a melhoria das, nossas estaturas produtivas.

A recuperação económica não se verifica, não se adopte um plana de, recuperação da economia que tenha em vista o relançamento do País, enfim, não existe uma política que faça diminuir a nossa dependência do exterior.

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E não se diga que a entrada na CEE vai resolver todas as situações. Antes pelo contrarie, as perspectivas são bem sombrias. Os próprios responsáveis governamentais declararam nesta Câmara que a política económica foi aplicada tendo em vista a integração na Comunidade. Ora, se a política económica deste Governo se tem revelado incapaz de concorrer para a solução dos graves problemas existentes, agravando a crise e as condições de vida dos Portugueses, tal política revelar-se-á incapaz de responder ao choque e ao impacte negativo que a adesão à CEE provocará.
O Governo não explicita, como já tivemos ocasião de afirmar desta mesma tribuna, qualquer estratégia de desenvolvimento que tenha como vectores o crescimento económico do País e a satisfação progressiva das necessidades básicas da população portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É ilusória à imagem, que se pretende dar, de que com a adesão à comunidade a situação se resolverá.
À obsessão do Sr. Primeiro-Ministro de entrar a todo o custo na CEE, não correspondeu um esforço mínimo para se aplicar uma política económica e financeira que concorra para o nosso desenvolvimento.
O acordo com ó que afirmámos no programa aprovado no nosso IV Congresso, em 1981, o MDP/CDE considera que a real dimensão económica do País no quadro da economia mundial, a sua localização geográfica e o relacionamento especial com povos de várias partes do mundo, abrem perspectivas de grande independência nas relações económicas com o exterior.
Não é uma fatalidade a grande dependência de Portugal da área económica que corresponde à CEE, nem a adesão é a única forma de intensificar com esta área as relações comerciais, tecnológicas e financeiras que ao País interessam. O que importa é aproveitar as reais potencialidades para o alargamento das nossas relações económicas, externas.
Com os países da CEE é possível negociar acordos comerciais, tecnológicos e financeiros; mutuamente vantajosos, que permitirão manter ou, até, intensificar globalmente as relações com tais países.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Terminado- este debate, mortiço e pouco esclarecedor, resta aguardar resposta às perguntas que coloquei ao Governo:
Que política económica vai o governo PS/PSD apresentar ao País?
Que tipo de programas vão ser implementados para fazer frente à caótica situação económica em que os últimos governos mergulharam o Pais e que o actual agravou sensivelmente? Em suma, Srs. Deputados, qual é a política deste Governo?
Questões que ficaram sem resposta e que o País aguarda desde que este Governo está em funções. Ë tempo de se encontrar outra solução goveraariva.º

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faca favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria colocar à Mesa uma questão.
Julgo que está suposto, no normal ordenamento dos trabalhos parlamentares, que o Sr. Primeiro-Ministro possa responder às questões que são aqui veiculadas pelo areópago parlamentar, nomeadamente pela oposição.
Posto isto, não sei se terá muito sentido a minha intervenção sem a presença do Sr. Primeiro-Ministro, isto para lhe dar oportunidade a essa resposta - a não ser que o Sr. Primeiro-Ministro entenda fazer a esta Câmara um discurso que seja de resposta a ninguém, e muito menos ao País;
Portanto, propunha ao Sr. Presidente, e punha isso à consideração do Governo, a hipótese de interrompermos os trabalhos por meia hora, para dar ocasião ao Sr. Primeiro-Ministro de poder ouvir o discurso da oposição, se for esse o caso.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra, para uma interpelação à Mesa, ao Sr. Deputado Carlos Lage, devo dizer que é evidente que se o CDS desejar a interrupção dos trabalhos pode pedi-la.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage, para interpelar a Mesa.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados; Verificámos que a UEDS e a ASDI prescindiram de usar da palavra, o que, de alguma maneira, nos permite encarar com maior tranquilidade os trabalhos parlamentares desta manhã e, por isso, não temos objecções à sugestão do Sr. Deputado Lucas Pires.
Por outro lado, não podemos concordar com as considerações por ele feitas. Se fôssemos a analisar essa questão por essa perspectiva, também teríamos que lembrar ao Sr. Deputado Lucas Pires que ontem não esteve aqui durante o debate parlamentar.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Estive, estive! Vozes do PS: - De passagem, Sr. Deputado!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra
para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, realmente, cheguei um pouco tarde e dirigi-me tão rapidamente para a tribuna que não reparei quê o Sr. Primeiro-Ministro não estava presente quando produzi a minha intervenção.
O Sr. Deputado Lucas Pires tem toda a razão, pois se eu tivesse reparado nisso não teria usado da palavra.
É lamentável que. o Sr. Primeiro-Ministro, para além de ontem não ter usado da palavra, em resposta a muitas das questões, ainda não esteja presente e que a minha intervenção tenha sido proferida sem a sua presença.
Estou de acordo que, realmente, os trabalhos sejam interrompidos para que o Sr. Primeiro-Ministro esteja presente e se interesse, finalmente, por este debate que, como se verifica, foi apenas um mero espectáculo eleitoralista.

Protestos do PS e da PSD.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.:

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, nós temos uma solução pari o problema do Sr. Deputado Corregedor da Fonseca. Não nos importamos que ele leia, pela segunda vez, a sua intervenção, quando chegar o Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos e risos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, parti interpelar a Mesa, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, se V. Ex.ª me conceder a palavra na devida altura, pretendo então ler a minha intervenção perante o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Desde que não haja objecções da Câmara, não será a Mesa a opor-se.
Posto isto, Srs. Deputados, está suspensa a sessão por meia hora.
Eram 10 horas e 33 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está reaberta a sessão.

Eram 11 horas e 25 minutos.

O Se. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, depois da interpelação do Sr. Deputado Lucas Pires, que apoiei, verifiquei que quando usei da palavra o Sr. Primeiro-Ministro também não se encontrava na Sala - aliás, na altura não reparei porquê entrei na Sala já atrasado. Depois de também eu ter manifestado essa estranheza, o Sr. Deputado Carlos Lage declarou que não via impedimento em que eu, repetisse a leitura da minha intervenção.
Não vou fazer isso, Sr. Presidente, espero; ao entanto, que ao Gabinete do Sr. Primeiro-Ministro, alguém faça chegar a intervenção que o Grupo Parlamentar do MDP/CDE achou por bem produzir nesta Assembleia sobre a adesão do nosso país à Comunidade.
Só lamento ,contudo, Sr. Presidente que o Sr. Primeiro-Ministro, quer ontem - e ele que devia ter sido a figura principal a prestar todos os esclarecimentos a esta Câmara nunca interveio- quer hoje de manhã, tenha desprezado os trabalhos parlamentares e que um deputado de um grupo parlamentar tenha proferido uma intervenção sem que o Primeiro-Ministro, o primeiro responsável do Governo tenha estado presente.
Espero, apenas, que o Sr. Primeiro-Ministro, se tiver paciência, leia a nossa intervenção que tem alguns bons momentos de reflexão para V. Ex.ª

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares): - Peço a palavra, Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente que tenho de pedir desculpa ã Câmara por não ter estado presente no inicio :dos trabalhos. Aliás, ontem, como todos viram, estive aqui presente no início dos trabalhos...
Como sabem, para além das obrigações para com a Câmara, também tenho outras, às quais, infelizmente, não me posso furtar, porque o País continua a funcionar, independentemente deste debate.
No entanto, o Sr. Deputado João, Corregedor da Fonseca pode estar certo de que leio com a maior atenção tudo quanto vem do seu grupo parlamentar, da sua bancada e de si próprio.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Lucas Pires, comunico ao Plenário que se encontrara na galeria os alunos da Escola Secundária de Almaçade, de Lamego, a quem saúdo.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Se. Deputado Lucas Pires.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Se. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sra. Deputados: A conclusão das negociações para a integração de Portugal na CEE é, por si mesmo, um acontecimento histórico para o nosso país.

Em primeiro lugar, porque, depois da descolonização, se trata de uma modificação sensível do nosso enquadramento e do nosso lugar no mundo e no continente a que, desde sempre, pertencemos.

Tradicional e até culturalmente, somos muitas vezes excêntricos em relação à Europa até ao ponto em que os portugueses europeus eram considerados no nosso país «estrangeiros». Durante muitos anos, fomos sobretudo uma, «Europa ultramarina».

Recentemente, ainda tivemos de vencer duas tendências opostas em relação à Europa: uma, isolacionista; outra, terceiro-mundista. Finalmente esta integração europeia, em termos mais recentes, é a culminação de um processo que é o contraposto da descolonização.

Se tudo isto aconteceu depois da descolonização, a verdade é que; em segundo lugar, a entrada na Europa é também importante por aquilo que significa em relação à revolução socialista que tivermos.

De facto, a entrada, na Europa é a entrada num bloco económico e político dos mais poderosos e desenvolvidos do mundo e que constitui, sem dúvida, uma grande resposta à guerra, ao colectivismo e ao individualismo, simultaneamente.

Vamos entrar num mercado de 300 milhões de pessoas, onde o primeiro valor é o mercado e a eficiência e: onde o nível, de vida é um dos mais altos. do mundo; onde, politicamente, a maior aspiração é a da liberdade política, que é, sem dúvida, a capital de um certo humanismo construído dolorosamente ao longo dos séculos.
Tudo isto traduz, afinal, para nós próprios, um ,complemento de cidadania e um ambição suplementar que pode, sem dúvida, ter o significado de um desafio muito positivo para todos nós.
Até agora éramos emigrantes na Europa e éramos, talvez para a Europa, numa espécie de conto turístico que aos anúncios em Paris andava muitas vezes asso-

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ciado a Marrocos ou ao Norte de África. A partir de agora passamos a ser europeus de pleno direito e não mais apenas os metecos de uma construção europeia.
Em terceiro lugar; este processo é ainda histórico pela razão de que foi possível através dele superar os egoísmos partidários.
No meio das dificuldades da vida política portuguesa este é tipicamente um projecto nacional e democrático, ao qual esteve associado, como disse recentemente um jornalista de um grande semanário português, toda uma geração portuguesa e, inclusive, os três líderes dos três principais partidos democráticos, nomeadamente o actual Primeiro-Ministro, Dr. Mário Soares, o Dr. Sá Carneiro e o Dr. Freitas do Amaral.
Tal e qual como numa corrida de estafetas, uma corrida de estafetas que era ao mesmo tempo uma maratona que durou bastante mais do que a chegada à índia e que teve bastantes «cabos das Tormentas», todos estes líderes foram passando o testemunho de uns para os outros, como se fosse ainda possível, em Portugal, apesar de tudo, que as forças democráticas encontrassem formas de cooperação e mínimos de solidariedade nacional que são indispensáveis. preservar.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Eu próprio pertenci a um governo que pôde encerrar 10 dos 17 dossiers que tinham a ver com a nossa negociação com Bruxelas. E se outros tiveram os louros da conclusão destas negociações, é bom não esquecer todos aqueles que tiveram o duro trabalho de condução das mesmas.
É mesmo por ter sido um projecto nacional, como disse também um analista, que ele pôde ser levado até ao fim, é por ter sido um projecto democrático que este processo representa uma etapa importante no vencimento do nosso segundo período transitório, que, infelizmente, ainda não foi completamente vencido e só será completamente vencido por uma última revisão constitucional que restitua ao nosso país a plenitude da soberania democrática.
Esperamos, desejamos expedimos apenas, ao Governo que este processo de integração continue a ser, nas suas etapas subsequentes, ião nacional e tão democrático como o foi na sua génese e como foi o seu desenvolvimento, o que levou inclusive, o CDS, num período recente, a propor a constituição; de uma comissão tripartida nacional que assegurasse plenamente o carácter nacional e o compromisso do País, no seu conjunto, no desenvolvimento deste processo.
É certo, porém, que neste processo também há muito para. lamentar ou criticar.
Em primeiro lugar, e desde logo que a intervenção tenha sido ibérica ao mesmo tempo que europeia. Partimos, primeiro de que á Espanha para este, processo e chegou a pensar-se que a Espanha não entraria na CEE. Pensava-se, em todo caso que a entrada CEE seria, o modo de assegurar a nossa, maior independências a nossa garantia ide independência, permanente em relação à Espanha. Mas viu-se que a Espanha conseguia acompanhar, paralelamente este processo, e, finalmente chegamos à meta, não apertas ao mesmo, tempo que a Espanha mas, inclusive, na, sua peugada. De resto, o «sindicalismo» negociai espanhol foi mais visível do que o português; Madrid tornou-se uma referência: mais dominante do que Lisboa na condução de todas as negociações.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não apoiado! É falso!

O Orador: - Em segundo lugar, é de; lamentar que o povo português tenha sido pouco ou mal informado. O CDS foi o primeiro partido a pedir um grande debate nacional e um grande debate parlamentar sobre esta questão. Eis senão quando o que temos não é um debate, mas uma coroação do que foi, alias, sintomática durante o início desta sessão a própria ausência do Sr. Primeiro-Ministro.

Protestos do PS.

Um exemplo de que ò País não está preparado para esta integração é que o lançamento do IVA, por exemplo, está a ser motivo de perturbação, entre outros, para os nossos retalhistas, mesmo para os nossos armazenistas, porque não foi objecto de qualquer pedagogia ou informação pública suficiente.
Talvez por tudo isto e com uma ironia involuntária, alguém respondia noutro dia na televisão sobre a integração na CEE que deveria ser muito bom para as pessoas inteligentes porque só a elas tinha sido dado, até agora, a perceber Q que é que isso significava na sua plenitude.
Em terceiro lugar, é lamentável que não tenham sido feitas ao mesmo tempo as reformas internas fundamentais e. que estejamos a entrar na CEE a «andar para trás».
Um professor de Direito, de Coimbra, especialista de desenvolvimento regional, dizia há pouco tempo que, sendo nós o País mais fraco da cadeia europeia, somos aquele que menos defesas organizou face às dificuldades, aos problemas e aos perigos da integração.
Além disso, e mais uma vez, jogou-se primeiro na liberação externa antes de se ter jogado na liberalização interna.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - ... o que quer dizer que a liberalização poderá ser feita ma» por invasão do que por, autodeterminação das forças produtivas nacionais.
Apesar disto, julgo que não valerá muito a pena ruminar um processo negocial que durou quase uma década e que vale sobretudo, pensar em termos de futuro nas dificuldades desde logo e, em primeiro lugar, na recusa de um certo espírito de facilidade que pensa talvez que a CEE será para Portugal apenas mais um novo empréstimo estrangeiro.
Não nos podemos esquecer que temos um quarto de produto per capita da Comunidade e que os europeus podem viajar para o Algarve ou para Lisboa, mas que os Portugueses não podem viajar para Bruxelas riem para Hamburgo.
Não nos podemos esquecer que não é mais uma facilidade que está em causa, nem um espectáculo político feito a partir de fora, nem uma nova passerelle para o Poder, mas sim um desafio para toda uma comunidade que não pode esquecer que, mesmo dentro da CEE, continuam a prevalecer os egoísmos e, mesmo aí, ou seremos capazes de competir ou seremos devorados por esse processo.
Em segundo lugar, esquecemos também e temos de nos prevenir para a necessidade
de reforçar todas as formas, do nosso autogoverno e da nossa capacidade de exposição sobre nós próprios. Algo que seria ridí-

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culo é que viéssemos a ser os governadores. civis da Europa no nosso, próprio país; que não fôssemos capazes de fazer a revisão constitucional, de fazer o referendo; que nos tivéssemos esquecidos que temos na nossa Constituição, no momento em que entrámos na Comunidade Económica Europeia, normas que não são de um Estado de direito democrático, mas que bem podiam pertencer a uma constituição de qualquer país socialistas do Leste; que nos tenhamos esquecido que autorizámos e conseguimos manter uma norma como o artigo 83.º ou como celtas alíneas do artigo 290.º da Constituição que são o equivalente a um mandato de captura em branco sobre toda a economia portuguesa...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador. - ..., que, fôssemos capazes de fazer um contrato liberal com o estrangeiro e não fôssemos capazes de fazer um novo contrato democrático com o nosso próprio povo. É por isso que dizemos é preciso desnacionalizar a nossa economia para que possamos nacionalizar a integração, para que possamos dar-lhe um significado nacional de afirmação da nossa soberania e não de diminuição da nossa soberania democrática.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador. - Há um curioso fenómeno na esquerda portuguesa: é que para ela é bom ser capitalista lá fora, é bom ser liberal lá fora e é mau ser liberal cá dentro.
É que ela pensa que os problemas da recuperação capitalista nacional são resolvidos pelo Fundo Monetário Internacional ou pela CEE e não pelos empresários portugueses. Não chega fazer jantares e almoços com os empresários portugueses, não chega fazer a recuperação capitalista. É preciso, sim, um novo. projecto liberal em Portugal! É preciso não encarar a CEE com um espirito de conquista irreversível ou demais uma conquista irreversível ou, muito menos; como a última vontade de um governo moribundo que se serve, mais uma vez, desse álibi para esconder todos os reais problemas internos do povo português que no último ano, em 1984, teve o pior ano económico que a minha geração conheceu.
Em terceiro lugar, é preciso ter consciência, e reforçá-la, sobre qual o papel de Portugal na- Europa »e de como vamos defender nela a nossa viabilidade e a nossa identidade.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - O que é que este Governo já, disse sobre isso? Apresentou durante este debate um álbum das suas, glórias sobre a CEE.
Mas o que é que ele já disse sobre o modo, de se defender na CEE? Portugal é um país com uma vocação marítima, é um país que na sus história sempre defendeu a sua autonomia no, mar e sempre a encontrou comprometida na terra; é um parque na sua história teve a maior experiência africana de todos os países europeus, porque teve a primeira, e a última de todas as experiências, africanas e, isso mesmo, levou-nos já a dizer que Portugal na CEE deveria defender o estatuto de um mediador privilegiado com a África.

O Sr. Luis Beiroco (CDS)- Muito tem!

O Orador: - O que é que já foi dito, explicado e proposto sobre o que. Portugal pode ser na CEE? De facto, Portugal é um país euro-atlântico, um país que preserva o seu triângulo estratégico com- os Açores e a Madeira, um país que garante, ou ajuda a garantir, no quadrei com a aliança com os Estados Unidos da América e da Aliança Atlântica, a liberdade dos mares, nomeadamente no Atlântico Norte.
É por isso que ë preciso estar atento aos perigos é às dificuldades; é preciso falar delas, é preciso não tratar a CEE apenas como um álibi. Esses perigos são, em primeiro lugar; o dos novos desequilíbrios regionais. Talvez não convenha esquecer que entre o Nordeste transmontano e Hamburgo há uma diferença de 1 para 12 em termos de desenvolvimento e que os fenómenos de polarização podem vir a agravar esta situação.
Não se conhece, no entanto, nem uma política de desenvolvimento regional nem uma política de regionalização, sobre a qual este Governo tem sido, de facto, inteiramente omisso. É, inclusivamente, duvidoso que estejamos preparados para aproveitar os recursos que os fundos comunitários põem ü nossa disposição a fim de serem aproveitados nesta matéria.
Sr. Presidente, como vejo a luz vermelha, peço-lhe que me dê mais, 2 minutos apenas para eu terminar a intervenção.

O Se. Presidente: - A Mesa concede-lhe os 2 minutos que pede, Sr. Deputado.

O Orador:- Por último, nada foi feito para tornar a nossa economia mais competitiva. Isto porque o problema não é, inclusive, o de nos tornarmos
auto-suficientes nisto ou naquilo, mas o de sermos capazes de ser competitivos no quadra europeu, não esquecendo que temos uma agricultura que tem um quarto da produtividade média da agricultura europeia, que temos uma economia burocratizada, habituada à preguiça dos preços fixos, uma economia que tem os elefantes brancos herdados do império mais que herdados da revolução; uma administração burocratizada, uma fiscalidade retrógrada, estatutos e estruturas de investigação que não correspondem às necessidades que nos põe o desafio europeu.
Julga que um pais pequeno no quadra europeu devia fazer pela Europa, talvez, aquilo que têm feito, quase, as nossas equipas de futebol, que é jogar mais em jeito do que em força, que era ter, uma economia ágil e não a economia, de monstros inúteis e com, que nós vamos justamente entrar na CEE.
Mas qual é o plano, do Governo para enfrentar todos estes problemas? O que é que o Governo aqui nos disse sobre o futuro? Como é que pode haver um plano para enfrentar a CEE, se não há sequer um claro plano de modernização a médio prazo, tornado eficaz em relação à economia Portuguesa? E qual é inclusive, a nossa atitude sobre a revisão constitucional de que a CEE, ela própria, também precisa, agora que passou a ser uma terra de 12 países ? Toda a gente sabe que com 12 países a CEE precisa de um desenvolvimento mais político e que, o Chanceler Koln por exempla, tem proposto para, esses 12 países finalmente, o projecto de uma federação doa Estados unidos da Europa. Mas o que nos disse aqui o Governo sobre isso?

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Toda a gente tem proposto - e ainda recentemente o Chanceler espanhol Gonzalez - que agora seja introduzido o princípio da maioria, porque é impossível com 12 países fazer funcionar o princípio da unanimidade. Mas o que é que nos foi dito aqui pelo Governo sobre esse projecto?
Toda a gente sabe que a Europa precisa hoje de resistir aos cantos de sereia do Leste, de novo pronto a dividi-la, e precisa do mesmo tempo de afirmar, a autonomia do pólo europeu, no quadro das próprias relações atlânticas. Mas o que é que nos foi dito aqui sobre isso tudo?
Nada disto impede, a nós, no CDS, de manifestar um profundo, sério, vivo e empenhado regozijo pela integração de Portugal na CEE e pela conclusão das negociações, que acabam de ter o seu termo. Até como partido nos identificamos, plenamente, com aquilo que são os pilares de uma cultura europeia, uma cultura cristã e uma cultura liberal, uma cultura de tradição e de modernidade e com aquilo que foi o nosso país durante séculos em relação à Europa o maior transporte e o maior veículo dessa cultura e desse esforço através do mundo.
Também nós temos, em relação à Europa, a esperança de um novo desenvolvimento português baseado na abertura, na qualidade, na dimensão internacional das nossas unidades, na competitividade e, sobretudo, num projecto geral de mudança, que. faça também dessa mudança europeísta uma via do maior reencontro dos Portugueses consigo mesmos. Uma via de mudança e uma via de reconciliação, porque agora que terminou este projecto das três forcas democráticas, talvez seja preciso reinventar uma nova forma de solidariedade, e de entendimento, um novo pacto de regime entre as três forças democráticas para que a mudança possa ser efectiva, possa ser crível e possa ser motivo de esperança para todos os portugueses.
Mas o CDS terá, em qualquer caso, a certeza de. que dizer Europa é dizer «Viva Portugal!» e que dizer «Viva Portugal!» é dizer «Viva a Europa!».

Aplausos do CDS e dos deputados Costa Andrade e José Augusto Seabra, do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr: Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governa, Srs. Deputados: Depois de um silêncio de 8 anos o Plenário da Assembleia da República volta a discutir a questão da adesão à CEE. Há que notar desde logo que a discussão sé está a fazer agora porque o Governo e 08 partido da coligação pensam que podem retirar dela benefícios depois dos acordos estabelecidos em finais de Março com o Conselho de Ministros da CEE.
Da mesma forma se pode concluir que não houve debate até agora, nem sequer depois da carta enviada, em Setembro pelo Governo à Assembleia da República propondo a sua realização, porque o Governo e a coligação não viram vantagem em que o mesmo se realizasse.
Joga-se, portanto, no terreno do Governo. Não surpreende por isso que a coligação governamental, com o CDS a reboque, tenham pretendido que o debate em vez de servir para esclarecer os ternos- dos acordos negociados em Bruxelas e as suão desastrosa consequências para Portugal e para os Portugueses, seja utilizado precisamente para escondê-las e escamoteá-la sob uma torrente de retórica e consabidos slogans de «fé nas comunidades» e «confiança na integração», de mistura com algumas disputas sob quem se lembrou primeiro da CEE e de ataques caluniosos e provocatórios ao PCP.
É a parada da propaganda manipuladora que tínhamos previsto e já denunciado perante a Assembleia e a opinião pública.
Porque é que isto acontece? Porque é que o Governo e a coligação, com o CDS a reboque, têm medo de aprofundar os termos concretos do Acordo? É porque as condições acordadas em Bruxelas são benéficas para a economia nacional, favoráveis à nossa situação social e promissoras para o nosso futuro desenvolvimento? Evidentemente que não.
O carácter sigiloso com que o Governo se comporta em face das nossas interrogações sobre os termos concretos do Acordo revela, tanto como a leitura do mesmo, as cedências e as abdicações que foram consentidas em relação a questões fundamentais do interesse nacional.
Será absolutamente inadmissível que o Primeiro-Ministro, no seu discurso de encerramento, não respondesse cabalmente a questões-chave que colocámos sobre os termos do Acordo, designadamente:

Quais os exactos e verdadeiros contornos quantitativos da balança orçamentai e quais as garantias efectivas de que Portugal não será no futuro um contribuinte ou pagador líquido?
Qual é o exacto, alcance das consequências da adesão para milhares de pequenas e médias explorações agrícolas portuguesas?
Qual a exacta dimensão das cedências em relação
as pescas e conservas?
Qual o sentido e moldes das negociações em curso com a Espanha?
Qual a quantificação dos prejuízos em relação aos nossos sectores industriais mais importantes?
Qual o montante efectivo das verbas do FEDER a atribuir, a regiões portuguesas, quais os critérios e orgânica de distribuição e que regiões não irão ser contempladas?
Qual a quantificação das consequências sociais da adesão?
Quais as consequências em matéria de relações externas, das duríssimas condições aceites pelo Governo?

Tratando-se do Primeiro-Ministro é esta a altura para lhe perguntar o que é feito da sua promessa eleitoral de renegociar todos os dossiers já encerrados pelo anterior governo da AD?

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

As intervenções dos membros do Governo e dos deputado das bancadas governamentais, com o CDS a reboque, dão plena razão à nossa análise quando dizemos que o projecto de integração é desde a primeira hora uma operação política contra as conquistas democráticas do 25 de Abril, visando impedir a plena realização do regime democrático-constitucional e as opções mais progressistas do nosso povo com consagração constitucional e pela via do sufrágio. O debate não pode disfarçar também a instrumentalização das negociações com a CEE ao serviço da candidatura presi-

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dencial de Mário Soares. A partir de 1983 as negociações passaram a ser dominadas pelo calendário eleitoral e pela obsessão de se obter uma data boa para esse calendário, fosse a que preço fosse, o que acabou por conduzir às gravíssimas cedências que o povo português irá sofrer se a adesão se concretizar nos termos negociados.
É o tal choque que o Primeiro-Ministro tanto gosta de falar e que em português também se traduz por desastre.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Com o texto dos acordos e o esclarecimento que vai seguir-se o povo português compreenderá que o choque tem trágicas consequências e que a forma de as impedir é a intensificação da luta contra estes acordos e contra a adesão. ao Mercado Comum.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O choque representa para a agricultura o congelamento e o progressivo nivelamento de preços no produtor, a normalização forçada dos. produtos, a crescente intervenção relativamente ao montante das produções, a sobreposição das conveniências dos grandes monopólios da CEE, a concorrência das agriculturas incomparavelmente mais evoluídas dos Dez da Comunidade e da própria Espanha, tudo conduzindo à liquidação de milhares de explorações agrícolas, à redução da área cultivada, ao agravamento da nossa dependência alimentar.
O choque representa para as pescas a entrega na prática da nossa ZEE à gestão discricionária da Comunidade, o que significará para os pescadores, portugueses, que actualmente pouco pescam nessa zona, dadas as insuficiências da nossa frota pesqueira, que amanhã não poderão lá pescar porque a zona estará sobreocupada pelas frotas espanholas e pelas dos outros países da CEE. Em contrapartida, os pescadores portugueses não vão ter acesso às zonas económicas exclusivas dos outros países da Comunidade por se encontrarem já em situação de sobreexploração.
O choque representará para a indústria dentro de 7 anos a concorrência brutal dos países, da Comunidade e dos chamados «países terceiros». Importantes produtos da indústria nacional serão batidos no próprio mercado interno pela indústria dos países desenvolvidos de alta tecnologia e pela indústria dos países subdesenvolvidos de baixos salários. Isto significará a falência e a liquidação de milhares de pequenas e médias empresas, o atrofiamento definitivo das indústrias de base e de equipamento pesado e, com o liberalíssimo direito de estabelecimento, a penetração e o domínio do grande capital internacional nos sectores mais rentáveis e a entrega dos nossos recursos mineiros nas mãos das multinacionais.
Em consequência de tudo isto o choque representaria no plano social um brutal agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo em geral;, a ruína e a falência de milhares de explorações agrícolas e de milhares de pequenos e médios comerciantes e, industriais .
No que se refere concretamente aos trabalhadores, a integração significaria mais despedimentos e maior desemprego, mais exploração, repressão e redobrados ataques aos seus direitos.

Ao contrário do que tem proclamado o Primeiro-Ministro, os acordos parecem verdadeiramente apontados para impedir o desenvolvimento e a modernização da nossa economia.
O Plano Siderúrgico Nacional, a reorganização da indústria naval e outros grandes projectos nacionais têm estado bloqueados e continuarão bloqueados por força da adesão e ;ias conveniências dos monopólios da CEE.

Aplausos do PCP.

O projecto da beterraba sacarina, que tem sido sacrificado aos planos da integração, fica agora definitivamente atrofiado com este acordo. Mesmo os nossos sectores mais especializados e competitivos ficam sujeitos a inadmissíveis restrições e controles. É o caso dos têxteis sujeitos, na maior parte, a direitos durante mais 3 ou 4 anos; é o das conservas de peixe, especialmente da sardinha, que em relação a dois terços das exportações continuará a pagar direitos.
A tal «modernização» significa a transformação da economia portuguesa numa economia cada vez mais dependente, subalterna, uma economia de mão-de-obra exposta à pilhagem internacional, uma economia em que as orientações principais seriam ditadas não pelos Portugueses; mas pelas multinacionais da CEE.
É este o tal grande desafio, o tal grande projecto nacional salvador? Reconheçam que com ele, o que os ricos da Comunidade tenderão a reservar-nos é a instalação de indústrias poluentes que não querem nos seus países.

Uma voz do PCP:- Muito bem!

O Orador: - ... e os serviços que nos transformem nos serviçais do Mercado Comum. Falou-se aqui de um projecto cultural; ora, eu creio que este é precisamente o momento para alertar para o perigo da aculturação tão bem antevisto e recriado, por exemplo, por Lídia Jorge, no seu O Cais das Merendas.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Pela nossa parte demonstrámos que as fortes esperanças que muitos depositam no desenvolvimento regional são em grande parte miragem sem consistência, pois, entre outras razões, a experiência de 28 anos de Mercado Comum mostra que a tendência não é para a atenuação das assimetrias, regionais, mas para acentuar as desigualdades do desenvolvimento regional. Demonstramos que os subsídios e o empréstimo traduzem numa imagem numérica a dureza do impacte da adesão na agricultura- e na balança de pagamentos mas ficam muito longe de cobrir os custos económicos e financeiros que a integração representará só neste sector. Além disso o País será verdadeiramente exaurido através de sobre e subfacturação, do pagamento de royalties, da falsa importação de tecnologia, do pagamento de juros e da amortização da divida e das transferências dos lucros paras as multinacionais. Demonstrámos que em matéria de relações externas os acordos representam um afunilamento ainda maior e mais perigoso e uma maior subordinação ao imperialismo e o abandono de quaisquer relações de comércio autónomas com os países africanos de expressão oficial portuguesa os países socialistas e outros.
Estas conclusões, não encontraram qualquer refutação minimamente válida no debate que aqui se travou.

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Mas a propósito, de debate e da» posições, nele assumidas, para além das disputas entre os dois partidos governamentais a propósito da paternidade da ideia da adesão e não só, e para além de alguns aparentemente ingénuos hinos e poesias, provenientes da bancada do PS, a essa rapariga estrangeira que se chama «Miss CEE» e da congénita tendência do PSD para sacudir a água do capote quanto toca a assumir responsabilidades, vale a pena apreciar a posição do CDS. Não deixa de ser interessante observar a insistente colagem aos acordos de Bruxelas e os aplausos incondicionais à negociação, produzidas pelo Sr. Deputado Luís Beiroco, quando ainda estão tão frescas na memória da Assembleia as enormes coisas que aqui foram ditas contra elas pelo Sr. Deputado Lucas Pires, que agora se apressa a escrever ao Primeiro-Ministro considerando «positivo» e «histórico» o fim do processo de negociação, apelando à revisão constitucional, e aludindo a «um novo conjunto de referências» para a eleição presidencial. Que vergonhosa instrumentalização do interesse nacional!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Houve quem se pronunciasse pela opção integracionista com a alegação de que para ela não havia alternativa. É a outra forma de levar a água ao moinho da CEE e desculpar as escandalosas cedências nas negociações ou até de elogiá-las, como também aconteceu. Não duvidamos que para os Srs. Deputados que assim falaram não há mesmo alternativas. Mas há alternativas para o povo português e há quem estude e trabalhe para enriquecê-las e quem lute para as levar à prática. É nesta linha de preocupações e esforços que se insere a recente conferência nacional do PCP intitulada «A Via do Desenvolvimento para Vencer a Crise». Definindo três condições prévias para a recuperação e o desenvolvimento (o fim da ofensiva contra as conquistas económico-sociais de Abril; a participação activa e criadora dos trabalhadores; a defesa firme e intransigente da independência nacional) aã conclusões da conferência apontam grandes linhas para a superação da crise como o aumento da produção; o saneamento financeiro do País (empresas, Estado e dívida externa); o melhoramento das condições de vida dos trabalhadores e do povo em geral. Trata-se naturalmente de uma linha apontada para um grande esforço nacional e para a plena mobilização dos nossos recursos, mas não é a defesa do isolacionismo ou do autarcismo como alguns críticos pouco inteligentes pretendem fazer crer. Não. É, isso sim, a defesa de novas relações externas e que o crescente afunilamento e dependência em relação ao imperialismo seja substituído pela diversificação das nossas relações económicas externas e a cooperação mutuamente vantajosa com todos os países (países capitalistas incluindo o do Mercado Comum, países socialistas, países africanos de expressão oficial portuguesa, países do chamado «Terceiro Mundo», etc.) na base dos princípios de independência, não ingerência e vantagens reciprocas.
Alguns que se autopromoveram à condição de sábios da nossa economia mas que não são capazes de analisá-la senão por detrás das lentes do grande capital, vão clamar que o que propomos é impossível, demagógico, irrealizável. Da nossa parte lembramos que quando, há 9 anos se iniciou a política de recuperação capitalista, nós dissemos que ela ta conduzir aos desastrosos resultados económicos e sociais que o País está a sofrer actualmente, e estão à vista de todos. Dizemos, agora que, se este projecto de adesão à CEE se concretiza», a situação agravar-se-á muito mais e serão, ainda muito maiores os sofrimentos que serão impostos ao nosso povo. Entretanto, a situação criada com os acordos: de Bruxelas não é, a nosso ver, uma situação nem definitiva, nem irreversível...

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A entrada na CEE tem sido mitificada, pela propaganda oficial e a falta de esclarecimento, a um ponto tal que, sendo uma verdadeira desgraça, pode ser instrumentalizada como trunfo da candidatura presidencial do Primeiro-Ministro.
Está situação vai, no entanto, acabar. Conhecidos os termos dos acordos vai-se perceber, que «o mito» é afinal um monstro que ameaça o nosso presente e que ameaçará com muito mais gravidade o nosso futuro.
A luta contra os acordos e o ruinoso projecto de integração no Mercado Comum vai conhecer uma nova fase muito mais dinâmica e mobilizadora. Talvez então alguns Srs. Deputados compreendam a importância dós têxteis, das conservas, do tomate, da beterraba sacarina, da batata, do arranque da vinha dos produtores directos e da queima dos vinhos. A última palavra pertence ao povo português!
Supomos que não há aqui quem ouse contrariar este princípio. Mas, se assim é, então há que dar ao. povo português as condições democráticas para que ele tenha realmente a última palavra.

Vozes: do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto coloca também a questão da representatividade da composição actual da Assembleia da República.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Na sua composição actual a Assembleia ás República: deixou manifestamente de corresponder à vontade maioritária dos portugueses e por isso mesmo não pode representá-los numa decisão tão carregada de consequências1 para o presente e o futuro do nossa povo- ë do nosso país como a ratificação da adesão.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A dissolução da Assembleia da República e realização de eleições legislativas antecipadas, que já é, a nosso ver, juntamente com a demissão do governo PS/PSD, uma exigência, institucional para a saída da grave crise política que o País atravessa, torna-se também uma exigência democrática para que o povo português pronunciar-se com todo o peso da sua vontade sobre os acordos de cedência e capitulação negociados com a CEE.
Por tudo o que referimos, por tudo o que ficou provado, PCP diz «Não, ao Mercado Comum!» é com mais forte razão diz «Não aos acordos que o Governo acaba de negociar em Bruxelas!» Dizemo-lo, em nome dos interesses dos Portugueses e de Portugal.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

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O Sr. Presidente: - Para. uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Salgueiro.

O Sr. João Salgueiro (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Poucos temas na vida do povo português se justificarão mais do que este, que durante 2 dias nos ocupou um debate na Assembleia da República. É das raras ocasiões em que sabemos que se está, necessariamente, a fazer história: a assinatura de um acordo que vai ter consequências inevitáveis por dezenas de anos na boa sorte do povo português...
Pela forma como o debate decorreu acabaram por não se discutir em detalhe as condições de adesão. A preparação necessária para a ratificação do acordo terá de se fazer, entretanto, ao nível das comissões especializadas e por trabalho individual de cada um de nós. Mas é, talvez, melhor assim porque todo o realce foi dado à importância política da decisão em si mesma. Decisão maior que o simples facto de ter levado a concluir mais de 8 anos, com 9 governos, várias coligações e várias maiorias, tornou claro que se trata, antes de uma questão de governo, de uma questão de Estado, verdadeira, uma questão nacional, que vai ser traduzida no texto do Acordo.
Luta de mais de 8 anos, mas que para muitos de nós foi bem mais longa. Desde o tempo da juventude e nos anos que se lhe seguiram foi a luta que muitos de nós quiseram travar. Nesses tempos, democracia e Europa eram sinónimos a vários títulos. A mesma bandeira e o mesmo objectivo traduzido indissociavelmente numa estratégia, num programa, numa maneira de ver o mundo e a realidade portuguesa. Para nós a Europa como a democracia traduzem simultaneamente um projecto de sociedade e um entendimento do. que é a civilização de que fazemos parte.
Da negociação ressaltaram os aspectos económicos e jurídicos mas para nós a luta pela Europa foi ao longo destes decénios, bem mais do que isso: um projecto de democratização plena da sociedade portuguesa com o que isso implica de respeitadas liberdades e direitos individuais, e de garantia das condições para o funcionamento efectivo do pluralismo político, simultaneamente, um projecto de desenvolvimento, de inovação técnica e científica, de acumulação, de capacidade produtiva, de criatividade cultural, de liberdade de informação, um projecto de solidariedade, vivida, entre os Portugueses e com os povos de outros países.
Não podem, por isso, subsistir quaisquer ambiguidades sobre a nossa posição em relação ao que é um desígnio histórico da vasta maioria do povo português. O facto de terem participado em sucessivos governos os 3 principais partidos que foram protagonistas deste projecto de mudança, evidenciou na realidade do que foram estes 8 anos, o apoio da vasta maioria do povo português a tal desígnio.
Mas também não devem subsistir ambiguidades sobre a necessidade de criar as condições para que a reintegração de Portugal no conjunto das nações europeias se possa fazer plenamente. Devemos olhar mais para o futuro do que para o passado. A consequência primeira de tomarmos a sério a importância desta decisão é mudarmos necessariamente de comportamentos em relação ao futuro que nos espera. Olhemos, no entanto, brevemente para algumas das lições que o passado próximo das negociações nos concedem.
Ressalto apenas dois aspectos.
Em primeira lugar, o facto de que chocando, em certa medida, com atitudes tradicionais portuguesas, esta negociação foi, em grande medida, a negociação de números, de quilos, de litros, de escudos por quilo, de calendários, de discussão de meses e de anos! Isto é, a discussão de condições concretas que para os sectores da indústria, do comércio, da pesca e da agricultura, para todas as nossas actividades produtivas e a própria sociedade traduzidas numericamente num período de transição vigorosa. E essa é uma lição, que em particular nós, Portugueses, devemos aprender. Se é decisivo para a sorte dos. povos das grandes nações já industrializadas da Europa o detalhe quantitativo e o calendário das actuacões quanto mais o não deve ser para o povo português essa análise, cuidada dos detalhes e da sua oportunidade!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Diz, aliás, o povo português, numa expressão que ficou de outras épocas, que «quem vai para o mar avia-se em terra». Não é depois de estarmos a navegar, depois de estarmos ao largo, que se pode assegurar o cuidado que a preparação das missões deve ter.
Em segundo lugar, a outra lição foi a de que se nós próprios não tratarmos dos nossos interesses, outros não o farão no nosso lugar. Esta lição, mais desagradável para nós, ficou também bem patente.
Teria sido possível concluir a negociação com a CEE em finais de 1982 negociada já a maioria dos capítulos e encerrados dois terços destes. Se calhar até teria sido possível encerrá-la alguns anos antes, mas disso não tenho provas. Não é por saudosismo, nem para olhar desnecessariamente para o passado, que agora aqui o recordo. É porque não podemos acalentar esperanças de que aquilo que não conseguimos no passado vamos alguma vez impor à Comunidade em relação a alguma dificuldade futura da nossa economia.
Gostaria de salientar que não foi nunca por parte da equipa negocial portuguesa que os atrasos se somaram. Digo-o comia intenção de frisar, se por um lado, a qualidade da equipa, de que estão aqui alguns membros como o então embaixador Dr. Ernâni Lopes e o Dr. António Marta. Mas também para registar o apoio que todos os serviços de todos os ministérios deram para que fossem, pontualmente, apresentadas, mesmo as mais difíceis posições. E ainda - como tive ocasião de fazer quando Ministro das Finanças e do Plano, algumas vezes aqui referi, a importância das decisões históricas do governo PS - também para salientar o apoio que nessa altura, o CDS, hoje na oposição, deu às negociações, designadamente em capítulos particularmente difíceis como os da indústria e da agricultura.
O calendário foi o que a Comunidade entendeu em função da necessidade de negociar com a Espanha. Apesar de todos os contactos com as capitais europeias, nem o conseguimos nós, nem foi conseguido anteriormente, nem posteriormente impor um calendário que fosse o de Portugal. Que isto nos sirva de lição para não esperarmos de diligências políticas no futuro o que for necessário para resolver os problemas portugueses. Contemos connosco, antes de mais.
E parto daqui para a necessidade de afirmar, sem qualquer ambiguidade, que as transformações das nossas estruturas económicas e sociais são hoje inadiáveis.

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Qualquer adiamento nos últimos anos foi, sem dúvida, lamentável e não cuidaremos de os historiar. Mas o que já era então lamentável, é inaceitável depois da adesão à CEE estar à vista.
Tem sido dito nas últimas semanas que é inexplicável a diferença de comportamento do povo espanhol e o do povo português face às notícias da adesão. Em meu entender é bem explicável. Em Espanha não houve o desgaste do atentísmo face a sucessivos adiamentos de um processo de negociação impostos por razões alheias ao nosso calendário. Mais importante, ainda, em Espanha, a adesão pôde ser de facto, o coroamento da consolidação democrática que teve lugar nos últimos anos. Infelizmente, entre nós, a adesão não poderá ser ainda o coroamento da consolidação democrática. Para verdadeira consolidação da democracia - que não se pode fazer sem condições de desenvolvimento real - faltam ainda profundas mudanças.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E não falo nas mudanças que terão necessariamente lugar em consequência da CEE. As instâncias da Comunidade assegurarão que, por exemplo, alterações na fiscalidade, na criação de associações de produtores, nas regras da concorrência e de livre estabelecimento terão lugar pontualmente. Falo daquelas mudanças que a Comunidade não exige de nós, que têm que ver com a saúde da nossa economia e que nos últimos anos, por razões de divergências políticas ou ideológicas, ainda não fomos capazes de levar a cabo. A sua vigência é agora indiscutível e conta-se por meses. É evidente que se trata da necessidade de enterrarmos o contencioso das nacionalizações, de garantir o cumprimento escrupuloso do que a lei diz, sem o qual se tratará de esbulhos e não de nacionalizações; o encerramento das diferenças, que há no quadro da nossa agricultura com a sobrevivência ainda de uma zona de intervenção da reforma agrária, que não se justifica em termos de política agrária de normalidade.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A necessidade de equacionarmos as condições de resolução do problema financeiro do Estado, sem o que não haverá solução para o financiamento necessário da nossa, economia nem para o necessário abaixamento das taxas de juro, a necessidade de esquemas para viabilizar a reconversão das empresas.
Algumas bancadas da oposição falaram nos problemas das pequenas e médias empresas; .mas é mais do que isso. Trata-se do problema de sectores, inteiros da nossa economia, cuja sobrevivência pode estar em risco, que está, de facto, em risco se não alterarmos as condições que lhe são oferecidas.
O problema de viabilizar, todo o sector das empresas públicas, que o Governo tem equacionado com rigor mas que interessa concretizar nos factos imediatamente.
O problema de um quadro necessário; e aceite pôr todos os participantes para a legislação laboral. Se o trabalho é de facto a base do desenvolvimento; não podemos ter um ordenamento jurídico, que impede tirar todo o partido desse recurso essencial.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A necessidade de quadros eleitorais que favoreçam a constituição de executivos com mais facilidade, mais fortes e mais estáveis, tanto ao nível da República como das autarquias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, a necessidade de um quadro de conversão e modernização claro, que seja oferecido a todos os portugueses, necessidade de rapidamente se apresentar o plano de recuperação financeira e económica e o plano de modernização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devemos ainda ir mais longe. De hoje em diante não se compreende que mantenhamos em aberto o contencioso que resulta de uma Constituição que é necessariamente provisória.

O Sr. Beato Gonçalves (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se os investidores portugueses e estrangeiros têm de fingir que não lêem o que está em algumas das disposições da nossa Constituição, alguma coisa está mal: ou a Constituição é meramente um papel que não é para se tomar a sério, ou tem de ser transformada naquele quadro fundamental que todos devemos respeitar e deve ser a base do ordenamento jurídico, em todos os. domínios e também no domínio económico.

Aplausos do PSD e do CDS.

E não se diga que os meses não contam. Já vimos que os meses contam, e contam, em particular, para nós. Tenhamos a noção de que vamos entrar na Comunidade Europeia, correspondendo a um profundo anseio do povo português e congratulemo-nos todos com isso. Mas vamos entrar em condições que não têm ainda paralelo na experiência de outras adesões. Existem entre os nossos níveis de desenvolvimento e os da maior parte dos países da CEE tais diferenças quantitativas, que são diferenças de qualidade. Nunca algum processo de adesão se fez, até agora, com tantas disparidades relativas. E nunca os processos de alargamento da Comunidade se fizeram em período de tão longa estagnação das economias europeias como este que ainda estamos a viver e vamos, necessariamente, viver no futuro, porque as décadas de desenvolvimento rápido estão ultrapassadas.
Não se diga também que essa revisão da Constituição é qualquer coisa de anormal: a própria Constituição o prevê, fixando as maiorias para a revisão dentro e fora dos prazos convencionados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: A profunda esperança de progresso que o povo português alimentou durante decénios foi resumida no 25 de Abril em três palavras: democratização, descolonizarão e desenvolvimento.
Muitas frustrações se acumularam depois. Progrediu-se. Mas para a verdadeira democratização ainda falta criar as condições para o funcionamento normal e sem crises, sucessivas das instituições políticas. Para a descolonização falta mais: falta restabelecer relações de solidariedade estáveis e realistas, em termos do interesse do nosso povo e dos povos dos países de língua oficial, portuguesa. Falta restabelecer um relacionamento permanente que corresponda às realidades económicas, culturais e históricas das duas partes.

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Para o desenvolvimento falta, mais, falta quase tudo: porque, em rigor, não se progrediu nesse objectivo que logo na madrugada do 25 de Abril correspondia a profundas aspirações nacionais.
A CEE oferece-nos um quadro e um desafio. Oferece-nos até alguns novos instrumentos para um desenvolvimento mais rápido e mais harmónico. Mas o desenvolvimento nunca será senão o que resultar da capacidade de construção, de criação de riqueza e da determinação do povo português.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Compete à classe política, de uma maneira ou de outra, garantir que assim será..

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo: O movimento para a unidade política europeia, com a natural salvaguarda das autonomias nacionais, configura-se como um dos acontecimentos mais originais e fecundos do nosso tempo.
No curso de uma evolução histórica secular acentuou-se a fragmentação e diversificação da Europa, ao sabor das línguas, regiões, culturas e compartimentos geográficos.
As mais intensas rivalidades caracterizam a formação e consolidação dos Estados-Nação da Europa. E se é certo que a competição e a emulação podem ser impulsionadoras do progresso, a verdade é que a exacerbação dos egoísmos nacionais provocou conflitos destruidores e prolongados e cavou ódios entre povos.
Dolorosos exemplos são as duas devastadoras guerras mundiais que deixaram a Europa em ruínas, cindida pela cortina de ferro, e lhe fizeram perder a sua posição de centro hegemónico da política mundial.
A construção da unidade europeia tem raízes e precedentes seculares, mas só se materializou depois da 2.ª Guerra Mundial, começando a impor-se á opinião pública e, a tomar lugar entre as preocupações, essenciais de todos os governos. A questão da organização e reforço da comunidade europeia identifica-se cada vez mais com o assegurar a sobrevivência de uma cultura que durante séculos se considerou sem rival. A concepção da unidade europeia começa, gradualmente a transfigurar-se do económico stricto sensu passará gradualmente à política de defesa, à ofensiva tecnológica, a uma cooperação mais intensa em todos os domínios. Portugal não poderia ficar, sem nefastas consequências, à margem, deste movimento, constituindo a plena integração na CEE um acontecimento histórico do plano interno, que transformara apenas em má recordação o isolamento político anterior ao 25 de Abril e contribuirá para atenuar os efeitos da situação periférica do país a que a geografia nos condenou.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Numa época de acumulação de incertezas geopolíticas, energéticas, tecnológicas e económicas, onde nenhuma tendência se desenha linearmente e todas as rupturas são possíveis, a opção europeia não tinha alternativas e é a que melhor assegura os interesses de Portugal. O equacionamento da problemática da CEE não pode ser, pois, divorciado deste pano de fundo e não o esteve durante o debate parlamentar.
O desenrolar do debate evidenciou que a política de integração representou o fio condutor da nossa política externa, desde o pontapé inicial dado por Mário Soares, em 29 de Março de 1577, até ao feliz epílogo do processo de negociações, recentemente concluído.
Negociou-se bem? Sem dúvida. O debate travada permitiu compreender que a perícia dos negociadores, combinada com a pressão diplomática adequada, conduziram a excelentes resultados para o País que só por sectarismo, miopia ou má fé podem ser negados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Acordo arduamente conseguido representa um sucesso para o País e foi visivelmente melhor que p obtido pela Espanha, o qual foi recebido no país vizinho com euforia, em contraste com o laconismo e o tom introvertido com que foi recebido entre nós por algumas forças políticas, das quais esperávamos uma reacção mais calorosa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, os dossiers mais sensíveis que ficaram para a recta final das negociações, deram satisfação à maior parte das pretensões portuguesas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não se confirmaram os temores alarmistas de quem vaticinava que nós, os «pobres», íamos ser contribuintes líquidos dos «ricos» da Comunidade. O Acordo garante-nos uma contribuição líquida vultosa dá CEE que activará o nosso desenvolvimento. Ninguém honestamente recusará que o balanço financeiro nos é deveras favorável.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O debate teve o mérito de clarificar e reafirmar as posições dê todas as forças políticas parlamentares, sendo fácil, desde já; antecipar os resultados da futura aprovação do Tratado de Adesão, quando for oportunamente submetido a ratificação do Parlamento. Será, com certeza, uma esmagadora maioria de aproximadamente 80% de deputados desta Câmara, que votará favoravelmente esse Tratado de Adesão.
Vencida que foi a melancolia que ensombrou alguns partidos políticos, nos dias imediatos à boa nova da adesão, assistiu-se, durante o debate, ao exteriorizar de um entusiasmo e uma cresça no ideal europeu a uma salutar convergência digna do maior apreço e que muito nos reconforta.
Ficámos com a certeza de que existe uma vontade ampla e forte que fará da adesão um projecto nacional com a participação activa de todo o País.
Este debate insularizou o PCP e raramente se presenciou uma argumentação tão inconsistente como aquela que expendeu. Razões? O PCP não assume a herança cultural europeia e rejeita a civilização democrática ocidental por as considerar como reflectindo os

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interesses das classes dominantes, feudal ou burguesa. Importa assinalar que a CEE é uma comunidade de Estados livres e soberanos que voluntariamente se uniram, não tendo paralelo com o COMECON, espaço organizado pelo domínio político e económico da União Soviética.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PCP declarou quê vai lutar pela não assinatura do Tratado de Adesão, luta que está, desde já, votada ao fracasso e que não encontrará qualquer eco na opinião pública nem entre muitos militantes do PCP que têm familiares na Europa e são a favor da Europa e da integração europeia.

Aplausos do PS e do PSD.

Protestos do PCP.

Só se acreditam, Srs. Deputados comunistas, que já. conseguiram modelar todas as consciências de todos os vossos eleitores!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Mas que preocupação a sua!

O Orador: - Uma lição a extrair do debate é a da óbvia necessidade de fazer uma pedagogia correcta e objectiva sobre a adesão. Informar e esclarecer trabalhadores, empresários, jovens, agricultores, pescadores e operadores turísticos daquilo que é legítimo esperar, dela. Sem paternalismos, é necessário dar orientações e directrizes para que os nossos industriais, agricultores e comerciantes saibam em que investimentos devem apostar, que produções devem seleccionar, apoiando-os na modernização das suas actividades. Particulares cuidados deve merecer o nosso mundo rural, que está esperançado, mas também perplexo e receoso.
A integração tem riscos? Pois tem. Mas não se tira qualquer glória de um êxito assegurado. ... .
Temos de passar da razão especulativa à razão prática. Responder pela acção enérgica ao desafio europeu, maximizando as vantagens resultantes da adesão.
De outro modo, se formos virtuosos na falta e pecarmos na acção, seremos merecedores do sarcasmo de Eça de Queirós contido num texto precisamente intitulado «A Europa», Diz o grande escritor:

Nós temos, ao que parece, todas as enfermidades da Europa (...). E, desgraçadamente, além destes males, uns nascidos do nosso temperamento, outros traduzidos do francês, morremos a mais de outro mal, todo nosso, que só a Grécia, menos intensamente, partilha connosco: é que, enquanto contra as tormentas sociais nas outras naus se trabalha, na nossa rota e rasa caravela, tagarela-se!

Passemos, pois, ao trabalho: Encaremos com optimismo, mas também com espirito de humildade e rigor a hora europeia.
O período pos-adesão, em especial a período de transição, será decisivo para o País. Aproveitemo-lo para melhorar a qualidade da nossa vida política e administrativa e lançar unia estratégia de desenvolvimento e modernização de largos horizontes utilizando, com eficiência, os recursos que a Comunidade colocar ao nosso alcance, sejam os cerca de 150 milhões de contos de transferências liquidas durante os próximos 7 anos, sejam, as verbas do FEDER, do FEOGA e do Fundo Social, sejam os nossos próprios recursos.
Quais são as políticas prioritárias a desencadear sem demoras? São, com certeza, a seguintes:
Em primeiro lugar, uma política agrícola que promova a redução da nossa dependência alimentar e melhore o nível de vida dos agricultores. Temos, infelizmente, uma agricultura velha feita por velhos, que urge modernizar e rejuvenescer; os resultados das negociações são um bom quadro de referência para definir uma política agrícola que nunca houve. Seria dramático que a nossa dependência alimentar se agravasse com a adesão. Temos de ordenar e racionalizar a nossa actividade agrícola, reconverter a vinha, o olival e o pomar, reduzir a componente rações na exploração pecuária, desenvolver novos vectores na exportação de floricultura, hortofruticultura e vinicultura, aproveitar mais racionalmente a floresta, diminuir a componente importada de cereais e oleaginosas, etc.
Em segundo lugar, uma política industrial dirigida à modernização e diversificação do tecido produtivo, em particular os sectores exportadores
tradicionais, fortalecendo a estrutura empresarial, modificando a especialização industrial incorrecta do País, que nos torna demasiado vulneráveis;
Em terceiro lugar, uma política energética que reduza a nossa dependência em energia importada, diminuindo, em particular, o custo energético dos transportes, do aquecimento dos edifícios, bem como a intensidade em energia de crescimento industrial;
Em quarto lugar, uma política de inovação tecnológica que nos permita combinar a diversificação industrial e a investigação científica com a assimilação das inovações da Terceira Vaga, de que á revolução informática, muito embora não seja a única e revolucionária inovação técnica dós últimos anos, é o factor comum que permite acelerar todos os outros;
Em quinto lugar, uma política educativa que tenha em conta que a educação comanda o futuro do homem num quadro de rápidas transformações no saber, no trabalho e nas tecnologias. A educação em Portugal tem vivido obcecada, nos últimos anos, pelos métodos pedagógicos, os conteúdos e finalidades do ensino devem agora passar à frente;
Em sexto lugar, uma política regional activa. O nosso país exibe um acentuado dualismo litoral/interior e uma concentração cada vez mais descontrolada de actividades numa estreita faixa litoral, e caracteriza-se por um forte subdesenvolvimento rural e por aglomerações urbanas desordenadas. Os recursos do FEDER constituem um poderoso apoio e estímulo ao desenvolvimento regional, se inteligentemente utilizados; deparamos aqui com uma indefinição institucional, em que a parte mais relevante não é, para mim, saber qual o departamento governamental que está mais apto a gerir o Fundo mas a inexistência de uma entidade autárquica regional.
Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Temos de aproveitar, de forma sistemática, os nossos recursos humanos e naturais, entre estes o sol, o mar, as águas interiores.
Se me permiti acentuar estas políticas no âmbito deste debate, é porque as considero estratégicas e delas depende o sucesso do processo de integração. Aliás, o lançamento destas políticas teria sempre de ser feito com a CEE ou sem a CEE, mas com muito menores hipóteses de êxito sem ela.
Com a integração dos países do Sul da "Europa na CEE, poderá verificar-se um movimento histórico inverso aquele que deslocou os principais centros de difusão de riqueza e conhecimento da bacia mediterrânica para o centro da Europa, obtendo-se um novo equilíbrio, recobrando um forte alento as velhas civilizações milenárias do bordo do Mediterrâneo, desempenhando novo papel, em especial na renovação da vida urbana, à escala do homem dadas as suas longínquas tradições.
Mas a integração de Portugal e Espanha põe também problemas ainda pouco palpáveis mas de repercussões imensas no quadro da própria Península ibérica, sobre os quais é preciso reflectir. Ninguém se surpreenderá com a nova redistribuição e concentração de poderes e actividades no espaço que daí derivará.
Em primeiro lugar, a zona raiana de Portugal e Espanha por onde passa a fronteira do subdesenvolvimento, tem dificuldades semelhantes, mas a capacidade de atracção sobre a faixa raiana portuguesa da Espanha é considerável, justificando, da nossa parte, rápidas providências traduzidas em programas dê desenvolvimento e infra-estruturas de transportes e comunicações que contrariem a força centrípeta espanhola.
Em segundo lugar, está em vias de se formar uma forte zona de crescimento urbano e industrial alastrando entre a Catalunha espanhola e Guimarães/Porto/Aveiro, caracterizada por uma grande vitalidade demográfica e económica, a qual poderá vir a ser uma nova grande mancha industrial dá Europa, e deslocará inexoravelmente o eixo do nosso desenvolvimento para o Norte do País.
Finalmente, a integração na CEE têm ó seu lado ideal e espiritual. E cimentará definitivamente a nossa vivência democrática e ajudará a consolidar um sistema político instável e com adversários ostensivos ou dissimulados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós, socialistas, sem querermos ter a exclusivo da convicção europeia e sem termos a arrogância de sermos os mais puros, temos defendido, com coerência, o projecto europeu. Temos consciência de pertencer a essa grande comunidade civilizacional europeia que teve o seu berço na Grécia antiga, existiu na Idade Média como comunidade religiosa, cultural e linguística, e esteve patente em todos os grandes movimentos culturais e sociais que caracterizaram a Europa: o Gótico, o Renascimento, os Descobrimentos Marítimos, o Barroco, o Romantismo, o Racionalismo movimentos que podendo ter despontado num país, assumiram sempre dimensão europeia.
O espírito europeu, do qual partilhamos; foi caracterizado, se a memória não me falhai pelo grande filósofo Karl Jaspers durante os Encontros Internacionais de Genebra, com três palavras-chave: a Liberdade, a História, a Ciência.
A sociedade europeia ocidental é uma sociedade aberta e pluralista, porque nunca foi moralmente neutra nem politicamente anémica.
O respeito pelo valor intrínseco da pessoa e a liberdade como inseparável da solidariedade humana, o dever de fazer aceder progressivamente todos os homens aos bens materiais e espirituais, são traços permanentes da cultura europeia, mesmo em momentos de eclipse ou de catástrofe histórica.
É nesta perspectiva histórica, cultural e económica que desejamos participar, sem complexos, como membros da CEE; contribuindo com a nossa riqueza cultural e a nossa inigualável experiência humana para esse novo élan das comunidades, de que fala Mário Soares, e, naturalmente também, para o um novo élan do nosso país. É isso que, deputados socialistas, ardentemente desejamos.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr, Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Primeiro-Ministro (Mário Soares): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate que aqui fizemos, sobre o feliz termo das negociações para a integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia foi um verdadeiro debate nacional, indispensável, de sensibilização e de informação do País. Terminadas as negociações em Bruxelas, ao cabo dê 8 longos anos, encerrados todos os dossiers sectoriais, que tanto nos preocuparam ao longo dos anos, preparamo-nos agora para a assinatura formal dó tratado de adesão, que espero possa ocorrer em Lisboa, entre fins de Maio, princípios de Junho próximos. O debate de agora antecede pois o debate formal que precederá a ratificação do tratado, feita por esta Assembleia da República, e que deverá ter lugar ainda na presente sessão legislativa, antes de férias, portanto.
Para Portugal trata-se de um virar de página histórico, de um imenso significado político, económico e social. Ninguém, o duvida hoje. Mas para a Comunidade Económica Europeia a entrada de Portugal e de Espanha não tem menor importância nem menor significado: o alargamento pressupõe como sempre defendi, o aprofundamento institucional de um novo fôlego para a Comunidade, acrescidas do contributo de duas culturas, que moldaram o génio europeu, e de dois idiomas que hoje são falados em três continentes por cerca de 450 milhões de seres humanos - 150 milhões o português e 300 milhões, o castelhano.
Encerrado o ciclo imperial da nossa história, feita a descolonização possível, com 20 ou mais anos de atraso sobre a restante Europa, reconquistada a democracia, Portugal, regressou, ao seu espaço europeu. Obrigado, pela forca das circunstâncias, a reestruturar o seu sistema de vida em termos políticos e económicos, houve hesitações, tergiversações e desvios; mas um grande projecto nacional logo se impôs e tem merecido, desde então, amplo consenso popular: a integração europeia. Porquê? Para fazer de Portugal um país economicamente moderno, socialmente justo e politicamente democrático - em termos e segundo padrões europeus ocidentais.. ...

Aplausos do PS e do PSD.

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Consenso que se exprimiu, no debate realizado nesta Assembleia, quando, em nome do I Governo Constitucional, tive a honra de subscrever o pedido de adesão à CEE, em 28 de Março de 1977, e que depois, foi sempre ratificado, com maior ou menor empenhamento, por todos os governos que se lhe seguiram, até ao actual. Nesse processo complexo e demorado, com tantas pausas, avanços e recuos, é justo destacar os esforços empreendidos pelo Primeiro-Ministro Sá Carneiro, já aqui referido, e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Freitas do Amaral, enquanto líderes, respectivamente, do PSD e do CDS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Boa gente!

O Orador: - Bem como agradecer e louvar o trabalho de todos quantos contribuíram para as negociações, em qualquer idos seus momentos e em particular. os excelentes negociadores da fase final, o Ministro Ernâni Lopes e o presidente da Comissão de Integração Europeia, António Marta.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

Sejam-me permitidas ainda duas referências, pelo significado de que se revestem: os esforços empreendidos pelo CDS, enquanto partido de oposição - e pelo seu actual líder Lucas Pires - junto dos seus congéneres europeus. E a palavra de apreço «aos agentes que responsavelmente conduziram e concretizaram o processo negociai» - cito - expressa publicamente pelo Sr. Presidente da República, considerando a adesão «um momento relevante e auspicioso para o nosso futuro, enquanto Nação».
Projecto nacional, portanto, sem qualquer dúvida, porque - como muito bem disse o Sr. Presidente da República:
«A adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia constitui um objectivo constantemente afirmado pelos agentes político» e forças, partidárias que ao longo dos últimos 9 anos viram os seus programas e as suas propostas sufragados pela larga maioria do povo português que assim deu, a tal objectivo, uma dimensão indiscutivelmente nacional.

É certo que o Partido Comunista sempre se lhe opôs...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Olhe que o PS também!

O Orador: - ...e continua a opor, o que aliás apenas sublinha o seu cada vez mais evidente isolamento político, em termos nacionais.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É um direito democrático que lhe assiste; mas é também mais um erro político que, de resto, os seus homólogos europeus tem vindo sucessivamente » a corrigir. Não virá longe o dia, estou seguro disso, em que para poderem politicamente sobreviver, os comunistas portugueses, nessa como noutras coisas, terão de se adaptar às novas exigências do tempo e ultrapassar os seus obsoletos preconceitos. Até lá, os seus deputados e quadros decerto não desdenharão ocupar os lugares que eventualmente lhes venham a caber no Parlamento Europeu e nas diferentes Comissões da CEE...

Aplausos e risos do PS e do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entramos na Europa por imperativo nacional, mas animados igualmente por um verdadeiro «espírito europeu». A Europa não é para nós tão-só um espaço económico de considerável dinamismo e com enorme capacidade de inovação tecnológica. Não é apenas um mercado de mais de 250 milhões de consumidores e de elevado potencial, que nos fica aberto e acessível. É também, e cada vez mais, um espaço social - de que falou recentemente no Parlamento Europeu François Mitterrand - baseado na solidariedade e na concertação, valores sem os quais será impossível resolver em concreto, no tempo de crise em que vivemos, os complexíssimos problemas que a necessária reestruturação industrial e agrícola impõem ao mundo do trabalho. E mais: a Europa é um pólo autónomo de desenvolvimento, entre as superpotências, sujeito ao desafio tremendo da modernização tecnológica, em competição com os Estados Unidos da América e com o Japão.
Entramos na Europa porque acreditamos no nosso destino europeu e porque desejamos que Portugal não fique à margem, irremediavelmente, da grande aventura científica e tecnológica deste final do século XX. Nesse sentido, desejamos que a Comunidade Económica Europeia seja mais do que um mercado comum, dotado de uma política agrícola comum. Estaremos com aqueles que quiserem avançar no caminho de uma Europa politicamente unida, espaço de diálogo, de liberdade e de invenção, com verdadeiras instituições comunitárias eficazes e com políticas comuns, designadamente a financeira e a de defesa; de uma Europa aberta sobre o mundo, especialmente sobre África e sobre a América Latina. Somos, além disso, a favor de uma comunidade, europeia dialogante com a outra Europa, a que não tem ainda voz suficientemente audível, e com a Europa da EFTA, a que nos ligam tão fundos e antigos laços, de solidariedade.
Portugal, país de antiquíssima cultura, com uma experiência ímpar de contacto, com povos de todas as latitudes, com tantas raízes culturais, linguísticas e afectivas dispersas pelo vasto mundo, país de diáspora e de convívio tolerante, está particularmente vocacionado para dar um contributo inestimável à nova Europa dos Doze.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Obviamente que vamos ganhar - e muito - como nação, com a integração europeia. Mas não devemos subestimar o nosso contributo, de dimensão muito maior do que comummente se crê. Temos que aprender a potenciar um e outro. Nisso consiste, para nós, o desafio europeu.
Vamos passar a participar, como parceiros de pleno direito, num mercado alargado que, em 1984, absorveu 58% das nossas exportações, (contra 10%, a EFTA).
Vamos poder defender em incomparavelmente melhores condições os direitos e interesses dos nossos emi-

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grantes europeus, que representam mais de 1 milhão de portugueses.. , .

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Vamos ter acesso às novas tecnologias e poder participar em grandes projectos de investigação científica aplicada.
Vamos ser «forçados» a modernizar as nossas estruturas retrógradas, para podermos resistir à concorrência, em termos competitivos, e a desburocratizar a nossa administração.
Vamos ver acrescido o interesse dos investidores estrangeiros, em relação a projectos portugueses, e em especial o dos americanos, japoneses e brasileiros, que aliás já começou, dado o pressuposto da nossa integração.
Vamos ter capacidade de cooperação acrescida com a África; principalmente a de fala oficial portuguesa, através de modelos tripartidos e joint ventures, tendo especialmente em conta a adesão desses países africanos ao Acordo de Lomé III.
Vamos ter novas e mais fáceis perspectivas de financiamento a fundo perdido, cerca de 8 milhões de contos por ano, durante 10 anos, para apoio à modernização da nossa agricultura - valores que implicam esforços da nossa parte, de pelo menos quantias iguais.
Vamos ter acesso aos fundos FEOGA (agricultura) e FEDER (desenvolvimento regional), cujos subsídios poderão também atingir valores muito elevados e a empréstimos em condições muito favoráveis - 1000 milhões de ECU para financiamento da nossa balança de pagamentos.
Finalmente, vamos poder participar nas estruturas e instituições comunitárias, com quadros portugueses numerosos e ter deputados no Parlamento Europeu. Caberão, com efeito, a Portugal 24 deputados do Parlamento Europeu designados, numa primeira fase, por esta Assembleia e depois eleitos directamente. Além de 1 comissário, 5 vogais no Conselho, 1 juiz no Tribunal de Justiça, 1 juiz no Tribunal de Contas, 12 membros no Comité Económico e Social, 3 membros no Comité Consultivo da CECA, 2 membros no Comité Científico do EURATOM, 1 membro no conselho de governadores e 1 membro no conselho de administração do Banco Europeu de Investimentos, enumeração que está longe de esgotar os cargos disponíveis para Portugal nos órgãos que asseguram as tarefas comunitárias.
Contudo, e apesar de todos estes benefícios, apenas sumariamente enumerados, não devemos considerar a integração europeia como mera panaceia, capaz de resolver automaticamente os nossos problemas estruturais. Não é. Tudo depende afinal do nosso esforço e capacidade colectiva. A integração representa um desafio, que tem de ser ganho, com determinação, criatividade e rigor, pelos nossos empresários, trabalhadores, quadros, cientistas, gestores e, sobretudo, pela juventude. Um novo futuro se abre agora e assim aos Portugueses que precisam de saber construir, com trabalho, persistência e amor. A última oportunidade, nas próximas décadas, de «apanhar o comboio do desenvolvimento» não será finalmente perdida, se os Portugueses assim o quiserem. Tudo depende de nós: temos agora um horizonte nacional de esperança, que importa saber concretizar, preservando a nossa identidade cultural e a nossa dignidade como Nação, muitas vezes secular.

Saliente-se que durante as negociações, como tem sido geralmente reconhecido, foi possível salvaguardar, em todas as circunstâncias, os interesses nacionais, designadamente em relação às pessoas e aos recursos próprios. Como resulta claro dos diferentes dossiers negociados, Portugal não cedeu em nenhum ponto essencial. Há assim razão bastante para nos congratularmos com os resultados obtidos, altamente satisfatórios para Portugal, como o fez, com independência e sentido de Estado, o Sr. Presidente da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Eça de Queirós dizia que a fronteira da Europa se situava nos Pirenéus. Caracterizava assim o atraso histórico dos povos peninsulares, em relação aos países de vanguarda da Europa, e a nossa secular e comum decadência a partir do século XVI. Nas últimas décadas, a Espanha, por circunstâncias diversas, e dada a ausência notória de guerras coloniais, avançou decisivamente em relação a Portugal. Seria trágico para o nosso povo que a fronteira da Europa se deslocasse e ficasse balizada por Valença, Vilar-Formoso e Vila Real de Santo António, com exclusão apenas de Portugal. Seria o nosso isolamento definitivo, irremediável, condenados a um ritmo de desenvolvimento muito lento ou à inevitável atracção em relação a outras zonas de influência, não tradicionais, com custos evidentes para a nossa identidade nacional.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

A opção europeia apresentou-se, pois, como a opção certa, no momento exacto - era bem tempo! -, fixando definitivamente o nosso quadro institucional democrático e permitindo-nos construir, para o povo português, um futuro de liberdade, de progresso, de justiça social e de modernidade.
Portugal e Espanha, países vizinhos, têm vivido ao longo dos séculos uma aventura muitas vezes comum, com histórias políticas quase sempre paralelas, mas nem por isso o seu entendimento tem sido satisfatório. Pelo contrário: os povos e as culturas têm-se frequentemente ignorado, coexistindo de costas um para o outro, quase sem comunicação. A integração na Europa dos Doze de Portugal e de Espanha, ao mesmo tempo, feita por razões que têm tanto de comum, ajudará seguramente a suprir ignorâncias, ressentimentos e complexos, de uma e outra parte, permitindo, estou seguro - disso, um novo e muito mais construtivo relacionamento entre ambas as nações peninsulares relacionamento entre si, face à Europa, que assim se reequilibra e reforça no seu flanco Sul, e face à América Latina. Essa é outra das vantagens, e não das menores, da integração.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal é um país de vocação, atlântica, que não enjeita. E tem interesses que derivam da história noutros continentes, que não pode deixar de assumir no momento presente. A integração na Comunidade Económica Europeia é complementar dessa vocação e potencializa-se, em alto grau, neste final do século XX. Não é contraditória com ela. Que os Portugueses, todos os Portugueses, o entendam, sem margem para qualquer dúvida.
Uma última palavra: Portugal nunca poderia ser membro de pleno direito da Comunidade Económica Europeia sem o 25 de Abril, que nos libertou de uma

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velha e retrógrada ditadura e que nos transformou a todos de súbditos em cidadãos de uma pátria livre.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

A integração europeia representa mais um passo - e decisivo - na caminhada democrática então iniciada. Em 11 anos ganhámos maturidade, aprendemos o valor da estabilidade política e social e temos agora o reconhecimento dos parceiros europeus que livremente elegemos, que nos dão a certeza de estarmos no bom caminho - na via da recuperação financeira e económica, da modernização e da democracia plena.
É tempo, pois, de sacudirmos o pessimismo, de ganharmos uma nova confiança em nós próprios, de recusarmos o catastrofismo permanente e o miserabilismo. Gozamos hoje de um prestígio internacional inegável. Tenhamos a coragem, de voltar a página. A integração europeia é a maior das reformas estruturais, no sentido em que a partir de agora comanda todas as outras. Preparemos a nossa juventude para os tempos novos que se avizinham de liberdade e de progresso. São eles, os jovens, que realizarão as nossas esperanças. Saibamos nós merecer aquilo que já conseguimos, com o sentido da dignidade nacional e da grandeza da Pátria.

Aplausos do PS, do PSD, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Sr s. Deputados, com a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, está, portanto, encerrado este debate sobre a CEE.
O Sr. Deputado Secretário vai anunciar a admissão de alguns diplomas.

O Sr. Secretário da Mesa (Leonel Fadigas): - Deu entrada na Mesa o pedido de ratificação n.º 149/III, da iniciativa do Sr. Deputado João Amaral e outros, do PCP, sobre o Decreto-Lei n.º 87/85, de 1 de Abril, que cria quadros de efectivos interdepartamentais em todos os departamentos ministeriais. Foi admitida.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima sessão plenária é na terça-feira, dia 16, às 15 horas, e tem período de antes da ordem do dia.
A primeira parte da ordem do dia é constituída pelos recursos do MDP/CDE e do PCP da decisão de admissão da proposta de lei n.º 102/III e, ainda, a eleição do Provedor de Justiça; a segunda parte é a continuação da agenda da semana passada.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amadeu Vasconcelos Matias.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Carlos Alberto da Mota Pinto.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
João Pedro de Barros.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
José Pereira Lopes.
José Vargas Bulcão.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Manuel Correia Lopes.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Basílio Adolfo Mendonça Horta Franca.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Luís Nogueira de Brito.
Manuel Jorge Forte Góes.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Francisco Alexandre Monteiro.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Manuel Azevedo Gomes.
Armando António Martins Vara.
João Rosado Correia.
José António Borba dos Reis Borges.
José Carlos Pinto Basto Mota Torres.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
Almerindo da Silva Marques.
António Gonçalves Janeiro.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João de Almeida Eliseu.
João do Nascimento Gama Guerra.
Jorge Lacão Costa.
José Manuel Niza Antunes Mendes.

Página 2843

13 DE ABRIL DE 1985 2843

José Maria Roque Lino.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando Manuel Cardoso ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
José Ângelo Ferreira Correia.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Georgete de Oliveira Ferreira.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Lino Carvalho de Lima.
Maria Margarida Tengarrinha.
Paulo Areosa Feio.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
António José Bagão Félix.
Horácio Alves Marçal.
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
José Miguel Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Manuel António Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

O REDACTOR, José Diogo.

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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