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DIÁRIO

da Assembleia da Republica

1 Série - Número 92

Sexta-feira, 14 de Junho de 1985

III LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

REUNIÃO PLENÃRIA DE 12 DE JUNHO DE 1985

Presidente: Ex.º Sr. Carlos Cardoso Lage

Secretários: Ex.ºs Srs. Leonel de Sousa Fadigas

José Mário de Lemos Damião
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 45 minutos.
Tendo sido apresentado pelo PS e PSD um projecto de resolução, relativo ao prolongamento do período normal de funcionamento da Assembleia da República até 15 de Julho, foi impugnada a sua admissibilidade por parte do PCP. Após intervenções dos Srs. Deputados João Amara! (PCP), Jorge Lacão (PS), Lopes Cardoso (UEDS), Vilhena de Carvalho (ASDI) e Cardoso Ferreira (PSD), foi o referido projecto de resolução retirado e em sua substituição foi apresentado, pelos mesmos partidos, um projecto de deliberação do mesmo teor, sobre o qual o PCP interpôs recurso da sua admissibilidade, em que intervieram os Srs. Deputados Jorge Lemos e João Amaral (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Jorge Lacão (PS/, Cardoso Ferreira (PSD), Raul Castro (MDP/CDE) e Nogueira de Brito (CDS).
Procedeu, finalmente, à discussão conjunta do projecto de deliberação do PS e PSD e de um outro entretanto apresentado pelo CDS, tendo o primeiro sido aprovado. Intervieram, a diverso titulo, os Srs. Depurados Nogueira de Brito (CDS), Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Raul Castro (MDP/CDE) e Jorge Lemos (PCP).
Concluiu-se o debate da ratificação n.º 133/III, do CDS, respeitante ao Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprovo o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, tendo sido aprovado o projecto de resolução n.º 53/III, do CDS, que visa suspender a vigência do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 16 de Dezembro, até à eventual publicação da lei que visa alterá-lo ou até à rejeição de todas as propostas de alteração apresentadas e que baixou à respectiva Comissão. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Raul Castro (MDP/CDE), Domingues Azevedo (PS), Portugal da Fonseca (PSD) e Nogueira de Brito (CDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Santos Meira.
António Manuel Azevedo Gomes.
António do Manuel do Carmo Saleiro.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Armando António Martins Vara.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Hândel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Luís Duarte Fernandes.
João Rosado Correia.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José António Borja dos Reis Borges.

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I SÉRIE - NÚMERO 92

José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto Basto Mota Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel Barros Barral.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Agostinho Correia Branquinho.
Amândio Domingues Basto Oliveira.
Alberto Augusto Faria dos Santos.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Anacleto Silva Baptista.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Augusto Seabra.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
Leonel Santa Rita Pires.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alexandre Carvalho Reigoto.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Filipe Neiva Correia.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.

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Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca. Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia. Francisco António Lucas Pires. Francisco Manuel de Menezes Falcão. Henrique Manuel Soares Cruz. Hernâni Torres Moutinho. João Gomes de Abreu Lima. João Lopes Porto. José Augusto Gama. José Luís Nogueira de Brito. Manuel António Almeida Vasconcelos. Manuel Jorge Forte Goes. Manuel Tomás Rodrigues Queiró. Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

Raul Morais e Castro.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António Poppe Lopes Cardoso. Francisco Alexandre Pessegueiro. Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho. Ruben José de Almeida Raposo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para, ao abrigo das disposições regimentais, solicitar a interrupção da sessão por 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Visto ser regimental, está suspensa a sessão.

Eram 15 horas e 46 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 16 horas.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para solicitar a interrupção da sessão por 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Está suspensa a sessão, Srs. Deputados.

Eram 16 horas e 1 minuto.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai enunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projectos de lei n.º 520/III, apresentado pelo Sr. Deputado Rui Picciochi e outros, do PS, relativo à alteração do Decreto-Lei n.º 494/79; 521/III, apresentado pelo Sr. Deputado Vasco Miguel e outros, do PSD, que diz respeito à região demarcada de vinhos do Oeste: 522/III, apresentado pelo Sr. Deputado Vasco Miguel e outros, do PSD, que diz respeito à zona do vinho leve do Litoral Oeste.
Deram igualmente entrada na Mesa as ratificações n.ºs 163/111, da iniciativa do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 163/85, de 15 de Maio, que define os princípios e estabelece as regras que condicionam o acesso e o exercício da actividade dos treinadores desportivos a qualquer que seja a modalidade desportiva no âmbito do desporto federado, 164/III, da iniciativa do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 164/85, de 15 de Maio, que estabelece os princípios fundamentais e as normas que regem as relações entre o Estado e os agentes desportivos, tendo como objectivo fundamental o desenvolvimento do desporto; 165/III, da iniciativa da Sr.ª Deputada Zita Seabra e outros, do PCP, ao Decreto-Lei n.º 185/85, de 29 de Maio, que extingue a Junta Central das Casas do Povo e revoga o Decreto-Lei n.º 392/80, de 24 de Setembro. Todos estes diplomas baixam às respectivas Comissões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido o projecto de resolução n.º 51/III, subscrito por deputados do PS e do PSD, sobre o prolongamento desta sessão legislativa.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - O presente projecto de resolução é do seguinte teor:

Nos termos legais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera prolongar o seu período normal de funcionamento até dia 15 de Julho, tendo em vista apreciar designadamente as seguintes matérias, respeitando a ordem de prioridades indicada:

1.ª Tratado de adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia;
2.ª Autorizações legislativas do Governo;
3.ª Votações finais a que haja lugar;
4.ª Legislação referente às autarquias locais (decretos-leis sujeitos à ratificação e lei da tutela);
5.ª Alterações pontuais às leis eleitorais e lei
eleitoral para o Parlamento Europeu;
6.ª Outras matérias que se revistam de especial urgência, designadamente acordos internacionais.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, foi distribuída aos diversos grupos parlamentares uma cópia do projecto de resolução, através da qual constato que tal diploma não foi ainda admitido pela Mesa, a menos que na versão que esta possui tenha havido despacho de admissão.
Nesse sentido, gostaria de questionar a Mesa sobre se há ou não despacho de admissão, pois caso isso não se verifique deveremos passar ao ponto seguinte da ordem do dia.

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I SÉRIE - Número 92

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, este projecto de resolução deu ontem entrada na Mesa e, por conseguinte vou consultar rapidamente os Srs. Secretários da Mesa a fim de saber o que é que se passa.

Pausa.

Sr. Deputado João Amaral, dos dados que possuo, a informação que posso dar é a seguinte: este projecto de resolução deu ontem entrada na Mesa às 19 horas e 30 minutos, o Sr. Secretário Roleira Marinho assinalou a entrada de tal diploma, o Sr. Presidente da Assembleia da República encontrava-se nessa altura numa conferência de líderes parlamentares onde se verificou convergência no sentido de admitir que até ao início do debate deste diploma pudessem dar entrada na Mesa outros projectos de resolução, havendo tacitamente - segundo depreendo - uma espécie de consenso no que se refere à sua admissão pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
Não sei se esta explicação é suficiente, mas a verdade é que não estou em condições de dar mais informações.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não questiono que na primeira parte da ordem do dia de hoje tenha sido inscrita a apreciação do projecto de resolução sobre o prolongamento da presente Sessão Legislativa até ao dia 15 de Julho próximo.
Contudo, a única coisa que pergunto é se o projecto de resolução foi admitido. aliás, a questão que coloco é muito simples e está muito circunscrita, pois só posso questionar o que foi admitido e, como V. Ex.ª sabe, não existe a figura da admissão tácita. O Regimento é expresso, como é expressa a admissão. Ora, se não há admissão expressa, não há admissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, estou de acordo com V. Ex.ª No entanto, acabo de suprir essa lacuna admitindo eu próprio o diploma, e faço-o reportando-me ao que se passou na sessão de ontem e, em particular, na conferência de líderes parlamentares, cujo relato me foi transmitido pelo Sr. Secretário Lemos Damião.
Creio, pois, que nestas circunstâncias, e tendo eu já assinado a admissão do projecto de resolução, esse problema formal já se encontra ultrapassado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. (Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? É para se pronunciar sobre esta questão prévia ou sobre o conteúdo do diploma?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para me pronunciar sobre esta questão prévia um pouco no seguimento das palavras produzidas pelo Sr. Deputado João Amaral e um pouco para aditar uma questão nova, mas que também é uma questão prévia.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em momentos diversos deste, mas também a propósito de deliberações que a Assembleia

tinha de tomar sobre o prolongamento dos seus trabalhos, já se entendeu - e sobre esse entendimento fez-se doutrina, aliás, admitida por consenso e unanimidade dos grupos parlamentares - que as matérias relativas à deliberação do prolongamento dos trabalhos parlamentares e, designadamente, a marcação da ordem de trabalhos referente a esse prolongamento tinham carácter interno à Assembleia da República e não eficácia externa, como bem se compreende.

Nesse sentido, os grupos parlamentares já optaram, no passado, por considerar que estas deliberações tinham tecnicamente o valor de deliberações e não de resoluções. Por isso mesmo, quando noutros momentos debatemos questões similares à actual, foi possível introduzir na Mesa, e no próprio momento dos debates, projectos que vieram a ser votados pela Câmara, tendo sido imediatamente admitidos pela Mesa no acto de propositura.
Portanto, na decorrência das palavras produzidas pelo Sr. Deputado João Amaral, para simplificar qualquer processo formal de admissibilidade pela Mesa e para dar a este acto o mesmo valor técnico que já teve noutros momentos, aliás de acordo com o nosso Regimento, proponho à Mesa que transforme este projecto de resolução num projecto de deliberação com eficácia interna, como compete a actos similares já anteriormente praticados pelo Parlamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Segundo fui informado pelo Sr. Presidente, a Mesa admitiu o projecto de resolução n.º 51/III, admitiu portanto um projecto de resolução e não o vai transformar noutra coisa.

Desde já, gostaria de adiantar que, em relação ao projecto de resolução n.º 51/III que a Mesa admitiu, o meu grupo parlamentar vai precisamente apresentar um recurso sobre o acto de admissão. A questão está fechada a partir do momento em que a ordem de trabalhos tem conteúdo definido - projectos de resolução - e a partir do momento em que a Mesa admitiu o que aqui está como projecto de resolução.

É precisamente nesse quadro que vou apresentar à Mesa um recurso de admissão do projecto de resolução, pedindo que se sigam os trâmites subsequentes de acordo com o Regimento.

O Sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra a mais algum Sr. Deputado, vamos tentar pôr um ponto de ordem no nosso debate a fim de clarificarmos um pouco as questões.

O Sr. Deputado Jorge Lacão propôs à Mesa que transformasse o projecto de resolução em projecto de deliberação. Portanto, solicito a este Sr. Deputado que, se assim o entender, faça chegar à Mesa o projecto de deliberação que substituirá o projecto de resolução assinado por deputados do PS e do PSD.

O Sr. Deputado João Amaral acaba de interpor recurso da decisão da Mesa admissão do projecto de resolução que ainda não foi retirado. Portanto, esse recurso é totalmente pertinente e seguir-se-á o respectivo debate, se o projecto de resolução não for retirado.

Pausa.

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Srs. Deputados, devo anunciar que deu entrada na Mesa um recurso sobre a admissão do projecto de resolução n.º 51/III. A Mesa esteve a apreciar o teor deste, admitiu-o e vai proceder à sua leitura.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - O recurso interposto pelo PCP é do seguinte teor:

Considerando que o projecto de resolução apresentado conjuntamente por deputados dos Grupos Parlamentares do PS e do PSD relativo ao prolongamento do período normal de funcionamento da Assembleia da República até 15 de Julho viola o disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 179. º da Constituição da República, ao abrigo do artigo 134. º do Regimento, os deputados do Grupo Parlamentar do PCP impugnam a decisão de admissão, requerendo, nos termos regimentais, a baixa à Comissão competente a restantes trâmites processuais aplicáveis.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Visto ter-me sido difícil acompanhar a leitura do recurso relativo ao projecto de resolução que deu entrada na Mesa, solicito a esta que me esclareça sobre quais os artigos da Constituição e do Regimento que foram invocados.

O Sr. Presidente: - Foram os n.ºs 1 e 3 do artigo 179.º da Constituição da República e o artigo 134.º do Regimento.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, suponho que o recurso está admitido nos termos em que foi apresentado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já disse que o recurso foi admitido.

O Orador: - Então, porque foi admitido nos termos em que foi apresentado, ter-se-á de seguir o dispositivo no artigo 134. º do Regimento e respectivos números.
Se V. Ex.ª me permite, farei uma breve fundamentação do recurso, sem prejuízo de se seguir o disposto no artigo 134.º do Regimento, nomeadamente no seu n.º 1 que manda seja consultada a Comissão respectiva.
A fundamentação em relação à inconstitucionalidade resulta de dois factos: o primeiro é que, nos termos do ri.º 1 do artigo 179. º da Constituição, a ordem do dia é fixada pelo Presidente da Assembleia da República seguindo a prioridade de matéria definida no Regulamento...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, eu não lhe concedi a palavra para fundamentar o recurso, estava apenas a verificar, sob o ponto de vista constitucional e regimental, se o podia fazer e a interpretação que a Mesa tem é precisamente a de que essa fundamentação já consta do próprio texto e portanto o Sr. Deputado não a pode fazer oralmente.

O Orador: - Portanto, a opinião de V. Ex. e é no sentido da baixa à Comissão...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nestas circunstâncias não lhe posso dar a palavra para fundamentar o recurso.
Quanto à baixa à Comissão ela parece-me ser imperativa pelos comandos constitucionais e regimentais, mas naturalmente que estou aberto a ouvir argumentos de todas as bancadas sobre o assunto.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, vejo-me na necessidade de recolocar alguns argumentos que há pouco invoquei. A Mesa dispõe neste momento de um requerimento assinado por deputados do PS e do PSD em que se solicita a transformação do projecto de resolução n.º 51/III num projecto de deliberação.
Tive já a oportunidade de aduzir as razões justificativas desta atitude: como afirmei há pouco a verdade é que toda a prática regimental da Assembleia da República até ao momento concretizada em matéria de deliberações tomadas quanto ao prolongamento de sessões legislativas e designadamente quanto à marcação provável da ordem de trabalhos que deveria corresponder a esse prolongamento da sessão legislativa foi tomada por deliberação e não por resolução.
Curiosamente, da última vez que esta questão esteve em debate foi a bancada do PCP que mais freneticamente se bateu para que a maioria transformasse o projecto de resolução então apresentado em projecto de deliberação e referiu tais argumentos...

O Sr. João Amaral (PCP): - Que vos convenceu!

O Orador: - ... que, sendo eles judiciosos à luz da Constituição e do Regimento, fizeram ponderar a maioria no sentido de que o projecto de resolução inicialmente apresentado, na mesma sessão em que estava a ser debatido, viesse efectivamente a ser alterado para projecto de deliberação.
O que está marcado na nossa ordem de trabalhos tem como objecto essencial uma deliberação sobre o prolongamento ou não prolongamento da presente Sessão Legislativa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Seja rigoroso!

O Orador: - Quanto á forma técnica de concretizar essa deliberação essa é uma questão de somenos importância relativamente à fixação da ordem de trabalhos.

A ordem de trabalhos não está, portanto, minimamente em causa. Em primeiro lugar, não há qualquer alteração da ordem de trabalhos marcada para hoje; existe tão-só um requerimento que hoje apresentámos na Mesa e que visa transformar o projecto de resolução em projecto de deliberação. E, em segundo lugar, devo dizer que a bancada do PCP argumenta contra si própria quando agora pretende colocar esta questão em termos de resolução quando sabe que tecnicamente se trata de uma deliberação com eficácia interna. Porque prolongar a Sessão Legislativa e apontar as matérias a debater nesse período são actos sem eficácia externa.

Nestes termos pedimos à Mesa que admita o requerimento apresentado pelos deputados do PS e do PSD. Uma vez admitido, votá-lo-emos e, caso seja aprovado,

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o projecto de resolução passará a projecto de deliberação, não havendo assim necessidade de consulta prévia a qualquer comissão especializada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Rúben Raposo (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu agora entrada na Mesa um requerimento, que vai ser lido.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - O referido requerimento é do seguinte teor:

Requer-se à Mesa que considere como sendo de deliberação o projecto de resolução apresentado sob o n.º 51/III.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Vilela de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, não pedia palavra para interpelar a Mesa. Pedi a palavra julgando que podia usar dela nos termos do n.º 5 do artigo 87.º do Regimento que diz que na discussão de qualquer recurso, como o que aliás foi interposto pelo PCP, qualquer grupo ou agrupamento parlamentar pode usar da palavra por 3 minutos.
A minha intenção era, ao abrigo do disposto no Regimento e se o Sr. Presidente assim entendesse, pronunciar-me exclusivamente sobre dois pontos...

O Sr. Presidente: - Um momento só, Sr. Deputado, estamos perante matéria de difícil e subtil interpretação regimental pelo que lhe peço que aguarde uns momentos.

O Orador: - A minha intervenção é precisamente para ajudar, Sr. Presidente.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, a interpretação que a Mesa faz do artigo 97.º é que ela tem a ver com as deliberações da Mesa.

O Orador: - Tem a ver com o recurso, Sr. Presidente. A epígrafe diz: «Recursos».

O Sr. Presidente: - Mas não com recursos no quadro do processo legislativo, são recursos de decisões da Mesa.

O Orador: - É isso. Essa é precisamente a questão que quero levantar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que estamos num terreno bastante fugidio. Dou-lhe a palavra para interpelar a Mesa.

O Orador: - Sr. Presidente, a minha interpelação é para perguntar à Mesa se entende ou não - e adianto desde já o meu entendimento que é o seguinte: julgo que sim - que ao caso vertente se aplica o artigo 87.º do Regimento e não o artigo 134.º? É que há recursos e recursos. Se trata de um recurso de admissibilidade de um projecto ou de uma proposta de lei aí, sim, há necessidade de baixar à respectiva Comissão para a respectiva elaboração do parecer.

Ora, isto foi o que pretendeu o Sr. Deputado João Amaral, quando ele bem sabia - e faço a justiça de lhe reconhecer que bem sabia - que o projecto de resolução ou de deliberação apresentado não se tratava nem de um projecto de lei nem de uma proposta de lei em relação à qual tivesse recaído um despacho do Sr. Presidente da Mesa.

Assim sendo, não é o artigo 134. º que se aplica, não tendo qualquer comissão a ver com o assunto. O artigo que se aplica é o artigo 87. º . É legítimo o recurso interposto e sobre ele entendo que esta Assembleia deve pronunciar-se através de votação.

Por outro lado, para além deste elemento de ordem regimental, gostaria também de colocar à Mesa uma questão ética: ontem, na conferência de líderes, que contava com a presença de um representante do Grupo Parlamentar do PCP, não só não foi levantada qualquer questão quanto ao agendamento e discussão deste projecto de resolução e quanto ao consenso estabelecido no sentido de não se entrar na discussão de qualquer outro ponto da ordem do dia enquanto este não estivesse esgotado, como foi ainda aceite pelos demais representantes dos outros grupos e agrupamentos parlamentares que tanto o PCP como qualquer outro grupo ou agrupamento parlamentar teria o direito de apresentar as propostas de alteração que entendesse a este projecto de resolução, que era conhecido de todos e fora apresentado e subscrito por deputados do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar a Mesa e dizer o seguinte: quando, em sede de conferência, foi colocada a questão, da parte do PS e do PSD, de não haver reunião na sexta-feira e de, não havendo reunião na sexta-feira, se abrir hoje um ponto relativo ao prolongamento da Sessão Legislativa não fomos nós que colocámos qualquer obstáculo.

Obviamente, não o colocámos porque, além do mais - o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho bem compreenderá isso -, sempre poderia haver reunião na sexta-feira com o decurso dos prazos regimentais para discutirmos esta matéria. Quanto a esse problema estamos resolvidos.

Ontem, na conferência, não se estava a discutir materialmente o conteúdo dos projectos de resolução, não se estava a verificar a sua conformidade constitucional e regimental, Estava-se, sim, a abrir um certo ponto na ordem de trabalhos e mais nada.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, olhos nos olhos lhe digo que da nossa parte o que houve foi a consideração de que, havendo um interesse real da parte do PS e do PSD para que não existisse a reunião de sexta-feira, que aliás estava combinada, e sendo necessário, nessa medida, um consenso para ser aberto este ponto, nós, da nossa parte, dissemos «de acordo», abra-se esse ponto na ordem do dia e vamos ver o que é que aparece. Essa é a primeira questão.

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Em segundo lugar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, admito que da parte do Sr. Deputado Jorge Lacão exista uma memória suficiente para saber como é que esta questão tem sido discutida e que posições têm sido assumidas - aliás, numa das últimas discussões, interveio o Sr. Presidente que na altura se encontrava a dirigir os trabalhos da bancada do Partido Socialista.
Mas a questão é esta: é que eu não posso recorrer de um projecto de deliberação se ele me aparece como um projecto de resolução. Ele apareceu-me aqui como projecto de resolução, logo é como projecto de resolução que o impugno e faço-o, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, nos termos do artigo 134.º do Regimento. 15to porque é nos termos do artigo 134.º do Regimento que tenho de impugnar a admissibilidade dos projectos de resolução, tal como foi feito aqui em relação ao acordo das Lajes e ao acordo laboral.
De facto, é nos termos do artigo 134.º do Regimento que impugno a admissão de projectos de resolução, que são projectos com eficácia externa.
Poder-me-ão dizer: mas este não é um projecto com eficácia externa, este é só um projecto com eficácia interna e, portanto, deve ser requalificado. Então os seus autores que o requalifiquem.
A Mesa já o admitiu como projecto de resolução e já admitiu o meu recurso. VV. Ex.ªs, se quiserem retirem o projecto de resolução - e sendo retirado o projecto de resolução cairá naturalmente a nossa impugnação - e façam distribuir um projecto de deliberação, se tiverem imaginação para isso, o que suponho que, apesar de tudo, não é pedir nada de extraordinário pois não é preciso muito.

Tudo visto e ponderado, o que temos neste momento é um projecto de resolução admitido pela Mesa e um recurso também admitido pela Mesa. Sendo assim, eu, Sr. Presidente, não posso deixar de lhe pedir a palavra para alegar em fundamento do recurso que apresentei, a menos que alguma coisa mude e isso só poderá acontecer por acção do PS e do PSD, ex-coligados, novamente coligados, talvez coligadíssimos agora nesta do prolongamento da presente sessão em termos tão obtusos que convirá uma explicação bastante, suficiente e aprofundada que ainda foi dado até este momento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer algumas considerações a propósito de uma afirmação que o Sr. Deputado João Amaral fez, contestando a argumentação do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, no sentido de que o que ficou ontem por consenso acordado na conferência de líderes teria sido a suspensão do prazo das 48 horas que o Regimento impõe, desde que houvesse acordo no sentido de poderem surgir aqui outras propostas acerca da mesma matéria. Portanto, não estaríamos a discutir a parte substantiva, mas tão só a iniciativa.
Em relação a esta questão, convém dizer que ao mesmo tempo que este projecto foi entregue foi também fornecido aos deputados presentes na conferência de líderes, nomeadamente ao Sr. Deputado Jorge Lemos do Partido Comunista que se encontrava presente, um texto do projecto de deliberação assinado e subscrito pelo PS e pelo PSD.
Portanto, não pode o Sr. Deputado vir agora dizer que não tinha dele conhecimento e se tivesse objecções teria sido perfeitamente razoável que as tivesse posto logo na altura.
Assim, o Sr. Deputado arranjará as argumentações que muito bem entender, mas o que é facto é que nós, com a maior normalidade, demos desde logo inclusivamente conhecimento do conteúdo do projecto.
Portanto, o Sr. Deputado não pode agora vir transformar esta questão como se tivesse surgido aqui uma autêntica caixinha de surpresas ou um projecto de deliberação perfeitamente surpreendente.
Já ontem V. Ex. ` tinha conhecimento do seu teor, pelo que terá de ser mais imaginoso na argumentação que expende, mas não será seguramente assim que poderá contestar os argumentos irrefutáveis do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Quem tem de ser mais imaginoso é o Sr. Deputado!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, fui citado pessoalmente e gostava de, em nome da minha bancada, uma vez que a representava ontem na conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, trazer um elemento que creio que pode clarificar o debate.

O Sr. Presidente: - Pretende usar da palavra para interpelar a Mesa?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para dar explicações.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª sabe que não pode usar a palavra para dar explicações.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Então usarei da palavra ao abrigo do direito de defesa, uma vez que o meu nome foi citado.

O Sr. Presidente: - Visto que invoca o direito de defesa, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que o PS e o PSD, com alguma ajuda do Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, parece que estão a querer complicar o que, de facto, é simples.
Ontem, na conferência de líderes dos grupos parlamentares, o que se tratou foi, com base numa proposta do PS e do PSD, de responder à situação de não haver sessão na sexta-feira. Ou seja, sendo hoje o último dia antes do prazo terminas do período normal de funcionamento da presente Sessão Legislativa, tratava-se da questão de poder ou não ser aberto um ponto para que a Assembleia deliberasse no sentido de prolongar os seus trabalhos.
Quanto a esse ponto creio que, por consenso, chegámos ao entendimento de que não havia objecções a que discutíssemos essa matéria hoje.

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No entanto, já perto do fim da conferência, o Sr. Deputado Cardoso Ferreira distribuiu uma cópia do documento que hoje foi qualificado como projecto de resolução e, logicamente, não pediu a opinião ao Grupo Parlamentar do PCP, nem nós teríamos, nessa altura, de nos pronunciar, sobre o documento. O Sr. Deputado Cardoso Ferreira deu-nos apenas a conhecer um documento.
Logicamente, se trata de um diploma que viola normas da Constituição, a altura própria para impugnar a sua admissibilidade é na primeira reunião do Plenário depois do diploma em causa ter sido admitido.
Na verdade, um documento não admitido e apresentado numa conferência apenas a título informativo não tem de merecer, da parte de qualquer representante partidário, qualquer tipo de comentário sobre o seu conteúdo, nem se é inconstitucional ou não. Foi apenas indicativamente que V. Ex.ª distribuiu o documento.
Portanto, creio que sobre isso estamos conversados e não vale a pena continuarmos «a chover sobre o molhado» - permitam-me a expressão.
Neste momento creio que o que os senhores têm de fazer é, das duas uma, ou insistem em manter o vosso projecto de resolução que foi já, aliás, admitido pela Mesa, e então o nosso recurso seguirá os trâmites normais do artigo 134.º do Regimento, ou VV. Ex.ªs retiram o projecto de resolução, acção essa que faz caducar todo o processo de recurso, apresentam um projecto de deliberação e seguir-se-á a discussão relativa a esse projecto.
Para facilitar as coisas, creio que isto é o que VV. Ex.ªs terão de resolver e não nós, logicamente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra a qualquer dos Srs. Deputados inscritos, a Mesa, tudo considerado e ponderado, considera que o documento foi admitido como projecto de resolução e, portanto, aplicam-se-lhe o artigo 134.º do Regimento. Por conseguinte, o projecto sofrerá a tramitação que consta deste artigo do Regimento. Trata-se da opinião unânime da Mesa, que dá essa questão como encerrada.
Entretanto, devo anunciar que há momentos deu entrada na Mesa um requerimento que vem assinado por deputados do PS e do PSD e que vai ser lido.

O Sr. Secretário (Lemos Damião):

- O referido requerimento é do seguinte teor:

Requer-se à Mesa que considere como sendo de deliberação o projecto de resolução apresentado sob o n.º 81/III.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não pode proceder a esta transformação. Compete aos Srs. Deputados autores do projecto de resolução, substituí-lo por outro diploma.
A Mesa não tem competência para fazer essa modificação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pediram a palavra os Srs. Deputados Jorge Lacão, João Amaral, Raul de Castro e Lopes Cardoso.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, como aliás compete, gostaria de chamar a atenção da Mesa para o seguinte: quando os deputados abaixo assinados apresentaram o citado requerimento, fizeram-no de acordo com o espírito e a letra do artigo 86. º do Regimento.
O n.º 1 do artigo 86.º do Regimento diz o seguinte:

São considerados requerimentos apenas os pedidos dirigidos à Mesa respeitantes ao processo de apresentação, discussão e votação de qualquer assunto ou ao funcionamento da reunião.

No caso vertente trata-se, manifestamente, de um processo de apresentação de um assunto. O que significa que os deputados que inicialmente apresentaram um projecto de resolução entendem agora - e pedem à Mesa que o entenda a partir desse requerimento que não se trata de um projecto de resolução, mas de um projecto de deliberação.
Sr. Presidente, pergunto se a Mesa tem dificuldades em ser ela, de acordo com o requerimento apresentado, a tomar a iniciativa - mas, repito, de acordo com o requerimento - de transformar um projecto de resolução em projecto de deliberação. Antes de continuar as minhas considerações, peço já ao Sr. Presidente que me confirme isso, porque os subscritores do projecto de resolução não têm dúvidas - e já está aqui na bancada dactilografado e subscrito um outro diploma nesse sentido - em trocar o documento por outro onde apenas se muda uma palavra.

Vozes do PCP: - Tanto tempo!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Tal é a sua teimosia!

O Orador: - Como se trata de uma questão meramente formal é óbvio que isto resulta não apenas de uma questão de interpretação do Regimento, mas também da má vontade e da obstrução sistemática da bancada do Partido Comunista.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Ilda (Figueiredo (PCP): - Quem está a obstruir os trabalhos é o senhor!

O Orador: - Limito-me a perguntar ao Sr. Presidente o seguinte: de acordo com o nosso requerimento, a Mesa considera-se em condições de transformar o projecto de resolução em projecto de deliberação? Se a resposta for afirmativa, o problema está ultrapassado, se a resposta for negativa, entregarei na Mesa a substituição do texto por outro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, já lhe dei antecipadamente a resposta: a Mesa não tem competência para fazer essa modificação.

O Orador: - Sr. Presidente, então, permita-me que continue os meus considerandos e no final entregarei na Mesa a substituição do projecto de resolução por um projecto de deliberação. E permita-me que continue porque antes de mais quero chamar a atenção para o seguinte: do primeiro ponto da ordem de trabalhos consta um projecto de resolução sobre o prolongamento da presente Sessão Legislativa. O que significa que a primeira parte da nossa ordem de trabalhos trata de

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uma tomada de posição da Assembleia da República sobre o prolongamento ou não da actual Sessão Legislativa. É isso que está em causa.
Já sucedeu que também noutros momentos se alterou, por questões meramente formais e regimentais, um projecto de resolução num projecto de deliberação, que é o que vai fazer-se.
Assim, espero não ter de ouvir, mais uma vez, da parte da bancada do Partido Comunista, argumentos contra ela própria quando considera que a forma regimental correcta é um projecto de deliberação e quando noutros momentos acabou por aceitar pacificamente um projecto de deliberação.
Espero, sinceramente, não ter de ouvir mais obstruções regimentais que outra coisa não visam senão dificultar o normal decurso dos trabalhos parlamentares.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não diga isso!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, a Mesa aguarda a entrega do projecto de deliberação.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, desejamos dizer que o nosso entendimento do que está contido no ponto n.º 1 da ordem de trabalhos é a questão do prolongamento.
O Sr. Deputado Jorge Lacão pode esta tranquilo, embora esteja desatento...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Depois erra!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - E atrasa os trabalhos!

O Orador: - Exactamente, depois erra! Mas, como dizia, pode V. Ex.ª estar tranquilo que ninguém vai questionar a entrega do projecto de deliberação.
No entanto, não nos impute a nós os seus próprios erros.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E o seu erro foi apresentar um projecto de resolução em vez de apresentar um projecto de deliberação. Corrigisse-o mais cedo e teríamos ganho tempo e teríamos resolvido esta questão há muito mais tempo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Rau1 Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece que já depois de morta a coligação ressurgiu mais uma vez, com este projecto de resolução que agora mudou para projecto de deliberação, para complicar aquilo que é simples e fácil.
A coligação ressurgiu, amanhã está prevista a saída dos membros do PSD do Governo, mas parece que ainda ontem, ao fim da tarde, a maioria, ou seja, a ex-maioria se entendia para apresentar este projecto de resolução.
Quanto a nós, Sr. Presidente, entendemos que é fundado o recurso que foi apresentado porquanto o projecto de resolução poderia ser simples se limitasse

a traduzir aquilo que penso ser opinião unânime de todas as bancadas, isto é, propondo a prorrogação dos trabalhos parlamentares até ao dia 15 de Julho.
Antes de continuar devo dizer que se me levantou agora uma dúvida: julgo, Sr. Presidente, que estará ainda em causa o recurso do PCP; é que tive de me ausentar para falar com o Sr. Presidente da Assembleia...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, neste preciso momento já não é assim, visto que deu entrada na Mesa um projecto de deliberação, mas evidentemente que não quero cortar-lhe a palavra.

O Orador: - Sr. Presidente, mas mantém-se ou não o recurso apresentado pelo PCP?

O Sr. Presidente: - O recurso cai porque a iniciativa cai também.

O Orador: - Como?! ...

O Sr. Presidente: - Caindo a iniciativa cai automaticamente o recurso.

O Orador: - Bom, pelo texto que possuo parece que se trata do mesmo.
Sr. Presidente, gostaria de saber se o projecto de deliberação, além do título, é ou não inteiramente igual ao projecto de resolução?

O Sr. Presidente: - Exactamente, Sr. Deputado, mas se me der oportunidade vamos transmitir o seu conteúdo à Assembleia.

O Orador: - Então, eu aguardo e depois pedirei a palavra para intervir no debate do projecto.

O Sr. Presidente: - Está certo, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, acaba de entrar na Mesa um projecto de deliberação com o mesmo conteúdo do projecto de resolução e, assim, dispensamo-nos de o estar a reler. O projecto foi admitido e está em curso a sua distribuição.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, para facilitar o andamento dos trabalhos, solicitaria a V. Ex.ª a seguinte informação: o teor do projecto de deliberação que V. Ex. e enunciou e que estará a ser distribuído é exactamente igual ao do projecto que tinha sido apresentado como projecto de resolução n.º 51/III?

O Sr. Presidente: - Excepto, naturalmente, na qualificação do diploma e na data.

O Orador: - Sr. Presidente, então anunciamos, desde já, que vamos entregar na Mesa, ao abrigo das disposições regimentais, um recurso da admissibilidade do referido projecto de deliberação e sua inscrição para discussão.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já faz parte da nossa tradição parlamentar terminar a Sessão Legislativa nestas circunstâncias.
Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um recurso do Partido Comunista Português sobre o projecto de deliberação que está em curso de distribuição e ainda um projecto de deliberação do CDS, que vão ser lidos na ordem por que foram anunciados.

Foram lidos. São os seguintes:

Recurso

Considerando que o projecto de deliberação apresentado conjuntamente pelos Grupos Parlamentares do PS e do PSD relativo ao prolongamento do período normal do funcionamento da Assembleia da República até 15 de Julho viola o disposto no artigo 179.º n.ºs 1 e 3 da Constituição da República, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, recorrem da decisão da sua admissão e inscrição na ordem do dia da reunião plenária de 12 de Junho.

Projecto de deliberação

Nos termos legais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera prolongar o seu período normal de funcionamento até ao dia 15 de Julho de 1985, tendo em vista apreciar as matérias que vierem a ser fixadas nos termos do Regimento.

O Sr. Presidente: - Quanto ao recurso interposto pelo Partido Comunista segue-se, agora, sim, na minha opinião, os trâmites do artigo 87.º do Regimento, que diz no n.º 1 que:

Qualquer Deputado pode recorrer das decisões do Presidente ou da Mesa.

e no n.º 2 que

O Deputado que tiver recorrido pode usar da palavra para fundamentar o recurso por tempo não superior a 3 minutos.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, em ordem a facilitar os trabalhos, quero referir que foi apresentado um projecto de deliberação subscrito pelo CDS, que pode ou não ser admitido pela Mesa. Se ele for admitido pela Mesa, é de presumir que o PCP apresente, em relação a essa admissão, um recurso com o mesmo conteúdo do que apresentou agora.
Sendo assim, penso que a Mesa devia dizer se admite ou não esse projecto de deliberação e, em caso afirmativo, votávamos o recurso do PCP em conjunto, para evitar votar-se dois recursos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Penso que a interpelação feita pelo Sr. Deputado José Luís Nunes se justifica inteiramente.
Como a Mesa admitiu o projecto de deliberação subscrito pelo CDS, a questão que se coloca agora é a de saber se o Partido Comunista faz incidir sobre esse projecto de deliberação algum recurso.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, para se pronunciar sobre esta matéria.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de deliberação subscrito pelo CDS, salvo lapso de audição, limita-se a dizer que a Assembleia prolonga os seus trabalhos até 15 de Julho e que exercerá as suas competências constitucionais e regimentais.
Se é isto, devo dizer que o projecto de deliberação do CDS não padece de nenhum vício de inconstitucionalidade mas de um outro mal grande - talvez seja um mal do CDS! -, que é o de não ter percebido bem qual é a situação política em que estamos. É, portanto, uma questão política, no entanto ele não padece de vícios de inconstitucionalidade.

Nessa medida, podemos dizer, desde já, que o texto do projecto de deliberação subscrito pelo CDS é impugnável politicamente mas já não o é constitucional e regimentalmente e, por isso, não há lugar para a apresentação de qualquer recurso.

O Sr. ]Presidente: - Nestas circunstâncias, e para economizarmos tempo, pergunto aos Srs. Deputados do Partido Comunista se ainda querem, ao abrigo do n.º 2 do artigo 87.º do Regimento, fundamentar o recurso que apresentaram.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra para esse efeito.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito brevemente, pois o Regimento só me concede 3 minutos, direi que o projecto de deliberação apresentado - estranhamente, diga-se - pelo PS e pelo PSD é inconstitucional em dois pontos: em primeiro lugar, porque, procurando obrigar a uma ordem de prioridades, tal como consta nesse projecto de deliberação - e passo a citar, «[...], respeitando a ordem de prioridades indicada», viola o disposto no artigo 179. º, n.º 1 da Constituição, que diz que é ao Presidente da Assembleia da República que cabe o poder de fixar a ordem do dia «[...], segundo a prioridade de matérias definidas no Regimento»; em segundo lugar, porque, contendo uma forma encapotada de limitação do exercício de competências da Assembleia, exclui o direito à determinação da ordem do dia de um certo número de reuniões por parte dos partidos aqui representados, designadamente por parte dos partidos minoritários. Ele é, portanto, inconstitucional nestes dois pontos.

Mas o projecto de deliberação apresenta-se ainda como uma monstruosidade que importa assinalar: é provocatório, porque se estende a 15 de Julho, ou seja, depois de 14 de Julho - e todos os Srs. Deputados

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sabem o que é que isso quer dizer -, sendo certo que 15 de Julho é uma segunda-feira e que nunca os prolongamentos dos trabalhos da Assembleia foram feitos de forma diferente que não tivessem em atenção o que, comummente é designado, como a «semana parlamentar».
O projecto de deliberação é também impudico, porque é apresentado por uma coligação que não existe, assim como é esdrúxulo porque quer meter todas as matérias que quer meter até 15 de Julho.
Pergunto: isso não será perigoso, dado que abre caminho a autorizações legislativas? Não as podem alterar para matérias que, ao fim e ao cabo, também estiveram na mesa das negociações e sobre as quais há entendimento, pois só não há entendimento quanto à candidatura presidencial? Há entendimento quanto ao «pacote laboral», quanto ao «pacote agrícola», etc.
O projecto de deliberação é também omisso, quando deixa de referir matérias que têm interesse, como, por exemplo, a criação de freguesias e outras.
O projecto de deliberação é ainda abusivo, quando quer pôr uma Assembleia moribunda, como esta é, e sem legitimidade a autorizar a ratificação de uma adesão à CEE, ou seja, de uma decisão fundamental para o País tomada por quem não tem responsabilidade, por quem, neste momento, já não tem capacidade para assumir as responsabilidades com que está a tentar vincular o País.
Porque é inconstitucional e por tudo o mais que eu disse, penso que o projecto de deliberação não deve ser admitido, deve ser rejeitado e, por isso, devemos passar aos pontos seguintes da ordem de trabalhos e, concretamente, quando, na altura devida, a Comissão Permanente, nos termos do respectivo Regimento, reunir que o faça para tomar as deliberações que, na altura devida, terá de tomar sobre uma Assembleia moribunda como esta é.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, pedi a palavra, no entanto, tomo a liberdade de solicitar à Mesa que me ajude a situar no debate, porque me perdi um pouco.
Queria, pois, saber se, neste momento, estamos a discutir o recurso do Partido Comunista ou se estamos a discutir o projecto de deliberação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, estamos a discutir o recurso interposto pelo Partido Comunista, tendo em vista a decisão da Mesa de admitir o projecto de deliberação subscrito por deputados do PS e do PSD.
Pretende, então, usar da palavra, Sr. Deputado Lopes Cardoso?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Se o Sr. Presidente me permite usarei da palavra para me pronunciar sobre o recurso apresentado pelo Partido Comunista.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votaremos contra o recurso interposto pelo Partido Comunista porque temos do projecto de deliberação uma leitura diferente da do PCP.

Não entendemos que o projecto de deliberação, tal como está formulado, venha a preterir, nem isso seria possível, os comandos constitucionais e regimentais de fixação das ordens do dia.
Suponho que não é por acaso que no corpo do projecto de deliberação se diz:

[...], tendo em vista apreciar, designadamente as seguintes matérias [...].

15to dá ao projecto de deliberação um carácter meramente indicativo e não um carácter...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Leia até ao fim!

O Orador: - Sr. Deputado, no projecto de deliberação diz-se:

designadamente as seguintes matérias

Na medida em que respeitar esse «designadamente», respeitará as prioridades referidas. 15to é apenas uma indicação e, em circunstância nenhuma, pode preterir o dispositivo constitucional e regimental.
Aliás, estamos a reviver uma situação semelhante à do ano passado em que, na altura, o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata apresentaram uma proposta de alteração ao projecto de deliberação que tinham apresentado.
Nessa proposta de alteração dizia-se, e passo a citar: « [ ... ], nomeadamente [ ... ] - o ano passado usavam esse advérbio, mas vem ao mesmo! - «[...] as seguintes matérias [...].» 15to tinha em vista acentuar o carácter indicativo das matérias a apreciar e o Partido Comunista, pela voz do Sr. Deputado João Amaral, admitiu que a proposta de alteração do Partido Socialista e do Partido Social-Democrata, que no fundo está subsumida no texto do actual projecto de deliberação, retirava a razão de ser da impugnação de constitucionalidade quando, textualmente dizia:

Ele vai ser alterado, em primeiro lugar, em matéria que não é irrelevante. Mas, mais do que isso, com muito maior significado, vai ser alterado aquilo que, de alguma forma, correspondia a expropriar o Presidente da Assembleia da República de uma sua competência e a descaracterizar a natureza jurídica do prolongamento do período normal da Sessão Legislativa.

Fazia-se, nessa altura, a leitura que, neste momento, fazemos e o advérbio «designadamente» - «nomeadamente» era o do ano passado - acentua o carácter meramente indicativo do projecto de deliberação que, em nosso entender, não está ferido de inconstitucionalidade, porque não entra em conflito com os dispositivos constitucionais que regem a fixação das ordens do dia das sessões da Assembleia.
Por esse motivo, votaremos contra o recurso do Partido Comunista.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer a figura regimental do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Fui citado pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, mas suponho que ele não ouviu, de forma completa, a minha argumentação.
De facto, há uma grande diferença entre o actual projecto de deliberação e o que foi apresentado no ano passado, quando, na parte final do seu corpo, diz:

[ ... ], respeitando a ordem de prioridades indicada

seguindo-se os n.ºs 1, 2, 3, 4, 5 e 6. É neste aspecto
que o projecto de deliberação excede aquilo que a Constituição admite.
Pode dizer-se que, na parte em que diz:

[...] designadamente as seguintes matérias,

está conforme à Constituição; no entanto, na parte em que diz:

[ ... ] respeitando a ordem de prioridades indicada,

excede a Constituição e o Regimento, nomeadamente.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -.Agradeço-lhe a interrupção.

Pedi-lhe para o interromper, porque suponho que, de outra forma, não teria processo de lhe dar o meu ponto de vista. Suponho que não podia usar da palavra...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, no caso concreto, tinha direito a dar explicações, porque já exerceu a figura regimental do direito de defesa.

O Sr. João Amaral (PCP): - De qualquer forma, se o Sr. Deputado Lopes Cardoso quiser usar da palavra, faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Creio que aqui pode haver duas leituras e eu faço uma.
O respeito pela ordem de prioridades que aqui consta pode ser entendido como o respeito por uma ordem de prioridades entendida globalmente com todas as prioridades possíveis ou como o respeito por uma ordem de prioridades entre as matérias que são referidas.
Para mim, a ordem de prioridades indicada é em relação às matérias referidas e não pretere outras prioridades eventualmente existentes no quadro geral das prioridades a que está submetida a ordem de trabalhos desta Assembleia.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, devo dizer-lhe que se essa fosse a leitura, então o ideal seria retirar tudo o que aqui está; precisamente porque isso consta do projecto de deliberação é que a leitura que dá não vale.
O que aqui está indicado é uma ordem de prioridades, ou seja, uma ordem que se sobrepõe à ordem de prioridades regimental. É por isso que este projecto de deliberação contraria a constituição e o Regimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para se pronunciar sobre o recurso interposto pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já estamos habituados a que da bancada do Partido Comunista nos venha frequentemente o sentido da oportunidade mas, infelizmente, já estamos habituados a que da bancada do Partido Comunista nos venha frequentemente a falta de sentido dos princípios.
Realmente, o Partido Comunista revelou hoje neste debate oportunidade em discutir certo tipo de questões regimentais; agora, quanto à questão essencial dos princípios, essa é uma questão mais discutível.
Quando ouvimos o Sr. Deputado João Amaral fundamentar o recurso do Partido Comunista e escandalizar-se pelo facto de o projecto de deliberação ser omisso quanto à possibilidade de constituição de novas freguesias mas, ao mesmo tempo, não ser omisso quanto à necessidade da aprovação do Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, infelizmente, algo vai bastante mal pela capacidade de apreciação daquilo que é o interesse português, daquilo que é o interesse nacional, relativamente ao contexto do nosso momento presente.
Talvez o Partido Comunista se escandalize quando vê grupos parlamentares, que ontem faziam parte de uma coligação e que hoje já não fazem parte dessa coligação...

O Sr. João Amaral (PCP): - 15so é que ainda não

O Orador: - ... , apesar de tudo, serem capazes de convergir na consideração daquilo que é o interesse nacional. Certamente, no dia 12 de Junho o interesse nacional, por mais mérito que tenha, é menos a criação de novas freguesias e mais a necessidade da aprovação do Tratado de Adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - 15so é na sua leitura!

O Orador: - Se o Partido Comunista não sabe fazer esta distinção só há uma coisa a lamentar: a falta de consciência nacional assumida pelo Grupo Parlamentar do PCP e dessa falta de consciência nacional, obviamente, não comungará o Partido Socialista.
Ao contrário, em termos processuais, não tenho dúvida nenhuma em comungar da interpretação que o Sr. Deputado Lopes Cardoso acabou de fazer de que o projecto de deliberação em nada viola os dispositivos regimentais, porque uma deliberação da Assembleia no sentido de prolongar os trabalhos parlamentares e achar que o prolongamento deve corresponder à indexação de um conjunto de matérias prioritárias não colide com os direitos regimentais potestativos de cada grupo parlamentar per si considerado.
Neste caso, não se trata de uma deliberação de nenhum grupo parlamentar mas de uma deliberação da Assembleia da República e as prioridades da Assembleia da República, no seu conjunto, se este projecto vier a ser aprovado, são as que nele constam.

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Vozes do PCP: - 15so é inconstitucional e anti-regimental!

O Orador: - Nós não temos é que ser responsáveis pelo nosso critério de prioridades e pelo facto de o critério de prioridades da Assembleia da República em nada corresponder ao critério de prioridades do Partido Comunista Português.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Há o Regimento e a Constituição!

O Sr. João Amarel (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - É para exercer o direito regimental do direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Na verdade, regimentalmente, volta a ter direito a usar dessa figura regimental.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sem dúvida!

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um destempero!

O Sr. João Amaral (PCP): - A intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão, citando o interesse nacional, é a demonstração clara daquilo que, de alguma forma, pode ser admitido que o seu grupo parlamentar, bem como o do PSD, façam aqui, neste momento, com esta Assembleia.
Em defesa do interesse nacional, os senhores não têm nenhuma legitimidade para discutir e votar a adesão de Portugal à CEE, pois neste momento já não são representativos de nada, não existem...

Aplausos do PCP e protestos do PS e do PSD.

A questão que se coloca, para quem queira encarar seriamente um problema tão grave como é o da análise de um tratado que todas as forças sociais dizem que foi negociado em cima do joelho, à pressa, ...

Protestos do PS.

... por uma operação política, repito, a questão que está colocada neste momento para defender o interesse nacional é precisamente a de que não seja esta Assembleia...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... , a de que não sejam os senhores a discutir este Tratado, mas uma Assembleia renovada, uma Assembleia que saiba responder perante o País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Com os senhores temos uma garantia: a de que uma discussão como a que estamos a ter é irresponsável, é uma operação política com fins políticos inqualificáveis, e nunca será a discussão séria, aprofundada que o interesse nacional exige.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para que isto fique bem registado, para que fique claro é bom que isto seja aqui dito.
Discutir convosco nesta Assembleia a adesão do Tratado de Adesão à CEE não é fazer uma discussão aprofundada de um tema que tanto e tão profundamente interessa ao País; é, pelo contrário e tão-só, dar um voto em branco a uma operação política, que não interessa ao País e que, ao fim e ao cabo, este rejeita.

Aplausos DO PCP.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É para dar explicações ao Sr. Deputado João Amaral?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Naturalmente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado João Amaral, gostava de lhe dizer que da bancada do Partido Comunista, ao longo de muito tempo, veio a alegação de que havia uma confusão entre esta maioria política PS/PSD, que costumava chamar de maioria governamental.
Há, naturalmente, uma crise política que atinge a própria funcionalidade do XX Governo, tal como é conhecido. Agora, o que é estranho é que, sendo a bancada do Partido Comunista, aquela que acusava a bancada do Partido Socialista de excessiva dependência governamental, no momento em que a bancada do Partido Socialista diz, aqui e lá fora, que não precisa de uma dependência governamental para assumir a responsabilidade nacional de aprovar o Tratado de Adesão à Comunidade Económica Europeia, seja o Partido Comunista a dizer: «Atenção, meus senhores, olhem que já não têm Governo.» Nós dizemos: «Sr. Deputado João Amaral, não se preocupe com essa circunstância porque, neste momento, não nos interessa saber se temos ou não governo.» Temos 90 deputados na nossa bancada, que representam uma parte do País.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Mais ou menos! ...

O Orador: - Esta questão é essencial e o PS tem muito mais legitimidade do que a sua bancada para interpretar o sentido do interesse nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que acontece é que os deputados da nossa bancada continuam a convergir com os deputados de outras bancadas para defenderem, em termos amplamente maioritários, o interesse nacional, o que a sua bancada não é capaz de fazer.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI e protestos do PCP.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A ver vamos, como diz o ceguinho! Ainda a procissão vai no adro!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira para se pronunciar sobre o recurso interposto pelo PCP.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ficou bem claro das palavras do Sr. Deputado João Amaral que o que está em causa e; de facto, tentar evitar a grande derrota, que se avizinha para o Partido Comunista, com a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDL

Essa é que é a questão de fundo.
Para isso utilizaram argumentos meramente de ordem formal, chegando o Sr. Deputado a substituir-se, ou a querer antecipar-se, à vontade do Sr. Presidente da Assembleia da República, única entidade que pode retirar a esta Câmara a representatividade que ela tem, a plenitude das suas funções, e não será nunca o Partido Comunista que nos virá aqui tirá-las.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, que fique bem assente que estamos aqui para discutir as questões substantivas, estamos aqui para procurar aquilo que tantas vezes os senhores criticaram, ou seja, criticaram a maioria de não deixar funcionar esta Assembleia, de dar um mau aspecto perante o País.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E continua a dar!

O Orador: - Acusaram-nos, afinal, daquilo que eram os senhores que iam proporcionando.
Queremos, neste momento, trabalhar; há questões fundamentais para resolver, estamos num órgão de soberania com legitimidade e em plenitude de funções e estamos em condições de realizar essas funções.
Lamento dize-lo mas os senhores terão de averbar esta grande derrota que é a integração de Portugal na CEE e que vai ser a ratificação do Tratado de Adesão à CEE.

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que está em discussão neste momento é a admissão deste projecto de deliberação que viola uma disposição constitucional, segundo a qual compete ao Presidente da Assembleia da República fixar a ordem do dia de acordo com as prioridades regimentais.
Poderá eventualmente o Sr. Deputado Cardoso Ferreira entender que é altura de musculadamente dizer que esta Assembleia é muito representativa. Mas o problema não está em o Sr. Deputado Cardoso Ferreira sentir, ou não, isso. O problema é que esta Assembleia já não é representativa - se o seu voto suceder - porque já não corresponde aos interesses nem à vontade do País.

0 Sr. Jorge (Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Essa é que é a questão!
Se, eventualmente, V. Ex.ª Srs. Deputados do PS e do PSD, querem trabalhar não é certamente para nada de bom nem para nada que corresponda aos interesses do País.

Protestos do PS e do PSD.

Eventualmente podem entender-se para todo o tipo de malfeitorias, mas não se entendem - isso está fora de questão - para resolver os problemas do País e, quanto às questões com que nos defrontamos, o único entendimento é no sentido de piorarem a situação.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado Cardoso Ferreira, que as dúvidas a respeito da adesão à CEE são muito fundas. Muito prezo o seu ar folgazão e bem disposto relativamente à adesão à CEE, mas devo dizer-lhe que algumas dessas dúvidas até vieram da direcção do seu partido e em tais termos vieram que a própria questão da assinatura foi aberta e foi-o em que termos?
E já agora pergunto porque é que foi forçada? O que é que se passou que permitiu esta assinatura quando ainda há 8 dias o PSD levantava problemas?
O Sr. Deputado Cardoso Ferreira sabe bem que esta operação política não foi amadurecida em termos nacionais. E se ontem ouviu o Sr. Ministro Almeida Santos na televisão, bem compreenderá o que quero dizer-lhe.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não quer ouvir! Está solipsista!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Só quer ouvir o Cavaco!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podemos deixar passar em claro a ideia de que vimos agora alegremente passar por cima de algumas objecções que oportunamente formulámos quanto à forma como as negociações se desenrolavam.
Julgo que isso não pode de forma alguma ser entendido como pôr em causa a questão fundamental e pela qual nos batemos desde longa data, que é a integração de Portugal na CEE. Pelo contrário, esse empenho é reforçado no sentido de se obterem as melhores condições e só se fossemos um partido irresponsável é que alguma vez poderíamos ter descurado esses pormenores que são importantes no desenvolvimento do acordo.
Além disso, Sr. Deputado, queria dizer-lhe, já que mais uma vez falou na questão da inconstitucionalidade, que há uma forma muito simples de resolver o problema.
Se o Sr. Deputado entende que este projecto de deliberação viola a questão constitucional que refere - concretamente o direito de agendamento por parte do Presidente da Assembleia, não impugnam a ordem do dia que o Presidente da Assembleia da República porque é que o Sr. Deputado e a sua bancada, na próxima sessão da Assembleia, não impugnam a ordem do dia que o Presidente da Assembleia da República vier eventualmente a fixar? Esse seria o momento adequado, não este agora.
Se o quiserem fazer, muito bem. No entanto, não me parece que, neste momento, seja razoável estar a antecipar essa questão quando os objectivos ficaram já

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bem claros. Aliás, o próprio ênfase que o Sr. Deputado deu à questão, acabando por abrir o jogo e por mostrar claramente qual é a vossa grande preocupação, deixa perfeitamente a descoberto os argumentos que são débeis, como aqui foi provado, ...

O Sr. José Magalhães (PCP): - A vossa argumentação é que é misteriosa!

O Orador: - ... são inconsistentes, como aqui já foi devidamente argumentado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para se pronunciar sobre o recurso interposto pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A simples comparação entre o projecto de resolução aprovado nesta Assembleia em 15 de Junho do ano passado, projecto esse apresentado pela então maioria PS/PSD, e o projecto de deliberação apresentado hoje mostra duas grandes diferenças.
É que o ano passado existia uma maioria e um governo e hoje, como é sabido, vive-se uma situação de crise pois a maioria terminou.
Para além disso, entre os dois projectos há ainda outra profunda diferença: é que, enquanto o projecto do ano passado começava por referir que se devia considerar em primeiro lugar a conclusão das matérias já agendadas em conferência de líderes, o projecto deste ano procura afastar as matérias já agendadas e a competência da conferência de líderes e restringir, limitar e praticamente suprimir a competência do Presidente da Assembleia da República e da conferência de líderes para o estabelecimento das ordens de trabalhos.
Efectivamente, quem ler um e outro desses projectos, ficará abismado com o tom irrealista do presente projecto de deliberação, no qual se pretende espartilhar a Assembleia da República dentro de limites aí fixados, não havendo quaisquer considerações que a possam justificar.
A afirmação segundo a qual a Assembleia seria suficiente para admitir a possibilidade de outras ordens de trabalho é efectivamente uma conclusão que não colhe, pois se assim fosse, porque não se incluíram outras matérias neste projecto de ordem de trabalhos e se referem apenas estas.
Do mesmo modo, a invocação do interesse nacional por parte do Sr. Deputado Jorge Lacão leva-nos a perguntar se as matérias já agendadas na conferência de líderes desta Assembleia não são matérias de interesse nacional.
Será que matérias de interesse nacional são apenas aquelas que a ex-maioria, agora moribunda, vem apresentar nesta altura?
Efectivamente, essa proposta de deliberação não só viola o n.º l do artigo 169.º da Constituição, restringindo e anulando os poderes do Presidente da Assembleia da República e dos grupos e agrupamentos parlamentares, como viola também diversas disposições do Regimento, nomeadamente a alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, a alínea b) do artigo 17.º e o artigo 54.º relativos à competência do Presidente da Assembleia da República e dos grupos parlamentares.

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Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o MDP/CDE - que aliás tinha um diploma já agendado para o dia 20 do corrente mês - considerando da maior gravidade a proposta de deliberação agora apresentada e o cerceamento dos direitos constitucionais do Presidente da Assembleia da República e dos grupos parlamentares votará favoravelmente o recurso apresentado pelo PCP.

O Sr. Presidente: - Também para se pronunciar sobre o recurso interposto pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, antes de me pronunciar sobre esta matéria agradecia que me informasse do tempo de que ainda dispomos nesta parte da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, neste momento não há limite para a primeira parte da ordem do dia, ele foi eliminado aquando da revisão regimental.
Tem V. Ex. e a palavra.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Então nesse caso farei agora a minha intervenção. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o CDS tem dúvidas acerca da constitucionalidade do projecto de resolução transformado à última hora em projecto de deliberação, apresentado pelo PS e pelo PSD.
Porque temos dúvidas sobre a sua constitucionalidade, apresentámos um projecto próprio que é substancialmente diferente.
Entendemos, no entanto, tal como é a nossa posição nesta matéria de apreciação prévia da constitucionalidade, que a questão, em princípio e quando haja, como agora, apenas dúvidas, não deve deslocar-se para questão prévia mas deve ser discutida na própria questão principal, no fundo da questão.
É o que iremos fazer.
No entanto, a circunstância de termos dúvidas e de termos apresentado o nosso próprio projecto levar-nos-á a uma posição de abstenção no que toca ao recurso do PCP.
Quanto ao conteúdo do projecto de deliberação do PS e do PSD tomaremos posição oportunamente, quando o debate for aberto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais nenhum Sr. Deputado inscrito para se pronunciar sobre o recurso interposto pelo PCP sobre a decisão da Mesa de admissão do projecto de deliberação, apresentado pelo PS e pelo PSD, vamos votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, da UEDS e da ASDI, votos a favor do PCP e do MDP/CDE e a abstenção do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegou a hora do intervalo, após o qual entraremos no debate e na votação do projecto de deliberação que todos conhecem.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, como esta questão já foi discutida, penso que haveria vantagens, nomeadamente quanto à fixação definitiva desta questão, em que se procedesse à discussão e votação do referido projecto antes do intervalo.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Nunes, pela parte da Mesa não há qualquer objecção apesar de a hora regimental do intervalo já ter sido largamente ultrapassada.
Assim, se todos estiverem de acordo, passaremos imediatamente à apreciação do projecto de deliberação.

Pausa.

Não havendo objecções à proposta do Sr. Deputado José Luís Nunes, vamos proceder à discussão conjunta dos projectos de deliberação, um deles que foi apresentado pelo PS e pelo PSD e o outro pelo CDS.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Jorge de Lemos (PCP): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito para uma intervenção, tem a palavra para interpelar a Mesa o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não queremos de modo nenhum coarctar a hipótese ao Sr. Deputado Nogueira de Brito de apresentar o seu projecto de deliberação.
No entanto, parece-nos estranho - daí a nossa interpelação à Mesa a quem peço que confirme o que digo - que não esteja inscrito nenhum deputado do PS ou do PSD com o fim de apresentar o seu projecto de deliberação, visto que foi o primeiro a dar entrada na Mesa.
Até agora, a Assembleia da República ainda não ouviu qualquer explicação por parte dos proponentes acerca das razões que os levam a apresentar um projecto com estas características.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, se algum Sr. Deputado do PS ou do PSD se tivesse inscrito, ter-lhe-ia dado a palavra em primeiro lugar. Como isso não acontece, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É lamentável!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, penso que está esclarecido que os deputados do PS e do PSD não querem justificar o seu projecto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É significativo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, até à data, não se inscreveram mas ainda o podem fazer.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Então, pronunciar-me-ei sobre o projecto do PS e do PSD - voltamos a ter projectos do PS e do PSD - ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e simultaneamente justificarei a apresentação do nosso projecto.
Assim, direi que o projecto de deliberação do PS e do PSD, com este elenco de matérias, é neste momento, pelo menos, caricato.

Depois das sessões a que assistimos aqui nos últimos dias, sessões - perdoem-me a expressão - de lavagem de roupa suja entre os dois grupos parlamentares, é curioso estarmos hoje perante este projecto.
É que este projecto ou é realmente a tentativa de renovação da coligação ...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Olhe, que susto!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Olhem quem falou!

O Orador: - Nenhum susto, está enganado!
Mas dizia eu que ou é uma tentativa de renovação da coligação ou é o inventário da coligação - também poderá ser.
Há aqui coisas caricatas como, por exemplo, autorizações legislativas do Governo. Mas de que governo?
Não sabemos que governo ... será o da República, com certeza mas é o de VV. Ex.", isto é, dos dois partidos, ou é apenas o do Dr. Mário Soares?

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - O seu é que não será!

O Orador: - O meu não será, não, Sr. Deputado.
V. Ex.ª está nitidamente com saudades desse Governo ou do seu governo.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Do seu?! ...

O Orador: - Não, não, do vosso, Sr. Deputado.

É realmente ou uma tentativa de o refazerem, ou o inventário, ou uma manifestação de saudosismo.
Mas, entendemos que, nesta perspectiva, é caricato e, portanto, também por isso não devia ter sido apresentado. 15to para além de levantar as questões constitucionais que já levantou o ano passado e que foram aqui exaustivamente discutidas, principalmente depois da revisão de 1982.
Não se justifica que se coarcte desta maneira, como não se coarctou o ano passado, a competência do Presidente da Assembleia da República para fixar as ordens do dia.
Por isso, nós apresentámos um projecto que significa fundamentalmente que estamos de acordo com o prolongamento dos trabalhos. Quanto à oportunidade política desse prolongamento, que o PCP pareceu achar tão estranho - terá a sua resposta na altura própria - O PCP quer auto-dissolver a Assembleia no seu afã dissolutório. Nós não vamos a esse ponto ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vocês até queriam que o Presidente da República se demitisse!

O Orador: - ... mas o que lhe digo é que não estamos contra o prolongamento dos trabalhos. Estamos é a favor de um prolongamento dos trabalhos que cumpra o disposto na Constituição e no Regimento.
Entendemos que VV. Ex." não o fazem com este projecto e além do mais se sujeitam realmente ao ridículo do País político e do País real apresentando aqui este elenco de matérias precisamente no dia 12.
Terá sido no dia 12 porque, por sorte, o dia 13 é feriado.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - É dia de Santo António!

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, evidentemente que partilho de várias críticas que formulou relativamente a este estranhíssimo projecto de deliberação, ao qual terei oportunidade de me referir mais tarde.
Não quero deixar de manifestar a minha estranheza relativamente ao projecto de deliberação que o CDS apresentou.
Se eu não estou em erro, foi anunciado esta madrugada ao País que a comissão política do CDS defendia a dissolução da Assembleia da República. Tudo é claro e o Sr. Deputado, na sua intervenção, não contradisse esta notícia.
É aqui que começa a minha estranheza. É que se é esse o ponto de vista do CDS, pergunto-lhe porquê o prolongamento e, particularmente, porquê o prolongamento até ao dia 15 de Julho, isto é, um prolongamento para além da data a partir da qual - o Sr. Deputado Nogueira de Brito sabe-o perfeitamente - o Presidente da República deixa de ter o poder de dissolver a Assembleia da República.
15to é contraditório. Compreenderia ainda que o CDS, com alguns argumentos que o Sr. Deputado expendeu, propusesse que a Assembleia da República prolongasse os seus trabalhos até ao dia 12 de Julho.
Mas porquê o dia 15 de Julho?
Relativamente ao que se passa no projecto de deliberação do PS e do PSD, creio que isto tem o toque de uma provocação política e institucional ao Presidente da República.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Enorme!

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Não apoiado!

O Orador: - Só assim se compreende.
O que também me surpreende no que toca especialmente ao PSD, uma vez que o líder nacional do PSD, o presidente da sua Comissão Política também defendeu, há dias, a dissolução da Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Não é assim!

O Orador: - E não se compreende, também em relação ao PSD, como é que se defende o prolongamento dos trabalhos para além da data a partir da qual o Presidente da República perde o poder de dissolução da Assembleia. Mas disso já trataremos, pois iremos tratar de um projecto de resolução.
Para o Sr. Deputado Nogueira de Brito fica a seguinte interrogação: porquê este procedimento? Também é estranho, também é intrigante e leva a pensar se tudo irá bem no CDS, se este grupo parlamentar está em consonância com aquela decisão da Comissão Política do CDS que ontem foi anunciada ao País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, para prestar esclarecimentos.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Esteja descansado Sr. Deputado Carlos Brito, pois tudo vai bem...

Risos do CDS, do PS e do PSD.

O Orador: - ... e esta direcção do Grupo Parlamentar até participou na reunião da Comissão Política, ou melhor, da Comissão Directiva do partido, de onde saiu essa notícia.
É facto que o CDS não põe de parte que essa hipótese da dissolução seja a hipótese mais correcta ...

Voz do PCP: - Exceptuando a renúncia...

O Orador: - ... Para a solução da presente crise.
Simplesmente, Sr. Deputado Carlos Brito, não conseguimos alcançar a extensão e o sentido do seu raciocínio pois o facto de prolongarmos os trabalhos até ao dia 15 impede, porventura, o Sr. Presidente da República de usar dos seus poderes ? Não impede, Sr. Deputado! E se o Sr. Presidente da República quiser e entender - e essa pode ser a única solução, a solução mais correcta - usar dos seus poderes, usará deles em relação a uma Assembleia que deliberou prolongar os seus trabalhos. Porém, enquanto o Presidente da República não usar dos seus poderes, a Assembleia mantém-se o centro do poder político português!
15to está correcto, está certo, e não temos nada a opor, Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado.

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, não lhe parece que nessa perspectiva de dissolução da Assembleia da República o CDS defende, como acaba de confirmar, um confronto de competências? Ou seja, não será um confronto de competências a Assembleia da República deliberar hoje que prolonga os seus trabalhos até ao dia 15 de Julho e o Presidente da República decidir amanhã dissolver a Assembleia da República? Não lhe parece que colocar esta situação é, ao fim e ao cabo tentar contrariar aquilo que vocês próprios defendem? Creio que é perfeitamente legítimo colocar esta situação.

O Sr. Vítor Hugo dos Santos (PS): - Assim é que é bonito, todos a lavarem roupa...

O Orador: - De maneira nenhuma, Sr. Deputado Carlos Brito. 15to porque o CDS não introduz nem pensa introduzir limitações ao poder de dissolução que o Sr. Presidente da República tem, nem sequer as admite!
Portanto, não é a circunstância de termos deliberado prorrogar os nossos trabalhos até ao dia 15 que constituirá uma limitação, como a não constituiria o facto de o Sr. Presidente da República poder dissolver a Assembleia durante o seu funcionamento normal. 15so para nós não está em causa, a data não tem nada a ver, não tem nenhuma intenção relacionada com o poder de dissolução, que poderá vir a ser - acentuamo-lo pois essa é a nossa posição - a solução mais correcta para a actual crise.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, pede V. Ex.ª. a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma intervenção porque esta declaração do Sr. Deputado Nogueira de Brito parece-me muito clara e satisfaz-me plenamente.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que estamos a discutir em simultâneo as duas propostas de deliberação e, portanto, pronunciar-me-ei sobre ambas.

Começo por dizer que a UEDS é favorável ao prolongamento dos trabalhos da Assembleia e, nessa medida, somos favoráveis às duas propostas de deliberação, no que elas significam quanto ao prolongamento do período normal, porque pensamos que em quaisquer condições, dado o acumular de trabalhos nesta Assembleia, não faria sentido que encerrássemos os trabalhos neste momento.
Mas há, para mim, uma razão ainda mais forte para prolongarmos os nossos trabalhos. É que penso que face à situação de crise política que o País atravessa nós, deputados, não nos podemos demitir nem ir embora, fechando a Assembleia da República.

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD e da ASDI

Até ao momento - se esse momento vier a ocorrer - em que o Sr. Presidente da República decida dissolver a Assembleia, nós estamos no exercício pleno do nosso mandato, com perfeita legitimidade nesse exercício e não devemos, em circunstância nenhuma, renunciar a ele porque esta Assembleia é e tem de ser o centro da democracia e da vida democrática portuguesa.

Urna voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Daí, Sr. Presidente, e Srs. Deputados, a nossa posição favorável ao prolongamento do período normal de funcionamento da Assembleia.

Concretamente em relação às duas propostas de deliberação apresentada pelo CDS tem o nosso apoio. Tem-no porque a proposta apresentada e subscrita pelo PS e pelo PSD, em nosso entendimento, não pode ter uma leitura diferente da que fizemos há pouco, isto é, é um elenco de questões meramente indicativas, sem preterir os comandos constitucionais. Assim sendo, parece-nos perfeitamente inútil que se proceda a essa elencagem de pontos de futuras ordens de trabalhos quando serão sempre as regras regimentais que determinarão, caso a caso, sessão a sessão, a fixação da ordem de trabalhos.
Por isso mesmo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, votaremos favoravelmente a proposta de deliberação do CDS por nos parecer ser aquela que melhor corresponde, que melhor resposta dá à questão que se nos coloca. Abster-nos-emos em relação à proposta do PSD e do PS porque, por um lado, somos favoráveis ao prolongamento da sessão mas, por outro, consideramos que ela é apenas inútil, pois a leitura que fazemos dela é uma leitura meramente indicativa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que esta proposta de deliberação nos coloca é desde logo a seguinte: o que é que se pretende com ela? Porque é que se forçou a sua apreciação e a sua votação no dia de hoje, quando é certo que sexta-feira é dia parlamentar e, tratando-se do último dia parlamentar da Sessão Legislativa normal, seria natural que esta e outras questões que se prendem com o futuro da Assembleia da República fossem tratadas nessa data.
Aliás, na sexta-feira até seria mais clara a situação porque entretanto já se teriam retirado do Governo - se é que a retirada se confirma - os Ministros do PSD e provavelmente já haveria outras indicações em relação à superação da crise em que a ex-coligação, a defunta coligação, mergulhou o País.
Porquê tratar desta questão no dia de hoje? Qual a intenção quando é verdade que a Comissão Permanente a todo o momento pode convocar o Plenário da Assembleia da República? Se há questões urgentes, se há questões inadiáveis elas podem sempre ser tratadas por convocação da Comissão Permanente, que existe exactamente para esse efeito.
Na verdade, ser contra uma deliberação a favor da continuação do funcionamento da Assembleia da República nestas condições não é nenhuma demissão, ao contrário do que se pretende fazer crer.
A Comissão Permanente fica em funcionamento e ela pode convocar o Plenário a todo o momento, se houver questões urgentes e importantes que mereçam essa convocatória.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Então, porquê hoje? Porque é que o PS e o PSD inscrevem no seu projecto de resolução o prolongamento dos trabalhos até ao dia 15 de Julho? Já colocámos essa questão ao CDS e obtivemos explicações desse partido. Porém, no que toca ao PS e ao PSD não podemos deixar de considerar que se trata de uma provocação política e institucional ao Sr. Presidente da República.

. O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Não apoiado!

O Orador: - O PS e o PSD deverão também explicar se no seu entendimento qualquer deliberação da Assembleia da República nesse sentido em nada embaraça os poderes do Presidente da República no que toca à dissolução da Assembleia da República quando ele bem entender.
A elencagem das questões também suscita interrogações. Terá havido aqui uma tentativa de repor o programa da coligação e de se realizar agora, nesta situação de crise, com o Governo demitido, com a Assembleia da República à beira da dissolução, o que não se realizou enquanto a coligação funcionou?
Expliquem-nos, Srs. Deputados, o seguinte: as autorizações legislativas são para que Governo?

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Vozes do PS: - Para o Governo da República! ...

O Orador: - Qual é o Governo a que os Srs. Deputados vão dar as autorizações legislativas? Expliquem-nos, Srs. Deputados quais são as matérias que incluem nas votações finais a que haja lugar! 15to é para incluir a lei das rendas?

Vozes do PS: - É!

O Orador: - Expliquem isso, Srs. Deputados. É para incluir a lei das rendas? É bom que o PS dê essa explicação e que a dê hoje!
Quanto às alterações pontuais às leis eleitorais, isso é para dar satisfação às reivindicações do PSD quanto à legislação eleitoral, em relação às quais dirigentes do PS têm anunciado que não cederão?
Em relação às autorizações legislativas, uma pergunta mais: estas autorizações legislativas serão para englobar a legislação laboral e, portanto, a lei dos despedimentos selvagens?

Vozes do PS: - Selvagens?!

O Orador: - São para incluir essas matérias?
Estas interrogações são, na verdade, permitidas por este estranho texto e por esta estranha convergência que se deu entre os Grupos Parlamentares do PS e do PSD. Aliás, não sei se poderei dizer < do PSD» porque isto soa a coisa muito diferente daquilo que tem sido defendido e proclamado pelo presidente da Comissão Política Nacional do PSD... Há aqui qualquer coisa que não joga.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - E aqueles Srs. Deputados que dizem que aqui é que se deve clarificar tudo, que aqui é que está a sede do poder, não consentirão certamente que as dúvidas se mantenham e gostarão seguramente que estas questões sejam esclarecidas.
Da nossa parte, Srs. Deputados, a nossa posição é muito clara. Pensamos que esta Assembleia da República teve oportunidade de fazer muito pelo País mas fez muito pouco.
Srs. Deputados, VV. Ex.ª foram os grandes entusiastas da revisão do Regimento e creio que hoje podem retirar conclusões. Não era por causa do Regimento que a Assembleia da República não fazia mais para resolver os problemas nacionais, era por falta de vontade política de uma maioria capaz de corresponder aos interesses nacionais e aos problemas do nosso povo e do nosso País!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Orador: - O Regimento revisto, Srs. Deputados, veio mutilar a Assembleia da República de algumas figuras essenciais para o debate democrático no seu seio, como por exemplo a apresentação de projectos. Não veio trazer nada de bom, mutilou a vida democrática e não aumentou a produtividade dos trabalhos da Assembleia da República porque os Srs. Deputados da maioria não foram capazes disso. Não foram capazes de aqui trazer e de aqui defender os problemas do nosso povo e do nosso país e bloquearam, boicotaram e derrotaram as iniciativas que aqui foram trazidas pelo meu partido e que tinham esses objectivos.

A Assembleia da República teve tempo para trabalhar. Não é agora, quando três dos maiores partidos parlamentares reclamam a dissolução da Assembleia da República, que se fala em tempo para trabalhar! Não é agora, Srs. Deputados, agora é tempo para dissolver a Assembleia!
Somos contra a continuação dos trabalhos.

Uma voz do PS: - Que admiração!

O Orador: - Somos pela dissolução da Assembleia da República. Admitimos, em todo o caso, que a Comissão Permanente possa convocar o Plenário para tratar de algumas questões urgentes e inadiáveis, mas não pensamos que esse seja o caso da questão da CEE.
Se o nosso povo pudesse travar o debate nacional, que não travou, acerca dessa questão...
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Orador: - ... se essa fosse uma questão central a colocar ao povo português nas eleições legislativas antecipadas, então teríamos o debate nacional. Ao contrário, Srs. Deputados, todo este processo de adesão à CEE é um processo imposto à força, à pressa, ao nosso povo. Os Srs. Deputados têm medo que o nosso povo tome consciência e diga não à CEE.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É disso que os Srs. Deputados têm medo. De contrário não teriam medo que se fizesse o debate nacional e que as diferentes forças políticas levassem os seus argumentos, as suas posições, ao nosso povo e que fosse ele a decidir. Ao povo português é que cabe decidir e os Srs. Deputados não lhe vão dar essa oportunidade.
Nas vésperas de eleições legislativas antecipadas pretender que seja a Assembleia da República a deliberar e a ratificar os acordos de adesão, feitos à pressa, desconhecidos do País, desconhecidos dos deputados creio até que desconhecidos de uma parte dos membros do Governo -, é defraudar a participação popular numa decisão que vai comprometer o nosso país e que vai ser dura para o nosso povo por muitas décadas.
Admitimos, volto a dizer, que o Plenário da Assembleia da República poderia ser sempre convocado pela Comissão Permanente, pois essa permaneceria em funções e por isso não há nenhum sentido nesta proposta de deliberação.
O PCP mais uma vez diz não à prorrogação e diz sim à dissolução. É a nossa posição.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Carlos Brito, ficou-me uma dúvida no espírito depois da sua intervenção.
Sendo certo que do ponto de vista jurídico VV. Ex.ª se opõem à aprovação deste projecto de deliberação fundamentando isso na circunstância de ele elencar em matérias sobre as quais há-de fazer incidir a sua discussão na Assembleia e, dessa forma, limitar inaceitavelmente, os poderes do seu Presidente,

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VV. Ex.ª tecem toda a vossa argumentação contra esta deliberação ao fim e ao cabo por causa do seu conteúdo quando V. Ex.ª que pertence a um partido que é sempre e em princípio favorável ao prolongamento dos trabalhos, ao moto contínuo da Assembleia.
Quer dizer: o vício de que padece a sua argumentação - ficou-me essa dúvida no espírito - é, no fundo, o mesmo vício de inconstitucionalidade de que padece a própria deliberação que V. Ex.ª ataca.
V. Ex.ª o que não quer, a todo o custo, é discutir aqui a ratificação do Tratado que foi hoje assinado.
Risos do CDS, do PS, do PSD da ASDI.

O Orador: - É ou não verdade isso, Sr. Deputado Carlos Brito? Ou será que realmente o que o preocupa é o prolongamento e as implicações que ele pode ter em matéria de dissolução?
Já lhe dissemos, Sr. Deputado Carlos Brito, que não nos preocupa esse aspecto porque nós, CDS, entendemos, e já o declarámos, que se não for encontrada aqui nesta Assembleia uma solução de apoio maioritário ao Governo - por exemplo uma coligação do PCP com o PS, hipótese admissível
Risos do PS.

O Orador: - ..., então, será admissível e desejável a dissolução.
Mas, Sr. Deputado Carlos Brito, não é isso que nos preocupa e ficou demonstrado que não será isso que constituirá preocupação válida para ninguém. Porém, argumentar contra um projecto porque ele elenca matérias e pelas matérias que ele elenca, não podemos aceitar.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não podem? Ora essa!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, creio que o Sr. Deputado Nogueira de Brito está com ciúmes porque eu argumentei contra o projecto do PS e do PSD e não disse uma palavra em relação ao projecto do CDS...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Tive sorte!

O Orador: - ... e foi isso que o fez falar, para fazer incidir a luz dos projectores relativamente ao seu projecto.
Mas, na verdade, o fundamento da rejeição do projecto do PS e do PSD implicava também a rejeição do projecto do CDS.
O Sr. Deputado ouviu mal. Nós não rejeitamos, fundamentalmente, o projecto do PS e do PSD em razão das matérias elencadas. Aquelas matérias chamam a atenção para outras coisas - e eu creio que chamei a atenção para elas -, para uns certos equívocos que aqui permanecem. Foi um apelo à clarificação que me levou a pronunciar sobre essa elencagem de matérias.
A nossa posição é de fundo...

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Não é de fundo, é no fundo!...

O Orador: - e eu também expliquei que esta Assembleia deu o que tinha a dar. Daqui para diante só

vai fazer mal. Teve tempo para trabalhar, até alterou o Regimento como eu expliquei, mas nem por isso conseguiu ter eficácia.
Foi das piores composições que aqui passaram, isto no que toca à maioria. Não produziu nada de bom para o nosso povo e este ano foi um ano paupérrimo. No aspecto da produção legislativa, faremos depois um balanço, mas o que há é uma pobreza franciscana. Aquilo que produziu foi negativo e está a fazer sofrer o País. A nossa posição é essa, nada mais.
O Sr. Deputado diz que o que nós queremos é a ratificação dos tratados com a CEE, mas eu disse isso; disse que os senhores têm é medo. Vamos fazer esse debate nacional nas eleições legislativas antecipadas, que os senhores também defendem. Os senhores vão defender junto do nosso povo a adesão e nós vamos dizer que a adesão é má e que, portanto, devemos encontrar outras soluções. Vamos para esse debate! Não escondi que é isso que pretendemos e não outras coisas.
Esta Assembleia moribunda - que três dos maiores partidos nacionais defendem que deve ser dissolvida não deve aprovar a lei das rendas, não deve aprovar a lei da tutela, não deve tomar uma série de medidas que são atentatórias para o nosso povo nem deve alterar as regras do jogo da lei eleitoral. Aliás, o seu partido, Sr. Deputado, pode ser tão vítima da alteração das regras de jogo como o meu, porque, provavelmente, os dois partidos da coligação moribunda se preparam para manipular um texto que sirva para as duas partes, ao contrário do que dizia ontem o Dr. Almeida Santos:
Alterar a lei eleitoral a favor do Partido Socialista, isso era um horror, nunca faríamos isso.

Risos do PCP e do CDS,

O Orador: - O que nós pensamos é que eles o pretendem fazer.
Sr. Deputado Nogueira de Brito, as nossas razões são razões de fundo. Por isso dizemos que esta Assembleia, na sua actual composição, está a mais. Deve acabar,...

Uma voz do PS: - Vocês é que estão aqui a mais!

O Sr. António Mota (PCP): - Não seja provocador barato!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Você é que está a demonstrar o que é: fascista! Os fascistas é que diziam isso!

O Orador: - ... não deve fazer mais erros, não deve cometer mais asneiras, não deve prejudicar mais o
nosso povo e o nosso país. Por isso dizemos não à prorrogação e sim à dissolução.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em longas considerações que já tivemos ocasião de formular em relação ao recurso apresentado peto PCP, desejaríamos acrescentar agora que, para nós, não está em causa a prorrogação do prazo dos trabalhos na Assembleia da República

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que não é essa a questão, pois o que está em causa
é aquilo que irá ser objecto de apreciação no futuro
período de prorrogação dos trabalhos da Assembleia
da República.
Por este aspecto e por aquilo que já dissemos, há
realmente uma profunda diferença entre a proposta
apresentada no passado, em 15 de Junho, pela coliga
ção então existente e a proposta apresentada hoje pela
antiga coligação, ressuscitada transitoriamente.
Há, realmente, uma profunda diferença: em primeiro
lugar, porque no ano passado a coligação propôs que
se tratasse da conclusão da apreciação das matérias já

anteriormente agendadas em conferência de líderes, no-
meadamente citando uma série de diplomas de autoria
de vários partidos que se encontravam pendentes. Este
ano, desaparece esse respeito por aquilo que estava
agendado na conferência de líderes para dar lugar às
matérias constantes da proposta do PS e do PSD.
Por outro lado, na proposta apresentada no ano pas-
sado a maioria propôs a prorrogação até ao dia 14 de
Julho e não até ao dia 15 de Julho e é estranhável que,
numa situação de crise, em que já não existe maioria
e em que se sabe que os poderes de dissolução do Pre-
sidente da República terminam no dia 14 de Julho, a
ex-maioria também nisto tenha mudado a sua proposta,
referindo não o dia 14 mas o dia 15 de Julho.
Pelas explicações dadas pelo CDS, cremos que, da
sua parte, ao apresentar a sua proposta com referên-
cia ao dia 15 de Julho o CDS não considerou esse as-
pecto e não o fez com esse objectivo.
Em relação às duas propostas, o MDP/CDE votará
contra a proposta apresentada pela ex-coligação, res-
suscitada transitoriamente, e irá abster-se na votação
da proposta apresentada pelo CDS, não em relação à
questão de fundo que ela encerra - porque nos pa-
rece que essa seria uma forma de evitar os inconve-
nientes que apresenta a outra proposta - mas apenas
por lá figurar a data de 15 de Julho e não a data de
14 de Julho, como figurava o ano passado na própria
proposta da coligação.
Por esta razão, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o
MDP/CDE concorda inteiramente com a prorrogação
dos trabalhos desta Assembleia até ao momento em que
o órgão de soberania competente entenda - o que se
espera não demore muito - que ela deve ser dissol-
vida, o MDP/CDE entende que devem ser prolonga
dos os trabalhos, que deve ser prorrogado o funciona-
mento desta Assembleia, não através do espartilho que
a ex-maioria pretende impor mas sim através do res-
peito da actuação do Presidente da Assembleia e da
conferência de líderes.

Vozes dm PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais
inscrições.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a
palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da
palavra, Sr. Deputado?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, em pri-
meiro lugar, desejo interpelar a Mesa no sentido de sa-
ber se não há nenhum pedido de inscrição por parte
do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - É evidente que não há, Sr. Deputado, pois eu afirmei que não havia mais inscrições.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Nesse caso, Sr. Presidente, peço a palavra para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Uma vez que não há qualquer outro orador inscrito, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Quer V. Ex.ª dizer, a última palavra!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a argumentação que trouxemos ao debate aqui travado, as interrogações que aqui deixámos e o silêncio com que as bancadas da maioria corresponderam às justas interrogações que aqui trouxemos, não deixa certamente antever nada de bom em torno desta proposta de deliberação quanto ao período de prolongamento.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que não pode deixar de ser considerado escandaloso que uma maioria, que já acabou e que se uniu à pressa para apresentar um projecto de deliberação - que, como já aqui demonstrámos, é provocatório, incongruente, esdrúxulo, perigoso e inconstitucional - não tenha uma palavra para explicar, para poder tornar claras as dúvidas que vão permanecer durante e para além deste debate caso a maioria continue na atitude de silêncio para que se remeteu.

De facto, é inaceitável que uma maioria moribunda, que uma maioria que já não o é em termos de legitimidade, uma vez que um dos seus parceiros já não quer nada com o outro, proponha que a Assembleia da República prolongue os seus trabalhos nestas circunstâncias, com um calendário como aquele que aqui nos traz e não diga uma palavra face às dúvidas e face às interrogações que aqui trouxemos.

É isto que queremos deixar sublinhado, em termos de opinião pública, para que se possa ficar a saber que, confrontada com questões, com perguntas e com interrogações, a maioria só teve o silêncio. E se as pessoas respondem às justas perguntas e às justas interrogações com o silêncio, é porque não prometem nada de bom e não têm razões justas a contrapor.

Esta é maioria que, além de moribunda, é muda e de moribundos e mudos nada de bom se pode esperar!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos passar à votação do projecto de deliberação subscrito por deputados do PS e do PSD, cujo conteúdo é sobejamente conhecido.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e da ASDI, votos contra do PCP, do CDS e do MDP/CDE e a abstenção da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a questão que se põe agora é a de se saber se o projecto de resolução apresentado pelo CDS está ou não prejudicado.
Em meu entendimento, ele está prejudicado mas gostaria que os Srs. Deputados se pronunciassem sobre esta matéria.

Pausa.

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Pelo silêncio dos Srs. Deputados, concluo que concordam com o meu entendimento de que o projecto de resolução apresentado pelo CDS está prejudicado.
Vamos agora fazer o intervalo regimental, recomeçando a sessão às 18 horas e 45 minutos.
Está suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados os nossos trabalhos vão continuar com a discussão da ratificação n.º 153/III, apresentada pelo CDS, respeitante ao Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
Inscreveram-se para usar da palavra os Srs. Deputados Raul Castro, Domingues Azevedo e Portugal da Fonseca.
Vou dar a palavra aos Srs. Deputados pela ordem que anunciei, pelo que tem a palavra. em primeiro lugar o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É hoje chamado à ratificação o diploma legal que criou o IVA e convirá recordar que o IVA foi apresentado pelo Governo, agora em crise, como algo que não é um imposto.

Grande propaganda foi feita na televisão, dizendo-se que o IVA não era um imposto. Hoje, todos estamos a ver claramente que o IVA é efectivamente um imposto e um imposto que vem criar condições muito mais gravosas que o anterior imposto de transacções.

Por outro lado, foi também afirmado que a publicação do diploma sobre o IVA decorria de uma obrigação que tinha a ver com a integração na CEE. Mas a verdade é que, quando em Dezembro foi publicado o decreto que criava o IVA ainda nem sequer tinha sido assinado o Tratado de Adesão e Portugal não fazia parte da CEE. Além disso, há países da CEE que demoraram vários anos a pôr em vigor o IVA - nomeadamente a Grécia - ou que ainda não o têm em vigor.
De qualquer forma, isto mostra que também nesta matéria o argumento foi mal usado na televisão e posto em prática antes de tempo pelo Governo de então.

Naturalmente que para nós não está em causa o aparecimento de um novo imposto nem tão pouco os objectivos desse novo imposto, nomeadamente, aquilo que ele possa significar no combate à fraude fiscal. 15so não está em causa e convirá mesmo separar este aspecto técnico do que é um novo imposto - que não está em causa - dos aspectos de fundo, que dizem respeito quer às taxas quer à incidência que o novo diploma do IVA veio criar.

Estas são realmente questões muito diferentes e já bastante se tem confundido - mesmo aqui» nesta Assembleia - o quadro e a moldura, confundindo-se por um lado o que é novo no imposto do IVA, os seus objectivos de combate à fraude fiscal e, por outro, o seu conteúdo quanto às taxas estabelecidas e à incidência dessas mesmas taxas.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, para nós, o que importa é que esse novo imposto, como qualquer outro imposto ou qualquer diploma legal que diga respeito a matéria fiscal, observe o que dispõe a Constituição, nomeadamente no seu artigo 106.º, n.º 1, que diz:

O sistema fiscal será estruturado por lei, com vista à repartição igualitária da riqueza e dos rendimentos e à satisfação das necessidades financeiras do Estado.

Para se respeitar esta disposição fundamental da Constituição, a política fiscal tem de ser uma política fiscal distributiva e que estimule a actividade económica do nosso país.

Não nos parece que nenhuma destas características esteja presente nas taxas e incidências do novo imposto nem que a nova legislação possua as virtualidades constitucionais exigíveis. E passamos a explicar porquê.
Em primeiro lugar, porque através do IVA se vem tributar numerosos artigos de primeira necessidade que não eram objecto de tributação por imposto de transacções. Vou citar alguns desses artigos: preparados de carne, fiambre, produtos de padaria afins do pão, conservas de peixe, produtos derivados de leite, farinhas lácteas, iogurtes, bolachas de água e sal, etc. Todos estes produtos passam a estar tributados pelo IVA com a taxa de 8 %, quando não eram tributados pelo imposto de transacções.

Para além destes, podem ainda citar-se alguns dos casos mais conhecidos e esses já reconhecidos como casos de manifesta injustiça fiscal e até de inconstitucionalidade como é o caso dos livros e dos medicamentos, dos óleos comestíveis, do sal, do vinagre, do sabão, do gás, da electricidade e da lenha. Todos estes produtos não eram objecto de imposto de transacções e que agora são onerados pelo IVA com a taxa de 8%.

Para além disso é também clamoroso que, no que diz respeito a artigos de luxo, se tenha assistido a um fenómeno inverso, isto é, que artigos de luxo que eram tributados com a taxa de 60 % - nomeadamente, aviões, aeronaves e seus acessórios, fotografias, filmes, discos, livros de conteúdo pornográfico ou obsceno, embarcações de recreio ou desporto superiores a 120 contos - passem agora, com o IVA, a ser tributados com taxas baixas, nalguns casos de 30 % noutros de 16%.

É, efectivamente, uma situação paradoxal e que não se pode manter!

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há. ainda que referir as consequências que o IVA representa no que diz respeito à nossa economia. Refiro-me, por uma lado, à situação concreta do nosso país no que concerne à inflação. E já que tanta vez aqui se fala e se argumenta, por parte da antiga maioria, com a adesão à CEE e com o que se passa nesses países, seria bom ter-se em conta, por exemplo, qual é a taxa de inflação nos outros países da Europa e qual é a taxa de inflação em Portugal.

Assim, diremos que nesses países as taxas de inflação de 1977 a 1982 foram as seguintes: Bélgica - 6,4%; França - 11,7%; Itália - 16,8%; Holanda - 5,5 %; Inglaterra - 12%; Portugal - 21 %.
Quer dizer, Portugal, que está na cauda de todos os países da Europa no que respeita ao nível de vida, está, no que toca à inflação, num pouco honroso 1.º lugar.

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Mas não só. Se examinarmos também o rendimento por cabeça, expresso em dólares, em diversos países, em 1981, chegamos a esta conclusão: RFA, 11 076; Bélgica, 9651; França, 10 532; e, na cauda Portugal com 2398.
Naturalmente que o lançamento do IVA, contribuindo ainda mais para agravar a inflação, vem criar uma acréscimo de dificuldades, não só às camadas mais carecidas da população portuguesa mas também aos empresários, em especial aos titulares de pequenas e médias empresas comerciais e industriais.
Por estas razões, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o MDP/CDE concorda inteiramente com o adiamento para o dia 1 de Janeiro da entrada em vigor do IVA, na convicção de que nesta data esta Câmara será obrigada, naturalmente, a considerar uma nova data, o que significa um novo adiamento quanto à entrada em vigor do diploma do IVA.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao iniciar a minha intervenção, gostaria de colocar uma questão prévia a qual, aliás, também foi referida pelos oradores que me antecederam sobre esta matéria: considero que é de certo modo uma aventura falar nesta Câmara sobre impostos. É uma aventura porquanto exige um conhecimento técnico bastante aperfeiçoado, o que leva a que, por vezes, corramos o risco de não ser entendidos. Corremos o risco até de ser alcunhados, nesta Câmara, de «cavaleiros andantes» em defesa do IVA.
Devo dizer que esse é um nome que me honra, porque esta Câmara, nos termos constitucionais, deve assumir a responsabilidade da discussão de todo o sistema fiscal. E estou com o Sr. Deputado Octávio Teixeira quando ontem dizia que compete a esta Assembleia chamar à colação a discussão dos sistema fiscal.
Para que possamos fazer um juízo e uma discussão aprofundada em termos de qualidade acerca do IVA é imprescindível termos conhecimento concreto da situação actual e do espaço em que se movimenta a nossa tributação sobre o consumo.
De facto, só comparando a situação que vivemos com uma situação nova que pretendemos impor é que poderemos descobrir as virtualidades do nosso sistema e condenar os defeitos de um sistema que pretendemos renovar.
O actual imposto de transacções - e não será despiciendo elaborarmos o nosso raciocínio nesta matéria - surge, aquando da reforma fiscal, já ferido de morte no sistema jurídico-fiscal em que assenta, na medida em que o legislador aprova a faculdade de os agentes económicos fazerem a suspensão do imposto, sendo todo o circuito até à fase de produção filial isento de imposto; ora, este é todo um espaço tremendamente grande a percorrer, onde são abertas todas as formas possíveis de evasão fiscal.
Este suporte é, efectivamente, o grande problema da evasão que, neste momento, se verifica relativamente a um imposto que tem obrigação de maiores receitas produzir. E há imensos processos que são utilizados: desde as empresas fictícias, desde as declarações modelo 6 relativas a empresas que não existem...

E porque todo o circuito é extremamente dilatado, torna-se impossível aos serviços de fiscalização seguir as mercadorias, dentro do circuito económico, até à sua fase final, até aquele que tem a obrigatoriedade, nos termos do imposto, de arrecadar, de liquidar o imposto e o entregar nos cofres do Estado. Não temos uns serviços de fiscalização capazes de proporcionar um efectivo controle de todo este circuito.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - 15so é verdade!

O Orador: - E o que é que verificamos hoje? É que, quando os agentes da tributação fazem incidir a sua fiscalização sobre o imposto, os nossos contribuintes, a braços com imensos problemas por virtude da aplicação do normativo da alínea b) do artigo 11.º do Código do Imposto de Transacções, encontram, em termos de cálculo de imposto a entregar ao Estado - calculado em função de despesas e do consumo de matéria-prima -, o montante tributário que têm obrigação de entregar ao Estado. Mas, pela deficiência de grande parte dos nossos técnicos que trabalham com o imposto e pelas faculdades de evasão que o próprio Código possibilita, há imensos casos de pequenos contribuintes que, neste momento, estão literalmente falidos, como consequência das acções de fiscalização nos termos da alínea b) do artigo 11.º do Código do Imposto de Transacções.
È se o sistema fiscal tem a obrigação de ser límpido e cristalino para o contribuinte, no sentido de este poder saber qual é a sua quota de responsabilidade em termos de liquidação, cobrança e entrega do imposto nos cofres do Estado, é importante também sabermos que o actual sistema do Código do Imposto de Transacções não dá aos contribuintes essa garantia no cumprimento das suas obrigações.

Outro dos aspectos que se prende com o actual imposto de transacções - para além deste problema jurídico-fiscal em que assenta a tributação sobre o consumo -, e contrariamente ao que tem sido produzido nesta Câmara praticamente em todas as intervenções que foram feitas, tem a ver com a organização administrativa exigida pelo actual Código do Imposto de Transacções.

Quando ouço nesta Assembleia dizerem que o IVA vem exigir mais organização aos contribuintes, fico triste, porque isso não corresponde à verdade...

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... e só revela um desconhecimento da situação actual.
De facto, o Código do Imposto de Transacções, nos seus artigos 75.º e 76.º, exige a existência de livros modelos 7, 8 e 9, para registo de operações de todas as mercadorias. E com uma agravante: para além destas obrigações, exige ainda que os contribuintes tenham registos (verbetes de existências) do movimento de todas as operações que se verifiquem no seu estabelecimento.
O Código do IVA prevê três cenários possíveis para esta movimentação.
Em primeiro lugar, o cenário das empresas que já têm contabilidade regularmente organizada nos termos do plano oficial de contabilidade - a estas empresas obriga apenas a que os seus planos de contas façam a interligação e discriminação, quer do imposto pago

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a montante quer dos impostos pagos a jusante. Este é o aproveitamento das verdadeiras potencialidades de um Código da Contribuição Industrial.

Para os contribuintes que transaccionem, no exercí-
cio dos seus negócios, valores superiores a 3500 con-
tos, o Código do IVA prevê a obrigatoriedade apenas
da indexação, em termos de taxas diferentes, ás dife-
rentes transacções.

E para os pequenos contribuintes, os contribuintes do grupo C, o que exige o Código? Apenas um livro onde se registem discriminadamente aquisições - valor da mercadoria e valor do imposto. Nem tão-pouco obriga a que estas empresas tenham um serviço de facturação que explicite qual o seu movimento à saída, ou seja, a jusante. O Código prevê que, nessas circunstâncias, o contribuinte entregue nos cofres do Estado 25 % do imposto pago a montante.

Por isso, quando vêm aqui dizer que o Código exige maior organização, isso não corresponde à verdade, visto que apenas vem exigir, outrossim, maior qualidade dos técnicos que trabalham com o Fisco e não maiores custos administrativos.

Devo dizer, aliás, que uma pequena unidade industrial exige um funcionário exclusivamente para tratar dos aspectos administrativos do imposto de transacções. Já o disse numa declaração aqui proferida na Assembleia e repito-o: se essa pequena unidade industrial não quiser que uma fiscalização lhe calcule o imposto por via da presunção, nos termos da alínea b) do artigo 11.º do Código do Imposto de Transacções, precisa, para preencher verbetes de existências e os livros modelos 7, 8 e 9 do imposto de transacções, de um funcionário administrativo só para essas funções. Ora isso não acontece no caso do IVA.

Mas, para além disto, e ainda no domínio da burocracia, não é despiciendo pensar que, com a anulação do imposto do selo devido pelo artigo 141.º da Tabela Geral do Imposto do Selo, se vem também arrumar uma série de burocracia que aqui é exigida, nomeadamente os livros de registo para efeitos de liquidação do imposto do selo.

Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando se afirma que as pequenas unidades empresariais não podem suportar os custos administrativos exigidos pelo Código do IVA, não se está a dizer a verdade, porque a verdade é efectivamente outra.

Os problemas que em sede de organização o Código do IVA trará prendem-se mais com aspectos qualitativos, ou seja, é exigido aos nossos técnicos uma maior perfeição na execução dos elementos a entregar ao Fisco. 15so é importante. É importante porque o trabalho que é apresentado ao Fisco não tem, na maioria dos casos, credibilidade. A continuarmos com este estado de desorganização das nossas empresas, não podemos dar cumprimento ao disposto na Constituição da República Portuguesa, na parte em que se afirma que as empresas serão tributadas pelo seu rendimento real - é letra morta, não corresponde à verdade.

E, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sabemos que neste momento 70 % dos contribuintes dos grupos B e C da contribuição industrial e 20 % do grupo A são calculados com base nas presunções e não com base no movimento real que tenham apresentado. Porquê? Porque os elementos de que o Fisco dispõe não são passíveis de credibilidade!

Perante todo este quadro em que se movimenta a tributação do consumo, é imprescindível que esta mesma tributação sofra uma alteração profunda e ganhe uma nova filosofia.
Ora, esta nova filosofia de tributação surge precisamente no Código do IVA.
Perguntarão os Srs. Deputados como. Através do processo do crédito do imposto, este mecanismo é conseguido.
De facto, quando no imposto de transacções a mercadoria, desde a sua origem, matéria-prima, até ao consumo final, percorre todo um circuito praticamente impossível de ser reconstituído, já no Código do IVA, se houve um contribuinte que a meio do percurso quebre esta cadeia tributária, o Estado, pelo menos, durante esse percurso, não se viu defraudado das receitas que lhe são devidas pelo mesmo imposto. E será bom dizê-lo que este mesmo contribuinte, através deste processo de crédito do imposto, será mesmo penalizado, na medida em que não pode deduzir a juzante o imposto que pagou a montante. Então, uma de duas coisas se passam: ou este contribuinte tem um valor acrescentado da mercadoria extremamente elevado, ou então perde competitividade comercial.
Esta a grande riqueza do IVA em termos de filosofia - o mecanismo do crédito de imposto, que permite a eficácia, em termos económicos, na recolha de receitas do IVA.
Ouvi ontem aqui alguns Srs. Deputados insurgirem-se contra o facto de estar previsto que este imposto não seja cobrado através das tesourarias da Fazenda Pública.
Também aqui estamos no domínio de uma nova concepção, e só é de louvar o espírito inovador que o Governo teve nesta matéria, já que o tratamento informático dos contribuintes permitirá minimamente, numa primeira fase, detectar se as oscilações dos negócios de um contribuinte se justificam ou não. E, não se justificando essas oscilações, o Estado tem a obrigação, como disse aqui em Dezembro, de fazer as fiscalizações por dentro, estando na posse dos elementos capazes para que os nossos agentes administrativos não andem na triste figura de, nas visitas aos contribuintes, terem de ver declarações modelo 13 ou papéis sem interesse nenhum, esquecendo-se o grosso da coluna.
O Estado, através do tratamento informático, através do ficheiro nacional de contribuintes que tem, fica com a possibilidade de controlar por dentro, não só toda a movimentação do imposto mas, inclusivamente, as oscilações que se possam verificar, indo imediatamente analisar a sua justificação em sede de tributação sobre o consumo.
Por outro lado, voltando novamente ao domínio da organização exigida pelo Código do IVA, que tem a ver com o Código da Contribuição Industrial, isto é, com os rendimentos produzidos pelas unidades económicas, queria dizer que aquilo que está mal, do meu ponto de vista, não é o facto de o IVA exigir organização. O que está mal, isso sim, é o facto de, até este momento, não ter sido pedida organização nenhuma aos contribuintes, particularmente aos do grupo C.
Ora, conhecendo a história deste grupo de contribuição industrial, que gera receitas consideráveis, nós vemos que apenas em Dezembro de 1980 (através do Decreto-Lei n.º 537) é que foi exigido a estes contribuintes que fizessem minimamente o registo, não das suas vendas mas das suas compras.

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Enquanto o Governo não se munir de todos os elementos necessários para que possa aplicar o imposto com base no rendimento real, teremos sempre no nosso sistema fiscal aquilo a que chamamos aberração fiscal, teremos sempre a utilização das presunções, teremos sempre esse problema terrível.
Por outro lado, entendemos que é extremamente positivo que esta Assembleia da República tenha pedido a ratificação do Código do IVA.
Tal proporciona a esta Assembleia um debate na sede restrita da tributação sobre o consumo, sendo certo que esta Câmara tem andado um pouco arredada e um pouco alheia à discussão do sistema fiscal.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é impossível pensar-se em sistema fiscal, é impossível aceitar-se de bom grado o sistema fiscal que actualmente temos. E isto porque, em sede do contribuinte, o sistema fiscal tributa rendimentos, esquecendo toda a situação do contribuinte. O imposto complementar perdeu as características de um imposto pessoal, uma vez que estamos a tributar rendimentos e não a capacidade tributária. Estamos a tributar não a verdadeira capacidade do contribuinte em poder comparticipar para a vida da Nação mas sim rendimentos isolados.
15to quer dizer o seguinte: o nosso sistema fiscal está a precisar de uma reforma profunda - reforma da concepção da tributação, reforma em que o cidadão se sinta justamente tratado no pagamento dos impostos devidos ao Estado.
O início está aí - através da tributação indirecta, através do IVA.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é necessário que debates destes se gerem nesta Assembleia e que em breve tenhamos a oportunidade, talvez não de pedir a ratificação de uma reforma fiscal profunda, mas de discutir todo o sistema fiscal, toda à tributação actualmente vigente em Portugal.
E não tenhamos medo de nos metermos nestas reformas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Na próxima Assembleia!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, deixe-se lá de brincadeiras!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Não é brincadeira!

O Orador: - Não tenhamos medo disto, porque a regulamentação do Código do IVA será, possivelmente daqui a 1 ano, muito superior ao próprio Código. Mas isso será um sinal de que a reforma é profunda e de que a reforma vale a pena.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos de parabéns, Portugal merece um novo sistema de tributação e o Código do IVA, não respondendo ao desafio da entrada na CEE mas porque o sistema fiscal está mal, deve ser implementado e deve avançar para bem de Portugal e para a dignificação desta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi atentamente, desde ontem, todas

as intervenções feitas por deputados competentes no ramo fiscal e vou referir as linhas mestras que tirei dessas intervenções. Os partidos democráticos não são contra a filosofia do Código do IVA, com excepção talvez do PCP, que, interpelado por um Sr. Deputado, disse que nenhuma conclusão se poderia tirar. Mas, porque nenhum deputado do PCP declarou que estava contra o IVA, concluirei que também o PCP está de acordo com o referido Código. 15to significa que toda esta Assembleia da República está de acordo com ele e, portanto, não é por aqui que estamos em desacordo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação ao Código é falso!

O Orador: - Há sim motivos de desacordo porque se poderá considerar uma taxa maior ou menor, bem como um maior ou menor crescimento de inflação. Apontou-se um crescimento de preços, sem mudança de margem comercial, entre 4% e 5% no limiar, e no limiar contrário superior, com talvez algum aumento de margem, um acréscimo adicional de 8%.
Não fiz as contas, mas até acredito que seja verdade esse pequeno acréscimo de custos no primeiro momento da entrada em vigor do novo imposto. Aceito que assim seja. De qualquer maneira, parece-me que também não foi essa a razão fundamental para se opor à entrada em vigor imediata do IVA. Foi sim a falta de regulamentação necessária à entrada do imposto. Mas o Sr. Secretário de Estado do Orçamento foi ontem muito claro ao referir que toda a regulamentação está aprovada em Conselho de Ministros e pronta, todos os modelos de livros e impressos estão na Imprensa Nacional a ser ultimados para serem distribuídos e parece, portanto, estarem criadas em princípio, as condições materiais para se implementar o IVA.

Levantar-se-ia outro problema que seria o da modificação das listas, tendo-se defendido, aquando da discussão do Orçamento para 1985, que diversos produtos deveriam mudar de escalão de taxa, alguns da taxa 8% para a taxa zero, outros da taxa 16% para a taxa 8%. Parece-me que essa nova listagem também foi feita e digo mudança de taxa e não isenção, porque pretendo fazer bem esta distinção. É que a isenção simples não tem razão de ser porque só vai agravar, segundo penso, o consumidor final. 15to acontecerá se batermos muito na isenção simples e se essas pessoas isentadas não estiverem muito próximas do consumidor final.
Quanto à isenção pura, à taxa zero, ela também é discutível, na minha opinião, e é-o no seguinte sentido: sendo qualquer imposto indirecto um imposto real, não olha, em princípio, às condições pessoais, quer sociais quer económicas. Não é pelos impostos indirectos que se fará distribuição de rendimentos para a justiça social, sendo isso uma informação deturpada. Por onde se faz a distribuição de rendimentos em ordem à justiça social é através de um sistema de impostos directos devidamente organizado e bem feito. 15to sim, porque o IVA é um imposto sobre a despesa e, simultaneamente, um imposto real.
Poder-me-iam objectar dizendo que a diferenciação de taxas poderá favorecer determinados produtos de primeira, segunda ou terceira necessidade e eu poderia até concordar com essa objecção. Mas também não é por aí que se faz justiça social; embora a percentagem do rendimento gasto pelas classes mais desfavorecidas seja muito maior nos bens essenciais, o que é necessário

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não é dar igualdade de tratamento em relação ao consumo, mas sim dar rendimento a essas classes mais desfavorecidas, através de isenção ou de progressão dos impostos reais além das medidas normais de economia.
Daí que eu pense também que não é razão suficiente estarmos a dizer que é necessário modificar taxas e reformular a filosofia do IVA, porque o que é necessário - e ainda há pouco isso foi afirmado - é que este imposto entre imediatamente em vigor. 15to porque estamos a dissimular coisas que são extraordinariamente graves no sector da fiscalidade e da administração e falo com conhecimento de causa resultante de 25 anos de trabalho numa empresa.
Estamos nitidamente a proteger a fraude e a evasão fiscal com a permissão da não entrada deste imposto em vigor. E essa situação não resulta apenas do imposto de transacções, mas também da contribuição industrial. Nisto ninguém fala, mas, é importante que alguém tenha a coragem para o dizer, porque este imposto, através do controle das transacções, permite ir controlar os rendimentos e aqui é que é natural que muitos interesses se estejam a bater para que este imposto não entre em vigor.
Como homem de empresa quero afirmar aqui que sou absolutamente adepto e defensor de que este imposto entre o mais rapidamente possível em vigor para se evitar e reprimir toda essa evasão e fraude fiscal. 15to pode-se fazer, como digo, através de uma maneira simples que é o novo imposto com uma nova filosofia.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PSD é defensor de que este imposto - e dado que demonstrei que não existe falta de instrumentos nem de legislação - entre o mais rapidamente possível em vigor.
Sabemos que a proposta do CDS não é radical quanto a datas. Nós também não queremos ser radicais, somos dialogantes, mas também não queremos que digam que a coligação só ressuscita às vezes porque está morta.
Queremos dizer que neste ponto não estamos com o Grupo Parlamentar do PS e não defendemos que este imposto entre em vigor no dia 1 de Janeiro de 1986. Defendemos que ele deve entrar em vigor durante o ano de 1985 e se, como foi aqui afirmado por um membro do Governo responsável pelo sector, tudo está pronto, então que o mais tardar até Setembro seja implementado este imposto com a força e com vigor, porque Portugal agradecerá essa medida.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que lamento não ter estado no hemiciclo quando o Sr. Deputado Domingues Azevedo fez a sua intervenção, para lhe pedir a ele também esclarecimentos.
Eu diria que no fundo, muito embora o Sr. Deputado Portugal da. Fonseca tenha agora afirmado que o seu grupo parlamentar não estava de acordo com o Grupo Parlamentar do PS, curiosamente as duas intervenções dos dois grupos parlamentares foram coincidentes nesta matéria. Ambos são defensores do IVA - e até aí tudo bem, o meu grupo parlamentar também o defende e já várias vezes o expressou nesta

Câmara - mas não são ambos defensores de uma entrada em vigor rápida, imediata. Até aqui o PSD defendia a entrada em vigor em 1 de Julho, mas agora, depois da intervenção do Sr. Deputado Portugal da Fonseca, verifiquei que afinal era em Setembro ou em Outubro.
Nós não marcámos datas, nem o nosso projecto de resolução o faz. Quem já marcou datas, mais uma vez com grande poder de antecipação sobre esta Câmara, foi o Sr. Primeiro-Ministro, que hoje de manhã na rádio, segundo me disseram, já afirmou que o imposto entrava em vigor no dia 1 de Janeiro de 1986.
Gostaria de saber como é que se coordenava a posição do Sr. Primeiro-Ministro com a do Sr. Deputado Domingues Azevedo. Não as consigo perceber bem, mas naturalmente o defeito é meu, visto que já não consigo perceber bem nenhuma destas coisas!
Foi dito aqui numa intervenção que o IVA não implica maior organização. É curioso que se diga isto, porque um imposto que é plurifásico (aplica-se a todas as fases do processo produtivo) é aqui comparado, em termos de maior ou menor complexidade de organização que implica da parte das empresas, com um imposto que era monofásico e que se aplicava apenas a uma fase do processo produtivo. isto é, ou os produtores ou os grossistas pagavam imposto sobre as transacções, agora os retalhistas também vão pagar e pergunto se apenas este facto não impõe uma maior organização a todo o comércio retalhista, que não está abrangido pelas medidas especiais que sem dúvida vêm consagradas no Código. Suponho que isto é evidente e claro para toda a gente, sendo precisamente este sector da vida económica portuguesa que se queixa do atraso que houve na preparação da entrada em vigor do novo imposto.
Em relação ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca, queria dizer que não tenho dúvidas nenhumas em subscrever os seus argumentos de que o IVA - e isso consta, aliás, da minha intervenção de ontem -vem evitar fuga ao imposto de transacções que sem dúvida se registava. Direi que o combate à fuga e à fraude se pode e deve fazer também em sede própria, não devendo desistir-se dessa atitude.
É evidente que é positivo pôr em vigor um imposto que permita evitar essa fuga e essa evasão, mas não poderá ser essa a única medida a tomar.
Por outro lado, quero perguntar ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca, de uma vez por todas, se entende que os agentes económicos e a regulamentação necessária estão preparados para que o imposto entre em vigor no dia 1 de Julho. É só essa a questão que o CDS põe. Entende ou não que é necessário, do ponto de vista do Governo, implementar a autorização legislativa que lhe foi concedida para alterar as listas t e ii e para aumentar o número das isenções, designadamente em relação aos medicamentos e aos livros. Estas questões é que têm de ter resposta. Não se trata de questões genéricas sobre o IVA porque nós em relação a ele, em geral, não pusemos questão nenhuma. Será, portanto e em suma, chover no molhado vir colocar novamente essa questão.
Por outro lado, já não seria chover no molhado e apontar alguns dados concretos sobre os efeitos inflacionistas da entrada em vigor deste imposto nestas condições, sem esclarecer, designadamente, o problema da transição entre imposto de transacções e IVA. .

Vozes do CDS: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra
o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal de Fonseca (PSD): - Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Sr. Deputado Nogueira de Brito: Penso
que algumas coisas do que disse não se dirigiam direc-
tamente a mim. Referiu que o CDS não percebia estas
coisas, que nós defendemos a entrada imediata em vi-
gor do Código do IVA e que o Sr. Primeiro-Ministro
veio declarar na rádio que entra em vigor em 1 de Ja-
neiro de 1986.
Mas, Sr. Deputado, somos nós que dependemos do
Governo ou é o Governo que depende aqui de nós?
Acusam-nos de governamentalização, quando exprimi
mos a nossa opinião sincera e real da vida quotidiana,
e vem então dizer que o Sr. Primeiro-Ministro é que
manda na Assembleia da República!
Sr. Deputado Nogueira de Brito, não sei o que o
Sr. Primeiro-Ministro disse, tenho muito respeito e con-
sideração por ele, mas eu disse aquilo que entendia e
que o meu grupo parlamentar entende e é nesta Câ-
mara que os problemas se devem debater. Não queria
levantar outras pressuposições.
O Sr. Deputado diz que poderá haver problemas de
inflação de acréscimo de custos, mas não haverá bu-
racos orçamentais. Ó Sr. Deputado, no ano passado foi
a bronca dos buracos orçamentais, mas estará a opo-
sição até aqui - daqui para a frente não sei como é
que será - disposta ela mesmo a abrir outros buracos
orçamentais para dar pancada depois? Não, Sr. Depu-
tado, para mim não, porque não gosto de embarcar
em buracos. Posso-me meter no saco da rede, mas não
em buracos!
O Sr. Deputado disse também que não percebia o
controle do IVA relativamente ao IT. Mas eu não disse
que era só para o IT, referi que era também para a
contribuição industrial e isso para mim é o mais im-
portante, Sr. Deputado. Não é só para o IT mas sim Risos.
também para a contribuição industrial e aí temos de
ter muito cuidado porque o Sr. Deputado sabe tão bem
ou melhor do que eu que a contribuição industrial é
um dos grandes cancros do nosso sistema fiscal.
Se é difícil fazer o controle directo - e eu como pe-
rito sei que é - ao menos que haja um controle feito
por via indirecta.
Quanto à preparação dos agentes económicos,
Sr. Deputado, não queria chamar nomes ao pequeno
merceeiro da minha aldeia, não queria dizer qualquer
coisa em desabono dele e do pequeno -comerciante da
minha vila. Quando falo com eles vejo que até sabem
o que querem e até são capazes de já saber preencher
aquilo que querem e quando não sabem vêm-me per-
guntar como é e trazem-me já elementos na mão para
lhes dizer como vai ser, sendo isto sinal de que estão
preparados.
Sr. Deputado, há cursos que as direcções de contri-
buições e impostos distritais estão a fazer em diversas
associações e organizações, estando a ensinar o «b-a
-ba» e eles vão lá aprender porque querem fazê-lo e
estão preparados para isso.

Mais: além dos agentes económicos o aparelho de Es-
tado está preparado. O Governo disse que sim e não
tenho nenhuma razão para duvidar do Governo que me

afirmou que o aparelho de Estado está absolutamente
preparado para arrancar imediatamente com o imposto.
Sendo assim, porque esperamos?

Quanto às listas dos bens, até já tenho em meu poder um exemplar igual aos que estão na Imprensa Nacional. Se quiser dou-lhe uma fotocópia.
Portanto, Sr. Deputado, continuo a afirmar que nós, que somos responsáveis pela política deste país, devemos ter a coragem de arrancar imediatamente com este imposto para bem de Portugal.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Domingues Azevedo, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente, é para usar o direito de defesa em relação à intervenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito, uma vez que essa é a única figura regimental que posso usar neste momento.

.O Sr. Presidente: - Nessas circunstâncias, o Sr. Deputado Nogueira de Brito que, com certeza, vai pedir a palavra invocando o seu direito de defesa face às respostas do Sr. Deputado Portugal da Fonseca, vai aguardar que o Sr. Deputado Domingues Azevedo use o direito de defesa relativamente às suas declarações.

Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, entendo que V. Ex. e não percebeu bem toda a minha intervenção, porque não esteve sempre aqui. Se V. Ex.ª tivesse ouvido bem a minha intervenção, não obstante ter sido uma intervenção não escrita e elaborada só em alguns tópicos, em nenhum espaço dela referi que o imposto sobre o valor acrescentado deveria entrar em vigor no dia 1 de Julho. Gostaria de esclarecer isto.

Disse que há necessidade urgente de se alterar a actual situação de tributação sobre o consumo, mas não fixei datas, Sr. Deputado. De qualquer modo, perdoo-lhe esse pormenor porquanto não estava presente.

A segunda questão que gostaria de referir, Sr. Deputado, prende-se com as dúvidas de V. Ex.ª acerca da minha afirmação de que, efectivamente, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado não vem exigir maior organização.

Sr. Deputado, reafirmo integralmente a minha afirmação, e provo-a. Actualmente os contribuintes do grupo C têm os seus livros do modelo 18 ou 19. Com a entrada do IVA, a única alteração para estes contribuintes, que serve simultaneamente para o IVA e para a contribuição industrial, é eles dizerem que é x de imposto e é y de mercadoria.

Sr. Deputado, a introdução do IVA não implica mais organização, entendamo-nos quanto a isto. O contribuinte chega ao fim do mês e, sobre o imposto que pagou a montante, entrega ao Estado 25 % do que liquidou. Não há efectivamente um aumento de burocratização com a entrada em vigor do IVA.

Eram apenas estas as explicações que gostaria de lhe dar, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar gostava de dizer que me parece mal a banalização da figura do direito de defesa em maté-

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rias deste tipo. Os Srs. Deputados Portugal da Fonseca e Domingues Azevedo não ofenderam a, minha honra, fizeram, eles sim, algumas confusões lamentáveis, mas terão de ficar com elas porque não vou defender coisa nenhuma.
Mantenho o que disse, tudo o que afirmei é correcto
e em relação ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca di-
ria que ele vai já tão longe que, pelos vistos, quer afir-
mar que não se trata de um imposto novo. Até pode
ríamos ser levados a concluir que o IVA, no seu
entender, até já substitui a contribuição industrial.
Bom, não sei se terá querido ir tão longe, Sr. Depu-
tado! _

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Portugal da Fonseca, apesar da exuberância dos seus gestos, pergunto-lhe qual a figura regimental que invoca para usar da palavra.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - A mesma figura regimental que o Sr. Deputado Nogueira de Brito invocou.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito deu explicações, na medida em que o Sr. Deputado Domingues Azevedo tinha exercido o direito de defesa.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Também queria dar explicações, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Não pode, Sr. Deputado.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - O Sr. Presidente quer obrigar-me a pedir a palavra para exercer o direito de defesa quando não fui ofendido.

O Sr. Presidente: - Não quero!

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Queria unicamente dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Presidente: - Mas não pode. Nesses termos não pode.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): ; Esse esclarecimento é o seguinte...

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado Portugal da Fonseca...

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Então, como fui ofendido na minha inteligência, vou pedir a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Naturalmente que esta questão é muito subjectiva, mas como tem sido uma característica da Presidência da Assembleia conceder a palavra, vou conceder-lha mais uma vez.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria unicamente dar um simples esclarecimento ao Sr. Deputado Nogueira de Brito. Não confundo, nunca confundi e penso que não virei a confundir - assim Deus me dê saúde física e mental o que é a contribuição industrial e o que é o IVA.

O que disse foi que hoje a fuga à contribuição industrial é um facto a nível de empresa, que nem sequer imaginamos, apesar de todos os técnicos de contas, sem ofensa para eles; apesar de todos os revisores oficiais de contas, que são obrigados a ter e também sem ofensa para eles; apesar de todos os conformistas, sem ofensa para eles. A fuga da contribuição industrial é, infelizmente, um facto terrível no nosso país. E isto porque há guias de remessa com 3, 4 ou 5 livros e a mesma numeração e se escapa uma guia de remessa, um milhão de quilos de um produto transformam-se em 10 Kg do mesmo produto na facturação, com dinheiro recebido por fora e outras coisas assim. O Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, que não é assim...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Está enganado; não sei nada disso!

O Orador: - E há ainda outras coisas que não lhe quero dizer.
Acontece, portanto, que o imposto sobre o valor acrescentado (IVA) virá ajudar a controlar esse facto. E é por isso que, como homem de empresa - repito-o -, sou defensor absoluto de que este imposto entre já em vigor.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para dar explicações, Sr. Deputado Nogueira de Brito?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É só para dizer ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca que está enganado.

Ouvi tudo perfeitamente e oiço sempre com muita atenção o Sr. Deputado Portugal da Fonseca. Simplesmente, não sei nada do que o Sr. Portugal da Fonseca acabou de dizer.

Risos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições e, portanto, vamos passar imediatamente à votação do projecto de resolução n.º 53/III, subscrito por um grupo de deputados do CDS, de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado Nogueira de Brito e que vai ser lido pelo Sr. Secretário Leonel Fadigas.

Foi lido. É o seguinte:

Projecto de resolução n.º 53/III

Os deputados abaixo assinados, atento o alcance das propostas de alteração apresentadas, apresentam, nos termos do disposto no artigo 193.º do Regimento, o presente projecto de resolução, com vista a suspender a vigência do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, até à eventual publicação da lei que visa alterá-lo ou até à rejeição de todas aquelas propostas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 53/III.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI e com a abstenção do PSD.

O Sr. Presidente: - Temos agora a votação do requerimento de baixa à Comissão, que tem as assinaturas regimentais, cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Nogueira de Brito e que vai ser lido pelo Sr. Secretário Leonel Fadigas.

Foi lido. É o seguinte:

Os deputados abaixo assinados do Centro Democrático Social (CDS) requerem, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, a baixa à Comissão de Economia, Finanças e Plano, das propostas de alteração apresentadas, referentes ao Decreto-Lei n.º 394-13/84, de 26 de Dezembro, que aprova o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, para discussão e votação na especialidade, sendo-lhe fixado o prazo de 30 dias.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI e a abstenção do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao final da nossa sessão. Porém, agradeço que não saiam, pois temos ainda para resolver o problema da ordem do dia da próxima sessão.
Não concluímos a ordem de trabalhos de hoje, na medida em que o projecto de lei n.º 196/III, da UEDS, que amnistia as infracções disciplinares nos órgãos de comunicação social, não chegou a ser discutido.
Dado que não houve uma conferência de líderes que habilitasse o Presidente da Assembleia a fixar uma ordem de trabalhos para a próxima terça-feira ou para a próxima semana, a próxima sessão da Assembleia da República será na próxima terça-feira, às 15 horas; terá período de antes da ordem do dia e da ordem do dia constará a continuação da ordem de trabalhos de hoje.
Creio bem que neste momento não será viável qualquer outro tipo de indicações sobre a ordem de trabalhos.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, creio que estava no espírito de V. Ex.ª convocar igualmente uma reunião de líderes parlamentares para a próxima terça-feira.

O Sr. Presidente: - Naturalmente que será convocada essa reunião de líderes parlamentares, Sr. Deputado. O Sr. Presidente da Assembleia da República encarregar-se-á de o fazer.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, como já tive oportunidade de dizer, tendo em conta que haveria um largo consenso quanto à solução adoptada para o problema pendente relativo ao projecto de lei n.º 196/III, pelo nosso lado não fazíamos objecção a que ele fosse votado na sessão de hoje. No entanto, tendo também em conta o quadro em que a Assembleia da República está a funcionar, não nos opomos à solução que V. Ex.ª acaba de anunciar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
António Gonçalves Janeiro.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
João do Nascimento Gama Guerra.
José Maximiano Almeida Leitão.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):
Fernando José da Costa.
João Luís Malato Correia.
José Vargas Bulcão.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.

Partido Comunista Português (PCP):
João António Torrinhas Paulo.
Manuel Correia Lopes.

Centro Democrático Social (CDS):
João Carlos Dias Coutinho Lencastre.
José Miguel Anacoreta Correia.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Almerindo da Silva Marques.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Edmundo Pedro.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Joaquim Manuel Ribeiro Arenga.
José de Almeida Valente.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Torres Couto.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Manuel Filipe Santos Loureiro.
Maria Luísa Modas Daniel.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Adérito Manuel Soares Campos.
Arménio dos Santos.

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Fernando José Alves Figueiredo.
João Maurício Fernando Salgueiro.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
José Pereira Lopes.
Manuel da Costa Andrade.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
Lino Carvalho de Lima.
Luís Francisco Rebelo.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Odete Santos.
Octávio Rodrigues Pato.
Zita Maria Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Gomes de Pinho.
Horácio Alves Marçal.
Joaquim Rocha dos Santos.
José António Morais Sarmento Moniz.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Corregedor da Fonseca.
Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

AS REDACTORAS: Cacilda Nordeste - Maria Amélia Martins.

PREÇO DESTE NÚMERO 90$00

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