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28 DE FEVEREIRO DE 1986 1267

Mas a independência e o pluralismo que o actual sistema asseguram -manifestamente insuficientes e desequitativos em atenção aos protestos a que têm dado azo em todos os quadrantes- são qualidades que não se atingem necessariamente por força de disposição legal que as pretenda impor. País em que só o Estado pode dispor do acesso à emissão é País em que vigora uma concepção reduccionista deste fundamental meio de expressão que é a televisão.
Também não cremos no argumento de que, no actual contexto, pode haver uma verdadeira concorrência entre os dois canais. Pode-se criar, porventura, alguma competição entre os respectivos programas. Todavia, sempre dentro da mesma matriz enformadora imposta, ainda que involuntariamente pelo domínio exclusivo do Estado.
Ao fim e ao cabo quem defende, em si mesmo, o monopólio estadual de emissão com fundamento nas suas virtudes intrínsecas? Poucos, e quem se tem empenhado na sua manutenção, com base em alegados impedimentos jurídicos, mormente de natureza constitucional? Alguns mais.
O CDS tem sustentado, nesta assembleia, não existir preceito constitucional de que decorra estar vedado, a outras entidades que não o Estado, o acesso à exploração da emissão.
Sendo a televisão um bem do domínio público por força da Constituição da República, nada impede que a sua exploração seja atribuída em regime de concessão (de domínio público e de serviço público).
Não há pois, a nosso ver, qualquer conflito ente a proposta de lei n.º 5/IV e os preceitos constitucionais vigentes.
Por isso votá-la-emos favoravelmente ou, em alternativa, os requerimentos entretanto apresentados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: dentro em breve mais emissões estrangeiras serão captáveis em Portugal. Já agora muitos milhares de pessoas seguem, dia a dia, os programas da televisão espanhola. A alternativa concedida aos portugueses para os programas da actual RTP vai ser, apenas, uma das várias emissões estrangeiras que chegarem até nós? Estaremos, se assim for, a defender a nossa língua, costumes e tradições populares? Estaremos, dessa forma, a incentivar a nossa produção artística e em geral a estimular o nosso desenvolvimento cultural?
Em suma: Estaremos conscientes do que, para além de tudo, está em jogo? Bom será que estejamos.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao iniciar a minha intervenção neste debate, quero dizer claramente que o irei fazer com a preocupação de impedir que seja criada irresponsavelmente uma questão religiosa. Infelizmente, no entanto, o modo como alguns órgãos de comunicação social costumam tratar questões como esta, a ausência de informação por parte do Governo em relação à Assembleia e os princípios que terão presidido a redacção desta proposta de lei - incorrectos, pelo menos - deixam-nos algumas sérias apreensões.
Foi aproximadamente assim que, em Fevereiro de 1982, o Prof. Jorge Miranda, então deputado eleito neste Parlamento, iniciou a sua intervenção a propósito das questões de inconstitucionalidade suscitadas em redor do texto de uma proposta de lei semelhante aquele com que, de momento, esta Câmara se vê confrontada. Ou seja: quatro anos depois, também razões políticas acabaram por ditar um texto mais que discutível, este que, agora, constitui tema de debate.
É que, de facto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que neste momento realmente está em causa não é o direito da Igreja Católica também fazer ouvir a sua voz através da televisão. Porque isso nós o defendemos, porque isso sempre o defendemos, clara e inequivocamente, desde que não sejam violados os princípios constitucionais. Só que, de facto, há pontos em que a Constituição seria claramente posta em causa se esta proposta de lei viesse eventualmente a ser aprovada.
Nem valerá a pena, no caso, referir-me à polémica questão da propriedade, segundo a qual o adjectivo «próprios», referido no n.º 5 do artigo 41.º da Constituição, deverá, segundo uns, ser entendido como «privativos» e, segundo outros como «adequados». Não esqueço simultaneamente a leitura daqueles que consideram que, por si só e em abstracto, a concessão a entidades privadas da utilização dos meios e serviços de televisão não é inconstitucional, já que ela não estaria abrangida pela proibição estatuída no artigo 38.º da Constituição. Argumentam, a propósito, que, com aquele artigo, apenas se pretendeu proteger, não propriamente a integração obrigatória do serviço de televisão num qualquer dos sectores de propriedade dos meios de produção, mas apenas e tão-somente o carácter público desse serviço. É, em resumo, a importante questão da utilização e gestão aqui colocada em anteriores legislaturas e que, a seu tempo, poderá merecer debate mais aprofundado.
Também não valerá a pena alongarmo-nos sobre a questão, hoje ultrapassada, da personalidade jurídico-pública por alguns atribuída à Igreja Católica. Esta é, na verdade, um sujeito de direito internacional, mas, na ordem interna portuguesa, não pode ser considerada pessoa colectiva de direito público.
Assim, debruçar-me-ei antes sobre as referências que, no diploma governativo, são feitas à Igreja Católica em confronto com «as restantes confissões religiosas». Deixamos no entanto, dada a sua complexidade, o problema de saber se a consagração do acesso à televisão, por parte dessas mesmas confissões religiosas, não exigirá que o legislador consagre, desde logo, os termos em que outras confissões, que não a Católica, ou até mesmo entidades privadas, poderão dele beneficiar.
É que, além de garantir a todas as confissões religiosas a utilização de todos os meios de comunicação social em ordem à prossecução do seu múnus pastoral, a nossa actual Constituição, ao contrário da de 1933 após a revisão de 1951 ou de outras como a espanhola ou a italiana (cito apenas dois dos exemplos mais significativos), não considera que a Igreja Católica deva ser objecto de qualquer tratamento especial. Nem certamente ela mesmo o permitiria, mais de 20 anos depois de um Vaticano II que, através de um dos mais importantes documentos produzidos por padres conciliares - a Gaudium et Spes -, proclamou a sua independência e a sua inequívoca autonomia em relação à «comunidade política».
Outra questão a merecer ainda uma referência especial diz respeito à competência legislativa, já que, no caso da proposta em causa, se trata de matéria da reserva relativa desta Assembleia. E é-o duplamente nos

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