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28 DE FEVEREIRO DE 1986 1241

Creio ter-me afastado utilmente dos absurdos horizontes mentais do Governo e ter dado exemplo concreto do que pode ser uma posição clara aposta na modernização de Portugal em atitude reformista. Proceder gradualmente e por etapas, sem precipitações, sem dogmas (salvo os da democracia e do Estado de direito) e confiante na utilidade dos ensinamento da experiência. Para resolver os problemas com justiça, cumpre equacioná-los com rigor. E antes de mais com rigor relativamente à determinação dos valores essenciais: a liberdade e a diversidade. Se bem interpreto a vontade maioritária, o que os telespectadores querem é uma televisão livre e variada. Os que quiserem uma televisão idealizada ou subserviente ao poder não encontraram, não encontram e não encontrarão em mim um representante do seu ponto de vista.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sottomayor Cardia solicitaram a palavra os Srs. Deputados Rui Machete e Costa Andrade.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, com a profundidade a que já nos habituou, V. Ex.ª fez um discurso sereno em que analisou, da sua perspectiva evidentemente, alguns dos problemas que esta proposta de lei coloca.
Gostaria de começar por sublinhar essa perspectiva serena, e intelectualmente correcta, em que o Sr. Deputado situou o problema - aliás, outra coisa, dele, não seria de esperar.
Como em breve terá ocasião de ver, Sr. Deputado Sottomayor Cardia, defendo, em muitos aspectos, pontos de vista diametralmente opostos, mas gostaria de não deixar em claro um aspecto em que estou, parece-me, em desacordo e do qual não fiquei com uma ideia nítida acerca do seu pensamento.
Evidentemente, que estamos de acordo em que deve ser dada a prevalência aos aspectos culturais sobre os económicos - aí não há dissensão em matéria de televisão -, mas o Sr. Deputado referiu com bastante insistência uma distinção entre o direito fundamental do receptor e pareceu-me excluir, da matéria dos direitos fundamentais, os problemas da emissão.

Uma Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora julgo que esse aspecto, que, como teremos oportunidade de ver ao longo do debate, não é, de modo nenhum, despiciendo, não é reconfortado por aquilo que resulta dos artigos da Constituição.
Efectivamente, quando a Constituição trata, em matéria de direitos, liberdades e garantias, a partir do artigo 37.º, dos problemas da liberdade de expressão e de informação, tem oportunidade de referir os meios de comunicação, como a imprensa e a televisão. É, portanto, a propósito dos direitos fundamentais que isso é referido e eu gostaria de sublinhar que, de uma maneira muito sintomática, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia omitiu qualquer referência ao artigo 41.º da Constituição, onde, de uma maneira clara, se diz, no seu n.º 5, que é garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticada no âmbito da respectiva confissão, bem como - e é isso que interessa - a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades.
Trata-se de um direito fundamental, julgo eu - e era sobre isso que gostaria de ouvir o Sr. Deputado -, e, mais do que isso, trata-se ainda e fundamentalmente, se quiser dentro da sua óptica, de um «privilégio» que é dado às confissões religiosas, o que infirma alguns aspectos, suponho, do seu raciocínio.
Por último, gostaria ainda de acrescentar que, se convergimos na prevalência dada à cultura sobre a economia, divergimos na confiança que temos sobre o papel do Estado em assegurar a imparcialidade nesta matéria televisiva, o que, aliás, os debates acerca da televisão têm vindo a demonstrar à saciedade, sejam quais forem os partidos que estejam no governo.
Não deixo de estranhar que o Sr. Deputado tenha tanta fé no papel motor do Estado em sociedades menos evoluídas, como será a nossa, visto que aí estamos claramente em posições antagónicas.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o pretende fazer já neste momento, tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Embora queira economizar o tempo de que o meu partido dispõe, não vou utilizar mais do que 30 segundos, pelo que vou responder já ao Sr. Deputado Rui Machete.
Sr. Deputado Rui Machete, muito obrigado pelas palavras que me dirigiu e pelas considerações que formulou.
O meu ponto de vista é o de que a emissão audio-visual é um direito não fundamental.
Quanto às confissões religiosas, elas dispõem de meios, mas não de todos os meios, de acesso à comunicação social, enquanto entidade emissora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, também eu começo por expressar uma concordância: a de que, do ponto de vista constitucional, as coisas não são claras. Não me parece que se possa com uma evidência soberana dizer, como o PS fez na comissão, que este diploma era manifestamente inconstitucional.
Também concordo com a atitude do Sr. Deputado, quando diz que talvez devêssemos deixar o assunto à prudência do Tribunal Constitucional para que, de uma vez por todas, a entidade competente se pronunciasse sobre a questão. Penso que essa seria a atitude mais correcta e não a de dizer com aquela certeza - aliás, não é própria de quem encara estes problemas com o grau de problematicidade que eles têm - e com aquelas evidências que o PS revelou.
Daí, portanto, a minha concordância com esta atitude intelectual que me merece todo o respeito. Já não me parece - e aqui começa a surgir uma certa discordância - que o Sr. Deputado deva, de certa maneira, condicionar as suas atitudes ao desenvolvimento da legislação penal em matéria de punição dos crimes cometidos através dá televisão.
Salvo melhor entendimento, a pergunta que o Sr. Deputado fez, não o explicitando mas dirigindo-a implicitamente ao Governo, está mal dirigida. É que o orgão com competência para legislar em matéria criminal é por definição a Assembleia da República.

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