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14 DE MARÇO DE 1986

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teúdo prevê uma criação de tribunais correccionais - salvo erro -, fazendo a ligação com o n.º 4 do artigo 212.º da Constituição.
Sendo assim, colocava-lhe somente esta questão: o n.º 4 do artigo 212.º da Constituição proíbe claramente que haja tribunais especializados no julgamento de certas categorias de crimes. Sabemos a razão desta proibição no julgamento dessas categorias de crimes, que, aliás, é de triste memória e não vale a pena explicar porquê.
No entanto, julgo que esta base III não se refere a categorias de crimes mas, sim, a graduação de crimes, ou seja, o tribunal teria competência para todos os crimes desde que a graduação fosse aquela.
Não sei se estou a ser claro, pelo que vou tentar explicar de outra maneira: não há exclusão de qualquer crime da competência do tribunal; o que existe é exclusão de certas penas, porque a classificação de tribunais criminais e correccionais dirige-se principalmente à graduação das penas. Ora, é este o esclarecimento que dirigia, neste momento, ao Sr. Deputado Mota Torres.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.

O Sr. Mola Torres (PS): - Sr. Deputado Correia Afonso, agradeço-lhe, em primeiro lugar, as simpáticas palavras que me dirigiu.
Em segundo lugar, gostaria, em relação à pergunta concreta que me colocou - que é mais um comentário sobre aquilo que expus durante a minha intervenção do que propriamente uma questão -, de dizer que o problema colocado na base III da proposta de lei n.º 8/IV , apresentada pela Assembleia Regional da Madeira, merece da parte de alguns conceituados juristas - devo começar por dizer que o não sou e daí alguma dificuldade que, em sede de especialidade, teria necessariamente, o que não obsta a que deixe de acompanhar este debate - a opinião de que a referida base do diploma em causa poderá levantar dúvidas sobre a sua constitucionalidade.
Outros pensam que não - também os ouvi -, daí que não tenha sido peremptório na afirmação da inconstitucionalidade, que, aliás, nem o poderia ser, até porque há órgãos próprios para dizer se a base m sofre ou não de tal vício.
No entanto, penso que a criação de um tribunal dessa natureza, isto é, de um juízo criminal, levanta algumas dificuldades, se não de natureza constitucional pelo menos de outra ordem, nomeadamente quanto à questão do juiz que presidirá a esse mesmo tribunal.
É um juiz - se for um único - que vai estar em permanência de funções durante um longo período e que tem necessariamente de julgar, de estar em situação complicada.
Em círculos maiores poder-se-ia admitir, por exemplo, a possibilidade da existência de vários juízes que, em rotatividade de funções, pudessem exercer e desempenhar o seu papel.
Neste caso concreto, isto levanta-me algumas dúvidas, que tive a preocupação de suscitar no Plenário, e penso que a comissão especializada vai dar rima resposta cabal a este problema.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se há pouco, para formular intervenções, os Srs. Deputados Magalhães Mota e José Manuel Mendes.

Neste momento e para o mesmo efeito, inscreveu-se igualmente o Sr. Ministro da Justiça, que demonstrou o desejo em intervir imediatamente.
Se os dois Srs. Deputados, antes inscritos, não virem inconveniente em que o Sr. Ministro se antecipe, dar-lhe-ia de imediato a palavra.

Devido à ausência na sala, neste momento, do Sr. Deputado José Manuel Mendes, perguntava aos seus colegas de bancada se têm objecções a que se proceda assim.

Pausa.

Visto não haver objecções, questionava, do mesmo modo, o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pela minha parte não há obstáculos.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo): Sr. Presidente, Srs. Deputados: No artigo 99.º da proposta de lei n.º 104/111 - Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais - dizia-se textualmente: "Lei própria poderá regular a organização, competência e funcionamento dos tribunais judiciais nas regiões autónomas." A dissolução da Assembleia da República não consentiu que o diploma então constituendo fosse objecto de decisão parlamentar. Ficou, no entanto, a afirmada vontade política de consagrar o princípio de que, sem derrogação da unidade da organização judiciária portuguesa, não regionalizável, se considerarem, na moldura dela, as especificidades das regiões autónomas.

Fui, como Ministro da Justiça, no IX Governo, um dos signatários da proposta de lei, e, como bem me recordo, pus o maior empenho na consagração do preceito. O que bem se compreende. Se a administração da justiça se traduz num serviço público - num dos mais essenciais e determinantes serviços públicos - ela terá de ir ao encontro dos interesses legítimos das pessoas. Quando a Constituição, vindo atrás de uma fórmula que tem feito carreira ao longo dos tempos, diz que os tribunais administram a justiça "em nome do povo", quererá também, e como é óbvio, dizer que essa justiça será administrada para e em favor do povo, entendido este como a universalidade viva e concreta de todos os cidadãos.
Uma justiça retardada, distanciada das pessoas e das realidades, prestada com base em leis frouxas e mal entendíveis não é justiça. Se aos juízes não pode, pelo fatalismo incontrolado da sobrecarga de trabalho, ser imposta "pressa", porque assim se inquinará a sua disponibilidade de espírito e uma das vertentes da sua independência - a justiça terá de ser "pronta", já que é um direito de todos o de verem julgadas as suas causas em prazo razoável, como se acautela no avisado n.º 1 do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Por seu lado, a lei terá de ser clara e coerente com o sistema. Não perdendo em rigor, deverá ganhar em praticabilidade e inteligibilidade. De inteligibilidade mesmo para os não juristas (ordinary text to ordinary people), já que daí advirá, pelo menos, nalguns espaços a sua praticabilidade.

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