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I Série - Número 87

Terça-feira, 1 de Julho de 1988

DIÁRIO da Assembleia da República

PORTE PAGO

IV LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE JUNHO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
António Duarte de Sousa Pereira
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMÁRIO - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos, das respostas a alguns outros e dos diplomas entrados na Mesa.
Em declaração política, o Sr. Deputado Seiça Neves (MDP/CDE) referiu vários problemas ligados à ria de Aveiro.
O Sr. Deputado Caio Roque (PS} chamou a atenção da Câmara para a situação em que se encontram várias dezenas de professores a leccionar no estrangeiro. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Osório (PCP) e Fernando Figueiredo (PSD).
O Sr. Deputado Sérgio Ribeiro (PCP) abordou alguns problemas existentes nos concelhos de Tomar e de Vila Nova de Ourém, distrito de Santarém. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Gomes de Pinho (CDS) e Jorge Lacão (PS).
O Sr. Deputado Barbosa da Costa (PRD) falou da destruição ecológica e ambiental dos nossos rios, que a extracção desordenada de areias está a provocar, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Roleira Marinho (PSD).
O Sr. Deputado Amândio Gomes (PSD) referiu-se aos problemas com que se debate a região de Trás-os-Montes. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Amândio Vara (PS), Custódio Gingão (PCP) e Amândio Gomes (PSD).
A Sr.ª Deputada Maria Santos (Indep.) alertou para a necessidade de se encetarem medidas práticas para o Meio da recuperação efectiva da lagoa de Albufeira e sua zona envolvente.
O Sr. Deputado António Mota (PCP) referiu-se à situação em que se encontram os trabalhadores das Minas da Panasqueira, tendo, depois, respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado António Paulouro (PRD).
O Sr. Deputado Vitorino Costa (PRD) abordou os problemas com que se debatem os professores de Português no estrangeiro. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Fernando Figueiredo e Luís Geraldes (PSD).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 75 a 79 do Diário.
Foi autorizada a prorrogação do prazo de funcionamento da comissão eventual para apreciação da proposta de lei n.º 5/IV.
Após ter sido lido, pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal (PCP), o respectivo relatório da Comissão de Equipamento Social e Ambiente procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 10/IV - revogação da Lei das Rendas - apresentado pelo PCP. Intervieram no debate, a diversos títulos, além do Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação (Elias da Costa), os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Marques Mendes (PSD), Vasco Marques (PRD), Borges de Carvalho (Indep.), Seiça Neves (MDP/CDE), Leonel Fadigas (PS) e Anselmo Aníbal (PCP). Ó Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.

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Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José Filipe Athayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Mendes Bota.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Joaquim Maria Bernardes Barranca.
Manuel Mana Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Helena Torres Marques.
Hermínio da Palma Inácio.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Joaquim Carmelo Lobo.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Margarida Tengarrinha.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Sérgio José Ferreira Ribeiro.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

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Centro Democrático Social (CDS):

António José Tomás Gomes de Pinho.
João Gomes de Abreu Lima.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Pedro José Del Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Manuel Caniço Seiça Neves.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho.
Maria Amélia Mota Santos.
Rui Manuel Oliveira Costa.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Cartas

De Jerónimo Pereira, residente em Valadares, Gaia, sugerindo que, numa tentativa de pôr cobro aos fogos nas matas e florestas, a limpeza das mesmas viesse a ser efectuada, entre outros, pelos denominados "objectores de consciência".
Da Comissão de Trabalhadores da Empresa do Jornal de Notícias do Porto, remetendo um exemplar do documento aprovado no plenário geral de trabalhadores, realizado naquela empresa no dia 13 do corrente.
Da Comissão de Trabalhadores da SONAFI - Sociedade Nacional de Fundição Injectada, S. A. R. L., com sede em S. Mamede de Infesta, remetendo documentos subscritos por trabalhadores da empresa, de secções que provocam desgaste anormal das suas condições físicas e psíquicas, reclamando a redução do horário de trabalho para 40 horas semanais e a idade da reforma para os 55 anos.

Ofícios

Da Junta de Freguesia de Lourosa, remetendo fotocópia de um abaixo-assinado dos moradores do lugar de Bloco, daquela vila, chamando a atenção para a grave poluição provocada pela empresa Manuel Alves Rodrigues & Filhos, Lda, com a utilização de produtos tóxicos, solicitando que sejam tomadas as adequadas providências.
Do Conselho Geral de Trabalhadores da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E. P., com sede em Lisboa, solicitando a intervenção desta Assembleia no sentido de ser possível o diálogo com o conselho de administração com vista à resolução de problemas que carecem da colaboração de ambas as partes.
Da Assembleia Municipal de Tomar, enviando a cópia de uma moção, aprovada por unanimidade naquele órgão autárquico, no passado dia 13 do corrente, sobre a situação nas Fábricas Mendes Godinho.
Do Conselho Directivo do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, em cumprimento de decisões tomadas na reunião de professores realizada no passado dia 24 do corrente, remetendo cópia de moção aprovada e aproveitando para informar que o corpo docente não se encontrava em greve.

Telegrama

Das Juntas de Freguesia de Duas Igrejas, Miranda do Douro e Sanhoane, de Mogadouro, alertando para os perigos das locomotivas a vapor na linha do Sabor, pedindo a sua imediata substituição.

Petições

De António José Ferro Inácio e outros, da Comissão de Trabalhadores da MUNDET, no Seixal, sobre a situação da empresa. Com o n.º 55/IV, está distribuído à 3.ª Comissão.
De Mário Alfredo da Silva Jara de Carvalho e outros, da Companhia Nacional de Navegação, expondo factos relativos à extinção da mesma e solicitando a urgente adopção de medidas tendentes a repor a legalidade e a justiça. Tem o n.º 56/IV e está igualmente distribuída à 3.ª Comissão.
Do Sindicato dos Médicos do Sul, com sede em Lisboa, expondo a situação dos médicos dos Serviços Médico-Sociais que optaram pela função pública. Com o n.º 57/IV, encontra-se distribuída à 2.ª Comissão.

"Telexes"

Do corpo clínico do Hospital Distrital de Beja, pedindo interferência para que sejam contratados médicos anestesistas, face ao vazio existente.
Da Comissão de Trabalhadores da EPAC, dando conta da não participação da empresa num concurso para importação de milho, e das suas preocupações quanto ao futuro da mesma.
Da Câmara Municipal de Sesimbra, chamando a atenção para a catástrofe pública que pode ocorrer com a poluição da lagoa de Albufeira, que devido a assoreamento tem interrompida a sua ligação com o mar.

Manifesto

Do Movimento Associativo da Área Consular de Lille, em França, dando conta da reunião de trabalho efectuada no dia 30 de Maio findo, a propósito da situação da nova rede escolar e dos professores contratados.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados os seguintes requerimentos:
No dia 19 de Junho de 1986, ao Ministério da Justiça, formulado pelos Srs. Deputados José Magalhães e José Manuel Mendes; ao Instituto Nacional de Estatística, formulado pelo Sr. Deputado Guerreiro Norte; ao Ministério da Educação e Cultura (5), formulados pelo Sr. Deputado Bartolo Paiva Campos; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelos Srs. Deputados Barbosa da Costa, Fernando Dias de Carvalho, Defensor Moura e Jorge Lemos; ao Governo, formulado pelos Deputados Marques Júnior e José Pinho da Silva; a diversos ministérios (5), formulados pelo Sr. Deputado Francisco Armando Fernandes, e aos Ministérios da Saúde e do Trabalho e Segurança Social (2), formulados pelo Sr. Deputado Carmelo Lobo e outros.

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No dia 20 de Junho de 1986, a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelos Srs. Deputados Oliveira e Silva e António Barreto; ao Ministério das Finanças, formulado pelos Srs. Deputados Sérgio Ribeiro e Álvaro Brasileiro; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Luís Roque; a diversos ministérios (12), formulados pela Sr.ª Deputada Maria Santos; aos Ministérios da Saúde e da Educação e Cultura (2), formulados pelo Sr. Deputado Defensor Moura; aos Ministérios da Educação e Cultura e da Administração Interna (3), formulados pelo Sr. Deputado Francisco Armando Fernandes; a diversos ministérios (6), formulados pelo "Sr. Deputado António Sousa Pereira; ao Governo, formulado .pelos Srs. Deputados "José Manuel Mendes e José Magalhães; à Secretaria de Estado da Juventude e ao Ministério da Saúde (2), formulados pelo Sr. Deputado Manuel Monteiro; ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pelos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Sérgio Ribeiro, e ao Ministério da Justiça, formulado pelos Srs. Deputados José Apolinário e António Esteves.
No dia 23 de Junho de 1986, à Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional, formulado pelo Sr. Deputado Rodrigues da Mata; a diversos ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado Rogério Moreira e outros; ao Ministério da Educação e Cultura (2), formulados pelo Sr. Deputado José Pinho da Silva; ao Ministério da Defesa Nacional (2), formulados pelos Srs. Deputados Sá Furtado e Ramos de Carvalho; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados Francisco Armando Fernandes e Carlos Lilaia, e ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota e outros... No dia 24 de Junho de 1986, à Secretaria de Estado dos Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Daniel Bastos; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Marques de Figueiredo.
No dia 25 de Junho de 1986, ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Barbosa da Costa.
No dia 26 de Junho de 1986, ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Seiça Neves; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Defensor Moura ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado António de Sousa Pereira; às Secretarias de Estado do Ambiente e da Administração Local (2), formulados pela Sr.ª Deputada Maria Santos; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Luís Roque; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelos Srs. Deputados José Manuel Mendes e José Magalhães; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Licínio Moreira; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Vieira Mesquita; ao Governo (7), formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: António José Marques Mendes, nas sessões de 14 de Novembro pa 17 de Dezembro; Margarida Tengarrinha, na sessão de 6 de Dezembro; António Machado Lourenço, Carlos Pinto e Manuel Martins, na sessão de 11 de Dezembro; João Abrantes, nas sessões de 20 de Dezembro e 8 de Abril; Vasco Marques, na sessão de 6 de Janeiro; Francisco Armando Fernandes, nas sessões de 6 de Janeiro, 18 de Fevereiro e 8 e 30 de Abril; Magalhães Mota, nas sessões de 9 de Janeiro, 4 de Fevereiro e 10 e 17 de Abril; Carlos Brito, na sessão de 10 de Janeiro; António Mota, nas sessões de 16 de Janeiro e 11 de Março; Horácio Marçal, na sessão de 16 de Janeiro; Ilda Figueiredo, nas sessões de 16 de Janeiro e 10 de Abril; Rabaça Vieira, na sessão de 30 de Janeiro; António Sousa Pereira, nas sessões de 30 de Janeiro, 27 de Fevereiro, 6 e 20 Março, 8 e 22 de Abril e 8 de Maio; Aloísio Fonseca, nas sessões de 31 de Janeiro e 4 e 28 de Fevereiro; Reinaldo Gomes, na sessão de 4 de Fevereiro; João Teixeira, na sessão de 7 de Fevereiro; Henrique da Mata, nas sessões de 18 e 28 de Fevereiro; Guerreiro Norte, na sessão de 20 de Fevereiro; José Mendes Bota, na sessão de 25 de Fevereiro; José Barros Madeira, Assunção Marques e José Pereira Lopes, na sessão de 27 de Fevereiro; Carlos Martins, na sessão 10 de Março; Roleira Marinho e Rui Silva, na sessão de* 13" de Março; Agostinho de Sousa, na sessão de 18 de Março; Álvaro Brasileiro, nas sessões de 18 de Março e 8 de Abril; Eduardo Pereira e outros, na sessão de 19 de Março; Raul Junqueiro e Corujo Lopes, na sessão de 8 de Abril; José Apolinário, na sessão de 10 de Abril; Carlos Carvalhas, Custódio Gingão, Miguel Relvas e António Paulouro, na sessão de 17 de Abril; Ribeiro Teles e José Seabra, na sessão de 22 de Abril; Luís Roque, na sessão de 30 de Abril; António Barreto e Licinio Moreira, na sessão de 7 ;de Maio; José Pinho da Silva, Jorge Lemos e Barbosa da Costa, na sessão de 8 de Maio; José Luís de Azevedo, na sessão de 9 de Maio; Adérito Soares Campos, na sessão de 13 de Maio; António Gomes de Pinho e Carlos Manafaia, na sessão de 15 de Maio, e Maria Santos, nas sessões de 20 e 22 de Maio.
Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 252/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Armando Lopes e outros, do PS, relativo à elevação da vila de Mangualde à categoria de cidade, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 253/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Armando Lopes e outros; do PS, propondo a elevação da vila de Tondela à categoria de cidade, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão.
Deu igualmente entrada na Mesa a ratificação n.º 84/IV, apresentada pelo Sr. Deputado Caio Roque e outros, do PS, relativa ao Decreto-Lei n.º 140-A/86, de 14 de Junho, que cria o sistema de conta crédito, denominada "Conta Poupança Emigrante", que foi admitida.
Deu, ainda entrada na Mesa a proposta de lei n.º 33/IV, da iniciativa da Assembleia Regional dos Açores, que propõe alteração ao Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, que foi admitida e baixou à 1.ª Comissão.

O Sr., Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muitos dos clássicos da literatura portuguesa se têm referido à ria de Aveiro em termos de deslumbre e maravilha pelo esplêndido espectáculo que os seus canais tentaculares oferecem, em contraste com a vegetação diversa e luxuriante que os marginam.
Sessenta e tal quilómetros de sonho e quase magia que desventram, irrigam e fertilizam todo, o bordado serpenteado dos seus esteiros, ilhotas e marinhas.

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Eça de Queirós, Raul Brandão, José Estêvão, Ferreira de Castro, Alves Redol, Câmara Reis e tantos, tantos outros, genuflectiram perante este fascínio de vida, de cor e de movimento, imortalizando nos seus textos as povoações ribeirinhas, que vão de Vagos à Torreira, à Murtosa e ao Areinho.
Proprietários indignos de tal riqueza preparamo-nos para legar aos nossos filhos não a imensa riqueza dos nossos avoengos, mas um enorme pântano gerador de poluição, fedor e doença.
Nada espanta por isso que já por numerosas vezes tenham sido VV. Ex." despertos para este crime de lesa-pátria que nos faz emudecer de espanto.
Mas porque a agonia se mantém, porque nenhumas medidas foram tomadas e antes que seja irremediavelmente tarde, aqui levantamos de novo o problema e daqui iremos formular algumas propostas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Está perfeitamente identificado o papel determinante exercido pela ria e pelo porto de Aveiro no desenvolvimento económico e no florescimento da região aveirense, como pólo de fixação das populações e agente dinamizador regional. Para testemunhá-lo basta atentar na recessão que sofreu a cidade de Aveiro, a nível demográfico e económico, sempre que a barra se tem fechado. Este facto deverá, só por si, servir de estímulo à defesa do conjunto lagunar, protegendo o seu equilíbrio natural e promovendo o entrosamento do labor das populações com a evolução espontânea do ecossistema que constitui.
Não basta criar novos organismos, como o Gabinete do Baixo Vouga ou o Centro de Investigação de Pescas de Aveiro. E necessário dar-lhes condições de trabalho na área da sua esfera de actuação. Levá-los a abandonar ancestrais conceitos de individualismos, que, extravasando o apertado círculo do cidadão, se transferem, em regra, para a forma de actuar das diversas entidades colectivas, cuja dinâmica deveria ser fundamental para o desenvolvimento harmonioso dos diversos sectores do distrito. Conduzi-los, por exemplo, a uma estreita colaboração com a Universidade de Aveiro, aproveitando todo o potencial humano e tecnológico disponível nesta instituição. Seria ainda necessário que se promovesse a conjugação da sua actividade com as câmaras municipais, muito particularmente com a Câmara Municipal de Aveiro, que, pela sua dimensão e por se tratar da capital do distrito, maiores responsabilidades tem no desenvolvimento da região. Levá-los a distribuir tarefas e conjugar esforços com a Junta Autónoma do Porto de Aveiro, organismo que deveria estar especialmente vocacionado para estimular, coordenar e controlar toda a actividade relacionada com a laguna, esse manancial de vida a que a região deve a prosperidade que hoje conhece e cujas potencialidades tem vindo a ser inexoravelmente degradadas, em alguns casos de forma irreversível.
Como consequência mais recente do abandono a que a ria tem estado votada, avulta a sua exclusão do conjunto das zonas consideradas pólos de desenvolvimento de aquicultura no Programa de Orientação Plurianual de Aquicultura - documento elaborado sob a égide do Ministério da Agricultura e Pescas, para ser apresentado às instâncias competentes da CEE, no âmbito do FEOGA. Passamos a transcrever, por elucidativa, a justificação dessa decisão:
[...] Sublinhe-se que a zona da laguna de Aveiro não está incluída aqui devido aos problemas relacionados com a poluição aí detectada, tornando-se necessário sustê-la urgentemente e proceder à recuperação da zona, que oferece condições naturais excelentes para a cultura de animais e plantas aquáticos.
Esta circunstância impedirá os aquicultores aveirenses de comparticiparem, durante três anos, na distribuição de subsídios comunitários que ascenderão a 876 500 contos.
De facto, esta opção de não considerar a região aveirense nos próximos anos pólo dinamizador do programa nacional de aquicultura não surpreende quem tenha seguido as Jornadas da Ria, realizadas no ano transacto. Mas não nos espantemos: investigadores do INIP (Instituto Nacional de Investigação das Pescas) e da Universidade de Aveiro trouxeram a lume as condições caóticas para que caminha a ria, com elevados teores de contaminação em nutrientes, arsénio, metais pesados - nomeadamente cádmio e mercúrio -, com reduzidos índices de oxigénio dissolvido, aspectos absolutamente inaceitáveis face aos critérios internacionalmente convencionados. Estas constatações são muito graves, sob dois pontos de vista: em primeiro lugar, verifica-se que a nível governamental tem vindo a ser apregoada a necessidade de aproveitar e reconverter as marinhas do salgado de Aveiro para a aquicultura, sem que, no entanto, tenha sido previamente verificada a qualidade da água disponível. Os valores de contaminação existentes em alguns locais excluem-nos corripletamente de tal actividade e, se pensarmos na exportação, será bastante duvidoso que o peixe criado na ria de Aveiro possa vir, no futuro, a ser comercializado nos mercados da CEE.
Em segundo lugar é espantosa a total impunidade em que têm vivido os agentes poluidores da laguna - e chamo a especial atenção dos Srs. Deputados para este facto -, nomeadamente os municípios ribeirinhos, que concorrem fortemente para a eutrofização das águas, ao lançarem aí, sem tratamento prévio, a maior parte dos seus afluentes domésticos e industriais. Não se pode dizer, por exemplo no caso da cidade de Aveiro, que seja por falta de disponibilidades financeiras, ao verificarmos que despendeu verbas vultosas em iniciativas contestadas e discutíveis, como é o caso das eclusas no canal das Pirâmides, sem qualquer proveito visível para as populações.
Perante a evolução da situação podemo-nos interrogar se na base da instalação do Centro de Investigação de Pescas de Aveiro terá estado um estudo sério, uma acção programada, com a necessária afectação de meios, ou se, pelo contrário, não terá constituído mais uma mera, gratuita e estulta acção política provinciana, destinada a granjear localmente alguns dividentes pessoais e eleitorais, sem contemplação pelo sacrifício de alguns "incautos" que, entusiasmados com argumentos falaciosos, investiram trabalho e capitais na reconversão de inúmeras marinhas.
É imperativo, pois, que se explique como foi possível gastar 20 000 contos com a instalação do CIPA sem que a sua acção tenha sido previamente planeada, dotando-o com as verbas necessárias à aquisição de

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equipamento laboratorial, à celebração de contratos científicos com a Universidade de Aveiro e à aquisição das marinhas necessárias à implantação de uma estação piloto de aquicultura.
Espantemo-nos, Srs. Deputados, porque já em 1917, na vigência da I República, foi publicado o Regulamento de Pesca da Ria de Aveiro, onde já se previa a construção dessa estação piloto! Perderam-se cerca de 70 anos!
Considerando a situação como "de facto consumado" e que nos próximos três anos o salgado de Aveiro não vai usufruir dos apoios comunitários tendentes à sua reconversão, importa saber que acções estão programadas para nesse período fazer retroceder a acção galopante da poluição, melhorando a qualidade das águas da ria, de forma que no triénio seguinte seja possível vê-la considerada pólo de desenvolvimento de aquicultura. Seria interessante conhecer como vão as câmaras ribeirinhas candidatar-se aos apoios do FEDER para reduzir efeitos nocivos dos seus afluentes e que medidas se propõe desencadear a Junta Autónoma do Porto de Aveiro para cercear a acção irresponsável - e mesmo criminosa - dos grandes depredadores da ria - a UNITECA, a QUIMIGAL e as fábricas de celulose do Caima e de Cacia e o porto industrial.
Se nos próximos cinco anos não forem aproveitados os subsídios comunitários para recuperar e melhorar os muros das salinas, a acção demolidora das águas, acrescida pelo aumento de caudais que entram na ria em consequência das obras em curso no porto de Aveiro, condenará definitivamente à extinção o salgado de Aveiro.
Ainda que em subaproveitamento, o salgado de Aveiro poderia garantir mais de 1000 t de peixe, o que é espantosamente muito se atendermos a que o nosso volume total de capturas é de cerca de 250 000 t.
A remodelação das condições existentes na barra de Aveiro e o novo apetrechamento do seu porto constituem um factor fundamental para o desenvolvimento da região. A sua incidência, positiva ou negativa, será condicionada pelo estudo e programação que tenham antecedido a sua execução. No entanto, não se conhecem estudos avaliadores das eventuais consequências de uma obra desta envergadura nas áreas a montante, com tanta incidência no ambiente da ria. Neste momento, é uma incógnita o que se está a passar no ecossistema lagunar, sendo urgente empreender a imprescindível investigação que, embora tardiamente, vise, numa óptica global, toda a problemática da ria. Estão também por determinar as interligações terra-mar, no que respeita à influência da ria na criação das espécies pisei colas, bem como as alterações introduzidas no movimento sedimentar no leito da laguna e na faixa costeira adjacente e, ainda, qual a alteração da salinidade nos canais interiores face ao aumento do prisma de maré.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais do que de vergonha é de revolta o sentimento que se apodera de nós perante estes dados.
Mas não choremos sobre a inércia, o conformismo e a anquilose.
Como escreveu Camões:

Não se aprende, Senhor, na Fontana, Sonhando, imaginando ou estudando, Senão vendo, tratando e pelejando.

E é assim que termino, lançando um convite aos Srs. Deputados de todos os grupos parlamentares sem excepção, especialmente aos deputados aveirenses, para que se constitua uma comissão eventual, nos termos do artigo 39.º do Regimento, para ajudar a salvar a ria, para que os nossos vindouros não se envergonhem de nós.

Aplausos do PCP, da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas dezenas de professores que leccionam no estrangeiro vêem-se, neste .momento, confrontados com a situação de desemprego e, porventura, de terem de regressar definitivamente por terem entregue a sua carta de autorização de estada e trabalho, quando então foram contratados pelo Governo há cerca de dez anos. Alguns deles têm hoje uma idade que lhes não dará qualquer possibilidade para uma outra colocação seja onde for! É esta a justiça tão apregoada por este governo?
Esta situação foi criada com o Despacho n.º 1/EBS-AE/86, que regulamenta o concurso para o preenchimento dos lugares de docentes nos cursos do ensino básico e secundário no estrangeiro. Este despacho exclui do concurso estes professores.
Muitos deles, com família constituída, vivendo há longos anos no estrangeiro, depois de terem servido o Estado com abnegação, vão para o olho da rua porque agora já não são precisos!
Que justiça, Sr. Presidente e Srs. Deputados!
Os professores em questão foram contratados localmente, pelo Ministério da Educação, ao abrigo do decreto-lei de 24 de Abril de 1971, a título excepcional. Nunca houve por parte do Ministério a intenção de generalizar tal processo de admissão de docentes e, assim, deixou de ser permitido .º recrutamento de professores não profissionalizados a partir do ano lectivo de 1976-1977.
Em 24 de Julho de 1977, o Despacho n.º 107/77, do Ministério da Educação, visando regularizar a necessidade de dignificar o ensino do Português no estrangeiro, fá-los optar exclusivamente pela docência, não permitindo a continuação do regime de acumulação com outras actividades públicas ou privadas. Foi nessa altura, como já me referi, que os professores restituíram as suas autorizações de estada e trabalho, tendo-lhes sido fornecida em troca uma autorização especial de estada como funcionários estrangeiros em missão, perdendo assim todos os direitos no mercado do trabalho no país de residência.
Até final do ano lectivo de 1979-1980, os professores assinaram apenas -um termo de posse no momento da primeira entrada em funções de docência. A partir do início do ano lectivo de 1980-1981, estes professores passam a assinariam contrato anual. Nessa altura, a profissionalização em exercício destes docente, reclamada desde 1977, torna-se ainda mais necessária. As promessas e estudos não cessaram até agora. Em Abril de 1983, os serviços do Ministério (SEBSPE) elaboraram um relatório (Relatório Mourão) que propõe a profissionalização destes docentes. Este relatório mereceu o acordo genérico do então Secretário de Estado, Dr. João de Deus Pinheiro. Em Janeiro e Fevereiro

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de 1986, os serviços pediram aos professores contratados um curriculum vitae, para que se pudesse iniciar a profissionalização em exercício - ofício-circular 13/86, de 22 de Janeiro, e oficio-circular 29/86, de 25 de Fevereiro.
Têm vindo a ser regularizadas situações semelhantes: ex-regentes escolares, monitores de Educação Física, auxiliares de educadores de infância, 12.º grupo e Trabalhos Manuais, e em Agosto de 1985 foi publicado um despacho que visa o complemento de habilitações e profissionalização em exercício dos professores do ensino particular e cooperativo,
A regularização dos professores contratados, em exercício de funções docentes nos cursos de língua e cultura portuguesas no estrangeiro, terá de passar pela criação de processos adaptados de complemento de habilitações e profissionalização em exercício. O facto de serem professores com, pelo menos, nove anos de serviço ininterrupto dá-lhes direitos que não podem agora ser negados.
O Estado Português não pode ignorar as responsabilidades assumidas com o facto de ter admitido estes professores, tê-los obrigado a optar por essas funções a tempo completo e tê-los mantido em funções com perspectivas, nunca desmentidas, de acesso à profissionalização em exercício.
O Despacho n.º 44-ES/82, de 19 de Fevereiro, previa a continuação em exercício dos professores e exigia para alguns um complemento de habilitações até à definição de habilitações suficientes para a docência no estrangeiro, nos termos de diploma legal a publicar pelo Ministério da Educação, o que ainda não foi feito. A competência dos professores nunca foi posta em causa pelas estruturas de ensino quer francês, quer alemão, quer belga ou outros, nem pelo Estado Português. Mais, todos eles participaram em estágios pedagógicos, ao longo dos nove anos de docência.
E, pois, injusta a posição do Governo para com estes docentes, com quem me solidarizo.
A experiência adquirida ao longo de todos estes anos tem de ser reconhecida e, por isso, devem ser reconduzidos nos seus lugares docentes. Assim como, de uma vez por todas, se deve garantir na lei e na prática a profissionalização a partir do início do próximo ano lectivo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para que não se tenham dúvidas, não poderia deixar de citar algumas passagens do Relatório Mourão:
Estes docentes que fazem parte das comunidades dos nossos emigrantes foram inicialmente contratados por simples despacho interno com o objectivo de, no próprio local onde se encontravam radicados, assegurarem, através do ensino da língua e cultura nacionais, não só a protecção dos direitos educacionais dos cidadãos portugueses no estrangeiro como também a conservação da língua pátria como veículo de comunicação.
Os docentes em causa viram-se, assim, envolvidos numa acção de apoio pedagógico junto dos seus conterrâneos, talvez por falta de estruturas da parte portuguesa para poderem dar resposta imediata a tal situação de emergência, visto que eram as próprias comunidades portuguesas que pressionavam o Governo Português no sentido de lhes solucionar o problema.
Decorreram vários anos em que tem havido continuidade na acção destes docentes contratados, acção esta, por que não dizê-lo, em princípio necessária, até que se reconheceu imperativa uma definição clara dos direitos e deveres dos professores do ensino básico e secundário de Português no estrangeiro, e daí ter sido publicada legislação adequada a um mais estruturado, racional e legal recrutamento destes agentes de ensino e bem assim a assegurar-lhes uma maior segurança profissional e social e a introduzir melhorias no funcionamento daquele ensino.
Os serviços não podem deixar de lhes dar razão nalgumas das suas aspirações, nomeadamente por terem sido eles, na verdade, que em tempo oportuno se tornaram necessários como plataforma para o arranque da vultosa e estruturada organização que é hoje o ensino do Português no estrangeiro, com a vantagem do conhecimento linguístico e sócio-cultural do meio, e bem assim porque tudo isto se desenvolveu com grande economia para o Estado.
Parece, pois, razoável, justo e oportuno ir ao encontro das aspirações destes docentes, dando-lhes em uma única oportunidade um rumo adequado e uma solução definitiva, sem contudo nos afastarmos dos princípios básicos legais e das reais necessidades pedagógicas do ensino, profissionalizando-os como reivindicam.
O então Secretário de Estado, Dr. João de Deus Pinheiro, hoje Ministro da Educação e Cultura, com o seu próprio punho dava o seguinte despacho: "Concordo genericamente com o proposto."
Só que não foram respeitados pelo Estado Português os compromissos assumidos, e não deverão ser os docentes a pagar os erros que outros cometeram, não lhes proporcionando as condições necessárias para que estes pudessem garantir uma melhor qualidade de ensino através de uma reciclagem que se deseja e é necessária.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante tudo aquilo a que se assistiu durante todos estes meses, não poderei deixar de qualificar esta situação como um saneamento político e ou o arranjar colocação para alguns amigos, cônjuges de funcionários do Estado Português que se encontram no estrangeiro à custa do desemprego para umas dezenas de cidadãos, que têm servido o Estado com abnegação, e principalmente os emigrantes radicados nos países onde leccionam a língua e a cultura portuguesa.
Com alguma razão dizia eu, na mensagem às comunidades portuguesas, pelas comemorações do 10 de Junho:
Por cá, terminado o dia (o dia 10) de Junho de todos os anos, as consciências tranquilizam-se - quem sabe?, do prometido talvez uma parte se cumpra... - e a rotina vai acumulando o desencanto do "agora é impossível, talvez um dia..."

Aplausos do PS, do PCP, da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados António Osório e Fernando Figueiredo.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado António Osório.

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O Sr. António Osório (PCP): - Sr. Deputado Caio Roque, gostaria de me associar às palavras que trouxe a esta Câmara sobre a situação dos professores de Português no estrangeiro.
Na realidade, trata-se de uma situação extremamente grave na medida em que o Governo, que se comprometeu com os professores de Português no estrangeiro que não tinham habilitação própria a que, se a concluíssem no prazo que o Ministério fixou, teriam direito a continuar nos seus postos de trabalho num país estrangeiro, não cumpriu o prometido. Esta é, pois, uma situação que, em nossa opinião, é verdadeiramente caricata: os professores cumpriram com a sua parte no contrato feito, mas o Governo não cumpriu.
Ora, esta é uma situação extremamente grave porque - tal como o Sr. Deputado Caio Roque referiu, e bem - hoje está em risco a vida de centenas de professores de Português no estrangeiro que lá labutam há dezenas de anos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como já foi claramente demonstrado na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, a Assembleia da República está atenta e chamou cá o Governo para que este problema fosse esclarecido. Porém, o Governo, face às questões que lhe foram colocadas pelos deputados, enfiou "os pés pelas mãos" e nada disse; baralhou todas as questões e tentou transferir está discussão para um outro plano, que não era, de forma alguma, o adequado.
Importa ainda referir que também neste caso fica demonstrado que não é a Assembleia da República que impede este governo de governar, mas sim a sua inépcia para resolver certos problemas, como seja o dos professores de Português no estrangeiro, que geram situações tão complicadas e tão graves como esta que hoje aqui foi trazida e à qual nos associamos.
No entanto, e para terminar, gostaria de deixar bem expressa que a nossa posição é a de que não podem ser os professores a pagar a factura pela incompetência do Governo para resolver compromissos que assumiu e, portanto, para dar satisfação a este anseio legítimo dos professores de Português no estrangeiro. Assim, continuamos a exigir que tal situação seja revista.
O Sr. Deputado não acha que seria necessário chamar cá mais uma vez o Governo para lhe perguntar se, depois daquilo que em comissão nos prometeu, já alguma coisa foi avançada ou está concluída?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Caio Roque, deseja responder já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Caio Roque (PS): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Figueiredo.

O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Sr. Deputado Caio Roque, ouvi, como é natural, com a maior atenção, as palavras de V. Ex.ª
Se, como sabe, comungo de muitas das suas preocupações, outros factos que alegou não têm a minha concordância e alguns deles, segundo penso, estarão até no caminho da inverdade.
Em primeiro lugar, é do nosso conhecimento que durante vários anos, a título precário, e a pedido de alguns professores no estrangeiro que não tinham as habilitações mínimas necessárias, foram sendo protelados os prazos que o Governo inicialmente lhes concedia para o exercício dessa tarefa, nomeadamente para a aquisição das habilitações necessárias à continuidade da função. Por n razões, parte desses professores, ou mesmo só alguns deles, não conseguiu atingir tais objectivos, pelo que vieram, finalmente, no fim do ano, solicitar que o Governo uma vez mais protelasse esses prazos. É do conhecimento do Sr. Deputado, como do meu, que houve, em n governos, n prazos acrescentados para que essas regularizações se tivessem de facto efectivado.
Em segundo lugar, tanto quanto é também do meu conhecimento e me foi explicado pelos responsáveis, este ano apenas houve os casos, em França, de dez pessoas que não tinham realmente as habilitações mínimas necessárias para exercer a sua profissão e de outros dez que estavam em apreciação de recurso. Portanto, quando se falou aqui de largas centenas de pessoas, fiquei muito preocupado, porque as informações que tinha não iam nesse sentido. Não disponho, pois, de informações condicentes, pelo que, se algum dos senhores deputados dispõe desses números, gostaria que os explicassem e comentassem.
Finalmente, quando V. Ex.ª falou de clientelismo e compadrio e fez determinadas alusões, dir-lhe-ei que o provimento das vagas foi feito por concurso. Assim sendo, repudio essa sua acusação ao actual governo, por que julgo que o que esteve na base desse concurso foi dotar os nossos emigrantes - que merecem o nosso maior respeito - de professores competentes, permitir que os concursos fossem feitos com a participação de todas as pessoas que possuíssem as respectivas habilitações e certamente - e nisto comungo consigo - procurar resolver, pela melhor via possível e sem ferir legítimos interesses, os interesses daqueles que eventualmente não pudessem ter concorrido por não terem podido atingir as habilitações necessárias.
Penso, pois, que a situação é um pouco diversa daquela que apresentou. Se tem alguns elementos que possam provar as afirmações que produziu e com as quais não concordo, gostaria que os apresentasse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque, que dispõe de dois minutos para o efeito.

O Sr. Caio Roque (PS): - Ao Sr. .Deputado António Osório quero dizer que acho que tem razão, ou seja, que o Governo já deveria ter vindo também à Subcomissão de Emigração para tratarmos deste assunto. Aliás, o Sr. Deputado Fernando Figueiredo é o próprio coordenador dessa Comissão, que ficou incumbido de convidar o Governo, o que penso já ter feito.
Ao Sr. Deputado Fernando Figueiredo quero dizer que existem apenas dois, três ou quatro casos de docentes que não adquiriram de facto as habilitações necessárias. Mas também lhe quero dizer que alguns deles não conseguiram adquirir essas habilitações porque, como também já tive oportunidade de dizer na

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Comissão de Educação, leccionavam de manhã numa localidade e depois iam leccionar para outras localidades à tarde e à noite. Assim é impossível adquirir habilitações!

O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Desculpe-me, Sr. Deputado, mas não lhe posso conceder a interrupção, porque não disponho de muito tempo e terei de ser mesmo muito rápido.

O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Peço desculpa!

O Orador: - Não foram, pois, dadas condições pelo próprio Governo para que esses docentes conseguissem as habilitações necessárias. São três ou quatro casos - estamos de acordo - de docentes que não têm habilitações. Paciência, temos de nos render à evidência, como se costuma dizer.
Só que, quando o Sr. Deputado diz que são alguns casos em França, quero dizer-lhe que continuam a ser cerca de 50, pelo que não é verdade aquilo que o Governo disse na Comissão de Educação. E devo dizer-lhe que ainda ontem tive informação de que são cerca de 50.

O Sr. António Osório (PCP): - E o próprio Governo o reconheceu!

O Orador: - Sim, é verdade, o próprio Governo reconheceu isso.

Quero também dizer-lhe, a respeito do concurso, que tenho a impressão de que, daqui a mês e meio ou dois meses, já poderemos falar novamente sobre este assunto nesta mesma Assembleia da República.

O Sr. Fernando da Silva Gameiro - professor em exercício na Bélgica, licenciado, desde 1976, em Relações Internacionais e, desde 1981, em Administração Pública pela Universidade de Laurin-La Neuve, com equivalência obtida na Universidade Técnica de Lisboa em 1983 e habilitação própria para o ensino preparatório do terceiro grupo do Despacho n.º 33/85 em Português e Francês - é um dos professores que foi preterido.
É, sinceramente, uma vergonha e uma injustiça o que o Governo está a fazer!

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Ribeiro.

O Sr. Sérgio Ribeiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como deputado eleito pelo distrito de Santarém, visitei, com o meu camarada Álvaro Brasileiro, dois concelhos vizinhos: Tomar e Vila Nova de Ourém. Os dois concelhos fazem parte do norte do distrito e sofrem de uma certa excentricidade e interioridade, que permite afirmar que integram "zona esquecida", apesar dos seus problemas e das suas potencialidades.
Esta uma primeira impressão. Apesar de pisarmos chão habitual, de vermos paisagem conhecida, de encontrarmos amigos velhos e caras já vistas e saudadas, o facto de termos estado naquelas paragens, investidos na qualidade de deputados, tornou-nos particularmente sensíveis ao sentimento da novidade do contacto, à receptividade ao nosso interesse... fora dos períodos eleitorais.
Depois, foi o confronto com a realidade, com os problemas vivos e vividos. Foi a confirmação - ao vivo! - dos resultados de uma política e das consequências locais de uma política anti-social, nalguns casos de ausência de políticas, ao sabor dos interesses, nem sempre confessáveis, nunca transparentes. O imbróglio das Fábricas Mendes Godinho é paradigmático. Os interesses que se movem, sobretudo visando o controlo da Tagol e seu terminal portuário, levam a que o Governo utilize a banca nacionalizada para privatizar o que está nos tribunais para decidir se já está ou não privatizado. E o Supremo Tribunal Administrativo acaba de obrigar o Governo a dar o dito por não dito, isto é, a despachar, anulando o despachado pelo Sr. Tavares Moreira!
Aqui não deixamos mais do que esta referência, sublinhando a unanimidade que está provocando em Tomar a colaboração da comissão de trabalhadores com a administração actual da empresa e a unidade de todos os partidos representados na Assembleia Municipal na defesa dos postos de trabalho e na manutenção da implantação regional das actividades económicas.
Esta vertente regional pode ser ilustrada pelo facto de a Platex, do conjunto Mendes Godinho, ser a fornecedora da empresa IRMADE, de Vila Nova de Ourém, onde a nossa visita foi ocasião para informação oportuna sobre os condicionalismos de tipo local, onde avultam os ligados às comunicações rodoviárias, e as consequências da adesão à CEE, particularmente no que respeita às exportações para Espanha, acrescendo as dificuldades exteriores e extinguindo-se os organismos e mecanismos de apoio internos, situação que justifica que tenhamos apresentado um requerimento ao Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram dois dias que reputamos da maior importância para a nossa actividade de deputados. Em Tomar, tivemos a oportunidade de um rápido contacto com a Câmara Municipal, representada por um vereador; em Ourém, fomos recebidos pelo presidente, vereadores a tempo inteiro e dois presidentes de junta. Não cabe nesta intervenção resumir sequer o manancial de informações que colhemos. Não podemos deixar de referir, no entanto, a visita ao Hospital de Tomar, o insólito das instalações repartidas, separadas por quilómetro e meio de ruas citadinas semeadas de semáforos e população - quilómetro e meio a ter de ser percorrido por uma única carrinha, que não pode ter acidentes ou avarias, porque senão não há refeições para os doentes - e outros pequenos pormenores (passo a ironia) que têm a ver com a assistência à doença e aos doentes. E são 100 mil os utentes, cuja saúde está, ou poderá estar, dependente do Hospital Distrital de Tomar.
Pudemos constatar o estado das infra-estruturas de saúde da região, com o antigo hospital de Ourém a aparecer como um fantasma, depois de ter deixado de ser o centro de saúde prioritário que um primeiro--ministro afirmou em rápida passagem (eleitoral) de há poucos anos. E lembramos só que a sede de um concelho de 420 km2 e mais de 40 mil habitantes não dispõe de um único aparelho de raios X.
E foi a visita à Cooperativa Agrícola de Vila Nova de Ourém e a perplexidade perante a indefinição, o "ao deus-dará", da política pós-adesão e do lugar das cooperativas!

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O sopro de esperança e juventude tivemo-lo do contacto com o grupo de Tomar "Fatias de Cá", o entusiasmo em volta do projecto, em próxima concretização, de uma grande iniciativa de âmbito distrital que trará a Lisboa, ao Teatro da Trindade, em 11, 12 e 13 de Julho, 20 grupos de teatro e dezenas de jovens.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os olhos de deputado viram de maneira diferente paisagens e situações bem conhecidas. Não descobriram as virtudes de um apregoado pragmatismo e as manifestações de uma auto-laudatória competência.
O que vimos foi bem o contrário: não há um vislumbre de solução dos problemas, antes o seu agravamento, e não se nota sequer o interesse pelas situações reais, pelas necessidades sentidas.
Mas encontrámos vontade e determinação e vimos capacidade e confiança. Os olhos de deputado que estamos sendo viram também olhos que nos olhavam frontalmente e nos diziam que não lhes é indiferente ver deputados por aquelas paragens. Para nós, também a visita não nos poderia deixar indiferentes.

Aplausos do PCP e da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Gomes de Pinho e Jorge Lacão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado Sérgio Ribeiro, ouvi com atenção e alguma surpresa a sua intervenção.
Referiu-se o Sr. Deputado, na parte que me interessaria abordar, às consequências gravosas que resultam da actual situação em que se encontram as empresas Mendes Godinho e à sua importância, quer no plano económico quer no plano social, para a região em que estão implantadas. V. Ex.ª salientou que se tratam de empresas de grande impacte na região, tendo também referido que a acção desenvolvida pelo Governo, e designadamente pejo banco a que essas empresas, por força das nacionalizações, aparentemente pertencem, se tem traduzido em graves prejuízos para essas empresas e, portanto, para essa região.
Gostaria de lhe perguntar - porque penso que seria interessante clarificar a sua posição sobre esta matéria - se V. Ex.ª está ou não de acordo com as soluções que são preconizadas pela grande maioria, senão mesmo a totalidade, dos trabalhadores das empresas, no sentido de que elas sejam imediatamente devolvidas aos seus proprietários, porque só eles poderão ser capazes de garantir o emprego e a sua reconversão, enfim, de garantir que essas empresas possam voltar a ser um pólo de actividade económica positiva para a região e suas populações. Gostaria, pois, que o Sr. Deputado esclarecesse qual é a sua posição sobre esta matéria, ou seja, se está em acordo ou em desacordo com os trabalhadores dessas empresas no que respeita ao seu futuro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Sérgio Ribeiro, também eu gostaria de aproveitar a sua intervenção justamente para aclarar alguns pontos de vista acerca desse caso tão preocupante para as populações de Tomar, e por si referido, que diz respeito ao futuro das Fábricas Mendes Godinho.
Acabámos de verificar, talvez até com o reforço da posição agora revelada pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho, que algumas forças políticas, em Tomar, têm tomado acerca desta questão uma posição em consonância com as expectativas dos trabalhadores das Fábricas Mendes Godinho, mas que, depois, essas mesmas forças políticas não repercutem o mesmo ponto de vista, designadamente na Assembleia da República. E, ao não repercutirem o mesmo ponto de vista aqui na Assembleia da República, não contribuirão para reforçar a posição e as expectativas que tanto os trabalhadores como a população de Tomar têm em ver suficientemente salvaguardado o destino daquela fábrica, que tanto impacte social e económico tem na região.
Ao mesmo tempo, verificamos que o Governo tem vindo, por sistema, a falar de diálogo ao Parlamento, quando nem sequer tem tido a ductilidade suficiente para ouvir, em termos dialogantes e atentos, as petições e tomadas de posição que vêm dos órgãos municipais de Tomar, posições essas que aí têm sido assumidas por unanimidade das forças políticas.
Neste sentido, gostaria também de perguntar ao Sr. Deputado Sérgio Ribeiro se está de acordo comigo quando refiro que o Governo tem sido, sobre esta questão, de uma total surdez relativamente aos interesses efectivos, sociais e económicos dos trabalhadores das Fábricas Mendes Godinho e às posições políticas tomadas na cidade de Tomar, designadamente por forças políticas que apoiam esse mesmo governo, mas que, entretanto, na Assembleia da República não têm, como se vê, assumido uma posição compatível com a posição assumida na cidade de Tomar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Ribeiro.

O Sr. Sérgio Ribeiro (PCP): - Sr. Deputado Gomes de Pinho, para trocarmos aqui impressões sobre o caso das Fábricas Mendes Godinho, que classifiquei de imbróglio, necessitaríamos, com certeza, de muito mais tempo do que aquele de que disponho.
O que lhe posso dizer é que, pelo relato de uma visita, verifiquei o interesse das comissões de trabalhadores em relação ao problema, no sentido de ele se clarificar, pois a situação, que tem atrás de si pareceres de leques variadíssimos e de personalidades ligadas a esta questão, existindo por detrás disto interesses que são talvez pouco confessáveis, é com certeza pouco transparente.
O interesse pela TAGOL e pelo seu terminal portuário tem realmente qualquer coisa que torna aliciante a posse das Fábricas Mendes Godinho e, como ,o Sr. Deputado sabe, há à volta disso aumentos de capital, conselhos de administração que mudam, e no meio de tudo isto os trabalhadores têm-se sentido vítimas por aquilo que representa o perigo para os seus postos de trabalho. Por isso mesmo, tudo aquilo que sejam actuações ou posições dos trabalhadores no sentido de defender esses mesmos postos de trabalho terão; com certeza, o nosso apoio e o nosso interesse, terão a nossa voz a apoiá-los.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, uma coisa que me parece ide sublinhar também é que, realmente, em relação a este caso,

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existem na Assembleia Municipal de Tomar posições que não terão o seu eco e o seu reflexo nesta Assembleia, porque - sublinho - todas as forças políticas representadas na Assembleia Municipal de Tomar estiveram de acordo no sentido de pedir um esclarecimento da situação, para o qual o Governo pouco ou nada tem contribuído, antes pelo contrário.
Em relação a isso, devolvia ao Sr. Deputado Jorge Lacão a pergunta - e faço-o com o interesse de deputados do mesmo círculo - que vai no sentido de saber se estaria de acordo com uma reunião especial da Comissão de Economia, Finanças e Plano com o Sr. Ministro das Finanças para que esta situação fosse tratada ao nível da Assembleia da República.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Sérgio Ribeiro, agradeço o facto de ter permitido que o interrompesse, pois se assim não fosse não teria figura regimental que me permitisse dizer-lhe que estou totalmente de acordo consigo e que apoio francamente essa iniciativa. Não só a apoio, como também acho que devem reunir com a Comissão de Economia, Finanças e Plano todos os deputados dos diversos partidos que são eleitos pelo círculo eleitoral de Santarém.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado. É essa, também, a minha posição.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Haverá que a concretizar!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cabe ao Estado em geral, e aos cidadãos em particular, lutar, por todos os meios disponíveis, contra a destruição do património natural, que, no nosso país, tem vindo a sofrer uma acelerada degradação nos últimos anos.
Na tentativa de pugnar pela defesa da natureza e pela qualidade de vida das populações irei colocar à atenção desta Assembleia uma questão que reveste aspectos muito graves.
Basear-me-ei, na exposição que irei produzir, numa cuidada investigação e análise feita pela Associação Quercus, que abnegadamente se tem dedicado à defesa da natureza.
A extracção de areias do leito dos nossos rios é um grave problema de âmbito nacional que conduz à sua progressiva degradação exercida pelos areeiros para quem o lucro fácil é a única lei.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os legítimos protestos das populações ribeirinhas, dos agricultores e das associações e movimentos de defesa da natureza não têm sido escutados pelas entidades que têm obrigação de zelar pela observância das leis em vigor, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 403/82.
Os areeiros legais ou clandestinos continuam a ser donos e senhores dos nossos rios, auferindo chorudos lucros, perante a indiferença, senão conivência, das autoridades responsáveis.
É doloroso verificar que se assiste impassivelmente à destruição do património comum por parte dos areeiros, que só abandonam as áreas exploradas quando só existe o caos e a desolação.
Importa relembrar as múltiplas consequências de ordem ecológica, económica e social que a actividade dos areeiros ocasiona:
Alteração na morfologia dos rios: abaixamento do nível médio das águas (por exemplo, o Mondego baixou, nalguns pontos, 5 m nos últimos dez anos) e alteração nos sistemas das correntes;
A formação de sulcos e poços profundos, que chegam a atingir 15 m e 20 m, nalguns rios, devido à utilização ilegal de métodos de extracção de areias com pás de arrasto. Estes locais passam a constituir sério perigo para os banhistas, contando-se já muitas vítimas destas autênticas ratoeiras;
Destruição de praias fluviais, locais de lazer para os veraneantes que não tem possibilidade de se deslocar para a orla marítima, na época estival;
Desaparecimento de locais de desova de inúmeras espécies piscícolas, cada vez mais raras, senão mesmo já desaparecidas dos nossos rios;
Erosão sobre os terrenos marginais, "devorados" pouco a pouco pelas correntes fluviais, depois de ter desaparecido a barreira natural de areia que os protegia da acção erosiva. Largos hectares terão já sido "comidos", entre os quais, solos de aptidão agrícola, como aconteceu já na veiga de Chaves e no vale do Mondego. Saliente-se que a economia de muitas populações ribeirinhas assenta numa agricultura tradicional, que constitui a base do seu sustento;
Riscos para a segurança das pontes e pontões (por exemplo, desmoronamento de um pilar da ponte de Penacova há cerca de sete anos);
Destruição da flora aquática e marginal. Têm sido abatidas árvores que marginavam cursos de água, que constituíam local apropriado para nidificação e refúgio de muitas espécies de aves cujo habitat é característico dos ecossistemas fluviais;
Destruição do habitat de outras espécies de mamíferos, que ocorrem nas margens dos rios;
Poluição das águas pelas poeiras resultantes da extracção de areias, em especial junto de locais de captação para abastecimento público;
Poluição sonora provocada pelo ruído das máquinas e camionagem trabalhando, por vezes, dezasseis a dezoito horas diárias;
Degradação paisagística das margens dos rios: caminhos destroçados, construções toscas, estaleiros e máquinas por todo o lado.
Pelos factos expostos se conclui que a extracção desordenada de areias está a provocar a destruição ecológica e ambiental dos nossos rios, a um ritmo acelerado e preocupante que, a breve trecho, os tornará irrecuperáveis para sempre.
Enquanto isto acontece e os defensores da natureza lutam dentro dos seus limites contra este estado de coisas, os areeiros continuam a auferir chorudos lucros, sem que alguém os faça recuar na sanha destruidora a que meteram ombros.
Consideramos que a extracção de areias é imprescindível para a construção civil, porém, nas condições em que esta actividade está a ser exercida no nosso país,

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em flagrante desrespeito pela lei e sem fiscalização eficiente e rigorosa, está a ocasionar a morte dos nossos rios.
Não se pretende lutar contra o progresso nem contra a industrialização, na medida em que podem criar postos de trabalho e levar o desenvolvimento a muitas regiões do País.
Creio, porém, que as leis que regulam a preservação do ambiente e da natureza não foram feitas para mera publicação na folha oficial.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há que velar pelo cumprimento das leis legítimas, exigir responsabilidades a quem tem ignorado toda a espécie, de desmandos praticados nos nossos rios, para que os rios voltem a ser conjuntos complexos e interligados, de seres vivos que povoam os seus leitos e as suas margens, locais de lazer e repouso que permitam a prática de desportos e que permitam ainda que sejam também uma fonte de riqueza para as populações ribeirinhas e não lugares de desolação e de morte.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Deputado Barbosa da Costa, V. Ex.ª acaba dê abordar, nesta Câmara, um problema de âmbito nacional que na realidade não tem merecido - suponho -' das entidades competentes a devida fiscalização, pois verificamos que os nossos rios, de Norte a Sul, começam realmente a ficar desertos, sendo a extracção de areias uma das principais causas que leva a que tal aconteça.
E que dizer das estradas das pequenas povoações por onde transitam pesados camiões, escorrendo água, danificando os pisos, que tornam o acesso muito difícil a essas mesmas povoações? Por isso, quero associar-me às palavras que acaba de proferir e também perguntar-lhe se, face à legislação existente, se pode impedir que se façam esses atropelos ou se é necessário tornar a malha da lei mais apertada.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Deputado Roleira Marinho, quero dizer que me congratulo com a pergunta formulada e devo dizer que a lei que actualmente vigora no País tem um pouco a ver com uma intervenção que fiz durante a I Legislatura quando me bati para que igual problema se afastasse, não das zonas ribeirinhas, mas da orla marítima.
Creio que a lei actualmente existente é perfeitamente suficiente para resolver os problemas que, de facto, esta situação acarreta, mas importa fazê-la cumprir.,, O grande mal é que há grandes conivências por parte de quem devia fiscalizar e não há o cuidado devido para que os problemas se resolvam.
A questão que coloquei aqui é a de que se deverá cumprir a lei e punir não só os prevaricadores, aqueles que afastam as areias dos rios, mas também aqueles que, com a obrigação de fiscalizar, são com eles coniventes.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio Gomes.

O Sr. Amândio Gomes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de um ano encontrei um velho amigo que, agarrado a uma enxada, cavava a sua vinha. '
Após um forte abraço e com o à-vontade resultante da amizade que nos une desde a infância, fez-me a seguinte interpelação:

- Olha, tenho andado toda a manhã a pensar cá numa coisa e, já agora, gostava de ouvir a tua opinião. - Diz lá...
- Ele há inferno ou não há?

Fiquei embaraçado e respondi com um "talvez".

Soltando uma gargalhada, retorquiu: - Olha Amândio, então tu não vês que enquanto houver enxada, inferno não falta? -
Ri com ele, conversei durante algumas horas sobre outros problemas e fiquei surpreendido por sentir que este homem, simples trabalhador rural transmontano, sem instrução, sabia tanto sobre os males que afligem a nossa terra e até tinha ideias muito claras sobre a forma de os combater.
Muitos "entendidos" pensam que as nossas gentes não sabem pensar! Como se enganam!
Se nesta Assembleia da República o tempo tivesse a medida do tempo daqueles que só se parecem preocupar com o nascer e pôr do Sol, eu não necessitaria de possuir o brilho e o talento dos mais ilustres tribunos deste hemiciclo para conseguir a unanimidade dos Srs. Deputados com vista à transformação de Trás-os- -Montes no paraíso desejado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Bastaria deixar dissertar o meu amigo.. ) Ele vos diria, na sua linguagem simples, que Trás-os-Montes continua sendo uma região subdesenvolvida porque, durante várias gerações, muitos dos seus melhores filhos, especialmente os que se têm dedicado à política e à Administração Pública, preferiram abandoná-la, em vez de se dedicarem à aliciante e urgente" tarefa de a transformar, aproveitando racionalmente os seus recursos naturais e outros.
Embora muitos dos Srs. Deputados não desconheçam as nossas riquezas, ele lembrar-lhes-ia que no sector agro-florestal possuímos inegáveis potencialidades, pois a heterogeneidade do espaço transmontano conduz a uma ocupação do solo diversificada.
Pena é que se pratique ainda uma agricultura de subsistência, onde sobejam as enxadas, em explorações agrícolas de pequena dimensão, cultivadas por uma população envelhecida e com baixo nível de qualificação, e onde faltam as máquinas agrícolas e os modernos sistemas de irrigação.
No sector das indústrias extractivas temos tungsténio, estanho, ouro, ferro, calcário, talco e granitos em abundância.
Produzimos a maior parte da energia hidro-eléctrica consumida no País.
Possuímos das mais belas paisagens da Europa, cobertas pelo céu mais azul de Portugal. Cultivamos valores e costumes tão raros que são ciosamente guardados, na esperança de poder impulsionar a indústria turística.

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Os nossos emigrantes, aforristas por excelência, têm contribuído substancialmente para o equilíbrio da balança de pagamentos do País.
Em seguida, e depois de lhes dar estas explicações, ele colocar-lhes-ia as seguintes questões:
Será que o nosso comércio deverá continuar a ser controlado por uma classe de intermediários radicados no litoral onde investem os lucros (por vezes excessivos) resultantes do sector primário pelos quais a nossa região recebe cada vez menos, em termos relativos quando comparados com os produtos manufacturados que importa?
Será que as remessas dos nossos emigrantes deverão continuar a ser canalizadas para os centros industriais do litoral?
Não teremos ao menos o direito de ficar com uma parte substancial dos impostos liquidados aos depositantes?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Noutros países isso é possível.
Por que é que aos municípios onde foram construídos os grandes aproveitamentos hidro-eléctricos se paga a título de «arrendamento das albufeiras» uma quantia irrisória, em vez de se lhes atribuir uma participação condigna nos lucros gerados, a qual poderia ser paga em numerário ou em espécie?
Por que é que os Srs. Deputados eleitos pelos círculos transmontanos, bem como os oriundos desta região ou a ela ligados por laços familiares, qualquer que seja o partido em que militam, não desencadeiam um movimento que congregue todos os seus conterrâneos e conduza a um autêntico desenvolvimento da nossa terra?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Será que têm medo? Ou será que o comodismo pode mais que a sua vontade política?
Os nossos conterrâneos merecem alguns sacrifícios da vossa parte, ainda que só seja o de coordenar o esforço gigantesco que os emigrantes vêm desenvolvendo individualmente em prol das suas terras.
Srs. Deputados transmontanos, então não se dão conta que unidos formariam uma importante força parlamentar, que conteria alguns dos mais brilhantes parlamentaristas portugueses?
Estas são realmente as questões inadiáveis sobre as quais todos teremos de nos debruçar para que o verdadeiro arranque para o desenvolvimento se verifique dentro de uma estratégia global conduzida por nós. Se continuamos a deixar os nossos destinos nas mãos dos outros, se não conseguimos transferir alguns centros de decisão para o seio da nossa região, pouco merecimento teremos.
O diagnóstico da situação está feito e as soluções técnicas encontram-se devidamente inventariadas no Programa de Desenvolvimento da Região Norte, o qual foi elaborado por uma equipa orientada pelo actual Ministro do Plano e da Administração do Território.
Tudo está estudado e previsto. Pouco foi realizado. As acções já concretizadas têm surgido a um ritmo tão lento que nada tem a ver com a nossa pressa, nem com as legítimas aspirações dos muitos milhares de jovens que aguardam o primeiro emprego.
Embora reconheçamos que já todos andamos cansados de reuniões sem conta, após as quais nada se passa, atrever-me-ia a sugerir que todos os Srs. Deputados transmontanos, sem excepção, se unissem e, em comissão constituída nos termos regulamentares, solicitassem uma audiência ao Sr. Primeiro-Ministro para que se elabore um plano de acção que contenha as medidas discriminatórias necessárias a favor da nossa terra, de aplicação imediata, e se definam com urgência as restantes acções que urge levar a efeito em curto e médio prazo, pois se não lá se vai mais um comboio.
Quem melhor que os Srs. Deputados para velar pelo cumprimento desse programa?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta, bem como todo o conteúdo da minha intervenção, poderá revelar muita ingenuidade política, mas talvez seja oportuno que nesta Câmara, pelo menos uma vez, deixem os ingénuos passar...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Armando Vara e Custódio Gingão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Deputado Amândio Gomes, levantou na sua intervenção algumas questões que implicariam um debate mais alongado sobre o problema em causa.
Todavia, quero referir unicamente um dos aspectos da sua intervenção que me deixou algo preocupado. É natural, cada vez que se fala de Trás-os-Montes, utilizar um discurso algo miserabilista sobre a região e fazer apelos aos naturais da terra que não estão lá, que não fazem nada por ela, esquecendo, por vezes, as nossas próprias responsabilidades. Quando o Sr. Deputado se referia aos deputados de Trás-os-Montes estava, com certeza, a referir-se também a si próprio.
Parece-me que mais importante do que fazer apelos desse género aos naturais de Trás-os-Montes - sendo verdade que nesta Assembleia cerca de 50 deputados são naturais dessa região ou eleitos por ela, podendo eles organizar-se de forma a constituir aquilo a que vulgarmente se chama um grupo de pressão -, seria através de várias formas que se poderiam resolver os problemas quase endémicos da região, e aquela que deve merecer o nosso empenhamento é a regionalização, não só da nossa região como de todo o País.
É por aí, penso eu, que passa a resolução das grandes assimetrias regionais e é fundamentalmente nesse sentido que nós temos de avançar e não com apelos desse género feitos a pessoas que são naturais de lá, que merecem o nosso respeito, que têm muito a dar à terra, mas que têm igualmente outras responsabilidades nos círculos por que são eleitos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Não sendo eu de Trás-os-Montes, visitei por várias vezes essa região integrado na Comissão de Agricultura. Posso por isso afirmar que muitas das questões aqui postas são realidades e que o Sr. Deputado tem razão. Mas a questão fundamental não foi posta pelo Sr. Deputado. É que, como nem o Sr. Deputado nem a sua bancada ignoram, o PSD está no governo há seis anos, há um plano

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integrado de Trás-os-Montes com verbas destinadas ao desenvolvimento dessa região. Pergunto, pois: o que é que os governos do PSD, ao longo destes anos, têm feito para desenvolver aquela região tão carecida?
O Sr. Deputado não deve, portanto, vir aqui pedir, mas sim exigir ao Governo, que tem meios, e que o que não tem tido é capacidade e vontade política para executar o plano de desenvolvimento de Trás-os-Montes.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio Gomes. Dispõe de um minuto, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio Gomes (PSD):- Serei breve, Sr. Presidente.
Queria unicamente dizer ao Sr. Deputado Armando Vara que gostei que tivesse ficado incomodado com a minha intervenção.
Afirmou que sem se regionalizar nada feito - também eu disse isso na minha comunicação.
O Sr. Deputado Custódio Gingão, não me fez nenhuma pergunta concreta pelo que não sei o que lhe hei-de responder.

O Sr. Presidente: -- para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Presidente, gostaria, antes de iniciar a minha intervenção, de agradecer ao CDS a cedência de tempo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A lagoa de Albufeira constitui um importante e sensível ecossistema de problemática multifacetada, envolvendo aspectos de análise paisagística, marinha e lagunar, agrícola, hidrológica, geológica e populacional, entre outros.
Desde a década de sessenta que a lagoa de Albufeira e a respectiva zona envolvente têm vindo a ser objecto de um acelerado processo de degradação ambiental, perante a inércia dos órgãos de poder central com júrisdição na área. Essa degradação iniciou-se com a proliferação selvagem de construções, na sua quase totalidade destinadas a segunda habitação.
As múltiplas entidades com jurisdição no local, à semelhança de outros casos idênticos, quando pressionadas, enveredam pela política de alijar responsabili-dades de umas para outras.
Note-se que, apesar de alguns diplomas legais (Decreto n.º 18/72 e Decreto Regulamentar n.º 80/77) manifestarem preocupação quer com a degradação da área envolvente quer com o aumento do grau de poluição das águas da lagoa e de em 1984 ter sido nomeada uma comissão para a elaboração de um plano de recuperação, tudo continua como dantes ou, para ser mais rigorosa, tudo continua a piorar de dia para dia.
O poder central não adoptou ainda uma única medida prática, remetendo para a Câmara de Sesimbra responsabilidades que não estão ao seu alcance, porque não dispõe de meios essenciais, sendo no entanto esta a entidade que, apesar de tudo, tem exercido alguma fiscalização na zona, adoptado medidas para suster a proliferação de clandestinos e desenvolvido um importante papel de informação às populações.
Entretanto, o plano de recuperação da lagoa continua a marcar passo e, enquanto a respectiva comissão tem passado os meses a discutir a «melhor filosofia»
para a defesa da lagoa, chegou-se no corrente ano a uma situação extremamente crítica devido ao assoreamento da ligação da lagoa com o mar.
O grau de poluição das águas da lagoa atingiu níveis próximos de uma situação de ruptura irreversível, morreram inúmeros exemplares das diversas espécies piscícolas que ainda povoam a lagoa, foram detectados casos de crianças com doenças de pele por terem tido a ousadia de tomar banho na lagoa e os próprios furos de captação de água destinada ao abastecimento do concelho de Sesimbra e que ficam nas imediações correm riscos eminentes de contaminação.
Tudo isto porque a entidade responsável -a Direcção-Geral de Portos- não dispõe de verba para executar os trabalhos de reabertura periódica da lagoa com o mar, tendo em vista a renovação das respectivas águas, o que terá um custo que não excederá os 2 000 000$.
Tornou-se pois necessária a intervenção de deputados desta Assembleia para que a Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais se prontificasse a tornar disponível a verba necessária. Se assim não fosse, continuaríamos no eterno jogo de que um não intervém porque não tem competência e o outro não intervém porque não tem verba. E, recorde-se, já andamos assim há mais de vinte anos!

Mas não podemos ficar por aqui! Há que, de uma vez por todas, encetar medidas práticas para o início da recuperação efectiva da lagoa de Albufeira e sua zona envolvente. Isso implica adequadas soluções de reordenamento que envolvem aspectos ecológicos, sociais e económicos.
O poder central tem de assumir definitivamente as suas responsabilidades, até porque a zona de primeira, intervenção (leito e margens da lagoa) está sob jurisdição exclusiva de organismos da administração central (Direcção-Geral de Portos, Capitania e DGRAH).
O tempo urge e vinte anos já são de mais para que se tome a primeira medida prática para defender a lagoa de Albufeira. Que as responsabilidades sejam
assumidas pois por quem lhe compete.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Voltar a trazer a este hemiciclo a situação em que se encontram os trabalhadores das minas da Panasqueira é significativo de que nada se tem feito para a alterar. O respeito que merecem os trabalhadores das minas devia já ter levado a que os vários governos tomassem medidas urgentes para pôr cobro às pré- potências das administrações destas multinacionais.
A administração da Beralt Tim & Wolfram Portugal, S. A. R. L., proprietária das minas, aproveitando uma situação conjuntural de cotações menos favorável aos seus lucros e evitando assumir quaisquer riscos, pretende transferir para os trabalhadores todos os custos e riscos possíveis, tentando aumentar as horas de trabalho, sem qualquer contrapartida salarial, de 10 horas e 30 minutos mensais, com dispensa de remuneração, quer das horas normais quer das horas extraordinárias. Com a organização de escalas móveis, a administração pretende despedir 527 dos 1350 trabalhadores.

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E, no entanto, a administração possui meios próprios, nomeadamente financeiros, que lhe permitem ultrapassar a situação conjuntural.

Quando as minas dão rios de dinheiro, a empresa embolsa, dando-se ao luxo de gastar exorbitantes verbas, como acontece ainda hoje. Quando vem a crise, são só os trabalhadores que a pagam.

Nos últimos seis anos, entre 1979 e 1985, os resultados líquidos acumulados foram da ordem de 2,3 milhões de contos, sendo o capital social de 300 000 contos.

Os capitais próprios da empresa cobrem mais de 80% do capital activo total, com ausência de capitais alheios de médio e longo prazo.

O activo circulante é cerca de quatro vezes superior ao exigível a curto prazo, não tendo, como se vê, o problema de liquidez.

As despesas com pessoal, que representavam, em 1979, 58,8% dos custos totais, só representam, em 1985, 42,6% desses custos.

Em 1985, os trabalhadores mineiros trabalharam mais 7,5% de horas que no ano anterior, tendo vindo a crescer a sua produtividade.

E isto apesar de ser mais aconselhável, em termos de horário, a sua redução, a exemplo de outros países, mesmo da CEE.

É um facto que a permanência longa no interior da mina diminui as capacidades físicas e intelectuais, aumentando assim o número de acidentes e doenças profissionais.

A administração não pode vir alegar, simplesmente, os resultados económicos de 1985 como negativos, devido à baixa da cotação internacional do minério, porque as receitas de aplicações financeiras inverteram substancialmente a situação.

É óbvio que a administração da Beralt tem conveniência em vir agitar o espectro do desemprego.

Tenta colocar-se em situação económica difícil para conseguir alterações às leis laborais, como: aumento de horas diárias de trabalho, diminuição dos prémios de produção, despedimento e transferências arbitrárias de trabalhadores dos seus postos de trabalho, fazendo pressão para obrigar os trabalhadores a aceitar tais condições.

As propostas da empresa visam, entre outros objectivos, travar as justas reivindicações dos trabalhadores, quer quanto às actualizações salariais e outras matérias pecuniárias quer quanto às condições de trabalho, segurança e actividade sindical, mas visam ainda mais fundo: obter concessões do Governo e benefícios de vária ordem.

No fundo, é pretender ultrapassar a crise das cotações mantendo os seus lucros e o património intactos, não assumindo as suas responsabilidades, fazendo-as transferir escandalosamente para os trabalhadores.

Já não bastam as condições em que estes trabalham, atrás da lavra gananciosa destas multinacionais, onde nem o regulamento da higiene e segurança para as minas é respeitado, o que tem vindo a provocar acidentes mortais, como aconteceu recentemente com a morte de mais um mineiro no fundo da mina, como ainda pretende a administração exigir-lhes mais sacrifícios desumanos.

Diminuir o horário de trabalho, criar postos de trabalho, criando melhores condições de reforma para os mineiros, seria a única política justa.

Para isso, seria necessária vontade política do Governo, criando melhores condições de vida e de trabalho a quem labuta nas entranhas do nosso solo. Esse seria o prémio justo e capaz de fazer um País novo, onde quem trabalha fosse respeitado e não explorado e marginalizado.

Mas em vez disto, o Governo continua a porfiar nos esforços para alterar as leis do trabalho, como pretendeu com a autorização legislativa, saindo derrotado.

Não pode merecer confiança um governo que tem como objectivo criar a insegurança no trabalho e o desemprego a milhares de trabalhadores que labutam nas minas.

Estamos certos que não conseguirá tais objectivos.

Urge pôr termo a tal situação. Os trabalhadores e o povo português assim o exigem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Pau-louro.

O Sr. António Paulouro (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou inteiramente de acordo com o que acaba de afirmar o Sr. Deputado António Mota.

O que se passa nas Minas da Panasqueira constituiria um absurdo se naquela região não houvesse tantos absurdos a pedir providências urgentes. Os trabalhadores das Minas da Panasqueira estão agora entre dois males igualmente angustiantes: o desemprego, a que a empresa quer condená-los alegando falta de lucros, e a degradação das condições de segurança, que excede tudo quanto se possa imaginar.

Aplausos do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): — Sr. Deputado, naturalmente que a minha intervenção não esgotou tudo o que se podia dizer sobre as Minas da Panasqueira; a BERALT, empresa multinacional, não procede só desta forma nas Minas da Panasqueira mas também em vária minas que tem abandonado, como as Minas da Borralha, não respeitando os direitos dos trabalhadores nem a nossa economia.

Naturalmente que estamos preocupados com esta situação, levanta-mo-la e continuaremos a fazê-lo, nomeadamente com o requerimento que tenho para ser entregue relativo à situação no sector extractivo, onde o desprezo pelos trabalhadores e pela nossa economia tem sido, por assim dizer, o dia-a-dia destas multinacionais, que não vêm cá pôr o seu dinheiro, antes levam lucros, como os 2 300 000 contos que levaram nestes últimos seis anos, não investindo nas minas. Mas depois pedem concessões, obrigando os trabalhadores a ceder para aumentarem ainda mais os seus lucros.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitorino Costa.

O Sr. Vitorino Costa (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ensino do Português na Europa é vivido pelos emigrantes como um problema seu, como

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algo que directamente lhes diz respeito. Os professores de Português são, como é óbvio, elementos fundamentais no ensino/aprendizagem do idioma, e da cultura pátria, nos países de emigração. Por isso, é sempre com preocupação que os emigrantes constatam a existência de problemas no seio deste pequeno grupo de transmissores da cultura-mãe. Não nos espanta, pois, o seu estado de espírito, as constantes interrogações sobre a situação dos professores contratados.
São cerca de 60 professores, na sua maioria esmagadora radicados em França, que foram localmente contratados pelo Governo Português, com a finalidade, exclusiva de atenderem às necessidades do ensino da língua e cultura portuguesa, numa altura em que as estruturas capazes de dar resposta a tão delicado problema ou eram inexistentes ou, pelo menos, incapazes e insuficientes.
Eram trabalhadores que, na grande maioria, tinham os seus empregos e que, como é óbvio, tiveram então de optar entre a sua profissão e leccionar a tempo inteiro, perdendo assim o seu contrato com o patrão anterior.
A maior parte deles possui, é certo, apenas o 7.º ano, o que lhes confere somente habilitação suficiente. Há que ter em conta, no entanto, que são docentes que, para além de leccionarem na sua totalidade há mais de oito anos consecutivos, não têm a culpa total de ainda hoje não possuírem a habilitação própria, já que há vários anos a esta parte lhes têm sido criadas sucessivas expectativas, feitas toda uma série de promessas, com a esperança da profissionalização, sem, no entanto, jamais se ter tido a coragem política para passar das palavras aos actos, de passar dos projectos à concretização dos mesmos. Assistiu-se a um sucessivo protelar da solução para os seus problemas, até que, finalmente, o actual governo resolveu pura e simplesmente dar a machadada final, colocando-os perante o espectro do desemprego, com a agravante de eles ficarem sem hipóteses de outro contrato, vendo-se por isso, na sua maioria, forçados a regressar ao seu país, ao serviço do qual se dedicaram durante estes últimos anos.
Foram-lhes criadas esperanças vãs em 1983, quando, sendo Secretário de Estado Adjunto do Ministério da Educação o actual Ministro daquela pasta, se elaborou um projecto de profissionalização que jamais se veio a concretizar pelo eterno alegar de faltas de verbas.
Novas esperanças foram criadas em 1986, mais concretamente em Janeiro e Fevereiro deste ano, quando foi inclusive elaborado um projecto de curso de profissionalização, chegando-se ao pormenor de solicitar o curriculum vitae aos interessados.
Já agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, permitam-me que pergunte:
Para quê todas estas diligências?
Para quê a elaboração de um projecto de curso de profissionalização, devidamente estruturado e especificado?
Para quê a solicitação dos currículos dos interessados, se, afinal não se pretendia levar nada a cabo?
Será esta atitude digna ou dignificante de quem a tomou?
Que reais interesses presidiram a toda esta encenação?
Se, efectivamente, existe vontade real de tornar efectivo um projecto de profissionalização em exercício para professores contratados, por que não se procuram alternativas viáveis, por que não se acaba de vez com toda esta série de medidas contraditórias e descoordenadas?
É que, e convém lembrá-lo aqui muito claramente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em circunstâncias similares o Ministério da Educação tomou atitudes bem diferentes. Basta para tal, recordar o caso dos professores do 12.º grupo e Trabalhos Manuais, dos monitores de educação de infância, dos monitores de Educação Física, dos ex-regentes escolares entre outros...
Isto para já não falar no mais recente exemplo do despacho ministerial de Agosto de 1985 que permitia o complemento de habilitações e profissionalização em exercício aos professores do ensino particular e cooperativo! ...
Parece-nos, pois, espontâneo e natural perguntar: por que não se tomam idênticas medidas com os professores contratados na Europa? Eles, que surgiram num momento em que as estruturas eram inexistentes ou precárias, que ajudaram, de qualquer modo a construir todo um edifício, não terão, pelo menos, o direito de serem tratados de maneira idêntica a outros do seu país natal?
A situação dos professores contratados em França e na Europa é deveras crítica e digna de uma aturada reflexão, sobretudo por parte de todos nós e dos mais directos responsáveis. A maior parte destes docentes não têm sequer qualquer desconto para a reforma, o que vem agravar ainda mais a sua precária situação. Não possuem a segurança no emprego e, alvo de contrato anual, vão-se tornando presas fáceis do desemprego, alvos preferidos do esquecimento e indiferença dos responsáveis.
O Governo Português, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tem responsabilidades na presente situação dos professores contratados e não pode pura e simplesmente, numa atitude aleatória, demitir-se destas mesmas responsabilidades de, como Pilatos, lavar daí as suas mãos, sob pena de fazer cair sobre si próprio todos os atributos característicos daquela triste figura, histórica.

Aplausos do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Fernando Figueiredo e Luís Geraldes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Figueiredo.

O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Sr. Deputado Vitorino Costa, far-lhe-ei três breves perguntas.
O Sr. Deputado disse que os professores não tinham a culpa total na situação vigente. É evidente que queria dizer que tinham a culpa parcial, o que lamento, mas é um facto.
Em segundo lugar, falou em promessas. Queria dizer-lhe que tenho conhecimento é de pedidos para a prorrogação de prazos para a aquisição de habilitações e não de promessas do Governo.
Em terceiro lugar, falou da coragem política do Governo. Pergunto-lhe - dado que esta foi uma matéria que tocou a vários governos - se um governo que tem a coragem de pôr o assunto no são, de ver quem são as pessoas que têm habilitações, de dar aos emigrantes - isso sim - docentes habilitados e capazes

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de lhes ensinarem a cultura e a língua portuguesas, se há um governo que tem essa coragem, o Sr. Deputado agora critica-o por este ter a coragem política de tentar resolver uma situação que se vem protelando, há longos anos, com o desagrado de emigrantes, de professores e, até, talvez, dos próprios governos que não tenham sido capazes de o fazer. Acha, pois, Sr. Deputado, que não existe neste governo a coragem política de se pôr os assuntos no são?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Deputado Vitorino Costa, muito rapidamente, colocar-lhe-ei duas questões em relação a esta matéria.
A primeira é no sentido de saber se, efectivamente, o Sr. Deputado desconhece que, de tantos professores que se fala que vão ser despedidos em França, só cerca de dezoito é que irão ser afectados. E serão afectados porque não têm habilitações próprias para o desempenho das suas funções.
Por outro lado, gostaria, também, de lhe expor o caso dos professores que entretanto adquiriram habilitações próprias, ou seja, cursos superiores, que não serão afectados devido a um protocolo assinado entre a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas e a do Ensino Básico e Secundário, de acordo com o qual serão enquadrados no esquema cultural. Só aqueles que não têm habilitações próprias para leccionar é que, de facto, vão ser afectados.
Gostaria ainda de lhe referir que este é um processo que já se vem arrastando desde 1979 e que é de conhecimento geral. E foi, de facto, com este governo que houve a frontalidade e a coragem de dizer «[...] basta! Há que dignificar o ensino no estrangeiro [...]», e foi este o momento adequado para que este aspecto fosse tomado em consideração.
Face aos números tão reduzidos de professores que serão afectados, gostaria que o Sr. Deputado me respondesse a esta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitorino Costa.

O Sr. Vitorino Costa (PRD): - Sr. Deputado Fernando Figueiredo, creio que falar apenas de promessas será muito pouco porque, efectivamente, o Sr. Deputado conhece tão bem como eu esquemas de cursos em que lhes é afectado um 1.º ano, um 2.º ano e, inclusive, um 3.º ano em que esses cursos de profissionalização são previstos. Portanto, há, efectivamente, promessas. Há promessas em que se pedia que os curricula vitae fossem entregues até Janeiro de 1986. Portanto, isto significa alguma coisa e não são palavras vãs.
Quanto aos docentes habilitados, Sr. Deputado, ainda há pouco o Sr. Deputado Caio Roque teve oportunidade de dar alguns exemplos - que não repito porque já a aqui foram enunciados -, os quais creio que são suficientemente claros e que dispensam quaisquer comentários.
Quanto ao facto de serem apenas dezoito os professores afectados pelo despedimento, Sr. Deputado Luís Geraldes, essa é a sua informação. A minha informação e a de outros deputados que estão ligados a este processo é bastante diferente. Efectivamente, serão muitos mais.
O que ponho em causa, neste momento, não será a vontade que o Governo tem de dignificar o ensino do Português no estrangeiro, pois todos nós temos essa vontade. O que todos nós, eu próprio e outros, que, como eu, conhecemos este assunto e que temos tratado destes problemas, queremos é que sejam dadas a estes professores oportunidades que, noutras circunstâncias, foram dadas aos professores do continente.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Deputado, penso que essas oportunidades já lhes foram dadas. Este é um processo que se arrasta desde 1979!
Por outro lado, os senhores professores que adquiriram cursos superiores não irão ser afectados.

O Orador: - Sr. Deputado, por exemplo, por que é que não lhes é permitida uma profissionalização, que já estava contemplada? Por que é que não lhes é permitida, agora, uma aquisição de cursos?
Tudo isso já foi discutido em comissão - o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente. A oportunidade que queremos que lhe seja dada é a de que sejam contratados. Muitos deles deixaram o emprego que tinham -o Sr. Deputado sabe-o tão bem como eu - e não têm agora oportunidade de arranjar outro. E deixaram o emprego porque lhes foi dada a garantia de que, indo para o ensino, aí o teriam.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - O Sr. Deputado sabe tão bem como eu que alguns destes professores não se dedicam, única e exclusivamente, ao ensino. Por conseguinte, dizer que vão ser expulsos não corresponde minimamente à verdade.

O Orador: - Mas o Sr. Deputado também sabe que a maior parte deles deixou o seu emprego e não possui agora carta de emprego, a não ser com o Estado Português. Esta verdade pode constatá-la junto de outros deputados que estão a par deste assunto.

Aplausos do PRD.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos agora no período da ordem do dia.
Estão em aprovação os Diários da Assembleia da República, 1.ª série, n.ºs 75, 76, 77, 78 e 79, respeitantes às reuniões plenárias de 28 de Maio e de 3, 4, 11 e 12 do mês de Junho findo.

Pausa.

Como não há oposição, consideram-se aprovados.
Vou agora submeter à votação o pedido da comissão eventual para prorrogação do prazo de apreciação da proposta de lei n.º 5/IV, que altera a Lei da Radiotelevisão.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e votos contra do PCP e do MDP/CDE.

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O Sr. Presidente: - Tendo sido aprovado, o prazo é prorrogado até ao dia 20 de Julho de 1986.
O Sr. Deputado Jorge Lemos pretende interpelar a Mesa. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, uma vez que não se verificou consenso no sentido de não ter lugar o intervalo regulamentar e que faltam só dez minutos, sugeríamos que talvez se pudesse antecipar um pouco a hora deste, realizando-se o debate que se segue imediatamente a seguir para não estarmos a interrompê-lo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Capucho tem a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, uso da palavra por uma questão de rigor. É que as horas no relógio da Sala não condizem, minimamente, com as dos nossos. A hora ali marcada é escandalosamente avançada em relação à hora oficial, e gostaria de saber por qual nos havemos de guiar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado. Eu preferia, realmente, guiar-me pelo meu relógio que marca 17 horas e 17 minutos, embora ainda nem tivesse notado tal.
Então, se os senhores deputados não vêm inconveniente, interromperíamos os trabalhos até às 18 horas, guiando-nos pelo meu relógio, ou, então, vamo-nos guiar pelo da Sala...

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, se de acordo com relógio de V. Ex. ª fazemos intervalo até às 18 horas, isso significa que este será de 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Não, é até às 17 horas e 30 minutos.

O Sr. António Capucho (PSD): - Então, o intervalo é de catorze minutos? Não percebi, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para as 17 horas e 30 minutos, que é, precisamente, a hora do intervalo regimental faltam, pelo meu relógio, cerca de treze minutos. Portanto, iríamos prosseguir os nossos trabalhos por mais treze minutos, e quando chegássemos às 17 horas e 30 minutos far-se-ia o intervalo regimental.
Sr. Deputado Jorge Lemos, tem a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, tínhamos sugerido a antecipação do intervalo mas não fazemos questão por mais ou por menos dez minutos. Enfim, parecer-nos-ia que o debate seria mais rentável se começasse só depois do intervalo, sem interrupção, mas, pelo nosso lado, se o Sr. Presidente assim o entender, começaremos já o debate e interrompê-lo-emos às 17 horas e 30 minutos, de acordo com o nosso relógio e não com o do Plenário.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então, prosseguir os nossos trabalhos com a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 1O/IV (PCP) - Revogação da Lei das Rendas.
Peço ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal o favor de ler o respectivo relatório e parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente sobre o projecto de lei n.º 10/1V - Revogação da Lei das Rendas e de alterações urgentes ao regime Jurídico do arrendamento com vista à garantia do direito à habitação.

1 - Foi presente à Comissão de Equipamento Social e Ambiente o projecto de lei n.º 1O/IV, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, em 4 de Novembro de 1985. A baixa à Comissão efectivou-se em 8 de Novembro de 1985, por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República.
2 - Constituiu-se uma Subcomissão coordenada pela Sr." Deputada Odete Santos, do Grupo Parlamentar do PCP, e também integrada pelos Srs. Deputados Vasco Marques (PRD), Sérgio de Azevedo (PSD) e pelo Sr. Deputado Carlos Melancia, depois substituído pelo Sr. Deputado Leonel Fadigas (PS).
3 -- O projecto de lei n.º 1O/IV tem em vista, segundo o Grupo Parlamentar do PCP, os seguintes objectivos:

a) Revogar, a Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro;
b) Determinar a aprovação no prazo de 60, dias, de legislação tendente a:

Institucionalizar e enquadrar o plano nacional de habitação;
Instituir os mecanismos legais adequados à recuperação do parque habitacional degradado;
Compelir ao arrendamento dos fogos devolutos;
Instituir novos procedimentos na administração urbanística, garantindo-se autonomia de intervenção dos municípios na gestão dos solos urbanizáveis;
Limitar a mudança de finalidade da ocupação dos fogos hoje destinados à habitação;

c) Fixar de imediato, e enquanto não for feito a revisão global do regime do arrendamento para habitação, normas destinadas a regular várias matérias sobre a «garantia especial do direito à habitação dos trabalhadores com salários em atraso», alterações à «transmissão do direito ao arrendamento por morte do arrendatário e do direito a novo arrendamento», «garantia de informação atempada aos inquilinos da iminência da caducidade do arrendamento», disposições sobre «obras de conservação e beneficiação» e "disposições diversas," entre as quais as de manter as alterações introduzidas pela Lei n.º 46/85 à Lei n.º 55/79 e à Lei n.º 2088 quanto ao montante de indemnizações.

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4 - A Comissão é de parecer que o projecto de lei 1O/IV está em condições de ser apreciado em Plenário.
Palácio de São Bento, 30 de Junho de 1986. - O Presidente da Comissão, A. Anselmo Aníbal.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A história do instituto jurídico do arrendamento urbano revela, como a de qualquer outro, a situação social que se vai desenvolvendo e que através dos tempos exigiu do Estado uma intervenção cada vez maior em defesa do direito à habitação.
A nossa história não longínqua, uma história enxameada de barracas e outros tugúrios, revela-nos como, da protecção desenfreada dos senhorios, da protecção que recusava os mais elementares direitos, mesmo processuais, aos inquilinos, se foi passando, por virtude da pressão das várias crises sociais, para a introdução de normas obrigatórias que foram modelando uma nova configuração jurídica do contrato de arrendamento para habitação.
A crise social que se viveu durante a 1.ª Grande Guerra levou a que a I República tomasse medidas de grande significado social, entre as quais se destaca o congelamento de certas rendas, precisamente na área do parque habitacional ocupado pelas classes trabalhadoras, assumindo, ainda, relevante significado a renovação automática do contrato de arrendamento para habitação.
Quem quiser fazer a história das crises sociais do País encontra nas várias alterações ao arrendamento urbano a forma como os governos as foram tratando, pressionados de um lado pelas carências habitacionais e do outro pelos interesses dos grandes proprietários.
A nossa história mais recente do parque habitacional (um parque fruto quase exclusivamente da iniciativa privada com graves carências em equipamentos e infra-estruturas, e basta recordar que mais de metade dos fogos não tinham em 1970 água canalizada), a nossa história mais recente, dizíamos, dá-nos também o retrato fiel da forma como o Estado tem encarado a efectivação do direito ao tecto, isto é, do direito à habitação.
E dá-nos a medida de como após o 25 de Abril o Estado se virou para o investimento público nesta área.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas quando, daqui a alguns anos, o historiador chegar a 1985 e estudar a conformação legal do instituto do arrendamento urbano, poderá à primeira vista e erradamente concluir, se não entrar noutras análises, que a crise da habitação foi superada, que no País se vivia em desafogo económico, que o Estado tinha encontrado as condições propícias para revogar normas protectoras dos inquilinos. É uma conclusão errada, porque parte da aceitação, de boa fé, de que em 1985 se legislava de acordo com a realidade social.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Em que outra sociedade, senão naquela em que o pretendente a inquilino tenha à sua disposição uma grande oferta no mercado do arrendamento, se podem introduzir alterações na renovação obrigatória e automática do contrato?
Em que outra sociedade, senão naquela em que o peso do sector público no mercado de arrendamento é significativo, se podem aligeirar as normas limitadoras dos montantes das rendas habitacionais?
Ora a história que já se vai fazendo e a que os dados estatísticos conferem a devida distanciação para uma análise correcta revela que em 1985 todas as condições sociais determinavam que se fizesse de facto uma revisão global do regime de arrendamento mas no sentido de alargar o âmbito da intervenção do Estado no contrato de arrendamento em favor da parte mais fraca, restabelecendo-se desta forma a igualdade contratual.
Contudo, em 1985 procedeu-se precisamente ao contrário, pelo que se conclui que o legislador decidiu fechar os olhos à grave crise social e legislar contra os inquilinos.
Parece, perante a Lei n.º 46/85, que não estamos num país atacado por vários flagelos. Parece que não temos salários em atraso, que não temos desemprego, que não temos um número cada vez maior de novos pobres, que não temos de novo o flagelo da exploração do trabalho feminino e infantil, índice seguro e certo de todas as crises sociais.
Mas se a degradação da situação social deveria ter levado à não aplicação da Lei n.º 46/85, há que dizer que para futuro os aumentos das rendas de casa não vão resolver os problemas do sector da habitação.

Hoje debatemos um projecto de lei do Partido Comunista Português fundado nessa realidade. Um projecto que vem antecedido de várias iniciativas do PCP no sentido de impedir que se agrave a situação social das famílias portuguesas.
Na discussão na especialidade da Lei n.º 46/85 apresentámos várias propostas no sentido de minorar de facto os efeitos nocivos da lei do aumento das rendas. Solicitámos depois a urgência para este nosso projecto de lei, porque de facto era urgente que a lei não entrasse em vigor.
Sujeitámos a ratificação o decreto-lei relativo ao subsídio de rendas.
Porque era necessário que a correcção extraordinária, afectando inquilinos que na sua maioria se encontram em débil situação económica, não entrasse em vigor.
Apresentámos várias propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 68/86, que iriam aproximar o actual regime da renda injusta, que é o regime da lei do aumento das rendas, ao regime da renda-rendimento apontado pela nossa Constituição.
Mais de 500 000 inquilinos iriam ficar abrangidos pelo subsídio de renda e não apenas a escassa percentagem que já se verifica e que nem sequer parece aproximar-se da iniciativa do Governo. Esperemos que, a este respeito, o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação nos dê hoje os dados sobre a aplicação do Decreto-Lei n.º 68/86 até ao presente momento.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Estamos, hoje, no debate de mais uma iniciativa do PCP, no debate de um projecto de lei que propõe a revogação da lei do aumento das rendas, com o qual o PCP dá cumprimento ao seu programa eleitoral.
É que de facto, para nós, o que é necessário fazer é isso mesmo: revogar uma lei que é desumana e injusta, uma lei que encara o contrato de arrendamento

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como um negócio, na livre disponibilidade das partes, no qual o Estado se demite dos seus deveres recusando a sua intervenção a favor de quem, carecendo de habitação, se encontra realmente em desigualdade na celebração do contrato.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas o projecto de lei do PCP não se queda na revogação da lei do aumento das rendas.
É que o PCP sempre defendeu a necessidade de se proceder a uma revisão global do regime do arrendamento urbano.
Em 1976, afirmávamos no preâmbulo de um projecto de lei, que consta das páginas de um Diário da Assembleia da República: "torna-se forçoso concluir que o regime actual do arrendamento urbano contraria frontalmente o preceito constitucional que proclama e garante o direito à habitação.
[...] É, indispensável proceder de imediato a uma reforma de fundo do regime do arrendamento urbano; há que elaborar um código de arrendamento urbano capaz de, assegurar o mais amplamente possível o direito à habitação."

Uma voz do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Porque assim o entendemos, assim o afirmamos neste projecto de lei, logo no artigo 2.º, concretizando no artigo 27.º as medidas pelas quais tem de passar a revisão global do regime de arrendamento. É fundamental, senhores deputados, um plano nacional de habitação. É necessário que se legisle no sentido de permitir a recuperação do parque habitacional. É urgente que se estabeleçam medidas, mas medidas sérias e não apenas o seu simulacro, para obrigar ao arrendamento dos fogos devolutos.
É imprescindível evitar a desertificação, dos centros das cidades, conseguida à custa da instalação de escritórios e comércios em casas ontem arrendadas para habitação.
É fundamental rever toda a administração urbanística, garantindo-se a autonomia dos municípios na gestão dos solos urbanizáveis.
E porque tudo isto é urgente e necessário, tudo isto consta do projecto de lei do PCP como necessidade imperiosa.
Mas se é necessário que esta Assembleia aprove, de imediato, a revogação da lei do aumento das rendas, antes mesmo de se vencerem as primeiras correcções extraordinárias - estamos no dia 30 de Junho -, há medidas que, também de imediato, devem ser aprovadas enquanto não se proceder à revisão global do regime do arrendamento para fins habitacionais. O projecto de lei em debate estabelece em moldes diferentes dos que constam da Lei n.º 46/85, o regime de transmissão do direito ao arrendamento e do direito a novo arrendamento. Tais regimes conheceram diversas flutuações desde 1974.
As alterações sucessivas ao artigo 1111.º do Código Civil foram alargando, ou restringindo, o número de pessoas com direito à transmissão. O mesmo aconteceu relativamente ao direito a novo arrendamento.
A filosofia que acabou por vencer foi a de restringir de facto aqueles direitos, deixando sem protecção familiares, subarrendatários, hóspedes, vivendo com o
inquilino por vezes há longos anos, e que, de um momento para o outro, se vêem despejados sem possibilidades reais de resolverem o seu problema.
Em 1981, o governo da ex-AD foi mesmo ao ponto de na lei considerar uma longa e extensa lista de excepções do direito ao novo arrendamento, através da qual negava aquilo que em princípio dizia conceder. Só por milagre com aquele diploma, seria possível efectivar o direito a novo arrendamento.
É que, ao fim e ao cabo, com as restrições ao direito à transmissão e ao direito ao novo arrendamento, já se permitia a liberalização das rendas.
O projecto de lei do PCP dedica um capítulo à questão das obras de conservação e de beneficiação.
Praticamente, reproduzem-se nele as propostas apresentadas pelo PCP aquando do debate na especialidade da lei do aumento das rendas. Valerá a pena deter-nos no regime proposto nesta lei que a nada conduz.
Desde logo porque não obriga, de facto, os senhorios a fazerem as obras necessárias.
Que se desiludam os inquilinos. O ónus continua a impender sobre as câmaras municipais, sobre os inquilinos e, é como se a lei lhes dissesse, se querem obras, façam-nas, paguem-nas, que depois se verá.
E vai-se tão longe à protecção ao senhorio, que nem sequer se permite que o crédito das câmaras ou dos inquilinos sobre os senhorios, seja executado noutro património destes que não seja, na renda. Isto é: câmaras e inquilinos; depois de beneficiarem o património do senhorio, ver-se-ão forçados a receber o que despenderam aos bochechos. É incrível, senhores deputados, mas o Regulamento Geral das Edificações Urbanas contém uma disposição de 1962 que previa muito mais.
Por outro lado, o regime da Lei n.º 46/85, alarga consideravelmente as obras classificadas como de beneficiação, aquelas que dão origem a outro aumento de renda, mesmo quando sejam absolutamente necessárias para um mínimo de conforto, aquele mínimo que é irrecusável a qualquer ser humano.
Desta forma se garantiu aos senhorios uma nova maneira de aumentar as rendas, já que aumentar rendas é o objectivo nuclear da Lei n.º 46/85.
O regime ora proposto pelo PCP é substancialmente diferente, aumentando-se o número de obras classificadas como obras de conservação, sem repercussão na renda, e rodeando-se de cautelas o acordo para a realização de obras de beneficiação, sabidas as artimanhas de muitos senhorios, pressurosos em realizar certas obras e relapsos na realização de outras.
O projecto de lei do PCP contém ainda medidas para garantir o direito à habitação dos trabalhadores com salários em atraso, uma parte das quais (mas não todas) foram consagradas numa lei aprovada pela Assembleia da República consagra medidas para evitar despejos em certos casos, garantindo ao inquilino a informação em hipóteses contempladas no artigo 1051.º do Código Civil. No projecto de lei prevêem-se alterações à Lei n.º 2088. Contemplam-se, ainda, medidas fiscais que de imediato devem ser impostas aos proprietários de fogos devolutos, já que as constantes da Lei n.º 46/85 constituem como que um envergonhado pedido de desculpa aos senhorios, pelas medidas que timidamente se tomam.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

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A Oradora: - Desculpa por se ter de legislar contra tais senhorios que, dispondo de uma propriedade com uma finalidade social, recusam o cumprimento desta finalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dissemos da Lei n.º 46/85 que ela seria fonte de conflitos e de despejos.
Passado pouco mais de um mês desde a entrada em vigor da correcção extraordinária das rendas, os dados comprovam a verdade daquela afirmação.
É que, por parte de muitos senhorios, assistimos durante um mês a toda uma série de tropelias à lei, escudando-se atrás de interpretações aleivosas da mesma.
Houve senhorios que jogando com a existência do mês de caução, impuseram aos inquilinos, logo em Junho, o pagamento do aumento da renda, quando é certo que a lei obriga a um intervalo de, pelo menos, 30 dias entre o recebimento da comunicação do aumento e a data da obrigatoriedade de pagamento da renda.
Houve senhorios que determinaram o coeficiente de correcção, não pela data do início do pagamento da renda do seu actual inquilino, mas pela data do anterior contrato de arrendamento.
Interpretação que a lei não autoriza.
Houve senhorios que não reconheceram a assinatura na missiva sobre a correcção da renda, inviabilizando o requerimento para concessão do subsidio. Houve mesmo senhorios que nem carta mandaram e exigiram verbalmente o aumento.
Houve, e há, senhorios que recusam a passagem de recibo em nome das pessoas com direito à transmissão do arrendamento, inviabilizando a concessão do subsídio.
Se não bastassem as consequências sociais e as razões já aduzidas só estes atropelos justificariam que a lei não fosse aplicada.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Perante tudo isto, cabe também perguntar a esta Assembleia, perante os resultados (escassíssimos) do tão cantado e decantado e, afinal, tão escarnecido decreto sobre o subsídio da renda se acha que é preciso ainda mais tempo para experimentar a lei, se não é suficiente a experiência, se é preciso deixar agravar, ainda mais a situação das famílias portuguesas, se não é tempo de dizer basta a uma lei que envergonha porque é a lei dos despejos, a lei que fará de facto ruir os tectos de muitos portugueses?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Disseram os autores da lei do aumento das rendas que iria permitir o relançamento da construção civil, a promoção da construção de habitações, o aumento do parque para arrendamento, porque a razão dos males que afectavam o sector estaria no congelamento das rendas. Disse-se tudo isto, e, convenhamos, senhores deputados, com algum despudor. Porque para os arrendamentos de prédios nunca arrendados, as rendas não estavam congeladas, porque depois do Decreto-Lei n.º 148/81, para os novos arrendamentos, mesmo de prédios anteriormente locados, as rendas ficaram descongeladas e em níveis absolutamente incomportáveis com a média dos orçamentos das famílias portuguesas. E apesar de tudo isso a crise da construção civil agravou-se ainda mais.
Aliás, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um dado adquirido, e adquirido pelas estatísticas, que a construção civil pelo menos no nosso país praticamente não constrói para arrendar.
Por exemplo, em 1979, dos 36 430 fogos concluídos para habitação só 3 % se destinavam a aluguer de renda livre, 31% destinavam-se a venda e 47% foram ocupados pelo proprietário.
Daí que, de facto, o aumento das rendas não vai determinar, como não determinou sobre a construção civil, o impacte que o Governo anunciou.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Aliás por entre loas ao novo regime de rendas, que fazem parte integrante desta cerimónia de imolação dos inquilinos, os industriais da construção civil vão adiantando os seus receios relativamente à evolução do sector, afirmando que, e passo a citar, "começam contudo a desenhar-se sinais de que a realidade poderá não corresponder aos indícios detectados e referidos (os de reanimação do sector da construção civil").
Desta forma, fica sem qualquer sustentação a tese defendida pelos defensores dos aumentos das rendas, que, por outro lado, nenhuma resposta têm para as objecções fortes àquele aumento daqueles que aconselham à imediata revogação da lei.
E é a essas objecções que esta Assembleia tem de responder, hoje, no debate do projecto de lei do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - É ou não é verdade, senhores deputados, que o parque arrendado é ocupado, em mais de 50 % por operários, reformados, pensionistas e idosos, pessoas de fracos recursos, a quem o aumento das rendas vai colocar numa situação de ainda maior pobreza?
É ou não verdade, senhores deputados, que não obstante a evolução favorável operada depois do 25 de Abril, havia em 1981 - por via de uma inversão de política - cerca de 200 000 alojamentos sem qualquer tipo de infra-estruturas? Que apenas pouco mais de metade dos alojamentos em 1981 eram equipados pelas infra-estruturas básicas?
E se isto é verdade, e é-o de facto porque os números são oficiais e não deixam mentir, é evidente que o antídoto destes males, não é a liberalização das rendas para habitação.
O remédio para a crise habitacional passa pelo investimento público na habitação, que é hoje nulo. Passa pelo apoio às cooperativas de habitação. Pela municipalização e combate à especulação dos solos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Por criar melhores condições para o exercício da actividade da construção civil. A habitação é um problema nacional. Todos os sectores, público, cooperativo e privado devem contribuir para a sua resolução.
Mas, quanto a tudo isto estamos, praticamente, no ponto zero.
Fica assim demonstrado, se é que o não está já, que a resolução da grave crise habitacional, passa por outras medidas. Fica assim demonstrado, senhores

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deputados, que o regime de rendas, numa situação como a que vivemos é de facto o último elemento do contrato a ser revisto.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Daí a urgente revogação da Lei n.º 46/85 antes que tal medida legislativa, que é de facto o telhado e não a base de um sistema, desabe arrastando nos escombros os que mais necessitam de protecção.
E cabe aos senhores deputados responder hoje aos apelos desses que lá fora, remetidos à categoria de novos pobres, vivendo abaixo do limiar de pobreza, esperam desta Assembleia que revogue uma lei que é, em si mesma a própria denegação da justiça.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é chegada a hora do intervalo regimental. Vamos interromper os trabalhos e recomeçaremos a sessão às 18 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos:

Srs. Deputados, tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cerca de um ano após a aprovação nesta Câmara, por grande maioria, da denominada "lei das rendas" e muito pouco tempo depois de se gorar a tentativa do PCP de inviabilizar a plena vigência daquela lei, voltamos hoje a debater a mesma matéria.
Ao longo dos debates travados neste hemiciclo ou na respectiva Comissão, quer por ocasião da discussão e aprovação da que é hoje a Lei n.º 46/85, quer por ocasião da ratificação do Decreto-Lei n.º 68/86, a bancada social-democrata deixou bem claramente definidos o seu entendimento e a sua posição.
Sempre pugnámos pelo descongelamento das rendas habitacionais, como um imperativo de relevantes reflexos tanto no que se refere ao incremento da política habitacional e do sector da construção civil como no que se prende com a necessidade da recuperação do nosso degradado parque habitacional.
Entendemos desnecessário repetir hoje tudo quanto por companheiros meus, e por mim próprio, aqui ficou dito aquando das discussões e votações anteriores, e a que já aludi.
Quando a Lei n.º 46/85 só agora começou a vigorar, no essencial, não descortinamos razões, e muito menos razões fundadas, para proceder já a alterações do que nela se consagra, e muito menos para votar a sua revogação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa da autoria do PCP, que hoje debatemos, visa tão-só, e mais uma vez, tentar criar um certo clima de agitação.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É falso!

O Orador: - Porém, os primeiros indícios colhidos do início da aplicação da lei revelam claramente que o "dramatismo" que o PCP coloca à execução da Lei n.º 46/85 não teve, não tem, nem terá o acolhimento que os comunistas esperavam e no qual tanto se têm empenhado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Os inquilinos adoram!

O Orador: - Apesar disso, e na sequência do que lhe é habitual, a Lei das Rendas é um slogan que o PCP considera dever continuar a usar, ainda que, como ele bem sabe, já só lhe sirva para mero uso interno.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É falso!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não diremos que há leis perfeitas e sobretudo imutáveis, mas dizemos, isso sim, que só por irrealismo poderemos votar a revogação de uma lei, aprovada nas condições que estão ainda vivas na memória de todos; que acaba de iniciar a sua plena vigência.

Uma voz do PCP: - Vê-se isso nas bichas!

O Orador: - O PCP, porque não podia ignorar que a sua iniciativa de revogação não ia merecer o menor acolhimento, entendeu, então, propor uma série de alterações ao regime do arrendamento para fins habitacionais, que denomina de transitório, com as quais acabaria por alcançar os mesmos objectivos.
Não estamos, contudo, esquecidos de que a grande maioria de tais alterações constituiu propostas que o PCP apresentou aquando da discussão e votação da lei na especialidade, em sede de Comissão.
E também os autores da presente iniciativa têm necessariamente ainda bem presente a rejeição dessas propostas por uma grande e inequívoca maioria.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso foi na anterior legislatura!

O Orador: - Se a presente iniciativa legislativa pudesse trazer consigo o mérito de provocar uma reflexão sobre alguns resultados negativos ou discutíveis da Lei n.º 46/85, ela obteria da nossa parte a apreciação e discussão compatíveis com aquele mérito; mas como este projecto visa apenas, como disse já, tentar mais uma vez um processo de agitação, ele não nos merece mais comentários, pelo muito respeito que devemos a esta Câmara e ao País.

Aplausos do PSD.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.

O Sr. Vasco Marques (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O regime de arrendamento urbano assentou nos últimos anos em dois diplomas fundamentais: a Lei n.º 2030, de 22 de Julho de 1948, e o Decreto-Lei n.º 445/74, de 12 de Setembro.
A Lei n.º 2030 consagrava a convenção livre da renda na altura da celebração do contrato de arrendamento e a sua actualização de cinco em cinco anos,

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mediante avaliação a pedido do senhorio. A avaliação não era permitida nos concelhos de Lisboa e Porto onde, durante a vigência do contrato de arrendamento, as rendas de casa estavam congeladas, desde 1948.
Esta lei aparece como resposta política a um período de crescimento elevado de preços e forte intranquilidade social no período subsequente à Segunda Grande Guerra e foi mantida em vigor até 1974.
Já em 1981, através do Decreto-Lei n.º 148/81, de 4 de Junho, estabelecia-se o regime de renda condicionada e revogava-se o Decreto-Lei n.º 445/74 no que dizia respeito aos novos contratos.
Este decreto-lei tinha como finalidade principal a dinamização do mercado da oferta de habitação para arrendar e, ao mesmo tempo, servia de elemento moderador dos níveis das rendas oferecidas no mercado livre.
Para além de outros aspectos contemplados, este diploma inscrevia pela primeira vez, desde 1948, o princípio da actualização das rendas condicionadas.
De facto, o regime da actualização previsto na Lei n.º 2030, que podia considerar-se adequado para a época, bastando observar que durante a década de 50 a inflação foi praticamente inexistente, passou a estar totalmente inadequado quando o nível do agravamento de preços começou a acentuar-se na década de 60 e principalmente nos anos setenta, exactamente quando se estabelece o congelamento global das rendas.
Como resultado de todo este percurso, e mesmo sem ter possibilidade de uma avaliação global do impacte do Decreto-Lei n. º 148/81, pode referir-se que a situação do mercado de arrendamento é hoje de quase completa estagnação, dela decorrendo graves distorções económicas e sociais a diversos níveis.
É dentro deste panorama que a AR, depois de alguns meses de discussão, aprova em 1985 a Lei n.º 46/85, conhecida pela "lei das rendas", que renova os Decretos-Leis n.ºs 148/81, de 4 de Junho, 328/81, de 4 de Dezembro e 294/82, de 27 de Julho.
O Decreto-Lei n.º 68/86, de 27 de Março, vem regulamentar o processo de atribuição e gestão do subsídio a que tem acesso os inquilinos cujas rendas fiquem sujeitas à correcção extraordinária e com a Portaria n.º 227/86, de 20 de Maio, que fixa as tabelas dos referidos subsídios e da renda limite, fica integralmente regulamentada a Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O problema da habitação é suficientemente grave e complexo para justificar um conjunto de medidas articuladas num plano nacional de habitação; não pode ser resolvido nem se esgota com uma lei. Uma lei do tipo da Lei n.º 46/85 era necessária, mas devia ter sido inserida num conjunto mais amplo de medidas. Além disso, o critério que esta Lei utilizou para a correcção extraordinária das rendas em vigência de contrato é criticável. Em primeiro lugar, porque os valores de base - os do contrato - estão inflacionados; depois, porque no estabelecimento dos coeficientes se privilegia a data do contrato, considerando portanto os valores do mercado e não os custos reais no estabelecimento dos valores. O valor dos fogos deverá ser calculado em função dos custos de construção e conservação, tanto actuais como na altura em que foram construídos, devidamente actualizados, o estado de depreciação e as condições de habitabilidade oferecidas.
Deverão ainda considerar-se as localizações absoluta e relativa do edifício.
Em relação às obras de conservação e beneficiação, os aumentos de rendas, por pesados que sejam para os inquilinos, continuam a não dotar a maior parte dos senhorios da capacidade de fazer as obras que os edifícios carecem. A Lei das Rendas não pode resolver esta questão pelo que é necessário regulamentar as modalidades especiais de crédito no apoio a este tipo de obras.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Muito bem!

O Orador: - O carácter restritivo do subsídio de renda, sempre representado como compensação para o aumento necessário, já mereceu por parte do PRD, nesta Assembleia, as críticas necessárias. Defendemos a implementação de um subsídio de renda que permita adoptar o regime de renda justa e garanta o direito à habitação nos casos dos agregados familiares de menor capacidade financeira. A proposta do valor global a atribuir a estes subsídios será apresentada no próximo orçamento do Estado para 1987, após a apresentação, por parte do Governo, que se comprometeu a fazê-lo em Outubro próximo, dos resultados da aplicação desta lei. Este assunto mereceu a concordância da Comissão de Equipamento Social, conforme transcreve o relatório desta Comissão sobre a ratificação do Decreto-Lei n.º 68/86, de 27 de Março, que "define o regime de atribuição do subsídio de renda de casa".
Notamos também que existe neste diploma confusão entre política social e política de habitação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A complexidade dos problemas, as diferentes capacidades financeiras, a evolução diversificada (desde o estado de conservação dos edifícios até às mudanças ou estabilidade dos inquilinos), os contrastes entre os núcleos históricos e as zonas novas ou entre as áreas urbanas e o mundo rural; os fracassos de várias experiências recomendam que a procura de soluções para o problema da habitação passe pelo recurso a formulas variadas. Assim, uma política habitacional, deveria ter em conta: a participação mais activa do sector público nos domínios do planeamento urbanístico, gestão do território, política de solos, legislação - regulamentação técnico-urbanístico-financeira (desde o ataque à especulação, reestruturação dos serviços da administração urbanística e ao apoio técnico às câmaras, entre outros); o reconhecimento que o Estado não tem capacidade para dar casa a todas as famílias necessitadas e a vantagem em utilizar todos os recursos e vontades em processos diversificados (desde a promoção exclusivamente pública, a diversas formas de associação ou simples apoio); a definição do papel da iniciativa privada, cooperativa e pública e encontrar o justo equilíbrio para a acção do sector público entre apoio técnico e financeiro, incentivos e isenções fiscais, promoção directa ou em colaboração nas suas diversas modalidades; a necessidade de fortes apoios e incentivos ao sector cooperativo, cuja promoção é insignificante em comparação com a de outros países da Europa (necessidade de um novo regime de enquadramento jurídico e de financiamento); a aceitação do papel importante da iniciativa privada e o reconhecimento aos proprietários do direito de receber um rendimento justo pelo capital investido na promoção e conservação dos imóveis, tendo em conta as características específicas do investimento imobiliário e o papel de risco entre as opções de investimento; o incentivo ao regime de renda condicionado de tal modo que

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tenda a ser o dominante e o incrementar operações de reabilitação urbana e de defesa do património de um modo geral.
Temos por fundamental que a legislação sobre arrendamento urbano deverá ter como objectivo permitir a utilização integral do parque habitacional.
As grandes carências de fogos não se compadecem com a existência de fogos devolutos pelo que defendemos a penalização destas situações por via da contribuição predial. Pensamos também que deverá ser encarada uma penalização tributária, posteriormente, dos fogos sem ocupação efectiva e situados em aglomerados com uma certa dimensão.
Deverá ser criada legislação que contenha medidas que impeçam a demolição de prédios de habitação, ainda em boas condições funcionais, e que dificultem a conversão de fogos em escritórios e similares.
Devem ser também criadas condições para um efectivo planeamento urbanístico e controle efectivo pelos municípios do seu território, principalmente as áreas urbanas ou sujeitas a maior pressão.
Pensamos também que se devem promover operações de reabilitação das zonas históricas e degradadas, prevendo o investimento participado do Estado-
-autarquia, proprietários e inquilinos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD assumiu publicamente uma posição sobre a Lei das Rendas exactamente no dia em que ela foi publicada.
Afirmámos que uma lei do inquilinato urbano deverá inserir-se num autêntico plano nacional de habitação, democraticamente participado, e que deverá também fundamentar-se no princípio da renda justa e como tal garantir condições de acesso a uma habitação condigna a todos os estratos da população. E a primeira crítica que o PRD formulava em relação à lei tinha a ver com a sua eficácia.
Como medida isolada que constitui, dizíamos, a sua eficácia é altamente duvidosa, quer no que se refere à animação do sector e ao relançamento da construção civil em crise, quer no que respeita à recuperação dos imóveis degradados.
O PRD manifestava nessa altura, e em plena campanha eleitoral, a sua concordância com o princípio do descongelamento das rendas.
É que em economia de mercado pode haver intervenção no sentido do tabelamento de preços, mas é injusto impor congelamentos. A política de preços sociais implica subsídios aos produtores, pois não se penaliza estes com aquela.
Além disso, o congelamento, sendo uma aberração em termos de mercado, só se deve aceitar para períodos curtos e limitados para fazer face a situações inesperadas, de tipo catástrofe.
O congelamento por períodos prolongados introduz graves perturbações e é responsável por muitas injustiças e problemas actuais, ou serve de desculpa, nomeadamente para os valores exorbitantes dos alugueres, retenção de fogos fora do mercado, falta de investimento e degradação dos prédios, bem como permite manter fogos subutilizados ou mesmo afastados do mercado com graves consequências em termos de oferta.
Além destas razões, o congelamento não permite a formação de poupança para reposição de stock habitacional, bem como cria injustiças sociais na distribuição dos rendimentos, não só entre senhorios e inquilinos, mas também entre estes últimos ao originar situações de rendas significativamente diferentes para fogos de idênticas condições.
Estamos a crer que neste momento a população já entendeu a necessidade de haver aumentos e já se habituou à ideia, pelo que nem sequer será muito popular manter o congelamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assinaladas as nossas, discordâncias face à Lei n.º 46/85 e expostas algumas das nossas ideias sobre a problemática mais geral da habitação e do inquilinato, parece-nos contudo que não será este o momento ideal para a revisão da actual Lei das Rendas.
Apesar de todas as suas deficiências, é preferível esta lei ao congelamento que anteriormente vigorava e será conveniente deixar passar um período de tempo na aplicação da lei para a rever, depois à luz da experiência adquirida e num quadro mais definido de política habitacional, sem, contudo, pôr em causa o princípio de que as rendas devem ser actualizadas periodicamente, de acordo com a evolução do índice de preços.
Para além do mais, a entrada em vigor de uma lei como esta implica um vencer de resistências, cria expectativas e implica a montagem de todo um conjunto de processos administrativos, que seria muito negativo travar ou alterar neste momento.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - De acordo com o princípio de contribuição para a resolução dos problemas nacionais e a estabilidade da sociedade portuguesa, o PRD não pode concordar com a revogação pura e simples da Lei n.º. 46/85.
Mas queremos também manifestar, desde já, a nossa abertura para colaborar em iniciativas destinadas a introduzir correcções que melhorem a aplicação da lei.
Aproveitamos esta ocasião para dar a conhecer à Assembleia que nos encontramos a trabalhar com vista a apresentar, na próxima sessão legislativa, o que se poderá chamar uma lei de bases da habitação, que concretize algumas das ideias já aqui expostas, e cujos princípios deverão informar o Plano Nacional de Habitação, que consideramos muito importante estabelecer.
Isto não impedirá a eventual apresentação prévia de propostas legislativas parcelares no que toca ao novo regime de enquadramento jurídico e de financiamento das cooperativas de habitação.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Vasco Marques, na sua intervenção, V. Ex.ª, referindo a posição pública que o PRD tomou aquando da publicação da lei do aumento das rendas, disse que essa posição era de forte crítica à lei e referiu-se à necessidade de se estabelecer uma renda justa.
Ora, o sistema de renda da lei do aumento das rendas é, obviamente - e creio que está à vista sem haver a necessidade de a lei estar em prática por mais tempo -, injusto, mais a mais tendo em conta o carácter fortemente restritivo do subsídio de renda.
Assim, as questões que queria colocar-lhe são estas: que correcções pensa o PRD que devem ser introduzidas quanto ao sistema de renda e quando é que acha

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que essas correcções devem ser introduzidas? Não pensa que será agora, numa altura em que podem evitar-se muitos males?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.

O Sr. Vasco Marques (PRD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, na minha intervenção respondi à sua pergunta quanto às correcções que o PRD pretende introduzir - inclusive, posso citar-lhe algumas -, assim como quanto ao sistema de rendas. Parece-nos que, por exemplo, as diferenças que há entre prédios com e sem elevador devem ser melhor esclarecidas. Em todo o caso, pensamos que a prática irá definir, com clareza, as medidas correccionais que iremos tentar introduzir.
De resto, aquando da discussão da ratificação, pedida pelo Partido Comunista Português, do Decreto-Lei n.º 68/86, foi feita esta observação. Aliás, muitas outras correcções iremos introduzir, após os estudos que estamos a fazer.
Também lhe quero dizer que não nos parece que este seja o momento oportuno, exactamente na véspera do primeiro mês em que vão ocorrer os aumentos das rendas, para revogarmos a lei do aumento das rendas. A revogação da lei iria criar um verdadeiro caos no Pais...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Iria evitar!

O Orador: - .... porque todos os senhorios já fizeram os recibos e a própria Assembleia não ficaria muito beneficiada se, à última hora, revogássemos a lei.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quem ficaria beneficiado eram os inquilinos!

O Orador: - Quanto à segunda pergunta, que me fez, recordo-lhe que eu disse que temos um plano ambicioso e que na próxima sessão legislativa iremos apresentá-lo aqui.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta intervenção deveria ser produzida pelo meu colega Anacoreta Correia; contudo, como, por deveres de carácter profissional, ele se encontra impedido de o fazer, serei eu que a vou ler. Deve ser, portanto, entendida nesse sentido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de em 3 de Dezembro do ano passado ter rejeitado o requerimento de processo de urgência para a discussão do projecto de lei n.º 1O/IV, da autoria do PCP, é esta Assembleia chamada a ocupar-se hoje desse mesmo projecto, que preconiza a "revogação da Lei n.º 46/85", vulgarmente conhecida como "lei das rendas".
Entretanto, em 20 de Maio último, o Plenário da Assembleia debateu, também, a solicitação do PCP, a ratificação do Decreto-Lei n.º 68/86, que "define o regime de atribuição do subsídio de renda de casa", diploma que, após discussão na especialidade em sede da Comissão Parlamentar de Habitação e Equipamento Urbano, foi ratificado em votação final global, no passado dia 20 de Junho.

uer isto dizer que, no curto espaço de seis meses, esta é a terceira vez que o PCP suscita a discussão parlamentar da Lei das Rendas.

Vozes do PCP: - E bem!

O Sr. António Mota (PCP): - Se calhar, não fica por aqui!

O Orador: - Reside aqui - na insistência obsessiva e quase paranóica com que o PCP faz debater esta questão - a primeira razão de discordância do CDS. Com efeito, não vemos que à Assembleia venha alguma utilidade, muito menos prestígio, em reanalisar tão repetidamente uma lei que aprovou, ainda não há um ano, por cerca de 80% dos seus deputados. E menos ainda se salientarmos - como não pode deixar de ser salientado - que essa aprovação ocorreu no termo de mais de três meses de intensa discussão na especialidade no seio da Comissão Parlamentar competente, que tomou em devida atenção numerosos aspectos que o prévio debate público da lei evidenciou como sendo relevantes.
Mesmo que estas sucessivas iniciativas do PCP concluam - como sempre têm concluído - por votações que confirmam, por esmagadora maioria, decisões anteriormente tomadas pela Assembleia, a verdade é que a simples repetição do agendamento desta matéria é, para uns, motivo de expectativas e ansiedades que, não se confirmando, acentuam, depois, as suas frustrações e, para outros, ocasião para juízos sobre a leviandade e a provisoriedade das nossas decisões. Um e outro sentimento são negativos para a imagem de responsabilidade e de seriedade que a Assembleia deve dar de si mesma e consentem a ideia de que o país político, por ser paralelo e não estar identificado com o chamado país real, não contribui nem para a estabilidade emocional nem para a confiança política que o povo deve ter naqueles que, como nós, foram eleitos para o representar.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Agradeço ter-me permitido a interrupção.
Sr. Deputado, aquilo que lhe quero dizer é só isto: a lei do aumento das rendas é que não tem nada a ver com o país real!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PCP): - E é fruto da instabilidade!

O Orador: - Fico a saber, assim, qual é a noção que o PCP tem do país real, o que confirma as minhas convicções a esse respeito. Para o PCP, o país real é outro e está a muitas milhas de distância!... Mas adiante.

Protestos do PCP.

Façam favor, expandam-se à vontade. Têm todo o tempo.

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É, portanto, e em primeiro lugar, pelo respeito que deve merecer uma decisão da Assembleia tomada por quatro quintos dos seus membros, após longo, sério e profundo debate público e parlamentar, que o CDS votará contra o projecto do PCP.
Uma segunda razão para o nosso voto decorre do entendimento que temos quanto às condições e ao enquadramento em que deva ser procurada uma solução para o problema habitacional português.
Permito-me recordar o que sobre esta questão foi dito pelo CDS na referida sessão de 3 de Dezembro último:

Repetidas vezes tem o CDS defendido que a extensão e a gravidade da situação exigem a definição de uma política integrada que mobilize, coordene e oriente as capacidades do Estado, das autarquias e da população em geal para o objectivo comum da eliminação do deficit habitacional num espaço de tempo que não peque por irrealista, por ser demasiado curto, nem seja desmotivador por ser demasiado longo.
Uma tal política, para possuir fiabilidade e determinar resultados positivos, deveria assentar num amplo consenso, envolvendo o compromisso das principais forças partidárias que, no governo ou na oposição, observariam as finalidades e as metas oportunamente definidas, prosseguindo persistente e empenhadamente o esforço bastante e durante o tempo indispensável à erradicação das carências básicas.

Temos a consciência de que a dimensão(e complexidade do problema habitacional exigem não apenas uma política global correcta como também a sua aplicação com continuidade e estabilidade no tempo, o que implica que seja amplamente consensual, tanto nos seus objectivos como nas componentes instrumentais que usa.
A Lei das Rendas - que constitui um elemento indispensável para que se possa inverter a actual tendência para o constante e progressivo agravamento da crise - é produto do esforço da busca desse consenso em que convergiram o PS, o PSD, o CDS e a ASDI.
Esse espírito de entendimento ficou significativamente alargado com as posições assumidas pelo PRD no processo de ratificação do decreto dos subsídios de renda. Durante o debate, na especialidade, desse diploma, o PSD, o PS, o PRD e o .CDS declararam o propósito de promover, no início da próxima sessão legislativa, uma apreciação da Lei das Rendas e da restante legislação complementar tomando como base os resultados concretos que a sua aplicação vier a evidenciar, tendo o Governo assumido o compromisso de facultar os elementos indispensáveis a tal análise.

A Sr." Odete Santos (PCP): - O Sr. Secretário de Estado disse que não era nenhum compromisso!

O Orador: - Consideramos, assim, que a iniciativa do PCP de propor hoje a revogação da Lei n.º 46/85 é, por um lado, inoportuna e despropositada em face da posição já anunciada por quatro partidos que representam cerca de 85% da actual composição do Parlamento e, por outro, é estranha e desinteressada dos esforços, dos resultados já obtidos e das expectativas que um tão amplo consenso permite relativamente à

definição e aplicação de uma política de habitação capaz de solucionar a crise que o País enfrenta neste domínio.

O desejo de preservar e aprofundar os progressos já alcançados na busca desse clima e dessa via de entendimento leva-nos a não tomar nem a apoiar iniciativas que recusem ou ignorem esse objectivo fundamental.
Esta é a segunda razão que leva o CDS a votar contra o projecto do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas múltiplas ocasiões em que o problema habitacional tem sido debatido nesta Câmara, sempre exprimimos a convicção de que a Lei das Rendas, por si só, não era capaz de determinar a alteração profunda da actual situação de crise.
É, contudo, um elemento importante e necessário para que se modifique o sentido do constante agravamento das carências existentes e das enormes injustiças sociais que lhe estão associadas.
Cremos, com efeito, que, para além do imediato lançamento ao mercado de arrendamento de várias dezenas de milhares de fogos que se encontram concluídos e desocupados, esta lei é susceptível de produzir alguns, embora incipientes, benefícios importantes.
Desde logo, põe termo ao tabu psicológico e legal que representam o congelamento das rendas, responsável pela extinção do mercado de arrendamento. Em substituição desse congelamento, fica, a partir de agora, consagrado o princípio da racionalidade, que considera a habitação como um serviço, cuja utilização tem um custo estabelecido, segundo critérios económicos periodicamente actualizáveis.
Estão, portanto, criadas condições para que, por um lado, se reactive o interesse dos senhorios na' conservação dos seus prédios (assim se evitando a degradação precoce e generalizada do valioso património constituído pelo parque arrendado) e, por outro, se reanime o investimento em fogos para alugar.
A lei pode, assim, ser indutora de um mais ajustado equilíbrio entre o mercado de arrendamento e o de habitação própria, permitindo a muitas famílias -especialmente jovens casais- encontrar um lar sem ter de o comprar e encarar a eventualidade de mudanças de residência em busca de melhores condições de vida sem ter de enfrentar os condicionamentos decorrentes da actual inexistência de casas para arrendar.

A Sr." Odete Santos (PCP): - Com rendas de 30 e 40 contos, como é que os jovens podem ter casa?!...

O Orador: - O equilíbrio entre estes dois mercados vai, por outro lado, libertar o Estado de funções que lhe não cabem e consomem as suas capacidade financeiras, possibilitando concentrar-se na missão de apoiar eficazmente, através de esquemas personalizados e dotados de equidade, as famílias que não possuam solvência para suportarem sozinhas e na totalidade os custos da sua habitação.
É também porque reconhecemos que a Lei das Rendas é um instrumento indispensável para a inflexão da filosofia e dos resultados da política habitacional seguida na última década que votaremos contra o projecto de lei n.º IO/IV. -
Das razões anteriormente enunciadas se conclui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a disponibilidade do CDS para, juntamente com outras forças partidárias

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e em espírito do maior consenso, participar na definição de uma política habitacional moderna, eficaz e justa.
Contribuiremos, assim o julgamos, para o respeito que é devido à nossa condição de deputados e para a dignificação desta Assembleia, onde temos como mandato imperativo representar e resolver os problemas do povo português.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Legislar sobre a venda de Coca-Cola neste país ou sobre as rendas é, para o Governo, apenas uma questão de terminologia.
O Governo esquece que a Constituição inscreve o direito à habitação no capítulo intitulado «Direitos e deveres sociais», paredes meias com o direito à saúde e à segurança social.
Para o Governo, Coca-Cola e direito à habitação são duas formas distintas de promover o seu clientelismo, que trata de igual forma.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - O PCP é partidário da Pepsi!

O Orador: - Diga lá, Sr. Deputado! Há pouco estava tão preocupado com os apartes!...

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - também tenho direito aos apartes, não tenho?

O Orador: - Há pouco é que parecia não reconhecer a outrem esse direito.
Mas continuando direi que em vez de promover o direito à habitação, o Governo restringe-o.
Esquece que em Portugal existem 729731 famílias que vivem sem electricidade, que há 230 mil fogos em regime de sobreocupação, 40 mil fogos de habitações para venda, e cerca de 700 mil habitações com mais de 60 anos, e só em Lisboa 16 247 famílias vivem em barracas.

A Sr." Odete Santos (PCP): - Este é que é o país real!

O Orador: - Estes os números da nossa vergonha, da nossa indignidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não que nós sejamos contra uma lei que regule o aumento das rendas para habitação.
Mas entendemos também que uma lei que intervenha nesse sector deve ter como intervenientes compartes a situação económica, isto é, o rendimento per capita quer do senhorio, quer do inquilino.
Mas a actual lei não contempla nem os senhorios pobres nem os arrendatários pobres.
Os ricos ficarão mais ricos e os pobres ficarão mais pobres.
E não falemos dos chamados «subsídios», que não são mais do que esmolas que muitas vezes não compensam sequer a eventual deslocação dos novos mendigos do arrendamento para receberem o bodo aos pobres que o governo lhes assegura.
E será que esta lei trará um recrudescimento do investimento no sector?
Não senhor, conforme a própria proposta governamental reconhece e porque nenhuma lei de financiamento ao sector foi entretanto promulgada, como ainda agora foi reconhecido pelo Governo aquando da discussão da moção de confiança.
Mas tornará mais disponível o direito a novo arrendamento? Pelo contrário, porque se mantêm os regimes de renda livre e condicionada que servirão «à maneira» sempre os interesses dos senhorios e nunca os seus compartes contratuais, que são os arrendatários, não se penalizando os senhorios absentistas.
Sendo certo que apenas 16% dos inquilinos auferem receitas superiores a 35 contos mensais, tememos, justamente, em função destes índices, que esta lei venha a constituir um verdadeiro despoletar de dramas pessoais e humanos que alguns só conhecem por intermédio dos jornais.
Mas ainda perguntamos, preocupados que estamos a ver a equidade por ambos os contraentes: esta lei serve os senhorios pobres, aqueles que tudo apostaram numa pequena casa de rendimento como única reforma possível da aventura emigratória, ou como complemento de uma reforma de todo em todo insuficiente para assegurar padrões mínimos de dignidade? Não o cremos.
Esta lei não se preocupa sequer com o volume de fogos arrendados, volume do investimento, volume de rendas recebidas à sua data e volume de encargos familiares dos senhorios.
Por isso lhe é quase indiferente beneficiar os senhorios que arrendaram moradias no Restelo ou aqueles que, vindo de longes paragens «com um saco cheio de nada», para repetir o poeta, adquiriram como único garante para a velhice pequenos apartamentos na periferia das grandes cidades.
Seria ocioso repetir os casos de desigualdade que da aplicação desta lei resultam.
Mas nem o que é bom para o Governo é bom para os senhorios que megalomanamente pretende representar. No seu conjunto, finalmente, já nem tudo o que é bom para a América é bom para a General Motors.
A repulsa popular por esta lei, o crescimento inevitável das acções de despejo num país com 50 mil famílias com salários em atraso e com mais de meio milhão de desempregados faz-nos acreditar na sua morte precoce.

A Coca-Cola que o Governo nos quis impingir está imprópria para consumo.
. Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Tinha de ser. Não se lhe pode falar na Coca-Cola!

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Deputado Seiça Neves, apenas a título de esclarecimento e para introduzir a questão que lhe quero colocar, referirei que esse problema das rendas de casa não vem nem do congelamento socialista produzido pelo Dr. Salazar nem do posterior congelamento introduzido pelo então Sr. Primeiro-Ministro, também socialista, Vasco Gonçalves.

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A Sr." Odete Santos (PCP): -4- O congelamento já vem da I República!

O Orador: - O problema vem muito mais detrás, vem do tempo da I República, quando foi abolida dos contratos de arrendamento uma das condições fundamentais de qualquer contrato e que é o respectivo prazo.
A partir daí e apesar da resistência -do Dr. João Soares, deva-se homenagem a esse outro socialista, não sei se na altura ele era ou não socialista-, que lutou com todas as suas forças contra tal «aborto legislativo» tal ficou consignado. Mas, enfim, isso pertence à história.
O facto é que a situação se foi degradando de tal maneira, Sr. Deputado Seiça Neves, que chegamos ao ponto de V. Ex." vir aqui dizer que uma pessoa que toda a vida labutou e que voltou para casa com o «saco cheio de nada» -que não era tão «nada» como isso pois comprou um andar-;aufere hoje, como acontece com milhares de casos por este país fora, de uma renda de, por exemplo, 3500$' (o que já é uma renda cara em relação à média) sem que se diga que essa mesma pessoa paga de impostos 700$ ou 800$ e que; depois, vai pagar 2500$ de condomínio.
Pergunto o seguinte: como é que V. Ex." resolve o problema? Ou V. Ex. tem dinheiro para pagar e, nesse caso, paga, ou considera que a habitação é um investimento condenado a não ter rentabilidade, a não ter vida, ou, então, está a fazer demagogia e é isso que, no fundo, ressuma de todo este debate e de todas estás iniciativas do" PCP que, como é evidente, V. Ex.ª, coonesta e apoia. É a mais pura e radical de todas as demagogias.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Para responder, tem ,a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, poder-se-ia. falar de demagogia quando V. Ex." refere aqui os governos do Dr. Salazar e do general Vasco Gonçalves: em primeiro lugar, porque mesmo no governo do Dr. Salazar o parque habitacional era mais apto e mais disponível do que é actualmente. V. Ex.ª fez demagogia porque a explosão demográfica em Portugal, bem como o regresso de retornados das ex-colónias não foram acompanhados por um crescimento no sector- da construção civil.
Por outro lado, V. Ex." fez mal em referir a «lei socialista», como lhe chamou, do general Vasco, Gonçalves, porque nesta Assembleia é apanágio dos parti; dos de direita atacarem permanentemente uni' homem que não se pode defender; em segundo lugar, quando essa lei foi feita estavam no poder todos os partidos aqui representados, à excepção do CDS.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E do deputado Borges de Carvalho!

O Orador: - Quanto à pergunta que V. Ex." me colocou muito concretamente, em relação aos senhorios pobres e ricos, digo-lhe que esse é exactamente um dos maiores defeitos desta lei, que aqui tive oportunidade de denunciar; esta lei não é uma lei boa nem pela óptica do senhorio, pois é uma lei que não discrimina os senhorios pobres dos senhorios ricos, não discrimina as pessoas que apostaram numa pequena moradia para garantir a sua reforma daqueles que têm dezenas e dezenas de fogos para arrendar. Esse é exactamente um dos vazios da lei.
Assim, devolvo à procedência o seu epíteto de demagogo, que lhe cabe e assenta muito bem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa intervenção neste debate quase que poderia ficar-se por remeter a Câmara para as posições por nós assumidas, quer aquando da discussão da lei na generalidade, quer na especialidade, quer quando -ainda há pouco tempo- tivemos oportunidade de aqui trazer algumas opiniões sobre esta matéria, a propósito da ratificação do diploma que regulamenta os subsídios de renda.
Não vale a pena/penso eu; fazer perder à Câmara o tempo indispensável para outros trabalhos, retomando e, repetindo aqui, com carácter de exaustão, posições que são conhecidas. O Partido Socialista mantém aqui, hoje, e dá por reproduzidas as opiniões e as posições que oportunamente teve neste Parlamento.
Naturalmente que se poderiam fazer acerca desta lei e da iniciativa do PCP mais um conjunto de afirmações que, segundo penso, são desnecessárias. r'' E são-no não só pelas razões que expendemos mas pelo próprio tom do debate.
Se a lei que aprovámos nesta Assembleia tivesse um carácter tão negativo como foi referido, quer no debate no ano passado, quer mesmo no deste ano -ainda que com outro vigor, naturalmente mais débil-, obviamente que o debate estaria a ser feito em ambiente completamente diferente.
E quem esteve no Parlamento durante o debate desta lei no ano passado e assistiu ao conjunto de movimentações sociais e ao próprio ambiente em que o debate decorreu, se comparar, verifica naturalmente que alguma coisa mudou. E o que mudou foi a verificação de que esta lei, ao entrar em vigor, já não tem a carga com que alguns artificialmente a quiseram ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vê-se a artificialidade!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lemos, hoje li O Diário e quase me convenci de que não havia debate sobre esta matéria na Assembleia, porque não vem lá uma linha acerca da revogação da lei das rendas.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Estamos a falar de coisa sérias, Sr. Deputado! Se for à bicha de pessoas que estão a espera de subsídio do Governo, verá o que elas dizem!

O Orador: Quase me convenci de que não havia debate....

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr Deputado saia da Assembleia e vá lá fora ver o que se passa!

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O Sr. António Capucho (PSD): - Está empolgante!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não estabeleçam diálogo.

O Orador: - Sr. Presidente, permiti esta interrupção ao Sr. Deputado Jorge Lemos porque, no fundo, apenas queria dizer que quase me parecia que hoje não haveria debate. Inclusivamente, não encontrei nenhuma manifestação à porta da Assembleia e as galerias estão desertas!...

Aplausos do PSD.

Uma voz do PCP: - E a sua bancada também!

O Orador: - Naturalmente, Sr. Presidente, esta lei não é uma lei simpática e seria mais simpático estar a defender a sua revogação do que a sua manutenção em vigor.
Porém, do nosso ponto de vista, reafirmamos que é uma lei equilibrada, bem como reafirmamos que, nós próprios, em relação às medidas de natureza social que a lei comporta e cuja regulamentação se fez apenas há pouco tempo, temos algumas críticas a fazer e já as fizemos, aqui, ao Governo.
Entedemos que, em relação a alguns aspectos de aplicação da lei, quer quanto à regulamentação do subsídio, quer quanto à forma como o Governo implementou os postos de atendimento público - que, enfim, se resumem a quatro na cidade de Lisboa, o que é manifestamente insuficiente -, valeria a pena que o próprio Governo aproveitasse mais tempo do que dispõe para propaganda para divulgar o próprio apoio social e as medidas de informação com vista à implementação da lei.
Mas independentemente disto e de nós próprios também temos assumido o compromisso de, em Outubro, em sede de comissão, retomar a discussão de algumas matérias - discussão essa para a qual o Governo não assumiu qualquer compromisso, contrariamente ao que disse aqui o Sr. Deputado Borges de Carvalho, apenas manifestou disponibilidade -, entendemos que a lei se deve manter em vigor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Grupo Parlamentar do PS pensa que esta lei não é a lei única para a implementação das medidas que se impõem com vista à criação de uma lei de orientação habitacional, ou melhor, de uma lei quadro da habitação.
Mas esta é uma primeira lei e nós próprios o afirmámos aqui; várias vezes tomámos a posição de dizer que aprovávamos e colaborávamos na feitura desta lei, a que se seguiriam outras acções e outras medidas. Porém, circunstâncias de natureza política levaram a que o PS não pudesse, em tempo útil, continuar, enquanto partido do Governo, a implementar as medidas que se lhe deveriam seguir.
No entanto, entendemos também que as preocupações de natureza social que o PS manifestou nesta Assembleia durante a própria feitura da lei nos obrigam a, em tempo útil, participar e contribuir para que as outras medidas se venham a implementar, medidas essas que dizem respeito às políticas de crédito, à normalização e regulamentação da prática urbanística, às acções e medidas de recuperação do parque degradado.
Pensamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o problema de lançar rapidamente - e este rapidamente significa uma boa meia dúzia de anos - umas centenas de milhares de fogos no mercado é essencial. Naturalmente que esses fogos que terão de ser de três tipos: fogos construídos pelo movimento cooperativo, fogos da iniciativa privada e pública para arrendamento e fogos para habitação própria.
Não é possível, nem pensável, que a reorganização da situação habitacional em Portugal se faça apenas à custa da casa própria. Se não tivermos a coragem de tomar as medidas necessárias - e algumas delas já deviam ter sido tomadas, não se explica que não tenham sido tomadas - com vista à dinamização do mercado de arrendamento, estaremos a perder a oportunidade de lançar os fogos necessários, essenciais, para um estrato significativo da população. E isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é uma realidade que não pode ser esquecida. Não podemos circunscrever simplesmente ao movimento cooperativo e à aquisição de casa própria as medidas de lançamento de fogos no mercado. Ou criamos as condições para reanimar o mercado de arrendamento - e o Governo tem aqui uma particular responsabilidade, por se ter atrasado tanto na regulamentação desta questão - ou perdemos um tempo que é urgente não perder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que está clara para todos os senhores deputados a posição do PS quanto a esta matéria e penso também que não valerá a pena estarmos permanentemente a retomar aqui as posições, as acusações, a troca de galhardetes que esta matéria tem permitido.
Pensamos que a questão está sobejamente discutida, o tempo dirá quem tem razão.
Entendemos que, não tendo tomado a atitude mais simpática, tomámos a atitude mais necessária e mais patriótica, que foi a de colaborar na feitura desta lei. O tempo nos julgará!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr." Deputada Odete Santos.

A Sr." Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Leonel Fadigas, creio que a leitura dos Diários da Assembleia da República de épocas passadas poderá ser extremamente elucidativa.
Estou neste momento a recordar-me de uma acta de uma sessão em 1979, quando esta Assembleia discutiu a sujeição a ratificação de um decreto-lei do então Primeiro-Ministro Mota Pinto, que já previa a questão do aumento das rendas. É elucidativo o facto de nessa altura o Partido Socialista ter afirmado, pela voz, por exemplo do Sr. Deputado Almeida Santos, que o sistema de renda era precisamente o último elemento do contrato onde se devia mexer, porque antes disso muitas outras coisas havia a fazer em relação à questão do arrendamento urbano.
A renda é, de facto, como disse na intervenção que fiz há pouco, o telhado, é a última coisa a mexer, depois de terem sido resolvidos muitos outros problemas, que, aliás, o Partido Socialista chegou a encarar em projectos, também presentes na Assembleia, com uma questão do plano nacional da habitação.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

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A Oradora: - Portanto, ,o Partido Socialista inverteu completamente a posição que anteriormente tinha tomado, posição essa que, aliás, foi unânime na> Assembleia da República, e considerou que nesta questão do arrendamento urbano devíamos começar precisamente pelo contrário, isto é, pelo telhado, desmantelando a questão do arrendamento urbano, arrastando as famílias para as barracas e só depois virão as outras medidas.
Sr. Deputado Leonel Fadigas, de facto, na última parte da sua intervenção, y. Ex.a, referiu medidas, que entendemos oportunas e que a Assembleia deve encarar, e é precisamente porque essas medidas, que também anunciámos, não foram tomadas que achamos que se impõe a revogação da lei do aumento das rendas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel" Fadigas. .

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - A Sr.ª Deputada Odete Santos referiu posições aqui assumidas por nós em 1979.
Disse na minha intervenção que, naturalmente, não circunscrevíamos à questão do arrendamento o ponto essencial de uma política da habitação. Por outro lado, disse também - não só agora como anteriormente, numa intervenção que produzi há pouco tempo - que mantinhamos as posições assumidas neste Plenário no ano passado por entendermos que, nas circunstâncias em que esta lei foi preparada, em 1984, depois de um ano de debate público, e em que foi aprovada, esta era a lei que melhor se ajustava às condições em que nos encontrávamos.
Disse já, mais do que uma vez esta lei veio com anos de atraso e que isso significa que a realidade do- País em 1975 não era a realidade de 1979, e que medidas que em 1979 se impunham e eram justas, naturalmente obrigavam a que, anos depois, alterando-se ás condições económicas e sociais do País e sendo necessário ...

Vozes do PCP: -Agravou-se a. situação!

O Orador: - Certo, agravou-se a situação. E continuaria a agravar-se á situação se mantivéssemos em vigor por um espírito de cegueira ou de avestruz...

A Sr." Odete Santos: - Agravou-se a pobreza!

O Orador: - ... normas que são uma das causas da crise habitacional que vivemos em Portugal!

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E preciso dizer que praticamente a partir de 1977 não tivemos lançamento de novos fogos no mercado habitacional, como é preciso dizer que, com esta lei; feriámos as condições para .deixar que aparecessem no mercado novos fogos para Arrendamento.
É esta a realidade que temos, de inverter, pois não se pode reduzir à aquisição de casa própria ou às casas produzidas pelo movimento cooperativo a produção e oferta de casas para quem delas necessite.
Por isso, temos defendido - e mais uma vez o. fazemos - que deve ser dinamizado o mercado de arrendamento e implementadas as condições que permitam o lançamento em Portugal do mercado de arrendamento.
Naturalmente que em 1984 e 1985 as condições a que tínhamos chegado eram completamente diferentes daquelas em que ainda estávamos em 1979 e se não tivéssemos tomado esta medida, pior seria a situação em que viríamos a estar-nos próximos tempos!
É que esta lei veio atrasado, Sr.ª Deputada. Deveríamos ter tido mais cedo coragem de mexer na questão do inquilinato!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado não haver mais inscrições, dou por encerrado este debate.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de saber se ainda dispomos de algum tempo, na medida em que queríamos produzir uma breve intervenção.
Estávamos à espera de que o Governo falasse para lhe podermos colocar algumas questões mas, uma vez que isso não aconteceu, gostaríamos de ainda fazer uma intervenção.

O Sr. Presidente: - O PCP dispõe ainda de seis minutos, Sr." Deputada.
Só, que, Sr." Deputada, eu já tinha perguntado à Câmara se ninguém mais se desejava inscrever. Porque é que só agora é que V. Ex.a...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É que, por estar a tomar atenção à resposta do Sr. Deputado Leonel Fadigas, não me apercebi disso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, se V. Ex.ª pretende usar da palavra para produzir uma intervenção, faça favor.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, gostaríamos de saber se o Governo não se encontra inscrito para intervir sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Não, não está - inscrito.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Então, Sr. Presidente, é na sequência disso que iremos produzir uma segunda intervenção, esperando que com ela o Governo se sinta motivado para fazer pedidos de esclarecimento ou para nos dar quaisquer indicações que entenda dar.

O Sr. António Capucho (PSD): - Se estiver tão motivado como eu...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, permite-me que interpele a Mesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, colocámos aqui a questão de saber se o Governo estava ou não inscrito para intervir e, pelos vistos, não está. Mas agora queria solicitar ao Sr. Presidente que tentasse obter junto do Governo uma informação sobre se tenciona ou não inscrever-se para o debate.

O Sr. Presidente: - Eu não posso fazer uma pergunta desse tipo, Sr. Deputado.

O Sr.º António Capucho (PSD): - É melhor mandar um contínuo perguntar!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -A questão é tão simples como isto: é que nós colocámos interrogações e gostaríamos de saber se o Governo está ou não em condições de responder ou se pretende participar no debate.

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O Sr. António Capucho (PSD): - Está a participar com o silêncio! É uma participação como outra qualquer! ...

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação (Elias da Costa): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: - Para dar um esclarecimento sobre a posição do Governo.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de assistir a este debate parlamentar sobre o projecto de lei n.º IO/IV, apresentado pelo PCP, e tendo verificado o consenso democrático reunido nesta Câmara sobre a posição a tomar relativamente a esta questão, considerei que não era necessária a nossa intervenção nesta matéria. Mais: se o tivesse feito, correria o risco de incomodar VV. Ex.as, na medida em que iria tornar a nossa posição repetitiva, pois subscreveria integralmente a posição assumida sobre esta questão pelos membros do Governo e pelas bancadas do PS e do PSD, entre outras, na altura em que a Lei n.º 46/85 foi discutida.
Nestes termos, considerei ser desnecessária a nossa intervenção.

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Com tanta desnecessidade, o melhor é ir-se embora!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para produzir uma intervenção, o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, julgo dever salientar ao Sr. Secretário de estado da Construção e Habitação que ele não incomoda nada, mesmo quando diz coisas um bocado inúteis.
De qualquer forma, vou aproveitar esta ocasião para fazer alguns pedidos de esclarecimento, o primeiro dos quais é o seguinte: o Sr. Secretário de Estado é Secretário da Construção e Habitação. Ora, tanto no debate sobre a interpelação ao Governo como no da moção de confiança, o Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, entendeu que não devia dar ao Parlamento e ao País uma explicação sobre a evolução do sector, nem nada de concreto sobre a construção e obras públicas.
Julgamos que este debate a propósito de um projecto de lei que trata de um problema relativo ao mercado de arrendamento diz respeito ao sector da habitação e que não seriam despropositadas umas palavras da parte do Governo que reflectissem como é que ele integra - se é que integra - esta medida em algum conjunto de medidas sobre a situação da habitação no nosso país.
Isto a menos que o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação esteja satisfeito - o que não acreditamos! - com a situação da habitação no nosso país, em especial do mercado de arrendamento nas grandes zonas urbanas, e com a situação daquilo que foi definido como «os novos mendigos do arrendamento».
O Sr. Secretário de Estado está satisfeito com as peias democráticas em relação às cooperativas? Está satisfeito com os níveis de financiamento da intervenção do Estado em relação ao mercado social? Julgo que V. Ex.ª não incomodava nada a Assembleia da República se dissesse, com números na mão - porque os deve ter - qual é a situação da habitação, na sua versão integrada, quando está aqui a destacar um dos aspectos que, como muito bem foi aqui assinalado, devia ser o último a ser tratado e deveria ser tratado integralmente.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Daí aproveitarmos esta mini- intervenção do Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação para lhe solicitar o esclarecimento adicional, se possível com números, sobre a situação do mercado de habitação, e sobre se, pelo lado da oferta habitacional, estão à vista alguns indicadores que justifiquem algum optimismo da parte do Governo.
Nós não consideramos assim, a população portuguesa também não, e gostaríamos de saber o que é que o Governo tem a dizer sobre o assunto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: - Sr. Deputado Anselmo Aníbal, ou estou equivocado ou o que está em discussão nesta Assembleia da República é o projecto de lei n.º IO/IV, do PCP, e não a política global de habitação do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nestes termos, quando V. Ex.ª entender solicitar esclarecimentos sobre essa matéria, terei todo o gosto de, em sede própria, clarificar, junto do Grupo Parlamentar do PCP, os pontos que VV. Ex." entenderem por necessário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado este debate sobre o projecto de lei n.º IO/IV, do PCP, cuja votação terá lugar amanhã às 18 horas.
A próxima sessão terá lugar amanhã, terça-feira, às 10 horas e do período da ordem do dia constará a continuação da apreciação do projecto de lei n.º 194/IV, do CDS, sobre o estatuto social dos bombeiros e a apreciação dos projectos de lei n.ºs 13/IV, do PSD, 21/IV, do CDS, e 174/IV, do deputado independente Gonçalo Ribeiro Teles, sobre baldios.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Alberto Monteiro Araújo.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.

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José de Almeida Cesário.
José Assunção Marques.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Melo Alves.
José de Vargas Bulcão.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.

Partido Socialista (PS):

Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
José Apolinário Nunes Portada.
Leonel de Sousa Fadigas.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Renovador Democrático (PRD):

Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Vasco Pinto da Silva Marques.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
Carlos Alfredo de Brito.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Antunes Mendes.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Deputados Independentes:

Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Francisco Jardim Ramos.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
João Luís Malato Correia.
João José Pimenta de Sousa.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Júlio Vieira Mesquita.
Manuel Estácio Marques Flórido.
Manuel Ferreira Martins.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

António Cândido Miranda Macedo.
António Domingues de Azevedo.
António Magalhães Silva.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Eurico Lemos Pires.
Defensor Oliveira Moura.
Fernando Dias de Carvalho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Carlos Pereira Lilaia.
José da Silva Lopes.
Maria Cristina Albuquerque.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.

Partido Comunista Português (PCP):

Domingos Abrantes Ferreira.
Jorge Manuel Lampreira Patrício.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Vasco Mello César Menezes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
José Vieira de Carvalho.
Manuel Fernando Silva Monteiro.

Deputados Independentes:

António José Borges de Carvalho.
Rui Manuel Oliveira Costa.

As REDACTORAS: Ana Maria Marques da Cruz Maria Amélia Martins.

PREÇO DESTE NÚMERO: 112$00

Depósito legal nº 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E P

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