O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 203

I Série - Número 9

Quarta-feira, 12 de Novembro de 1988

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 2.º SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE NOVEMBRO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 15 horas e 20 minutos.

Antas da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) teceu críticas ao Governo pela sua actuação relativamente ao problema dos salários em atraso.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Cardoso Ferreira (PSD) congratulou-se com a política levada a cabo pelo Governo desde a sua tomada de posse, nomeadamente nos planos social e da defesa. No fim respondeu a um protesto do Sr. Deputado Eduardo Pereira (PS) e a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Lello (PS) e Carlos Brito (PCP).
O Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP) criticou a visita do Presidente da República da África do Sul, Pieter Bolha, à Madeira, tendo, no final, respondido a um protesto do Sr. Deputado Jardim Ramos (PSD).
O Sr. Deputado Raul Junqueiro (PS) alertou a Câmara para a grave situação que se está a viver na Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos.
A Sr.ª Deputada Ana Gonçalves (PRD) criticou o Governo pela falta de vontade política em aplicar a Lei n.º 17/86, referente aos salários em atraso, no ano de 1986.
O Sr. Deputado Pereira Coelho (PSD) salientou a necessidade de melhor aproveitamento das instalações do Hospital de Rovisco Pais, na Tocha.
A Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) referiu-se ao Plano de Desenvolvimento para a Península de Setúbal anunciado pelo Governo, designadamente para fazer face aos problemas do distrito. No final respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Mendes Costa (PSD).
O Sr. Deputado Correia de Azevedo (PRD) falou acerca de problemas do concelho de Esposende e da criação de uma reserva natural na zona litoral, entre os rios Neiva e Cávado.
O Sr. Deputado Horácio Marçal (CDS), a propósito da comemoração dos 150 anos do concelho da Mealhada, felicitou o povo daquela vila e chamou a atenção do Governo para as solicitações da população.
O Sr. Deputado Lopes Vieira (PRD) chamou à atenção do Governo para a actualização das pensões de aposentação anteriores a 1981, tendo, no final, respondido a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS).
O Sr. Deputado Mendes Bota (PSD) fez-se eco dos anseios dos pescadores da vila de Alvor.
O Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos (PRD) comentou a circunstância de uma visita surpresa da Sr." Ministra da Saúde ao Hospital de São João, no Porto, ter sido coberta pelos órgãos da comunicação social.
O Sr. Deputado Barbosa da Costa (PRD) lembrou diversas medidas para a erradicação do analfabetismo.
Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão do projecto de lei n.º 140/IV (PSD) e do texto alternativo da Comissão sobre a obrigatoriedade do parecer vinculativo das câmaras municipais para o licenciamento de jogos e diversões públicas, tendo sido aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final global. Produziram intervenções a diverso título, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados João Amaral (PCP), Silva Marques (PSD), Magalhães Mota (PRD), Fernando Lopes (PS), Barbosa da Costa (PRD), Roleira Marinho (PSD), Raul Castro (MDP/CDE) e Horácio Marçal (CDS).
Entretanto, a Assembleia saudou uma delegação da Assembleia Nacional da Hungria de visita ao nosso país.
Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do PCP e do CDS.
Foi lida a acta de apuramento da eleição para a Comissão de Apreciação dos Actos do MAPA, que se realizou na sessão anterior.
Foi discutido e aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final global o texto alternativo da Comissão ao projecto de lei n.º 141/IV, apresentado pelo PSD, relativo à actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia. Intervieram, a diverso título, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados Luís Martins (PSD), Fernando Lopes (PS), Horácio Marçal (CDS), Rui Silva (PRD), Raul Castro (MDP/CDE), Cláudio Percheiro (PCP), Barbosa da Costa (PRD), João Amaral (PCP) e Roleira Marinho (PSD).
Iniciou-se o debate, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 172/IV, do PCP, sobre o subsídio de dedicação exclusiva dos docentes do ensino superior e dos investigadores, e 177/IV, do PRD, sobre a alteração das disposições relativas ao regime de dedicação exclusiva na carreira docente universitária. Intervieram os Srs. Deputados António Osório (PCP), que respondeu no final a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS), e Sá Furtado (PRD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas.

Página 204

204 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe de Athayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José Pereira Lopes.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro. Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.

Página 205

12 DE NOVEMBRO DE 1986 205

Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

António Filipe Neiva Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Francisco Manuel Menezes Falcão.
Horácio Alves Marçal.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernando de Morais e Castro.

Deputados independentes:
Maria Amélia Mota Santos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Carta

De Francisco Duarte, residente em Lisboa, tecendo algumas considerações sobre a solidariedade que, no seu dizer, deverá existir, no domínio da segurança social.

Ofícios

Da União dos Sindicatos do Distrito de Setúbal, com sede na cidade de Setúbal, anexando uma fotocópia da resolução aprovada na concentração dos trabalhadores da Reforma Agrária, realizada junto do Governo Civil do distrito, no passado dia 24 de Outubro;
Da Junta de Freguesia da Póvoa de Santo Adrião, remetendo cópia do ofício enviado a S. Ex.ª o Ministro da Administração Interna, acerca de pretendida instalação naquela freguesia de um posto da PSP;
Do Governo Civil do Distrito de Coimbra, remetendo fotocópia de um «memorando», ali apresentado pela Associação de Empresas de Máquinas Recreativas, com considerações sobre o texto do projecto de lei n.º 140/IV;
Das Câmaras Municipais de Oeiras e Portei e da Junta de Freguesia do Beato, de Lisboa, todos capeando moções aprovadas naquelas autarquias sobre o problema das finanças locais.

Telex

Da Câmara Municipal de Mora, solicitando que sejam tomadas providências para impedir que à UCP - Luta é de Todos, na Herdade da Castelhana, se retirem terras na posse útil da mesma.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: a diversos Ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado Raúl Junqueiro; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Mendes Bota, Roleira Marinho, António Esteves, Leonel Fadigas, Carlos Ganopa, Corujo Lopes, Rui Sá e Cunha e Álvaro Brasileiro; ao Ministério da Saúde e do Trabalho e Segurança Social (2), formulados pelo Sr. Deputado Luís Roque; aos Ministérios das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (2), formulados pela Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo; a diversos Ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado António João Brito dos Santos; à Secretaria de Estado do Ensino Básico e Secundário e à EDP (2), formulados pelo Sr. Deputado José Pinho Silva; a diversos Ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Armando Fernandes; a diversos Ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Barros Madeira; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e das Finanças (2), formulados pelo Sr. Deputado Lopes Vieira; a diversos Ministérios (10), formulados pelo Sr. Deputado Barbosa da Costa; a diversos Ministérios (14), formulados pelos Srs. Deputados Jerónimo de Sousa, José Magalhães e Octávio Teixeira; ao Mi-

Página 206

206 I SÉRIE - NÚMERO 9

nistério da Educação e Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Rogério Moreira e Luís Roque; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Alexandre Manuel; a diversos Ministérios (21), formulados pelo Sr. Deputado Sousa Pereira; a diversos Ministérios (19), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Educação e Cultura e ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Raul Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos formulados pelos seguintes Srs. Deputados: Manuel Moreira, na sessão de 15 de Abril; Amândio de Azevedo e Mendes Bota, na sessão de 8 de Maio; Sousa Pereira, nas sessões de 8 e 28 de Maio, Ilda Figueiredo, na sessão de 9 de Maio; Vasco Marques, na sessão de 13 de Maio; Andrade Pereira, na sessão de 22 de Maio; Carlos Brito e outros, nas sessões de 4 e 24 de Junho; Francisco Armando Fernandes e António Feu, na sessão de 12 de Junho; José Magalhães e José Manuel Mendes, nas sessões de 12 de Junho e 9 de Outubro; Oliveira e Silva, na sessão de 20 de Junho; Maria Santos, nas sessões de 10 de Julho e 9 de Outubro; João Corregedor da Fonseca e Raul de Castro, na sessão de 7 de Outubro; António Magalhães, na sessão de 9 de Outubro, e João Matos e Ilda Figueiredo, na sessão de 16 de Outubro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai enunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n. º 287/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Azevedo Gomes e outros, do PS - sobre baldios -, que foi admitido e baixou à 6.ª Comissão; projecto de lei n.º 288/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Adriano Moreira e outros, do CDS - rede dos liceus portugueses no estrangeiro -, que foi admitido e baixou à 4.ª Comissão; projecto de lei n.º 289/IV, da iniciativa da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos - proíbe a instalação, armazenamento, estacionamento ou trânsito de armas nucleares em Portugal -, que foi admitido e baixou à 9.ª Comissão; projecto de lei n.º 290/1 V, da iniciativa da Sr.ª Deputada Independente Maria Santos - proíbe a instalação, armazenamento, estacionamento ou trânsito de equipamento que sirva a militarização do espaço em Portugal -, que foi admitido e baixou à 9.ª Comissão; projecto de lei n.º 291/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Tiago Bastos e outros, do PRD - exercício do direito de associação dos jovens maiores de 14 anos e menores de 18 anos -, que foi admitido e baixou à 13.ª Comissão; projecto de lei n.º 292/IV, da iniciativa da Sr.ª Deputada Odete Santos e outros, do PCP - aprova medidas tendentes a reforçar a protecção legal devida aos cidadãos vítimas de crimes -, que foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; ratificação n.º 115/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Ferraz de Abreu e outros, do PS, que se refere ao Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro - transforma em sociedade anónima de responsabilidade limitada e de capitais exclusivamente públicos a União de Bancos Portugueses, E. P., passando a denominar-se União de Bancos Portugueses, S. A. R. L. -, a qual foi igualmente admitida.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na passada semana três factos trouxeram de novo para a actualidade política esse flagelo social dos salários em atraso.
Primeiro facto: na terça-feira, dia 4 de Novembro, o Tribunal Constitucional, a requerimento do Governo Cavaco Silva (que assim concretizou a ameaça de recorrer a todos os meios para bloquear a aplicação da lei 17/86, aprovada na Assembleia da República), aprovou um acórdão no sentido de que a aplicabilidade da lei de combate aos salários em atraso a nível de prestações só poderia ter tido lugar em 1986 se o Governo tivesse deliberado adoptar as respectivas providências orçamentais.
Segundo facto: Por ironia e a vida tem, por vezes, destas coisas -, na tarde do mesmo dia 4 de Novembro, o Sr. Ministro do Trabalho afirmava, perante a Comissão de Trabalho da Assembleia da República, que da verba de 30,5 milhões de contos inscrita no Orçamento da Segurança Social para 1986, destinada ao pagamento do subsídio de desemprego, salários em atraso, garantia salarial e lay-off, só seriam gastos 20 a 22 milhões de contos até Dezembro do corrente ano.
Terceiro facto: no dia 6 de Novembro, na Comissão Parlamentar de Juventude, o Sr. Ministro do Trabalho, confundindo os seus desejos com a realidade, como que num grito de alma, proclamava que não sabia o que fazer à verba orçamental inscrita para o pagamento dos salários em atraso em 1987, já que o Tribunal Constitucional se tinha pronunciado pela inconstitucionalidade da lei n.º 17/86. A notícia correu célere na comunicação social, ficando a pairar a ideia de que o diploma em apreço tinha sido varrido da ordem jurídica portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Impõe-se não só a reposição da verdade, mas também a apreciação e o julgamento político da conduta do Governo em todo este processo, que tem a ver com o direito à vida e ao salário de milhares de trabalhadores portugueses.
Todos os grupos parlamentares tinham consciência da existência da lei travão, mas tanto no debate em Comissão como nas declarações de voto em votação final global, realizada em Abril passado, ficou claro que a aplicação da lei era uma questão de vontade política do Governo.
As verbas existiam - demonstração lapidar é o testemunho do próprio Ministro do Trabalho, que provou a existência de uma «sobra» de 8 a 10 milhões de contos na rubrica inscrita para o efeito. E esta é a primeira acusação que fazemos: 8 a 10 milhões, que o Governo preferiu arrecadar e que poderiam ter evitado todo um cortejo de dramas de fome e de miséria para milhares de famílias portuguesas.
Os contornos da operação merecem ser descritos.
Rodeando o seu Decreto n.º 7/A-86 (que visava transformar os trabalhadores com salários em atraso em desempregados) com uma campanha colossal de propaganda, silenciando o protesto e a luta dos trabalhadores, fabricando estatísticas, proeurou neutralizar a solidariedade da opinião pública e, em particular, de muitos homens da imprensa, que tinham estado na primeira linha da solidariedade para com estes trabalhadores; proeurou, enfim, meter num ghetto os 80 ou 90 mil trabalhadores que viviam essa dramática situação. As debilidades de meios técnicos, materiais e humanos da Inspecção-Geral do Trabalho serviam às mil maravilhas, restando ainda o requerimento ao Tribunal Constitucional.

Página 207

12 DE NOVEMBRO DE 1986 207

Os centros regionais de segurança social davam indicações aos trabalhadores para recorrerem ao Decreto n.º 7/A-86. A Assembleia da República ainda não tinha iniciado a sua sessão legislativa. A operação tinha tanto de inteligente como de hipócrita e sinistra. Estava em causa uma das mais expressivas manifestações do direito à vida - o direito ao salário. Para o Governo de Cavaco Silva estava em causa o confronto e a desforra com a Assembleia da República, bem como os conceitos classistas em relação ao mundo laboral.
Mas os trabalhadores e as suas organizações souberam, no fundamental, recusar o decreto armadilhado do Governo reclamando a aplicação da Lei n.º 17/86.
Pressionada a Inspecção-Geral do Trabalho, começou aqui e acolá a movimentar-se, inventando mais uma burocracia: qualquer requerimento para a sua intervenção passava por uma folha de papel selado mais o correspondente selo de 100$. Lentamente, procedia a levantamentos, queixando-se, nalguns distritos, de falta de orientação do Governo, da falta de viaturas, da gasolina que acabava a meio do mês, da falta de agentes e de pessoal administrativo, cujo exemplo do Algarve é bem significativo. A intervenção concreta em cada situação concreta foi praticamente secundarizada para dar lugar a denominadas «operações globais», que servem de base às estatísticas do Ministério do Trabalho.
O processo é espantoso. O agente desloca-se à empresa com um inquérito. O contacto é estabelecido com a entidade patronal e nunca com as organizações representativas dos trabalhadores. No sector da construção civil, por exemplo, aconteceu que o tal inquérito era colocado na caixa do correio da residência da entidade patronal, já que era ali que a sede da empresa era referenciada.
Tem salários em atraso? Obviamente que não!
Tem subsídios e outras remunerações em atraso, contratos a prazo, etc.? Que ideia! Obviamente que não!
Entretanto, o número de empresas com salários em atraso, que encerravam ou eram conduzidas à falência prosseguia de forma acelerada.
A estatística estava pronta a ser servida à opinião pública. Cavaco Silva aparecia, uma vez mais, na Televisão, a garantir que em dois anos terminaria com os salários em atraso. O Ministro do Trabalho, nas suas contas, apontava para a existência de uns escassos 35 mil trabalhadores com salários em atraso, mais coisa menos coisa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O comportamento político do Governo em relação a este flagelo social dos salários em atraso define bem o seu conceito de justiça social. É uma manifestação extrema da sua conduta em relação ao mundo laboral. Mas ela vem na linha de outras decisões e condutas nas áreas do emprego e dos direitos dos trabalhadores.
Uma nova mancha alastra imparavelmente, denominada de trabalho precário. Os contratos a prazo já não abrangem todo o conceito da extensão e diversidade do carácter precário do trabalho, surgindo novas formas de exploração, como as empreitadas, o trabalho à peça, à hora, ao dia e à tarefa. Em certas zonas industriais, onde os desempregados são referenciados por contratantes de trabalho negro, ressurgem de novo autênticas «praças de jorna».
O Ministro do Trabalho afirma, publicamente, que tal facto não tem nada de grave, já que vale mais isso que nada. Até ajuda a provar que o desemprego está
a baixar em Portugal e a atacar a legislação laboral mais progressista. E, no entanto, centenas de milhares de trabalhadores, jovens e também já as crianças, acossados pela fome e pelas dificuldades económicas das suas famílias, sujeitam-se aos baixos salários, à falta de qualquer protecção da Segurança Social e ao mutilar de direitos inalienáveis, que ultrapassam a relação laboral e se transformam numa questão de dignidade humana. Também aqui, como na higiene e segurança no trabalho, é escandalosa a ineficácia da Inspecção-Geral do Trabalho.
Exemplo gritante é um relatório recente enviado pelo Ministério do Trabalho à Comissão Parlamentar respectiva, onde, perante centenas de queixas feitas pelo Sindicato das Trabalhadoras Domésticas, denunciadoras da exploração de mão-de-obra infantil, a IGT afirma que nada fará, por estar impedida de verificar as situações nos locais de trabalho. Para o Governo é mais fácil cobrar taxas de televisão nas casas das pessoas do que pôr cobro a esta situação escandalosa que envolve a exploração desenfreada de crianças.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda no plano social, a ameaça de grandes despedimentos colectivos, nomeadamente na CENTREL, na UTIC, na INDEP, na Casa Hipólito, entre outras, demonstram o agravamento da situação dos trabalhadores.
Mas o Governo, baixando lentamente a máscara, não só não resolve os velhos e novos problemas sociais, como veio ontem atirar mais uma acha para a fogueira que alimenta a sua actuação classista.
Quer liberalizar os horários de trabalho e dos turnos; quer retirar às mulheres trabalhadoras direitos adquiridos; quer que as entidades patronais decidam e imponham aos trabalhadores não só a forma como trabalham, mas também como dispõem das suas vidas. Cínico argumento esse de que as mulheres são discriminadas nos horários de turno. Retiram-lhes as creches, restringem-lhes direitos de maternidade, discriminam-nas no acesso às promoções e actividades profissionais e, depois, choram lágrimas de crocodilo sobre um direito adquirido, que deve ser mantido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A grandeza dos problemas sociais silenciados pelo Governo reclama não só a denúncia, como a actuação urgente das forças democráticas.
Nas vésperas do debate do Orçamento do Estado torna-se necessário salvaguardar e acolher justas aspirações dos trabalhadores e das suas organizações representativas. A Assembleia da República, na questão dos salários em atraso, assumiu, através da aprovação da Lei n.º 17/86, um imperativo de solidariedade nacional e um compromisso com esses milhares de trabalhadores, visando atender às situações mais dramáticas provocadas por esse flagelo social. Reforçar as verbas inscritas para 1987 é um acto político de firmeza e de justiça, visando reparar os danos provocados pelo Governo. Mas, para além dos salários em atraso, para além do trabalho precário, do desemprego e da repressão, os trabalhadores, partindo destes e doutros problemas concretos com que se debatem, começam a perceber quem é na realidade este Governo e quais são os verdadeiros resultados da sua política. A televisão e a propaganda não vão conseguir sobrepor-se à vida e à realidade objectiva. E porque eles nunca foram

Página 208

208 I SÉRIE - NÚMERO 9

espectadores da história, porque começam a trazer a sua acção e a sua luta para o nível que a gravidade da situação comporta, saberão dar o seu contributo determinante para derrotar esta política e demitir este Governo, com a forte esperança de que as forças democráticas, maioritárias nesta Assembleia, saberão, com audácia e sem sectarismo, construir uma alternativa democrática, retomar os caminhos do progresso, do desenvolvimento e da justiça social e contar com o seu poder criativo, a sua participação, intervenção e também com o seu trabalho.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um ano passado sobre a tomada de posse do Governo, importa fazer um balanço da sua actividade.
Saído de eleições em que o País, numa inequívoca manifestação de confiança, sagrou o Partido Social-Democrata como maior partido português, logrou este obter uma maioria relativa nesta Assembleia.
Tal facto, porém, não o impediu de, com plena legitimidade, assumir responsavelmente todas as competências constitucionalmente atribuídas, no sentido do cumprimento do Programa sufragado pelo povo português e viabilizado por este Parlamento.
Coeso na sua composição, solidário na actuação de todos os seus membros, determinado na prossecução dos seus objectivos, tem procurado ser um Governo de todos os portugueses e para todos os portugueses sem excepção. Nesse sentido, o clima de diálogo permanente com os parceiros sociais, desde as organizações patronais às sindicais e partidos políticos com e sem assento parlamentar. Quanto a estes últimos, dando cumprimento escrupuloso, como já foi reconhecido, ao estatuto da oposição, mau grado os que confundem diálogo e concertação com cedência nos princípios e capitulação nos objectivos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sem arrogância nem triunfalismo, tem dado passos decisivos para um futuro melhor, com um arrojo que choca, naturalmente, as mentalidades mais conservadoras do País, entrincheiradas com os seus dogmas em partidos que programaticamente se afirmam progressistas.
E se este Governo não tem avançado mais nas transformações estruturais necessárias para que nos aproximemos dos níveis de desenvolvimento e bem-estar dos nossos parceiros do espaço comum europeu, que agora partilhamos, é porque parte das oposições privilegiam interesses próprios partidários, de cariz conjuntural e eleitoralista, em detrimento do interesse nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De facto, a actuação de certos partidos, desde a tomada de posse do Governo, tem vindo a configurar uma oposição sistemática, inviabilizando até medidas que num passado bem recente preconizavam, numa tentativa permanente de impossibilitarem o Governo de cumprir o seu Programa, imiscuindo-se em áreas da sua competência exclusiva, forçando até ao cumprimento de medidas constantes de normativos inconstitucionais, como, aliás, reconheceu recentemente o Tribunal Constitucional quanto à Lei dos Salários em Atraso e independentemente das tentativas do PCP de deixar perante a opinião pública que essa questão seja colocada em termos diversos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Diversos de quê?!

O Orador: - E tudo isto sem sancionarem politicamente o Governo através dos dispositivos ao seu alcance, sem se materializarem como alternativa que dizem ser e sem passarem da sombra, cada vez mais negra, à saudável claridade do jogo democrático limpo.
Nem mesmo quando o Governo os convida a assumirem-se, como recentemente fez, ao submeter a esta Assembleia um voto de confiança.
Talvez que a conjuntura mundial venha a ser desfavorável, que haja seca, que caia um raio na Gomes Teixeira ou que venha a peste. A isto se resumem as esperanças da oposição: que piores dias possam surgir para o Governo. Mas o Governo prossegue, com a confiança gratificante que lhe advém do apoio popular, certo de estar no bom caminho.
Uma primeira linha das suas preocupações situa-se no domínio da justiça social, no sentido de melhorar as condições de vida dos portugueses mais desfavorecidos. Apesar de acusado de direita, é o Governo que até hoje mais justiça social tem praticado.

Vozes do PSD : - Muito bem!

O Orador: - Nesse sentido, apraz-nos registar o esforço, desenvolvido no campo da Segurança Social, de progressiva elevação dos níveis de pensões e subsídios, com especial destaque para a recente decisão da passagem de 510 000 trabalhadores agrícolas do regime especial, limitativo no plano financeiro e no domínio dos benefícios concedidos, para o regime geral, mais vantajoso, da Segurança Social, medida a entrar em vigor em 1 de Janeiro de 1987.
De facto, no regime especial agrícola, os seus benefícios - ainda que na sua definição sejam praticamente os mesmos que os estabelecidos para o regime dos demais trabalhadores -, os seus quantitativos, nomeadamente no que se refere às pensões e aos subsídios de doença e de desemprego, são sensivelmente mais baixos e aquém das necessidades correntes das pessoas abrangidas.
Considerou o Governo, por razões de justiça social e de equidade, ser altura de pôr fim a esta discriminação de protecção social.
No que diz respeito ao esquema de benefícios, se estes já eram qualitativamente quase idênticos, em elenco de prestações e em condições gerais de atribuição, aos demais trabalhadores, com a legislação agora aprovada pelo Governo são significativamente melhorados os seus quantitativos mínimos e reais.
De facto, são valorizados de forma expressiva, entre outros, o subsídio de doença, o subsídio de desemprego, as pensões de velhice e de invalidez, o subsídio por morte, as pensões de sobrevivência e o suplemento de pensão para grandes inválidos.
Por outro lado, os trabalhadores agrícolas passam a ter direito, já a partir de 1 de Dezembro, ao suplemento por cônjuge a seu cargo e ao subsídio por assistência a filhos doentes.

Página 209

12 DE NOVEMBRO DE 1986 209

A legislação aprovada determina um aumento de despesas com benefícios que se estima em cerca de 6 milhões de contos no primeiro ano da sua aplicação, isto é, em 1987.
À semelhança da generalidade dos países europeus, a protecção social dos trabalhadores agrícolas tenderá a manter um défice significativo, a ser compensado pela solidariedade dos outros sectores de actividade e pelas dotações do Orçamento do Estado.
Este esforço financeiro global, baseado na cooperação de todos os que participam no processo produtivo, representa também um empenhamento do Estado, dos parceiros sociais e da sociedade em geral na dinamização e na melhoria das condições do desenvolvimento económico e social do País, em particular da agricultura.
Também foi agora aprovada legislação que procede à actualização do valor mínimo das pensões de invalidez e velhice, aliás, objecto de um aumento extraordinário em Setembro passado. Assim, promovendo a melhoria efectiva do poder de compra dos beneficiários reformados, as pensões de invalidez e velhice são actualizadas à taxa de 13%, o que excede o nível de inflação de 9% previsto para 1987.
Na linha de favorecimento dos pensionistas de menor nível económico, as taxas de aumento das pensões mínimas foram superiores à taxa geral. Os novos valores destas pensões entram em vigor em 1 de Dezembro e abrangem o subsídio de Natal.
Com os aumentos agora aprovados, o encargo financeiro é, só para 1987, de cerca de 34 milhões de contos, o qual, adicionado ao acréscimo operado com a actualização extraordinária de Setembro, que se estima em 26 milhões de contos, implica, para o próximo ano, um encargo financeiro global de 60 milhões de contos.
Tudo isto é possível porque se têm impedido os desperdícios e utilizado criteriosamente os dinheiros do Estado, o que a oposição, sabendo ser verdade, se recusa, contudo, a reconhecer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E aqui cabe fazer uma referência (sem pretender antecipar a discussão oportuna do Orçamento do Estado) à actividade do Governo no plano da preparação da defesa militar, questão, ao que parece, na ordem do dia ao mais alto nível da representação do Estado.
As necessidades de modernização e reequipamento das Forças Armadas, até ao momento, só parcialmente têm estado a ser satisfeitas. Esta situação, porém, será deliberadamente ultrapassada, à medida que forem criadas condições para uma aplicação mais alargada de fundos públicos na área militar, utilizando-se de forma concertada os vários mecanismos previstos na lei.
A modernização deverá ser obtida pela qualidade, que tem de prevalecer sobre a quantidade, incrementando a valorização profissional, e o reequipamento deverá ser conseguido com o concurso concertado de recursos de duas origens: os nacionais e os do auxílio externo.
Numa nota que é devida cumpre realçar o rigor e parcimónia com que as Forças Armadas têm sabido gerir as verbas orçamentais, no que constituem um exemplo para muitos serviços da Administração Pública.
Ainda uma referência a insinuações críticas que, por vezes, ao sabor das conveniências, alternando com rasgados elogios, são feitas aos militares e às instituições que estes servem. Críticas essas que, além de geralmente injustas, são susceptíveis de criar ou alimentar um contencioso absurdo e infundado, muito negativo para o País.
Os militares estão sujeitos ao poder político e estão correctamente inseridos na comunidade. Se algumas vezes ocorreram desvios, eles foram protagonizados por militares que actuaram e se assumiram como políticos.
A instituição militar é um símbolo e o suporte último da independência nacional. É parte integrante e fundamental da nossa sociedade, que o Estado tem por dever apoiar e situar na posição devida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lembram-se das palavras mais utilizadas, há um ano atrás, no dia a dia da política portuguesa? Eram «crise» e «austeridade». Mas eram mais do que palavras; eram a expressão de um estado de espírito nacional, resignado e sem esperança de dias melhores.
E então foi a mudança. À crise sucedeu a estabilidade, à austeridade o progresso. E assim se reganhou a confiança dos Portugueses e se acordou a esperança de que pensavam já não serem capazes.
É este o caminho que o Governo quer continuar a trilhar. Alheio a crises que não quer, mas que, irresponsavelmente e com sofreguidão de poder, outros já decidiram desencadear. Artificialmente procurando uma solução que os subtraia ao veredicto popular, ensaiam contactos e promovem convenções, com os olhos ansiosos, gulosamente postos na mesa do Orçamento.
O Partido Social-Democrata e o Governo, que empenhadamente apoia, prosseguirão serenamente, certos de que só nas umas se encontra a legitimidade para governar o País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formularem pedidos de esclarecimento, pediram a palavra os Srs. Deputados Eduardo Pereira, José Lello e Carlos Brito.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, não pedi a palavra para solicitar um esclarecimento - estou esclarecido sobre a forma de intervenção do PSD nestas circunstâncias -, mas fundamentalmente para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Então, tem V. Ex.ª prioridade, pois, para além de ser o primeiro inscrito, os protestos são imediatos.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Deputado Cardoso Ferreira, pela nossa parte, não se trata apenas de desfazer o sofisma de base da sua intervenção. Não se pode avaliar da actuação de um partido no Governo comparando as possibilidades que um «tempo de vacas gordas» permite - possibilidades essas que foram criadas pelo sacrifício e o sentido nacional do dever de outros partidos, ou melhor, do meu partido que, uma vez mais (pelo menos pela terceira vez), pôs o País à frente dos seus interesses partidários a fim de resolver situações criadas pela incompetência e má governação de governos a que o seu partido, sem nós, pertenceu - com as possibilidades existentes num tempo de «vacas magras».

Página 210

210 I SÉRIE - NÚMERO 9

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a história e a situação internacional hão-de dar-nos razão, hão-de esclarecer essa situação, como vão esclarecendo os tremendos erros que, fora da área económica, o seu partido continua a cometer no Governo, quer em termos de defesa nacional, a que se referiu, e quero deixar aqui uma palavra de grande admiração pelo sentido patriótico da intervenção do Sr. Presidente da República, ontem, no Instituto de Defesa Nacional ...

Aplausos do PS.

... quer também ela falta de visão em política externa de que a responsabilidade ou irresponsabilidade - do Sr. Primeiro-Ministro tem vindo a dar provas nos últimos tempos.
Mas vamos ao protesto. Já estávamos habituados, nesta Câmara, à ideia de que o Governo era constituído por um conjunto de eminências, muitas das quais nunca se sentaram nesta Casa, mas que têm a dificuldade, ou a facilidade, de se porem diante desta Assembleia como se esta Câmara de representantes do povo fosse apenas um conjunto de cidadãos apostados em criar-lhes dificuldades. Porém, já não me parece tão consentâneo com a forma de actuarmos aqui, que o Sr. Deputado use as mesmas palavras que alguns dos seus ministros e que venha constantemente dizer que os outros partidos põem os interesses próprios e partidários à frente dos interesses nacionais.
Aqui, nesta Casa, desde a direita à esquerda, parlamentar, todos, de acordo com a sua forma de ver os problemas e de sentir o interesse nacional, o -«pomos à frente dos interesses partidários. E, desde 1985? se algum partido tem colocado os interesses partidários à frente dos interesses nacionais, esse partido é o PSD!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente; Srs. Deputados: Estamos já habituados, por parte do PS, ao argumento de que a actual conjuntura é favorável, de que o tempo é de «vacas gordas» e de que o PS tem a triste sina de, em situações extremamente difíceis, levantar o País do atoleiro para que outros depois o governem.

Vozes do P§: - E é verdade!

O Orador: - Bem, o Sr. Deputado Eduardo Pereira, ao insistir neste argumento, continua a passar ao povo e ao eleitorado português um enormíssimo atestado de estupidez.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que, de facto, o povo português não tem premiado o PS e, como o Sr. Deputado sabe, esse é o supremo julgamento da actuação política. É o eleitorado que o diz claramente nas umas ...

Aplausos do PSD. ... portanto, tal argumento não colhe, Sr. Deputado.

Diz o Sr. Deputado que, realmente, o eleitorado não lhe dará razão, mas a história sim. O Sr. Deputado ficará então com a satisfação que a história lhe dará e nós ficaremos com a gratidão, com o reconhecimento te com a consagração que o eleitorado nos dá!

Vozes do PSP: - Muito bem!

O Sr. António Macedo (PS): - 29%!

O Orador: - Fala também o Sr. Deputado nas provas de irresponsabilidade dadas pelo Primeiro-Ministro e pelo Governo. Mas a que se refere o Sr. Deputado concretamente? Refere-se ao facto de querermos, por exemplo, aliviar o Orçamento de alguns encargos insuportáveis de empresas públicas inviáveis? Refere-se, por exemplo, ao facto de querermos aliviar o sector público da comunicação social, alienando, eventualmente, algumas empresas?
Aliás, deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, que aqui tenho imensa dificuldade em compreender como é que o PS e o PCP acusam permanentemente o PSD e o Governo de instrumentalizar a comunicação social do Estado e, ao mesmo tempo, impedem o Governo de alienar esses mesmos órgãos de comunicação social. Há aqui uma contradição difícil de perceber, Sr. Deputado.
Quanto aos interesses nacionais, quanto a quem põe os interesses nacionais à frente dos interesses partidários, Sr. Deputado, devolvo-o à questão inicial: há um juiz e esse juiz é o povo, o qual, ao consagrar o PSD como maior partido português, entendeu, implicitamente, que os interesses que prosseguimos são os mais adequados à realização das suas aspirações, à resolução dos seus problemas e à solução das suas carências.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Deputado Cardoso Ferreira, compreendo o sentido da sua intervenção, pois hoje V. Ex.ª foi escalado como «deputado de dia» (ia dizer oficial de dia) para crucificar a oposição. Ao tentar fazê-lo, V. Ex.ª referiu que essa mesma oposição, ou melhor, certa oposição, privilegiou interesses sectoriais e partidários, sempre na denúncia dos malefícios do Governo.
Gostaria de lhes perguntar se será desajustado que esta oposição denuncie o nepotismo que o partido do Governo demonstra na utilização das verbas públicas para fazer mera propaganda desse mesmo Governo, se será desajustado denunciar a arrogância manifestada por esse Governo no tratamento com o órgão de soberania que é o Parlamento, designadamente quando se trata de um Governo minoritário - não se esqueçam que têm apenas 29 % e não uma maioria no «bolso do colete».
Pergunto ainda se será desajustado que o partido do qual V. Ex.ª faz parte e o Governo mantenham esta atitude de claro abandono dos interesses deste nosso país no que se refere à política externa.
Finalmente, pergunto se será desajustado que este Governo tenha um Ministério da Indústria que se transformou em mera comissão liquidatária do sector empresarial do Estado e que tenha um Ministério da Educação que se transformou num ministério de escolas fechadas e de universidades privadas.

Página 211

12 DE NOVEMBRO DE 1986 211

Sr. Deputado, finalmente ressalto e sublinho a sua reconversão, quando refere a adequada aplicação de fundos públicos na área da defesa nacional. V. Ex.ª, que ainda na semana passada interpelou o Sr. Deputado Jaime Gama confundindo saúde com a defesa nacional, confundindo manteiga com canhões, ainda não percebeu que o Ministério da Defesa Nacional não existe, não tem lei orgânica, não tem quadro orgânico, ocupa duas ou três assoalhadas no Estado-Maior-General das Forças Armadas e, atrevia-me mesmo a dizer, não tem sequer ministro. Este Ministério da Defesa Nacional não existe e é apenas uma das rubricas do Orçamento do Estado, mais nada!
Quanto à modernização que V. Ex.ª refere, dir-lhe-ei que a modernização apontada resulta apenas e só da ajuda externa, o que quererá dizer que, em termos de modernização das Forças Armadas, não estamos a defender os interesses nacionais.

Vozes do P§: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Cardoso Ferreira, ouvi com muita compreensão e paciência democrática a sua redacção sobre o melhor governo do mundo.

Risos do PSD.

No entanto, acho que o Sr. Deputado, manifestamente, exagerou. Senão vejamos: o Sr. Deputado ocultou - embora certamente o reconheça - que o nosso país vive actualmente numa conjuntura externa excepcionalíssima e favorável ao nosso país, nomeadamente à nossa economia. Sendo assim, como é que o Sr. Deputado explica que um tão maravilhoso Governo como esse que apregoou da tribuna não tenha sido capaz de tomar medidas que debelassem esse flagelo social que todos consideramos absurdo e que persiste, isto é, os salários em atraso? Como é que explica que este Governo não tenha sido capaz de reduzir o desemprego maciço que existe no nosso país, que é de mais de 500 000 trabalhadores?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como é que o Sr. Deputado explica que se tenha agravado a crise do nosso sistema produtivo em termos tais que - como o Sr. Deputado certamente reconhece - ramos inteiros da indústria se afundam e há um número cada vez maior de empresas que se encontram em dificuldades, que encerram e param tanto no distrito de Setúbal (que o Sr. Deputado bem conhece) como no distrito do Algarve, de Santarém e do Porto? Como é que explica que a situação social não melhore e que a situação económica se tenha agravado em muitos aspectos?
Numa situação excepcionalmente favorável, a pergunta é esta: o que é que este Governo faz aos dinheiros públicos?! Não será precisamente este Governo que sobrepõe o interesse partidário ao interesse nacional? Não será este um Governo que não é capaz de dar solução aos problemas, tendo esta situação tão favorável?
Outra questão que gostaria de lhe colocar diz respeito ao Acórdão do Tribunal Constitucional sobre a Lei n.º 17/86 - combate aos salários em atraso. O Sr. Deputado afirmou que o PCP procura inculcar uma interpretação diversa. O que é que o Sr. Deputado quer dizer com isso? Será que o Sr. Deputado quer dizer que a Lei n.º 17/86 não está plenamente em vigor e que o Governo não é obrigado a cumpri-la em 1987? Isso significa que não somos obrigados a prover o Orçamento do Estado com as dotações necessárias para que esta lei possa ser plenamente aplicada em 1987?
Sr. Deputado, responda a esta questão, pois será edificante para o País, para o seu Governo e para o Ministro do Trabalho, responsável pela tutela deste sector.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Creio que não seria necessário mais do que este exemplo dos salários em atraso para responder por inteiro ao seu panegírico do Governo. Este Governo não serve, pois nem sequer foi capaz de resolver o problema dos salários em atraso, apesar de a Assembleia da República ter colocado nas suas mãos os meios legislativos necessários para o fazer.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - O Sr. Deputado José Lello falou na arrogância que o Governo tem no tratamento com o órgão de soberania, que é a Assembleia da República. Sr. Deputado gostaria de lhe dizer que isso é, formalmente, um atestado de incapacidade à oposição desta Câmara ou de demissão das suas possibilidades.

Voz do PS: - Ah! ...

O Orador: - É que de facto este Governo é minoritário, e se o é, está na mão da oposição, que tem todos os mecanismos constitucionais e regimentais para o derrubar, criar uma alternativa. A oposição deve perfilar-se e apresentar-se como tal ao povo português, que é o grande juiz em democracia.
O que é facto é que, apesar de o Governo ter convidado VV. Ex.ªs a assumirem-se como oposição neste Parlamento, propondo um voto de confiança, o resultado é conhecido, isto é, o Governo saiu daqui com a sua confiança reforçada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Diz também o Sr. Deputado que o Governo trata os interesses portugueses, no que toca à política externa, com negligência. Esquecer-se-á, porventura, V. Ex.ª de que muitas das vicissitudes que hoje estamos a sofrer, no que toca ao processo de participação na Comunidade Económica Europeia, decorrem da pressa, do afogadilho, com que na altura o então secretário-geral do seu partido e Primeiro-Ministro quis concluir as negociações, com objectivos que me dispenso de qualificar?!
V. Ex.ª disse ainda que há dias eu tinha contraposto a questão de defesa nacional à questão da segurança social e à da saúde, quando interpelei aqui o Sr. Depu-

Página 212

212 I SÉRIE - NUMERO 9

tado Jaime Gama. Sr. Deputado, em meu entender, isso é a mistificação do pensamento que exprimi. O que eu quis dizer e o Sr. Deputado sabe-o bem foi que, sendo os recursos escassos, há que começar por sectores prioritários da vida portuguesa, há que dar condições aos mais desfavorecidos, há que incentivar todo o processo produtivo, isto é, há que criar condições para que progressivamente a defesa nacional, na sua componente militar, venha a ter as verbas necessárias para ser aquilo que na realidade é, ou seja, a instituição de defesa última da independência nacional.

O Sr. José Lello (PS): - Era isso que eu queria ouvir!

O Orador: - O Sr. Deputado diz que não existe um Ministério da Defesa Nacional, que não existe Ministro, que não tem política ...

O Sr. José Lello (PS): - Só houve um ministro!

O Orador: - Sr. Deputado, diga-me se houve alguma alteração, nomeadamente nos seus instrumentos fundamentais, como o conceito de estratégia da defesa nacional e as grandes opções do Concelho Estratégico de Defesa Nacional, entre a política de defesa deste Governo e a do anterior? No actual Governo, houve alguma alteração, nomeadamente na vertente militar, da política externa portuguesa?
O Sr. Deputado sabe tão bem como eu que não houve alteração nenhuma ou, então, quererá V. Ex.ª admitir, eventualmente, que no anterior Governo, liderado pelo seu partido, também não havia política de defesa e que a componente externa militar das relações com o exterior também era negligenciada?! ...
O Sr. Deputado Carlos Brito perguntou-me como é que, com uma conjuntura excepcional, há ramos inteiros de sectores que se afundam. O Sr. Deputado saberá melhor do que eu a resposta a esta questão, pois na origem de todas essas dificuldades, das sequelas que ainda hoje vivemos e que nos obrigam a um esforço enorme de recuperação do tecido empresarial português, estão as actuações insensatas ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não diga isso, não me faça rir, Sr. Deputado!

O Orador: - ... e irresponsáveis do Partido Comunista Português, que instrumentalizando os trabalhadores os levou a situação em que hoje se encontram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos salários em atraso, respondo-lhe muito simplesmente. O que W. Ex.ªs sempre omitiram hoje e continuam a omitir é que o Acórdão do Tribunal Constitucional declara inconstitucional a norma referente aos salários em atraso e isso, quer o Sr. Deputado queira quer não, leva claramente à possibilidade de fazer um juízo político no sentido de que o Governo que é permanentemente acusado de irregularidades e de inconstitucionalidades é, ele próprio, forçado a aplicar normas inconstitucionais, que lhe são impostas através da oposição nesta Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É o contrário!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Por que é que sobravam esses milhões de contos?! ...

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A anunciada visita do primeiro responsável pelo regime do apartheid Sr. Pieter Botha a território português não pode deixar de ser considerada como mais um escândalo político provocado pelo PSD.
No momento em que a comunidade internacional vem adoptando medidas contra o regime racista de Pretória, no momento em que este regime se encontra cada vez mais isolado internacionalmente, a visita do Sr. Botha à Região Autónoma da Madeira surge como um balão de soro para tentar reanimar esse corpo em estertor, que é o regime do apartheid. Este facto constituiu, só por si, mais um exemplo significativo da política do PSD, seja no Governo da República, seja no plano das regiões autónomas, com esta particularidade: o alinhamento pelas posições assumidas pelos sectores mais retrógrados do imperialismo é agora conduzido pelo presidente de um governo regional, que assim usurpa funções de condução da política externa, o que implica a subversão e perversão dos poderes autonómicos com a conivência do Governo, que abdica da soberania e, segundo leva a crer, concede o visto ao Sr. Botha.
Este escândalo vai consumar-se? O Governo vai mesmo conceder visto que viabilize o inacreditável e ilegítimo convite do Sr. João Jardim? Aguardamos resposta!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tanto mais que este escândalo não pode ser dissociado de outras atitudes de igual jaez que vêm sendo assumidas pelo PSD. A prová-lo aí estão, entre outros, factos como a recente atitude indecorosa do PSD na Assembleia Regional da Madeira aquando da morte do Presidente Samora Machel e a destacada e activa participação do Governo Português através de Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros - em todas as operações destinadas a impedir a aplicação de sanções económicas contra o regime racista de Pretória.
Mas estas atitudes do PSD e dos seus responsáveis governamentais não estão também desligadas da política de braços caídos, de inactividade, de permissão da organização e actuação em Portugal dos bandos terroristas -eles mesmos tentáculos do regime do apartheid que combatem os Governos legítimos de Angola e Moçambique. Cabe perguntar, Srs. Deputados, que medidas pensa o Governo tomar, o que já fez -se faz alguma coisa para defender a vida e os direitos dos portugueses que estes mesmos bandos terroristas raptam em Moçambique e em Angola. Mas não basta perguntar, temos de agir no sentido de, face à falta de vontade política do Governo Português, ser a Assembleia da República a tomar as medidas necessárias para que se ponha cobro a esta situação escandalosa. Escândalo que vai ao ponto de serem impunemente difundidas em Portugal com base em

Página 213

12 DE NOVEMBRO DE 1986 213

comunicados emitidos em Portugal por pessoas bem conhecidas- notícias relativas a actos terroristas praticados em Angola e Moçambique, visando cidadãos portugueses. O noticiário desta manhã na RDP Antena 1 foi bem exemplificativo. Mais do que uma estacão pública de radiodifusão quase diríamos estar perante uma estação emissora da RENAMO que anunciava o rapto e cativeiro de 34 cidadãos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todo este comportamento do PSD é demonstrativo da hipocrisia política do governo Cavaco Silva quando propagandeia de modo insistente a sua vontade de melhorar as suas relações com a República Popular de Angola e com a República Popular de Moçambique. Esta política não serve Portugal e contraria as aspirações sinceras do povo português -bem expressas na Constituição da República- de manter «laços especiais de amizade e cooperação com os países de língua portuguesa».
É, também, razão acrescida para demonstrar a necessidade de pôr fim a esta política e acabar com os dias deste Governo, substituindo-o por um governo democrático capaz de realizar uma política que prestigie Portugal e defenda os verdadeiros interesses nacionais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Jardim Ramos.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: acabámos de ouvir uma intervenção que ofende o povo madeirense. Com efeito, orgulha-se o povo madeirense da hospitalidade com que recebe seja quem for.
É insuspeita a posição dos madeirenses e do PSD na condenação do apartheid. Não pode restar qualquer dúvida quanto a isso nem esta Câmara, nem em Portugal, nem em qualquer outro ponto do mundo. Portugal mantém inequivocamente uma posição anti-apartheid.
Tem sido demonstrado por diversas vezes que os madeirenses sabem receber quem quer que seja. Tivemos a honra de receber, em visita oficial, os Srs. Embaixadores da União Soviética, dos Estados Unidos da América e da França. A todos, julgo, soubemos receber bem. Nunca fomos censurados nesse aspecto, apesar das diferenças ideológicas e políticas que norteiam o país que cada diplomata representa.
Também vamos ter a honra de receber, embora a título particular, a visita do Sr. Presidente da África do Sul, país onde residem milhares de portugueses e com quem Portugal mantém relações diplomáticas. Portanto, vamos recebê-lo de acordo com a natureza da visita.
Os madeirenses não precisam de receber lições de ninguém sobre como e quando receber seja quem for, seja humilde ou seja nobre, seja monarca ou seja plebeu, e muito menos, Sr. Deputado, de um grupo parlamentar que teve o descaramento de abandonar este hemiciclo aquando de uma sessão de boas-vindas de um presidente de um país amigo de Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, para contraprotestar.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Jardim Ramos, se as notícias vindas a público sobre a anunciada visita do Sr. Pieter Botha, chefe principal do regime do apartheid, à Região Autónoma da Madeira já eram graves, V. Ex.ª agravou ainda mais o conteúdo dessa mesma deslocação.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não me diga!...

O Orador: - E fê-lo ao tentar instrumentalizar o povo madeirense para uma acção que nada tem a ver com ele. O povo madeirense não está com as acções que visam ajudar, promover aqueles que são os principais inimigos dos direitos do homem, como é o caso do regime do apartheid, de Pretória.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - E o Afeganistão?!

O Orador: - O Sr. Deputado Jardim Ramos sabe que o PSD/Madeira e o PSD em geral não têm um tratamento, em termos institucionais, protocolares, de que se possam gabar. O escândalo que se passou aquando da morte do Presidente Samora Machel na Assembleia Regional da Madeira deve levá-lo a pensar sobre o que são as atitudes, em termos institucionais, do PSD na Região Autónoma da Madeira.
Mas mais, Sr. Deputado: ao receber o Sr. Pieter Botha, o Sr. Deputado está também a ser cúmplice das actividades contra os cidadãos portugueses que os bandos terroristas, como a RENAMO e a UNITA, praticam em Angola e Moçambique. Isto porque o Sr. Deputado sabe tão bem como todos nós nesta Casa que esses bandos só sobrevivem devido ao apoio que lhes é concedido pelo regime da África do Sul! E sabe mesmo mais, sabe que esses bandos só foram constituídos para salvaguardar os interesses da África do Sul!
Portanto, o Presidente do Governo Regional da Madeira, ao receber o Sr. Pieter Botha, está a assumir a grave responsabilidade de se tornar cúmplice de toda uma actividade contra os direitos humanos e é essencial que isto seja dito- contra os cidadãos portugueses em África.
Mas nós deixámos uma interrogação na nossa intervenção: será que o Governo Português, nestas condições, vai conceder visto ao Sr. Pieter Botha para vir a Portugal?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Junqueiro.

O Sr. Raúl Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: no dia 15 de Abril do ano corrente tive ocasião de alertar a Assembleia da República para a grave situação que se estava a viver na Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos.
Disse então que esta Companhia estava confrontada com problemas preocupantes que, a não serem resolvidos, poderiam lançar no desemprego os mais de 600 trabalhadores que nela labutam e ainda pôr em causa os interesses nacionais.
Mais salientei na altura, que, mercê de uma gestão deficiente e da evolução negativa da conjuntura internacional, a Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos acumulava prejuízos significativos e dívidas incom-

Página 214

214 I SÉRIE - NÚMERO 9

portáveis, situação que levava os credores, com destaque para a banca e para a EDP, a ameaçar com medidas drásticas.
Denunciei na mesma ocasião a passividade da entidade patronal, que não mostrava capacidade para tomar qualquer medida de fundo no sentido da reestruturação e da viabilização da empresa, e também o desinteresse do Governo, completamente indiferente à sorte de 600 trabalhadores e dos interesses do País.
É bom não esquecer que a Companhia em questão, para além de garantir anualmente a entrada em Portugal de mais de 4 milhões de contos, resultantes da exportação, possui linhas de produção de alto valor estratégico como, por exemplo, o silício-metal e o ferro-silício.
Apesar de estas advertências e dos contactos que em sequência foram estabelecidos com o Ministério da Indústria e Energia nada foi feito, quer pelo Governo, quer pela entidade patronal, no sentido de modificar e inverter a situação de previsível colapso.
E na última semana, perante a angústia dos trabalhadores e a impotência dos municípios do distrito de Viseu, onde a Companhia de Fornos Eléctricos se radica, a EDP decidiu cortar (e cortou) o fornecimento de energia, levando à paragem total daquela unidade industrial.
De resto e independentemente da cessação do fornecimento de energia, a própria empresa estava na iminência de parar a laboração por falta de matérias-primas essenciais.
Este facto está a gerar um ambiente de grande gravidade social na região da Beira Alta e, em particular, nos concelhos de Nelas e de Carregal do Sal, onde recentemente os trabalhadores, numa manifestação de protesto, cortaram a estrada nacional durante algumas horas.
Mas o mais preocupante tem sido e continua a ser a incompetência da entidade patronal que nem sequer se mostra empenhada na aplicação do Decreto-Lei n.º 177/86, uma das vias de tentar solucionar o problema, e a inacreditável posição de abstenção do Ministério da Indústria e Energia.
Pretendendo tirar a água do capote e lavar as mãos como Pilatos, o Secretário de Estado da Energia, em audiência concedida a um grupo de autarcas da região, na passada quinta-feira, afirmou nada ter a ver com o assunto, o qual apenas diria respeito, em sua opinião, à empresa devedora e às empresas credoras.
Estranho comportamento este que ignora as responsabilidades do Governo no assunto, tanto mais que, para além das empresas credoras serem empresas públicas ou nacionalizadas, a EDP cumpre as instruções do Sr. Primeiro-Ministro, no sentido de cortar a energia a quem não pagar, independentemente dos condicionalismos específicos de cada caso.
Estranho comportamento este que pressupõe a demissão do Ministério da Indústria da responsabilidade de aplicar uma política de salvaguarda dos interesses nacionais, nomeadamente através da garantia da laboração de produtos estratégicos.
Estranho comportamento este que leva o Governo a desinteressar-se da sorte dos Portugueses, em especial daqueles que são atingidos por situações da maior gravidade, como, no caso presente, os 600 trabalhadores da Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos ameaçados de desemprego.
Como referi no requerimento dirigido ao Sr. Ministro da Indústria e Energia, entregue na sessão da Assembleia da República do dia 6 de Novembro passado, é urgente encontrar caminhos de viabilização para a Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos.
É urgente obter o rápido andamento do procedimento judicial instaurado ao abrigo do Decreto-Lei n.º 177/86.
É urgente motivar os credores e, em particular, a banca e a EDP para assumirem as responsabilidades que lhes competem e competirão no assunto.
É urgente que o Sr. Ministro da Indústria e Energia e o Governo adoptem as medidas necessárias à reposição da normalidade de funcionamento e à garantia dos postos de trabalho na Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.

A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As declarações políticas dos Grupos Parlamentares do Partido Comunista Português e do Partido Social-Democrata suscitam da parte do Grupo Parlamentar do PRD um breve comentário.
Lamentamos não ter ainda conhecimento do conteúdo do Acórdão do Tribunal Constitucional sobre a Lei n. º 17/86, referente aos salários em atraso, apesar dos infrutíferos esforços junto daquele tribunal para o obter.
Contactado o Tribunal Constitucional, foi-nos dito que só através da sua publicação no Diário da República poderíamos dele tomar conhecimento.
Contudo, fazendo fé nas informações veiculadas e tornadas públicas num semanário, constatamos que o Tribunal Constitucional mais não fez do que reforçar aquilo que vínhamos dizendo desde a aprovação do diploma. Isto é: para executar a lei em 1986 teria que haver vontade política por parte do Governo. Difícil se tornava dizer se as verbas inscritas no Orçamento do Estado de 1986 eram ou não suficientes para aplicar o diploma. Todavia, a haver vontade política, poderia o Governo, caso não fossem suficientes as verbas, reforçá-las no orçamento suplementar apresentado à Assembleia da República. Como não o fez, criou em nós a convicção de que, efectivamente, as verbas inscritas permitiriam a aplicação da lei.
Porém, assim não aconteceu e estranhamos que o Governo tenha recorrido a argumentos formais, suscitando a inconstitucionalidade e invocando a lei-travão numa matéria que a todos preocupa e a todos envergonha. Para mais, o Sr. Ministro do Trabalho, em reunião da Comissão Parlamentar de Trabalho decorrida na semana passada, referiu exactamente que da verba inscrita no Orçamento do Estado para 1986 para subsídio de desemprego, salários em atraso, lay-off, etc., de 30,5 milhões de contos, tinham sobrado entre 8 a 10 milhões de contos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Que vergonha!

A Oradora: - Ora, obviamente que essa verba poderia ter sido aplicada no pagamento de subsídio de desemprego a trabalhadores sem salário, caso tivesse havido vontade política por parte do Governo para o fazer.

Página 215

12 DE NOVEMBRO DE 1986 215

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Muito bem!

A Oradora: - Vem, pois, o Governo dar razão às inúmeras queixas que o Grupo Parlamentar do PRD tem recebido por parte dos trabalhadores que, dirigindo-se aos serviços competentes para receber o subsídio de desemprego nos termos da lei da Assembleia da República, são informados pelos funcionários de que só têm instruções para aplicar o decreto-lei do Governo sobre a mesma matéria.
Estranhamos sobremaneira que o Governo, que se tem apregoado de tão preocupado com a situação dos trabalhadores que não recebem atempadamente o seu salário, se aproveite desta situação, desrespeitando as legítimas expectativas dos trabalhadores, para desencadear mais uma campanha contra o Parlamento.
É caso para perguntar se o Governo sabe quem é quem em regime democrático, perante quem responde, perante quem é responsável.
O Sr. Ministro do Trabalho foi ao ponto de, na reunião de quinta-feira da semana da passada com a Comissão Parlamentar de Juventude, em que se discutiu o Orçamento do Estado para 1987, nos dar - visivelmente agradado - a informação de que o Tribunal Constitucional teria declarado inconstitucional a lei sobre salários em atraso e que ele, Ministro, não sabia o que havia de fazer às verbas inscritas no Orçamento do Estado para 1987 com vista à execução daquela lei, já que ela, segundo o Sr. Ministro do Trabalho, seria inexistente.
Contudo, a fazer fé - mais uma vez o digo, uma vez que não conhecemos o Acórdão - nas informações veiculadas pelo semanário Expresso, é caso para dizer ao Sr. Ministro do Trabalho que se tranquilize, pois a lei é válida e obrigatória para 1987. Portanto, execute-a!

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, em tempo oportuno, um requerimento, subscrito por deputados do PRD, pedindo, nos termos do artigo 74.º do Regimento, a prorrogação do período de antes da ordem do dia, o qual vamos de imediato votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, concedo a palavra ao Sr. Deputado Pereira Coelho, informando-o de que dispõe de quatro minutos.

Entretanto, peço ao Sr. Vice-Presidente Carlos Lage o favor de me vir substituir na presidência da Mesa.

O Sr. Pereira Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São conhecidos os grandes problemas que afectam o nosso país. Mas, se os problemas existem e os procuramos resolver com os recursos escassos que todos conhecemos, também estamos certos de que, se conseguirmos racionalizar certos gastos, muitos recursos ficariam disponíveis para o desenvolvimento que desejamos.
Neste contexto, tomo a palavra nesta Câmara para denunciar uma situação que se me afigura como gritante, exemplo de desperdício num sector onde todos sabemos existirem grandes carências; trata-se da situação do Hospital de Rovisco Pais, na Tocha.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Hospital de Rovisco Pais é uma unidade criada pelo Decreto-Lei n.º 29 122, de 15 de Novembro de 1938, e foi inaugurado a 7 de Setembro de 1947. Para a concretização desta obra cumpre salientar a actuação do Prof. Bissaia Barreto, preocupado com a falta de instalações hospitalares dedicadas à doença de Hansen, que desde tempos imemoriais flagelou a humanidade. Felizmente, hoje a situação é completamente diferente, nomeadamente no nosso espaço territorial.
Assim, a maior parte das enormes instalações do Hospital de Rovisco Pais estão completamente abandonadas e sujeitas à constante degradação motivada pelo tempo.
Fácil se torna verificar que, se não há ocupação, também o quadro de pessoal, cerca de 100 pessoas, se encontra desaproveitado, provocando só por si gastos inúteis para o Estado. Mas, para se ter uma noção mais exacta da grandeza das instalações, diga-se que este hospital foi implantado na Tocha numa área de cerca de 1200 ha, compreendendo imóveis que o apetrecham da melhor maneira, desde blocos residenciais até uma igreja.
Dado o abandono a que progressivamente foi votado, foram entretanto cedidas algumas instalações ao Ministério da Educação, funcionando assim o ensino preparatório e unificado, e ao Laboratório Nacional de Investigação Veterinária.
No entanto, um boa parte das instalações continua desaproveitada e urge dar uma solução, a qual é já ansiosamente esperada há dez anos pelos autarcas e populações do concelho.
Vários têm sido os estudos feitos para aproveitamento das instalações, mas não há qualquer decisão sobre as soluções alternativas avançadas.

De entre estas saliente-se:

Reorganização do bloco hospitalar, colocando-o ao serviço das populações;
Cedência de instalações ao Ministério da Educação para melhor instalação do estabelecimento de ensino que já funciona;
Cedência de um núcleo familiar ao FAOJ para instalação de uma pousada de juventude;
Aproveitamento de dois núcleos familiares para pousada de férias para os profissionais de saúde;
Cedência das instalações de Espariz (em Tábua) para centro de recuperação de jovens toxicómanos.
Mas outras hipóteses existem, talvez de melhor aproveitamento para a comunidade, dirão alguns. Entendemos que sim, mas o que o País, as populações da zona e os autarcas do concelho exigem é uma resposta rápida à situação de desperdício ultrajante com que estamos confrontados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos conhecemos a escassez de recursos do País e, como tal, mais gritante se tornam as situações de desperdício e desaproveitamento.
O Hospital de Rovisco Pais cumpriu a sua missão; hoje, é imperioso que as suas modelares instalações cumpram outros objectivos também importantes numa sociedade carenciada como a nossa.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.

Página 216

216 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se sabe se foi qualquer súbito alarme causado pela recente vitória da APU nas eleições para as novas freguesias do concelho de Almada que levou pressurosamente o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território a anunciar com pompa a próxima chegada de um plano de desenvolvimento para a península de Setúbal.
Há muito que os residentes no distrito ouvem repetidamente falar que o Poder Central tem soluções para a crise que ali grassa, como em todo o País. Primeiro vieram com um plano de emergência, para acorrer à forma e à miséria, disseram.
Mas de tudo o que é tornado público quanto a essa «sopa dos pobres», resulta que nada resolveu, e que apenas serviu para colocar algumas (poucas) pessoas numa situação de emprego precário.
Sabe-se que no apoio a carências alimentares coube a cada pessoa das famílias abrangidas, em média, apenas 622 escudos por mês.
Sabe-se que entre 1 de Junho de 1984 e 31 de Dezembro de 1985 as verbas do plano de emergência terão servido para apoiar sessenta e duas iniciativas locais de emprego, das quais os gestores dos dinheiros da «sopa» destacam publicamente como relevantes a compra de um carrinho de gelados e mesmo de um burro.
Depois de gerirem os dinheiros do Estado no estilo de qualquer «saco azul» e perante o agravamento da crise, vieram-nos com o anúncio de um Programa de Desenvolvimento da Península de Setúbal, de sua sigla PROSET, a que o Governo entendeu dar a dignidade (ou a indignidade?) de resolução do Conselho de Ministros, publicada no Diário da República, em 30 de Junho do corrente ano.
Mas se motivos já havia para descrer de tantas anunciadas medidas, razões acrescidas lançaram a descrença sobre o PROSET, porque, além do mais, se apresenta como um plano a ser negociado com a CEE (a tal que prometia mundo e fundos do FEDER), pela Direcção-Geral do Desenvolvimento Regional e pela CCR de Lisboa e Vale do Tejo. Esse PROSET anunciava-se desde logo como um plano de desenvolvimento regional dirigido do estrangeiro, subordinado aos interesses das comunidades estrangeiras, estabelecido à margem das autarquias.
Agora o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, numa fase mais adiantada da operação de propaganda, vem afirmar que a situação do distrito de Setúbal estará totalmente modificada daqui a 18 meses e que o desenvolvimento integrado da península de Setúbal irá garantir 45 000 novos postos de trabalho.
Sabendo-se, como se sabe, que a prioridade para o centro de formação profissional, já há muito anunciado para Setúbal, é a formação de cabeleireiros, esteticistas, massagistas, como responsáveis pelo centro já referiram, ficamos a pensar que para este Governo desenvolvimento significa alindamento da fachada segundo o último grito, ou talvez melhor, o dernier cri da Europa.
Por detrás desse alindamento fica a imagem de um distrito alvo de uma operação concertada de destruição do tecido industrial, destruição em que participou como protagonista o principal agente económico da região, o Estado, dando o péssimo exemplo de desrespeito pela legislação laboral no fomento da precarização de emprego, contribuindo com a sua acção destruidora, que se fez sentir sobretudo na indústria transformadora, para o agravamento da crise no distrito e no País.
O Primeiro-Ministro quer culpar o sector público de todos os males do distrito de Setúbal - e lembro o que disse hoje o Sr. Deputado Cardoso Ferreira -, quando afinal é o Governo e a política que lhe está e esteve subjacente que devem responder pelos crimes cometidos contra a economia nacional e os direitos dos trabalhadores.
Aliás, a recente conferência sobre a situação económica e social do concelho de Setúbal, organizada pela respectiva assembleia municipal e a que os eleitos da APU, em maioria relativa e com a presidência da assembleia, deram o apoio empenhado, veio demonstrar que as unidades do sector público empresarial do Estado nele instalado são viáveis, que muitas empresas privadas são viáveis e que a situação em que todas elas se encontram se deve não à agitação social mas a omissões e a acções do Governo contra o tecido industrial existente no distrito, omissões e acções essas que se abatem de uma maneira brutal sobre as classes trabalhadoras.
Ao mesmo tempo que se desenvolveu esta estratégia programada e concertada, que neste ano atingiu ainda um escalão mais elevado (o número de desempregados tem aumentado este ano ao ritmo de 700 por mês), as populações adquirem cada vez mais a consciência de que as autarquias APU têm desenvolvido uma acção no sentido inverso, como, de resto, provou a mencionada conferência da Assembleia Municipal de Setúbal. Uma acção dirigida no sentido de resolver as carências das populações, nomeadamente quanto ao saneamento básico. Mas também em áreas da competência do poder central, nomeadamente quanto à habitação social.
Fruto deste saber de experiência feito são os resultados obtidos pela APU nas eleições para as novas freguesias de Almada.
A APU ganhou em todas as freguesias (e são oito), garantindo a maioria absoluta em cinco delas.
Ao mesmo tempo, pagando o preço da sua coligação com a direita a nível autárquico, o PS desce a sua percentagem de votação, sendo o PSD o beneficiário dessa descida. Mas parece que isto não lhes serviu de lição, pois no Montijo tornaram a formar a coligação com o PSD.
Os resultados eleitorais demonstraram a grande confiança no trabalho, competência, honestidade e experiência dos eleitos APU, na sua capacidade de diálogo, na sua determinação em resolver os problemas das populações.
Mas os resultados eleitorais demonstram também que, apesar da manipulação dos meios de comunicação social por este Governo, a população trabalhadora tem a consciência de que com o Governo Cavaco Silva se agravam ainda mais as suas condições de vida.
Talvez por isso o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território se apressou a anunciar o projecto para o desenvolvimento da península, que começa mal com um programa de financiamento pedido à CEE que prevê uma despesa de 20 mil contos.
Mas talvez não só por esta razão. É que, estando a regionalização em marcha e sendo obrigatória, nos termos constitucionais, a participação das autarquias

Página 217

12 DE NOVEMBRO DE 1986 217

regionais na elaboração do plano regional, o Governo pretende ficar livre de peias nas negociações do plano para a península com a CEE.
Daí também a sua urgência, daí também a sua corrida. Corrida que apesar de tudo falhará a meta, pela manifesta oposição que o Governo encontra no distrito aos seus planos e projectos.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.

O Sr. Mendes Costa (PSD): - Sr.ª Deputada Odete Santos, já que falou do Plano Integrado de Desenvolvimento Regional apresentado pelo Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, no passado dia 4, em Setúbal, plano esse que, na sua apresentação, mereceu da parte das autarquias e dos sindicatos presentes o maior aplauso e o maior sentido de colaboração, pergunto se a Sr.ª Deputada está ou não de acordo com aquilo que foi dito pelo Sr. Ministro em prol do desenvolvimento do distrito de Setúbal, nomeadamente da sua recuperação económica e da diminuição do desemprego que actualmente aí se verifica.
Gostaria que a Sr.ª Deputada dissesse concretamente se está ou não de acordo com essas iniciativas do Governo para o nosso distrito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos, que dispõe de um minuto para esse efeito.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Mendes Costa, responder-lhe-ei muito telegraficamente, porque apenas disponho de um minuto.
Sr. Deputado, não estive presente nessa conferência de imprensa, mas estive na conferência e posso desmentir o Sr. Deputado quando diz que as autarquias e os sindicatos aplaudiram dessa maneira o PROSET, porque a reacção das autarquias e das organizações sindicais foi precisamente a contrária, ou seja, criticaram veemente a forma como este PROSET estava a ser orientado.
Em segundo lugar, estou de acordo com a diminuição do desemprego. Só que o PROSET e os planos do Governo para o distrito de Setúbal não são no sentido da diminuição do desemprego, mas, bem pelo contrário, se possível, do aumento do desemprego, nomeadamente com esta denúncia da Convenção n.º l, que também vai reflectir-se no distrito de Setúbal.
Como disse, os planos do Governo vão no sentido do aumento do desemprego, porque o que o Governo não admite é que empresas como a SETENAVE são viáveis, tal como ficou bem patente na intervenção do presidente do conselho de administração da SETENAVE na conferência que se realizou em Setúbal: o Governo não admite que o sector empresarial do Estado é viável e que algumas empresas privadas destruídas também o são. O que sucede é que não foram tomadas medidas para as viabilizar...

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Azevedo.

O Sr. Correia de Azevedo (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esposende é, em área geográfica, um pequeno concelho. Não lhe faltam, todavia, razões ou dignidade para que esta Magna Assembleia dele se ocupe.
É o único litorâneo do distrito de Braga. Possui uma pequena fracção da nossa, relativamente longa e variada, interface terra-mar.
No caso, com uma frágil estrutura durar que está e tem estado sujeita a dois movimentos de longa duração, que se agravam com o crescimento demográfico: um, de natureza antropológica e social, com a utilização e a ocupação articuladas das dunas para recreio, pesca, guarda de alfaias, recolha e seca de algas; outro, de regressão da costa e de natureza geológica, que se radica na dinâmica das placas tectónicas, segundo alguns especialistas.
Mas o clima de Verão, a suavidade das dunas e praias e outras naturais belezas, próprias e adjacentes, potenciam os factores, mais ou menos artificiais, de um terceiro movimento, este mais conjuntural.
Manifesta-se por uma mal disfarçada cobiça sobre aqueles espaços; luta pela implantação de equipamentos turísticos e da habitação, para uma ocupação, comummente sazonal; tem a mira no lucro e nas altas rendas a curto prazo.
A cobiça parece ter aguçado a argúcia e reduzido os escrúpulos aos seus principais protagonistas.
Apropriar-se, privatizar, construir e especular é caminho inevitável para os seus principais objectivos. Gerar cumplicidades institucionais, implementar mecanismos corruptores e traficar influências é uma forma de garantir uma certa impunidade.
Alegam-se, para justificar, «direitos históricos». Pretende-se sobrepô-los ao interesse nacional e aos direitos das populações que desde há séculos dão uso colectivo e permanente a esses espaços.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, denúncias sobre idênticos problemas têm ecoado nesta Câmara. Na sua origem encontram-se formas de oposição mais ou menos pacíficas, veiculadas pelos órgãos de informação.
Têm alguns vectores em comum. No caso vertente, ver-se-ia submergir a necessidade imperiosa de garantir a preservação e o equilíbrio daquele frágil ecossistema. Esquecer-se-ia a manutenção necessária da veiga fértil que se contém entre as dunas e o sopé dos montes, entrecortada por escassos caminhos, algumas estradas e povoações. Perverter-se-ia o objectivo nacional de não aumentar a nossa dependência alimentar com o exterior. Atentar-se-ia contra os preceitos constitucionais da defesa do meio ambiente e da qualidade de vida.
O repto de sempre é procurar a linha divisória entre a satisfação de interesses, mais ou menos imediatos, de alguns, poucos, e o interesse nacional, constitucionalmente perspectivado para um futuro colectivo mais justo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que há de significativo até agora em relação a este caso é o comportamento concordante dos diversos poderes públicos, com uma inequívoca maioria populacional. Parece um exemplar contraponto àquilo a que nos temos vindo a habituar.
Releva-se pela capacidade com que a Assembleia Municipal de Esposende, no último dia 30 de Setembro, interpretou um desejo da população, como assumiu a defesa de valores naturais inestimáveis, como propôs

Página 218

218 I SÉRIE - NÚMERO 9

a «criação da reserva natural - litoral entre os rios Neiva e Cávado», pela prossecução para sul dessa área, até ao limite do concelho de Esposende com o da Póvoa de Varzim.

Sublinha-se a dinâmica e o apoio da actual presidente da câmara e do executivo camarário.

Faz-se eco dos despachos favoráveis do Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, «dado o valor da reserva em causa, a qual se insere na prioridade nacional de protecção e valorização do litoral» - acabei de citar.
Espera-se que a implementação dos mecanismos necessários à preparação e aprovação dos diplomas legais, enquadrados pelo Decreto-Lei n.º 613/76, de 27 de Julho, encontre o mesmo eco no seio do Governo.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marcai (CDS): - Sr: Presidente, Srs. Deputados: Fez no passado dia 6 de Novembro 150 anos o concelho da Mealhada, terra que até 1836 integrava o extinto concelho de Vacariça.
O concelho da Mealhada, situado a sul do distrito de Aveiro, é um dos 19 concelhos deste distrito que a reforma de Mousinho da Silveira criou, corrigindo assim uma divisão anacrónica que se vinha verificando.
Inserido em plena Bairrada, célebre este concelho pelos seus vinhedos e leitões, de todos tão apreciados, é ainda este concelho possuidor do grande pulmão verde Bairradino - floresta do Buçaco -, zona de nobres tradições para a história de Portugal, onde Portugal, com valentia, venceu o invasor e continuou a ser Portugal.
Localiza-se ainda no Buçaco uma das mais belas jóias arquitectónicas do País, o palácio do Buçaco, frequentemente utilizado por reis, chefes de Estado, outros governantes e até estrangeiros, que nos visitam.
Mealhada é uma terra também célebre pelas suas águas termais e de mesa do Luso.
Gente trabalhadora e abnegada tem visto as suas terras a suscitar a apetência de distritos confinantes, com promessas a que nem sempre correspondem benefícios concretos.
Aveiro é um distrito dinâmico e uno e não deve abdicar da cedência das suas parcelas sem que se faça uma regionalização condigna.
Para além dos interesses político-partidários, devem sobrepor-se sempre os reais e basilares interesses das populações.
Mealhada, pelo peso sócio-económico de que é portadora, com realce para o sector turístico que referimos, bem merece a atenção governamental que lhe é devida, pois as carências existentes ao nível de rodovias, de saúde e de educação são ainda muito sensíveis para que os Mealhadenses possam ser aveirenses e portugueses de 1.ª classe.
Aproveitamos este ensejo das comemorações dos 150 anos do concelho da Mealhada, que o município está dignamente a comemorar, para felicitar todo o povo daquela terra e para chamar a atenção do Governo para as solicitações justas que o povo da Mealhada vem reivindicando para o seu progresso.

Aplausos do CDS, do PSD e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Vieira.

O Sr. Lopes Vieira (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nestes últimos meses, temos vindo a observar o interesse claramente manifestado pelo Governo em incentivar a aposentação dos funcionários públicos. Eu próprio recebi uma carta-circular do Sr. Ministro das Finanças, lembrando-me das condições mais favoráveis agora existentes para me aposentar.
Por vezes, criaram-se expectativas aos aposentados, que até agora não foram concretizadas. Os aposentados, quer pela sua idade, quer pela sua situação social, constituem uma classe de fraco poder reivindicativo. Mas não será por isso que os deixaremos ao abandono. Cumpre-nos até ser, aqui e agora, um arauto das suas preocupações.
Acontece presentemente que funcionários, estando nas mesmas condições básicas para exercer o direito à aposentação, recebem pensões de valores bem diferenciados, consoante se tenham aposentado antes ou depois de 1981.
Com a desvalorização da moeda e a falta de actualização do valor das pensões, os pensionistas viram, angustiados, diminuir rapidamente o seu poder de compra, e surgiu uma nova figura jurídica que designaram por «pensões degradadas».
O Decreto-Lei n.º 110-A/81, de 14 de Maio, que regulamentou as várias remunerações do funcionalismo, veio dar uma esperança aos aposentados quanto à possibilidade de verem actualizado o valor das suas pensões.
Uns meses mais tarde, publicou-se o Decreto-Lei 245/81, de 24 de Agosto, dedicado ao programa de recuperação do valor das pensões degradadas.
Tomando uma atitude cautelosa quanto ao limite dos encargos, o governo de então afirmava reconhecer o direito dos aposentados quanto à actualização do valor das suas pensões.
Nos termos deste diploma, os vencimentos a ter em conta no cálculo das pensões degradadas passaram a ser de 76,5% dos vencimentos das categorias correspondentes do activo.
Conjugando os textos de ambos os diplomas referidos, pode concluir-se que a actualização do valor das pensões só teria por limite as dificuldades financeiras que obstassem à inclusão no orçamento das verbas que financiassem a subida daquela percentagem, até igualar o valor das pensões pagas aos funcionários com igual categoria e com o mesmo tempo de serviço, aposentados depois de 1981.
Por enquanto, os funcionários que se aposentaram depois de 1981 recebem as pensões de aposentação na base de 92 % do vencimento do activo e os que se aposentaram antes desse ano recebem na base de apenas 76,5% do vencimento do activo.
Melhorada a situação financeira do País, facilitada agora a tarefa de actualização das pensões, tendo em consideração motivar os funcionários para a aposentação antecipada, e prosseguindo a política de apoio aos pensionistas da Segurança Social, chamamos a atenção do Governo no sentido de cumprir os compromissos assumidos pelo anterior Conselho de Ministros, no qual o PSD era maioritário, unificando o critério do cálculo das pensões de aposentação.

Aplausos do PRD e do MDP/CDE.

Página 219

12 DE NOVEMBRO DE 1986 219

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado Lopes Vieira, não quero propriamente formular um pedido de esclarecimento, mas sim solidarizar-me, em nome do meu partido, com a pretensão que o PRD acaba de dirigir ao Governo.
Efectivamente, o Governo está em falta para com os aposentados, e nós próprios, após a reunião da comissão permanente do meu partido, na passada semana, integrada nas jornadas de reflexão sobre o Orçamento, tivemos a oportunidade de difundir um comunicado sobre este problema.
Assim, queremos manifestar aqui o nosso apoio à pretensão formulada pelo PRD e também pedir ao Governo que não deixe degradar mais a situação em que se encontram os aposentados, antes e depois de 1981, situação esta que é intolerável, mesmo sob o ponto de vista dos direitos humanos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Vieira.

O Sr. Lopes Vieira (PRD): - Sr. Deputado Narana Coissoró, o Sr. Deputado não nos dirigiu de facto qualquer pergunta, pelo que só temos a agradecer o apoio que acaba de manifestar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota, que dispõe de sete minutos, cedidos pelo CDS, dado o PSD já não dispor de tempo.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As palavras que se seguem não pertencem ao deputado que subscreve esta intervenção. Elas são, na sua quase totalidade e genuinidade, a voz da revolta de um filho da aldeia piscatória de Alvor, que connosco compartilhou por um dia aquele sabor a sempre, sabor amargo, do contraste chocante entre um Algarve cosmopolita e um Algarve perdido e abandonado, que teima em sobreviver.
Estas palavras pertencem a eles, os heróicos pescadores do Alvor, dos quais gostosamente nos fazemos aqui câmara de ressonância e tapete de penetração nos corredores do Poder, para que o País acorde e o Estado desperte para a realidade das suas potencialidades naturais e se estenda a página do panfleto turístico, ao rodapé da contra-página, que quantas vezes está mesmo ali ao nosso lado.
São palavras que não são nossas. Elas pertencem ao povo de Alvor. E não pagam direitos de autor, pois para quem toda a vida tudo deu sem nada receber em troca começa a ser tarde para mudar de atitude.
Só que a nossa atitude, como responsáveis públicos, essa tem que necessariamente mudar. E terá de ser, neste caso, uma atitude de denúncia, de inconformismo e de reivindicação.
O rio Alvor, outrora fundo, navegável, abrigado e rico de marisco, principal fonte de riqueza dos naturais (disso falam os escritos antigos), está actualmente quase impraticável.
A sua navegabilidade só é possível na praia-mar. Durante as marés baixas os pescadores têm de aguardar, em horas roubadas ao seu merecido descanso, que a subida das águas permita a entrada ou saída do rio.
Esta pausa, quando antecede a entrada no rio, tem ainda o grave inconveniente de pôr em risco a vida dos pescadores.
Só quem já experimentou pode avaliar o grande perigo que significa o aguardar a subida da maré, às vezes de noite, à entrada de uma barra.
Um golpe repentino de mar, uma onda traiçoeira ou uma rajada de vento podem, de um momento para o outro, deixar famílias na orfandade e na miséria.
E isso, infelizmente, já tem acontecido muitas vezes.
Basta que uma onda apanhe a embarcação de lado ou que, fazendo-a correr, ela toque num banco de areia para que os pescadores sejam lançados à água juntamente com os apetrechos marítimos e, levados pela corrente, fiquem à mercê da morte.
A solução destes problemas passa pelo refundeamento da barra e do rio ou pela construção de um canal de acesso que permita aos pescadores de Alvor entrarem ou saírem para a pesca a qualquer hora e em segurança.
Eles bem o merecem pela sua coragem, pela sua tenacidade, pelo seu amor ao trabalho.
Não podemos continuar, passivamente, assistindo às consequências da erosão e permitindo que um rio que sempre teve notável importância na vida dos habitantes desta região se transforme num extenso areal, que já quase o é, nas marés baixas.
Há que lutar contra a erosão, mas também contra a inércia de certos homens.
Há que pugnar pelas condições de navegabilidade deste rio e pelo seu refundeamento.
Mas este problema - o refundeamento do rio - prende-se com outro problema, não menos grave, do rio Alvor: o do marisco.
Este foi, desde tempos remotos, a grande fonte de subsistência dos marítimos, que o comiam ou comercializavam quando, nos dias invernosos, o mar embravecido não os deixava sair para a pesca.
O marisco foi igualmente, durante centenas de anos, especialmente o berbigão e o lingueirão, o isco utilizado pelos pescadores de Alvor.
Havia sempre grande quantidade de marisco. Chegava para tudo e para todos.
Actualmente, o marisco está em vias de desaparecer e os pescadores lutam com enormes dificuldades para conseguir o isco para a pesca.
E sem isco não podem pescar, ficando impossibilitados de exercer a sua actividade.
Que razões terão levado ao desaparecimento do marisco no rio Alvor?
Ouvidos os pescadores, eles comungam da opinião de que a origem do fenómeno se prende com o lançamento de águas altamente poluídas e com o assoreamento do rio.
Na realidade, a invasão do rio pelas areias cria nele condições ambientais adversas à proliferação, reprodução e vida do marisco.
O berbigão, por ser o que vive mais à superfície da terra, é o mais atingido e, por isso, o que se encontra em vias de desaparecimento, constituindo um gravíssimo problema para a subsistência dos pescadores de Alvor, que, apesar da influência do turismo nesta região, são ainda a maioria da população desta localidade.
Mas as amêijoas encontram-se também ameaçadas. As condições do rio também não lhe são favoráveis.

Página 220

220 I SÉRIE - NÚMERO 9

E, neste sector, estão em jogo largos milhares de contos, pois as amêijoas de Alvor são mundialmente conhecidas.
Quer vendidas localmente para consumo nos muitos restaurantes desta importante zona turística, quer exportadas para vários países da Europa, as amêijoas de Alvor constituem uma importante fonte de riqueza nacional que urge defender e amparar.
Daqui chamamos a atenção das entidades competentes para os problemas do rio Alvor. Pelas riquezas que guarda em si, ele bem merece essa atenção.
O seu desassoreamento impõe-se.
O povo de Alvor, gente humilde e trabalhadora, é credor de consideração e de estímulo.
Que se olhe por ele e se resolvam os problemas que o afligem é um grito de alerta que urge desenvolver aqui na Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, afirmei há pouco que a anterior intervenção seria a última, mas a verdade é que se inscreveram para usar da palavra os Srs. Deputados José Carlos Vasconcelos e Barbosa da Costa, utilizando os dois minutos de que o PRD ainda dispõe. Portanto, cada um destes Srs. Deputados disporá de um minuto para fazer uma intervenção, o que será um verdadeiro exercício de autodisciplina.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou aproveitar esta feliz circunstância para, muito brevemente, manifestar a estranheza do PRD perante o que ontem nos foi dado ver na televisão.
Foi ontem noticiada uma chamada «visita-surpresa» da Sr.ª Ministra da Saúde ao Hospital de São João, no Porto, a partir da qual foram tiradas várias conclusões sobre a diligência da Sr.ª Ministra e a bondade dos serviços.
De facto, é espantoso como, numa visita de surpresa, em relação à qual foi dito que ninguém tinha conhecimento, estavam presentes todos os órgãos de comunicação social, incluindo a televisão que fez uma larga cobertura dessa visita. Não sei se os hospitais funcionam ou não, se é ou não assim que se sabe se funcionam, mas que a propaganda do Governo funciona, isso não há dúvida, inclusive através destas visitas-surpresa!

Aplausos do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O analfabetismo em Portugal constitui ainda hoje uma penosa realidade que a política prosseguida pelo ministério da tutela vai manter, nos níveis actuais, durante largos anos.
Não deixa de ser significativa e sintomática a recusa de uma proposta para um reforço de verba do Orçamento do Estado para a educação de adultos para o próximo ano.
Longe de se concretizar um aumento de agentes de ensino, com adequada preparação, nesta missão fundamental assiste-se a uma progressiva retirada de professores de educação de adultos substituídos por bolseiros habilitados na melhor das hipóteses com o ensino secundário.
E a situação é tanto mais preocupante quando louvavelmente se criam cursos sócio-profissionais e se alarga a alfabetização ao 6.º ano de escolaridade.
Perante tal política, somos levados a pensar que o Governo não está particularmente empenhado na erradicação do analfabetismo em Portugal.
Não se compreende, por outro lado, que haja alguns milhares de professores do ensino primário e educadores de infância com vínculo à função pública a exercerem vagas funções administrativas nos mais variados departamentos do Ministério da Educação.
Para além do mais, está-se a permitir o exercício de funções inadequadas para professores e a entregar o desenvolvimento de tarefas de maior responsabilidade pedagógica a jovens, talvez voluntariosos e empenhados, mas logicamente impreparados.
Acrescente-se ainda que o actual esquema de ocupação de lugares de docência por meio de destacamento dá lugar a processos não muito claros, onde os regimes de favores não têm sido excluídos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O futuro exige um claro empenhamento na alfabetização correcta e total do País e não é com paliativos, como os que actualmente se verificam, que se vai a algum lado.
A transferência e o sentido de equidade exigem que haja um quadro de agentes de ensino para a educação de adultos, onde através de concursos públicos se permita o acesso para o exercício dessa função.
Espera-se ainda que haja um número crescente de docentes habilitados implicados no processo e não o sistema que actualmente se verifica.
Não esqueçamos que os analfabetos existentes em número preocupante no País foram sempre os deserdados da sorte que carências sócio-económicas e a inexistência de estruturas necessárias arredaram em tempo oportuno dos bancos da escola.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um voto de protesto sobre a visita do Presidente da África do Sul, Pieter Botha, à Região Autónoma da Madeira.

Há alguma oposição a que este voto de protesto seja hoje discutido e votado?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, o PSD lamenta mas não pode dar o seu consenso à discussão imediata deste voto e, portanto, requeremos que ele transite para a próxima reunião plenária.

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. Portanto, esse voto de protesto fica agendado para a próxima reunião plenária.
Srs. Deputados, visto estarmos a atingir a hora regimental para fazer o intervalo, declaro suspensa a sessão até às 17 horas e 45 minutos.

Eram 17 e 15 minutos.

Página 221

12 DE NOVEMBRO DE 1986 221

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do projecto de lei n.º 140/IV, do PSD, sobre a obrigatoriedade do parecer vinculativo das câmaras municipais para o licenciamento de jogos e diversões públicas.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, creio que teremos que proceder à votação do projecto de lei apresentado pelo PSD e à votação do texto alternativo da comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, a comissão elaborou um texto de substituição?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, há um projecto de lei que vai ser votado em primeiro lugar, há um texto alternativo obviamente que o resultado esperado não inviabiliza nem um nem outro e depois há propostas de alteração que harmonizam a questão.
Sugiro ao Sr. Presidente e suponho que todos os Srs. Deputados estarão de acordo- que, em primeiro lugar, se proceda à votação do projecto de lei apresentado pelo PSD, em segundo lugar à votação do texto alternativo e por fim à votação na especialidade.

O Sr. Presidente: - Então vamos passar à votação na generalidade do projecto de lei apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do MDP/CDE, de cinco deputados do PRD e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Oliveira e Costa, votos contra do PRD e abstenções do PCP e do deputado do PRD Ivo Pinho.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o texto alternativo.

Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Oliveira Costa, votos a favor do PCP e abstenções do MDP/CDE e do deputado do PRD Ivo Pinho.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não se encontra na Mesa nenhum requerimento de baixa à comissão. V. Ex.ª pede a palavra para o formular?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não, Sr. Presidente. Regimentalmente, não havendo requerimento de baixa à comissão, deve passar-se à imediata discussão e votação das propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Vamos, pois, passar à discussão das propostas de alteração.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, as únicas propostas que se encontram na Mesa são as que deram entrada no dia 6 deste mês, visto que anteriormente tinham sido apresentadas outras propostas que, em tempo, foram retiradas.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Está em discussão a proposta de substituição do artigo 1.º do projecto de lei n.º 140/IV.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que nos levou à abstenção do texto original deste artigo foi precisamente o disposto no seu n. º 3, ou seja, que na falta de parecer se presumia como favorável a posição da câmara municipal. O texto de substituição corrige de forma satisfatória o problema levantado com esse n.º 3 e, nesse sentido, daremos o nosso voto favorável a este texto de substituição.

O Sr. Presidente: - Visto mais ninguém pretender usar da palavra, vamos votar a proposta de alteração ao artigo 1.º

Submetida à votação, foi aprovada com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, de seis deputados do PRD e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Oliveira e Costa e votos contra do PRD.

É o seguinte:

Artigo 1.º

1 - As entidades a quem compete a concessão e a renovação de autorização para jogos de perícia, o licenciamento e a sua renovação de máquinas de diversão, mecânicas, automáticas, eléctricas, computorizadas ou electrónicas, ou de salas para exploração destas actividades, ou outras diversões, nomeadamente casas de espectáculos, boites, discotecas, bares e estabelecimentos congéneres, devem remeter, por ofício registado ou mediante protocolo, cópia do respectivo requerimento para parecer prévio da câmara municipal do concelho em que se situar a actividade a licenciar, salvo indeferimento liminar do pedido.
2 - A câmara municipal tem a faculdade de, no prazo de 30 dias, contados a partir da data do recebimento do ofício, comunicar o seu parecer.
3 - Os prazos aplicáveis à decisão das entidades referidas no n.º 1 contam-se a partir do recebimento do parecer da câmara municipal competente ou do termo do prazo para a sua recepção.

Página 222

222 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se na tribuna da Assembleia da República uma delegação da Assembleia Nacional da Hungria, chefiada pela Vice-Presidente da Assembleia Nacional da Hungria, acompanhada pelo Sr. Embaixador da Hungria, a quem saudamos vivamente.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão a proposta de alteração ao artigo 2.º

Visto ninguém pretender usar da palavra, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, de seis deputados do PRD e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Oliveira e Costa e votos contra só PRD.

É o seguinte:

Artigo 2.º

O parecer desfavorável da câmara municipal, que deve ser fundamentado, determina o indeferimento do pedido pela entidade licenciadora.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta de alteração ao artigo 3.º Visto não haver inscrições, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, de seis deputados do PRD e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Oliveira e Costa e votos contra do PRD.

É o seguinte:

Artigo 3.º

São nulas, independentemente de declaração dos tribunais, as decisões tomadas que não obedeçam ao disposto nos artigos anteriores.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta de alteração ao artigo 4.º Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que o sistema que está configurado nos artigos já aprovados não justifica uma tão grande dilação. Aliás, há a regra geral de que as leis entram em vigor nos cinco dias seguintes à sua publicação no Diário da República.
Assim, dirijo-me directamente aos subscritores da proposta, no sentido de uma melhor ponderação da questão, propondo muito concretamente, já não a eliminação deste prazo excepcional de dilação, mas, pelo menos, a sua redução a metade do tempo, ou seja, a 30 dias.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, em termos práticos, a diferença entre 60 e 30 dias não será grande se tivermos em conta o trabalho de redacção final da lei, a sua promulgação e publicação. De qualquer modo, como este projecto de lei já teve tantas e talvez desnecessárias atribulações, não nos parece que seja este o momento de atribuir uma nova atribulação. O resultado prático não será diferente com uma ou outra solução.
Relativamente àqueles que tanta oposição fizeram a esta iniciativa legislativa, em nome de que isso iria desorganizar a situação actual em termos de processamento dos requerimentos que entretanto tenham sido feitos, por esta via deixamo-los tranquilos, com a certeza de que o objectivo fundamental é conseguido, isto é, o reforço do poder local relativamente ao qual aqui se verificou um longo entendimento parlamentar. Inclusivamente, uma tão pequena iniciativa demonstrou como é fundamental nestas coisas o conteúdo das iniciativas legislativas e não a sua roupagem articulada.
Por outro lado, também se demonstrou que, afinal de contas, para os partidos que têm enchido a boca com o poder local e que de certa forma se tentaram implantar nestes últimos anos atrás da bandeira do poder local, bastou um pequeno grão para que toda essa fantasia e todo esse discurso fácil se desfizesse.
Por isso, julgo que tendo em conta tudo o que rodeou esta iniciativa legislativa e, inclusivamente, a sua evolução no próprio Plenário, não há motivo - até porque não há grande diferença prática - para introduzirmos uma nova alteração.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que as glorificações do poder local são, no mínimo, um aliviar de consciências mais do que uma transferência de competências para o poder local.
Não passaria pela cabeça de ninguém que glorificássemos o poder local, transferindo-lhe, por exemplo, a competência para decidir sobre a aquisição de fragatas, que é uma competência parlamentar, que aliás, causa algumas dificuldades ao Parlamento.
Do mesmo modo não é uma glorificação do poder local transferir para as autarquias a competência para decidirem sobre se é bom ou mau para os Portugueses, especialmente para os jovens portugueses, a utilização indiscriminada de jogos de fortuna e de azar, quando não encaramos aqui, com a mesma frontalidade, essa questão. E, quando nos revelamos incapazes de optar, transferir competências não é, com certeza, uma forma de dignificar aqueles para quem transferimos a responsabilidade, que nós próprios não somos capazes de assumir.
Por isso, a nossa posição quanto a este projecto de lei e, em especial, em relação ao artigo 4.º

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que não percebo o exemplo que deu das fragatas, visto que a maior parte dos municípios está no interior do País. Portanto, o problema não é marítimo.

Página 223

12 DE NOVEMBRO DE 1986 223

Uma voz do PSD: - Ou fluvial! O Orador: - Ou fluvial!...

Com certeza que o Sr. Deputado não leu o projecto de lei, porque o que lá se propõe é que as câmaras, enquanto representantes, livremente eleitos, das populações, possam emitir em juízo eficaz acerca do que pretendem no seu município, nesta área específica.
Só lastimo que não tenha havido oportunidade para alargar esta possiblidade de os representantes eleitos pelas populações, pelas comunidades, também se poderem pronunciar com eficácia. Esperamos que esse alargamento de capacidade de intervenção chegue aqui brevemente! Aliás, estou seguro disso, tendo em conta a intervenção que um seu colega de bancada aqui produziu há pouco tempo.
Decerto que, dentro em breve, chegará aqui com um pacote de medidas tendentes ao alargamento da intervenção nas questões especificamente comunitárias por parte dos livremente eleitos representantes dessas comunidades, pois não se está a propor que eles actuem em relação a todos os portugueses, mas, sim, que actuem em relação àquilo que diz respeito à sua comunidade.
Espero que o Sr. Deputado Magalhães Mota não considere que as questões que aqui se abordam, e às quais diz respeito o projecto de lei, nada têm a ver com as comunidades representadas pelas câmaras municipais! ...

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Silva Marques, ouvi dizer que me ia pedir um esclarecimento, mas terei que adivinhar qual é ele para tentar responder-lhe.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Perguntei-lhe se leu o projecto de lei!

O Orador: - Dir-lhe-ei, muito rapidamente, que, em relação àquilo que é o conteúdo do projecto de lei, que foi apresentado, e apesar das suas sucessivas variações, me mantive ao corrente de todas elas e acompanhei todas as que entraram na Assembleia da República. Devo dizer-lhe que houve, da minha parte, não só atenta leitura como até alguma reflexão, porque entendo, com dificuldade, como é que um parecer que foi aprovado na Comissão seja depois reprovado em Plenário pelas partes integrantes dessa mesma Comissão. Ora, isto aconteceu mesmo com os partidos que não dispõem de liberdade de voto, o que é razão para nos congratularmos, porque vemos que alguns exemplos vão frutificando! ...
Em complemento, gostaria ainda de lhe dizer que há questões de interesse nacional e há questões de interesse local. Todas as questões de interesse nacional têm, com certeza, repercussão a nível local. A inversa já não será verdadeira. O que me recuso a acreditar é que a tomada de posição dos Portugueses sobre o interesse que tem a existência de máquinas de Jogo seja uma questão exclusivamente de nível local. É, com certeza, uma questão que também interessa a nível local, mas creio que não é uma competência das autarquias estar a transferir-lhes a responsabilidade para decidir sobre essa questão.
Aquilo que, em nosso entender, se processou foi que, sob a capa de se transferir uma responsabilidade para as autarquias, atribuindo-lhe uma competência, recusámos tomar posição sobre a proliferação, a existência, a manutenção de máquinas de jogo em Portugal e o papel que elas desempenham na educação da nossa juventude.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco fiz um pedido aos subscritores do projecto de lei, no sentido de se pronunciarem sobre a possibilidade de redução do prazo de 60 para 30 dias. De facto, obtive resposta de um dos subscritores, mas não obtive resposta por parte dos outros. Talvez o silêncio signifique alguma coisa, neste caso!...
Queria ainda referir-me a uma expressão que tem sido aqui utilizada: a transferência de uma competência.
Não é verdade que o texto aprovado transfira uma competência para as câmaras municipais. A única coisa que o diploma introduz, como novidade, é a obrigatoriedade de elas serem consultadas, previamente à decisão que as entidades competentes para o licenciamento de jogos têm que tomar sobre os pedidos que lhes são feitos.
A segunda grande novidade é a de que o parecer negativo fundamentado é vinculativo para essa entidade licenciadora.
Como são estas as duas novidades do projecto de lei, parece-me que não se pode falar, como aqui se faz, em transferências de competência.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Lopes.

O Sr. Fernando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sob a forma de intervenção, vou responder ao Sr. Deputado João Amaral, dizendo-lhe que é evidente que o silêncio tem um significado, pois quem cala consente.
Também me pronunciei sobre a redução do prazo de 60 para 30 dias. Para o PS isso era indiferente. Podia ser 30 dias, inclusivamente, o diploma podia entrar imediatamente em vigor, de acordo com a lei geral. No entanto, em contacto com alguns governadores civis chegou-se à conclusão de que isso causaria alguns embaraços. É apenas essa a razão e o silêncio deve ser interpretado nessa base. Trata-se, portanto, de um consentimento fundamentado.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em segunda intervenção, e dirigindo-me sobretudo ao líder da bancada do PRD, queria fazer-lhe uma pergunta. É a seguinte: o PRD é contra esta iniciativa legislativa? O PRD não concorda que se atribua às câmaras municipais a possibilidade de dizerem «não»? É que é este o conteúdo da iniciativa legislativa.

Página 224

224 I SÉRIE - NÚMERO 9

A intervenção do Sr. Deputado Magalhães Mota leva-me a concluir que não leu o projecto de lei. Isto porque, na sequência da intervenção feita, há alguns dias, por um seu colega, a argumentação por si produzida está fora do tema do projecto de lei.
Por isso convém que, de forma clara, visto que o PRD é um partido de clareza, o líder da bancada informe o hemiciclo, o País, os autarcas e os que não são autarcas sobre se o PRD se opõe a que se dê às câmaras a possibilidade de dizerem «não» e atribuir a esse «não» eficácia, ou se considera isso inconveniente.
Eu, em termos de intervenção, peço este esclarecimento ao líder da bancada do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que o pedido formulado pelo Sr. Deputado Silva Marques merecerá resposta, porque de pedido se trata e não de uma imposição. É evidente que terei todo o gosto em explicar a posição do Grupo Parlamentar do PRD. Penso, aliás, que só por desatenção do Sr. Deputado Silva Marques ela não terá ficado perfeitamente esclarecida. Creio que a minha atitude não poderá constituir precedente e longe de mim atraver-me a supor que qualquer líder parlamentar seria forçado, por qualquer intervenção, a ter que explicar as posições da respectiva bancada!... Isto porque, neste momento, teria que colocar algumas questões sérias.
Creio que a Assembleia da República não pode ignorar que não está perante uma situação quimicamente pura. Quer dizer, não estamos a legislar como se não houvesse máquinas de jogo em Portugal. Há máquinas de jogo em Portugal e a sua proliferação foi autorizada por um membro da bancada do PSD. Refiro--me ao Ministro da Administração Interna, engenheiro Ângelo Correia, a um despacho normativo que ele publicou e que permitiu essa proliferação de maquinas de jogo em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ignorar esta situação histórica é, pelo menos, desvirtuar a questão.
Neste momento, existem máquinas de jogos, existe uma proliferação indiscriminada e a transferência sucessiva de responsabilidades, a que vimos assistindo, do Governo para os governos civis e, agora, dos governos civis para as autarquias, corresponde apenas a escamotear esta situação de partida. Há máquinas de jogo em Portugal, elas foram instaladas e estão um pouco indiscriminadamente por toda a parte.
Quando se vai permitir que algumas câmaras municipais possam emitir um parecer vinculativo que leve os governadores civis a modificar uma decisão, quando as máquinas já estão estabelecidas, ou a não permitir o seu licenciamento está a atribuir-se-lhes um poder, mas não está a atribuir-se-lhes um poder completo, nem se está a resolver uma situação, situação essa que é grave e implica, da parte dos poderes constituídos, uma demissão perante o problema geral, mais vasto e mais importante.
E nem se diga, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que a situação é tão difícil de resolver quanto isto, porque seria fácil ao Governo dar instruções aos seus governadores civis, dizendo-lhes: «Acabam já amanhã as máquinas de jogo.» Então, a situação que preocupa o PSD estaria resolvida por forma mais eficaz e generalizada para todo o País, mas não se diga que com isto se está a resolver toda a situação. Isto porque apenas se está a permitir a algumas câmaras a possibilidade de tomarem este tipo de iniciativa, permitindo inclusivamente uma situação que os Portugueses não perceberão e que será a de, em alguns concelhos, as máquinas estarem autorizadas e nos concelhos imediatamente ao lado estarem proibidas.
Creio que todas estas situações mereceriam uma mais atenta reflexão e um maior aprofundamento do problema e que tudo isso foi, de algum modo, escamoteado pela urgência desta discussão e pelo facto de se pensar que conferir uma nova competência às autarquias resolvia tudo e mais alguma coisa. Não resolve, Sr. Deputado. O problema é mais fundo, tem uma importância tão grande que justifica, da nossa parte, medidas mais aprofundadas, mais reflectidas, e com certeza que as tomaremos.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Lopes.

O Sr. Fernando Lopes (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, quanto à liberalização das máquinas, o PS está à vontade porque foi um governo de inspiração socialista que tentou pôr travão a uma certa promiscuidade que se verificava neste campo de actividades, proibindo nomeadamente as máquinas nos cafés.
Agora, a realidade é esta e não pode ser ignorada, Sr. Deputado: existem máquinas - estamos aqui a falar só em máquinas mas o projecto de lei aplica-se a discotecas, a boites, a várias formas de diversão do homem - e não vejo que haja possibilidade de nos libertarmos delas, pois não vamos para uma posição tão radical. Até agora, quem as licenciava era o Governo e o certo é que há autarcas que não vêem com bons olhos que, na área dos seus municípios, existam essas máquinas e essas diversões. De qualquer forma, são os autarcas que estão em situação privilegiada, não digo para avaliarem as vantagens, mas para avaliarem as desvantagens da instalação deste tipo de actividades, sejam discotecas ou bares. O projecto foi este. Aliás, foi aqui dito, aquando da discussão na generalidade, que este diploma não procurava - e devo dizer que não tenho procuração do Sr. Deputado Silva Marques, mas ela está de acordo comigo - resolver tudo; apenas deu um passo no sentido de o licenciamento não continuar a ser feito à revelia dos autarcas.
Pergunto: entende V. Ex.ª que não é importante dar uma palavra, que é efectivamente vinculativa, que pode não ser simpática, mas é uma arma política que os autarcas saberão ou não usar - e nós, socialistas, pensamos que eles saberão usá-la - aos autarcas para que eles possam dizer: «No meu concelho não quero esta ou aquela actividade neste ou naquele local»?
É esta a pergunta clara que lhe faço, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, é por uma razão de clareza política que volto a insistir consigo.

Página 225

12 DE NOVEMBRO DE 1986 225

Sr. Deputado, quem licenciava - aliás, isso já lhe foi lembrado - continua a licenciar. E mais: continua com a possibilidade de emitir um juízo de natureza pública, mesmo que as câmaras dêem um parecer favorável ou não dêem parecer nenhum.
Portanto, quem licenciava continua a licenciar no futuro. Só que se dá às câmaras municipais a possibilidade de, quando o seu juízo é negativo, terem uma eficácia real. Isto é um passo em frente.
O Sr. Deputado diz que não é um passo em frente porque a matéria é muito complexa. Admito-o, mas, em nome da complexidade, sabe que o nosso país tem adiado não por meses, não por anos, mas por décadas a sua evolução real. E aqui, se calhar, estamos em duas posições diferentes relativamente à maneira de encarar as reformas ou o reformismo.
Sr. Deputado, V. Ex.ª referiu-se à urgência. Este processo já tem meses. O próprio projecto de lei é a renovação de uma iniciativa da legislatura anterior. Porquê então falar na urgência?
Afinal de contas, aqueles que acham que esta iniciativa não é boa e que tem de haver uma outra mais completa têm estado parados. No entanto, foram alertados para esta problemática há muito tempo, há mais de dois anos, através de uma iniciativa legislativa e, inclusivamente, através das tomadas de posição da generalidade das câmaras municipais do nosso país.
Então, Sr. Deputado, se a reforma é insuficiente, onde é que está a reforma suficiente? Sr. Deputado, já tenho ouvido esse discurso a muita gente - gente essa que tem condenado o nosso país à estagnação -, e ele é o de, em nome do tudo, acabar no nada!
Quando o Sr. Deputado pergunta por que é que o Governo não dá, antes, instruções, só tenho a dizer-lhe o seguinte: Meu Deus! Quando, pela boca de V. Ex.ª, se preferem as instruções do Governo ao juízo dos autarcas, pergunto-me que discussão está V. Ex.ª a fazer nesta matéria, sobretudo quando o Sr. Deputado se arroga, quer individualmente quer relativamente à sua bancada, como um paladino do poder local.
Mas, afinal, o que é que andamos a fazer? Andamos a encher a boca com as palavras «poder local» ou queremos, de facto, levar a cabo acções concretas no sentido da sua afirmação?
Sr. Deputado, de entre as instruções do Governo - mesmo as do actual Governo, que merece a minha inteira confiança - e o juízo dos autarcas, prefiro o juízo dos autarcas, pois estes estão melhor colocados para produzirem esse juízo, e prefiro-o só por essa razão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Começarei por responder à primeira das questões que me foram formuladas.
Penso ser evidente que não são apenas as máquinas de jogo que estão em causa; essa foi também uma das críticas que formulámos.
Misturar, no mesmo «saco», o licenciamento das casas de espectáculos, das boites, dos bares e dos jogos é algo que resulta confuso. Os critérios têm de ser necessariamente diferentes, os pareceres têm, também, que o ser, pois não se pode licenciar uma casa de espectáculos nem emitir parecer sobre o seu licenciamento do mesmo modo que uma máquina de jogos. Esse foi um aspecto de pormenor, que a seu tempo foi explicitado.
Quanto ao fundo da questão - e aí os dois pedidos de esclarecimentos formulados são, de algum modo, coincidentes - ao invocar a facilidade que o Governo teria para dar instruções, eu estava a caricaturar, com alguma evidência, um aspecto deste mesmo problema, e que é o de a bancada proponente desconfiar da capacidade do seu Governo em relação à resolução do problema e pretender que algumas câmaras se oponham à proliferação das máquinas de jogo e ao modo taxista como o seu Governo tem autorizado essa proliferação.
No fundo, é isto o que está em causa, é este sublinhado que importa aclarar, porque o que se está a conceder a algumas câmaras municipais é, tão-somente, a possibilidade de, elas próprias, virem a corrigir uma tendência. Só que, do nosso ponto de vista, não tendo dúvidas em declarar que este passo é positivo, ele não é suficiente, em especial para justificar que a Assembleia da República ligue o seu voto e a sua voz a uma situação toda inquinada desde o início.
Há outros processos de resolver a questão e recusamos ligar o nosso voto e a nossa voz a uma situação inquinada que, por esta forma, não fica resolvida.
Que isto representa um passo positivo, é um facto, mas é tão insuficiente que não compensa o resto. E o resto é ignorar uma situação anterior, não tomar posição sobre uma situação inquinada do princípio ao fim, pactuar com a situação e com os condicionamentos existentes em relação a toda esta matéria.
É isto o que recusamos, é a isto que não devemos deixar ligar o nosso nome.
Não estamos, portanto, a prejudicar o exercício autêntico das competências das autarquias, não estamos a pôr em causa o poder local, nem a diminui-lo, mas sim a chamar à atenção para um problema mais sério, mais vasto e mais profundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, concluído o debate sobre este artigo 4.º, vai o mesmo, de imediato, ser submetido à votação na especialidade.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, de cinco deputados do PRD e dos deputados independentes Oliveira e Costa e Ribeiro Telles, votos contra do PRD e com as abstenções do PCP e do MDP/CDE.

É o seguinte:

Artigo 4.º

A presente lei entre em vigor 60 dias após a sua publicação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos de imediato passar à votação final global de todo o diploma.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, de cinco deputados do PRD e dos deputados independentes Oliveira e Costa e Ribeiro Telles e votos contra do PRD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Matias.

Página 226

226 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. Carlos Matias (PRD): - Sr. Presidente, desejo apenas anunciar que entregarei na Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Para declarações de voto estão inscritos os Srs. Deputados João Amaral, Barbosa da Costa, Roleira Marinho, Raul Castro, Horácio Marçal e Fernando Lopes.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero afirmar que a medida que a Assembleia da República tomou neste momento não se traduz, de facto, na resolução dos problemas de fundo que envolvem toda esta matéria. Todavia, ela é uma medida que pode atenuar situações que hoje se vivem e mal seria que a Assembleia da República se dissociasse de medidas que podem atenuar situações lesivas das comunidades locais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Ao votar contra o projecto de lei n.º 140/IV, do PSD, o PRD pretende deixar bem claro que a questão em apreço tem uma tal profundidade que afasta, à partida, soluções ligeiras.
Sem pôr em causa o reforço do poder local, o PRD entende que o jogo e as diversões públicas, por atingirem particularmente os jovens, com poucas ou nenhumas alternativas para a ocupação dos tempos livres, constitui matéria para reflexão profunda, que não pode desligar-se de um conjunto de componentes sociais a ter em conta.
Ao mesmo tempo, não pode passar em claro que a proliferação das máquinas de jogo, com todas as consequências decorrentes, ficou a dever-se a um despacho do então Ministro da Administração Interna do PSD, Ângelo Correia, que, apesar de revogado, não deixou de influenciar decisivamente a actual situação, mau grau as tentativas legislativas correctoras subsequentes.
O projecto de lei agora apresentado pelo PSD, não só não encara a questão com a frontalidade devida, como pretende transferir para a Assembleia da República uma responsabilidade que ela, desta forma, não deve assumir.
Pretendeu-se, assim, fazê-la substituir o Governo num acto para o qual possui total competência. A Assembleia da República legitimaria, desta forma, uma situação que continuaria longe das soluções adequadas.
No entender do PRD, o projecto de lei n.º 140/IV apresenta-se como um descarregar de consciência por parte dos seus autores que, em termos práticos, deixariam o problema na mesma situação e fora de qualquer responsabilidade por parte do Governo.
O PRD considera que as autarquias e populações preocupadas com a proliferação das máquinas de jogo e diversões públicas devem exigir junto dos governadores civis que o Governo assuma as suas responsabilidades na matéria.
O PRD reafirma a necessidade de se encarar esta questão com toda a profundidade e em todas as suas implicações, pelo que manifesta, desde já, a sua inteira
disponibilidade para o efeito. Para já, vai o PRD propor, durante a discussão da lei do Orçamento para 1987, a instituição de um pesado imposto, de carácter punitivo, sobre estas actividades.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

O Sr. Moleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acabámos de aprovar este projecto de lei, da iniciativa do Partido Social-Democrata, e, do nosso ponto de vista, depusemos nas mãos dos autarcas um instrumento que, de algum modo, lhes permite defender os bons costumes e preservar a qualidade de vida e o bem-estar das populações.
Ao contrário daqueles que entendem que as câmaras municipais assumiram uma responsabilidade, ficaram com um ónus daquilo que amanhã venham a fazer em prol das suas populações, essa preocupação não nos atinge porque temos a certeza que fomos ao encontro daquilo que, desde há muito, as câmaras municipais, os autarcas, reclamavam.
Mais não fosse, bastar-nos-ia o parecer favorável que obtivemos por parte da Associação Nacional de Municípios, que colaborou na feitura desta lei.
Por isso, o PSD sente-se satisfeito por verificar que a maioria desta Câmara comungou connosco dos anseios e da atribuição de um dever e, também, de uma responsabilidade que os autarcas, desde há muito, repito, sentiam necessidade para levar o seu mandato a bom termo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Castro.

O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE votou favoravelmente o presente projecto de lei, porquanto, embora tratando-se de uma medida tardia - pois é sabido que proliferam em todo o País demasiados estabelecimentos deste género -, ele é uma iniciativa que pode impedir que continue a verificar-se essa proliferação.
O MDP/CDE votou-o, ainda porque desta forma se coloca ao alcance das câmaras municipais a intervenção que estas sempre ambicionaram, visto que até agora o não podiam fazer. Aliás, em função da sua ligação aos problemas concretos de cada município, consideramos as câmaras municipais como as entidades mais vocacionadas para intervir nesta matéria.
Por essa razão, votámos favoravelmente este projecto de lei, embora com a consciência de que ele não vem resolver totalmente o problema; porém, em nosso entender, esta iniciativa representa um passo positivo para impedir a proliferação de estabelecimentos deste género.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente o projecto de lei n.º 140/IV porque entende que, embora ele não venha resolver o problema na totalidade, vem moralizar bastante a instalação indiscriminada das máquinas de diversão mecânica, das máquinas automáticas e da instalação de casas de espectáculo e boites.

Página 227

12 DE NOVEMBRO DE 1986 227

Entendemos que, na verdade, nesta situação se devia valorizar a acção do poder local, porque os autarcas é que conhecem os verdadeiros interesses das suas populações. Por esse motivo, votámos favoravelmente este projecto.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Lopes.

O Sr. Fernando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista também votou favoravelmente o projecto de lei n.º 140/IV, na convicção de que, efectivamente, ele não resolve todos os problemas da sociedade portuguesa, nomeadamente da juventude.
No entanto, como já aqui foi dito, era para nós importante que o licenciamento deste tipo de actividades não continuasse a ser feito à revelia do poder autárquico. Foi apenas este passo que foi dado; o outro, aquele que vai muito mais longe, é muito mais fundo e não se resolve com repressão. Não é proibindo, pura e exclusivamente, as máquinas nem é criando impostos excessivos que se resolve o problema, porque, então, caímos - e a experiência ensina-nos isso - no jogo clandestino e nas casas clandestinas.

Vozes do P§: - Muito bem!

O Orador: - Vale mais que elas vivam à luz do dia, pois são uma realidade com a qual temos de viver e só deixaremos de frequentar essas diversões - nomeadamente a juventude - quando for possível ter alternativas, uma efectiva ocupação de tempos livres. Quando falo em alternativas de ocupação de tempos livres não estou a falar naquilo que este Governo vem fazendo para a juventude, que não é propriamente uma alternativa séria que resolva os problemas da juventude.
Assim, votámos favoravelmente este projecto de lei, na certeza de que não é possível, com repressão, acabar com os malefícios dos jogos e das diversões da pessoa humana.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai agora ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandato

Em reunião realizada no dia 11 de Novembro de 1986, pelas 16 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitada pelo Partido Comunista Português:

Maria Margarida do Carmo Tengarrinha Campos Costa (círculo eleitoral de Faro) por José Estêvão Correia da Cruz. Esta substituição é pedida nos termos da alínea a), n.º 2, artigos, da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados) por um período não superior a três meses, a partir de 4 de Novembro corrente, inclusive.

Bernardina Lúcia Sebastião (círculo eleitoral de Beja) por Bento Aniceto Calado. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c), n.º 2, artigo 5.º, da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados) por um período não superior a seis meses, a partir do dia 12 de Novembro corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Fernando da Silva Monteiro. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b), n.º 2, artigo 5.º, da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados) por um período não inferior a quinze dias, a partir do dia l de Novembro corrente, inclusive.

Pedro José Del Negro Feist (círculo eleitoral de Lisboa) por António Filipe Vieira Neiva Correia. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b), n.º 2, artigo 5.º, da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados) por um período não inferior a quinze dias, a partir do dia 11 de Novembro corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.

Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Manuel da Costa Andrade (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) - Henrique Rodrigues da Mata (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Carlos Manuel da Costa Candal (PS) - Carlos Manuel Luís (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - José Manuel Antunes Mendes (PCP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o relatório e parecer que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai ser lida agora a acta de apuramento da eleição da Comissão de Apreciação dos Actos do MAPA, que se realizou na sessão anterior.

Foi lida. É a seguinte:

Aos 6 dias do mês de Novembro de 1986, na Sessão Plenária da Assembleia da República, procedeu-se à eleição para a Comissão de Apreciação dos Actos do MAPA, tendo-se verificado

Página 228

228 I SÉRIE - NÚMERO 9

a entrada nas umas de 191 votos, assim distribuídos pelos respectivos candidatos:

Votos Sim Não Abstenções Brancos Nulos

Efectivos:

PSD:
Luís António Damásio
Capoulas ......... 140 34 12 4 1

Cristóvão Guerreiro
Norte. ............ 155 21 10 4 1

PS - José dos Santos
Frazão ................... 149 15 23 3 1
PRD - Paulo Manuel Q.
Guedes Campos ....... 144 23 20 3 1
PCP - José Élio Sucena... 128 39 17 6 1

Suplentes:

PSD:

Luís Manuel Neves
Rodrigues ........... 153 19 13 5 1
Mário O. Mendes
Santos ............... 153 19 13 5 1

PS - Armando Santos
Lopes ................... 152 14 19 5 1
PRD - António João Brito 142 23 19 5 2
PCP - Rogério Brito ..... 137 34 14 5 1

Verificando-se assim que todos os candidatos obtiveram os votos necessários à respectiva investidura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à discussão na generalidade do projecto de lei n.º 141/IV, apresentado pelo PSD, relativo à actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia.
De acordo com uma informação que agora me foi prestada, há um relatório da Comissão, do qual consta um texto alternativo, cujo relator foi o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.
Srs. Deputados membros da Comissão de Administração Interna e Poder Local, agradeço o favor de nos informarem se esta discussão na generalidade incide sobre todos os documentos, ou se, havendo um texto alternativo da Comissão, foi retirado o projecto de lei original.

O Sr. Luís Martins (PSD): - Sr. Presidente, a discussão é sobre o texto alternativo.

O Sr. Presidente: - Portanto, Sr. Deputado, o PSD retirou o texto original. Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, ,ouvi-o anunciar este debate como um debate na generalidade e, de facto, é um debate na generalidade que se abre. Mas o que ficou assente em conferência de líderes foi que p debate seria feito sem qualquer interrupção temporal, ou seja, logo no termo do debate na generalidade, far-se-ia a votação na generalidade, a votação na especialidade e a votação final global.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe o esclarecimento que acabou de prestar, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, na medida em que há consenso no sentido de não serem feitas intervenções na discussão na generalidade, vamos votar o texto alternativo.

É assim, Sr. Deputado João Amaral?

O Sr. João Amaral (PCP): - Não, Sr. Presidente. Eu não disse que não haveria intervenções -sei até que vários Srs. Deputados têm intervenções preparadas -, mas sim que, no termo do debate, se procederia à votação na generalidade que, em vez de ser realizada na próxima quinta-feira, pelas 18 horas, seria realizada imediatamente, procedendo-se em seguida às votações na especialidade e final global.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tal como tinha anunciado há pouco, está aberta a discussão na generalidade do texto alternativo e de algumas propostas de alteração referentes ao mesmo texto alternativo.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Martins.

O Sr. Luís Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão e votação do projecto de lei n.º 141/IV - Actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia- iniciativa do Partido Social-Democrata é uma correcção da Lei n.º 9/81, de 26 de Julho, que há vários anos se impunha.
De facto, a Assembleia da República ao aprovar aquela lei das remunerações e abonos dos eleitos locais, o legislador previu a actualização desses abonos, esquecendo aqueles que são a base do poder local, os membros das juntas de freguesia. - A esta iniciativa legislativa juntou-se a contribuição de todos os grupos parlamentares, contribuição que veio reforçar a iniciativa e sobretudo enriquecer o objectivo.
Se as autarquias locais não são só os municípios, mas também as freguesias, também os autarcas não são só os presidentes dos municípios, os vereadores e membros das assembleias municipais, mas são também os membros das juntas das assembleias de freguesia. Destes destacamos os membros das juntas, que por mais próximos das populações mais próximos estão dos problemas e são de facto os autarcas servidores directos, por excelência, das populações.
Ao seu altruísmo, à sua disponibilidade, ao seu sentido de servir e ao seu trabalho na construção do estado democrático não deve acrescer ainda o desembolsar dos seus orçamentos familiares para resolver os problemas da comunidade.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quantas vezes se desloca o presidente da junta de freguesia à custa dos seus próprios meios à sede do município para resolver problemas, e por vezes sem sucesso? O subsídio que a Lei n.º 9/81 lhe atribuiu é manifestamente insuficiente. Sabemos que esta actualização não vai cobrir estas despesas, mas é uma contribuição que a comunidade dá, com a respectiva actualização, que pretende que aqueles que com menos meios não sejam impedidos de se candidatar aos órgãos locais com prejuízos eventuais para a escolha dos melhores e dos mais competentes.

Aplausos do PSD.

Página 229

12 DE NOVEMBRO DE 1986 229

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Lopes.

O Sr. Fernando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista também vai votar favoravelmente o projecto de lei n.º 141/IV, na versão encontrada no seio da Comissão de Administração Interna e Poder Local.
Fazemo-lo na convicção de que é uma iniciativa relativamente modesta. No entanto, tem o mérito - que não regateamos - de colmatar uma verdadeira lacuna legis, ou talvez uma lacuna do legislador, porquanto, na Lei n. º 9/81, indexou os subsídios a atribuir aos autarcas que desempenham as suas funções junto das câmaras e assembleias municipais, a nível de concelho, mas não fez o mesmo para aqueles outros autarcas que desempenham as suas funções a nível de freguesia.
Ora a democracia tem, no poder local, um dos seus pilares mais fortes. No entanto, quanto a nós, socialistas, o poder local não se esgota nos municípios. Pelo contrário, tem as suas raízes mais profundas a nível de freguesia, onde o eleito está ainda mais perto do eleitor.
Por isso, entendemos que esta injustiça não tinha razão de ser, tanto mais que ainda vivemos em inflação, e não é este Governo que nos garante que se vá acabar com o processo inflacionista. Portanto, se pretendemos atribuir aos autarcas que trabalham a nível de freguesia não propriamente um vencimento nem sequer uma remuneração pelas horas perdidas, mas apenas uma indemnização - e na maior parte dos casos apenas parcial -, entendemos que é necessário indexar também esses subsídios, para que mantenham um mínimo de actualização.
Entendemos que é possível e desejável fazer mais, e muito mais, pelo poder local, e o Partido Socialista está disponível para isso. Hoje, como em 1981, estamos abertos ao aprofundamento e reforço do poder local e a algumas sugestões que então foram avançadas, no sentido de admitir que alguns autarcas que desempenham as suas funções a nível de freguesia possam vir a ser remunerados, quando a complexidade e dimensão dessas freguesias o possam justificar.
No entanto, retomando também algumas ideias e algumas palavras que aqui foram então proferidas, aquando da discussão da Lei n.º 9/81, pela voz do meu camarada Carlos Lage, quereria dizer agora que pretendemos avançar nesse sentido sem saltos no eseuro e nunca perdendo de vista... aliás, para não ser muito infiel, vou citá-lo:

Não queremos, hoje como ontem, dar saltos no escuso nem perder de vista que, no exercício das funções autárquicas, com particular incidência a nível de freguesias, não podemos destruir aquilo que há de essencial no espírito de participação, por exemplo, por convicção cívica nos interesses das colectividades.
Com isto pretendemos dizer que não queremos profissionalizar os autarcas deste país.
No entanto, estamos abertos a discutir, e este projecto não tem outro objectivo que não seja fazer justiça aos humildes homens das juntas e das assembleias de freguesia.

Aplausos do deputado do PS Raul Junqueiro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As juntas de freguesia são as bases da estrutura do poder local. São elas que mantêm o contacto permanente com as populações locais, principalmente com aqueles que não têm voz para chegar ao poder municipal ou regional.
As juntas de freguesia são o sustentáculo que compõe a base da pirâmide do poder local em que assenta a nossa acção democrática tendente a uma maior valorização dos autarcas modestos que se propõem servir em lugares recônditos, sem estruturas humanas e técnicas para levar a cabo as obras que as freguesias reivindicam para a fixação e sobreviência das suas gentes.
Os elementos das juntas de freguesia são, em toda a sua amplitude, homens e mulheres preocupados constantemente com a qualidade de vida dos seus cidadãos.
Ora, apesar da acção meritória dos elementos das juntas de freguesia, que deve ser reconhecida por todos os elementos desta Câmara, constatou-se que a Lei n.º 9/81, de 26 de Junho, não indexou o valor dos abonos aos membros das juntas de freguesia, os quais ficariam estáticos e, consequentemente, sem actualização, o que se poderia considerar uma flagrante injustiça.
Assim, este projecto de lei n.º 141/IV vem reparar essa injustiça e actualiza esses abonos, indexando-os com os aumentos anuais da função pública.
É uma reparação justa e oportuna desta Assembleia da República em relação aos elementos das juntas de freguesia, e daí, pela muita consideração que nos merecem estes autarcas, independentemente do quadro político em que se insiram, vamos votar favoravelmente este projecto de lei.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD considera que o reforço das competências e meios de actuação das freguesias constitui um elemento chave no aprofundamento da democracia local.
A realização dos interesses próprios e específicos das comunidades locais, no quadro mais vasto do município, passa por uma maior participação das freguesias na gestão dos assuntos locais, pela prestação de novos serviços às populações, pelo exercício de novas funções e por uma maior colaboração com os municípios na realização de tarefas da competência destes, nomeadamente em matéria de investimento.
Reunido consenso para um aumento significativo das receitas das freguesias, será necessário reequacionar a breve prazo a reestruturação dos seus quadros de pessoal, adaptando-os às exigências de uma progressiva descentralização. Todavia, todas as propostas que venham a ser apresentadas não podem perder de vista que o elemento decisivo serão sempre os homens e mulheres dispostos ao sacrifício de interesses pessoais para se dedicarem à prossecução dos interesses comuns.
Saudamos esses homens e mulheres, titulares dos órgãos do primeiro escalão do nosso sistema do poder local, que, apesar da ausência de meios ao seu dispor

Página 230

230 I SÉRIE - NÚMERO 9

e lutando por vezes com incompreensões e obstáculos de diversa ordem, têm sabido ser os intérpretes do sentir e vontade das populações e merecem todo o respeito devido aos cidadãos livremente eleitos.
Embora as suas funções tenham um carácter eminentemente cívico e político, é justo que os eleitos locais nas juntas de freguesia sejam compensados pelos encargos decorrentes das suas responsabilidades. Assim o entendeu esta Assembleia ao aprovar na Lei n.º 9/81, de 26 de Junho, uma compensação a abonar aos presidentes, tesoureiros e secretários das juntas de freguesia e senhas de presença para os outros vogais das juntas e membros das assembleias de freguesia.
Contudo, não foram previstos mecanismos de actualização, pelo que os referidos abonos se encontram fortemente degradados, criando-se, assim, relativamente aos titulares dos órgãos do município, uma diferenciação entre eleitos que, enquanto tal, têm a mesma dignidade.
O que agora se propõe é a correcção dessa injustiça, actualizando a base dos abonos na proporção prevista na Lei n.º 9/81 para os titulares dos órgãos do município e criando mecanismos para actualização em anos futuros.
Pelas razões expostas não podíamos deixar de votar favoravelmente estas alterações, embora afirmemos que o reforço do papel das freguesias exige que se equacione a possibilidade de, a médio prazo, os presidentes de algumas juntas de freguesia virem a dedicar-se exclusivamente às suas funções. Importa arredar tentações tecnocráticas para a criação de estruturas de desconcentração de alguns municípios e explorar as potencialidades que as freguesias encerram. Para isso, há que dignificar a função dos eleitos e reduzir as relações de dependência das freguesias em relação aos municípios sem cair em situações que impeçam a necessária coordenação na gestão dos assuntos locais.
O estatuto dos eleitos para as freguesias exige, deste modo, uma posterior consideração mais ponderada.

Aplausos do PRD.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cremos que esta iniciativa legislativa do PSD, visando suprir uma omissão da Lei n. º 9/81, uma lacuna da lei, é um iniciativa naturalmente pacífica e que nem sequer pode pôr em perigo a possível profissionalização dos presidentes de junta de freguesia, porquanto os montantes das compensações mensais são tão modestos - 10 000$, 8000S e 6000$, pois trata-se mais de uma comparticipação para encargos do que de uma remuneração - que estão longe de poder pôr em causa a devoção com que os cargos têm de ser exercidos.
Apresentada de uma forma um tanto sumária, a versão inicial do PSD viria a ser corrigida na Comissão de Administração Interna e Poder Local através de uma versão alternativa, que é a que está hoje, aqui, em apreciação e que, já aperfeiçoada, corresponde e preenche os requisitos legais para aprovação.
Porque se trata do suprimento de uma lacuna existente na Lei n.º 9/81, de um suprimento manifestamente justo e correcto, pela nossa parte, MDP/CDE, votaremos favoravelmente o projecto de lei relativo à actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia, naturalmente na sua última versão, que é aprovada na Comissão de Administração Interna e Poder Local.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República vai hoje deliberar sobre a actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia. Como bem salienta o relatório da Comissão de Administração Interna e Poder Local, a Lei n.º 9/81 não tinha indexado o valor dos abonos aos membros das juntas de freguesia, pelo que estes se encontravam significativamente degradados, sendo necessário proceder à revisão do regime legal e à sua indexação para futuro.
Queremos deixar registado o trabalho positivo desenvolvido na subcomissão que analisou o projecto de lei n.º 141/IV e o facto de se ter chegado a um texto alternativo, que teve apoio unânime de todos os grupos parlamentares.
Votaremos pois favoravelmente na generalidade, na especialidade e em votação final global o texto alternativo aqui presente porque consideramos que a Assembleia da República responde desta forma a uma flagrante injustiça.
Mas era urgente tomar outras medidas de reforço da autonomia das freguesias, e consequentemente do Poder Local. A Assembleia da República deveria igualmente dignificar a acção dos eleitos das freguesias, garantindo-lhes, em certas condições, o exercício do mandato em regime de permanência. Neste sentido, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou já o projecto de lei n.º 184/IV.
A sua aprovação permitirá que os membros das juntas, pelo menos das maiores, tenham mais disponibilidade para a sua actividade junto das populações.
Na verdade, sem a urgente instituição do regime de permanência será cada vez mais difícil aos membros das juntas desempenhar cabalmente as suas funções, acompanhar os trabalhos que se desenvolvam na sua área de actuação, dirigir os trabalhadores da junta, tratar do expediente, articular a actividade da junta com a câmara e a assembleia municipal.
Por que razão um eleito numa freguesia é obrigado a sujeitar-se à boa vontade, amabilidade e compreensão da entidade patronal, ou muitos deles deixarem a sua vida própria, mendigando umas horas do dia em prol da comunidade, quando se trata de um direito que há muito lhes deveria assistir?
Todos os senhores deputados, com certeza, podem avaliar os problemas que terão os membros das juntas de freguesia, como a da Pontinha ou de São Teotónio, que pelo número de habitantes ou pela área territorial são chamados a intervir diariamente num vasto conjunto de questões. Não queremos profissionalizar todos os membros das juntas, mas não podemos continuar a vê-los sem capacidade de resposta para os problemas e sem tempo para os resolver.
A Assembleia da República pode e deve corresponder à dedicação e ao esforço com que os autarcas das juntas têm desempenhado o seu mandato ao longo de vários anos, instituindo urgentemente o regime de permanência.
Mas o estatuto constitucional reconhecido às freguesias e as importantes atribuições e competências que legalmente lhe estão cometidas deviam ter correspondência nos meios financeiros.
A autonomia da autarquia freguesia completa-se com a participação efectiva desta no Fundo de Equilíbrio Financeiro.

Página 231

12 DE NOVEMBRO DE 1986 231

Defendemos, por isso, que a Lei das Finanças Locais consagrasse a atribuição às freguesias de 20% do valor do FEF das despesas correntes de cada município, valor que considerámos adequado para dar resposta ao conjunto de problemas que estas têm.
Por fim, queríamos manifestar a nossa total disponibilidade e empenho para que a Assembleia da República venha a legislar no sentido de reconhecer as funções relevantes que estão atribuídas às freguesias.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vou submeter à votação, na generalidade, o texto alternativo proposto pela Comissão de Administração Interna e Poder Local relativo ao projecto de lei n.º 141/IV (PSD) - actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à discussão e votação, na especialidade, do artigo 1.º do texto alternativo.

Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa.

É o seguinte:

Artigo 1.º

O artigo 13.º da Lei n.º 9/81, de 26 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

Artigo 13.º

(Valor dos abonos)

1 - A partir de 1 de Janeiro de 1987, os presidentes das juntas de freguesia têm direito a uma compensação mensal para encargos correspondente aos valores seguintes, actualizados de acordo com o n.º 3 deste artigo:

a) Freguesias com número de eleitores superior a 20 000 ................ 10 000$00

b) Freguesias com número de eleitores igual ou inferior a 20 000 e superior a 5000..................8 000$00

c) Freguesias com número de eleitores igual ou inferior a 5000........6 000$00

2 - ............

3 - A actualização referida no n.º 1 dos valores dos abonos em 1987 é feita pela aplicação aos respectivos valores da percentagem média de aumento dos vencimentos da função pública nesse ano.
4 - A partir de l de Janeiro de 1988, sempre que se verifique actualização dos vencimentos da função pública, os abonos a que se referem os números anteriores do presente artigo devem ser indexados da percentagem média que venha a incidir sobre os vencimentos da função pública.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora discutir e votar a proposta de eliminação do artigo 2.º do texto alternativo.

Está em discussão.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que está prejudicado o artigo 2.º pela aprovação da proposta de eliminação, vamos discutir e votar o artigo 3.º, que passa assim a artigo 2.º

Está em discussão.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa.

É o seguinte:

Artigo 2.º

A presente lei entra em vigor em 1 de Janeiro de 1987.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global.

Submetida a votação final global, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o projecto de lei n.º 141/IV, relativo à actualização dos abonos aos titulares das juntas de freguesia, pelas razões seguintes: a dinâmica da progressiva descentralização, que se deseja mais ampliada e consequente, obriga a uma crescente disponibilidade de tempo e empenhamento por parte dos titulares das juntas de freguesia.
Entendemos que o não pagamento aos eleitos locais de verbas facultativas que permitam uma razoável capacidade de acompanhamento e de intervenção dará lugar, a breve trecho, à ocupação desses cargos da maior importância para o governo das comunidades pelos detentores de maior capacidade económica, com todos os riscos daí decorrentes, nomeadamente com a impossibilidade de acesso a essas funções por parte de cidadãos com fracos recursos económicos.
Pensamos, ainda, que o passo seguinte será o de criar condições que possibilitem o pagamento a membros de algumas juntas de freguesia de quantitativos que lhe permitam a dedicação exclusiva aos cargos que exercem.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

Página 232

232 I SÉRIE - NÚMERO 9

O Sr. João Amaral (PCP): - Aproveitando a possibilidade de fazer uma declaração de voto, quero dizer que a Assembleia foi confrontada, com a velocidade que o Sr. Presidente imprimiu os trabalhos, com uma votação um pouco insólita, que foi a de votar contra um artigo com o qual não discordava, pois não havia discordância em relação ao artigo 2.º Na verdade, a Comissão eliminou-o do texto alternativo por, entretanto, ter aprovado uma certa disposição de igual ou de idêntico conteúdo na Lei das Finanças Locais.
Fazendo esse registo em nome de toda a Comissão, quero dizer que, de facto, a Comissão não discordava do que ali estava, concordava até com o texto, e só pelo contexto em que foi feita a votação é que se. gerou este equívoco.
Por outro lado, quero dizer que é com satisfação que vemos aprovado este projecto de lei nesta fase e neste momento, pois ele vai permitir que, desde logo, os orçamentos das freguesias para o próximo ano sejam feitos tendo em atenção este valor.
Também é importante registar que a elevação de 5 % para 10% da verba de transferências correntes do Fundo de Equilíbrio Financeiro, que passa a ser a receita das freguesias, permite com alguma folga responder aos novos encargos para as freguesias que decorrem deste normativo.
A nossa satisfação não deixa, no entanto, de ter um certo travo, na medida em que, ainda desta vez, não se aproveitou a oportunidade para aprofundar aquilo que seria justo que se fizesse, que era considerar a possibilidade e a necessidade de, em juntas de freguesia correspondentes a freguesias de maior dimensão, poder haver elementos em regime de permanência.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São os presidentes de juntas de freguesia os primeiros suportes do poder democrático, dos órgãos democráticos do Estado e, apesar disso, muitas vezes não lhes é dada a atenção que merecem pela acção que, dia a dia, fazem junto das populações.
São os presidentes da junta de freguesia os primeiros a sentir as dificuldades das populações, são os primeiros a bater à porta do Poder para verem resolvidas muitas das situações que se lhes deparam. Por isso, aquilo que hoje a Assembleia da República votou não foi mais do que o reconhecer o trabalho, o desapego e o desinteresse com que esses homens anónimos se dedicam a essa acção.
Temos a certeza de que os abonos que hoje aprovámos não são ainda aqueles que os autarcas das juntas de freguesia merecem, mas é, no entanto, um passo significativo para que, amanhã, possamos vir a instituir uma melhoria significativa no dia a dia da sua vida de presidentes de junta de freguesia.
Não só no que respeita a abonos, mas também nas suas competências e nas suas atribuições, reconhecemos que não está tudo feito, mas vamos construindo devagar o poder democrático.
Aos presidentes de juntas de freguesia, hoje, atribui-mos esta melhoria nas subvenções, estes abonos, porque não tinha ficado consignada em lei a sua progressiva automatização. E por isso a Assembleia da República cumpriu justamente o dever para com os autarcas, para com os presidentes das juntas de freguesia, para com as juntas de freguesia em geral.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE votou favoravelmente este projecto de lei porque ele corresponde a um acto de justiça que visa suprir uma omissão do diploma que anteriormente regulava esta matéria.
Mesmo sem considerarmos que efectivamente os presidentes de junta são a base do poder local democrático - porque essa base é composta por órgãos colegiais e não por pessoas individualmente consideradas -, é verdade que os presidentes de junta têm um papel especial dentro do respectivo órgão colegial que é a junta de freguesia, um papel mais importante e mais trabalhoso, pelo que era justo atribuir-lhe este subsídio.
De resto, o poder local democrático, nascido do 25 de Abril, tem evoluído desde uma situação de grande sacrifício, que começou com as primitivas comissões administrativas, até ao actual poder local, ao qual se vão criando outras condições de existência. Este é um passo positivo nesse sentido e por isso o MDP/CDE votou favoravelmente este diploma.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente este projecto de lei porque entende que os membros das juntas de freguesia são, na realidade, uns modestos servidores da causa pública, bem como a base da pirâmide democrática do poder local. Eles são os homens que estão permanentemente em serviço, pelo que até deveriam ter direito a um tempo de dedicação exclusiva, tal as solicitações que têm durante toda a sua acção como autarcas.
Todos os problemas das respectivas freguesias passam pelos presidentes de junta e eles são os mensageiros dos problemas das suas terras, não só junto das câmaras municipais, como até dos governadores civis e dos governantes.
Por tudo isto e porque entendemos que os seus vencimentos - que não são vencimentos, mas meros subsídios - deviam ser actualizados a fim de corrigir uma lei que não tinha previsto a sua actualização, votámos favoravelmente este projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Lopes.

O Sr. Ferroando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS também votou favoravelmente este projecto de lei que actualiza os subsídios atribuídos aos eleitos a nível de junta de freguesia.
Não quero cair no elogio fácil, porque poderá parecer que estamos todos aqui apenas para elogiar, mas desta vez estamos de acordo em que os eleitos que exercem as suas funções nas juntas de freguesia são aqueles que merecem em primeiro lugar o nosso respeito.
Contudo, queria também deixar aqui muito claro que esta remuneração não é, de forma nenhuma, um pagamento pela sua actividade. Isto porque, infelizmente, a opinião pública conhece mal os autarcas que desempenham as suas funções nas freguesias - normalmente quem tem acesso à opinião pública são os autarcas municipais.

Página 233

12 BE NOVEMBRO DE 1986 233

Assim, queria desmistificar esta situação: estamos a aumentar o subsídio atribuído aos presidentes de junta, na sua esmagadora maioria, de 3000$ para 6000$. A importância é tão ridícula que é importante que se diga e que fique registado que ela não pode ser considerada como o pagamento do seu trabalho - porque esse corresponde à consciência que eles têm de cumprir o dever de ser úteis à sua terra -, mas apenas uma indemnização, e na maior parte dos casos parcial, das despesas que eles fazem para desempenhar as suas funções.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim deste ponto da ordem de trabalhos. Segue-se a apreciação dos projectos de lei n.ºs 172/IV, do PCP, sobre o subsídio de dedicação exclusiva dos docentes do ensino superior e dos investigadores, e 177/IV, do PRD, sobre a alteração das disposições relativas ao regime de dedicação exclusiva na carreira docente universitária.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Osório.

O Sr. António Osório (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A revalorização material da carreira docente universitária e a fixação dos universitários à escola e ao trabalho de docência e investigação universitárias são dois dos mais importantes objectivos a que o Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado, após ratificação pela Assembleia da República, em Julho de 1980, se propunha dar resposta.
A pertinência de tais objectivos, que ainda hoje se consideram fundamentais, está intimamente ligada à defesa da qualidade do ensino nas nossas universidades. Uma tabela de vencimentos inadaptada à importância das funções desempenhadas tende a afastar do ensino muitos dos seus possíveis docentes. No sentido de colmatar esta falha grave do sistema de remunerações dos docentes do ensino universitário foi criado o subsídio de dedicação exclusiva, que, não sendo a solução ideal para o problema, surgiu na altura como a solução possível.
Embora esta solução tenha sido comummmente aceite, os valores que lhe foram atribuídos eram de tal forma exíguos que tornavam o objectivo que se tinha em vista de difícil concretização. Isso mesmo o reconheceu o actual Ministro da Educação e Cultura quando, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 243/85, dizia que tal situação sempre ocorreria «em consequência da relativa inadaptação das remunerações estabelecidas para o regime de dedicação plena e pelo seu progressivo desajustamento face a outras carreiras e actividades».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Que o problema existe, é grave e carece de rápida resolução é opinião de todos, Governo incluído. Que a solução avançada no Decreto-Lei n.º 243/85 não resolve o problema, antes pelo contrário, veio introduzir graves discriminações, disso ninguém duvida, excepção feita ao Governo.
Este diploma não só altera princípios e subverte o espírito do Estatuto da Carreira Docente Universitária, como também cria uma situação de desigualdade, até aí inexistente, para quantos optaram pela carreira de investigação científica. Em Março do corrente ano, em intervenção que produzimos no Plenário, no período de antes da ordem do dia, alertámos para a situação criada por esta medida do Governo. Aos motivos que então nos levaram a formar tal opinião, e que aqui sumariamente recordamos, acresce, hoje, uma outra razão de peso, ou seja, a aprovação pela Assembleia da República da Lei de Bases do Sistema Educativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei de Bases do Sistema Educativo obriga, entre outras coisas, a que sejam revistas as carreiras de pessoal docente, por força do seu artigo 59.º O facto de tal ter sido feito para os docentes do ensino não superior, após porfiada e decidida luta dos professores desses graus de ensino, traz para a ordem do dia a necessidade de rever também as carreiras docentes do ensino superior. Os projectos de lei que estamos a discutir são um primeiro contributo para dar resposta a esta necessidade. Não sendo projectos perfeitos são, contudo, uma boa base de trabalho, para que durante a discussão na especialidade, que se seguirá, possa ser aperfeiçoada no sentido de dar resposta às justas aspirações dos docentes envolvidos.
No que concerne aos docentes universitários os dois projectos de lei apontam para metas sensivelmente idênticas, embora por formas diversas. A diferença entre eles reside no facto de o projecto de lei do PRD se quedar por aí, ao passo que o projecto de lei do PCP vai mais longe ao apontar medidas que visam também a carreira dos investigadores.
O paralelismo entre a carreira docente universitária e a carreira dos investigadores remonta a 1980 e sempre se entendeu isso como positivo. Foi por isso que causou grande surpresa e profunda indignação o facto de o Governo, através do Decreto-Lei n.º 243/85, ter alterado a carreira docente universitária sem ter promovido qualquer alteração na carreira dos investigadores.
Qualquer medida que quebre a tradicional regra do paralelismo entre estas duas carreiras, além de uma injustiça flagrante, pode ser fatal para qualquer delas, já que pode conduzir a que, à partida, se opte pela mais beneficiada, esvaziando assim a outra dos quadros necessários ao seu desenvolvimento, o que, a manter-se a situação actual, perspectivaria um futuro sombrio para a investigação em Portugal.
Convém ainda salientar que a situação de desigualdade que referimos não é única, já que, com as devidas diferenças, há outras situações de discriminação que é urgente remediar. Uma respeita aos professores do ensino superior politécnico que, tendo o seu regime de «dedicação exclusiva» definido pelo Decreto-Lei n.º 185/81, foram também esquecidos nas alterações que, em 1985, foram introduzidas pelo diploma governamental. A outra envolve os docentes das escolas superiores não integradas. Nestas a discriminação não é de hoje, vem desde o princípio e manteve-se incólume às várias alterações que se foram introduzindo nos estatutos das carreiras docentes do ensino superior.
Qualquer um destes dois casos requer urgente solução, sob pena de por via da discriminação existente entre carreiras docentes estarmos a contribuir para um ensino superior de primeira e de segunda, em que «uns são filhos e outros enteados». São aspectos que a discussão na especialidade não poderá deixar de considerar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém poderá contestar a importância que as carreiras docentes do ensino superior e a carreira de investigação assumem para o desenvolvimento cultural e sócio-económico do País.

Página 234

234 I SÉRIE - NÚMERO 9

Esta constatação traz-nos, a todos, novas responsabilidades. Se estamos empenhados no desenvolvimento do País temos que ter consciência de que tudo o que se vier a investir no ensino e na investigação terá, por certo, importância decisiva na construção de um futuro mais democrático e mais independente. Aliás esse é o sentido da filosofia da Lei de Bases do Sistema Educativo, que no seu artigo 42.º considera que na elaboração do Plano e do Orçamento do Estado a educação será considerada como uma das prioridades nacionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Peritos da OCDE que estudaram o nosso sistema científico e tecnológico, em trabalho que sobre a matéria publicaram em 1984, apresentaram as baixas remunerações que aí se praticam, como uma das principais causas do seu estado de desenvolvimento. Se queremos ter os nossos melhores quadros a trabalhar na formação de técnicos superiores, tão necessários ao País, ou no trabalho de investigação, temos que lhes oferecer remunerações compatíveis com a importância dessas tarefas.
Como é possível atrair para estas actividades, de interesse público fundamental, os jovens quadros que encontram no sector privado remunerações muito superiores àquelas que o Estado lhes proporciona?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos neste momento uma óptima oportunidade de mudar o rumo das coisas neste sector. Os projectos de lei aqui em discussão são contributos positivos nesse sentido e por isso votaremos favoravelmente os dois. Esperamos que na discussão na especialidade os outros partidos apresentem os seus contributos para que eles possam ser melhorados. A dignificação do ensino superior e da investigação científica em Portugal assim o exigem.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do deputado Raúl Junqueiro, do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado que acabou de usar da palavra referiu aqui a Lei de Bases do Sistema Educativo português e chamou a atenção para o seu artigo 59.º, no qual a Assembleia da República devolveu ao Governo a competência para, no prazo de um ano, sob a forma de decreto-lei, legislar sobre as carreiras de pessoal docente e outros profissionais de educação, e também para a necessidade que existe de cuidadosamente tratar desse problema.
Gostaria de perguntar ao PCP, que tomou - e bem - parte activa na elaboração desta lei, por que é que não espera que o Governo use da competência que o próprio PCP acordou em dar-lhe e, antes da publicação de um decreto-lei regulamentador, vem pressurosamente regulamentar esta matéria por via da Assembleia da República.
Não é que eu seja um dos protectores da competência do Governo ou que não queira que a Assembleia da República se debruce sobre este problema importantíssimo, grave e inadiável, do Estatuto da Carreira Docente; não é que o CDS não esteja interessado em ver todo o quadro em que actualmente se desenvolve a docência e a investigação na universidade ser revisto o mais cedo possível; não é que o CDS vá regatear qualquer voto para que o estado actual em que a universidade e a investigação científica trabalham em Portugal seja rapidamente melhorado. Contudo (e isto também é dirigido ao PRD), tendo-se feito uma Lei de Bases do Sistema Educativo em que se distribuiu a competência entre a Assembleia da República e o Governo - e foi o próprio Parlamento que deu um determinado prazo e instituiu uma forma de intervenção para que o Governo tentasse, com os meios que tem ao seu alcance, regulamentar, através de decreto-lei (e desculpem-me esta expressão legislativa, profissional e cientificamente má), a Lei de Bases do Sistema Educativo - não compreendo que agora a Assembleia se venha sobrepor ao Governo num dos aspectos essenciais da Lei de Bases.
Isto é, por que é que neste momento se está a infringir o artigo 59.º da Lei de Bases do Sistema Educativo?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Osório.

O Sr. António Osório (PCP): - Sr. Deputado Narana Coissoró, queria chamar-lhe a atenção para dois factos, sendo o primeiro de ordem cronológica.
Quer o projecto de lei n.º 172/IV, do PCP, quer o projecto de lei n.º 177/IV, do PRD, foram apresentados a esta Câmara em Abril, muito antes da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo. E se nessa altura os apresentámos com o objectivo concreto de resolver, assim e desde logo, este problema para todos os professores do ensino superior, universitários e outros e também para os investigadores, era porque se tratava de um problema candente, que ainda hoje se mantém e com mais acuidade porque, entretanto, já passou um ano sobre a situação criada através da publicação do Decreto-Lei n.º 243/85 e, portanto, ainda mais urgente se torna discuti-la.
Por outro lado, em relação ao referido artigo 59.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, queria chamar a atenção do Sr. Deputado Narana Coissoró para o n.º 2 onde se refere que muitas das matérias terão de ser tratadas não por decreto-lei mas por propostas de lei apresentadas a esta Assembleia, desde que tenham constado de leis aprovadas na Assembleia da República, o que, aliás, se passa neste caso, pois consta de uma lei aprovada nesta Câmara em 1980.
Portanto, na nossa opinião, esta matéria já devia ter sido aprovada há mais tempo e o adiar da situação até à publicação ou apresentação de uma nova proposta por parte do Governo significaria o adiamento do problema por mais um ano. Ora, na nossa opinião, isto iria agravar ainda mais a situação, designadamente o fosso que hoje existe entre as carreiras docentes do ensino superior e universitário e as carreiras dos outros graus de ensino. Cada minuto que passa no sentido de se adiar a resolução deste problema é um minuto de grave perda para o futuro do ensino superior no nosso país e, de uma forma geral e por via de tal, para o futuro do próprio País.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faz favor.

Página 235

12 DE NOVEMBRO DE 1986 235

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado António Osório, pedi para o interromper porque não posso invocar nenhuma outra figura regimental para lhe responder.
Simplesmente, tenho a impressão de que V. Ex.ª faz uma leitura errada do n. º 2 do artigo 59.º, pois penso que ele reforça a minha ideia quando diz que é o Governo que deve apresentar propostas de lei e que não é a Assembleia que deve apresentar projectos de lei para regular a matéria. Deste modo, o n.º 2 é contra a sua argumentação.
Além disso, V. Ex.ª vem-me dizer que o seu grupo parlamentar apresentou este projecto de lei antes da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo. V. Ex.ª devia tomar em consideração a modificação das circunstâncias que se verificou entretanto. Isto é, o seu grupo parlamentar apresentou um projecto de lei antes da apresentação da Lei de Bases, ora, com a aprovação desta última, VV. Ex.ªs deviam retirar este projecto de lei porque votaram entusiasticamente uma lei pela qual se devolveu ao Governo a competência para a regulamentação desta matéria. V. Ex.ª não pode, agora, manter as duas coisas ao mesmo tempo!

O Orador: - Sr. Deputado Narana Coissoró, queria só esclarecê-lo de que a Assembleia da República não devolveu essas competências para o Governo. A Assembleia da República permite ao Governo que apresente, no prazo de um ano, sob a forma de decreto-lei, a legislação sobre esta matéria, o que não a inibe de tomar iniciativas próprias sobre a mesma. E esta situação verifica-se também com outras matérias e prosseguirá, certamente, para bem do ensino em Portugal.
A questão muito concreta - e permitir-me-ia «devolver a bola» ao Sr. Deputado Narana Coissoró - é a de saber se o CDS pensa ou não que esta situação é de grave injustiça e que urge resolvê-la rapidamente. Se assim é, por que razão não há-de a Assembleia aproveitar esta oportunidade para tomar as medidas necessárias para resolver a situação?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ciência, a tecnologia, a cultura constituem nossa preocupação cimeira e permanente, por serem componentes essenciais, factores insubstituíveis, entendidos como expressão de modernidade, para a dignidade e para o progresso do povo português. A sua concretização, a nível do Estado, tem por agentes primeiros os docentes universitários e os investigadores que, imersos numa sociedade mutável e contraditória, sofrem o impacte das suas solicitações e apelos e vêm sentindo a degradação da sua condição e imagem.
É elemento chave na arquitectura das suas carreiras, componente fundamental sem o que tudo o mais não passará de vã retórica, gongorismo inconsequente, o valor e escalonamento das suas retribuições. Importa, pois, não descurar a sua correcta e justa adequação às alterações rápidas que vão ocorrendo, pois a desregulação e anomalias prolongadas afectarão seriamente a modernização e a recta evolução que os Portugueses desejam e a que têm iniludivelmente direito.
Os dois projectos de lei, hoje e aqui, em debate inserem-se nesta linha de pensamento e intervenção, e são por nós considerados como constituintes básicos de toda uma política de ciência e cultura, que não se quede por declarações platónicas, melhor ou pior intencionadas. Pretendemos reforçar os vectores propiciadores do nosso desenvolvimento no que tem de intrínseco e endógeno, fruto do nosso esforço e da nossa inteligência, tendo em mira as modificações estruturais indispensáveis a um progresso continuado e ininterrupto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A circunstância de ser um dos proponentes do projecto de lei n.º 177/IV, impõe-me a obrigação de, perante a Câmara, intentar produzir a sua justificação. O Decreto-Lei n.º 243/85, de 11 de Julho, constitui a mais recente tentativa para tornar a carreira universitária mais aliciante, aumentando os subsídios de exclusividade e de formação, fixados na Lei n.º 19/80, de 16 de Julho. Desde logo, não deu resposta satisfatória aos anseios dos universitários que, em virtude da sua grande autonomia funcional e hierárquica, consagrada por séculos de exercício, pensavam e continuam a pensar que, a exemplo do que acontece com outras carreiras de tradição e estatuto similares, deverão fugir ao espartilho anacrónico e naufragado do esquema das letras, sobrevivência necrológica da Administração Pública portuguesa. A erupção súbita e prodigiosa de universidades privadas veio agudizar toda esta questão, pela concorrência ad libitum a que as universidades públicas ficaram sujeitas. Se o Governo entendeu por bem, dentro da filosofia que o informa, enveredar por este caminho, compete ao Estado, jogando capazmente as regras deste jogo, defender o bem público, procurando acautelar as suas universidades e os nobres ideais por elas perseguidos através da criação de condições que levem à dedicação plena dos seus professores, numa disponibilidade total para leccionar, investigar, exercer a livre crítica, fazer escola e discípulos.
O aumento agora proposto fica muitíssimo aquém dos estimados 2000 contos, que, numa pura lógica de mercado, resultariam da extrapolação à luz da teoria marginalista do valor da centena e meia de contos correspondentes à repetição da matéria de uma disciplina numa universidade privada.
Por aqui se vê como se encontra aviltado o estatuto dos universitários! Não acudir a tempo, como pretendemos, a este descalabro é grave omissão reveladora de incúria e, mesmo, cumplicidade.
O recrutamento tornou-se mais difícil, a dedicação exclusiva tende a regredir face às sereias de um liberalismo serôdio, desordenado e amoral. A própria Administração Pública, fruto das confederações de ministérios que são os governos neste nosso Portugal, tem exercido uma acção manifestamente deletéria e anti-social, no encaminhamento dos nossos valores. No momento da integração europeia há que inverter este movimento, ir corrigindo, que é a forma democrática de ter esperança, dando particular atenção à criação de um corpo docente universitário competente, integralmente votado à docência de graduação e pós-graduação, à investigação e à reflexão crítica e criadora, sem o que, por muito que melhoremos a balança de pagamentos, permaneceremos, para a eternidade, na categoria de país em vias de desenvolvimento.

Página 236

236 I SÉRIE - NÚMERO 9

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Inovação de realçar, salto qualitativo assinalável, há muito exigido pela instituição universitária, é o de considerar o professor na sua plenitude essencial, no respeito pela sua unidade substancial. Isto é, o professor universitário ensina e investiga numa síntese indissociável que é já, entre nós, conquista adquirida e aceite por todos os universitários dignos deste nome. Daí que à condição de professor e à de assistente corresponda uma remuneração global, não desagregada, interrompendo-se, assim, finalmente, o recurso ao artifício vexatório do subsídio. Tem o Estado a obrigação de incentivar os dois princípios mestres da comunidade universitária: a sua fidelidade aos padrões internacionais do saber e o seu respeito à capacidade intelectual, acima de qualquer outra consideração.
Este entendimento da missão do professor universitário não é partilhado, quer pelo projecto de lei n.º 172/IV, quer pelas alterações propostas pelo Partido Socialista, que vão, quanto a nós, ao arrepio da modernidade e da prática das mais prestigiadas universidades.
As remunerações ao longo da carreira são referidas ao vencimento fixado para o lugar de partida, o de assistente estagiário, o qual será anualmente actualizado. O seu escalonamento pretende traduzir as dificuldades e exigências do acesso aos diferentes lugares, constituir um estímulo na progressão da carreira académica e reflectir as correspondentes obrigações e responsabilidades. Complementarmente é de esperar o aumento da mobilidade dos professores universitários, factor positivo de renovação e criatividade, que, no caso português, terá ainda reflexos favoráveis na atracção e fixação de docentes nas novas universidades públicas, sobretudo nas do interior, que lutam com sérias dificuldades no preenchimento dos seus quadros.
Uma palavra, natural e necessária, de referência para os restantes professores do ensino superior: os do ensino politécnico e os ainda abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 137/70.
Para os primeiros apresentamos uma proposta de revisão atinente à exclusividade, atentando ao seu posicionamento na estrutura do sistema nacional de educação. Quanto aos segundos levantaram-se-nos dificuldades inibitórias à sua consideração, derivadas sobretudo da não integração das suas carreiras nos dois ensinos superiores presentemente consagrados. Urge encontrar, com brevidade, solução para esta indefinição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao projecto de lei n.º 172/IV, do Partido Comunista Português, reiteramos-lhe o nosso apoio, no respeitante ao seu artigo 2.º, que trata da dedicação exclusiva na carreira de investigação científica. Os institutos e laboratórios do Estado desempenham uma missão fundamental, imprescindível à transformação do País, através da criação e utilização mais eficaz das descobertas cientificas, inventos e aplicações tecnológicas. Para isso, há que dotar estas instituições com boas equipas de pesquisa, providenciando pelo seu recrutamento, formação e continuidade de permanência. Só com uma apropriada e justa remuneração, adequada às exigências de uma carreira árdua, absorvente, requerendo grande dedicação e autodisciplina será possível consolidar um corpo d.e investigadores, com o número e a qualidade que as tarefas de modernização nacional demandam. Existem já em Portugal condições que permitem delinear estratégias de desenvolvimento assentes nos nossos próprios
recursos. Dispomos de pessoal altamente qualificado com capacidade e entusiasmo para se dedicar devidamente aos trabalhos de investigação e de criação cultural que o dealbar da apelidada III Revolução Industrial reclama. Não podem consequentemente os poderes públicos descurar o acompanhamento do estatuto profissional dos investigadores, tendente a propiciar o avanço do povo português para níveis progressivamente mais elevados de desenvolvimento científico, técnico e cultural.
O investimento no homem, o investimento em saberes, fundamentais e aplicados, conduziu neste século a resultados espantosos, nunca antes registados.
O novo conhecimento é o facto determinante do desenvolvimento social e económico.
A fuga de cérebros das carreiras universitárias e de investigação, quer para o estrangeiro, quer para os sectores público e privado nacionais, requer a adopção de uma verdadeira política de Estado, norteadora do nosso futuro colectivo que se deseja digno e próspero. Os dois projectos de lei em apreço na Assembleia da República dão, quanto a nós, contribuição válida para este propósito eminentemente patriótico.

Aplausos do PRD, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado que atingimos a hora regimental de encerramento dos nossos trabalhos, vamos terminar a sessão de hoje.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sá Furtado fica inscrito o Sr. Deputado Narana Coissoró, e o Sr. Deputado Raúl Junqueiro fica inscrito para fazer uma intervenção.
Srs. Deputados, a próxima sessão plenária terá lugar na próxima quinta-feira, pelas 15 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: continuação do debate sobre os projectos de lei n.ºs 172/IV (PCP) e 177/IV (PRD), cuja votação fica fixada para as 18 horas; debate do projecto de lei n.º 162/IV (CDS) sobre direito de associação dos menores de 18 anos e debate da proposta de lei n.º 36/IV, que aprova a Lei do Emparcelamento Rural.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Arménio dos Santos.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Dinah Serrão Alhandra.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
João Álvaro Poças Santos.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Assunção Marques.
José Júlio Vieira Mesquita.
José de Vargas Bulcão.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.

Página 237

12 DE NOVEMBRO DE 1986 237

Partido Socialista (PS):

Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Domingues Azevedo.
António José Sanches Esteves.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Torres Couto.
Leonel de Sousa Fadigas.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Carlos Alberto Rodrigues Matias.

Partido Comunista Português (PCP):

António Manuel da Silva Osório.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
João Gomes de Abreu Lima.
Manuel Fernando Silva Monteiro.
Narana Sinai Coissoró.

Deputados independentes:

Rui Manuel Oliveira Costa.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Domingos Duarte Lima.
Fernando José Alves Figueiredo.
José Ângelo Ferreira Correia.
Licinio Moreira da Silva.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Mário Jorge Belo Maciel.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
João Cardona Gomes Cravinho.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Eduardo de Sousa Pereira.
Eurico Lemos Pires.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Rodrigues Vitoriano.
Octávio Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

João da Silva Mendes Morgado.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho.

Declaração de voto enviada para publicação sobre a votação do projecto de lei n.º 140/IV

Achamos que o País tem «Jogo» a mais.
Jogos de fortuna e azar. Temos seis zonas de jogo a funcionar, uma das quais, no Algarve, com três casinos. Mais duas, Pedras Salgadas e Tróia, a abrirem a curto prazo. Temos 41 salas de bingo em funcionamento. Mais meia dúzia autorizadas a abrir. Temos o Totobola, o Totoloto e a Lotaria como outra gama de opções criadas pelos que apostaram em transformar o jogo de azar como via para o País e os seus cidadãos saírem da crise. Contudo, o projecto hoje votado não se ocupa do jogo de fortuna ou azar, mas sim do licenciamento de jogos de perícia e outras diversões públicas que com os jogos de fortuna ou azar mantêm sempre estreita conexão.
O projecto prefigura mais um remendo aos preceitos legais, dispersos, avulsos, passajados, cozidos no desfiado e por vezes inconsistente, para não dizer inconsciente, tecido de despachos e decretos sobre estas matérias, publicados, derrogados e vigentes na última década.
São por demais conhecidas as reclamações que tem suscitado a concessão de autorização para a prática de jogos de perícia, que muitas vezes dão prémios em dinheiro, e o licenciamento de máquinas ou outras diversões, tais como discotecas, bares e congéneres que a legislação até aqui vigente tem permitido.
Crianças faltam à escola por causa das máquinas instaladas nas cercanias destas.
Adolescentes ensaiam nos jogos de diversão e em certas diversões hábitos para mais largos voos.

Página 238

238 I SÉRIE - NÚMERO 9

O projecto que acaba de ser votado é, em nosso entender, porém, restritivo em relação à proliferação de máquinas e outras diversões que possam pôr em perigo os valores comunitários e o interesse público ao tornar obrigatório e vinculativo o parecer prévio das câmaras municipais.
Com efeito, nenhuma entidade melhor que as câmaras conhece os problemas dos seus munícipes.
Os municípios são instituições democráticas que tem de ter sempre em conta os interesses do povo em que repousa o poder. E o povo pode não querer, não quer certamente, máquinas de diversão, boites, jogos de perícia concedidos a esmo.
Quem melhor do que uma câmara pode coadjuvar as autoridades policiais e a própria Inspecção-Geral de Jogos a controlar e fiscalizar os desvios que na sua área de jurisdição se podem verificar face a autorizações concedidas para pratica de jogos de diversão ou diversões?
Ninguém a qualquer nível de responsabilidade se afoitou à iniciativa de uma lei completa, equilibrada e justa sobre esta matéria.
O projecto agora votado, pontual, não sistematizado, reforça o poder local. É eivado de espírito descentralizador, o bastante para o votarmos favoravelmente na generalidade.

Lisboa, 11 de Novembro de 1986. - O Deputado do PRD, Carlos Matias.

Os REDACTORES, Maria Amélia Martins - José Diogo.

PREÇO DESTE NÚMERO 126$00

Depósito legal n.º 8818/85 IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×