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I Série - Número Terça-feira, 23 de Dezembro de 1986
DIÁRIO da Assembleia da República
PORTE PAGO
IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE DEZEMBRO DE 1988
Presidente: Exmo. Sr. Carlos Cardoso Lage
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Mala Nunes de Almeida
SUMÁRI0. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 327/IV (PSD).
Na sequência de uma interpelação à Mesa feita pelo CDS na sessão anterior, a propósito da transferencia dos reféns portugueses da RENAMO para o Maputo, o Sr. Presidente transmitiu os esclarecimentos prestados pelo Governo, após o que produziram declaração os Srs. Deputados José Cama (CDS), José Seabra (PRD), António Capucho (PSD), Carlos Brito (PCP) e Lopes Cardoso (PS).
Ordem do dia. - Foi aprovado o n.º 16 do Diário.
Na sequência dos pedidos de ratificação n.ºs 106/IV (PCP), 112/IV (PRD) e 115/IV (PS), foi rejeitado um projecto de resolução, apresentado pelo PCP, de recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, que transforma em sociedade anónima de responsabilidade limitada de capitais exclusivamente públicos a União de Bancos Portugueses, E. P., passando a denominar-se União de Bancos Portugueses, S. A. R. L., e aprovado um requerimento, apresentado pelo PRD, que suspende parcialmente a vigência do referido decreto-lei. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Carvalho Fernandes), os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Raúl Castro (MDP/CDE), Comes de Pinho (CDS), Victor Ávila (PRD), João Cravinho (PS), Borges de Carvalho (Indep.) e Rui Macheie (PSD). Foi ainda aprovado um requerimento de baixa à Comissão para apreciação das propostas de alteração ao decreto-lei por um período de 45 dias.
A Assembleia rejeitou vários requerimentos do PSD e do CDS para avocação a Plenário do debate, na especialidade, de diversos artigos do texto elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a Lei do Licenciamento de Estações Emissoras da Radiodifusão, após o que este foi aprovado em votação final global. Produziram declaração de voto os Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP), Adriano Moreira (CDS), Vieira Pinto (PSD) e Magalhães Mota (PRD).
O Orçamento da Assembleia da República para 1987 foi aprovado na especialidade e em votação final global.
Foi discutida e aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global a proposta de lei n. º 48/IV, que autoriza o Governo a celebrar um acordo com a República Federal da Alemanha até ao montante de 60 milhões de marcos. Intervieram, a diverso título. Incluindo declarações de voto, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Carvalho Fernandes), os Srs. Deputados Ivo Pinho (PRD), Ilda Figueiredo (PCP), João Cravinho (PS), António Capucho (PSD), Nogueira de Brito (CDS), José Magalhães (PCP) e Rui Macheie (PSD):
A proposta de lei n. º 49/IV, que autoriza o Governo, através do Ministro das Finanças, a elevar o limite global de 15 para 27 milhões de contos, destinado a empréstimos internos de prazo superior a um ano, a conceder ao conjunto das regiões autónomas, foi discutida e aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global. Além do Sr. Secretaría de Estado do Tesouro (Carvalho Fernandes), Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Ivo Pinho (PRD), Helena Torres Marques (PS), Octávio Teixeira (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Rui Macheie e Cecília Catarino (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 10 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos. Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Gaspar Rodrigues.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
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Arménio dos Santos.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe de Athayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Hermínio da Palma Inácio.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva de Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur T. Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Eurico Lemos Pires.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
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Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernando de Morais e Castro.
Deputados independentes:
Maria Amélia do C. Mota Santos.
Rui Manuel Oliveira Costa.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar um diploma apresentado na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na última sessão deu entrada na Mesa o seguinte diploma: projecto de lei n. º 327/IV, da iniciativa do Sr. Deputado João Matos e outros do PSD, que propõe a criação da freguesia de Pêro Pinheiro, concelho de Sintra, que foi admitido e baixa à 10.º Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a sessão de hoje não continha período de antes da ordem do dia. Contudo, na conferência de líderes, que reuniu na sexta-feira já depois de terminada a sessão, com a presença de um representante do Governo, foi decidido fazer hoje um curto período de antes da ordem do dia em consequência da interpelação à Mesa feita pelo CDS no final da sessão de sexta-feira sobre o problema dos reféns da RENAMO que foram transportados para o Maputo.
Como todos se lembram, o CDS solicitou esclarecimentos ao Governo através da Mesa desta forma um tanto heterodoxa, que está a ser frequentemente utilizada pelo que a Mesa fez diligências junto do Governo para que nos fossem proporcionados esses esclarecimentos, caso o Governo o quisesse fazer.
Já tinha terminado a sessão quando o Sr. Secretário de Estado nos comunicou que tinha algumas informações a dar à Assembleia. Na sequência da sugestão dada pelo Sr. Deputado Carlos Brito e também devido à solicitação do CDS, procedi então à marcação da conferência de líderes, onde o Sr. Secretário de Estado nos deu alguns esclarecimentos, que fiquei de transmitir de forma sintética à Assembleia da República.
Nessa altura fomos informados de que o Governo, através do Encarregado de Negócios no Malawi, preparou as condições para os reféns da RENAMO regressarem directamente a Portugal, tão depressa quanto fossem libertados.
Mais informou o Sr. Secretário de Estado de que quando o Governo tomou conhecimento de que as autoridades do Malawi enviaram compulsivamente os refugiados para o Maputo protestou junto do Governo do Malawi e, através do Embaixador de Portugal no Maputo, desencadeou as diligências necessárias para assegurar o regresso daqueles portugueses que o quisessem fazer.
Esta foi, sinteticamente, a informação que nos deu o Sr. Secretário de Estado, e na sequência dessa informação ficou decidido que hoje haveria um curto período de antes da ordem do dia em que cada grupo parlamentar disporia apenas de três minutos para expor o seu ponto de vista numa curta intervenção, não havendo protestos, pedidos de esclarecimento ou outras formas de prolongarem este curto período de antes da ordem do dia.
Creio que este entendimento é aceite por todos os grupos parlamentares. Assim, na sequência desta explicação e do resumo das informações que o Governo nos proporcionou, dou a palavra aos representantes dos grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.
O Sr. José Gama (CDS): - Vindos do esquecimento, da angústia, do sofrimento, 53 portugueses, homens, mulheres e crianças, preparavam-se para escalar o muro da liberdade em vésperas de Natal.
Vinham das privações, da floresta, onde na guerra civil se começa, de forma implacável, a morrer devagar.
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Vinham do esquecimento deste Governo e dos governos que o antecederam. Esquecimento que os curtos comunicados oficiais não conseguem ludibriar. Sem capacidade de iniciativa, de imaginação, reverentes, hirtos, calculistas, os governantes continuam impotentes face à odisseia de portugueses que morrem, de portugueses que desaparecem, de portugueses cativos.
Quem matou o padre Sílvio Moreira - quem foi? O Governo, este, ainda não nos deu resposta.
Quem sabe do paradeiro de muitos portugueses desaparecidos cujo nome o Governo conhece - quem sabe?
Qual foi a reacção oficial do Governo face às torturas violentas a que foram sujeitos quatro caçadores-guias da Tanzânia? Quem sabe?
Que faz o Governo para que a RENAMO acabe de vez com o cativeiro de portugueses inocentes?
Às vezes o Governo ralha. Protesta vigorosamente, como se diz em linguagem oficial. Temo-nos ficado nisto: nos protestos! Como são diferentes as reacções em outros países! A Suécia decidiu cortar toda a ajuda económica a Moçambique se dois cidadãos seus, presos sem culpa formada, não fossem imediatamente libertados. Em Portugal estamos na era heróica do protesto. Protestou-se ontem, protesta-se hoje, irá protestar-se amanhã. E com isto vai o Governo fazendo o seu número.
A comunidade internacional corou de vergonha, a Cruz Vermelha arrepiou-se, o nosso Governo, este, protestou face ao gesto vil do Governo Moçambicano que sujeitou a um segundo rapto portugueses inocentes, doentes, muitos, angustiados todos.
O Governo Moçambicano, o Malawi e a RENAMO têm que saber que os portugueses não são coisas, objectos, moeda de troca, produto de contrabando ou archotes de publicidade.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - E tudo isto porque são homens, seres livres. E tudo isto em nome da dignidade, da liberdade, dos Direitos do Homem, que jamais poderão ser letra morta, particularmente nesta época de Natal!
Aplausos do CDS e do deputado Domingues de Azevedo (PS).
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Seabra.
O Sr. José Seabra (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD não pode deixar de tomar posição perante os acontecimentos que envolveram reféns portugueses em resultado de acções violentas levadas a cabo pela RENAMO, em Moçambique. O PRD manifesta aqui a sua preocupação pela insegurança e risco de integridade em que incorreram cooperantes portugueses.
O PRD insurge-se, uma vez mais, contra a prática de actos de terrorismo que estiveram na origem do aprisionamento de cidadãos portugueses.
O PRD, como partido responsável, considera imprescindível a manutenção de relações amistosas com todos os estados, em particular com aqueles a quem nos unem laços histórico-culturais profundos.
O PRD manifesta a sua repulsa pelo rapto e maus tratos praticados pela RENAMO sobre cidadãos portugueses e considera tal conduta violadora dos mais elementares princípios de respeito pelo homem e pelas normas do direito internacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD não pode deixar de se questionar e alertar o País sobre o seguinte: que contrapartidas tem o Governo Português obtido no domínio da segurança e assistência aos cooperantes portugueses deslocados ao abrigo de acordos de cooperação?
Entende o Governo continuar a manter a Assembleia da República em silêncio sobre relações externas nas quais se insere o problema dos reféns e ao mesmo tempo expressar que a política externa é uma questão de Estado?
O PRD não pode deixar ainda que haja alguns a querer levantar incidentes com a República Popular de Moçambique, misturando neste Hemiciclo a consolidação da dívida daquele país com a questão dos reféns, como se moeda de troca se tratasse!
E haja outros a provocar interrupções ao funcionamento normal do Plenário com questões colocadas de improviso e perante as quais se torna necessário sedimentar informações para que juízos de valor, correctos e oportunos, sejam tomados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD manifesta aqui, como já teve oportunidade de o fazer através de proposta de resolução apresentada pelos deputados renovadores e aprovada recentemente no Parlamento Europeu, a sua solidariedade para com os cidadãos portugueses vítimas de rapto, e expressa o seu reconhecimento às instâncias humanitárias internacionais pelo apoio dado à libertação destes portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD considera que as relações entre Portugal e Moçambique têm de ser reforçadas e são estrategicamente demasiado importantes para poderem ser perturbadas com incidentes do género dos verificados. Contudo, e embora possa compreender-se a posição de Moçambique ao querer deslocar os reféns portugueses para o Maputo, discordamos de que aos portugueses não tivesse sido dada a liberdade de escolha do seu destino, de forma a pôr termo à situação de angústia e assegurar a sua rápida estabilização e segurança.
Aplausos do PRD e de, alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD acompanhou as preocupações oportunamente aqui expressas pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho a propósito da insólita transferência de Harare para o Maputo de um grupo de sequestrados pela RENAMO, entregues às autoridades do Malawi.
De qualquer modo, aqui ficou também registado que não se nos afigura curial suscitar este tipo de problema em sede de Plenário da forma como ocorreu, sem qualquer cobertura regimental. De facto, quer a Comissão de Negócios Estrangeiros, quer a conferência de líderes em situações análogas podem ser convocadas de urgência e de forma expedita, em ordem a serem proporcionados os esclarecimentos prévios indispensáveis a posteriores tomadas de posição devidamente fundamentadas.
Resta-nos reiterar o nosso repúdio pela transferência verificada com aquele primeiro grupo e congratularmo-nos pelo imediato protesto apresentado pela nossa diplomacia, que acompanhou de perto a situação. Sem embargo, importa registar a posterior atitude
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das autoridades do Maputo, que proporcionaram à nossa Embaixada todas as facilidades no contacto com os nossos cidadãos, que foram, segundo fomos informados, alvo de observação médica adequada, alojamento em óptimas condições e de outros cuidados essenciais.
Quanto ao segundo grupo, esta manhã entregue pela RENAMO no Malawi, que integra quatro cidadãos portugueses, existem legítimas expectativas que, face à intervenção da nossa diplomacia, possam ser embarcados de regresso direito a Portugal, via Paris, na próxima quarta-feira.
Em suma, o Governo fez o que podia fazer e fez o que tinha que fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A campanha contra a República Popular de Moçambique a propósito da libertação de 53 portugueses reféns da RENAMO e de que aqui se torna eco o CDS, não tinha afinal qualquer fundamento.
Naturalmente que a nossa primeira manifestação é a de nos regozijarmos muito por esse facto, uma vez que estava em causa a vida e a segurança de um grande número de portugueses, nossos compatriotas.
Regozijamo-nos também com o acolhimento que as autoridades da República Popular de Moçambique dispensaram aos 53 portugueses e também com as facilidades que foram concedidas à Embaixada de Portugal para contactar com eles e saber da sua situação, encaminhando as coisas da melhor maneira possível.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Repito que registamos com grande regozijo, nesta véspera de Natal, tal facto. Mas também pensamos que o que a tentativa desta campanha traz agora à superfície é a situação em que têm estado portugueses raptados pela RENAMO. Diz-se aqui que eles têm sido objecto de esquecimento, mas eu direi que o que eles têm sido é objecto de esquecimento por parte daqueles que usam agora estas bonitas palavras...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. José Gama (CDS): - É mentira!
O Orador: - Na verdade, da parte de alguns partidos, só observámos preocupação pela situação dos 53 portugueses reféns da RENAMO depois de eles terem sido libertados...
Vozes do CDS: - É falso, é falso!
O Orador: - Nunca ouvimos preocupação enquanto eles estiveram na selva, em condições absolutamente desconhecidas, mas certamente muito graves para as suas vidas, para a sua condição humana e para os seus direitos de cidadãos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É essa a questão que se coloca e que a Assembleia da República tem de encarar de frente.
Não é possível que organizações que se permitem actuar em Portuga] e viver aqui praticamente na legalidade, à luz do dia, servindo-se da comunicação social portuguesa, ajam desta maneira contra cidadãos portugueses, e é contra isto que não temos ouvido levantar a voz daqueles que hipocritamente se aproveitaram agora da situação para tentar organizar uma campanha contra a República Popular de Moçambique.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS e do PRD.
Pela nossa parte, entendemos que o nosso dever de portugueses e o dever da República Portuguesa é, por um lado, adoptar uma atitude mais enérgica em relação à RENAMO e às suas actividades contra o povo português e, por outro lado, reforçar as relações de cooperação a todos os níveis com a República Popular de Moçambique. Isto é que é respeitar o interesse nacional e o do povo português.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais e em nome do Partido Socialista, queria manifestar a nossa congratulação pelo modo como, finalmente, a situação criada aos reféns portugueses em mãos da RENAMO acabou por ser solucionada com a sua vinda rápida para Portugal.
Por outro lado, queria congratular-me também pelas explicações que o Governo trouxe a esta Assembleia. Queria, no entanto, fazer aqui um parênteses que, ao contrário do que já foi feito aqui nesta Casa, não é de crítica à tomada de posição do CDS ao exigir no Plenário desta Assembleia, talvez de forma aparentemente não muito curial, as explicações que o Governo veio a dar.
Infelizmente, a experiência demonstra-nos que se porventura o CDS não tivesse assumido essa posição em pleno Plenário, os esclarecimentos que nos foram dados não teriam tido lugar. Nesta medida, congratulamo-nos com a posição assumida pelo CDS, que, aliás, não deixámos de apoiar no momento da sua formulação.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Dito isto, acrescentaríamos contudo que, para nós, nas explicações que o Governo nos deu - e não sabemos até que ponto o Governo estaria em condições de no-las dar - algo que continua pouco claro é a responsabilidade que, no fundo, cada um dos intervenientes tem neste processo, atendendo à solução que finalmente foi encontrada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não queria deixar de, em nome da bancada do PS, aproveitar esta oportunidade para, uma vez mais, lavrar o nosso veemente protesto pelo 'modo como o Governo continua a contemplar as acções da RENAMO em pleno território nacional.
É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o problema que hoje se nos coloca - a nós portugueses e ao Governo Português - face às actividades da RENAMO, é o da aceitação ou não da tomada de posição em território nacional de movimentos que, porven-
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tura, se oponham a governos de Estados com os quais Portugal mantém relações diplomáticas. É mais do que isso: é a forma como o Governo Português tolera a actividade em território nacional de movimentos que atentam contra a liberdade e a vida de cidadãos portugueses. Do nosso ponto de vista, isso é inadmissível e é com este veemente protesto, ao qual gostaríamos de ver associadas as outras brancadas, nomeadamente de forma inequívoca a bancada do CDS, que termino a minha intervenção.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, vamos entrar no período da ordem do dia.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em aprovação o n.º 16 do Diário, respeitante à reunião plenária de 2 de Dezembro de 1986.
Pausa.
Não havendo objecções, considera-se aprovado.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação das ratificações n.º 106/IV (PCP), 112/IV (PRD) e 115/IV (PS), sobre o Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, que transforma em sociedade anónima de responsabilidade limitada de capitais exclusivamente públicos a União de Bancos Portugueses, E. P., passando a denominar--se União de Bancos Portugueses, S. A. R. L.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr: Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está marcada para hoje, às 18 horas, a votação final global do texto alternativo à proposta de lei sobre a Lei da Rádio, elaborado e já votado pela respectiva Comissão.
Acontece que, hoje mesmo, o Grupo Parlamentar do PRD foi confrontado com a seguinte situação que lhe foi exposta pela administração da Rádio Renascença.
Através dos seus administradores, engenheiro Magalhães Crespo e Dr. Torgal Ferreira, a administração da Rádio Renascença diz que, com data de 3 de Outubro de 1985, ou seja, 48 horas antes da realização das eleições legislativas, houve um despacho do Sr. Secretário de Estado Anselmo Rodrigues quê atribuiu «[...] uma autorização de atribuição provisória à RDP e à Rádio Renascença de uma rede nacional de frequência modulada nas frequências a determinar pelos serviços de telecomunicações [...]», o qual não seria, afinal, uma autorização a título provisório - tal como consta da letra do despacho e da interpretação da auditoria jurídica do Conselho de Ministros que, com despacho de concordância do Sr. Secretário de Estado, foi comunicada à respectiva comissão parlamentar em Julho de 1986 -, mas seria uma atribuição a título definitivo.
Comunicou-nos, ainda, a administração da Rádio Renascença, que esta interpretação de que a atribuição teria sido feita a título definitivo e que constituiria um direito adquirido poderia ser confirmada pelos intervenientes directos neste despacho ou seja, segundo estes mesmos administradores, pelo Dr. Anselmo Rodrigues e pelo Dr. Almeida Santos, respectivamente Secretário de Estado e Ministro de Estado na altura.
Sendo assim, e porque esta posição nos parece de extrema importância, diremos que consideramos justamente criticável a falta de transparência das decisões que escrevem uma coisa e têm interpretações diferentes.
Parecendo-nos que esta situação não é perfeitamente transparente, queremos anunciar que, se há um compromisso de Estado, nós, discordando dele, estamos dispostos a cumpri-lo. Só que precisamos de saber se esse compromisso existe ou não. E, assim sendo, pedia a V. Ex.ª Sr. Presidente, que, antes da votação, convocasse uma conferência de líderes parlamentares para que o assunto possa ser devidamente esclarecido e para que saibamos se houve ou não um compromisso assumido pelo Estado Português nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra para fazer uma interpelação à Mesa, e agradeço-lhe que não a transforme numa intervenção.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, não o farei mas em todo o caso, espero que a Mesa não mostre ter dois pesos e duas medidas. De qualquer maneira, não era minha intenção fazer uma intervenção sob pretexto de uma interpelação à Mesa.
Dado que, como' acabámos de ouvir, se colocam dúvidas relativamente à posição final de voto do PRD, numa matéria em que, até hoje, este partido não tinha manifestado qualquer dúvida e na qual, ao contrário, tinha sido totalmente veemente na defesa da solução encontrada com a referida lei a votar e porque nesta Câmara não pode pairar qualquer dúvida sobre a posição de voto dos partidos, entendemos que deve ser aceite a iniciativa do PRD. Por isso, manifestamos a nossa concordância quanto ao princípio da realização de uma conferência de líderes. De facto, não lhe tendo faltado oportunidade para tal, só lamentamos que o PRD não tenha tido ocasião de se inteirar cabalmente sobre as circunstâncias das decisões que oportunamente tomou.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, tem a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. António Capacho (PSD): - Sr. Presidente, se alguma coisa se encontra prostituída nesta Assembleia é a figura regimental de interpelação à Mesa e não vou colaborar nisso.
Direi, apenas, que considero pertinente o pedido do Sr. Deputado Magalhães Mota, embora seja discutível a fundamentação apresentada segundo a qual seria possível apresentar este pedido ao abrigo desta figura regimental. Mas, enfim, interpelou a Mesa para solicitar a convocação de uma conferência de líderes. Nesses precisos termos - porque o Regimento não me permite mais - concordo com a realização da conferência de líderes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, tem a palavra.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, era para manifestar o nosso acordo quanto à convocação da conferência de líderes e quanto às razões aduzidas
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pelo Sr. Deputado Magalhães Mota que, aliás, só reforçam a justeza das posições que o CDS oportunamente aqui tinha expresso sobre esta matéria.
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não tem sido hábito do Grupo Parlamentar do PCP fazer oposição à convocação de uma conferência de líderes quando qualquer partido a propõe. Em todo o caso, devo dizer que não percebi bem por que é que o PRD, neste caso concreto, a propõe. É para ouvir o Governo acerca de um despacho emitido por outro governo? É para irmos todos em colectivo ler o Diário da República e verificarmos se o despacho é provisório ou definitivo?
Portanto, a minha interpelação à Mesa é no sentido de que importaria que o Sr. Presidente esclarecesse qual é o objecto desta conferência de líderes para que possamos fazer alguma preparação relativamente ao seu conteúdo e ao seu resultado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, convoco uma conferência de líderes parlamentares para as 17 horas.
Como hoje não terá lugar o intervalo regimental, peço ao Sr. Vice-Presidente Marques Mendes que presida a essa conferência ...
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não estive a ironizar e insistia no meu pedido. Portanto, gostaria que V. Ex.ª nos explicasse qual é, exactamente, o objectivo da conferência.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, creio que é no âmbito dessa conferência de líderes parlamentares que poderá ser explicitada a razão da sua própria convocação ...
O Sr. Certos Brito (PCP): - Não, não. Era melhor se ficasse claro ...
O Sr. Presidente: - As razões aqui apresentadas por vários Srs. Deputados parecem ser suficientes para a Mesa não recusar a convocação da conferência de líderes.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a empresa pública União de Bancos Portugueses, e cujo processo de ratificação hoje tem lugar, é um diploma inconstitucional, ditado por razões de natureza exclusivamente política que, contrariamente ao afirmado pelo Governo, não assentam em considerações sérias de índole económico-financeira ou de gestão.
É inconstitucional porque, como se refere no requerimento de declaração de inconstitucionalidade, oportunamente apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português ao Tribunal Constitucional, «a transformação da União de Bancos Portugueses, E. P., em sociedade anónima representa uma alteração profunda do estatuto daquela empresa, não contemplada nem admitida pelo estatuto das empresas públicas vigente, o que (como sublinhou reiteradamente o Tribunal Constitucional) constitui matéria reservada à Assembleia da República, que não legislou no sentido almejado pelo Governo [...]».
Por outro lado, a ser aceite a concepção governamental segundo a qual a publicação de sucessivos decretos-leis não autorizados sobre matérias reservadas à Assembleia da República é susceptível de firmar no sistema jurídico «princípios gerais» não admitidos e até mesmo afastados por lei, estaria aberto o caminho para a completa subversão da reserva relativa de competência legislativa constitucionalmente estabelecida, com graves consequências institucionais.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Acresce que o diploma, embora preveja a titularidade pelo sector público do capital do banco, elimina condicionalismos e mecanismos de gestão e controle, consagrando um modelo de gestão assente na degradação do controle orçamentai e parlamentar e na supressão dos direitos de intervenção e participação dos trabalhadores.
Estamos, assim, perante mais uma manobra encapotada, visando abrir o processo das desnacionalizações, desta feita no sector bancário, e que, tal como outras iniciativas legislativas recentemente tomadas pelo Governo, designadamente no âmbito da comunicação social, se insere objectivamente na prática subversiva do Governo que, à margem da Constituição, visa a eliminação da garantia das nacionalizações e a própria diminuição das reservais de competência legislativa da Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo procura encapotar a sua inconstitucional decisão política de transformar a União de Bancos Portugueses em sociedade anónima com falaciosos argumentos económico-financeiros, com sofismas de necessidades do modelo de gestão.
O primeiro argumento reside no facto de o actual estatuto das instituições de crédito nacionalizadas, no entender do Governo, ocasionar «inconvenientes de relevo quando se pretende flexibilizar ou ajustar a novas exigências económico-financeiras as empresas bancárias». No entanto, o Governo, porque o não pode, não justifica tal afirmação, manifestamente gratuita. Na verdade, o Decreto-Lei n.º 729-F/75, que define o estatuto dos bancos nacionalizados, estabelece um quadro legal suficientemente genérico que permite aos bancos nacionalizados funcionarem com grande flexibilidade, de acordo com as orientações dos órgãos de gestão e de tutela.
Aliás, a existência dessa flexibilidade é implicitamente reconhecida pelo próprio Governo, quando (ilegalmente) decreta a transformação em sociedade anónima de apenas um banco nacionalizado. Por que razão o actual estatuto dos bancos nacionalizados haveria de mostrar «inflexibilidade» para apenas um ou alguns bancos e «flexibilidade» para os restantes? Trata-se de um falso argumento. Na verdade, se em alguns bancos nacionalizados existem eventuais desajustamentos face às realidades económico-financeiras e manifestas insuficiências de gestão, eles devem-se fundamentalmente às insuficiências, incapacidades e, tantas vezes, à má fé dos gestores e à prepotência dos membros do Governo da tutela, mas não ao estatuto das empresas
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públicas do sector bancário. Se algo há que mudar não é pois o estatuto das empresas públicas, mas os gestores e os governantes.
A segunda falácia justificativa apresentada pelo Governo é a de permitir à União de Bancos Portugueses «aumentar o seu capital social através do concurso de fundos de organismos e instituições do sector público, administrativo e empresarial, assumindo tal facto a natureza de investimento, e não de despesa orçamental». Os sofismas também aqui são múltiplos e evidentes. Desde logo, é falso que o Estado não possa proceder a investimentos desta natureza sem que passem por despesa orçamental. Aliás, é o próprio Governo que expressamente o reconhece e comprova, exactamente no caso da União de Bancos Portugueses e em simultâneo com a sua transformação em sociedade anónima, ao proceder à subscrição de 3 milhões de contos de títulos de participação. Nenhumas razões de natureza jurídica, estatutária ou orçamental permitem uma tal subscrição de títulos e impedem similares subscrições de aumento do capital social. Apenas razões da natureza e vontade políticas do Governo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, é notória a contradição do Governo quando argumenta não pretender aumentar o capital social de um banco através de uma despesa orçamental, ao mesmo tempo que admite que esse mesmo aumento de capital possa ser subscrito por fundos e serviços autónomos, através da inscrição nos seus orçamentos de idênticas despesas orçamentais. Por que razões esses fundos e serviços autónomos, integrados na administração central, e as próprias empresas públicas não deverão em alternativa canalizar os seus eventuais excedentes financeiros para o Orçamento do Estado, procedendo este aos aumentos de capital social? Enfim, o aumento de capital da União de Bancos Portugueses subscrito por empresas públicas e pelo fundo de garantia automóvel não resulta manifestamente de uma opção de investimento autonomamente tomada pelos respectivos conselhos de gestão, antes tendo sido uma imposição das respectivas tutelas governamentais. Aqui acresce o facto de, para subscrever o aumento do capital social na União de Bancos Portugueses, uma destas entidades ter solicitado um empréstimo bancário para o efeito.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - Assim se escavaca, à partida, o apregoado argumento da necessária autonomia de gestão das empresas públicas.
O terceiro sofisma argumentativo do Governo é o de que da transformação da União de Bancos Portugueses em sociedade anónima resultará «uma dinâmica que conduzirá progressivamente a maior eficiência e racionalidade económicas». Também aqui o Governo não justifica a sua afirmação, melhor, a sua esperança, pois expressamente de uma mera «esperança» se trata. O que é que, afinal, mudaria na União de Bancos Portugueses por efeitos da sua transformação em sociedade anónima? Na óptica da eficiência e da racionalidade económica ... nada!
Nem o quadro legal em que exerce a sua actividade, pois o sector bancário é regido por legislação específica aplicável a todas as empresas, independentemente da formação económica em que se integram. Nem as condições de exploração e de rentabilidade da empresa, já que as causas profundas e essenciais nada têm a ver com a sua transformação de empresa pública em sociedade comercial. Nem os próprios gestores ... que continuam a ser os mesmos, nomeados, directa ou indirectamente, pelos mesmos membros do Governo.
O que o Governo pretende mudar com esta transformação não se reporta, de facto, à eficiência e racionalidade económica. Tem a ver com a degradação do enquadramento constitucional e legal do seu estatuto de empresa pública. Tem a ver com a limitação e supressão dos direitos dos trabalhadores e dos seus organismos representativos, de que são já claras manifestações a criação de quadros de excedentes. A sonegação do direito ao controle de gestão e à participação de representantes dos trabalhadores nos órgãos de gestão e de fiscalização da empresa e a instauração de processos disciplinares a membros da comissão nacional de trabalhadores, por estes pasme-se!- terem procedido à distribuição de um comunicado aos trabalhadores denunciando, designadamente, a intenção governamental de transformar a empresa em sociedade anónima de responsabilidade limitada!
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É um escândalo!
O Orador: - Não se põe em causa a necessidade de reforço da estrutura financeira de alguns bancos nacionalizados e, designadamente, da União de Bancos Portugueses, E. P. Mas a solução das debilidades estruturais do sistema bancário e. o fortalecimento da rentabilidade das empresas públicas do sector não se conseguem com o simples aumento do capital social. Ninguém de boa fé escamoteará que o ónus da política monetária restritiva tem recaído pesadamente sobre a banca comercial nacionalizada, cuja actividade se tem desenvolvido num grave contexto em termos de rentabilidade. Daí que os seus problemas actuais resultem fundamentalmente do excesso de liquidez gerado por limites de crédito sucessivamente negativos em termos reais (e aplicado em dívida pública mal remunerada), do prolongamento no tempo dos atrasados do sector público administrativo, da redução das margens de juro efectivas, do peso desproporcionado dos depósitos a prazo, do crescimento geométrico dos níveis absolutos e relativos do crédito mal parado, e também da insuficiência de capitais próprios. A que acresce, em muitos casos, os efeitos de erros de gestão e a subsidiação de interesses privados, por iniciativa dos próprios gestores e ou da tutela governamental (aliás a União ,de Bancos Portugueses é a este último respeito um exemplo significativo. Recordem-se as grandes negociatas subjacentes ao desarrolamento dos bens que garantiam a dívida do ex-banqueiro Afonso Pinto de Magalhães - dívida que continua por solver - e a chamada compensação de créditos com a Torralta, que lesaram fortemente em muitos milhões de contos a União de Bancos Portugueses, E. P.).
O Sr. José Magalhães (PCP): - Bem lembrado!
O Orador: - Por isso, aumentar o capital social dos bancos com situações mais delicadas sem que sejam resolvidas as questões de fundo referidas, não passará de um transitório e pouco eficaz balão de soro.
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Mas a transformação da União de Bancos Portugueses em União de Bancos, S. A., como condição prévia a um aumento do capitai social, é transformar o balão de soro numa injecção venenosa de efeitos nefastos na arquitectura constitucional que nos rege e no equilíbrio de poderes institucionais.
Ainda muito recentemente, Srs. Deputados, a maioria democrática manifestou nesta Assembleia uma clara desconfiança e reprovação à política prosseguida pelo governo de Cavaco Silva.
Mau seria, para o País e para o regime constitucional, que a Assembleia da República, através da ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma a União de Bancos Portugueses em sociedade anónima, viesse agora não só a absolver politicamente a inconstitucionalidade originária do acto do Governo, mas ainda a dar cobertura legal a um inaceitável atentado contra a Constituição da República, contra os direitos e o sentimento publicamente expresso dos trabalhadores, contra os interesses do País.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PCP, na sequência das responsabilidades assumidas e das expectativas criadas com a apresentação à Assembleia da República da ratificação n.º 106/IV, opor-se-á, sem quaisquer ambiguidades, à transformação em sociedade anónima da empresa pública União de Bancos Portugueses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Esperamos que outros grupos parlamentares, do mesmo modo, assumam frontalmente nesta Assembleia as posições públicas que até agora tomaram, assumam, em coerência, idêntica posição.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, desejaria lamentar a ausência do Governo neste debate, visto que se trata da ratificação de um decreto governamental e que o Governo não se encontra presente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 351/86, em ratificação, coloca do seguinte modo a questão da passagem da União de Bancos Portugueses a sociedade anónima: por um lado, salienta-se que «as instituições de crédito nacionalizadas» são «pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, com a natureza de empresas públicas», mas, por outro lado, o Governo apresenta a passagem da União de Bancos Portugueses a sociedade anónima, pelo aumento do capital, através de fundos de organismos e instituições do sector público, como sendo - como na realidade é - a alteração da sua natureza de pessoa colectiva de direito público para pessoa colectiva de direito privado.
Esta mudança de natureza da União de Bancos, operada através do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, de pessoa colectiva de direito privado, viola claramente a Constituição.
Em primeiro lugar, como decorre do disposto da alínea v) do artigo 168.º da Constituição, entre as matérias de competência reservada à Assembleia da República, figura o estatuto das empresas públicas, em que o Governo não pode legislar.
Em segundo lugar, o decreto-lei do Governo viola o disposto no artigo 92.º da Constituição, na medida em que estando as empresas públicas submetidas ao Plano, que em relação a elas tem carácter vinculativo, já as empresas privadas, como a União de Bancos Portugueses passaria a ser, deixam de estar submetidas no Plano, que para elas tem mero carácter indicativo.
Em terceiro lugar, o Decreto-Lei n.º 351/86 ao alterar, abusivamente, a natureza da pessoa colectiva do direito público da União de Bancos Portugueses, para a transformar em pessoa colectiva de direito privado, afronta directamente os direitos dos trabalhadores, ao violar, nomeadamente, o estabelecido na alínea y) do artigo 55.º da Constituição, que garante, nas empresas públicas, a eleição de representantes dos trabalhadores para os órgãos sociais.
O Decreto-Lei n.º 351/86, é um novo passo do Governo na sua ofensiva contra as empresas públicas. Um novo passo, porque assume contornos sinuosos, que só podem enganar os incautos. Trata-se de um balão de ensaio, que a não ser imediatamente detido, permitiria que o Governo viesse a alterar arbitrariamente a natureza pública de todas as empresas públicas que entendesse, ao arrepio do desenvolvimento da propriedade social, consignada no artigo 90.º da Constituição, e do desenvolvimento do Pais, que subentende a coexistência dos sectores público, privado e cooperativo, e não o ataque e a asfixia de qualquer desses sectores e, ainda, contra os interesses dos trabalhadores. Por isso, não será com a concordância do MDP/CDE que este decreto-lei será ratificado.
O MDP/CDE votará, por isso, contra a ratificação, requerida pelo PCP, pelo PS e pelo PRD deste diploma do Governo, que, além de violar a Constituição, representa um grave e perigoso precedente.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, neste momento não há mais inscrições na Mesa. Somos informados que o Sr. Deputado Gomes de Pinho tinha pedido a palavra para fazer uma intervenção sobre esta matéria mas, de momento, não se encontra no Hemiciclo. Assim, pedimos ao CDS que providencie no sentido de o Sr. Deputado vir fazer a sua intervenção.
Pausa.
Sr. Deputado Andrade Pereira, esteve a contactar o Sr. Deputado Gomes de Pinho?
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, já pedi a comparência do Sr. Deputado Gomes de Pinho e peço à Mesa que aguarde uns momentos.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, aguardávamos a sua comparência para podermos prosseguir o debate.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas muito me surpreendeu que não houvesse mais inscrições para intervenções de Srs. Deputados sobre esta matéria. Imaginava usar da palavra só depois de o terem feito os representantes
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dos partidos que subscreveram os pedidos de ratificação. De qualquer modo, tenho muito gosto em fazer agora a minha intervenção.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: À União de Bancos Portugueses, criada por decreto-lei de 9 de Janeiro de 1978, e resultante da nacionalização do Banco Pinto de Magalhães, do Banco da Agricultura e do Banco de Angola, veio a ser dado o estatuto de pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira com a natureza de empresa pública, pelo Decreto-Lei n.º 729-F/75, de 22 de Dezembro.
O preâmbulo deste diploma previa a curto prazo, «a adequada reformulação dos sistemas adoptados de modo a evitar a constituição de uma superstrutura social dependente do Estado, portadora das já conhecidas tendências para a burocratização com prejuízo da participação efectiva que aos trabalhadores em geral deve caber em sistema de transição para o socialismo». Esta regulamentação nunca se fez, nem poderia, aliás, ser feita, atendendo às condições políticas subjacentes ao processo de nacionalização, e o resultado está à vista. Ë o próprio Governo que o reconhece - só um aumento substancial do capital da UBP, através de recurso a fundos alheios, lhe permitirá sobreviver, não se sabe bem até quando e em que condições. E por isso, o Governo aprova o Decreto-Lei n.º 351/86, cuja ratificação agora se discute.
Porém, para o CDS, a solução constante desse decreto-lei fica aquém do necessário. O seu efeito útil mais significativo é o de permitir resolver os problemas financeiros imediatos com que se debate aquela instituição bancária, sem recurso directo ao Orçamento do Estado.
Aliás, recorrer ao Orçamento do Estado para cobrir prejuízos do sector público é cada vez mais difícil, porque os Portugueses vão tomando consciência do custo que esses prejuízos acarretam para o País e para os seus rendimentos pessoais, e que os elevados impostos que pagam se destinam em grande parte a cobri-los. Mas não nos iludamos!
Pois a adopção de processos diferentes para cobrir os prejuízos de certas empresas do sector público, designadamente através da afectação de recursos de outras lucrativas, terá um efeito substancialmente idêntico, diminuindo as receitas do Estado, ou distorcendo a lógica de mercado e resultando sempre em aumento da carga fiscal e em mais ineficiência da economia.
Não fora esta questão e o actual estatuto da União de Bancos Portugueses deveria permitir, segundo a lógica dos defensores do modelo estatizante que justifica a manutenção no sector público de empresas não essenciais, que este Banco cumprisse todas as suas finalidades económicas e sociais.
Ou será, que ao reconhecer a necessidade de alterar o estatuto desta instituição se atesta também que é o próprio sector público ou grande parte dele que é manifestamente inviável, enquanto tal?
Se assim foi, é bom que isso fique claro para a Assembleia da República e para o País, e que o Governo, sobretudo o Sr. Ministro das Finanças, o assumam neste debate.
É curioso, aliás, verificar o que se passa com este Governo, em que parece haver dois tipos de ministros: uns, que estão encarregados de gerir o sistema, ainda que para isso tenham introduzir-lhe pequenas reformas; outros de aparentar querer destruí-lo.
Cada um desempenha a sua função, e assim enquanto o IPE engorda e alarga as suas actividades com o beneplácito do ministro da tutela, o Sr. Ministro do Trabalho diz, convictamente, que «o Estado é bronco na área dos negócios, porquanto só é capaz de gerar grandes empresas que acabam por redondar em grandes défices, mas mais broncos são aqueles que têm dificuldade em aceitar o facto como verdadeiro» (transcrição do Jornal de Notícias, de 20 do corrente).
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Ora, não podendo eu tomar esta atitude do Ministro do Trabalho como um acto de rebeldia e não acreditando que possam existir contradições tão profundas num governo tão homogénio e minoritário, sou levado a concluir que estas aparentes divergências se enquadram numa estratégia comum em que se fala à direita para se agir à esquerda. Isto é, uma estratégia de pura gestão do sistema, embora contra ele se vão lançando alguns inocentes impropérios.
O decreto agora sujeito a ratificação confirma esta estratégia, pois não exprime qualquer objectivo de mudança estrutural.
Mais: É possível que a transformação de uma Empresa Pública, emergente, ainda que indirectamente, das nacionalizações, em sociedade de capitais exclusivamente públicos constitua um factor de consolidação do sector público, dificultando a prazo a sua privatização. E é ainda possível e até provável, que se venha assim a reforçar o poder dos Lobbies dos gestores públicos, cada vez menos susceptíveis de controle pelas instituições democráticas e que tendem a funcionar como o principal esteio da perpetuação do sistema além de que ninguém nos garante que, a se este decreto ratificado, com as alterações impostas pela maioria de esquerda reinante nesta Câmara - que, aliás, se prevêem - ele se não transforme num instrumento que agrave a rigidez do funcionamento da empresa e que a venha a afastar mais ainda do modelo de concorrência que o Governo diz pretender instaurar.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Muito bem!
O Orador: - E que fará então o Governo? Aceitará essas alterações - se elas vierem a ser propostas - com a resignação que vem revelando ou revogará o decreto? Era bom que a questão fosse, também, esclarecida durante este debate.
O Governo parte, aliás, ao aprovar o Decreto-Lei n. º 351/86, do pressuposto ilusório de que a simples mudança de estatuto tornará possível que uma empresa pública passe a funcionar como uma sociedade privada, isto é, que adquira as suas virtudes. É este também o último argumento dos defensores da manutenção de um vasto sector público em Portugal, venham da esquerda antiga, da moderna ou da contemporânea.
Esquece, porém, o Governo e estes que, para além do estatuto jurídico, subsistirão sempre profundas diferenças entre um e outro tipo de empresa, quer em relação às respectivas motivações, quer em relação aos objectivos dos seus proprietários. Uma sociedade ano-
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nima privada, cujas acções estejam cotadas na bolsa, é permanentemente controlada e avaliada pelo mercado, o que obriga os seus gestores a tomá-lo em consideração, e isto conduz, em regra, a uma melhor gestão.
Por outro lado, que maiores garantias de independência perante o poder político-partidário dá uma sociedade de capitais públicos, cujos gestores são designados por empresas públicas, elas próprias directamente dependentes desse poder.
A alternativa do CDS à reforma do sector público é a sua privatização.
Entendemos a privatização, não como um conjunto de medidas avulsas ditadas por razões de oportunidade política ou eleitoral, mas como uma verdadeira estratégia pós-revolucionária de modernização da economia portuguesa, através da redução da intervenção do Estado, do reforço da iniciativa privada, da afirmação das regras do mercado e da difusão do direito de propriedade a camadas cada vez mais vastas da população.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Em alternativa à propriedade colectiva dos meios de produção, qualquer que seja o seu estatuto, geradora da burocracia, da corrupção, da ineficiência e da injustiça, contrapomos um capitalismo popular, inspirado por uma concepção humanista e assente na empresa privada, concebida como uma verdadeira comunidade de interesses.
Uma voz do CDS: - Apoiado!
O Orador: - O processo que conduziu à nacionalização da banca não teve qualquer nacionalidade económica; foi determinado por razões de pura ordem política e apresentado como o melhor caminho para garantir o controle do poder económico pelo poder político e o acesso ao crédito sem discriminações.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Na verdade, os únicos objectivos alcançados foram os que se ocultavam por detrás destas pias intenções. Esses objectivos eram, em Portugal, como noutros países que sofreram situações semelhantes, o controle da iniciativa privada através da banca pública, a decapitação da capacidade de resistência contra a colectivização triunfante, a criação da insegurança geradora do desespero e do abandono, enfim, a ameaça ao direito de propriedade, que é um dos pilares da democracia política.
Felizmente que esses intentos dos protagonistas da revolução totalitária foram frustados pela afirmação das forças democráticas expressa em várias eleições, pelo combate das forças morais da sociedade portuguesa e pela coragem e resistência de muitos empresários e trabalhadores que, solidariamente e à custa de tantos sacrifícios, atravessaram esse período difícil, continuaram e, finalmente, venceram.
Por isso, é com preocupação que se vê hoje o Partido Socialista, apesar do discurso renovador do seu líder, apresentar-se sistematicamente acorrentado às iniciativas dos comunistas, como aconteceu neste caso, contribuindo, não se sabe a troco de quê, para que se dilua a fronteira, duramente construída, da liberdade.
No entanto ninguém ignora os custos sociais e económicos da política de nacionalizações e da sua manutenção. Nem os empresários, nem os trabalhadores, nem os contribuintes, nem os consumidores. Porquê então continuá-la?
Perante as consequências tão gravosas das nacionalizações, é paradigmático que, poucos dias depois da ratificação por esta Câmara do Acto Único Europeu, nos reunamos, não para discutir a privatização do sector público, como uma das condições fundamentais das transformações que a integração na CEE e o seu desenvolvimento implicam, mas para sujeitar a ratificação um decreto do Governo que, timidamente, transforma uma empresa pública numa empresa de capitais públicos. Operação, aliás, pouco mais que cosmética, mas mesmo assim discutível face à constituição ideológica e colectivista que ainda temos, e posta em causa por partidos que, se somarem os seus votos, têm a maioria nesta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais útil seria se os partidos com tradição democrática se empenhassem, desde já, na tarefa necessária e possível de construir uma plataforma para a revisão da Constituição que elimine os constrangimentos que impedem a mudança de sistema e não contribuíssem, sob o olhar babado do; comunistas, para lhe introduzir ainda mais rigidez. O que seria desejável é que se discutisse se o Governo deveria ou não ir mais além, e não que tenha ido demasiado longe.
Este debate é, porém, revelador do desajustamento da maioria de esquerda, que se vai afirmando, votação após votação, nesta Assembleia, com a realidade e as necessidades do País e, sobretudo, do seu atraso em relação à Europa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solução do Governo não é boa, mas a que a maioria de esquerda se propõe aprovar, através da introdução de emendas no diploma que estamos a analisar, é bem pior.
Se por uma não vale a pena terçar armas, a outra deve ser combatida. Mas, em nome de uma verdadeira alternativa que o CDS exprime nesta Assembleia e que a maioria dos Portugueses com certeza quer.
Aplausos do CDS.
O Sr. Bártolo Campos (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Bártolo Campos (PRD): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar, solicito à Mesa uma interrupção dos trabalhos por 20 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este é um direito que assiste ao Grupo Parlamentar do PRD.
Está, pois, interrompida a sessão, a qual recomeçará às 17 horas.
Eram 16 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão. Eram 17 horas e 10 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila.
O Sr. Victor Ávila (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD solicitou a apreciação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma em sociedade anónima
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de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, por entender que o diploma em apreço contém disposições que não salvaguardam de um modo eficaz, por um lado, os objectivos que o próprio Governo afirma pretender atingir - ou seja, a reestruturação financeira desta instituição de crédito - e, por outro lado, por não acautelar os direitos dos trabalhadores, nomeadamente os previstos na lei n.º 46/79, nem o interesse nacional na manutenção futura da União de Bancos Portugueses como banco do sector público. Porém, a iniciativa do Governo poderia, eventualmente, conduzir à extinção futura da União de Bancos Portugueses como empresa bancária, sem o controle da Assembleia da República.
A eficácia da reestruturação financeira da banca do sector público, nomeadamente a da União de Bancos Português, depende: das iniciativas que o Governo e o Banco de Portugal adoptarem, tendo em vista a viabilização económica desta instituição de crédito; da qualidade da gestão que seja realizada; da adesão dos trabalhadores à solução que vier a ser encontrada e do tipo de tutela que vier a ser exercida pelo Governo.
As instituições de crédito do sector público necessitam de receber do Estado o valor dos créditos em dívida concedidos no âmbito da descolonização e os relativos aos atrasados da cooperação, aos saneamentos financeiros de empresas e aos créditos vencidos e não pagos avalizados pelo Estado.
A banca do Estado tem também necessidade de que este lhe adquira os títulos de baixo rendimento, que foi obrigada a aceitar por força de. disposições legais.
No que respeita à União de Bancos Portugueses, e porque esta questão lhe diz directamente respeito e não abrange a generalidade dos bancos do sector público; há que assegurar-lhe o pagamento dos créditos concedidos no âmbito da descolonização, pelo menos no ano económico de 1988, uma vez que o Orçamento do Estado para 1987 já se encontra neste momento aprovado.
A reestruturação financeira não terá, no entanto, quaisquer resultados a prazo se o Governo e o Banco de Portugal não tomarem medidas urgentes que melhorem as condições económicas em que opera a banca no nosso país, nomeadamente a do sector público.
Assim, há que rever as taxas de intervenção nos mercados interbancários de títulos e dos bilhetes do Tesouro, no sentido de assegurar uma adequada remuneração ao excesso de liquidez existente na banca do Estado, resultante da não aplicação, em crédito concedido, de parte dos depósitos a prazo, o que no caso da União de Bancos Portugueses, em 1985, atingiu 39 milhões de contos, remuneração essa que, nesse mesmo ano, se quedou nos 20, ficando, portanto, seis pontos percentuais abaixo da taxa média dos depósitos a prazo.
Por outro lado, há que criar e incentivar o aparecimento de mais alternativas aos depósitos a prazo, rever os critérios de repartição dos limites de crédito e substituir as obrigações de fomento ultramarino e do tesouro de angola por outras que remunerem as instituições de crédito a taxas actualizadas.
À gestão exige-se que tenha uma política de concessão de crédito consentânea com as garantias apresentadas, que acelere as acções de cobrança do crédito mal parado que, na União de Bancos Portugueses, atingiu 27,8 milhões de contos em 1985 e que, simultaneamente, tenha em atenção que a gestão de uma empresa moderna não se faz sem a adesão dos seus trabalhadores.
A solução encontrada pelo Governo não colheu o apoio dos trabalhadores, entre outras razões, porque foi ignorada a aplicação da lei n.º 46/79, que institucionaliza os direitos das comissões de trabalhadores e a representação destes nos órgãos sociais da empresa, o que alimenta um clima de suspeição que em nada ajudará à recuperação da empresa.
Por outro lado, os estatutos da empresa dão à assembleia geral o poder de extinguir a mesma, o que poderá levar, eventualmente, à sua liquidação sem o controle da Assembleia da República, situação inaceitável numa sociedade de capitais públicos.
Outra questão que não se encontra devidamente regulamentada é a da não transferência de acções da União de Bancos Portugueses para entidades privadas, no caso da extinção das sociedades de capitais públicos ou das empresa públicas que as detenham.
Por último, consideramos que o êxito de qualquer iniciativa depende do tipo de tutela que vier a ser exercida, ou seja, da autonomia de que puder usufruir o futuro conselho de administração da empresa, cuja acção deverá ser avaliada pelo cumprimento dos objectivos previamente fixados e não por critérios de oportunidade política, geradores de situações de clientelismo, que, do nosso ponto de vista, deverão ser banidas das empresas públicas.
Pesem emboras as críticas apresentadas por alguns sectores, com algumas das quais estamos de acordo, a reestruturação financeira das instituições de crédito do sector público deve ser analisada casuisticamente.
Conhecida que é a situação financeira do Estado nos últimos anos, onde persistem os défices estruturais, o financiamento dos bancos do sector público, mediante a participação financeira de empresas públicas ou de capitais públicos, poderá ser uma das formas de canalizar meios financeiros sem o recurso ao Orçamento do Estado, o que contribuirá também para a interligação do capital industrial com o capital financeiro do Estado, condição indispensável para uma verdadeira concorrência entre o sector público e o privado, mas onde o primeiro disponha de meios idênticos aos do segundo no exercício da sua actividade.
Ao Estado cabe, não o controle administrativo e casuístico da gestão, mas a fixação de objectivos à União de Bancos Portugueses que tenham também em conta que a racionalização da actividade bancária não se faz ignorando que o peso dos custos de pessoal tem vindo a decrescer - 13,1% em 1979 para 9,96% em 1985 dos custos totais -, e que é na cobrança dos créditos mal parados, na melhoria da rentabilidade das operações activas e na diminuição dos custos com as operações passivas, como é o caso das aplicações financeiras e da remuneração dos depósitos, respectivamente, que reside o cerne da rentabilidade económica da banca. Assim o entendam p Governo, o Banco de Portugal e a gestão da União de Bancos Portugueses.
O PRD é, pela sua parte, favorável à melhoria da situação financeira da União de Bancos Portugueses, nomeadamente a medidas que visem assegurar o pagamento pelo Estado, no ano económico de 1988, dos créditos concedidos no âmbito da descolonização, ao reforço dos capitais próprios, à representação dos tra-
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balhadores na gestão e na fiscalização e ao cumprimento da Lei n. º 46/79, da Assembleia da República, e pautará o seu voto por estas suas considerações.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apreciação do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, que transforma a União de Bancos Portugueses em sociedade de capitais públicos, suscita a questão prévia de saber o alcance dessa iniciativa face à reconhecida necessidade de reestruturação da banca pública.
Integra-se esta iniciativa do Governo num plano de reestruturação do sector? Tem o Governo qualquer plano de reestruturação em curso? A resposta é duplamente negativa. O Governo não revela ter o mínimo de capacidade necessária para lançar e orientar a reestruturação sistemática da banca pública.
Atendendo ao papel fulcral do sector bancário na consolidação e dinamização de toda a economia, esta inoperância do actual Governo traduz-se num enorme risco a poucos anos de vida.
Verificando-se uma verdadeira revolução financeira no plano internacional a que os bancos portugueses não podem ficar imunes, estando em curso transformações radicais internas na estrutura concorrencial do sector, a banca pública ou se reestrutura ou entra em queda vertical. Nestas condições, a incapacidade do Governo para orientar uma reestruturação global da banca pública assume foros de demissão que ameaça gravemente não só o sector bancário, como todas as outras actividades económicas vitalmente dependentes do bom funcionamento das instituições financeiras. O Governo fica-se por uma ou outra iniciativa isolada. É curtíssimo mesmo para um governo de tão curto horizonte.
Assim, a primeira conclusão que a Assembleia da República deve tirar deste debate é a de que se impõe elaborar um programa global de reestruturação do sector bancário. O Partido Socialista entende que o Governo deve ao País e à Assembleia da República uma proposta urgente sobre essa reestruturação.
Quanto ao Decreto-Lei n.º 351/86, é fora de dúvida que estamos perante uma medida localizada, mal enquadrada nas suas razões justificativas e claramente deficiente no que toca à salvaguarda de direitos e garantias essenciais inerentes à natureza pública da instituição.
É evidente que a transformação de instituições bancárias em sociedades de capitais públicos não poderá ser a solução reestruturadora da banca pública na sua generalidade. É uma medida de aplicação singular.
Quanto à justificação, invocam-se duas razões. A primeira razão é que será possível aumentar deste modo o capital social da instituição. Como foi geralmente reconhecido, trata-se de uma razão espúria e sem peso próprio. O reforço do capital poderia ser feito por via orçamental, sem qualquer inconveniente, teórico ou prático.
Quanto ao segundo argumento, o da melhoria das condições de gestão, é certo que a fórmula «sociedade de capitais públicos» contém virtualidades significativas. Mas não nos deixemos iludir pelos passes de magica do Diário da República. A grande realidade é que os gestores continuarão a ser nomeados directamente pelas tutelas ou sob a sua influência. Muito mais importante do que qualquer passe de mágica jurídica, o que comanda a qualidade da gestão pública é o comportamento real das tutelas e dos gestores que delas continuarão a receber o poder. Portanto, pode concluir-se que as razões invocadas pelo Governo não justificam, por si só, a transformação da União de Bancos Portugueses em sociedade de capitais públicos.
Estranhamente, o Governo invocou razões secundárias e inconsequentes e esqueceu-se de avançar a grande razão de fundo que pode justificar a transformação da União de Bancos Portugueses em sociedade de capitais públicos. Com efeito, o factor essencial que justifica a cooperação de um banco público com empresas públicas industriais, seguradoras e de prestação de serviços é a possibilidade de gerar sinergias capazes de dinamizar não só o banco em si mesmo como as empresas públicas que com ele se associam. É esta lógica que poderá justificar a transformação da União de Bancos Portugueses em sociedade de capitais públicos, plataforma financeira dinamizadora de um grupo público aberto à inovação e à iniciativa criadora de riqueza e de postos de trabalho, atenta à rentabilização social e económica das oportunidades de legítimo lucro.
Por ironia da história, se assim vier a suceder, a iniciativa de um governo que assim quis abrir caminho à privatização da União de Bancos Portugueses poderá, afinal, dar nova perspectiva à sua valia como empresa pública.
A criação de sinergias pela via da cooperação de instituições financeiras industriais e de serviços é uma das mais fortes expressões do desenvolvimento contemporâneo em todos os países de economia de mercado, sem excepção. Em Portugal, por exemplo, é óbvio que estão nascendo e crescendo novos grupos económicos sob esse paradigma, dando origem a alianças das principais empresas privadas em torno de bancos privados e outras instituições financeiras. A constituição de grupos públicos nos mesmos moldes é desejável. O que seria indesejável seria condenar a banca pública ao esplêndido isolamento, ao gueto de arbitrárias compartimentações sectoriais.
Com efeito, a banca pública não poderá ficar à margem de duas tendências de fundo do novo modelo de crescimento em gestação. Uma dessas tendências traduz-se no abatimento das barreiras tradicionais entre especializações, actividades, sectores e países, dando origem a novas lógicas de especialização e de vantagem comparativa. A outra grande tendência de fundo é a articulação da multiplicidade de grupos económicos e de interesses públicos e privados em redes hierarquizadas de produção e partilha do valor acrescentado, segundo a capacidade de controle e uso da informação, da tecnologia e dos próprios mercados. A banca pública, no seu conjunto e através de cada uma das suas componentes, terá de encontrar novas modalidades de inserção nessas redes, valorizando o seu potencial próprio de coordenação e promoção da oferta diversificada de novos e velhos serviços, financeiros e outros, essenciais ao desenvolvimento das empresas nacionais.
Neste sentido, pensamos que a União de Bancos Portugueses poderá ainda ser reforçada, mediante a cooperação de outras entidades públicas para além das que já participam actualmente na sociedade.
Por estas razões não somos contra a passagem da União de Bancos Portugueses a sociedade de capitais
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públicos, mas temos de ser contrários às disposições e omissões do Decreto-Lei n.º 351/86, que violam ou. negligenciam a salvaguarda de direitos e garantias essenciais inerentes à natureza pública da União de Bancos Portugueses. Em conformidade, o Partido Socialista depositou na Mesa nove propostas de alteração ou aditamento ao referido diploma e estatutos anexos.
Em síntese, as propostas do Partido Socialista visam quatro grandes finalidades.
A primeira finalidade é a de salvaguardar, sem margem para dúvidas, a natureza 100% pública da União de Bancos Portugueses. Neste sentido, o Partido Socialista propõe um aditamento ao artigo 3.º, regulando a aquisição pelo Estado de acções detidas por entidades que eventualmente deixem de ter 100% de capital público, e um aditamento ao artigo 4.º, impossibilitando a assembleia geral de proceder à alteração da natureza jurídica da União de Bancos como sociedade de capitais públicos.
A segunda finalidade é a de clarificar a lógica empresarial da sociedade de capitais públicos, excluindo da sociedade a intromissão abusiva de fundos e serviços do sector público administrativo. A razão é óbvia: o sector público administrativo rege-se por uma lógica, político-burocrática muito diferente da visão empresarial necessária à União de Bancos Portugueses.
A terceira finalidade é a de compensar a União de Bancos Portugueses pelos encargos públicos da descolonização, que resultaram exclusivamente da posição especial do ex-Banco de Angola, posteriormente, integrado na União de Bancos Portugueses. Como é lógico, entendemos que. o mesmo princípio de compensação deverá ser estendido, nos mesmos termos, ao Banco Nacional Ultramarino.
A última finalidade, que é também a primeira das nossas finalidades, visa repor todos os direitos, sublinhamos bem, todos os direitos dos trabalhadores violados ou omitidos pelo Decreto-Lei n.º 351/86, quer os que se encontram acautelados pela Lei n.º 46/79, de 12 de Setembro, quer os que derivam de contratação, designadamente do contrato colectivo do sector bancário. Para esse efeito, o Partido Socialista propõe alterações ao artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 351/86 e aos artigos 14.º, 20.º e 24.º dos estatutos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Resta-nos apenas manifestar uma esperança e um receio.
A esperança é a de que todas estas alterações e aditamentos sejam rapidamente aprovados pela Assembleia da República, numa prova simultânea de real capacidade para entender e defender os superiores interesses nacionais e de eficiência na aprovação da legislação correspondente. O receio é o de que este governo, que começou por dar razões absurdas para a transformação da União de Bancos Portugueses em sociedade de capitais públicos, não esteja interessado no sucesso da única boa razão para essa transformação: o sucesso de um grupo público capaz de se consolidar e desenvolver no sentido do interesse nacional.
Mas, tudo ponderado, damos o nosso voto favorável na generalidade e com as ditas emendas, porque pensamos que é real a possibilidade de este governo sair do paradoxo que a si próprio criou e que consiste no seguinte: começou com a ideia fixa de privatizar por privatizar e acabou por demonstrar a esterilidade das suas obsessões.
Como vai o Governo sair deste paradoxo? Bem, pela força do reconhecimento geral da oportunidade do seu fim para dar o lugar a uma alteração política que conduza a soluções eficazes e duradouras, em vez dos confusos e tacanhos horizontes em que a política do Governo se enredou.
Neste momento, a União de Bancos Portugueses ameaça transformar-se, para este governo, no símbolo da sua incoerência, não só em relação ao País, mas em relação aos princípios que diz defender.
Tendo começado por ser um desejo e uma vontade de privatização, acabará, com certeza e com o apoio desta Câmara, por ser a consolidação de um grupo 100% público.
Aplausos do PS.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular pedidos de esclarecimentos ao Sr. Deputado. João Cravinho.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Deputado João Cravinho, ouvi- com a maior atenção e consideração a intervenção de V. Ex.ª e queria não colocar-lhe uma questão mas solicitar-lhe que elaborasse um pouco sobre um tema que lhe vou, propor. Aliás, V. Ex.ª é um notável elaborador, sendo que, portanto, nos fará, com certeza, o favor de explicitar ou elaborar um pouco mais sobre uma ideia que nos veio aqui trazer.
V. Ex.ª disse-nos que se deveria prevenir, neste diploma legal, que, por qualquer «porta do cavalo», por qualquer travessa ou por qualquer questão mais recôndita, se pudesse dar entrada a capitais privados na União de Bancos Portugueses. Portanto, vem expor-nos a eventual entrada de capitais privados na União de Bancos Portugueses como algo de execrável, de horrível - o que é, aliás, natural da parte de um deputado socialista...!
Por outro lado, veio V. Ex.ª também dizer que nada deve existir neste diploma que possa prejudicar a dinâmica empresarial da União de Bancos Portugueses.
Ora, como estamos habituados -e falo agora como cidadão comum- a ver pôr de um lado mais privado a lógica empresarial e a lógica não empresarial, a lógica social, de um lado público, gostaria que V. Ex.ª elaborasse um pouco -estou a dar-lhe essa oportunidade e espero que me o reconheça acerca de qual a ligação entre o facto de, por um lado, se procurar prever, à outrance, a proibição da entrada de capitais privados e, por outro, dizer que se pode, a partir daqui, criar uma dinâmica empresarial.
Não sei se V. Ex.ª está a entender a minha questão, mas julgo que lhe estou talvez a dar a «oportunidade da sua vida» de nos elucidar quanto a determinadas teses de fundo do PS e da esquerda democrática em geral!...
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder; tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Muito obrigado Sr. Deputado Borges de Carvalho, pela «oportunidade da minha vida».
Risos.
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Porém, suponho que é a oportunidade da sua vida e não da minha.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Não tem nada que agradecer!
O Orador: - De qualquer maneira, as suas perguntas tem, de facto, um fundo, e o que me espanta é que, numa matéria desta importância - se é realmente verdadeira a intenção do Governo de com isto alcançar (na minha opinião justificações perfeitamente erradas) um marco na evolução do sector público bancário, por caminhos totalmente errados -, a sua bancada não tenha rigorosamente nada a dizer sobre o assunto... bem, espantar-me-ia, pois percebo, aliás, por que é que não tem nada a dizer - quando se passam as coisas dali para aqui, não há retorno.
Quanto àquilo que é dito pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, a questão é perfeitamente simples. É que o PS é a favor do desenvolvimento da iniciativa privada, o PS é a favor do desenvolvimento da iniciativa pública...
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - É a favor de tudo!
O Orador: - ..., o PS reconhece, como está aqui no próprio texto, a finalidade social, útil, do lucro legitimo. No entanto, o que o PS não reconhece, não tolera, nem aceita é que, a propósito dos novos bens públicos, representados, de facto, no sector nacionalizado, se repita aquilo que no século XIX foi a venda dos bens da Igreja e semelhantes.
No nosso entendimento, a iniciativa privada encontra no sector público dois grandes apoios: por um lado, o apoio da clarificação de uma política de médio e longo prazo dirigida à inovação e também ao apoio do lucro legítimo baseado na iniciativa, no espírito de empresa e na inovação; por outro lado, tem também o benefício de contar com o sector público, que, sob a nossa gestão, será racionalizado, dinamizado, sendo complementar do sector privado e vice-versa. Não encontra é a possibilidade de depredar o sector público, abastecendo-se nele a baixo custo das necessidades.
Quanto ao carácter fechado da União de Bancos Portugueses relativamente ao sector público administrativo, tal é evidente. Com efeito, se se trata de uma sinergia que se quer fazer no mundo dos negócios, é obviamente inqualificável que se pretendam imiscuir nessa sinergia organismos cuja vocação é puramente burocrático-administrativa.
Este simples facto revela que quem fez o diploma não tinha, de facto, a noção de como poderão funcionar as sinergias no mundo moderno e até acabou, esse facto, por revelar que a única vantagem que poderá haver na União de Bancos Portugueses, como associação de empresas prestadoras de serviços, financeiras e industriais, acabaria por ficar anulada.
Que faz um serviço burocrático metido nisso? Ou faz a colocação de clientelas ou o controle dos organismos em causa por via do legado.
Qualquer dessas coisas é perfeitamente execrável...
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Não tem nada a ver com a minha pergunta!
O Orador: - Eu percebo que não tem..., mas tem que ver com o que está por detrás da sua pergunta!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - É para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Cravinho?
O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Exactamente! É para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Cravinho. Creio que fiz sinal atempadamente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado João Cravinho, naturalmente que algumas das suas intervenções merecem a nossa concordância. Contudo, subsistiram alguns pontos menos claros, em relação aos quais gostaria de ser esclarecido.
O próprio teor do Decreto-Lei n.º 351/86 não põe o problema dos capitais privados, visto que limita o aumento de capital ao capital de organismos e instituições do sector público.
A primeira dúvida que se me coloca prende-se com o facto de, quanto a este ponto, me parecer que o projecto do Partido Socialista é coincidente com o Decreto-Lei n.º 351/86.
O segundo aspecto que gostaria de realçar é o de que, para nós, a questão fundamental - e isso é, aliás, assumido pelo Governo no preâmbulo- é que, através desta forma de aumento de capital, a União de Bancos Portugueses deixa de ser uma pessoa colectiva de direito público, passando a ser uma pessoa colectiva de direito privado. Esta é a questão fundamental.
O que eu perguntava ao Sr. Deputado é se, efectivamente, na sua concepção a União de Bancos Portugueses passa ou não a ser uma pessoa colectiva de direito privado, embora com alguns acrescentos constantes das propostas apresentadas pelo PS, ou seja, se a União de Bancos Portugueses passaria a ser perdoe-me Sr. Deputado! - uma pessoa de direito privado «recauchutada», mas uma pessoa de direito privado e não uma pessoa de direito público.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Em relação à primeira questão, uma vez que o Governo já previa que a sociedade fosse 100% de capitais públicos, a nossa alteração vai no sentido de garantir que qualquer evolução futura dos societários não venha a alterar tal situação. Isso não estava devidamente acautelado, na medida em que, na prática, se poderia criar uma situação tal que uma empresa que participasse da União de Bancos Portugueses e mais tarde viesse a sofrer alterações do seu estatuto poderia prolongar a sua posição na União de Bancos Portugueses até se chegar a um acordo sobre o destino da sua parte.
No caso português, por razões que são conhecidas, essa situação poderia dar origem a uma indefinição que viesse posteriormente a servir para novas interpretações dos próprios estatutos. Isso fica completamente barrado, e, nesse ponto, não coincidimos de maneira
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nenhuma com o Governo. Mas, há uma coisa em que com ele coincidimos, e gostaríamos de deixar isso aqui bem claro: entendemos que, desde que esteja acautelada, com todas as garantias, á tutela pública sobre a empresa, esta transformação pode ser desejável.
Fazemos aqui um aviso: ou o sector bancário se reestrutura nos próximos dois ou três anos ou corre o risco de cair na vertical. Portanto, não podemos de maneira alguma fechar-nos a todas as sugestões que representem uma potencialidade, ainda que, de certo modo, de difícil concretização, desde que constituam uma efectiva potencialidade de transformação.
Quanto ao segundo aspecto, pensamos que, para além do fetichismo do direito - que levaria a classificar os entes como públicos ou privados (este trata-se de um ente ainda de .direito privado, com restrição ou garantias na defesa do interesse público, que são muito especiais, e estabelecidas por lei especial) -, temos de ver como as coisas são na prática.
Na prática, para muitos entes públicos, tal como eles funcionam, não é o facto de estarem submetidos ao. direito público que tem contribuído, para lhes dar uma vivência razoável.
Para nós, mais importante do que o fetichismo do direito público e do direito privado é o encontrar de soluções que funcionem e que acautelem, na prática, o interesse público.
Fica, assim, perfeitamente salvaguardado o aspecto essencial do direito público: o direito de tutela, porque todos os societários são a 100% de capital público. Portanto, com vários mecanismos de tutela, conjugando inclusivamente vários actores que têm a seu cargo a potência pública, é possível intervir aqui com tanta ou mais eficácia como noutros sectores.
A lei dirá que não é bem assim, que há, de facto, garantias do direito público que não estão aqui. A prática demonstra que nunca essas, garantias foram utilizadas em dez anos. Estou convencido de que não é a passagem a sociedade de capitais públicos que dá menos garantias práticas efectivas quando houver vontade política. O que tem faltado é vontade política, e esse é que é o problema.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Mui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata será extremamente breve na sua intervenção acerca desta ratificação, que obviamente não solicitou, do decreto-lei que transforma em sociedade anónima de responsabilidade limitada, e de capitais exclusivamente públicos, a União de Bancos Portugueses.
A primeira observação diz respeito ao. facto de este. debate não ter feito surgir nenhuma novidade significativa. Todas as bancadas que se pronunciaram limitaram-se a expender argumentos já conhecidos.
Permitam-me que sublinhe que o PS, que fez uma intervenção inteligente, várias vezes disse que era importante não cedermos ao fetichismo do direito público e do direito privado, de encontrarmos soluções que funcionem, e até criticou o Governo pela circunstância de ser necessário que as soluções sejam soluções que desenvolvam sinergias, que permitam uma adaptação (e reestruturação) da banca pública aos novos condicionalismos que enfrenta, sob pena de soçobrar.
Apesar destes propósitos, hão foi capaz de ir além de uma concordância na generalidade, acabando por propor tais alterações, tais modificações com tantas peias que acaba, afinal, por inviabilizar, por ser contraditório com aquilo que ele próprio - PS - diz defender.
Penso que é sintomático o seguinte aspecto nesta matéria: nós continuamos fiéis a um dogma que levou a enxamear a nossa Constituição de uma série de expressões colectivizantes publicizantes, e algumas delas marxizantes, esquecendo que o essencial é encontrar, fornias que permitam assegurar o progresso. . Não somos - o PSD - contra as empresas públicas, nem entendemos que se justifique em todos os casos a privatização pela privatização - nem é isso que neste momento se encontra em discussão -, mas não podemos deixar de sublinhar que nos parece francamente inadmissível (e acaba por ter efeitos perversos) sacrificar a fórmulas que já demonstraram a sua ineficácia e, afinal de contas, esquecer as verdadeiras realidades. Continua-se a insistir, justamente porque se quer prestar preito a dogmas vazios de conteúdo, ou que não foram capazes de funcionar, em determinadas soluções que já demonstraram não serem capazes de dar os frutos que inicialmente se esperavam.
Penso que esse é um dos pontos mais significativos e importantes deste debate.
Quere-se, e penso que bem, encontrar soluções que dêem às empresas públicas e, neste caso concreto, ao sector bancário - uma nova dinâmica; que sejam capazes de enfrentar a especialização e a internacionalização a que a banca, tanto pública como privada, tem que fazer face; que encontrem soluções capazes de cativar os clientes que encontrem formas inovatórias de prestação de novos serviços que sirvam efectivamente a economia nacional e, em todo o caso, insiste-se em manietar, em encontrar coletes de forças que impedem justamente essa adaptabilidade às novas situações.
Julgo que é uma contradição que resulta da forma dogmática ou ideológica como estas matérias continuam a- ser perspectivadas e que é a primeira conclusão importante a retirar deste debate. E é por isso, penso, que as intervenções do PS e do PRD são contraditórias, porque tem determinados propósitos, determinados objectivos e acabam por recusar alguns dos meios essenciais para os alcançar.
Já assim não acontece, obviamente, no que concerne à intervenção do PCP e do MDP/CDE - esses são perfeitamente coerentes na rígida monolítica com que continuam a insistir nas fórmulas colectivizantes e sem margem para qualquer inovação, nem resposta concreta às novas necessidades.
O segundo aspecto diz respeito aos problemas constitucionais que foram suscitados. Sem me pretender alongar, direi que a interpretação do artigo 83.º, n.º 1, da Constituição, que pareceu fazer vencimento na intervenção daqueles que tiveram, sobretudo, a preocupação de evitar qualquer fórmula, ainda que disfarçada, de privatização, não são as únicas interpretações possíveis em relação ao que se encontra escrito nesse preceito constitucional.
O que parece seguro e claro, e que obtém o consenso dos autores, é que, em matéria de nacionalizações, é necessário assegurar dois princípios básicos (tal como eles são inscritos na Constituição): o primeiro é o da continuidade das nacionalizações, isto é, que aquele capital, aquele acervo de bens que foi nacionalizado
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permaneça na titularidade do sector público - e esse aspecto está amplamente assegurado pela circunstância de se tratar de uma empresa de capitais públicos; o segundo, é justamente o cotejo entre o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 83.º, que leva a concluir que se torna ainda necessário que a gestão permaneça no sector público. Também ai se torna claro que o diploma agora objecto de ratificação assegura e permanência dessa gestão no sector público.
É, por outro lado, evidente que a própria Constituição, apesar de insistir - a nosso ver, demasiado - num princípio socializante de colectivização, não confunde a nacionalização com a socialização. É assim que, nos diversos artigos que a partir do artigo 89.º tratam da estrutura da propriedade dos meios de produção, claramente se acentua uma diferença entre a estatização e a socialização.
O facto de passarmos de uma empresa pública para uma sociedade privada de capitais públicos, significa que se viabiliza e se agiliza esse princípio da sociedade.
Nestes termos, entendemos que esta iniciativa do Governo é um primeiro ensaio, e aqueles que acusam o Governo de ser tímido deveriam avançar com propostas significativas para uma solução mais alargada e progressiva - ou não viessem a inviabilizar, pela introdução de alterações que, afinal de contas, acabam por tornar inútil esta alteração, retirando-lhe toda a ductilidade. Esses, dizia eu, acabam afinal por, na prática, negarem aquilo que afirmam na teoria.
Deste modo, penso que o Governo fez bem em não apresentar algo de extremamente geral, porque se, mesmo uma medida que é limitada, prudente e como foi dito por alguns dos seus críticos -, tímida, suscita estes tipos de reacções e esta chuva de alterações, o que aconteceria se não se fizesse esta primeira experiência e se apresentasse um modelo geral da gestão dos organismos públicos de carácter bancário?
Resta-me acrescentar um outro ponto que, suponho, é extremamente relevante.
Foi dito que, em matéria de empresas públicas, a questão fundamental seria o comportamento da tutela em relação aos órgãos de gestão. E é verdade que um dos problemas essenciais em matéria de empresas públicas é precisamente o de garantir a sua verdadeira autonomia face aos órgãos de soberania - não apenas ao Governo mas também à assembleia da República.
Um dos motivos pelos quais as empresas públicas têm infelizmente falhado na sua missão criadora de riqueza, em muitos pontos, resulta basicamente do facto de não terem suficiente autonomia face aos poderes públicos.
Ora esta solução, se não lhe introduzirmos as modificações agora propostas, que, afinal de contas, pretendem reproduzir na sociedade comercial aquilo que já existia nas empresas públicas, mas sem ser praticado - diga-se em abono da verdade - e mantivermos a forma proposta pelo Governo, isso garantirá uma maior autonomia dos órgãos de gestão face aos órgãos de soberania.
Justamente o que me parece altamente criticável nas propostas apresentadas pelo PS e pelo PRD é a insistência em alterações que, afinal de contas, redundam numa clara diminuição, por um lado, da autonomia face aos órgãos de soberania, designadamente face ao Governo e à Assembleia da República, e, por outro lado, vêm criar limitações que dão à nova sociedade um estatuto de menoridade em relação às suas concorrentes, as sociedade privadas.
Nestes termos, obviamente que o PSD continua a votar pela aprovação da ratificação a este diploma, mas não pode naturalmente concordar com a maioria das propostas de alteração apresentadas, pensando que, nestes termos, se presta uma mau serviço e não se conseguem os propósitos que, teoricamente, foram enunciados quando se diz aprovar na generalidade o diploma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Rui Machete inscreveram-se os seguintes Srs. Deputados: João Cravinho, Vítor Ávila, Octávio Teixeira e Raul Castro.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Deputado Rui Machete, ouvi com atenção as suas considerações e confesso que fiquei muito surpreendido por o ver fazer afirmações que não resultam necessariamente do exame nem das nossas propostas nem de alguma coisa que aqui tenha sido dita. Nomeadamente, quando disse que o PS teria uma vontade bloqueadora, que iria criar obstáculos ao funcionamento da sociedade através de mecanismos, que são exactamente o contrário daquilo que corresponde à sua intenção.
Ora bem, as nossas propostas visam fundamentalmente impedir que a dissolução possa ser feita por assembleia geral, sem confirmação por parte do Governo, via decreto-lei. O Sr. Deputado acha que este obstáculo, esta rigidez introduzida é realmente grave? Acha bem que a sociedade pudesse ser dissolvida sem que o Governo fosse tido ou achado? Acha isso de tal maneira grave?
O segundo ponto diz respeito aos direitos dos trabalhadores, matéria em que a nossa proposta não visa mais do que mante-los. O Sr. Deputado acha que o grande obstáculo ao desenvolvimento deste País são os direitos dos trabalhadores nos parcos casos em que a lei lhes garante efectiva participação - por exemplo, no conselho fiscal? Acha que é isso que bloqueia o desenvolvimento do nosso país? Desbloquear o desenvolvimento no nosso país é, portanto, ir sempre contra os direitos dos trabalhadores?
O último ponto diz respeito a ser uma sociedade pública ou integrar o sector público administrativo. Uma das nossas propostas visa retirar ao Governo a possibilidade de fazer o sector público administrativo participado fora de toda a sua lógica, fora de tudo quanto possa entender-se como a sua vocação na União de Bancos Portugueses. Acha que isso é bloquear a União de Bancos Portugueses?
Devo dizer que o Sr. Deputado acha que a União de Bancos Portugueses só singrará se forem retirados direitos aos trabalhadores, se pudermos misturar entre os societários serviços públicos administrativos sem qualquer controle político?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ávila.
O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Sr. Deputado Rui Machete, como é hábito, ouvi com atenção a sua intervenção e fiquei surpreso com as conclusões que tirou, designadamente quanto à «posição contraditória do PRD» no que se refere a esta ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86.
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Uma vez que na minha intervenção referi que o PRD é favorável a um funcionamento eficaz do sector público o Sr. Deputado referiu-se às nossas propostas que então ainda não estavam distribuídas, mas que entretanto o foram -, que nas nossas propostas não há nada que vá contra a autonomia que deve existir em relação ao sector público, nomeadamente à União de Bancos Portugueses, nem qualquer das alterações por nós apresentadas deixa de ter em vista o respeito pela Lei n.º 36/74, sobre direitos dos trabalhadores e, por outro lado, não se retira qualquer poder ao conselho administrativo em termos de gestão corrente e eficaz da empresa, não vejo onde é que o Sr. Deputado encontra limitações à autonomia da gestão, nas propostas apresentadas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Rui Machete, na sua intervenção reportou-se várias vezes de forma crítica às formas dogmáticas e ideológicas com que, em seu entender, este assunto das empresas públicas tem sido tratado. Mas, ao fim e ao cabo, toda a sua intervenção se revestiu de uma forma dogmática e ideológica. Ao fim e ao cabo, o que o Sr. Deputado aqui veio fazer foi mostrar a «rigidez monolítica» que o PSD continua a manter em relação à pretensão de destruir as empresas públicas e de eliminar o sector público da economia.
Em relação às questões concretas que pudessem justificar as suas críticas, essas não existiram ou as que existiram desculpe que lhe diga são ridículas e vou dar-lhe dois ou três exemplos.
Sobre a questão da nova dinâmica que deveria ser introduzida nas empresas públicas e a que a transformação em sociedades anónimas poderia conduzir, fala-me, por exemplo, no caso dos bancos, em formas de atendimento de clientes e na prestação de novos serviços.
Ó Sr. Deputado, em que é que o estatuto de uma empresa pública impede um banco público de prestar novos serviços, de atender desta ou daquela forma os seus clientes? Não há nada que vá contra isso. Nada, de facto, em termos práticos, justifica a defesa dogmática e ideológica feita pelo Sr. Deputado da transformação de empresas públicas em sociedades anónimas.
Refere a insuficiência da autonomia face à tutela, que seria colmatada com aquela transformação em sociedades anónimas. Sr. Deputado, o seu argumento logo à partida, neste caso concreto, vem por terra, pois foi a tutela que obrigou e o Sr. Deputado não tem dúvidas sobre isso as empresas públicas e o fundo que participaram no aumento de capital desta empresa a fazê-lo...
Do ponto de vista da racionalização empresarial da empresa, da rentabilidade do investimento, nenhuma dessas empresas teria feito este investimento ou então os seus gestores seriam imediatamente demitidos. E só a tutela obrigou - e obriga - que essas empresas e este fundo viessem aumentar o capital das empresas públicas.
Para terminar, Sr. Deputado Rui Machete, quero dizer-lhe que chamou a atenção para a questão fundamental parece-nos neste caso concreto. No final da sua intervenção referiu que esta iniciativa do Governo é um primeiro ensaio deste mesmo Governo que pretende, caso esse ensaio venha a ter ratificação por esta Assembleia da República, vir depois a estendê-lo. É esse o grande problema que aqui nos é colocado, é o grande problema que esta Câmara que é política deve ter em consideração e é com consciência desse perigo que deve votar, porque é o problema de ser um primeiro ensaio...
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... o que decorre desta iniciativa do Governo.
Não tenhamos dúvidas, e julgo que ninguém as tenha, de que, se a Assembleia da República vier a ratificar este diploma, estará, para além de abrir caminho para todos esses perigos, a absolver politicamente a inconstitucionalidade orgânica existente neste decreto-lei, porque o Governo não pode fazer estas alterações como o Sr. Deputado muito bem sabe- tal como tem sido assumido através de diversos acórdãos do Tribunal Constitucional.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raúl Castro (MDP/CDE): - Sr. Deputado Rui Machete, em primeiro lugar, quero agradecer-lhe o reconhecimento da coerência da minha bancada e retribuir-lhe o cumprimento, dizendo que a sua também o é, quando ataca o sector público. Ambos somos coerentes: nós quando defendemos, o PSD quando ataca.
A propósito da classificação «monolítica» das reformas colectivizantes, creio que esta é uma expressão ambígua com que o Sr. Deputado designa as normas constitucionais. Se elas para si representam essa rigidez monolítica de reformas colectivizantes, isso é com o Sr. Deputado, porque para nós a Constituição deve ser cumprida e tentamos fazê-lo.
O Sr. Deputado preocupou-se exclusivamente com o artigo 83.º da Constituição, mas a verdade é que na minha intervenção citei várias normas constitucionais que o decreto-lei viola - e não foi só o artigo 83.º -, nomeadamente a alínea g) do artigo 68.º, relativo à falta de competência do Governo para apresentar este diploma, pois é matéria da competência relativa da Assembleia da República, o artigo 92.º, a alínea f) do artigo 55.º e o artigo 90.º, tudo disposições constitucionais violadas , pelo Governo ao apresentar este diploma.
Finalmente, Sr. Deputado, peco-lhe um outro esclarecimento. Fiquei sinceramente admirado com a sua afirmação de que este diploma assegura a continuação da União de Bancos Portugueses no sector público, quer dizer, verifico que o Sr. Deputado é «mais papista que o Papa», porque o próprio Governo, que tem por base o seu partido, afirma no preâmbulo que com esta transformação a UBP deixa de ser uma pessoa colectiva de direito público e passa a ser uma pessoa colectiva de direito privado. Há no sector público pessoas colectivas de direito privado? Penso que não! Com certeza não era isso o que o Sr. Deputado queria dizer, deve tratar-se de uma confusão.
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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete. Informo-o, Sr. Deputado, de que o seu grupo parlamentar dispõe de quatro minutos.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei pelo fim, ou seja, pela interpelação do Sr. Deputado Raul Castro, para lhe dizer, Sr. Deputado, que talvez eu seja mais papista que o Papa, mas que V. Ex.ª segue melhor o Manual de Direito Administrativo do Dr. Marcello Caetano do que eu.
Risos do PSD.
Como sabe, essa é uma matéria que hoje é perspectivada de diversas formas, consoante os autores, e o que interessa não é tanto a fórmula de direito administrativo mas o saber se o Estado tem ou não o controle. Se V. Ex.ª der, por exemplo, uma mirada por aquilo que se passa em França, verificará que o próprio conceito de empresa pública, nesse caso, abrange os casos das empresas de capital público e privado simultaneamente, as chamadas empresas mistas, e que, aí, todos os autores concordam que o que é determinante nessa matéria é que o Estado detenha o controle efectivo dessas empresas.
Neste caso, vai-se mais além e exige-se que o Estado detenha a totalidade do capital. O problema mão está, pois, em saber se é pessoa colectiva de direito público ou privado e nem foi esse o contexto que utilizei.
Por outro lado, em relação ao artigo 168.º - e é o único ponto que tratarei, pois não terei tempo de abordar os restantes -, quanto à reserva relativa da Assembleia, pois muito bem, se V. Ex.ª meditar, por exemplo, no voto de vencido do conselheiro Cardoso da Costa no Acórdão do Tribunal Constitucional sobre a SOCARMAR, verificará que ele fez uma demonstração luminosa de que essa matéria não pertence ao estatuto das empresas públicas, pois é precisamente a delimitação do que pertence ou não pertence às empresas públicas. Portanto, não há nenhuma violação orgânica do princípio de reserva de competência da Assembleia da República - se V. Ex.ª quiser ver essa demonstração, poupar-me-á o gastar alguns minutos com ela.
Quanto às questões fundamentais que foram postas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que tem toda a razão: isto é realmente apenas um ensaio, e não o é apenas para o Governo mas também para a sensibilidade da Assembleia da República. Trata-se de saber se a Assembleia da República permanece dogmática e cega acerca daquilo que foi a experiência negativa de várias empresas públicas, se contra ventos e marés pretende manter-se inalterável e imperturbável e, afinal de contas, deixar que a realidade à sua volta evolua de uma maneira diferente. O mesmo vale, aliás, em relação a considerações feitas por outros Srs. Deputados, designadamente os Srs. Deputados João Cravinho e Victor Ávila. Ë que não estamos perante um problema puramente formal ou dialéctico de uma interpretação a contrario, como aquela que o Sr. Deputado João Cravinho fez ao dizer que se é contra os interesses dos trabalhadores ao não aceitar as propostas de alteração feitas pelo Partido Socialista. O problema essencial é o de saber se queremos permanecer ad eternum agarrados a determinados princípios formais e imperturbáveis da Constituição, enquanto a realidade ao nosso lado e a de outros países se vai desenvolvendo, se ficamos felizes mantendo determinados direitos inalteráveis, mas com um conteúdo cada vez menor ou se, pelo contrário, queremos uma realidade dinâmica aberta e capaz de inovar, de crescer, de progredir. Esse é que é o problema. E quando se vem dizer que nada obsta a que uma empresa pública preste bons serviços, tal como uma empresa privada, isso é verdade. Só que na realidade das coisas temos ainda a verificar, infelizmente, que em muitas empresas públicas tempos assistido a uma contaminação e a uma burocratização sucessiva em relação ao Estado, o que leva a que, sendo possível em teoria - e os livros explicitam teorias magníficas que poderiam transformar-se de sonhos em magníficas realidades concretas -, a realidade a que assistimos seja bastante distinta. É por isso que nós pensamos que tudo aquilo que seja perpetuar e transferir o modelo da empresa pública para a sociedade anónima de capitais públicos, incluindo a Lei n.º 46/79, que como o Sr. Deputado João Cravinho sabe não tem sido aplicada, é negativo e acaba por ser contraditório com os propósitos de que V. Ex." defende e de cuja sinceridade eu não duvido, como não duvido igualmente da sinceridade dos propósitos do Sr. Deputado Victor Ávila.
A meu ver, defendem-se melhor os direitos dos trabalhadores conseguindo que as empresas sejam empresas ricas e progressivas do que atrofiando-as, acabando-se assim, defendendo embora formalmente os direitos de alguns trabalhadores que lá estejam, por impedir, ao mesmo tempo, que essas empresas possam promover novos empregos e melhorar a situação económica e o estatuto desses trabalhadores.
Por tudo isto, penso que a solução preferível é aquela que foi apresentada pelo Governo que - repito - ainda é uma solução tímida, mas é um primeiro ensaio, sem dúvida preferível a voltarmos por esta forma enviesada a repor, sob a forma de sociedade comercial, aquilo que há de negativo no modelo das empresas públicas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado este debate. Vamos passar às votações pela ordem prevista, ou seja, primeiro a Lei de Licenciamento das Estações Emissoras de Radiodifusão, depois o orçamento da Assembleia da República e, finalmente, as ratificações.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, ao abrigo das disposições regimentais, pedimos uma interrupção de quinze minutos.
O Sr. Presidente: - Está concedida, a sessão recomeçará às 18 horas e 25 minutos.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 25 minutos.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, peço à palavra para interpelar a Mesa.
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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, ao abrigo das disposições regimentais, pedimos a suspensão por mais 30 minutos.
O Sr. Presidente: - Está concedida. A sessão recomeçará às 19 horas.
Neste momento a sessão foi suspensa.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 19 horas e 10 minutos.
Sr. Deputado, vamos passar à votação final do texto da Lei de Licenciamento das Estações Emissoras de Radiodifusão proveniente da Comissão.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, como ficou patente na última reunião deste Plenário e como tive ocasião de na altura referir, considero que esta reunião se realiza à revelia do Regimento, uma vez que foi convocada no seguimento de um prolongamento ilegítimo e ilegal dos trabalhos parlamentares, na passada quinta-feira.
Protestos do PCP.
O Orador: - Ou seja, ao contrário do que o Regimento diz e sem que para tal houvesse consenso, o requerimento de prolongamento da sessão deu entrada na Mesa às 20 horas e S minutos e, portanto, fora da hora regimental. No entanto, por imposição de uma maioria ad hoc, a sessão foi ilegitimamente prolongada e, no seu seguimento, fez-se esta sessão.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, considero esta sessão como ilegal, inconstitucional, anti-regimental e ilegítima. Peço, portanto, à Mesa que me esclareça sobre o que é que pensa a esse respeito.
Sr. Presidente, nessa reunião de quinta-feira foi ainda ventilada a ilegalidade da votação que V. Ex.ª acabou de anunciar, em face do n.º 2 do artigo 155.º do Regimento, que diz que a votação final global se deve realizar duas sessões após a publicação no Diário da Assembleia da República do texto a votar, coisa que ainda não se verificou, ou, alternativa e cumulativamente, após a sua distribuição aos grupos parlamentares, aos agrupamentos parlamentares e aos Srs. Deputados Independentes.
Sr. Presidente, não se verificam estas condições. Não sei se o texto em causa foi distribuído aos grupos parlamentares, é possível que tenha sido, aos agrupamentos parlamentares não foi porque não há agrupamentos parlamentares, aos deputados independentes não foi, pois tem V. Ex.ª a minha palavra como prova disso mesmo. Ora, se não foi distribuído, não pode ser votado.
Risos do PCP.
E não se alegue que há uma maioria que pretende proceder a tal votação anti-regimentalmente, porque até ver, em Portugal, a democracia não é a ditadura da maioria, mas o exercício do poder legítimo por essa maioria.
Aplausos do CDS e do PSD.
Ora, é completamente ilegítimo que, sem haver consenso nesta Assembleia, se proceda a uma votação para a qual não estão reunidas as condições regimentais, inegavelmente indispensáveis para que ela se faça.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Pergunto por isso a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se a Mesa adia esta votação ou se contesta o ilegítimo agendamento desta votação para este momento, aqui e agora.
Aplausos do CDS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, considero algumas das considerações do Sr. Deputado Borges de Carvalho completamente extemporâneas; o prolongamento da sessão foi feito regularmente e o requerimento a que se referiu o Sr. Deputado Borges de Carvalho só foi posto à votação em cima da hora, pois só nessa altura houve oportunidade de o ler e pôr à votação.
Quanto à inclusão na ordem de trabalhos desta matéria, não houve até à data nenhum recurso, pelo que não tenho mais nenhuma explicação a dar ao Sr. Deputado Borges de Carvalho.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, V. Ex.ª acaba de me dizer que o requerimento foi lido depois da hora regimental por motivos atinentes ao decorrer dos trabalhos, o que aceito integralmente.
Agora quero, se V. Ex.ª me der licença, pedir-lhe que leia a hora de entrada, que há-de estar escrita no requerimento, pois é essa a hora que interessa. Como o requerimento só podia ser apresentado até às 20 horas ou eu estarei enganado ou, então, estará V. Ex.ª.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da Lei do Licenciamento das Estações Emissoras de Radiodifusão. Para esse efeito, há na Mesa um requerimento que vou passar a ler.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, verifico que V. Ex.ª não é sensível ao tipo de argumentação aqui produzida pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, argumentação essa que pode inquinar o diploma que vamos votar. Se a Mesa não é sensível a
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esta argumentação, que pode ser defendida e desenvolvida em sede de julgamento a posteriori da constitucionalidade, isso será a consciência da Mesa e de V. Ex.ª Sr. Presidente.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - É da sua responsabilidade, Sr. Presidente.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se levássemos a interpretação do Sr. Deputado Borges de Carvalho que eu não considero correcta às últimas consequências, a própria sessão de hoje seria ilegítima desde o início.
Houve consenso para a realização da sessão, pois, na conferência de líderes, não houve oposição ao seu agendamento, pelo menos significativa.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não lhe concedo a palavra para qualquer outra intervenção.
Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.
Protestos do deputado independente Borges de Carvalho.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é chicana!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Olha quem fala!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entraram na Mesa requerimentos de avocação a Plenário de alguns artigos respeitantes a esta votação, que vão ser lidos.
Estes requerimentos já foram distribuídos.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, estou a pedir a palavra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já disse que não lhe concedo a palavra.
Protestos do deputado independente Borges de Carvalho.
Já lhe respondi o que tinha a responder, Sr. Deputado.
Protestos do deputado independente Borges de Carvalho.
Protestos do PS.
Protestos do deputado independente Borges de Carvalho.
O Sr. Torres Couto (PS): - É uma vergonha!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, está a exceder-se nas suas expressões, está nervoso e, por isso, nem sequer levo em consideração o que acabou de dizer.
Já lhe disse que não lhe concedo a palavra para interpelar a Mesa nem atenderei mais às suas reclamações.
Pausa.
Srs. Deputados, enquanto aguardamos a chegada dos requerimentos que anunciei há pouco, vai ser lido um ofício entregue na Mesa pelo Governo, e que também já mandei distribuir.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Ofício dirigido a S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República:
Em 27 de Maio de 1986 foi aprovada, na generalidade e por unanimidade, a proposta de lei n.º 20/IV, sobre licenciamento de estações emissoras de rádio, a qual baixou à comissão parlamentar respectiva para apreciação e votação na especialidade.
Promovida esta, e sem que tenha sido solicitada a participação do Governo nos respectivos trabalhos, o texto aprovado em Comissão foi enviado para o Plenário, nos termos regimentais, para votação final global.
Da análise agora efectuada no texto, e só agora o Governo a pôde fazer pela razão já aduzida, constata-se que o mesmo, em aspectos essenciais, se traduz num claro desvirtuamento da proposta de lei referida.
De facto, a subordinação dos actos de concessão a um parecer vinculativo do Conselho da Rádio traduz-se num claro desvirtuamento do regime originariamente preconizado, transformando o Governo em mero executor de decisões tomadas por outrem e constitui uma flagrante violação do princípio constitucional e da separação de poderes, contrariando igualmente o princípio de que é o Governo o órgão superior da administração pública. Por outro lado, o disposto no artigo 48. º no texto agora aprovado resulta numa clara violação de direitos e expectativas adquiridas, com a qual não podemos estar de acordo por menos respeitadora dos legítimos interesses de entidades cuja boa fé se tem por inquestionável.
Pelo exposto, o Governo solicita a V. Ex.ª que considere sem efeito, pela sua retirada, a proposta de lei n.º 20/IV, que no seu entender não se reconhece minimamente no texto presente ao Plenário pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Se, atento o Regimento interno da Assembleia da República, for considerado que não é de conceder o que agora se requer, sempre gostaríamos de deixar explícito que o Governo se dessolidariza do actual processo legislativo por considerar, obviamente com o devido respeito pelas competências próprias da Assembleia da República, que o conteúdo daquela proposta foi drasticamente alterado em dois pontos que se consideram fundamentais.
Mais se solicita a V. Ex.ª que da presente comunicação seja dado conhecimento aos grupos parlamentares em momento anterior à votação final global pela via que considerar mais adequada.
Com os melhores cumprimentos.
O Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, Joaquim Fernando Nogueira.
Pausa.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço-lhe que aguarde um momento, pois a Mesa está a consultar o Regimento, a fim de examinar as consequências da apresentação deste requerimento.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, talvez a minha interpelação ajude a meditação da Mesa.
O Sr. Presidente: - No entanto, Sr. Deputado, peço-lhe que aguarde um momento.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Pede-me para aguardar a meditação da Mesa?!
A vossa interpretação é mais importante do que a de um deputado?!
Risos do CDS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Isso é muito subjectivo, Sr. Deputado. Ver-se-á.
Pausa.
Srs. Deputados, o artigo 130.º do Regimento refere-se explicitamente ao cancelamento de iniciativas legislativas.
O n.º 1 do citado artigo diz: «Admitido qualquer projecto ou proposta de lei, ou qualquer proposta de alteração, os seus autores podem retirá-lo até ao termo da discussão.»
Ora, a proposta não foi retirada até ao termo da discussão, pois, neste momento, estamos em votação final global. Por consequência, julgo que a retirada da proposta do Governo, neste momento, não prejudica a votação final global que estava fixada.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra, para interpelar a Mesa, o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, queria questionar o Governo sobre a possibilidade da comparência, perante a Assembleia, do Sr. Ministro que assina o ofício que foi lido, porque - e sem qualquer desprimor para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares aqui, presente - o CDS queria ser esclarecido sobre alguns aspectos que nos suscitam dúvidas de interpretação. E sempre é melhor a interpretação dada pelo próprio autor do que a que é dada pelos outros intérpretes.
Em segundo lugar, julgo que a discussão ainda não está terminada, na medida em que há na Mesa requerimentos de avocação a Plenário de alguns artigos que, naturalmente, serão discutidos aqui.
Portanto, a discussão continuará e o Governo está regimentalmente dentro do tempo oportuno para retirar a sua proposta. Por isso, não concordamos com a interpretação apressada e ligeira dada pela Mesa.
Esta é a razão pela qual eu disse ao Sr. Presidente que talvez aquilo que eu ia dizer servisse para melhor meditação da Mesa.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, a minha interpretação do n.º 1 do artigo 13.º é praticamente literal.
Acho que a sua interpretação ajudou pouco a Assembleia da República neste caso.
Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, a interpretação da Mesa faria sentido depois de votados os requerimentos pendentes na Mesa porque, caso sejam avocados a Plenário os dispositivos constantes destes requerimentos, não está encerrada a discussão e fez sentido a retirada da proposta de lei.
Portanto, teríamos de aguardar por esse momento.
Mas também interpelo a Mesa porque, no meio de uma curta agitação produzida na Sala, a propósito de interpelações anteriores, fiquei com a seguinte dúvida: a Mesa foi interpelada sobre duas questões fundamentais, sendo a primeira a de se saber qual tinha sido a hora da entrada na Mesa do requerimento - parece que está registada no próprio requerimento e eu julgo ter sido às 20 horas e 5 minutos.
Ora, isto tem de ser confirmado para sabermos da sua legitimidade.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Só agora!
O Orador: - Só agora é que o problema foi levantado por um deputado, que tem direito a levantá-lo. É que, embora esse Sr. Deputado seja independente, parece que isso não o diminui aos olhos dos outros.
Vozes do PSD: - Muito bem! Protestos do PCP.
O Orador: - Em segundo lugar, tem de ser dada uma resposta, pois suponho que o Sr. Deputado em causa recorreu do agendamento, pelo facto de não lhe ter sido distribuído o diploma em apreço, já que tem direito a que o mesmo lhe seja distribuído.
Pelo menos, a Mesa tem de responder a esta questão: o diploma foi ou não entregue? E não tendo sido entregue, passa-se uma esponja sobre o assunto? Foram os serviços que não estiveram atentos? Foi a Mesa que não deu instruções nesse sentido? Parece-me um pouco precipitado calar esta situação.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - E estou a manter-me a um certo nível da discussão, não entrando noutro tipo de pormenores.
Sr. Presidente, estas três questões deviam ter sido elucidadas. A sua interpretação a propósito do pedido do Governo, Sr. Presidente, é eventualmente certa, mas só depois do resultado das votações dos requerimentos de avocação a Plenário, porque, se forem aprovados, o Governo pode retirar a proposta.
Além disso, gostaríamos de ouvir a sua resposta a duas questões suscitadas pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, o que me parece fundamental.
Aplausos do CDS, do PSD e do deputado independente Borges de Carvalho.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, penso que a sessão de hoje é inteiramente legal, pois foi convocada na sexta-feira, nos termos habituais. Além disso, penso que tal convocação não está articulada com o prolongamento da sessão de quinta-feira.
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O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - A que horas entrou o requerimento?
O Sr. Presidente: - Na verdade, podemos verificar qual foi a hora de registo de entrada na Mesa do requerimento de prolongamento da sessão de quinta-feira.
Neste momento, não posso dar essa informação, mas espero que a Mesa me forneça esses dados.
Quanto aos requerimentos de avocação a Plenário, serão votados a seguir, introduzindo uma questão nova, sobre a qual solicito a opinião dos restantes grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Bastos.
O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Presidente, na sexta-feira passada eu estava na Mesa como secretário e confirmo que o requerimento deu entrada as 20 horas e 5 minutos.
Vozes do PCP: - Não pode ser. Não é verdade! Protestos do CDS.
O Orador: - O despacho está exarado no próprio requerimento -aliás, os restantes membros da Mesa aperceberam-se disso -, o qual deu entrada às 20 horas e 5 minutos.
Confirmo esse despacho, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só há um equívoco, porque isso se passou na quinta-feira e não na sexta-feira.
Na sexta-feira realizou-se uma sessão, perfeitamente regular; a reunião de hoje foi convocada durante essa sessão de sexta-feira, depois de uma reunião de líderes parlamentares, cumprindo-se, com isso, todas as regras regimentais.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Era ilegal!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, não queria intervir, mas acho lamentável o que se está a passar.
Vozes do CDS: - É de facto muito lamentável!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Penso que, se porventura existissem quaisquer dúvidas quanto à validade da convocação desta sessão, elas estariam ultrapassadas. Ela foi hoje convalidada pela própria Assembleia, quando aceitou estar até às 19 horas e 30 minutos no exercício das suas funções, sem ter levantado quaisquer problemas.
E o que é mais estranho, e mostra bem o significado real das intervenções e a sua dimensão, é que o Sr. Deputado Borges de Carvalho, que vem agora levantar a legalidade ou a ilegalidade desta reunião, não se coibiu de intervir nela, pedindo esclarecimentos, usando da palavra. E depois de, pela sua própria atitude, ter convalidado a realização desta reunião, vem agora levantar dúvidas quanto à sua legalidade.
Penso que não vale a pena dizer mais nada, Sr. Presidente.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Para defesa da honra, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Lopes Cardoso: Há pouco, comecei a minha interpelação à Mesa exprimindo a minha opinião quanto à ilegalidade desta reunião.
Exprimi a minha opinião quanto a esta ilegalidade e pedi ao Sr. Presidente que me dissesse, para minha informação está no meu direito e espero que V. Ex.ª não me o negue -, a que horas tinha entrado o tal requerimento para o prolongamento da sessão. Esta questão está sobejamente esclarecida: o requerimento entrou depois da hora regimental, à revelia das disposições, e sem que houvesse consenso para a sua aceitação.
No entanto, Sr. Deputado Lopes Cardoso, eu pedi esta informação à Mesa. Foi a primeira parte da minha interpelação.
A minha segunda interpelação e o Sr. Deputado, como democrata que é, confirmar-me-á se é ou não assim foi no sentido de saber se o direito desta Assembleia ou da maioria desta Assembleia, nem que seja de 249 deputados,...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ou até mais!
O Orador: - ... pode passar por cima dos direitos de um cidadão, quanto mais de um deputado, quando eles estão inscritos na lei.
Protestos do deputado do PS Raúl Rêgo.
A questão é a de saber se a nossa democracia se funda no poder discricionário e ditatorial das maiorias, tal como a maioria a que V. Ex.ª pertence e assume,...
Protestos do deputado do PS Raúl Rêgo.
... ou se os direitos do homem, e por maioria de razão, os direitos do deputado, se sobrelevam ao poder discricionário e atrabiliário das maiorias de que V. Ex." faz parte.
Protestos do deputado do PS Raúl Rêgo.
Esta é que é a questão, e é isto que V. Ex.ª vem escamotear, ofendendo-me e dando, por consequência, lugar a esta minha defesa da honra.
Queira V. Ex.ª dar uma explicação e, já agora, peço-lhe que diga qual é para si o conceito de democracia: se se sobrelevam ou não os direitos do homem aos direitos das maiorias e se foi ou não com uma maioria que o Sr. Adolf Hitler foi para o poder. Diga-me, Sr. Deputado, se, quando VV. Ex.ªs aproveitam a maioria de que de momento disfrutam para pisar a lei e rasgar o Regimento, se configuram ou não determinadas manifestações que há muitos anos gostaríamos de ter visto postergadas de Portugal!
Aplausos do PS e de alguns deputados do PCP.
Aplausos do CDS e do PSD.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que não há qualquer relação entre a convocação desta reunião e a entrada, na quinta-feira, do requerimento para prolongamento da sessão, segundo me informa o Sr. Secretário, cinco minutos depois das 20 horas, quando a sessão estava a decorrer. Não há qualquer relação, uma vez que a convocação da sessão foi feita na sexta-feira, obedecendo a todos os requisitos regimentais.
Quanto à distribuição dos documentos, ela foi feita da forma habitual. Se a versão final do texto não chegou às mãos do Sr. Deputado Borges de Carvalho...
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - V. Ex.ª está-se nas tintas!...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, não posso nem me compete seguir o curso dos documentos para verificar se eles chegam ou não à mão de todos os Srs. Deputados.
O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Basta que lhe o diga!
O Sr. Presidente: - Há, naturalmente, uma tramitação habitual na qual se confia, numa atitude de boa fé.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos requerimentos entrados na Mesa relativos à avocação a Plenário de diversos artigos do projecto de lei.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O primeiro requerimento é apresentado pelo PSD e é do seguinte teor:
Nos termos do artigo 154.º do Regimento, os deputados abaixo assinados requerem a V. Ex.ª a avocação a Plenário da votação na especialidade dos artigos 1.º, n.º 7, 3.º, n.º 2, 11.º, n.º 2, 13.º, 14.º, 15.º, n.º l, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 40.º, 44.º, 47.º, 48.º e 49.º do projecto de lei sobre Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão.
Segue-se um requerimento, apresentado pelo CDS, que diz o seguinte:
Os deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, a avocação a Plenário para discussão e votação dos normativos correspondentes aos artigos 16.º a 32.º, inclusive, do capítulo m da Lei de Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão, tal como foi aprovado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O terceiro requerimento, apresentado igualmente pelo CDS, é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, a avocação a Plenário para discussão e votação dos normativos correspondentes aos artigos 5.º, n.º 3, 9.º, 11.º e 12.º da Lei sobre Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão, tal como foi aprovado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Finalmente, passo a ler outro requerimento, apresentado ainda pelo CDS:
Os deputados abaixo assinados requerem, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, a avocação a Plenário para discussão e votação dos normativos correspondentes aos artigos 1.º, n.ºs 4, 5, 6, e 7, e 3.º, n.ºs l e 2, da Lei sobre Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento para prolongamento da sessão, que vai ser lido.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, creio que a Mesa omitiu um outro requerimento que foi oportunamente entregue na Mesa pelo meu grupo parlamentar e que se refere aos artigos 47.º e 48.º
O Sr. Presidente: - Se o omitimos, foi certamente por lapso, mas vamos já corrigi-lo.
Pausa.
Sr. Deputado, encontram-se na Mesa quatro requerimentos de avocação a Plenário de diversos artigos, um dos quais é apresentado pelo PSD e os restantes três pelo CDS.
No entanto, a Mesa vai averiguar.
Pausa.
Srs. Deputados, o que acontece é que à medida que os requerimentos chegam à Mesa são admitidos, registados e fotocopiados para serem distribuídos. É possível que, dado o elevado número de requerimentos que deram entrada na Mesa, tenha havido alguma confusão.
Pausa.
Sou informado de que o requerimento que o Sr. Deputado Gomes de Pinho referiu está a ser fotocopiado, aguardando-se que chegue à Mesa.
Entretanto, o Sr. Secretário vai ler o requerimento, apresentado pelo PCP, para prolongamento da sessão.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - É do seguinte teor o referido requerimento:
Ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados requerem o prolongamento da reunião até à conclusão da discussão e votação das matérias inscritas na ordem do dia.
O Sr. Presidente: - Vamos votar este requerimento, Srs. Deputados.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Rui Oliveira e Costa e Ribeiro Telles.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do referido requerimento apresentado pelo CDS.
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O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O requerimento diz o seguinte:
Nos termos do artigo 154.º do Regimento, os deputados abaixo assinados requerem a V. Ex.ª a avocação a Plenário da votação na especialidade dos artigos 47.º e 48.º da Lei sobre Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar estes requerimentos pela ordem da sua entrada na Mesa.
Dado que três dos requerimentos apresentados pelo CDS entraram simultaneamente, vamos votá-los segundo a sua ordem lógica.
Assim, vamos votar, em primeiro lugar, o requerimento que diz respeito aos artigos 1.º, n.ºs 4, 5, 6 e 7, e 3.º, n.ºs 1 e 2.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, creio que o requerimento apresentado pelo PSD deu entrada na Mesa antes desse nosso requerimento.
Penso, por conseguinte, que os requerimentos deverão ser votados por ordem de entrada e, quando a hora de entrada for simultânea, por ordem lógica...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, segundo sou informado, o requerimento apresentado pelo PSD não entrou antes do que anunciei.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Então, há momentos, a Mesa tinha indicado uma ordem errada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar o requerimento que referi há pouco.
Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, vamos agora votar o segundo requerimento apresentado pelo CDS, que diz respeito aos artigos 5.º, n.º 3, 9.º, 11.º e 12.º
Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Vamos votar o terceiro requerimento apresentado pelo CDS relativo aos artigos 16.º a 32.º
Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Segue-se a votação do requerimento apresentado pelo PSD.
Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Finalmente, vamos votar o último requerimento, apresentado pelo CDS.
Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, tendo sido rejeitados todos os requerimentos de avocação de artigos a Plenário, vamos proceder à votação final global do diploma em apreço.
Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos contra do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, quero apenas comunicar que o Grupo Parlamentar do PS apresentará uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, concedo agora a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lemos, também para uma declaração de voto.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País tem finalmente uma lei de bases das estações emissoras de radiodifusão.
Foi um processo longo e trabalhoso, mas que valeu a pena. Temos uma lei democrática, transparente, feita às claras, não discriminatória e sem privilégios de qualquer espécie.
Importa referir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, reclamada pelo Governo como sendo uma das leis mais importantes e que esta Assembleia estava a meter na gaveta, o Governo e o partido que o apoia deixou de considerar essa prioridade e deixou de pensar no espaço radioeléctrico que estava tão degradado e em relação ao qual o Governo tanta urgência tinha em ver o problema resolvido.
Chegou ao ponto de nos mandar uma carta dizendo que retirava a sua proposta e de nos dizer que se dessolidarizava do texto aprovado pela Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Acabam de o fazer com a vossa votação.
Agora que o Governo, que apresentou como tarefa essencial dotar esta País de uma lei de licenciamento de estações emissoras de radiodifusão...
Vozes do PSD: - Não é esta!
O Orador: - ..., venha assumir esta postura, é inacreditável, é inaceitável. Realmente, isto só acontece porque temos um governo como o de Cavaco Silva!...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - De facto, os senhores doeram-se! A direita doeu-se! E doeu-se por uma razão essencial: porque a Assembleia da República não permitiu que fossem os senhores a distribuir o espaço radioeléctrico como muito bem entendessem.
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A Assembleia da República criou um mecanismo de controle democrático que permite que um espaço público,, como é o espaço radioeléctrico português, seja utilizado em benefício de todos, sem qualquer tipo de discriminações ou de contrapartidas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Esta foi a decisão política, de fundo que a Assembleia da República tomou.
Mas a Assembleia da República foi mais longe: entendeu que, colocada a questão de tratar do problema do espaço radioeléctrico, devia fazê-lo de fundo e não aceitar qualquer distribuição anterior de frequências feita com base num plano que só entraria em vigor em Julho de 1987, doa a quem doer o modo e a forma como essa atribuição foi feita.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E isto tanto mais que a Assembleia conhecia o teor do despacho que considerava precária a atribuição dessas mesmas frequências.
Resolvemos, portanto, um problema do País, criámos uma situação democrática e acabámos com posições de privilégio que há muito tempo deveriam ter acabado em Portugal.
Cumprimos os objectivos que tínhamos em vista e, por isso, creio que a Assembleia está de parabéns, assim como estão de parabéns os democratas e as estações de rádio locais, que tanto se bateram para que o seu problema fosse resolvido.
Finalmente, de modo democrático, transparente e pluralista, a Assembleia acaba de resolver esse problema.
Penso que foi um bom serviço prestado ao País, pelo qual nos devemos regozijar.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Igualmente para produzir uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma muito breve declaração de voto, começando, naturalmente, por dizer que estamos em total desacordo com a lei que foi votada. Contudo, também estamos em total desacordo com a maneira como o Governo se conduziu com esta Assembleia.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Digo isto porque temos presente um ofício em que o Governo se dessolidariza do processo legislativo, às 19 horas, porque só agora teve tempo de meditar sobre a tramitação de. um' processo que era fundamental do ponto de vista dos objectivos que ,o Governo declara que quer prosseguir.
Se o Governo quisesse, em relação a esta Assembleia, praticar um acto que não devesse surtir efeito, era justamente este acto que deveria ter praticado.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata sempre "defendeu e defenderá a existência de uma verdadeira lei de licenciamento de estações emissoras de radiodifusão, destinada a servir os interesses dos cidadãos em geral e das empresas privadas, públicas e cooperativas que tenham por objecto a actividade radiofónica.
O nosso grupo parlamentar não pode, porém, abdicar de princípios, valores e interesses bem enraizados na sociedade portuguesa e, por isso, impostergáveis.
A lei acabada de aprovar, com o voto contra do PSD, é um conjunto pesado e complexo de normativos apertadamente burocratizantes e desmotivadores da livre actividade radiofónica, qual pedregulho pronto a esmagar a voz das rádios privadas, de que as rádios locais são lídimos arautos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Também votámos contra porque a existência do Conselho da Rádio, com competência para emitir parecer vinculativo em matéria de atribuição de frequências, traduz-se na criação de um órgão anómalo que irá tutelar a acção executiva do Governo, que, sendo órgão de soberania, apenas depende, nos termos da Constituição, de outros órgãos de soberania.
Esta promíscua entorse, gerada pelos partidos da oposição da esquerda parlamentar, foi ao ponto, de irresponsabilizar, cível, criminal e disciplinarmente, os membros do Conselho da Rádio pelos votos emitidos, o que é extremamente grave para os cidadãos, dado que a decisão de licenciamento de rádios se determina sempre em função do seu parecer vinculativo.
Aliás, tais pareceres, não sendo actos definitivos e executórios, são inatacáveis contenciosamente, assim se evadindo ao controle jurisdicional, o que é verdadeiramente inadmissível.
Votámos igualmente contra porque a lei acabada de aprovar vai esbulhar a Rádio Renascença -Emissora Católica Portuguesa e a Radiodifusão Portuguesa de frequências atribuídas de harmonia com a legislação anterior e até por departamento governamental que à data era da responsabilidade do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
É de igual modo indeclinável aqui declarar que o fazer reverter para o domínio público as frequências legitimamente atribuídas às aludidas estações emissoras de rádio envolve necessariamente um aumento de despesas, não previstas no Orçamento do Estado, para dar satisfação ao pagamento das indemnizações devidas às emissoras prejudicadas, o que viola o disposto no n.º 2 do artigo 170.º da Constituição.
Vozes do PCP: - Essa agora!
O Orador: - Sempre fomos e seremos a favor da legalização e do licenciamento das rádios, mas, como «não vendemos a alma ao diabo», e ainda por razões de consciência e dignidade, temos de repudiar com toda a veemência as soluções adoptadas, que não servem o nosso país.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Almeida.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - Sr. Presidente, quero apenas informar que entregarei na Mesa uma declaração de voto escrita.
O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado. Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que o largo debate travado no seio da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a lei me dispensa neste momento de tecer sobre ela largas considerações.
Quereria, pois, tão-somente referir-me a um facto político que considero importante.
Todos sabemos como o espectro radiofónico é um bem finito e um bem público. Assim, com certeza que todos estamos preocupados com as condições da sua concessão e todos desejamos certamente que essa concessão seja feita através de processos tão claros, transparentes e objectivos que sobre eles nenhuma suspeição seja possível.
Por isso, nenhum de nós desejará que eles sejam objecto de atribuição por forma menos transparente, menos clara, que possa confundir-se com qualquer favoritismo de ocasião.
No início desta sessão, tive ocasião de pôr em causa o facto de duas das três possibilidades de atribuição de frequências, em frequência modulada, terem sido atribuídas por despacho ministerial de 3 de Outubro de 1985, ou seja, 48 horas antes de um acto eleitoral, e que esse despacho não tenha sido tornado público e seja, inclusivamente, alvo de interpretações divergentes.
Nenhum esclarecimento nos foi prestado que permitisse concluir que havia compromissos de Estado nesta matéria. Como tal, teremos de admitir que, contrariamente à convicção estabelecida pelos empresários, nenhum compromisso foi assumido por parte do Estado, por parte do Governo.
Assim, votámos conscientemente de acordo com aquilo que tinha sido o nosso voto na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Pensamos, aliás, poder fazê-lo de consciência tranquila. Melhor do que ninguém, o então Primeiro-Ministro e actual Presidente da República, conhecerá se algum compromisso de Estado foi assumido e estará assim em condições de politicamente vetar a lei, se ela infringe um compromisso de Estado.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, quero apenas informar que vou entregar na Mesa uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, concluído este ponto, vamos passar à votação do orçamento da Assembleia da República para 1987, na medida em que o orçamento suplementar da Assembleia da República para 1986 não está em condições de ser votado, pois necessita de alguns ajustamentos na especialidade, que serão oportunamente feitos. Ou seja, a votação na especialidade e a votação final global do orçamento suplementar serão feitas oportunamente, mas nada impede que façamos já a votação do orçamento para 1987, até segundo uma apreciação feita na conferência de líderes parlamentares.
Quanto ao orçamento da Assembleia da República para 1987, já procedemos à sua votação na generalidade, pelo que apenas teremos de fazer a votação na especialidade e a votação final global.
Há alguma dúvida?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Feist.
O Sr. Pedro Feist (CDS): - Sr. Presidente, salvo o devido respeito, temos algumas dúvidas quanto à possibilidade de votarmos na especialidade o orçamento para 1987, uma vez que, por aquilo de que temos conhecimento, não foram ainda inscritas as verbas para as receitas do orçamento suplementar.
Sendo assim, para se votar na especialidade o orçamento para 1987, haveria que ter a confirmação por parte do Governo da dotação necessária de 110000 contos, porque, a não' haver essa dotação, obviamente que na especialidade o orçamento fica comprometido.
Esta é apenas uma questão de números, mas que julgo que se levanta.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Feist, se algum dos Srs. Deputados insistir em que se faça a votação do orçamento para 1987 mais tarde, não haverá qualquer objecção da parte da Mesa.
No entanto, fizémos uma análise dessa questão e chegamos, embora sumariamente, à conclusão de que não há repercussões importantes da aprovação na especialidade do orçamento suplementar para 1986 no orçamento para 1987. Só nessa medida é que o vou submeter à votação.
Há alguma objecção a que procedamos agora à votação na especialidade e à votação final global do orçamento da Assembleia da República para 1987?
Pausa.
Não havendo objecções, vamos proceder à votação na especialidade do orçamento da Assembleia da República para 1987.
Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Borges de Carvalho e Maria Santos e a abstenção do CDS.
Vai proceder-se à votação final global do orçamento da Assembleia da República para 1987.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Borges de Carvalho e Maria Santos e a abstenção do CDS.
Srs. Deputados, vamos passar às votações das ratificações agendadas, cuja discussão se conclui cerca das 18 horas.
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O Sr. Secretário vai proceder à leitura de um requerimento e de um projecto de resolução sobre o diploma objecto de ratificação.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, o requerimento apresentado pelo PRD é do seguinte teor:
Ratificação n.º 112/IV
Requerimento de suspensão parcial da vigência e de baixa à Comissão do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro
Nos termos do artigo n.º 172.º, n.º 2, da Constituição e dos artigos 148.º e 193.º do Regimento, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Renovador Democrático requerem a suspensão dos artigos 4.º, n.º 3, e 7.º do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, e dos artigos 11.º, n.º 1, alínea c), 14.º, n.º 3, 15.º, n.º 1, alínea c), 20.º, n.º 3, 24.º, alíneas b) e c), e 29.º, n.º 2, do Estatuto da União de Bancos Portugueses, S. A., publicado em anexo, bem como a sua baixa à comissão respectiva, juntamente com as propostas de alteração apresentadas, por um período de 45 dias.
É do seguinte teor o projecto de resolução apresentado pelo PCP:
Projecto de resolução
Recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º de 20 de Outubro 351/86,
A Assembleia da República resolve, nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 172.º e do n.º 4 do artigo 169.º da Constituição, o seguinte:
1) É recusada a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro, que transforma em sociedade anónima de responsabilidade limitada e de capitais exclusivamente públicos a União de Bancos Portugueses, E. P., passando a denominar-se União de Bancos Portugueses S. A. R. L.;
2) São repristinadas as normas legais revogadas pelo Decreto-Lei n.º 351/86, de 20 de Outubro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, neste caso, a ordem lógica é diferente da ordem cronológica. Ou seja, deveremos proceder em primeiro lugar à votação do projecto de resolução apresentado pelo PCP e só depois, caso o projecto de resolução do PCP seja rejeitado, é que votaremos o requerimento apresentado pelo PRD.
Há alguma objecção?
Pausa.
Não havendo objecções, vamos proceder à votação do projecto de resolução apresentado pelo PCP, que acabou de ser lido.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho, votos a favor de quatorze deputados do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e abstenções do PS e de 21 deputados do PRD.
Srs. Deputados, a Mesa acaba de ser informada de que todos os deputados do PRD que votaram a favor do projecto de resolução apresentado pelo PCP pretendem apresentar na Mesa declarações de voto escritas.
Vai proceder-se à votação do requerimento apresentado pelo PRD, que foi lido há pouco.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos, votos contra do PSD e abstenções do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, prosseguindo a nossa ordem de trabalhos, de acordo com o requerimento que foi aprovado, passamos à discussão da proposta de lei n.º 48/I V, que autoriza o Governo a celebrar um acordo com a República Federal da Alemanha até ao montante de 60 milhões de marcos.
Pausa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.
O Sr. Ivo Ponho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com a apresentação da proposta de lei em apreço, o Governo solicita autorização para celebrar, no quadro da Acta das Negociações Intergovernamentais assinada em Dezembro de 1985, um acordo de cooperação financeira com a República Federal da Alemanha, segundo o qual o Estado Português e ou mutuários por ele devidamente avalizados poderão contrair empréstimos, até ao montante de 60 milhões de marcos, destinados ao financiamento de projectos com incidência na produção e distribuição de energia eléctrica na Região Autónoma dos Açores, na actividade de pequenas e médias empresas industriais e no desenvolvimento do Laboratório de Metrologia e Serviços do Instituto Português de Qualidade.
Sucede, uma vez mais, que o Governo não fez acompanhar a proposta em análise dos elementos informativos necessários à sua adequada apreciação. Por isso, a Comissão de Economia, Finanças e Plano deliberou ouvir o Governo sobre o assunto, mas as informações prestadas, em reunião expressamente convocada para o efeito, quedaram-se muito aquém do que seria desejável.
Com efeito, não foi dada explicação plausível para a circunstância de o Governo só agora apresentar esta proposta à Assembleia da República. É que, como já se referiu, a Acta das Negociações Intergovernamentais foi assinada há um ano, sendo que as carências nos domínios beneficiários do acordo não são novas. Por que se esperou tanto?
Por outro lado, o facto de o Governo não ter habilitado a Assembleia com a informação bastante para a avaliação do mérito dos projectos beneficiários do acordo constitui, a nosso ver, um indício claro de que alguns dos projectos a financiar não se encontram ainda adequadamente configurados, o que, aliás, é implicitamente reconhecido na nota explicativa enviada pelo Governo, entrada na Assembleia apenas no passado dia 17.
Apesar do que antecede, atentas as condições contratuais altamente favoráveis do aludido acordo financeiro, bem como as carências manifestas dos domínios
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que serão beneficiados pelos financiamentos emergentes do acordo, e considerando ainda a necessidade de este ser assinado até ao fim do ano, sob pena de, face as regras comunitárias, não poder ser operacionalizado, o PRD conferirá bom acolhimento à proposta do Governo. Como quer que seja, o PRD solicita desde já ao Governo que, à luz do disposto no artigo 4.º da proposta de lei em análise, sejam oportunamente prestadas informações à Assembleia que incluam, para além das condições contratuais do financiamento de cada um dos projectos beneficiários, os resultados da execução dos mesmos.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em termos de intervenção, gostaria de interpelar o Governo, nomeadamente o Sr. Secretário de Estado do Tesouro ou o Sr. Ministro das Finanças, sobre algumas questões relacionadas com esta proposta de lei. Uma delas tem a ver com um problema já levantado pelo Sr. Deputado Ivo Pinho e refere-se às razões do atraso na subcomissão à Assembleia da República deste diploma que autoriza o Governo a celebrar um acordo com a República Federal da Alemanha até ao montante de 60 milhões de marcos. Tendo em conta que as negociações intergovernamentais remontam a 11 de Dezembro de 198 5, quais as razões por que o Governo demorou mais de um ano a fazer chegar à Assembleia esta proposta de lei?
Uma outra questão diz respeito à aplicação dos projectos referidos na proposta de lei. Nesse diploma é referido que o montante dos projectos irá ser aplicado em diversos projectos de investimento já identificados, mas sem referir quais, podendo vir a ser utilizados para financiamento de qualquer outro projecto elegível, além, dos três expressamente referidos na proposta. Foi ainda referido numa explicação adicional, que foi enviada pela Secretaria de Estado do Tesouro que há um pipeline - expressão usada nesse documento explicativo - de projectos já devidamente identificados. Porém, não refere qual o conteúdo desse pipeline de projectos já devidamente identificados.
Seria bom que o Governo desse aqui algumas explicações relativamente às questões que coloquei.
O Sr. Presidente: - Visto mais ninguém pretender usar da palavra, dou por encerrada a discussão e vamos passar à votação.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Então fazem-se perguntas ao Governo e este não responde?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os membros do Governo não são obrigados a usar da palavra. Visto não haver mais inscrições, dou o debate por concluído.
A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, há uma questão em relação à qual creio que seria conveniente que o Governo a clarificasse. Embora o conteúdo do acordo acompanhe a proposta de lei, o que é certo é que levantámos algumas questões, o Governo não apresentou aqui o diploma nem respondeu às perguntas que foram colocadas e a verdade é que há algumas dificuldades que é necessário ter em conta. Ora, se estão aqui presentes dois elementos do Ministério das Finanças é facílimo obtermos as respostas aos problemas que levantámos.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, neste momento, mesmo que os membros do Governo pretendessem usar da palavra, não lhes a concedia, porque já dei por encerrado o debate.
Vamos, pois, votar na generalidade a proposta de lei n.º 48/IV.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PRD, do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho e abstenções do PS, PCP e do MDP/CDE.
Para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de explicar a razão de um voto de abstenção, que é um voto insólito. Porém, aqui, o caso verdadeiramente insólito é o facto de o Governo vir à Assembleia da República e, instado a responder a questões precisas que deveriam esclarecer os deputados no sentido de melhor orientar a sua votação, entendeu que a sua presença física é suficiente para dar resposta. Assim, a contemplação do físico dos Srs. Membros do Governo é, por si só, a resposta às questões que foram colocadas. Nestes termos, a nossa votação no sentido da abstenção foi o mínimo que poderíamos fazer.
Porém, em primeiro lugar, queríamos chamar a atenção do Governo e depois de toda a Câmara para este comportamento que, de facto, não é admissível. Se ele for repetido conduz à situação de se saber se, efectivamente, valerá ou não a pena ter o Governo fisicamente aqui presente. Gostamos de o ver, mas, sobretudo, gostamos de obter as respostas às perguntas que lhe são formuladas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD votou favoravelmente este diploma, na generalidade, tanto mais que, segundo me informam os nossos colegas que fazem parte da Comissão de Economia, Finanças e Plano, se considerou perfeitamente satisfeito com todos os esclarecimentos que o Governo prestou em sede própria, pelo que aqui não tinha que repetir esses esclarecimentos, pois era desnecessário.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Igualmente para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente o di-
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ploma em questão, porque também se considerou esclarecido, mas deve confessar que neste momento se sente defraudado ...
Uma voz do PSD: - Não me diga!
O Orador: - É verdade, vou explicar porquê e Sr. Deputado vai ver que concorda comigo.
Ora, como estava a dizer, o CDS sente-se defraudado porque considerou parte do seu esclarecimento um pedido que foi feito - ou antes, uma solicitação, o que é diferente, pois é menos subserviente - ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro durante o debate na Comissão de Economia, Finanças e Plano para que numa das disposições da proposta de lei fosse incluído um inciso, no sentido que aqui foi referido pelo Sr. Deputado Ivo Pinho. Ora, o Sr. Secretário de Estado manifestou a sua aquiescência e estávamos à espera que o PSD, que normalmente transmite a aquiescência do Governo e a transforma em projectos, o fizesse. Porém, verificamos que tal não sucedeu e devo dizer que realmente esse inciso era importante neste diploma, pois tinha a ver com o controle desta Câmara sobre o Governo em aspectos que têm sido salientados pelos deputados.
De qualquer modo, consideramos que há questões mais importantes que são colocadas ha proposta de lei e por esse motivo a votámos favoravelmente. Porém, lamentamos que não tenha sido dada sequência a um processo que julgámos pacífico, tal como decorreu na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão na especialidade a proposta de lei. Não sei se os Srs. Deputados preferem que se faça a discussão artigo a artigo ou conjuntamente.
O Sr. João Amuaral (PCP): - Artigo a artigo e, se por parte do Governo não houver explicações sobre eles, baixam à Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na medida em que o PCP pretende que se analise artigo a artigo, está em discussão o artigo 1.º
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 1.º refere o seguinte: «[...] o montante de 60 milhões de marcos alemães destinados ao financiamento de projectos de produção e distribuição de energia, de pequenas e médias empresas industriais e de outras acções visando o desenvolvimento económico e social.» Mas que outras acções, Srs. Membros do Governo? Ficamos, pois, a aguardar que o Sr. Ministro das Finanças ou o Sr. Secretário de Estado do Tesouro nos dêem resposta.
O Sr. Presidente: - Visto não haver inscrições, vamos votar o artigo 1.º
Submetido ò votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD. do CDS e do deputado independente Borges de Carvalho e abstenções do PS, do PCP e do MDP/CDE.
É o seguinte:
Artigo 1.º
Fica o Governo autorizado, através do Ministro das Finanças, com a faculdade de delegar, a celebrar um acordo de cooperação financeira com a República Federal da Alemanha no montante de 60 milhões de marcos alemães, destinados ao financiamento de projectos de produção e distribuição de energia, de pequenas e médias empresas industriais e de outras acções visando o desenvolvimento económico e social.
Está em discussão o artigo 2.º
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo está a colocar-nos numa posição muito delicada, porque se a nossa posição inicial relativamente a esta proposta de lei era no sentido de não levantar-obstáculos à sua aprovação na medida em que, no essencial, o conteúdo do acordo com a República Federal da Alemanha parecia ser correcto, embora faltasse clarificar duas ou três questões que aqui levantámos, neste momento a posição do Governo em se recusar a dar resposta aos problemas que aqui colocámos, nomeadamente a outras acções que aparecem referidas sem explicitar que acções são, está a colocar-nos um problema muito delicado. Poderemos ter que pedir o adiamento da votação destes artigos e a sua baixa à Comissão para uma clarificação mais aprofundada deste problema, já que o Governo se recusa a fazê-lo em Plenário.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Carvalho Fernandes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sinto-me numa situação incómoda ao ter que repetir as explicações que já dei aquando da discussão na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Pode ser que acrescente mais qualquer coisa.
O Orador: - De qualquer maneira, direi que, tal como consta do acordo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federal da Alemanha, os 60 milhões de marcos previstos correspondem a 15 milhões de marcos para um projecto que é o Laboratório de Metrologia e serviços do Instituto Português de Qualidade, 10 milhões de marcos para produção e distribuição de electricidade nos Açores e 35 milhões de marcos para uma linha de crédito a distribuir pelo Banco de Fomento Nacional destinada a pequenas e médias empresas.
Portanto, quando na proposta de lei se referem acções visando o desenvolvimento económico e social é exactamente isso que se pretende, ou seja, as acções do Laboratório de Metrologia, a produção e distribuição de electricidade nos Açores e linhas de crédito a pequenas e médias empresas para a produção de energia.
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O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Secretário de Estado, gostava de saber se estes empréstimos são apenas atribuídos a esses projectos que referiu.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr.ª Deputada, é evidente que na linha de crédito do Banco de Fomento Nacional estão os projectos de pequenas e médias empresas que vão aparecendo, embora as condições de mobilização de fundos do Kreditanstalt far Wiederaufbau prevejam perfeita admissibilidade de outros projectos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, vamos votar o artigo 2.º
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para anunciar que a partir de agora o nosso grupo parlamentar dispensa a votação artigo a artigo e aceita a votação em bloco de todos os artigos do diploma em questão.
O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Rui Macheie (PSD): - Sr. Presidente, não podemos proceder à votação dos artigos em bloco porque o meu grupo parlamentar vai entregar na Mesa da Assembleia da República uma proposta de alteração ao artigo 4.º, de acordo com aquilo que tinha sido discutido na Comissão e, por lapso, não foi entregue atempadamente.
O Sr. Presidente: - Então, Srs. Deputados, vamos passar à votação conjunta dos artigos 2.º e 3.º
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
São os seguintes:
Artigo 2.º
1 - Os empréstimos concedidos ao abrigo da cooperação financeira com a República Federal da Alemanha vencerão juros à taxa de 4,5 % e serão amortizados em quinze anos, iniciando-se a amortização cinco anos após a entrada em vigor dos contratos de empréstimo.
2 - Os empréstimos poderão ser concedidos ao Estado ou às entidades a quem for incumbida a execução dos projectos, competindo ao Ministro das Finanças, neste último caso, designar os mutuários.
3 - Fica o Governo de igual modo autorizado, através do Ministro das Finanças, com a faculdade de delegar, a celebrar os contratos de empréstimo com as entidades referidas no número antecedente em ordem a pôr à sua disposição os fundos mutuados directamente ao Estado, ao abrigo da cooperação financeira com a Republica Federal da Alemanha.
4 - Compete ao Ministro das Finanças aprovar as condições dos empréstimos referidos neste artigo e no artigo 1.º
Artigo 3.º
l - O Governo fica ainda autorizado, ao abrigo do n.º 2 do artigo 168.º da Constituição, a isentar o Kreditanstalt far Wiederaufbau, de Franco-forte do Meno, de todos os impostos e demais encargos a que possa estar sujeito em Portugal por ocasião ou durante a execução dos contratos.
O Sr. Presidente: - Vai ser lida uma proposta de aditamento do artigo 4.º
Foi lida. É a seguinte:
Proposta de aditamento do artigo 4.º
[...], bem como a indicação de cada projecto beneficiário e o modo como foi utilizado.
O Sr. Presidente: - Estão em discussão o artigo 4.º da proposta de lei e a proposta de aditamento.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente, é só para lembrar aos Srs. Deputados que a obrigatoriedade desta formalidade para as centenas de eventuais projectos de pequenas e médias empresas pode ser exagerada, muito mais quando é o Banco de Fomento Nacional que vai distribuir a linha de crédito. Isto pode ser exagerado e de alguma delicadeza.
O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar o artigo 4.º Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
É o seguinte:
Artigo 4.º
O Governo comunicará à Assembleia da República as condições concretas de cada financiamento.
O Sr. Presidente: - Vamos votar a proposta de aditamento do artigo 4.º
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Vamos proceder à votação final global. Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Passamos, finalmente, à discussão da proposta de lei n.º 49/IV, que autoriza o Governo, através do Ministro das Finanças, a elevar o limite global de 15 para 27 milhões de contos, destinado a empréstimos internos de prazo superior a um ano, a conceder ao conjunto das regiões autónomas.
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Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro, pergunto se dispensam a leitura do relatório.
Pausa.
Como ninguém se manifesta, dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A autorização que é pedida destina-se, pura e simplesmente, a regularizar os encargos de 1985 relativos ao capital e juros dos empréstimos obrigacionistas colocados no sistema bancário que, por razões conhecidas, não estavam regularizados pela Região Autónoma da Madeira. Repito: são encargos referentes ao serviço da dívida de 1985.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.
O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pela proposta de lei n.º 49/IV, entrada na Assembleia da República em 11 do corrente mês, o Governo solicita autorização para elevar o limite global previsto no n.º 7 do artigo 3.º da Lei n.º 9/86 de 15 para 27 milhões de contos, com o objectivo de, transcreve-se, «conceder, ao conjunto das regiões autónomas, empréstimos internos de prazo superior a um ano».
No que se segue, procuraremos contribuir para que a Câmara fique plena e cabalmente esclarecida sobre o que vai discutir e votar, sem prejuízo da afirmação da nossa posição sobre o contencioso financeiro com a Região Autónoma da Madeira.
Em primeiro lugar, importa salientar que os deputados são chamados a votar não uma mera proposta de autorização que habilita o Governo a praticar determinados actos, mas uma autêntica proposta de alteração orçamental. É pena que o Governo, sempre tão atento às questões legais e regimentais, tenha, desta feita, optado por dissimular a natureza da proposta ora em análise. Tal não impediu, porém, que no seu relatório, aprovado por unanimidade, a Comissão de Economia, Finanças e Plano refira, expressamente, que se trata de discutir e votar uma proposta de alteração orçamental.
Uma alteração orçamental que surge no final do ano, em cima do período de suspensão dos trabalhos parlamentares.
Uma alteração orçamental que é, de facto, queira-se ou não, a segunda alteração ao Orçamento de Estado para 1986.
Estamos, agora, a discuti-la porque a Comissão de Economia, Finanças e Plano entendeu, uma vez mais por unanimidade, que seriam de dispensar os prazos regimentais previstos para processos de alteração orçamental.
Não fora assim e teríamos uma de duas coisas, ambas com consequências negativas: o Governo retiraria a presente proposta ou teríamos, desde já, a certeza de que, em 1987, ocorreria uma alteração orçamental por factos não imputáveis à gestão orçamental desse ano.
Em segundo lugar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, importa ter plena consciência de que não iremos discutir e votar uma proposta de alteração orçamental com incidência nas regiões autónomas mas uma proposta com exclusiva incidência na Região Autónoma da Madeira. Com efeito, o Governo informou, verbalmente, a Comissão de Economia, Finanças e Plano de que, afinal, não há necessidade de inserir a Região Autónoma dos Açores no presente processo de alteração orçamental. Trata-se, em rigor, de aumentar de 15 para 22 milhões e não para 27 milhões, como constava da proposta governamental o limite a que se refere o já citado n.º 7 do artigo 3.º da lei orçamental de 1986, para ocorrer a uma situação financeira específica da Região Autónoma da Madeira.
E qual é essa situação?
O Governo explica-a assim: em 1985, a Região Autónoma da Madeira não liquidou juros, vencidos naquele ano, no valor de 5,7 milhões de contos, relativos a uma parte da dívida contraída junto de instituições monetárias nacionais. Não pagou os juros vencidos e também não pagou a correspondente amortização, no valor de 1,1 milhões de contos, do capital em dívida. Nestes termos, o Governo propõe a regularização, em 1986, mediante a emissão de obrigações, da dívida adicional de 6,8 milhões assim gerada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há, nesta matéria, vários aspectos obseuros. Um deles prende-se à questão de saber por que razão o Governo que, aquando da preparação do Orçamento para 1986, não desconhecia que a Região Autónoma da Madeira não tinha dado cumprimento aos compromissos assumidos -, não introduziu, na respectiva proposta de Orçamento, a correcção que ora submete a esta Assembleia. Naturalmente que, por maioria de razão, é manifestamente inaceitável que o Governo não tenha rectificado a situação noutra oportunidade de que dispôs, meses depois, aquando da apresentação de uma proposta de orçamento suplementar para 1986.
Desta hipotética obscuridade, porém, estamos, felizmente, todos livres já que o Governo admitiu que cometeu este duplo lapso.
Há, porém, outras áreas de obscuridade que não foram tornadas transparentes. No entender do PRD chegou o momento de chamar a atenção do País para a gravidade de uma situação que, a manter-se, poderá gerar tensões socialmente intoleráveis.
Referimo-nos, obviamente, à situação financeira da Região Autónoma da Madeira.
Como é sabido, o governo central celebrou, com a Região, um Programa de Reequilíbrio Financeiro. Apesar dos esforços que tem desenvolvido nesse sentido, a Assembleia da República não foi ainda plena e cabalmente esclarecida sobre os objectivos, as acções e os mecanismos de controle de execução do referido programa. Por outro lado, é do conhecimento público que o Governo Regional não tem vindo a cumprir os compromissos que tem assumido, em matéria de gestão orçamental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os custos da insularidade justificarão muita coisa mas não explicam tudo. É altura de conter, firme e determinadamente, os «buracos» orçamentais sucessivos da Região Autónoma da Madeira.
Aplausos do PRD e do MDP/CDE.
O governo central tem, naturalmente, o dever que é, também, um direito de solucionar um problema grave que não pode continuar a ser, expressa ou veladamente, dissimulado. A Assembleia da República, instância decisiva da autoridade orçamental, tem, igual-
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mente, que encarar este problema de frente. Admitimos que seja necessário regularizar a situação financeira da Região Autónoma da Madeira a partir de um programa de acção plurianual. Mas vamos exigir que os seus objectivos e os compromissos bilaterais com incidência orçamental nele incluídos sejam escrupulosamente cumpridos.
Vamos ser realistas e responsáveis. Não toleraremos que o conhecido aforismo «Já chegámos à Madeira?», normalmente empregue como reacção a factos ou situações anómalas, adquira sentido em matéria de gestão orçamental.
Vozes do PRD e do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PRD vai solicitar, hoje mesmo, ao Governo todos os elementos informativos disponíveis sobre o Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira e sobre a sua execução. Queremos ser completamente esclarecidos sobre a sua natureza, fundamentos e objectivos, sobre as acções nele contidas e correspondentes indicadores de execução,- sobre as obrigações reciprocas assumidas e respectivos reflexos orçamentais e, ainda, sobre o estado actual de execução do Programa. Depois de apreciados os elementos informativos aludidos, promoveremos, com carácter de urgência, a realização de uma sessão de perguntas ao Governo sobre a situação financeira da Madeira.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador. - Nessa sessão, apresentaremos propostas concretas que assegurem que o nível de endividamento das regiões autónomas, fixado na lei orçamental, não possa ser ultrapassado.
É assim que nos propomos dar sequência a acções congéneres que desencadeámos aquando da discussão e votação da proposta de lei orçamental para 1987, sempre com o objectivo de contribuirmos, activamente, para a plena consecução do objectivo consistente na clarificação das finanças públicas.
Sr, Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É exclusivamente -repito, exclusivamente a esta luz que não inviabilizaremos a aprovação da proposta de lei n.º 49/IV, habilitando, assim, o Governo a converter, em dívida titulada, uma dívida actualmente oculta.
Aplausos do PRD, do PS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr." Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: no dia 10 deste mês, há portanto apenas doze dias, o Governo solicitou à Assembleia da República autorização para elevar de 15 para 27 milhões de contos o limite de empréstimos, superiores a um ano, a conceder ao conjunto das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Para tanto havia que proceder à alteração de uma lei da Assembleia da República, a Lei n.º 9/86, por acaso, o Orçamento do Estado actualmente em vigor.
Para o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, que veio justificar à Comissão de Economia, Finanças e Plano a necessidade de aprovação desta proposta de lei,
tratava-se de um mero acto correctivo: tinha-se constatado que o volume dos empréstimos autorizados para cobrir o défice da Madeira não havia incluído em 1985, por esquecimento, como candidamente nos informou o Secretário de Estado do Tesouro, o montante correspondente a parte dos juros daquela dívida.
O Governo não se apercebeu desta diferença, pequena aliás - o que são uma dúzia de milhões de contos quando se fala do défice das regiões autónomas? -, aquando da elaboração do Orçamento para 1986 nem quando procedeu à sua alteração em Julho último, e veio, agora, no último dia, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro explicar-nos a necessidade de ampliar a autorização da cobertura do défice.
Não se tinha dado conta, pois, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, nem pelos vistos o Governo, que acabara de propor à Assembleia da República uma alteração ao Orçamento do Estado para 1986, o que em geral se chama um orçamento suplementar. Afinal, o segundo apresentado este ano, com a vantagem para nós, Assembleia da República, de desta vez o Governo não ter assacado, como o fez no primeiro orçamento suplementar de Julho, as culpas a esta Assembleia.
O Governo tinha-se, pois, esquecido, em primeiro lugar, destes 12 milhões de contos e, em segundo lugar, que uma alteração orçamental tem, de acordo com a Constituição, um processo especial de análise e votação.
Não ficam por aqui os enganos deste Governo do rigor, pois de há doze dias para cá voltou a enganar-se: já não são precisos 12 milhões de contos, mas apenas 7 milhões para a Madeira, verificando-se a «desnecessidade da verba de 5 milhões de contos destinados à Região Autónoma dos Açores», como bem refere o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Numa semana, os Açores deixaram de necessitar destes 5 milhões de contos, o que nos leva a perguntar se alguma vez deles necessitou ou se estamos perante uma novo discriminação ou penalização desta Região Autónoma.
Solicita-nos, então, o Governo que corrijamos estes três enganos e votemos mais 7 milhões de contos para a Madeira.
Mas afinal quanto deve a Região Autónoma da Madeira?
De acordo com os elementos fornecidos pelo Governo até ao final de 1985, 49,6 milhões de contos.
Em 1986, de acordo com o Programa de Reequilíbrio Financeiro aprovado entre o Governo da Região Autónoma e o da República (ou seria o do continente?) o défice acrescer-se-ia de 9,5 milhões de contos, ou seja, devia totalizar 59,1 milhões de contos.
Entretanto, o Presidente da Assembleia Regional da Madeira escreve à Assembleia da República recomendando-nos que autorizemos um reforço de verba destinada à cobertura do défice daquela Região Autónoma relativa ao ano de 1986 de mais 3 milhões de contos, destinado ao pagamento dos compromissos financeiros com particulares, fornecedores que por esse motivo vêem dificultada a situação das respectivas empresas.
Ou seja, a Assembleia Regional da Madeira vem-nos afirmar que, até ao final de 1986, a dívida da Madeira era ainda superior em 3 milhões de contos - ou seja, atingia 62,1 milhões de contos - e recomenda-nos que, desde já, estejamos preparados para a necessidade de um novo orçamento suplementar, agora ao Orçamento para 1987, que ainda nem sequer foi publicado.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos perante uma situação extraordinariamente séria, relativamente à qual a irresponsabilidade prevaleceu.
Estamos no Natal. Só o nosso espírito cristão e uma boa vontade que a todos nos deve imbuir neste momento nos leva a abster em relação ao pedido agora formulado pelo Governo.
Risos do PSD.
Esperamos que 1987 não nos traga, pelo menos em relação ao défice da Madeira, mais «surpresas» indesejáveis mas previsíveis.
Aplausos do PS e do PRD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 49/IV é bem um exemplo da forma aligeirada e incompetente como o Governo trata questões sérias.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Em primeiro lugar, o Governo apresentou à Assembleia da República esta proposta de lei tentando escamotear que, constitucional e regimentalmente, se tratava de uma segunda proposta de alteração do Orçamento do Estado para 1986. Mas se a proposta vier a ser aprovada no seu conteúdo substancial, deverá sair daqui como lei de alteração do Orçamento do Estado para 1986, filha da incompetência e da exclusiva responsabilidade do Governo e do Ministério das Finanças.
Em segundo lugar, o Governo apresentou um pedido de aumento global dos limites de empréstimos de 12 milhões de contos quando, afinal, apenas necessita de 7 milhões. Que razões levaram o Governo a fazer o pedido desnecessário de 5 milhões de contos para a Região Autónoma dos Açores é questão por dilucidar e que o Ministro das Finanças deve explicar a este Plenário. Concretamente: tratou-se de um pedido da Região Autónoma dos Açores, posteriormente retirado, ou foi apenas uma iniciativa fantasiosa do Governo?
Em terceiro lugar, as razões da necessidade de emissão de mais 7 milhões de contos de dívida da Região Autónoma da Madeira. Aceitando como boas as informações prestadas pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro, tratar-se-á de formalizar a dívida já existente e conhecida quando da assinatura pelo Ministro das Finanças, em 26 de Fevereiro de 1986, do chamado Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira e que o Governo se esqueceu de contemplar no Orçamento do Estado para 1986. Isto é, só dez meses depois é que detectou o «lapso» de 7 milhões de contos. É obra! Nomeadamente para um Governo cuja propaganda assenta, em boa parte, numa pretensa e não demonstrada competência.
Em quarto lugar, e mais uma vez aceitando como boas as razões apresentadas pelo Governo, o que o Governo pede à Assembleia da República - a alteração do limite estabelecido no n.º 7 do artigo 3.º da Lei n.º 9/86, de 30 de Abril - não é, afinal, a resposta adequada à visada aplicação da autorização solicitada. De facto, a invocada disposição do Orçamento do Estado para 1986 destina-se a fazer face ao «financiamento de investimentos dos respectivos planos ou amortizar empréstimos vincendos no decurso de 1986». Ora, a emissão da dívida de 7 milhões de contos, agora em análise, não se destina nem a amortizar a dívida de 1986 nem a financiar investimentos do mesmo ano; visa, exclusivamente, titular dívida que, à margem da lei, foi contraída pelo Governo da Região Autónoma da Madeira até 31 de Dezembro de 1985. É exactamente isso que deve vir a constar da alteração ao Orçamento do Estado para 1986, se tal vier a ser aprovado pela Assembleia da República. Impõem-no a verdade e a transparência das contas públicas.
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Em suma: da proposta de lei do Governo aproveita-se o título, uma vez que o conteúdo é para reformular de cabo a rabo!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além das vicissitudes da mal nascida proposta de lei ora em discussão e das manifestações de incompetência de que, a seu respeito, o Governo deu provas, há uma questão essencial em todo este processo que não pode ser escamoteada, qual seja a da gravidade crescente do caos financeiro em que o governo regional do PSD lançou a Região Autónoma da Madeira.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A dívida da Região Autónoma da Madeira, que, em 31 de Dezembro de 1985, ascendia a 49,6 milhões de contos, deverá montar, neste final de ano, a mais de 60 milhões de contos, qualquer coisa como 200% do seu produto.
O défice orçamental do corrente ano, inicialmente fixado num já elevado valor de 9,5 milhões de contos, e de acordo com informações prestadas pela Assembleia Regional da Madeira, deverá ser ultrapassado em cerca de 30%. São, afinal, os tais 3 milhões de contos adicionais que uma Sr.ª Deputada do PSD pretendia incluir no Orçamento do Estado para 1987 e que, por uma birra noctuma do Ministro das Finanças, recusando-se a prestar informações ao Plenário da Assembleia da República, não vieram a ser considerados.
Mas convém não esquecer que os tais 3 milhões de contos adicionais, que certamente implicarão uma primeira alteração do Orçamento do Estado para 1987, não se destinam, inversamente ao então afirmado, a Financiar investimentos da Região Autónoma dos Açores. Bem pelo contrário, a execução financeira dos investimentos encontra-se substancialmente abaixo do orçamentado. A necessidade adicional de 3 milhões de contos, resulta, exclusivamente, da crescente desregulação financeira do governo de João Jardim, que o governo de Cavaco Silva e o Ministro das Finanças não se mostram capazes de suster.
Face a este quadro caótico, melhor se compreende a inqualificável diatribe provocatória, ontem debitada por Alberto João Jardim, no Machico, ameaçando «reactivar o espírito de 74/75», «voltar à luta feroz e dura» e «meter na ordem» quem ponha em causa a política desastrosa do PSD-Madeira.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - Srs. Deputados, o grau de rebelião institucional que certas aleivosias traduzem exige adequada resposta dos órgãos de soberania e, designadamente, o fim do incrível silêncio do Primeiro-Ministro, directamente visado pela escalada provocatória de Alberto João Jardim e absolutamente incapaz de «meter na ordem» quem põe abertamente em causa a unidade nacional, além de arruinar as finanças regionais.
Aplausos do PCP.
Não há dúvida quanto a estes aspectos!
O Programa de Reequilíbrio Financeiro, assinado em Fevereiro passado entre os Governos da República e da Região Autónoma da Madeira, não resistiu a dez meses de execução. É caso para perguntar: que acompanhamento da execução orçamental tem sido levado a cabo pelo Governo da República? Que razões levaram o Governo a não tomar as medidas adequadas visando manter a execução orçamental da Região Autónoma da Madeira nos limites definidos pelo Programa de Reequilíbrio?
Até quando, Srs. Deputados, continuará o Governo a permitir ou mesmo a alimentar os desvarios financeiros do presidente do Governo Regional da Madeira?
Tenhamos presente, Srs. Deputados, que os principais prejudicados com o aumento do caos financeiro na Madeira serão a própria Região e a sua população. Quanto mais o governo de João Jardim minar as finanças públicas da Região, maiores serão os sacrifícios exigidos aos madeirenses num futuro próximo.
É contra essa política de descalabro que hoje votámos!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O meu partido, Sr. Presidente, Srs. Deputados, vai votar favoravelmente esta proposta de lei, porque, como já aqui foi salientado, se trata de um mal menor. É preferível que este défice, respeitante à amortização e ao pagamento de juros que se destinava a ficar oculto, como oculta esteve uma parte das dívidas da Região Autónoma da Madeira durante o tempo que nós conhecemos, acabe para não o estar com esta proposta de lei. É claro que reconhecemos o esforço feito aqui pelo Sr. Secretário de Estado, dando um certo tom ou inflexão à sua intervenção e dizendo-nos que estivéssemos sossegados - suponho que era essa, no fundo, a sua intenção -, porque se tratava realmente de amortização e juros respeitantes a 1985.
No entanto, seria bom que o Governo - que tem sido tão rápido e tão pronto em censurar a Assembleia da República quando esta, pelas suas deliberações, põe em risco a necessidade de aqui serem votados orçamentos suplementares ou põe em risco a execução do orçamento do respectivo ano - tivesse, com esta indicação e com esta proposta, identificado os verdadeiros causadores deste enorme atraso que o leva a propor, apenas nesta altura, uma verdadeira alteração ao Orçamento e o obriga a omitir estas importâncias no breve sumário que nos deu da situação do défice da região autónoma com o Orçamento de 1986.
Seria bom que o Governo tivesse aqui, com os dados que hoje tem, identificado rigorosamente a situação, apontasse os seus responsáveis e que tivesse identificado o acto de indisciplina financeira que consistiu em provocar esta omissão relativamente ao Orçamento de 1986. Assim não fez, e a Assembleia vai - suponho eu - proceder correctamente, aprovando esta proposta de lei. Isto porque, se o não fizesse, pior estaríamos do que aprovando-a, como vamos fazê-lo.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente: Pretendia apenas dar alguns esclarecimentos, pois parece-me que algumas das afirmações que aqui foram feitas, o foram apenas por desconhecimento de alguns factos.
Uma voz do PCP: - O Governo não informa!
O Orador: - A primeira questão diz respeito à utilização dos 5 milhões de contos previstos para a Região Autónoma dos Açores. O facto é muito simples.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Simples? Para este governo é tudo simples!
O Orador: - O Governo da Região Autónoma dos Açores deu a conhecer ao Governo da República que iria utilizar, do montante previsto no Orçamento de 1986, 5 milhões de contos, mas com o decorrer do tempo não os utilizou e informou-nos recentemente de que não precisava de os utilizar.
Quanto ao problema da emissão da dívida, informaria apenas de que é um problema formal: não existe um centavo de movimento de fundos; trata-se apenas de uma situação irregular que vem de 1985 e que diz fundamentalmente respeito, até pela proposta do tempo, à gerência do governo anterior.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Já chega!
O Orador: - Referiram também, a propósito da minha afirmação, de que foi este governo o primeiro a celebrar um protocolo com a Região Autónoma da Madeira, de modo a pôr ordem financeira nas contas da Região, que a Assembleia da República não conhece o acordo de reequilíbrio financeiro da Madeira. Fico sinceramente surpreso com isso, uma vez que ele consta no anexo ao Orçamento de 1986.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Trata-se de um pedido de esclarecimento muito rápido. O Sr. Secretário diz que, ao fim e ao cabo, a inclusão dos 5 milhões de contos para a Região Autónoma dos Açores se deve ao facto desta Região ter dito que utilizaria essa quantia e só agora vir dizer não precisar deles.
A minha pergunta é muito simples e concreta: essa comunicação da Região Autónoma dos Açores, de que não pretendia utilizar os 5 milhões de contos, é posterior ou anterior a 10 de Dezembro de 1986?
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O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.
O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Não se trata tanto de pedir esclarecimentos mas de, sob essa forma regimental, dizer ao Sr. Secretário de Estado que efectivamente ele pouco acrescentou àquilo que já se sabia.
Não encontra na nossa intervenção nada que contradiga aquilo que disse, excepto quando refere que já é do conhecimento desta Assembleia o Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira. É verdade que o Governo enviou, quando dos trabalhos de preparação do Orçamento do Estado para 1986, um anexo informativo, mas esse anexo - e é isso que se diz na nossa intervenção - não é suficiente para explicar qual a natureza desse acordo, quais os seus fundamentos, quais os seus objectivos, as acções aí contidas, bem como as obrigações mútua e reciprocamente assumidas pelo Governo Central e pelo Governo da Região Autónoma dos Açores. É dessas informações qualitativas que precisamos, e não apenas de quadros para saber que a Madeira está a dever tanto ou que o grau de execução do Programa é este ou aquele. Precisamos de ser informados sobre o que é que está em causa e qual a posição do Governo sobre o que vai acontecer nos próximos tempos.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: - Respondendo ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, queria afirmar que, como é evidente, o conhecimento é posterior a 10 de Dezembro.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Ivo Pinho, pretendia dizer que, no fundo, as obrigações das partes estão previstas no texto do próprio acordo.
O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de lei.
Vamos agora proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 49/IV.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS, votos contra do PCP e abstenções do PS e do MDP/CDE.
Vamos agora proceder à votação da proposta na especialidade, que tem apenas um artigo e sobre o qual existe uma proposta de emenda. Assim sendo, a proposta de emenda tem prioridade na votação sobre o texto do artigo.
A proposta de emenda, da autoria dos Srs. Deputados do PSD, diz que o limite de 27 milhões de contos referidos passe para 22 milhões de contos. Ou seja, onde no corpo do artigo se diz «elevar para 27 milhões de contos o actual limite global estabelecido no n.º 7» passará para «elevar para 22 milhões o actual limite global estabelecido no n.º 7».
Está aberta a discussão sobre a proposta de emenda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de colocar uma questão aos subscritores desta proposta e que é de saber se não considerariam oportuno alterar também o dispositivo legal da lei do Orçamento de 1986 a que se refere esta proposta de lei, na medida em que isto não é aplicável se ficar incluído nessa rubrica. Ë que, a não ser assim, não poderá ser utilizado o reforço de 7 milhões de contos. Punha esta questão à consideração dos Srs. Deputados do PSD.
O Sr. Presidente: - Pretende algum Sr. Deputado do PSD responder a esta questão colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Macheie (PSD): - É evidente que terão que ser feitas as necessárias alterações para que o dispositivo legal fique em termos de daí se poderem retirar as ilações necessárias.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Remete tudo para a redacção final!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de emenda.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS, votos contra do PCP e abstenções do PS e do MDP/CDE.
Srs. Deputados, vamos agora votar o artigo único desta proposta, cujo teor é já conhecido.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS, votos contra do PCP e abstenções do PS e do MDP/CDE.
Temos agora uma proposta de aditamento de um artigo novo, artigo 2.º, que vai ser lida.
Foi lida. É a seguinte:
Artigo 2.º
Informações sobre o Programa de Reequilíbrio Financeiro
O Governo remeterá à Assembleia da República, até 31 de Janeiro de 1987, as informações necessárias à avaliação da execução do Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira, incluindo os relatórios sobre a dívida e a situação dos fundos e serviços autónomos da Região Autónoma da Madeira.
Sr. Deputado, está em discussão esta proposta de aditamento.
Pausa.
Não havendo inscrições, vai ser submetida à votação.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada do PSD Cecília Catarino e abstenções do PSD e do CDS.
Sr.ª Deputada Cecília Catarino, a Mesa tem dúvidas quanto ao sentido do voto de V. Ex.ª
A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Se o Sr. Presidente me dá licença, esclarecerei que votei a favor porque o Governo Regional da Madeira não tem rigorosamente
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nada a esconder da execução do protocolo e estará perfeitamente disponível para fornecer todos os elementos indispensáveis.
Vozes do PS e do PCP: - Finalmente!
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr.ª Deputada.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pede a palavra para que efeito?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, não fiquei esclarecido sobre o sentido de voto da Sr.ª Deputada Cecília Catarino, pois a Sr.ª Deputada disse que «votaria favoravelmente».
Vozes do PSD: - A Sr.ª Deputada disse que «votou favoravelmente»!
O Orador: - Se disse que tinha votado favoravelmente, já não tenho qualquer dúvida.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação final global da proposta de lei n.º 49/IV.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PRD, do CDS, votos contra do PCP e abstenções do PS e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotámos, assim, a nossa ordem de trabalhos.
A próxima sessão plenária terá lugar no dia 6 de Janeiro de 1987, pelas 15 horas, com período de antes da ordem do dia, estando agendada para o período da ordem do dia a discussão dos projectos de lei n.ºs 311/IV, apresentado pelo PCP, que suspende a atribuição de reservas na Zona de Intervenção da Reforma Agrária até à conclusão da actividade corrente do inquérito parlamentar à actuação do Ministério da Agricultura, e 325/IV, apresentado pelo PRD e que versa sobre a mesma matéria.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, julgo que há um lapso por parte da Mesa que importa corrigir de imediato. Com efeito, será também discutido na próxima sessão plenária um projecto de lei apresentado pelo PS, cujo número não recordo, que transfere a competência na atribuição de reservas para os tribunais administrativos.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, mas na súmula da conferência de líderes não se inclui esse projecto, pelo que a Mesa não dispunha dessa informação.
Fica a correcção feita.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Com efeito, a súmula da conferência de líderes continha essa imprecisão, pelo que já falei com o Sr. Presidente há alguns dias e foi-me dito que o diploma seria agendado.
O Sr. Presidente: - Não há dúvidas quanto a isso, Sr. Deputado.
A correcção fica registada e, assim, na próxima reunião plenária será também, discutido o projecto de lei n.º 321/IV, apresentado pelo PS, sobre matéria conexa.
Srs. Deputados, desejo a todos um Bom Natal e um feliz Ano Novo.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 10 minutos.
Declarações de voto enviadas para publicação sobre a ratificação do Decreto-lei n.º 351/68, de 20 de Outubro
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma a União de Bancos Portugueses em sociedade anónima de capitais públicos por várias ordens de razão.
Estou convicto que a banca nacionalizada tem de passar por uma profunda reestruturação para a fortalecer, tornar mais competitiva, desgovernamentalizá-la e defender os seus trabalhadores. Esta reestruturação implica, a meu ver, a fusão de bancos e a sua especialização. Ora, o Decreto-Lei n.º 351/86 aparenta transformar no bom sentido para deixar tudo pior, relativamente à eficácia e ao poder concorrencial da banca nacionalizada. Evidencia a incapacidade do poder político de reforçar, com visão e sentido de Estado, o que lhe pertence, encaminhando a sociedade portuguesa na via de uma melhor democracia participativa. Vem a palco a questão permanente da democracia versus oligarquia, que se coloca de forma inescapável, mostrando que enquanto houver homens a ideologia não está morta.
Não é ainda claro, para mim obviamente, que a nível puramente técnico a solução orientará, de um ponto de vista de devir histórico, a banca nacionalizada no sentido correcto. Antes me parece que, pelo aumento da complexidade institucional do sistema financeiro, pelo tratamento casuístico adoptado, por falta de uma teoria dinâmica da evolução do conjunto do sistema bancário, se contribui para o incremento da instabilidade e da insegurança que não serve os objectivos do regime democrático em Portugal. Estes alguns dos motivos, que não todos, do meu voto.
O Deputado do PRD, Sá Furtado.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra, nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições dê concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respecti-
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vás consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
Os Deputados do PRD: Marques Júnior - Vasco da Gama Fernandes.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
O Deputado do PRD, Alexandre Manuel.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n. º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
O Deputado do PRD, António Marques.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n. º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
Os Deputados do PRD: Costa Carvalho - José Luís Correia da Azevedo.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n. º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
Os Deputados do PRD: António Paulouro - Vitorino Costa.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n. º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
O Deputado do PRD, Sá e Cunha.
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Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
O Deputado do PRD, Tiago Bastos.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n.º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espirito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se vivem na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
Por outro lado, e pela forma como se apresenta o diploma, é de admitir que mais do que resolver o problema da União de Bancos Portugueses, é conduzir à sua eventual extinção como empresa pública, sem o controle da Assembleia da República, com as respectivas consequências, em especial o futuro de milhares de trabalhadores e, eventualmente, pôr em causa a médio prazo, com a abertura deste precedente, a existência da banca nacionalizada em Portugal.
O Deputado do PRD, Coruja Lopes.
Votei contra a ratificação do Decreto-Lei n. º 351/86, que transforma em sociedade anónima de capitais públicos a União de Bancos Portugueses, porque não se vê nem na letra nem no espírito do respectivo diploma uma filosofia de fundo, tendente a equacionar e resolver os graves problemas estruturais que se viver na banca nacionalizada. Situação que foi substancialmente agravada, pelo facto de a abertura à iniciativa privada ser feita sem primeiro se ter reestruturado o sector nacionalizado e feito o respectivo saneamento, o que teve como consequências, entre outras, o restringir do seu mercado, criando condições de concorrência que lhes são muito desfavoráveis.
O Deputado do PRD, Sousa Pereira.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Francisco Jardim Ramos.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
João Álvaro Poças Santos.
João Luis Malato Correia.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José de Vargas Bulcão.
Mário Jorge Belo Maciel.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama.
João Rosado Correia.
José Barbosa Mota.
José Manuel Torres Couto.
Leonel de Sousa Fadigas.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Lopes Marques.
Fernando Dias de Carvalho.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Partido Comunista Português (PCP):
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Octávio Rodrigues Pato.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
José Augusto Gama.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Pedro José De Negro Feist.
Deputados independentes:
Gonçalo Pereira Ribeiro Telles.
António José Borges de Carvalho.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
José Mendes Melo Alves.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário Júlio Montalvão Machado.
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Partido Socialista (PS):
Carlos Manuel N. Costa Candal.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Luís do Amaral Nunes.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Partido Renovador Democrático (PRD):
João Barros Madeira.
José Caeiro Passinhas.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Victor Manuel Lopes Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
José Rodrigues Vitoriano.
Centro Democrático Social (CDS):
António Vasco Mello César Menezes.
Hernâni Torres Moutinho.
Joaquim Rocha dos Santos.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Declarações de voto enviadas para publicação sobre a Lei de Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão
A aprovação, pela Assembleia da República, da Lei de Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão é um marco de elevado significado político, institucional e mesmo cultural.
O PS desde cedo manifestou o seu total empenhamento no apoio e na legalização da actividade de radiodifusão por operadores privados, tanto no âmbito nacional, como no âmbito regional e local.
Ao PS e à resistência dos socialistas se deve o ter-se garantido as condições de liberdade das estações emissoras de radiodifusão no período mais conturbado da revolução portuguesa.
Foi o PS o único partido que apresentou projecto de lei com vista à legalização do licenciamento das estações emissoras de rádio.
O PS empenhou-se activamente em todo o processo de apreciação e votação, na especialidade, do referido diploma.
A solução institucional entretanto alcançada é a resultante de um esforço de consenso, do qual voluntária e deliberadamente se alheou, por ausência, o partido apoiante do Governo.
Tal solução exprime três princípios essenciais a saber:
Defesa da igualdade de acesso de candidatos ao licenciamento de alvará de radiodifusão, mediante obrigatoriedade de concurso público;
Garantia de independência no processo de licenciamento, através de exercício, pelo Governo, da competência de atribuição de alvarás vinculada a parecer favorável do Conselho de Rádio;
Transparência na gestão do espectro radioeléctrico mediante publicação do mapa de frequência, nos termos legalmente definidos.
A Lei de Licenciamento condiciona a atribuição do alvará a um conjunto de requisitos indispensáveis a garantir a probidade, a qualidade e a operacionalidade das estações emissoras de rádio.
A Lei do Licenciamento vem efectivamente permitir que o pluralismo radiofónico se afirme como uma realidade no nosso país.
Por discordância pela institucionalização do Conselho da Rádio e pela reversão para o domínio público disponível das frequências atribuídas a título precário à Rádio Renascença, o Governo proeurou impedir a aprovação de uma lei por si própria há muito tempo reclamada.
No primeiro caso, é patente o nervosismo governamental por não poder vir a dispor do poder insindicável de atribuição dos alvarás de licenciamento num sector indissociável da liberdade de expressão e de informação. O Governo menospreza nas suas alegações o facto de as condições de exercício dos direitos, liberdades e garantias serem definidos pela Constituição e por lei da Assembleia da República. Nesta matéria, o exercício vinculado de um acto administrativo de conteúdo positivo revela-se, seguramente, como sendo uma exigência mínima de independência.
Acresce ainda que o Conselho da Rádio, concebido como órgão simétrico (ainda que não idêntico) do Conselho de Imprensa e como embrião de um futuro conselho nacional do audiovisual, é uma inovação que deveria merecer o aplauso de todos quantos pugnam - ou dizem pugnar - por uma sociedade aberta e plural, fundada na liberdade da iniciativa e da criatividade.
Quanto ao segundo problema, é manifesta a total improcedência das alegações governamentais, produto de uma hipocrisia política que deve ser sublinhada.
Com efeito, merece referência o facto de o actual Secretário de Estado, com tutela sobre a comunicação social, Marques Mendes, haver solicitado parecer à Auditoria Jurídica da Presidência do Conselho de Ministros sobre a legalidade e as implicações do despacho atributivo, a título precário, de duas redes nacionais de frequência, respectivamente à RDP e à Rádio Renascença. E de, perante as conclusões do parecer, - segundo o qual não se tratara de nenhum acto constitutivo de direitos, de onde a cessação poder verificar-se a todo o tempo e as frequências poderem remeter para o domínio público disponível - sobre o mesmo ter averbado despacho de concordância e remessa para conhecimento à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
A conclusão é, pois, a todos os títulos evidente: o Governo induziu os deputados a legislar no sentido em que o fizeram e procura, posteriormente, eximir-se às suas próprias responsabilidades no acto produzido.
O Partido Socialista está consciente da campanha demagógica que se vai abater sobre si, em consequência da decisão de aprovação da Lei do Licenciamento. Mas está convicto de ter cooperado para a aprovação de uma das leis com mais impacte na vida portuguesa e de o ter feito com os olhos postos no interesse nacional, sem subserviências a interesses constituídos, a pressões ilegítimas, a conveniências políticas ou partidárias.
O Grupo Parlamentar do PS.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O exercício da actividade da radiodifusão caiu, há muito, na mais profunda desordem. Incapazes de responder oportuna e convenientemente aos problemas do seu tempo, o Estado e os governos olham perplexos e atarantados para a evolução da vida. Assim, a adequação da lei às novas realidades que vão surgindo opera-se por excepção à geral desconformidade dos textos legais com as necessidades profundas do País.
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Em Maio do ano em curso o Plenário votou na generalidade, com a abstenção do CDS quanto ao segundo, a proposta de lei n.º 24 e o projecto de lei n.º 142/IV, da autoria do Partido Socialista, ambos sobre o licenciamento de estações emissoras de radiodifusão.
Desejavam os vários grupos parlamentares que o subsequente trabalho da Comissão proporcionasse, atenta a natureza da matéria em ponderação, o mais vasto acordo entre partidos. Desejavam, ao menos, a fazer fé nas declarações dos vários partidos...
Concluído o trabalho de redacção do texto alternativo acabado de votar, desvaneceu-se aquela intenção. E é pena. Porque no domínio dos meios de comunicação de massa, tão essencial ao desenvolvimento do País, era bom que se decidisse, senão por unanimidade, ao menos por margem expressiva que retratasse a vasta maioria nacional que perfilha a liberdade contra o estatismo monovalente.
Votámos contra a Lei do Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão. Fizemo-lo porque o texto agora aprovado é um repositório de preconceitos tutelares dirigidos contra a liberdade dos cidadãos e das suas iniciativas; enferma de um xenofobismo que é justamente o inverso do nacionalismo convenientemente entendido; estabelece condições de preferência, umas discutíveis, outras tão intencionalmente obscuras, que o seu efeito útil mais evidente será, precisamente, proporcionar a fraude à lei; outras, ainda, de tal forma falaciosas que o futuro demonstrará não passarem de cândidos equívocos.
Por outro lado, o diploma agora aprovado cria um vasto conselho da rádio com o pretenso objectivo de assegurar a liberdade, o pluralismo e a independência da actividade, bem como o acesso, em condições de igualdade, aos respectivos meios de comunicação. E ainda e particularmente com a incumbência de emitir parecer prévio vinculativo sobre propostas de licenciamento.
Temos assim a constituição de mais um órgão a expensas do OE. Um órgão que, contrariamente às finalidades que lhe são enunciadas, vai funcionar como um real centro de controle da radiodifusão a exercer pela maioria de esquerda que o votou. Sob o manto de uma neutralidade aparente, mal se esconde o propósito efectivo de detenção, pelas várias famílias socialista e comunista, das rédeas da actividade radiofónica. Para o confirmar, mais não é necessário do que atentar no critério da sua constituição.
Interfere o Conselho da Rádio na actividade normal do Governo? Ainda bem. Pensarão os que, de um lado e do outro, incitam, provocando a confrontação permanente entre os órgãos de soberania.
Entretanto o sistema caminha, gradualmente, para a ingovernalidade. Dá agora, com este diploma, um passo exemplar na esquerdização do País. Movimento que, quanto a nós, é em larga medida consequência da desproporcionada altivez do Governo face às realidades - para quem uma política maioritária de futuro que represente o centro das preocupações do povo português não existindo é substituída precária e ilusoriamente por um apregoar incessante de alegados êxitos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O voto do CDS contra a Lei do Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão tem implícito outro voto: o de que este diploma, pelo seu conteúdo indesejável, venha a ser objecto de oportuna e rápida revisão. O CDS tomará a seu cargo essa iniciativa em devido tempo. Tendo em vista a reparação da arbitrariedade cometida pelo artigo 48.º, ao retirar designadamente à Rádio Renascença uma rede nacional de FM legalmente licenciada.
Não há dúvida que a provisoriedade referida no despacho do Secretário de Estado Anselmo Rodrigues dizia apenas respeito ao prazo durante o qual a autorização será válida. Isto é, prevaleceria o prazo fixado no artigo 12.º de quinze anos.
Mas não: a Comissão resolveu atribuir o prazo farisaico de 90 dias para exploração do licenciamento. Nós, pasmados, protestamos.
O Deputado do CDS, Gomes de Almeida.
OS REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - José Diogo.
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