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DIÁRIO da Assembleia da República

I Série - Número 37

Sexta-feira, 30 de Janeiro de 1987

IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE JANEIRO DE 1987

Presidente: Ex.º Sr. José Rodrigues Vitoriano

Secretárlos: Ex.ºs Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes

Victor Manuel Caio Roque
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Maia Nunes de Almeida

Sumário. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes de ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e do entrada na Mesa de alguns diplomas.
O Sr. Deputado Pinho Silva (PRD) falou sobre a situação profissional e social dos professores primários.
O Sr. Deputado Virgílio Carneiro (PSD) apoiou a elevação de Riba de Ave à categoria de vila.
O Sr. Deputado Mota Torres (PS), no 10. º aniversário da autonomia das regiões autónomas, considerou haver falta de condições de participação democrática para os partidos da oposição na Regido Autónoma da Madeira. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento e protestos dos Srs. Deputados Mário Maciel, Jardim Ramos e Cecília Catarina (PSD).
O Sr. Deputado Sá Furtado (PRD) congratulou-se com a recente assinatura de um convénio básico entre as Universidades de Coimbra e de Salamanca.
A Sr. º Deputada Maria Santos (Indep.) manifestou a sua discordância com a construção das chamadas Torres dos Jerónimos.
O Sr. Deputado José Cruz (PCP) chamou a atenção da Câmara para a necessidade de se esclarecer o envolvimento de Portugal na venda de armas ao Irão e à Guatemala.
O Sr. Deputado Borges de Carvalho (Indep.), na passagem de mais um aniversário do regicídio, evocou a figura do rei D. Carlos I.
O Sr. Deputado Corujo Lopes (PRD) analisou as consequências da existência de uma carreiro de tiro na zona sul da cidade de Espinho.
O Sr. Deputado Anselmo Aníbal (PCP) abordou o grave problema das valas sanitárias localizadas na zona oriental de Lisboa perto do rio Tejo.

O Sr. Deputado Sousa Pereira (PRD) trouxe à colação alguns elementos relativos da má qualidade sanitária das águas das piscinas da cidade do Porto.

Ordem do dia. - Foram autorizados vários senhores deputados a depor como testemunha.
Iniciou-se a apreciação dos pedidas de ratificação n.º 126/IV (PCP), 127/IV (PRD) e 128/IV (PS), relativos ao Decreto-lei n. º 16/87, de 9 de Janeiro (Lei Orgânica Hospitalar), que revoga o Decreto-lei n.º 129/77, de 2 de Abril.
Intervieram no debate, a diverso título, além da Sr. ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza), os Srs. Deputados Vidigal Amaro (PCP), Jar-

dim Ramos (PSD), José Carlos Vasconcelos (PRD), António Capucho (PSD), Carlos Brito (PCP), Costa Andrade (PSD), Ferraz de Abreu (PS), Valdemar Alves e Duarte Lima (PSD), Dias de Carvalho (PRD), Zita Seabra (PCP), Horácio Marçal (CDS), Sá Furtado e Defensor de Mouro (PRD), Santana Maia (PS), Raul Castro (MDP/CDE) e Eduardo Pereira (PS).
Entretanto, foi aprovado um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um deputado do PRD e de outro do CDS e aprovados os projectos de lei n.º 121/IV e 336/IV (PSD) e 346/IV (PS) e rejeitados os projectos de lei n.º 6/IV (PCP) e l27/IV (PRD), que versavam todos matérias relativas ao Estatuto Remuneratório dos Titulares dos Cargos Políticos, tendo os projectos aprovados baixado à respectiva Comissão para debate e votação na especialidade.
Procedeu-se ainda à eleição de dois membros para o Conselho de Comunicação Social, tendo apenas um deles sido eleito, e foram aprovados três pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a apresentação em juízo de três senhores deputados.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues. Adérito Manuel Soares Campos. Alberto Monteiro Araújo. Amadeu Vasconcelos Martins. Amândio dos Anjos Gomes. António d'Orey Capucho. António Joaquim Bastos Marques Mendes. António Manuel Lopes Tavares. António Paulo Pereira Coelho.

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António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Filipe Athayde de Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montai vão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Octávio Júlio Pereira Machado.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Luís Gomes Vaz.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.

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Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Defensor Oliveira Moura.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Rarnos.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José Rodrigo Costa Carvalho.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral. Rui José dos Santos Silva. Rui de Sá e Cunha. Tiago Gameiro Rodrigues Bastos. Vasco da Gama Lopes Fernandes. Vasco Pinto da Silva Marques. Vitorino da Silva Costa. Victor Manuel Ávila da Silva. Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro. António Anselmo Aníbal. António Dias Lourenço da Silva. António da Silva Mota. António Manuel da Silva Osório. António Vidigal Amaro. Belchior Alves Pereira. Bento Aniceto Calado. Carlos Alfredo de Brito. Carlos Campos Rodrigues Costa. Carlos Manafaia. Cláudio José Santos Percheiro. Custódio Jacinto Gingão. Domingos Abrantes Ferreira. Jerónimo Carvalho de Sousa. João Carlos Abrantes. Joaquim Gomes dos Santos. Jorge Manuel Abreu de Lemos. Jorge Manuel Lampreia Patrício. José Estêvão Correia da Cruz. José Manuel Antunes Mendes. José Manuel Santos Magalhães. José Manuel Maia Nunes de Almeida. José Rodrigues Vitoriano. Luís Manuel Loureiro Roque. Manuel Rogério de Sousa Brito. Maria lida da Costa Figueiredo. Maria Odete dos Santos. Octávio Augusto Teixeira. Octávio Rodrigues Pato. Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida. Adriano José Alves Moreira. António Filipe Neiva Correia.

António José Tomás Gomes de Pinho. Carlos Eduardo Oliveira Sousa. Eugénio Nunes Anacoreta Correia. Francisco António Oliveira Teixeira. Henrique José Pereira de Morais. Henrique Manuel Soares Cruz. Horácio Alves Marçal. João Gomes de Abreu Lima. João José Camacho Borges Pinho. Manuel Afonso de Almeida Pinto. José Maria Andrade Pereira. Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca. José Manuel do Carmo Tengarrinha. Raul Fernandes Morais e Castro.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho. Gonçalo Pereira Ribeiro Teles. Maria Amélia Mota Santos. Rui Manuel Oliveira Costa.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Cartas

De Lucília de Conceição Mondego Ferreira, de Ermesinde, protestando pela discriminação de sexo praticada na direcção-geral da CP num recente concurso e invocando os preceitos contidos nos artigos 8.º e 9. º do Decreto-lei n.º 491/85, de 26 de Novembro; em nome da Obra de Assistência aos Animais, da Liga Portuguesa dos Direitos do Animal e da Comissão para a Implantação dos Direitos do Animal em Portugal, protestando pela manipulação feita pela Radiotelevisão Portuguesa acerca da entrada nesta Assembleia do projecto de lei sobre touros de morte, exigindo o apuramento de responsabilidades e o direito de resposta em tempo de antena, com idênticas condições ao da notícia apresentada; de Fernando Lourenço Veiga, residente em Vale de Amoreira, no Barreiro, lamentando situações existentes com a aquisição de habitação própria, designadamente com dificuldades surgidas na Caixa Geral de Depósitos, e pedindo que seja revista a forma actual do contrato-promessa de compra e venda.

Ofício

Da Câmara Municipal de Cascais, transcrevendo o teor da moção aprovada naquela autarquia, na reunião levada a efeito no dia 25 de Novembro findo, de congratulação pela vitória das forças democráticas, no dia de mais um aniversário.

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Petições

N.º 115/IV, da iniciativa da Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços, com sede em Lisboa, expondo questões sobre a situação ilegal de trabalho dos trabalhadores dos supermercados; n.º 116/IV, da iniciativa de António Lopes Valentim da Silva, residente em Moscavide, expondo a sua situação de aposentado da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses - CP, e pede que a mesma seja decidida; n.º 117/IV, da iniciativa de Maria Teresa Gomes da Silva e outros, expondo questões sobre a alteração ao regime de dedicação exclusiva nas carreiras docente universitária, ensino superior politécnico e de investigação científica; n.º. 118/IV, da iniciativa de Mário Bruno Lopes, residente em Paço de Arcos, expondo a sua situação de trabalhador com salários em atraso e solicitando a isenção de impostos; n.º 119/IV, da iniciativa de Eduardo Abrantes e outros, de Oeiras, expondo questões sobre a alteração ao regime de dedicação exclusiva nas carreiras docente universitária, ensino superior politécnico e de investigação científica.

Telex

Da Câmara Municipal de Pombal, solicitando que, paralelamente com o Estatuto Remuneratório dos Titulares dos Cargos Políticos, se discuta e aprove o Estatuto Autarca.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Manuel Luís; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Relvas; ao Ministério da Educação e Cultura (2), formulados pelo Sr. Deputado João Abrantes; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Trabalho e Segurança Social (2), formulados pelo Sr. Deputado Horácio Marçal; a diversos Ministérios (14), formulados pela Sr. Deputada Maria Santos; a diversos Ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; ao Governo Regional dos Açores, formulado pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes e outros; ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Martins, e ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Lopes Vieira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai enunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: o projecto de lei n.º 347/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Jaime Gama e outros, do PS, que versa sobre incompatibilidades à alteração ao Estatuto dos Deputados, o qual foi admitido e baixou à 1. ª Comissão; a ratificação n.º 134/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Álvaro Brasileiro e outros, do PCP, relativa ao Decreto-lei n.º 15/87, de 9 de Janeiro, que cria o Instituto Regulador e Orientador dos Mercados Agrícolas, e a ratificação n.º 153/IV, da iniciativa do Sr. Deputado João

Amaral e outros, do PCP, referente ao Decreto-lei n.º 440/86, de 31 de Dezembro, que reestrutura o Serviço de Estrangeiros, a qual foi igualmente admitida.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Presidente da Comissão Interparlamentar Luso-Brasileira pede para informar os senhores deputados que integram esta Comissão de que a mesma reúne às 16 horas na sala 250-H.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Silva.

O Sr. Pinho Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Ministério da Educação penaliza, monetariamente, muitos professores do ensino primário.
O Decreto-lei n.º 211/81, de 13 de Julho, reconhece, no seu preâmbulo, a complexidade dos problemas administrativos inerentes ao funcionamento das mais de 10 000 escolas, 45 000 professores e 1 000 000 de alunos, e determina as atribuições e competências das direcções e delegações escolares, bem como o preenchimento dos quadros destas estruturas, clarificando as condições de nomeação e cessação das respectivas comissões de serviço.
Numa breve análise deste diploma, conclui-se que esta estrutura administrativa está dependente da confiança pessoal do «senhor que se segue», não podendo por isso responder às necessidades de uma administração descentralizada, localmente integrada, participada e responsável pela prossecução das tarefas importantes que lhe cabem, deixando escandalosamente de fora os directores e subdirectores das escolas, principais garantes do funcionamento administrativo e únicos professores a serem eleitos para ocuparem os respectivos lugares.
Pelo citado decreto-lei, o delegado escolar recebia pela letra de topo da carreira, tendo ainda uma gratificação mensal de 2000$.
O Decreto-lei n.º 100/86, de 17 de Maio, actualizou as letras de vencimento dos professores e estabeleceu as seguintes seis fases: 1.ª fase - letra I, 2.ª fase - letra H, 3.ª fase - letra F, 4. ª fase - letra E, 5.ª fase - letra D, e 6.ª fase - letra C.
Assim, estão os delegados escolares a receber pela letra F, quando, neste momento, a letra de topo da carreira é a letra C, sendo ainda certo que, como professores e dados os anos de serviço, receberiam por letra superior.
Esta situação afecta ainda os directores escolares e os inspectores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também gritante e injusta é a situação em que se encontram os professores profissionalizados não efectivos.
Como se não bastasse a mudança frequente de escola, o rodopio constante em que andam, a permanente incerteza com que vivem a colocação seguinte, os reflexos profissionais, familiares e sociais que este nomadismo frenético lhes acarreta, vêem-se ainda e pelo simples facto de não serem efectivos condenados a não receber pela fase a que têm direito de acordo com os anos de serviço prestado, auferindo vencimentos mensais muito inferiores, que nem os posteriores retroactivos podem minimizar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez dou voz, nesta Assembleia, aos professores que, por serem do ensino primário, não podem ver piorar a sua situação profissional e social.

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Conhecemos as dificuldades de algumas mudanças, mas sabemos de razões objectivas de interesse nacional que exigem o renascer da esperança dos professores, num projecto educativo que contribua decisivamente para o desenvolvimento e progresso de todos os portugueses.

Aplausos do PRD.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, a conferência de líderes fixou para hoje a repetição das eleições para os cargos ainda em aberto no Conselho da Comunicação Social e ainda para uns pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos que têm que ser votados sob voto secreto.
Não sei se a Mesa pretende organizar esse processo eleitoral já, pois, se assim não for, tenho receio de que haja problemas na afluência às umas. Portanto, convinha que a Câmara acertasse o horário da votação; adianto, desde já, que as umas poderiam ficar abertas até às 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Penso que é oportuna a chamada de atenção do Sr. Deputado. Assim, vou dar indicações aos serviços para organizarem já as votações.
Quanto à votação dos relatórios e pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, tenho-as aqui indicadas na primeira parte da ordem do dia, pelo que podem talvez fixar para essa altura ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, desculpe insistir, mas, tratando-se de uma votação secreta, poderia ser feita em simultâneo com as outras - penso que facilitaria os trabalhos.

O Sr. Presidente: - De acordo, Sr. Deputado. Nada tenho a objectar a que tal se processe desse modo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Virgílio Carneiro.

O Sr. Virgílio Carneiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora suspeito ao afirmá-lo, não haverá dúvidas de que Portugal é um país recheado de belos recortes. Desde as serranias do Norte até às planícies do Sul, por muito que se viaje, é sempre possível descobrir novidades que nos deleitem a vista, purifiquem o peito, serenem e enriqueçam o espírito e enlevem a natural vaidade de ser português. Em cada canto, uma paisagem verdejante ou uma seara loura, um monte estéril ou um vale fecundo; aldeias, vilas e cidades, umas grandes, outras minúsculas, vão salpicando essa paisagem variada e indicando ao transeunte os brasões da nossa história, gravados em múltiplos e seculares monumentos, os padrões da nossa cultura, expressos num sem-número de costumes, tradições e lendas, os vectores da nossa economia, espelhada nas específicas manifestações materiais dos três principais sectores de produção, a estrutura da nossa sociedade, que, mais ou menos, evidencia as bases económicas e culturais de que depende.
Entre essas sempre novas maravilhas, que são as terras de Portugal, encontra-se, equidistante de três progressivas cidades do Minho (Vila Nova de Famalicão, Guimarães e Santo Tirso), a não menos promissora povoação de Riba de Ave.
Se na sua história, semelhante à da maioria das aldeias do País, não ressaltam factos de extraordinário relevo, quis a providência, contudo, que nesta povoação, administrativamente integrada no concelho de Vila Nova de Famalicão e localizada na confluência dos rios Vizela e Ave, surgisse o motor poderoso e transformador da indústria têxtil portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com efeito, a expressão Riba de Ave (Ripa Ave) remonta já ao século IX (época visigoda), para designar uma região «acima do curso de água» que englobava não só o núcleo actual, mas vários lugares hoje pertencentes a freguesias circunvizinhas, como Serzedelo, Guardizela, etc. Mesmo quando este nome passa a identificar uma freguesia devidamente delimitada, como se depreende dos censuais de Braga dos séculos XI a XV, das inquirições do século XIII e do seu tombo do século XVI, a área que abrangia ocupava zonas que excedian, em boa medida, as suas fronteiras actuais.
Ainda hoje, também, os seus arruamentos prolongam-se em agregado contínuo por espaços de freguesias vizinhas, com particular destaque para o lugar de Sobreira, da freguesia de Serzedelo, do concelho de Guimarães.
Todavia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o grande salto desta terra para o progresso acontece quando, no dealbar deste século, ali decidiu fixar-se Narciso Ferreira, que ali empenhou o seu génio empreendedor, obrigando a história contemporânea a referir Riba de Ave com letras de ouro, ao mesmo tempo que, desde os primeiros anos deste século, rasgava com firmeza, pela primeira vez em Portugal, os caminhos da moderna indústria têxtil e abria perspectivas novas para o rumo da economia nacional. Por isso mesmo, após a morte deste benemérito, em 1933, alguém escreveu, com verdade, que « o nome de Riba de Ave e de Narciso Ferreira, não serão mais um anonimato topográfico ou individual, no conjunto dos mais assinalados valores humanos e económicos de Portugal» ('). E ainda, no dizer de um ilustre estudioso, filho daquela terra, «Riba de Ave é uma das primeiras freguesias de Portugal inteiro a beneficiar do sortilégio da electricidade e a possuir iluminação pública; foi a precursora da indústria têxtil mecânica; a capital nortenha do trabalho» (').
Daí para a frente, Riba de Ave e a família Ferreira tornaram-se o paradigma da nova indústria do Norte de Portugal e o seu exemplo irradiou com relevantes empreendimentos, não só em Riba de Ave, onde bom número de empresas se criaram e onde dezenas de milhares de trabalhadores de há muito ganham o seu pão, mas por outras terras do Minho, com particular incidência nos concelhos do vale do Ave (Guimarães, Vila Nova de Famalicão e Santo Tirso).
O norte industrial tem aqui o seu fulcro, daqui partiu a semente de uma economia moderna e daqui saiu o princípio de uma transformação que não se limitou apenas ao lado económico, criando condições e lançando estruturas para uma nova fisionomia sócio-cultural que hoje possuem aquelas populações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

(1) SOUTO, Correia, in Minha Terra e Minha Musa.

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O Orador: --A atestá-lo, lá estão, em plena actividade, as variadas fábricas, as instituições sócio-culturais e outros equipamentos: escolas infantis, primárias e secundárias, cinema, grupos culturais, recreativos e desportivos, hospital, bombeiros, correios, Guarda Nacional Republicana, rasgadas ruas e frondosos parques, casas de comércio e mercado. Tudo isto, na maioria dos casos, tendo por detrás o incentivo, a inspiração, o bairrismo e o precioso apoio da família Ferreira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem sido uma constante da nossa história, do nosso povo e dos nossos sucessivos governantes, saber honrar as gentes e as terras que, de forma peculiar, contribuíram para o desenvolvimento, engrandecimento, prestígio e bem-estar de Portugal e dos Portugueses.
Riba de Ave e as suas gentes continuam a manter bem vivo o seu espírito laborioso e o seu empenhamento num progresso cada vez mais acentuado, mas ao mesmo tempo, porque é justo e o merecem, vivem actualmente, com ansiedade, a expectativa de lhes ser reconhecida unia nova categoria no seio da comunidade nacional, em geral, e famalicense, em particular. Para isso, esperam o apoio decisivo da Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

1 O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.

O Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comemoraram recentemente as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira os dez anos de autonomia. Dada a óbvia importância desta realidade, que o 25 de Abril viabilizou, a Constituição da República consagrou em l976 e a revisão constitucional de 1982 viria a ampliar, alargando as competências dos respectivos órgãos de governo próprio; o Sr. Presidente da República, convidado, a ambas presidiu.
No exercício da mais alta magistratura da Nação e com a legitimidade moral que resulta de, sempre e inequivocamente, com elevadas responsabilidades no Governo ou na oposição, apoiar e contribuir para a consolidação, desenvolvimento e aperfeiçoamento das autonomias das regiões dos Açores e da Madeira, o Sr. Presidente da República sublinhou, a traço grosso, e afirmou com a sua presença, não só o grande princípio da unidade nacional mas a convicção de que o desejável prestígio das Regiões Autónomas é, hoje e também, peça importante na dignificação do regime democrático.
Ainda a este propósito e procurando interpretar um sentimento de legítima satisfação de madeirenses e açorianos, o meu colega de bancada, Ricardo de Barros, propôs nesta Câmara o agendamento de uma sessão comemorativa que, por ter neste caso uma dimensão nacional, contribuiria também para prestigiar perante o País o regime autonómico e o seu significado no quadro da democracia em Portugal.
Razões que então ocuparam as páginas dos jornais, os blocos noticiosos da rádio e da televisão e que constituiam mesmo o tema central das conversas de ocasião de todos os que seguem com atenção os difíceis, e quantas vezes indispensáveis, caminhos destes quase treze anos de vida democrática, fizeram com que tal proposta caísse no esquecimento e não tivesse tido o eco que motivações parlamentares recomendariam e o País exigiria.

Quero, desde já e antes de mais, em meu nome pessoal e no da minha bancada, corroborar a sugestão feita, e actualizadamente a subscrever como proposta, procurando contribuir para que tal sessão constitua uma inequívoca manifestação de apoio aos princípios que nortearam a concretização da descentralização política e administrativa e abriram novos e largos horizontes nas históricas aspirações das populações da Madeira e dos Açores.
A autonomia não constitui um fim em si própria, não podendo nem devendo ser transformada em mero argumento de natureza político-partidária, a esgrimir sempre que o valor da eficácia eleitoral se sobrepõe ao seu valor intrínseco e às potencialidades que evidencia, na satisfação dos anseios das populações, numa perspectiva de desenvolvimento económico e cultural e da defesa da paz e da justiça social, estes sim, verdadeiros valores que os regimes autonómicos deveriam permanentemente assumir como bandeira.
Mas não.

E vem-se assistindo a um relacionamento institucional que, por defeituoso, tem constituído factor decisivo no denegrir da imagem das autonomias insulares junto da opinião pública nacional. Mantêm-se como bons e proveitosos os desregramentos de linguagem, num preparar constante e quase obsessivo de terreno negocial; fixa-se uma latente desconfiança das populações da Madeira em relação à alegada propensão centralizadora e colonizadora do poder no continente.
Se passo a referir a Região Autónoma da Madeira, faço-o porque sou deputado eleito neste círculo; porque, em alguns aspectos do viver a democracia, existem em relação à Madeira razões da mais veemente crítica e porque pretendo, com esta intervenção, não uma análise global de ambos os processos, mas tão-só deixar expressas algumas das minhas preocupações, a juntar a outras que, em momentos diferentes, nesta Câmara, tive oportunidade de manifestar.
Aqui, na Madeira, a autonomia - pretende-se tem proprietários, insinuam-se mesmo como donos, dispõem da democracia abusando da própria democracia, assumem a folgada maioria de que disfrutam como se ela, em e porque em democracia, legitimasse tudo, esquecem sistematicamente os protestos e críticas da oposição fazendo vingar os seus pontos de vista através de uma comunicação social que informa, sobretudo, fazendo-se eco das posições oficiais e das actividades do Governo Regional, apesar da discordância de alguns competentes profissionais, cujo trabalho aproveito para reconhecer e sublinhar.
É o PPD/PSD quem assim se comporta, em nome de uma autonomia que é dos homens e mulheres da Madeira e Porto Santo e que só tem sentido se exclusivamente ao seu serviço.

A autonomia dignifica-se no quadro do regime democrático em Portugal, se ao centralismo do Terreiro do Paço se não opuser o centralismo do Governo Regional; se o poder local se puder assumir como tal perante as respectivas comunidades, sem indefinições e interferências abusivas do poder regional; se a Assembleia Regional dispuser de mecanismos regimentais que permitam a crítica e o livre debate de ideias; se a comunicação social for actuante e tiver como preocupação dominante a informação isenta; se o peso da maioria for substituído por uma prática de diálogo e formação de consensos em matérias de importância decisiva para a Região Autónoma da Madeira, quais sejam, por

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exemplo, o Estatuto Político-Administrativo ou a revisão constitucional; em suma, se os interesses de toda a população se sobrepuserem aos estritamente partidários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Madeirenses e Porto-Santenses que, ao longo dos anos, se afirmam numa luta constante e tenaz de trabalho e dedicação, de seriedade e determinação, tinham legítimas razões para esperar mais, mas sobretudo melhor.
O Partido Socialista, apesar das dificuldades que tem de, sistematicamente, vencer, não deixará de, em todas as circunstâncias, estar ao lado do equilíbrio e do bom senso, olhos postos na defesa, consolidação e prestígio dessa realidade que é a autonomia. Continuaremos a ser oposição firme e serena como até aqui, não abdicando, no entanto, de lutar pela criação das condições indispensáveis à participação democrática de todos na construção de uma Madeira e Porto Santo prósperos.
Temos como positivo, apesar de tudo, o saldo destes difíceis dez anos. Daí que não possamos deixar de manifestar, a par das críticas, o nosso empenhamento e determinação no corrigir de muitas situações tendencialmente desvirtuadoras dos princípios que nos devem continuar a nortear na concretização desta grande e aliciante tarefa colectiva, dignificando o regime autonómico como parte integrante da nossa vida democrática.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para formularem pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Mota Torres inscreveram-se os Srs. Deputados Mário Maciel, Jardim Ramos e Cecília Catarino.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente, não me vou reportar a considerandos que dizem respeito à Região Autónoma da Madeira, porque não sou eleito por essa região, mas sim pela Região Autónoma dos Açores. Disso se ocuparão certamente os meus colegas de bancada. No entanto, gostaria de aproveitar a oportunidade que me dá o Sr. Deputado Mota Torres para também me congratular com a proposta que, então, foi feita pelo meu colega ilhéu, deputado Ricardo Barros, para que nesta Câmara se fizesse uma sessão evocativa do 10. º aniversário da criação das regiões autónomas da Madeira e dos Açores. Seria, sem dúvida, uma sessão elevada, nobre, brilhante e que, afinal de contas, serviria para reafirmar a intenção dos Governos Regionais dos Açores e da Madeira no sentido de trabalharem para o enriquecimento do País com o patriotismo e o portuguesismo do qual nunca nos desvincularemos.
Porque, a dada altura, me pareceu que se referia a ambas as regiões autónomas e porque expressou a opinião de que teria havido um relacionamento institucional defeituoso nestes últimos tempos, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Mota Torres se, a partir da altura em que a Região Autónoma dos Açores foi notícia - por razões tristes, diga-se de passagem -, acha que houve, por parte dos órgãos da região autónoma, um relacionamento institucional defeituoso com os órgãos de soberania portugueses.
Gostaria que V. Ex.ª precisasse esta matéria, porque, afinal de contas, quando a Região Autónoma dos Açores se preparava para rejubilar - chegou mesmo a fazê-lo - com a aprovação do seu estatuto, vieram à colação na imprensa considerandos acerca do mesmo

que eram injustos, mas que tiveram o condão de galvanizar, contra a própria autonomia, sectores importantes da sociedade portuguesa, que, afinal de contas, conseguiram impôr um veto ao Sr. Presidente da República que, certamente, estaria longe do seu espírito. Gostaria, pois, que o Sr. Deputado precisasse esta matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jardim Ramos.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Sr. Deputado Mota Torres, talvez antes de pedir esclarecimentos gostasse de protestar. Vou, contudo, deixar as perguntas que vão no meu espírito porque, de facto, o Sr. Deputado Mota Torres produziu aqui uma intervenção que acho calamitosa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Lamentável!

O Orador: - Sr. Deputado Mota Torres, que autoridade tem V. Ex. º para dizer que os Madeirenses e Porto-Santenses esperavam mais e melhor desta gestão regional quando sabe que, aquando da governação maioritária socialista, foram bloqueadas transferências de verbas para a Região Autónoma de Madeira por ordem expressa do primeiro-ministro de então - militante do seu partido -, Dr. Mário Soares?
Sr. Deputado Mota Torres, os Madeirenses e Porto-Santenses têm razão em querer mais e melhor - é essa a aposta da gestão social-democrata. Nós estamos atentos a isso a procuraremos sempre fazer o máximo, consoante as disponibilidades que temos.
É por isso, Sr. Deputado, que os sociais-democratas têm vindo sempre a ver o seu número de eleitores a aumentar enquanto o Partido Socialista o tem vindo a ver diminuir.
O Sr. Deputado Mota Torres pensa que se os Madeirenses e os Porto-Santenses não estivessem contentes com a gestão social-democrata iriam continuar a apoiar, expressamente, com o voto democrático, o governo social-democrata?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Deputado Mota Torres, lamento não ter ouvido a sua intervenção desde o princípio...

O Sr. António Capucho (PSD): - Não perdeu nada!

A Oradora: - Gostaria, no entanto, de tecer algumas considerações sobre aquilo que tive oportunidade de ouvir.

Em primeiro lugar, apraz-me registar o facto de o Partido Socialista, pela voz do Sr. Deputado, se mostrar disponível e aberto h manutenção e continuação do diálogo que sempre tem mantido, na Região Autónoma da Madeira, com o Partido Social-Democrata. E apraz-me registar essa disponibilidade porque penso que o mesmo não se tem passado a nível nacional, o que é pena.
O Partido Social-Democrata na Madeira tem sempre procurado, através do diálogo com os partidos da oposição e em especial com o Partido Socialista, arranjar

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bases de consenso alargadas que permitam soluções que sejam as melhores para todos aqueles que vivem naquela região autónoma.
Não posso, contudo, deixar passar em claro duas observações que V. Ex.ª fez.
Uma relaciona-se com o facto de os interesses partidários se sobreporem aos interesses nacionais; nunca assim foi, não é, nem será, e temos dado sobejas provas disso! Nem tão-pouco os interesses partidários alguma vez se sobrepuseram aos interesses regionais.
O Sr. Deputado sabe tão bem quanto eu que assim é. Compreendo que muitas vezes haja necessidade de se fazer determinado tipo de intervenções e de se dizer determinado tipo de coisas, mas o Sr. Deputado sabe bem - e dispenso-me de apontar exemplos mais do que evidentes - que os interesses regionais se têm sempre sobreposto aos interesses partidários e nunca o contrário.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Quanto ao facto de madeirenses e porto-santenses desejarem mais e melhor, Sr. Deputado, muito mal estaríamos nós se nos déssemos por satisfeitos com aquilo que temos. É próprio do homem civilizado, do homem que aspira ao melhor para a sua terra, nunca estar contente com aquilo que fez e querer sempre mais e melhor. É esse o apanágio da governação social-democrata na Madeira; é isso que o PSD, na Madeira, tem sempre procurado fazer; é isso que o PSD, a nível nacional, procura também fazer em todos os domínios

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres. Dispõe de quatro minutos, Sr. Deputado.

O Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela ordem em que foram feitos os pedidos de esclarecimento, responderei, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado Mário Maciel, que, substancialmente, não me colocou nenhuma questão. Congratulou-se com a proposta de realização nesta Assembleia de uma sessão solene comemorativa das autonomias, também subscrita por mim próprio, já que a ideia e a sugestão desta partiram do meu colega de bancada, Ricardo Barros. Congratulo-me com o facto de V. Ex.ª aderir a esta iniciativa que, suponho, é também extensiva à bancada de que V. Ex.ª faz parte.
Passaria a dizer-lhe que, durante a minha intervenção tive uma preocupação: sou deputado eleito pelo círculo eleitoral da Madeira, conheço os Açores insuficientemente mas sei que, em termos de prática e vigência democrática, há diferenças entre a Região Autónoma dos Açores e a da Madeira. De resto, aquelas ficaram patentes durante uma recente visita de uma delegação da Assembleia Regional dos Açores à Região Autónoma da Madeira, em que os deputados desta Região Autónoma viram que a prática democrática é, de facto, diferente. Por exemplo -e espero que a minha referência a estes exemplos constitua já uma parte da resposta que, posteriormente, darei ao Sr. Deputado Jardim Ramos e à Sr.º Deputada Cecília Catarino -, na Assembleia Regional dos Açores o perfodo de antes da ordem do dia é escrupulosamente respeitado, teno em conta a possibilidade de cada

grupo parlamentar se fazer ouvir. Na Assembleia Regional da Região Autónoma da Madeira pratica-se um regime de inscrições e, como o Sr. Deputado calcula, com um grupo parlamentar composto por 40 deputados, como é o do PSD, os deputados do PS, do CDS, da UDP e da APU raramente têm possibilidade de intervir atempadamente em matérias de interesse público e geral.
Nos Açores, a Mesa da Assembleia Regional tem uma constituição plural. Na Madeira o mesmo órgão tem uma composição monocolor: só tem um presidente do PSD, um vice-presidente do PSD, dois secretários do PSD, dois vice-secretários do PSD. O símbolo da democracia que é a Assembleia Regional, representada na sua Mesa, tem uma composição estritamente partidária; não pluripartidária mas estritamente partidária. Daí que eu tenha distinguido entre a prática da vida democrática nos Açores e a da Madeira..
Em relação às considerações que V. Ex.ª fez posteriormente, quanto a recentes acontecimentos que também referi na minha intervenção, sem ter a preocupação de os aprofundar porque acho que a opinião pública nacional já o fez suficientemente, acho que, neste momento, não vale a pena pronunciar-me sobre eles.
Quanto ao Sr. Deputado Jardim Ramos que considerou a minha intervenção calamitosa, penso que não houve calamidade nenhuma nesta Assembleia. Expressei um conjunto de opiniões que são as minhas ,e que, até pelo relacionamento pessoal que temos, de há uns anos a esta parte, o Sr. Deputado devia saber que são as minhas de sempre, que mantenho e que reafirmei daquela Tribuna. O facto de o Sr. Deputado as achar calamitosas não me vai inibir de as produzir sempre que entender que seja necessário. Aqui, respondo, tambem, à Sr.ª Deputada Cecília Catarino, dizendo-lhe que não faço discursos de circunstância a não ser que estas assim o exijam. Não houve nenhuma circunstância especial que exigisse esta intervenção; exige-a o facto de eu sentir e pensar que a deveria produzir em nome da defesa democrática e dos regimes autonómicos, causas pelas quais sempre me tenho batido, nesta Assembleia e fora dela.
Quanto à minha afirmação de que os madeirenses e porto-santenses mereciam mais e, sobretudo, melhor, eu não disse que mereciam mais e melhor, disse que «mereciam mais e, sobretudo, melhor». Disse-o porque, com dez anos de experiência de Governo nas regiões autónomas, o seu partido com certeza que fez coisas. Portanto, eu disse «mais, mas sobretudo [...]»; não disse «mais e melhor [. ..]»; fez, tinha que o fazer. De resto, em termos de contas regionais, o seu partido tem uma situação que evidencia que alguma coisa está feita e tem orçamentos e planos que provam que alguma coisa tinha de estar feita. Acho é que a população da Madeira e de Porto Santo mereciam melhor. Daí que tenha dito «[...] podia ter feito mais mas, sobretudo, melhor [ ... ]». Disse-o de outra forma mas acho que dava para entender.
A talhe de foice, o Sr. Deputado aproveitou e disse que o Sr. Presidente da República, quando era primeiro-ministro, foi quem mais contribuiu para que não fossem enviadas verbas para a Região Autónoma da Madeira. O Sr. Deputado afirmou-o, mas com certeza não está muito convencido disso - desculpe que lhe diga -, porque isso não corresponde à verdade: não houve bloqueamento de verbas! De facto, foi no

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período dos governos socialistas que a Madeira teve acesso não só a um maior volume de receitas financeiras mas também em condições mais fáceis. Lembro ao Sr. Deputado que o programa de reequilíbrio financeiro, imposto pelo Sr. Ministro das Finanças e pelo actual governo do PSD, aconteceu pela primeira vez na história da região autónoma e, tanto na Assembleia Regional como na Assembleia da República, todos os partidos manifestaram muitas vezes a discordância sobre uma gestão pouco cuidadosa que se verificava na Região Autónoma da Madeira. E foi este Governo quem impôs um programa de reequilíbrio financeiro, altamente limitativo dos planos de desenvolvimento regional e, mais, altamente lesivo dos interesses da própria região autónoma. Não foi o Dr. Mário Soares que o fez; foi este Governo.
O Sr. Deputado diz que o PSD tem vindo a crescer e os outros partidos vão diminuindo.

O Sr. António Capucho (PSD): -

É um facto!

O Orador: - Sr. Deputado, se tivesse ouvido com atenção a minha intervenção, verificaria que eu sugeri que para os partidos da oposição não havia condições de participação na vida democrática da Região Autónoma da Madeira. Quando há limitações de toda a ordem é evidente que, com meios financeiros, com responsabilidade de fazer coisas, com a comunicação social praticamente ao seu serviço, o partido maioritário aparece sempre como o «herói da fita» e a oposição aparece como sendo «os maus» que estão a tentar dificultar a actividade do Governo.
Finalmente e em relação à Sr.ª Deputada Cecília Catarino, julgo que já lhe respondi no essencial. Dir-lhe-ei só que, quanto à questão dos consensos alargados, temos exemplos vários de que estes são sistematicamente obstaculizados pelo partido maioritário. Veja-se, recentemente, a questão da revisão do Estatuto do Regimento da Assembleia Regional; veja-se a questão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira; veja-se a dificuldade, sempre sentida e sempre encontrada, em matéria de revisão constitucional.

Aplausos do PS.

A Sr. a Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para protestos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não pode porque, como sabe, não há lugar a protestos.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, então, lamento mas vou ter de recorrer à figura regimental de defesa de honra.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, se considera que foi ofendida, então, tem a palavra.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, os minutos que se perdem a justificar estas questões seriam mais fáceis se não se tivesse que usar estas figuras regimentais.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Pois é.. ., o Regimento é uma chatice!, não é?...

A Oradora: - Sr. Deputado Mota Torres, muito resumidamente, quero dizer-lhe o seguinte: no período das suas respostas aos pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado fez uma série de considerandos que poderiam ter sido muito melhor utilizados aquando da própria intervenção.
Em relação a tudo isso, tenho, apenas, uma observação a fazer-lhe.
Sr. Deputado, se os Madeirenses e os Porto-Santenses estão tão aborrecidos e são tão mal tratados, porque razão que cada vez que há eleições a percentagem eleitoral do PSD aumenta?
Mais: tendo havido uma experiência socialista numa câmara da Região Autónoma da Madeira, na Câmara do Porto Santo, porque razão o PS a perdeu e nunca mais a conseguiu reaver?
São todos os Porto-Santenses masoquistas? Não acredito!
Portanto, para o Sr. Deputado poder resolver o seu problema de fundo, das duas uma: ou consegue convencer o eleitorado por obras, por actos - não por palavras - de que é realmente um partido que pode assumir a liderança da autonomia na Madeira, que pode levar «a muito melhor a autonomia na Madeira» (segundo a sua expressão), ou então, Sr. Deputado, não queira passar um atestado de menoridade a todos os madeirenses e porto-santenses.
Há aqui qualquer coisa que não está a jogar muito bem. O Sr. Deputado vive na Madeira há anos, conhece a realidade madeirense e sabe o que tem sido feito e aquilo que ainda não foi possível fazer por obstaculização dos governos centrais. O Sr. Deputado sabe de tudo isto muito bem, portanto, não queira pôr nas costas do PSD culpas que serão muito maiores do seu partido, quando teve na mão a possibilidade de facilitar e ser mais expedito na resolução dos problemas insulares e o não foi, do que do próprio PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jardim Ramos.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Sr. Presidente, depois da intervenção da minha colega de bancada, prescindo da palavra.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.

O Sr. Mote Torres (PS): - Sr. Presidente, vou dar explicações que já dei, mas não vou deixar perder esta oportunidade, porque sinto que não fui suficientemente claro.
Penso que a Sr.ª Deputada Cecília Catarino, ao insistir na questão das escolhas do eleitorado, voltou a laborar no erro que referi na minha intervenção e que eu julgava ter conseguido esbater com a resposta que dei numa primeira fase - pelos vistos, não consegui.
De facto, a minha intervenção tinha um tema central, que era o da falta de condições de participação democrática dos partidos da oposição na Região Autónoma da Madeira. E nisto insisto e reafirmo, Sr.ª Deputada! Reafirmo: a Sr.ª Deputada não tem, desde 1982, um debate televisivo na programação da televisão regional; a Sr.ª Deputada desde 1982 não tem nenhuma entrevista a nenhum dirigente ou político da oposição; no Centro Regional da RDP, a Sr.ª Depu-

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tada tem um conjunto de programas para o qual só convidam os directores regionais e os directores de serviços, que são todos do PPD/PSD.
E depois disto, a Sr.ª Deputada diz-me que está tudo muito bem, que o PS e a oposição é que não se conseguem impôr perante o eleitorado? Acha que é possível alguém impôr-se perante o eleitorado, nestas condições? Não é possível, Sr.ª Deputada! Veja as condições de participação!
Quanto à Câmara de Porto Santo, tivemos de facto aí uma primeira experiência. Tivemos a sina de ter que gerir aquela Câmara, logo depois das primeiras eleições autárquicas, mas como a perdemos imediatamente a seguir e o Governo Regional teve o cuidado de nomear um delegado seu junto de Porto Santo para garantir que ai tudo corresse bem e não se corressem riscos de o PSD perder novas eleições, é óbvio que a não podemos recuperar.
Quanto às obras, sugeriu a Sr.ª Deputada que as fizesse a oposição, na Região Autónoma da Madeira. Mas não é o Governo que faz as obras? É o Governo que tem de fazer as coisas, pois é o Governo que tem o dinheiro e o orçamento, é o Governo que gere o erário público. Quer a Sr.ª Deputada que o PS mostre que faz coisas, que faz obras? Quer a Sr.ª Deputada que o PS tenha um orçamento próprio para construir uma estrada, uma igreja, uma ponte? Esse orçamento o PS não o tem de certeza absoluta.

Quanto à questão de os governos centrais - prefiro a expressão «Governo da República» - obstaculizarem o desenvolvimento das regiões autónomas, quero dizer que, se os governos e os demais órgãos de soberania na República obstaculizassem o desenvolvimento, de certeza, Sr.ª Deputada, que não haveria autonomias. Elas existem e com certeza que daqui a uns dias as comemoramos com dignidade e de acordo com os interesses das populações da Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na galeria à esquerda da Mesa encontram-se a assistir aos nossos trabalhos alunos e professores da Escola Secundária de São João do Estoril, para quem a Mesa agradece uma saudação da Assembleia.

Aplausos gerais.

Peço aos Srs. Deputados Valdemar Alves, do PSD, Fernando Lopes, do PS, Jaime Coutinho, do PRD, e Belchior Pereira, do PCP, o favor de servirem de escrutinadores nas votações para eleição de dois membros para o Conselho de Comunicação Social e para aprovação de um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, que vão iniciar-se.
Se algum dos Srs. Deputados tiver dúvidas quanto à votação no que se refere ao parecer daquela Comissão, esclarece-se que o voto «sim» é o voto favorável ao referido parecer.
Peço aos Srs. Deputados o favor de se dirigirem para a mesa de escrutínio, indo a Mesa votar em primeiro lugar.
Informo os Srs. Deputados de que as umas encerrarão às 19 horas e 30 minutos.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É de assinalar todo e qualquer acontecimento que na vida dos povos e das instituições transcenda o quotidiano e constitua fonte de inspiração no desbravar de novos caminhos, na prospectiva de exaltantes metas e iniciativas fraternas e modernizantes, mormente quando se revista de um simbolismo enriquecedor da vivência nacional. É este o caso, emérito pela sua própria natureza e pelas entidades envolvidas, da assinatura no passado dia 16 de Janeiro do convénio básico entre a Universidade de Coimbra e a Universidade de Salamanca e firmado pelos magníficos reitores na presença abonatória, distinta e significativa do Presidente da República Portuguesa e do Ministro espanhol das Relações com o Parlamento.
As duas mais antigas universidades da Península altamente prestigiadas internacionalmente, criadoras e depositárias de muito da cultura, tradição e história das Pátrias ibéricas, decidiram em boa hora, afirmando conscientemente a sua autonomia na assunção plena e responsável da liberdade que a nossa Península conquistou, celebrar um acordo de cooperação nos domínios académico, científico e cultural. A investigação, a docência e as actividades culturais encontrarão, através do protocolo firmado, instrumentos que permitirão um aprofundamento do intercâmbio e da cooperação já existentes entre as universidades salamantina e conimbricense. A influência, a acção e o exemplo das duas universidades darão frutos não só a nível de cada um dos Estados, como ainda através do dinamismo cultural, científico e tecnológico que imporão na vasta região que se situa de cá e de lá da raia e potenciarão o relacionamento cultural e os laços seculares que nos unem aos povos irmãos de África e das Américas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Que satisfação intelectual e contentamento afectivo não teriam tido esses gigantes tutelares da cultura e do civismo que foram e continuam a ser D. Miguel de Unamuno e Joaquim de Carvalho se pudessem, no seu tempo de opróbio e escuridão, ter patrocinado este acordo, concretização emblemática da cooperação e entendimento das suas almae mater.
Como universitário de Coimbra e, sobretudo, como parlamentar daqui dirijo um voto muito expressivo de felicitações e de êxito nas acções que a Universidade de Salamanca e a Universidade de Coimbra virão, em franca e dedicada entreajuda, incentivar o enriquecimento da cultura universal e o fortalecimento dos laços fraternos que a história talha aos povos de Portugal e de Espanha.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Vamos desmanchar os Jerónimos!»
Desmancham-se e levam-se para outro sítio. Qual? Não interessa. Vão para onde não incomodem. É que assim ficamos com o problema das torres resolvido.
Depois, se quiserem construir novas torres na nova morada dos Jerónimos, desmonta-se outra vez o mosteiro e leva-se para outro lado. E continua-se assim, até acabarem as torres, ou seja, até que as mentalidades mudem. Sem isso nada feito!

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É que, podem crer, o caso das torres dos Jerónimos não é um caso singular: é pura e simplesmente o nosso quotidiano. Já pensaram se alguém teria intenção de fazer seja o que for lá para essas bandas se aí não houvesse Jerónimos, não houvesse Tejo, não houvesse um determinado tipo de equilíbrio urbano?
Esses locais são valiosos pelo que lá está. Então deixem estar como está, não estraguem! O que não quer dizer: não façam. A cidade é um lugar de intervenção, mas um lugar de intervenção da comunidade. Ela é feita pela comunidade para a comunidade. E é esse o sentido que deve presidir às decisões dos políticos e orientar o trabalho dos especialistas.
Em última análise, ousaria dizer que o que está em causa, neste caso, não são os Jerónimos, nem a Igreja da Memória e as consequentes áreas de protecção. O que de facto está em causa é o modo de gerir o espaço urbano. O questionamento base poder-se-ia formular como sendo: o quê? Para quem? Quando e como? E ao formular estas interrogações seríamos obrigados a concluir, mas por desvio das respostas que lhe são subjacentes.
A identificação da comunidade com a cidade que é a sua faz-se através de um quadro físico construído
já vivido e assimilado enquanto estrutura espacial.
aí que as referências culturais são encontradas e é aí que se podem buscar os elementos de inovação que permitem a prospectivação das novas realidades. Neste sentido, não defendemos o imobilismo das estruturas urbanas, nem tão-pouco a preocupação de pastiches. O homem de hoje deve produzir uma estética de hoje com os meios que lhe são adequados. Mas não deve, diria mesmo não pode, destruir a herança cultural que possui, e muito menos quando isso é feito a partir de argumentos falaciosos, que justificam meros interesses conjunturais.
Não discutimos a relevância estética do projecto das torres dos Jerónimos. Não discutimos volumetrias, cérceas, áreas protegidas. Não nos parece ser o fundamental neste processo.
O que nos parece grave é que este caso não é único, bem pelo contrário. O somatório de questões deste tipo, em Lisboa, mas não só, é impressionante. Assiste-se de facto à luta permanente entre duas concepções opostas de intervir no território e a resultante tem sido, o mais das vezes, favorável a quem usa da argumentação do progresso para produzir aberrações; aberrações que, de facto, só se justificam por uma visão lucrativista e ainda lucrativista em termos de amanhã. Mas passado amanhã já não servem. É por isso que dizemos: mudemos mentalidades. E é por isso também que dizemos desenvolvimento, o que pressupõe harmonia entre o homem e o seu quadro de vida, seja ele construído ou natural.
Sobre as torres dos Jerónimos, elas mesmas, claro que somos contra. Mas mesmo se não fossem torres e se fossem estruturas construídas maciças e massificadoras postas ao serviço de interesses dúbios, e resultando na anulação de espaços usufruídos pela comunidade, seríamos contra também.
Também estamos contra que mudem a serra da Arrábida de sítio, lá porque está limpa de clandestinos e pode servir como óptimo instrumento para um turismo ambulante (o pior é que se calhar alguém neste país ainda se lembra disso!).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: E se puséssemos o Norte no Sul, tornando o Norte climaticamente mais rentável, e o Sul no Norte, porque já está saturado?

Há, de facto, uma medida para as ambições e talvez que essa medida se encontre no respeito pelos outros, com tudo o que isso implica.
Por tudo isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, às torres dos Jerónimos dizemos: não!

Aplausos do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Cruz.

O Sr. José Cruz (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A opinião pública nacional e internacional tem seguido com natural interesse e curiosidade o escândalo Irangate protagonizado pelo presidente dos Estados Unidos da América, Ronald Reagan, e membros da sua administração, interesse que não tem sido acompanhado pelo Governo Português, que, apesar das numerosas provas que documentam a utilização do território português e mesmo o envolvimento de entidades governamentais no caso tentou impor um muro de silêncio sobre as suas responsabilidades.
A natureza do escândalo à escala dos Estados Unidos da América e das suas instituições -e pouparemos os pormenores já sobejamente divulgados na comunicação social- resume-se no facto comprovado de o presidente Ronald Reagan ter desobedecido e violado as leis do seu próprio país no que se refere ao envio de armas para o Irão e, com o produto do negócio, de caminho, ter furado o embargo de ajuda aos chamados «contras» da Nicarágua, ex-Somozistas a soldo da CIA: de nada serviu ao presidente Reagan negar o envolvimento. A imprensa, tal como já aconteceu com Richard Nixon e o Watergate, lançou-o numa posição insustentável perante a opinião pública com sucessivas revelações.
Discute-se nos Estados Unidos da América se o presidente mentiu. Deixemos às instituições americanas e ao povo daquele país o esclarecimento dessa questão. Para nós, portugueses, interessa, antes do mais, conhecer os factos e as circunstâncias em que Portugal se viu envolvido no Irangate e quais sãos as responsabilidades governamentais nas facilidades concedidas nesta obscura operação, que tantos prejuízos está já a causar à dignidade nacional.
Colocamos esta questão mesmo tendo conhecimento da nota distribuída pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, que, nada esclarecendo sobre a montanha profusa de revelações da imprensa, antes coloca o Governo perante chocantes e legítimas dúvidas, as quais urge esclarecer.
De facto, se analisarmos a natureza das operações descritas pela nota do Ministério dos Negócios Estrangeiros -venda de armas ao Irão e à Guatemala, segundo a imprensa-, o Governo aparentemente não autorizou, citamos, «qualquer venda de material português de defesa a organizações que combatem governos internacionalmente reconhecidos de países com os quais Portugal mantém relações diplomáticas» e as exportações processaram-se «aparentemente» no respeito das normas legais em vigor. Tem a nota o mérito de reconhecer que as operações de exportação e reexportação do material de guerra dependem de autorização governamental, o que é importante para o esclarecimento necessário. Mas também implicitamente se reconhece o logro de que os certificados de destino final das armas embarcadas para a Guatemala continham falsas assinaturas de um oficial-general do exército

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guatemalteco, pois que na referida nota se anunciam medidas, citamos, «visando reduzir o risco de não correspondência à realidade dos documentos exibidos».
É estranho que seja necessário tomar mais medidas que as já previstas no Decreto-lei n.º 371/80, de 11 de Setembro, aprovado pelo governo do PSD/CDS, onde, para além da autorização do Ministro da Defesa, se prevê da parte deste a respectiva fiscalização com recurso às autoridades competentes, designadamente militares, e ainda sem prejuízo da competência das autoridades aduaneiras.
A falsificação de assinaturas -ou a sua aceitação pelas autoridades- torna-se tanto mais inverosímil quando se sabe que, designadamente na banca, não se executam operações de comércio externo sem as análises das assinaturas por espécimes, a confirmação telegráfica chavada das operações, as informações completas, a confiança entre todos os intervenientes. E tais operações, se legais, têm certamente componentes de natureza cambial.
O silêncio governamental, que não consideramos quebrado com esta nota emitida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, não é, pois, de molde a afastar as suspeições.
A questão é, pois, delicada e embaraçosa para o Governo. Portugal foi utilizado como placa giratória no tráfico de armas dos Estados Unidos para o Irão e a Nicarágua. Até que ponto o Governo de Portugal ou qualquer outra entidade oficial foram utilizados como peões da administração Reagan?
A verdade é que foram utilizados portos e aeroportos portugueses para o tráfico ilegal de armas.
Quanto a este facto -a utilização de portos e aeroportos-, a comunicação social dá números de voos, cita datas, companhias aéreas envolvidas, exportadores e importadores, natureza do armamento, montantes, tonelagem embarcada, nomes de navios, origens e destinos (e ao longo de vários meses), revelações que deveriam merecer um esclarecimento completo do Governo.
A vertente portuguesa do Irangate americano exige pois um rápido esclarecimento, já reclamado pela opinião pública do nosso país, e a Assembleia da República tem o dever e o direito de questionar o Governo sobre este problema!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Muito mal!

O Orador: - O País tem de saber se sim ou não é deficiente o nosso sistema de fiscalização de importação-exportação de armamento, se existiram pressões da CIA para que os mísseis Hawk não fossem encalhados em Lisboa, o que diz realmente o suporte magnético de computador sobre a presença de aviões de transporte no Aeroporto da Portela, se o Governo está disposto a divulgar oficialmente os nomes das empresas responsáveis e como vai actuar em relação às mesmas no futuro, qual a nacionalidade das armas transaccionadas que escalaram ou foram remetidas directamente da Portela ou de Setúbal, como explica a presença em Portugal dos voos assinalados da Southern Air Transport, Inc., e que compromisso assumiu o primeiro-ministro Cavaco Silva na viagem aos Estados Unidos da América e designadamente no encontro com o director da CIA, Sr. Wílliam Casey.

Temos presente que no volume de informação até agora divulgado o núcleo central provém das investigações efectuadas pelas instituições americanas. Para apurar a verdade sobre o Irangate. Aí se descobriu a vertente portuguesa do escândalo.
A Assembleia da República tem o dever de averiguar se esta política faz ou não parte da política externa de colaboração do governo Cavaco Silva com a administração Reagan.
As instituições dos Estados Unidos da América já decidiram enviar ao estrangeiro inquiridores sobre o caso. Não queiramos arriscar-nos a que, mais uma vez, o núcleo das revelações provenha do senado americano. Seria acrescentar ao escândalo a vergonha de uma escandalosa cumplicidade.
A Assembleia da República deve, pois, ser informada com toda a clareza sobre esta matéria e adoptar as medidas necessárias para que lhe sejam fornecidos todos os elementos oficiais e públicos, tanto de carácter nacional como internacional, com vista a apurar todas as circunstâncias em que ocorreu a participação portuguesa nos acontecimentos que levaram ao Irangate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Momentos há na história que marcam profundamente a vida e o futuro das nações.
Momentos altos, admiráveis e para sempre admirados uns, momentos outros que, ao invés, marcam a existência, sempre tenebrosamente presente, da bestialidade e da ignomínia, lembram que a memória colectiva não é só cheia de glória mas também cheia com vergonha, que o sono da razão engendra monstros, que a injustiça, a estupidez e a brutalidade são também ingredientes da história dos povos.

Voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O regicídio de Fevereiro de 1908 - faz no próximo domingo 79 anos - é um desses momentos infaustos em que a inteligência é vencida pela brutalidade, em que a história e a nobreza de um povo são espezinhadas, em que a lógica infernal das alfurjas leva de vencida a limpidez e a honra dos homens e das instituições, em que a inveja bate a dignidade, a cobardia ganha à coragem, os instrumentos da tirania vencem a legitimidade e a história.
«Quando ao sol poente daquele dia - cito livremente Sousa Tavares - a antinação assassinou o rei e o príncipe real, caíram por terra, na pedra batida ali do arsenal, dois homens, uma Pátria, o carácter de um povo e um princípio secular de soberania.
Aqueles tiros de espingarda atingiram em cheio o objectivo marcado. Mais do que um rei, mais do que um homem na perfeita e total acepção da palavra, era o carácter de um povo que caía na rua, e com ele um fecundo sistema de aliança e de legitimidade do poder.»
Um ano antes, escrevia D. Carlos, talvez em lógica premonição: «Seja como for e suceda o que suceder, temos de caminhar para diante, ainda que a luta seja áspera e rude (e espero-a), porque aqui, mais do que nunca, parar é morrer, e eu não quero morrer assim.»

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D. Carlos de Bragança não morreu, de facto, por ter parado, por ter desistido. Morreu porque lutou, no desvario dos tempos e das vontades, fiel à missão que assumia e à legitimidade que encarnava, fiel às franquias e liberdades dos Portugueses, consciente do sentido ocasional e restaurador que, porventura erradamente, atribuiu à ditadura, ele que disse e escreveu que «a força da nossa obra é governar com o Parlamento», ou que «fizeram-se as eleições com ordem e liberdade, ordem e liberdade em que é absolutamente necessário não só entrar agora, mas prosseguir».
Sobre o sangue derramado na calçada por D. Carlos e D. Luís Filipe de Bragança erigir-se-ia a República e, em cortejo, os seus anos de instabilidade e ditadura.
Cortado brutalmente o fio condutor da evolução para formas superiores de liberdade e realização histórica, Portugal afastou-se, quase irremediavelmente, do progresso político das politicamente mais felizes nações da Europa.
Importa, nas vésperas de mais um aniversário do regicídio, deixar bem clara a palavra de homenagem àquele que foi um dos melhores entre os melhores portugueses, D. Carlos I, rei de Portugal, ao seu altíssimo sentido do dever, ao seu profundo amor à sua Pátria, à sua vontade de servir o seu povo e de cumprir a sua missão, ao seu sacrifício, à sua honra, á sua gigantesca dignidade, como homem e como rei.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Corujo Lopes.

O Sr. Corujo Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Denominada muito justamente a «rainha da Costa Verde», é a cidade de Espinho uma das principais atracções turísticas do Norte do País, não só pela sua privilegiada localização, como também pelo enquadramento da sua paisagem, onde o mar se casa com o campo.
Possuindo um conjunto de infra-estruturas dignas de registo no sector do turismo, ocupa este progressivo concelho do distrito de Aveiro, do qual é parte integrante, um lugar de primacial relevo, sendo o seu poderio económico e industrial deveras significativo.
No entanto, e não obstante o surto de progresso e desenvolvimento registado nos últimos tempos, debate-se Espinho com problemas específicos, que, para além de dificultarem a sua expansão e o aproveitamento integral dos seus recursos naturais com fortes apetências de carácter turístico, constituem um perigo iminente para a segurança e bem-estar das populações.
É disso prova elucidativa o que aconteceu no dia 15 de Dezembro, justamente em dia de feira semanal, que, reunindo milhares de pessoas, provocou momentos de autêntico alvoroço.
No ar, algo de tóxico pairava, desconhecendo-se no entanto a sua proveniência, o que, como é normal nestas situações, além do pânico gerado, propicia variadas especulações. Entretanto, veio a ser apurado que a perturbação do ambiente ali registada era causada por gases lacrimogéneos lançados na carreira de tiro localizada a sul da cidade, mais propriamente na freguesia de Silvalde, pertencente ao Regimento de Engenharia de Espinho, também ali instalado.
Efectivamente, na tarde desse mesmo dia, um pelotão da Polícia de Segurança Pública do Porto esteve a efectuar exercícios na carreira de tiro, neles utilizando

granadas de gás lacrimogéneo. Como entretanto as condições meteorológicas se alteraram de imediato, grande parte da cidade foi invadida pelo gás.
O que a seguir se passou foi um autêntico pandemónio, não só pelo pânico instalado, mas também pelos efeitos provocados pelo gás em inúmeras pessoas.
Apesar de o sucedido não ter atingido a gravidade que inicialmente se supunha, mesmo assim, ainda treze pessoas, entre as quais oito crianças, necessitaram de receber tratamento hospitalar.
Tal fenómeno não é a primeira vez que sucede, pois já em 1985 incidente idêntico ali ocorreu, embora com menores proporções.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os inconvenientes causados por tal carreira de tiro, cuja localização fica muito próxima da malha urbana da cidade e da praia que a delimita, são também de outra ordem, não menos preocupante do que a acabada de descrever: são as granadas por rebentar espalhadas pelo solo; é a perturbação do sossego de quem frequenta as praias da zona na época balnear; é o perigo existente para a integridade física dos banhistas, constando até que alguns já foram atingidos por balas; é o abalo provocado pelo fogo pesado nas habitações mais antigas de Silvalde, enfim... é um nunca mais acabar de inconvenientes e perigos!
A par de todos estes problemas, outra situação existe a suscitar fundadas preocupações e que concretamente se prende com o cerceamento da expansão turística e balnear de Espinho, que tais instalações estão a provocar.
O plano elaborado para aquela zona -plano parcial a sul de Espinho-, além de prever o aproveitamento e recuperação de toda a área para fins turísticos, bem como o seu enquadramento nas infra-estruturas já existentes, propõe-se também obviar à degradação da lagoa de Paramos e das dunas que lhe estão subjacentes, criando, para o efeito, uma reserva natural.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É inquestionável que a situação acabada de descrever não pode subsistir por muito mais tempo, tornando-se imperioso proceder à transferência da carreira de tiro para outra localidade, onde os inconvenientes por ela provocados não se façam sentir.
Numa zona de forte atracção turística e com potencialidades inegáveis para o seu desenvolvimento, é perfeitamente intolerável que tal estado de coisas se verifique.
Por outro lado, é absolutamente inaceitável sujeitar as populações aos perigos resultantes de tal carreira de tiro.
Assim sendo, é urgente que as entidades responsáveis tomem as medidas que se impõem no sentido de obviar a tal situação.
Os interesses turísticos nacionais exigem-no e merece-o a população de Espinho.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sempre entendemos que a instância determinante para abordar e tratar problemas de âmbito local é naturalmente a instância autárquica, seja na assembleia, seja na câmara de um município. A instância municipal é a sede primeira e prevalente.

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Mas isso não obsta a que haja problemas locais que possam ser postos também aqui. Pela exemplaridade que revestem e pela situação que traduzem.
É exactamente este o caso: a existência de valas de lixo, ditas sanitárias, a 50 m do rio Tejo, na zona oriental de Lisboa, em terrenos da Administração-Geral do Porto de Lisboa, por obra e encargos assumidos pelos actuais gestores do Município de Lisboa. É pouco concebível que num espaço desta importância, perto do rio, seja assumido um tipo de acções desta natureza. Lesa cidade, lesa rio e lesa populações.
Recordar-se-ão alguns dos Srs. Deputados mais atentos que, há meses atrás, a população e os respectivos órgãos autárquicos da Amadora conseguiram pôr fim -e bem- ao perigo público que decorria da permanência, na zona urbana desse Município e cidade, de uma lixeira-vazadoura utilizada para depósito dos lixos da capital. A actual equipa que dirige o Município de Lisboa fizera ouvidos de mercador e assumira-se em incapacidade reiterada de promover uma alternativa, em 5,5 ha, perto dos limites administrativos da cidade, num processo já aprovado pela vereação, mas cujo processo decisório se atrasou por forma inconcebível.
Como já não havia município vizinho que aceitasse ser receptáculo do lixo feito em Lisboa, a actual equipa que dirige o Município de Lisboa viu-se constrangida a uma operação de urgência.
E, Srs. Deputados, eu pedia-lhes a vossa atenção para o seguinte: a operação de urgência é esta: depositam-se 250 t de lixo diárias que excedem a capacidade da estação de tratamento de resíduos sólidos, em Beirolas, em valas sanitárias, que são abertas ao lado daquela estação, a meio metro do nível freático, a escassas dezenas de metros do rio (50 m). E se bem que impermeabilizados os terrenos, esta situação é reveladora de uma política de ambiente feita de desinvestimentos, tarde e a más horas, promotora de cheiro inqualificável para as povoações perto (Portela de Sacavém, Moscavide e Sacavém) e, naturalmente, geradora de graves atentados naturais.
Nós acabámos de aprovar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, apenas com o significativo voto contra do CDS - isto é, do mesmo partido que tem um seu dirigente a gerir mal o Município de Lisboa -, a Lei de Bases do Ambiente. Alguns se têm procurado apropriar da paternidade dessa lei e alguma comunicação social mais confundida entendeu - e mal - que a lei fora feita pelo Governo. Como todos deveriam saber, a lei foi demoradamente debatida e votada na especialidade na Comissão de Equipamento Social e do Ambiente durante um tempo que se calcula em mais de 120 horas; de análises e verificações de propostas, de aditamentos de alterações aos projectos de lei apresentados sem qualquer proposta de lei do Governo, pelos vários grupos parlamentares. E, Srs. Deputados, se se fala de uma relativa operacionalidade na área do ambiente

então que não haja dois pesos e duas medidas. importante que haja intervenção onde deve haver inter
venção, que haja embargo onde deve haver embargo,
que haja exigência formal onde o destempero e a paro
lice encartada de alguns gestores procuram uma reso
lução incorrecta.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, trouxemos este problema de índole local, porque consideramos que é um exemplo exemplar de muita coisa que é preciso actuar. Ao trazer à Assembleia da República o que trazido já foi à Assembleia Municipal e à Câmara Municipal de

Loures e de Lisboa e a várias instâncias das freguesias, queremos fazer eco do protesto alargado que atinge muitos dos que se preocupam com estes problemas, renovando a nossa intenção, em permanência, de cooperar nas melhores soluções e na sua viabilização prática, aqui na Assembleia da República, como em outras instâncias, sendo aliás esta a postura dos eleitos nas listas da Aliança Povo Unido.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dirigi há tempos um requerimento ao Ministério da Saúde sobre o controle das águas das piscinas da cidade do Porto. A resposta recebida hoje apresenta indicações e números que pela sua gravidade vou levar ao conhecimento da Assembleia da República. Passo a citar uma informação proveniente da Administração Regional de Saúde do Porto:

Na sequência de um programa elaborado pelos Serviços de Engenharia Sanitária, as águas das piscinas do concelho do Porto são colhidas quinzenalmente, após o que se enviam para o Instituto Nacional de Saúde do Porto para análise.
Em face dos resultados obtidos verificaram os Serviços que o panorama não era nada animador, consequência por um lado de deficiências construturais relativas às instalações e equipamentos e por outro da falta de um domínio de normas tendentes a controlar o número e estado físico dos utentes, bem como o uso das instalações.
Em face destas anomalias procederam estes serviços a um levantamento das deficiências existentes, as quais foram comunicadas aos responsáveis respectivos no sentido de se conseguir uma melhoria de qualidade não só da água como também das condições de funcionamento das instalações em geral.
Contudo, foi sempre evidente a falta de apoio legislativo e regulamentar, tendo os Serviços de Engenharia Sanitária elaborado há anos um projecto de regulamento geral das piscinas, o qual até à data não mereceu por parte das entidades governamentais qualquer aprovação.
Apesar de tudo, pode-se afirmar que se verificaram progressos consideráveis, envidando estes Serviços todos os esforços para que todas as piscinas possam ser locais seguros sob o ponto de vista de higiene e salubridade.

E agora passemos aos números: assim, no ano de 1985, para um total de 86 amostras colhidas na piscina do Futebol Clube do Porto, 78 davam água imprópria para ser utilizada; na piscina do Foco, num total de 36 amostras, 28 davam análise negativa; na piscina municipal foram colhidas 26 amostras, e 15 davam água imprópria para ser utilizada; na piscina de Campanhã foram colhidas 4 amostras, e 3 davam água imprópria para ser utilizada; na piscina fluvial foram colhidas 57 amostras e 39 davam resultado negativo; finalmente, na piscina do CDUP foram colhidas 24 amostras, e 12 davam água imprópria para ser utilizada.

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No ano de 1986 -embora apresentem melhores resultados, os números só se referem ao 1.º semestre os valores são: para a piscina do Futebol Clube do Porto, em dez colheitas, três dão análises negativas; na piscina do Foco, em três colheitas nenhuma dá análise negativa; na piscina municipal, em cinco colheitas, três são negativas; na piscina de Campanhã, em quatro colheitas, três são negativas; na piscina fluvial, em cinco colheitas, uma é negativa, e na piscina do CDUP, em três colheitas nenhuma dá resultado negativo.
Deixo, pois, o alerta às entidades competentes para que seja posto cobro a esta grave situação, que põe em perigo a saúde dos utentes das piscinas da cidade do Porto.

Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando na ordem do dia, passamos à apreciação das ratificações n.º5 126/IV (PCP), 127/IV (PRD) e 128/IV (PS), relativas ao Decreto-lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro - Lei Orgânica Hospitalar -, que revoga o Decreto-lei n.º 129/77, de 2 de Abril.
Srs. Deputados, enquanto aguardamos a chegada do Governo, o Sr. Secretário vai proceder á leitura de dois relatórios e pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Sá e Cunha): - O primeiro relatório e parecer é do seguinte teor:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 37, processo n.º 387/85, da 1.ª Secção do 1.º Juízo Correccional do Tribunal Criminal da Cormarca do Porto de 17 de Janeiro corrente, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca da Sr.ª Deputada Maria da Glória Moreira da Costa Padrão Carvalho, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a referida Sr.ª Deputada a depor como testemunha no processo referenciado.

Palácio de São Bento, 27 de Janeiro de 1987. O Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, António Cândido Miranda Macedo.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Oliveira e Costa e Ribeiro Teles.

O Sr. Secretário (Sá e Cunha): - O segundo relatório e parecer é o seguinte:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 582-G, processo n.º 63/86, de 3 de Dezembro de 1986, do Tribunal de Instrução Criminal de Vila Real, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Aloísio Fernando Macedo da Fonseca, tendo a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir pa-

recer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a ser inquirido como testemunha no processo referenciado.

Palácio de São Bento, 27 de Janeiro de 1987. O Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, António Cândido Miranda Macedo.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Oliveira e Costa e Ribeiro Teles.

Srs. Deputados, estamos agora em condições de dar início ao debate relativo às ratificações.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-lei n.º 16/87, ao acabar com a gestão democrática nos hospitais, é mais uma peça que leva à degradação dos serviços públicos de saúde.
É significativa a rapidez com que a Assembleia da República deliberou agendar a discussão desta matéria, pois demonstra a preocupação e recusa por parte dos partidos maioritários nesta Câmara da política que o governo PSD tenta impor no campo da saúde.
Mas para bem compreender e analisar o diploma em debate há que procurar enquadrá-lo na situação geral em que se encontra hoje a saúde do País.
E esta é uma questão fundamental, que urge analisar.
Vejamos pois qual o pano de fundo em que esta política se enquadra.
Não é novidade para ninguém, é mesmo hoje um ponto de consenso, que os serviços públicos de saúde não satisfazem no mínimo as necessidades em cuidados de saúde do povo português.
A falência nos cuidados primários, de que são simples exemplo as longas listas de espera para simples consulta de clínica geral, a dificuldade de acesso a consultas de especialidade ou a meios complementares de diagnóstico, levam cada vez mais os utentes a ter que recorrer ao sector privado e aos hospitais.
Particularmente grave é a situação existente nas urgências com a ruptura destes serviços, hoje já denunciada e tornada pública pelos próprios responsáveis.
A responsabilidade pelo estado caótico em que se encontram hoje os serviços públicos de saúde cabe exclusivamente ao Governo por levar a cabo uma política de desarticulação e degradação dos serviços públicos, de que são exemplos significativos: a redução dos meios financeiros, como ficou demonstrado na discussão do Orçamento do Estado para 1987, onde se verificou que a transferência do Orçamento do Estado para o sector correspondeu apenas a 9,2%.
Srs. Deputados, este foi o mais baixo valor registado nos últimos dez anos.
A irracional política de pessoal manifestada pela não publicação dos novos quadros hospitalares, do não preenchimento de vagas existentes, pelo protelamento das comissões instaladoras nas administrações regionais de saúde, pela proliferação e incrementação do trabalho precário e dos contratos a prazo, pelo despedimento

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de técnicos, nomeadamente médicos, tão necessários ao funcionamento dos serviços e que com malabarismos estatísticos diz o Governo existirem em excesso.
A alienação de unidades de saúde, como sucede com a entrega à misericórdia de hospitais, ou a tentativa de entrega aos sectores privados de laboratórios de análises existentes nos centros de saúde.
O desvio para o sector privado de milhões de contos do Serviço Nacional de Saúde, para pagar exames complementares, como sejam a tomografia axial computorizada, as ecografias, a hemodiálise e a endoscopia, entre outros.
O patrocínio e implementação de novos subsistemas
de saúde, de que é exemplo recente a incentivação do
seguro-doença, que mais não faz do que aliciar os cida
dãos para pagar em duplicado os cuidados de saúde
a que legal e constitucionalmente têm direito.
Esta política, levada conscientemente à prática por este governo, está a conduzir à situação de ruptura dos serviços públicos de saúde, que é denunciada pelos profissionais do sector e que leva a uma profunda contestação por parte dos utentes.
Perante esta gravíssima situação, o Governo pretende lavar as mãos e imputar a outros, designadamente aos médicos e agora também aos órgãos de gestão hospitalar democraticamente eleitos, as responsabilidades que exclusivamente lhe cabem. Para tal não se coibe de recorrer a uma escandalosa campanha de desinformação nos meios de comunicação social e muito especialmente na RTP.
É o que se chama fazer o mal e a caramunha. Por um lado retira o Governo os meios financeiros, técnicos e humanos aos hospitais e depois responsabiliza os profissionais do sector e os órgãos de gestão hospitalar pelo seu mau funcionamento.
É, pois, este o quadro, Sr. Presidente, Srs. Depu
tados, em que se situa a tentativa do Governo em fazer passar o Decreto-lei n.º 16/87 e o respectivo decreto regulamentar. .
O processo que levou à publicação deste decreto-lei é, a todos os títulos, inaceitável.
Por parte da Assembleia da República sempre foi demonstrada a maior abertura ao diálogo, para que fosse possível a elaboração de legislação que pudesse actualizar certos aspectos que dez anos após a consagração da gestão hospitalar democrática se mostrassem necessários. Nesse sentido foram apresentadas iniciativas legislativas tendo em vista a elaboração de um diploma que desse respostas às necessidades sentidas.
O Governo conhecia essas iniciativas e sabia da vontade da Assembleia da República em conhecer previamente a legislação que o Governo tinha em preparação.
A tudo isto a Sr.ª Ministra da Saúde fez orelhas moucas. Não deu qualquer informação à Assembleia da República e com o espírito de que o segredo é a alma do negócio publica, sem a prévia audição de quaisquer entidades, o Decreto-lei n.º 16/87.
Só depois do facto consumado se veio dirigir à Assembleia da República, tentando explicar o que inexplicável é.
Apesar de arrogantemente propagandear que não abdica das suas posições, a Sr.ª Ministra, face à previsível derrota parlamentar, tenta estender a mão a alguns partidos com assento parlamentar, demonstrando também aí o carácter sectário da sua política, ao excluir desse «diálogo» partidos da oposição democrática.

A atitude de afrontamento da Sr.ª Ministra não deve deixar de merecer uma resposta clara desta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contrariamente ao que afirma o preâmbulo do decreto-lei, não são inovadoras as formas de gestão que apontam para «a existência de planos no contexto de um modelo de gestão participada por objectivos»: tal está já consagrado nos hospitais civis de Lisboa; nem a existência de «centros de responsabilidade e níveis intermediários de administração», pois tal também se pratica já, por exemplo em Santa Marta, em Santa Maria, nas Caldas da Rainha ou em Castelo Branco.
Cai pois assim pela, base a principal argumentação apresentada pela Sn a Ministra para revogar o Decreto-lei n.º 129/77.

O Governo demonstra um profundo desconhecimento do sector e pretende vender-nos gato por lebre.
Inovador é, sem dúvida, abrir a possibilidade de os depósitos bancários dos hospitais se virem a efectuar na banca privada! Ora aí está, se calhar, um dos objectivos deste diploma.
Mas a principal gravidade deste diploma está na pretensão de acabar com a gestão democrática dos hospitais, passando todos os órgãos de gestão e administração a ser por si nomeados.
A tentativa desesperada de governamentalização de todos os sectores da vida nacional é uma síndroma patológica de que padece este governo.
Hipocritamente afirma o Governo que com isto pretende dar maior autonomia à gestão hospitalar. O que se verifica, porém, é uma centralização de poderes no Ministro: a simples decisão de separar a contabilidade de uma lavandaria passa a depender de autorização ministerial. Pasme-se, Srs. Deputados!
Por outro lado, há completa concentração de poderes nos gestores nomeados pelo Ministro.
Com este diploma o Governo visa, por um lado, esvaziar de poderes o conselho geral, transformando-o num órgão meramente consultivo, e, por outro lado, possibilitar a intervenção decisiva na gestão de elementos estranhos ao quadro hospitalar, inclusive à função pública, e cujo valor será segura e exclusivamente ponderado por factores de ordem política.

Mas em que bases assentou o Governo para fazer crer que os gestores por si nomeados são melhores que os gestores eleitos?
Não tem hoje o Ministério inteira tutela sobre esses órgãos de gestão?

Nestes últimos dez anos de gestão democrática, quantos inquéritos foram levantados aos órgãos de gestão hospitalar e quando se provou que havia incúria, corrupção ou incompetência na sua gestão?
O administrador hospitalar, que pertence ao conselho de gerência, não é nomeado para os hospitais pelo Mnistério?
Quando e em que casos não homologou o Ministério os órgãos eleitos?
Estas são questões a que este governo não pode deixar de responder.
A nomeação de gestores hospitalares pelo Governo trará inevitavelmente uma profunda instabilidade nos serviços.
Temos já hoje disso exemplos. É ver o que se passa nas administrações regionais de saúde, cujos órgãos directivos todos nomeados são hoje cargos políticos distribuídos a amigos ou pessoas de confiança, sem qual-

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quer critério de competência. E veja-se a situação caótica em que se encontram os cuidados primários de saúde, que são da sua inteira responsabilidade.
O que se procura agora, com este diploma, não é mais do que estender aos hospitais esta instabilidade e criar mais uns lugares de gestor para distribuir por apaniguados e amigos. O Decreto-lei n.º 191-F/79, ao abrigo do qual são nomeados estes gestores, garante a absoluta docilidade dos nomeados e permite a desestabilização da empresa hospitalar, a que paradoxalmente se procura dar «dinâmica empresarial».
Debrucemo-nos agora, embora sucintamente, sobre algumas questões de especialidade e no que respeita à competência dos órgãos.
O conselho geral, cuja composição nos merece reservas, é um órgão completamente esvaziado de responsabilidades, ficando apenas com funções meramente formais.
O conselho de administração não é um órgão permanente, é puramente deliberativo e não tem quaisquer funções executivas. Não é um órgão de administração, é sim um tribunal de conflitos.
O administrador geral, também da confiança política do Governo, evidentemente, é o único órgão executivo, tem competências excessivas e possivelmente conflituantes com o conselho de administração.
Tem poderes tão grandes e vastos que nem sequer é exigida audiência prévia dos órgãos técnicos, para a tomada de certas decisões. Este é mais um excelente exemplo do que não deve ser a gestão em saúde e particularmente a gestão hospitalar.
O conselho técnico tem competências sobrepostas com o conselho geral e com o administrador geral, o que trará seguramente fricções e atritos perfeitamente escusados.
Em conclusão poderemos dizer que este diploma:

Retira autonomia à gestão hospitalar (veja-se por exemplo que um simples acto de gestão contabilística, que é a criação de um centro de custos, requer autorização ministerial);
Despreza por completo a participação responsável;
Introduz no hospital uma perigosa instabilidade interna;
Privilegia a confiança política em detrimento da competência técnica.

O Decreto-lei n.º 16/87, acabando com a gestão democrática é pois mais uma peça que tem por finalidade a destruição do Serviço Nacional de Saúde.
Por tudo isto, a única atitude que esta Assembleia pode responsavelmente assumir é a recusa de ratificação do decreto-lei, com o que «defenderá o direito à saúde do povo português», constitucional e legalmente consagrado.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lembro-lhes que estão a decorrer duas votações e peço-lhes o favor de não se esquecerem de votar.
Vai agora ser lido um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão
do Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 29 de Janeiro de 1987, pelas 16 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitadas pelo Partido Renovador Democrático:

Aníbal José da Costa Campos (círculo eleitoral de Aveiro), por José Emanuel Corujo Lopes. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a seis meses, a partir do próximo dia 3 de Fevereiro, inclusive.
Agostinho Correia de Sousa (círculo eleitoral de Viana do Castelo), por Defensor Oliveira Moura. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), para os dias 29 de Janeiro corrente a 15 de Fevereiro próximo, inclusive.

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

José Luís Nogueira de Brito (círculo eleitoral de Braga), por Manuel Afonso de Almeida Pinto. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não inferior a um mês, a partir do dia 29 de Janeiro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez
que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) António Marques Mendes (PSD) - Henrique Rodrigues da Mata (PSD) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Jaime Manuel Coutino Ramos (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - António José Borges de Carvalho (CDS).

Srs. Deputados, vamos votar o requerimento que acabou de ser lido.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Borges de Carvalho, Ribeiro Teles e Rui Oliveira e Costa.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Sr. Presidente, antes da leitura do relatório, eu tinha pedido a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas a Mesa não reparou no seu pedido de palavra.

Como ainda não se iniciou qualquer outra intervenção, V. Ex.ª tem a palavra para pedir os esclarecimentos que entender ao Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Vidigal Amaro, V. Ex.ª só viu desgraças no actual decreto-lei, cuja ratificação agora foi pedida, quando se trata de um diploma que vem fazer exactamente o que acontece noutros países europeus e democráticos. Nem mais nem menos, Sr. Deputado!
V. Ex.ª teceu loas ao anterior decreto-lei, falando da gestão democrática e referiu, como exemplo paradigmático, a gestão do Hospital de Santa Maria.
Sr. Deputado, é capaz de informar a Câmara sobre há quantos anos não há eleições para a gestão do Hospital de Santa Maria? Isso é que é um funcionamento capaz? É isso que o Partido Comunista quer continuar a conservar?
O Sr. Deputado citou desgraças na saúde e na assistência em Portugal. São essas desgraças que o Partido Comunista quer ver continuar em Portugal? Pelo menos, que os ventos da mudança, que sopram pela União Soviética, soprem também pelo Partido Comunista Português! Talvez o País venha a lucrar alguma coisa com isso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vidigal Amaro, se desejar responder ao Sr. Deputado Jardim Ramos, tem a palavra para esse efeito.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - De facto, ao advogar a defesa de um projecto de lei como este, penso que o Sr. Deputado Jardim Ramos constitui um bom exemplo de como não se deve entender a defesa de um decreto-lei como este. É que este decreto-lei é indefensável e foi a primeira vez que ouvi alguém defendê-lo!

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Nem a Sr.ª Ministra?!

O Orador: - Todas as entidades ouvidas...

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Com certeza. Tenho sempre muito gosto em deixá-lo interromper-me.

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Nesse caso, depreendo que me dá o privilégio de eu ter sido o primeiro a defendê-lo, mesmo antes da Sr.ª Ministra da Saúde, dos enfermeiros do Norte e de muitos outros...

O Orador: - Quais outros, Sr. Deputado?

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Dezenas de médicos e de profissionais de saúde que todos os dias saem a terreiro...

O Orador: - Ó Sr. Deputado Jardim Ramos, indique-me um!...

O Sr. Jardim Ramos (PSD): - Por acaso não tenho aqui à mão...

Risos.

Mas ainda hoje a imprensa da manhã do Porto...

O Orador: - Mas eu tenho aqui à mão a informação e vou dar-lha: desde a Ordem dos Médicos aos sindicatos dos médicos, aos enfermeiros, aos gestores hospitalares, aos engenheiros dos hospitais, aos directores de serviço todos eles estão contra este diploma.
Ao ter referido a boa gestão do Hospital de Santa Maria queria eu dizer que os novos modelos para que agora a Sr.ª Ministra aponta já ali são praticados. Se a gestão desse Hospital é má, é ao Ministério da Saúde que cabe a culpa, é este Ministério que tem a responsabilidade, porque é a ele que compete a tutela, incluindo a instauração de inquéritos para se saber se a gestão é má ou boa.
Ora, isso nunca foi feito e foi isso que eu afirmei daquela tribuna. O que eu perguntei foi quantos inquéritos tinham sido levantados nos hospitais para se provar que a gestão era corrupta e incompetente. Isso não foi feito!
Sr. Deputado, o que é necessário é que não se transfira para a gestão hospitalar a incompetência que grassa nas administrações regionais de saúde, que, essas sim, são de pura nomeação ministerial. É isso que não se pode permitir e que este diploma tenta consagrar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do meu partido sobre esta matéria, na parte técnica - digamos assim -, será exposta por outros meus companheiros de bancada.
No entanto, e como questão prévia, não posso deixar de pôr em evidência e de lamentar o facto de o Governo, contra o que tem sido uma praxe geralmente respeitada - e que consideramos uma praxe democrática salutar-, ter legislado por decreto-lei sobre uma matéria que era objecto de um projecto de lei apresentado pelo PRD nesta Assembleia.
Recordamos que, em Fevereiro de 1977, foi aprovada por esta Assembleia uma resolução da qual consta a conveniência de o Governo não legislar por decreto em matéria pendente de iniciativa legislativa. Este tema foi aqui muito discutido, designadamente quanto a saber se os considerandos da resolução, de acordo com a qual o Parlamento passa a enviar para o Governo, exactamente também para este efeito, os projectos de lei que aqui são apresentados, obrigavam ou não o Governo

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e se, ao votar a resolução, os partidos votavam ou não esses considerandos. A resolução foi aprovada por unanimidade e os considerandos apenas não foram votados pelo Partido Socialista, que na altura estava no Governo.
Não sei se hoje, nessa como noutras matérias, as situações se inverterão...
O PSD, hoje partido no Governo, defendeu então este princípio - e até com algum calor -, que nos parece, repito, de uma salutar prática democrática, através de várias intervenções, designadamente do Sr. Deputado Rui Machete, que disse, a este respeito, o seguinte:
Dando às coisas o seu devido valor e salientando que se trata apenas de um problema de vantagem ou de conveniência, em princípio, salvo se houver razões ponderosas que o aconselhem, o Governo, quando já houver propostas ou projectos de lei que estejam a decorrer os seus trâmites na Assembleia, não deve usar da sua competência normativa.
Em idêntico sentido se pronunciaram outros partidos, com argumentos perfeitamente ponderosos. Por exemplo, valerá a pena recordar o que disse, na altura, o representante do CDS:
O CDS não admite que o Governo faça, de qualquer maneira, obstrução aos trabalhos parlamentares e, por isso, considera perfeitamente admissível e pertinente, como princípio das boas relações que devem existir entre o Governo e a Assembleia, dentro de uma partilha de competência legislativa constitucionalmente definida, a proposta de resolução, que votará com os considerandos e na parte decisória.
Portanto, a partir daqui estabeleceu-se uma prática neste sentido, que, acentuo de novo, tem sido geralmente respeitada.
Quanto aos argumentos de ordem constitucional, não vale a pena invocá-los e, se calhar, nem vale a pena lembrar que, no domínio da Constituição de 1933, uma constituição própria de uma ditadura, pertencia sobretudo ao governo a iniciativa legislativa. Mas com a Constituição de 1976, designadamente depois da sua última revisão, ficou claramente marcado o princípio do primado da iniciativa legislativa da Assembleia. Por isso, só em casos absolutamente excepcionais e de extrema urgência se pode admitir que seja desrespeitado o princípio da resolução a que aludi.
Agora, ele foi claramente desrespeitado, sem nada que o justificasse.
Nem se diga que a questão da morosidade do processo legislativo nesta Câmara o justifica. Em primeiro lugar, se o Governo requeresse urgência, pela nossa parte - e penso que por parte de todos os outros partidos-, estaríamos inteiramente dispostos a que o processo tivesse essa urgência e que a questão fosse de imediato discutida.
Por outro lado, essa é sempre uma falsa questão. Porquê? Porque se o Governo legisla no mesmo sentido dos projectos que estão nesta Câmara, então o que deve fazer e acho que mandam as boas relações entre os partidos e as boas relações democráticas que o faça - é falar com o partido que apresentou o projecto e com ele conversar, para se resolver a questão; a não ser assim, isto é, quando o Governo legisla em sentido contrário a uma iniciativa que já existe nesta Câmara, o que é que se passa? Passa-se o que se passou agora: é pedida a ratificação e o diploma pode ser ou não ser ratificado. Obviamente, em vez de ser mais rápido o processo, acaba por ser mais lento.
Por isso, o PRD lamenta profundamente que isto se tenha dado e não pode deixar de salientar que corresponde a mais uma criação artificial, se não deliberada, de um conflito entre o Governo e a Assembleia da República, numa matéria de indiscutível interesse. Matéria que entendemos que se deve tentar discutir e debater serenamente, para obter quanto possível um consenso, para o que estamos abertos, como acontece relativamente a todas as matérias de interesse nacional.
Aplausos do PRD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, o que acabou de dizer pode resumir-se no seguinte: um bom entendimento entre o Governo e o Parlamento levaria aquele (o Governo) a não legislar por decreto-lei sobre matérias que estivessem pendentes de apreciação em sede parlamentar.
Bom, acerca disto, dir-lhe-ia, Sr. Deputado, o seguinte: em teoria, não temos nada a objectar ao lindíssimo princípio que encerra essa praxe, que V. Ex.ª invocou, citando até intervenções do passado, e ouvi perfeitamente nessa sua citação - e ressalto - a expressão "salvo se houver razões ponderosas".
Sr. Deputado, o projecto de lei apresentada pelo PRD sobre esta matéria é de Julho de l986... já lá vão sete ou mais meses. O Governo pode cercear-se de legislar sobre matéria que, no seu juízo, entende prioritária, só porque, entretanto, está presente na Assembleia da República um projecto de lei?

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isso era uma forma absolutamente inaceitável de bloquear a acção governativa, e basta atentar na existência - e V. Ex.ª sabe-o - de duzentos ou, provavelmente, trezentos projectos de lei, que estão pendentes nesta Assembleia. Ora, o Governo não pode, obviamente, porque não é matéria da responsabilidade ou da iniciativa exclusiva do Parlamento, cercear-se, pois ficaria impedido de legislar sobre o que quer que fosse.
Creio que não já nenhum assunto sobre o qual não existam projectos de lei pendentes nesta Assembleia da República e, se fosse como o Sr. Deputado diz, o Governo cessava a sua actividade legislativa. Isto era uma aberração total. Por isso, devo dizer que, em termos de preâmbulo da vossa intervenção, isso teria algum cabimento se outra fosse a situação e a produtividade da Assembleia da República ou o frenesim legislativo da Assembleia da República. Mas não é! E a prática é a seguinte: existem, de facto, projectos de lei pendentes nesta Casa, e, que eu me recorde, não há nenhuma matéria sobre a qual não exista, perdido por ai, algum projecto de lei.
O vosso projecto de lei tem oito meses . ... se o Governo considera que é prioritário . .. se VV. Ex.ª o consideravam prioritário, utilizassem o vosso direito

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protestativo à fixação da ordem do dia: têm mais direitos que o PSD e poderiam tê-lo feito em Agosto, Setembro, Outubro, Novembro, etc.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas vir agora com essa argumentação, em termos de preâmbulo à vossa intervenção - que me diz que é de carácter técnico, oxalá o seja -, com toda a franqueza, não tem a mínima pertinência. Isso seria um obstáculo inaceitável, de todos os pontos de vista, designadamente constitucional, à liberdade de aprovação de leis através do Executivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, começo por me solidarizar com o protesto lavrado pelo Grupo Parlamentar do PRD relativamente a esta falta grave cometida pelo Governo no que toca ao relacionamento com a Assembleia da República. De facto, não é só o grupo parlamentar do PRD que é atingido, mas é toda a Assembleia da República que é atingida.
Creio que a necessidade de nos associarmos ao seu protesto se tornou ainda maior depois de ouvirmos o Sr. Deputado António Capucho.
Ao ouvir a forma inexacta como se referiu à resolução de 1977 e à praxe seguida desde então nas relações entre o Governo e a Assembleia da República, fica-se com a ideia de que o PSD, que sempre e até agora defendeu a resolução e a praxe, deixa de ser solidário com elas. Esta é mais uma razão para que todos os demais grupos parlamentares fiquem alerta e procurem fazer vingar a praxe, que tão importante se tem revelado na nossa vida institucional.
Na verdade, ao contrário do que dizia há pouco o Sr. Deputado António Capucho, ao Governo não fica coarctada a possibilidade de tomar uma iniciativa legislativa. Evidentemente que a Assembleia da República tem o bom senso suficiente para nunca, e em tempo algum, ter procedido dessa maneira.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Não pode!

O Orador: - O que se exige ao Governo é que, havendo já um projecto de lei pendente na Assembleia da República sobre o assunto, se quiser legislar sobre o mesmo assunto mande uma proposta de lei para a Assembleia apreciar conjuntamente os dois documentos.

Protestos do PSD.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Qual é o artigo da Constituição que obriga a isso?

O Orador: - É esse o sentido da resolução, e é esse o sentido da praxe várias vezes invocada ao longo destes anos e várias vezes respeitada. Se alguém não cumpre esta praxe importante na vida democrática é o PSD, é o Governo e é agora o Grupo Parlamentar do PSD.

Mas, como dizia, ao Governo não é coarctada essa possibilidade. Pelo contrário, é-lhe dada inteira possibilidade de apresentar uma proposta de lei, de requerer prioridade e urgência para ela e de a fazer discutir conjuntamente com o projecto de lei. Então se verá qual é a melhor solução. Era aquilo que, no caso vertente, devia ter sido feito. Estava já um projecto de lei pendente na Assembleia da República, o Governo enviava uma proposta de lei, pedia para ela prioridade e urgência e então poderia ser discutida conjuntamente com o projecto de lei.
Era isto que queria dizer em apoio da posição que aqui foi defendida pelo PRD.
Queria, no entanto, fazer mais uma pergunta que me ocorre sobre um assunto que não ficou claro da sua intervenção, Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, e que se tornou mais confuso depois da intervenção do Sr. Deputado António Capucho.
Diz o Sr. Deputado António Capucho que o vosso projecto está aqui pendente há vários meses e que não houve nenhuma iniciativa para ser discutido.
É ou não verdade, Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, que da parte do PRD houve um pedido, na conferência dos líderes parlamentares, para que o projecto de lei apresentado pelo seu partido fosse discutido hoje conjuntamente com estas ratificações? E é ou não verdade que a ele se opôs o Grupo Parlamentar do PSD, pela boca do mesmo Sr. Deputado António Capucho?
Quer dizer, hoje nós poderíamos estar a fazer uma de duas coisas: primeira se se gerasse aqui uma maioria contrária ao decreto do Governo, essa maioria faria vencimento e o decreto do Governo não seria ratificado, ou sê-lo-ia para ser depois submetido a alterações em sede de comissão; mas, segunda, poderíamos já estar a discutir também o projecto de lei do PRD, podendo assim, dentro de muito poucos dias, emendar o erro do Governo e dar ao País uma boa solução para os problemas da gestão democrática dos hospitais.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra, se o desejar, o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, quanto à questão fundamental colocada pelo Sr. Deputado António Capucho é óbvio que tenho a resposta: o Governo não fica cerceado de tomar a iniciativa legislativa, o que deve é fazê-lo através de propostas de lei enviadas para esta Assembleia. Isso é perfeitamente claro.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Onde é que a Constituição diz isso?

O Orador: - O Sr. Deputado Costa Andrade... sei que V. Ex.ª é um dos pais da Constituição e sei também que às vezes se invoca a Constituição de mais.
Eu não disse que era inconstitucional ou ilegal a prática do Governo. O que disse, claramente, foi que o Governo está a violar uma praxe democrática estabelecida desde há anos e que geralmente tem sido seguida. Penso que V. Ex.ª até era deputado nessa altura, basta ler o que disse o seu partido.
Lamento que, uma vez mais, um partido tome aqui certas posições quando está na oposição e, chegado ao

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Governo tome posições contrárias. Isso está a acontecer constantemente. Penso que não é bom para a moralidade e moralização do regime democrático, as pessoas pensarem uma coisa quando estão no Governo e outra quando estão na oposição. Isto é perfeitamente claro e V. Ex.ª veja o que disse o seu partido.

Aplausos do PRD.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado, há aqui duas questões a ter em conta.
Em primeiro lugar, na sua intervenção, embora em termos não tão explícitos como acaba de o fazer agora, deixou mais ou menos indicada a ideia de uma certa prioridade legislativa a favor da Assembleia da República. Se nos deixássemos levar por aí estaríamos a deixar-nos escorregar e a permitir que essa praxe constituísse um direito constitucional costumeiro. Ora, nós vivemos em direito constitucional positivo e as praxes aqui estabelecidas não podem nunca ser invocadas, como o Sr, Deputado fez há pouco na sua intervenção, para dizer que o Governo estava a violar uma certa ordem de prioridades de competência legislativa da Assembleia da República. Isto foi dito pelo Sr. Deputado há pouco na sua primeira intervenção, mas, em nosso entender, não podemos deixar escorregar para aí o sistema. Vivemos num sistema de direito constitucional positivo e não de umas certas praxes.
Por outro lado, Sr. Deputado, sempre me permitia dizer-lhe outra coisa ...

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, este tempo conta para o tempo do PSD, não é verdade?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, conta no tempo do seu partido, pois foi V. Ex.ª que permitiu a interrupção, e não a Mesa.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Acabo já, Sr. Presidente.
Todas as praxes devem ser entendidas, como sempre foram entendidas, rebus sic stantibus no pressuposto de que da Assembleia da República haveria também relações cordatas e de cooperação com o Governo, como acontecia seguramente em 1977 quando essas posições foram firmadas. Não é manifestamente o caso. O que haveria, mesmo que de praxe se tratasse, seria um inadimplemento por parte da maioria desta Câmara.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Deputado, não vou entrar obviamente na discussão constitucional. V. Ex.ª sabe, ainda melhor do que eu, que a Constituição que actualmente nos rege, com a Constituição democrática, há uma clara supremacia da Assembleia da República como órgão legislativo, que não existia com a Constituição de 1933. E há um caso célebre de 1952, em que interveio o Sr. Deputado Sá Carneiro (não o Dr. Francisco Sá Carneiro, mas julgo que o pai), que protestou porque na ditadura o governo mudava por decreto-lei leis desta Assembleia. Foi uma discussão a propósito dos registos e do notariado.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - A Constituição é assim!

O Orador: - Desde a Constituição de 1976 que é nítida e, como sabe, exprime-se, pelo menos, em seis razões a supremacia da Assembleia da República como órgão legislativo, que vai desde o direito de ratificação, que hoje estamos a exercer até à competência exclusiva ou reservada, etc. Não vamos falar dessa questão técnica porque V. Ex .ª sabe muito bem que é assim.
O que eu disse foi que há uma praxe democrática que decorre de uma resolução de 1977 desta Câmara nesse sentido e que tem sido geralmente respeitada. Dai decorre que só quando se trata de algo de muito urgente é que o Governo deve legislar por decreto-lei sobre uma matéria pendente na Assembleia, de contrário, o Governo deve fazê-lo por proposta de lei.
Mas há mais: em Novembro de 1986 o PRD perguntou ao Governo, inclusive na discussão do Orçamento, se ia tomar alguma iniciativa nesta matéria e o Governo e a Sr.ª Ministra não responderam à questão que lhes colocámos.
Com a abertura que temos para discutir os assuntos, o Governo deveria ter enviado para aqui uma proposta de lei que, e muito bem, seria agendada com urgência e estaríamos agora a discutir. Porque a única razão que há para justificar tal procedimento, insisto, é a urgência. E, como eu lhe disse, os próprios deputados do seu partido disseram várias vezes em 1977 - e peço aos deputados do PSD para verificarem o que o PSD disse em 1977 - que a única razão que podia ser aduzida era a de celeridade. Obviamente, deste procedimento do Governo resulta o contrário, como hoje estamos a demonstrar.
Se o diploma não for ratificado, volta-se ao princípio de todo o processo, enquanto se o Governo tivesse trazido aqui a proposta de lei, tivesse requerido urgência, estávamos hoje a discutir os vários projectos e propostas e com muito mais celeridade se tinha resolvido a questão. Aliás, ainda em 1977, o Sr. Deputado Rui Pena, então, salvo erro, líder parlamentar do PDS, dizia mais: "[...] Quero apenas referir que o meu partido, por mais de uma vez, denunciou perante esta Câmara o facto, que considera impertinente, de o Governo legislar quando estavam pendentes [...]nesta Câmara projectos de lei." Esta foi uma matéria que mereceu então unanimidade, excepto por parte do PS, que então estava no governo.
É lamentável, pois, que tenham criado esta situação.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os trabalhos serão suspensos até às 18 horas e 10 minutos para o intervalo regimental.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho, ao que creio, para interpelar a Mesa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, eu ousava sugerir à Mesa que consultasse os líderes parlamentares sobre o cancelamento do intervalo, pois os trabalhos estão relativamente atrasados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, necessito de fazer um intervalo de cinco minutos, pelo menos.
Se os Srs. Deputados estiverem de acordo, faz-se um intervalo de um quarto de hora e retomam-se os trabalhos às 18 horas.
Tem ainda a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito, para interpelar a Mesa.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, suponho que não estamos atrasados. Fixámos tempos bastante largos para este debate e suponho que não irão ser utilizados na totalidade, o que vai permitir que acabemos os trabalhos bastante mais cedo. Pela parte da minha bancada, vamos poupar bastante do tempo que dispomos para intervir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que não há consenso, os trabalhos recomeçam às 18 horas e 10 minutos. Está interrompida a sessão.

Eram 17 horas e 44 minutos.

Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 26 minutos.

Srs. Deputados, vamos proceder às votações dos diplomas discutidos, na generalidade, durante a sessão anterior sobre o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos, Lei n.º 4/85, de 9 de Abril.
Votaremos pela ordem de entrada na Mesa dos respectivos diplomas.
Em primeiro lugar, votaremos o projecto de lei n.º 6/IV, apresentado pelo PCP (revogação de aumentos e reformas para membros do Governo e deputados).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Borges de Carvalho, Rui Oliveira e Costa e Ribeiro Teles e votos a favor do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
Srs. Deputados, passamos agora à votação do projecto de lei n.º 121/IV, apresentado pelo PSD (introduz alterações ao artigo 16.º da Lei n.º 4/85, de 9 de Abril, Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e dos deputados independentes Borges de Carvalho, Rui Oliveira e Costa, Ribeiro Telles e Maria Santos, votos contra do PRD e do CDS e abstenções do PCP e do MDP/CDE.
Srs. Deputados, votaremos agora o projecto de lei n.º 127/IV, apresentado pelo PRD (sobre o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos, alterações à Lei n. 4/85, de 9 de Abril).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS, do CDS e dos deputados independentes Borges de Carvalho, Rui Oliveira e Costa e Ribeiro Telles e votos a favor do PRD, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.
Vamos votar o projecto de lei n.º 336/IV, apresentado pelo PSD (Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e dos deputados independentes Rui Oliveira e Costa, Borges de Carvalho e Ribeiro Telles, votos contra do PCP, do PRD, do CDS e da deputada independente Maria Santos e a abstenção do MDP/CDE
Finalmente, votaremos o projecto de lei n.º 346/IV, apresentado pelo PS.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e dos deputados independentes Rui Oliveira e Costa e Ribeiro Telles, votos contra do PRD e abstenções do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Borges de Carvalho e Maria Santos.
Srs. Deputados, há um requerimento de baixa à comissão dos projectos de lei aprovados, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

Os deputados abaixo assinados requerem a baixa à 1.ª Comissão, pelo prazo de 30 dias, dos projectos de lei aprovados na generalidade referentes ao estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, para efeitos de apreciação e votação na especialidade.

Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, encontram-se na galeria central deste hemiciclo os autarcas do concelho de Almada, cujo presidente da Assembleia Municipal é o nosso colega, Deputado Maia Nunes de Almeida. Foram hoje recebidos pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, tendo tido ainda um encontro com os deputados eleitos pelo distrito e com uma delegação da Comissão de Administração Interna e Poder Local.
Agradeço uma saudação por parte da Câmara a estes representantes do poder local.

Aplausos gerais, de pé.

Continuando agora o debate sobre as ratificações agendadas para hoje, concedo a palavra ao Sr. Deputado Ferraz de Abreu, para uma intervenção.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Lê-se na nossa Constituição que para assegurar o direito à protecção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado:

a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua situação económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;
b) Garantir uma racional e eficiente cobertura
médica e hospitalar de todo o País.

Nunca é de mais relembrar estas obrigações do Estado, pois as carências gritantes que ainda se observam um pouco por todo o País testemunham que têm faltado a determinação e a vontade política necessárias para lhes dar cumprimento, através da progressão e melhoria contínuas do Serviço Nacional de Saúde.
Pelo contrário, ao longo dos últimos anos, tem-se assistido a uma série de avanços e recuos motivados pelas flutuações políticas com incidência na política social praticada.
E as mutações assim geradas têm sido altamente responsáveis pelo atraso em que nos encontramos e por uma certa desorientação registada no sector, com repercussões indesejáveis no comportamento das pessoas envolvidas e na instabilidade das instituições.

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Por outro lado, continuamos a ser o País da Europa que menos gasta com a saúde, quer comparemos os gastos por pessoa/ano, quer as taxas do PIB que lhe são destinadas.
Nestas circunstâncias, será justo exigir das nossas unidades médicas a prática de uma medicina moderna cada vez mais desejada por ser cada vez mais eficaz, sabendo-se que os custos desta eficácia também são cada vez mais elevados?
Para enfrentar a situação assim criada, uma política de saúde inconsistente, propositadamente vaga e contraditória, com meios financeiros inadequados, sem vontade de ultrapassar tais dificuldades, não pode deixar de levar, a curto prazo, a uma crise vizinha da rotura.
É com grande preocupação que temos tomado conhecimento da inquietação e da desestabilização reinantes entre os trabalhadores da saúde, não poupando mesmo os seus mais elevados quadros, motivadas por intervenções infelizes do Ministério, por ausência de soluções adequadas e solicitadas e por um conjunto de medidas pontuais que não vão ao fundo dos problemas, mas que aumentam as tensões existentes e põem em risco o funcionamento e a eficácia dos serviços.
O Decreto-Lei n.º 16/87 e o Decreto Regulamentar n.º 3/87, de que hoje nos ocupamos, que pretendem modificar a legislação que até hoje tem regulamentado os órgãos de gestão dos hospitais, são exemplos de tais medidas. A sua publicação desencadeou grande descontentamento entre os trabalhadores dos hospitais e está sendo causa de uma onda de protestos proveniente de todos os seus quadros mais qualificados.
No entanto, apesar de se reconhecer que a legislação de 1977 introduziu nos hospitais regras de gestão que contribuíram de forma notável para a melhoria do seu funcionamento e da sua eficácia, era por todos sentida a necessidade da sua revisão. Mas o quadro de gestores que ao longo destes dez anos adquiriu notável experiência e que conta com valiosos e criativos profissionais sentiu-se perplexo com as consequências negativas da presente legislação e frustrado e ofendido com o tratamento que nela lhes é injustamente reservado.
Todos esperavam mais autonomia, mais autoridade e mais responsabilidade para os órgãos de gestão. Todos esperavam novas regras de gestão que melhorassem a eficácia e a rentabilidade. Todos esperavam maior autoridade e maior responsabilidade para os directores dos serviços. Todos aceitavam uma intervenção mais directa do Ministro da Saúde na designação dos responsáveis dos órgãos de gestão, mas sem pôr em causa a democraticidade já institucionalizada.
Ora, é manifesto o desfasamento entre os propósitos explícitos nos preâmbulos dos dois decretos e os resultados objectivos a que conduzirão os respectivos articulados.
O decreto-lei, apesar de pouco ou nada controverso, é relativamente pouco inovador quer em relação à legislação que revoga, quer até relativamente à actual prática gestionária já corrente na generalidade dos nossos hospitais. Na realidade, muitas das técnicas da tão anunciada «gestão empresarial» são já hoje prática corrente, o que demonstra as virtualidades e a capacidade técnica dos actuais órgãos de gestão hospitalar. Mas, ao consagrar na lei estes e outros princípios igualmente aceitáveis, o diploma não mereceria contestação, não fora o caso de ser o ponto de partida para uma regulamentação que faz tábua rasa de uma experiência rica, fértil em bons resultados, e que não esgotara ainda todas as suas potencialidades, em vez de a aperfeiçoar, o que certamente não seria difícil nem controverso; que despreza a gestão democrática com participação responsável dos trabalhadores como factor determinante de uma adequada gestão e actividade hospitalares e que abre caminho à escolha política dos gestores em vez de privilegiar a competência e a experiência.
Na realidade, o processo de nomeação dos membros do conselho de administração é, sem dúvida, o mais grave erro da presente regulamentação. A metodologia seguida para a nomeação do presidente e para a nomeação, por proposta deste, dos restantes membros do conselho de administração, e a sua possível origem exterior aos quadros hospitalares era impensável que ocorresse no Portugal de 1987. Tal metodologia pode garantir homogeneidade, mas não garante por si competência e eficácia, destrói a autonomia do hospital pela total dependência dos gestores face ao Ministério e faz correr o risco da partidarizacão e da instabilidade da gestão dos hospitais.
Isto para não falar na falta de confiança do Ministério nos seus próprios quadros...
Que gestores serão nomeados? Quem lhes atribui o mérito e determina a adequação do seu currículo às funções que vão exercer?
Consideramos igualmente errada a inclusão no órgão de gestão do director clínico e do enfermeiro-director, que até agora se têm constituído com inegável mérito institucional e benefício para o hospital como primeiros e principais baluartes de defesa do primado da técnica médica e da enfermagem. Com tal medida corre--se o risco de anulação das vozes independentes que sempre têm estado na primeira linha da defesa da técnica junto da gestão. Parece-nos ainda pura fantasia o processo da sua nomeação e a possibilidade do seu recrutamento entre profissionais de outros hospitais. Como discordamos de que o director clínico não exerça funções médicas no hospital.
Em resumo, diremos que o decreto-lei se limita a apontar como grandes objectivos de gestão um conjunto de medidas já há muito experimentadas e implementadas por iniciativa e dinâmica dos actuais órgãos de gestão dos hospitais e que só não têm colhido melhores resultados pela falta de apoios e até de algum distanciamento das várias tutelas; que a sua regulamentação vem cercear a autonomia das instituições hospitalares, destrói a dinâmica introduzida pela gestão participada e causará graves e imparáveis danos, como consequência do processo de nomeação e recrutamento dos titulares dos seus órgãos de gestão e de alguns dos seus directores técnicos.
Por isso, votaremos contra a sua ratificação.
Mas o PS reconhece a necessidade de melhorar a legislação existente, de modo a explorar todas as suas potencialidades e a aproveitar os resultados da experiência já adquirida e das novas técnicas de gestão.
Está demonstrada a necessidade de implementação de novas regras de gestão, da criação de centros de custos e da introdução de métodos de avaliação, de planos anuais e plurianuais que conduzam a uma racionalização da utilização dos recursos financeiros sem perder de vista que a qualidade e a eficácia dos cuidados produzidos são a finalidade última da «empresa» hospitalar. Também se reconhece a necessidade de esbater certos aspectos corporativos dos órgãos de gestão e de diminuir a dependência eleitoral dos gestores,

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aumentando o peso da intervenção do ministro da tutela na sua nomeação, mas de modo equilibrado, de modo a permitir a democraticidade e a participação até agora observadas. Que esta intervenção restabeleça a responsabilidade dos gestores perante o Ministério, mas que também contribua para aumentar a sua autonomia e a sua autoridade.
Também a comunidade em que o hospital se insere deverá estar representada através do órgão de participação e consulta, avaliando, criticando e sugerindo sobre a actividade da sua gestão.
Naturalmente que algumas das medidas constantes do decreto-lei do Governo poderão e deverão ser retomadas pela sua coincidência.
Serão estes os princípios que enformarão o projecto de lei que o Partido Socialista apresentará de imediato como alternativa, se os decretos em discussão não forem ratificados pela Assembleia da República.
Assim, será mantido o conselho geral, como órgão de participação e consulta, em representação da comunidade, a ser presidido pelo presidente da administração regional de saúde.
O conselho de gerência será o órgão de gestão e será constituído por um médico e um enfermeiro do quadro permanente do hospital, nomeados pelo ministro da tutela entre uma lista de três médicos e uma lista de três enfermeiros eleitos pelo colégio eleitoral do hospital, sendo o médico presidente do órgão e designado por director do hospital; um administrador da carreira dos administradores hospitalares a nomear pelo Ministro da Saúde, ouvido o departamento responsável pelo quadro único dos administradores hospitalares.
Os órgãos de direcção técnica serão a direcção médica, a ser eleita por um colégio eleitoral, composto pelos médicos do quadro permanente, sendo o seu presidente o director clínico do hospital; a direcção de enfermagem, que será instituída segundo as normas estabelecidas para a respectiva carreira; a direcção de administração, que será constituída segundo as regras aplicáveis ao quadro único dos administradores hospitalares.
A existência ainda de uma direcção de manutenção, instalações e equipamentos, bem como de alguns dos órgãos de apoio técnico (direcção de internato médico, comissão de serviço do bloco operatório, comissão de farmácia e terapêutica, comissão de higiene hospitalar e direcções de serviços), poderá ficar dependente das necessidades do hospital respectivo, em termos a regulamentar.
São estas as linhas gerais da nossa alternativa, na elaboração da qual tivemos em conta o parecer de numerosos administradores, médicos, enfermeiros e outros técnicos de saúde.
Temos a consciência da complexidade do problema e anima-nos, exclusivamente, a vontade de dar o nosso contributo para a melhoria do funcionamento, da eficácia e da rentabilidade dos nossos hospitais, órgãos fundamentais para o Estado cumprir o seu dever de assegurar cuidados médicos aos cidadãos que deles carecem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Valdemar Alves e Duarte Lima.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, a intervenção que V. Ex.ª acaba de produzir merece, da minha parte, que saliente um aspecto positivo, que é o carácter sério e ponderado com que ela foi feita. Congratulo-me com isso e daqui vai o meu reconhecimento.
No entanto, surgiram-me algumas questões que, muito rapidamente, gostaria de colocar-lhe.
Um dos problemas fundamentais deste diploma -e concordo, em certa medida, com o Sr. Deputado no que disse sobre o decreto-lei anterior, que tinha dezassete artigos, treze dos quais sofreram melhorias técnicas e de forma, tendo sido outros dois excluídos porque, de facto, não se adaptavam aos tempos actuais- é precisamente o dos centros de responsabilidade e de custos, pelo que é fundamental a introdução de alterações nesta matéria.
O problema põe-se, efectivamente, no decreto regulamentar, e aqui queria colocar-lhe duas ou três questões, a primeira das quais diz respeito à democraticidade.
Parece-me que o Sr. Deputado sobrevalorizou a democraticidade interna para a eleição dos órgãos de gestão de um hospital, desvalorizando a democraticidade que resulta da eleição universal, a nível do País, donde emana este Governo. Julgo que a legitimidade deste Governo, como órgão democrático, não pode ser discutida, uma vez que foi feita uma eleição universal, que será, com certeza, maior do que a legitimidade que resulta de uma eleição de classe de médicos.
Por outro lado, a própria eleição é, de facto, só de classe. A participação, infelizmente, nem sempre é a desejável e, possivelmente, nem sempre o eleito é o mais capaz. Talvez seja eleito o mais permissivo, o mais tolerante, o menos exigente, mas nem sempre é o mais capaz. Portanto, só pela eleição não se pode garantir que o eleito seja o mais capaz dentro da instituição.
O Sr. Deputado disse, ainda, que discorda - e se percebi mal peço-lhe desculpa - da inclusão do director clínico no conselho de administração. No entanto, Sr. Deputado, tenho aqui um documento da Ordem dos Médicos que «mete», precisamente, no conselho de gestão o director clínico. Gostaria de ouvir a sua opinião sobre isto.
Quanto à participação da comunidade, que me parece ser muito importante, acho que o Sr. Deputado não nos trouxe nada de novo, na medida em que isso já está previsto, e com um leque bastante alargado, no actual diploma, agora sujeito a ratificação.
Para já, são estas as questões que a sua intervenção me suscitou.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Oram (PSD): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, na intervenção que proferirei, dentro de momentos, terei ocasião de contraditar alguns dos argumentos invocados por V. Ex.ª na sua intervenção de há pouco. Por agora, queria unicamente não deixar passar uma observação que me espanta vinda de V. Ex.ª e do PS e que tem a ver com o facto de haver uma escolha de gestores hospitalares por parte do Governo. De resto, na maior parte dos países da Europa Ocidental o modelo é o da escolha e não o da eleição, como sabe.

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A observação é a seguinte: o governo que financia o sistema e é responsabilizado perante a opinião pública pelo bom ou mau funcionamento dele não pode, na opinião de V. Ex.ª, ter uma participação, pois o facto de ser o Governo a nomear partidarizaria a gestão. Pergunto-lhe, Sr. Deputado, por que é que não seguem esse critério em relação a todos os gestores da Administração Pública? Por que é que os directores-gerais e os subdirectores-gerais não vão passar a ser eleitos pelos trabalhadores? Por que é que nas companhias de seguros e nos bancos as administrações não passam a ser eleitas? Não será mais democrático? Vamos-nos eleger todos uns aos outros, vamos ser a democracia mais feliz do mundo, mas, naturalmente, a mais ineficaz!
Não entendo, pois, qual a base de sustentação filosófica desse argumento, isto é, de que a gestão deve de ser virada para dentro do hospital, para os seus trabalhadores, médicos, enfermeiros e pessoal administrativo, e não, ao contrário, de que quem deve ter participação nela serão os utentes. É óbvio que a prestação de cuidados de saúde é uma função do Estado, que é o governo, órgão superior da Administração Pública, quem é responsabilizado por isso, mas essa função do Estado tem de ser exercida em função dos seus utentes, ou seja, em função dos doentes. Não vejo, no entanto, como é que esse universo poderá ser delimitado.
A ideia que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu aqui traz é quase uma ideia autogestionária e não de gestão democrática, de resto, é uma ideia que não tem tradição no Partido Socialista. V. Ex.ª, que acompanhou atentamente o que se passou no anterior governo, já que era um conselheiro - e bem, porque é um homem competente nesta matéria- privilegiado do anterior ministro da Saúde, sabe perfeitamente o que estava nos planos do ministro da Saúde e que havia um diploma assinado por ele, para ser levado a Conselho de Ministros, em que se optava pelo sistema da nomeação. Será que ia o PS acabar com a gestão democrática dos hospitais?
Como é que explica essa inversão? Eu sei que agora não estão no governo, mas de certa forma o PS é um partido de mutantes. Na lei da rádio tomaram uma posição e depois inverteram-na, pelo que estão de facto a transformar-se num partido de mutantes.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Que falta de imaginação!

O Orador: - O que quero que explique é se ponderam o interesse nacional na mesma perspectiva quando estão na oposição e quando estão no governo, e se quer aqui reconhecer a posteriori que o ministro Gonelha ia acabar com a gestão democrática nos hospitais, porque o princípio era esse.

O Sr. António Capucho (PSD): - Essa é que é a questão!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Deputado Valdemar Alves, começo por lhe agradecer o ter reconhecido que fiz isto com serenidade, com seriedade e preocupado com os interesses do País.

Em relação à democratização pergunto-lhe, Sr. Deputado, por que é que vamos permitir a eleição dos presidentes da câmara e de todas as autarquias? Para que é que vamos regionalizar o País?

Protestos do PSD.

Pergunto: por que é que não se pode descentralizar o poder e aceitar que estes órgãos também têm democraticidade?
Por que é que havemos de dizer que só o Governo, que foi eleito, é que tem representatividade? Mais: diz que nem sempre o mais capaz é o eleito. Talvez não, talvez nós próprios, os deputados eleitos, não sejamos os mais capazes, é um argumento que não posso rebater.
Em relação à eleição hospitalar, julgo que o Sr. Deputado não prestou atenção à minha intervenção. Eu disse que o director hospitalar seria eleito pelo colégio eleitoral do hospital e, depois, falei no colégio eleitoral dos médicos para o director clínico. Isto é, a eleição do director do hospital é feita pelo colégio eleitoral do hospital onde estão representados todos os seus trabalhadores e não apenas os médicos, o que é uma das inovações do nosso projecto. Quanto ao facto de a Ordem dos Médicos incluir o director clínico no conselho de gerência e nós não o fazermos, na realidade, há uma grande distância entre a Ordem dos Médicos e o PS, não temos nada de comum com a Ordem dos Médicos, não interviemos na sua direcção no passado e não o faremos no futuro, pelo que não somos obrigados a aceitar a opinião da Ordem dos Médicos, como, de resto, sucede também com o seu partido e com o Governo.
Disse o Sr. Deputado que o conselho geral não trouxe nada de novo, pois não, Sr. Deputado. Tive a honestidade de confessar que muitas das ideias que estão neste decreto já estavam no anterior; retomaremos essas ideias e não deixaremos de o fazer pelo facto de terem sido publicadas num decreto de um governo do PSD. Mas há uma coisa nova em relação ao conselho geral dos hospitais. É que até aqui era o Ministério da Saúde a indicar o seu presidente, ou seja, até aqui isto era governamentalizado. Ora, sendo este um órgão representativo da comunidade, ela deve intervir na avaliação dos resultados. Pensamos que se pusermos a presidir a este órgão uma personalidade da região, que trabalhe nela e conheça os seus problemas, julgamos que faremos uma boa escolha, não entregando isto a qualquer pessoa alheia a estas questões.
Quanto ao Sr. Deputado Duarte Lima, uma vez que volta também a glosar o tema da democratização, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que isto não é alheio ao Partido Socialista, pois o diploma de 1977 que estabeleceu a gestão democrática e participada dos hospitais é da autoria de um governo do PS, pelo que isto está, ao contrário do que disse, nas nossas tradições.
Quero esclarecê-lo de que o projecto do ministro Maldonado Gonelha não acabava com a eleição. Aliás, trabalhei nesse projecto e não chegou a ser assinado, pelo que o posso afirmar. O decreto agora em debate é um decalque de um projecto estudado pelo ex-ministro Luís Barbosa e não do ex-ministro Maldonado Gonelha, cujo projecto falava "na nomeação do director, ouvido". É como quem diz: "votem lá quem é e depois eu nomeio".

O Sr. António Capucho (PSD): - O quê?! ...

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O Orador: - Era assim. A eleição não desaparecia e mantinha-se o colégio. A não ser que haja outro projecto para além daquele em que eu trabalhei. Mas esse era assim.
Não sei por que é que havemos de nos assustar com a democratização e com a gestão democrática, pois os resultados não têm sido nada assustadores, mas, pelo contrário, tem havido bons resultados. Para quem conheceu os hospitais antes da introdução destas leis de gestão e os conhece agora, apesar de todas as suas mazelas, carências e dificuldades, é notória e notável a alteração e a mudança. Só isso permitiu que hospitais, como sucede em Lisboa, que conservam as mesmas camas que há 30 anos estão a prestar assistência a uma população multiplicada por três. Só isto -e não quero estar agora a incomodar as pessoas com índices- dá uma ideia da mudança, para melhor, que esta lei permitiu. Aceitamos que possa haver, de vez em quando, uma certa permissividade de alguns gestores e, por isso, introduzimos o factor corrector de o Ministério escolher um dos três eleitos, o que obriga o director do hospital a pensar que não depende exclusivamente do seu eleitorado, mas também do ministro da tutela, que é quem, em última análise, avaliará a sua actuação como gestor e terá o poder de o exonerar, não sendo obrigado a aceitá-lo no caso de ele ser reeleito, pois terá mais dois para escolher, ao contrário do que acontecia no decreto anterior. Segundo este último, após uma exoneração de um director de hospital, o ministro corria o risco de esse director voltar a ser eleito e ter de o aceitar.
Creio que a nossa lei introduz factores de correcção em algumas das distorções que poderiam ser apontadas e, em relação às alterações que trouxe este decreto, jogamos mais nas nossas alterações do que naquelas que o Governo introduziu.
Não estou a fazer ao actual governo qualquer espécie de acusação ou processo de intenções no sentido de que ele iria ou não partidarizar as nomeações. O que referi foi que ficava aberto o caminho às nomeações políticas.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Então acabamos com todas as nomeações!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD está à vontade no sector da saúde, pois apresentou a esta Assembleia projectos de lei sobre tempo de antena para a educação, para a saúde, Lei de Bases da Gestão Hospitalar e Lei de Bases da Gestão das Administrações Regionais de Saúde, em virtude de sentir que tal era necessário para melhorar a saúde dos Portugueses.
Ao lançar a discussão destes temas quis contribuir de modo decisivo para que as estruturas da saúde se tornassem mais eficazes.
Apresentou em último lugar a Lei de Bases da Gestão das Administrações Regionais de Saúde porque sempre considerou que um membro do Governo que se apresenta publicamente com ar tão decisivo e auto--suficiente fosse exigente consigo próprio para não consentir que as administrações das ARS permanecessem um ano e alguns meses em total ilegalidade com graves prejuízos para os utentes e para os trabalhadores das próprias ARS, pois viam devolvidos pelo Tribunal de Contas os processos que estas lhe enviavam para visto. E passado todo este tempo de vazio legal, o Governo limitou-se a publicar um decreto-lei prolongando o regime de instalação, em vez de apresentar legislação que colocasse as ARS em regime normal de funcionamento, dada a enorme relevância deste sector não só no campo da prevenção e promoção da saúde, mas também no campo curativo. Esta legislação era urgente, mas não foi publicada, possivelmente porque aqui já é o Governo que nomeia os elementos responsáveis pela gestão, mas apressou-se a publicar legislação sobre gestão hospitalar, que, embora necessária, não era urgente e relativamente à qual havia um projecto nesta Assembleia.
O Governo, ao tomar esta atitude, não se preocupou com a necessidade imperiosa de dinamizar o funcionamento dos centros de saúde, prejudicando deste modo gravemente os utentes. Preocupou-se, antes, com o desejo do poder sobre as pessoas que não sobre as instituições e pretendeu, mais uma vez, entrar em conflito com a Assembleia da República a fim de poder apresentar-se como vítima junto do eleitorado, tentando, deste modo, encobrir as suas crescentes incapacidades de governação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro, em discussão, e o decreto regulamentar que se lhe segue institui no hospital uma gestão centralizadora, burocratizante e corporativa, não ajustada à realidade do hospital de hoje. A preocupação fundamental do Governo ao elaborar o decreto-lei é a de reivindicar o poder de nomear os responsáveis que integram o conselho de administração - órgão anómalo, aberrante, gerador de instabilidade, como adiante demonstraremos.
É uma gestão centralizadora e burocratizante porque o Governo pensa que os hospitais, estruturas complexas, podem ser geridos por telex directamente do gabinete da Ministra da Saúde e por isso deixa-os sem quaisquer poderes próprios e não consagra, de modo inequívoco, níveis de autoridade e responsabilidade - princípio vital para o funcionamento de uma instituição considerada entre as mais complexas organizações da sociedade moderna. No mundo de hoje, a gestão hospitalar deixou de poder assentar na polivalência de um homem e exige uma grande divisão de trabalho e de especialização, sempre crescentes, sendo portanto incompatível com o modelo burocrático de gestão publicada que está agravada em relação à lei anterior. O decreto-lei e o decreto regulamentar também não são ajustados à realidade do hospital de hoje, pois não instituem níveis de autoridade e responsabilidade em áreas de apoio tão importantes como o sector hoteleiro, o sector de manutenção do vasto equipamento e outras, cada vez mais diversificadas e diferenciadas, deixando estes grandes departamentos com a mesma estrutura definida há vinte anos.
E que dizer do conselho de administração, definindo o decreto regulamentar?! Este órgão é uma aberração total. Não respeita os níveis de autoridade e responsabilidade, confunde o nível de gestão global do hospital com a direcção funcional nas áreas médicas e de enfermagem, confunde a autoridade e a responsabilidade do 1.º nível com a autoridade e a responsabilidade do 2.º nível e não são consagrados, como já dissemos, outras direcções funcionais de hoje. O conselho de administração é um órgão híbrido, tecnicamente

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errado, altamente corporativo e gerador das maiores confusões. Os poderes dos elementos que o integram sobrepõem-se. Assim, o administrador-geral é obrigado a adoptar as medidas necessárias à melhoria da orgânica e funcionamento dos serviços [artigo 12.º, alínea b)]. O artigo 15.º define ainda como competência específica do administrador a autorização da introdução de novos produtos ao consumo hospitalar. Só ele o pode fazer.
Pergunto: para que serve o conselho de administração se, como verificámos, um só homem pode tomar por si próprio todas as medidas necessárias ao bom funcionamento dos serviços de toda esta máquina complexa que é o hospital e se este mesmo homem tem poderes específicos para a introdução de novos produtos, como medicamentos, sondas, etc.? Um homem tão sábio e com tantas qualidades, só de facto nomeado por V. Ex.ª Sr.ª Ministra. Tanto atrevimento, anacronismo e irrealismo! Será isto fruto do desconhecimento da vida hospitalar?
Outros exemplos da aberração deste conselho de administração: como compatibilizar as competências do director clínico, referidas no artigo 15.º, alíneas b), c) e d), com as do administrador-geral, definidas no artigo 12.º, alínea b), se as opiniões não coincidirem? O mesmo se pode perguntar a respeito das competências do enfermeiro director do serviço e enfermagem [artigo 17.º, alínea f)].
Quem decide nestes casos? O conselho de administração? Mas como, se são as pessoas em causa que o constituem? Será que pelo facto de serem nomeados serão bons juízes em causa própria?
Eis algumas das razões por que não se pode confundir o órgão de administração com o órgão de direcção, como o Governo o fez. Isto equivale a colocar o juiz a julgar-se a si próprio.
A actuação pública de V. Ex. ª e também os decretos-lei em discussão revelam bem o espírito de oposição a tudo e a todos, embora disfarçado neste caso com interesse pelos doentes! Este espírito é tão forte que todo o Conselho de Ministros assinou este monstrozinho que é o Decreto Regulamentar n.º 3/87, de 9 de Janeiro. Imagine a Sr.ª Ministra o que seria para os doentes se os técnicos de saúde cometessem erros tão grosseiros!
Não se pode deixar de abordar também o problema de nomeação versus eleição, de que se faz cavalo de batalha para ver se se encobrem outros erros.
Como é sabido, o conselho de gerência instituído pelo decreto-lei 30/77, de 20 de Maio, agora revogado, era composto por quatro elementos: dois eleitos - o médico e o enfermeiro - e dois de carreira - o administrador e o engenheiro. V. Ex.ª afirma constantemente que a razão do mau funcionamento dos hospitais reside no facto de todos os elementos não serem da nomeação directa do Ministro. Seria óptimo se assim fosse, pois ficaria tudo resolvido hoje aqui mesmo, porque nós votaríamos este projecto. Será que conhece o funcionamento das ARS, cujos elementos responsáveis pela gestão são todos nomeados pelo Governo? Sabe que, apesar disso, por esse país fora os doentes começam a fazer bicha, à uma da madrugada, às portas de alguns centros ou postos de saúde para terem direito a uma senha de consulta às 8 horas?
E a instabilidade política e funcional que tem existido sempre a nível das ARS provocada peio facto das mudanças constantes efectuadas pelos respectivos ministros, acrescendo ainda, salvo honrosas excepções, que para a maior parte dos cargos são nomeados puros amadores! E se os hospitais funcionam com problemas, muitos deles são causados pela instabilidade e desorganização descrita nas ARS.
Depois destes exemplos perguntamos: será, de facto, para melhorar os hospitais que se querem nomear todos os responsáveis da administração? Não acreditamos.
V. Ex.ª, Sr.ª Ministra, é inteligente e conhece o que se passa. O Governo quer nomear os responsáveis por interesses pessoais e partidários.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - O poder não está em nomear as pessoas;, o poder está no planeamento, no controle, na avaliação. O Governo, ao pretender nomear os elementos do conselho de administração dos hospitais, é o responsável por transferir para aí toda a instabilidade e o amadorismo que caracterizam as ARS e prejudica gravemente os hospitais - sector da saúde que ao longo de todo este tempo se tem mantido mais estável e operacional- e será igualmente responsável pelo desinteresse profissional que a instabilidade acaba por provocar.
O Ministério não tem sido capaz de responder às necessidades concretas dos hospitais: há mais de quinze anos que não abre concurso para a progressão na carreira médica, ao ponto de os chefes de serviço dos hospitais civis de Lisboa serem na quase totalidade técnicos com mais de 55 anos; não preenche os quadros dos hospitais e quando abre concursos estes demoram quase dois anos a concluir-se, embora o júri seja nomeado pelo Ministério.
E que dizer do planeamento da responsabilidade dos serviços centrais? Se os contribuintes tomassem consciência de quanto lhes custa e irão custar estes erros da responsabilidade do Ministério da Saúde, o que pensariam eles deste Ministério, que os vai convencendo que os médicos neste país são os responsáveis por todos os males?!
Como largamente ficou demonstrado, a gestão dos hospitais aprovada é asfixiante e é prejudicial aos utentes. Logo, não a podemos aceitar. O PRD está vivo e concretamente interessado em melhorar o nível de saúde dos Portugueses e está disposto a colaborar com todos os partidos e com o próprio Governo na aprovação de legislação que garanta a todos o direito à saúde. O PRD quer definir um novo hospital que preste aos doentes um serviço de boa qualidade técnica e personalizada, só possível com um sistema de gestão participado, descentralizado e desconcentrado, como o impõem os interesses do doente, a Constituição e a Lei do Serviço Nacional de Saúde.
Queremos ainda que o hospital seja considerado como um pólo de desenvolvimento económico, social e científico. Não desbaratemos a qualidade dos quadros técnicos que possuímos.
Dentro destes princípios, pode o Governo e o País contar com o PRD.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Se algum Sr. Deputado ainda não votou, agradeço o favor de o fazer porque as umas encerram às 19 horas e 30 minutos.
Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Dias de Carvalho, inscreveram-se os Srs. Deputados Duarte Lima e Valdemar Alves. Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

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O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Dias de Carvalho, V. Ex.ª começou a sua intervenção com um remoque pessoal à Sr.ª Ministra da Saúde, dizendo que muitas vezes ela aparecia com ar decidido e auto-suficiente. Nós achamos que realmente ela aparece com um ar decidido e não auto-suficiente. Porém, na intervenção que o Sr. Deputado formulou afirmou que ela era auto-suficiente e pouco decidida. Ora, é precisamente o contrário.
O Sr. Deputado começou por dizer que o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos fez a introdução ao problema político e que a intervenção de V. Ex.ª iria ser essencialmente técnica. Ora, pareceu-me que a sua intervenção foi também política e era sobre algumas questões políticas que gostaria de o interrogar.
O Sr. Deputado disse que o Governo legislou, estando um projecto de lei do PRD sobre esta matéria pendente nesta Assembleia da República, o que significaria entrar em conflito com a Assembleia. Esse é o estafado argumento que VV. Ex.ªs agora utilizam todos os dias!
Sr. Deputado, é bom que fique claro que o Governo legislou numa matéria em que constitucionalmente pode legislar. Esta é uma matéria em que a iniciativa é concorrencial entre o Governo e a Assembleia da República e este não está inibido de legislar pelo facto de a Assembleia apresentar um projecto de lei. Se assim fosse, os senhores apresentavam 40 ou 50 projectos de lei sobre todas as matérias em que o Governo pretendesse legislar e este, pura e simplesmente, ficava paralisado. Portanto, esse argumento não tem nenhuma cobertura constitucional.
Relativamente à gestão corporativa, não sei se V. Ex.ª pretenderá ou não dar algum novo contributo, em termos semânticos, para aquilo que é uma gestão corporativa. Porém, gestão corporativa não é aquela que se estabelece no diploma do Ministério; é, antes, a actual, se quer falar dessa maneira. A gestão corporativa feita de dentro é a actual e não aquela que o Governo pretende impor. Portanto, penso que o Sr. Deputado deve estar equivocado em relação aos termos.
Finalmente, V. Ex.ª vem também falar de que o Governo nomeia, partidariza, etc. Realmente é esquisito que venha com esse argumento. Penso, pois, que V. Ex.as nunca poderão ir para o Governo porque com esta postura deixam subentender que se fossem para o Governo sempre que tivessem que nomear alguém iriam partidarizar.

Assim, têm que ficar condenados a estar na oposição. Depois de um governo sombra, o PRD, que também não poderá constituir um governo sombra, vai ser naturalmente um governo ensombrado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Dias de Carvalho, V. Ex.ª pretende responder já ou no fim?

O Sr. Dias de Carvalho (PRD): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): - Sr. Deputado Dias de Carvalho, infelizmente não posso adjectivar a sua intervenção, tal como fiz em relação ao Sr. Deputado

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Ferraz de Abreu, porque por baixo de uma falsa humildade e de uma falsa modéstia, apareceu muito de veneno e eu não posso concordar com isso.
O Sr. Deputado falou em monstrozinho e noutros termos que não são apanágio da nossa terminologia. Se comparar este "monstrozinho" com o vosso projecto de lei, verificará que o vosso projecto de lei está ainda nas cascas, porque nem monstro chega a ser.
Com muita franqueza, frontalidade e um veemente repúdio, gostaria de o chamar à atenção para o facto de ter responsabilizado as ARS pelo mau funcionamento dos hospitais. O Sr. Deputado não deve conhecer minimamente o que é uma ARS nem o que é um centro de saúde; deve estar metido dentro da quinta do seu hospital e, portanto, virado para dentro, sem conhecer a realidade de fora. Ë um facto que as ARS não funcionam bem e que os centros de saúde, que são dirigidos por colegas seus, também não funcionam bem.
Gostaria que me dissesse, muito frontalmente, se 1500 utentes para cada médico de clínica geral é muito ou pouco. Se cada um cumprir as 36 horas semanais - o que dá 7 horas por dia -, numa unidade de saúde que tem 1300 ou 1400 utentes (e digo utentes e não doentes), isso é ou não suficiente?
Sr. Deputado, não se digam coisas em relação às quais não se tem um profundo conhecimento.
Quando uma ARS quer entrar num hospital não consegue; se quer uma consulta da especialidade não tem e espera meses; ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Ora aí está!

O Orador: -...se quer um elemento, um diagnóstico ou uma terapêutica, não tem; ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Ora aí está!

O Orador: -...tenta-se o diálogo e não obtemos resposta. Vem agora o Sr. Deputado, invertendo a situação, talvez porque é médico de um hospital, responsabilizar uma instituição que nada tem a ver com isso.
Vamos todos cumprir e ver quem é que não quer trabalhar, quem é que não quer colaborar.
A defesa da interligação cuidados primários/cuidados diferenciados tem sido a nossa luta de há muitos anos, e ainda não obtivemos resposta, Sr. Deputado.
Não queira inverter os papéis. Vamos abrir os hospitais, tal como as ARS o fazem, para a comunidade; vamos fazer intercâmbio; vamos colaborar conjuntamente e, depois, vamos ver quem está fechado ao diálogo.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (PRD): - Sr. Deputado Duarte Lima, no princípio da sua intervenção, voltou a repetir uma questão que já aqui foi clarificada por mim quando aqui falei nesse assunto. Penso que não vale a pena estarmos a perder tempo, uma vez que o assunto está devidamente assente.
Penso que devia haver um certo entendimento entre, pelo menos, a Assembleia da República e o Governo no que diz respeito a matéria concorrencial, para mais quando existe um projecto de lei sobre esse assunto.

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Penso que é, pelo menos, uma questão de ética avisar as pessoas e não fazer como a Sr.ª Ministra, que quando na Comissão de Saúde, Segurança Social e Família foi interrogada, disse que não respondia sobre o que é que o Governo tinha sobre legislação relativa à gestão hospitalar.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - É um direito que ela tem!

O Orador: - Ela tem o direito de fazer isso, mas creio que não é correcto.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não é preciso estar tudo na lei. Acho que o consenso habitual e o convívio normal entre as pessoas também é alguma coisa, sem que seja preciso estar tudo na lei, senão passamos a ser um país excessivamente burocratizado em que temos que andar com o código no bolso para ver o que é que podemos fazer.
Não é, pois, esse o nosso entendimento pela vida, Sr. Deputado.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à gestão corporativa de que acusei este órgão, repito que ela é corporativa, altamente corporativa, porque traz para o órgão máximo de gestão hospitalar o médico e o enfermeiro que, sendo órgãos de direcção, têm também de organizar o trabalho dos médicos e dos enfermeiros.
Portanto, criar um órgão com esta composição é não ter a noção da diferença entre a administração e a direcção.
O médico e o enfermeiro são órgãos de direcção, mas reúnem-se de vez em quando e, nessa altura, são órgãos de administração. Quando se reúnem vão carrear, vão levar, para o órgão de administração, para o órgão supremo, os problemas do seu sector, pois tanto os médicos como os enfermeiros tenderão a apresentar os seus respectivos problemas.
Ao fazer isto, na prática, este órgão é muito mais corporativo do que o que estava definido na lei anterior, segundo a qual médico e enfermeiro, uma vez eleitos, representavam todo o hospital, e não os médicos ou os enfermeiros. Isto porque para os representar existia a direcção médica e a direcção de enfermagem.
Portanto, este órgão é altamente corporativo, muito mais corporativo do que o anterior.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não percebi nada!

O Orador: - Tenho pena de que não tenha percebido, mas não posso gastar mais tempo. No fundo, acabam por ser todos a julgarem-se a si próprios.
Quanto à partidarização, não quero acusar o actual Governo porque, regra geral, ela tem sido aplicada também por outros. Se olharmos para a nossa Administração encontramos muitos exemplos e se os referisse agora levaria bastante tempo. A partidarização é evidente, sobretudo numa Administração como a nossa em que quando muda o Governo muda tudo. A Administração que temos leva facilmente à partidarização e, portanto, levará à partidarização dos órgãos inferiores, e nós não queremos a partidarização dos hospitais.

O Sr. Deputado Valdemar Alves defendeu as ARS e eu compreendo-o, porque o Sr. Deputado é um elemento das mesmas.
Mas, Sr. Deputado, na realidade, as ARS têm sido o sector da saúde mais desestabilizado em Portugal, pelas razões que apontei e que não quero estar a repetir.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que os centros de saúde funcionam mal, mas eles dependem das ARS. Elas é que mandam nos centros de saúde. Directamente, as ARS também são responsáveis pelo mau funcionamento dos centros de saúde. Isto porque, dentro desta lógica de que as ARS são da responsabilidade do Ministério e de que isso melhora a gestão, a gestão dos centros de saúde e o seu funcionamento devia ser muito melhor do que a dos hospitais. Mas isso não acontece. O funcionamento das ARS e dos centros de saúde é muito pior do que o dos hospitais.

O Sr. Presidente: - Pergunto se está presente algum Sr. Deputado que ainda não tenha votado.

Pausa.

Como ninguém se manifesta, declaro encerradas as votações em curso e peço aos senhores deputados escrutinadores o favor de procederem aos escrutínio.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde (Leonor Beleza): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entenderam três partidos da oposição chamar a processo de apreciação, nos termos do artigo 172. º da Constituição, o Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro, que aprova a Lei Orgânica Hospitalar.
Quase não se ouviram até agora, nesta Assembleia e fora dela, críticas ao conteúdo do referido decreto-lei. Parece mesmo que, sobre os seus princípios, há um notável nível de acordo. Porquê então a chamada a apreciação do referido texto?
È que ele comete ao Governo, no seguimento do que já anteriormente fora feito sem que ninguém protestasse, e no âmbito do poder regulamentar que indiscutivelmente lhe cabe, emitir por decreto a fixação e o regime dos órgãos de gestão hospitalar.
O que o Governo aliás fez, por decreto regulamentar da mesma data do decreto-lei referido, e que esse, sim, tem suscitado alguma polémica e pelos vistos suscita tantas reservas a alguns grupos parlamentares.
Em suma: o que esses grupos querem pôr em causa não é o decreto-lei, mas o decreto regulamentar aqui já discutido, até, na pequenina especialidade.
Aquilo que se quer contestar é que o Governo deva escolher a forma como devem ser designados e compostos os órgãos de gestão de serviços da Administração Pública, cuja condução cabe indiscutivelmente ao Governo; é certo que serviços de particular complexidade e delicadeza, mas serviços da Administração Pública em qualquer circunstância, por cuja actividade pareceria - e certamente parecerá a qualquer cidadão - que o Governo deve ser responsabilizado.
Não vale a pena fingirmos assim que do decreto-lei se trata, pelo que centrarei a minha atenção sobre as regras do decreto regulamentar, que alguns grupos parlamentares querem agora atingir pela via da diminuição da competência do Governo para sobre o assunto decidir.

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E regresso ao que disse há momentos: qualquer cidadão julgará que é o Governo que é responsável pelo que se passa nos hospitais. De facto, se estes são públicos, se são financiados pelo Orçamento do Estado, se são servidos por funcionários públicos, se se inserem na administração pública central, se estão sujeitos à tutela do Governo, que outra coisa poderia o cidadão menos prevenido sobre as originalidades da nossa democracia pensar sobre a questão, aparentemente simples, de saber quem é que manda nos hospitais?
Engana-se, todavia, o cidadão comum. É que não só aqui se está a pôr em causa que deva o Governo decidir livremente sobre as regras que, em matéria de gestão dos hospitais, devem ser adoptadas, como se está - eu diria, talvez sobretudo - a pôr em causa que essas regras devam apontar para um directo e efectivo envolvimento do Governo na escolha de quem dirige os hospitais. Daqui a não querer dar ao Governo aquilo de que ele precisa mesmo para tutelar os hospitais - e ser responsabilizado pelo que neles se passa - não vai senão coisíssima nenhuma.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São extensas e profundas as alterações que o Governo introduziu na concepção e na arquitectura da gestão hospitalar. É de uma verdadeira reforma estrutural, para me servir de uma expressão que continua a ter muito significado, que estamos a falar. Reforma estrutural no âmbito da Administração Pública, a que o Governo entendeu que deveria proceder, sob pena de continuar a ser conivente - por omissão - com um estado de coisas que o cidadão comum, utente e pagante dos serviços de saúde, está farto de sofrer na pele.

Vozes do PSD - Muito bem!

A Oradora: - Reforma que decorre da dupla consciência, por um lado, da ilegitimidade originária do sistema que estava em vigor de gestão hospitalar e, por outro, da degradação e desperdícios por que em boa verdade e em grande parte é responsável; reforma urgente, que pelo menos já os dois Governos que nos antecederam diagnosticaram no essencial como necessária. Reforma que não deveria ter de esperar pelo funcionamento demorado da pesada máquina legislativa da Assembleia, porque todos os dias nos nossos hospitais se joga a vida e a morte e se sofre muitas vezes mais do que o necessário, porque a máquina está perra, o estímulo é pouco e os interesses de muitos impedem que se vá pelo caminho da seriedade, da eficácia e da disciplina.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quem está no Governo não tem tempo a perder. É que nós temos mesmo de assegurar que as coisas funcionem. Não podemos perder tempo com discussões filosóficas, mecanismos processuais proteladores das decisões ou subtis pretextos para nada fazer. E neste governo temos pressa. Temos pressa de proporcionar aos Portugueses o nível de vida e de bem-estar que eles merecem tanto como os nossos novos parceiros comunitários.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso também não gostamos de ficar por meio caminho. Se julgamos que uma solução é mesmo a boa, então porquê escolher meias soluções? Muitos sugeriram-nos, em todo este processo, que quisemos andar depressa de mais. É que, Srs. Deputados, é muito o caminho que nos afasta da Europa em que nos integrámos.
Se a solução correcta é uma, por que não dar o salto para ela, em vez de tentarmos eternamente conciliar com um passado excessivamente original e nos determos por meias-tintas ou soluções de compromisso, quando está ao nosso alcance fazer melhor? A legislação hospitalar que alterámos tinha dez anos de vigência. Querem esperar mais dez anos quando nos podemos pôr já a par do que são as boas soluções, aquelas que todos sabem - mas todos sabem mesmo - que um dia ou outro vamos ter de escolher? Porquê contentarmo-nos com meia Europa, por assim dizer, se o passo pode ser já muito mais ambicioso e realista?
Se são extensas e profundas as alterações que a nova legislação introduziu, se todas elas se reconduzem às ideias de descorporativizar e de homogeneizar, de reduzir conflitos e de conferir autoridade e responsabilidade aos órgãos de gestão hospitalar, como já se viu, uma questão suscita particular discussão: é a de ter o Governo substituído a anterior eleição dos membros do conselho de gerência por nomeação dos membros do novo conselho de administração.
Nomeação versus eleição, eis ao fim e ao cabo a grande questão.
Enfrentemo-la, pois.
No anterior processo de designação dos membros do conselho de gerência, dois deles eram eleitos pelos trabalhadores do hospital: um médico, o director do hospital, e um enfermeiro, aquele eleito pelos médicos e o outro pelos enfermeiros.
Isto é, o órgão máximo de gestão do hospital era de facto escolhido por quem trabalhava no hospital. A autoridade máxima, o director, era um médico escolhido pelos seus colegas. Ao Ministro da Saúde não restava senão homologar quem os médicos do hospital tinham escolhido, pôr-lhe na mão um orçamento e mantê-lo em funções quer ele gerisse bem quer não; se gastava mais do que o orçamentado, o Ministro só podia mandar cobrir indefinidamente o défice, se não mantinha a disciplina, o Ministro só podia enviar fiscais e inspectores ao hospital. Uma vez terminado o mandato, de novo só aos colegas do médico director cabia dizer se ele devia continuar ou não nas suas funções.
Esta solução, que uns chamam de gestão "democrática", significava que o hospital existia para os seus trabalhadores: era gerido por quem e como eles quisessem. E os utentes do hospital? E os doentes? E os cidadãos que pagam o hospital? Esses não tinham nenhuma palavra a dizer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Mas o hospital existe para quem? O hospital é para os médicos, os enfermeiros e os outros profissionais de saúde ou é para quem precise de ser tratado neles?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - É para o Governo!

A Oradora: - Onde há conflito entre os interesses dos utentes e os interesses dos trabalhadores - e há sempre esses conflitos, extensos e inevitáveis -, quais são os interesses que devem prevalecer?

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O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Para a lei anterior, e isto tem de ser dito com toda a clareza, acabavam por ser os interesses dos trabalhadores que deviam prevalecer. A lei, ao conferir aos trabalhadores do hospital resolver quem os dirigia, só responsabilizava os dirigentes perante os seus colegas - não perante os utentes, não perante a comunidade e nunca perante a tutela.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A lei nova coloca nas mãos do Governo a decisão sobre quem manda nos hospitais. É que, Srs. Deputados, o Governo, esse, representa os utentes dos serviços de saúde. É que, Srs. Deputados, o Governo, esse, é escolhido pelos cidadãos que usam e que pagam os serviços de saúde. É que, Srs. Deputados, o Governo, esse, é julgado pelos cidadãos quando votam, é responsabilizado nas eleições, como é responsabilizado perante este Parlamento. O Governo, se actua mal, se serve mal os cidadãos, é punido e é substituído. Os trabalhadores dos serviços de saúde, se escolhiam mal os gestores, se os escolhiam porque eram pouco firmes ou demasiado complacentes, não eram responsabilizados perante nada nem ninguém.
É isso a democracia? Democracia é ser livre e também ser responsável. Que democracia é essa que retira das mãos de quem deve ser servido e de quem legitimamente representa esses a escolha dos dirigentes? Não é de regras democráticas que falamos, Srs. Deputados, mas de regras antidemocráticas.
Será razoável, Srs. Deputados, que se desconfie sistematicamente do Governo - não deste, mas de qualquer um -, do Governo democrático e legítimo do País, como se se compusesse necessariamente de gente incapaz de servir com isenção? Será razoável partir do princípio de que o Governo escolhido livremente pelos cidadãos em democracia vive sempre obcecado por servir clientelas partidárias e interesses inconfessáveis? Que democracia é esta que uma dúzia de anos depois da liberdade reconquistada continua tão desconfiada de si própria e dos mecanismos democráticos de controle do poder?
Aplausos do PSD.

Há certas coisas que compreendemos vindas daqueles de quem a democracia nos há de livrar de ver no Governo. Mas dos outros não: será que eles se vêem a si próprios como incapazes de imparcialidade?
Não preocupa excessivamente o Governo a contestação de alguns sectores, demasiado envolvidos no anterior sistema de gestão para o olharem com isenção. É que não é por causa desses sectores que procedemos à reforma do sistema. Procedemos a essa reforma porque em nossa opinião ela serve melhor os cidadãos, não obviamente por julgarmos que ela é mais conforme aos interesses dos profissionais de saúde.
Alguns têm querido ver nesta afirmação - que é a expressão fundamental da política que temos seguido - uma desconfiança permanente para com os trabalhadores do Ministério da Saúde e um julgamento necessariamente negativo para com tudo o que fazem. É óbvio que é falso e são claras as intenções de quem imputa ao Governo tal tipo de atitude. Não tenho dúvidas nenhumas sobre a competência e a dedicação da generalidade dos profissionais de saúde, nem sobre o espírito de serviço de muitos daqueles que têm sido eleitos para o exercício de cargos de gestão nos hospitais. Não se trata agora de julgar pessoas ou classes de trabalhadores. Trata-se simplesmente de reconhecer - e reconheço com toda a frontalidade- que os interesses dos profissionais podem aqui, como em todos os outros sectores, entrar em conflito com os interesses dos utentes, e que isso deve bastar para que se estabeleçam regras que impeçam a inversão da consideração correcta da hierarquia desses interesses. Trata-se ainda de reconhecer que os trabalhadores do sector fazem parte da máquina de que disponho para melhor servir os cidadãos. Permito-me, assim, gostosamente, assimilá-los á minha própria posição como sendo todos nós servidores desses cidadãos e em consequência considero que aquilo que deles exijo de alguma forma exijo de mim própria.
Algumas breves considerações ainda, para terminar.
Certos sectores têm reagido mal a que se fale de gestão empresarial a propósito dos hospitais. É uma expressão que choca alguns, que querem nela ver como que a ideia de que os hospitais deveriam gerar lucros.
É claro que tal ideia não deveria passar pela cabeça de ninguém quando estamos a referir-nos aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. Eles não têm manifestamente por fim gerar lucros, mas algo de infinitamente mais nobre - preservar a vida e a saúde dos cidadãos.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Os critérios de rentabilidade que desejamos ver consagrados na gestão dos nossos hospitais não podem em circunstância alguma deixar de visar que sejam prestados serviços da melhor qualidade possível ao maior número de cidadãos.
Mas o que ninguém deve esquecer é que estes objectivos implicam gerir melhor. Implicam não desperdiçar recursos. Hoje dispomos de meios adequados a julgar quais são os recursos necessários para tratar os doentes nos hospitais, consoante o tipo de patologia em causa. Dispomos de elementos de comparação entre o que se passa em vários dos nossos hospitais, bem como de comparação com o que se passa em hospitais estrangeiros. É possível saber se o tempo de trabalho e o tempo de ocupação de uma cama hospitalar com um doente é adequado, excessivo ou insuficiente.
Sejamos mais precisos. Sabemos que o tempo pago em média a um médico por doente internado em enfermaria de medicina é entre nós cinco vezes superior ao que seria necessário. Sabemos que o tempo gasto, em média, por análise em laboratório de hospital é com frequência o triplo do que seria razoável. Sabemos que o tempo de internamento é, por variadas razões, e sobretudo por desadequada organização interior do hospital, manifestamente superior, em média, ao que seria necessário. Sabemos que as salas de operações dos hospitais funcionam as mais das vezes metade do tempo do que seria possível.
Que é que nós queremos quando falamos de melhor gestão? È muito simples: queremos que uma utilização racional e total daquilo que temos, em pessoal e em material, faça que os doentes esperem menos pelas consultas, pelas análises, pelas operações, que passem menos tempo no hospital, que este sirva mais depressa e melhor.

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Sabemos que isto é possível. Há hospitais, mesmo entre nós, que gastam o dobro, em tempo e em pessoal, do que outros para obter o mesmo resultado. Poderiam, melhor geridos, tratar no mesmo tempo o dobro dos doentes.
O que no Governo queremos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é tão-só que melhor gestão conduza a menos sofrimento.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados faltam pouco mais de dez minutos para as 20 horas e como os pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra e as respectivas respostas levarão a que os nossos trabalhos se prolonguem muito para além das 20 horas, pergunto se há consenso para que assim se faça.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, pela nossa parte não temos nada a objectar a que se formulem desde já os pedidos de esclarecimento e que a Sr.ª Ministra dê as respostas que entenda dar e que, portanto, os trabalhos só sejam dados por encerrados depois disso. De qualquer maneira, em nossa opinião, deve ficar clarificado que o debate prosseguirá amanhã.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que na questão que coloquei essa situação estava implícita. No entanto, agora, com a intervenção de V. Ex.ª ficou explicito que assim será.
Creio poder depreender que não há objecções a que assim se proceda.
Para formular pedidos de esclarecimento inscreveram-se os Srs. Deputados Vidigal Amaro, Zita Seabra, António Capucho, Horácio Marçal, Sá Furtado, Defensor de Moura, Ferraz de Abreu, Santana Maia, Raul de Castro e Dias de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr.ª Ministra da Saúde, V. Ex.ª começou por referir que não se ouviram críticas a este diploma dentro ou fora da Assembleia da República.
A primeira pergunta que lhe quero colocar é se a. Sr.ª Ministra não esteve na Comissão de Saúde, Segurança Social e Família onde se debateu esta matéria e se não ouviu a posição majoritária dos diversos partidos sobre a mesma.
Houve, então, uma contestação absoluta - pelo menos assim o entendi - e esse resultado vê-se hoje, durante esta discussão.
Mas isso não se passou só na Comissão de Saúde, Segurança Social e Família.
Recebi, o que certamente foi também enviado à Sr.ª Ministra, opiniões expressas pelos sindicatos dos médicos, pela Ordem dos Médicos, pelo Sindicato dos Enfermeiros do Sul e Açores, pelos representantes das administrações hospitalares, pela Federação dos Sindicatos da Função Pública, pelas Associações dos Técnicos de Engenharia e por diversos hospitais, como sejam o Hospital de Cascais, Hospitais Civis de Lisboa, Hospital de Vila Nova de Gaia, Hospital de Aveiro, etc., etc.

Vozes do PSD: - E não recebeu opiniões expressas pelos doentes?

O Orador: - O que o meu grupo parlamentar e a Comissão de Saúde, Segurança Social e Família não receberam foi uma única voz que se levantasse na defesa do seu projecto.
Esta é a realidade que tenho constatado.
A Sr.ª Ministra procura retirar totalmente ao Governo a responsabilidade pelo caos em que se encontram os hospitais e transferir para a gestão dos hospitais a responsabilidade da situação em que os mesmos se encontram.
Mas não é a Sr. e Ministra que tem a tutela sobre essa gestão? Esses órgãos não são civil e criminalmente responsáveis pelas eventuais irregularidades que cometam? Não são os gestores hospitalares nomeados pelo Governo? Quantas sindicâncias promoveu o seu Governo aos actuais órgãos de gestão?
Que responsabilidade pode ter um hospital por receber 800 doentes num serviço de urgência para o qual não está adaptado? Não será isso responsabilidade do Ministério? Ou será que essa responsabilidade cabe aos gestores hospitalares?
Que responsabilidade pode ter uma direcção de serviços quando a capacidade desses mesmos serviços é para 25 doentes e tem lá 60, alguns em cima de macas, caindo delas abaixo e partindo braços, quando não é pior? Que responsabilidade têm as direcções clínicas e as pessoas que lá trabalham?
Essa responsabilidade não será de V. Ex.ª , do Governo deste país?
Diz a Sr. 0 Ministra que não há estruturas, que tem pressa, e anda sistematicamente a falar dos hospitais ocidental e oriental de Lisboa, mas quando se discutiu aqui o Orçamento do Estado verificou-se que não estavam previstas verbas para esses hospitais. No entanto, a Sr.ª Ministra continua a dizer na televisão e em todos os órgãos de comunicação social, fazendo demagogia da mais barata, de que aqueles problemas vão ser resolvidos com esses hospitais.
Esta é a verdade, Sr.ª Ministra.
Tenho a impressão que consigo citar as palavras da
Sr.ª Ministra quando afirmou: "A máquina está perra. O estímulo é pouco e os interesses de muitos impedem que se vá pelo caminho da seriedade, da eficácia e da disciplina."
Sr.ª Ministra, que a máquina está perra todos o sabemos; mas está-o porque não são dados aos hospitais nem às suas direcções e à sua gestão os meios técnicos, financeiros e humanos capazes para esses serviços serem bem geridos.
Serão os gestores que vão ser nomeados por V. Ex.ª que suprirão estas necessidades, estas carências? Será que esses gestores é que vão pôr a funcionar as administrações regionais de saúde, de maneira a que os cuidados primários não caiam todos em cima dos cuidados diferenciados, não caiam todos nos hospitais, o que, efectivamente, provoca o mau funcionamento destes.
Muito seriamente, gostaria de saber que razões leva-
aram a Sr. Ministra a insinuar que os actuais gestores não são sérios, honestos e competentes.

Se a Sr.ª Ministra tiver alguma razão que lhe garanta tal facto, tem toda a possibilidade de a denunciar e de responsabilizar criminalmente esses gestores, pois a Sr.ª Ministra é o órgão de tutela.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Para terminar, refiro o facto de a Sr.ª Ministra falar muito nos utentes, mas é precisamente a Sr.ª Ministra que lhes retira todo o poder de fiscalização e de avaliação que tinham no anterior decreto de gestão hospitalar.
Como a Sr.ª Ministra sabe, os conselhos gerais tinham a possibilidade de aprovar os orçamentos e de fiscalizar. Hoje em dia, os actuais conselhos gerais, nos quais esses doentes têm participação efectiva, são meros órgãos emblemáticos que não fazem mais do que dar conselhos e avaliar estatísticas.
A Sr.ª Ministra que se preocupa tanto com os utentes, não acha que estes deveriam ter uma maior participação na gestão, na avaliação e realização de programas hospitalares?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr.ª Ministra da Saúde, quero colocar-lhe algumas questões que me foram suscitadas pela sua intervenção.
Creio que a Sr.ª Ministra focou a questão que consideramos fundamental em relação a esta legislação.
Pela nossa parte sempre admitimos a possibilidade de alterar questões que estejam erradas ou de alterar uma legislação que tem dez anos de cumprimento e que, num ou noutro ponto, se pode ter mostrado desactualizada da realidade ou das necessidades.
A questão chave que está em causa, que foi o que nos levou a chamar este decreto a ratificação e a avisá-la previamente que o faríamos, é a questão da eleição ou não eleição, da gestão democrática ou não gestão democrática dos hospitais.
A Sr.ª Ministra fez todo um conjunto de considerações teóricas, contestando essa gestão democrática, contestação essa que poderíamos resumir ao seguinte: os trabalhadores escolhem os seus representantes, e fazem-no não em função do interesse dos utentes ou do da instituição que servem, mas em função dos seus interesses corporativos. Isto é, elegem aqueles que serão mais "baldas" e que lhes consentirão que trabalhem menos e não aqueles que ponham a instituição a trabalhar.
Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se teremos a sorte de nunca a ver na pasta da educação para voltarmos a ver os reitores nomeados pelo Governo em lugar de serem eleitos pelas faculdades, pela universidade?
Acha a Sr.ª Ministra que os professores universitários são gente muito mais séria, muito mais digna do que os médicos e os enfermeiros?
Quanto à gestão democrática nas faculdades, na qual já deve ter participado, tanto mais que é professora universitária, acha que quando a Faculdade de Direito de Lisboa elege o seu conselho directivo está a eleger aqueles que vão defender os interesses corporativos dos assistentes, dos professores, dos monitores e não o funcionamento democrático da escola, com toda a experiência altamente positiva que isso trouxe à universidade portuguesa? Ou acha que os assistentes, os professores de Direito, são melhores do que os médicos e os enfermeiros, que, fazendo a sua escolha por esse critério, nem sequer deveriam ter direito a voto para eleger a Assembleia da República?
A Sr.ª Ministra argumenta que se eles escolhem, fazem-no corporativamente, e que o Governo nomeia gente honesta, gente de trabalho.
Reporto-me, então, à experiência das comissões instaladoras dos novos hospitais, cujas nomeações são feitas pelo Governo, como por exemplo no Hospital do Barreiro, que, praticamente, não está a funcionar, no Hospital de Santarém, que, praticamente, também não está a funcionar, no Hospital de Coimbra, que não está igualmente a funcionar - refiro-me ao novo Hospital de Coimbra, aquele que custou 14 milhões de contos e que a Comissão de Saúde, Segurança Social e Família teve oportunidade de visitar -, pergunto-lhe se a experiência é mais positiva nesses hospitais do que a dos órgãos de gestão eleitos.
Com isto não estou a responsabilizar as comissões instaladoras nomeadas pelo Governo para esses hospitais, mas a responsabilizar o Governo porque, evidentemente, não cometo o mesmo erro que a Sr.ª Ministra comete ao tentar responsabilizar as comissões de gestão dos hospitais pelo mau funcionamento que os mesmos possam ter.
Graças ao PSD, quando anteriormente esteve no Governo, as ARS são de nomeação governamental, isto é, os cuidados primários de saúde dependem directamente da Sr.ª Ministra e relativamente a eles não têm aqueles gravíssimos problemas que diz ter em relação aos hospitais para poder "mandar" nos centros de saúde ou em todas as outras unidades de cuidados primários que dependem já de gestores nomeados pelo Governo.
Mais, ai verificamos que os critérios de nomeação que o PSD usou, sempre, agora ou anteriormente, não são critérios de competência, mas de compadrio. Assistimos à situação de muitos ex-deputados que não entraram nas listas do PSD e que nada têm a ver com saúde serem nomeados gestores de ARS.
Sr.ª Ministra, nessa distribuição de "tachos" acha que têm funcionado critérios de competência ou, antes, que assistimos, como, por exemplo, no Algarve, à sua distribuição entre o PSD e outros partidos, ficando o turismo para uns, a ARS para outros, consoante os desempregados que cada um tem (refiro-me a desempregados políticos)?
Termino dizendo à Sr.ª Ministra que revela uma desconfiança terrível em relação aos trabalhadores que dependem da Sr.ª Ministra, do ponto de vista do Ministério, como sejam os médicos, os enfermeiros e os outros trabalhadores da saúde.
Pensamos que isso é grave para quem tem poder. É grave para qualquer ministro. É perigoso para a democracia.
Mas a Sr.ª Ministra revela ainda uma outra coisa, que é uma incapacidade total de governar o seu Ministério e, por isso mesmo, arranja lobbies nos conselhos de gerência dos hospitais, nos médicos, nos enfermeiros e em tudo aquilo que pode ser responsabilizado para escamotear uma coisa que é a sua capacidade de melhorar a situação dos doentes em Portugal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr.ª Ministra da Saúde, o que ressalta da intervenção de V. Ex.ª é fundamentalmente, quanto ao ponto crucial do debate que está aqui a decorrer, uma diferença nítida quanto à forma de eleição. Enquanto V. Ex.ª preconiza um método que pode responsabilizar em primeira linha o Governo por aquilo em que ele é de facto responsável

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e por aquilo que a opinião pública o responsabiliza, privilegiando ao mesmo tempo os interesses dos utentes das unidades hospitalares, temos, por outro lado, uma postura «neocorporativa» que manifestamente privilegia os interesses dos trabalhadores das unidades em causa.
Afigura-se-me que a postura de V. Ex.ª não é abstrusa por variadíssimas razões.
Em primeiro lugar, porque levada às últimas circunstâncias essa fórmula teria de ter aplicação noutros serviços públicos, por exemplo, na Rodoviária Nacional, onde não seria o Governo, nem os utentes, a nomear o conselho de gestão, mas sim os trabalhadores.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra não me venha com o caso dos reitores, porque quem também elege os reitores são os alunos e eles são utentes. Não se esqueça disso, porque há uma diferença abissal!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - O conselho geral do hospital também tem utentes!

O Orador: - Não é abstrusa, em segundo lugar, porque tanto quanto me é dado saber não é um modelo novo nem diferente daquele que ocorre na generalidade dos sistemas que vingam por essa Europa fora e, em terceiro lugar, porque não tenho má memória e recordo-me de que em governos anteriores de que fiz parte, de resto com muita honra, esta matéria foi debatida profundamente e, ao contrário do que aqui foi referido, esteve pronto um diploma - era Ministro da Saúde o Sr. Maldonado Gonelha - que preconizava um esquema, tanto quanto me lembro rigorosamente igual ao que V. Ex.ª vem agora preconizar e que referia a possibilidade de indicação de três nomes, dos quais o Ministro selecciona um.
Posso estar enganado e a minha memória falhar quanto a este aspecto, mas tanto quanto sei os socialistas enquanto tiveram responsabilidades governamentais defenderam um processo que era, pelo menos, diferente do que está hoje em vigor e, se bem me recordo, não era diferente daquele que V. Ex.ª aqui defendeu.
De resto, também não era grande inovação, porque tanto quanto me recordo, num governo anterior, o então ilustre militante do CDS, Dr. Luís Barbosa, apresentou um sistema idêntico.
Não há nada de escandaloso nisto e a postura de V. Ex.ª é a única que pode proporcionar, a quem tem a responsabilidade cimeira nesta matéria, a possibilidade de a assumir e a possibilidade de poder ser responsabilizado pelas respectivas falhas. Se não, entramos num qualquer sistema autogestionário, moderno, que se calhar nem a suposta «primavera gorbacheviana» poderá introduzir na União Soviética.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Outra vez? Essa já não é nova!

O Orador: - Mas estamos em Portugal e achamos bem que a Sr.ª Ministra prossiga na sua intenção de moralizar e dotar os conselhos de administração dos hospitais -assim chamados se prevalecer a tese do Governo, o que espero que aconteça- de órgãos que possam ser plenamente responsáveis perante o Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - A Sr.ª Ministra está de acordo com o Sr. Deputado António Capucho. Claro, ele não perguntou nada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marcai.

O Sr. Horácio Marcai (CDS): - Sr.ª Ministra da Saúde, ouvi-a com muita atenção e, a dado passo da sua intervenção, V. Ex.ª referiu que as críticas se dirigem mais ao decreto-lei do que propriamente ao decreto regulamentar. Contudo, parece-me que este último depende do primeiro, pelo que se não for aprovado o decreto-lei o decreto regulamentar não fica em vigor.
Por outro lado, a Sr.ª Ministra referiu que tem pressa em que as coisas funcionem e funcionem bem. A questão que coloco a V. Ex.ª é a seguinte: por que não tentou o Governo, através da Sr.ª Ministra, um consenso prévio com os vários partidos ao nível de comissão especializada da Assembleia da República? É que o Governo tem o direito de legislar, mas se tivesse seguido essa metodologia, com certeza que teríamos uma lei hospitalar que entraria em vigor mais depressa do que esta. É que, sendo de admitir que este diploma não venha a ser aprovado, o País é prejudicado, especialmente os doentes, na medida em que em vez de se apressar se atrasou esta matéria.
Em resumo, eram estas as questões que lhe colocava, porque irei fazer uma intervenção e deixarei para ela algumas das considerações que tenho a fazer sobre este decreto-lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr.ª Ministra da Saúde, afirmou V. Ex.ª que o Governo tem pressa e não tem tempo para discussões filosóficas. Quis V. Ex.ª dizer que o Governo actua baseando-se num voluntarismo empírico sem uma teorização e uma ponderação prévia dos fundamentos e consequências dos seus actos?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Defensor de Moura.

O Sr. Defensor de Moura (PRD): - Apesar de ter uma intervenção preparada sobre este tema não posso, no entanto, deixar de fazer duas correcções e duas perguntas à Sr.ª Ministra da Saúde.
Em primeiro lugar, devo corrigir a Sr.ª Ministra que não é o conselho de gerência o órgão máximo do hospital, porque, como sabe, tanto o Decreto-Lei n.º 129/77 como o Decreto Regulamentar n.º 30/77, diziam que o órgão máximo era o conselho geral, onde os utentes estavam representados através dos autarcas das assembleias municipais e regionais.
A segunda correcção visa esclarecer que, ao contrário do que a Sr.ª Ministra disse, o Ministério da Saúde não se limitava a controlar a gestão através de inspecções. E passo a ler o que referia o Decreto-Lei n.º 129/77:
No exercício do controle de gerência pode o secretário de Estado decidir a colocação nos hospitais de um ou mais delegados seus, sempre que se verificarem deficiências na organização ou funcionamento dos respectivos serviços que julgue insuperáveis em prazo conveniente com os meios pessoais de que dispõe.

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Pergunto à Sr.ª Ministra quantas vezes fez isto, já que diz que há tantos hospitais a funcionarem mal. Esta é a primeira pergunta. A segunda refere-se à nomeação por competência. A Sr.ª Ministra da Saúde assegura aqui, na Assembleia da República, que as nomeações que tem feito para as administrações regionais de saúde e para as comissões instaladoras dos hospitais têm seguido unicamente o critério da competência?

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - A Sr.ª Ministra da Saúde quando fez a sua intervenção referiu-se ao que se passa nos hospitais e às suas carências, como se não tivesse a mínima responsabilidade pelo que lá se passa. Se algumas culpas podem ser atribuídas a deficiências de gestão ou de actividade dos trabalhadores dos hospitais, quem é o responsável pelas carências de meios que deviam ser fornecidos aos hospitais e não o são?
Em segundo lugar, a Sr.ª Ministra referiu algumas situações e citou, por exemplo, o funcionamento do bloco operatório que só funciona até às 14 horas ou 15 horas. Todos sabemos isso, mas para um bloco operatório funcionar das 9 horas da manhã às 19 horas da tarde precisa de dois ou três turnos de pessoal, pelo que pergunto se a Sr.ª Ministra está devidamente informada se há pessoal, nomeadamente a nível de enfermagem, para fazer frente a essas situações ou se está disposta a aumentar os quadros e a conseguir arranjar esses funcionários. É que então depois talvez se possa fazer a crítica dessas situações!
Em terceiro lugar, a Sr.ª Ministra da Saúde mostra-se muito preocupada com as demoras que possam surgir pela não aprovação deste diploma. Mas o que é verdade é que este diploma está feito há seis meses e pelos vistos não procuraram saber qual foi o seu resultado catastrófico a nível do tratamento dos doentes.
Pergunto se o facto de, de um momento para o outro, ter a possibilidade de designar gestores para os hospitais lhe vai resolver problemas como o que recentemente a Sr.ª Ministra teve que resolver, recorrendo para enfrentar uma situação de ponta no Hospital de S. José a um hospital que é hoje quase um pardieiro, que é o Hospital do Trabalho, onde arranjou 30 camas para transferir doentes urgentes entrados no Hospital de S. José, colocando lá dois policlínicos daqueles que a Sr. a Ministra não se cansa de afirmar que são simples aprendizes. Segundo as nossas informações, foi isso que se fez para resolver os graves problemas do hospital em causa.
Por outro lado, a Sr.ª Ministra já tomou em devida conta as disposições apresentadas por todos os directores de serviços do Hospital de Santa Maria e dos outros hospitais civis que há anos andam a referir essas dificuldades, a falta de meios, de instalações, de aparelhos, etc.?
E pode V. Ex.ª afirmou com toda a tranquilidade que a culpa é da gestão, dos trabalhadores e dos seus terríveis inimigos, os médicos, ou o Ministério não tem nada que ver com isto, está perfeitamente inocente e não tem que se preocupar com nada disso?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Santana Maia.

O Sr. Santana Maia (PS): - A Sr.ª Ministra da Saúde fez o seu diagnóstico do mau funcionamento dos hospitais, com o qual não estamos de acordo e, por isso, também discordamos da terapêutica que preconiza.
A Sr.ª Ministra diz que os hospitais funcionam mal e que, portanto, vai procurar responsáveis e responsabilidades. Entretanto, também vai dizendo que o que está mal não são as pessoas é o sistema e porque o culpado de tudo é o sistema, dá-se ao Ministro a livre nomeação das competências, que certamente têm passado despercebidas, e tudo vai ficar resolvido.
Mas, o que pensa a Sr.ª Ministra dos actuais conselhos de gerência? Tem tido conflitos? São maus gestores? Não procuram rentabilizar os hospitais de que são responsáveis? São negligentes? São incompetentes?
Sr.ª Ministra, qual a sua visão global da cota de responsabilidades dos conselhos de gerência no diagnóstico que fez do deficiente funcionamento dos hospitais?
Em relação ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Capucho, queria dizer que, de facto, no tempo do ministro Luís Barbosa esteve em discussão, pelo menos entre algumas pessoas nos hospitais, um projecto de diploma que era sobreponível ao actualmente publicado pelo Governo. No tempo do governo anterior não é do meu conhecimento que aquilo que estava previsto ser feito fosse sobreponível ao que agora nos é apresentado.
De qualquer forma, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que qualquer um desses governos era majoritário e que no governo da AD, em que foi ministro o Dr. Luís Barbosa, foi tal a contestação levantada em todo o mundo da saúde, e sobretudo hospitalar, que o projecto não foi para a frente e que no governo anterior bastou a suspeição de que havia qualquer coisa para o então ministro Maldonado Gonelha ter tido o bom senso de parar o processo e não o prosseguir.
E é este governo do PSD, minoritário, que com as experiências anteriores de que deve ter conhecimento vem aqui defender, depois de publicada, uma legislação de que os deputados só tiveram conhecimento através do Diário da República.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito obrigado. Sr. Deputado, não me preocupa muito que este governo seja minoritário e que os outros tenham sido majoritários. O que é facto é que este governo teve a coragem de avançar com medidas, que podem não ser populares, como aconteceu noutras ocasiões em que parece que o corpo clínico não gostou delas, mas são as soluções que ele entende serem as melhores para os utentes.

O Orador: - Sr. Deputado, devo dizer-lhe que o Governo teve com certeza coragem mas não teve bom senso. E não teve bom senso porque esta legislação vai ser reprovada nesta Câmara!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr.ª Ministra da Saúde, gostaria de lhe pedir alguns esclarecimentos, observando, em primeiro lugar, que a ideia que me fica

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da intervenção que aqui fez é a de que a Sr.ª Ministra apresenta este Decreto-Lei n.º 16/87 como um grande álibi para cobrir a falência da actuação do Ministério da Saúde.
Quer dizer, a Sr.ª Ministra conhece tão bem como todos nós o estado calamitoso e de rotura em que se encontram os serviços de saúde e pretende desculpabilizar-se perante a população dizendo que o Governo para resolver este problema apresentou o Decreto-Lei n.º l6/87. Isto quando, inclusivamente, a Sr.ª Ministra diz que é necessário dar o salto para se atingir o nível dos países da Europa. O salto que há é lógico na sua intervenção, porque era preciso demonstrar que é através do seu sistema de nomeação de gestores, que podem até ser gestores de empresas públicas estranhos aos serviços hospitalares, que se vão resolver os problemas da assistência hospitalar.
Por outro lado, ao fazer a crítica do anterior regime legal, a Sr.ª Ministra diz que o conselho de gerência podia actuar mal que o Governo nada podia fazer. Mas, Sr.ª Ministra, o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 129/77, estabelecia que, no exercício do controle da gerência, o Secretário de Estado da Saúde podia decidir a colocação nos hospitais de um ou mais delegados seus, sempre que se verifiquem deficiências, etc.
Portanto, tratava-se de um poder que o Governo tinha e que não foi usado e, aliás, como já foi para aqui evidenciado, seria necessário apresentar e justificar um outro sistema administrativo e demonstrar os erros e os vícios do actual sistema, o que a Sr.ª Ministra não fez.
Finalmente, a Sr.ª Ministra afirma que não a preocupa a contestação de alguns sectores. Já aqui foram referidos muitos sectores, porque a contestação é generalizada a este decreto-lei, mas gostava de perguntar a V. Ex.ª se também não a preocupa a contestação dos médicos do núcleo dos Trabalhadores Social-Democratas (TSD), da área de Lisboa que, como os jornais de ontem noticiavam, não só (referindo-se aos 1508 policlínicos que estão no desemprego), diziam que isso constituía motivo de grande apreensão como afirmavam que este diploma sobre a gestão hospitalar é um erro da Sr.ª Ministra.
Assim, Sr.ª Ministra, parece que a contestação não é só a dos grupos parlamentares que estão em oposição ao Governo, ela chega aos médicos do seu próprio partido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias de Carvalho.

O Sr. Dias de Carvalho (PRD): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde: - Para poupar tempo, tentarei responder às questões postas, agrupando-as e também só responderei às questões que de facto têm a ver com o que está em discussão.
Muito se disse sobre coisas que se passam mal nos serviços de saúde, mas não será certamente a Ministra da Saúde que dirá que muita coisa se passa mal e que tudo decorre do sistema de gestão. Ninguém disse isso, Srs. Deputados, e não vale a pena perder tempo com essa questão. Aliás, alguns dos senhores deputados, manifestamente, ouviram mal aquilo que eu disse.
Sr. Deputado Vidigal Amaro, eu não disse que não houve contestação ao decreto regulamentar e seria talvez de admirar que não houvesse. O que disse foi que não houve contestação ao decreto-lei, o que é uma coisa diferente.

Risos do PCP.

Em relação ao conselho geral, disse o Sr. Deputado que os utentes estão representados nele, onde podem defender bem os seus interesses. Devo-lhe lembrar, Sr. Deputado, que tem dez anos a legislação que fala do conselho geral e que estabelece um determinado perfil legal para esse conselho. Só que essa legislação nunca foi aplicada. Ora, legislação que é letra morta para que é que serve? Passaram tantos governos e tantos ministros pelo Ministério da Saúde, mas nenhum conseguiu pôr em funcionamento o conselho geral.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr.ª Ministra, permite-me que a interrompa?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr.ª Ministra, gostaria de saber quantos representantes nomeou a Sr.ª Ministra para esses conselhos gerais. Quantos?!

A Oradora: - Nomeei-os em todos os casos em que os hospitais o pediram.
Sr.ª Deputada Zita Seabra, quanto à questão da eleição, da democracia e de todas essas questões levantadas pela passagem de um sistema de eleição para um de nomeação, devo dizer-lhe que não basta haver eleições para haver democracia. Para que haja democracia - e estou a falar de democracia - é preciso que quem escolhe seja quem tem os seus interesses directamente postos em causa. Isto é, nos países democráticos, as eleições que consideramos democráticas colocam nas mãos dos governados, dos utentes, dos cidadãos, a escolha de quem vele por esses interesses.
Estou a falar de democracias, Sr.ª Deputada, não estou a falar de democracias populares, onde o partido escolhe quem governa o povo.

O Sr. António Capucho (PSD): - É diferente!

A Oradora: - Isso é, de alguma maneira, parecido com o que se passa nos hospitais, pois são os funcionários dos hospitais quem resolve quem trata dos interesses dos cidadãos, Sr.ª Deputada. De facto, são realidades diferentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Gostava de saber se alguém nesta Câmara diria haver poder local democrático, se nas câmaras municipais fossem os funcionários a escolher o presidente da câmara! Ninguém certamente diria que havia poder local democrático.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Posso interrompê-la, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr.ª Ministra, se o seu decreto regulamentar e o seu decreto-lei entrarem em vigor, não será no imediato o seu partido que irá nomear os gestores dos hospitais? Isto é, não é no imediato o PSD que vai escolher quem é e quem não é competente para gerir? Afinal, não têm pecado as democracias populares, mas a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Oradora: - Sr.ª Deputada, nós não fazemos nenhuma confusão entre o partido e o Governo. Este governo é do País e, portanto, é o Governo que escolhe.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Deputada falou das comissões instaladoras, nas ARS, das terríveis instabilidades que existem e das nomeações partidárias. Olhe, Sr.ª Deputada, desde que estou no Governo mudei uma comissão instaladora...
No que respeita aos hospitais que funcionam bem ou mal, a Sr.ª Deputada escolheu muito mal o exemplo que deu, pois o Hospital de Coimbra está a funcionar bem. Aliás, 70 % dos serviços já passaram para as novas instalações e só tenho razões para estar satisfeita com aquilo que tem vindo a ser feito.
Relativamente a outras coisas, Sr.ª Deputada, há muitos problemas em muitos serviços de saúde onde há nomeações. Agora, esse não há! Pode haver outros problemas, mas esse problema resultante de os gestores serem escolhidos por eleição não existe, felizmente, em alguns dos serviços de saúde.
No que diz respeito a essa desconfiança que se diz que eu tenho em relação aos trabalhadores, bom, essa já é uma história velha... Não posso vir à Assembleia sem que essa questão seja posta. Mas, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que estou muito mais preocupada com a confiança dos utentes, e certamente virá o momento em que os cidadãos utentes dirão se têm ou não confiança em quem os tem governado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O Sr. Deputado António Capucho referiu, aliás na sequência daquilo que eu própria tinha dito, que os dois governos anteriores tinham tentado introduzir modificações na gestão dos hospitais e tinham feito um diagnóstico que é exactamente o deste governo, ou seja, que as eleições das gestões hospitalares não são um processo correcto de designação dos gestores. E posso dizer-lhe o que é que concretamente foi feito nesses dois casos: no último governo da Aliança Democrática o então ministro Luís Barbosa fez aprovar em Conselho de Ministros um decreto-lei e sucessivamente aprovou um decreto regulamentar, que não chegaram a ser publicados em virtude da queda do Governo, mas em que, de facto, se substituía a eleição por uma escolha pelo Ministro da Saúde. Tenho, aliás, conhecimento directo desses dois diplomas, porque na altura exercia funções governamentais que me davam acesso a esses textos.
Quanto ao que se passou no governo anterior, recebi, quando já era Ministra da Saúde, por parte do Ministério das Finanças, um comentário sobre um projecto de decreto regulamentar que lhe fora enviado pelo meu antecessor. Foi, portanto, por essa via que conheci esse texto assinado pelo meu antecessor, onde se substituía a eleição do presidente do conselho de gerência por nomeação pelo Ministro da Saúde. Não havia nenhuma nomeação pelo hospital nem de um, nem de três, nem de número nenhum de gestores; era o Ministro da Saúde que passava a nomear o presidente do conselho de gerência.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Foram enganados!

A Oradora: - Tenho aqui esse texto, que está assinado pelo meu antecessor e que posso mostrar a quem, eventualmente, quiser vê-lo.

O Sr. António Capucho (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr.ª Ministra, como ninguém da bancada do Partido Socialista lhe faz esse pedido, sugiro a V.ª Ex.ª que mande uma cópia desse documento àquela bancada.
Afinal, parece que sempre tenho boa memória...

A Oradora: - Terei muito gosto em fazê-lo, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Horácio Marçal perguntou-me por que é que não tentei legislar de uma maneira diferente ou por que é que o Governo, antes de emitir legislação, não conversou com os partidos. Já respondi a essa questão quanto intervim, mas, de qualquer modo, sempre lhe digo que o Governo fez uma coisa tão simples como exercer a sua competência legislativa, e tem todo o direito de fazê-lo sem consultar os partidos da oposição. O Governo assume totalmente aquilo que fez: os textos do decreto-lei e do decreto regulamentar são do Governo, são a solução que considera como boa. O Governo não viu nenhuma razão para prescindir de emitir a sua solução, que é aquela que está nesses diplomas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado Sá Furtado, quanto às discussões filosóficas para as quais lhe disse que o Governo não tinha tempo, devo dizer-lhe que o Executivo tem manifestamente uma opção clara relativamente àquilo que tem a fazer. É óbvio que o Governo actua informado por um determinado projecto que também tem componentes desse tipo, mas o que eu disse foi que não temos tempo para andar a discutir se deve ser assim ou assado. Não temos tempo para isso, Sr. Deputado, porque há tanta coisa a fazer neste país que, quando sabemos muito bem o que é que queremos fazer, fazemo-lo.
No que respeita a algumas considerações que foram produzidas pelo Sr. Deputado Defensor de Moura, sei muito bem que, no desenho legal anterior, o conselho de gerência não era o órgão máximo, mas na prática era-o, Sr. Deputado, e eu, apesar de ser jurista, preocupo-me muito mais com aquilo que acontece na prática do que, porventura, com excelentes desenhos legais que não venham a ter nenhuma espécie de vigência.
Quanto ao controle da gerência, havia, de facto, meios excepcionais de o Ministro intervir na vida dos hospitais, mas o Governo entende que ao Ministério não bastam meios excepcionais - e esses com certeza fortemente geradores de conflito - para garantir a vida normal...

Vozes do PSD: - Muito bem!

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A Oradora: - ... e que não basta ao Governo intervir a posteriori quando as coisas já correram mal. É preciso prevenir, é preciso que haja regras que permitam que as coisas funcionem o melhor possível. O Governo entende que ir punir só depois é pouco; é melhor primeiro poder prevenir.
No que se refere aos critérios que eu própria e o resto do Governo temos seguido, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que até já tivemos certos problemas com algumas estruturas do partido a que pertenço. Esses problemas são públicos e as pessoas sabem bem que este governo adoptou uma postura bem diferente em relação às nomeações que faz, pois sabem que as faz por critérios de competência e não por quaisquer outros.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado Santana Maia, como disse, o que está em causa não são as pessoas nem os actuais conselhos de gerência. O que está em causa é que a forma de designação dos membros do conselho de gerência é inadequada.
Na intervenção que formulei disse reconhecer que muitos daqueles que têm exercido funções nos hospitais o têm feito com grande espírito de serviço. Mas o problema é que a própria legislação, ao não enfrentar a questão de que há conflitos entre os trabalhadores e os utentes, permite que as designações das gerências não sejam feitas da melhor maneira. Srs. Deputados, o que está em causa são regras e não pessoas - aliás, não faria qualquer sentido que o fossem.
Quanto à diferença entre os governos minoritários que aparentemente não podem legislar e governos majoritários que aparentemente podem fazer aquilo que é difícil, receio bem que a prática tenha vindo a demonstrar o contrário - aliás, já há pouco o Sr. Deputado António Capucho fez essa referência. De facto, não vejo por que é que este governo, por ser minoritário, haveria de deixar de tomar as medidas que não necessárias e que, aliás, os cidadãos sabem que o Governo tem vindo a tomar.
O Sr. Deputado Raul Castro colocou uma questão relacionada com aquilo que anteriormente o Governo podia fazer em termos de resolução dos problemas dos hospitais. Já referi - e vou repetir - que não bastam intervenções repressivas a posteriori, mas, se nenhumas outras restarem ao Governo, nenhum outro remédio ele terá do que retomar e pôr em execução esse tipo de medidas.
Quanto à questão da contestação de alguns médicos do meu partido, devo dizer que isso não me perturba. Perturbam-me os problemas e o facto de encontrar a melhor solução. Mas, Sr. Deputado, que melhor demonstração terá V. Ex.ª de que não é ao serviço do partido a que pertenço que este governo está (e as medidas que ele toma) do que o facto de haver contestação até dos médicos do meu partido?

Aplausos do PSD.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, tal como o Sr. Deputado António Capucho fez, tinha feito sinal para solicitar uma interrupção à Sr.ª Ministra, mas como ela só tem olhos para a bancada do PSD, não me viu. Como a Sr.ª Ministra não me viu, peço agora a palavra ao abrigo do direito de defesa, para defender a honra da minha bancada relativamente a afirmações feitas pela Sr.ª Ministra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - A Sr.ª Ministra era também membro do anterior governo. Lembra-se desse diploma, do qual disse ter aí um rascunho e que foi enviado para o Ministro das Finanças?
Por outro lado, eu fui ministro e nunca esse diploma ou projecto parecido entrou em Conselho de Ministros.
Assim, pergunto-lhe: com que segurança diz a Sr.ª Ministra que esse diploma foi aprovado ou que estava aprovado pelo anterior ministro?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Deputado Eduardo Pereira, não foi só ao meu partido que permiti que me interrompesse há momentos e peço-lhe desculpa, pois, de facto, não o vi na altura.
Quanto à questão que me coloca, queria dizer-lhe que, de facto, o diploma que está em causa não é um decreto-lei. E porque não é um decreto-lei, não foi nem tinha de ir ao Conselho de Ministros. Portanto, não era necessário que os outros ministros se tivessem apercebido dele.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - São formalismos...

A Oradora: - Na verdade, trata-se de um decreto regulamentar e, como sabe, os decretos regulamentares são aprovados pelos ministros directamente envolvidos, pelo Primeiro-Ministro, e são depois promulgados.
Assim, repito que o conhecimento que tenho desse texto processa-se através de um ofício do Ministério das Finanças, que, já na vigência deste governo, enviou ao Ministério da Saúde um parecer que lhe tinha sido pedido, nos termos das regras - que, como sabe, existem - que se aplicam a certos diplomas. Isto é, os diplomas que têm a ver com as finanças ou com a Administração Pública precisam de parecer ou, enfim, da aprovação dos respectivos membros do Governo.
Portanto, nesse âmbito, tinha sido enviado o diploma ao Ministério das Finanças e foi-me enviado depois o parecer daquele Ministério, já no decurso deste governo.
Por outro lado, repito-o, trata-se de um projecto de decreto regulamentar assinado pelo meu antecessor - é disso que estou a falar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à leitura das actas de apuramento das votações que se fizeram esta tarde, a qual vai ser feita pelo Sr. Secretário.

Foram lidas. São as seguintes:

Acta

Aos 29 dias do mês de Janeiro de 1987 procedeu-se, em Plenário da Assembleia da Repú-

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blica, à votação, por voto secreto, para eleição para o Conselho de Comunicação Social, tendo sido apurados os seguintes resultados:

Votantes - 204.
Francisco Sousa Tavares:

Votos sim - 139; Votos brancos - 61; Votos nulos - 4.

José Adelino Eufrázio de Campos Maltez:

Votos sim - 121; Votos brancos - 79; Votos nulos - 4.

Considera-se, assim, que, de acordo com o artigo 15.º da Lei n.º 23/83, de 6 de Setembro, foi eleito o candidato Francisco Sousa Tavares, não tendo o candidato José Adelino Eufrázio de Campos Maltez obtido o número de votos necessário para a sua eleição.

Acta

Aos 29 dias do mês de Janeiro de 1987 procedeu-se, em Plenário desta Assembleia da República, à votação, por voto secreto, dos pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos para apresentação em juízo dos seguintes Srs. Deputados: António Maria Paulouro, José Carlos Torres Matos Vasconcelos e Narana Sinai Coissoró, tendo sido apurados os seguintes resultados:

Votantes - 204. António Maria Paulouro:

Votos sim - 172; Votos não - 20; Abstenções - 7; Votos brancos - 5.

José Carlos T. M. Vasconcelos:

Votos sim - 173; Votos não - 21; Abstenções - 5; Votos brancos - 5.

Narana Sinai Coissoró:

Votos sim - 173; Votos não - 22; Abstenções - 4; Votos brancos - 5.

Considera-se, assim, que os relatórios da Comissão foram aprovados por maioria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a próxima sessão, que terá lugar amanhã, inicia-se às 10 horas, tendo como ordem do dia a continuação da discussão das ratificações n.ºs 126/IV (PCP), 127/IV (PRD) e 128/IV (PS) e das propostas de resolução n.ºs 8/IV, que aprova para ratificação as emendas à Convenção Relativa à Organização Internacional de Satélites Marítimos e ao respectivo acordo de explorações, adoptadas em Londres a 16 de Outubro de 1985 pela 4.ª assembleia geral das partes da referida Organização, e 9/IV, que aprova para ratificação a Convenção Internacional das Telecomunicações, o Protocolo Final e os Protocolos Adicionais I, II, III, IV, V, VI e VII, assinados em Nai-robi a 6 de Novembro de 1982.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, certamente por lapso, não consta da agenda da reunião de amanhã a discussão das ratificações n.ºs 100/IV (CDS) e 105/1V (PCP) relativas ao Decreto-Lei n.º 313/86, de 24 de Setembro, que extingue a Casa do Douro, criada pelo Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Setembro.
Certamente que se trata de um mero lapso, pelo que pedia à Mesa que a discussão dessas ratificações fosse inscrita na ordem do dia de amanhã.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, não me apercebi da intervenção do Sr. Deputado Jorge Lemos, mas se se trata do agendamento das ratificações n.ºs 100/IV e 105/IV, elas têm, de facto, lugar amanhã.
Mas a minha interpelação vai no sentido de dizer que ficou acordado em conferência de líderes que V. Ex.ª anunciava hoje a votação, às 12 horas e 30 minutos, pelo menos, da proposta da resolução n.º 9/IV.
O Sr. Presidente: - Com certeza; a proposta de resolução n.º 9/IV será então votada amanhã e, relativamente à proposta de resolução n.º 8/1 V, depois ver-se-á.
Quanto às ratificações n.ºs 100/IV e 105/IV, elas serão agendadas e discutidas amanhã, a seguir à discussão das propostas de resolução n.ºs 8/IV e 9/IV.
Fica rectificada a agenda.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Fernando Monteiro do Amaral.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
João Luís Malato Correia.
José Angelo Ferreira Correia.

Página 1472

1472 I SÉRIE - NÚMERO 37

José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Helena Torres Marques.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Ana da Graça Gonçalves Antunes.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José da Silva Lopes.
Maria Cristina Albuquerque.

artido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Centro Democrático Social (CDS):

Hernâni Torres Moutinho.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Os REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - José Diogo.

PREÇO DESTE NÚMERO: 160$00

Depósito legal n. º 8818/85 IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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