O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1497

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

I SÉRIE NÚMERO 39

Quarta-feira, 4 de Fevereiro de 1987

PORTE
PAGO

IV LEGISLATURA

2ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE FEVEREIRO DE 1987

Presidente: Ex.mº Sr. Carlos Cardoso Lage

Secretários: Ex.mºs Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Bastos Mota Torres
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO, - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 15 horas e 45 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, dos requerimentos entrados na Mesa e das respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado António Barreto (PS), a propósito de declarações proferidas pelo Sr. Ministro da Educação e Cultura (João de Deus Pinheiro) em resposta a questões levantadas numa conferência de imprensa dada pelo deputado, teceu críticas ao Governo pelo actuação que tem tido na área da educação. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento das Srs. Deputados Bártolo Campos (PRD) e Victor Crespo (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) criticou o contrabando de armamento e de produtos radioactivos que se vem registando em Portugal, tendo respondido no final a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado António Capucho (PSD).
O Sr. Deputado Luís Roque (PCP) abordou a situação do Hospital Distrital de Elvas. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Malato Correia (PSD) e do Sr. Deputado Miranda Calha (PS).
O Sr. Deputado Sá e Cunha (PRD) referiu a necessidade de a Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais resolver a situação que se vem verificando na costa litoral do distrito de Aveiro, a norte de São Jacinto, que está a ser fustigada pelo mar, pondo em risco populações, ao que se associou o Sr. Deputado Adérito Campos (PSD).
O Sr. Deputado António Capucho (PSD) teceu várias considerações sobre o voto apresentado por diversos deputados e relativo a mais um aniversário do regicídio.
O Sr. Deputado Borges de Carvalho (Indep.) fez a apresentação do referido voto, tendo também usado da palavra, a diverso titulo, os Srs. Deputados Raúl Rego (PS) e Silva Marques (PSD).
A Assembleia rejeitou depois o voto em referência, após este ter sido objecto de alterações, tendo formulado declaração de voto os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP) e José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE).

Ordem do dia. - Foi recusada ratificação ao Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro (Lei Orgânica Hospitalar), que revoga o Decreto-Lei n. º 129/77, de 2 de Abril, cujas normas foram representadas - ratificações n.ºs 126/IV (PCP),127/IV (PRD) e 128/IV (PS) -, tendo produzido declaração de voto os Srs. Deputados Vidigal Amaro (PCP), Raúl Castro (MDP/CDE), Ferraz de Abreu (PS), Horácio Marçal (CDS) e Duarte Lima (PSD).
Entretanto, foi aprovado um relatório a parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputadas do PSD, do PRD e do PCP.
Procedeu-se à apreciação das ratificações n.ºs 100/IV (CDS) e 105/IV (PCP), relativas ao Decreto-Lei n.º 313/86, de 24 de Setembro, que extingue a Casa do Douro, criada pelo Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Setembro. Intervieram no debate, a diverso titulo, além da Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação (Álvaro Barreto), os Srs. Deputados João Morgado (CDS), António Mola (PCP), Daniel Bastos (PSD), Aloísio Fonseca (PS), Rogério de Brito (PCP), Cavaleiro Brandão (CDS), Pinho Silva (PRD) e Raúl Castro (MDP/CDE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Araújo Guedes.
Abílio Gaspar Rodrigues.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Álvaro José Rodrigues Carvalho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.

Página 1498

1498 I SÉRIE - NÚMERO 39

António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe Ataíde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Luís Gomes Vaz.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Manuel Gouveia B. Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.

Página 1499

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1499

António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva de Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur T. Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Defensor Oliveira Moura.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Barbosa da Costa.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José Rodrigo Costa Carvalho.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.

ntónio Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria lida da Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
Carlos Eduardo Oliveira Soares.
Eugênio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marcai.
João José Camacho Borges de Pinho.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Raul Fernando de Morais e Castro.

Deputados independentes:

António José Borges de Carvalho.
Rui Manuel Oliveira Costa.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Maria Amélia Mota Santos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente, dos requerimentos e das respostas a requerimentos.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente Cartas

Carta-circular da comissão de trabalhadores da EPAC, contendo uma resolução aprovada em reunião realizada no dia 23 do passado mês, referindo-se ao Decreto-Lei n.º 15/87, de 9 de Janeiro, e pedindo a sua suspensão.
De Amândio da Cruz, residente em Lisboa, referindo-se ao Decreto-Lei n.º 265/72, de 31 de Julho, em nome dos agentes militarizados da autoridade marítima (agentes e cabos-de-mar), pedindo que se recomende ao Estado-Maior da Armada e ao Ministério da Defesa para acabar com a discriminação a que estão sujeitos relativamente a outros agentes.
De Armindo Castelão Ferreira, residente em Vila Nova de Ourem, e telex da direcção da Associação de Juristas Católicos de Lisboa, referindo-se à chamada lei da rádio.
Da direcção da Associação dos Monitores da Telescola, com sede em Vila Nova de Gaia, congratulando-se com a recente aprovação por esta Assembleia da Lei de Bases do Ambiente.

Página 1500

1500 I SÉRIE - NÚMERO 39

Ofícios

Da Assembleia Municipal de Chaves, remetendo cópia da proposta apresentada na reunião efectuada no passado dia 7 de Janeiro, que foi aprovada por unanimidade e se refere a reorganização judicial.
Da Assembleia Municipal da Nazaré, remetendo fotocópia de uma moção apresentada na reunião realizada no dia 30 do passado mês de Dezembro pela Aliança Povo Unido, que foi aprovada por maioria, sobre o Ano Internacional da Paz.
Do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços do Sul, com sede em Setúbal, anexando um texto que resultou do Encontro Nacional dos Trabalhadores em Supermercados, realizado no passado dia 18 de Janeiro, com sessões em Almada, Lisboa e Porto.

Telegrama

Dos trabalhadores da Escola Secundária de Murça, exigindo a publicação imediata do novo regime jurídico escolar.

"Telex"

Da direcção da Rádio Braga, com o texto que foi difundido por esta estação após a aprovação da Lei da Rádio por esta Assembleia.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os requerimentos que a seguir vou indicar.
No dia 29 de Janeiro de 1987: ao Ministério da Defesa Nacional, formulada pelo Sr. Deputado Miguel Relvas; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Guerreiro Norte e Poças Santos; à Secretaria de Estado do Ambiente e ao Governo (2), formulados pela Sr.ª Deputada Maria Santos; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelos Srs. Deputados Bártolo Campos e Sá Furtado; ao Governo (2), formulados pelo Sr. Deputado Carlos Manuel Luís; à Secretaria de Estado da Cultura e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (3), formulados pelo Sr. Deputado Corujo Lopes; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Armando Fernandes; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação e ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado António João de Brito; ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado Rui Rabaça Vieira.
No dia 30 de Janeiro de 1987: ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Jaime Gama; à Direcção-Geral da Comunicação Social, formulado pelo Sr. Deputado Raúl Rego e outros; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulado pelos Srs. Deputados José Manuel Maia e Jorge Patrício; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado João Amaral; ao Ministério da Justiça (7), formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães e Odete Santos; à CP, formulado pelo Sr. Deputado Pinho Silva; à Presidência da Assembleia da República, formulado pelo Sr. Deputado Pereira Coelho; à Secretaria de Estado da Administração Escolar, formulado pelo Sr. Deputado Reinaldo Gomes.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Mota Torres, na sessão de 9 de Janeiro e na sessão de 8 de Janeiro; Guerreiro Norte, na sessão de 7 de Maio; Rogério Brito e António Mota, na sessão de 3 de Junho; Raul Brito, na sessão de 4 de Junho e na sessão de 27 de Novembro; António Feu, na sessão de 12 de Junho; Raul Junqueiro, na sessão de 17 de Junho e nas sessões de 31 de Outubro e 13 de Novembro; Pinho Silva, na sessão de 1 de Julho; Jerónimo de Sousa, na sessão de 25 de Julho; Aloísio da Fonseca, na sessão de 1 de Outubro e nas sessões de 30 de Outubro e 8 de Janeiro; José Manuel Mendes, na sessão de 9 de Outubro; Barbosa da Costa e outros, na sessão de 10 de Outubro; Ramos de Carvalho, nas sessões de 23 de Outubro e 6 de Janeiro; Rui Sá e Cunha, na sessão de 24 de Outubro; António Brito, na sessão de 28 de Outubro; Sousa Pereira, nas sessões de 6 de Novembro, 11 de Dezembro e 6 de Janeiro; António Mota e Armando Fernandes, na sessão de 20 de Novembro; José Tengarrinha e Raul Castro, na sessão de 2 de Dezembro; Reinaldo Gomes, na sessão de 3 de Dezembro; João Abrantes, na sessão de 3 de Dezembro; Luís Roque, na sessão de 4 de Dezembro; Manuel Monteiro e Leonel Fadigas, na sessão de 11 de Dezembro; Joaquim Gomes, na sessão de 16 de Dezembro; Jorge Lemos, nas sessões de 16 de Dezembro e 13 de Janeiro; Magalhães Mota, Bártolo Paiva, Alexandre Manuel e José Carlos Vasconcelos, na sessão de 6 de Janeiro; Maria Santos, na sessão de 13 de Janeiro.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em conferência de imprensa realizada na semana passada, fiz declarações que tiveram o condão de provocar inesperadas e descontroladas reacções do Governo. Permitam-me recordar brevemente.
Depois de analisar certos aspectos da situação vivida nas universidades, conclui que se detectavam indícios anunciadores de uma crise académica ou universitária, e que competia ao Governo evitar que tal viesse a ser uma realidade. Acrescentei então: "a tarefa de um Governo consiste em evitar e prevenir uma crise, qualquer crise, e não a de apagar fogos quando já é tarde".
Tive também a oportunidade de situar a posição do Partido Socialista sobre uma possível crise académica. Disse inequivocamente que os socialistas não eram parasitas das greves e dos conflitos sociais. Disse e repito que não queremos ter razão graças à desgraça dos outros, dos estudantes ou dos professores. De modo pouco habitual para um partido de oposição, pedi ao Governo (pedi, foi a expressão utilizada), pedi ao Governo, dizia, que evitasse e prevenisse a possível crise.
Já agora, recuemos um pouco mais. Nessa mesma conferência de imprensa, noutras ocasiões públicas e até nesta Assembleia, exprimi os nossos receios perante a evolução da situação nas escolas superiores, receio esse agravado pela imperícia do Governo, particularmente do seu Ministro da Educação.
Fundamentei essa crítica, denunciando o contraste existente entre, por um lado, a acção arrogante, o monólogo, a legislação feita sem consulta dos interessados, os diplomas e regulamentos incompetentes e mal feitos, o
auto-convencimento sem motivos que o justi-

Página 1501

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1501

fiquem e a recusa da participação e do diálogo e, por outro lado, a facilidade da cedência, a leviandade com que se suspendem decretos aprovados dias ou semanas antes e a aceitação apressada e sob constrangimento do diálogo recusado durante semanas e meses. Comparei esta actuação hesitante e de "duche escocês" com o estilo de Marcelo Caetano e de outros governantes fracos e sem razão, e sobretudo fracos porque sem razão, que, nas histórias conhecidas, antecedem as crises. Mais ainda: que provocam as crises e que por elas são responsáveis.
Estou consciente e convencido de que assim cumpri o meu dever e de que assim o meu partido fez a sua obrigação, mesmo se talvez fosse mais lógico e mais proveitoso esperar pelos conflitos e por eventuais perturbações para, depois, retirar louros. Em vez disso, tentámos denunciar para prevenir, alertar para evitar, a chamar a atenção do Governo, em vez de nos limitarmos a acusá-lo quando já é tarde.
Mais ainda. Em todas as ocasiões, identificámos serena e rigorosamente os que considerámos serem os ingredientes da crise. Mencionei as consequências sociais do numerus clausus e o mal-estar crescente que este vem criando, assim como esta espécie de passividade do Ministério, que, aparentemente contente com a situação e com este mecanismo (que deveria ser provisório), não dá mostras de se preocupar e de se preparar para encontrar soluções para este complexo problema que é o do acesso ao ensino superior. O provisório numerus clausus transformou-se em definitivo; traduz exclusivamente as carências e as insuficiências em salas e instalações, a falta de professores, os erros de planeamento e os reduzidos orçamentos e já não representa, se é que algum dia representou, qualquer espécie de critério qualitativo; noutras palavras, nem é o reflexo das necessidades do mercado e da sociedade nem é o mecanismo de selecção pelo mérito.
Mas há mais ainda. Ninguém pode deixar de estar atento ao desemprego juvenil, em particular de jovens licenciados e diplomados, quanto mais são seja pelos reflexos que tal fenómeno tem na própria vida universitária. Também a elevada taxa de repetição e de insucesso, assim como um elevadíssimo abandono do sistema educativo a meio dos estudos, constituem fenómenos preocupantes, traduzem desequilíbrios e desajustamentos anormais e exigem cuidada atenção. Também aqui o Ministério parece estranhamente alheio e desatento.
Referi ainda, e volto a fazê-lo, o problema do alojamento estudantil, gravíssima deficiência de cada vez mais pesadas consequências. Recordei a insuficiência de bolsas de estudo, em quantidade e em valor, com os seus efeitos socialmente injustos e com o desperdício de inteligência e de talentos que daí resulta. Se a isso acrescentarmos as necessidades de mobilidade estudantil devido ao numerus clausus, ficamos com uma ideia aproximada dos factores de instabilidade e de desenraizamento gerados em meio jovem estudantil, especialmente pesados para as famílias e os estudantes com menos meios.
O panorama preocupante está longe de ser completo. Mencionem-se ainda: as escolas sobrelotadas, algumas das quais ultrapassam já os cinco ou seis mil alunos por faculdade, o que é quase tanto como reputadas universidades inteiras; os horários atropelados impeditivos de um planeamento racional do tempo dos estudantes; a preparação insuficiente do ensino pré-universitário; a desordenada situação no ensino privado universitário e a precipitada actuação do Ministério neste domínio.
O exercício das competências regulamentares pelo Ministério também deixa a desejar e tem vindo a agudizar problemas que, em condições normais, poderiam encontrar fáceis soluções dialogadas e participadas. Assim, os regimes de prescrição e de precedência foram elaborados pelos serviços técnicos e burocráticos sem a suficiente consulta dos estudantes e dos próprios professores e órgãos de gestão das universidades e das faculdades. O resultado não se fez esperar: conflitos inúteis e perfeitamente evitáveis, que apenas se verificaram por causa da política do Governo e da falta de jeito do Ministro. Aflito e receando os exemplos contagiosos das universidades espanholas e francesas, o Ministro apressou-se a suspender os seus próprios decretos, revelando insegurança e hesitação. Apreciámos evidentemente que o Ministro tenha recebido os estudantes, depois de a tal se ter recusado; e que tenha suspendido os decretos, depois de os ter mal feito. Mas não nos impediremos de sublinhar a desorientação que reina no Ministério, nem a hipocrisia do anúncio que foi feito logo a seguir sobre a disposição ministerial para o diálogo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A verdade é que, sob a capa de declarações dialogastes, o Ministério vem agindo com crescente secretismo e com uma auto-suficiência que lhe será fatal. Nem a participação, nem o diálogo, nem a concertação têm sido regra no Ministério da Educação.
A tudo isto, que não é pouco, e que diz respeito a todos, estudantes e professores, vêm juntar-se factos recentes e da maior gravidade, especialmente relativos aos docentes e investigadores.
Uma vez mais por exclusiva culpa do Governo, abriu-se uma nova frente de crise. Estou a referir-me à legislação sobre a dedicação exclusiva dos docentes e investigadores que, depois de aprovada pela unanimidade desta Câmara, mereceu o injustificado ataque do Primeiro-Ministro, perante a passividade culpada e ubíqua do Ministro da Educação. Já se sabe, por outro lado, que o Governo acaba entretanto de aprovar medidas legais com as quais pretende: primeiro, perverter a lei aprovada; segundo, renovar o seu ataque à universidade e à investigação; terceiro, abrir e tentar explorar mais um conflito com o Parlamento. Isto tudo, apesar do bom acolhimento que a lei da dedicação exclusiva teve na generalidade dos meios interessados e mesmo na opinião pública, consciente da importância da universidade e da ciência para o desenvolvimento do Pais.
Com esta actuação, vem o Governo agravar uma situação e diminuir consideravelmente os meios e as possibilidades de encontrar soluções eficazes e concertadas. Com efeito, as questões ligadas com a docência e a investigação são difíceis e exigem a urgente atenção do Governo, que, uma vez mais, parece satisfeito consigo próprio e desatento ao mundo. A insuficiência de professores e de assistentes é lamentável e põe em risco a qualidade de formação; a falta de doutorados é, na maior parte das escolas, preocupante; a rigidez dos sistemas de promoção e de graduação revela um conservadorismo incompatível com as necessidades

Página 1502

1502 I SÉRIE - NÚMERO 39

do desenvolvimento e da modernidade; a acumulação de cargos e funções e a insuficiente dedicação exclusiva de muitos docentes traduzem um mal-estar diariamente crescente.
Perante estes fenómenos inquietantes - a maioria dos quais, é certo, não são da directa responsabilidade deste Ministro, pois são o resultado de antigas evoluções sociais, económicas e políticas -, o Governo e o seu Ministro da Educação revelam passividade e incompreensão; hesitação e imperícia; nervosismo e auto-suficiência.
Eis o que, em linhas gerais, denunciei publicamente, concluindo: "estão reunidas condições sociais, económicas, culturais, políticas, pedagógicas e institucionais que permitem fazer o vaticínio de uma crise académica".
A confirmar tal previsão, os conflitos que se repetem em várias escolas; as greves já ocorridas ou previstas; o clima de instabilidade e de incerteza que se vai criando a propósito das diversas questões interessando directamente os estudantes, as suas famílias, os professores e os assistentes. Tal não se verificará todavia, e os socialistas esperam que tal não se verifique, se o Governo souber prever, se preocupe, esteja atento, se prepare, estude e consulte, promova a participação e o diálogo, saiba preparar a legislação com mais competência e talento, em duas palavras, se o Governo evitar e prevenir as crises. Os Socialistas voltam a pedir ao Governo que as evite. Mas também aqui virão para responsabilizar o Governo e o Ministério no caso de estes não cumprirem o seu dever.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nada mais teria a acrescentar se o Governo, pela voz do Ministro Fernando Nogueira, não viesse revelar um nervosismo confrangedor e não utilizasse uma demagogia insensata, que só nos vieram dar razão. À saída do Conselho de Ministros, em pose de pompa e circunstância, até à sombra da bandeira de Portugal, calcule-se, o Ministro Adjunto acusou os Socialistas (ou a mim, pessoalmente) de "apelar à greve" e de "instigar à agitação social", isto entre impertinências diversas de cariz pessoal. Já conhecia o nervosismo e a crispação destes ministros, tão calmos quando monologam e tão inquietos quando têm de se defender ou de se confrontar com os que têm opiniões diversas das suas. Voltei a confirmar que alguns dos ministros actuais não suportam que a oposição denuncie os seus erros e as suas insuficiências. E fiquei a saber que o Ministro Fernando Nogueira deturpa e falta à verdade: com efeito, não apelei à greve nem instiguei à agitação social. Tenho, felizmente, cópia gravada das minhas declarações.
Mas quero dizer-lhe, Sr. Ministro Adjunto: a sua voz melíflua já não esconde a impaciência ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Barreto, faça favor de concluir as suas considerações.

O Orador: - Só lhe posso dar um conselho, Sr. Ministro: impaciente-se com o seus próprios erros, com as suas insuficiências e com os seus insucessos.
Este triste episódio poderia ter encerrado o assunto. Todavia, os jornais de domingo e de segunda-feira trouxeram nova surpresa e novo sinal de nervosismo e inquietação. As declarações do Ministro da Educação constituem uma nova peça lamentável a acrescentar a este processo. Além das banalidades com que se limita a repetir o seu colega Nogueira, o Ministro Deus Pinheiro vai mais longe, revelando uma inaceitável intolerância, roçando a xenofobia. O Ministro da Educação escolheu a inauguração da nova escola salesiana para, louvando a Igreja, vociferar contra "alguns portugueses de raiz estrangeirada que se arvoram em profetas de desgraça e vão instigando a agitação juvenil" (fim de citação).

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Interrogado na televisão sobre a identidade do destinatário, recusou-se a dizer nomes, assim demonstrando a fragilidade das suas convicções. Num tom perfeitamente irresponsável, o Ministro aproveitou para misturar tudo, acusando tais estrangeirados de denegrir a acção da Igreja e até de a impedir de difundir a sua mensagem na rádio.
Isto, Srs. Deputados, ultrapassa os limites. Não foi um troglodita, não foi um desequilibrado que assim se exprimiu: foi o Ministro da Educação e Cultura de Portugal. E o Ministro da Educação de Portugal não é troglodita nem desequilibrado. É doutorado em universidade estrangeira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Gostava de lhe perguntar: como conseguiu resistir no estrangeiro e manter-se puro e nacional? Qual será o contrário de estrangeirado: " de trazer por casa" ou "saloio"?
Gostaria mesmo de perguntar, aliás, o que pensam, a este propósito, os estrangeirados Cavaco Silva e Durão Barroso; Valente de Oliveira e Fernando Real; Adriano Moreira e José Gama; Victor Crespo e Silva Marques.
Devo recordar ao Ministro Deus Pinheiro que há milhões de portugueses estrangeirados e que o são por causa do trabalho. Há milhares de portugueses estrangeirados por causa da liberdade. Há milhares de portugueses estrangeirados por causa da ciência e do saber. Só lhe digo que ainda bem que assim é. Como tantos outros, regozijo-me com a oportunidade que tive de viver e de aprender no estrangeiro, em países tolerantes onde os ministros da educação não tratam de estrangeirados aqueles que se lhe opõem.
Só lamento que, quando parti, não tenha sido de livre vontade, mas a isso tenha sido forçado, como outros, pela política do antigo regime, pelos governantes que, como hoje o Ministro Deus Pinheiro, a exemplo do gulag, do fascio e do macarthismo, tratam de "anti patriotas" os que têm opiniões diferentes das suas.
Lamento ainda que, no primeiro ano de adesão à Comunidade Europeia, ainda haja um ministro que utiliza linguagem e conceitos ultrapassados e irracionais. Lamento que seja esta homenagem que o Ministro da Educação e da Cultura de Portugal presta à história universalista dos Portugueses e às tradições de tolerância do espírito universitário.
Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Bártolo Paiva Campos e Victor Crespo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bártolo Campos.

Página 1503

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1503

O Sr. Bártolo Campos (PRD): - Sr. Deputado António Barreto, sob a forma de pedido de esclarecimento, devo dizer-lhe que me associo à sua intervenção, uma vez que estou de acordo com a denúncia que fez da falta de diálogo, manifestada, a maior parte das vezes, pelo actual Ministério da Educação, quanto à solução dos problemas, levando depois, em muitos casos, às cedências apressadas.
Também não poderei estar de acordo com a linguagem utilizada pelo Sr. Ministro da Educação em relação às críticas feitas pela oposição.
Gostaria de lhe perguntar se considera ou não que os partidos da oposição têm um papel a desempenhar no fomento da solução dos problemas através do diálogo, de modo a evitar que eles sejam resolvidos pelas cedências apressadas ou por formas mais críticas. Em caso afirmativo, como pensa que os partidos da oposição o devem concretizar?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Barreto, pretende responder já ou no fim dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. António Barreto (PS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Crespo.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): - Sr. Deputado António Barreto, ouvi a sua intervenção e naturalmente não vou comentar a sua reacção, que tem a ver com outras entidades que não comigo pessoalmente, embora, já uma vez tenha tido ocasião de dizer que, porque isso se coaduna mais à personalidade de estrangeirado, também me considero estrangeirado no sentido em que o Sr. Deputado lhe deu.
Lamento um pouco que se enverede por um tipo de linguagem que muitas vezes, por falta de serenidade, faz cair por terra argumentos que têm alguma validade. Não é o caso da declaração do Sr. Deputado António Barreto, com a qual estou integralmente em desacordo.
Vou pôr-lhe uma questão extremamente concreta porque ela é muito significativa, muito importante, tem a ver com um assunto com o qual todos os que se interessam por educação têm que ter extremo cuidado na maneira como o tratam. Refiro-me ao numerus clausus.
Naturalmente que o Sr. Deputado sabe que o numerus clausus foi instituído por um seu companheiro de bancada, o que, aliás, é totalmente irrelevante, e tive mesmo ocasião, nesta Câmara, num determinado dia, de louvar o Ministro Sottomayor Cardia pela sua actuação nesse sentido. Sei, e penso que é lamentável, que a procura do ensino superior é excessiva em relação à oferta.
Contudo, há soluções para isso - que se atrasaram um pouco- através do ensino politécnico, porque é bem conhecido que, em certos domínios e cursos, há já no sistema universitário licenciados em número suficiente para as quantidades previsíveis de ocupações.
Por outro lado, não é exacta a crítica que se faz, a cada momento, de que se não sabe quais são as perspectivas de utilização dos diplomados do ensino, pois há, pelo menos, um trabalho feito, com seriedade, em 1981, no âmbito do Ministério da Educação, sobre a procura do ensino superior.
Mas a minha pergunta concreta que lhe quero fazer é esta: o Partido Socialista, e em particular o Sr. Deputado António Barreto, é ou não favorável à existência do numerus clausus, situação que existe em praticamente todos os sistemas educativos do mundo?

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Deputado Bártolo Campos, aprazem-me as declarações com que iniciou o seu pedido de esclarecimento e devo dizer-lhe que só o Sr. Deputado mencionou alguma solidariedade nesta matéria, em que houve - acho eu - ofensa à cultura. Considero que a grande maioria desta Câmara não faria suas declarações como aquelas que citei sobre os estrangeirados e o antipatriotismo da oposição. De qualquer modo, repito, aprazem-me as suas declarações, noto-as e registo-as.
Quanto à sua pergunta, devo dizer que não considero a educação acima de toda a política, tal como o Ministro da Educação referiu há pouco tempo, antes é um domínio essencialíssimo e importante que exige largos consensos, mas não está fora da política. Há opções fundamentais de carácter social, económico e político que, de facto, dividem os partidos políticos ou as diferentes posições. Mas porque há uma zona de consenso, que, a meu ver, deve ser larga, bastante larga mesmo, penso que os partidos da oposição devem colaborar numa procura de soluções para alguns dos grandes problemas de fundo da Nação, da nacionalidade, da juventude, do sistema geral da investigação e ciência.
Penso, em particular, que o Conselho Nacional de Educação - que na Comissão de Educação estamos a tentar criar, peça a peça, após longas discussões - é uma das maneiras de cristalizar a colaboração entre todos os partidos, sejam eles da oposição ou do Governo, e entidades técnicas, profissionais e da sociedade. Penso que, no actual momento, essa é a melhor maneira de colaborar institucionalmente. Mas há outras, evidentemente; há diversas maneiras de colaborar. A Lei de Bases do Sistema Educativo foi feita graças ao fruto e ao espírito de colaboração entre os seis grupos parlamentares desta Casa, que colaboraram substantiva e fertilmente nesta matéria.
Portanto, a minha resposta é "sim, vamos localizar institucionalmente essas formas de colaboração", e creio que, no imediato, o Conselho Nacional de Educação é uma prova disso.
Sr. Deputado Vítor Crespo, sei que é estrangeirado como eu. Sei que nos reconhecemos nessa qualidade, sei que apreciamos as questões de maneira diferente dos outros.
Quanto ao numerus clausus, devo dizer que os considero uma medida transitória, resignada e forçada pela natureza das coisas. Ela traduz carências, falta de dinheiro, insuficiente desenvolvimento da economia, uma procura excessiva em relação à oferta, oferta essa que é do sistema educativo, mas também é oferta de trabalho na ciência, nas empresas, etc. No fundo, o numerus clausus é uma gestão deste desajuste.
Agora - e há já bastantes anos que o numerus clausus está em vigor em Portugal -, não tenho visto, da parte das entidades oficiais, suficiente atenção para

Página 1504

1504 I SÉRIE — NÚMERO 39

tentarem encontrar alguns sistemas, eventualmente sistemas sucedâneos, a fim de organizar e gerir de outra maneira este desajustamento entre a procura e a oferta. Como sabe, a maneira como o sistema é concretizado na prática, nomeadamente através dos envios dos números às escolas e às faculdades, que ajustam os méritos dos candidatos em função da existência de vagas, e não em função do mérito...

O Sr. Vítor Crespo (PSD): — Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): — Reconheço que existe alguma verdade no que está a dizer, mas não é bem assim e particularmente o caso de Medicina é típico. Neste caso o numerus clausus tem sido reduzido por consideração das necessidades previsíveis e de uma procura excessiva nesse campo. E dado que esse problema existe em Medicina, há necessidade de reduzir o acesso a esta área, sob pena de criarmos um proletariado desempregado, com todas as consequências que daí advêm.
Situação semelhante verifica-se no caso das Faculdades de Letras, onde o problema está, neste momento, em discussão.
Assim, se eu quiser aceitar a sua crítica, só posso aceitar ligeiramente nos casos das Faculdades de Engenharia.

O Orador: — Sr. Deputado Vítor Crespo, talvez se prosseguíssemos na discussão nos aproximássemos um pouco mais. Estou de acordo consigo quanto às Faculdades de Medicina, mas já não estou de acordo consigo quanto às Faculdades de Letras.
Devo dizer-lhe que jamais referi o caso das Faculdades de Letras ou de Medicina pelo simples facto de serem casos actuais, o que podia justamente dar azo a qualquer entendimento de aproveitamento oportunista dessas situações.
Se não o fiz, e se me referi globalmente a toda a Universidade, foi para evitar enxertar uma reflexão de fundo, que temos de ter sobre o sistema de selecção, em casos que actualmente são «quentes», porque há conflitos.
Devo dizer-lhe que acho que é possível encararmos outras formas de selecção. E mais ainda: tenho dúvidas, muitas dúvidas — e creio que, de certa forma, o espírito da Lei de Bases vai nesse sentido — quanto à bondade do sistema do numerus clausus como tradução de uma exigência da economia.
Sei que a nossa troca de opiniões pode prolongar-se pela tarde inteira, mas eu talvez prefira ver desempregados licenciados do que desempregados desqualificados ou desempregados analfabetos.
Esta é uma fórmula que resume o meu pensamento sobre esta problemática, ainda que de forma caricatural, mas não penso que o numerus clausus, mesmo que traduzisse as necessidades do mercado, as necessidades da economia, fosse uma medida justa e aceitável.
A educação, até a educação superior, é cada vez mais um direito e um acto de cultura e cada vez menos uma necessidade de instrumentação profissional perante o mercado e as empresas.

O Sr. Presidente: — Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): — Sr. Presidente, gostaria de invocar o Regimento no seguinte sentido: na passada quinta-feira, em nome do grupo de deputados que o subscreveu, fiz entrega na Mesa de um voto.
Atentas as disposições do artigo 76.° do Regimento que regula o agendamento dos votos, julgo que a sua discussão não poderá ser adiada para além da sessão de hoje, sem que para isso haja um consenso.
Não se verificando tal e tratando-se de um voto que tem um horizonte temporal preciso, invocava o Regimento no sentido da aplicação do seu artigo 76.°, logo da discussão desse voto na sessão de hoje.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Borges de Carvalho, não consta da ordem de trabalhos a discussão do voto que acaba de referir.
Por outro lado, estabeleceu-se uma praxe na Assembleia da República de que, devido a uma deficiente regulamentação deste instrumento, era na conferência de líderes que eram apreciados os votos e estabelecido o momento do seu agendamento.
Fui informado de que na última conferência de líderes esta questão não foi apreciada, pelo que sobre este assunto nada mais posso acrescentar. No entanto, ponho à consideração dos diversos grupos parlamentares a questão de se dar acordo a que se agende ainda hoje esta matéria. Em qualquer dos casos, o voto não está agen-dado e o Sr. Deputado Borges de Carvalho poderia ter reclamado anteriormente a natureza da agenda de hoje.
Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): — Sr. Presidente, não reclamei anteriormente desta matéria porque considerei adquirido, em face do estabelecido no regimento, que o voto seria agendado hoje. Só quando ouvi V. Ex.ª anunciar a agenda é que fiquei surpreendido e interpelei a Mesa.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não fui eu que anunciei a agenda, ela foi anunciada, como é regimental, na sessão anterior.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): — Sr. Presidente, não somos subscritores do voto, mas entendemos que o Sr. Deputado Borges de Carvalho tem inteira razão. O voto foi apresentado na sessão anterior e a não ser que hoje haja um requerimento de dez deputados no sentido de adiar a votação para a reunião plenária seguinte, a sua votação deve ter lugar hoje. E o que diz o Regimento no seu artigo 76.°.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Capucho, acabei de referir que, por dificuldades que o Sr. Deputado conhece, o agendamento de votos, que por vezes têm proliferado no período de antes da ordem do dia, não tem sido feito dessa forma.
O voto não consta da agenda de hoje, mas, pela minha parte, não há objecção a que hoje se faça a sua apreciação e votação. Só me limitei a sublinhar o que tem sido a nossa prática.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, pela nossa parte, o voto pode ser admitido à discussão na devida altura. Só que a ordem do

Página 1505

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1505

dia está estipulada, para ter qualquer alteração tem de haver consenso de todos os grupos parlamentares e, neste momento, Sr. Presidente, não estamos em condições de conceder esse consenso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nestas circunstâncias e na medida em que a apreciação do voto não consta da ordem do dia de hoje, remeto para a próxima conferência de líderes, a realizar amanhã, o agendamento do voto que o Sr. Deputado Borges de Carvalho acaba de referir.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso pais tem, ultimamente, sido notícia em vários pontos do mundo. Isso nada teria de anormal se a imprensa, a rádio e a televisão da América, da Ásia, da Europa ou do Médio Oriente expressassem opiniões lisonjeiras e positivas sobre o nosso desenvolvimento económico, sobre o nosso pleno emprego, ou sobre os nossos modelos exemplares do Serviço Nacional de Saúde, do sistema de ensino ou da habitação social.
A verdade é bem mais pessimista: nem há desenvolvimento económico, a taxa de desemprego é assustadora, a saúde existe para quem a pode pagar, o ensino desenvolve-se de forma precária e limitativa e quanto à habitação todos sabemos o caos que se verifica: em vez de habitação social temos muitos milhares de barracas e bairros de lata.
A realidade, como se pode verificar sem qualquer dificuldade, é muito preocupante e não é este Governo que concorre para a sua melhoria. O facto que leva a imprensa internacional a falar de Portugal deve preocupar-nos a todos, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Como temos tido oportunidade de observar, Portugal está a ser considerado como um pais onde se torna muito fácil vender ou contrabandear armamento. Jornais nacionais e estrangeiros fazem-se eco desse tipo de actuação em que intervêm, ao que parece, não apenas portugueses mas organizações internacionais que impunemente utilizam o nosso território para essa finalidade, que um povo defensor da paz não pode tolerar por muito mais tempo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A opinião do Grupo Parlamentar do MDP/CDE é de que este tipo de negócio constitui um problema nacional que não nos deve deixar ficar indiferentes e aceitá-lo com a justificação de que se movimentam elevadas quantias e divisas.
Há certos negócios que por muito lucro que produzam, ou que por muitas divisas que canalizem (e serão canalizadas para Portugal?) não devem manter-se, principalmente quando se desenrolam ou quando se efectivam sem transparência negocial ou à margem das leis.
Existem muitos aspectos obseuros neste sector que importa clarificar, nomeadamente no que diz respeito à compra, venda e transporte de armas para países em guerra, como acontece com o conflito no Golfo Pérsico.
O Governo tem obrigação de esclarecer o Pais sobre esta situação lamentável e tranquilizar os Portugueses sobre a transferência que se exige em todos os sectores e sobre este em particular, dado o seu melindre.
Portugal não pode ser considerado, como determinada imprensa europeia chegou já a classificar, como uma "república das bananas" onde existe permissividade para se efectuarem negócios pouco claros e contrabando, desde as armas até à droga.
Acreditamos que nem o Governo, nem nenhum membro da Assembleia da República, pode admitir que o nosso país sirva de entreposto a actuações ilícitas e que põem em causa a nossa democracia e prestígio internacional. Mas também não é aceitável que sobre este assunto se opte por um silêncio que podemos classificar de comprometedor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou apresentar um exemplo que serve para fundamentar as palavras que acabo de proferir. E para esse exemplo chamo a atenção dos Srs. Deputados:
Uma revista alemã de ampla divulgação no mundo, a Stern, numa das suas últimas edições, publicou uma ampla reportagem sobre um determinado e muito perigoso contrabando onde, na opinião expressa pelo seu repórter, Portugal ocupa lugar de grande relevo.
Trata-se, nem mais nem menos, de contrabando de produtos radioactivos, de urânio, de plutónio, de cobalto.
O jornalista dessa revista deslocou-se várias vezes ao nosso pais, "transformou-se em homem de negócios interessado em obter aqueles produtos, contactou diversos portugueses, concluiu contratos fictícios e obteve informações que, depois corajosamente publicou.
Pelo tipo de reportagem efectuada verificamos que este comércio, ilegal e florescente, decorre com impunidade e desenvolve-se com produtos radioactivos roubados.
A reportagem da Stern insere-se, ao que parece, numa investigação jornalística sobre o mercado negro de matérias radioactivas, que têm preocupado, seriamente, as autoridades de diversos países, como os Estados Unidos da América e a República Federal da Alemanha. Neste último país, e segundo aquele repórter, "fontes dos serviços secretos confirmam a existência de tal mercado negro". Quanto aos Estados Unidos da América, as implicações deste mercado negro são objecto de estudos pormenorizados do respectivo Governo, que já investiu 100 milhões de dólares no sistema de defesa ultra-secreto intitulado "NEST".
Por outras palavras, um mercado desta natureza pode atingir dimensões gravíssimas, uma vez que o urânio ou o plutónio, por exemplo, podem ser utilizados com diversas finalidades, nomeadamente em certos armamentos.
O artigo, bastante ilustrado com fotografias, assinala que em Portugal foram oferecidos àquele jornalista, para transacção, 36 recipientes com urânio e plutónio e relata, ainda, as peripécias, os disfarces, a camuflagem e deslocações no nosso pais a que a "transacção" obrigou os seus intervenientes.
O trabalho não nos parece especulativo e o repórter pediu o apoio de peritos do Centro de Pesquisa Nuclear Alemão, Juelich que fizeram testes de radiação a esses produtos, confirmando a sua natureza radioactiva.
Como é evidente, não podemos confirmar se esses recipientes com urânio foram roubados, ou não, em Portugal, mas o que não suscita dúvidas é que existe tal mercado no nosso país e a revista Stern mais não faz do que confirmar rumores que circulam sobre este tipo de contrabando.
Por esse motivo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do MDP/CDE vai inquirir do Governo esclarecimentos sobre a actuação das autoridades neste sector, e a colaboração com organismos

Página 1506

1506 I SÉRIE - NÚMER0 39

internacionais, assim como pretendemos ser esclarecidos sobre as transacções de urânio português com o estrangeiro.
Somos da opinião de que um problema deste teor se reveste de grande gravidade, pelo que os Portugueses não podem continuar a viver intranquilos, sabendo que a nossa democracia pode ser utilizada para finalidades pouco transparentes e ilegais.
É ao Governo que compete tomar medidas adequadas para tranquilizar o País, pelo que vou entregar na Mesa um requerimento, acompanhado das fotocópias da documentação em que baseei esta minha intervenção, ao qual espera o Grupo Parlamentar do MDP/CDE a resposta urgente que o assunto exige.

Aplausos do MDP/CDE, do Sr. Deputado José Lelo (PS) e da deputada independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, ouvi a sua intervenção atentamente e V. Ex.ª trouxe à colação duas questões que não são impertinentes mas que talvez fossem mais eficientemente colocadas noutra sede - V. Ex.ª é livre de escolher a sede que pretende -, mostrando-se preocupado pela leitura da imprensa estrangeira a propósito do nosso país.
Sr. Deputado, tirando esses dois casos que citou, e um deles é do meu desconhecimento, a leitura da imprensa estrangeira sobre Portugal devia levá-lo para um caminho manifestamente diverso, no sentido de se congratular pelo efectivo êxito da política governativa.
Por exemplo, V. Ex.ª não leu, faz hoje oito dias, o Financial Times, em que em meia página se elogia o Secretário de Estado do Ambiente e a política de Ambiente prosseguida pelo actual governo?
V. Ex.ª não lê todos os relatórios internacionais sobre o sucesso das políticas, designadamente no campo financeiro e económico, do governo Cavaco Silva?
E vem aqui um representante de um pequeno partido socorrer-se da leitura de jornais para atacar o Governo em matéria de dois pontos que - insisto não são impertinentes, esquecendo toda a outra imagem verdadeiramente espectacular que o nosso país, através da acção governativa, tem merecido, designadamente na Europa. O Sr. Deputado cometeu um pecado por omissão extremamente grave, devia pedir a absolvição sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado António Capucho, V. Ex.ª deu um exemplo de como se se pretende fugir de assuntos sérios, se foge tranquilamente.
É evidente, Sr. Deputado, que o PSD e o Governo por mais de uma vez se socorreram do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Carlos Pimenta, que é a grande bandeira do Governo.
A imagem deste governo não resulta do desenvolvimento económico, da baixa da inflação em termos rigorosos, de uma política laboral consciente, da diminuição do desemprego, mas sim da política do Sr. Secretário de Estado Carlos Pimenta contra os clandestinos em áreas que devem ser - e o MDP/CDE defende-o ecologicamente preservadas.
Mas já agora, Sr. Deputado António Capucho, também lhe digo que o Sr. Secretário de Estado Carlos Pimenta não se tem preocupado muito com a invasão do nosso país por indústrias altamente poluentes que os países ricos da CEE transferem para Portugal.
Por outro lado, o Sr. Deputado refere o MDP/CDE como um pequeno partido. O MDP/CDE é um pequeno partido mas tem voz e assento parlamentar! Pensei que V. Ex.ª estava preocupado não só com este problema, que é extremamente grave - e farei seguir para todos os grupos parlamentares a documentação que aqui tenho -, porque, tal como diz este jornalista, há matérias radioactivas que ele teve a oportunidade de verificar numa casa de campo próxima de Lisboa, mas também pelo facto de o Governo não fiscalizar esta matéria.
Sr. Deputado, existe, desde 1975, um decreto-lei do Ministério da Defesa referente ao controlo de matérias-primas e produtos industriais de alto risco no domínio da segurança e estamos extremamente preocupados com o facto de estarmos a verificar que o condicionamento e a segurança destas matérias-primas não está a ser preservado.
Entendemos, Sr. Deputado, que este problema é muito grave, assim como é muito grave o contrabando de armamento para outros países, nomeadamente para zonas em guerra como é o caso do Golfo Pérsico. V. Ex.ª citou o Financial Times e eu posso citar-lhe o Washington Post que é um jornal tão prestigiado como esse e que refere claramente o papel de Portugal nesta transferência de armamento para o Golfo Pérsico e não só nesse caso.
Nesse sentido, Sr. Deputado, um jornal suíço classifica Portugal como "uma república de bananas" onde o contrabando de armas, de drogas e de matérias radioactivas se faz livremente sem grandes dificuldades!
Espero que V. Ex.ª, como presidente do grupo parlamentar mais votado e que apoia o Governo, manifeste outro tipo de preocupações que não aquelas que manifestou ao atacar este pequeno partido que tem tido mais voz nesta Câmara do que o seu grande partido, que é várias vezes superior ao nosso em número de deputados, mas apenas nisso.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Andrade Pereira, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa vem ainda a propósito do voto a que se referiu há pouco o Sr. Deputado Borges de Carvalho.
V. Ex.ª já decidiu que a decisão do assunto ficará para a próxima conferência de líderes e não vou, obviamente, interpor recurso dessa decisão da Mesa. Agora, sendo como sou um deputado que ainda está na fase de aprendizagem do Regimento, começo a ter realmente alguns problemas.
.

Página 1507

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1507

É que, na verdade, a discussão e a votação de votos, nos termos do artigo 76.º do Regimento, não tem sequer de ser agendada. No fundo, o argumento que V. Ex.ª utilizou, apoiando-se de algum modo no que disse o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, foi o de que era preciso consenso para alterar a agenda. Isto é verdade, mas também é verdade que, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 76.º do Regimento, os votos não têm de ser agendados, são apresentados e imediatamente discutidos e só ficam para a sessão seguinte se, de facto, um grupo de dez deputados o requerer.
Sr. Presidente, o meu problema é este: será que realmente a Mesa pode alterar aquilo que tão claramente vem no Regimento? Gostaria de ouvir V. Ex.ª pronunciar-se sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Andrade Pereira, reconheço que parcialmente a sua argumentação é pertinente. Contudo, esse problema já se colocava também em relação à sessão anterior, se, na verdade, o voto entrou antes do início da sessão...

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Mas na última sessão não houve período de antes da ordem do dia!

O Sr. Presidente: - Em qualquer dos casos, aquilo que tentei explicar foi que a emissão e a discussão de votos não está claramente regulamentada no nosso Regimento, o que criou imensas dificuldades, sobretudo quando surge mais do que um voto e quanto à compatibilização dos votos com as restantes declarações políticas e outras matérias do período de antes da ordem do dia, tendo começado a esboçar-se a praxe de a conferência de líderes fazer esse agendamento.
É essa a interpretação da Mesa, embora reconheça que uma interpretação literal do Regimento pode ir no sentido do que diz o Sr. Deputado Andrade Pereira. Da minha parte, não há nenhuma dificuldade a que se agende o voto hoje. Porém, colocada a questão à Assembleia, não vi vontade de o fazer por parte de outros grupos parlamentares; por outro lado, as pessoas têm de saber o que vão discutir em cada dia para poderem preparar as suas intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, não teria voltado a este problema se não fosse a intervenção do Sr. Deputado Andrade Pereira, porque ele tem inteira razão; ou seja, não tem de haver agendamento do voto.
O voto foi apresentado na sessão anterior, em que não houve período de antes da ordem do dia, logo ele está automaticamente agendado, sem mais nenhuma formalidade, para hoje. Como o primeiro subscritor do voto não insistiu no sentido do seu debate hoje também não acrescentei mais nada, designadamente porque bastam dez deputados para o adiar.
Simplesmente, penso que não devíamos constituir aqui um precedente de adiar sem mais o voto, a não ser que, de duas uma: ou o Sr. Deputado Borges de Carvalho abdica da sua posição e o voto é considerado como se tivesse entrado no meio da sessão de hoje, ficando para ser discutido na próxima sessão que tiver período de antes da ordem do dia, ou então um grupo de dez deputados requer o seu agendamento para essa altura. Sem isto, devíamos, por uma questão de princípio, apreciar o voto hoje.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, aceito perfeitamente que se passe a proceder como referiu. Mas já se tentou proceder dessa forma e lembro-me perfeitamente que chegámos a acumular mais de vinte votos por dificuldade de os introduzir neste período de discussão.
Por mim não há nenhuma dificuldade em aplicar essa doutrina, ela tem é que depois ser aplicada no futuro, não havendo oscilações.
Nestas circunstâncias, se vamos para uma interpretação literal deste preceito regimental, não há dúvida nenhuma de que o voto será discutido hoje, mas então passará a fazer doutrina este tipo de interpretação, o que poderá acarretar certos inconvenientes no futuro.
Ora, já tem havido oscilações de interpretação e de prática e o Sr. Deputado António Capucho não pode neste momento invocar por completo a boa interpretação regimental porque não ignora que, para além do Regimento, existe certo tipo de práticas da Assembleia que procuram adoptar esses preceitos regimentais.
Mas penso que não há qualquer dúvida de que devemos agendar para o final deste período o voto subscrito pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, entrando nessa interpretação regimental que o Sr. Deputado António Capucho invoca.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, V. Ex.ª levantou uma questão sobre os votos, mas esta semana podem aparecer mais votos e, segundo o que diz o Sr. Deputado António Capucho, não se poderá impedir a sua votação.
Por outro lado, entendi a argumentação do Sr. Deputado Andrade Pereira. É evidente que o Sr. Deputado fez uma interpretação em relação à qual, até certo ponto, estou de acordo. Mas nesse sentido também posso invocar o artigo 54.º, n.º 1, do Regimento que diz que "a ordem do dia é fixada pelo Presidente, segundo a prioridade das matérias definidas no Regimento".
O Sr. Presidente definiu a ordem do dia e não pode dar-se a sua alteração sem haver consenso de todos os grupos parlamentares. Assim, entendo que seria preferível, Sr. Presidente, transferir a discussão e votação deste voto para outra sessão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, se é invocada uma interpretação literal do Regimento, não há dúvida nenhuma de que este voto não tem de ser agendado antecipadamente. Por isso, não posso, perante esta reclamação, deixar de considerar que o voto seja discutido hoje. Contudo, estava convencido de que já existia uma prática entre nós, maleável e, creio, sábia, para se evitar estas situações.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, creio que a sua reclamação está atendida e não vale a pena prosseguirmos com este debate regimental.

Página 1508

1508 I SÉRIE - NÚMERO 39

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): É que não percebi, Sr. Presidente... Portanto, este voto é agendado para o período de antes da ordem do dia de hoje, não é verdade?

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Então, muito obrigado por este precedente, Sr. Presidente...

O Sr. Presidente: - Um mau precedente, Sr. Deputado!

O Sr. João Corregedor dm Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, quando é assim, todos nós discutimos o agendamento! Foi bom, foi bom...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que V. Ex.ª pode, ao abrigo do n.º 4 do artigo 76. º do Regimento, requerer a discussão e votação para a sessão seguinte, e já não será apanhado assim de surpresa.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr .Presidente, podíamos estar agora aqui a desenvolver teses... Muito bem, Sr. Presidente, muito obrigado, foi bom que isto acontecesse hoje mesmo!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. Luís Roque (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em recente despacho da Sr.ª Ministra da Saúde, o Hospital Distrital de Elvas foi classificado com o nível I. Nada permitia antever esta classificação, já que em anterior despacho, datado de 5 de Maio, apenas se consideravam de nível I os antigos hospitais concelhios.
A Sr.ª Ministra, mais uma vez, esqueceu-se de cumprir a sua própria determinação, o que provocou justo descontentamento da população do concelho de Elvas e limítrofes, utentes desta unidade de saúde.
Este estabelecimento, com uma lotação de 130 camas, funciona em instalações inadequadas e com uma vetustez acentuada (há 250 anos que foram construídas), além de uma localização péssima - em pleno centro da cidade -, o que torna o acesso dos doentes muito difícil, devido ao normal trânsito da zona central da cidade.
Acresce que o Estado paga à proprietária do edifício, a Misericórdia de Elvas, 4151 contos/ano pela sua utilização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A partir de 1983, o Hospital Distrital de Elvas passou a contar com as valências de cardiologia, medicina interna, cirurgia geral, ortopedia, pediatria, obstetrícia, radiologia e laboratório de análises clínicas.
A criação de novas valências foi obra da sua administração, na captação de meios técnicos e humanos, para as tornar operacionais, o que, devido à interioridade de Elvas, foi tarefa naturalmente difícil.
O aumento de valências e a capacidade dos seus técnicos de saúde permitiu não só estancar a fuga de doentes para Badajoz, como alargar a zona de influência natural do Hospital (concelhos de Elvas, Monforte, Campo Maior e Arronches) para concelhos do distrito de Évora, como Alandroal, Vila Viçosa, Borba e Estremoz, que gozam de mais fácil e pronto acesso a Elvas que a Évora. Isto é, a área de influência passou de 50 000 habitantes para cerca de 90 000.
Na verdade, na decisão da Sr.ª Ministra da Saúde não foi ponderada uma séria de factores: a evolução e a diferenciação atingidas, as dificuldades de acesso a Portalegre e Évora, a elevada produtividade e os baixos custos apresentados (10.º lugar a nível nacional) e o facto de Elvas ter tido um crescimento demográfico superior a 10%, foram questões ignoradas pela responsável da Saúde.
Importa referir também que, apesar de insistentemente pedido, nunca foi autorizado o alargamento do quadro do Hospital.
Assiste-se até ao caricato de, com conhecimento do Ministério, o Hospital de Elvas ter apenas uma anestesista, que assiste quatro cirurgiões.
Srs. Deputados, não é com demagogia e com o lavar de mãos por parte do Governo que se resolvem os problemas da saúde do País. São os actos e omissões do Governo que, em prejuízo dos utentes, levam às rupturas que se conhecem. É isto que importa clarificar. A saúde está mal e o Governo é totalmente responsável.
Ou então, se não se considera responsável, nesse caso, demita-se...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os serviços de obstetrícia, situados na maternidade Mariana Martins, que era propriedade de uma instituição particular, foram integrados, entretanto, no Hospital Distrital de Elvas. Os serviços, localizados fora da cidade, têm instalações modelares, com enfermeiros especializados, 32 camas e material sofisticado. No entanto, o aparelho de anestesia nunca foi utilizado!
Isto porque não se fazem operações devido à falta de anestesistas de obstetras, embora o quadro de obstetras do Hospital de Elvas esteja preenchido.
E o incrível também acontece. É que os dois obstetras que fazem parte do quadro do Hospital de Elvas e por este estão a ser pagos, exercem clínica noutro ponto do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No capítulo da saúde, Elvas está doente. Precisa que seja implementada urgentemente a construção de um novo hospital junto à maternidade, cujo início foi previsto para 1987 (embora não existam verbas no PIDDAC/87 e PIDR norte-alentejano para esse fim) e que o actual quadro hospitalar esteja de acordo com a sua dimensão, e não que reduzam a capacidade do actual hospital. As populações do concelho de Elvas e limítrofes assim o exigem!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falando sobre os problemas do concelho de Elvas, não poderia deixar de referir as questões relativas à antiga fronteira do Caia.
Esta povoação, atravessada pelo IP 7, desde que daí se deslocaram os serviços fronteiriços e foram retiradas as cabinas de serviço da alfândega e Guarda Fiscal, é atravessada a alta velocidade pelo trânsito, tendo a população apenas como protecção uma passadeira não protegida por semáforos.

Página 1509

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1509

Se ainda não se registaram acidentes graves, tal pode vir a acontecer com o normal trânsito de peões da povoação e o elevado trânsito automóvel nesta via.
Acresce que já há muito que a iluminação desta povoação não funciona, dando um ar de abandono e vergonha para quem vem de Espanha, vindo duma iluminação feérica para a mais negra escuridão.
Esta situação não se pode manter numa das mais importantes portas de entrada deste Pais.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos a chegar ao final do tempo de duração do período de antes da ordem do dia. Visto que tivemos declarações políticas, há naturalmente possibilidade de prolongamento, caso seja requerido.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que aguarde um momento, Sr. Deputado Malato Correia.
O Sr. Deputado António Capucho pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar a Mesa. Porém, para não quebrar este diálogo, sugeria que V. Ex.ª desse a palavra ao Sr. Deputado Malato Correia, que houvesse a resposta e eu faria depois a minha interpelação.

O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos, tem então a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Deputado Luís Roque, quero dizer-lhe que concordo com muito do que foi dito, pois, como deputado eleito pelo círculo de Portalegre, as suas preocupações são também as minhas. Simplesmente, no que se refere ao Hospital de Elvas, queria apenas solicitar-lhe um esclarecimento.
Referiu que dois obstetras que pertencem ao quadro do Hospital de Elvas se encontram a trabalhar fora um está em Lagos e outro, se não estou em erro, em Setúbal. Assim, quero dizer-lhe que tem razão em tudo à excepção disto, pois não se admite que num hospital - seja em Elvas, em Portalegre ou noutro sitio qualquer - que precisa de técnicos, o director clínico autorize a sua transferência para outros locais.
Portanto, se esses dois obstetras não se encontram hoje em Elvas, foi porque foram dispensados pelo director clínico para começarem a trabalhar noutros hospitais, e, como é óbvio, quando um hospital precisa de técnicos, não pode dispensar nenhum. Isto porque a partir dai falta-lhe toda a autoridade moral para pedir novos obstetras, neste caso para Elvas.
Assim, era só isto que lhe quer dizer, embora, de resto, partilhe consigo de todas as preocupações no que concerne a Elvas, as quais são perfeitamente justas.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Deputado Luís Roque, em primeiro lugar gostaria de lhe dizer que estou de acordo com as questões levantadas por V. Ex.ª acerca do distrito de Portalegre.
Em segundo lugar, queria colocar-lhe a seguinte questão: recentemente fiz aqui uma intervenção sobre o desenvolvimento do plano integrado
norte-alentejano, o qual penso que considerava muitos dos aspectos que estão por resolver em termos do distrito de Portalegre. Assim, queria perguntar ao Sr. Deputado se está de acordo com as considerações que então fiz sobre essa matéria e que têm a ver com o desenvolvimento e o progresso do distrito de Portalegre.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. Luís Roque (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por responder ao Sr. Deputado Miranda Calha, no que diz respeito ao problema do PIDR do Alto Alentejo como resolução dos problemas do Norte Alentejano.
Quanto a essa questão, a nossa opinião é a de que, efectivamente, isso poderia vir a resolver tais problemas. Porém, nada resolve, uma vez que é um balão que se está a esvaziar. Na verdade, foi lançado, com pompa e circunstância, com 50 milhões de contos de atribuição e neste momento já vai com 20 milhões de contos, com tendência a descer por aí abaixo.
Em relação ao que foi dito pelo Sr. Deputado Malato Correia sobre a direcção do Hospital, não foi essa a informação que tive; pode ser confusão minha, mas não foi a informação que tive.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no seguimento da afirmação que V. Ex.ª acabou de produzir há pouco, no sentido de que não teria entrado na Mesa qualquer requerimento para prolongamento do período de antes da ordem do dia. No entanto, tal é normal, já que existe, neste caso e manifestamente, uma praxe no seguinte sentido: quando há uma marcação da ordem do dia - e é o caso, pois, se se permite a expressão, hoje o dia é nosso, há uma marcação do PSD -, ou se fazem apenas as declarações políticas, ou se faz um período de antes da ordem do dia sem prolongamento.
No entanto, Sr. Presidente, poderíamos ser um pouco mais maleáveis no seguinte sentido: antes do nosso projecto de lei existe a ratificação inerente à Casa do Douro, dado que o Sr. Ministro da Agricultura - que penso que irá assistir ao debate - ainda não chegou, poderíamos continuar o período de antes da ordem do dia, sem necessidade de requerimento, até o Sr. Ministro chegar (desde que fosse notificado para se deslocar rapidamente para a Assembleia) e falariam seguidamente os partidos que ainda não tivessem produzido qualquer declaração política ou intervenção, procedendo-se depois à discussão e votação do voto de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado Borges de Carvalho.
Quanto à intervenção do PSD, ela será sobre o voto, pelo que não faríamos declaração de voto depois da votação, a não ser que entretanto apareça um requerimento para o adiar.

Página 1510

1510 I SÉRIE - NÚMERO 39

O Sr. Presidente: - De acordo com a sugestão do Sr. Deputado António Capucho e para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Sá e Cunha.

O Sr. Sá e Cunha (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A costa litoral do distrito de, Aveiro, a norte de São Jacinto, está a ser fortemente fustigada pelas investidas do mar, pondo frequentemente em risco as populações e os seus haveres.
De facto, em fins de Novembro passado, foi a praia do Furadouro, em Ovar, invadida pelo mar, cujas alterosas vagas galgaram vários pontos da avenida marginal e correram ao longo das suas numerosas ruas, pondo em perigo e causando certo pânico ao seu elevado aglomerado populacional.
Recentemente, o avanço do mar deu-se entre a praia da Torreira e a praia do Furadouro, com o mar a galgar e a destruir uma grande parte das dunas e a invadir os férteis terrenos de cultivo ali existentes, que as dunas delimitavam e protegiam.
Assim, a nossa intervenção vai no sentido de alertar as competentes entidades do Poder Central, designadamente a Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, para a gravidade da situação, que anualmente se tem agravado, e, ao mesmo tempo, apelar para a urgente adopção de medidas que a defesa da costa, na zona afectada, impõe.
Finalmente, afigura-se-nos que devem ser cuidadosamente investigadas as causas que possam estar na origem da situação acabada de descrever. A este propósito, refere-se que as populações atingidas apontam como causas prováveis a incontrolada extracção de areias que há anos vem sendo feito na região de São Jacinto e ainda a grande extensão do molhe norte ali em construção, que está a originar desvio de correntes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quaisquer que sejam os motivos do avanço do mar, certo é que, ano após ano, o fenómeno de repete e se agrava. Impõe-se, por isso e com urgência, a tomada de medidas para a defesa do litoral aveirense na zona abrangida.

Aplausos do PRD e do deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em jeito muito telegráfico, devido à exiguidade de tempo de que dispõe o meu grupo parlamentar, pretenderia apenas manifestar ao Sr. Deputado Sá e Cunha a minha solidariedade pelo tipo de intervenção aqui produzido. Isto porque, de facto, os problemas com que se debate toda a zona aqui invocada, quanto ao facto de o mar ter galgado a terra de tal forma, obrigam a que as autoridades tenham a máxima atenção no que respeita ao problema agora suscitado e possam encontrar, o mais rapidamente possível, formas de ultrapassar situações que, ano após ano, têm vindo a pôr em causa uma zona importante do distrito de Aveiro.
Portanto, queria expressar também a minha solidariedade quanto ao apelo que aqui fez a essas mesmas entidades, a fim de que seja possível encontrar soluções que possam obviar a este caos que, ano após ano,, se vai verificando na zona.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Deputado Sá e Cunha, gostava, a este propósito e a este pretexto, de perguntar a V. Ex.ª, na perspectiva da futura regionalização, se o problema que acaba de pôr não será, futuramente, melhor resolvido se todos os actuais concelhos do distrito de Aveiro vierem a pertencer à mesma região, e não, como consta do projecto do seu partido, se, por exemplo, o conselho de Espinho pertencer a uma região diferenciada do distrito de Aveiro, onde são extraídas as tais areias, no interesse dessa zona mais próxima de Aveiro.
Já houve deputados do seu partido, eleitos por Aveiro, que se demarcaram, clara e publicamente, do projecto de regionalização apresentado pelo PRD, afirmando que defendem, em princípio e sem prejuízo da livre escolha das populações, a manutenção, na mesma região, de todos os concelhos que integram o actual distrito.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sá e Cunha.

O Sr. Sá e Cunha (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Começo por responder ao Sr. Deputado Adérito Campos, agradecendo-lhe a solidariedade que manifestou a propósito da minha intervenção.
Relativamente ao Sr. Deputado Carlos Candal, quero apenas dizer-lhe - até porque temos mais deputados inscritos para o período de antes da ordem do dia e o tempo escasseia - que não confundimos estas questões com aquelas que se levantam a propósito da regionalização.
Sabemos que o processo de regionalização está em curso e que a sua concretização ainda levará o seu tempo. Porém, o que é urgente é a defesa do litoral aveirense na zona que refen.
Por conseguinte, para já, é tudo o que tenho a dizer ao Sr. Deputado Carlos Candal.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos, que vai utilizar o tempo que lhe foi concedido pelo CDS e pelo MDP/CDE..

A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: "A água não tem fronteiras, pois é um bem comum que impõe cooperação internacional." Quem o afirma é a Carta Europeia da Água, que consagra os princípios que deverão reger as legislações dos países membros do Conselho da Europa.
Porém, quando se verificam factos como os recentemente ocorridos no rio Guadiana, é legitimo que nos interroguemos: A Península Ibérica é parte integrante da Europa também para a aplicação deste princípio ou será que, qual Jangada de Pedra, vai vogando Atlântico fora?
É sabido que o estado de poluição normal do rio Guadiana exige, de há muito, medidas que tardam em surgir. Mas, quando ocorrem circunstâncias como as verificadas em Dezembro último, em que a descarga de águas ruças dos lagares que laboram nas margens

Página 1511

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1511

do rio Matachel provoca a subida de níveis de matéria orgânica para índices preocupantes (15,6 g/m3) e a redução de quantidade de oxigénio de 11 para 1 mg/l, ocasionando a morte de mais de vinte toneladas de peixe, permanecendo o Governo Português impávido e sereno, quiçá embevecido, de termos um Reno ibérico, questionamo-nos: onde vamos parar?
De uma forma precipitada, o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais tranquilizou os Portugueses: não se preocupem que tudo se passa em Espanha e Portugal não será afectado!
Mas hoje que vemos?
O troço do rio Guadiana, em território nacional, é um lençol de água castanha; a fauna piscícola foi afectada e estima-se que apenas será recuperável, na melhor das hipóteses, no prazo de um ano; a Câmara Municipal de Mértola alerta para o risco de graves epidemias e viu-se forçada a prescindir da captação de água a partir do Guadiana, com as consequentes deficiências de abastecimento para as populações.
É que as autoridades hidráulicas espanholas limitaram-se a abrir as comportas das suas barragens apenas o suficiente para se libertarem da imensa podridão provinda do rio Matachel, empurrando-a para território português. O efeito das marés, que se faz sentir até junto de Mértola, impede que essa podridão seja levada para jusante e ela aí permanece estagnada. E agora o Governo Português permanece quedo e mudo perante a realidade que tem pela frente.
Importará reter que a problemática dos rios internacionais, comuns a Portugal e Espanha, se rege por um convénio, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48 661, de 5 de Novembro de 1968, que não aborda os aspectos da qualidade da água.
Desse convénio resultou a criação da Comissão Luso-Espanhola para Regular o Uso e Aproveitamento dos Rios Internacionais nas suas Zonas Fronteiriças, que de há muito se encontra paralisada.
E o Governo Português, principal parte interessada nesta questão, porquanto 50% dos recursos hídricos superficiais de que o País dispõe são provenientes do território espanhol, nada fez para dinamizar essa comissão e para promover a indispensável revisão e actualização do convénio de 1968.
Hoje são águas ruças de lagares que nos chegam de Espanha; amanhã poderão ser resíduos radioactivos.
Urge salvar os nossos rios. Urge neste momento actual salvar o rio Guadiana!
Será que o Governo Português, nomeadamente os responsáveis pela gestão dos recursos hídricos, desconhecem que, em 1966, a Associação Internacional de Legislação aprovou e recomendou a sua aplicação, pelos países nela filiados, de um documento conhecido como "Regras de Helsínquia", que no seu artigo x determina que um Estado "deve evitar qualquer nova forma de poluição ou qualquer aumento do grau de poluição existente numa bacia hidrográfica internacional que provoque prejuízos sensíveis no território de outro Estado da mesma bacia hidrográfica" e que "deve tomar todas as medidas razoáveis para diminuir a poluição numa bacia hidrográfica internacional até um grau tal que não seja ocasionado qualquer dano substancial no território de outro Estado da mesma bacia hidrográfica".
Estes princípios estão internacionalmente consagrados há mais de vinte anos, mas tudo continua como se não existissem. Se se trata de ignorância relativamente às regras a que deve obedecer a gestão das bacias hidrográficas internacionais, tal facto é imperdoável para quem a nível nacional é responsável pela gestão dos recursos hídricos. Mas, se se trata de negligência, a valoração deste tipo de omissões terá de ser qualificada de forma mais grave.
Estamos em 1987, ano europeu do ambiente, e à luz dos mais elementares princípios que devem enformar a defesa dos diferentes ecossistemas, o contributo mínimo que ao Governo Português cumpre prestar para a salvaguarda dos recursos naturais passa, imprescindivelmente, pela adopção de iniciativas que actualizem os acordos existentes no âmbito da protecção do ambiente, no que concerne aos recursos comuns aos dois países ibéricos. É a própria vida da população desta "jangada" que está em jogo e o tempo perdido já foi demasiado!
Aplausos do PCP, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pergunto se não há na Mesa nenhum requerimento no sentido de adiar a votação do voto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, pois tenciono pronunciar-me sobre essa matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, era minha intenção anunciar o início da discussão do voto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho após as intervenções do período de antes da ordem do dia.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, de qualquer forma vou pronunciar-me agora, pois a minha bancada considera que devemos pronunciar-nos antes e não a título de declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, é que o voto ainda não foi posto à discussão.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, os partidos discutem o voto, desde que ele esteja agendado, no tempo de que dispõem no período de antes da ordem do dia. A não ser que a votação seja adiada e então eu não o farei hoje e fá-lo-ei na próxima reunião.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, hoje não há inconveniente porque há outras intervenções a seguir à sua, se não, dava-se no período de antes da ordem do dia uma grande dissonância: um deputado fala sobre uma coisa, outro sobre outra e depois é que se passa à votação. Neste caso, não há dificuldades pois logo após a sua intervenção passaremos à discussão do voto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho.
Tem então a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curta intervenção acerca do voto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho. O que vou dizer só me obriga a mim, é a opinião pessoal do líder parlamentar do PSD sobre esta matéria, já que a minha bancada votará de acordo com a sua

Página 1512

1512 I SÉRIE - NÚMERO 39

consciência, sem subordinação a qualquer disciplina partidária, uma vez que esta matéria releva do foro íntimo de cada um.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - O voto apresentado tem manifestamente duas questões que se poderiam dissociar e que, do nosso ponto de vista, se deveriam dissociar, mas provavelmente o Sr. Deputado proponente não estará disponível para fazer essa separação.
A primeira parte é aquela em que, aproveitando a efeméride do aniversário do regicídio, se propõe que a Assembleia exprima o seu profundo repúdio pela violência como forma de afirmação política. Independentemente da oportunidade, ou seja, da efeméride que se pretende aproveitar para o efeito (a do regicídio), penso que toda a Assembleia unanimemente estaria disponível para, em abstracto, manifestar o seu profundo repúdio pela violência como forma de afirmação política.
Mas, em boa verdade, esta efeméride não é inocente e considero, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que muito mais relevante para a condenação da violência como forma de afirmação política seriam questões mais actuais e relevantes, como sejam o protesto pela violência inerente à política de apartheid, que é uma questão dos nossos dias; o protesto inerente à violência pela ocupação do Afeganistão pelo exército soviético, pela violência inerente à infindável guerra entre o Iraque e o Irão, que é também uma questão dos nossos dias, pelo fanatismo religioso que assola o Líbano ou pelas guerras que assolam tantos espaços e nações africanas e condenam milhares de cidadãos a morrer de fome todos os dias.
Tudo isto era mais oportuno e mais justificativo de uma manifestação de repúdio por parte desta Câmara pela violência como forma de afirmação política. No entanto, não deixamos de considerar que o regicídio, ocorrido no princípio deste século (na altura poucos de nós éramos vivos) seja um pretexto, embora não seja, de forma nenhuma, o melhor pretexto. Esta é a minha posição pessoal em relação à primeira parte do voto.
Em relação à segunda parte do voto, ou seja, quanto à homenagem do penúltimo Chefe de Estado Português do período do constitucionalismo monárquico, quero dizer que estarei sempre disposto a homenageá-lo como homem simpático que era, como artista, por muitas outras facetas do seu carácter, mas não como Chefe de Estado. Sem prejuízo de muitas qualidades que reconheço ao penúltimo Chefe de Estado Português do período do constitucionalismo monárquico, não poderei homenagea-lo nessa qualidade.
Nesta conformidade, a minha postura pessoal, uma vez que não posso dissociar o profundo repúdio pela violência como forma de afirmação política, será de abstenção em relação ao voto proposto pelo Sr. Deputado Adriano Moreira. Mas a minha bancada, como referi, votará em total liberdade de consciência.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Deputado António Capucho, independentemente do conteúdo da sua afirmação, V. Ex.ª terminou as suas declarações dizendo que se tratava de um voto do Sr. Deputado Adriano Moreira. Como acontece que entre os subscritores do voto não veio o nome do presidente do CDS, penso que terá sido por lapso, ou com qualquer outra intenção, que V. Ex.ª fez essa referência.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Foi lapso. Trata-se de outro ilustre Adriano que não o Sr. Deputado Adriano Moreira, mas sim o Sr. Deputado Adriano Borges de Carvalho.

Risos.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Chamo-me António e não Adriano, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do voto de que é primeiro subscritor o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

Foi lido. É o seguinte:

Na passagem de mais um aniversário do regicídio, a Assembleia da República exprime o seu profundo repúdio pela violência como forma de afirmação política, e homenageia o penúltimo Chefe de Estado Português do período do constitucionalismo monárquico.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de fazer a apresentação deste voto, gostaria ainda de esclarecer um ponto do mini debate que há pouco se gerou à volta da apresentação deste voto, ao qual não posso deixar de aduzir a minha posição pessoal. Na verdade, falou-se em consenso para que pudesse ser agendado este voto, mas julgo que, num bom relacionamento parlamentar, os consensos se têm de estabelecer quando é necessária alguma ultrapassagem ao Regimento. Nessa matéria não houve consenso, pelo que, a posteriori qualquer consenso deixaria de fora não apenas a mim pessoalmente mas todos os subscritores do voto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto, como dizia o Sr. Deputado António Capucho, não é, de facto, totalmente inocente. Não se trata de exprimir o repúdio pela violência como forma de actuação política numa ocasião qualquer; trata-se de o fazer numa determinada efeméride.
No entanto, queria chamar a atenção dos Srs. Deputados para o seguinte: temos, infelizmente, em Portugal um pouco o receio de ultrapassar os nossos próprios limites ideológicos, os nossos próprios fantasmas políticos, em favor daquilo a que, de uma forma dura, se poderia chamar "um certo maniqueísmo intelectual da nossa classe política". Ainda há pouco tempo, nos Estados Unidos, vimos o povo americano homenagear os mortos do Vietname, independentemente da justiça ou injustiça da guerra travada ou da posição pessoal de cada um em face dela.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em Portugal, ainda não vimos fazer o mesmo em relação aos nossos mortos do Ultramar e, por que não, também em relação àqueles que contra nós se bateram e no mesmo campo de batalha morreram.

Página 1513

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1513

O Sr. Raul Rego (PS): - E aos da PIDE!

O Orador: - Por isso, ao propormos este voto, neste momento, propomos também . ..

O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, estou a preparar-me espiritualmente para tomar uma posição relativamente ao seu voto.

Risos.

Tenho uma dúvida: V. Ex.ª também condena a violência utilizada por D. João I a fim de salvaguardar os interesses da Nação Portuguesa relativamente a Espanha e aos adeptos do rei espanhol?

Vozes do PS e do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Silva Marques, muito me surpreende, antes de mais, que ainda esteja a fazer exercícios de aquecimento para este tipo de decisão que, julgo, V. Ex.ª já deverá ter tomado há muitos anos.
Dando isso de barato, julgo que não devemos misturar "alhos com bugalhos" e que se é de facto controvertível a personalidade política que agora se pretende homenagear, também é verdade que, ao fim de 79 anos, já era tempo de muita gente nesta Câmara e na nossa classe política ser capaz de ultrapassar os seus fantasmas e os seus tabus.
Assim, digamos que o que proponho é um assassínio dos fantasmas e dos tabus de cada um, para que possa olhar para a história com a distância e a perspectiva que estes 79 anos nos permitem e saber distinguir o que é a dignidade das pessoas e o seu sacrifício da nossa discordância com as suas atitudes políticas ou com aquilo que para alguns de nós elas poderiam representar.
Lembro que tive nesta Câmara oportunidade de votar favoravelmente um voto por ocasião da comemoração do 31 de Janeiro, porque eu não tenho fantasmas e todos aqueles que morrem por aquilo em que acreditam merecem a minha homenagem, independentemente daquilo porque se bateram, com o que, eventualmente, posso discordar. No entanto, acho que não se deve discutir a dignidade de cada um, a forma como encararam a sua missão histórica, a forma como morreram ao serviço daquilo que consideravam justo e certo.
O convite que faço a esta Assembleia é o de sermos todos nós capazes de, por unanimidade, ultrapassar esse tipo de complexos e de fantasmas e de, numa manifestação verdadeiramente democrática e de tolerância que só nos enobreceria, sermos capazes de unanimemente votar o voto que aqui lhes proponho.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, estão inscritos os Srs. Deputados Raul Rego e Silva Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, está tão compungido com o assassínio de D. Carlos, enaltecendo aqui D. Carlos como se fosse

uma das grandes figuras da nossa história, que se esquece que ele foi o rei dos adiantamentos à Casa Real no correspondente a 4 milhões de contos de hoje. Conhece o Sr. Deputado Borges de Carvalho isso?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, se V. Ex.ª me propusesse o repúdio da violência enquanto terrorismo, violência individual e cega, não teria dúvidas em aderir ao seu repúdio. Mas o Sr. Deputado propõe que repudiemos a violência como forma de afirmação política e, neste caso, devo dizer-lhe que tenho dificuldades em repudiar a violência utilizada por D. Afonso Henriques contra o poder legítimo, tenho dificuldade em repudiar a violência utilizada pelo Mestre de Aviz, bem como muitas outras violências praticadas por aqueles que levaram à afirmação dos interesses da Nação Portuguesa. Dai que eu propusesse a V. Ex.ª uma alteração ao texto que nos propõe, a fim de, eventualmente, conseguir a tal unanimidade que tanto desejaria, pois de outra forma e em rigor o Sr. Deputado não condena outras formas de violência como afirmação política, e refiro-me concretamente àquelas que indiquei.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Deputado Raul Rego, não sei se as contas que apresentou estão ou não bem feitas.

O Sr. Raul Rego (PS): - Então que as faça!

O Orador: - No entanto, o convite que lhe fiz mantém-se e V. Ex.ª é ou não capaz de ultrapassar isso, em nome da história, da tolerância democrática e de outras coisas talvez mais importantes do que os defeitos ou qualidades que possamos estar a discutir, em relação à personalidade em causa.
Quanto aos casos que o Sr. Deputado Silva Marques referiu, é evidente que o que houve foi afirmação política à qual corresponderam formas de violência que podemos considerar legítimas, o que não é o caso do terrorismo, do assassínio nas ruas, etc. ... Portanto, se V. Ex.ª puder, no seu português que certamente é mais rico do que o meu, fazer alterações que não prejudiquem o sentido da homenagem, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, se não conhece a história de D. Carlos era bom que se informasse em relação a ela. Os documentos estão publicados, foram encontrados na Casa Real e estão lá expressos os adiantamentos pedidos entre 1890 e 1908; basta pedir ao Banco de Portugal, que é um organismo sério, para fazer as contas e saber as equivalências.
Quanto ao voto, ele não representa mais do que uma provocação aos democratas da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

Página 1514

1514 I SÉRIE - NÚMERO 39

Quem o apresenta não sentiu os assassínios da PIDE, nem nunca entrou nos protestos contra os assassinados no Tarrafal e em Caxias...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... mas proponho à reacção portuguesa que apresente um voto contra o assassínio do duque de Viseu pelo rei D. João II, outro pelos assassinados no Cais do Sodré e na Praça Nova pelo rei D. Miguel...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... outro pelo assassínio do general Humberto Delgado por elementos da PIDE.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

Por outro lado, quero acrescentar ao voto do Sr. Deputado Borges de Carvalho um protesto contra o assassínio de três cidadãos portugueses pelas Forças Armadas, sem julgamento, no Terreiro do Paço, no dia 1 de Fevereiro de 1908: Manuel Buissa, Alfredo da Costa e Sabino da Costa.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente, em boa verdade não sei, pois é para pedir esclarecimentos, defender a minha honra e protestar.

O Sr. Presidente: - Tem de escolher, Sr. Deputado.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep): - Pode ser para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra para esse efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Antes de mais, quero dizer ao Sr. Deputado Raul Rego que não deveria personificar tão taxativamente este voto que fui encarregado de defender nesta Câmara, pois não fui só eu quem o assinou, há mais doze ou treze Srs. Deputados que o subscreveram. Portanto, as suas ofensas, Sr. Deputado, são dirigidas a todos eles e não só a mim.

O Sr. Raul Rego (PS): - Não ofendi ninguém, só apresentei factos.

O Orador: - Em relação aos democratas desta Casa, quis dar a oportunidade a V. Ex.ª de demonstrar que essas coisas estavam ultrapassadas. Por outro lado, V. Ex.ª vem com questões de antes do 25 de Abril, do período da 2.ª República de que tanto gosta.

O Sr. Raul Rego (PS): - Antes da 2.ª República foi 1908!

Uma voz do PSD: - Tenha calma, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado, que eu saiba, o almirante Américo Tomás não era filho do marechal Craveiro Lopes ...

Risos.

... e, portanto, a ditadura foi republicana e não monárquica.
V. Ex.ª volta, portanto, com o período. da 2.ª República para chamar antidemocratas às pessoas!

O Sr. Raul Rego (PS): - Não foi aprovada por mim, eu só tive a cadeia!

O Orador: - V. Ex.ª não consegue ultrapassar-se a si próprio nem reconhecer aos outros aquilo que, já agora, terão feito para que ela nascesse. Lembro ao Sr. Deputado que tive a honra de o conhecer na Rua dos Fanqueiros, na candidatura da CEUD, muito antes de 1974. Certamente não se lembra disso e é natural, mas na altura eu era já um jovem militante no seio daquilo a que se pode chamar os democratas portugueses em geral e não tenho lições a pedir-lhe nem tenho de as receber de V. Ex.ª, no que diz respeito à defesa da democracia em Portugal. Não lhe devolvo os epítetos porque não está no meu espirito ser tão maniqueísta nem ter os olhos tão fechados como V. Ex.ª e recuso-me a chamar democrata ou antidemocrata seja a quem for. Aprecio as atitudes que as pessoas tomam e devo dizer que a que V. Ex.ª aqui tomou há pouco é altamente antidemocrática para aquilo que eu considero serem valores da democracia: a tolerância, a compreensão e o despique político.
Em relação aos votos que V. Ex.ª sugere, pois apresente-os V. Ex.ª e vamos a ver como é que cada um de nós os vota, vamos a ver se, também nessa altura, se verificará ou não uma diferença entre a atitude democrática de V. Ex.ª e a minha.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, era para fazer uma proposta de alteração ao texto do Sr. Deputado...

O Sr. Raul Rego (PS): - Peço a palavra para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, queira aguardar a sua vez de inscrição e dar-lhe-ei a palavra a seguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego, para defesa da honra.

O Sr. Raul Rego (PS): - Quero dizer ao Sr. Deputado Borges de Carvalho - ao que parece, segundo disse, era menino antes do 25 de Abril - que não recebo nenhumas lições de democracia dessa bancada, embora conte alguns amigos nela. Repito, não recebo lições de democracia, muito menos quanto a procedimentos de antes do 25 de Abril.
Quanto às lições de História, digo-lhe que a nossa não começou em 1908. A história portuguesa começa pelo menos no século XII, em 1111, com D. Afonso Henriques. Então, se for propor um voto de protesto por cada assassínio real até hoje, tem muitas dezenas deles a fazer.

Página 1515

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1515

O Sr. Presidente - Sr. Deputado Silva Marques, tem a palavra.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Borges de Carvalho, proponho-lhe uma alteração ao texto do voto de protesto apresentado por si, a qual me parece que permitiria um maior consenso:

Voto de protesto

Na passagem de mais um aniversário do regicídio, a Assembleia da República exprime o seu profundo repúdio por tal tipo de violência como forma de afirmação política, relembrando a este propósito o penúltimo chefe de Estado Português do período do constitucionalismo monárquico.

O Sr. Presidente: - Os subscritores deste voto, em particular o Sr. Deputado Borges de Carvalho, aceitam a alteração proposta pelo Sr. Deputado Silva Marques?

O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - Sr. Presidente como não há objecções por parte dos outros subscritores aqui presentes, pela minha parte aceito a alteração proposta.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques peço-lhe que envie à Mesa o texto definitivo do voto, de protesto.
Srs. Deputados, como não há inscrições, submeto à votação o voto de protesto, com a nova redacção agora proposta.

Pausa.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PRD, do PCP e de 2 deputados do PSD, votos a favor de 29 deputados do PSD, 7 deputados do CDS e dos Srs. Deputados Independentes Borges de Carvalho e Gonçalo Ribeiro Teles e com a abstenção do MDP/CDE, de 16 deputados do PSD, de 4 deputados do PRD e de 2 deputados do CDS.

Srs. Deputados, apenas podem fazer declarações de voto os representantes dos grupos parlamentares que não intervieram no debate. Estão neste caso o Sr. Deputado Carlos Brito, do PCP, e o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha, do MDP/CDE. Os Srs. Deputados Frederico Moura e Ribeiro Teles inscreveram-se para esse efeito mas não podem fazer declarações de voto orais.
Sr. Deputado Ribeiro Teles, tem a palavra.

O Sr. Ribeiro Teles (Indep.): - Sr. Presidente, evidentemente que gostaria de fazer uma declaração de voto e tenho a aceitação do Partido Socialista para o fazer, mas se tal não for possível, entregá-la-ei na Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ribeiro Teles, regimentalmente não é possível. Terá de fazer chegar à Mesa a sua declaração de voto por escrito.

O Sr. Ribeiro Teles (Indep.): - Lamento.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Somos, naturalmente, solidários com as gerações de republicanos que nos precederam e com a apreciação que nos deixaram sobre a actuação política do rei D. Carlos. Mas a razão principal por que votámos contra o texto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho foi por entendermos que seria um péssimo caminho para a Assembleia da República começar a julgar os acontecimentos e as personalidades da nossa História com os conceitos e os valores políticos de hoje. Já aqui foram citados alguns exemplos para nos mostrarem quanto seria absurdo fazê-lo. Não o podemos fazer!

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Tengarrinha.

O Sr. José Manuel Tengarrinha (MDP/CDE): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a nossa abstenção queremos dizer que consideramos este voto irrelevante e até absurdo. Lamentamos que a Assembleia da República tenha perdido tanto tempo com este caso.
A nossa primeira reserva, portanto, é sobre a oportunidade de voto. Estamos contra a apresentação de votos desta natureza na Assembleia da República, os quais, de facto, não têm sério alcance histórico e cultural e apenas mais não visam do que tirar efeitos de duvidosa oportunidade política.
Repudiamos inequivocamente qualquer forma de violência como meio de afirmação política e, nesse caso, ainda com mais fortes razões, protestamos contra os que foram assassinados por defenderem a liberdade, por defenderem a justiça, por defenderem o pão, aí incluindo desde alguns dirigentes republicanos, assassinados pela Monarquia, até aos mártires do Tarrafal.
Não podemos, porém, prestar homenagem ou lembrar saudosamente o monarca que, sob a aparência de bonomia e de bon vivant, permitiu e até fomentou a escandalosa corrupção e degradação que marcaram os últimos anos da Monarquia Portuguesa, um soberano que era contra os ventos da História que, havia mais de vinte anos, sopravam contra o regime monárquico no nosso país, como expressão da vontade nacional e patriótica do povo português. Ai, não só não podemos associar-nos como protestamos vivamente contra a actuação política do rei D. Carlos.

Aplausos do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Frederico de Moura, tinha pedido a palavra mas não lha posso conceder, na medida em que só pode apresentar a sua declaração de voto por escrito.

O Sr. Frederico de Moura (PS): - Sr. Presidente, era apenas para dizer que, de facto, apresentarei na Mesa a minha declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é tempo de assinalarmos a presença nas galerias de alunos e professores da Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo, de Leiria, da Escola Secundária de Sacavém e da Escola Secundária de Cascais, os quais assistem à sessão.
A todos saudamos calorosamente.

Aplausos gerais.

Página 1516

1516 I SÉRIE - NÚMERO 39

Srs. Deputados, chegámos à hora do intervalo regimental, Vamos suspender os nossos trabalhos que recomeçarão às 17 horas e 50 minutos.

Eram 17 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, embora compreendendo a marcação do PSD, por razões de necessidade do meu grupo parlamentar, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, solicitamos a interrupção dos trabalhos por 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o pedido é regimental, pelo que declaro a sessão interrompida até às 18 horas e 15 minutos.

Eram 17 horas e 57 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando no período da ordem do dia, vamos passar à votação das ratificações n.ºs 126/IV (PCP), 127/IV (PRD) e 128/IV (PS), que incidem sobre o Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro (Lei Orgânica Hospitalar), que revoga o Decreto-Lei n.º 129/77, de 2 de Abril.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, solicitava que fossem chamados à Câmara os Srs. Deputados que se encontram dentro da Assembleia, mas reunidos em comissões.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul Castro, já foram feitas diligências nesse sentido, uma vez que vamos proceder a votações. Mo entanto, iremos fazê-las novamente.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos passar à leitura e votação de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer de Comissão de Regimentos
e Mandatos

Em reunião realizada no dia 3 de Fevereiro de 1987, pelas 16 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Amândio Anes de Azevedo (círculo eleitoral
de Vila Real), por Abílio de Mesquita

Araújo Guedes. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5. º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a três meses, a partir do dia 3 de Fevereiro corrente, inclusive.

Solicitada pelo Partido Renovador Democrático:

Eurico Lemos Pires (círculo eleitoral de Braga), por José Torcato Dias Ferreira.
' Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n. º 2 do artigo 5. º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a 3 meses, a partir do dia 5 de Fevereiro corrente, inclusive.

Solicitadas pelo Partido Comunista Português:

Octávio Floriano Rodrigues Pato (círculo eleitoral de Lisboa), por José Manuel Santos de Magalhães. Esta substituição é pedida os termos da alínea c) do n. º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a três meses, a partir do dia 1 de Fevereiro corrente, inclusive;
Angelo Matos Mendes Veloso (círculo eleitoral do Porto), por António Manuel da Silva Osório. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a seis meses, a partir do dia 31 de Janeiro passado, inclusive;
Maria Margarida do Carmo Tengarrinha Campos Costa (círculo eleitoral de Faro), por José Estêvão Correia da Cruz. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5. º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a três meses, a partir do dia 4 de Fevereiro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - Álvaro José Rodrigues de Carvalho (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Carlos Manuel Luís (PS) - Mário Manuel Cal Brandão

Página 1517

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1517

(PS) -Jaime Manuel Coutinho Ramos (PRD) Carlos Alberto Correia Rodrigues Matias (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) José Manuel Antunes Mendes (PCP) - António José Borges de Carvalho (CDS).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente Borges de Carvalho.

Srs. Deputados, vão ser lidos os projectos de resolução apresentados pelos subscritores dos pedidos de ratificação do Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro, ou seja, das ratificações n.ºs 126/IV, 127/IV e 128/IV.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Os projectos de resolução foram apresentados pelo Partido Renovador Democrático, pelo Partido Comunista e pelo Partido Socialista.
Sendo o conteúdo perfeitamente igual a Mesa procederá apenas à leitura de um dos textos - o do PRD, uma vez que foi o primeiro a dar entrada na Mesa.
O projecto de resolução é do seguinte teor:

1 - Os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Renovador Democrático abaixo assinados propõem, nos termos do artigo 172.º da Constituição e do artigo 195.º do Regimento, a recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro, sobre gestão hospitalar.
2 - São repristinadas as normas legais revogadas pelo Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se houver acordo, vamos proceder à votação conjunta, na generalidade, dos três projectos de resolução, uma vez que têm conteúdo idêntico.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles, votos contra do PSD e abstenções do CDS e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

Vamos agora proceder à votação na especialidade.
Os projectos de resolução são compostos por dois números, pelo que, não havendo pedidos para que sejam votados separadamente, serão esses dois pontos votados em conjunto.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votas a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles, votos contra do PSD e abstenções do CDS e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

Vamos agora proceder à votação final global dos projectos de resolução.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votas a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles, votos contra do PSD e abstenções do CDS e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

Solicitaram a palavra para fazer declaração de voto os Srs. Deputados Raul Castro, Vidigal Amaro e Horário Marçal.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa no sentido de saber se há lugar a declarações de voto.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Julgo que, em princípio, não deveria haver, desde que tenha havido intervenções durante o debate. Caso se reconheça a possibilidade de se fazerem declarações de voto, a minha bancada fará uma declaração de voto. Mas creio que não deverá haver lugar a tais declarações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa irá verificar esse aspecto.

Pausa.

Sr. Deputado Lopes Cardoso, relativamente às propostas de lei e aos projectos de lei, houve uma interpretação na conferência de líderes parlamentares no sentido de ser possível fazer declarações de voto orais nas votações finais globais, por se considerar o Regimento manifestamente inadequado nesse ponto.
Estamos perante votações de projectos de resolução, que não têm exactamente a mesma natureza da proposta de lei ou do projecto de lei. Mas por analogia, se não houver oposição a esta interpretação, conceder-se-ia a palavra aos Srs. Deputados - um por cada grupo parlamentar - para uma declaração de voto, caso o queiram fazer.
Proceder-se-á deste modo até melhor apreciação desta questão em sede de revisão regimental.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pouco temos a acrescentar ao debate que aqui se fez, durante dois dias, no decorrer da passada semana, mas não podemos deixar de nos regozijar com o resultado obtido.
O que realmente se pretendia era responsabilizar os órgãos de gestão dos hospitais pelo seu mau exercício e pelo seu mau funcionamento.
Ora, quando da parte do Governo (que é o único responsável por isso) se retiram meios financeiros, técnicos e humanos a esses hospitais, não se podem responsabilizar os gestores pelo mau funcionamento dos mesmos.
Foi isso que o Governo aqui pretendeu trazer, através deste decreto-lei. O que se pretendeu fazer mais não foi do que responsabilizar os órgãos directivos dos hospitais pelo péssimo funcionamento dos serviços hospitalares.
Isso é inconcebível e não se pode admitir. E a Assembleia da República ao "reprovar" este decreto-lei mais não fez do que dar razão aos gestores que nesta altura estão nos hospitais e garantir uma gestão democrática dentro deles.
Ao Governo compete, se assim o quiser - e tem poderes para isso! - nomear delegados nos hospitais em que julgue existir uma má gestão, para, desse

Página 1518

1518 I SÉRIE - NÚMERO 39

modo, poder fazer uma correcção dessa mesma gestão. Por isso, acho que a Assembleia da República, no exercício das suas competências, fez o que lhe competia fazer, e julgo ser um passo positivo no seu exercício.
Não queria deixar de referir que também a Comissão Parlamentar e nós, nesta bancada, já nos manifestámos de acordo com uma revisão dessa legislação. Alguns partidos já apresentaram projectos de lei nesse sentido; o mesmo fará a nossa bancada, no seguimento do que manifestaremos, na Comissão, o nosso melhor trabalho a fim de que brevemente seja aprovada nova legislação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - O MDP/CDE congratula-se com a rejeição desta iniciativa legislativa do Governo, uma vez que visava claramente, por um lado, transferir para o Governo aquilo que até agora tem sido da iniciativa dos próprios trabalhadores dos hospitais e, por outro lado, através dessa transferência o Governo procurava salvar a face - em especial a Sr.ª Ministra da Saúde - da má gestão que este Governo tem feito nos hospitais, conduzindo-os a uma situação de pré-ruptura.
É sabido que o Governo, e em especial a Sr.ª Ministra da Saúde, tinha já, no domínio da legislação em vigor, instrumentos de intervenção na administração hospitalar, sempre que ela fosse negativa. Não o fez. Vir aqui pretender transferir para o Governo aquilo que é da competência dos trabalhadores hospitalares, isto é, a escolha dos órgãos de gestão hospitalar, é um mero estratagema em ordem a justificar o fracasso da sua actuação.
Por isso, a Assembleia da República, ao rejeitar a proposta do Governo, repôs a legalidade democrática e prestou um valioso serviço à população deste país.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor dos projectos de resolução, isto é, votámos contra o decreto-lei do Governo sobre gestão hospitalar, por razões que não vou repetir mas, sim, resumir, visto que tais razões já foram expostas durante o debate.
Pensamos que o decreto-lei não merecia ser aqui reprovado não fora o facto de ele ter sido o ponto de partida para um decreto regulamentar, que, esse sim, contém uma filosofia e contém medidas que não poderíamos aceitar.
Quanto ao decreto-lei em si, ele limitava-se a consagrar certas leis (ou certos princípios de gestão) que estão, na sua grande maioria, a ser já aplicados em todos os hospitais e que nós naturalmente desejaremos ver aplicados.
Mas quanto ao decreto regulamentar que teve origem neste decreto-lei, ele vinha, de facto, alterar profundamente as regras da gestão hospitalar. Punha em causa, acima de tudo, a competência dos técnicos que o Ministério da Saúde hoje possui relativamente a esta matéria e introduzia regras que levariam, matematicamente, à partidarização e à instabilidade na gestão dos hospitais.
Compreendemos e desejamos que a gestão participada que tem vigorado nos hospitais e que, na nossa opinião, é responsável pela melhoria que se tem observado nos hospitais nos últimos anos - não sendo responsável pelas carências enormes que se observam neste momento nos hospitais, porque essas são essencialmente devidas à falta de meios postos à disposição dos hospitais - deve continuar a ser aplicada, dado que a dinâmica que ela introduziu é aproveitável, sob todos os pontos de vista. Mas também entendemos que há algumas correcções a introduzir na lei anterior. Já as anunciámos e será nesse sentido que o meu partido apresentará, provavelmente ainda no decorrer desta semana, um projecto de lei sobre gestão hospitalar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conforme tivemos oportunidade de expressar durante o debate, o CDS só votaria a favor da ratificação deste decreto-lei se lhe fossem introduzida emendas que o beneficiassem e dessem satisfação às preocupações já largamente expendidas.
Como não lhe foram introduzidas as emendas por nós julgadas necessárias, o CDS absteve-se nesta votação, mas fê-lo altamente preocupado com a saúde deste pais. Por isso, apresentaremos amanhã, neste Parlamento, uma lei alternativa para a gestão hospitalar e daremos toda a nossa colaboração ao nível da Comissão de Saúde, para que, com celeridade, o País tenha uma lei aprovada maioritariamente e que dê plena satisfação não só aos interesses dos profissionais da saúde como aos das populações utentes.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos de Vasconcelos.

O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer que pensamos que a nossa posição ficou perfeitamente clara e definida durante o debate e que por isso iremos enviar para a Mesa, por escrito, a nossa declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Por último, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD deixou também bem expressa a sua posição no Plenário, durante o debate desta questão.
Votámos contra os projectos de resolução porque o diploma que o Governo publicou era um diploma bastante positivo, que poderia introduzir melhorias substanciais na gestão hospitalar.
Pensámos que se tratava de uma verdadeira reforma estrutural nesta área. A Assembleia da República não entendeu assim e fica agora com a responsabilidade política de arranjar uma solução melhor.
Chamámos sobretudo a atenção para a argumentação que foi utilizada para que este decreto-lei não fosse ratificado. Viu-se que não era o decreto-lei que estava em causa - chegámos ao absurdo de ouvir alguns partidos dizerem que o decreto-lei era até globalmente positivo -, sendo que o que se pretendia atingir era

Página 1519

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1519

o decreto regulamentar e não o próprio decreto-lei. E o argumento substancial que aqui foi invocado pela oposição e que é absolutamente ridículo, foi o de que, pelo facto de o Governo poder ter a capacidade de nomear gestores para órgãos da administração que de si dependem, isso implicava a partidarização desses órgãos.
Entendemos que é um argumento doentio que, numa Câmara democrática, não deveria ser apresentado. O Governo tem legitimidade democrática; o Governo é escolhido por forma indirecta, depois do resultado de eleições livres, universais e secretas; e o Governo, que é legitimado democraticamente, responde, perante a Assembleia da República, pela sua actividade e pela actividade de todos os órgãos da Administração de si dependentes. Há sempre a possibilidade de um controle político por parte da Assembleia da República dos actos do Governo e dos actos dos órgãos deste dependentes.
Entendemos, por isso, que este argumento que, no fundo, foi um argumento substancial brandido por alguns partidos da oposição para chumbarem este projecto-lei, não tem nenhuma razão séria em cuja base possa ser sustentado. Foram razões meramente formais que impediram que este diploma, que era, a nosso ver, positivo, pudesse vigorar na nossa ordem jurídica.
Os partidos da oposição que "chumbaram" o decreto-lei do Governo são agora responsáveis perante o País por arranjar uma solução melhor do que esta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora ao ponto seguinte da ordem do dia, do qual consta a discussão das ratificações n.ºs 100/IV (CDS) e 105/IV (PCP), relativas ao Decreto-Lei n.º 313/86, de 24 de Setembro, que extingue a Casa do Douro criada pelo Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Setembro.
Estão, pois, em discussão, Srs. Deputados.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A publicação do Decreto-Lei n.º 313/86, de 24 de Setembro, constituiu, sem dúvida, um acto surpreendente deste governo: surpreendeu os vitivinicultores, que não foram chamados a pronunciar-se sobre o diploma; surpreendeu o Conselho Agrário e a direcção da Casa do Douro que foram confrontados com uma versão do diploma obtida por forma sigilosa e bastante diversa do projecto que lhes fora apresentado, e surpreendeu todos os partidos políticos, mesmo aqueles que suportam o Governo, a avaliar pelas declarações que sobre o respectivo teor teceram depois parlamentares, autarcas e dirigentes partidários da região duriense.
Pela nossa parte, não deixaremos de salientar que a nossa surpresa assenta em dois fundamentos. Em primeiro lugar, interrogamo-nos sobre os motivos que levaram o Governo a aplicar à Casa do Douro a pena capital. E isto, porque na exposição de motivos constante do diploma nenhum encontrámos que minimamente justifique a opção de extinguir uma instituição com as tradições, a representatividade e as tarefas de interesse regional e nacional que lhe estão atribuídas, como é a Casa do Douro.

Refere o Governo que a extinção vem na sequência do propósito anunciado no Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Dezembro.
No entanto, se bem entendemos o preâmbulo deste diploma, ele apenas diz, e passo a citar "devendo o Estatuto da Casa do Douro ser objecto da nova revisão quando se proceder à reformulação orgânica e funcional do Instituto do Vinho do Porto".
Assim, não tendo sido ainda reformulado o Instituto do Vinho do Porto, nem sequer haveria lugar à revisão do Estatuto da Casa do Douro, quanto mais à sua extinção.
Em segundo lugar, o que os vitivinicultores do Douro e as suas organizações esperavam e têm reivindicado do Governo, não é a eliminação da Casa do Douro: é uma maior autonomia económica e financeira deste organismo e da vitivinicultura duriense.
É a definição e criação de linhas de crédito bonificado para a reconversão das vinhas velhas, para melhoria da qualidade e aumento da produção.
É sobretudo uma acção intensiva, permanente, agressiva e penetrante em novos mercados internacionais, no sentido de aumentar a exportação do vinho do porto até se conseguir o escoamento de toda a produção potencial, por forma a dar satisfação à mais antiga e mais justa aspiração dos vinicultores da Região Demarcada do Douro.
A possibilidade de beneficiação integral do precioso vinho que produzem naquela região. As nossas embaixadas e os nossos postos consulares muito poderiam fazer nesta área e o desafio aqui lhes fica..., mais uma vez.
Mas o diploma não é apenas surpreendente, é também um diploma ambíguo, carregado de falta de rigor.
Embora no seu preâmbulo venha manifestado o propósito de obter uma situação "capaz de exprimir e respeitar os diversos e por vezes algo contraditórios interesses em presença" - e são palavras do legislador -, a verdade é que a opção tomada se afigura desconcertante.
Pretender substituir a actual Casa do Douro - pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira - por uma associação representativa dos produtores da região não se coaduna com os princípios que enformam a nossa Constituição sobre liberdade de associação.
Caberia perguntar ao Governo: quantas associações pensa que poderiam constituir-se?
Qual dessas associações seria representativa dos produtores da região, ou seja, com que fundamento jurídico-constitucional o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação iria reconhecer a uma delas e não a todas o direito de utilizar a designação tradicional da Casa do Douro e a representatividade dos vitivinicultores associados ou não?
A qual dessas associações seria atribuído o património da Casa do Douro, que é de todos os agricultores do Douro, hoje avaliado em mais de 15 milhões de contos?
E depois: o que deve entender-se por representação indirecta dos agentes económicos?
Mas há mais: segundo o decreto-lei, o vínculo laboral que liga os funcionários da Casa do Douro a esta instituição extinguir-se-ia, sendo substituído por um vínculo novo que os ligaria ao Instituto do Vinho do Porto.
Entretanto, a situação deste pessoal teria algo de muito curioso, multifacetado e francamente inovador: vinculado funcionalmente ao Instituto do Vinho do

Página 1520

1520 I SÉRIE - NÚMERO 39

Porto, exerceria funções numa associação privada, que suportaria os encargos e dependeria disciplinarmente dos dirigentes do Instituto. Seria isto possível, na prática?
Entendemos que não!
Por último, dispõe o diploma que só poderá utilizar a designação de Casa do Douro a associação que aceitar o disposto no clausulado sobre a integração e o estatuto do pessoal da instituição extinta. Nada mais indefinido. Porque desde logo podem colocar-se várias questões, como sejam: se nenhuma associação aceitar esse clausulado, quem representará legitimamente os vitivinicultores durienses? Se uma associação aceitar esse clausulado e, posteriormente, por deliberação da sua assembleia geral, o rejeitar?
Enfim, todo o diploma enferma de indefinição, vacuidade, incerteza e até ligeireza técnico-jurídica.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Casa do Douro deve continuar a ser um órgão orientador, prestador de serviços e dinamizador da região duriense. As competências que detém devem ser-lhe mantidas e a sua autonomia administrativa e económico-financeira alargada.
Entendemos, por isso, dever ser negada ratificação ao Decreto-Lei n.º 313/86, de 24 de Setembro, e represtinadas as normas legais do Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 230/83, de 28 de Maio, e ao qual oportunamente proporemos as alterações que a conjuntura determinar. Nesse sentido, o CDS fez entrega do respectivo projecto de resolução.
Não aceitaremos legislação que, a coberto do reconhecimento da natureza associativa, de índole privatística dos interesses da lavoura directamente ligados ao vinho da Região do Douro, acabe, afinal, por reservar a um instituto alheio aos produtores os poderes públicos que, de facto, determinarão a vitivinicultura desta região.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate que hoje realizamos na Assembleia da República sobre a Casa do Douro tem plena justificação. O governo do PSD pós em causa interesses legítimos dos produtores da região duriense. Mais uma vez o Governo apresenta-se aqui com duas caras: comprometeu-se a revogar o Decreto-Lei n.º 313/86, mas acabou por não o fazer. Mais um exemplo a juntar a outros recentes em que, ou o Secretário de Estado mentiu aos agricultores e proeurou enganar a Assembleia da República e retardar o debate da ratificação deste diploma, ou este membro do Governo foi alvo de uma desautorização por parte do primeiro-ministro. Mas essa é uma guerra interna do próprio Governo.
O que importa agora é que seja a Assembleia da República face à incapacidade do Governo a defender os agricultores da região.
Srs. Deputados, perante a inexistência de legislação capaz de integrar, de forma global, a complexidade das relações de produção na Região Demarcada dos Vinhos do Douro, cujas características não se podem confundir com as demais regiões, o Governo com o seu Decreto-Lei n.º 313/86 mais não fez que comprometer os direitos e interesses legítimos dos produtores da região duriense.
A pretender modificar - a natureza jurídica da Casa do Douro, tentando conferir-lhe a qualidade de pessoa colectiva privada, sem sequer estabelecer o âmbito das suas competências e atribuições, o Governo criou as condições para que as grandes casas exportadoras que detêm cada vez maior parcela da produção se integrassem na nova associação e pudessem fazer prevalecer os seus interesses sobre os dos produtores tradicionais, particularmente dos pequenos agricultores com menos de dez pipas, que constituem 85 % dos vitivinicultores do Douro.
Esta situação seria duplamente agravada já que seria igualmente possível que grande parte dos interesses dos produtores, hoje acautelados pela Casa do Douro, viessem a ficar. nas mãos do IVP (Instituto do Vinho do Porto), que ninguém ignora ser hoje dominado pelas casas exportadoras.
A este propósito, aliás, importa ter presente e tirar as devidas ilações do facto de, embora ter estado prevista a reformulação e funcionamento do IVP, esta continuar por fazer.
Todo o processo que envolve o Decreto-Lei n.º 313/86 afigura-se pouco credível, mesmo que se invoque a necessidade de assegurar o eficaz controle da produção vitícola e vinícola. E não podemos estar de acordo com conclusões do tipo "que este controle para ser eficaz tem de ser independente do vitivinicultor".
Na verdade, ninguém mais que os produtores está interessado em preservar o futuro, produzindo com qualidade, desde que se lhes não negue o apoio técnico e os incentivos necessários não serão com certeza aqueles, que com o seu suor conquistaram as encostas íngremes do Douro, realizando autênticas obras-primas de engenharia agrícola, que comprometerão o futuro desta produção tão generosa quanto é a generosidade dos que o produzem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se o Governo ao pretender impor o Decreto-Lei n.º 313/86 não deu resposta aos direitos e legítimos interesses dos produtores do Douro, a verdade é que continua, agora mesmo, depois de ter ouvido as suas reclamações, sem os respeitar.
Com efeito, o Sr. Secretário de Estado comprometeu-se a não aplicar o decreto-lei agora em discussão. Dizia o Sr. Secretário de Estado, na Régua, num plenário de vitivinicultores:

A vontade do Governo é atender aos interesses do Douro e dos seus vitivinicultores. Que atendendo a vontade expressa por unanimidade do conselho agrário, que representava a totalidade dos vitivinicultores da região do Douro, de não formar nova associação, o Decreto-Lei n.º 313/86 se tornava inexequível e que, por tal facto, iria propor ao Governo a sua revogação.

Dizia ainda que:

O Decreto-Lei n.º 313/86 caia por inutilidade uma vez que os vitivinicultores o rejeitam no seu todo. Caso venha a ser criada a nova associação, nos termos do Decreto-Lei n.º 313/86, só poderia ser reconhecida se obtivesse o apoio de mais de dois terços do Conselho Regional Agrário, em votação. Vou tomar providências, no sentido de se proceder a eleições nos termos do Decreto-Lei n.º 486/82, ainda este trimestre.

Página 1521

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1521

Acabei de citar extractos da acta da reunião.
Agora estamos confrontados com uma situação bem diferente: o Governo não respeitou os seus compromissos e deu o dito por não dito.
Afinal, o desastroso Decreto-Lei n.º 313/86 seria para continuar. Mas a Assembleia da República pode e deve revogar aquilo que o Governo não foi capaz de fazer. E muitas são as razões para tal.
O Governo pretende lançar a confusão entre o Decreto-Lei 486/82 que criou a Casa do Douro, como pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e o Decreto-Lei n.º 313/86 que cria uma nova associação, pessoa colectiva privada de utilidade pública.
Ora, uma associação nos termos da lei regula-se exclusivamente pela vontade dos seus associados e com estatutos próprios aprovados por eles. E, nesta óptica, é clara a filosofia do Decreto-Lei n.º 486/82.
O mesmo não se pode dizer do Decreto-Lei n.º 313/86 que consagra o contrário no seu artigo 1.º, n.º 4.
A associação que representaria os produtores do vinho da região, no que respeita à gestão e à competência técnica, ficaria dependente de reconhecimento do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação.
Estão pois claros os objectivos do governo de Cavaco Silva. O governo do PSD insiste, portanto, em legislar sem sequer ouvir as opiniões das organizações de agricultores e da lavoura do Douro. É uma opção pela qual tem de ser responsabilizado na Assembleia da República e no Pais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Casa do Douro deve manter o actual estatuto de pessoa colectiva de direito público, com a participação dos vitivinicultores durienses na eleição democrática dos seus dirigentes.
A Casa do Douro deve manter as suas funções tradicionais e constituir-se ainda como agente impulsionador e sócio de uma sociedade anónima, com capital exclusivamente da lavoura, virada para a exportação do vinho generoso.
Neste sentido, a recusa da ratificação e a consequente revogação do Decreto-Lei n.º 313/86 constitui a única atitude que esta Assembleia da República pode assumir com a certeza de que assim estará a corresponder aos verdadeiros anseios dos vitivinicultores do Douro.
Os agricultores e a gente de Trás-os-Montes bem o merecem.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Bastos.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Casa do Douro é o organismo representativo de toda a vitivinicultura da região Duriense que abrange 22 concelhos, distribuídos por quatro distritos e representa cerca de 30 000 viticultores, muitos deles inscritos nas 24 adegas cooperativas da região.
Vigorando como organismo de feição corporativa desde 1932, após a sua extinção depois do 25 de Abril de 1974, foi-lhe dada nova formulação jurídica, criada pelo Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Dezembro. É uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e património próprio e tem por objectivo a defesa dos interesses dos viticultores durienses, tendo o legislador pretendido dar-lhe uma vertente de ligação ao Estado e outra aos próprios agricultores.
O Conselho Regional Agrário, órgão consultivo e deliberativo da Casa do Douro, composto por 60 elementos, reuniu em plenário no passado dia 10 de Janeiro, tendo sido dado conhecimento, na ordem de trabalhos, das acções desenvolvidas por força do Decreto-Lei n.º 313/86, com uma filosofia diferente do anterior e que prevê a transformação da Casa do Douro de organismo público em organismo privado.
A esta reunião esteve presente o Sr. Secretário de Estado da Alimentação que, após intervenções de vários conselheiros, referiu que dado os agricultores durienses não pretenderem constituir a nova associação, o Decreto-Lei n.º 313/86 seria inexequível, pelo que iria propor a sua revogação.
Esta posição do Sr. Secretário de Estado foi amplamente apoiada e eu próprio, estando presente na mesma reunião, não deixei, também, de lhe expressar a minha satisfação por tal tomada de posição.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Muito banal

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pensando interpretar o sentimento da maioria dos viticultores durienses, tendo em vista o futuro da organização da Casa do Douro e procurando-se acautelar, sem ambiguidades, a lavoura duriense, solicito ao Governo respostas concretas sobre as orientações que se pretendem implementar nesta matéria, tendo em atenção a rejeição do decreto-lei agora em apreço.
De texto pouco adequado às características próprias da Região Demarcada do Douro - a região mais antiga do mundo - o Decreto-Lei n.º 313/86 não pode ser aplicado, pois, de acordo com as normas aprovadas pelo Governo, para tal ser possível deveria ser aceite por maioria qualificada de dois terços dos elementos do conselho agrário.
O desenvolvimento regional e, muito especialmente no que respeita ao Douro, tem de ser preocupação permanente da Administração Pública, afirmando-se através de uma política eficaz, mobilizadora de todos quantos nela estão interessados.
É este o sentido da nossa preocupação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Daniel Bastos, tem a palavra o Sr. Deputado Aloísio Fonseca.

O Sr. Aloísio Fonseca (PS): - Sr. Deputado Daniel Bastos, desejo apenas formular-lhe um pedido de esclarecimento muito rápido, quase telegráfico. Disse o Sr. Deputado que, sendo assim, e depois de todo este processo, o Decreto-Lei n.º 313/86 não pode ser aplicado - são palavras do Sr. Deputado! -, pelo que lhe pergunto qual a sua opinião acerca da discussão que hoje se trava nesta Assembleia, isto é, se é a favor ou se é contra o Decreto-Lei n.º 313/86.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Bastos.

Página 1522

1522 I SÉRIE - NÚMERO 39

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Deputado Aloísio Fonseca, uma vez que um outro colega meu de bancada se encontra inscrito para fazer uma intervenção sobre esta matéria, disponho de muito pouco tempo para responder, para não prejudicar a intervenção do meu colega.
No entanto, devo dizer-lhe que a minha posição quanto a esta questão foi clara - basta ler a minha intervenção -, quando apoiei a posição tomada por unanimidade pelo conselho agrário. Sendo a minha posição clara, não é preciso dizer mais nada.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação.

O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação (Álvaro Barreto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero esclarecer que o Governo, ao aprovar o Decreto-Lei n.º 313/86, visou os mesmos objectivos aqui hoje expressos pelos diversos deputados que intervierem sobre esta matéria, ou seja: considerando de excepcional importância para o País tudo o que se passa na região do Douro, entendeu tomar medidas que pudessem de certa maneira esclarecer claramente quais as funções e as atribuições dos diversos agentes económicos que intervêm na vida daquela região e pretendeu, também, dotar a região de organismos representativos.
Pretendeu-se que estes organismos, em conjunto com outros que também intervêm na sua vida, pudessem fazer a promoção da qualidade daquela grande riqueza portuguesa, que é o vinho do porto, que, hoje, além de integrar a actividade de vários milhares de pequenos agricultores, significa em exportações um valor superior a 20 milhões de contos.
Sabem os Srs. Deputados que a região do Douro desde há muito tempo se tem caracterizado por indefinições várias, pois são diversos os organismos que intervêm na vida daquela região. Assim, temos: a Casa do ,Douro, o Instituto do Vinho do Porto e o Centro de Estudos de Viticultura. Temos, pois, diversos organismos, todos com funções ambíguas. O próprio decreto-lei que, em 1982, reformulou o estatuto jurídico da Casa do Douro prevê que ela seja representativa dos interesses dos viticultores da região, mas, simultaneamente, reconhece-lhe um estatuto de pessoa de direito público e dá-lhe um conjunto de atribuições que vão desde a formação do cadastro à atribuição de benefícios, isto é, atribuiu-lhe um certo número de funções em que a Casa do Douro é simultaneamente representante dos agricultores e fiscalizadora dos mesmos agricultores.
Sabemos perfeitamente que, em outras regiões demarcadas de outros países da CEE, vigora um outro estatuto, que é o de organismo interprofissional, no qual se encontram juntos o Estado, os produtores e os operadores comerciais que têm a ver com esse sector. É isso que acontece nas regiões mais afamadas de produção de vinhos de qualidade da CEE e é isso que vai acontecer noutras regiões demarcadas - como a do vinho verde e a do vinho do Dão -, onde se entende implementar um figurino que, na realidade, seja transparente. .
Nesse sentido, entendeu-se que a Casa do Douro tinha toda a razão de existir mas que deveria ser a representante da lavoura privada daquela região e não ter este estatuto ambíguo de, por um lado, representar os agricultores privados e de, por outro lado, ser um instituto de direito público.
Simultaneamente, entendeu-se reformular a estrutura do Instituto do Vinho do Porto no sentido de que nele estivessem presentes essas três forças que têm a ver com o futuro do vinho do porto e que são as seguintes: os produtores, em representação da Casa do Douro; os exportadores e comerciantes, em representação da Associação de Exportadores do Vinho do Porto e o Estado, através de uma pessoa nomeada pelo próprio Estado.
Nesse sentido, aprovou-se em Conselho de Ministros um novo projecto de decreto-lei.
Previamente a essa aprovação, em 23 de Julho de 1986, o Sr. Secretário de Estado da Alimentação reuniu-se com o Conselho Regional agrário representado por 60 pessoas.
Nessa reunião foi apresentado o projecto de decreto-lei no sentido de transformar o Instituto do Vinho do Porto numa outra instituição de direito privado. Foi aí dito, então, qual o projecto global do Governo para o futuro dessa região.
De acordo com a acta de que, neste momento, disponho, obteve-se a unanimidade dos membros presentes do Conselho Regional Agrário para que este projecto de decreto-lei fosse aprovado.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Não é verdade!

O Orador: - Portanto, espanta-me que o Sr. Deputado João Morgado venha aqui dizer que o diploma foi feito sem que tenha sido auscultada a voz dos viticultores da região.
As posteriores alterações a este decreto-lei são alterações de pormenor, sem qualquer substância, que em nada alteram os fundamentos da transformação de instituto de direito público em instituto de direito privado, pois isto, repito, foi aprovado em reunião do Conselho Regional Agrário cuja acta tenho em meu poder e que poderei distribuir.
Inclusivamente, nessa reunião do Conselho Regional Agrário foi deliberado convidar o Sr. Ministro da Agricultura a estar presente na cerimónia de constituição da nova associação privada que substituiria a Casa do Douro.
Só depois de assegurada a garantia de que o projecto de decreto-lei tinha o apoio do Conselho Regional Agrário, órgão que consideramos representativo dos viticultores daquela região, é que o Governo procedeu à aprovação, em Setembro, deste decreto-lei.
Mas os interesses em causa são grandes. Houve movimentações regionais e locais e sabemos perfeitamente que, a pedido do Conselho Regional Agrário, se realizou em 10 de Janeiro de 1987 uma reunião para analisar o Decreto-Lei n.º 313/86, reunião essa na qual se alterou em questões de pormenor - as quais, se necessário, o Sr. Secretário de Estado especificará -, esse decreto-lei que havia sido, repito, aprovado por unanimidade na reunião de Julho de 1986.
Nessa reunião, depois de ouvir os argumentos apresentados, o Sr. Secretário de Estado disse que iria propor ao Governo a revogação do Decreto-Lei n.º 313/86 e assim o fez.
Em primeiro lugar, apresentou-me essa proposta no Ministério através de um despacho, proposta essa que, depois, levei a Conselho de Ministros, mantendo, no entanto, que a organização dada pelo Conselho de

Página 1523

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1523

Ministros era a mais clara e transparente , a que melhor definia as atribuições dos organismos que intervinham nesta região.
Analisando exaustivamente os motivos que, de certa maneira, estavam por detrás das reivindicações do Conselho Regional Agrário no sentido de agora revogar o Decreto-Lei n.º 313/86, talvez se devesse considerar um deles como tendo razão de ser. Era o relativo à falta de representatividade que poderia ter qualquer associação de agricultores que, amanhã, viesse a encabeçar esta nova associação.
Nesse sentido, o Governo entendeu que, sendo pertinente essa crítica, se deveria legislar por decreto-lei, e fê-lo, no sentido de que a nova associação de agricultores e ser criada só pudesse ser reconhecida desde que aprovada por dois terços dos delegados ao Conselho Regional Agrário.
Com isto pretendemos atingir o objectivo de a associação ser realmente representativa e que, como diz o Sr. Deputado António Mota, não houvesse a possibilidade dos exportadores ou das pessoas ligadas ao comércio virem a tomar posição e a controlar aquilo que, no desejo do Governo, será o organismo verdadeiramente representativo dos agricultores daquela região.
Apesar de tudo, quer o CDS quer o PCP entendem que não estão dadas as garantias suficientes e propõem a revogação deste decreto-lei. Pois, poderão fazê-lo.
De acordo com o que julgo saber, a Assembleia irá votar favoravelmente a revogação deste diploma. No entanto, penso que presta um mau serviço à lavoura regional e aos interesses dos viticultores porque não clarifica a função de "quem faz o quê"! ...
Continuará a mesma organização a exercer poderes que devem sempre competir ao Estado, como sejam, por exemplo, a atribuição dos cartões de benefício e o cadastro vitícola da região, situação essa que desde há longos anos se sabe ser motivo de alta especulação, muitas vezes contrária aos interesses dos pequenos e médios agricultores.
Portanto, com este diploma o Governo pretendeu defender estes mesmos agricultores.
Pergunta o Sr. Deputado Daniel Bastos o que a seguir irá fazer o Governo, se este decreto-lei vier a ser revogado. É evidente que o Governo já preparou o regulamento eleitoral para a direcção da Casa do Douro, o qual irá discutir com o Conselho Regional Agrário, e irá providenciar para que se possam fazer eleições o mais rapidamente possível, uma vez que a actual direcção (nomeada há muitos anos) há muito que deveria ter sido submetida a sufrágio directo.
O Governo irá tomar as medidas para que isso aconteça rapidamente de modo a, pelo menos, minorar os interesses daqueles que estão interessados na Casa do Douro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de terminar com o que referi no início da minha intervenção: penso que os objectivos do Governo são coincidentes com o que aqui hoje foi afirmado pelos Srs. Deputados que já intervieram, ou seja, vão no sentido de legislar para que seja garantida a protecção dos interesses dos pequenos agricultores, dos agricultores daquela região, e de garantir que o vinho do porto continue a ocupar o lugar de grande importância que desde há longos anos tem na vida nacional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro inscreveram-se os Srs. Deputados Rogério de Brito, António Mota, Cavaleiro Brandão, Pinho Silva, João Morgado, Aloísio Fonseca e Raul Castro.
O Sr. Ministro dispõe apenas de um minuto para responder, mas dado o interesse manifestado pelos Srs. Deputados em questionarem o Sr. Ministro, naturalmente que a Mesa será tolerante e concederá ao Sr. Ministro o tempo razoável para que possa responder.
Creio que não há qualquer objecção a que assim se proceda.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Ministro da Agricultura, eu diria que o Governo tem uma postura espantosa quando se trata, como é o caso, de discutir questões ligadas à agricultura. Com efeito, mesmo que a esmagadora maioria, quer das forças políticas quer dos directamente interessados, prove que as coisas têm a cor branca o Governo persiste em defender sempre que a cor não é branca mas preta, embora possa ter os mesmos objectivos.
Sr. Ministro, com efeito, tem havido problemas com questões de cadastro das vinhas e de atribuição de cartões de benefício. Há, de facto, deficiências, contudo, penso que a própria alteração do processo de eleição dos corpos gerentes da Casa do Douro vai introduzir melhorias qualitativas nesse aspecto e permitir a participação e fiscalização dos próprios produtores associados.
De qualquer modo, direi que são muito menos perigosos os erros cometidos pela Casa do Douro em matéria de atribuição de benefícios e de levantamento cadastral do que seriam se essas competências fossem transferidas para uma qualquer entidade, designadamente para o próprio Estado.
Há imensas pressões a serem exercidas em torno de uma região e de um produto que desperta a gula! ...
O Sr. Ministro referiu aqui exemplos de lá de fora e eu direi que o Sr. Ministro não pode apontar como exemplo de lá de foram que os produtores tenham estado impedidos de exportar o seu produto durante dezenas de anos, o que aconteceu no nosso país. Por isso, os produtores têm agora de se organizar para poderem conquistar essa parte de intervenção no próprio mercado.
Quando cada vez mais as casas exportadoras pretendem ter maior peso ao nível da própria produção e, simultaneamente, dominar, de uma vez por todas, os circuitos, permitir que eles intervenham directamente em áreas que deixam de estar protegidas pelos interesses directos dos próprios produtores é uma situação a que nem sequer o Governo, por melhores intenções que tivesse, conseguiria pôr cobro.
São pressões imensas as que existem e o Sr. Ministro sabe-o tão bem quanto nós.
O Sr. Ministro sabe, por exemplo, o que se tem passado em matéria de plantações; sabe as pressões que têm sido feitas para que os benefícios sejam estendidos a áreas que nem sequer reúnem condições objectivas para serem classificadas dentro da própria região demarcada! ...
Penso que o Sr. Ministro deve reflectir sobre estes aspectos e ter em conta os próprios condicionamentos a que os produtores estiveram sujeitos durante dezenas de anos.

Página 1524

1524 I SÉRIE - NÚMERO 39

Não é a solução que o Governo propõe que iria permitir o necessário período de transição para uma nova etapa de intervenção dos produtores como também não permitiria acautelar os interesses em jogo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Ministro, fiquei perplexo com a sua intervenção, porque V. Ex.ª veio aqui dizer que o Decreto-Lei n.º 313/86 tem os mesmos objectivos de "pôr em ordem" a Casa do Douro - digamos assim - que tem o Decreto-Lei n.º 486/82.
Sr. Ministro, se os objectivos de ambos os decretos-lei são os mesmos, não percebo por que é que o Governo pretende alterar o Estatuto da Casa do Douro...
Também não percebo por que é que o Governo não procura resolver o problema do Instituto do Vinho do Porto, regulamentado-o, por exemplo. Até lhe posso dizer, Sr. Ministro, que o Instituto do Vinho do Porto ainda hoje tem sede no Porto - e acho curioso isto -, quando actualmente não há qualquer razão para que este Instituto esteja concentrado no Porto. Naturalmente, há 10, 30 ou 40 anos atrás teria, porque, de facto, era dali que se faziam as grandes exportações por via marítima. Hoje, como sabe, já não se justifica a colocação deste Instituto na própria região.
Pergunto, Sr. Ministro, o seguinte: se o Governo quer e tem interesse, de facto, em resolver ou definir o novo Estatuto da Casa do Douro, por que é que não se enquadrou num quadro legislativo global para a região? Por que é que vai, única e exclusivamente, direitinho à Casa do Douro?
Para nós, Sr. Ministro, esta situação do Governo é complicada. Nós percebemos que, na realidade, não é aquilo que o Sr. Ministro diz, porque o Decreto-Lei n.º 313/86 não vem ajudar em nada a resolver nem a beneficiar os agricultores do Douro - aliás, se viesse, os agricultores não estavam totalmente contra ele.
Pelo contrário, este decreto-lei, a ser ratificado, viria destituir a Casa do Douro de competências de que actualmente dispõe e criar grande confusão na Região do Douro, o que não é necessário, porque o que é preciso é definir o Estatuto da Casa do Douro e tornar a dar-lhe as competências que lhe foram retiradas por vária legislação, como V. Ex.ª bem referiu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Ministro, V. Ex.ª é habitualmente colocado nesta Câmara perante situações difíceis e, apesar de tudo, é reconhecido como uma pessoa que vai resolvendo essas dificuldades com grande habilidade.
Por isso, é para mim espantoso e quase chocante a maneira como dificultou aquilo que parecia uma situação simples: há consenso na Câmara, aparentemente há consenso quer da parte dos interessados quer até do representante do seu partido - que já falou -, e V. Ex.ª conseguiu produzir aqui uma intervenção que descaracteriza por completo o problema, intervenção eivada e assente em equívocos, para não dizer em dados completamente falsos, e desloca por completo a atenção da Câmara daquilo que, realmente, é o objecto dos nossos trabalhos de hoje, isto é, saber se o Decreto-Lei n.º 313/86 deve ou não subsistir, se tem ou não razão de ser.
V. Ex.ª assentou a sua intervenção em duas ideias fundamentais.
Em primeiro lugar, disse que o projecto que terá estado por detrás do diploma hoje em apreço foi objecto de aprovação unânime pelo Conselho Regional Agrário.
Sr. Ministro, isto não é exacto: houve algum consenso em relação ao sentido reprivatizador do associativismo dos agricultores, mas nunca por nunca houve qualquer votação e, muito menos, unânime deste projecto. Aquilo sobre que houve unanimidade foi sobre a intenção de os agricultores se autoconstituírem numa associação própria, não foi em relação ao projecto de decreto-lei em si, e muito menos ao sistema em geral.
Em segundo lugar, V. Ex.ª assentou na ideia de que este projecto visava - e teria conseguido - clarificar o sistema institucional que envolve a agricultura duriense. É a afirmação mais espantosa que eu podia ter ouvido da sua boca! E quando repercute para o Sr. Secretário de Estado o encargo de se desenvencilhar dos pormenores, receio que V. Ex.ª e não tenha relido o decreto-lei antes desta sessão.
Sr. Ministro, este decreto-lei, no que toca a clarificação daquilo que é importante, que são as atribuições, funções e competências da Casa do Douro, limita-se a dizer que ela manterá como próprias - ela, a futura associação privada - aquelas que hoje se manteriam na Casa do Douro e que, entretanto, não foram distribuídas ou redistribuídas por uma outra entidade qualquer. Não é possível estabelecer-se nenhum regime mais confuso e mais aleatório, e mais incaracterístico do que este.
Primeiro, é absolutamente inadmissível que se atribuam, por via legislativa, funções ou competências de natureza pública a uma associação de natureza privada, que, ainda por cima, nem sequer existe.
Segundo, menos clarificador é ter-se iniciado o percurso da reestruturação dos organismos e das instituições que intervêm na agricultura duriense, quando começamos por redistribuir funções que têm natureza pública antes de começarmos por "mexer na casa" que é por exemplo, o Instituto do Vinho do Porto ou a própria Casa do Douro.
Sr. Ministro, lamento que V. Ex.ª coloque um partido como o CDS no papel de vir aqui desmascarar aquilo que podia ser uma iniciativa liberalizadora.
Nós defendemos que, onde isso se justifique e onde isso se revele necessário, se avance liberalizando, mas não aceitamos que levianas fantochadas sejam impingidas ao Pais, como se de verdadeira liberalização se tratasse!
Este decreto-lei foi um mau serviço prestado ao Pais, Sr. Ministro. Não aceitamos que V. Ex.ª venha aqui dizer que quem pretende desfazer este fraco e ténue edifício - que, aliás, VV. Ex.as reconhecem que já nem se destina sequer a ser aplicado nem a ter eficácia - e limpá-lo do nosso enquadramento jurídico, preste um mau serviço ao País.
Sanear o ordenamento jurídico de um diploma que não tem sequer verdadeira existência, que V. Ex.ª reconhece não estar destinado a produzir qualquer espécie de eficácia é, certamente, o melhor serviço que, neste domínio, podemos prestar ao País.

Página 1525

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1525

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Silva.

O Sr. Pinho Silva (PRD): - Sr. Ministro, desta vez V. Ex.ª tentou, nesta Câmara, o impossível. De facto, e apesar dos atributos que lhe são conhecidos, isso não será capaz de fazer.
Citou, por exemplo, uma reunião realizada em Julho de 1986, em que, segundo as suas informações, toda a gente teria estado de acordo. Tenho aqui alguns apontamentos, dessa reunião, e digo-lhe, por exemplo, que as pessoas colocaram sérias reticências ao projecto de decreto-lei, nomeadamente à alteração do regime jurídico, à conjugação da transferência das atribuições e competências da Casa do Douro, ao reconhecimento da utilidade pública e ainda em relação à decisão do Governo expressa naquele anteprojecto, isto é, se ele significaria, por um lado, tão-somente a necessidade de entregar a Casa do Douro àqueles que sempre foram os seus titulares, os vitivinicultores do Douro, etc. Enfim, uma série de reticências e de dúvidas que o Conselho Regional Agrário colocou depois de apreciar o documento que V. Ex.ª nos fez chegar.
V. Ex.ª disse ainda que a revogação do Decreto-Lei n.º 313/86, e a manutenção do Decreto-Lei n.º486/82, não clarificará totalmente a situação da Casa do Douro.
Uma vez que o Governo - embora, em nossa opinião, tardiamente - iniciou um diálogo, coloco-lhe a seguinte questão: o Governo está na disposição de prosseguir esse diálogo com todos os intervenientes e interessados no processo, para se chegar a um diploma que, de uma vez por todas, defina e defenda a Casa do Douro e os vitivinicultores durienses, assim como esse precioso néctar que é o Vinho do Porto?

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado.
O CDS já não dispõe de tempo, mas dentro deste critério de flexibilidade, e se o Sr. Deputado considera imprescindível o seu pedido de esclarecimento, concedo-lhe um minuto para esse efeito.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, o meu partido concede um minuto ao CDS, a fim de que o Sr. Deputado João Morgado possa formular os pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Tem então V. Ex.ª, Sr. Deputado João Morgado, a palavra.

O Sr. João Morgado (CDS): - Antes de mais, quero agradecer ao PRD a cedência de tempo.
Sr. Ministro, penso que a questão da apresentação aqui deste diploma não se deve colocar no plano das intenções mas, sim, no plano dos factos e dos resultados. O que, quanto ao plano das intenções, aí poderíamos talvez fazer até juízos próximos, mas, no plano dos factos e dos resultados, estamos muito distantes.
Sr. Ministro, eu estava à espera de que, após a minha intervenção, V. Ex.ª respondesse às perguntas que, da Tribuna, coloquei ao Governo. V. Ex.ª não respondeu a nenhuma, tendo-se limitado a fazer críticas ao facto de eu ter referido que o diploma não tinha sido apresentado ao Conselho Regional Agrário, quando tinha sido e, quanto a isso, V. Ex.ª classificou muito mal, do nosso ponto de vista, o Conselho Regional Agrário.
Também causa uma certa surpresa que, tendo o Sr. Secretário de Estado da Alimentação estado presente numa reunião do Conselho Regional Agrário, em Janeiro, não tenha referido exactamente a contradição em que o mesmo Conselho se colocou quando, segundo a versão do Sr. Ministro, terá aprovado por unanimidade o projecto de diploma, da mesma maneira que, depois, aprovou por unanimidade a respectiva revogação.
Tenho aqui a acta da última reunião do Conselho Regional Agrário, em que o Sr. Secretário de Estado refere claramente que vai propor ao Governo a revogação, mas onde nada se diz sobre essa posição contraditória e absurda, nesse caso, da posição do Conselho Regional Agrário.
Penso que a posição do Conselho não é bem aquela que o Sr. Ministro referiu, pois, segundo as informações de que dispomos, o que aconteceu foi que o projecto apresentado ao Conselho Regional Agrário não foi depois reduzido a diploma legal, nos seus precisos termos. Houve alterações profundas, designadamente no artigo 2.º do diploma agora em apreciação.
Era exactamente isto que eu queria perguntar ao Sr. Ministro: qual a razão por que não objectou ao Conselho Regional Agrário esta questão e qual a razão por que o Sr. Ministro não deu resposta às questões que lhe coloquei na minha intervenção.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Aloísio Fonseca.

O Sr. Aloísio Fonseca (PS): - Sr. Ministro, em primeiro lugar, quero congratular-me por algumas afirmações que foram aqui feitas e, nomeadamente, pela necessidade sentida pelo Sr. Ministro de reformular, orgânica e funcionalmente, o Instituto do Vinho do Porto. Essa intenção, de resto, não é nova, pois o decreto-lei de 1982 já previa isso, antes mesmo daquilo que o Sr. Ministro fez através do Decreto-Lei n.º 313/86.

Falou V. Ex.ª em várias indefinições e ambiguidades que reinam na vitivinicultura duriense, nomeadamente na sua estrutura organizativa. Mas pergunto: entende que, através da publicação do Decreto-Lei n.º 313/86, vai colmatar todas essas deficiências? É nosso entendimento que não, mas o Sr. Ministro responderá.
De resto, julgo que essas indefinições e ambiguidades estão também presentes em todo este processo: na atenção que o Governo lhe dedicou e até na posição do partido ao qual o Sr. Ministro pertence.
De facto, não sei qual é a posição do Partido Social-Democrata: na Régua manifestou-se claramente contra este decreto-lei; aqui iremos ver! ... Não sei também qual é a posição do Sr. Secretário de Estado, nem se conhecia a tal acta em que o Conselho Regional Agrário dava o seu agrément a esse intento do Sr. Ministro. Não exibiu o teor dessa acta do Conselho Regional Agrário e veio para Lisboa com uma missão: a de propor a revogação.
Sr. Ministro, ou aquilo que o Sr. Secretário de Estado da Alimentação foi fazer à Régua - e demorou bastante tempo a fazê-lo - foi uma viagem inglória, ou o Sr. Secretário de Estado não tem autoridade para fazer vingar a sua proposta no Conselho de Minis-

Página 1526

1526 I SÉRIE - NÚMERO 39

tros, ou então o Governo, mais uma vez, enclausurado no seu dogmatismo, não quer tomar consciência do erro que cometeu.
Sr. Ministro, antes de tudo isso não seria melhor reformular primeiro o Instituto do Vinho do Porto e transformá-lo num organismo interprofissional? Não seria melhor o Governo tomar consciência do erro, abandonar este decreto-lei e, com base no Decreto-Lei n.º 486/82, com, naturalmente, as alterações que surgiram em 1983 através do Decreto-Lei n.º 240/83, partir para a efectiva institucionalização da Casa do Douro? Se o Governo entende que este decreto-lei não deve ser aplicado por ser inexequível, por que não deixá-lo cair? O que é que o Governo pretende fazer: colaborar com a vitivinicultura do Douro no sentido da defesa dos interesses daquela gente que trabalha e que transforma a terra, fabricando um produto de reconhecido valor na economia regional e nacional, ou abandonar o Douro?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, ainda para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Ministro, na sequência da intervenção que produziu, gostaria de colocar-lhe algumas questões.

É, na verdade, muito difícil compreender que o mesmo organismo, o Conselho Regional Agrário, possa, com a diferença de seis meses, ter primeiro concordado e depois discordado do mesmo projecto que representava este decreto-lei. Poderemos mesmo dizer que ainda hão-de nascer os sábios que possam explicar um fenómeno destes: em Junho discorda e em Janeiro seguinte concorda.
Outro estranho fenómeno é o de o Governo dizer, aquando da última reunião do Conselho Regional Agrário, que ia propor a revogação e, passados uns dias, manter o projecto e enviá-lo novamente aqui, apenas com pequenas alterações. Também ninguém percebe qual é, afinal, o propósito do Governo: revogar o decreto-lei ou mante-lo? Parece que o último propósito é o de manter, pelo que poderemos concluir, como dizia o outro, que, afinal, não interessa o que o Governo diz mas, sim, o que escreve. Portanto, quando o Governo diz numa reunião que vai revogar, não se pode levar isso a sério, porquanto diz depois por escrito que mantém.
Finalmente, o Sr. Ministro referiu que este decreto-lei reflectia uma grande preocupação com os pequenos agricultores. Vinda do Sr. Ministro da Agricultura esta afirmação pareceu-me tocante, na medida em que traduz a sua preocupação com os pequenos agricultores. Simplesmente, o Decreto-Lei n.º 313/86, no seu artigo 1.º, n.º 3, ao referir-se à representatividade dos agentes económicos, menciona, em primeiro lugar, o critério do volume de produção. Parece, manifestamente, que, quanto a essa tal protecção aos pequenos agricultores, aferir a representatividade pelo volume de produção é algo perfeitamente contrário à protecção dos pequenos agricultores. Isto quer dizer, Sr. Ministro, que daquilo que V. Ex.ª disse só ficam contradições e nada mais do que isso.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, para responder.

Na medida em que o Governo já não dispõe de tempo, peco-lhe, Sr. Ministro que seja o mais breve possível, restringindo a sua intervenção a sete minutos, ou seja, um minuto por cada Sr. Deputado que o interpelou.
O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação: - Com certeza, Sr. Presidente. Tentarei ser breve.
O Sr. Deputado Rogério de Brito começou por considerar a minha intervenção nesta matéria como uma postura espantosa. Diria que foi, talvez, o momento em que o Partido Comunista foi mais simpático comigo, pois só classificou a minha postura de espantosa. Agradeço-lhe essa amabilidade, pois estou habituado a ouvir acusações bastante mais fortes por parte dessa bancada.

Risos.

Invocando as palavras do Sr. Deputado António Barreto, que ainda há pouco tempo dizia que nem sempre a quantidade se confunde com a qualidade, diria que o facto de haver muitas pessoas contra este decreto-lei nada quer dizer. Neste momento encontro-me com ele nessa sua apreciação.
Disse o Sr. Deputado Rogério de Brito que o Estado não exercia tão bem as suas funções, dado que, durante largos anos, os produtores foram impedidos de exportar, tendo havido muitas pressões nesse sentido. Pergunto ao Sr. Deputado Rogério de Brito qual foi o governo que autorizou os produtores a exportar directamente e que não foi permeável a essas pressões. Como se deve lembrar, foi o actual Governo, o que, de certa maneira, desdiz que o Governo seja permeável a esse conjunto de pressões, porque, na realidade, houve muitas nesse sentido, mas não nos deixámos vergar a elas.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Desculpe, mas tenho pouco tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado António Mota disse que afirmei que o Decreto-Lei n.º 313/86, tinha os mesmos objectivos que o Decreto-Lei n.º 486/82. No entanto, aquilo que referi foi que os objectivos do Decreto-Lei n.º 313/86, eram coincidentes com as afirmações feitas nesta Câmara sobre o desenvolvimento e o futuro da viticultura daquela região. Eu não disse, ou pelo menos não quis dizer, que aqueles objectivos fossem coincidentes com os do Decreto-Lei n.º 486/82!...
Estarei de acordo com o Sr. Deputado quanto a reconhecer que a revisão do estatuto da Casa do Douro teria sido mais claramente compreendida se tivesse sido acompanhada pela revisão dos estatutos do Instituto do Vinho do Porto, que estão neste momento em elaboração e que muito brevemente serão objecto de análise e aprovação por parte do Conselho de Ministros. Concordo que, se tivessem sido vistos em conjunto, claramente se compreenderia que o Instituto do Vinho do Porto passasse a ter um estatuto de organismo interprofissional, pois num organismo deste tipo o representante da lavoura privada não pode, em nosso entender, deixar de ter o estatuto de uma entidade privada. Mal seria que, numa organização interprofissional, tal como ela é concebida, em que têm de estar representados os produtores privados, a parte do comércio e

Página 1527

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1527

a parte do Estado, duas dessas partes tivessem um estatuto que fosse simultaneamente público e privado. Portanto, não estou de acordo com essa sua posição.
O Sr. Deputado Cavaleiro Brandão disse que eu não respondi a muitas das questões que foram postas - aliás, o Sr. Deputado João Morgado fez a mesma afirmação, pelo que aproveito para responder aos dois - e sentiu-se na obrigação de explicar por que é que o CDS vem neste momento votar contra a ratificação de um decreto-lei que prevê a passagem para a área dos privados de um sector que sempre foi e deve ser propriedade dos privados. Penso que, de facto, terá de arranjar desculpas para dar essa explicação, pois, para mim, é perfeitamente inexplicável que, indo este diploma no sentido de dar aos verdadeiros agricultores a propriedade da Casa do Douro, venha o CDS dizer que quer manter nela a presença do Estado. É uma posição que esperaria mais que viesse do lado do Partido Comunista do que do lado do CDS.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Ao fim de tanto tempo ainda não percebeu, Sr. Ministro!... Olhe que é pena!

O Orador: - Disse o Sr. Deputado Pinho Silva que as suas notas sobre a reunião de 23 de Julho, do Conselho Regional Agrário não seriam coincidentes com aquelas que refen.
Não vou ler exaustivamente a acta dessa reunião, mas somente o primeiro ponto das conclusões, que diz o seguinte: "[...] por votação nominal dos seus membros e por unanimidade, criar uma associação profissional com vista a dar cumprimento ao n.º 3 do artigo 1.º do projecto apresentado". Ora, o referido n.º 3 prevê exactamente a alteração do estatuto de entidade de direito público para uma outra de direito privado. Relativamente a este aspecto, disse o Sr. Deputado que, de certa maneira, houve reticências, mas a verdade é que, apesar das reticências, ele foi votado por unanimidade.
Aliás, as alterações introduzidas no diploma foram, do nosso ponto de vista, alterações de pormenor e não justificam, de maneira nenhuma, a mudança de posição que o Conselho Regional Agrário assumiu sobre esta matéria.
Foi várias vezes aqui referido que o Governo mudou de posição, questão à qual o Sr. Deputado Raul Castro veio também dar ênfase.
Sr. Deputado, já tive ocasião de dizer que o Governo não mudou de posição. o Sr. Secretário de Estado disse - e mantenho, até porque está nas actas - que ia propor ao Governo a revogação do Decreto-Lei n.º 313/86, e não que o Governo o ia revogar. Aliás, ele nem poderia dizer isso, pois, como sabe, o acto de revogar ou não revogar um diploma compete ao Conselho de Ministros. O Sr. Secretário de Estado da Alimentação, cumprindo integralmente aquilo que tinha dito na reunião, propôs, na realidade, a revogação deste decreto-lei, e tive ocasião de apresentar essa proposta em Conselho de Ministros como uma hipótese de evolução desta questão. Contudo, como disse na minha intervenção, o Conselho de Ministros, analisando as razões que tinham levado a que a Casa do Douro sofresse a transformação proposta, entendeu que não o devia fazer, não obstante ter dado acolhimento a uma das críticas que havia sido feita relativamente à falta de representatividade.

O Sr. Deputado Raul Castro disse que ficou tocado por eu falar nos pequenos e médios agricultores mas, se o Sr. Deputado lesse com atenção o segundo parágrafo do artigo, veria que é a associação em si que será julgada pelo seu volume de produção. É a associação, o conjunto dos seus sócios e não os sócios individualmente que serão mais ou menos representativos em função do seu volume de produção. O que havia era que garantir que essa associação fosse realmente representativa, e posteriormente entendeu-se que ela o seria por uma maioria de dois terços dos delegados. Agora, tirar dai a ilação de que a representatividade ou a qualificação dos agricultores, tenha a ver com a sua produção poderá ser uma interpretação do Sr. Deputado Raul Castro, que muito prezo, mas que na realidade não é aquela interpretação que deveria ser feita.
Finalmente, gostaria de me referir, uma vez mais, àquilo que o Governo vai fazer - e assim respondo às perguntas do Sr. Deputado Aloísio Fonseca.
O Governo manterá o diálogo sobre esta matéria, como, aliás, teve intenção de o fazer previamente à sua aprovação, tendo-se deslocado o Sr. Secretário de Estado da Alimentação à Casa do Douro para aí debater o diploma antes de ser aprovado em Conselho de Ministros. Da mesma maneira, estaremos sempre abertos a dialogar sobre esta matéria, como estamos abertos a dialogar sobre muitas matérias e disso temos dado provas recentes.
Pensamos que realmente teremos de encontrar uma solução que clarifique esta situação, que crie o tal organismo interprofissional que o Sr. Deputado Aloísio Fonseca referiu e que, no fundo - e eu disse-o na minha intervenção -, é a base completa desta questão. E aí, parece-me incoerente que simultaneamente o Sr. Deputado esteja de acordo em que o organismo tenha de ser interprofissional mas que não esteja de acordo em que se atribua o estatuto privado a uma associação de agricultores, como a Casa do Douro. E, certas funções que hoje estão atribuídas à Casa do Douro não passem a ser, por esse...

O Sr. Presidente: - Terá a mais apenas o tempo para beber um cálice de porto, Sr. Ministro.

Risos.

Pois... É pena não o poder fazer, mas não o tenho aqui neste momento. Agradeço-lhe só mais dois minutos, Sr. Presidente.
De qualquer maneira, Sr. Deputado, pela sua intervenção, pelo que me pareceu ver naquilo que disse, V. Ex.ª não se afasta muito da nossa concepção. Reconheço, na realidade, que isto teria sido mais claro se, simultaneamente com a reestruturação da Casa do Douro, o Governo tivesse apresentado a reestruturação do Instituto do Vinho do Porto. Estou de acordo com isso e reconheço que aí errámos...

Vozes do PS: - Não é mau!

O Orador: - Deveríamos tê-lo feito em conjunto, mas isso não quer dizer, de qualquer maneira, que o que está aqui proposto não é correcto. Trata-se de um passo...

Uma Voz do PS: - Para trás!

O Orador: - ... na criação das estruturas que melhor vêm defender os interesses daquela região.

Página 1528

1528 I SÉRIE - NÚMERO 39

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Silva.

O Sr. Pinho Silva (PRD): - Antes de iniciar a minha intervenção tenho de fazer referência a duas questões.
A primeira é a de o Sr. Ministro ter citado apenas o primeiro ponto de um documento que tem sete e onde, de facto, só o primeiro serve e defende esta tese.
A segunda, é a de que lhe perguntei muito concretamente se o Governo depois de ter iniciado o diálogo em relação a este tema estaria na disponibilidade de o continuar e alargar, e, de facto, fiquei sem resposta.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Preparado com uma confidencialidade comprometedora, a publicação do Decreto-Lei n.º 313/86 colheu de surpresa os cerca de 30 000 agricultores durienses que, através do conselho agrário e da direcção da Casa do Douro, se uniram no repúdio de um diploma que atentava contra os seus interesses, por pretender esvaziar a Casa do Douro das suas múltiplas e importantes actividades e competências.
Este assunto, embora de relevância indesmentível, já não justifica uma análise circunscrita apenas à apreciação do seu articulado, uma vez que, flagelado pelo fogo cruzado dos vitivinicultores e de todos os partidos políticos, sem excluir o que nesta assembleia apoia o Governo, o Sr. Secretário de Estado de Alimentação disse, no passado dia 10 de Janeiro na cidade de Peso da Régua, que o tão discutido diploma caía por inutilidade, uma vez que os lavradores da região duriense rejeitavam profundamente a sua entrada em vigor.
Seria pois de esperar que o governo, que tantas vezes se refere ao rigor e ao diálogo, tivesse assumido a revogação deste decreto-lei, ou apresentasse um outro, mais adequado aos anseios, valores e interesses económicos deste sector relevante da agricultura portuguesa.
Adiado por duas vezes do agendamento para ratificação neste plenário, reaparece agora com a mesma "roupagem" anterior, embora acrescido de dois "adornos" que só lhe destacam as "mazelas".
Estranha, é a designação que no mínimo podemos dar a esta atitude, tanto mais que em ocasiões anteriores se mostrou altamente vantajosa a colaboração que o conselho agrário e a direcção da Casa do Douro prestaram na elaboração de outros diplomas e que este Governo teimou em não ouvir.
Por força da defesa dos interesses dos vitivinicultores durienses, o que estava em causa era a escolha de um modelo que considerasse dois aspectos fundamentais:
Por um lado, os exportadores e a sua associação, apostando no Instituto do Vinho do Porto, com quem estão lado a lado na Rua de Ferreira Borges, tentavam aumentar a sua influência nos negócios do Vinho do Porto estendendo-os até ao Douro.
Por outro, os interesses dos produtores vitivinícolas, em continuarem a dispor de um poder que a Casa do Douro sempre deteve, alicerçando num património que vale alguns milhões de contos.
É evidente que um produto tão especial como o vinho do Porto, cuja qualidade média nos últimos anos não tem sido isenta de reparos, tem que merecer uma defesa permanente dos diversos agentes intervenientes e do próprio Estado, através de uma estrutura e organização idónea.
A sensibilidade dos mercados externos e a posição que o vinho do Porto já alcançou, pese embora a concorrência que à margem da lei internacional lhe movem, exige que todos se façam ouvir, mas que o Estado possa desempatar e decidir sempre que esteja em jogo o nome e a qualidade do precioso néctar.
Neste domínio, a Direcção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes não pode continuar a ser uma espectadora passiva, tanto mais que lhe estão confiadas funções claras ao nível da vinha duriense.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A reposição em vigor do Decreto-Lei n.º 486/82, com as modificações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 230/83 e a realização a curto prazo de eleições para a Casa do Douro, merecem o nosso apoio, por privilegiarem a vontade e os verdadeiros interesses da agricultura duriense.
Morre, assim, o Decreto-Lei n.º 313/86 nas mãos daqueles que, de espírito fechado e tudo centralizando, desdenharam da capacidade das mulheres e homens transmontanos e das suas associações representativas.
O PRD, por saber que a democracia se exprime fundamentalmente na capacidade de diálogo oportuno e fecundo, reafirma a sua vontade e disponibilidade para participar na resolução deste e doutros problemas que se colocam aos Portugueses.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, o PSD prescinde da segunda intervenção porque ficou realmente esclarecido com a intervenção do Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação.

Aplausos do PSD.

Risos.

Vozes do PCP: - Não diga?

O Sr. Presidente: - Foi popularíssima a sua intervenção ...

Risos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Aloísio Fonseca.

O Sr. Aloísio Fonseca (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Na sequência da publicação do Decreto-Lei n.º 313/86, em 24 de Setembro, que extingue a Casa do Douro, e da reflexão que fez em torno do seu conteúdo, o Partido Socialista teve oportunidade de, em 31 de Outubro do pretérito ano, transmitir a esta Assembleia a sua posição de grande inquietação sobre o mesmo.
Nessa altura, salientando alguns dos pormenores do diploma, alertámos o Governo para as implicações negativas da sua aplicação. Volvidos três meses podemos reafirmar tudo o que na altura nos inquietava.
O modelo jurídico-organizativo preconizado pelo Governo para substituir um organismo de tão rica tradição, como é a Casa do Douro, e que tão relevantes serviços tem prestado à vitivinicultura, que na promoção do seu produto - os célebres vinhos do Porto e do Douro -, quer na defesa do seu património e dos

Página 1529

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1529

interesses dos agricultores, surgiu pela sua indefinição, pela sua ambiguidade e pela sua incerteza, como altamente lesivo à promoção e defesa da vitivinicultura da região demarcada mais antiga do Pais e uma das mais, senão a mais antiga, do mundo vinícola.
O decreto-lei ao pretender substituir a Casa do Douro por uma associação de índole privatística, fica sem definir atribuições e competências. Desconhece-se o significado e sentido da representatividade directa dos agentes económicos. Ignora-se o destino dos seus bens patrimoniais (imóveis, bens e equipamentos, existências ... ) cujo valor ultrapassará as três dezenas de milhões de contos e que é resultado de um árduo e longo trabalho do "homem duriense".
Não auscultando, convenientemente, os interessados. Indiferente às sugestões que foram emitidas pelos órgãos representativos da lavoura. Insensível ao que se escreveu - na nossa opinião correctamente - na parte preambular do Decreto-Lei n.º 486/82, de 28 de Dezembro, quando se aponta para uma nova revisão do estatuto da Casa do Douro, mas após a "reformulação orgânica e funcional do Instituto do Vinho do Porto".
O Governo, "pondo o carro à frente dos bois", advogou e ditou um modelo que aponta, indubitavelmente, para a "reserva", de todos os poderes ao Instituto do Vinho do Porto, retirando à Casa do Douro o exercício das atribuições e competências que lhes havia sido cometidas pelo decreto de 1982 e deixando a porta aberta à ambição de meia dúzia de empresas ou grupos económicos.
Perante a gravidade da situação e interpretando a inquietação daqueles que na região trabalham a terra e fabricam um produto de tão grande importância na economia regional e nacional, alertámos o Governo para as gravosas implicações do diploma publicado que de modo algum nos parece adequado à defesa e promoção da vinicultura e à salvaguarda do património histórico e material do Douro.
O Governo, enclausurado no seu dogmatismo estéril e na ilusão enganadora da posse da verdade, a tudo fechou os ouvidos.
Não se compreende a sua apatia e indiferença perante a unanimidade manifestada pelos representantes das várias forças partidárias com assento nesta Assembleia (incluindo o partido do Governo, o PSD!), pela direcção da Casa do Douro e pela mesa do Conselho Regional Agrário, que reunidos, a convite do Partido Socialista, nas instalações do organismo na Régua, entenderam por bem que o Governo devia "deixar cair" o Decreto-Lei n.º 313/86 e manter em vigor o Decreto-Lei n.º 486/82.
Muito menos se compreende que até hoje não tenha sido capaz de concretizar a intenção enunciada no Conselho Regional Agrário pelo Secretário de Estado da Alimentação, em 10 de Janeiro, de propor ao Governo a revogação do decreto-lei já que "ele não tinha aplicabilidade", não era exequível e "caía por inutilidade, uma vez que os vitivinicultores o rejeitam no seu todo".
Aguardando esta decisão do Governo o Douro viveu, até hoje, nesta expectativa.
Por seu turno, o Plenário desta Assembleia viu desagendada, por duas vezes, a discussão dos pedidos de ratificação do decreto-lei, através de deliberações da conferência de líderes, a quem lhe foi, igualmente, transmitido tal propósito do Governo.
Quando tudo aconselha à revogação do Decreto-Lei n.º 313/86, eis que o Governo, no dia 28 de Janeiro, entrega na Assembleia da República, o texto do diploma, aprovado em Conselho de Ministros, sobre a Casa do Douro.
Lamentavelmente, e contra as expectativas geradas, o Governo decide-se pela não revogação do decreto-lei e numa "jogada de diversão" promete "auscultar" o Conselho Regional Agrário no reconhecimento da associação e transmite-nos o seu entendimento sobre o requisito da "representatividade". A filosofia e o articulado do Decreto-Lei n.º 313/86, esses, permanecem inalteráveis. A indefinição e a incerteza continuam a pairar sobre os Durienses.
O Governo chegou tarde e mal. Após todo este tempo de discussão e de reflexão não conseguiu oferecer aos muitos milhares de vitivinicultores da Região Demarcada do Douro um quadro legal, claramente definido e estável que lhes permitisse avançar para a realização de eleições dos seus corpos directivos num clima de grande segurança institucional.
Mais uma vez, nesta como noutras situações, o Governo substitui a humildade, a flexibilidade e a consciência do erro pelo dogma, pela arrogância e pela inflexibilidade habituais.
Assim sendo, na serenidade e na disponibilidade por si evidenciada ao longo de todo este processo, o Partido Socialista não pode deixar de criticar o Governo e o Secretário de Estado da Alimentação pelo "erro" cometido e não reconhecido, pela "ignorância" clara da realidade duriense, pelo "silêncio" e pela "apatia" revelada e pelo "atraso" sempre manifestado em todo este processo.
Em suma, já não nos surpreende que este Governo faça leis incompetentes sem ouvir devidamente os interessados e depois as "engula". E nesta "refeição" não pode culpar o Partido Socialista que tudo fez para que ele assumisse a consciência do seu erro - o que é difícil! . .. - e abandonasse o famigerado decreto-lei.
Sr. Presidente Srs. Deputados: Neste contexto, tendo em conta o resultado da meditação que fizemos em torno do diploma em apreço e do diálogo por nós encetado com as forças representativas da Região Demarcada do Douro, diremos não, à tentativa de extinção da Casa do Douro.
Ao defender a reposição do Decreto-Lei n.º 486/82, com as modificações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 230/83, de 28 de Maio - como ponto de partida sólido e construtivo para a "efectiva institucionalização" da Casa do Douro, particularmente para a urgente e necessária realização de eleições para os seus órgãos directivos - queremos manifestar a nossa total abertura e disponibilidade para uma reflexão profunda, serena e objectiva da problemática do Douro de forma a encontrarem-se as respostas consensuais e satisfatórias para um sector de capital importância para a região e para o País e de que a Casa do Douro é uma parte importante.
Se assim agirmos, jamais trairemos os legítimos interesses e expectativas dos Durienses.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Silva, para o que dispõe de dois minutos.

Página 1530

1530 I SÉRIE - NÚMER0 39

O Sr. Pinho Silva (PRD): - Sr. Presidente, não demorarei mais de quinze segundos.
Há pouco não entendi, pelas palavras do Sr. Ministro, se, de facto, nessa reunião em que o Sr. Deputado Aloísio Fonseca diz que participou na Régua, ficou ou não definido o regulamento eleitoral. Tenho a sensação que sim e julgo ter percebido das palavras do Sr. Ministro que isso iria agora ser feito.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Aloísio Fonseca.

O Sr. Aloísio Fonseca (PS): - Sr. Deputado Pinho Silva, naturalmente há aí um desfasamento de reuniões. A reunião a que me referi foi aquela onde estiveram representantes de todas as forças políticas, mas posso adiantar qualquer coisa, até porque, do diálogo que assumimos com as forças representativas da lavoura tenho conhecimento de que a proposta de regulamento eleitoral já foi posta à consideração do Governo e que, naturalmente, ele a irá aplicar.

O Sr. Presidente: - Para a última intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Alimentação: Em primeiro lugar quero salientar o ambiente de certa "intimidade" a que fomos remetidos pelo facto de na bancada do Governo só se encontrar, presente o Sr. Secretário de Estado que na cidade de Peso da Régua já manifestou o propósito de propor a revogação deste diploma, propósito esse que é coincidente com o nosso. A ausência do Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação coloca-nos num clima de um certo entendimento com a bancada do Governo.

Risos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, e para que não restem dúvidas, gostaria de frisar que o MDP/CDE vai votar contra a concessão de ratificação. Sendo assim, visto que todos os grupos parlamentares já se pronunciaram no mesmo sentido, excepto o PSD, que não chegou a pronunciar-se em sentido algum, fenómeno, aliás, algo estranho porquanto o primeiro interveniente pela bancada do PSD interrogado sobre esta matéria relegou a resposta para um outro deputado da mesma bancada que iria intervir, mas o Sr. Deputado Vasco Miguel acabou por prescindir do uso da palavra e a Assembleia ficou neste terrível suspense de não saber como é que vai votar e em que sentido se pronuncia o Grupo Parlamentar do PSD...

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Nem tem nada que saber.

O Sr. Álvaro de Figueiredo (PSD): - No bom sentido, Sr. Deputado!

O Orador: - Se se pronuncia no bom sentido, então vai votar contra a concessão de ratificação!

Risos.

Na fúria privatizadora do Governo toca agora a vez à Casa do Douro. É claro que este diploma e a sua evolução acabou por colocar o Governo numa corda
bamba, de que é exemplo o aditamento deste artigo único, que, aliás, não altera fundamentalmente a substância do Decreto-Lei n.º 313/86, limitando-se a referir a auscultação do Conselho Regional Agrário - auscultar significa ouvir sem carácter vinculativo, o que é a mesma coisa do que praticamente não ter em conta a opinião do Conselho Regional Agrário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Não obstante, o problema da Casa do Douro é grave na economia do nosso pais. Criada pelo Decreto n.º 30 408, após o 25 de Abril, ela viria a ser reformulada pelo Decreto-Lei n.º 486/82, mas o certo é que a sua criação trouxe importantes benefícios para os agricultores e para a agricultura da Região do Douro.
Na realidade, ao atribuir à Casa do Douro na primitiva legislação funções para a formação de cooperativas e ao facilitar até ao ponto de pagar as instalações, terrenos, edifícios, etc., a Casa do Douro deu um forte impulso à constituição de cooperativas que hoje ocupam cerca de 40 % da produção nesta região.
O certo é que o decreto-lei posterior - o Decreto-Lei n.º 486/82 -, embora retirando esta competência para a formação de cooperativas, manteve e melhorou o escoamento de ambas espécies de vinho - ou seja, não só o escoamento do vinho de pasto, mas também o vinho tratado - e em 1982 continuou a considerar a casa do Douro com uma pessoa colectiva de direito público. Ora, agora o Governo - por razões obscuras -, pretende considerar a Casa do Douro como pessoa colectiva de direito privado.
Naturalmente que a associação que se pretende criar como pessoa colectiva de direito privado não poderá senão servir os seus ócios.
Aqui se verifica a primeira grande ruptura em relação às funções até agora desempenhadas pela Casa do Douro e que, esperamos, continuarão a sê-lo através da não ratificação deste decreto-lei.
Na verdade, enquanto que é obrigatória a inscrição na Casa do Douro, e como tal é ela que tem o direito de distribuir o benefício e exercer todas as funções cometidas, na nova associação de direito privado tal inscrição não seria obrigatória, mas facultativa, o que poria em risco as funções que actualmente a Casa do Douro desempenha.
Cumpre ainda acrescentar que parece estar no espírito do Governo - pois é o que consta do texto - que a representatividade dos agentes económicos resulta do volume da produção - penso que daqui não é possível fazer interpretação diferente daquela que continha na minha pergunta. Ora, isso significa que em tal organismo seriam os maiores produtores aqueles que viriam a ter a maior representatividade, o que é uma situação claramente injusta e que nos faria recuar ao tempo dos senadores que só eram eleitos se possuíssem determinado rendimento.
Como se isto não bastasse, no artigo 4.1 estabelecem-se disposições que são extraordinariamente chocantes. Em primeiro lugar, diz-se que:

O Instituto do Vinho do Porto e a associação a criar celebrariam um acordo com duração indeterminada respeitante à prestação de serviços de pessoal da Casa do Douro, que manteria as funções.

Porém, depois acrescenta-se que:

O exercício de acção disciplinar sobre o pessoal referido no número anterior será assegurado pelo Instituto do Vinho do Porto.

Página 1531

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1531

Quer dizer, mantendo-se a Casa do Douro e o seu pessoal seria, no entanto, o Instituto do Vinho do Porto a exercer a acção disciplinar sobre eles. Mas, pior do que isso: os encargos resultantes da aplicação do disposto no número anterior serão suportados não pelo Instituto do Vinho do Porto, mas pela nova associação. Quer dizer: a nova associação teria de assistir à acção disciplinar a ser exercida pelo Instituto e depois pagava aquilo que outra entidade tinha feito. Estes são, realmente, critérios muito estranhos!
O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação considerou agora, na última versão governamental, que seria um mau serviço prestado aos agricultores a não ratificação deste decreto-lei. Ora, o que o MDP/CDE pensa é que «mau serviço» será o facto de não deixar de recusar a ratificação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos a discussão deste ponto da nossa agenda de trabalhos. A votação terá lugar amanhã às 18 horas.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, não sou e com toda a franqueza- quero dizer que nem quero ser - pelo menos para alguns efeitos que aqui são utilizados - especialista do Regimento. No entanto, ponho à consideração de V. Ex.ª a dúvida sobre se é ou não regimental e curial que num dia de uma interpelação ao Governo haja alguma votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me parece que seja impossível e ilegítimo procedermos a essa votação amanhã. Poderá considerar-se pouco consonante com a sessão de amanhã, mas acontece que se assim não for não sabemos em que dia é que essa votação teria lugar, na medida em que na próxima sexta-feira também está agendada uma sessão de perguntas ao Governo.
Segundo o nosso Regimento, as votações terão lugar às 18 horas e, portanto, creio que não haverá algum inconveniente que amanhã assim se faça logo após o intervalo da sessão. Porém, se o Sr. Deputado tiver algum inconveniente em que esta votação tenha lugar amanhã, ela realizar-se-á na próxima sexta-feira.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, não vejo inconveniente algum, desde que após a votação não se produzam declarações de voto. E digo isto porque, em princípio, as votações dos pedidos de ratificação não dão lugar a declarações de voto, mas hoje isso aconteceu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pode chegar-se a acordo no sentido de que amanhã não se produzam declarações de voto e apenas se realize a votação às 18 horas.
Srs. Deputados, da nossa agenda de trabalhos estipulada para hoje constava a discussão do projecto de lei n.º 309/1 V, do PSD, que diz respeito à apreciação dos símbolos das coligações para fins eleitorais - esta é uma fixação ao abrigo do direito regimental que permite a cada partido fixar um certo número de ordens de trabalho. Em conversa com o Sr. Deputado António Capucho, líder do Grupo Parlamentar do PSD, este mostrou abertura no sentido de que amanhã, em conferência de líderes, se apreciasse a data mais adequada para que este ponto fosse discutido e votado, não ficando assim cancelado este direito regimental que hoje não chegou a ser exercido.
Srs. Deputados, a sessão de amanhã terá lugar às 10 horas e a ordem de trabalhos será preenchida pela interpelação ao Governo sobre a matéria de política geral e incidente no sector de Defesa, solicitada pelo PRD. Às 18 horas terão lugar as votações das ratificações que agora acabámos de discutir.
Como os Srs. Deputados sabem, na quinta-feira haverá reunião de comissões e para sexta-feira está agendada uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 5 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António Joaquim Bastos Marques Mendes.

Partido Socialista (PS):

Raul Fernando Sousela da Costa Brito.

Partido Comunista Português (PCP):

José Manuel Santos Magalhães.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Mário Jorge Belo Maciel.

Partido Socialista (PS):

Helena Torres Marques.
José João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Luís do Amaral Nunes.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Armando Fernandes.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
José da Silva Lopes.

Centro Democrático Social (CDS):

António José Tomás Gomes de Pinho.
João Gomes de Abreu Lima.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Declaração de voto enviada è Mesa para publicação sobre a revisão do Estatuto da Região Autónoma dos Açores (correspondente à votação efectuada no dia 27 de Janeiro de 1987).
O PRD, ao longo de todo este demorado e atribulado processo de apreciação e votação das alterações ao Estatuto Político-Administrativo dos Açores, propostas pela respectiva assembleia regional, assumiu sempre uma posição clara, coerente e compatível com

Página 1532

1532 I SÉRIE - NÚMERO 39

a defesa da autonomia, encarada como tarefa nacional a ser prosseguida e aperfeiçoada dentro do quadro definido pela Constituição da República Portuguesa.
Assim, em 10 de Julho de 1986, votou favoravelmente, na generalidade, aquela proposta de lei, tendo na altura feito referência a algumas deficiências, lacunas e até inoportunidade de alguns preceitos propostos pela assembleia regional.
No seio da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, onde a proposta de lei da Assembleia Regional dos Açores foi apreciada na especialidade, o PRD colaborou activamente com os restantes partidos e com uma delegação da própria assembleia regional na melhoria de um texto - foram cerca de 25 as alterações efectuadas -, tendo desde sempre pautado a sua conduta pela obtenção de soluções consensuais.
Esse consenso foi obtido, e, em 25 de Julho, todos os partidos com assento na Assembleia votaram unanimemente a proposta de lei n.º 33/IV, que consubstanciava as alterações ao Estatuto dos Açores.
Entendeu, porém, S. Ex.ª o Sr. Presidente da República exercer, nos termos constitucionais e após consulta ao Conselho de Estado, o seu direito de veto relativamente aquela proposta de lei, aprovada por unanimidade em 25 de Julho. Da mensagem fundamentada que dirigia a esta Assembleia solicitando nova apreciação do diploma, não ressaltavam, conforme fez antes o PRD nas sessões de 7 e 30 de Outubro de 1986, quaisquer questões de fundo relacionadas com a autonomia nem eventuais inconstitucionalidades das alterações propostas, e somente destas, facto parecendo indicar que o que estava em causa era apenas a "redacção particularmente infeliz" de alguns artigos, nomeadamente do artigo 6.º, n.ºs 2 e 3 - único artigo referido expressamente na mensagem do Sr. Presidente da República.
Foi, então, opinião do PRD, que uma regulamentação adequada do artigo 6. º seria suficiente para esclarecer todas as dúvidas e deixar inequivocamente expressa a indiscutível e indiscutida dignidade e supremacia dos símbolos regionais bem como o tratamento oficial e protocolar devidos aos símbolos regionais. Este entendimento do PRD, que evitava a reapreciação do diploma, assentava ainda no facto de outras questões existirem no Estatuto dos Açores, carecendo de correcção ou aprofundamento, não poderem ser alteradas pela Assembleia da República dada precisamente a natureza especial deste processo legislativo. A uma delas fizemos nós referência logo na primeira intervenção nesta Assembleia, ao lamentar que a Assembleia Regional dos Açores não tivesse tido a iniciativa de a tomar. Referimo-nos à forma de aprovação do orçamento regional constante da alínea g do artigo 26.º do Estatuto ainda em vigor e que a Assembleia Regional dos Açores sempre persistia em não alterar, não obstante as muitas solicitações que teve para o fazer.
Tendo esta Assembleia entendido maioritariamente rever a sua votação inicial, a posição do PRD no processo subsequente foi a de continuar sempre à procura de soluções consensuais. E foi apenas relativamente às propostas de alteração que lograram o consenso que o PRD votou favoravelmente.
A finalizar, e na sequência do que já dissemos na sessão desta Assembleia de 15 de Janeiro próximo passado, em que se votou as alterações a introduzir no Estatuto dos Açores, queremos também aqui deixar expresso que consideramos grave erro político da Assembleia Regional dos Açores, e muito principalmente do partido nela majoritário, a atitude de intransigência face às numerosas solicitações que teve para alargar o âmbito da revisão a outros artigos.

Pelos Deputados do PRD, Roberto Amaral.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação e relativas à passagem de mais um aniversário do regicídio

Votei positivamente o voto apresentado pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho e outros, sobre o regicídio de 1908 porque considero o assassinato do rei D. Carlos 1 e do príncipe real D. Luís Filipe um daqueles acontecimentos que não se dilui no tempo. A memória do Povo Português tem-no sempre presente porque a morte violenta do Chefe do Estado legítimo e do seu mais próximo sucessor na continuidade dinástica atingiu toda a comunidade nacional ao eliminar criminosamente o seu símbolo histórico e vivo.
Ao relembrarmos o primeiro Chefe de Estado assassinado e o seu herdeiro devemos ter por finalidade repudiar toda a espécie de terrorismo como forma de afirmar ideologias ou propósitos revolucionários e políticos.
O desenvolvimento calmo e tranquilo da democracia, após o regicídio, e uma vez gorados os esforços do grande democrata e patriota que foi D. Manuel II, não mais foi possível realizar-se continuamente em segurança, paz e plena liberdade.
Com o 25 de Abril reencontrámos o caminho da democracia que só será possível percorrer se soubermos construir um amplo consenso nacional acerca das instituições democráticas, uma modernidade alicerçada nos valores válidos do presente e do passado e nos símbolos permanentes da independência.

Gonçalo Ribeiro Telles.

Votei contra o mais que extemporâneo voto de repúdio pelo regicídio que vitimou o rei D. Carlos de Bragança, não por defender, em qualquer circunstância, um homicídio, ainda que seja por motivos políticos, mas porque vislumbrei no voto intuitos que ultrapassavam as fronteiras da mais límpida sinceridade.
E porque era de tal maneira insólito o voto apresentado e era de tal maneira expressivo de uma nostalgia que ultrapassava, de longe, aquilo que seria legítimo, não poderia deixar de contribuir para a sua rejeição, ciente de que a morte violenta de um homem - ainda que esse homem fosse rei - não poderia servir, honestamente, de pretexto e uma intenção humanitária mas, ao contrário, significava, pura e simplesmente, não digo um monarquismo mas, até, um miguelismo infuso que impregna a essência do voto apresentado.
Por isso e sem que isso possa significar quaisquer solidariedades com o regicídio ou, apenas, com simples homicídios, mas, simplesmente, porque não é fácil levar-me a alinhar com monarquismo, aliás já arqueológicos e tradutores de um reaccionarismo - não direi ultramontano - mas infestado de um bolor que tresanda e trauliteiranismo e que tínhamos a ingenuidade de considerarmos mortos por inanição.
O rei D. Carlos teve os seus méritos e os seus deméritos mas o respeito que nos merece a memória dos mortos - particularmente dos mortos que na sua vivência foram proeminentes - impede-me de colabo-

Página 1533

4 DE FEVEREIRO DE 1987 1533

rar num voto que, lamentavelmente, vem parasitar uma tragédia que, não sendo de maneira nenhuma defensável, não pode servir de pretexto para que seja utilizada para servir de núcleo e pretexto para exibir nostalgias perfeitamente desarticuladas com o nosso tempo e com a aceitação que hoje usufrui o regime republicano.

O Deputado do PS, Frederico de Moura.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação dos projectos de resolução sobre as ratificações n.ºs 126/1V (PCP), 127/1V (PRD) e 128/1V (PS), sobre o Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro (Lei Orgânica Hospitalar), que revoga o Decreto-Lei n.º 129/77, de 2 de Abril.

O PRD votou a favor da recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 16/87, de 9 de Janeiro, pelas seguintes razões:

a) A estrutura de poder definida para os hospitais é centralizadora, confusa, ambígua e tecnicamente incorrecta. Não consagra de modo inequívoco níveis de autoridade e responsabilidades, princípio vital, para o funcionamento de uma instituição considerada entre as mais complexas organizações da sociedade moderna;
b) Não institui direcções funcionais em áreas fundamentais que pelas suas especificidades extensão e importância, como por exemplo a manutenção de todo o equipamento, cada vez mais sofisticado, os serviços hoteleiros e outros, sem as quais não é possível o hospital prestar serviços humanizados e técnicos, exigido nos dias de hoje;
c) Porque não é definido o nível técnico do presidente e do administrador-geral, que integram o conselho de administração, deixando a sua escolha totalmente ao arbítrio do Ministro da tutela, correndo o risco de serem mais importantes as simpatias partidárias ou pessoais que a preparação profissional;
d) Embora estejam definidas as categorias profissionais dos dois restantes membros do conselho de administração a sua nomeação é igualmente por escolha do Ministro da tutela.

Com este processo de constituição do conselho de administração, corria-se o risco de transportar para os hospitais o amadorismo e a instabilidade política, que se registam hoje nas A. R. S., cujo órgão de administração obedece às características que agora se pretendiam impor aos hospitais.
Em nome dos utentes dissemos não á tentativa de instrumentalização dos hospitais.
Em nome dos utentes, o PRD está aberto a colaboração com todas as forças partidárias e com o próprio Governo no sentido de criar um "novo hospital", que preste aos doentes bons serviços quer no aspecto técnico, quer humano e que simultaneamente seja um pólo de desenvolvimento económico, social, e científico.

Pelo deputado do PRD, Fernando Dias de Carvalho.

As REDACTORAS: Maria Amélia Martins - Maria Leonor Ferreira.

Página 1534

PREÇO DESTE NÚMERO: 152$00

Depósito legal n. º 8818/83

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×