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I Série - Número 54
Sexta-feira, 13 de Março de 1987
PORTE PAGO
IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)
SESSÃO PLENÁRIA DE 12 DE MARÇO DE 1987
Presidente: Exmo. Sr. António Alves Marques Júnior
Secretários: Exmos. Srs. Daniel Abílio Ferreira Bastos
Victor Manuel Caio Roque
Rui de Sá e Cunha
José Estêvão Correia da Cruz
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos, da resposta a alguns outros e de diversos diplomas entrados na Mesa.
Relativamente ao voto de pesar pela morte do Prof. Paulo Quintela, aprovado na sessão anterior, produziram declaração de voto os Srs. Deputados Vasco da Gama Fernandes (PRD), Raúl Rêgo (PS), José Manuel Mendes (PCP), José Gama (CDS) e Costa Andrade (PSD).
Foi aprovado um voto de pesar pela morte dos elementos da guarnição da corveta da Armada Portuguesa António Enes.
O Sr. Deputado Álvaro Brasileiro (PCP), a propósito de uma manifestação de trabalhadores da Zona da Reforma Agrária, acusou o Governo de estar a levar a cabo uma ofensiva contra a Reforma Agrária.
O Sr. Deputado Raul Brito (PS) abordou a situação vivida no concelho de Baião e as preocupações da população, tendo respondido a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Pinho Silva (PRD).
O Sr. Deputado António Feu (PRD), analisando a problemática da indústria da pesca e das conservas de peixe, criticou a acção do Governo no sector.
O Sr. Deputado Mendes Bota (PSD), a propósito de instituições que se dedicam a recuperar, amparar e preparar crianças diminuídas, referindo-se à CRACEP - Cooperativa de Reeducação e Apoio à Criança Excepcional de Portimão, apelou ao Governo no sentido de não permitir que instituições como esta não atinjam os seus objectivos por falta de financiamentos.
O Sr. Deputado Carlos Laranjeira (CDS) alertou para o perigo que a brucelose representa para a saúde pública e falou da necessidade de sensibilizar a lavoura, apontando ainda algumas medidas tendentes a minorar os prejuízos decorrentes do abate de gado contaminado.
Em declaração política, o Sr. Deputado Caio Roque (PS) referiu-se à problemática do emigração portuguesa, defendendo existirem condições que permitem pôr em prática uma política de desenvolvimento que transforme Portugal num país acolhedor e criticando o Governo por não estar a aproveitar esta situação.
Ordem do dia. - Foi aprovada uma proposta de resolução apresentada pela Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, dando assentimento à viagem de carácter oficial de Sua Excelência o Presidente da República ao Brasil.
Foram também aprovados dois pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos, um autorizando e outro não alguns deputados a deporem como testemunha.
Após leitura do parecer da Comissão de Juventude, iniciou-se a discussão, na generalidade, dos projectos de lei n.º 3/IV (PCP), 323/IV (PS) e 380/IV (CDS), relativos ao subsidio de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego. Intervieram no debate, a diverso titulo, além dos Srs. Secretários de Estado da Juventude (Couto dos Santos) e do Emprego e Formação Profissional (Fernandes Marques), os Srs. Deputados Jorge Patrício (PCP), Carlos Coelho (PSD), Horácio Marçal (CDS), Miranda Calha (PS), Rui Salvada (PSD), Rogério Moreira (PCP), José Apolinário (PS), Tiago Bastos e Ana Gonçalves (PRD) e Santos Poças e Mário Maciel (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
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I SÉRIE - NÚMERO 54
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Flausino Pereira da Silva.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Francisco Jardim Ramos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Limão de Andrade.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Rosado Correia.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
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Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeída dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
José Torcato Dias Ferreira.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria Cristina Albuquerque.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
Carlos José Machado L. Pereira.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Augusto Garcia M. Pinto.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Pedro José del Negro Feist.
Deputados independentes:
Rui Manuel Oliveira Costa.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura dos requerimentos e dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Foram apresentados os seguintes requerimentos: No dia 6 de Março de 1987: a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado José Magalhães e outros; ao Ministério das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Ilda Figueiredo e Carlos Carvalhas; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e da Educação e Cultura, formulados pelo Sr. Deputado António Mota; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Virgílio de Oliveira, Mendes Bota, Ana Gonçalves, Cláudio Percheiro, José Passinhas, António Feu, Carlos Lilaia e Agostinho Domingues; ao Ministério da Educação e Cultura, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Sousa Pereira; à Secretaria de Estado da Juventude, formulados pelo Sr. Deputado Tiago Bastos; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário.
No dia 10 de Março de 1987: ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Mendes Morgado, Alexandre Manuel, Rui Santos Silva, Bártolo Paiva Campos, Carlos Alberto Matias, António Lopes Marques e Cláudio Percheiro; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Rui Silva; ao Ministério da Defesa Nacional, formulados pelo Sr. Deputado Costa Carvalho; ao Governo, formulados pela Sr.ª Deputada Cristina de Albuquerque; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulados pelo Sr. Deputado Pinho Silva; aos Ministérios do Trabalho e Segurança Social e do Plano e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Luís Roque; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados José Lello, José Apolinário, António Barreto, Cardoso Alves, Carlos Manafaia, António Osório e Armando Vara; aos Ministérios da Administração Interna e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Sá Furtado; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Jaime Gama; a diversos ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Santos; a várias Câmaras Municipais, formulados pelo Sr. Deputado Pereira Coelho e outros; a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Mendes Bota; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Duarte Lima; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Cláudio Percheiro e outros.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Sousa Pereira, na sessão de 8 de Maio e nas sessões de 3 e 11 de Dezembro e 174 respostas de câmaras municipais aos requerimentos apresentados na sessão de 22 de Dezembro;
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Ramos de Carvalho e Sá Furtado, na sessão de 12 de Junho e nas sessões de 20 de Novembro e 22 de Janeiro; José Magalhães e outros, na sessão de 12 de Junho e nas sessões de 6 de Novembro, 9 e 16 de Dezembro e 6 de Janeiro; António Mota, na sessão de 9 de Outubro; Corujo Lopes, nas sessões de 9 de Outubro e na sessão de 9 de Janeiro; Duarte Lima, na sessão de 23 de Outubro; António Guterres, nas sessões de 28 de Outubro e 9 de Dezembro; Jorge Lemos, nas sessões de 6 de Novembro e 6 de Janeiro; Miranda Calha, na sessão de 19 de Novembro; Silva Pinho, nas sessões de 21 de Novembro, 2 de Dezembro e 6 de Janeiro; Maria Santos, nas sessões de 2 e 18 de Dezembro, 13 e 15 de Janeiro e doze respostas de câmaras municipais aos requerimentos apresentados na sessão de 27 de Janeiro e 4 de Fevereiro; José Cesário, na sessão de 2 de Dezembro; Barros Madeira, na sessão de 16 de Fevereiro; Borges de Carvalho, na sessão de 13 de Janeiro; António Paulouro, na sessão de 22 de Janeiro; Raul Junqueiro, nas sessões de 23 de Janeiro e 4 de Fevereiro; Álvaro Brasileiro, na sessão de 27 de Janeiro; Paiva Campos e Sá Furtado, na sessão de 29 de Janeiro; Raul Castro, na sessão de 4 de Fevereiro.
Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: ratificação n.º 142/IV, da iniciativa do Sr. Deputado José Manuel Mendes e outros, do PCP, do PS, do PRD; do CDS e do MDP/CDE, do Decreto-Lei n.º 102/87, de 6 de Março, que dá nova redacção aos artigos 6.º, 14.º, 15.º, 17.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 64/76, de 24 de Janeiro - bilhetes de identidade. Foi admitido e baixou à 1.ª Comissão.
Deram igualmente entrada na Mesa os projectos de lei n.º 385/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Jaime Gama e outros, do PS, que diz respeito à participação da Assembleia da República na formulação das políticas comunitárias - foi admitido e baixou à 11.ª Comissão - e 386/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que estabelece normas tendentes a salvaguardar e garantir o pleno exercício das competências da Assembleia da República no tocante às questões decorrentes da adesão à CEE.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, atendendo a que como Presidente da Assembleia da República em exercício tomei ontem ao fim da tarde conhecimento de um comunicado do Gabinete do Sr. Primeiro-Ministro relativo à delegação da Assembleia da República que neste momento realiza uma viagem à União Soviética, convido de imediato os representantes dos grupos parlamentares para uma conferência de líderes no Gabinete do Sr. Presidente.
Creio que o período de antes da ordem do dia deve decorrer normalmente e as intervenções políticas que versarem sobre esta questão deverão ter lugar depois da conferência de lideres parlamentares.
Informo ainda os Srs. Deputados que no inicio deste período de antes da ordem do dia devem ser produzidas as declarações de voto relativamente ao voto de pesar pela morte do Professor Paulo Quintela, que já foi votado na última sessão.
Ainda neste período de antes da ordem do dia irá ser lido um voto de pesar relativamente ao que se passou com a corveta da Armada Portuguesa António Enes.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, gostava de obter um esclarecimento sobre o entendimento da Mesa quanto à sequência dos trabalhos. Pelo que me foi dado entender das palavras do Sr. Presidente, alguns grupos parlamentares manifestaram-se já no sentido de se pronunciarem no período de antes da ordem do dia sobre aquilo que classificaria - sem atribuir nenhum significado especial - como um incidente suscitado em torno da missão parlamentar que neste momento se encontra na União Soviética.
O Sr. Presidente sugeriu que se fizesse uma conferência de líderes parlamentares para se debater esse mesmo assunto e que, entretanto, decorresse normalmente o período de antes da ordem do dia.
Ora, gostaria de saber se, neste esquema, as intervenções que estão previstas ou possam vir a ser suscitadas não ficarão prejudicadas. Era bom que não se consumisse o período de antes da ordem do dia enquanto decorre a conferência de líderes parlamentares porque depois víamo-nos confrontados com a situação de não ser possível abordar essa matéria porque o período de antes da ordem do dia já está ultrapassado ou porventura tenha havido quem a tenha abordado já num quadro de uma certa «anarquia». Era esta questão que gostaria de ver esclarecida para saber como
orientar os nossos trabalhos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a ideia da Mesa relativamente a esta questão é a de sistematizar, de uma forma organizada, este próprio problema no caso de ele vir a ser suscitado no período de antes da ordem do dia. Com esta intenção não pretendemos, de maneira alguma, impedir que as declarações políticas que eventualmente venham a ser consideradas pertinentes se processem. Há vários processos que se podem utilizar - e a Mesa admiti-los-á -, incluindo o da suspensão dos trabalhos depois de esgotado o período de antes da ordem do dia para que, eventualmente, se pudessem produzir as declarações políticas.
De qualquer modo, devo dizer que a preocupação da Mesa é a de sistematizar este tipo de debate em conferência de líderes parlamentares. Há um conjunto de informações que antes de serem vinculadas em termos de Assembleia devem ser suscitados ao nível da conferência de líderes. Esta é a intenção da proposta que apresentei relativamente a esta questão.
O Sr. Lopes Cardoso. (PS): - Sr. Presidente, sendo esse o entendimento da Mesa, não temos nada a objectar e até nos parece que a sugestão de V. Ex.ª pode ser útil para o desenrolar ordenado dos nossos trabalhos.
O Sr. Presidente: - Solicito ao Sr. Vice-Presidente José Vitoriano o favor de me substituir na presidência.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.
O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto sobre o voto de pesar pela morte do Professor Paulo Quintela, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco da Gama Fernandes.
O Sr. Vasco da Gama Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O impensável Regimento que dirige os trabalhos desta Assembleia - impensável e
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inverosímil - não permite que a minha intervenção ultrapasse três minutos. Vou obedecer-lhe, ou vou tentar obedecer-lhe, porque para mim bastaria apenas um minuto para falar sobre a Estónia, mas falar sobre Paulo Quintela em três minutos chega a ser uma violência.
Creio que foi Raymond Poincaré que, à hora da morte de George Clemenceau, teria dito «há homens que devem ser enterrados de pé». Com isto queria dizer Poincaré que há homens cuja postura na vida se não compadece a não ser com a direitura da espinha e do seu próprio corpo. Paulo Quintela é um dos homens que deveria ter sido enterrado de pé.
Conheci-o - já o considero da minha geração pela proximidade para onde caminho - e considero-o como uma das figuras mais interessantes e tutelares da cultura portuguesa. Fazer a história da sua vida nem em três horas, quanto mais em três minutos. Direi simplesmente que Paulo Quintela era um dos oito filhos de uma padeira e de um trabalhador rural (homem pobre de Trás-os-Montes), tendo chegado pobre a Coimbra, desprovido de bens, e pouco tempo depois Paulo Quintela era já considerado como uma das grandes figuras do seu tempo.
Não vou ler-lhes a obra dele como tradutor de Goethe, como fundador desse maravilhoso Teatro dos Estudantes, como professor. Tudo isto é mais ou menos conhecido por VV. Ex.ª e o País já tomou a notícia do que ele era.
Importa, no entanto - é esse o meu dever e a razão por que aqui estou -, focar uma faceta da personalidade de Paulo Quintela.
Paulo Quintela era um homem difícil. Aliás, em Portugal são sempre difíceis os homens que falam duro e que são frontais nas suas afirmações e nas suas atitudes.
Paulo Quintela ingressou na Faculdade, formou-se com 19 valores, preparou-se para o seu doutoramento, em que obteve igualmente 19 valores, e, perante o espanto deste país, só conseguiu ser professor catedrático depois do 25 de Abril. O Sr. António Oliveira Salazar nunca perdoou a sua irreverência, o seu desassombro e a sua coragem. Era um homem frontal, que dizia a verdade, por mais dura que fosse, custasse o que custasse. Assim, Paulo Quintela só conseguiu ascender à cátedra de professor catedrático após a restauração das liberdades neste país.
Meus senhores, dado o tempo de que disponho estar a terminar, pouco mais vos posso dizer.
Paulo Quintela deixou um vácuo no coração dos seus amigos, deixou um vácuo difícil de preencher na cultura portuguesa, deixou um vácuo na moral dos portugueses, na honra e na hombridade da defesa das suasideias e daquilo que julgava ser o melhor para o seu país.
Paulo Quintela, minhas senhoras e meus senhores, merecia, na verdade, ser enterrado de pé.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Rêgo.
O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista, com o voto de pesar pela morte do Professor Paulo Quintela, não quer manifestar apenas quanto sente a falta do seu antigo militante, mas também exprimir quanto representou para a cultura portuguesa a figura ímpar que ficou para sempre sepultada em Bragança, onde nascera.
Paulo Quintela era um mestre universitário, mas era-o também do civismo, do trato social aberto, franco, na sua linguagem clara, por vezes brusca, e não recusando a polémica. Sabia-se sempre onde ele estava e o que pensava. Foi democrata e todos os movimentos democratas, até nas horas mais graves, contaram com o seu apoio, a sua combatividade. Por isso o mestre consagrado por universidades e institutos estrangeiros, o germanista insigne distinguido com a medalha Goethe, só muito tarde ascendeu à cátedra universitária.
Formador de mentalidades, Paulo Quintela não dava o seu magistério por findo com as palestras, os interrogatórios dos alunos, os exames. Ele vivia as preocupações, os interesses dos estudantes e o trabalho prosseguia na convivência constante das associações académicas, nos contactos ocasionais e nessa obra ímpar de cultura em que mestre e alunos trouxeram para o nosso tempo a arte dramática mais clássica.
O Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra correu Portugal inteiro. Foi a África e ao Brasil, a outros meios cultos da Europa, é uma realização que só a cultura e a integração do mestre entre os alunos tornaram possível. E tem pernas para andar. Esse o orgulho de qualquer mestre: que os discípulos caminhem avante sem ele.
Paulo Quintela foi sempre socialista. Pertenceu à Acção Socialista na clandestinidade e foi candidato do Partido Socialista às eleições para a Constituinte.
Meu companheiro de lista em Bragança, durante umas semanas vivemos essa novidade que era a de falar livremente ao povo em comícios, em palestras, em simples encontros no distrito mais rural do País e onde ambos nascemos. Paulo Quintela continuava a ser o mestre, em salas grandes, em teatros, em Casas do Povo, em escolas primárias, sentia-se tão à vontade entre lavradores e homens de enxada como entre os seus alunos de Coimbra.
Não poderei esquecer uma lição que poderia ser a introdução à filologia dada por Paulo Quintela no comício da Escola Primária de Carvalhais. Com toda a naturalidade, o catedrático, como se estivesse a falar de Goethe ou de Holderlein aos seus alunos de Coimbra, foi dizendo àquela gente de mãos calejadas como se poderia trabalhar com as palavras, apurando-lhes o sentido, acentuando as diferenças, decompondo-as; e que esse trabalho, se era diferente, cuidadoso, não era diferente, cuidadoso, não era menos difícil nem menos útil do que o trabalho de quem lavra a terra, a semeia, cuida das culturas e depois as ceifa.
A morte de Paulo Quintela, professor e homem de carácter, filho de um pedreiro e que, por vezes, nas suas falas, parecia ter o vigor e a aspereza de quem trabalha o granito, cobre de luto a cultura nacional. O cidadão tinha a grandeza do professor.
Em nome do Partido Socialista, manifesto à Assembleia da República, à Academia de Coimbra e a todos os democratas portugueses o nosso profundo pesar pelo desaparecimento daquele homem bom, sem refolhos, que desceu à terra donde vinha no cemitério de Bragança.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
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I SÉRIE - NÚMERO 54
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Bertolt Brecht, que foi um dos autores alemães traduzidos por Paulo Quintela, escreveu:
Não preciso de pedra tumular, porém
Se vós precisais duma para mim
Desejaria que se lesse nela:
Este fez propostas.
Nós Aceitámo-las.
Com tal inscrição ficaríamos
Todos nós honrados.
O memorado Professor da Faculdade de Letras de Coimbra foi alguém que marcou o percurso da vida com o sinete da criatividade, da inventividade, dos impulsos renovadores. Fundador do TEUC, desempenhou, na época e no Portugal do marasmo oficialmente tutelado, um papel de actualização, de reformulação positiva e progressiva do nosso teatro, só comparável, como alguém já notou, àquele que a Almeida Garrett coubera nos alvores do século XIX e de que ficaram marcadas imperecíveis no nosso legado histórico-cultural.
Foi pelo engenho e pela pertinácia de Paulo Quintela que os palcos, onde os estudantes coimbrãos actuaram, trouxeram ao convívio do público Lorca, Bertolt Brecht, há pouco referido, Gil Vicente, José Régio, Miguel Torga e tantos outros que são sinais cimeiros de cultura, nacional e internacionalmente considerada.
Já aqui se aludiu à importância enorme da acção do Professor Quintela na Faculdade de Letras e no magistério da vida, no contacto com sucessivas gerações de estudantes.
Republicano, socialista, homem íntegro que nunca pactuou com o servilismo, para quem o espírito de cedência era, antes do mais, uma autoderrota, esteve em cada um dos momentos da luta estudantil e antifascista e, já com o Portugal da liberdade, em todos aqueles em que a esperança se alimentou de construções estimulantes a caminho da dignificação do homem.
Tradutor celebrado de nomes eternos da literatura universal (Reiner Rilke, Goethe, Hölderlin, Brecht, Georg Trake, Nietzsche, Nelly Sachs, entre muitos) deixou-nos, acima de tudo, a lição permanente dessa sua escola do rigor, da seriedade, da autenticidade, que fez com que poetas e leitores nela encontrassem uma referência a tantos níveis paradigmática.
O tempo é escasso. Gostaria, ainda assim, de lembrar que, desde os primórdios da carreira universitária, quando pretendeu defender uma tese sobre Gerhart Hauptmann e os problemas sociais da sua obra, Paulo Quintela se viu confrontado com os impedimentos que, na escola e nas áreas globais da sociedade portuguesa, o obscurantismo e o fascismo prodigalizavam. Dessa confrontação, que assumiu até ao fim, resulta a imagem de uma personalidade fraterna, solidária e exemplarmente livre nos diferentes actos da sua vida.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, nesta circunstância, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, com profundo apreço e com emoção, evoca a figura de Paulo Quintela, honrando-lhe, a memória, sabendo - como Rilke - «que os mortos estão sempre ocupados», que é o «coração mortal lagar dum vinho inesgotável para os homens» e, sobretudo, que a sua luz continuará nos nossos passos confiantes para o devir.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Gama tem a palavra.
O Sr. - José Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: realizou-se há dias em Bragança um encontro de futebol entre a Académica e o Desportivo local. O resultado não fica, obviamente, para a história. O que fica para a história é a razão por que esse encontro se realizou.
Coimbra e Bragança, no amplexo fraterno, quiseram homenagear o ilustre português que dá pelo nome de Professor Paulo Quintela.
Coimbra, que era a sua segunda terra, essa Coimbra que, bem recentemente, o havia distinguido com a medalha de ouro da cidade; Bragança, a terra que o viu nascer, o ilustre filho de um pedreiro, como ele orgulhosamente se referia ao seu pai.
Paulo Quintela era um homem singular; era homem espontâneo, com aquela espontaneidade que habitualmente se lê nos autos vicentinos, de que ele era um grande apaixonado; era um homem agreste por vezes, agreste mas sincero; era um homem da geração dos homens de «antes quebrar que torcer», mas era também e acima de tudo um homem - como dizia o Sr. Deputado Raúl Rêgo - de coerência granítica, característica que normalmente se encontra nos homens que vêm das ladeiras do Nordeste transmontano. Esta coerência, que fez dele, sempre dele, o homem independente, o homem que estava no lugar certo, o homem que tinha a coragem de nunca permitir que a sua independência fosse leiloada, embora fosse e sempre foi um socialista convicto. Mas era também um mestre amigo em quem os alunos confiavam. E este confiar dos alunos, esta devoção aos seus alunos, custou-lhe alguns dissabores académicos e alguns prejuízos também.
Paulo Quintela era - e recordo-me aqui de Jacques Marithan - uma pessoa capaz de se dar. Ele dava-se à cultura e dava-se aos seus alunos. E, por isso, à cultura em Portugal ficou mais empobrecida, particularmente em Coimbra - onde ele foi mestre ilustre, germanista, humanista - e, de forma particular, o TEUC, que levou o teatro português às diferentes paradas, do mundo, perdeu o seu fundador e perdeu a sua alma mater de há dezenas de anos.
E os transmontanos, nós os transmontanos, perdemos uma das glórias de que nos podemos orgulhar.
Homem que era uma fraga inamovível, esse Professor Paulo Quintela; homem que quis ser enterrado na sua terra na resposta ao seu apelo final das raízes ou, como diria Eça de Queirós, na resposta ao chamamento dos penhascos.
O CDS associou-se ao voto de pesar do Professor Paulo Quintela e relembra aqui, com emoção e muito respeito, a sua memória.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cultura é, manifestamente, um dos limites de fronteira das comunidades e dos homens que nelas se inserem.
Os homens de cultura perfilam-se em relação ao universo, ao mundo, ao devir; em relação às alternativas, numa perspectiva permanentemente aberta e criadora.
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Esta Assembleia da República, representante por excelência do povo português, não pode deixar de sentir com mágoa a perda irreparável que para nós, para o povo português, para a face da cultura portuguesa, representa a perda de Paulo Quintela.
Paulo Quintela, já aqui foi dito por vozes mais qualificadas que a minha, foi um homem de cultura ao nível mais profundo e mais radical, porque tinha da cultura aquela atitude de permanente abertura, de permanente antidogmatismo, de busca de alternativas permanentes em relação às construções do mundo e da vida codificadas, herdadas e transmitidas pela tradição.
Não é por acaso que muitos dos poetas, dos filósofos, dos teatrólogos que Paulo Quintela traduziu e nos deu a conhecer são todos eles homens de cultura, homens fundamentalmente de alternativa.
Lembro-me, sobretudo, de Nietzsche, um dos homens mais acarinhados por Paulo Quintela e cuja obra Paulo Quintela introduziu, também, entre nós.
Como transmontano, como antigo estudante de Coimbra - que lembra e agradece a solidariedade que Paulo Quintela sempre deu aos estudantes de Coimbra (a minha geração conheceu a grave crise de 1969 e contou inteiramente com a solidariedade de Paulo Quintela)-, como transmontano, como estudante de Coimbra -dizia eu -, como deputado do Partido Social-Democrata, um partido que no seu ideário cultiva, fundamentalmente, a liberdade e a tolerância, curvo-me com respeito ante a memória de Paulo Quintela.
Como representante do povo português, nesta contingência e nesta conjuntura históricas - os representantes quantitativamente mais representantes - se é lícito assim falar - não podemos deixar de erguer também a nossa voz perante esta perda irreparável que Portugal, as letras portuguesas, a alma portuguesa acabam de sofrer.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir aos nossos trabalhos, nas galerias, alunos das Escolas Secundárias de Rio Maior, de Alfredo da Silva, do Barreiro, de D. Maria I, n.º 2 de Lagos e de Campos Meio, na Covilhã.
Para todos eles uma saudação amiga da Assembleia da República.
Aplausos gerais.
Srs. Deputados, se não houver objecções, vai proceder-se à leitura de um voto de pesar.
Foi lido. É o seguinte:
Nas passada terça-feira, pelas 17 horas, ao entrar no porto da Horta, na ilha do Faial, nos Açores, após ter completado mais uma das suas missões de fiscalização da ZEE - Zona Económica Exclusiva, a corveta da Armada Portuguesa, NPR António Enes registou a bordo uma explosão da qual resultaram quatro mortos, oito ferídos e dois desaparecidos.
Estes trágicos acontecimentos vieram enlutar, além dos familiares das vítimas, as Forças Armadas em geral e a Marinha em particular.
Nestes termos, a Assembleia da República manifesta às famílias enlutadas e à Armada Portuguesa o seu profundo pesar pela morte dos elementos da guarnição da NPR António Enes, vitimas da explosão, ocorrida à entrada no porto da Horta, salientando o alto espírito de sacrifício mais uma vez demonstrado por militares que morreram no cumprimento da sua missão.
Palácio de São Bento, 12 de Março de 1987.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do MDP/CDE e dos deputados independentes Borges de Carvalho, Rui Oliveira e Costa e Ribeiro Telles.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.
O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sob o lema «não toquem mais na Reforma Agrária», cerca de 700 viaturas (incluindo 300 tractores) e cerca de 7000 trabalhadores dos distritos de Évora, Beja, Setúbal, Portalegre e Santarém deslocaram-se a Lisboa numa grandiosa manifestação de repúdio contra a vergonhosa ofensiva levada a cabo pelo Ministro Álvaro Barreto contra a mais bela conquista de Abril - a Reforma Agrária.
Foi uma manifestação pacífica mas cheia de tenacidade, determinação e coragem daqueles que querem trabalhar e produzir. Com eles, e em defesa da Reforma Agrária, se alinhavam milhares de pessoas anteontem ao longo de todo o percurso, especialmente na estrada n.º 10, entre Vila Franca de Xira até às portas de Lisboa.
Eram operários, muitos deles com as lágrimas nos olhos, também eles vitimas deste malfadado governo, e que gritavam bem alto: viva a Reforma Agrária, abaixo o governo Cavaco e Silva.
Antes da junção no Infantado, a 25 km de Vila Franca de Xira, as colunas foram interceptadas várias vezes pela GNR, onde eram pedidos os documentos das viaturas (basta dizer que a um tractorista foram-lhe pedidos os documentos cerca de 10 vezes), tudo para amedontrar, tudo para retardar a marcha e desmobilizar os trabalhadores.
Foi no Infantado que se juntaram à coluna do Ribatejo as colunas vindas do Alentejo e de Setúbal.
A fila estendia-se por vários quilómetros. O objectivo era vir até Lisboa, à Assembleia da República. Não houve pressa, não se notou ansiedade por parte daqueles que já vinham à longas horas em marcha.
Quando a GNR os mandava parar, a resposta era sempre serena e paciente, pois sabiam que com eles estava a justeza da sua luta, a força da sua razão.
Na conferência de imprensa que se realizou em pleno campo, a comissão organizadora sintetizou para os jornalistas a situação actual da Reforma Agrária e realçou que os trabalhadores tudo têm feito, especialmente nos últimos meses para suster a ofensiva do Governo.
A aprovação, na generalidade, aqui na Assembleia da República, dos dois projectos de lei, do PS e do PRD, transferindo do Governo para os tribunais a competência para decidir sobre questões da posse de terra, abriu algumas expectativas quanto à possibilidade de ser posto um travão à acção do MAP e do Governo. Expectativas que têm vindo a ser goradas pelo arrastamento dos projectos referidos e em sede de especialidade. Acrescentou a comissão organizadora que o
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Ministro Álvaro Barreto está a aproveitar esta situação para entregar reservas e majorações a torto e a direito.
Desde a aprovação na generalidade desses projectos foram já entregues treze reservas com mais de 4000 ha e sucedem-se as acções judiciais reivindicativas de propriedades.
Como já foi aqui denunciado por camaradas meus, pelo telefone, o Ministro chega a entregar terras, e a nomear os agrários como fiéis depositários de terras na posse dos trabalhadores: Tudo isto acontece nove anos depois de ter terminado o prazo para o pedido de reservas e oito anos após o prazo limite para a , execução dos processos.
O Governo aperta o cerco financeiro às cooperativas, nega-lhes o crédito e subsídios (até os da CEE), recusa-se a fazer o acerto de contas, a pagar as benfeitorias e a cumprir os mais de 400 acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo.
Foi tudo isto que os trabalhadores disseram ao longo do caminho e queriam dizer em Lisboa junto à Assembleia da República.
Será bom lembrar aos deputados, e a esta Câmara que a GNR, ao longo do percurso, além de muitos soldados estarem com metralhadoras aperradas, muitas vezes encobertos pelos sobreiros e outras mesmo às claras, também filmou tudo o que quis e lhe apeteceu. Primeiro, discretamente dentro de um carro sem insígnias que o identificasse; depois, descaradamente, com um operador fardado, a pé entre os trabalhadores. Para quê? Ninguém o disse, mas é fácil perceber ....
Mais fácil ainda quando se notou que os mais filmados eram os que mais falavam, os dirigentes sindicais e presidentes de câmaras ou todos aqueles que expressavam mais vivamente o seu protesto.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - Com que cobertura legal a GNR registou em filme as caras dos cidadãos que exercem um direito constitucional?
Que missões tipo «pidescas» serão atribuídas a este corpo militar? Quem as determina?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os protestos e reivindicações dos trabalhadores, não chegaram a ser ouvidos aqui junto ao Palácio de São Bento, mas alguns deputados comunistas ouviram-nos porque com eles caminharam durante a longa maratona.
O Sr: Carlos Carvalhas (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Com eles também muitos dirigentes sindicais dos sectores de Lisboa e dos distritos da ZIRA, assim como muitos autarcas vindos do Alentejo, Ribatejo e Setúbal.
De todo o Pais chegaram até à caravana os ecos de solidariedade. Do Norte ao Sul do Pais choveram as mensagens em cartas e telegramas, assim como da Hungria e da França.
Foi uma marcha que ficará na história da luta em defesa da Reforma Agrária. Foi uma marcha contra o arbítrio e a prepotência deste governo. Foi uma marcha em defesa da constituição e da liberdade.
Esta marcha, Sr. Presidente e Srs. Deputados, foi uma afirmação plena e vigorosa de que os trabalhadores, os democratas deste pais, estão determinados em defender a Reforma Agrária, com a força da razão, que a história, a moral, o direito e os interesses económicos do País lhe conferem.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Brito.
. O Sr. Raul Brito (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em todos os países existem regiões com diferentes níveis de desenvolvimento e de riqueza. Estas disparidades estão a maior parte das vezes aliadas a uma repartição desequilibrada das actividades económicas e ao maior ou menor grau de infra-estruturação desses espaços.
As zonas rurais, cuja economia dependa, sobretudo, da agricultura de montanha, são por excelência territórios deprimidos.
O estado democrático, solidário que é por definição,
não pode tolerar, que sejam mantidos no seu seio essas
discriminações e desigualdades de condições de vida entre os seus cidadãos.
Essa é a razão porque, hoje, decidimos intervir nesta
Câmara, em nome dos anseios e preocupações de uma dessas regiões: as do concelho de Baião.
Não temos, por exiguidade de tempo e pela profusão dos problemas, condições para, neste preciso momento, alertarmos os Srs. Deputados e aos governantes do País para todas as questões pertinentes e a pedir uma rápida intervenção. Por força destas limitações pecaremos necessariamente por omissão. Que me perdoem os Baionenses, na certeza de que continuaremos a lutar pelos seus direitos.
O concelho de Baião, situado a pouco mais de 55 km da cidade do Porto, tem uma área de 17 571 ha e uma população de 24 438 habitantes.
O território que se estende do pico do Marão (que alguns erradamente situam no distrito de Vila Real ou no concelho de Amarante) até às margens do rio Douro, que o limita a sul e a nascente, é na sua generalidade constituído por montes, pinhais e prédios agrícolas de pequena dimensão, nos quais uma população envelhecida trabalha predominantemente uma agricultura de sobrevivência.
A pequenez das explorações e a falta de acessos às mesmas (refira-se que das cerca de 5000, apenas 12,7% tem condições que permitam a passagem do tractor ou de máquinas agrícolas) provocou a dispersão das populações por 572 lugares e lugarejos.
Este contratempo, aliado à, difícil orografia da região, ao deficiente traçado e estado das estradas, a par da ausência ou insuficiência dos transportes públicos, provoca enormes dificuldades de comunicação entre as populações locais e destas com os centros urbanos mais próximos, seja Penafiel ou Porto.
Daqui resulta o isolamento do concelho e, em consequência, o seu subdesenvolvimento, com o rol de problemas, insuficiências e discriminações que a ditadura aprofundou e que o poder democrático ainda não conseguiu resolver. A esta situação não é naturalmente estranho o facto de os consecutivos governos não terem ainda produzido um plano de desenvolvimento para a região, nem
tão-pouco de ordenamento territorial.
Não fora o dinamismo do poder local, que com oportunidade, bem senso e sentido das responsabilidades aprovou as grandes opções do seu plano director,
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do qual já se conhecem os estudos sumários, e o concelho de Baião, continuaria a desconhecer a sua crua realidade e a não poder propor e expor com autoridade, fundamento e prioridade as providências que a situação requer.
Foi nesta sequência que a Câmara Municipal de Baião, associando os seus interesses aos dos concelho de Cinfães e Resende e na perspectiva de ver o seu isolamento acentuado pela construção da IP-4, pediu ao anterior titular do Ministério do Equipamento Social que fosse feita uma ligação do concelho a essa via rápida, a estabelecer entre a ponte do Mosteirô e o nó viário de Castelões. Este projecto, que mereceu muito merecidamente um despacho favorável do Ministro de então, determinava que o estudo prévio ficasse concluído no prazo de 120 dias. Estávamos em Fevereiro de 1985. São decorridos mais de dois anos e este governo, mostrando o maior desprezo pelas autarquias e populações, não honra um compromisso de Estado e propõe-se intencionalmente acentuar o isolamento desta região.
Esta atitude incompreensível não é infelizmente um acto isolado.
Concelho carenciado como é, outras legítimas solicitações tem feito ao poder central, com igual e incompreensível infortúnio.
É o que se passa no sector da educação. Para se ajuizar da grave situação em que se encontra o ensino ao nível do primário, no concelho de Baião, bastará atentar nos seguintes números:
1) 65,5% das crianças do 2.º ano, 1.º fase, reprovaram em 1985;
2) 50,8% das crianças do 2. º ano, 2.ª fase (antiga 4.ª classe), reprovaram em 1985;
3) Para um total de 81 lugares vagos, no início do corrente ano lectivo (1986-1987), foi preciso recorrer à colocação até ao momento de 232 professores, verificando-se vários casos em que só o 14.º ou 16.º acabou por ocupar o respectivo lugar.
Parece-nos claro que o fenómeno referido no n.º 3 constitui uma das razões principais para o insucesso ilustrado nos dois primeiros dados.
Entretanto, os professores invocam a falta de transporte e alojamento; a autarquia sente-se impotente para actuar numa área que não é a sua; o Estado, esse, pura e simplesmente vira as costas aos alunos.
No ensino preparatório e secundário a situação não é melhor. Com uma escola preparatória na sede do concelho, inaugurada vai para dois anos, mas já insuficiente para dar resposta às necessidades, Baião obriga algumas centenas dos seus alunos a frequentar as escolas preparatórias e secundárias dos concelhos vizinhos de Cinfães, Régua, Amarante, Mesão Frio e Marco de Canaveses.
Estas deslocações, para além dos enormes encargos que provocam ao Município [20 000 contos no corrente ano (11 % das receitas totais)], contribuem para o incumprimento e insucesso escolares.
Além do mais, estamos no único concelho do distrito do Porto, onde não há curso complementar, o que obriga os jovens a ficarem-se pelo 9.º ano, ou então a deslocarem-se para os concelhos periféricos.
Ciente destas realidades, a Câmara Municipal tem, infrutiferamente, solicitado ao Ministério da Educação a maior prioridade para a construção de uma outra escola preparatória, esta na freguesia de Santa Marinha do Zêzere, por sinal a maior freguesia de Baião e estrategicamente situada na metade oriental do concelho.
Já há o terreno. Autarquia, educadores, encarregados de educação e alunos contentavam-se com os pavilhões pré-fabricados que anualmente ficam disponíveis com a conclusão de novas escolas por todo o País.
Mas a entidade que pode e manda, o Ministério da Educação, esse fica indiferente ao insucesso escolar, ao incumprimento da escolaridade, às despesas da autarquia, como se o assunto não lhe dissesse respeito.
É imoral, Srs. Deputados, é antinacional. Nós, socialistas, protestamos contra esta prepotência, este desleixo que desperdiça a nossa maior riqueza: o homem.
Outras situações anómalas e indesculpáveis merecem ser hoje aqui trazidas à colação: o atraso na construção do Tribunal de Justiça, cujo projecto está aprovado, e para o qual já há o terreno; a demora na beneficiação da estrada nacional n.º 321-1, entre as vilas de Baião e Marco de Canaveses; a deficiente distribuição postal no concelho, onde ainda existem várias freguesias sem esse serviço; a ausência de cabinas telefónicas públicas, com a excepção da existente na sede do concelho, a delonga do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações em reforçar a verba que permita a execução da passagem desnivelada de Mosteirô; o retardamento na construção do novo quartel da GNR; a falta de apoio à construção do Centro Cívico de Santa Cruz do Douro e ao edifício da centenária Banda Marcial de Ancede, etc., etc.
O ostracismo a que o concelho está a ser votado pelo Governo e Administração é tão óbvio que, sendo Baião o município que mais projectos apresentou ao GAT de Amarante, no âmbito das candidaturas ao FEDER e FEOGA, foi em contrapartida aquele que menos apoios recebeu: 4000 contos do FEDER (um projecto) e 6200 contos do FEOGA-PEDAP (dois projectos).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A correcção das assimetrias regionais só é possível com a solidariedade nacional.
A Assembleia da República, como órgão legislativo, dispõe dos poderes para corrigir a distribuição dos meios que o Estado põe à disposição do País.
A Lei das Finanças Locais é um desses instrumentos. A sua aplicação não tem, em todos os casos, contribuído para esse objectivo. O concelho de Baião, pela sua orografia, diminuta população e ausência de indústrias, pouco ou nada tem a esperar da nova lei.
A Assembleia da República tem, pois, também a sua quota-parte de responsabilidades nas vicissitudes com que o concelho de Baião se debate.
Rever a Lei das Finanças Locais ou criar, alternativamente, mecanismos compensatórios para as regiões da tipologia de Baião parece-nos ser o caminho mais adequado para atenuar as diferenças entre os níveis de desenvolvimento observados no País.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pinho Silva.
Acontece que o Sr. Deputado Raul Brito não dispõe de tempo. Porém, a Mesa pode conceder-lhe 1 minuto para o Sr. Deputado Raul Brito responder, se V. Ex.ª desejar pedir esclarecimentos.
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O Sr. Pinho Silva (PRD): - Sr. Presidente, não me cabe agradecer essa concessão da Mesa; de qualquer modo, não vou usar da palavra mais do que um minuto para pedir esclarecimentos.
Sr. Deputado Raul Brito, é evidente que V. Ex.ª conhece, e sabe que eu também conheço, todas as situações a que se referiu e que, nomeadamente, algumas delas já foram trazidas por mim a este Plenário.
Em relação aos problemas de ensino, é óbvio que o concelho de Baião não tem, por exemplo, nenhuma escola de ensino pré-primário oficial.
Em relação ao ensino primário, é evidente que a quantidade de professores que anualmente passa pelas escolas não é, de modo nenhum, a melhor situação para ultrapassar e criar e gerar naquele concelho, que tão carenciado é, uma situação de sucesso escolar.
Em relação às ligações IP-4, a ligação Baião-Marcos está a «arrancar» e está contemplada no ano corrente, a ligação pelo nó de Castelões e pela ponte do Mosteirô para os concelhos de Resende e Cinfães está previsto no plano.
No entanto, há situações em relação às quais, pese embora a comunhão de ideais e a justiça que lhe presto na intervenção que acaba de fazer, não posso deixar de referir que, nomeadamente, e em primeiro lugar, o concelho de Baião é «governado» passo a expressão - por uma câmara que tem sido sistematicamente, à excepção de um mandato, do Partido Socialista; em segundo, - e o Sr. Deputado referiu-se, e muito bem, a isso - a solidariedade nacional. E eu diria, mais, para além da solidariedade nacional, interessa, para a resolução deste problema, o empenhamento de tudo e de todos, nomeadamente dos deputados dos diversos partidos políticos que nesta Assembleia conhecem a grande carência destas situações.
Pela minha parte, sempre me mostrei disponível perante a Câmara, a Assembleia e todas as organizações para resolver e ajudar a resolver essas situações. Não posso deixar de lhe dizer - e o Sr. Deputado sabe-o - que, até ao momento, para além de uma visita que fizemos ao concelho, nenhuma outra situação foi posta à nossa disposição em termos de empenhamento para a resolução desses problemas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Brito. Informo-o que a Mesa lhe concede um minuto.
O Sr. Raul Brito (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Pinho Silva, quero agradecer-lhe por se ter congratulado com a minha intervenção, demonstrando preocupação igual à minha pelos problemas que acabei de pôr à Câmara. Estou certo de que o povo de Baião, de onde é natural, lhe ficará reconhecido.
Só não estou de acordo com o Sr. Deputado quando, referindo-se a uma câmara municipal, fala com um sentido que não considero positivo. Isso não é só injusto como lamentável. Isto porque quem conheceu Balão antes do 25 de Abril e quem por lá hoje passa sabe perfeitamente que, independentemente das carências e das dificuldades, o que lá foi realizado foi um trabalho extraordinário.
O Sr. Deputado referiu, e muito bem, os problemas que há, por exemplo, no ensino primário. Mas veja-se, hoje, o enorme esforço que foi feito na construção e reparação de escolas. Foram construídas doze escolas em doze anos e reparadas mais de vinte escolas nesse curto período. Isto com um orçamento que pouco ultrapassa os 200 000 contos. Isto é significativo!...
O Sr. Deputado sabe as dificuldades que há de comunicações, mas, ao longo dos últimos doze anos, em 85 km que há de estradas municipais 55 km foram construídos nos últimos onze anos, e o Sr. Deputado sabe que construir 1 km em Balão é mais difícil, é mais custoso do que construir 30 km ou 40 km em Aveiro ou no Alentejo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Feu.
O Sr. António Feu (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: é do conhecimento público a situação caótica em que se encontram a indústria da pesca e das conservas de peixe no nosso país, particularmente em zonas muito sensíveis e dependentes destas actividades, como é o caso da região do Algarve.
A frota de pesca vem reduzindo progressivamente o número das suas unidades, as fábricas de conservas ou encerraram ou estão laborando (uma meia dúzia) num regime extremamente periclitante, em riscos de paralisar.
O que foi uma actividade intensa e nuclear da região algarvia transformou-se numa demonstração clara e lamentável da falta de apoios da administração sectorial, da incompetência e da irresponsabilidade.
Tivemos oportunidade de referir, nesta Câmara, que o sector das pescas é um dos que apresenta maiores yulnerabilidades perante a integração de Portugal na CEE.
A adesão sem medidas sectoriais de base a nível interno pode ter consequências gravíssimas para dois sectores em crise preocupante. E, com efeito, não existe uma política verdadeiramente nacional para as indústrias da pesca e das conservas de peixe, pois estamos a funcionar como se a política de pescas da CEE fosse a nossa própria política, numa dependência subservientemente aceite, sem a demonstração da mínima capacidade negocial, o que representa a marginalização dos interesses do nosso País e a sua maior dependência externa.
Perante esta situação, o Governo, sem política de pescas, sem medidas de fundo para acudir a dois sectores importantes da nossa economia, prefere remeter-se à cómoda posição de aguardar que a CEE lhe defina as regras do jogo.
Se tal é a política do Governo nos sectores da pesca e das conservas de peixe, esta assembleia deverá chamar-lhe a atenção para os pesados custos sociais e económicos que esta estratégia representa para o nosso país, tanto mais que nem sequer se cumprem as grandes linhas do programa que o Governo elaborou para o sector das pescas em Novembro de 1985.
Onde estão os elementos mínimos que permitam o «conhecimento real dos recursos piscatórios existentes para uma correcta exploração dos mesmos»? Qual o apoio efectivo que concedeu à frota em actividade na costa portuguesa, cujas dificuldades são bem conhecidas? Onde se concretizou o apoio para reapetrechamento e desenvolvimento da indústria conserveira?
As pescas e actividades complementares, como as conservas de peixe e as farinhas e óleos, continuam a ser tratadas pelos nossos representantes, nas relações
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com a Comunidade, como se atravessassem uma «situação normalizada», ignorando-se, pura e simplesmente, os gravíssimos problemas que empresários e trabalhadores vêm enfrentando há alguns anos.
Existe uma grande incoerência na actuação, quando os responsáveis falam em grandes e significativos investimentos em novas realizações e esquecem, totalmente, o que existe e necessita de apoio e medidas urgentes, estratégia que terá de ser desenvolvida a nível interno, com recurso à nossa vontade política e aos nossos próprios meios, independentemente dos compromissos comunitários.
Quer se queira quer não, os sectores da pesca e das conservas de peixe necessitam de um plano de emergência, cuja responsabilidade terá de ser assumida, em exclusivo, pela administração sectorial portuguesa, como forma de salvar e reactivar o que existe, através do recurso à capacidade e ao engenho dos empresários e dos trabalhadores.
Endossar toda a responsabilidade da recuperação e desenvolvimento das pescas portuguesas aos apoios comunitários é uma forma de enjeitar os compromissos próprios, de não ter política nacional e de realizar uma má gestão dos nossos recursos. Até porque muitos dos projectos aprovados pela CEE só serão exequíveis se os empresários tiverem significativos meios próprios e capacidade de crédito para satisfazer as exigências e regras comunitárias, o que não se enquadra na gravíssima situação económica e financeira das indústrias da pesca e das conservas de peixe no nosso país.
Na prática, o empresário que vê um seu projecto aprovado pelo FEOGA/CEE tem de contar, à partida, com, pelos menos, 25 % de fundos próprios para iniciar, o que pressupõe a existência de significativas disponibilidades que a esmagadora maioria dos eventuais investidores não está em condições de satisfazer.
Se recorre à banca em condições normais, tem de pagar taxas de juro incomportáveis para a actividade, mas, se opta pelo regime de bonificações SIFAP, perde o direito aos subsídios previstos nos apoio comunitários! Está-se mesmo a ver, que só um número muito restrito de armadores ou industriais conserveiros de maior dimensão, que constituem a excepção à regra, estará em condições de desenvolver, sem sobressaltos, os seus projectos, situação que não é justa nem admissível, nem parece preocupar muito o governo, através do responsável sectorial.
Um caso exemplar e anacrónico, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o da situação discriminatória dos industriais de conservas de peixe portugueses, que beneficiam de um contingente de direitos nulos de 500 t nas exportações de sardinha para os países da Comunidade - um terço das mesmas exportações - quando Marrocos, país não comunitário e nosso concorrente nos mesmos mercados, dispõe de um contingente de 14 000 t!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O primeiro ano de adesão à CEE, para os sectores da pesca e das conservas de peixe, tem de ser encarado sob uma óptica profundamente critica e desanimadora, pois não se vislumbrou capacidade no Governo para atingir os objectivos a que se propôs, nem vontade política para atacar, a nível interno, os grandes e graves problemas que estas indústrias complementares vêm enfrentando. Tão-pouco se vislumbra possam ser confirmadas as afirmações optimistas iniciais e a libertação de volumosos montantes disponíveis para reactivar o sector.
Os responsáveis esqueceram-se que no «grande edifício das pescas», a reconstrução começa pelos alicerces e não pelas janelas, ou melhor, pela «fachada», como tem sido a regra usual a que nos vêm habituando.
Aplausos do PRD.
O Sr. António Esteves (PS): - Peço a palavra para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Esteves, nem o PRD nem o seu partido dispõem de tempo. Há pouco cedi um minuto a um deputado do seu partido. Porém, o Sr. Deputado Raúl Brito já tinha excedido o tempo regimental.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Largamente!
O Sr. Presidente: - Depois, ainda lhe cedi mais um minuto.
Assim sendo, não posso continuar com indulgências e não posso, por conseguinte, dar-lhe a palavra, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A vida humana também se joga, muitas vezes, na roleta genética. Ninguém está livre de um jackpot ao contrário. Quando chega a hora da sorte madrasta. Quando a alegria de gerar um filho fica escurecida na contemplação de um ser inferiorizado, física ou mentalmente.
Quando a hora negra de a sorte ser madrasta pode bater à porta de qualquer um de nós, não basta quedarmo-nos pela força anímica de um pai ou de uma mãe na luta contra a adversidade. De nos revoltarmos porque a vida deveria, pelos menos à partida, conceder o direito à igualdade de oportunidades. Nessa hora, não chega o consolo menor de saber que há um tecto, que há uma cama, uma mesa farta e um carinho abundante.
É dever da sociedade, que somos todos nós, criar as estruturas do apoio e recuperação das criaturas a quem a sorte virou as costas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A solidariedade social para com os inferiorizados, os humildes e os deficientes não pode ser um simples pregão político, um dogma religioso que se repete cantando nas missas dos domingos. A solidariedade social não tem de ser necessariamente constitucional, nem direito escrito sob forma de lei, pela simples razão de que ela já existia quando ainda não se haviam inventado as constituições, nem regulamentado os hábitos, os costumes e os procedimentos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Egoísticamente, quantos de nós ignoramos esse lado maldito da nossa existência comum? Quantos de nós - os da parte bafejada na roleta da vida - preferimos seguir em gerente, fingindo não ver o que muitas vezes está mesmo ao nosso lado, e que também tem esperanças, e que também acredita que a vida pode ser, pelo menos, um pouquinho melhor?
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Em Portugal, tal como em quase tudo, também no apoio às crianças deficientes começámos tarde, estamos atrasados e o horizonte da recuperação não se divisa ainda.
Só no Algarve, num inquérito levado a cabo pela Associação de Pais e Amigos das Crianças Diminuídas de Faro, se detectaram cerca de 2000 casos de deficiência mental, entre os 7 e os 14 anos, dos quais cerca de 800 na zona do Barlavento.
E enquanto escasseiam as instituições, que se dedicam a esta meritória actividade de recuperar, amparar e preparar aqueles que a natureza não quis ajudar, eu saúdo os homens e as mulheres que em Portimão, por exemplo, criaram, mantêm e projectam a CRACEP - Cooperativa de Reeducação e Apoio à Criança Excepcional de Portimão, com uma obra de inestimável dedicação e competência.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E saúdo todas as entidades colectivas e individuais, públicas e privadas, que, com o seu apoio, têm conseguido manter de pé uma instituição frequentada por 60 crianças deficientes, de todo o Barlavento.
E saúdo o ex-Secretário de Estado do Emprego, Dr. Rui Amaral, e o Instituto do Emprego e Formação Profissional, por terem permitido o financiamento da primeira fase da construção de umas novas e magníficas instalações, que prossegue em ritmo assinalável, em terreno em boa hora cedido pela, edilidade portimonense.
São cerca de 110 000 contos, muito bem empregues e que contemplam a parte profissionalizante desta cooperativa. Dali sairão homens e mulheres recuperados utilmente para a vida, nos sectores da carpintaria, cestaria, tricotagem, construção civil, costura, tecelagem, cartonagem e serralharia. Só que o projecto contempla uma segunda fase, onde cabe à área sensorial, escolarizável, apoio à infância e ATL, que implica um
investimento de cerca de 90 000 contos, para o qual não existe ainda patrono.
Mas pior do que isso: vai ter de se fazer agora uma cobertura provisória, que será destruída quando um dia se der inicio às obras da segunda fase, obras que, obviamente, implicarão a suspensão da actividade da CRACEP.
É porque não saudámos, nem aceitamos e porque nos revoltamos contra esta teia administrativa e burocrática, que persiste, muitas vezes, em contrariar á vontade e a boa-fé de quem governa, que lançamos um apelo aos responsáveis dos Ministérios da Educação e do Trabalho, para que actuem rapidamente e em força em Portimão e não permitam que se fique de costas viradas uns para os outros. Uma obra tão linda que o Estado lá está a fazer não pode ficar inertemente deficiente por culpa desse mesmo Estado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - À comunicação social deste país, que muitas vezes busca obcecadamente os, leads do escândalo e encharca as suas páginas no sangue da tragédia, só vos digo que vale a pena irdes a Portimão; tomar um banho de sol numa praia de humanidade e solidariedade.
As crianças excepcionais merecem a vossa atenção, e ainda acreditam que um bocadinho de sonho, pelo menos, será possível.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Laranjeira.
O Sr. Carlos Laranjeira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dirijo-me a V. Ex.ª com o intuito de os alertar e sensibilizar para o controle de uma doença que tão graves consequências tem tido para a saúde pública e para a economia nacional: a brucelose ou febre de malta.
O que é a febre de malta ou a brucelose? É uma doença grave dos animais, que a transmitem entre si e ainda ao ser humano.
Os animais mais atacados são as cabras, as vacas e as ovelhas, mas outros como o porco, cavalos e aves podem também ser atingidos pela doença. As pessoas infectam-se pelo contacto com os animais atacados pela brucelose, sobretudo com os produtos do parto ou do aborto, tais como o feto, secundinas, águas fetais, outras excrescências várias e ainda com os locais onde permanecem: estábulos, currais, pocilgas, etc. As pessoas podem igualmente infectar-se pelo sangue e carne dos animais doentes. Se tudo isto é perigoso, mais grave se torna por o contágio se fazer facilmente através de ingestão de leite cru (sem fervura) e pelos queijos frescos, feitos com leite proveniente de animais doentes.
A febre de malta é uma doença de difícil cura, arrastada, que impossibilita as pessoas para o trabalho durante alguns meses e até anos, podendo mesmo causar a morte. Bom, pelo que acabo de descrever teremos que considerar que é um verdadeiro milagre não existirem mais casos de febre de malta entre as pessoas.
No distrito de Coimbra foram infectadas, de 1981 a 1986, 216 pessoas. Em 1981, foram infectadas 27 pessoas, tendo este número vindo a crescer, estando, em 1986, em. 59.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A brucelose, em 1986, causou a perda de 921 animais (vacas leiteiras) em três distritos da Beira Litoral (Aveiro, Coimbra e Viseu), assim distribuídos: Aveiro, 418 animais; Coimbra, 445; Viseu, 58.
Refiro-me aos abates, somente por não dispor de dados (nem ninguém os tem) quanto ao número de animais doentes e não abatidos, por andarem em deambulações pelo país, como é sobejamente conhecido de todos.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Os processos de abate de animais doentes são lentos por várias razões.
Primeiro, porque o agricultor não está sensibilizado e não acredita totalmente nos resultados das análises feitas ao sangue do seu gado. Sabendo, como só eles sabem, quão difícil é conseguir um animal de boa qualidade e sendo esses animais o principal suporte da economia do seu agregado familiar, fácil é compreender a relutância que têm em deixar abater os seus animais.
Em segundo lugar, se não existisse esta relutância da lavoura, os serviços oficiais não dariam resposta às necessidades de abate.
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Para que não se pense que é o agricultor o culpado deste estado de coisas, convém que se diga que quando se fez a recolha de sangues (feito, na grande maioria, pelo sector cooperativo e pago pelo Estado) para conter a peripneumonia, poderia e deveria ter sido só com esse trabalho também estancado a brucelose. Não se fez e agora repete-se tudo, ainda com o inconveniente de se ter deixado passar mais de um ano de contágio.
Convém que se diga que, em especial nos distritos de Aveiro e Coimbra, a maioria do gado leiteiro frequenta ordenhas colectivas, pois pertence a pequenas explorações familiares. E senão vejamos: Aveiro, com 62 181 animais em 19 125 explorações; Coimbra, com 38 802 animais em 15 060 explorações.
Para que VV. Ex.ª possam avaliar a quebra do efectivo leiteiro nestes dois distritos e os prejuízos inerentes, dir-lhes-ei que, de 1979 a 1986, o distrito de Aveiro passou de 64 413 animais para 62 181 e o distrito de Coimbra de 46 395 para 38 802 animais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se aos prejuízos causados pela brucelose, em 1986, acrescentarmos os da peripneumonia, poderão VV. Ex.ª aquilatar dos danos causados à lavoura desta região. Em 1986, foram abatidos com peripneumonia, em Aveiro, 762 animais e em Coimbra, 342.
Não quero aqui escamotear algum esforço que foi feito pelo Governo no sentido de controlar a brucelose e também a peripneumonia, mas foi pouco, lento, injusto e sem qualquer sensibilização do agricultor.
O Sr. José Gama (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Não basta pagar a carne das vacas abatidas, pois elas valem fundamentalmente pelo leite que produzem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saibamos apreciar o leite que tomamos não só pelo seu sabor e pelo bem que faz, mas também pelos sacrifícios que a lavoura passa.
Esquecer e não enaltecer o esforço e sacrifício das mulheres e crianças da Beira Litoral é injusto, pois são elas que, às 5 ou 6 horas da manhã, faça chuva ou frio, aí vão a caminho da ordenha colectiva com os animais à soga, onde permanecem duas ou três horas. As mulheres quando regressam a casa continuam a cuidar dos seus animais enquanto o marido parte para o campo e os filhos para a escola.
O Sr. José Gama (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Quão comovedor é ver essas mulheres no dia em que recebem a notícia de que a sua vaca está doente e vai ser abatida!
Srs. Deputados, façamos sentir ao Governo que é preciso um esforço acrescido para que a dor termine o mais rapidamente possível e com maior justiça. Não posso compreender, face ao País que temos e com os atrasos conhecidos que existem, uma tabela tão discriminatória para o pagamento dos animais com registo e sem registo: com registo são pagos a 517$50/kg e sem registo a 432$/kg. Com esta tabela estamos a proteger a importação de bovinos, pois esses estão inscritos em detrimento dos nacionais, que o não estão.
Refiro-me agora à importação que, sem um saneamento total do efectivo leiteiro e não só, mais não é do que gado para abate a curto prazo.
A peripneumonia não acabou e a brucelose permanece. 0 que fazer?
Em primeiro lugar, sensibilizar a lavoura através da televisão (não são só telenovelas ... ) e dando apoio ao sector cooperativo para que o faça também.
Em segundo lugar, iniciar um pagamento adequado ao valor do gado leiteiro e imediato ao abate.
Em terceiro lugar, activar um escoamento rápido do gado contaminado.
Por último, conceder a permissão para a contra-análise ao sangue recolhido nos animais em que seja duvidosa a doença. Esta medida é moralizadora e, em alguns casos, evita que se possam abater animais sadios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito mais e com mais pormenor teria para dizer sobre este assunto. O tempo de que disponho é pouco, mas espero a compreensão de VV. Ex.ª
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Poças Santos.
O Sr. João Poças Santos (PSD): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Caio Roque. Aliás, esclareço a Câmara para o facto de esta ser uma declaração política que nada tem a ver com a questão há pouco aqui tratada.
O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma política nacional responsável e inteligente perante a problemática da emigração portuguesa ultrapassa o simples enquadramento da posição partidária de cada um; ultrapassa o facto de ser oposição ou ser Governo. «Pensar» nos emigrantes portugueses é «pensar Portugal.»
Com efeito, sabemos existirem cerca de quatro milhões de portugueses espalhados pelos países da Europa, África e América, isto para citar apenas as comunidades portuguesas de forte concentração demográfica.
Em relação à população residente no território nacional (cerca de dez milhões de habitantes), 40 % vive e trabalha no estrangeiro! É uma percentagem demasiado grande para que os problemas que os afectam sejam tratados com a ligeireza e leviandade com que este Governo os tem vindo a tratar.
Estamos perante uma autêntica diáspora lusitana. As razões deste fenómeno migratório são antigas e profundas e mais ou menos comuns a todos os regimes que submeteram a sociedade civil portuguesa, desde os tempos remotos da monarquia: a pátria madrasta, que sucessivas gerações de políticos, ao longo da nossa história, não souberam transformar em pátria acolhedora e no lar da família portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos, pois, a partir de 1985, depois da recuperação financeira, internacionalmente reconhecida, levada a cabo pelo anterior governo liderado pelo Partido Socialista e quando, peia primeira vez depois do 25 de Abril, se verifica uma situação económica internacional extremamente favorável, em condições de permitir por em prática uma política de desenvolvimento que poderia então transformar o nosso país na Pátria acolhedora e no lar de todos os portugueses. Mas o grave é que esta situação, que é porventura conjuntural e temporária, não esteja
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a ser aproveitada por este Governo, porque é incapaz e se preocupa apenas em continuar a ser uma comissão técnica eleitoral do PPD/PSD.
O anterior regime, sua crise económica e a guerra de África provocaram a mais dramática das fases da emigração portuguesa, nos anos 60, quando os jovens, arrancados às suas aldeias para combater em África uns, recusando tomar parte numa guerra injusta outros, regressavam habituados aos grandes espaços tropicais, feitos homens cépticos com a experiência da guerra e já não podiam entender a pequenez e a probreza da sua aldeia. Aí começou a emigração em massa para os países da Europa, hoje nossos parceiros na CEE, onde temos cerca de dois milhões de compatriotas.
Recentemente tive ocasião de exprimir, em entrevista publicada no mensário Lusitano, publicado em Janeiro, a opinião de que é preciso ter coragem de dizer aos emigrantes que ainda não existem as condições desejáveis para um regresso de elevado número de emigrantes.
Tão cedo essas condições não existirão. O horizonte do regresso estará cada vez mais longe, se o actual Governo não for capaz de as criar. E não está a ser capaz.
O actual governo tem uma visão econométrica de administração da «coisa pública», visão puramente matemática de um tecnocrata bancário, que não tem a menor visão de estadista, que desconhece a sociologia, que não sabe valorizara geostratégia que pode tornar forte um fraco país, que permite, por ignorância e omissão, que Portugal esteja a ser vendido ao estrangeiro a metro quadrado, que os espanhóis pesquem nas nossas águas territoriais a coberto do sofisma da bandeira portuguesa, que permite que os nossos lavradores vejam os seus produtos agrícolas apodrecer porque não consegue travar o capitalismo selvagem dos intermediários especuladores - abutres inevitáveis sempre que não há uma rede de frio e distribuição a nível nacional para os produtos da terra e do mar. Enfim, o relatório da demagogia e da incompetência deste governo seria longo.
Estou a pensar nos nossos emigrantes, que, eles sim, deviam ser incentivados a investir na sua pátria, não só no sector tradicional da construção civil, mas, também encaminhar as suas poupanças (que são muitos milhões de contos/ano) para investimentos em áreas prioritárias, como a pesca, a agricultura, a agro-pecuária e consequentes empresas de serviço de apoio, como o frio e a distribuição. Mas, para isso é preciso planificar e incentivar o investimento. Que tem sido feito aos muitos milhões de contos em divisas que os nossos emigrantes remetem todos os anos para Portugal? Que programas e que projectos são
explicados ou propostos aos nossos emigrantes nas áreas do investimento produtivo? Para que servem a Secretaria de Estado das Comunidades e o Instituto de Apoio à Emigração? Será que irão continuar apenas a servir a Sr.ª Secretária de Estado para a sua promoção pessoal junto das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo?
A diáspora lusitana contém, naturalmente, duas componentes que este governo está irresponsavelmente a matar: a componente cultural e a componente económica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em recentes visitas que fiz ao círculo eleitoral que represento deparei com algumas situações que não poderia deixar de trazer a plenário.
Os portugueses que residem e trabalham no estrangeiro e que tanto têm ajudado o País na sua recuperação financeira, sendo uma das grandes fontes de receitas para o Estado não só pelo envio das suas economias, como também quando vêm de férias, e os emigrantes, que durante as mais graves crises financeiras nunca deixaram de enviar as suas economias, acreditando sempre na sua maioria na democracia instaurada após o 25 de Abril, vêem-se hoje perante uma situação que jamais se pensava que viessem a encontrar.
Hoje sabemos e compreendemos quão difícil é, sem dúvida, para o PPD/PSD cumprir o seu programa eleitoral, que ao longo de todos estes anos (e já oito!) tem apresentado aos emigrantes e que, aliás, nunca soube, diria mesmo nunca quis, cumprir, faltando sempre aos seus compromissos eleitorais.
O que não entendo nem compreendo é como pode este governo levar a cabo uma política de destruição de um programa de apoio aos emigrantes, bem definido, iniciado e levado a cabo pelos dois primeiros governos constitucionais.
Em Londres, os responsáveis das associações tiveram uma reunião com o Sr. Primeiro-Ministro, que lhes afirmou que ele e o Estado Português já não precisavam das economias dos emigrantes. Em Paris e Bruxelas fazia a mesma afirmação, noutros termos, mas querendo dizer o mesmo.
Mais grave: nas Grandes Opções do Plano, apresentadas pelo Governo a esta Assembleia, referindo-se a todos os emigrantes portugueses, afirmava: «A fachada é portuguesa, mas a alma escondida nem sempre o é!» Quis, portanto, dizer-nos o Sr. Primeiro-Ministro, Professor Aníbal Cavaco Silva, e seu governo que nós, emigrantes, nem sempre somos portugueses. Como pode um, primeiro-ministro responsável admitir que o seu governo mostre tanto desprezo e desconsideração para com os emigrantes?.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O descontentamento é geral, e não trazer aqui a voz dos emigrantes seria trair aqueles que represento.
Como se não chegasse o mau funcionamento e atendimento dos consulados, de que muito se queixaram em Osnabruck, Londres, Lille, Roterdão e outras cidades, eis que a Sr.ª Secretária de Estado das Comunidades, Dr.ª Manuela Aguiar, através de um despacho, decide rescindir, a partir do início do ano, os contratos de avença dos consultores jurídicos que vinham prestando serviço nos consulados aos emigrantes, decide também, a partir da mesma data, a suspensão provisória das deslocações dos delegados da emigração e funcionários dos serviços sociais às associações, a venda dos automóveis sem prévia autorização, enfim, mas que política é esta de apoio às comunidades?!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Que tem feito o executivo de Cavaco Silva por exemplo, sobre a questão do regresso dos emigrantes? Quais as perspectivas de emprego e quais os novos postos de trabalho que foram criados desde que administra o País? Que projectos concretos tem para oferecer aos emigrantes que desejam ou tenham de regressar e pretendam investir com segurança as suas poupanças?
Encontramo-nos hoje, mais do que nunca perante a ausência de apoio efectivo, eficiente e humano às Comunidades portuguesas no estrangeiro, nomeadamente para
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acções e iniciativas de carácter social e cultural promovidas pelas associações de emigrantes, bem como a falta de protecção adequada contra discriminações e arbitrariedades de que são vítimas cidadãos portugueses em países de acolhimento.
A inoperância do Govemo no que diz respeito à emigração ficou aqui bem demonstrada nesta minha intervenção.
Posso ainda adiantar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, a partir da próxima semana, irão dar entrada na mesa requerimentos sobre algumas das questões que acabo de vos expor.
Aplausos do PS.
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Fernando Figueiredo pediu a palavra para um pedido de esclarecimento, mas o Sr. Deputado Caio Roque não tem tempo, assim como o PRD, que também pediu a palavra, mas já não tem tempo.
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Sr. Presidente, eu quero fazer apenas um rápido protesto ...
O Sr. Presidente: - Como o PSD tem ainda tempo pode ceder um minuto ao Sr. Deputado Caio Roque, se assim o entender.
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Sr. Presidente, por delicadeza para com a falta de tempo do Sr. Deputado Caio Roque, dado que os assuntos que ele abordou são realmente relevantes e importantes para serem discutidos com tempo e com calma, limito-me apenas a lavrar um protesto, que se refere exclusivamente aos termos em que o Sr. Deputado se referiu desabridamente, e em termos pessoais, quer ao Sr. Primeiro-Ministro, quer à Sr.ª Secretária de Estado das Comunidades. É só esse reparo que faço neste momento, aguardando que, em sede própria e em tempo oportuno, possamos dialogar e discutir os restantes problemas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. António Paulouro (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu partido já não dispõe de tempo. O PSD tem, mas o PRD não tem tempo.
O Sr. António Paulouro (PRD): - Sr. Presidente, o que tenho a dizer é muito breve. Sei que não tenho tempo e que ...
O Sr. António Capucho (PSD): - Se não tem tempo, como é que diz?
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado António Paulouro vai fazer uma intervenção, mesmo muito breve, naturalmente que se justifica que o Sr. Deputado Caio Roque responda ...
O Sr. António Pauloro (PRD): - Se o Sr. Presidente me der licença, direi apenas que no substancial estou de acordo com o Sr. Deputado Caio Roque.
Protestos do PSD.
Não subscrevo, evidentemente, todas as suas afirmações, e muito brevemente voltaremos ao assunto, porque teremos de começar por saber ...
Protestos do PSD.
Falou em quatro milhões de emigrantes. Sabemos que, por exemplo, na África do Sul ...
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - Isto é uma intervenção, por amor de Deus!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª está a desencadear protestos das bancadas.
O Sr. Fernando Figueiredo (PSD): - É evidente!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não sei se o Sr. Deputado António Capucho pode dar alguma informação à Mesa em relação à continuação dos trabalhos. Esgotámos o período normal antes da ordem do dia.
O Sr. António Capucho (PSD): - Suponho que o Sr. Presidente em exercício está a dirigir-se ao Plenário para informar sobre o que se segue. Eu não me anteciparia, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então aguardamos.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inicialmente, quando abri a sessão e convoquei uma conferência de líderes, ficaram pendentes declarações políticas, nomeadamente de dois partidos, que versavam matéria que nos ocupou nessa conferência; porque há um conjunto de informações que a Assembleia da República e os Srs. Deputados ainda necessitam de ter, foi decidido que terminamos aqui o período de antes da ordem do dia, ficando estas intervenções políticas para amanhã.
Continuaremos então amanhã este assunto como primeiro ponto da ordem do dia. Entretanto, foi solicitada a presença do Governo através do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para amanhã, que portanto se fará representar - foi nossa sugestão - através do Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares e do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Portanto, a informação que tinha para vos dar é esta: vamos continuar os nossos trabalhos e esta questão que estava pendente desta conferência de líderes fica adiada para amanhã como primeiro ponto da ordem de trabalhos, com a presença dos membros do Governo que acabei de referir, tal como a Assembleia solicitou através do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
Continuaremos agora os nossos trabalhos de acordo com a agenda que está distribuída e que está prevista.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à apreciação do pedido de autorização da S. Ex.ª o
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Sr. Presidente da República para a sua deslocação ao Brasil entre os dias 29 de Março e 5 de Abril próximos, que vai ser lido.
Foi lido. É o seguinte:
Sr. Presidente da Assembleia da República:
Estando prevista a minha deslocação ao Brasil entre os dias 29 de Março e 5 de Abril próximo, em viagem de carácter oficial, venho, nos termos dos artigos 132.º, n.º 1, e 166.º, alínea b), da Constituição, requerer o necessário assentimento da Assembleia da República.
Apresento a V. Ex.as os meus respeitosos cumprimentos.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Entretanto, vou ler um parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração relativa à carta que acaba de ser referida.
É a seguinte:
Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração
Perecer e proposta de resolução
A Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República, em que solicita o assentimento para se deslocar, em viagem de carácter oficial, ao Brasil, entre os dias 24 de Março e 5 de Abril próximo, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução:
Nos termos do n.º 1 do artigo 132. º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à viagem de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República ao Brasil, entre os dias 24 de Março e 5 de Abril próximo.
Palácio de São Bento, 10 de Março de 1987. -
O Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, Roberto de Sousa Rocha Amaral.
O Sr. Presidente: - Vamos votar esta proposta de resolução.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Srs. Deputados, vão agora ser lidos três pareceres relativos a autorização para que Srs. Deputados sejam ouvidos em tribunal como testemunhas.
Vai, pois, ser lido o primeiro.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 48 117, processo n.º 35 322/84, da 13.ª Secção da Directoria da Polícia Judiciária de Lisboa de 4 de Agosto de 1986, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Domingos Duarte Lima, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações como testemunha no processo em causa.
Com os melhores cumprimentos.
Palácio de São Bento, 10 de Março de 1987. O Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, António Cândido Miranda Macedo.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vai ser lido o segundo parecer.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 111, processo n.º 3861/86, da 1.ª Secção, de 29 de Janeiro passado, do 5.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado António Borges de Carvalho, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo supra mencionado.
Com os melhores cumprimentos.
Palácio de São Bento, 10 de Março de 1987. O Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, António Cândido Miranda Macedo.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vai ser lido o terceiro e último parecer anunciado.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 167, processo n.º 58/86, da 1.ª Secção do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, de 3 de Fevereiro último, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Aloísio Fernando Macedo da Fonseca, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo acima referenciado.
Com os melhores cumprimentos.
Palácio de São Bento, 10 de Março de 1987. O Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, António Cândido Miranda Macedo.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos entrar na segunda parte do período da ordem do dia, relativamente aos projectos de leis n.º 3/IV, apresentado pelo PCP, 380/IV, apresentado pelo CDS, e 323/IV, apresentado pelo PS, sobre subsídio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Patrício, pediu a palavra para fazer uma intervenção?
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, pretendo realmente fazer uma intervenção, mas suponho que existe um parecer da Comissão Parlamentar de Juventude para ser lido sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: - Não deu entrada na Mesa nenhum parecer sobre estes projectos de lei.
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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, assinei, na qualidade de presidente da Comissão Parlamentar de Juventude, o referido parecer por volta das 15 horas, se estou bem recordado, e informaram-me que seria enviado directamente para a Mesa. Provavelmente pode ter havido um lapso na sua entrega e estar neste momento no Gabinete do Sr. Presidente. De qualquer forma, se o Sr. Presidente autorizasse, poderíamos proceder à leitura do parecer através da cópia que o Sr. Deputado relator, António Tavares, tem e entretanto providenciar-se-ia no sentido que o original chegasse à Mesa.
O Sr. Presidente: - Se não houver objecções e para adiantarmos os nossos trabalhos enquanto esse parecer não chega à Mesa, peço ao Sr. Deputado António Tavares para ler o respectivo relatório.
O Sr. António Tavares (PSD): - É do seguinte teor:
Parecer da Comissão Parlamentar de Juventude
1 - O presente parecer reporta-se à apreciação na generalidade do projecto de lei n.º 3/IV, da iniciativa do PCP, sobre «Subsídios de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego», apresentado em 4 de Novembro de 1985, e do projecto de lei n.º 323/IV, da autoria do Partido Socialista, sobre «Subsidio social de desemprego a jovens à procura do primeiro emprego», apresentado em 18 de Dezembro de 1986.
2 - A matéria em apreço tem como destinatário um numeroso universo de jovens, particularmente desprotegidos e afectados pelo problema do desemprego, e em relação ao qual esta Comissão considera dever serem adoptadas soluções que consubstanciem uma maior atenção e apoio com vista à defesa da sua dignidade enquanto cidadãos jovens.
3 - De acordo com os proponentes destes projectos de lei, eles visam sobretudo contribuir para minorar a dramática situação com que tais jovens se debatem, assegurando-lhes condições mínimas de sobrevivência e inserção social, tentando evitar comportamentos desviantes e situações de bloqueio.
4 - O projecto de lei do PCP prevê a concessão pelo período de 450 dias de um subsidio igual a 70% do salário mínimo nacional (SMN) para os requerentes que não tenham pessoas a cargo e de 80 % para os restantes.
Entre outras condições, obriga-se o candidato a estar inscrito no centro de emprego há, pelo menos, três meses e ter capacidade e disponibilidade para o trabalho nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 20/85.
É consagrada a inaplicabilidade da lei aos jovens cujo rendimento do agregado familiar seja superior aos mínimos previstos no projecto de lei ou que venha a ser alterado em virtude de heranças, lotarias, etc.
5 - O projecto de lei do Partido Socialista prevê a concessão pelo período de quinze meses de um subsídio igual a 70 % do salário mínimo nacional (SMN) para os jovens entre os 18 e os 25 anos à procura do primeiro emprego.
Obriga-se, contudo, o candidato a estar inscrito no centro de emprego da sua área de residência e auferir um rendimento per capita não superior a 50 % do SMN.
6 - Constituem particulares diferenças entre os dois projectos de lei o facto de:
a) O projecto de lei do PS limitar a aplicação da lei ao intervalo etário dos 18 aos 25 anos;
b) O rendimento máximo per capita do agregado familiar ser de 70 % e 50 % do SMN, respectivamente para o projecto de lei n.º 3/IV e 323/IV;
c) O projecto de lei n.º 323/IV prever a redução em 20 % do montante do subsidio nos últimos 90 dias de concessão;
d) O projecto de lei do PCP estipular a inscrição do centro de emprego há, pelo menos, três meses, quando o PS exige, apenas, a inscrição;
e) O PCP distinguir as situações em que o requerente tem ou não tem pessoas a cargo, atribuindo, respectivamente, 80% e 70 % do SMN, quando o PS atribui 70 % em todas as circunstâncias;
f) O projecto de lei n.º 3/IV estabelecer as limitações para os jovens beneficiados com o subsidio que venha a obter para o seu agregado familiar rendimentos não provenientes do trabalho como heranças e lotarias.
7 - De sublinhar a referência no projecto de lei n.º 323/IV à concessão de prioridade aos jovens beneficiados por este subsídio no acesso aos cursos de formação profissional lançados ou apoiados pelo IEFP.
8 - Embora não esteja consignado na legislação actualmente em vigor, é de salientar que a concessão do subsídio de desemprego a jovens à procura do, primeiro emprego já esteve prevista nos seguintes diplomas:
O Despacho Normativo n.º 374/79, de 20 de Dezembro, que definiu candidatos a primeiro emprego e estabeleceu as condições em que poderiam adquirir o direito ao subsídio de desemprego; e
O Decreto-Lei n.º 297/83, de 24 de Junho, que deu nova redacção a vários artigos do Decreto-Lei n. º 183/77, de 5 de Maio (subsídio de desemprego).
8.l - O Despacho Normativo n.º 374/79, de 20 de Dezembro, que entrou em vigor com efeitos retroactivos reportados a 1 de Dezembro de 1979, baseou-se no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 445/79, de 9 de Novembro, e remetia subsidiariamente para as disposições comuns do capítulo III do Decreto-Lei n.º 183/77, de 5 de Maio.
Definia candidatos a primeiro emprego como os indivíduos que não tivessem trabalhado por conta de outrém ou por conta própria durante mais de 120 dias consecutivos, a quem fixou o montante
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do subsidio de desemprego em 60 % do salário mínimo nacional fixado para os trabalhadores da indústria, comércio e serviços.
Salientam-se entre as condições de atribuição que os candidatos, cumulativamente, deveriam reunir:
Os rendimentos do agregado familiar não poderem atingir em média e per capita 60 % do salário mínimo nacional;
Terem a seu cargo, pelo menos há um ano, um ou mais filhos, enteados ou adoptados plenamente ou terem exclusivamente a seu cargo o mínimo de dois familiares de entre cônjuge, pais e sogros;
Estarem inscritos, pelo menos há um ano, no centro de emprego da área da sua residência como candidatos a emprego.
Deveriam fazer prova das situações invocadas mediante a apresentação de vários documentos que eram expressamente enunciados.
8.2 - O Decreto-Lei n.º 297/83, de 24 de Junho, que entrou em vigor em 1 de Agosto de 1983, revogou o Despacho Normativo n.º 374/79, de 20 de Dezembro, integrando a matéria relativa a candidatos a primeiro emprego na secção III do capítulo III do Decreto-Lei n.º 183/77, de 5 de Maio, que para o efeito foi totalmente substituída.
Limitando o âmbito de aplicação aos jovens com idade compreendida entre os 18 e os 25 anos, inclusive, a quem fixou o montante do subsidio de desemprego em 70 % do valor mais elevado do salário mínimo nacional, manteve o período de concessão nos 180 dias previstos no Decreto-Lei n.º 183/77, apesar de ter alterado o período normal de concessão de subsídio de desemprego para 450 dias.
Os jovens abrangidos deveriam reunir, cumulativamente, as seguintes condições:
Nunca terem trabalhado ou, tendo trabalhado a tempo inteiro, a média ser inferior a l80 dias nos últimos 360 anteriores à data do desemprego;
Terem concluído ou interrompido, há menos de um ano, qualquer dos cursos integrados no sistema oficial de ensino, ou como tais reconhecidos, de duração não inferior a dois anos;
Requererem o subsídio dentro de 60 dias a contar do termo do prazo da conclusão ou interrupção dos estudos e estarem inscritos nos centros de emprego durante, pelo menos, três meses sem terem obtido emprego.
A prova das situações em que se encontrassem foi simplificada relativamente à prevista no Despacho Normativo n.º 374/79, mas mesmo assim sujeita à apresentação de documentos.
8.3 - No entanto, o Decreto-Lei n.º 394-A/83, de 30 de Julho, veio suspender a entrada em vigor deste regime, invocando que se tratava de matéria inovadora relativamente ao Decreto-Lei n.º 183/77 que era discutível que a forma prevista satisfizesse objectivos da natureza dos que o Governo pretendia prosseguir e que seguramente a juventude desejava, que se tratava de terapêutica que não atacava o mal e que não se encontravam elaborados estudos de impacte financeiro e muito menos de rentabilidade económica e social que a medida liminarmente impunha.
É de notar que o Decreto-Lei n.º 297/83 não é da autoria do mesmo governo que publicou o Decreto-Lei n.º 349-A/83.
9 - Em sede de especialidade, deverá ser tomado em linha de conta o espírito da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Assembleia da República, assim como as recomendações da OIT sobre esta matéria.
10 - Neste quadro, a Comissão Parlamentar de Juventude aprova o presente parecer, com a indicação de que nada tem a objectar à apreciação em Plenário, ressalvadas as posições que os Srs. Deputados e os grupos parlamentares entendam vir a exprimir.
Palácio de São Bento, 11 de Março de 1987. O Presidente da Comissão, Carlos Miguel Coelho. - O Relator, António Lopes Tavares.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, era só para informar a Mesa e a Assembleia - devia tê-lo feito antes da leitura do parecer mas não me ocorreu - que o parecer da Comissão de Juventude, como ficou claro, só incide sobre os projectos de lei de iniciativa do Partido Socialista e do Partido Comunista, uma vez que o projecto de lei de iniciativa do CDS não baixou à 13.ª Comissão, mas sim à Comissão de Trabalho.
Se V. Ex.ª o permitir, gostaria de adiantar que, em casos futuros e na nossa opinião, iniciativas legislativas que têm a ver com o âmbito de diversas comissões deveriam baixar, para efeito de apreciação na generalidade, a todas as comissões envolvidas na discussão dessa matéria e não apenas a uma, o que obstará a situações como esta, em que sobre esta matéria temos uns projectos de lei que baixaram a uma comissão e outros que baixaram a outra.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Coelho, a Mesa regista a sua sugestão, a qual penso que deve ser tomada em linha de conta no futuro.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No nosso país continuam a ser negados direitos fundamentais aos jovens portugueses. Entre eles o direito constitucional ao trabalho.
Direito que não é estável para aqueles que vivem numa situação de contrato a prazo ou são vítimas do trabalho sem contrato e clandestino. Direito que é negado àqueles que, pela primeira vez, se defrontam com a necessidade e aspiração de obter um posto de trabalho.
Trata-se, portanto, de um problema gravíssimo, que continua a piorar de dia para dia e que coloca os jovens portugueses numa situação verdadeiramente insustentável e com as graves consequências de todos conhecidas.
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E é perante esta triste realidade que se impõe a aplicação de medidas justas e eficazes que, à falta de criação de novos postos de trabalho, tenham como objectivo fundamental minorar os graves problemas de ordem económica, social, de comportamento e de relacionamento familiar a que tal situação conduz parte significativa dos jovens nessas condições.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - E é exactamente nesse sentido que a Assembleia da República aponta quando decide inscrever no Orçamento do Estado para 1987 uma verba para esse efeito e quando decide por unanimidade e conferência de presidentes dos grupos parlamentares, com a presença do Governo, agendar para hoje a discussão em plenário da matéria em causa.
Nestas circunstâncias estaríamos, portanto, à espera que os diferentes grupos parlamentares, como aliás fez o CDS, apresentassem, se o entendessem necessário, as suas próprias iniciativas. Como à espera estaríamos que o Governo, através da apresentação de uma proposta de lei, concorresse também com o seu contributo para a discussão e resolução deste problema.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Não foi o que se passou!
O Orador: - Como é evidente e normal, seria este o processo transparente e democrático que deveria ser seguido.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas o Governo assim não o entendeu! Preferiu fazer batota!
Calou-se no momento em que o assunto foi discutido em conferência de presidentes, quando ao mesmo tempo prepara no segredo dos gabinetes o «fabuloso» decreto que na passada semana aprovou em Conselho de Ministros.
Comportou-se como aquele «batoteiro de salão que no momento aprazado tira uma carta da manga e vicia o jogo».
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso não é linguagem séria!
O Orador: - Incapaz de definir e de levar à prática uma política coerente que resolva os problemas fundamentais dos jovens, o Governo aposta na viciação dos dados, foge ao debate das soluções com os deputados e ainda por cima tenta retirar os louros de decisões que não são suas e perante as quais sempre manifestou a sua obstrução, como é manifestamente o caso.
Aplausos do PCP.
E faz acompanhar essa atitude de um forte aparato de propaganda, como aliás vem sendo hábito, ao mesmo tempo que tudo faz para silenciar as vozes dos partidos da oposição e as medidas propostas e aprovadas pela Assembleia da República. Também por esse motivo este debate constitui um desafio à comunicação social para que, no mesmo pé em que reflectiu as posições governamentais, informe a opinião pública sobre o que se está a passar, sobre os antecedentes do problema e sobre as propostas que os vários partidos defendem para a sua resolução.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo sabe que a Assembleia da República, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1987, aprovou, com os votos favoráveis do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE, as abstenções do CDS e votos contrários do PSD - repito -, os votos contrários do PSD, a inscrição de uma verba de 750 000 contos destinada a suportar as despesas com a atribuição de um subsídio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.
O Governo sabe que, no decurso dessa justa decisão, ficou entendido entre todos nós a necessidade de a Assembleia da República legislar o mais rapidamente possível no sentido de regulamentar a concessão desse direito e até porque existiam já na Assembleia da República há muito tempo iniciativas legislativas nesse sentido. É esse, aliás, o compromisso que no presente momento nos encontramos a cumprir.
Como o Governo também sabe que há sensivelmente um mês a Assembleia da República decidiu agendar para o dia de hoje a apreciação da matéria em causa e que, inclusivamente, estipulou um prazo para a apresentação de outras iniciativas legislativas, prazo esse que findou na passada quinta-feira, dando assim a possibilidade aos restantes grupos parlamentares e ao próprio Governo de contribuírem com as suas opiniões para a resolução do problema em causa.
Recordamos estes três factos indesmentiveis, não apenas no sentido de apoiar e valorizar uma decisão positiva tomada pela Assembleia da República e que responde a uma justa aspiração desse tão carenciado sector da juventude portuguesa, mas também no sentido de chamar a atenção do Plenário para o facto de o Governo, com a lamentável atitude que tomou, tentar criar mais uma situação de hostilidade para com a Assembleia da República, ainda por cima com uma medida carregada de hipocrisia e demagogia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Carregada de hipocrisia, porque na verdade foi o PSD e o Governo que sempre levantaram os maiores obstáculos à aprovação de uma medida desta natureza. Foi o PSD que sempre contestou aqueles que, como nós, desde há muito entendemos de elementar justiça a atribuição de um subsídio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.
Carregado de demagogia, porque pretendem agora fazer sua uma justa medida tomada e assumida pela Assembleia da República e perante a qual o PSD votou contra e o Governo sempre tentou inviabilizar.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Estes são os factos que comprovam a falta de lealdade, a hipocrisia e a demagogia de que enferma mais esta lamentável atitude do Governo do PSD.
Aplausos do PCP.
Já agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e porque o Governo fala muito da necessidade de auscultar e ouvir as opiniões dos jovens e das suas organizações,
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convinha perguntar por que razão não submeteu o Governo o seu diploma à apreciação do Conselho Consultivo da Juventude?
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Ora aí está uma boa pergunta!
O Orador: - Será que o criou apenas e tão-só para que o Secretário de Estado da Juventude e o Primeiro-Ministro andem pelo País fora a dizer que o Governo desenvolve um intenso diálogo com os jovens e com as suas organizações, mas no fim de contas, quando se trata de discutir matérias tão importantes como estas, o Governo esquece pura e simplesmente o Conselho Consultivo da Juventude?
Ou será que o Governo tinha receio que as suas opiniões sobre a matéria não obtivessem vencimento nesse Conselho? Ou ainda porque, ao desencadear esse processo de discussão, o que naturalmente levaria algum tempo, o Governo se viria impossibilitado de levar por diante a sua jogada de antecipação às decisões que a Assembleia da República venha a tomar?
Tudo indica que sim! Que a antecipação do Governo, desviando a bola para canto, visava apenas impedir que a equipa da juventude marcasse um golo! Porque, ao que se conhece, a medida assumida pelo Governo não pretende responder às dramáticas situações dos jovens candidatos ao primeiro emprego, mas apenas contemplar um restrito número de jovens, talvez aqueles que o Governo considera os mais bem comportados.
Mas esta questão é uma questão muito séria, que diz respeito a muitos milhares de jovens que vivem numa situação de total insegurança é incerteza, que não é compatível com o jogo de cartas viciadas que o Governo pretende fazer.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A triste realidade é que o desemprego, e neste particular o desemprego juvenil, continua a aumentar. A triste realidade é que são cada vez mais escassas as oportunidades de emprego para aqueles que o procuram pela primeira vez. E mesmo que alguém o encontre, outra alternativa não lhe resta se não a de se submeter a uma crescente e desumana exploração e instabilidade decorrentes da total precarização e clandestinidade do trabalho.
São muitos os milhares de jovens que se vêm forçados a trabalhar nestas condições. Como são também já muitas as crianças de 11, 12 e 13 anos que, em virtude das condições de miséria em que vivem e porque os cinco ou seis contos que recebem são indispensáveis para a sobrevivência da sua família, se vêm forçadas a deixar a escola, entrando nesse submundo da exploração do trabalho infantil.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Uma vergonha!
O Orador: - Tratam-se de situações que nos envergonham a todos nós!
E por isso mesmo são chocantes as gravíssimas afirmações de membros do Governo e do próprio Primeiro-Ministro quando com elas pretendem transferir para as famílias a responsabilidade da exploração do trabalho infantil. Quando dizem que o trabalho infantil resulta em grande parte da ganância que os pais
têm no aproveitamento do trabalho dos filhos. Quando afirmam que a concessão de apoios e auxílios económicos aos jovens que procuram o primeiro emprego apenas servirá para que esses jovens tenham dinheiro para comprar droga ou para abandonarem as suas famílias.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Se não fosse dramático era pelo menos ridículo!
O Orador: - É verdadeiramente inacreditável que da boca de membros do Governo se ouçam afirmações de tal calibre. Mas elas espelham bem e ao mesmo tempo a concepção, a imagem e a confiança que o Governo tem nos jovens portugueses.
Quem tem responsabilidade pelo aumento do desemprego é o Governo e não os jovens. Quem tem responsabilidade no recrudescimento da exploração do trabalho infantil é o Governo e não as famílias. Quem tem responsabilidade pelo agravamento da criminalidade e do autoconsumo de droga é o Governo, porque não toma as medidas capazes de combater as causas que estão na base desses fenómenos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E o que é um facto é que enquanto não se inverter a actual orientação política e governativa, criando as condições necessárias para o desenvolvimento harmonioso e participativo dos jovens, continuar-se-á a cavar um fosso cada vez mais fundo, onde se deposita, contra tudo o que é racional, a inteligência e a capacidade criadora dos jovens.
É isso que urge alterar radicalmente, criando as condições para que o direito ao trabalho seja efectivamente assegurado, para que o primeiro emprego e as saídas profissionais sejam uma realidade, para que a precariedade e a clandestinidade no trabalho sejam suprimidas, para que as discriminações salariais de que os jovens são vitimas sejam eliminadas.
Mas criando também um quadro que permita fazer justiça àqueles que, por razões alheias e pelas quais não são responsáveis, não encontram o seu primeiro emprego, vivendo assim, na maior parte dos casos, numa situação verdadeiramente angustiante.
É esse o mal que pretendemos reparar quando apresentámos o projecto de lei n.º 3/IV, que visa atribuir um subsídio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.
Não o entendemos como um projecto acabado ou fechado a críticas e a alterações. Mas estamos, no entanto, certos que ele é um contributo importante do nosso grupo parlamentar e que, conjuntamente com as iniciativas legislativas apresentadas por outros partidos, a Assembleia da República está em condições de poder aprovar uma lei positiva e de elementar justiça para com os jovens desempregados que procuram o primeiro emprego.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado Jorge Patrício, antes de mais quero felicitá-lo pela excelente intervenção que acabou de produzir: uma intervenção
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clara e objectiva, que inicia bem este debate. Só lamento que levasse perto de metade da sua intervenção não a apresentar a essência do seu projecto e a sustentá-lo, mas a tentar atribuir maior legitimidade para apresentar uma iniciativa legislativa, para legislar, ao seu grupo parlamentar do que a outros grupos parlamentares ou outros órgãos de soberania.
Sr. Deputado, apenas lhe quero formular dois pedidos de esclarecimento muito concretos. Em primeiro lugar, comparou - numa linguagem com uma adjectivação que caracteriza algumas intervenções do seu grupo parlamentar e que já não qualifico porque não vale a pena- o Governo a um «batoteiro» e disse que revestia uma grande hipocrisia o facto de o Governo legislar por decreto-lei aquilo que deveria ter feito, na sua opinião, sob proposta de lei. Porém, não compreendi nem o alcance político nem jurídico-constitucional dessa observação. Não sei se o Sr. Deputado Jorge Patrício pretendia dizer que não assiste ao Governo legitimidade para legislar sobre esta matéria. Mas, se assim é, era bom que o dissesse para ficarmos mais elucidados sobre a opinião do Partido Comunista Português sobre o âmbito das competências do Governo no uso da totalidade dos poderes que a Constituição lhe confere.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado Jorge Patrício referiu-se à verba dos 750 000 contos, orçamentados para 1987, e tentou fazer uma apreciação que indiciava que apenas os partidos que tinham proposto a orçamentação desta verba teriam legitimidade para apresentar iniciativas legislativas que se inscrevessem no objecto político desta orçamentação.
A pergunta que lhe coloco a este respeito é a seguinte: a partir do momento em que esta Assembleia aprova o Orçamento e que o Governo tem de o executar, compete ou não ao Governo definir a forma mais correcta para gastar as verbas dentro dos parâmetros que a legislação publicada o obriga a executar?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Deputado Carlos Coelho, devo dizer-lhe que não perdi muito tempo na apresentação do projecto de lei do PCP porque suponho que esta questão já foi suficientemente discutida na Assembleia da República - aliás, não é a primeira vez que faço a apresentação do projecto de lei do meu partido, uma vez que ele já foi apresentado duas ou três vezes em várias sessões legislativas - e creio que não valeria a pena estar a repetir os argumentos e a filosofia que defendemos relativamente a esta questão.
Em relação às questões importantes que o Sr. Deputado Carlos Coelho referiu, pergunto-lhe se ficou chocado pelo facto de eu ter chamado hipócrita ao Governo ou pelo facto de eu ter classificado a atitude do Governo como aquela de um batoteiro de salão que num momento aprazado retira a carta da manga e vicia o jogo. Sr. Deputado Carlos Coelho, não é essa a imagem que, de facto, o Governo dá?
Vozes do PSD: - Não é, não!
O Orador: - Sr. Deputado, deixe-me explicar-lhe: o que lhe pergunto é se é verdade ou mentira - e gostaria que o Sr. Deputado Carlos Coelho me pudesse responder na intervenção que vai produzir - que foi sempre o Partido Social-Democrata e também a JSD que nesta Câmara se manifestaram, por todos os meios, contra a concessão de um subsídio de desemprego, aos candidatos ao primeiro emprego. Sr. Deputado, sempre foi assim em todas as ocasiões em que isto foi discutido!
Em segundo lugar, pergunto ao Sr. Deputado Carlos Coelho se não vê na comunicação social várias afirmações de membros do Governo que sempre se manifestaram contra essa concessão.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade, vi, sim!
O Orador: - Inclusivamente estão aqui, no Diário de Notícias do dia 10, afirmações do próprio Primeiro-Ministro, dizendo que se se conceder um subsídio de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego estaremos a criar condições para que esses jovens vão gastar o dinheiro na droga e até vão abandonar as famílias, etc., etc. Isto são afirmações gravíssimas, como deve calcular!
Ora se é assim, por que razão é que o Governo decretou aquilo que decretou? E, se é assim, por que razão é que o Governo, sabendo que existia o debate marcado para hoje na Assembleia da República há cerca de um mês, saiu com o decreto-lei no fim da semana passada, anunciou que ainda não foi publicado, em vez de decretar não apresentou à Assembleia da República a sua iniciativa legislativa para que fosse discutida hoje conjuntamente com as outras iniciativas legislativas que foram apresentadas e com os deputados?
Pergunto se o facto de o Governo ter tomado esta atitude não representa uma atitude de clara hipocrisia, de clara demagogia, tentando retirar louros para si de iniciativas e decisões que não são suas, que são da Assembleia da República - esta é que é a verdade - e contra as quais votou.
Portanto, que outra análise poderemos fazer da atitude do Governo senão concluir que é uma atitude hipócrita, demagógica e de clara tentativa de hostilizar mais uma vez a Assembleia da República como órgão de soberania? Esta é que é a verdade, e não pode ser, como é evidente, esquecida!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não respondeu!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder ao intervalo regimental, mas, antes disso, informo que estão inscritos os Srs. Deputados Horácio Marçal e Miranda Calha.
Está interrompida a sessão.
Eram 17 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desemprego é um risco social que está a assumir nos nossos dias a maior gravidade, devendo exigir, assim, medidas conducentes à sua prevenção, diminuição e, se possível, erradicação.
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Não é só com a adopção de medidas pecuniárias que se combate a chaga social, o desemprego, pois, para evitar essa endemia, que vai grassando, infelizmente, no nosso país, há que implementar várias iniciativas, que passam essencialmente pela revisão das leis laborais. É que sem lei laboral adequada ao processo sócio-económico do País não se podem combater eficazmente as questões do desemprego e solucionar-se com celeridade e eficiência os problemas que preocupam prioritariamente a sociedade portuguesa a caminho da melhoria da condição de vida, independentemente da situação social e económica de cada um.
Tentativas tem havido no nosso país para corrigir o que se nos vem deparando, mas o certo é que não surgiram até hoje soluções adequadas e eficazes, de molde a enfrentarmos com realismo o binómio emprego/desemprego.
Não se tomam medidas de fundo e por outro lado a legislação publicada não satisfaz todos aqueles que são afectados pelo desemprego.
Foi o que sucedeu com o Decreto-Lei n.º 20/85, de 17 de Janeiro, que cria um esquema não contributivo de protecção no desemprego, concretizado através do designado subsídio social de desemprego, o qual não contempla os jovens com formação profissional que procuram o primeiro emprego.
Daí, o CDS, preocupado, e perante a insuficiência da legislação em vigor, ter decidido apresentar, em 27 de Fevereiro, um projecto de lei (n.º 380/IV), considerando ser urgente pôr termo a tão flagrante injustiça e infundada discriminação.
O desemprego juvenil, bem como a resolução do desemprego geral, passa pela aplicação de uma política que esteja voltada para o desenvolvimento económico do País, com o aproveitamento integral das suas potencialidades materiais e humanas, tendo sempre como finalidade um progresso harmónico de todas as nossas terras e gentes.
Portugal é ainda um país com muita juventude. Juventude que na generalidade quer ser participativa e responsável. Para que esses jovens assumam na sociedade portuguesa o lugar a que têm jus temos de lhes proporcionar condições de ocupação e de sobrevivência dignas, desviando-os dos caminhos ínvios è proporcionando-lhes perspectivas em que tenha lugar a ambição comedida, legítima aspiração de contribuírem, com a sua acção e o seu trabalho, para a renovação e a prosperidade de Portugal.
Uma voz do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Há que pensar nessa juventude, nos homens de amanhã, deste Portugal que se quer renovado. Daí deve ser suprema preocupação desta Assembleia da República minorar as dificuldades monetárias desses jovens sem emprego - razão de ser do nosso projecto - e perspectivar-lhes um futuro melhor.
Mas não devemos deixar de fazer todos uma reflexão profunda das razões sociais, económicas e políticas que estão na base do incremento do desemprego.
O País e mormente esta Assembleia da República, se quiserem solucionar estes e outros problemas graves da sociedade portuguesa têm de corrigir erros passados e presentes, despir a capa partidária e dar, prioritariamente, preferência a estas questões, para que Portugal se assuma como um país verdadeiramente democrático, independente e totalmente inserido nas directivas e preocupações da Comunidade Económica Europeia, de que somos, com muita honra, Estado membro.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há inscrições para pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Horácio Marçal.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda recentemente tive oportunidade, nesta Câmara, de referir a situação dramática dos jovens que não encontram resposta à sua situação de desemprego e as consequências da manutenção de tal situação.
Referi então que alguns indicadores apontavam para que 50 % do total de desempregados tinham menos de 25 anos de idade e que dos jovens desempregados até àquela idade 42 % estavam nessa situação há mais de um ano. Por outro lado referi que o nível de escolaridade era extremamente baixo quanto aos jovens que trabalhavam e que o trabalho de menores tendia a consolidar-se, que havia um aumento de trabalho jovem sem contrato e a prazo e que se alargava a utilização de jovens como mão-de-obra barata e sem segurança de qualquer espécie. Nalguns pontos do País denunciava-se o aparecimento de casos de trabalho infantil.
Da parte do Governo, e para fazer face a esta situação de injustiça gritante, as iniciativas têm sido infelizmente parcas e mesmo assim provocadas pela própria utilização de fundos europeus com orientações bem direccionadas. É claro que poderá falar-se do Decreto-Lei n.º 170/86, posteriormente completado pelo Decreto-Lei n.º 257/86, do despacho normativo considerando apoios à criação de actividades independentes, do programa de fomento de iniciativas locais de emprego e da OTJ (ocupação dos tempos dos jovens). Mas os números falam por si. A taxa de desemprego é na sua globalidade idêntica à de meados de 1985 e não se vislumbra alteração significativa das situações mencionadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1987, a Assembleia da República, sensível às preocupações dos jovens em matéria de emprego, aprovou uma proposta de verba da ordem dos 750 000 contos com o objectivo de criar um benefício novo a favor dos jovens à procura do primeiro emprego, em condições limitativas e a definir. Tratava-se assim de lançar um regime que, contrariamente ao que se passa em muitos países europeus, em Portugal ainda não existe, não obstante em 1979 ter sido produzida alguma legislação sobre esta matéria que entretanto veio a ser alterada.
Sublinhou então o PS, ao subscrever esta proposta de 750 000 contos, que a verba que veio a ser aprovada pelos partidos da oposição, com a abstenção do CDS, se destinava a facilitar a criação de um regime que fosse ao encontro de necessidades inadiáveis, nomeadamente no sentido de aliviar a situação em que se encontram os jovens à procura do primeiro emprego com pesados encargos familiares.
É, pois, na sequência desta iniciativa que apresentamos hoje o projecto de lei n.º 323/IV. Propõe-se assim
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a instituição de um esquema não contributivo de protecção do desemprego a jovens à procura do primeiro emprego - o subsídio social de desemprego.
Os destinatários deste esquema serão os jovens compreendidos entre os 18 e os 25 anos que reúnam determinadas condições: estarem inscritos nos centros de emprego da sua área e o respectivo agregado familiar auferir rendimento per capita não superior a 50 % da remuneração mínima nacional garantida para a indústria. O montante que se prevê refere-se a um valor de remuneração mínima nacional e é calculado na base de 30 dias de trabalho por mês e igual a 70 % daquele valor. Indica-se ainda neste projecto a duração do subsídio e preconiza-se - o que é extremamente relevante - que os jovens nesta situação têm prioridade no acesso a cursos de formação profissional.
Naturalmente que a primeira preocupação em relação ao desemprego em geral é a de arranjar empregos por todas as vias para todos os desempregados e de criar esquemas especiais de introdução dos jovens no mundo do trabalho. Só em casos devidamente delimitados - o nosso projecto distingue-se aí de outros - se considera de atribuir um subsídio de desemprego à população mais jovem, à qual é absolutamente urgente garantir a introdução no emprego pela conjugação de esforços a nível da educação e orientação profissional (criando formação útil), da formação profissional e das iniciativas criadoras de emprego, sobretudo a nível local.
O financiamento a utilizar para esta população mais jovem deverá pois traduzir-se fundamentalmente na criação de novos empregos, aplicando-se-lhe as verbas eventualmente destinadas à concessão de subsídios de desemprego.
Esta instituição de um subsídio de desemprego para jovens deverá ter em vista especialmente aqueles que se encontrem em maiores dificuldades de subsistência, tendo em conta o baixo rendimento do agregado familiar, porque consideramos de evitar todos os desincentivos à tentativa de obtenção de um posto de trabalho. É neste contexto que propomos esta legislação e a desejamos discutir de modo aberto e participado. É que não é por acaso que, hoje, aqui, apreciamos diversos diplomas sobre a problemática dos jovens e não é por acaso que se encontram nesta Assembleia da República mais iniciativas sobre os jovens e o emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cremos, no entanto, que a iniciativa que o PS tomou já teve alguns méritos: o Governo - parece, pois ainda não conhecemos nenhum diploma - em reunião recente decidiu apropriar-se da ideia e lançar uma medida semelhante. Tinha obrigação de, pelo menos, mencionar os autores ... ou, talvez, de estar hoje aqui presente - e não está -, visto ter direito a vinte e cinco minutos para intervir nesta matéria. É que, em Dezembro - recorde-se -, o PSD e o Governo opuseram-se a tal iniciativa, que foi aprovada na Assembleia da República.
Parece, no entanto, que o Sr. Primeiro-Ministro está pouco convicto da medida tomada, pois considerou «reprovável e socialmente condenável o subsidio de desemprego, que pode contribuir para que os jovens percam a vontade de procurar trabalho».
O Sr. Primeiro-Ministro revela assim uma falta de confiança total nos jovens. Ou talvez se comece a aperceber melhor de que o desemprego juvenil aumentou, a educação e a formação profissional são insuficientes, os serviços sociais não correspondem às necessidades e, consequentemente, que há, isso sim, uma maior desconfiança por parte dos jovens em relação ao governo a que preside.
O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Não apoiado!
O Orador: - Não serão essas espantosas campanhas de propaganda que o Governo promove que podem esconder a dura realidade que os nossos jovens enfrentam. Não faço o resto da citação porque a acho menor para um primeiro-ministro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que subscrevemos e colocamos à vossa apreciação será um contributo positivo da Assembleia da República, que entende e sente a situação de muitos jovens, que continua a degradar-se sem que se perfilhem soluções adequadas.
Não podemos deixar comprometer o futuro das novas gerações. É uma responsabilidade de todos nós, incluindo a do Sr. Deputado Paulo Coelho, que disse: «Não apoiado!»
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Salvada e Rogério Moreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.
O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr. Deputado Miranda Calha, na sua intervenção V. Ex.ª pareceu ter encontrado o remédio para todo o mal da juventude, através do projecto de lei do seu partido, e criticou que o Governo tivesse assumido aquilo que parece ser comummente aceite e que é a assunção das suas responsabilidades.
Muitas vezes, acusa-se injustificadamente o Governo de assumir uma posição arrogante perante a Assembleia. Neste caso concreto, em que aquele respeitou uma deliberação desta Assembleia, aquando da discussão do Orçamento do Estado, concretizando-a, o PS, e o Sr. Deputado Miranda Calha, acha que o Governo está a desvirtuar as suas justas intenções e está, digamos, a ceifar em seara alheia. Quis, portanto, dizer que não é nossa percepção que os factos sejam como o Governo os apresenta.
Assim, queria perguntar ao Sr. Deputado se acha que o Governo não está, de facto, a exercer as suas funções ao legislar dentro desta matéria.
Concretamente, socorrendo-me do projecto de lei do seu partido, pergunto-lhe se não considera que, no fundo, está a desmotivar a continuação dos estudos dos jovens, independentemente de qualquer formação profissional, através da criação de um subsídio. Gostaria igualmente de perguntar-lhe se não tem em conta que, sendo escassos os recursos da Segurança Social, a ideia subjacente na intervenção do Sr. Primeiro-Ministro que o senhor referiu é mais a de que deve haver equidade na distribuição destes fundos do que a de qualquer outra intenção que o Sr. Deputado parece ter subentendido.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.
O Sr. Rogério Moreira (PCP):- Sr. Deputado Miranda Calha, pôr-lhe-ei duas questões.
Primeira: o Sr. Deputado referiu que a atribuição do subsídio de desemprego a esses jovens nunca deverá, de forma alguma, constituir um desincentivo à sua pro-
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cura de um posto de trabalho: Pergunto-lhe se o Sr. Deputado considera que pode sê-lo, atendendo à forma como estão apresentadas. as propostas e às condicionantes que aqui são apresentadas. Ou seja: considera que, tal como esperamos que a Assembleia da República a venha a aprovar, a atribuição do subsídio de desemprego a jovens à procura do primeiro emprego pode constituir, de facto, um desincentivo à procura de um posto de trabalho?
Pelo contrário, o facto de se induzir, como o fazem todos os projectos de lei apresentados, a obrigatoriedade de inscrição num centro de emprego não será uma forma de se suscitar a esses mesmos jovens a procura das formas de emprego institucionalmente consagradas através dos centros de emprego?
Não considera, precisamente, que a não criação e até a liquidação a que assistimos de postos de trabalho é que têm efeitos incrivelmente perniciosos sobre esses jovens que se encontram nessas condições e não a atribuição de um subsídio com as condicionantes que, repito, existem nos diferentes projectos de lei?
A segunda questão prende-se com a curta referência - bastante útil para o debate - que o Sr. Deputado fez acerca das declarações do Sr. Primeiro-Ministro sobre esta matéria. Completá-las-ei: numa declaração publicada no Diário de Notícias, no passado dia 10, o Sr. Primeiro-Ministro diz que « [ ... ] há necessidade de evitar que, através do subsídio de desemprego, os jovens adquiram uma mentalidade assistencial, desistam dos estudos ou da valorização profissional, disponham de fundos para comprar droga ou para abandonar a família».
0 Sr. Primeiro-Ministro considera que a possibilidade de atribuição de qualquer subsídio é uma forma de os jovens irem comprar droga, mas faz esta afirmação no exacto momento em que o Governo decide atribuir um subsidio de 7500$ a esses jovens.
Pergunto ao Sr. Deputado como é que interpreta esta aparente contradição nas afirmações e na prática do Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - E quanta droga é que se pode comprar com 7500$?
O Orador: - Se o Sr. Deputado Carlos Coelho deseja intervir, vai ter de aguardar.
Os 7500$ são para as «drogas leves» ou o Sr. Primeiro-Ministro tem medo das «drogas pesadas» e é por isso que só dá essa verba, que até pode servir outras coisas, mais «leves»? ...
Risos do PSD.
... Por outro lado, Sr. Deputado Miranda Calha, não acha que a atribuição de uma coisa tão ridícula como são hoje 7500$ - que pouco mais dá do que para comprar o passe social - leva a que haja condições para que se agrave e se multiplique a situação de perfeita instabilidade destes jovens? Ou seja: não acha que uma verba destas que não dá absolutamente para nada, é uma verba que só cria falsas expectativas e não dá, de facto, para o jovem ter uma vida regular e minimamente digna? E, Sr. Deputado, não acha que precisamente por isso há mesmo que atribuir uma verba minimamente digna dentro das possibilidades e daquilo que é justo?
Gostava de saber que interpretação tira o Sr. Deputado Miranda Calha destas afirmações.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o. Sr. Deputado Miranda Calha. .
O Sr. Miranda Calha (PS): - O Sr. Deputado Rui Salvada, que me interpelou em primeiro lugar, disse que eu considerava na minha intervenção que o Governo se desvirtuava a ele próprio por tomar iniciativas em relação a esta matéria, que este diploma que apresentámos é o remédio para todo o mal, etc., etc. Tenho a dizer-lhe, Sr. Deputado, que não percebeu nada da minha intervenção ... mas rigorosamente nada! É porque tive o cuidado de explicar no texto as razões que nos levaram a apresentar este documento e a sua génese. Se o Sr. Deputado ler as actas das reuniões da Comissão de Economia, Finanças e Plano da época, verá que foi o seu próprio partido que disse que não valia a pena inscreve verbas para esta matéria, porquê isto não era relevante e porque vinham aí umas verbas do Fundo Social Europeu e tudo se resolveria sem nenhuma complicação. Isto levou a que acabou por votar contra a verba dos 750 000 contos.
O que não deixa de ser curioso é que oito dias antes de virmos aqui discutir esta matéria e de outro tipo de iniciativas, se calhar tomadas pelos diversos grupos parlamentares sobre este assunto, venha de repente o Governo tomar uma iniciativa sobre esta matéria, fazendo-o de uma maneira que nem sequer conhecemos.
Não há legislação publicada, sabemos vagamente que o Sr. Secretário de Estado da Juventude, o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social e o Sr. Primeiro-Ministro falaram do assunto, mas não sabemos mais nada. Por exemplo, o Governo podia estar hoje aqui - ainda tem vinte e cinco minutos para isso - a explicar por que é que legislou, que era para ficarmos informados e sabermos o que é que estamos a fazer. É que pode acontecer que estejamos a legislar e que o Governo também esteja a legislar optimamente sobre esta matéria, originando depois uma possível incompatibilidade dos documentos. Acho que era útil que o Governo nos explicasse esta questão.
Penso que este é um problema extremamente sério. Os números respeitantes ao desemprego são graves, a componente juvenil desses mesmos números é elevadíssima e o Governo não tem feito rigorosamente nada sobre estas matérias. Houve umas iniciativas, uns incentivos, mas os números demonstram que não há alterações significativas desde 1985 em relação a esta matéria e é isso que tem de ser invertido, é isso que o Governo tem de resolver e é a isso que o Governo tem que dar resposta, vindo aqui à Assembleia explicar como se resolve o problema do desemprego.
O Sr. Deputado Rogério Moreira disse depois que a consagração deste diploma não constitui um incentivo aos postos de trabalho. Essa é uma das componentes da introdução do nosso texto e é óbvio que consideramos que o subsídio de desemprego é para fazer face a situações de grande dificuldade e de gravidade extrema em termos familiares, e por isso mesmo o apresentamos com determinado tipo de limitações e condicionantes. Entendemos evidente que não deve haver a mínima ideia de desincentivar a procura de opções em termos de emprego. Consideramos que isso é fundamental.
Portanto, o nosso projecto de lei é de facto bem claro e bem limitado nas opções que propõe em termos de procurar resolver determinada tipologia de situações.
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Consequentemente, Sr. Deputado, não se consagra aqui a desincentivação em relação á procura de emprego; antes pelo contrário, procuram resolver-se as situações mais dramáticas em relação a esta matéria.
Depois, o Sr. Deputado referiu que havia uma mentalidade assistencial, os tais 7500$... Bom, Sr. Deputado, desconheço tudo isso. Houve declarações públicas mas não sei o que elas querem dizer. O que sei certamente é que o Governo não está onde devia estar presente, que era aqui, na Assembleia da República, a esclarecer estes assuntos e é capaz de logo estar na Televisão, às 20 horas, a dizer precisamente o contrário e a chamar a si aquilo que não lhe diz respeito e em que não tomou a iniciativa. Este é que é o problema fundamental.
Assim, respondendo à sua questão, tomava a iniciativa de sugerir que o Governo, antes de o vermos hoje na televisão, ainda viesse à Assembleia explicar claramente o sentido das suas tomadas de decisão em termos legislativos sobre esta matéria.
Faço este apelo e espero que a bancada que apoia o Governo faça eco desta situação e nos traga aqui, pelo menos, o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, para ele nos esclarecer sobre o que é que pretende fazer nesta matéria.
Vozes do PSD: - O Sr. Ministro está doente!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Na opinião da JSD há duas questões subjacentes a este debate.
A primeira é a de saber que desemprego é que temos.
Importa sublinhar, uma vez que isso não foi feito nesta Câmara, que o nosso desemprego juvenil não é tão grave como em muitos outros países da Europa. Não quero comparar, por exemplo, as estatísticas portuguesas com as estatísticas espanholas...
De qualquer forma, isso não deve evitar que algum de nós nesta Câmara deixe de sublinhar e subscrever uma grande preocupação em relação aos índices de desemprego juvenil e dos jovens à procura do primeiro emprego.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A segunda questão subjacente a este debate é o conceito de juventude que cada um de nós tem. Como é que encaramos a juventude portuguesa? Se vemos uma juventude passiva ou se entendemos que a juventude portuguesa tem revelado, particularmente nos últimos anos, grande criatividade, grande energia, grande capacidade de decisão e de participação?
Na nossa opinião há duas maneiras fundamentais de resolver o problema do desemprego juvenil: podemos entender que este problema é resolvido com subsídios, recorrendo à «caridade» do Estado, gerando a tal mentalidade assistencial a que os Srs. Deputados que intervieram antes de mim se referiam, ou podemos entender - de uma maneira mais correcta no nosso entender - que se pode resolver o problema do desemprego juvenil relançando o investimento, criando emprego e incentivando a capacidade de iniciativa dos jovens e dos empresários.
O PSD e a JSD não têm escondido que a sua preferência vai para esta segunda maneira de encarar o combate ao desemprego juvenil. Mas há cautelas a ter, Srs. Deputados. Cautelas sérias e não cautelas fruto de demagogia de quem quer marcar pontos políticos com um problema tão grave como o do desemprego dos jovens.
E há uma cautela que nos preocupa, que é o abandono precoce do sistema de ensino.
Não podemos aprovar sistemas que tenham como objectivo, como consequência ou como causa lateral o abandono precoce do sistema de ensino por parte dos jovens, antes pelo contrário, devemos encontrar sistemas e processos que incentivem o jovem a aprofundar a sua valorização pessoal e intelectual.
Em segundo lugar, não podemos encontrar sistemas que anestesiem a iniciativa dos jovens.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado Miranda Calha desafiou-nos na sua intervenção a apresentarmos as soluções. Esse era um desafio que podia devolver-lhe; o Sr. Deputado Miranda Calha não o fez e talvez competisse fazê-lo a quem vem assumindo-se como a alternativa para este Governo e como alternativa nesta matéria que diz respeito aos jovens.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Orador: - Mas vamos nós fazê-lo!
Há várias soluções possíveis para o problema do desemprego juvenil e todas elas conjuntamente - está-se a rir, Sr. Deputado Raúl Rêgo, mas isto é um assunto sério.
É necessário, em primeiro lugar, o relançamento da economia e a retoma do investimento e, em segundo lugar, incentivos ao lançamento de jovens empresários agrícolas e industriais.
Temos de recusar a filosofia dos que entendem que o jovem vai ao mercado de emprego à espera de que os investidores adultos invistam, que sejam eles a promover a riqueza e a criar o emprego.
Uma voz do PSD: - Esse é que é o problema.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Então é resolvê-lo!
O Orador: - Já ficou demonstrado, com as medidas de apoio aos jovens agricultores e com as iniciativas do Fundo de Apoio às Iniciativas de Jovens Empresários, que os jovens são capazes de ter a iniciativa e de, por eles próprios, criarem emprego e riqueza.
Outra solução é o apoio à contratação de jovens, como este Governo fez através do diploma legal que concede isenções fiscais às empresas que contratem jovens sem contratos a prazo.
Temos de apostar também na melhoria da educação e da formação profissional e nos programas de sensibilização para as exigências da vida activa, como os OTLS, os OTJs e os Inforjovens. E, em relação a todos estes programas, temos de dar prioridade no acesso aos jovens mais carenciados.
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E temos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de rever globalmente a legislação laboral, que funciona simultaneamente como um mecanismo limitador da contratação de jovens e de abuso em situações de contratos a prazo.
Além destas medidas, há situações-limite, que têm de nos preocupar. Há jovens desempregados que há muito tempo procuram o primeiro emprego. São aquilo a que poderemos chamar os jovens candidatos ao primeiro emprego de longa duração.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Os tais 7500$ vinham a calhar?...
O Orador: - São, em algumas circunstâncias, jovens com poucos recursos. Admitimos que, em relação a estes jovens, se encontre, não um subsídio de desemprego, porque eles não estão empregados, mas um subsídio que facilite a integração na vida activa.
Mas o que importa que, de uma vez por todas, fique claro neste debate, é que o subsídio não é o mais importante ou o fundamental. O que é importante e fundamental é a resolução do problema de fundo, que é o problema do emprego. É encontrar um complexo de soluções que ofereçam aos jovens uma alternativa para a grave situação social em que se encontram neste momento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que, em boa verdade, o jovem pede ao Estado não é, estendendo-lhe a mão, um subsídio precário. O que o jovem exige do Estado é, ao estender-lhe a mão, um futuro sólido e uma sociedade onde ele tenha lugar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Há quem, contra a nossa opinião, considere que a questão do subsídio é a questão fundamental e, simplisticamente, coloca o problema desta maneira: o que é que é melhor? Os 7500$ que o Governo oferece, como dizia há pouco o Sr. Deputado Rogério Moreira, ou os 15 000$ que o CDS oferece, ou os 17 500$ que o PS oferece ou os 20 000$ que o PCP oferece?
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - O Governo retira-os!
O Sr. José Apolinário (PS): - Isto não é a Misericórdia!
O Orador: - Importaria recordar aqui, Srs. Deputados, que as pensões mínimas da Segurança Social são de 7500$ para o regime não contributivo e de um valor entre os 11 000$ e os 12 000$ para o contributivo. Isto significa que há pessoas, com uma idade muito superior à minha que, depois de uma vida de trabalho, recebem do Estado as pensões que acabei de referir.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - A responsabilidade é do Governo.
O Orador: - Sr. Deputado Jorge Patrício, cada um faz a demagogia que pode. Se entende que este Governo é o responsável por esta situação depois dos aumentos substanciais que fez das pensões, aumentos que todos os governos depois do 25 de Abril deixaram num limiar inqualificável e inadmissível, parece-me que o Sr. Deputado podia ter encontrado outro ponto, eventualmente mais simpático, para fazer agitação aí da bancada, pois este é dos pontos em relação ao qual o governo do PSD está completamente à vontade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - O seu Governo está no poder há que anos!
O Orador: - Sr. Deputado Jorge Patrício, se me desse licença para concluir, é que estou quase no fim e não abusarei muito mais da sua paciência ...
Não sei - mas talvez o Sr. Deputado me ajude a pensar- como é que esta Assembleia, como é que o poder político, como é que o Estado podem resolver o problema nas famílias em que, sob o mesmo tecto, há jovens à procura do primeiro emprego e, simultaneamente, um velho, que, ao abrigo dos esquemas da Segurança Social, recebe uma pensão de valor inferior ao do subsídio do jovem. E o que é que se consegue política e socialmente com esta situação?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Que a sociedade aponte um dedo irado e questione os privilégios dos jovens! Quando todos nós - e, em particular, os deputados da JSD - aqui vimos bradar no sentido de que é um grande problema que afecta os jovens, acentuar a responsabilidade do Estado para a sua complexidade, dizer que isso obriga a um grande esforço da sociedade e do Estado, e tentar construir uma política global e integrada para a juventude com a participação dos jovens e em diálogo, como podemos sustentar que os jovens têm poucos apoios e que merecem outra atenção, se podem vir a ser acusados de gozar de privilégios injustificáveis?
Não sei qual é a quantificação feita pelo CDS, pelo PS e pelo PCP, mas no meu grupo parlamentar tentámos fazer algumas contas para apurar qual o universo de jovens susceptíveis de serem abrangidos por estas regalias. É um valor entre 5 a 30 000. Admitimos que, na melhor das circunstâncias, com os critérios previstos nos projectos de lei chegue a 50 000. Os jovens com menos de 25 anos são 1 700 000 e os com menos de 30 anos são 2 300 000!
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Isso é demagogia da mais barata!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não somos ingénuos ao pensar que fazer ouvir um grito de geração se faz sem dor e sem conflito e todos os jovens sentem isso na sociedade e sentem-no também aqueles que participam nos órgãos de poder. Mas isso não nos pode permitir e certamente não nos levará a defender soluções tecnicamente discutíveis e socialmente não justificáveis!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Coelho inscreveram-se os Srs. Deputados José Apolinário, Ana Gonçalves, Tiago Bastos e Jorge Patrício.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.
Entretanto, peço ao Sr. Vice-Presidente José Vitoriano o favor de me substituir na presidência da sessão.
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O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Deputado Carlos Coelho, quero, muito rapidamente, colocar-lhe algumas questões suscitadas pela sua intervenção.
Em primeiro lugar, gostava de saber onde é que acaba o PSD e começa a JSD. Isto é: nesta matéria JSD e PSD têm ou não a mesma posição?
Em segundo lugar, gostava de saber se, quando critica o Governo pela demagogia, quando critica o Governo por não tomar iniciativas no plano do relançamento do emprego, essa é a posição da JSD ou do PSD. Mas, se não é uma crítica, então para quê vir aqui em nome da bancada do PSD, defender que é necessário retomar o investimento, etc. e tal, se o Governo é o seu, é o do PSD e o Sr. Deputado está comprometido com ele?
Por outro lado, Sr. Deputado, há algumas informações que gostaria de dar-lhe. Falou da isenção fiscal como incentivo à criação de postos de trabalho e de iniciativas avulsas tomadas pelo Governo. O problema é esse, Sr. Deputado! É que, apesar do elevado investimento em acções de formação, por exemplo, as medidas tomadas não passaram de medidas avulsas, que não criaram emprego...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não é verdade, Sr. Deputado!
O Orador: - ... que não criaram estabilidade no emprego.
Ao longo de 1986, apenas 3000 jovens foram abrangidos pelas acções de isenção fiscal, enquanto os OTJs abrangeram 22 000; o emprego para as jovens mulheres 36 e as medidas de apoio a deficientes 1200. Foi esta a política de emprego e de formação profissional do Governo que o Sr. Deputado Carlos Coelho aqui veio defender!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Malato Correia (PSD): - Lá está o PS das farturas!
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitorino.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - O Sr. Deputado Carlos Coelho referiu na sua intervenção que não é com uma política de «caridade» do Estado que se resolve o problema do desemprego juvenil. Estamos inteiramente de acordo!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Ainda bem!
A Oradora: - E também estamos inteiramente de acordo quando o Sr. Deputado diz que o problema do desemprego juvenil e do desemprego em geral só se resolve com o relançamento da economia e do investimento com vista à criação de mais postos de trabalho. Até aqui, inteiramente de acordo!
Só que, ou o Governo tem medidas prontas a aplicar nesta matéria ou não as tem. Se não as tem, devo entender a sua intervenção como uma crítica ao Governo que apoia; se as tem - e porque nós, ainda não as conhecemos e ainda não as vimos serem implementadas ao longo de todo este tempo em que o Governo tem estado em funções - agradecia-lhe, se o Sr. Deputado pudesse, que aqui anunciasse algumas dessas medidas para não estarmos dependentes da altura em que o Governo as resolva divulgar através da comunicação social. Por isso lhe peço que se antecipe ao Governo - que, por sua vez, se antecipa sempre através da comunicação social - e que agora aqui nos anuncie algumas dessas medidas, a título de favor, atendendo a que ainda somos um órgão de soberania de que o Governo depende e até hoje não conhecemos essas medidas.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Tiago Bastos.
O Sr. Tiago Bastos (PRD): - Sr. Deputado Carlos Coelho, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que penso que o Sr. Deputado fez a melhor defesa da necessidade destes subsídios...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito obrigado, Sr. Deputado. Entendo isso como «lisonjeiro» para a minha pessoa!...
O Orador: - ... porque o Sr. Deputado defendeu aqui que o Governo tinha feito tudo o que era possível, em matéria de criação de emprego, e que tinha tomado as melhores iniciativas. No entanto, pelos números de que dispomos, o desemprego continua a aumentar e o número de jovens desempregados é enorme.
Se o seu Governo já fez tudo o que podia, se os programas são «excelentes», mas o problema continua, então talvez seja melhor auxiliar os jovens de alguma forma, pois continuam com gravíssimos problemas. Por isso, Sr. Deputado, penso que terá de concordar em que se esta não é a melhor forma é, pelo menos, a única possibilidade que nos resta.
Em segundo lugar, quero dizer que, de certa forma, fico triste por o Sr. Deputado vir aqui tentar justificar que este problema não é importante, com o argumento de que o desemprego juvenil em Portugal não é tão grave como noutros países. É mau que isso o contente, Sr. Deputado!
Por outro lado, como veio defender que os 7500$ que o Governo atribui são «excelentes», penso que poderia também, numa óptica de coerência com aquilo que o Governo tem afirmado, explicar-nos em que campo se insere a atribuição deste subsídio. É que - devo lembrar-lho - o Sr. Secretário de Estado da Juventude sempre disse «não aos subsídios aos jovens», porque eram «esmolas». Portanto, se um subsídio de 50 % ou 60 % do salário mínimo nacional era uma esmola, gostaria de saber o que é que são 7500$. É uma esmola mais pequenina?
Há pouco, em aparte, perguntou ao Sr. Deputado Rogério Moreira em relação ao que ele estava a dizer, se ele sabia para quanta droga dava 7500$. Esse aparte espantou-me bastante, por isso pergunto-lhe se o seu problema é só uma questão de quantidade de droga, se o que lhe interessa saber não é se sim ou não os jovens consomem droga, mas se é muita ou se é pouca. Penso que não é esse o problema e se for por aí, mesmo na sua óptica, está mal.
0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Tu és um colosso!
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O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Segundo o Carlos Coelho há uma relação directa, o que é grave!
O Orador: - Por agora, só desejo que me responda a isto. Espero, depois, poder fazer mais perguntas, mas ao Governo!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Deputado Carlos Coelho, creio ser notório, pelo que tem dito neste debate, que está a desempenhar uma tarefa dificílima!
Passando adiante, gostaria de colocar-lhe algumas questões.
Julgo ser evidente estarmos todos de acordo - ninguém põe isso em causa - em que é melhor haver emprego do que subsídio de desemprego.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Ainda bem que concorda. É porque eu tinha dúvidas...
O Orador: - Suponho que ninguém põe isso em causa, mas se o Sr. Deputado tem dúvidas é porque anda esquecido ou não tem andado por esta terra. Ninguém defende o subsídio de desemprego como melhor solução do que a criação de novos postos de trabalho.
O que se pergunta, Sr. Deputado - e esta é que é a situação com que nos confrontamos -, é onde estão os empregos. Onde estão os postos de trabalho? Esta é que é a questão fundamental!
Se os subsídios de desemprego existem para fazer face a situações gravíssimas vividas por algumas pessoas e, como tal, devem ser um auxílio prestado pelo Estado a essas pessoas, o que se pergunta é por que razão, não havendo empregos, o Sr. Deputado Carlos Coelho não entende que essa é uma medida positiva que deve ser tomada.
Porque a verdade é esta, Sr. Deputado: o desemprego tem vindo a aumentar, sobretudo, como o Sr. Deputado sabe, no sector juvenil, e é dificílimo para qualquer jovem encontrar o seu primeiro emprego. E o que se pergunta é se o Estado Português, as instituições democráticas em Portugal vão corresponder ou não a uma necessidade sentida pelos jovens para fazer face à vida que actualmente têm e que, como todos nós sabemos, é uma situação dramática.
Relativamente ao abandono precoce do sistema de ensino, questão levantada pelo Sr. Deputado, pergunto-lhe se considera que é a criação de um subsídio que iria provocar esse abandono. Ou seja: o que se passa hoje, em seu entender deve-se à existência de um subsídio de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego?
Suponho que o Sr. Deputado sabe qual é a taxa de abandono e por isso lhe pergunto, se essa taxa elevadíssima se deve ao facto de os jovens hoje receberem subsídio de desemprego. É essa a verdade?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O problema é saber se ela será agravada.
O Orador: - Deixe-me acabar, Sr. Deputado!
A questão que se coloca é a de saber por que razão os jovens abandonam precocemente o sistema de ensino. É por vontade própria ou é porque as famílias não têm condições económicas para suportar e sustentar os jovens que estão a estudar?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E por que razão o Governo, por exemplo, não eleva as capitações para que os jovens que beneficiam do apoio social sejam mais abrangidos e mais efectivamente apoiados? Essa é uma medida que o Governo pode tomar! Tem capacidade para isso, tem verbas para isso. Então por que razão não as toma?
A terceira e última questão: quem é que pretende marcar pontos políticos nesta matéria?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Os senhores!
O Orador: - É a Assembleia da República e os partidos políticos, que aprovaram há dois ou três meses - já não estou bem recordado - no Orçamento do Estado uma verba de 750 000 contos para criar esse subsídio de desemprego, ou é o Governo - e com ele o seu partido - que, sabendo há mais de um mês que estava marcada para hoje a discussão desta matéria, em vez de apresentar uma proposta de lei, elaborou um decreto-lei e vai todos os dias para a rádio e para os jornais dizer que «é o maior», que não há ninguém melhor que ele...
O Sr. Adérito Campos (PSD): - E é verdade!
O Orador: - ... e que ele foi o único a criar o subsídio de desemprego para os jovens?! ...
Quem pretende, afinal marcar pontos políticos? Os partidos representados na Assembleia ou o Governo, que tomou uma atitude hostil e hipócrita relativamente a esta matéria?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho, para responder aos pedidos de esclarecimento formulados, se o desejar. Para conhecimento de V. Ex.ª informo que o seu partido dispõe de onze minutos.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais queria agradecer os diversos pedidos de esclarecimento, bem como as palavras simpáticas do Sr. Deputado Jorge Patrício.
Gostaria de tentar arrumar as perguntas em três grandes áreas.
Uma voz do PCP: - À grande homem!
O Orador: - Começarei pelas questões de pormenor.
Sr. Deputado Jorge Patrício, em relação ao sistema de ensino, o Sr. Deputado só deu razão às minhas afirmações. A taxa de abandono do sistema escolar já é muito grande? Pois é! E uma regulamentação mal feita de um dispositivo como este não pode acentuar essa taxa, não pode acentuar essa tendência.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Peço imensa desculpa, mas o Sr. Deputado também não permitiu a minha interrupção, pelo que não permitirei a sua...
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Esta questão das tendências é exactamente a mesma que se coloca em relação a uma referência do Sr. Deputado Tiago Bastos que questionava onde estava o crescimento do emprego ou, ao contrário, onde está o crescimento do desemprego.
Sr. Deputado, eu não sei se neste momento há crescimento do desemprego. Os números que tenho apontam exactamente para um decrescimento do desemprego. Todos os dados que estão publicados - e são oficiais - apontam nesse sentido.
Não é um decrescimento no sentido acentuado que os Srs. Deputados do Partido Comunista estão a dizer. É um decrescimento baixo, mas é um decrescimento; há menos desemprego.
Ainda que não houvesse uma redução do número de desempregados, em particular dos desempregados jovens, essa não seria a questão política. A primeira questão política é saber se há ou não uma redução do agravamento do desemprego. E essa é clara, insusceptível de ser contestada. Há uma inversão clara da tendência, em relação à curva do desemprego.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Apolinário (PS): - Não é verdade!
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Isso é que é um homem que lê as estatísticas!
O Orador: - Continuando ainda a bordar as questões de pormenor, o Sr. Deputado José Apolinário enumerou uma série de acções. Mas, antes, gostaria de dizer que, de qualquer modo, se trata de uma descida, uma descida positiva do desemprego. Julgo que concordará comigo que a descida do desemprego é uma descida boa.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Permita-me que o interrompa, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Faça favor.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Esses elementos que está a fornecer são interessantíssimos, porque o Sr. Deputado esqueceu-se de uma coisa que é fundamental e que é dos elementos mais interessantes relativamente ao que agora está a suceder, é a descida da população activa. Como tal, representa uma descida da taxa de desempregados face ao total da população activa.
Talvez o Sr. Deputado tenha uma explicação para aquilo que hoje consiste na transferência massiva, ou pelo menos muito significativa, de jovens raparigas para situação de «domésticas». O Sr. Deputado conhece a juventude, tal como eu a conheço, e esta é uma situação verídica. O que há é falseamento estatístico e cada vez mais o trabalho em casa, à peça, e portanto o desemprego aumenta; assume é formas diferentes.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Disse-me ainda o Sr. Deputado Jorge Patrício que eu estava a fazer um discurso errado e perguntava-me porque é que me oponho a esta questão do subsídio.
A questão está em saber para onde é que o Estado deve drenar os seus recursos: se deve drenar os seus recursos (escassos) para a perspectiva assistencial do subsidio ao desemprego, ou se o deve fazer no sentido da criação de emprego.
Entendemos que o subsídio é uma questão precária, provisória, que não resolve as questões de fundo e que só uma política decidida de criação de emprego é a única política que pode resolver este problema na sua raiz.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Onde é que ela está?
O Orador: - Ó Sr. Deputado, eu tive ocasião de enumerar algumas das acções e esse foi outro equívoco do Sr. Deputado José Apolinário quando entendeu que aquilo que eu disse foi crítica ao Governo.
Mais de metade, para não dizer quase tudo, daquilo que eu disse foram acções que o Governo já tomou. O Sr. Deputado não me diga que estava distraído! Todas aquelas acções que enumerei foram acções que o Governo já tomou. Há certamente algumas que o Governo ainda não tomou.
Isto também responde a uma questão da Sr.ª Deputada Ana Gonçalves que me perguntava - e bastava ser a Sr.ª Deputada a perguntar para eu responder com o maior prazer - se o Governo não tomar essas medidas, se o criticávamos ou não. É óbvio, Sr.ª Deputada! Se o Governo não tomar as medidas que entendemos serem fundamentais, criticamos o Governo. Viremos a esta Assembleia (e lá fora) dizer que o Governo não fez aquilo que era fundamental. Isto não é surpresa, porque a JSD já a habituou a isto.
Apenas mais dois pontos, para terminar.
O primeiro relaciona-se com a questão de fundo que é saber qual é a eficácia das medidas do Governo. O Governo está aqui presente, pelo que não irei falar por ele - mal seria se assim fosse.
Mas, julgo que a eficácia das medidas do Governo se está a provar. Mesmo em relação às variáveis macroeconómicas do relançamento do investimento. E mesmo em relação aos números que o Sr. Deputado José Apolinário referiu do aumento de emprego por virtude da aplicação de algumas medidas pontuais.
O Sr. Deputado diz que é insuficiente. Eu também digo que o é; mas é um passo. Mas tenho em atenção que é a quantificação que se pode fazer do alcance das medidas no ano de lançamento.
Não tenho quaisquer dúvidas de que nenhuma das medidas que apontou deixará de, no segundo ano, ter números muito mais substanciais do que no primeiro. E deixe que lhe refira que, ao contrário daquilo que disse, os OTJ não criaram emprego.
O Sr. José Apolinário (PS): - Muito bem!
O Orador: - Há aí uma grande confusão. Julgo que sobretudo o Partido Comunista ajudou a criar na opinião pública essa ideia, mas os OTJs não são para criar emprego. Lembro-me, inclusivamente, de ouvir o Sr. Deputado Jorge Patrício na televisão a dizer qualquer coisa sobre isso.
Srs. Deputados, termino respondendo a uma crítica política.
Foi questionada, pelo Sr. Deputado José Apolinário, onde acabava a JSD e onde começa o PSD, se eu os critico ou não e se estamos comprometidos com o Governo.
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Sr. Deputado, para que não subsistam dúvidas, estamos apostados em que o Governo governe o melhor, que puder. E sempre que a JSD puder colaborar, através da crítica construtiva, para que isso se verifique entendemos que a devemos formular.
Sempre que o Governo faz coisas boas aqui estaremos para aplaudir, sempre que ele errar aqui estaremos para contestar.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Têm aplaudido pouco!
O Orador: - Há tempo, Sr. Deputado. Os governos são para durar quatro anos e não apenas alguns meses. É mau quando, na democracia portuguesa, nos habituamos a que os governos durem apenas alguns meses.
Se o Sr. Deputado me pergunta o que é que pode ser melhor que um Governo do PSD, bom, só consigo vislumbrar como melhor do que um governo do PSD um governo da JSD.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com dados fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística, reportados ao 2.º trimestre de 1986, os jovens com menos de 25 anos representam 50% do total de desempregados em Portugal e, se alargarmos o limite de idade para os 30 anos, o seu peso eleva-se para 64%, abrangendo jovens à procura do primeiro emprego e jovens à procura de novo emprego. E cerca de 61 % dos jovens desempregados procuram emprego há mais de seis meses!
O desemprego juvenil se não é mesmo o mais grave problema com que se debatem hoje os jovens, é dos mais graves, não só em Portugal mas, com intensidades diversas, por toda a parte.
Desnecessário se torna nesta intervenção dissertar sobre as causas do desemprego e consequências para a vida do jovem resultantes da inactividade. Elas são de todos sobejamente conhecidas!
A ausência de perspectivas e o sentimento de insatisfação da geração mais nova conduzirá, num futuro mediato e imediato, a consequências imprevisíveis.
O mercado de trabalho está hoje praticamente fechado, mas está-o sobretudo para a camada mais jovem da população.
Como é que poderemos, todos nós, contribuir para alterar a situação, abrindo-lhes as portas do emprego e criando mais postos de trabalho, é a questão de fundo.
Não ignoramos as dificuldades inerentes à situação, mas só se vislumbrará a saída da crise se for definida uma correcta política de emprego e se alterarmos comportamentos e mentalidades, quer dos partidos políticos e do Governo, quer dos empresários e dos sindicatos.
Desde logo, o comportamento dos partidos políticos, que enquanto candidatos ao poder se desmultiplicam em projectos e promessas aos jovens, conscientes do seu peso eleitoral, fazendo tábua rasa de tudo quando o objectivo - poder - é atingido.
Assim tem acontecido com os sucessivos governos que governam de costas voltadas para a juventude portuguesa, embora explorando a mobilização e a eterna generosidade dos mais novos.
O governo do PSD não é infelizmente excepção e digo infelizmente porque muito prazer nos daria constatar o contrário... Se por um lado - justiça lhe seja feita - é o Governo que desde o 25 de Abril mais medidas tomou e mais falou sobre os problemas dos jovens portugueses - o que não deixará decerto de ser um bom sintoma - é também verdade que no concreto essas medidas e os discursos não tiveram expressão e nem os resultados práticos correspondem ao apregoado.
Não há uma clara política de juventude nem se definiram objectivos a atingir. Daí que se assista a um desfiar de medidas avulsas, desenquadradas, não dando resposta às carências mais prementes da camada jovem. Cartão jovem, OTL, OTJ, linhas de crédito jovem, são alguns exemplos.
Numa táctica eleitoralista, é sem dúvida este o governo que melhor tem sabido dirigir-se aos jovens. Mas o que importa são os resultados concretos, é a melhoria das condições de vida dos jovens portugueses. E essa melhoria, infelizmente, não descortinamos, nem a curto nem a médio prazo.
Vemos, isso sim, o Governo invocar sistematicamente a rigidez da legislação laboral para justificar aos mais novos a sua incapacidade para criar as condições que permitam o desenvolvimento económico do País, indissociável do desenvolvimento da iniciativa privada, com vista ao aumento do investimento em Portugal potenciador da criação de mais postos de trabalho.
Comportamentos e mentalidades têm também que ser alterados por parte dos empresários, que, apostando no imediatismo do lucro, preferem empregar indivíduos já com alguma especialização em detrimento da aposta nos mais jovens, compreensivelmente sem experiência.
Mas também os sindicatos não podem continuar a sua política de defesa exclusiva de quem já está instalado, de quem conquistou um posto de trabalho, devendo alterar qualitativamente as suas reivindicações por forma a abranger não só os trabalhadores empregados mas também os desempregados e os candidatos ao primeiro emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os jovens esperam e exigem maior atenção pelos seus problemas, mas «quem espera desespera» e muitos são os que vivem já uma situação de profundo desespero.
Os projectos de lei hoje em análise mais não pretendem do que minorar os graves problemas decorrentes do desemprego juvenil.
E há que reconhecer que este conjunto de iniciativas corresponde, no fundo, a uma ideia defensiva.
Ninguém foi capaz de delinear uma política de emprego.
Atribuir o subsídio de desemprego representa, de certo modo, as confissões pelos proponentes de que não têm propostas para alterar a situação.
Não têm para oferecer aos jovens mais do que uma perspectiva de desemprego, que julgam atenuar pelo subsídio.
Ao analisarmos estes projectos, colocámos algumas reticências.
Fosse o emprego juvenil um problema de menores proporções ou víssemos alguma possibilidade de, a curto prazo, ele ser substancialmente reduzido e decerto não votaríamos a favor dos projectos de lei em debate, porque a colocação do jovem na dependência do Estado, recebendo num determinado período um subsídio, sem ter tido ainda qualquer contacto com a vida activa, não nos parece que seja um bom princípio de vida.
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Contudo, pela gravidade e dimensão do problema, consideramos positivo que, aos jovens mais carenciados e que preencham determinados requisitos, seja atribuído um subsídio que lhes facilite a integração na sociedade e desincentive o exercício de práticas marginais à vida em comunidade.
De sublinhar que as soluções preconizadas pelos projectos de lei não são inovadores na ordem jurídica portuguesa, existindo também soluções idênticas noutros países.
A posição do actual governo face a estes subsídios não pode deixar de ser aqui analisada.
Em reuniões conjuntas de representantes, quer do meu grupo parlamentar quer de responsáveis da juventude do PRD, com responsáveis do Governo, nomeadamente com o Sr. Secretário de Estado da Juventude, tivemos há já vários meses o ensejo de conhecer a sua profunda discordância relativamente à atribuição de subsídios a jovens candidatos ao primeiro emprego.
Dizia-nos o Sr. Secretário de Estado que qualquer subsídio seria uma «esmola» dada aos jovens e que o Governo se recusava a dar-lhes esmolas. Dizia ainda que o Governo preferia empregar os recursos financeiros, porque escassos, na criação de mais postos de trabalho.
Ainda recentemente, no programa «Parlamento», o Sr. Secretário de Estado da Juventude afirmava, e cito:
As medidas que o Governo tem tomado vêm demonstrar muito claramente que o Governo não deve ter uma política dirigista nem paternalista em relação aos jovens.
Justificava assim a sua frontal oposição á atribuição desses subsídios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deliberou o Conselho de Ministros na primeira semana de Março, há oito dias exactamente, a atribuição de um subsídio de 7500$ aos jovens à procura do primeiro emprego, desistindo, ao que parece, de criar mais postos de trabalho.
O Governo mudou de opinião, congratulamo-nos por tal facto, já que traduz uma capacidade de autocrítica, que até agora desconhecíamos, por parte do actual executivo.
O Sr. Paulo Campos (PRD): - Muito bem!
A Oradora: - Contudo, não podemos deixar de referir que o Governo mudou de opinião depois de, em Novembro último, ter recebido com alguma violência as alterações introduzidas pelos partidos de oposição nas despesas do Orçamento do Estado para 1987, entre as quais figura a verba de 750 000 contos que dá cobertura orçamental a esses subsídios.
E mudou ainda de opinião depois de saber estar já agendada para hoje a apreciação dos projectos de lei sobre a mesma matéria. Antecipou-se o Governo uma semana e decidiu não enviar uma proposta de lei à Assembleia da República para ser discutida em simultâneo com os projectos de lei, quando o podia fazer.
Sabendo o Sr. Primeiro-Ministro da razão que assiste à Assembleia da República, recorreu de imediato aos meios de comunicação social para propagandear tal medida.
Numa política oportunista, mudou o Governo de opinião, e fê-lo porque se move não em função da defesa efectiva dos interesses do povo português, mas sim em função do popularismo das medidas que toma numa perspectiva eleitoralista.
Pela nossa parte, não estamos interessados em competir nessa corrida, porque nos move unicamente a defesa séria e intransigente dos interesses do povo que nos elegeu.
Mais uma vez, o Governo não perde oportunidade para afrontar a Assembleia da República. Só que a medida que o Governo tomou em antecipação é, na verdade, uma medida atrasada, pois, estando o Orçamento de Estado aprovado desde finais de 1986, poderia o Governo já há alguns meses ter regulamentado a atribuição dos 750 000 contos. E se não o fez ainda mais tarde foi porque este debate estava agendado.
O Sr. Tiago Bastos (PRD): - Muito bem!
A Oradora: - Desconhecemos o conteúdo do decreto-lei - o pouco que sabemos é através dos meios de comunicação social - e entristece-nos registar o mau juízo que o Sr. Primeiro-Ministro faz dos jovens portugueses.
Vozes do PRD: - Muito bem!
A Oradora: - Considera o Prof. Cavaco Silva «reprovável e socialmente condenável» que através do pagamento de subsídios se contribua para que os jovens percam a vontade ao emprego.
Contestamos que com 7500$ por mês se possa correr esse risco, mas o que nós consideramos reprovável e socialmente condenável é que milhares de jovens, sem nunca terem trabalhado, sejam já considerados desempregados de longa duração por estarem inscritos nos centros de emprego há mais de um ano.
Ficamos também estupefactos quando o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro do Trabalho revelam tanta preocupação em esclarecer que os 7500$ não são atribuídos a título de subsídio de desemprego, mas, sim, a título de subsídio de integração na sociedade.
Isto é esclarecedor, porque ficamos a saber que o subsídio de desemprego não aponta para a melhor integração na sociedade. E ficamos também a saber que um jovem desempregado com mais de 7500$ no bolso é um potencial marginal.
Disse o Sr. Primeiro-Ministro na visita efectuada há dias ao FUNDETEC:
É condenável e socialmente reprovável que através do pagamento de subsídio de desemprego se contribua para que os jovens percam a vontade de trabalhar, adquiram uma mentalidade assistencial, desistam dos estudos ou da valorização profissional, disponham de fundos para comprar droga ou para que abandonem a família.
Será, Sr. Primeiro-Ministro, que a ser aprovada pela Câmara a atribuição de subsídio mensal aos jovens desempregados na ordem dos 50 %, 60 % ou 70 % do salário mínimo nacional vamos ter mais delinquentes, maior consumo de droga, etc.? E os 7500$ que o Governo quer atribuir levaram em conta esses perigos?
Que concepção afinal tem o Governo de uma política de segurança social voltada para a protecção dos mais desprotegidos?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sabemos sequer se o Sr. Presidente da República já promulgou ou não o decreto-lei do Governo. Mas não seria este um dos casos que justificaria o veto político do Sr. Presidente da República? Em nossa opinião, seria. Senão, veja-
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mos: os trabalhos da Assembleia da República são públicos, era pois conhecido o agendamento desta matéria. O Governo, ao legislar exactamente uma semana antes sobre o mesmo assunto, mais não pretendeu que retirar impacte político ao debate no Parlamento e afrontar este órgão de soberania.
Promulgando o decreto-lei no preciso momento em que se processa o debate dos projectos do PS, do PCP e do CDS, não corre o Sr. Presidente da República o risco de, com a sua assinatura, dar cobertura à política eleitoralista e oportunista do Governo?
É nossa opinião que o Sr. Presidente da República, pela dignidade do cargo que ocupa, não deve pactuar com este governo na tentativa de desprestigiar o Parlamento, órgão de soberania que representa o povo português e de que o executivo emana e depende política e constitucionalmente.
Vozes do PRD: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos votar favoravelmente todos os projectos de lei, pese embora a nossa preferência por algumas das soluções preconizadas nalguns projectos, como sejam a inscrição no centro de emprego há mais de três meses, a consideração do rendimento familiar do jovem, impondo a diferenciação entre o jovem com ou sem encargos familiares.
Vamos votar convictos de não resolver o problema do desemprego juvenil, por não ser uma medida de combate ao desemprego, mas insere-se numa política de segurança social voltada para valores fundamentais como a justiça e a solidariedade.
Porque não é uma medida de combate ao desemprego, receamos que, pelo facto de alguns jovens desempregados receberem subsídio, adormeçam os governantes na boa consciência de que o problema dos jovens candidatos ao primeiro emprego é um problema já resolvido.
Esperamos que assim não suceda e que o Governo implemente medidas concretas tendentes à redução do desemprego, tal como, a título de exemplo, a antecipação de reformas, por forma a libertar postos de trabalho a preencher pelos jovens desempregados, e que prove ter capacidade para introduzir as principais reformas estruturais na sociedade portuguesa, indispensáveis ao desenvolvimento do País e à criação de mais postos de trabalho.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Ana Gonçalves os Srs. Deputados Miranda Calha, Horácio Marçal e José Apolinário.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr.ª Deputada, ouvi com o maior interesse e atenção a sua intervenção e queria fazer-lhe duas perguntas, muito simples.
Há pouco, ouvimos aqui um deputado do grupo parlamentar que apoia o Governo falar em três objectivos essenciais à resolução do problema do emprego, ou seja, a retoma na economia, o apoio aos jovens empresários e jovens agricultores, a melhoria da educação e a extensão dos OTLs e OTJS. Considera, Sr.ª Deputada, que são estes os elementos básicos para ajudar a resolver os problema do emprego?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Esqueceu-se da revisão da legislação laboral!...
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho, se quiser interromper-me, faça favor.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Agradeço-lhe, Sr. Deputado Miranda Calha.
Uma vez que teve a bondade de enumerar algumas das coisas que eu tinha dito sobre os itens que deviam ser contemplados na luta contra o desemprego juvenil, queria dizer-lhe que se esqueceu do último, que é a revisão da legislação laboral.
O Orador: - O Sr. Deputado precipitou-se - deve ser uma questão juvenil -, porque essa era a questão que eu ia colocar em seguida à Sr.ª Deputada.
Perdeu uma oportunidade de estar caladinho!
Risos.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Está tonto!...
O Orador: - Em relação a estes pontos, a Sr.ª Deputada considera que este governo - e relembro que é um Governo de 29 % - tem feito alguma coisa no sentido de dinamizar iniciativas respeitantes a estas questões, que possam, de facto, resolver o problema do emprego?
Uma outra questão, Sr. Deputada: V. Ex.ª referiu algumas medidas pontuais, que o Governo tem tomado avulso - eu próprio citei algumas dessas medidas que o Governo tomou e que foram esquecidas pelo Sr. Deputado Carlos Coelho quando falou há pouco. Considera que essas medidas vêm ajudar a resolver o problema do emprego?
Uma última questão: a da revisão da legislação laboral.
Há dias, o meu partido desafiou o Governo a apresentar propostas de revisão de legislação laboral. Considera que é um ponto essencial para ajudar a resolver este problema?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horário Marçal.
O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, ouvi com muita atenção a sua brilhante intervenção, aliás, como sempre!
Mas fiquei com algumas dúvidas sobre aquilo que a Sr.ª Deputada referiu e por isso gostaria de colocar-lhe algumas questões.
A Sr.ª Deputada disse que estes projectos de lei visam essencialmente minorar os problemas dos jovens, mas que não os resolvem na totalidade pois não resolvem a questão de fundo do problema do desemprego dos jovens e que, se estes projectos de lei forem aprovados, os jovens ficam na dependência do Estado.
V. Ex.ª disse também que, apesar de tudo, acha vantagens que haja um subsídio destinado a minorar a situação dos jovens desempregados.
Da sua intervenção, não me pareceu que tivesse apresentado soluções de fundo para a resolução do problema. Se acha que os projectos apresentados têm algumas insuficiências, por que é que o PRD não apresentou um projecto de lei que solucionasse na totalidade os problemas que a preocupam e que nos preocupam a todos nós?
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Era só isto que queria perguntar-lhe, Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.
O Sr. José Apolinário (PS): - Prescindo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Começando por responder ao Sr. Deputado Miranda Calha, quero agradecer-lhe as perguntas que me formulou.
Em relação à primeira, gostaria de dizer-lhe o seguinte: tive oportunidade de manifestar ao Sr. Deputado Carlos Coelho que estou inteiramente de acordo com ele, pois entendo que o problema do desemprego não se resolve a não ser pela retoma do investimento, pelo relançamento da economia, pela criação de mais postos de trabalho.
Aquilo que perguntei foi onde é que estavam essas medidas, por parte do Governo. Aquilo que ouvi foi aquilo que o Sr. Deputado Miranda Calha ouviu, isto é, nenhuma resposta concreta por parte do Sr. Deputado Carlos Coelho.
Enfim, fiquei esclarecida: não há medidas concretas por parte do Governo.
Portanto, a intervenção do Sr. Deputado Carlos Coelho foi, isso sim, uma crítica à actuação do Governo nesta matéria.
Logo, considerei-me esclarecida por ausência de resposta.
Vozes do PRD: - Muito bem!
A Oradora: - No que diz respeito à legislação laboral, Sr. Deputado Miranda Calha, provavelmente estará tão saturado como eu de ouvir este álibi.
Há que esclarecer aqui uma questão, porque me parece que se fez uma grande confusão em torno deste tema «legislação laboral».
O que é isto? O que é que se entende por legislação laboral? Ora bem, quando ouvimos na televisão o Primeiro-Ministro ou o Ministro do Trabalho e Segurança Social, a leitura imediata que se faz do tipo de legislação laboral a que se referem é exactamente a flexibilização do despedimento, enfim, a flexibilização da cessação do contrato individual de trabalho, designando-o pelo nome correcto.
Ora bem, nessa perspectiva, estou inteiramente em desacordo. Não é isso, obviamente, que vai resolver o problema do desemprego, seja ou não juvenil, até porque há vários mecanismos que a lei hoje já põe ao dispor do empresário, quer para despedir a título individual, quer para proceder a despedimentos colectivos.
Mas se considerarmos a legislação laboral num sentido lato, então é evidente que eu e o meu grupo parlamentar somos favoráveis à revisão da legislação laboral, porque há vários aspectos na legislação actualmente existente que não satisfazem nada nem ninguém, pois estão profundamente desarticulados entre si e desajustados da realidade.
Ora bem, o que nos parece é que, quando o Governo é «pressionado» várias vezes no bom sentido, é evidente - tal como o Sr. Deputado referiu há pouco quando também lançou o desafio ao Governo para apresentar uma proposta de alteração de legislação laboral e tal como nós também já o fizemos há vários meses e temos vindo a fazer - que não está interessado em fazer este tipo de revisão global, como nós pretendemos.
O Governo está unicamente interessado em rever uma parte dessa legislação, mas, revendo essa parte, desequilibraria ainda mais a legislação que hoje existe.
Penso que lhe respondi, Sr. Deputado Miranda Calha.
Também lançámos sucessivas vezes o desafio ao Governo para que apresente aqui uma proposta de alteração da legislação laboral sob a forma de proposta de lei e não sob a de pedido de autorização legislativa.
Com efeito, todos temos o direito e o dever de nos pronunciar sobre essa matéria, pois ela é demasiado sensível para passar ao lado da Assembleia da República. No entanto, como o Sr. Deputado bem vê, não obtemos resposta relativamente a ela. E o álibi continua.
Na verdade, o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro do Trabalho não se cansam de invocar a rigidez da legislação laboral como argumento justificativo das suas incapacidades para criar mais postos de trabalho.
Compreendemos as dificuldades que existem para os criar, compreendemos as dificuldades existentes para aumentar o emprego ou diminuir o desemprego, mas o que não se deve apresentar é esse tipo de álibis, como é o da necessidade de revisão da legislação laboral, que não justifica rigorosamente nada, funcionando apenas como mera desculpa.
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Referiu, depois, as medidas avulsas, o que também tive oportunidade de referir.
Sr. Deputado Miranda Calha, penso que o Governo está, de certa forma, «desnorteado», como há pouco um Sr. Deputado do PSD dizia a nosso e a vosso respeito.
O Governo quer tomar muitas medidas, quer fazer muito e acaba por tomar medidas avulsas, perfeitamente desenquadradas, sem qualquer ligação às necessidades mais prementes dos jovens portugueses - vide o caso «cartão-jovem»... !
Noutros países, nomeadamente em França, o cartão-jovem tem um outro peso que cá não tem (em França o cartão-jovem é algo diferente do que é cá) e, de certa forma, está já a redundar num fracasso.
Veja-se esse exemplo e veja-se qual a ligação que isso tem com as carências mais profundas dos jovens portugueses que não têm dinheiro para fazer compras, apesar dos descontos que o cartão jovem propicia.
Risos do PSD.
Srs. Deputados, se têm dúvidas, deveriam ter-se inscrito para me formular pedidos de esclarecimento e eu teria todo o prazer em responder-lhes!...
Agora, por favor, respeitem o meu tempo de intervenção.
Aplausos do PRD.
Sr. Deputado Miranda Calha, há pouco ouvi uma afirmação por parte do Sr. Deputado Carlos Coelho que apontava para o facto de, através desses programas, não se pretender criar postos de trabalho, com o que estamos inteiramente de acordo.
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O que se passou foi que o Governo criou nos jovens a expectativa de que isso se iria traduzir num posterior emprego.
É óbvio que se trata de medidas importantes e ninguém lhes retira o mérito. No entanto, não vão resolver o problema, pelo que não se devem criar expectativas onde elas não podem existir.
Sr. Deputado Horácio Marçal, em primeiro lugar, quero agradecer-lhe a amabilidade das palavras que me dirigiu.
Compreendo que o barulho que se fazia sentir na sala tivesse sido uma dificuldade a que se compreendesse a minha intervenção. No entanto, será com todo. o prazer que lhe darei uma fotocópia da mesma.
0 que eu disse foi que, se o desemprego não tivesse as proporções que tem e se víssemos possibilidades de, a curto prazo, ele vir a diniinuir, nunca aprovaríamos estes projectos.
Consideramos que é mau que, no seu início de vida, o jovem seja colocado na dependência do Estado, pois pode, efectivamente, criar-se uma mentalidade assistencial e somos contra isso. Contudo, há que ver os graves problemas com que vivem muitos jovens, alguns deles já com encargos familiares sem que consigam arranjar emprego.
Para minorar os problemas desses jovens em concreto é que consideramos que, do mal o menos, e lhes deve atribuir algum dinheiro, por forma a minorar as suas graves dificuldades. Mas o que é certo é que isto não resolve o problema; não é uma medida de combate ao desemprego. Com isto, o que se pretende é minorar os problemas, dos jovens.
Disse-me ainda o Sr. Deputado Horácio Marçal que não apresentei soluções de fundo. Não apresentei não sou obrigada a fazê-lo nem, por certo, se esperaria que o fizesse numa intervenção de tão escassos minutos.
Esperamos que o Governo, apresente essas soluções e o Sr. Deputado ouviu tão bem, quanto eu que, quando perguntei ao Sr. Deputado Carlos Coelho quais as medidas concretas que este governo tem, as quais pedi que fossem apresentadas aqui na Assembleia antes de o serem à comunicação social, o Sr. Deputado Carlos Coelho limitou-se a não responder.
Aplausos do PRD.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada, já referi várias vezes que não ,é a mim, mas, sim, ao Governo, que compete fazer isso!
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, desejo
interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, desejo
perguntar à Mesa se o Governo está inscrito para intervir sobre esta matéria, porque há assuntos que podem estar relacionados com ela e, primeiro, gostaríamos de ouvir o Governo.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para intervir sobre esta matéria está inscrito o Sr. Secretário de Estado da Juventude, que, seguindo a ordem das inscrições, usará da palavra depois do Sr. Deputado José Apolinário.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.
O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Segundo o Instituto Nacional de Estatística, em Portugal mais de 500 000 cidadãos estão desempregados, dos quais mais de 50 % tem menos de 25 anos e, se o limite de idade passar para os 30 anos, essa percentagem atingirá os 70%.
A propósito da questão do desemprego, a comunicação social confrontou-nos mais uma vez com bom básticas declarações dos nossos governantes, já aqui glosadas por diversos oradores, de entre as quais aquela em que o Sr. Primeiro-Ministro, de uma forma paternalista, distante, desconhecendo a realidade concreta, incapaz de compreender a juventude, veio a público dizer que isso de subsídio de desemprego era uma coisa terrível, que, afinal, só ia dar dinheiro aos jovens para comprarem droga.
Pois é, na óptica de Cavaco Silva todos os partidos, à excepção do PSD (e da JSD) estariam imbuídos de tão perniciosas intenções ao defenderem a concessão de subsídio social de desemprego para os jovens.
Nesta, como, noutras matérias; o PSD e o Governo são largamente minoritários e esta é apenas mais uma prova do isolamento do PSD perante tais problemas da juventude.
O PSD e a JSD estão aqui isolados e, insensíveis perante os anseios da juventude. O que aqui se assinala é a derrota do PSD e do Governo sozinho e minoritário no quadro parlamentar. O que aqui se consagra é a incapacidade do PSD em olhar de frente os jovens portugueses. O Governo, o PSD e a JSD revelam-nos mais uma vez que estão de costas voltadas para a juventude, refugiando-se no eleitoralismo fácil e no populismo, preparando o terreno, tentando manipular a juventude, na perspectiva de eleições antecipadas.
Procuram, em suma, através da publicidade - às vezes enganadora - e da comunicação social fazer crer que estão a fazer o que de facto não se faz.
Por outro lado, Cavaco Silva não é capaz de entender a juventude; fala de diálogo, mas exagera no paternalismo; fala na responsabilidade dos jovens, mas esquece-se logo a correr e revela falta de confiança e desconhecimento da juventude portuguesa.
Vozes do PSD: - Muito mal!
O Orador: - O emprego, o acesso à formação profissional e ao trabalho, eis as nossas principais preocupações. Tal objectivo implica necessariamente uma, política visando reduzir o desemprego, preparando o País para, os desafios da modernidade, reformulando a estrutura produtiva, descentralizando e regionalizando a sua implementação. Tal implica, ainda, um adequado enquadramento da formação profissional, o lançamento
de acções de criação de emprego para jovens, com estabilidade e sem recursos a contratos a prazo, subemprego e trabalho sem contratos, o apoio e incentivo ao investimento nas novas tecnologias, nas iniciativas locais de emprego, no associativismo e cooperativismo, no domínio empresarial, agrícola e das pescas, só para salientar algumas pistas.
A criação de condições para o aumento substancial dos estágios de integração em postos de trabalho e uma correcta avaliação e racionalização das verbas gastas com base no Fundo Social Europeu, eis outros aspectos a considerar.
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Nesta perspectiva de uma política de emprego que privilegie a inserção social da juventude, assumem ainda papel de destaque os sindicatos, numa visão de defesa global do emprego e não apenas dos seus associados, negociando contratualmente cláusulas favoráveis à integração dos jovens. E, aqui, nas iniciativas de modernização, de implementação de uma visão de desenvolvimento que privilegie o emprego, merecem que se faça o destaque às estruturas sindicais que têm a ousadia de ver mais adiante.
Pelo contrário, na política do Governo, na política deste governo, não se privilegia o emprego. As poucas medidas voltadas para a criação de emprego que se têm tomado, independentemente dos problemas de eficácia, abrangem números irrisórios confrontados com os meios financeiros investidos. Na formação profissional os meios disponíveis não têm contribuído para a criação concreta de emprego.
No nosso país caminhamos rapidamente, demasiado rapidamente, para a sociedade dos dois terços. Dois terços da população têm acesso a mínimos de bem-estar social, a meios de formação, a informação. Um terço da população debate-se com maiores dificuldades, confrontando-se com problemas de inserção social. Ora, a juventude constitui o estrato etário em que precisamente se reflectem as maiores dificuldades de inserção. Daí que a atenção para a iniciativa juvenil seja plenamente justificável.
Para nós não se trata de mendicidade para os jovens. Os jovens não são mendigos nem pedem caridade. Trata-se de uma questão de solidariedade e justiça social. Inserir os jovens é uma tarefa de toda a sociedade, cabendo o papel de protagonistas aos jovens.
O subsídio de desemprego para jovens não vai, certamente, resolver o problema do emprego, mas é uma resposta política de solidariedade, de atendimento às situações sociais mais degradantes, de prevenção perante o recurso a fenómenos associais.
Importa, aliás, conhecermos o que noutras áreas se tem feito para a ajuda a pessoas sem emprego.
A protecção no desemprego cobre apenas cerca de 30 % dos desempregados e, por outro lado, a ocupação para os titulares das prestações de desemprego ocupou em 1986 apenas 300 trabalhadores e os programas ocupacionais e sazonais abrangeram 5000 pessoas.
O Partido Socialista baseia a sua posição na justiça, na fraternidade, na solidariedade social. Aquando da discussão do Orçamento de Estado para 1987 o PS tomou a iniciativa de propor uma verba para subsídio social aos jovens à procura do primeiro emprego. O PSD votou contra. Quis a maioria desta Assembleia que os jovens tivessem o direito ao subsídio social para jovens.
O PS apresentou um projecto de lei estabelecendo critérios de atendimento a situações sociais mais dramáticas. A solidariedade social, como a entendemos, assim nos obriga.
Consideramos ainda que se trata de casos tendencialmente transitórios, porque, para nós, os jovens a quem seja concedido o subsidio social de desemprego têm prioridade no acesso a cursos de formação profissional. Assim, para nós, o que é fundamental é a formação profissional e a criação de emprego.
Quanto à posição do Governo, não a conheço, pelo que sobre ela não me posso pronunciar em detalhe. Pela leitura dos jornais parece-nos que o Governo tomou uma iniciativa de cariz diferente. É claro que o Governo tem meios de divulgação diferentes dos deste próprio debate, mas, por experiência passadas - como, por exemplo, no caso do crédito à habitação para jovens -, entre o que o Governo diz e a realidade, normalmente, é grande a diferença.
Mas, se a iniciativa do Governo é a de um subsídio de inserção, então como enquadrá-la financeiramente no quadro dos subsídios ao emprego e desemprego?
Daquilo que sabemos, a solidariedade e a justiça social não são consagradas no diploma do Governo. O Governo e o PSD defendem uma política de caridade. O PS defende uma política de solidariedade social.
Ao longo destes dias, o Governo mais não tem feito que procurar deitar poeira para os olhos dos jovens portugueses.
Nesta como noutras matérias, assumimos uma posição construtiva.
Os jovens e os seus problemas existem hoje e não só apenas nos homens do amanhã.
Os problemas existem hoje e exigem um diálogo entre os jovens.
Nessa perspectiva, temos defendido e temo-nos batido por esse diálogo.
Uma pedra no quadro global de política de emprego é como definimos este projecto de lei sobre subsidio de desemprego.
E este projecto de lei é também consensualmente considerado nesta Assembleia (à excepção do PSD, que teima em ficar isolado, nesta como noutras matérias, perante os anseios da juventude portuguesa) como uma pedra no quadro da construção de uma alternativa à política de emprego deste governo, no quadro da construção de uma política de emprego dirigida à juventude.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Poças Santos e Mário Maciel.
Tem a palavra o Sr. Deputado Poças Santos.
O Sr. Poças Santos (PSD): - Sr. Deputado José Apolinário, estranhei imenso que o Sr. Deputado começasse a sua intervenção de modo tão desabrido, tentando dizer que a JSD, o PSD, o Governo, são minoritários, são isolados, tentando atirar-nos para um canto desta Assembleia.
O Sr. Deputado fez isso e quase que o fez de uma maneira menos correcta para com uma organização juvenil como é a nossa e como o é aquela a que o Sr. Deputado preside. Mas compreende-se que o tenha feito por que a JS sabe que a JSD é maioritária no seio da juventude portuguesa, que a JSD tem uma posição maioritária no movimento associativo estudantil e no seio de outros movimentos de jovens.
Aliás, o Sr. Deputado estará lembrado do discurso de encerramento que proferiu no Congresso da JS, no qual reconheceu indirectamente esse lugar de primazia da JSD no contexto nacional.
O Sr. José Apolinário (PS): - Não é verdade!
O Orador: - Devo dizer-lhe que o Governo é apoiado pela JSD, que é parte integrante do PSD, e que tem muita honra disso.
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A JSD só aumenta ainda mais o seu espaço de manobra por apoiar o Governo de uma maneira construtiva, como ainda há pouco o meu companheiro Carlos Coelho aqui fez, apoiando as medidas positivas deste Governo e criticando junto dos órgãos de poder onde a JSD está presente, como é o caso desta Assembleia, quando tal se torne necessário.
O Sr. Deputado, tal como todos os outros Srs. Deputados que pertencem à Comissão Parlamentar de Juventude, sabe bem qual é a postura dos deputados da JSD nessas matérias, postura essa que, em primeiro lugar, tem em vista defender os interesses da juventude portuguesa, e não, como o Sr. Deputado quis defender aqui, uma posição seguidista em relação, ao Governo.
Aliás, é sintomática a maneira como o Sr. Deputado se referiu aqui, dizendo sempre, «nós, do Partido Socialista», sem se referir ao facto de pertencer à Juventude Socialista, que aqui representa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado, se de hoje para amanhã estivesse na base de apoio de um Governo, era capaz de fazer (como a JSD tem feito até agora) a intervenção crítica, construtiva, ao Governo? Ou será que, tal como no passado, se calaria, e só elogiaria o Governo do Partido Socialista, sem tomar uma posição como a que sempre tomámos sobre esta matéria?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, igualmente para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Deputado José Apolinário, gostaria de perguntar-lhe, em primeiro lugar, se reconhece ou não que, em relação aos outros governos, o actual governo marcou uma atitude de maior preocupação perante a juventude portuguesa e que tem actuado na prática em defesa dessa juventude.
Lembro-me de que o discurso das organizações defensoras dos interesses da juventude antes do actual governo era no sentido de reivindicar que se fizesse algo em defesa dos jovens. Hoje esse discurso já é completamente diferente: critica-se aquilo que está a ser feito em prol da juventude.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É uma atitude muito diferente, Sr. Deputado!
Reconhece ou não que, relativamente aos governos anteriores, este governo está, efectivamente, a fazer algo pela juventude?
A Juventude Socialista vem aqui arvorar-se em única e legítima defensora da juventude portuguesa, como se fosse a maior organização de juventude, não querendo reconhecer a sua pequenez em relação à JSD. Gostaria de perguntar o que é que a Juventude Socialista fez junto dos governos, que até eram da sua cor política, para, por exemplo, implementar uma estrutura, que está a ser eficaz, como a Secretaria de Estado da Juventude. Conseguiu implementá-la? Não! Mas a JSD fê-lo e com grandes benefícios para a juventude portuguesa.
Finalmente, pergunto qual é a base social de apoio que lhe confere legitimidade para falar com a largueza e o à-vontade com que aqui falou. A Juventude Socialista não está praticamente em nenhuma escola secundária portuguesa, a Juventude Social-Democrata detém a maioria das escolas, e, portanto, pergunto-lhe qual é a legitimidade que lhe dá essa largueza e esse à-vontade de explanação neste hemiciclo.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário, a quem informo que, apesar de o seu grupo parlamentar apenas dispor de um minuto, a Mesa lhe concede mais um para, telegraficamente, poder responder.
O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Responderei primeiro a uma questão pontual, que é a de representatividade de que falou o Sr. Deputado Mário Maciel.
Creio que há aqui um equívoco: é que nós não fazemos a contabilidade das muitas ou poucas bandeirinhas no quadro dos mapas das sedes dos partidos para saber se temos muitas ou poucas associações de estudantes. A questão está naquilo que são as aspirações, os anseios e as preocupações dos jovens portugueses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nessa matéria não tenho nenhuma dúvida de que aquilo que defendemos são os sentimentos e as posições da maioria dos jovens portugueses...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ..., enquanto o que os Srs. Deputados defendem é o sentimento da minoria dos jovens portugueses. Isto porque é uma minoria instalada na vida que negoceia com o poder para ver se consegue ou não uma Secretaria de Estado da Juventude, mas que não é capaz de resolver os problemas da juventude portuguesa.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Permite-me que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Desculpe, mas não posso porque tenho tempo limitado.
Por outro lado, quero dizer-lhe que também saudamos, nos congratulamos, por se ter criado uma estrutura própria como a Secretaria de Estado da Juventude. O que criticamos é que essa Secretaria de Estado passe a ser apenas o cartão de identificação panfletário - é assim que é designado - de tudo o que signifique a divulgação de informação para a política de juventude. A Secretaria de Estado da Juventude é, assim, como que a empresa que faz o patrocínio em termos de marketing da propaganda do Governo para a juventude.
Relativamente à questão das medidas, penso que é natural e salutar que se tenham tomado algumas medidas positivas para a juventude. Não o contestamos, pois estamos numa posição de crítica construtiva. É, portanto, natural que isso surja porque hoje os meios são diferentes e porque também é diferente a situação conjuntural e financeira do País, como, de resto, todas as pessoas que percebem disto reconhecem. Srs. Deputados, só não vê quem não quer!...
Falou-se também aqui da questão do apoio ou não da JSD.
Bom, a JSD, devido a ter aqui uma série de deputados, criou durante alguns anos nesta Assembleia a ilusão da crítica construtiva e de que tinha um posi-
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cionamento autónomo perante o partido. Mas eu desafio os Srs. Deputados da JSD a indicarem-me uma única posição pública assumida pela JSD de crítica à política de juventude deste governo. É que é assim que se prova a realidade, Srs. Deputados, porque, de resto, o que estão a fazer aqui mais não é do que a aprender rapidamente com o Prof. Cavaco e Silva a publicitar aquilo que não existe!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude.
O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Couto dos Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desemprego juvenil constitui nas sociedades modernas um dos mais graves problemas sociais, e em Portugal, ainda que a dimensão deste problema seja comparativamente menor do que a registada em alguns outros países europeus, verifica-se que o desemprego de jovens é hoje um dos problemas que mais desafia a nossa capacidade de intervenção e de bom senso.
Feito o diagnóstico, detectam-se várias causas para esta situação, nomeadamente a queda brutal no investimento que ocorreu em anos que não estão longe, a rigidez da legislação laboral, que coloca os jovens indefinidamente numa lista de espera e que cada vez mais retarda a sua entrada na vida activa, as rápidas evoluções tecnológicas com novas exigências ao nível do mercado de trabalho e as insuficiências na resposta às necessidades de formação profissional face a esta evolução tecnológica.
O combate ao desemprego juvenil passa pela adopção de medidas que permitam soluções sustentadas e permanentes, ou seja, que promovam o investimento, revitalizando as empresas já existentes e promovendo o aparecimento de outras; pelo apoio às iniciativas lançadas pelos jovens que criem novas oportunidades de trabalho; pelo reforço da confiança entre empregador e empregado, através de uma nova legislação laboral, e ainda pela formação profissional, valorizando os recursos humanos mais jovens.
As despesas com formação profissional e apoio às iniciativas dos jovens são humanamente preferidas, socialmente mais justas e rentáveis do que a atribuição de um subsidio de desemprego tout court. Através das primeiras o Estado aposta na criatividade e potencialidade da nossa juventude, dando-lhe uma ferramenta para enfrentar o futuro; através das segundas o Estado promove a apatia, a demagogia, e introduz no jovem a mentalidade assistencial, tornando o Estado paternalista.
A atribuição de um subsídio de desemprego, nos termos em que está a ser proposto nesta Câmara, seria altamente nociva para os jovens e teria graves consequências económicas, sociais e culturais. Passo a explicitar: económicas porque as verbas necessárias para a concessão de tal subsídio desencadeariam um significativo agravamento do desequilíbrio das contas públicas. Tal tipo de medidas contraria frontalmente a estratégia de redução gradual do défice do Estado, agravando o desequilíbrio na economia e comprometendo o desenvolvimento, na medida em que reduziria os meios financeiros disponíveis para o investimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A adopção de tal medida teria ainda consequências sociais porque colocaria pais e avós contra filhos e netos.
0 Sr. Rogério Moreira (PCP): - E bisnetos ...
O Orador: - Com efeito, tendo os primeiros trabalhado a vida inteira e recebendo uma pensão inferior àquela que os segundos receberiam através do subsídio proposto sem nunca terem tido uma actividade, estaríamos a fomentar na prática a injustiça social ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... e a colocar largas camadas da população contra os jovens.
Não será esta uma forma subtil de destruir a política de juventude que o Governo tão empenhadamente tem vindo a construir?
Estamos todos empenhados e de acordo em considerar a resolução dos problemas de algumas camadas de jovens que lutam com carências económicas. O Governo tem-no feito, mas com medidas realistas, exequíveis, que geram a esperança e a adesão dos jovens. A adesão dos jovens deve ser espontânea e não demagógica, e todos sabem qual será a reacção dos jovens a uma medida destas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Teria ainda consequências culturais, porque seria propor o inverso daquilo que a juventude portuguesa tem vindo a reclamar e seria contrário ao sentido de solidariedade social e de responsabilidade que os jovens já por várias vezes demonstraram em Portugal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os jovens querem que «os ensinem a pescar e não que lhes ofereçam o peixe cozido».
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os jovens têm direito à opção, à definição do que deve ser o seu futuro e, como dizia há dias a Sr.ª Deputada Maria Santos, também têm direito à diferença.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A solidariedade que todos nós devemos aos jovens - uma solidariedade civilizada - impõe a criação de condições de modo que cada um tome as decisões que lhe dizem respeito, numa atitude de grande responsabilidade social.
É com este propósito que o Governo tem vindo a tomar uma série de iniciativas para os jovens, que, em 1987, permitirão que mais de 170 000 jovens tenham a oportunidade de fazer cursos de formação profissional, participar em programas de inserção na vida activa, ter experiências profissionais e passar pela aprendizagem. Muitos jovens terão à sua disposição financiamentos para iniciar a actividade empresarial quer no sector agrícola quer no sector industrial.
Desenvolveram-se ainda medidas de incentivo à celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado e muito recentemente foi criado um incentivo - e sublinho um incentivo - de inserção dos jovens na vida activa. E aqui quero frisar bem a diferença entre o subsídio e o incentivo.
Mantendo o princípio da solidariedade e justiça social, especialmente para com aqueles jovens cujas famílias dispõem de escassos recursos, o Governo
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propôs-se minorar a situação dramática com que alguns jovens se debatem, assegurando-lhes condições para prosseguirem as suas iniciativas, repito, de inserção profissional - portanto, não os abandona à sua sorte durante os períodos difíceis de busca de oportunidade - e melhorarem o seu nível de formação para
o exercício de uma actividade profissional.
Neste sentido, o Governo dá especial atenção aos desempregos de longa duração, estabelecendo para eles prioridade no acesso à formação profissional e a programas de experiência profissional para a juventude.
O Governo está preocupado em inserir os jovens na vida activa e não em incentivá-los a ficarem em casa à espera de um subsídio com um cariz paternalista.
O Sr. António Mota (PCP): - Arranjem emprego para a juventude!
O Orador: - É neste quadro que o Governo manifesta a sua discordância em relação à proposta de atribuição de subsídio de desemprego aos jovens aqui apresentada e em discussão. Devo mesmo dizer que, se o decreto-lei que o Governo do bloco central fez sair no sentido de atribuir subsidio de desemprego a jovens não tivesse sido suspenso nessa altura, como foi, não sei onde é que agora estariam esses jovens.
Falou-se aqui em política de juventude, mas pergunto que autoridade têm alguns jovens para falar nesta Câmara se, quando no Governo do bloco central, fizemos um trabalho na Comissão Interministerial de Juventude, da qual era membro, nem esse trabalho queriam receber. Onde é que está essa política de juventude?!
Vozes do PSD: - Muito bem !
O Orador: - Srs. Deputados, o problema da atribuição do subsidio não está no montante de 7 500$, de 15 000$ ou de 20 000$; o problema é o da filosofia, e esta é que é a questão de fundo.
Protestos do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O subsídio de desemprego é, em si mesmo, uma forma de prolongar o desemprego dos jovens porque dirigido a um grupo muito restrito, quando são os jovens cerca de 2 milhões e todos eles podem vir a estar na mesma situação.
Discute-se o pormenor e esquece-se o essencial. Os problemas de emprego não de resolvem com este tipo de medidas.
Por que se esquece a legislação laboral ou, antes, por que é que se está contra a sua revisão? E não me venham com a história de que o Governo não apresenta propostas, porque já o fez mas recusaram-nas!
Por que se levantam tantos obstáculos à reestruturação do sector empresarial do Estado? Por que se bloqueiam todas as medidas estruturais que o Governo apresenta e que gerariam, por si só, confiança no sistema económico, reforçariam a actividade económica e, certamente, criariam mais postos de trabalho para jovens?
Aqui fazia uma referência a alguns dados estatísticos que aqui foram apontados. As taxas de evolução da actividade no que diz respeito à população jovem cresceram em 1986, bem como a criação de postos líquidos de trabalho. Isto é apenas para complementar os dados estatísticos que ouvi e que não sei donde
vieram.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Os problemas dos jovens são um assunto muito sério, que não pode, nem deve, ser discutido no plano emocional ou no da busca desenfreada da captação de votos. Os jovens merecem-nos respeito, solidariedade e consenso nacional. E se alguém tem outras soluções, que as avance, pois o Governo está aberto ao diálogo. Mas o problema, Srs. Deputados, é que não as têm, porque senão apresentavam-nas muito claramente. O que se assiste é à apresentação de um conjunto de linhas de orientação política que «faz» manchetes nos jornais mas que é de difícil exequibilidade prática.
Vozes do PSD:.- Muito bem!
O Orador: - E esta discussão, Srs. Deputados, é um exemplo disso. À falta de ideias e de imaginação, vai-se pelo mais fácil. Quantas medidas para os jovens poderiam ser discutidas nesta Câmara? Mas não, caminhou-se para a mais fácil, para aquela que não exige imaginação, que não exige trabalho: - um subsídio. Porque ele, o Governo, faz a gestão e dar um subsídio é simples, é só determinar o montante.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, farei duas observações. Dizem que o Governo não tem uma política de juventude, mas, ao criticarem o Governo, listam sempre uma série de medidas. Aqui há uma contradição: falam muito em política de juventude, mas nunca a explicitaram. O que será essa política de juventude? Aguardemos, porque com o tempo que levam a produzi-la, certamente vai surgir uma política de juventude muito «inovadora» e, nessa altura, eu próprio, como membro do Governo responsável por este sector, estarei à vossa disposição para a discutir. Oxalá ela seja inovadora!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, subscrito por deputados do PCP e do PS, um requerimento sobre a continuação dos nossos trabalhos que é do seguinte teor: «Ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, requer-se o prolongamento da sessão pelo período necessário até ao termo de debate.»
Esclareço que são já poucos os tempos disponíveis para as diversas bancadas e que, de facto, me parecia ...
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, agradecia que nos esclarecesse sobre qual é o tempo disponível, aproximadamente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dispomos ainda de 30 minutos.
Srs. Deputados, vamos votar o requerimento.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Ana Gonçalves, Tiago Bastos, José Apolinário, Jorge Patrício e Miranda Calha.
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De entre estes há alguns Srs. Deputados cujo partido já não dispõe de tempo de intervenção, tendo este sido cedido por outros partidos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, a quem informo que há dois pedidos de palavra de deputados do seu partido e que dispõem apenas de quatro minutos.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Presidente, o CDS concedeu-nos três minutos. Como nós tínhamos dois minutos, ficámos com cinco minutos. Por isso, peço-lhe, Sr. Presidente, que rectifique o tempo de que o meu grupo parlamentar dispõe.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada. Tem V. Ex.ª a palavra.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Secretário de Estado da Juventude, lamento dizê-lo - já estou habituada e por isso não devia estranhar -, mas não o reconheço quando vem ao Parlamento.
Lamento dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, até pelo respeito que lhe tenho, mas de uma pessoa calma e dialogante que me habituei a ver em si em reuniões da Comissão, apresenta sempre aqui uma imagem exaltada, politiqueira no mau sentido e altamente demagógica.
Vozes do PRD: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Não apoiado!
A Oradora: - Srs. Deputados do PSD, também era melhor que me apoiassem!
Sr. Secretário de Estado, lamento ter de lhe fazer aqui algumas críticas, que implicam, obviamente, um pedido de esclarecimento.
Refere-se o Sr. Secretário de Estado à rigidez da legislação laboral e à necessidade de a alterar. Decerto, ouviu-me há pouco fazer a destrinça entre os vários sentidos que pode revestir esta afirmação.
Peço-lhe que esclareça a Câmara sobre aquilo que entende por revisão da legislação laboral.
Mais adiante, afirmou que não vale a pena estarmos a desafiar o Governo, porque o Governo já aqui apresentou propostas.
Lembro-lhe, Sr. Secretário de Estado - decerto está desatento -, que o Governo não apresentou qualquer proposta de lei, mas sim um pedido de autorização legislativa, o que é profundamente diferente.
O Sr. Secretário de Estado referiu que a atribuição de um subsídio de desemprego tem graves consequências. Dispenso-me de comentar as económicas, que dependem exclusivamente da vontade do Governo, e passo às sociais.
Diz que vai voltar pais e avós contra filhos e netos, porque estes passariam a receber mais do que os primeiros.
Sr. Secretário de Estado da Juventude, qual é a bitola do Governo? É a bitola mais baixa, é a de retirar direitos? É a de medir tudo pelos mais desprotegidos?
Sr. Secretário de Estado, não quero acreditar que seja esse o seu juízo. Se alguma coisa está mal, é a miséria das pensões e das reformas atribuídas aos pais e avós.
0 Sr. Rogério Moreira (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Não é, decerto, aquilo que se vai atribuir aos filhos e aos netos.
Por amor de Deus, penso que o Sr. Secretário de Estado tem uma mentalidade evoluída...
Uma voz do PCP: - É evidente que não tem !
A Oradora: - ... e que, portanto, não pretende estar a nivelar tudo pelos critérios mais baixos de protecção social.
Depois, referiu a demagogia que esta Câmara está a pretender fazer.
Sr. Secretário de Estado, francamente, gostaria de perceber esta sua afirmação. Para si demagogia é estarmos hoje aqui a discutir democraticamente três projectos de lei sobre esta matéria, com a liberdade de, por exemplo, o meu grupo parlamentar apresentar algumas dúvidas e expor algumas reticências em relação a este tipo de subsídios?
O Sr. Secretário de Estado faz parte de um governo, que exactamente há oito dias decidiu atribuir um subsídio de 7500$, embora não lhe chame subsídio de desemprego e prefira chamar-lhe pomposamente «subsídio de integração na sociedade». Bom, então, proponho que se passe a chamar ao subsídio de desemprego «subsídio de reintegração social».
Uma voz do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Secretário de Estado, francamente, a demagogia é vossa e a corrida..., enfim..., aos louros para apresentar em eleições é vossa.
Foi uma jogada de antecipação do Governo - mais uma -, mas que decerto não escapará à opinião pública.
Depois, devo dizer-lhe que os jovens não querem «o peixe cozido»; querem é « a cana de pesca» - em sentido figurado, claro.
Mas, Sr. Secretário de Estado, o que é lamentável é que nem a cana de pesca nem o peixe cozido são dados. Talvez as espinhas, não? É só o que o Governo lhes dá!
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, está a consumir o tempo do seu colega.
A Oradora: - É a última questão, Sr. Presidente.
Devo dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado - e muitas outras seriam as questões a levantar -, que lamento tê-lo ouvido aqui a repetir o discurso que o Primeiro-Ministro tem proferido sobre esta matéria.
Efectivamente, diz que este subsídio de desemprego vai incentivar o abandono escolar, o abandono da casa, o consumo das drogas, etc. Ó Sr. Secretário de Estado, uma pessoa que aposta tanto na juventude como o senhor, não devia fazer este juízo sobre os jovens portugueses, não acha?
Aplausos do PRD.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Apolinário, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Secretário de Estado, a sua intervenção tem dois aspectos semelhantes a intervenções que já temos ouvido nesta Assem-
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bleia, proferidas por pessoas que normalmente só falam da juventude quando começam a contabilizar os votos para as eleições, designadamente pelo Sr. Primeiro-Ministro. E tais intervenções são muito próximas pelo seguinte: em primeiro lugar, porque veio aqui fazer a crítica sobre a actividade ou não actividade da Assembleia - ao bom estilo do Prof. Cavaco Silva - e, por outro lado, introduz uma questão que não tem o mínimo de senso e que é a dos conflitos sociais.
Este Governo é um Governo que teima em vir à Assembleia levantar conflitos sociais inexistentes. Este é o Governo que aqui veio dizer que os jovens não podem receber subsídio de desemprego por causa dos avós. Mas, Sr. Secretário de Estado, afinal o que é isto?
Uma voz do PSD: - O Sr. Deputado está muito fogoso!
O Orador: - Há algumas questões muito concretas que gostaria de colocar, relacionadas com os números que apresentou e com a evolução do emprego e do desemprego.
É ou não verdade que a população activa baixou entre 1984 e 1986?
É ou não verdade que entre 1984 e 1986 continuaram a atingir a idade da vida activa muitos jovens?
É ou não verdade que o Governo teme que a eventual abertura desse processo, com a necessidade de inscrição nos centros de emprego, implique um aumento da taxa de desemprego e seja talvez nocivo em termos eleitorais?
É ou não verdade que esta questão está a ser colocada, por esse prisma, apenas numa perspectiva de contabilidade estatística para fins eleitorais?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Bastos.
O Sr. Tiago Bastos (PRD): - Sr. Secretário de Estado, gostei muito de o ver hoje tão «fogoso» naquela bancada. Gostava de conseguir falar tão desembaraçadamente de coisas em que não acredito... !
Quero perguntar-lhe se o Sr. Secretário de Estado está satisfeito com o que tem feito, se acha que, pela via que está a seguir, vai conseguir acabar com o desemprego juvenil.
Está satisfeito quando promove medidas de gabinete e depois fica surpreendido quando lhe explicam que as suas medidas não servem para nada?
Fica satisfeito quando tenta convencer os jovens dos OTJ's de que vão conseguir emprego e eles depois vêem que não conseguem?
Está satisfeito por gizar uma linha de crédíto para a habitação dos jovens e depois lhe explicam que não têm casa para esse crédito e o Sr. Secretário de Estado fica surpreendido?
É esta a grande política do Governo para combater o desemprego juvenil? É por isso que os subsídios de desemprego são ineficazes e contraproducentes? É esta política «maravilhosa» que vai conseguir acabar com o desemprego juvenil? Ou será que o Sr. Secretário de Estado vai continuar a fazer discursos destes e a tomar medidas destas como se fossem os novos contos de fadas dos anos 80?
Vozes do PRD: - Muito bem!
Uma voz do PSD: - Dos anos 90!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Patrício, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Normalmente, quando não temos razão exaltamo-nos, gritamos e parece-me que foi aquilo que o Sr. Secretário de Estado da Juventude veio aqui fazer à Assembleia, tentando, mais uma vez, responsabilizá-la por uma coisa de que quem é responsável exclusivo é o Governo. O Sr. Secretário de Estado não pode esquecer que não é a Assembleia da República que pode definir uma política para a criação de postos de trabalho - que eu saiba! Quem tem essa responsabilidade é o Governo.
O que pergunto é que postos de trabalho é que as medidas que o Sr. Secretário de Estado tanto apregoa criaram no sector juvenil. A isto é que era importante que o senhor respondesse. E que respondesse mais: desde que o Sr. Secretário de Estado da Juventude faz parte do Governo do PSD, quantos postos de trabalho juvenil foram destruídos? Também era importante que respondesse a isto.
Criar 2000 postos para despedir 20 000 ou 3000, leva-me a perguntar-lhe se essa é, de facto, alguma política de emprego em Portugal. E ponho esta primeira questão pela simples razão de que vem dizer aqui, na Assembleia da República, repetidamente, que o Governo privilegia a política da criação de empregos à política da concessão do subsídio de desemprego. Mas, Sr. Secretário. de Estado, nisso todos concordamos.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Óptimo! Estamos de acordo!
O Orador: - Há alguém que não esteja de acordo com isso?
O que pergunto é onde estão os empregos, e se o Sr. Secretário de Estado me pode garantir que o Governo está a criar empregos ...
Uma voz do PSD: - Estão a ser criadas condições.
O Orador: -... e que não está a destrui-los.
Os índices que por aí andam, elaborados pelo Instituto Nacional de Estatística, dizem exactamente o contrário. Os despedimentos e o desemprego estão a aumentar, sobretudo no sector juvenil. Esta é que é a realidade.
Outra questão importante é esta: vem aqui também dizer que o Governo é contra a atribuição do subsidio de desemprego, uma vez que isso era uma questão que iria colocar os avós contra os filhos ou os filhos contra os avós, os primos contra as primas, os enteados contra não sei quem, etc., etc. Era pôr a família toda à guerra! ...
Uma voz do PSD: - Isso é entre o MDP/CDE e o PCP que, acontece!
O Orador: - Aquilo que eu gostaria de perguntar é se o Sr. Secretário de Estado, nesta conjuntura, considera que é justa a pensão de reforma que é recebida. É que o Sr. Secretário de Estado faz as contas por baixo em vez de as fazer por cima. E, em vez de aumentar as pensões, considera que o que é necessário é não criar um subsídio mais alto que as pensões.
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Achávamos importante que o Sr. Secretário de Estado pensasse de outra forma, que aquilo que era de facto necessário era aumentar as pensões.
Três questões fundamentais e últimas.
Por que razão é que o Governo não apresentou uma proposta de lei à Assembleia da República e decidiu decretar?
Devo dizer ao Sr. Secretário de Estado que o Governo sabe há já um mês que a Assembleia da República tinha agendado para hoje a discussão desta matéria. Gostava de saber por que razão é que não apresentou uma proposta de lei à Assembleia.
Segunda questão: por que razão é que o Sr. Secretário de Estado da Juventude não apresentou a sua iniciativa legislativa ao Conselho Consultivo da Juventude, para que ele pudesse dar uma opinião sobre essa matéria?
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Interessante essa pergunta!
O Orador: - Terceira questão: continua o Sr. Secretário de Estado (e vai continuar) a dizer que para empregar os filhos é necessário despedir os pais?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.
O Sr. Miranda Calha (PS): - Registo que o Secretário de Estado da Juventude está um bocado nervoso. Está mesmo muito nervoso! ...
Penso que se está a atrasar nos tempos, penso que possivelmente não está a ter capacidade de mostrar serviço e tenho a sensação de que está a ser vitima das suas próprias campanhas de auto-promoção e auto-propaganda.
Unta voz do PSD: - Isso é a cassette!
O Orador: - É pena, porque tinha-o na conta de um bom elemento do Governo, mas, de facto, está a entrar no período da «derrapagem» ...
Queria lembrar ao Sr. Secretário de Estado que a questão de captação dos votos, se tivesse exemplo mais acabado, está, se nós olharmos para a televisão todas as noites, nas sucessivas propagandas e iniciativas governamentais para apresentar medidas que jamais houve em Portugal.
Neste momento, já nem temos sequer uma comissão técnica eleitoral do PSD no Governo; temos é uma agência de publicidade. Qualquer dia, se calhar, também me candidatarei para ver se realmente podem fazer a nossa própria promoção ...
Risos do PS e protestos do PSD.
Queria lembrar o Sr. Secretário de Estado que o seu Governo e o apoio do Grupo Parlamentar do PSD ao seu Governo se traduzem em 29%. O seu Governo não tem 50 %; tem 29 % ! Portanto, tem de vir à Assembleia conversar, dialogar; tem de vir apresentar as propostas, tem de falar das questões que são importantes para a Administração Pública! Não pode, assim, falar como se tivesse 50 %, não obstante o facto de o líder carismático do PSD ir dizendo pela Europa fora que o Governo governa como se tivesse 50%. Com efeito, tem rigorosamente 29 % e não sei se por este andar não começará, de facto, a dar também a volta.
Risos do PSD.
De qualquer modo, queria também dizer ao Sr. Secretário de Estado que este subsídio e a inserção dos 750 000 contos no Orçamento do Estado para 1987 tiveram o apoio de praticamente todas as bancadas do Parlamento. Estavam, portanto, todos errados e só o PSD é que tem razão? ...
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado usou esta questão do subsídio, do incentivo, fez aqui este trocadilho, incentivo/subsidio ... Bem, se for caso disso nós mudamos o nosso «subsídio de desemprego» e passamos a chamar-lhe «incentivo ao emprego» - é rigorosamente a mesma coisa, não há problema.
Vozes do PSD: - Já mudou! Vai mudando!
O Orador: - Porém, esqueceu-se de um pequeno pormenor: não explicou o que era ... Quer dizer, ao menos explique-nos o que é que o Governo apresentou, porque só ouvimos a propaganda feita pelo Governo na imprensa e na televisão e não sabemos o que é concretamente. Portanto, gostávamos de saber. Explique-nos ao menos isso! E com a vivacidade que o Sr. Secretário de Estado colocou na sua intervenção!
O Sr. Rogério Moreira (PCP): - Foi por episódios!
O Orador: - Por outro lado, quanto à questão da legislação laboral, o Sr. Secretário de Estado não está muito informado sobre esta questão.
Ainda há dias o meu partido fez um desafio ao Governo - está aqui o Sr. Secretário de Estado do Trabalho - para que apresentasse as suas propostas de alteração da legislação laboral. No entanto, não tragam cá um pedido de autorização legislativa, porque o que queremos aqui é discutir a legislação propriamente dita.
E aqui lanço de novo o desafio: gostava de saber qual é a resposta dos Srs. Secretários de Estado da Juventude e do Trabalho, isto é, se pensam ou não trazer à Assembleia da República, definitivamente, uma proposta de alteração da legislação laboral, porque esse argumento do Governo tem de acabar. Realmente, para quê encontrar argumentos de justificação para aquilo que não é, afinal, capaz de fazer?
Finalmente, Sr. Secretário de Estado, sobre esta questão dos subsídios de desemprego houve esta proposta - o Governo não ouviu tudo porque não estava cá -, a qual traduz, obviamente, uma iniciativa limitada e bem direccionada àquilo que desejamos. Porém, existem diversos países da Europa ...
Portanto, gostava de perguntar ao Sr. Secretário de Estado - com certeza que lê estas coisas a nível da informação que por aí corre - se está de acordo com a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, que afirma ser isto um apelo à droga. Gostaria de saber se, realmente, concorda com esta intervenção, pois ela é extremamente gravosa e negativa, em termos da juventude portuguesa.
Nós queremos dar um contributo positivo. Todavia, da parte do Governo, há agora, efectivamente - como dizia um deputado do seu grupo parlamentar -, um verdadeiro desnorte. O Governo não é capaz de implementar a mínima medida estrutural, só faz propaganda
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e certamente, que chegará a altura em que será penalizado por aquilo que não fez, por aquilo que desbaratou e por aquilo que, não resolveu.
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PSD: - Muito mal!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude.
O Sr. Secretário de Estado da Juventude: - Começaria por responder à Sr.ª Deputada Ana Gonçalves,
No entanto, gostaria de, antes disso, fazer uma pequena observação. É que o Sr. Deputado Miranda Calha foi muito «fogoso» maneira como disse que eu estava zangado.
Risos do PSD.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Foi da juventude!
O Orador: - Eu Pergunto se, estar zangado é ser capaz de vir cá falar aberta e francamente e enumerar as coisas. Bem, então não sei se tenho de aprender boas maneiras, e, assim sendo, pedirei, depois ao Sr. Deputado Miranda Calha para, me dar algumas lições nessa matéria.
Vozes do PSD: - Muito, bem!
O Sr. Jorge Lacão, (PS): - Bem precisa!
0 Orador: - Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, não sei se, de facto, fui mais, exaltado ...
O Sr. Miranda Calha (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Sr. Deputado, dar-lhe-ei depois um pequeno momento.
Como ia dizendo, não sei se fui, de facto, exaltado; apenas expressei o que senti. E penso que quando se expressa o que se sente, não se pode agir de outro modo.
Quanto à questão da legislação laboral, o Sr. Secretário de Estado do Emprego irá depois falar sobre ela.
Porém, porque me colocou concretamente essa questão, dir-lhe-ei que, quanto a mim, há duas posições extremistas quanto à questão da legislação laboral: de um lado colocam-se os que falam nos contratados a prazo, tema que serve a toda a gente; do outro colocam-se os que dizem «despedir não», o que também serve a toda a gente.
A Sr.ª Deputada conhece, aliás, a minha posição sobre a legislação laboral, pois, numa audiência que tive com a sua organização de juventude, expressei a minha posição de, de uma vez por todas, serem os próprios jovens a desencadear um debate a nível nacional; de serem eles a dizerem: meus senhores; vós, parceiros sociais tradicionais, têm feito um trabalho excelente em função dos trabalhadores, mas chegou a hora de também nós, jovens determinarmos as grandes linhas de orientação, do nosso futuro. E no que diz respeito a legislação laboral, os jovens têm a grande responsabilidade de promover o grande debate de consenso, o qual penso só ser, possível - e desculpem-me - neste plano dos jovens, porque neles eu acredito!
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PCP.
- O Orador: - Já lá vou, Srs. Deputados ... Afinal, parece que os Srs. Deputados é que estão exaltados! Calma!
Quanto às questões económicas, Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, compreendo-a em parte quando fala em «boa vontade», Contudo, não se pode só contar com a boa vontade, porque senão o País tinha já resolvido os, seus. problemas financeiros.
Vozes do PSD: - Muito bem!
- 0 Orador: - A boa vontade tem limites orçamentais! Há recursos finitos e não podemos dispor deles de qualquer maneira ... !
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Bem, quanto aos «louros», diria que sempre que trabalho para os jovens - digo-o nesta Câmara com toda a honestidade -, a única coisa que me, preocupa é servi-los. Isto porque fui jovem, vivi imensos problemas, nunca tive oportunidades na minha vida, hoje vejo que os jovens continuam a ter os mesmos problemas e penso que, chegou a altura de se fazer alguma coisa por eles!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E se ponho o meu empenho na política de juventude é porque acredito e sei que é necessário fazer mais. Nunca pela minha cabeça passou qualquer intenção de captar votos, pois os jovens merecem muito mais do que isso. Os votos devem ser esquecidos porque os problemas que os jovens vivem hoje exigem de todos nós um grande esforço e um grande consenso.
Aplausos do PSD.
Uma voz do PS: - Demagogia!
O Orador: - Sr. Deputado José Apolinário, queria dizer-lhe que não critiquei a actividade da Assembleia. Longe de mim fazê-lo, pois tenho muito respeito por esta Câmara, a qual é o ponto alto da Democracia em qualquer país. Oxalá que sempre se mantenha pelos anos fora, porque me sentirei feliz.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Muito bem!
O Orador: - O que, fiz foi enumerar alguns casos concretos que aqui aconteceram. Se isso é crítica, Sr. Deputado, assumo-a. Por mim, não pretendi criticar a Assembleia, nem nunca o farei.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quanto aos conflitos sociais, quando o Sr. Deputado faz essa reflexão está, em si próprio, interiormente, já a pensar que isso é um potencial facto que pode acontecer.
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No entanto, não o vamos esquecer, pois pode, de facto, acontecer. E o Sr. Deputado sabe perfeitamente como tem sido difícil, ao longo destes 12 anos, criar e executar uma política para os jovens. Ou será que se esqueceu já de algumas dificuldades, que como jovem certamente encontrou, para se fazer ouvir?
Quanto à população activa, é verdade que em 1984-1985 há um decréscimo - falo de população activa jovem, entre os 14 e os 25 anos. Porém, em 1986, essa população cresceu.
Passaria agora a responder ao Sr. Deputado Tiago Bastos, que me perguntou se eu estava satisfeito.
Penso que a isto nem valeria a pena responder porque, pela minha intervenção anterior, certamente entende que não estou satisfeito. Essa é a grande questão da política de juventude. Gostaria de ouvir os Srs. Deputados sobre o que é que entendem por política de juventude porque ela, em si, é sempre uma política de insatisfação constante, é sempre um horizonte que nunca atingimos.
Por isso, enquanto eu cá estiver, trabalhando até à exaustão das minhas forças, dir-lhe-ei: «Nunca estarei satisfeito».
Aplausos do PSD,
E aqui respondo a uma questão com uma pergunta: já que entrámos no plano filosófico e das teorias quanto às medidas de gabinete, será que este subsídio de desemprego vai criar emprego?
Protestos do PS, do PRD e do PCP.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - E eu pergunto se o Sr. Secretário de Estado ouviu a nossa intervenção!
O Orador: - Porque parece haver uma certa efervescência na bancada do Partido Comunista Português, vou responder já ao Sr. Deputado Jorge Patrício.
Pergunta ele por que é que eu não apresentei o diploma ao Conselho Consultivo da Juventude. O Conselho Consultivo da Juventude reúne de dois em dois meses, tem feito reuniões extraordinárias e há uma ordem de trabalhos que é previamente determinada. O Governo não pode, na área juvenil, estar à espera em determinadas matérias.
Por outro lado, se os Srs. Deputados queriam discutir o diploma propunham-no ao Conselho Consultivo da Juventude - aliás, a exemplo do que faz a Juventude Centrista. Esta apresentou na Assembleia uma proposta sobre artes e ofícios e ao mesmo tempo apresentou-a ao Conselho Consultivo de Juventude para lá ser discutida.
A Sr.ª Anua Gonçalves (PRD): - Dá-me licença, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: - Srs. Deputados, apresentem os diplomas e eles serão certamente discutidos.
Pergunta o Sr. Deputado Jorge Patrício onde estão os empregos.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - O Sr. Secretário de Estado não me deixa interrompê-lo! ...
O Orador: - O Sr. Deputado não lê as estatísticas porque se as lesse ou as confirmasse saberia que houve criação líquida de postos de trabalho em 1986.
Mas aqui gostava de lhe dizer o seguinte: quando fala em criação de emprego, acho que há uma ética e uma responsabilidade políticas.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Fala-se em criar empregos, mas todos sabemos que sem empresas não há emprego e sem confiança não há empresas.
Pergunto: o que é que o seu partido faz - aliás, vêem-se as zonas do país onde isso acontece - para que essas empresas surjam, para que a actividade empresarial surja, para que os jovens dessas zonas tenham emprego?
Protestos do PCP.
Quanto à questão de saber se a pensão de reforma é ou não justa, comparando-a com o incentivo proposto, há duas ordens de razão: a primeira tem a ver com a filosofia que referi há bocado; a segunda tem a ver com o facto de sermos realistas, pragmáticos com o país que somos. É sempre muito bonito dizermos que uns estão abaixo, outros acima, vamos dar a todos. Onde está a capacidade financeira do País? Será que vocês querem condenar o futuro em nome dos mesmos jovens?
Protestos do PCP.
Sr. Deputado Miranda Calha, quanto às «derrapagens» do Governo, não vou pronunciar-me. Talvez seja uma associação de ideias do Ralye de Portugal... Mas não vou pronunciar-me sobre isso! ... Derrapagens, eu não as sinto.
Quanto à propaganda, dir-lhe-ei, Sr. Deputado, que é um facto - e eu cada vez que percorro o país oiço sempre os jovens dizer isso - que há muitas medidas que não conhecemos. Já disse nesta Câmara que um dos problemas fundamentais da juventude portuguesa é a falta de informação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sendo a televisão um órgão por excelência, que entra em casa de toda a gente, por que é que não há-de fazer-se chegar aos jovens os programas a que eles têm direito? Vamos continuar a manter-nos na situação de esses jovens passearem pelos corredores ministeriais pedindo e solicitando as benesses dos amigos? Não, os jovens têm direito a ter todos a mesma oportunidade, seja no norte ou no sul.
E nesta questão de propaganda, diria que...
O Sr. Presidente: - Não se está a ouvir, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Nesta questão de propaganda...
O Sr. Presidente: - Um momento, Sr. Secretário de Estado. Há qualquer avaria no som.
Vozes do PRD: - É «boicote»!...
Risos do PRD.
O Orador: - Nesta questão de propaganda...
Vozes do PS e do PRD: - Não se ouve!
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O Orador: - Mas não posso falar mais alto, ainda que digam que estou exaltado!
Risos.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, faça favor de continuar para verificarmos se o som já está em condições.
O Orador: - Nesta questão de propaganda, diria que a memória é curta para muita gente, e não diria mais nada!...
Não discuto aqui, Sr. Deputado Miranda Calha, se a percentagem que aqui representamos é de 29 % ou de 30%. Apenas sei que, como responsável político por uma área, houve um governo que apresentou um programa, que foi votado. Cabe-me a mim,- perante os portugueses, governar o meu sector e fazer o melhor que posso.
Aplausos do PSD.
O Orador: - Para falar sobre a questão da legislação laboral, se o Sr. Presidente autorizasse, passaria a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
O Sr. Presidente: - Talvez seja melhor interrompermos por uns minutos porque não se ouve.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jerónimo de Sonsa (PCP): - Sr. Presidente, creio que não estão reunidas as condições necessárias para continuarmos o debate. Tendo em conta a instituição em que nos encontramos, proponho a interrupção do debate para o continuarmos posteriormente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Não sei se há acordo no sentido da interrupção do debate, dado que há problemas de som?!
Pausa.
Parece que já há som, pelo que vou dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional (Fernandes Marques): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito rápido, mas, dado que fomos de certa forma interpelados por alguns Srs. Deputados relativamente à questão da legislação laboral, creio que era útil aproveitarmos esta oportunidade para dizer alguma coisa, sem responder
ao desafio que o Partido Socialista fez ao Governo, porque é um desafio como outro qualquer. Eu talvez faça um desafio ao Partido Socialista daqui por um segundo.
Não vou contar toda a história do que se passou
relativamente à discussão nesta Assembleia da proposta de lei de pedido de autorização legislativa que, acompanhado dos textos respectivos sobre três questões importantes, o Governo apresentou. Não há dúvida de que esta Assembleia rejeitou esse pedido, foi uma atitude legítima...
O Sr. Presidente: - Estamos, de novo, com problemas de som.
0 Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, com estas condições, julgo que a interpelação que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa fez há pouco tem toda a pertinência. Portanto, penso que não estão reunidas as condições para continuarmos este debate, com a dignidade exigível.
Podemos talvez continuar o debate amanhã de manhã...
O Sr. Presidente: - Com certeza. Continuaremos o debate amanhã, a seguir ao período de antes da ordem do dia.
Sr. Secretário de Estado, como não há som, não podemos...
O Orador: - Sr. Presidente, de qualquer forma, aquilo que eu iria dizer era muito breve e mesmo sem som, só com o recurso da minha própria voz, talvez pudesse continuar.
O Sr. Presidente: - Se houver consenso, a Mesa não se opõe.
De facto, os tempos estão esgotados.
O Orador: - Diria só que, a respeito da questão da legislação laboral, tendo em conta a posição legítima que a Assembleia da República assumiu relativamente ao pedido de autorização legislativa do Governo, naturalmente que o Governo não ficou de braços cruzados quanto a essa matéria. A exemplo de muitas outras questões importantes para a sociedade portuguesa, nomeadamente para a generalidade dos trabalhadores portugueses, têm vindo estas questões a ser analisadas no âmbito do Conselho Permanente da Concertação Social. Mas eu perguntaria ao PS se, de facto, vai cumprir aquilo que prometeu nas jornadas Parlamentares que recentemente realizou e em que disse claramente que iria tomar a iniciativa de apresentar nesta Assembleia uma proposta de revisão global da legislação laboral.
O PS vai cumprir essa promessa ou não?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Rogério Moreira está inscrito para uma intervenção, no entanto, devido à avaria no sistema do som seria melhor deixá-la para amanhã.
Srs. Deputados, a agenda para amanhã é a seguinte: a sessão começa às 10 horas, havendo período antes da ordem do dia.
A ordem do dia iniciar-se-á com a continuação deste debate de que há apenas uma intervenção muito curta, porque o tempo é pouco.
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Será seguidamente discutido o projecto de lei n.º 343/IV, apresentado pelo PCP, PRD, PSD e PS, sobre «Extinção da enfiteuse ou aforamento», e o projecto de resolução n.º 18/IV.
Às 12 horas serão votados os diplomas que estivemos agora a debater e cuja discussão terminará amanhã.
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 40 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Arménio dos Santos.
Francisco Mendes Costa.
José de Vargas Bulcão.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Partido Socialista (PS):
António Frederico Vieira de Moura.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Paulo Manuel Q. Guedes de Campos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Centro Democrático Social (CDS):
João da Silva Mendes Morgado.
Narana Sinai Coissoró.
Deputado independente:
António José Borges de Carvalho.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Roleira Marinho.
Fernando Monteiro do Amaral.
Luís António Damásio Capoulas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António Domingues Azevedo.
Helena Torres Marques.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António João Percheiro dos Santos.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Partido Comunista Português (PCP):
António Manuel da Silva Osório.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
António José Tomás Gomes de Pinho.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Hernâni Torres Moutinho.
Joaquim Rocha dos Santos.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Declaração de voto enviada è Mesa para publicação e relativa ao voto de pesar pela morte do Professor Paulo Quintela.
Uma palavra breve, simples e comovida para recordar o já saudoso Doutor Paulo Quintela e prestar-lhe o meu preito descolorido de homenagem, respeito e gratidão.
Homem de invulgar estatura moral, democrata coerente desde o berço, professor e humanista, germanista internacionalmente consagrado honrou e prestigiou a sua Universidade, o País e a livre cultura, que abnegadamente serviu. Professor emérito da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tradutor excepcional de, entre muitos, Goethe, Brecht e Rilke, teatrólo ímpar que, entre méritos vários, vivificou Gil Vicente nos nossos palcos.
Para gerações de estudantes e professores foi referencial de integridade, de frontalidade e de tolerância cívica e política. A coerência constante, o rigor ético, a busca conseguida da plena consonância entre o pensamento e o acto tornaram-no incómodo para muitos, admirado por muitos mais, respeitado por todos.
Não tinha contemplações com a mediocridade, a insídia, o farisaísmo que denunciava e castigava com frontalidade e coragem. A amizade, a lisura, a lealdade norteavam, todos os dias, a sua conduta.
Por tudo isto e o mais que não sei dizer, o meu obrigado amigo e mestre Doutor Paulo Quintela.
O Deputado do PRD, Sá Furtado.
Declaração de voto enviada è Mesa para publicação e relativa ao projecto de lei n.º 367/IV
O Partido Renovador Democrático considera necessária a elaboração de um enquadramento legal à venda de artifícios pirotécnicos utilizados para fins lúdicos.
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Tal iniciativa reveste-se de grande importância tanto mais que a legislação actual peca por defeito, sendo imprecisa e insuficiente, possibilitando com a sua permissividade a venda sem controlo das chamadas «bombas de carnaval» e outros artefactos similares a crianças, com as consequências danosas já sobejamente conhecidas.
O projecto de lei n.º 367/IV, da autoria do Grupo Parlamentar do PCP, hoje aprovado na Generalidade com o nosso voto favorável, tem em vista dar solução a tão fremente problema. Contudo, em nosso entender, deve ser objecto de criterioso aperfeiçoamento em sede de especialidade.
Para além de algumas incorrecções técnicas e redundâncias já apontadas pelos deputados do PRD no debate realizado, o projecto em apreço deverá precisar com clareza quais os artifícios abrangidos, tendo para tal em atenção o seu grau de perigosidade aferido através de pareceres emitidos por peritos que deverão ser chamados à comissão parlamentar respectiva.
Pelo Grupo Parlamentar do PRD, Jaime Coutinho.
Os REDACTORES: Carlos Pinto da Cruz - Maria Leonor Ferreira.
PREÇO DESTE NÚMERO: 184$00
Depósito legal n. º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA, E. P.