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l Série - Número 59

Quarta-feira, 25 de Março de 1987 - PORTE PAGO

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

IV LEGISLATURA

2.º SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 24 DE MARÇO DE 1987

Presidente: Ex.mo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Ex.mos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui José dos Santos Silva
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 10 horas e 40 minutos.
Foi dado conhecimento de um ofício do Sr. Presidente da República informando da alteração da hora de chegada a Lisboa a propósito da sua deslocação ao Brasil em viagem de carácter oficial, que a Assembleia autorizou.
Deu-se conta de vários diplomas entrados na Mesa.
Os Srs. Deputados Jerónimo de Sousa, Octávio Teixeira e Odeie Santos (PCP) e o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social (Mira Amaral) usaram da palavra no início da interpelação ao Governo apresentada pelo PCP com vista à abertura de um debate de política geral centrado na situação laborai, designadamente sobre os problemas do desemprego, dos salários em atraso, do trabalho precário e do trabalho infantil.
No debate que se seguiu usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social (Mira Amaral) e dos Srs. Secretários de Estado da Juventude (Couto dos Santos) e do Emprego e Formação Profissional (Joaquim Marques), os Srs. Deputados Duarte Lima e Nunes do Valle (PSD), Cavaleiro Brandão (CDS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), João Amaral e lida Figueiredo (PCP), José Seabra (PRD), Álvaro Brasileiro (PCP), António Marques (PRD), Jorge Patrício (PCP), José Apolinário e Marcelo Curto (PS), Carlos Coelho (PSD), Jerónimo de Sousa (PCP), Ferro Rodrigues (PS), Luís Salvado (PSD), Carlos Brito (PCP), Vieira Mesquita (PSD), Ana Gonçalves (PRD), Eduardo Gomes (PSD) e Rui Oliveira e Costa (Indep.).
Entretanto, foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um deputado do CDS.
Após aprovação na generalidade, o projecto de lei n." 343/IV (sobre extinção da enfiteuse ou aforamento) baixou à Comissão de Agricultura e Mar para apreciação na especialidade.

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Melo Alves.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.

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Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Luís Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
Helena Torres Marques.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueira.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barras.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barras Feu.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo C. da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria lida da Cesta Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

António José Temas Gomes de Pinho.
José Henrique Meirelles de Barras.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro José Del Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Deputados independentes:

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura de um ofício do Sr. Presidente da República.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República recebeu um ofício de S. Ex.ª o Presidente da República, do seguinte teor:

A minha deslocação ao Brasil em viagem de carácter oficial estava prevista para os dias 24 de Março a 5 de Abril do corrente ano, conforme minha comunicação à Assembleia da República de 4 de Março passado.
Tendo havido posteriormente necessidade de alterar a hora da chegada a Lisboa, venho informar V. Ex.ª que a mesma está agora prevista para a madrugada do próximo dia 6 de Abril.
Apresento a V. Ex.ª os meus respeitosos cumprimenteis.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há alguma objecção quanto a esta alteração, que, ao fim e ao cabo, é uma diferença horária?

Pausa.

Não havendo objecções, considera-se aprovada. O Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 39S/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do PCP, que elimina dúvidas quanto ao regime de aquisição da nacionalidade, que foi admitido e baixou à 1.º Comissão; projecto de lei n.º 396/TV, por iniciativa do Sr. Deputado Álvaro Bra-

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sileiro e outros, do PCP, pretendendo que se consagrem medidas de preservação e defesa do património das marinhas de sal de Rio Maior e se garanta o direito à exploração, por parte dos salineiros, que foi admitido e baixou à 6." Comissão, e, finalmente, projecto de resolução n.º 39/1 V, por iniciativa de todos os grupos parlamentares, propondo a criação de uma comissão eventual para o diálogo e cooperação entre Portugal e a República de Cabo Verde e respectivas instituições parlamentares, que foi admitido e baixou à 8.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da ordem do dia para hoje consta a interpelação ao Governo n.º 3/1V (PCP) (abertura de um debate de política geral, centrado na situação laborai, designadamente sobre os problemas do desemprego, dos salários em atraso, do trabalho precário e do trabalho infantil).
Uma vez que tenho indicação de que o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares e o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social estarão prestes a chegar, proponho que se aguarde a sua chegada para darmos início ao debate.

Pausa.

Para uma intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A interpelação do PCP sobre política laborai, que foi adiada por uma semana a pedido do Governo, acaba por ter lugar num quadro em que o Governo já está posto em causa institucionalmente.
Por isso mesmo, o que aqui for dito é, sem dúvida nenhuma, um julgamento sectorial da política do Governo. Ninguém tem dúvidas de que o valor e o significado do presente debate não poderão deixar de ser tidos em conta para o exame global a que desde ontem o Governo e a sua política estão a ser submetidos.
Vamos julgar e acusar o Governo pela sua política laborai, mas é evidente que fazê-lo nestas condições representa ter presentes as acusações e as condenações de que o Governo tem sido objecto nestes tempos mais próximos.
É aliás impossível olharmos para este governo sem termos presente o que aqui se passou há precisamente uma semana, após a afronta à Assembleia da República e ao seu Presidente a propósito da visita parlamentar à URSS, quando vimos este governo remetido para um isolamento sem paralelo, sujeito à condenação de todas as bancadas e com a sua própria bancada profundamente desfalcada.

O Sr. António Capucho (PSD): - É falso! Prove lá isso se é capaz!

O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma evidência!

O Orador: - Confirma-se todas as semanas que a política deste governo não serve. Não serviam as suas Grandes Opções para 1987, e por isso foram derrotadas. Não serviam as suas GOPs a médio prazo, e por isso teve de retirá-las à pressa antes que sofressem a mesma sorte (publica-as agora como mais uma provocação à Assembleia da República, contrabandeando-as numa resolução do Conselho de Ministros).
Não servia o seu Orçamento para 1987, e por isso foi significativa alterado por esta Assembleia da República.
Mas também ficou exemplarmente demonstrado nesta Assembleia que não serve a sua política de defesa nacional ou a política que lança o caos na justiça.
É o mesmo governo que viu refutada a sua política para a gestão hospitalar, travado o seu desejo de leilão do sector público de comunicação social e inviabilizadas peças mestras de uma política de degradação do sistema escolar.
O recente debate sobre o Acto Único Europeu e o primeiro ano de adesão à CEE, concluído com mais uma votação em que o Governo foi derrotado, mostrou também que o Governo não é capaz de assegurar a defesa do interesse nacional no quadro da adesão à CEE.
Digam-me, Srs. Deputados, se, em face deste rol de condenações e de derrotas verificado num período que pouco excede os dois meses, não é espantoso que este governo não tenha apresentado uma moção de confiança.

O Sr. António Capucho (PSD): - Outra?

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Mais uma?

O Orador: - E esse facto não é mais uma razão a determinar a sua condenação global?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Interpelamos o Governo sobre a sua política laborai, que é incontestavelmente uma das facetas mais nefastas da sua política e que, pela sua particular importância, não pode deixar de merecer a mais firme condenação.
Em política laborai dirigimos nove acusações fundamentais ao Governo:

1) Não tem uma política de emprego, sendo os jovens e as mulheres os mais duramente atingidos;
2) Fomenta e incentiva despedimentos em massa;
3) É responsável e co-autor na proliferação dos contratos a prazo e do trabalho precário e clandestino;

4) Tem graves responsabilidades no ressurgimento do trabalho infantil;

5) Não dá combate aos salários em atraso e subverte a lei aprovada na Assembleia da República;
6) Viola e restringe a liberdade nas negociações da contratação colectiva, tentando aplicar tectos salariais;
7) Amnistia e incentiva permanentemente a repressão patronal;
8) Insiste na liquidação e desregulamentação dos direitos constitucionais e legais dos trabalhadores;
9) Criou novas e graves situações de pobreza, nalguns casos em risco iminente de se transformarem em situações de desastre social.

Acusamos e provamos!
Para tanto, tivemos de conhecer lá nos locais as coisas concretas, o país real que a televisão e o martelar ensurdecedor da propaganda governamental distorcem e silenciam.

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Nas minas da Panasqueira, na CENTREL, na UTIC, na INDEP, na Metalúrgica Duarte Ferreira, em Braga ou em Faro, nos contactos com os trabalhadores e estruturas sindicais do ramo automóvel, da metalo-mecânica pesada e da siderurgia, da construção civil, dos têxteis, do comércio, dos sectores conserveiro, alimentação e bebidas, química e farmacêutica, cerâmica e vidros, apercebemo-nos da profundidade e da dimensão da crise social e laborai. Mas... «a crise acabou», diz o Primeiro-Ministro.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - E é verdade!

O Orador: - Se males existem, «a culpa é por causa de a lei dos despedimentos não permitir ao patronato mais poderes para despedir», diz o Ministro do Trabalho. Se trabalho infantil existe, «isso tem muito a ver com a ganância dos pais, que já ninguém fala dos salários em atraso», diz o Secretário de Estado do Emprego. Frases soltas desprovidas de razão, de verdade e do sentir da justiça social. Mas ditas de má fé para criar um sentimento de demissão nacional e esconder a injustiça e a crueldade deste governo e desta política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas aqui não o poderão escamotear!
Vamos aos factos: a nível de emprego, pode constatar-se que cerca de 25% da população activa está desempregada ou tem um emprego precário, remunerado em atraso ou clandestino. Cerca de 42% da população desempregada anda à procura do primeiro emprego e mais de 407o dos desempregados já se encontram nesta situação há mais de um ano. A cobertura social do desemprego é inferior a 20%.
Para resolver este grave problema, o Governo limita--se a confiar nos milhões que hão-de vir do Fundo Social Europeu para executar uma política de formação profissional sem qualquer fio condutor e onde cada um faz mais ou menos aquilo que quer, promove acções tipo OTJ, reduzidas à propaganda do Governo e num fracasso para os jovens, considera para as suas estatísticas de emprego o trabalho realizado nem que seja de uma hora por semana por parte de desempregados, transforma as mulheres desempregadas em domésticas, e, depois, serve a quente uma estatística dizendo aos Portugueses que o desemprego diminuiu e, por último, como grande remédio, propõe a precarização e o trabalho a tempo parcial, com sacrifício do trabalho efectivo e estável.
Não é apenas um governo de vistas curtas e incompetente. Funciona e exerce conscientemente um poder, sacralizando o lucro em desfavor da justiça social. Assim se compreende a afirmação do Ministro do Trabalho que essa coisa das oito horas de trabalho, o emprego certo e seguro com um estatuto e garantias sociais, já passaram à história, já pertencem à década de 60. E à luz deste conceito que se procura liquidar ou obrigar os trabalhadores a vender, a troco de míseras indemnizações, milhares de postos de trabalho na Panasqueira, na MDF, na Siderurgia Nacional, na INDEP, nos Fornos Eléctricos, na SOREFAME, na Casa Hipólito, na UTIC, no sector conserveiro, no ramo automóvel, em dezenas e dezenas de empresas de vários ramos de actividade. O caso da CENTREL dispensa qualquer outra acusação: no polémico processo de aquisição das centrais digitais, o Governo, além de ter feito o negócio em condições que estão a ser objecto de inquérito nesta Assembleia, desbloqueou uma verba de 800000 contos -repilo, 800000 contos -, não para criar qualquer posto de trabalho alternativo, não para investir, mas para que o patronato liquide, nesta fase, 800 postos cê trabalho na CENTREL.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Tudo isto feito em nome da modernização e das novas tecnologias.
Sem dúvida, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que fascina o espírito neste fim de século é o extraordinário grau alcançado pelos conhecimentos do homem em todos os domínios da ciência e da técnica. Mas será inevitável que is;o custe mais desemprego, o recuo social e o subdesenvolvimento aos trabalhadores?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se assim fosse, teríamos de renunciar ao progresso técnico e regressar à época das casernas, o que seria um absurdo.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que choca profundamente é que no limiar do século XXI e em nome das novas tecnologias o governo de Cavaco Silva tenta fazer recuar as relações laborais para os esquemas do final do século passado, numa visão retrógrada e passadista.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E por isso é ele o próprio co-autor da proliferação dos contratos a prazo e do trabalho precário. Exemplei escandaloso é o que se passa na função pública. No Ministério da Educação e Cultura há mais de 6000 contratados a prazo. No Ministério da Saúde, apesar de no início de 1986 haver 23 000 vagas por preencher, existiam 12 000 pessoas com vínculo precário. Nas empresas públicas a situação é idêntica. Actividades inteiras com trabalho efectivo são preenchidas por empreiteiros e empresas alugadoras de mão-de-obra. Na EDP, nos CTT, na CP, na RN, na Quimigal, entre outras, pululam autênticas zonas francas, livres de obrigações sociais, livres para explorar sem limites, sendo os trabalhadores com vínculo precário privados de todos os direitos e pagos de fornia inferior.
Quando é o próprio Governo e os seus gestores públicos a assumirem o papel de fautores da legalidade, como há-de, Sr. Presidente, Srs. Deputados, agir o patronato?
Não é o Governo que proíbe a entrada em funções dos gestores eleitos pelos trabalhadores das empresas públicas, violando a Lei n.º 46/79? Não é o Governo que proíbe ilegalmente a existência do Sindicato dos Trabalhadores dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas?
Fazendo tábua rasa da lei, empresas existem onde a esmagadora maioria dos trabalhadores tem um contrato a prazo. Passados três anos são despedidos, regressando após uma semana de intervalo. Mas, se se sindicalizarem, se participarem num plenário ou numa greve, a condenação é imediata: a não renovação do contrato, seguida de despedimento. Mas o contrato a prazo já

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não abrange todo o conceito de trabalho precário. Procurando subsistir e sobreviver, milhares de trabalhadores sujeitam-se ao trabalho por empreitada, à peça, à tarefa, ao dia e até à hora.
Com um cinismo chocante, o abuso dos contratos a prazo e do trabalho precário, nas suas diversas manifestações, não é entendido pelo Governo como um mal menor, como gosta de dizer o Ministro do Trabalho: é realmente encarado como instrumento fulcral da repressão e chantagem sobre a legislação laborai progressista, amnistiando assim permanentemente todos aqueles que não cumprem as leis da República.
Estes governantes são capazes de encarar sem um arrepio o ressurgimento das autênticas praças de jorna, ali mesmo no mercado de Cacilhas, em aldeias minhotas e em vários locais onde os desempregados são referenciados! E acham um belo espectáculo quando o administrador da LISNAVE, à frente das câmaras da televisão, se gaba do recurso ilegal ao trabalho precário depois de o Governo ter autorizado a consumação de um gigantesco despedimento colectivo!

O Sr. António Mota (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Tem a Inspeccão-Geral do Trabalho (IGT) a força e a vontade para intervir numa Dan Cake onde as jovenzitas têm medo de falar da exploração desenfreada a que estão sujeitas, sabendo que se o fizerem são imediatamente despedidas?
Onde chegámos, Srs. Deputados! O grande objectivo do Governo é que volte a haver medo nas fábricas, nas empresas, nos serviços, na administração central. Que haja medo de exercer direitos, de denunciar a ilegalidade, porque o cutelo do desemprego pesa sempre sobre a cabeça de quem, já por si, vive em permanente insegurança. E falamos de centenas de empresas, da administração central, falamos de SOO 000 ou 600 000 portugueses e portuguesas, a quem a lei do medo é imposta, com sacrifício, muitas vezes, da liberdade, dos direitos individuais e colectivos e da própria dignidade humana.
Já nem as crianças escapam. A exploração de mão-de-obra infantil, que começa a estender-se numa vasta zona do Norte do País e pontualmente no Centro e Sul, transforma-se num grito de acusação a exigir a denúncia nacional que deve ser analisado nas suas causas mais fundas. Para o Governo, no seu jeito de passa culpas, a questão reside essencialmente na ganância dos pais. Ë um desabafo cruel e empedernido, que não pode ser subscrito por quem se identifique com a justiça social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Foram muitas as fábricas onde vimos crianças entrarem para trabalhar. Em Felgueiras, em Braga, em Guimarães, elas fugiram de nós com medo de falar. Medo de perder os 7 ou 8 contos mensais que ganham e que entregam em casa aos pais, muitas vezes doentes e desempregados, quando o Governo considera que apenas existe ganância, da sua parte. Medo, sempre o medo, neste país de Abril.
Isto conduz-nos à quarta acusação sobre a existência dos salários em atraso e à forma como o Governo subverte o espírito e a forma da lei aqui aprovada na Assembleia da República. Diz o Governo que já ninguém fala nos salários em atraso. Brande com estatísticas fabricadas e consegue inculcar em certa comunicação social a discussão aritmética de mais ou menos trabalhadores vitimados por este flagelo social. Depois do seu comportamento social e moralmente inaceitável, que levou ao adiamento da aplicação da Lei n.º 17/86, deixou que o patronato se adaptasse mais uma vez à ilegalidade. Em primeiro lugar, não considera no plano dos salários em atraso os retroactivos, o subsídio de férias e o subsídio de Natal. Em segundo lugar, não actua face ao novo esquema inventado pelo patronato, ou seja, o pagamento em jeito de conta--gostas: 5 contos hoje, 10 contos amanhã e na outra semana logo se verá!
Até o não pagamento do salário é já usado como arma de arremesso para atirar os trabalhadores para reformas compulsivas, para venderem o seu posto de trabalho e travar a sua luta por melhores condições de vida.
Apesar da manipulação estatística, apesar da demagogia e sonegação da realidade, apesar da liquidação e encerramento de dezenas de empresas que viviam essa situação, para além da aplicação da Lei n.º 17/86, os salários em atraso continuam a ser uma mancha de vergonha no Portugal democrático.
Braga: 163 empresas, envolvendo 17 142 trabalhadores, com um montante de dívida na ordem dos 3 milhões de contos; Porto: 104 empresas, 18 800 trabalhadores, 3 400 000 contos de dívida; Lisboa: 162 empresas, 17 000 trabalhadores, sendo em 1986 a dívida acrescida em mais de 400 000 contos.
Como dado esclarecedor: em 1986, 400 empresas do distrito de Lisboa passaram por situações de salários em atraso.
Leiria: 62 empresas, 6600 trabalhadores abrangidos, com uma dívida de 400 000 contos; Santarém: 60 empresas, 7000 trabalhadores, com l SOO 000 contos de dívida; Coimbra: 25 empresas, 2000 trabalhadores, montante da dívida por apurar; Setúbal: só no sector metalúrgico, em 27 empresas, o montante da dívida aos 7700 trabalhadores ronda os 3 milhões de contos; Algarve: só no sector conserveiro, mais de 35O 000 contos de salários em atraso; e Aveiro: só no sector metalúrgico, existem 1194 trabalhadores com salários em atraso, credores de 286 000 contos.
Não dará certa com os números acima referidos a estatística do Ministério do Trabalho. Ficará de fora quem não recebeu subsídio de Natal, quem não recebeu subsídio de férias, quem não viu actualizado o seu salário, apesar de ter havido aumento salarial contratual, quem, como os trabalhadores da UTIC e da INDEP, que estão a receber a conta-gotas, recebendo agora o vencimento ao Hm do mês, tem dívidas acumuladas ao longo dos anos, ou aqueles trabalhadores cujas empresas foram abatidas, por falência ou encerramento, das listas do Ministério do Trabalho. Nas estatísticas sem emoção, completas ou incompletas, há números. Mas em centenas e centenas de empresas os números são substituídos por homens e mulheres privados de uma questão que está ligada ao direito à vida, que é o direito ao salário.
Tudo isto é possível porque se criou, pela mão do Governo, um sentimento de indulto constante e generalizado a uma larga faixa do patronato e às administrações das empresas.
Para o Governo, o que está mal não são as descaradas violações à lei e aos direitos dos trabalhadores. Para o executivo de Cavaco Silva o que está errado são

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precisamente os direitos, liberdades e garantias, o seu exercício pelos trabalhadores e a sua cobertura constitucional e legal. O que para si está mal é haver uma lei de despedimentos que salvaguarda minimamente o trabalhador de ser despedido sem justa causa. Não lhe chega a lei dos despedimentos colectivos, o lay-off, a lei dos contratos a prazo, as normas que permitem a declaração da empresa em situação económica difícil. Quer dar ao patronato um instrumento decisivo, o camartelo para despedir quando e como bem entender, para transformar todos os trabalhadores em contratados a prazo incerto.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Após a operação falhada do pedido de autorização legislativa nesse sentido, deixa cristalizar e alastrar as actividades repressivas das entidades patronais e à sorrelfa põe à discussão em circuito fechado um novo pacote laborai. E esta é outra acusação que fazemos: para os horários de trabalho, ao arrepio da prática europeia da semana máxima das quarenta horas, justa reivindicação do movimento sindical unitário, propõe a desorganização total da vida dos trabalhadores com horários que podem ir a dez horas diárias e cinquenta horas semanais, obrigar as mulheres a trabalhar à noite nos estabelecimentos industriais, acabar com a regra do descanso semanal ao domingo.
Quer alterar o lay-off de forma a criar uma antecâmara de despedimentos colectivos, restringir ainda mais a liberdade da negociação da contratação colectiva e reconhecer legalmente as empresas mercadoras de mão-de-obra. Quatro peças indissociáveis da sua prática política. Não se quer submeter ao debate franco, aberto e democrático aqui na Assembleia. Atirando a pedra mas escondendo a mão, usando os slogans do «liberalismo económico», da «flexibilização», tentando muitas vezes virar os jovens contra as gerações mais idosas, os desempregados contra os que têm trabalho, o que o Governo pretende e preconiza é a exploração desenfreada do grande capital e das multinacionais.
Por isso mesmo o Governo, apesar da conjuntura externa favorável que vivemos, tenta impor tectos salariais aos trabalhadores. E é significativo que a única ameaça até hoje feita ao patronato pelo Governo foi a de que, caso este negoceie livremente com os sindicatos e se disponha a aceitar tabelas salariais acima da inflação prevista, será punido com sanções económicas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Dois pesos e duas medidas. Quando se trata de repor a legalidade, defender os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, o Governo assume o papel de carrasco ou de Pilatos. Mas quanto se trata de, no plano da livre negociação entre as partes, haver a possibilidade de melhorar as condições de vida e de trabalho dos trabalhadores, o Governo é mais papista que o Papa e assume-se como guardião dos interesses económicos dos mais poderosos em desfavor dos mais fracos. Este posicionamento é mais perceptível quando nas tentativas de conciliação das convenções colectivas de trabalho ou na publicação de portarias de extensão se verificam sistematicamente as concepções a favor dos que mais têm e mais podem e contra quem trabalha. A prová-lo está o exemplo recente e escandaloso das portarias para os trabalhadores da panificação e dos gráficos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta política desumanizada e desumanizante, oca de verdadeiro conteúdo social, virada para que os ricos estejam cada vez mais ricos, permissiva ao aparecimento cê uma classe parasitária e especulativa, geradora da insegurança e do medo, está a conduzir ao alastramento das zonas de pobreza. Uma doença que volta a ressurgir e que tinha sido praticamente arredada com o Portugal de Abril dispensa quaisquer adjectivos e quaisquer outras considerações e funciona como prova. Voltou a tuberculose a Portugal.

Risos do PSD.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Não se riam, porque é verdade.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Já não se pode rir?

O Orador: - Ri-se, Sr. Deputado? ... Tem o direito de se manifestar, pela forma que entender ..., o riso é livre, assim como a asneira.

O Sr. António Capucho (PSD): - Principalmente a asneira.

O Orador: - Fique sabendo, Sr. Deputado, que podemos ter divergências profundas, mas o que me choca muitas vezes nesta Assembleia é o comportamento ético do Grupo Parlamentar do PSD ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Só? Veja lá o vosso comportamento ético!

O Orador: - . . que, com certeza, tem aí gente sensível a estas questões, e, por isso mesmo, não aceito que riam quando digo que a tuberculose surge de novo em Portugal por causa da fome que este governo provoca com a sua política todos os dias no Portugal de Abril.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Protestos do FSD.

As doenças profissionais, os acidentes de trabalho, o aumento da mendicidade, aberta ou disfarçada, os dramas psíquicos do desemprego e dos salários em atraso, os malefícios insanáveis da exploração violenta do trabalho infantil, transformam-se hoje num libelo acusatório a um governo que governa para satisfazer o lucro, esquecendo e punindo os verdadeiros criadores da riqueza os trabalhadores.
No Tramagal, na Barroca, na Marinha Grande, em Setúbal, em Canis de Senhorim, aqui bem perto, na INDEP, na CENTREL ou na UTIC, levanta-se o espectro do desemprego e da pobreza.
A interpelação do PCP, ao denunciar estes aspectos, aponta também para a urgente necessidade de encontrar respostas políticas paia a resolução dos graves problemas dos trabalhadores e do povo português.
A nossa pátria não pode transformar-se num país de homens e mulheres com medo, numa zona subsidiária de manufacturação, do biscate, de turismo para os estrangeiros, da exploração mais agreste para os Portugueses. O país real, Srs. Deputados, começa e sobrepor-se ao fogo de artifício, à medida avulsa, à propaganda do Governo.

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Com coragem e tenacidade, milhares de trabalhadores lutam e furam o cerco do silêncio e do isolamento que o Governo lhes quis impor. Sectores operários e trabalhadores dos serviços, professores, enfermeiros, médicos, estudantes, começam a abalar a arrogância do Executivo. Lutam pelo direito ao trabalho, ao salário, por melhores condições de vida e de estudo.
Homens íntegros da comunicação social, sectores da Igreja Católica e personalidades democráticas assumem posições públicas clamando pelo respeito de direitos fundamentais dos trabalhadores e em defesa da dignidade humana, todos os dias ofendida pelo Governo.
Acreditamos sinceramente que as forças democráticas aqui representadas saberão acolher o eco que vem das minas, das fábricas e das empresas, e, em conjunto, ponham fim a esta política de desastre social e a este governo.
Ninguém, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em parte alguma pode defender os interesses dos trabalhadores ou fazer a sua felicidade sem eles. Eles são os autores do seu próprio destino e saberão ser os actores activos na construção do progresso do Portugal democrático, do Portugal de Abril, que pretendemos aqui, na nossa pátria.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: a grave situação social que foi descrita pelo meu camarada Jerónimo de Sousa não assenta apenas nas concepções retrógradas da política social do Governo, como é também o resultado da sua política económica.
Na verdade, não poderia deixar de ter nefastos efeitos na situação social uma política económica que desbarata os recursos que a envolvente externa colocou à disposição do País, degrada a estrutura produtiva e a produção nacional, agrava estruturalmente as contas externas e a independência nacional, aumenta a injustiça na distribuição do rendimento nacional e faz alastrar o desemprego, o trabalho precário, a exploração de mão-de-obra infantil e a pobreza.
Vejamos o que se passa com o emprego.
É profundamente martelada pelo Governo a ideia de que a situação de diminuição do emprego e de aumento do desemprego se inverteu em 1986. Mas é falsa. Não há manipulação estatística que consiga escamotear a realidade vivida por centenas de milhares de portugueses que não têm acesso ao mais elementar dos direitos: o direito ao trabalho. O Governo vai diminuindo permanentemente o número da população activa, designadamente transferindo estatisticamente mulheres desempregadas para a categoria de domésticas. Mas não consegue com isso reduzir o desemprego real.
O Governo considera como empregado quem, num qualquer biscate de ocasião, trabalhe, pelo menos, uma hora na semana do inquérito estatístico. Mas não consegue com isso aumentar o emprego efectivo.
Bem pode o Governo trombetear aos ventos que a sua política económica foi boa para o emprego e que o emprego aumentou. A falsidade e o ridículo dessa afirmação são comprovados pelos factos e pela vida.
A menos que o Governo pretenda dizer-nos que o problema não é o da sua política, que o problema é o de haver excesso de portugueses que querem trabalhar. Mas quem está em excesso não são os que procuram trabalho. Quem está a mais é um governo que, para além de minoritário, se mostra incapaz de uma política geradora de novos postos de trabalho.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita aos salários, o limitado aumento do salário real registado em 1986 não pode, Srs. Deputados, escamotear um novo agravamento na distribuição do rendimento em prejuízo dos trabalhadores.
Desde logo é triplamente indecoroso que o Governo se atribua a «bondade» de ter «consentido» um tal aumento do salário real. Em primeiro lugar, porque o aumento dos salários reais não é, nunca poderá ser, uma benesse de um qualquer governo, mas um direito dos trabalhadores, um princípio básico e necessário da melhoria do nível de vida dos Portugueses e do crescimento económico.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, porque o aumento verificado se ficou a dever, fundamentalmente, à luta dos trabalhadores para ultrapassar os tectos salariais definidos pelo Governo. Em terceiro lugar, porque o Governo foi ele próprio ultrapassado pela evolução do ritmo de crescimento do índice de preços no consumidor face às suas previsões iniciais. Aliás, a evolução trimestral do salário real na indústria transformadora (e idêntica evolução para os salários na construção civil) é bem significativa da política governamental: à medida que aumentava a desaceleração da taxa de inflação diminuía a taxa de crescimento dos salários reais.
Mais significativo ainda da política de classe conduzida pelo governo Cavaco Silva, o limitado crescimento do salário real foi acompanhado de uma substancial diminuição do peso relativo da massa salarial no rendimento nacional. Do já baixo nível de 47% verificado em 1985, sem paralelo em qualquer país da Europa, a massa salarial caiu inconcebivelmente para a ordem dos 43%! Paralela e inversamente, o peso dos lucros aumentou de forma significativa.
Isto é, a política de rendimentos do Governo conduziu a uma nova e considerável transferência do valor acrescentado em detrimento dos trabalhadores e em benefício da acumulação financeira do grande capital. Acumulação financeira que, contrariamente ao apregoado pelo Governo, não beneficiou o emprego, antes pressionou a aceleração da redução de efectivos e foi a grande responsável pela elevada taxa de inflação na produção nacional e pelo incremento galopante da especulação bolsista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: a crua situação social evidenciada nos números, particularmente nos relativos ao desemprego e à repartição do rendimento, tem necessariamente correspondência com a situação económica.
É facto publicamente reconhecido pelos mais diversos sectores da vida nacional que o Governo não aproveitou as condições favoráveis da conjuntura: desperdiçou-as.
Que o Governo não corrigiu alguns dos maiores estrangulamentos estruturais da economia portuguesa, como o da subutilização da capacidade produtiva instalada e o da elevada componente importada do investimento e da produção nacionais: agravou-os.

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Que o Governo não minorou as maiores injustiças sociais, como o desemprego, a repartição do rendimento e a pobreza: piorou-as.
De facto, não poderia deixar de ter graves consequências para a situação social a desastrosa política de substituição da produção nacional por importações, decorrente dos primeiros efeitos da adesão à CEE, mas agravada em nome de um «liberalismo económico» caduco e prejudicial aos interesses nacionais, e que se verifica em praticamente todos os sectores da actividade económica.
Como não podia haver uma diminuição do rendimento dos produtores, se na agricultura prossegue a involução destruidora e os agricultores portugueses assistem ao apodrecimento do fruto do seu trabalho, ao mesmo tempo que o mercado nacional é crescentemente invadido por produtos agrícolas provenientes de Espanha e de outros países comunitários, e se o sector das pescas, em especial da pesca artesanal, se vê confrontado com o desmantelamento da frota e com a diminuição das capturas, ao mesmo tempo que as nossas águas são exploradas por terceiros e aumenta a importação de pescado?
Como não poderia haver aumento do emprego, se a construção civil, após uma quebra de produção de 20% nos três anos anteriores, não consegue melhor que uma estagnação a esse nível extremamente baixo?
Como poderia haver diminuição do desemprego, se a indústria extractiva, com potencialidades reconhecidas, regista uma diminuição de actividade de 12%, significativa por outro lado das nefastas consequências para o país da entrega dos seus recursos a empresas multinacionais, se a indústria produtora de bens de investimento, após uma estagnação em 1985, volta a registar diminuição da sua actividade, o que reveste especial gravidade face à sua natureza estratégica para o desenvolvimento económico do país e para a independência nacional, e se múltiplos são os subsectores industriais que registam novas e gravosas diminuições na produção: conservas de peixe (-8%), fabricação de adubos (- 12%), preparação de especialidades farmacêuticas (- 3 %), indústrias do vidro (- 3 %), indústrias básicas de metais não ferrosos (- 5 %), fabricação de ferramentas manuais (-8%), fabricação de mobiliário metálico (-9%), fabricação de aparelhos de rádio, televisão e outro material electrónico (- 3 %), fabricação de fios e cabos (- 11 %) e - repare-se! - fabricação de máquinas e aparelhos industriais eléctricos (-61%)?! Face a um tal desastre na produção, é inevitável o aumento da subutilização das capacidades produtivas instaladas, a degradação acelerada de sectores completos da actividade económica. Com o consequente aumento do desemprego, os despedimentos e os salários em atraso, a proliferação das actividades clandestinas e do trabalho precário.
Mas como se chegou aqui, apesar do favorável enquadramento externo? Fundamentalmente devido a duas causas principais, que se integram na política do Governo: o crescimento da procura interna foi satisfeito fundamentalmente por recurso a importações, em prejuízo da produção nacional, e o crescimento substancial dos lucros foi, em boa parte, canalizado para aplicações financeiras parasitárias, para alimentar um mercado bolsista especulativo.
Em qualquer dos casos, contrariando a produção nacional, o desenvolvimento, o emprego e a melhoria da situação social do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: face ao manifesto insucesso da sua política social e económica, o Governo pretende escamoteá-lo, adornando-se com as penas de pavão de alguns resultados macroeconómicos que resultam, indesmentivelmente, da favorável envolvente externa, para a qual o governo de Cavaco Silva «não meteu prego nem estopa».
É insofismável que Portugal beneficiou em larga escala das condições externas, fundamentalmente por três ordens de razões.
Em primeiro lugar, porque, sendo grande importador de petróleo, cereais e outras matérias-primas, ganhou com a baixa dos preços internacionais e com a depreciação do dólar.
Em segundo lugar, porque, sendo um país fortemente endividado, acrescendo que mais de 50% da dívida externa é denominada na divisa norte-americana, ganhou com a baixa das taxas de juro nos mercados internacionais e, novamente, com a depreciação do dólar.
Em terceiro lugar, porque, tendo a componente importada um peso significativo na produção nacional, a baixa dos preços de produtos básicos e a baixa das taxas de inflação nos países nossos fornecedores repercutiram-se positiva e fortemente na inflação interna.
Mas, sendo inquestionável que os resultados macroeconómicos obtidos em 1986 decorreram de factores exógenos à política económica do Governo, importa que os efeitos da envolvente externa não escondam um efectivo agravamento estrutural da economia portuguesa.
Assim, o défice da balança comercial é inferior em cerca de 20 milhões de contos ao de 1985. No entanto, o efeito preço ca baixa das cotações do petróleo, cereais e oleaginosas significou uma poupança nas importações que rondará o 200 milhões de contos. Ou seja, se os preços internacionais daqueles três grupos de produtos se tivessem mantido ao nível de 1985, o défice da balança comercial portuguesa registaria um agravamento efectivo da ordem dos 40%, bem patente no crescimento exponencial das importações em volume e na desaceleração do volume exportado, o que espelha a degradação da estrutura produtiva nacional e significa o agravamento da dependência da economia portuguesa em relação às importações, o agravamento da dependência nacional!
Situação que não poderia deixar de ter, como teve, consequências sociais, designadamente agravando o desemprego, as baixas remunerações e os salários em atraso.
No que respeita à inflação, a desaceleração da respectiva taxa, que se verifica desde meados de 1985, tem igualmente por causa básica o decrescimento dos preços dos produtos importados, não decorrendo de quaisquer mérito! da política governamental. Bem pelo contrário. A política do Governo teve por efeito travar a desaceleração da taxa de inflação. A não repercussão significativa da quebra dos preços do petróleo bruto no preço dos combustíveis, nomeadamente dos de uso industrial, impediu uma maior baixa da taxa de inflação. A poli .iça de rendimentos prosseguida, permitindo que os lucros, em média nacional, tenham aumentado à volta dos 35%, actuou igualmente no sentido de inviabilizai uma maior desaceleração do crescimento dos preços. Acresci que as políticas monetária e cambial apenas se limitaram a acompanhar, a posteriori, a baixa da; taxas de juro externas e os efeitos da envolvente externa sobre a inflação interna.

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Isto é, o Governo não foi capaz, ou não quis, ser agente de uma política activa que potenciasse os favoráveis efeitos externos sobre a inflação interna.
O que inequivocamente se traduziu numa actuação contrária aos interesses do povo e do país e contrária à necessidade de melhoria do poder de compra dos Portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: as extremamente favoráveis condições da conjuntura económica externa exigiam uma política económica e social activa que visasse o seu cabal aproveitamento para combater as causas estruturais do défice comercial, fortalecer e desenvolver as capacidade produtivas do País, proceder à recuperação de sectores e empresas em situação mais degradada, aumentar o emprego, melhorar os rendimentos salariais e atacar decididamente o trabalho precário e a pobreza mais revoltante.
Nada disso o governo de Cavaco Silva conseguiu ou mesmo tentou. A sua política económica e social salda--se por um rotundo e gravoso fracasso na perspectiva dos interesses nacionais.
A situação em que o País se encontra não se compadece com mais adiamentos de soluções inadiáveis, tendentes a valorizar os recursos nacionais, materiais e humanos, a aumentar a produção nacional e a diminuir a dependência externa. Sempre com o objectivo último de melhoria permanente do nível e das condições de vida do povo português.
Urge a congregação de esforços das forças democráticas para se encontrar uma alternativa política que possa implementar uma política alternativa.
Uma política que ponha fim à destruição de meios de produção que hoje se verifica, que favoreça os esforços produtivos das empresas e penalize o desperdício de recursos.
Uma política que integre como elemento necessário a participação activa e criadora dos trabalhadores no desenvolvimento do País e os faça participar nos resultados desse desenvolvimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Que reconheça, e daí tire as consequentes ilações, que o crescimento acentuado dos lucros que se regista há vários anos não conduziu à melhoria da economia nacional e que a degradação salarial deprime a actividade económica.
Que faça assentar a eficácia dos investimentos no alargamento da produção, no desenvolvimento e na conquista do mercado interno, na redução dos custos materiais e financeiros.
Uma política que assuma claramente que a real e eficaz modernização da estrutura produtiva nacional é inseparável do necessário aumento do emprego e nunca se lhe poderá opor.
O emprego tornou-se uma questão central de uma política económica e social que vise a defesa dos interesses nacionais. É uma exigência nacional que se opõe frontalmente às opções do governo actual e do grande capital cujos interesses serve.
É indispensável e possível compatibilizar o crescimento da produção e do investimento com uma mais justa repartição do rendimento e com a promoção do emprego.
O que não é aceitável nem defensável é continuar com políticas económicas que visam objectivamente a supressão e precarização de empregos. Porque os ataques contra o emprego e os salários, para satisfazer exigências do grande capital, são a causa primeira do atraso económico do País e das situações de pobreza, de precariedade na vida e da injustiça social. São a causa fundamental da desumana exploração do trabalho infantil, que, sob a complacência cúmplice do Governo, recrudesce dia a dia.

Uma voz do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - O PCP tudo fará para impedir que esta situação continue. O PCP tudo fará para alterada, e essa é uma das razões por que fez esta interpelação.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputado Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Já hoje, nas intervenções dos meus camaradas, por duas vezes foi abordada a questão da exploração da mão-de-obra infantil.

Vozes do PSD: - Ah!

A Oradora: - É, no entanto, o momento de falar uma terceira vez nesse assunto, muito embora haja da parte da bancada do Governo e do próprio Governo talvez uma sensação de enfado, pois não gostam que se lhes fale daquilo que deixam grassar pelo País e que é um dos mais graves flagelos, um dos mais graves crimes na área laboral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. António Capucho (PSD): - As crianças também fugiam de si!

A Oradora: - Um dos aspectos mais chocantes da situação social sob o governo Cavaco e Silva é, sem dúvida, a exploração da mão-de-obra infantil, instituída na prática diária de centenas de empresas abrangendo vastas regiões do País, consentida criminosamente por este governo. Ao flagelo dos salários em atraso, do trabalho precário e do desemprego soma-se agora um novo submundo: o da exploração do trabalho infantil.
Na radiografia da crise económica e social, crise que é evidente e manifesta, aparece esta mancha negra que chama a atenção de todos nós, que chama a atenção do País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - E é aqui que surge a mais viva acusação a este governo. Professores, organizações sindicais, a Igreja, as próprias crianças, ex-colegas da escola, levantam-se para condenar uma política que permite que crianças sejam roubadas aos bancos da escola, substituindo livros e cadernos pela linha que dá forma aos sapatos ou pelo balde de massa que se transporta aos ombros. Crianças que, a troco de umas centenas de escudos, criam o lucro fácil e das quais se faz uso na subversão das relações laborais próprias de uma democracia. São crianças que como o Alberto Quintela, de Lagares, Felgueiras, de 12 anos, ganham

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8 contos por mês, trabalhando muitas vezes até à meia--noite. Ou como o Rui, de 11 anos, que gostava de estudar, mas não pode, porque tem muitos irmãos. Ou como a Maria dos Anjos, de 10 anos, que socorre a doença do pai com o seu trabalho na fábrica de confecções.

O Sr. António Capucho (PSD): - Demagogia!

A Oradora: - São crianças - estas e muitas outras - entrevistadas por alunos de uma escola preparatória, que são mesmo usadas como forma de bareatamento de mão-de-obra adulta.
A censura a este governo prolifera naqueles distritos e naqueles sectores onde a exploração do trabalho infantil entrou no quotidiano. É o que acontece nos distritos de Braga, do Porto, de Aveiro, de Coimbra. Nos sectores das confecções, do calçado, da construção civil, da alimentação.
E, se a censura já era viva, bem mais viva se tornou quando o Governo procurou sacudir a água do capote, acusando os pais de ganância, quando a verdade é que neste, como em todos os graves problemas que se vivem no mundo laborai, ao Governo cabe tão-só o papel de réu e não de acusador. Quando a verdade é que os pais são também, como as crianças, humilhados e ofendidos.
Colocados numa situação de extrema necessidade, vitimas da crise que este governo agrava, vêem renascer formas de exploração que pertenciam ao passado. E não pode, de facto, Srs. Deputados, deixar de recordar-se os tempos, que ainda estão na memória, em que as crianças intituladas aprendizes eram exploradas, utilizadas para substituir os adultos. Tal como não pode deixar de lembrar-se aqueles tempos, não muito recuados, em que os trabalhadores lutavam para que o trabalho à peça fosse substituído pelo trabalho à jorna.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Estes males, que existem no mundo dos adultos, existem também no submundo do trabalho infantil, onde há flexibilização do horário de trabalho (tão do agrado do Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social), onde existe a exploração do trabalho à peça, do trabalho no domicílio.
Ao Governo, no entanto, pouco importa tudo isto, o mesmo se passando com o partido que o apoia, o que foi bem evidente na sua reacção inicial, quando se começou a fazer esta intervenção sobre o trabalho infantil ou quando se falou dos males que grassam no nosso país, como a tuberculose.

Aplausos do PCP.

Ao Governo pouco importa tudo isto, nem mesmo as graves consequências decorrentes da utilização de mão-de-obra infantil. Pouco lhe importa que entre as vítimas de acidentes de trabalho se contem crianças dos 10 aos 14 anos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um escândalo!

A Oradora: - Aliás, é só abrir os jornais e ler as notícias locais, onde encontramos crianças de 13 anos que foram assistidas nos serviços de urgência dos hospitais por acidentes de trabalho, onde encontramos que uma criança perdeu um dedo, vendo assim minorado o seu futuro.
Pouco lhe importa que estas crianças sejam vítimas de envelhecimento precoce, que se vejam empurradas para trabalhos não qualificados, privadas que estão do acesso à escolaridade obrigatória. E, se ao Governo nada disto importa, é a nós, Srs. Deputados, àqueles que têm vontade política para isso, que compete tomar as medidas necessárias para debelar este e os outros flagelos que grassim no mundo dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As intervenções já produzidas pelos meus camaradas demonstram que é necessário que se tomem medidas urgentes. Medidas que são possíveis, apesar da negritude do quadro existente. Medidas que os trabalhadores reclamam, porque não querem adiar o futuro.
Entre outras que são reclamadas, o PCP apresenta hoje, na Mesa da Assembleia da República, dois projectos de lei.

O Sr. António Capucho (PSD): - Só?!

A Oradora: - Num dos projectos apresentam-se propostas de alteração ao actual Código de Processo do Trabalho, código que está gizado à imagem e semelhança do Código de Processo Civil e que por isso mesmo não protege, em sede de direito adjectivo, os direitos dos trabalhadores. É um código que, bem pelo contrário, quer fomentar nos trabalhadores o fastio pela justiça do trabalho. Assim se procura também descongestionar os tribunais do trabalho.
Aliás, é, cie facto, imperioso que se legisle nesta matéria. Isto quando proliferam formas de contratação escondidas sob a subcontratação e o aluguer de mão-de-obra. Até o recibo verde, normalmente utilizado pelas profissões liberais, é colocado nas mãos de trabalhadores por conta de outrém, tal como se prestassem serviços. E, porque assim é, há que reforçar os mecanismos processuais do direito do trabalho para que estes casos cheguem aos tribunais e para que se defina que estes trabalhadores não são, de facto, subempreiteiros, não são empreiteiros, nem prestam serviços. São, isso sim, trabalhadores por conta de outrem, explorados duplamente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas o PCP apresenta também um projecto de lei no qual se inserem medidas de combate à exploração do trabalho infantil. É um projecto urgente por cujo debate nos bateremos com vista à sua conversão em lei da República - exigem-no as crianças e os seus pais.
Estas iniciativas legislativas, apresentadas no quadro da interpretação, são, decerto, um contributo para que a Assembleia da República dê resposta a alguns dos aspectos mais graves da política do Governo.
Mas proporemos também, por outro lado, a adopção de medidas que conduzam à alteração da actual situação de bloqueamento e inacção da Inspeccão-Geral do Trabalho e a uma profunda alteração do quadro legal existente em matéria de acidentes de trabalho.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Consideramos fundamental, e merecerá o profunde empenhamento do Grupo Parlamentar do PCP, o cumprimento rigoroso da lei dos salários em atraso aprovada pela Assembleia da República, a revogação da lei dos contratos a prazo e a sua substituição por legislação que institua o seu carácter limitado e

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excepcional, a garantia plena do direito à contratação colectiva, incluindo a dos trabalhadores da função pública e a participação efectiva dos trabalhadores nos organismos ligados ao emprego, à formação profissional, à Segurança Social e nos demais níveis de decisão, pondo-se termo às discriminações existentes.
Impõe-se também, no entender do PCP, a previsão legal de sanções às entidades que utilizam a subcontratação de trabalhadores sem vínculo laborai e sem segurança social e a supressão de entraves à constituição e funcionamento das comissões de trabalhadores e outras organizações representativas dos trabalhadores e a entrada em funções dos gestores eleitos pelos trabalhadores nas empresas do sector público.
Finalmente, Srs. Deputados, o PCP não poupará esforços para que seja cumprida a legislação de protecção das mães trabalhadoras aprovada pela Assembleia da República e eliminadas as discriminações que atingem a mulher no trabalho e no acesso ao emprego.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sabemos, Srs. Deputados, que só será possível resolver os problemas do desemprego, dos salários em atraso, do trabalho precário, com a mobilização efectiva dos recursos e potencialidades nacionais dos diferentes sectores da economia. Só será possível melhorar as condições de vida do nosso povo com uma nova política de salários, de preços, de impostos, de segurança social, de habitação, de saúde e de ensino.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Logo após as eleições de Outubro de 1985, o PCP chamou repetidamente a atenção dos partidos da oposição democrática para a existência de condições objectivas que permitiam e permitem uma alternativa ao governo minoritário do PSD.
Estes anos de ilegalidades, de afrontamento com os órgãos de soberania e de destabilização na vida nacional - nos seus diferentes sectores - colocam na ordem do dia da Assembleia da República aquilo para que vimos alertando.
Esta interpelação do PCP, trazendo à luz os graves problemas sociais dos trabalhadores e do povo português, que o Governo pretendia esconder, coloca com mais força ainda a necessidade urgente de construir a alternativa democrática exigida pelos Portugueses e pelo País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se presentes na galeria central 45 alunos da Escola de Francisco Rodrigues Lobo, da cidade de Leiria. Agradeço o favor, Srs. Deputados, de os saudarem da forma habitual.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social (Mira Amaral): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ano de 1986 foi um ano de ouro para a economia portuguesa. As principais metas de política económica foram atingidas. O PIB deverá ter crescido entre 4,25 % e 4,5 % em Portugal, ao passo que na CEE terá ficado pelos 2,5%. Portugal foi o país da CEE que mais cresceu em 1986. Para 1987 perspectiva-se na CEE a Doze um crescimento da ordem dos 2,3%, ao passo que em Portugal ele deverá ser da ordem dos 4%.
Quanto ao investimento em capital fixo, o seu crescimento em 1986, para Portugal, andará à volta dos 9%, enquanto a Europa dos Doze deverá ficar pelos 4%.
A inflação caiu, em Portugal, para 11,7 % em média anual e para um valor ainda mais baixo se medido sobre Dezembro de 1986 em relação a Dezembro de 1985, o que confirma a tendência e a trajectória desinflacionista da economia portuguesa.
É oportuno referir que instituições internacionais credenciadas, como a própria OCDE, confirmam os valores apontados pelo Governo Português e que já mereceram a concordância dos parceiros sociais em termos de meta de inflação anual para 1987.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os salários nominais terão crescido cerca de 17%, o que implica uma subida, em termos reais, de cerca de 5%. Por via disso, e devido à desoneração fiscal, o consumo privado terá crescido cerca de 6%.
Quanto ao desemprego, se pensarmos em sentido lato, havia, em Dezembro de 1985, 497 000 desempregados e uma taxa de desemprego de 10,9%, enquanto em Dezembro de 1986 o número de desempregados desceu para 433 000 pessoas e a taxa de desemprego reduziu-se para 9,6%. Por outras palavras, o número de desempregados, em sentido lato, diminuiu 12,8% e a taxa de desemprego sofreu uma redução de 11,8%.
Falando no desemprego em sentido restrito que é aquele que está de acordo com a metodologia EUROS-TAT e que é medido nos países europeus, houve, em Dezembro de 1985, 407 000 desempregados e no mês homólogo de 1986 360 000 desempregados. A taxa de desemprego em sentido restrito era de 9,0% em Dezembro de 1985, tendo-se reduzido para 8% em Dezembro de 1986.
Significativo é o facto de, em 1985, a taxa de desemprego ter subido do 3.º para o 4.º trimestre devido a efeitos de sazonalidade e de, em 1986, essa taxa se ter estabilizado do 3.º para o 4.º trimestre, o que destrói as afirmações de alguns mais apressados, que diziam que o excelente valor obtido no 3.º trimestre de 1986 era só devido a fenómenos de sazonalidade. Os resultados mostram que esse valor (do 3.º trimestre) e o do 4.º trimestre reflectem uma contínua descida da taxa de desemprego desde o fim de 1985 e ao longo de 1986.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A nossa taxa de desemprego em Dezembro de 1986 -8,0%- é ainda significativamente inferior à média europeia no mesmo ano -11 %- e à de alguns países da CEE. Por exemplo, no ano passado, a Espanha teve uma taxa de desemprego de 21,7%, a Irlanda de 18,4%, a Itália de 13,4%, a Bélgica de 12,9% e o Reino Unido e a Holanda de 12%. Instituições internacionais credenciadas e reconhecidas, como a OCDE, dizem que o desemprego ainda vai baixar em Portugal em 1987.
Quanto ao desemprego de longa duração, conseguimos inverter a tendência europeia, que vai no sentido de um aumento percentual daqueles que procuram emprego há mais de um ano face ao número total de desempregados.

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Assim, no 4.º trimestre de 1985 a percentagem de desempregados de longa duração era de 44,6% e no 4.º trimestre de 1986 tinha-se reduzido para 42,2 %.
Quanto aos jovens à procura de primeiro emprego, no 4.º trimestre de 1985 eram cerca de 188 000, ao passo que em período homólogo de 1986 o número tinha-se reduzido para cerca de 145 000.
Entre Dezembro de 1985 e Dezembro de 1986 o emprego cresceu, em Portugal, de 0,57o, pois passou de 4 048 000 para 4 069 000 pessoas empregadas. Aqui é oportuno referir que estes valores são calculados pelo Instituto Nacional de Estatística, de acordo com as metodologias unanimemente reconhecidas nos países desenvolvidos.
Por outro lado, gostaria de pedir a atenção de alguns dos Srs. Deputados para o facto de que estas questões das taxas de desemprego e do emprego não precisam de operações matemáticas complicadas. Na verdade, não pediria aos Srs. Deputados do PCP que soubessem álgebra; atrevia-me apenas a pedir-lhes que percebessem de aritmética.

Aplausos do PSD.

E quando referem que a taxa de actividade diminui porque o Governo passa pessoas empregadas para pessoas já desincentivadas do mercado de trabalho, dir-lhes-ia que a taxa de actividade é o quociente entre a população activa e a população do País.
Na realidade, a população activa diminuiu um pouco (l%), enquanto a população do País cresceu, em 1986, 0,6%, o que significa, grosso modo, que a taxa de actividade diminuiu 1,6%. Porém, o que é facto é que a taxa de desemprego diminuiu porque a diminuição percentual do número de desempregados foi superior à diminuição percentual da população activa.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Isso é que é aritmética!

O Orador: - Dito por outras palavras, a taxa de desemprego é o número de desempregados sobre a população activa. O número de desempregados desceu 12,8%, ao passo que a população activa apenas desceu 1%. Como resultado, a taxa de desemprego reduziu-se, grosso modo e neste sentido, em 12%. É apenas aritmética e não álgebra...

Vozes do PSD: - Muito bem! Protestos do PCP.

O Orador: - Isto mostra que não é devido à redução da taxa de actividade que a taxa de desemprego se reduziu. Na verdade, ela reduziu-se porque o número de desempregados se reduziu mais do que a taxa de actividade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É apenas aritmética - volto a repeti-lo, Srs. Deputados!
Tudo isto mostra uma melhoria na criação de emprego, que deverá ser significativamente reforçada nos próximos anos, de acordo com a estratégia de recuperação e crescimento económico do nosso país, implementada na sequência da política seguida pelo Governo. Com efeito, existiam, em 1985, na economia portuguesa muitas situações de subemprego e de salários em atraso, situações essas consideradas como de trabalhadores empregados, embora, na realidade, fossem de desemprego não explícito.
Com o crescimento económico, em 1986, essas situações de desemprego não explícito foram sendo gradualmente reabsorvidas, isto é, transformadas em emprego efectivo, e por isso é que a taxa de crescimento do emprego captada pelas estatísticas será, de facto, inferior à verdadeira criação de emprego na nossa economia em 1986.
Reabsorvidos esses casos de subutilização da mão-de-obra, há razões para supor que em 1987 as estatísticas captem melhor a verdadeira criação de emprego na economia. Por outras palavras, haverá em 1987 uma relação mar; directa entre o crescimento do PIB e o crescimento de emprego, que, em termos médios anuais, o Governo desejaria que fosse entre 17o e 1,57o. Aliás, um recente relatório da CEE apontava Portugal e a Alemanha como os dois países em que há um crescimento real do PIB e portanto da economia a permitir e a induzir um crescimento significativo do emprego.
Quanto aos salários em atraso, havia 64 800 trabalhadores com salários em atraso em Dezembro de 1985, 37 800 em Dezembro de 1986 e 32 900 em Janeiro de 1987, o que significa uma contínua e significativa descida dos trabalhadores vítimas desta chaga social.
Dos 32 900 trabalhadores ainda com salários em atraso em Janeiro de 1987, 22 400 estavam cobertos pelo subsídio de desemprego, o que dá um grau de cobertura sócia, de 68%.
Recordo aqui que a metodologia utilizada pela Inspeccão-Geral do Trabalho para captar o número de trabalhadores com salários em atraso não é mais do que a utilizada para a definição de «trabalhador com salários em atraso» na lei feita por esta Assembleia da República.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No que respeita aos conflitos laborais nas empresas, eles diminuíram de 1985 para 1986, pois houve, em 1985, 1237 conflitos de empresa contra 1052 em 1986, o que está de acordo com o clima de paz e distensão social que «e vive em Portugal, devido à recuperação económica proporcionada pela estratégia de progresso controlado. Todos estes resultados confirmam a melhoria, nos mercados de trabalho e emprego sentida em 1986 e resultante dessa estratégia económica de progresso controlado.
É importante chamar aqui a atenção para a acção da Inspecção-Geral do Trabalho em 1986, que, em termos muito sintéticos, se pode traduzir em cerca de 100 000 visitas feitas às empresas, nove acções globais específicas a sectores de actividade económica e 124 empresa; declaradas em situação de salários em atraso, de acordo com a lei da Assembleia da República.
Há ainda que referir o trabalho e a actividade específica que a Inspeccão-Geral do Trabalho tem vindo a desenvolver no domínio do trabalho infantil. No entanto, aqui gostaria de, mais uma vez, chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de este fenómeno do trabalho infantil ser difícil de detectar, pois resulta muito da conivência entre os pais e os empregados, pois que esses são trabalhadores e muitas vezes sindicalizados.

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Portanto, há aqui um problema de consciência, de responsabilidade cívica de todos - pais e empregadores -, para a qual importa chamar a atenção e a qual é preciso desenvolver, para que o combate que o Governo e a Inspecção-Geral do Trabalho têm travado com o trabalho infantil possa ser desenvolvido ainda mais e, se possível, ainda melhorado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Focaria, em resumo, os principais indicadores macroeconómicos em 1986, isto é, aqueles que têm uma relação mais directa com os mercados de trabalho e emprego: produto interno bruto, a crescer entre 4,25% e 4,5%; investimento em capital fixo, a crescer 9%; taxa de inflação (média anual), a crescer 11,7%; salários nominais, a crescerem 17%; salários reais, a crescerem cerca de 5%, e consumo privado, a crescer 6%.
Quanto ao mercado de trabalho: população empregada, a crescer, entre o 4.º trimestre de 1985 e o 4.º trimestre de 1986, em 0,5%; população desempregada, se pensarmos em sentido restrito, a descer, entre os mesmos trimestres de 1985 e 1986, 11,7%; desempregados em sentido lato, a descer, entre Dezembro de 1985 e Dezembro de 1986, 12,8%.
Ainda relativamente ao mercado de trabalho e quanto ao número de trabalhadores com salários em atraso, verifica-se uma descida, entre o fim de 1985 e o fim de 1986, de 41,7%. Quanto ao número de estabelecimentos onde existe esse fenómeno, regista-se uma descida, entre o fim do ano de 1985 e o fim do ano de 1986, de 50,3%.
Relativamente ao número de trabalhadores desempregados à procura do primeiro emprego, verifica-se uma descida, entre o fim de 1985 e o fim de 1986, de 22,9%.
Com respeito ao número de conflitos de empresas, regista-se um decréscimo, entre o fim de 1985 e o fim de 1986, de 15%.
Quanto à taxa de desemprego em sentido restrito, existe uma descida, entre o final de 1985 e o final de 1986, de 9% para 8%; em relação à taxa de desemprego em sentido lato, regista-se uma descida, entre Dezembro de 1985 e Dezembro de 1986, de 10,9% para 9,6%.
No que toca ao crescimento de emprego e à estabilidade dos postos de trabalho, os resultados poderiam ser certamente melhores se tivesse sido possível a alteração da legislação laborai no sentido moderno e europeu proposta pelo Governo a esta Assembleia. Com o actual crescimento económico temos condições para entrar num círculo virtuoso em que o crescimento favorece a distensão social, o que facilita a alteração da legislação laborai no sentido de uma maior eficiência no funcionamento do mercado de trabalho e emprego, e essa maior eficiência faria ainda melhorar o crescimento e o desenvolvimento económicos.
No domínio social, há a registar as substanciais melhorias no domínio das pensões, dos abonos de família, prestações complementares e prestações para deficientes. Bastará recordar que, quando tomámos posse, a pensão mínima do regime geral da Segurança Social era de 5500$ e agora é de 11 500$ e o do regime especial dos trabalhadores agrícolas era de 4800$, tendo passado para 8500$, ao passo que a pensão do regime não contributivo da Segurança Social, a chamada pensão social, se elevou de 4600$ para 7500$ no prazo de um ano.
As pensões de reforma, invalidez e velhice dos pescadores artesanais, do bacalhau e do arrasto também tiveram aumentos num ano, que se cifram, em termos médios, respectivamente, em cerca de 85,5%, 92,7% e 129,2%, quando os preços cresceram, durante o ano de 1986, em 11,7%.
Os abonos de família e prestações complementares sofreram, em Janeiro de 1986, aumentos de mais de 50% e recentemente actualizámos os abonos complementares e os subsídios mensais vitalícios para os deficientes no valor médio da ordem dos 54%.
É também importante recordar essa medida verdadeiramente estrutural que foi a integração dos trabalhadores rurais no regime geral da Segurança Social, permitindo equipará-los, em termos sociais, aos trabalhadores dos outros sectores de actividade e possibilitando-lhes melhores prestações nos subsídios de doença, desemprego e morte e nas pensões de invalidez, velhice e sobrevivência.

Uma voz do PS: - Está tudo rico!

O Orador: - Tudo isto foi possível no quadro de uma política económica e social global e coerente.
É também neste contexto que se deve equacionar a política de emprego implementada pelo Governo. Ela faz parte dessa política económica e social global e coerente.
Numa pequena economia aberta como a portuguesa, a política de emprego não pode ser um desenho mecanicista e voluntarista por parte do Estado, no sentido da criação administrativa de postos de trabalho, nem sequer a manutenção artificial de emprego nas empresas.
Nem mesmo os socialistas europeus ousam, hoje em dia, afirmar que a prosperidade decorre da planificação, de políticas voluntaristas de grandes fileiras industriais ou das nacionalizações. Durante um século, depois de 1873, ser moderno e progressista significava ver no Estado o motor da mudança social e do progresso. Hoje todos sabemos que aqueles que pregam essas receitas não têm uma visão correcta sobre o progresso das sociedades modernas.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Estado deverá, sobretudo, fornecer o enquadramento e os estímulos para que as decisões autónomas dos agentes económicos - trabalhadores e empresários - coincidam com o interesse nacional.
Não podemos fazer a gestão do novo modelo de desenvolvimento com a mentalidade e os instrumentos do passado. Aqueles que continuam agarrados à mentalidade e aos instrumentos do passado são, na prática e na realidade, conservadores, Srs. Deputados do PCP!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Srs. Deputados do PCP, é que não estamos de acordo com os «paleomarxistas», ou seja, os marxistas da era paleolítica.

Aplausos do PSD.

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As empresas são o verdadeiro motor do crescimento económico e da criação de emprego, devendo para isso ser ajudadas pelo Estado através de um conjunto de acções visando assegurar um sistema económico produtivo e eficiente.

neste contexto que a política de emprego implementada pelo Governo assenta nos vectores seguintes.
O primeiro vector são as políticas de expansão macro-económica que, não degradando nem a moeda nem o equilíbrio externo, favoreçam a formação de unidades de mais trabalho intensivo e menos capital intensivo. É a estratégia do progresso controlado que está a ser implementada pelo Governo, com um enfoque no lado da oferta através da redução dos custos unitários de produção.
O segundo vector são as políticas que visem incentivar o lado da oferta através de uma maior liberalização do nível macro-económico, visando o aparecimento de cooperativas e de uma rede de PMEs, que são em toda a pane as grandes geradoras de emprego. É a política que visa eliminar a rigidez do nosso sistema económico e o apoio às cooperativas, às PMEs, à criação do próprio emprego e ao estabelecimento por conta própria dos trabalhadores portugueses.
O terceiro vector traduz as políticas que visem a eliminação dos factores de rigidez dos mercados de trabalho e emprego, incentivando a formação, a informação, a flexibilidade e a adaptabilidade dos mercados de trabalho e emprego.
As nossas estruturas jurídico-laborais assentam ainda na concepção tradicional da grande empresa de produção, fortemente assente sobre o mercado interno, empregando maioritariamente trabalhadores cujas qualificações tecnológicas são, senão inexistentes, pelo menos incipientes.
A crescente internacionalização da nossa economia e o novo modelo de desenvolvimento económico e industrial exigem unidades de dimensão mais pequena, baseadas na inteligência dos trabalhadores, no talento empresarial e viradas sobre o mercado externo.
É neste contexto de um mundo em mudança, em que aparecem novos desafios e oportunidades às empresas portuguesas, que devemos encarar a flexibilidade e adaptabilidade dos mercados de trabalho e emprego e as políticas de formação profissional que estão a ser implementadas pelo Governo.
Assim, o quarto vector de uma política de emprego são as políticas de desenvolvimento regional, visando uma contribuição decisiva para a diversificação geográfica das oportunidades de emprego. Ë a política que está subjacente aos PIDRs, ao lançamento de vias de comunicação e à criação de infra-estruturas nas regiões do interior, conjugada com os estímulos de base regional virados para o investimento produtivo e para a criação de emprego nessas regiões.
É também a política ligada ao fomento do artesanato e à promoção das iniciativas locais de emprego.
O quinto vector da política de emprego visa os apoios ao primeiro emprego e à contratação salarial. E a política reflectida na legislação que incentiva a admissão de jovens e deficientes nas empresas, quer isentando-as, total ou parcialmente, das contribuições para a Segurança Social, quer apoiando a admissão nas empresas de ex-estagiários de formação profissional ou desempregados de longa duração, através do pagamento pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social, durante períodos de seis meses a um ano, do salário
mínimo nacional a esses estagiários ou recém admitidos. É ainda a política reflectida nas acções de formação profissional financiadas pelo Fundo Social Europeu e realizadas nas empresas, política essa que permitiu criar cerca de 50 000 postos de trabalho para os jovens em 1986.
O sexto vector da política de emprego são as políticas de rendimento!, e preços que permitam moderação salarial com vista a que o crescimento do produto seja feito com controle do nível de preços e crescimento do emprego. É, afinal, a estratégia para o crescimento de produção e emprego adoptada pela CEE e reflectiva em Portugal no Acordo do Conselho Permanente da Concertação Social sobre Política de Rendimentos e preços.
Neste Acordo foi possível às confederações empresariais, a uma central sindical democrática, moderna e europeia e ao Governo assentarem numa estratégia que só traz benefícios para os trabalhadores e para o nosso país.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo vai, com a ponderação que os problemas económicos e sociais em presença exigem, procurar motivar o crescimento um pouco mais pelo lado do emprego. Conta, para isso, com a efectiva possibilidade de reduzir o custo relativo do emprego, o que pressupõe o preenchimento de cinco condições que se revestem de importância decisiva.
A primeira condição é a de fazer incidir as medidas da política de redução dos custos unitários de produção mais sobre o factor trabalho do que sobre os outros factores de produção, sem, obviamente, criar artificialismos, que se pagam caro, nos custos do uso da energia ou dos equipamentos.
A segunda condição traduz-se na possibilidade de restaurar a faculdade de uma empresa gerir pelos processos normais a componente laborai das escalas microe-conómicas da produção. Os contratos a prazo têm constituído um subterfúgio que permite aos empresários atenuar o sobre custo associado à rigidez laborai da escala. Durante anos temos assistido a um encarecimento relativo do factor trabalho; e uma das manifestações mais delicadas deste encarecimento é de ordem psicológica e não completamente contabilizável, mas com severo; efeitos na propensão para investir e criar emprego em Portugal.
Basta ver o que aconteceu quando o Governo fez uma legislação que permitia às empresas serem dispensadas do pagamento à Segurança Social se admitissem jovens com contratos sem prazo. Com efeito, as empresas preferiram, muitas delas, continuar a admiti-los com contratos a prazo; no fundo, as empresas preferiram pagar os 24% da taxa social única a admitirem trabalhadores jovens com contratos sem prazo. Isto mostra que o sobre custo da rigidez do factor trabalho custa, pelo menos, 24 % da massa salarial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A terceira componente é a europeização da legislação laborai - o que abrange o pressuposto anterior -, no sentido de colocar as empresas portuguesas em pé de igualdade com as empresas da CEE no que respeita ao mercado de trabalho e no sentido de tornar o recurso ao factor trabalho mais con-

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dizente com a racionalidade empresarial e, portanto, mais atraente quando posto em comparação com as hipóteses alternativas de simplesmente não investir ou de investir poupando o trabalho e reforçando o capital técnico (acentuando o coeficiente capital/emprego).
Foi, aliás, aquilo que o Governo propôs à Assembleia da República e que foi rejeitado por esta Câmara.
A quarta componente é investir dinheiros públicos e fundos da CEE (Fundo Social Europeu) na valorização profissional dos recursos humanos, deste modo elevando a sua produtividade potencial e baixando o seu custo relativo.
A quinta condição é a de congregar o entendimento dos parceiros sociais no sentido de uma política de rendimentos que ajude a promover o emprego em vez de o contrariar; os excessos salariais têm-se revelado efémeros; a moderação salarial é susceptível não só de proporcionar melhorias duradouras do nível de vida, como também suscitar reduções do desemprego.
No que respeita aos programas de política de emprego desenvolvidos pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social, alguns deles em colaboração com a Secretaria de Estado da Juventude, é oportuno referir que eles se podem dividir em:

Programas de criação e de manutenção de emprego, que são, por exemplo, as iniciativas locais de emprego, o apoio à admissão e contratação de jovens e desempregados de longa duração e o lançamento do Centro Experimental de Criação de Empresas de Setúbal. As iniciativas locais de emprego receberam o necessário enquadramento legislativo através do Despacho Normativo n.º 46/86, de 4 de Junho, do Ministério do Trabalho e Segurança Social, o qual fixa os apoios técnicos, financeiros e técnico-financeiros a dar as iniciativas locais de emprego. Já se receberam no Instituto do Emprego e Formação Profissional 115 projectos de iniciativas locais de emprego para um número total de postos de trabalho de cerca de 900;
Programas ocupacionais, destinados a ocupar, numa certa época, a mão-de-obra inactiva, que são, por exemplo, as Organizações de Tempos Livres, as Ocupações Temporárias de Jovens e o Apoio aos Desempregados de Longa Duração;
Programas de integração profissional, destinados a apoio salarial e estágios nas empresas de trabalhadores ou desempregados, aos quais o Ministério do Trabalho e Segurança Social paga o salário mínimo nacional;
Programas de apoio a deficientes, em que, como exemplo, há a referir os centros de emprego protegido, os apoios financeiros ou a isenção parcial de contribuições da Segurança Social para a integração profissional de deficientes e ainda a pré-profissionalização.
O conjunto destes programas mobilizou, em 1986, cerca de 69 000 pessoas e gastou cerca de 5 milhões de contos. Em 1987 pensamos gastar cerca de 13 milhões de contos para cerca de 90 000 pessoas.
No que toca à formação profissional, interessa referir as acções de aprendizagem da Lei da Formação em Cooperação, da formação de formadores e ainda os programas de reabilitação profissional.
Na aprendizagem vão-se gastar 2,2 milhões de contos, em 1987, para 3400 aprendizes, contra 1,1 milhões de contos e 1000 aprendizes em 1986.
Na Lei da Formação em Cooperação ir-se-ão gastar 5 milhões de contos para financiar os 650 acordos que permitirão a formação profissional nas empresas a cerca de 150 000 trabalhadores e ainda 6 milhões de contos para o financiamento dos 22 centros de formação profissional protocolares do Instituto do Emprego e Formação Profissional, onde receberão formação superior a 400 horas cerca de 8000 trabalhadores.
Ainda na formação profissional, as acções financiadas pelo Fundo Social Europeu permitiram um bom significativo em 1986, tendo Portugal conseguido 31,6 milhões de contos de créditos de compromisso e recebido 15,8 milhões de contos de créditos de pagamento para financiar a formação de 154 000 pessoas, das quais 113 000 jovens.
Para 1987 foram submetidos ao Fundo Social Europeu dossiers referentes a 3% 000 pessoas, das quais 235 000 jovens, e correspondentes a 105 milhões de contos de créditos de compromisso.
Calculamos obter entre 50 e 55 milhões de contos de créditos de compromisso e cerca de 30 milhões de contos de créditos de pagamentos.
Estas acções do Fundo Social Europeu, implicando também um esforço significativo do Orçamento do Estado, permitiram e vão permitir a formação quer de jovens com qualificações insuficientes ou inadaptadas, quer de trabalhadores abrangidos por processos de reestruturação na sequência da modernização tecnológica ou de alterações profundas na procura do sector, quer ainda a formação nas novas tecnologias de trabalhadores de PMEs. O Fundo Social Europeu veio ainda financiar a formação de formadores, de conselheiros de orientação profissional e de agentes de desenvolvimento.
É também importante chamar a atenção dos Srs. Deputados para o conjunto de programas destinados aos jovens, programas de emprego e formação profissional, nos quais se pensa gastar, em 1987, cerca de 64 milhões de contos, abrangendo 250 000 jovens.
Todo este conjunto de acções e programas no domínio do emprego e da formação profissional mostra que o País está no bom caminho, no caminho do progresso e da modernização, por muito que isto custe aos arautos da desgraça, eternos conservadores, sempre renitentes às mudanças, avessos ao ideal europeu e ao modelo democrático e ocidental, por muito que isto custe aos «paleomarxistas».

Risos do PSD. Protestos do PCP.

Por nós, reafirmamos a nossa fé no futuro do nosso país, na sequência da política económica e social, feita de acordo com o modelo social europeu, em que as mudanças no mercado de trabalho e emprego, no quadro de uma economia moderna, aberta e competitiva, devem ser feitas no respeito pelos direitos fundamentais dos trabalhadores, nos quais se inclui, obviamente, o direito à protecção social, assegurada pelo sistema de segurança social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Para nós, o objectivo da política económica não é nem será o de dar subsídios às empresas, mas sim o de criar as condições de recuperação económica, no intuito de estimular o investimento e o emprego.
Para nós, o objectivo da política social não é o de pôr em causa os direitos dos trabalhadores, mas sim o de aliviar as restrições e os espartilhos que pesam sobre a actividade económica para que se possam assegurar níveis elevados de emprego no quadro de uma economia moderna aberta e competitiva.
Por isto tudo é que as leis do trabalho, o aparelho de formação profissional e o sistema de segurança social são para o Governo instrumentos activos da política de emprego.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a fase de abertura, entramos no debate, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Duarte Lima para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, não há dúvida de que as interpelação do Partido Comunista ao Governo têm uma má sina: da primeira vez que o Partido Comunista fez uma interpelação ao Governo foi anunciada a apresentação de uma moção de confiança, ficando a interpelação completamente esvaziada de sentido; desta vez, que estava agendada uma outra interpelação do Partido Comunista, o PRD decidiu apresentar uma moção de censura ao Governo, e mais uma vez a interpelação do Partido Comunista foi atirada para o cesto das coisas inúteis. Por isso se compreende o modo apagado como V. Ex.ª começou a intervenção!
Quero começar por fazer uma correcção às suas palavras: é que V. Ex.ª proferiu uma inverdade naturalmente não de má fé, mas por estar mal informado- ao dizer que, aquando da sessão realizada há dias por motivo da deslocação de uma delegação parlamentar à Estónia, uma grossa fatia do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata não se encontrava presente. Esse foi, de resto, um argumento que a brincar, penso eu, porque ele é um bocado brincalhão o Sr. Deputado Hermínio Maninho já ontem proferiu perante os microfones da RTP. Ele de vez em quando diz umas coisas destas na «reinação» e V. Ex.as pegaram no mote!... Na verdade, não é assim. A lista de presenças, que V. Ex.ª poderá consultar, regista 73 deputados no começo da sessão, num total de 88, e durante a sessão entraram mais 11 deputados.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Via-se, via-se!

O Orador: - Sr. Deputado, como sabe, a votação foi feita com o nosso consentimento e nós não pusemos nenhum obstáculo a que isso sucedesse, quando podíamos fazê-lo. Isto porque a votação não estava agendada. Portanto, este argumento cai pela base, porque o PSD não se afastou, o PSD esteve aqui com a maioria esmagadora dos seus deputados.
Trata-se, pois, de uma inverdade que gostaria de deixar corrigida.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Há falta de solidariedade!

O Orador: - Alguns dos argumentos que expendeu durante a sua intervenção foram profusamente rebatidos pelo Sr. Ministro do Trabalho, pelo que agora me dispenso de fazer algum comentário.
V. Ex.ª acusa o Governo pela proliferação do trabalho infantil. Diz mesmo que foi a umas fábricas e que as crianças fugiam de si à entrada.

O Sr. António Capucho (PSD): - Pudera!

Risos do PSD.

O Orador: - Não quero cometer a injustiça de pensar que as crianças se assustaram comigo...

Risos do PSD.

..., a menos que V. Ex.ª tivesse...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É um assunto demasiado sério!

O Orador: - É, sem dúvida, um assunto demasiado sério para o Partido Comunista vir aqui fazer, como fez, demagogia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É um assunto demasiado sério para o Partido Comunista vir fazer demagogia, como fez, da tribuna.

Aplausos ao PSD.

As crianças poderão ter pensado que V. Ex.ª pertencia à Inspecção-Geral do Trabalho. Porque não?!... Que garantia; tem V. Ex.ª de que quando a Inspecção Geral do Trabalho vai às fábricas e às empresas as crianças não fogem? O Governo não pode pôr um fiscal atrás de cada empresário. V. Ex.ª sabe bem disso! Sem dúvida que este é um problema que releva da actuação do Governo e da Inspecção-Geral do Trabalho, e o Governo está preocupado com isso. Mas não só: releva também da colaboração das famílias, das empresas, dos sindicatos, dos próprios trabalhadores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pergunto: V. Ex.ª denunciou as empresas em questão aos órgãos competentes? Fez isso, como era seu dever como cidadão, como deputado e como sindicalista?

Protestos do PCP.

É uma pergunta em relação à qual gostaria que me esclarecesse.
V. Ex.ª também diz uma coisa que não podemos deixar em cia-o: do rol das críticas que fez ao Governo, a principal é a de que o Governo é o culpado da proliferação da tuberculose, e da tribuna apontou-nos o dedo porque nos rimos. De resto, nesta Câmara esta já não é a primeira manifestação preocupante da unicidade humorística, porque parece que da minha bancada já ninguém se pode rir. Só daí é que se podem rir, daqui ninguém se pode rir!...

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Sr. Deputado, não nos rimos da tuberculose nem das pessoas que, infelizmente, padecem desse mal; rimo-nos, isso sim, de si e do disparatado da sua argumentação quando aqui vem dizer que o Governo é o culpado do aumento da tuberculose.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nunes do Valle.

O Sr. Nunes do Valle (PSD): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, continua o PCP a criticar todos os governos sempre da mesma forma sem conseguir mudar o discurso. Obtiveram a primeira tradução, e até hoje não conseguiram arranjar tradutor. Algo vai, pois, mal no PCP e, para camuflar todas as incapacidades, aparecem repetições ancestrais.
Hoje voltamos a ouvir a leitura de antigos discursos sem qualquer inovação e, como vão ficando cansados, tivemos de ouvir três leitores.
Mesmo assim, pergunto: onde estão as grandes e incontroláveis movimentações contra o X Governo? Que tipo de greves, e onde, se têm verificado ultimamente?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com que adesão? Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Será que meia dúzia de trabalhadores pagos para tal, com certeza, empunhando cartazes já gastos e sem qualquer significado, se poderá considerar movimento de contestação?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Já nem o Salazar dizia isso!

O Orador: - Não há dúvida de que na vossa bancada há falta de conhecimentos aritméticos!...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Nem o Caetano dizia isso!

O Orador: - Quem ameaça com agressões os trabalhadores que pretendem trabalhar e entrar nas empresas?

Aplausos do PSD. Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - O Sr. Deputado Duarte Lima começou por dizer que tivemos um azar tremendo com as interpelações, porque da primeira vez que apresentámos uma interpelação foi também apresentada uma moção de confiança e desta vez vai ser apresentada uma moção de censura. Eu disto tiro um ensinamento contrário ao que o Sr. Deputado tirou: tenho a impressão de que vale a pena fazer uma nova interpelação para ver se o Governo cai!

Aplausos do PCP.

Neste sentido, pensamos que vale a pena fazer a interpelação, e no fim do debate é que se vai provar se valeu ou não a pena. A própria interpelação e os casos que aqui são trazidos servirão também para serem incluídos numa apreciação global da política do Governo e com certeza terão expressão significativa no desenrolar da discussão da própria moção de censura.
Quanto à ausência de um terço de deputados do PSD aquando do recente debate da ida de uma delegação parlamentar à União Soviética, devo dizer que não falei em números, disse apenas que se tinha registado uma significativa ausência.

O Sr. António Capucho (PSD): - Estiveram presentes 84 deputados!

O Orador: - O mérito que reconheço ao PSD é o de que nas grandes discussões, nas grandes votações, é um grupo parlamentar disciplinado, tem sempre a bancada cheia de deputados - reconheço-lhe esse mérito.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito obrigado!

O Orador: -...-, mas, curiosamente, nesse dia faltaram muitos deputados!...

O Sr. António Capucho (PSD): - Faltaram quatro deputados!

O Orador: - Tirei a ilação política na minha intervenção e referi essa situação.
Depois o Sr. Deputado Duarte Lima tentou fazer uma graça - aliás, hoje tanto o Governo como a bancada do PSD estão muito bem dispostos - relativamente às crianças que fugiam quando tentávamos contactá-las.
Sr. Deputado, não sei, mas penso que deve conhecer pouco a vida. Eu, por exemplo, era um dos que às vezes me escondia no armazém da cavilha quando a Inspecção-Geral do Trabalho lá ia. A culpa não era dos meus pais nem minha, mas do próprio regime fascista. Ali, na minha terra, que Soeiro descrevia de «homens que não tiveram tempo de muitas vezes serem meninos», para sobrevivermos - e não era por ganância dos pais -, tínhamos de nos sujeitar a essas formas de exploração, Sr. Deputado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando as crianças voltam a fazer o mesmo no Portugal de Abril é porque há qualquer coisa que está mal. Apelo, pois, à sua consciência democrática para perceber que alguma coisa está mal neste Portugal quando as crianças têm de ir trabalhar para as empresas.
Estou de acordo consigo quando diz que isso é uma questão das famílias, dos sindicatos, mas também, Sr. Deputado, é uma questão do Governo, e não é, como o Sr. Ministro afirmou, de ganância dos pais.

Aplausos do PCP.

Nesse sentido, Sr. Deputado Duarte Lima, apresentámos um projecto de lei que visa, de uma forma pedagógica, ajustar essas entidades que acabou de referir, com vista a combater esse flagelo social que existe no nosso país.

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Quanto à questão da tuberculose, devo dizer-lhe que o seu aumento significativo - e o Sr. Deputado vai ouvir uma intervenção por pane da minha bancada que visará esse tema - tem também um significado político e social. Se os sintomas da pobreza se manifestam, nomeadamente no aumento da doença, isto tem a ver com os acidentes de trabalho - e repare que o Sr. Ministro do Trabalho nem uma vez referiu a questão da higiene e segurança no trabalho. Veio cá, no ano passado, uma delegação da OIT, uma delegação tripartida - Governo, patronato e associações sindicais -, que apontou recomendações sérias ao Governo no sentido da higiene e segurança no trabalho, e nem sequer uma coisa foi feita, Sr. Deputado. Isto é preocupante, porque depois tem expressão concreta no aumento da doença, no aumento da pobreza em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Nunes do Valle disse que não mudamos o discurso quando atacamos os governos. É que o nosso drama é que eles não mudam de política. O actual governo, com a nuance de ser minoritário, não muda de política, fazendo uma política de continuidade, uma política velha, com os mesmos objectivos de governos anteriores.
Nesse sentido, procuramos denunciar as situações, e é curioso que o Sr. Deputado não tivesse afirmado, uma única vez, que, relativamente aos casos concretos que referi, esses factos não correspondiam à verdade.
Quanto às manifestações que ninguém vê, tome este conselho, Sr. Deputado: veja menos televisão e conheça mais a vida!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.ª, ao longo da sua intervenção, veio aqui ratificar - diria repetidamente, porque já anteriormente o seu partido o tinha feito - a conclusão, que o Governo tem afirmado publicamente, de que os salários reais cresceram em Portugal, no ano de 1986, na ordem dos 4% ou 5%.
Como V. Ex.ª sabe, essa operação traduziu uma significativa inversão da tradição negociai portuguesa e mesmo na tradição negociai europeia. Isto é, a evolução dos salários reais sempre foi aferida em função da recuperação dos salários nominais face à inflação ocorrida no ano precedente, isto é, a inflações consumadas, concretizadas e apuradas.
Desta vez - o Governo, aliás, teve a hombridade de o afirmar no seu próprio Programa - operou-se o cálculo e a avaliação da evolução dos salários reais em função não da inflação ocorrida em 1985 mas da inflação perspectivada para o ano de 1986. Isto é, os aumentos salariais ocorreram por antecipação da evolução da inflação.
A operação pode parecer, neste caso, uma operação meramente aritmética; do nosso ponto de vista, não é uma operação meramente aritmética e traduziu-se num grave e muito concreto prejuízo para os trabalhadores portugueses.
Se os salários, como sempre tinha acontecido anteriormente, no início de 1986, tivessem recuperado o poder de compra degradado em 1985, deveriam ter evoluído em valor numérico inferior aos 19,3%, valor em que se tinha quedado a inflação em 1985.
Pelo contrário, situando-se a evolução dos salários na ordem dos 15% ou 16%, isto é, abaixo da inflação concretizada em 1985, o normal teria sido falarmos do decréscimo do poder de compra dos trabalhadores e não do aumento do poder de compra dos trabalhadores.
Interessou ao Governo dar a ideia de que a evolução dos salários devia ser aferida em função da evolução da inflação respectivada, e o curioso foi que a Intersindical, o F CP e a UGT tiveram interesses convergentes com o Governo nesta operação de opinião pública e o País vive hoje contente e regalado com a ideia de que os Portugueses melhoraram o seu nível de vida ao longo de 1986.
Isto é uma questão assente e sobre ela não queria instar mais V.Ex.ª
Vindo o Partido Comunista e parte da opinião dos economistas portugueses a reflectir a preocupação de que poderemos estar na iminência de uma retoma do ritmo inflacionista e de uma retoma do agravamento das tensões inflacionistas, torna-se inevitável que este governo, como porventura qualquer outro, retome as teses antecedentes. Isto é, a antecipação da inflação em termos salariais traduz um efeito de agravamento das tensões inflacionistas e, como tal, não é suportável por nenhuma economia. Teremos por isso de regressar à ideia de que a evolução dos salários tem que repercutir apenas inflações previamente concretizadas.
A pergunta que quero fazer-lhe é esta, Sr. Deputado: nessa altura o Partido Comunista vai também avalizar este tipo de operação?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, julgo que convém clarificar alguns pontos, uma vez que penso que confundiu algumas coisas.
Em primeiro lugar, confundiu - e julgo que essa é a questão central - a questão de saber se a negociação salarial num determinado ano deve tentar recuperar a taxa de inflação do ano anterior ou se deve ter em atenção a taxa prevista para o próprio ano. Essa é uma questão.
Quanto à questão da medida do salário real - e não vou entrar em discussões profundas sobre o conceito de salário içai, porque haveria muito que dizer sobre o que é o salário real, mas não levantou essa polémica, digamos assim -, por norma, quando se faz o cálculo do chamada «salário real», compara-se o índice de evolução dos salários nominais com o índice de evolução dos preços do mesmo ano. Isto tem sucedido todos os anos.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Não é assim!

O Orador: - Tem sucedido todos os anos, Sr. Deputado. Peço desculpa, mas basta consultar qualquer relatório do Banco de Portugal, o relatório do PCP, os dados estatísticos do INE, etc. É sempre assim que se calcula.

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O problema que o Sr. Deputado põe é outro: o da contratação colectiva.
Nessa perspectiva, Sr. Deputado, não pode tirar a conclusão que queria tirar e que chegou a afirmar, isto é, a de que haveria uma convergência de opiniões entre o Partido Comunista Português e o Governo. Não há convergência absolutamente nenhuma. A divergência é total e radical. Que não se suscite a menor das dúvidas! ...
Dir-lhe-ei ainda, Sr. Deputado, sem entrar - e repito-o mais uma vez - na discussão profunda do que deve ser o salário real, que há uma questão essencial que não pode ser escamoteada e para a qual alertamos: é que esse aumento do salário real, nas condições em que ele é medido normalmente, não pode escamotear a baixa de peso da massa salarial no rendimento nacional. Nunca, como nos dois últimos anos, o salário real, da forma como é medido, ficou tão longe do chamado «salário de equilíbrio». Não houve nenhum ano como o de 1986, ano em que, de facto, foi maior a perda dos salários em relação às possibilidades da economia, em relação ao enriquecimento da economia, enriquecimento esse - frise-se - em termos meramente nominais.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por conseguinte, o problema não se põe como o Sr. Deputado o pôs; o problema da possibilidade de retoma de ritmo inflacionista a taxas elevadas está bem presente, é bem actual e deve ser considerado, porque quando desaparecerem os efeitos da envolvente externa sobre a inflação interna corremos sérios riscos de a inflação «disparar» de novo. Mas aí o Governo prepara-se para dar o salto antes que isso suceda! É nessa perspectiva que ele tem desenvolvido a sua política demagógica e fundamentalmente eleitoralista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, inscreveram-se os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, Octávio Teixeira, Jerónimo de Sousa, Odete Santos, João Amaral, António Mota, lida Figueiredo, José Seabra, Álvaro Brasileiro, António Marques, Jorge Patrício, José Apolinário, Marcelo Curto e Carlos Coelho.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Ministro, quando estava há dias em casa a ver um noticiário «apanhei» com o direito de antena do PSD. V. Ex.ªs, com falta de imaginação, repetiu exactamente aquilo que foi dito no direito de antena do PSD e, sobretudo, do Sr. Dr. Cavaco Silva, os mesmos números, as mesmas propagandas. Mas, tal qual nessa altura aconteceu, V. Ex.ª não falou no vosso modelo de desenvolvimento económico, não disse como é que estão a ser aproveitadas as nossas potencialidades, como é que está a ser modernizado o nosso aparelho produtivo, o que é que está a ser feito para a criação dos postos de trabalho e de fábricas, onde é que está o plano industrial deste país, etc.
Vai citando, isso sim, números e fala, como é evidente, da estratégia do progresso controlado. Só não referiu, desta vez, a flexibilização da economia através da flexibilização da área laborai, tão do vosso agrado. Mas referiu claramente a necessidade de alteração da legislação laborai. Esqueceu-se, no entanto, dessa frase tão bonita, e o Sr. Ministro gosta muito de frases bonitas como as que foi citando e das quais algumas até tem dificuldade em soletrar por falta de leitura constante, com certeza.

Risos.

Mas o Sr. Ministro citou também grandes exemplos: Portugal é o país da CEE que tem a taxa de desemprego mais baixa. E citou a taxa de desemprego da CEE, mas se fizermos contas são algumas dezenas de milhões de pessoas as que nos países da CEE estão desempregadas: andam à volta de 24 a 25 milhões.
É evidente que o Sr. Ministro não vai com certeza desmentir que na CEE há grande desemprego e em Portugal também há grande desemprego e este governo não nos diz quais são as suas perspectivas para acabar com esta situação. Também se esqueceu de citar, a propósito do desemprego nos países da CEE, quais são os apoios sociais extraordinários de que estas populações beneficiam e que em Portugal não colhem esses apoios.
Temos hoje em Portugal, Sr. Ministro, problemas gravíssimos, como seja o problema do trabalho infantil.
Tive oportunidade de, na semana passada, ir ao Minho a propósito da minha actividade parlamentar. Em Braga disseram-me que a maioria do pão que se come lá é feito por crianças de 9 e 10 anos. É claro que depois diz-se que não é possível o Governo pôr inspectores do trabalho em todos os locais. O Sr. Secretário de Estado ri-se mas era conveniente que visse bem as questões e não sorrisse tanto. A situação é grave e quando é assim alguém tem responsabilidade; o Governo não pode dizer que a não tem.
Gostava, Sr. Ministro, que me dissesse, na sequência dos números que apresentou: Quantos desempregados recebem o subsídio de desemprego no nosso país? Quantos contratados existem no nosso país? Agravou-se ou não a precarização do emprego?
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística respeitantes ao 3.º trimestre de 1986, o número de contratados a prazo é de 13,2% da mão-de-obra empregada. E dos trabalhadores admitidos naquele trimestre 68,8% foram contratados a prazo e cerca de 8,7% a título permanente. Aumentou ou não, Sr. Ministro, o recurso à tarefa, à hora, ao domicílio, ao aluguer da mão-de-obra?
Sr. Ministro, qual é a percentagem de desempregados, já que tem tantos números, com menos de 25 anos? Gostaria de saber se é ou não é superior a 20%. E qual a percentagem de desempregados há mais de um ano?
Também gostava de saber, com os números todos que o Sr. Ministro tem, qual foi nos últimos dois anos a evolução do desemprego na zona da Reforma Agrária e gostava também que me dissesse se aumentou ou não aumentou o desemprego nessa zona na vigência deste governo. Se aumentou ou não aumentou, Sr. Ministro, o número de mulheres que estão a ser lançadas para casa com aquele epíteto do anterior regime de «domésticas». Já agora, Sr. Ministro, para terminar, quais são os sectores, e eu só peço estes números na sequência da sua intervenção, mais atingidos pelo desemprego neste país?

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São questões muito simples, a que gostava que o Sr. Ministro fizesse o favor de responder.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro, gostaria de começar por lhe dizer que há uma questão em que estou totalmente de acordo consigo.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - É difícil!

O Orador: - É anormal mas é verdade. Estou totalmente de acordo consigo porque para analisar as estatísticas do INE sobre o emprego não é preciso saber álgebra, basta saber aritmética. Aliás, a prova provada é que o Sr. Ministro consegue falar sobre isso.

Risos do PCP.

O problema do emprego - esta é uma questão fundamental -, não é um problema de metodologia de estatística; a questão essencial que se coloca, e que nós colocamos, é que, independentemente de discutirmos agora a metodologia que está a ser seguida, a verdade é que os números que estatisticamente são apontados para o desemprego estão sempre muito abaixo da realidade do desemprego. Essa é que é a questão fundamental, não é uma questão de metodologias. Podemos discutir a metodologia, mas essa é uma outra questão.
Abordemos ainda a questão do emprego - utilizando os números do INE - e a questão da diminuição ou não diminuição da população activa e do efeito disso na baixa do desemprego. Comparando valores comparáveis, diz o INE que entre o 4.º trimestre de 1985 e o 4.º trimestre de 1986 o desemprego diminuiu em 54 000 pessoas, mas o emprego só aumentou em 20 000. Isto é, dois terços da diminuição do desemprego são «tapados» com a diminuição da população activa. Essa é que é a grande questão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E isto é que não pode ser. É que, mesmo com os números oficiais - e vamos esquecer agora a outra discussão -, de facto, o problema que se põe é o da diminuição da população activa. É evidente que, se o Governo conseguisse estar uns anos à frente dos destinos deste país, conseguiria eliminar a taxa de desemprego porque conseguia reduzir substancialmente a população activa e, assim, chegaríamos a uma altura em que não haveria taxa de desemprego.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, é significativo que V. Ex.ª não tenha falado numa questão que é fundamental em termos de remuneração dos trabalhadores. Qual a evolução da participação do rendimento do trabalho no rendimento nacional em 1986? Quais são as previsões do Governo? Quais são as estimativas do Governo? Aumentou ou baixou? O Sr. Ministro fala de 43%. Considera que isso é um número digno de se apresentar em qualquer país onde haja um mínimo de respeito pelos trabalhadores?

O Orador: - É assim que o Sr. Ministro quer melhorar as condições de vida dos trabalhadores? É assim que quer melhorar as condições de vida da população?
Sr. Ministro, focando agora o problema da inflação, V. Ex.ª é capaz d: explicar à Câmara por que é que o índice de preços no consumidor cresceu apenas 11,7% e a taxa implícita no produto aumentou 18%?
Ora, aumentando a taxa implícita no PIB de 18%, como é que é capaz de vir apregoar que houve uma grande desaceleração da taxa de inflação em Portugal de 1985 para 1986, quando baixou 2 ou 3 pontos no máximo? E só aí é que se pode ver se houve mérito ou demérito do Governo, porque é o problema da inflação na produção nacional que está em causa; a inflação no índice de preços no consumidor é efeito da envolvente externa.
Sr. Ministro, face às suas concepções sobre a política social, sobre a política laborai, V. Ex.ª deve lamentar imenso não ter nascido um século antes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - O Sr. Ministro afirmou que o Governo estava a cumprir a Lei n.º 17/86, aprovada na Assembleia da República, e desafiou-nos para que interpretássemos a lei, que, no seu artigo 2.º diz que «ficam abrangidos pelo regime previsto na presente lei as empresas públicas, privadas e cooperativas em que por causa não imputável ao trabalhador se verifique a falta de pagamento total ou parcial da retribuição [...]».
Ora, o Sr. Ministro sabe que a jurisprudência é pacífica neste aspecto, entendendo que no conceito de «retribuição» estão envolvidos subsídio de férias, subsídio de Natal, diuturnidades, retroactivos, etc. É este o entendimento do Governo? Ou a Inspecção Geral do Trabalho - e este governo - só age quando se verifique não existir pagamento do vencimento ao fim do mês, ou considera que subsídio de Natal, subsídio de férias e diuturnidades também deviam contar nas estatísticas que apresentou à Assembleia da República?
Passando agora para uma segunda questão, o Sr. Ministro teve muita graça com «aquela» da modernidade e do conservadorismo em relação à legislação laborai, mas saber quem é quem é sempre uma velha questão. Gostaria de lhe dar um exemplo: já em 1886 - e esta data, que é histórica, com certeza lhe faz lembrar alguma coisa - os operários de Chicago lutavam pela jornada das oito horas de trabalho. Pois bem, no projecto de intenções sobre a alteração ao horário de trabalho o Sr. Ministro - e o seu governo - propõe, nomeadamente, dez horas por dia, cinquenta horas semanais, com descanso certo semanal que pode acontecer só de sete em sete domingos. Repare, Sr. Ministro, que, se aquela lei algum dia pertencesse à ordem jurídica portuguesa, um trabalhador só descansaria de sete em sete domingos. Para não falar já no trabalho nocturno das mulheres na indústria, etc.
Isto é quase mais um desabafo do que uma pergunta: de facto, o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social é uma pessoa muito moderna.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, na sua intervenção, não se referiu às formas de trabalho clandestino que proliferam por esse pais fora e que foram denunciadas. Pergunto-lhe se quando fala nas tais reformas modernas e europeias inclui formas de trabalho clandestino e de trabalho «negro». É que, de facto, não vemos que a Inspecção-Geral do Trabalho tome qualquer actuação acerca desta situação.
Gostaria de lhe colocar uma segunda questão, mas não sem antes perguntar ao Sr. Ministro, que «encheu» a sua intervenção de percentagens e de números, se o Governo inclui sempre nas contas que faz a mesma margem de erro nas operações aritméticas, porque estou recordada que não há muito tempo, em relação à questão do subsídio de rendas, o Sr. Secretário de Estado Elias da Costa anunciou nesta Assembleia que esse subsídio seria atribuído a 220 000 famílias, tendo o Sr. Ministro vindo agora dizer que só tinham sido abrangidas 11 000. Se é esta a margem de erro, então teremos de fazer o devido desconto.
Em relação às questões do trabalho infantil, que mereceu da sua parte apenas um aparte, gostava de lhe dizer o seguinte: o Governo parece incidir a crítica desta situação nos pais, uma vez que aqui disse que era precisa a consciência cívica dos pais.

Uma voz do PSD: - E não só!

O Orador: - Não desconhecerá o Governo que, como se diz, até a nível internacional e em várias revistas, esta questão do trabalho infantil não é uma doença isolada, mas é um sintoma de uma doença muito mais generalizada. E, de facto, quando aumentam as percentagens de exploração de trabalho infantil, podemos estar certos e seguros de que a crise se agravou.
Gostaria, pois, de perguntar, neste ciclo de miséria que a política do Governo fomenta, que medidas prevê o Governo para esta situação. E só mandar a Inspecção-Geral do Trabalho ou, pelo contrário, é preciso tomar outras medidas? É que não basta tornar o ensino gratuito, é preciso dar aos pobres - que aumentaram no nosso país e atingem uma cifra alta (cerca de metade da população vive em estado de pobreza) -, dar aos pais os subsídios sociais escolares para que eles incentivem os filhos a ir à escola. O Governo pensa criar emprego para que eles não sintam como inútil o diploma que os filhos tiraram?
Pergunto-lhe ainda se o Governo, ao fim e ao cabo, quer apenas fazer sessões de esclarecimento para ensinar os pobres a aguentar a fome e a terem consciência cívica.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos, que prosseguirão às IS horas.

Eram 13 horas.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral, para fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, vou reportar-me a uma questão muito concreta de violação da liberdade sindical e que é o caso da não publicação dos Estatutos do Sindicato dos Trabalhadores dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas.
A ilegalidade desta não publicação está reconhecida em parecer votado pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, em recomendação do Provedor de Justiça, em pareceres aprovados por unanimidade nesta Assembleia, em duas ocasiões, pelas então Comissões de Assuntos Constitucionais e de Direitos Liberdades e Garantias, em acórdão do Tribunal Constitucional, que se pronunciou indirectamente sobre a questão, e que já foi também objecto de uma deliberação do Comité de Liberdade Sindical da Organização Internacional do Trabalho, que reconheceu que havia violação da Convenção n.º 87 com esta não publicação e recomendou, por isso, ao Governo Português a sua publicação urgente.
Sr. Ministro, obviamente que esta violação vem já do anterior ministro, também do PSD, Amândio de Azevedo, que o antecedeu, só que a violação mantém-se e é sob a sua responsabilidade que o questiono.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro, o seguinte: é um facto ou não que não ha nenhum argumento jurídico - porque só de argumentos jurídicos é que aqui falamos e que interessam - que rebata as opiniões e as posições assumidas pela PGR, pelo Provedor de Justiça, pelo Tribunal Constitucional, pelas comissões parlamentares da Assembleia da República e pela Organização Internacional do Trabalho?
A segunda pergunta é que, se não há nenhum argumento jurídico, vai V. Ex.ª determinar a publicação dos estatutos?
Finalmente, Sr. Ministro, se não o fizer, quer com isto dizer que o Governo reconhece que para prosseguir objectivos políticos pratica acções ilegais?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro, a manipulação de números tem limites. Apesar da sua intervenção deixar antever que Portugal é o «paraíso da CEE», todos sabemos que assim não é.
Começando por alguns números que referiu, gostaria de lhe dizer que o número de trabalhadores com contrato permanente diminuiu em pelo menos 24 000, de acordo com as estatísticas do Instituto Nacional de Estatística. Ainda de acordo com o mesmo inquérito feito pelo INE, a população activa atingiu no final de 1986 o número mais baixo de sempre desde que existe aquele inquérito, como o Sr. Ministro bem sabe.
Naturalmente que isso se reflecte no agravamento da discriminação da mulher trabalhadora, na filosofia do regresso da mulher ao lar, no aumento do número de mulheres domésticas. E aí está o Governo a atingir os seus objectivos com esses princípios: consegue esconder o elevado desemprego que existe. Esta questão é tanto mais grave quando, por exemplo, no campo da formação profissional não existe qualquer programa específico para as cerca de 250 000 mulheres, ou mais, desempregadas. É importante que o Sr. Ministro clarifique aqui que programas existem do Instituto do Emprego e Formação Profissional ou do Ministério do

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Trabalho e Segurança Social que dêem particular importância a este problema das mulheres desempregadas, sabendo que 57% dos desempregados oficiais são mulheres.
Será que o Ministério continua à espera que as mulheres deixem de manifestar interesse pelo trabalho, dado o número e tempo que têm de estar à espera de um emprego sem o conseguirem e a discriminação de que continuam cada vez mais a ser vítimas, para que assim elas se desinteressem pelo trabalho e para que o Sr. Ministro consiga ainda apresentar números mais baixos de desempregados? Mas que controle de utilização, já que falou tanto da formação profissional, e dos fundos para a formação profissional, nomeadamente do Fundo Social Europeu, tem sido feito desses milhões de contos do Orçamento do Estado e do Fundo Social Europeu aplicados na formação dita profissional? Onde estão os resultados dessas acções?
Era importante que o Sr. Ministro esclarecesse a Câmara e o País sobre o controle e a utilização dessas verbas.
Quanto aos centros de formação profissional estatais, o que se sabe é que eles continuam subaproveitados. Com efeito, somente cerca de 1000 formandos frequentam anualmente os dezasseis centros de formação profissional estatais que existem e apenas cerca de 10% dos formados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional obtêm colocação após a conclusão do curso.
Era igualmente interessante que o Sr. Ministro clarificasse o que se passa com o cancelamento da hipótese de construção de mais quinze centros de formação profissional com financiamento do Banco Europeu de Investimentos e do Conselho da Europa. É verdade que o Governo Português cancelou essa hipótese?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Seabra.

O Sr. José Seabra (PRD): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, é sabido que as deficientes aptidões profissionais constituem um factor bloqueador do aumento da produtividade, do trabalho e do desenvolvimento das empresas.
Portugal ocupa o último lugar no domínio da produtividade, no contexto dos países da Comunidade e em todos os sectores económicos. Por exemplo, na agricultura a nossa produtividade é inferior a um terço do verificado em Espanha e na Grécia e treze vezes inferior ao verificado na Holanda e na Bélgica. Na indústria é 60% do verificado na Grécia, 35% do verificado em Espanha e 20% do verificado na Holanda. No sector dos serviços é 50% do verificado na Grécia e quatro vezes inferior ao verificado na Alemanha, o que releva este factor para a primeira linha de prioridades nas nossas preocupações.
A taxa de desemprego em Portugal é das mais elevadas da Europa comunitária, tendo custos sociais elevadíssimos. É certo que do mesmo mal enfermam as economias mais desenvolvidas, provocando por parte destas fortes pressões no sentido de beneficiarem de verbas do Fundo Social Europeu cada vez mais significativas. Por exemplo, a Itália, o Reino Unido, a Alemanha e a Franca têm beneficiado de mais de 80% das verbas do Fundo Social Europeu.
Nestas circunstâncias, solicito ao Sr. Ministro que me informe sobre qual a percentagem destas mesmas verbas atribuídas a estes mesmos países para 1987.
O desemprego afecta particularmente os mais vulneráveis, os jovens - 64% da população desempregada tem menos de 30 anos -, e torna-se estrutural, pois 40% dos desempregados procura emprego há mais de um ano.
As pequenas e médias empresas constituem um vector determinante numa política de emprego, pois ocupam 70% da mão-de-obra, são um factor de desenvolvimento e representam 90% das empresas portuguesas.
Um inquérito realizado em finais de 1986 pelo Instituto de Apoio lis Pequenas e Médias Empresas Industriais (IAPMEI) revelou que a impreparação dos dirigentes das pequenas e médias empresas - e acrescentaria dos seus trabalhadores - figurava no segundo lugar do elenco das suas preocupações.
Sr. Ministro, existe alguma orientação do seu Ministério no sentido de privilegiar as acções de formação profissional levadas a cabo nas PMEs? Esta realidade levaria à adopção criteriosa de uma política de valorização e reciclagem dos recursos humanos e, por isso, à correcta aplicação das verbas do Fundo Social Europeu.
A experiência d: 1986, contudo, cria-nos algumas perplexidades e preocupações. Senão, vejamos: como é que se explica e 3 que é que se invoca para esclarecer o sentido de custos tão díspares suportados por formando? Por exemplo: em Aveiro, cada formando custou, em 1986, 354 contos; em Leiria, 538 contos; no Porto, 321 contos, e em Lisboa, 371 contos.
Os desvios e más aplicações são tantos que se tornam do domínio publico. Para dar só alguns exemplos, apontaria: empressas encerradas que reabriram apenas para receber as verbas do Fundo Social Europeu e logo tornaram a fechar; gabinetes criados e constituídos por técnicos sem preparação pedagógica e profissional adequada; técnicos com salários horários de 10 500$, dando oito horas de formação por dia; empresários e técnicos que dão cursos de formação na própria empresa, acumulando salários superiores a 300 000$; sociedades que pagam pavilhões para formação, que depois são utilizados para outros fins; formandos obrigados a assinar recibos por valores superiores ao montante percebido.
Muitos outros exemplos poderiam ser dados mas, para já, interessa saber o que é que o seu Ministério pensa relativamente a esta situação.
Importa igualmente saber como é que se explica a distribuição regional das verbas do Fundo Social Europeu. Por exemplo Leiria recebeu 15% - que representa 80% da verba distribuída em Lisboa - e Aveiro 9%. Pergunto: então, por que é que a delegação do Fundo Social Europeu está em Coimbra e não em Leiria?
Aonde está uma política de formação profissional com estabelecimento de prioridades, de forma a evitar a utilização casuística e avulsa das verbas do Fundo Social Europeu, ludibriando as legítimas expectativas dos empresários que pretendem o desenvolvimento das suas empresas e do País e estão habilitados para uma aplicação eficiente destas verbas?
Que papel foi concedido neste domínio às associações empresariais e sindicatos?
Considera ou não o Sr. Ministro desajustado à realidade portuguesa o despacho de V. Ex.ª, de 2 de Junho de 1986, que limita os pedidos de financiamento para acções de formação envolvendo menos de 10 formandos por curse e 100 por projecto?

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Para finalizar, gostaria de perguntar-lhe quantos trabalhadores com perspectivas reais de emprego se tornaram trabalhadores efectivos em 1986.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, mesmo trabalhando com os números oficiais, vamos lá ver se o distrito de Santarém faz parte do nosso país.
Entre 1981 e 1986, estatísticas do Ministério do Trabalho e Segurança Social revelam que o número de empregos desceu 4% no distrito de Santarém.
Esta situação acelerou-se nos últimos meses.
O desemprego registado nos centros de desemprego passou de 5,4% do total do continente, em Dezembro de 198S, para 5,8%, em Dezembro de 1986.
Este desemprego registado (e sabe-se que nem é todo, porque nem tudo está registado) ultrapassa os 20 000, em Dezembro de 1986 - mais concretamente 20 730 -, fronteira só ultrapassada em Abril de 1986, em que foi de 20 035.
Nos quatro centros de emprego do distrito de Santarém, entre Dezembro de 1985 e Dezembro de 1986, o crescimento do desemprego registado foi bem diverso. Assim, em Abrantes foi de 8,1%, em Santarém de 9,6% e em Tomar de 8,7%.
Separando do desemprego registado a «procura do primeiro emprego», assimilável a desemprego jovem, teríamos, de Dezembro de 1985 a Dezembro de 1986, o seguinte: em Abrantes um acréscimo de 31,7%; em Santarém, de 23,6%; em Tomar, de 23,2%, e em Torres Novas, de 74,8%.
Sendo assim, no distrito de Santarém são 60 as empresas encerradas e 7000 os trabalhadores afectados, com mais de l 500 000 contos de salários em atraso. Nesta situação encontra-se a Metalúrgica Duarte Ferreira, que continua a ser um escândalo. A vila do Tramagal é uma vila fantasma em que a fome é bem sentida, ao contrario do que o Sr. Ministro diz.
Esta e outras empresas encontram-se nesta situação, pelo que importa saber o que pensa o Sr. Ministro sobre esta questão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Marques.

O Sr. António Marques (PRD): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, do discurso que V. Ex.ª produziu ficou-nos de tal modo a impressão de que tudo corria às mil maravilhas que, inclusivamente, gostaríamos de poder aplaudir. Mas não o podemos fazer, na medida em que entre o discurso do Sr. Ministro e algumas afirmações oriundas do próprio Ministério do Trabalho e Segurança Social há incoerências que gostaríamos de ver aclaradas.
Da parte do Sr. Ministro há a afirmação de que o problema do desemprego sofre um desagravamento que deverá manter-se. As expectativas estão, portanto, criadas. Contudo, da parte da Comissão Interministerial para o Emprego já assim não é, a avaliar pelo seu relatório, do qual passo a citar dois ou três parágrafos:
À excepção do 2.º trimestre de 1986, o nível de emprego e a taxa de desemprego dos jovens têm descido, ao mesmo tempo que se eleva o número de contratos a prazo e quase entram em estagnação as taxas de actividade.
Há indícios que podem fazer crer num agravamento da situação no mercado de emprego no futuro, atendendo a inevitáveis processos de modernização económica, com as consequentes alterações das estruturas produtivas.
Para além da preocupação relativa à evolução do emprego, regista-se ainda a sua particular incidência no que se refere ao aumento da sua duração.
Na actual situação económica os efeitos sobre o emprego não se fazem sentir proporcionalmente: ou porque ocorre em primeiro lugar uma diminuição dos factores de subemprego, ou porque as empresas a aproveitam para melhorar a sua situação financeira.
Sr. Ministro, o que é que os números que V. Ex.ª nos trouxe aqui - que, aliás, divergem de outros -, em relação ao aumento da oferta de emprego, querem dizer na realidade? Querem dizer que houve uma diminuição da população activa? Referem-se a uma diminuição da população residente ou a um aumento do subemprego? Querem dizer que aumentou o trabalho precário? Significarão que o aumento de contratos a prazo está em evolução? Ou quererá dizer que o trabalho à tarefa tem progredido?
Gostaríamos de ver aclarados estes números para podermos fazer uma ideia mais correcta de toda esta situação.
Referiu ainda o Sr. Ministro que, quanto ao problema dos salários em atraso, está tudo bem e que a situação melhora substancialmente. Bom, creio que neste momento existem cerca de 130000 trabalhadores com salários em atraso mas, em relação apenas à legislação vigente, vejamos um só caso, para exemplo, que me parece substancialmente interessante: utilizando a Lei n.º 17/86, os trabalhadores de uma empresa, a EUROALDI, nas Caldas da Rainha, entregaram todo o processo devidamente em ordem e até hoje não obtiveram qualquer resposta. Atinge-se o cúmulo de se assistir ao «passar a bola» de departamento de Estado para departamento de Estado, mas a realidade é que os trabalhadores desta empresa têm salários em atraso, as situações são aflitivas e não há qualquer esclarecimento por parte da própria Secretaria de Estado.
Nestas circunstâncias e em relação a este caso específico, em que o processo está depositado no Ministério do Trabalho, gostaríamos de saber que resposta nos pode dar o Sr. Ministro do Trabalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício.

O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, tenho pouco tempo disponível mas, em todo o caso, devo informá-lo de que irei produzir uma intervenção, aguardando que nessa altura o Sr. Ministro responda às perguntas que lhe vou colocar. Mas, porque tenho pouco tempo, farei agora apenas duas.
O Sr. Ministro disse que o desemprego juvenil decresceu em Portugal, quando já foram dados vários elementos que mostram que aquilo que o Sr. Ministro afirma não é verdade.
Disse também que o Governo está a criar um conjunto de postos de trabalho, sobretudo e em particular, para os jovens portugueses, e a pergunta que lhe quero fazer é que postos de trabalho são esses. São postos de trabalho por tempo indeterminado ou os OTJs

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(ocupação temporária de jovens), que duram seis meses? Ou serão os OTLs (ocupação de tempos livres), que duram algumas semanas? Ou será o subsídio complementar à formação profissional de que o Sr. Ministro falou, que dura também seis meses e que ainda por cima é pago pelo Estado, tendo as entidades patronais isenção total, quer do pagamento do salário, quer dos descontos para a Segurança Social? São estes os postos de trabalho que o Sr. Ministro diz estar a criar para os jovens portugueses, postos de trabalho a prazo durante seis meses, em que os jovens, decorrido esse tempo, outra alternativa não têm que não seja a de virem novamente para o desemprego?
A outra questão que lhe quero colocar relaciona-se com a discriminação salarial.
Certamente que o Sr. Ministro não desconhece que uma missão multidisciplinar da OIT que visitou o nosso país chegou à conclusão - e posso ler o relatório - de que em Portugal existem situações gravíssimas de discriminação salarial entre os jovens em função da idade e não em função da actividade profissional que exercem. Aquilo que pergunto é se acha ou não que o decreto-lei sobre o salário mínimo nacional que o seu Governo aprovou recentemente vem fomentar que a discriminação salarial entre os jovens em função da idade e não em função da actividade profissional que desenvolvem se acentue ainda mais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, gostaria de lhe colocar algumas questões que a sua intervenção me suscitou.
Antes, porém, devo dizer-lhe que o Sr. Ministro escusa de estar preocupado com a defesa, nesta Assembleia, da política de juventude ou da inexistência de política de juventude em matéria de emprego, uma vez que o Sr. Deputado Carlos Coelho falará a seguir em nome da JSD e, portanto, fará desde logo a defesa nua e crua da política antijuvenil que o seu Governo tem desenvolvido em matéria de emprego.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Que engraçado!

O Orador: - Mas o que queria era colocar-lhe apenas três ou quatro questões sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, se a população juvenil aumenta todos os anos e mesmo que apenas 75% dos jovens que atingem a idade de entrar na vida activa nela se pretendam inserir - ainda assim seria necessário criar mais de 120 000 postos de trabalho por ano só para corresponder a esse aumento populacional, mesmo considerando que cada reforma representará um novo posto de trabalho -, pergunto se o Sr. Ministro considera que os números e as estatísticas oficiais correspondem à realidade em termos de desemprego e, designadamente, à afirmação pomposa de que o desemprego juvenil tende a decrescer no nosso país. Aliás, o Sr. Ministro adoptou um estilo a que também já nos habituou o Sr. Ministro da Educação, isto é, quando surge um problema o Governo vem dizer que daqui a dez anos estará resolvido. O Sr. Ministro da Educação, quando foi da questão do numerus clausus, também disse que no ano 2000 esse problema já estaria resolvido.
Quer dizer, somos um pais permanentemente adiado, em que o Governo não tem respostas para a juventude, limitando-se a pôr alguns pensos, como é o caso dos ATDs (apoio aos desempregados de longa duração) e dos OTJs, mas que não representam, de facto, criação de emprego.
Por isso, pergunto: qual é a posição do Governo perante a eventual revisão dos critérios de utilização do Fundo Social Europeu? Quantos postos de trabalho em concreto, e desses quantos é que são postos de trabalho fixos, representaram os apoios e os subsídios a empresas para a criação de postos de trabalho para jovens? O Sr. Ministro subscreve também a afirmação do Sr. Primeiro-Ministro Cavaco Silva de que a atribuição de subsídio de desemprego representa um incentivo ao abandone da família e ao recurso à droga por parte dos jovens.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não foi nada disso!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marcelo Curto.

O Sr. Marcelo Curto (PS): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, devo dizer-lhe que tinha uma nova formulação para um problema que o Sr. Ministro voltou a tratar na sua intervenção, que é o da alteração da legislação laborai num sentido moderno e europeu ou a europeização da legislação laborai.
O Sr. Ministro disse-nos que isso daria uma maior eficiência ao funcionamento do mercado de trabalho e que melhoraria o crescimento do desenvolvimento económico, tornando-se ainda mais atraente para os investidores. Nu verdade, o panorama que temos é um panorama de abuso dos contratos a prazo e, por isso, pergunto: ao Sr. Ministro tem algum cálculo feito quanto à criação de emprego que a alteração da legislação laborai poderia levar a cabo? Ou estas suas observações são -, e quanto a mim são-no - música celestial e de tendência neoliberal, já ultrapassada, aliás, na Europa, onde is intervenções dos governos, mesmo dos de direita, estão já na ordem do dia?
Mas o que me interessa saber é se o Sr. Ministro diz isto só para repetir incansavelmente os seus argumentos ou se, efectivamente, acredita que isto tem alguma influência, quer no mercado de trabalho, quer nas condições de investimento, que se tornariam mais atraentes.
Em segundo lugar, gostaria de colocar-lhe uma questão que já tive oportunidade de lhe pôr, mas que o Sr. Ministro Jodeou - espero que agora possa responder. Já que e Sr. Ministro fala na modernização e na europeização da nossa legislação laborai, pergunto-lhe se também já encarou a hipótese de modificar as condições de atribuição do subsídio de desemprego em sentido europeu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social, depois do anúncio que o Sr. Deputado José Apolinário fez da minha intervenção, de facto, não sei bem o que deva dizer. Devo confessar que estou algo atrapalhado.
É esta maleita que persegue a JSD de agradar tanto a alguns perdidos quando, com coragem e determinação, critica, quando entende que deve criticar, mas.

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quando acha que deve apoiar, lá está um dedo severo apontado e uma voz a dizer: «Bem, estão colados ao Governo! Não sabem dizer outra coisa!...»
Mas o que é que lhe posso perguntar, Sr. Ministro? Posso perguntar-lhe quais são as acções que o Governo e o seu Ministério têm feito? Provavelmente o Sr. Deputado José Apolinário pensará que são poucas. Acha que isto dos OTJs e de dar uma experiência profissional aos jovens não é grande coisa. Achará que o programa dos ATDs para os desempregados de longa duração é insuficiente. Achará que as iniciativas locais de emprego não resolvem o problema do desemprego dos jovens. Achará que o diploma que o Governo aprovou sobre a criação de emprego para jovens, que dá isenções fiscais às empresas que contratam jovens com contratos sem prazo, é insuficiente, e é capaz também de achar que aquela mania deste governo de entender que os jovens não se devem limitar à posição de consumidores do mercado de emprego, mas eles próprios criarem emprego, terem iniciativa, terem uma mentalidade empreendedora, quer no âmbito do FAO J, quer no âmbito da criação de actividades independentes por pane dos jovens, é tudo um acto de demagogia.
Se o Sr. Deputado José Apolinário me pergunta se a JSD acha que isto é suficiente, digo-lhe que não. Não é seguramente suficiente e muito há ainda a fazer. Agora, se me pergunta se este governo até agora, em doze meses de governação, fez mais do que todos os governos anteriores em relação à criação de emprego para jovens e à tentativa de combate a este flagelo social, digo-lhe que acho que sim.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Muito mais!

O Orador: - Portanto, Sr. Ministro, não lhe vou perguntar quais são as acções que tem feito, nem se acha que elas têm sido eficazes. Julgo que as suas taxas de eficácia para o primeiro ano de lançamento nos deixam fundadas esperanças de que em próximos anos elas possam ter um efeito muito mais substancial.
Também não lhe vou perguntar o que é que acha da taxa de desemprego, uma vez que ela é seguramente inferior à média europeia - a menos que todos nós tenhamos números errados.
Agora, há duas perguntas sérias que não são fruto da demagogia e que importa clarificar neste debate, até porque são questões prévias dá intervenção que a JSD provavelmente ainda fará.
Assim, pergunto: qual é a sua previsão, de curto e médio prazo, quanto à criação de emprego?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Zero!

O Orador: - E, em particular, quanto é que acha que dessa criação de emprego se pode repercutir em termos de emprego jovem?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Zero!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Ministro disse - e quanto a nós muito bem - que a questão do emprego ultrapassa seguramente o Ministério do Trabalho. Ela tem a ver com a economia geral do País e com outras políticas que não dependem directamente do Ministério do Trabalho. Atrever-me-ia a dizer que também tem a ver com a juventude e com a criação de algum consenso nacional em relação a algumas medidas.
No âmbito do Conselho Nacional de Juventude, por proposta da Juventude Social-Democrata, foi aprovada uma resolução que visa que todas as organizações nacionais de juventude se debrucem sobre o problema do desemprego juvenil, tentando isolar as causas que conduzem a estes números e, através desse diagnóstico, apontar algumas soluções que todos os jovens possam subscrever e sugerir em termos de medidas a executar pelo poder político.
Como está presente o Sr. Secretário de Estado da Juventude, gostava de saber qual o contributo que o Ministério do Trabalho e Segurança Social e os serviços dele dependentes poderão dar ao Conselho Nacional de Juventude para que esta reflexão seja eficaz e consequente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, creio que deveria estar distraído, pois não ouviu a explanação da nossa política económica e social de emprego. Gastei uns largos minutos a expô-la e, portanto, creio que V. Ex.ª devia estar mesmo distraído.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Está doente! Está com 39º de febre!

O Orador: - Em todo o caso, devo dizer-lhe que aceito uma observação que fez: é que tenho dificuldades em soletrar. Na realidade - já da outra vez disse isso a um seu compagnon de route e hoje volto a dizê-lo -, ainda não tenho os vossos hábitos palacianos e tenho alguma dificuldade em falar nestes salões.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - O que é que quer dizer com compagnon de route? Não ofenda! Não tenho compagnon de route, mas sim companheiro de bancada e de partido!

O Orador: - Volto a soletrar aquilo que disse, para o Sr. Deputado conseguir compreender: chamei «paleomarxistas», isto é, marxistas da época paleolítica.

Risos do PSD.

Se o Sr. Deputado se quiser juntar a essa «brigada do reumático», faça favor.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Este Ministro é muito engraçado!...

O Orador: - Em relação ao conjunto de perguntas formuladas pelos Srs. Deputados do PCP, devo dizer que, de facto, a realidade social que pretendem descrever, mas que não conseguem quantificar visto que não conseguiram negar os números que apresentei, dá-me a sensação que desceram de outro planeta. Ora, como ainda não aprendi a falar como os marcianos às vezes tenho dificuldade em vos compreender.

Risos.

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não quer fazer aqui umas cócegas, Sr. Ministro, para ver se me consigo rir!?.

O Orador: - Gostaria de parafrasear a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves e dizer que a vossa interpelação parlamentar é o exemplo nítido de que os senhores vão de «amanhãs que cantam a amanhãs que cantam até à derrota final».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Tanta graça que ele tem!...

O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira não conseguiu negar os nossos números. Respondendo concretamente às perguntas que colocou, dir-lhe-ei que o número de desempregados com subsídio de desemprego em percentagem dos desempregados e inscritos nos centros de emprego era, no fim de 1986, de 32%. Isto é, tínhamos 378 000 desempregados e inscritos nos centros de emprego e tínhamos 118 000 trabalhadores a receber subsídio de desemprego - são as estatísticas que o dizem.
No que respeita aos contratos a prazo, é óbvio que o problema é preocupante. Porém, quando propusemos a alteração da legislação laborai avisámos que a manutenção deste estado de coisas em termos de leis laborais fazia aumentar o volume de contratos a prazo. Portanto, a culpa é vossa e não do Governo.

Aplausos do PSD.

Posso ainda acrescentar que o número de contratados a prazo, sob o volume total de emprego, deve andar pelos 13% na nossa economia, mas o que é mais preocupante é que o número de contratos a prazo sob os novos empregos é de cerca de 68%. A culpa destes números é vossa, Srs. Deputados!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Isto é que é uma coisa!

O Orador: - A baixa da taxa de actividade da população activa tem acontecido - e o INE refere-o - devido ao aumento da população estudantil, pois há maior actividade em termos escolares dos jovens. Parece que o Sr. Deputado quer criar um país de pessoas iletradas ou analfabetas quando pretende que a taxa de actividade da população activa aumente. Ela está a diminuir - e bem -, porque há mais jovens no período de escolaridade. Esta é uma realidade positiva que o Governo entende realçar.
Também já expliquei por que é que a taxa de desemprego diminuía, e recorri apenas a uma aritmética elementar que creio que os Srs. Deputados não compreenderam: o decréscimo do número de desempregados é superior ao decréscimo da população activa e, portanto, a taxa de desemprego, que é o quociente das duas, diminui. Isto é elementar em termos de aritmética, Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Eles não sabem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Aumentem de arrogância! Isso é bom para a moção de censura!

O Orador: - O Sr. Deputado diz ainda que o índice de preços implícito no PIB é de 18%. Ora, é de 18% em termos de PIB a. preços de mercado, mas em termos de PIB a custes de factores anda pelos 12%, isto é, aproxima-se da taxa de inflação medida pela variação de índice de preço ao consumidor. E o que é que isto quer dizer em termos macroeconómicos? Quer dizer que o Governo não deixou passar para o consumidor a melhoria das razões de troca. Aproveitou essa melhoria das razões de troca para diminuir o défice público.
Esta foi, pois, uma boa medida de gestão macro-económica que significa que os preços das importações não foram directamente repercutidos no consumidor. É mais um aspecto que mostra o êxito da variação do índice de preços ao consumidor.
O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa não é dado a questões ideológicas, pois professa um «marxismo enlatado» que é retirado do congelador da história.

Risos do PSD.

O Sr. Deputado está sempre a falar em neoliberais e em liberalismo, mas devo dizer-lhe que não há nenhuma contradição entre o Estado providência e o Estado liberal. O Estado providência é o fundamento do Estado liberal, é a consolidação do plano substantivo das liberdades e direitos formais consagrado pelo estado liberal.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Então para que é que propõem 50 horas por semana!?...

O Orador: - O Sr. Deputado não quer é aceitar que a liberdade política é indissociável da liberdade económica. Não tem atrevimento para dizer em público que nega a liberdade política e, portanto, só quer negar a liberdade económica. Elas são indissociáveis, e é isso o que o Sr. Deputado não quer negar.

Aplausos do PSD.

Vozes do PCP: - Não seja provocador!

O Orador: - O que nós pretendemos é que os Portugueses tenham liberdade económica como têm liberdade política, isto que é a nossa visão da sociedade portuguesa num quadro europeu, moderno e ocidental.

Aplausos do PSD.

Quando o Sr. Deputado fala dos operários de Chicago e das conquistas dos trabalhadores apenas cita exemplos dos países ocidentais, pois é onde elas existem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Que tolice!

O Orador: - Em relação à lei dos salários em atraso, devo dizer que a regulamentação desta lei está de acordo com aquilo que a Assembleia da República aqui aprovou.
Agora vou raciocinar por contraposição para ver o paradoxo da opinião do Sr. Deputado sobre esta matéria. Imaginemos que um trabalhador, por razões de serviço ou por uma benesse, recebia da empresa um carro, que era um benefício complementar. Suponhamos também que a empresa estava em dificuldades financeiras

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e que esse carro lhe era retirado. Segundo o conceito do Sr. Deputado este trabalhador está com salários em atraso, mas eu diria que ele está com «carros em atraso». Veja, pois, se a sua definição de salários em atraso faz algum sentido, Sr. Deputado!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - E o subsídio de férias e o subsídio de Natal?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Os subsídios são uma benesse?!...

O Orador: - O Sr. Deputado João Amaral diz que os Estatutos do Sindicato das Trabalhadores dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas vêm do governo anterior e transitaram nessa altura para tribunal. É óbvio que o Governo respeita as decisões do tribunal e aguarda paciente e serenamente o veredicto do tribunal.
A Sr.ª Deputada lida Figueiredo não consegue negar nenhum dos números e depois diz que faço manipulação.
Já expliquei o problema da população activa dos estudantes, creio que desta vez talvez tenha compreendido e não volto a repetir.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Já leu o relatório do Governo à OIT?!

O Orador: - A Sr.ª Deputada perguntou o que é que havia em termos de programas para mulheres. Em Outubro de 1986 os senhores deputados tiveram na Assembleia o plano de actividades e o orçamento do Instituto do Emprego e Formação Profissional e tiveram oportunidade de ver a descrição dos programas para mulheres. Como disponho de pouco tempo, apenas lhe cito a igualdade de oportunidades na formação e emprego.
Em termos de centros de formação profissional estatais, posso dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que os seus números estão errados, pois esses centros de formação profissional formam 2700 pessoas por ano.
Não cancelámos a construção de centros de formação profissional estatais. O que fizemos foi fazer avançar o primeiro plano de dez centros e quando esse plano estiver concluído, então, avançaremos para a segunda fase do plano de 25 centros. Estas são razões pragmáticas e operacionais que qualquer pessoa de bom senso consegue perceber - não sei se a Sr.ª Deputada perceberá!

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Não seja provocador, Sr. Ministro!

O Orador: - O Sr. Deputado do PRD falou sobre a questão das verbas do Fundo Social Europeu. Posso dizer que, em 1986, Portugal obteve 8,8% das verbas totais do Fundo Social Europeu, a Irlanda 9,4% e a Espanha 13,9%. Isto mostra a boa quota de mercado que obtivemos logo no primeiro ano e que esperamos que seja melhorada ainda este ano.
Quanto à questão da disparidade de custos entre formados, devo dizer que o que houve foi o funcionamento do mercado. Houve regiões onde a oferta de formadores era mais escassa e, obviamente, o preço dos formadores subiu. De facto, não podemos ter uma uniformidade em todo o País, mas, em todo o caso, fiz um despacho em que, de certo modo, se tabelam ou limitam, quer as remunerações hora dos formadores, quer os subsídios que se podem dar aos formandos. Aqui estamos a caminhar numa certa minimização da dispersão, que não pode ser uma igualização tout court.
Fico admirado quando o Sr. Deputado pergunta que papel foi concedido às associações empresariais e sindicais nas questões do Fundo Social Europeu. Se houve vantagens e se houve alguma coisa que é de realçar nas acções do Fundo Social Europeu foi o facto de elas terem sido feitas em colaboração com as forças sociais, empresários e sindicatos. Basta consultar as listagens para ver o conjunto de acções que foram feitas com associações empresariais e sindicais.
Quanto à questão de limitar a entrada no Fundo Social Europeu de acções de formação de menos de 100 trabalhadores, devo dizer que isso não é correcto. O que limitei foi a entrada directa no departamento para os assuntos do Fundo Social Europeu de dossiers já de uma certa dimensão. Os dossiers mais pequenos devem ser introduzidos através do Instituto do Emprego e Formação Profissional, que terá uma tarefa agregadora através dos dossiers quadros nacionais, dossiers esses que reflectem a política de emprego e formação profissional do Governo. Há aqui uma perfeita coerência e lógica na maneira de entrada no Fundo Social Europeu.
Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, devo dizer-lhe que citei médias nacionais dos indicadores que referiu e não tenho tempo de as desagregar e de as esmiuçar para cada região ou distrito do País.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Não lhe convém!

O Orador: - Quanto à questão da Metalúrgica Duarte Ferreira, posso dizer que temos um grupo de trabalho com todas as vertentes sociais a trabalhar nesta matéria. A Metalúrgica Duarte Ferreira é uma empresa privada e, em primeira análise, o Governo deve apoiar os trabalhadores e não a empresa.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Não é isso que estão a fazer!

O Orador: - O problema dos contratos a prazo já está esclarecido.
Sr. Deputado Jorge Patrício, referi programas ocupacionais e não programas de criação de emprego. Fui correcto na terminologia utilizada, pois são programas de ocupação das pessoas - os OTJ - e não são programas de criação de emprego.
Sr. Deputado José Apolinário, deve dizer que esperava que referisse uma das grandes questões que condicionam o emprego dos jovens, que é a legislação laborai, mas não o fez, o que me desiludiu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De facto, a legislação actual é uma das barreiras à entrada no mercado de trabalho dos jovens. É fácil compreender que quando a população activa cresce e não são criados novos empregos são os jovens que ficam no chamado «fenómeno de fila de espera». É isto que acontece com os jovens, Sr. Deputado. É neste aspecto que o Sr. Deputado se devia preocupar com os jovens, que é aquilo que o Governo tem feito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Deputado Marcelo Curto, V. Ex.ª tem uma visão conservadora dos problemas do mercado de trabalho e emprego. Aliás, o Sr. Deputado raciocina sempre assim: «A alteração da legislação laborai é para retirar os que estão empregados e meter os novos.» Isto é uma visão conservadora, é manter o «bolo» constante.
Ora, é justamente a alteração da legislação laborai que faria criar a confiança aos empresários para estes criarem novos postos de trabalho. Isto é aumentar o «bolo», é a nossa visão dinâmica, correcta e progressista. O Sr. Deputado tem uma visão conservadora destas matérias.

Risos do PSD.

Aconselho também o Sr. Deputado a ler os últimos acordos que nos outros países da Comunidade Económica Europeia os sindicatos subscreveram, para ver quão afastado anda das realidades sindicais europeias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Coelho, é evidente que numa estratégia de crescimento económico e quando pensamos que em Portugal o emprego deve aumentar entre 1% a 1,5% por ano, aqueles que em primeira linha devem ser os mais beneficiados serão os jovens; é a população que tem maior taxa de desemprego e, portanto, é aquela que terá acesso prioritário a este crescimento do emprego. Portanto, a nossa estratégia vai, de facto, beneficiar os jovens.
Peço autorização ao Sr. Presidente para que os Srs. Secretários de Estado da Juventude e do Emprego e Formação Profissional possam usar da palavra para completar as respostas que dei.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sobre as medidas para o trabalho infantil não disse nada!

O Sr. António Mota (PCP): - Ficámos a saber menos do que o que sabíamos!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude.

O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Couto dos Santos): - O Sr. Deputado Jorge Patrício diz que o desemprego juvenil não decresce. Decresce, sim, Sr. Deputado! Aliás, basta consultar os relatórios internacionais, que demonstram isso claramente. Se o Sr. Deputado não acredita nas nossas estatísticas tem as do exterior.

Protestos do PCP.

Parece que os Srs. Deputados estão nervosos!

Quanto aos postos de trabalho criados ou não por tempo indeterminado - e respondo também ao Sr. Deputado José Apolinário -, a questão é esta: Srs. Deputados, este assunto é muito sério e há muitos jovens em Portugal que olham para esta Câmara e esperam uma solução.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A ética e a moral política obrigam a que encaremos esta questão em profundidade. Os jovens continuam indefinidamente na bicha de espera.
Porquê? Os jovens continuam com contratos de trabalho a prazo. Porquê? Todos nós sabemos as razões! Não vamos continuar a discuti-las. Haja o consenso e a vontade política para se fazer aquilo que os jovens esperam de todos nós.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Jorge Patrício, não vamos transformar experiências de trabalho, oportunidades que se dão aos jovens para, pela primeira vez, poderem saber o que é o mundo do trabalho, nem ludibriá-los, levando-os a tomar posições que premeditadamente são de certa maneira conduzidas a que se voltem contra os próprios jovens. Isso não f defender os interesses dos jovens.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão do salário mínimo nacional, creio que o Sr. Deputado não lê o Diário da República ou as medidas do Governo.
O que foi decidido foi que em relação aos jovens a partir dos 18 anos se acabava com a discriminação e aos jovens com menos de 18 anos melhorou-se a situação em 25%. Foi esta a medida que o Governo adoptou. Se o Sr. Deputado considera que isso não é positivo, então talvez esteja de acordo com a posição de um seu colega de bancada que há dias dizia que se fosse responsável pela política de juventude fazia tudo ao contrário. Não sei o que é que seria esse contrário!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional (Joaquim Muques): Muito brevemente, porque o tempo é escasso, vou referir-me a alguns dos temas que aqui foram tratados.
Devo dizer, Srs. Deputados do Partido Comunista, que todos os Sr:,. Deputados me merecem, individualmente, a máxima consideração.
Mas, por vez as, têm atitudes ...

O Sr. João Abrantes (PCP): - Tem de dizer isso aos seus colegas!

O Orador: - Desculpe, eu não o interrompi, Sr. Deputado. Não me interrompa também, se faz favor.

Protestos do PCP.

A respeito d£ sinistralidade laboral, queria dizer que, felizmente, ela tem vindo a diminuir no nosso país.
Tem vindo a diminuir porque tem havido acções conjugadas, não só dos Serviços de Higiene e Segurança do Trabalho mas também da Inspecção do Trabalho, que têm procurado sensibilizar trabalhadores e empresas para a necessidade de se implementarem medidas de higiene e segurança no trabalho. Daí que a sinistralidade laboral tenha vindo, felizmente, a diminuir, como também tem vindo a diminuir o número de acidentes mortais.
No que respeita ao trabalho infantil, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa só ouviu metade daquilo que eu disse. É que, se eu disse que havia algumas situações

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de exploração do trabalho infantil que resultavam da ganância dos pais, disse que havia outras situações que resultavam, efectivamente, de necessidades das famílias.
Mas temos de ser todos nós, através dos organismos do Estado, das autarquias locais e das organizações sindicais, que temos de dizer aos pais das crianças que são exploradas que não é esse o caminho adequado para fazerem face a eventuais dificuldades momentâneas que tenham nas suas famílias. É através do desenvolvimento económico e do crescimento económico que podemos continuar a contribuir, como o Governo tem vindo a fazer, para que aumente o rendimento das famílias e, portanto, o bem-estar das pessoas.
Relativamente à questão dos salários em atraso, não vou ter tempo para explicar ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa qual a distinção que existe entre a previsão do artigo 3.º da Lei n.º 17/86 e o artigo 17.º, conjugado com o artigo 30.º De qualquer forma, vou dizer-lhe que, se há dívidas aos trabalhadores, nem todas elas se enquadram na previsão da lei dos salários em atraso.
Já agora, e porque estamos aqui a falar com toda a transparência, devo ainda dizer-lhe que, se há dívidas que não são consideradas dentro da previsão da lei dos salários em atraso, isso engloba também, pelo menos, dois sindicatos da Intersindical.

Aplausos de alguns deputados do PSD.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Forcem-nos a pagar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Para defesa do meu grupo parlamentar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, isso não é uma figura regimental.
Certamente, V. Ex.ª pretende a palavra para defesa da sua consideração ou honra e, para esse efeito, tem a palavra.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, não é hábito e creio mesmo que é a primeira vez, ao longo destes anos ter de utilizar esta figura regimental para fazer um reparo a um qualquer membro do Governo.
Não é hábito um deputado do meu grupo parlamentar referir-se ao Governo ou a qualquer ministro da forma como o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social se nos referiu.
Sr. Ministro, somos críticos, mas não somos ofensivos nem grosseiros - e estão aqui 250 deputados que o poderão comprovar, além dos membros do Governo que estão ao seu lado.
O Sr. Ministro exagerou, o Sr. Ministro ofendeu, claramente que ofendeu!

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Disse-lhe claramente, Sr. Ministro, que nada há na sua intervenção que nos refira um programa credível de desenvolvimento económico, programas industriais, programas de criação de emprego - a não ser algumas intenções -, e nada diz sobre o aproveitamento das nossas potencialidades e recursos naturais.
Fiz-lhe perguntas muito claras, Sr. Ministro, como a de saber quantos desempregados recebem o subsídio de desemprego, quantos contratados a prazo existem. Referi que, no último trimestre em 1986, 68,8% das pessoas que se empregaram foram contratadas a prazo e apenas 8,7% em trabalho efectivo.
Quanto às mulheres, referi-lhe que estas estão cada vez mais a ser levadas para o sector doméstico. Além de outras questões, perguntei-lhe ainda quais são os sectores mais atingidos pelo desemprego.
O Sr. Ministro não respondeu a nada disto, preferiu ofender. Preferiu uma graça gratuita, pesada, em busca do aplauso fácil e fagueiro.
Lamento, Sr. Ministro, foi um prazer equívoco.
V. Ex.ª está nervoso, lamento-o. Não ficou bem colocado. O meu grupo parlamentar mantém-se tal qual como se tem mantido até agora.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, se desejar dar explicações, tem a palavra para esse efeito.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: - Não desejo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Para defesa da minha bancada, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: - Que é isto? A bancada não tem defesa!

Risos do PSD.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, esclarecendo, é para defesa de honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Ministro do Trabalho, com toda a franqueza, devo dizer-lhe que, independentemente das profundas divergências que temos, e que são nítidas neste debate, o Sr. Ministro habituou-nos, particularmente nas comissões, a encontrarmos um espaço de diálogo.

Sabemos que é uma pessoa sensível, ..

O Sr. António Capucho (PSD): - Isto é suspeitíssimo!

Risos do PSD.

O Orador: -... mas hoje veio aqui de uma forma profundamente rombuda e agressiva, dando a ideia de que está já a sofrer da síndroma da moção de censura.
Portanto, vem fazer uma coisa para a qual não tem jeito nenhum, que é o anticomunismo humorístico. Obviamente, teve o riso da sua bancada e quase me apeteceu pedir-lhe para me vir fazer cócegas, para ver se me conseguia rir ...

Risos do PSD.

Mas nisso o Sr. Deputado Silva Marques é muito melhor do que o Sr. Ministro.

Risos.

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Mas, falando a sério, o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social revelou aqui uma falta de sentido político das coisas. Ora, creio que devíamos discutir, minimamente, estas questões num plano sério.
O Sr. Ministro não respondeu às acusações sobre trabalho infantil, não respondeu às questões sobre os salários em atraso, designadamente sobre se considera ou não os subsídios de férias e de Natal como remunerações em atraso, nem respondeu, afinal, sobre qual é o seu conceito «modernista» ao querer aplicar aos trabalhadores 10 horas de trabalho diário, SÓ horas semanais, e que só descansem uma vez de sete em sete domingos.
O Sr. Ministro veio aqui dizer que o que era bom era a lei dos despedimentos.
Sr. Ministro, sei que é capaz de fazer melhor. Livre-se dessa síndroma da moção de censura e venha para este debate com aquela franqueza de que o senhor é capaz!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marcelo Curto, para que efeito deseja usar da palavra?

O Sr. Marcelo Curto (PS): - Sr. Presidente, é para defesa da consideração pessoal.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isso não existe!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para esse efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Marcelo Curto (PS): - Sr. Ministro, fiquei efectivamente muito surpreendido com a sua resposta.
Na verdade, o Sr. Ministro disse que eu era conservador e não admito que digam isso de mim.

Risos do PSD.

Efectivamente, não sou conservador nem nunca fui, e tenho reputação pública de não ser conservador.
Sr. Ministro, fiz-lhe uma pergunta, que V. Ex.ª devia ter retido, e que era a de saber quais os benefícios quantitativos decorrentes de alterações da legislação laborai, isto é, que tipo de transferência de emprego ocorria para o Sr. Ministro nos propor aqui a alteração da legislação laboral.
Ora, o Sr. Ministro não disse uma palavra acerca disso.
Termino por lhe dizer que o Sr. Ministro classificou aqui alguns deputados, principalmente os homens do Partido Comunista, de «marxistas paleolíticos». Eu digo que o Sr. Ministro é um «liberal neolítico», porque já está fora de moda.

Vozes do PSD: - Ah! Ah! Ah!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Marques, para que efeito pediu a palavra?

O Sr. António Marques (PRD): - Sr. Presidente, nos termos regimentais, também para defesa da minha consideração.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Mas onde é que está essa figura no Regimento?

O Sr. Malato Correia (PSD): conhece o Regimento?

O Sr. António Marques (PRD): - Conheço, sim, Sr. Deputado.

O artigo do Regimento é o mesmo que se refere à defesa da honra ou da consideração. Eu evoco a defesa da minha consideração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Marques, tem a palavra para a defesa da sua consideração.

O Sr. António Marques (PRD): - Sr. Ministro, fiz-lhe algumas perguntas, fui correcto, fui bem educado - suponho -, mas não obtive qualquer resposta sua. Inclusivamente, evoquei um documento recente da Comissão Interministerial para o Emprego, pedi que me esclarecesse alguns números, em relação...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de aguardar uns me mentos.
É que havia a1 i no corredor um grupo de pessoas, que não fazem parte do Plenário, e que estava a perturbar o funcionamento da sessão.
Sr. Deputado, queira fazer o favor de continuar no uso da palavra de desculpar esta interrupção.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Pedi, portanto, ao Sr. Ministro que me esclarecesse alguns destes números, o que eles significavam em relação ao aumento do desemprego e em que conceitos se baseavam.
Tenho na imo este documento da Comissão Interministerial para o Emprego e verifico que ele tem um conceito que me parece estranho em relação à definição de pessoas com emprego. No conceito da Comissão, que produz os dados estatísticos, pessoas com emprego são as seguintes: todos os indivíduos que, tendo idade igual ou superior a 12 anos, têm no período de referência um emprego civil ou são militares de carreira.
Logo, ao não responder em profundidade às questões relacionadas com o trabalho infantil, talvez o Sr. Ministro nos queira dizer que aceita este conceito de pessoas com emprego.

Uma voz do PSD: - Isto é a defesa da consideração?!

O Orador: - Sr. Ministro, isto é um documento oficial, é um documento da Comissão Interministerial para o Emprego.
Ao invocar este documento, suponho que teria merecido da parte do Sr. Ministro uma resposta, ainda que fosse uma resposta leve.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, se desejar dar explicações, tem a palavra para esse efeito.

O Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social: - Com todo o gosto, Sr. Deputado António Marques, explico-lhe qual o problema que se passa: é que a metodologia do INE ainda considera como população empregada a maior de 12 anos.
É óbvio que, em termos jurídicos e face à actuação da Inspecção-Geral do Trabalho, nós não aceitamos como trabalhadores pessoas de 12 anos. Para nós, isso

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é trabalho infantil, que não aceitamos e que sempre temos reprimido através da Inspecção-Geral do Trabalho.
Isto está incorrecto tecnicamente, pois, de acordo com a nossa legislação, empregados são os trabalhadores maiores de 14 anos. O Sr. Deputado tem toda a razão, quando diz que eu não lhe referi isto.
Já agora, aproveito para lhe dizer que não lhe dei explicações, porque já lhas tinha dado na Comissão Parlamentar de Integração Europeia. Como o tempo era escasso, quis esclarecer os outros senhores deputados, uma vez que já o tinha esclarecido, nessa Comissão, sobre as questões relacionadas com o Fundo Social Europeu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero anunciarmos que temos entre nós a presença de alunos das seguintes escolas: Escola Secundária de Belém, em Algés, Escola Secundária n.º l de Alverca, Escola do Magistério Primário de Lisboa, Escola Secundária da Damaia, Escola Secundária de Estremoz, Escola Preparatória da Quinta de Marrocos, de Lisboa, e Escola Secundária D. João de Castro, também de Lisboa.
Agradeço, Srs. Deputados, o favor de os saudarem da forma habitual.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Um debate de política geral centrado na situação laborai é em Portugal obviamente necessário, hoje como ontem, já que o nosso país continua a apresentar no contexto da Europa democrática os indicadores mais graves, no que respeita à vida de quem trabalha e nomeadamente no que se refere àqueles que só vivem do seu salário. Esses indicadores, relativos a poder de compra, património pessoal, protecção social, condições de trabalho, qualificações, oportunidades de mobilidade social, acesso a cuidados de saúde ou a uma habitação digna, e tantos outros, não podem ser avaliados fria ou tecnocraticamente, visto que exprimem, para muitos, a dureza de uma existência sem outro horizonte que não seja o da mera sobrevivência.
Discutir a situação laborai em Portugal é, além disso, fundamental, se se equacionar a sua evolução desde a institucionalização do regime democrático. Será então possível analisar: como é que a coincidência do 25 de Abril com a crise internacional e o aparecimento à luz do dia da fragilidade das nossas estruturas produtivas pôs em causa os ganhos salariais dos primeiros anos; como é que a realidade complexa do funcionamento das sociedades abertas e livres mostrou os becos sem saída das estratégias maximalistas e estatizantes; como é que os assalariados foram instrumentalizados e sacrificados nos períodos em que (em grande parte por erros primários na condução da política económica anterior) fomos constrangidos a processos de estabilização perante a iminência de rupturas cambiais; como é que, em resultado de erros de governo e de oposição (e aqui interpelados e interpelantes são recordistas), se chegou a uma situação iníqua, em termos de distribuição do rendimento nacional, de desemprego e de insegurança no emprego.
Discutir a situação laboral no nosso país é também muito oportuno, atendendo a que, apesar das dádivas celestes que este governo recebeu (dinâmica de reequi-líbrio das contas externas e de desinflação, quedas dos preços do petróleo e de outras matérias-primas estratégicas para Portugal, desvalorização do dólar, baixa das taxas de juro internacionais), a melhoria dos salários e extensão das pensões foi em grande parte feita sem qualquer esforço financeiro do Governo mas sim dos beneficiários do regime geral da Segurança Social, o emprego não progrediu, a desregulação social concretizou-se com procedimentos de ultra-exploração, com o trabalho temporário quase esclavagista ou a infâmia do trabalho infantil.
Discutir a situação laborai em Portugal assume mesmo carácter de urgência. Na verdade, o procedimento deste governo, que gere heranças e donativos, mas não adianta uma reforma de fundo, deixa antever o pior. Sem respostas atempadas, integradas e consequentes, o carácter penoso das reestruturações adiadas mas inevitáveis agravar-se-á, o desemprego de longa duração e o pessimismo dos jovens instalar-se-ão, a modernização de Portugal, com liberdade e justiça, permanecerá adiada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, a utilidade deste debate será tanto maior quanto mais a opinião pública dele conseguir aferir as diferenças de postura e de proposta. No fundo, trata--se de tornar transparentes as grandes alternativas presentes nesta Assembleia sobre o papel do Estado, e em especial do Governo, na regulação social e na regulação económica da sociedade portuguesa. Nesta questão de fundo discordamos do PCP.
O PCP, partido interpelante, mantém nestas questões, essencialmente, posições tradicionais e ortodoxas, como se o Mundo e o País não estivessem em profunda mutação - quanto mais Estado na esfera económica, melhor;...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - São muito conservadores!

O Orador: - ... quanto maior o sector púbico produtivo, melhor; quanto mais controle sobre a iniciativa empresarial, melhor; quanto menor internacionalização e mais proteccionismo, melhor; quanto menos consenso social, melhor; quanto mais maximalistas as reivindicações, tanto melhor; quanto menor o pluralismo sindical, tanto melhor. Para o partido interpelante, o papel do Estado deve ser, para já, determinante e, no futuro, hegemónico, tanto na regulação económica como na regulação social.
O Governo, agora interpelado, assume um liberalismo travestido de social-democracia, com muito populismo à mistura. No essencial, prega a desregulamentação e visa a desregulação; sacraliza um mercado teórico, embora sabendo que da concorrência dos livros à realidade das relações de força oligopolistas vai uma grande distância; quer destruir um Estado providência incipiente, quer quebrar a espinha à capacidade sindical de contribuir para uma modernização que sirva a todos e não apenas a alguns; tem da flexibilidade uma ideia ultrapassada, de receita milagrosa; quer aprofundar a partilha desigual entre rendimentos de propriedade e empresa, e rendimento do trabalho; quer impor tectos tecnocráticos ao desenvolvimento do investimento público ou da despesa social em saúde, educação, segu-

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rança social. Para os interpelados, quanto menos Estado melhor, tanto na regulação económica, como na regulação social. A pouco e pouco vem ao de cima a direita dos interesses e inferiorizam-se os sociais-democratas, numa roleta comandada pelo populismo.
Para nós, o papel do Estado é fundamental, embora não exclusivo, na regulação social, e a iniciativa empresarial privada ou cooperativa são insubstituíveis ao nível produtivo. Reformar os mecanismos de financiamento e afectação dos recursos da Segurança Social; fazer da problemática da solidariedade a grande questão política nacional; garantir os direitos dos trabalhadores em geral e dos assalariados em particular; lutar pelo aprofundamento da sua dignidade de homens livres dentro e fora dos locais de trabalho; contribuir para uma verdadeira democratização do ensino e da formação; estimular a participação, reforçar a negociação e a concertação a todos os níveis - empresa, sector, região, País -, aceitando a conflitualidade inerente às modernas sociedades democráticas, corresponde ao sentido profundo da nossa intervenção política e da nossa perspectiva programática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As teses liberais pseudo explicativas do desemprego são completamente erradas. Ó desemprego não deriva da pressão salarial, do poder sindical ou dos excessos do Estado providência.
As teses liberais de combate ao desemprego têm mostrado a sua incapacidade. O emprego não surge magicamente se o Estado abdica do seu papel na regulação social. Se é verdade que em economia aberta o desemprego é tendenciamente tanto maior quanto mais fraca é a especialização internacional de um país, é também um facto que o desemprego só se domina quando há vontade política de o controlar.
Em Portugal, não tem havido criação líquida de empregos, nem mesmo desde que os deuses do enquadramento externo passaram a estar connosco. Mulheres e jovens são grupos especialmente sacrificados; aumenta a importância do desemprego de longa duração, e as zonas de Lisboa, Setúbal e Alentejo são duramente atingidas.
Com o governo do PSD não se têm verificado, com um mínimo de significado, novos investimentos, portugueses ou estrangeiros, em novas empresas, produtos ou serviços, e as medidas de promoção de emprego por via de apoios governamentais saldam-se por fraquíssimos resultados estruturais.
Diminui constantemente o número de trabalhadores com segurança de emprego, e o abuso dos contratos a prazo é uma realidade indesmentível e galopante. O trabalho negro, a exploração de crianças, envergonham o País, mas não merecem do Governo qualquer combate sistemático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo não denota qualquer preocupação com as condições de trabalho, ou seja, não apresenta qualquer política visando a salvaguarda da dignidade dos trabalhadores, não incentiva uma verdadeira prevenção face aos riscos de trabalho, não aplica medidas de higiene e segurança indispensáveis. É um governo que esquece que a larga maioria da população activa é assalariada e passa grande pane da sua vida nos locais de trabalho. Em resumo, é um governo que não actua nem quanto à quantidade nem quanto à qualidade do emprego. Além de mais, é um governo que apenas concebe a participação dos trabalhadores na vida das empresas quando se trata da exigência de sacrifícios, como os salários em atraso, mas não quando o que está em causa é a informação, a consulta, a negociação efectiva, em suma, a intervenção activa, a participação.

s trabalhadores que, nos períodos de combate conjuntural aos desequilíbrios externos, foram duramente atingidos, constitui ido mesmo o grupo social em cujo sacrifício assentou o ajustamento financeiro, são agora confrontados, num i situação envolvente bem diferente, com as teses de classe de que os salários reais devem crescer a ritmo inferior aos rendimentos reais de empresa e propriedade, como única garantia de dinamização do investimento e do emprego, ou seja, o Governo prepara i ma ainda maior deterioração da distribuição do rendimento nacional como base da sua estratégia. Esta lógica, esse processo, não são aceitáveis sob nenhuma óptica: económica, social ou política.
O Governo parece entender que se chegou ao máximo possível no que respeita à importância da despesa social. A SUE perspectiva tecnocrática (e portanto, a prazo, conflitual com o seu populismo estratégico) aponta para a contenção das despesas em educação, saúde e segurança social. Em nome de equilíbrios macro-económico abstractos, é o essencial da intervenção reguladora que fica minimizado. Como se em Portugal houvesse um problema de excesso de Estado providência, como se em Portugal não fosse injusta e ineficaz a lógica diferenciada dos sistemas de reforma, como se em Portugal houvesse uma verdadeira protecção no desemprego, como se no nosso país tivéssemos já atingido níveis dignos de democratização do ensino ou de acesso à saúde.
E quanto à famigerada questão da legislação laborai? Resumidamente, qual tem sido a atitude do Governo?

Colaborar na enorme mentira que os sectores mais retrógrados do patronato querem fazer passar, ou seja, que a revisão da legislação laborai, no que respeita a afectar os direi os dos trabalhadores com contratos permanentes, é condição necessária e suficiente para o dinamismo do investimento e criação de novos empregos. Como se hoje os despedimentos não fossem executados, individuais ou colectivos, como se esse patronato não aproveitasse abusivamente, com apoio governamental, das várias formas de trabalho precário.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Colaborar, portanto, na dramatização artificial de uma questão, com graves consequências para o Pais, comportando-se como uma espécie de governo de oposição, sem querer testar a capacidade nacional de chegar a consensos alargados, preferindo explorar um falso argumento para justificar a falência de certos resultados económicos, como o investimento privado, ou resultados sociais, como a criação de empregos.
Apresenta: no Conselho Permanente de Concertacão Social diplomas técnica e politicamente inaceitáveis, numa linha de liberalismo acéfalo, como nos casos das agências de colocação de emprego, das alterações ao lay-off, da flexibilização autoritária da, jornada de trabalho.
Utilizar o Conselho Permanente de Concertacão Social de forma demagógica e contraditória, explorando os naturais e desejáveis consensos como triunfos

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político-partidários, mas escamoteando a posição dos parceiros sociais quando ela lhe não é grata; poder-se ia falar das incorrecções do diploma relativo ao salário mínimo e da marginalização dos deficientes que nele transparece ou da confusão jurídica aí patente entre salário mínimo e rendimento mínimo garantido, com consequências graves para alguns assalariados. Mas, onde a lógica de desconcertante desconcertação social aparece mais clara é agora, com a aprovação, pelo Conselho de Ministros, de um diploma sobre alterações ao regime jurídico da negociação colectiva, que foi transformado em facto consumado, mesmo após a frontal oposição da maior parte dos parceiros sociais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Queremos deixar bem clara, neste debate, a nossa orientação: o PS, embora na oposição, assume uma cultura de governo, uma postura alternativa.
Consideramos que medidas expressivas de apoio à criação de empregos para desempregados de longa duração, para jovens, incentivos suficientes para iniciativas locais de emprego, cooperativas ou outros agentes da economia social, ajudas à partilha do trabalho, ligando o dinamismo empresarial à resposta a amplas necessidades sociais, constituem vectores importantes no combate ao desemprego.
Consideramos que uma política activa de criação de emprego, com expressão regional diferenciada e preocupações sectoriais específicas, deverá ser colocada no centro da política portuguesa, para que venha a ser materialmente possível a conjugação da modernização da economia portuguesa com o desenvolvimento da liberdade e da justiça.
Consideramos que o trabalho infantil não pode ser encarado como uma fatalidade, com observações do género «trata-se de um problema cultural» ou «os pais são tão responsáveis como os patrões» ou «sempre houve e sempre haverá enquanto o País não se desenvolver» ou ainda «a realidade é o que é e não o que gostaríamos que fosse», pois embora muito disto seja verdade, o Governo não se pode demitir de intervir, de actuar, de transformar, com desincentivos ou mesmo com medidas dissuasoras exemplares, articulando o Ministério do Trabalho e Segurança Social com o próprio Ministério da Educação. Não faz sentido que a Inspecção-Geral do Trabalho seja manuseada como um instrumento de pressão sobre os recalcitrantes das obrigações fiscais, como um agente secundário da política de trabalho do Estado democrático, não faz sentido que o Ministério da Educação não desempenhe um papel activo no esforço para o cumprimento da escolaridade obrigatória.
Consideramos que a situação de desemprego não pode obstar ao prosseguimento de uma política efectiva da melhoria das condições de trabalho. O País não pode permanecer espectador dos acidentes laborais, o País não pode admitir a contínua degradação das condições de higiene e segurança, o País não ganhará com a marginalização dos assalariados do processo micro-económico de introdução de novas tecnologias, que só será dinâmico se participado.
Consideramos que há que legislar sobre trabalho temporário, contratos a prazo, regime jurídico da negociação colectiva, flexibilidade negociada dos horários de trabalho. Mais uma vez desafiamos o Governo a propor nesta Assembleia estes e outros diplomas relativos ao trabalho. Desafiamos o Governo a governar. Como maior partido da oposição, saberemos assumir nesse contexto as nossas obrigações.
Consideramos que a boa utilização dos dinheiros investidos na formação profissional, do Fundo Social Europeu ou do Orçamento, mas no fundo, dinheiro de todos nós, é uma grande exigência nacional. A formação profissional constitui vector fundamental da política de modernização. Tem de ser assumida como uma política essencial, e isto exige enquadramento e sistematização de objectivos estratégicos e meios. Queremos que a formação profissional sirva para qualificar, para o aumento da quantidade e da qualidade do emprego, para dinamizar a mudança de especialização do País, para alargar a liberdade individual e não para limitar escolhas ou perspectivas. Queremos ver os parceiros sociais e os agentes regionais com uma palavra decisiva sobre as opções e sobre o controle das acções prosseguidas.
Consideramos que os ganhos de produtividade da economia portuguesa devem constituir uma mola impulsionadora para a melhoria continuada dos salários reais e para a correcção da distribuição do rendimento. Para a população mais favorecida, há que criar incentivos à poupança e ao investimento e não ao consumo privado ou à especulação.
Consideramos que modificações de múltiplos mecanismos da segurança social, desde o que define as regras de cálculo das pensões até aos que se ligam à concessão de subsídios de desemprego ou aos processos de apoio a reformas progressivas ou antecipadas, constituem uma importante arma de simultânea dignificação de inactivos ou desempregados e incentivos à criação de postos de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como socialistas, assumimos como fundamentais os valores da liberdade, da solidariedade, da justiça social e da igualdade real de oportunidades. Os custos da mudança têm de ser suportados por todos os que dela beneficiam, em última análise por toda a comunidade, não apenas por alguns, e nunca pelos mais fracos. Os resultados do labor colectivo, em que cada um interpreta um papel diferenciado, têm de ser repartidos à luz de critérios de justiça, que reforcem a coesão social evitando fenómenos de marginalização.
Como defensores da inovação e da modernidade, pretendemos contribuir para a construção de uma sociedade aberta, vitalizada por múltiplas e diversificadas iniciativas, onde sejam minimizadas as resistências às mudanças culturais, sociais ou tecnológicas, que sejam portadoras de futuro, no sentido de melhorar a qualidade da vida e a harmonia no relacionamento entre os homens e entre estes e o meio ambiente.
Somos pelo dinamismo e contra o conformismo. Assim, encaramos a crise como oportunidade para mudar para melhor. As energias, as vontades, as capacidades criativas têm de convergir. Somos inconformistas face aos dramas que afectam os trabalhadores - a miséria, o trabalho infantil, os salários em atraso, o desemprego, a discriminação.
Somos pelo diálogo e pela concertacão. Sabemos que não há verdades totais e absolutas. Sabemos que o conflito é próprio dos organismos vivos e que a dinâmica gerada pelas tensões conflituais pode e deve ser aproveitada para a mudança e o progresso humano. Recusamos um Estado totalitário ou mesmo asfixiante das iniciativas dos cidadãos ou grupos sociais. Porém, não advogamos um liberalismo selvagem que abriria espaço à prevalência da lei do mais forte. O Estado deve contribuir para suscitar iniciativas que conduzam à con-

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tratualização das soluções. Tal exige o reforço do papel institucional dos sindicatos e associações empresariais. Não esquecemos que o isolamento do trabalhador o deixa desprotegido e que, portanto, é a via da negociação colectiva que se deve privilegiar, na empresa, na região, no sector ou no plano nacional. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Portugal precisa de um governo com uma verdadeira estratégia de combate ao desemprego e à injustiça social. Hoje existem demasiadas situações de desemprego e insegurança, super exploração e opressão em muitos locais de trabalho.
Queremos a concertação social a todos os níveis; queremos a contratualização e não a desintegração social como corolário da livre expressão dos conflitos.
A democratização da sociedade anda a par com a democratização da empresa. O enriquecimento do conteúdo do trabalho é elemento fundamental para a dignificação dos trabalhadores.
Combater o desemprego, hoje, em Portugal, é combater o conformismo social. Esse conformismo corresponde às águas turvas onde os pescadores do populismo desenvolvem a sua actividade.
Combater o desemprego, hoje, em Portugal, é combater a política de terra queimada e de desespero que conduz a becos sem saída. Não somos profetas da desgraça nem queremos ser.
Combater o desemprego, sem conciliar com a exploração desenfreada, é a tarefa mais digna, mais relevante, mais modernizadora e solidária que se pode e deve assumir politicamente. É por aí que queremos ir, é por aí que iremos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues os Srs. Deputados Rui Salvado, Cavaleiro Brandão, Carlos Brito e Vieira Mesquita.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Rui Salvado.

O Sr. Rui Salvado (PSD): - Sr. Deputado Ferro Rodrigues, V. Ex." referiu no seu discurso frases do género: «O Governo assume o liberalismo», «quer contribuir para partir a espinha do movimento sindical», «a direita dos interesses», «não tem uma política de salvaguarda dos trabalhadores».
Ora, é conhecido e é um dado adquirido que este governo, pese embora o processo de concertação social que teve início no Governo anterior - mas em termos muito formais, porque nunca houve resultados práticos muito palpáveis -, operou uma reforma estrutural no tecido social português, que foi a concertação social com objectivos e resultados práticos. Isto é, a central sindical democrática, por exemplo, tornou credível este governo, ao subscrever com ele metas de política económico-social.
Sr. Deputado, estas expressões que eu referi querem significar que o «ministro sombra» do PS está contra esta posição da UGT, querem significar que o «governo sombra» do PS está alheado desta realidade?
É para estas questões que peço uma resposta, Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Deputado Ferro Rodrigues, escutei com a maior atenção a intervenção de V. Ex.ª à qual não podia deixar de atribuir, e julgo que tola a Câmara terá atribuído, a maior relevância. Julgo ter-se tratado da primeira intervenção formal do «ministro sombra» de um partido que se assume como alternativa ao actual governo - e é nesse sentido que eu a entendo como primeira intervenção formal -, da primeira explicitação global de uma perspectiva política, de uma filosofia política, para esta área da governação.
A importância do texto que foi lido justificará, certamente, uma nova análise e, por isso, não queria precipitar juízos definitivamente conclusivos, mas não poderia deixar de sublinhar aquilo que, para mim, pareceu uma certa cor tradição entre uma primeira fase em que V. Ex.ª se esforçou por tentar distanciar-se, quer em relação ao pai tido interpelante, quer em relação ao Governo, e uma segunda fase, onde V. Ex.ª procurou enunciar as suas próprias proposições em sede de filosofia governativa e onde eu julgo ter lobrigado algumas incongruências, algumas redundâncias e algum excesso de literatura.
Gostava, nesta altura, de me circunscrever a duas questões concretas.
Em primeiro lagar, V. Ex.ª acusou o partido interpelante de excesso de ortodoxia, de estatismo sem fim, de um papel absorvente e crescente para o Estado. Se V. Ex.ª olhar para as medidas concretas que enunciou, deverá, porventura, concluir comigo que em todas elas e de todas elas decorre um crescimento, um agravamento, um aprofundamento da intervenção do Estado nos domínios saciai e económico.
Parece, por isso, ser difícil manter a linha de separação que V. Ex.ª começou por procurar enunciar relativamente ao Partido Comunista.
Em segundo lugar, reporto-me a um tipo de desafio que V. Ex.ª já tinha dirigido publicamente ao Governo - que eu tiniu colhido da imprensa - e que, aqui, veio repetir.
É que V. Ex.ª defendeu aqui que era importante a negociação, a concertação, a procura de acordos, nomeadamente no âmbito da preparação da legislação laborai e da sua revisão. Entendia eu, porventura ingenuamente, que essa negociação e concertação deveriam ser desenvolvidas, essencialmente, entre o Estado e os parceiros sociais.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Mais: levando em conta a maneira viva como nesta Assembleia foi denunciada - e com os votos do seu partido foi derrotada - uma primeira iniciativa do Governo, no sentido de apresentar, aqui, uma proposta legislativa para a revisão da legislação dos despedimentos e dos contratos a prazo, denúncia que foi feita em direcção ao carácter minoritário do Governo e à falta de legitimidade para tomar iniciativas que visassem, de moto próprio e exclusivo, não amparado em prévia negociação e em prévia concertação social, e propósito de alterações estruturais neste domínio, acho estranho que, por um lado, se aplauda o trabalho de concertação e de negociação e, por outro lado, se venha aqui repetir aquilo que aos olhos de um espectador parece uma provocação gratuita, socialmente desestabilizadora e absolutamente inconveniente para quem acredita com seriedade na necessidade de rever a nossa legislação.

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Eram estes dois aspectos que eu gostava que o Sr. Deputado, se julgasse oportuno, me ajudasse a entender.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues, que, pela primeira vez, ouvi falar na Assembleia da República, lamento ter de começar por lhe dizer que rejeitamos a caricatura que fez das nossas posições e nem nos parece que seja muito adequada por parte de quem tem, hoje, tantas responsabilidades como o Sr. Deputado tem no seu partido. Mas deixemos isso para depois, pois haverá tempo de discutir essas questões. Agora, apenas queria fazer-lhe uma pergunta muito breve.
Diz o Sr. Deputado que para o Governo, e naturalmente também para o PSD, «quanto menos Estado melhor», o que não é exacto, pois isso depende do papel do Estado. O Sr. Deputado não observou bem as posições do Governo e do PSD nesta matéria. E diz que para o PCP «quanto mais Estado melhor», e isto também não é exacto. O Sr. Deputado não reparou bem na importância que nós damos a uns aspectos da intervenção do Estado e a importância que não damos a outros aspectos da mesma intervenção.
Mas, admitindo que é assim, gostaria agora de lhe fazer uma pergunta, Sr. Deputado Ferro Rodrigues. Dirijo-lhe a pergunta pessoalmente, sem pretender comprometê-lo com as posições que o seu partido já assumiu nos governos deste país nos últimos anos e, portanto, esta pergunta vai dirigida à frescura com que o Sr. Deputado aqui nos surge e com que intervém nestas matérias.
Para o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, qual é a proporção de Estado que está certa?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Deputado Ferro Rodrigues, V. Ex.ª referiu o trabalho infantil como uma infâmia. Nós - e queria deixar-lhe esta palavra - consideramos, obviamente, o trabalho infantil uma infâmia. Agora, o que não podemos admitir é que V. Ex.ª tenha dito que este governo não combate o trabalho infantil.
É público e é sabido que o Governo, através do instrumento de que dispõe, que é a Inspecção do Trabalho, tem actuado de forma a reprimir as situações de trabalho infantil e julgamos mesmo que vai continuar a reprimir essa chaga social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª referiu que se verificam mutações pelo mundo e no nosso país e acusa o Governo de não providenciar pelas reformas de fundo.
Toda a gente conhece que este governo já solicitou a esta Assembleia da República um pedido para alterar globalmente a legislação laborai. Fê-lo apresentando os projectos para esta Câmara tomar deles conhecimento e poder balizar a forma de revisão dessa legislação.

or isso pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o seu discurso é o novo discurso do Partido Socialista, e se com esse discurso V. Ex.ª se dispõem a rever, globalmente, a legislação laborai que nós consideramos como a maior causa, designadamente, do desemprego e, também, de outras situações de insegurança no emprego, como seja a chaga do contrato a prazo.
Por isso mesmo, pergunto se VV. Ex.ªs, nos tempos de hoje, já se manifestam no sentido de rever a legislação laborai.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, para responder.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por um lado, por motivos de tempo que, como calculam, não é muito e, por outro lado, porque julgo que isto é uma interpelação, ainda nesta fase, ao Governo e não ao «governo sombra»...

Risos do PSD.

... não poderei responder de uma forma tão aprofundada como gostaria.

Em relação ao Sr. Deputado Rui Salvado, sobre a questão da concertação social, é capaz de ser um erro de paralaxe dizer que isso resulta de uma reforma estrutural deste governo. Que eu saiba, o Conselho Permanente da Concertação Social já vem de trás.
Os objectivos e os resultados práticos são, obviamente, importantes e o que lamento é que um objectivo nacional, como deve ser considerado o da concertação social, seja demasiadamente utilizado por este governo para tirar trunfos político-partidários. E foi isso que eu disse. É que, além do mais, se nós analisarmos os últimos diplomas sobre questões laborais que foram apresentados no Conselho Permanente da concertação social, dos quatro diplomas aí apresentados três foram recusados.
Não passaram (não tiveram apoio de Concertação Social), o diploma do lay-off, o diploma das agências de colocação de emprego e o diploma sobre a flexibilização do horário de trabalho, no estado em que foram apresentados. E houve um quarto que também não foi aprovado no Conselho de Concertação e que o Governo publicou como se tivesse sido, contra o parecer das próprias organizações patronais e não apenas da UGT.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, agradeço a sua questão - refiro, contudo, que não foi esta a minha primeira intervenção na Assembleia da República pois estive aqui, também com «contrato a prazo», na altura da discussão do Orçamento do Estado - mas, efectivamente, não considero que haja qualquer espécie de contradição entre as duas fases que julgou verificarem-se na minha intervenção: a fase da demarcação e a fase da afirmação.
Procurei utilizar conceitos, que não vou ter tempo de desenvolver aqui, que são bastante diferentes: a intervenção do Estado na regulação económica e a intervenção do Estado na regulação social.
Ora, eu defendo uma intervenção profunda do Estado na regulação social. Por isso, é perfeitamente possível conciliar uma demarcação, no primeiro tempo, com uma afirmação, na segunda fase.

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Quanto à questão da negociação da legislação laborai, o que julgo é que, neste momento, o Governo teve uma atitude demissionista porque, Srs. Deputados, dar a iniciativa a um parceiro social para tentar fazer os consensos não me parece próprio de uma estrutura que é fundamental no Estado democrático. O Governo, se está convencido que com a alteração das leis laborais poderia melhorar alguma coisa, suponho que a amostra foi má porque quando enviou para aqui as suas propostas que estavam apensas ao pedido da autorização legislativa - e não era uma proposta de discussão profunda nesta Assembleia - mostrava claramente que era um tipo de posições com as quais não concordávamos e, portanto, teriam de ser discutidas.
Julgo, assim, existir um demissionismo por parte do Governo, neste campo como noutros, em relação a grandes reformas de fundo que, inclusivamente, foram apresentadas como temas centrais para a ruptura do bloco central e que, desde aí, não se viu nada em relação a essas mesmas reformas, como o Sr. Deputado, certamente, sabe.
Quanto ao Sr. Deputado Carlos Brito, é óbvio que todas as caricaturas são más, que todos os esquemas fogem um pouco à verdade global dos factos e, repetindo a tentativa de explicação que dei ao Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, digo que a atitude que o Partido Socialista tem em relação à intervenção do Estado ao nível da regulação social, por exemplo, ao nível das questões de segurança social, com a protecção do desemprego, com os incentivos à criação de emprego, é uma atitude diferente, do meu ponto de vista, da que tem em relação à expansão do sector produtivo, ao nível económico.
Há, portanto, uma demarcação e não se trata, evidentemente, de proporções ou percentagens. Eu sei que o Sr. Deputado estava a fazer humor com a questão das percentagens.
Quanto à pergunta do Sr. Deputado Vieira Mesquita, folgo muito que a bancada do PSD considere o trabalho infantil uma infâmia, mas mantenho a afirmação de que não se têm visto resultados concretos na possível acção efectiva do Governo no combate ao trabalho infantil e julgo que, se a via for meramente pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social e pela Inspecção-Geral do Trabalho, será muito difícil obter resultados, pelos mesmos motivos que já hoje aqui foram referidos.
Por isso, parece-me que há necessidade de articular as medidas do Ministério do Trabalho e Segurança Social com as medidas, inclusivamente, do Ministério da Educação, porque há um problema de não cumprimento da escolaridade obrigatória em grande parte desses casos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvado.

O Sr. Rui Salvado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Seria suposto que uma interpelação - para mais vinda de quem vem - pretendesse mostrar as fraquezas do Governo, os seus erros, as suas omissões - em suma, comprovar o falhanço da sua acção, o incumprimento do seu programa.
No caso presente, tratando-se, como se trata, de uma missão impossível, resta a hipótese de o PCP estar a servir-se desta figura regimental para dizer ao seu eleitorado - ao que ainda resta digerindo lancinantes dúvidas e àquele que já se encontra em fuga irreversível - que: «interpelo, logo existo».
E é assim que, mesmo antes de a interpelação chegar ao seu termo, o Governo já adregou uma importante e decisiva vitória. A iniciativa do PCP, que sempre privilegiou a luta de ruas e, na sua própria terminologia, a força das massas populares, é a confissão do seu isolamento dos estratos da população em que tinha algum apoio.
E por isso esta interpelação é, tanto ou mais que uma vitória do Governo, uma vitória da própria democracia!
Que maior, que mais decisiva reforma estrutural era exigível a este governo do que reduzir o mais ortodoxo partido comunista da Europa livre a um pequeno partido de agitação ideológica obrigando-o a conter-se no liliputiano universo das discussões burguesas de um parlamento cada vê:, mais tornado na sua última tribuna disponível?
Nunca, como agora, o PCP desejou tanto a queda de um governo. Mas, absurdo estranho, nunca - como agora - entendeu dispensável a realização de eleições. Num momento em que, conforme diz, os Portugueses, os trabalhadores:, estão sujeitos a tão grandes sacrifícios.
A tão desoladora desesperança, o PCP não reclama eleições, não organiza manifestações de rua ou, quando as ensaia, sofre pesados vexames e desilusões.

Vozes do PSD: - Muito bem! Risos do PCP.

O Orador: - Que faz então, que lhe resta neste corredor estreito de uma existência difícil que a eficácia do Governo não permite se transforme em campo aberto para a agitação de que tanto gosta e de que tanto precisa? Que faz? Pois, interpela, ratifica, discursa!
Que derrota para o ortodoxo Partido Comunista Português!
Mas que vitória para o Governo, que consolo para os democratas, que esperança para os Portugueses e para os trabalhadores!
Adivinho, no entanto, as dificuldades que terá experimentado ao optar, como lhe exigia a proximidade do 1.º de Maio, pelo tema «trabalho» para fulcro da interpelação. Porque se há matérias em que a interpelação se traduziria numa pesada derrota para o PCP e em mais uma oportunidade para o País tomar consciência das grandes vitórias deste governo, o trabalho é, seguramente, unia das mais adequadas.
Recebeu este governo um país desconsolado: o não pagamento atempado dos salários tendia a transformar-se numa rotina; a inflação corroía salários, pensões e intenções de investimento; o desemprego não parava de crescer, tornando-se uma ameaça permanente sobre estratos crescentes da população; o investimento sofrera uma recessão de menos 30% nos últimos três anos; a concertacão social balbuciava um formalismo apertado de boas intenções sem especiais resultados práticos - e sobre tudo isto, muitos portugueses, cerceados na sua esperança, já admitiam não poder ser outro o seu destino.
Neste ambiente de descrença, onde os democratas vislumbravam perigos crescentes, o PCP colhia fartos dividendos: era o tempo em que organizava marchas velocipédicas da Marinha Grande para Lisboa, fazia ma-

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drugadas na Gomes Teixeira e na Praça de Londres, deitava abaixo o Governo por tudo onde fosse sítio nos muros e nas paredes de Portugal.
A decisiva e grande medida estrutural deste governo foi a criação de condições para que os trabalhadores, crescentemente, se apercebessem de que em Portugal, afinal, era possível viver melhor. Nada tem conseguido demovê-los da crescente adesão ao Governo e ao partido que o apoia: nem a fabricação de crises artificiais que o tempo se encarrega de tornar ridículas; nem o ataque injusto a ministros; nem a repetida ameaça da queda do Governo, logo sucessivamente adiada; nem a disponibilidade permanentemente propagandeada para eleições que não ousam desencadear porque não é sincera.
E é assim que o País, boquiaberto, assiste a este aparente paradoxo: o PCP, que 24 horas antes da posse dos anteriores governos já preparara o seu discurso para reclamar novas eleições na semana seguinte, subitamente converte-se à estabilidade parlamentar.
Não estando no seu espírito, como ninguém admite que esteja, a adopção do slogan «eleições nunca mais», estaremos perante mais um aperfeiçoamento democrático que aponta para a aceitação e defesa de governos de legislatura?
E os outros partidos de oposição - ditos à esquerda do PSD - dão a triste imagem ao País de que, mais que atacar o Governo, se atacam mutuamente; que são, não tanto oposição ao Governo, mas oposição um ao outro - e daí muitos portugueses já terem por assente que eles são não uma alternativa ao Governo mas uma alternativa à liderança da oposição. Por muitos anos!
Alheado destas questiúnculas, o Governo apoiado pelo PSD operou outra importante reforma estrutural no tecido social português: ajudou a formar uma nova mentalidade dos Portugueses, que, cansados de discursos, de ideologias que se resumem a palavras logo desvirtuadas na acção concreta, já não vão atrás de quem fala bem ou fala alto, mas de quem faz bem, ainda que no silêncio dos gabinetes.
A transparência com que o Governo propôs a esta Assembleia e ao País as metas que se propunha alcançar -e a forma rigorosa como as tem vindo a cumprir- são o suporte da convicção sentida pelos Portugueses e pelos trabalhadores de que com o Governo Cavaco Silva é mesmo para valer, isto é, foi possível que entre o Executivo e o povo se recriasse uma relação de confiança recíproca que é um pilar insubstituível de fortalecimento do regime democrático e uma garantia de progresso e paz social.
Recriada a confiança, o Governo iniciou o combate à crise económico financeira, com especial atenção ao crescimento dos preços, onde veio a adregar uma vitória tanto mais significativa quanto foi possível obtê-la sem penalizar o emprego, ele próprio em clara reanimação. É fácil e cómodo vir agora dizer-se que só a conjuntura externa permitiu tais resultados - não é, porém, sério. Desde logo porque os relatos dos debates travados nesta Assembleia a propósito do Programa do Governo e do Plano e Orçamento para 1986 mostram à saciedade que tal evidência só foi adquirida, por essa altura, pelo Governo e pelo PSD, e que a oposição, como também muitos analistas económicos, a recusaram. Mas não o é também porque em outros países, que compram também petróleo e onde o dólar é necessariamente moeda de referência, a taxa de inflação não desceu e pese embora, em alguns casos, a baixa dos produtos petrolíferos se ter repercutido nos preços ao consumidor, posição que em Portugal o Governo sempre contrariou e que provavelmente outros - com menos sentido dos interesses nacionais - não resistiram a adoptar na mira de alguns votos fáceis.
Assegurou o Primeiro-Ministro, aquando da discussão do Orçamento, um crescimento do produto não inferior a 4% (foram atingidos os 4,2%); o controle do crescimento dos preços abaixo dos 14% a visar os 127o (não ultrapassou os 11,8%); uma melhoria de, pelo menos, 3% nos salários reais e de 8% nas pensões (obtiveram-se 5% e 10%, respectivamente); a expansão do investimento em cerca de 10% (também cumprida) e a criação de mais postos de trabalho, os quais cresceram 0,5%, pese embora a capacidade subaproveitada que persistia em muitas unidades.
Do semanário O Jornal, insuspeito quanto à sua independência face ao Governo, respigo alguns títulos da sua página económica:

De 30 de Janeiro: «Mercado Automóvel -procura excede a oferta»; «Consumo de cimento- sobe»; «Oferta de emprego: record»;
De 13 de Fevereiro: «Oferta de emprego - alta mantém-se»; «Habitação: crédito duplica»; «Materiais de construção: vendas crescem»;
De 20 de Fevereiro: «Telefones: pedidos sobem em flecha»; «Oferta de emprego: recuperação continua»; «Supermercados: vendas aceleram»;
De 27 de Fevereiro: «Conflitos laborais diminuíram em 1986»; «Indústria: optimismo mantém-se»; «Salários: mais poder de compra»; «Dívida externa: diminuição»; «Comércio externo: défice reduzido».

Risos do PCP e do MDP/CDE.

Estes são os dados conhecidos e as realidades sentidas pelos Portugueses, que os discursos desesperados da oposição não podem alterar, e que são tanto mais lisonjeiros quanto é certo não ter o Governo contado com uma oposição construtiva, pois que tudo tem feito nesta Assembleia para subverter o equilíbrio de poderes ao nível do Estado.
Mas, então, sobre que vem o PCP interpelar? Sobre a proliferação dos contratos a prazo que persiste devido ao irrealismo da oposição, que faz que não compreende a necessidade, já generalizadamente adquirida, da revisão -ponderada e cuidadosa embora- da legislação sobre o contrato de trabalho? Que não quer compreender que esta situação enfraquece o próprio movimento sindical por que os trabalhadores contratados a prazo normalmente não se sindicalizam? Que os impossibilita de usufruir da necessária formação profissional, já que tendencialmente serão sempre preteridos?
Sobre os salários em atraso? Sobre os salários em atraso que ele - PCP - potenciou com a aventura do 11 de Março, com o desmantelamento cientificamente programado do aparelho produtivo nacional, com o aventureirismo para que conduziu os trabalhadores em reivindicações que, sabia-o bem, eram de todo irrealistas?
As consequências desses desvarios têm merecido a atenção cuidada do Governo: desde logo pela convicção de que é problema a resolver no contexto global da economia e não com paliativos que se traduzem normalmente em desperdício de meios financeiros sem qualquer vantagem para os trabalhadores. Como tam-

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bem - escassos dois meses passados sobre a sua tomada de posse logo aprovou legislação específica sobre a matéria.
A acção global do Governo - económica, legislativa e inspectiva - possibilitou a redução drástica do número de trabalhadores nessa situação, que se saldou
- Dezembro de 1986 sobre Dezembro de 1985- em menos 42% dos casos existentes, dos quais 60% estão a beneficiar dos apoios concedidos pela legislação em vigor, designadamente a Lei n.º 17/86.
Interpelação sobre o desemprego, que regrediu em 1986, situando-se mais do que dois pontos abaixo da média da CEE, e tendo o emprego subido cerca de meio ponto?
Sobre a política de segurança social, onde os reformados e os idosos viram aumentado o seu poder de compra real em mais 10%, onde 510 000 trabalhadores agrícolas foram integrados no regime geral, passando a usufruir de melhores subsídios de doença e desemprego e viram fazer-se justiça a um sector da população que outros sempre consideraram de 2.ª; onde dezenas de milhares de pescadores viram melhoradas as condições de cálculo das pensões; onde mais de 30 000 deficientes beneficiaram de um aumento superior a 50% dos abonos complementares e subsídios mensais?
Interpelação sobre instabilidade social, quando o número de acções grevistas diminuiu 25 % e muitas das greves existem apenas nos comunicados de quem ainda manipula a informação?

Risos do PCP.

Interpelação do PCP ao Governo? Ou interpelação do País ao PCP?
Não sendo já capaz de mobilizar os trabalhadores na rua, bem se compreende que o PCP interpele. Mas sendo certo que esta interpelação não tem qualquer sentido e que o Governo vai sair dela reforçado, será que o PCP só não apresenta uma moção de censura porque já a terá recomendado a outro partido? E que iremos proximamente debater uma moção de censura com um subscritor confesso e um autor escondido?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não quero terminar a minha intervenção sem fazer referência a dois aspectos relevantes da situação sócio-laboral que propositadamente guardei para o fim: o accionato dos trabalhadores e a concertação social.
O acesso dos trabalhadores ao capital das suas empresas é um passo importante no sentido da desproletarização da sociedade portuguesa e a sua desejável generalização irá contribuir decisivamente para aumentar a eficácia das empresas e as condições de vida dos respectivos trabalhadores.
Que ele venha ocorrendo um pouco aqui e acolá é um corolário lógico da confiança introduzida pelo Governo na vida social e económica portuguesa. Mas que ele tenha lugar nos antigos feudos comunistas, como há bem pouco tempo aconteceu na FISIPE - em pleno Barreiro- constitui outra importante reforma estrutural potenciada pela política global do Governo, e um testemunho concreto de que os trabalhadores estão a mudar mais depressa, e para melhores caminhos, do que certa classe política que a cada passo os invoca.
Finalmente, desejo terminar referindo-me a outra grande reforma estrutural, porventura uma das mais importantes, pelo que encerra de bom senso, de sentido do interesse nacional, de preocupação pelos reais interesses dos trabalhadores: a concertação social concretizada entre este Governo, a União Geral de Trabalhadores e as confederações patronais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Quem era o Ministro do Trabalho do governo anterior?!...

O Orador: - A apreciação das realidades a que vimos assistindo aponta para um grande mérito do Governo, único que mereceu dos parceiros sociais credibilidade bastante para a subscrição - sem temor de críticas - dos acordos celebrados sobre política de rendimentos e preços.
Mas mérito também das confederações patronais, cuja actuação permite supor que o País dispõe de um leque de empresários com uma visão moderna das relações sociais que são um referencial indispensável para o progresso e o País.
Mérito, finalmente, da União Geral de Trabalhadores, que soube, com realismo e sentido de responsabilidade, captai as aspirações dos trabalhadores portugueses e perceber que da concertação social com este governo resultariam ganhos palpáveis para os trabalhadores e uma maior justiça social.

Risos do PCP.

Quando - em Portugal - doze anos após o 11 de Março, assisámos à mais profunda reforma estrutural que é a reforma das mentalidades - de que é testemunho irrecusável este protagonismo social entre Governo, organizações patronais e central sindical democrática - o PCP, ao interpelar o Governo em matéria laborai, está a assumir e a reconhecer o seu total isolamento!

O Sr. António Osório (PCP): - Mude de cassette!

O Orador: - Isolamento político - seguramente; mas, principalmente, isolamento social.
O que, sendo uma vitória do Governo, é uma vitória dos trabalhadores. E um bem inestimável para o futuro do País.

Aplauso do PSD.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Deputado Rui Salvada, o seu discurso idílico levanta-me uma séria interrogação: todos sabemos que é presidente da Comissão de Trabalho da Assembleia da República, local privilegiado onde chegam protestos, petições, reclamações, pedidos de entrevista, dados objectivos sobre a situação social em que vivemos. Será que tudo isso é uma terrível conspiração dos sindicatos, dos comunistas? Uma invenção pura e simples?
Uma segunda questão: decidiu a Comissão de Trabalho, recentemente, visitar as minas da Panasqueira e a Metalúrgica Duarte Ferreira, duas situações graves que envolvem o risco do despedimento de milhares de trabalhadores. Perante o seu discurso, pergunto-lhe se

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quando esteve de acordo em fazer essas visitas estava a pensar em ir ver essas situações dramáticas ou em ir fazer turismo à serra da Estrela e uma cura de águas ao Tramagal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Com essas coisas não se brinca, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Também para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Marques.

O Sr. António Marques (PRD): - Sr. Deputado Rui Salvada, ao ouvir o seu discurso fiquei também um pouco preocupado. Já se falou aqui na Idade da Pedra, mas ao ouvi-lo fiquei com a sensação de estar a assistir ao vivo a um daqueles filmes dos Flintstones. Na verdade, o seu discurso é realmente antigo. Queria, no entanto, fazer-lhe unicamente uma pergunta: onde é que se dá o crescimento de emprego que referiu? Em que sector é que se dá esse crescimento de emprego? Se o confrontarmos com o Programa do Governo, verificamos que este aponta para «uma excessiva população no sector primário».

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Anda com boas leituras, ultimamente!

O Orador: - Obviamente, pretenderia dizer que havia necessidade de desemprego neste sector. Os últimos dados que obtivemos do Instituto Nacional de Estatística apontam para o crescimento de emprego na área da agricultura ... logo, gostaria que me explicasse melhor o crescimento de emprego que o Governo apresenta. Se na verdade cresce o emprego na agricultura, se se distorcem os dados aqui apresentados, das duas uma: ou estamos em conflito com o Programa do Governo, ou não há tanto êxito quanto aquele que o Sr. Deputado nos anuncia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Rui Salvada.

O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, é evidente que estou aqui na minha qualidade de deputado do PSD e não em qualquer outra qualidade. No entanto, em relação à questão que me pôs e que tem a ver com outra sede, passo, de todo o modo, a dar-lhe a minha percepção da questão. É a seguinte: dessas muitas cartas que referiu e que efectivamente são recebidas, 98 % ou 95 % vêm de um espectro sindical claramente definido e que o Sr. Deputado bem conhece. Trata-se de cartas que servem mais para fazer um certo show-off, uma certa crítica formal, que para tentar obter quaisquer resultados práticos ao nível da concertação social, que devem ser obtidos - e têm sido obtidos - no Conselho Permanente de Concertação Social, que é onde esses problemas são tratados.
As visitas à Panasqueira e à Metalúrgica Duarte Ferreira decorrem, naturalmente, do interesse que os deputados têm em conhecer situações que não estão tão bem quanto seria desejável, mas que não são forçosamente da responsabilidade deste governo - não está certamente à espera que este governo resolva todos os problemas deste país. É evidente que, infelizmente, ainda há bolsas onde existe essa infelicidade. É desse tipo de problemas que o Governo tem vindo a ocupar-se e vai crescentemente continuar a fazê-lo.
Sr. Deputado António Marques, o problema que levantou tem resposta nos números; para 1987 está adquirido - e os deputados especializados nessa matéria, incluindo os da sua bancada, reconhecem-no - que a situação vai ser caracterizada por um aumento de emprego. Portanto, o investimento tem vindo a aumentar, a actividade económica tem vindo a ser dinamizada, e isso vai ter consequências ao nível do emprego. O que está a dizer é uma consequência natural da política que este governo desenvolve desde a sua tomada de posse e do clima generalizado de confiança que criou nos parceiros que têm a ver com o tecido económico português. Penso que isso é um motivo de regozijo para o PSD e para o Governo, mas também certamente para o seu partido e para todos os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é chegada a hora do nosso intervalo regimental. Os nossos trabalhos reiniciar-se-ão às 18 horas, com uma votação final global.

Está, pois, suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida):

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 24 de Março de 1987, pelas 11 horas, foi apreciada a seguinte substituição de deputado:

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social:

Joaquim Augusto Garcia Marques Pinto (círculo eleitoral de Aveiro), por António Alberto Vieira Dias. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo S.º da Lei n.º 3/8S, por um período não inferior a quinze dias, a partir do dia 24 de Março corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, consi-

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derando a ordem de preferência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Teles, Borges de Carvalho e Rui de Oliveira e Costa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura de um requerimento relativo ao projecto de lei n.º 343/1 V, apresentado pelo CDS ao abrigo do artigo 148.º do Regimento, em que se pede uma nova apreciação do respectivo texto.

Foi lido. É o seguinte:

Os deputados abaixo assinados requerem, nos termos do artigo 148.º do Regimento, a baixa à 1.ª Comissão do projecto de lei n.º 343/IV, com vista à reelaboração do texto, em termos de encontrar a forma mais correcta de acautelar os interesses que estão na base daquela iniciativa legislativa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, é que da leitura do requerimento não me apercebi se ele tem algum prazo relativamente à baixa que é requerida.

O Sr. Presidente: - Não contém, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Nesse caso, se V. Ex.ª me permite, estando no uso da palavra, apelava aos requerentes para que fosse estabelecido um prazo tão curto quanto possível, o que facilitaria o nosso voto; por exemplo, quinze dias.

O Sr. Presidente: - Pergunto aos Srs. Deputados requerentes se aceitam a alteração proposta pelo Sr. Deputado António Capucho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, admitimos a sugestão de que seja introduzido um prazo de quinze dias, o que nos parece perfeitamente razoável.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ao requerimento apresentado faz-se então o aditamento de que o prazo de baixa à Comissão será de quinze dias.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, é para, ao abrigo do Regimento, solicitar a interrupção dos nossos trabalhos por um período de dez minutos.

O Sr. Presidente: - É regimental, pelo que será concedido. Está suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 27 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 37 minutos.
Srs. Deputados, vamos então proceder à votação do requerimento que foi lido, com o aditamento de que o prazo será de quinze dias.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do PSD e do CDS e votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, é para, nos termos regimentais, pedir a suspensão dos nossos trabalhos por um período de 15 minutos.

O Sr. Presidente: - É regimental, está concedido. Eram 18 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 19 horas.

Srs. Deputados, vamos então proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 343/IV, apresentado pelo PSD, PS, PRD e PCP, sobre extinção da enfiteuse ou aforamento.

Submetido á votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Teles e Rui Oliveira e Costa e votos contra do CDS.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, é só para informar que faremos chegar à Mesa uma declaração cie voto escrita.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, estão na Mesa dois requerimentos solicitando a baixa à comissão do projecto de lei n.º 343/IV, que vão ser lidos.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O primeiro requerimento tem como primeiro subscritor o Sr. Deputado António Capucho e é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem a baixa à 1.ª Comissão, pelo prazo de dez dias, do projecto de lei n.º 343/IV, para efeitos de discussão e volição na especialidade.

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O segundo requerimento, entrado posteriormente, tem como primeiro subscritor o Sr. Deputado Jorge Lacão e é do seguinte teor:
Os deputados abaixo assinados requerem, nos termos regimentais, a baixa à Comissão de Agricultura e Mar do projecto de lei n.º 343/IV, pelo prazo de dez dias, para votação na especialidade.

A diferença entre os dois requerimentos é que o primeiro solicita a baixa do projecto de lei n.º 343/IV à 1.ª Comissão e o segundo à 6.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, pois, votar o primeiro requerimento, que solicita a baixa do projecto de lei n.º 343/IV à 1.ª Comissão.

Submetido à votação, foi rejeitado com votos contra do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Teles e votos a favor do PSD, do CDS e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

Srs. Deputados, vamos votar o segundo requerimento, que solicita a baixa do projecto de lei n.º 343/IV à 6.ª Comissão.

Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos, Ribeiro Teles e Rui Oliveira e Costa e a abstenção do CDS.

Srs. Deputados, vamos prosseguir os trabalhos com o debate fixado na ordem do dia.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.

A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP, interpela hoje esta Câmara o Governo sobre política de trabalho e política de emprego.
A situação sócio-laboral em Portugal apresenta, na verdade, aspectos profundamente preocupantes.
As chagas sociais que vão desde o desemprego de cerca de 500 000 portugueses às formas, cada vez mais sofisticadas, de precarização do trabalho, até ao não pagamento de salários, passando pela dramática utilização da mão-de-obra infantil, levam-nos a questionar se Portugal não estará a regredir no tempo.
Na verdade, os problemas endémicos da sociedade portuguesa afiguram-se como problemas próprios do início da era da industrialização.
Em 1987, a treze anos do século XXI, sendo Portugal membro de pleno direito da Comunidade Económica Europeia, generalizam-se situações que se enquadram não num Estado social de direito mas sim na filosofia do Estado liberal absoluto.
Os poderes públicos assistem impotentes à degradação progressiva das relações de trabalho e à crise dos sistemas laborais, na ausência de uma política de trabalho e de uma política de emprego definidoras de uma estratégia global, coerente e articulada com políticas delineadas para outros sectores.
Restaura-se o laissez faire, laissez passer e é perigosamente posto em causa o princípio fundamental do primado do homem sobre a economia e do seu trabalho sobre os restantes factores de produção.
Este é o receio que se generaliza e que o Papa João Paulo II tão bem expressou na carta encíclica Laborem Exercens, quando escreveu:

O perigo de tratar o trabalho como uma mercadoria sui generis ou como uma força anónima necessária para a produção continua a existir nos nossos dias, especialmente quando a maneira de encarar o problema económico é caracterizada pela adesão às premissas do economismo materialista, enformador da filosofia e das teorias económicas do século XVIII.
Importa, por tudo isto, interpelar o Governo perguntando-lhe o que tem feito, que política de trabalho e de emprego enforma a sua acção, se é que as tem, quais as perspectivas de evolução do emprego, quais as soluções tentadas pelo Ministério do Trabalho para debelar os males de que enferma a sociedade portuguesa no sector laboral.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PRD não pretende aqui limitar-se à denúncia das anomalias da sociedade portuguesa. Embora consideremos que ela é importante, pensamos, todavia, que de nada adianta a denúncia episódica das chagas sociais, para de seguida tudo ficar na mesma.
Muito menos nos move a denúncia pela denúncia, sem verdadeira intenção de contribuir positivamente para alterar a situação.
Discursos trágicos, chavões, visões apocalípticas e tão-só não se enquadram no desejo do PRD de contribuir para que este debate seja tão profundo quanto possível, dado o melindre e a importância do mundo do trabalho e dos novos problemas que hoje aí se levantam.
Pouco importa traçar o quadro do sector laborai, pois ele é de todos sobejamente conhecido.
A radiografia da situação, podemos afirmá-lo, é consensual.
Todos nesta Casa, e fora dela, afirmamos estar contra a existência de salários em atraso, contra a utilização abusiva e generalizada de contratos a prazo, contra o número crescente de menores que abandonam os estudos para aumentar os proventos da família, contra o número elevado de acidentes de trabalho, contra o número de trabalhadores da função pública em regime de tarefeiros, contra a existência de um volume elevadíssimo de desemprego, et c., etc.
Todos desejaríamos por certo um mercado de trabalho devidamente estruturado e dirigido para o objectivo primordial do pleno emprego, hoje, e cada vez mais, uma miragem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas, se recusamos esse discurso imobilista, recusamos também o discurso que, encobrindo a incapacidade de enfrentar problemas estruturais e de introduzir as necessárias reformas na sociedade portuguesa, se refugia em álibis como justificação para que tudo continue na mesma, numa fuga sistemática às responsabilidades próprias.
É este o discurso de quem vê na simples alteração das leis laborais o remédio para todo o mal.
Mas será que têm razão os que consideram factor fundamental de mudança a revisão da legislação laborai?
Convém, antes de mais, esclarecer o que se entende por revisão das leis do trabalho.

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Enquanto o Grupo Parlamentar do PRD tem uma perspectiva global e dinâmica das leis laborais, reconhecendo a necessidade de uma melhor articulação entre diplomas dispersos e a necessidade de revisão de alguns dos seus aspectos por forma a alterar ou regulamentar novas realidades que hoje se colocam, com grande acuidade, num mundo laborai em constante mutação, temos a sensação de que para o Governo essa revisão se traduz unicamente na flexibilização da cessação do contrato individual de trabalho.

Uma voz do PSD: - Não é nada disso!

A Oradora: - Esta perspectiva do Governo, num período de recessão económica e de crise social, traduz uma visão profundamente limitada e redutora das consequências de tal revisão.

Vozes do PRD: - Muito bem!

A Oradora: - Facilitar o despedimento arbitrário, ignorando as suas eventuais consequências, quando a lei já o permite, quer por razões objectivas quer por razões subjectivas, e quando o desemprego atinge cerca de 500 000 trabalhadores, convenhamos que mais não traduz do que a visão meramente economicista do Governo e das outras forças sociais que, defendendo tal pretensa solução, provam não ter preocupações de índole social.
A legislação laborai não é mais do que um álibi, e estamos convictos de que também o Governo tem consciência de que a sua alteração não resolve os problemas de fundo, caso contrário, a fazer fé naquilo que o Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social e o Sr. Primeiro-Ministro repetidamente afirmam, já teria o Governo tomado a iniciativa de propor essas alterações sob a forma de uma proposta de lei à Assembleia da República.

Uma voz do PSD: - Outra vez?!

A Oradora: - Como não fez e não o faz somos forçados a afirmar que o Governo prefere brandir essa bandeira, piscando o olho à direita, mas não tomando a iniciativa por consciência das tensões sociais que suscitaria, piscando assim o olho à esquerda.

Uma voz do PSD: - À esquerda?!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já afirmámos várias vezes a nossa disponibilidade para rever a legislação laborai.
A realidade laboral é dinâmica, as leis laborais não podem ser imutáveis, sob pena de não aplicação. É, pois, importante alterá-las. Importante, mas não fundamental.
E não é fundamental hoje e agora, porque, em primeiro lugar, entendemos que as causas da inadequação das leis vigentes à realidade prendem-se, não tanto com os aspectos substantivos da legislação, mas sim com a sua aplicação, fiscalização e instrumentos de punição.
Em segundo lugar, entendemos que o que é fundamental hoje e agora é a introdução de reformas estruturais. Reformas estruturais orientadas desde logo no sentido de proporcionar um diagnóstico tão profundo quanto possível da realidade sócio-laboral, por forma a tornar eficaz o funcionamento das instituições e das estruturas, através da definição de um plano de acção correcto e capaz de minorar as mazelas sociais antes referidas.
Primeiro, é preciso conhecer seriamente a realidade, fazer o diagnostico e com base nesses dados definir políticas e traçar planos de acção.
Pois bem, logo aqui se revelam claramente os referidos problemas estruturais. O primeiro diz respeito ao aparelho de informação e de estatística.
Informação estilística e sociológica séria e rigorosa que permita uma análise correcta da situação e da sua evolução é algo que não existe.
Temos informação e dados estatísticos do Governo, designadamente Ministério do Trabalho, Instituto do Emprego e Formação Profissional, Instituto Nacional de Estatística, sindicatos, etc., que valem o que valem, pois perdem toda a credibilidade quando apresentam números profundamente discrepantes.
Não há identidade de dados, não há precisão de conceitos. Por exemplo: Quem é considerado empregado e desempregado? Que realidades são contabilizadas nas estatísticas do emprego? O trabalho clandestino que reflecte, na verdade, um desemprego oculto é contabilizado como emprego ou não?
Não há, pois informação circunstanciada do mercado de trabalho. Informação que, mais do que possibilitar a intervenção do Estado, garantiria aos agentes económicos o conhecimento exaustivo da realidade.
Não pode, na verdade, haver uma análise séria, planeamento, definição de uma política de trabalho e de emprego que se projecte no futuro, na quase ausência de informação cena e fiável.
Outro dos problemas de fundo, o segundo, diz respeito à inexistência do plano, cuja função estruturante é basilar.
O plano, que não temos, orientador e definidor de objectivos predeterminados, poderia ser o instrumento fundamental cie uma estratégia de mudança social, como contrato político capaz de mobilizar e enquadrar as múltiplas negociações que caracterizam a vida económica e social.
O terceiro problema estrutural diz respeito à administração do trabalho.
Quando não existem mecanismos que permitam com eficácia prevê evitar e punir as práticas marginais ao quadro legal não há leis susceptíveis de aplicação correcta, pelo que é secundário o objectivo da mera alteração das leis em cada momento vigentes.
Refiro-me à Inspecção-Geral do Trabalho e, num sentido lato de administração do trabalho, aos tribunais do trabalho.
A Inspecção-Geral do Trabalho, organismo competente para fiscalizar o cumprimento das normas do direito do trabalho contidas nas leis, convenções colectivas e contratos individuais, relativos à condição de trabalho, e fazer respeitar as normas relativas ao emprego e à protecção contra o desemprego, bem como à formação profissional, não funciona em Portugal.
As inspecções às empresas são em número reduzido e meramente pontuais. Sectores de actividade económica, como a agricultura, minas e pequenas empresas, são largamente negligenciados ou mesmo ignorados; não assegura o controle da aplicação das normas relativas à segurança e higiene no trabalho; não desenvolve a acção preventiva e ou pedagógica, funcionando, quando muito, em último caso, isto é desenvolvendo acção repressiva.

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A Inspecção-Geral do Trabalho não desenvolve visitas periódicas e sistemáticas e as suas intervenções não correspondem a nenhum programa nem a nenhuma estratégia nacional ou local.
Se fosse fiscalizado o correcto cumprimento dos deveres das empresas como seria possível a existência de salários em atraso?
A ineficácia da IGT permitiu que empresas após meses e meses em situação de impunidade institucionalizassem o não pagamento de salários, quando o motivo de fundo nem sempre se traduzia nas dificuldades económicas e financeiras das mesmas.
A utilização do trabalho de menores num elevado número de empresas também só é possível numa teia complexa de conivências, mantendo-se o Estado à margem, num receio absoluto de intervir, quebrando essa alegada cumplicidade entre os pais dos menores, os empresários, os trabalhadores e todos os que receiam denunciar tão escabrosa situação.
Responsáveis do Governo afirmaram não há muito tempo que não tinha correspondência com a realidade a denúncia feita pelos sindicatos do emprego de mão-de-obra infantil. Foram desmentidos publicamente, depois de visitas da Inspecção-Geral do Trabalho a várias empresas do Norte.
Em Julho de 1986 os contratos a prazo representavam 71,5% das entradas de pessoal, enquanto as entradas por novos contratos permanentes representavam apenas 9,3%.
A utilização abusiva dos contratos a prazo, se bem que seja justificada por empresários e forças políticas como fuga à rigidez das leis laborais, mais não esconde na verdade que a inoperância dos tribunais do trabalho, da Inspecção-Geral do Trabalho e do próprio Ministério.
A precarização do trabalho e o trabalho clandestino nas suas diversas formas são o sintoma da doença que afecta o mercado de trabalho.
As regras do jogo estão claramente pervertidas quando é o mercado de trabalho clandestino o mais dinâmico em termos de oferta.
O trabalho clandestino, efectuado à margem das disposições da legislação do trabalho e das regras fiscais e administrativas em vigor, e iludindo as medidas de protecção social, é um elemento de forte distorção das regras de concorrência e gerador de uma profunda injustiça social, já que apenas uma pane dos cidadãos activos suporta as despesas de toda a comunidade.
Contudo, o trabalho clandestino constitui a tábua de salvação daqueles a quem não é dada alternativa de subsistência num quadro de desemprego estrutural.
Não vemos por parte do Governo qualquer acção tendente a minorar este flagelo, o que só se justifica se o Ministro do Trabalho e Segurança Social considerar que o trabalho clandestino não é um flagelo social, mas antes uma válvula de segurança amortecedora das tensões sociais potenciadas pelo desemprego.
Se é esse o entendimento do Governo, decerto terá a esperança de reduzir o nível de desemprego através da liberalização oculta do mercado clandestino. A reacção do Governo aí está a prová-lo, pois, em vez de tentar a detecção e repressão das formas ilegais de trabalho, tem antes uma reacção de tolerância mais ou menos assumida.
A prevenção dos acidentes de trabalho, que em 1985 atingiram 241 000 trabalhadores, e 378 mortalmente, é outra das incumbências da Inspecção-Geral do Trabalho deficientemente executada.
O último problema de fundo que ainda queríamos realçar diz respeito à necessidade imperiosa de que o Governo assuma de forma responsável o princípio da concertação e da negociação com os parceiros sociais, promovendo um efectivo debate para procura de soluções, ao invés de predefinir isoladamente as suas posições políticas, tentando depois recolher o assentimento das partes envolvidas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Ministro do Trabalho e Segurança Social há uns meses nesta Câmara afirmou que tinha cumprido o Programa do Governo na política definida para o seu Ministério.
Não compreendemos a atitude do Governo, que, por um lado, grita vitória, mas, por outro lado, afirma que tudo estaria bem se a legislação fosse outra, remetendo para os agentes económicos a resolução das chagas sociais, à boa maneira do Estado liberal.
Que boa consciência a deste governo, que grita vitória enquanto se degradam as condições de vida dos trabalhadores.
Que falta de solidariedade social a deste governo, que se propõe deixar passar ao largo uma conjuntura económica extremamente favorável para impor os desbloqueamentos estruturais.
Que falta de sensibilidade a deste governo, que permite tratar displicentemente neste debate os problemas de milhares de homens e mulheres com salários em atraso. Refere o Governo que são 32 000, como se fossem poucos, Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social! Ainda que fosse só um trabalhador, tal facto deveria, ainda assim, preocupá-lo.

Risos do PSD.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!

A Oradora: - Também os cerca de 700 000 contratos a prazo e o fenómeno medieval do trabalho infantil não preocupam por de mais o responsável da pasta e o Governo.
Não descortinamos neste governo uma política de emprego nem uma política de trabalho; é um governo de mera gestão, incapaz de empreender as reformas estruturais de que Portugal tanto carece.
A ausência de medidas de fundo é tanto mais grave quanto foi esse o motivo invocado pelo Prof. Cavaco Silva para denunciar o acordo do bloco central, provocando a queda do anterior governo.
Nessa altura, aplaudiu-se-lhe a vontade de resolver os problemas.
Ano e meio depois, temos de interrogar-nos sobre se essa posição era séria ou mero artifício para a conquista do Poder.
Agora, o Governo está apenas instalado. E a instalar os compadres, os amigos e os clientes.

Vozes do PRD: - Muito bem!

A Oradora: - De medidas de fundo nem sequer já ouvimos falar. O País adiado, de que antes se acusava a existência, adiado continua. Mas com ar feliz. Triunfante pelo adiamento. O Governo não resolve, mas é Governo. Isso lhe basta. E ao que parece basta também aos que o apoiam.

Aplausos do PRD e de alguns deputados do PS.

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O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, escutei-a com extrema atenção, como é próprio, e ouvi a Sr.ª Deputada dizer que o PRD não queria fazer nesta interpelação, como outros partidos, um discurso «trágico, cheio de chavões e de visões apocalípticas».
Ouvi-a também invocar Sua Santidade o Papa João Paulo II -e devo confessar que não sei bem se o fez para abençoar a bondade das suas intenções-, mas não percebi qual era a coerência dessa parte da sua intervenção com os seus início e termo, em que fez um quadro negro da situação no País, em que disse que «Portugal está a regredir nessas matérias» e em que afirmou que «os poderes públicos assistem impotentes ao desenrolar desta situação».
Devo dizer, Sr.ª Deputada, que particularmente neste momento, com pouco mais de doze meses de actividade governativa, nunca ouvi o Governo gritar «vitória» em relação à resolução completa dos problemas, seja nesta ou noutra área. Agora o que também não entendo é como é que a Sr.ª Deputada vem aqui dizer que tudo está pior, que estamos a assistir a uma regressão, sem que aponte pelo menos uma única medida em que, na sua opinião, não estejamos perante uma situação desse género, mas, sim, a marcar pontos no sentido de atenuar as graves situações que teve ocasião de referir.
E era em relação a esta matéria que gostaria de lhe colocar três perguntas muito claras. A primeira, no sentido de saber se a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves não entende que um discurso sério da oposição pressupõe exactamente isso mesmo: quando constata que há áreas de intervenção em que o Governo está a fazer qualquer coisa, não deixar de dar o braço a torcer e dizer que há com certeza situações graves e dramáticas com as quais se preocupa, mas que, aqui e ali, se estão a tomar algumas medidas e decisões que levam à diminuição substantiva dos problemas sociais que estamos a enfrentar.
Em segundo lugar, concordo consigo em que, quanto à Inspecção-Geral do Trabalho, não há lei que resista se não houver um sistema de fiscalização eficaz, mas gostaria de lhe perguntar se não entende que, por exemplo, é de louvar o esforço que o Governo fez neste campo, em particular no Orçamento do Estado para 1987, quer quanto às despesas correntes quer no PIDDAC - tanto quanto me recordo, em cerca de 200% na dotação deste último e em 60% no orçamento de despesas correntes. Não entende a Sr." Deputada que há aqui um esforço muito grande no sentido de dotar a Inspecção-Geral do Trabalho de meios mais eficazes?
E, neste campo, gostaria de chamar a sua atenção para o facto - que não sei se a Sr.ª Deputada o conhece, porque referiu que a Inspecção-Geral do Trabalho não tem ido às empresas vezes suficientes- de que perto de 60% das visitas inspectivas não são feitas a pedido de entidades (trabalhadores, organizações sindicais ou empresas), mas, sim, pela própria iniciativa dos serviços. Ou seja: a iniciativa dos particulares ou das instituições não chega a 30% do total das visitas feitas pela Inspecção-Geral do Trabalho.
A última questão, Sr.ª Deputada, tem a ver com a legislação laborai. Ninguém disse -pelo menos não me recordo de alguém da minha bancada o ter dito- que a legislação laborai é o remédio para todos os males,
e entendendo que, além da legislação sobre a cessação do contrato individual de trabalho, há também a legislação sobre contratos a prazo que V. Ex.ª referiu, e muito bem.
Mas, Sr.ª Deputada, qual é a justificação que encontra para que haja aquilo que classificou de «utilização abusiva do contrato de trabalho»? É só a legislação que está mal e que e importante corrigir ou esta utilização abusiva do contrato de trabalho não servirá aqui como a válvula de escape do sistema, porque há outras coisas erradas, nomeadamente a legislação referente à cessação do contrato individual de trabalho?
Por último, se a Sr.ª Deputada se agasta tanto pelo facto de o Governo que não viu aprovada uma proposta de altera não legislativa que em qualquer circunstância esta Assembleia poderia chamar novamente à discussão através do processo de ratificação de decretos-leis ter a responsabilidade de nesta matéria corrigir desvios legais que na sua opinião existem, pergunto-lhe porque o que o Grupo Parlamentar do PRD e a Sr.ª Deputada também não tomaram a iniciativa legislativa nesta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que a tomaram em relação a matérias que a Constituição da República reserva à competência legislativa concorrencial entre o Governo e a Assemblea, e em relação a esta matéria, que é uma competência exclusiva da Assembleia da República, em relação à qual o Governo apenas pode legislar sob autorização legislativa, não foi o PRD a tomar a iniciativa legislativa?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Salvada.

O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr.ª Deputada, ouvi com atenção a sua intervenção, e queria pôr-lhe duas questões.
Uma refere-se aos dados que já foram abundantemente referidos nesta Câmara, não só pelo Governo como também pela bancada do PSD, e que, no seu discurso, a S' .ª Deputada perverteu, na medida em que entendeu extrair daqueles conclusões diferentes. De modo que gostaria de lhe perguntar se acha credíveis as estatísticas, os números, as indicações fornecidas por organismos internacionais, como é o caso da OCDE, e também gostaria de saber quais são as fontes de informação em que se baseia para afirmar o contrário.
Com a segunda questão queria manifestar-lhe uma preocupação e pedir-lhe que me esclarecesse se fosse possível: a intervenção do Partido Socialista, embora tendo tonado uma determinada posição, foi clara no sentido d; se demarcar do discurso do Partido Comunista Português.

O Sr. António Capucho (PSD): - É um facto!

O Orador: - Tanto quanto me apercebi, a sua intervenção não só se identifica com a posição do Partido Comunista Português e com a do MDP/CDE como coincide com posições destes dois partidos tomadas noutras matérias desde ontem à noite e durante o dia de hoje

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De modo que, se entendi bem, queria perguntar-lhe qual é, nesta matéria, a diferença entre a sua intervenção e a interpelação ao Governo apresentada pelo Partido Comunista Português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.

A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Deputado Rui Salvada, peco-lhe desculpa, mas francamente não entendi o que me perguntou. Acredito que tenha sido falha minha, e é exactamente porque desejo esclarecê-lo que lhe agradecia que repetisse o seu pedido de esclarecimento, mas peco-lhe que seja breve para não gastar o tempo de que disponho para responder.
Pode repetir, Sr. Deputado? É que eu não entendi, palavra de honra!

O Sr. Rui Salvada (PSD): - Sr.ª Deputada, não gastarei tempo nos considerandos.
Assim, sendo minha percepção e da minha bancada que, contrariamente à posição do PS tomada no discurso hoje feito, a sua posição muito se identifica com a do discurso da interpelação ao Governo apresentada pelo Partido Comunista Português, gostaria de saber qual é a diferença entre ambas, se é que há, ou, se não há, então gostava que confirmasse que existe, de facto, essa identificação.

A Oradora: - Agora, entendi perfeitamente, Sr. Deputado. Agradeço-lhe imenso.

Sr. Deputado Carlos Coelho, teceu considerações que são subjectivas sobre a coerência ou não do discurso. Enfim, cabe-lhe a si ajuizá-lo, coube-me a mim fazê-lo portanto, ficaremos por aqui acerca da pertinência daquilo que eu disse.
Diz o Sr. Deputado que nunca ouviu o Governo gritar «vitória» sobre nada. Olhe, Sr. Deputado Carlos Coelho, com certeza que neste último ano e meio não andou por cá! Lamento dizer-lhe, mas, decerto, não tem andado atento à grande propaganda que o Governo tem feito, utilizando os meios de comunicação social e, nomeadamente ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Sr. Deputado, deixe-me acabar, que depois lhe darei autorização para me interromper ... e, nomeadamente, o Sr. Deputado Carlos Coelho esteve desatento a uma intervenção da sua bancada - o que é lamentável e imperdoável. Refiro-me à intervenção que precedeu a minha, a do Sr. Deputado Rui Salvada. Se lhe tivesse prestado atenção teria ouvido um relambório de frases que eram o mesmo que dizer: «Gritem vitória!» Por amor de Deus, Sr. Deputado Carlos Coelho, tem andado profundamente desatento!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada, posso interrompê-la?

A Oradora: - Diga lá! Está excitadíssimo! Diga lá ...

Risos gerais.

Mas, por favor, está a gastar o meu tempo ...

O Sr. Presidente: - Pelo que vemos, o Sr. Deputado Carlos Coelho não está excitado.

Risos gerais.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada, o Sr. Presidente já teve ocasião de responder por mim. Agradeço-lho, pois para mim seria muito penoso e embaraçoso fazê-lo ...

Risos gerais.

Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, ao referir-me ao gritar «vitória» considerei o que a senhora disse, isto é, a Sr.ª Deputada referiu que o Governo tinha gritado «vitória», no sentido de que tinha já cumprido o seu Programa, que já tinha atingido todos os seus objectivos, que tinha resolvido todas as situações. Eu disse que, nesse sentido, no sentido de que tudo estaria bem, que não teríamos problema sociais com que nos defrontar, nunca tinha ouvido o Governo gritar «vitória». Agora, que o Governo se regozije com alguma legitimidade em relação ao que de positivo já fez, parece-me natural, e grave seria se o não fizesse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Deputado Carlos Coelho, pelo esclarecimento que me deu.
Repito exactamente aquilo que disse: o Governo continua a «gritar vitória», sempre «gritou vitória» e, por favor, não me peça para procurar nos textos de debate sobre o Orçamento do Estado dar-me-ia muito trabalho!- as afirmações do Ministro do Trabalho, referindo que tinha cumprido a parte do programa que dizia respeito ao seu Ministério. Sr. Deputado Carlos Coelho, faça fé na minha afirmação! Se não o fizer terei de ir fazer uma pesquisa, que decerto não levará muito tempo, para justificar o que lhe digo.
Mais adiante, o Sr. Deputado Carlos Coelho diz que é lamentável que a oposição não tenha um papel positivo, que não seja uma oposição construtiva e que não «dê o braço a torcer» quando vê que há alguma coisa bem feita pelo Governo. Sr. Deputado, devo dizer-lhe que não teria o mínimo problema em «dar o meu braço a torcer»; só que acontece que no sector laborai o do Sr. Ministro do Trabalho não vemos que tenha sido feito nada de tão positivo que me levasse a fazê-lo. Lamento, mas não posso.
Por outro lado, o Sr. Deputado Carlos Coelho diz que a IGT tem grandes problemas, que não funciona. Não sei se quereria deixar subentendido que a culpa do não funcionamento da IGT não se deve ao Governo. É evidente que a IGT tem problemas ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não disse nada disso!

A Oradora: - Não disse? Então, com certeza que foi falha minha.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada, muito obrigado por me permitir esta segunda interrupção. Peco-lhe desculpa, mas eu não disse isso.

A Oradora: - O Sr. Deputado referiu que o Governo tinha feito um grande esforço para aumentar as dotações para a Inspecção-Geral do Trabalho. Certo?

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sim, sim. Foi exactamente isso que eu disse, mas não disse que a IGT tinha muitos problemas. Não sei se os tem. Provavelmente terá, mas ...

A Oradora: - Efectivamente, o Governo aumentou as dotações para a IGT. Quanto a afirmar-se que estes aumentos foram de 200%, devo dizer-lhe que as verbas que estão previstas para a IGT são manifestamente insuficientes. Ainda assim, a Assembleia da República reforçou essas dotações, mas consideramos que continuam a ser insuficientes para fazer face ao grande âmbito de actuação e de intervenção que deve ser o da Inspecção-Geral do Trabalho. Mas, Sr. Deputado, não duvide - isso não! - que muitos destes graves problemas que afectam o sector laborai, o mercado de trabalho, poderiam ser substancialmente minorados se a Inspecção-Geral do Trabalho tivesse uma capacidade de intervenção e de acção que não possui.
Refere o Sr. Deputado Carlos Coelho que a utilização abusiva dos contratos a prazo se deve à rigidez da legislação laborai. Sr. Deputado, devo dizer-lhe que, pelos vistos, desconhece inteiramente os mecanismos que hoje a legislação laborai põe ao dispor do empresário para despedir a título quer individual quer colectivo.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não foi exactamente ...

A Oradora: - Não é preciso explicar, porque com certeza, o Sr. Deputado, desconhecendo esta matéria, vai analisá-la profundamente. Além disso, não sou propriamente professora para estar aqui a dar-lhe uma sessão de esclarecimento.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Essa só a brincar!

A Oradora: - Ao Sr. Deputado Rui Salvada, que diz que ouviu com atenção a minha intervenção, devo dizer que, ao que me pareceu, ouviu e divertiu-se. Divertiu-se porque da tribuna era possível ver o grande divertimento em que V. Ex.ª se encontrava, rindo abundantemente. Faço-lhe um juízo de boas intenções não dizendo que estava a rir dos graves problemas que eu estava a enunciar mas, sim, com certeza, do estilo da intervenção. Há-de ser só isso, não a substância, simplesmente o estilo.
Depois, referiu um problema em que não vejo qualquer pertinência. Disse que o nosso discurso, aqui, hoje, não se demarcou do PCP ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Nada!

A Oradora: - ... e que isso terá a ver com outra coisa qualquer. Ora bem, Sr. Deputado Rui Salvada, somos partidos distintos, e se tivesse estado com atenção e de boa-fé a ouvir o meu discurso por certo teria notado muitas e substanciais diferenças em relação ao discurso do PCP.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não temos dúvida em considerar oportuno que nesta Assembleia se realize um amplo debate sobre a «questão social», hoje, em Portugal.
Apesar disso, e não obstante tratar-se de iniciativa regimental e formalmente regular, a presente interpelação do PCP, encarada nos seus precedentes e na sua configuração circunstancial, não deixa de nos suscitar algumas reservas.
Por um lado, uma objectiva identificação dos nossos problemas sociais -sejam o do desemprego, sejam o do trabalho infantil, sejam o dos salários em atraso ou quaisquer outros não conduzem à conclusão de que deva identificar-se o Governo como o único réu, nem porventura como o principal réu, no julgamento das responsabilidades que conduziram ou que continuam a explicar e a consentir um tal estado de degradação social.
O próprio pá tido interpelante tem aí as mais graves responsabilidades e essa há-de ser certamente uma das ilações políticas a confirmar no final do presente debate.
Daí que, dada a magnitude das questões em apreço, dada a necessidade de uma ampla convergência para as enfrentarmos seriamente, nós entendamos que a sua abordagem muito teria ganho se pudesse ter sido empreendida foi a de uma dialéctica Governo oposições, a qual se nos afigura, no presente contexto, inevitável e lamentavelmente redutora.

or outro lado ainda, tendo o PCP desejado evitar uma ampla e descomplexada abordagem dos problemas sociais e laboreis, ao reduzi-los e ao subsumi-los dentro de uma interpelação ao Governo, então nada justificaria que tivesse querido impor uma ocupação tão luxuosa dos tempos de trabalho desta Assembleia. Como partido lê oposição que somos, lamentamos que o PCP, fazendo o que reputamos um uso inadequado da interpelação, acabe por contribuir para a erosão e a desvalorização de tão importante instrumento político e constitucional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Das nove acusações ao Governo que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa aqui hoje formalmente deduziu, e das múltiplas outras questões que hoje aqui se justificaria aprofundar, pretendo, por age ira, fixar-me em duas das principais áreas de intervenção do Governo no domínio da sua política laboral.
Refiro-me à política salarial, por um lado, e à política ou iniciativa legislativa do Governo, por outro; quanto à política salarial, deverá aqui reconhecer-se que o Governo se pode vangloriar de ter obtido surpreendentes cumplicidades numa primeira fase do seu mandato e de ter alcançado, numa segunda fase, um muito relevante sucesso social, que aqui não deve ser subestimado nem escamoteado.
Na verdade, aquando da discussão do seu Programa, o Governo prometeu uma evolução positiva dos salários reais, os quais deveriam passar, segundo ele, a ser

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aferidos e negociados em função da inflação esperada. Esta orientação, introduzida num período de crescente desaceleração do ritmo inflacionista, significou uma viragem de 180 graus nas concepções de há muito adquiridas e assentes no âmbito da prática das negociações colectivas e implicou um rude golpe nas legítimas expectativas dos trabalhos portugueses.
Na verdade, se o ano de 1985 findou com uma inflação situada na ordem dos 19,3%, esperavam legitimamente os trabalhadores portugueses recuperar no início de 1986 o seu poder de compra, degradado ao longo de 1985, e, consequentemente, ver actualizados os seus salários num valor nunca inferior àqueles 19,3%, com base na mesma lógica que sempre presidira e justificara as anteriores negociações salariais.
Em vez disso, a evolução dos salários nominais viria a quedar-se na ordem dos 15%-16%. A única conclusão obviamente a tirar seria a de que em 1986 os trabalhadores portugueses perderam, de facto cerca de quatro pontos no seu poder de compra.
Contudo, estava-nos reservada uma inesperada mas interessante surpresa. Não foi só o Governo - e isso não teria sido surpreendente - a decretar oficiosamente que, em vez da redução do poder de compra, até ocorreu uma melhoria dos salários reais. Não, ao lado do Governo, concorrendo conscientemente para valorizar e viabilizar a sua operação de propaganda, apareceram depois a CGTP, o PCP e até a UGT a confirmar e a fixar historicamente a conquista em 1986 de um crescimento dos salários reais - ainda que, obviamente, reivindicando para cada um deles a autoria moral e o estrelato na protagonização de mais esta vitória dos «seus» trabalhadores!
Tratou-se de uma grande operação de propaganda, podendo hoje considerar-se consolidados os seus efeitos e, como tal, definitivamente assimiladas pela opinião pública as correspondentes conclusões, entendidas como verdades indiscutíveis.
Talvez pudéssemos deixar passar em claro o logro, não fora o sentirmos dever expressar aqui as nossas mais sérias reservas sobre a orientação do Governo que vai apontando para uma crescente desvalorização da mão-de-obra nacional, deixando continuar a agravar--se o fosso que a separa dos níveis salariais europeus.
Consideramos, de facto, ultrapassada e definitivamente condenada a política que, nos anos 60, assentava a defesa da competitividade da nossa economia nos baixos salários.
Urge avançar em direcção ao gradual nivelamento do rendimento dos trabalhadores portugueses, aproximando-os dos seus companheiros europeus, designadamente pela via da sua rápida e crescente valorização educacional e profissional.
Noutro plano diferente, Srs. Deputados, mas ainda no quadro da política de rendimentos, o Governo contribuiu para um sucesso que aqui não deve ser ignorado. Reporto-me aos acordos alcançados no âmbito do Conselho de Concertação Social.
Fomos, porventura, os primeiros - já lá vão alguns anos - a defender a institucionalização de um órgão com as características e a vocação daquele Conselho. Poderemos hoje discutir a composição e alguns aspectos do seu funcionamento.
Seja de que modo for, reputamos da maior relevância - e temos gosto em aqui o sublinhar - os acordos e as orientações em matéria salarial que o trabalho tripartido do Conselho de Concertação Social de algum modo já viabilizou.
Apenas queremos deixar aqui votos expressos para que as entidades ali presentes e representadas não se deixem entretanto regressar à lógica redutora das pressões envolventes e interesses político-partidários, sob pena de completa inutilização dos avanços já alcançados.
Feitas estas referências à política de rendimentos do Governo, pretendo ainda trazer à presença desta Câmara a tão debatida problemática da política legislativa laborai e a questão das responsabilidades do Governo neste âmbito.
Devo, contudo, começar por recordar que o CDS, sempre preocupado com a desdramatização destas questões, não tem, em todo o caso, evitado defender que a crise económica e a superação de alguns conceitos tradicionais no domínio da filosofia empresarial, da organização das estruturas produtivas e das relações industriais têm gerado a efectiva necessidade, e até a premência, de se proceder à actualização e à flexibilização da nossa legislação laboral.
A ideia de flexibilização deveria por si própria traduzir uma ideia positiva, uma resposta saudável, desejável ou, ao menos, aceitável por todos, face à profundidade da crise económica e à consequente crise de alguns conceitos até ao presente reputados como nucleares da doutrina jus-laboral.
Contudo, os termos em que por vezes tem defendido a liberalização económica e em que se tem exigido a revisão das leis do trabalho têm gerado, compreensivelmente, no seio do movimento sindical e nos trabalhadores, expectativas profundamente negativas e uma quase desesperada resistência à anunciada mudança.
Importa, por isso, uma certa pedagogia social e torna-se sobretudo premente que os objectivos de mudança sejam inteligentemente seleccionados pelo seu sentido positivo, em função de interesses concretos e fundamentados, socialmente respeitáveis, economicamente importantes e reprodutivos.
Apesar dessa necessidade de inteligência e bom senso, não podemos, em todo o caso, adiar por mais tempo o libertamo-nos dos complexos e preconceitos que nos têm limitado a vontade política, sendo imperioso que nos disponibilizemos todos para enfrentar as realidades e a nova fisionomia da questão social.
Na verdade, a ideia de que o direito do trabalho se justifica historicamente pela necessidade de protecção do trabalhador, como parte mais fraca na relação individual de trabalho; a ideia de que o direito do trabalho é, por definição e inexorável vocação, determinantemente progressivo e tende a consagrar, sempre e sempre, condições cada vez mais favoráveis ao trabalhador; a ideia de que os direitos sociais, uma vez adquiridos e incorporados na esfera individual do trabalhador, neles se incluindo o próprio direito ao emprego, são inatingíveis e inamovíveis; a pretensão de que a generalidade das normas de direito do trabalho visa interesses de ordem pública, delas decorrendo um nível de coercividade profundamente limitador da liberdade das partes - tudo isso são hoje conceitos ou preconceitos em crise profunda, que a vida económica e a realidade social abalaram ou desmistificaram por completo.
Hoje, a «questão social» não respeita tanto aos empregados, mas sobretudo, e muito mais, aos desempregados. Hoje, a intervenção do Estado, para a salvaguarda do bem comum e dos interesses colectivos, tem de se preocupar mais com os sindicatos, como

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corporações organizadas dos interesses estabelecidos de quantos têm emprego, do que propriamente com os interesses dominantes dos patrões ou das suas organizações. Hoje, não pode reconhecer-se como regra tendencialmente universal que o trabalhador seja um ser desacompanhado, ou seja, um ente fraco, desprotegido perante o patrão individual ou a empresa. Hoje, em nome do realismo e do bom senso, tem de admitir-se a reversibilidade de algumas regalias economicamente insustentáveis, desde que não essenciais.
Hoje, a solução para a maior parte das situações críticas e de confronto de interesses tem de ser resolvida no terreno, através da concertação entre os interessados, em nome das realidades e não por meio de soluções formais legais impostas pela Administração Pública.
O CDS, como partido que se funda no património moral e espiritual da democracia
cristã, como partido que defende a liberdade de iniciativa e a economia social de mercado, entende caberem-lhe responsabilidades próprias na formulação de uma resposta actual e eficaz para a nova fisionomia que a «questão social» hoje apresenta.
Para tanto, cumpre enunciar e hierarquizar as questões e os problemas (que são novos e diferentes), recordar valores, formular os princípios, adaptar orientações e actualizar as soluções - soluções que, por um lado, viabilizem a necessária liberalização do sistema e a dinamização da actividade económica e que, por outro, promovam a necessária desconflitualização social, bem como a imprescindível sensibilização, interessamento e mobilização dos trabalhadores para a mudança, garantidos por níveis mais elevados de emprego, bem-estar e justiça social.

Nesse âmbito, entendemos que há-de especificamente ser garantido:

A flexibilidade necessária a uma correcta gestão dos recursos humanos das empresas e a necessidade de se reforçarem os níveis gerais de produtividade e de competitividade da nossa economia;
A desobstrução dos embaraços, ineficácias e insensibilidade gestionária da parte dos serviços do Estado, de que tendem a emergir inadmissíveis estrangulamentos para uma adequada administração dos níveis globais de emprego de cada empresa, quando confrontada com situações de crise, temporária ou definitiva;
A eliminação de todas as excrescências que permanecem na Constituição e na lei e que continuam a configurar inadmissíveis prolongamentos de um projecto de sociedade e de um modelo socialista, marxista-leninista e neorevolucionário.
A evolução e flexibilização da lei há-de concretizar, nomeadamente, as seguintes adaptações:
Valoração do princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei, como conceito matricial decisivamente informador das relações jurídico-laborais, assumindo-se, contra a socialização crescente do contrato individual de trabalho, a sua natureza sinalagmática e a sua vocação eminentemente bilateral;
Reforço do carácter contratual da relação individual e das relações colectivas de trabalho e, bem assim, da liberdade de decisão e da autonomia substantiva das partes intervenientes;
Aceitação de que a ponderação da realidade concreta de cada contrato, de cada empresa, de cada sector pode legitimar que, por acordo directo das partes interessadas, se proceda à reversão e remoção de alguns direitos e regalias não fundamentais.
A empresa moderna deve assentar no activo empenhamento dos seus trabalhadores, construído sobre fórmulas adequadas i promover a personalização e individualização das relações, o seu interessamento anímico e material nos resultados da empresa, o seu acesso à informação e a sua participação, individual e institucional, na vida da empresa.

Nesse quadro, defendemos, nomeadamente:

O efectivo interessamento dos titulares de funções técnicas, de chefia e de enquadramento, criando--se, inclusive, um regime contratual próprio, que, sem prejuízo dos direitos adquiridos ao abrigo do contrato de trabalho, introduza estímulos e compensações adequados às exigências, às responsabilidade e aos riscos envolvidos pelo exercício daquelas funções;
Uma política de retribuição do trabalho que estimule e premeie os mais esforçados, os mais competentes, os mais produtivos e que, no mínimo, compense a participação dos trabalhadores através da distribuição dos resultados nos acréscimos de produtividade que lhes possam ser imputáveis;
Uma política global que vise activamente a promoção do acesso dos trabalhadores à constituição e consolidação na sua esfera individual e familiar de patrimónios próprios e estabilizados (designadamente sob a forma de aquisição de habitação propila, da sua iniciativa ao nível empresarial ou da fruição de acções na empresa, com estatuto adequado à sua origem e funções).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes são os grandes objectivos que vimos defendendo e cuja necessidade consideramos pressuposto essencial ao êxito de qualquer combate às nossas principais enfermidades sociais.
O Governo, em relação a elas, apenas poderá, porventura, garantir uma melhor e mais concreta luta, por exemplo, contra o desemprego. O Governo terá também necessariamente de fazer muito mais quanto à urgente erradicação dessa intolerável monstruosidade social (essa sim, Sr. Ministro, verdadeiramente paleolítica) que é o trabalho infantil.
Mas, convenhamos, Srs. Deputados, não é este governo o específico responsável pelo estado de coisas que todas hoje aqui descrevemos e à volta do qual haverá convergência de posições e de constatações.
Este estado de coisas resulta muito mais da destruição revolucionária da nossa economia, de uma legislação anquilosada e obstrucionista; enfim, de condições e estatutos que são preexistentes ao próprio Governo.
Daí que, mais uma vez e sempre, a verdadeira questão que o País, a Câmara e o Governo, todos temos de enfrentar seja essa: é a fórmula do governo minoritário satisfatória para enfrentar situações e circunstâncias históricas não compatíveis com medicamentos e paliativos e que, muito mais que isso, exigem intervenção cirúrgica profunda, exigem as tão reclamadas reformas estruturais?

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Esta é verdadeiramente a questão. Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, foi com bastante interesse que ouvi a sua intervenção mas queria, se fosse possível, que me esclarecesse duas aparentes contradições que nela me pareceu ver.
Em primeiro lugar, pareceu-me que desenvolveu uma tese francamente progressista no que se refere à ideia de que o País deve caminhar cada vez mais para pagar salários cada vez mais altos aos seus trabalhadores, mas, por outro lado, a sua concepção de retrocesso em relação às conquistas sociais deixou-me alguma preocupação de como é que poderão ser compatíveis estas duas posições políticas ou doutrinárias. Queria, aliás, chamar-lhe a atenção para o facto de que alguns dos países que maiores progressos sociais conseguiram são países que aqui na Europa têm menores taxas de desemprego e onde as leis laborais e o controle pelos sindicatos da sua execução é mais fone, como é o caso, por exemplo, da Suécia.
Essa relação directa entre retrocesso social e avanço do emprego está muito longe de ser científica.
A outra dúvida com que fiquei resulta de que o Sr. Deputado fez um ataque, pela esquerda, em relação ao problema da evolução dos salários em 1986, dizendo que no fundo toda a gente tinha sido enganada pela demagogia do Governo, que teria afirmado que os salários reais haviam subido em 1986.
O que lhe queria perguntar era se considera que os salários reais desceram em 1986 e, por outro lado, como é que compatibiliza essa sua afirmação com o sentido profundo de apoio aos compromissos e aos acordos tomados no Conselho Permanente de Concertação Social, que tiveram alguma coisa que ver com o problema da inflação esperada e que pelos vistos criticou anteriormente?

Eram estas duas perplexidades que gostava que esclarecesse.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para formular pedidos de esclarecimento o Sr. Deputado Eduardo Gomes.

O Sr. Eduardo Gomes (PSD): - Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, queria apenas referir-me à primeira parte da sua intervenção e nessa matéria queria dizer que foi um recado com certeza também para a bancada do PRD e para a Sr." Deputada Ana Gonçalves, já que se verifica que não é só o Governo que declara aqui vitórias neste Plenário mas, inclusivamente, um partido da oposição vem reconhecer essas vitórias quando fala da concertação social conseguida por este governo.
Queria colocar-lhe a seguinte questão, Sr. Deputado Cavaleiro Brandão: declarou, a dado passo da sua intervenção, que esta política salarial imposta pelo Governo foi um rude golpe nas perspectivas dos trabalhadores portugueses. Curiosamente, reconhece também que os trabalhadores portugueses, através das suas centrais sindicais (UGT e CGTP) e de todos os parceiros sociais, acabaram por aceitar bem esta política salarial concertada.
Alguma coisa não está bem: ou o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão não percebeu a razão social desta política ou os trabalhadores e todos os restantes parceiros sociais estão enganados! Gostaria, assim, de perguntar-lhe se não se considera possivelmente enganado e distorcido em relação à situação real do País, quando a maioria dos trabalhadores e as centrais sindicais acabam por reconhecer esta política salarial como positiva.

O Sr. António Marques (PRD): - Essa é boa!

O Orador: - A segunda questão, que também tem a ver com esta, Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, é a de que, de facto, os trabalhadores portugueses acabaram por aceitar esta política salarial em termos de revisão de salário, não na perspectiva da inflação passada, mas sim na perspectiva da inflação futura, porque esta política consegue estabelecer um determinado equilíbrio entre a revisão salarial e a inflação, de maneira que acabe o pesadelo do passado em que, quando vem uma revisão salarial, logo a seguir vem uma inflação que absorve essa revisão salarial e a ultrapassa, prejudicando obviamente o poder de compra dos trabalhadores.
Com esta política salarial conseguida os trabalhadores atingem uma garantia: a de que de facto a revisão salarial não será mais ultrapassada pela inflação futura, porque existe obviamente a garantia do equilíbrio através da indexação dessa inflação no salário.

O Sr. António Marques (PRD): - Essa também é boa!

O Orador: - Penso e queria perguntar ao Sr. Deputado Cavaleiro Brandão se entende que, de facto, esta perspectiva dos trabalhadores portugueses, ao aceitarem esta nova política de revisão salarial, não é muito mais correcta em relação à que se tinha seguido até aqui.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Oliveira e Costa.

O Sr. Rui Oliveira e Costa (Indep.): - Sr. Presidente, agradeço, desde já, o tempo que a Mesa me concede.
Sr. Deputado Cavaleiro Brandão, resolvi formular-lhe este pedido de esclarecimento porque achei que a sua intervenção, para além de bem estruturada, foi lúcida. A meu ver, foi uma das poucas vezes em que nesta Câmara se analisou a concertacão social e todas as suas implicações para além da existência de um órgão desse tipo.
No entanto, quero colocar-lhe duas questões.
O Sr. Deputado disse reconhecer que na repartição de rendimentos em Portugal o factor trabalho tem menos de 50% do total. Julgo que o Sr. Deputado também sabe que, em média, o rendimento do factor trabalho na CEE está acima dos 65%.
Há só duas hipóteses de corrigir, de algum modo, esta repartição de rendimento, que é tão desfavorável aos trabalhadores, e que assenta no facto de os aumentos de produtividade que vierem a ter lugar reverterem a favor do factor trabalho.
Ou seja: entende ou não o Sr. Deputado que os salários reais têm também de ter em conta, para além da

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inflação esperada, os aumentos de produtividade, os quais têm de reverter na sua totalidade para o factor trabalho, senão agrava-se consideravelmente a disparidade na repartição dos rendimentos?
Uma segunda questão prende-se com o facto de, na parte final da sua intervenção, ter falado da legislação laborai.
Disse que o assunto tem de ser desdramatizado, com o que estou inteiramente de acordo. Disse, também, que por vezes ele é apresentado de uma tal forma que os trabalhadores reagem negativamente.
É evidente que seriam desejáveis leis europeias para Portugal, designadamente no domínio da legislação laboral.
No entanto, isso só é possível se tivermos tribunais de trabalho a funcionar sob uma forma europeia e não com um atraso de três anos.
Mais: não acha que para termos leis laborais europeias, designadamente em matéria de contrato individual de trabalho, também é necessário termos uma segurança social europeia, isto é, subsídios e seguros de desemprego «à europeia»? Por outras palavras, não podemos pôr o «carro à frente dos bois». Em matéria da lei de despedimentos, legislação a nível europeu terá de ser obtida com segurança social, com subsídios de desemprego ao nível da Europa.
Por fim, quero mais uma vez dar-lhe os parabéns, pois acho que fez uma boa intervenção.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Sr. Deputado Ferro Rodrigues, muito obrigado pelas questões que me formulou.
Penso que as duas primeiras estão interligadas e, de algum modo, todas elas estão relacionadas com as questões que me foram posteriormente colocadas, embora sob perspectivas diferentes.
A primeira dessas questões é a de sabei até que ponto é que uma perspectiva que defendi para Portugal, relativamente à política salarial, e que o Sr. Deputado considerou como sendo progressiva - e já não digo «progressista», embora tenha utilizado essa expressão- é compatível com as questões que suscitei e com o apelo que, de alguma forma, formulei no sentido de que nos libertemos de complexos, preconceitos e rigidismos quanto à aquisição de um certo número de «conquistas» (foi esta a expressão utilizada pelo Sr. Deputado).
Penso que isso é perfeitamente compatível, porque, aqui, o optimismo social é meu, quando devia ser seu. Isto é: pelos vistos, sou eu quem acredita que a dinâmica de uma economia mais saudável e de uma evolução da situação social conduz à retoma, a prazo, de todas essas regalias.
Temos duas alternativas, e isso tem a ver com uma questão que me foi colocada pelo Sr. Deputado Rui Oliveira e Costa.
A postura conservativa, sobretudo da actual esquerda em Portugal -de alguma forma explicada, consentida e até provocada por um patronato que nem sempre é inteligente e lúcido-, aponta num sentido de que mais vale mantermos e conservarmos o que já temos do que arriscar pôr em crise, suspender temporariamente, essas regalias, em nome de paraísos que estamos longe de estar certos poder vir a alcançar algum dia. É um pessimismo da esquerda, pouco socialista, mas é em nome desse pessimismo, em nome dessa falta de confiança, que os senhores tem recusado a evolução.
Não é essa a minha perspectiva.
Quando sugiro, defendo, que não podemos continuar a fechar-nos e a ignorai a crise que enfrentamos - porque não poetemos ignorar os salários em atraso, o trabalho infantil os despedimentos colectivos e o nível de desemprego a que chegámos-, os senhores entendem que a resposta é mantermos tudo tal qual está.
A nossa perspectiva é diferente.
Entendem V. Ex.ªs que o mercado, os empresários ou o mercado paralelo, como quiserem, encontram soluções que, normalmente, são erradas, ilegais - e dentro do vosso pessimismo e da vossa perspectiva conservativa, até utilizariam, porventura, a expressão «soluções subversivas». De qualquer forma, essa será, porventura, a forma mais aberrante, inconveniente e socialmente ma s indesejável de se pôr permanentemente em causa o essencial, o importante, das conquistas efectivamente alcançadas.
A minha perspectiva é a de que mais vale remover aquilo que são empecilhos, ainda que o façamos por períodos delimitados no tempo, de modo que, a prazo, reencontremos níveis de bem-estar e de sucesso económico, embora assentes, porventura, em soluções diferentes e mais avançadas em termos de política social.
Um segundo nível de questões tem a ver com a política salarial d» Governo e com a denúncia que, mais uma vez, aqui fiz dos seus sucessos e insucessos em 1986.
O Sr. Deputado colocou-me uma questão concreta, que foi a de saber se entendo que os salários reais subiram ou não, em 1986.
Há duas respostas possíveis: uma, que poderia ser a minha, é a de que as estatísticas, nomeadamente as estatísticas correntes do Banco de Portugal -tal como o Sr. Deputado Octávio Teixeira aqui fez presente, dizem que sim, porque, por tradição, as estatísticas económicas comparam valores dentro do mesmo período; a segunda resposta, e essa era a que eu esperava ouvir por parte do PCP «vou ser eu quem lhe a vai dar, é a de que os trabalhadores não «comem» estatísticas do Banco de Portugal.
O que o senhor sabe tão bem quanto eu é que no início de 1986 o poder de compra dos trabalhadores se encontrava degradado, em média, na ordem dos 19,3% e que, quando quiseram recuperar esse poder de compra apenas encontraram actualizações salariais na ordem dos 15% e 16%.
Esta é a resposta.
A resposta séria, importante, e que deve fazer-se presente - e isto é algo que V. Ex.ªs devem adquirir e é a resposta que devo dar a quem perguntou se eu estava encanado -, resulta do seguinte: no momento em que se inverter a actual tendência de desaceleração da inflação e, porventura (oxalá isso nunca aconteça!), se retomar uma fase de crescimento da inflação, vai ser inevitável que regressemos à lógica precedente. Isto é: a negociação dos salários vai ser feita com base em inflações consumadas e não com base na antecipação da inflação, pois, caso contrário - como qualquer economista sabe melhor do que eu -, produzir-se-iam efeitos aceleradores da inflação e não efeitos que permitissem o seu amortecimento.
O facto de esta lógica da antecipação de efeitos ser abstrusa - essa é uma segunda resposta que dou ao

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Sr. Deputado Rui Oliveira e Costa - é fácil de aferir quando, justamente, colocamos a questão da produtividade.
O Sr. Deputado Rui Oliveira e Costa perguntou-me se defendo que a produtividade e os seus respectivos aumentos devem ser repartidos pelos trabalhadores. Disse-o expressamente ao longo do meu discurso, mas não tenho tempo de o reproduzir (talvez o Sr. Deputado tenha, porventura, perdido essa passagem da minha intervenção.)
O que é facto é que, defendendo eu essa distribuição, não possa aceitar a mais infeliz e desastrosa das respostas do Sr. Ministro das Finanças e que, quando instado aqui a respeito da evolução dos salários da função pública para 1987 e da razão dos 9% ou dos 12% para essa evolução, ele tenha respondido perguntando: «Os Srs. Deputados não acreditam que, em 1987, a produtividade do trabalho na função pública vá crescer pelo menos 3%?»
Bem para um governo de tecnocratas, isto é curto, insatisfatório, indesejável.
A verdade é que, quando falamos de produtividade esperada, ficamos condenados a dar e a ouvir respostas destas.
Por isso, considero ser mais correcto um outro tipo de juízos, um outro tipo de métodos.
Sr. Deputado Rui Oliveira e Costa, não disponho de tempo para prosseguir no aprofundamento das questões que me colocou.
Em todo o caso, no que toca à legislação europeia e à nossa aproximação a ela, não quero deixar de lhe pedir que faça presentes algumas das considerações que formulei inicialmente e que foram dirigidas ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, somos chegados ao termo dos nossos trabalhos de hoje.
Os tempos ainda disponíveis para amanhã são os seguintes: Governo, 67 minutos; PSD, 33 minutos; PS, 31 minutos; PRD, 23 minutos; PCP, 44 minutos; CDS, 7 minutos; MDP/CDE, 26 minutos.
Para o encerramento, o Governo disporá de 30 minutos e o PCP de outros 30 minutos.
A sessão plenária de amanhã terá lugar pelas 10 horas, com a mesma ordem de trabalhos da de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Assunção Marques.
José Augusto Limão de Andrade.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Valdemar Cardoso Alves.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Luís Ferro Rodrigues.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.

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2346 - I SÉRIE - NUMERO 59

José Fernando Pinho da Silva.
José Torcato Dias Ferreira.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vítor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.

Centro Democrático Social (CDS):

António Alberto Vieira Dias.
Abel Augusto Gomes de Almeida.
Carlos José Machado L. Pereira.
Eugênio Nunes Anacoreta Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marcai.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Manuel Alberto Sá do Rio.

Deputados independentes:

Rui Manuel Oliveira Costa.
Maria Amélia Mota Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Flausino Pereira da Silva.
José Angelo Ferreira Correia.
José Mendes Bota.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Rui Manuel Parente Chancerelle Macheie.

Partido Socialista (PS):

António Cândido Miranda Macedo.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Torres Couto.
Mário Manuel Cal Brandão.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Maria Paulouro.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Francisco Armando Fernandes.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
Paulo Manuel Q. Guedes de Campos.

Partido Comunista Português (PCP):

José Rodrigues Vitoriano.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Hernâni Torres Moutinho.
José Augusto Gama.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Manuel Caniço Seiça Neves.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputado independente:

António José Borges de Carvalho.

Declaração de voto enviada a mesa para publicação relativa ao projecto de lei n.º 343/IV (sobre euflteuse ou aforamento).

O CDS votou contra o projecto de lei n.º 343/IV por razões que terão ficado já claras na intervenção que produziu na discussão em plenário daquela iniciativa legislativa.
Como então acentuámos, o objectivo que se anunciou como justificativo de tal projecto - a resolução do problema dos foreiros de Salvaterra de Magos - merecia a nosso apoio. Por isso requeremos que o projecto de lei baixasse à Comissão antes da votação, para ser reformulado o texto em termos de satisfazer aquele objectivo, mas sem os inconvenientes graves que denunciámos.
Aquele nosso requerimento, que representava uma tentativa séria ás encontrar solução capaz para os foreiros, porventura, mais rápida, mais expedita e menos onerosa, não obteve aceitação.
Resultou daí que havia que tomar posição face ao projecto de lei, eu. o texto, além de repetir disposições que o Decreto-Lei n.º 195-A/76 tornou direito positivo, prevê expressamente que se atribuirá a propriedade de prédio rústico ao agricultor autónomo que o cultive há mais de 40 anos, que tenha pago uma prestação anual ao senhorio até 1976 e que tenha feito no prédio benfeitorias cujo valor actual corresponda pelo menos a metade do valor da terra «considerada no estado de inculta».
Segundo o texto do projecto de lei, reunidas estas circunstâncias, considerar-se-á constituído, por usucapião, o contrato de enfiteuse ou aforamento, contrato que o Código Civil previa com diferentes requisitos.
Ora, o conjunto daquelas circunstâncias com facilidade e com requência se verifica nos arrendamentos rurais na zona norte do país; aqui, nos arrendamentos de pequenos prédios rústicos, não raro acontece o arrendatário manter-se por 30 ou 40 anos, normalmente a renda é anual e não são precisas muitas benfeitorias (tanques, muros, poços, etc.) que valham hoje mais que metade do valor do prédio, se inculto estivesse.
Porém, resulta literalmente do projecto de lei n.º 343/IV que, quando isto e só isto acontecer, o cultivador do prédio pode obter decisão judicial a dizer que é foreiro e que lhe é atribuída a propriedade do prédio. O que, para além de ser um «aborto jurídico», é ... um roubo!
Tendo o plenário deliberado, como deliberou, que havia de sei sobre este texto que incidia a votação, não podia o CDS deixar de votar contra, como votou.

Pelo Grupo Parlamentar do CDS, Andrade Pereira.

Os REDACTORES, Ana Maria Marques da Cruz - José Diogo) - Maria Leonor Ferreira.

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Página 2348

PREÇO DESTE NÚMERO: 216$00

Depósito legal n º 881885
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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