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I Série - Número 62 Sábado, 28 de Março de 1987
DIÁRIO da Assembleia da República
PORTE PAGO
IV LEGISLATURA 2.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE MARÇO DE 1987
Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes 
Victor Manuel Caio Roque 
Rui de Sá e Cunha 
José Manuel Maia Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa de vários diplomas.
Concluiu-se a apreciação conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 271/IV (PS), 313/IV (PRD) e 3S7/IV (CDS) sobre a lei de bases dos meios áudio-visuais e televisão, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretario de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Marques Mendes), os Srs Deputados Vieira Mesquita (PSD), Gomes de Almeida (CDS), Costa Carvalho (PRD), Jorge Lemos e José Manuel Mendes (PCP) e Alexandre Manuel (PRD).
Foi anunciada e lida uma moção de censura ao Governo, apresentada pelo PRD.
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Mesquita Araújo Guedes. 
Adérito Manuel Soares Campos. 
Alberto Monteiro Araújo. 
Álvaro Barros Marques de Figueiredo. 
Amadeu Vasconcelos Matias. 
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira. 
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo. 
António d'Orey Capucho. 
António Joaquim Bastos Marques Mendes. 
António Jorge de Figueiredo Lopes. 
António Manuel Lopes Tavares. 
António Paulo Pereira Coelho. 
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João Maria Pereira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
José de Vargas Bulcão.
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Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Crucho Esteves Robalo.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Frederico Vieira de Moura.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Luís Ferro Rodrigues
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Henriques Lopes.
Hermínio da Palma Inácio.
Jaime José Matos da Gama.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueira.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Agostinho Correia de Sousa. 
Alexandre Manuel da Fonseca Leite. 
António Alves Marques Júnior. 
António Eduardo de Sousa Pereira. 
António João Percheiro dos Santos. 
António Lopes Marques. 
António Magalhães de Barros Feu. 
António Maria Paulouro. 
Arménio Ramos de Carvalho. 
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Fernando Dias de Carvalho.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo C. da Costa Carvalho.
José Torcato Dias Ferreira.
Manuel Gomes Guerreiro.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Q. Guedes de Campos.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Ma a Nunes de Almeida.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Octávio Augusto Teixeira.
Centro Democrático Social (CDS):
António Alberto Vieira Dias.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Filipe Neiva Correia.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Horácio Alves Marçal.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Henriques Meirelles de Barros.
José Maria Andrade Pereira.
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Manuel Afonso Almeida Pinto. 
Manuel Alberto Sá do Rio. 
Narana Sinai Coissoró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca. 
João Manuel Caniço Seiça Neves.
Deputada independente:
Maria Amélia Mota Santos.
O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: ratificação n.º 146/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Lilaia e outros, do PRD, relativa ao Decreto-Lei n.º 100/87, de 5 de Março (harmoniza a legislação regulamentadora da Região Demarcada do Dão aos princípios e normas estabelecidos na Lei n.º 8/85, de 4 de Junho, que aprova a Lei Quadro das Regiões Demarcadas Vitivinícolas); ratificação n.º 147/IV, da iniciativa do Sr. Deputado João Morgado e outros, do CDS, também relativa ao Decreto-Lei n.º 100/87, de 5 de Março; ratificação n.º 148/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Francisco Teixeira e outros, do CDS, relativa ao Decreto-Lei n.º 104/87, de 6 de Março (reformula a legislação regulamentadora da Região Demarcada dos Vinhos Verdes), e ratificação n.º 149/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Andrade Pereira e outros, do CDS, relativa ao Decreto-Lei n.º 143/87, de 23 de Março (estabelece disposições quanto à atribuição de acréscimos ao vencimento do pessoal da carreira de investigação científica em regime de dedicação exclusiva). Todas estas ratificações foram admitidas.
Deram ainda entrada na Mesa o projecto de lei n.º 403/IV, da iniciativa dos Srs. Deputados Manuel Moreira (PSD), Magalhães da Silva (PS), Cláudio Percheiro (PCP), Horácio Marcai (CDS) e João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - Estatuto dos Eleitos Locais -, que foi admitido e baixou à 10.º Comissão, e o projecto de lei n.º 404/IV, da iniciativa dos Srs. Deputados Ana Gonçalves e Tiago Bastos (PRD) - Dia Nacional do Estudante -, que foi admitido e baixou às 4.ª e 13.ª Comissões.
O Sr. Presidente: - Entrando na primeira parte da ordem de trabalhos para hoje, da qual consta a continuação da discussão dos projectos de lei n.ºs 274/IV (PS), 313/IV (PRD) e 387/IV (CDS), dou a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: estão hoje em discussão na Assembleia da República os projectos de lei apresentados pelo Partido Socialista, pelo Partido Renovador Democrático e pelo Centro Democrático Social que visam a abertura da televisão à iniciativa privada.
Estas iniciativas vêm na esteira da proposta do Governo, que, na sequência do seu Programa, defende «a livre circulação de informação e a existência de um salutar espírito crítico de toda a comunidade nacional, que só uma comunicação social activa e independente conseguirá proporcionar», com «salvaguarda da propriedade pública e da gestão das frequências pelo Estado», prevendo o regime de concessão de exploração de canal de televisão a entidades não públicas e apontando mesmo para que a igreja católica possa ser, prevalentemente, beneficiária dessa concessão.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Em virtude do Programa do X Governo Constitucional, social-democrata, ganhou novo alento, quer no plano da sociedade portuguesa, quer no plano político, a multiplicação de interessados no acesso ao meio televisivo, sendo disso vivo testemunho os membros participantes na Comissão Eventual para Atribuição de Um Canal à Igreja Católica, como é conhecido.
Com certeza sensibilizados pelos argumentos ouvidos na citada Comissão, os Srs. Deputados de alguns partidos da oposição, finalmente e em boa hora, reconheceram a justeza das posições do Governo e a nunca alterada doutrina do Partido Social-Democrata acerca da abertura da televisão à iniciativa privada.
Regozijamo-nos pois com o fenómeno de pôr em causa o monopólio da televisão, o que aliás sempre defendemos e que hoje outros também corroboram para bem de uma televisão de melhor qualidade, a benefício do público.
Mas então em que consistia a vexata questio que ontem foi forte motivo de divisões e hoje se apresenta com contornos consensuais?
Tal questão consiste em determinar qual o sentido e alcance da proibição constante do n.º 7 do artigo 38.º da Constituição da República Portuguesa ao estatuir que «a televisão não pode ser objecto de propriedade privada».
Uns, como Gomes Canotilho e Vital Moreira, defenderam a interpretação de que não só o meio televisão não poderá ser objecto de propriedade privada mas também e igualmente que tal proibição incluía a impossibilidade de gestão privada da televisão, argumentando com a ratio do preceito constitucional. Enquanto a outros, pelo contrário, sempre se lhes afigurou claro «que no texto constitucional a propriedade está dissociada da gestão e da concessão de gestão e que é perfeitamente legítima e constitucional a concessão de exploração e de gestão» - v. Marcelo Rebelo de Sousa in Diário da Assembleia da República, n.º 45, de 3 de Fevereiro de 1982.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Olhe que escolheu um bom exemplo!
O Orador: - Uma terceira corrente, perfilhada pelo Prof. Jorge Miranda, sempre sustentou que a lei constitucional tinha a flexibilidade e abertura necessárias para permitir que o legislador ordinário pudesse legislar livremente sobre a matéria.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sobretudo ordinariamente!
O Orador: - Ao reflectirmos sobre toda esta problemática não poderemos deixar de recordar os argumentos produzidos aquando da revisão constitucional de 1982, em que foram apresentadas duas propostas de alteração do então n.º 6 do artigo 38.º, uma da AD, no sentido de clarificar que «a televisão é objecto de
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propriedade pública sem prejuízo da possibilidade de concessão de exploração a entidades privadas ou cooperativas» ...
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Justamente chumbada!
O Orador: - ... outra da autoria do MDP/CDE, propondo que «a televisão não pode ser objecto de propriedade, exploração ou gestão privadas».
Ambas as propostas foram abandonadas por ter vencido a tese, perfilhada por Jorge Miranda, de que o problema ficaria para a interpretação, para o legislador ordinário e para o juízo de inconstitucionalidade. Tanto mais que fenómenos tecnológicos imprevisíveis e que podem exceder as possibilidades de um pequeno país como Portugal poderão aconselhar a que a lei ordinária tenha de «inclinar-se hoje num sentido e amanhã num outro sentido».
A tal opinião também não é completamente alheio Vital Moreira, que, referindo-se ao problema, independentemente de saber qual das interpretações é a correcta nos diz, e passo a citar: «Importa sobretudo realçar é que não vamos aprovar uma alteração da Constituição que implicasse directamente por via constitucional a possibilidade de uma concessão privada de televisão, apesar de continuar como propriedade pública.» O que nos leva a concluir, a contrario sensu, que este jurista admitiu que o legislador ordinário pudesse possibilitar, mediante concessão, a atribuição de exploração ou de gestão a entidades privadas.
O Sr. Licínio Moreira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mais recentemente, a propósito da proposta de lei n.º 5/IV, que, alterando o artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro (Lei da Televisão) visa possibilitar a concessão de um canal de radiotelevisão à igreja católica, foram emitidos, por conceituados constitucionalistas das Faculdades de Direito de Lisboa e Coimbra, alguns pareceres respeitantes à constitucionalidade de tal concessão, sendo unânime a conclusão de todos eles de que o legislador ordinário poderia consagrar a gestão privada da actividade de televisão no quadro da actual Constituição.
Neste sentido se pronunciaram expressamente Marcelo Rebelo de Sousa, Jorge Miranda, André Gonçalves Pereira e Barbosa de Melo, tendo o parecer deste último obtido a concordância de Afonso Queiró.
Adquire-se hoje como inquestionável a constitucionalidade de distinguir a propriedade dos meios televisivos da sua gestão.
Os próprios princípios fundamentais da Constituição abonam neste sentido, nomeadamente o princípio do pluralismo e o princípio da igualdade e da não discriminação.
Com efeito, perguntamos o que será mais adequado ao pluralismo democrático: o monopólio estadual, como poucos prefeririam, ou a liberdade e a concorrência? A liberdade de acesso à actividade televisiva é com certeza melhor e maior garantia do pluralismo do que o démodé monopólio estadual.
De igual modo, o princípio da igualdade e da não discriminação fica salvaguardado através do concurso público que assegurará igualdade de oportunidades aos sujeitos interessados na concessão.
É que não temos dúvidas em concluir que «a concessão representa, pois, a utilização do estímulo da iniciativa privada e da sua flexibilidade e experiência para proveito do interesse público. A empresa privada, diz-se, tem maior sentido da economia, da produtividade e da eficiência do que as empresas públicas» - cf. Manual de Direito Administrativo, Prof. Marcello Caetano, 8.ª ed., t. u, p. 1015.
A aludida argumentação jurídico-constitucional mais se reforça, nos tempos hodiernos, pela necessidade de despertar o sei viço público de televisão - que deve ser mantido através da empresa pública RTP -, mas sem bloqueamento; ou asfixias para enfrentar a concorrência das futuras televisões privadas e das emissões de televisão estrangeiras, que, face à evolução tecnológica verificada, a :ada passo aí estão já em nossas casas.
Não somos caso único em pôr termo ao monopólio da televisão porque a maior parte dos países industrializados já tomaram as medidas adequadas, tendo estado atentos aos novos mercados e aos desafios do presente e do futuro.
É preciso organizar melhor e saber fazer com maior qualidade, o que ocorrerá através da privatização, permitindo que os melhores se imponham.
O exemple das rádios livres é explícito no sentido de apressarmos a legislação de abertura da televisão à iniciativa privada pelo perigo que representa a multiplicação de IVs piratas, cuja pletora seria extremamente nefasta.
Como dissemos, entendemos dever manter-se um canal de televisão encarregado das tradicionais missões de serviço publico, que também será destinado à difusão das diferentes correntes de opinião, e saibamos, de igual modo, criar as condições indispensáveis a uma televisão de gestão privada que possa trabalhar de forma eficaz e livre para fazer uma melhor televisão e assim melhorar a satisfação do público.
Será que os projectos de lei em apreciação realizarão tal desiderato ou apenas toleram a iniciativa privada como um seu parente pobre que hão-de consentir por força de inelutáveis circunstâncias?
Estamos particularmente à vontade para responder que tais projectos, na sua actual forma, revelam uma certa tibieza no tratamento da iniciativa privada quando cotejada com a abundância de privilégios conferidos à iniciativa publica e, repito, sentimo-nos particularmente à vontade efectivamente porque o PSD desde sempre sustentou a abertura da televisão à iniciativa privada.
O projecto de lei n.º 313/IV, do PRD, apresenta como inovação, no seu artigo 2.º, a possibilidade de abertura de televisão à iniciativa privada, socorrendo-se para o efeito da figura jurídica da subconcessão, enquanto e projecto de lei n.º 274/IV, do PS, adopta um sistema menos complicado, quanto a nós mais correcto, para permitir o acesso da iniciativa privada à actividade de radio televisão, o que faz mediante concessão.
Não só neste aspecto como noutros o projecto de lei do Partido Socialista oferece maior coerência e frontalidade, assumindo sem rodeios, nos tempos actuais, a boa razão que assistia a todos quantos (e hoje são mais) sempre defenderam a abertura da televisão à iniciativa privada.
E outro tanto já não se pode dizer do projecto de lei do PRÓ, que, verdadeiramente, nem sequer se disponibiliza para, mediante subconcessão, abrir o exercício da actividade de televisão à iniciativa privada.
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Com efeito, o n.º 6 do artigo 2.º do projecto de lei do PRD estabelece que «é permitido à concessionária ceder a terceiros, em regime de subconcessão, a totalidade ou pane das respectivas programações, mediante concurso público a realizar de acordo com as normas definidas no seu estatuto». Neste caso, a empresa concessionária é a RTP e as normas definidas no seu próprio estatuto de empresa pública, sendo os programas os da própria RTP.
Ora, como se lê, tão-só se admite e autoriza por lei o acesso, por parte de terceiros, à programação da própria televisão pública, o que é bastante diferente e pouco significativo e não condiz com as afirmações de principio contidas no preâmbulo do projecto de lei que explicita e passo a citar: «a possibilidade de abertura da televisão à iniciativa privada é defendida por faixas cada vez mais largas de cidadãos, de tal modo que se pode considerar constituir hoje uma matéria com largo consenso na sociedade portuguesa».
Quem diz assim pensar e estabelece no articulado de modo tão inadequado, ou o faz por hipocrisia política ou para, porventura, acolher posições de lobbies instalados na Radiotelevisão Portuguesa.
Importa clarificar, sem evasivas ou subterfúgios, quem é a favor da abertura da televisão à iniciativa privada.
Nós, Partido Social-Democrata, sempre fomos a favor e aqui voltamos a reiterar a nossa posição. Aliás, o governo que apoiamos foi ao ponto de aprovar, em reunião do Conselho de Ministros de Dezembro de 1985, uma proposta de lei, remetida a esta Assembleia, em que, dando cumprimento ao n.º 5 do artigo 41.º da Constituição, prevê a atribuição à igreja católica de um canal de televisão, bem como a outras confissões religiosas.
Tal proposta de lei continua, há longo tempo, em sede de comissão especializada e bom seria que a oposição se pronunciasse a fim de ser votada, ou, pelo menos, que a posição da igreja católica e das demais confissões religiosas fosse contemplada na futura lei da televisão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Como vimos, não existe barreira constitucional à cindibilidade da titularidade do direito de propriedade da televisão e da gestão social do meio televisivo, visto a forma negativa consagrada na lei fundamental permitir o encontro de soluções jurídicas diversificadas.
A evolução tecnológica tem de se aceitar e o ponto de chegada de ontem já se atingiu, pelo que, se desejarmos preservar a nossa cultura, a nossa língua e a nossa maneira de ser e de estar no mundo, devemos fazer a ponderação dos valores e dos interesses em presença de forma adequada à existência de uma televisão aberta e livre cuja actividade seja prosseguida por empresas públicas ou privadas, pela igreja católica e outras confissões religiosas.
Com a iniciativa privada vamos criar oportunidade para um crescimento de ideias e o aparecimento de talentos capazes de renovar o estilo da nossa televisão. E tudo isto depende do legislador ordinário que somos.
No fundamental, como já tive ocasião de dizer nesta Câmara, é preciso mudar de mentalidade e de óptica.
Os meios audiovisuais não podem continuar a ser instrumentos de poder. Eles são um poder por si próprios e, como tal, criaram e criarão as suas próprias regras.
Tomemos consciência da expansão fantástica das comunicações e saibamos, numa futura lei de televisão, estar à altura e ter a suficiente capacidade de inovação para que possamos responder aos problemas dos dias de hoje e aos desafios do amanhã.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Vieira Mesquita, inscreveram-se os seguintes Srs. Deputados: Gomes de Almeida, Costa Carvalho, Jorge Lemos, José Manuel Mendes e Alexandre Manuel.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Almeida.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - Sr. Deputado Vieira Mesquita, da sua intervenção retive, em primeiro lugar, a constatação feita de que os projectos de lei apresentados padecem de tibieza no que diz respeito à abertura da televisão à iniciativa privada.
V. Ex.ª referiu criticamente os projectos de lei do PRD e do PS e fiquei na dúvida quanto ao que pensa o PSD sobre o projecto de lei do CDS, ou seja, se também pensa que há tibieza na formulação dos nossos preceitos no que diz respeito a este objectivo político. 
Sabemos que está pendente na comissão eventual para a apreciação da proposta de lei n.º 5/IV um projecto de diploma legal do Governo que concede à igreja católica acesso à iniciativa privada. Do nosso ponto de vista, não é hoje o momento para se falar desse diploma - pelo menos, essencialmente - porque, como sabe, se encontra pendente da elaboração de um relatório sobre a matéria e a devido tempo cuidaremos disso.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A ver vamos!
O Orador: - O que, entretanto, me parece dever ser esclarecido - e nesse sentido sugeria ao Sr. Deputado que alargasse um pouco as suas considerações - são os aspectos essenciais que, do seu ponto de vista, não vê consagrados no projecto de lei sobre esta matéria apresentado pelo CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.
O Sr. Costa Carvalho (PRD): - Sr. Deputado Vieira Mesquita, com o devido respeito, creio que V. Ex.ª, ao tentar fazer o elogio da eliminação do monopólio da televisão, procurou chamar ao PSD um outro monopólio, o da ideia de acabar com o monopólio do Estado. Perguntaria mesmo quem é concretamente a favor da iniciativa privada, porque terá atribuído ao PRD qualquer ideia mais ou menos hipócrita - aliás, «hipocrisia» é uma palavra que, desde ontem, está a soar muito neste hemiciclo do lado da sua bancada.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Ficámos um pouco na dúvida porque, logo a seguir, o Sr. Deputado diz que a iniciativa privada irá servir para que os melhores se imponham. Não sei se isso é da competência da iniciativa privada e fiquei um pouco em dúvida porque o serviço público - como o Sr. Deputado certamente saberá - não obriga um público, muito pelo contrário, tem de se
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preocupar com os públicos. E quando assim é, não vejo como é que os melhores podem estar só do lado da iniciativa privada.
Por fim, Sr. Deputado Vieira Mesquita, fiquei com algumas dúvidas quanto à leitura feita pelo Sr. Deputado do projecto de lei do PRD. O Sr. Deputado sugeriu - ou assim me pareceu - que o nosso projecto de lei quase faria depender da empresa pública a atribuição de subconcessões e que isso seria regulamentado, ou pelo menos espartilhado, pelos estatutos. Será que o Sr. Deputado leu até ao fim o n.º 4 do artigo 2.º do nosso projecto de lei, onde se diz que «os estatutos serão aprovados pela Assembleia da República»? Será que o PSD não quer responsabilidade na aprovação desses estatutos ou será que o PSD, hipocritamente, se estará a libertar dessa responsabilidade?
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Não é isso!
O Sr. António Capucho (PSD): - Não percebeu nada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado Vieira Mesquita veio aqui proferir um discurso em que falou muito de concurso público, de regras de acesso, de igualdade, mas o que é um facto é que o seu partido não apresentou, até agora, nenhuma iniciativa legislativa nesse sentido nesta Assembleia da República. A única iniciativa que foi apoiada pelo PSD, depois de o Governo a ter trazido, foi uma inqualificável tentativa de entregar a uma entidade restrita a posse de um canal de televisão. Portanto, o PSD não pode argumentar que é a favor da igualdade de condições de acesso e ao mesmo tempo, na prática, demonstrar o contrário através de uma iniciativa legislativa.
Por outro lado, quando em 9 de Dezembro passado se discutiu nesta Câmara o projecto de lei de bases apresentado pelo Partido Socialista, o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, Dr. Fernando Nogueira, referindo-se a esse mesmo diploma, dizia que este projecto é pernicioso «[...] quando viola de fornia estrondosa [...] o princípio da separação de poderes e ainda quando pretensamente quer introduzir um sistema de gestão moderno para o mundo do áudio-visual, acabando por levar ao extremo a consabida tendência para a pulverização exponencial dos órgãos e conselhos [...]».
E, mais à frente, acrescentava: «Atrevo-me mesmo a dizer que, a ser aprovado semelhante sistema, o que só por ser absurdo se admite, estaríamos caídos na ausência total de senso [...]»
Dizia ainda mais: que, «se o presente projecto fosse aprovado, a Assembleia estaria, do nosso ponto de vista, a cometer um grave erro [...]».
Ora, o projecto de lei do Partido Socialista não foi alterado, mantém-se na sua vertente essencial. De resto, ainda ontem aqui o tivemos confirmado pelos Srs. Deputados da bancada do PS quando lhes coloquei uma questão nessa esfera.
O que é que se passa, Sr. Deputado Vieira Mesquita?
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Não se passa nada!
O Orador: - O Sr. Deputado Vieira Mesquita, neste momento, já não pensa da mesma forma que o Sr. Ministro Fernando Nogueira?
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Penso!
O Orador: - Ou será que já se está a habituar a deixar as cadeiras do poder e a tentar encontrar uma nova forma de checar aos objectivos que por essa via não consegue alça içar?
Vozes do F CP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Vieira Mesquita, depois do debate ontem travado nesta Câmara era de supor que não viesse hoje insistir em alguma requentada argumentação, que, para todos os efeitos, está, de facto, perimida.
Refiro-me à tentativa, que não recusarei considerar esforçada, mas claramente inconvincente e insustentável, de advogar que o n.º 7 do artigo 38.º da Constituição prevê, ao cabo e ao resto, toda, mas toda, a iniciativa privada.
O que o Sr. Deputado Vieira Mesquita pretende é, na esteira de algumas personalidades que serão respeitáveis em alguns outros domínios, proclamar que o regime de concessão que os senhores propõem - e vamos lá saber qual será ele! - é perfeitamente compaginável com o princípio da propriedade pública que a Constituição estabelece, estabelecendo também, numa mesma norma, o princípio da gestão pública.
Ignora o Sr. Deputado o que se diz, de forma cabal, no n.º 3 do artigo 89.º, que lhe vou ler, apenas para lhe refrescai a memória:
O sector privado é constituído pelos bens e unidades de produção cuja propriedade ou gestão pertençam a pessoas singulares ou colectivas privadas [ ..]
Como o Sr. Deputado Vieira Mesquita vê - é jurista -, não pode fazer uma leitura tão superficial da nossa lei fundamental e passar por cima, como preferiu, daqui Io que é inteiramente clarividente e definitivo. A efectivação de uma qualquer gestão privada faz com que se transfira para o sector privado aquilo que a Constituição quis, de maneira inequívoca, que fosse do sector público.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mas, quanto a isso, temos falado. O Sr. Deputado Vieira Mesquita faz a defesa da sua dama; a iniciativa privada é, para si, certamente a solução para iodos os males de que o País enferma e a simples circunstância de se colocar na lei que a televisão pode f er aberta à iniciativa privada levará a que, na sua óptica, ela atinja os tops da qualidade e ser a melhor de mundo.
«Viva a iniciativa privada», diz o Sr. Deputado Vieira Mesquita, sem sequer ter em conta que a lei o não permite nesta área específica e os graves problemas que resultariam da sua instituição, que, naturalmente, quando possível, merecerá muito cuidado e,
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sobretudo, uma ponderação adequada dos interesses populares, sejam eles culturais, sociais, económicos, políticos ou da informação.
Uma última nota apenas para referir uma outra passagem da sua intervenção que reputo particularmente significativa e, em função dela, interrogar: até onde vai, para o PSD, a iniciativa privada no domínio da televisão? Quando, neste momento, aparece a sufragar o mero regime de concessão - e nem sequer nos termos em que ainda ontem o preconizava o Sr. Deputado Andrade Pereira, isto é, procurando reenviar para uma clara dominialidade pública - o PSD não estará, ao cabo e ao resto, a agir com reserva mental, na espera do instante próprio em que, avançando sobre o que agora puder adquirir, pretende estabelecer um regime de completo regabofe, de ausência de regras, do liberalismo mais serôdio, daquilo a que outrora chamavam a devolução à sociedade civil das suas inerentes potencialidades e a que hoje chamam coisas que, por serem uma mistela tão intragável, renuncio aqui a dizer diante deste microfone?
Até onde é que vai o PSD? Explique-nos lá, porque todos nós temos interesse em sabê-lo.
O Sr. António Capucho (PSD): - Até aos 45%!
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Olhe que não vai, não!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado Vieira Mesquita, a sua intervenção foi bastante significativa por alguns motivos que passo a expor.
Primeiro, porque é a justeza, por comparação, dos princípios assumidos pela oposição em muitas das decisões em relação à Lei da Rádio.
Segundo, porque ajudou, finalmente, a esclarecer alguns dos princípios que o PSD advoga para a televisão privada. Espero que neste momento V. Ex.ª transmita fielmente o pensamento do PSD.
Por outro lado, acho curiosa a sua intervenção quando classifica de tíbia a abertura da televisão à iniciativa privada proposta pelo PRD. Pergunto-lhe como é isso possível se até agora, pelo menos do que conhecemos, o PSD não apresentou iniciativas legislativas no sentido da abertura da televisão à iniciativa privada, mas apenas uma proposta de monopólio.
Como apontamento final, gostaria de lhe colocar a seguinte questão: entre os especialistas a que V. Ex.ª se referiu citou abundantemente o Dr. Marcelo Rebelo de Sousa.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Mal citado!
O Orador: - Pergunto: estava a reportar-se ao momento em que ele considerou nesta Câmara que a televisão não devia ser aberta à iniciativa privada?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Bem perguntado!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por responder ao Sr. Deputado Gomes de Almeida, dizendo-lhe que o seu projecto de lei apareceu já na fase deste processo. V. Ex.ª, de resto, preside à comissão eventual que foi criada para a apreciação da proposta de lei do Governo que atribuía à igreja católica um canal de televisão e o Centro Democrático Social veio a evoluir desde aí até que, numa fase final de todo este processo, apresentou o projecto de lei que temos presente, sobre o qual, como disse, não tive tempo suficiente para fazer a reflexão que V. Ex.ª exige.
Mas sempre lhe direi que ao PSD não restam dúvidas quanto, designadamente, à abertura da televisão à iniciativa privada pretendida nesse projecto de lei, que consideramos perfeitamente aceitável.
Ao Sr. Deputado Costa Carvalho direi que, indiscutivelmente, pretendemos acabar com o monopólio do Estado. Sempre foi essa a nossa posição e não estamos nem estaremos nunca a favor dos monopólios. Estamos a favor, sim, da abertura de espaços de liberdade neste campo da televisão e, portanto, do acesso da iniciativa privada à televisão, mas não da forma desregrada ou desordenada como, por exemplo, aconteceu com o acesso ao espaço radioeléctrico por parte das rádios. Toda a gente sabe como isso foi nefasto e ainda hoje o é, em virtude deste interregno em que a lei não é aplicada.
Somos de opinião que os monopólios devem acabar e que a iniciativa privada deve aceder. Mas deve aceder com condições que lhe permitam trabalhar em pé de igualdade com a televisão pública. É que nós, ao mesmo tempo que dizemos que a iniciativa privada deve aceder aos meios de televisão para produzir emissões e levar a todo o País os seus programas, também entendemos que a essa iniciativa privada devem ser garantidas todas as condições para poder exercer a sua actividade em pé de igualdade com a empresa pública Radiotelevisão Portuguesa, isto sem prejuízo de considerarmos o ónus que pode representar para uma empresa pública como a Radiotelevisão Portuguesa o facto de não receber indemnizações compensatórias exactamente nessa medida por prestar esse serviço público.
Entendemos que quer a televisão pública quer a privada devem poder esgrimir perante o público, que é a sociedade portuguesa, com as mesmas armas e sem qualquer tipo de desigualdade. Por isso mesmo é que digo que assim se podem melhorar os programas de televisão e que o público poderá ficar mais satisfeito com os programas que venham um dia a gerar-se a partir da televisão privada. Não significa isto que entendamos que só a televisão privada irá passar a produzir os melhores programas e aqueles que vão agradar percentualmente em maior número aos Portugueses. O que digo é que desta interacção entre a iniciativa privada e a iniciativa pública podem e devem nascer melhores programas, venham eles da televisão pública ou da privada.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sempre pagos pela pública, claro!
O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lemos, a iniciativa do PSD é uma iniciativa que não escondemos (é pública) e que ainda não vimos, como desejaríamos, ser votada nesta Câmara.
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Digo-lhe mais: entendemos que o artigo 41.º Constituição, nesta matéria, não está cumprido.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Viera Mesquita, é capaz de nos explicar por que é que ainda não viram a vossa iniciativa votada?
O Orador: - Porque ela está em sede de comissão...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Mas o PSD tem possibilidade de trazer o problema ao Plenário! Ninguém o impede! Se a questão é assim tão importante para o PSD e se tem tanta razão, vamos discuti-la aqui no Plenário e veremos então se a razão assiste ou não ao PSD! Por que é que o PSD não o faz?
O Orador: - O Sr. Deputado, o senhor sabe bem que o PSD nesta Câmara não tem os votos que tem essa maioria de esquerda...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ah, bom!...
O Orador: - Refiro-me à esquerda parlamentar em relação ao PSD, que tem mais votos que nós.
É que nós não conduzimos os processos nas comissões como os senhores todos juntos o fazem.
O Sr. Deputado citou o Dr. Fernando Nogueira, mas quero dizer-lhe que a minha posição como deputado do Partido Social-Democrata é coincidente com a do Dr. Fernando Nogueira.
É que quando o Sr. Ministro Fernando Nogueira aqui falou, fê-lo a propósito de um capítulo v desta lei...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É falso!
O Orador: - ... que foi desanexado por vontade dos seus autores e que tinha a ver com o estatuto de gestão da empresa pública Radiotelevisão Portuguesa e da rádio pública.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Olhe que não, olhe que não!
O Orador: - O Sr. Deputado citou as palavras do Dr. Fernando Nogueira relativamente a essa matéria.
No entanto, penso que elas são desajustadas ao tema que hoje aqui discutimos, que nada têm que ver com o estatuto de gestão das empresas públicas.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - São é desajustadas à Constituição e à normalidade democrática!
O Orador: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, não vou repetir-me relativamente àquilo que disse na minha intervenção. Entendemos que, por lei ordinária, é perfeitamente possível fazer a gestão, por parte de entidades privadas, do meio televisivo e por isso me dispenso de estar aqui a corroborar todos os argumentos que tive ocasião de explanar aquando da minha intervenção.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Então e o artigo 89.º?
O Orador: - Por isso mesmo lhe digo que quando dúvidas porventura se possam pôr no domínio da interpretação, designadamente do n.º 7 do artigo 38.º da Constituição, essa altura entendo que deveremos recorrer aos princípios fundamentais também previstos na Constituição, um dos quais é o do pluralismo.
Bem, o Sr. Ex.ª Deputado pode entender que com a salvaguarda do pluralismo interno de uma televisão pública única, através portanto desse monopólio de comunicação sedai no domínio da televisão, está salvaguardado esse pluralismo.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E bem!
O Orador: - É uma opinião que respeito. No entanto, devo dizer-lhe que para mim, na minha opinião, entendo que esse pluralismo é muito melhor defendido e assegurado se for feito através da concorrência, através do cotejo permanente existente entre entidades públicas e privadas. É esta a minha opinião.
O Sr. José Miguel Mendes (PCP): - Já agora, qual é a opinião da Constituição?
O Orador: - Julgo que através desse acesso à televisão por parte da iniciativa privada esse pluralismo fica melhor assegurado e, como tal, esse princípio constitucional.
Bom, até como é que vai a iniciativa privada do PSD?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Vai de vela!
O Orador: - Vai até ao ponto de considerar que as regras pelas quais se pauta o funcionamento de uma televisão pública tive ser exactamente iguais às regras pelas quais se pauta uma televisão de iniciativa privada.
Só que essas regras não podem representar a asfixia do que é verdadeiramente a essência da iniciativa. Na verdade, a iniciativa tem a ver com a criação e não podemos espartilhar o espaço de liberdade que deve existir para toda; estas entidades.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - A única diferença que encontro traduz-se no problema relativo à prestação do serviço público, pois esse incumbi: a uma empresa pública e deve ser prosseguido por ela. Portanto, os respectivos custos devem caber ao Estado e o Estado deve suportá-los na exacta medida desse serviço público.
Quanto ao problema do liberalismo mais serôdio, Sr. Deputado, desculpe-me mas isso não tem nada a ver com o Partido Social-Democrata.
Também não vou alcunhar a sua bancada do tipo de impropério que proferiu - e poderia fazê-lo.
Nós não somo» liberalistas no mau sentido. Nós somos sociais-democratas e acreditamos na nossa doutrina.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vê-se, vê-se!...
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O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - O Sr. Deputado Alexandre Manuel perguntou-me que princípios é que advogo para a televisão.
Bem, Sr. Deputado, são aqueles que resultam da minha exposição. V. Ex.ª já os ouviu, não os renego e mantê-los-ei sempre, até que, porventura, outros melhores surjam e me possam fazer evoluir nesse sentido.
Quanto à abertura tíbia à iniciativa privada, Sr. Deputado, com toda a franqueza lhe digo que ou é corrigido o artigo 2.º do vosso projecto de lei, que dispõe que são subconcessionadas programações de uma empresa pública para outras empresas que têm a ver com a iniciativa privada, dentro desses estritos limites... É que isso faz-me lembrar o programa Clube Amigos Disney, que o Júlio Isídro apresenta na televisão aos domingos.
Entendo que a abertura da televisão à iniciativa privada deve pautar-se por regras; e a lei que determinar a concessão deve estabelecer essas regras, dando-lhe um espaço suficiente - balizado, com certeza - mas que permita a sua criação e não seja um verdadeiro espartilho ou um arremedo de abertura à iniciativa privada.
Penso que o artigo 2.º do vosso projecto de lei terá de ser corrigido, porque o que está consignado nos projectos de lei quer do CDS quer do PS é muito mais claro e muito mais adequado a este objectivo de abertura da televisão à iniciativa privada.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Então, a mim não me deixou interrompê-lo?!
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado, até sou capaz de comungar de algumas das opiniões de V. Ex.ª, mas a minha questão é só esta: como é que V. Ex.ª classifica de tíbia a nossa abertura perante a vossa proposta de lei, que não defende nenhuma abertura a não ser um duopólio?
O Orador: - Sr. Deputado, a nossa proposta de lei não tinha nada a ver, repito, com a filosofia e o objectivo do que aqui hoje estamos a discutir. Com efeito, o que estamos aqui a discutir é a abertura, através de lei ordinária e ao abrigo do que permite o n.º 7 do artigo 38.º da Constituição, da televisão à iniciativa privada.
Aquilo que representa a proposta do Governo, quanto a nós muitíssimo bem - penso que esse tema tem de ser tratado e que não pode ser escamoteado -, é a concessão à igreja católica, como a outras confissões religiosas, ao abrigo do artigo 41.º da Constituição, de um canal privado de televisão. Na verdade, este preceito constitucional estatui, no seu n.º 5, que a igreja católica e outras confissões religiosas devem usufruir de meios próprios de comunicação para o exercício da sua finalidade como entidades.
Por isso mesmo, entendo tratar-se de duas questões separadas, embora devam, indiscutivelmente, ser consideradas.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, pedi várias vezes ao Sr. Deputado Vieira Mesquita que me deixasse interrompê-lo nas considerações que produzia, mas suponho que ele não terá visto. O Sr. Deputado Vieira Mesquita é uma personalidade com quem sempre mantiver relações afáveis. Portanto, gostaria de saber se a Mesa permite que, neste momento, o Sr. Deputado Vieira Mesquita dê pelo facto de eu o pretender interromper e se, embora um pouco à revelia do Regimento, aceita que, com autorização dele, interrompendo-o, eu possa fazer uma breve interpelação.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa não é uma figura regimental e certamente que eu ficaria numa situação bastante difícil para poder, de algum modo, corresponder à pretensão do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
Penso que o Sr. Deputado Vieira Mesquita, no seu interesse e na defesa do espaço que lhe compete, deu as respostas convenientes, e se houve alguma omissão, certamente que ficará para nova oportunidade.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Carvalho.
O Sr. Costa Carvalho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os actos de magia não têm nada a ver com o tamanho da varinha de condão, mas antes com a sua fórmula, com o sortilégio das palavras.
Eis o que também se poderá dizer do projecto de lei n.º 387/IV, do CDS, sobre a lei da radiotelevisão. Até porque longe de constituir uma anáfora do articulado, o preâmbulo do diploma mostra, nos seus refolhos, subtilezas, senão mesmo eflúvios, de um inteligente modo de perspectivar tão importante como polémico assunto.
Quando, em 1938, E. B. White viu pela primeira vez imagens trémulas num pequeno ecrã de televisão, com preciência afirmou:
Acredito que a televisão será o teste do mundo moderno. Nesta nova oportunidade de vermos além do alcance da nossa visão descobriremos uma nova e insuspeitável perturbação de paz geral ou um brilho redentor no céu. A televisão manter-nos-á de pé ou, estou certo, derrubar-nos-á.
Porque, também colocado perante o dilema de White, o CDS volta a emprenhar-se na «resolução, com a maior consensualidade possível, do problema da televisão em Portugal».
Evidentemente que o faz num posicionamento não de todo coincidente com o do PRD. Mas ainda assim respeitável e, por isso mesmo, susceptível de uma análise crítica que pretendemos seja vista como construtiva.
Assim, e pelos critérios técnicos mais actualizados, não vemos como, embora sendo correcta a definição de «televisão», no projecto de lei do CDS não se atenda ao rigor de precisar a televisão por ondas electromagnéticas e a TV por cabo. Do mesmo modo nos parece difusa a ideia que possa ter presidido à redacção do artigo 3.º, na medida em que esquecerá toda uma estrutura de sistemas envolvendo o fenómeno tele-
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visivo, quais sejam, nomeadamente, a recepção, a comunicação, a distribuição e o transporte. Julgamos extremamente vago considerar propriedade do Estado apenas o sistema de distribuição.
Estamos em crer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que as definições defendidas por Berger e por d'Arcy, inspiraram este projecto de lei quanto à caracterização do âmbito dos canais terrestres. Só que o CDS omitiu ou negligenciou o que Berger catalogou de «microtelevisão» e d'Arey entendeu designar «self-media». É um lado oculto da lua e, reconheço, por isso mesmo difícil de ser atendido sem passar por sérios riscos.
A evolução tecnológica é um constante aviso às cautelas, que, no entanto, não parecem contempladas ao atribuir-se uma duração máxima de vinte anos à concessão - uma concessão que, em teoria e na prática, diverge dos critérios defendidos pelo PRD.
Importa, no entanto, realçar o facto de o CDS perfilhar a tese do PRD quanto à abertura da televisão à iniciativa privada através do concurso público, com as garantias e cautelas para que remete com o seu projecto de lei.
E, também como nós, também o CDS de nenhum modo visa destruir ou minimizar a empresa pública concessionária da televisão - a RTP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobretudo em televisão, tecnologia ainda na sua pré-história, se assim me é permitido dizer, será de evitar o perigo que muitos vêem como seu principal objectivo; isto é, não se trata de entregar programas aos assistentes, mas, pelo contrário, vender os telespectadores aos anunciantes. Para os defensores de uma pura comercialização da TV, o seu produto não é a produção, mas antes a entrega do maior número de pessoas ao mais baixo custo.
Neste aspecto da publicidade o CDS poderia estar a contribuir, talvez involuntariamente, para que a televisão se firmasse cada vez mais como um ritual e não como acto intelectual. É certo que no artigo 8.º do seu projecto de lei acena com a «representatividade cultural e social», expressão suficientemente fluida para poder ser utilizada sempre e a preceito.
Quanto à competência da concessão, ela está, a nosso ver, enlaçada de modo a fazer andar os concorrentes de Herodes para Pilatos, por força de normas e critérios que o CDS já defendeu quando da lei dos licenciamentos da radiodifusão - nada a opor à coerência de princípios.
Registe-se ainda o facto de o CDS considerar a proposta de lei n.º 5/IV «insuficiente a vários títulos», embora não avançado para os terrenos de contemplação ecuménica em que o PRD se afoita, atribuindo tempo de emissão «às confissões religiosas públicas e notoriamente reconhecidas e implantadas no nosso país».
Por último, importará realçar um certo comedimento do CDS perante o fascínio exercido pelas novas tecnologias. Ao contrário de outros fora do poder, o CDS não descobriu, ou parece não ter descoberto, que o campo da comunicação social é muitíssimo mais vasto do que as primitivas análises deixariam perceber.
Mas também nisso o PRD vai um pouco mais longe, ao não desejar que o atractivo da novidade seja transformado numa autêntica e perniciosa bolímia mediática. Isto porque, face ao dilema de White, queremos ver na televisão «um brilho redentor» e não «uma insuspeitável perturbação da paz geral».
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Magalhães Mota pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para, nos termos regimentais, solicitar a suspensão dos trabalhos por 30 minutos.
O Sr. Presidente: - É regimental, pelo que está concedido, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, está interrompida a sessão por 30 minutos.
Eram 11 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 12 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, durante a sessão deu entrada na Mesa uma moção de censura, apresentada pelo PRD, que o Sr. Deputado Secretário vai ler, conforme ficou deliberado na conferência de lideres.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O texto da moção de censura é do seguinte teor:
Moção de censura
1 - No,; termos do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República e do n.º 1 do artigo 229.º do Regimento, o Grupo Parlamentar do Partido Renovador Democrático, representado pelos deputados abaixo assinados, vem apresentar uma moção de censura ao Governo.
Justificam a moção de censura, para além de aspectos relativos à execução do Programa do Governo, factos cuja gravidade democrática e relevo para o interesse nacional só por si a imporiam: a incapacidade do Governo de enfrentar os problemas estruturais que ao País se apresentam, preferindo aproveitar os benefícios de uma conjuntura económica favorável e adiar e escamotear as questões em permanente eleitoralismo, o clientelismo desenfreado com que vão sendo ocupados todos os lugares da Administração, a manipulação da informação e o relacionamento conflitual do Governo com a Assembleia da República, que chegou agora ao ponto de pôr em causa a dignidade do Estado Português e do Parlamento, em comportamento que a Assembleia da República censurou por larga maioria, sem que após tal votação parlamentar o Governo houvesse tido a dignidade democrática de apresentar uma moção de confiança.
2 - Requere-se se sigam os demais termos dos artigos 22$.º e seguintes do Regimento, identificando-se expressamente o primeiro signatário nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 230.º do Regimento.
Pelo Grupo Parlamentar do PRD, Hermínio Martinho.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à distribuição. Vamos prosseguir a ordem de trabalhos. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por marcação do PRD voltamos hoje a analisar na Assembleia da República a problemática do áudio-visual, desta vez centrada na questão da televisão.
Questão importante, sem dúvida, a merecer profunda análise, enquadrada no aspecto global da comunicação, tendo em conta a diversidade de situações em presença, os avanços tecnológicos e as novas possibilidades de aproveitamento dos meios áudio-visuais.
Pelo nosso lado, gostaríamos que este debate se pudesse realizar no seu quadro próprio, proporcionando uma profunda reflexão em torno desta matéria e do áudio-visual em geral, considerando as suas diferentes componentes, os seus avanços e novas possibilidades de aproveitamento. Temos dúvidas que tal seja possível no momento actual.
Não se trata apenas de estar em causa o exacto momento constitucional para debater esta matéria. Estão também em causa questões muito concretas da actualidade política que, a não serem consideradas, nos levariam a visões parcelares da realidade, com inevitáveis consequências negativas.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora, aí está!
O Orador: - Importa acentuar que continuamos sujeitos a uma poderosa ofensiva do Governo contra o sector público da comunicação social, que chega a revestir a forma de ultimato à Assembleia e que, do nosso ponto de vista, urge travar.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É uma vergonha!
O Orador: - É neste quadro que decorre o presente debate, tornando-se urgente a aprovação de medidas de fundo que permitam alterar radicalmente as perturbações, anomalias e distorções resultantes da actuação de um governo que, apesar de minoritário e isolado, procura conjurar, a todo o vapor, medidas inconstitucionais fortemente lesivas do direito à informação.
Do nosso ponto de vista, não é possível adiar por mais tempo a adopção de medidas que permitam desgovernamentalizar, reestruturar e modernizar, viabilizar e desenvolver o sector público de comunicação social; é urgente definir uma nova política para o áudio-visual; tardam as medidas para apoiar a informação escrita e difundir o gosto pela leitura; há que garantir novas condições para o exercício da profissão dos jornalistas e dos demais trabalhadores do sector.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Importa melhorar a qualidade da informação produzida e salvaguardar a independência do sistema informativo nacional.
Uma tal postura não deve, porém, levar a ignorar o que em matéria de televisão se tem vindo a passar nestes últimos tempos. Um articulista do insuspeito jornal Expresso chamava a atenção, no passado fim-de-semana, para as movimentações que neste momento estão sendo desenvolvidas no nosso país por esse grande tubarão da TV privada, o australiano Sr. Murdoch, para a actuação em Portugal nos domínios da televisão e da comunicação social em geral e das ligações que ia mantendo com os candidatos «nacionais» à TV privada.
Como referia o citado articulista, «o condicionamento maciço e a uniformização de padrões de gosto e consumo - segundo os valores mais conformistas e retrógrados - são dois elementos essenciais do modelo Murdoch, ou ainda que «a ser aplicada em Portugal a receita Murdoch com a mesma intensidade que se registou na Austrália, na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos estaria possivelmente liquidada a veleidade de produzir informação independente no País».
Interessantes reflexões, sobretudo se conjugadas com o conhecimento das ligações, de concretos candidatos nacionais à TV privada com o grupo Berlusconi, cuja programação anticultural e antinacional é por demais conhecida em vários países da Europa, de modo a dispensar comentários adicionais.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sim senhor!
O Orador: - Estes factos não podem ser ignorados no presente debate e aconselham à maior prudência e ponderação nas soluções a adoptar.
Sabe-se, por outro lado, que a gula pela TV privada vem crescendo, chegando-se ao ponto de, sem qualquer despudor, se reclamar o total sorvedouro da empresa pública RTP, ou a pura transferência para os privados do 2.º canal (e já agora porque não também o 1.º!).
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Lá chegarão! ...
O Orador: - Sempre com a tónica de que o sector público pague a factura e o privado assuma os lucros. As vozes de sereia podem encantar, mas não podem enganar!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Prova exemplar do que foi dito é o projecto de lei do CDS.
Para este partido o importante é destruir a actual lei da televisão, sempre com o objectivo de pôr a saque a RTP, E. P. Se o projecto já de si era abstruso e rotundamente inconstitucional, se para o CDS direitos essenciais como os direitos de antena e de resposta não contam, se para este partido de nada interessa preservar direitos dos profissionais da informação e programação ou assegurar regras mínimas de funcionamento, ficámos ontem a saber que, apesar de tentar vender a teoria de que todos seriam iguais em oportunidades de acesso, ficámos a saber, dizia, que para o CDS há uns mais iguais que outros.
É preciso descaramento, senhores deputados do CDS! Não nos venham, pois, com argumentos de pseudo-igualdade - o que o CDS preconiza é a retoma de forma encapotada da proposta de lei n.º 5/IV, que não conseguiu obter vencimento nesta Câmara. É tentar fazer passar gato por lebre, o que é a todos os títulos inaceitável, quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista ético.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Para além disto, a não previsão de qualquer tipo de limitações que permitissem afastar à partida a gula estrangeira revela à evidência o que quer o CDS. Quer o domínio dos grandes grupos económicos internacionais, quer a destruição do serviço público da televisão. Quer a lei da selva tão querida dos Murdochs, Berlusconis e companhia.
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Não é novidade; do CDS não seria, aliás, de esperar outra atitude.
Uma voz do CDS: - Não apoiado!
O Orador: - Mas este debate trouxe novidades. O PSD, talvez por se sentir já na linha de queda, dá o salto em frente negando hoje o que vinha afirmando.
«Canal de TV para a Igreja... Claro! A proposta para aí está: trata-se quando se tratar, mas o que interessa é o concurso público.»
«Desgovernamentalização da eventual concessão - evidentemente, nada a opor.» Ao aceitar em pleno o Conselho Nacional do Audio-Visual previsto no projecto do PS, e não retirado da discussão, que tem como atribuições designadamente proceder à concessão das actividades de televisão. E esta, Srs. Deputados?!
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É como gato a bofes!
O Orador: - E andou o Governo a desdobrar-se em declarações e campanhas contra o Conselho da Rádio, «ai que me querem tirar poderes, ai que estão a interferir na minha área de competência», para agora se ver tão mal tratado pelo seu próprio partido, que aplaude hoje o que ontem renegava.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto aos outros projectos em debate, há que reconhecer que neles estão previstas algumas alterações de conteúdo positivo no que se refere à actual lei da televisão. Uma melhor delimitação de competências, um esforço desgovernamentalizador, o assegurar igualdade de direitos às diversas confissões religiosas, uma mais clara definição de regras de funcionamento são, obviamente, aspectos que merecem o nosso apoio.
Não podem, contudo, deixar de contar com a nossa oposição disposições no sentido de permitir, antes de uma revisão constitucional, o exercício de actividades de televisão por entidades privadas. E mais uma vez afirmamos que as iniciativas em debate suscitam profunda perplexidade.
Não podemos, por exemplo, esquecer que o programa eleitoral do PS afirmava de maneira peremptória que qualquer alteração legal no domínio da televisão dependeria de uma reponderação do quadro constitucional, que, como é óbvio, não podia decorrer nesta sede em debate de lei ordinária. Nem tão-pouco restam dúvidas, como aqui sublinharam deputados de diversas bancadas, designadamente do PS, que o quadro constitucional neste domínio é claramente limitativo.
Nem se venha falar de interpretações actualizadas da Constituição. Mal andaríamos se com tais actualizações se pretendesse antecipar resoluções que só a própria revisão constitucional pode, se assim for entendido, vir a concretizar.
Pela nossa parte não vemos razão para alterar as posições com que nos apresentamos ao eleitorado, nem vemos que tenham ocorrido circunstâncias que pudessem vir a legitimar uma tal alteração de comportamento e posicionamento institucional.
Que o CDS e o PSD queiram a todo o custo abrir brechas na constituição, percebe-se: estes partidos sempre se habituaram mal à Constituição nascida do 25 de Abril e sempre se bateram, reconheça-se-lhes a coerência, pela tomada de assalto do sector público da comunicação social - particularmente a TV - pelos grandes grupos económicos (nacionais e estrangeiros) como forma de assegurar novas e mais requintadas formas de manipulação ideológica.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - E o assalto à Renascença?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Isso foram alguns que agora estão no PSD, como por exemplo o Albarran!
O Orador: - Se o Sr. Deputado do CDS quiser fazer um pedido de esclarecimento, terei todo o gosto em esclarecê-lo quanto à questão da Rádio Renascença.
O Sr. António Capucho (PSD): - Era sobre o assalto...
O Orador: - Como dizia, esses grupos não escondem a pressa suspeita de intervir na vida política nacional através desse poderoso meio que é a TV, também não é novidade para ninguém, como o não seria o aproveitamento que dele fariam para levar às últimas consequências a sanha que manifestam contra as forças de esquerda, num caso hipotético de a ele terem acesso.
Que eles queiram acabar com o monopólio público da TV - que está obrigado a ser independente e pluralista - também se percebe.
Agora que queiramos ser nós a fazê-lo, como que tentando antecipar-nos a acções que em nada beneficiam a democracia, é incompreensível!
Estão bem presentes os resultados a que têm conduzido as antecipações ou a prática política de medidas de direita por forças políticas que se reclamam de esquerda e as feridas que elas têm aberto no regime democrático.
Colhamos es ensinamentos do passado antes de optarmos por vias de aventureirismo político ou de criação de perigosos precedentes institucionais.
A não ser que se pretenda montar um verdadeiro cenário de faz de conta, que faz que faz mas não faz, para estar de bem com Deus e com os homens. Será isso?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora aí está!
O Orador: - Estes jogos são perigosos, Srs. Deputados, são muito perigosos, sobretudo quando o que está em causa e precisamente o valor mais alto que é a Constituição da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já aqui tivemos oportunidade de salientar, também nós não ignoramos a proliferação de parabólicas, emissões espanholas, clubes de v de, autarquias constituídas em agentes de retransmissão, etc. Mas não podemos fechar os olhos aos poderosos interesses argentários que se posicionam para engolir os meios e o mercado publicitário da RTP sem vantagens, para os Portugueses.
Isto e só isto leva-nos a reafirmar que a questão essencial de momento é a importância de valorizar e modernizar a RTP enquanto entidade responsável pela prestação do serviço público de televisão de qualidade.
Tal implica, desde logo, melhorar a qualidade das emissões, defendendo os dois canais existentes e assegurando a sua autonomia e complementaridade. Para
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lelamente, há que dar mais peso à produção nacional e à promoção da língua e da cultura portuguesas numa televisão em que se fale português para os Portugueses.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ainda neste quadro são urgentes medidas que permitam a diversificação e a programação para cobrir de forma mais articulada toda a gama de interesses, motivações e valores com implantação social significativa, a criação de espaços de representação social nas emissões normais, o desenvolvimento da «TV útil», o estudo de viabilidade de emissões regionais de TV, etc. Mas tudo no quadro do serviço público de televisão, da televisão pública que a todos deve servir.
Mas é também necessário rentabilizar a RTP, aprovando medidas de viabilização económica, concluindo a rede primária de emissores, assegurando e melhorando a intervenção da RTP no programa europeu do satélite - intervindo sempre para defesa dos interesses nacionais -, aproveitando integralmente os recursos humanos e materiais da empresa e dando prioridade ao aparelho de produção, tornando-o mais vivo e mais criativo, com formação profissional específica para atingir esses objectivos.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O mesmo se poderia dizer quanto à RDP, em que é necessário desgovernamentalizar e desenvolver o serviço público.
Não poderemos, finalmente, deixar de referir que uma nova política para o áudio-visual não poderá deixar de estimular o desenvolvimento da produção nacional, seja no vídeo, no cinema ou na rádio, estimular o intercâmbio com outros países e fomentar a cooperação, procurando promover e defender a cultura portuguesa, combater as tentativas de penetração e domínio das transaccionais do áudio-visual e também assegurar a criação de uma indústria áudio-visual nacional, conjugando para esse fim meios financeiros da RTP, da RDP e de outras empresas públicas do sector, do Instituto Português de Cinema, de produtores privados e cooperativos e de outras entidades.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Defendemos que sejam concluídos os processos legislativos pendentes na Assembleia da República cuja urgência é manifesta e de que destacamos a lei da radiodifusão, o reforço das garantias de independência dos órgãos de comunicação social do sector público, designadamente no que se refere à radiotelevisão.
Estas medidas não poderão fazer esquecer a urgência da aprovação do necessário enquadramento legal para a profunda renovação tecnológica em curso, no sentido de reforçar o regime democrático e salvaguardar a independência nacional.
Esta é a nossa firme disposição.
Esperamos que também seja esta a opinião sincera da Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Jorge Lemos, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Almeida.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - Não é para pedir esclarecimentos, é para formular um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Almeida (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lemos, não lhe peço qualquer esclarecimento tão esclarecido estou quanto às atitudes do Partido Comunista relativamente a este e a outros problemas. Mas, já agora, queria deixar aqui bem vincado que, à medida que aumentam os decibeis da catilinária que o Partido Comunista produz contra nós, mais nos convencemos do acerto das nossas posições, pelo que estamos agradecidos.
Queria também sublinhar, Sr. Deputado, que o que o projecto do CDS faz é contrariar o modelo que o Sr. Deputado desejaria para o nosso país, modelo que em boa verdade e objectivamente não consigo destrinçar do modelo existente nos Estados comunistas. Ora, é precisamente isso que não aceitamos e é justamente contra isso que nós combatemos.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à proposta de lei n.º 5/IV, sabe o Sr. Deputado, sempre o dissemos claramente, da nossa disponibilidade em votar favoravelmente tal proposta de lei; o que aconteceu foi que o CDS entendeu, dada a ineficiência, por razões várias, dos trabalhos produzidos pela comissão eventual criada, apresentar o seu próprio projecto para que ao menos não se dissesse que a comissão era incapaz de, ela própria, encontrar um projecto alternativo. Mas fico agradecido ao Sr. Deputado pelas considerações que fez acerca do nosso projecto, pois permitem demarcar claramente a distância que existe entre o meu partido e o Partido Comunista Português.
O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra, se o desejar, o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não tenho nada a dizer, a conversa do Sr. Deputado do CDS foi esclarecedora.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Marques Mendes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dezoito meses passados sobre uma campanha eleitoral em que a generalidade dos partidos democráticos formularam a promessa de promover a abertura da actividade televisiva à iniciativa privada e quinze meses após a apresentação a esta Câmara de uma proposta de lei do Governo preconizando o fim do monopólio estatal em matéria de televisão encontramo-nos hoje aqui a debater, na generalidade, projectos de lei que, de uma ou outra forma, procuram dar cumprimento a este desiderato.
Congratulamo-nos, pois, e em primeiro lugar, com esse facto, embora realcemos os atrasos e adiamentos em que a discussão desta matéria tem sido fértil.
A nossa primeira e principal preocupação é a de que, também desta vez, o retomar desta questão não redunde em mais protelamentos e adiamentos, que os projectos hoje aqui em debate sejam realmente discutidos e votados com base na apreciação dos seus méri-
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tos e não se enterrem nos meandros de uma qualquer comissão ou se afundem no pântano das discussões estéreis.
Por mais voltas que se queira dar a este assunto, a verdade é que a esmagadora maioria dos portugueses deseja hoje ver um ponto final no monopólio estatal, já com 30 anos de existência, e não é com artifícios processuais ou regimentais que se poderá inverter esse vivo sentimento da opinião pública.
Constatamos com agrado que, ao contrário do que há um ano sucedia quando o Governo - e então só o Governo - despoletou o debate sobre esta matéria, hoje a grande maioria das forças políticas representadas nesta Câmara parecem estar de acordo quanto a um objectivo essencial - a concorrência em matéria de televisão.
Ficam apenas de fora deste consenso alargado os que, mau grado os acenos de abertura que sopram do exterior, continuam a ter da nossa sociedade e da comunicação social uma visão retrógrada, estatizante e fechada à modernização.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os monopólios, por via de regra, inibem o espírito de iniciativa, estiolam a imaginação, prejudicam a criatividade. E quando esses monopólios respeitam a um meio de comunicação social tão importante como a televisão, então as consequências são ainda mais nefastas e perigosas - elas conduzem a querelas constantes, a polémicas desnecessárias, a um estado permanente de erosão e desgaste de trabalhadores e dirigentes e, mais grave do que isso, não são de molde a melhorar a qualidade do serviço a prestar às populações.
É necessário que, também em matéria de televisão, haja a consciência legislativa bastante para encarar o princípio sempre ouvido no banco das escolas de que a realidade supera sempre a mais elaborada das previsões.
De facto, o fenómeno a que se assistiu neste país no que diz respeito ao problema das rádios livres - e que hoje de algum modo se começa já a fazer sentir de forma preocupante na área televisiva - demonstrou à saciedade a fraqueza dos instrumentos processuais dilatórios frente à dinâmica dos factores sociais e económicos das comunidades locais.
Com efeito, os enormes saltos qualitativos que vêm sendo dados no domínio do progresso tecnológico de produção, difusão e recepção de emissões televisivas, a crescente dinâmica da sociedade civil, as exigências de qualidade que a população constantemente reivindica levam-nos à conclusão de que a concorrência em matéria de televisão é irreversível, mas, mais do que isso, é desejável e necessária. Não há, neste caso, dilações nem espartilhos legais que possam travar a implantação das novas tecnologias e, sobretudo, dar corpo e concretização aos princípios da liberdade de expressão e do pluralismo informativo.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não queremos, nem podemos permitir, que o erro se repita no caso da televisão.
É a própria credibilidade das instituições que o exige e requer.
Pensamos mesmo que já se perdeu a este respeito tempo em demasia. Mas não por culpa do Governo, que, como é sabido, despoletou o debate sobre esta matéria, logo no primeiro mês de exercício do seu mandato, através de uma proposta de lei que, mau grado mais de um mo volvido, faz, inalterada, na comissão especial criada para o efeito.
De facto, através da apresentação da proposta de lei n.º 5/IV, em 21 de Dezembro de 198S, pretendeu o Governo abrir nesta Assembleia da República a discussão sobre quem pode ter acesso à exploração da actividade televisiva.
Na esteira da iniciativa do Governo, outros projectos vêm ser do apresentados por alguns partidos da oposição, atitude que não pode deixar de se registar face ao conhecido imobilismo ideológico à volta deste tema que vinha sendo patenteado pela chamada oposição de esquerda.
Infelizmente, no entanto, é sobretudo quanto à oportunidade das iniciativas e quanto ao seu supremo objectivo que radica a nossa total concordância, havendo, ao invés, muito a questionar, quer no plano das ideias, quer no tocante aos modelos preconizados.
Os esquemas de abertura à exploração da actividade televisiva a operadores estatais, no caso dos projectos do PS e do PRD, são, ainda, profundamente eivados de concepções estatizantes, excessivamente regulamentadoras, e consagram mesmo fórmulas de intervenção ou órgãos u instituir que parecem denotar uma intenção de institucionalização do princípio da unicidade em matéria de programação.
Nada nem nenhum princípio pode justificar a construção legal da desejável e natural liberdade de estilo na criação de um produto que ao público se dirige e por ele deve ser julgado, aplaudido ou condenado.
São esta, - ou deveriam ser estas - as regras do jogo em qualquer sociedade livre e democrática e é com base nessa;, regras que os operadores portugueses têm o direito d: poder contar para o cabal e pleno exercício do princípio da liberdade de expressão.
Por outro lado, julgamos fundamental ter presente que a exigência do direito à diferença e o desejável progresso tecnológico não podem vir a ser travados por uma concepção arcaizante da comunicação de massas.
Porém, ao pretender impor o carácter de serviço público à actividade televisiva, mais não servem os projectos do PS e do PRD que defender uma lógica que contraria os princípios definidos pela Comunidade Económica Europeia, que de há muito abandonou a perspectiva publicista da televisão.
A Comunidade Económica Europeia e o Conselho da Europa, ainda ontem aqui citado por um Sr. Deputado da oposição, que a esta matéria vêm dedicando uma particular atenção, tratam já hoje a actividade radiofónica e televisiva numa óptica diferente da simples e estrita concepção de serviço público.
Claro que a actividade pode ser exercida numa perspectiva de serviço público pelas entidades a quem uma tal missão seja confiada; no entanto, o exercício da actividade em si e globalmente considerada não deve estar submetida à disciplina e obrigações específicas inerentes ao postulado de serviço público.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A existência do serviço público de televisão não deve, nem pode, asfixiar o natural desenvolvimento do mercado neste sector, cabendo
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ao legislador definir um quadro moderno onde se possam articular as regras de uma sã concorrência.
Não ignora, contudo, o Governo o impacte cultural e social que um meio de comunicação como a televisão tem nas sociedades modernas e nesse sentido, de resto, como é do conhecimento público, defende que sejam priorizadas nas autorizações a conceder para a exploração da actividade televisiva justamente aquelas entidades que, pela sua idoneidade, tradição e enraizamento histórico na cultura e mentalidade do povo, apresentam garantias iniludíveis de corresponder cabalmente às exigências a que esta actividade deve obedecer no interesse colectivo.
Sabe esta Assembleia e sabe o povo português que o Governo defende que a igreja católica deve ser preferenciada no processo de abertura da televisão a novos operadores. Como, de resto, no passado, outras forças e diversas personalidades o defenderam.
Trata-se, afinal, do reconhecimento de uma realidade tão evidente e tão notória, em termos morais, culturais, históricos e civilizadoras, que uma tal preferência em relação à igreja católica não é nem pode ser considerada na sociedade portuguesa uma benesse do Estado, um privilégio inconcebível ou uma qualquer afronta ao princípio da igualdade e oportunidade.
Bem ao invés, só quem despreza os valores morais e tradicionais da sociedade portuguesa, quem desconhece a implantação social e a influência histórica e cultural que tal instituição teve e tem no nosso país e quem, com alguma ligeireza de princípios e de convicções, pretende equiparar o que não deve ser equiparado é que pode confundir preferência legítima com privilégios inadmissíveis, favor do Estado com afirmação de justiça, benesse do poder com aplicação de imperativos que a Constituição inequivocamente consagrou e reconheceu.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Temos a consciência de que parece não ser este o entendimento de alguns. Apenas lamentamos que assim seja e que nem todos tenham a coragem política de o afirmar, adiando e protelando, sem decisões, uma proposta de lei que continua inerte nesta Assembleia há mais de um ano, sobretudo quando este objectivo não é de agora, mas corresponde, sim, a uma finalidade expressa e inequivocamente assumida no Programa do Governo que esta Assembleia viabilizou.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A par da abertura a operadores não estatais, defende o Governo, sem margem para dúvidas, o exercício de um serviço público de televisão capaz, moderno e preparado para o futuro.
É, também aqui, a afirmação do princípio de que o Estado não pode abdicar e antes deve assegurar um serviço público essencial, ainda que não omnipresente, total e absoluto.
Daí que o Governo tenha vindo a dotar a empresa pública RTP dos meios e condições que lhe possibilitem cumprir a sua missão, prosseguir os objectivos de serviço público que lhe estão cometidos, racionalizar e rentabilizar a sua exploração, servir em boas condições todo o País e todos os portugueses e enfrentar com êxito os saudáveis desafios da concorrência que se deseja, mas que vem tardando.
Assim, não podemos deixar de, neste âmbito - e para que desapareçam todas as dúvidas -, referir as principais e muito importantes acções já tomadas, programadas ou em curso:
Decisão governamental de Novembro de 1986, no sentido da cobertura, no prazo de dois anos, de todo o País, em termos de rede primária e secundária de emissão, tendo em atenção que ainda hoje cerca de 800 000 portugueses não vêem o 1.º canal e cerca de 2 050 000 não vêem o 2.º canal, o que obrigará a um esforço financeiro global de 5 milhões de contos, dos quais 3 milhões serão suportados pelo Orçamento do Estado;
Aumento, já determinado, do capital estatutário da RTP para 4 milhões de contos, única forma de corrigir a desactualização que grassava inverter a degradação a que se assistia e viabilizar os investimentos que urge realizar;
Determinação, em 1986, e já em 1987, dos critérios e valores de indemnizações compensatórias devidas à RTP e decorrentes das exigências legais e sociais de cobertura televisiva das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, terminando, assim, com o lamentável conflito e alguma arbitrariedade que no passado vinha acontecendo com notórios prejuízos;
Concretização e formalização, muito em breve, de um contrato-programa por um período mínimo de cinco anos entre o Estado e a RTP, o qual está em fase final de elaboração e onde serão definidas, com rigor, as exigências de serviço público que sobre a empresa impendem, quantificados os inerentes custos e comparticipações estatais e definidas orientações muito claras e precisas em termos de reequipamento da RTP e da abertura de várias delegações regionais desta empresa, para mais convenientemente servir as populações;
Finalização, em 1987, da rede de emissão do 1.º canal em toda a Região Autónoma dos Açores, tal como já hoje é uma realidade na Madeira, sendo, neste particular, de destacar a elevada colaboração e o muito significativo esforço financeiro despendido pelos respectivos Governos Regionais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Estas e outras medidas de fundo demonstram, sobretudo, que não descuramos o serviço público, que o Governo está atento no presente e a preparar atempadamente o futuro e que, por isso, não têm razão de ser e são totalmente descabidas as afirmações dos que hoje tão preocupados parecem mostrar-se com o futuro da RTP, E.P., quando, no passado, não foram capazes de lhe dispensar os meios exigíveis ao desenvolvimento e prossecução da sua normal actividade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O presente debate comprova que os caminhos da modernização exigem e requerem que saibamos ser céleres e seguros na definição de uma opção que urge - o estabelecimento de um regime de concorrência em matéria da televisão.
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É que há interesses culturais, económicos e sociais a preservar, há uma população inteira a satisfazer, há uma produção nacional a incentivar e difundir, há avanços tecnológicos que não devem ser menosprezados, mas antes aproveitados e desenvolvidos, há erros do passado, ditados pelo imobilismo, pela paralisia e pela incapacidade política, que não devem, em matéria de televisão, ser repetidos ou reeditados, há, sobretudo, que ter a perfeita consciência de que vivemos numa era de transformação, de mudança e de modernização e que nada nem ninguém pode verdadeiramente travar ou inviabilizar.
Nesta como noutras áreas de governação da sociedade portuguesa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto mais ninguém pretender usar da palavra, dou por encerrado este debate, cuja votação terá lugar na próxima terça-feira, às 18 horas.
Assim, a próxima sessão terá lugar na terça-feira, dia 31 de Março, e da ordem do dia constará a apreciação dos diplomas agendados para hoje e que não foram discutidos, acrescida da apreciação do recurso interposto pelo PSD sobre a admissibilidade dos projectos de lei n.ºs 381/IV (PRD) - intervenção da Assembleia da República em matéria respeitante à participação de Portugal nas Comunidades Europeias - e 385/IV (PS) - participação da Assembleia da República na formulação das políticas comunitárias -, 3 86/1V (PCP) - estabelece normas tendentes a salvaguardar e garantir o pleno exercício das competências da Assembleia da República no tocante às questões decorrentes da adesão à CEE.
Da ordem do dia constará, ainda, a apreciação dos projectos de lei n.ºs 355/IV (PS) - altera o artigo 88.º da Lei n.º 49/86, de 31 de Dezembro -, 3S6/IV (PS) - alienação das participações do sector público por negociação particular -, 246/IV (PCP) - elimina a obrigatoriedade de venda das participações financeiras das empresas públicas e indústria e energia -, 171/IV (PCP) - Dia do Estudante 400/1V (PS) - Dia do Estudante - e 401/IV (PSD) - Dia Nacional do Estudante.
Proceder-se-á também, às 18 horas, à votação final global da ratificação n.º 4/1V (PCP), relativa ao Decreto-Lei n.º 125/82, de 22 de Abril, que cria o Conselho Nacional de Educação e das Universidades, e à votação final global da proposta de lei n.º 46/IV, que autoriza o Governo a continuar a execução dos programas de reequipamento das Forças Armadas.
Nada mais havendo a tratar, dou por terminada a sessão.
Eram 12 horas e 45 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel M. Almeida Coelho.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Flausino Pereira da Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle. 
José de Almeida Cesário. 
Rui Alberto Limpo Salvada.
Partido Socialista (PS):
António Carlos Ribeiro Campos.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
Armando António Martins Vara.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Francisco Miguel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Ana da Graça Gonçalves Antunes. 
José Luís Correia de Azevedo. 
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Partido Comunista Português (PCP):
Jorge Manuel Lampreia Patrício. 
José Manuel Santos Magalhães. 
Maria Odete dos Santos. 
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida. 
Carlos José Machado L. Pereira. 
Eugênio Nunes Anacoreta Correia. 
José Miguel Nunes Anacoreta Correia. 
Pedro José Del Negro Feist.
Deputado independente:
Rui Manuel Oliveira Costa.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Cristóvão Guerreio Norte.
Daniel Abílio Feri eira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Limão de Andrade.
José Luís Bonifácio Ramos.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montai vão Machado.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Partido Socialista (PS):
António Cândido Miranda Macedo. 
António Domingues Azevedo. 
António Manuel de Oliveira Guterres. 
Carlos Manuel N. Costa Candal. 
João Cardona Gomes Cravinho. 
José Barbosa Mota. 
José Luís do Amaral Nunes. 
José Manuel Torres Couto. 
Manuel Alegre de Melo Duarte. 
Mário Manuel Cal Brandão. 
Rui Fernando Pereira Mateus.
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Partido Renovador Democrático (PRD):
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
Partido Comunista Português (PCP):
António Dias Lourenço da Silva. 
Carlos Campos Rodrigues Costa. 
Domingos Abrantes Ferreira. 
Joaquim Gomes dos Santos. 
José Rodrigues Vitoriano. 
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira. 
Henrique Manuel Soares Cruz. 
Hernâni Torres Moutinho. 
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Deputado independente:
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Os REDACTORES: Ana Afaria Marques da Cruz - José Diogo.
PREÇO DESTE NÚMERO: 72$00
Depósito legal n.º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.