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I Série - Número 64 Sexta-feira, 3 de Abril da 1987

DIÁRIO da Assembleia da República

PORTE PAGO

IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE ABRIL DE 1987

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto B. da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 10 horas e 35 minutos.

Deu-se conta dos diplomas entrados na Mesa.

Iniciou-se a apreciação da moção de censura ao Governo, apresentada peto PRD, com as intervenções do Sr. Deputado Hermínio Maninho, por parte do partido interpelante, e do Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva), por parte do Governo.
No debate que se seguiu intervieram, a diverso título, além do Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva) e do Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira), os Srs. Deputados Guerreiro Norte, Duarte Lima, Mendes Bota, Costa Andrade, Silva Morgues e Angelo Correia (PSD), Carlos Brito (PCP), António Capucho e Carlos Coelho (PSD), Hermínio Maninho e Sousa Pereira (PRD), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Lopes Cardoso e Jorge Loção (PS), Seiça Neves (MDP/CDE), Vasco Morgues, Ramos de Carvalho e Silva Lopes (PRD), Carlos Carvalhas (PCP), Manuel Alegre (PS), Vítor Ávila, Tiago Bastos e Magalhães Mota (PRD), Luís Capoulas (PSD), Vitorino Costa (PRD). lida Figueiredo (PCP), Morgues Júnior (PRD), António Guterres (PS), Agostinho de Sousa e Vítor Crespo (PSD), Ferraz de Abreu (PS), João Amaral (PCP) e Roberto Amaral (PRD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Vale.

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João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Assunção Marques.
José Augusto Limão de Andrade.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Crucho Esteves Robalo.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Hermínio da Palma Inácio.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Luís Saias.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José de Almeida Valente.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Mamei Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueira.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manjei Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto da S. Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
José Torcato Dias Ferreira.
Manuel Ferreira Coelho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.

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Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Filipe Neiva Correia.
Carlos José Machado L. Pereira.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Horácio Alves Marcai.
João da Silva Mendes Morgado.
José Luís Nogueira de Brito.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Alberto Sá do Rio.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro José dei Negro Feist.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
João Manuel Caniço Seiça Neves.

Deputados independentes:

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas entrados na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa as ratificações n.º 150/IV e 152/IV, a primeira da iniciativa do Sr. Deputado António Barreto e outros, do Partido Socialista, e a segunda do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros, do Partido Comunista Português, ambas dizendo respeito ao Decreto-Lei n.º 143/87, e as ratificações n.ºs 151/IV e 153/IV, da iniciativa, respectivamente, do Sr. António Barreto e outros, do Partido Socialista, e do Sr. Deputado Jorge Lemos e outros, do Partido Comunista Português, ambas dizendo respeito ao Decreto-Lei n.º 145/87, de 24 de Março. Foram admitidas as quatro ratificações.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ainda ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor:

Em reunião realizada no dia 2 de Abril de 1987, pelas 10 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:

Solicitada pelo Partido Socialista:

José Barbosa Mota (círculo eleitoral de Aveiro), por José de Almeida Valente. Esta substituição é pedida, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), para os dias 2 a 16 de Abril corrente, inclusive.
João Rosado Correia (círculo eleitoral do Porto), por Luís Silvério Gonçalves Saias. Esta substituição é pedida, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), para os dias 2 a 16 de Abril corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais;
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) - Henrique Rodrigues da Mata (PSD) - Mário Coutinho Albuquerque (PSD) -

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Carlos Cardoso Lage (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Jaime Manuel Coutinho Ramos (PRD) - Carlos Alberto Correia Rodrigues Matias (PRD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP).

O Sr. Presidente: - Está em discussão o relatório e parecer que acabou de ser lido, Srs. Deputados.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votá-lo. Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados vamos iniciar a apreciação da moção de censura apresentada pelo PRD.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Martinho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação de uma moção de censura é sempre um acto de particular significado. No contexto constitucional português, o facto de uma moção aprovada derrubar o Governo, a pausa de reflexão imposta, o impedimento da propositura, na mesma sessão legislativa, de outra moção aos proponentes de uma moção rejeitada são outros tantos índices de que se trata de um julgamento em que é pressuposta a possibilidade de condenação sem apelo de uma política.

Risos do PSD.

A perspectiva de queda do Governo só não existe quanto este dispõe da maioria parlamentar.
Um governo sem apoio majoritário é assim um governo vulnerável que, na sua acção política, não pode nem deve ignorar essa vulnerabilidade. Sobretudo quando a sua localização no espectro político não é tal que exclua a possibilidade de oposição maioritária de um ou outro dos lados.
Isto significa que um governo sem apoio maioritário, sobretudo um «governo descentrado», está sujeito, em qualquer momento, a ser culpabilizado por não ter sido capaz de gerar os necessários consensos capazes de garantirem a sua sobrevivência.
A lógica coerente de um partido de oposição, num parlamento em que um governo não disponha de apoio maioritário, pode assim manifestar-se, desde logo, em relação à legitimidade e à composição do Governo.
Por isso, três partidos de oposição, o Partido Socialista, o Partido Comunista Português e o MDP/CDE, propuseram de imediato moções de rejeição do programa do Governo, ainda que o Partido Socialista apenas tenha votado favoravelmente a moção de que foi proponente.
De modo diferente entendeu dever actuar o Partido Renovador Democrático. Ainda que minoritário, o Governo foi formado pelo Partido mais votado no último acto eleitoral. O PRD não inviabilizou a sua formação. Mas, desde logo, balizou a sua própria atitude e tornou claro o comportamento que do Governo esperava.
O PRD, disse-o então, iria apreciar pelos seus méritos cada iniciativa e esperava que o Governo fosse capaz de gerar e alargar consensos. O PRD não seria nem situação nem oposição tradicionais, mas alternativa, desenvolveria uma acção positivamente crítica da acção do Governo e não o manteria artificialmente.
O Governe foi formado porque o novo leader do PSD, Prof. Dr. Cavaco Silva, entendera que o interesse nacional é sempre o valor democrático mais importante, superando qualquer perspectiva que tudo condicionasse à estabilidade.
Assim, podido em causa «a maior maioria de sempre» que o bloco central constituía, o apoio social oferecido pelas confederações patronais e por uma das confederações sindicais, a excepcional colaboração dos trabalhadores no suportar dos gravíssimos sacrifícios que lhe foram exigidos por uma rígida política de austeridade e as próprias perspectivas de uma eleição presidencial acordada no interior do «bloco», isto é, pondo em ca asa a situação mais estável e conferindo maiores perspectivas de estabilidade, o Prof. Cavaco Silva e o PSD entenderam mais importante tudo quebrar para prometer a resolução dos grandes problemas estruturais cem que Portugal se confrontava.
Esta perspectiva de interesse nacional - colocado, como deve, no lugar não só prioritário como absoluto que lhe compete - só por si justificaria, no entendimento do PRD, que do interesse nacional tem esta mesma conceição, uma expectativa em relação ao comportamento do Governo. E justificaria que lhe conferisse, como conferiu, condições para actuar.
O PRD esperava, pois, e em primeiro lugar, que o Governo e o PSD assumissem, com responsabilidade e determinação, a necessidade, que oportunamente haviam invocado, de realizar as profundas transformações de que carece a sociedade portuguesa. Transformações que, minoritário como era o Governo, exigiam a procura sincera de consensos que o excedessem.
Do Governo poder-se-ia ainda espetar - e deveria esperar-se - que cumprisse as promessas feitas, designadamente que actuasse com rigor, competência e isenção.
O Prof. CE vaco Silva utilizou expressões nossas...

Risos do PSD.

Eu aproveito para beber água, Srs. Deputados!

Aplausos ao PRD.

Obrigado rela oportunidade!

O Prof. Cavaco Silva utilizou expressões nossas e também essa convergência poderia não ter mero significado eleitoralista, mas representar uma opção de fundo, por si só transformadora de boa parte da vida política portuguesa.
A estas expectativas, que o PRD entendeu - e preferia não te que admitir que «ingenuamente» - justificarem uma atitude crítica mas confiante, correspondeu o Governo, e em particular o Primeiro-Ministro, com actuações que, embora pontuais, permitiram ao PRD apreciar a sua acção como «globalmente positiva» e destacar, por forma elogiosa, a actuação governamental.
Durante um ano, o PRD, mantendo um comportamento exigentemente crítico e dando claro sinal em relação aquilo com que não pactuaria, permitiu ao Governo um clima de estabilidade que só o próprio Governo algumas vezes pôs em causa.
Assim, embora discordando da sua oportunidade e do seu fundamento, e não deixando de assinalar a falta de razão dos argumentos invocados, viabilizou ainda a própria moção de confiança colocada pelo Governo em Julho de 1986.

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Avisou-o solenemente em intervenção política com que fez o balanço da primeira sessão legislativa.

Aviso mais solene foi dado na II Convenção Nacional do PRD.

No discurso feito ao assumir a liderança do PRD, disse o general Eanes:

Não deseja o PRD eleições antecipadas, porque as considera nocivas à democracia e ao País. Mas que ninguém se iluda! Não temos dúvidas sobre as nossas forças, nem falta de confiança no resultado do nosso empenhamento.
Conte-se com o PRD para não promover crises artificiais e para tentar evitar que as que forem criadas por terceiros se avolumem. Não se conte com ele, nunca, para evitá-las, quando o preço a pagar fosse sacrificar princípios ou valores, ajoelhar a pressões ou ceder a interesses não genuinamente nacionais.

Aplausos do PRD.

Preocupa-nos que o Governo não tenha conseguido motivar suficientemente o investimento.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Essa é boa!

O Orador:

Aflige-nos que elevado número de empresas vá passando da inviabilidade financeira à inviabilidade económica.

O Sr. António Capucho (PSD): - É um espanto!

O Orador:

Magoa-nos que continuem a existir situações inadmissíveis de salários em atraso.
Preocupa-nos que a situação agrícola nacional continue sem solução económica e social globalmente capaz; preocupa-nos que a indústria se não estruture; preocupa-nos a fragilidade negociai portuguesa perante a CEE; preocupa-nos também a comunicação social portuguesa.
[...]
A suspeita da mentira ou da propaganda, a interpretação ou consideração de profissionais e meios de comunicação social como servidores do poder político ou do poder económico, ou ainda de facções ideológicas, retiram credibilidade à informação e ao comentário crítico e deixam a sociedade desprovida de linhas de compreensão e orientação sobre os acontecimentos quotidianos e sobre os projectos do futuro.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isso é um atestado de incompetência aos jornalistas!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O anúncio, pelo Governo, de que iria apresentar Grandes Opções do Plano a Médio Prazo foi um motivo de esperança no desenrolar da sua acção.
O Governo teve a oportunidade rara de encontrar não apenas uma conjuntura económica extremamente favorável - a mais favorável de sempre desde os anos 70 como de actuar na sequência de uma política de austeridade extremamente dura.
Ora, a preocupação, que o anúncio de um planeamento a médio prazo parecia significar, de não apenas gerir a conjuntura, mas a de a aproveitar para criar condições para que Portugal e os Portugueses pudessem ter um futuro melhor, mais digno e justo, parecia, só por si, uma boa notícia.
Acresce que, quando o PRD tomou conhecimento das grandes prioridades estabelecidas nas opções a médio prazo, elas se afiguraram ajustadas aos desafios da modernidade e plena inserção na Europa com que a sociedade portuguesa se defronta.
Simplesmente, quando se pôde conhecer o texto das Grandes Opções, verificou-se que não correspondia, minimamente, à expectativa favorável gerada.
Só que o Governo, em vez de discutir as opções a médio prazo, de procurar o seu debate aprofundado, de se sujeitar à crítica, preferiu a saída fácil de impedir essa discussão e confrontar-se com alternativas globais ou sectoriais.
O Governo retirou a proposta de lei que continha as Grandes Opções do Plano a Médio Prazo.
Tal posição do Governo independentemente de se atribuir boa ou má fé ao facto de as opções retiradas do debate público aparecerem posteriormente como orientação interna do Governo- é, por si só, significativa de um posicionamento perante a sociedade e a democracia.
O Governo não teve a coragem das escolhas de futuro!
Isto significa, quanto ao seu comportamento como poder, que acima de tudo lhe importa guardá-lo a todo o custo.
O poder não é usado a bem de todos os portugueses, mas utilizado como instrumento em benefício de alguns.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Escolher o futuro significa enfrentar corajosamente os grandes interesses económicos que à nossa escala se movimentam, em vez de os manter na expectativa colaborante que o adiamento das questões permite.
Utilizar o poder, servir-se o poder numa conjuntura económica favorável, é agravar o eleitoralismo e o imediatismo, a eles sacrificando o futuro.
É ainda, e numa palavra, tentar perpetuar, em forma actualizada, a «caricatura» democrática que é a do nosso século XIX: tentar que, em vez de as eleições criarem governos, sejam os governos a fazer eleições para se consagrarem.

Aplausos do PRD.

O significado político da recusa do PRD em votar favoravelmente as Opções do Plano para 1987, documento apressadamente elaborado e sem qualidade, ultrapassou, por isso, e claramente, o voto contra uma proposta de lei. É que o Governo assumiu-se então como mero gestor de conjuntura. Por isso, o PRD sublinhou que, com esta atitude e a retirada das opções a médio prazo, o Governo não merecia a nossa confiança.
Assim, foi publicamente explicitado que o PRD votaria contra uma moção de confiança que o Governo viesse a apresentar.
Ao mesmo tempo, ao Partido Socialista foi dito que poderia dispor do necessário apoio para, assumindo os

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desafios que a situação política e económica do País coloca à esquerda democrática, tomar a iniciativa de uma alternativa.
Perante o País foi também tornado público que o PRÓ apoiaria uma solução governativa alternativa ao actual Governo.
Assim, a apresentação de uma moção de censura ao Governo tem uma coerência sequencial cuja lógica temporal não oferece dúvidas. Apenas surpreende que ela possa ser encarada com surpresa.
Por tudo isto, nem a apresentação da moção de censura foi um acto precipitado, desesperado ou sem sequência lógica, nem, sem hipocrisia política, pode assim ser considerada por outras forças políticas.
Houve a coragem que as circunstâncias exigiam. É tudo.

Vozes do PSD: - Acabou, Sr. Deputado?!

O Orador: - Sei que é difícil ouvir as verdades, mas ainda não terminei.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Com essas verdades ainda chega a profeta!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação de uma moção de censura por parte do PRD tem a ver com a própria coerência do Partido, com a sua própria matriz genética.
O PRD constituiu-se para introduzir na vida política portuguesa uma nova prática e moral, para que o rigor, a competência e isenção fossem assumidos como critérios prioritários de apreciação.
Teria sido fácil que o PRD se instalasse no conforto do seu resultado eleitoral de Outubro de 1985, actuando, como os outros, em oposição sistemática.
Bem ao contrário, o PRD deu um prazo ao Governo.
Terminado o prazo, considerando que o Governo não serve, seríamos como os outros, se nos limitássemos a dizê-lo.
O que seria estranho é que quem votou contra a constituição do Governo, contra a moção de confiança por este apresentada e contra o Orçamento ainda achasse inoportuna uma moção de censura.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: No recordar do posicionamento do Partido Renovador Democrático que venho fazendo, justificar-se-á ainda um breve apontamento sobre o comportamento do Governo quando da deslocação de uma missão parlamentar à URSS. E tanto importaria que o País visitado fosse este ou outro qualquer.
Foi, dissémo-lo, o momento imediatamente antecedente da nossa decisão.
É, que, independentemente do facto de o Governo, a quem cumpre conduzir a política externa do Estado, ter preparado mal uma visita da Assembleia da República, cuja delegação era chefiada pelo seu Presidente, o que ressalta como inadmissível é o comunicado público emitido pelo Governo.

Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Quem sente a sua Pátria e sabe o significado de a representar condignamente não pode deixar de verberar o comportamento do Governo face a uma delegação parlamentar portuguesa no estrangeiro.
Como se tal não bastasse, o Governo, que com o Parlamento tem na estrutura constitucional portuguesa a especial relação que está na base das moções de confiança e de censura, após ter visto a sua conduta reprovada por um voto de protesto subscrito e votado por deputados de todos os grupos parlamentares -à excepção do PSD -, não teve a dignidade democrática elementar de pretender ser ele próprio a saber se ainda conserva a confiança do Parlamento.
Acrescento, ainda neste momento de intervenção, uma explicação que, em boa razão, seria desnecessária.
A moção de censura não é, obviamente, contra o Presidente da República.

Risos do PSD.

Mantenham-se calmos, Srs. Deputados!
Na situação da normalidade democrática que felizmente se vive em Portugal, o Presidente da República pôde, sem problemas, cumprir a missão de Estado que constitui a sua ida ao Brasil.
Mas o PRD teve o cuidado de informar antecipadamente o Sr Presidente da República da sua decisão de apresentar uma moção de censura ao Governo.
Só depois seria informado o Sr. Presidente da Assembleia da República e, após este, todos os presidentes dos grupos parlamentares representados na Assembleia da República.
Mas ainda: a apresentação formal da moção foi diferida no tempo, de modo que a sua votação só se efectivasse na/espera do regresso do Presidente da República, calendário este acertado com o Sr. Presidente da República.

Aplauso do PRD.

Dizer-se que a moção de censura é contra o Presidente da República tem subjacente a ideia de que o Sr. Presidente da República, ultrapassando os seus poderes constitucionais, pretenderia intervir no debate antes de este se processar e, designadamente, influenciar a posição do Partido Socialista.
Trata-se, por conseguinte, de uma perspectiva que o Dr. Mário Soares e o Dr. Vítor Constando haveriam, no mínimo, de ter por pouco lisonjeira.
Só se estranha, por isso, que tal hipótese seja invocada por pretensos amigos do Dr. Mário Soares e proclamada por alguns intelectuais que à análise ou comentário político se dedicam.

Aplausos do PRD.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Certo é que já Raul Proença escrevia:

Simplesmente, os intelectuais do nosso tempo, pouco seguros na sua razão crítica e mais nobres na aparência do que na realidade [...], levaram longe demais, essa reacção e excederam os limites que uma exacta visão das coisas lhes consentia. Não esclareceram o povo, abandonaram-no, desertaram a causa que deviam enobrecer. Procederam, também eles, como puros instintivos, como homens de reacções exclusivamente medulares, a quem falta equilíbrio, a claridade, a força ponderadora da razão.

Aplausos do PRD.

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A moção de censura também não se dirige contra o PS.

Vozes do PSD: - Não!

O Orador: - Folgo que estejam de acordo comigo!
Ao PS cabe a responsabilidade democrática de se pronunciar, pelo voto, face à moção apresentada.
O PS não foi consultado previamente.
Nem tinha de o ser, como o PRD o não foi nem tinha de o ser em relação aos tempos e modos de intervenção definidos pelo PS.
Aliás, se tivesse havido consultas prévias, haveria ou uma moção conjunta ou a aceitação de posições alheia;, renunciando às escolhas próprias ou fingimento do abandono de posições para as impor, enganando os parceiros, fórmulas todas elas pouco consentâneas com o próprio espírito constitucional e com a transparência e lealdade democráticas.

Aplausos do PRD.

Também tal crítica parece pressupor um estatuto que não pode deixar de recusar-se: a de que só o PS tinha «direito» de apresentar uma moção de censura quando o entendesse oportuno.
Mais ainda: o que esta crítica pressupõe é que uma moção de censura se coloca no tempo mais adequado de acordo com o interesse partidário.
O PRD pensa que o tempo adequado é aquele que interessa ao País.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Duas outras questões têm sido formuladas também e não pretendemos ocultá-las.
A primeira é a de saber se a moção de censura não vai gerar instabilidade.
Forçoso será interrogarmo-nos sobre se, no nosso passado histórico recente, não vivemos demasiado o império desse argumento.

Aplausos do PRD.

Como escreveu ainda Raul Proença: «a estabilidade não pode dar virtudes a quem as não tem».

Aplausos do PRD.

«A estabilidade vale o que valem os governantes - boa, se os governantes são bons, má, se são maus.»
Quem duvida, mesmo entre os adeptos da estabilidade, quando lhes convém - já que nunca a invocam quando oposição...

Aplausos do PRD.

... que «quanto mais tempo um mau governo se conserva no poder, tanto pior para o País»? Estabilidade sim, mas estabilidade democrática acima de tudo!
A derradeira questão é a de alternativa.
A ideia da moção de censura construtiva não existe no nosso sistema constitucional. É inútil, a não ser em sede de revisão, querer especular sobre os seus méritos. Pior é pretender exigi-la, como se outros fossem os preceitos constitucionais vigentes.
No quadro constitucional actual há dois momentos na moção de censura. O momento da sua apresentação responsabiliza os proponentes e só estes. O momento da sua votação corresponsabiliza de um modo os apoiantes, de outro quantos a rejeitaram. Não antecipemos o tempo. A História fará a História.
Apenas importa salientar que, em democracia representativa, o Parlamento é o único representante do povo no tempo que medeia entre cada acto eleitoral. A sua legitimidade é plena. Por isso, as soluções encontradas no seu âmbito são tão válidas como o seriam no dia imediato ao da realização de eleições ou na véspera de nova consulta.
A representatividade de um parlamento é a que o povo lhe conferiu.
Ninguém, em democracia, se pode substituir à soberania popular para pôr em causa tal responsabilidade.

Aplausos do PRD.

Como no requerimento para abertura deste debate referimos, em nossa opinião, a moção de censura que propomos justifica-se pela análise da prática governativa, isto é, pela execução do seu programa, e em relação a assuntos relevantes de interesse nacional, para utilizar a própria linguagem constitucional.
É a esta análise que procurarei seguidamente proceder, com a profundidade compatível com as limitações de tempo de intervenção com que nos defrontamos.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao mencionar os bons resultados da sua política económica, o Governo refere-se, essencialmente, à baixa da inflação e ao arranque do investimento. Considera um resultado brilhante uma baixa de seis pontos na taxa de inflação. De igual modo, apresenta um crescimento real do investimento de 8% como o começo do fim de todos os bloqueamentos que têm travado o desenvolvimento da nossa economia.
Não se nega que a evolução destas duas variáveis tenha sido positiva.
O que se considera é que é bem pouco para um governo que recebeu a economia num momento de viragem, depois de três anos de uma política económica muito dura que penalizou fortemente as camadas mais desfavorecidas da nossa população, e para um governo que actuou num contexto internacional tão favorável que todos os especialistas concordam que dificilmente se repetirá.
Diz o Governo que outras economias tiveram piores comportamentos, apesar do enquadramento exterior ser o mesmo.

O Sr. António Capacho (PSD): - E é verdade!

O Orador: - Ignorará o Governo que a reacção de uma economia aos estímulos exteriores depende da situação interna à data em que tais estímulos se fazem sentir?
A economia portuguesa saiu, ainda em 1985, de um período de profunda recessão, originado pela política de défice externo adoptada a partir de 1982. E a esta luz que deve ser avaliado o comportamento da nossa economia em 1986.
A queda de seis pontos dos preços conseguida no ano que passou é positiva, sem dúvida, mas tem de ser avaliada tendo presente que, em 1985, estes já tinham caído dez pontos - se os preços desceram 327o em 1986, já haviam caído 35% em 1985.
O Sr. Primeiro-Ministro deve essa homenagem elementar à verdade e ao Dr. Ernâni Lopes.

Aplausos do PRD.

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As expectativas inflacionistas dos agentes económicos quando o Governo iniciou funções haviam sido decisivamente influenciadas pelo comportamento dos preços.
O aumento do investimento de 8% ou 9% em termos reais deve, por sua vez, ser avaliado à luz do comportamento desta variável nos anos anteriores. Entre 1983 e 198S o investimento havia entre nós caído quase 30%. Será que, depois de uma tal evolução, em que nem sequer foi concretizado muito investimento de substituição, 9% são um sucesso tão espectacular? Quando se sabe que o investimento privado se quedou mesmo abaixo deste número, negando objectivamente o que o Governo vem afirmando?
Depois de ter encontrado a economia em fase de recuperação de uma recessão profunda e num ano em que:

O preço do petróleo caiu e com ele o de muitas matérias-primas que importamos - o que, para além de permitir poupar muitas divisas, levou aos cofres do Estado novas receitas pela via dos impostos sobre combustíveis;
O dólar norte-americano desvalorizou pesadamente, enquanto os juros internacionais caíam - o que permitiu ao Estado poupar milhões no serviço da dívida externa;
Foi lançado o IVA, imposto que havia, aliás, sido preparado ainda na vigência do anterior governo - o que permitiu ao Governo arrecadar vultosas receitas adicionais;
Começaram a ficar disponíveis ajudas comunitárias dirigidas a diversos sectores de actividade;
A adesão à CEE não deixou de aumentar a nossa credibilidade financeira, contribuindo para potenciar uma melhor imagem externa, que, aliás, já resultava da recuperação financeira a nível da balança de pagamentos.
Neste prolongado contexto de factores excepcionalmente favoráveis, que haveria de acontecer a um país de economia aberta ao exterior, gravemente dependente do estrangeiro, que tinha atingido o fundo de um ciclo de contracção económica e de empobrecimento excepcionalmente severo?
A economia portuguesa só podia ter manifestado sinais de alguma melhoria.
É decepcionante que o Governo se considere satisfeito com esses resultados, os quais, em boa pane, se lhe não devem; que se atribua, com total desembaraço, o mérito de um renascer da confiança dos agentes económicos, manifestada tão-só na retoma do investimento tornada inadiável para repor uma erosão dos stocks de bens de capital, que se tinha processado em escala gravíssima para um país carente de desenvolvimento rápido - e, mesmo assim, de expressão bem modesta face à base de referência por que vem medida.
Onde estão as anunciadas acções dirigidas às causas estruturais do défice da balança de transacções correntes? Onde estão os sinais convincentes de redução do desemprego, cuja permanência, em nível muito elevado, é a mais eloquente demonstração de que o investimento tem sido, predominantemente, de mera reposição e não de confiante criação de novas unidades produtoras de riqueza? Onde estão os resultados da aposta inequívoca na iniciativa privada? Como justificar, em clima tão favorável, que o anunciado ataque à situação dos salários em atraso tenha produzido tão magros frutos?
A estratégia de progresso controlado que o Governo anunciava ter escolhido, em nome dos Portugueses, traduzia-se (está escrito no Programa) «num enorme esforço de investimento produtivo orientado para a correcção estrutural do défice externo e para a criação de muitos postos de trabalho», esforço que o Governo tinha a certeza de ser feito pelas empresas portuguesas, em resposta à política que se propunha executar.
Ò que preocupa o PRD é que, apesar de serem óbvios os factores que, externamente ao Governo, contribuíram para a melhoria da situação conjuntural, este se esteja a esgotar num gigantesco esforço de auto-elogio sem assumir, com um mínimo de humildade política, o vazio de que se tem revestido a sua actuação em área;, estratégicas vitais da nossa realidade económica e social.
Se, em relação à inflação e, menos, no que respeita ao investimento, se icconheceu uma evolução positiva em 1986 mas em que o mérito do Governo terá de ser objectm mente avaliado, no que respeita à resolução e supressão dos problemas que bloqueiam o nosso desenvolvimento -, ral acção ou foi inexistente ou contraditória e não raras vezes negativa.
Passado ano e meio de acção do Governo, ultrapassada que foi a linha correspondente dos primeiros doze meses, tornou-se patente a sua incapacidade para propor ao País políticas coerentes e articuladas dirigidas à resolução e ultrapassagem dos graves problemas que nos afectam.
Incapacidade política para o diálogo, para a procura fecunda de consensos.
Mas, igualmente, incapacidade técnica em áreas de extrema importância -indústria, agricultura, educação, saúde, defesa, negócios estrangeiros -, incapacidade que tentava esconder por trás de uma constante manipulação da informação e de uma atitude de permanente desafio e arrogância.
Não se esperava, naturalmente, do Governo que num ano e meio resolvesse problemas e dificuldades estruturais, mas eia de lhe exigir que procurasse aproveitar as circunstâncias excepcionais que encontrou para criar um quadro favorável ao lançamento de políticas sectoriais e globais, coerentes e articuladas, capazes de fazer avançar o nosso sistema económico no caminho do crescimento e do desenvolvimento económico e social.
A economia está a ver passar e desperdiçar um período de ouro. E tempo de reconhecer que a política económica do Governo se quedou aquém do que teria sido possível e era legítimo esperar. Sabemos que seria cedo para ver resultados concretos de um programa de alcance estrutural. Não o é, todavia, para afirmar que nenhuma estratégia está em marcha, que as acções de estímulo à formação de capital orientado para a diversificação e modernização do aparelho produtivo português não foram lançadas, que os sinais de melhoria não passam dos efeitos quase automáticos dos estímulos conjunturais sobre um aparelho produtivo, na sua generalidade ultrapassado, cansado, obsoleto e inadequado.
Quando passar o tempo de bonança de que o Governo se tem aproveitado, desaproveitando-o, iremos encontrar-nos de novo com os mesmos estrangulamentos: na nossa dependência do exterior; na vulnerabilidade de um aparelho industrial excessivamente baseado em actividades tradicionais e já não europeias; num sector agrícola pura e simplesmente arcaico e inteiramente desprotegido face às Comunidades.

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Para quem, como os Portugueses, já não tinha tempo a perder, mesmo tendo de defrontar circunstâncias adversas, perder tempo em circunstâncias favoráveis é imperdoável.
Sabemos que o Governo não preza o sector empresarial do Estado, sabemos que gostaria de ver esse sector, em grande parte, desmantelado e reprivatizado. Essa é, porém, uma questão que não compete ao Governo, por si só, resolver. E, enquanto ela não foi democraticamente resolvida em sede própria, não pode permitir-se que o Governo se demita de exercer uma parte importantíssima dos seus deveres como poder executivo - fazer gerir bem o sector empresarial público.

Aplausos do PRD.

A continuada degradação da situação económica de tantas empresas públicas, para as quais o próprio Governo não deixou, expressamente, e nomeando-as, de reconhecer a necessidade de rápidas acções saneadoras e reestruturantes, é outra clamorosa manifestação de incapacidade - se não for, mais grave ainda, uma atitude de má fé, calculada e sabotadora.

Aplausos do PRD.

Ao fracasso da política do Governo junto dos agentes económicos junta-se o incumprimento de promessas programáticas, cuja realização só do Governo dependia. Por exemplo, a de que o Orçamento do Estado passaria a ser um orçamento de verdade. Os dois debates realizados nesta Câmara sobre propostas orçamentais do Governo provaram-no à saciedade...
E só o trabalho aqui realizado, sobretudo o que se desenvolveu nas comissões especializadas, permitiu algum progresso nesse sentido. Tivemos orçamentos mais verdadeiros - mas não é ao Governo que o País o deve.

Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

Para além do aproveitamento eleitoralista da situação conjuntural, o Governo criou um quadro minimamente adequado à resolução dos nossos grandes problemas.
Dizendo-se apologista dos mecanismos de mercado, não raras vezes adoptou medidas contraditórias. Dizendo-se respeitador das expectativas, modificou o capital exigível e recém-fixado das instituições bancárias novas, sem uma explicação credível. Afirmando-se rigoroso e competente, não avançou um milímetro na formulação de soluções capazes de travar a progressiva desagregação e enfraquecimento de muitas empresas públicas ou nacionalizadas.
No ano em que aderimos à Comunidade Económica Europeia e em que começou a contagem decrescente para o desmantelamento das últimas barreiras e protecções que se opõem à livre entrada de produtos provenientes dos outros países membros, não foi criado um quadro de política económica susceptível de enquadrar e apoiar a nossa reconversão industrial e a reorganização das actividades agrícolas.
No plano das contas públicas os problemas mantiveram-se, apesar das receitas adicionais com que o Governo pode contar.
Um dos pontos, aliás, mais evidentes da falta de orientação política financeira do Governo liga-se à sua incapacidade para delinear uma estratégia global e coerente de ataque aos problemas que estão a enfraquecer o sector público não administrativo.
Política financeira, que, em vez de estabelecer um quadro claro de referência para as decisões dos agentes económicos, se tem ficado pelo anúncio de medidas avulsas, decididas com o objectivo de delas tirar o maior partido político sem cuidar dos seus efeitos sobre a economia.
No plano do sistema bancário, continua por definir uma actuação concertada sobre o conjunto dos bancos nacionalizados. Sabendo-se que alguns dos bancos se debatem com desequilíbrios financeiros que urge ultrapassar, quais as medidas que o Governo tem anunciado?

Aplausos do PRD.

Legisla o desaparecimento dos chamados «juros à cabeça» e adopta apenas uma taxa máxima activa.
Sabendo que são medidas que, embora em si mesmas positivas, podem contribuir para deteriorar a já enfraquecida situação financeira de vários bancos, o Governo tem vindo a permitir que estes penalizem fortemente o pequeno e mais modesto aforrador.
Os pequenos depósitos a prazo são penalizados; é-lhes atribuída uma remuneração menor que penaliza, exactamente, os mais modestos depositantes. Esta prática generalizou-se a todo o sistema bancário numa tentativa inaceitável de fazer assentar sobre as famílias mais modestas e com menor capacidade para poupar os custos da travagem - da travagem, que não da resolução e ultrapassagem - do processo de enfraquecimento financeiro dos bancos nacionalizados.
Afirmando que pretende acabar com os abusos de utilização da legislação de emigrantes abusos que, de facto, existiam, mas que não eram de emigrantes na maioria dos casos -, o Governo anunciou novo quadro regulamentar para as contas que podem os nossos compatriotas manter junto dos seus bancos locais. Depois de muitos meses de bloqueio das contas-poupança dirigidas à aquisição de habitação por parte dos emigrantes, com enormes prejuízos para muitos deles, o Governo faz sair um novo quadro regulamentar que, não resolvendo grande pane dos problemas da anterior legislação, está a criar novas dificuldades.
Em Janeiro, é anunciado, com grande esforço propagandístico, que, com o objectivo de favorecer o investimento, o crédito dirigido a investimento, a mais de S anos, passaria a ser desenquadrado. Tal quereria dizer que o crédito concedido pelos bancos para investimento produtivo passaria a não estar limitado. Um mês depois, sem qualquer explicação credível, o Governo volta atrás e este crédito é de novo enquadrado.
Estes exemplos pretendem apenas ilustrar o que têm sido as contradições, o que é a falta de uma política articulada e global de intervenção sobre o sistema bancário.
No que respeita ao mercado de capitais, todos temos presentes as palavras pronunciadas pelo Sr. Primeiro-Ministro há algumas semanas. Segundo ele, o que se passava na Bolsa era uma autêntica revolução financeira que a oposição não queria reconhecer. Pela Bolsa passa uma modestíssima percentagem dos financiamentos dirigidos à actividade económica. Mas o certo é que, passados poucos dias, o Governo, pelos vistos incapaz de dotar a Bolsa com um mínimo de condições técnicas e operacionais, teve de autorizar o seu encerramento.

Aplausos do PRD.

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No que respeita à política industrial, só não será possível apresentar contradições pela simples razão que, neste campo, o Governo não tem sequer procurado esconder - não se sabe se deliberadamente, se por incapacidade ou inviabilidade - a completa ausência de orientação e de estratégia.
Nas poucas intervenções em que o Sr. Ministro da Indústria é tentado ou forçado a referir-se à política industrial, fica-se por um desarticulado somatório de afirmações, como se esperasse que a tão celebrada «mão invisível» resolvesse os estrangulamentos evidentes

Aplausos do PRD.

Aqui a situação é sem dúvida particularmente grave, assumindo mesmo foros de escândalo no momento em que aderimos à CEE e rapidamente desaparece o período em que alguns sectores industriais ainda gozarão de alguma protecção.
Apesar de a espinha dorsal da nossa indústria ser formada por pequenas e médias empresas, utilizando tecnologias ultrapassadas, descapitalizadas na sua maior parte, produzindo em sectores tradicionais com mercados internacionais muito saturados, com uma estrutura financeira muito enfraquecida, o Governo não se preocupou, até hoje, com a criação de condições capazes de auxiliar a sua reconversão e organização.
Não foi até hoje lançado pelo Governo nenhum processo sistemático de informação dos pequenos e médios empresários relativamente às dificuldades técnicas, financeiras e de marketing que terão de enfrentar.
O Governo limita-se a manipular instrumentos macro-económicos, baixando as taxas de juro e introduzindo de forma muito nítida outros incentivos. Sendo medidas positivas, não são suficientes face às distorções, desequilíbrios e atrasos enfrentados por muitas das nossas empresas industriais que dentro de algum tempo terão de enfrentar a dura competição de indústrias poderosas. A não ser que o Governo nos quisesse especializar na produção de vestuário, têxteis e calçado, copiando modelos de economias subdesenvolvidas e deste modo condenar os trabalhadores portugueses a salários muito abaixo da média europeia.

Aplausos do PRD e do MDP/CDE.

A nível da agricultura a situação é ainda mais grave, dada a debilidade deste sector.
Não se conhece uma política para a agricultura que procure, de forma articulada e equilibrada, atacar os problemas que afectam este sector. Problemas que, como todos sabemos, são diferentes no Norte, no Centro e no Sul e pedem soluções específicas.
Apesar de algum pequeno esforço do Ministério da Agricultura nos últimos meses para informar os agricultores sobre esquemas de ajuda a que podem recorrer, despendido, aliás, na sequência de pressões da opinião pública face à completa inoperância neste domínio, o panorama continua a ser caracterizado pela desarticulação e inoperância.
Os gigantescos serviços do Ministério, espalhados tentacularmente pelo País, são de uma ineficácia inacreditável. Sabem-no, e sabem-no dolorosamente, todos os agricultores que a eles tentam recorrer.

Aplausos do PRD.

Tendo Portugal assumido, no âmbito do processo de adesão, compromissos importantes no que diz respeito à evolução interna dos preços agrícolas, impunha-se o lançamento d; uma discussão aprofundada e alargada, a conduzir com os agricultores de todo o País, de modo a tirar de tais compromissos as consequências que não deixarão de ser sobre muitas produções da nossa agricultura.
Repete-se que tentativas pontuais feitas por entidades públicas ou privadas e dirigidas à discussão de alguns problemas não são senão a excepção à regra - e esta é a da ausência de uma política global que procure encaminhar a nossa agricultura para níveis mais próximos dos de outros países europeus.
A não ser que, também aqui, o Governo espere que a «mão invisível» venha, num período mais ou menos longo, seguidamente depois da desertificação de muitas áreas rurais, resolver tais problemas.
Uma política agrícola tem que avançar de uma forma concertada instrumentos distintos, desde os mecanismos e os recurso» financeiros mais adequados à ultrapassagem de muitos bloqueamentos até ao tratamento fiscal mais consentâneo com o nosso actual nível de desenvolvimento, até à preparação profissional e à reciclagem dos nossos agricultores.
A situação atrasada e débil da nossa agricultura quase impõe a adopção de um programa de emergência capaz de articular esforços e fazer corrigir vontades na busca de soluções viáveis.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governei, Srs. Deputados: Também, no âmbito do nosso processo de adesão à Comunidade Europeia, a actuação de Governo é passível das maiores e mais fundadas críticas.
Na verdade, o propagandeado saldo positivo de 30,4 milhões de contos não só ficou aquém, em cerca de 25%, do vigor (40 milhões) que o próprio Governo nos tinha apresentado no Orçamento para 1986...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Esse número está errado!

O Orador: - ... como é apenas cerca de 60% dos valores que a Grécia e a Irlanda obtiveram em idênticas circunstâncias; no domínio industrial o Governo não conseguiu, até hoje, garantir um financiamento específico comunitário para o PEDIP.
Tendo representado este programa em Fevereiro do ano passado, no âmbito do protocolo do tratado de adesão, conduziu tão mal as negociações que a determinada altura chegou a pensar-se, nos meios próximos da representação portuguesa junto das Comunidades, que o Governo tinha abandonado esta proposta.
Teve que ser o Parlamento Europeu a apoiar o PEDIP para que o mesmo não fosse abandonado. Foi, aliás, por iniciativa do PRD que a Comissão de Economia e Política Industrial decidiu incluir no parecer sobre o Orçamento para 1987 uma rubrica específica destinada ao PEDIP.
A negociação do respectivo montante cabe no âmbito das atribuições do Governo, desconhecendo-se quais as diligências que o mesmo tem efectivado para negociação de uma verba suplementar específica - e significativa - para o PEDIP.
Também no sector agrícola deixaram-se por utilizar os apoios estruturais de que a lavoura portuguesa podia ter beneficiado. Um caso flagrante é o do próprio

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PEDAP - Programa Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa -, cujo regulamento, tendo sido aprovado pelas Comunidades em 20 de Dezembro de 1985, só muito recentemente veio a ser incluído na legislação portuguesa. Assim, não só não se conseguiu a média anual dos 70 milhões de ECUs previstos no PEDAP como nem sequer se utilizou um tostão dos 33 milhões orçamentados para 1986.

Aplausos do PRD.

Para cúmulo, as próprias ajudas de pré-adesão para o Programa Específico da Melhoria em Estruturas Agrícolas e das Acções Preparatórias de Adesão continuam por utilizar a níveis quase chocantes: na ordem dos 8% e 25%, respectivamente.
Portugal vai pagar 3,2 milhões de contos para ajudar o financiamento do escoamento dos excedentes de manteiga, porque, quando a questão foi decidida a nível do Conselho de Ministros da Agricultura, Portugal não tomou, como a Espanha, uma posição frontalmente contra. Só mais tarde, depois da decisão estar tomada, veio a tomar posição contra no ECOFIN.
Já esta semana o Governo veio a pronunciar-se contra a imposição de uma taxa sobre as matérias gordas, mas omitindo que a contrapartida seria um aumento das ajudas aos milhares de pequenos olivicultores e a criação de uma oportunidade de reconverter a produção cerealífera através da promoção de oleaginosas, como o cártamo e o girassol.
Também ao nível da contratação de funcionários portugueses para as instituições comunitárias, a actuação do Governo tem sido desprovida de qualquer sentido estratégico, dando primazia a práticas de favoritismo partidário e pessoal.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se o Governo dispõe de uma política de desenvolvimento, certo é não ter ela contribuído para um mais efectivo aumento da riqueza nacional, para uma distribuição com mais justiça, deixando de penalizar os que até agora têm sido os mais sacrificados.
A acção deste Governo tem-se pautado também no sector da saúde pelo autoritarismo e arbitrariedade.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Quais foram os resultados de tantas inspecções? Melhoraram os serviços como deveria ser pretendido e algo foi corrigido?

Risos do PSD.

Devem ser os únicos a dizer que sim!

Aplausos do PRD.

Tudo redundou em autoritarismo demagógico, agitação gratuita e em inutilidade.
Quanto à arbitrariedade, ela tem tido uma expressão constante nas nomeações de dirigentes que têm sido feitas, tanto para as administrações regionais de saúde (ARS) como para as comissões instaladoras dos hospitais. Nuns casos e noutros, tais nomeações têm sido todas, quase sem excepção para confirmar a regra, nomeações político-partidárias.
Esta apetência para a nomeação discricionária teve o seu apogeu com a famigerada lei da gestão hospitalar, que permitia à Ministra da Saúde nomear todos os órgãos de gestão e de direcção dos hospitais. Eram algumas centenas de lugares que iriam satisfazer as clientelas do partido do Governo.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Também isto, Sr. Primeiro-Ministro, a par do que se passa no sector público, são provas evidentes do clientelismo desenfreado em que vão sendo ocupados todos os lugares da Administração.
Ao autoritarismo, arbitrariedade e ilegalidade junte-se a vacuidade da acção deste Governo no sector da saúde. Depois de tanta agitação e publicidade nos órgãos de comunicação social, nenhuns resultados concretos e positivos se conseguiram.
Tem-se por adquirido que o nosso sistema de regimes de segurança social é complicado pela existência de diversos regimes especiais, quer quanto às questões definitivas, quer quanto às imediatas.
Por isso o Governo havia prometido diminuir progressivamente o seu número, aproximando gradualmente os regimes especiais do geral e os regimes de pensões entre si. O Governo sabia que era indispensável simplificar o sistema; contudo, nada fez.
Quanto à fiscalidade contra a evasão contributiva, nada foi mudado.
Quanto à luta anunciada contra o acesso indevido a prestações, o Governo limitou-se a atacar pontualmente os sintomas, não tendo feito nada para eliminar as suas causas.
O planeamento continua centralizado e divorciado das realidades concretas dos distritos. Há sintomas inquietantes de desmoralização dos funcionários, fruto de ausência de políticas de motivação e participação, de falta de comunicação descendente, da inquinação das regras de selecção de pessoal dirigente, cada vez mais escolhido por critérios de ordem partidária.

Aplausos do PRD e do PS.

Abandonou-se a política de informatização; fez-se a junção irresponsável de organizações do sistema, com culturas diferenciadas, sem o cuidado de o fazer de forma programada, mas decidindo ao sabor de pressões sectoriais, prejudicando cidadãos e funcionários. Nestes processos de fusão caótica, assistiu-se mesmo à decisão do Secretário de Estado da Segurança Social de mandar dezenas de funcionários do Gabinete de Gestão do Fundo de Desemprego para casa, com despesas pagas pelo Estado.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - É um escândalo!

O Orador: - Quanto à prometida humanização do sistema, o que se observa é: uma regressão da política de informação da Segurança Social, assistindo-se à sistemática substituição de uma legítima política de relações públicas, destinada a tornar o sistema mais transparente, por uma política de propaganda destinada a deformar a realidade através da pseudo-informação; a continuação de uma acção social, a quem não são fornecidos meios para uma intervenção comunitária eficaz, limitando-se muitas vezes à acção casuística.
Mesmo relativamente à acção casuística, observavam-se diversos sinais de que os escassos recursos são mal distribuídos: as queixas de diversos IPSS, acusando os conselhos directivos dos centros regionais de segurança social de distribuírem dinheiros com critérios de ordem ideológica, dão disto testemunho.

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Outro sinal inquietante do relacionamento incorrecto das estruturas da Segurança Social com a as instituições é a ausência de meios de tutela técnica disponíveis, quer relativamente às IPSS, quer aos estabelecimentos com fins lucrativos. O resultado disto são os velhos e os deficientes a servirem de meio de enriquecimento de alguns cidadãos.

Aplausos do PRD.

No âmbito das medidas contra a pobreza, pouco ou nada se fez e não se registaram melhorias na nossa política social relativamente aos trabalhadores emigrantes.
No seu Programa, disse o Governo - e passo a citar - atribuir «à modernização da agricultura um carácter prioritário, e é dentro deste espírito que o Governo elaborará e implementará, a curto prazo, com a participação dos produtores e suas organizações, um programa de emergência que constitua um quadro claro para a orientação da actividade agrícola, pecuária e florestal». E continuo a citar. «Neste programa será definida a natureza, a origem e a repartição dos apoios institucionais, técnicos e materiais, em função das prioridades que serão estabelecidas em relação às diferentes regiões, actividades, explorações, sistemas e tecnologias de produção.»
Onde está o prometido programa, para mais de emergência?
O Governo mostra total incapacidade para conceber e executar uma política agrícola de fundo. O Governo não tem uma política agrícola nacional explícita e clara, como, obviamente, não tem uma estratégia transparente e eficaz que lhe dê concretização.
Na prática, o Governo limita-se a traduzir em acções de âmbito nacional, e por vezes com erros grosseiros de gramática política, económica e técnica, as decisões e orientações comunitárias da política agrícola comum.

Aplausos do PRD.

O que deveria constituir um quadro referencial de parâmetros e variáveis à concepção e execução da nossa, repito, da nossa, política agrícola, transformou--se no substituto efectivo dessa mesma política agrícola.
Em agricultura é sabido, a história confirma-o, é toda a comunidade nacional, produtores e contribuintes, que pagam os custos dos desmandos em política agrícola.
Flagrante exemplo da superficialidade, sujeição a pressões de lobbies internos e de incompetência técnica no tratamento de assunto de elevada responsabilidade política e económica para o sector, é a aplicação a Portugal do Regulamento (CEE) n.º 797/85. Após largos meses de preparação do diploma que aplicaria a Portugal o referido regulamento comunitário, pseudo-agricultores pretenderam e, até certo ponto, conseguiram, através de organizações e grupos de pressão que pouco ou nada têm a ver com os verdadeiros e profundos interesses da agricultura portuguesa, introduzir desvios aos objectivos e meios de actuação consagrados naquele regulamento comunitário.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente surge em finais de Julho do ano transacto o já célebre Decreto-Lei n.º 172-G. E o inevitável aconteceu. A Comunidade exigiu a alteração de pontos essenciais deste decreto-lei! Praticamente não chegou a ser aplicado nessa versão, pelo que o Governo ia o revogou e aprovou novo diploma, agora referenciado por 79-A, e estamos em crer que face a distorções que tem implícitas não será, ou não poderá ser ainda, aplicado com rigor.
Sr. Primeiro-Ministro como explica tanta incompetência e irresponsabilidade?
Nas acções de pré-adesão está incluído o PADAR. Tem por acaso conhecimento o Sr. Primeiro-Ministro que largas dezenas de técnicos dos serviços regionais do Ministério da Agricultura estão, alguns há mais de um ano, para serem reembolsados de despesas de deslocação e outras efectuadas em desempenho de acções e actividades realizadas no âmbito do PADAR? Qual o técnico que não se sentirá desmotivado se, para desempenho das suas atribuições profissionais, tem que desembolsar várias dezenas de contos e esperar pelo seu reembolso mias de um ano? Assim vai o Ministério da Agricultura!
O Sr. Primeiro-Ministro não pode ignorar os graves estrangulamentos que impedem o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação de responder com eficácia às solicitações do sector que tutela e, contudo, nada foi feito para obviar à situação degradante em que operam alguns serviços regionais, locais e centrais. Os bloqueamentos que persistem na admissão de técnicos qualificados, direcções-gerais que desde há anos funcionam (mal) sem lei orgânica, cortes orçamentais cegos e indiscriminados, criam a desorientação e a total desmotivação dos respectivos serviços. Desta incompetente gestão governativa é ainda o sector agrícola a principal vítima.
Ainda, uma vez mais em contraste com o que o Programa do Governo contém, não foi minimamente valorizado e defendido o património florestal, não foram tomadas medidas de fundo que proporcionem o desenvolvimento do subsector florestal e das actividades económicas conexas. A sua delapidação progressiva em consequência dos incêndios não foi travada com medidas adequadas.
Não há uma política de extensão rural e agrária ou, pelo menos, um serviço eficiente de investigação e vulgarização técnica junto dos agricultores e suas organizações. As poucas excepções existentes numa ou outra região ficam, a dever-se ao voluntarismo abnegado de técnicos e ser ricos e não a política de acções programadas e persistentes. Nesta fase, em que ajudas e incentivos à melhoria técnica e económica da exploração agrícola é possível, mais do que nunca os resultados da experimentação, as inovações técnicas e tecnológicas, as propostas de alternativa nos sistemas culturais, nos investimentos necessários e ainda o correcto conhecimento das oportunidades de mercado, além de muitos outros conhecimentos, têm que chegar descodificados e atempadamente ao agricultor. Sem esse serviço de extensão o agricultor não tem acesso à inovação útil em tempo oportuno. As próprias organizações de produtores poderiam colmatar esta deficiência estrutural dos serviços s: fossem suficientemente apoiadas para disporem dos seus próprios quadros técnicos para esse objectivo. Também aqui o Governo falhou.
A preparação dos produtos para o mercado e a própria estrutura do mercado deveriam merecer a maior atenção do Governo. Assim, perguntamos ao Sr. Primeiro-Ministro: os tão propagandeados mercados de origem em que fase se encontram da sua implementação? E i obre os novos mercados abastecedores?

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No que se refere às ajudas à constituição e arranque de funcionamento de agrupamentos de produtores previstas nos Regulamentos Comunitários n.º 1035/72 e 1360/78, não estará o Governo esquecido de criar as condições à sua aplicação em Portugal, passados que são quinze meses após a nossa adesão? A negligência tem limites Sr. Primeiro-Ministro.
O Governo não dispõe de uma política de crédito agrícola; não dispõe de uma política de solos; não dispõe de uma política de regadio, de ordenamento cultural.
Em suma, o Governo enunciou no seu Programa um conjunto de intenções que não cumpriu; desbarata as condições favoráveis existentes no sector agrícola, nesta fase da nossa adesão, e quase impossíveis de repetir no futuro; está a frustrar as expectativas criadas particularmente nos jovens agricultores; foi incapaz de pacificar os conflitos na zona de reforma agrária; não tem uma estratégia de médio e longo prazo que minimize os efeitos nefastos para Portugal dos desenvolvimentos que se verificam na política agrícola comum, potenciando as virtualidades positivas que dos mesmos podem decorrer para a agricultura portuguesa.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No já escasso tempo de que disponho, tentarei ainda deixar breves apontamentos críticos sobre outras áreas governamentais.
No que respeita ao desenvolvimento regional e ordenamento do território a actuação deste Governo tem--se caracterizado por: primeiro, ausência final de uma estratégia de desenvolvimento regional, recuperando conceptualizações ultrapassadas dos problemas regionais e limitando-se quase sempre a um enunciado de propósitos onde se confundem objectivos finais com os instrumentos para os atingir;
Segundo, e como consequência, limitação à gestão do que veio de anteriores governos (não é por acaso que os responsáveis são os mesmos) sem capacidade de corrigir os aspectos negativos e de desencadear acções que potenciem a contribuição dos recursos disponíveis para a transformação das estruturas regionais;
Terceiro, ineficácia no aproveitamento dos recursos financeiros disponíveis, limitando-se a uma política de construção de infra-estruturas sem qualquer enquadramento por um esquema de ordenamento do território e desprezando todas as acções institucionais visando a mobilização dos agentes económicos e sociais;
Quarto, desenquadramento das políticas sectoriais e lançamento de medidas avulsas sem pré-avaliação das suas implicações e, o que é mais grave, sem uma ideia clara da sua sequência.
Por isso, não foi capaz de responder a várias solicitações da CEE com implicações directas na selecção de projectos a serem comparticipados pelo FEDER. Por isso, não foi capaz de promover a selecção de projectos a apresentar ao mesmo Fundo, optando por uma regulamento que tem causado inúmeros problemas. Por isso, não estabeleceu prioridades na execução dos vários programas integrados de desenvolvimento regional. Por isso ainda, se revelou incapaz de criar um verdadeiro sistema de estímulos de base regional, de decidir sobre a localização de determinados serviços de apoio às actividades económicas e de ter uma acção efectiva no sentido do desenvolvimento das regiões e do País.
Tal como se passou com o SEBR, o Governo prefere atirar dinheiro aos problemas, permite o escândalo que é a utilização das verbas do Fundo Social Europeu sem que procure integrá-las no sentido do desenvolvimento das regiões e do País.

Aplausos do PRD.

Mas com base em considerações financeiras e sem pensar duas vezes, extingue serviços e empresas que poderiam ter um papel activo na execução da política regional (caso da EPPI) e permite ou fomenta o encerramento em áreas onde são a única alternativa de trabalho para centenas de trabalhadores (minas da Panasqueira) sem estudar sequer possíveis soluções e os custos da sua implementação.
Com leviandade, procura soluções expeditas para os problemas, sem cuidar das consequências para o País. Fornece à CEE estatísticas agrícolas com base no RICA sem se preocupar que as mesmas sobrevalorizam a situação da agricultura portuguesa, em particular das áreas do interior.
Mantém reservadas e não implementa as conclusões da Comissão Encarregada da Reestruturação do Sistema Estatístico Nacional.
Também no que toca à educação, a actuação não se afasta da tónica geral do comportamento e actividade do Governo.
Tem o Ministério da Educação e Cultura pautado a sua conduta em relação a esta Assembleia da República através de duas atitudes típicas; ou pelo confronto ou pelo esquecimento das directrizes que a lei impõe.
Exemplo do primeiro caso é a formulação do decreto-lei que destinado a regulamentar aspectos parcelares da lei de dedicação exclusiva de professores do ensino superior e de investigadores, aprovada por unanimidade nesta Assembleia e comprometendo nos seus trabalhos preparatórios o Ministro da Educação e Cultura. Sob o pretexto de regulamentar, o que o Governo realmente faz é revogar a lei, nos seus princípios e na sua substância.
Em relação ao segundo caso, isto é, esquecimento das directrizes que leis da Assembleia da República impõem, que mais não significa senão um confronto passivo, podemos buscar exemplo numa longa série de atitudes reveladoras.
O mais notório deles é o que respeita ao incumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo, também aqui votada com a aprovação do partido do Governo.
É, porém, na falta de decisões relativas às mudanças estruturais que o comportamento do Governo, neste sector, é mais criticado.
Falta claramente uma política educativa que transpareça em grandes decisões reveladoras da vontade da mudança necessária e premente.
O recente Orçamento do Estado é bem demonstrativo dessa falta de política.
Não existem objectivos prioritários claros e a programação não é explícita. Falta um conjunto de medidas e de estratégias de racionalidade visível que nos leve a presumir uma mudança substantiva do estado de coisas que afligem a educação no nosso país e que não são de pequena monta.
A produtividade do sistema é muito baixa; vejam-se as taxas de insucesso escolar e de abandonos precoces. E a medida tomada, no princípio deste ano lectivo, em relação aos efeitos produzidos pela reprovação em Português nos ensinos preparatório e secundário, é exemplificativa de uma decisão que tenderá a agravar o elevado insucesso escolar já existente nestes níveis de ensino.

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A formação inicial de professores não se adequa à educação das crianças e dos jovens e a formação contínua é inexistente. Já depois de conhecido o texto da Lei de Bases, foi determinada a implementação, nas escolas superiores de educação, de um modelo de formação de professores para o ensino preparatório que não respeita a formulação da Lei de Bases, a qual preconiza já aquela adequação da formação inicial.
A recente crise das Faculdades de Letras é bem exemplo da incapacidade de decisão do Ministério perante um problema de tão extensa gravidade e da falta de perspectiva na procura de soluções sérias, sem recurso ao facilitismo e à demagogia.
No que respeita ainda à formação inicial de professores e educadores, ainda que se considere positivo o arranque das escolas superiores de educação, há que pôr sérias reservas à dimensão do empreendimento. Um lançamento simultâneo de um grande número destas escolas está a produzir graves distorções na qualidade do seu corpo docente e na bondade dos respectivos programas de formação, correndo-se o risco de se comprometer seriamente o sucesso deste sector do ensino politécnico.
Se aqui se teme um possível fracasso, já em relação ao ensino técnico-profissional, implantado há já alguns anos e sempre desenvolvido em ministérios da responsabilidade do PSD, ele tem-se revelado um fracasso completo. Se a oferta não é grande, a procura é ainda menor: 40% dos lugares oferecidos não são preenchidos. Trata-se, de facto, de um projecto marginal ao sistema e, por isso, não é de estranhar a rejeição social que ele produziu e que a escassa procura testemunha.
Marginal é também a formação profissional e a aprendizagem realizada sob tutela do Ministério do Trabalho e Segurança Social. Marginal e extremamente dispendiosa onde os fumos da corrupção são visíveis, e de resultados duvidosos. Duvidosos são ainda os custos de tal projecto, revelador de uma irracionalidade e de um mau cuidado de gestão que leva a que os formandos do sistema de aprendizagem, sistema que é o mais elementar de todos, representem um custo de cerca de 800 contos por formando; se compararmos estes custos com os que o Orçamento de Estado revelou, ficaríamos a saber que esta verba representa, aproximadamente, uma formação de oito anos de ensino não superior ou uma formação de três anos no ensino superior.
As famílias continuam ausentes da direcção do projecto educativo, tal como é consagrado na Lei de Bases, sendo mantidas perpetuamente em situação marginal que não dignifica nem as famílias nem a escola.
Em resumo se poderá dizer que a política do Governo em matéria de educação tem sido mais uma política de remendos, de corrigir de tensões e de satisfação pontual de interesses confinados.
É uma política de reacção, e não uma política de iniciativa e de antecipação, como seria requerido.

Aplausos do PRD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É quase um lugar--comum o afirmar-se ser necessário iniciar reformas de fundo na Administração Pública, de modo que esta possa desempenhar um papel relevante na modernização da sociedade portuguesa.
Ora, no campo da Administração Pública, o que se verifica é a partidarização da Administração, o assalto aos cargos d: direcção e ao poder, a sistemática substituição de e leves utilizando os critérios do compadrio político e da instalação de lobbies...

O Sr. António Capucho (PSD): - É falso!

O Orador: - ... insuficiência na agilidade e racionalização de aparelho administrativo. Neste campo, o Governo, apenas pode registar no seu activo o estabelecimento da orçamentos programa, de relatórios de actividade e análise de desvios; a adopção de novos sistemas contabilísticos e de gestão financeira para os organismos com autonomia financeira (LNETI e IAPMEI), o que se considera adequado.
O Governo sentou-se no aparelho de Estado, usou e abusou das nomeações políticas e, administrativamente, limitou-se a acções tecnocráticas de pouco alcance, pontuais e inconsequentes.

Aplausos do PRD.

Vozes do PSD: - Essa página já foi lida!

O Orador: - Percebo o vosso nervosismo, mas tenham calma!

Resumindo, no campo da Administração Pública a actuação governativa foi politicamente perversa e tecnocraticamente medíocre.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ainda breves considerações sobre outra área que temos por importante.
A actuado deste Governo em matéria de política de apoio às comunidades portuguesas tem sido verdadeiramente desastrosa.
Reconhecia o Governo no seu Programa a «importância fundamental à preservação e expansão da nossa língua no Mundo e, em particular, nas comunidades portugueses», e, ainda que «o ensino do português no estrangeiro represente um seu instrumento decisivo».
A resposta do Governo a esse reconhecimento foi o despedimento de dezenas de professores na França e na Alemanha, os quais tinham uma experiência de muitos anos cie trabalho com filhos de emigrantes. Tal não nos surpreende quando no próprio Programa se definia como várias acções no campo do ensino do português «a estruturação de novos e mais eficazes esquemas de articulação entre os departamentos governamentais que superintendem na matéria».
E o que se fez no âmbito da «dinamização do investimento em Portugal por parte de empresários de origem portuguesa», emigrantes regressados, ou ainda relativamente à reestruturação dos serviços consulares ou de nuas uma anunciada reestruturação - a do Instituto de Apoio à Emigração e ás Comunidades? E tudo que referi estava previsto no Programa do Governo.
O Governo não cumpriu, porque até agora nada fez no sentido de concretizar as grandes linhas do seu Programa.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Isso é um exagero!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Para a modernização do País, para que possamos enfrentar o desafio da nossa plena integração na Europa, será necessária uma política industrial actuante. A realidade é que ela não existe.

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Nem há um plano mineiro. Nem vigora nenhum plano energético nacional. O que havia foi suspenso. Face a este vazio de linhas de política actuantes, específicas, concretas, cumpre perguntar: porquê?
O documento mais recente, tão propagandeado, o PCEDED - Programa de Controle Estrutural do Défice Externo e do Desemprego, parece excluir uma intervenção directa e estruturante da malha industrial.
No posicionamento da indústria portuguesa em relação à CEE avultam as desvantagens em termos da estrutura industrial, tendo esta um peso excessivo de sectores tradicionais, nomeadamente os têxteis, confecções, calçado, madeira, cortiça e mobiliário; a ocorrência significativa na malha industrial nacional de sectores em crise: siderurgia, construção naval, electrometalurgia, petroquímica, química pesada; as desvantagens quanto à produtividade, que é cerca de um quarto da produtividade média da CEE; as desvantagens quanto ao perfil das exportações: as exportações portuguesas têm por base produtos tradicionais, com forte incorporação de mão-de-obra e são tecnologicamente pobres; a desvantagem quanto à base tecnológica atrasada e, nalguns sectores, obsoleta; as desvantagens quanto ao consumo energético especifico, ocorrendo um consumo energético por unidade de VAB mais elevado que a média europeia; as desvantagens na pesquisa científica, na investigação e no desenvolvimento tecnológico; a desvantagem no aparelho de formação profissional; a desvantagem nos processos de articulação entre as empresas e as universidades; as desvantagens em termos de organização e gestão.
Em relação a alguns aspectos da dinâmica de reestruturação da indústria portuguesa e da reestruturação industrial das Comunidades, recorda-se que a reestruturação industrial em curso nos países do centro da CEE orienta-se para sectores de ponta envolvendo tecnologias avançadas. O investimento industrial português, mesmo após a aplicação do sistema de estímulos de base regional, não tem dado continuidade à reestruturação industrial existente, vulnerável e dependente; o consumo energético por unidade de produto na Europa reduz-se, em Portugal aumenta; na CEE o processo de readaptação dos sectores em crise (têxteis, construção e reparação naval, petroquímica e química pesada, siderurgia) está praticamente ultimado; em Portugal apenas nalguns sectores está esboçado.
Quanto à recente evolução da divisão internacional da produção decorrente do desenvolvimento industrial do Japão e dos novos países industrializados é de referir que prossegue uma modificação qualitativa da presença do Japão no processo da divisão do trabalho, por predomínio de uma tecnologia em sectores tecnológicos estratégicos e pelo seu posicionamento relativo no comando das exportações mundiais de produtos manufacturados; os novos países industrializados desenvolveram uma indústria competitiva, primeiro nos sectores tradicionais (têxteis e calçado), agora nos sectores de indústrias tecnológicas de ponta (electrónica e electrodomésticos) e em sectores da indústria pesada (construção naval); as empresas industriais dos novos países industrializados são, em termos de qualidade, produtividade e custos praticamente imbatíveis.
Como pode, neste contexto, o Governo dispensar-se de definir e gerir uma estratégia de mudança?
Como pode o Governo dispensar-se do esforço de diálogo necessário à obtenção dos consensos entre as forças partidárias e as forças políticas e entre estas e os agentes económicos?
Como pode o Governo remeter-se a uma posição de arrogância, de procurado isolamento, de autoritarismo, de guerrilha institucional, de sistemática obstrução ao necessário diálogo?
Este estilo de governação, esta estratégia de não ter estratégia, esta política liberal que julga o liberalismo como ausência de política, são perigosamente insuficientes. Nada permite garantir que se consiga o objectivo pretendido de adequação, quantitativa e qualitativa, do investimento industrial de fornia a obter-se a restruturação e renovação desejáveis e necessárias.
Estamos a perder o tempo de mudar a tempo.

Aplausos do PRD.

A actividade mais visível do actual governo sintetiza-se num frenesim evidente em servir e se servir de clientelas partidárias por vezes por incompetência dificilmente imaginável. Consequentemente, registam-se casos de desagregação e, mesmo, de paralisia de certos serviços e de algumas importantes acções, designadamente na Direcção-Geral de Energia.
É notória a diminuição da capacidade de orientação e de decisão visando inflectir a débil situação energética nacional. Frequentemente, tem-se assistido ao desbaratar de oportunidades proporcionadas pela adesão comunitária, em virtude da inexistência de orientações claras, de participação de intervenientes sem um mínimo de qualidade, ou, inclusive, da ausência, pura e simples, de responsáveis portugueses em reuniões importantes.
A título de exemplo, refira-se que a uma reunião extraordinária convocada com larga antecedência pelo novo director-geral de Energia da Comissão com os seus homólogos dos Estados membros, à qual era atribuída a maior importância, não esteve ninguém em representação de Portugal. Evidentemente que, para o país que apresenta a pior situação energética comunitária e que tinha francas hipóteses de apoios comunitários para melhoria da sua situação energética, actuações demissionistas como esta são altamente negativas.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Como paradigmático é o Decreto-Lei n.º 250/86, o qual, visando incentivar a utilização mais eficiente da energia e a valorização de recursos energéticos endógenos, constitui uma manta de retalhos, cuja inconsistência e arbitrariedade interpretativa de terminarem a exclusão da sua aplicabilidade aos sectores terciário e agrícola, o que implicou uma chamada de atenção da CEE para a sua incompatibilidade com os sistemas de apoio comunitários, designadamente com um programa comunitário particularmente destinado ao apoio da vertente energética no desenvolvimento regional, em que Portugal é um destinatário privilegiado.
Ao nível da paralisação de acções importantes que vinham sendo desenvolvidas, o Ministério da Indústria e Comércio foi, nomeadamente, incapaz de preparar um documento orientador sobre política energética, aperfeiçoar os modelos energéticos existentes e iniciar a prevista aplicação de novos, iniciar vários projectos previstos anteriormente visando a melhoria do planeamento energético, adaptar a legislação vigente de fomento de autoprodução aos problemas específicos das pequenas centrais hidroeléctricas e definir as condições do seu acesso a financiamentos especiais, rever os aspectos legais relativos à concessão de novos aprovei-

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tamentos e renovação de concessões existentes, sobretudo no que respeita às normas de segurança a adoptar em pequenos aproveitamentos sem pessoal permanente e incentivar a participação da indústria nacional nos novos empreendimentos energéticos e apoiar a criação e o desenvolvimento de um núcleo de indústrias de novas tecnologias energéticas e de economias de energia.
Em síntese, a actividade do actual Ministério da Indústria e Comércio tem conduzido à destruição de iniciativas em marcha importantes para o sector e à desarticulação de organismos oficiais, revelando-se, por outro lado, incapaz de aproveitar as oportunidades derivadas da situação actual mais distendida nos mercados internacionais dos principais vectores energéticos, para implementar medidas estruturais conducentes a alterações fundamentais na situação energética nacional, extremamente débil e vulnerável a flutuações nos mercados energéticos internacionais.

Aplausos do PRD.

Sr. Primeiro-Ministro, concluirei, falando-lhe da liberdade.

Porque não somos livres de pensar quando a expressão das nossas opiniões determina o impedir de progresso na carreira ou o saneamento.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Não somos livres de ser oposição quando uma certa televisão apenas ouve o Governo e selecciona das oposições o que este mais gosta de ouvir.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Não somos livres de discutir condições de trabalho quando há salários em atraso e o número de desempregados cresce e a percentagem do valor trabalho no rendimento nacional é a mais baixa desde o 25 de Abril.

Aplausos do PRD, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

Não somos livres quando o tempo de crescer e de brincar é explorado por formas de produção impróprias do nosso tempo e da nossa dignidade.

Aplausos do PRD.

Não somos livres quando o crédito para a habitação esquece os que não têm posses.

Aplausos do PRD.

Não somos livres quando a doença, o desemprego e a velhice isolam e são razão de medo.
Não se é livre quando se penaliza quem diz não.
Não somos livres quando o Governo faz equivaler competência a filiação partidária!

Aplausos do PRD, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

Ninguém é livre quando só alguns são livres.

Aplausos do PRD. Protestos do PSD.

O Sr. Silva Marques (PSD): - O PCP não vai tão longe!

O Sr. António Capucho (PSD): - Deus, nosso senhor, há-de livrai-nos disso!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PRD julga propostas, pessoas, homens, pelo seu mérito próprio. E procura fazê-lo com isenção.
O PRD não diz que este governo foi péssimo mas diz que teve uma oportunidade única e desiludiu. E diz que o auto-elogio pode dar satisfação a quem o faz, mas apenas aumenta ilusões e não resolve problemas.
O PRD dá tempo ao tempo - e deu tempo ao Governo, à oposição e a si próprio.

O Sr. Sita Marques (PSD): - Dê prioridade ao eleitorado!

O Orador: - Não esteja preocupado com isso. Eu não estou, Sr. Deputado!

Aplausos do PRD.

Mas há tempo para tudo e também para dizer que o tempo acabou...

Aplausos do PRD, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

Entende o PRD que é agora esse tempo, para que não se paguem dolorosamente mais tarde os enganos de hoje, pura que não se descubra só tarde de mais que o Governo se preocupou sobretudo em implantar um aparelho partidário, em perpetuar-se no poder, em escolher «lendários eleitorais e em abrir o caminho para oportunamente fazer regressar privilégios que definitivamente se julgariam abolidos, para fracturar a sociedade portuguesa, para fazer com que prosperidades aparentes terminem em injustiça sociais agravadas.
O PRD toma a responsabilidade do que faz. Assim como tomou antes a de haver contribuído para viabilizar o Governo - um governo de expectativa frustada -, assim toma agora a da iniciativa desta moção de censura e toma a própria responsabilidade de fazer os outros assumirem as suas.
Que o ficam, sem reservas nem desculpas, no voto da moção, na construção de soluções, com a certeza de que a falta de coragem de um tempo se paga redobradamente tempo depois.

Aplausos do PRD, do MDP/CDE e de alguns deputados do J95.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se inscreveram, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Hermínio Martinho, os Srs. Deputados Guerreiro Norte, Duarte Lima, Mendes Bota, Nogueira de Brito, Costa Andrade, Silva Marques, Angelo Correia, Carlos Brito, Gomes de Pinho, Horário Marcai, Carlos Coelho e Dias Loureiro.
Tem a palavra S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Precisamente em véspera da visita de listado ao Brasil do Sr. Presidente da Repú-

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blica e em pleno processo de assinatura do acordo entre Portugal e a República Popular da China relativo ao futuro de Macau, uma delegação do Partido Renovador Democrático comunicou ao Sr. Presidente da República que iria apresentar uma moção de censura ao Governo.
Desde então o País assistiu a uma intensa sucessão de comunicados, de propostas e de contra propostas, de declarações e de contra declarações, reuniões, conversações, negociações - enfim, os habituais ingredientes e os tradicionais condimentos das chamadas «crises políticas».
Perante tudo isto o Governo manteve absoluta serenidade.
Não nos afastámos nem um milímetro do nosso plano normal de actividades. Continuámos simplesmente a trabalhar, a cumprir as promessas que fizemos aos Portugueses.

Vozes do PS: - Não é verdade! Aplausos do PSD.

O Orador: - Apenas tivemos de recordar que não estamos vocacionados para entrar em qualquer tipo de jogadas e encenação política.
Mas hoje abre-se formalmente o debate da moção de censura e o Governo aqui se encontra perante a Assembleia da República de quem politicamente depende. São estes o lugar e o tempo apropriados para, com toda a clareza, exprimirmos a nossa posição.
E porque esta questão de método não decorre apenas de um dado estilo e de uma cena forma de estar na política, mas também do entendimento que temos acerca do modo como se deve normalizar a vida política portuguesa e estabilizar os comportamentos institucionais, deverei deter-me, durante alguns minutos, num aspecto que considero prévio relativamente à análise dos motivos e das consequências da apresentação da moção de censura.
Durante este período, aberto pela iniciativa do Partido Renovador em virtude da qual, assinale-se, a palavra «crise» reapareceu no vocabulário corrente- um dos partidos da oposição -o Partido Socialista- propôs ao Governo que se realizassem conversações para modificação da sua política que possibilitassem a alteração do sentido do voto provável desse partido.
Gostaria de deixar bem claro que, ao recusar envolver-se nessas apressadas e intempestivas propostas, o Governo quis simplesmente afirmar que não aceita negociar sob pressão e não alinha em nenhuma forma, mais ou menos hábil ou sofisticada, de chantagem política.

Aplausos do PSD.

O Governo não admite ligar a sua manutenção em funções a negociações de conveniência de última hora, que nada têm a ver com os reais interesses do País mas apenas com a necessidade de um partido justificar a sua posição. Já o dissemos e aqui o repetimos: por aí não vamos, por aí nunca iremos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Depois de, vezes sem conta, nos últimos doze meses, fugir ao diálogo, como pode ser verdadeiro o súbito amor pelo diálogo manifestado pelo Partido Socialista? A encenação é pouco convincente, porque demasiado ostensiva. O PS quis apenas, à última hora, encontrar uma desculpa perante si próprio e perante o País porque, em verdade, continua a pensar que esta moção de censura é uma atitude de grande irresponsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sempre manifestámos abertura para discutir, na perspectiva do interesse nacional, tudo aquilo que possa contribuir para a estabilidade e progresso do nosso país. Mas esse diálogo deve processar-se em clima de boa fé e não ser ditado por considerações de oportunidade táctica, de conveniência partidária ou de encenação política.
A posição do Governo é transparente: não quis a crise, nada fez que a agravasse, não deseja que se interrompa o ciclo de estabilidade e de confiança aberto em Outubro de 1985.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A decisão do PRD de apresentar uma moção de censura ao Governo surpreendeu, sem dúvida, a grande maioria dos cidadãos deste país, só não tendo apanhado desprevenidos aqueles que, infelizmente, tudo esperavam e esperam de um certo tipo de oposição.
O Partido Renovador é capaz de estar satisfeito... tristemente satisfeito.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Está tranquilo!

O Orador: - Chamou a atenção da opinião pública. Ganhou títulos de destaque nos meios da comunicação social.

Vozes do PRD: - Já não era sem tempo!

O Orador: - Mas o povo português está estupefacto e interroga-se sobre os motivos desta repentina crise política. O povo português sente-se intrigado e não descortina quais os motivos (graves) que terão levado os partidos da oposição a provocarem, neste momento, a queda do Governo, como tão levianamente já anunciaram.
Mas quais os motivos que levaram o PRD a apresentar a moção de censura ao Governo?
Será que a razão da moção de censura se encontra na evolução económica e social do País durante o período de vigência do Governo? É óbvio que não.
O Governo está à vontade para assumir perante esta Assembleia e perante o País os resultados da sua governação.
Os dados sobre o comportamento da economia portuguesa em 1986 são conhecidos dos partidos da oposição e estes sabem que são extremamente positivas as apreciações feitas por organizações internacionais insuspeitas. Sabem bem, os partidos da oposição, que os resultados da economia portuguesa em 1986 são os melhores desde o 25 de Abril e muito poucos países europeus registaram resultados mais favoráveis do que Portugal.
Os Srs. Deputados queriam mais? Sim, dirão alguns; como disse há pouco o Sr. Deputado Hermínio Martinho. Mas então eu deixo-vos uma pergunta: o que fizeram para isso? De positivo, pouco. Dificuldades, criaram bastantes.

Aplausos do PSD.

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Compreendo o vosso embaraço face ao falhanço das previsões que fizeram e à negação pelos factos dos discursos e afirmações que produziram. Compreendo que receiem pela vossa credibilidade aos olhos de quem vos escuta ou lê.
Mas, Srs. Deputados, não acredito que os comportamentos de avestruz compensem; não vale a pena fechar os olhos à realidade dos factos.
A produção nacional cresceu em 1986 cerca de 4,5%, quando em 83 e 84 tinha diminuído e em 85 se tinha quedado por 3,3%.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Uma fartura!

O Orador: - Qual o país da Europa comunitária que teve, em 1986, crescimento económico mais elevado do que Portugal? De acordo com as informações disponíveis... nenhum.
Os Srs. Deputados sabem, ou deviam saber, que a Grécia e a Irlanda, países que são normalmente escolhidos para comparações com Portugal, tiveram crescimento nulo ou muito reduzido em 1986.
E o que dizer das vossas afirmações, repetidas até há bem poucos dias, de que o Governo ia falhar no relançamento do investimento?
Compreendo o embaraço que sentem ao saber que o investimento afinal aumentou 9% a 10%, tal como o Governo tinha previsto, o que contrasta com uma queda de cerca de 30% no período de 1983-1985.
Quantos países da Europa Comunitária podem os Srs. Deputados apontar com taxas de expansão do investimento maiores do que a de Portugal?
O Governo conseguiu restabelecer no País um clima de confiança e de esperança quanto ao futuro, como é reconhecido pelos empresários e pela população em geral.
Por isso, começou novamente a acreditar-se que vale a pena investir no nosso país em máquinas e equipamentos, em edifícios, em viaturas, avançando assim no caminho da modernização, criando as bases para a produção de mais riqueza e melhoria do bem-estar da população e possibilitando o surgimento de novos postos de trabalho.
Será que se quer censurar o Governo por ter excedido, para melhor, a meta que propôs para a taxa de inflação? Por os preços terem acabado por subir em 1986 apenas 11,7%, quando em 1984 tinham subido 30% e em 1985, 20%.
Será que somos censurados porque a tendência para a diminuição da inflação continuou nos primeiros meses de 1987, de tal forma que, em Fevereiro, se situou a 9,5%, o valor mais baixo dos últimos treze anos?
Não foi certamente por isso, porque o PRD não cairia em tal ridículo.
Mas também não foi devido à evolução do poder de compra da população, porque esse aumentou em 1986 como não acontecia há doze anos. É sabido que o poder de compra dos salários aumentou em 1986 cerca de 5% e o das pensões de reforma e invalidez cerca de 10%.
Quais foram, Srs. Deputados, os países da Europa Comunitária que obtiveram melhores resultados do que nós? Segundo a informação disponível ... nenhum.
Temos governado para todos os Portugueses, mas prestando uma atenção especial àqueles que, entre nós, são mais desfavorecidos.
Foi por isso e que aumentámos extraordinariamente os valores das pensões mínimas de invalidez e velhice.
Foi por isso que melhorámos o sistema de cálculo das pensões dos pescadores.
Foi por isso que procedemos à integração dos trabalhadores agrícolas no regime geral da Segurança Social.
Foi por isso que aumentámos significativamente as prestações da Segurança Social para os deficientes.
Foi por isso que encaminhámos elevados recursos financeiros país fazer face às situações de carência mais gritantes na península de Setúbal.
Qual foi o primeiro governo a dar uma resposta efectiva ao drama dos salários em atraso?
Em resultado das medidas tomadas e do crescimento da economia, o número de trabalhadores com salários em atraso baixou 50% entre Dezembro de 1985 e Janeiro de 1987.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Certas forças políticas prefeririam que não manifestássemos uma tão grande preocupação pelos mais desfavorecidos. Gostariam de agitar a bandeira da fome e da miséria e dispor de um exército de descontentes para mobilizações de rua.
Cometeram Srs. Deputados, um erro de apreciação que não tem e desculpa, porque tinham ao vosso dispor elementos de formação suficientes para deverem saber que a nossa acção se pautaria, como se tem pautado, pelos princípios da justiça e da solidariedade sociais.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, nem tão-pouco a evolução da taxa de desemprego vos fornece argumento para censurar o Governo. No 4.º trimestre de 1986 situava-se em 9,6%, quando um a 10 atrás era de 10,9%. A taxa de desemprego, em sentido restrito, baixou de 9% para 8% nos últimos doze meses. Estes valores são os mais baixos desde que começaram a ser feitos os inquéritos trimestrais ao emprego.
Os Srs. Deputados sabem qual é a taxa média de desemprego na CEE? 11 %. Sabem qual é a taxa em Espanha? E na Irlanda? 18%. E na Itália? 14%.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - E a protecção? Protestos do PSD

O Orador: - É a política que temos vindo a executar, e não aquela que os Srs. Deputados gostariam que seguíssemos, que permite combater o desemprego: uma política de expansão económica, de aumento do investimento e de aposta na iniciativa privada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A moção de censura também não é apresentada porque não tenhamos manifestado abertura ao diálogo social. Pela primeira vez, em Portugal, foi possível pôr em prática uma política de rendimentos, resultado de um acordo de concertação entre o Governo, a central sindical democrática e as confederações patronais. Os seus resultados têm sido altamente benéficos para a economia portuguesa e para os trabalhadores.
Os acordes conseguidos em Julho de 1986 e em Fevereiro de 1937 no seio do Conselho de Concertação Social são acontecimentos memoráveis que prestigiam o nosso pais e prestigiam os parceiros sociais.

Aplausos do PSD.

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Será que o PRD quer censurar o Governo por ter implementado, pela primeira vez em Portugal, uma política global e integrada de juventude? É óbvio que não.
Com efeito, ninguém de boa-fé ousará contestar que o Governo fez mais pelos jovens em acções concretas - e não apenas em discursos - do que qualquer outro depois do 25 de Abril: no relançamento da economia, na retoma do investimento, no incentivo à criação de empregos, na aquisição de casa própria, na formação profissional, na ocupação dos tempos livres, no desporto, no intercâmbio e turismo juvenil, na realização de experiências profissionais, no incentivo à criação de empresas agrícolas e industriais, no apoio à inserção na vida activa.
Quero reafirmar-vos aqui, Srs. Deputados, que de facto apostamos e acreditamos nos jovens portugueses: no seu dinamismo, na sua pujança, na sua abertura à mudança, na sua criatividade. Consideramos decisivo o seu contributo para a construção da sociedade do futuro.

Aplausos do PSD.

Será que o PRD apresentou a moção de censura porque o Governo não está a defender bem os interesses portugueses na complexa e difícil negociação que significa a nossa integração na CEE? Com certeza que não, porque estaria a actuar de má-fé.
É reconhecido, em todas as instâncias comunitárias, que Portugal tem revelado uma capacidade de resposta muito superior à inicialmente prevista.
Quem poderá dizer que não foram bem sucedidas as negociações relativas ao acesso dos nossos têxteis aos mercados comunitários e da EFTA, ou sobre o sistema de regras de origem no comércio com a Espanha, ou sobre o diferendo entre a CEE e os Estados Unidos?
Quem poderá negar que hoje, nas grandes questões europeias e na cooperação de política externa, a voz de Portugal é ouvida e respeitada?
E quem de boa-fé poderá dizer que não aproveitámos bem os fundos comunitários?
Aquando da negociação do tratado de adesão estimava-se que, no primeiro ano, a transferência líquida de fundos para Portugal não ultrapassaria sete milhões de contos. Afinal acabou por ultrapassar os 30 milhões de contos.
Tendo sido recebido nas instâncias comunitárias com alguma desconfiança quanto à sua capacidade de resposta, Portugal acumulou, nos primeiros quinze meses de adesão, um capital de respeito, de admiração e estima, que reforçou consideravelmente a nossa posição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A moção de censura não pode assim deixar de suscitar muito legítimas interrogações, atendendo a quem a apresentou e os termos em que o fez - e tendo presentes as atitudes nervosas e os espíritos agitados que por aí se descortinam.
Com efeito, como é que pode explicar-se que um partido que ainda há bem pouco tempo considerava «globalmente positiva» a actuação do Governo e elogiava e continua a elogiar a acção do Primeiro-Ministro venha, de um momento para o outro, sem causa aparente e sem qualquer motivo evidente, apresentar uma moção de censura ao Governo?

Aplausos do PSD.

A primeira razão plausível é a de que o PRD não tem encontrado no calendário das actividades da oposição o espaço suficiente para afirmar a sua própria iniciativa.
Havia um partido (partido esse especializado em contribuir para o derrube de todos os governos constitucionais) que vinha anunciando já a intenção de lançar uma ofensiva de «massas» na segunda metade de Abril, até ao 1.º de Maio.
Um outro partido anunciara publicamente que a sua posição se definiria só lá para meados de Maio, tentando assim, muito provavelmente, demarcar-se da ofensiva do Partido Comunista.
Perante isto, o Partido Renovador terá concluído que lhe restava ocupar um único espaço livre no calendário da oposição - fins de Março, princípios de Abril.

Risos do PSD e do CDS.

E então avançou com a moção de censura, procurando antecipar-se ao partido que, na mesma ocasião, procurava liderar o combate ao Governo.
Isso foi, aliás, reconhecido pelos dirigentes máximos do partido censurante, os quais chegaram a dizer que a moção de censura não visava necessariamente a queda do Governo, mas sim e sobretudo clarificar a situação dos que apoiam ou não apoiam o Governo.

Aplausos do PSD.

Chegou mesmo a afirmar-se que não achariam mal de todo que o mesmo Primeiro-Ministro voltasse a formar outra vez governo!

Risos do PSD.

Conforme tem sido amplamente reconhecido nos últimos dias, esta não é uma moção de censura ao Governo. Politicamente, é antes uma censura que o segundo partido da oposição dirige ao primeiro partido da oposição: e tudo, muito provavelmente, no interesse e por conta do terceiro partido da oposição!

Aplausos do PSD.

Por isso vos pergunto, Srs. Deputados: será legítimo que os mecanismos constitucionais da moção de censura sejam accionados, nestas circunstâncias e com este fundamento, para resolver um problema de liderança no interior da oposição?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, um mínimo de dignidade no debate!

O Orador: - Será política e democraticamente aceitável que um partido crie uma situação de instabilidade e abra uma crise política porque tem um problema de afirmação perante um outro partido da oposição e quer mostrar à viva força que é capaz de ser ele a mandar na oposição, que os outros vão a reboque, que é mais oposição do que os outros?
Será que o País tem de pagar os custos de uma actuação ditada por uma necessidade de antecipação, de manobra e guerrilha política de um dos partidos da oposição?
Será que Portugal, a economia e a sociedade portuguesa, no momento crucial em que se joga o desafio da nossa integração nas Comunidades Europeias, o desafio da modernização e do desenvolvimento, têm de

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se sacrificar aos desígnios de uma jogada política originada por um partido instável e em crise de afirmação? Será legítimo fazer o País pagar os custos da perturbação em que vivem alguns pela rivalidade com outra força política que lhe estará próxima ou em relação à qual terão uma especial sensibilidade, ditada por histórias antigas que nada interessam ao nosso futuro colectivo?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como quer que seja, Srs. Deputados, as razões desta atitude do PRD são sempre menores e sem elevação.
E quando nos lembrarmos, Srs. Deputados, que estes procedimentos vêm de um partido que constantemente repetia que subordinava os interesses partidários aos interesses nacionais e pregava os valores da coerência, da transparência e se afirmava como símbolo da ética política ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por afinal o partido em apreço ser portador de vícios velhos, de comportamentos em nada inovadores ou virtuosos, sempre poderão alguns dizer que em vez de PRD se devia chamar «PDR», partido (dito) renovador.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Isso é lamentável!

Aplausos do PSD. Protestos do PRD.

O Orador: - O seu líder chegou a afirmar que quando o PRD deixasse de ser um partido diferente dos outros - isto é, com aquela imagem de ética e de coerência que reclamava nos discursos - não teria outro caminho senão abandoná-lo. E agora ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... agora, Sr. Presidente, Srs. Deputados, chegámos a esta situação inacreditável. Reparem bem: em 6 de Novembro de 1985, na cerimónia da tomada de posse do Governo a que me honro de presidir, afirmou textualmente o então Presidente da República:
Vai V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, ombrear com tais tarefas, enfrentar um mundo de dificuldades e exigências, exercer, enfim, a sua acção governativa num momento político complexo, num tempo económico, apesar de tudo, difícil e numa situação social preocupante.
E vai fazê-lo com um governo minoritário, formado em resultado das eleições legislativas de 6 de Outubro. Na formação de tal executivo foram tomados em consideração, nos termos constitucionais, não só os resultados eleitorais, que deram ao partido político que V. Ex.ª lidera maioria relativa, como ainda a inexistência de quaisquer acordos políticos que viabilizassem a formação de um governo de coligação com apoio parlamentar maioritário. Trata-se de um governo cuja perfeita legitimidade constitucional não oferece dúvidas nem admite discussões.

Aplausos do PSD.

E mais £ diante disse o então Chefe do Estado:

Finalmente, o País espera que o bom senso político imponha - já que a Constituição o não estabelece - que o Parlamento não recuse uma solução sem que tenha solução alternativa melhor para oferecer.

Aplausos do PSD.

Há dias, numa entrevista televisiva, a mesma individualidade, agora líder do partido, afirmou também textualmente (passo a citar):

O Governo nunca percebeu que, sendo legal, tem uma legitimidade duvidosa.

Risos do PSD.

Um governo minoritário é um governo que não representa a maioria do País, representa apenas uma parte do País.

Risos do PSD.

Nada disto faz sentido e se estamos hoje aqui, Srs. Deputadas, é porque o Partido Renovador entendeu que era a hora de incomodar o País e os Portugueses, era a altura de dai um qualquer salto para a frente, era sua vontade provocar agora uma crise política.
Perante tocas estas jogadas políticas, cabe aqui uma pergunta, uma simples pergunta: e Portugal? E os Portugueses? E a estabilidade? E o clima de confiança necessário ao desenvolvimento e ao progresso do País?

Aplausos do PSD.

Infelizmente julgo que se esqueceram destes valores. Talvez porque não tenham sofrido, como outros, com a austeridade, com o «aperto do cinto», com as diminuições do poder de compra, com as consequências da queda do investimento e do aumento do endividamento externo.
Reparem bem, Srs. Deputados, no momento que vivemos.
Como irão os nossos parceiros das Comunidades Europeias entender que nos ponhamos com crises artificiais quando estamos no início do processo de integração europeia?

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Não temos prestar contas a ninguém!

O Orador: - E quando de forma empenhada e persistente reclamamos apoios para a modernização e desenvolvimento dos vários sectores da economia portuguesa, para a valorização dos nossos recursos humanos, para a redução dos desequilíbrios entre o litoral e o interior?
A estabilidade e a confiança que conseguimos restabelecer no País, os resultados alcançados, deram-nos um capital precioso para defesa dos nossos interesses na CEE. E agora os Srs. Deputados querem destruir esse capital.
Os nossos parceiros não vão entender que o País, que ainda tem os índices de desenvolvimento mais baixos, se dê ao luso de fabricar artificialmente crises políticas quando justamente inicia o árduo e enorme desafio de acertar o passo pelo ritmo e pelo nível da Europa comunitária.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados, começou o PRD por sugerir que na base da moção de censura estava uma história das Estónias. Se fosse uma história das Arábias ainda podia haver algum mistério ... mas aqui é tudo claro.

Risos do PSD.

E vejam, Srs. Deputados, como se confirma a total insensibilidade e inadvertência do dito partido para a política externa - como aliás para as outras políticas. Então não é desastroso para a imagem de Portugal no exterior apresentar uma moção de censura na véspera da partida da primeira figura do Estado, o Sr. Presidente da República, para uma visita oficial ao Brasil? E não quero deter-me no que tudo isto representa para Portugal no momento em que, depois de concluídas de forma honrosa as negociações sobre Macau, o Primeiro-Ministro deve deslocar-se à China para assinar, em nome do Estado Português, com o Primeiro-Ministro chinês, o acordo que celebrou com esse país.
Srs. Deputados, mesmo que houvesse algum motivo de reparo, cabe na cabeça de alguém abrir uma crise política por uma história daquelas?

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se o PRD quisesse ser coerente com os princípios que diz defender, teria bons motivos para se censurar a si próprio pelos erros cometidos ou por aquilo que, com o seu voto, impediu que fosse feito nesta Câmara, e podia aproveitar para se comprometer perante a opinião pública a um comportamento diferente no futuro, mais consentâneo com os interesses do País.
Podia censurar-se a si próprio por ter inviabilizado a revisão do regime jurídico da cessação do contrato de trabalho e dos contratos a prazo, assim como a disciplina jurídica do trabalho temporário, leis importantes para a expansão do investimento, modernização da nossa economia, combate ao desemprego e para criar melhores perspectivas aos jovens.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Deveria auto censurar-se por ter inviabilizado a aprovação de legislação tendente à estabilização da posse e exploração da terra, de modo a aumentar a produção e a produtividade da nossa agricultura.
O mesmo deveria fazer em relação ao Regulamento Disciplinar da PSP, por o ter inviabilizado ao recusar ao Governo a necessária autorização legislativa.
O PRD deve igualmente autocensurar-se por ter rejeitado in limine, sem querer discutir, a proposta das Grandes Opções do Plano a Médio Prazo, às quais fez referências elogiosas quando se reuniu com o Governo e que o seu próprio presidente considerou um «grande documento» em entrevista concedida à rádio em 27 de Novembro de 1986.
Mas o PRD não se limitou a inviabilizar diplomas tão importantes para o País. Colaborou activamente no desvirtuamento de propostas de lei do Governo.
Foi isso que aconteceu com as propostas de lei do Orçamento do Estado para 1986 e 1987, com a proposta de lei relativa aos salários em atraso e, de modo gritante, com a proposta de lei de licenciamento das estações emissoras de rádio. Neste caso, a subversão do diploma do Governo foi tão grave que este se viu mesmo obrigado a retirar a sua proposta, não pactuando, assim, com a solução que veio a ser consagrada e que foi vetada pelo Presidente da República, por consubstanciar uma inadmissível violação do direito da igreja católica e da Radiodifusão Portuguesa e conter mecanismos de censura sobre órgãos de comunicação privados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isto, o PRD, se fosse coerente, como diz ser, deveria autocensurar-se e comprometer-se a uma actuação diferente no futuro.
Porém, há mais razões para se auto-recriminar.

A proposta de lei n.º S/IV, que tem em vista atribuir um canal de televisão à igreja católica, baixou à respectiva comissão em 27 de Fevereiro de 1986 por 30 dias. Sobre os 30 dias há passou mais de um ano. Repito, mais de um ano.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Ainda bem!

O Orador: - Que fez o PRD para pôr termo àquela situação, sendo tão pródigo como é em afirmar que tem dado um precioso contributo para a eficácia do funcionalmente instituição parlamentar? Ou considera eficácia mais de um ano para uma comissão dar parecer sobre uma proposta de lei?

O Sr. Joio Amaral (PCP): - O Sr. Ministro não diz que está lá!

O Orador: - Também a proposta de lei n.º 14/IV, sobre o serviço militar, está na respectiva Comissão desde 12 de Junho de 1986.
A proposta de lei n.º 20/IV, que regula o exercício da radiodifusão, e que deveria ser discutida e votada antes da Lei de Licenciamento das Estações Emissoras, faz em comissão desde 27 de Maio de 1986 e aí continua sem sinais de vida.
A proposta de lei n.º 28/IV, sobre o arrendamento rural, baixou à respectiva comissão em 25 de Julho de 1986 e aí dorme o sono do esquecimento, conjuntamente com a lei do emparcelamento rural, esta desde 18 de Dezembro de 1986.
Recorde-se ainda que a lei de segurança interna está em comissão há mais de oito meses, quando aí havia baixado apenas por 90 dias.
O PRD, co-responsável por esta situação altamente desprestigiante para a Assembleia da República e nociva para o País, devia, também por esse motivo, penitenciar-se, tanto mais que afirma ser a locomotiva da eficácia parlamentar.

Aplausos do PSD.

Mas o Partido Renovador é ainda um dos agentes mais activos dos erros e das inconstitucionalidades praticadas por esta Assembleia. É cúmplice do erro cometido com o artigo 88.º da Lei do Orçamento do Estado para 1987, foi autor da discriminatória e inconstitucional proposta de incriminação exclusiva dos membros deste governo - que acabou por retirar manifestamente a contragosto e para evitar uma derrota. É protagonista das inconstitucionalidades que o Tribunal Cons-

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titucional reconheceu na lei dos salários em atraso e no orçamento suplementar para 1986, bem como noutras inconstitucionalidades já arguidas pelo Governo.
Também o PRD não verá esgotados aqui os motivos para a reprovação dos seus actos, já que outros domínios há - como por exemplo o do uso do instrumento de ratificação - em que os seus exageros ainda são maiores, sendo assim responsável pela continuação de situações de grandes desperdícios de dinheiros públicos.
O PRD é também autor e figurante nas resoluções que suspenderam e ou alteraram, descaracterizando-os, os diplomas referentes à extinção da Empresa Pública de Parques Industriais e do IACEP, à criação da SILOPOR, à alteração dos estatutos da EPAC, à alienação de participações do Estado em empresas de comunicação social e à transformação da União dos Bancos Portugueses em sociedade anónima.
O PRD é ainda autor de dois bizarros pedidos de ratificação, que são os referentes à Lei Orgânica do Ministério do Plano e da Administração do Território e à Lei Orgânica do Ministério da Educação e Cultura, ambas elaboradas no âmbito de competência exclusiva do Governo.
O PRD deverá ainda penitenciar-se pelo papel relevante, por vezes até primordial, que tem desempenhado nas tentativas de perversão do nosso sistema democrático.

Aplausos do PSD.

Tomou ou apadrinhou iniciativas legislativas em matéria orçamental, advogou a imposição da forma de decreto-lei para actos administrativos com o único objectivo de os poder controlar por via da ratificação, violou a lei-travão.
Pode ainda o PRD autocensurar-se pela ausência de iniciativas legislativas suas nos domínios correspondentes às chamadas «reformas estruturais», que, com alguma hipocrisia, acusa este governo de não ter feito, ao mesmo tempo que não deixa fazer.

Aplausos do PSD.

Mas então, Srs. Deputados, que iniciativas tomou o PRD no domínio da agricultura, para além do projecto de lei sobre a atribuição de reservas, na peugada do PC, ferido, aliás, de manifesta inconstitucionalidade, que em 8 de Janeiro de 1987 baixou à respectiva comissão por dez dias e lá dorme também o sono do esquecimento?
Que iniciativas tomou o PRD no domínio das finanças, da defesa nacional, da justiça, da indústria, do comércio, dos transportes e comunicações, do trabalho ou do ambiente?
Considerará o PRD que agiu com a diligência devida em matéria de preenchimento das duas vagas de juizes existentes no Tribunal Constitucional?

Protestos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

E que diz da não eleição ainda do Alto Comissário contra a Corrupção que devia ter ocorrido até 4 de Janeiro passado?
Não fora melhor que o PRD, em vez de gastar o seu tempo e energias em obstruir e interferir indiscriminadamente na esfera de competências do Governo, os tivesse utilizado para levar a Assembleia da República a fazer bem o que lhe compete?
Não terá o PRD consciência das gravosas consequências que decorrem da suspensão, por tempo indefinido, por parte da Assembleia da República, dos diplomas do Governo, como vem acontecendo sistematicamente pela via da ratificação? Já pensaram os Srs. Deputados renovadores e dos outros partidos que votaram favoravelmente a suspensão dos diplomas referentes à União de Bancos Portugueses, à SILOPOR, à EPAC, na situação de ir segurança e incerteza que provocaram, e no desprestígio que daí resulta para o Estado de direito e para as próprias instituições democráticas?

Aplausos do PSD.

Será que os Srs. Deputados não percebem que a vida e a actividade económica têm um outro ritmo que não o do funcionamento das comissões da Assembleia da República?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não seria melhor que o PRD utilizasse o seu tempo e os meios parlamentares ao seu alcance para exigir do Governo e concomitantemente proporcionar-lhe o cumprimento escrupuloso do seu Programa?
Não beneficiaria mais o Pais se o PRD quisesse contribuir para evitar o desperdício de dinheiros públicos, libertando de um interminável processo de ratificação o decreto-lei do Governo que estabelece as regras da alienação das participações do Estado em empresas públicas de comunicação social? Ou prefere o PRD, como tem preferido até aqui, pactuar com uma situação que desde 1975 até hoje já custou ao País mais de 20 000 000 de contos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Não dói a consciência a este partido que só a Empresa Pública Notícias/Capital, por inércia dos seus deputados, custe ao erário público mais de 1500 contos por dia? Repito... por dia.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Lá têm o excedentário geral cio PSD que resolve isso.

O Orador: - Parece que não; perante isso os Srs. Deputados confortam a sua consciência apresentando mais meia dúzia de requerimentos num mês, ou pedindo um rol de elementos ao Governo, ou reclamando em Plenário, em qualquer período antes da ordem do dia, a queda do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Que o PRD tenha actuado dês a maneira, embora altamente censurável, é de algum modo compreensível visto tratar-se de um partido novo, inexperiente, com dificuldades de definição ideológica, o que provoca problemas de identidade e sobrevivência e, consequentemente, de adaptação à democracia e às suas regras.

Aplausos do PSD.

Porém, já não é compreensível que o Partido Socialista tenha lido, em relação ao Governo, uma actuação tão negativa como o PRD, chegando mesmo ao ponto de o ultrapassar em alguns aspectos.
Não se entende que assim proceda o PS, partido democrático enraizado na vida política portuguesa, com uma tradição de luta política e de responsabilidades de

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Estado - que já foi governo durante largos períodos e que julga poder voltar a sê-lo. Não se compreende que um partido que se pretende perfilar, quando na oposição, como a única alternativa democrática credível, tenha alinhado com os (ditos) renovadores na inviabilização de propostas de lei do Governo que ele sabe bem serem importantes para o nosso país; e que tenha alinhado com o PRD na recusa de ratificação de diplomas do Governo significativos para a moralização do sector público, para a melhoria da sua eficácia, para a racionalização do sector empresarial do Estado. Surpreende-nos que tenha alinhado com o PRD, muitas vezes em despique irresponsável, no desvirtuamento de diplomas do Governo e na sua suspensão, com todos os inconvenientes daí decorrentes.
Também surpreende a actuação do Partido Socialista em todas as iniciativas e comportamentos dirigidos ao desvirtuamento das regras básicas do nosso sistema democrático, ao arrepio das regras constitucionais e das exigências de estabilidade política.
O PS não está pois ilibado de responsabilidades.
Mas a agravar a actuação do PS, há ainda o facto de o PS, enquanto governo, querer uma coisa e, enquanto oposição, querer outra. Com efeito, o traço dominante da actuação do PS no Parlamento - e fora dele - tem sido a duplicidade, o dar o dito por não dito em matérias de relevante interesse nacional. Foi o que aconteceu na votação de leis tão essenciais como as do trabalho, da reforma agrária, da lei orgânica hospitalar e da lei de licenciamento das estações de rádio.
Nalguns casos o Governo tinha-se limitado a reeditar soluções de projectos de diplomas aprovados pelo IX Governo Constitucional, com a assinatura de ministros socialistas. E este PS, numa atitude a todos os títulos reveladora da mais completa indiferença pelos interesses do País e dos Portugueses, apenas com o intuito de obstruir a acção deste governo, votou contra essas leis, em que havia aposto a sua própria assinatura.
Foram comportamentos irresponsáveis e imperdoáveis. Tanto mais imperdoáveis quanto é certo que o Governo tem cumprido escrupulosamente o estatuto da oposição e tem promovido mais encontros e mais diálogo do que qualquer outro governo no passado.
Assim, o Governo ouviu e dialogou com o PS e o PRD, e em relação a algumas matérias mais do que uma vez, a propósito da legislação laborai, Orçamento do Estado, Grandes Opções do Plano, Reforma Agrária, Estatuto Disciplinar da PSP, Estatuto da Condição Militar, Lei dos Salários em Atraso, gestão hospitalar, defesa nacional, integração europeia, recurso de militares para o Provedor de Justiça, Lei do Licenciamento de Estações Emissoras de Radiodifusão, segurança interna, etc.
Também sinto legitimidade para reafirmar aqui que nunca, e em qualquer ocasião anterior, foi tão elevado o número de membros do Governo que por iniciativa sua ou a pedido das comissões da especialidade compareceram na Assembleia para tratar de assuntos relativos à governação.
Srs. Deputados, se não foi este, então qual foi o governo que mais dialogou e respeitou o estatuto da oposição? Felizmente que os elementos estão disponíveis e as contas podem fazer-se! Qual foi o Governo que melhor diálogo institucional manteve com a Presidência da República? Com o anterior Presidente e com o actual.
Qual foi o governo que pela primeira vez conseguiu um acordo com os parceiros sociais?
Por todas estas razões não posso deixar de considerar como eivadas de má fé as acusações de falta de vontade de diálogo do Governo e de criação de conflitos com a Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A haver moção de censura, lógico seria que ela viesse do Partido Comunista, que, valha a verdade, sempre esteve contra este governo e já se manifestava contra ele mesmo antes de ter sido constituído.

Risos do PSD.

Mas não é o PCP que apresenta a moção de censura. É o PRD que, mais uma vez, como sempre aliás nos momentos cruciais, aparece a fazer aquilo que o Partido Comunista quer que se faça mas não lhe convém fazer.

Aplausos do PSD.

Protestos do PRD.

A moção de censura, repare-se, aparece precisamente no momento em que o PCP procurava obrigar o PS a uma posição radical na luta contra o Governo.
A votação desta moção de censura serve pois essencialmente os interesses dos comunistas, que por todas as formas procuram evitar que em Portugal se estabilize um regime democrático de tipo ocidental.
Os comunistas não se conformam com a nossa entrada nas Comunidades Europeias e sobretudo não toleram que ela tenha constituído um êxito e não tenha sido o desastre nacional que vaticinavam.
É quando o clima de confiança dos agentes económicos começa a ganhar força, é quando o desenvolvimento e o progresso começam a ganhar raízes mais fortes, que o Partido Comunista, por interposto partido, lança uma crise política.

Risos do PRD.

Os comunistas não toleram um governo de legislatura num Portugal democrático. Tudo farão para evitar a normalização da nossa vida institucional e a recuperação da economia portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As responsabilidades não cabem exclusivamente a quem toma a iniciativa da crise. Esta foi provocada obviamente pelo PRD, em consonância perfeita com os desígnios estratégicos do PCP. Perante esta situação o País avaliará as responsabilidades de cada um dos partidos. E para isso é relevante o voto da moção de censura.
A votação de uma moção de censura não consiste apenas na declaração de concordância ou discordância relativamente à política geral do Governo.
A moção de censura é um instituto constitucional demasiadamente importante para se esgotar na expressão de um mero juízo opinativo. Porque a sua aprovação por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções implica a queda do Governo.
Quem aprova uma moção de censura assume também as consequências, os resultados, os efeitos necessários da sua decisão.
Por isso não compreendemos, ninguém de bom senso compreende, como um partido que, pela voz do seu

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líder, considera a moção de censura «inoportuna» e «irresponsável» pode declarar depois que vota a favor da mesmíssima irresponsável e inoportuna moção de censura.

Aplausos do PSD.

Como consegue um partido que se diz responsável subscrever a moção de censura sem poderar as razões de oportunidade em termos nacionais e os fundamentos de uma iniciativa que ele próprio condena?
Perante a moção de censura em discussão, cada partido e cada deputado tem de assumir as suas responsabilidades.
Quem provocou a crise foi iniludivelmente o PRD quando, surpreendendo o País, que queria e quer estabilidade, decidiu apresentar uma moção de censura.
Mas quem votar a favor assume também - como é óbvio - a co-autoria da crise. Nenhum exercício de retórica, por mais hábil que seja, convencerá os Portugueses do contrário.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, em política, pelo menos tão importante como a ética da convicção é a ética da responsabilidade.
Então o que quer dizer se a Assembleia da República aprova uma moção de censura ao Governo sem saber exactamente as consequências dessa mesma aprovação, para além de conduzir à queda do Governo?
Trata-se de uma completa irresponsabilidade política, como o têm salientado, com coragem e desassombro que cumpre enaltecer, algumas figuras da oposição que têm destacado a irresponsabilidade de querer derrubar um governo sem que se saiba o que fazer a seguir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É evidente que aquilo que profundamente me preocupa não é propriamente o problema da perca de credibilidade do partido ou dos partidos que subscrevem este tipo de atentados à ética da responsabilidade que deve orientar o comportamento democrático.
Estamos convictos que esta violação da ética política democrática será punida, pois estamos em democracia e felizmente existe sanção eleitoral.

Aplausos do PSD.

Mas preocupa-me, devo dizer que me preocupa sinceramente, que um determinado sistema institucional possa produzir decisões num sentido completamente oposto àquele que é o da sensibilidade geral do País.
Com efeito, é evidente que a imensa maioria do povo português deseja presentemente estabilidade governativa e, quanto ao essencial, apoia a acção do actual governo.
Todos os Srs. Deputados no seu íntimo sabem que, se a moção de censura for aprovada, tal não acontece porque o Governo esteja a governar mal aos olhos dos Portugueses, mas precisamente porque há quem queira travar o sucesso da actividade governativa.

Aplausos do PSD.

É evidente que os partidos não têm necessariamente de seguir o sentido da opinião pública. Cabe-lhes um certo poder de iniciativa. Mas se o sistema institucional permite que o resultado de uma determinada orientação nos partidos produza efeitos completamente opostos ao sentida da vontade popular, então algo está errado.
Num regime democrático tem de existir o mínimo de congruência entre o sentimento majoritário da população e os resultados concretos produzidos pelo próprio funcionamento do sistema institucional. Não é admissível que a lógica de competição partidária provoque efeitos que alienam o apoio da população ao próprio funcionamento do regime.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo o que fica dito, estou certo de que os Srs. Deputados sabem que, para o povo Português, não é o Governo que merece ser censurado.
O povo português, esse, se tivesse o direito de apresentar hoje aqui uma moção de censura, remetê-la-ia para o PRD <_ p='p' lamentável='lamentável' este='este' todo='todo' processo...='processo...' para='para' em='em' acompanha='acompanha' quem='quem' o='o'>

Aplausos ao PSD.

... que vem, ao fim o ao cabo, fazer o jogo do PCP, prejudicando o percurso que Portugal tem vindo a trilhar no sentido do desenvolvimento, do progresso. E da melhoria das condições de vida da população.
O que preocupa os Srs. Deputados da oposição é saber qual do;, seus partidos é oposição com mais força. A mim, o que me preocupa é governar cada vez mais de acordo com os interesses e as aspirações de Portugal e dos Portugueses.

Aplausos ao PSD.

Esta Assembleia, estes deputados, sabem muito bem que esta crise é artificial. Os Srs. Deputados estão bem cientes de que o País não quer a queda do Governo. O que os Srs. Deputados não suportam é que o Governo e governe bem.

Aplausos co PSD.

Os Srs. Deputados assustam-se, apavoram-se, porque sentem que o Governo tem o apoio da maioria da população. For isso resolvem agir, destruindo.
Infelizmente, quem paga, quem sofre com esta grande leviandade e inconsciência é Portugal e os Portugueses.
Por isso, quero de que a grande maioria do povo português me acompanha, deixo aqui o meu mais veemente protesto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que pediram a palavra, para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Primeiro-Ministro, os seguintes Srs. Deputados: Sousa Pereira, João Corregedor da Fonseca, Lopes Cardoso, Carlos Brito, Jorge Lacão, Seiça Neves, Barbosa da Costa, Carlos Martins, Alexandre Manuel, Carlos Matias, Vasco Marques, Ivo Pinho, Ramos de Carvalho, Silva Lopes, Carlos Carvalhas, António Guterres, José Magalhães, Marcelo Curto, Sá Furtado, Vítor Ávila, Vítor Hugo Sequeira, Tiago Basto i, José Seabra, Cristina Albuquerque, Magalhães Mota, Vitorino Costa, João Brito, Pinho Silva, Corujo Lopes, lida Figueiredo, Marques Júnior, Carlos Lilaia, Manuel Alegre, Agostinho de Sousa, Hermínio Martinho e João Amaral.

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Os Srs. Deputados inscritos ficam com a palavra reservada para o recomeço da sessão, que terá lugar às 15 horas.

Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Guerreiro Norte.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Hermínio Martinho: O PRD reivindica uma nova forma de fazer política que se caracteriza pela ética e pela moralidade, pautando o seu comportamento mais por objectivos nacionais do que por interesses partidários.
Naturalmente que esta actuação pressuporá da sua pane uma redobrada cautela e atenção no uso de um instrumento constitucional de tamanha importância e significado político como a moção de censura, designadamente a existência de um governo alternativo.
Ora, o secretário-geral do Partido Socialista classificou a atitude do PRD de irresponsável, já que não consultou os outros partidos.
Verifica-se, assim, que o PRD, ao apresentar a moção de censura, exerceu legitimamente um direito, mas não acautelou o dever político correspondente.
Pode-se concluir daqui que o PRD abandonou os seus preconceitos de ordem ética e enveredou por jogadas políticas, que tanto tem denunciado?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Hermínio Martinho: Nós dois temos uma coisa em comum...

Risos do PS e do PRD.

... que é o facto de sabermos pouco de finanças. Só que V. Ex.ª teve a ousadia, diria mesmo a imprudência, de tentar dissertar, ao longo da sua intervenção, sobre temas financeiros. Penso que isso não terá sido fruto de uma reflexão rigorosamente pessoal, mas eventualmente de contributos que terão vindo de outros seus colegas de bancada. E por isso se percebeu que V. Ex.ª produzisse aquela longa e maçadora intervenção de hora e meia com algum martírio. Acho até que o deputado Hermínio Martinho quase foi o deputado Hermínio «Martírio» ao proferir uma intervenção daquele jaez.
Vou tecer alguma consideração sobre outras partes da sua intervenção, nomeadamente sobre os fundamentos que subjazem à apresentação desta moção de censura na Assembleia da República.
Referiu V. Ex.ª, a certa altura da sua intervenção, que esta moção de censura aqui apresentada pelo PRD foi profundamente reflectida, não se tratando de uma moção de censura precipitada. Estou de acordo, não foi uma moção de censura precipitada, foi uma apresentação de moção de censura feita de forma irresponsável e leviana.

Protestos do PRD.

E de forma irresponsável e leviana porquê? Porque VV. Ex.ªs aproveitaram, na sequência do comunicado do Governo, o problema da Estónia e não se coibiram de apresentar, discutir e votar uma moção de censura num momento delicado em que o Presidente da República vai ao Brasil numa visita de Estado importante para o País. Ora, isso é irresponsável!

Protestos do PRD.

E é irresponsável também porque, ao contrário daquilo que o general Ramalho Eanes dizia quando era Presidente da República - que não se devia derrubar ou que não se devia substituir o Governo sem haver uma alternativa credível -, VV. Ex.ªs até agora não conseguiram indicar nenhuma alternativa credível para este governo. Dizem apenas: «nós negociamos tudo, nós discutimos tudo». Isso é o cúmulo da irresponsabilidade!
É esta a nova ética política que o PRD quer vir aqui trazer?

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O que até agora resultou das conversações, das contra conversações, das negociações foi que VV. Ex.ªs têm pressa de ir para o Governo a todo o transe e que, inclusive, não se cobrem de tentar fazer com que o Governo venha a ser liderado pelo partido que foi o principal derrotado nas últimas eleições. Quando arguimos a ilegitimidade política, quando falamos em fraude política é a isto que nos queremos referir!
É óbvio que qualquer governo minoritário é legítimo, é legal e é constitucional. Simplesmente, o partido que foi o principal derrotado nas últimas eleições, que desceu 167o nessas mesmas eleições não quis aqui constituir um governo.
VV. Ex.ªs lembraram-se agora, passado ano e meio, de que podem constituir um governo alternativo ao actual? Por que não se lembraram disso a seguir às eleições? Por que não quiseram assumir essa responsabilidade a seguir às eleições?
É esta ética política que o PRD tem para nos apresentar?

É isto que gostaria que V. Ex.ª esclarecesse.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Deputado Hermínio Martinho, creia que, com toda a sinceridade, me é extremamente penoso ver V. Ex.ª colocado onde está, na situação difícil de epicentro desta crise política. Isto porquanto sou daqueles que apreciam as suas qualidades, a sua simpatia pessoal. Aliás, são essas qualidades e simpatia pessoal - que julgo serem geralmente apreciadas pelo povo português - que fazem de pessoas como o Sr. Deputado aqueles indivíduos essencialmente vocacionados para presidir aos destinos de uma cruz vermelha, de uma associação dos escoteiros de Portugal ou até de uma «associação dos amigos dos agricultores abandonados».

Risos do PSD.

No entanto, Sr. Deputado Hermínio Martinho, o que queria dizer-lhe é que para se vir aqui fazer um dis-

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curso tem de se ter uma vocação política quanto mais não seja momentânea, e essa vocação falhou aqui neste momento.
O discurso de V. Ex.ª foi um discurso fraco, desgarrado; foi um discurso que adormeceu as bancadas da Assembleia da República, ...

O Sr. Armando Fernandes (PRD): - Não se nota muito!

O Orador: - ... apenas entrecortado aqui ou ali por algumas palmas da sua bancada que, voluntariosa, lhe deu apoio.
O Sr.. Deputado Hermínio Martinho disse que esta não se tratava de uma moção de censura contra o Presidente da República. Bem, então será o caso de uma bala perdida que, digamos, apenas atravessou de raspão a perna da visita do Sr. Presidente Mário Soares ao Brasil.
Sr. Deputado Hermínio Martinho, quando o Governo apresentou aqui, em Junho do ano passado, a moção de confiança, foi censurado, foi extremamente criticado por ter previamente anunciado nos órgãos de comunicação social que o ia fazer, antes da sua formalização na Assembleia da República.
Assim sendo, pergunto-lhe: agora que o PRD fez exactamente a mesma coisa, qual é o seu comentário a esse respeito?
O Sr. Deputado diz que a estabilidade não dá virtudes a quem as não possui. Contudo, dir-lhe-ia que a estabilidade não oculta os vícios daqueles que virtudes não demonstram.
O Sr. Deputado disse também que o Governo demonstra incapacidade política de diálogo.
Sr. Deputado Hermínio Martinho, num partido onde por vezes as pessoas falam, tomam posições e decisões a título pessoal, quantas vezes foi V. Ex.ª, na sua qualidade de alto dirigente do PRD, contactado, convocado ao mais alto nível do Governo para, com membros do Governo, discutir e encontrar consensos sobre algumas matérias de interesse nacional?
Disse o Sr. Deputado Hermínio Martinho que à RTP apenas vão os membros do Governo.
Isso não é verdade, Sr. Deputado. Porém, se isso lhe interessa bastante, posso dizer-lhe que entrevistas como aquela que o líder do seu partido deu há alguns dias na televisão, que discursos como aquele que V. Ex.ª aqui proferiu há pouco, esses podem ter não o tempo normal de passagem na televisão, mas o triplo. Isto porque quanto mais tempo passarem na televisão maior credibilidade dão às sondagens que apontam para uma subida espectacular do PRD, em termos eleitorais: a subida destas bancadas para as galerias do público.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - O Sr. Deputado Hermínio Martinho brindou esta Câmara com um longo discurso onde praticamente nada faltou, desde uma ode pouco ritmada à liberdade até a algumas franjas de filosofia - filosofia do tempo, a evocação da Sagrada Escritura, «há tempo para tudo, para amar e morrer», «o ser e o tempo». Portanto V. Ex.ª fez uma certa lucubração filosófica sobre o tempo. Contudo, não é isso o que fundamentalmente interessa.
O PRD apresenta aqui uma moção de censura. É natural que sempre que se censure alguém, o dedo em riste seja sempre a contra-indicação da virtude. Com efeito, quanto estigmatizamos os outros com os estigmas do pecado, do lado de lá está o pecado e do lado de cá a virtude. Sempre que censuramos os outros, revemo-nos automaticamente no espelho das nossas virtudes.
O PRD não foi parco na sua autocontemplação. Definiu-se a si próprio com uma matriz - e penso estar a citá-lo mais ou menos literalmente - «genética, feita de nova política, nova moral, novo rigor e nova competência). Portanto, no mundo do pecado da política, cai aqui, como a Virgem do Apocalipse («vestida de sol, coroada de estrelas e com os pés envoltos em luar»), esta «virgem» do Partido Renovador Democrático.

Risos do PSD.

Aliás, este é também da Sagrada Escritura... Risos do PSD.

E é com esta «virgem vestida de sol, coroada de estrelas e co n os pés envoltos em luar» que temos de nos haver com este partido novo.

Mas será efectivamente novo este partido? Tenho para mim que não. Tenho para mim que, nascido ontem, este partido é já mais velho que Matusalém.
Na verdade, este partido é, de todos os partidos desta Câmara, aquele que não tem futuro. Este partido nunca anuncia nada; este partido recorda. Quando lhe perguntam qual o seu modelo, qual o seu programa, este partido recorda uma imagem de ética que passou aí pelo poder: exibe quatro costelas de Catão e a imagem de ética que está aí.
Este partido não anuncia, recorda; não semeia, colhe; não investe, delapida aquilo a que chama o seu capital político. Ironia do destino..., no pórtico programático de um partido de esquerda, a expressão «capital político» de um ex-Presidente da República.

Aplausos do PSD.

No entanto, o que é que é novo na actuação deste partido? Se olharmos bem - e porque quem censura define-se a si próprio, embora quem é censurado também possa censurar -, qual é a actuação deste partido nesta Câmara? Alguma vez, em relação a algum problema definido, este partido deu soluções prospectivas, tomou decisões, ou, pelo contrário, as suas soluções sempre foram soluções de «empata», de «adia», de «faz que anda mas não anda»? A verdade é esta e posso demonstrá-la.
Por exemplo, a propósito das leis do trabalho - promessa que o PRD fez antes das eleições, dizendo que esse ser a o objectivo do primeiro projecto de lei, mas deixemos isso -, as propostas foram feitas aqui e que é que o PRD diz? Sim? Não?

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Orador: Concluo já, Sr. Presidente.
Portanto, como ia dizendo, o que é que o PRD diz? Sim? Não? Nem uma coisa nem outra: estamos de acordo com as leis, mas discordamos da forma.

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Põe-se o problema da Reforma Agrária. Como resolver o problema? Sim? Não? Nem uma coisa nem outra: arranja-se mais uma instância, recorre-se do Ministro para o Supremo Tribunal Administrativo. Porém em que sentido? Isso não interessa muito...
Coloca-se a questão de conceder um canal de televisão à igreja católica e que é que diz o PRD? Sim? Não? Nem uma coisa nem outra: crie-se uma comissão e discuta-se.
Levanta-se o problema da corrupção e que é que faz o PRD? Propostas concretas para lutar contra a corrupção? Não! O PRD arranjou aqui uma solução que se traduz na legitimidade relativamente quebrada da actual figura que tem a seu cargo a liderança da luta contra a corrupção. Na verdade, essa solução assenta numa legitimidade que, à luz do ordenamento jurídico português, já não é uma legitimidade plena, mas duvidosa.
A propósito da televisão privada, o que é que faz o PRD? Sim? Não? Nem uma coisa nem outra. Resolve-se o problema através de uma concessão? Não! A imaginação escolástica do PRD havia de arranjar sempre mais uma ideia: não é uma concessão, mas uma subconcessão.

Vozes de protesto do PRD.

Isto está a ser descontado no tempo da minha bancada, Srs. Deputados!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente. Peço que desconte este tempo no tempo global da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Mas, de qualquer modo, a figura regimental do pedido de esclarecimento comporta apenas três minutos, Sr. Deputado.

O Orador: - Então, Sr. Presidente, se me permitisse, faria agora algumas perguntas ao Sr. Deputado Hermínio Martinho.

Vozes do PRD: - Ah!...

O Orador: - Não se enervem, Srs. Deputados, que eu não tenho o recurso do copo de água como tinha o Sr. Deputado Hermínio Martinho e não posso meter água.

Risos do PSD.

Bem, penso que a primeira pergunta muito séria que se deve colocar é a seguinte: Ó que é que o PRD quer concretamente com esta moção de censura? Quer efectivamente derrubar o Governo ou quer, como começou por dizer, e como o disse o Sr. Deputado Hermínio Martinho, apenas testar o Parlamento?
O PRD começou por dizer que era preciso clarificar as relações entre o Governo e a Assembleia da República. Quer efectivamente derrubar o Governo, ou não?
Em segundo lugar, gostaria também de saber qual a alternativa que o PRD tem.
O PRD subiu ali à tribuna e disse que a Constituição não impunha ainda a exigência de uma moção de censura construtiva. Só que a Constituição não é o «guia prático do escoteiro mirim»! A Constituição é o conjunto de coordenadas jurídicas do político!
É evidente que a Constituição não impõe isso. Mas a moral, Sr. Deputado, a moral política, aquela que os senhores trouxeram lá desse universo de onde caíram aqui, vestidos de sol, coroados de estrelas e com os pés envoltos em luar, não lhes dá nenhuma responsabilidade política? Não há moral para isto?
O Sr. General Ramalho Eanes dizia há tempos o seguinte: «Cavaco Silva não transacciona lugares por saber que eles só funcionam com pessoas capazes».
O Sr. General Eanes fez esta afirmação, isto é, o Sr. General Eanes proclamou, ubi et orbi, que com este governo não há clientelismo. Ora, uma das causas da moção de censura é precisamente o clientelismo. Então como conciliar estes dois factos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, tomo a palavra para protestar e não para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Queira V. Ex.ª desculpar, mas se me tivesse dito que pretendia a palavra para esse fim, ter-lhe-ia concedido em primeiro lugar, tal como manda o Regimento.

O Sr. Silva Marques (PSD): - De qualquer modo, em matéria de tempo, também é tempo para o meu protesto.

Risos do PSD.

Sr. Deputado Hermínio Martinho, eu protesto porque o PRD, em nome do destino do povo português, da nação portuguesa, tinha a obrigação patriótica, cívica de trazer uma autêntica renovação ao sistema político português. Não tanto jurídica, porque a nossa urgência não é a de renovar os papéis, mas a de renovar os comportamentos humanos na política.
Era essa a esperança de todos (nossa também) quando VV. Ex.ªs anunciaram a vossa vinda à vida política portuguesa. No entanto, causaram a mais profunda frustração a todos nós, Portugueses, independentemente de pertencermos ou não ao mesmo partido, mas na certeza de que pertencemos ao mesmo país, à mesma nação e que temos de construir em comum o mesmo país e o mesmo futuro.
Os senhores vieram renovar no sentido de retirar, através do comportamento político, o nosso sistema da «partidarite», isto é, da lógica cega da movimentação política? Não! Os senhores vieram agravar ainda mais essa «partidarite», ao ponto de tomarem uma iniciativa política com a responsabilidade da vossa moção de censura por mera lógica de sobrevivência partidária!

Aplausos do PSD.

Os senhores vieram atenuar o excesso de «parlamentarite» do nosso regime? Não! Os senhores vieram agravar até ao paroxismo a «parlamentarite» do regime português! É essa a vossa renovação?! Não é!
Os senhores vieram dar um contributo para a coerência política (e de tanta incoerência política tem sofrido o nosso sistema político)? Não! Os senhores vieram fazer em frangalhos o próprio conceito de coerência política!

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Infelizmente, os senhores não vieram renovar! Os senhores vieram dar um contributo para andar para trás, para agravar todos os vícios de que, infelizmente, o nosso sistema político tem sofrido!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Hermínio Martinho, os senhores foram ao ponto não apenas de recusar o conceito positivo de moção de censura construtiva; os senhores tiveram a ousadia de a apresentar perante o povo português como uma moção de censura experimental.

O Sr. José Magalhães(PCP): - Experimental?! Experimente-a!...

O Orador: - Só que, Sr. Deputado Hermínio Martinho, infelizmente não há experiência laboratorial quando se trata da sociedade e da vida dos homens - nada aí é experimental. Pode ser construtivo ou destrutivo, mas, infelizmente, não é experimental. Por isso a vossa moção de censura não é experimental.
Em vez de terem dado um passo em frente para introduzir no funcionamento prático das nossas instituições essa ideia positiva da moção de censura construtiva, o que é que os senhores «renovaram»? «Renovaram» introduzindo não a ideia, mas a prática de moção de censura destrutiva!
E esta a vossa renovação, Sr. Deputado Hermínio Martinho? Não é, e digo-o aqui sem receio de qualquer agravo pessoal. Estou a discutir politicamente com o Sr. Deputado, pois é a minha obrigação de cidadão português.
Há pouco, o Sr. Deputado disse que não éramos livres. Não somos livres, Sr. Deputado Hermínio Martinho?! Então a noção de liberdade é aquela que corresponde ao nosso governo? Se levássemos essa tese às suas últimas consequências, o Sr. Deputado Hermínio Maninho tinha acabado de preconizar o mais absurdo, o mais extremo dos vanguardismos em termos de Estado, a negação mais pura do conceito de democracia.
Se nós não somos livres, Sr. Deputado Hermínio Martinho, peça eleições e dê a voz ao povo português!

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Hermínio Martinho, os senhores ousam ainda hoje chamar-se de renovadores quando os outros, sim, renovaram?! E reafirmo-o sem receio de me acusarem de estar a defender causa própria: outros que já cá estavam renovaram!
Renovou-se no PSD graças à liderança de um homem, do grande dirigente nacional que é Cavaco Silva!

Aplausos do PSD.

Risos do PS, do PRD e do PCP.

Não riam, que estou a falar a sério, pois estou a pensar no meu país! Os senhores é que não estão a pensar no meu país! Podem rir à vontade!
Como ia dizendo, podia ter-se renovado, sim, se o líder que saiu do congresso do PS não tivesse, aos primeiros embates da luta política, metido as suas teses renovadoras no bolso! Isto porque a sua tese fundamental, a sua tese de abertura do futuro era a de que o PS não voltaria ao poder sem eleições.
Esta é a base da própria lógica da moção de censura construtiva, com a vantagem de a censura ser feita pelo juízo directo do eleitorado, portanto com a eliminação de todo o resto de «parlamentarite».
Sr. Deputado Hermínio Martinho, os senhores ousam chamar-se renovadores porque vivem em liberdade, e a liberdade é essa responsabilidade suprema de se poder construir ou destruir, de se ser sensato ou insensato e de, inclusivamente, fazer o pino, fazer da coerência uma inversão completa.
Os senhores ousam chamar-se renovadores porque estão a ver a realidade do nosso país a realidade presente, passada sobretudo, a realidade futura - com inversão de imagem, porque estão a vê-la de cabeça para baixo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de saber que a metodologia que o Sr. Presidente está a seguir m orientação dos trabalhos.
Creio que até agora tem sido norma aprovada na conferência dos presidentes dos grupos parlamentares que neste período de pedidos de esclarecimento, quer, no caso concreto, ao Sr. Deputado que apresentou a moção de censura quer depois ao Si. Primeiro-Ministro, tenhamos por referência os tempos das figuras regimentais, e o tempo estabelecido regimentalmente para o pedido o e esclarecimento é de três minutos.
Não sei se o S'. Presidente se está a ater a este princípio que tem regido outros momentos da nossa actividade ou se os pedidos de esclarecimento contam nos tempos dos respectivos partidos e são, portanto, feitos sem limitação durante todo o tempo que o deputado pretenda fazê-los.
A ser assim, creio que isso é gravemente prejudicial ao nosso trabalho. Porém, gostaria que o Sr. Presidente esclarecesse essa questão.

O Sr. Presidente: - A interpelação é pertinente, na medida em que houve efectivamente dois casos que excederam os três minutos, apesar da costumada generosidade com que a Mesa habitualmente atende a estas situações.
Espero, Srs. Deputados, em função do apelo que já fiz, mesmo a esses dois Srs. Deputados que se excederam, que façam o favor de respeitarem a figura regimental, excedendo pouco e, se possível, limitando-se aos três minutos correspondentes ao direito que cada um dos Srs. Deputados tem para formular a respectiva pergunta. Vamos, pois, ver se conseguimos limitar a formulação da pergunta aos termos regimentais.
Muito obrigado. Sr. Deputado Carlos Brito, por se ter lembrado e me ter dado oportunidade de fazer de novo este apelo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Sr. Deputado Hermínio Martinho, a intervenção de V. Ex.ª, que teve uma extensão bastante apreciável, é, todavia, no plano político, inversamente proporcional, na clareza dos seus objectivos, à duração do tempo que ela própria demorou.

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A essa luz gostaria de lhe fazer duas perguntas: uma pergunta sobre a génese da crise e outra sobre a saída da crise.
Há um ano e três meses o PRD viabilizou o programa do governo do PSD. Há cerca de um ano viabilizou o Orçamento do Estado do PSD. Há oito ou nove meses viabilizou uma moção de confiança ao governo do PSD. Há três meses viabilizou o Orçamento do Estado do governo do PSD.
Em quatro momentos decisivos da vida nacional parlamentar o PRD diz sim, deixa passar, deixa governar; diz que o Governo tem capacidade e legitimidade. Ha dois meses o líder do PRD louva o Primeiro-Ministro, louva a sua acção.
Se é assim, se estes foram os factos perante o País, o que é que, em dois ou três meses, fez alterar o posicionamento político do PRD?
Mais: com que lógica, daquela bancada, o Sr. Deputado Hermínio Martinho hoje cita leis, argumentos e factos anteriores ao comportamento político de coonestacão do PRD à acção do governo do PSD?
Como é que hoje em dia o PRD diz uma coisa e invoca argumentos que, no passado - no momento próprio -, calou, omitiu, silenciou ou aceitou? Qual a palavra do PRD? O que é que o PRD quer de si próprio? Ao fim e ao cabo, o que é o PRD?
Sr. Deputado Hermínio Martinho, a pergunta fundamental é esta: esta moção de censura, que hoje aqui apresentou, é para o Governo ou é para o vosso comportamento pretérito, durante toda a vida política portuguesa, que afinal hoje os senhores vêm recusar como legítimo, adequado, necessário e correcto? Afinal, quem é que os senhores criticam: o Governo ou a vocês próprios?
A segunda questão básica é a da saída para a crise. Os senhores abriram ilegitimamente uma crise e a questão que se coloca é esta: qual a saída?
Não queria nem posso prescindir de tentar fazer o ajustamento, inevitável, entre o comportamento actual do vosso líder partidário e o daquele que foi Presidente da República durante dez anos.
Do meu ponto de vista, há um traço de coerência na vossa vida política. É que VV. Ex.ªs prolongam em Portugal a instabilidade que o general Eanes provocou durante os seus mandatos presidenciais.

Aplausos do PSD.

De qualquer forma, recordo que em 1978, sendo Presidente da República o general Ramalho Eanes, com um governo PS/CDS maioritário na Assembleia, não houve qualquer tentativa de arranjo parlamentar, não houve qualquer tentativa de novo encontro de fórmulas: o general Eanes disse pura e simplesmente «demito o Governo».
Segunda fase: em 1983, um governo da Aliança Democrática dispunha-se a governar e havia uma maioria na Câmara PSD/CDS/PPM. Nessa altura, o general Ramalho Eanes, não atendendo sequer à maioria existente, pura e simplesmente, dissolve a Assembleia da República.
Em 1985, com um governo PS/PSD. Crise aberta. Em vez de encontrar também outra fórmula, no âmbito da Assembleia da República, o Presidente da República general Ramalho Eanes dissolve a Assembleia e convoca eleições antecipadas.
Nos três momentos essenciais da vida portuguesa dos últimos dez anos, o general Eanes tentou sempre criar dificuldades práticas ao partido dominante da vida política nacional da altura.
Hoje em dia, o PRD, perante o maior partido da vida política nacional, tem exactamente o mesmo comportamento. Mais: se o PRD é coerente com o modelo que o general Eanes desenvolveu enquanto Presidente da República, não deverá hoje ...

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente. Ainda bem que me lembrou para concluir o meu pedido de esclarecimento. E vou concluir desta maneira: se o PRD é coerente com o modelo do seu líder, a saída para a crise, que os senhores abriram, não deveria ser exactamente como o general Eanes fez nesses três momentos, ou seja, convocar eleições antecipadas? Se é assim, se a coerência é como a postura do então Presidente da República, como é que os senhores vêm hoje, noutra instância, falar de arranjos parlamentares, não dando voz ao povo?!
Que sentido faz a liberdade, que sentido de responsabilidade e de representação popular têm hoje os senhores?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Hermínio Martinho, esta procissão bastante desesperada dos deputados do PSD...

Risos do PSD.

...tal como antes já fora aflorada no discurso do Sr. Primeiro-Ministro, não lhe dá ideia de que o Governo e o PSD se deixaram convencer, pela sua própria demagogia e pela sua própria fanfarronice, de que se tinham transformado, ao fim e ao cabo e não se sabe por obra de quem, num Governo maioritário?

Vozes do PSD: - Vamos à prova!

O Orador: - Sr. Deputado Hermínio Martinho, como já tivemos ocasião de dizer publicamente, para nós, o grande mérito desta moção de censura, que o Sr. Deputado fundamentou com muita dignidade e grande detalhe...

Risos do PSD.

...é o de dar uma oportunidade ao povo português e, antes de tudo, às instituições democráticas de demitirem este governo e de o substituírem por um governo democrático, que seja realmente capaz de aproveitar as condições excepcionais da conjuntura externa, para resolver alguns dos grandes problemas nacionais.
Sr. Deputado, pensamos também que esta moção de censura teve um outro grande mérito, o de pôr a nu...

Risos do PSD.

... a situação anormal em que vivíamos, em que um governo minoritário se arvorava em maioritário...

Risos do PSD.

... e não só se propunha governar desconhecendo a Assembleia da República mas contra ela.

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Creio, ainda, Sr. Deputado Hermínio Martinho, que a moção de censura permitiu revelar uma coisa mais: a incomodidade do Sr. Primeiro-Ministro com a vida democrática. Há dias, numa entrevista ao Expresso, o Sr. Primeiro-Ministro dizia que há deputados a mais,...

O Sr. Silva Marques (PSD): - E há!

O Orador: - ... que há jornais a mais. Hoje, revelou-nos aqui o seu incómodo dizendo que há comunicados a mais, há encontros de partidos a mais, há conferências a mais. Manifestamente, o Sr. Primeiro-Ministro não está talhado para a vida democrática.

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS, de alguns deputados do PRD e do MDP/CDE.

Risos e protestos do PSD.

Não é um caso original! E sublinho que não é um caso original, pois a história política portuguesa conhece outros casos semelhantes.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Mas queria também dizer que revelou ainda a aversão do Sr. Primeiro-Ministro à Assembleia da República.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro tem esta aversão à Assembleia da República porque ela é o espelho permanente da sua falta de maioria parlamentar, é o espelho permanente da precariedade do seu próprio governo.

Protestos do PSD.

Sr. Ministro, aliás, Sr. Deputado, queria agora fazer-lhe uma pergunta, mas sem gastar muito tempo.
O Sr. Deputado Hermínio Martinho terminou o seu discurso dizendo que há tempo para tudo e eu pergunto-lhe se este não é o tempo de irmos um pouco mais longe e de considerarmos uma questão. É que o PSD e o Governo já puseram em marcha a máquina de manipulação para criar no País a ideia de que só há uma solução para a crise decorrente da caída do Governo: eleições antecipadas. É esse o seu entendimento, Sr. Deputado Hermínio Martinho?

Vozes do PSD: - Boa pergunta!

O Orador: - Ou entende que nesta Assembleia da República há soluções para a crise?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira fazer o favor de concluir.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente, vou concluir imediatamente.

A resposta do meu partido é a de que há soluções para a crise no quadro desta Assembleia da República. E é isso que desespera o Sr. Primeiro-Ministro e a bancada do PSD.

Aplausos do PCP, de alguns deputados do PS, de alguns deputados do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de defender a honra da minha bancada face a declarações do Sr. Deputado que acabou de intervir a propósito da figura política do líder do meu partido. É que o Sr. Deputado Carlos Brito acabou de referir que o Sr. Primeiro-Ministro, Professor Cavaco Silva, não está talhado para a vida democrática.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para esse efeito Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com toda a serenidade, gostaria de defender a honra da minha bancada, que apoia o Governo e Primeiro-Ministro, Professor Cavaco Silva, pelo fado de o Sr. Deputado Carlos Brito, despudoradamente, ter acabado de afirmar que o Sr. Primeiro-Ministro não está talhado para a vida democrática.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - É óbvio!

O Orador: - Quero afirmar peremptoriamente que, quer na nossa bancada quer no Partido Social Democrata, não admitimos insinuações deste tipo a nenhum dos nossos militantes e muito menos ao líder do nosso partido.

Aplausos do PSD.

Não admitimos que se confunda a crítica ao Governo, subjacente a uma moção de censura - que parece estar implícita na atitude política do Partido Comunista -, com o reconhecimento óbvio de que o nosso Primeiro-Ministro e todos os dirigentes do Partido Social-Democrata estão profundamente talhados para a vida democrática.

O Sr. Raul Rego (PS): - Não parece!

Protestos do PSD.

O Orador: - O que não esquecemos é que, por exemplo, o líder do Partido Comunista afirmou reiteradamente que nunca o nosso país conheceria uma democracia parlamentar.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Exacto!

O Orador: - De facto, nós não confundimos a forma como estamos talhados para viver em democracia ocidental com os conceitos que porventura perpassem nos países em que assumiram o poder, por via totalitária, os partidos afins do Partido Comunista Português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, se desejar dar explicações, tem a palavra.

O Sr. Curiós Brito (PCP): - Pois, terá de ser, Sr. Presidente.

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Não fiz nenhuma acusação infundada ao Sr. Primeiro-Ministro, não o caluniei.

Protestos do PSD.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Disparate!

O Orador: - O que eu fiz foi pegar em algumas afirmações do Sr. Primeiro-Ministro, relativamente a manifestações que são próprias da vida democrática, e dizer que a incompreensão face a essas manifestações da vida democrática e ao papel da Assembleia da República no nosso regime democrático, a incompreensão face às competências da Assembleia da República, decorrentes do nosso regime democrático, revelam dificuldade de compreensão, incomodidade - foi a primeira palavra que usei - e falta de talhamento para a vida democrática.
Estou convencido, porque acredito sempre na capacidade de evolução dos homens, que isto se aprende. O Sr. Primeiro-Ministro está há pouco na política, pode aprender estes valores da vida democrática.

O Sr. Silva Marques (PSD): - E há quem já não os aprenda!

O Orador: - Mas a verdade é que revela perante eles gravíssimas dificuldades e gravíssimas incompreensões. Foi esse o sentido da minha intervenção.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - O senhor é que tem de aprender a ser democrata!

O Orador: - Quanto à minha posição e à posição do meu partido face aos valores democráticos, devo dizer-lhe, Sr. Deputado António Capucho, que luto por eles desde criança. Portanto, não recebo lições nem do Sr. Deputado António Capucho, nem do Governo, nem da bancada do PSD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Deputado Hermínio Martinho - não o vou tratar por Sr. Ministro, isso fez o Sr. Deputado Carlos Brito, certamente por lapso, pois não creio que fosse antecipação -, em nosso entender, governar não pode significar exclusivamente preparar, melhorar, aliviar as condições de vida com que os Portugueses se debatem no presente.
Mesmo que assim fosse, seguramente que este governo não poderia receber da sua bancada uma crítica tão contundente quanto a que fez, mas um elogio pela maneira substantivamente provada como melhorou o nível de vida dos Portugueses desde que tomou posse até agora.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado!

O Orador: - Mas concordemos que governar significa mais do que isso. Significa preparar o futuro, significa ter em atenção a construção de um país novo e apostar nas novas gerações enquanto fermento de uma sociedade nova, que já estamos a construir.
Esta maneira prospectiva de encarar a gestão do poder, esta maneira séria de encarar a governação é a maneira que mais interessa às jovens gerações.
Deixe que lhe diga, Sr. Deputado Hermínio Martinho, que não pude deixar de assistir à sua intervenção com alguma perplexidade.
Como presidente da maior organização de jovens deste país, julgo que se deve colocar, neste momento e nesta Câmara, uma questão em nome da juventude: é facto ou não que este governo deu resposta a questões gravíssimas que afectam a juventude portuguesa? É verdade ou não que no seio da juventude portuguesa há uma maneira mais optismista, um rasto de esperança, que este governo, indiscutivelmente, veio abrir nos nossos tempos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Hermínio Martinho, a minha geração não compreende esta atitude do PRD.
Talvez fosse agora altura de perguntar aos deputados jovens dos outros partidos, que insistentemente têm desafiado a JSD para tomar posições diferentes daquelas que o PSD e o Governo às vezes aqui tomam, onde está a sua autonomia.
No momento em que nós entendemos que a resolução dos grandes problemas com que os jovens se defrontam exige estabilidade política, exige um governo que dê respostas como este está a dar, será que os Srs. Deputados vão demonstrar um posicionamento de autonomia, não subscrevendo uma atitude crítica em relação a este governo, ou será que se vão conformar com a disciplina partidária e vão votar também favoravelmente esta injustificada moção de censura ao governo do Professor Cavaco Silva?

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PRD.

O Orador: - Sr. Deputado Hermínio Martinho, não vou tecer considerações sobre a simultaneidade da apresentação da moção de censura com a visita de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República ao Brasil, mas gostaria de lhe fazer três perguntas muito concretas.
Primeira: está em condições de garantir que a moção que o Partido Renovador Democrático apresentou resulta de uma análise séria, fundada sobre o interesse nacional?
Segunda: está em condições de garantir que o principal móbil da moção que subscreveu não resulta de razões de estratégia vincadamente partidária?
Em terceiro lugar, está em condições de garantir à Câmara e ao País que quem está a ser julgado não é o Governo, mas o próprio PRD?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Martinho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, naturalmente, pensava ter de dispor de mais tempo para responder às questões colocadas, mas infelizmente as perguntas colocadas, relativas ao texto que li - longo, de 63 páginas, e não fui eu que atribuí a mim próprio 90 minutos -, têm, nele mesmo, resposta.

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Gostaria de começar por sublinhar que olho igualmente com todo o respeito todos os Srs. Deputados presentes nesta Câmara ...

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - ... e não gostaria de deixar de registar o facto de que a maioria dos deputados mais cotados da bancada do PSD não necessitam de formular pedidos de esclarecimento relativamente à minha intervenção, ..

Vozes do PRD: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - . o que, para mim, é significativo.

O Sr. António Capucho (PSD): - Ó Sr. Deputado! ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Para nós também!

O Orador: - Se quiserem fazer perguntas, ainda estão a tempo, pois não tenho dúvidas em responder a todas as questões.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Não merece!

O Orador: - É um registo que eu tenho o direito de fazer.

Uma voz do PSD: - Não sabe fazer!

O Orador: - E o Sr. Deputado, neste momento, está a mostrar aquilo que temos visto desde a apresentação da moção de censura. É que, ao contrario do que têm dito, se há deputados nervosos neste hemiciclo, são exactamente os da sua bancada.

Vozes de protesto do PSD.

Não esteja preocupado! Iremos ver no futuro quem terá lugar ali em cima, naquelas cadeiras,...

Aplausos do PRD.

... onde, aliás, estão pessoas que nos merecem o melhor respeito.
Gostaria só de lembrar que, na véspera das eleições de 6 de Outubro, os senhores - e alguns estão aqui - ainda diziam em todo o lado onde estavam, particularmente em Santarém, que eu não ia ser eleito deputado. Curiosamente, fui só o primeiro deputado a ser eleito por Santarém.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Muito bem!

O Orador: - Não estejam preocupados com isso, pois aqui não está ninguém nervoso.

O Sr. António Capucho (PSD): - Conhece mal o seu partido!

O Orador: - Conheço mal?! É natural que sim! Quanto às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Guerreiro Norte, que eu agradeço, pouco mais tenho a dizer sobre as questões de ética e moralidade do que aquilo que es á dito. Gostaria só de acrescentar um factor que me parece ter sido esquecido pelos Srs. Deputados que intervieram: olhem, como eu fiz questão de sublinhar na minha intervenção, paia aquilo que dissemos e para a coerência da nossa actuação em relação ao que dissemos.
Quanto à existência ou não de alternativa, é óbvio que existe. Sempre o dissemos, e eu disse-o aqui, nesta bancada, na minha última declaração política, em 25 de Julho do ano passado.
Já nessa altura eu disse que existia alternativa.

Uma voz do PSD: - Qual é?

O Orador: - Obviamente, que somos pessoas de respeito e dignidade e ela tem de ser apresentada em primeiro lugar o Sr. Presidente da República - se ele no-la pedir. Depois disso, não teremos dúvidas em a comunicar ao País. É isso que iremos fazer, como sempre temos feito.

Aplausos co PRD.

O Sr. Deputado Duarte Lima, cujas questões agradeço, tentou demonstrar que temos uma coisa em comum, o que é sabermos pouco de finanças.

Uma voz do PSD: - Ninguém diria!

O Orador: - Peço desculpa por discordar, mas, de facto, eu não i>ercebo nada de finanças e nunca o escondi.
Quanto ao facto de a moção de censura ser uma moção irresponsável e leviana... bem, talvez o PSD esteja a tentar camuflar na opinião pública...

O Sr. António Capucho (PSD): - Não fomos nós, foi o PS!

O Orador: - Vocês disseram-no.

Como eu estava a dizer, talvez se esteja a tentar camuflar na opinião pública aquilo que foi feito pelo PSD, injustificadamente, em Junho do ano passado, com a apresentação da moção de confiança.
É bom lembrar que nessa altura uma delegação desta Assembleia, chefiada pelo seu Presidente, se encontrava no estrangeiro. Nessa altura, por acaso, esse factor não contou!...

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Apesar de tudo, nós tivemos o cuidado de falar com o Sr. Presidente da República,...

O Sr. António Capucho (PSD): - Essa é óptima!

O Orador: - ... e, como eu também disse na minha intervenção, tivemos ocasião de acertar com o Sr. Presidente da República a forma de apresentação de uma decisão que tínhamos tomado e que, como lhe comunicámos, era irreversível.
Disse ainda que nós estávamos a demonstrar muita pressa em irmos para o Governo. Não temos, Sr. Deputado, e já o demonstrámos; se quiséssemos estar no Governo, esta íamos desde 1985. Isso é óbvio, é óbvio para toda a gente, mas não temos pressa.
A pressa que temos neste momento é a de mostrar ao País que é urgente e possível governar mais e melhor. Isso temos alguma pressa em demonstrar!

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Quanto ao Sr. Deputado Mendes Bota, devo dizer que o seu pedido de esclarecimento me suscitou uma questão. Dele ficou evidente que, de facto, o clientelismo que tem sido seguido pelo Governo chegou ao extremo de o Sr. Deputado me propor cargos no futuro. Nunca precisei nem precisarei do PSD para ter cargos.
Em relação as outras questões que me colocou, gostaria de lhe dizer que a sua intervenção ultrapassou aquilo que considero o limite do respeito e da dignidade e, como tal, nunca entrarei por esses caminhos.

Aplausos do PRD.

Portanto, não respondo!

O Sr. Deputado Costa Andrade começou por dizer que havia tempo para amar e para morrer. Ainda bem que há! Devo dizer-lhe que gosto imenso de amar e depois de morrer também lhe direi se gostei ou não.

Risos.

O Sr. Deputado perguntou-me o que quer o PRD, se quer derrubar o Governo. O PRD quer, e sabe que tal é possível, oferecer um melhor governo ao País. Obviamente que, para atingir esse ponto, teremos de derrubar este governo. Foi isso que fizemos, foi isso que assumimos, responsável e frontalmente - e só nós - perante o País.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Só nós?!...

O Orador: - Falou ainda o Sr. Deputado sobre afirmações do general Ramalho Eanes em relação àquilo que ele entendia ser a posição e a prática do Sr. Primeiro-Ministro.
Queria apenas dizer-lhe que, se a actuação do Sr. Primeiro-Ministro tivesse confirmado as afirmações do general Eanes, não estaríamos hoje aqui a discutir uma moção de censura, pelo menos por iniciativa do PRD.

Aplausos do PRD.

Sr. Deputado Silva Marques, V. Ex.ª disse-me para pedir eleições...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto, uma vez que não há liberdade!

O Orador: - Bem, devo dizer-lhe que essa questão vai depender, espero eu, a partir de amanhã, da decisão do Sr. Presidente da República.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Isso não quer dizer que não peçam!

O Orador: - Foi tudo ponderado. Já dissemos o que pensávamos e estamos tranquilos em relação a isso.

Vozes do PSD: - Não ouvimos!

O Orador: - É natural, às vezes não se ouve tudo o que se queria ouvir.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Disseram a quem? Aqui, a nós?

O Orador: - Queria dizer que da parte do seu partido - e não só do seu partido, mas também de alguns analistas políticos - tem sido feito um grande esforço para mostrar aos Portugueses que o PRD está feito num «oito».

Risos do PSD.

Gostaria de lembrar que, por enquanto, estamos feito num «dezoito».

Risos do PRD.

E, nas próximas eleições, tenho confiança no povo português, em num e nos meus camaradas de bancada.

Aplausos do PRD.

Em relação aos elogios feitos ao Professor Cavaco Silva, não só pelo Sr. Deputado como por outros Srs. Deputados, acho normal e natural. Gostaria só de referir uma pequena nota: no meu partido não é necessário fazer elogios ao líder para assegurar os lugares.

Aplausos do PRD.

E espero que continuemos a ser escolhidos pela competência e péla qualidade.

O Sr. Deputado Angelo Correia não está na sala, pelo que vou deixar a resposta às suas perguntas para o fim.

O Sr. Sousa Pereira (PRD): - Já deu o recado!...

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Fez o número e foi-se!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Brito, estão dadas as respostas às suas perguntas, temos o mesmo discurso desde o princípio e obviamente que apresentámos esta moção de censura para proporcionar outro governo ao País.
E quanto a eleições antecipadas já o disse: é o Sr. Presidente da República que vai ter de decidir. Aguardaremos calmamente a sua decisão e respeitá-la-emos.

Uma voz do PSD: - Ficam a chupar no dedo!

O Orador: - Já fendera vou...

Sr. Deputado Carlos Coelho, a minha intervenção e a realidade mostram aquilo que deve ser dito em relação à sua pergunta sobre a questão da juventude.
Entendemos que a moção de censura corresponde ao resultado de uma análise séria e penso que a minha intervenção já explicitou isso claramente. Obviamente que a sua posição pode ser a de que isto corresponde a uma estratégia partidária, mas gostaria de lhe dizer que mantenho aquilo que sempre afirmámos: a apresentação da moção de censura corresponde àquilo que entendemos ser o interesse nacional, onde temos de levar em Unha de conta aquilo que o meu partido pode e deve fazer para a concretização do que em nossa opinião é o interesse nacional.
Disse também que não é o Governo que está a ser julgado, mas sim o PRD. Neste momento é claramente o Governo que está a ser censurado e que está a ser julgado. O PRD também irá ser julgado no futuro e irá ser julgado também por esta decisão. De qualquer modo, uma vez mais lhe digo que estamos tranquilos e vamos manter-nos calmos.

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Sr. Deputado Angelo Correia, a resposta às suas perguntas ficou para o fim, o que não quer dizei que seja o último, de maneira nenhuma. Já o tinha tentado encontrar na bancada, mas V. Ex.ª não estava.
O Sr. Deputado referiu «génese da crise», «tempos» e «votações», foram exactamente todos esses tempos que alinhou, todas as votações que fizemos, tudo aquilo que dissemos, inclusive elogiar o Governo quando entendíamos que devia ser elogiado, que nos deram ainda mais força moral...

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - ... para sermos hoje os únicos responsáveis pela apresentação de uma moção de censura a este governo.

Aplausos do PRD.

O Sr. Deputado disse que muitas das afirmações que fiz não estavam correctas.

Devo dizer-lhe que a minha intervenção está escrita e, embora seja longa, pode ser lida.

O Sr. Ivo de Pinho (PRD): - Exactamente!

O Orador: - Fico à espera que algum dos Srs. Deputados demonstre que eu disse alguma mentira.

O Sr. Ivo de Pinho (PRD): - Muito bem!

O Sr. António Capucho (PSD): - É castigo que nunca darei aos deputados do meu grupo parlamentar.

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro nem sequer respondeu à minha intervenção, fez o discurso a que já estamos habituados.
Perguntam: «Qual a saída?» Já expliquei há pouco que vamos, em primeiro lugar, como é nossa obrigação, levá-la a quem de direito e depois, se for caso disso, trá-la-emos também ao local de direito que é esta Assembleia.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Como é que se vota a moção de censura sem se saber o resto?

O Orador: - O Sr. Deputado falou várias vezes da decisão da dissolução da Assembleia da República por parte do anterior Presidente da República, em especial em 1985. Gostaria de lhe dizer que ao fazer essa afirmação está em contradição com aquilo que foi afirmado e pedido, na altura, pelo líder do seu partido. De resto, já tinha estado antes quando disse que o PRD tinha votado e tinha deixado governar o PSD, ou melhor, este governo, pois o Sr. Primeiro-Ministro ainda hoje de manhã disse que não tínhamos deixado governar o Governo! Há dois pontos de contradição que depois o Sr. Deputado terá de discutir e encontrar a resposta correcta com o líder do seu partido.

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Penso que as questões colocadas, e lamento que tenham sido poucas, estão, de uma maneira geral, respondidas.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, regimentalmente falando, não sei como foi organizado o debate, mas a resposta que o Sr. Deputado Hermínio Maninho teve a gentileza de me fornecer não é, naturalmente, unia verdadeira resposta e queria pedir-lhe um esclarecimento adicional...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não o pode fazer.

Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, vau colocar-lhe duas questões: a primeira é no sentido de saber se o Governo tomou posição inequívoca sabre o caso de corrupção na Polícia Judiciária do Porto, afirmando o seu empenhamento no apuramento de todas as responsabilidades até as últimas consequências o, em caso afirmativo, quando e como.

Protestos do PSD.

A segunda é a seguinte: qual a posição que o Sr. Primeiro-Ministro entende dever transmitir aos Portugueses sobre essa questão?

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Joio Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Primeiro-Ministro: Na nossa opinião, foi fraco o balanço que apresentou sobre a actividade do governo PSD. Não tios satisfaz. Uma vez mais auto elogiou-se, nada de no/o nos apresentou que nos levasse a rever a nossa posição sobre a responsabilidade que lhe cabe na situação em que se encontra a sociedade portuguesa. Este governo, na nossa opinião, concorreu decisivamente para que se verifique um muito grave bloqueio na sociedade portuguesa. Bloqueio na saúde, no ensino, na economia, nos transportes, no emprego, na cultura. É um bloqueio a que urge pôr termo, já que encerra em si mesmo graves perigos para a nossa democracia. E um dos primeiros passos a dar para alterar este quadro será, sem dúvida, afastar este governo. Do seu balanço - repetição da utilização diária da antena da RTP - resulta, sem dúvida, uma conclusão: apesar dos seus números optimistas, continuamos na cauda da Europa e não será com este governo que sairemos de tal lugar.
Perante à Assembleia da República, órgãos de soberania que tintas vezes desrespeitaram ilegítima e afrontosamente, o Sr. Primeiro-Ministro e o seu governo são hoje chamados a prestar contas. Vão ser obrigados a dizer por que não prosseguiram uma política que tivesse conduzido o País para uma situação de desenvolvimento, de desafogo, de confiança no futuro e de estabilidade social.
Estabilidade social só possível de atingir com a melhoria acentuada das condições de vida, com a diminuição visível do excepcional número de desempregados para um país com uma tão reduzida população activa, com a criação de empregos e não com a sua contínua diminuição.

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Estabilidade social só possível com a aplicação de uma política de ensino que vise a boa preparação da juventude para o futuro e não uma política ineficaz e de agressividade constante contra os professores, contra os alunos, contra as famílias.
O Governo e o Primeiro-Ministro são hoje obrigados a esclarecer a Assembleia da República e o País por que não promoveram a valorização dos nossos recursos e potencialidades; por que não concorreram para a elevação da qualidade de vida do povo português, principalmente das camadas da população mais desfavorecidas.
O Sr. Primeiro-Ministro tem de nos dizer, porque não o disse ainda, a razão que levou o Governo a não proceder à recuperação do aparelho produtivo nacional e por que razão não fomentou a redução da nossa dependência externa com particular incidência nos domínios alimentar, energético, dos bens intermédios e de consumo.
Sr. Primeiro-Ministro: Estas são algumas das muitas questões que continuam sem resposta e que apesar da sua intervenção de hoje não foram esclarecidas.
Para além destas, farei uma última questão mais concreta sobre uma grave afirmação proferida por V. Ex.ª O Sr. Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, declarou, numa entrevista a um jornal semanário, que «fazer um outro governo sem recurso a eleições seria uma fraude política, ...

Uma voz do PSD: - E é verdade!

O Orador: - ... seria inaceitável do ponto de vista de ética política, seria uma política de desrespeito para com o eleitorado».
Sr. Primeiro-Ministro: V. Ex.ª alargou, não restam dúvidas, os conflitos institucionais que sempre manteve com a Assembleia da República por sua iniciativa, alargou-os à Presidência da República. Já não lhe bastam os ataques infundados durante meses contra esta Câmara. V. Ex.» foi mais longe; na nossa opinião, ofendeu directamente o Sr. Presidente da República.

Risos do PSD.

O Orador: - Pergunto, Sr. Primeiro-Ministro: Será que V. Ex.ª e o seu governo entendem que o Sr. Presidente da República é capaz de desonestidades? Que o Sr. Presidente da República é capaz de fraudes? Que o Sr. Presidente da República, no cumprimento das normas constitucionais em vigor, se viabilizar uma alternativa democrática, legítima, a este governo, isso alguma vez pode ser considerado por alguém como violador da ética política e desrespeitador do eleitorado?
V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, mediu bem a gravidade de tais afirmações, que, no mínimo, consideramos como antidemocráticas?

Aplausos de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de o questionar sobre o seguinte: como concilia o facto de não ter acedido à proposta do PS, no sentido de se entabular um diálogo susceptível de evitar uma eventual crise política, rotulando-a de manobrismo político e de chantagem, com o facto de ter
feito preceder a crise que desencadeou em 198S - e de que resultou a queda do governo PS/PSD - de idêntica proposta, que o PS, aliás, não deixou de aceitar?
Das duas, uma, Sr. Primeiro-Ministro: ou acredita naquilo que disse e não se terá dado conta de que, ao acusar o PS de manobrismo e chantagem política, acabou por autoclassificar de forma impiedosa o seu próprio comportamento, ou o Sr. Primeiro-Ministro não acreditou em nada daquilo que disse e as suas palavras foram apenas a expressão de uma hipócrita arrogância política, arrogância que o levou, aliás, a recusar liminarmente qualquer discussão com o PS, assumindo por inteiro e sem possibilidade de recusa a sua quota de responsabilidade na crise política, crise esta que acusou de inoportuna por várias razões, nomeadamente por estarmos na véspera de uma importante missão de Estado à China, esquecendo-se, uma vez mais, que V. Ex.ª desencadeou uma crise - a de 198S - na véspera de um acto não menos importante, que era a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro parece raciocinar como se a si tudo fosse permitido e aos outros nada fosse autorizado!
Em democracia não é assim; a democracia é difícil, mas, por muito difícil que seja, todos nós, e o Sr. Primeiro-Ministro mais que ninguém, temos de nos conformar com as suas regras.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PRD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção, por mais de uma vez fez referência à abertura do Governo ao diálogo. Em todo o caso, devo lembrar-lhe que em declarações que fez ao jornal Lê Monde afirmou o seguinte: «[...] não há alternativa para o Governo a que presido, o que me permite governar o País como se dispusesse de uma maioria no Parlamento. Isso permite-me agir de cara descoberta, sem ter necessidade de negociar o apoio dos partidos políticos para cada medida governamental [...]»; e, num outro passo da sua entrevista, o Sr. Primeiro-Ministro também afirmou que «[...] a confrontação entre o Governo e a oposição parlamentar saldou-se por uma popularidade acrescida da equipa que dirijo [...]».
A pergunta que lhe faço é a seguinte: aquilo que aqui está contido, ao invés de ser uma filosofia de diálogo, de concertação, de entendimento com o Parlamento, não é o contrário disso, uma filosofia apontada para o afrontamento na base da convicção de que a oposição é impotente porque está dividida e, então, o Governo funciona como majoritário? E não terá sido este engano que conduziu a este momento e à surpresa que o Sr. Primeiro-Ministro há pouco revelava relativamente à apresentação da moção de censura?
Na segunda questão farei algumas referências à situação social. Devo dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que me chocou muito a afirmação que fez em relação aos salários em atraso. Disse que o Governo os reduziu para metade. Mas, tratando-se do que se trata, de uma

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questão chocante, revoltante, dessa chaga social, como em todos os lados a temos qualificado, pode-se estar contente e fazer disto motivo de vanglória?
São 30 000 os trabalhadores com salários em atraso, segundo os números mais optimistas do Governo. Mas, na verdade, são 40 000, 50 000 famílias nesta situação, e o Governo pode dizer que é um resultado positivo a manutenção dessa situação?
O Sr. Primeiro-Ministro não fez alusão ao trabalho infantil, que é um fenómeno que acompanha o nascimento e a vigência do seu governo, o que parece grave da sua pane, como já outro dia tivemos ocasião de observar ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social.
O Sr. Primeiro-Ministro fez referência ao aumento de salários, mas esconde uma circunstância fundamental: este aumento não foi concedido pelo Governo, foi conseguido contra a vontade do Governo, que queria impor tectos salariais muitíssimo mais baixos, que, se tivessem vigorado, não teriam permitido este aumento de salários. E, mesmo assim, com este aumento de salários, o que demonstrámos na interpelação ao Governo foi que se reduziu a participação do trabalho no rendimento nacional. Isto é, naquilo a que os senhores chamam o «ano de ouro» da economia nacional os trabalhadores viram reduzida a percentagem da sua participação no rendimento nacional! Estas são questões que gostaria de ver esclarecidas; outras poremos nas nossas intervenções.
Finalmente, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, a certo momento da sua intervenção, que para o povo português não é o Governo que merece censura, tendo feito também noutros momentos referência ao povo português. Como é que o Sr. Primeiro-Ministro pode falar em nome do povo português, e mais, falar em nome do povo português contra a Assembleia da República, que é o órgão de soberania que tem a representação de todos os portugueses? É absurda esta situação!
O Sr. Primeiro-Ministro pode falar, quando muito, em nome de 30% dos portugueses, o que é tão pouco - e devemos dar conta destas realidades - que não lhe dá para governar se não tiver a aquiescência de outros partidos da Assembleia da República. Repito, com 30% o Sr. Primeiro-Ministro só pode governar com a aquiescência de outros partidos da Assembleia da República. Então, como falar em nome do povo português contra a Assembleia da República? Creio que o Sr. Primeiro-Ministro me acompanhará, não aceitando que existam mandatos providenciais, pois eles não existem! Mais, o povo português tem, dos mandatos providenciais, uma triste memória e não quer voltar a eles!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Primeiro-Ministro, penso que uma das condições essenciais para qualquer líder político, sobretudo se é primeiro-ministro, é, nas suas declarações públicas, procurar não atentar contra a inteligência das pessoas que o ouvem.
Ora, na intervenção feita nesta Câmara pelo Sr. Primeiro-Ministro várias afirmações revelaram truques fáceis e mesmo grosseiros, constituíram um verdadeiro atentado contra a inteligência daqueles que o ouviram!

Voz do PCP: - Sem dúvida!

O Orador: - Poderá o Sr. Primeiro-Ministro pretender convence-nos de que está exclusivamente preocupado com es altos interesses do Estado, enquanto os partidos políticos gastam o seu tempo e as suas energias com meras reuniões de directórios político-partidários? Mão saberá o Sr. Primeiro-Ministro que hoje um dos elementos essenciais e estruturadores dos Estados democráticos modernos são justamente os partidos políticos, sem os quais não há democracia, e que sem a vida democrática no interior dos partidos o Sr. Primeiro-Ministro não poderia estar sentado aí onde se encontra?
Sr. Primeiro-Ministro, quanto a esta fórmula que utilizou, penso que deveria, no futuro, deixar de recorrer a tão simples manipulações demagógicas. Aliás, com elas está a habituar-nos a um novo estilo, e eu diria que, aludindo a uma rábula ao sabor daquela que o Sr. Primeiro-Ministro utilizou aludindo ao símbolo de um partido político, o estilo Cavaco Silva é o estilo MRPP da direita portuguesa!

Risos do PSD.

Uma voz de PCP: - E percebe-se porquê!

O Orador: - Continuando por esse caminho iremos para um radicalismo verbal de tal ordem que escamotearemos permanentemente as questões essenciais em debate.
Disse o Sr. Primeiro-Ministro que se vangloriava de ter contribuído para uma boa relação institucional com os presidentes da República. Pergunto-lhe: poderá igualmente vangloriar-se de ter contribuído para um bom relacionamento institucional com a segunda figura do Estado, o Presidente da Assembleia da República?
Gostaria ainda que me respondesse a uma questão para que, nas e políticas ao Parlamento, não ficasse pelas críticas fáceis que lhe ouvimos, sem que elas tivessem o mínimo rigor intelectual, sem que elas produzissem, na prática, um mero efeito de propaganda.
Quanto à propaganda, uma última questão: Sr. Primeiro-Ministro, dizia-se no Programa do Governo, por si apresentado à Assembleia, que era intenção do Governo tomar iniciativas legislativas «com vista à desgovernamentalização da gestão dos órgãos públicos de comunicação social [...]» - e sublinho «com vista à desgovernamentalização» - «[...] de modo a não permitir as degradantes tentativas de controle político por parte das forças partidárias que, em cada momento, detenham o poder executivo».
Sr. Primeiro-Ministro,. tanto tempo volvido desde a posse do Governo, dado que a desgovernamentalização não foi feita, terá sido por falta de tempo, por distracção ou por manifesto e inequívoco oportunismo político?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª fez um discurso de números, um discurso tecnocrata, manipulou os números a seu bel-prazer. Ficámos, no entanto, um pouco preocupados,

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porque soubemos que marchamos, finalmente, na vanguarda das estatísticas referentes aos países da Comunidade em matérias tão importantes como a inflação, a taxa de desemprego, o crescimento do emprego, etc... Ficámos até com dúvidas se valeu a pena termos aderido à Comunidade e se não teria sido melhor a Comunidade ter aderido a Portugal.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

Sr. Primeiro-Ministro, sabíamos que V. Ex.ª tinha da política uma concepção maniqueísta: do lado do Governo tudo está bem, é o Governo que trabalha, é o Governo que governa, é o Governo que representa, é o Governo todo-poderoso; do lado da oposição. .. é um ramo de flores, são as damas, as vestias que serviriam para o encantamento da serpente governamental.
Ficámos também a saber que V. Ex.ª perfilha uma concepção cesarista da política. V. Ex.ª, não só não quer esta oposição como não quer nenhuma oposição, quer, de facto, governar sem nenhuma oposição. Por isso é que podemos dizer seguramente que esta crise, em que apenas e exclusivamente V. Ex.ª precipitou o País, ...

Risos do PSD.

...é, efectiva e claramente, a tentativa desesperada de obtenção da terra prometida, de uma maioria absoluta que lhe permitisse governar a seu bel-prazer.
Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª fala de números, mas, por exemplo no que diz respeito à habitação, há necessidade de 700 000 casas, há 729 000 famílias que vivem sem electricidade, há 700 000 habitações com mais de 60 anos e, só em Lisboa, 16 247 famílias vivem em barracas. O que é que o Governo fez, que medidas implementou para combater esta calamidade?
Sr. Primeiro-Ministro, é conhecida a crise em que se encontram os estaleiros de construção naval; soubemos que, só em 1986, 15,7% da população activa dos estaleiros os abandonou por encerramento dos mesmos, por falta de pagamento dos salários, etc... Soubemos que a SETENAVE ganhou um concurso, na República Democrática Alemã, para a construção de uma plataforma no montante de 21 milhões de dólares; soubemos também que, após o seu triste discurso de Berlim, a RDA cancelou o convite que tinha feito a Portugal, que era quem tinha ganho o concurso, para entregar essa construção a um estaleiro belga. Pedia-lhe que comentasse esta situação.
Finalmente, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª falou abundantemente, como é seu hábito, dos salários em atraso, pois sabe que isso faz na consciência e na moral do povo português, e ainda hoje referiu que essa grande hecatombe tinha sido reduzida a expressões ínfimas, para já, a 50%. Pergunto-lhe por que é que foi aplicada a lei-travão à lei dos salários em atraso de 1986, e se não seria possível fazer uma transferência de verbas, uma vez que a Segurança Social terminou o ano com um superavit de mais de 15 milhões de contos, isto é, se se canalizassem esses 15 milhões de contos, não seria possível erradicar definitivamente esse cancro dos salários em atraso?

O Sr. Vasco Marques (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, é do conhecimento geral o estado de degradação a que chegaram os Caminhos de Ferro Portugueses.
Estamos pelo menos seis anos atrasados no processo de renovação de via, cuja política de recuperação teve início em 1969, e o actual governo mostrou a sua enorme preocupação neste campo, ao introduzir na proposta orçamental para 1987 a verba de 8 milhões de contos destinada à modernização da via férrea nacional.
Considerando que até ao 2.º trimestre deste ano não foi ainda aberto qualquer concurso destinado à realização das obras necessárias e considerando ainda que o processo de concursos tem uma duração de alguns meses, pergunto ao Sr. Primeiro-Ministro se foi alterada a política que tinha como objectivo reiniciar a renovação integral dos Caminhos de Ferro Portugueses ou, em caso contrário, como se explica ou justifica esta inércia por parte do Governo e da administração da CP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Ramos de Carvalho.

O Sr. Ramos de Carvalho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Tem vindo o Ministério da Indústria e Comércio a conceder a diversas entidades subsídios através de diversos departamentos como a Direcção-Geral da Indústria, o Gabinete da Área de Sines, o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas, o Instituto de Comércio Externo, o Instituto de Produtos Florestais, etc.
Mas, para além destes apoios, vem o Sr. Ministro da Indústria e Comércio a conceder subsídios através do seu Gabinete, que, de Agosto a Dezembro de 1986, contemplaram 477 entidades ou empresas dos mais variados ramos de actividade, que atingiram o montante de l 842 965 contos.
Verifica-se que apenas 7,1 % das empresas receberam 71,6% do total dos subsídios superiores a 10 000 contos e que 26,4% das empresas receberam 22,2% de subsídios superiores a 1000 contos e 65,5% das empresas receberam subsídios inferiores a 1000 contos.
Destes, merecem referência especial, pela natureza e dimensão das entidades contempladas, as seguintes: Ana Salazar - 8 000 000$; SOREFAME - 7 629 000J; Construções Matelomecânicas MAGUE - 7 500 000$; Sociedade Portuguesa do Acumulador TUDOR - 5 197 000$; Júdice Fialho - 144 400 000$; COFACO - 56 700 000$; Amorim e Irmãos e Corticeiras Amorim - 36 300 000$; Fábricas Riopele - 18 200 000$; SONAE - 16 400 000$.
Tudo parecendo indicar que o sistema esteja aberto a uma vasta gama de empresas, mas apenas um número muito restrito delas tem tratamento especial.
Pergunto, que critérios foram estabelecidos para esta distribuição de subsídios?

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.

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2522 I SÉRIE - NÚMERO 64

O Sr. Silva Lopes (PRD): - O Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção desta manhã, pôs grande ênfase no facto de Portugal ter tido, em 1986, a maior taxa de crescimento económico dos países da CEE.
Esta posição leva-me a apresentar algumas perguntas: não reconhece o Sr. Primeiro-Ministro que o resultado conseguido por Portugal, em comparação com outros países da CEE, se deve essencialmente à política de estabilização económica aplicada entre nós nos anos de 1983 e 1984 e à conjuntura externa que teve impacte mais favorável sobre o nosso país do que sobre os outros?
Não aceita o Sr. Primeiro-Ministro que a compressão da procura interna, em 1983 e 1984, e as taxas negativas da evolução do PIB nesses anos criaram reservas de capacidade produtiva desaproveitada, que facilitaram enormemente a recuperação económica iniciada em 1985 e seguida em 1986?
Considera o Sr. Primeiro-Ministro que em 1986 Portugal poderia ter conseguido uma taxa de crescimento do PIB um pouco superior à de outros países da CEE se este governo tivesse herdado do ano anterior um défice da balança de transacções correntes semelhante ao que o governo AD, dirigido pelo PSD, legou, no começo de 1983, ao governo que se lhe seguiu?

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Não admite o Sr. Primeiro-Ministro que os novos resultados em matéria de crescimento do PIB foram substancialmente melhores que os da Grécia por este país se encontrar agora a braços com um programa de estabilização, numa situação semelhante àquela que Portugal tinha em 1983?
Tenho agora um segundo grupo de questões que gostaria de lhe colocar. De acordo com os órgãos de informação, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou há poucas semanas: «Portugal, dentro de três anos, deixará a cauda da Europa.»
Esta é uma afirmação de enorme importância, talvez mesmo de importância histórica. Embora não seja muito precisa, penso que ela significa que o PIB per capita de Portugal dentro de três anos ultrapassará o da Grécia, em termos de paridade dos poderes aquisitivos.
A afirmação do Sr. Primeiro-Ministro é, porém, muito precisa na definição do prazo durante o qual isso acontecerá. Não se trata de um prazo de três ou quatro anos, trata-se rigorosamente de um prazo de três anos - por sinal aquele que decorrerá até ao fim da presente legislatura da Assembleia da República, se ela não for interrompida.
Na base dos dados publicados no último relatório económico da CEE, estimei que para atingir o objectivo anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro seria necessário que em 1988 e 1989 a taxa anual média de crescimento do PIB de Portugal excedesse a da Grécia em pelo menos sete pontos de percentagem. Conseguir uma tal diferença é obra.
Nessas condições, pergunto ao Sr. Primeiro-Ministro: espera um milagre económico para Portugal? Ou espera uma catástrofe económica para a Grécia?

Risos do PRD, PS, PCP e MDP/CDE

Com que políticas atingiria as taxas de crescimento do PIB que tem de se verificar em Portugal em 1988 e 1989?
Quais as consequências dessas políticas no equilíbrio externo?

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Cario i Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No seu tom habitual, o Sr. Primeiro-Ministro não disse, é verdade, que o seu governo era o melhor do mundo, mas afirmou com soberba gabarolice que era o melhor da CEE.
A declaração da inflação no conjunto da CEE, Sr. Primeiro-Ministro, foi superior à de Portugal, mas no conjunto do OCDE a taxa de inflação foi a mais baixa dos últimos vinte anos. Onde está o milagre do Governo acerca da inflação em Portugal?
Não acha, Sr. Primeiro-Ministro, no mínimo demagógico auto-elogiar-se por ter obtido uma taxa de investimento d: 8% ou 97o, depois de uma queda nos últimos anos de 307o? Não lhe parece que, com tal posição, faz lembrar certos dirigentes de «repúblicas das bananas» que, com uma fábrica no seu território, ao inaugurarem a segunda, dizem ao mundo e ao povo que o investimento cresceu 1007o? O Sr. Primeiro-Ministro reconhece, ou não, que o défice estrutural da balança comercial apresenta um agravamento significativo? Reconhece ou não que com a diminuição do preço dos cereais, oleaginosas e petróleo o défice da balança comercial teria tido um agravamento superior a 150 milhões de contos? Em suma, não entende que deve ser censurado um governo que, com tais vantagens, apresenta tais agravamentos estruturais na balança comercial, na balança de transacções corrente:;, que apresenta quebra na produção de bens de equipamento, apresenta a dês industrialização de regiões inteiras e do próprio país? Não está preocupado com o facto desta balança comercial com a CEE se ter agravado em cerca de 96 milhões de contos?
Falou-nos da Irlanda e da Grécia, mas é ou não verdade que a redução da balança de transacções correntes da Grécia é superior à nossa? Desconhecem o Sr. Primeiro-Ministro e o seu mui ilustre Ministro das Finanças que, com as taxas de crescimento que temos tido, só atingiremos o produto interno bruto per capita da Espanha de hoje lá para o fim do século? As contas são fáceis de fazer!
O que é que este governo fez com os mais de 200 milhões de contos da melhoria das relações de troca? Onde está a modernização que o Sr. Primeiro-Ministro prometeu ao País? Onde está a substituição da produção estrangeira pela produção nacional? Onde está o adensamento da malha industrial, o aproveitamento dos nossos recursos e onde estão as indústrias novas? Onde está tudo isto que foi prometido na campanha eleitoral e no Programa do Governo? Era isto que o povo português gostaria de conhecer, e queríamos ouvir as suas respostas precisas.

Aplausos do PCP.

Quais as taxas de crescimento do PIB que projecta para um e outro país? Com que fundamentos?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

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O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro colocou-se aqui numa posição que não posso deixar de considerar como de grande hipocrisia política, de confusão de conceitos e de dificuldade em compreender o funcionamento do regime democrático.

Protestos do PSD.

E digo hipocrisia política, pois por enquanto ainda há liberdade de expressão e continuará a haver, uma vez que o Sr. Primeiro-Ministro vem queixar-se quando tem precisamente aquilo que quis, embora não tenha tido coragem de o assumir com frontalidade.
O Sr. Primeiro-Ministro vem protestar, mas toda a gente sabe que o Sr. Primeiro-Ministro, como ninguém, desejou a crise, fomentou a crise, provocou a crise!

Risos do PSD.

De certo modo, o primeiro subscritor da moção de censura chama-se Aníbal Cavaco Silva.

Vozes do PS e do PRD: - Muito bem!

Risos do PSD.

O Orador: - Ao hostilizar o Parlamento como o tem feito e ao ignorar as suas decisões, ao não realizar nenhuma das reformas de fundo que prometeu e em nome das quais derrubou o anterior Governo, de que o seu partido também fazia parte, ao agredir os partidos políticos e ao desafiá-los constantemente para derrubarem o Governo e, finalmente, ao recusar o diálogo que o Partido Socialista lhe propôs, o Sr. Primeiro-Ministro mostra claramente que quer a queda do Governo e que é responsável por ela.

Vozes do PSD: - Não o deixem cair!

O Orador: - Por outro lado, recordando o binómio de Max Weber «ética da responsabilidade ética da convicção», V.ª Ex.ª criticou a não apresentação de uma alternativa, mas entretanto já a tinha classificado de fraude.
Gostaria que me explicasse por que é que este Parlamento é legítimo para viabilizar o Governo minoritário do PSD e já não o é para viabilizar qualquer outro Governo.

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

Em que teoria política, em que concepção política se fundamenta para afirmar que um outro governo sem eleições seria uma fraude?
Gostaria de ser esclarecido, gostaria que V. Ex.ª me esclarecesse, se for capaz.

O Sr. António Capucho (PSD): - É tão óbvio que não vale a pena!

O Orador: - Se não o fizer serei obrigado a concluir que o Sr. Primeiro-Ministro não só não tem feito, como seria sua obrigação constitucional, a apologia de valores básicos da democracia, nomeadamente do Parlamento, como defende concepções que são incompatíveis com os fundamentos da própria democracia. Não quero ofendê-lo, mas, ao afirmar o que afirmou, é V.º Ex.ª quem ofende o Parlamento, quem ofende os deputados, a democracia e, nesse caso, não merece continuar a governar Portugal!

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa pessoal, visto que não há outra figura regimental que possa utilizar. No entanto, posso alargar o exercício do direito de defesa à minha bancada, porque quem ofende a minha bancada ofende-me a mim próprio e quem me ofende também ofende a minha bancada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Manuel Alegre, V. Ex.ª tem o direito de discutir se são bons ou maus para o País os conceitos políticos defendidos pelo líder do meu partido, que é também o Primeiro-Ministro. Porém, não tem o direito de os adjectivar de conceitos e de propostas antidemocráticos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A vossa atitude não é apenas conservadora e retrógrada; a vossa atitude é imoral no estrito plano do debate político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E digo-lhe porquê, Sr. Deputado: o líder actual do partido a que V. Ex.ª pertence saiu do congresso com uma proposta semelhante à do líder do meu partido. Só que o líder do seu partido a meteu «no bolso» nos primeiros embates políticos.
Ora, pergunto: o líder do seu partido está talhado para a democracia? É o líder do meu partido que não está? O que é do seu partido é bom e o que é do meu partido é mau? É o Sr. Deputado que, com essas ideias, está talhado para a democracia?
Vou colocar uma segunda questão, saída dos últimos ensinamentos da nova vida política - e quando falo dos últimos refiro-me ao congresso do meu partido e do do Sr. Deputado. Relativamente a este debate profundíssimo, que diz respeito ao funcionamento das instituições do Estado democrático, pergunto: quando Pierre Mendes France, enquanto Primeiro-Ministro, se dirigiu pela primeira vez ao país e o ousou fazer sem vir falar aos deputados - e bem caro isso lhe custou, pois custou-lhe uma incompatibilidade para sempre insanável com o sistema parlamentarista nessa altura em vigor - não estava talhado para a democracia? Ou estava talhado para a democracia no sentido de a querer renovar para que ela viesse a dar as respostas que a França daquela altura precisava de resolver?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Deputado Manuel Alegre...

Vozes do PS: - Em terceiro lugar!

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O Orador: - Se quiserem pode ser em terceiro lugar, mas a verdade é que estava a desenvolver o segundo aspecto da segunda questão!

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Manuel Alegre, V. Ex.ª é também daqueles que ainda hoje pensa que De Gaulle era um fascista, como assim considerava a corrente comunista da altura, e ainda hoje considera, na medida em que eles não mudaram? O Sr. Deputado também não mudou?
Sr. Deputado Manuel Alegre, sejamos frontais, mas humildes perante nós próprios, perante o povo português e perante as lições muito dolorosas que a história mais recente do nosso país e do mundo nos tem dado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Deputado Silva Marques, sempre considerei que De Gaulle foi um grande resistente, coisa que, infelizmente, o nosso Primeiro-Ministro não chegou a ser.
Quero recordar que foi o Sr. Primeiro-Ministro quem começou por acusar o Partido Socialista de desvirtuar as regras do jogo democrático. Devo ainda acrescentar que o PS não se pronunciou sobre qual a solução para esta crise política: nem disse que desejava eleições, nem que não as desejava, nem disse que queria ou não um governo. Sempre tem afirmado que, neste momento, não manifesta qualquer preferência por alguma solução antes de ouvir o Sr. Presidente da República e os demais partidos em relação a este aspecto.
O Partido Socialista não afirmou nenhuma preferência. Porém, o Sr. Primeiro-Ministro, ao fazer a afirmação que fez no sentido de considerar como fraude uma solução legítima, democrática e constitucional - quer o Sr. Deputado queira, quer não -, proferiu algo que ofende a democracia, o nosso regime democrático e o nosso Parlamento.

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE,

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ávila.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, o Governo no seu Programa enunciou um conjunto de medidas imediatas que, no âmbito da administração fiscal, se concretizavam na utilização de amostragens aleatórias de contribuintes no combate à evasão e fraudes fiscais.
Como é que o Sr. Primeiro-Ministro compatibiliza este enunciado de medidas do Programa do Governo com um despacho do Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais, onde se excluem à partida do universo a fiscalizar, agora pretensamente «aleatório», as empresas que tenham apresentado em 1986 resultados fiscais declarados, conducentes a um aumento de contribuição industrial superior à de 1985 em 35 %?
Como justifica o Sr. Primeiro-Ministro esta desigualdade de tratamento das empresas face ao que prometeu ao País?
Não propiciará este despacho a cobertura de eventuais situações de evasão fiscal, uma vez que aquelas empresas ficam à partida isentas de fiscalização?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Primeiro-Ministro, um dirigente do PSD dizia há tempos que actualmente nesse partido só se emite opinião depois de ouvir o chefe. Isso tem riscos: hoje verificamos o que acontece quando os deputados do PSD imitam o chefe: é uma desgraça!

O Sr. António Capucho (PSD): - Isso deve ser no PCP!

O Orador: - No caso concreto, o Sr. Primeiro-Ministro, que aliás preparava uma visita à China, resolveu optar por aquilo que alguém lhe deve ter dito que era uma «estratégia maoísta» - eles querem censurá-lo, mas não, nós é que os censuramos - e veio aqui repetir, infelizmente sem novidade, um conjunto de acusações à: quais vale a pena ir devagar. Quanto a nós foi verdadeiramente um fiasco - porque a situação que o País enfrenta é grave, coloca-se a necessidade de uma alternativa, a coisa compagina-se pouco com tons comicieiros e de campanha eleitoral, como aqueles que aqui ouvimos -, mas com duas agravantes, e era sobre elas que gostaria de o ouvir.
A primeira é esta: a imagem um pouco degradada da vida democrática que transparece das suas palavras. Isso suscitou um pouco de escândalo da bancada do PSD, mas gostaria que atentassem nas seguintes características do discurso do Primeiro-Ministro.
Quando o Primeiro-Ministro se refere à vida política e ao papel do Governo na vida política faz a seguinte linha de fronteira: de um lado, o Governo que pensa, esgota e governa. Do outro lado, quem? Seguramente agitadores, perturbadores, gente que não se confina aos «superiores interesses do País» - é a expressão que é do Primeiro-Ministro na entrevista ao Expresso, e que hoje aqui foi ventilada outra vez -, gente que faz «tácticas politiqueiras», «encenações políticas». E isto aplica-se a todos. O Sr. Presidente da Assembleia da República fez aqui há dias uma encenação política do dizer do deputado Dias Loureiro, que é um deputado videofónico, que não existe parlamentarmente, mas que existe para as câmaras da televisão...

Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

... e foi infamar o Presidente para as câmaras de televisão. O Governo diz: é assim o superior interesse do País. Alguém que faça uma objecção ou uma crítica está errado! O superior interesse do País reside «em» o Primeiro-Ministro, que apesar de ser magrinho, está «grávido» do interesse nacional, é monopolista do interesse nacional, tem-no inteiro. Esta visão é uma visão negativa, que se conforma mal com o nosso regime democrático. O segundo aspecto para o qual chamo a atenção é o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro tem uma concepção plebiscitaria ia vida política. Isto é, pelos vistos o Sr. Primeiro-Ministro dialoga com o povo, que tem qualidades mediumínicas. Esta manhã apareceu aqui dizendo: «O povo português censura a Assembleia da República...» O Sr. Primeiro-Ministro telefonou esta manhã ao povo português?!...

Risos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

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67 85 49: «Povo português, queres a moção de censura?» E o povo português respondeu-lhe directa e boçalmente que não queria a moção de censura.
E isto, Sr. Primeiro-Ministro, quando vem acompanhado - como vem - de apelos directos à ultrapassagem das instituições chama-se uma coisa que em alemão é um pouco arrepiante: Rufam Volk. Isto traduz-se no «apelo ao povo», no grito ao povo: «Povo, anda cá e, através dos meios que desenvolvi neste meses, faz-me o que eu não faço porque não tenho votos, não tenho meios, não tenho armas políticas e tenho de recorrer a uma coisa que se chama plebiscito.»
V. Ex.ª tem um sonho plebiscitado e isso é perigoso e negativo para Portugal - isso ficou espalhado no discurso que produziu esta manhã.
Um terceiro aspecto é o de que o Sr. Primeiro-Ministro não suporta a contradita. Ora, percebo isso perfeitamente: é muito mais fácil ouvir «sim, sim» obedientes. V. Ex.ª chega à sua bancada e diz: «Isto anda atrasadíssimo, os senhores não avançam com as propostas de lei», e toda a gente lhe diz que sim. No entanto, são alguns dos deputados da sua bancada que são culpados de alguns dos atrasos - nos casos em que existem, noutros casos são calúnias.

Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

VV. Ex.ªs não só atrasam como se gabam de atrasar. Por exemplo, o deputado responsável pelo relatório da Lei de Enquadramento do Orçamento, que é necessária ao País, começou por ser um deputado do PSD, que foi para gestor público, então substituiu-se esse deputado, nomeou-se outro, que foi outra vez para gestor público, e a lei marca passo e VV. Ex.ªs fazem o mal e a caramunha e gabam-se. Ora, este estilo é mau.
Sr. Primeiro-Ministro, por que é que o Governo, que se gaba de cumprir a lei, está neste momento a violar qualificadamente cerca de quinze ou vinte obrigações legais fixadas no Orçamento? O Governo não aumentou as pensões mínimas do regime geral de segurança social e o regime dos trabalhadores agrícolas, nos termos determinados pelo artigo 12.º do Orçamento. O Governo não apresentou e não pagou as indemnizações compensatórias a transportes colectivos municipalizados, nos termos do artigo 13.º do Orçamento, e não cumpriu os artigos 21.º, 23.º, 24.º, 26.º ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, para nós conta o tempo a mais e para aquela bancada não?

O Orador: - Sr. Deputado António Capucho, não pode haver duas medidas. VV. Ex.ªs primam por uma indignação farisaica!

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado José Magalhães, que ouvirei depois os protestos.

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª não só não cumpre as obrigações legais, como acaba de demitir um gestor da EPAC unicamente porque pretendeu defender os interesses nacionais contra interesses estrangeiros. E gostaria que V. Ex.ª não saísse daqui para fora sem explicar a esta Assembleia esse escândalo, genuíno e concreto, que acaba de perpetrar.

Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, não tendo outra figura regimental para utilizar, peço a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Disse que não tinha outra figura regimental para utilizar porque, de facto, não me senti de maneira alguma ofendido com a expressão do Sr. Deputado José Magalhães. Na minha terra diz-se que «não ofende quem quer, ofende quem pode» e a verdade é que não me senti nada ofendido.
Porém, apenas gostaria de lhe dizer, Sr. Deputado, que no Parlamento falo quando entender que devo falar e o Sr. Presidente me der a palavra, falo quando entender que tenho alguma coisa a dizer e não falo quando entender que não devo falar. No partido a que pertenço não há nenhuma escala de serviço, os chefes não mandam falar agora ou calar depois. Aqui sou livre, falarei quando quiser e não falarei quando não quiser.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para dar explicações.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Longe de qualquer um de nós, suponho, contestar ao Sr. Deputado Dias Loureiro o direito de falar quando quiser, acordado, a dormir, diante das câmaras de televisão, na Assembleia, onde entender. A questão não é essa!
A questão está na maneira como VV. Ex.ªs - e não só, pois há outros, inclusivamente membros do Governo - estabelecem relações com esta Assembleia numa postura perversa. Isto é, o que aqui no hemiciclo caracteriza o debate é o seu carácter contraditório. Agora V. Ex.ª não se sentiu ofendido, mas sentiu necessidade de replicar, o Sr. Presidente concedeu-lhe a palavra, V. Ex.ª replicou, exprimiu o seu pensamento. Eu replicarei agora dizendo aquilo que se me oferecer. Mas sucede que isto, que é contraditório e que é a realidade do Parlamento é sistematicamente sufocado e não é transposto para o exterior.
Portanto, VV. Ex.ªs, quando aqui apanham valentes tundas, quando são derrotados, quando ficam sem razão e sem argumentos, graças ao monopólio da comunicação social e à manipulação da opinião pública, conseguem inverter completamente a realidade do sucedido.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Assim, V. Ex.ª, que em minha opinião fez uma provocação perfeitamente rasteira ao Presidente da Assembleia da República e que se limitou a debitar, citando o Melo Palheta, que se lhe tinha acabado a capacidade de espanto entre outras coisas que se lhe acabaram - logo se verá! - apareceu na televisão como um verdadeiro gladiador, aquele que tinha erguido o facho da verdade, aquele que, face ao Presidente da Assembleia que dizia que o Governo se tinha comportando sem sentido de Estado, vinha afirmar pesporrentemente, patronalmente - aí sim - que o Governo tinha tido todo e mais algum sentido de Estado e que todos aqueles que o contraditassem eram,

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no mínimo, anfíbios e pigmeus e estavam contra a Nação. Juntou nesse bando todos nós e o Presidente da Assembleia da República e não teve o mínimo rebuço em o fazer.
E é este uso perverso, que consiste em ser derrotado aqui e ir ali fazer-se vencedor, que consiste em não ter razão aqui e agarrar num papagaio, pendurar-lhe um recado e dizer «esta é a verdade», é este sentido de impunidade que consideramos que é profundamente maléfico e que deve acabar com a queda deste governo. Isso será higiénico, isso será natural.

Protestos do PSD.

Talvez V. Ex." volte a ser um deputado normal, que se exprima normal e democraticamente. Com isso ganhará o regime democrático, ganhará V. Ex.ª e o PSD, que adquirirá um deputado em vez de um «videomano» e de alguém que faz lá fora o que não tem coragem de fazer cá dentro.

Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Bastos.

O Sr. Tiago Bastos (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, afirmou V. Ex.ª que a política de juventude deste governo é óptima. No entanto, gostaria de perguntar se sabe que a taxa de abandono escolar na camada etária dos 15 aos 19 anos é de 63,5%, segundo números do Instituto Nacional de Estatística relativos ao 3.º trimestre de 1986. Como é que interpreta estes números?
Conhece o Sr. Primeiro-Ministro que a linha de crédito jovem para aquisição de habitação própria não tem qualquer correspondência no actual mercado de oferta? Ou conhece V. Ex.ª muitas casas com valor inferior a 4 000 contos?
Conhece o Governo que a taxa de desemprego entre os jovens dos 15 aos 24 anos corresponde ao dobro da taxa de desemprego em Portugal e que 64% dos desempregados portugueses são jovens com idade até 30 anos? Que 43 % dos desempregados procura o primeiro emprego?
Anuncia o Sr. Primeiro-Ministro como grande conquista do seu governo em política de juventude a ocupação temporária dos jovens. É assim que o seu Governo procura resolver o problema do desemprego?
Mas mais, Sr. Primeiro-Ministro: Afirmou V. Ex.ª que a criação de jovens empresários é um objectivo plenamente alcançado pelo seu governo. Pergunto-lhe, pois, quantos jovens empresários surgiram no ano de 1986 e em que áreas.
Para concluir, citar-lhe-ei um estudo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, orientado pelo Professor Sedas Nunes e encomendado pela Secretaria de Estado da Juventude que revela que mais de 50% dos jovens encararam a possibilidade de emigrar. Que pensa V. Ex." disto? Será esta a consequência de este governo ter sido, nas suas palavras, o primeiro governo desde o 25 de Abril a ter uma política global e integrada para a juventude?
Com certeza o Sr. Deputado Carlos Coelho ajudá-lo-à a responder a esta pergunta, já que se tem intitulado como o verdadeiro representante do espírito das gerações mais jovens, e assim ficaremos elucidados.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, antes de mais, gostaria de dizer que nesta intervenção não alterarei o seu nome, não alterarei o nome do seu partido, não entrarei nesse tipo de discussões.

Aplausos do PRD.

A primeira regra de comportamento democrático é a do respeito que devemos uns aos outros, independentemente das críticas que temos para formular e, por isso mesmo, actuarei nesse campo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em primeiro lugar, gostaria, Sr. Primeiro-Ministro, de dar um esclarecimento e não de lho pedir. Quando V. Ex.ª faz críticas ao funcionamento de algumas comissões da Assembleia da República seria da mais elementar prudência verificar, em primeiro lugar, que o seu partido tem maioria em todas as comissões.

Protestos do PSD.

Em segunde lugar, que as comissões a que V. Ex.ª se referiu são Ia presidência de deputados do seu partido, ...

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - ... que os diplomas em atraso têm relatores que são deputados do seu partido. Farão o favor de confirmar!

Aplausos de PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE. Protestos do PSD.

Os Srs. Deputados pretendem explicar-me que o Sr. Deputado Luís Capoulas já não preside à Comissão de Agricultura e Mar?

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Qual é a comissão em que o PSD tem maioria?

O Orador: - Creio que nas comissões há sempre mais deputados do PSD que deputados de qualquer outro partido. Estou enganado?
Sr. Primeiro-Ministro, apenas gostaria de colocar duas questões extremamente simples. No início do discurso que V. Ex." fez na Assembleia da República aquando da posse do governo a que preside, disse o seguinte: «A Assembleia da República tem de ser respeitada como órgão máximo de representação democrática. Sendo a Assembleia da República o rosto e a voz de toda a comunidade, respeitá-la é respeitarmo-nos, valorizada é tomarmos consciência daquilo que valemos.»
Um ano e poucos meses depois pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, se mudou de pensamento. Caso contrário, como é que explica o seu discurso de hoje?
A segunda questão que quero colocar - e que também é importante - é a seguinte: V. Ex.ª terminou a sua intervenção com aquilo que pretendia ser o voto de protesto, voto de protesto pela existência de uma

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moção de censura, voto de protesto pela existência de aposições, voto de protesto pela existência de uma Assembleia da República. Pergunto: voto de protesto pela existência de instituições democráticas?

Aplausos do PRD e do Sr. Deputado José Manuel Mendes, do PCP.

O Sr. Luís Capoulas (PSD): - Sr. Presidente, peco a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Capoulas (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, devo dizer-lhe que sou presidente da Comissão de Agricultura e Mar, que é uma comissão que funciona democraticamente, onde a maioria não é do meu partido, como o não é nesta Assembleia, e onde as decisões têm de ser tomadas por maioria, e não compete nem está nos poderes do presidente fazer com que os Srs. Deputados reunam mais assiduamente ou proporcionar as comissões melhores condições de trabalho para que este possa ser mais profícuo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer também que não cabe ao PSD nenhuma responsabilidade pelo atraso nos seus trabalhos, uma vez que a Comissão de Agricultura e Mar tem sido nitidamente prejudicada pela criação de uma interminável comissão de inquérito à actuação do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação quanto à Reforma Agrária e que tem inviabilizado quase completamente o funcionamento da Comissão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acresce também que os diplomas e as propostas a que o Sr. Deputado se refere não têm relatores do meu partido. Portanto, em relação às subcomissões eventuais que não têm podido reunir nem dar uma prestimosa colaboração à acção legislativa, mínimas responsabilidades cabem ao Partido Social-Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Deputado Luís Capoulas, agradeço parte das informações que me forneceu e que são tão úteis para o Sr. Primeiro-Ministro, que queria saber como funcionava a Comissão de Agricultura e Mar e que creio terá ficado a sabê-lo.
Julgo que o Sr. Deputado, para infirmar ou confirmar as ilações que tirei, poderá esclarecer quando foi convocada pela primeira vez a subcomissão que trata da legislarão sobre o arrendamento rural e que creio que é presidida por V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vitorino Costa.

O Sr. Vitorino Costa (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, a dado ponto do seu discurso, V. Ex.ª referiu que na base da moção de censura do PRD estaria uma história das Estónias. Ora, a tal propósito e em recente entrevista V. Ex.ª afirmou que vários países se interrogaram sobre se Portugal tinha mudado de política externa, isto por causa da visita da delegação da Assembleia da República à URSS.
Por isso, pergunto: entre esses países contam-se alguns dos que na ONU votaram a favor da posição da Indonésia na sua pretensão de anexação de Timor? Está a diplomacia portuguesa em condições de modificar tal posição de voto? Que diligências têm sido desenvolvidas nesse sentido, nomeadamente com o apoio dos Estados Unidos da América?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Primeiro-Ministro, como pode vir aqui afirmar que o povo e o País estão com o seu governo, quando a verdade é que continua o flagelo dos salários em atraso, aumenta, de forma assustadora, a precarização do emprego incentivada pelo seu governo na administração central e nas empresas públicas, prolifera a exploração do trabalho infantil, o desemprego atinge centenas de milhar de mulheres e de jovens, são criadas novas e graves situações de pobreza? E não falo só de Setúbal, Sr. Primeiro-Ministro, mas também do Tramagal, das minas da Panasqueira e de tantas outras zonas.
Como pode dizer que melhorou o nível de vida quando se agrava o insucesso escolar, aumenta a tuberculose pulmonar e a taxa de mortalidade infantil?
Como se pode admitir que, face a esta situação social, o Sr. Primeiro-Ministro venha aqui numa atitude de alta gabarolke e não tenha a modéstia de reconhecer que o mínimo que se lhe exigia era que falasse verdade, reconhecesse os erros e aceitasse a justeza da moção de censura?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É que, Sr. Primeiro-Ministro, a manipulação de estatísticas e a sua televisão não podem esconder a vida real, as dificuldades da grande maioria do povo português, enquanto, por exemplo, ao lado, prossegue a reconstituição das fortunas, das negociatas bolsistas, do nepotismo, dos privilégios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Nenhuma manipulação estatística pode esconder que cerca de 25% da população activa está desempregada ou tem trabalho precário ou clandestino; mais de 40% da população desempregada já se encontra nesta situação há mais de um ano; só menos de 20% - repito, só menos de 20% - dos desempregados é que recebem subsídios de desemprego e a parte do rendimento nacional que cabe aos trabalhadores é a mais baixa desde o 25 de Abril.
Com esta política social, o Sr. Primeiro-Ministro ainda considera que deve continuar a ser primeiro-ministro?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

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O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, sou deputado do PRD. Isto para lhe dizer que num aspecto o Sr. Primeiro-Ministro tem razão quando diz que o PRD devia autocensurar-se por muitas coisas, uma vez que penso que o PRD tem de se autocensurar. Porquê? Porque inicialmente acreditou no governo presidido pelo Sr. Primeiro-Ministro, e isso, devo dizer-lhe, foi um erro grave, do qual, provavelmente, o PRD jamais se conseguirá libertar.
É que, depois do discurso feito hoje pelo Sr. Primeiro-Ministro, ficaram evidenciadas questões que eu não achava possível e não acreditava ser possível serem colocadas aquando da discussão do Programa do Governo na Assembleia da República, Programa esse que o PRD viabilizou.
Reconheço hoje que, em muitos aspectos, tinha razão um senhor deputado que, na altura, fez um discurso altamente crítico e com aspectos que pessoalmente tive o cuidado de dizer que não subscrevia. Refiro-me ao discurso produzido pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

Vozes do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!

O Orador: - Se me permitem, como não vou fazer as perguntas que tinha previsto, gostaria de recordar uma diferença fundamental que penso ser de sublinhar. Recordo que, depois do 25 de Abril, o I Governo Constitucional, presidido pelo Dr. Mário Soares, caiu na Assembleia da República porque apresentou uma moção de confiança que não foi aprovada. Mas que diferença de discurso, Sr. Primeiro-Ministro!... O Dr. Mário Soares dizia no seu discurso que a democracia, nesta Casa, tinha cumprido as suas obrigações, tinha feito valer valores fundamentais da democracia. Nessa altura, o Sr. Primeiro-Ministro Mário Soares sublinhava isso de uma maneira verdadeiramente determinante. Pois bem, veio-me à memória - veio-me à memória, repito - a diferença dos dois discursos.
Para terminar, vou fazer-lhe uma pergunta: pensa o Sr. Primeiro-Ministro que o discurso que aqui fez hoje se insere na matriz cultural, política e democrática do nosso sistema político português?

Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Primeiro-Ministro, ao ouvi-lo descrever a situação económica do País imaginei, por momentos, que era ainda o Prof. Cavaco Silva de Económicas e que um aluno tinha a ousadia e a lata de descrever a situação económica do País e a sua evolução recente com as mesmas palavras utilizadas pelo Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que reprimenda esse aluno não teria levado do Prof. Cavaco Silva!?
Sr. Primeiro-Ministro, o senhor mostrou sofrer de uma doença, até agora desconhecida para mim, e que é o daltonismo numérico, que o faz reparar em todos os números que de perto ou de longe possam parecer favoráveis à acção do Governo e ter uma cegueira total em relação a todos aqueles - e são muitos! - que constituem um severo libelo acusatório em relação à ineficácia da gestão económica do mesmo governo.
Por outro lado, é necessário inverter algumas das perguntas que no; fez. Nesse sentido, pergunto-lhe: que outro governo, desde o 25 de Abril, encontrou um quadro de evolução na situação económica e financeira internacional tão favorável como o actual?
É necessário perguntar-lhe que outro país da Europa Ocidental, que não Portugal, gozou de um efeito tão positivo da evolução dos termos de troca sobre as suas contas? É que, infelizmente, é maior em Portugal do que em qualquer outro desses países o peso das dependências alimentar e energética, e foi essa fraqueza que neste caso funcionou a nosso favor.
Sr. Primeiro-Ministro, como é possível perguntar qual é a taxa de desemprego em Espanha ou na Irlanda? Se eu perguntasse ao Sr. Primeiro-Ministro qual o poder de compra dos salários em Espanha ou na Irlanda, como não me acusaria de demagogo!... Se perguntasse a taxa de inflação na Suíça ou na Alemanha, como mo me acusaria de demagogo!... Nada disso tem a ver com a gestão deste governo, nada disso tem a ver com a conjuntura, como o Sr. Primeiro-Ministro sabe perfeitamente.
O Sr. Primeiro-Ministro também falou da recuperação do investimento. Mas é necessário dizer que o essencial é ver qual a recuperação do investimento privado - e esse Foi extremamente reduzido em Portugal, uma vez que teve um crescimento um pouco superior a 5% - e o ano passado o investimento estrangeiro cai de 42 milhões para 24 milhões de contos.
Apetece perguntar o seguinte: será que o Sr. Primeiro-Ministro não percebe que a vida económica e o investimento não se compadecem com a incapacidade dos seus ministros para acordarem, com eficácia e rapidez, um verdadeiro sistema de incentivos ao investimento, capaz de fomentar devidamente o investimento privado em Portugal?
Mas mais importante e mais grave do que o discurso económico é o discurso político - e o seu discurso é, aliás, o de um estróina que recebeu uma herança e que diz ao vizinho do lado, que ganha honestamente a sua vida: «Malandro, não és capaz de gerir tão bem como eu as tuas finanças». No essencial, o Sr. Primeiro-Ministro procurou dar ao País, mais do que à Câmara, pois falou mais para a televisão do que para nós, a seguinte ideia simples:

Há aqui um homem, que sou eu - o Sr. Primeiro-Ministro -, que está preocupado com o bem-estar dos Portugueses e com o interesse nacional. Tudo o resto é um conjunto de pessoas que só cuidam do seu interesse partidário.
Penso que o Sr. Primeiro-Ministro não tem autoridade moral para fazer declarações deste género.
Recordo-lhe que foi ministro das Finanças num momento de vacas gordas», que as ajudou a fazer emagrecer e, quando as viu já bastante magras, saiu do Governo; que o seu primeiro acto político, como líder do PSD, foi o de derrubar o Governo do «bloco central»; que o Sr. Primeiro-Ministro, no fundo, tem andado em permanente campanha eleitoral, à espera de uma crise que deseja e que ajudou a provocar.
Permita-me que lhe pergunte o seguinte: E Portugal? E os Portugueses? E a estabilidade política?

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho de Sousa.

O Sr. Agostinho de Sonsa (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, o meu colega Marques Júnior contentou-se em fazer-lhe uma pergunta, que era bem mais ampla do que as três que lhe vou fazer. Estas perguntas serão, com certeza, a afirmação de uma perplexidade, e talvez uma denúncia também ao sentido ideológico que as técnicas e as tecnocracias não conseguem encobrir.
A primeira pergunta que lhe formulo é esta: a que horas terá chegado a este Plenário? O que esteve a fazer neste Plenário? Isto porque ignorou, desconheceu ou - o que é pior - desvirtuou algumas das questões fundamentais postas na intervenção de apresentação da moção de censura feita pelo engenheiro Hermínio Martinho...

Vozes do PRD: - Muito bem!

... entregando-se, entretanto, a uma exibição sofrível, de mau gosto, de mau humor nos dois sentidos e esquecendo questões que eram de verdadeiro interesse nacional?
A segunda pergunta, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: em que ano é que pensa que está?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É uma boa pergunta!

O Orador: - Em relação a algumas das partes do seu discurso - se não houve a intenção, há um facto concretizado e V. Ex.ª é o responsável -, atrevo-me a temer que V. Ex.ª tenha parado longe, às portas de 24. Quem sabe? E isto resulta dos excessos e da intolerância que V. Ex.ª demonstrou, à espera de a fechar, pelo menos parcialmente.
Para terminar, uma última pergunta: numa certa altura, V. Ex.ª julgou a nossa conduta pervertida democraticamente.
Pergunto - e esta curiosidade é extensiva a muita gente nesta Câmara - quem, quando e como lhe outorgou procuração ou poder para vir a esta Câmara arvorar-se em juiz supremo da bondade das condutas democráticas dos partidos democráticos? É que - pasme-se - é V. Ex.ª quem faz esta pergunta. É o autor e subscritor - confesso -, é o leitor indesmentível de um discurso que, com toda a certeza, honraria alguns dos próceres nossos antecessores do regime.

Vozes do PRD: - É uma vergonha!

O Orador: - Devo dizer-lhe que conclui que V. Ex.ª se apresentou a liderar a «esquerda inteligente» - é o sentido posto por V. Ex.ª.
Já agora, depois deste julgamento, penso que se presta para lidera a «esquerda judicial ou julgadora». Ficamos a conhecer esta candidatura!

Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Martinho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Primeiro-Ministro, a intervenção que V. Ex.ª fez nesta Câmara, no final da manhã, veio confirmar aquilo que há algum tempo começámos a denunciar, pois tratou-se da continuação de uma campanha eleitoral que vem mantendo há algum tempo.
Naturalmente que teria gostado que a sua intervenção tivesse procurado responder às questões que o meu partido apresentou e que nos levaram a apresentar a moção de censura.
Quanto a algumas passagens da intervenção de V. Ex.ª, eu teria muita dificuldade em as aceitar, mesmo vindas de um líder partidário, num comício, em campanha eleitoral.
Aqui, da tribuna, ninguém, em minha opinião, deve ultrapassar os limites do respeito e da dignidade, muito menos o Primeiro-Ministro, como penso que V. Ex.ª, hoje, fez.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não ouviu a intervenção anterior!

O Orador: - Penso, Sr. Primeiro-Ministro, que entre as injustiças que cometeu para com esta Câmara, talvez elas não tivessem sido cometidas por V. Ex.ª se aqui já tivesse sido deputado.

Protestos do PSD.

Espero, Sr. Primeiro-Ministro, que o Sr. Presidente da República e esta Assembleia da República lhe proporcionem, em breve, a possibilidade de aqui mesmo iniciar esse estágio. Aliás, sugiro-lhe que aceite essa oportunidade.

Termino com uma pergunta: está o Sr. Primeiro-Ministro na disposição de seguir esta minha sugestão?

Aplausos do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 21 deputados se ergueram para colocar questões ao Primeiro-Ministro durante o debate da moção de censura.
Mas se, antes de se iniciar este debate, era grande a minha perplexidade -e digo-vos aqui, novamente, que estou convicto, profundamente convicto de que a perplexidade do povo português não é menor -...

Protestos do PRD.

... neste momento, muito maior é a minha perplexidade, depois de ouvir as vossas 21 intervenções.
É que, Srs. Deputados, existem múltiplos institutos constitucionais: podem fazer-se requerimentos ao Governo...

O Sr. Raul Rego (PS): - E ele não responde!

O Orador: - ... para saber se este fecha ou não uma certa estação de caminho de ferro; podem fazer-se sessões de perguntas ao Governo, e ele vem aqui à Assembleia da República. Aliás, foram feitas quatro ou cinco sessões para esse efeito e nós próprios insistimos em saber por que razão é que o Governo não era chamado mais vezes a esta Assembleia para responder. Apesar da nossa insistência, apenas cinco vezes - e era à sexta-feira de manhã, portanto com muito pouca assistência - aqui tivemos possibilidade de responder às vossas perguntas.

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2530 I SÉRIE - NÚMERO 64

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PRD.

O Orador: - Mas este é um instituto que não cria grandes problemas ao funcionamento da nossa democracia nem traz grandes prejuízos ao povo português.
Existe ainda um outro, que é a interpelação ao Governo. Pode-se interpelar o Governo sobre a sua política neste ou naquele sector, e já foram feitas algumas interpelações. Por exemplo, o Partido Comunista Português já interpelou o Governo sobre política nos sectores públicos e do trabalho. Também o PRD já interpelou o Governo sobre política de defesa e o Partido Socialista sobre política de justiça. São institutos normais que permitem clarificar, dialogar, permitem que os Srs. Deputados fiquem mais esclarecidos sobre a justeza das políticas do Governo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Boa conclusão!

O Orador: - Mas nós não estamos numa sessão de perguntas nem numa interpelação; não estamos naquela situação em que o requerimento se remete ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e que, seguidamente, segue para o ministério; não estamos na situação em que o deputado, em vez de fazer isso, traz a pergunta de casa, muitas vezes desfasada daquilo que ele já disse no seu discurso, para interpelar o Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estamos a discutir uma moção de censura ao Governo, que, nos termos constitucionais, se for aprovada por maioria dos deputados em efectividade de funções, implica o derrube do governo deste país. Esta é uma matéria muito séria, que não tem a ver com a pergunta que se faz num requerimento ou com a interpelação que se dirige a um governo.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, se alguém tinha dúvida sobre o artificialismo desta crise política, perdeu-a totalmente, depois das vinte e uma perguntas que dirigiram ao Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto porque as perguntas que dirigiram - desculpem-me que lhes diga - não têm dignidade para a discussão de uma moção de censura, que pode conduzir ao derrube do Governo.

Aplausos do PSD e protestos do PS, do PRD e do PCP.

Srs. Deputados, tal como a liberdade e a democracia que permitem que os senhores tenham dito tudo aquilo que há pouco disseram ao Primeiro-Ministro ...

O Sr. Alexandre Manoel (PRD): - Mas com dignidade!

O Orador: - ..., também eu aqui posso dizer aquilo que, sincera e honestamente, penso.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, a queda de um governo significa lançar o País numa crise política, criar incerteza, significa o País andar paia trás e deixar de andar para a frente.

Aplausos do PSD.

Derrubar um governo significa um país ter mais dignidade de defender os seus interesses nas negociações difíceis em que está envolvido todos os dias, no contexto das comunidades europeias.
Os senhores sabem muito bem que, ao criar-se uma crise política num país, há uma certa paralisação da actividade económica e quem sofre não são os senhores, mas aquele:, que já no passado tiveram de apertar o cinto, aquele: que, em certo momento, tiveram de ser lançados para situações de salários em atraso.

Protestos do PCP e do PRD.

São sempre os mesmos!

Aplausos do PSD e protestos do PS, do PCP e do PRD.

É que, Srs. Deputados, para fazer cair um governo é preciso que exista uma razão muito grave e séria.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Sr. João/mural (PCP): - E há uma razão muito séria!

O Orador: - Há pouco, num discurso, chegou-se mesmo a falar do girassol, das matérias gordas. Meus senhores, não é a subida ou a descida do leite pasteurizado ou o facto de o trigo ser mole ou duro que está em causa: as questões que aqui estão em causa são questões políticas de grande profundidade, porque não têm a ver connosco - governo ou deputados - mas com o povo português.

Aplausos do PSD.

É que os Srs. Deputados, nas vossas intervenções, nunca conseguiram contestar os resultados conseguidos pelo Governo durante os dezasseis meses que leva de governação.

O Sr. Caries Carvalhas (PCP): - É preciso ter descaramento!

O Orador: - Será que não é um facto que a produção crescei, que relançámos a actividade económica depois de um período de austeridade? Será que não é um facto que o investimento cresceu? Os senhores disseram que 107o de crescimento não é muito, mas a queda de 307o no passado não é importante?
No entanto, recordo que foram os senhores mesmo que aqui disseram que o Governo não seria capaz de fazer subir o investimento em 5%.

Aplausos do PSD.

E eu pergunto o seguinte: depois do 25 de Abril, e tirando aqueles períodos que se seguiram a 1974, qual foi o ano em que o poder de compra dos salários e das pensões subiu mais do que o de este ano? Como é que os senhores têm coragem de afirmar aqui o que o povo não sente? É que, em 1986, registou-se a melhoria mais aproximáveis do poder de compra da população!

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Melhoria arrancada a ferros!

O Orador: - Então, permita-me que lhe responda desde já a essa parte da questão que me colocou.
Há pouco, um Sr. Deputado disse aqui nesta Câmara que a melhoria registada do poder de compra da população foi por vontade forte dos trabalhadores e eu pergunto se a queda verificada no poder de compra nos anos de 1983, 1984 e 198S foi com a complacência da população.

Aplausos do PSD.

Como é que os senhores conseguem negar que o desemprego não está a aumentar e que essa chaga (sou o primeiro a reconhecê-lo) dos salários em atraso, de que os senhores são os primeiros e grandes culpados ...

Aplausos do PSD.

.... não teve, pela primeira vez, uma resposta positiva?
Quer que lhe diga que estou satisfeito? Não estou!
Quando este governo tomou posse, existiam cerca de 100000 trabalhadores com salários em atraso. Hoje existem menos de 50 000 trabalhadores nessa situação. No entanto, aquilo que conseguimos fazer num ano não tinham os outros conseguido fazer em três!

Aplausos do PSD.

Os salários em atraso, meus amigos, não se combatem criando receio e afastando a iniciativa privada.
Por que é que em Setúbal se vive uma situação dramática? Faltam estradas? Faltam portos? Faltam acessos a Lisboa ou à vizinha Espanha? Por que será? Por uma razão só, meus senhores, que é a de que, neste momento e por aquilo que foi feito no passado, a iniciativa privada não quer apostar no distrito de Setúbal. Mas quem foi que criou esse medo à iniciativa privada? Foram aqueles que apostaram na estatização, que resolveram ocupar as fábricas, destruir o aparelho produtivo!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - E em Trás-os-Montes?

O Orador: - Hoje não existe ninguém que queira criar riqueza, que, no fundo, é a base para surgirem mais postos de trabalho e para que as condições de vida da população melhorem.
No entanto, estamos a vencer essa situação, estamos a trabalhar para ultrapassar essa dificuldade. Não é fácil, mas temos demonstrado o nosso empenho permanente para que na península de Setúbal os empresários voltem novamente a criar fábricas, a comprar equipamentos, a apostar nas viaturas, criando mais riqueza, que depois vai dar, de forma sustentada, novos postos de trabalho. É esta a forma de dar resposta aos problemas e não através de subsídios permanentes!
Os Portugueses não querem viver constantemente a estender a mão ao Orçamento ou à Segurança Social para se conseguirem sustentar. O homem realiza-se pelo trabalho e o que todo o homem quer é que lhe dêem uma oportunidade para mostrar aquilo de que é capaz.

Aplausos do PSD.

Por isso, temos posto o nosso empenho e grande determinação para que o investimento cresça, para que a produção aumente e, dessa forma, se possa combater os salários em atraso e criar mais postos de trabalho.
Estamos a fazer face às situações de carência mais gritante, e não me venham dizer que os senhores sentem mais dor do que nós por aqueles que têm fome ou por aqueles que não têm ou não conseguem comprar uma casa!

Protestos do PRD e do PCP.

Este governo pode dizer-vos, os Portugueses sabem-no bem, que foi ele que aumentou substancialmente os valores mínimos das pensões de reforma e de invalidez, conseguiu integrar os trabalhadores agrícolas no regime geral da Segurança Social, alterou o esquema de cálculo das pensões de reforma dos pescadores e aumentou em mais de 50 % as prestações sociais para os deficientes.

Aplausos do PSD.

Meus senhores, eu e o Sr. Ministro das Finanças estamos já cansados de abordar essa questão da «boa conjuntura».

Vozes do PRD: - Vá descansar!

O Orador: - Penso que já havia toda a razão para terem entendido como é que se define a política económica e como é que ela toma em consideração as variáveis externas, ou seja, a conjuntura. Assim, respondo citando apenas um homem: «A qualidade nunca é um acidente. É sempre o resultado de uma forte intenção, de um esforço sincero, de uma direcção inteligente e de uma execução hábil. Representa a escolha sábia entre muitas alternativas.»

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Falou-se aqui em guerrilha entre o Governo e a Assembleia da República.
Compreendo o vosso embaraço, o vosso incómodo, pelo facto de, passados treze meses de trabalho com o Sr. Presidente da República, não se terem confirmado os prognósticos de guerrilha com que os senhores tinham avançado.
Este primeiro-ministro tinha já trabalhado, sem problemas, com o anterior presidente da República e penso que tem trabalhado com igual entendimento, numa colaboração frutuosa e benéfica para o País, com o actual presidente da República.

O Sr. Raul Rego (PS): - Mas não com a Assembleia da República!

Protestos do PSD.

O Orador: - Por tudo isto, compreendo o vosso embaraço!
Aos olhos dos Portugueses, os senhores estão isolados, são aqueles que criam problemas ao Governo, são os que cometem inconstitucionalidades, os que fazem obstruções, os que não deixam aprovar as leis, e não digo mais porque o rol completo consta do discurso que há pouco proferi!
O Governo respeita muito a Assembleia da República.

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O Sr. Raul Rego (PS): - Não parece!

O Orador: - O que o Governo não pode aceitar é que a Assembleia impeça que ele cumpra as promessas que assumiu para com o povo português. Tive já oportunidade de dizer, e reafirmo-o, que considero isto um ponto de honra.
Não somos nem queremos ser daqueles que fazem muitas promessas em campanha eleitoral para as colocar na gaveta no dia seguinte ao da vitória. Por isso insistimos e lutamos para que as nossas propostas sejam aprovadas e não nos venham dizer que temos manifestado falta de vontade para o diálogo. Eu próprio me tenho encontrado com muitos de vós. Os membros do Governo têm vindo aqui com uma frequência que não é comparável com a de qualquer outro governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Penso que os membros do actual governo estiveram presentes em mais comissões especializadas que os membros de quase todos os outros governos juntos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr s. Deputados, não basta dizer na praça pública que se quer diálogo. É preciso ter vontade e boa fé para praticar o diálogo e penso -posso estar errado, mas os senhores também o podem estar- que ao longo destes dezasseis meses manifestámos uma forte vontade para o diálogo.

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Pensa, ou tem a certeza?!

O Orador: - Se não fosse assim, como é que teria sido possível aplicar, pela primeira vez em Portugal, uma política de rendimentos com o acordo de todos os parceiros sociais à excepção da central controlada pelo Partido Comunista?

Aplausos do PSD.

Mas não nos peçam que entremos em jogadas políticas. Não nos peçam que, à última hora, nos surja um amor desmedido pelo diálogo, só para encobrirmos dificuldades de alguns. Por aí não vamos, por aí não iremos. A nossa vontade é clara, já o dissemos abertamente.
Um Sr. Deputado disse aqui que o Governo criou crise. Receio que esse Sr. Deputado tenha acompanhado o Sr. Presidente da República na sua viagem ao Brasil e não tenha tido acesso aos jornais. A situação é muito clara. O Governo não quer a crise, não a quis e nada fez para a alimentar.
Como eu disse, este é o lugar próprio e este é também o tempo próprio para apresentarmos as nossas posições. Por isso aqui estamos, por isso disse tudo aquilo que há pouco referi daquela tribuna e não retiro uma palavra.
Este é, de facto, o momento adequado para mostrar ao povo português que, afinal, não há nenhuma razão séria para censurar o Governo.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ficou claro, penso que já o teria ficado por algumas afirmações feitas, que esta moção de censura tem objectivos que vão muito além da queda do Governo. Mas porque também implicam a queda do Governo é que há pouco, perguntei: E Portugal? E os Portugueses? E a estabilidade? E a confiança?
É por isso que disse, e repito, que não é aceitável que, para dirigir um conflito entre dois partidos, se utilize uma moção de censura. Não se pode utilizar um instrumento que cria ou pode criar uma crise tão grave ao País só para ultrapassar uma questão de rivalidade entre partidos políticos.
Meus senhores, se nas últimas eleições eu tivesse sido derrotado e tivesse sido por margem apreciável, nunca aceitaria formar governo sem ser novamente julgado por esse povo. Penso que é a regra da democracia.

Aplausos de PSD.

E penso que não estou só, não estou só nesta Câmara nem nas partidos de oposição. Com efeito, no dia 6 de Março de 1987, o Partido Socialista disse à Antena 1 o seguinte: O PS só regressará ao poder depois de nova» eleições» e um Sr. Deputado aqui presente disse que «o PS não tem motivos ou razões suficientes para desejar uma coligação com qualquer outro partido antes de se realizarem eleições».

Aplausos do PSD.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Já se esqueceram do que disseram!

O Orador: - Penso que isto ajudou a esclarecer um pouco as dúvidas que alguns Srs. Deputados colocaram e deixei para e fim uma questão que foi colocada a propósito da juventude, porque é pela juventude que estou aqui ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ...é pela juventude que estou aqui a lutar e a enfrentar as dificuldades perante os senhores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como foi dito, e concordo, a nossa juventude tem lido a grande vítima dos erros cometidos no passado, das loucuras pós-revolucionárias que se cometeram, i começar por uma lei que este governo tentou modificar e que os senhores não deixaram. Refiro-me à lei dos contratos a prazo e da cessação dos contrato individual de trabalho.

Uma voz do PCP: - E dos despedimentos!

O Orador: - Essa lei é contra os jovens, pois quer impedir que eles revelem as suas potencialidades, que tenham a oportunidade de obter um posto de trabalho que seja simultaneamente um posto de emprego e de salário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Essa lei quer que os jovens sejam condenados ao trabalho precário, à situação de poderem ser despedidos plissados seis ou sete meses, e que aquele

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que, a certo momento, conseguiu entrar numa empresa pública (independentemente do que venha a acontecer depois, como, por exemplo, que essa empresa não possa vender os seus produtos ou não tenha mercado), isto é, aquele que conseguiu um posto de emprego (pode não ser um posto de trabalho) tenha tudo garantido até ao final da vida. Mas ao jovem que se formou, que quer que lhe dêem uma oportunidade para mostrar do que é capaz, a esse não!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - É uma falsa questão!

O Orador: - É por isso, meus senhores, que hão-de ser os jovens, talvez não este governo nem eu, que vão impor que vocês tenham de aceitar a alteração da legislação laborai!

Aplausos do PSD.

Se não foi este governo que se preocupou com os jovens, qual foi o outro que o fez? Qual foi o primeiro governo que definiu uma política global e integrada para a juventude?
Criei uma secretaria de Estado, dependente do próprio Primeiro-Ministro, consciente de que as políticas são horizontais para a juventude.
Procurámos dar uma resposta, em primeiro lugar, no relançamento da economia, porque não há jovem com futuro enquanto a economia se degrada em cada dia.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Procurámos criar condições para expandir o investimento, desenvolver programas de ocupações dos tempos livres, no desporto, no intercâmbio juvenil. Tentámos criar condições mais favoráveis para aquisição de casa própria.
Sr. Deputado, confesso aqui que algo há a corrigir na legislação para permitir que o jovem tenha um mais fácil acesso à aquisição de casa, mas o diploma está já preparado. Obrigado pela sugestão.

Aplausos do PSD.

Quem foi que deu incentivos especiais para que as empresas decidam empregar um jovem, dispensando-as de pagar contribuições para a Segurança Social?
Quem foi que ofereceu aos jovens experiências profissionais? Quem é que agora está a criar possibilidades para surgirem os novos empresários no sector agrícola, no sector industrial? Perguntou-me alguém: Quantos já surgiram? Estou insatisfeito e espero que surjam muitos mais, porque confio bastante nesta nova classe empresarial que está a surgir em Portugal com pujança, dinamismo e que não está sempre à espera que o Estado venha com um chapéu-de-chuva para a proteger dos riscos que possam correr.
Trata-se de uma juventude empresária que não está de mão estendida à espera de mais um subsídio ou de mais uma subvenção do Estado. É uma juventude que acredita nela própria, que é agressiva, dinâmica, que está convencida que Portugal pode vencer este grande desafio que é a entrada no Mercado Comum.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, se não foi este governo que procurou dar uma resposta - ainda que, com certeza, incompleta - aos problemas da juventude, qual foi o governo que o fez?
Este governo deu oportunidades à participação dos jovens no Conselho Nacional da Juventude, no Conselho Consultivo da Juventude, para que ajudem o próprio Governo a resolver os seus problemas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Meus senhores, não estou excessivamente preocupado quanto ao futuro e isto por uma só razão: penso que esses jovens nos vão apontar o caminho e vão apontá-lo a todos aqueles que têm dúvidas sobre qual a linha a seguir neste momento.
É precisamente porque acredito nos jovens portugueses que estou certo que vamos vencer e que Portugal, a passo mais rápido do que muitos esperam, se vai aproximar do nível de vida médio da Comunidade Económica Europeia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Para exercer o direito de defesa em nome da minha bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro veio aqui explicar-nos que nenhuma das 21 questões suscitadas pelos deputados tinha dignidade para se enquadrar na discussão da moção de censura.
Recordo-lhe que o Sr. Primeiro-Ministro entende que não tem dignidade ser questionado, como foi, por exemplo, pela nossa bancada, sobre o seu empenhamento no relacionamento institucional com o Presidente da Assembleia da República, o incumprimento ou não cumprimento do Programa do Governo, a situação da comunicação social relacionada com a forma como ela é manipulada pelos poderes públicos, sobre a posição do Primeiro-Ministro como agente activo da crise, e fico-me por aqui. Estas são questões que, do ponto de vista do Sr. Primeiro-Ministro, não têm dignidade.
Mas há mais, e perdoe-me que retome a primeira dessas questões, que foi aquela que lhe coloquei.
O Sr. Primeiro-Ministro entende que não tem dignidade, no debate da moção de censura, ser questionado pela posição que V. Ex." mesmo assumiu face à moção de censura perante o Partido Socialista. Não obstante, o Sr. Primeiro-Ministro foi o primeiro a trazer essa matéria a este hemiciclo, nas primeiras páginas da sua intervenção.
Sou, uma vez mais, obrigado a retirar uma de duas conclusões: ou o Sr. Primeiro-Ministro entende que as posições que assume e que as questões que aqui traz não têm dignidade - e é V. Ex.ª que faz esse juízo, não sou eu que me atrevo a fazê-lo - ou, mais uma

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vez, vem demonstrar aqui a arrogância hipócrita com que exerce o desempenho das suas funções políticas neste país.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PCP.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Deputado, eu não disse que todas as questões não tinham dignidade, referi apenas algumas, pelo que até lhe respondi à questão que colocou. E tinha de lhe responder, pois não mudo de opinião da manhã para a noite! Como já tinha abordado o assunto na minha intervenção, tive de lhe responder da mesma forma.
A minha opinião quanto a esse assunto que, com certeza, é importante nesta moção de censura, tinha-a eu dado há pouco e agora voltei a reafirmá-lo.
Portanto, peco-lhe desculpa, Sr. Deputado, por não ter mudado de opinião. Sei que outros mudam de opinião com alguma rapidez, mesmo em questões essenciais e ligadas a este debate da moção de censura...

Risos do PSD.

...mas a minha posição em relação ao diálogo com o seu partido foi a que exprimi no início, a qual reafirmei há pouco.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra do meu grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Primeiro-Ministro, disse V. Ex.ª que nenhuma das 21 perguntas formuladas tinham a dignidade deste debate, nem tão pouco a tinham os argumentos da oposição. Talvez tenham mais dignidade para V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, algumas palavras chicanarias de alguns Srs. Deputados do grupo parlamentar que o tem apoiado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Talvez essas sejam mais dignas para V. Ex.ª Eu creio que nem sequer são dignas desta Câmara.

Receio, Sr. Primeiro-Ministro, que V. Ex.ª esteja a ir longe demais, mesmo nesta situação periclitante para o seu governo.
V. Ex.ª não rebate nem as perguntas nem os pedidos de esclarecimento e, em vez disso, faz propaganda uma vez mais - e tem esse direito; manifesta-se como um crítico, mas como um crítico que pode ser considerado - e corre esse risco - antidemocrático, pela forma como se nos dirige. É preciso ter mais cuidado com as palavras, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Porquê?

O Orador: - V. Ex.ª não quer que se façam perguntas. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, num debate desta natureza, numa moção de censura, os pedidos de esclarecimento e as perguntas encerram em si mesmos críticas imediatas actuação governamental. Saiba rebatê-las, Sr. Primeiro-Ministro, e rebatê-las sem ofensas!
O meu protesto em defesa do meu grupo parlamentar tem a ver com a sua declaração de que não houve dignidade nas nossas interpelações. V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, corre o risco de ser considerado um político que não aceita as regras democráticas, o que é grave.
Pela minha parte e pela do meu grupo parlamentar, além de lhe ter apresentado alguns aspectos negativos das condições de vida dos Portugueses que nos preocupam, dissemos-lhe e perguntámos-lhe claramente o seguinte: a V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, que abrigou os conflitos institucionais a outro órgão de soberania - a Presidência da República -, já não lhe bastam os ataques infundados à Assembleia da República? V. Ex.ª vai mais longe: ofendeu directamente o Sr. Presidente da República.

Protestos do PSD.

Em seguida, perguntei-lhe: será que V. Ex.ª e o seu governo entendem que o Sr. Presidente da República é capaz de clesonestidades? Que o Sr. Presidente da República é capaz de fraudes? Que o Sr. Presidente da República, mi cumprimento das normas constitucionais em vigor, se viabilizar uma alternativa democrática e legítima a este governo, isso alguma vez pode ser considerado por alguém como violador da ética política e desrespeitado r do eleitorado?
O Sr. Primeiro-Ministro preferiu refugiar-se na ofensa. Fugiu às respostas porque sabe perfeitamente que não tem desculpa, porque ofendeu nessa entrevista o Sr. Presidente da República, a própria democracia e a Assembleia da República, já que não aceita as alternativas democráticas e constitucionais que o Sr. Presidente da República decida adoptar para a substituição do seu governo.
Afinal, Sr. Primeiro-Ministro, o que é que não tem dignidade: a minha pergunta ou a sua afirmação ofensiva e abusiva no jornal Expresso contra o Sr. Presidente da República? Quem é, realmente, aqui mais digno, Sr. Primeiro-Ministro?

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª deseja responder, Sr. Primeiro-Ministro?

O Sr. Primeiro-Ministro - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra pari defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª quis insultar a Assembleia da República gratuitamente.

Uma voz do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Não é que pensemos que todas as 21 perguntas que lhe foram dirigidas sejam adequadas neste debate. Pensamos que muitas delas não o são.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - Mas isto é um debate parlamentar e respeita-se...

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O Sr. João Amaral (PCP): - É isso! Não há meio de entender...

O Orador: - ...porque entretanto lhe foram feitas todas as perguntas essenciais - repito, todas as perguntas essenciais - que este debate coloca na ordem do dia. E a muitas delas o Sr. Primeiro-Ministro não foi capaz de responder.

Protestos do PSD.

No plano social, Sr. Primeiro-Ministro, colocámos-lhe a questão do desemprego e acusámos o Governo de não ter sido capaz de reduzi-lo. Colocámos a questão dos salários em atraso e acusámos o Governo de manter essa chaga social. Levantámos o problema do trabalho clandestino e do trabalho infantil - grandes chagas sociais surgidas, afirmadas e generalizadas na vigência do seu governo - e sobre isto o Sr. Primeiro-Ministro não foi capaz de responder.
Acusámos o seu governo de não ser capaz de aproveitar a conjuntura externa extremamente favorável para relançar a economia e melhorar seriamente as condições de vida do nosso povo.
Dissemos que o seu governo não é capaz de dar estas respostas porque ataca cegamente o sector público, porque está caído no eleitoralismo e no clientelismo.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Sr. António Capacho (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Admitimos que uma crise política possa ter algumas implicações na situação económica. Admitimos isso, mas não admitimos a paralização da economia, que se verificaria com o seu governo.
Mas mais grave e perigosa para o País não será a paralisação da economia, mas a paralisação da democracia, e é essa que a permanência do seu governo ameaça.

Aplausos do PCP.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - É preciso lata!

O Orador: - É a paralisação da democracia que a permanência do seu governo ameaça. Creio que todos nos fomos dando conta disso, todos nos fomos dando conta desse estilo autoritário, que mais dia menos dia pode paralisar as instituições. E creio que esta moção de censura veio no seguimento desta convicção geral, porque - creio - nós, portugueses, temos experiência bastante para dizer «não» às soluções autoritárias, pois sabemos que não trazem nem felicidade ao nosso povo nem desenvolvimento ao nosso país. E trazem, como bem soubemos, o terror e a perseguição que aqui vivemos durante 50 anos.
É esse perigo que queremos afastar, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Deputado Carlos Brito, tenho muito respeito por todos os Srs. Deputados e nunca levantaria obstáculos a que defendesse a sua honra - porque foi o preceito que invocou. Só que não consigo estabelecer bem a relação entre a defesa da honra e a parte final da sua intervenção. E por isso lhe pergunto: se eu tivesse respondido directamente e em todo o pormenor, será que teria sido possível mudar o conteúdo da cassette?

Risos e aplausos do PSD.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro citou-me directamente numa pergunta que me dirigiu e não quero cometer uma falta de atenção não respondendo à pergunta do Sr. Primeiro-Ministro. Fui interrogado, devo responder.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Isso não é regimental!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Regimentalmente, não pode falar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, regimentalmente isso não é possível. V. Ex.ª terá certamente oportunidade de o fazer através de uma intervenção.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, posso usar agora a figura regimental da defesa de honra para a defesa da minha honra pessoal, uma vez que há pouco usei da palavra em defesa da honra da minha bancada...

Risos.

.... e agora fui pessoalmente interpelado pelo Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, também não é possível, porque não houve nenhuma intervenção que desse lugar a tanto.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra.

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de poder intervir, ao contrário do seu estilo exaltado, com uma grande serenidade.

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - A vossa boa disposição, aliás, ajuda à minha serenidade. Uso, pois, da palavra para lhe dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que todos nós que aqui estamos fomos eleitos pelos Portugueses, temos legitimidade para representar sectores do eleitorado e temos toda a legitimidade para pormos ao Sr. Primeiro-Ministro as questões que entendermos. Da mesma forma que o Sr. Primeiro-Ministro pode escolher não responder a essas questões, como escolheu, uma vez que não respondeu à maioria esmagadora das questões dignas que aqui lhe foram postas...

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O Sr. António Capucho (PSD): - Essa é a sua opinião!

O Orador: - ... e criou um conjunto de perguntas que, em sua opinião, sintetizariam essas questões para poder fazer uma nova intervenção, no estilo que considerou mais conveniente à campanha eleitoral já iniciada neste momento no País, gostaria de lhe dizer, com toda a clareza, que as posições do meu partido são determinadas pelas decisões dos seus órgãos competentes. E pode o Sr. Primeiro-Ministro estar descansado, não vale a pena ter já muito medo, embora perceba que tenha medo que se forme outro governo sem o senhor como Primeiro-Ministro para aproveitar a conjuntura existente, porque certamente daqui a seis meses, um ano se veria quão magros foram os ganhos conseguidos pelo seu governo, dado o carácter verdadeiramente fabuloso dessa mesma conjuntura - porque a posição do PS, a posição sempre definida pelos órgãos colectivos que representam o partido é a que passo a expor.
Primeiro, o PS não desencadearia nenhuma crise política para substituir este governo por um Executivo seu antes de eleições.
Segundo, e isto consta dos textos do congresso e foi sempre afirmado pelos órgãos de direcção política do partido: se uma crise fosse aberta, independentemente da nossa iniciativa, o PS apreciaria a situação criada em termos do seu entendimento do interesse nacional (e, Sr. Primeiro-Ministro, todos nós temos direito a ter o nosso entendimento do interesse nacional, e o seu não é necessariamente o único e o autêntico) e manifestaria a sua disponibilidade para uma de duas soluções, ou para disputar eleições, que não tememos, ou para colaborar com o Sr. Presidente da República e com os restantes partidos representados nesta Assembleia, caso houvesse um consenso maioritário no sentido de não haver essas eleições, que têm custos - o Sr. Primeiro--Ministro, aliás curiosamente, não falou nunca nos custos dessas eleições, mas só de Portugal, dos portugueses e da estabilidade política. O PS estava, pois, livre para, em colaboração com o Presidente da República, tomar a decisão que entendesse. Não a tomou, não manifesta neste momento nenhuma preferência e, como temos dito com grande clareza e insistência, aguardamos serenamente a chegada do Sr. Presidente da República - que consideramos o primeiro intérprete do interesse nacional, pois foi o único que foi eleito em condições que o tornam o intérprete verdadeiramente autêntico desse interesse - para colaborar com ele na procura daquilo que for entendido como a melhor solução para o País, seja eleições, seja a formação de novo governo no quadro parlamentar.
Estamos totalmente à vontade. Julgaremos a situação em função dos dados que existirem com inteira liberdade de critério.

Aplausos do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Vice-Presidente Marques Mendes o favor de me vir substituir na presidência da sessão.
Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Mendes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Crespo.

O Sr. Vítor Crespo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na véspera do dia em que a Europa celebrava o 30.º Aniversário do Tratado de Roma cai-nos a notícia de que o PRD ia apresentar uma moção de censura ao Governo.
Enquanto es países mais ricos e mais prósperos pensavam no futuro, procuravam novos caminhos de progresso e aplanavam as dificuldades existentes, nós, os que estamos na cauda da Europa, os que temos mais dificuldades, abríamos uma crise política, fomentávamos a instabilidade, parávamos o relógio, bloqueávamos o desenvolvimento da sociedade portuguesa.

O Sr. Licínio Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A moção de censura pode obviamente ser apresentada pelos partidos da oposição - é um seu direito. Mas é inteiramente legítimo perguntar se ela tem ou não razão de ser, se justifica perante o desenvolver da actividade governativa.
Ninguém ignora que a moção de censura é um acto de último recurso a utilizar quando estiverem em causa os interesses da Nação.
Já habituado: a muita coisa estranha, não deixamos de aguardar com expectativa a sua fundamentação, que nos causou um enorme espanto.
Não são postos em causa «a execução do Programa do Governo», nem se abordam «assuntos relevantes de interesse nacional», como exige a Constituição da República.
Antes, são reunidos meia dúzia de slogans, ditos e reditos, que não passam de apreciações subjectivas e de banalidades.
Dois exemplos: são pelo PRD elevados à categoria de «assunto relevante de interesse nacional»: «o clientelismo desenfreado com que vão sendo ocupados todos os lugares da Administração» e «a manipulação da informação».
Críticas que não têm nada de original; encontramo-las entre nós na vigência de qualquer governo; fazem-se nos diferentes países, onde naturalmente se lhes dão a dimensão e a importância próprias.
Críticas que também se fazem dentro dos próprios partidos apoiantes do Governo, e que temos mesmo ouvido a titulares de órgãos de soberania.
Há sempre alguém que se julga com direito ao lugar ocupado por outrem e que procura explicar o ter sido preterido com argumentos de ordem política, forma de se autojustificar da sua falta de mérito.
Em sociedades mediáticas há sempre quem julgue que o seu quinhão na comunicação social é insuficiente, por serem mau juizes em causa própria.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É por isso que este debate é intemporal e se faz por te do o lado. Apesar disso, é forçoso reconhecer que teu sido na vigência deste governo, mais do que minha, que tudo se tem passado com grande isenção.
As pessoas são escolhidas pelos seus méritos, capacidades e competência. Eu próprio o posso testemunhar, olhando à minha volta; nos sectores da Administração Pública que melhor conheço assim se faz, sem sombra para dúvidas.

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Aliás, é essa a posição do Governo, que o tem afirmado e praticado. Tem uma nova maneira de governar para os Portugueses, sem atender aos meros interesses partidários.
E quanto à comunicação social, basta trazer à memória o que se tem passado nestes últimos dias: tem sido um autêntico festival e monopólio dos partidos da oposição.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Ah! Ah!

O Orador: - Não escolhi estes dois temas extraídos da justificação da moção de censura por acaso.
E que eles põem verdadeiramente a nu os reais objectivos e algumas das razões íntimas para a iniciativa do PRD - receoso, por lhe ver fugir o eleitorado -, o que as sondagens vão revelando, por ver minguar a sua importância em cada dia que passa, por ver pulverizados os seus sonhos cor-de-rosa.
Daí serem levados a pensar que importava, a todo o custo, praticar um clientelismo do aparelho de Estado e garantir um controle da comunicação social, para que se estancasse a hemorragia em curso e para não caírem na apagada tristeza de pertencer a um partido secundário.
O que está verdadeiramente em causa é a satisfação de apetites, uma vontade urgente em distribuir benesses e o embaraço de se não saber tirar dos clamorosos erros que tem praticado em matéria de comunicação social.
Quanto ao mais, não passam de figuras de retórica ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... que nem a arrastada, mal fundamentada e incaracterística fundamentação apresentada esta manhã pelo Sr. Deputado Hermínio Martinho nos permite alterar a nossa posição.
E assim se lança o PRD, de cabeça ao fundo, numa moção de censura cuja inoportunidade não preciso de sublinhar, já que isso é feito todos os dias, com insistência e calor por aqueles mesmos que os renovadores procuram cortejar e fazer companheiros da sua aventura, enormemente irresponsável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Há, porém, que admitir que houve outras razões a ditar a iniciativa do PRD que se vêm tornando claras a partir da multiplicidade de declarações.
Trata-se de uma luta de clãs para a hegemonia no espaço político à esquerda do PSD.
São o reflexo de contendas intra e interpartidárias, numa corrida desmiolada à prioridade da iniciativa política. São a fuga para a frente na procura do eleitorado. São ainda um indisfarçado receio do sucesso do Governo e a manifestação de intranquilidade perante os que realizam e vencem.
Só que isto traz enormes custos!
A moção de censura não é só inoportuna, fere também os interesses do País. Trava o processo de desenvolvimento e a melhoria das condições económicas e sociais que se tem vindo a realizar, como é amplamente reconhecido por observadores insuspeitos.
É que, sem embargo de todas as dificuldades -e muitas têm elas sido e dos bloqueamentos e da interferência indevida que a Assembleia tem colocado à actividade do Governo, mesmo assim, ele tem vindo a dar uma resposta adequada e desejável a um sem-número de problemas da sociedade portuguesa. O que explica a cota de popularidade do Primeiro-Ministro e das políticas do Governo. O que é indesmentível.
Limitações de tempo impedem-me de desenvolver mais este aspecto ... outros dos meus companheiros de bancada o farão.
Mas não quero neste momento perder a oportunidade de ainda afirmar que a instabilidade causada pela crise, e que persiste enquanto ela durar, vai irremediavelmente atrasar o processo de adaptação à CEE, prejudicar a capacidade de aproveitar as ajudas comunitárias e pôr em causa a continuação do sucesso que foi este primeiro ano de adesão.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O que se tem passado nestes últimos dias não pode deixar de nos preocupar. Vem-se patenteando na imagem pública o espectáculo confrangedor de uma sucessão de declarações e contra declarações, de reviravoltas em posições políticas, da exibição de uma incerteza e falta de opções, que não são salutares ao fortalecimento da democracia. A imagem da classe política volta a ressentir-se. Há um desnorteamento que contrasta com a serenidade da gestão das coisas públicas a que o Governo nos habituara.
Mas não ficam por aqui as razões da nossa preocupação. Tomam foros de cidade o jogo do faz e desfaz de acordos, da elaboração de propostas que não têm viabilidade de ser minimamente atendidas, do avançar e desfazer de soluções alternativas do Governo.
Com que legitimidade?

De acordo com Schumpeter: «A democracia significa somente que o povo é encaminhado a aceitar ou afastar os homens chamados a governar.»
Mesmo que tenhamos algumas reservas - e temo-las- sobre esta «teoria alternativa» da democracia, ninguém pode esquecer que a última campanha eleitoral se orientou essencialmente para a escolha do Primeiro-Ministro.
E também não podemos ignorar que qualquer tentativa de constituição de um governo alternativo ao de Cavaco Silva seria feita com dirigentes políticos que não estiveram na última consulta popular, que a ela são inteiramente estranhos e que por essa razão mesmo não temos a possibilidade de os ver hoje sentados entre nós a defender as suas teses ou propostas de solução para a crise que criaram e pela qual são inteiramente responsáveis.
É ainda importante recordar que o Partido Socialista, que seria o primeiro responsável por um tal governo, sofreu nas eleições passadas uma pesadíssima derrota, não apenas no pedido que formulou ao eleitorado, mas até mesmo em relação à sua tradicional implantação. Ao que se não pode dar outro significado senão o da expressa recusa de que formasse governo.
Ao que acresce que tanto o PS como o PRD se apresentaram ao sufrágio com outra cara e linhas programáticas que entretanto alteraram.
Construir um Governo com aqueles partidos e nestas condições corresponderia a uma ruptura da confiança exigida entre eleitos e eleitores e a um indesmentível desvio do princípio da representatividade, que é pedra de toque num regime democrático.
Era além disso uma actuação antiparlamentar por sobrepor os arranjos de cúpulas partidárias, os acordos de corredor, à lógica e ao processo de funcionamento parlamentar.

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Se tal governo alguma vez fosse construído, nas condições actuais, estaríamos a dar origem a uma grave entorse e a um claro defraudar das regras estabelecidas, o que não podia deixar de repugnar à consciência democrática.
Talvez seja por isso que me é doloroso seguir os discursos e declarações dos autores da crise. O PRD e o PS passam o tempo a esforçar-se por repartir responsabilidades, alijando, da forma que podem, o encargo de as assumir inteiramente.
Não fui eu, ou não fui apenas eu, são os lei motivo de muitas das declarações políticas.
Verdadeiras soluções nem um nem outro partido as têm e por isso mesmo não as apresentam. Ficam-se por querer demonstrar que isso pertence a outros.
O PS e o PRD fazem o «jogo do empurra». E quanto ao PS, numa soma de incoerências quase patéticas, nas suas posições procura desesperado que por qualquer acto de magia se esconjure o seu pesadelo.
Não é preciso dizer mais para demonstrar que nem o PS nem o PRD têm condições ou capacidade para governar.
É que à partida, e antes de tudo, destruíram todas as bases para um crédito de confiança, não deixaram uma réstea de possível estabilidade, necessários para garantir o desenvolvimento económico e social do País.
Não admira, pois, que a linguagem forte do Governo sem eleições venha apenas do lado do Partido Comunista.
O que debilita ainda mais a posição do PS e do PRD, pois que, neste aspecto tão significativo para o futuro do País, encontram-se mais uma vez perante a perspectiva de se subordinar e seguir a estratégia claramente afirmada, e de há largo tempo, pelo PC ou ficar de mãos a abanar.
Se formassem governo, aqueles partidos ficariam inteiramente prisioneiros da vontade do Partido Comunista, situação que os comunistas nem sequer se dão ao trabalho de esconder.

Aplausos do PSD.

Tudo acaba por tornar evidente a irracionalidade e também a irresponsabilidade do passo dado pelos renovadores. Ele nasceu, certamente, de um desejo mal sufocado, sem que se tivessem medido todas as consequências.
Destruir para que das cinzas nasça a fénix tem o sabor de um programa revolucionário/utópico. Só que não dá para governar.
Por tudo isto, não só me parece legítimo mas também justificado que dirija ao PRD um apelo: que reconsidere a sua atitude, de aceitar que cometeu um erro.
Ainda está a tempo de retirar a sua moção de censura. Ainda está a tempo de reconhecer que não é legítimo subordinar de forma tão evidente os interesses nacionais aos interesses partidários. Ainda está a tempo de reconhecer que esta não é a «nova» forma de estar na política nem a que corresponde ao que prometeu ao eleitorado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estou certo de que se o fizer os Portugueses saberão reconhecer dignidade nesse seu acto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Julgar um governo e concluir pela sua rejeição ou pé a sua manutenção é um dos poderes democráticos da Assembleia da República, e por isso um acto normal em democracia. Não há que fazer disso nenhum drama.
O PS participará neste debate de forma responsável de acordo com a sua análise à actuação e comportamento do Governo e com a sua reflexão sobre a situação política criada com a presente moção de censura apresentada pelo PRD.
É conhecida a nossa posição sobre o momento e as condições que precederam ou deixaram de preceder e, em qualquer caso, rodearam a apresentação desta moção. Mas trata-se do legítimo exercício de um direito constitucional e cada um exerce como entende os seus direitos.
Veio aqui o Sr. Primeiro-Ministro, num discurso que há-de ficar como um modelo de mistificação política, tentar responsabilizar o PS por não se dispor a inviabilizar essa moção.
A verdade é que não podia esperar da nossa parte outra atitude. Nunca lhe ocultámos que não tinha a nossa confiança. Recusámo-lha mesmo quando no-la pediu. Votámos, antes disso, contra o seu programa e as suas propostas de orçamento e Plano. Quereria o Sr. Primeiro-Ministro que lhe déssemos razão quando aqui pretendeu acusar-nos de darmos o dito por não dito?
Nunca deixámos de lhe significar até que ponto estávamos em profunda discordância com a sua atitude em face deste Parlamento, que é como quem diz perante a sua atitude antidemocrática em face da democracia.
Não se ultraja sistematicamente o órgão de máxima representação popular esperando ao mesmo tempo a tolerância desse órgão e a compensação do povo nele representado.
Ao longo do empo já decorrido desde então e apesar da melhoria inevitável de alguns índices decorrente de razões estranhas à actividade dos seus ministros, este governo tem demonstrado ser incapaz de aproveitar a conjunção, que jamais se repetirá, de três favoráveis circunstâncias: primeiro, os resultados da contenção da crise e o início ia sua recuperação, conseguidos pelo governo anterior segundo, a excepcional conjuntura económica mundial; terceiro, a nossa entrada na CEE.
Na realidade tem-se limitado a gerir os benefícios da conjuntura com um olho posto na popularidade fácil e com outro atento à satisfação das necessidades e ambições da sua clientela. Não enfrentou os problemas de fundo do País, não introduziu as reformas estruturais necessárias 10 seu desenvolvimento e modernização e não praticou uma real política de justiça social. Continuam à espera de solução problemas como o desemprego, os salários em atraso, as assimetrias sociais no acesso à saúde, à habitação e à educação e, facto esclarecedor de toda uma política, mantém-se a tendência para a redução da taxa dos rendimentos nacionais atribuídos ao trabalho.
E que dizer da escandalosa ocupação partidária da Administração e do sector empresarial do Estado, com verdadeiros saneamentos de opositores à mistura?
Ao contrário das repetidas afirmações do Sr. Primeiro-Ministro, este governo pela sua actuação está a

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afastar dos Portugueses a esperança num Portugal livre onde todos venham a encontrar condições de vida que os tornem iguais aos seus parceiros europeus.
Para ocultar os seus fracassos o Sr. Primeiro-Ministro e o seu governo têm privilegiado a «venda» da sua imagem e dos miríficos resultados obtidos. Têm assumido um comportamento arrogante e sobranceiro face à oposição e à Assembleia da República, provocando confrontos, mantendo um clima permanente de guerrilha institucional e confundindo a opinião pública, afirmando que se «não governamos melhor é porque não nos deixam».
Para obterem este efeito nada descuram. Governamentalizam a comunicação social, onde a manipulação assume aspectos verdadeiramente escandalosos, contratam técnicos de marketing, recorrem a técnicas publicitárias de reconhecida eficácia na venda de maus produtos, agora utilizados em campanhas de autopromoção, na distorção dos factos e nas louvaminhas não só aos resultados já conseguidos mas sobretudo aos que aí virão...
Quanto aos ultrajes à Assembleia da República, não era já preciso o ataque de hoje para sabermos o que nos competia. O lamentável caso da Estónia, o novo número desse folhetim a propósito da Coreia do Norte, e sobretudo repito, sobretudo- esse supremo ultraje de aprovar por resolução uma proposta de Plano que esta Assembleia afogou em ridículo!

Aplausos do PS e de um deputado do PRD.

Desbastou o grosso do ridículo, deixou o retalho e jogou, uma vez mais, na confrontação com o Parlamento.
Noutra democracia, só por esse ultraje, seria demitido e riscado do rol dos políticos que respeitam as regras democráticas.
Não é fácil, com efeito, imaginar maior quebra de respeito à instituição parlamentar, maior descortesia, mais grosseira ofensa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Temos, pois, um Governo que desconhece até que ponto é incomensurável o seu próprio ridículo! E que conta, pela segunda vez, a anedota triste.
Perdoável é, apesar de tudo, essa inconsciência. O que não pode ter perdão é o ultraje de tentar prescindir do Parlamento para aprovar essa chata e vil porção de prosa a que chamou Plano e à que agora chama grandes linhas de acção, trocando uma lei por um acto administrativo e uma exigência constitucional por mais um acto de arrogância!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas não se foge à impressão de que o indisfarçável nervosismo do Governo e a insegurança do seu Primeiro-Ministro escondem mal a inconvicção com que pretendem ter governado bem.
Mas o Sr. Primeiro-Ministro, com o seu habitual discurso, misto de propaganda e mistificação, renega toda esta prática e afirma com candura «que não o move qualquer intuito de ferir a dignidade da», «que respeita muito o Sr. Presidente da Assembleia da República» (embora lhe escape a afirmação de que a intervenção deste sobre o famoso caso da Estónia «foi mera encenação»), e afirma quanto ao caso das GOPs: «Desenvolvemos as nossas prioridades num documento que a Assembleia da República não pretendeu discutir e por isso as especificámos numa resolução do Conselho de Ministros.» Lê-se e custará a acreditar. Mas é verdade.
Tristemente reconhecemos que todos estes factos, alguns denunciando uma total ausência do sentido de Estado, são mais próprios de uma qualquer república das bananas do que de um Estado democrático defensor da sua dignidade e da sua independência.
E reconhecemos ainda que o discurso do Sr. Primeiro-Ministro, a sua postura cultural e a sua maneira de estar na política ameaçam perverter, sem que ele próprio tenha consciência disso, o verdadeiro conceito da democracia e contribuem perigosamente para o seu descrédito. Não haverá ainda ameaça aos ideais de Abril, mas cremos pertinente deixar aqui esta advertência.
Mas o PS, consciente das suas responsabilidades e tendo em conta o interesse nacional, nunca se mostrou disposto a seguir automaticamente qualquer iniciativa política que se apresente, como frequentes vezes tem provado. Também assim actuou nas presentes circunstâncias, até porque entendeu que o Governo e o seu partido deveriam igualmente assumir as suas responsabilidades na defesa da estabilidade política. Deste modo o PS anunciou que faria depender o seu voto nesta moção dos resultados das negociações a encetar com o Governo sobre um conjunto de condições indiciadoras da necessidade de mudança, exclusivamente relacionadas com a normalização do funcionamento das instituições e aprovação na Assembleia da República de propostas concretas em torno dos problemas de fundo do País. Informo a Câmara que juntarei em anexo a lista das condições destinadas a esta negociação para que constem na acta deste debate, lista que foi ontem divulgada à imprensa depois da reunião da comissão política do nosso partido, como fora prometido desde sempre.
Com a habitual arrogância e incapacidade de diálogo, o Professor Cavaco Silva não esboçou o mínimo gesto na direcção de quem lhe oferecia uma hipótese de suster os custos da instabilidade política que vamos todos agora viver.
Mas esta recusa ao diálogo significa que o Governo deixou cair a máscara e tornou claro que também ele quer a crise política que o PRD veio abrir.
Que dizer da «lição» que o Sr. Primeiro-Ministro tentou dar ao meu partido por não ter querido decidir a sua intenção de voto sem ter tentado, em diálogo com o Governo, explorar as possibilidades que houvesse de este fazer agulha para mais eficácia, mais democracia, menos compadrio e menos auto-propaganda?
Nisso viu o Sr. Primeiro-Ministro uma «manobra política» e uma «chantagem».

Ainda que tarde, V. Ex.ª autoqualifica-se. É que tem memória curta, e depressa se esqueceu de que, quando se propôs derrubar o último governo, foi assim mesmo que o senhor procedeu, ao convidar o governo de então para a discussão de um conjunto de exigências de actuação futura.
Veja-se a diferença: a então direcção do PS aceitou o diálogo e aceitou todas as condições menos duas: uma porque era inconstitucional, outra porque, tratando-se de matéria da competência reservada da Assembleia da República, não deveria, no entender do PS, ser escamoteada à sua discussão no Parlamento.

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Estranha conduta da pane de quem recentemente afirmava que «é condenável que se procure criar crises políticas quando o País precisa de estabilidade». Mas as razões estão à vista. Embora repetidamente tenha afirmado que «o País não quer eleições», o Professor Cavaco Silva deseja-as. Ainda se manteve aparentemente distante e sereno alguns dias, poucos. Quando surgiram notícias de que poderia haver um governo para suceder ao seu, perdeu a compostura e faz a sua entrada em cena gritando que «só há uma alternativa aceitável para os interesses do País: a realização de eleições».

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ainda não seguro, resolve mesmo exigi-las, e é então que faz a espantosa declaração de que «um novo governo sem eleições seria uma fraude política».

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Fraude a quê, Sr. Primeiro-Ministro? Às suas ambições?

Agora não diz «muito bem», Sr. Deputado António Capucho?

Uma voz do PCP: - Toma!

O Orador: - Nada tem a democracia a ver com elas! À vontade popular? Esperamos que até ao fim do debate nos esclareça por que é que outro eventual governo, apoiado por esta Assembleia, é menos legítimo do que o seu, que como se sabe passou aqui com menos votos a favor do que contra. Digam «muito bem», Srs. Deputados!

Uma voz do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Mais uma vez o seu pedido demagógico lhe ofuscou a razão e a dignidade do discurso. Compreendemos que o Sr. Primeiro-Ministro, ameaçado de perder o poder, precisa desesperadamente de ganhar a opinião pública e atirar com uma palavra de esperança para o seu partido e para a sua clientela, não vá a dúvida infiltrar-se aí e iniciar-se já um salve-se quem puder.
Aquela frase não será um símbolo, mas será sempre tida em conta por todos aqueles que queiram julgar a sua maneira de estar na democracia!
Sr. Primeiro-Ministro, nós não diremos o mesmo do seu governo, muito embora ele tenha ganho na Assembleia da República com mais votos contra do que a favor, mas o que diremos, isso sim, é que o seu governo defraudou a esperança dos Portugueses e por isso o PS votará contra tal governo ao dar o seu apoio à moção de censura que estamos debatendo.

Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não quis a bancada do PS criar um incidente parlamentar no momento em que o seu líder proferia o discurso que acabámos de ouvir.
Não o fez para não criar um incidente parlamentar, mas quero comunicar à Mesa, em nome da minha bancada, que não podem as deixai de registar mais um acto de arrogância do Sr. Primeiro-Ministro ao estar ausente no momento em que o líder do principal partido da oposição fazia o seu discurso a propósito da moção de censura. É a própria confirmação da denúncia que o Partido Socialista tem feito relativamente à arrogância do Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, ouvi as suas palavras mas elas não constituíram propriamente uma interpelação à Mesa.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira): - Sr. Deputado Jorge Lacão, queria esclarecê-lo do seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro ausentou-se porque tem o direito de o fazer, embora seja se a propósito voltar.
E ausentou-se no momento em que ainda não tinha sido anunciada a intervenção do líder da bancada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Tinha sido anunciada uma outra intervenção.
Naturalmente que o se o Sr. Primeiro-Ministro tivesse tido conhecimento...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS t: - Sr. Ministro, as inscrições estão na Mesa de o Governo, com diligência, poderia ter tomado conhecimento delas. Por outro lado, o Sr. Ministro está sentado nessa bancada e poderia ter tido também a diligência de evitar que isto tivesse acontecido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. António Capucho (PSD): - Não sabe que antes estava inscrito outro deputado?

O Orador: - Sr. Presidente, não vale a pena dar explicações a quem não as quer ouvir.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Ferraz de Abreu, ouvimos a sua intervenção com cuidado, com atenção e com o respeito que nos merecia e chegámos à conclusão que do ponto de vista do Partido Socialista nada r avia que justificasse outro voto que não o voto contra em relação ao Governo e, portanto, o voto favorável à moção de censura. Para o Partido Socialista, um governo destes é um governo próprio de uma república da; bananas, é um governo que não tem sentido de Estado, que tem cometido tantos erros - referia-se o Sr. Deputado aos casos da Estónia e das opções do Plano - que bastaria um destes para, num Estado democrático normal, se demitir.

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Pergunto ao Sr. Deputado se acredita verdadeiramente naquilo que diz. Porque das duas, uma: se é verdade que este é o juízo do PS, então, Sr. Deputado, que sentido teria uma promessa de negociações até ao início do debate para manter a estabilidade desse governo que é tão mau?
Como é que o PS concilia este juízo que faz do Governo e, ao mesmo tempo, lamenta a ausência de promessas... Porque bastaria a promessa de diálogo, bastaria um piscar de olho do Governo para salvar um governo que é tão censurável para o PS.
O Partido Socialista acredita ou não que esta moção de censura é, como tem dito, um acto de irresponsabilidade, e por isso coonestá-la com o seu voto é também praticar um acto de irresponsabilidade? Só que o PS está a assumir uma posição de automenoridade política: diz muito claramente aquilo que quer, classifica as coisas, mas depois pede ao PRD que não obrigue a votar, que não apresente a moção, que é inoportuno, e pede ao Governo que lhe dê uma esperança que não o obrigue a votar também esta moção de censura.
Como tal, a pergunta que lhe coloco é se o PS acredita ou não na sua maioridade política. Se acredita, para que é que precisa do gesto do Governo para se decidir em relação a um governo que diz ser tão mau? Como é que um piscar de olho do Governo, até ao início do debate, faz de um governo que não tem a mínima salvação um governo com sentido de Estado, um governo da democracia, um governo que privilegia os interesses nacionais?
Só nesse sentido, naturalmente, o PS evitaria a sua queda. Em que ficamos, pois, Sr. Deputado?

O Sr. Victor Hugo Sequeira (PS): - O Governo não piscou o olho, fez um «manguito»!

O Sr. Presidente: - Para responder, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Deputado, penso que não esteve com total atenção à leitura da minha intervenção. E é pena que eu não tenha lido as condições que queríamos submeter ao Governo com vista ao diálogo. Eram muito longas e nós temos pouco tempo.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Lamento, Sr. Deputado, mas temos pouco tempo.
Se tivesse ouvido com atenção, teria ouvido que nós quisemos de facto dialogar com o Governo e explorar as possibilidades que houvesse de este fazer agulha para mais eficácia, para mais democracia, para menos compadrio e para menos autopropaganda, Sr. Deputado. Não estávamos a querer o mesmo Governo. Se o Governo fosse susceptível de mudar e de fazer tudo isto que dizemos aqui, estaríamos dispostos a deixá-lo passar.
Nós não pedimos nada ao Governo; oferecemos-lhe a possibilidade de cumprir aquilo que sempre tem dito: que é preciso estabilidade, que o povo não quer eleições, etc. ...
Por outro lado, não pedimos nada ao PRD para não votarmos a moção deles. O que nós sugerimos ao PRD foi apenas que se adiasse este momento, dado o Sr. Presidente da República se encontrar fora do País. Não lhe pedimos para não votar, nunca fizemos tal pedido.
E lamento que o Sr. Deputado Costa Andrade, pessoa por quem tenho muita consideração, caia um pouco no hábito que certas pessoas do seu partido têm em nos atribuir coisas que nunca pensámos nem nunca dissemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Costa Andrade pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

Vozes do PS: - Eli...!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. V. Ex.ª é juiz em causa própria.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Penso que, na base da praxe de hoje, o PS tem tudo menos a legitimidade para exprimir este espanto. Pelo menos, prometo que não me afastarei da figura mais do que aquilo que tem sido hoje aqui feito, designadamente pelo Partido Socialista.
Mas, Sr. Deputado, a questão é a seguinte: o PS disse -se bem interpretei as notícias vindas a público através da comunicação social- que bastaria a abertura de negociações para que não viabilizasse a moção de censura. Pergunto-lhe: a abertura de negociações é suficiente?
O PS nunca fez depender a sua posição, nas notícias que foram veiculadas através da comunicação social, de mudança ou da metanóis de um novo comportamento por parte do Governo. O PS disse: dê-nos o Governo a graça de um olhar, de uma promessa, e nós fazemos o milagre. E para o PS, quem é o Governo? É o Governo das bananas, é o Governo que não tem sentido de Estado e que tem feito factos, tais e tantos, que só por um merecia ser demitido. Para o Partido Socialista tudo isso se apagaria e continuaríamos a viver como Deus com os anjos no melhor dos mundos! É isto que me parece incoerente, Sr. Deputado.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Deputado, creio que a minha resposta é simples, porque, como não houve qualquer ofensa, começo por não ter de pedir desculpas por tê-lo ofendido.
Porém, creio que o Sr. Deputado continua um bocado distraído, porque, na tentativa que fizemos de diálogo com o Governo -nem em sítio nenhum -, nunca foi dito que bastaria o Governo dizer que negociaria connosco para nós dizermos que íamos mudar o nosso voto. Não! E até demos um prazo: a véspera do agendamento do debate na Assembleia da República! E o Governo nem sequer quis tomar parte. É, como aqui tem sido dito tantas vezes, a arrogância, a sobranceria do Sr. Primeiro-Ministro que, na realidade, nem sequer quis tomar conhecimento das nossas condições. Se o tivesse feito, verificava que talvez fosse rápido a concluir essas negociações. As condições que púnhamos eram simples, claras e não iam transformar

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o PS num partido de apoio ao Governo; continuaríamos na oposição, em oposição às políticas do Governo. O que pretendíamos era ver resolvido um certo número de problemas graves, sobretudo aqueles que ainda agora acabei de citar e que põem em risco o jogo da democracia em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições -o que lamentamos- ver-me-ei obrigado a interromper os trabalhos.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, não havendo na Mesa inscrições para intervenções, penso que V. Ex.ª deveria marcar, não propriamente para hoje mas para o momento que entendesse a fase de encerramento deste debate.
Pela minha parte, estaria disponível, dado já serem 19 horas, que a fase de encerramento se iniciasse amanhã pelas 10 horas.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pediu a palavra para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - E o Sr. Deputado António Capucho pediu de novo a palavra para que efeito?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria apenas de saber, para nosso esclarecimento, quais são os partidos parlamentares que ainda não intervieram depois do período de abertura.

O Sr. Presidente: - Só intervieram o PSD e o PS, Sr. Deputado.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado João Amaral para uma intervenção.

O Sr. João Amaral (PCP): - Estou convencido que o Sr. Deputado António Capucho, depois da insatisfação que manifestou, vai ter muito gosto em ouvir a continuação do debate antes da votação e da queda do Governo.

O Sr. António Capucho (PSD): - É sempre com muito prazer que ouço V. Ex.ª!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Desde o anúncio da apresentação da moção de censura e da situação por ela criada (e é um dos aspectos que vale a pena neste momento realçar), nenhuma significativa força política, social ou económica (com a óbvia excepção do próprio PSD e dos seus escribas de serviço) veio a público louvar, apoiar ou mesmo sustentar o governo Cavaco Silva ou defender a sua permanência.
A moção de censura e o seu desenvolvimento teve, em relação à situação política no País, o mesmo cru efeito que tem na fábula de Ramalho Ortigão a constatação de que «o rei vai nu»: o governo Cavaco Silva está isolado no País, come está na Assembleia da República.
Quando o Primeiro-Ministro aqui vem mais uma vez, agora à beira d a queda, invocar a sua legitimidade como um «dom exclusivo», importa recordar que a fórmula de governo minoritário bem como a política apresentada foram logo durante o debate do Programa do Governo objecto de reprovação veemente e generalizada, sucedendo mesmo que uma das moções de rejeição apresentadas, embora sim lograr atingir o seu efeito constitucional, teve mais totós contra o Governo do que a seu favor.
A moção de censura não é, como salienta a Comissão Política d a PCP, um acontecimento fortuito, antes culminando im processo de contestação ao governo PSD no País, traduzido em sucessivas condenações na Assembleia da República.

Uma voz cio PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário do que diz o PSD,

monumental Fraude seria a subsistência deste Governo ou qualquer solução que directa ou indirectamente conduzisse à manutenção da política por ele levada a cabo.
A nosso ver, a formação e subsistência deste governo constituíram, elas sim, um desvirtuamento à vontade do eleitorado de 6 de Outubro de 1985. Ao contrário do que gosta de se pavonear o Sr. Primeiro-Ministro, se ele é efectivamente o líder do partido que teve mais votos (e mesmo assim com menos de 307o do eleitorado), o facto é que tendo sido ele um líder que se apresentou às eleições como defensor de uma política de continuidade (agravada), viu os eleitores demonstrarem maioritariamente uma real vontade de mudança política.
Dizia o meu camarada Carlos Brito, no debate do Programa governamental, que ao Governo minoritário que então se formava estava reservada a sorte da rã que queria ;er grande como um boi.
O Governo viveu, ao longo deste ano e meio, das benesses da conjuntura, da pesporrência e da propaganda. Hoje, com a apresentação da moção de censura, o Governo desincha com a mesma velocidade com que a rã da fábula estoirou.

Aplausos do PCP.

E, aliás, como podia deixar de ser de outra forma se, contra a política praticada, se desenvolve um amplo e vigoroso movimento social, se só no 1.º trimestre deste ano estiveram envolvidos em acções de luta mais de 800 000 trabalhadores, se mesmo o Ministério do Trabalho veio reconhecer que o número de conflitos colectivos de trabalho registados, quer a nível de empresa, quer sectorial, foi substancialmente superior ao ocorrido em igual período de 1986?
Que outra conclusão tirar que não seja a de uma viva e alargada contestação da política governamental, se ela conseguiu concitar contra si e trazer a lutas de rara amplitude sectores tão variados, sensíveis e significativos como o 5 médicos, os professores, os estudantes universitários : liceais, os agricultores?

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E que conclusão tirar do sucessivo isolamento a que o Governo foi conduzido na Assembleia da República, em áreas tão determinantes como as das políticas de trabalho, de defesa nacional, da justiça, da economia, da saúde? E do isolamento político, que teve a sua expressão máxima na condenação aqui feita da atitude do Governo, sob pretexto da visita à Estónia, contra uma delegação da Assembleia da República e contra o Sr. Presidente da Assembleia, Fernando Amaral?
A questão de fundo que se colocava era a de que todos sentiam e sabiam que o País estava a perder com esta política, que se agravavam os problemas estruturais da economia e da sociedade, que se degradava a situação social, em particular das famílias trabalhadoras, que se intensificava a exploração dos trabalhadores.
Tudo isto, quando a conjuntura era excepcionalmente favorável, e por isso mesmo criava a especial responsabilidade de atacar os problemas de fundo, melhorar as condições de vida, relançar a economia, abrir perspectivas para consolidar um processo de desenvolvimento económico.
A baixa do preço do petróleo só por si beneficiou o País em mais de 130 milhões de contos. A cotação do dólar baixou, como baixaram as taxas de juro no mercado internacional. O preço do trigo baixou 18<_9b de='de' espelhada='espelhada' indirectos='indirectos' do='do' cerca='cerca' srs.='srs.' mais='mais' aumentar='aumentar' continuou='continuou' milhões='milhões' apropriação='apropriação' anteriorbr='anteriorbr' beneficiaram='beneficiaram' grosso='grosso' terem='terem' _300='_300' quase='quase' exemplarmente='exemplarmente' conjuntura='conjuntura' aumentado='aumentado' em='em' contos='contos' beneficiaram.='beneficiaram.' financeiros='financeiros' as='as' ganhos='ganhos' deputados='deputados' política='política' que='que' no='no' foi='foi' enquanto='enquanto' facto='facto' dos='dos' fica='fica' essa='essa' _1986='_1986' escudos.='escudos.' disso='disso' aliás='aliás' cofres='cofres' não='não' pão='pão' _='_' a='a' trabalhadores='trabalhadores' ano='ano' os='os' _28='_28' dólares='dólares' e='e' ou='ou' externa='externa' encher='encher' o='o' governamentais.='governamentais.' lucros='lucros' empresas='empresas' _70='_70' impostos='impostos' da='da'> As possibilidades da conjuntura esvaíam-se assim nas mãos perdulárias de um governo mais vocacionado para comité eleitoral do que para resolver os problemas.
Em vez de aproveitar os ventos favoráveis para relançar a produção nacional, designadamente em sectores estratégicos como o dos bens de investimento (e cabe aqui dizer, em parêntesis, que se o investimento aumentou, como não podia deixar de suceder depois de se ter verificado anteriormente uma diminuição real de 26%, o facto é que disso não beneficiou a indústria produtora de bens de investimento, como o demonstra por exemplo, a escandalosa diminuição de 60% registada na produção das empresas fabricantes de máquinas e aparelhos industriais eléctricos), retomando, em vez de aproveitar os ventos favoráveis, o Governo agravou a dependência externa da economia portuguesa, tornando-a ainda mais vulnerável aos choques da conjuntura externa. Isto como indisfarçavelmente o mostra o efectivo agravamento estrutural da balança comercial, espelho das insuficiências e deficiências não combatidas da estrutura produtiva nacional para satisfazer as necessidades do desenvolvimento económico.
É esse mesmo espírito de capitulação que conduz o Governo a persistir na aceitação de condições impostas pela CEE que põem em causa os interesses nacionais do desenvolvimento económico, em sectores tão importantes e significativos como as pescas, as conservas e os têxteis.
Espírito aliás que conduziu, num sector, com a dimensão e importância económica e social, como o da agricultura, a instalar a anarquia e descoordenação do mercado (como o escândalo do desmantelamento da EPAC, hoje ainda agravado com o saneamento de um dirigente de EPAC que não se queria sujeitar aos ditames impostos pelo Governo, ou como o escândalo da importação de borregos com a consequente quebra dos preços no produtor que não no consumidor!), com a liquidação de milhares de explorações agrícolas (particularmente em sectores como o do leite, pela retirada da exclusividade às cooperativas leiteiras de recolha, e de pecuária, pelo processo de concentração nos matadouros), tudo isto para não falar de casos como o da vinha, do tomate, das acções desajustadas de emparcelamento, entre outros que conduziram a uma situação de instabilidade generalizada.
Instabilidade e degradação que se projectam em todo o sector das condições e da qualidade de vida.
O desemprego continua a agravar-se, com particular incidência nas mulheres (isto, descontada a manipulação estatística que leva a aumentar em dezenas de milhares por ano o número de domésticas!).

Uma voz do PCP: - Que vergonha!

O Orador: - A precariedade da relação de trabalho traduz-se desde logo no aumento do número de contratos a prazo e na proliferação de formas de trabalho clandestino e precário, que chegam - escândalo máximo! - ao trabalho à hora!
Mantém-se a chaga dos salários em atraso (apesar das medidas tomadas pela Assembleia da República), enquanto uma nova e insuportável chaga - a do trabalho infantil - alastra um pouco por todo o País.
A juventude participa dolorosamente nos picos mais negativos do desemprego, do trabalho precário, da instabilidade e da ausência de perspectivas criadas para o seu futuro. Não é por acaso que, em recente inquérito publicamente divulgado, o emprego e - pasme-se, Srs. Deputados! - a pobreza aparecem no topo das preocupações da juventude!
Na educação, acentua-se a taxa de insucesso escolar, degrada-se o ensino público superior, surgem obscuros negócios em torno do ensino superior privado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Na saúde, degrada-se e desmantela-se propositadamente o sector público, aumentam as dificuldades de acesso, entram em falência o sistema de cuidados primários de saúde e em ruptura os serviços de urgência dos hospitais centrais, registam-se escandalosos aumentos das taxas de mortalidade infantil e de morbilidade por tuberculose pulmonar.
A habitação encarece a olhos vistos, as rendas aumentaram, cessa a oferta de habitação social - aliás, condenada pelo Governo -, as cooperativas são tratadas sem respeito pelos princípios e fundamentos da sua actuação, os jovens vêem bloqueado o acesso à habitação por não encontrarem resposta no crédito oferecido, os níveis de produção exibidos pela construção civil mostram que continua a não haver qualquer nível significativo de recuperação.
Existe, entretanto, em todo o quadro sobre a situação social um número que, para além de particularmente chocante, é talvez o mais significativo quanto ao conteúdo e objectivos da política governamental. Efectivamente, segundo dados oficiais, o peso relativo da massa salarial no rendimento nacional, do já baixo

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nível de 47% verificado em 1985, aliás sem paralelo em qualquer país da Europa, desceu ainda assim e inconcebivelmente para o nível de 43% em 1986.

Vozes do PCP: - Que vergonha!

O Orador: - Isto é, a escandalosa política de rendimentos do Governo conduziu a uma nova considerável transferência do valor acrescentado, em detrimento dos trabalhadores e em benefício da acumulação financeira do grande capital, acumulação financeira que, aliás, este viria a utilizar não para a produção e o emprego mas para o incremento galopante da especulação bolsista.
É esta mesma postura, são estes mesmos objectivos que condicionam o quadro global da actuação política do Governo. Quando privilegia os ataques ao sector público. Quando reclama a desregulação da legislação de trabalho. Quando apoia e estimula a repressão patronal e a violação dos direitos e liberdades dos trabalhadores. Quando desfere fundos ataques à Reforma Agrária. Quando aceita e favorece as condições e benesses das multinacionais.
Disse-o, Srs. Deputados, o povo, que sente que perde com esta política, numa situação em que devia e podia ganhar. Com outra política, como claramente manifestou na vontade de mudança expressa no voto que elegeu, em 1985, esta Assembleia. Com uma política que também contenha e vise a transferência, o rigor, a competência e o sentido democrático.
E é bom que aqui se desfaçam os mitos. É este um governo de competências? Mas, meus senhores, então e os sucessivos fracassos e asneiras cometidos por este ou aquele ministro? Falemos francamente. Aliás, neste quadro e sem ofensa, basta olhar, um a um, os membros do Governo e perguntar quem não recorda o que fizeram, o que não fizeram, e a forma como alguns foram penosamente conduzindo a gestão das suas pastas ... É olhá-los um a um!

Aplausos do PCP.

Um governo de transparência e rigor? Então, e a baralhada -aliás propositada- na apresentação dos números do Orçamento? E o clientelismo, as portarias a alargarem as possibilidades de recrutamento para cargos dirigentes da função pública para permitir a entrada de afilhados e as nomeações para as empresas públicas? E aquela pequena habilidade de sacar, por antecipação, em 31 de Dezembro, 9 milhões de contos dos lucros do Banco de Portugal do ano seguinte apenas para reduzir contabilisticamente o défice orçamental de 1986? Que transparência quando o Governo se recusou a fornecer à Assembleia da República os cálculos para a previsão da cobrança dos principais impostos, visando criar almofadas orçamentais e sacos azuis que lhe permitissem manobras de intuitos eleitoralistas? E que transparência, Srs. Deputados, quando uma Sr.ª Secretária de Estado nomeia o marido - parece que vendedor de automóveis para o cargo de presidente da Comissão Instaladora do Instituto Politécnico da Guarda, ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - ... cargo de si dependente e para o qual o marido não tem habilitações nem experiência profissional, e depois ainda despacha dois subsídios, um pessoal para «ajuda» da execução das obras de adaptação de uma certa capela e outro, de 1000 contos, para a realização de um simples seminário, a título de comparticipação? Ë isto transparência, Srs. Deputados?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É transparência a proliferação de indiciados casos d: corrupção no Ministério da Agricultura no que respeita à atribuição de reservas na zona da Reforma Agrária?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Quanto ao sentido democrático: mas que sentido democrático num governo que escolheu a arrogância mesmo método político? Que, sabidamente minoritário, escolheu desde a primeira hora a via da provocação â Assembleia da República e do desrespeito pelas leis por ela aprovadas? Um governo capaz de retirar do debate da Assembleia a matriz fundamental da política económica e social, as Grandes Opções do Plano a médio prazo, para depois, de repelão, as fazer publicar no Diário da República -com gasto, aliás, 10 erário público como grandes orientações para 5 Governo? É isto sentido democrático, Srs. Deputados?
Perante fastos como estes não restam dúvidas que, se a autopropaganda governamental ainda atinge alguns incautos, isso deve-se e tão-só ao apertado controle e à permanente manipulação da comunicação social.
Aliás, e neste quadro, importa acentuar que hoje não é já possível o Governo esconder que a sua prática e a sua postura política são a causa determinante da instabilidade que perpassa os Portugueses e a vida nacional: instabilidade do emprego, medo nas empresas, instabilidade dos agricultores em geral e dos campos da Reforma Agrária em particular, instabilidade nos mecanismos económicos, com o desestímulo do relançamento da economia, instabilidade resultante do vezo policiesco de quem se dá mal com o regime de liberdades consagrado nu Constituição de Abril, que hoje, dia 2 de Abril, comemoramos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, é a possibilidade de fazer cessai toda esta situação que abre, como perspectiva, a queda do governo de Cavaco Silva.
As linha: da política democrática alternativa estão abertas e, por vezes, suficientemente desenhadas na própria acção da Assembleia da República e na convergência em iniciativas políticas legislativas aqui tomadas e aprovadas em áreas tão significativas como a área laborai, a defesa do sector público, a moralização da vida pública, a dinamização da economia, a garantia da independência da comunicação social, a estabilização da zona da Reforma Agrária, a defesa dos direitos e liberdades fundamentais, a melhoria dos serviços de saúde e de uma política democrática do ensino e da educação, na defesa e garantia dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
As posições do PCP nesta matéria estão expressas no documento da Comissão Política ontem divulgado e são publicamente conhecidas.

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O PCP entende que a queda do Governo significará a condenação da sua política e a afirmação maioritária da necessidade da formação de um governo com uma política democrática, constituído no quadro desta Assembleia.
A reivindicação apressada, fundamentada e arrogante do PSD de realização de eleições antecipadas corresponde, neste momento, à mesma postura de «comissão eleitoral» que o Governo assume desde o início. É um governo que sempre soube não se identificar com a vontade de mudança manifestada maioritariamente pelo eleitorado em 1985.
É um governo que, na perspectiva da sua queda e da formação de uma alternativa democrática, a procura evitar e tenta pressionar a realização de eleições, mantendo-se em gestão - e, Srs. Deputados, como saberia gerir bem nessas circunstâncias a propaganda eleitoral ...

Uma voz do PSD: - Foi sempre assim!

O Orador: - O mesmo governo que sofre sucessivas derrotas na Assembleia, que vê a sua política alargadamente contestada, o governo que foi isolado aqui na Assembleia no voto sobre o caso da delegação parlamentar à União Soviética e que foi incapaz de tirar as consequências do facto tomando a iniciativa de se apresentar aqui a perguntar se tinha a confiança da Assembleia, vem agora dizer que acha a moção de censura inoportuna, um verdadeiro caos!
Estamos convencidos de que a moção de censura é, efectivamente, inoportuna para o Governo.

Aplausos do PCP.

Só que a queda do Governo é para o País e o povo português oportuna, conveniente e necessária.

Aplausos do PCP.

A moção, Srs. Deputados, não constitui nenhuma surpresa.
Alguém poderá talvez dizer que terá vindo tarde. Mas, Srs. Deputados, veio muito a tempo!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, para começar, quero lembrar-lhe que não foi nem o PSD, nem o Governo que disseram pela primeira vez que a moção de censura era inoportuna, mas sim o Partido Socialista. É claro que sabemos que para o Partido Comunista esta moção de censura não é oportuna, é oportuníssima ... Só estranhamos é por que é que o Partido Comunista não apresentou antes uma moção de censura! Ainda não explicaram por que é que esperaram que o PRD a apresentasse!
O Partido Comunista tem conseguido algumas vitórias e não duvido que a apresentação desta moção de censura seja uma delas, só que é à custa de algumas humilhações políticas. Por isso, quero questionar o Sr. Deputado João Amaral sobre alguns assuntos que aqui não referiu.
Por exemplo, o Sr. Deputado não discorreu sobre as consequências posteriores à discussão e votação desta moção de censura. Como é que o PCP e o Sr. Deputado João Amaral consideram a postura do Partido Socialista e do PRD de nunca aceitarem, numa eventual solução alternativa, o Partido Comunista no Governo? O líder do seu partido tem dito sempre que é fundamental para a democracia e para a melhoria das condições de vida dos Portugueses que os comunistas estejam no Governo!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não considera isto uma secundarização e uma humilhação do seu partido, Sr. Deputado? Será que estes excelsos deputados do PS e do PRD pensam que o Partido Comunista tem ou tinha algum mal contagioso para não poder estar no Governo? Será que consideram o Partido Comunista Português um partido de segunda? Será que, afinal, não consideram que os comunistas são tão democratas e tão imprescindíveis como os outros para a resolução dos problemas nacionais?
Como é que o Sr. Deputado João Amaral e o seu partido encaram a posição destes partidos de querer meter o Partido Comunista no gueto?
Falou V. Ex.ª no princípio da fábula da rã que queria ser grande como o boi. Mas também tenho de lembrar-lhe uma história, a propósito desta humilhação que lhe está a ser infligida, que é a dos famosos sapos que VV. Ex.ªs começaram a engolir e que neste momento já são elefantes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Duarte Lima, devo confessar que julguei que era o Sr. Deputado Silva Marques que estava hoje de serviço.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - O homem também tem de ser rendido...

O Orador: - De qualquer modo, fico satisfeito por saber que o Sr. Deputado Duarte Lima já está suficientemente operacional para conseguir preencher as dignas funções que o Sr. Deputado Silva Marques exerce.

O Sr. António Capucho (PSD): - Essa teve muita graça!

O Orador: - Entretanto, tenho duas coisas muito simples para lhe dizer.
Em primeiro lugar, não sei em que lugar é que está nas listas do seu círculo eleitoral e, portanto, não sei se o nervosismo que está a manifestar resulta já da possibilidade de ser empurrado para um modesto lugar, algures lá fora, ou se será alguma questão séria.
Em segundo lugar, a grande questão que se pode colocar neste momento é em termos de uma alternativa política e a posição do nosso partido nessa matéria é muito clara. Falamos, nomeadamente, em relação à nossa participação no Governo, em prevenções anticomunistas alimentadas por sectores que ainda não entenderam a situação da sociedade portuguesa. Devo dizer que o Sr. Deputado Duarte Lima foi um exemplo claro da razão que temos em dizer que essas prevenções e essa componente anticomunista é uma realidade e é alimentada por si de uma forma bastante clara.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, quero começar por dizer-lhe, a si e a todos os deputados do Partido Comunista, que nenhum de nós tem problemas relativamente aos seus lugares nas listas.

Risos do PCP.

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Tanto que não têm que pedem eleições! Agora, parece-me que os senhores é que têm medo de eleições e dos vossos lugares nas listas. Portanto, o argumento é ao contrário e vira-se para aí.
Por outro lado, gostaria de dizer-lhe que, por acaso, não estou a substituir o meu colega Silva Marques, que também não estava de serviço. Mas se estivesse, substituí-lo-ia com honra, porque ele faz aqui intervenções de muita qualidade e seriedade.
Agora, com a intervenção que V. Ex.ª produziu, que foi demagógica e não foi séria nem profunda, dificilmente encontrará no Partido Comunista quem queira aceitar que o substitua.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Fraquíssimo!... O Silva Marques fez bastante melhor...

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Duarte Lima, talvez eu tenha, de facto, esse problema. Assumo-o. Não sei quais são os seus problemas, os seus medos, as suas síndromas, ... mas logo veremos.
Quanto à questão política que colocou de saber que medos é que existem aqui politicamente - que, apesar de tudo, é curiosa -, devo dizer que o medo que aqui existe não é o medo de eleições.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Nota-se!

O Orador: - O medo que aqui está colocado claramente é o medo do PSD de ser arredado da área do Governo e de ser constituído um governo democrático com uma política democrática. Esse é que é o medo que hoje foi aqui manifestado ao longo de todo este debate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Roberto Amaral.

O Sr. Roberto Amaral (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nas eleições de 6 de Outubro de 1985 o PSD foi o partido mais votado, tendo embora recebido menos de 30% dos votos do eleitorado.
Face a estes resultados, o Sr. Presidente da República, ouvidos que foram todos os partidos políticos com assento parlamentar, convidou o líder do partido mais votado a constituir governo e elaborar o seu programa.
Seguidamente, esta Assembleia não se manifestou maioritariamente contra o programa de governo apresentado.
Teve, pois, este governo, e ainda tem neste momento, legitimidade institucional e democrática, advinda, expressamente, da posse que lhe foi dada pelo Sr. Presidente da República e, tacitamente, pela não inviabilização do seu programa por parte da Assembleia da República.
Não há, pois, quaisquer dúvidas nem reservas quanto à legitimidade deste governo. Nem deste, nem de nenhum outro que igualmente se venha a constituir com base neste quadro parlamentar, seja ele maioritário ou minoritário.
Por isso, não percebemos as razões que levam o Governo, o PSD e o Sr. Primeiro-Ministro a considerarem este governo o único legítimo saído deste quadro parlamentar.
Este governo é, de todos os governos formados após o 25 de Abril de 1974, o mais minoritário, facto que também o deveria obrigar a um determinado tipo de relacionamento com esta Assembleia, onde igualmente têm assento representantes eleitos de mais de 70% da população que não votou no partido, no único partido, que apoia este governo.
O discurso proferido pelo Sr. Primeiro-Ministro nesta Assembleia aquando da apresentação do seu programa de governo parecia denotar uma consciência perfeita da situação e prometia perspectivas de diálogo e de um bom relacionamento com o Parlamento e com todos os outros partidos nele representados.
Efectivamente, são do primeiro responsável por este governo as seguintes frises proferidas aquando da apresentação do st u programa: «somos pelo diálogo, pelo encontro, pela concertação»; «a Assembleia da República tem de ser respeitada como o órgão máximo de representação democrática»; «sendo a Assembleia da República o rosto e .1 voz de toda uma comunidade, respeitá-la é respeitarmo-nos, valorizá-la é tomarmos consciência daquilo que vivemos»; «respeitamos escrupulosamente a ordem constitucional e tudo faremos para que o regime político português fique marcado por um novo tipo de relações entre os diversos órgãos de soberania».
Manifestou ainda o Sr. Primeiro-Ministro na oportunidade, entre muitas outras afirmações de princípio, a intenção de sempre governar no plano suprapartidário e de forma não enfeudada a clientelas alimentadoras e beneficiaras de processos de aviltamento e corrupção.
O discurso com que este governo se apresentou a este Parlamento, liem como o que o seu partido utilizou na campanha eleitoral, era diferente, inovador e em muitos aspectos parecido, por vezes igual, àquele que o PRD introduzia na vida política. Por isso lhe conferimos inicialmente o benefício da. dúvida; por isso lhe continuámos a dar o beneficio da dúvida quando ele aqui apresentou uma moção de confiança.
Essa nossa expectativa saiu, porém, frustrada.
O Governo mudou de atitudes; o Governo não cumpriu o rigor que de início prometeu; o Governo falhou.
Ou será que 3 diálogo, o encontro e a concertação foram sempre prosseguidos e desenvolvidos por este governo?
Ou será que a Assembleia da República foi sempre respeitada como o órgão máximo de representação democrática?
Sendo a Assembleia da República, na própria expressão do Sr. Primeiro-Ministro, o rosto e a voz de toda uma comunidade, por que é que mais nenhum outro governo dela saído, mesmo que tenha a confiança política do Sr. Presidente da República e, tal como aconteceu a este governo, veja por ela viabilizado o seu programa, não é democraticamente legítimo?
Que novo tipo de relacionamento teve este governo com o Parlamento? Apenas o do afrontamento?
Será que o recrutamento de pessoal para cargos públicos se tem vindo a fazer com base apenas em critérios de isenção, seriedade e competência?
Foram as e posições consultadas para as nomeações feitas para os postos mais importantes e para as nossas representações na Comunidade Europeia.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputado.;, se sectores houve onde p Governo falhou redondamente, um deles foi, sem dúvida alguma, o da política externa.
Neste domínio, o Governo começou por não conseguir garantir a uni Jade da representação externa do Estado, como é evidenciado nos seguintes dois casos: visita de Pieter Botha è Madeini; última viagem ao estrangeiro de uma delegação deste Parlamento chefiada pelo seu Presidente, a segui ida figura da hierarquia do Estado Português.
Nestes dois casos o Governo reagiu como um qualquer ciclotímico: deprimido e envergonhado no que diz respeito à visita de Pieter Botha; arrogante e despropositado na visita io Presidente da Assembleia da República.

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Significa isto que o Governo receia mais o Presidente do Governo Regional da Madeira do que respeita o Presidente desta Assembleia?
Sabe o Governo se a viagem de Pieter Botha à Madeira se insere em alguma estratégia de aproveitamento por parte da África do Sul de ilhas de países da CEE com estatutos diferenciados em relação ao Tratado de Adesão, como é por exemplo o caso das ilhas inglesas do canal?
Ainda dentro desta perspectiva de defesa da soberania nacional, que dizer da atitude de cumplicidade, impotência e submissão face à atitude do Governo Regional da Madeira em não aceitar o luto nacional decretado pela morte de Samora Machel?
Quanto à cooperação política no âmbito da CEE, a única vez em que o Governo deu um sinal da sua existência foi, ao que nos lembramos, aquando das sanções à África do Sul, e isto, parece, por convir a outros estados da Comunidade que gostariam, assim, de ver os seus interesses mais protegidos a coberto da atitude do Estado Português. Hoje em dia, a posição de Portugal aparece completamente ultrapassada se a compararmos com a de um país tão responsável como os EUA, que veio efectivamente a decretar sanções económicas à África do Sul.
Tomou Portugal alguma posição activa em defesa dos países da Unha da frente, ameaçados na sua integridade territorial?
Não está o Governo ao corrente de uma maior presença de italianos e britânicos naqueles países, em especial Moçambique, onde a cooperação se estende inclusivamente ao campo militar e ajuda alimentar e onde os quadros italianos e ingleses estão a expandir a sua influência no quadro da cooperação estabelecida pela CEE através da Convenção de Lomé III?
E, a propósito, por que é que ainda não se assinou o protocolo entre Portugal e os países ACP, que garante a efectiva participação de Portugal na Convenção de Lomé III e que, tendo entrado em vigor em 1986, faz que o atraso do Governo Português seja já considerável?
Que diligências e que medidas tem tomado o Governo Português, no quadro das relações bilaterais com os países africanos de expressão portuguesa, no sentido de determinar os aspectos positivos e as potencialidades de cooperação no âmbito da execução da Convenção de Lomé III?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na sequência do já por nós referido aquando da interpelação ao Governo solicitada pelo meu partido e centrada sobre política de defesa nacional, gostaríamos ainda de saber em que ponto está, neste momento, a candidatura de Portugal à UEO e as conclusões que o Governo tira deste atraso de mais de dois anos.
Será que o Governo já desistiu da candidatura ou será que a sua não concretização é já considerada uma derrota?
Finalmente, gostaríamos de saber como explica o Governo o facto de, no quadro das relações derivadas da entrada de Portugal e Espanha na CEE, o investimento estrangeiro em Espanha, nomeadamente o proveniente dos outros Estados Membros da Comunidade, ter aumentado substancialmente - cerca de 115 % nos primeiros dez meses de 1986 sobre igual período do ano anterior- e em Portugal esse aumento ser insignificante e, segundo o que já foi hoje aqui dito, ter diminuído em 1986?
Ainda nesta matéria de relações com Espanha, que tem o Governo feito nesta nova fase da vida portuguesa para salvaguardar todas as condições de independência real de um pequeno país que é o nosso e que é dos raros da Europa a só terem fronteira terrestre apenas com um outro?
A moção de censura apresentada pelo PRD não visa, como é óbvio, apenas a demissão do Ministro dos Negócios Estrangeiros. Visa sim a demissão de todo o Governo, com todas as consequências daí advenientes e consequente responsabilização de todos os que votarem, a favor e contra.

Aplausos do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não tem mais inscrições.

Pausa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, estava previsto que esta sessão acabaria às 21 horas. Portanto, uma vez que não há mais inscrições e, segundo penso, todas as bancadas já fizeram uma intervenção, nada mais há a fazer senão interromper os trabalhos e marcar o início do encerramento do debate para as 10 horas da manhã.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, pela nossa parte, organizámos o nosso trabalho parlamentar sabendo que há dois dias de sessão para o debate desta moção de censura - a de hoje e a de amanhã - e, portanto, entendemos que devíamos falar amanhã.
O Sr. Deputado Seiça Neves é quem vai intervir de manhã, por conseguinte, Sr. Presidente, entendemos que podemos suspender aqui a sessão e prosseguir amanhã.
Já agora, Sr. Presidente, gostava de saber se o Governo ou algum ministro vão novamente usar da palavra como é hábito normalmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para interpelar a Mesa, o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, queria só pedir à Mesa uma indicação sobre o tempo de que cada partido ainda dispõe e também qual o tempo que o Governo ainda tem para fazer intervenções.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais, indicarei os tempos disponíveis: Governo - 68 minutos; PSD - 35 minutos; PS - 47 minutos; PRD - 37 minutos; PCP - 25 minutos; CDS - 50 minutos; MDP/CDE - 28 minutos.

Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, em relação à intervenção que fez, devo-lhe dizer que, não havendo na Mesa inscrições, só poderemos informar que o Governo, como é evidente, também não está inscrito.
Srs. Deputados, verificando a Mesa não haver inscrições, o melhor será suspender aqui a reunião de hoje. Como não há objecção de nenhuma das bancadas, dou por terminada esta reunião, que continuará amanhã pelas 10 horas.

Eram 19 horas e 50 minutos.

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Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.

Partido Socialista (PS):

Alberto Manuel Avelino.
António Magalhães Silva.
José Luís do Amaral Nunes.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Ana da Graça Gonçalves Antunes.

Centro Democrático Social (CDS):

Henrique José Pereira de Moraes.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Vieira de Carvalho.

Deputados independentes:

Maria Amélia Mota Santos.
Rui Manuel Oliveira Costa.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Daniel Abílio Ferreira Bastos.
José Olavo Rodrigues da Silva.

Partido Socialista (PS):

Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Manuel Torres Couto.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Armando Fernandes.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.

Partido Comunista Português (PCP):

José Rodrigues Vitoriano.

Centro Democrático Social (CDS):

Hernâni Torres Moutinho.
José Augusto Gama.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Rectificação ao Diário, n.º 58, de 21 de Março de 1987

Na p. 2282, col. 2.a, antes do último parágrafo e a seguir a «Aplausos do PRD», deverá constar o seguinte, que figurava no original, mas não saiu publicado:

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Deputado Paiva Campos, a situação é de facto estranha e curiosa; o PS, o PRD, o PCP e o MDP/CDE parecem estar de acordo com o facto de este despacho se'- um disparate e sei mesmo que muitas pessoas que não se podem exprimir individualmente dessa maneira o pensam em termos humanísticos, científicos, técnicos e pedagógicos.
São dois assuntos os que estamos a discutir: o primeiro ê o da urgência. Se o PCP considera, pela sua maneira de ver as coisas, que é um problema extremamente urgente, que utilize as possibilidades regimentais que i em de o fazer e não tente socializar ao conjunto dos grupos parlamentares a sua decisão. Cada grupo parlamentar tem o seu relógio, o seu calendário, as suas prioridades. Creio que este ponto é claro. Nós temos o nosso, o PRD tem o seu, o PCP terá o seu e o MDP/CDE também.
Por outro lado, nós já não estamos a discutir ratificações nem revogação de decretos-leis, já vamos no despacho! Gostava de chamar a atenção da Câmara para o facto de que isto é um caso de extrema gravidade e nós só em última instância entendemos utilizar o processo de «forjar» um projecte de lei para revogar um despacho.
Apesar de ser um disparate, apesar de o Governo se comportar com marialvismo e machismo e não querer revogar ou dar a mão a fim de corrigir uma medida insensata, apesar disso, entendemos que só em última instância é que tal se deve fazer, e, assim, só contrariados estamos dispostos a fazê-lo.
Pergunto ao Sr. Deputado se já imaginou o que serão a democracia portuguesa e as instituições democráticas no dia em que estejamos aqui sucessivamente a aprovar projectos de lei que revogam ou corrigem despachos de secretários de Estado e ministras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paiva Campos.

As REDACTORAS: Maria Amélia Martins - Cacilda Nordeste - Ana Maria Marques da Cruz.

PREÇO DESTE NUMERO: 256$00

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA. E. P.

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