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I Série - Número 65 Sábado, 4 de Abril do 1987
DIÁRIO da Assembleia da República
PORTE PAGO
IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE ABRIL DE 1987
Presidente: Exmo. Sr. António Alves Marques Júnior
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Rui de Sá e Cunha
José Manuel Mala Nunes de Almeida
SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 50 minutos.
Concluiu-se a apreciação da moção de censura ao Governo apresentada pelo PRD, tendo intervindo, a diverso título, além dos Srs. Ministros de Estado e da Administração Interna (Eurico de Melo), Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira), da Defesa Nacional (Leonardo Ribeiro de Almeida) e das Finanças (Miguel Cadilhe), os Srs. Deputados Alexandre Manuel (PRD), Duarte Lima (PSD), Cavaleiro Brandão (CDS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Perna, de Abreu (PS), António Capucho (PSD), Seiça Neves (MDP/CDE), José Manuel Mendes (PCP), Magalhães Mota (PRD), António Guterres (PS), Mendes Boto (PSD). Carlos Lilaia (PRD), Octávio Teixeira (PCP), Maria Santos (Indep.), José Magalhães (PCP), Manuel Alegre (PS), Marques Júnior (PRD), Nogueira de Brito (CDS), Rui Macheie (PSD), Ana Gonçalves (PRD), Carlos Coelho e Angelo Correia (PSD), Guedes de Campos (PRD), Jorge Loção (PS), Adriano Moreira (CDS), Cartas Brito (PCP) e Jorge Sampaio (PS).
Intervieram no encerramento do debate, por parte do Governo, o Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva) e, por parte do partido interpelante, o Sr. Deputado Hermínio Martinho (PRD).
Finalmente, foi aprovada a moção de censura ao Governo apresentada pelo PRD.
Entretanto, fora aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados do PSD e do PS.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 50 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
António d'Orey Capucho.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Francisco Jardim Ramos.
Cuido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
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José Assunção Marques.
José Augusto Limão de Andrade.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José Olavo Rodrigues da Silva.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Crucho Esteves Robalo.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS):
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel Morais Barreto.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Hermínio da Palma Inácio.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa. José Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Silvedo Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António João Ferreiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Pa vá Seabra Rosa.
João Barros Madeira.
José Caeiro Passinhas.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
José Torcato Dinis Ferreira.
Manuel Ferreira Coelho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Árida da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
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Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Centro Democrático Social (CDS):
Abel Augusto Gomes de Almeida.
António Alberto Vieira Dias.
António Filipe Neiva Correia.
Carlos José Machado L. Pereira.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Horácio Alves Marcai.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
José Vieira de Carvalho.
Manuel Alberto Sá do Rio.
Manuel Eugênio Cavaleiro Brandão.
Pedro José dei Negro Feist.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Manuel Caniço Seiça Neves.
Deputados independentes:
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Maria Amélia do C. Mota Santos.
Rui Manuel Oliveira Costa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar o debate da moção de censura que ontem iniciámos.
A Mesa aguarda inscrições.
Pausa.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Presidente, peço a V. Ex.ª o favor de me informar quanto tempo há disponível por cada bancada, incluindo a do Governo.
O Sr. Presidente: - Os tempos de debate constam do documento de informação geral e são os seguintes: Governo, 68 minutos; PSD, 35 minutos; PS, 47 minutos; PRD, 37 minutos; PCP, 25 minutos; CDS, 50 minutos, e MDP/CDE, 28 minutos. Isto sem contar, naturalmente, com o tempo de encerramento que quer o Governo quer o PRD dispõem de 30 minutos.
Para debate dispomos, portanto, neste momento, de 4 horas e 50 minutos e mais l hora de encerramento.
A Mesa aguarda inscrições.
Pausa.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, se realmente não há mais inscrições na Mesa, sugiro que se passe à fase das declarações finais.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Penso que, do ponto de vista formal, o Sr. Deputado tem toda a razão; portanto, a Mesa vai aguardar que os líderes das diferentes bancadas confirmem se têm ou não inscrições porque - informo os Srs. Deputados - neste momento também se está a processar uma conferência de líderes e não se conhece qual é o objectivo nem os resultados de tal conferência, embora presuma que se relacionará com o próprio debate.
O Sr. Deputado Cavaleiro Brandão pede a palavra, ao que creio, para interpelar a Mesa. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Já ontem, no final da sessão, se chegou à conclusão de que havia falta de inscrições. O Sr. Deputado António Capucho teve, na altura, oportunidade de introduzir na Mesa a seguinte questão: na falta de inscrições talvez seja razoável e justificado que passemos à fase das intervenções finais. Tendo, então, sido suscitada a questão de haver partidos, nomeadamente o CDS, que ainda não tinham intervindo, pôs-se o problema de saber se devíamos ou não aguardar que cada um interviesse nesta primeira fase. Nesse sentido, eu gostaria de informar, formalmente, a Mesa de que o CDS só tem intenção de fazer a sua intervenção final, motivo por que, do nosso ponto de vista, não há nenhuma objecção a que, mantendo-se este estado de coisas, passemos à fase das intervenções finais.
Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca para interpelar a Mesa.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, em forma de interpelação à Mesa, cada grupo parlamentar organiza os debates do seu grupo conforme entende. Na conferência de líderes parlamentares o Governo fez questão de ter mais tempo, uma vez que ia ser fortemente interpelado, como, na realidade, se tem verificado.
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Ora, acontece que o Governo tem 68 minutos e existe a expectativa legítima de que volte a usar da palavra por qualquer dos seus Ministros e daí que os grupos parlamentares estejam a reservar o seu tempo para os interpelar.
ortanto, Sr. Presidente, eu pedia que se fizesse a pergunta ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares para se saber se, na realidade, o Governo vai novamente usar da palavra ainda nesta fase do debate.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Governo está presente, as regras são claras e penso que não devo fazer essa pergunta ao Sr. Ministro. Se, porém, o Sr. Ministro entender que deve dar algum esclarecimento, pedirá e usará da palavra para o efeito.
O Orador: - A verdade, Sr. Presidente, é que nós tivemos, ainda na semana passada, um exemplo muito claro: os grupos parlamentares foram gastando o seu tempo e, no final, um membro do Governo usou da palavra e os grupos parlamentares ficaram sem o poder interpelar por falta de tempo.
Por isso, Sr. Presidente, embora eu não possa interpelar directamente o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, agradecíamos que o Sr. Ministro nos fizesse o favor de dizer se está nas expectativas do Governo inscrever algum dos Srs. Ministros.
Caso contrário, teremos que, daqui a um bocado, pedir a interrupção dos trabalhos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já estava admirado de que a culpa da situação não fosse do Governo.
Risos gerais e aplausos do PSD e do deputado João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
Muito obrigado, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, pelas suas palmas.
O Governo tem, efectivamente, 68 minutos, mas em contas sumárias agora feitas - embora sujeitas a erro - a oposição, no seu conjunto, tem 187 minutos, ou seja, o triplo do tempo.
Não vejo por que é que há-de o Governo falar e a oposição não fala.
Aplausos do PSD.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - O Sr. Deputado do MDP/CDE fez aqui uma comparação com uma situação da semana passada em que o Governo estava a ser interpelado. Só que aquilo que estamos a apreciar não é uma interpelação ao Governo mas uma moção de censura.
Os partidos censurantes não tem mais nada a dizer ao Governo?
Está-se a censurar o Governo e esperamos que se continue a censurar o Governo!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Volto a informar os Srs. Deputados de que está neste momento a decorrer uma conferencia de líderes que, presumo, se relaciona com este debate.
Pausa.
Dado que não há inscrições na Mesa, por não ter outra solução, vou interromper a sessão por quinze minutos a indagar, junto do Sr. Presidente da Assembleia da República, qual é, efectivamente, a evolução da conferência de líderes.
Está interrompida a sessão por quinze minutos.
Eram 10 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 10 horas e 15 minutos.
Para uma interpelação tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, acontece que já usaram da palavra pelo menos quatro grupos parlamentares - o CDS declarou que não vai falar neste debate -, o Governo ainda não se inscreveu e nós, para não criarmos um novo hiato, porque poderíamos ir de pedido de suspensão em pedido de suspensão dos trabalhos, inscrevemos o deputado Seiça Neves para fazer uma intervenção.
Esperamos, Sr. Presidente, que a seguir o Governo inscreva algum dos seus ministros, uma vez que, quando se organizou o debate na conferência dos grupos parlamentares com o Sr. Presidente, o Governo expressou claramente a opinião de que no debate também queria usar da palavra, pelo que até teve mais dez minutos do que o partido interpelante.
Esperamos, portanto, que o Governo saiba respeitar a regia da alternância e cumpra com as normas democráticas que são hábito desta Casa.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Nós gostaríamos de saber se a Mesa tem conhecimento do horário do Sr. Primeiro-Ministro quanto a este debate, isto é, se o Sr. Primeiro-Ministro é o responsável-mor deste governo, nós desejávamos saber se já desistiu de ser Primeiro-Ministro ou se, de facto, ainda tenciona aparecer na Câmara como tal.
Vozes do PSD: - Tenciona!
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O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, sobre a regra de alternância, desejava dizer o seguinte: como é manifesto, neste debate o Governo já interveio pela voz do Sr. Primeiro-Ministro na sessão de abertura e, neste momento, pelo menos dois partidos ainda não intervieram. Sabemos, agora, através de declarações de fundo que há um que está, apressadamente, a inscrever um Sr. Deputado.
Por outro lado, Sr. Presidente, neste caso não se trata de apresentar um programa de governo, em que a iniciativa é do próprio Governo, cabendo-lhe avançar com as inscrições no sentido de expor à Câmara os seus pontos de vista. Ora, a iniciativa deste debate é do PRD, no que está, aliás, muito bem acompanhado por todos os partidos à sua esquerda. Portanto, eles que tomem a iniciativa.
O Governo estará, sempre que entenda, pronto para intervir!... Não se pretenda agora que seja o Governo a garantir a regra de alternância. A Mesa que garanta essa regra se houver intervenções.
Quanto aos horários dos membros do Governo, o Sr. Deputado Ferraz de Abreu, à falta de melhor, tentou fazer graça mas não a teve.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em democracia a geografia do poder corresponde à geografia do voto.
Com todos os seus vícios, supostas contradições, cabalas e jogos de poder, é esta a única forma de depositar no povo o poder que dele dimana.
Princípio querido do sistema é o da alternância que permite que em cada situação política o sistema se revivalize e desencadeie - como verdadeiras autodefesas - os mecanismos que o expurgarão dos seus inimigos históricos e principais.
Separados os poderes interconjugam-se meios de controle que permitem que nenhum poder possa ser exercido despoticamente contra a vontade sufragada.
Por isso e dentro deste espírito se convencionou que em democracia os governos dependem politicamente de um ou mais órgãos colegiais directamente eleitos pelo povo.
Admitindo a possibilidade generosa da existência de governos minoritários, torna-se porém claro que a governação só é possível através do consenso alargado, do diálogo concertado, da busca incessante de soluções comuns onde se eliminem as razões acidentais ou de ocasião e se busque o essencial do interesse comum e colectivo.
Assim, caberá agora perguntar se foi esta a prática que este governo, minoritário que é, seguiu.
E a resposta é, evidentemente, negativa.
Despiciendo é já falar do clima que o Sr. Primeiro--Ministro estabeleceu com esta Assembleia em termos institucionais. Nenhum governo, ainda que
maioritário, usou da arrogância do non sense, da petulância deste Governo do Prof. Cavaco Silva.
Ainda ontem, considerando indignas as perguntas feitas pela oposição, a todos indiscriminadamente afrontou, prosseguindo o diálogo de surdos a que nos habituou numa patética despedida.
Vozes do PSD: - Olha, olha! Que é isso?
O Orador - O Sr. Prof. Cavaco Silva não quer esta oposição nem qualquer outra.
O Prof. Cavaco Silva tem uma concepção autoritária e miguelista do poder.
Interessa-lhe a oposição se esta for submissa, obediente, dialogante a seu modo e, sobretudo, minoritária.
A diferença entre oposição e subversão para o Primeiro-Ministro é mesmo essa: o de ser ou não ser maioritária.
Daí o seu mal-estar institucional, o seu estrebuchar por vezes mal contido, a sua arrogância, a sua falta de sentido de Estado.
De forma politicamente hipócrita foi aguentando com espírito sacrílego as relações com outros órgãos de soberania.
Mas estalou-lhe o verniz ao primeiro assalto ainda que o companheiro de «ringue» fosse imaginário, ainda que só esgrimisse contra moinhos de vento.
E assim é que ataca nos termos deselegantes e incorrectos o Sr. Presidente da República, carismando-o de possível burlão, provável agente de fraude, etc., em recente entrevista concedida a um semanário.
O que foi um grande presidente e um grande homem de Estado, transformou-se assim, pela mágica oportunista, em hipotético burlão, em provável agente de fraudes, sabe-se lá se mesmo a soldo do KGB.
Para quem, como o Sr. Primeiro-Ministro enche a boca com espartana coerência, não lhe ficaria mal reflectir sobre esta desbragada calúnia, para não lhe chamar chantagem política, chicana de poder ou trauliteirismo institucional.
E que dizer das relações deste Governo com os tribunais quando um dos ministros do seu elenco se acha já indiciado criminalmente pelo crime de desobediência qualificada?
Por isso, a palavra estabilidade é, na boca do Executivo, um verdadeiro impropério, uma das muitas que demagogicamente empregou para dar ao povo uma imagem sua que não corresponde à realidade.
Mas, como dizia Almeida Garrett, «quem mente ao povo as mãos lhe morre».
Manipulando números como quem comanda marionetas, o Sr. Primeiro-Ministro procurou devolver à oposição uma crise pela qual só ele e a sua cegueira de poder são responsáveis.
E pior que isso: fez crer que para lá da sua queda seria necessário precipitar nova consulta eleitoral, bem sabendo que os Portugueses, na sua generalidade, não desejam eleições.
Vozes do PSD: - Ah! Ah!
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O Orador: - Mas o Prof. Cavaco Silva vai enganar-se mais uma vez. O regime democrático vai arranjar soluções, dentro deste quadro parlamentar, que resolvam a crise e que rapidamente façam esquecer este Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Calcule a revolta de centenas de milhares de portugueses que vivem em barracas quando ouviram ontem o Sr. Primeiro-Ministro falar sobre Portugal, fazendo crer, na sua cantata de Dido, que o paraíso encantado, a ilha dos Amores, era aqui.
Mas são também os agricultores e os homens da pecuária a queixarem-se.
Os primeiros porque são quase nulos os incentivos, é quase nula a rentabilidade, é difícil o acesso ao crédito - o crédito PAR está bloqueado - no campo da estruturação fundiária do Centro e Norte do País, nada se faz que possa corrigir o excessivo parcelamento da propriedade rústica.
No sector da pecuária a tuberculose e a brucelose bovinas aumentam assustadoramente, sendo hoje ameaça real para a saúde humana.
Também a peste suína africana continua a dizimar os nossos suínos por falta de cumprimento das normas sanitárias emanadas da Direcção-Geral da Pecuária.
No sector das pescas continua por se fazer a tão propalada renovação da frota pesqueira, contando-se pelos dedos os armadores que até este momento receberam subsídios do FEOGA, aliás, atribuídos sem qualquer controle.
Não virá longe o dia em que os nossos parceiros comunitários nos vendam o peixe apanhado nas águas que nos pertencem.
E que dizer dos tribunais, num estado tão caótico que já ninguém neles acredita, tão injustificadamente morosa é a sua acção, tantos são os prejuízos para quem ali dirime os seus conflitos!
Os professores em greve? E os estudantes em greve?
E que dizer dos apenas 43% do rendimento nacional distribuídos ao trabalho? E as greves de médicos e de enfermeiros, originalidade que este Governo para si reivindica? E as falências em catadupa, sem que, ao menos, haja o cuidado de não deixar depreciar essa valiosíssimo e imobilizar parque de máquinas? E os salários em atraso que o Governo não resolveu, apesar da Segurança Social ter chegado ao fim do ano com um superavit de mais de 15 milhões de contos.
Risos e vozes do PSD: - O seu mal é tosse!
O Orador: - E o parque habitacional que não foi melhorado nem renovado, tendo o Governo prometido que iria fazer descer o custo das empreitadas? E os pequenos e médio empresários que continuam a ter uma enorme dificuldade no acesso ao crédito, cada vez mais selectivo, cada vez mais ao acesso do grande capital financeiro?
Por isso o Sr. Primeiro-Ministro, não diga que não há razão para o derrube do seu governo, derrube esse que só peca por tardio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É no respeito pela sua coerência, em nome do seu patriotismo e em defesa da democracia que o MDP/CDE vota serena, confiante e favoravelmente esta moção de censura.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Seiça Neves, o Primeiro-Ministro procedeu ontem ao parto de uma intervenção descosida, sofrível, incapaz de dar resposta às acusações que haviam sido aduzidas pela oposição e, naturalmente, aos problemas que vergastam o quotidiano do povo português.
Não é esta, decerto, a altura para fazer a análise do discurso que, de resto - conviremos -, não ficará para a História, mas pareceu-me evidente que ele se caracterizou, além do mais, pela escolha muito clara dos objectivos, dos temas a tratar. Ressalta, assim, com particular nitidez o conjunto das omissões do texto. Entre essas omissões, uma se me afigura especialmente significativa: a que se traduziu pelo escamotear do gravíssimo problema, suscitado por órgãos da imprensa, pelo PCP e por outras bancadas da oposição nesta Câmara, da prática de actos de vigilância a democratas, de perseguição policial e anticonstitucional a actividades de cidadãos.
Refiro-me, concretamente, ao caso da DINFO e ao que lhe é conexo, e não pode, de forma nenhuma, tolerar-se que um governo simule ignorar,
desresponsabilizando-se, na hora de prestar contas, factos que colidem nevralgicamente com o regime dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Como o Sr. Deputado não teve oportunidade, seguramente por razões de tempo, de aludir à questão, eu aqui lhe deixo o desafio de se pronunciar sobre ela e, à luz dela, fazer também o exame que se impõe ao comportamento político do Prof. Cavaco Silva e de ioda a sua equipa, ali moribunda mas ainda sentada.
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Deputado José Manuel Mendes, é evidente que o problema deste Governo não é apenas o caso da DINFO, existem muitos outros problemas. É essencialmente um problema de filosofia do Governo, é um problema estrutural - são as escutas telefónicas, o sigilo, a correspondência, a pressa da lei de segurança, a governamentalização das polícias... Por isso, penso que o problema não se reduz ao caso da DINFO; é um problema estrutural, é um problema de filosofia de poder, de apego e cegueira pelo poder.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peco a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pretendia qu; a Mesa informasse se o Governo pretende usar o seu :empo, visto que, ao contrário do que é habitual nestes debates, ficou acordado que não haveria perdas de tempo do primeiro para o segundo dia de debate.
Como o Governo ficou com 68 minutos para intervir hoje no debate e tem todo um texto de uma moção de censura, com várias análises sectoriais para anali-
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sar, tem 21 perguntas, pelo menos, deste grupo parlamentar para responder, eu gostaria de saber se o Governo tem assim tanta dificuldade de resposta e se tem a sua capacidade esgotada já às 10 horas da manhã de hoje.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE, e risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, a única coisa que a Mesa pode informar, relativamente à interpelação que fez, é que não temos na Mesa qualquer inscrição de membros do Governo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na história da vida política democrática do nosso país ninguém, certamente, fez tantos elogios a si próprio como o Sr. Primeiro-Ministro cessante.
O Governo tem mobilizado uma gigantesca máquina de propaganda, em boa parte à custa do dinheiro dos contribuintes, para procurar convencer os Portugueses de que à sua acção se deve tudo o que de bom nos acontece e que só não faz muito melhor por obstrução da Assembleia da República e, em particular, dos partidos da oposição.
Vozes do PSD: - Exacto!
O Orador: - Fugindo ao confronto directo perante a opinião pública, recusando repetidas vezes a realização de debates na televisão entre o Primeiro-Ministro e o líder do maior partido da oposição, adoptando uma postura de arrogância intolerante, o Governo usa os órgãos da comunicação social estatizada para a permanente repetição da sua cassette, convencido de que uma mentira muitas vezes repetida acaba por se transformar numa verdade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Todos temos consciência de que se vive hoje um pouco melhor em Portugal do que se vivia em 1985.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É evidentemente verdade que a subida dos preços se desacelerou, que os salários reais e as pensões de reforma tiveram uma melhoria, que se sente consequentemente no País um clima de maior descompressão e optimismo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Agora já vão discordar, Srs. Deputados do PSD.
Risos do PSD.
Já há muito tempo que não era tão cumprimentado pelos Srs. Deputados...!
Só que muito pouco disto se conseguiu graças ao Governo, quase tudo aconteceu apesar do Governo e até alguns dos aspectos mais positivos foram obtidos contra o Governo.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Já discordámos!
O Orador: - A verdade é que, ao tomar posse, o executivo de Cavaco Silva encontrou um País com as suas contas externas equilibradas graças à acção patriótica do executivo anterior e assistiu depois a uma evolução da situação económica e financeira internacional que foi totalmente favorável a Portugal, de fornia sem precedentes desde a Segunda Guerra Mundial e sem paralelo equivalente em relação a qualquer outro país europeu. Nenhum outro governo, nem mesmo o do Dr. Sá Carneiro, teve a seu favor um quadro de actuação tão fácil como este.
Só que Portugal ficou muito longe de aproveitar plenamente as excepcionais circunstâncias que lhe foram proporcionadas do exterior.
Uma voz do PSD: - Isso não é verdade!
O Orador: - É verdade, sim, Sr. Deputado!
É verdade que os preços subiram em 1986 apenas 127o. Só que, graças à queda do valor do petróleo bruto, dos cereais, de diversas outras matérias-primas e do próprio dólar, o preço médio em escudos dos bens e serviços comprados por Portugal ao estrangeiro baixou mais de 7%.
É verdade que uma parte dessa quebra se não reflectiu nos consumidores e foi desviada para melhorar as contas públicas. Mesmo assim, este efeito positivo dos preços internacionais compensou uma taxa média do crescimento dos preços de produção interna da ordem dos 18,5%, portanto ainda muito elevada. O calcado e o vestuário, por exemplo, subiram de 22,5%.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): - O Sr. Deputado continua ignorante nessa matéria.
O Orador: - Como teria sido diferente a evolução dos preços em Portugal sem uma tão brutal ajuda do exterior, para a qual o Governo em nada contribuiu, e que não estava sequer prevista na sua verdadeira dimensão, nas projecções por ele feitas no início do ano. Só por acaso se concretizou o objectivo dos 12%.
Se os preços das nossas importações de bens e serviços tivessem subido ao mesmo ritmo dos preços das exportações, o País teria desembolsado mais cerca de 200 milhões de contos. Quer isto dizer que, sem nenhum mérito do Governo, por causas inteiramente alheias ao País, a evolução dos termos de troca deu a Portugal um acréscimo de rendimento da ordem dos tais 200 milhões de contos. Importa reconhecer que o Governo esteve longe de saber aproveitar devidamente este verdadeiro maná.
Desde logo porque se acentuaram as graves injustiças na repartição do rendimento.
Os salários subiram o ano passado à volta de 17% (12% de inflação + 5% de aumento real), mas os lucros e dividendos cresceram perto de 30%. A quota-parte dos salários no rendimento nacional baixou assim novamente em 1986 cerca de 4 pontos e é já hoje inferior aos 44% - muito menos que metade. Em Portugal são os trabalhadores que mais sofrem as consequên-
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cias da crise, mas o que é grave é que são eles também os que menos beneficiam com momentos de fácil prosperidade.
Pode argumentar-se ser positivo o aumento substancial dos lucros e dividendos porque este melhora a situação das empresas e permite libertar fundos para o investimento. Infelizmente, porém, o Governo fracassou rotundamente na criação de condições para a retoma do investimento produtivo privado em Portugal.
Na verdade, a recuperação do investimento em 1986, aliás modesta, se tivermos em conta o baixo nível de partida em consequência do período anterior de austeridade, ficou quase exclusivamente a dever-se à descompressão do Orçamento do Estado, que, conjuntamente com as ajudas comunitárias, permitiu um razoável crescimento do investimento público.
O investimento privado subiu pouco mais de 5%, o que é facilmente explicável pelas hesitações na política económica do Governo e pela incapacidade deste para definir com rapidez um sistema de incentivos eficaz.
Portugal continua desarmado face aos nossos concorrentes da CEE e nomeadamente face à Espanha e à Irlanda, tão citados sempre no discurso do Sr.
Primeiro-Ministro.
Não admira, portanto, que, para esses países, se continuem a canalizar os investimentos estrangeiros com carácter estruturante, com apreciável nível tecnológico e com um papel relevante na modernização das economias.
Portugal continua a poder atrair apenas os que pretendem explorar uma
mão-de-obra que em termos relativos tem sido cada vez mais barata, ou tirar partido dos nossos escassos recursos naturais.
Daí que o investimento estrangeiro em Portugal tenha baixado, de cerca de 42 milhões de contos, em 1985, para menos de 25, em 1986. A preços constantes, caiu, assim, para pouco mais de metade.
Ora, sem investimento não há modernização nem há criação eficaz de postos de trabalho. É lamentável que, no momento excepcional como o que vivemos, a taxa de desemprego seja hoje pouco menor do que era em meados de 1985 e sobretudo que haja hoje mais desempregados jovens e mais desempregados com mais de um ano de inactividade. É também lamentável que, enquanto o investimento produtivo privado arranca penosamente, de novo se desenvolvam, no mais alto grau, todas as formas de especulação financeira, num jogo onde todos pensam ganhar, mas onde um dia a maior parte perderá.
A cassette Governo-PSD tem repetido incessantemente que outros países - recordo a Noruega, Irlanda e a Grécia -, tendo supostamente enfrentado as mesmas condições que Portugal, continuam com défices apreciáveis nas suas contas externas e não têm crescido tanto. É uma afirmação puramente demagógica como passo a provar.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A Noruega, em primeiro lugar, é um país produtor e exportador de petróleo. Quando o preço deste baixa, a economia da Noruega entra em défice. É, pois, um exemplo mal escolhido.
A Grécia e a Irlanda não ajustaram as suas economias como em Portugal, não tendo aplicado políticas de austeridade de 1983 a 1985. Chegaram assim a esse ano com expressivos défices nas suas contas externas, enquanto Portugal tinha já um apreciável saldo positivo e tiveram eles também de apertar o cinto posteriormente, ajustando as suas economias.
Mesmo não beneficiando de forma tão radical como Portugal, dada a estrutura peculiar das nossas importações e o peso das remessas de emigrantes, que se exprimem em moedas europeias de cotação forte, também os défices grego e irlandês se reduziram substancialmente, da mesma forma que cresceu o nosso saldo positivo. Tudo aconteceu, portanto, como se poderia prever.
O mesmo se poderia dizer, salvo circunstâncias excepcionais, que sempre podem existir num caso ou noutro, em relação à generalidade dos países europeus e à generalidade das variáveis macroeconómicas.
O nosso crescimento económico foi, de facto, o ano passado maior do que a média dos países da OCDE; mas é o tradicionalmente desde os anos 60 e é natural que se tenha acentuado agora o efeito recuperação, dada a inevitável quebra provocada pela austeridade 83-84.
Recorde-se, aliás, que já em 1985 e em circunstâncias muito mais adversas tínhamos realizado uma razoável evolução na generalidade daquelas mesmas variáveis macroeconómicas.
Não tem, portanto, o Governo verdadeiramente de que se orgulhar.
Mais grave e, aliás, do que tudo o que já disse é o facto de o Governo não ter sabido criar as condições para a realização, tão consensual quanto possível, das grandes reformas estruturais indispensáveis à modernização do País, reformas em nome das quais o Prof. Cavaco Silva deitou abaixo o governo do bloco central. Mas reformas essas de que se foi progressivamente esquecendo, para garantir, sem concessões e sem diálogo, a sua manutenção no poder, satisfazendo clientelas de crescente apetite e gastando por vezes tanto ou mais dinheiro do Estado em anúncios de televisão propagandeando as medidas do Governo do que no próprio volume dos benefícios concedidos à população.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É nos períodos de prosperidade aparente que se tem que lançar em bases sólidas o desenvolvimento e garantir com segurança a melhoria gradual para o futuro e não apenas instante fugaz das condições de vida dos Portugueses.
Um dia o dólar recuperará, as taxas de juro aumentarão, os preços do petróleo e dos cereais voltarão a subir.
Como aqui referi em debate recente, se tudo continuasse como está, sem estratégia de desenvolvimento assumida, sem um programa claro de modernização da agricultura, sem política industrial definida, sem um sistema eficaz de incentivos ao investimento, esse dia traria de novo para Portugal uma grave crise financeira. Nesse dia seria preciso voltar a apertar o cinto. Nesse dia certamente o Prof. Cavaco Silva voltaria a demitir-se, como fez em 1980, quando as nuvens negras se começaram a acastelar no horizonte da economia portuguesa.
Aplausos do PS, do PRD e do MDP/CDE.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos hoje poupar-lhe esse trabalho.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
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O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Mendes Bota e Duarte Lima e o Sr. Ministro das Finanças.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - A intervenção do Sr. Ministro «sombra» António Guterres, da bancada do Partido Socialista, efectivamente não trouxe nada de novo ao discurso que a oposição de esquerda tem vindo a proferir nos ataques a este Governo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Olhe que não!
O Orador: - Ele diz que o Governo tem uma cassette e eu diria que o Sr. Deputado tem, certamente na sua algibeira, uma estante de cassettes, tão repetitivo é o seu discurso.
Sr. Deputado António Guterres, gostaria de lhe colocar uma questão muito simples: se o panorama, em termos de desperdício das condições da conjuntura externa, é tão negativo e se o seu discurso, o da sua bancada e o da oposição de esquerda vem sendo o mesmo desde há tantos meses no ataque constante, na guerrilha a este Governo, pergunto: como é que o Partido Socialista se deixou ultrapassar na apresentação de uma moção de censura? Como é que o Partido Socialista deixou que o PRD tomasse rédeas, a soldo não se sabe de quem...
Protestos do PRD.
..., desta iniciativa de apresentar uma moção de censura?
Gostaria ainda de lhe perguntar, Sr. Deputado António Guterres, a que se deve esse atraso do Partido Socialista? Se ele se deve ao masoquismo, se se deve, digamos, a uma vingança sobre o eleitorado português pela derrota que infligiu ao PS em Outubro de 1985, não desejando agora proporcionar mais cedo a oportunidade que o povo tem para usufruir dessas condições económicas tão favoráveis, por via da conjuntura externa? Será apenas por uma questão de estratégia e lógica partidária? Por que será, Sr. Deputado António Guterres, que o Partido Socialista, julgando ter a razão que tem na argumentação que aqui aduziu e repetiu pelo seu discurso, não se adiantou na apresentação de uma moção de censura?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa de honra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Presidente, eu preferia não utilizar a palavra neste momento, mas, de facto, é lamentável que, na sequência do discurso do Sr. Primeiro-Ministro e da interpelação do Sr. Deputado Mendes Bota ao
vice-presidente do meu partido e deputado nesta Assembleia, Hermínio Martinho, em que utilizou linguagem menos própria e digna, volte hoje a utilizar uma linguagem inconcebível e inqualificável.
O Orador: - O PRD quer e exige, neste momento, que o Sr. Deputado Mendes Bota prove já aquilo que afirmou.
Aplausos do PRD.
O Sr. Presidente: - Para dar os esclarecimentos que entender, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - O Sr. Deputado do PRD que usou da palavra apenas demonstra...
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado Mendes Bota, em chamo-me Alexandre Manuel!
O Orador: - Já sabia, Sr. Deputado. Não era preciso dizer, pois foi o único deputado que usou da palavra e, portanto, estou-lhe a dar explicações.
Efectivamente, o Sr. Deputado está muito nervoso como tem demonstrado e, aliás, já o demonstrou ontem ...
O PRD tomou uma iniciativa, mas, de facto, perdeu o controle dela e eu
limitei-me a dizer que não se sabe a soldo de quem é que esta moção de censura foi apresentada e digo-o porque, efectivamente...
Protestos do PRD e do PCP.
Fica perfeitamente evidente o nervosismo da bancada do PRD e eu diria apenas que, se estão tão nervosos, usem da palavra, inscrevam-se, não permitam situações como aquela que se verificou aqui hoje de manhã, em que houve interrupção dos trabalhos...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Provocada por V. Ex.ª!
O Orador: - ... por não haver inscrições por parte daqueles que tinham obrigação de dar sequência lógica e prática à moção de censura aqui apresentada e que ficaram à espera que fosse o Governo a tomar essa iniciativa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Para dissolver a Assembleia!
O Orador: - Como se o Governo é que tivesse que apresentar uma moção de censura! Efectivamente, deveria apresentá-la se lhe fosse, constitucional e
regimentalmente, permitido, mas é aos senhores que compete tomar essa iniciativa!
Quanto ao resto, efectivamente, está demonstrado perante o povo português a inconsequência e a irresponsabilidade da vossa tomada de posição política, mas saberão ter o resultado dessa mesma irresponsabilidade.
Aplausos do PSD.
Vozes do PRD: - Não respondeu!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não deu explicações, só agravou o que disse!
O Sr. Carlos Lalaia (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Intriga!
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Se fosse possível, pedia ao Sr. Presidente para esclarecer a Assembleia sobre quem é que ontem abriu o debate, quem o fechou e sobre os tempos que foram gastos ontem pelo PRD. Se, de facto, não fizemos mais - e tínhamos muito mais coisas para dizer na sessão de ontem - foi porque não tivemos oportunidade de o fazer, mas fá-lo-emos ainda durante a sessão de hoje.
Por outro lado, gostava também de chamar a atenção do Sr. Presidente para o facto de o Sr. Deputado Mendes Bota, tal como acontece muitas vezes em relação a questões que aqui são colocadas ao Governo, não esclarecer mais uma vez, seguindo a senda do Governo e do Primeiro-Ministro, a Assembleia e não tornar claro perante esta a gravidade das afirmações que aqui produziu.
Aplausos do PRD.
A gravidade dessas afirmações são remetidas ao Dr. Mendes Bota...
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lilaia pediu a palavra para fazer uma interpelação à Mesa e creio que essa figura regimental foi adulterada.
De qualquer modo, a Mesa informa o Sr. Deputado que ontem se inscreveram para intervir nesta Câmara o Sr. Deputado Hermínio Martinho, o Sr.
Primeiro-Ministro e os Srs. Deputados Vítor Crespo, Ferraz de Abreu, João Amaral e Roberto Amaral. Hoje já intervieram os Srs. Deputados Seiça Neves e António Guterres.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria que a Mesa fosse mais clara, pois pareceu-me ouvir que a Mesa acaba de referir que a intervenção do PRD, que antecedeu a minha, foi uma adulteração do Regimento. O PRD violou, de facto, o Regimento; o partido da ética viola o Regimento sistematicamente, mas isso não importa, Sr. Presidente!
Aplausos do PSD e risos do PRD.
Sobre a ética do PRD estamos conversados O que interessa agora é uma questão contabilística. É que o PRD, à custa da sua ética e deste tipo de intervenções
- não são interpelações, mas sim intervenções - tem-nos feito perder tempo e por isso seria importante que o tempo que gasta não deixasse de ser registado na Mesa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, vou resolver este problema, dando a palavra ao Sr. Deputado Duarte Lima para formular pedidos de esclarecimento, mas, antes disso, quero esclarecer que o que disse foi que a figura de interpelação à Mesa utilizada pelo Sr. Deputado Carlos Lilaia foi, do ponto de vista do Presidente da Mesa - pois não consultei os meus companheiros de Mesa -, ligeiramente adulterada...
Risos do PSD.
..., como o foi também a figura de interpelação usada pelo Sr. Deputado António Capucho.
Aplausos ao PS e do PRD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa pela segunda vez.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas há pouco interpelei mesmo a Mesa. V. Ex.ª pode dizer que me excedi em considerações, no entanto, fiz uma interpelação muito concreta sobre a condução dos trabalhos, referindo à Mesa que entendia que as violações ao Regimento deveriam merecer, por parte aí Mesa, a respectiva sanção, que, no mínimo, era que o tempo ficasse registado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Está a reincidir!
O Orador: - De facto, interpelei a Mesa, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Capucho, segundo o acordado em conferência de líderes, o tempo das interpelações não é contabilizado nos tempos atribuídos aos partidos, tal como acontece com os pedidos de palavra para defesa da honra e respectivos esclarecimentos.
O Sr. António Capucho (PSD): - Mas se violou o Regimento!...
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado António Guterres, ouvi com toda a atenção e expectativa a sua intervenção, até porque, por norma, as análises aprofundadas, do ponto de vista substantivo, que aqui costuma trazer são merecedoras desse cuidado.
Começo per lhe dizer que desta vez houve alguma frustração, pois a sua intervenção não foi tão rica em análise como é habitual. Repisou argumentos que já expendeu nesta Câmara mais vezes e que têm sido expendidos também pelo seu partido.
No entanto, ela teve uma novidade: pela primeira vez, o Sr. Deputado António Guterres foi ultrapassado pelo Dr. Vítor Constando. É que, normalmente, o engenheiro António Guterres costuma dizer, com um dia de antecedência, aquilo que o Dr. Vítor Constâncio vai dizer na televisão no dia seguinte e desta vez aconteceu o contrário. Aquela lição de economia que o Dr. Vítor Constando deu ontem para umas centenas no cinema Império - e que foi transmitida, quase em directo, à noite pela nossa querida televisão, de que o Partido Socialista tanto se queixa - foi hoje aqui, um dia depois, ao contrário do que sucede normalmente, feita ao Sr. Deputado António Guterres. E o primeiro facto político que saliento é o de que o Sr. Deputado foi pela primeira vez ultrapassado pelo líder do seu partido.
Em segundo lugar, esperávamos que V. Ex.ª, como alto dirigente político do PS, fizesse aqui algumas considerações de carácter político - para além das críticas que legitimamente fez ao Governo - sobre a apresentação desta moção de censura.
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E gostava, porque ainda não vi este assunto ser abordado pela bancada do PS, que V. Ex.ª me esclarecesse sobre se o seu partido ainda mantém, após a apresentação desta moção de censura, algumas das afirmações que foram feitas num passado recente sobre a irresponsabilidade da mesma, nomeadamente se confirma estas declarações feitas há dias no Acção Socialista: «Moção de censura, iniciativa insólita dos renovadores que confirma a total ausência de linha política desse partido depois de ter caído sob o comando do general Eanes»; ou, então, se confirma aquilo que dizia há dias o Dr. Vítor Constando: «Um governo só deve cair no Parlamento quando as oposições que o derrubarem fizerem maioria alternativa a esse governo»; ou, então, o que dizia o Acção Socialista mais recentemente, no dia 26: «Verdadeira provocação o suscitar-se a questão da confiança um dia antes da partida de Soares para o Brasil»; ou, finalmente, o que afirmou o Dr. Vítor Constando no dia 26 de Março passado: «Moção de censura serve egoísmo partidário do PRD, que quis sair da situação difícil com uma fuga para a frente».
Era importante que estas questões, que são questões essencialmente políticas, mas que não podem ser escamoteadas no debate de uma moção de censura, fossem clarificadas, porque V. Ex.ª passou por elas sem lhes fazer nenhuma referência. Mantêm-nas ou o PS, à semelhança do que tem feito nas últimas semanas, com quatro discursos nos últimos oito dias, mudou de novo de discurso...
Vozes do PS: - Quatro não, já fizemos mais!
O Orador: - ... e deita para trás tudo aquilo que foi dito nos últimos dias?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do Sr. Primeiro-Ministro, responderei a todas as perguntas, independentemente da dignidade das mesmas.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
Começo, aliás, por lamentar que o Sr. Deputado Mendes Bota, que procurou brilhar com tanta intensidade, tenha visto esse brilho interrompido por este incidente regimental. Mas quanto à sua intervenção gostaria de sublinhar que V. Ex.ª disse que eu não trouxe nada de novo. É verdade, trouxe apenas a verdade e a verdade não tem nada de novo, tem apenas a verdade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que é infelizmente também a verdade é que quem tem andado a dizer mentiras também tem dito sempre as mesmas mentiras e também cá as tem repetido com alguma frequência.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
Fico muito feliz por ter frustrado o Sr. Deputado Duarte Lima. Esse foi, aliás, um dos objectivos da minha intervenção ...
Risos do PSD.
... e aproveito para lhe responder, bem como ao Sr. Deputado Mendes Bota, às questões da oportunidade da moção de censura e da manutenção ou não do discurso do meu partido.
E ao contrário do que pensam, temos dito sempre a mesma coisa acerca disto. De tal forma que ainda há pouco nos acusavam de ter uma cassette. Isto é, em duas perguntas da bancada do PSD acusam-nos simultaneamente de ter uma cassette, ou seja, de repetir sempre a mesma coisa e de mudar quatro vezes de discurso em duas semanas, o que prova que as perguntas não têm fundamento.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Concluo já, Sr. Deputado Mendes Bota.
Todas as nossas observações sobre a oportunidade da moção de censura do PRD se mantêm, tal como se mantém com toda a clareza a posição do PS como partido de oposição que apresentou uma moção de rejeição do Programa do Governo, que não deu confiança ao Governo em Junho passado, que votou contra o Orçamento do Estado e o Plano e que sempre afirmou que quando a questão da confiança estivesse em jogo votaria contra o Governo. Não fomos nós que tomámos a iniciativa, limitámo-nos a agir em inteira coerência com aquilo que sempre dissemos e sobre as iniciativas dos outros temos a liberdade de produzir os comentários que entendemos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mendes Bota, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Tem a honra à flor da pele.
Risos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.
O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, pedi há pouco uma ligeira interrupção ao Sr. Deputado António Guterres, que não fez o favor de me a conceder, no sentido de deixar expresso que não disse ao Sr. Deputado António Guterres que ele tinha uma cassette, mas, sim, que ele tinha uma estante de cassettes, e que quem tem uma estante de cassettes tem sempre a possibilidade de ouvir e de dizer coisas diferentes de dia para dia.
Há de facto uma possibilidade de diversidade. Só uma cassette tem o Partido Comunista e isso é um monopólio que ninguém lhe quer tirar!
Risos do PSD e protestos do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Guterres, V. Ex.ª pede a palavra para que efeito?
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, sinceramente não sei qual é a figura regimental que posso usar - se, por exemplo, é a defesa da honra das cassettes -, mas gostaria de dar algumas explicações ao Sr. Deputado Mendes Bota.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra para esse efeito, Sr. Deputado.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, sinceramente não considero necessária dar estas explicações, mas não quero perder este prazer de continuar um diálogo tão agradável.
Isto para lhe dizer, Sr. Deputado, que tenho efectivamente uma estante de cassettes, onde tenho religiosamente gravados todos os tempos de antena do PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado António Guterres suscita-me algumas correcções, o que faço com muito gosto, dado que sempre que os erros por intenção ou por ignorância são cometidos por uma pessoa competente ou aparentemente competente, como o Sr. Deputado ...
Risos do PSD e protestos do PS.
É com muito gosto que aproveito a oportunidade para lhe mostrar onde está a verdade e fazer a correcção dos factos.
O Sr. Deputado António Guterres insiste num erro primaríssimo, sobre o qual já o elucidámos nesta Câmara e noutros lados, mas vou fazê-lo novamente.
O Sr. Deputado quando analisa a inflação em Portugal olha para o índice de preços no consumidor e para o deflacionador do produto interno bruto (PIB) a custo de factores, por um lado, e a preços de mercado, por outro, e não pode esquecer que em 1986 houve uma diferença substancial entre o deflacionador do PIB a custo de factores e o deflacionador do PIB a preços de mercado por causa da tributação indirecta, que tem a ver com o imposto sobre os produtos petrolíferos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Aqui não é ignorância é, com certeza, esquecimento do Sr. Deputado. O que aconteceu em 1986 foi que o deflacionador do PIB a preços de mercado ficou perto dos 17% a 18%, mas o deflacionador do PIB a custo de factores ficou a cerca de 13%, o que está muito perto da taxa de inflação no consumidor.
Depois, o Sr. Deputado omitiu, intencionalmente, algumas das razões que estiveram por de trás da inflação em Portugal em 1986. Omitiu, por exemplo, a introdução do IVA, que provocou um acréscimo na taxa de inflação entre dois a quatro pontos percentuais, conforme as estimativas que andaram para aí a circular.
O Sr. Deputado esqueceu ainda que o efeito dos preços internacionais das matérias finais tiveram pouco impacte directo na taxa de inflação em Portugal. Porquê? Designadamente porque os preços das ramas de petróleo não foram directamente repercutidas na totalidade, apenas o foram numa pequena parte sobre os preços no utilizador.
Finalmente o Sr. Deputado, intencionalmente e com desonestidade intelectual ...
Protestos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
... tentou subalternizar e esconder o papel da política macroeconómica do Governo no extraordinário sucesso que foi a dês inflação em Portugal em 1986.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E isto era já uma certeza para o Governo em Novembro de 1985 quando apresentou o seu Programa nesta Câmara. Quando traçámos as metas do Governo em matéria de política macroeconómica, os Si s. Deputados da oposição não acreditaram, chamaram-nos irrealistas, mas depois, a meio do ano, já diziam que os números das estratégias não andavam certos e, em finais de 1986, já afirmavam que afinal poderíamos ter feito muito mais.
Aplausos do PSD.
Sr. Deputado António Guterres, porque a sua memória é curta, vou ler-lhe rapidamente um extracto do Diário da Assembleia da Republica, de 20 de Novembro de 1985, altura em que o nosso Programa estava a ser apreciado nesta Câmara. E dizíamos nós, perante o cepticismo da sua bancada, da bancada do PRD e ... das outras!
Risos gerais.
«Os objectivos da política macroeconómica do Governo serão os seguintes: num horizonte temporal de três a quatro anos o Governo fará encostar a taxa de inflação portuguesa à taxa média da CEE.» O Sr. Deputado não acreditou e agora diz-nos que poderíamos ter feito muito mais.
E dizíamos também que «por outro lado, num horizonte temporal mais largo, o Governo encorajará um enorme esforço de investimento, orientado para a correcção estrutural do défice externo e para a redução do desemprego».
É esta estratégia de médio prazo para corrigir os graves problema: do País que os senhores querem interromper têm medo de que consigamos fazer em 1987, 1988 e 1989 o que fizemos em 1986.
Aplausos do PSD.
Do que o Sr. Deputado António Guterres e os seus colegas têm medo é do efeito «contraste» entre quem governa bem n quem não sabe governar, que é o vosso caso.
Aplausos do PSD e protestos do PS.
Mas vou continuar a corrigi-lo, Sr. Deputado. Esta foi a primeira nota de correcção.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Até cair, pode corrigir!
O Orador: - A segunda nota é a seguinte: os salários reais subiram em 1986, como já não acontecia há muito tempo. A distribuição do produto, Sr. Deputado - é unu questão de aritmética ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Como as galinhas!
O Orador: - ... -, evoluiu favoravelmente ao factor trabalho, olhando para o PIB a custo de factores. As contas são simples e inevitáveis: se os salários reais
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sobem mais do que a produtividade, então a distribuição do PIB a custo de factores melhora para o trabalho.
Por outro lado, estamos «presos por ter cão e presos por o não ter». Dizem-nos que os salários estão a subir demais, que a economia está a entrar em derrapagem, que o consumo privado está a subir em demasia ao mesmo tempo que nos afirmam que a distribuição do rendimento se está a deteriorar. Para além de ser falsa esta afirmação, devo dizer-lhe, Sr. Deputado António Guterres, que, de facto, é muito difícil gerir macroeconomicamente o País.
O senhor tem de andar ainda muitos anos, ver como nós governamos o País e, depois, talvez comece a estar preparado para o fazer.
Aplausos do PSD e protestos do PS.
Sr. Deputado António Guterres, tenho por V. Ex.ª muita simpatia pessoal, mas o senhor quer governar, mas não sabe; tem de aprender!
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Vamos fazer o exame prático daqui a bocado!
O Orador: - Quanto à posição dos salários no PIB, Sr. Deputado, ela passou de 41,8%, em 1985, para 43,3%, em 1986. Subiu, portanto.
No que respeita à formação bruta de capital fixo, o Sr. Deputado diz que não fizemos nada pelo investimento em Portugal. Há treze ou catorze meses atrás dizia que nós éramos uns idealistas porque o investimento não iria atingir as nossas metas. Apontávamos, então, para 9% a 10% em termos reais. Acresceu, assim, o investimento em Portugal em 1986.
Tal e qual! E quanto à sua afirmação de que o investimento privado esteve adormecido, o que nos interessa é o investimento produtivo empresarial. E o que é que denuncia a importação em volume de máquinas a crescer 20% em 1986? E do material de transporte terrestre a crescer 23% em volume em 1986? O que significa isto a não ser que o investimento produtivo está aí, animadíssimo, até que os senhores façam um disparate de nível nacional.
Aplausos do PSD.
Quanto à ausência de reformas, o Sr. Deputado vai desculpar-nos, mas vou ler-lhe rapidamente uma listagem que de memória fui anotando à medida que o Sr. Deputado ia falando, referente a reformas com carácter estrutural, reformas de fundo.
Fizemo-las no sistema financeiro e no mercado de capitais; introduzimos as sociedades de capital de risco, os fundos consignados e os certificados de consignação, os fundos de pensões ficaram fora da órbita das companhias de seguros; as sociedade de factoring foram revistas, bem como os mediadores monetários, as contas de poupança/habitação, poupança/reformados e poupança/emigrante; fizemos a destipificação das contas de depósito, o que foi uma grande inovação no sistema bancário português, que estava congelado nessa matéria há muitos anos; fizemos a liberalização das taxas de juro; introduzimos os certificados de depósito; estabelecemos incentivos ao mercado primário de títulos; pusemos o IFADAP e o INGA a tratar em Portugal do FEOGA - Orientação e do FEOGA - Garantia; introduzimos o mercado de câmbios a prazo; liberalizámos o regime cambial para residentes; eliminámos os juros à cabeça; fizemos um programa de reforço da solidez financeira das instituições de crédito do sector público; estamos a fazer a reforma fiscal; introduzimos o IVA, contra muitos fantasmas que se levantavam nessa altura; introduzimos a tributação no funcionalismo público; introduzimos o crédito fiscal por investimento; a dedução de lucros retidos reinvestidos; estamos a modernizar profundamente a administração fiscal.
Nas finanças públicas, pusemos fim aos défices ocultos; às despesas sem cabimento; aos orçamentos suplementares; ninguém acreditava, mas em 1986 não houve orçamento suplementar. Isto, Sr. Deputado, é uma reforma de fundo.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Esperemos pelas contas públicas!
O Orador: - Apresentámos a proposta de orçamento para 1987 em 15 de Outubro.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Uhau!
O Orador: - Foi uma mudança, Sr. Deputado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mudança que só consegue quem governa bem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Pusemos o Orçamento do Estado de 1987 em vigor em 1 de Janeiro deste ano, o que já não acontecia há muito tempo; fizemos a extinção e a liquidação de fundos autónomos - o melhor exemplo é o do Fundo de Abastecimento, que resolvemos extinguir a meio do ano de 1986 e em 31 de Dezembro estava liquidado -, o que nem sempre aconteceu com governos em que o seu partido estava maioritariamente presente; fizemos a não monetização do défice das finanças públicas; diversificámos os títulos da dívida pública; fortalecemos o Tribunal de Contas, de que o melhor exemplo foi o da escolha do seu presidente; estamos a fazer a reforma do Tribunal de Contas ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não se viu nada!
O Orador: - ...; estamos a fazer a modernização da Direccão-Geral da Contabilidade Pública; estabelecemos um programa de redução do défice do sector público administrativo para que em 1990 esteja na casa dos 5% do produto, quando em 1985 estava em 11%; estamos a investir fortemente em rodovias, portos e aeroportos...
Uma voz do PS: - Nota-se!
O Orador: - ...; estamos a reduzir as necessidades de financiamento do sector público administrativo, precisamente para que o sector produtivo tenha meios de financiamento à altura.
Este é um programa para vários anos. É uma reforma de fundo.
Vozes do PCP: - É, é!
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2562 I SÉRIE - NÚMERO 65
O Orador: - Estamos a reduzir a carga fiscal sobre quem trabalha, quem produz, quem risca; estamos a tratar das empresas públicas ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Da saúde! Risos do PCP.
O Orador: - ..., já dissemos em Junho do ano passado nesta mesma Câmara que as empresas públicas precisam de dar valor ao dinheiro, precisam de dinheiro fresco, precisam de saber ganhar dinheiro, não podem é continuar a contar com o Orçamento de Estado. O Tesouro está seco. Injectar dinheiro nas empresas públicas é fazer dívida pública.
O Sr. António Osório (PCP): - Injectem os gestores que é mais simples!
O Orador: - Fizemos uma reforma de fundo em matéria de inflação, como disse logo de início. Passar a inflação da casa dos 207o a 30% para baixo dos 10% é coisa que ninguém imaginava que se pudesse fazer ao longo de todos estes anos depois do 25 de Abril.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sempre que a inflação «picava» os 20%, no ano seguinte regressava aos 25% e aos 30%. Isso seria o que teria acontecido em 1986 se não tivéssemos usado uma política macroeconómica correcta para desinflacionar a economia portuguesa.
Desinflacionar, Sr. Deputado, não é o mesmo que deflacionar.
Risos do PSD.
É mais uma achega aos seus conhecimentos ...
Risos do PSD.
... que são poucos mas são atrevidos. Protestos do PS e do PCP.
Srs. Deputados, não vão esquecer que o Sr. Deputado António Guterres foi malcriado quando chamou ao Sr. Primeiro-Ministro «Primeiro-Ministro cessante».
plausos do PSD.
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Sr. Ministro, agradeço o favor de guardarem a serenidade conveniente para que o debate possa correr com a dignidade que merece.
O Orador: - O que estamos a fazer com a inflação em Portugal é uma das reformas mais profundas na economia portuguesa, reconhecida internacionalmente como tal.
A inflação é uma forma de redistribuir, repito, redistribuir riqueza e rendimento completamente cega. Além disso, implica má afectação de recursos e investimento especulativo. Estamos a acabar com a inflação.
Dissemos em Novembro de 1985, repito, que o faríamos de três a quatro anos. Estamos a consegui-lo.
Finalmente, o programa de correcção estrutural do défice externo do desemprego que procura fazer a conciliação dificílima entre, por um lado, a modernização
da economia portuguesa, a produtividade, a competitividade, a correcção do défice externo, e, por outro lado, a correcção do desemprego. É uma conciliação dificílima, que requer uma estratégia de médio prazo, uma estratégia de concertação, uma estratégia macroeconómica correcta.
O programa de correcção estrutural do défice externo demorou doze meses a ser feito porque passou pela concertação sacial, ouvimos os parceiros sociais, ouvimos várias entidades nacionais e internacionais e temos o programa pronto para quatro anos mais quatro anos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com este programa pronto os Srs. Deputados da oposição querem interromper a governação.
Aplausos do PSD.
Quando quem está a fazer as coisas as está a fazer bem, sempre se cria o despeito, a inveja, a vontade de imitar.
Vozes do PSD: - Exacto!
O Orador: - Mas não imita quem quer, imita quem pode e sabe. Já o disse nesta Câmara, aceitamos lições de quem tenha feito melhor, mas não de quem diga que faz melhor.
Aplausos do PSD.
Entretanto assumiu a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
O Sr. António Guterres (PS): - Sr Ministro das Finanças...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Cessante!
O Orador: - .... gostaria de lhe dizer, em primeiro lugar, três coisas.
A primeira, é que o senhor é um homem de sorte porque eu sou um homem bem educado.
Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.
A segunda, é que nunca procurei nem nunca procurarei imitá-lo, porque imitá-lo seria renegar os princípios com que os meus pais me educaram.
Aplausos do PS, de alguns deputados do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
A terceira, é que a arrogância e a impertinência são normalmente, infelizmente, sintomas de insegurança e de falta de confiança em si próprio.
Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD e do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É falta de «chá» democrático!
O Orador: - Nenhuma das observações feitas pelo Sr. Ministro conjugou dois factos: o entendimento daquilo que eu disse e a razão da correcção.
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O Sr. Ministro fez várias afirmações verdadeiras só que não corrigiu o que eu disse porque não ouviu ou não quis ouvir. E fez algumas que em minha opinião não são, também elas, correctas.
Em primeiro lugar, Sr. Ministro, fui eu próprio quem afirmou que uma parte do efeito decorrente da diminuição dos preços das importações teve reflexo na melhoria das contas públicas. Fui eu quem o disse. O Sr. Ministro apenas o repetiu.
Agora, Sr. Ministro, não me venha dizer que o facto de ao longo de um ano inteiro os preços de um conjunto de bens extremamente vultosos no conjunto da nossa economia terem baixado em média 7% - o que quer dizer que mesmo na parte que foi apropriada fiscalmente eles subiram zero ou até tiveram ligeiros decréscimos, como em alguns casos nos preços dos combustíveis - não tem nenhum efeito na quebra da inflação, e que a quebra da inflação nada tem a ver com isso. É evidente que esse foi o factor determinante da queda dos preços em Portugal. E isso foi o que eu disse.
É claro que houve vários sectores coadjuvantes, mas este foi um factor determinante da queda dos preços tal como ela se registou e o Sr. Ministro citou, aliás, o deflator do PIB em números muito próximos dos que eu dei.
Portanto, nenhuma das suas correcções tem qualquer fundamento em relação àquilo que eu disse.
Em segundo lugar, o que afirmei sobre repartição do rendimento fi-lo exclusivamente sobre repartição do rendimento e quanto a ele é evidentemente verdade, pois nem o Sr. Ministro o negou.
Pode fazer todas as contas que quiser à volta disso que não altera o que eu disse nem a verdade do que disse a esse respeito. O mesmo se diga acerca do investimento. O que afirmei sobre investimento privado é verdade, porque é no investimento privado que se vê a capacidade que as políticas do Governo têm para induzir as acções dos outros. Enquanto que o investimento público decorre da decisão própria do Governo e obviamente de uma situação de folga orçamental que este Governo encontrou e que governos anteriores não encontraram.
Sobre a acção governativa do PS quero dizer-lhe o seguinte: Fui no passado muitas vezes crítico em relação à acção de governos socialistas. Fui-o como militante socialista, e nas convicções que tinha na altura e que mantenho, mas há um facto que quero e devo reconhecer - e que o Sr. Ministro também devia reconhecer -, é que sempre que o PS chegou ao poder encontrou o País numa situação financeira catastrófica e sempre que o PS deixou o poder o País teve as suas contas equilibradas.
Aplausos do PS.
Infelizmente é muito fácil fazer brilhardes à custa do trabalho dos outros, repito, é muito fácil fazer brilharetes à custa do trabalho dos outros. Mas, há uma coisa que lhe posso garantir: se em consequência da queda deste Governo, o Sr. Presidente da República vier a optar por não dissolver a Assembleia e se constituir um governo alternativo no quadro deste Parlamento ou se, em consequência de eleições, houver um governo do meu partido ou com a sua participação, posso garantir-lhe que ao fim de um ano ninguém se lembrará dos êxitos deste Governo.
Aplausos do PS e de alguns deputados do PRD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lilaia.
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados: Na intervenção que há pouco acabou de fazer, p Sr. Ministro das Finanças procurou minimizar os efeitos dos factores exógenos e, em particular, da descida do preço do petróleo e da descida da taxa de juro sobre a economia portuguesa.
O Sr. Ministro das Finanças tem que procurar ser rigoroso, como rigoroso pretende ser o seu Governo e o seu Primeiro-Ministro. Para além do mais, sendo até, como creio, um assistente universitário - e sobretudo por via disso -, o Sr. Ministro tem que ser rigoroso.
Passo a citar uma passagem da análise de conjuntura da economia portuguesa de Janeiro a Junho de 1986, produzida pelo Gabinete de Estudos do Banco de Portugal, em que se pode ler: «[...] a economia portuguesa - uma pequena economia aberta e fortemente endividada - tem podido beneficiar recentemente de uma conjugação particularmente favorável de factores exógenos, designadamente, da quebra dos preços do petróleo, depreciação do dólar e redução das taxas de juro internacionais [...]» e diz-se ainda que «[...] a retoma da actividade económica, que já fora evidente ao longo de 198S, foi sustentada no primeiro semestre de 1986 [...]», e poderíamos continuar.
Gostava de perguntar se o Sr. Ministro das Finanças está de acordo com aquilo que se refere neste relatório do Gabinete de Estudos do Banco de Portugal, até porque se diz que, depois da saída deste volume, o Sr. Ministro ficou descontente e teria chamado, inclusivamente, técnicos do Ministério das Finanças que colaboraram neste trabalho. Facto que já não é novo porque quando o Sr. Ministro das Finanças era ainda Secretário de Estado do Planeamento - e posso testemulhá-lo -, não gostava que muitas vezes tecessem comentários - até na presença dos técnicos -, acerca de análises de conjuntura que eram produzidas pelo Centro de Estudos de Planeamento. E essa é também a razão por que extinguiu o Instituto de Análise de Estudos de Conjuntura e Planeamento. Essa foi, de facto, uma razão.
Pergunto-lhe agora, Sr. Ministro, se ainda pensa, no pouco tempo que tem disponível, extinguir o Gabinete de Estudos do Banco de Portugal.
Risos do PRD.
Gostava também de lhe perguntar se está em condições de poder responder...
Uma voz do PS: - Estão a ensiná-lo!
Uma voz do PRD: - Está em conferência!
O Sr. Presidente: - Pode prosseguir, Sr. Deputado.
O Orador: - Sr. Presidente, estava a aguardar, pois o Sr. Ministro das Finanças estava desatento. Ele tem muitas capacidades, mas penso que não tem a capacidade de estar a falar com duas pessoas ao mesmo tempo e ainda ouvir-me.
O Sr. Ministro das Finanças: - Está enganado!
Risos do PRD e do PCP.
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2564 I SERIE - NÚMERO 65
O Orador: - Gostaria de perguntar seguidamente ao Sr. Ministro das Finanças se está em condições de responder a uma pergunta que ontem foi colocada ao Sr. Primeiro-Ministro pelo meu colega de bancada Sr. Deputado Silva Lopes relativamente à possibilidade de o país deixar a cauda da Europa nos próximos três anos.
Esta pergunta não foi, de facto, uma pergunta indigna. A questão que foi colocada pelo Sr. Primeiro-Ministro é que foi de uma grande indignidade.
E se a estou aqui a colocar, é porque já hoje foi também reafirmada na rádio, às 8 horas, mais concretamente na Antena 1, pelo Sr. Deputado Dias Loureiro, que, curiosamente, também não está cá. Deve estar na rádio ou na televisão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ele é assim, só fala na rádio!
O Orador: - Esta é que é uma questão de grande rigor, Sr. Ministro, e, por isso, perguntava-lhe e desafiava-o a confirmar ou infirmar esta afirmação do Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pareceu-me que o Sr. Ministro das Finanças explicou que conseguia ouvir e falar ao mesmo tempo. Pensava que ele não tinha respondido por não ter ouvido.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ele ouve para registo!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não foi bem uma interpelação o que V. Ex." fez; foi um comentário.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Foi um desabafo!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. António Capacho (PSD): - Estão todos combinadíssimos. Esta maioria de esquerda está a funcionar!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças - ainda! ... por pouco tempo! -: A forma como o Sr. Ministro se dirigiu há pouco a esta Assembleia mostra mais uma vez a sua cabal inaptidão para se dirigir a uma Assembleia democrática.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Não é capaz de aceitar a contradita, perde imediatamente as estribeiras, confunde crítica política com ataques e ofensas pessoais.
De facto, o senhor não consegue trabalhar, não consegue estar numa Assembleia democrática.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, Sr. Ministro, os seus malabarismos verbais - pelo facto de terem mais decibéis isso não lhes dá qualquer acréscimo de razão - não podem esconder a realidade dos factos. E a realidade dos factos é esta: a massa salarial diminuiu o seu peso relativo no rendimento nacional em 1986 e, da sua parte, é mentalmente desonesto ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto!
O Orador: - ..., é tecnicamente desonesto vir aqui dizer que isso não se verificou.
Diz o Sr. Ministro que não houve orçamento suplementar, mas não diz as operações de cosmética...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... que têm vindo a ser feitas no Orçamento do Estado de 1986. Não diz, por exemplo, que para esse Orçamento o Sr. Ministro foi «sacar» duas vezes os resultados - os lucros - do Banco de Portugal de dois anos: os relativos a 1985 e os relativos a 1986, que só deveriam ser sacados em 1987. Não refere que ainda hoje, dia 2 de Abril, continuam a sair no Diário da República alterações ao Orçamento de 1986.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Aí está!
O Orador: - Meras operações de cosmética.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É o orçamento suplementar encapotado!
O Orador: - É um facto que a inflação desacelerou, mas o Sr. Ministro esquece-se de dizer que mesmo comparando com a média dos países da CEE a desaceleração em Portugal foi inferior à desaceleração na média desses países.
O Sr. Ministro diz que as contas melhoraram - o saldo da balança de transacções correntes - e é um facto. Seria impossível piorarem. Por isso, o Governo não o conseguiu porque era um símbolo de impossibilidade. Não era a probabilidade nula. Era impossível.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas esquece-se de dizer que na balança comercial houve um agravamento efectivo do défice que só foi e só está a ser escamoteado pela baixa dos preços do petróleo, dos cereais, das oleaginosas e do algodão, que, esse agravamento do défice foi substancial, foi da orcem dos 40% em relação a 1985 e que vai trazer nefastas consequências para o futuro próximo do País e paia as contas externas.
Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do deputado do PS Tito de Morais.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Desmintam lá isto!
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um pedido de esclarecimento.
Uma voz do PSD: - Vejam-se ao espelho!
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, gostava de perguntar - e através de V. Ex.ª a todos os deputados aqui presentes - por que é que quando um ministro fala nesta bancada e diz que um deputado, ao fazer determinada afirmação, foi intelectualmente desonesto é uma agressão à Câmara, que provoca uma reacção de todo despropositada, e por que é que o Sr. Deputado pode dirigir-se a um ministro dizendo que ele é mental e tecnicamente desonesto.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Vozes do PCP: - Não foi isso que foi dito!
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Eles têm o privilégio da ofensa!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro, não foi isso que eu disse.
Risos do PSD e do CDS.
Não disse que o Sr. Ministro era mental e tecnicamente desonesto. O que disse foi que as operações e os resultados que ele apresentou é que eram de forma mental e tecnicamente desonesta.
Além do mais, depois de o Sr. Ministro das Finanças ter intervindo da forma como o fez, só com muita calma e com muito poder de contenção é que, apesar de tudo, nos poderíamos ter dirigido ao Sr. Ministro da forma como o fizemos. De facto, merecia muito, mas muito mais.
Aplausos do PCP e de alguns deputados do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.
A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A problemática ambiental tem sido politicamente utilizada, e eu diria mesmo que até à exaustão, por este Governo. Somos mesmo acompanhados diariamente pelo seu desenrolar televisivo. E certamente com alegria que tomamos conhecimento que foi empossada uma nova comissão antipoluicão e temos o grato prazer de ver regularmente o responsável da pasta a percorrer o País, mas juro que nunca fomos levados a pensar que essa correria faz parte de uma campanha de propaganda eleitoral bem planificada!
Aliás, estamos até relativamente calmos quanto à energia nuclear, por exemplo, pois mesmo que um membro do Governo nos venha dizer que «sim», que Portugal no futuro terá centrais nucleares, como nos disse o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia, temos outro que vem dizer prontamente «não» e assim dormimos mais descansados!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Que alívio!
A Oradora: - Também concordámos com a demolição dos clandestinos, não sabemos é quais os projectos para essas áreas. Mas o principal é que se saiba da acção determinada do executivo, que, embora pontual e tardia, decerto vai contribuir para que o investimento privado edifique infra-estruturas turísticas nessas zonas, mas que atinjam nível europeu, com nível tão alto que a maioria dos portugueses deixará de lhes ter acesso, pois o que interessa é que estamos numa de modernidade e de eficácia e o milagre são as divisas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Venderemos assim mais sol, mais campos relvados para golfe, mais reservas naturais, com os seus inovadores ecomuseus, onde as populações residentes constituem também acervos museológicos necessários para a caracterização cultural e, claro, para a venda do artesanato local.
Embora a despoluição do rio Alviela esteja atrasada apenas muitos anos e quatro meses, as populações podem descansar porque os protocolos estão assinados e mesmo que tenham pago, não sendo poluidores, com a sua saúde o atraso das medidas, «vale mais tarde que nunca!», como diz o ditado, que também nestas coisas é politicamente bem utilizado.
Ainda que a plantação indiscriminada de eucaliptos promova a desertificação e o empobrecimento dos Portugueses, que vivem da floresta de pinho e da agricultura, dir-nos-ão que é nosso dever, como membros de pleno direito da CEE, que temos de contribuir para a Comunidade. Alimentemos, pois, as celuloses, que destroem os nossos rios, transformemo-nos no caixote do lixo da Europa e deixemos que as indústrias mais poluentes, que os países do Norte e do Centro já rejeitaram, venham poluir as nossas zonas estuarinas, lagunares e rias.
O Sr. José Magalhães (PCP): Isso é que tem «pimenta»!
A Oradora: - Se o lago Laranjo, em Aveiro, tem concentrações de mercúrio excessivas e o ar do Barreiro atinge níveis de poluição dez vezes acima do que é permitido pela Organização Mundial de Saúde, não nos preocupemos porque alguém zela por nós.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Deitem-lhe «pimenta».
A Oradora: - Dir-se-ia, pois, que o Partido Ecologista Os Verdes, com estes breves exemplos da política ambiental do Governo, deveria votar contra a moção de censura. Mas não, nós vamos votar a favor e não é porque sejamos «mausinhos», mas sim porque consideramos que a atenção dada aos problemas ambientais tem constituído como que uma cortina de flores destinada a tapar os fumos negros de uma política economicista e mecanicista.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Não somos tão ingénuos que acreditemos que os potentados económicos que mais degradaram e degradam o nosso património natural sejam agora os iluminados defensores do ambiente, que em última instância tentam esvaziar as reivindicações ecologistas, procurando, com as suas campanhas de marketing ambiental, dizer que tudo está resolvido, quando, no fundo, o que se atira são punhados de areia com que nos tentam tapar os olhos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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2566 I SÉRIE - NÚMERO 65
A Oradora: - O Ano Europeu do Ambiente é, em certa medida, uma resposta institucional nesta área, mas também a tentativa para esbater os «acidentes» e as degradações ecológicas diárias, é como que uma árvore bela e verde a esconder a floresta que destroem.
Os verdes recusam-se a aceitar a utilização da ecologia e da defesa do ambiente confinada a ghettos ou como instrumento da modernidade e da eficácia impostas pela CEE, que querem transformar o ambiente em mercadoria que se vende, que se exporta para belo prazer dos que tudo compram.
Hoje o que está em causa é a política deste Governo e a utilização despudorada que faz das questões ambientais para esbater outras áreas de intervenção. O que está em causa é uma política centralizadora, uma máquina que desumaniza, que plastifica o nosso quotidiano, é uma filosofia de desenvolvimento que nos impõe níveis e padrões de vida que nada têm a ver com as nossas necessidades e potencialidades, que nos violenta com as maratonas televisivas e nos tenta descaracterizar culturalmente.
E porque rejeitamos a plastificação da sociedade e a política do que «quem quer bom ambiente que o pague», não damos a nossa confiança a este Governo.
Aplausos do PS, do PRD do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho. Porém, devo dizer que a Sr.ª Deputada não dispõe de tempo para responder.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar concede à Sr.ª Deputada Maria Santos um minuto do tempo de que dispõe para que ela possa responder.
Sr.ª Deputada, compreendemos a necessidade que V. Ex.ª tem de se justificar quando afirma que vai votar favoravelmente a moção de censura. Tendo sido eleita através de uma lista do Partido Comunista Português, é normal que assim faça.
O Sr. José Magalhães (PCP): - São só flores, passarinhos!
O Orador: - Compreendemos também a dificuldade de V. Ex.ª em vir aqui censurar o Governo a propósito de um dos sectores em que dificilmente ele pode ser censurado.
Em suma, o que lhe pergunto, porque não tenho tempo para mais, é o seguinte: não concorda V. Ex.ª que o povo tem razão quando diz que «verde só há um, o Pimenta e mais nenhum»?
Risos do PSD e do CDS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos, que dispõe de um minuto que lhe foi concedido pelo PSD.
A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Creio que o Sr. Deputado António Capucho também deve ter telefonado ao povo a perguntar-lhe isso!
Sr. Deputado, a primeira questão que colocou já é velha, é aquela das melancias, e dá-me ideia de que já não pega. Ela está subjacente à sua própria intervenção e, portanto, passo à frente e nem lhe respondo.
O meu discurso é bem exemplar de que tem sido tomado determinado tipo de medidas pontuais com as quais concordamos e em relação às quais nos manifestamos favoravelmente.
Porém, em termos estruturais, em termos de uma política global, em termos de uma política de raiz, devo dizer que r ao foram tomadas as medidas fundamentais. E vou dar alguns exemplos, como seja o caso do condicionamento da plantação do eucalipto. As populações que vivem em Vale de Açor certamente que são os tais portugueses de segunda que não interessam ao mercado da CEE ...!
As conclusões das jornadas e dos estudos que são feitos devem ser levadas à prática, devem resolver os nossos problemas, o que não acontece, nomeadamente na ria de Aveiro, na ria Formosa e em outra; situações. Até podemos dar o exemplo da própria actuação do Sr. Secretário do Ambiente, que já anteriormente esteve na Secretaria de Estado e o Ambiente e que já foi Secretario de Estado das Pescas - de facto, esquecemos isso porque não vale a pena levantar «coisas» que vêm do passado -, que condicionou uma acção que o próprio governo anterior estava a desenvolver nas expropriações de terrenos na ria Formosa. Na verdade, devem ter-se levantado «altos valores» para condicionar a possibilidade de resolução dos problemas nessa zona.
Somos um bocado ingénuos ...
O Sr. Duarte Lima (PSD): - São muito ingénuos. Aliás, está no partido ideal!
A Oradora: - ..., mas temos aprendido aqui alguma coisa. Temos aprendido que a política, o modo como se joga, os condicionamentos, as especulações e as forças condicionam muito daquilo que podia ser resolvido.
Portanto, devo dizer que estamos de acordo relativamente a acções pontuais, mas quanto à política do Governo - e é a política deste Executivo que hoje estamos a analisar e não a política de um qualquer secretário de Estado - não concordamos com ela, pois trata-se do modo como essa política é utilizada para nos condicionar a vida no seu conjunto.
Que qualidade de vida é que queremos? A qualidade de vida que exclusivamente põe os filtros nas fábricas e que cria as reservas? É só isso que queremos, ou é um todo? Ou e uma maior participação dos Portugueses ...
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou o tempo de que dispunha e, portanto, peco-lhe o favor de concluir rapidamente.
A Oradora: - Já concluí, Sr. Presidente. O Sr. Deputado já deve ter percebido!
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
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Foi lido. É o seguinte:
Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos
Em reunião realizada no dia 3 de Abril de 1987, pelas 12 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitada pelo Partido Social-Democrata:
Luís António Damásio Capoulas (círculo eleitoral de Évora) por António Augusto Ramos. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não inferior a quinze dias, a partir do dia 9 de Abril corrente, inclusive.
Solicitada pelo Partido Socialista:
José Manuel Torres Couto (círculo eleitoral de Lisboa) por António José Martins Seguro. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/8S (Estatuto dos Deputados), para os dias 2 a 16 de Abril corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) - Henrique Rodrigues da Mata (PSD) - Carlos Manuel Luís (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Jaime Manuel Coutinho Ramos (PRD) - Carlos Alberto Correia Rodrigues Mattos (PRD) - José Manuel Antunes Mendes (PCP) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP).
Está em discussão.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, segundo me pareceu, o relatório da Comissão de Regimento e Mandatos é relativo à substituição do Sr. Deputado Torres Couto. Terei compreendido bem?
O Sr. Presidente: - Compreendeu sim, Sr. Deputado.
O Orador: - Tanto quanto sei, o Sr. Deputado Torres Couto encontra-se no Brasil a desempenhar funções desta Assembleia.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Torres Couto encontra-se no Brasil, mas em funções da UGT.
O Orador: - Obrigado pela informação, Sr. Presidente. No entanto, era importante esclarecer esta questão e foi esse o meu objectivo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Foi um tiro ao lado!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cerdoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas gostaria de esclarecer que nunca a minha bancada substituiria um deputado que estivesse no estrangeiro em missão da Assembleia. Nem sequer tomaria essa iniciativa! Aliás, foi por isso que não substituímos o nosso camarada João Cravinho, que se encontra em funções da Assembleia.
O Sr. Presidente: - Visto mais ninguém pretender usar da palavra, vamos votar o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, a Mesa não tem conhecimento de mais nenhum orador inscrito para usar da palavra nesta fase do debate da moção de censura. Assim sendo, tenho que dar por encerrado este debate, ressalvando apenas as declarações finais, que, como sabem, terão lugar às 15 horas, e o primeiro partido a usar da palavra será o MDP/CDE.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste momento do debate, e se as nossas contas são exactas, o Governo dispõe ainda de 50 minutos para intervir, o PSD de 30 minutos, o PS de 30 minutos, o PRD de 34 minutos, o PCP de 20 minutos e o MDP/CDE de 20 minutos, visto que o CDS já declarou que dos 50 minutos que dispõe só os utilizará aquando da declaração final.
Assim sendo, pensamos que o Governo e os restantes partidos que não pretendem inscrever-se para usar da palavra prescidem do tempo de que dispõem e, nessa convicção, se ela se verificar, devo dizer que temos inscrições para fazer.
Porém, se o Governo censurado neste debate ainda vai intervir, então temos que gerir o nosso tempo para poder responder a essas intervenções, visto que estamos habituados a que na televisão e fora dela as regras do jogo não sejam respeitadas.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, também gostaríamos de sabei ao certo se mais ninguém pretende usar da palavra nesta fase do debate, pois o MDP/CDE pretende fazer uma segunda intervenção.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a verdade é que não há inscrições e quando assim acontece temos que encerrar esta fase do debate, ficando apenas ressalvado o direito que cada grupo parlamentar tem de fazer a sua declaração final.
O Sr. António Capucho (PSD): - Há a inscrição do MDP/CDE, que já anunciou uma segunda intervenção!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, se o relógio da Câmara está certo, estamos a poucos minutos das 13 horas. Creio que a dignidade do debate de uma moção de censura não se compagina com discussões do tipo jogo de futebol, no sentido de saber quem intervém, quando é evidente que o PRD ainda dispõe de tempo para usar da palavra e - tal como o Sr. Deputado António Capucho passou a manhã a sublinhar - se coloca a importante questão política de saber como é que o Governo responde. Sabemos que o Governo adopta politicamente a tese de que a moção de censura não tem nenhuma razão de ser e quer fazer julgar no roulement das intervenções a demonstração desta tese. Isto é um pouco infantil, mas é verdade! Foi a isto que assistimos!
Assim, Sr. Presidente, permito-me sugerir a V. Ex.ª que suspenda os trabalhos para a hora de almoço - tal como é habitual - e que reabra a sessão às 15 horas, podendo os partidos e o Governo reflectir sobre o normal exercício do seu direitos de inscrição no tempo que ainda resta. No caso do meu grupo parlamentar, estamos um pouco limitados no tempo. Em todo o caso, isso não acontece com os outros partidos.
Portanto, durante a hora do almoço ponderaremos o exercício destes direitos e não vejo nenhuma razão para se encerrar esta fase do debate como se estivéssemos perante uma situação catastrófica, o que não acontece.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não havendo inscrições, não posso obrigar nem os membros do Governo nem os deputados dos grupos parlamentares a inscreverem-se para usar da palavra.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas haverá inscrições, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Quando anuncio que não há inscrições é evidente que se os membros do Governo ou os deputados dos grupos parlamentares estivessem interessados em usar da palavra, inscrever-se-iam.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço novamente a palavra porque certamente que me exprimi mal.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, o que há pouco queria sublinhar foi o facto de haver uma fortíssima expectativa de realização de inscrições - o PRD acabou de a manifestar.
Não acredito que o Governo não venha a inscrever algum orador - porventura o Sr. Ministro das Finanças - para refutar as observações que aqui foram feitas por deputados de várias bancadas dos partidos da oposição
Protestos do PSD.
Quer dizer que há uma expectativa tão forte que V. Ex.ª cumprirá o Regimento encerrando esta reunião. Não quero pedir a interrupção da reunião para que se perfaça o mecanismo regimental, e confio em que será possível criai- o clima normal para interrompermos os trabalhos e fazermos as inscrições às 15 horas.
O Sr. Presidente: - Dizem-me os Srs. Secretários da Mesa que agora há inscrições. Não podemos continuar nesta situação de cada grupo parlamentar ou o Governo estarem a jogar com os tempos.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, na realidade esperávamos que houvesse alguma inscrição por parte do Governo. Vejo que na bancada do Governo se encontra presente o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Protestos do PSD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Isto não é nenhuma interpelação à Mesa, Sr. Presidente!
O Orador: - Sr. Deputado António Capucho, já termino a interpelação à Mesa.
Como foram ontem feitas críticas ao funcionamento da Assembleia e como o Estatuto Social dos Bombeiros, que envolve 40 000 pessoas, espera há 30 dias resposta por parte do Sr. Ministro da Defesa Nacional, seria legítimo esperar uma intervenção do Sr. Ministro.
Protestos do PSD.
Mas como não há nenhuma inscrição por parte do Governo, vamos inscrever-nos para intervir.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Leonardo Ribeiro de Almeida): - Sr. Deputado Magalhães Mota, apenas quero dizer que não é verdade que o Estatuto Social dos Bombeiros esteja há 30 dias numa comissão pari a qual nem sequer fui solicitado à espera de um parecer meu.
É certo que acerca de uma semana o Sr. Deputado João Amaral teve a gentileza de pedir a minha opinião sobre o texto da lei. Ora, já expliquei muito claramente
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ao Sr. Deputado João Amaral - de quem, aliás, obtive a compreensão suficiente para o facto - que não tive possibilidade material de enviar esses elementos.
Portanto, o Sr. Deputado Magalhães Mota faltou inteiramente à verdade quando disse que o Estatuto estava há 30 dias à espera de parecer meu.
Aplausos do PSD.
Quero ainda dizer-lhe, Sr. Deputado, que não me parece boa a atitude que está a tomar quando pretende compelir os membros do Governo a falar quando V. Ex.ª entende.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Em todas as sessões desta Câmara em que tenho estado presente, o estatuto do Governo tem sido sempre respeitado, em igualdade de condições com o Estatuto dos Deputados. Se o Governo se encontra aqui para tomar parte de um debate, tem que se lhe reconhecer que tenha as mesmas oportunidades e possibilidades. O direito de dispor da vontade ou não de falar e de o fazer quando se entender é tanto nosso como seu, Sr. Deputado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Marques pediu a palavra?
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, quando pedi a palavra era para comunicar à Câmara exactamente o mesmo que o Sr. Ministro da Defesa Nacional acabou de dizer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, apenas quero refutar aquilo que o Sr. Ministro acabou de dizer.
ai fazer na quarta-feira que vem um mês que, pela primeira vez, por meu intermédio e dos Srs. Deputados João Amaral e João Abrantes, solicitámos ao Sr. Ministro uma opinião sobre um artigo do Estatuto Social dos Bombeiros. Gostaria de recordar ao Sr. Ministro que já por três vezes voltou a ser contactado por estes Srs. Deputados e voltou a dizer que daria a resposta na terça-feira seguinte, a última vez foi na semana passada e ficou de nos dar a resposta na próxima segunda-feira. Vamos, pois, aguardar que o Sr. Ministro nos dê essa resposta. É inteiramente verdade o que estou a dizer.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não se inscreve no campo da interpelação à Mesa.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, apenas quero dizer que o que o Sr. Ministro comunicou à Câmara é exactamente verdade e o que o Sr. Deputado Rui Silva comunicou à Câmara é também verdade.
Risos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
A este propósito, o Sr. Ministro da Defesa Nacional foi contactado por três ou mais vezes nos corredores deste Parlamento. O que é lastimável é que o Sr. Deputado Rui Silva confunda um pedido relativamente a uma opinião acerca de um texto com vista a ajudar a Comissão de Administração Interna e Poder Local e que considere útil para efeitos de trabalho parlamentar as intercepções que foram feitas ao Sr. Ministro. De qualquer modo, quero dizer que, contando o prazo a partir das intercepções que foram feitas, ainda não decorreu um mês.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, atingimos a hora regimental de interrompermos a sessão, que reabrirá às 15 horas.
Está suspensa a sessão.
Eram 13 horas.
Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 34 minutos.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, penso que a organização dos nossos trabalhos e o modo como eles estão a decorrer justifica a realização imediata de uma conferência de líderes, a que esteja presente um representante do Governo, para que fixemos as regras deste debate até ao seu final. Nesse sentido, pediria que V. Ex.ª convocasse, de imediato, uma conferência de lideres.
O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado, se não houver qualquer oposição por parte dos outros grupos parlamentares, assim se fará.
Há alguma objecção a que assim se proceda, Srs. Deputados?
Pausa.
Visto não existirem quaisquer objecções, dou por interrompidos os trabalhos por quinze minutos.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna.
O Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna (Eurico de Melo): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Uma semana antes do dia 27 de Março, data
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em que entrou nesta Assembleia uma moção de censura ao Governo, já o PRD tinha anunciado e publicitado essa moção de censura. Poucas horas passadas, já o PRD e o PCP...
Vozes do PRD: - Ah!
O Orador: - ... tinham feito a sua análise e publicitado o seu voto a favor da moção de censura.
O PS, uma semana antes do dia 27 de Março, começou as suas reuniões, as suas conferências de imprensa, o envio das suas cartas-ultimato, dizendo que se o PSD não quisesse conversar consigo, votaria contra a moção de censura.
Vozes do PS: - A favor!
O Orador: - Exacto, a favor da moção de censura.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Não se engane, Sr. Ministro, não se engane...!
O Orador: - Quando erro corrijo-me sempre, Srs. Deputados.
Aplausos do PSD.
Nestas circunstâncias será este debate minimamente esclarecedor? Estaremos a assistir a um julgamento falacioso com sentença pré-fabricada? Este processo dignifica a Assembleia da República?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Dignifica!
O Orador: - Será ofensivo para este Parlamento? Terá falta de sentido de Estado este processo?
Nesta cronologia e nas circunstâncias que acabei de expor, deixo a análise e a resposta para V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República.
O Sr. Presidente: - Certamente que V. Ex.ª não desejará que eu o faça!
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Orador: - Não ouvi, Sr. Presidente. Pedia-lhe o favor de repetir o que disse.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, dada a sugestão que V. Ex.ª tinha feito, referi que, certamente, não desejaria que eu fosse dar essa resposta.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Orador: - A resposta, Sr. Presidente, é com V. Ex.ª é a resposta de um deputado eleito pelo distrito de Braga, que também é deputado, embora com suspensão de mandato.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - E não é! Há aí uma confusão muito grande!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se estamos a discutir uma moção irresponsável e inoportuna - como já a classificou o líder de um dos partidos desta Assembleia -, se este debate, pelas posições já assumidas, não foi minimamente esclarecedor, ele serve pelo menos para termos a oportunidade de analisar as posições criadas pelos fundadores da «frente popular» e seus potenciais integrantes.
O PCP, no seu caminho habitual de ortodoxia imobilista, luta pela sobrevivência.
Vozes do PCP: - Olhe que não!
O Orador: - Enfraquecido em eleições sucessivas, não conseguindo mobilizar os portugueses para grandes política;, nem os seus caciques para manifestações subversivas ...
Vozes do PSD: - Muito bem! Protestos do PCP.
O Orador: - .... grita e suja as paredes, continuando as suas mentiras.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É baixo, é baixo!
O Orador: - Julga certamente, como o julgava o Dr. Goebbels, que a mentira repetida produz verdade. Só que se esquece que já não estamos na Alemanha de Hitler ou na Rússia de Estaline!
Aplausos do PSD. Protestos do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Estamos em Portugal e há ministros que são uma vergonha!
O Orador: - O PCP, enfraquecido, desde há muito que procura uma muleta. Ainda me lembro quando o senhor de cabelos brancos dizia com insistência: no quadro político português ainda há lugar para mais um partido.
O PCP fomentou, apoiou e ajudou a criar o PRD.
Aplausos do PSD. Protestos do PRD.
Infiltrou-o com alguns inocentes à mistura, convenhamos - e transformou-o, no momento adequado e a seu bel-prazer, no seu novo MDP/CDE.
Aplausos do PSD.
Protestos do PRD.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Tenha vergonha!
O Orador: - Ao velho MDP/CDE, já sem prestígio político e nos últimos tempos tornado rabugento, mandou-o para casa sossegado.
Risos do PSD.
Srs. Deputados, há muito que o PCP queria a queda do Governo e a formação de uma «frente popular» - todos o ouvimos. Tinha chegado a hora para que o PRD desempenhasse o papel para que tinha sido criado. Da a ilusória iniciativa da moção de censura do Partido Renovador Democrático.
Mas não nos preocupemos, Srs. Deputados, com o PRD. Já se ouve para aí dizer que é a nova caserna do velho MFA...
Aplausos do PSD.
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O Sr. Ivo de Pinho (PRD): - Bem explicado!
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Teve ele dois dias para fazer isto!
O Orador: - Não temos de nos preocupar com o PRD. Basta ler a informação dos últimos dias, proveniente dos mais variados quadrantes políticos, para não termos de nos preocupar. O que diz essa informação? Diz o seguinte: partido sem passado e sem futuro; caritativamente desejamos paz à sua alma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Traga os cães!
O Orador: - No entanto, Srs. Deputados, devemos estar seriamente preocupados com o desatino, um certo desatino apenas, que a iniciativa do PCP/PRD causou no PS. Aí devemos estar pelo menos preocupados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não nos preocupámos por uma certa incoerência de o PS votar a favor - agora não me engano - de uma moção de censura por ele mesmo classificada de irresponsável e inoportuna. Isso será, a seu tempo, julgado pelos cidadãos portugueses.
Ao contrário, esses mesmos portugueses estão preocupados pela hesitação que se sente no PS em colaborar na tal «frente popular», criada, insisto, pelo PCP e pelo PRD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E eu que estive, em tarde e noite chuvosas, diante de O Século convosco; eu que vim do Norte para estar na Alameda convosco...
Uma voz do PS: - Olhe que nunca o vi lá!
O Orador: - ...; eu que assisti, no Estádio das Antas, convosco, a uma noite memorável em defesa da liberdade; eu que defendi, no seio do meu partido e com muito vigor, uma coligação convosco em hora crucial e difícil para Portugal...
Uma voz do PS: - Foi o primeiro a destruí-la!
O Orador: - ..., eu tenho razão para estar preocupado com uma certa falta de memória de um partido sempre defensor da liberdade e da democracia.
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados do PS, eles ainda são os mesmos, com mais um satélite!
Aplausos do PSD.
Protestos do PRD.
Ou será que um só homem faz tanta falta a um tão grande partido?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Magalhães (PCP): - É demasiado baixo! É inaceitável!
O Orador: - Srs. Deputados, no CDS parece que passou uma fraca neblina. Porém, ventos fortes do norte clarificaram a situação.
Risos do PS e do PCP.
Está tudo bem claro, para vosso bem, para nosso bem e para bem dos Portugueses!
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados do PSD, estamos a ser julgados, Governo e partido, em tribunal de 1.ª instância.
O Sr. Domingos de Azevedo (PS): - De última instância!
O Orador: - Não tribunal supremo ou último tribunal, como muitos pensam. É um tribunal de partidos. Há ambições pessoais e políticas, há interesses partidários. Mas a democracia tem regras. E em outro tribunal, constituído por cidadãos que não saberão bem o que é a inflação ou a reserva cambial ...
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - É por isso que alguns são enganados!
O Orador: - ..., mas que sabem que os mercados estão abastecidos e que a mercearia está mais barata ...
Risos do PS, do PSD e do PCP.
...; noutro tribunal, constituído por cidadãos que não ouvem nem sabem fazer discursos, mas sabem que os seus jovens filhos são acarinhados e que seus idosos são protegidos; em outro tribunal, constituído pelos cidadãos da península de Setúbal, ludibriados pelo PCP, mas que sabem que encontrarão em nós a sua solução ...
Aplausos do PSD.
O Sr. António Mota (PCP): - Que cheiro a naftalina!
O Orador: - ...; noutro tribunal de cidadãos alentejanos acorrentados, mas que sabem que serão libertados pela liberdade e pela democracia ...
Aplausos do PSD.
...; noutro tribunal, constituído pelos cidadãos a quem não pagavam salários, mas que já estão a ser pagos, e mesmo aqueles que ainda não receberam sabem que vão receber ...
O Sr. João Amaral (PCP): - Não é um ministro, é um industrial!
O Sr. João Salgado (PSD): - Ó João Amaral, tem calma!
O Orador: - ..., nesse tribunal e nesse júri, constituído por estes e muitos outros cidadãos, serão esses os nossos julgadores. Esses, Srs. Deputados, constituem o tribunal a que vamos recorrer: o voto do povo.
Aplausos do PSD.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Noutros tempos a batalha fazia-se com espadas e com escudos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Com clavas!
O Orador: - Porém, a história evoluiu: hoje a batalha trava-se com a palavra e com a razão.
O Sr. António Marques (PRD): - Então por que é que trouxe o cacete?!
Risos do PRD.
O Orador: - Foi travada uma batalha, a respeito desta moção de censura, fora e dentro da Assembleia e certamente que fomos contundentes uns para os outros; fomos, certamente, uns para os outros defensores da nossa razão. Hoje, repito, as armas são a palavra e a razão.
Penso que não seria aqui deslocado proferir, sem palmas ou assobios, umas últimas palavras para aqueles que porventura as não saibam ou para aqueles que eventualmente tenham esquecido que Portugal é a nossa Pátria.
A Pátria é a terra dos nossos pais que herdámos com muito orgulho, nas nossas diferenças, nas nossas violências uns para com os outros. Não esqueçamos que, com muito trabalho, todos temos a obrigação de delegar aos nossos filhos uma Pátria de que eles também se possam orgulhar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro de Estado, inscreveram-se os seguintes Srs. Deputados: José Magalhães, Magalhães Mota, Ferraz de Abreu, João Corregedor da Fonseca, Manuel Alegre e Marques Júnior.
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Sr. Ministro de Estado, ontem ouvimos aqui o Sr. Primeiro-Ministro injuriar 21 deputados da oposição, ao considerar indignas as perguntas que lhe tinham sido formuladas. Hoje de manhã, o Sr. Ministro das Finanças, de uma forma inacreditavelmente incorrecta, boçal ...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Não apoiado! O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Muito mal!
O Orador: - ... respondeu ao Sr. Deputado António Guterres, que, da forma mais urbana e mais correcta, o havia interpelado.
Agora ouvimos o Sr. Ministro de Estado, que, sem sequer poupar a figura - essa, sim, de facto veneranda, do e Sr. Presidente da Assembleia da República ...
Vozes do PSD: - Ah! Ah! Ah!
O Orador: - Repito: o Sr. Ministro de Estado, sem poupar essa figura veneranda do Sr. Presidente da Assembleia da República, disse coisas a respeito do meu
partido, referindo-se também ao PRD e tentando pô-lo a ridículo, que nem a noção do ridículo lhe fazemos, Sr. Ministro de Estado, nem usamos da sua linguagem trauliteira.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Compreendemos que a vossa queda eminente os coloca perante esse desespero, mas espanta-me a sua má-criação, Sr. Ministro.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Queremos apenas que isso fique registado e mais nada.
Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PRD e do PCP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro de Estado pretende dar explicação?
Vozes do PSD: - Não lhes dê confiança!
O Sr. Ministro de Estado: - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Magalhães Mota pediu a palavra para defesa da honra da sua bancada?
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Não, Sr. Presidente. Não vou invocar a figura regimental de defesa da honra, porque não ofende quem quer, mas quem pode.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para defesa de honra, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Agora já não pode falar, depois deste comentário ...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Ministro de Estado, num curto período de tempo podemos ouvir dois Ministros de um Governo que enfrenta uma circunstância que pode acontecer a qualquer Governo: a iminência e o seu derrube democrático na Assembleia da República. É uma circunstância prevista na Constituição, que deve ser enfrentada pelo Governo com serenidade, sobriedade e dignidade. Devo dizer que nenhuma dessas qualidades foi exibida pelo Sr. Ministro de Estado. Nem dignidade e nem sequer sobriedade.
Vozes de PCP e do PS: - Muito bem!
Vozes de PSD: - Não apoiado!
O Orador: - Refiro-me evidentemente a sobriedade política. E isto tem um gravíssimo significado, porque há pouco tínhamos ouvido outro Ministro - o Ministro Cadilhe - fazer aquilo que considero uma das maiores exibições de pesporrência a que a Assembleia da República já alguma vez assistiu.
Risos e aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.
Protestos do PSD.
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Julgando transpor, em jeito de mestre-escola, para a Assembleia da República ademanes, tiques e outros aspectos, que são fanicos e aqui não pegam. Podem pegar numa cátedra, num postal de monitor ou de assistente, mas não pegam na Assembleia da República, onde há democraticamente o contraditório. E, assim, o Ministro foi desmentido, ponto por ponto, e calou, encestou, não replicou.
Aplausos do PCP, do PS, do PSD e do MDP/CDE.
Protestos do PSD.
E isso é democrático, é bom e devia ser uma lição de modéstia para o Governo. Mas o Governo, durante a hora de almoço, almoçou. Não retirou nenhuma lição de modéstia e reincidiu agora. Quanto a nós, reincidiu de forma grave.
O Sr. Ministro Eurico de Melo subiu àquela tribuna para insultar tudo e todos. Teve o cuidado de não esquecer ninguém, nem o CDS. O PSD é um partido ingrato, já o sabíamos, mas é também um partido sádico, como agora o provou. E mais: insultou de uma maneira que é já rara nesta Casa. Muitos anos de experiência democrática deram ao diálogo desta Casa uma certa sobriedade, uma certa contenção. V. Ex.ª, do alto da tribuna, veio dizer coisas tão simples como isto: «mobilizam caciques para manifestações»,...
Risos do PSD.
... dito no tom odioso que o Sr. Secretário de Estado Durão Barroso usava em 1975, na Faculdade de Direito, quando rebentava cabeças à correntada. V. Ex.ª herdou-lhe o gosto e os ademanes trauliteiros - e gosta.
Por outro lado, veio acusar o PRD de ser «só» isto - são coisas graves: um partido infiltrado. E, replique-se, infiltrado, ao que suponho, pelo meu partido ...
Vozes do PSD: - É, é!
O Orador: - ..., qualificando o secretário-geral de um partido com assento nesta Casa de «aquele senhor de cabelos brancos ...». V. Ex.ª também tem cabelos brancos, mas não vou referi-lo nesse estado, como aquele senhor de cabelos brancos que disse umas asneiras do alto daquela tribuna. Vou conter-me.
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.
Mas, mais: acusa um partido com assento aqui, que tem a sua voz e dirá o que quiser - por mim, digo o que tenho a dizer em nome desta bancada -, de ter inocentes à mistura. Note-se, este velho conceito de recorte, que não vou qualificar: «inocentes à mistura»!
E mais: depois acusa o PCP de ter abandonado o velho e rabugento MDP. Seiça Neves, meu rabugento, abandonámos-te!
Risos.
É esta a imagem que se traça perante o País!
E vira-se para o PRD e exclama, com ar de cangalheiro: «partido sem passado e sem futuro».
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro Eurico de Melo: Há limites para encenação política! Dizem VV. Ex.ªs que não fazem encenações políticas, que governam, ainda quando fazem negócios mesquinhos e bastante difíceis de qualificar. Os outros fazem intrigas políticas; os outros fazem encenações estaticistas, tácticas, políticas - mesmo que se trate do Presidente da Assembleia da República, que também faz encenações políticas, desde que esteja em discordância convosco.
Creio que isto é malsão! A queda do vosso Governo e alteração deste modus, desta atitude, poderá ser boa para normalizar a vida política portuguesa...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... e para dar ao PSD o estatuto de um partido normal, de um partido que se senta aqui como nós todos, de carne e osso - e às vezes, com uma carne fraca, como se vê olhando para alguns dos vossos deputados.
Gostava de vos confessar uma inquietação, um inquietação séria: há pouco, estava a olhar para a tribuna e, vendo o Sr. Ministro da Administração Interna, estava a pensar que este é o homem que chefia os serviços de informações.
O Sr. António Capucho (PSD): - O que é que isso tem a ver?
O Orador: - É o homem em cujas mãos está a defesa ou não da intimidade da nossa vida privada, da nossa tranquilidade, da nossa capacidade de exercer, sem ingerências e vigilâncias pidescas, os nossos direitos.
O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Isso é abusivo!
O Orador: - E devo dizer que, olhando para este Ministro, não há nenhuma garantia de, em Portugal, podermos exercer os nossos direitos. O seu derrube é um acto higiénico, necessário e absolutamente imprescindível, já!
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. Ministro de Estado: - Sr. Presidente, quero dizer muito simplesmente, para repetir: eles são os mesmos!
Risos e aplausos do PSD.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Já Salazar e a PIDE diziam o mesmo!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Por isso é que se interessam tanto por nós!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Ministro de Estado, até às 16 horas e 20 minutos de hoje, depois da apresentação de uma moção de censura, depois de várias perguntas sobre a mesa, o Sr. Ministro de Estado e o Governo tiveram a coragem e a inteligência de remissa para formularem hoje esta intervenção. Registo o facto.
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E a ouvi-lo, Sr. Ministro de Estado, senti-me mais jovem e pensei que V. Ex.ª ia apelar para os cães polícias.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
Protestos do PSD.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Tenha vergonha! Até parece que não foi fundador deste partido!
O Orador: - Mas depois, Sr. Ministro de Estado, lembrei-me de que um membro do Governo fez um trocadilho de mau gosto a propósito dos cães polícias e falou dos polícias cães e não quis estabelecer nenhuma confusão.
Sr. Ministro de Estado, quero perguntar-lhe poucas coisas. A primeira, diz respeito ã sua referência aos militares e quero perguntar-lhe, olhos nos olhos, frente a freme, se V. Ex.ª não se sente devedor perante eles da liberdade de que usa, em especial, da liberdade que lhe permitiu subir a essa tribuna e dizer essas coisas. Liberdade que sem eles não teria sido possível.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
V. Ex.ª nos dirá se até lhes deve a própria liberdade que usou para nos insultar e os insultar.
Depois disse V. Ex.ª que este era o momento de usar ou da palavra ou da razão. Gostaria de lhe perguntar sinceramente: Sr. Ministro de Estado, por que não usou da razão?
Risos do PCP.
Finalmente, o Sr. Ministro de Estado pôs-nos uma questão muito directa e frontal. E nós - cansados andamos todos do tempo em que havia monopólios de patriotismo - pensamos que nenhum de nós é detentor exclusivo, nem do interesse nacional, nem do sentido da Pátria. E é por isso mesmo, Sr. Ministro, que lhe quero dizer - e agora já não é uma pergunta - que, depois de ouvir a sua intervenção, é o sentido da Pátria que nos leva também a votar esta moção de censura.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado.
O Sr. Ministro de Estado: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tenho saudades, consideração e estima pelos militares do 25 de Abril e do 25 de Novembro. Não tenho nenhuma pelos militares do 11 de Março.
Aplausos do PSD.
Felizmente, a minha razão é diferente da sua. Cada um tem a sua e penso que o Sr. Deputado não quer ter o exclusivo de todas as razões.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quando falei em Pátria, Sr. Deputado, fazia um apelo a todos - todos - os que se encontram nesta Sala. Lembro-lhe e repito: a todos. Não o fiz só ao meu partido.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Ministro de Estado, vou usar da palavra, não para protestar, mas para agradecer. Quero dirigir os meus agradecimentos ao Sr. Ministro de Estado e, sobretudo, ao Sr. Ministro das Finanças pela melhor contribuição que trouxeram a esta Câmara durante este debate, por melhor se ter iluminado a verdadeira imagem deste governo.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Ministro de Estado, V. Ex.ª é a segunda figura do Governo.
Uma voz do PS: - Fraca figura.
O Orador: - Creio, Sr. Ministro, que se esqueceu dessa circunstância. Depois de ouvir o Sr. Primeiro-Ministro tratar de indignos 21 deputados...
Vozes do PSD: - Outra vez?
O Orador: - ... que argumentaram responsavelmente, fazendo perguntas...
O Sr. António Capucho (PSD): - Não é verdade! É sempre a mesma coisa: deturpam tudo!
O Orador. - .... depois de ouvir a intervenção coerente - também, justiça lhe faço - do Sr. Ministro das Finanças esta manhã e de ouvir V. Ex.ª, muita pedagogia e necessária neste país é o comentário que me ocorre.
Realmente, na nossa opinião, a democracia, Sr. Ministro, corria perigo. V. Ex.ª, que ocupa uma das pastas mais importantes e responsáveis em qualquer Governo, assustou-me agora...
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Ainda se assusta?
O Orador: - ... com esta sua intervenção. Em que mãos estava aquela pasta? Ouvimo-lo agora e várias vezes ao longo deste ano e meio, mas, desta vez, Sr. Ministro, V. Ex.ª revelou finalmente o seu fundo democrático.
A postura do Governo tem sido lamentável. O Sr. Ministro não tenta convencer com responsabilidade e serenidade e não contrapõe argumentos aos da oposição. Prefere esta linguagem.
Sr. Ministro, quando julgámos que V. Ex.ª, como segunda figura do Governo, vinha aqui completar o fraquíssimo balanço ontem aqui apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro...
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - ... que vinha aqui tentar defender o Governo dos aspectos relativos ao seu sector e apresentar as perspectivas futuras para o País, no vosso entender, V. Ex.ª vai buscar um tipo de linguagem altamente ofensiva - e não só ofensiva para os deputados da oposição, mas também contra a própria democracia.
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Antes de lhe formular qualquer pergunta, digo-lhe, Sr. Ministro: o vosso afastamento impõe-se mais do que nunca, porque a situação, depois destas três intervenções, é mais grave do que supúnhamos. Convosco no governo eram muito graves os perigos que a nossa democracia estava a correr.
O balanço da vossa actividade vai ser feito, mas sem a presença do Governo, sem a vossa manipulação nos órgãos de comunicação social. Então, haverá muitas surpresas, Sr. Ministro, mesmo para aqueles que ao longo deste país acreditaram nas vossas manipulações e mentiras constantes.
Sr. Ministro: que tem V. Ex.ª a dizer-nos, nesta Câmara, em defesa do seu governo, depois da intervenção que fez?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Ministro de Estado, em primeiro lugar, quero esclarecer que o PS não faz ultimatos. Não baseia nem nunca baseou a sua política na chantagem e no medo, mas sim na luta contra a chantagem e contra o medo.
O último ultimato de que há notícia foi aquele que Cavaco Silva lançou ao governo anterior, do qual, aliás, o seu partido fazia parte.
Propusemos negociações responsáveis e democráticas com o Governo e o partido do Governo. O Governo disse não. Demos a Cavaco Silva a oportunidade de escolher entre a arrogância e o poder. Cavaco Silva preferiu a arrogância e, por isso, vai perder o poder.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, não somos nem nunca fomos um partido de um só homem. Somos um partido da liberdade, da democracia, da pluralidade, do direito à diferença. Um partido que deve muito a alguns homens, onde alguns homens podem fazer falta, mas onde não há homens insubstituíveis, porque somos um partido de homens livres para a construção de uma sociedade livre em Portugal, de cidadãos iguais.
Em terceiro lugar, somos um partido com memória. Mas a nossa memória vai mais longe e não se fica só por 1975, Sr. Ministro. A nossa memória vai também de 1926 a 1974.
Vozes do PS, do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!
O Orador: - Nós não esquecemos!
E o que está hoje aqui em confronto não é só uma questão entre o Governo e a oposição. É mais do que uma moção de censura. O que está aqui em confronto é a tolerância e a intolerância, a arrogância e a humildade democrática - diferentes concepções da nossa vida política, diferentes concepções do que deve ser o regime em Portugal. Pensamos que não é possível construir outro Portugal sem a tolerância, sem a convivência democrática pacífica, sem a divergência, sem o direito à diferença, sem a humildade democrática. E, por isso, com alguma da autoridade moral de quem travou outros combates e que daqui desta tribuna noutras datas lançou alguns alertas, quero dizer que devemos tirar as conclusões políticas daquilo que aqui se passou, de alguns discursos que aqui foram feitos, do sentido político que lhes está subjacente.
E daqui quero lançar um alerta, em primeiro lugar a todos os socialistas, a todos os democratas, a todos os que prezam o valor da liberdade, da tolerância e do pluralismo em Portugal. Mais do que uma questão entre o Governo e a oposição, mais do que uma moção de censura, há outras coisas em jogo e é preciso dizer aqui que a intolerância não pode passar! A arrogância não pode passar! A tolerância, a convivência democrática, o pluralismo e a liberdade têm de voltar a vencer e é esse o sentido do debate que estamos aqui a travar.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna.
O Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna: - Sr. Deputado Manuel Alegre, nunca falei em chantagem; falei em ultimato. Se entendeu que esse ultimato tinha tal sentido, com toda a certeza entendeu mal. Aproveito para daqui o esclarecer que, caso lhe tenha dado tal entendimento, não era, de modo algum, minha intenção dar-lhe esse sentido.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Ainda bem, que é para esclarecer o que disso o Sr. Primeiro-Ministro!
O Orador: - Sr. Deputado, já há pouco disse que quando erro corrijo ou esclareço.
Eu não disse, Sr. Deputado, que um só homem fazia falta num tão grande partido. Perguntei e V. Ex.ª respondeu-me. Agradeço a sua resposta.
Mas, o que aqui já começa a transparecer e que faltava neste debate era o discurso antifascista para justificar a frente popular.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Os meus colegas de bancada pediram-me para estar calmo.
Risos do PSD.
E eu vou estar calmo, por respeito para com todos os portugueses, que infelizmente tiveram a oportunidade de assistir àquilo a que posso considerar como um infeliz espectáculo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!
O Orador: - Digo isto porque penso que a intervenção do Sr. Ministro de Estado a propósito da moção de censura foi uma intervenção que entrou por caminhos tais que penso ser legítimo os Portugueses interrogarem-se sobre o que se passa hoje e aqui na Assembleia da República.
Sr. Ministro, não irei também fazer a defesa dos militares de Abril - porque tal direito não me assiste, não me foi passada procuração para tal -, que o Sr. Ministro tão injustamente aqui insultou.
Protestos do PSD.
Mas vou falar, Sr. Ministro, exclusivamente por mim, militar de Abril, que muito me orgulho de ser.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
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Talvez tenha mesmo sido o acto de que mais me orgulho de ter ajudado e participado, e provavelmente não farei outro de que me orgulhe tanto no resto da minha vida, que espero seja longa.
Vou falar exclusivamente na minha qualidade de deputado desta Assembleia da República que se sentiu profundamente insultado pelas palavras do Sr. Ministro.
Sr. Ministro, eu também lutei, na altura própria, com outras armas, para que a democracia e a liberdade fossem possíveis em Portugal.
Hoje, luto aqui com outras armas, com as armas da palavra, do diálogo, para que a democracia seja possível em Portugal.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Como deputado, Sr. Ministro, devo dizer-lhe que me sinto profundamente insultado pelas suas palavras quando o senhor faz e mistura fantasiosas lucubrações relativamente a casernas, a MFAs e coisas que andas.
É que, Sr. Ministro, os homens do 25 de Abril, que fizeram a Revolução, que deram a liberdade a este país, devem neste momento sentir-se, apesar de tudo, felizes e satisfeitos porque é possível ao Sr. Ministro, na Assembleia da República, na democracia e em Portugal, insultar dessa tribuna esses mesmos militares de Abril.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Mas, esses militares ficarão de igual modo tristes por saber que foi possível a um governo saído do 25 de Abril insultar a democracia, como o Sr. Ministro fez nesta Assembleia.
Protestos do PSD.
E esses militares vão, de certeza, ficar felizes, satisfeitos, porque a democracia e o sistema político português vão conseguir derrotar e fazer cair este Governo, que não foi capaz de defender os valores fundamentais da democracia e da liberdade.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna.
O Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna: - Sr. Deputado Marques Júnior, já há pouco afirmei ao seu colega de bancada Sr. Deputado Magalhães Mota a consideração que tenho pelos militares do 25 de Abril e do 25 de Novembro. Esse assunto está esclarecido.
Mas gostaria de lhe fazer uma pergunta: foi V. Ex.ª também militar do 11 de Março?
Protestos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Magalhães Mota pretende interpelar a Mesa?
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - É para interpelar a Mesa e para invocar o Regimento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Salvo erro, o artigo 89.º do Regimento diz que quando um orador se desvia do assunto em discussão e cai no insulto ou na provocação deve ser advertido pela Mesa. Peço, por isso, à Mesa que advirta o Sr. Ministro de Estado.
Aplausos do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE.
Risos do PSD e do CDS.
Naturalmente que, por desconhecimento das circunstâncias, o Sr. Ministro insultou o meu camarada de bancada - deputado Marques Júnior -, provocando uma confusão com o 11 de Março. Se o Sr. Ministro estivesse mais atento aos problemas da democracia portuguesa - e não tenho «atento» por respeito para com a Assembleia - saberia certamente não se situar nesse quadrante.
O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª me permite, Sr. Deputado Magalhães Mota, não faço comentários à interpelação feita. Penso que não é ajustada à figura regimental invocada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, Sr. Ministro de Estado: A bem da saúde do regime democrático, o CDS tem-se recusado a ver r este debate a consubstanciação de uma querela institucional entre o Governo e a Assembleia.
Este debate representa uma questão entre um partido censurante que tem o direito de censurar, e o Governo censurado.
Nessa perspectiva, o CDS tem tido uma posição de espectador interessado, respeitador dos intervenientes no debate, e não se recusa, evidentemente, a tomar nele uma posição.
V. Ex.ª, Sr. Ministro, referiu, porém, o CDS. E referiu em termos que desagradam ao meu partido, e por isso intervenho neste momento. Intervenho para dizer que, como membro desta Câmara, o CDS não se recusa a tomar posição. Toma-a ouvindo, auscultando, pesando o valor das iniciativas, as intenções que as determinam; toma-a pesando também a sua responsabilidade para com o povo português; e toma as suas decisões, para intervir neste debate, democraticamente, como partido democrático, discutindo nos órgãos próprios, assumindo posições que nem sempre são posições de acordo, mas que são posições que chegam a uma síntese democrática.
Por tudo isto não consideramos feliz a analogia meteorológica, Sr. Ministro. Não houve «neblina», nem «ventos fortes» de parte alguma. Houve consciências esclarecidas, consciências democráticas, discussão democrática, decisões democraticamente assumidas.
Portanto, Sr. Ministro, agradecemos-lhe que não volte a introduzir analogias que consideramos de menos bom gosto no interior do nosso partido.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.
O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Era uma vez um partido que se apresentou ao eleitorado sob a
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forma de uma organização política inteiramente nova, livre do pecado original de ter um programa ideologicamente coerente, de assentar as suas raízes ou o seu crescimento no húmus histórico das pugnas do post 25 de Abril. O País ia mal - dizia - porque os partidos até aí existentes, divididos por querelas internas, fruto de ambições pessoais, ou ocupados em servir clientelas, esqueciam o interesse público. Mas, bastaria que os votantes atentassem nas excelsas virtudes de que o recém-chegado sem cerimónia se arrogava para que todas as dificuldades desaparecessem, todos os problemas encontrassem solução rápida e definitiva.
Com a ingenuidade e o ardor dos neófitos ou dos que, revestindo nova pele, pretenderam passar como tais, multiplicaram as condenações e proclamaram urbi et orbe as suas promessas redentoras.
Tinham como guia que os teleconduzia alguém que, momentaneamente impossibilitado de ocupar a liderança efectiva, era, todavia, conhecido por opinar, sem hesitações e com detalhe, sobre as mais complexas questões económicas, sociais e políticas. Como haviam de falhar?
Nas eleições de Outubro de 1985 registou-se, como é hábito após um período prolongado de austeridade, um voto de protesto que beneficiou largamente o novel partido. Com as velas pandas, apesar de registar alguns acidentes de percurso, o jovem partido só ansiava por que o seu leader natural se libertasse das corveias do poder que ainda o impediam de se assumir plenamente como tal. Finalmente, Eanes chegou!
O partido pôde então mostrar a sua verdadeira fisionomia, o seu real valor.
Realizou-se o que se esperava. Sem pôr em causa a boa vontade dos seus dirigentes e militantes, o facto é que, porém, se multiplicaram as acções contraditórias, se acentuou a incoerência da trajectória. A marcha foi num crescendo, atingindo o clímax na votação da chamada «lei da rádio» e, agora, na apresentação desta moção de censura.
É que, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a apresentação de uma moção de censura, se, em todas as circunstâncias, se reveste, ou melhor, se deve revestir, de pesada significância política, no contexto actual e subscrita pelo PRD assume um carácter muito particular.
Quando, no quadro de um governo minoritário, a moção de censura é apresentada por um partido que está fora do chamado arco constitucional, como é o caso do PCP, trata-se de um gesto simbólico, sem consequências políticas imediatas quanto à vida do executivo, destinado apenas a testar o modo como cada grupo parlamentar da oposição exprime o seu desacordo crítico. Se, porém, como aqui e agora, na ambiência política presente, um partido pertencente à esquerda oposicionista, mas que se situa à direita do Partido Socialista, apresenta uma moção de censura, tem a obrigação de saber que a sua proposta conduz, com toda a probabilidade, à queda do Governo. Poderá o PRD desejar também pôr-se em bicos de pés e, apesar da sua percentagem inferior de votos, pretender dar lições, de como se deve liderar a oposição, ao PS rival; mas o objectivo principal não pode deixar de ser o de derrubar o Governo.
A substituição de um governo por outro implica sempre um custo funcional muito gravoso, pois envolve uma paralisia mais ou menos longa na tomada de decisões políticas e administrativas. Esta paragem na actividade decisória, em qualquer país, mas particularmente em Portugal, a enfrentar os primeiros anos de adesão às Comunidades Europeias e numa fase decisiva para o seu desenvolvimento, constitui, só por si, um revés que apenas razões políticas ponderosas podem justificar. A instabilidade governamental, o stop and go político destroem também a confiança dos agentes económicos, a possibilidade destes estabelecerem com razoabilidade os seus cenários futuros, os seus planos. Perante a incerteza do que virá - e entre o período de gestão do governo que sai e a adaptação do governo que entra medeiam no mínimo seis meses - o investimento retrai-se, os projectos suspendem-se.
Perante a extensão e a gravidade das consequências que inevitavelmente uma crise política arrasta consigo, um partido responsável só deve provocá-la por motivos poderosíssimos que, na balança dos pós e centras, sobrelevem claramente os inconvenientes.
Sobrevieram, em tempo próximo, factos novos que expliquem esta iniciativa do PRD? Foi o País surpreendido com acções do Governo particularmente controversas que obrigassem a oposição a uma reacção imediata desta envergadura? Nem no discurso de apresentação do Sr. Deputado Hermínio Maninho nem na entrevista do Sr. General Ramalho Eanes dada à televisão - e em que ainda hesitava quanto à decisão final - se apontam quaisquer fundamentos deste tipo. Limitam-se a emitir um juízo negativo sobre as acções e omissões do Governo, coisa natural num partido da oposição; nada que não pudesse esperar pelo veredicto popular, em tempo devido, quando chegasse ao fim a legislatura.
Compreende-se, deste modo, a enorme estupefacção do País, confrontado com uma crise inesperada, sem causa próxima séria.
Esta moção de censura pode assim ter sido ditada pela preocupação de, na concorrência com o PS, arrecadar alguns louros, ou ainda pelo propósito de querer diminuir as perdas eleitorais que o PRD certamente irá sofrer, antecipando a data do julgamento do seu comportamento por parte do povo português. Sejam estes, ou outros ainda, não obedecem certamente à ética política tão solenemente anunciada pelo PRD na sua campanha eleitoral! A banalização de um instrumento tão sério como a moção de censura é um pecado capital a exigir prolongada penitência.
Acresce - e o PRD e os restantes partidos da oposição sabem-no - que o Governo goza de crescente aceitação no País, que excede, por largo, o número dos que em Outubro de 1985 votaram no PSD. Podem desgostar-se com esse facto, mas não podem ignorá--lo. E sejamos claros. Um tal apoio popular - sob pena de negarmos os princípios democráticos - não pode resultar apenas da simpatia dos meios de comunicação social, como alguns pretendem, ou de uma conjuntura externa favorável. Tem de assentar, e assenta, no mérito próprio. Este governo, como todos os governos, tem as suas luzes e as suas sombras. Mas o cômputo global, visto numa perspectiva macropolítica, é francamente positivo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sinto-me particularmente à vontade para o dizer e quero fazê-lo nesta hora, pois que não sufraguei a estratégia do Dr. Cavaco Silva no congresso da Figueira da Foz, e o que afirmo excede o estrito dever de solidariedade partidária que sempre cumpri.
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Considero, e sempre o afirmei nesta Casa, que os governos para poderem ser julgados têm de durar o suficiente para podermos observar a sua actuação nos tempos fastos e nos tempos nefastos. Aproximam-se momentos difíceis. Era salutar e, digamos mesmo, justo que o Dr. Cavaco Silva e este governo pudessem dar, até ao fim da legislatura, a plena demonstração das suas capacidades.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A iniciativa do PRD pode ter ainda efeitos perversos num nível mais profundo e mais importante a médio prazo, no do sentimento de respeito que o País deve ter pelas instituições da democracia representativa.
Com efeito, em resultado da aprovação desta moção de censura, três cenários são possíveis. No primeiro, o Dr. Cavaco Silva volta a ser convidado e forma governo. Estaremos perante uma remodelação ministerial obtida por um processo ínvio e demasiado caro em termos de funcionamento do sistema político. Mas, mais nada. No segundo, face à impossibilidade de haver um governo cujo programa não seja impugnado na Assembleia da República, ou na ausência de perspectivas de durabilidade, a Câmara é dissolvida e haverá eleições antecipadas. Retoma-se a tradição de instabilidade governativa, aumenta o cansaço de um eleitorado chamado a pronunciar-se em intervalos de tempo demasiado curtos e o País sofre os prejuízos de uma campanha eleitoral intempestiva e antecipada. É mau, contribui para fortalecer um sentimento de cepticismo quanto à eficiência funcional das instituições. Mas, pelo menos, o essencial do princípio democrático, o respeito pela vontade popular é salvaguardado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Na terceira hipótese, haveria a formação de um governo alternativo no quadro da presente legislatura; a função essencial da representação política e o mandato eleitoral seriam defraudados. Fizeram-se umas eleições, em 1985, na base de plataformas eleitorais e de candidatos a primeiros-ministros. O respeito formal pelas normas constitucionais não chegaria para impedir que a opinião pública não sentisse que as regras do jogo eleitoral e do respectivo mandato tinham sido falseadas. Seria, claramente, a solução pior de todas, que contribuiria não para o vivificar da legitimidade do sistema mas para o seu enfraquecimento.
A democracia é certamente o menos imperfeito dos sistemas políticos e o único digno de homens livres. Mas, como todas as construções sociais, carece de atenção e do esforço quotidiano para ser robustecida e aperfeiçoada, sob pena de tender para a natural anomia. Não corramos o risco de acordar os demónios liberticidas da cidade, por acções impensadas e desnecessárias.
Faço votos e tenho esperança que o bom senso, apesar de tudo, prevaleça e que se minimizem os efeitos danosos desta imprudente iniciativa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro não pretende interlocutores - nem entre ele e o povo, nem entre o povo e ele -, porquanto a existência de mediadores na comunicação corresponde a uma visão crítica dessa mesma comunicação.
O governo e o Prof. Cavaco Silva despreza os corpos constituídos para comunicar, em estilo populista, directamente com o povo português.
Perguntamos ao Sr. Primeiro-Ministro qual é o seu pensamento, e o do Governo, sobre a democracia representativa.
A pergunta, que espera resposta, não tem só a ver com as intervenções ontem feitas pelo Sr. Primeiro-Ministro mas com toda a prática do seu governo.
A democracia representativa é uma realidade que o Primeiro-Ministro tenta subverter, pelo desprezo por esta Assembleia.
O Governo optou por ignorar a Assembleia da República, para, sem críticas, poder fazer comunicação directa, que ainda por cima faz sem verdade.
Vozes do PSD: - E falso!
A Oradora: - E não o faz com verdade porque o Governo não informa, propagandeia. O seu modelo de comunicação e o do propagandista, a sua linguagem a do slogan, o seu objectivo aumentai o número de consumidores. E também por isso nós o censuramos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Servindo-se da extensão ao domínio público de princípios elementares de técnicas de vendas, o Governo tenta criar uma imagem falsa, menosprezando a inteligência de cada um e as próprias regras da democracia.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
A Oradora: - Tudo isto para fazer crer aos portugueses que cumpre, que tem uma nova forma de governar, que utiliza a transparência, a competência e a honestidade. Estamos perante uma aparência só conseguida através de um cenário que encobre uma realidade bem diferente, mas que não terá deixado de enganar alguns menos avisados. Cenário esse montado à custa de manipulação de indicadores económicos, de sondagens, de propaganda e tudo contando com facilidades de alguma comunicação social.
Vozes do PRD: - Muito bem!
A Oradora: - A informação sócio-económica é manipulada com o à-vontade de quem pensa ser impossível a sua desmistificação perante a opinião pública.
É nessa convicção que o Governo divulga indicadores económicos previamente seleccionados à medida das suas conveniências. Divulga correctamente o que interessa divulgar, deturpa o que lhe interessa deturpar, omite o que lhe interessa omitir.
Vozes do PRD: - Muito bem!
A Oradora: - É lá habitual vermos o Governo atribuir-se o mérito de resultados económicos para os quais nada contribuiu, sendo seu único mérito o ter previsto, e frequentemente de forma errada, a evolução natural de algumas variáveis e tê-las erigido em objectivos da sua actuação.
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A principal coroa de glória deste Governo é ter a inflação baixado para 11,7%, mas não diz que tal resultado é mera continuação da tendência iniciada em 1985 e fruto de factores externos para os quais o Governo pouco ou nada contribuiu.
O crescimento do produto é apontado pelo Governo como sucesso da sua política económica. O professor Cavaco Silva afirmou mesmo que foi o país onde o produto mais cresceu, decerto por se ter esquecido de mencionar países fora da CEE, como a Noruega, a Islândia e a Turquia, em que o crescimento de PIB foi superior ao verificado em Portugal.
O Governo apresenta os factos económicos da forma mais conveniente para a sua acção de propaganda e desacredita as fontes estatísticas quando não correspondem aos seus interesses.
O Ministro Miguel Cadilhe procurou desacreditar o inquérito ao emprego quando o mesmo apontava para o aumento da taxa de desemprego. É com base no mesmo inquérito que hoje o Governo afirma que a sua política conduziu ao aumento do emprego e à redução do desemprego. De Outubro de 85 a Outubro de 86 o inquérito ao emprego contabiliza um acréscimo de 0,5 $ no emprego, um decréscimo de 0,97 % na população activa e uma diminuição de 13% no desemprego. Mas o Governo não se interroga sobre a natureza dos novos empregos e não atende a que a redução do desemprego se fica a dever principalmente à saída de trabalhadores do mercado de trabalho.
O Governo diz que a taxa de desemprego, 9,6%, é inferior à média europeia, mas não refere os países, como a Áustria, Dinamarca, Grécia e Noruega, em que a taxa de desemprego é inferior à portuguesa.
O Governo utiliza indicadores que nem ele nem ninguém pode contestar ou confirmar. É o caso do crescimento do investimento em 1986, que se diz ter sido de 9% ou 10%, e é o caso dos salários em atraso, em que tudo indica que se aceitou inflacionar o número referente a Dezembro de 85 para que se pudesse apresentar uma evolução mais positiva. Evolução mais positiva, que também é contraditória: o Ministro do Trabalho afirmou na semana passada que havia ainda cerca de 32 000 trabalhadores nessa situação e ontem o Primeiro-Ministro referiu 50 000. É só uma questão de mais 20 000 menos 20 000. Assim ninguém se entende, embora os trabalhadores continuem a sentir na pele enormes dificuldades.
Enfim, o negócio do Governo é números, pois perante a opinião pública está como peixe na água, manipulando-os como quer.
A não criação de estímulos ou incentivos ao funcionamento dos institutos estatísticos permite ao Governo manipular estatísticas e indicadores: é o adiamento da reestruturação do INE; é a não actualização de estatísticas, como, por exemplo, as industriais, que datam de 1983; é a extinção do IACEP; é o retardamento deliberado da saída dos relatórios do Banco de Portugal.
O Governo permite-se referir os indicadores de que pensa tirar louros políticos, como é o caso da inflação, e aí é pronto a apresentar números, mas, por outro lado, quando confrontado com situações que lhe são desfavoráveis, limita-se a criar expectativas, a apontar perspectivas e a fazer promessas que sabe serem impossíveis de concretizar - o que é patente nas promessas de substancial diminuição do desemprego até 1990 e na afirmação do Primeiro-Ministro de que, a continuar no caminho iniciado em 1986, Portugal deixará dentro de três anos a cauda da Europa - promessas vagas e demagógicas, que só seriam possíveis se os outros países estagnassem e Portugal crescesse a ritmos espectaculares.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A manipulação da informação pelo governo do Prof. Cavaco Silva não se fica por aí.
A utilização de sondagens de opinião promovidas pelo Governo é outra forma privilegiada para enganar a opinião pública. Sondagens que, sendo pagas por todos os portugueses, são só do conhecimento de alguns, normalmente do Governo e do partido que o apoia, por forma a facilitar a sua acção política. Quando convém, por lhes serem favoráveis, aí então o Governo dá-se ao trabalho de dar ampla divulgação dessas sondagens.
Às inúmeras perguntas e requerimentos dirigidos ao Governo por deputados da minha bancada, indagando quais os custos e resultados das ditas sondagens, o Governo diz nada.
Mas a manipulação da informação pelo executivo também não se fica ainda por aqui.
Montou o Governo uma máquina de propaganda altamente estruturada, necessariamente dispendiosa e suportada, em última análise, por todos nós.
Ao invés de informar, correcta e seriamente, sobre as medidas que toma, o Governo prefere publicitá-las. Nem que para tal tenha de recorrer à publicidade paga, tipo «mais segurança social» ou «é tão bom viver em Portugal», cujos gastos ainda desconhecemos, apesar dos requerimentos feitos por vários deputados. Não raras são as vezes em que o Governo anuncia medidas como se estivessem a ser aplicadas quando não têm ainda existência legal ou anuncia medidas que não correspondem na execução àquilo que foi divulgado.
Propaganda sem quantificação, sem seriedade, sem verdadeira informação.
Propaganda que tem por objectivo, nada mais nada menos, convencer o povo português de que «nove em cada dez estrelas preferem Cavaco Silva».
Risos do PRD e do PS.
Tudo isto só é possível porque o Governo conta com a ajuda imprescindível de alguma comunicação social.
O Governo serve-se de indicadores e de técnicas de marketing para atingir directamente a opinião pública através dos órgãos de informação, indo mesmo ao ponto de seleccionar a publicidade que lhe convém com o à-vontade de quem confia que os órgãos de comunicação social não deixarão de fazer eco de tal publicidade.
O Governo desfila todos os dias, e mais de uma vez, nos pequenos écrans e, não satisfeito com tal tratamento, ainda canaliza responsáveis do Governo, ministros e secretários de Estado, para programas infantis e de juventude.
Criando uma aparência de distanciamento e de não interferência nos órgãos de comunicação social, o Governo estabeleceu mecanismos através dos quais utiliza comissários políticos, sobretudo ao nível dos órgãos de maior impacte, os audiovisuais.
Para quem duvidasse, ainda ontem tivemos mais uma prova: o equipamento televisivo que ontem não havia para os partidos houve, afinal, para o Primeiro-Ministro.
Vozes do PRD: - Muito bem!
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A Oradora: - Fazemos votos, a bem da democracia, de que esta experiência governativa, de que não gostámos, seja encerrada com a queda do Governo e que um novo capítulo seja iniciado no longo livro da História.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE,
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, começo por dizer que hoje, não obstante a sua intervenção, estou sereníssimo.
Risos do PSD.
Começaria por dizer que a primeira ideia com que ficámos é a de que a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves é «uma entre cada dez estrelas que não gostam do professor Cavaco Silva».
Risos do PSD.
A Sr.ª Deputada Ana Gonçalves fez um discurso catastrófico: disse que este Governo foi horroroso, que foi péssimo, não fez nada, não abriu espaço à juventude, falseia todos os números relativos ao trabalho, apresenta expectativas que não pode confirmar na prática da sua actividade executiva.
Vozes do PRD: - E é a verdade!
O Orador: - Nas suas palavras, isto é, portanto, dramático, pois estamos perante um logro ou um mito, uma vez que nada disto se sustenta na prática.
Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que se trata de um discurso assaz diferente do discurso prudente que o Sr. Deputado Hermínio Martinho ontem aqui fez, e no qual disse que este governo poderia ir mais além, que terá feito algumas coisas e outras não, apresentando como principal crítica o facto de este Governo não ter aproveitado bem as variáveis da conjuntura económica, quando o deveria ter feito.
Na verdade, esta diferença do discurso é uma questão fundamental. É uma questão fundamental, pois trata-se de saber qual a constatação que o PRD fez da governação, ou seja, se a governação é tão terrível que justificava a moção de censura ou se a governação é má apenas porque, neste equilíbrio, nesta avaliação entre os prós e os contras, poderia ter feito mais coisas do que aquelas que fez.
Esta é uma questão eminentemente juvenil, Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, tem a ver com a estabilidade política, tem a ver com a constatação de que para a resolução das nossos problemas há um valor fundamental que releva hoje em dia, que é o valor da estabilidade. Não podemos estar de mês a mês, de ano e meio a ano e meio, a pôr governos na rua. A democracia portuguesa e o regime precisam de se consolidar e precisam de se consolidar com governos de legislatura - na linha, aliás, da brilhante intervenção que o meu companheiro de bancada Rui Machete ainda há pouco fez.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Porque o tempo é escasso, far-lhe-ei apenas duas perguntas, Sr.ª Deputada.
A primeira na retribuição da pergunta que fiz ontem ao Sr. Deputado Hermínio Martinho e à qual, em boa verdade, ele não teve ocasião de me responder: qual é o seu entendimento, como deputada do PRD, e como deputada jovem, sobre a avaliação que o PRD fez ou não do interesse nacional para a apresentação desta moção de censura?
Em segunde lugar, a Sr.ª Deputada entende ou não que para a resolução dos problemas dos jovens, para a resolução dos nossos problemas releva ou não o valor da estabilidade política? E em abono desse valor não se justificaria que a Sr.ª Deputada, como eu votasse contra a moção de censura?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Deputado Carlos Coelho, muitos parabéns pela sua brilhante imaginação. V. Ex.ª limitou se a repetir aqui o que já tinha repetido ontem, o que prova exactamente a grande forma em que estão os deputados do PSD.
Diz V. Ex.ª que tem estado sereno, isso é óptimo, pois é o único na sua bancada, e por isso também o felicito.
Risos do PRD.
Sr. Deputado Carlos Coelho, eu nunca disse que o Governo não fez nada; o que eu disse foi que o Governo não fez aquilo que disso, ou não fez como disse que o faria. São pequenas nuances, importantes, e não sei se o Sr. Deputado tem subtileza suficiente para as perceber.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Isso das nuances serem o importante ...
A Oradora: - Sr. Deputado Carlos Coelho, prezo muito a estabilidade política porque ela é um valor fundamental, sem e qual não é possível caminhar com passos seguros para o progresso e para o futuro.
Mas, Sr. Deputado, a estabilidade política não é conseguida a qualquer preço. Aqui há uns anos atrás também houve estabilidade política, ninguém duvida disso, mas essa estabilidade política eu não a quero!
Risos do Sr. Deputado Carlos Coelho
O Sr. Deputado Carlos Coelho está a rir-se, pois, certamente, tal como eu, pela nossa juventude, nunca teve contacto directo com esse tipo de experiência, com esse tipo de estabilidade; folgo que nunca venha a ter, tal como espero nunca vir a ter.
Não confundi, portanto, estabilidade política com aquilo que nós hoje aqui fazemos e com aquilo que pretendemos ao apresentar esta moção de censura.
Estabilidade política sim, mas não a qualquer preço. Não com este Governo, não com os métodos antidemocráticos que ficaram, ontem e hoje, provados à saciedade!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer e direito de defesa da honra.
Risos do PRD.
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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece que alguns grupos parlamentares, que inúmeras vezes têm utilizado a figura da defesa da honra, não me querem reconhecer a mim e ao PSD o direito de utilizar essa mesma figura. Particularmente quando a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves produziu aqui uma insinuação que não posso deixar passar em claro: era a de entender que quando eu estava a defender a estabilidade política estaria a defender uma estabilidade de 48 anos. Isso eu não posso suportar à Sr.ª Deputada Ana Gonçalves, nem a nenhum Sr. Deputado nesta Câmara.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É que a minha juventude, que me fez não conhecer os rigores do regime ditatorial de antes do 25 de Abril, uma vez que quando ele veio eu tinha apenas 14 anos, também não me leva a confundir aquilo que não é susceptível de ser confundido!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não é sério dizer que quem aponta o dedo e levanta o valor da estabilidade política, quando estamos depois do 25 de Abril - e reparem os Srs. Deputados que nunca tivemos um governo que estivesse mais de dois anos a governar -, põe em perigo a democracia. Será possível criar uma democracia forte neste sistema?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Governos de dois em dois anos, governos de ano e meio em ano e meio ... esta é uma questão séria!
Poderão os Srs. Deputados dizer que ela não é oportuna, que agora há matérias mais relevantes do que a estabilidade política para justificar a moção a este Governo - isso é um combate político sério. Dizer que se associa à questão da estabilidade política - que no meu entender é fundamental - a comparação com o anterior regime é um discurso pouco sério que eu não esperava que a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves aqui viesse fazer e que não pode passar sem o meu veemente protesto!
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves.
A Sr.ª Ana Gonçalves (PRD): - Sr. Deputado Carlos Coelho, leia os discursos da altura e compare-os com os deste Governo!
Aplausos do PRD.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.
O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate da moção de censura que o PRD colocou nesta Câmara suscita três questões: a primeira - o porquê; a segunda - os seus antecedentes; a terceira - as saídas que a crise provocada pela moção de censura pode implicar na vida portuguesa.
Porque é que o PRD fez e apresentou uma moção de censura é facto que, nesta Câmara, tentou ser explicado, mas não foi conseguido. O PRD não conseguiu explicar o porquê do desvio fundamental do seu comportamento, durante um ano cooperante e apoiante em genérico da acção do governo do PSD - todavia, não lhe dando instrumentos fundamentais para o exercício desse poder -, para de repente, numa atitude sincopada, o PRD ter pura e simplesmente passado, numa viragem de 180º, do apoio à crise provocada e latente em Portugal.
Penso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não é no quadro dos comportamentos políticos normais que se pode interpretar a acção do PRD. Por isso, quero pesquisá-lo no âmbito daquilo que o Sr. Deputado Hermínio Maninho ontem colocava como factor importante: a chamada «matriz genética do PRD». O PRD, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nasceu ...
Pausa.
O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados que estejam de pé que tenham a bondade de se sentar, para que o Sr. Deputado Ângelo Correia possa prosseguir na sua intervenção.
O Orador: - É o respeito parlamentar que alguns invocam a toda o instante, mas que em alturas fundamentais não cumprem.
Aplausos do PSD.
Estava eu a dizer que o PRD nasceu à luz de uma indicação oriunda da Presidência da República quando o general Eanes dirigia esse lugar, nasceu formado da cúpula para as bases através de dois grupos de cidadãos que provocaram rupturas nos dois maiores partidos nacionais, PS e PSD, e fundamentalmente contra os dois maiores líderes nacionais, o Dr. Mário Soares e o Dr. Francisco Sá Carneiro.
O pessoal que hoje em dia aqui se senta ...
Vozes do PRD: - O pessoal, Sr. Deputado?
O Sr. Mendes Bota (PSD): - São muito sensíveis!
O Orador: - O pessoal político - peço desculpa pela expressão - que hoje em dia aqui se senta são os fautores, foram principais dirigentes do PS e do PSD na altura em que abriram rupturas no interior dos dois maiores partidos, num momento em que esses dois partidos dirigiam a vida política nacional.
Associada a uma certa fracção do MFA oriunda daquilo que foi o espírito inicial do 25 de Abril, impuseram-se no País através de um acto constitutivo, que foram as eleições de Outubro de 1985. Nesse acto o PRD destruiu em grande parte o capital político e eleitoral do Partido Socialista. O seu primeiro acto constitutivo foi, assim, a destruição parcial do Partido Socialista.
Depois disso, quando veio para a Assembleia da República, tentou impor um estilo, um consenso, uma moral, que na prática o curto prazo demonstrou que era uma ideia abstracta, mas não uma concretização.
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Por isso as sondagens foram demonstrando, a pouco e pouco, que o PRD, partindo de 18%, se foi transformando num partido de um terço do que era.
Protestos do PRD.
O PRD na sua prática política foi saindo de uma situação de algum peso político para uma situação de um partido em luta pela própria sobrevivência.
Vozes do PRD: - Não se preocupe, Sr. Deputado.
O Orador: - É por isso, e só por isso, que hoje em dia o PRD, numa atitude que tem a ver acima de tudo com a sua sobrevivência política, joga o futuro de Portugal pelos seus próprios interesses.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Confunde e quer colocar no âmbito de Portugal, da sua estabilidade e da sua governabilidade, aquilo que foi sempre a sua postura e, sobretudo, a postura do seu líder: estar sempre em oposição ao maior partido português ...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... criando-lhe dificuldades, criando dificuldades à própria governabilidade.
O PRD é o partido que em Portugal se coloca como o partido que vive da dificuldade, vive da anormalidade democrática e de uma coisa que é a inexistência de maiorias.
Vozes do PRD: - Olhe que não!
O Orador: - O PRD é importante enquanto Portugal for instável, porque quando Portugal caminhar numa marcha de progresso, de estabilidade política e governativa, o PRD é um partido que é prescindível no espectro político. É útil enquanto a confusão reina, é útil enquanto a estabilidade não existe. É um partido condenado, por isso, a ser satelizado por qualquer outra das suas grandes forças partidárias portuguesas!
Aplausos do PSD.
O PRD sabe-o, e sabia-o. Por isso mesmo escolheu o momento em que duas circunstâncias se podiam perfilar.
Ou paralelamente provoca eleições antecipadas e teria a derrota mínima possível - neste momento, pois se as eleições fossem mais à frente o PRD passaria de partido que luta pela sobrevivência a partido em extinção política, donde escolhe o momento onde apesar de tudo ainda possa sobreviver - ou, em alternativa, encontra uma fórmula governativa com outros que lhe desse o acesso ao poder para, com base no poder, reconstruir do poder e pelo poder um poder que não tinha.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PRD optou por uma de duas lógicas, abrindo assim uma crise política para a sua sobrevivência e não para a defesa dos interesses nacionais.
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados, o primeiro acto constitutivo do PRD foi destruir uma parte da base eleitoral do PS e o segundo acto foi o de uma hostilidade política para com o maior partido, que é o PSD - e isto quando o PRD está no momento da sua pior queda eleitoral.
O PRD, tal e qual como o general Eanes, nesta Câmara, no dia 25 de Abril de 1977 - que todos lembramos! - são o prolongamento da permanência da crise em Portugal, da crise do adiamento em Portugal, gerando eternamente conflitos e problemas nos dois maiores pá tidos portugueses, quer seduzindo-os, quer atacando-os, quer minando o seu próprio terreno.
Hoje, o que o PRD faz é sobreviver e, para isso, luta e destrói aquilo que era a estabilidade, o progresso, que noutros tempos já existiram.
O segundo acto constitutivo do PRD é, pois, um acto não pela afirmativa, não pela apresentação de um programa - por exemplo, de revisão da Constituição, renovação do sistema económico português, de revisão do sistema político, do sistema educativo ou do sistema de segurança social. Nada pela positiva é apresentado pelo PRD ... apenas uma coisa: a destruição. O PRD apresenta-se não como algo que renova, que aponta caminhos, que desbrava futuros, mas impõe-se hoje, em Portugal, tal como no passado o seu líder, pelo bloqueamento, pela paralisia, pela travagem, para evitar que Portugal caminhe na marcha e no esteio do progresso que vinha trilhando.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Destino triste o de um país que nasceu para ser diferente, e a verdade é que é diferente. Pensámos que inicialmente o PRD era um partido igual a todos nós, com as mesmas virtudes, com os mesmos defeitos que todas nós temos e, hoje em dia, damos razão ao PRD: e PRD é um partido diferente, porque é pior.
Aplausos do PSD.
Não chega, Sr. Presidente e Srs. Deputados, analisar o comportamento político do PRD exclusivamente dentro da sua própria lógica. O PRD cumpre, do nosso ponto de vista, um objectivo táctico que lhe é exterior.
No final do Outono do ano passado, o dirigente do Partido Comunista, Sr. Dr. Álvaro Cunhal, lançou uma vez o mote: «Governo para a rua.» Só que antigamente pedia sempre eleições; desta vez, o Dr. Álvaro Cunhal deixou de confiar no povo português. Percebe-se porquê! E daí começou automaticamente uma campanha de conexão com a actuação táctica que o PRD veio a cumprir. C PRD, objectivamente - não falo de coligação política - no terreno, cumpriu o objectivo táctico do Partido Comunista, que tem dois tabuleiros de jogada política.
A vossa coligarão objectiva, não política, tem dois fins diferentes: uni atinge a estabilidade, atinge o maior partido português, o PSD, atinge a governação. Paralelamente, os senhores actuam em «pinça» contra o Partido Socialista, entalando-o, obrigando-o ou a levá-lo a reboque, perdendo a liderança política, ou vai atrás e, nesse caso, é um partido subalterno.
Vozes do PSD - Muito bem!
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O Orador: - Curiosamente, o que se passou em Portugal na última semana é disso prova evidente. O PCP, a longo prazo, lançou o mote; o PRD detonou no plano táctico a queda deste executivo; o PS está na situação mais difícil que é possível visualizar.
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Estamos aqui estamos na intentona, Sr. Deputado!
O Orador: - O Partido Socialista deverá sobretudo, talvez, repensar uma questão. É que, no prazo de uma semana, assistimos da vossa parte a três atitudes opostas: em primeiro lugar, a crítica do lançamento da moção de censura por parte do PRD; em segundo lugar, a disponibilidade do Partido Socialista para até deixar continuar o Governo negociando com o PSD; em terceiro lugar, a hipótese em aberto de fazerem um governo conjunto com aquele partido que inicialmente criticaram.
Convenhamos, Srs. Deputados do Partido Socialista, que em oito dias três posições desta natureza são muitas e relevam de uma realidade: a de que o Partido Socialista, neste momento, está numa situação de desnorte estratégico.
O Sr. Ferraz de Abreu (PSD): - Está delirando!
O Orador: - O Partido Socialista sabe que não era este o seu momento e, por assim ser, sofre as consequências de uma atitude política conjugada do Partido Comunista e do PRD que estão contra si. O PS sabe isso e daí o seu desnorte.
Protestos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Analisados os antecedentes, vejamos as saídas.
Vozes do PRD: - Não analisou nada!
O Orador: - Se acreditássemos nos discursos dos líderes políticos da oposição à esquerda do PSD, saberíamos que o PS só iria para o Governo depois de novas eleições. A prova disso são as moções aprovadas em congresso do Partido Socialista e é o discurso do Dr. Vítor Constando.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Isso já foi corrigido!
O Orador: - Se acreditássemos nessas palavras, obviamente o País saberia que tínhamos eleições antecipadas. Mas como muitas vezes as palavras não significam os actos e como o próprio PRD colocou a questão da formação de um governo conjunto com o Partido Socialista, não podemos, nem devemos, interferir no posicionamento e na «desejabilidade» daquilo que cada partido deseja fazer nesta Câmara perante o País.
Mas não podemos deixar de vos recordar, Srs. Deputados do Partido Socialista, que os senhores, ao formarem um governo com o PRD, esse governo vai ter a mesma natureza minoritária que um governo do PS.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mais: só é maioritário, fornecendo uma certa estabilidade na Assembleia, se os senhores tiverem o apoio objectivo, completo e total do Partido Comunista.
Esta é a primeira realidade política com que o Partido Socialista se confronta: ou o Partido Socialista encontra uma situação que na prática, objectivamente, depende do voto do Partido Comunista ou, então, está numa situação tão minoritária como estava o governo do PSD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, se aceitarem formarem um governo com o PRD, os senhores assumem uma atitude política que é esta: perderam eleições, foram derrotados no nosso campo pelo vosso principal adversário e os senhores derrotados, satisfeitos, alegres, felizes com a derrota dão a mão àquele que vos destruiu. Ou seja, politicamente os senhores, coligando-se com o PRD, contestam a vossa derrota de Outubro de 1985. São derrotados, gostaram e deram a mão a quem vos derrotou! ... E com VV. Ex.ªs.
Aplausos do PSD.
O PS é livre de fazer o que quiser, mas também nós somos livres de fazermos a interpretação política dos factos que qualquer partido político produza em Portugal ...
O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Vocês são livres de dizer asneiras!
O Orador: - ... e a análise é a de que o PS, a fazê-lo, estaria não só numa estratégia suicidaria como numa estratégia que, eventualmente, podia levá-lo a caminhar para uma circunstância de impedir a médio prazo não só uma reconquista do espaço que perdeu como, provavelmente, um caminho para projectar o novo líder presidencial às eleições de 1990.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se a moção de censura for aprovada, devemos dar a voz ao País e aos Portugueses para dizerem o que querem. O Grupo Parlamentar do PSD, através das intervenções que aqui produziu e que o seu líder parlamentar fará no final, apenas reafirma aquilo que disse sempre: «O governo por ele apoiado não abriu crise; apenas governou Portugal.» O seu pecado foi governar bem; o seu mal foi ter sido eficaz. Se fosse mau, a oposição teria razão..., mas nessa altura não tenham medo da voz do povo, porque seguramente ele estará de acordo com a oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Governo não abriu a crise, quis ser estável e dar estabilidade, quis governar, quis ser honesto e, acima de tudo, propiciar bem-estar. Não fez crise e outros fizeram-na. O País perceberá quem quis servir Portugal e quem quis servir-se de Portugal!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Guedes de Campos.
O Sr. Paulo Guedes de Campos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Noto com mágoa a ausência do Sr. Primeiro-Ministro nesta fase do debate.
Protestos do PSD.
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O Sr. António Capucho (PSD): - Se quiser, manda-se chamar!
O Orador: - Espero poder contar com os bons ofícios do Sr. Ministro de Estado para garantir que as palavras que vou proferir chegarão rapidamente ao conhecimento do Sr. Primeiro-Ministro, sem deturpações especiais.
É difícil tecer qualquer apreciação a este governo sem referir, quase que exclusivamente, o Primeiro-Ministro. Em primeiro lugar porque ele é de direito o primeiro responsável pelo Governo e o responsável do Governo perante os outros órgãos de soberania; em segundo lugar, porque com este governo e Primeiro-Ministro é, ele próprio, o Governo e todos os ministros mais não são do que agentes executivos da vontade individual do Primeiro-Ministro.
É por isto que se revestia de especial relevância o discurso inicial do Primeiro-Ministro, mas também porque as posições do Governo e do próprio PSD sobre a moção de censura, expressas ao longo da última semana, foram parcas e muito anormais de um ponto de vista democrático.
De facto, quase se reduziram à afirmação de que qualquer governo que viesse a ser formado no actual quadro parlamentar seria uma fraude política.
É estranho, é inadmissível, mas é compreensível.
Cavaco Silva fora do Governo não quer um governo alternativo, de imediato, sem mais perturbações, porque sabe muito bem que esse governo irá demonstrar à saciedade, a todo o povo português, que é possível governar melhor, que são possíveis melhores resultados globais, que é possível mais sustentadamente construir o futuro e, principalmente, que é possível repartir melhor os resultados positivos que um bom governo, numa boa conjuntura, irão gerar.
Aplausos do PRD.
Cavaco Silva prefere eleições com uma crise arrastada em alguns meses de governo de gestão, porque assim poderia sempre procurar justificar a falta de autenticidade das afirmações que agora produz com a situação indesejável desse próprio arrastamento de crise por si desejado.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Todos nós esperávamos, com fundada curiosidade, o discurso do Primeiro-Ministro. Cavaco Silva não desiludiu os seus mais acrílicos apoiantes. Excedeu-se, ultrapassou-se. Foi mais exageradamente Cavaco Silva do que poderíamos esperar.
Cavaco Silva feriu a consciência de todos os democratas. Cavaco Silva colocou-se, pelo menos, aparentemente, no espaço inexistente que separa a democracia da antidemocracia.
Vozes do PSD: - Não apoiado!
O Orador: - O seu discurso, apesar de tudo, merece a nossa gratidão - amarga gratidão - porque, de uma vez por todas, ficámos a saber, com absoluta certeza, o que é que Cavaco Silva é politicamente.
Aplausos do PRD.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos a perfeita noção de que criticar duramente o Primeiro-Ministro com a garantia de difusão pública que este debate nos dá é hoje em dia um risco. E é um risco porque todos sabemos que, de uma forma particularmente inteligente, por vezes com grande subtileza e mesmo com laivos de técnica bem aplicada, este governo tem manipulado algumas áreas da opinião pública. Tem veiculado a ideia de que é eficaz, de que um dado satisfação a algumas aspirações da comunidade nacional, apesar da asfixia a que está submetido das regras da democracia.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Corre-se o risco de, perante essa opinião pública, habilmente manipulada, se ficar mal visto por defender a democracia e criticar o Primeiro-Ministro. Mas é imperioso correr-se esse risco, sejam quais forem os custos para quem assume essa responsabilidade, porque em nome de nada, nem mesmo de qualquer conceito tecnocrático de eficácia, os democratas portugueses podem pactuar com o ataque a regras fundamentais «Io funcionamento democrático e à essência da própria democracia.
É assim que se torna uma exigência democrática a formação rápida de um governo no actual quadro parlamentar que demonstre claramente ao povo português que só no escrupuloso respeito pelo funcionamento normal das instituições democráticas é possível satisfazer, de maneira equilibrada hoje e para o futuro, as aspirações e os direitos de toda a população.
Aplausos do PRD.
O discurso d 3 Primeiro-Ministro tem politicamente algumas ideias marcantes que importa salientar. Faz a defesa permanente e exaltada da capacidade própria e da competência intrínseca do Governo, não em termos relativos - o que só lhe ficava bem - mas em termos absolutos. Só o Governo sabe, só o Governo faz e, pior do que isso, só o Governo pode saber, só o Governo pode fazer.
Cavaco Silva deixa passar também subtilmente o elogio sem limites a si próprio. Simultaneamente, faz o ataque sistemático ao órgão de soberania em que sente concorrência - Assembleia da República - de uma forma brutal, não olhando a meios. Importa destruir a credibilidade da Assembleia da República, mesmo que isso custe o sacrifício da dignidade dos deputados do próprio partido que lidera, e que é suporte do Governo.
Restam, perante a opinião pública, Cavaco Silva e o seu Governo, porque mesmo o Presidente da República cometerá fraude política se não fizer o que Cavaco decidir que lhe convém.
Depois, vem o desrespeito pelos mecanismos formais do exercício democrático. Claramente se condenam, desde que entravem ou dificultem o sentido e a marcha do seu governo.
Não se diz, per exemplo, quando, quem e como pode apresentar una moção de censura. Talvez envergonhadamente, pedindo desculpa e garantindo, à partida, os próprios proponentes que votariam contra.
Cavaco Silva pretende ignorar que em democracia, tal como em Portugal está institucionalizada, as maiorias não podem esmagar as minorias, nem tão-pouco é legítimo as minorias imporem-se às maiorias.
Vozes do PRD: - Muito bem!
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O Orador: - Pode governar-se sem o apoio da maioria mas não se pode governar contra a maioria. Cavaco Silva resolve esta dificuldade de forma expedita mas clássica. Não respeita os mecanismos democráticos de representação da vontade popular e invoca o diálogo directo com o povo.
Conviria saber quais são os mecanismos que utiliza para esse diálogo directo!...
Cavaco Silva afirma saber o que convém ao povo português e, mais do que isso, afirma saber que os 70% que faltam ao PSD para representar o todo nacional estão enganados.
Aplausos do PRD.
Cavaco Silva possui a verdade absoluta.
Será que Cavaco Silva está convencido de que tem o privilégio de dialogar com qualquer ente supremo que lhe permite emitir juízos absolutos, apanágio dos que só têm certezas e raramente se enganam num profundo corte mental com a realidade dos homens?
Tudo o que acabo de dizer e muito mais consta de maneira explicita no discurso inicial do Sr. Primeiro-Ministro e nas suas outras intervenções. E é importante que se faça uma leitura atenta e desapaixonada de todas estas afirmações e atitudes do Sr. Primeiro-Ministro, porque é por essa via que se conhece o carácter de um dirigente político e se fica a saber com o que se pode contar.
Aliás, seria muito proveitoso para todos nós que os politólogos do partido que apoia o Governo gastassem algum tempo, procurando enquadrar num modelo de liderança política as características do Sr. Primeiro-Ministro, de que acabo de dar alguns exemplos bem reais, em vez de exercitarem imaginação à volta de arranjos possíveis com as siglas dos partidos da oposição, no discurso lido pelo Primeiro-Ministro.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Primeiro-Ministro Aníbal Cavaco Silva, com o seu discurso, demonstrou que nos enganou ao longo de mais de um ano. Dentro de algumas horas, através da aprovação da moção de censura, a Assembleia da República impedirá que o povo português continue a ser enganado.
Aplausos do PRD.
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além de todas as causas próximas que já aqui foram referidas como razão da sem razão de ser desta controversa moção de censura, valerá a pena fazer um exercício de racionalidade para averiguar das suas causas remotas, muito mais profundas, por certo, do que aquelas. A razão distante do que se passa hoje aqui encontra-se sem dúvida num erro de avaliação que toda a oposição de esquerda cometeu logo após as eleições de Outubro de 1985. Tal erro residiu na subestimação das capacidades do PSD e, em particular, do Primeiro-Ministro, Cavaco Silva. Em finais de 1985 era frequente ouvir-se comentários, oriundos da oposição de esquerda, carregados de «autoconvencimento» de que o Governo e o Prof. Cavaco Silva se desacreditariam em escassos meses.
Também quando o Governo apresentou o seu Programa nesta Câmara e fixou os objectivos para a sua política macro-económica, os mesmos iluminados profetas afiançaram a pés juntos que tais objectivos eram inverosímeis e inatingíveis.
Claro que, poucos meses depois, já reconheciam a contragosto que as coisas estavam a melhorar, mas, com a mesma prosápia, reafirmavam que o Governo ficaria aquém das metas traçadas.
Finalmente, quando as estatísticas e os factos se tornaram irrefutáveis, não tiveram melhor saída do que imputar o sucesso da política governamental a causas externas.
A um erro de avaliação juntou-se outro erro de avaliação, pois ainda que a razão exclusiva da actual situação económica se devesse apenas às condições externas, o que ninguém de boa fé pode afirmar, sempre se dirá que os bons espíritos da oposição as não souberam prever nem souberam prever tão-pouco os seus efeitos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mas a oposição de esquerda não cometeu apenas os erros já indicados. Na verdade, foi incorrendo em ilusões sucessivas durante este período de quase ano e meio.
Assim, auto-iludiu-se quando, ainda mal refeita perante o impacte extremamente positivo dos primeiros dois meses e meio de governo, pensou que as eleições presidenciais, com a vitória do actual Presidente da República, constituíram a queda automática e a curto prazo do actual governo e do seu Primeiro-Ministro.
Depressa foram frustadas tais esperanças, pelo exemplar relacionamento que rapidamente se estabeleceu entre estes dois órgãos de soberania.
Viraram-se, então já com algum desespero, para o mito da nova liderança do Partido Socialista, cujo congresso se anunciava como redentor para toda a esquerda.
Vinha aí o salvador da Pátria e da democracia, o «anti-Cavaco», o Doutor Vítor Constâncio. Mais uma desilusão. Depois da entrada de leão começaram a vislumbrar-se saídas de sendeiro.
Mas a esperança é a alma da vida e logo a uma ilusão se sucede outra. A sorte do Governo ficaria decidida com o assumir da liderança do PRD pelo general Ramalho Eanes. Simplesmente, o sebastianismo é o fenómeno da ausência e do regresso sempre adiado que se esfuma como as coisas etéreas, quando tem lugar a aparição efectiva do desejado. E assim sucedeu; depois de Ramalho Eanes, o PRD em vez de se fortalecer, enfraqueceu-se, a esquerda em vez de se unir, divergiu mais.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A outra tábua de salvação entretanto surgida, a denominada «Convenção da Esquerda Democrática», foi disso prova cabal.
Um outro erro de apreciação da esquerda parlamentar foi o de pensar que o Governo se atemorizaria por dispor apenas de uma maioria relativa e que capitularia a cada esquina perante as suas exigências.
Que o Governo estaria disposto a tudo aceitar para se manter no poder custasse o que custasse, convertido em presa fácil em resultado das contradições insuperáveis em que por essa via se veria envolvido.
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Como tal se não verificou, e em resultado de tudo isso, a oposição de esquerda aumentou a sua frustração e o seu divórcio com a população, pois enquanto clamava que o Governo fugia ao diálogo, toda a gente se apercebia de que o Governo era capaz de dialogar politicamente com o Presidente da República e com os parceiros sociais, de forma ímpar, quando comparada com quaisquer situações em governos anteriores.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, um outro erro de apreciação cometido em bloco pela esquerda parlamentar é o de não ter sabido discernir qual a razão fundamental por que a mensagem do Governo passa e a sua não passa. Ela, a razão do Governo, não se prende com a alegada manipulação da comunicação social, que não existe...
Risos do PS, do PRD e do PCP.
...nem com quaisquer mecanismos ditos de propaganda que não dispomos nem está no nosso jeito utilizar.
Risos do PS, do PRD e do PCP.
A razão é bem simples, por muito que lhes custe: é que aquilo que é afirmado pelo Governo é apreendido e é sentido pelos Portugueses; dizendo a oposição o contrário, fala de uma realidade que os cidadãos ignoram e não sentem ser aquela que vivem.
Aqui é que está a razão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - É falso!
O Orador: - A diferença está em que o Governo faz e acredita no que faz e os Portugueses sentem e apreciam os feitos da sua acção. Ao invés, a oposição fala e nem ela própria acredita no que diz.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Seiça Neves (MDP/CDE): - Falso!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tantos erros de apreciação conduziram também a erros graves de vaticínio e o País assistiu ao triste espectáculo do anúncio de crises a curto prazo, que nunca se confirmaram, que foram sempre adiadas. E a oposição entrou num carrocei louco de anúncios de eleições, intercalado com crises, recomendou remodelações e inventou divergências entre ministros. Tudo debalde. Tudo reverteu em descrédito dos protagonistas e autores de tais afirmações.
A oposição tentou promover e anunciar, também, vezes sem conta, no seguimento de uma notável falta de sentido de previsão das coisas, uma enormíssima agitação social.
Porém, o ano de 1986 - e é com orgulho que o dizemos, em nome da liberdade e da democracia, que também representamos, pois os senhores não têm o exclusivo da democracia -...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ... foi dos mais pacíficos e calmos dos últimos anos. Os surtos grevistas foram notoriamente moderados, não houve violência nas ruas, a crise estudantil, ao contrário do que os senhores queriam, não deflagrou - e não deflagrou pela capacidade do Governo.
Aplausos do PSD.
Em termos se ciais, pode dizer-se, sem exagero, que Portugal foi em 1986 e tem sido no princípio deste ano de 1987 um exemplo ímpar na Europa e no Mundo. Basta olhar para os nossos países vizinhos.
O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - E a mortalidade infantil?! ...
O Orador: - Enganou-se a oposição ao pensar que a força e determinação do PSD, do seu governo e do Primeiro-Ministro Cavaco Silva eram transitórias e fugazes. Esse foi o vosso erro. Enganou-se a oposição ao pensar que tido seria diferente depois das eleições presidenciais. Também aí se enganaram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Enganou-se a oposição ao julgar que tudo se alteraria após o congresso do Partido Socialista. Nada se alterou.
Enganou-se a oposição ao imaginar que a liderança efectiva do PRD, pelo general Ramalho Eanes, modificaria radicalmente o cenário político. Nada mudou ou o que mudou foi para pior. Enganou-se a oposição quando tomou como seguro que o Governo não alcançaria os objectivo; macroeconomia» e sociais a que se propunha. Em alguns casos, ultrapassou-os.
Enganou-se a oposição quando o Governo não quis conservar o podei a todo o custo, não aceitando confundir diálogo com capitulação.
Enganou-se a oposição quando esperou e anunciou crises, remodelações ou divergências no seio do Governo.
Enganou-se a oposição quando, em vão, desejou e fomentou uma agitação social que não existiu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, foi esta floresta de enganos que naturalmente levou o PS, de forma sui generís, e para não perder ainda mais a sua já diminuta credibilidade, a anunciar publicamente que desistia de fazer fosse o que fosse até, pelo menos, ao mês de Maio.
Foi também esta floresta de enganos que, em atitude insensata e precipitada, levou o PRD a apresentar esta moção de censura. Foi a fuga em frente. Foi o desespero acumulado. F ai a irracionalidade produto de frustrações sofridas.
Mas perante a precipitação do PRD que fez o Partido Socialista?
Optou pela «coerência». Considera «irresponsável» e «inoportuna» a iniciativa do PRD e vai daí, porque sempre votou contra o Governo, decide acompanhar o PRD na irresponsabilidade e inoportunidade anunciada, e votar a favor da «moção de censura». É a coerência, perdoe-se-me o plebeísmo, é a coerência do «bota abaixo».
Aplausos do PSD.
Em tudo o mais, o PS ignora, ou despreza mesmo, a coerência.
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Então não são públicas afirmações prévias à crise, de altos responsáveis do PS, que negavam peremptoriamente qualquer tipo de coligações com o PRD? Não é verdade que, duas ou três semanas antes da apresentação da moção de censura, o PS, instado pelo PRD, respondeu não a um qualquer entendimento com este partido? Incoerentemente o PS diz agora que é uma hipótese a admitir. Aqui, não lhe importa a coerência.
Além, dizia que não era o tempo oportuno, agora já admite sê-lo. Então, afirmava orgulhoso a sua estratégia autónoma, agora parece estar disponível para ir a reboque da estratégia alheia.
Os Srs. Deputados Socialistas lembram-se com certeza da multiplicidade de autos-de-fé que muitos de vós fizeram: «Governo antes de eleições, não.»! Lembrar-se-ão também como foram pressurosos e afoitos a afirmar a autonomia e a recusar rever a vossa posição quando o Sr. Presidente da República vetou a Lei de Licenciamento das Estações de Radiodifusão. Agora candidamente abdicam da iniciativa própria e declaram nada assumir publicamente, sem aguardar o seu regresso do Brasil e o seu parecer.
Também a coerência do PS deixa muito a desejar pela concepção, modo e tempo de diálogo que, em cada caso, pretende assumir e praticar.
Que dizer da coerência da prática de diálogo preconizada pelo PS quando, pelo menos nos primeiros encontros formais que teve com o Governo, durante as reuniões tratava de assuntos de Estado e depois, ao falar com os órgãos de comunicação social, lia as mensagens políticas que trazia de casa e que nada tinham a ver com os assuntos debatidos nas mesmas reuniões.
Ou ainda, que pensar da coerência do PS quando depois de irresponsavelmente ter votado contra a Lei do Orçamento do Estado para 1987, o PS veio fazer figura de apaziguador para disfarçar o mal feito, propondo através dos órgãos da comunicação social um acordo de cavalheiros ao PSD, mas, pasme-se, as conversações não se iniciariam no dia seguinte, tão-pouco no mês seguinte, mas antes e só depois da revisão constitucional.
Como essa atitude, Srs. Deputados, contrasta com o modo expedito como simulam agora querer falar com toda a urgência com o PSD e o Primeiro-Ministro quando deixaram sem resposta a comunicação do Primeiro-Ministro endereçada ao seu secretário-geral, longe dos holofotes da ribalta, o que lhe conferia naturalmente uma seriedade e uma isenção de intenções que a do PS manifestamente agora não pode ter!
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Em suma, a coerência do PS esgota-se quando se trata de dificultar a acção do Governo, de impedir a sua marcha, ou de o fazer cair, neste caso por iniciativa de ou trem, já que a coragem lhe terá escasseado para tomar iniciativa própria, que aí, sim, teria sido coerente.
Tudo se encaminha, Sr. Presidente, Srs. Deputados, para que a oposição de esquerda vá concretizar o seu mais grave e grosseiro erro de apreciação, qual seja o de pensar que fazer cair o Governo será a mesma coisa que fazer cair o vigor, a pujança e a credibilidade do PSD e do Primeiro-Ministro do X Governo Constitucional.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Srs. Deputados, podem destruir e derrubar o Governo, podem construir soluções artificiais. Mas não se iludam, não conseguirão volatilizar, desmaterializar ou fazer desaparecer os esteios mais fortes do espectro partidário em Portugal, que são, neste momento, e para o futuro, o PSD e o seu líder, Prof. Cavaco Silva.
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados, aconteça o que acontecer, vão ter de contar connosco. Os Portugueses vão obrigar-vos a terem de contar connosco e nós contamos com eles para isso.
Não será a aprovação de uma moção de censura que irá esconder, ofuscar ou fazer esquecer o ciclo de progresso, bem-estar e paz social que o X Governo Constitucional conseguiu para o País, apesar dos vossos esforços em sentido contrário.
A opinião pública sabe distinguir a verdade da mentira, a retórica da acção, o trabalho da destruição, a capacidade e a competência da sofreguidão oportunista pelo poder.
A vossa escolha está feita, mas a que vai vingar, Srs. Deputados, será a escolha dos Portugueses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre, ao que julgo para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, é para defesa da honra.
Risos do PSD.
É mesmo para defesa da honra.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra para esse efeito.
O Sr. Manuel Alegre (PS): - O Sr. Ministro não está especialmente bem colocado para falar de coerência ou dar lições de coerência ao Partido Socialista.
Nós vamos derrubar o seu governo, Sr. Ministro, por razões que são as nossas. Não acompanhamos o PRD.
Vamos derrubá-lo por uma atitude de coerência democrática, porque sempre negámos a confiança política ao seu governo de todas as vezes que ela foi institucionalmente suscitada: aquando da discussão do Programa do Governo, quando foi apresentada a moção de confiança e durante a discussão do Orçamento.
Demos, de facto, uma última oportunidade ao Governo.
Quem nos deu agora razões nossas, razões socialistas e democráticas para derrubar o Governo foi o Sr. Primeiro-Ministro e foi o Governo, ao recusar-se ao diálogo. Eu já aqui disse que oferecemos ao Governo a possibilidade de escolher entre a arrogância e o poder. Escolheu a arrogância, vai perder o poder. Vai ser derrubado por isso, porque não foi capaz de compreender a necessidade do diálogo em democracia; mostrou-se incapaz de compreender a natureza minoritária do seu governo, mostrou-se incapaz de compreender a necessidade da busca de consensos em democracia. Recusou-se ao diálogo, recusou-se à humildade democrática necessária em democracia, optou pela arrogância. Por isso, vai perder o governo.
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De facto, a nossa mensagem não passa. Se o Sr. Ministro tivesse visto ontem o 2.º canal da televisão, compreenderia porque é que não passa; não passa porque é cortada, pura e simplesmente. Tivemos meia hora do Sr. Primeiro-Ministro, em campanha eleitoral, a responder às perguntas dos 21 deputados. Simplesmente, a nossa mensagem não passa - e não só a de esquerda, pois o CDS também foi coitado - porque é cortada. Não passa por razões físicas, somos cortados.
Uma voz do PCP: - É assim a democracia deles!...
O Orador: - Sr. Ministro, o Partido Socialista assumiu uma posição clara, uma posição de responsabilidade democrática. Não se trata de acompanhar ou não este ou aquele partido. Qualquer partido tem o direito constitucional de apresentar uma moção de censura. Vamos votar essa moção de censura por razões que são as nossas, mas que não são só nossas. Neste momento, são razões de democracia, são razões do funcionamento normal e regular das instituições democráticas.
Mas digo-lhe uma coisa, Sr. Ministro: não seremos uma oposição domesticada, não somos nem nunca seremos a oposição de «Sua Majestade», não seremos oposição à medida e para satisfação do Primeiro-Ministro Cavaco Silva.
Somos oposição para derrubar, sempre que for preciso, um governo que não respeita ou distorça as regras democráticas. Por isso, vamos derrubar o governo de V. Ex.ª, Sr. Ministro.
Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, para que efeito pediu a palavra?
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: - Tem, V. Ex.ª, a palavra.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Ministro, no início deste debate, era nossa expectativa que o Governo viesse seriamente a esta Câmara explicar várias coisas.
Em primeiro lugar, explicar as razões de fundo pelas quais não tinha aceite a proposta para negociações que o Partido Socialista lhe tinha endereçado. Acerca disso, apenas ficámos a saber que o Governo entendia não dever aceitar ultimatos.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - A gente não negoceia com toda a gente!
O Orador: - Mas quanto à questão de fundo, ou seja, quanto aos oito pontos divulgados pelo Partido Socialista, não para seu interesse partidário mas em nome do interesse nacional, não houve uma única justificação da parte do Governo que nos pudesse convencer ou convencer esta Câmara que algum desses pontos, a ser aceite, não teria sido em nome do interesse nacional.
Vimos aqui, inicialmente, o Sr. Primeiro-Ministro dizer que estava preocupado com os interesses de Estado, que os partidos, esses sim, se limitavam a uma actividade politiqueira.
Acabámos de ver agora o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares fazer uma intervenção que nada tem a ver com preocupações de Estado. Essa, sim, é autenticamente uma intervenção politiqueira.
Nesse sentido, quero perguntar, pela última vez, a este governo e ao Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares, face à posição do Governo e ao entendimento que tem do interesse nacional, qual das oito condições apresentadas pelo Partido Socialista merecia, do ponto de vista do Governo, não ser aceite, para em função disso podermos ficar a saber as razões de fundo pelas quais este governo e o seu Primeiro-Ministro são totalmente corresponsáveis por esta crise, porque se a demonstração não for feita - e não está a ser feita - a conclusão só pode ser uma: o principal interessado nesta crise política terá sido, em primeiro lugar, o PRD com a sua moção de censura, mas em segundo lugar, e a reboque, manifestamente Cavaco Silva, o PSD e este governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, como não há mais inscrições para pedidos de esclarecimento, se desejar responder ao Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra.
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, desejo lavrai aqui o meu protesto pela circunstância de, nas últimas vezes que tenho falado nesta Câmara - e penso que isso não ofende ninguém - , por sistema, se té n levantado vozes da bancada do Partido Socialista para defender a honra.
Não vejo em que é que ofendi a consideração do Sr. Deputado Manuel Alegre.
Isso também é uma forma de distorção da democracia, de condicionamento das pessoas...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não é correcto!
O Orador: - Também e uma forma de distorção da democracia e das regras democráticas, de tentativa de condicionamento cio modo da forma e da livre expressão de pensamento, a que, por enquanto, os Ministros também têm direito em Portugal.
Aplausos do PSD.
Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lacão, a única coisa que lhe vou dizer neste momento é que, para além da carta que foi enviada pelo Primeiro-Ministro ao secretário-geral do seu partido, as oito condições de que o Sr. Deputado falou não foram divulgadas nem dadas a conhecer ao Sr. Primeiro-Ministro nem ao Governo.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - O Sr. Primeiro-Ministro recusou-se!
O Orador: - Forem, sim, dadas a conhecer à comunicação social...
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Exacto!
O Orador: -..., depois de o PS já ter dito que votava a favor da moção de censura, em face da resposta do Primeiro-Ministro ao secretário-geral do seu partido.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Agradeço-lhe por me ter permitido interrompê-lo.
Queria apenas esclarecer que, como sabe, se essas condições não foram formalmente apresentadas ao Sr. Primeiro-Ministro, foi porque o Sr. Primeiro-Ministro se recusou a recebê-las.
Em segundo lugar, na primeira intervenção feita pelo Partido Socialista nesta Câmara, o líder do meu grupo parlamentar apontou essas condições. E este governo tinha tido total oportunidade, ao longo deste debate, de fazer a demonstração de que essas condições eram irrealizáveis.
O Sr. António Capucho (PSD): - Essa é boa!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - O que eu lhe suscitei foi uma resposta franca para dizer, quanto ao conteúdo delas, porque é que tais condições não eram aceitáveis pelo seu Governo. Neste momento, essa resposta continua por dar.
O Orador: - O Sr. Deputado continua a tentar..., diz que o Governo manipula, mas o senhor é que está a tentar manipular os factos...
O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ..., porque a carta dirigida ao Sr. Primeiro-Ministro dizia uma coisa, que é de pasmar: propunha um programa para a normalização da vida democrática.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Exactamente!
O Orador: - Pois é.
Julgo que o Partido Socialista agiu com leviandade, porque só depois de ser apresentada no Parlamento uma moção de censura é que se lembrou de pensar que estava em causa a normalidade da vida democrática. Quis, assim, substituir-se ao Sr. Presidente da República - eu não queria falar nesta questão - , parecendo fazer-lhe um reparo, já que ele é que deve cuidar do normal funcionamento das instituições democráticas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E veio o Dr. Vítor Constando, pressurosamente, desafiar o Governo, dizendo «vamos fazer um programa para a normalização da vida democrática», como se a vida democrática não estivesse a funcionar normalmente.
O que é isto que nós estamos aqui a fazer senão a normalidade da vida democrática, ainda que o Governo caia? É normal em democracia o Governo cair.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, neste momento não há mais inscrições.
Pausa.
Não havendo mais inscrições, vamos entrar no período das declarações finais, começando pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. António Capucho (PSD): - Para, ao abrigo dos dispositivos regimentais, requerer a interrupção dos trabalhos por cinco minutos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - É regimental, pelo que a interrupção é concedida.
Eram 18 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.
Concedo a palavra ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca para, em representação do MDP/CDE, produzir uma intervenção.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo: Ao votar a moção de censura do PRD, derrubando o governo PSD do Prof. Cavaco Silva, o Parlamento porá fim a um dos períodos de análise mais complexa da história recente da sociedade portuguesa.
A teoria de incompetências, irresponsabilidades, acções contraditórias, incapacidades, que se acumularam durante a vigência deste governo obscurece a verdadeira natureza da sua acção.
Andará mal avisado quem se deixar influenciar por aspectos, apesar de tudo, secundários do comportamento do Governo, subalternizando os seus traços essenciais: a comprovada incapacidade de convívio democrático e de respeito pelas instituições, o clientelismo partidário e pessoal, a manipulação da informação e a aplicação pertinaz de uma estratégia de subdesenvolvimento.
A nosso ver, afirmar simplesmente que o Governo foi incapaz de aproveitar as condições económicas externas excepcionalmente favoráveis com que deparou e de não ter definido nem aplicado nessa conjuntura uma estratégia de desenvolvimento do País é absolvê-lo de culpa bem mais grave.
Na realidade, o Governo adoptou e aplicou com pertinácia uma estratégia de subdesenvolvimento, centrada teoricamente em arcaicas formulações de liberalismo económico e inevitavelmente associada ao domínio do grande capital, ao sacrifício dos pequenos e médios produtores, à desvalorização da força do trabalho nacional, à instabilidade social e ao agravamento da dependência externa em todos os domínios.
O debate desta moção de censura e o pouco tempo de que dispomos dispensam-nos de quantificar esta afirmação, que a manipulação delirante dos números e as comparações demagógicas, de que foi exemplo paradigmático o discurso de ontem do Sr. Primeiro-Ministro, não conseguem desmentir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao analisar os resultados das eleições de Outubro de 1985, o MDP/CDE afirmou que um Governo PSD sozinho «não reuniria
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condições mínimas de estabilidade que lhe permitissem enfrentar os graves problemas nacionais, ameaçado como estaria de moções de censura que o poderiam derrubar».
Hoje, pode dizer-se, além disso, que cada dia que passe com o PSD no poder será um passo atrás no caminho da resolução dos problemas nacionais e em que se agravam as dificuldades do futuro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A saída deste Governo vai obrigar à elaboração, tão rapidamente quanto possível, de um verdadeiro balanço sobre a situação política e social em que Cavaco Silva e os seus ministros deixaram o País.
É evidente que tal balanço servirá para desfazer muitas ideias erradas e para destruir, sem dificuldade, toda a teia de inexactidões que o Governo do PSD foi anunciando como sendo verdadeiras, numa manipulação ilegítima dos órgãos da comunicação social, nomeadamente da televisão.
A sua propaganda tem de cessar e será inadmissível imaginar-se que, derrubado o Governo, este, enquanto Governo de gestão, utilize, impune e indiscriminadamente, os órgãos do poder para continuar o seu lamentável elogio que não corresponde à realidade dos factos.
Todos nós, partidos que se opõem ao Governo, temos necessidade de uma pedagogia democrática que tarda em ser aplicada. As nossas responsabilidades são acrescidas porque a sociedade portuguesa se encontra numa situação muito, mas mesmo muito, grave e que encena na sua génese perigos reais para o regime democrático.
Rodeado de propaganda irresponsável e manipuladora da opinião pública, nomeadamente de grandes estratos da população que não se encontram devidamente informados e esclarecidos, Cavaco Silva e o seu elenco governamental, para além da mentira continuada, induzindo em erro a boa-fé dos Portugueses, foi criando, através de uma actuação antidemocrática, um bloqueio que, a não ser rompido, pode concorrer para a criação de gravíssimos problemas idênticos aos existentes antes do 25 de Abril. O País, o povo português não aceita, não quer mais autoritarismo, mais autocracia, mais repressão. O derrube do Governo do PSD é já uma medida pedagógica, uma medida salutar que pode travar os condicionalismos que estavam a ser colocados contra o Portugal democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando, com serenidade e com seriedade, se proceder ao balanço da verdadeira situação em que o governo do PSD, o governo de Cavaco Silva deixou o País muitos portugueses vão ficar surpreendidos.
Iludidos na sua boa-fé, grande número de cidadãos, de democratas, acreditou e julgou poder acreditar nas virtualidades deste Governo. Não os condenamos, porque foram enganados. Quando tomarem conhecimento da realidade então terão possibilidade de confirmar que a oposição ao Governo estava, como está, dentro da razão, que a oposição não derrubou o Governo por capricho, mas apenas devido ao seu alto sentido das responsabilidades, ao seu alto sentido patriótico.
Governantes sem qualquer sentido de Estado ainda agora, em plena moção de censura, chegaram ao extremo, como Cavaco Silva, de lançar processos de intenção e de ofender gravemente a figura e a personalidade do Sr. Presidente da República.
E mesmo durante o debate, Cavaco Silva e os Ministros, o das Finanças e o de Estado, insultaram este órgão de soberania, insultaram os Deputados com palavras próprias de quem não aceita as regras democráticas. Cavaco Silva e o elenco que o acompanha refugiaram-se ao insulto, já que foram incapazes de, com elevação de responsabilidade - já nem lhes pedimos sentido de Estado - foram incapazes, dizia, de rebaterem, porto por ponto, os argumentos bem fundamentados dos parlamentares da oposição.
Não quis o Governo, nem na sua agonia, dialogar com profundidade, tentar convencer com credibilidade. Não! Manteve sempre uma postura antidemocrática.
Foi um Governo não dialogante.
Foi um Governo conflituoso.
Foi um Governo autoritário e intolerante.
Foi um Governo incompetente para solucionar os graves problemas Sociais que se deparam aos Portugueses.
Prejudicou o País.
Foi um Governo incapaz.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, como em 1985, o MDP/CDE sublinha que o País precisa de uma nova orientação política, que então caracterizou nos seguintes traços essenciais: defesa da independência nacional e da nossa autonomia de decisão; valorização das potencialidades do País nos seus aspectos humanos, naturais e produtivos; combate à corrupção, à irresponsabilidade e à incompetência; retorno pleno aos ideais democráticos e de justiça social da Revolução de Abril.
Hoje, como eu 1985, o MDP/CDE defende como objectivos prioritários de uma política de desenvolvimento socioeconómico: a elevação da qualidade da vida do povo português, particularmente das camadas mais desfavorecidas, mediante a progressiva melhoria da satisfação das necessidades básicas; a recuperação do aparelho produtivo nacional, baseada na resposta ao mercado interno e na diversificação das exportações; a redução da dependência externa, com particular incidência nos domínios alimentar, energético, dos transportes e dos bens intermédios e de consumo.
Hoje, como em 1985, o MDP/CDE define como linhas de força dessa política económica: o aumento da produção, predominantemente dirigido para a substituição das importações e valorização dos recursos nacionais; a redução progressiva da dependência tecnológica e busca de um novo posicionamento na divisão internacional do trabalho; o reconhecimento da imperiosa necessidade de planear o desenvolvimento económico-social numa perspectiva de longo prazo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A alternativa ao Governo PSD capaz de pôr em prática a nova orientação política de que o País carece pode e deve ser procurada no quadro deste Parlamento.
A legitimidade constitucional do novo Governo depende, óbvia e exclusivamente, da vontade conjugada do Presidente da República e do Parlamento.
Não são necessárias, nem benéficas, para o País eleições antecipadas.
É, no entendimento das forças políticas, à esquerda do PSD que reside a alternativa de governo consentânea com o sentido de voto maioritário do povo português manifestado nas eleições legislativas e presidenciais de 1985-1986.
É, neste entendimento, avalizado pelo Presidente da República, que reside a viabilização de uma política de liberdade, de progresso, de justiça social e de estabilidade.
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Concretizar esta solução é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma responsabilidade partilhada e comum.
O MDP/CDE saberá assumir a sua quota-parte nesta importante responsabilidade.
Aplausos do MDP/CDE e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para intervir em nome do Grupo Parlamentar do CDS, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.
O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Por decisão meditada, e depois de ouvir os discursos, respectivamente, pronunciados pelos representantes do partido responsável pela moção de censura e a resposta do Primeiro-Ministro em nome do Governo, o CDS não teve intervenção no debate.
Isto foi assim porque, no entendimento do nosso partido, cujo voto já muitos tiveram o cuidado de salientar que não tem peso na decisão que vier a ser tomada pelo Parlamento, afirmação que aceitamos apenas como tecnocraticamente certa, esperávamos que tais intervenções balizassem uma meditação profunda sobre a relação entre a crise suscitada e os interesses de Portugal.
Infelizmente, pareceu-nos antes que, no essencial, houve apenas uma censura e outra censura à censura, uma questão principalmente entre duas formações políticas, quase um debate entre a árvore e o seu primeiro fruto, e também um ensaio eleitoral.
Estando nós sem responsabilidades no Governo, sem responsabilidades na definição do sistema vigente, que combatemos, sem clientelismos, sem interesses dispersos pelas múltiplas gestões e assessorias que nos administram, dependentes dos instrumentos da comunicação social, que nenhum deles é nosso, humanamente atreitos a dúvidas e a enganos, porque não existem vozes que nos falem do alto, modestos mas sem nenhuma humildade, detestando por isso a arrogância, também supomos que estas circunstâncias nos dão uma independência maior para avaliar a situação em que todos, Portugueses, nos encontramos.
Que a moção de censura apareceria não foi surpresa para ninguém, em vista do agravamento conflitual da relação entre o Governo e a Assembleia da República, e neste mesmo debate foi utilizada uma linguagem que abrange todos os deputados e toda a Câmara, sem ter ocorrido a quem a usa que magoa indevidamente portugueses escolhidos por igual método para as funções que exercem, entre o mesmo povo que representam, e que não é crível que esse cortejado eleitorado tenha arrumado para uma só banda uns poucos escolhidos entre todos os chamados. O nosso humanismo cristão leva-nos a repetir que a causa da nossa instabilidade está no sistema que combatemos, e que as preocupações semânticas com a escolha das palavras, que não podem ser ouvidas sem repúdio, seriam mais utilmente substituídas por um esforço, que não foi feito, no sentido de alterar, como advogamos, o sistema que se vai consolidando à medida que se enraízam os interesses, nem sempre legítimos.
Este juízo sobre a marcha das relações entre os órgãos da soberania é que nos levou a chamar nesta Câmara a atenção do Governo para a necessidade, decorrente dos tratados, de promover este ano as eleições para o Parlamento Europeu, fora das paixões que sempre despertam as eleições internas e dando a todo o eleitorado a consciência, que ainda não tem, por falta de informação, no novo país que somos em consequência da entrada nas Comunidades Europeias. As eleições gerais, quando viessem, seriam guiadas por motivações assumidas e ponderadas sobre a realidade nova e o esclarecimento ideológico, que não temos em Portugal, a julgar pelas relações das formações políticas internas com as formações políticas do Parlamento Europeu, seria de grande conveniência para o interesse geral.
Parecia-nos que qualquer responsável poderia entender isto e dar uma resposta activa imediata, pelo menos quando tal necessidade foi depois enunciada pelo próprio presidente do Parlamento Europeu, desta vez com maior realce noticioso em Portugal.
Tratava-se ainda da estabilidade governativa, que sempre defendemos e pela qual fizemos sacrifícios partidários, pensávamos ainda uma vez na proeza modesta, que não conseguimos desde 1974, de obter um governo de legislatura, e nos custos pesados que uma mudança governamental tem sempre para os cidadãos como contribuintes, e para os interesses gerais da comunidade nacional, cada vez mais obrigada a responder à interdependência estrutural do mundo que não escolhemos e à interdependência jurídica internacional pela qual optámos, mas parecendo consentir em que o sistema nos debilite e faça crescer a dependência, na medida em que se atrasa a criação da estabilidade interna e da confiança, sem as quais não daremos o anunciado salto em frente que nos retire da cauda da Europa.
O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Queremos que fique claro e que o País o saiba, se isso for consentido pelo sistema, que o CDS fez tudo quanto estava ao seu alcance em favor da estabilidade governativa, sem qualquer benefício partidário, antes pelo contrário.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, desencadeada a presente crise, resistimos às pressões, evidentemente organizadas, para dizermos publicamente a nossa posição antes de cumprirmos o dever de ouvir todas as instâncias partidárias do arco constitucional que não consideraram despiciendo falar com o CDS, que tão repetidamente se proclama não pesar na votação. A nossa conclusão foi, depois de se pronunciarem, institucionalmente, todos os órgãos do partido - e sem vozes do norte -, que devíamos votar contra a moção. Entendemos que foi apresentada em tempo errado e em circunstâncias inaceitáveis. Uma crise desta natureza não se desencadeia na ausência do Presidente da República, em visita de Estado ao Brasil, sem poder exercer a sua institucional função de prevenir e controlar a evolução da mesma.
Embora a Constituição não preveja a moção de censura construtiva, uma crise destas não é aceitável, em nosso juízo, sem uma alternativa organizada com viabilidade minimamente crível. Uma crise destas não se provoca quando estão pendentes interesses internacionais do Estado que exigem um governo de competência plena.
Vozes do CDS: - Muito bem!
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O Orador: - É o sentido da responsabilidade demonstrado na oposição que torna críveis as formações políticas para assumirem responsavelmente o Governo, e por isso compreendemos as hesitações do Partido Socialista, que sempre tratámos como a alternativa dentro do arco constitucional que possuímos e que nessa posição temos interesse em que se mantenha como força europeia que se oponha ao frentismo de esquerda, contra o qual alertámos o País desde as últimas eleições presidenciais, obtendo então como resposta, de interessados na campanha, um inglório esforço de ter graça com problemas sérios.
Este frentismo de esquerda, assumido claramente pelo Partido Comunista Português, coincide com uma ofensiva soviética contra a solidariedade europeia e a consistência da NATO, que vai muito para além dos desejáveis acordos sobre o desarmamento. O hábil novo secretário-geral da URSS tem, entre nós, mais tempo de antena gratuito do que qualquer formação política interna do arco constitucional democrático; são afirmados largamente nos meios de comunicação, e sem crítica, escândalos atribuídos à maior força espiritual do Ocidente em coincidência com a postergação de direitos de órgãos fundamentais de comunicação da igreja católica.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Um oficial português com a maior das graduações possíveis toma parte activa nessa estratégia indirecta em curso contra os interesses portugueses e ocidentais sem que o Governo pareça dar-se conta de tudo isto e sem que, ao menos, se incomode a dar resposta à pergunta simples que lhe fizemos e procura saber quem autorizou o referido oficial.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Por tudo isto, o CDS, que não conta para a votação desta censura, como tão larga e repetidamente tem sido divulgado pelas fontes sempre fidedignas e sempre anónimas que se ocupam da sua diminuição, fará tudo o que estiver ao seu alcance para impedir que as forças comunistas entrem na área do poder, porque queremos ser portugueses que evoluem livremente, dentro da sua herança histórica, que é europeia, ocidental e cristã. Por isso, não temos dúvidas sobre que a campanha do voto útil e do providencialismo carismático prejudicam gravemente os interesses portugueses e favorecem os interesses que lhes são contrários.
Vozes do CDS: - Muito bem!
O Orador: - Do que precisamos é de um sistema viável e de votos em programas e não em pessoas.
Pela estabilidade governativa em moldes ocidentais e contra o frentismo de esquerda, não tendo conseguido a primeira e sendo evidente a ameaça do segundo, temos de definir as responsabilidades que a crise evidencia, e neste ponto aconselhamos as fontes fidedignas, e sempre anónimas, a consentirem que os Portugueses se ouçam com exactidão uns aos outros. A luta pelo poder não justifica tudo e, neste caso, o interesse nacional, que vem antes de todos os outros, exige tal exactidão.
Em primeira lugar, é imperativo que os Portugueses saibam claramente que a decisão que vai orientar a saída da cr se só pode ser tomada pelo Presidente da República, que este não está no País, que não pode ir escutando e avaliando as opiniões dos órgãos que é obrigado a consultar, e que não vale a pena estar aqui a dar por assente que a decisão será uma ou será outra e a adjectivar previamente a decisão que lhe cabe.
O único facto certo é que, votada favoravelmente a moção, o Governo está demitido e que, independentemente de dúvidas constitucionais, já levantadas, parece-nos que, política e eticamente, vai ser necessário investir outro ainda da mesma origem, porque ao actual será retirada a confiança indispensável da Assembleia da República.
Está demonstrado que os governos minoritários duram pouco, e o actual, na experiência europeia, fez a proeza de durar mais do que a média corrente.
O Governo do PSD parece dar por assente que teremos eleições gerais e, assumindo o seu pressuposto, o CDS tem de dizer claramente, não em inexistentes longas cartas que fontes fidedignas e anónimas fizeram anunciar, mas aqui e ao PSD, o seguinte:
Primeiro, o CDS está convencido de que nenhum partida obterá sozinho uma maioria absoluta, que nenhum pode ter isso por axiomático, embora qualquer um seja livre de partir desse pressuposto;
Segundo, que a luta contra o frentismo de esquerda não é monopólio de nenhum partido, que o CDS tem esse dever como próprio e inalienável e que não o transfere nem condiciona a decisões exteriores;
Terceiro, que, se tivermos eleições gerais, é dever dos partidos que assumem o legado político ocidental contra o frentismo de esquerda unirem-se num programa claro, para que o País, finalmente, se institucionalize e não se perca uma oportunidade histórica com isolacionismos que excedem os riscos patrioticamente aceitáveis;
Quarto, desse programa devem constar as reformas estruturais que um Governo minoritário não consegue fazer, como está demonstrado, designadamente o acordo para a revisão constitucional que mude o sistema, as leis fundamentais sobre a privatização viável do sector público, a política agrária que unifique o País num regime legal único, a legislação laboral que reanime a economia e diminua os vigentes constrangimentos da juventude, a reforma do sistema educativo, a marcha livre para uma vida europeia, independente e respeitadora da identidade portuguesa.
A decisão, no caso de haver eleições, não pode esperar; o nosso esforço foi até ao limite alcançável; a responsabilidade por uma solução diferente não será nossa. Tudo isto é dito dando por aceitável que o Governo está certo quando entende que haverá eleições. Mas com eleições gerais ou sem elas, com resposta ou na falta dela, o CDS manterá a sua liberdade e cumprirá o seu dever de lutar pelos princípios que sustenta em quaisquer circunstâncias que a realidade imponha, porque tem de lutar, até ao limite das suas forças, pêlos
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valores em que acredita, o primeiro dos quais é Portugal, e no cumprimento desse dever está apenas empenhado à moral de responsabilidade, de que não abdica.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para intervir em nome da bancada do PCP, o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate sobre a moção de censura apresentada pelo PRD pôs, mais uma vez, em evidência o já proverbial isolamento do Governo PSD/Cavaco Silva neste hemiciclo. O Governo cai isolado, como vinha vivendo.
É importante que o País saiba que não se trata de uma situação ocasional nem recente, é uma situação que se verifica praticamente desde o início da segunda sessão legislativa, há seis meses a esta parte, em quase todas as questões mais importantes que passaram pela Assembleia da República.
Ao contrário do que o Governo pretende fazer crer, a apresentação da moção de censura não abriu uma «repentina crise». A crise está latente há muitos meses e o Governo é o seu principal responsável.
Não é a queda do Governo que é artificial. Artificial era a impunidade com que o Governo vinha desenvolvendo a guerrilha institucional contra a Assembleia da República, a ocupação partidária, metódica e sistemática de todos os lugares importantes na Administração, no sector público da economia e na comunicação social, a instrumentalização acelerada dos meios e dos recursos do Estado para os planos eleitoralistas do PSD e a intensificação da actuação ilegal contra as empresas públicas e a reforma agrária.
Artificial seria a aceitação por parte dos partidos da oposição democrática, que contam com larga maioria na Assembleia, da atitude de afrontamento e subversão por parte de um Governo que conta apenas com o apoio de 88 dos 250 deputados.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A aprovação da moção de censura não é uma acção desestabilizadora, como o Governo pretende fazer crer. Pelo contrário, é um acto para a normalização democrática da vida institucional. Ele torna-se necessário tanto para pôr cobro à rebelião do Governo, à sua atitude de afrontamento com a Assembleia e à sua acção ilegal e prepotente, como para substituir a sua política nefasta por uma política democrática, capaz de aproveitar, em benefício do nosso povo e do nosso país, a presente conjuntura externa extremamente favorável.
O Governo julgava-se em completa impunidade. O Primeiro-Ministro gabou-se a um jornal estrangeiro que, embora sendo minoritário, governava «como se dispusesse de uma maioria no Parlamento», «sem ter que negociar o apoio dos partidos». Vangloriou-se mesmo, também ao mesmo jornal, dizendo que a confrontação entre o Governo e a oposição parlamentar se saldava por um aumento da popularidade da equipa que dirigia.
Isto é falso, mas com tais pressupostos e com tais convicções não admira que o Governo tenha intensificado continuamente o afrontamento e o desrespeito
pela Assembleia da República e pelas suas leis, atingindo proporções inadmissíveis, ultrajantes e altamente perigosas para o regime democrático.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O Governo não cumpriu a legislação aprovada pela Assembleia da República que o obrigava a baixar os preços dos combustíveis, o que poderia ter tido efeitos altamente incentivadores no relançamento da economia. Não quis cumprir a lei da Assembleia contra os salários em atraso. Recusou-se a aplicar as disposições aprovadas pela Assembleia da República visando a baixa do preço do leite e não aproveitou as condições para baixar o preço do pão, como por parte da Assembleia lhe foi recomendado.
Mas o Governo também não cumpriu até agora as disposições aprovadas no último Orçamento do Estado pela Assembleia, tendo em vista o aumento das reformas e pensões mínimas da segurança social, nem a lei que facilita o acesso ao exercício da profissão por pane dos pescadores.
O Governo não deu execução e até perverteu leis positivas como: a lei de bases do sistema educativo, a lei sobre alienação das empresas públicas de comunicação social, as leis que alteram o regime de extinção da Empresa Pública de Parques Industriais e o IACEP, a lei da profissionalização de professores.
Repare-se: um cidadão que desrespeita e não cumpre as leis é punido por elas, e o que deve acontecer a um governo a quem cabe dar o exemplo do respeito pela legalidade?
Bastaria isto para que não pudessem verificar-se quaisquer hesitações, entre os partidos democráticos, para aprovar a moção de censura.
Aplausos do PCP.
Mas o Governo tem usado outras formas de ultrajar a Assembleia da República, apresentando, como suas, decisões e iniciativas aprovadas pelos partidos da oposição, muitas vezes com o voto contra do partido do Governo. É, por exemplo, o caso recente da criação de um subsídio aos jovens à procura do primeiro emprego, que a Assembleia aprovou em Dezembro, no último Orçamento de Estado, e que o Governo pretende agora fazer passar como coisa sua.
Vê-se quem se preocupa verdadeiramente com a juventude e os seus problemas e quem se limita a ter acção parasitária, fazendo de conta que faz trabalho sério.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O Governo proclama como um dos seus méritos a acção estabilizadora. Nada mais falso! O Governo tem tentado fomentar e suscitar graves tensões e conflitos no seio da nossa sociedade. Foi o conflito entre os chefes do PSD nas regiões autónomas e as Forças Armadas, a propósito dos símbolos nacionais, em que o Governo procurou envolver a Assembleia da República; foi a tentativa de opor a Assembleia da República à Igreja católica, tentando provocar artificialmente uma questão religiosa; é agora a tentativa de criar uma guerra de gerações, quando o Governo diz aos jovens que, se querem emprego, devem apoiar uma lei dos despedimentos que leve ao despedimento dos seus próprios pais.
Vozes do PCP: - É um escândalo!
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O Orador: - O que isto prova é que o Governo não tem resposta para o desemprego juvenil, como não tem resposta para o numerus clausus e para outros graves problemas que afectam a juventude.
O Sr. Primeiro-Ministro advogou ontem a tese de que a Assembleia deveria suportar os seus atropelos à legalidade, o seu autoritarismo, as suas desconsiderações e ultrajes a ti oco da alegada boa acção governativa que vinha desenvolvendo. Os discursos do Primeiro-Ministro são inadmissíveis relambórios de gabarolice e auto-elogio.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. António Capucho (PSD): - Não apoiado!
O Sr. João Amara) (PCP): - Apoiado!
O Orador: - Diz o nosso povo: elogio em boca próprio é vitupério, mas pelos vistos o Sr. Primeiro-Ministro conhece pouco a sabedoria popular.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A verdade é que a sua acção governativa não só não resolveu nenhum dos grandes problemas nacionais como, pelo contrário, tem agravado muitos deles.
Em relação à situação económica, a diminuição da inflação, a relativa melhoria nas contas externas e uma certa reanimação do investimento não se devem aos méritos do Governo. Devem-se a uma conjuntura muito favorável resultante da queda do dólar, da baixa dos preços do petróleo, cereais e outros produtos alimentares, de que somos grandes importantes, e ainda da diminuição das taxas de juro externas. O que importa que o País saiba é que com uma tal conjuntura, que não se verificava há 20 anos e que provavelmente não se registará tão cedo, se poderia e deveria ter feito muito melhor se outro fosse o governo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Falando concretamente, a inflação poderia ter sido inferior se se tivessem repercutido nos preços internos as baixas das cotações internacionais do petróleo e dos cereais e se se tivesse limitado a taxa de crescimento dos lucros de capital. Em relação às contas externas os resultados poderiam ter sido muito melhores se o aumento da procura interna tivesse sido satisfeito fundamentalmente pelo aumento da produção nacional, como exigiam os interesses do País, e não através do aumento considerável das importações, como se verificou, com a liberalização destas por parte do Governo.
Quanto ao investimento, o crescimento modesto de 9% que o Governo apresenta, depois da queda profunda de 30 % verificada nos dois anos anteriores, ficou a dever-se, ainda assim, em grande parte ao investimento público e não à iniciativa privada, o que comprova à evidência o fracasso da política do Governo. Mas o aumento do investimento poderia ter sido muito maior se não fosse a política governamental de ataque e destruição das empresas públicas, se em vez de se brincar com a baixa da taxa de juro se tivesse verificado uma verdadeira baixa a tempo e horas, se o Governo tivesse uma clara política de desenvolvimento capaz de canalizar para o investimento os meios que se desviaram para a especulação bolsista.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Esta mesma atitude tornou ainda mais graves as consequências da adesão à CEE, que sempre seriam prejudiciais para o nosso país.
O fracasso da política económica do Governo é testemunhado pela procissão das empresas, que se afundam em dificuldades, suspendem a laboração, despedem e caminham para a falência sem que novas unidades produtivas surjam para substituí-las.
O fracasso da política económica do Governo tem causas profundas das suas próprias opções a favor do grande capital e dos grandes interesses estrangeiros no nosso país, em prejuízo dos verdadeiros interesses nacionais.
É particularmente escandalosa a forma como o Governo oferece agora à voracidade dos grupos económicos o repasto das participações do sector público em milhares de empresas e queria entregar, de mão beijada, uma das partes das mais lucrativas da Rodoviária Nacional, e que acaba de ser impedido por decisão do Tribunal Constitucional.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
Na situação social, diga o Governo o que disser, o que avulta é a manutenção do desemprego, a continuação da chaga dos salários em atraso, que, segundo os próprios números governamentais, continua a abarcar cerca de 50 000 trabalhadores, a generalização dos contratos a prazo, a precarização do emprego, a exploração odiosa do trabalho das crianças, o reaparecimento de zonas de pobreza.
Em nenhum destes domínios o Governo apresenta qualquer resultado minimamente positivo e várias destas anormalidades sociais expandiram-se na vigência deste governo. É o caso do trabalho infantil e da generalização do trabalho clandestino.
É espanto; o que o Sr. Primeiro-Ministro não tenha tido uma só palavra para estas dolorosas realidades, o que reflecte bem a secura desumanizada como concebe a actividade governativa. Gabou-se dos aumentos de salários.
Mas os aumentos de salários não se ficaram a dever a qualquer dádiva do Governo, devem-se apenas à luta dos trabalhadores contra a política de tectos salariais que o Governo pretendia impor.
Aplausos do PCP.
O que importa esclarecer, também, e que o fenómeno mais característico em matéria salarial do ano de 1986, apesar da conjuntura externa tão favorável, foi que a parte do trabalho no rendimento nacional diminui de 47% para 43%.
A política do Governo desenvolvida em todas as áreas da vida nacional não amnistia minimamente os seus excessos em matéria de afrontamento institucional e de actuação ilegal e prepotente. Confirma-as em toda a linha e constitui, ao contrário do que o Governo pretende fazer crer, a razão principal pela qual deve ser censurado, demitido e substituído.
O Sr. Primeiro-Ministro apareceu aqui na Assembleia da República, que é o órgão de soberania representativo de todos os Portugueses a pretender falar, ele e
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só ele, em nome do povo português. O partido do Primeiro-Ministro só teve 30% dos votos nas últimas eleições. Perante a Assembleia da República é essa e só essa a sua representatividade. Não lhe reconhecemos nenhum mandato providencial. Temos até uma amarga experiência dos chamados homens providenciais. Alguns deles são mesmo os principais responsáveis pelo nosso atraso e pela opressão que o nosso país sofreu.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro tentou também, logo que foi apresentada a moção de censura, dar o seu veredicto. Considerou ilegal um acto democrático e legítimo e também ousou dizer que, segundo ele, «fazer um outro Governo sem recurso a eleições seria uma fraude».
É uma atitude que não tem nenhum fundamento constitucional e para a qual o Primeiro-Ministro não tem nenhuma competência especial.
Repare-se que o Sr. Presidente da República, por altura do 1.º aniversário da sua eleição, afirmava linearmente:
É no Parlamento que se formam os Governos e se derrubam, de acordo com as indicações do voto popular e com a relação de forças que se estabelece na Assembleia.
Parece-nos oportuno, pela nossa parte, dizer agora que no entender do PCP a aprovação da moção de censura e a consequente queda do governo PSD/Cavaco Silva não pode ser tomada como atitude ocasional, significa a condenação de uma solução e de uma política que não se querem ver retomadas.
O debate destes dois dias foi muito importante: desfez intrigas, revelou consensos. O Governo queria dividir-nos, mas foi ele que ficou isolado e é ele que vai ser derrotado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O nosso quadro institucional é rico em possibilidades alternativas, mas cumpre reconhecer no final deste importante debate que aqui mesmo esteve sempre presente a possibilidade de se concretizar, a curto prazo, uma solução capaz de responder a alguns dos mais importantes problemas nacionais e que aproveite a conjuntura favorável em benefício do País, para o relançamento da economia e a melhoria das condições de vida do nosso povo.
Não percamos tempo.
A votação a favor da moção de censura é o primeiro passo para ganhá-lo.
No entender do PCP não basta porém votar a moção de censura é preciso estar disponível e trabalhar para que ela signifique a abertura do caminho para melhores dias. E o que pela nossa parte não deixaremos de fazer.
Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - Para intervir em nome do Partido Socialista, concedo a palavra ao Sr. Deputado Jorge Sampaio.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O Partido Socialista apresenta-se hoje neste hemiciclo com serenidade, responsabilidade e de consciência tranquila.
Esta Câmara é a mais qualificada testemunha colectiva de como sempre os socialistas definiram com clareza a sua oposição frontal e responsável ao governo minoritário do PSD.
Votámos contra o Programa deste governo.
Votámos contra a confiança que o Governo solicitou
Votámos contra a proposta do Plano anual e do seu indissociável esquema financeiro de curto prazo, que é o Orçamento do Estado, por incompatíveis com as necessidades, as possibilidades existentes e a transparência. Contribuímos de forma decisiva para a derrota do Governo, que se consubstanciou na retirada da agenda, por sua iniciativa, das Grandes Opções do Plano de médio prazo, afinal ressuscitadas agora, em clara afronta democrática à instituição parlamentar e às suas competências e à Constituição, peia via de resolução do Conselho de Ministros.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sempre que estiveram em causa a filosofia, os objectivos de fundo, a ideologia, a discricionariedade, a sobranceria, a arrogância, a conflitualidade tornada objectivo, a incapacidade negociai deste governo minoritário, os socialistas estiveram clara e legitimamente contra.
Ninguém o ignora e muito menos o Governo.
Fizemo-lo em nome da nossa filosofia democrática, da nossa ideologia, do nosso apego a valores que este governo ignora, tais como a transparência, a tolerância e o diálogo e, direi mesmo, a fraternidade necessária entre os Portugueses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por razões, pois, que têm a ver com a essência e a substância das coisas - e essas são a base da nossa intervenção política - a disposição do PS tem sido sempre e continua a ser a de recusar a confiança política ao actual governo quando esta esteve e está em causa.
Este debate e a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro só reforçam o nosso posicionamento de fundo sobre este governo. Mantém-se, pois, a orientação do PS no sentido de recusar essa confiança e votar favoravelmente a moção de censura.
Tudo isto que temos vivido revela, uma vez mais, três questões da sociedade portuguesa que o posicionamento do Governo e a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro reavivaram de forma inegavelmente grave.
Trata-se da questão cultural, da questão política e da questão institucional.
A questão cultural, da cultura como expressão democrática da vida de um povo na sua complexidade e riqueza, tem necessariamente de ser a matriz essencial e profunda de avaliação de quem assume ou exerce o poder.
A cultura democrática plasma-se em comportamentos, em posturas individuais e colectivas, na vida das instituições, no relacionamento entre umas e outras, na forma e capacidade de resolução de conflitos. A cultura democrática não é uma forma, ou apenas um
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espectáculo em si mesmo redutor. É antes a substância ou a envolvente decisiva com que os povos se unem, os consensos nacionais se estabelecem, os dinamismos sociais se fortalecem para as grandes tarefas nacionais.
E esta não é uma questão de somenos no Portugal de hoje. Não haverá progresso nem dinamismo nacional assumido sem cultura democrática, à sua revelia ou contra ela.
Não haverá modernização sem justiça nem solidariedade.
Mas não haverá nenhuma delas sem que as energias nacionais para o progresso se mobilizem num quadro cultural democrático, em que a diversidade é uma riqueza insubstituível e o unanimismo, porque medíocre, uma doença mortal contra a Nação e o seu povo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Perante este corpo de valores, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª reprovou, diria mesmo que prescreveu.
Acentuo que o digo com todo o respeito, que é em mim uma norma habitual de comportamento.
A questão não merecia referência especial se V. Ex.ª fosse uma pessoa qualquer. Sucede que V. Ex.ª tem sido o Primeiro-Ministro de Portugal, do Portugal democrático saído do 25 de Abril, erigido, com tanto suor, lágrimas, contradições e dificuldades, após décadas de autoritarismo e de silêncios.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª, no seu comportamento e no seu discurso, utiliza o populismo demagógico como fonte de legitimidade política; pretende que a sua verdade seja sinónimo do interesse nacional; concebe o diálogo, que não pratica, como uma propaganda de sentido único; V. Ex.ª não sabe que a busca esforçada de consensos ou a resolução de conflitos pela síntese possível e necessária é quase sempre a única saída disponível em democracia.
V. Ex.ª equipara o funcionamento normal dos partidos democráticos, mediadores que são na instância política de anseios nacionais multiformes, a «jogadas» desprezíveis ou, o que é pior, a instrumentos de chantagem ou de prossecução de fins inconfessáveis perante os detentores da verdade, que seriam V. Ex.ª e o seu Governo.
V. Ex.ª quer - não faz mesmo outra coisa - dividir os Portugueses entre os bons e os maus, sendo os primeiros o seu Governo e os seus respeitosos seguidores e sendo os últimos todos aqueles que têm a veleidade - pasme-se - de se interrogar, de criticar, de propor alternativas, de aspirar a uma justiça de sentido múltipo, de pretender afinal o aprofundamento e a vivência democráticos.
V. Ex.ª, com ressonâncias profético-messiânicas, apela ao povo contra a Assembleia da República, como se a sua legitimidade não lhe viesse também desta, como se o Parlamento democrático não constituísse a essência da representação nacional, afinal do povo que temos. V. Ex.ª põe em causa a legitimidade desta Assembleia, sem com isto perceber - o que é sintomático - que está a fazer o mais grave ataque aos próprios fundamentos do regime que V. Ex.ª é suposto defender.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - V. Ex.ª confunde exercício do poder com arrogância, V. Ex.ª assimila o normal funcionamento dos direitos parlamentares, essenciais na nossa vida colectiva, i sinistras prerrogativas com ínvias motivações; V. Ex.ª equipara o patriotismo a si próprio, como se precisássemos de voltar atrás para lhe relembrar que, afinal, somos todos portugueses e que em circunstâncias difíceis muitos sofreram por isso e o não esquecem. Não o esquecem mas também o não reivindicam! V. Ex.ª, não se dá conta que a Nação é plural e o povo é democrático, quer progresso e justiça, mas não quer salvadores.
Vozes do PS e do MDP/CDE: - Muito bem!
O Orador: - Em democracia, V. Ex.ª não é o Estado. O Estado e o Governo são formas institucionais de organização do povo. Querer estar acima do Estado ou fora dele é estar fora ou acima do povo.
É isto, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, que não lhe consentiremos. Por todas as razões. Mas também porque não vemos possível que desse modo, a partir dessa base, se avance para o progresso, para a justiça e para a modernização num quadro democrático, único que permite a durabilidade do propósito e a coesão da Nação que temos. Poder democrático e arrogância são sempre incompatíveis.
Agora a questão política.
Este Governo leve sempre da democracia uma noção sumária e redutora. Teve sempre a maior dificuldade em entender que a oposição existe legitimamente para se opor.
Em vez de governar como lhe cumpria, ocupou-se muito mais em fazer oposição à legítima oposição parlamentar.
O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Muito bem!
O Orador: - Apanhou a boleia de uma conjuntura económica externa invulgarmente favorável, se não mesmo - e isso é que é grave - irrepetidamente favorável, e passou o teu pó a subaproveitá-la. A sua obsessão, o seu passatempo e o seu objectivo foram o de fazer a guerra ao Parlamento, por ver nele um crítico e um obstáculo. Fez-lhe guerra pela simples razão, em si mesma normalíssima, de o Parlamento não abdicar de cumprir o que é o seu dever em qualquer regime democrático.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Este governo quis afinal realizar um compromisso, em o mesmo impossível, entre a valorização de um governo de um só partido, pela via do relacionamento com um Parlamento que se desejou silenciar e pela guerra institucional que aquele sistematicamente lhe moveu.
Não conseguiu nem uma coisa nem outra.
À notória incapacidade que demonstrou para o relacionamento democrático constitucional com o Parlamento - em si mesmo potencial geradora de uma pré-rotura - somaram-se quer o desaproveitamento da conjuntura para a modernização pela via das reformas estruturais quer a clara impossibilidade de mobilizar os Portugueses para elas.
O real objectivo do governo do PSD - cada vez mais claro e óbvio - não era exactamente o de governar pela via da escolha das opções viradas para o
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futuro, mas o de tudo preparar para umas eleições em que pudesse - com a propaganda ajudando - tirar partido do que o petróleo e o dólar fizeram. Tratou--se sempre de conceber as coisas e as acções para evitar o risco de a opinião pública se aperceber de que, ao contrário do pretendido, é o Governo que deve muito ao País por tudo quanto poderia ter feito e não fez.
Uma voz do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Pelas razões culturais e políticas apontadas, e por óbvias exigências democráticas, cabia ao Governo alterar o seu comportamento institucional, cabia-lhe não só assumir o compromisso de discutir os problemas de fundo como também o de aceitar publicamente realidades indiciadoras da mudança.
Foi por isso - por exigência democrática inadiável - que o PS formulou esse conjunto de pontos que, tendo em conta a situação que vivemos, visavam a essência da nossa vida democrática e o funcionamento das instituições. Foram apelidados de chantagem, com a arrogância e a sobranceria habituais. Mas nenhum desses pontos tinha a ver com partilhas do poder, com aspirações clientelares ou quaisquer desígnios específicos para benefício próprio nem com eles pretendia o PS abandonar o seu estatuto de oposição. Mas era ainda uma oportunidade para diálogo, uma exigência democrática afinal conforme à existência de um governo minoritário, que este podia e devia ter assumido.
A rejeição do Primeiro-Ministro, comunicada ao País antes mesmo de o ser ao PS, reforça-nos duas convicções que resultam da análise inevitável dos factos: a sobranceria e o patrocínio permanente do antidiálogo foram e são, uma vez mais, os instrumentos de que o Governo se serve para abrir caminho a eleições.
O Governo esteve na origem desta situação, por todo o seu comportamento anterior como governo. Mas agora está também tentado pela miragem egoísta e partidária de uns quantos votos mais.
O PS não deu pretexto àquilo que comummente se designa por crise (e antes deve ser considerado como um evento normal em vida democrática).
Não se nos peça agora o remédio para um governo que não somos, e a que sempre nos opusemos, para uma via que reprovamos, para uma atitude mental e política que sempre criticámos, para algo que não nos pode trazer a coesão nacional, o desenvolvimento e a paz democrática entre os Portugueses.
Umas palavras mais quanto à questão que se pode designar como a do funcionamento institucional.
Nunca estivemos dispostos a seguir, de forma automática, quem quer que seja ou qualquer iniciativa. Já o afirmámos repetidas vezes.
Agimos de forma responsável e democrática.
Chegou por isso o momento de uma resposta clara e inequívoca. Vamos dá-la com a profunda responsabilidade histórica de quem não foge aos desafios. Afinal, sempre acreditámos nos Portugueses.
É necessário relembrar que o PS está aberto a qualquer solução que corresponda aos interesses nacionais, considerados na sua complexidade e no seu pluralismo. A opinião pública pode e deve acolher, sem reservas nem suspeitas, a perspectiva de solução que vier a ser dada por quem representa o todo nacional e a quem, aliás, assiste constitucionalmente a competência para o fazer: o Sr. Presidente da República. É essa a posição de responsabilidade e de sentido do Estado em que nos colocamos. Nada disto tem a ver com a dependência. Simplesmente, não marcamos eleições.
A posição do PS é de abertura e colaboração para o encontrar de uma alternativa. Estamos disponíveis e preparados, quer para eleições, quer para uma solução no quadro deste Parlamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É tempo de dizer que a Nação vive. Que tem a sua dignidade, as suas esperanças seculares, afinal uma tradição de vida em consenso e em paz. Os Portugueses não são manipuláveis. Querem viver melhor, na solidariedade e na fraternidade, com o sentido de justiça que secularmente se lhes tem assinalado. Têm esperança no futuro. Tudo faremos para corresponder às suas necessidades de justiça e de progresso.
Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.
O Sr. Presidente: - Para intervir em nome do PSD, concedo a palavra ao Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros e Srs. Deputados: No debate que agora se encerra os partidos que declararam de início a sua intenção de aqui derrubar o Governo nada de novo acrescentaram ao que todos já sabíamos. Mas o debate permitiu evidenciar alguns pontos interessantes, que passo, resumidamente, a referir.
Ficou claro, em primeiro lugar, que a acção governativa nada tem a ver nem é fundamento credível para justificar a moção de censura apresentada. Os dados conhecidos sobre o comportamento da nossa economia em 1986, a acção do Governo no campo social e nos vários domínios sectoriais não justificam minimamente que o PRD, que até há bem pouco tempo elogiava globalmente o Executivo e o Primeiro-Ministro, tenha modificado a sua atitude colocando-se na posição diametralmente oposta.
Em segundo lugar, constatou-se que a moção do PRD visou de facto censurar e comprometer o maior partido da oposição, o Partido Socialista, no interesse, por conta e para júbilo do terceiro partido da oposição, o Partido Comunista.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O Cavaco já disse isso e melhor!
O Orador: - Destinou-se também a mostrar serviço, tarefa em que, de resto, o PRD tem sido exímio no plano parlamentar, não propriamente em qualidade, mas em exorbitante quantidade.
Destinou-se ainda a assegurar a efémera glória de se assumir ou exibir como partido supostamente liderante da oposição ao Governo, quando obviamente, de acordo com a solução que vier a ser encontrada para a crise, se ela se consumar, essa oposição continuará lamentavelmente a ser liderada pelo PCP (como até aqui) ou passará a ser liderada pelo PS se forem convocadas eleições legislativas antecipadas.
Em terceiro lugar, ficou demonstrado que não foi por mero acaso que o PRD escolheu este momento para avançar. Era o espaço ainda livre no calendário das iniciativas previsíveis dos outros partidos da oposição e, assim sendo, nada se preocupou em escolher a véspera da partida do Presidente da República para
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o Brasil, poucos dias antes da chegada a Lisboa do Presidente da República Francesa e a uma semana da partida do Primeiro-Ministro para a República Popular da China.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E de não sei a quantos dias antes do Natal! ...
O Orador: - Com este grande sentido de inoportunidade política, o PRD justifica que também se lhe impute a intenção de condicionar a solução eleitoral para a saída da crise que criou, com a invocação, que não deve tardar, de pretensos inconvenientes inultrapassáveis com a realização de eleições no início do período de férias.
Em quarto lugar, ficou evidenciado que o PRD se transtornou com a percepção das intenções de voto abissalmente decrescentes que lhe são atribuídas por inúmeras sondagens, provenientes de empresas que não temos por suspeitas, e publicadas, de resto, em órgãos de comunicação social de diferentes quadrantes.
Na perspectiva do descalabro eleitoral, preferiu antecipar-se e protagonizar um golpe político visando o acesso imediato ao poder, que afirma não o seduzir.
Finalmente, em quinto e último lugar, no que ao PRD concerne, e decorrendo logicamente das conclusões anteriores, o debate serviu para, de uma vez por todas, arrancar a máscara dos renovadores, pretensos arautos e expoentes da ética política, da coerência, da transparência e do interesse nacional e, afinal, manobradores da pequena política, embalados pelo interesse partidário.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Mas a conclusão fundamental a retirar deste debate, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é a de que os que estão dispostos a votar a moção de censura e consequentemente a derrubar o Governo não têm ainda a menor ideia, para além do bota-a-baixo, do que se segue!
Nós limitamo-nos a reiterar que é ilegítimo e absurdo qualquer outro governo no actual quadro parlamentar.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Politicamente ilegítimo, Srs. Deputados, e é isso que importa: não está obviamente em causa a legitimidade jurídico-constitucional.
Politicamente ilegítimo porque ninguém pode negar a evidência de que o PSD, desde Outubro de 1985, se reforçou como primeiro partido, que a quota de prestígio do Primeiro-Ministro e do Governo é a mais elevada desde o 25 de Abril, que a esmagadora maioria da opinião pública está contra o derrube do Governo e antes defende a estabilidade até ao final da legislatura.
A ser derrubado o Governo ao arrepio do que indubitavelmente é a expressão largamente majoritária do eleitorado, a instituição parlamentar será mais uma vez gravemente afectada no seu prestígio, já de si tão abalado pelos continuados excessos cometidos pela oposição no sentido da governamentalização da Assembleia da República.
Politicamente ilegítimo, ainda, porque o segundo partido, o PS, sofreu a mais pesada derrota e penalização da história eleitoral recente no nosso país e seria no mínimo imoral atribuir-lhe responsabilidades cimeiras no Governo sem prévia consulta aos eleitores.
Politicamente ilegítimo, finalmente, porque o actual líder do PS e também o actual líder do PRD jamais se submeteram ao sufrágio legislativo.
Aplausos do PSD.
O surrealismo político deste debate atinge aspectos porventura inéditos em toda a nossa agitada história parlamentar cie sempre.
O maior partido da oposição prepara-se para votar o que considerou inoportuno e irresponsável. Isto é, associa-se, pelo voto, à irresponsabilidade inoportuna e à inoportunidade irresponsável do PRD.
Para líder dos renovadores a legitimidade do Governo, apesar 3e minoritário, não oferecia dúvidas nem era discutível no acto da respectiva posse. Hoje, já entende que a legitimidade é duvidosa porque é minoritário. Como alternativa a este governo, privilegiam, tanto quando se percebe, outra solução necessariamente também minoritária e, portanto, em sua opinião, duvidosamente legítima!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Dirijo-me, paia terminar, a V. Ex.ª, e aos membros do Governo a que honrosamente preside e a quem o meu grupo pai lamentar tem dispensado um apoio que, não sendo incondicional, tem sido activo e entusiástico.
Começaria por felicitar V. Ex.ª por não ter embarcado na serôdia proposta de pretensas negociações sob pressão, apenas destinadas a limpar consciências ou a fornecer álibis.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Hoje, depois do êxito na concertação social e do que soube designadamente durante este debate, das iniciativas concretas do Governo visando o diálogo, fico j claríssimo quem é que nele não esteve interessado e objectivamente prosseguiu o afrontamento.
Mas, fundamentalmente, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de lhe dizer, em nome da bancada do PSD, e qualquer que seja o resultado da votação que se seguirá, que ninguém conseguirá apagar a história e negar a V. Ex.ª o mérito de ter já protagonizado como homem de Estado um papel determinante na projecção do nosso país para a modernidade da sua nova expressão europeia. No relançamento do prestígio internacional de Portugal e, fundamentalmente, no redespertar da confiança e do orgulho de sermos portugueses.
Esse papel, Sr. Primeiro-Ministro, não vai, obviamente, terminar hoje.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou a fase de debate, pele que vamos passar à fase de encerramento.
Nesse sentido, tem a palavra S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Segundo as declarações aqui produzidas, os partidos da oposição vão derrubar o Governo. Porquê?
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O povo português tem toda a razão para se interrogar.
Quem assistiu a este debate, não pode deixar de estar perplexo porque não surgiram motivos que justifiquem lançar o País numa crise política. Tenho pena, tenho muita pena, de que os Portugueses - todos os Portugueses - não tenham podido assistir na íntegra ao debate destes dois dias.
Aplausos do PSD.
Vozes do PCP: - Nós também!
O Orador: - Por que é que se derruba um governo que governa? Que trabalha afincadamente para resolver os problemas do País?
Vozes do PCP: - Porque o Governo governa mal!
O Orador: - É porque teve a ousadia de conseguir melhorar as condições de vida dos Portugueses e criar no País um clima de confiança que permite encarar o futuro com mais esperança?
É porque a maioria da população considera que a acção do Governo tem sido positiva e quer estabilidade?
É quando o País estava em paz e tranquilidade, a avançar, a avançar no caminho do progresso, que os Srs. Deputados decidem que é a hora de provocar uma crise política, de derrubar o Governo.
Desculpem que vos diga, mas é uma total irresponsabilidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não desculpamos!
O Orador: - Quando, no encerramento da campanha eleitoral de Outubro de 1985, me dirigi aos Portugueses, a minha promessa maior foi a de estar na política como sempre estive na vida: penso que só pelo trabalho o homem pode ir mais longe; penso que na política, tal como na vida, a seriedade, o rigor e a honestidade não podem ser nunca meras figuras de retórica mas uma atitude permanente; penso que a jogada habilidosa, a manobra política, não podem ser método para vencer e ultrapassar dificuldades.
Volvidos dezasseis meses, estou aqui, com o Governo a que presido, de cabeça erguida, de consciência tranquila, com o mesmo padrão de comportamento pessoal e político.
Em Outubro de 1985, o povo português, através de eleições livres e democráticas, expressou claramente a sua vontade: O PSD obteve uma nítida vitória eleitoral, e deveria passar a ser, inequivocamente, o motor da governação.
Nessa altura ninguém negou esta evidência. Dos próprios partidos da oposição - que manifestaram a sua inteira indisponibilidade para a construção de uma solução governativa com suporte maioritário nesta Assembleia - se ouvia: «O PSD ganhou as eleições; o PSD deve governar.»
Assumimos, assim, a responsabilidade de governar Portugal.
Aqueles que, no decurso dos últimos dias, falaram de uma maioria parlamentar existente nesta Assembleia não a descortinavam naquela altura. E de então para cá a composição da Assembleia não mudou ... o que mudou então?! ...
Por um lado, passaram muitos meses e os resultados eleitorais, que na altura eram frescos, foram varridos, por conveniência, da memória de alguns.
Por outro lado, naquela altura, era enorme a tarefa que se apresentava a um governo.
Fomos assim, por direito que ninguém negou - bem pelo contrário -, chamados a formar governo.
Dissemos sim, porque nos sabíamos com coragem para enfrentar as dificuldades. Dissemos sim, porque sabíamos que tínhamos uma solução para colocar Portugal no caminho do progresso e da melhoria das condições de vida da população.
Aceitámos, com a consciência plena, que a hora era difícil, que os desafios eram grandes, que a nossa tarefa não seria fácil.
Aceitámos, cientes de que governar é servir: servir os ideais em que se acredita e em nome dos quais, em democracia, se aceita ser julgado; servir aquilo que, honestamente, consideramos serem os interesses do povo, que é o nosso.
E nem por ser grande o desafio deixámos de acreditar que era possível. Bem pelo contrário.
Contávamos, para tanto, com a vontade imensa que nos animava.
Contávamos com a certeza de saber que Portugal é uma Nação com uma história grande, capaz de vencer os desafios se existir uma linha de rumo, estabilidade, e, simultaneamente, um clima de confiança.
E o desafio primeiro era esse, exactamente: inverter um ciclo de desconfiança e descrença que morava em nós. Fazer acreditar que, com trabalho, com método, com vontade, com organização, podíamos vencer. Fazer acreditar que um povo com oito séculos de história não pode vergar-se ao pessimismo e ao miserabilismo. Fazer a nossa juventude acreditar que não estava condenada a um amanhã sem perspectivas.
O desafio era crescer, desenvolver, modernizar. Era corrigir os desequilíbrios que caracterizavam a economia portuguesa no período recente.
O desafio era criar riqueza. Criar mais riqueza e distribuí-la com mais justiça. A começar por aqueles que não possuíam sequer condições mínimas de vida digna. A começar por aqueles que, de entre nós, são os mais desfavorecidos.
O desafio era vencer. Vencer o momento histórico em que nos integrámos, de corpo inteiro, na Europa Comunitária.
Em tudo tínhamos pressa. Muita pressa. Porque só com passo seguro, mas rápido, poderíamos recuperar o atraso face aos nossos parceiros europeus.
A tudo, os mesmos «velhos do Restelo» de sempre, chamaram ambição impossível.
E hoje? Quem pode hoje negar que conseguimos?
Quem pode negar que a estabilidade e a confiança foram restabelecidas em Portugal?
Quem pode negar que nós, portugueses, as mulheres e os homens de Portugal, passámos a acreditar em nós próprios?
Quem pode negar que os empresários passaram a investir no País e que o dinheiro, que antes fugia lá para fora, hoje é aplicado em Portugal?
Quem pode dizer que os jovens não têm hoje perspectivas um pouco melhores do que ontem? Que não tomámos múltiplas iniciativas dirigidas aos problemas e preocupações da nossa juventude?
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Quem pode dizer que o nível de vida dos trabalhadores, dos reformados, dos idosos, não melhorou nos dezasseis meses que levamos de Governo?
Quem ousará dizer que o dia de hoje não é melhor que o de ontem para um número cada vez maior de portugueses?
Quem, de boa fé, ousará dizer que não se vive hoje um pouco melhor em Portugal do que há um ano atrás?
Quem ousará dizer que não fomos capazes? Quem terá coragem para dizer que não trabalhámos? Que não cumprimos?
Quem ousará dizer que não travámos o endividamente externo e não introduzimos mais disciplina na utilização dos dinheiros públicos?
Quem pode negar que a nossa agricultura começa a sair do marasmo em que esteve mergulhada durante décadas?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Vê-se, vê-se!
O Orador: - Quem pode negar que estamos a vencer o desafio da integração europeia? Que temos defendido bem os interesses de Portugal?
Quem ousará dizer que, naquilo que de nós depende, não estamos a cumprir as promessas feitas aos Portugueses em campanha eleitoral? O que não conseguimos concretizar foi porque os Srs. Deputados dificultaram, obstruíram, impediram.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Uma voz do PS: - Impediram em quê?
O Orador: - Quem pode dizer que não fomos capazes?
E por que haveríamos nós - povo com direito a sentir-se orgulhoso de si - de dizer que o nosso sucesso se deve aos outros?
Por que haveríamos de ser nós a dizê-lo se as realidades demonstram o contrário?
Por que haveríamos de ser nós a diminuirmo-nos se são os outros que nos elogiam?
Se organizações internacionais insuspeitas dizem que os méritos são nossos?
Por que haveríamos de ser nós, os Portugueses, as mulheres e os homens concretos que somos, que trabalhamos, que conseguimos, que vencemos, a vir dizer agora que não, que o mérito não é nosso, que foi a sorte ou a caridade a fazer por nós o que nós realmente fizemos?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E podíamos ter feito mais. Bastava que a força, a vontade e o querer, o empenhamento do País real, tivesse tido igual tradução aqui, na Assembleia, no comportamento de alguns partidos da oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É que, se algum mérito pudesse ter esta moção de censura - e não tem nenhum -, seria a de, uma vez por todas, nos dar razão na denúncia que, perante os Portugueses, sempre fizemos das forças políticas que apenas apostavam em dificultar, em obstruir, em não deixar ir mais longe.
Afinal sempre tivemos razão.
Os Srs. Deputados da oposição não suportam um governo que governe bem e que tenha o apoio da grande maioria da população. E, então, querem travar o seu passo, querem derruba-lo.
O Governo está consciente dos seus méritos, tanto, quanto está consciente dos méritos dos Portugueses.
Ao Governo, como primeiro responsável, coube dar o exemplo. Ao Governo coube criar as condições, definir uma linha de rumo, promover um clima de estabilidade e de confiança.
Os Portugueses acreditaram, deitaram mãos à obra e construíram.
Esta moção de censura, se algum mérito pudesse ter - e não tem nenhum -, seria o de provar que certas atitudes de algumas forças políticas da oposição nada têm a ver com o interesse nacional, bem ao contrário, têm por fundamento, apenas, o mero interesse partidário.
Foi aqui apresentado algum motivo sério para esta moção de censura? Nenhum.
Onde poderia fundamentar-se esta moção de censura?
Repito: não restabeleceu este governo a confiança?
Vozes do PCP: - Não!
O Orador: - Não temos vivido um tempo de estabilidade, de paz social e de progresso?
Vozes do PCP: - Não!
O Orador: - Não conseguiu o Governo dar aos Portugueses a ceneza de que tinham um governo que governava?
Vozes do PS e do PCP: - Não!
O Orador: - Não se preocupou o Governo com os mais desfavorecidos, os que mais precisam?
Vozes do PS e do PCP: - Não!
O Orador: - Não enfrentou o Governo, com êxito, o desafio da adesão às Comunidades Europeias?
Vozes do PS, do PRD e do PCP: - Não!
Protestos do PSD.
O Orador: - Não está a economia a crescer e o investimento a surgir?
Vozes do PS, do PRD e do PCP: - Não!
O Orador: - Não foram desvendadas novas portas à juventude?
Vozes do PS e do PCP: - Não!
O Orador: - Não entrou o Governo, com seriedade e rigor, dos interesses fundamentais do povo português?
Vozes do PCP: - Não!
O Orador: - Não é seguramente nada disto que está em causa.
Então porque esta leviandade de derrubar o Governo?
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Não se pode querer condenar um governo só porque cometeu a ousadia de sonhar com um Portugal melhor para todos e teve o engenho e a força de tornar o sonho realidade.
Não se pode julgar um governo só porque quis correr a aventura de tirar Portugal dos últimos lugares da escala do desenvolvimento dos países europeus e combater a pobreza.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Governo tem obra feita, que os Portugueses conhecem. E os senhores o que fizeram? Quantas leis importantes para o País produziram?
Vozes do PCP: - Muitas!
O Orador: - Até aqui obstruíram como método, como tentativa permanente de desgastar, de impedir que caminhássemos em frente. E quando se tornava visível que nem assim eram capazes de tudo impedir, recorreram a uma moção de censura.
Queriam à viva força impedir o Governo de governar e para isso deitaram mão à última solução que lhes restava: derrubá-lo.
Esta moção de censura, é bem sabido, serviu sobretudo como instrumento de meras lutas partidárias no seio dos partidos da oposição.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esta moção foi uma nova arma com que decidiram guerrear-se dois partidos da oposição: o PRD e o PS.
Na luta que cada um desesperadamente trava para vencer o outro, recorre-se agora a uma arma nova, como, de resto, quase expressamente um desses partidos confessou.
É muito grave que uma moção de censura, que conduz ao derrube de um governo, seja utilizada como arma para jogadas políticas de exclusivo interesse partidário, só para ver quem manda na oposição, quem é mais oposição.
A competição entre partidos é, em democracia, necessária, saudável e legítima, mas não pode processar-se de forma tão negativa para o País.
Então provoca-se uma crise política para saber quem é que lidera a oposição?
Vozes do PS: - Não!
O Orador: - Se os prejuízos ficassem circunscritos ao seio dos partidos em conflito - o PS e o PRD - não valia a pena grande preocupação.
Mas não será assim. Os efeitos negativos atingirão todo o País, a colectividade, atingirão os Portugueses no seu conjunto.
Esta moção de censura veio abrir uma crise política em Portugal. No exacto momento em que o País tanto precisa de um clima de confiança e de estabilidade, condição indispensável para construir o progresso.
Por que se quer deitar a perder o que com tanto trabalho foi construído?
Por que se quer fazer o País andar para trás, para a austeridade, o apertar do cinto?
Desculpem que lhes diga outra vez: é uma grande irresponsabilidade.
Aplausos do PSD.
Primeiro tem de estar Portugal, depois a democracia e só depois os interesses partidários.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Por isso é que o PSD tem de sair do Governo!
Vozes do PS: - Essa é boa!
O Orador: - Espero poder pensar que foi em função desta ordem de valores que, num primeiro impulso, o próprio Partido Socialista se apressou a classificar a apresentação desta moção de censura como atitude irresponsável!
«Irresponsável», nem mais nem menos. Nisso pensamos como o Partido Socialista.
A diferença está em que o Partido Socialista já não pensa como nós... ou já não diz como pensa! Ainda há bem poucos dias dizia que a moção de censura era «inoportuna» e «irresponsável».
Só que depois, logo depois, olhou para os seus próprios interesses, esqueceu o resto e mudou de opinião.
Não deixamos, apesar de tudo, de notar o peso de consciência com o que faz.
Reparem-se nos cuidados, pretensamente habilidosos, com que o PS procurou esconder a sua súbita mudança de opinião. Tudo quis e quer esconder.
Em matéria de diálogo, o Governo nada tem a aprender.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): nada contra a Nação!
Tudo pela Nação,
O Orador: - Qual foi o Governo que mais respeitou o estatuto da oposição?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Este não foi!
O Orador: - Qual foi o Governo que mais procurou dialogar com os partidos da oposição? Estes furtavam-se, adiavam, recusavam ... tudo para depois, à míngua de melhor argumento, dizerem que o Governo não dialogava.
Qual foi o Governo que melhor diálogo manteve com a Presidência da República? Com o anterior presidente e com o actual.
Uma voz do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Qual foi o Governo que conseguiu pela primeira vez em Portugal um acordo com os parceiros sociais?
O PS pretendeu arranjar à última hora uma desculpa para a atitude que quer tomar. O Partido Socialista precisa de uma desculpa perante si próprio e perante o País pela crise que ajudou a criar.
Porque, em verdade, o Partido Socialista continua a pensar que é uma atitude de grande irresponsabilidade esta moção de censura do PRD.
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O Partido Socialista tinha mesmo dito e redito, afirmado e reafirmado, prometido e jurado que seria ele a determinar os seus próprios tempos, que nunca votaria uma moção de censura apresentada por outro partido.
Vozes do PS: - Não é verdade!
O Orador: - Srs. Deputados, esta moção de censura não faz sentido.
Não há razão para derrubar o Governo - e os partidos da oposição sabem-no perfeitamente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Na vida política, tal como na vida privada, há momentos em que cada um tem de assumir as suas próprias responsabilidades.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É o que estamos a fazer.
O Orador: - O Governo foi aqui chamado, e como era nossa obrigação viemos.
Entrámos e saímos de cabeça erguida, com a serenidade de quem se sabe com o dever cumprido.
Aplausos do PSD.
O Partido Socialista disse que a moção de censura era uma atitude irresponsável e apresta-se agora a contribuir para que a irresponsabilidade vença.
O Partido Socialista afirmou, repetiu vezes sem conta, até há poucos dias, que só voltaria ao Governo depois de ser julgado em eleições.
É uma atitude que seria, sem dúvida, eticamente correcta e consentânea com os interesses do País.
Já se imaginou o que seria uma coligação entre o PS e o PRD, que, ainda por cima, teria de contar com o apoio dos comunistas: até aqui o campo de luta, de um contra o outro, tem sido na Assembleia e nos meios de comunicação social; depois, o palco de luta seria o Governo.
O que sucederia então à confiança, à produção, ao investimento ... para mais, repito, tendo de ser um governo com o apoio dos comunistas?
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Bela solução!
O Orador: - Não é política e democraticamente legítimo, já o dissemos, que se lance mão da moção de censura - que conduz à queda do Governo - para servir a luta entre os partidos da oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Seria igualmente ilegítimo, seria dramático, que pudessem escolher um novo palco para as suas lutas e jogadas e esse palco fosse o Governo da Nação.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E tudo à custa de Portugal e dos Portugueses, da modernização e desenvolvimento do País, das condições de vida da população.
E tudo para voltarmos atrás: em vez da estabilidade, a crise, em vez do progresso, a austeridade.
Então, Srs. Deputados, e em nome da democracia, poderia formar-se um governo de dois partidos cujos líderes actuais não se submeteram sequer ainda ao julgamento do eleitorado?
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Seria possível formar-se um governo liderado pelo partido que foi o grande derrotado nas últimas eleições?
É esse o vosso entendimento da ética democrática?
Aplausos do PSD.
Não, Srs. Deputados. Não é possível chegar a tal irresponsabilidade, a tal atrevimento.
O poder só é digno de ser exercido quando representa, para quem o exerce, a possibilidade de pôr em prática o protesto que considera mais capaz de resolver os problemas concretos da população e construir um futuro mais feliz para as gerações vindouras.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem.
O Orador: - Nós, só assim entendemos o poder.
Nós, só assim o temos exercido e só assim o exerceremos.
Abriu-se deliteradamente uma crise política em Portugal. O Governo nada fez por ela e não a deseja, porque é indesejável para Portugal.
É preciso que a crise seja vencida o mais rapidamente possível para que o País não sofra de mais.
Para que não se comprometa o nosso futuro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A nossa posição é muito clara.
Só aos Portugueses, em eleições, cabe julgar as responsabilidades de cada um e escolher o caminho que querem seguir no futuro.
Não tenhamos medo da voz do nosso povo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só através de eleições é possível ultrapassar rapidamente a crise agora aberta.
Eleições que sempre teriam de realizar-se até ao fim deste ano, para escolher os representantes portugueses no Parlamento Europeu, conforme estipula o Tratado de Adesão às Comunidades Europeias.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tememos o julgamento desta Assembleia, porque não tememos o julgamento do povo português.
Aplausos do PSD.
Saímos daqui com a mesma serenidade, a mesma confiança, a mesma determinação.
Os Portugueses sabem que temos uma solução para Portugal.
Começámos a executá-la nos dezasseis meses que levamos de governo.
É uma solução de estabilidade e de progresso, de criação de mais riqueza e melhoria das condições de vida da população. É uma solução de modernidade
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para o País e aproximação aos níveis de desenvolvimento da Europa Comunitária. É uma solução de solidariedade e justiça social com os olhos postos, em primeiro lugar, nos mais desfavorecidos. È uma solução que aposta nas capacidades dos homens e mulheres de Portugal e em particular nos jovens.
Os Srs. Deputados vão derrubar o meu governo. Não porque ele esteja a governar mal. Não porque a maioria do povo queira que o Governo caia.
Quem sofre com esta grande inconsciência é Portugal, são os Portugueses.
Mas uma coisa vos quero dizer, Srs. Deputados: Não pensem que vão destruir a nossa vontade. Não julguem que vão quebrar o nosso ânimo. Não acreditem que vão vencer a nossa determinação. Confiamos tranquilos no julgamento dos Portugueses.
Temos um sonho e não vamos desistir dele: fazer de Portugal um país moderno, mais justo e mais próspero.
Havemos de conseguir.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, e concluindo a fase de encerramento, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Maninho.
Aplausos do PRD.
O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se dúvidas pudessem restar de que o PRD fez bem quando tomou a iniciativa de apresentar uma moção de censura, o discurso inicial do Governo dissipou-as. Se ilusões pudessem ainda alimentar os que prezam a liberdade e a justiça, o discurso inicial do Governo desfê-las.
Evidentemente, no discurso final que acabámos de ouvir, perante as câmaras da televisão, o Sr. Primeiro-Ministro mudou o tom, mas isso, também, é por si motivo de preocupação.
Aplausos do PRD.
Gostaria de dizer, também, que estou de acordo com o Sr. Primeiro-Ministro quando afirmou que foi pena que todas as intervenções aqui produzidas ontem e hoje não tivessem sido vistas pelos Portugueses.
Certamente, V. Ex.ª e os membros do Governo teriam aparecido de frente perante as câmaras de televisão, dado que o privilégio de aparecer de costas a falar aos Portugueses só me é dado a mim pela RTP.
Aplausos do PRD, do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.
O Governo foi deselegante. Quis ironizar com a sigla do nosso partido. O resultado foi grosseiro.
Era fácil fazer igualmente ironia, e com melhor sucesso, a propósito da sigla do partido a que pertence o Governo. Mas nós temos demasiado respeito pelos portugueses que votaram no PSD ou nele são filiados, pelos portugueses que votam em qualquer partido ou que em qualquer partido militam, para nos permitirmos coisa parecida. É uma questão de diferença. E de ética. E de correcção.
Aplausos do PRD.
Mas queremos deixar uma recomendação ao Governo: quando desejar brincar com a sigla do meu Partido, use as outras letras e não toque no D. Porque para nós «D» só tem um significado: democrático; nas palavras...
Aplausos do PRD.
... nos actos, na alma, na vida, se preciso for!
Queremos estar certos de que o gosto do Governo em trocar democrático por dito não corresponda à tentação de uma palavra que não tenha havido por ora coragem para acabar de pronunciar!
O Governo foi deselegante segunda vez e, também segunda vez, sem graça: fala de uma «história das Estónias»; e comenta que «se fosse uma história das arábias ainda podia haver algum mistério».
Mas não nos deixaremos arrastar pelo tom pouco sério usado pelo Governo. O que importa é a noção que o Governo tem - ou não tem - da gravidade das coisas. Que uma delegação parlamentar, presidida pelo Sr. Presidente da Assembleia da República e composta por representantes de todos os partidos, em visita oficial a um país estrangeiro seja publicamente desprestigiada pelo Governo, para o Governo é indiferente. Que o Presidente da Assembleia da República - segunda figura na hierarquia do Estado - seja enxovalhado pelo Governo, para o mesmo Governo não conta. Que uma larguíssima maioria nesta Assembleia, a qual incluía todos os partidos menos o do Governo haja veementemente censurado este pelo seu acto, para o Governo é como se fosse irrelevante. Que perto de 30% dos próprios deputados do PSD não tenha estado presente no momento da votação, isso seria sempre insignificante. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros descobriria um ou dois «bodes expiatórios». Porventura, sê-lo-ia também ele próprio daqui a uns tempos. E pronto.
Não pode ser assim.
Houvesse o Governo tido a ombridade de reconhecer o seu erro manifesto e o PRD teria expresso o seu respeito pelo carácter assim revelado. Todos erram: a diferença está apenas entre os que o reconhecem e os que não o fazem. Houvesse o Governo colocado a questão de confiança - o que, agora sim, se justificaria, e o PRD, não votando a confiança, teria sublinhado a dignidade desse comportamento.
Com o fugir às responsabilidades, o alijar ostensivamente culpas, não podemos pactuar.
O Governo sofismou e deturpou princípios e realidades.
É óbvio que ninguém esperaria, ou desejaria, que o Governo, colocado perante a proposta de uma moção de censura, não se defendesse. É legítimo, é salutar que o faça. Corresponde à sua estrita obrigação.
Mas corresponderia igualmente à sua estrita obrigação não pretender arvorar-se, simultaneamente, em parte e em juiz, não pretender julgar do direito que os grupos parlamentares têm de apresentar ou deixar de apresentar moções de censura - que o PRD exerceu segundo a sua consciência e tendo em conta o seu juízo sobre as exigências do interesse nacional.
Entende o Governo que não devia o PRD ter anunciado uma moção de censura nas vésperas da visita do Sr. Presidente da República ao Brasil e do Sr. Primeiro-Ministro à República Popular da China; afirma que a apresentação da moção é uma «jogada política» em que o Governo não está interessado e protesta contra
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a abertura de uma crise; procura encontrar autores ocultos por detrás da atitude do PRD e pensa descobrir, como não podia deixar de ser, o Partido Comunista; tenta desviar-se e alega que verdadeiramente a moção se dirige contra o Partido Socialista; tece considerações e faz citações acerca da legitimidade dos governos minoritários e invoca bom comportamento nas relações com a Assembleia da República, lançando sobre a oposição as culpas dos conflitos e, evidentemente, de tudo o mais.
Entendamo-nos com seriedade.
A oportunidade e a necessidade dos actos políticos não depende ou não depende só da vontade.
O PRD teve todas as cautelas que podia ter. Conforme é público e sabido, não só não nos dispensámos do acto de respeito que era o de informar previamente o Sr. Presidente da República da nossa decisão, como tivemos o cuidado de diferir a apresentação formal da moção, em termos que analisámos com o Sr. Presidente da República, de modo a não prejudicar a visita oficial ao Brasil.
Quanto à visita à República Popular da China, o PRD tomou já posição, em comunicado, acerca do acordo relativo à transferência da administração sobre o território de Macau. Da sua parte não se suscitará o mais pequeno obstáculo à aprovação nesta Assembleia desse acordo e, consequentemente, à sua ratificação.
Mas não podemos deixar de manifestar a nossa surpresa em como a memória de alguns é curta. Quando, em Junho de 1985, o actual Primeiro-Ministro provocou a ruptura da coligação em que se baseava o governo do bloco central, encontrava-se o então Presidente da República em visita de Estado a país estrangeiro.
O Sr. Raul Rego (PS): - Isso já esqueceu!
O Orador: - E estava-se a dias da assinatura do Tratado de Adesão de Portugal à CEE.
Uma voz do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Isso não impediu a iniciativa, embora, como agora, houvesse adiamento na execução. Nem consta que o Presidente da República haja sequer sido previamente informado.
Uma voz do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Clama agora o Sr. Primeiro-Ministro contra o que chama a abertura de uma crise política. Será que se censurou a si próprio por haver aberto uma, em Junho de 1985, a poucos meses de eleições presidenciais?
E não foi o Governo quem, em Junho do ano transacto, desencadeou uma crise quando, sem nenhuma razão para isso, apresentou uma moção de confiança?
Uma voz do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Aqui, sim, autocensuramo-nos. O que em seguida se passou revela que o Governo não merecia que a nossa atitude de então, responsável e coerente, o tivesse mantido em funções, após provocar uma crise artificial.
Aplausos do PRD.
Recordar-se-ia VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, que quando, em Novembro passado, durante o debate do Orçamento, sem se preocupar então, e mais uma vez, com as consequências da abertura de uma crise, o Sr. Primeiro-Ministro desafiou os partidos da oposição: mostrem a coragem de apresentar uma moção de censura! Aqui a tem, Sr. Primeiro-Ministro. Não para responder ao desafio de V. Ex.ª, mas para responder ao desafio da nossa consciência e do futuro da nossa Pátria.
Aplausos do PRD.
Coragem, Sr. Primeiro-Ministro, nunca nos faltou nem nunca nos faltará.
Orgulhamo-los de ter entre nós alguns dos que enfrentaram contestações juvenis sem desmaiar, sem tremer nem chorar, que provaram a sua coragem quando era difícil. Na conquista e na defesa da liberdade, estiveram onde V. Ex.ª não esteve no dia 25 de Abril de 1974; estiveram onde V. Ex.ª não esteve em 1975.
Aplausos de PRD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Tenha decoro nesse tipo de afirmações idiotas!
Uma voz do PSD: - Que desgraça!
O Orador: - Gosta o Governo de efectuar processos de intenção.
É curioso que, enquanto uns nos criticam por havermos tomado una iniciativa sem contactos prévios com ninguém e por havermos agido sozinhos, outros nos acusam de estarmos conluiados com terceiros.
Agimos sozinhos, com plena consciência e total assunção de responsabilidades. Convença-se o Governo, de uma vez, que há alguma coisa mais no nosso país, felizmente, para além de si e do Partido Comunista. E respeito ao menos aqueles, sem a coragem e independência de quem, nem poderia sequer ter pensado na possibilidade de ser governo.
Mas com tantos processos de intenção que o Governo nos faz, sentimo-nos no direito de perguntar: em obediência a que desencadeou o Sr. Primeiro-Ministro a crise de Junho de 1985, com a ruptura do governo do bloco central, que aqui não se discute, mas que poderia ter comprometido a assinatura do Tratado de Adesão de Portugal às Comunidades Económicas Europeias, ...
O Sr. António Capucho (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - .. .ª que o Partido Comunista se opunha, e que impediu a aprovação de algumas leis a que também então o Partido Comunista se opunha?
Fez com este algum acordo?
Risos do PRD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Isso é tudo falso!
O Orador: - Sejamos sérios na discussão das coisas. O PRD praticou estes dois actos com inteira consciência.
O Governo prometeu e criara expectativas. O PRD aceitou viabilizá-lo - ficando precisamente na expectativa. Pouco a pouco, o PRD foi observando que a acção política do Governo se desviara dos objectivos que deveriam ser os seus.
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Avisou uma, duas, três vezes. As condições excepcionais de conjuntura estavam a ser consumidas dia a dia sem preparação do futuro e segundo intenções que só poderiam ser as de ganhar crédito para eleições.
A análise feita pelo PRD mostra que é possível governar melhor, talvez sem tanta propaganda, mas lançando bases solidas de um porvir, de um Portugal de todos os portugueses - sobretudo dos mais sacrificados. Era o que o Governo prometera, era exactamente por isso que tinha acabado com o bloco central.
Disse-o e disse que era indispensável criar uma alternativa ao actual governo.
Essa alternativa existe - basta querer.
Essa alternativa permitirá que melhorias transitórias não se transformem em desemprego acrescido no futuro, em empresas devoradas, em divisões sociais agravadas. E em perda de independência real do País.
Não queremos que este governo continue.
Queremos capitais estrangeiros, mas não queremos um país tornado servo. Queremos progresso económico, mas não queremos novos capitais imensos acumulados em poucas mãos e um poder político subordinado ao poder económico.
Vozes do PRD: - Muito bem!
O Orador: - Veja-se ou não, é para aí que estamos agora a caminhar.
E nós queremos uma pátria de todos, não uma quinta de alguns.
Aplausos do PRD.
Não se negam realidades. Avisa-se do perigo.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo é um governo minoritário. Isso, por si, não tem mal. Um governo minoritário - isto é, um governo que não possui o apoio da maioria do Parlamento nem dos sufrágios - é constitucional. E é, em princípio, legítimo, como igualmente legítimo, nem mais nem menos, será outro que se forme e observe iguais requisitos.
Mas um governo minoritário tem de agir nos limites da sua legitimidade. Tem de procurar, em pontos essenciais, soluções que não sejam exclusivamente suas, que resultem, pois, de um consenso não necessariamente com todos os outros partidos, mas pelo menos com algum ou alguns dos outros partidos.
Que soluções de consenso procurou o Governo?
Era isso que o Governo procuraria na sua apresentação ao Parlamento - e foi isso, entre outras coisas, que iludiu.
Dizia então o Sr. Primeiro-Ministro, e passo a citar:
A Assembleia da República tem de ser respeitada como órgão máximo de representação democrática.
Sendo a Assembleia da República o rosto e a voz de toda uma comunidade, respeitá-la é respeitarmo-nos, valorizá-la é tomarmos consciência daquilo que valemos.
Se não estivessem os outros inteira e incondicionalmente de acordo com as suas propostas, o Governo não as apresentava no Parlamento ou retirava-as. O Governo não queria soluções, queria ou submissão ou confronto.
Por isso, o Governo foi, de facto, vendo a sua legitimidade diminuída.
E a questão está agora posta: em termos finais, a legitimidade do Governo depende do resultado da votação da moção de censura - se não for aprovada, o Governo mantém a legitimidade; se for aprovada, o Governo perde-a.
Perdê-la-á, Sr. Primeiro-Ministro.
O Governo faz demagogia. Vejamos os tão decantados indicadores económicos, que o Governo tão irreflectidamente aborda na sua política de autopropaganda.
O País, no triénio de 1983-1985, fora objecto de um intenso programa de estabilização financeira, sem o qual, melhor ou pior, jamais poderíamos recuperar.
Esta política de estabilização financeira teve alguns resultados: a balança de transacções correntes, no final de 198S, mais do que equilibrada, estava excedentária - o Banco de Portugal acumulara mais de 400 milhões de dólares, que funcionaram como excelente fundo de maneio para a gestão seguinte. Mas com que sacrifícios para os Portugueses e para a economia em geral: os salários haviam caído 13%; o investimento havia caído 28%; o desemprego, sempre a crescer, atingia já os 11 % da população activa; a capacidade produtiva instaladora encontrava-se numa das suas mais baixas utilizações de sempre.
É daqui que o Governo parte: de uma situação extremamente propícia ao sucesso. Pode dizer-se, sem medo de errar, que, excepção feita às contas externas, já não era possível fazer recuar mais qualquer indicador económico. O Governo, mesmo não fazendo rigorosamente nada, mesmo ficando em casa a observar os acontecimentos, poderia ver sem esforço aqueles indicadores a melhorar.
Risos do PSD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Não brinque com coisas sérias!
O Orador: - A conjuntura interna era, pois, a grande distância de qualquer outra, a melhor que já alguma vez ocorrera depois do 25 de Abril.
Mas, à conjuntura interna veio juntar-se a externa, para, em simultâneo, gerarem condições de favor sem precedentes. O preço do petróleo, fantasma terrível de todos os governos anteriores, que chegara a passar a barreira dos 30 dólares o barril, caiu, progressivamente, até aos 15 dólares: só nesta alteração, para que o Governo, obviamente, nada contribuiu, poupámos mais de 200 milhões de contos. A cotação do dólar, que chegara a exceder os 180$, caiu, progressivamente, até aos 140$: só nesta alteração, para que o Governo, obviamente, também nada contribuiu, as nossas poupanças ultrapassaram os 200 milhões de contos. As taxas de juro, no mercado internacional, caíram cerca de dois pontos percentuais: só nesta alteração, para que o Governo, obviamente, também nada contribuiu, as poupanças em encargos da dívida externa excederam os 50 milhões de contos. O comércio externo, outrora titubiante, disparou, sobretudo do lado das importações dos países industrializados, para onde se canalizam os nossos produtos: e nesta mutação, para que o Governo, também obviamente, nada contribuiu, ganhámos também, em quantidade e em preço, muitos milhões de contos.
Com todo este dinheiro, como que caído do céu em catadupas, de estranhar seria que o Governo não fizesse algumas «flores» em torno de salários e de pensões,
tecnicamente incompetente e politicamente desonesto - a que se juntou, entretanto, uma sorte espantosa, que infelizmente para o País ele não soube aproveitar.
Uma voz do PSD: - É preciso ter lata!
O Sr. Presidente: - Aceito a interpelação como uma proposta. Há alguma objecção por pane das bancadas?
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
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É, pois, a esta luz que a actividade do Governo tem de ser apreciada:, a de uma conjuntura, interna e externa, sem precedentes, onde o difícil seria não brilhar.
Ora bem, e que fez o Governo com esta conjuntura?
Comecemos com os indicadores que mais frequentemente o Governo utiliza como bandeira para justificar os seus pretensos .êxitos: a inflação, os salários reais e o investimento. . .
A inflação, em 1986, baixou de 19% para cerca de 12%. É um facto positivo, que fica bem ao Governo realçar. Mas a esse realce não podemos deixar de contrapor três factos. Em primeiro lugar, que a desaceleração do crescimento dos preços já se iniciara em 1985 e não apenas em 1986: a queda fora então de dez pontos percentuais, contra os sete pontos do ano findo. Em segundo lugar,- é o próprio Governo, nos seus documentos oficiais, a admitir a nulidade do seu mérito: os 12% .da inflação, em 1986, resultam da média ponderada de 18% no. mercado interno e de 7% negativos da inflação importada, e é óbvio que só pela primeira o Governo pode ser. responsabilizado. Em terceiro lugar, que a própria redução de preços em Portugal tem, ainda assim, um mérito relativo: quase todos os países da CEE conseguiram reduções superiores à nossa.
Os salários, pelos elementos até agora disponíveis, terão crescido cerca de 5% em termos reais. É razoável.
E talvez seja bom lembrar agora a intervenção que o Sr. Primeiro-Ministro fez há cerca de um ano, após «ignora» o último trimestre de 1985, como se nada tivesse a ver com isso - e foi nesse período, exactamente, que o emprego mais diminuiu. Por outro lado, utiliza artifícios metodológicos para baixar a população activa, que serve de base a») cálculo da taxa de desemprego: as mulheres portuguesas, por exemplo, que não têm emprego, não são chamadas «desempregadas», mas «inactivas»
... O método pode servir para fazer discursos bonitos, com taxas sonantes, mas não é um método honesto.
Uma história conhecida lembra: a do senhor que fez um albergue para aqueles que primeiro tinha feito pobres.
Veja-se o caso da estrutura de distribuição de rendimento, de que o Governo nunca fala. Em 1973, o peso do factor do trabalho no conjunto do rendimento era da ordem dos 53%. Em 1975, era da ordem dos 70%, análogo ao que se verifica na generalidade dos países europeus. Em 1986, com uma conjuntura sem precedentes, aquele peso salarial não ia além de escassos 47% - a taxa mais baixa depois do 25 de Abril! É simplesmente chocante que um governo que diz prosseguir a justiça social aceite como boa uma situação como esta e a silencie.
Mais grave do que tudo isto, porém, é a total ausência de medidas de fundo de que o Governo até agora deu mostras; e foi para tomar medidas de fundo que ele se propôs governar e tinha rompido o bloco central. Mais grave de tudo isto é a total ausência de um modelo de desenvolvimento, através do qual possamos minimamente saber o que queremos e para onde vamos: ninguém ainda sabe o que este governo quer
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O Orador: - Se for aldrabice, fico à espera do vosso desmentido.
Risos do PSD.
E em especial os portugueses que gostarão de facto de passar a saber a verdade!
O Governo diz que daqui a três anos deixamos a cauda da Europa! Não é verdade, como V. Ex.ª sabe, Sr. Primeiro-Ministro.
Só se nós andarmos para a frente, o que sinceramente espero e desejo, e os outros para trás, e mesmo assim terá de ser a uma velocidade muito grande. Que o Governo e o Primeiro-Ministro não se coíbam de repetir frases destas até à exaustão só revelam como estão à vontade e sem réplica.
Com o desemprego, diz e repete, que a taxa baixou em 1986. Posta a questão nestes termos, a afirmação é verdadeira, mas induz a uma conclusão que é fácil: que o Governo tenha criado novos postos de trabalho. Não é verdade. Já dissemos que destruiu, até agora, 70 000 postos de trabalho e que aquela situação só parece ter melhorado porque o Governo ignora os seus primeiros meses de actividade e «transfere» trabalhadores para a classificação de inactivos.
Trata-se de um método porventura eficaz em termos de propaganda, mas claramente desonesto.
Uma voz do PSD: - Desonesto és tu!
O Orador: - Outras vezes, ainda, o Governo escuda-se na ausência de estatísticas para fazer afirmações que não demonstra, como sucede com o investimento. Provavelmente, a taxa de crescimento não foi aquela que o Governo diz, mas quem a pode contestar se não há elementos disponíveis? Daqui a uns meses, quando vier a saber-se, porventura, que o Governo, também aqui, não falava verdade, já ninguém, então, se lembrará!
Enfim, se no plano económico quiséssemos classificar o Governo com uma simples frase poderíamos resumi-la a isto: foi um governo metodologicamente demagogo, tecnicamente incompetente e politicamente desonesto - a que se juntou, entretanto, uma sorte espantosa, que infelizmente para o País ele não soube aproveitar.
Uma voz do PSD: - É preciso ter lata!
O Orador: - E um Governo que por tudo isto merece bem esta moção de censura.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PRD na sua moção de estratégia, aprovada na segunda convenção nacional reunida no Porto, afirmou claramente que seria cada vez mais exigente face ao Governo.
Chegou o momento de uma moção de censura.
A nossa denúncia é uma denúncia representativa. Por isso este governo vai cair! Mas Portugal não ficará desgovernado. Pelo contrário, a queda deste governo torna-se imperiosa para que Portugal venha a poder usufruir de uma política mais dinâmica economicamente e mais justa socialmente.
O debate fez cair máscaras.
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - Tornou-se mais que a discussão de uma moção de censura.
Assistiu-se, infelizmente, por vezes, ao reavivar do espírito de D. Miguel e dos seus «caceteiros».
Aplausos do PRD.
A moção de censura foi-o também contra a demagogia e o clientelismo. Quase ocorreu que a moção fosse não de censura mas de confiança. Na tolerância. No diálogo. Na liberdade. Na democracia.
A moção de censura triunfará.
Porque representa também a moção de confiança na tolerância, no diálogo, na Uberdade e na democracia.
Aplausos do PRD.
É, com a autoridade moral de quem deu tempo ao Governo para governar, que hoje lhe dizemos: assim, não, Sr. Primeiro-Ministro.
E dizemo-lo com tranquilidade.
Porque pudemos dizer aos Portugueses, em especial aos sem casa, aos desempregados, aos com contratos a prazo, aos jovens sem acesso à universidade, à casa e ao trabalho, aos velhos com reformas de miséria, aos doentes sem recursos nem assistência, a todos os portugueses, que é possível governar melhor, que é necessário governar melhor, que é urgente governar melhor!
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e do MDP/CDE.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Para interpelar a Mesa.
Se houvesse consenso e julgo que o há por parte de todos os grupos parlamentares, poderíamos dispensar o intervalo previsto de meia hora antes da votação. O Sr. Presidente faria soar as campainhas e aguardaríamos apenas alguns minutos, se assim o entender, para que os Srs. Deputados pudessem tomar o lugar na sala e dispensaríamos o intervalo.
O Sr. Presidente: - Aceito a interpelação como uma proposta. Há alguma objecção por parte das bancadas?
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, o Regimento refere - creio - que há intervalo se alguém o requerer, não é assim!?
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Em resultado da conferência de líderes, o que ficou combinado é que haveria um intervalo de meia hora.
O Sr. António Capacho (PSD): - Se alguém o requerer, Sr. Presidente, nos termos regimentais. Mas só queria dizer que nós não o requeremos.
O Sr. Presidente: - Vamos, pois, proceder à votação da moção de censura apresentada pelo PRD.
O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado, interrompendo a votação.
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O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, se interrompi a votação é porque, obviamente, tenho razões fortíssimas para o fazer.
E a razão é simples, Sr. Presidente: é que através desse método, V. Ex.ª não conseguirá apurar o resultado da votação.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero entender que a observação feita pelo Sr. Deputado António Capucho é no sentido de que a votação deve ser feita por filas a fim de se proceder à respectiva contagem.
Entendo esse pedido como um requerimento, pelo que vamos proceder desse modo à votação da moção de censura.
Submetida a votação, foi aprovada, com 134 votos a favor, do PS, do PRD, do PCP do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos, 108 votos contra, do PSD, do CDS e do deputado independente Oliveira e Costa, e uma abstenção, do deputado independente Ribeiro Telles.
Srs. Deputados, tal como ficou acordado em conferência de líderes, as declarações de voto serão entregues na mesa por escrito.
O Sr. Deputado Ribeiro Telles pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Ribeiro Telles (Indep.): - Sr. Presidente, é para declarar que também enviarei para a Mesa uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: - Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 55 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel M. Almeida Coelho.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Fernando José Alves Figueiredo.
Francisco Mendes Costa.
Jaime Carlos Marta Soares.
Joaquim Eduardo Gomes.
José de Almeida Cesário.
José Angelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José de Vargas Bulcão.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Partido Socialista (PS):
Alberto Manuel Avelino.
António José Martins Seguro.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
José Apolinário Nunes Portada.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Luís do Amaral Nunes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Ricardo Manual Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
José Carlos Pereira Lilaia.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Partido Comunista Português (PCP):
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Henrique José Pereira de Morais.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Partido Socialista (PS):
João Cardoso Gomes Cravinho.
Partido Renovador Democrático (PRD):
Francisco Armando Fernandes.
José Carlos Torres Matos Vasconcelos.
Partido Comunista Português (PCP):
José Rodrigues Vitoriano.
Centro Democrático Social (CDS):
Hernâni Torres Moutinho.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE):
José Manuel do Carmo Tengarrinha.
Os REDACTORES: Maria Leonor Ferreira - Carlos Pinto da Cruz - José Diogo.
Página 2609
Página 2610
PREÇO DESTE NUMERO: 248$00
Depósito legal n º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA E P.