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Quarta-feira, 13 de Janeiro de 1988 I Série - Número 39

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JANEIRO DE 1988

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos P. Basto da Mota Torres
Cláudio José dos Santos Percheiro
Rui José dos Santos Silva

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão as 15 horas e 15 minutos.
Procedeu-se à discussão conjunta dos pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que foram aprovados, relativos aos recursos interpostos pelos PCP e pela ID sobre a admissibilidade das propostas de lei n.º 16/V - Alterações à Lei n.º 24/87, de 24 de Junho {estabelece o regime disciplinar de alienação de participações ou bens e instalações detidas pelo Estado em empresas de comunicação social) e 18/V (autoriza as empresas públicas a serem transformadas em sociedades anónimas de maioria de capital público). Intervieram no debate, a diverso título, incluindo declaração de voto, os Srs. Deputados José Manuel Mendes (PCP). Raul Castro (ID). Almeida Santos (PS), Mário Raposo (PSD), José Magalhães (PCP), Basílio Horta (CDS) e Marques Júnior (PRD).
Iniciou-se a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 100/V (PS) - Instalação de antenas -, sobre o que intervieram, além do Sr. Ministro Adjunto e da Juventude (Couto dos Santos) e do Sr. Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e das Comunicações (Matos dos Santos), os Srs. Deputados Raul Junqueira (PS), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Nuno Deleure (PSD), Marques Júnior (PRD), Vieira Mesquita (PSD), Narana Coissoró (CDS), José Manuel Mendes (PCP), Jorge Loção (PS), Lopes Cardoso (PS), Correia Afonso (PSD) e Jorge Lemos e Carlos Brito (PCP).
Entretanto, foi lido e aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do PSD.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Moura Veiga.
António José de Carvalho.
António Maria Oliveira de Matos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Talo Diogo.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Casimira Gomes Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime pomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Cosia da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Pereira de Matos.
João José da Silva Maçãs.
João Manuel Ascensão Belém.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Saíres Pinto Montenegro.
Joaquim Fernandes Marques.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José António de Coito Pita.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Licínio Moreira da Silva.
Luís Amadeu Barradas Amaral.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Natalina Pessoa Milhano Pintão.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Deleure Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vítor Pereira Crespo.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.

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Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Fernando Ribeiro Moniz.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Barroso Soares.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Carneiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tilo de Morais.
Mana Helena do R. da C. Salema Roseta.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Assunção Pimenta Rego.
Raul Manuel Bordalo Junqueira.
Ricardo Manuel Rodrigues Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
Álvaro Manuel Bolseiro Amaro.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo Brito.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Jerónimo de Carvalho de Sousa.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Eduardo Linhares de Castro.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
José da Silva Lopes.
Natália de Oliveira Correia.
Rui José dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Agrupamento Intervenção Democrática (ID):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Srs. Deputados, foram entregues na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 144/V, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Pinto, do PSD, propondo a elevação de Paul à categoria de vila, que baixou à 10.º Comissão; projecto de lei n.º 145/V, da iniciativa dos Srs. Deputados Jorge Sampaio e outros, do PS, sobre a Lei da Radiodifusão, que baixou à l.9 Comissão; projecto de lei n.º 146/V, da iniciativa dos Srs. Deputados Carlos Lage e outros, do PS, sobre a organização dos estudos de impacto ambiental para certos tipos de empreendimentos, actividades e projectos, que baixou à 10.ª Comissão; projecto de resolução n.º II/V, da iniciativa do Grupo Parlamentar do PS, propondo a criação de uma comissão eventual para análise das contas públicas de 1972 a 1985; proposta de lei n.º 24/V, da iniciativa da Assembleia Regional da Madeira, propondo a alteração da Lei n.9 30/86, de 27 de Agosto, que baixou à 6.º Comissão; proposta de lei n.9 25/V, da iniciativa da Assembleia Regional da Madeira, sobre taxas da RTP e da RDP na Região Autónoma, que baixou à 1.ª Comissão, e proposta de lei n.º 27/V, da iniciativa da Região Autónoma da Madeira, propondo a actualização dos vencimentos dos professores e dos ex-regentes escolares, que baixou à 4* Comissão.
As propostas de lei da iniciativa da Assembleia Regional da Madeira, distribuídas sob os n.ºs 26/V (garantia de fixação de carreiras aéreas entre o continente-Madeira e Madeira-Porto Santo) e 28/V, sobre a organização judiciária na Região Autónoma da Madeira, não receberam acolhimento, não tendo sido admitidas pelo Sr. Presidente.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Eduardo Pereira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Para interpelar a Mesa, no sentido de o Sr. Presidente nos dar os esclarecimentos que entender por bem sobre uma notícia que nos chegou às mãos, veiculada através da Lusa, e que diz que a Indonésia aceita a visita de uma missão parlamentar portuguesa a Timor-Leste, mas apenas se for de observação e não de investigação. A afirmação foi do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros da Indonésia, em Madrid. Na sequência da notícia, pode ler-se que o Sr. Ministro confirmou que o Governo de Lisboa propôs que uma missão parlamentar portuguesa visitasse Timor-Leste.
Como o Sr. Presidente deve estar recordado, este assunto foi trazido aqui à Assembleia há já algum tempo, na sequência de uma notícia também publicada num órgão de informação. Voltámos agora a ser surpreendidos por uma notícia deste tipo, posta na boca do Sr. Ministro dos

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Negócios Estrangeiros da Indonésia, pelo que gostaríamos que o Sr. Presidente nos informasse se tem conhecimento desta démarche do Governo Português, se ela se realizou e de tudo que o Sr. Presidente tenha conhecimento sobre o assunto, visto que consideramos extremamente estranho que o Governo tenha aceitado, concretizado ou negociado uma visita de parlamentares a Timor-Leste sem ter em conta a posição de V. Ex.ª, a desta Assembleia e a dos seus grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, sobre essa notícia apenas lhe posso dizer que também a li. Esse assunto será tratado na próxima conferência de líderes.

Pausa.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares — Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa no seguinte sentido: o Governo foi citado na intervenção do Sr. Deputado Eduardo Pereira, mas o Governo não faz comentários nesta sede porque considera que a evocação da figura da interpelação à Mesa, para os efeitos, é totalmente ilegítima, como V. Ex.ª, melhor do que eu, o saberá. No entanto, está disponível para todos os esclarecimentos que V. Ex.ª entender, na sede própria e ao abrigo das figuras regimentais próprias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Eduardo Pereira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Em virtude da intervenção do Sr. Ministro, gostaríamos de declarar que, embora o Sr. Presidente reserve para a conferência de líderes o tratamento desta matéria, o meu grupo reserva-se o direito de a trazer depois aqui ao Plenário, para que todos tenham conhecimento do que na conferência de líderes se tiver passado e do que a si próprio se oferecer.

Vozes do PSD: — Queixinhas!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, como aqui já foi notado — e como na última conferência de líderes tivemos ocasião de verificar e de analisar—, há certas figuras regimentais que, muitas vezes, são utilizadas de maneira indevida. Este assunto, por exemplo, não se insere claramente no programa dos nossos trabalhos de hoje; é colocado sob a forma de interpelação à Mesa. Ora, em qualquer caso, a Mesa só pode saber exactamente o que se pretende com uma interpelação no fim, uma vez que esta tem uma duração máxima de dois minutos.
Talvez haja aqui um certo contra-senso no tempo que é concedido para fazer uma pergunta.
Informei o Sr. Deputado de que li a notícia, repito, apenas li a notícia. Na conferência de líderes analisaremos esta matéria e, depois, o grupo parlamentar do PS tomará a posição que entender, como é óbvio.
Srs. Deputados, a Mesa confronta-se com uma situação que é preciso esclarecer. Na conferência de líderes, quanto me recordo — e, aliás, não sou o único a recordar-me —, ficou estabelecido que para debate dos recursos inerentes à
admissão das propostas de lei n.ºs 16/V e 18/V se reservaria um período de dez minutos.
Sou agora informado de que na Comissão teria surgido uma interpretação diversa. Uma vez que existe este contencioso de interpretações, gostava de pedir a opinião dos grupos parlamentares sobre o assunto. No entanto, informo, desde já, que a impressão com que fiquei é a mesma com que ficou o Sr. Deputado Secretário. Por isso, o que consta da agenda é a reserva de dez minutos para o conjunto das duas propostas. De resto, embora não se trate exactamente do mesmo assunto, as matérias são conexas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP):—É para responder à questão que o Sr. Presidente colocou ao Plenário.
Em nosso entender, as propostas de lei n.ºs 16/V e 18/V abordam questões distintas, e foi como distintas que elas sempre foram tratadas. O que acontece é que sobre cada um dos diplomas incidem dois recursos: um, que é nosso, e outro, que é da ID. A circunstância que se verifica é a existência de dois recursos, mas de dois recursos sobre cada um dos diplomas. Apresentámos primeiro um recurso sobre um dos diplomas, apresentámos depois outro recurso sobre o outro diploma, e sempre interpretámos que as decisões que tomávamos eram no sentido de haver debates distintos em relação a cada um dos diplomas.
Admitimos, Sr. Presidente, que se possa fazer um debate conjunto, isto é, que quem quiser possa amalgamar os tempos. Mas, sob o nosso ponto de vista, trata-se de duas matérias distintas, duas votações distintas, e essa foi sempre a nossa interpretação, como foi também nesse sentido que interpretámos a atribuição de tempos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS):—Como mais nenhum grupo parlamentar se pronuncia, quero emitir a minha opinião, que não será talvez de uma ajuda decisiva, na medida em que não estive presente na conferência de líderes em que esta questão foi abordada. Não posso, pois, trazer aqui um testemunho claro e inequívoco daquilo que lá se passou, pois quem lá esteve foi o meu camarada Jorge Sampaio.
Sou, no entanto, levado a supor que também ele fez a interpretação de que os dez minutos seriam para cada uma das propostas de lei recorridas, até porque há vários recursos sobre a mesma proposta de lei.
Digo isto porque, esta manhã, eu e o meu camarada Jorge Sampaio trocámos impressões sobre as vantagens de que se fizesse o debate conjunto, com vinte minutos, isto é com dez minutos atribuídos a cada um dos recursos correspondentes a cada uma das propostas de lei. Julgo ser esta a interpretação do PS, que emito com a reserva de quem não esteve presente na conferência de líderes.
Faço-o, porém, em virtude da ausência do meu camarada Jorge Sampaio e por julgar ser esta a sua interpretação, pelas razões que acabei de expor a V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: — Pedia aos grupos parlamentares que fossem muito breves. Não quererão pronunciar-se o PSD, o PRD e o CDS?

Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): — Realmente o problema de saber se os dez minutos diziam respeito a cada um dos recursos não ficou debatido na conferência de

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líderes. Fiquei, no entanto, com uma impressão contrária à do PCP, ou seja, a de que todos os recursos estavam englobados no mesmo item e de que os dez minutos eram para todos os recursos. E, mais, se assim não fosse, para o debate das leis da rádio não teria pedido que nos dessem mais tempo, em virtude de termos três diplomas sobre esse assunto. Ó nosso pedido foi apreciado e foi-nos concedido mais tempo. Se não estivesse convencido de que os tempos respeitavam a cada iniciativa e não à globalidade do assunto, não teria feito esse pedido. Portanto, a minha convicção foi sempre a de que os dez minutos incidiam sobre todos os recursos. Mas posso estar enganado, porque, já disse, este ponto não foi explicitamente debatido.

O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): — Fui informado de que na conferência de líderes ficou esboçado, pelo menos, ou definido, que seriam dez minutos para os dois recursos.
Foi essa a ideia com que fiquei depois da leitura do boletim informativo, onde, na realidade, parece congregar os dois diplomas.
Entretanto, eu próprio, esta manhã, na 1.ª Comissão, suscitei o problema e levantei a dúvida porque admitia o pressuposto de que as duas propostas seriam debatidas com a atribuição de apenas dez minutos a cada grupo parlamentar.
A verdade, porém, é que esse entendimento colide com o artigo 134.º do Regimento e daí a troca informal de impressões que ocorreu na 1.ª Comissão. Isto porque a 1.ª Comissão não é a sede própria para debater este assunto.
A minha opinião pessoal — e suponho que é partilhada pela direcção do meu grupo parlamentar — é que, de acordo com o que foi agora exposto por uma das bancadas, as duas propostas sejam analisadas em conjunto, até porque tem conotações ou conexões evidentes e que, mantendo-se a regra dos dez minutos, haja uma certa flexibilidade — não será uma tolerância, porque ideia de tolerância induz na de concessão de um direito e o direito preexiste — e uma certa acomodação de todos nós, dentro de uma «convenção» constitucional, para limitar ao mínimo as nossas intervenções, a fim de que não seja prejudicado o debate da proposta que está agendada a seguir.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca — que, aliás, c um dos subscritores do recurso —, queria dizer que o Regimento tem uma excepção — salvo decisão da conferência que aumente os tempos de debate. Mas isso pressupõe a possível revisão.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): — Ao contrário do que diz o Sr. Deputado Narana Coissoró, as leis da rádio não são discutidas hoje, são-o na sexta-feira. Hoje debatem-se as antenas parabólicas, e existe aqui uma grande confusão. Perante isto, Sr. Presidente, creio que o melhor seria manter o princípio de dez minutos para cada recurso, numa globalidade de vinte minutos.

O Sr. Presidente: — Tem a apalavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): — É para responder à solicitação do Sr. Presidente e transmitir a posição do PRD sobre o assunto.
Não estive na conferência de líderes. Por isso não posso pronunciar-me sobre o que aí foi decidido.
A minha interpretação do resumo que me foi dado era a de que, efectivamente, os dez minutos seriam para a discussão dos dois diplomas. Mas esta é a interpretação do texto que nos foi distribuído, embora o PRD entenda como lógico que se deva desdobrar esse tempo e darem-se, efectivamente, dez minutos a cada recurso.

O Sr. Presidente: — A Mesa tomaria a decisão, de acordo com a sugestão, de discutir os dois recursos em conjunto e, depois, ajustaria o tempo. De preferência dez minutos, com um tudo nada de latitude.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): —Sr. Presidente, há, para além do mais, os tempos regimentais, que atribuem dez minutos para cada recurso.
Não houve, na verdade, uma total clarificação desta questão na conferência de líderes. Só assim se compreende que hajam interpretações diversas. Admito até que, da nossa parte, pudéssemos ter dito dez minutos para os dois recursos. Mas esses dois recursos eram o nosso e o da ID, sobre cada um dos diplomas.
Em relação ao que há pouco disse o Sr. Deputado Narana Coissoró, em minha opinião estamos perante dois processos que são distintos, independentemente da similitude da matéria sobre a qual os diplomas incidem. Embora os dois recursos tenham sido apresentados mais ou menos na mesma altura, o facto é que são dois processos completamente distintos e não há que estar aqui a forçar o amalgamá-los. Se houve a admissão de que os dois recursos fossem discutidos em conjunto, essa admissão incidia sobre os recursos de cada um dos partidos sobre cada um dos diplomas.
Em face disso e também daquilo que o Regimento estabelece — que são dez minutos, no mínimo, a menos que a conferência decida mais—, creio que aquilo que o Sr. Presidente está a propor, e que, aliás, já foi proposto pela bancada do PSD, é manifestamente pouco em relação às expectativas que, na base da interpretação que foi feita, se estabeleceram nalguns grupos parlamentares. O meu grupo parlamentar vem preparado, com base na interpretação que fizemos, para intervir mais demoradamente e, provavelmente, outros grupos parlamentares encontram-se na mesma situação.
Em face disso, creio que aquilo que é proposto pela bancada do PSD — dez minutos, com tolerância —, e que parece que o Sr. Presidente estaria tentado a propor, é manifestamente insuficiente. Por isso, apelo para que nos aproximemos mais dos tempos estabelecidos pelo Regimento.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, assim gastamos os setenta minutos em discussões prévias.
Entendi —e parece que não há nenhuma objecção— que os dois recursos devem ser tratados inicialmente em conjunto. A grande questão é a questão dos tempos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardos (PS): — O Sr. Presidente acabou de dizer que a grande questão é a questão dos tempos, mas eu fiquei sem saber qual a solução para a questão dos tempos.

O Sr. Presidente: — Entre dez e vinte minutos, Sr. Deputado.

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O Sr. Lopes Cardoso (PS):—Nesse caso, Sr. Presidente, pedia a palavra para interpelar a Mesa, pois é uma questão de processos, pelo que estou rigorosamente dentro da figura de interpelação à Mesa para lhe dizer que o Regimento fixa um mínimo de dez minutos. Todos nós sabemos que, numerosas vezes, esse tempo tem ultrapassado os condicionalismos regimentais, quando há consenso. Acontece que neste momento já verificámos que há interpretações diversas quanto àquilo que se passou na conferência de líderes. Portanto, penso que, uma vez que não há consenso, a solução é só uma: temos de aplicar o que está no Regimento. E não há consenso porque há interpretações diversas sobre o que teria sido acordado na conferência dos líderes. Não havendo consenso, temos de aplicar o artigo 134.º do Regimento, que fixa um período mínimo de dez minutos para a discussão de cada parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias em recursos deste tipo.

O Sr. Presidente: — Embora continue a dizer —e a interpretação não é só minha— que me pareceu que a conferência de líderes tinha derrogado os dez minutos para cada diploma — o que, aliás, tem feito várias vezes — e dado dez minutos para o seu conjunto, atendendo que se verificou que não há consenso, atendendo que estamos a prolongar o assunto, a única questão que queria esclarecer, em face da situação, é se querem discutir os recursos em conjunto ou em separado.
Quando disse entre dez e vime minutos era óbvio que estava a dizer que eram vinte minutos, pedindo que abreviassem para dez. Era a única interpretação que se podia deduzir das minhas palavras e julgo que estamos a perder tempo de mais com a matéria.
A sugestão da Comissão e do Presidente foi de que a discussão fosse feita em conjunto, e isso não levantou objecção.
Portanto, começávamos o nosso trabalho com a discussão dos recursos em conjunto — e é evidente que podem ir até aos vinte minutos —, pedindo a Mesa que, se possível, façam um esforço para os reduzirem para dez minutos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro dos Assunto Parlamentares: — Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: —Faz favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, não vou entrar na discussão dos minutos a que há direito para estas matérias, embora ...

Vozes do PCP: — O Regimento diz dez minutos!

O Orador:—Eu conheço bem o Regimento, Srs. Deputados.
De qualquer modo, não deixo de estranhar que, pela primeira vez que me lembre, duas matérias que, bem ou mal, são agendadas simultaneamente, concomitantemente os tempos não contem para as duas, Enfim, é uma matéria que o Plenário e V. Ex.ª já decidiram. Agora o que é complicado, Sr. Presidente, é que, já agora, gostaria da ajuda de V. Ex.ª para me dizer a que horas é que devo chamar os Srs. Ministros que vão intervir na matéria que está agendada a seguir para virem ao debate neste Plenário. Porque fiquei sem perceber minimamente qual o tempo que
V. Ex.ª pensa gastar, ou antes, que atribui aos grupos parlamentares para gastarem neste debate.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, eu não lhe posso dar uma resposta concreta. A única resposta que lhe posso dar mais aproximada é a de que, se todos os partidos quiserem usar os vinte minutos, teremos 7x20, o que representa 140 minutos.
Embora tivesse ficado com a convicção de que tinha ficado acordado apenas dez minutos para o conjunto dos recursos, peço que, na próxima vez, quando da conferência de líderes, sejamos muito mais precisos sobre matérias dessa natureza. Porque, repito, efectivamente fiquei com a convicção de que os dez minutos incidiam sobre o conjunto dos dois recursos.
Mas não percamos mais tempo com o assunto. Pedia ao Sr. Deputado Secretário o favor de ler os dois relatórios.

Foram lidos.

São os seguintes:

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos Interpostos por deputados do Grupo Parla-mentar do PCP e do Agrupamento Parlamentar da 10 quanto à proposta de lei n.º 16/V (admissibilidade).
1.1—Em relação ao artigo l.º do Decreto-Lei n.º 358/86, de 27 de Outubro, na redacção que lhe deu a Lei n.º 24/87, de 24 de Junho, a proposta de lei apenas altera a parte final do n.º l: onde se dizia «são alienáveis quando tal for admissível nos termos da Constituição e da lei», passar-se-á a dizer «são alienáveis nos termos da Constituição e do presente diploma».
Trata-se de uma mera modificação de forma e não de substância. Acode-se a virtuais dúvidas de exegese; dúvidas que, vistas bem as coisas, nem teriam, de resto, razão para surgir. A Constituição «é a ordem jurídica fundamental do Estado»: todos os actos dos poderes públicos têm de ser conformes à Constituição (cf., por exemplo, Gomes Canolilho, Direito Constitucional, n, 1981, p. 40). Esta consequência do carácter normativo da Constituição e da sua supremacia na hierarquia das normas legais vale em todos os sistemas democráticos, sem necessidade de ser, caso a caso, explicitada (Garcia de Enterria, «La Cons-titución como norma jurídica», no Anuário de Dere-cho Civil, t. 32, Abril-Setembro de 1979, máxime p. 327).
E também evidente a adstrição do intérprete, ao aplicar a lei, à que for aplicável.
1.2 — Do confronto da proposta de lei com o Decreto-Lei n.° 358/86 mostra-se que ela deixa intocado o n.º 3 do artigo l.º, no aditamento trazido pela Lei n.º 24/87. A supressão desse n.º 3 é que seria uma inovação de relevo substancial.
2.1—Quanto ao artigo 2.° do mesmo decreto--lei, introduz a proposta de lei uma modificação significativa, na medida em que viabiliza a alienação de títulos ou conjunto de bens e instalações que integrem o estabelecimento comercial de empresas públicas de comunicação social. De certo modo, está em causa uma decorrência do artigo 1.º da Lei n.º 20/86, de 21 de Julho. Fala este apenas em «empresas de comunicação social»; daí o n.º 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.º 358/86, logo na sua redacção originária, que remanesceu às alterações introduzidas pela Lei n.º 24/87.

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Poder-se-ia argumentar que o legislador, já na Lei n.º 20/86 e no Decreto-Lei n.º 358/86, pretendeu visar as empresas públicas de comunicação social; não se vê, com efeito, pelo menos com fluidez, como poderia uma empresa privada estar indisponibilizada para alienar bens do seu património só pelo facto de o Estado (em sentido amplo) nela possuir uma pequena fracção do capital social, não maioritário, portanto. Essa situação é que contenderia com o n.° l do artigo 62.º da Constituição. Assim sendo, o legislador, sob risco de estar a editar disposições inúteis, porque meramente declarativas, logo no artigo l.º da Lei n.º 20/86 e no n.º 2 do artigo l.º teria tido em vista as empresas públicas de comunicação social.
Afigura-se, no entanto, que este entendimento resultaria forçado. A alienação de bens dessas empresas públicas é objecto da norma inovadora do n.º l do artigo 2.º da proposta de lei («é igualmente legítima»).
Mas será a inovação constitucionalmente comportável?
Afigura-se que sim.
O estabelecimento comercial não se confunde com a empresa, mesmo quando encarado numa ampla acepção. Trata-se de um mero instrumento, de um dos instrumentos, da actividade empresarial; pode dar-se até a hipótese de uma empresa ter vários estabelecimentos, ou de não ter nenhum.
E não se confunde, também, com o património da empresa, onde, designadamente, se congregam situações activas e passivas que poderão nada ter a ver com o estabelecimento.
A empresa possui personalidade jurídica; o estabelecimento não. A tese que atribui personalidade ao estabelecimento, sufragada por autores como Ha-senpflug, Endemann ou Ralhcnau, está hoje geralmente posta de parte e não encontrou eco na nossa doutrina.
2.2 — Certo é que a alienação de bens do estabelecimento pode significar o remate da vida de uma empresa inviável. Só que, como decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 11/84, de 7 de Fevereiro de 1984 (Diário da República, 2.ª série, de 8 de Maio de 1984), a própria extinção de uma empresa nacionalizada não se traduz em desnacionalização, nem infringe a garantia da irreversibilidade do artigo 83.º da Constituição.
3 — Tem a ver a revogação do artigo 2.º da Lei n.º 24/87 e do artigo 3.º da Lei n.º 20/86 com a audição do Conselho de Comunicação Social.
Ora, parece que, na verdade, essa audição não é postulada pelo artigo 39.º da Constituição — nem encontra qualquer lugar paralelo na listagem feita no artigo 5.º da Lei n.º 23/83, de 6 de Setembro.
Aliás, o problema não é sequer suscitado em qualquer dos recursos.
4 — A moldura destes é a Constituição económica, com fulcro no seu artigo 83.º
Não se vê, no entanto, que seja posta em crise qualquer da normas invocadas, pelas razões mais detidamente deduzidas no parecer desta Comissão respeitante ao recurso interposto da admissão da proposta de lei n.º 18/V.
Acrescentar-se-á que o artigo 83.° não impede a realização de actos que se destinem a assegurar uma maior rentabilidade pública das empresas nacionalizadas. Mal fora que a garantia da irrcversibilidade do
que no preceito constitucional é crismado de conquistas «das classes trabalhadoras» fosse arvorada num dogma cego, em que um classismo não conotável com o princípio da igualdade prevalecesse sobre o interesse geral.
Isto sem cair, como é óbvio, no extremo oposto de uma interpretação que neutralizasse o sentido apurável do preceito.
5 — Face ao que assim se fundamenta, emite-se o parecer de que a proposta de lei n.º 16/V não viola a Constituição, estando em condições de ser admitida.
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos Interpostos por deputados do Grupo Parlamentar do PCP e do Agrupamento Parlamentar da ID quanto à proposta de lei n.º 18/V (admissibilidade).

I

1.1 — Da estatização da economia desenrolada depois de 11 de Março de 1975 adveio, segundo se assinala na exposição de motivos da proposta de lei, um «sector público empresarial sem lógica interna nem racionalidade». É à correcção dessa conjuntura, tornada estrutural, que a proposta de lei se inten-cionaliza, iniciando «um processo de abertura ao sector privado de empresas cuja inserção na área pública não encontre justificação económica ou social»; isto, porém, «dentro dos estritos limites constitucionais em vigor».
1.2 — Para tal, prevê o artigo l.º que as empresas públicas, ainda que nacionalizadas, desde que situadas em sectores não vedados à actividade privada, possam, por decreto-lei, ser transformadas em sociedades anónimas de maioria de capitais públicos, observado que seja o disposto na lei constituenda.
Realmente, a transformação obedecerá a regras imperativas e precisas.
Assim (artigo 2.º):
a) Ela não implicará a reprivatização do capital directamente nacionalizado, devendo os títulos representativos do capital assumido pelo Estado à data da respectiva nacionalização ser sempre detidos pela parte pública;
b) A maioria absoluta do capital social será sempre detida pela parte pública;
c) A representação da parte pública nos órgãos sociais será sempre maioritária.
A sociedade anónima que resultar da transformação continuará a personalidade jurídica da empresa pública transformada (artigo 3.°, n.º 1).
1.3 — Sem prejuízo do disposto no artigo 2.º, poderá o Estado [em sentido amplo, compreendendo outras pessoas colectivas públicas ou entidades que, por imposição legal, devam pertencer ao sector público (n.º 2 desse artigo 2.°)] alienar acções da sociedade anónima de que seja titular.
Mas mesmo estas alienações cingir-se-ão a certas regras.
Assim, pelo menos 20% das acções a alienar serão reservadas a pequenos subscritores, a trabalhadores da sociedade anónima e àqueles que o tenham sido da empresa pública durante mais de três anos [alínea a) do n.º l do artigo 5.º]; nenhuma entidade não pública, singular ou colectiva, poderá adquirir

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mais de 10% das acções a alienar [alínea b)]; o montante de acções a adquirir pelo conjunto de entidades, singulares ou colectivas, estrangeiras ou cujo capital seja delido maioritariamente por entidades estrangeiras não poderá exceder 10 % das acções a alienar [alínea c)].
Acresce que a participação do conjunto de entidades estrangeiras [na acepção da alínea c) do n.º 1] no capital social das sociedades anónimas não poderá exceder 5 % do mesmo (n.º 4 do artigo 5.°).
1.4 — E nem se diga que as operações previstas na proposta de lei visam, directa ou reflexamente, conceder qualquer vantagem ou reconhecer qualquer expectativa, mesmo que em certa óptica legitimável, àqueles que, antes de operadas as nacionalizações, eram seus proprietários ou do respectivo capital social.
Com efeito, as receitas do Estado provenientes das alienações a que a proposta de lei se reporta destinar--se-ão à correcção dos desequilíbrios financeiros do sector empresarial do Estado, à amortização antecipada da dívida pública e à cobertura da dívida (global) emergente das nacionalizações e expropriações anteriores à Constituição de 1976 (artigo 7.°).
2 — Reagem os Srs. Deputados do PCP invocando a violação do artigo 83.° da Constituição e a distorção e inversão do sentido e princípios fundamentais da Constituição económica. Aduzem os Srs. Deputados da ID que a proposta de lei transgride, nomeadamente, os artigos 83.°, n.° l, 89.º, n.º l, e 80.º, alíneas a), b), c) e e), da Constituição.
Mas será assim?

II

3.1 — Passa como moeda corrente que a nacionalização é um «acto jurídico instantâneo» (Kat-zarov, Théorie de Ia nationalisation, 1960, p. 227), motivado por razões de ordem sócio-política, pelo qual se opera a transferência de um certo bem de produção para a colectividade, em ordem a que à gestão privada se substitua uma gestão mais imediatamente determinada por objectivos de interesse nacional. Transferência da propriedade, pois. Mais, porém: transferência da propriedade para que passe a ocorrer um diferente tipo de gestão.
O surto de nacionalizações consumado depois de 11 de Março de 1975 não leve como fonte necessária a Revolução de 25 de Abril de 1974; inseriu-se no «processo revolucionário» que a partir daquela data declaradamente se desdobrou. Realmente, como informa Fernando José Bronze («As indemnizações em matéria de nacionalizações», na Revista de Direito e Economia, Julho-Dezembro de 1976, máxime p. 484), apenas o Programa de Política Económica e Social, aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Fevereiro de 1975, retirara, pela primeira vez, da «estratégia antimonopolisla» preconizada no Programa do MFA a consequência de, eventualmente, se ter de «ir até à nacionalização». Até então as nacionalizações haviam recaído somente em três Bancos — o de Angola, o Nacional Ultramarino c o de Portugal (Decretos-Leis n.ºs 450/74, 451/74 e 452/74, de 13 de Setembro).
De qualquer modo é de sublinhar, como o fazem Avelino Rodrigues, Ccsário Borga e Mário Cardoso (Portugal depois de Abril, 1976, p. 111), que aquele
Programa de Política Económica e Social passaria, depois do «11 de Março», a «mero exercício literário».
3.2 — Serve isto para evocar que as nacionalizações acumuladas em 1975 surgiram numa ex-cepcionalidade histórica, ao ritmo de um «processo revolucionário». Certamente por isso não se ajusta o artigo 83.° à formulação habitual nas regras jurídicas. Mais do que uma norma, é uma proclamação, uma bandeira, quando muito uma frase de preâmbulo legislativo.
Só que nem por isso deixa de ter eficácia vinculativa. Aliás, os preceitos constitucionais, sejam eles como forem, não serão de tomar como meras enunciações ou declarações políticas, juridicamente insignificativos (Pensovecchio Li Bassi, Llnterpre-tazione delia Norme Costiluzionali, 1972, p. 26).
Ora, por assim ser, é de indagar qual o alcance e o sentido do preceito.
3.3 — Em primeiro lugar, ele abrange apenas as nacionalizações que tiveram lugar entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976, data em que a Constituição entrou em vigor (n.° 2 do artigo 300.º). «Cabe [aliás] assinalar que depois da aprovação da Constituição não houve novas nacionalizações, tendo tido, assim, o documento constitucional um papel, neste domínio, de conservação ou consolidação de sucessos anteriores e não um papel prospectivo, baseador de um programa futuro.» (Mota Pinto, Direito Económico Português—Desenvolvimentos Recentes, 1982, p. 18.)
Em segundo lugar, as nacionalizações serão entendidas, nunca como nacionalizações de sectores da economia, mas como nacionalizações de empresas em concreto (Jorge Miranda, A Constituição de 1976, 1978, p. 511). Pois, e além do mais, se assim não fosse, nem faria sentido que o n.º 3 do artigo 85.º (n.º 2 antes da revisão de 1982) tivesse incumbido o legislador ordinário de demarcar quais os sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas ou a outras entidades da mesma natureza.
Em terceiro lugar, não impedirá o preceito que, por um desígnio de melhor racionalidade (global, da própria economia, e específica, da empresa considerada em si mesma), seja a empresa pública transformada numa sociedade anónima de maioria de capitais públicos. A forma societária é uma mera técnica de organização, que não altera as finalidades económicas da empresa a ela subjacente.
4 — Nos artigos 2.º e 5.º, a proposta de lei aperta, aliás, a um ponto máximo as malhas por onde virtualmente poderia passar qualquer descaracterização do primado público das empresas nacionalizadas.
Garantido fica, sem assomo de hesitação, a inserção da empresa transformada no sector público; o Estado (em sentido amplo) mantém o controle da gestão e a maioria do capital social.
A declaração de voto do conselheiro Cardoso da Costa no Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 273/86, de 21 de Agosto de 1986 (Diário da República, 1.» série, n.º 209, de 11 de Setembro de 1986), é, a este respeito, particularmente elucidativa:
É que, mantendo-se no sector público o capital inicialmente nacionalizado, preserva-se o princípio da continuidade da nacionalização; e, assegurando-se que serão entidades integradas no

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mesmo sector a deter sempre a maioria do capital, não só se preserva que a titularidade predominante do capital e, portanto, da empresa permaneça no sector público como, através dos poderes determinantes de gestão da actividade empresarial emergentes dessa maioria, se garante que tal gestão prossiga segundo o modelo público.
5 - A transformação numa sociedade anónima de maioria de capitais públicos não resultará, no caso, de uma actuação de natureza contratual, mas de um acto legislativo do Governo, em consonância com as directrizes estabelecidas pela lei da Assembleia da República. Do conceito clássico de sociedade pôr-se-á de lado o seu segmento contratual para se privilegiar a sua dimensão institucional. Isto, a todas as luzes, é perfeitamente favorável.
6 - E nem se observe que, pela aplicação do sistema previsto na proposta de lei, subvertidos ficarão os próprios alicerces da Constituição económica - e, mais concretamente, os princípios consignados nas alíneas a), 6), c) e e) do artigo 80.º da lei fundamental.
É, com efeito, precisamente em sintonia com a Constituição económica, reformulada em 1982, que se autoriza a participação (minoritária) do capital privado em empresas, situadas em sectores não vedados à actividade privada, que continuam a estar integradas no sector público; assegurada fica, nesta medida, e suficientemente, a subordinação do poder económico ao poder político e a sobrevivência do espaço público da economia.
Pois não é, de resto, verdade que a anterior redacção do artigo 80.º, que modelava o fundamento da ( organização económico-social, fazendo-o assentar «no desenvolvimento das relações de produção socialistas», foi substituída por uma outra muito menos programática e liberta já da compressão do dogma de um socialismo de tendência colectivizante?
Pois não se depurou o n.º 1 do artigo 89.º da* menção, ideologicamente tão carregada, de que os três sectores de propriedade dos meios de produção existiriam (apenas?) na «fase de transição para o socialismo»?

IV

7 - Face ao que assim fica fundamentado, emite-se o parecer de que a proposta de lei n.º 18/V foi correctamente admitida.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, como estes dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não foram distribuídos pelas diversas bancadas, solicito que seja divulgado o sentido de voto dos mesmos pareceres na Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os pareceres não foram distribuídos apenas porque não deram entrada na Mesa a tempo de se proceder à sua distribuição.
O sentido de voto do parecer que diz respeito à proposta de lei n.º 18/V é o seguinte: votos a favor do PSD, abstenções do PS e do PRD e votos contra do PCP e da ID.
O sentido de voto do parecer que diz respeito à proposta de lei n.º 16/V é o seguinte: votos a favor do PSD, abstenções do PS, do PRD e do CDS e votos contra do PCP e da ID.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP impugnou as propostas de lei n.º 18/V e n.º 16/V: a primeira, porque pretende autorizar a desnacionalização parcial de empresas protegidas pelo disposto no artigo 83.º e por princípios fundamentais da Constituição económica; a segunda, porque visa a supressão inconstitucional de uma componente determinante do sector público da comunicação social.
Com efeito, a proposta de lei n.º 16/V procura revogar as normas que, aprovadas por unanimidade num passado recente, visavam moralizar quanto possível as alienações - quando e se não contrárias à Constituição- de empresas públicas do sector em apreço, estabelecendo um justo feixe de regras conducentes à transparência dos actos de Estado. O Governo pretende agora, para prosseguir a sua moléstia privatizadora:
Abolir o parecer obrigatório do Conselho de Comunicação Social, previsto, designadamente, no artigo 2.B-A da Lei n.º 24/87;
Criar condições mais favoráveis à aquisição por entidades privadas e ulterior alienação, numa via de concentração, de empresas- tanto através do encurtamento de prazos como da inteira flexibilização do expediente da força maior,
Decair das exigências constantes da lei em vigor quanto à salvaguarda de uma participação maioritária do sector público no caso de alienação de fracções do capital de empresas públicas da comunicação social.
Mas (e por isso a presente iniciativa do PCP) o Governo vai mais longe e intenta:

Eliminar todas as referências ao enquadramento constitucional das alienações de empresas que hajam sido nacionalizadas e, bem assim, suprimir as cláusulas da sua protecção pela garantia do artigo 83.º, como ocorre, desde logo, no n.º l do artigo 2.º proposto, que, flagrantemente, elimina as exigências constantes da Lei n.0 24/87;

Viabilizar a sua alienação total ou parcial;

Tornar possível a alienação total ou parcial de títulos;
Consagrar a alienação total ou parcial dos bens e instalações das empresas, transferindo para o sector privado a sua função;
Permitir, com a maior das naturalidades, como se não vivêssemos numa sociedade regulada pelo direito e pela lei, a transformação de empresas públicas da comunicação social em sociedades anónimas ou a sua cisão, concessão ou cessão de exploração a entes privados.
Trazendo no bojo este gordo conjunto de soluções, a proposta de lei é obviamente inconstitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Como se escreveu no texto da impugnação que apresentámos, a iniciativa governamental contende, de modo inequívoco, com o artigo 83.º da Constituição Portuguesa, que se aplica, é bem de ver, a todas as nacionalizações posteriores ao 25 de Abril. Não há a menor legitimidade para estabelecer, a esta luz, nacionalizações de primeiro e segundo grau, umas alvo de tutela especial da Constituição, outras completamente desprotegidas e à mercê de um qualquer legislador famélico.

Vozes do PCP - Muito bem!

O Orador: - A charla de alguns esgrimistas segundo a qual as empresas públicas de comunicação social focam nacionalizadas apenas por arrastamento e, portanto, são livremente alienáveis não resiste a uma argumentação perfunctória. É sabido que todas as principais empresas ou órgãos de comunicação social do sector público foram objecto de acto legislativo de nacionalização directa, via decretos-leis aprovados por executivos posteriores a Novembro de 1975. Mas ainda que assim se não entendesse, estariam sempre sujeitas, no mínimo, ao comando do n.º 2 do artigo 83.º da lei fundamental. E, nestes termos, aos requisitos que aí, insuperavelmente, se prescrevem. A saber apenas as pequenas e médias empresas poderão, a título excepcional (sublinho: a título excepcional), ser alienadas e desde que não optem os trabalhadores por um modelo autogestionário ou cooperativo.
Alguns destes requisitos é cumprido peto Governo? Não. Primeiro: porque não visa desnacionalizações pontuais e excepcionais - quer a liquidação integral do sector, de acordo com o seu Programa. Segundo: porque a EPNC ou, entre outras, a EPDP não são pequenas e médias empresas de comunicação social, com os seus, respectivamente, mais de 1000 e mais de SOO trabalhadores. E onde o respeito peto direito de opção destes?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ponto de vista contrário é sustentado no relatório da 1.ª Comissão. Mas os argumentos são insólitos.
Afirma-se que não se empenha o Governo em violar a Constituição, antes se entretém na produção de umas modestas modificações formais; proclama-se que, quando se esquece ou constrange o universo constitucional ou legal que haverá de afeiçoar a actuação no domínio das eventuais alienações, afinal não se olvida nem reduz nada porque o que se deseja, ardentemente, é subentender que a lei que se aplica a cada caso concreto é hão mais do que ... a lei aplicável, e que, nesta lógica, não se colocam em causa as empresas nacionalizadas do sector.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É incrível!

O Orador: - Tal espantosa descoberta, não fora uma mistificação, faria dar urros de frustração aos lobbies que cobiçam as empresas públicas de comunicação social.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Bem observado!

O Orador: - Navegando, fagueiro e alheio a escolhos reais, neste vasto e bonançoso mar, o texto acaba por apodar de constitucional a liquidação dos títulos, do património das EPs e de todos os seus estabelecimentos comerciais. Diz-se que o que restaria ainda seriam empresas públicas: empresas sem rotativas, sem títulos, sem trabalhadores ou com contingentes de trabalhadores no desemprego, quiçá com conselhos de administração de estrita fidelidade ao PSD e, naturalmente, pagos a ouro de alto
quilate. Autenticas empresas fantasmas, verdadeiros eunucos empresariais, de si próprias ausentes, de si mesmas vazias e carentes, soletrando uma doce designação académica, sem corpo nem ossos, para gáudio dos escribas-teóricos desta direita capadócia que nos coube em sorte.
Sabe-se que o PSD almeja desnacionalizar todas as empresas públicas da comunicação social escrita;...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... assevera a construção verbal, contra o «muito bem» que acabo de ouvir dás bancadas governamentais, aprovada pela maioria esta manhã, que não, não há desnacionalizações no horizonte que suscita à nossa oposição. Ou, então, a haver, elas ocorrem em perfeita harmonia com os imperativos constitucionais. Raciocinando a fortiori, o relatório do PSD exprime o ponto de vista de que, sendo possível extinguir as empresas em análise por razões de rendibilidade económica, é ressível, uma vez mais a fortiori» a sua alienação, até como forma de não as extinguir. Chega-se ao ridículo de insinuar que não se extingue uma empresa pública de comunicação social quando se decreta a sua extinção mediante a transferência para o sector privado do integral complexo dos seus títulos, património e estabelecimentos!
Não passa igualmente de um expediente a proposta de lei n.º 18/V - que ainda suscitará detida análise do meu grupo parlamentar -, através da qual o Governo prossegue o escopo de abrir empresas nacionalizadas à penetração de capitais privados. Trata-se de admitir uma fórmula de desnacionalização parcial que ofende o disposto no artigo 83.º da Constituição. Qualquer que seja o juízo sobre as circunstâncias da sua aprovação e sobre a relegitimação que dele foi operada em 1982, a verdade é que não pode reduzir-se a um nada o seu conteúdo preceptivo, como o faz o relatório do PSD. A garantia constitucional das nacionalizações tem sequelas inegáveis na sua vertente positiva (que o Governo por completo subverte). Más, na vertente negativa, não se limita a implicar que as empresas adquiridas por nacionalização permaneçam sob controle público tendência!. Exige-se constitucionalmente que não seja facultada qualquer forma de apropriação não colectiva e de gestão privada. É isto precisamente que o Governo pretende romper.
Sr. Presidente, peço licença para, mesmo daqui do alto da tribuna, solicitar que me seja fornecido um copo de água. Creio que esse procedimento ainda não está banido dos hábitos parlamentares!...

O Sr. Presidente: - Certamente, Sr. Deputado. É favor aguardar um minuto.
O Orador. Uma pequena pausa para os Srs. Deputados do PSD reflectirem um pouco nos argumentos que tenho vindo a produzir.

Risos.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não acredites.

Vozes do PSD: - Ainda mais água?

O Orador: - Efectivamente, a reflexão dos Srs. Deputados do PSD está ao nível da boca mais primária!

Vozes do PSD: - Não apoiado!

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O Orador: - Contra essa operação nos batemos. Por isso, impugnámos estas propostas e propusemos a realização do debate sobre o sector público, que terá lugar na próxima quinta-feira. Pretendemos, acima de tudo, alertar para os perigos decorrentes da política de destruição em que o Governo se afadiga.
Permitam-me, nesta breve intervenção, uma última observação, ainda sobre a comunicação social.
Uma imprensa pública, pluralista, independente de qualquer tutela dos poderes económicos privados, reestruturada, viva, de indiscutível qualidade, pronta a dar resposta às mais variadas e candentes necessidades sociais, é, ainda hoje, essencial à democracia portuguesa. Não se presta, pois, à servilização de que o PSD se revela ávido, ao plano da direita de instrumentalizar a governação ao favor a minorias poderosas, adversas ao adquirido revolucionário libertador e ao regime que nele assentou e assenta os seus alicerces. Daí a proposta de lei n.º 16/V. Sendo manifesta a sua inconstitucionalidade, bem como a da proposta de lei n.º 18/V, não deixaremos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de accionar todos, mas todos, os mecanismos de fiscalização ao nosso alcance junto dos órgãos competentes. E, como é nosso timbre, assumimos as responsabilidades que nos cabem na defesa, sem titubeações, do que é indissociável do Portugal democrático.

Aplausos do PCP e da ID.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Restringindo-se este debate à impugnação da admissibilidade das propostas de lei n.ºs 16/V e 18/V, dada a sua clara inconstitucionalidade, não nos é possível abordar diversos aspectos de fundo das mesmas propostas de lei. E é pena, porque haveria então ocasião de evidenciar os sofismas com que o Governo pretende justificar o desmantelamento das empresas públicas e a sua entrega a vorazes apetites de grupos privados.
Mas atendo-nos aos limites do presente recurso, desde logo salta à vista a sintomática contradição destas propostas com a reiterada alegação governamental da necessidade de eliminar, na revisão constitucional, as disposições constitucionais que estabelecem a irreversibilidade das nacionalizações efectuadas depois do 25 de Abril. Tratar-se-ia, na óptica do Governo, de remover o obstáculo constitucional à sua política de privatizações.
Porém, quando a proposta de lei n.º 16/V estabelece, nos artigos 2.º e 4.º, que são alienáveis as quotas, partes ou acções das empresas públicas de comunicação social e que é igualmente legítima a alienação do capital ou de títulos ou do conjunto de bens e instalações das mesmas empresas, verifica-se que, afinal, o Governo já não precisaria de revisão constitucional para pôr em prática a sua retrógrada política de acabar com as nacionalizações efectuadas depois do 25 de Abril!...
Aliás, as contradições que esta proposta de lei consubstancia respeitam ainda à apresentação dela antes da proposta de lei n.º 18/V, quando esta é que estabelece, como uma espécie de lei quadro, o regime das desnacionalizações.
De tal modo, que na proposta de lei n.9 16/V se recorre a um regime que é estabelecido posteriormente na proposta de lei n.º 18/V...
Mas há mais: é que na proposta de lei n.9 16/V nem sequer se respeita o critério definido na proposta de lei n.º 18/V, nem quanto à obrigatoriedade de transformação em sociedade anónima, nem quanto ao limite da maioria do capital público!
Quer dizer, na proposta de lei n.9 16/V vale tudo, ainda que aquelas regras, na outra proposta de lei fixadas, não passem de meros álibis para encobrir a sua flagrante inconstitucionalidade!
Porque, ao fim e ao cabo, mais ou menos enfeitadas com travestis de legalidade, ambas as propostas de lei são claramente inconstitucionais.
Na verdade, o escopo permissivo da proposta de lei n.º 16/V é a desnacionalização das empresas nacionalizadas após o 25 de Abril, ou seja, o fim destas empresas públicas e a sua passagem a empresas privadas.
O que desde logo resulta não só da alienação livre, sem quaisquer condicionamentos, das partes, quotas ou acções do Estado ou de empresas públicas de comunicação social, mas ainda do recurso à «fórmula mágica» da transformação prévia em sociedade anónima, no caso de alienação do capital.
Fórmula mágica esta da transformação em sociedade anónima, de pura magia incipiente, que não só não consegue ocultar mas ainda agrava a inconstitucionalidade que pretende encobrir, já que se trata do abandono, não só da substância mas da própria forma específica das empresas públicas!
Por isso, nos requerimentos de interposição dos presentes recursos, se referiu a inconstitucionalidade desta proposta de lei como resultando da violação, nomeadamente, dos artigos 83.º, n.º 81.º, 89.º, n.º 1, e 80.º, alíneas b) e a), c) e e) da Constituição da República.
Com efeito, saliente-se, em primeiro lugar, a clamorosa violação do n.º 1 do artigo 83.9, já que nele se prescreve que são irreversíveis as nacionalizações, efectuadas depois do 25 de Abril, pelo que não há passes de mágica capazes de descobrir maneira de fazer o contrário, ou seja, desnacionalizar, sem que tal colida frontalmente com a Constituição!
E repare-se que quando a Constituição proíbe as desnacionalizações não prevê nem admite graus, de menos ou mais, de minoria ou de maioria do capital ou dos bens das empresas nacionalizadas.
Com isto cai, como um baralho de cartas, o argumento dos 49 % do capital.
Onde é que está isto admitido no artigo 83.º? Diz o artigo 83.º que as nacionalizações são, maioritariamente, irreversíveis? É evidente que não o diz, nem o admite.
E o mesmo resulta de muitas outras disposições constitucionais.
Como salienta o Prof. Oliveira Ascensão, na sua recente obra O Direito-Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 1987, p. 322, «a interpretação parte de um elemento determinado - duma fonte - e procura exprimir a regra que daquela é conteúdo. Mas isto não nos pode fazer esquecer que a interpretação é necessariamente uma tarefa de conjunto: pano de fundo da interpretação é sempre o ordenamento em globo».
Ora, muitas outras disposições da Constituição permitem concluir que o ordenamento constitucional reforça a única interpretação que o citado artigo 83.º admite.
Por um lado, é o estabelecimento de três sectores distintos de propriedade e a prioridade atribuída ao sector público, na sua ordenação [artigos 89.º, n.º 1, e 80.º, alínea 6)], e, por outro lado, é a consagração do princípio do desenvolvimento do sector social, como uma das bases da organização económico-social, e ainda do princípio da subordinação do poder económico ao poder político democrático, e também do princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção, solos e recursos naturais, igualmente como bases da organização económico-social [artigo 80.B, alíneas a), c) e e)}.

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Daqui resulta que múltiplas disposições permitem integrar o disposto no artigo 83.9 com o único sentido possível da sua interpretação individualizada. De outro modo, a admitir-se que o artigo 83.B não proíbe as alienações, totais ou parciais, de empresas nacionalizadas, como seria possível assegurar a coexistência dos sectores e a prioridade do sector público, o desenvolvimento da propriedade social, a apropriação colectiva dos meios de produção ou a subordinação do poder económico ao poder político democrático reduzindo e enfraquecendo o sector público?
A tal propósito, gostaria aqui de referir o que ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira, a pp. 408 da sua Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. l, e que 6 o seguinte:
I. A garantia das nacionalizações [...] obedece a três determinantes essenciais: (a) assegurar a subordinação do poder económico ao poder político [...] garantindo a eliminação dos monopólios e dos latifúndios [...], pois que, na verdade, as nacionalizações atingiram essencialmente os grandes centros do poder económico existentes antes do 25 de Abril; (b) satisfazer o princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção [...] já que nessa categoria se hão-de integrar, sem dúvida, os meios de produção (incluindo os solos) transferidos para a propriedade pública através das nacionalizações; (c) consolidar a base de desenvolvimento da propriedade social [...], visto que, nos termos do artigo 90.B, n.º 2, as nacionalizações são uma das condições (ou seja: pressupostos) do desenvolvimento daquela.
E são ainda os mesmos autores que, a propósito da possibilidade das privatizações parciais das empresas públicas, referem o seguinte, na p. 410 da mesma obra:
Mas é no plano da sua vertente negativa que a norma do n.c l do artigo 83.º adquire um valor preceptivo imediato, ou seja, enquanto proibições de desnacionalização, tomado este termo num sentido amplo, englobando toda e qualquer forma de reprivatização ou de transferencia para o sector privado. Estão aqui abrangidas ao mesmo título, desde logo, as figuras de revogação da nacionalização (desnacionalização, em sentido estrito) e de alienação a entidades privadas (ou outras); mas há-de estar abrangida também, do mesmo modo, a extinção da empresa nacionalizada, quando essa extinção tenha o propósito de uma desnacionalização, ou seja, quando ela se traduza numa reprivatização de uma empresa ou unidade económica com empobrecimento do sector nacionalizado.
Não existe desnacionalização apenas quando haja reprivatização de uma empresa inteira, enquanto tal. Da leira ë da ratio da norma resulta igualmente claro que a Constituição, não só proíbe a desnacionalização integral, mas também a desnacionalização parcial de qualquer empresa ou exploração nacionalizada - a Constituição não fala em empresas nacionalizadas mas sim em nacionalizações, tout court.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No entendimento do Agrupamento da Intervenção Democrática, estas duas propostas de lei consubstanciam matéria que constitui verdadeira aberração constitucional. Estas duas propostas de lei são, para nós, claramente inconstitucionais e daí a interposição dos respectivos recursos.
Aplausos da ID, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se entre nós um grupo de 30 pessoas da Liga dos Amigos da Terceira Idade, de Sintra, e os alunos da Escola Secundária da Moita.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após um longo período de passividade, em resultado da qual os governos do PSD foram criticados pelos seus acólitos, o actual governo enviou a este Parlamento três propostas de lei destinadas a aplacar a impaciência dos destinatários das suas reiteradas promessas.
Do que se trata em todas elas é do anunciado esvaziamento do sector público empresarial. Do Programa consta a promessa de menos Estado, emagreça-se esse empresário incómodo.
E claro que, vindo aí a revisão constitucional e sabendo--se já, como se sabe, que está assegurada em certos termos uma abertura à reprivatização do hoje irreprivatizável, não faltará quem ache inoportunas estas iniciativas.
Mas não sejamos ingénuos: o Governo prometeu menos Estado antes da revisão e independentemente dela!
A este respeito, uma de duas: ou o Governo tencionava cumprir no respeito da Constituição ou à revelia desse respeito. No primeiro caso, não se percebe bem o que o deteve.
No segundo, esta é de facto a melhor oportunidade para um acto de tríplice provocação: a esta Assembleia, ao Presidente da República e ao Tribunal Constitucional.
Dirá aos seus: eu bem tentei, mas não me deixaram. Precisamos de outra Constituição, outro Tribunal Constitucional e a seu tempo se verá se também outro Presidente da República.
Se o objectivo foi esse, estejamos certos de que as propostas se situam na fronteira entre o que é e não é inconstitucional.
Em nenhum dos casos convinha o óbvio.
Repete-se a velha história: o «Estado» de magreza só convém a quem lhe não detém as rédeas.
Daí que o actual governo tente duas coisas inconciliáveis: o esforço de convencer os seus acólitos de que fez tudo para o emagrecer; o disfarce da evidência de que lhe convém bem gordinho.
Nada impedia o Governo de há muito ter feito o que, sem violar a Constituição, estava ao seu alcance. Não precisava sequer de procurar na Assembleia consensos que de antemão sabe difíceis: a matéria das propostas em causa cabe na sua competência legislativa normal.
O ter preferido a via de propostas de lei tem precisamente o objectivo, e a explicação, de tentar explorar uma vez mais ignorâncias bem intencionadas e, através delas, um capital de queixa a que, muito provavelmente, vai pôr termo definitivo a próxima revisão constitucional!
Ele que é tão lesto a pedir autorizações legislativas em nome da pretensa morosidade do trabalho parlamentar, desta vez não quis ser autorizado. Quis mesmo a demora!...
O Governo começa por não querer a privatização das participações em emissoras públicas de televisão e de rádio. Por isso a mantém expressamente excluída no que acaba de nos propor. E construiu as suas propostas de transformação de empresas públicas e de alienação de participações públicas em termos de constitucionalidade duvidosa o bastante para que as oposições lhas recusem e também para que a morosidade das burocracias da fiscalização e a incerteza do

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resultado lhe proporcionem uma dilação não inferior à da entrada em vigor da Constituição revista.
Entretanto, o sector público da economia, insensível ao anúncio de sucessivas dietas, placidamente engorda.
Engorda pela via da conversão de crédito bancário mal parado em participações no capital de empresas privadas. Engorda através da generalização da figura da dação em cumprimento, ou seja, da conversão de créditos em bens patrimoniais de empresas públicas.
Engorda através da tentativa de relançamento da especulação bolsista, ou seja, da compra por empresas do sector público (banco, seguradoras, ele.) de títulos de capital de empresas privadas, através de tomadas firmes de ofertas públicas de capital.
Se o Governo e o partido que o apoia estivessem de facto empenhados em menos Estado, de há muito teriam alienado inúmeras casas de habitação de que o Estado é proprietário, já que lhe não quadra o papel de senhorio, alienado empresas e participações em empresas que não foram objecto de nacionalização, alienado empresas e participações em empresas que foram objecto de nacionalização indirecta, cumpridas as condições e formalidades do n.º 2 do artigo 83.º da Constituição, alienado ramos secos do património de empresas públicas, ainda que não privatizáveis enquanto empresas.
Em vez disso o partido que apoia o actual governo passou os três anos da AD sem um passo nesse sentido (apesar do acicate do então parceiro de coligação); passou o ano de 1987 bem instalado no poder que o peso do Estado confere; e nos seis meses do actual governo não foi além de produzir as tentativas de «passa-culpas» que estas propostas representam.

Vozes do PS: Muito bem!

O Orador: - Mais: no decurso do governo PS-PSD teve o acordo do parceiro de coligação para a aprovação de uma proposta de lei permissiva do aumento do capital de empresas públicas até 49 %, com abertura à subscrição privada desse aumento, bem como da alienação de elementos patrimoniais de empresas irreprivatizáveis; mas, depois disso, desinteressou-se do destino parlamentar dessa proposta. Não era inconstitucional, não rendia capital de queixa.
Quero com isto absolver o actual governo do objectivo de eliminar os entraves constitucionais e legais à alienação de empresas e participações do sector público?
Seria a outra face da mesma ingenuidade. O que quero significar é que este governo quer simultaneamente as duas coisas: poder vender e abster-se disso, enquanto puder ser o titular do poder que emerge do que retém!
Resta demonstrar que o Governo doseou em termos hábeis a dúvida sobre a constitucionalidade do que nos propõe.
Analisemos sumariamente as três propostas, apesar de só duas delas estarem hoje oficialmente em causa:

a) Proposta sobre a alienação das participações do Estado no actual sector público de comunicação social (n.º 16/V).
Onde está o gato?
Desde logo na substituição, no proposto artigo 1.º, da expressão «são alienáveis quando tal for admissível nos termos da Constituição e da lei» pela expressão «são alienáveis nos termos da Constituição e do presente diploma».
Dir-se-á: não é a mesma coisa?
Digo eu: se fosse, por que havia o Governo de propor a substituição?
Idem na substituição, no artigo 2.5, da expressão «nas condições e limites definidos no artigo 1.º» pela expressão «desde que observado o disposto no presente diploma».
Enfim - para só referir o principal -, na revogação do n.º 2 do artigo 2.º (sempre da lei em vigor), quando prescreve que «no caso de alienação de fracções do capital de empresas públicas de comunicação social, quando legalmente possível, será sempre salvaguardada uma participação maioritária do sector público».
Consiste o gato em que, segundo a lei em vigor, tão condicionada pelo disposto na Constituição é a alienação das participações do Estado (ou de qualquer entidade pública) prevista no artigo 1.B como a alienação, oneração ou reforço do capital de empresas públicas, num e noutro caso de comunicação social, estas previstas no artigo 2.8
Inversamente, e de acordo com o texto agora proposto, as primeiras continuam a só poder processar-se nos termos da Constituição, bastando às segundas a observação do disposto no novo diploma.
Dir-se-á: mas a Constituição não continua a sobrepor-se à lei? Claro que sim. Embora tenhamos de distinguir entre as regras constitucionais que são directamente aplicáveis e as que não são directamente aplicáveis. E neste caso não estamos no domínio das regras directamente aplicáveis, o que agrava o problema. Mas desde logo para a viciar de inconstitucionalidade, quando restringe à parte o que a Constituição e a lei em vigor querem que se aplique ao todo!
ò) Proposta sobre a alienação das participações sociais do Estado e outros entes públicos em sociedades civis e comerciais (n.º 17/V).
Aqui o gato tem o rabo mais de fora. E consiste no facto de na exposição de motivos o Governo ressalvar «os limites constitucionais vigentes», enquanto sobre eles silencia no texto da proposta.
Inadvertência? Seria grosseiro de mais se não acontecesse que é o silêncio, não o contrário, que está de acordo com a tónica direccional das medidas propostas.
No artigo 1.º, o Governo escreve:
A alienação de participações sociais por parte de entes públicos fica sujeita ao regime estabelecido na presente lei.
No artigo 2.B estabelece:
A alienação pode ter por objecto todas as acções ou quotas sociais de que o ente público for titular na sociedade participada, ou apenas uma parte delas.
E no artigo 4.º admite que a alienação de acções ou quotas sociais «[...] implique a perda de uma posição maioritária do ente alienante», com a só exigência de que, neste caso, se faça por concurso público ou transacção na bolsa de valores, embora esta mesma exigência se não aplique às principais participações do Estado. Estão excluídas as detidas por bancos, seguradoras, IPE; o que é que fica de fora?
Mesmo o leitor mais desatento está em condições de ver:

Que a proposta não distingue as participações que foram e não foram objecto de nacionalização; De entre aquelas, não distingue as que foram e não
foram nacionalizadas após o 25 de Abril de 1974; De entre as que foram, não distingue entre as directa e indirectamente nacionalizadas; De entre estas, não distingue das demais as pequenas e médias empresas situadas fora dos sectores básicos da economia.

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Resumindo: o Governo mete no bolso, esquecendo-os deliberadamente, o que equivale a violá-los, os n.081 e 2 do artigo 83." da Constituição!
Esta violação é independente do que, do ponto de vista material, se pense a respeito destes dispositivos constitucionais. Discordar deles não habilita ninguém a desconhecê-los, e a legislar como se não existissem!
Para não se cometer o desrespeito ao Governo que representaria pressupor a sua desatenção a estas elementaridades, há que render-lhe a homenagem de lhe imputar o «ardil» de estar tentando antecipar um debate instrumental do futuro banimento dos textos em apreço.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso mesmo!

O Orador: - c) Proposta sobre a transformação jurídica das empresas públicas (n.º 18/V).
Nada há a opor à mera transformação jurídica das actuais empresas públicas em sociedades anónimas.
Só que, logo no artigo 1.º, se prevê a sua transformação em sociedades anónimas «[...] de maioria de capitais públicos».
Primeira questão: mesmo que, antes da transformação, todo o capital público tivesse sido objecto de nacionalização posterior ao 25 de Abril de 1974?
O artigo 2.º resolve em parte esta questão ao exigir que «a transformação não implique a reprivatização do capital directamente nacionalizado».
Fica, no entanto, em causa o indirectamente nacionalizado, sendo que, quanto a este, uma vez mais o Governo mete no bolso, esquecendo-o, o n.º 2 do artigo 83.º da Constituição.
É certo que, a seguir ao passo atrás transcrito, acrescenta: «[...] devendo os títulos representativos do capital assumido pelo Estado à data da respectiva nacionalização ser sempre detidos pela parte pública».
Temos assim que, quanto ao capital indirectamente nacionalizado, a única limitação à sua alienação que a proposta prevê, do ponto de vista da sua titularidade, é que aquele de que o Estado for titular, e só esse, só pode ser alienado a favor de outros entes públicos. Inversamente, aquele de que for titular um ente público que não o Estado pode ser alienado livremente, desde que o seja com salvaguarda da maioria pública do capital e da representação na gestão.
A franja de desrespeito da Constituição corresponde assim, pelo menos, à possibilidade de privatização de capital indirectamente nacionalizado detido por entes públicos que não o Estado, isto na melhor das interpretações, fora das condições prescritas no n.º 2 do artigo 83.º, desde que se salvaguarde a maioria pública do capital e da representação na gestão.
Uma outra pode desenhar-se ainda a partir de um entendimento não restritivo da expressão «capital directamente nacionalizado». Quid júris, se se tratar de capital resultante de aumento operado por incorporação de reservas geradas a partir de capital directamente nacionalizado? Está sujeito às restrições do artigo 2.º ou à livre alienabilidade prescrita pelo artigo 4.º ? O silêncio neste caso é também obviamente suspeito.
Conhecido o espírito com que o actual governo encara as restrições constitucionais à reprivatização de bens nacionalizados, toda a ambiguidade é receável.
É claro que estes defeitos das propostas em apreço não são os únicos. Mas são os mais salientes do ponto de vista da sua constitucionalidade.
Apesar deles -e do significado que lhes emprestamos- vamos abster-nos de votar as impugnações, tal como fizemos a propósito dos correspondentes pareceres.
Por duas ordens de considerações:

A primeira consiste no seguinte: a maioria que apoia o Governo vai sufragar a perfeita constitucionalidade das propostas e assegurar-lhes livre curso parlamentar antes de que possa exercer-se o poder de fiscalização do Tribunal Constitucional; assim sendo, o Governo terá sempre oportunidade de demonstrar, em sede de discussão das propostas, a sua boa fé constitucional, nomeadamente quando tiver de se pronunciar sobre propostas de alteração que não deixaremos de apresentar.
A segunda advém do facto de, na 1.ª Comissão, os representantes da maioria, ou alguns deles, nos terem asseverado que existe a intenção de respeitar os dispositivos constitucionais em causa e que consideram irrelevante, desse ponto de vista, a eliminação das mencionadas salvaguardas de respeito pelo texto da Constituição. É de admitir - se assim for - que a maioria que apoia o Governo não resista à reposição no texto dessas salvaguardas, já que é indefensável que seja nociva a permanência delas.
Eliminadas - se for caso disso - as dúvidas sobre a pureza das intenções que tenham presidido às modificações em causa, não será por as julgarmos inconstitucionais que a final votaremos contra as propostas.
Se não, não!
Há dias dei por mim a dizer que o princípio da irreversibilidade das nacionalizações se converteu no «patinho feio» das instituições de Abril.
É sabido que não morremos de amor por ele, disso sendo testemunha o nosso projecto de revisão constitucional.
Mas a questão não é essa. Enquanto o artigo 83.9 da Constituição estiver em vigor merece-nos o mesmo respeito de qualquer outro preceito constitucional. Os patinhos, mesmo feios, merecem o respeito que é devido a todos os outros animais.
A verdade é que não há inconstitucionalidades bonitas!...

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor.
Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia 12 de Janeiro de 1988, pelas 16 horas, foram observadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
Alípio Pereira Dias (círculo eleitoral do Porto) por Carla Maria Tato Diogo. Esta substituição é pedida nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), com efeitos a partir de 1 de Janeiro corrente, inclusive;
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo (círculo eleitoral da Guarda) por Luís da Silva Carvalho. Esta substituição é solicitada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), com efeitos a partir de 6 de Janeiro corrente;

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Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes (círculo eleitoral de Lisboa) por João Granja Rodrigues da Fonseca. Esta substituição é solicitada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), com efeitos a partir de 6 de Janeiro corrente;
Manuel Filipe Correia de Jesus (círculo eleitoral da Madeira) por José António Coito Pita. Esta substituição é solicitada nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.0 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), com efeitos a partir de 11 de Janeiro corrente;

Solicitadas pelo Partido Renovador Democrático:

Hermínio Paiva Fernandes Maninho (círculo eleitoral de Santarém) por Francisco Armando Fernandes. Esta substituição é solicitada nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo S.9 da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a seis meses, a partir de 31 de Dezembro próximo passado, inclusive;
José Carlos Pereira Lilaia (círculo eleitoral de Lisboa) por Isabel Maria da Costa Valentim Ferreira Espada. Esta substituição é solicitada nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a seis meses, a partir de 12 de Janeiro corrente.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

Pela Comissão de Regimento e Mandatos: Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Vice-Presidente, Alberto Marques de O. Silva (PS) - Secretário, José Manuel de Melo A. Mendes (PCP) - Secretário, João Domingos F. Salgado (PSD)-Fernando Monteiro do Amaral (PSD) - Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD) - Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD) - António de Almeida Santos (PS)-José Manuel Maia N. Almeida (PCP) - Vasco da Gama Lopes Fernandes (PRD) - José Luís Nogueira de Brito (CDS) - Herculano Silva P. M. Sequeira (PV) - João C. Corregedor da Fonseca (ID).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar. Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade. Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.
1227.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, antes mesmo de pedir o esclarecimento que justifica a minha intervenção, quero esclarecer o Sr. Deputado e meu querido amigo Almeida Santos de que, neste caso e enquanto relator do parecer da Comissão, não fui «uma maioria que apoiou» o Governo; fui uma minoria, fui eu próprio, incólume na minha consciência técnico-jurídica - como, aliás, tive ocasião de evidenciar. Fui até «foco» de uma eventual «contestação». Só que no caso houve sintonia com a posição assumida pelo Governo. Mas justifiquei isso, exactamente, em termos técnico-jurídicos que, suponho, são pelo menos aproveitáveis.
Por outro lado, e como consta do segundo parecer, gostaria de dizer também que, seja qual for a posição que se assuma perante o artigo 83.º da Constituição - que é, no mínimo, o tal «patinho feio» a que o Sr. Deputado Almeida Santos se referia, com a sua imagística verbal que transforma as instituições em animais ou vice-versa.

Risos do PSD.

De facto, só o Sr. Deputado Almeida Santos conseguiria isso! ...
Mas a verdade - e voltando atrás - é que, seja qual for a posição que o meu partido ou eu próprio assumamos perante o artigo 83.º, acatamos o artigo integralmente.
Não vou reler o parecer da Comissão - eu próprio fugi da Sala quando ele estava a ser lido e, portanto, não vou incorrer no risco de voltar a lê-lo a todos vós, embora fragmentadamente -, mas sempre direi que tive ocasião de, citando Pensovecchio Li Bassi, dizer que o PSD - e, portanto, eu próprio - pensa que o artigo 83.º deve, no seu sentido juridicamente «respeitável» ou «considerável», ser inteiramente acatado.
Depois desta afirmação esclarecedora, o objecto do meu pedido de esclarecimento é a contrapartida - nós nunca damos nada sem pedir algo em troca ...

Risos do PSD.

... - em relação ao Sr. Deputado Almeida Santos.
De facto, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Almeida Santos se, em consciência, não entende que a formulação inicial do artigo 2.º, n.º 1, que a proposta de lei dá ao Decreto-Lei n.º 356/86 não conduz exactamente ao mesmo que resulta da redacção que lhe deu a Lei n.9 24/87. Ou seja, diz-se aqui: «É igualmente legítima, desde que observado o disposto no presente diploma [...]» Ora o Sr. Deputado Almeida Santos considerou que estas «especialidades» ou «especiosidades» textuais teriam como efeito ou como decorrência o retirar a constrição constitucional que o legislador ordinário deve aceitar. Como já evidenciei, não só no parecer como na troca de impressões que tivemos aquando do exame do mesmo na Comissão, creio que, quando se remete para o todo de um diploma, remete-se também para cada uma das suas parcelas.
Como só conheço a proposta e não falei com o Governo sobre o assunto, estou em crer que a ideia do Governo, quando diz «desde que observado o disposto no diploma», terá sido a de se referir não apenas ao n.91, mas a todos os restantes preceitos. Quer isto dizer que a «alienação» só é possível quando feita, designadamente, por concurso público, mediante a concessão ou outorga de preferencia às empresas e aos jornalistas, etc. Significa isto que o Governo, em vez de ter um propósito restritivo ou amputador, teve um propósito de amplificar, tomando mais amplos os deveres do Governo face a diversas entidades.

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Gostaria também de fazer a mesma observação, que julgo será válida e igualmente pertinente, quanto à redacção do artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 356/86, na redacção que lhe dará a proposta de lei n.º 16/V, neste momento em debate, ainda em fase preambular, e que diz: «[...] são alienáveis nos termos da Constituição e do presente diploma [...]» Parece que é objecto ou pedra de escândalo ou motivo de inconformidade a substituição por esta frase da frase anterior, que era «quando tal for admissível nos termos da Constituição e da lei». É evidente que estas frases são homólogas ou substancialmente sinónimas, e o Sr. Deputado Almeida Santos, que, além de brilhante deputado, é simultaneamente um douto jurista, sabe perfeitamente que assim é.
É evidente que podemos estar contra o «patinho feio» ou estar a favor de um «patinho mais bonito», mas a verdade é que as leis existem, a ideia do legislador é bem patente e não podemos hipotisar aquilo que supomos que o legislador vai fazer com uma determinada formulação. Devemo-nos ater à formulação que está expressa e objectivada na sua expressão textual. Caso contrário, estamos a fazer um juízo de intenções, uma valoração de processos, e não a interpretação correcta de uma lei em formação.

O Sr. Presidente: - Para dar esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Mário Raposo, os meus respeitos.
Começo por estranhar que o Sr. Deputado diga que quem apoiou o Governo através deste relatório foi uma «minoria» e que ela se resumiu a si mesmo, visto que este relatório foi votado pela representação da maioria que neste Parlamento apoia o Governo ao nível da 1.ª Comissão e sempre se entendeu - não sei se depois da minha saída da Comissão como presidente se alterou essa regra salutar - que os representantes dos partidos ou dos grupos parlamentares nas comissões têm tantos votos ou representam tantos votos quantos os seus colegas por cies representados. Assim, julgo que se tratou mesmo da «maioria», embora se trate de um aspecto formal que não tem muita importância.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Posso interrompê-lo Sr. Deputado?

O Orador: - Fax. favor, Sr. Deputado.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - É evidente que eu me referi à redacção intelectual do documento, não à posição política assumida perante ele. A posição política assumida pelo meu grupo parlamentar e pelo meu partido é consonante com o parecer. Mas o «agente» intelectual, no sentido de quem fez o parecer, fui eu, e nesse momento até era uma «minoria», pois estava em casa sozinho e não perguntei nada a ninguém. Nem sequer tinha o número de telefone do meu grupo parlamentar...

Risos do PSD.

O Orador: - Sr. Deputado, digamos que o «ultraje» aos seus camaradas está mais atenuado, mas, de qualquer forma, nós votamos aquela maneira de dizer as coisas e quantas vezes alteramos a maneira de dizer as coisas que constam dos pareceres. Portanto, houve um voto no sentido da direcção do parecer e também ninguém do seu grupo parlamentar considerou aberrante, do ponto de vista formal, o que constava do parecer.
O Sr. Deputado disse também, o que me deixa tranquilo: «Acatamos integralmente o artigo 83.º» Mas essa é a questão. Pois foi com base nessa afirmação feita hoje que o meu grupo parlamentar entendeu não votar favoravelmente as impugnações e dar ao Governo e à maioria que o apoia a possibilidade de depois, em discussão na generalidade e na especialidade, demonstrar isso mesmo. Pois estou convencido de que, se o Sr. Deputado Mário Raposo e o seu grupo parlamentar acham que tudo é a mesma coisa, então não se vão opor a que se reponham as formulações que já constavam da lei e que nos davam absoluta tranquilidade. Também não creio que o Governo se vá empenhar «ferozmente» na manutenção de expressões inúteis. Se uma modificação é inútil, eliminemos a modificação, e tenho a certeza de que nos vamos entender. Se, pelo contrário, o Governo disser: «não, não, não elimino coisa nenhuma; faço questão em manter integralmente as expressões da minha proposta», desculpará o Sr. Deputado, mas ingénuos não somos, e as expressões, normalmente, têm o significado que têm, e aquilo que o Sr. Deputado chamou «especiosidades verbais» não são tanto como isso, porque num caso trata-se de substituir um juízo de admissibilidade por um juízo de processamento. No texto anterior dizia-se «quando tal for admissível nos termos da Constituição», agora diz-se só «nos termos da Constituição», o que é bastante diferente.
Mas não é neste facto que reside a minha preocupação, mas sim no artigo 2.º, em que, referindo-se ao capital das empresas públicas e não a participações, o que é mais grave, se dizia «nas condições e limites definidos no artigo 1.º», e agora se eliminou essa matéria e se diz apenas «nos termos deste diploma».
O Sr. Deputado diz que a referência ao diploma é global. Estou de acordo, não está em causa que o Governo não pense cumprir o que está no diploma. O que digo é que ele pensa não cumprir o que está na Constituição, porque retirou a ressalva. Se o Governo não tem essa intenção, e eu estou a fazer um juízo de intenções que o Governo não merece, então basta que o Governo admita as minhas razões, considere que a substituição é inútil e reponha as expressões anteriores já citadas.
Com esta atitude todos ficaremos satisfeitos e a proposta de lei passa à discussão na generalidade e na especialidade, o que nos levará a um entendimento sobre estes aspectos, os únicos que pus em causa.
Relativamente aos restantes aspectos, o Sr. Deputado também não levantou objecções. Mas quanto às «expressões» que o Sr. Deputado considera como sinónimas, entramos em divergência, porque entendemos que não o são. Se o Governo entende que sim, então penso que existe, nesse caso, uma boa plataforma para se entender connosco, podendo então adoptar aquelas «expressões» que não nos fazem «borbulhas», e assim, no momento final da aprovação desta proposta de lei, todos estaremos, com certeza, felizes. Sinceramente, não sou tão ingénuo quanto isso e penso que o Governo é suficientemente hábil para ter optado intencionalmente por estas expressões, substituindo as anteriores. Vamos pôr à prova o Governo e depois veremos se é assim ou não é. Se não for, eu pedirei desculpa ao Governo, como é óbvio.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mário Raposo ainda deseja intervir?

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Obviamente que não vou fazer uma intervenção estirada. Vou apenas aproveitar a minha intervenção para fazer uma brevíssima referência à intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos.

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O Sr. Presidente: - É que, aqui na Mesa, ficámos com dúvidas se o Sr. Deputado Mário Raposo estava inscrito para uma intervenção...

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Estou inscrito para uma intervenção, mas usarei essa intervenção no mínimo.

O Sr. Presidente: - Certo! Faça favor. Simplesmente quero dizer ao Sr. Deputado que o PS não dispõe de tempo e que foi indicado, na conferência de líderes, que a Mesa utilizasse de extremo rigor quanto à utilização de tempos, o que vai fazer. O Sr. Deputado Almeida Santos não terá, portanto, tempo para lhe responder.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - O Sr. Deputado dá-lhe um bocadinho do seu tempo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Ah! Eu dou o meu tempo todo...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Todo não, só um bocadinho.

O Orador: - Eu calo-me, eu sento-me. Sento-me não! Eu não me sento nem me calo, mas repartirei.

O Sr. Presidente: - Há já dois grupos parlamentares que se ofereceram para dar tempo ao PS, designadamente a ID.

O Orador: - Obviamente que quero propiciar o diálogo, até porque o diálogo é enriquecedor e quero dispor de uma partícula desse enriquecimento.
Começarei por dizer que ouvi com muito aprazimento e com muita confiança o final da intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos, quando afirmou «nós não somos ingénuos». Já sabia que o Sr. Deputado não era e ainda bem que continua a não o ser. O Sr. Deputado Almeida Santos tem como elemento caracterizador o facto de não ser ingénuo, mas sim um homem confiante, uma pessoa aberta. É assim que se deverá ser. Portanto, estamos num diálogo fácil e é neste comprimento de onda que vamos proceder.
Devo confessar ao Sr. Deputado Almeida Santos que eu também não sou ingénuo. Tenho obrigação de não o ser, por todas as razões e até porque a ingenuidade excessiva é às vezes parvoíce. Temos obrigação, sobretudo, de não ser parvos.
Quanto à incidência destas especulações laterais ou personalizadas no texto do diploma, por mais artifícios verbais que faça dentro de mim próprio, por mais argumentações que use dentro do meu universo mental, transformando-o numa fogueira a crepitar, nada consigo. Quero ir ao encontro do Sr. Deputado Almeida Santos e acolher a sua contra-argumentação, mas, sinceramente, não compreendo que divergência possa haver entre «desde que observado o disposto no presente diploma» e «desde que observado o artigo 1.º deste diploma».
É evidente que a expressão «observado o disposto no presente diploma» é mais ampla do que a formulação anterior, que limita a observância ao artigo 1.º Relativamente a isto, até poderei dizer que seríamos ingénuos se tivéssemos admitido a anterior interpretação. Pois eu aqui até quero ser ingénuo! Realmente, sem uma fraude muito grande ou sem algum intuito oculto, no qual não creio, não vejo que a textualização da proposta de lei não seja clara.
Quanto ao artigo 83.º e, reservamo-nos para a sede própria, que é a revisão constitucional, para tomar uma
decisão sobre essa excrescência, essa remanescência de uma época que parametrou o sentimento, a disponibilidade e a flexibilidade da vida em Portugal e que tem, ainda agora, evidências à flor do tecido social que somos todos nós. Eu pergunto o que é que se conquistou com a imutabilidade das nacionalizações, quando todos nós sabemos que elas foram mal feitas. Conquistou-se o quê? A desagregação da economia, a deterioração do sentido de cooperação dos trabalhadores? Obteve-se ou conquistou-se alguma coisa em relação ao sector público? Não! Pelo contrário, degradou-se, em relevante medida, a imagem do sector público da economia, naquilo em que este é necessário e útil ao País. Portanto, esta convolação do Estado como Estado para o Estado como empresário público foi realmente um fiasco no nosso país.
Mas isto não está em causa neste momento. Nós aqui estamos escolasticamente, escolarmente, a aceitar o artigo 83.º Depois, em sede de revisão constitucional, iremos então debatê-lo - a começar pelos meus colegas de bancada que pertencerem à Comissão - ardorosamente - e penso mesmo que bras dessus, bras dessous - com o PS e com outros partidos desta Câmara. Porque, certamente, haverá um repensar global que a todos atingiu. Estou certo de que iremos então encarar o artigo 83.º e viabilizar realmente um país unido, um país com flexibilidade, um país moderno, um país em que haja realmente uma justa intervenção do Estado, em que o Estado não seja um Estado do laissez passer, um Estado inerme, um Estado passivo, um Estado abúlico, mas sim um Estado que intervenha, que corrija as anomalias, que impeça as distorções e as perversões da economia, mas que não torne imutável aquilo que nasceu para ser livre e criativo.
Esta é a minha opinião, tão desdobrada em palavras, sobre o preceito que o Sr. Deputado Almeida Santos, com o seu poder de síntese, definiu como o «patinho feio». Vejam lá, estive este tempo todo para dizer aquilo que o Sr. Deputado disse só numa frase: «Patinho feio.»
Tudo isto visa dizer que não haverá agora, de forma alguma, que beliscar no artigo 83.B
O que o Governo terá querido -e é evidente que quis- é o que está corporizado ou expresso nas duas propostas de lei, sobretudo nesta primeira que agora foi referida, ou seja, a viabilização de determinadas empresas- será evitar que elas sejam extintas e que, com isso, todos percam: os trabalhadores, a economia nacional, enfim, todos nós. E que, sobretudo -nisto continuo a insistir e com isto remato-, se perverta ou que se desfigure a própria imagem da economia pública. Porque o sector público é necessário num país. Não devemos contrapor necessariamente, em economia, um sector que é bom, que é o privado, e um sector que é mau, que é o público. Devemos, sim, recuperar a imagem do sector público, porque ele é necessário ao País, e evitar que ele se console ou se transforme numa fonte de prejuízos, de distorções, de erros permanentes e continuados, que toda a gente reconhece, mas que ninguém tem coragem de enfrentar. Isto porque muitos receiam, com isso, beliscar a sensibilidade daqueles que persistem em erigir num símbolo imutável a constitucionalidade económica colectivizante, apesar da modificação estrutural com que a beneficiou após a revisão de 1982. Homenagem seja aqui prestada a essa revisão.
Estou certo de que, na próxima revisão, haverá uma nova reformulação do artigo 83.º, mas até lá cumprimo-lo. Mas cumprimo-lo com bom senso.

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E é a isso que, estou certo, o Governo se propôs. É isso que está justificado, bem ou mal, mas com a necessária clareza, nos dois pareceres que foram lidos perante o Plenário.
Com isto me basta, pois suponho que já se disse o suficiente sobre o mérito -mérito, evidentemente, no sentido processual - dos recursos interpostos pelo PCP e pelo Agrupamento Parlamentar da ID.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para uma pedido de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só para homenagear o Sr. Deputado Mário Raposo, nos mesmos termos que ele o fez em relação a mim, porque as perguntas são sempre lisonjeiras para quem acaba de falar.
Não somos ingénuos, é evidente que não somos. Só que um de nós está errado e é preciso saber quem. Se o Governo chegar e disser «vamos lá repor aquilo que lá estava, a intenção é a melhor possível, não queremos dúvidas sobre o nosso respeito pela Constituição», estarei errado eu e pedirei desculpa. Se em vez disso disser «não, não, eu quero isto tal como está lá», nessa altura quem está errado é o Sr. Deputado Mário Raposo.
Fez V. Ex.ª considerações sobre o artigo 83.B que eu penso que não estão em causa. Não estamos a discutir o que vale, o que valeu e o que não valeu o artigo 83.B Eu não secundo isso. Acho que ele é um «patinho feio», converteu--se nisso sobretudo, mas não estou de acordo em que as nacionalizações tenham assim, de forma tão redonda, promovido a desagregação da economia, a degradação da imagem do sector público, o fiasco, etc.
Quero, porém, dizer que penso muitas vezes no que teria acontecido à economia em geral se algumas empresas do sector público não tivessem sido nacionalizadas. Muitos bancos tinham falido, as seguradoras tinham falido quase todas, muitos hotéis teriam desaparecido ou falido se não tivessem sido intervencionados. Na altura, as pressões para a intervenção do Estado na empresas eram tão grandes e tão fortes que provam bem que o sector privado estava mais alto do que o que resultaria das excelências que normalmente lhe atribui quem defende o sector privado, contrapondo-o ao sector público. Acho que o sector público está ultradimensionado, sobredimensionado, mas não estou convencido de que alguns tipos de empresas tivessem mais êxito ou venham a tê-lo se forem transferidas para o sector privado. Também não estou convencido, repito - disse-o e o Sr. Deputado Mário Raposo fez-me o favor de não me contraditar -, de que o Governo vai muito menos longe do que o que se julga no desejo real de transferir empresas para o sector privado.
Mas o que queria perguntar, para justificar a minha intervenção, quanto mais não fosse, é que, se me diz que não vê onde é que está a diferença, interrogo-me como é que pode não a ver se o artigo 1.º diz «as partes, quotas ou acções são alienáveis nos termos da Constituição», repito, «as parte, quotas e acções são alienáveis nos termos da Constituição» -portanto, só as partes, as quotas e as acções -, e o artigo 2.º diz «é igualmente legítima, desde que observado o exposto neste diploma, a alienação e oneração do capital da empresa». O artigo 1.º refere-se a participações, o artigo 2.º ao capital da empresa. No primeiro ressalva-se a Constituição, no segundo eliminou-se a ressalva da Constituição. Porque, se isso cá não estivesse, eu ainda admitia a boa fé do Governo. Não estava cá, o legislador anterior também a não tinha julgado necessária... Mas acontece que estava cá e foi retirada. O Governo há-de explicar-me onde está a boa fé em ter tirado o que cá estava.
É esta a razão de ser da minha suspeição de que o Governo não está nisto de boa fé. Se está, ainda tem tempo para o demonstrar. Se o fizer, ficaremos felizes no fim, como nas histórias que contamos às criancinhas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos: Uma intervenção muito breve para lhe dizer ser evidente que acho, como todos nós acharemos, que algumas nacionalizações, na época, terão sido feitas correctamente. Pelo menos tiveram uma resultante temporal ou conjunturalmente correcta. Só que a sua permanência, a sua transformação numa estrutura, é que se tornou profundamente errada. E é isso exactamente o que está mal no artigo 83.º Não permite seleccionar, não permite tomar opções, não permite uma avaliação disponível do que é bom e do que é mau. Não estarei contra algumas nacionalizações feitas em 1975 - aliás, foram quase todas em 1975, de 11 de Março até à Constituição. O que repudio, de jure constituindo, entendamos, é a permanência, a imutabilização, a parametração, o amordaçamento que é feito da nossa capacidade selectiva. Nós, que já fizemos parte de um mesmo governo, constatámos então situações catastróficas de empresas, perante as quais pouco se poderia fazer, por existir um artigo que é uma bandeira, que é uma proclamação, que é um preâmbulo, um artigo que é um verso, mas que não tem realmente um reverso. É disso que discordo.
Quanto àquilo que o Sr. Deputado Almeida Santos disse muito esclarecidamente - esclarecidamente e em jeito de pedido de esclarecimento -, direi que tive o cuidado de acentuar que a mais sensível diferença residirá exactamente no facto de mais configuradamente se permitir, neste diploma, a alienação de estabelecimentos de uma empresa ou de parte deles. Quereria também voltar a esclarecer - e todos nós sabemos isso, nem sequer seria necessário de novo esclarecer, pois só sábios somos não sei quantos, e não recordo o número dos Srs. Deputados presentes...

Uma voz do CDS: - O Sr. Deputado era um deles!

O Orador: - Comigo então era um reforço enorme!
Como ia dizendo, esclarecerei que aí é que haverá realmente uma diferença qualitativa, porque um estabelecimento é um conjunto de bens. No entanto, um conjunto de bens que se dissocia da empresa. Isso já estia, de qualquer forma, implícito no artigo 3.B do Decreto-Lei n.º 358/86.
Consequentemente, esse é o único ponto de diferença, perfeitamente natural porque já estava no artigo l.8 da Lei n.º 24/86, embora de modo pouco expresso. Daí que o Governo o tenha agora clarificado.
O Sr. Deputado Almeida Santos ainda há pouco teve ocasião de precisar e de definir que na sua perspectiva da legislação agora em preparação não vai resultar uma avalanche de reprivatizações. Não sei se vai ou se não vai. O que sei é que, na realidade, o Governo se integrou exactamente na moldura que lhe era conceptível e é isso que neste momento poderemos avaliar.
Parece até que a resultante final destas nossas mútuas intervenções foi concordante. Concordámos que algumas

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nacionalizações foram mal feitas e têm de ser rectificadas, concordámos que o artigo 83.º tem de ser alterado, mas que até lá ele vale e tem de valer, e que este diploma, fundamentalmente, não poderá derrogar em muito o sistema que já está estabelecido.
Na perspectiva do Sr. Deputado Almeida Santos, numa pequena franja ele será inconstitucional. Na minha perspectiva, penso que ele é totalmente constitucional. Esta a nossa pequena margem de desentendimento. Mas o que era a vida sem desentendimentos entre pessoas que se estimam e se admiram. Eu, pelo menos, penso assim. Não sei qual será a sua posição em relação a mim.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Almeida Santos pede a palavra para que efeito?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só por uma questão de cortesia. Para dizer que também é recíproco esse respeito e amizade. Mas já agora, já que me deu esta oportunidade, gostaria de dizer que, em política, as atitudes têm data e muitos de nós já não se lembram quem é que votou, em 1976, a favor da irreversibilidade das nacionalizações e quem votou contra...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, pedia-lhe para ser breve. V. Ex.ª está a usar da palavra, mas, regimentalmente, não o pode fazer, pois não dispõe de tempo.

O Orador: - Faça de conta, Sr. Presidente, que pedi uma interrupção ao Sr. Deputado Mário Raposo e que ele a consentiu, embora isso não seja muito regimental.
Em 1976 quem votou contra a irreversibilidade das nacionalizações foi o PCP e quem votou a favor dela fomos todos nós.

Vozes do PCP: - Ó Sr. Deputado Almeida Santos!

O Orador: - Sim, sim. Peço desculpa, mas é verdade.
As coisas têm uma data e, portanto, não vale a pena atirarmos pedras uns aos outros como se nós fôssemos os responsáveis pelo artigo 83.B ou, sobretudo, como se fosse o PCP que está inocente. Nós temos alguma culpa.
Era só isto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães quer interpelar a Mesa?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que o Sr. Deputado Mário Raposo irá responder às observações feitas pelo Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Mas regimentalmente, o Sr. Deputado Mário Raposo não tem oportunidade para responder.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Este é um considerando preliminar, que não obsta ao segundo, para frisar que o Sr. Deputado Almeida Santos acabou de ditar para a acta uma observação - que, aliás, já tinha tido a gentileza de formular num jornal que se publica semanalmente - e que não corresponde à realidade. É uma matéria em relação à qual gostaríamos que não houvessem dúvidas.
Qualquer partido é livre de alterar as posições que entender. Assume disso a responsabilidade integralmente.
Naturalmente todos nós temos a nossa história e podemos fazer alterações de posição. Isto tudo concedemos.
Agora diga-se à puridade que dizer-se que o PCP votou contra a irreversibilidade das nacionalizações não tem ponta por onde se lhe pegue. O artigo 83.º da Constituição é composto pelos n.ºs 1 e 2. O n.º 2 estabelece uma excepção ao n.º 1 e o n.º 1 garante a irreversibilidade das nacionalizações. O PCP, tendo votado a favor do princípio da irreversibilidade das nacionalizações, pronunciou-se contra a admissão das nacionalizações parciais, o que é completamente diferente do que aqui ficou dito. E aqui se rectifica a puridade, para todos os efeitos. Agradecia que equívocos deste tipo não fossem multiplicados, porque são coisas banais, verdades de facto elementares.

O Sr. Presidente: - Sob a forma de interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Eu disse isso a título de graça, mas devo dizer-lhe que é isso mesmo que consta dos manuais constitucionais. O que os comentaristas da Constituição dizem é que o PCP votou contra os dois números do artigo 83.º

Vozes do PCP - Isso é um erro!

O Orador: - Ah!, bom! Se é erro, então eu, nessa altura, corrijo o erro. Agora que isso figura no texto da Constituição do Dr. Jorge Miranda e também num outro texto é evidente que consta. Portanto, o meu erro é um erro induzido. Se é erro, peço desculpa, mas na verdade estou coberto por esses dois comentadores.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Está mal coberto Sr. Deputado!

O Orador: - Mal coberto? Talvez! Talvez!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o CDS o que tem caracterizado este debate é, salvo a dureza da expressão, um pouco de fraude política. Com efeito, um observador menos atento que ouvisse o que se tem passado nesta Assembleia poderia ser levado a pensar que o Governo tinha trazido a esta Câmara uma proposta de lei de desnacionalização do sector público. Poderia, de facto, ser levado a pensar que o Governo queria desnacionalizar, queria aplicar em Portugal a receita «tatchcríana», queria levar à prática a promessa eleitoral do capitalismo popular, queria, numa palavra, cumprir a esperança, como o Governo tão prodigamente disse antes das eleições.
Ora, não é nada disso que se passa. O Governo trouxe a esta Assembleia uma proposta de lei tímida, desconexa e sem grande sentido, vindo dizer que ainda não sabe quais os sectores onde quer actuar, nem como é que vai actuar. Faz uma amálgama entre o regime geral das sociedades comerciais e as sociedade públicas reprivatizadas, que é algo que ainda não se percebe bem o que vai ser. Em suma, é um fogacho! E é um fogacho precisamente para que haja este debate aqui, na Assembleia da República, para que lá fora se diga que o Governo está a cumprir uma promessa, está a reprivatizar, está a desnacionalizar, quando isso é uma mentira.

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Por isso, o que aqui vimos dizer é que este debate está mal e que o Partido Comunista está, mais uma vez, a prestar um grande serviço ao PSD.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Está, de facto, a prestar um grande serviço à intervenção política do PSD, porque neste momento o PSD não quer privatizar nem desnacionalizar nada - e isto não quer dizer que o não venha a querer-, porque, se realmente o quisesse fazer, teria aguardado por uma revisão constitucional séria e só depois teria apresentado nesta Câmara uma lei quadro de privatizações e de desnacionalizações, onde, aí sim, este debate teria a sua sede própria.
Ora, não foi nada disto que se passou e estamos agora a discutir aqui qualquer coisa cuja constitucionalidade é, obviamente, duvidosa. Ainda há bem pouco tempo, aliás, o próprio Tribunal Constitucional se dividiu quando analisou o caso concreto da SOCARMAR - e no fim de contas é isso que está aqui em causa-, tendo-se quatro conselheiros pronunciado a favor da inconstitucionalidade e três contra.
Portanto, trata-se de algo de constitucionalidade duvidosa, mas de nulo efeito político nesta sede.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a atitude do CDS sobre este assunto é modesta. O que dizemos é apenas isto: a Assembleia da República não deve servir como órgão normal de fiscalização preventiva da constitucionalidade - para isso existe o Tribunal Constitucional -, a não ser quando a inconstitucionalidade seja grosseira, seja tão óbvia que a Assembleia deva, inequivocamente, assumir esses poderes.
Neste caso concreto há dúvidas, é uma questão de «malha fina», como se poderia dizer, em que obviamente há divisões: há juristas e especialistas que entendem uma coisa e outros que entendem outra. Mas não é mais do que isso o que está em causa nesta altura.
Portanto, trata-se de uma proposta de lei que balanceia entre o conservadorismo do Partido Comunista, que não pode ouvir falar em desnacionalizações nem em privatizações, pois fica logo nervoso, excitado, e contesta tudo o que tenha a ver com isso - tenho para mim que, se a perestroika fosse aplicada à nossa Constituição, vocês eram capazes de dizer que ela também era inconstitucional -, e a timidez do PSD, que, mais uma vez, não está a cumprir as promessas eleitorais.
Isto não é nem reprivatizar nem desnacionalizar; é deitar areia nos olhos dos nossos votantes, e é isso o que neste momento está em causa.
Ora, o CDS não participa nessa fraude política e, portanto, nesta sede apenas dizemos que vamos votar contra o recurso interposto pelo PCP e pela ID, porque entendemos que, embora de constitucionalidade duvidosa, a Assembleia da República não deve assumir essa fiscalização preventiva nesta matéria.
Quanto ao fundo da questão, é evidente que ele não está a ser aqui discutido. Esta não é a reprivatização que o CDS entende, não é nenhuma desnacionalização. Logo, só quando o Governo e o partido que o apoia apresentarem aqui a sua proposta, se o quiserem fazer, é que discutiremos sobre este assunto. Se não o fizerem, o CDS, a seu tempo, apresentará o seu próprio projecto de desnacionalização e de reprivatização, e nessa altura ver-se-á o que é uma desnacionalização e uma reprivatização.
Agora, fogachos, meios termos, iniciativas para encobrir o imobilismo do Governo, nessa propaganda o CDS não colabora!

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, acabei de o ouvir falar em timidez do PSD e de ouvir dizer que, se fosse o CDS a apresentar uma proposta de lei neste momento, iria muito mais além.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não, não!

O Orador: - O CDS, a seu tempo, como disse o Sr. Deputado, irá fazer qualquer coisa diferente. Quer dizer: o PSD é mau e o CDS é bom!
Ora, no fundo, somos todos iguais. Cada um tem a sua perspectiva, o seu ponto de vista, e, portanto, penso que não devemos acusar de timidez um partido apenas porque ele, manifestando a sua inconformidade com um preceito constitucional, o quis respeitar. Acho que acusar alguém de pretender respeitar a Constituição é um erro ou, pelo menos - e não quero qualificar a atitude do Sr. Deputado Basílio Horta com grandes adjectivos, até porque nunca o faria, obviamente -, é inadequado.
O PSD, através do Governo, apresentou uma proposta de lei com o propósito perfeitamente definido de flexibilizar um regime, de aperfeiçoar determinados preceitos de um sistema global, sem atentar contra uma norma constitucional que tem de prevalecer e que é de aplicação e de respeito obrigatório, diga-se o que se disser.
Como vê, Sr. Deputado Almeida Santos, eu tinha razão, e já tenho o Sr. Deputado Basílio Horta a dar-ma.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Pelo contrário!

O Orador: - Enfim, no fundo, o PSD tende a estar entre dois fogos, e ainda bem que assim é, porque está sempre muito bem acompanhado.
Penso que a proposta de lei em questão é perfeitamente pertinente, assim como a posição do PCP também tem a sua justificação. E compreendo que o Agrupamento Parlamentar da Intervenção Democrática, tendo uma determinada perspectiva do artigo 83.B e dentro do seu conceito de Constituição -que é, evidentemente, antípoda do nosso -, tenha considerado este diploma inconstitucional. É que, no fundo, se trata da interpretação de um artigo e se trata da interpretação de uma parcela da Constituição, a chamada «Organização económica», que arranca, salvo erro, do artigo 80.º e vai por aí fora.
Portanto, a posição do PCP e a da Intervenção Democrática são perfeitamente naturais, como foi natural a intervenção do Partido Socialista e como foi respeitável, dentro desta acepção, a posição do CDS. Esta talvez tenha sido um pouco truculenta - e tenho muita pena de o dizer, porque sou um velho compagnon de route do CDS -, já que penso ser demasiado acusar de «timidez» o PSD apenas por ele se ser atido à observância de um preceito constitucional.
O Sr. Deputado Basílio Horta pode retorquir: «Não, é uma questão de timing, de calendário; o que dizia era que o PSD não devia ter apresentado proposta nenhuma antes da revisão constitucional e, quando esta tiver lugar, nela fazer com que o artigo 83.º seja expurgado.»
Ora, é evidente que o PSD não comanda a revisão constitucional, pois trata-se de uma tarefa de toda a Assembleia, que tem de ser decidida pela maioria constitucional prevista.
Consequentemente, o PSD, neste momento e nesta circunstância, fez exactamente tudo p que devia ter feito. Assim sendo, e com toda a afectividade que tenho pelo

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Sr. Deputado Basílio Horta, em meu nome e suponho que no da minha bancada, repudio frontalmente essa tímida acusação de timidez. Ao menos, não haverá grande mal enquanto as acusações de timidez sejam tímidas...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Penso que, ao contrário de ser tímida, a acusação do CDS foi tão frontal que o Sr. Deputado Mário Raposo se sentiu tocado por ela e veio responder com a afectividade que lhe é conhecida e que lhe agradeço.
Sr. Deputado Mário Raposo, o problema que o CDS tem em relação ao PSD nesta matéria não é um problema de timing, não é dizer que o PSD apresentou esta iniciativa fora do timing. O que poderíamos dizer era que se tratou de um problema de compreensão lenta. Sc esta Constituição está em vigor desde 1980 e se ininterruptamente o PSD foi governo até hoje, por que é que só agora é que apresentou esta proposta de lei? Por que é que só agora é que sentiu essa necessidade de cumprir a Constituição? Por que é que durante tantos anos nunca a sentiu e, pelo contrário - como há pouco dizia o Sr. Deputado Almeida Santos-, foi até travão de algumas das desnacionalizações, no bom sentido do termo, isto é, no das reprivatizações que foram tentadas em governos anteriores? Então o PSD opôs-se a elas e é agora, em vésperas de revisão constitucional, que sente esse impulso irrespondível de cumprir o artigo 83.B da Constituição? Mas que estranho timing o do seu partido, Sr. Deputado Mário Raposo!... Isso não tem nada a ver com o cumprimento do artigo 83.º da Constituição!
Por isso, Sr. Deputado, é que dizemos que não é uma questão de timing, mas sim de princípios. Sc, efectivamente, o PSD quisesse proceder a uma reprivatização séria - e digo séria politicamente, obviamente -, a uma nova repartição do sector público da economia, a um novo estatuto da gestão dos bens públicos do Estado, então esperava por uma revisão constitucional que lhe permitisse fazer uma lei quadro e não fogachos, que lhe permitisse enquadrar numa perspectiva globalizante tudo aquilo que tem a ver com a gestão do sector público da economia e não isto. Isto é a desculpa para não fazer a revisão constitucional, é a desculpa na perspectiva de que não vai encontrar consensos para fazer aquilo que deseja e, então, diz ao eleitorado que tentou. No fim de contas, Sr. Deputado Mário Raposo, é o afloramento nesta Câmara daquilo que o Sr. Primeiro-Ministro falou em Vila Real, que são as tais «forças paralisantes e imobilistas», as tais «toupeiras», que andam até e sublinho o até - junto da Presidência da República. Isto é mais uma desculpa ao lado de outras, ou seja, o Governo apresenta esta proposta de lei para depois poder dizer que era o que se podia fazer, uma vez que a revisão constitucional não pôde ser feita.
Isto não tem absolutamente nada de truculento, é a verdade. De outra forma, mal se entenderia, porque reconheço que o Governo e o PSD têm, certamente, ideias mais globalizantes e concertadas sobre este tema; a apresentação deste diploma, que, sendo entendido como tal, é um meio de o Estado dar um primeiro passo e ler algumas receitas adicionais, mas não é, certamente, a vossa proposta em matéria de reprivatização, nem é esse impulso de cumprir o artigo 83.º da Constituição.
Por isso é que, politicamente, neste momento estas propostas são um fogacho... e de mau prenúncio, porque se os senhores tivessem uma boa dose de certeza de que iam fazer a revisão constitucional, certamente que aguardariam que essa revisão fosse feita e, então, em sede própria, apresentariam as leis oportunas que aqui teríamos muito gosto em discutir com a seriedade que elas merecem.

O Sr. Mário Raposo (PSD):- Peço a palavra para fazer uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O seu grupo parlamentar esgotou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, dá-me licença que interpele a Mesa?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, uma vez que o recurso também é nosso e estamos interessados neste debate, se ainda tivermos dois minutos, cedo-os ao Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, dou a palavra ao Sr. Deputado Mário Raposo, para uma intervenção.

O Sr. Mário Raposo (PSD): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Afinal, o Sr. Deputado Basílio Horta, no esclarecimento que deu, acabou por não esclarecer nada ou, melhor, acabou por esclarecer que não tinha nada a esclarecer.
O Sr. Deputado disse e repisou que não era uma questão de timing, mas depois acabou por dizer que para se fazer uma privatização séria tinha de se esperar pela revisão constitucional. Ora, esperar pela revisão constitucional é aguardar por um tempo diferente, o que, se bem traduzo o inglês, é timing, é calendário, é correr no tempo, situar no tempo.
E evidente que aquilo que o Governo pretendeu não foi privatizar nada nem fazer nenhuma política, para além da que resulta desta proposta de lei. Isto é: alterar muito concretamente um decreto-lei de 1986, que, por seu turno, foi alterado pela Lei n.º 24/87 e que agora o Governo vai ver clarificado no que respeita ao que advirá da transformação do capital e dos bens de algumas empresas públicas. Pode contestar-se isto por não ser uma privatização «à Tatcher» ou uma privatização «à Chirac», mas é evidente que não a podemos fazer agora, enquanto tivermos o artigo 83.º E nem se diga que melhor seria pedir-se «asilo político» a outro país porque aqui em Portugal não o conseguimos fazer. Mas eu sinto-me muito bem em Portugal, Sr. Deputado Basílio Horta, e, portanto, o melhor é mantermo-nos aqui com todos os defeitos e até com o artigo 83..

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - No fundo, a intervenção do Sr. Deputado Mário Raposo veio dar total razão à intervenção do meu partido e até trouxe alguns aspectos que lançam alguma perplexidade.
Se, efectivamente, o PSD e o Governo, com estas propostas - que qualifico de tímidas e que o Sr. Deputado qualifica de arrojadas -, não querem dar o primeiro passo na privatização, então gostaria de saber o porquê desta

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urgência em alienar 49% das sociedades do Estado. Começo a não entender o porquê desta urgência agora, depois de sete anos decorridos sobre a revisão da primeira Constituição, tão expedita, se assim se pode dizer, em afectar ao sector privado, sem regras muito claras, uma parte do sector público.
Ainda se esta matéria fosse enquadrada, como há pouco dizia, numa visão global, que pode ser a nossa ou a vossa... Mas esta não é uma política global, e o Sr. Deputado é o primeiro a reconhecê-lo quando diz que se pretende apenas cumprir o artigo 83.B, isto é, possibilitar a aplicação de um decreto-lei preexistente.
Que urgência é esta? A que interesses quer o Governo responder com esta proposta de lei? É que, se não é dar o primeiro passo para a privatização, então é outra coisa. Qual é essa coisa, Sr. Deputado Mário Raposo? Qual é ela?
É que aí o problema complica-se, porque se é um primeiro passo de um projecto, de um longo caminho, ainda tem alguma lógica, embora nós não o fizéssemos assim. Mas se não é um primeiro passo, é um remendo? O que é que V. Ex.ª quer remendar com esta proposta de lei, Sr. Deputado?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo, a quem o Grupo Parlamentar do PRD acaba de ceder cinco minutos do seu tempo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, devo dizer-lhe, em primeiro lugar, que não qualifiquei de arrojadas as propostas do Governo-arrojadas, evidentemente, na circunstancia.
O Sr. Deputado fez aí um processo muito complicado ..., perguntou qual é a coisa.... o que é que haverá...
Penso que estamos aqui a encarar uma lei com tantos argumentos extralegais, estamos a fazer uma análise tão politizada de uma proposta de lei que acabaremos por não a compreender, quando o que deve ser encarado numa iniciativa legislativa é aquilo que consta dela, o condicionalismo em que se insere e o quadro constitucional em que se pode mover.
Ora, foi exactamente isso o que o PSD fez.
Quanto à questão de saber por que é que o governo em 1982, ou seja, depois da revisão constitucional, não desencadeou imediatamente mecanismos deste estilo, o melhor é fazer essa pergunta ao governo de então, do qual, salvo o erro, fazia parte o Sr. Deputado Basílio Horta.
Depois, em 1988, o governo encarou essa problemática - e tenho disso uma recordação precisa e desencadeou a iniciativa legislativa de que resultou o decreto-lei de 1986 e que é aquele que está agora...

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Basílio Horta (CDS): - Já que o Sr. Deputado referiu o nosso governo de 1980, gostaria de perguntar-lhe se está a ver o Dr. Sá Carneiro a subscrever propostas de lei deste tipo.
O Orador: - Sr. Deputado, penso que não vale a pena chamarmos aqui à colação o Dr. Sá Carneiro, uma vez que todo este conjunto de actuações só se tornou fundamentalmente possível depois da revisão constitucional de 1982.
Tive ocasião de dizer, num dos pareceres da Comissão de que fui relator, que tinha sido substancial a alteração do quadro constitucional do artigo 80." e seguintes da Constituição, na medida em que se tinha ampliado ou constituído um novo quadro hermenêutico em que se podia mover o legislador ordinário.
Portanto, o problema não se pôs em 1980, mas sim depois da revisão constitucional de 1982. Entretanto, como sabe, é sempre com muita saudade e afectividade que relembro esse tempo. Aliás, a nossa afectividade vem fundamentalmente daí, porque depois disso até não tenho tido o prazer de contactar muito consigo.
Mas é evidente que nessa época o problema não se podia pôr porque o quadro constitucional de então não era o mesmo de hoje.
Penso que o que o Governo pretendeu fazer foi permitir alterações dentro do quadro constitucional actual. No entanto, não posso saber qual o pensamento do Governo, porque, como digo, para emitir um parecer sobre uma proposta de lei um deputado não tem a obrigação de promover uma reunião do Conselho de Ministros para lhes perguntar o que é que se pretendeu com isto ou com aquilo, para saber como vai elaborar o seu parecer. Não tenho obrigação de fazer isso, Sr. Deputado. Como deputado que sou, estou numa relação de fidelidade e atribuo confiança ao Governo que apoio, como certamente haverá uma reciprocidade dessa confiança e desse respeito em relação a mim.
Portanto, nem eu perguntei nada ao Governo, nem o Governo me perguntou como é que eu iria elaborar o meu parecer. E assim é que estamos bem, cada um em seu campo, sabendo de antemão que partimos do mesmo ponto e pretendemos atingir os mesmos objectivos, que são os do Partido Social-Democrata.
Daí que não tenha de haver concatenações, nem confabulações, porque normalmente, espontaneamente, chegamos ao mesmo resultado. E ainda bem que assim é.
Mas já que o Sr. Deputado fez essa invocação histórica, gostaria de lhe pôr a questão de saber por que é que de 1982 a 1984, uma vez que depois entrou outro governo com outro pondo de vista, necessariamente diverso, não se terão tomado essas atitudes.
Agora, sem saber exactamente quais terão sido as intenções últimas, para além das evidentes melhorias formais do texto e de uma certa amplitude do seu quadro legal e normativo, diria que há uma hipótese que é evidente. Imagine o Sr. Deputado um estabelecimento comercial de uma empresa pública cujo equipamento se está a degradar por completo. Pergunto: então será por esse estabelecimento pertencer a uma empresa nacionalizada que o Governo deve, passiva e irrealisticamente, cruzar os braços e deixar que tudo se deteriore e degrade? Não!
É evidente que o que o Governo pretende com isto é ampliar a sua capacidade de acção, sem, no entanto - e repito -, alterar o quadro constitucional em que se move e que tem exactamente como referencial o artigo 83.º
Em síntese, as observações que o Sr. Deputado Basílio Horta fez, salvo o devido respeito, não são muito pertinentes naquilo que me toca, porque me limitei a fazer a análise de um texto legal em termos perfeitamente descomprometidos ou, melhor, apenas com o único pressuposto de partir da mesma base doutrinal de que parte o Governo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao impugnar as duas propostas de lei hoje em debate, o PCP quis, precisamente, que na Assembleia da República se fizesse um alerta e uma clarificação em relação a uma questão fundamental no actual momento português.
Ao fazê-lo estamos convictos de que prestámos um serviço à luta contra a alteração ilegítima e inconstitucional da Constituição e não, seguramente, um serviço ao PSD e aos defensores dos lobbies, que neste momento se acotovelam para a conquista e o desmantelamento do sector

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empresarial do Estado, protegido pela Constituição da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O debate aqui travado, como todos podemos perceber, foi de grande importância política. Ouvimos da boca de alguns dos protagonistas da ofensiva contra as nacionalizações, ao longo destes anos, interessantes revelações, confissões sobre pormenores e detalhes dessa ofensiva, que revelam os intuitos que presidiram à sua actuação contra os interesses nacionais ao longo destes anos. Só por isso valeu a pena realizar este debate, porque fizemos essa clarificação e ela não é despicienda para o juízo que o povo português há-de fazer sobre tudo o que hoje ocorre.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O debate confirmou, quanto a nós claramente, que a maioria parlamentar, o PSD, está mergulhada na inconstitucionalidade e, premeditadamente, na névoa em relação aos seus propósitos neste domínio. E não tem argumentos! O debate sob esse ponto de vista foi inteiramente claro.
Vive-se, em matéria de privatizações, um clima abertamente malsão, um clima doentio. Por um lado, porque as propostas, como hoje aqui ficou demonstrado, são aberta e contumazmente inconstitucionais. Esta observação veio de todas as bancadas, salvo da bancada do PSD, em termos mais dúbios aqui, menos dúbios dali, em termos inteiramente consequentes da nossa pane.
O programa de desnacionalizações, esse e inteiramente desconhecido. A maioria, como é próprio, será a última a saber e revelou hoje, aqui, uma exemplar ignorância quanto aos alvos, às metas, aos contornos e às intenções do Governo nesta matéria.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso mesmo!

O Orador: - Quanto ao Governo, não diz, isso sabemo-lo, coisa com coisa. Ao Finantial Times, às vezes, ao Wall Street Joumal, outras vezes, o Sr. Primeiro-Ministro diz coisas sobre objectivos, sobre empresas a desnacionalizar e a privatizar, total ou parcialmente. No dia seguinte desmente tais afirmações aos jornais portugueses, à televisão portuguesa, contradiz-se. Para cúmulo -e isso é inaceitável numa matéria desta gravidade -, os ministros, os tais que são aconselhados a «não andarem a falar por aí», acodilhados por algum jornalista mais curioso, perguntados sobre quais são as intenções do Governo sobre esta matéria, berram esta coisa medonha: «Não tem mais nada que fazer do que perguntar-me sobre privatizações?» Foi o que aconteceu ao Sr. Ministro Cadilhe. Perguntamos se isto é forma de um governo, com um programa e com uma específica legitimização, se comportar no nosso regime democrático. Pela nossa parte, entendemos claramente que não! Só o Primeiro-Ministro saberá, só na mente do Primeiro-Ministro estarão as peças, as fases, os trâmites e demais segredos do dossier «privatizações» ...
Entretanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados -e isto é grave-, os lobbies uivam. Sc alguma frase resume o aspecto negativo dos tempos que vivemos, é talvez essa: este é o tempo em que os lobbies uivam. Parafraseando um célebre livro de um grande escritor, somos gente que vive e luta «quando os lobbies uivam».
Este debate não permitiu clarificar esse nebuloso conjunto de intenções, não se revelou, aqui, qual é o programa oculto da cruzada privatizadora. Isso teremos de continuar a desvendar, contra isso teremos de combater!
Em todo o caso, conseguimos hoje - e isso foi importante do nosso ponto de vista - avançar na demonstração
da inconstitucionalidade das propostas apresentadas pelo Governo. E, isso, como já sublinhei, por parte não de uma mas de várias bancadas.
Também devo dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é significativo que, junto da opinião pública de vários quadrantes, a acusação de inconstitucionalidade parta tão frontal e tão aberta: é contradição entre as propostas do Governo e a Constituição da República, tenha-se sobre ela a opinião que se tiver.
E significativo que há dias, num seminário realizado na Universidade Católica, o ponto de vista exclusivo, não digo dominante, emitido a propósito da proposta do Governo tenha sido a de que, precisamente, a operação 49 % é inconstitucional.
Curioso é também que Freitas do Amaral, em recente conferência realizada no Fórum Picoas, tenha dito isto a certa altura, em resposta a uma pergunta, aliás formulada por um deputado desta Casa que está ausente neste debate: «Concorde-se ou não com o princípio contido no artigo 83.Q da Constituição da República, a verdade é que, mantendo-se este, a privatização a 49 % é inconstitucional.»
Os relatórios hoje apresentados pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias são, em nosso entender, lamentáveis, mas vêm introduzir no debate um aspecto que lhe faltava, ou seja, uma originalidade que se aproxima do ridículo. A maior originalidade é esta: segundo o douto relatório, a proposta do Governo relativa à privatização de empresas públicas de comunicação' social não seria inconstitucional porque o Governo, afinal, não quer desnacionalizar empresas nacionalizadas. Quererá outra coisa que o autor do relatório não é capaz de exprimir, o resto seria um processo de intenções. Devo dizer que se nos afigura inaceitável um argumento deste tipo.
As intenções do Governo constam do seu Programa, suo conhecidas, ninguém pode alegar a ingenuidade de não ler o Programa do Governo. Nós, em todo o caso, não podemos aceitar que se faça o fingimento de dizer à opinião pública que a intenção do Governo não é aquela que, confessamente, é e pela qual ansiosamente os tais grupos de interesses se movem e se agitam de uma forma que é particularmente obscena!
A segunda originalidade dos pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é que levam demasiado longe a argumentação. Se o artigo 83.º da Constituição da República não implica a proibição de privatização parcial, não implica a proibição de alienação de todo o património de empresas públicas, é porque permite a alienação integral desse património, todo, permite a manutenção de empresas públicas completamente esvaziadas e, então, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o que e que os senhores andaram estes anos todos a fazer ao imputarem ao artigo 83.º aquilo que ele efectivamente é. ou seja, uma barreira contra as desnacionalizações?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Qual é o vosso critério? Em que é que ficam? Qual é a vossa posição e coerência? A nossa resposta é: nenhuma! Todos os expedientes vos parecem adequados! Tudo aquilo de que se queixaram ao longo de anos, afinal de contas, tudo espremido, tudo concluído, tudo matutado, não significaria coisa nenhuma. O artigo 83.º da Constituição da República não estabeleceria, em vosso entender, um princípio de proibição de reversão de nacionalizações, mas tão-só uma ténue garantia de que haveria um certo controle estadual das empresas públicas,

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ainda que estas tivessem participação de entidades privadas, ainda que estas fossem geridas por entidades privadas, ainda que estas não fossem públicas mas mistas.
Eis, pois, ao fim de tantos anos, a conclusão a que chegaram: é que afinal de contas o artigo 83.º, longe de ser o «Adamastor» da economia portuguesa, longe de ser uma barreira, seria coisa nenhuma. O que quer dizer que os senhores se auto-iludiram, ignoravam ou actuavam de má fé.
O Dr. Sá Carneiro, ao propor a alteração do artigo 83.º, não tinha visto este expediente genial? Esta ideia verdadeiramente «arcabuzástica»? Ninguém viu? Esta é a questão! Por que é que propuseram a revisão do artigo 83.B na revisão constitucional de 1982? Não era preciso, Srs. Deputados! O artigo nem carecia de revisão para se poder fazer tudo aquilo que os senhores dizem que é possível fazer neste momento.
Se agora é possível, já o era, sempre o foi, e os senhores são uma de duas coisas: ou um monumento de distracção ou monumento de atraso!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em nosso entendimento, as nacionalizações não são isso e nessa matéria não estamos sós, mas sim acompanhados, e bem acompanhados, pela generalidade da doutrina económica portuguesa e, a contrario, pela opinião de todos aqueles que sustentaram que o artigo 83.º carecia de ser alterado, precisamente porque proíbe tudo o que proíbe e, em nosso entender, bem.
Os senhores não podem utilizar uma argumentação dupla e dizer hoje que esse artigo implica uma proibição para dizerem amanhã que não implica proibição nenhuma.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Preocupa-nos a ofensiva do Governo nesta matéria. Não consideramos que se trate unicamente de um bluff, nem de um espectáculo para impressionar lobbies.
Consideramos que está aqui co-envolvida uma operação perigosa para o regime democrático e para o funcionamento da nossa economia, na perspectiva, que para ela decorreu, do próprio 25 de Abril.
Esta inconstitucionalidade é, por um lado, uma inconstitucionalidade em «bola de neve». O Governo anunciou no seu Programa que esta proposta se trata de uma primeira fase, pelo que haverá fases ulteriores, posteriores, quiçá, à revisão constitucional, se esta - coisa contra a qual nos bateremos- viesse a consagrar alterações fulcrais em matéria de garantia de nacionalizações.
Por outro lado, é uma ofensiva feita com um cunho profundamente secretista, não transparente, que dá azo a operações de corrupção. E nós alertamos para o que aconteceu durante o debate orçamental. Durante o debate foi aprovada uma norma -e isso é um aviso que é um serviço a um lobby, e a um lobby concreto em matéria de supressão de um conjunto de isenções. Isso aconteceu aqui, durante a noite, mas à vista de todos; é algo que envergonha a Assembleia da República, que foi aprovado com os vossos votos governamentais, e, assim, envergonha só os deputados governamentais e a mais ninguém, ou melhor, a nós não, seguramente, porque contra isso protestámos e votámos. Mas é um aviso de alguma coisa que se pode multiplicar por muito se a ofensiva prosseguir nestes termos.
Finalmente, trata-se de uma operação complexa e em vários planos. Ao mesmo tempo que o Governo nos apresenta esta proposta prepara operações, como as que decorrem da Lei de Bases das Telecomunicações, da Lei de
Bases dos Transportes Terrestres, das entregas de novos sectores ao grande capital, mediante revisão implícita ou explícita da lei de delimitação de sectores. Não subestimamos essa ofensiva e contra ela nos bateremos!
Por outro lado, para o Governo, «privatizar» rima com «despedir». Trata-se de uma ofensiva em que o Governo pretende não actuar através de um meio, mas através de uma conjugação de meios, incluindo o ataque ao direito dos trabalhadores, incluindo os trabalhadores das empresas públicas, aos quais se acena agora com um decantado «accionarato» operário ao qual haverá que antepor este lema: «Serás accionista se não fores despedido.»

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E só isto resume a credibilidade nula das arengas governamentais em relação ao «accionarato» operário.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, estas propostas implicam uma concepção distorcida e viciosa do que seja a revisão constitucional.
Esta legislação é, quanto a nós, uma forma ínvia de queimar etapas, de discutir em sede de lei ordinária aquilo que só pode ser discutido dentro dos limites constitucionais, em sede de revisão constitucional.
Trata-se, portanto, de uma «brutalização» das regras, e este espírito de «brutalização» das regras do regime democrático, e de regras basilares, é um atentado gravíssimo. E estaremos de acordo com aqueles que dizem que se trata de uma tríplice provocação: provocação à Assembleia da República, seguramente, provocação ao Presidente da República e provocação ao Tribunal Constitucional, que haverá de se pronunciar sobre todas estas matérias.
Por isso, e essa é a nossa última palavra, entendemos que a hora é, seguramente, de cerrar fileiras para que também neste aspecto fundamental seja defendida a legalidade democrática, isto é, o Estado de direito democrático nascido com o 25 de Abril.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e da ID.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está encerrado o debate. De acordo com o que ficou decidido na reunião de líderes, as votações passarão para as 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, só agora tive oportunidade de, ao ler o boletim informativo, reparar num erro que pode induzir a Câmara num lapso. É o seguinte: na p. 4, quando se referencia as eleições, menciona-se «Conselho Nacional de Alfabetização e Educação de Base de Adultos», o que é um lapso, pois este organismo já não existe, nem nunca existiu com este nome. Sendo assim, deve constar «Conselho Nacional de Educação». Agradecia, pois, Sr. Presidente, que ficasse registada esta correcção.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Vamos, agora, passar à segunda parte da nossa ordem de trabalhos, com a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 100/V, da iniciativa do PS, relativo à instalação de antenas.
Srs. Deputados, há um relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre esta matéria que vai ser lido.

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O Sr. Licínio Moreira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Licínio Moreira (PSD): - Sr. Presidente, penso que uma vez que o relatório já está distribuído, poderíamos dispensar a sua leitura para aproveitarmos tempo.

O Sr. Presidente: - Caso não haja objecções por parte da Câmara, assim se fará, Sr. Deputado.

Pausa.

Visto não haver objecções, está dispensada a leitura do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo ao projecto de lei n.º 100/V.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueira.

O Sr. Raul Junqueira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde há alguns anos que a anarquia se vem instalando no espectro radioeléctrico nacional.
Primeiro, com a proliferação de retransmissores da televisão espanhola, depois com o movimento das chamadas «rádios piratas» e mais recentemente com as múltiplas iniciativas de distribuição de televisão oriunda do espaço.
Em todos estes casos, o Estado, a quem cabe a responsabilidade de definir as regras de gestão do conjunto de frequências de radiocomunicações e de assegurar a sua correcta utilização, no respeito pelo interesse nacional e pelos acordos internacionais, tem assumido uma posição de inaceitável passividade.
As consequências estão à vista, com todo o rol conhecido de interferências e perturbações na recepção da radiodifusão sonora e televisiva, para além de prejuízos sérios, a diversos níveis, na comunidade.
Trata-se de uma situação gravíssima que, a persistir, poderá conduzir, a curto prazo, sem qualquer exagero, ao bloqueio do sistema de comunicações do País. O caso das chamadas «antenas parabólicas» é exemplar.
Os sistemas de satélites contribuíram decisivamente para a internacionalização da informação e para o aparecimento de novas formas de comunicar.
Hoje em dia, graças aos satélites de telecomunicações e de radiodifusão, os cidadãos europeus podem aceder a dezenas de programas de televisão de diversas origens, através da utilização de sistemas de recepção e distribuição especiais, vulgarmente conhecidos como «antenas parabólicas».
No caso português, esta possibilidade é também real, embora os custos de recepção sejam mais elevados, devido ao facto do actual satélite europeu não cobrir integralmente o território nacional e ser de potência relativamente reduzida.
No futuro, as coisas serão muito mais simples, dada a potência e a órbita favorável dos novos satélites europeus e também devido à introdução da radiodifusão directa por satélite.
Isto significa, a curto prazo, antenas mais pequenas, dispensabilidade de redes terrestres de distribuição e, portanto, menores custos.
Calcula-se que uma antena parabólica individual para um sistema de radiodifusão directa por satélite possa vir a custar menos de metade de um aparelho de TV a cores.
Na Europa existem dois tipos de recepção e distribuição de televisão oriunda do espaço.
O primeiro é o da recepção individual. Qualquer pessoa pode escolher uma antena individual no mercado e mandá-la instalar em sua casa, desde que respeite os regulamentos em vigor sobre segurança dos edifícios e ambiente.
O segundo é o da recepção comunitária. Os sinais de televisão oriundos do espaço são recebidos numa antena comunitária, de maiores dimensões, após o que são distribuídos, em regra, por cabo, mas também por via hertziana, a um edifício, conjunto de edifícios ou comunidade.
As únicas limitações neste caso têm a ver, para além do referido a propósito das antenas individuais, com o respeito pelo espectro radioeléctrico (no caso de distribuição hertziana) e por acordos com os operadores de telecomunicações (no caso de distribuição por cabo).
Portugal vive também um momento de grande popularidade das antenas parabólicas.
Perante a falta de alternativas nacionais ao monopólio televisivo estatal e a deficiente cobertura da própria RTP, os Portugueses vão aderindo a outras formas de comunicação audio-visual e, nomeadamente, à televisão que vem do espaço, pesem embora os custos elevados e as barreiras linguísticas.
Os mais ricos adquirem antenas individuais; para a maioria da população surgem as iniciativas das autarquias, que, atentas à realidade, instalam antenas comunitárias e sistemas de distribuição locais.
A ausência de legislação e a apatia dos poderes públicos fazem com que as coisas nem sempre corram pelo melhor.
Temos antenas individuais colocadas em varandas de edifícios de andares, sem respeito pelas mais elementares normas de segurança ou de estética.
Temos antenas comunitárias ligadas a sistemas de distribuição hertziana, utilizando frequências de forma incorrecta e gerando problemas de interferências com serviços de radiocomunicações.
Trata-se de situações que importa corrigir.
A correcção, no entanto, tem de fazer-se pela positiva e não, como aconteceu recentemente, pela negativa, quando o Governo promoveu acções policiais e judiciais que levaram à apreensão e desmontagem de equipamentos de cinco das muitas dezenas de autarquias que prestam serviços de recepção e distribuição de televisão por satélite.
O Estado não pode e não deve, invocando preceitos legais ultrapassados, reprimir por reprimir, como forma de resolver um problema que ele próprio criou, ao não definir previamente, como lhe competia, as regras do jogo.
Além de que a actuação contra as autarquias é a todos os títulos inaceitável e mesmo injusta.
As autarquias têm assumido em Portugal um papel fundamental no processo de desenvolvimento e de melhoria da qualidade de vida dos Portugueses, onde se inclui o acesso à informação.
As autarquias têm substituído a própria RTP, algumas vezes a pedido desta, montando elas próprias a rede de retransmissores dos canais da empresa pública, que, como é sabido, não teve ainda capacidade para dotar o País de uma boa cobertura, sobretudo no que se refere ao segundo programa.
Finalmente, as autarquias prestam um verdadeiro serviço público, permitindo, através da sua iniciativa, o acesso à informação por parte de centenas de milhares de cidadãos, que, de outra forma, por limitações económicas, dela ficariam privados.
O projecto de lei que estamos a apreciar visa definir os grandes princípios em matéria de instalação de antenas relativas aos diversos serviços de radiocomunicações, contemplando, naturalmente, as parabólicas e também a legitimidade de actuação das autarquias neste domínio.

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Nesta matéria, o projecto do Partido Socialista, preocupado em estabelecer as regras que devem vigorar, estabelece, designadamente: a recepção de programas de rádio e de televisão, oriundos de terra ou do espaço, é inteiramente livre, não carecendo de qualquer autorização específica nem dependendo do pagamento de taxa de qualquer natureza; a distribuição dos programas assim recebidos pode ser feita por entidades, públicas ou privadas, desde que respeitem as normas técnicas a definir pela entidade competente e mediante prévio licenciamento; as autarquias são desde já dotadas de capacidade para promoverem essa distribuição de programas de rádio e de televisão; a distribuição pode igualmente fazer-se através de cabo, bastando neste caso o acordo do operador público de telecomunicações sempre que os cabos atravessem a via pública.
O projecto do Partido Socialista não se fixa contudo apenas na questão das antenas parabólicas.
Consciente da necessidade de se vir a definir um conjunto de princípios capazes de permitirem uma resposta positiva aos desafios que hoje se colocam nesta matéria, o projecto de lei em análise aborda igualmente a instalação de todos os outros tipos de equipamentos de recepção.
A preocupação subjacente em todos os casos relaciona-se sempre com a defesa do espectro radioeléctrico nacional e com a liberdade de comunicação.
Destacam-se aqui as normas referentes às rádios locais e aos radioamadores.
No que toca às primeiras, impõe-se a necessidade de uma definição das regras para instalação, inclusivamente das respectivas antenas de emissão, condição indispensável para que exista harmonia nas ondas, neste caso da frequência modulada.
No que toca aos segundos, incluindo os radioamadores e os utilizadores da chamada «banda do cidadão», reconhece-se o direito de instalar os equipamentos de emissão e de recepção nos prédios que ocupem a título legítimo.
Trata-se, neste último caso, de superar uma lamentável omissão da legislação actual, dando-se aos radioamadores em geral condições para poderem exercer a sua actividade, à qual se reconhece indiscutível utilidade pública.
Finalmente o projecto de lei consagra a obrigatoriedade de todos os prédios cuja construção se inicie após a aprovação da lei pelo Parlamento instalarem antenas colectivas de recepção de terra, ao mesmo tempo que faz prevalecer as antenas colectivas sobre as individuais, visando proteger nomeadamente a paisagem urbana.
Os prédios novos deverão igualmente prever as necessárias condições de estrutura para poderem vir a suportar antenas parabólicas.
O Partido Socialista espera, desta forma, contribuir para definir os grandes princípios que devem vigorar nesta matéria.
A aprovação de tais princípios, a que certamente a discussão na especialidade dará ainda uma maior consistência, através da inclusão de contributos de outros grupos parlamentares, será determinante para motivar o Governo a exercer com urgência os seus poderes regulamentares, permitindo por esta via que o País usufrua sem problemas de todos os serviços de radiocomunicações, televisão por satélite incluída.
Só assim Portugal verá salvaguardado o seu espectro radioeléctrico, bem escasso e precioso que urge preservar, e só assim Portugal poderá avançar para a nova sociedade de informação, no respeito pelos direitos dos cidadãos e pelos interesses nacionais.

Aplausos do PS, de Os Verdes e de alguns deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - O Sr. Deputado Raul Junqueira começou por dizer que a inexistência de legislação está a criar um caos no País, o que é verdade. Estamos de acordo, na generalidade, com o projecto de lei apresentado pelo PS; contudo, gostaria de solicitar alguns esclarecimentos.
V. Ex.ª referiu que o Governo está a reprimir por reprimir. Acontece que há alguns meses assistimos a um triste espectáculo, que foi o de o Governo, sem legislação adequada, ou pelo menos sem regulamentação adequada, «entrar» na repressão - como, aliás, se está a verificar noutros sectores- e atingir alguns proprietários de antenas parabólicas, e não todos. Seria interessante que o Governo nos explicasse, aqui e agora, por que razão atingiu proprietários de antenas parabólicas instaladas nalguns prédios e não atingiu outros.
Em relação à anarquia no espectro radioeléctrico nacional, sabemos, realmente, o que se está a passar, e até sabemos que, em alguns aspectos, os radioamadores têm atingido determinadas bandas, criando problemas, como V. Ex.ª sabe melhor do que eu, em relação à questão dos aviões, por exemplo. É, pois, esta anarquia existente que urge disciplinar.
O artigo 5.º do projecto de lei do PS, de que V. Ex.ª é subscritor, diz:
Todo aquele que for autorizado pela entidade competente a montar estações de emissão ou recepção tem o direito de instalar as antenas no prédio que ocupe ou, nos casos de impossibilidade, de instalar nos prédios vizinhos, a título legítimo, antenas adequadas à transmissão e ou à recepção de serviços de radiocomunicações [...]
Pergunto se não vamos assistir, de um momento para o outro, a um certo abuso e invasão dos direitos de proprietários e inquilinos de outros edifícios.
Imaginemos, por hipótese, que o proprietário do prédio ao lado do meu ou do de V. Ex.ª, porque o prédio dele é mais baixo, vai instalar as antenas no prédio mais alto, que não é o dele. Imaginemos também que, dentro de um ano ou dois, os proprietários do prédio de V. Ex.ª ou do meu pretendem instalar antenas de estação de emissão ou de recepção. Pergunto se não pode existir aqui algum problema e se vai ou não criar-se uma certa confusão. Gostava que me explicasse, claramente, se não vai haver problemas quanto à aplicação deste artigo.
Finalmente, quanto ao artigo 19.B (Distribuição de radiodifusão a nível local), que refere que a distribuição a nível local dos programas de radiodifusão sonora e televisiva poderá ser autorizada às autarquias e às associações de carácter cultural, recreativo e humanitário, pergunto se também neste caso não poderá criar-se uma grande confusão, uma grande anarquia. Bem sei que V. Ex.ª diz que essa distribuição não poderá exceder os limites geográficos das autarquias, mas também sei o que se passa actualmente com alguns postos locais emissores de radiodifusão e até de televisão!... Por outro lado, gostava de saber se isto também não vai «brigar» um pouco com a nossa ordem constitucional vigente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul Junqueira, há mais oradores inscritos. Deseja responder já ou no fim?

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O Sr. Raul Junqueira (PS): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Deleure.

O Sr. Nuno Deleure (PSD): - Sr. Deputado Raul Junqueira, nesta fase inicial do debate tenho duas perguntas para lhe colocar.
V. Ex.ª refere no seu projecto de lei, e inclusivamente na intervenção que fez, que o licenciamento das antenas seria feito pela entidade competente.
Pergunto: numa altura em que ainda não está definido o número de frequências que o Estado vai alienar, quer em termos nacionais, quer em termos regionais, mas no pressuposto de que todas as frequências atribuídas pelos acordos internacionais a Portugal vão ser alienadas, quantas situações é que V. Ex.ª entendia que eram passíveis de ser licenciadas?
A segunda questão tem a ver - de resto o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca já o referiu - com o problema do artigo 19.B do projecto de lei. Esse artigo ultrapassa largamente o âmbito da mera recepção - que, penso, será uma questão mais ou menos pacífica - e fala da retransmissão. Queria confrontá-lo com uma situação limite, de certo modo até caricata: imagine V. Ex.ª que todas as autarquias deste país montavam um sistema de recepção e de retransmissão de televisão (e faziam-no não sei como, a não ser por cabo) que se limitava aos limites geográficos de cada concelho. Nessa altura, era ou não possível, se o projecto de lei do Partido Socialista fosse aprovado, ter em Portugal a recepção e a retransmissão 24 sobre 24 horas de uma estação de televisão em português com sede num qualquer país do mundo? Isto era ou não viável?
Ponho o problema de outra maneira: era ou não possível a uma qualquer entidade, em qualquer ponto do mundo, montar uma estação em português que era recebida em Portugal por via satélite e distribuída pelas autarquias? Isto no pressuposto de que todas as autarquias tinham serviço de recepção e de retransmissão por satélite e, portanto, em Portugal 24 sobre 24 horas uma estação de televisão em português, de âmbito nacional. Isto era ou não possível? Esta situação está ou não salvaguardada?
Não se infira daquilo que digo que estou contra a abertura à iniciativa privada da televisão, antes pelo contrário. Simplesmente, este projecto de lei tem como objectivo a instalação de antenas e parece-me que este preceito, a ser verdade, ultrapassa largamente o âmbito do projecto inicial ou, pelo menos, daquilo que poderia transparecer ser o âmbito do projecto inicial, e, nessa altura, terá de ser analisado com todo o cuidado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD):- Sr. Deputado Raul Junqueira, também nós sentimos algumas preocupações diante do proliferar desordenado de antenas, não apenas por questões de estética, mas, sobretudo, por razões de segurança e de qualidade técnica no acesso aos meios audiovisuais.
Foram apresentadas algumas questões em relação às quais também nós nos interrogamos e temos preocupações, mas, concretamente, gostaria de lhe apresentar mais duas ou três questões.
A primeira é a seguinte: existindo frequências com diferentes finalidades, não considera V. Ex.ª que, em primeiro lugar, importa definir o espectro radioeléctrico, de forma a que alguns canais fiquem disponíveis para a utilização por entidades públicas? Só que, penso -e o Sr. Deputado sabe isso melhor do que eu -, tal facto exige negociações a nível da União Internacional de Telecomunicações.
A segunda questão é esta: a distribuição comunitária por via hertziana não deverá ser posterior, por exemplo u concessão destas frequências?
A terceira questão é esta: como o Sr. Deputado disse, considerando correcto o privilégio concedido à recepção colectiva ou individual desde que servindo edifícios residenciais, há, no entanto, quem advogue o lançamento de uma tributação sempre que existe uma distribuição de sinais a terceiros, e estariam neste caso os hotéis, por exemplo. Qual é, neste caso concreto, a opinião de V. Ex.ª?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Deputado Raul Junqueira, antes de mais, V. Ex.ª falou na anarquia do espectro radioeléctrico. Interrogo-me sobre se V. Ex.ª, que esteve dois anos no Governo e foi responsável pelas telecomunicações, também não terá alguma culpa ao não prevenir situações que eram previsíveis e que se avizinhavam. V. Ex.ª tinha a responsabilidade de uma pasta pela qual talvez pudesse ter feito um pouco mais, de modo a evitar aquilo que hoje sentimos e que V. Ex.ª da tribuna referiu.
Mas deixemos isso para olharmos um pouco para o seu projecto de lei. Ora, aquilo que de mais essencial e fundamental o seu projecto de lei revela é que ele tem a ver com a instalação de antenas parabólicas para a recepção e a transmissão de televisão. Só este facto é bem elucidativo de que V. Ex.ª, desde já, está a caminhar pelo terreno da revogação da lei da televisão.
Daí a pergunta: o Partido Socialista tem ou não consciência de que está a revogar a lei da televisão e a abri-la à iniciativa privada num diploma que não é o quadro normativo adequado para esse efeito?
Por outro lado, também me interrogo - e V. Ex.ª foi um bom paladino da lei dos meios áudio-visuais - se este diploma é ou não um apêndice dessa lei dos meios áudio-visuais.
Por outro lado ainda, sabendo nós que a evolução tecnológica no domínio da televisão, das transmissões, é rápida, muito rápida, e que aí se obtêm progressos muito significativos, pergunto se o custo que hoje em dia tem uma antena parabólica, amanhã, ou muito proximamente, não terá um custo muito menor e se por este processo não se estará a promover um negócio que representará um custo sobrevalorizado para os cidadãos.
São estas perguntas que lhe coloco e não deixarei de escutar, com toda a atenção, o que tem para nos dizer.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e da Juventude.

O Sr. Ministro Adjunto e da Juventude (Couto dos Santos): - Sr. Deputado Raul Junqueira, pergunto-lhe se considera que a retransmissão por via hertziana neste momento é legal, face à legislação em vigor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Interessantíssima pergunta!

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O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): — Sr. Deputado Raul Junqueiro, desde já devo dizer-lhe que não tenho receios, como o Sr. Deputado Vieira Mesquita tem, sobre a privatização da televisão...

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Não foi isso o que eu disse!

O Orador: —.... pelo que a sua iniciativa nos merece, se fosse esse o seu alcance, o nosso aplauso.
Simplesmente, tenho algumas dúvidas no que toca às servidões sobre a propriedade privada que, nalguns artigos, esta sua iniciativa cria.
Gostaria de saber se pensou no regime que actualmente vigora no Código Civil sobre os limites do direito de propriedade e o modo de constituição das servidões, sejam elas a favor de órgãos comunitários no sentido da comunidade, sejam vicinais, sejam mesmos individuais, e que, muitas vezes, chega ao ponto de fazer passar os cabos e as antenas sem a autorização, ou sequer um aviso, do legítimo proprietário.
Essa confusão entre o proprietário da antena e o proprietário do edifício ou da propriedade do terreno é patente no artigo sobre a «responsabilidade». Quando se trata do contrato de seguro, mete no mesmo saco os proprietários das antenas e os dos edifícios ou dos terrenos; no entanto distingue-os ao longo de todo o diploma.
Em segundo lugar, por sele ou oito vezes, há uma remissão para diversos tipos de entidades; umas vezes o diploma fala em «entidade governamental competente»; outras vezes fala em «entidade competente tout court»; outras vezes ainda fala em «entidade competente para o efeito». Ficámos sem saber quantas entidades prevê e que espécie de entidades são essas. Sei que é um vezo socialista criar entidades, entidades e entidades por tudo e por nada — naturalmente é uma das formas de alimentar o corporativismo dos gestores públicos ... —, mas queria saber o que significam essas inúmeras formas que aparecem, pelo menos literalmente, distintas umas das outras: entidades governamentais, entidades próprias, entidades para regulamentar, etc.
Pergunto também se este diploma vem completar o diploma anterior, ou seja, um decreto-lei de 1986, que dizia claramente que este aspecto seria regulado por uma lei especial. Pergunto, pois, se o vem enquadrar — e, então, tem de satisfazer a filosofia geral que anima o decreto-lei, porque o vem complementar —, portanto, vem anunciar a boa nova c não vem contra esse decreto-lei, ou se é uma forma de inutilizar o decreto-lei existente em alguns dos seus dispositivos principais. Mas aquando da discussão na especialidade falaremos disso.
Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.

O Sr. Presidente:—Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, vou tentar responder a todas as perguntas —que são muitas e interessantes— o mais sinteticamente possível pela ordem que me foram colocadas.
Em primeiro lugar, relativamente à pergunta do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca quanto à posição do Governo de reprimir a actuação de algumas autarquias,
como na altura tivemos ocasião de dizer, compreendemos que o Governo se preocupe em não deixar degradar o estado do espectro radioeléctrico, preocupamo-nos com isso e compreendemos essa preocupação do Governo. O que não entendemos é que o Governo reprima sem antes tentar prevenir, que reprima sem antes tentar definir as regras do jogo e, ainda por cima, que actue de uma forma que consideramos discriminatória. Porquê cinco autarquias, quando dezenas delas prestam este serviço? Porquê exactamente aquelas cinco? Isto nunca foi explicado e, independentemente de tudo o resto, não nos parece que a actuação do Governo tenha sido correcta porque em princípio, para se reprimir é preciso criar a consciência de que há um ilícito, de que há algo que é ilegítimo, e neste caso o Governo não o demonstrou.
No que toca à preocupação do artigo 5.° do projecto de lei, dizendo o Sr. Deputado que poderá haver abusos pela circunstância de esta lei admitir a possibilidade de colocação de antenas em prédios vizinhos, digo-lhe que não há motivo para preocupação, uma vez que isso, a acontecer, apenas ocorrerá em circunstâncias absolutamente excepcionais, só quando não for possível por todos os meios colocar no próprio prédio, e apenas no que se refere a instalações de radioamadores e da chamada «banda do cidadão». De resto, o artigo 5.º terá sempre de ser conjugado com o artigo 6.º, onde, de uma forma explícita, estão referidas as preocupações, nomeadamente as que o Sr. Deputado exprimiu quanto as garantias que tem de haver com este serviço.
Finalmente, quanto ao artigo 19.° do projecto de lei, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca perguntou se não será um problema, se não se virá a criar uma anarquia pela circunstância de se admitir a possibilidade de várias autarquias prestarem este tipo de serviço. O que digo é que a anarquia já existe, a anarquia está criada e o grave é não haver uma regulamentação dessas regras. O que temos, pois, de fazer é regulamentar a forma da prestação deste serviço para que a anarquia não exista. O problema é fundamentalmente este. Nós não vemos inconveniente em que haja uma distribuição de sinais recebidos via satélite num determinado âmbito geográfico; o que nos preocupa é que isso seja feito sem regras, e o que o artigo 19.° do projecto de lei preconiza é exactamente que haja regras, que se definam os termos em que esse serviço pode vir a ser prestado.
O Sr. Deputado Nuno Deleure colocou-me uma questão extremamente difícil de responder porque é eminentemente técnica, é uma questão que só poderá ser respondida depois de se conhecer a distribuição das frequências previstas no plano radioeléctrico nacional, as que iriam ser afectadas a este tipo de serviço. O que preconizo é que, numa determinada fase, seja criada uma «bolsa de frequências» que possa corresponder a este tipo de serviços e, evidentemente, que essa «bolsa de frequências» seja negociada nos termos previstos, nacional e internacionalmente, para que este serviço possa vir a ser executado sem problemas.
Quanto à outra questão que o Sr. Deputado Nuno Deleure me colocou, devo dizer que é uma questão — permita-me que lhe diga — que o futuro virá colocar a muito breve prazo. Perguntou-me: «Se todas as autarquias tivessem um sistema deste tipo e se alguém se lembrasse de montar um canal de televisão em português fora do nosso país, se haveria uma rede própria para receber e distribuir esse canal de televisão.» Sr. Deputado, isso pode ser feito hoje em dia. Neste momento qualquer entidade poderia alugar espaço num satélite — e já não digo no actual, cuja capacidade está esgotada, mas nos próximos satélites europeus que vão ser lançados e que vão estar operacionais a partir de

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1989 — e fazer transmissões para Portugal. De resto, ainda recentemente houve um caso em que um grupo de cidadãos espanhóis anunciou fazer uma emissão via satélite para espanha, exactamente com esta finalidade.
Deixe-me dizer-lhe que quando os satélites de distribuição directa, ou seja, aqueles satélites que não precisam de rede de distribuição terrrestre estiverem operacionais (e estarão a muito curto prazo), então a questão é muito mais fácil de responder. Automaticamente, haverá por parte de todos nós uma recepção desse tipo de emissões, recorrendo a pequeníssimas antenas parabólicas, e este problema que aqui estamos a discutir não terá a relevância que hoje tem.
O Sr. Deputado Marques Júnior perguntou se não se devem privilegiar as entidades públicas na concessão de frequências. Penso que a questão não deve ser colocada em termos de privilegiar entidades públicas ou privadas, mas saber quais as frequências que devem ser afectas a determinado tipo de serviços de rádio e comunicações. Em geral, nos termos das convenções internacionais, isto está estipulado, é preciso que se conheça claramente quais são as frequências que servem para os serviços de radioajuda à navegação aérea, por exemplo, para os serviços de radiodifusão local, para os serviços de televisão. Ao fim e ao cabo, é precisamente isso, que fará parle do «plano de frequências» a nível nacional e aí é que têm de se considerar os «privilégios» para cada um dos serviços. É evidente que há serviços em que temos de admitir o acesso da iniciativa privada e há outros em que esse problema não se põe. São assuntos que terão de ser vistos caso a caso.
Perguntou ainda ao Sr. Deputado se a distribuição por via hertziana, não deve ser posterior à concessão destas frequências. É evidente que sim. Só depois de estar «arrumado» o espectro radioeléclrico e de se saber as frequências que devem pertencer a um ou a outro serviço é que deveríamos atribuir frequências especificamente a este caso.
Quanto à distribuição de sinais para terrenos contíguos a uma determinada urbanização, naturalmente que isso não precisa de ser feito — e não deveria ser permitido que fosse feito— por via hertziana. Isto porque essa via implica sempre a utilização de frequências e estas, são um bem escasso, são um bem limitado. Portanto, não deveria ser permitida a utilização da via hertziana para satisfazer necessidades de distribuição de televisão ou outra qualquer num espaço contíguo, portanto imediato. Aí deveria impor-se a distribuição por cabo.
O Sr. Deputado Vieira Mesquita colocou-me várias questões e não deixou de me lembrar as responsabilidades que tive, durante dois anos, na pasta das comunicações. Sr. Deputado, tive essa responsabilidade, alertei várias vezes para a necessidade de se fazer alguma coisa neste domínio e alguma coisa foi feita. Se mais não foi feito foi porque o tempo de gestão do Governo, a que tive o gosto de pertencer, não teve o tempo necessário para avançar em todos os domínios. Em todo o caso, alguma coisa foi feita e nalguns domínios deram-se passos importantes, corrigiram-se situações que vinham do anterior e perspectivou-se p futuro, da forma a permitir que nos anos seguintes, teoricamente, pudessem ser. tomadas soluções para resolver esse tipo de problemas.
O que me preocupa é que, ao fim e ao cabo, q Sr. Deputado Vieira Mesquita está preocupado que esta lei,venha a revogar a lei da televisão.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): — É isso, é isso!

O Orador: — Anoto—e acho que a Câmara deve fazê-lo — a preocupação do Sr. Deputado Vieira Mesquita e do seu grupo parlamentar com a possível privatização da televisão.
Eu já andava desconfiado de que todas aquelas promessas de abertura da RTP à iniciativa privada não eram mais do que promessas e o Sr. Deputado veio confirmar isso.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): —Não mistifique!

O Orador:—No fundo, o Sr. Deputado está a dizer que o que o preocupa nesta lei é que ela posa revogar a lei da televisão. Considero que a Câmara deve notar essa sua preocupação!...

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Deputado, nós não estamos aqui para revogar a lei da televisão, porque, quando a quisermos revogar, fazemo-lo explicitamente. Devo recordar ao Sr. Deputado que o único partido que apresentou nesta Assembleia um projecto de lei para revogar a lei da televisão e para a abrir à iniciativa privada foi, na anterior legislatura, o Partido Socialista, e esse diploma teve votos favoráveis do grupo parlamentar a que pertence.

O Sr. Vieira Mesquita: (PSD): — Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: —Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Sr. Deputado, se me permite —e isso está claro, basta ler o Diário da Assembleia da República—, o Partido Social-Democrata sempre defendeu, e continuaremos a defender, a iniciativa privada em todos os campos e domínios sociais, nomeadamente na televisão.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Já não é sem tempo!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — O Sr. Deputado lembra-se bem de que foi o Governo anterior que introduziu o tema, ao apresentar uma proposta de lei, a qual VV. Ex.ªs e outras forças da oposição dilataram até às calendas quando criaram uma comissão especializada. É no quadro da lei dos meios áudio-visuais que entendemos que a iniciativa privada no domínio do áudio-visual, deverá ser regulada e estamos contra é que V. Ex.ª o pretenda fazer de uma forma enviesada, como através desta lei de antenas, a propósito de antenas parabólicas. Isso não é correcto. Sempre dissemos nesta Câmara que se devia começar por grandes leis quadro no domínio do áudio-visual, com, em geral, no domínio da comunicação social. Assim não foi entendido por actuais partidos da oposição, que, como sabe, na altura eram maioria...

O Sr. Eduardo Pereira (PS):—E os últimos seis meses?!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): —.... e nós tivemos de nos sujeitar, embora vencidos, a essa força que era a da maioria, agora oposição.
Por isso mesmo, Sr. Deputado, permita-me que lhe diga que não tem razão, pois nós estamos a favor da iniciativa privada no domínio da televisão e desejamos que, o mais cedo possível, isso aconteça, porque não é através de uma lei de antenas parabólicas que V. Ex.ª pode fazer televisão privada. Efectivamente, pode fazê-la, mas fá-la de uma forma desregrada e enviesada, permita-me que lhe diga.

O Orador: — Sr. Deputado, registo, mais um vez, essa vontade do PSD em querer a televisão privada. Fico à espera dos actos, da concretização dessa vontade.

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- A única coisa em que reparei é que agora, que o PSD dispõe de uma maioria absoluta, nem sequer o projecto de lei que tinha apresentado na legislatura anterior reapre-sentou. Enfim, com certeza, ele virá proximamente. Mas veremos se isso acontece, porque a sua intervenção deixa-me perceber que aquilo que o preocupa em relação a este projecto de lei é a eventualidade ou a possibilidade de ele revogar a lei da televisão e de, portanto, abrir a televisão à iniciativa privada.
De resto, espero que não seja também esse o intuito com que o Sr. Ministro Adjunto e da Juventude me colocou uma pergunta: a de saber se a retransmissão por via hertziana é legal em face da legislação em vigor.
É evidente que penso que essa retransmissão é legal, porque não considero que ela seja uma emissão de televisão.
Não podemos estar a situar o problema de uma forma burocrática, através de uma interpretação extremamente literal, como o fizeram os serviços governamentais para justificar a actuação contra as câmaras municipais, dizendo que a retransmissão de um sinal de televisão é uma emissão de televisão. Não é uma emissão de televisão! Há um sinal que é recebido numa antena e é retransmitido o mesmo sinal. Portanto, o que se verifica é isso mesmo, c uma retransmissão de sinal, não há uma emissão de um novo sinal. Se houvesse uma emissão de um novo sinal, se houvesse uma emissão de televisão, é evidente que, em face da legislação actual, essa emissão seria ilegal, mas não é esse o meu entendimento, nem é esse o entendimento, penso eu, que pode ser tido como razoável.
Quanto às questões que o Sr. Deputado Narana Coissoró me colocou ... Ó Sr. Deputado, não há qualquer razão para se preocupar com eventuais servidões sobre a propriedade privada. A única coisa que se reconhece neste diploma, que, de resto, agora se reconhece de uma forma explícita, mas que, em anteriores diplomas, já bastante antigos, se apontava no mesmo sentido, é em relação a determinados utilizadores de serviços de radiocomunicações, nomeadamente a radioamadores, reconhecer-se a possibilidade de instalarem estações emissoras ou receptoras nos prédios que ocupam a título legítimo.
Penso, portanto, que isto não deve constituir uma preocupação, mas deve, antes, reconhecer um direito que os radioamadores devem ter, até porque a actividade dos radioamadores é de grande importância numa sociedade, como o têm, de resto, demonstrado abundantemente no nosso país, em situações de muita dificuldade para as populações. Os radioamadores têm, de facto, através dos seus sistemas próprios, prestado uma ajuda que tem salvado muitas vidas, inclusivamente no nosso país.
Por outro lado, também não fico preocupado com a entidade competente, porque ela, nos termos deste diploma, c fundamentalmente uma entidade que já existe, que são os serviços radioeléctricos, que é, evidentemente, a entidade a quem compete a gestão e a fiscalização do espectro radioeléctrico. Remetemos para aí, não mencionamos expressamente que é a Direcção dos Serviços Radioeléctricos, uma vez que essa Direcção está, actualmente, integrada numa empresa pública. Espera-se, até para clarificação do estatuto dos mesmos serviços, que estes passem para um organismo dependente do Estado e não que estejam numa empresa pública, como estão hoje em dia.
O Sr. Deputado Narana Coissoró perguntou-me ainda se este projecto de lei se destina a completar o Decreto-Lei n.° 147/87 ou se é uma forma de o inutilizar. Bom, este decreto-lei tem um âmbito diferente. Aquele que o Governo publicou em Março de 1987 é um decreto-lei genérico sobre radiocomunicaçõcs, c um decreto-lei, digamos, em que se fixam determinados princípios em certas áreas. O projecto de lei que estamos a discutir é uma lei de bases, de princípios fundamentais sobre a instalação de antenas de recepção, portanto uma matéria completamente diferente. Aliás, como reparará, o Decreto-Lei n.° 147/87 apenas se relaciona com este projecto num único artigo.
De resto, e para finalizar, o que nós pretendemos com esta lei é, basicamente, estabelecer um conjunto de princípios a vigorar nesta área e o que queremos é que a Assembleia da República aprove na generalidade estes princípios, para que depois, uma vez a lei aprovada, o Governo exerça os seus poderes regulamentares, porque nenhum de nós recusará a evidência de que tem de ser o Governo, através dos seus organismos competentes, nomeadamente através do órgão gestor e fiscalizador do espectro radioeléctrico, a disciplinar esta matéria. Essa tarefa não pode ser da Assembleia da República. A única coisa que a Assembleia deve fazer — e foi isso que nos propusemos aqui trazer — é estabelecer os princípios gerais, é aprovar esta lei, para que, na especialidade, possa ser enriquecida com o contributo de outros grupos parlamentares e para que, depois, uma vez aprovada, o Governo emita, o mais rapidamente possível, os regulamentos que deve emitir para que possa disciplinar e regulamentar todas estas actuações em nome dos interesses nacionais, em nome da defesa do espectro radioeléctrico nacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e das Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e das Comunicações (Matos dos Santos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em resposta ao que foi afumado pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro, quero fazer notar a esta Assembleia que em 1983-1984, quando começaram a ser instalados os primeiros emissores das rádios locais e da TVE, os CTT, no âmbito das suas competências, deram início às respectivas acções de fiscalização. No entanto, aquela empresa recebeu, na altura, instruções do Governo no sentido de se limitarem a fazer o levantamento das situações detectadas. Foi assim, quando o Governo de que o Sr. Deputado Raul Junqueiro fazia parte se demitiu das suas obrigações, que a anarquia hoje existente no espectro radioeléctrico se instalou. Que se saiba, foi então o único passo importante dado nesta área.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Entrando agora na matéria que aqui nos reúne, quero, antes de tudo, mais uma vez, procurar clarificar a questão das antenas parabólicas.
Não existe qualquer impedimento legal, ou de outro tipo, à instalação de antenas parabólicas no nosso país, a sua instalação é livre.
Existem sim impedimentos legais, no âmbito da legislação nacional e de acordos internacionais, à emissão ou retransmissão de programas de televisão recebidos via satélite.
Assim, não é, nem nunca foi, posta em causa a liberdade de recepção de programas via satélite. Assim como nunca foi impedida a instalação ou funcionamento de qualquer antena receptora.
O que não pode ser permitido no actual quadro legislativo é a emissão e retransmissão de programas, que as leis existentes fazem depender de determinados condicionalismos, de todos bem conhecidos.

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Mas não se julgue também que a questão se resume a mera má vontade legislativa, a um não querer mudar o que existe. A questão de fundo prende-se com a necessidade de defesa do espaço radioeléctrico, que é um bem colectivo, que tem de ser aproveitado da forma mais racional possível, ao serviço da comunidade, e que não se pode deixar que seja saqueado pêlos mais afoitos ou menos escrupulosos, criando situações de facto que depois se procurariam eternizar.
O espaço radioeléctrico é um bem que pertence a todos os portugueses e que por isso apenas esta Assembleia está em condições de dizer como e quando ele deve ser distribuído em programas de cobertura nacional, regional ou local, a operadores privados, públicos ou outros...

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ...Não se pode permitir que sejam criadas situações de facto, de modo que quando esta Assembleia quisesse legislar sobre esta matéria não lhe restasse nada sobre que legislar, por o espectro estar já saturado.
Mas, mais ainda, para além dos aspectos da legislação nacional, dos acordos internacionais e da necessidade de preservar o espaço radioeléctrico, existem razões técnicas que limitam fortemente as possibilidades de emissão ou retransmissão; basta dizer que se, neste momento, metade das autarquias do País fizessem o mesmo tipo de retransmissões que algumas têm feito, ninguém em Portugal conseguiria já ver qualquer programa de televisão, dos nacionais ou importados. O grande desejo dos Portugueses seria então conseguir ver pelo menos a RTP-1.
Entrando agora na análise concreta do projecto de lei do PS, e limitando-me aos aspectos técnicos do mesmo, não posso deixar de começar por realçar a confusão que resulta evidente de todo o texto, confusão essa que atinje tais proporções que chega a parecer que é propositada.
Tudo começa pelas inúmeras finalidades que o projecto em causa parece ter, ou seja, rever discretamente a lei da televisão, terminar com as taxas da RDP e RTP, impor novas obrigações aos proprietários de prédios arrendados, regulamentar a construção civil, utilizar a figura da lei para fazer regulamentos (muitos dos quais sobre matéria que já está regulamentada), ele., um verdadeiro pacote legislativo disfarçado de inocente lei sobre instalação de antenas.
Mas para além da confusão sobre as finalidades c das consequências que a adopção de um diploma deste tipo traria, também noutros planos o diploma é extremamente confuso, na sua falta de coerência interna, na terminologia utilizada, na incompatibilidade com os acordos internacionais (de que o País é signatário) e na sua falta de consistência técnica.
No que respeita à ausência de coerência interna do .projecto, ela é evidente em diversas partes, por exemplo, quando a alínea b) do artigo 6.° contradiz a alínea a) do mesmo artigo, quando nos artigos 8.° e 12.° as definições de antena colectiva e individual se baseiam em critérios contraditórios e por aí fora.
Mas tudo seria rcsolúvel se os problemas do presente diploma se limitassem a algumas incoerências internas. No entanto a realidade é bem pior.
Pretendeu-se neste projecto baralhar todos os tipos de antenas, rádio, TV, e destinadas a outros serviços de radio-comunicaçõcs, independentemente do carácter das entidades utilizadoras (e incluindo assim os próprios operadores de
comunicações), estendendo depois a regulamentação à televisão por cabo e ainda à construção civil, às obrigações dos proprietários e aos próprios incentivos à indústria. Tem de ser reconhecido que, perante tamanha salada, o melhor legislador teria de sucumbir e o resultado dificilmente poderia ser melhor que o conseguido.
Quanto à articulação com a legislação existente, é melhor nem falar; é caso para perguntar se terá sido a consciência desse facto que levou o autor do projecto a não mencionar a legislação a revogar? Que incluiria no mínimo diversas leis da Assembleia, os estatutos de diversas EP's, já para não falar nas inconstitucionalidades.
Mas, para além de tudo isso, o projecto ignora do princípio ao fim a existência do Decreto-Lei n.º 147/87, que é a base da estrutura legal das radiocomunicações e cuja existência o Partido Socialista parece desconhecer. E mesmo que fosse também intenção do autor deste projecto de lei revogar parcialmente aquele decreto, as contradições entre os dois diplomas estabeleceriam um quadro extremamente confuso, ao abrigo do qual dificilmente poderiam ser emanados quaisquer regulamentos com o mínimo de consistência.
Mas, ainda no âmbito da legislação nacional, e sobretudo de destacar que aquilo a que o diploma diz destinar-se, instalação de antenas, não teria em caso nenhum dignidade de lei, visto não poder ser mais que mera regulamentação de alguns aspectos, e dos menos importantes, do decreto-lei n.fl 147/87. Trazer questões como estas para o âmbito das leis é preverter a hierarquia dos diplomas e estabelecer a anarquia legislativa total.
Antes de passar a uma análise detalhada da proposta apresentada, não quero deixar de fazer uma referência à contradição deste projecto com o Regulamento das Radiocomunicações, que é um anexo à Convenção Internacional de Telecomunicações, que foi ratificado por esta Assembleia pela Resolução n.º 3/87.
Mas as incompatibilidades com as normas internacionais a que o Estado Português está obrigado na matéria não ficam por aí. A Convenção de Bruxelas e os Acordos Intelsat e Eutelsat suo puramente ignorados e propostas disposições que os contradizem.
Face ao adiantado da hora, não vos vou maçar com a análise detalhada dos diversos artigos do projecto e passo à sua fase final ou, mais propriamente, ao artigo 18.º
Chegados aos artigos 18.º e 19.º, parece então que todo o projecto se destina, de facto, a legislar sobre a distribuição dos programas de radiodifusão, apesar de a sua finalidade explícita ser a de regulamentar apenas as antenas!
A distribuição a que se refere implica moios de emissão radioeléctrica, e assim a revogação da Lei n.8 75/79, entre outras.
Por outro lado, nos números 2 e 3 do artigo 19.º não se obedece aos preceitos constitucionais dos «direitos, liberdades e garantias».
Nos mesmos artigos são ainda violados os acordos internacionais, com destaque para a Convenção de Bruxelas e os Acordos INTELSAT e EUTELSAT, que impedem a distribuição de programas recebidos por satélite.
Depois, mais à frente, toda a secção IV do diploma contraria competências fundamentais do sector, nomeadamente as da Companhia Portuguesa Rádio Marconi, e desconhece as regras e procedimentos estabelecidos pela União Internacional de Telecomunicações.
E assim por aí fora em todo o diploma, que, para acabar em beleza, termina com um artigo que extravasa claramente o seu âmbito e que, a ser adoptado, envolveria o precedente perigosíssimo de passar a ser necessário em cada diploma legislativo referir todas os «boas intenções» que com ele se pudessem relacionar. E aí põe-se a questão de saber se a única boa intenção do PS nesta área se prende com o

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problema levantado. E se assim não é, porque apenas esta «boa intenção» é afirmada? Porquê nem uma preocupação cultural? Porquê nem uma preocupação de ordem social? Porquê este interesse súbito e despropositado de apoio à indústria nacional de antenas?
Do que disse resulta evidente a opinião de que, sob o ponto de vista técnico, o diploma não tem qualquer possibilidade de aproveitamento, isto embora individualmente surjam aqui ou ali ideias, sugestões, que poderão vir a ser aproveitadas e trabalhadas noutros diplomas, noutros contextos.
Resumindo, temos na frente um projecto de lei que parece pretender ser um regulamento (o que não consegue por desconhecer a legislação existente), mas que tudo leva a crer ser sobretudo um projecto de revisão da lei da televisão, que, por razões que não descortinamos, o Partido Socialista não quis assumir e que, para cúmulo da ironia, resolveu disfarçar sob a capa de um projecto de liberalização de instalação de antenas parabólicas, cuja instalação é já livre.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há várias inscrições para pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Perante a forma como o Sr. Secretário de Estado se apresentou nesta Câmara, lamenta-se agora, talvez - e pela minha parte o faço-, ter-se dado consenso a que não fosse lido o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, cujo presidente é o Sr. Deputado Mário Raposo, e que foi elaborado pelo Sr. Deputado José Vieira Mesquita, também do PSD. Nesse relatório diz-se, convém já agora relembrar ao Sr. Secretário de Estado: «A presente iniciativa legislativa intenta preencher algum vazio no domínio da legislação do sector, que as inovações tecnológicas não só aconselham como impõem. Na verdade, o Decreto-Lei n.º 147/87, de 24 de Março, já contém, em larga medida, algumas disposições conexas com a presente matéria, mas no caso especial da instalação de antenas individuais ou colectivas para a recepção de programas via satélite ou para outros fins específicos remete para legislação própria, que o projecto em análise procura a seu modo resolver.» Portanto, o Governo não resolveu coisa nenhuma. Daí, creio eu, esta iniciativa do Partido Socialista.
Sr. Secretário de Estado, em relação àquilo que disse queria só fazer duas ou três perguntas muito rápidas. Começou por falar na fiscalização, no levantamento das situações detectadas, atacou o anterior Governo, que era também do PSD, e acabou por referir a necessidade de «não deixar saquear...» -foi esta exactamente a frase do Sr. Secretário de Estado- ... «o espectro radioeléctrico existente». Para já, gostaria de lhe perguntar onde é que está o mapa das frequências, não só neste aspecto, mas de outras e por que razão o Sr. Secretário de Estado não traz esse mapa.
Perante essa fiscalização, gostava de lhe perguntar o seguinte: quantas antenas parabólicas foram instaladas em Portugal? Quantas retransmitem programas captados? Porquê só cinco das autarquias foram atingidas?
Sr. Secretário de Estado, vou ler-lhe este «naco» de prosa, que talvez seja interessante é da Câmara Municipal da Moita -, que diz o seguinte: «Na procura de proporcionar à população do Município a divulgação das
realidades de alguns países da CEE, a Câmara da Moita procede à instalação de uma antena parabólica, que permite a captação e a retransmissão de oito programas televisivos de alguns países que integram aquela Comunidade. Inicialmente foram poucas as pessoas, passados alguns meses a procura de instalação de antenas viradas para aquela que nos proporcionava uma nova realidade aumentou. Entretanto, na procura de manter o obscurantismo das populações, baseado em legislação que não proíbe e apenas omite as retransmissões de programas televisivos, no dia 4 de Novembro foi saqueado o equipamento e selada a nossa antena parabólica, na sequência de instruções de órgãos governamentais competentes. Pela forma violenta e furtiva, arrombamento das instalações municipais, que representam um exercício claro e inequívoco do abuso do poder, etc...., diligenciámos junto da Assembleia da República ... - isto foi mandado à Assembleia da República, Sr. Secretário de Estado .... «para que se preencha o actual vazio legal, definindo concretamente ...»

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, sabe que combinámos sermos razoavelmente rigorosos, por isso faz favor de terminar.

O Orador: - Sr. Presidente, estamos habituados a isso...

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Estamos, estamos!

O Orador: -... costumo ser rigoroso, já agora também vou ser rigoroso, senão inscrevo-me para uma intervenção.
«... a possibilidade de existência de retransmissão de programas televisivos por via satélite».
Sr. Secretário de Estado, para impedir o tal saqueamento do espaço, como referiu, acha que esta é a melhor forma de pôr termo à confusão existente? Não seria preferível legislar? Porquê este ataque, verdadeiramente descabelado, a uma iniciativa que está a ser discutida calmamente na Assembleia da República e que tem um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, como há pouco lhe citei?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Secretário de Estado, duas questões que respeitam directamente ao Governo.
A primeira tem a ver com os procedimentos adoptados relativamente à apreensão, desactivação e selagem de equipamentos de autarquias locais destinados à captação e retransmissão de sinais de televisão e não, de forma alguma, a emissões. Sabia o Executivo, certamente, que são já inúmeros os proprietários privados de equipamentos congéneres, espalhados de ponta a ponta do País. Daqui flui naturalmente a pergunta. Porquê uma acção apenas desencadeada contra as autarquias locais? Por que não, a haver, uma acção também dirigida aos proprietários privados da capital ou de qualquer outro local? Porquê, em suma, uma actuação que viola o princípio da igualdade e permanece sem uma sustentação legal que a torne clara como ausente de qualquer motivação política directa e persecutória.
O segundo problema: o que é que está feito no sentido de salvaguardar a soberania nacional, obviamente ferida, se não acautelada, pela imparável onda tecnológica a que vimos assistindo, designadamente no que concerne à perservação da

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nossa identidade cultural, da língua portuguesa, quer na vertente da sua defesa, quer na do seu enriquecimento? O que é que está feito, por exemplo, em termos do serviço público de radiotelevisão, para assegurar um maior espaço de produção nacional, desta forma acolhendo o trabalho criativo dos trabalhadores do espectáculo? São perguntas simples, às quais importará dar respostas cabais e concretas. É que da réplica que a estas inquirições for dada pelo Governo resultará certamente uma melhor aferição da sua actividade e, naturalmente, uma mais implacável capacidade de apuramento das responsabilidades no caos que todos radiografam, mas que, pelos vistos, ninguém quer assumir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Secretário de Estado, estava eu nesta Câmara posto em sossego...

Risos.

...quando ouvi o Sr. Secretário de Estado acusar o então Secretário de Estado Raul Junqueira de, por omissão, ter contribuído para o caos instalado no espectro radioeléctrico, e com ele outros membros do governo da altura. Daí, a seguinte pergunta que gostaria de fazer: o Sr. Secretário de Estado está em condições de garantir a esta Câmara que os membros do PSD desse Governo de que fez parte o Sr. Deputado Raul Junqueira, os membros do PSD do Governo anterior e os membros do PSD deste Governo não terão contribuído, por acção, para esse caos instalado no espectro radioeléctrico ao darem entrevistas a essas mesmas rádios locais? Esta a primeira pergunta a que, frontalmente, gostaria que respondesse.
Segunda pergunta: reconhecendo que existe esse caos no espectro radioeléctrico, como justifica o Sr. Secretário de Estado que não tenha dado cumprimento, em Setembro deste ano, ao comando legal que lhe mandava publicar o mapa de frequências e imediatamente dar cumprimento ao primeiro concurso público para o licenciamento das referidas rádios? Se assim tivesse feito, em Janeiro de 1988 já não estaríamos perante o caos do espectro radioeléctrico, e se estamos, é também por omissão, e grave, deste governo. Gostaria que me explicasse porquê as razões profundas dessa omissão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, quero felicitá-lo pelo seu discurso, na medida em que raras vezes o Governo vem aqui dizer mais do que as partes preambulares das suas propostas de lei. Pela primeira vez vejo denodo, audácia e arrojo numa intervenção governamental, nem que esta intervenção seja uma espécie de oposição à oposição. Esta iniciativa foi bem criticada do ponto de vista do Governo, o que devia ter sido feita pela bancada partidária que o apoia, porque neste momento é um projecto de lei que está a ser discutido entre os partidos e, naturalmente, não caberia, em bom rigor, ao Governo vir em defesa daquilo que o seu grupo parlamentar não fez ou não se mostra capaz de fazer. E não se mostra capaz de fazer porque aquele que aqui, timidamente, esboçou a primeira reacção ao discurso do Sr. Deputado Raul
Junqueira foi exactamente aquele que no parecer mostrou total desconhecimento dos principais argumentos que hoje o Sr. Secretário de Estado aqui trouxe.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Refere-se a mim? O Orador: - Refiro, sim.
O Sr. Secretário de Estado, em algumas das principais críticas que teceu, retomou as dúvidas que eu próprio tinha posto ao autor do projecto. V. Ex.1 diz que a instalação das antenas é livre, que o actual projecto que estamos aqui a debater não vem trazer muito de novo, que nem sequer era preciso este projecto de lei para regulamentar o projecto de instalação das antenas e que não precisava de uma lei para fazer aquilo que o projecto de lei está a fazer. O Decreto-Lei n.9 147/87, do governo anterior, no n.º 5 do artigo 9.º, diz que «a instalação de antenas individuais ou colectivas para recepção de programas via satélite ou para outros fins específicos de radiocomunicações obedecerá a legislação própria». O próprio decreto-lei reconhece que há um vazio legal, que quer que haja legislação específica, que nos diz que esta matéria é tão importante, e por isso chama a atenção da posteridade e dos intérpretes dizendo «está aqui um grande vazio que é preciso preencher».
O projecto de lei, obedecendo a essas directrizes, isto é, sendo legislação geral, ao precisar uma legislação especial sobre as antenas veio preencher este vazio. Tem lacunas que extravasa este número S, tem algumas contradições, tudo isto é verdade, mas daí saltar para inconstitucionalidades, dizer que isto é um regulamento, que isto é um mau serviço, dizer tudo isto só mostra a fraqueza do Governo, porque se tudo...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Na conferencia de líderes parlamentares costumamos dizer que temos de ser rigorosos - vou repetindo. Mas ficamos sempre no «só mais um minuto». Faz favor.
O Orador: - Pergunto ao Sr. Secretário de Estado porque é que o Governo - sabendo da importância disso, sabendo que estava apresentado um projecto de lei do Partido Socialista e sabendo que era sua obrigação fazer uma proposta de lei, nos termos do n.º 5 desse decreto-lei -, não se apressou a agendar para hoje uma iniciativa legislativa, concorrendo com o projecto do Partido Socialista, para que pudéssemos tomar em consideração as duas propostas e sair daí uma legislação especial, capaz para o País?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueira.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - O Sr. Secretário de Estado fez aqui uma intervenção que, pessoalmente, considero lamentável a diversos níveis. Lamentável, logo a começar, pelo tom, porque, de facto, o que foi aqui feito foi uma exposição calma, serena, tranquila dos motivos que levaram o Partido Socialista a apresentar este projecto de lei e que não merecia da parte do Governo, nomeadamente do Sr. Secretário de Estado, o tom que imprimiu à sua intervenção.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Registamos. Parece que, de facto, os secretários de Estado deste Governo aprendem depressa com alguns ministros...

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Voz do PS: - Muito bem!

Mas deixe-me dizer-lhe que a sua intervenção é profundamente injusta, para não dizer outra coisa, quando»diz que o Governo de que fiz parte deixou, por inacção, aumentar a degradação do espectro radioeléctrico e citou para o efeito o caso dos retransmissores da televisão espanhola.
Sr. Secretário de Estado, os retransmissores da televisão espanhola começaram a instalar-se neste país muito antes do 25 de Abril e avançaram rapidamente a seguir ao 25 de Abril, em 1974 e em 1975, altura em que o Partido Socialista não fazia parte do Governo e eu próprio também não.
Devo, no entanto, dizer ao Sr. Secretário de Estado o seguinte: em 1984 havia, de acordo com os registo oficiais da Direcção dos Serviços Radioeléctricos dos CTT, catorze rádios piratas a funcionar sem estarem legalizadas. Em Junho de 1985 havia cerca de quarenta, porque o Governo preocupou-se em dialogar com esses movimentos, em pedir-lhes para não emitirem, com a promessa de vir a esta Assembleia da República uma lei que disciplinaria...

Protestos do PSD.

O Orador: - Há governos que gostam de dialogar!

Aplausos do PS.

Aconteceu, pois, que os Grupos Parlamentares do PSD e do Partido Socialista comprometeram-se a apresentar nesta Assembleia da República uma lei - que, de resto, chegou a ser discutida e votada na generalidade - que iria permitir a atribuição de frequências. Porém, a Assembleia da República foi dissolvida e essa lei não pôde ser votada na especialidade. Nessa altura, Sr. Secretário de Estado das Comunicações, havia cerca de 40 rádios piratas neste país. Agora, quantos existem?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Existem 1000!

O Orador: - Quantas rádios piratas há a funcionar neste país? Existem mais de 1000! E a quem se deve a proliferação dessas rádios piratas? É ao governo socialista, Sr. Secretário de Estado ...?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - É ao PSD!

O Orador: - Por outro lado, devo dizer que uma intervenção como a do Sr. Secretário de Estado, que se limita a dizer que este projecto de lei, feito com todo o espírito construtivo, é confuso, e incoerente, que baralha, que viola não sei que ..., que tem estado contra as disposições internacionais, sem sequer justificar uma única das afirmações que fez, alegando ...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estou a dar meio minuto alem do tempo regimental de três minutos. Agradecia que fossem rigorosos.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Estava só a dizer que uma intervenção como a que o Sr. Secretário de Estado fez demonstra a evidência de que o Sr. Secretário de Estado não tem a mínima razão, e, como diz o povo, «não é quem fala mais alto quem tem razão», não é quem insulta quem tem razão, nem é quem confunde quem tem razão.
De facto, o Sr. Secretário de Estado, com esse tipo de argumentação, ao dizer que não presta sem justificar por que é que não presta, demonstrou que não tem razão.
Por outro lado, devo dizer-lhe que me surpreende a circunstância de V. Ex.ª se espantar pelo facto de o Partido Socialista ter um artigo nesta lei que visa a protecção da indústria nacional - não apenas de antenas, mas do sector que tem a ver também com os equipamentos. As antenas não são o único equipamento nesta matéria!
O Sr. Secretário de Estado não tem de se espantar com isso, porque o Partido Socialista preocupa-se com a produção da riqueza nacional, com uma indústria nacional forte. Portanto, para o Partido Socialista é preferível que se fabriquem os equipamentos no nosso país do que importá-los.
Finalmente, agradeço ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca a circunstância de ter lido o relatório da Comissão, subscrito e elaborado por um deputado do PSD, aprovado por unanimidade, e onde, de facto, houve uma unanimidade de pontos de vista sobre este projecto de lei.
Agora houve uma mudança súbita na atitude do PSD. Parece que o Governo não liberalizou nada, não privatizou nada, o que ele está a fazer chama-se outra coisa. Parece que o Governo só quer nacionalizar, e, neste caso, nacionalizou o Grupo Parlamentar do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para um último pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Deleure.

O Sr. Nuno Deleure (PSD): - Sr. Secretário de Estado, tenho uma questão para lhe colocar. Espero que o Sr. Deputado Narana Coissoró não se importe que ponha questões a um Secretário de Estado de um Governo que apoio! ...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Até louvo!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, imagine que, ao abrigo do previsto no artigo 19.8 do projecto de lei, todas as autarquias deste país estavam na disposição de receber e de retransmitir sinais de televisão recebidos via satélite.
Partindo do princípio de que todas as autarquias estão em igualdade de circunstâncias, porque não há qualquer possibilidade de opção em relação a isto, partindo deste princípio, faço uma pergunta muito concreta: o espectro radioeléctrico aguenta-se ou não?
Por outro lado, e como já resultou claro neste debate, pelo menos para mim, há duas questões distintas que importa serem analisadas separadamente: uma, a recepção individual, outra, a recepção para fins de retransmissão.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado, lembro à Câmara que, de acordo com o que foi acordado, teremos votações às 19 horas e 30 minutos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e das Comunicações:-Em relação às questões postas quanto ao número de antenas parabólicas instaladas em Portugal, é por demais evidente que não possuo esses números, dado que não existe registo das antenas que são instaladas.
Quanto aos postos emissores - é disso que se trata, se for esse o âmbito da pergunta -, chegaram a emitir para o ar 40 retransmissores de televisão no nosso país. Neste momento, estão já bastante menos a emitir.

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As intervenções que foram feitas pelo Governo, como aqui foi afirmado, não foram apenas em cinco locais, foram em mais locais. Anteriormente a esta operação, tinha havido uma série de outras actuações junto de outros equipamentos que faziam retransmissão de televisão aqui na área de Lisboa. Após esta acção, e porque esta lei estava aqui em discussão, o Governo decidiu pedir aos serviços que administrativamente conduzem estas acções que o não fizessem durante esse período. Foi esta a razão por que foram realizadas estas cinco acções em Novembro. No entanto, já tinham sido realizadas outras anteriormente.
Quanto aos problemas de defesa da língua portuguesa que foram referidos, são problemas que não se ligam com aspectos técnicos, mas com aquilo que se prende a aspectos de comunicação social e com o que poderia ser uma lei da televisão, com todo um «pacote» mais vasto, sobre o que, posteriormente, o Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social falará.
Com certeza que não posso garantir que não haja nenhum membro do Governo que, inadvertidamente, tenha dado entrevistas...

Risos do PS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Foram lá!

O Orador: -... a rádios não legalizadas, visto não ser muito fácil, quando se está a falar com uma série de jornalistas, distinguir a que rádios ou para que empresas trabalham esses jornalistas.
Em relação ao que aqui foi dito pelo Sr. Deputado Narana Coissoró quanto à instalação de antenas parabólicas, não há nada que impeça a sua instalação, ao contrário do que se passa com a retransmissão ou a emissão pelo espaço radioeléctrico de programas de televisão ou outros sem licenciamento.
No que diz respeito à instalação de antenas parabólicas não existe qualquer legislação que o proíba. Portanto, essa instalação é livre.
Não tinha sentido o Governo trazer à Assembleia uma proposta de lei para um assunto que é meramente regulamentar e que não tem a nobreza suficiente para ser trazido a esta Casa.
Em relação à intervenção do Sr. Deputado Raul Junqueiro, quero primeiro salientar que considero o diploma confuso pelas razões que aduzi. O diploma desconhece toda a legislação nacional e internacional a que estamos obrigados, e é por essa razão que o diploma é confuso, embora, aqui e ali, como referi, surjam ideias que possam ser aproveitadas e possam ter o seu interesse noutros âmbitos, mas que não têm nada a ver com a finalidade com que era apresentado nesta sede.
Em relação ao tom de voz, também lamento o tom do Sr. Deputado Raul Junqueira. Enquanto o meu tem a desculpa de eu ser um «novato» nestas lides, o senhor é um veterano, e por isso não tem a desculpa que eu tenho para se exceder.
Quanto à última pergunta...

Vozes do PS: - E as outras?

O Orador: - ...já foi respondida na minha última intervenção quando disse que se todas as câmaras transmitissem para o ar programas de televisão não seria possível neste momento ver esses programas, nem a RTP-1, nem a RTP-2.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos a dois minutos da hora das votações.
Entretanto, informo que está a ser distribuído um requerimento do Partido Socialista, que, nos termos do n.º 5 do artigo 61.º, solicita a votação -é um direito do Partido Socialista- do projecto de lei n.º 100/V na sessão de hoje.
A Mesa também está informada de que o PRD, que não participou no debate dos recursos sobre a admissibilidade das duas propostas de lei, com o que, incidentalmente, se gastaram 89 minutos para a sua discussão, vai fazer uma declaração de voto no final das votações, uma vez que é um direito que lhe cabe.
Vamos, agora, passar à votação do recurso...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Só pretendo saber exactamente o que é que vamos votar. Vamos votar os pareceres ou os recursos? Penso que serão os recursos!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, não se ouviu aqui na bancada do Governo se o debate sobre o projecto de lei do Partido Socialista foi interrompido ou de encerrou.

O Sr. Presidente: - O debate está apenas interrompido para dar lugar às votações que estão previstas para as 19 horas e 30 minutos e continuará até o seu termo, uma vez que o Partido Socialista requereu a votação na sessão de hoje.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, se a hora das votações é às 19 horas e 30 minutos, depois das votações continua o debate de um diploma que vem do antecedente? É totalmente inédito! Não foi esse o espírito que acordámos em conferência de líderes. O debate das matérias pára exactamente no momento das votações às 19 horas e 30 minutos. Se assim não fosse, não se tinha suscitado o adiamento das votações das 18 horas para as 19 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o que se combinou na conferência de líderes foi que as votações se fanam todas às 19 horas e 30 minutos e não às 18 horas por razões que aí foram discutidas.
Isso não impede que, em certas circunstâncias, o debate se possa prolongar pela noite dentro, como já tem acontecido, desde que seja esse o acordo e desde que o Regimento o permita.
Não decorreu o debate que tivemos -embora se considerassem as vantagens e os inconvenientes de votar a uma ou a outra hora - que o facto de se votar às 19 horas e 30 minutos implicava, absoluta, necessária e irredutivelmente, o termo da sessão às 20 horas, embora seja esse o termo normal da sessão de cada um dos dias.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, não queria continuar a complicar, pois por vexes complicamos as coisas que são simples.
Pareceu-me, na altura, que o mais lógico, uma vez que vamos ter uma votação, talvez às 20 horas - ó um direito potestativo do Partido Socialista, este requereu-o (aproveito para esclarecer o Sr. Ministro que, como temos visto, não esqueceu a sua larga experiência de deputado) -, o mais simples era fazermos todas as votações nesse momento. Ou então fazemos esta agora e a outra às 20 horas, mas continuarmos a perder tempo em torno do momento em que vamos fazer a votação é que não nos leva a lado nenhum.
Atrevo-mo a sugerir que fizéssemos as votações todas às 20 horas, senão façamos já uma e passemos adiante.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa nada obsta a isso, simplesmente, segundo a tradição, as votações eram às 18 horas e continuava-se o debate. Porque ninguém requereu o contrário, apesar de ler sido preterida para as 19 horas e 30 minutos, seguiu-se esse critério, podendo a Mesa ou alguém sugerir o contrário, se assim o entender.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, julgo que, neste momento, há dois temas que podem interessar. O primeiro foi levantado pelo Sr. Deputado Narana Coissoró quando perguntou o que é que se ia votar. Parece que o Regimento dá uma resposta muito clara no artigo 134.º Penso que o que se vai votar e o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nesse aspecto, ainda não tinha terminado de esclarecer a Câmara. Fui interrompido quando estava a dizer que íamos votar a matéria relativa à proposta de lei n.º 16/V.

O Orador: - Sr. Presidente, não linha a pretensão de estar a responder pela Mesa. Sei que o Sr. Presidente ia responder. Estava apenas a adiantar que há dois problemas.
O segundo é sobre a votação que foi requerida pelo Partido Socialista. Não tive oportunidade, no momento, de assistir à leitura do requerimento, mas julgo que este problema torna necessário que a questão volte à conferencia de líderes. Se a circunstância de se ler passado a marcação da hora das 18 para as 19 horas e 30 minutos permite que se aplique o n.º 5 do artigo 61.º do Regimento, creio que, efectivamente, não poderemos aceitar que esta hora se mantenha. De qualquer forma, hoje está assim estabelecido e a Mesa decidirá.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para uma curta interpelação à Mesa que creio poder reconduzir a questão onde ela deve ser posta.
Julgo que a hora fixada das 19 horas e 30 minutos é para permitir as votações das matérias que estiverem prontas para serem votadas. Ou seja, se há uma matéria que está em curso de discussão, se ainda há tempo disponível dos partidos para intervir, não se compreenderia que as 19 horas e 30 minutos fosse como que uma guilhotina que cortasse a hipótese de intervenção a quem, por exemplo, como o PCP - porque o Governo ultrapassou o PCP na inscrição
em relação a este debate - ficasse sem possibilidade de usar da palavra.
Cremos, Sr. Presidente, que outro entendimento não pode ser feito do Regimento. A hora das 19 horas e 30 minutos é para as votações que for possível fazer. Portanto, o debate deve continuar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se continuamos com este processo gastamos todo o tempo.
A passagem das 18 horas para as 19 horas e 30 minutos foi acordada na conferência de líderes e entendeu-se, ou pelo menos eu entendi - e pergunto se esse foi o entendimento geral, que julgo que não podia deixar de ser - que as 19 horas e 30 minutos eram as «novas» 18 horas do sistema anterior, que, com todo o espírito e com todas as condições, se entendeu ser mais operacional. Neste sentido, a votação das matérias relativas às propostas de lei n.ºs 16/V e 18/V que, seguindo a tradição, seria feita às 18 horas, porque o debate terminou antes, passa para as 19 horas e 30 minutos, como foi anunciado.
Entretanto, tendo começado o debate do projecto de lei n.º 100/V, o Partido Socialista requereu a votação na sessão de hoje, e nestas circunstâncias cabe à Câmara decidir duas coisas: ou fazemos a votação agora dos recursos relativos às propostas de lei e continuamos o debate e votamos a proposta do Partido Socialista, ou, então, adiamos todas as votações para o termo da discussão de hoje.
Como estas questões não foram levantadas na conferencia de líderes solicito o consenso da Câmara. Se não houver consenso, faremos de acordo com o combinado na conferencia de líderes, isto é, procederemos de imediato à votação relativa às propostas de lei n.ºs 16/V e 18/V.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, é para confirmar que não existe consenso, por isso devemos proceder de imediato às duas votações.

O Sr. Presidente: - Vamos, pois, votar o parecer da Comissão relativo ao recurso de admissão da proposta de lei n.º 16/V - Alterações à Lei n.º 24/87, de 24 de Junho (estabelece o regime disciplinar de alienação de participações ou bens e instalações delidas pelo Estado em empresas de comunicação social) -, interposto pelo PCP e pela ID.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS, votos contra do PCP, de Os Verdes e da ID e abstenções do PS e do PRD.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acabámos de votar o parecer relativo ao recurso interposto pelo PCP e pela ID de admissão da proposta de lei n.º 16/V, que liberaliza a alienação, oneração e demais formas de privatização de empresas públicas de comunicação social, bem como dos respectivos bens e instalações.
Fundamenta-se o recurso na violação do disposto no artigo 83.º da Constituição, «porquanto a mesma autoriza a prática de actos de desnacionalização de empresas directamente nacionalizadas, bem como de grandes empresas directamente nacionalizadas».

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A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu sobre o referido recurso o parecer de que a proposta de lei n.º 16/V «não viola a Constituição, estando em condições de ser admitida», com base nos seguintes fundamentos:

a) A inovação introduzida no artigo 2.º pela referida proposta de lei pressupõe a distinção entre empresa, património e estabelecimento comercial, sendo legítima a alienação de títulos ou conjunto de títulos de bens e instalações que integrem o respectivo estabelecimento comercial;
b) Tal alienação, embora possa significar a própria extinção de uma empresa nacionalizada, não se traduz em desnacionalizações, nem infringe a garantia da irreversibilidade do artigo 83.º da Constituição.
É esta a posição do Governo e a interpretação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Mas há quem entenda que «deve ter-se por inconstitucional a alienação da propriedade ou do direito de exploração de qualquer estabelecimento ou parte distinta do património de uma empresa nacionalizada susceptível de exploração empresarial autónoma, directa e imediata» (por exemplo, Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa, anotada).
Ora, a proposta de lei em causa não só permite a alienação e oneração de capital das empresas públicas de comunicação social, como ainda as mesmas são precedidas da respectiva transformação em sociedades anónimas, ao contrário do que se dispõe no n.8 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 358/86, na redacção dada pela Lei n.º 24/87, que salvaguarda uma participação maioritária do sector público.
A permissão da alienação de títulos ou conjunto de bens e instalações que integrem o respectivo estabelecimento comercial, agora consagrada na proposta de lei n.º 16/V, poderá, pois, significar a possibilidade de extinção das empresas nacionalizadas.
Nessa ordem de ideias, a extinção de uma empresa nacionalizada traduzir-se-ia na desnacionalização com infracção da garantia de irreversibilidade prevista no artigo 83.º da Constituição, sempre que a extinção da empresa nacionalizada assume o propósito de uma desnacionalização, ou seja, quando ela se traduz numa reprivatização de uma empresa ou unidade económica com empobrecimento do sector nacionalizado.
É verdade que esse propósito de desnacionalização vem expressamente explanado na «exposição de motivos» da proposta de lei, quando se afirma que «ao Governo cabe, pois, no seguimento de uma tarefa já encetada, prosseguir uma política de alteração profunda das estruturas vigentes [...] tomando como vector essencial a necessidade de liberalização do sector [...]». Entendemos que a questão, sob o ponto de vista jurídico, é controversa, sendo mais determinada por elementos de carácter político do que por fórmulas de cariz essencialmente técnico, sempre discutíveis. Daí a nossa abstenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar o parecer correspondente ao recurso de admissão da proposta de lei n.º 18/V - Autoriza as empresas públicas a serem transformadas em sociedades anónimas de maioria de capital público, interposto pelo PCP e pela ID.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS, votos contra do PCP, de Os Verdes e da ID e abstenções do PS e do PRD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior para uma declaração de voto.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa posição de princípio decorre do que dissemos relativo à proposta de lei n.9 16/V e dela decorrem igualmente os pressupostos da apreciação por nós feita sobre o recurso de admissão da proposta de lei n.º 18/V.
Para além das questões estritamente jurídicas, é numa perspectiva meramente política que o assunto deve ser equacionado.
O que nos parece mais relevante é a disposição do Governo em apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei tão importante à revelia do processo de revisão constitucional, em cuja sede se irá discutir a reformulação constitucional dos sectores público e privado da economia.
Como é sabido, o PRD nunca sustentou que os princípios consagrados na Constituição constituíam condicionante efectiva à modernização e desenvolvimento do País. Mas também nunca defendeu posições dogmáticas e insensíveis às transformações que urge operar no sistema produtivo.
É neste quadro que deve ser analisada a nossa posição sobre a importância do actual sector empresarial do Estado no sistema produtivo nacional. Consideramos, como várias vezes temos afirmado, que, apesar de tudo, o sector empresarial do Estado tem desempenhado, globalmente, um papel fundamental, nomeadamente no tocante ao seu relacionamento com um estrato significativo de pequenas e médias empresas à assimilação e difusão de novas tecnologias, à investigação e ao desenvolvimento.
Também temos dito amiudadas vezes que é cada vez mais estéril o afrontamento ideológico entre sector público e sector privado num país que, acima de tudo, precisa modernizar-se, adensar a malha das relações intersectoriais, apostar decididamente em novas tecnologias assimiláveis e adequadas, enfim, combinar, optimizando, as complementaridades produtivas e tecnológicas entre os dois sectores.
A experiência demonstra, no entanto, que não há condições objectivas e subjectivas para prosseguir tal desiderato se não houver transformações profundas na estrutura e composição do sector empresarial do Estado.
A questão angular radica, no entanto, na salvaguarda do interesse público - é fundamental que seja o Estado, entendido em sentido estrito, e não organismos de direito público ou outras entidades de direito público, a assegurar sempre a maioria do capital social das empresas do sector público.
A proposta de lei que constitui o objecto de recurso em apreciação propõe uma alteração da técnica de organização, pela assunção de formas societárias, mas poderá discutir-se a alteração das finalidades económicas e sociais, que estão na base de muitas das actuais empresas nacionalizadas e que poderão advir da sua adopção.
E a circunstância de as empresas públicas serem objecto de transformação numa sociedade anónima de maioria de capitais públicos, nomeadamente mediante um decreto-lei do Governo, não arreda definitivamente a possibilidade de a evolução política e governativa conduzir à descaracterização do primado público das empresas nacionalizadas.
A suceder tal rumo, o que estaria verdadeiramente em causa seria a desvalorização, ou mesmo a subversão, de um dos princípios fundamentais do Estado de direito democrático, ou seja, o princípio de subordinação do poder económico ao poder político.

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Não se discute, pois, a necessária correcção dos desequilíbrios de um sector empresarial do Estado. Equacionam-se, sim, os modos e formas da sua reestruturação.
Constituirá a proposta de lei n.º 1/V uma das vias? Temos dúvidas, como dúvidas temos sobre a sua integral conformidade aos princípios e preceitos constitucionais. Daí a nossa abstenção.

O Sr. Presidente: - Retomando a discussão do projecto de lei n.9 100/V, o PCP, que solicitou a palavra, dispõe de 13 minutos, que e exactamente o tempo que nos leva às 20 horas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A Assembleia da República é hoje chamada a debater matéria relativa à instalação de antenas destinadas à recepção de serviços de radiodifusão sonora e televisiva.
E vai fazê-lo porquanto a incúria governamental neste domínio ameaça criar uma ruptura total numa situação já de si de verdadeiro caos. A anarquia existente é, aliás, constatável pelo simples olhar do cidadão para telhados, terraços e janelas dos prédios, um pouco por todo o país.
A intervenção do Sr. Secretário de Estado das Comunicações neste debate veio agravar ainda mais as preocupações unanimemente sentidas, porquanto anunciou, pura e simplesmente, a manutenção do que está. Isto é grave!
O Governo tem má consciência nesta matéria e daí tentar dar o salto para a frente assumindo, não a figura de agente relapso, que efectivamente é, mas imputando a outros as culpas que são exclusivamente suas.
Um pouco de modéstia, de moderação, de reconhecimento das próprias culpas não ficam mal a ninguém e o Governo deveria ter disso consciência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Lembremos, a este propósito, que a recusa governamental na aplicação e regulamentação da Lei de Licenciamentos de Estações Emissoras de Radiodifusão é factor acrescido de agravamento da já degradada situação actual.
É hoje inquestionável, Srs. Deputados, a necessidade de proceder a alterações na regulamentação da matéria em debate, de modo a encontrar as necessárias resposta, que, tendo em conta a evolução tecnológica verificada, permitam salvaguardar uma correcta utilização do espaço radioeléctricos do espaço físico, assegurando aos cidadãos a recepção da informação disponível.
É óbvio que o projecto de lei em apreciação se deve circunscrever ao quadro constitucional em vigor, não sendo legítimo, como se pretenderia inferir por algumas intervenções de deputados nesta Casa, tentar retirar deste debate conclusões sobre matéria que não esteja efectivamente em apreciação. Duo de outra maneira, é importante clarificar que o que está em causa se circunscreve à instalação de antenas que não ao regime de actividade e condições de emissão de serviços de radiodifusão, nomeadamente de radiodifusão televisiva.
É para nós inquestionável que não existem quaisquer limitações constitucionais ou legais para a livre recepção pelos cidadãos de sinais de radiodifusão sonora ou televisiva que não as decorrentes dos acordos internacionais subscritos pelo Estado Português em matéria de radiocomunicações e a preservação de uma correcta utilização do espaço radioeléctrico nacional. Questão totalmente diversa é a do regime de actividade, a titularidade, produção, emissão e transmissão de radiodifusão sonora ou televisiva, cada uma com um regime específico, não tratável de maneira similar, como, aliás, decorre da lei fundamental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, como o pano de fundo para o presente debate está a recente acção desenvolvida pelos serviços radioeléctricos dos CTT, em colaboração com a Polícia Judiciária, de desactivação, selagem e apreensão de equipamentos destinados à recepção de sinais de televisão, instalados por autarquias locais em cinco concelhos do Norte, Centro e Sul do País.
A forma como decorreu a intervenção policial suscitou indignação das populações e das autarquias visadas e generalizou inquietudes. Com efeito, o desencadeamento desta acção-surpresa, pela calada da noite, por sobre não ter acautelado prejuízos adicionais, saldou-se em actos de desproporção manifesta, como seja o caso da degradação de um depósito de água, em Fafe, e a maceração de diversas estruturas de suporte.
A questão já foi por nós colocada ao Governo há cerca de dois meses, mantendo-se, contudo, um silêncio do Executivo - aliás, reavivado hoje no presente debate - que não contribui para o salutar funcionamento das instituições nem para o normal relacionamento entre o poder central e os órgãos de poder local.
Srs. Deputados, os equipamentos instalados pelas autarquias visavam única e simplesmente tomar acessível aos munícipes dos respectivos concelhos aquilo que era - e continua a ser- acessível aos cidadãos, individual ou colectivamente, que tem disponibilidades económicas para instalarem a sua própria antena parabólica para a captação de emissões via satélite. Neste quadro, como têm feito questão de sublinhar vários presidentes de câmaras municipais, as instalações visadas não produziam nem transmitiam programas de televisão próprios, não podendo, por isso, ser consideradas televisões piratas.
A questão que está colocada com esta intervenção relâmpago contra as instalações municipais é a de saber até que ponto o Governo e as entidades dele dependentes estão a agir de boa fé ao fazer aplicar às autarquias locais disposições legais que ele próprio, através de repetidos apelos à subversão do quadro legal existente em matéria de radiotelevisão, tem contribuído para esvaziar de conteúdo e sentido prático aliás, bem ilustradas no próprio Programa do Governo. Importa, pois, interrogar-nos, Srs. Deputados, sobre se será eticamente aceitável uma concepção que visa dar a exclusividade da recepção das transmissões via satélite a um conjunto de cidadãos com elevada capacidade económica, aos frequentadores de hotéis e instalações turísticas de luxo -contra os quais não há notícia de que entidades responsáveis pela fiscalização da utilização do espaço radioeléctrico tenham agido -, apesar de se saber, como se sabe, que algumas delas utilizam retransmissores. Não é despiciendo sublinhar que, em muitos casos, os equipamentos instalados pelas autarquias locais visavam suprir carências na recepção do serviço da RTP (nomeadamente do segundo canal) decorrentes de limitações na rede de emissores e retransmissores desta empresa pública ao nível do País.
Por outro lado, a acção desencadeada contra as autarquias locais veio deitar por terra sofismas e demagogias propagados ao longo dos anos por figuras do Governo, do PSD e outros da área ideológica do partido sem excluir, obviamente, os lobbies de interesses que se movem na luta pela

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TV privada. De uma penada, um dos principais pólos da argumentação que vinha servindo de base à campanha para abertura da TV à iniciativa privada, «inevitável porque qualquer pessoa pode receber emissões via satélite e as emissões de Espanha», diziam uns, ou que «as novas tecnologias impedirão que se limite a liberdade de emitir e receber», argumentavam outros, esta argumentação foi claramente contraditada pela acção dos seus próprios autores.
Eles agora já estão noutra. Está em curso um processo de selecção de quem pode (os grupos e os lobbies, logicamente) e de quem não pode (o público em geral) recolher os benefícios do progresso tecnológico.

Aplausos do PCP.

O que está em causa, em última análise, Srs. Deputados, é o próprio princípio da igualdade de direitos dos cidadãos perante a lei, tal qual prescreve a Constituição da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - De acordo com o projecto de lei em análise é, desde já, reconhecido às autarquias locais o direito a promoverem a distribuição, a nível local, dos programas de radiodifusão sonora e televisiva, captados em sistemas de recepção de serviço de terra ou de serviço de espaço, direito este extensível a associações de carácter cultural, recreativo e humanitário, sendo que estas últimas veriam o respectivo regime definido pela entidade governamental competente.
Se quanto ao primeiro aspecto não surgem dúvidas quanto à sua aceitação, tendo em vista o serviço público a prestar aos cidadãos na área do município, já quanto ao segundo haverá que colocar algumas interrogações quanto às entidades a abranger, condições de funcionamento e nível de intervenção.
São interrogações pertinentes, porquanto tais definições são deixadas para a entidade governamental competente em termos que ela própria definirá.
As abundantes remissões para competências de entidades governamentais, que surgem ao longo do projecto, são, aliás, matéria que deve merecer profunda ponderação ao longo deste processo legislativo.
Pensamos que a Assembleia da República teria a ganhar em uma mais concreta tipificação das situações a abranger pelo nosso lado, desde já afirmamos que não deixaremos ? dar a nossa própria contribuição no debate na especialidade, se for caso disso, se a maioria do PSD tiver regem de o enfrentar.
Permitam-me, Srs. Deputados, uma breve reflexão sobre umas questões suscitadas em tomo da matéria em debate.
A «livre circulação» de TV de uns Estados para os colide, naturalmente, com a sua soberania, sobretudo tivermos em conta que essa circulação se dá sempre num
ido - de um pequeno número de países, com especial importância para os EUA, para a grande maioria, sem que os últimos tenham a possibilidade de, com produção
ria, circular nos primeiros de dizer-se que a circulação está hoje limitada pela linguística e pelas possibilidades individuais de cão dos programas dos satélites, is tenhamos consciência, Srs. Deputados, de que estas coes irão progressivamente desaparecendo com o das conquistas tecnológicas, e facto coloca a cada Estado e, no caso concreto, a tal, três tipos de questões: a primeira, definir regras de que salvaguardem a soberania, a indústria nacional
e os direitos de autor, a segunda, a necessidade de investimento na produção nacional, particularmente através do desenvolvimento do serviço público, como forma para combater a colonização estrangeira; e, finalmente, a salvaguarda de uma cooperação internacional que evite a imposição de factos consumados, a lei da selva, a lei do mais forte.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Estas questões estão hoje na ordem do dia e, sobre elas, a resposta governamental tem sido nula, como o prova o presente debate.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o Governo apresenta-se pela negativa, intervém pela negativa e vai sair certamente pela negativa neste debate. O que está verdadeiramente em causa é saber com rigor o que está a ser feito para que os Portugueses possam receber mais e receber melhor em português e as medidas que estão a ser adoptadas para a necessária resposta do serviço público.
O acesso do nosso país ao sistema de radiodifusão directa por satélite ou a outros satélites, no sentido de assegurar uma melhor cobertura do território nacional pela programação da RTP, é questão a merecer resolução urgente.
E também aqui a posição governamental merece justo reparo e exige rápida clarificação. O Primeiro-Mimstro referia há tempos que o serviço público de televisão não estaria vocacionado para tal efeito. Outros membros do Governo argumentam com a falta de disponibilidade financeira para encarar um tal projecto.
Mas que poderá isto significar?
Será que se pretende deixar o acesso ao sistema de recepção directa por satélite para os lobbies da TV privada, que, obviamente, o fariam como parceiros de um qualquer grupo multinacional, com as previsíveis consequências em termos de informação e programação? Os exemplos estrangeiros aí estão para nos alertar, Srs. Deputados, para este problema e para as suas nefastas consequências.
É necessário, designadamente, ter uma resposta concreta sobre o estado da participação portuguesa em projectos comuns com outros países europeus, como seja o projecto Europa/TV, e seu futuro.
A este propósito convém também recordar que mesmo sem esperar pela recepção directa por satélite, a nossa vizinha Espanha alugou recentemente um transporte no EUTELSA I-F4 para cobrir com o seu primeiro canal da TVE o continente, Ceuta, Melilla e as Canárias.
É urgente que seja retomada a participação da RTP em projectos pan-europeus, acautelando os interesses nacionais. Importa que as grandes vantagens da difusão por satélite não sejam apenas aproveitadas por estrangeiros para entrarem no nosso país.
É com este espírito que participamos no presente debate, pela adopção de medidas legislativas, que, não ignorando, antes respondendo aos novos desafios tecnológicos, permitam defender os interesses dos Portugueses e de Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda estão inscritos para usar da palavra os Srs. Deputados Vieira Mesquita, Maria Santos e Narana Coissoró, pelo que ainda não posso dar o debate por encerrado.

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Contudo, atingimos a hora regimental de encerrar a sessão e como não houve nenhum pedido de prorrogação dos nossos trabalhos o requerimento apresentado pelo PS não tem exequibilidade.

Vozes do PCP: - Oh, Sr. Presidente!

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que há aqui dois pontos que podem ter um momento de sintonia: o primeiro é o desejo ou direito potestativo do PS no sentido de votar hoje o projecto de lei que agendou. O segundo é o de a sessão terminar à hora regimental.
Ora, a solução para isso é a de agora às 20 horas votarmos o diploma apresentado pelo PS, com prejuízo de todos os oradores inscritos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa é nova!

O Orador: - No que respeita aos deputados do Partido Social-Democrata, devo dizer que aceitamos esse entendimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que, nos termos do n.º 5 do artigo 61.º do Regimento, o facto de haver oradores ainda inscritos não impede que se proceda à votação. Aliás, este dispositivo existe exactamente para possibilitar que se vote, embora a discussão se não tenha completado.
Dito isto, é evidente que o Partido Socialista não tem nada a opor a que o debate se prolongue para que aqueles deputados que ainda não intervieram e o desejem fazer possam usar da palavra. Se algum grupo parlamentar requerer o prolongamento da sessão, o PS dará o seu voto favorável a esse requerimento.
Devo, pois, dizer que o nosso objectivo não foi, de modo algum, coarctar nem impedir a intervenção dos Srs. Deputados. A maioria tem em particular o poder de tornar exequível um eventual requerimento ou torná-lo perfeitamente inútil. No fundo, o prolongamento da reunião - sejamos claros- está na mão da maioria, está nas mãos do PSD. É, pois, esse partido que permitirá ou não que aqueles que ainda não intervieram o façam.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é evidente que a Mesa se confronta com duas situações contraditórias. Compete, pois, às bancadas propor a solução para estas duas situações contraditórias, que são: votar imediatamente este diploma ou continuarmos o debate na próxima reunião, a fim de os deputados que pretendam usar da palavra o possam fazer.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, neste momento o CDS dispõe apenas de quatro minutos para intervir. Portanto, não será por nossa causa que o debate se irá prolongar por muito tempo.
Contudo, gostaria de ser informado sobre o tempo de que os outros grupos parlamentares dispõem para poder fazer as contas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os tempos disponíveis são os seguintes: o PSD dispõe de vinte e quatro minutos, o PRD de nove minutos, o CDS de quatro minutos, Os Verdes de dez minutos, a ID de quatro minutos, o Governo de quinze minutos e o PS e o PCP já não dispõem de tempo.
Srs. Deputados, como não deu entrada na Mesa nenhum requerimento solicitando o prolongamento da sessão, vamos votar...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É dado adquirido para todos nós que o PS tem todo o direito de requerer que se faça hoje a votação do diploma em questão.
Porém, gostaria de chamar a atenção da Câmara, pois creio que é a primeira vez que, havendo deputados que querem fazer uso do tempo de que ainda dispõem, não se decide no sentido de se prolongar a sessão pelo tempo suficiente para que esses oradores possam intervir no debate, procedendo-se em seguida à votação do diploma.
É isto que sempre se tem feito e creio que é isto que está no espírito de todos nós. Na realidade, quando ainda há pouco teve lugar aquele incidente em torno da votação dos recursos, a nossa ideia era de que o debate continuaria e que no final deste se procederia à votação do projecto de lei.
A nossa posição é a de se encontrar consenso por parte de todos os grupos parlamentares no sentido de se prolongar a sessão até que os oradores inscritos usem da palavra e que se vote o diploma. Creio, pois, que isso vai ao encontro daquilo que deseja o PS, que foi o partido que exerceu o j direito de marcação do diploma em questão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vou prolongar esta questão processual, que já nos arrasta por algum tempo.
A Mesa foi insinuante e pôs em evidência uma dificuldade! O que é verdade é que já se passou algum temi e ainda não deu entrada na Mesa nenhum requerimento solicitando o prolongamento da sessão. Assim, vamos passar à votação do projecto de lei.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, quanto questão é colocada é no sentido de saber se há ou consenso em termos de se chegar a um acordo prolongamento da sessão...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já se viu que no consenso e portanto não vale a pena estarmos a perde tempo!

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O Orador: - Sr. Presidente, quero anunciar que o meu grupo parlamentar vai entregar na Mesa um requerimento solicitando o prolongamento da sessão. Estamos apenas a recolher as assinaturas necessárias. Não nos force, Sr. Presidente, a solicitar uma interrupção da reunião para depois entregarmos o requerimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já ultrapassámos a hora regimental de encerrar os trabalhos e eu suscitei este problema ainda antes das 20 horas. Aliás, comecei a suscitado quando disse ao Sr. Deputado Jorge de Lemos qual o tempo que faltava para as 20 horas e qual o tempo de que ainda dispunha para intervir. Na realidade, esta foi a primeira indicação que dei à Câmara da situação com que estávamos confrontados.
Assim sendo, vamos passar à votação do diploma em questão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já anunciei que vamos passar à votação. Ou o Sr. Deputado inscreveu-se antes?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, os elementos que fazem parte da Mesa só olham para o outro lado... Não estão habituados a que os deputados deste lado usem da palavra. Aliás, V. Ex.ª sabe que muitas vezes tenho de recorrer ao telefone que tem ligação com a Mesa para me inscrever, mesmo para formular pedidos de esclarecimento. Sou sempre o último a intervir, porque a Mesa está mais preocupada com a bancada do PCP do que com a minha.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço que não faça insinuações à Mesa na sua globalidade. Pela posição geográfica de cada membro da Mesa, uns vem melhor para um lado e outros para outro. Porem, anotamos com toda a honestidade os pedidos de palavra e muitas vezes até permitimos que haja lugar a inscrições fora de tempo. Na realidade, a Mesa tem sido sensível quanto a isso.
Como o Sr. Deputado Narana Coissoró disse que se tinha inscrito antes de eu pôr à votação o projecto de lei, faça favor de usar da palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, quando em conferência de líderes parlamentares foram fixados os tempos para cada partido não se aventou a hipótese de estes tempos não estarem esgotados ou de algum grupo parlamentar não ter intervindo antes das 20 horas. Partiu-se do princípio de que os dois debates estariam encerrados às 19 horas e 30 minutos. Porém, durante o primeiro debate V. Ex.ª não se encontrava presente, mas, fora de todas as figuras regimentais, a Mesa alimentou um diálogo entre os Srs. Deputados Mário Raposo e Basílio Horta: primeiro, foi a intervenção do Sr. Deputado Basílio Horta, depois foi o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Mário Raposo, depois foi esclarecimento a esclarecimento, depois foi contra-esclarecimento a contra-esclarecimento, e a certa altura já os dois falavam como queriam.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª está a arrastar uma situação que não tem de ser arrastada. Faça favor de concluir.

O Orador: - Assim, pelo facto de por culpa da Mesa se ter ultrapassado as 20 horas sem terminarmos o debate, pergunto se isto deve ser pago pelo CDS. Dado que o CDS, que dispõe apenas de quatro minutos, ainda não interviu - o debate que se travou foi entre o Governo e o partido proponente -, está o PSD na disposição - até e um favor que se lhe faz - de votar imediatamente sem intervir...? Eu quero intervir e disso não posso ser proibido!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quanto à primeira questão devo dizer que houve dois relatórios, questionei o presidente da Comissão, anotei os tempos que foram gastos, pelo que, logicamente, a Mesa, com honestidade, não podia proceder de outra forma senão ao alargamento de mais dez minutos. Julgo que, em bom sentido, não se poderia ter feito outra coisa.
Aconselhei-me nessa matéria e assim se fez. Devo dizer que, há pouco, tive ocasião de observar que, apesar de tudo, se gastaram 89 minutos, e até seria interessante verificar quem gastou o quê.
Quando se iniciou o segundo debate, todos os Srs. Deputados estavam conscientes da situação em que nos encontrávamos. Foram alertados com devido tempo. Conhecem o Regimento tão bem ou melhor do que eu próprio, sabiam dos condicionalismos, e eu tive o cuidado de avisar a Câmara do que se estava a passar.
Não peçam, pois, à Mesa que resolva momentaneamente um problema que tem séculos e séculos, que é o da quadratura do círculo.
Em face disto, se o PS não retirar o requerimento - e não tenho conhecimento de que o tenha feito -, vamos passar à votação.
Se algum Sr. Deputado quiser que impugne esta minha decisão.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, quero anunciar que deu entrada na Mesa um requerimento pedindo o prolongamento da sessão.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Entrou fora de horas, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, não entrou fora de horas porque nem a sessão ainda não foi encerrada nem se procedeu já à votação. Recorro, pois, da decisão do Sr. Presidente.

D Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem todo o direito de recorrer da minha decisão.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Peço a palavra para invocar o Regimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Quero, concretamente, invocar o artigo 91.º do Regimento, que diz que anunciado o início da votação nenhum deputado pode usar da palavra.
Como o Sr. Presidente anunciou que se ia votar, mais nenhum deputado pode usar da palavra.

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O Sr. Presidente: - Mas eu não anunciei que se ia votar, disse, sim, que se ia passar à votação. E é isso que eu vou fazer imediatamente...

Vozes do PCP: - Mas há um recurso interposto!

O Sr. Presidente: - Vamos então votar, de imediato, o recurso interposto pelo Sr. Deputado Carlos Brito.

Protestos do PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID.

Protestos do PCP.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Regimento dá-nos o direito de fundamentar os recursos.

O Sr. Presidente: - Como o recurso foi rejeitado, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 100/V.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, quando o Partido Socialista apresentou este requerimento -já tive ocasião de o dizer- não pretendeu, de nenhum modo, impedir que Srs. Deputados interviessem no debate.
Acontece que a maioria e a própria interpretação que a Mesa tem dado a todo este processo têm conduzido a que se utilize este requerimento como instrumento para calar a capacidade de intervenção dos deputados.

Protestos do PSD.

Nestes termos, e dado o que acabei de anunciar, o Partido Socialista retira o requerimento e solicita que a discussão continue na próxima sessão.

Vozes do PSD: - Ah!...

O Orador: - Nós não somos cúmplices, nem permitiremos que as nossas iniciativas sejam usadas para coarctar a capacidade de intervenção dos deputados nesta Assembleia.

Aplausos do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, em forma de interpelação à Mesa, quero dar um esclarecimento.
É que um dos deputados que está inscrito sou eu próprio e eu dispenso a defesa do Sr. Deputado do Partido Socialista relativamente ao uso ou não da palavra.
Por outro lado, que eu saiba, o requerimento não foi retirado, e V. Ex.ª tinha aberto a possibilidade de se proceder à votação.
Penso, pois, que tudo isto é descabido e pouco edificante para a Assembleia da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado Filipe Abreu?
O Sr. Filipe Abreu (PSD): - Sr. Presidente, desejo usar da palavra no seguinte senado: foram aqui proferidas afirmações que põem em causa a maioria e a Mesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sou um deputado eleito pelo povo português, sou um deputado novo neste Parlamento, mas queria aqui dizer, perante a Mesa e perante os deputados, que repudio a forma como o Sr. Deputado Lopes Cardoso se dirigiu à Mesa e à maioria.
Esta maioria não recebe lições de democracia do Partido Socialista. Esta maioria social-democrata tem plena consciência dos seus direitos, tem plena consciência da sua democracia - repito - e não aceita lições de democracia nem do Partido Socialista nem do Partido Comunista.
Estamos aqui com a legitimidade do povo português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado Adérito Campos?

O Sr. Adérito Campos (PSD): - Sr. Presidente, estamos já numa hora adiantada, mas eu não posso deixar de intervir em relação à intervenção que o Sr. Deputado Lopes Cardoso acabou de fazer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, intervir não pode...

O Sr. Adérito Campos (PSD): - É uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Adérito Campos (PSD): - É, pois, em forma de interpelação à Mesa que uso da palavra, utilizando as mesmas regras que o Sr. Deputado Lopes Cardoso utilizou por duas vezes, para dizer que aquilo que o Sr. Deputado referiu em relação à Mesa é uma autêntica hipocrisia política.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso diz que ao apresentar o requerimento não pretendia que se tolhesse a possibilidade de que os deputados que estavam inscritos interviessem nesta matéria. O Partido Socialista deveria então ter assumido a sua responsabilidade até ao fim e ter apresentado, conjuntamente, um outro requerimento, pedindo a prorrogação dos trabalhos.
Não o fez! Assuma essa responsabilidade! Não venha é dizer que a responsabilidade é da maioria porque isso é hipocrisia política!
Ao utilizar o seu direito potestativo de forma a votar-se no final dos nossos trabalhos deveria ter apresentado um requerimento pedindo o prolongamento da sessão para que nenhum partido fosse prejudicado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não dou a palavra a mais nenhum deputado na sessão de hoje.
A Mesa procura, com todas as dificuldades que lhe são colocadas, aliás naturais (algumas talvez não tanto), levar as questões a bom termo, na maior equidade, atendendo a que muitas vezes os interesses são conflituosos. O Regimento, ele próprio não há regimentos perfeitos -, permite alguma conflitualidade.
A nossa próxima sessão terá lugar no dia 14, com período de antes da ordem do dia e da ordem do dia consta a continuação da discussão do projecto de lei n.º 100/V, dependente daquilo que a conferência de líderes parla-

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13 DE JANEIRO DE 1988 1255

mentares amanhã determinar, e a deliberação n.º 4/V, do PCP, também dependente da mesma conferência. Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Costa de A. de Sousa Lara.
António Maria Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Sequeira Roriz.
Gilberto Parca Madaíl.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Granja R. Fonseca.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Vilela de Araújo.
José de Almeida Cesário.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Pereira Lopes.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Silva Carvalho.
Manuel Maria Moreira.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.

Partido Socialista (PS):

António Manuel Carvalho Vitorino.
António Miguel Morais Barreto.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
João Cardona Gomes Cravinho.
Manuel António dos Santos.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.

Partido Comunista Português (PCP):

António da Silva Mota.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
José Manuel Antunes Mendes.
Maria Luísa Amorim. Maria Odete Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Armando Fernandes.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Isabel Maria V. Ferreira Espada.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Álvaro José Rodrigues Carvalho.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Manuel Lopes Tavares.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Faustino José Pereira da Silva.
José Angelo Ferreira Correia.
José Mendes Melo Alves.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.

Partido Socialista (PS):

Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
José Luís do Amaral Nunes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Vítor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP):

João António Gonçalves do Amaral.
Rogério Paulo S. de Sousa Moreira.

Os REDACTORES: Carlos Pinto da Cruz - Ana Maria Marques da Cruz.

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