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1380 I SÉRIE-NÚMERO 43

Em Portugal, na rádio, trata-se agora de enquadrar juridicamente de forma acertada uma realidade já existente; na televisão, pelo menos, de perceber que a lamentável governamentalização e dependência do serviço público do Estado não deveria seduzir de tal forma os governantes que os fizesse de todo esquecer não só aquilo que prometeram como a urgência em definir, pelo menos, qual o modelo e a dimensão da abertura à iniciativa privada que queremos para o nosso país.
Fiquemos, porém, por aqui sobre o problema da televisão privada. Em requerimento que apresentarei hoje mesmo ao Presidente desta Assembleia dirigirei ao Governo as perguntas que julgo justas e pertinentes face ao seu singular silencio e à situação na RTP.
As grandes opções que se colocam aos legisladores sobre o exercício da actividade da radiodifusão sonora são diversas.
Trata-se, em primeiro lugar, definir se é exigível aos operadores privados o mesmo conjunto de deveres que constitui imperativo das empresas públicas do sector.
Em segundo lugar, de decidir se deve ou não haver uma entidade fiscalizadora, tendo em conta a multiplicidade previsível de operadores e o vasto conjunto dos seus direitos e deveres, como, aliás, dos próprios ouvintes.
Em terceiro lugar, de assegurar, face à dimensão e importância atribuídas ao operador público de radiodifusão - a empresa pública RDP -, que este seja a um tempo independente perante o Governo, a Administração e os demais poderes públicos e garante da possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião, conforme impõe o texto constitucional.
A proposta de lei governamental está apenas correcta no primeiro aspecto.
Não é exigível aos operadores privados todo o conjunto de deveres que incumbe à empresa pública do sector.
Não e, com efeito, facilmente harmonizável, por exemplo, a exigência de uma programação que respeite as apetências de sectores culturalmente minoritários e a origem publicitária dos rendimentos das rádios privadas. A dependência total perante as regras do mercado conduz inevitavelmente à procura das grandes audiências, e não necessariamente à valorização de programas que, sendo de elevado nível cultural, têm muitas vezes custos sobre-dimensionados face à sua popularidade.
A mais recente jurisprudência constitucional alemã federal - e recordo que talvez em nenhum outro país se tenha debatido tão aprofundadamente todas estas questões - reflectiu esta conclusão: a cedência perante os aspectos comerciais é inevitável quando a publicidade é a única fonte de rendimento.
A proposta de lei do Governo erra, no entanto, ao não compreender a necessidade de criar um organismo independente que procure salvaguardar a liberdade, o pluralismo e a independência das entidades que exerçam a actividade de radiodifusão e que aprecie eventuais queixas apresentadas por pessoas singulares ou colectivas cujos direitos tenham sido ofendidos.
Não se trata, pois, apenas de criar um organismo verdadeiramente independente que torne transparente o processo de licenciamento dos novos operadores de radiodifusão. Mesmo que não viesse a ter o vasto leque de competências de entidades como a Comissão Nacional da Comunicação e das Liberdades francesa ou a Comissão Federal das Comunicações, existente há mais de meio século nos Estados Unidos da América, o Conselho da Rádio poderia desempenhar um importante papel nesta fase de transição entre um regime caracterizado pela presença quase monopolista da emissora do Estado e da Rádio Renascença e a legalização simultânea de centenas de novos operadores, com tudo o que isso implica.
Não parece admissível acompanhar esta fase quase experimental de tantas novas experiências locais de radiodifusão sem temer a consequência da ausência de uma espécie de «tribunal moral» que procurasse articular a expressão dos interesses dos novos operadores e da opinião pública, dirimindo os seus inevitáveis conflitos sem tomar obrigatório o recurso, sempre mais complexo, menos expedito e proventura menos eficaz, aos tribunais.
Os conflitos sobre o exercício do direito de resposta, a apreciação da conduta deontológica dos profissionais da radiodifusão, a protecção dos direitos dos ouvintes, a defesa da independência das estações emissoras, entre outras matérias, justificariam também que se mantivesse a ideia de um conselho da rádio. Este é o primeiro grande erro da proposta do Governo.
Entretanto, a empresa pública de radiodifusão manterá um papel relevante, apesar do aparecimento dos novos operadores privados. Assegurará serviços de radiodifusão não só em onda média e frequência modulada como também em onda curta, reservada na esmagadora maioria dos países ao monopólio do Estado. Manterá a utilização de, pelo menos, três redes de frequência de cobertura geral em ondas métricas. Terá naturalmente uma vasta audiência, o que lhe impõe o respeito pela sua diversidade social, cultural ou ideológica.
Importa, pois, assegurar que um serviço de radiodifusão com esta audiência e impacte na população portuguesa cumpra o único dos seus deveres a que foi dada dignidade constitucional: a independência perante o Governo, a Administração e os demais poderes públicos e a expressão e confronto das diversas correntes de opinião.
A opção da lei portuguesa para assegurar este objectivo foi original. Enquanto em todos os países da Europa Ocidental os legisladores garantiram essa independência através de diversas formas de desgovernamentalização dos processos de designação dos gestores das empresas públicas do sector, em Portugal optou-se pela criação de um órgão essencialmente fiscalizador - o Conselho de Comunicação Social -, mantendo um modelo de gestão típico dos regimes autoritários.
Há que reconhecer com coragem que esse modelo não satisfaz os imperativos constitucionais nem garante o pluralismo e a independência da informação.
O Conselho de Comunicação Social tem, como se sabe, competências limitadas.
O conselho de gerência da RDP, como o da RTP, é integralmente designado pelo Governo, sem necessidade de consulta a qualquer outro órgão. Os seus membros podem ser destituídos livremente, em qualquer momento, sem qualquer justificação nem processo disciplinar. Os mandatos, mesmo quando integralmente cumpridos, têm uma duração diminuta. Dos órgãos administrativos da RDP ou da RTP não fazem parte membros designados em representação do conjunto da sociedade civil. Os conselhos de redacção não têm as competências previstas na Lei de Imprensa.
Um tal conjunto de condicionalismos à independência das empresas públicas de comunicação social não tem paralelo na Europa Ocidental.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Importa, pois, mudar. A definição das regras gerais do modelo de gestão da empresa pública de radiodifusão não pode deixar de figurar

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