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23 DE JANEIRO DE 1988 1405

A questão que lhe coloco é a seguinte: V. Ex.ª admite que haverá possibilidade de devolução à regulamentação autárquica - e eu não tenho preconceitos contra o exercício das competências pelas autarquias, é preciso salientá-lo! - que não se traduza na emanação de regulamentos restritivos, mas apenas de regulamentos necessários à organização do exercício deste direito?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, como há outro pedido de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - O Sr. Deputado José Manuel Mendes referiu-se, taxativamente, a alguns acórdãos do Tribunal Constitucional, dizendo, nomeadamente, que eles referiam a inconstitucionalidade do nosso projecto.
Gostaria de perguntar-lhe se tem conhecimento dos acórdãos do Tribunal Constitucional de 28 de Fevereiro de 1978 e de 28 de Março de 1978 acerca de algumas posturas municipais que foram analisadas por este Tribunal e das quais passo a citar algumas passagens, não querendo, contudo, abusar da paciência de V. Ex.ª:
O direito de expressão e de informação, tal como o define a Constituição da República, não pode ser limitado ou impedido por qualquer tipo ou forma de censura, ficando as infracções a esse direito submetidas ao regime de punição da lei geral a apreciar pelos tribunais judiciais nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 37.º daquele diploma.
O artigo 15.º das posturas municipais do Porto [era este o caso em análise], que proíbe, além do mais, riscar e sujar muros ou outras vedações das ruas, largos e demais lugares públicos, nada tem a ver com aquele direito de expressão e informação.
Trata-se de disposições não incompatíveis que tutelam interesses diferentes: aquele, a liberdade de expressão e de informação, e este, a limpeza e segurança dos lugares públicos a cargo da respectiva câmara, daí que não possa afirmar-se inconstitucionalidade daquela postura municipal.
Sr. Deputado José Manuel Mendes, gostaria que comentasse este acórdão do Tribunal Constitucional.

O Sr. Joaquim Fernandes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, a questão que me coloca não é nova mas importante.
Dir-lhe-ia que, quando a regulamentação autárquica não é restritiva, obviamente se não coloca qualquer questão de inconstitucionalidade. No entanto, quando ela é restritiva, colocam-se, sobretudo quando essa restrição se traduza numa pura disponibilidade do direito pela autarquia, sem o mínimo enquadramento legal.
O que acontece é que, como pode inferir da minha intervenção, defendemos que nesta matéria, que é sensível, estão em presença, por um lado, o direito de expressão, o
direito de propaganda, o direito da formação da própria vontade popular e, por outro lado, interesses de natureza privada e outros que a Constituição tutela em relação ao ambiente e à qualidade de vida.
Não pode talhar-se um regime que abra as portas ao arbítrio, à discricionariedade, à decisão casuística. É necessário encontrar uma malha que, no quadro das disposições constitucionais e sem fazer enfraquecer o direito fundamental à expressão e à propaganda política, possa acautelar os outros direitos que, de alguma forma, com ele colidirem.
Não disse, hoje, perante a Câmara, nem no passado, que era impossível tocar nesta matéria, fosse de que modo fosse, por via legislativa. O que disse, e repito, é que é exigível que qualquer intervenção seja feita não no quadro do projecto do PSD mas no de um entendimento rigoroso e escorreito do que é a Constituição da República e do que está em jogo.
Quanto aos acórdãos que o Sr. Deputado Mendes Bota referiu, devo dizer-lhe que eles são conhecidos e não tem a ver exactamente com aquilo que estamos neste momento a tratar.
As portarias a que se refere têm alguma vaga cobertura em disposições legais preexistentes. Há momentos aludi ao Código Civil, mas há mais, nomeadamente o Código da Estrada. Sempre que as câmaras municipais agem no enquadramento de uma lei, em sentido técnico e estrito, obviamente não se coloca a questão da constitucional idade. Nos casos que cita o problema é talvez um pouco este, embora eu não conteste o ponto de vista jurídico--constitucional expresso pelos respectivos relatores dos acórdãos. Seria até curioso dizer-lhe que, como pode verificar, as teses expressas nos mencionados acórdãos fizeram vencimento por uma escassíssima minoria, logo depois completamente substituída por outras maiorias em sentido contrário, mesmo apesar da existência de alguma regulamentação que hoje se entende, a meu ver justamente, carecer de fundamentação constitucional.
Repito que o que está em causa é essencialmente isto: o povo português saiu do túnel de 48 anos de obscurantismo e de fascismo, farto de formas censórias e constrições ao exercício da liberdade de expressão. No presente, esse mesmo povo pretende uma propaganda sem restrições indevidas e dispondo de uma tutela constitucional relevante paralela à prescrita para a acção dos partidos políticos, que são, como sabe, uma das forças da democracia. Não pode, de forma alguma, nem o PSD nem ninguém intentar através de mecanismos inidóneos, porque feridos de inconstitucionalidade, atacar esses direitos, ainda por cima abrindo mão a actuações casuísticas, muitas vezes à revelia da própria vontade do legislador. Toda esta realidade tem de ser considerada.
Uma democracia é um livre jogo de forças, é um equilíbrio entre forças que se movimentam, mas é também um exercício de legalidade e de uma alta sagacidade política, deste modo, importa, realmente, que uma câmara democrática não incorra na pecha ou no desleixo de permitir que, por qualquer via, se ponham em causa princípios fundamentais e direitos que exigiram longos sacrifícios do nosso povo até ao momento de serem garantidos, e muito bem, numa Constituição que, segundo o nosso entendimento, deve continuar a merecer o respeito de todos, incluindo os que no Governo ou nesta Câmara actuam no exercício do poder.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de conceder a palavra ao próximo orador inscrito, recordo a todos os grupos parlamentares a realização de uma conferência de líderes às 12 horas.

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