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1408 I SÉRIE-NÚMERO 44

se devem pautar. E evidente que não posso dar o meu aval, e certamente a bancada do meu grupo parlamentar também não o fará, à existência de regulamentos de tal forma díspares que impossibilitem a verificação de uma certa continuidade «legislativa» regulamentar de um município para outro, estabelecendo-se 300 critérios completamente diferentes ao longo do País; creio que teremos de acautelar essa matéria.
Sr. Deputado José Manuel Mendes, tal como o Sr. Deputado, também eu partilho de preocupações de carácter material. Não foram só as ideias que evoluíram. Muitas outras coisas evoluíram desde a tecnologia ao tipo de materiais utilizados na propaganda. Certamente que a questão que põe sobre a propaganda feita em taipais de obras versus fachada de igreja no centro de uma cidade também nos preocupa. A questão do mobiliário urbano, bem como a do património arquitectónico, preocupa-nos aos vários níveis, pois julgamos ser importante ter em atenção não só os projectos novos mas também os projectos já feitos ou os que se recuperam.
Quanto à questão do Sr. Deputado Nogueira de Brito no sentido de saber qual a disposição do PSD para trabalhar na especialidade este diploma, já tive oportunidade de referir que a nossa disponibilidade é total para o efeito.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A liberdade não se ensina, mas é predisposta pela educação, e a liberdade, como todas as coisas humanas, não funciona validamente senão sobre um fundo de hábitos socialmente adquiridos. É precisamente aqui que a informação pode ajudar o esforço dos cidadãos para conhecer a vida pública e nela participar, porque detém a acessibilidade dos instrumentos que lhe permitem comunicar: expressão concreta da política em movimento, no momento actual para um futuro partilhado.
O que se exige é um constante equilíbrio entre as realidades da vida, a percepção que delas tem de adquirir cada indivíduo e a nossa capacidade legislativa para o traduzir.
Expresso estas ideias, visando trazer à vossa consideração reflexões que provoquem dúvida, que perturbem, que animem este debate. Dizia Rui Mário Gonçalves que «a capacidade reflexiva é incómoda para o poder, quando lhe lembra que uma sociedade sã se define pela criatividade».
Pretende o projecto de lei n.º 25/V, apresentado pelo PSD, condicionar a afixação de publicidade ou de propaganda, bem como a realização de inscrições ou de pinturas murais, objectivo final que exigiria, quanto a nós, um processo de pedagogização cívica que, aumentando as possibilidades de informação plural e diversificada, garantisse paralelamente o exercício normal da vida democrática.
É impossível esquecer que a sociedade portuguesa se viu tolhida durante muitos anos na sua dinâmica própria, que conseguiu apenas há treze anos rejeitar as peias que lhe eram impostas, que aboliu a censura, que proclamou a liberdade de expressão e a liberdade de associação, que fez surgir uma linguagem de novas imagens.
Então o poema visual individualizou-se como escrita: escrita mural de um momento histórico, de uma cidade e de um povo, num período em que as multiformes mensagens de rua nos ofereceram constantes mensagens de mudança.
Toda esta nova postura social era inevitável e teria de vir a dar-se; por isso, surgiram novos símbolos, produtos de um determinado contexto histórico-social. Por isso, os muros foram imediatamente apropriados para uma intensa
actividade política. Por isso, cresceu uma nova maneira de utilizar p espaço urbano e não apenas em função de valores partidários mas também em função de valores lúdicos. Por isso e por toda a parte, as pessoas se expressaram nas ruas e os muros receberam a poesia, a cor e o pensamento. As paredes popularizaram-se, como suporte social da expressão visível de um grupo em relação a outros grupos.
As paredes foram e são ainda um meio directo de comunicação e acção. Os que pretendem servir a democracia e sistematicamente inibem o cidadão a retomar o controle da sua vida social e política contradizem-se plenamente se não assumirem uma postura consentânea com a ideia que a sociedade somos todos nós, que os seus eleitos devem provocar movimento, mas não se substituírem aos sujeitos do seu desenvolvimento.
Na realidade o que está em jogo é algo bastante mais profundo e vasto e que, parecendo à primeira vista correcto, pode destruir as raízes de uma nova postura social.
É que este projecto de lei contêm algumas, eu diria «nebulosidades» de foro jurídico, que podem destruir na prática a essência e a vitalidade de uma consciência cívica e política que cresce modelada pela participação ampla de um cada vez maior número de indivíduos.
E não é com «despertadores» electrónicos que se desperta a nova mentalidade. Não se legisla esquecendo que o tempo da formação é um e que o tempo histórico outro. Que desenvolver não é dois mais dois igual a quatro e pronto! É mais do que isso, é saber ajudar a crescer no respeito pelo ritmo da diversidade social, se se quiser partilhar a construção do futuro.
O próprio parecer da Comissão clarifica, no entanto, essa «nebulosidade» quando diz que «é de admitir a hipótese de uma inconstitucionalidade orgânica» (artigo 32.º); como se lê no acórdão n.º 74/84 do Tribunal Constitucional exarado em 10 de Julho de 1984, «a liberdade de expressão, que o artigo 37.º, n.º 1, garante, compreende o direito de manifestar o próprio pensamento e, bem assim, o da livre utilização dos meios através dos quais esse pensamento pode ser difundido».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém melhor que os ecologistas é contra a degradação da paisagem, a utilização indiscriminada e desrespeitadora do património edificado e natural.
Os ecologistas não preconizam a «pichagem» dos monumentos nacionais e sabem que não há liberdade para destruir a arte.
Mas não nos digam que o ambiente se defende à custa da censura, da castração das potencialidades expressivas. Não nos digam que a criação de painéis, que são «grilos» plásticos da força criativa que irrompe num quotidiano entristecido pelas longas esperas dos transportes públicos, pela distância a que a competição obriga, devem estar sujeitos a autorização burocrática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado verão ardeu uma árvore.
Aqui há um mês alguém deixou cair lixívia num rio.
Ontem ruiu um prédio numa cidade portuguesa.
Estes três acontecimentos, sejamos sensatos, não põem em perigo o meio ambiente.
Mas se lhes disser que no Verão passado arderam centenas de hectares de floresta.
Se lhes disser que diariamente os nossos rios e a nossa atmosfera são envenenados.
Se lhes disser que o património construído das nossas cidades se degrada neste país e, o que é mais grave, com efeitos cumulativos.

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