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Quarta-feira, 3 de Fevereiro de 1988 I Série - Número 47
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA
1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE FEVEREIRO DE 1988
Presidente: Ex.mo Sr. Vítor Pereira Crespo
Secretários: Ex.mos Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Vítor Manuel Caio Roque
Cláudio José dos Santos Percheiro
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 14 horas e 15 minutos.
Antas da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos, das respostas a alguns outros e de diversos diplomas.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP) solicitou informações obre uma referência incluída no Boletim Informativo da Assembleia da República, relativa à deslocação de uma delegação parlamentar à África do Sul. Sobre o mesmo assunto, interpelaram igualmente a Mesa os Srs. Deputados Lopes Cardoso (PS), Marques Júnior (PRD), Duarte Lima (PSD), João Corregedor da Fonseca (ID) e Narana Coissoró (CDS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Basílio Horta (CDS) protestou contra a forma como foi transmitido pela RTP o Congresso do CDS, tendo respondido, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Sampaio (PS), João Corregedor da Fonseca (ID), Duarte Lima (PSD), Marques Júnior (PRD) e Vieira Mesquita (PSD).
A Sr.ª Deputada Lurdes Hespanhol (PCP) referiu-se ao agravamento da situação escolar em Portugal e respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Cesário (PSD).
O Sr. Deputado Marques Júnior (PRD) abordou alguns aspectos relacionados com o caso que envolveu o engenheiro Carlos Pimenta, regozijando-se pela sua resolução.
O Sr. Deputado António Mota (PCP) criticou a ocupação policial das instalações dos Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade (SMGE) da cidade do Porto, respondendo, no fim,
a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Vieira Mesquita (PSD) e Manuel dos Santos (PS).
Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do PSD e do PCP.
Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 36 e 37 do Diário.
A Câmara concedeu autorização a dois Srs. Deputados para deporem em tribunal.
Concluiu-se a discussão da proposta de lei n. º 17/V, que revê o regime de participações do sector público e procede à concentração dos princípios gerais a ele relativos. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe), os Srs. Deputados Silva Lopes (PRD), Octávio Teixeira (PCP), Raul Castro (ID), Manuel dos Santos (PS), Vieira de Castro e Guido Rodrigues (PSD), Nogueira dos Santos (PS), Narana Coissoró (CDS), Carlos Brito (PCP), Joaquim Marques e Jaime Soares (PSD).
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 18/V, que autoriza as empresas públicas a serem transformadas em sociedades anónimas de capital público.
Entretanto procedeu-se à leitura das actas das votações para a eleição de um Secretário e dois Vice-Secretários da Mesa da Assembleia da República - que foram eleitos -, de dois juizes para o Tribunal Constitucional - que não receberam o número suficiente de votos para a sua investidura - e de um vogal para o conselho directivo do Grupo Português da UIP - que foi eleito.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 15 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 14 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Álvaro Cordeiro Dâmaso.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira
António Abílio Costa.
António Augusto Ramos.
António de Carvalho Martins.
António Cosia de A. de Sousa Lara.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Mota Veiga.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Amónio da Silva Bacelar.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Ari nulo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Armando Manuel Pedroso Militão.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carla Talo Diogo.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Flausino José Pereira da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Gilberto Parca Madaíl.
Cuido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Carlos Maria Soares.
Jaime Gomes Milhomens.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João Manuel Ascenção Belém.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José de Almeida Cesário.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José António Coito Pita.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Manuel da Silva Torres.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Licínio Moreira da Silva.
Luís Amadeu Barradas Amaral.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Meneses Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel António de Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Maria Natalina Pessoa Milhano Pintão.
Mary Patrícia Pinheiro Correia e Lança.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Vítor Pereira Crespo.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
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Partido Socialista (PS):
Afonso Sequeira Abrantes.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Fernandes Silva Braga.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel Carvalho Vitorino.
António Miguel Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Fernando Ribeiro Moniz.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco Igrejas Caeiro.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Cosia.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Amónio dos Santos.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Cosia Brito.
Raul Manuel Bordalo Junqueira.
Ricardo Manuel Rodrigues Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Vítor Manuel Ribeiro Constâncio.
Partido Comunista Português (PCP):
Álvaro Favas Brasileiro.
Álvaro Manuel Balseiro Amaro.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo Brito.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
João António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria de Lurdes Dias Hespanhol.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Rogério Paulo S. de Sousa Moreira.
Partido Renovador Democrático (PRD):
António Alves Marques Júnior.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Cosia Ferreira Espada.
José da Silva Lopes.
Natália de Oliveira Correia.
Rui José dos Santos Silva.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):
Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.
Agrupamento Intervenção Democrática (ID):
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.
Srs. Deputados, como sabem, vai proceder-se às eleições que estão marcadas para as vagas de juizes no Tribunal Constitucional e para as vagas na Mesa da Assembleia da República entre este momento e as 18 horas, na Sala de D. Maria, onde já se encontram os Srs. Deputados escrutinadores. O boletim de voto para a eleição dos juízes do Tribunal Constitucional tem apenas a legislação que o regula para não haver quaisquer confusões.
Assim, interrompo agora a sessão para a reabrir às 15 horas e 15 m mulos.
Neste momento, a sessão foi interrompida.
Após a interrupção, assumiu a presidência o Sr Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É uma interpelação à Mesa no seguinte sentido: foi distribuído o boletim informativo, n.º 37, da Assembleia da República, do qual consta, na p. 6, que de 2 a 7 de Fevereiro se desloca à África do Sul uma delegação da Assembleia da República para assistir às comemorações que estão a ser levadas a cabo em Mossel Bay. Diz-se que a referida delegação e integrada por cinco deputados do PSD, dois deputados do PS e um deputado do CDS.
Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaríamos de saber onde foi definida, ou se foi definida, que haveria uma delegação da Assembleia da República a deslocar-se a Mossel Bay.
Em segundo lugar, não sei se o Sr. Presidente estará em condições de prestar essa informação, mas entendemos que seria importante fazê-lo, pois, nos termos do artigo 44.º do Regimento, diz-se que as representações e deputações da Assembleia devem respeitar os princípios da proporcionalidade das comissões, isto e, devem respeitar, logicamente, o princípio da representação das diferentes forças políticas com assento na Assembleia da República.
Em terceiro lugar, gostaríamos de saber se se trata realmente de uma delegação, se e um grupo de deputados que vai ter as suas viagens organizadas pela Assembleia da República ou se, pelo contrário, as viagens são organizadas a título individual.
Desde já adiantaríamos a nossa posição: consideramos que a nenhum título esta deslocação de Srs. Deputados à África do Sul poderá ser considerada uma delegação ou, sequer, uma representação da Assembleia da República; será, quanto muito, uma deslocação de deputados que poderão ir sempre que quiserem, pela sua própria responsabilidade e a título individual.
Sr. Presidente, pensamos, pois, que esta questão deve ser esclarecida perante o Plenário da Assembleia da República. A comunicação social tem feito eco desta deslocação e por isso gostaríamos de saber, com rigor, como foi organizada, uma vez que o meu grupo parlamentar não teve qualquer conhecimento deste tipo de iniciativa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, também peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): -Sr. Presidente, não quero interpelar a Mesa sobre a questão anteriormente referida e sobre ela reservar-me-ei o direito de usar da palavra se, porventura, assim o entender. É para colocar uma outra questão que tem a ver com aquele mínimo de dignidade que deve presidir aos nossos trabalhos, porque creio que ultrapassa o que é habitual e o que é aceitável que, enquanto decorre uma sessão do Plenário da Assembleia da República, haja trabalhadores pendurados nas estátuas situadas atrás do Sr. Presidente a fazer arranjos de verdes e de flores. Nesse sentido, solicitava-lhe que pusesse termo a esta situação, que e, no mínimo, caricata.
Vozes do PSD, do PS, do PCP e do PRD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, a Mesa já deu instruções para os trabalhadores se ausentarem do Plenário.
Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lemos, não estou habilitado a responder à sua interpelação. Assim que o Sr. Presidente da Assembleia ocupe aqui o seu lugar,
transmitir-lhe-ei a interpelação feita e penso que ele estará em condições de lhe responder, eu não estou.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a ver com questão suscitada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos no sentido de lhe dizer que nós, Partido Socialista, não temos também qualquer espécie de conhecimento quanto à constituição de uma delegação, assunto que não foi discutido em reuniões de líderes e não foi deliberado pela Assembleia. Temos conhecimento de que alguns camaradas nossos, deputados desta Assembleia, se deslocarão à África do Sul, mas fazem-no a título individual e na sequência de um convite individual, pelo que creio, de facto, que é abusiva a informação que vem no boletim informativo da Assembleia da República e que é relativa à deslocação de uma delegação da Assembleia da República à África do Sul. Isso não corresponde minimamente à realidade. Julgo que estou autorizado a avançar esta afirmação, na medida em que esta matéria não foi discutida e nem sequer foi abordada em qualquer instância desta Assembleia com a participação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e, pelos vistos também, com a participação do Grupo Parlamentar do Partido Comunista.
Nestes termos, solicitava ao Sr. Presidente que providenciasse no sentido de fazer a necessária rectificação à informação que erradamente foi distribuída.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - O que é preciso é saber quem paga!
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Marques Júnior (PRD): - É também para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, é um pouco no mesmo sentido. Depois de o Sr. Presidente dar os esclarecimentos adequados provavelmente não restará ao PRD nenhum outro tipo de observação, contudo, gostaríamos também de registar a nossa grande surpresa por ter visto incluído no referido boletim a informação que nos é dada, pois já sabíamos, através dos órgãos de comunicação social - e aí também com alguma surpresa-, que efectivamente alguns Srs. Deputados se deslocavam a Mossel Bay. Para alem disso, sabendo nós, através da comunicação social, que ao nível do Governo parece haver representação oficial, esse facto aumentou as nossas preocupações e as nossas dúvidas.
Esta seria uma questão que, apesar de tudo, iríamos pôr à Assembleia da República, pois ficámos perfeitamente surpresos pelo facto de estar no boletim informativo a expressão «em representação da Assembleia da República» - creio que e assim que está referenciado. Portanto, manifestamos a nossa surpresa e aguardamos com alguma ansiedade a resposta do Sr. Presidente da Assembleia da República.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra, também para uma interpelação à Mesa.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, é sobre a mesma questão. Não está aqui o presidente do meu grupo parlamentar, contudo não quero deixar de adiantar que o conhecimento de que disponho relativamente a este facto é o que os meus colegas de bancada que fazem parte, desta delegação, o fazem por convite, a título individual, como parlamentares portugueses. Este é o conhecimento de que disponho em relação a esta situação e penso que o mesmo se passará com os colegas dos outros partidos.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, também peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - V. Ex.ª está colocado perante uma situação que lambem desconhece. A comunicação social declara que vai uma delegação da Assembleia da República à África do Sul. Não é verdade! Mas, uma vez que vão a convite pessoal, podem ir - aliás, eu também vou a muito lado. Portanto, o que gostaria de saber, na informação que o Sr. Presidente da Assembleia da República forçosamente terá de dar a esta Câmara, é se a Assembleia paga alguma das deslocações dos Srs. Deputados.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra novamente para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, vamos continuar a aguardar a informação de V. Ex.- Desde já, creio que deveríamos clarificar alguns aspectos: primeira questão, não há delegação da Assembleia da República; segunda questão, não há representação da Assembleia da República; terceira questão, a Assembleia tem de saber por que razão foi dada esta informação, que medidas foram tomadas relativamente a esta deslocação e como e que ela se vai organizar. Sendo uma deslocação de deputados - que o poderão sempre fazer -, não pode ser considerado algo de oficial e, como tal, do nosso ponto de vista, isso tem de ser tornado público para que não restem dúvidas sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já dei a informação que tinha para dar. Creio que, de facto, talvez esteja errada a informação que vem no boletim que foi distribuído. O Sr. Presidente da Assembleia, quando reocupar o seu lugar, dará os esclarecimentos que lhe foram pedidos.
ANTES DA ORDEM DO DIA
Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente, dos requerimentos, dos inquéritos parlamentares, dos diplomas e das ratificações que deram entrada na Mesa.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Da União dos Sindicatos do Distrito da Guarda, Castelo Branco e Região Autónoma da Madeira, Sindicatos dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários de Aveiro e Faro e da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses/Intersindical Nacional manifestando o seu protesto pela ocorrência verificada na cerimónia da assinatura do Acordo de Política de Rendimentos para o ano de 1988, com o representante da Intersindical;
Da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses/Intersindical Nacional, com sede em Lisboa, remetendo em; anexo um exemplar da resolução aprovada na Conferência Nacional sobre os Direitos dos Trabalhadores realizada em Braga nos dias 22 e 23 do passado mês de Janeiro.
Telegramas
Do Sindicato de Hotelaria do Sul e outros sindicatos protestando contra a aprovação do projecto de lei n.º 25/V, pelas limitações à liberdade de informação que dizem estar contidas no mesmo.
«Telexes»
Do engenheiro técnico António Fernando de Jesus Seixas solicitando providências para que o ISES não seja integrado no ensino politécnico, pois, a acontecer isso, será um erro com graves consequências para o País;
Da União dos Sindicatos do Porto/CGTP/IN manifestando a sua solidariedade para com as posições assumidas pela Câmara Municipal daquela cidade no diferendo que opõe aquele executivo ao conselho de gerência da EDP.
O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa, na ultima reunião plenária, os seguintes requerimentos: aos Ministérios do Planeamento e da Administração do Território e da Educação (quatro), formulados pelos Srs. Deputados Afonso Abrantes e António Braga; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Rui Vieira, lida Figueiredo, António Mola e Linhares de Castro; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Miranda Calha e Vidigal Amaro; a diversos ministérios (quatro), formulados pelo Sr. Deputado Herculano Pombo; ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes e outros; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Espada; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Adão Silva; à Câmara Municipal de Beja e à Junta de Freguesia de Aldeia Nova de São Bento, formulados pela Sr.ª Deputada Helena Torres Marques.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Roque, na sessão de 12 de Novembro; Apolónia Teixeira, na sessão de 17 de Novembro; Luísa Amorim e outros, na sessão de 17 de Novembro; Herculano Pombo, na sessão de 29 de Dezembro.
Deram ainda entrada na Mesa os seguintes diplomas: o inquérito parlamentar n.º 2/V, do CDS (abertura de inquérito parlamentar à conduta das entidades intervenientes na oferta pública de venda de acções, mandada investigar pelo Sr. Ministro das Finanças), que foi admitido e baixou à respectiva Comissão; projecto de lei n.º 166/V (criação da freguesia do Vale da Pedra, concelho do Cartaxo), apresentado pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos e outro, do PS, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 167/V (consagra o direito a «ano sabático» para os educadores de infância e professores do ensino básico e secundário), apresentado pelo Sr. Deputado Linhares de
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Castro e outros, do PCP, que foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; projecto de lei n.º 168/V (criação da freguesia de Santo António de Cavaleiros, concelho de Loures), apresentado pelos Srs. Deputados João de Matos e outros, do PSD, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 169/V (Lei Orgânica da Assembleia da República), apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Sampaio e outros, subscrito pelos Srs. Deputados do PS, do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e da ID, que foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; projecto de lei n.º 170/V (criação da freguesia de Canas do Soeiro, concelho de Celorico da Beira), apresentado pelos Srs. Deputados José Assunção Marques e outros, do PSD, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; projecto de lei n.º 17l/V (criação da freguesia de Vila Franca da Beira), apresentado pelo Sr. Deputado António Paulo Pereira Coelho e outros, do PSD, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; ratificação n.8 9/V (Decreto-Lei n.º 4/88, de 14 de Janeiro, que cria em regime especial de comparticipações para a recuperação de imóveis sujeitos a arrendamentos), apresentada pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo e outros, do PCP, e ratificação n.º 10/V (Decreto-Lei n.º 19/88, de 21 de Janeiro, que «aprova a Lei de Gestão Hospitalar»), apresentada pelo PCP.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Vítor Crespo.
O Sr. Presidente (Vítor Crespo): - Srs. Deputados, tive conhecimento de que foram feitas interpelações à Mesa no sentido de saber se teria havido uma delegação da Assembleia da República em visita à República da África do Sul. Não há, embora admitida que o boletim informativo possa induzir nesse sentido e, mais, que as notícias que tem vindo a público possam igualmente induzir nesse sentido. Estava preocupado com o assunto a tal ponto que apontei na agenda da próxima conferência de líderes, que lerá lugar amanhã, um número que diz «autoproclamadas missões da Assembleia da República».
Tive ocasião de chamar a atenção a três deputados que se deslocavam à África do Sul de que eles não correspondiam a uma delegação da Assembleia da República, muito menos a uma delegação presidida por x, y ou z, uma vez que se tratava de um conjunto de deputados que tinham sido convidados por uma determinada entidade da África do Sul. A notícia apareceu no boletim informativo da Assembleia da República, em certa medida não é da minha origem e devo até dizer que não tinha conhecimento do último parágrafo, pois só hoje o li. O boletim não é um órgão informativo oficial, digamos que é uma informação que contém alguns erros, mas que está a procurar ser feito com algum esforço.
Julgo que foi ainda colocada a questão se a Assembleia tinha alguns encargos com essa deslocação. Sim e não. Como tem sido hábito quando há deputados que se deslocam por convite em certas missões, tem sido feita, à Presidência da Assembleia, a sugestão para a justificação das suas faltas e o pagamento das ajudas de custo correspondentes a esses dias. Assim autorizei, uma vez que foi solicitado por todos os elementos que estavam envolvidos nesta deslocação -tenhamos o cuidado com as palavras-, a exemplo do que se tinha feito em anteriores situações análogas. Não a todos, porque não os encontrei, mas a três deputados, como disse, tive o cuidado de chamar a atenção da situação em que se deslocavam à África do Sul.
Em todo o caso, lamento o que se passa, lamento as notícias que vieram a público e tive o cuidado de transmitir a alguns dos Srs. Deputados a minha preocupação e inscrever esta questão - que não é nova - na conferência de líderes, para que se não torne a repetir aquilo que, na agenda da conferência de líderes, chamei «autoproclamadas missões da Assembleia da República.»
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, em consequência das suas palavras, tenho de justificar, perante a Câmara, em que qualidade o Sr. Deputado José Luís Nogueira de Brito, e meu querido colega, se desloca à África do Sul.
Devo dizer que nunca tivemos dúvidas de que ele não fazia parte de qualquer delegação parlamentar. Ele foi convidado a título pessoal, como uma personalidade política relevante de Portugal e do CDS, para assistir a um acontecimento histórico que honra o País e honra todo o Mundo. Não irei aqui falar sobre quem paga as despesas e quem não paga. Pela nossa parte, temos perfeita consciência de que o Sr. Deputado Nogueira de Brito não faz parte de qualquer delegação parlamentar, mas é um parlamentar do CDS que vai assistir a um acontecimento que honra e dignifica a Assembleia da República e dignifica o País pelo feito que se comemora.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados Lopes Cardoso, Jorge Lemos e João Corregedor da Fonseca, queria dizer que a notícia que vem no boletim - tive agora a informação- tem origem num serviço da Assembleia (o Núcleo de Apoio às Missões Parlamentares Internacionais) e resultou de o facto de, em tempos, face a algumas observações que me tinham feito, ter dado uma ordem por escrito para que o Núcleo fizesse referências às missões internacionais e aos objectivos que as determinam. Portanto, o boletim passou, efectivamente, a incluir, como tiveram ocasião de verificar, alguma explicitação das missões à União da Europa Ocidental (UEO), ao Conselho da Europa, etc.
Como é que o Núcleo de Apoio às Missões Internacionais teve conhecimento e produziu esta notícia, ainda não tenho essa informação, aliás, ela está transcrita, como tive ocasião de ver, e admito que tenha sido pelo facto de eu ter justificado as faltas dos Srs. Deputados e pelas razões que acabei de anunciar há pouco.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe desculpa por voltar a esta questão, mas não posso deixar passar em claro, sob pena de se gerarem aqui equívocos, algumas afirmações feitas pelo Sr. Presidente.
Quando o Sr. Presidente acentuou a existência das autoproclamadas missões da Assembleia e por várias vezes insistiu que linha chamado a atenção dos Srs. Deputados, correu o risco de deixar pairar a sensação de que na origem desta notícia errada estaria o comportamento dos Srs. Deputados que vão à África do Sul. Ora, penso que não pode ser deixada qualquer espécie de dúvida sobre essa matéria, pois, pela parte que toca aos meus colegas de bancada, não houve nenhuma autoproclamação de missão da Assembleia e estou perfeitamente certo que o mesmo aconteceu com os deputados do PSD e com o deputado do CDS, que não se autoproclamaram de missões de coisa nenhuma e menos ainda desta Assembleia.
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Isto tem de ficar claro, porque o Sr. Presidente referiu as missões autoproclamadas e referiu várias vezes a sua chamada de atenção para os deputados, quando penso que o que está aqui em causa e aquilo a que cabe chamar a atenção, se a alguém deve ser chamado a atenção, Sr. Presidente, 6 aos serviços que publicaram esta notícia e não aos Srs. Deputados, que dela são objecto e que, estou perfeitamente seguro, não tom nenhuma responsabilidade no facto de ela ter aparecido.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me fiz entender, pois por vezes não usamos exactamente as mesmas palavras, talvez por razões culturais diferentes.
Não quis de maneira nenhuma insinuar que a razão resultava do comportamento dos Srs. Deputados e, quando chamei a atenção dos mesmos, fi-lo pelo simples facto de que li na comunicação social que se tratava de uma delegação parlamentar e porque o não era, independentemente do que pudesse ser ou não. Porque não estou a julgar sobre a matéria, é que tive ocasião de chamar a atenção dos Srs. Deputados de que não era, efectivamente, uma delegação parlamentar, pois não tinha seguido os trâmites normais.
Autoproclamada é uma forma, porventura, incorrecta da minha maneira de dizer porque muitas vezes vou buscar as palavras por outras vias que não são as vias tradicionais e que quer dizer uma missão ou o título da missão que nasceu por geração espontânea. E, neste caso, a geração espontânea dever ter nascido, estou convencido, em resultado de se saber que estes Srs. Deputados iam deslocar-se à África do Sul, a convite, como aqui se diz, de uma determinada entidade, ao que, talvez por facilidade de linguagem, se chamou uma delegação da Assembleia da República, quando, na verdade, as delegações da Assembleia da República tom características de certa natureza.
Apenas quis apresentar alguns factos, admito que a maneira como o fiz pudesse ter levado a algumas interpretações que, de maneira nenhuma, pretendia fazer, porque, na realidade, chamei a atenção dos Srs. Deputados simplesmente no sentido de não incorrerem em erro.
Como já disse, eu próprio autorizei a sua dispensa de serviço e até mandei determinar as ajudas de custo, visto que uma coisa implicava a outra, o que, aliás, já tem acontecido algumas vezes. Apenas queria dizer que linha consciência que este conjunto de Srs. Deputados não correspondiam a uma delegação da Assembleia da República e dei alguns passos para que a confusão de nomenclaturas não se instalasse e nada mais do que isso quero dizer.
Também não quero fazer nenhuma censura aos Srs. Deputados e nem sequer pretendo dizer que a notícia provém deles, pois pode provir de muitos outros lados e até do simples conhecimento de que há deputados que vão à África do Sul, facto que poderia, naturalmente, ter induzido a notícia de que era uma missão da Assembleia da República.
Quero, portanto, que fique claro que não foi essa a minha primeira explicação em resposta ao que disse o Sr. Deputado Lopes Cardoso, pois o mesmo se poderá verificar na própria troca de impressões que tive ocasião de ter com os Srs. Deputados em causa.
O Sr. João Corregedor da Fonseca GD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Presidente, não está aqui em causa nem a deslocação nem a dignidade dos Srs. Deputados, que fazem muito bem em aceitar o convite, se entendem que o devem fazer.
A questão que se coloca é a seguinte: sabemos que há Srs. Deputados do Conselho da Europa, da União Europeia Ocidental, da NATO, etc., que, quando se deslocam no estrangeiro, vão para o aeroporto, têm o seu bilhete e metem-se no avião. O que gostava de saber, sem outros trâmites, é se, porventura, tem conhecimento de que algum serviço da Assembleia da República tenha procedido a qualquer contacto com o Aeroporto de Lisboa no sentido de ser concedida dignidade de tratamento VIP aos Srs. Deputados que agora se deslocam à África do Sul, porque, realmente, o tratamento VIP é normalmente concedido a delegações da Assembleia da República, e não a deputados que vão a convite pessoal aqui ou acolá. Portanto, Sr. Presidente, gostava de saber se isso se confirma.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso dizer-lhe, em primeiro lugar, que não foram concedidos bilhetes pela Assembleia da República.
Em segundo lugar, sobre se foi ou não pedido tratamento VIP, não tenho o menor conhecimento e presumo que, dado o contexto, nem sequer o devia ter.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, pensamos que a questão já está bastante clarificada, em primeiro lugar, creio que nos devemos regozijar com a informação do Sr. Presidente, porque tomou claro que ninguém na Assembleia da República considera a deslocação dos Srs. Deputados a Mossel Bay a qualquer título oficial ou ligada à actividade parlamentar da Assembleia da República, enquanto tal.
Em segundo lugar, também ficou claro - e gostava de o dizer para a Acta - que. do ponto de vista do Partido Comunista, cada deputado irá onde entender, assume as responsabilidades que lhe cabem sobre isso, mas não deve recair ónus sobre a Assembleia por qualquer espécie de decisões pessoais quanto a deslocações.
Quero igualmente dizer, perante a Câmara, que pensamos que este nosso debate foi importante, não só para nós, mas também para a comunicação social, porque evitou que certas acções permitam criar precedentes sobre pequenos abcessos que se poderiam ter instaurado no modo de funcionamento da vida parlamentar.
E, em último lugar, quero ainda dizer-lhe que na próxima conferência de líderes nós próprios teremos mais alguns pontos de vista a trocar sobre esta matéria, mas consideramos que o nosso objectivo foi alcançado, pois ficou clarificado este incidente e o Sr. Presidente actuará relativamente a algumas das outras questões que aqui foram colocadas como entender.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É apenas para dizer que o Sr. Presidente fez bem em levantar este assunto, já está suficientemente esclarecido e os aspectos processuais, como é costume, deverão ser tratados na conferência de líderes, pelo que deve dar-se por encerrado este debate.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está connosco esta tarde um grupo de alunos e professores da Escola Secundária de Gama Barros, do Cacém.
Aplausos gerais.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da direcção do meu partido e do seu presidente, Sr. Professor Freitas do Amaral, eleito no último Congresso do CDS, gostaria -como é tradição nos países democráticos que muito gostosamente cumpro - de começar por saudar esta Assembleia da República e na pessoa de V. Ex.ª, Sr. Presidente, exprimir o nosso profundo respeito por esta Assembleia, símbolo da liberdade da República e da genuinidade democrática do regime.
O CDS tudo fará para prestigiar este órgão de soberania e estará sempre ao lado daqueles que lutam por uma liberdade de expressão e por uma legitimidade que não admite a existência de partidos de 1.º e de 2.º nem de deputados de 1.º e de 2.º categoria.
Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O CDS gostaria ainda, muito sinceramente, de saudar, sem excepção, todos os partidos representados nesta Assembleia e todos os Srs. Deputados, garantindo-lhes toda a cooperação no sentido de prestarmos ao povo português, que a todos elegeu, um serviço eficaz, que dignifique as instituições e que seja um factor de progresso para o povo português.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este congresso do meu partido teve um duplo significado.
Em primeiro lugar, teve um inequívoco significado político e tenho para mim que foi, sem dúvida, o 2.º congresso mais importante do CDS.
No 1.º congresso, realizado também no distrito do Porto, mais precisamente na cidade do Porto, o CDS teve a coragem de lutar contra aqueles que o consideravam o adversário do País, quando o CDS só era adversário do socialismo, e teve a coragem de lutar pela liberdade, pelo pluralismo, pelo direito à diferença.
Deste 2.º congresso, aliás, realizado sobre a inspiração do saudoso Adelino Amaro da Costa e sobre a inspiração do seu legado político, o CDS parte com idêntica disposição.
Felizmente, os tempos são outros, a democracia está hoje enraizada nas instituições e nas pessoas, mas, se houvesse novamente tentações de confundir os adversários políticos com inimigos do Governo e do País, se houvesse as tentações de uniformizar todos pela mesma bitola e de nos obrigar a falar a todos a mesma linguagem, estaríamos, ontem, como hoje, ao lado daqueles que prezam a liberdade e a democracia, a lutar pela liberdade e pelo nosso legítimo direito à diferença.
Em segundo lugar, este Congresso do CDS teve também um significado interno. Sem dúvida que foi o congresso do reencontro, do reencontro do CDS com a sua história, com a sua estrutura, com as suas bases e com o seu eleitorado. Para isso contribuiu decisivamente a dignidade do presidente da comissão política cessante, Sr. Professor Adriano Moreira, a quem daqui presto um preito de sentida homenagem e de profundo respeito. O Sr. Professor Adriano Moreira entra, por direito próprio, na galeria dos mais ilustres CDS e daqueles que maiores contributos prestaram ao partido.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, o significado do Congresso do CDS é também o significado da sua revitalizado e do primeiro passo para o seu crescimento.
É evidente que os nossos adversários não gostaram que o nosso congresso tivesse corrido desta forma e é por isso que começaria por dizer, nesta Assembleia, que foi com profunda estranheza, para não dizer com senado de pesar, que assistimos à transmissão que a RTP fez do nosso congresso.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Essa transmissão não pode deixar indiferente nenhum dos deputados que se sentam nesta Assembleia, mesmo os deputados que se sentam na bancada do Governo. É que nessa transmissão aparece pela primeira vez - e repito, pela primeira vez - como comentador de um congresso precisamente o secretário-geral do partido do Governo ...
Uma voz do PS: - É um escândalo!
O Orador: - É uma transmissão que não dignifica a independência dos órgãos da comunicação social, que não dignifica quem a promoveu, que não dignifica quem a transmitiu ...
Aplausos do CDS, do PS, do PCP. do PRD e da ID.
... que não dignifica, numa palavra, o respeito pela identidade de cada um.
Vemos nos países democráticos o cuidado com que a oposição é tratada; é pena que, no Portugal de 1988 e no Portugal de catorze anos depois de Abril, nós ainda assistamos a uma distorção e a uma falta de objectividade tão grave como aquela a que tivemos ocasião de assistir.
No entanto, o que foi dito nessa transmissão também não pode ficar sem resposta. É que pela primeira vez ouvimos uma pessoa responsável...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dita responsável!
O Orador: -... do partido que aqui apoia o Governo confundir a oposição democrática que o CDS, com legítimo orgulho, representa nesta Assembleia com «adversário» do País. Foi dito expressamente depois deste congresso que o CDS não é apenas adversário do Governo, mas é também adversário do País.
Ora tal afirmação não pode ser passada em claro, porque é grave que se façam afirmações desta natureza, porque nós, como há pouco dizia, já as ouvimos em 1975 e não era possível, pensávamos nós, voltar a ouvi-las cerca de catorze anos depois.
Não, Srs. Deputados do PSD, nós não somos adversários do País, nós somos vossos adversários, nós somos adversários do Governo, nós somos oposição ao Governo e é, exactamente, no exercício legítimo de oposição ao Governo que nós não somos só adversários do País, somos aliados do País, porque a nossa forma de servir o País é ser oposição a este Governo, a nossa forma de servir as instituições é sermos diferentes de vocês, a nossa forma de servir as instituições é termos liberdade de, com frontalidade, dizermos o que pensamos e assumirmos as posições que, em consciência, entendemos dever assumir, tendo como último juiz o eleitorado e o País.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Não têm, pois, VV. Ex.ªs o direito de nos qualificarem como adversários do País e, quando o fazem, estão a ter uma visão errada, grave e preocupantemente distorcida do funcionamento dos mecanismos democráticos. É mais um afloramento, agora mais grave, como aquele que já tivemos aqui com a Lei Orgânica do Parlamento, que aqui e ali aparece, como se VV. Ex.ªs confundissem a vossa maioria, obviamente legítima e respeitável, com o uniformismo, com o mesmo tom, como se VV. Ex.ªs não entendessem que as maiorias de hoje são as minorias de amanhã.
Uma voz do PS: - Muito bem!
O Orador: - Também foi aqui claramente feita outra distorção: VV. Ex.ªs disseram que o inquérito parlamentar que há pouco tempo o meu colega de bancada, o Sr. Deputado Nogueira de Brito, solicitou era - e pasme-se! - um ataque do CDS à iniciativa privada; pela primeira vez um partido se tinha atrevido -e nem o Partido Comunista (e cito de memória) dos anos quentes de 1975 alguma vez o fez - a trazer para esta Assembleia os assuntos íntimos das empresas portuguesas. É espantosa uma afirmação destas e é espantosa pela falta de seriedade que revela - seriedade política, obviamente:
Mas não foi o CDS que levantou o inquérito às operações da SONAE, foi o vosso governo, foi o vosso governo que levantou esse inquérito depois de pressionado, obviamente, por uma opinião pública e depois de certamente aconselhado a assumir a responsabilidade pelo Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
O Orador: - O que nós dissemos e repetimos, o que continuaremos a dizer, é que o Sr. Ministro das Finanças, pelas declarações que proferiu, não mostrou isenção para ser o árbitro e o juiz desse inquérito, porque não se pode ser juiz quando se antecipa a sentença, porque não se pode ser juiz quando antes de o inquérito estar terminado se diz que tudo está bem, porque não se pode ser juiz quando se demonstra tanta parcialidade.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que nós dissemos e repetimos é que não consideramos que o Governo e o Ministério das Finanças tenham credibilidade e independência para fazer esse inquérito. Nunca dissemos nem referimos que as instituições dependentes do Ministério das Finanças não tivessem toda a credibilidade e é óbvio que, se esta Assembleia vier a fazer esse inquérito, e isso está nas vossas mãos, Srs. Deputados do PSD, e nas vossas consciências,...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Se tivessem coragem!
O Orador: -... dizia eu, se viermos a fazer esse inquérito, a quem iremos recorrer para nos dar os dados necessários para que esse inquérito possa ser levado a efeito? Obviamente que será ao Banco de Portugal, obviamente que será à Inspecção-Geral de Finanças. Daí resulta, manifestamente, que esse tipo de afirmação não é correcta e que essa comparação é, em tudo, ilegítima.
Para terminar quero dizer-vos que não são esse tipo de argumentos nem esse tipo de intervenções que vão adoçar a nossa oposição, ou que vão fazer com que o CDS não diga o que tem vindo a dizer, pelo contrário, diz claramente e repete até porque não é o CDS que o diz, é o povo português que o diz. Isso é que faz com que o Governo diga o que não deve dizer, porque as sondagens recentes dizem-no claramente. Não é o Prof. Freitas do Amaral, ao contrário do que dizem, que afirma que este governo é pior do que o anterior, são as sondagens que dizem que este governo perdeu cerca de 40.% de popularidade nos últimos tempos. É portanto, o povo português que afirma -dizemos nós e continuamos dizer- que este governo tem governado pior do que o anterior e tem-no feito na política financeira e económica. Basta apenas perguntar, para já não dizer tantas coisas que já aqui foram expressas, como é que este governo não baixa as taxas de juro, o que é um espanto para todos os técnicos, para todas as pessoas que se debruçam sobre essa matéria. É um governo pior na política de justiça, é um governo pior na política da saúde, que confunde política de saúde com política de imobiliário. Em suma, é um governo pior em quase todos os domínios.
Protestos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Congresso do CDS foi um primeiro passo -e um passo muito importante - na revitalização da democracia-cristã portuguesa, e é isso que dói! Temos a certeza de que vamos crescer, temos a certeza de que, se já éramos um partido indispensável, no futuro seremos ainda mais. Somos já um partido de charneira e um partido fundamental e seremos o maior partido na última década deste século. É isso p que os senhores não querem, mas é isso que vão ter para bem de Portugal e dos Portugueses.
Aplausos do CDS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais, quero recordar à Câmara que se estão a processar eleições e que a hora do fecho das umas é, tal como estava previsto, às 18 horas. Portanto, aqueles Srs. Deputados que ainda não votaram devem fazê-lo até às 18 horas.
Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Basílio Horta, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Deputado Basílio Horta, sob a forma de pedido de esclarecimento gostaria de, em nome da minha bancada, me congratular com a intervenção que produziu, na medida em que assinala o Congresso do CDS da forma que V. Ex.ª achou por bem fazê-lo. Congratulamo-nos com a vivacidade de todos os partidos existentes em Portugal e congratulamo-nos com a vivacidade de que deu provas o CDS neste seu Congresso. Desculpar-me-á o Sr. Deputado que não vá mais longe nesta minha apreciação, porque ou seria oportunismo ou ingerência, e nem uma coisa nem outra é de bom tom fazer neste momento. Em todo o caso, assinala-se este ponto como relevante para o progresso democrático em Portugal e certamente para o CDS.
Portugal precisa de todos os partidos e de todas as correntes de pensamento e, em todos os momentos, precisamos de assegurar o pluralismo. V. Ex.ª referiu, no entanto, algumas notas que poderão ser extremamente graves para o futuro da democracia em Portugal. Esta é, pois, a questão.
Não podemos estar indiferentes sobre o que se passou relativamente à cobertura do Congresso do CDS, não porque se tenha dito que o CDS poderia ou não ser o
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adversário do partido A ou do partido B, pois isso faz parle da contravérsia democrática, mas que aquilo que certamente representa - dada a importância da pessoa que fez esse comentário - de reducionismo democrático que me atreveria a considerar extremamente grave para o futuro da democracia em Portugal. É que esse reducionismo vai a par com a obsessão de a maioria PSD se considerar como a única portadora do interesse nacional ou, pior ainda, como a única capaz de o definir. Ora, este reducionismo, esta forma de comportamento é atentatória da nossa dignidade de partidos políticos, é atentatória do nosso regime e, pior do que tudo isso, é extremamente grave para o futuro do processo democrático, na medida em que é ou pode ser impeditiva da alternância democrática, do pluralismo, enfim, daquilo que são as raízes sérias do nosso regime democrático em Portugal.
Vou terminar como comecei, saudando o CDS na pessoa do Sr. Deputado Basílio Horta. Quero, pois, dizer que nos associamos, com toda a solenidade, às preocupações que V. Ex.ª acabou por enunciar no que respeita ao processo democrático e ao reducionismo de que o PSD nos tem dado numerosos exemplos, que inteira e frontalmente rejeitamos.
Aplausos do PS, do PRD, do CDS e da ID.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Basílio Horta, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?
O Sr. Basílio Horta (CDS):-Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Sr. Deputado Basílio Horta, agradeço e retribuo as saudações democráticas que dirigiu. Sr. Deputado, está provado por a mais b que o PSD e o Governo não aceitam muito bem as oposições, quer à direita, quer à esquerda. Isto ficou perfeitamente provado no vosso pedido de inquérito, ficou provado no vosso Congresso, ficou provado nos projectos de lei de alteração do Regimento e da Lei Orgânica, onde se pretende alterar as regras do jogo democrático em pleno funcionamento da legislatura.
Ficámos perfeitamente espantados quando verificámos que a RTP descobriu um novo comentador político. Não foi buscar um daqueles «observadores políticos», não foi buscar um grupo de jornalistas nem fez uma mesa-redonda com representantes de partidos e de outras forças políticas, mas sim o Secretário-Geral do PSD, nosso colega deputado. Esta atitude, Sr. Deputado Basílio Horta, é mais uma demonstração do rigor, da independência e do pluralismo propalado e defendido na semana passada, quer por deputados do PSD, quer pelos membros do Governo, quando se discutiu aqui a venda dos jornais de qualquer maneira.
Sr. Deputado, isto é grave para a democracia! Estamos a caminhar por muito mau caminho, o que não deixa de nos causar grandes preocupações!
Porém, perante o que se passou, aguardava que V. Ex.ª nos dissesse o que é que o CDS vai fazer. O CDS vai exigir à RTP o direito de resposta? Vai o CDS socorrer--se do Conselho de Comunicação Social e exigir que aprecie esta falha gravíssima da RTP contra a independência, o rigor e o pluralismo da comunicação social?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.
O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado Basílio Horta, em nome do meu grupo parlamentar, quero felicitar V. Ex.ª e tornar esta felicitação extensiva a todos os dirigentes do seu partido que neste Congresso foram eleitos para assumir funções directivas. Desejamos-vos, pois, felicidades e estamos certos de que esta direcção do CDS - aliás, como as do passado - darão um contributo inestimável para o enriquecimento da democracia portuguesa.
Sr. Deputado Basílio Horta, gostaria que nas declarações dos dirigentes do meu partido V. Ex.ª não visse uma preocupação ou uma manifestação de menos apreço pela forma como o Congresso do CDS foi conduzido. Não temos nada com isso, pois não interferimos nisso. V. Ex.ª poderá dizer isso em relação a outras pessoas do seu partido - permita-me este tipo de observação -, mas em relação a nós não tem razão para afirmar tal.
Aproveito também -e quero fazê-lo em nome pessoal - para testemunhar o meu apreço e a minha grande admiração pelo Prof. Adriano Moreira, vosso dirigente principal até ao momento, que, quanto a mim, deu um exemplo relevantíssimo de grande dignidade política e pessoal.
Sr. Deputado Basílio Horta, não tendo V. Ex.ª feito aqui comentários alongados sobre aquilo que vai ser a actuação futura do CDS, permitir-me-ia sintetizar a intervenção que fez em duas breves conclusões: em primeiro lugar, o CDS é um partido que, mais do que nunca, se assume aqui em busca do tempo e dos votos perdidos, o que é uma aspiração legítima para quem, tendo-se distraído, deixou que tudo o vento levasse.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado veio aqui dizer que, em vossa opinião, o Governo é pior. Essa é uma opinião que respeitamos e não contestamos. Eu também poderia dizer, Sr. Deputado Basílio Horta: cuidado que o CDS que aí vem também é um CDS pior. Quando V. Ex.ª diz que o Governo está nervoso, eu também poderia dizer: cuidado que o CDS que aí vem também é um CDS nervoso. E é um CDS nervoso porquê? Porque numa das suas principais decisões começa já por mostrar uma contradição flagrante. Não sei se é a primeira moção de censura que o novo presidente da comissão política apresenta à anterior! Creio que sim, mas V. Ex.ª poderá esclarecer melhor. É que ontem o Prof. Freitas do Amaral disse para a rádio que o CDS não havia pedido um inquérito à SONAE ou às OPVs da SONAE, mas «sim ao Ministro das Finanças pela sua actuação altamente controversa e parcial, não isenta nesta matéria». E aquilo que o Sr. Deputado Nogueira de Brito especificou, respondendo ao Sr. Deputado João Cravinho, foi o seguinte: «[...] estamos dispostos a pôr à disposição de todos os deputados e de todos os grupos parlamentares. Foi ponderado com muito cuidado, atendendo ao efectivo melindre que as intervenções nesta matéria -do inquérito- podem ter. Por isso, circunscrevemos ao âmbito rigoroso da inspecção que foi determinada pelo Ministério das Finanças» - ou seja, as sete OPVs da SONAE- «pelas razões que expus na minha intervenção». Isto foi o que o Sr. Deputado Nogueira de Brito disse, mas o que agora vem dizer o Sr. Presidente da Comissão Política do CDS é coisa completamente diferente. Isto é ou não uma contradição absoluta nas posições? Isso é ou não uma desautorização da posição assumida pelo seu partido, aliás, como foi aqui expresso aquando da leitura do expediente? Isso é ou não uma demonstração de incoerência da vossa parte?
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Deputado Basílio Horta, em nome da minha bancada gostaria de saudar o CDS e desejar-lhe as maiores felicidades. O congresso de um partido é sempre elemento muito importante na vida de um partido e, independentemente das divergências que entre nós existem, esperamos que o CDS continue como até aqui, a dar um contributo muito válido à vida parlamentar e à democracia em Portugal.
Gostaria também de dizer ao Sr. Deputado Basílio Horta, se é que de qualquer modo isso o pode satisfazer ou deixar menos triste relativamente à cobertura do Congresso do CDS, que, quando todos esperariam que a televisão transmitisse uma reportagem desenvolvida sobre o CDS, ouviu-se o secretário-geral do PSD, o que deixou muitas pessoas admiradas. Estou convencido de que de norte a sul do País as pessoas que se interessam por estas coisas ficaram perfeitamente surpreendidas, porque, quando pensariam ver desenvolvida uma reportagem sobre o CDS, viram o secretário-geral do PSD, quando nada o justifica ou quando talvez tudo o justificasse.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Talvez tudo o justificasse!
O Orador: - Neste momento, não quero tecer considerações sobre aquilo que o secretário-geral do PSD disse - e algumas afirmações já foram aqui referenciadas e sublinhadas -, mas a verdade é que, levadas à letra ou analisadas em mais profundidade, poderiam perspectivar aspectos de alguma preocupação para a evolução do País e para a vida democrática.
Como acredito muito nas pessoas, acredito também que numa entrevista deste tipo são ditas certas coisas que não se pretende dizer. É esse, digamos, o benefício da dúvida que poderia dar ao secretário-geral do PSD.
Para terminar, gostaria de saudar o CDS e desejar-lhe as maiores felicidades dentro do espírito e de uma vivência democrática que. do nosso ponto de vista, é fundamental e salutar.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado Jorge Sampaio, agradeço as palavras que me dirigiu e muito sinceramente quero também desejar para si e para o seu partido muitas felicidades no vosso Congresso.
Ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Basílio Horta, peço desculpa de o interromper, mas o Sr. Deputado Vieira Mesquita também estava inscrito para formular um pedido de esclarecimento. Não sei se V. Ex.ª prefere responder a todos os deputados que colocaram questões e depois ouvir o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Vieira Mesquita...
O Orador: - Sr. Presidente, prefiro que o Sr. Deputado Vieira Mesquita formule desde já o pedido de esclarecimento, pois depois responderei a todos os deputados em conjunto.
O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós também pensamos que vivemos em liberdade e há lugar à diferença. Portanto, nesta Assembleia da República também tenho o direito a usar do pedido de esclarecimento que sempre pretendi usar.
Risos.
Sr. Deputado Basílio Horta, ouvimo-lo com atenção e podemos dizer que também comungamos com alguns dos princípios que enunciou, como seja o princípio da liberdade e do direito à diferença. Queremos, pois, que V. Ex.ª conheça e tome consciência que desta bancada e neste partido prezamos esses princípios de uma forma muito profunda.
Porém, também quero dizer-lhe, como se tivéssemos culpa de em 19 de Julho o povo português ter confiado em nós e nos ter dado uma maioria, que, efectivamente, somos uma maioria responsável e estaremos aqui para, com responsabilidade, defender as expectativas que o povo português em nós confiou.
Risos.
Srs. Deputados, muito obrigado pelo sorriso porque eu vivo com alegria e a vossa alegria dá-me satisfação.
Sr. Deputado Basílio Horta, o líder do seu partido - e isso consta dos jornais -, em 19 do Janeiro, em afirmações produzidas em Viseu disse: «Cavaco Silva talvez devesse ter optado por um Governo de coligação com o CDS, evitando, assim, arrastar-nos para a oposição em face das brechas da sua administração.»
Face à maneira privilegiada como nestes últimos tempos o Sr. Deputado Basílio Horta vem fazendo oposição ao Governo, gostaria de saber se a verdadeira motivação é exactamente a de não estar em coligação com o PSD no Governo. V. Ex.ª não entende como perfeitamente legítimo que esta maioria social-democrata apoie um governo de perfil e características sociais-democráticas?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta, que dispõe de sete minutos.
O Sr. Basílio Horta (CDS): - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, a direcção do meu partido já fez uma exposição/queixa - embora não goste muito da expressão «queixa» - ao Conselho de Comunicação Social e, como é óbvio, vai pedir o direito de resposta à RTP. Na realidade, já estamos à espera dessa resposta para visionar todo o programa e esperamos que ele não nos seja negado, porque se assim for alguma coisa de muito grave se estará a passar em Portugal.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (ID): - Muito bem!
O Orador: - Em relação aos Srs. Deputados Duarte Lima e Vieira Mesquita, quero começar por dizer que, pelos vistos, há também um direito à diferença dentro do vosso partido: é que as vossas intervenções não têm nada a ver com aquela que teve lugar na televisão! São intervenções perfeitamente normais e naturais e são essas as intervenções a que estamos habituados a ouvir em termos democráticos. Vejo com sincera alegria -e digo isto com toda a franqueza- que VV. Ex.ªs não se associam ao estilo nem à intervenção do vosso secretário-geral porque não rebateram uma única crítica daquelas que apontei.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!
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O Orador: - Vejo, pois, que VV. Ex.ªs não nos consideram adversários do País! VV. Ex.ªs consideram-nos uma força de oposição legítima, que, no exercício do nosso mandato, estamos a prestigiar as instituições e a servir os interesses do País. Porém, temos visões completamente distintas pois VV. Ex.ªs falam uma linguagem diferente e, consequentemente, sobre essa apenas obterão as respostas às perguntas que fizeram.
Sr. Deputado Duarte Lima, devo esclarecê-lo que não há nenhuma contradição com o que disse o presidente do nosso partido e o que dizemos no pedido de inquérito parlamentar, que foi o seguinte: «O inquérito que ora se requer visa, nos termos da lei apurar em toda a extensão a conduta das entidades intervenientes na oferta pública de venda de acções mandada investigar pelo Sr. Ministro das Finanças.» Ora, o que realmente dissemos, como tive ocasião de exprimir - e creio que o Sr. Deputado concordará comigo -, foi que, se o Sr. Deputado estiver num tribunal e o juiz lhe disser antecipadamente qual é a sentença, V. Ex.ª levanta um incidente de suspeição do juiz. Não há dúvida! Ora, mal seria que na política não se passasse a mesma coisa, por maioria de razão! Enquanto deputado -e já nem digo enquanto deputado apoiante do Governo-, V. Ex.ª não pode aceitar o julgamento de uma entidade que começa por antecipar os resultados do inquérito.
Portanto, não há aqui contradição alguma e até creio que o Sr. Deputado estará do nosso lado quanto a este aspecto.
Em relação ao resto que disse, o Sr. Deputado teve uma expressão feliz. Ao falar nos votos, no tempo perdido disse: «os votos que o vento levou». Pensava que era o Sr. Presidente que tinha levado os votos, mas, afinal, vejo que quem os levou foi o vento. Isso já tem mais lógica: quando o vento amainar - e vai amainar -, esses votos regressarão, como outros estão a regressar todos os dias, ao CDS.
Risos do PSD.
O Sr. Deputado Vieira Mesquita fez uma intervenção extremamente interessante e pergunta-nos, em síntese, se somo oposição porque não estamos no Governo, citando declarações proferidas em 19 de Janeiro pelo Prof. Freitas do Amaral.
Quero dizer ao Sr. Deputado Vieira Mesquita que, efectivamente, isso é verdade. Se estivéssemos no Governo, temos, para nós, a impressão que o Governo não faria tantas asneiras como tem feito e, nessa altura, claro, não necessitaríamos de ser oposição.
Por outro lado, é naturalíssimo que o PSD governe sozinho, tem toda e completa legitimidade para o fazer e nunca, nem por um momento, pusemos em causa essa legitimidade. Agora, o que V. Ex.ª também não pode, obviamente, é pôr em causa a nossa posição de termos de nos opor ao Governo, tanto mais que temos fundamentos para isso. E não somos só nós a dizê-lo, é também o povo português. Volto a lembrar-lhe as sondagens de um semanário independente que diz claramente que, em pouco tempo, o Governo perdeu cerca de 40% do seu prestígio. Nós reflectimos aqui essa opinião pública e temos honra em a reflectir.
Penso que respondi a tudo, embora, recordando uma das questões aqui postas, queira dizer ao Sr. Deputado Vieira Mesquita, para o acalmar, que uma das conclusões do Congresso foi a de que o meu partido não fará coligações pré-eleitorais com ninguém, tendo total independência para, depois das eleições, analisar a situação política portuguesa sem quaisquer compromissos.
O Sr. Presidente: - Terminaram as declarações políticas.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lurdes Hespanhol.
A Sr.ª Lurdes Hespanhol (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O agravamento da situação escolar é tema a que não pode ficar alheia esta Assembleia da República.
Salientaria que tal se está a passar com a generalidade dos diferentes níveis de ensino. Os exemplos aí estão para o demonstrar:
O ano escolar iniciou-se em 15 de Setembro e estamos hoje em 2 de Fevereiro;
Há muitas escolas que não funcionam em toda a sua plenitude. A Educação Musical e a Educação Física são apenas privilégio para alguns. Opções há que ainda não funcionam;
Há cantinas e refeitórios fechados de que são exemplos significativos os casos da Escola Secundária de Avelar Brotero, em Coimbra, cuja situção priva 4000 alunos das refeições diárias a que têm direito, a Escola C+S de Sernancelhe, onde não existem condições higiénico-sanitárias, para citar algumas;
Há falta de aquecimento nas escolas da região de Trás-os-Montes, situação que já levou os pais a fazerem uma manifestação de protesto em Bragança;
Faltam as condições de segurança e de acesso que obrigam os pais a intervirem, como é o caso de estabelecimentos de ensino em Rio de Mouro;
As escolas superiores agrárias continuam sem condições para funcionamento integral, como é o caso da Escola Superior Agrária de Beja, que ainda não dispõe de terreno para as aulas práticas;
Algumas escolas superiores de educação debatem-se com problemas terríveis no domínio da formação, designadamente no que se refere à falta de acompanhantes da prática pedagógica;
Renova-se, contra a opinião das escolas, a tentativa governamental de integração, à força, dos Institutos Superiores de Engenharia e dos Institutos Superiores de Contabilidade e Administração no ensino politécnico;
A situação que se vive nas Faculdades de Letras é anómala: criam-se licenciaturas em ensino sem que os alunos tenham garantidas perspectivas de trabalho;
Na educação pré-escolar (sector tão apregoado como sendo fulcral para permitir a obtenção de sucesso) estamos longe de encontrar soluções que permitam uma cobertura total do País (continuamos com menos de 30%). E que tal se experimentássemos atingir os 50%? Confesse-se que não estamos a exigir muito;
Acrescente-se ainda que, lamentavelmente, a lei do ensino especial é como se não existisse;
A educação sexual nas escolas continua a ser enjeitada, se não impedida.
Entretanto, persiste uma política de alijar responsabilidades transferindo para as autarquias novas competências sem as correspondentes transferências financeiras. É presentemente o que se passa com os funcionários administrativos e de apoio da educação pré-escolar, ensino primário e ciclo preparatório/TV.
Como é ainda o caso da imposição/chantagem face às autarquias locais de que a escola A ou B (cuja construção é da responsabilidade do poder central) só avançará se a
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autarquia comparticipar com percentagem elevada. E não são casos isolados, Srs. Deputados!
Isto está a acontecer no Algarve, na região norte, no Alentejo, um pouco por todo o País. Isto não pode ser!
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Entretanto, o País vai vivendo em regime de experiências pedagógicas. Nada temos contra a experiência pedagógica, mas pensamos que ela não poderá substituir a efectiva resolução dos problemas, das carências, das reclamações os jovens, das crianças; dos professores, dos pais e de todos aqueles que têm a ver com o sistema educativo e reclamam a sua efectiva democratização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que é mais que tempo de se dar início à implementação da Lei de Bases do Sistema Educativo. Acompanhámos, aliás, com interesse a discussão sobre os documentos preparatórios editados pela chamada comissão de reforma do sistema educativo, mas há uma questão essencial que importa rapidamente esclarecer. É sabido que muitos dos documentos postos em debate são contraditórios pois apontam caminhos completamente inversos. Tendo presente que esta comissão é uma estrutura consultiva do Governo, cabe perguntar o que pensa o Sr. Ministro e como está acompanhando o problema. Não é aceitável que permaneça a situação de «um lavar de mãos» sem perspectivas mínimas de orientação, sabendo-se, como se sabe, que documentos há que têm a assinatura do próprio Ministro.
O PSD fala muito do seu programa e do respectivo cumprimento. Então, aqui não têm nada a dizer?
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - Sobretudo terá de esclarecer, de vez, estas contradições e dizer em que é que ficamos.
A situação actual veio, mais uma vez, demonstrar que o Governo deve explicações ao País, mas explicações claras e objectivas. O PCP tem colaborado por forma a conseguir resolver algumas das questões mais urgentes e fê-lo em diferentes ocasiões, fê-lo com propostas sérias e viáveis aquando do debate do Orçamento do Estado. Tem apresentado diversos projectos de lei e ainda na última sessão plenária fez a entrega de mais um projecto, desta feita sobre o ano sabático para os educadores de infância, professores do ensino primário, preparatório e secundário.
Este esforço tem se ser acompanhado pela Assembleia, que não pode continuar alheia aos reais problemas da educação em Portugal, como tem vindo a suceder na presente legislatura.
A nossa disposição é a de trabalhar e contribuir para uma educação mais justa, pela igualdade, pela paz e pela democracia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.
O Sr. José Cesário (PSD): - Sr.ª Deputada Lurdes Hespanhol, ouvimos uma intervenção do PCP sobre educação, uma intervenção bem no estilo habitual do Partido Comunista...,
Vozes do PCP: - É verdade!
O Orador: -... uma intervenção bem no estilo habitual de quem tem estado, está e estará na oposição, uma intervenção bem no estilo habitual de quem apenas é capaz de falar e não de realizar...
Uma voz do PCP: - Isso já não é verdade!
O Orador: - Pois isso o povo português não lhe dá o direito de fazer.
A Sr.ª Deputada colocou aqui um vasto conjunto de questões que há muito são referenciadas pela generalidade dos partidos políticos com assento nesta Casa. Suo questões que conhecemos há muito e sabemos que afectam o sistema educativo. Contudo, não podemos referenciá-las isoladamente, é preciso referenciá-las num quadro geral legislativo que todos sabemos estar o actual Governo a atacar.
Uma voz do PCP: - Está, está!
O Orador: - Na sequência da lei de bases aqui aprovada, neste momento, está em fase de discussão pública um vasto conjunto de iniciativas que visam- pôr de pé a verdadeira reforma do sistema educativo. Nesta fase, o Governo está efectivamente atento às questões que colocou, às questões que todos vimos colocando desde há muito tempo, pois não basta enumerar, isoladamente, este ou aquele problema nesta ou naquela escola. Sabemos que a educação é um mundo de problemas. É e continuará a ser, apesar de o sector educativo se encontrar em franco desenvolvimento. É isto o que lhe podemos dizer neste momento.
Queremos, no entanto, deixar bem frisado, bem claro que o debate que este Governo está a proporcionar em torno da reforma educativa é uma iniciativa única, uma iniciativa válida, que permite à generalidade das forças vivas empenhadas no processo educativo português pronunciar-se acerca do que deve ser a educação do futuro, a educação de amanhã.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lurdes Hespanhol.
A Sr.ª Lurdes Hespanhol (PCP): - Sr. Deputado José Cesário, ouvi com atenção a cassette que utilizou.
Aplausos do PCP.
Risos do PSD.
Estou há pouco tempo no Parlamento, mas já deu para entender que os Srs. Deputados do PSD, quando têm pouca argumentação e poucos factos para contradizer aquilo que a bancada do PCP lhes aponta, utilizam normalmente a cassette que V. Ex.ª utilizou. Espero que a mudem.
Risos do PSD.
Sr. Deputado, queria dizer-lhe que, na sua intervenção, houve uma coisa que me chocou bastante.
Vozes do PCP: - É verdade!
Uma voz do PSD: - Além da cassette?
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A Oradora: - É que o Sr. Deputado não teve a coragem de desmentir absolutamente nada do que apontei. Se na minha intervenção houvesse algo que não fosse verdade, o Sr. Deputado deveria ter tido a coragem de o apontar aqui. Gostaria também de lhe dizer que o PSD não está há seis meses no Ministério da Educação, o PSD está lá há oito anos.
Aplausos do PCP.
Uma voz do PSD: - Essa é cassette!
A Oradora: - Está lá há oito anos e ao fim desses oito anos contínua com discursos de generalidades, continua a não apontar casos concretos, contínua a não estudar as situações. Ora, eu gostava que me dissesse que era mentira, por exemplo, o caso das escolas cuja construção, sob a responsabilidade do Ministério da Educação, era uma prioridade e que agora, com este Orçamento Geral do Estado, são apontadas às populações como só sendo susceptíveis de construção caso as autarquias comparticipem.
Uma voz do PSD: - Não é nada disso! Lá vem a cassette!
Uma voz do PCP: - É verdade e é chantagem!
A Oradora: - Sr. Deputado, se acha que isto é cassette, então tínhamos muita música para vos dar...
Uma voz do PSD: - É só música!
A Oradora: -... porque temos muitos dados para trazer aqui ao Parlamento.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na passada sexta-feira, na RTP, tive oportunidade de assistir a uma entrevista ao ex-governante, actual deputado no Parlamento Europeu, o cidadão engenheiro Carlos Pimenta.
Pode parecer, à primeira vista, que é algo de menor importância e será para quem esteja menos atento ou para quem tenha da vida e da política a opinião de que tudo é legítimo e, ao mesmo tempo, desculpável, numa palavra, para quem subscreva o conceito de que «os fins justificam os meios».
Nessa entrevista, ficámos a saber que o processo judicial desencadeado há alguns meses e que, entre outras coisas, punha em dúvida a honorabilidade do cidadão engenheiro Carlos Pimenta, unha sido mandado arquivar, sem qualquer procedimento. De facto, depois de apuradas investigações, feitas a vários níveis, tinha-se considerado que não havia qualquer culpa imputável ao cidadão em causa que, portanto, tinha sido «absolvido.» Ponto final. Tinha chegado ao fim o pesadelo e a incomodidade para este cidadão, que afirmou nunca ter tido dúvidas relativamente ao desfecho deste caso porque tinha actuado sempre dentro dos limites da lei e na defesa intransigente dos interesses do País.
Devo confessar que, como cidadão, me senti satisfeito mas ao mesmo tempo apreensivo e até preocupado com esta entrevista.
Satisfeito por verificar que se terá feito justiça, contrariamente ao habitual e apesar de tudo, até com alguma rapidez e também pela maneira clara, aberta e convincente como o Sr. Engenheiro Carlos Pimenta soube transmitir às pessoas que o viam e ouviam que nada havia, afinal, de menos claro e, ao contrário, o que se tinha passado devia ser classificado de relevante para os interesses dos Portugueses e sem violar qualquer norma ou disposição legal.
Mas, ao mesmo tempo, fiquei apreensivo e preocupado, e de certo modo o engenheiro Carlos Pimenta pareceu-me que também tinha a mesma preocupação, quando penso nos processos pendentes que levam anos a resolver, levando muitas pessoas ao desespero e a não acreditarem na justiça.
Apreensivo também por verificar que o procedimento que a RTP teve para com o cidadão Carlos Pimenta, dando-lhe tempo de antena de largos minutos, em horário importante, não ser o habitual para com outros cidadãos, igualmente necessitados não só de justiça, mas de reparação moral. De facto, quantos cidadãos deste país aguardam justiça e reparação moral por ofensas à sua honra e dignidade? Quantos cidadãos não desesperam e chegam até a descrer da democracia por não verem, em tempo útil, a respectiva resolução para casos que os afectam e, em especial, quando esses casos dizem precisamente respeito a questões de honorabilidade?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta pequena e simples intervenção tem - para além do regozijo com que quero associar-me (e não há aqui nenhum cinismo político da minha parte) à resolução do assunto que envolvia o engenheiro Carlos Pimenta, cidadão que não conheço pessoalmente- a pretensão de vos conduzir a duas reflexões que reputo como fundamentais: a primeira é a facilidade com que é posta em causa a honorabilidade das pessoas; a segunda é a falta de rapidez na resolução das questões de justiça, em especial, quando têm a ver com a honorabilidade das pessoas e o tratamento diferente que é dado aos cidadãos deste país, quer na rapidez dos processos quer no acesso à comunicação social em geral e à RTP em particular.
Que este exemplo possa servir de pedagogia para que não seja possível acusar cidadãos quando estão em causa questões de honra e dignidade sem provas consideradas irrefutáveis, quando estão em causa, numa palavra, direitos fundamentais do homem e, por outro lado, para que sejam dadas a todos os cidadãos as mesmas possibilidades de defesa, quer na rapidez dos processos quer na sua divulgação pública, porque todos os cidadãos são iguais perante a lei.
Aplausos ao PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Não é para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente. É para, ao abrigo das disposições regimentais, solicitar meia hora de interrupção dos trabalhos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para terminarmos o período de antes da ordem do dia julgo que gastaremos apenas três minutos ou poucos mais para concluirmos as intervenções e procedermos à leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos. Contudo, se o Sr. Deputado entender que é necessário interrompermos neste momento, assim o faremos. De contrário, atrever-me-ia a sugerir que prolongássemos por mais uns dez minutos e fizéssemos o intervalo a seguir.
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O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, não vamos levantar problemas por dez minutos. Iremos dar uma conferencia de imprensa neste intervalo, foi para isso que o solicitámos, mas estamos convencidos de que a comunicação social também aguardará os dez minutos que o Sr. Presidente solicitou. Nesse sentido pedia ao Sr. Presidente que, logo que se concluísse o período de antes da ordem do dia, nos concedesse então a meia hora de intervalo.
O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Para uma última intervenção, no período de antes da ordem do dia de hoje, damos a palavra ao Sr. Deputado António Mota.
O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os inadmissíveis factos ocorridos no passado fim-de-semana nos Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade do Porto inserem-se na actuação governamental contra o poder local democrático que pretende dissolver a Câmara de Gondomar, fazer o silenciamento das antenas parabólicas, os cortes no FEF, etc.
Foi com grande aparato policial que o governador civil do Porto mandou ocupar pela força policial as instalações dos Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade, reunindo com elementos da EDP, em confronto com as deliberações unânimes da Câmara Municipal do Porto e do conselho administrativo dos Serviços Municipalizados.
Esta ocupação governamental de instalações e serviços que são património da Câmara Municipal do Porto é um acto que viola gravemente a autonomia e os direitos constitucionais do poder local democrático e, por isso, está a ser repudiado por autarcas das mais diversas áreas e vivamente contestado pela população do Porto.
Nada justifica a ocupação policial de instalações municipais. E tudo se torna tanto mais grave quanto havia já um protocolo negociado entre a Câmara Municipal do Porto e a EDP com vista à recuperação do tarifário e à resolução dos problemas existentes. A própria assinatura do protocolo esteve prevista por mais de uma vez. E só não se concretizou por diferendos quanto ao local da assinatura. Muita gente, incluindo autarcas, se interrogam sobre as verdadeiras razões de tão inadmissível e inconstitucional actuação governamental contra os Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade do Porto.
É necessário e urgente que o Governo reveja a situação criada, que tenha em conta o protocolo negociado, que através do diálogo se encontrem soluções que tenham em conta os interesses da população do Porto e respeitem a autonomia do poder local.
A Assembleia da República e, nomeadamente, os deputados eleitos pelo distrito do Porto não podem ficar indiferentes à grave situação criada pelo Governo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Deputado há muito tempo que a distribuição de energia eléctrica vem sendo integrada na empresa pública Electricidade de Portugal. A pergunta que lhe deixo é esta: sabendo-se que há muito tempo se fazem essas integrações de distribuição de energia eléctrica na empresa pública EDP, V. Ex.ª entende que os Serviços Municipalizados da Câmara Municipal do Porto deverão revestir um acto isolado, uma verdadeira excepção, no meio da chamada distribuição de energia eléctrica? Deixo-lhe ainda mais outra pergunta: relativamente ao protocolo que aí referiu, V. Ex.ª disse que houve apenas uma divergência quanto ao local para assinatura desse protocolo. V. Ex.ª tem consciência do que está a afirmar? Sabe que, na verdade, não foi nada disso que se passou, que o assunto não teve nada a ver com o local de assinatura, mas sim a ver com cláusulas de deferimento quanto ao problema das taxas de energia? É a estas duas perguntas que gostaria que V. Ex.ª respondesse.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe que me informe do tempo de que disponho para formular o pedido de esclarecimento.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado dispõe de três minutos, nos termos regimentais.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho a certeza de que o Sr. Deputado António Mota responderá cabalmente às perguntas que lhe foram colocadas pelo Sr. Deputado Vieira Mesquita, mas, de qualquer forma, em nome dos deputados do círculo eleitoral do Porto, quero manifestar a minha solidariedade para com a intervenção que acabou de ser produzida pelo Sr. Deputado António Mota.
O que está realmente em causa não é tanto a actualização das tarifas -aspecto que reveste de uma certa flexibilidade e que naturalmente seria negociável, como, aliás, o foi-, mas sim mais um atentado ao poder local democrático, ou seja, a invasão da propriedade privada, a usurpação do património do Município do Porto levada a efeito pelo Governo, servindo-se como instrumento da EDP.
Pergunto ao Sr. Deputado António Mota se tem consciência do que isto significa para a história e para a cultura da cidade e se tem consciência do que isto significa para o legítimo orgulho dos Portuenses e, sobretudo, do que isto vai significar em termos de funcionamento dos próprios Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade (SMGE), que eram um modelo de organização, de exploração energética e que naturalmente não poderão continuar exactamente com a mesma eficiência.
Gostaria que me dissesse, Sr. Deputado António Mota, se sabe que o primeiro acto das pessoas que instrumentalmente tomaram conta do património da Câmara foi aumentar os vencimentos do pessoal dos Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade. Pergunto ainda ao Sr. Deputado António Mota qual a razão por que o Governo se recusou a concordar com o período de recuperação proposto? O Governo é o responsável, e não a EDP. Aliás, o Partido Socialista está solidário com a EDP, com os seus trabalhadores, e sabe que a EDP precisa de ser reorganizada, racionalizada e desenvolvida.
Vozes do PSD: -Ah!...
O Orador: - O Sr. Deputado António Mota sabe que a verdadeira razão que levou o Governo a tomar conta pela força das instalações pertencentes ao Município do Porto foi exactamente a de não concordar com a possibilidade de os consumidores carenciados do Porto terem um período de recuperação de dez anos, desejando-lhes impor uma reso-
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lução do Conselho de Ministros que fixa em cinco anos esse período de recuperação, quando é sabido que a situação do Porto é uma situação especial?
Espanta-me que os Srs. Deputados, do círculo eleitoral do Porto, de todos os partidos, não comunguem desta mesma indignação, que nos foi aqui trazida pelo Sr. Deputado António Mota e que subscrevo integralmente. Porque, se realmente não estivermos unidos nesta questão, que é fundamental para o poder local democrático, muito mal vai a democracia portuguesa. Esta semana foi realmente um momento extremamente triste e negro para o poder local democrático, sobretudo para a cidade do Porto.
Aliás, espero, que, na sequência de posições unânimes assumidas ontem mesmo numa reunião da Assembleia Municipal do Porto, o Governo seja sensível a esta problemática e possa encontrar no dialogo, com flexibilidade, uma solução correcta para os problemas que se colocam à energia e aos consumidores da cidade do Porto.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.
O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Deputado Vieira Mesquita, julgo que uma parte das questões por si colocadas já foram respondidas pelo nosso colega deputado Manuel dos Santos, do PS.
O Sr. Deputado põe o problema do local, mas devo dizer-lhe que não é um problema de local.
Sr. Deputado, se há algum local em que o protocolo deveria ser assinado, seria naturalmente na sede própria, e não fora dela, menosprezando assim um direito que a Câmara Municipal do Porto tem de assinar um protocolo com a EDP no seu próprio edifício.
Consideramos que isto é já uma falta de respeito pela autarquia e, portanto, lamentamos que o Governo tenha tomado esta posição. Mas digo mais, Sr. Deputado: estou convencido de que a posição de não querer assinar o protocolo em 4 de Novembro e de o adiar para o dia 16 do mesmo mês, alegando que o queria assinar no Governo Civil e não na Câmara Municipal do Porto, é já um propósito, e julgo que se trata de má-fé por parte do Governo a de não assinar o protocolo, criando esta situação.
Lamento que o Sr. Deputado, eleito pelo círculo do Porto, não conheça, de facto, a situação criada ao longo de todos estes anos, em que essa população não tem outra alternativa, não tem outras fontes de aquecimento. Nestes termos, consideramos que este caso, não é similar a outros, pois é um caso muito particular o da cidade do Porto.
Neste momento em que se está a discutir no sentido de se obter a equiparação do tarifário e em que existe a assinatura de um protocolo onde está expresso que durante dez anos se iria fazer a recuperação do tarifário, pelo menos, no caso das pessoas de dobeis recursos, o Governo recusa tudo isto e, em vez de dialogar e de ter em conta esta situação, defendendo os interesses do Porto, opta pela política da «martelada». Isto é, em vez de resolver o problema, invade os serviços com o Sr. Governador Civil do Porto à frente de uma carga policial. Mais, Sr. Deputado - desculpe-me a franqueza -, mas, cinicamente, telefona à Câmara Municipal do Porto e ao conselho de administração do S MG E para que assistam à tomada de posse pela parte da EDP dos Serviços Municipalizados. Pergunto, Sr. Deputado: isso são formas correctas de se actuar? Não acha que é uma falta de respeito pelo poder autárquico, uma falta de respeito pelo Município e pela população da cidade do Porto? Nós consideramos que sim e que é lamentável que o Sr. Deputado, sendo eleito pelo círculo do Porto, não tenha na sua mente esta grande realidade: é que, de facto, esta situação não pode continuar, porque o que vai acontecer é que a população do Porto - ou, pelo menos, as pessoas de menores recursos - vai sofrer as suas consequências, pois vão surgir situações muito complicadas. Sr. Deputado, há naturalmente razões por detrás disto!... Um dia poderemos discutir estas razões, mas a verdade é que há razões para além destas.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos, devo dizer que nós consideramos que os Serviços Municipalizados de Gás e Electricidade foram sempre geridos exemplarmente, e digo «sempre» porque estes serviços pagaram sempre à EDP as contas que tinham correspondentes ao tarifário que recebiam. Por isso, quando se vem aqui trazer a questão do que os SMGE devem 40 milhões se contos, digo que ela é falsa, porque, de facto, estes Serviços sempre pagaram o que tinham a pagar à EDP.
Portanto, consideramos que os Serviços Municipalizados vão sofrer, mas mais do que isto vai sofrer a população do Porto, porque vai ver encarecido o tarifário e isto traz grandes implicações, podendo mesmo dizer-se que um quarto da população, que se encontra na situação de recursos débeis não sabe como vai resolver este problema do agravamento. E, portanto, não se traia só dos agravamentos das condições de vida, como também do agravamento da electricidade, que vão criar condições de vida muito graves e difíceis à população do Porto.
Em suma, consideramos que os deputados eleitos pelo Porto deviam tomar uma medida para que o Governo tivesse em conta esta situação e a revesse.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, admito a interrupção, desde que se desconte no tempo regimental do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, as interrupções são regimentalmente interrupções.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, solicitei a interrupção e creio que o Sr. Deputado António Mota ma concedeu.
Por isso, se me permitisse, usaria...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Sr. Deputado António Mota disse que concederia uma interrupção se ela fosse descontada no tempo regimental do PSD, e, como isso não é possível, não a pode fazer.
O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, com esta pequena intervenção concluí, de facto, as respostas aos pedidos de esclarecimentos que me foram feitos pelos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
Comissão de Regimento e Mandatos Relatório e parecer
Em reunião da Comissão de Regimento e Mandatos realizada no dia 2 de Fevereiro de 1988, pela 16 horas,
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foram observadas as seguintes substituições de deputados:
Solicitadas pelo Partido Social-Democrata:
José Mendes Melo Alves (círculo eleitoral dos Açores) por Paulo Manuel Pacheco da Silveira. Esta substituição é pedida nos termos da alínea à) do n.º 2 do artigo 5.Q da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período de 30 dias, a partir do dia 2 de Fevereiro corrente, inclusive;
António Maria Pereira (círculo eleitoral de Lisboa) por António Paulo Veloso Martins Bento. Esta substituição é pedida nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período não inferior a 15 dias, a partir do dia 2 de Fevereiro corrente, inclusive;
Solicitada pelo Partido Comunista Português:
Jerónimo Carvalho de Sousa (círculo eleitoral de Lisboa) por José Manuel Santos de Magalhães. Esta substituição é pedida nos lermos da alínea c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85, de 13 de Março (Estatuto dos Deputados), por um período de 15 dias, a partir do dia 1 de Fevereiro corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
Comissão de Regimento e Mandatos: Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Vice-Presidente, Alberto Marques de O. e Silva (PS) - Secretário, José Manuel de Melo A. Mendes (PCP) - Secretário, João Domingos F. de Abreu Salgado (PSD)- Álvaro José Rodrigues de Carvalho (PSD)- Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Domingos da Silva e Sousa (PSD) - Fernando Sequeira Roriz (PSD)-José Augusto Santos da S. Marques (PSD)-José Guilherme Pereira C. dos Reis (PSD)-José Luís Bonifácio Ramos (PSD) - Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD) - Rui Manuel Lobo Gomes da Silva (PSD)-Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD)- Carlos Cardoso Lage (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Vasco da Gama Lopes Fernandes (PRD) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (ID).
Srs. Deputados, vamos passar à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, a pedido do PS, vamos interromper os nossos trabalhos por 30 minutos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, em virtude de ter dado entrada na Mesa um voto de protesto, apresentado por deputados do PS do círculo eleitoral do Porto, relativo à questão que foi aqui discutida, pergunto se V. Ex.ª não o vai referir.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, fui neste momento informado de que esse voto de protesto deu entrada na Mesa e julgo que a Câmara já tem dele conhecimento.
Vamos agora interromper os nossos trabalhos por 30 minutos, a pedido do Grupo Parlamentar do PS.
Eram 17 horas e 15 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 18 horas.
Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 36 e 37 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 28 e 29 de Dezembro findo.
Pausa.
Como não houve qualquer objecção em relação a estes diplomas que foram publicitados, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vai ser lido um parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 745 (processo n.º 2413/83) do 5.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa, de 20 de Outubro passado, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca dos Srs. Deputados António Miguel de Morais Barreto e José Manuel Torres Couto, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar os referidos Srs. Deputados a deporem como testemunhas no processo em referência.
Com os melhores cumprimentos.
Palácio de São Bento, 27 de Janeiro de 1988.- Pelo Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado
Srs. Deputados, vamos proceder à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, informo-os de que as umas que se encontram na Sala de D. Maria fecham dentro de quatro minutos.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão da proposta de lei n.º 17/V - Revê o regime de participações do sector
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público e procede à concentração dos princípios gerais a ele relativos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por parte do Governo há ires ordens de razões fundamentais para esta proposta de lei.
A primeira tem a ver com a transparência e, se possível, com o consenso sobre uma maioria que é, aliás, concorrencial entre os dois órgãos de soberania. De facto, o Governo poderia legislar sobre esta maioria por simples decreto-lei, como já o fez, mas emendemos que seria preferível ira/cr uma proposta de lei à Assembleia da República. Aliás, isso consta do Programa do Governo.
Procuramos, desta forma, criar um quadro único em que se faça a revisão e a condensação de lodo o quadro anterior, revogando-se os Decretos-Leis n.ºs 322/79 e 148/87 e as Leis n.ºs 26/87 e 27/87, bem como diversas portarias que desde 1982 vem regulando a maioria, que são as Portarias n.ºs 694/82,257/86 e 683/86.
A segunda ordem de razões tem a ver com a nacionalidade empresarial. De facto, a lógica patrimonial de uma empresa conduza que os activos não afectos à exploração, ou só longinquamente a cia afectos, possam e devam ser alienados quando as condições de mercado e as necessidades de exploração da empresa assim o determinem.
Há também uma regra primária fundamental na vida de uma empresa -estou a referir-me, obviamente, às empresas participantes-, que e a de desinvestir para reinvestir ou sanear o essencial. Ou seja, desinvestir o acessório para melhorar o essencial que fax parte do objecto de exploração da empresa participante. Refiro ainda, dentro destas razões de ordem empresarial, os princípios de autonomia de gestão, que têm a ver com a suavidade de decisão, o aproveitamento das oportunidades, a liberdade negociai e, afinal de contas, com a própria responsabilidade da administração da empresa participante ou da entidade do sector público que detenha as participações.
A terceira ordem de razões tem a ver com a reforma do sector empresarial do Estado, conforme consta do Programa do Governo. Esta reforma tem de ser profunda e o Governo vai fazê-la sem hesitações, mas com a ponderação e o diálogo que são exigidos pela importância económica, financeira e política do sector. O Programa do Governo refere ainda que esta proposta de lei distinguirá regimes de alienação para as participações minoritárias e maioritárias. Quanto às primeiras, as minoritárias, o regime regra será o da liberdade negociai. E, meus senhores, a isso se refere o artigo 3.º da proposta de lei, que inclui a negociação particular como uma das fornias possíveis de alienação destas participações minoritárias.
Mas, prosseguindo com o Programa do Governo, quanto às participações maioritárias exigir-se-ia aqui que a venda se faça pelos mecanismos institucionalizados do mercado de capitais sempre que a dimensão da participação o justificar. A isto se refere o artigo 4.º da proposta de lei quando considera que as alienações das participações maioritárias em empresas com situação líquida acima de meio milhão de contos devem ser sempre feitas por concurso público ou transacção em bolsa.
Prosseguindo com o Programa do Governo, este refere ainda que a alienação de participações tem de ser considerada, em geral, como acto natural da administração das empresas participantes. Outra coisa seria ferir os princípios da boa gestão patrimonial, da responsabilidade e da autonomia de gestão das empresas públicas e entidades equiparadas.
Haverá, contudo, situações em que a redução da presença do sector público numa sociedade é considerada desaconselhável por razões de interesse nacional. Meus senhores, a estas situações de excepção se dirige o artigo 6.º da proposta de lei, que salvaguarda a não alienação de participações em empresas que tenham especial relevância para o País, quer seja por razões de ordem estratégica, por razões de complementaridade horizontal ou vertical relativamente ao sector público, ou até mesmo por outras razões consideradas relevantes peio Governo. «Em tais circunstâncias», continua-se no Programa do Governo, «providenciar-se-á para que o Estado ou outra entidade pública adquiram a participação em causa.» Isto está também previsto no artigo 6.º do diploma em análise, quando se diz que a entidade pública detentora da participação, se esta for declarada inalienável, pode, todavia, requerer a sua alienação a outra entidade do sector público, não ficando desta forma prejudicada a sua boa gestão patrimonial, que pode ser precisamente no sentido da alienação.
Ainda no âmbito da alienação de participações o Programa do Governo refere que são privilegiadas as alienações a favor dos trabalhadores da empresa participante ou, por maioria de razão, da empresa participada. A isto, meus senhores, se dirige o artigo 7.º, n.º 1, da nossa proposta de lei.
Estas foram as razões que levaram o Governo a apresentar este diploma, cujo espírito e regras fundamentais passarei agora a apresentar esquematicamente.
Quanto ao espírito, penso que as próprias razões que há pouco apresentei são suficientemente fortes para dar a sua configuração.
No que se refere às regras fundamentais da proposta de lei, devo dizer que tanto o Ministro das Finanças como o ministro da tutela poderão declarar uma empresa participada como inalienável -na parte da participação, obviamente-, e, se assim acontecer, se for considerada inalienável, a entidade participante não pode vender, salvo se requerer aos mesmos ministros que a participação seja comprada por outra entidade do sector público.
Se a declaração de inalienabilidade não for feita, então a participação pode ser vendida. Mas aqui ainda há que olhar à natureza da entidade participante, porque, se for o Instituto de Participações do Estado (IPE), uma companhia de seguros, uma sociedade de investimentos, uma sociedade de capital de risco ou outras entidades que pertencem ao sector público mas que, por natureza do seu objecto, devam comprar e vender participações, então a venda e totalmente livre.
Sc for outra a natureza das entidades participantes, nesse caso há que prosseguir na aplicação das regras do diploma e perguntar qual e a dimensão da empresa participada. Se ela tiver uma dimensão superior a meio milhão de contos, medida pela sua situação líquida, então haverá que saber se a participação e maioritária ou minoritária, pois os regimes de alienação serão deferentes nos dois casos, como explicarei adiante.
No caso de a situação líquida ser menor do que meio milhão de contos, a venda é livre, independentemente de ser uma participação maioritária ou minoritária - e quando digo venda livre quero dizer que poderá ser por negociação particular, por concurso público ou por transacção em bolsa. Se a dimensão for superior a meio milhão de contos, nesse caso haverá que ver se a participação que a entidade participante pretende alienar é superior a 50% do capital social da participada, porque, se o for, a participada e maioritária e a venda pode ser feita apenas e exclusivamente
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por concurso público ou transacção em bolsa, salvo num caso excepcional, que e o de se tratar de um plano de venda aos próprios trabalhadores, quer da empresa participante, quer da empresa participada, onde se permite que a venda seja feita por negociação particular, estando, de qualquer modo, sujeita a regulamentação por decreto-lei no prazo de 90 dias. Aliás, a regulamentação por decreto-lei aparece noutros pontos desta proposta de lei.
Sc a participação for considerada minoritária, então, ainda há que indagar se há outras participações de outras entidades públicas sobre esta mesma empresa participada. Se as houver e se a sua agregação der mais do que 50% do capital social da empresa participada, pode o Governo determinar que se lhe aplique o regime de alienação de participações maioritárias, que é o que descrevi anteriormente. Sc não houver esta declaração, então aplica-se-lhe o regime das minoritárias, que é o da venda livre, incluindo negociação particular, concurso público ou transacção em bolsa.
As regras fundamentais estão, pois, claramente definidas nesta proposta de lei e as complementares são remetidas para um decreto-lei que deve estar pronto no prazo de 90 dias.
Srs. Deputados, como disse de início, fundamentalmente esta proposta de lei retoma toda a legislação que está publicada sobre esta matéria e procura respeitar requisitos fundamentais de racionalidade empresarial e de autonomia e responsabilidade da administração, salvaguardando, todavia, alguns casos considerados de interesse nacional, os quais requerem que o Governo lenha uma atitude activa de declaração de que ó assim mesmo. De qualquer modo, nunca se prejudica o interesse patrimonial da entidade participante, a qual poderá requerer ao Ministro das Finanças e ao da tutela que outra entidade pública compra essa participação.
Srs. Deputados, eram estes pequenos apontamentos que gostaria de transmitir à Câmara no início deste debate.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Silva Lopes, Octávio Teixeira e Raul Castro, ao primeiro dos quais concedo desde já a palavra.
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Ministro das Finanças, desde há vários anos que têm vindo a ser alienadas importantes participações empresariais do Estado e de outras entidades do sector público, alienações essas que tem sido permitidas sem grandes dificuldades pela legislação anterior.
O Sr. Ministro, nos esclarecimentos que nos deu, não explicou muito bem quais são as melhorias reais mais importantes que o Governo espera que sejam introduzidas com a entrada em vigor das disposições da proposta de lei que agora nos apresentou, pelo que agradecia que o fizesse.
Pessoalmente, parece-me que a grande melhoria consiste em se permitir que a negociação da esmagadora maioria das participações do Estado possa ser feita por negociação particular.
É verdade que o artigo 2.º esclarece que a alienação das participações do sector público deve ser feita através de concurso público, de operações em bolsa ou de negociação particular. Mas depois os outros artigos do diploma abrem
que pergunto o que é que fica para a transacção através de concurso público e de negociação em bolsa.
De facto, o artigo 7.º deixa plenas possibilidades de negociação particular aos bancos, ao IPE, às companhias de seguros e a outras entidades financeiras. Ora, é sabido que são estas entidades que detêm a esmagadora maioria das participações do sector público e se lhes deixarmos a possibilidade de fazer transacções através de negociação particular, pouco fica para ser transaccionado através de concursos públicos ou de operações em bolsa.
Mas, pelos vistos, isto não basta ao Governo, porque o artigo 3.º admite que a alienação através de negociação possa ser feita para todas as participações minoritárias, independentemente do seu valor. Podem, assim, transaccionar-se participações de centenas de milhares de contos ou até de milhões de contos, se as houver, sem qualquer limitação quanto à possibilidade de as fazer por negociação particular.
Ainda o artigo 3.º admite - ou parece admitir, já que a redacção não e muito clara - que haja negociação particular mesmo nos casos de participação maioritária pelo sector público, desde que essa participação maioritária se encontre dispersa por várias entidades.
Nestas circunstâncias, parece que quase tudo pode ser transaccionado por negociação particular.
Gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse se é realmente esse o grande objectivo da proposta de lei que temos perante nós. Sc não é, então pergunto em que é que estarei enganado quando digo que o grande objectivo deste diploma é o de permitir a negociação particular na quase totalidade das alienações que vierem a ser feitas ao abrigo dele.
Pergunto se não teria sido preferível estabelecer um limite máximo de, por exemplo, 200 000 ou 300 000 contos, acima do qual todas as alienações teriam de ser obrigatoriamente feitas por concurso público, independentemente de quem as possuísse e de se tratar do participações maioritárias ou minoritárias. Penso que a solução adoptada pelo Governo é contrária ao tão prolongado objectivo de transparência de que o Governo vem falando frequentemente e que o Sr. Ministro das Finanças ainda hoje aqui nos referiu, mas que não me parece ter enformado, de forma alguma, o diploma que estamos a apreciar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, há uma afirmação que o Sr. Ministro fez logo no início da sua intervenção que não me parece estar correcta. Aliás, julgo que foi um erro em que lambem caiu a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
É que esta proposta de lei não visa revogar todos os diplomas legais a que se refere no seu artigo 8.º, na medida em que essa legislação já está praticamente toda revogada. De facto, o que está em vigor neste momento são apenas as Leis n.º 26/87 e 27/87, as quais revogaram iodos os diplomas anteriores que não estivessem de acordo com o que nelas se dispunha.
O que se nota nesta proposta de lei é que o princípio básico dessas duas leis é completamente alterado. Inversamente àquilo que alguns pretendem deduzir do seu texto, o princípio básico expresso na proposta de lei não e o da venda por concurso público ou em bolsa de valores. Essa e a excepção, quando nas Leis n.ºs 26/87 e 27/87 era a regra. Agora renuncia-se a esse princípio, mas depois introduzem-se uma série de alterações, de possibilidades de assim não ser, de tal forma que, de facto, deixa de ser princípio para passar a ser excepção.
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Há um aspecto que, penso, valeria a pena clarificar e que diz respeito ao significado do n.º 2 do artigo 5.º
Diz-se nesse artigo que quando uma empresa vender participações que sejam maioritárias numa outra empresa terá de informar a tutela das razões nos quinze dias subsequentes à venda. Ora para que é que a tutela está interessada em conhecer as razões apenas depois da venda? Convinha que este aspecto fosse clarificado.
Quanto ao problema da dimensão das empresas, julgo que da parte do Governo terá sido menos ponderado o indicador utilizado. É que a situação líquida pode querer dizer muito e pode mio querer dizer nada. Uma grande empresa que ainda tenha um elevado capital social e que tenha tido em anos recentes prejuízos substanciais, embora esteja recuperada, é capaz de não ter a situação líquida de SOO 000 contos, mas continua a ser uma grande empresa e pode ter muita importância.
Mas o esclarecimento substancial que solicito ao Sr. Ministro das Finanças e esta: a que universo de participações seria aplicável esta proposta de lei? A todas as participações do sector público?
É que este aspecto, que já foi debatido, prende-se com a necessidade de salvaguardar requisitos fundamentais da Constituição e, portanto, e necessário que seja clarificado, mesmo face a questões que foram colocadas por Srs. Deputados do PSD no último debate sobre esta matéria. Qual é, na opinião do Governo, o universo a que esta proposta de lei e aplicável? São todas as participações, sem quaisquer limitações e qualquer que tenha sido a sua origem?
Era para esta questão essencial que gostaria de obter uma resposta do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Ministro das Finanças, aquilo que referiu como sendo um pequeno comentário à proposta de lei n.º 17/V foi, na realidade, uma exegese resumida do que ela contem.
Quanto àquilo que a proposta de lei contem, naturalmente, basta lê-la para nos apercebermos de quais são as suas medidas. Agora, a dúvida com que ficamos e que não foi abordada na intervenção do Sr. Ministro e que, tratando-se de matéria constitucionalmente regulamentada, logo no artigo 2.º só se refere como limitadora da alienação de participações sociais a presente lei, o que é matéria do artigo 1.º Diz-se aí que «A alienação de participações sociais por parte de entes públicos fica sujeita ao regime estabelecido na presente lei.» Não há, portando, aqui nenhuma referência à Constituição. No entanto, parece que estas participações dizem no fundo, respeito a pequenas e médias empresas, e, sendo assim, existe um regime constitucionalmente previsto na lei, que naturalmente o Sr. Ministro conhece perfeitamente e que é o do artigo 83.º, n.º 2, que estabelece várias características fundamentais.
Em primeiro lugar, a Constituição estabelece que se trata de um regime excepcional, ao contrário desta lei, que estabelece um regime de alienação geral e não excepcional. Em segundo lugar, exige que se trate de empresas indirectamente nacionalizadas e, em terceiro lugar, fora dos sectores básicos da economia. Ora, nada disto aparece contemplado nesta proposta de lei, que e larga e geralmente permissiva de toda a espécie de alienações de participações. Até mesmo naquilo que parece inculcar haver restrições, que é nos que diz respeito a participações maioritárias, acaba o diploma por dizer que isso fica dependente da decisão do Ministro das Finanças e do ministro da tutela. Quer dizer,
isso não fica dependente daquilo que é o nosso regime constitucional, mas sim da vontade do Governo.
Eram estas as questões que lhe queria colocar, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por responder às questões colocadas pelo, Sr. Deputado Silva Lopes, a primeira das quais tem a ver com as alienações das participações feitas até hoje, tendo perguntado o porquê da necessidade desta lei, se elas tem sido feitas.
Acontece, Sr. Deputado, que as Leis n.ºs 26/87 e 27/87 vieram introduzir um novo quadro legal, que, aliás, não está suficientemente regulamentado e que não corresponde ao entendimento do Governo sobre esta matéria e ao que consta do seu Programa. Além disso, parle da legislação que estava em vigor até à publicação das Leis n.ºs 26/87 e 27/87 não foi revogada, ao contrário do que há pouco o Sr. Deputado Octávio Teixeira quis significar.
Quer isto dizer que neste momento temos um quadro legal para enquadrar as alienações de participações que apanha tudo o que está nas Leis n.ºs 26/87 e 27/87, com as suas carências de regulamentação, mais os resíduos da legislação anterior, designadamente do próprio Decreto-Lei n.º 148/87.
Em concreto, quanto às alienações feitas por negociação particular, elas, de facto, estavam enquadradas pela Portaria n.º 694/82, que estabelece algumas condições e requisitos para as negociações particulares na alienação de participações.
Entendemos que é preciso rever toda essa legislação, criar um quadro num diploma único que aproveite o que de bom haja na legislação anterior e que consagre a filosofia do Governo nesta matéria.
Estamos aqui para cumprir o nosso Programa e, como compreenderá, Sr. Deputado Silva Lopes, esta proposta de lei decorre do Programa do Governo e está lá expressamente prevista.
Quanto ao objectivo que V. Ex.ª referiu, devo dizer-lhe que a negociação particular vai abranger quase a totalidade das participações existentes.
O Sr. Deputado pensa ser possível fixarmos um limite quanto ao valor da participação cm, por exemplo, 300 000 contos, independentemente da natureza da entidade participante e do carácter maioritário ou minoritário dessa participação. Bom, teria sido uma opção, pensámos nessa hipótese. No entanto, não adoptámos a configuração que o Sr. Deputado referiu. Todavia, se analisar com cuidado a nossa proposta de lei poderá concluir que essa hipótese está prevista nestes termos: sempre que o valor da empresa participada for superior a meio milhão de contos, na sua situação líquida, e se a participação for maioritária ou, no caso de ser minoritária - por exemplo, se for de 250 000 contos, que já está abaixo do limite de participação -, se houver outras também minoritárias...
O Sr. Silva Lopes (PRD): - O pior é o artigo 7.º!
O Orador: - ... que somem mais de metade do capital social desta empresa, que hipoteticamente tem a situação líquida superior a meio milhão de contos, então o Governo pode determinar que se lhe aplique o regime das participações maioritárias, ou seja, o concurso público ou a transacção em bolsa. Portanto, o exemplo que o Sr. Depu-
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tado seu está perfeitamente contemplado na nossa proposta de lei e até talvez com maior severidade.
É preciso ver, tal como dissemos, que o princípio fundamental que enforma a nossa proposta de lei e o da liberdade negociai, da responsabilização e da autonomia dos conselhos de administração, que têm a ver também com a boa gestão patrimonial. Assim, a sua proposta alternativa, que seria simples, está contida na nossa proposta de lei.
O Sr. Deputado referiu-se ao n.º 2 do artigo 7.º que excepciona entidades participantes cujo estatuto assim o justifica plenamente, como por exemplo o IPE, as companhias de seguros, as sociedades de investimento e as sociedades de capital de risco do sector público. Obviamente que tem ser assim, porque senão iríamos contrariar, o mais primariamente possível, o próprio estatuto e a vocação dessas instituições.
Teríamos, por exemplo, o IPE impedido de fazer aquilo que tem de fazer por nascença; teríamos as companhias de seguros impedidas de vender para as suas carteiras, que correspondem às reservas técnicas e às provisões técnicas. O mesmo se passa com os bancos -desde que sejam bancos do sector público-, na parle correspondente à conta de acções, obrigações e quotas. Aliás, estas excepções foram reconhecidas pela Assembleia da República, em parte pelo menos, na legislação que já fez sobre a matéria, considerando que era indispensável excepcionar entidades como o IPE.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, devo dizer-lhe que nem tudo está revogado na legislação anterior às Leis n.ºs 26/87 e 27/87.
Pergunta-me o Sr. Deputado por que razão é que, tal como consta do n.º 2 do artigo 5.º, a entidade participante só comunica a posteriori que fez a alienação. Exigimos no n.º 1 desse mesmo artigo que a decisão de alienação seja devidamente fundamentada. Partimos de um princípio fundamental, que já invoquei por mais de uma vez, que é o da liberdade negociai e o da responsabilidade dos conselhos de administração ou de gestão das entidades participantes, de modo que essas entidades tem de fundamentar devidamente a decisão de alienação - pois são responsáveis por ela - e comunicar nos quinze dias seguintes ao Ministro das Finanças e ao ministro da tutela não só a decisão em si, mas também as próprias condições de alienação, isto é, as condições de preço, por exemplo, se essa alienação foi feita por concurso público ou negociação particular, e a quem é que vendeu.
Se vendeu mal é evidente que teremos sobre isso o julgamento que a tutela e o Governo devem fazer. Agora não vamos é dizer, por um lado, que o princípio fundamental da nossa proposta de lei é o da liberdade negociai e da responsabilização das entidades participantes e, por outro, dizer que tais entidades nos devem comunicar a posteriori a decisão de alienação para que o Governo diga se devem ou não alienar.
Não e esta a filosofia que enforma a nossa proposta de lei; e a inversa ou quase inversa, Sr. Deputado. O poder e a responsabilidade da decisão pertencem à entidade participante. Sc fizerem mal, nós, a posteriori, estaremos presentes para retirar daí as devidas consequências. Mas, Srs. Deputados, não nos peçam para mudar a filosofia fundamental da nossa proposta, que seria precisamente retirar responsabilidade e autonomia de decisão às entidades participantes e tolher também a liberdade negocial.
Para que a entidade participante retire resultados patrimoniais e bom que haja liberdade negociai e responsabilidade da administração. E essa a nossa orientação fundamental, e não podemos ir contra ela.
O Sr. Deputado Raul Castro invocou o n.º 2 do artigo 83.º da Constituição. Devo dizer-lhe que no universo das participações do sector público, aquelas que estão abrangidas por este n.º 2 do artigo 83.º dizem respeito às pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas, fora dos sectores básicos da economia, em que os trabalhadores declarem que não optam pela autogestão ou pela transformação em cooperativas, pois nesses casos não poderemos proceder à alienação.
Mas, no universo das participações do sector público há ainda todas as outras que não decorrem das nacionalizações e não estão, portanto, sujeitas à restrição do n.º 2 do artigo 83.º
Voltando ainda a esta disposição da Constituição, ela permite excepcionar as pequenas e medias empresas indirectamente nacionalizadas que estejam fora dos sectores básicos da economia cujos trabalhadores não optem - como já referi - pela autogestão ou transformação em cooperativa. Deste modo, abre-se, de facto, um largo campo à alienação das participações, porque podemos considerar como excepção suficientemente justificativa o facto de essas participações em pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas exorbitarem do património normal da entidade participante, ou seja, estarem fora do seu objecto de exploração e, portanto, ser recomendável desinvestir para, como já disse, reinvestir naquilo que é essencial para a entidade participante.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a discussão da presente proposta de lei completa-se a apreciação do pacote legislativo que o Governo tem vindo a apresentar à opinião pública como sendo o pacote das privatizações.
Tivemos já oportunidade de denunciar a manobra propagandística que o Governo inevitavelmente iria lançar, tendo em vista esconder da opinião pública a sua incapacidade de governar em harmonia com as suas promessas eleitorais e a fragilidade da sua acção governativa, bem evidenciada nos meses já decorridos após as eleições de 19 de Julho.
Pressionado pela componente mais conservadora do seu eleitorado, que lhe exige o desmantelamento puro e simples do sector público da economia e a redistribuição dos despojos do mesmo por grupos de interesses bem definidos, o Governo escolhe a fuga para a frente e confronta a Assembleia da República, em vésperas de revisão constitucional, com um teste legislativo que eufemisticamente considera como sendo o processo de privatizações.
Mais uma vez se prepara o Governo para esconder o essencial com o acessório e uma vez mais se nega à opinião pública a oportunidade de uma discussão sensata, leal e enriquecedora sobre o sector empresarial do Estado.
Quando as iniciativas legislativas forem aprovadas pela Assembleia da República, e certamente o serão, o Governo dirá que iniciou as tão publicitadas reformas estruturais, e até o eventual voto negativo das oposições lhe servirá para, em momentos de aperto, clamar contra a obstaculização da instituição parlamentar.
Concorrerão então neste sentido a preparação que o Governo fez do debate nalguns meios da comunicação social, o aparato que lhe atribuiu e as conclusões que, necessariamente, lhe retirará, a menos importante das quais não será certamente a da subalternização do processo de revisão constitucional.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do Partido Socialista sobre privatizações é conhecida e por mais de uma vez tem sido apresentada na instituição parlamentar.
No entanto, se algumas dúvidas ainda se apresentam no espírito dos mais desatentos, remeto VV. Ex.ªs e a opinião pública para a leitura da nossa proposta de revisão constitucional.
Nela se contêm dois princípios fundamentais a que se deve subordinar o processo de modernização da sociedade portuguesa, que, a nosso ver, precede e condiciona a via das privatizações.
Esses princípios são, por um lado, o reconhecimento da necessidade da reversibilidade das nacionalizações do pós-25 de Abril e o imperativo da obtenção do consenso mais alargado possível para a consumação dessa reversibilidade.
Estes dois princípios tem subjacentes uma concepção de fundo que e a de alterar completamente o modo de enquadramento e gestão do sector empresarial do Estado, visando conferir-lhe eficácia instrumental para a modernização sócio-económica do País.
É em obediência a esta concepção que deve entender-se a nossa proposta de constituição de holdings de feição vertical que compatibilizem e promovam o aparecimento de grupos económicos dotados de dinâmica empresarial e capacidade de planeamento estratégico.
À luz desta concepção, as privatizações e alienações que necessariamente ocorrerão como consequência da dinâmica empresarial dos grupos económicos resultantes do sector empresarial do Estado não constituem um objectivo último da política do Partido Socialista.
Mas, por outro lado, as transferências de propriedade empresarial não podem ser simples negociatas e, muito menos, instrumento de desvalorização da necessária racionalização do sector público da economia.
Ora, o pacote de iniciativas legislativas do Governo, que hoje continuamos a apreciar, sendo, em si mesmo, um conjunto de propostas banalíssimas, tem exactamente o significado profundo da subversão da lógica e do tempo constitucionais e não assegura minimamente a igualdade de acesso de todos à alienação de participações ou partes sociais das empresas públicas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em perfeita consonância com tudo o que o Partido Socialista tem dito em matéria de privatizações, a nossa atitude perante as propostas de lei em apreciação será assumida em obediência aos critérios seguintes.
Em primeiro lugar, o que a Assembleia agora vier a aprovar não pode condicionar, limitar ou desvalorizar o processo de revisão constitucional quanto à organização económica.
Em segundo lugar, as alienações de parles do capital social de empresas actualmente públicas ou de participações em empresas privadas de entes públicos terão de subordinar-se à lógica da racionalização do sector empresarial do Estado ou à dinâmica empresarial dos entes públicos titulares das participações.
Neste sentido é particularmente preocupante o silêncio que o Governo mantém, mesmo quando já questionado, sobre o conjunto de alienações que concretizará na sequência da previsível aprovação das propostas legislativas em apreço.
Em terceiro lugar, imporia que seja respeitado o actual ordenamento constitucional, o que implica necessariamente a correcção das propostas apresentadas, para o que contribuirá o Partido Socialista com um conjunto de alterações significativas, cuja não aceitação pela maioria parlamentar visará a manutenção de um conluio sobre a constitucional idade da matéria, logo de um álibi para o Governo, que desde já se denuncia.
Em quarto lugar, é necessário que as leis aprovadas contenham mecanismos inequívocos de clareza e transparência insusceptíveis de transformar as eventuais alienações em operações especulativas, altamente lucrativas para certos grupos económicos bem identificados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 17/V, que visa a revisão do regime de participações do sector público, tem sido secundarizada na discussão e praticamente ignorada pela opinião pública.
Dir-se-á que, não estando aqui em causa empresas públicas, e, portanto, razoáveis centros de decisão económica e de concentração financeira, a importância do debate é secundária.
Veremos que assim não é.
A proposta parte do princípio de que a irreversibilidade as nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril de 1974 se aplica só às empresas e não às posições ou participações de entes públicos.
Daí que no seu artigo 1.º não se contemple qualquer sujeição ao regime previsto na Constituição. O PS não aceita a livre alienabilidade das posições ou participações delidas por entes públicos, e que foram objecto de nacionalização, pelo que considera que a proposta de lei n.º 17/V, na formulação do Governo, está ferida de inconstitucionalidade e não pode, consequentemente, ser aprovada.
Mas igualmente preocupante é o regime e os modos de alienação previstos.
A proposta de lei do Governo define três regimes de alienabilidade - concurso público, transacção em bolsa ou negociação particular -, aplicáveis em situações diversas, mas não distingue quando o destinatário, ou comprador da participação, é um particular ou é um ente público.
Quer isto significar que num número significativo de situações, que, aliás, se encontram previstas no articulado da proposta, a transmissão de propriedade para entidades particulares se poderia fazer através de simples negociação particular. Não podendo estar em causa o princípio da obtenção do melhor preço, que, aliás, mais facilmente se conseguirá através do concurso público ou da transacção em bolsa, a manutenção deste princípio retiraria ao processo de alienação das participações boa parte da clareza e da transparência e a garantia de livre acesso que, necessariamente, terão de o caracterizar.
Mais do que o domínio das empresas, o que está em causa com esta proposta de lei é a normalidade e a legitimidade dos negócios que ao seu abrigo se podem vir a realizar.
O Sr. Gameiro do Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Não podendo nem desejando pôr em causa as intenções do Governo, traduzidas na proposta de lei n.º 17/V, e em especial dos seus principais responsáveis, não nos tranquiliza o clima em que vem desenvolvendo-se diversos negócios de especulação, particularmente, bolsista, que constitui um péssimo augúrio para a aplicação, sem lugar a reparos, da lei a aprovar, se a mesma não vier, neste domínio, a ser profundamente alterada.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não rejeita liminarmente a proposta de lei n.º 17/V.
Na formulação do Governo, esta proposta ó, a nosso ver, claramente inconstitucional, mas este vício pode ser corrigido com a introdução dos necessários mecanismos correctores.
Preocupante é a falta de clareza e transparência do regime de alienabilidade proposto, que, a manter-se, não poderá merecer a nossa concordância.
Não contribuiremos, contudo, para a criação de álibis por parte do Governo. Assumiremos uma posição responsável e, nesse sentido, iremos propor em sede de especialidade, as alterações que, em nosso entender, se configuram necessárias para suprir aquela insuficiência.
Apresentarei de seguida na Mesa um conjunto de propostas que visam exactamente ocorrer e colmatar as lacunas que venho denunciando.
Compete ao Governo e à sua maioria demonstrar a boa-fé das suas intenções. Pela sua atitude, assumirá as correspondentes responsabilidades. O PS, por seu turno, assumirá as suas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro para formular pedidos de esclarecimento.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): -O Sr. Deputado Manuel dos Santos confundiu-me e, portanto, peço-lhe um esclarecimento.
Numa tentativa de minimização da relevância das propostas de lei n.ºs 17/V e 18/V, V. Ex.ª, salvo erro logo na primeira linha da sua intervenção, diz que, a propósito destas propostas, o Governo tem feito uma manobra de propaganda. Imediatamente, a seguir, V. Ex.ª diz que o que o Governo quer é o desmantelamento do sector público e, mais adiante ainda, diz que se trata de propostas banalíssimos.
O que lhe pergunto é o seguinte: São ou não relevantes estas propostas? Se o não são, e se se trata de uma mera manobra de propaganda do Governo, por que razão é que o PS se afadiga em apresentar propostas de alteração a estas leis?
Vozes do PSD: - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, há mais um orador inscrito para formular pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): -Sr. Deputado Manuel dos Santos, o seu discurso e semelhante àquele que o seu colega João Cravinho produziu aquando da discussão da proposta de lei n.º 18/V.
E, portanto, uma retomada requentada da mesma matéria. E é requentada porquê? Porque começou por se referir aos problemas de constitucionalidade. Esses problemas ficaram perfeitamente precludidos na semana passada, quando o meu colega Rui Machete fez uma intervenção em que procurou escalpelizar - procurou e conseguiu, com êxito! - o que se entendia por empresas directa e indirectamente nacionalizadas quando discutiu e analisou (sem que tivesse lido qualquer resposta das bancadas da oposição) o problema do artigo 83.º e o problema de como as empresas foram nacionalizadas.
Com esta intervenção ficou prefeitamente claro que, na realidade, as empresas não foram objecto de nacionalização do seu património, mas foram objecto de nacionalização pela via da titularidade ou do capital. Muito mais o meu colega Rui Machete disse na altura e surpreendentemente as bancadas da oposição -a do PS e a do PCP- não reagiram às questões da constitucionalidade. Inclusivamente, o Sr. Deputado José Magalhães, quando respondeu, colocou a questão numa área completamente distinta, o que foi para nós uma grande surpresa e, efectivamente, o reconhecimento de que a questão da constitucionalidade e a dos artigos 83.º, 89.º e 290.º estão perfeitamente claras.
Relativamente à actuação do PS na discussão sobre esta matéria, devo dizer que tal actuação ainda em surpreende mais porque o PS foi o grande responsável pela circunstância de, na sessão legislativa passada, ter constado na Lei Orçamental para 1987 o artigo 88.º, que é perfeitamente aberrante e limitativo, pois é um artigo que não tinha sentido absolutamente nenhum. Posteriormente, o próprio PS reconheceu o erro - aliás, explicarei isso em detalhe na intervenção que farei mais tarde- e, depois de o reconhecer, tentou dar a volta e corrigi-lo. Simplesmente, tentou corrigi-lo tarde e a más horas. E tarde e a más horas foi a Lei n.º 27/87 aqui aprovada nesta Assembleia...
Felizmente que agora temos uma proposta de lei coerente, capaz e justa pura a resolução desta matéria.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - É sempre com muito gosto que sou interpelado pelos Srs. Deputados da bancada do PSD, particularmente pelos Srs. Deputados Vieira de Castro e Guido Rodrigues.
Começaria por responder ao Sr. Deputado Guido Rodrigues, porque, no fundo, não me colocou grandes questões, teceu apenas algumas considerações, e, portanto, a resposta é mais fácil.
Em primeiro lugar, todos nós em geral, e eu em particular, respeitamos a competência, em matéria constitucional, do Sr. Deputado Rui Machete, mas que eu saiba ele não é o Tribunal Constitucional. A Assembleia da República, em primeiro lugar, por maioria, e depois o Tribunal Constitucional - e outras instâncias, naturalmente- é que dirão a verdadeira interpretação das normas constitucionais.
Não ouvi a intervenção do meu camarada João Cravinho, porque nessa altura participava num debate na Rádio Comercial, e, portanto, não se trata de uma cópia dessa intervenção. No entanto, é bom que assim tenha sucedido, porque prova que somos um partido coerente, onde as pessoas pensam nas questões essenciais de maneira semelhante, embora divirjam, por vezes, nas questões acessórias.
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Isto é uma questão essencial e é bom que tenha sido este o entendimento que o meu camarada João Cravinho veiculou quando aqui interveio a propósito da discussão da proposta de lei n.º 18/V.
Como lhe digo, a questão fundamental, em termos de constitucionalidade, não se põe na eventual brilhante lição teórica -também não assisti a essa intervenção, pelos mesmos motivos que atrás referi - que aqui terá dado o Sr. Deputado Rui Machete, colocar-se-á em sede própria, sobretudo em sede de Tribunal Constitucional.
De resto, nem sequer esta nossa interpretação em relação à pretensa inconstitucionalidade desta matéria constitui um dado novo, na medida em que sempre o fomos dizendo ao longo dos tempos, pois a nossa interpretação é substancialmente diversa da do Sr. Deputado Rui Machete.
De algum modo, a nossa proposta de revisão constitucional parte exactamente deste pressuposto, isto é, do pressuposto que há, nestes termos, violação da norma constitucional.
Gostaria mais de ouvir o Sr. Deputado e o seu colega de bancada responderem-me às questões que coloquei e darem o seu ponto de vista relativamente à disponibilidade da bancada que apoia o Governo - e quero lembrar o que às vezes e muito esquecido, ou seja, que são os senhores que aprovam as leis e não o Governo- e, por exemplo, aceitar inserir uma referencia à Constituição. Aliás, é nesse sentido que a nossa proposta de alteração ó apresentada quando diz «nos termos da presente Lei e da Constituição»-é mais ou menos assim, posso lê-la, mas talvez não valha a pena perder tempo. Pergunto-lhe, Sr. Deputado, até que pomo estão ou não VV. Ex.ªs dispostos a aceitar essa alteração, que já seria, a nosso ver, um mecanismo suficiente para suprir as interpretações de eventual inconstitucionalidade que esta proposta de lei tem.
Penso que não me colocou mais nenhuma questão, mas falou-me no passado, tal como o fez num outro dia num debate em que ambos participámos e em que respondi como lhe vou responder agora: só sou responsável pelo passado do meu partido na medida em que sou solidariamente ulular com um património comum, mas também não estou estaticamente agarrado ao passado. O que seria dos senhores se lhes lesse - não vou cometer essa crueldade, embora tenha aqui comigo o documento- o comunicado n.º 51, em que VV. Ex.ªs saúdam efusiva e revolucionariamente a nacionalização da banca feita na oportunidade? ...
Risos do PS, do PCP e da ID.
Protestos do PSD.
O Orador: - Srs. Deputados, tenho aqui o comunicado, e se for preciso leio-o! Tem o n.º 51.
É óbvio que não cometo a injustiça de pensar que VV. Ex.ªs pararam no tempo. VV. Ex.ªs não pararam no tempo, evoluíram. Em meu entender, evoluíram mal, mas evoluíram!
O Sr. Cuido Rodrigues (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado. Tenho muito gosto em o ouvir!
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Efectivamente estamos em matérias de tal maneira distintas que não me atrevo a comentar a afirmação do Sr. Deputado.
Estamos a tratar defuma matéria que tem um carácter nitidamente técnico. É evidente que também tem um carácter constitucional, mas, depois desse carácter constitucional, tem uma vertente nitidamente técnica, e não me atreveria a fazer afirmações dizendo que a técnica numas situações funciona de uma maneira e noutras funciona de maneira contrária. De qualquer forma, muito obrigado pela informação.
O Orador: - Já percebi que V. Ex.ª é partidário da teoria de que a técnica é neutral, eu não o sou propriamente. A técnica é comprometida, mas isto é um assunto que daria uma longa discussão que poderíamos ter noutra oportunidade - e teremos, com certeza, ao longo dos muitos dias em que vamos conviver.
Em relação ao Sr. Deputado Vieira de Castro, devo dizer com toda a franqueza que não vejo - não vejo tudo, não tenho as qualidades de alguns governantes do País - onde é que esteja a contradição nos diversos planos em que fiz a apreciação desta proposta de lei.
Uma voz do PSD: - É falta de vista!
O Orador: - Procurei situar esta proposta de lei num conjunto, num pacote que nos foi aqui apresentado, e não a situei, por isso, desgarrada. De alguma maneira, ale a própria comunicação social tem permitido que essa imagem tenha passado com alguma evidencia, pois as primeiras páginas dos jornais ululam «privatizações na Assembleia da República» ou «processo das privatizações em marcha», ele. É verdade que há aqui, efectivamente, a criação de uma realidade que é, no mínimo, uma realidade, digamos, incompleta, e foi exactamente isso que eu disse. E relevante na medida em que, de algum modo - pelo menos parece-me-, se procura fazer doutrina em matéria de revisão constitucional e condicionar a própria revisão constitucional. Portanto, nesse sentido é relevante.
Quanto ao que eu disse sobre a manobra do Governo, isso foi uma referencia que já aqui enunciei noutra oportunidade, e é evidente que o Governo está pressionado à sua direita e à sua esquerda por forças sociais de sentido oposto. É, pois, natural que procure, na fuga para a frente, a resolução de alguns problemas que não pode resolver de outra maneira.
Em relação à referencia às propostas banalíssimas - não diria banalidades, até porque, sabendo da proveniência deste diploma, não podia falar em banalidades -, queria dizer com isso propostas simples, propostas de entendimento técnico fácil. Isto não tem nenhuma contradição, é um plano completamente diferente. Do ponto de vista político, pode-se estar perante uma realidade relevante ou perante uma realidade que constitui uma manobra eleitoral determinada e, no entanto, tecnicamente tratar-se de questões banais, isto é, simples ou facilmente entendíveis. Não há, pois, aqui nenhuma intenção de memorizar a proposta que foi apresentada.
No entanto, gostaria de ouvir da bancada que suporia o Governo pronunciar-se sobre as propostas de alteração que enterguei na Mesa e que, naturalmente, se ainda não foram distribuídas, sê-lo-ão a muito curto prazo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Guido Rodrigues para uma intervenção, o Sr. Secretário vai ler os resultados do acto eleitoral realizado hoje, entre as 14 e as 18 horas, na Sala de D. Maria.
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O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - São os seguintes:
Acta da eleição de um Secretário e dois Vice-Secretários da Mesa da Assembleia da República
Aos 2 de Fevereiro de 1988 realizou-se numa das salas do Palácio de São Bento o acto eleitoral mencionado em epígrafe, tendo-se apresentado a sufrágio os seguintes candidatos:
Secretário da Mesa - Daniel Abílio Ferreira
Bastos; e
Vice-Secretários da Mesa - João Domingos
F. Abreu Salgado e Rui José dos Santos
Silva.
Entraram nas urnas 248 votos, assim distribuídos:
Daniel Abílio Ferreira Bastos
João Domingos F. Abreu Salgado
Rui José dos Santos Silva
Votos
sim
Votos
Não
Votos de
Abstenção
Votos
brancos
Votos
nulos
167
157
140
48
55
51
18
20
35
15
16
21
-
-
1
Verifica-se, assim, que todos os candidatos receberam o número de votos suficientes à respectiva investidura.
Acta da eleição de um vogal para o conselho directivo do Grupo Português da UIP
Aos 2 de Fevereiro de 1988 realizou-se numa das salas do Palácio de São Bento o acto eleitoral mencionado em epígrafe, tendo-se apresentado a sufrágio o candidato Cuido Orlando de Freitas Rodrigues.
Entraram nas urnas 248 votos, assim distribuídos:
Votos a favor- 158;
Votos não - 57;
Votos de abstenção 16;
Votos brancos -17;
Votos nulos - 0;
pelo que o candidato recebeu o número de votos suficientes à respectiva investidura.
Acta da eleição de dois juizes para o Tribunal Constitucional
Aos 2 de Fevereiro de 1988 realizou-se numa das salas do Palácio de São Bento o acto eleitoral mencionado em epígrafe, tendo-se apresentado a sufrágio uma lista com os seguintes candidatos:
Rui Alfredo Tato Marinho; e
Vítor Manuel Neves Nunes de Almeida.
Verificou-se que entraram nas umas 248 votos, assim distribuídos:
Rui Alfredo Tato Marinho
Vítor Manuel Neves Nunes de Almeida
Votos
sim
Votos
brancos
Votos
nulos
148
140
97
105
3
3
pelo que nenhum dos candidatos recebeu o número de votos suficiente para a sua investidura.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cuido Rodrigues.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A revisão do regime de alienação de participações do sector público impunha-se face às realidades actuais.
Não podemos esquecer que a grande maioria das participações sociais do sector público resultaram directamente das nacionalizações de 1975 e, nos anos entretanto decorridos, a clara manifestação de vontade do povo português em numerosas eleições demonstrou à saciedade o apoio inequívoco àqueles que defendiam e se propunham implementar no País uma política que considerava e contava com a iniciativa privada como principal força motora do desenvolvimento económico, técnico e tecnológico da Nação.
Havia que concretizar mais esta reforma estrutural, cumprindo as promessas eleitorais feitas ao povo português nas eleições de 19 de Julho passado.
Para além desta razão, por si mais que suficiente para que o Governo proponha à Assembleia a apreciação de legislação coerente sobre a matéria, outras razões o justificam sobejamente, razões que tem a ver como esta matéria foi introduzida de forma anómala no Orçamento do Estado para 1987, na Lei n.º 49/86, ficando a constituir o seu artigo 88.º
Com efeito, o artigo 88.º da lei orçamental para 1987 referia que o regime de alienação de participações do Estado ou de qualquer fundo autónomo, instituto público, instituições de segurança social, empresas públicas ou sociedades de capitais públicos no capital de sociedades seria estabelecido por decreto-lei, o qual asseguraria que o mesmo se processasse exclusivamente mediante concurso público e sob proposta do conselho de gestão competente.
Era perfeitamente óbvia a aberração deste texto se tivermos em conta, como é sabido, que existiam participações do Estado ou dos entes públicos mencionados (como se disse, quase todas com origem em Março de 1975) em centenas e centenas de empresas, a maioria das quais PME, participações na maior parte dos casos minoritárias mas em cerca de 350 empresas essas participações são maioritárias. E que havia e há entes públicos como o IPE que constantemente efectuam essas transacções e cujos estatutos já regulavam expressamente o regime de alienação de participações.
Sujeitar as alienações destas participações a concurso público era perfeitamente impraticável e o texto do artigo 88º só pode ser compreendido como um articulado bloqueante e impeditivo das transacções das participações. Além disso, obviamente, a exigência de decreto-lei visava que a Assembleia com a composição da IV Legislatura pudesse discutir e inviabilizar as transacções caso a caso.
É um articulado estatizante, de retrocesso, travão. É a estratégia estatizante, embora encapotada, a estratégia de nada beliscar no âmbito do sector público.
O Partido Socialista compreendeu tarde de mais as razões que referi ouvindo os clamores dos seus técnicos e gestores: verificou que se tratava de um lapso imperdoável mesmo para quem defende a estatização como princípio sagrado. Então assistimos ao afã do Partido Socialista na Comissão de Economia, Finanças e Plano, tentando encontrar textos que pudessem merecer a aprovação dos seus compagnons de roule na aprovação do artigo 88.º Tarefa difícil, por ter de contentar gregos e troianos e principalmente não desdizer o que havia dito e votado em Dezembro de 1986. Em Março de 1987, apesar do contributo dado pelo Governo com a
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publicação do Decreto-Lei n.º 148/87, a Assembleia da República aprova a Lei n.º 27/87, de 29 de Junho, que representa uma tímida abertura ao regime estabelecido no artigo 88.º: liberta do condicionalismo do concurso público somente as participações minoritárias globais dos entes públicos nas sociedades e tem em conta a situação de instituições como o Investimentos e Participações do Estado.
No entanto, retoma uma nova limitação que linha escapado aos autores do artigo 88.º: impõe que nas alterações do capital social das empresas participadas pelo Estado o Estado mantenha sempre a «sua posição relativa em relação à totalidade do capital social»! (Para além da frase plcnástica, é de meditar nesta afirmação.)
Continuava-se no fundo a desejar paralisar os actos mais corriqueiros de pura administração das empresas.
Fiz esta resenha retrospectiva para que os Srs. Deputados, especialmente os mais novos no Parlamento e que não viveram estes eventos, possam avaliar, por si próprios, como se impunha retomar esta matéria, legislando com coerência, lógica e transparência.
É o que o Governo fez, apresentando à Assembleia da República a proposta de lei n.º 17/V.
Na proposta estabelecem-se definições conexas com o articulado de forma a evitar as interpretações divergentes e por vezes contraditórias que são utilizadas pelos especialistas das áreas económica e financeira. Fica perfeitamente claro o que se entende por participações maioritárias e minoritárias, bem como participações públicas e entes públicos.
A proposta estabelece o regime geral de alienação das participações, com as possibilidades de concurso público, transacção na Bolsa ou negociação particular. Estabelece ainda que a forma de alienação será aquela que seja mais favorável aos interesses dos entes públicos envolvidos, ou seja obviamente o Estado: poder-se-ão alienar as acções ou quotas sociais no todo ou em parte, em bloco ou separada e parcialmente.
Salvaguarda tudo aquilo que o Estado entenda dever salvaguardar: o artigo 6.c da proposta de lei estabelece inequivocamente que, por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do ministro da tutela do sector de actividade da empresa participada, poderá ser determinada a inalienabilidade total ou parcial de qualquer participação pública, seja ela maioritária ou minoritária. E, no caso de qualquer ente público detentor de participações sociais cuja inalienabilidade tiver sido decidida pelo Governo, desejar por razões de gestão empresarial a sua alienação, poderá requerer ao Estado que as adquira ou que autorize a venda a outros entes públicos.
Acautela ainda a forma de alienação de participações maioritárias em sociedades participadas de valor superior a 500 000 contos: só poderá ser realizada por concurso público ou transacção na bolsa de valores. Faz-se assim corresponder esta forma de alienação obrigatoriamente às chamadas grandes empresas ou médias/grandes, no segmento médio/grande.
Para as participações maioritárias em sociedades participadas de situação líquida inferior a 15 000 contos (médias e pequenas/médias empresas) e para as participações minoritárias, qualquer uma das formas de alienação previstas no regime geral será aceitável.
Acautela ainda exemplarmente os interesses do Estado quando se verifique a existência de várias participações minoritárias de entes públicos na mesma sociedade das quais resulte uma participação majoritária do Estado: a forma de alienação será obrigatoriamente, para as grandes empresas, por concurso público ou transacção na Bolsa, e para as PME por qualquer das formas permitidas pelo regime geral.
No artigo 5.º da proposta o Estado atribui liberdade de actuação aos órgãos de gestão das empresas ou entes públicos alienantes, como aliás é imprescindível, evitando interferências tutelares paralisamos, mas responsabiliza-os simultaneamente pelas decisões de alienação de participações maioritárias ou equivalentes, obrigando-os a fundamentar a decisão, bem como a especificar o processo de alienação e as condições da transacção e a comunicar ao Governo imediatamente todo o processo.
A proposta exceptua de concurso público a alienação das participações, mesmo que maioritárias, quando os adquirentes sejam trabalhadores do ente público alienante ou da sociedade participada.
Isenta igualmente das exigências do regime geral a alienação de participações, mesmo que maioritárias, quando os entes públicos alienantes sejam entidades cujo diploma de criação expressamente disponha sobre o regime de alienação de acções e quotas sociais, como é o caso do IPE, as empresas seguradoras, as instituições de crédito no que se refere aos elementos da rubrica «acções, obrigações e quotas», e ainda as sociedades de investimento, fundos de pensões, sociedades de capital de risco, etc., cujo objecto seja a compra e venda de acções ou quotas.
A aprovação da proposta de lei n.º 17/V na Assembleia da República irá permitir a flexibilização da gestão empresarial das empresas públicas ou entes públicos, actualmente manietados por possuírem activos inertes, dos quais não podem dispor mesmo quando toda a gestão estratégica apontasse para a sua alienação com vista à realização de meios financeiros a aplicar na actividade directamente produtiva das empresas. Simultaneamente responsabiliza por tais actos directamente os órgãos de gestão.
Permite também a transparência das alienações, impondo para as grandes empresas o concurso público ou a transacção na Bolsa para participações maioritárias ou minoritárias que agrupadas se transformem nas primeiras. Permite ainda acautelar os respectivos interesses do Estado quando eles, na realidade, forem de acautelar; estabelece concretamente a inalienabilidade não por omissão mas por acto volitivo, expresso.
É em suma, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, um documento necessário, clarificador, prudente, justo. Insere-se na linha de orientação que o Governo do Prof. Cavaco Silva definiu para as áreas sócio-económicas: «ter menos Estado e simultaneamente melhor Estado».
É igualmente um documento que, pela importância dos seus conceitos e praxis, nos fax reflectir sobre o que deverá ser a próxima revisão constitucional nas matérias económicas, para dar corpo aos desejos expressos pelo povo português nas últimas eleições. É também nesta óptica que visa o futuro, que visa a revisão constitucional que o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata encara a matéria contida na proposta de lei n.º 17/V e lhe dá o seu pleno apoio.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado Cuido Rodrigues, vou tentar colocar uma questão que há pouco coloquei ao Sr. Ministro e que julgo ser essencial. Veremos se, em termos de resposta, desta vez lerei mais sorte.
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O Sr. Deputado referiu claramente -e bem- que a grande maioria das participações sociais do sector público decorreram das nacionalizações posteriores ao 25 de Abril. Por outro lado, a alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º da proposta de lei diz o seguinte: «participações sociais: todas e quaisquer acções ou quotas sociais representativas de parte de capital [...]» (todas e quaisquer). A questão que lhe coloco é: do seu ponto de vista, esta proposta de lei é aplicável -não estou a dizer que vai ser aplicada- a todas e quaisquer participações sociais que estejam na posse dos entes públicos? Posso colocar-lhe a questão de outra maneira: o Sr. Deputado referiu que existem participações maioritárias, neste momento, da ordem das 350. Essas 350 participações maioritárias são passíveis de aplicação desta proposta de lei, se vier a ser aprovada?
Na parte final, o Sr. Deputado referiu que havia empresas que tinham activos incites de que não podem dispor. Qual ó a grilheta que, neste momento, impede as empresas, quaisquer que elas sejam, de dispor desses activos e que esta proposta de lei vem permitir? Essa grilheta é apenas o texto constitucional ou é qualquer um desses decretos ou portarias que o Governo pretende revogar? Isto é uma questão essencial.
Sr. Deputado, peço-lhe que não confunda o Programa do Governo com a Constituição. Isto é: não pense que o Programa do Governo -independentemente da posição que tenhamos sobre ele -se pode sobrepor à Constituição.
O segundo pedido de esclarecimento que lhe faço, Sr. Deputado, é que, do ponto de vista constitucional, não chame à colação o seu colega Rui Machete apenas por uma razão: porque ele não está cá e não se pode defender.
O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Deputado Guido Rodrigues, quero perguntar-lhe o seguinte: Posso, eventualmente, ler entendido mal, o que não creio, mas, se o fiz, peço as minhas desculpas. O senhor disse que o Partido Socialista é um partido que faz da estatização um princípio sagrado? Se V. Ex.ª disse isso, não entendeu nada das intervenções que temos vindo a efectuar nos últimos tempos, não tem seguido a vida do nosso partido, não tem assistido aos inúmeros documentos teóricos e práticos que temos produzido sobre essa matéria, e, francamente, nem sequer em regra de discussão parlamentar me parece muito correcto fazer esse tipo de afirmação.
O Sr. Filipe Abreu (PSD): - Nas campanhas eleitorais!
O Orador: - As campanhas eleitorais, Sr. Deputado, foram todas realizadas com base no programa eleitoral que se intitulou «Para um Portugal moderno e solidário» e desafio-o a descobrir, aqui, onde é que está a estatização como um princípio sagrado para o Partido Socialista.
O Sr. Filipe Abreu (PSD): - Está a ler ao contrário!
Vozes do PCP: - Não sabe ler! Tem de aprender a ler!
O Orador: - Isso não é uma questão política, é uma questão elementar - digamos - de interpretação.
Posto isto - e tenho a certeza que o Sr. Deputado Guido Rodrigues não usará do primarismo do seu colega de bancada-, apresento-lhe duas questões muito concretas: o Sr. Deputado pensa que não existem participações minoritárias que tenham mais importância do que as participações maioritárias, mesmo que essa importância não seja medida pelo quantitativo ou pelo valor que for atribuído a essas participações? Não julga que há participações minoritárias situadas em determinados sectores propiciadores de negócios de oportunidade que têm muito mais importância e, portanto, a sua transacção deve ser mais transparente e clara do que participações maioritárias?
Segunda questão: pensa o Sr. Deputado que e indiferente que a transmissão de propriedade se faça para privados ou para outros entes públicos e que os regimes lerão de ser exactamente os mesmos? Não lerá que haver alteração, não terá que haver diferenciação quando a transmissão de propriedade se faça para interessados privados ou para outros entes públicos? Pensa que deve ser aplicado exactamente o mesmo regime quando está em causa a possibilidade de a participação ser comprada por uma entidade privada e quando está em causa, em contrapartida, a possibilidade de a participação ser comprada por um outro ente público?
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carneiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Sr. Deputado Guido Rodrigues, no início da intervenção, ao justificar a proposta de lei, o Sr. Deputado referiu que se estava em presença de uma...
O Sr. Presidente: - Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, mas é que houve um lapso: o Sr. Deputado não pode pedir esclarecimentos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, a Câmara ficou a saber que o Sr. Deputado Gameiro dos Santos não pode formular um pedido de esclarecimento, pelo que gostaria de saber porquê.
O Sr. Adérito Campos (PSD): - Porque não se inscreveu a tempo. Só agora é que o fez!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, embora não tenha sido seguida estritamente a regra, a razão é esta: o Sr. Deputado Guido Rodrigues fez um intervenção. Pois bem, a Mesa teve conhecimento dos pedidos de palavra dos Srs. Deputados Octávio Teixeira e Manuel dos Santos e o Sr. Deputado Carneiro dos Santos só se inscreveu - aliás, isso foi notório- quando o Sr. Deputado Manuel dos Santos estava a usar da palavra, isto é, já muito depois do termo da intervenção do Sr. Deputado Guido Rodrigues.
Em todo o caso, para não complicar o debate dou a palavra ao Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - O Sr. Deputado Guido Rodrigues, no início da intervenção, disse que a proposta de lei visava uma autentica reforma estrutural. Já ouvimos dizer isto há muito tempo - aliás, este foi um dos motivos invocados pelo PSD para romper com o bloco central -, mas o que acontece e que o PSD ganhou as primeiras eleições em Outubro de 1985 e só agora, volvidos mais de dois anos, e que parece que aparece a primeira reforma estrutural.
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O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Essa é de um desplante!
O Orador: - Dá-me a impressão de que estou a incomodar alguém e não sei porquê!
O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Porque o Sr. Deputado está a mentir!
O Orador: - Sr. Deputado Guido Rodrigues, em primeiro lugar, gostaria de saber se lhe parece que está em presença de uma autêntica reforma estrutural e porquê. Em segundo lugar, pergunto: se no seu entender isto é uma autêntica reforma estrutural, por que razão e que ela só aparece dois anos depois de o PSD estar no Governo?
O Sr. António Vitorino (PS): - Estavam distraídos!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço imenso as perguntas porque me permitem expor um pouco mais o meu pensamento sobre esta matéria, que é estrutural e importante.
O Sr. Deputado Gameiro dos Santos não acha que alienar bens que, em grandes casos, são pesos monos nas empresas, que são, tal como disse há pouco, activos inertes, que não estão directamente relacionados nem com a produção nem com a actividade da empresa é perfeitamente legítimo e desejável, em termos de gestão empresarial? Se, porventura, o Sr. Deputado gerisse uma empresa e tivesse um terreno ao lado que não lhe servia para nada, mas que podia ser urbanizado, não acha que o devia vender para potenciar a sua empresa, para a expandir?
VV. Ex.ªs podem pensar que esta matéria não é estrutural, mas na realidade é-o. É evidente que esta proposta de lei não teria muito sentido se aparecesse isolada, se aparecesse não tendo antes ocorrido a discussão da proposta de lei n.º 18/V, sendo essa o núcleo desta reforma estrutural. Contudo, a proposta de lei agora em debate também tem a sua importância, que é grande.
Ao Sr. Deputado Octávio Teixeira tenho de responder com a maior franqueza...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É isso que quero!
O Orador: - ... - aliás, é isso que espera de mim e conhece-me já há uns poucos de anos - que não tenho dúvida nenhuma de que, nos termos do artigo 83.º, n.º 2, da Constituição, as participações das pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas podem perfeitamente ser alienadas.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não perguntei sobre a Constituição, mas sobre a proposta de lei!
O Orador: - Não tenho dúvida absolutamente nenhuma disso. Agora, quanto ao resto, Sr. Deputado, quanto à base da matéria foi aqui feita, na passada semana, pelos constitucionalistas essa análise, por uma forma que fiquei perfeitamente espantado, perfeitamente surpreso.
O Sr. Deputado José Magalhães não se encontra presente e V. Ex.ª falará com ele sobre a matéria, mas o Sr. Deputado José Magalhães mudou completamente o rumo da discussão,...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quem mudou foram os senhores!
O Orador: -... não rebateu absolutamente nada do que o Sr. Deputado Rui Machete afirmou sobre o problema da constitucionalidade; o Sr. Deputado José Magalhães colocou a matéria no campo estritamente político, no campo daquilo que estamos habituados a ouvir do Partido Comunista.
Portanto, Sr. Deputado Octávio Teixeira, quanto à constitucionalidade não me meto, não meto «foice em seara alheia»!...
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Nem se meta. Já se meteram seis homens do seu partido e todos fizeram asneira!
O Orador: - O Dr. Rui Machete não se pode defender por não estar presente, mas eu nada disse que fosse diferente daquilo que o Sr. Deputado Rui Machete referiu.
Quanto ao princípio sagrado da estatização referido pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos, lembro que o Partido Socialista tem afirmado variadíssimas vezes que não defende à outrance a estatização; mas isso é o que ele declara. Na prática, o Partido Socialista aprovou o artigo 88.º da Lei do Orçamento do Estado para 1987. Ora, o que é isso senão uma tentativa de bloqueamento e de estatização? Não é mais do que isso, Sr. Deputado!
Não é preciso ir muito longe: a proposta que o Partido Socialista apresentou como alternativa à proposta de lei n.º 18/V tem, no fundo, um carácter estatizante.
O Partido Socialista quer fazer as privatizações englobando no capital que foi inicialmente nacionalizado em 1975 tudo o resto e dizendo que as privatizações só se podem fazer através do aumento de capitais. O que o Sr. Deputado está a fazer é, pura e simplesmente, a inviabilizar ou a querer inviabilizar todo esse precesso. O que é isso senão estatização? Uma coisa é a teoria, é o Partido Socialista dizer que teoricamente defende tudo isso; outra coisa é a prática, e eu, na realidade, não vejo nada disso.
Vozes do PSD: - Essa é que é a verdade! Muito bem!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - É bom ler a proposta!
O Orador: - O Sr. Deputado Manuel dos Santos fez-me uma pergunta à qual responderei com muito prazer. Pergunta o Sr. Deputado se o Estado vai abdicar de todos os seus direitos relativamente a participações mesmo minoritárias, isto porque há participações minoritárias que, apesar de o serem, têm uma importância extraordinária. Se olhar para o artigo 6.º, n.º 1, da proposta de lei, verificará que o Ministro das Finanças e o ministro da tutela do sector da empresa participada poderão determinar a inalienabilidade, total ou parcial, de qualquer participação, Sr. Deputado. Sc for essa tal participação minoritária, magnífica, extraordinária, de grande interesse estratégico, sem dúvida nenhuma que o Estado irá fazer isso; é evidente que o Sr. Ministro das Finanças, que está presente, e o Sr. Ministro da Tutela irão fazer isso.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Tem-se visto!
O Orador: - O Estado terá de acautelar os seus interesses e continuar a tutelar os entes públicos.
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Simplesmente, tutelar não é fazer imobilizar os entes público, mas, sim, atribuir responsabilidades, é permitir que os órgãos de gestão, efectivamente, façam gestão. No fim de contas, não é nada do que se passa nas economias planificadas, como o Sr. Deputado sabe.
Quanto ao saber se é ou não indiferente que a alienação seja feita para privados ou para públicos, devo dizer que, em nosso entender e no meu pessoalmente, as regras do jogo são exactamente as mesmas, são lineares, claras, perfeitas. Por que razão é que as regras hão-de ser diferentes para os privados e para os públicos? Em meu entender, alienar uma participação privada ou pública é exactamente a mesma coisa.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Prejuízo para o Estado e lucros para os capitalistas!
O Orador: - VV. Ex.ªs estão em desacordo comigo. Eu ate ficava preocupadíssimo se não estivessem, porque julgava que «estava a meter o pé na argola».
Ao Sr. Deputado Carneiro dos Santos tenho a impressão de que já respondi.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Por acaso, não respondeu, Sr. Deputado!
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, é para fazer um protesto agradável e risonho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apesar do fim-de-semana, estamos um pouco cansados. Primeiro, há um barulho excessivo na Câmara; segundo, temos de seguir algumas regras de sistemas.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente, ficava extremamente preocupado se porventura algumas das minhas afirmações tivessem merecido o protesto do Sr. Deputado Manuel dos Santos. De certeza que não mereceram, pois nada do que eu disse podia ter merecido.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado não está a fazer uma interpelação à Mesa. Estamos a começar a «derrapar» nos temas.
Vamos continuar o debate seriamente e, antes de procedermos à votação da proposta de lei n.º 18/V, dou a palavra ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, para uma intervenção.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de já ter sido objecto de um primeiro debate, continua por esclarecer pelos proponentes a questão fundamental da proposta de lei n.º 17/V, que visa o regime de alienação das participações sociais do sector público. Embora já o pudessem e devessem ter feito anteriormente, eventualmente poupando tempo e energias a esta Assembleia, importa que o Governo e o PSD clarifiquem hoje a questão do âmbito desta proposta de lei.
Que participações pretende o Governo sujeitar ao regime que agora propõe? Quaisquer participações do sector público como resulta da letra da proposta de lei? Ou pretende abranger, tão-só, as participações que não decorrem das nacionalizações, directas e indirectas, verificadas depois do 25 de Abril de 1974? Esta clarificação é não só inadiável como fulcral.
Se o que o Governo pretende é abranger todas as participações do sector público, como inegavelmente decorre da proposta de lei, estaremos perante uma insofismável e grosseira inconstitucionalidade, a que a Assembleia da República deve pôr imediato ponto final, rejeitando-a.
Na verdade, se há matéria em que se verifica uma prática unanimidade entre os constitucionalistas, esta é uma delas. Na verdade, «do ponto de vista constitucional [...], é certo e seguro serem inalienáveis as acções que tenham advindo ao sector público por nacionalização [...] Isto vale, em princípio, tanto para as nacionalizações directas como para as nacionalizações indirectas. A regra constitucional da irreversibilidade [...] é formulada indiscriminadamente paru ambas as espécies de nacionalização; e a excepção consignada no n.º 2 do artigo 83.º da Constituição é subordinada a um tríplice condicionalismo - para além duma quarta exigência: a título excepcional [...]». Citei o Dr. José Simões Patrício, como poderia citar, no mesmo sentido, muitos outros constitucionalistas. Aliás, no debate há poucos dias aqui realizado sobre esta proposta de lei, foi essa a posição assumida por todas as bancadas, incluindo o Sr. Deputado Mário Raposo, da bancada apoiante do Governo, ao afirmar, designadamente, que esta proposta de lei não pode abranger as participações maioritárias decorrentes das nacionalizações (directas e indirectas).
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso mesmo!
O Orador: - Mas, se a intenção do Governo e do PSD não é a que resulta do texto da proposta de lei, impõe-se que isso fique claro através de um texto reformulado, ou das necessárias propostas de alteração, que afastem de forma inequívoca o vício da inconstitucionalidade.
Lançamos-lhes o repto para que o façam! Aqui e agora, pois é este o local próprio e o último momento oportuno para o fazerem. Só então fará sentido discutir as soluções para o regime de alienação - a título excepcional e desde que os trabalhadores não optem pela auto-organização - das participações sociais indirectamente nacionalizadas em pequenas e médias empresas fora dos sectores básicos da economia, pois só estas estão possibilitadas pelo texto constitucional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contrariamente ao referido no parecer da 1.ª Comissão sobre o recurso de admissão, a proposta de lei n.º n.º 17/V não visa «ordenar melhor e clarificar o regime de alienação de participações públicas». A proposta de lei introduz sensíveis e negativas alterações ao regime actual estabelecido no artigo 88.º da Lei n.º 49/86 e nas Leis n.ºs 26/87 e 27/87.
Revela-se oportuno relembrar a motivação desses dispositivos legais, afinal os únicos que hoje conformam o regime de alienação de participações públicas, já que todos os outros foram por eles revogados. Motivação ditada pela necessidade de «um regime de enquadramento que garanta efectivamente a transparência e a equidade dos negócios de alienação», assim evitando «os abusos que, mesmo localizados, alimentarão um clima de suspeição e impulsionarão tendências negocistas à custa do erário público». Necessidade essa suscitada, nomeadamente, por uma portaria do Ministro das Finanças que introduzia duas novas
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modalidades de transacção de participações públicas não só «permissíveis de situações iníquas tendentes a conferir a alguns privilegiados o acesso à função empresarial sem risco», como sem paralelo em quaisquer normas de direito comum reguladoras de negócios de direito privado. Era aquilo que em linguagem comum se costuma designar por um «negócio das arábias».
Não sabemos quantos desses «negócios» se realizaram (e importaria que o Governo nos informasse desses negócios e dos beneficiados). O que parece claro, pelas notícias ultimamente vindas a público, é que a concessão de privilégios iníquos e abusivos aumenta. É incompreensível que o Ministro das Finanças determine a instauração de um inquérito às OPVs de um grupo económico e se declare, desde logo, certo de que o resultado do inquérito absolverá esse mesmo grupo.
Por isso, perguntamos hoje ao Governo aqui representado: primeiro: que conhecimento tem o Executivo desse negócio para fazer tal afirmação?
A Sr. Ilda Figueiredo (PCP): - Muito boa pergunta!
O Orador: - Segundo: que razões levaram o Ministro a determinar uma reunião, prévia à realização dessas OPVs, entre o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e o presidente desse grupo económico? Terceiro: que razões, certamente ponderosas, terão levado o Auditor-Geral para o Mercado de Títulos a autorizar aquelas OPVs com PERs superiores ao máximo por ele próprio estipulado? Quarto: como pode conceber-se que o mesmo Ministro das Finanças resolva que não há qualquer incompatibilidade em que o mesmo presidente desse mesmo grupo económico assuma um lugar de direcção na Bolsa do Porto, onde veio a realizar mais-valias superiores a 30 milhões de contos?! É inadmissível!
A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito boa pergunta!
O Orador: - O Grupo Parlamentar do PCP considera exigível que o Ministro das Finanças clarifique as suas recentes afirmações de que «são muitas as pressões que sobre si tem a incidir, nos últimos meses, para que actue ao sabor de interesses parciais, ou mantenha intocáveis certos privilégios injustificados, ou incline as decisões para promover uns grupos a favor de outros». A Assembleia da República tem o direito e o dever de saber de onde partem e que efeitos têm tido essas pressões. Ao marido da mulher de César não se exige apenas que o pareça; impõe-se-lhe que mostre que o é!
Aplausos do PCP.
Por isso, imporia que o Sr. Ministro das Finanças clarifique, de forma inequívoca: primeiro, quais os interesses parciais e os privilégios injustificados a que se refere? Segundo, quais são essas pressões e quais os lobbies que as exercem? Terceiro, que relações existem, se é que existem, entre a multa aplicada ao Banco Português do Atlântico, aquelas OPVs e estes privilégios?
Importa que a tumba não leve estes segredos do Ministro das Finanças.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O que o Sr. Ministro pode e deve levar é a proposta de lei n.º 17/V. Reformule-a, retire-lhe todas as inconstitucional idades e apresente-a, de novo, à Assembleia da República para que então possa ser discutida.
Aplausos do PCP e da ID.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, proclamo eleitos Secretário da Mesa o Sr. Deputado Daniel Abílio Ferreira de Bastos e Vice-Secretários os Srs. Deputados João Domingos, Abreu Salgado e Rui José dos Santos Silva.
Proclamo também eleito vogal do conselho directivo do grupo português da UIP o Sr. Deputado Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, gostaria de fazer um protesto.
O Sr. Presidente: - Não estou a ver exactamente em que figura regimental é que o Sr. Ministro vai protestar.
O Sr. Ministro das Finanças: - É na sequência da intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa quase não consegue ouvir...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, íamos fazer primeiro as votações e, depois de as «arrumarmos», começávamos este minidebate sobre o protesto do Sr. Ministro ou não protesto porque senão V. Ex.ª não pode fazer as votações.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apesar de tudo - como sabe-, depois das votações não vamos retomar os trabalhos a não ser que seja solicitado como tal.
Atendendo ao critério que há pouco utilizei para o Sr. Deputado Gameiro dos Santos, dou a palavra ao Sr. Ministro das Finanças para fazer o protesto.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não vou perder tempo a responder a insinuações que são mentiras e nada mais e que vêm do Partido Comunista Português. Fazem parte da sua vocação, da sua forma de ser e de estar no Parlamento e na vida e não merecem resposta. Mas daria resposta se essas mesmas insinuações e mentiras viessem, por exemplo, do CDS, do PS ou do PRD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Só quero que me apresentem factos porque, de resto, mentiras ficam com o Partido Comunista Português. Valem tanto quanto as vossas ideias e as vossas influências e as vossas pressões e aquilo que têm feito pelos trabalhadores portugueses e pela economia portuguesa.
Aplausos do PSD.
Mentiras e insinuações ordinárias ficam com quem as faz.
Protestos do PCP.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É fácil lançar infamantes mentiras, é fácil lançar infamantes insinuações. ..
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É, é!
O Orador: -... e depois, mais tarde, quando a verdade e apurada, não há ninguém que venha retratar-se - ainda o caso recente do Sr. Engenheiro Carlos Pimenta está bem presente!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E o Sr. Primeiro-Ministro a ele fez referência há pouco tempo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao Partido Comunista Português só respondo perante factos. De resto, mentir é a vossa metodologia e sempre foi.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Mas o senhor já sabe qual e a verdade!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Vem aí os factos!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uso regimental do contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É lamentável que o Sr. Ministro das Finanças se lenha dirigido a um grupo parlamentar da forma como o fez. Simultaneamente, ao referir-se a esse grupo parlamentar, referiu-se a toda a Assembleia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Protestos do PSD.
O Orador: - É lamentável que tenha perdido, por completo, a cabeça, que tenha perdido o mínimo de senso para utilizar as palavras que utilizou.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD.
E para utilizar as palavras que o Sr. Ministro utilizou, o Sr. Ministro perdeu a cabeça, mentindo, porque o PCP não lhe fez qualquer acusação, não lhe fez qualquer insinuação. As insinuações estão em letra de forma, nos jornais do fim-de-semana,...
Protestos do PSD.
... estão em letras de forma no seu discurso na tomada de posse do actual presidente do Banco Totta & Açores. Foi aí que o Sr. Ministro referiu que estava a ser sujeito a pressões, etc. A única coisa que - como deputado do PCP - lhe coloquei daquela tribuna foi «Sr. Ministro, o senhor fez acusações que está a ser pressionado, etc. Esclareça a Câmara de quem e que o está a pressionar, porquê, quais são os grupos». E é isso que o Sr. Ministro não quer dizer.
Aplausos do PCP.
É a essas perguntas que o Sr. Ministro não quer responder e, por conseguinte, tenta desviar, utilizando expressões inusitadas, a atenção para outras matérias. Não o ataquei, não insinuei, não o acusei, nem eu, nem o meu partido, de que o Sr. Ministro, por exemplo...
Protestos do PSD.
Mas o que é isto? Não posso falar?
Vozes do PSD: - Pode!
O Orador: - Não acusei o Sr. Ministro -nem o meu partido- de que o Sr. Ministro tenha considerado que um presidente de um grupo económico podia ir claramente para a comissão directiva da Bolsa do Porto, porque não havia problemas legais. Não foi ele que o declarou? Está em letra de forma. Leia a entrevista que ele deu no último fim-de-semana.
Não fui eu, nem o meu partido que inventámos que o Auditor-Geral do Mercado de Títulos tenha estabelecido um PER de 10 e que depois tenha aceite aquelas OPVs desse mesmo grupo com PERs muito superiores. É o presidente do Banco Português do Atlântico que o afirma claramente numa entrevista. Os factos estão aí, Sr. Ministro. Se quiser responder a eles, responda. Deve responder, porque, se o não fizer, poderá ser legítimo para qualquer pessoa tomar por certas todas e quaisquer insinuações que venham nos órgãos da comunicação social. Isto são factos, apenas atendemos aos factos. Sc eles devem ser desmentidos, desminta-os e mostre que eles não tem razão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Aplausos do PCP.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não defende a honra?
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na nossa ordem de trabalhos estava e está prevista a votação...
O Sr. Ministro das Finanças: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro pede a palavra para que efeito?
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, nos termos do Regimento, poderia pedir a palavra para defesa da honra, mas ela não está em causa, pois não ofende quem quer.
Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma intervenção, após a votação.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, vou dar-lhe a palavra para defesa da honra.
O Sr. Ministro das Finanças: - Não, não! Não peço isso, porque ela não está em causa Sr. Presidente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Então, o que é que o Sr. Ministro pede, pois temos de usar uma figura regimental?
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, peço a palavra para uma intervenção, quando V. Ex.ª entender que pode ser.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fazem favor. Há momentos ia a dizer que está prevista a votação da proposta de lei n.º 18/V, e isso que vamos passar a fazer de seguida.
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Vamos proceder à votação na generalidade da proposta de lei n.º 18/V.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS, votos contra do PCP, de Os Verdes e da ID e abstenção do PS e do PRD.
Srs. Deputados, há um requerimento de baixa à comissão, pelo prazo de quinze dias, da proposta de lei n.º 18/V, que é assinado pelos Srs. Deputados do Partido Social-Democrata.
Vamos proceder à votação do requerimento de baixa da proposta de lei n.º 18/V à respectiva comissão.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, como ainda nos restam cinco minutos, vamos terminar com um problema que ficou por resolver antes da votação.
Julgo que o Sr. Ministro pretende inscrever-se para uma intervenção. Tem a palavra, Sr. Ministro.
Protestos do PS, PCP e ID.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Só pergunto à Mesa se está alguém inscrito para intervenções antes do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: - Está o Sr. Deputado Silva Lopes, embora o PRD não disponha de tempo.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço imensa desculpa, mas não há nenhum razão para que, esgotadas as figuras regimentais, o Sr. Ministro das Finanças não se inscreva na ordem das inscrições. É o que parece evidente e tem sido praxe nesta Assembleia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, há uma certa tradição, que não é recente, de deixar inscrever os membros do Governo à medida que forem solicitando a palavra para responder a pedidos de esclarecimento.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Capucho): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Jorge Sampaio tem toda a razão, visto que em termos regimentais é rigorosamente assim e o Governo não quer nenhuma excepção no sentido de lhe ser dada prioridade no uso da palavra.
Simplesmente, o Governo apenas gostaria de chamar a atenção para o facto de que o Partido Comunista Português, na intervenção que fez, em lugar de a ter feito em termos normais, fê-la em termos interrogativos em relação ao
Governo e, perante o silêncio do Governo - que não tinha acabado de fazer nenhuma intervenção e a quem não tinha sido dirigido nenhum pedido de esclarecimento, mas uma intervenção na interrogativa-, faz um barulho enorme, acusando-o de não responder.
Pretendemos apenas que fique claro que, se o Governo não responde é por esta estrita razão, ou seja, porque a Mesa não pode alterar a ordem de inscrições.
Aplausos do PSD.
Portanto, o que se pede, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que o Partido Comunista Português, quando intervém, não faça a seguir exibicionismos desta natureza, no sentido de acusar o Governo de não responder, quando sabe que este não tem figuras regimentais para o efeito.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.
O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Convém que fique claro, Sr. Presidente, que a nossa ideia sobre a matéria é muito simples, pois desde já dizemos que, se o PSD requerer a prorrogação da sessão para que o Sr. Ministro possa responder, tem o voto favorável da bancada socialista. Mas, o que não tem -e isso só se daria com o nosso protesto - é o nosso apoio para que se altere a ordem das inscrições, ou seja, para que fale o Sr. Ministro antes de um deputado que está inscrito, fazendo aliás - e permita-me a expressão- «um péssimo serviço» ao Sr. Ministro, que foi o primeiro a dizer que a sua honra não estava em causa, momento esse que, evidentemente, precludia tudo o mais e o Sr. Ministro falaria imediatamente.
É o Sr. Ministro que o diz, nós não temos que nos pronunciar sobre isso. Regressando à normalidade, é a normalidade que prevalece: em primeiro lugar, fala o Sr. Deputado inscrito e, só a seguir, o Governo.
Se for necessário o prolongamento da sessão, têm o nosso voto afirmativo para que esse prolongamento se possa fazer e para que o Governo possa responder em tempo útil a esta matéria e não será, certamente, um prolongamento muito grande.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Brito, para uma interpelação à Mesa, queria pedir-lhes que este incidente regimental que a Mesa tentou resolver da melhor maneira possível não se prolongasse excessivamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem um sentido útil que é o de saber se o Governo ainda dispõe de tempo ou, até mais rigorosamente, se, quando o meu camarada Octávio Teixeira usou da palavra, o Governo dispunha de tempo.
Vozes do PCP: - Tinha, tinha!
O Orador: - É então perfeitamente correcto e adequado que o meu camarada Octávio Teixeira tivesse feito a sua intervenção na interrogativa e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares não tem nesta questão uma ponta sequer de razão.
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Além disso, nós não aceitamos que o Governo, que já tem muito poder e uma larga maioria, se permita ainda dizer aos Srs. Deputados como é que devem intervir na Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD.
O Governo não tem esse poder, dispensamos essas lições, dispensamos essas recomendações. Mas, para além disso, o que se verifica é que, neste caso, era verdadeiramente propositada a forma interrogativa que o meu camarada usou na sua intervenção. Isto mostra também que o Sr. Ministro das Finanças não tinha razão para se mostrar tão ofendido com as questões que lhe foram colocadas pelo meu camarada Octávio Teixeira -como se verificou agora- por aquilo que diz o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, quando reconhece que era uma intervenção na interrogativa.
Portanto, o sentido útil da minha intervenção, para além de tudo o que disse, é também o de considerar que, pela nossa pane, há inteira disponibilidade para que a sessão seja prolongada e o Sr. Ministro das Finanças possa responder cabalmente, se assim o entender, às questões que da nossa bancada lhe foram colocadas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vieira Mesquita pede a palavra para que efeito?
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar pretendia requerer que esta sessão continue, a fim de que o Sr. Ministro das Finanças tenha a possibilidade de fazer a sua intervenção e, por isso mesmo, não impedir a riqueza do diálogo que aqui se estabeleceu com a intervenção do Sr. Ministro das Finanças, que usa o seu direito de intervenção, porque, como bem disse, não se sente atingido na sua honra, porque não atinge a honra quem quer, como é o caso do Partido Comunista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o PCP, o PS e o PSD pronunciaram-se a favor do prolongamento da sessão.
Penso que o Sr. Deputado Narana Coissoró também pediu a palavra para se pronunciar sobre esta matéria.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não tenho absolutamente nada a opor à continuação da sessão, mas queria saber até que horas e com que inscrições é que se vai continuar.
O Sr. Presidente: - Já agora também perguntava ao PRD qual é a sua posição.
A Sr.ª Isabel Espada (PRD): - O PRD nada tem a opor ao prolongamento da sessão.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Guido Rodrigues pede a palavra para que efeito?
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, para informar que estamos a redigir um requerimento em que solicitamos a continuação dos trabalhos até. ao final da discussão da proposta de lei n.º 17/V.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, tenho que pedir desculpa, mas pelo nosso lado, não podemos aceder a todas as intervenções. Naturalmente que damos a palavra ao Sr. Ministro e nada temos a opor a que o Sr. Ministro responda às questões, mas isso originará depois uma troca de intervenções a que não poderemos assistir.
Portanto, o nosso assentimento é condicionado ao seguinte: o Sr. Ministro fala imediatamente a seguir, se os outros intervenientes lhe derem a vez, e depois a sessão deve encerrar.
Se é para continuar com outras intervenções, não poderemos estar presentes, porque temos uma reunião marcada no partido a que não poderemos faltar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que estão inscritos para usar da palavra o Sr. Deputado Silva Lopes e o Sr. Deputado Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.
O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, para sabermos até que horas podemos continuar o debate, creio que é indispensável termos conhecimento dos tempos ainda disponíveis.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, enquanto internamente tratamos do problema e para não perdermos mais tempo, creio que podíamos continuar com o debate, ouvindo as intervenções dos Srs. Deputados Silva Lopes e do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, sob pena de dentro de muito pouco tempo estarmos novamente enredados em questões processuais, creio que antes de reiniciar o debate haveria toda a vantagem em esclarecer o assunto.
Devo ainda dizer que o Grupo Parlamentar do PS votará favoravelmente a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Guido Rodrigues para que o debate continue até ao termo da discussão deste diploma. E fazemo-lo justamente na perspectiva de evitar novos incidentes processuais, porque é admissível que após a intervenção do Sr. Ministro outros deputados se sintam, com a mesma legitimidade que reconhecemos ao Governo, motivados para intervir hoje mesmo na continuação do debate. Desta forma, corremos o risco de estar sucessivamente enredados em questões processuais.
Portanto, o mais simples é votarmos a proposta apresentada pelo PSD no sentido de se prolongar o debate até ao termo da discussão, e desde já posso adiantar que, pelo menos nós, PS, votá-la-emos favoravelmente. Aliás, tudo
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indica que ela seja aprovada, pois bastaria o voto favorável do PSD. Desta forma encerrávamos este incidente de uma vez por todas.
Caso assim não se proceda, daqui por meia hora ainda estaremos a discutir se vamos ou não prolongar a sessão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento apresentado pelo PSD no sentido de prolongarmos os trabalhos até ao final da discussão da proposta de lei n.º 17I/V.
Vamos, pois, votar esse requerimento.
Submetido à votação, foi aprovado com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da ID e a abstenção do CDS.
Vamos, pois, continuar com os nossos trabalhos. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer a minha intervenção em condições difíceis, pois imagino que toda a Câmara estará ansiosa por ouvir a intervenção do Sr. Ministro das Finanças e que haverá pouca paciência para ouvir os meus comentários à proposta de lei.
Vozes do PRD e do PS: - Não apoiado!
O Orador: - Mesmo assim, vou apresentar os comentários que tinha preparado.
O Grupo Parlamentar do PRD é a favor das alienações de participações do sector público em empresas e entende que a alienação dessas participações deve ser feita com a necessária flexibilidade. No entanto, não concordamos com as condições propostas pelo Governo na proposta de lei em questão.
Estão em jogo valores muito importantes do património do Estado. Devemos afastar os riscos de transacções menos claras que possam pôr em causa os valores do sector público. Por isso, a regra de negociação particular que enforma a maioria das disposições desta proposta de lei não é para nós aceitável.
A proposta que apresento é no sentido de se estabelecer um limite máximo quanto aos valores das participações que podem ser transaccionadas através de negociação particular. Essa proposta não é, de forma alguma, contemplada no diploma do Governo, ao contrário do que o Sr. Ministro das Finanças aqui quis fazer crer.
De facto, o Sr. Ministro das Finanças indicou que a proposta de lei admite as cedências através de concurso público, através de operações em bolsa, mas isso só acontece em relação a participações majoritárias em sociedades que tenham capital próprio de mais de 500 000 contos e que não pertençam às instituições a que se refere o artigo 7.º Ora, como já referi, este artigo é de importância fundamental, porque exceptua o IPE, os bancos, as companhias de seguros, as sociedades financeiras e outras instituições que detêm a grande maioria das participações do sector público.
Entendemos que as participações destas entidades devem poder ser cedidas com a necessária flexibilidade, mas pensamos que o limite que propomos, de 200000 a 300 000 contos, é mais do que suficiente para assegurar essa flexibilidade. Caso contrário, arriscamo-nos a que empresas como a Portugal e Colónias ou como a SOREFAME sejam cedidas através de negociação particular. Ora, é preciso chamar a atenção da opinião pública para os riscos que o diploma do Governo envolve em empresas com esta dimensão.
Vozes do PRD e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Conclui-se, assim, que a esmagadora maioria das participações do sector público em empresas, de acordo com a proposta de lei, pode ser cedida sem as exigências de transparência e de concorrência que seriam asseguradas através de concurso público ou através de operações de bolsa, desde que devidamente estruturadas.
A referência a concurso público, por se aplicar apenas a um número muito limitado de casos, parece-nos como uma manobra de diversão. Os riscos de falta de transparência e até de negociatas são evidentes. Há que recear que possam ser cedidos valores importantes do sector público através de negociações particulares sobre os quais a opinião pública não tenha informação suficiente, e, como disse, podem estar em jogo operações de centenas de milhares de contos ou mesmo de milhões de contos. Mas, apesar disso, o Governo não hesita: pelos vistos, os seus interesses são outros! Não podemos, pois, deixar de manifestar a nossa violenta oposição a esses métodos.
Aplausos do PRD, do PS, do PCP e da ID.
O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Deputado Silva Lopes, os dois exemplos que concretamente referiu são as empresas SOREFAME e a Portugal e Colónias, não é verdade?
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Exacto!
O Orador: - E o Sr. Deputado pensa que a situação líquida destas empresas será de quanto? Agradecia que me dissesse, porque o exemplo que deu tem de ter fundamento suficiente.
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Ministro, para se determinar a situação líquida dessas empresas é preciso, antes de mais, fazer uma adequada reavaliação dos seus activos, e eu não penso que isso esteja feito. Não creio que o Sr. Ministro saiba também qual é a situação das empresas.
O Orador: - Vai desculpar, Sr. Deputado, mas foi um exemplo infeliz o que deu, porque não tem fundamento suficiente. O Sr. Deputado não sabe quanto valem as empresas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para nós elas têm uma situação líquida, após a avaliação, superior a meio milhão de contos. E como as participações são maioritárias, a sua alienação estará sujeita a concurso público ou transacção em bolsa. O Sr. Deputado ou apresentou um exemplo impensado ou então o exemplo vira-se contra a sua exposição.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não está, não!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Agradeço ter-me dado a palavra, Sr. Presidente, pois gostava que o Sr. Deputado Silva Lopes me esclarecesse no seguinte sentido: como no artigo 7.º se exclui o problema do IPE, estas empresas, tenham ou não tenham 500 000 contos de situação activa, deixam de estar obrigadas a concurso público?
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.
O Sr. Silva Lopes (PRD): - Sr. Presidente, a resposta que ia dar já foi, de certo modo, apresentada nesta interpelação do Sr. Deputado Octávio Teixeira. De facto, o Sr. Ministro das Finanças confirmou que a SOREFAME e a Portugal e Colónias têm um valor líquido superior a 500 000 contos, informação que agradeço. Mas, como a proposta de lei isenta o IPE, que tem a maioria das participações destas duas empresas, da obrigação de concurso público, penso que o meu argumento continua inteiramente válido e gostava que o Sr. Ministro das Finanças me esclarecesse se não é assim.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Quer fazer de nós tolos... Vigarice barata!
O Sr. Ministro da Finanças: - Sr. Presidente, peço a palavra para responder.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, não há figura regimental que permita que agora V. Ex.ª use da palavra. O melhor é aguardar a sua intervenção para responder, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro das Finanças: - O Sr. Presidente vai desculpar, mas eu fui interpelado pelo Sr. Deputado Silva Lopes...
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o Sr. Deputado Silva Lopes pode interpelar, mas é a Mesa que comanda o debate, não é o Sr. Deputado Silva Lopes. O Sr. Ministro terá ocasião de responder quando fizer a sua intervenção.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, tinha já dito que trocava com o Sr. Ministro das Finanças. Como o Sr. Ministro está muito excitado para responder às bancadas da oposição, caso queira, troco com ele.
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Ministro desejar efectuar a troca, a Mesa não tem nada a opor.
O Sr. Ministro das Finanças: - Aceito, sim.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças para uma intervenção.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei n.º 27/87 de 29 de Junho, aprovada pela Assembleia da República um dia antes -se não estou em erro - de se consumar a dissolução determinada pelo Sr. Presidente da República, reza precisamente o seguinte: «O artigo 88.º da Lei n.º 49/86», que é a Lei do Orçamento do Estado para 1987, «não se aplica às entidades que hajam sido criadas por lei ou decreto-lei em que se estabeleça expressamente o regime específico de alienação de participações sociais.» Ou seja, a Assembleia da República, estando o Sr. Deputado Silva Lopes presente, porque fazia parte do grupo parlamentar do PRD de então - que, suponho, votou favoravelmente esta lei-, aprovou uma excepção para o IPE que lhe permite vender, conforme entender, por concurso público ou por negociação particular, todas as participações que tenha, inclusive as participações na Portugal e Colónias e na SOREFAME.
Vai desculpar-me, Sr. Deputado Silva Lopes, mas o seu exemplo contínua virado contra a sua exposição.
Gostaria de aproveitar a minha intervenção para fazer uma referência às inspecções que determinei, por minha exclusiva decisão e após ponderados todos os aspectos que estavam em presença, às sete OPVs realizadas em fins de Dezembro. Assim que esse despacho foi exarado por escrito, dele foi dado conhecimento ao Sr. Primeiro-Ministro e a todas as entidades envolvidas nas várias inspecções em causa. Quando as conclusões estiverem retiradas serão tornadas públicas e, se alguma coisa esteve mal, as consequências serão também retiradas. Não tenham V. Ex.ªs dúvidas nenhumas de que será assim! Peço-vos que, se alguma dúvida vos passa pelo espírito, aguardem pela data da apresentação das conclusões a público e pelas respectivas consequências. Agora não vou responder as mentiras disfarçadas de perguntas que o Sr. Deputado do PCP fez.
Surpreender-me-ia se tais comentários ou tais perguntas capciosas e envenenadas fossem feitas, como já disse, por um Sr. Deputado do CDS, por exemplo, porque, de algum modo, seriam perguntas ou insinuações contranatura, uma vez que poriam em causa o próprio funcionamento do mercado, livre iniciativa das empresas, e nós não vamos por esse caminho. Faremos sempre inspecções a posteriori, normais ou extraordinárias, e, se alguma coisa foi feita de modo menos correcto - repito -, retiraremos daí todas, mas todas, as consequências, doa a quem doer.
Aplausos do PSD.
Agora, vai ser certamente uma profunda desilusão para o PCP...
Protestos do PCP.
Vai ser uma profunda desilusão para o PCP, porque o resultado é no sentido de que nada há a objectar ao modo como as operações foram feitas.
Vozes do PCP: - Então já sabe o resultado?
O Orador: - Ninguém poderá pôr isso em causa, porque o resultado decorre de várias entidades que fazem, independentemente umas das outras, inspecções. E, meus senhores, não se pode pôr em causa a independência e a competência dessas entidades, entre as quais, com a maior responsabilidade nessas inspecções, estão precisamente o Banco de Portugal e a Inspecção-Geral de Finanças.
Convido um deputado qualquer do Parlamento que não seja deputado do Partido Comunista Português a apontar razões para duvidar da competência ou da independência destas entidades. Não acredito que haja um Sr. Deputado que o faça, a não ser que seja da bancada do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E o Belmiro?
O Orador: - Como estava a dizer, o PCP vai ter uma grande desilusão porque o resultado é no sentido de nada
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haver a objectar. Não pode haver dúvidas, Srs. Deputados, porque estão várias entidades de competência e independência indiscutíveis envolvidas nestas inspecções. Mas, se o resultado apontar no sentido de que coisas funcionaram mal, de que coisas estiveram mal, as consequências vão ser tiradas. Portanto, quer num caso quer noutro, para o Partido Comunista Português vai ser uma desilusão.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É preciso ter «lata», Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra não para pedir esclarecimentos -visto que, em relação à atitude do Sr. Ministro das Finanças, ficamos por agora esclarecidos -, mas sim para fazer um protesto.
Sr. Ministro das Finanças, nas duas intervenções que tive oportunidade de ouvir, não se cansou de repelir que não responde, nem presta esclarecimentos, ao PCP. Devo dizer, Sr. Ministro das Finanças, que V. Ex.ª pode assumir essa atitude. Mas, Sr. Ministro, essa atitude contraria as regras democráticas do nosso país e até mesmo as de qualquer outro país, as regras democráticas do funcionamento da Assembleia da República e do próprio Regimento da Assembleia da República.
O Sr. Ministro das Finanças gosta de proclamar a sua profissão de fé democrática, mas com esta atitude está a demonstrar que essa profissão é oca, pois não corresponde aos seus sentimentos íntimos. Quando o Sr. Ministro é inquirido, no sentido correcto do termo, quando é questionado ou quando é contrariado, a sua atitude é a de dizer: não respondo a esse partido.
Ora bem, Sr. Ministro, esse partido a que se refere procede dentro da legalidade democrática, dentro da legalidade da Assembleia da República, e é o Sr. Ministro que assim não actua. V. Ex.ª procura, na verdade, encobrir-se em relação às suas dificuldades, fugir a questões acutilantes que lhe são colocadas pela minha bancada. O Sr. Ministro não responderá, o que é antidemocrático e o que mostra que tem dificuldades em responder.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, não tenho nada a responder.
Aplausos do PSD.
Risos do PCP.
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Mudam de ideias com esta facilidade?!
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, se não responde a pedido de esclarecimento, não tem oportunidade de usar da palavra, porque a única forma que tem para o fazer é por meio desta figura regimental.
Risos do PCP.
O Sr. Ministro das Finanças: - Se o Sr. Presidente me der licença, porque não consegui perceber qual é o pedido de esclarecimento formulado pela bancada do Partido Comunista Português, peço que o repitam.
Vozes do PSD: - Não houve pedido de esclarecimento, Sr. Presidente! Foi apenas um protesto!
O Orador: - Não foi um pedido de esclarecimento?! Foi um protesto?
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças pode pedir a palavra para um protesto.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, V. Ex.ª é que me perguntou se eu queria ou não responder a um pedido de esclarecimento da bancada do PCP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro tem a palavra, se o desejar, para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram feitos.
Vozes do PSD: - Não houve, Sr. Presidente!
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, desculpe-me, mas é que não houve pedidos de esclarecimentos, a não ser que eu esteja equivocado.
O Sr. Presidente: - Houve um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, suponho que houve apenas um protesto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, usou ou não da palavra para pedir esclarecimentos?
O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, usei da palavra para fazer um protesto e explico ao Sr. Ministro quais foram as suas ideias principais, porque me parece que não compreendeu.
Protestos do PSD.
O protesto tinha duas ideias essenciais: a primeira, o Sr. Ministro não responderá ao PCP, mas isso é antidemocrático...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - A Mesa tinha interpretado o uso da palavra do Sr. Deputado Carlos Brito como pedido de esclarecimento. Mas, como foi um protesto, o Sr. Ministro tem a palavra para dar explicações.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Ministro nem sequer percebeu para que era o protesto!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro pede a palavra para interpelar a Mesa?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, apenas desejo explicar a V. Ex.ª que o Sr. Ministro das Finanças não pediu a palavra.
Risos do PS e do PCP.
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O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Ministro das Finanças está muito nervoso!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vinha eu hoje para debitar as minhas ideias sobre um diploma adjectivo que devia ser discutido nesta Câmara antes da aprovação de um diploma substantivo sobre as privatizações de empresas do Estado. A proposta de lei hoje em discussão é complementar e meramente subsidiária daquela que hoje foi aqui votada. Simplesmente, o Sr. Ministro das Finanças anda a dormir mal. Vê fantasmas! Vê diante de si moinhos de vento e quixotescamente queria a todo o custo vir aqui à Assembleia da República dizer aquilo que tem dito às paredes do seu Ministério e aos órgãos de comunicação social, que não o ouvem e estão contra ele, a avaliar pelas notícias. Queria enfim, aproveitar a oportunidade para vir dizer aos Srs. Deputados por que é que não errou, por que é que não se enganou, por que é que a inspecção, quando ordenada pelo ministro, é melhor do que o inquérito parlamentar e por que é que está com a SONAE e não com a Assembleia da República.
Risos do PS, do PCP e da ID.
O Sr. Ministro teve a sua oportunidade e agora quero que, descansado por já ter dito à Assembleia da República, aos Srs. Deputados, o que lhe ia na alma, ouça o que o CDS lhe tem a dizer.
Risos do PS, do PCP e da ID.
Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª mandou para os órgãos de comunicação social um comentário que é contrário a todas as regras democráticas e é bom que a comunicação social, e principalmente a televisão, ouça isto.
A Assembleia da República, no uso regimental e constitucional dos seus direitos, apresentou um requerimento para abertura de um inquérito parlamentar. E o que é que fez a televisão? Ao dar a notícia, correu para o gabinete do Sr. Ministro a dizer: «Sr. Ministro, ó tio, ó tio, diga-me o que é que eu vou dizer ao País!» E o Sr. Ministro, «ó tio, ó tio», permitiu-se fazer um comentário que foi transmitido à televisão para que no Telejornal se dissesse o que é que o Ministro das Finanças respondeu a um requerimento dirigido a um órgão de soberania para instauração de um inquérito parlamentar, requerimento esse que há-de seguir os seus trâmites normais. Há-de vir aqui, e o PSD, para cobrir o seu ministro e como não quer o inquérito, como já disse, vai votar contra. Não haverá, portanto, inquérito nenhum porque o PSD há-de cobrir o Sr. Ministro das Finanças para não lhe descobrirem a careca.
Risos do PS, do PCP e da ID.
O Sr. Ministro lançou os foguetes e o secretário-geral do PSD apanhou as canas.
O que é que se passou, Sr. Ministro? O que se passou é simples: V. Ex.ª mandou abrir uma investigação que logo transformou numa investigaçãozinha...
Risos do PS, do PCP e da ID.
E o que era essa investigaçãozinha? Pretendia o Sr. Ministro que os funcionários nomeados por si fossem ver o que é que aquelas entidades tinham feito relativamente às OPVs do grupo SONAE.
Não temos nada a ver com este assunto quase doméstico,...
Risos do PS, do PCP e da ID.
... com o tal triângulo que gira e para o qual o Sr. Primeiro-Ministro nos tinha alertado quando disse que os departamentos ministeriais andam infestados de lobbies. Ora, V. Ex.ª quis desinfestar, quis desratizar os lobbies, o que não era nada connosco. Mas alguém veio dizer o que V. Ex.ª não queria que o público soubesse. Houve uma fuga de informação, e V. Ex.ª, Sr. Ministro, teve de vir dizer donde é que partiu a fuga de informação e o que é que aconteceu Veio então dizer calmamente que afinal a tal investigaçãozinha não era uma investigaçãozinha, era um inquérito, e que tudo correria pelo melhor.
Isto faz-me lembrar o caso célebre passado com o Sr. Nixon por causa do caso Watergate, em que ele disse assim ao Congresso: «Deixem-me nomear um procurador da minha confiança e depois ele investigará tudo livremente.»
Risos e aplausos do PS, do PCP e da ID.
E o Congresso disse-lhe: «Sr. Presidente da América, se V. Ex.ª nomeia um procurador da sua responsabilidade e depois ele vai investigar livremente, este inquérito não será inquérito.» E foi o próprio Congresso que nomeou o procurador.
Ora, o que é que V. Ex.ª fez? V. Ex.ª veio dizer: «Tenho aqui a minha inspecção -já uma inspecçãozinha, como referi - e tenho a certeza de que tudo vai correr bem.» E ela vai dizer que tudo vai correr bem porque não vai colocar mal o Ministro das Finanças.
No fundo, é isto que se passa. Eu, que sou advogado, ou melhor, V. Ex.ª, é um «macro-economista» e eu sou um «macrojurista»,...
Risos do PS, do PCP e da ID.
... tirei daí uma conclusão «macropinião pública». E a «macropinião pública» diz assim: «Ó diabo, o juiz está tomado». Há lugar ao incidente na suspeição do juiz! O juiz, que é o Ministro das Finanças, que é quem tem de homologar depois a inspecção, não pode continuar com esta inspecção! E nós dissemos por isso: «A mesmíssima investigação vamos transformá-la num inquérito parlamentar.» E eu, que sabia que V. Ex.ª não vinha preparado para o debate da lei que nos interessava mas sim para responder na Assembleia da República ao caos, trouxe o requerimento que escrevemos e que diz muito claramente isto: «O inquérito que ora se requer visa, nos termos da Lei n.º 43/77, apurar em toda a sua extensão a conduta das entidades intervenientes na oferta pública de venda de acções, mandada investigar pelo Sr. Ministro das Finanças.»
Ora, se quando a Assembleia da República, por motivo da suspeição do juiz - por causa da suspeição, repito -, transfere o foro desta investigação do Governo para a Assembleia da República, e lhe chama inquérito, como deve ser, V. Ex.ª começa a gritar na TV: «Estão a ofender o Banco de Portugal, estão a ofender as entidades, estuo a ofender tudo!», é porque se isso fosse verdade era V. Ex.ª quem estava a ofendê-las ou então queria dominar todas as entidades que agora diz que é a Assembleia da República que quer ofender.
V. Ex.ª fez uma coisa deselegantíssima! É que, tendo o inquérito parlamentar sido requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS, V. Ex.ª pessoalizou-o ao imputá-lo ao
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Sr. Deputado Nogueira de Brito, lembrando a sua qualidade - que não é neste momento - de administrador do Banco de Portugal. Ora, nós nunca quisemos pessoalizar inquéritos. Nós nunca quisemos pessoalizar nada, mas apenas, como grupo parlamentar, quisemos mudar a sede de uma «investigaçãozinha» para um autêntico inquérito parlamentar.
Porquê? Porque V. Ex.ª colocou-se sob a suspeição de proclamar os resultados antes de eles se verificarem. E V. Ex.ª vem agora dizer ao que se lhe atribuem como tendo dito: «O que quero dizer é que o réu é inocente antes de ser sentenciado.»
Sr. Ministro, o réu é inocente antes de ser sentenciado! Mas o réu, a que agora se chama arguido, só é tratado assim quando há fundadas e muito sérias presunções contra a sua conduta ilegal. Um cidadão normal não se vai sentar no banco dos arguidos sem mais nem menos, e quando o faz é porque, como disse, há fundadas suspeições sobre a sua conduta. V. Ex.ª não disse até agora, fazendo-se de Ministério Público, por que é que colocou as entidades mandadas investigar como arguidos e quais são as fundadas queixas que tem para as colocar no banco dos arguidos, ou no banco dos réus, como se chamava antigamente. Esta é mais uma asneira que V. Ex.ª disse a juntar a tantas outras!
V. Ex.ª teima em dizer que o deputado Nogueira de Brito quer pôr em causa a própria instituição onde serve. O Sr. Secretário-Geral do PSD vem dizer, no tempo de antena dedicado contra o Congresso do CDS no Telejornal de sábado, que nós queríamos desestabilizar a confiança empresarial e a confiança da iniciativa privada. Gostaria de lhe perguntar o seguinte, Sr. Ministro: se V. Ex.ª tem tanta, tanta garantia de que tudo vai bem, por que é que ordenou a investigação? Se V. Ex.ª tem tanta, tanta garantia de que tudo vai correr bem, por que é que primeiro escondeu a investigação da opinião pública e depois disse que tinha havido uma fuga de informação?
O que é que todas essas entidades tem a temer um inquérito parlamentar -julgo que não temem, V. Ex.ª é que teme! - e não temem uma investigação? Temem sim, a «investigaçãozinha» porque tinha a cobertura de V. Ex.ª logo desde o início e o inquérito parlamentar não tem!
Em quarto lugar, pergunto-lhe onde está a forma de o CDS desestabilizar o mercado e as empresas. Nós fizemos a mesmíssima coisa que V. Ex.ª fez. Tratar-se-á da tal guerrilha institucional? Quando V. Ex.ª manda fazer a investigação, tudo corre bem para as empresas e até aumenta a confiança do grupo SONAE, aumenta a confiança na bolsa e a confiança dos donos dos grupos envolvidos, mas se a mesmíssima investigação é feita pela Assembleia da República, V. Ex.ª diz que tudo é desestabilizado. Porquê, Sr. Ministro? Por que é que uma investigação feita por V. Ex.! dá garantia à iniciativa privada de não desestabilização e quando os mesmíssimos factos, as mêsmíssimas personalidades e as mesmíssimas entidades são trazidas aqui à Assembleia tudo se desestabiliza? Porquê, Sr. Ministro? Isto é que V. Ex.ª vai ter de nos explicar! Por que é que uma «investigaçãozinha» ordenada pelo Ministro das Finanças não desestabiliza nada, não preocupa a SONAE, não preocupa o Banco de Portugal, não preocupa nenhuma entidade, e quando a sede da mesmíssima investigação é mudada para a Assembleia da República como inquérito tudo fica desestabilizado? Quem é que está no centro da desestabilização? É a Assembleia da República ou é V. Ex.ª?
Vozes do PSD: - Chega!
O Orador: - Chega, chega! Mas para que isso não se repita mais, para evitar que este tipo de ofensas à Assembleia da República, ao deputado Nogueira de Brito, ao Grupo Parlamentar do CDS e ao próprio CDS que foram feitas na própria noite do Congresso com a cobertura do Governo e do Secretário-Geral do PSD não se repitam mais V. Ex.ª tem de responder a estas questões e é pessoalmente responsável por toda esta desestabilização.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de terminar, pois já acabou o seu tempo global.
O Orador: - Quanto à lei «adjectivazinha» que aqui veio hoje ao debate agendada, votaremos a favor.
Risos.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Ministro das Finanças: - Para tecer um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vieira Mesquita pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Para formular um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sendo assim, dou a palavra ao Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que se acaba de passar no Parlamento através do Sr. Deputado do CDS é de facto grave!
O Sr. Deputado classificou de «investigaçãozinha» ou de «inqueritozinho» um conjunto de inspecções que estão a cargo de instituições que nunca foram postas em causa, como o Banco de Portugal ou a Inspecção-Geral de Finanças, para não designar as outras entidades. Chamar, nesta Câmara, a isto uma «investigaçãozinha» é uma afirmação que, meus senhores, só posso considerar muito, mas muito grave.
Esta atitude vem no seguimento da posição tomada pelo CDS na quinta-feira passada de manhã, na ausência do Ministro das Finanças ou de membros do Governo responsáveis por este conjunto de inspecções. Estas inspecções foram determinadas pelos canais normais e, portanto, não podem perturbar o funcionamento do mercado. Mas, quando se pretende chamar ao seio do Parlamento o mesmo objecto de investigação, aí, sim, traz-se a vida empresarial ao seio do debate parlamentar e isso, pelo menos, tem por vezes efeitos nefastos no clima de confiança.
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Eles sabem o que estão a fazer!
O Orador: - Sr. Deputado, chamar a este conjunto de inspecções uma «investigaçãozinha» tem de ser ou demonstração de ignorância...
Vozes do PSD: - E, é!
O Orador: -... ou de irresponsabilidade.
Vozes do PSD: - E, é!
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O Orador: - Porque não pode ser, de modo nenhum, a demonstração do pensamento do seu partido. É impossível que assim seja, Sr. Deputado! Por isso, faço justiça ao seu partido e concedo-lhe o benefício da dúvida pela sua ignorância e irresponsabilidade.
Aplausos do PSD.
De resto, quanto às pressões que se exercem sobre o Ministro das Finanças, devo dizer-lhe que elas são muitas, de facto, e por vezes muitas delas não são identificáveis.
Vozes do PCP: - Ah!
O Orador: - O CDS não é um grupo de pressão, é um partido com 4% do eleitorado,...
Vozes do PSD: - Cada vez menos!
O Orador: -... mas hoje, depois das suas declarações, fiquei com dúvidas se o Sr. Deputado estava a trazer a esta Câmara pressões inconfessáveis,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: -... embora inconscientemente.
Aplausos do PSD.
Se fosse um empresário que tivesse apoiado sempre o CDS, talvez o Sr. Deputado tivesse ponderado um pouco melhor, o que quer dizer que há motivações partidárias e pró-partidárias na sua intervenção.
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Ministro.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas sendo um empresário que apoiou publicamente um outro partido ou o candidato de um outro partido, talvez seja essa a sua motivação.
Risos.
Uma voz do PS: - Está a meter-se em terrenos apertados!
O Orador: - Até acontece que não está em causa, para nós, Governo, essa independência e esse direito de manifestação democrática de um qualquer empresário em Portugal.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Está, está!
O Orador: - O que está em causa, Sr. Deputado, é se ele cumpre ou não a lei e, para isso, recorremos a inspecções que são normais e que-repito-estão a cargo de entidades de cabal e indiscutível competência e independência.
Lamento profundamente que o Sr. Deputado tivesse classificado isto com «investigaçãozinha». Sabe o que é inqualificável? É a sua atitude, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró dispõe de cinco minutos, cedidos por «Os Verdes».
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, o Sr. Deputado Narana Coissoró tem o direito regimental de fazer um contraprotesto e o Sr. Deputado Vieira Mesquita está inscrito para pedidos de esclarecimento, mas o PSD já não dispõe de tempo.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Presidente, tinha-me inscrito para formular pedidos de esclarecimento e nada me foi dito, da parte da Mesa, de que não tinha tempo regimental. Porém, V. Ex.ª diz-me agora que não tenho tempo. Nessa medida, peço a palavra para fazer um protesto em nome da minha bancada.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vieira Mesquita, o PSD dispunha realmente de um minuto, porém, cedeu-o ao Governo. Por isso, dei a possibilidade ao Sr. Deputado Narana Coissoró de responder ao protesto, avisando o PSD, contudo, de que não dispunha de tempo, embora passe agora a ter por cedência do PRD. Nestas circunstâncias, o CDS dispõe de dois minutos para um contraprotesto.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, não tenho qualquer objecção ao princípio de cessão de tempo por parte de «Os Verdes». Pretendia apenas saber quem foi o seu autor, visto que não vejo no Plenário nenhum deputado de «Os Verdes», a não ser que tenham deixado alguma procuração no período da manhã.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa informação foi transmitida ao Sr. Secretário da Mesa, via telefónica. Não tenho, pois, possibilidade de controlar todas as informações.
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, são elementos de que disponho e que transmito. Neste momento, o PRD acaba de ceder ires minutos ao CDS.
O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, não tenho nada contra o facto de o Sr. Deputado Narana Coissoró voltar a usar da palavra dentro de um princípio do facilitar a expressão ao CDS. Porem, sou contra a abertura de um precedente de cessão de tempos por forma indemonstrável, inclusivamente por telefone.
Sr. Presidente, peço, pois, que não seja aceite esse precedente e, se necessário, então que seja V. Ex.ª a ceder cinco ou 50 minutos ao CDS, mas não aceitamos o precedente - ainda por cima de pessoas tão preocupadas com os princípios das regras democráticas!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o problema da cedência de tempos já foi abordado em conferencia de líderes e continuará a sê-lo.
Para não se prolongar mais esta discussão, embora reconheça que há certas questões no funcionamento do
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sistema que têm de ser afinadas, dou a palavra ao Sr. Deputado Narana Coissoró para fazer o contraprotesto.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª especializou-se num estilo que julga servir os seus interesses, isto é, dizer barbaridades em altos gritos, em tom contundente, e chamar irresponsáveis aos deputados, dizer que estes não representam os seus partidos e chamar outras coisas deste jaez que não vêm ao caso. Se eu dissesse que o Sr. Ministro é a nódoa do seu Governo, com certeza que não gostava, da mesma maneira como V. Ex.ª diz que eu não digo o que o meu partido quer. Se eu dissesse que o Sr. Ministro não representa este governo e que está ligado a interesses que o Primeiro-Ministro não quer, que está envolvido em manobras de que o País rejeita, V. Ex.ª não gostava de ouvir.
Simplesmente» não irei por esses caminhos.
Vozes do PSD: - Já foi!
O Orador: - Se o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social manda a Inspecção do Trabalho a uma empresa e diz antes de começar a missão que «vão lá ver o que é que este empresário faz contra os trabalhadores» e ao mesmo tempo afirma publicamente «tenho a certeza de que tudo vai correr pelo melhor», V. Ex.ª aceitava isso?
O Sr. José Magalhães (PCP): - É aberrante!
O Orador: - Isto é, dar palmadinhas nas costas da Inspecção dizendo que tudo vai correr pelo melhor não é exercer coação moral sobre essa Inspecção? O Sr. Ministro quer que chame a isto inspecção? Isto é menos que uma «inspecçãozinha»!
Protestos do PSD.
O Sr. Ministro das Finanças: - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Não dou, Sr. Ministro! Faça favor de se sentar!
Risos do PS, do PCP e da ID.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Narana Coissoró está no uso da palavra e não permitiu a interrupção do Sr. Ministro.
O Orador: - V. Ex.ª diz que fizemos a declaração política na ausência do Governo. É a sua ignorância crassa sobre o Regimento da Assembleia da República. Fazia bem que V. Ex.ª tivesse um ou dois dias, como deputado, sentado nestas bancadas!... É que V. Ex.ª habituou-se a, donde está sentado, «mandar vir», como costuma dizer o povo.
Sr. Ministro, as declarações políticas são feitas no período antes da ordem do dia e o Governo pode ou não estar presente; não somos obrigados a chamar o Governo para ouvir as declarações políticas, que têm lugar no período de antes da ordem do dia.
Isto de dizer, para amanhã ser gravado na televisão, que o CDS fez uma declaração política em que pediu a instauração de um inquérito sem a presença do Governo é mais uma demagogia e ignorância por parte de V. Ex.ª
O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Em terceiro lugar, V. Ex.ª veio dizer que isto é contra a vida empresarial. Ora, contra a vida empresarial foi a inspecção que V. Ex.ª disse que tinha mandado fazer e que o País só pôde saber por causa de uma fuga de informação.
Finalmente, quanto aos nossos 4%, pense antes por que é que o Governo baixou em seis meses para 31% de popularidade. Pense bem se isso não se deve a si, ao seu destempera, à ineficiência e à incompetência verbal que tem mostrado ao País, através das suas afirmações, pela sua falta de inteligência e de irresponsabilidade com as empresas públicas e os grupos que protege!
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro das Finanças, há pouco pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, julguei que tinha de pedir a palavra para usar a figura regimental da defesa da honra, ma agora concluí que não há razão para isso. Tal qual como há pouco não usei da palavra para responder ao Partido Comunista, também agora não tenho que usar da palavra.
Aplausos do PSD.
O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto. Serei muito breve.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não tem tempo!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Narana Coissoró, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira Mesquita.
O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex.ª deu aqui, hoje, um bonito espectáculo. V. Ex.ª tem protestado muito perante a comunicação social porque esta não o filma... Esperamos que hoje a comunicação social esteja atenta para o filmar e dar a imagem ao País da credibilidade do novo CDS, de que V. Ex.ª se intitula perante a Câmara!...
Aplausos do PSD.
Como é que é possível que V. Ex.ª, porque não gosta do estilo, passe a atacar a possibilidade de um ministro? Isso não é admissível, Sr. Deputado!
Estava hoje agendada a discussão da proposta de lei n.º 17/V e sobre a mesma V. Ex.ª não disse nada. V. Ex.ª veio aqui par fazer ataques pessoais, o que é inadmissível! O senhor está num Parlamento, está numa casa digna, pelo que a deve dignificar e não degradá-la aos olhos do povo, que já de si a tem como degradada. O que devíamos era torná-la mais dignificada e V. Ex.ª não faz isso com intervenções que produz.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A falta de argumentos por parte de V. Ex.ª desanda na diatribe, na demagogia pura, no ataque sem cabimento. E mais: V. Ex.ª ataca instituições credíveis e respeitáveis do nosso país. O senhor ataca o Banco de Portugal e a Inspecção-Geral de Finanças, duas instituições que estão a produzir inquéritos. Deixe que elas os produzam e veja depois os resultados! Por que é que está contra essas instituições?
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Quanto ao inquérito parlamentar que V. Ex.ª aqui referiu, pergunto: que tem o Sr. Ministro das Finanças a ver com ele? Acha que é um inquérito que diz respeito a esta Câmara? Então esta Câmara, com liberdade, vai votá-lo e o seu lobby não nos impressiona, Sr. Deputado Narana Coissoró.
Por isso, Sr. Deputado, poupe a Câmara ao lamentável espectáculo que nos deu e seja mais correcto perante a mesma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não fui eu quem trouxe aqui, durante o debate de hoje, o problema do inquérito, da investigação e da chamada irresponsabilidade do CDS, mas sim o Sr. Ministro das Finanças, a quem tive que responder, porque se o não fizesse, amanhã, a comunicação social, principalmente a televisão, com a subserviência que vem mostrando, diria que o Sr. Ministro, mais uma vez, tinha chamado irresponsável ao CDS, linha declarado aos Deputados o que se passava sobre o inquérito e que o CDS não tinha respondido.
Quanto aos altíssimos decibéis que ouvimos ao Sr. Vieira Mesquita,...
Vozes do PSD: - Sr. Deputado!
O Orador: -... devo dizer que eles não me impressionam. Isto porque os aplausos fáceis, quando estão 148 deputados que tudo aplaudem sem questionar,...
Protestos do PSD.
... repito, que tudo aplaudem sem questionar, não interessam a ninguém. E eles sabem que na própria direcção parlamentar do partido há pessoas que entenderam que o inquérito tinha fundamento e que devia ser feno; simplesmente, agora tem de aplaudir tudo. Portanto, não fui eu quem trouxe o debate do inquérito hoje para a Assembleia, mas o Sr. Ministro, que tudo tem feito para denegrir este mesmo inquérito. Pessoalizar o inquérito chamando-o de inquérito do Dr. Nogueira de Brito, fazer uma nota a dizer que, sendo Dr. Nogueira de Brito administrador do Banco de Portugal, este se colocava contra o Banco de Portugal e exercendo perante toda esta espécie de chantagens - é esta a única palavra adequada -, tínhamos de responder como fizemos.
Tínhamos de responder e respondemos. Não ofendi ninguém. Quando o Sr. Ministro da Finanças diz que não me confunde com o CDS - e é a terceira vez que hoje ouvimos essa afirmação -, julga-se ainda na demagogia eleitoralista do voto útil, julga que ainda está a apelar para o voto daqueles que já se desiludiram com o Governo. Quem começou a ofender o CDS foi o Sr. Ministro das Finanças, ao dizer que o que vem desta bancada não é do CDS, ao dizer que há interesses inconfessáveis, ao dizer que há lobbies e ao dizer também que sabe quais as empresas que votaram não sei em que candidato... Quem foi que votou na campanha presidencial e quem foi que não votou nessa campanha. Isto ficará registado, Sr. Presidente, Srs. Deputados.
A gritaria dos 148 não me impressiona nada. Comigo está a razão, com o PSD e com Sr. Ministro das Finanças está a vozearia e está a TV. Não está, com certeza, a
comunicação social independente que assistiu a este debate, que irá buscar a acta desta sessão e dela tirará a sua notícia, se a não tiver registado. A gritaria do Sr. Deputado Vieira Mesquita e a gritaria do PSD não impressionam um deputado. Pode apenas impressionar 148 deputados que não pensam como eu e tudo aplaudem.
Protestos e apupos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradecia o silencio. Estamos todos um pouco cansados, mas isso não impede que façamos silencio na Câmara.
O Sr. Deputado Joaquim Marques pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Para exercer o direito de defesa da honra, no mínimo. Depois daquilo que ouvimos do Sr. Deputado Narana Coissoró, parece-me que é o mínimo que poderemos fazer neste momento. Serei muito breve, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, normalmente pergunto para que efeito pretendem os Srs. Deputados o uso da palavra. Não tenho outra conotação sobre isso.
Mas, já agora, queria saber, porque há outros pedidos de uso da palavra, para que efeito, embora a defesa da honra tenha preferência.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jaime Soares pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Jaime Soares (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mário Maciel pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr Presidente, apesar de hoje ser terça-feira - suponho que é por isso que V. Ex.ª refere cansaço-, não me sinto minimamente cansado e não vejo como o cansaço possa justificar o que se tem passado nesta Câmara esta tarde, designadamente por parte do deputado que acabou de intervir.
Mas eu pedi a palavra, Sr. Presidente, para interpelar a Mesa e não para exercer o direito de defesa da honra. Pelas razões que o meu colega de governo já explicou, não utilizaremos essa via regimental neste caso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas utiliza outra!
O Orador: - Utilizo aquela que entender, Sr. Deputado
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O Sr. José Magalhães (PCP): - É óbvio!
O Orador: - E se alguém me quiser tirar a palavra, é o Sr. Presidente que ma tira. Por enquanto V. Ex.ª não me tira a palavra.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, o Sr. Deputado Narana Coissoró é por todos nós reconhecido como um parlamentar com estilo próprio, acutilante, inquieto, o que me parece saudável. Mas agora, manifestamente - provavelmente não estará hoje num dos seus melhores dias -, exorbitou tudo o que era imaginável, o que lamento.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É uma interpelação?!
O Orador: - É uma interpelação, como V. Ex.ª irá verificar. Se alguém nesta Câmara tem legitimidade para interpelar a Mesa sem ser interpelado por V. Ex.ª da forma com está a interpelar, esse alguém sou eu. E quem não tem legitimidade para me estar a interromper e V. Ex.ª
Aplausos do PSD.
E verá V. Ex.ª que é uma interpelação pela forma como vou concluir utilizando o tempo - curto, curtíssimo, Sr. Presidente e Srs. Deputados - de que disponho.
É que me parece elementar - e V. Ex.ª, Sr. Presidente, não verá nisso nenhuma crítica à Mesa - que, perante as expressões utilizadas pelo Sr. Deputado Narana Coissoró, o mínimo que seria exigível para se dignificar esta Casa - e eu neste momento situo-me e sinto as dores de deputado com mandato suspenso - era cortar-lhe o uso da palavra. Não é na defesa da honra...
Protestos do PCP.
... não e através da utilização do direito de defesa da honra que vou explicar ao Sr. Deputado Narana Coissoró ...
Protestos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quando há pouco falava no cansaço, tinha alguma razão. Começámos os trabalhos às 14 horas -pelo menos ou comecei às 14 horas - e o dia tem sido um bocado duro. Agradecia, por isso mesmo, que a Câmara se mantivesse em razoável compostura decibélica, ou seja, razoável compostura quanto ao nível sonoro, pois nós aqui não ouvimos convenientemente o que se diz na Câmara.
Queira continuar, Sr. Ministro.
O Orador: - Concluo, Sr. Presidente, reiterando o que antes afirmei: Não se trata de qualquer crítica à Mesa, trata-se apenas da forma que posso utilizar - não recorrendo à defesa da honra, que me parece desprositada nesta altura - para criticar o Sr. Deputado Narana Coissoró pela forma como utilizou determinadas expressões. O mínimo que qualquer parlamento democrático faria em idênticas circunstâncias seria não deixar V. Ex.ª exprimir-se dessa forma, quer em relação à maioria, que em relação ao Governo.
Se V. Ex.ª dá instruções à comunicação social para ler o borrão, permita-me que o instrua também para que leia o borrão e veja a triste figura que fez.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jaime Soares pede a palavra para uma interpelação à Mesa?
O Sr. Jaime Soares (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jaime Soares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, com certeza que como deputado rural que sou deveria agarrar-me aos princípios dessa mesma ruralidade e aprender exactamente aquilo que o povo me ensinou e que normalmente dizia assim: «Não gastes cera com tão fraco defunto.» Quero dizer-lhes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não poderia deixar passar a forma incorrecta, a falta de educação...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas isso é uma intervenção?!
O Orador: - Aos senhores também já respondo, se for preciso!
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de se dirigir à Mesa, para uma interpelação.
O Orador: - Sr. Presidente, interpelo a Mesa no sentido de dizer que se não fosse neste Parlamento, em que o Regimento é evocado por tantas razões que não aquela a que, efectivamente, se destina, iria pedir sob a forma de um inquérito parlamentar ou de um requerimento qualquer um atestado de sanidade mental a determinadas pessoas...
Protestos do PS e do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): -Isto não é rural, e abaixo de cão!
O Orador: - Fiquem descansados que eu não tenho medo!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa, apesar de tudo, conhece alguma coisa de alguns debates parlamentares no País e fora do País.
O Sr. Deputado sabe que a linguagem parlamentar tem alguns códigos, que por vezes é viva e, não raro, excessiva.
A Mesa, para não coarctar os debates - até porque eles ficam e cada um tem a responsabilidade deles -, tem interferido e já interferiu em questão de insultos directos pessoais a determinada pessoa ou instituição. Entendo, no entanto, que quando se expõem pontos de vista, mesmo com uma linguagem que eu possa não aceitar, não tenho o direito de interferir, porque cada um fará e será responsável pelas suas opções.
Em todo o caso, quando fala em «sanidade mental», está a dirigir-se directamente a alguém.
Peço-lhe, Sr. Deputado, que não use expressões personalizadas que possam ser consideradas de natureza ofensiva.
O Orador: - Não me dirigi directamente a ninguém, foi um facto que constatei e disso não abdico, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para defesa da honra, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim
Marques.
O Sr. Joaquim Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser o mais breve possível, mas creio
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que depois das afirmações, que no mínimo poderei qualificar de irreflectidas, do Sr. Deputado Narana Coissoró, não poderíamos, de facto, ficar calados.
Esta bancada, e parece que isso causa muitos engulhos ao Sr. Deputado Narana Coissoró, é composta, efectivamente, por 148 deputados. Mas nós respeitamos todos os outros deputados desta Câmara, assim como também exigimos que nos respeitem a nós e não estamos aqui os 148 aos gritos, como o Sr. Deputado Narana Coissoró, que está ali sozinho e que tem, de facto, que utilizar esse tom de voz para tentar valorizar a sua própria posição individual. Nós, deputados sociais-democratas, respeitamos todos os outros deputados desta Câmara, todos e cada um de nós que está aqui por vontade do povo português, mas não aceitamos lições de moralidade, ou lições de sabedoria, nomeadamente do Sr. Deputado Narana Coissoró, que hoje e neste fim de tarde está a ter um comportamento claramente infeliz.
Era isso que pedia ao Sr. Deputado Narana Coissoró e também aos outros Srs. Deputados, porque comportamentos destes, afirmações destas, não prestigiam quem as profere, mas também não prestigiam a Assembleia da República. E creio que passa por cada um de nós, deputados, sentemo-nos em que bancada nos sentemos, passa por cada um de nós também prestigiar este órgão de soberania e é isso que os portugueses esperam de nós.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, queria em primeiro lugar interpelar V. Ex.ª e a Mesa, no sentido de saber se registaram quaisquer expressões desprimorosas pessoais e ofensivas a quem quer que fosse.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado está a fazer uma pergunta que é uma figura de retórica, mas sabe perfeitamente o funcionamento parlamentar. A Mesa não regista, no borrão da Assembleia é que tudo fica claramente registado.
O Orador: - Em segundo lugar, o eu dizer que 148 que não pensam como eu e aplaudem tudo, não é ofensa para ninguém.
Protestos do PSD.
O Orador: - Em terceiro lugar, pela grande estima e respeito parlamentar e pessoal que me merece o Sr. Ministro dos Negócios Parlamentares, eu direi...
Vozes do PSD: - Negócios?!
Protestos do PSD.
O Orador: -Também é uma ofensa, não é?
Vou apenas fazer um convite ao Governo e ao meu querido amigo e Ministro dos Assuntos Parlamentares: como eu não tenho dinheiro e o Governo tem muito, vamos publicar em suplemento e em qualquer órgão da comunicação social o relato inteiro deste debate para ver quem fez a triste figura.
Risos do PSD e do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, terminou o debate da proposta de lei n.º 18/V, que será votada na quinta-feira.
Amanhã reunimo-nos numa sessão solene comemorativa dos descobrimentos portugueses. Peço a vossa atenção para o facto de que a cerimónia começa as 10 horas e, para tal, é necessário que os Srs. Deputados aqui estejam a partir das 9 horas e 45 minutos.
Está encerrada a sessão.
Eram 21 horas e 15 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Maria Oliveira de Matos.
António Paulo Veloso Bento.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Francisco João Bernardino da Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João José Pedreira de Matos.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Mário Lemos Damião.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel José Dias Soares Costa.
Margarida Borges de Carvalho.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Paulo Manuel Pacheco Silveira.
Valdemar Cardoso Alves.
Partido Socialista (PS):
António Manuel Oliveira Guterres.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Maria Odete dos Santos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PPD/PSD):
António Fernandes Ribeiro.
José Angelo Ferreira Correia.
Partido Socialista (PS):
José Manuel Torres Couto.
Os REDACTORES: Cacilda Nordeste e Carlos Pinto da Cruz.
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DIÁRIO da Assembleia da República
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